compêndio de ensaios jurídicos: temas de direito dos animais - v. 01, n. 01

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TAUÃ LIMA VERDAN RANGEL COMPÊNDIO DE ENSAIOS JURÍDICOS: TEMAS DE DIREITO DOS ANIMAIS V. 01 N. 01

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Tradicionalmente, o Direito é reproduzido por meio de “doutrinas”, que constituem o pensamento de pessoas reconhecidas pela comunidade jurídica em trabalhar, academicamente, determinados assuntos. Assim, o saber jurídico sempre foi concebido como algo dogmático. É possível, à luz da tradicional visão empregada, afirmar que o Direito é um campo no qual não se incluem somente as instituições legais, as ordens legais, as decisões legais; mas, ainda, são computados tudo aquilo que os especialistas em leis dizem acerca das mencionadas instituições, ordens e decisões, materializando, comumente, uma “meta direito”. No Direito, a construção do conhecimento advém da interpretação de leis e as pessoas autorizadas a interpretar as leis são os juristas.Contudo, o alvorecer acadêmico que é presenciado pelos Operadores do Direito, que se debruçam no desenvolvimento de pesquisas, passa a conceber o conhecimento de maneira prática, utilizando as experiências empíricas e o contorno regional como elementos indissociáveis para a compreensão do Direito. Ultrapassa-se a tradicional visão do conhecimento jurídico como algo dogmático, buscando conferir molduras acadêmicas, por meio do emprego de métodos científicos. Neste aspecto, o Compêndio de Ensaios Jurídico objetiva disponibilizar para a comunidade interessada uma coletânea de trabalhos, reflexões e inquietações produzida durante a formação acadêmica do autor. Debruçando-se especificamente sobre a temática de Direito dos Animais, o presente busca trazer para o debate uma série de assuntos contemporâneos e que reclamam maiores reflexões.

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Page 1: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

TAUÃ LIMA VERDAN RANGEL

COMPÊNDIO DE ENSAIOS

JURÍDICOS: TEMAS DE DIREITO

DOS ANIMAIS

V.

01

N.

01

Page 2: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

COMPÊNDIO DE ENSAIOS JURÍDICOS:

TEMAS DE DIREITO DOS ANIMAIS

(V. 01, N. 01)

Capa: Tarsila do Amaral, Cartão Postal (1929).

ISBN: 978-1517124618

Editoração, padronização e formatação de texto

Tauã Lima Verdan Rangel

Projeto Gráfico e capa

Tauã Lima Verdan Rangel

Conteúdo, citações e referências bibliográficas

O autor

É de inteira responsabilidade do autor os conceitos aqui

apresentados. Reprodução dos textos autorizada

mediante citação da fonte.

Page 3: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

A P R E S E N T A Ç Ã O

Tradicionalmente, o Direito é reproduzido por

meio de “doutrinas”, que constituem o pensamento de

pessoas reconhecidas pela comunidade jurídica em

trabalhar, academicamente, determinados assuntos.

Assim, o saber jurídico sempre foi concebido como algo

dogmático. É possível, à luz da tradicional visão

empregada, afirmar que o Direito é um campo no qual

não se incluem somente as instituições legais, as ordens

legais, as decisões legais; mas, ainda, são computados

tudo aquilo que os especialistas em leis dizem acerca das

mencionadas instituições, ordens e decisões,

materializando, comumente, uma “meta direito”. No

Direito, a construção do conhecimento advém da

interpretação de leis e as pessoas autorizadas a

interpretar as leis são os juristas.

Contudo, o alvorecer acadêmico que é

presenciado pelos Operadores do Direito, que se

debruçam no desenvolvimento de pesquisas, passa a

conceber o conhecimento de maneira prática, utilizando

as experiências empíricas e o contorno regional como

elementos indissociáveis para a compreensão do Direito.

Page 4: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

Ultrapassa-se a tradicional visão do conhecimento

jurídico como algo dogmático, buscando conferir

molduras acadêmicas, por meio do emprego de métodos

científicos. Neste aspecto, o Compêndio de Ensaios

Jurídico objetiva disponibilizar para a comunidade

interessada uma coletânea de trabalhos, reflexões e

inquietações produzida durante a formação acadêmica do

autor. Debruçando-se especificamente sobre a temática

de Direito dos Animais, o presente busca trazer para o

debate uma série de assuntos contemporâneos e que

reclamam maiores reflexões.

Boa leitura!

Tauã Lima Verdan Rangel

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5

S U M Á R I O

A proeminência da Declaração Universal dos Direitos dos

Animais na afirmação da solidariedade entre espécies ..... 06

Anotações aos princípios internacionais para a pesquisa

biomédica envolvendo animais: breve painel ..................... 45

Comentários à Lei nº 11.794/2008: reconhecimento do

fortalecimento da solidariedade entre espécies naturais

na pesquisa envolvendo animais ........................................ 76

Do reconhecimento da edificação do Direito dos Animais:

o fortalecimento da solidariedade entre espécies

naturais ................................................................................ 114

O redimensionamento da filosófica concepção de

dignidade entre espécies animais à luz da bioética:

solidariedade entre espécies animais? ................................ 155

Solidariedade entre espécies naturais? O alargamento da

moldura axiológica do princípio da solidariedade

ambiental ............................................................................. 203

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6

A PROEMINÊNCIA DA DECLARAÇÃO UNIVERSAL

DOS DIREITOS DOS ANIMAIS NA AFIRMAÇÃO DA

SOLIDARIEDADE ENTRE ESPÉCIES

Resumo: O objetivo do presente está alicerçado

na análise do princípio da solidariedade,

expressamente positivado no Texto

Constitucional, em uma acepção alargada,

voltada, não apenas para o gênero humano, para

as demais espécies (animais e vegetais)

existentes. Como desdobramento da projeção

normativa do corolário da solidariedade, na órbita

ecológica, há que se estruturar uma solidariedade

entre todas as espécies vivas, na forma de uma

comunidade entre a terra, as plantas, os animais

e os seres humanos, visto que a ameaça ecológica

coloca em risco todas as espécies existentes no

planeta, afetando por igual a todos e ao todo.

Neste diapasão, a necessidade de despertar uma

consciência pautada na solidariedade entre as

espécies naturais é despertada, sobremaneira, em

decorrência das ameaças à vida desencadeadas

pelo desenvolvimento civilizatório fazerem com

que o ser humano se reconheça como um ser

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natural integrante de um todo ameaçado e,

concomitantemente, responsável por tal situação

de ameaça existencial. A ameaça de contaminação

propicia que o ser humano perceba que o seu

corpo integra parte das “coisas naturais” e que,

em razão disso, está sujeito à ameaça

supramencionada. A construção de tal consciência

leva o ser humano a reconhecer, forçosamente,

uma comunidade natural, diante da qual o

estabelecimento de um vínculo de solidariedade e

respeito mútuo como pressuposto para a

permanência existencial das espécies naturais,

abarcando-se em tal concepção o ser humano.

Palavras-chaves: Meio Ambiente. Princípio da

Solidariedade. Espécies Naturais. Interpretação

Axiológica.

Sumário: 1 Ponderações Introdutórias: Breves

notas à construção teórica do Direito Ambiental;

2 Comentários à concepção de Meio Ambiente; 3

A Solidariedade Intergeracional no Direito

Ambiental: O Fortalecimento dos Ideários de

Fraternidade nos Direitos de Terceira

Dimensão; 4 Solidariedade entre Espécies

Naturais? O Alargamento da Moldura Axiológica

do Princípio da Solidariedade Ambiental; 5 A

Proeminência da Declaração Universal dos

Direitos dos Animais na Afirmação da

Solidariedade entre Espécies

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8

1 PONDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS: BREVES

NOTAS À CONSTRUÇÃO TEÓRICA DO DIREITO

AMBIENTAL

Inicialmente, ao se dispensar um exame acerca

do tema colocado em tela, patente se faz arrazoar que a

Ciência Jurídica, enquanto um conjunto multifacetado de

arcabouço doutrinário e técnico, assim como as robustas

ramificações que a integram, reclama uma interpretação

alicerçada nos plurais aspectos modificadores que

passaram a influir em sua estruturação. Neste alamiré,

lançando à tona os aspectos característicos de

mutabilidade que passaram a orientar o Direito, tornou-

se imperioso salientar, com ênfase, que não mais subsiste

uma visão arrimada em preceitos estagnados e

estanques, alheios às necessidades e às diversidades

sociais que passaram a contornar os Ordenamentos

Jurídicos. Ora, infere-se que não mais prospera o

arcabouço imutável que outrora sedimentava a aplicação

das leis, sendo, em decorrência dos anseios da população,

suplantados em uma nova sistemática.

Com espeque em tais premissas, cuida

hastear, com bastante pertinência, como flâmula de

interpretação o “prisma de avaliação o brocardo jurídico

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9

'Ubi societas, ibi jus', ou seja, 'Onde está a sociedade,

está o Direito', tornando explícita e cristalina a relação

de interdependência que esse binômio mantém”1.

Destarte, com clareza solar, denota-se que há uma

interação consolidada na mútua dependência, já que o

primeiro tem suas balizas fincadas no constante processo

de evolução da sociedade, com o fito de que seus

Diplomas Legislativos e institutos não fiquem inquinados

de inaptidão e arcaísmo, em total descompasso com a

realidade vigente. A segunda, por sua vez, apresenta

estrutural dependência das regras consolidadas pelo

Ordenamento Pátrio, cujo escopo primevo é assegurar

que não haja uma vingança privada, afastando, por

extensão, qualquer ranço que rememore priscas eras em

que o homem valorizava a Lei de Talião (“Olho por olho,

dente por dente”), bem como para evitar que se robusteça

um cenário caótico no seio da coletividade.

Ademais, com a promulgação da Constituição

da República Federativa do Brasil de 1988,

imprescindível se fez adotá-la como maciço axioma de

sustentação do Ordenamento Brasileiro, precipuamente

1 VERDAN, Tauã Lima. Princípio da Legalidade: Corolário do

Direito Penal. Jurid Publicações Eletrônicas, Bauru, 22 jun.

2009. Disponível em: <http://jornal.jurid.com.br>. Acesso em 30 mai.

2015.

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10

quando se objetiva a amoldagem do texto legal, genérico

e abstrato, aos complexos anseios e múltiplas

necessidades que influenciam a realidade

contemporânea. Ao lado disso, há que se citar o voto

magistral voto proferido pelo Ministro Eros Grau, ao

apreciar a Ação de Descumprimento de Preceito

Fundamental Nº. 46/DF, “o direito é um organismo vivo,

peculiar porém porque não envelhece, nem permanece

jovem, pois é contemporâneo à realidade. O direito é um

dinamismo. Essa, a sua força, o seu fascínio, a sua

beleza”2. Como bem pontuado, o fascínio da Ciência

Jurídica jaz, justamente, na constante e imprescindível

mutabilidade que apresenta, decorrente do dinamismo

que reverbera na sociedade e orienta a aplicação dos

2 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão em Arguição de

Descumprimento de Preceito Fundamental Nº. 46/DF. Empresa

Pública de Correios e Telégrafos. Privilégio de Entrega de

Correspondências. Serviço Postal. Controvérsia referente à Lei

Federal 6.538, de 22 de Junho de 1978. Ato Normativo que regula

direitos e obrigações concernentes ao Serviço Postal. Previsão de

Sanções nas Hipóteses de Violação do Privilégio Postal.

Compatibilidade com o Sistema Constitucional Vigente. Alegação de

afronta ao disposto nos artigos 1º, inciso IV; 5º, inciso XIII, 170,

caput, inciso IV e parágrafo único, e 173 da Constituição do Brasil.

Violação dos Princípios da Livre Concorrência e Livre Iniciativa. Não

Caracterização. Arguição Julgada Improcedente. Interpretação

conforme à Constituição conferida ao artigo 42 da Lei N. 6.538, que

estabelece sanção, se configurada a violação do privilégio postal da

União. Aplicação às atividades postais descritas no artigo 9º, da lei.

Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Marcos Aurélio.

Julgado em 05 ago. 2009. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso

em 30 mai. 2015.

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Diplomas Legais e os institutos jurídicos neles

consagrados.

Ainda neste substrato de exposição, pode-se

evidenciar que a concepção pós-positivista que passou a

permear o Direito, ofertou, por via de consequência, uma

rotunda independência dos estudiosos e profissionais da

Ciência Jurídica. Aliás, há que se citar o entendimento

de Verdan, “esta doutrina é o ponto culminante de uma

progressiva evolução acerca do valor atribuído aos

princípios em face da legislação”3. Destarte, a partir de

uma análise profunda dos mencionados sustentáculos,

infere-se que o ponto central da corrente pós-positivista

cinge-se à valoração da robusta tábua principiológica que

Direito e, por conseguinte, o arcabouço normativo

passando a figurar, nesta tela, como normas de cunho

vinculante, flâmulas hasteadas a serem adotadas na

aplicação e interpretação do conteúdo das leis.

Nas últimas décadas, o aspecto de

mutabilidade tornou-se ainda mais evidente, em especial,

quando se analisa a construção de novos que derivam da

Ciência Jurídica. Entre estes, cuida destacar a

ramificação ambiental, considerando como um ponto de

congruência da formação de novos ideários e cânones,

3 VERDAN, 2009, s.p.

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motivados, sobretudo, pela premissa de um manancial de

novos valores adotados. Nesta trilha de argumentação,

de boa técnica se apresenta os ensinamentos de

Fernando de Azevedo Alves Brito que, em seu artigo,

aduz: “Com a intensificação, entretanto, do interesse dos

estudiosos do Direito pelo assunto, passou-se a

desvendar as peculiaridades ambientais, que, por

estarem muito mais ligadas às ciências biológicas, até

então era marginalizadas”4. Assim, em decorrência da

proeminência que os temas ambientais vêm, de maneira

paulatina, alcançando, notadamente a partir das últimas

discussões internacionais envolvendo a necessidade de

um desenvolvimento econômico pautado em

sustentabilidade, não é raro que prospere, mormente em

razão de novos fatores, um verdadeiro remodelamento ou

mesmo uma releitura dos conceitos que abalizam a

ramificação ambiental do Direito, com o fito de permitir

que ocorra a conservação e recuperação das áreas

degradadas.

Ademais, há de ressaltar ainda que o direito

4 BRITO, Fernando de Azevedo Alves. A hodierna classificação do

meio-ambiente, o seu remodelamento e a problemática sobre a

existência ou a inexistência das classes do meio-ambiente do

trabalho e do meio-ambiente misto. Boletim Jurídico, Uberaba,

ano 5, n. 968. Disponível em: <http://www.boletimjuridico.com.br>.

Acesso em 30 mai. 2015.

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ambiental passou a figurar, especialmente, depois das

décadas de 1950 e 1960, como um elemento integrante da

farta e sólida tábua de direitos fundamentais. Calha

realçar, com cores quentes, que mais contemporâneos, os

direitos que constituem a terceira dimensão recebem a

alcunha de direitos de fraternidade ou, ainda, de

solidariedade, contemplando, em sua estrutura, uma

patente preocupação com o destino da humanidade5·.

Ora, daí se verifica a inclusão de meio ambiente como um

direito fundamental, logo, está umbilicalmente atrelado

com humanismo e, por extensão, a um ideal de sociedade

mais justa e solidária. Nesse sentido, ainda, é plausível

citar o artigo 3°., inciso I, da Carta Política que abriga

em sua redação tais pressupostos como os princípios

fundamentais do Estado Democrático de Direitos: “Art.

3º - Constituem objetivos fundamentais da República

Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre,

justa e solidária” 6.

Ainda nesta esteira, é possível verificar que a

construção dos direitos encampados sob a rubrica de

5 MOTTA, Sylvio; DOUGLAS, Willian. Direito Constitucional –

Teoria, Jurisprudência e 1.000 Questões 15 ed., rev., ampl. e

atual. Rio de Janeiro: Editora Impetus, 2004, p. 69. 6 BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República

Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 30 mai. 2015.

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terceira dimensão tende a identificar a existência de

valores concernentes a uma determinada categoria de

pessoas, consideradas enquanto unidade, não mais

prosperando a típica fragmentação individual de seus

componentes de maneira isolada, tal como ocorria em

momento pretérito. Com o escopo de ilustrar, de maneira

pertinente as ponderações vertidas, insta trazer à colação

o entendimento do Ministro Celso de Mello, ao apreciar a

Ação Direta de Inconstitucionalidade N°. 1.856/RJ, em

especial quando, com bastante pertinência, destaca que:

Cabe assinalar, Senhor Presidente, que os

direitos de terceira geração (ou de

novíssima dimensão), que materializam

poderes de titularidade coletiva atribuídos,

genericamente, e de modo difuso, a todos os

integrantes dos agrupamentos sociais,

consagram o princípio da solidariedade e

constituem, por isso mesmo, ao lado dos

denominados direitos de quarta geração

(como o direito ao desenvolvimento e o

direito à paz), um momento importante no

processo de expansão e reconhecimento dos

direitos humanos, qualificados estes,

enquanto valores fundamentais

indisponíveis, como prerrogativas

impregnadas de uma natureza

essencialmente inexaurível7.

7 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido em Ação

Direta de Inconstitucionalidade N° 1.856/RJ. Ação Direta De

Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense Nº 2.895/98) -

Legislação Estadual que, pertinente a exposições e a competições

entre aves das raças combatentes, favorece essa prática criminosa -

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Quadra anotar que os direitos alocados sob a

rubrica de direito de terceira dimensão encontram como

assento primordial a visão da espécie humana na

condição de coletividade, superando, via de consequência,

a tradicional visão que está pautada no ser humano em

sua individualidade. Assim, a preocupação identificada

está alicerçada em direitos que são coletivos, cujas

influências afetam a todos, de maneira indiscriminada.

Ao lado do exposto, cuida mencionar, segundo Bonavides,

que tais direitos “têm primeiro por destinatários o gênero

humano mesmo, num momento expressivo de sua

afirmação como valor supremo em termos de

existencialidade concreta”8. Com efeito, os direitos de

terceira dimensão, dentre os quais se inclui ao meio

Diploma Legislativo que estimula o cometimento de atos de

crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei Nº 9.605/98,

ART. 32) - Meio Ambiente - Direito à preservação de sua integridade

(CF, Art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu caráter de

metaindividualidade - Direito de terceira geração (ou de novíssima

dimensão) que consagra o postulado da solidariedade - Proteção

constitucional da fauna (CF, Art. 225, § 1º, VII) - Descaracterização

da briga de galo como manifestação cultural - Reconhecimento da

inconstitucionalidade da Lei Estadual impugnada - Ação Direta

procedente. Legislação Estadual que autoriza a realização de

exposições e competições entre aves das raças combatentes - Norma

que institucionaliza a prática de crueldade contra a fauna –

Inconstitucionalidade. . Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator:

Ministro Celso de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Disponível em:

<www.stf.jus.br>. Acesso em 30 mai. 2015. 8 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 21 ed.

atual. São Paulo: Editora Malheiros Ltda., 2007, p. 569.

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ambiente ecologicamente equilibrado, positivado na

Constituição de 1988, emerge com um claro e tangível

aspecto de familiaridade, como ápice da evolução e

concretização dos direitos fundamentais.

2 COMENTÁRIOS À CONCEPÇÃO DE MEIO

AMBIENTE

Em uma primeira plana, ao lançar mão do

sedimentado jurídico-doutrinário apresentado pelo inciso

I do artigo 3º da Lei Nº. 6.938, de 31 de agosto de 19819,

que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente,

seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá

outras providências, salienta que o meio ambiente

consiste no conjunto e conjunto de condições, leis e

influências de ordem química, física e biológica que

permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.

Pois bem, com o escopo de promover uma facilitação do

aspecto conceitual apresentado, é possível verificar que o

meio ambiente se assenta em um complexo diálogo de

fatores abióticos, provenientes de ordem química e física,

9 BRASIL. Lei Nº. 6.938, de 31 de Agosto de 1981. Dispõe sobre a

Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de

formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 30 mai. 2015.

Page 17: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

17

e bióticos, consistentes nas plurais e diversificadas

formas de seres viventes. Para Silva, considera-se meio-

ambiente como “a interação do conjunto de elementos

naturais, artificiais e culturais que propiciem o

desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas

formas”10.

Nesta senda, ainda, Fiorillo11, ao tecer

comentários acerca da acepção conceitual de meio

ambiente, coloca em destaque que tal tema se assenta em

um ideário jurídico indeterminado, incumbindo, ao

intérprete das leis, promover o seu preenchimento. Dada

à fluidez do tema, é possível colocar em evidência que o

meio ambiente encontra íntima e umbilical relação com

os componentes que cercam o ser humano, os quais são

de imprescindível relevância para a sua existência. O

Ministro Luiz Fux, ao apreciar a Ação Direta de

Inconstitucionalidade N°. 4.029/AM, salientou que:

(...) o meio ambiente é um conceito hoje

geminado com o de saúde pública, saúde de

cada indivíduo, sadia qualidade de vida, diz

a Constituição, é por isso que estou falando

de saúde, e hoje todos nós sabemos que ele é

10 SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. São

Paulo: Malheiros Editores, 2009, p. 20. 11 FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de Direito

Ambiental Brasileiro. 13 ed., rev., atual e ampl. São Paulo:

Editora Saraiva, 2012, p. 77.

Page 18: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

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imbricado, é conceitualmente geminado com

o próprio desenvolvimento. Se antes nós

dizíamos que o meio ambiente é compatível

com o desenvolvimento, hoje nós dizemos, a

partir da Constituição, tecnicamente, que

não pode haver desenvolvimento senão com

o meio ambiente ecologicamente

equilibrado. A geminação do conceito me

parece de rigor técnico, porque salta da

própria Constituição Federal12.

É denotável, desta sorte, que a

constitucionalização do meio ambiente no Brasil

viabilizou um verdadeiro salto qualitativo, no que

concerne, especificamente, às normas de proteção

ambiental. Tal fato decorre da premissa que os robustos

corolários e princípios norteadores foram alçados ao

patamar constitucional, assumindo colocação eminente,

ao lado das liberdades públicas e dos direitos

fundamentais. Superadas tais premissas, aprouve ao

12 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido em

Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 4.029/AM. Ação Direta de

Inconstitucionalidade. Lei Federal Nº 11.516/07. Criação do Instituto

Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Legitimidade da

Associação Nacional dos Servidores do IBAMA. Entidade de Classe

de Âmbito Nacional. Violação do art. 62, caput e § 9º, da

Constituição. Não emissão de parecer pela Comissão Mista

Parlamentar. Inconstitucionalidade dos artigos 5º, caput, e 6º, caput

e parágrafos 1º e 2º, da Resolução Nº 1 de 2002 do Congresso

Nacional. Modulação dos Efeitos Temporais da Nulidade (Art. 27 da

Lei 9.868/99). Ação Direta Parcialmente Procedente. Órgão

Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Luiz Fux. Julgado em 08

mar. 2012. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em 30 mai.

2015.

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Constituinte, ao entalhar a Carta Política Brasileira,

ressoando os valores provenientes dos direitos de terceira

dimensão, insculpir na redação do artigo 225, conceder

amplo e robusto respaldo ao meio ambiente como pilar

integrante dos direitos fundamentais. “Com o advento da

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988,

as normas de proteção ambiental são alçadas à categoria

de normas constitucionais, com elaboração de capítulo

especialmente dedicado à proteção do meio ambiente”13.

Nesta toada, ainda, é observável que o caput do artigo

225 da Constituição Federal14 está abalizado em quatro

pilares distintos, robustos e singulares que, em conjunto,

dão corpo a toda tábua ideológica e teórica que assegura

o substrato de edificação da ramificação ambiental.

Primeiramente, em decorrência do tratamento

dispensado pelo artífice da Constituição Federal, o meio

ambiente foi içado à condição de direito de todos,

presentes e futuras gerações. É encarado como algo

13 THOMÉ, Romeu. Manual de Direito Ambiental: Conforme o

Novo Código Florestal e a Lei Complementar 140/2011. 2 ed.

Salvador: Editora JusPodivm, 2012, p. 116. 14 BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República

Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 30 mai. 2015: “Art.

225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,

bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,

impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e

preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

Page 20: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

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pertencente a toda coletividade, assim, por esse prisma,

não se admite o emprego de qualquer distinção entre

brasileiro nato, naturalizado ou estrangeiro, destacando-

se, sim, a necessidade de preservação, conservação e não-

poluição. O artigo 225, devido ao cunho de direito difuso

que possui, extrapola os limites territoriais do Estado

Brasileiro, não ficando centrado, apenas, na extensão

nacional, compreendendo toda a humanidade. Neste

sentido, inclusive, o Ministro Celso de Mello, ao apreciar

a Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 1.856/RJ,

destacou, com bastante pertinência, que:

A preocupação com o meio ambiente - que

hoje transcende o plano das presentes

gerações, para também atuar em favor das

gerações futuras (...) tem constituído, por

isso mesmo, objeto de regulações

normativas e de proclamações jurídicas,

que, ultrapassando a província meramente

doméstica do direito nacional de cada

Estado soberano, projetam-se no plano das

declarações internacionais, que refletem, em

sua expressão concreta, o compromisso das

Nações com o indeclinável respeito a esse

direito fundamental que assiste a toda a

Humanidade15.

15 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido em

Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 1.856/RJ. Ação Direta De

Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense Nº 2.895/98) -

Legislação Estadual que, pertinente a exposições e a competições

entre aves das raças combatentes, favorece essa prática criminosa -

Diploma Legislativo que estimula o cometimento de atos de

crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei Nº 9.605/98,

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21

O termo “todos”, aludido na redação do caput

do artigo 225 da Constituição Federal de 1988, faz

menção aos já nascidos (presente geração) e ainda

aqueles que estão por nascer (futura geração), cabendo

àqueles zelar para que esses tenham à sua disposição, no

mínimo, os recursos naturais que hoje existem. Tal fato

encontra como arrimo a premissa que foi reconhecido ao

gênero humano o direito fundamental à liberdade, à

igualdade e ao gozo de condições de vida adequada, em

ambiente que permita desenvolver todas as suas

potencialidades em clima de dignidade e bem-estar.

Pode-se considerar como um direito transgeracional, ou

seja, ultrapassa as gerações, logo, é viável afirmar que o

meio-ambiente é um direito público subjetivo. Desta

feita, o ideário de que o meio ambiente substancializa

patrimônio público a ser imperiosamente assegurado e

ART. 32) - Meio Ambiente - Direito à preservação de sua integridade

(CF, Art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu caráter de

metaindividualidade - Direito de terceira geração (ou de novíssima

dimensão) que consagra o postulado da solidariedade - Proteção

constitucional da fauna (CF, Art. 225, § 1º, VII) - Descaracterização

da briga de galo como manifestação cultural - Reconhecimento da

inconstitucionalidade da Lei Estadual impugnada - Ação Direta

procedente. Legislação Estadual que autoriza a realização de

exposições e competições entre aves das raças combatentes - Norma

que institucionaliza a prática de crueldade contra a fauna –

Inconstitucionalidade. . Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator:

Ministro Celso de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Disponível em:

<www.stf.jus.br>. Acesso em 30 mai. 2015.

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22

protegido pelos organismos sociais e pelas instituições

estatais, qualificando verdadeiro encaro irrenunciável

que se impõe, objetivando sempre o benefício das

presentes e das futuras gerações, incumbindo tanto ao

Poder Público quanto à coletividade considerada em si

mesma.

Assim, decorrente de tal fato, produz efeito

erga omnes, sendo, portanto, oponível contra a todos,

incluindo pessoa física/natural ou jurídica, de direito

público interno ou externo, ou mesmo de direito privado,

como também ente estatal, autarquia, fundação ou

sociedade de economia mista. Impera, também,

evidenciar que, como um direito difuso, não subiste a

possibilidade de quantificar quantas são as pessoas

atingidas, pois a poluição não afeta tão só a população

local, mas sim toda a humanidade, pois a coletividade é

indeterminada. Nesta senda, o direito à integridade do

meio ambiente substancializa verdadeira prerrogativa

jurídica de titularidade coletiva, ressoando a expressão

robusta de um poder deferido, não ao indivíduo

identificado em sua singularidade, mas num sentido

mais amplo, atribuído à própria coletividade social.

Com a nova sistemática entabulada pela

redação do artigo 225 da Carta Maior, o meio-ambiente

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passou a ter autonomia, tal seja não está vinculada a

lesões perpetradas contra o ser humano para se

agasalhar das reprimendas a serem utilizadas em

relação ao ato perpetrado. Figura-se, ergo, como bem de

uso comum do povo o segundo pilar que dá corpo aos

sustentáculos do tema em tela. O axioma a ser

esmiuçado, está atrelado o meio-ambiente como vetor da

sadia qualidade de vida, ou seja, manifesta-se na

salubridade, precipuamente, ao vincular a espécie

humana está se tratando do bem-estar e condições

mínimas de existência. Igualmente, o sustentáculo em

análise se corporifica também na higidez, ao cumprir os

preceitos de ecologicamente equilibrado, salvaguardando

a vida em todas as suas formas (diversidade de espécies).

Por derradeiro, o quarto pilar é a

corresponsabilidade, que impõe ao Poder Público o dever

geral de se responsabilizar por todos os elementos que

integram o meio ambiente, assim como a condição

positiva de atuar em prol de resguardar. Igualmente,

tem a obrigação de atuar no sentido de zelar, defender e

preservar, asseverando que o meio-ambiente permaneça

intacto. Aliás, este último se diferencia de conservar que

permite a ação antrópica, viabilizando melhorias no meio

ambiente, trabalhando com as premissas de

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desenvolvimento sustentável, aliando progresso e

conservação. Por seu turno, o cidadão tem o dever

negativo, que se apresenta ao não poluir nem agredir o

meio-ambiente com sua ação. Além disso, em razão da

referida corresponsabilidade, são titulares do meio

ambiente os cidadãos da presente e da futura geração.

3 A SOLIDARIEDADE INTERGERACIONAL NO

DIREITO AMBIENTAL: O FORTALECIMENTO

DOS IDEÁRIOS DE FRATERNIDADE NOS

DIREITOS DE TERCEIRA DIMENSÃO

Em sede de comentários introdutórios, ao

volver um olhar analítico para o tema colocado em

debate, forçoso é reconhecer que o corolário da

solidariedade intergeracional apresenta-se como reflexo

de direitos de terceira dimensão, denominados direitos

de solidariedade ou fraternidade. Com destaque, os

direitos encampados pela denominação ora expendida

encontra como alicerce de sustentação o ideário de

fraternidade e tem como exemplos o direito ao meio

ambiente equilibrado, à saudável qualidade de vida, ao

progresso, à paz, à autodeterminação dos povos, a

proteção e defesa do consumidor, além de outros

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direitos considerados como difusos. “Dotados de altíssimo

teor de humanismo e universalidade, os direitos de

terceira geração tendem a cristalizar-se no fim do século

XX enquanto direitos que não se destinam

especificamente à proteção dos interesses de um

indivíduo, de um grupo”16 ou mesmo de um Ente Estatal

especificamente. Ainda nesta esteira, é possível verificar

que a construção dos direitos encampados sob a rubrica

de terceira dimensão tende a identificar a existência de

valores concernentes a uma determinada categoria de

pessoas, consideradas enquanto unidade, não mais

prosperando a típica fragmentação individual de seus

componentes de maneira isolada, tal como ocorria em

momento pretérito. Com efeito, está-se diante de

valores transindividuais, eis que os direitos abarcados

pela dimensão em comento não estão restritos a

determinados indivíduos; ao reverso, incBRASIL sobre

a coletividade. Ao lado disso, os direitos de terceira

dimensão são considerados como difusos, porquanto não

têm titular individual, sendo que o liame entre os seus

vários titulares decorre de mera circunstância factual.

Nesta feita, importa acrescentar que os

direitos de terceira dimensão possuem caráter

16 BONAVIDES, 2007, p. 569.

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transindividual, o que os faz abranger a toda a

coletividade, sem quaisquer restrições a grupos

específicos. Ora, o ideário de solidariedade alberga

justamente um sucedâneo de direitos que contemplam a

coletividade enquanto unidade, não se atendendo a

característicos diferenciadores ou mesmo

particularidades segregadoras. Neste sentido, pautaram-

se Motta e Motta e Barchet, ao afirmarem, em suas

ponderações, que “os direitos de terceira geração

possuem natureza essencialmente transindividual,

porquanto não possuem destinatários especificados,

como os de primeira e segunda geração, abrangendo a

coletividade como um todo”17. Desta feita, são direitos

de titularidade difusa ou coletiva, alcançando

destinatários indeterminados ou, ainda, de difícil

determinação. Nesta esteira de exposição, os direitos em

comento estão vinculados a valores de fraternidade ou

solidariedade, sendo traduzidos de um ideal

intergeracional, que liga as gerações presentes às

futuras, a partir da percepção de que a qualidade de vida

destas depende sobremaneira do modo de vida daquelas.

Dos ensinamentos dos célebres doutrinadores, percebe-se

que o caráter difuso de tais direitos permite a

17 MOTTA, Sylvio; BARCHET, Gustavo. Curso de Direito

Constitucional. Rio de Janeiro: Editora Elsevier, 2007, p. 152.

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abrangência às gerações futuras, razão pela qual, a

valorização destes é de extrema relevância. “Têm

primeiro por destinatários o gênero humano mesmo,

num momento expressivo de sua afirmação como valor

supremo em termos de existencialidade concreta”18. A

respeito do assunto, com bastante pertinência, Motta e

Barchet19, em seu magistério, ensinam que os direitos de

terceira dimensão surgiram como “soluções” à

degradação das liberdades, à deterioração dos direitos

fundamentais em virtude do uso prejudicial das

modernas tecnologias e desigualdade socioeconômica

vigente entre as diferentes nações.

Tecidos estes comentários, ao esmiuçar o

corolário da solidariedade intergeracional, também

denominado de princípio da equidade ou princípio do

acesso equitativo dos recursos naturais, salta aos olhos

sua íntima relação com a temática dos espaços

protegidos, eis que configura um dos baldrames robustos

18 BONAVIDES, 2007, p. 569. 19 MOTTA; BARCHET, 2007, p. 153. “Duas são as origens básicas

desses direitos: a degradação das liberdades ou a deterioração dos

demais direitos fundamentais em virtude do uso nocivo das

modernas tecnologias e o nível de desigualdade social e econômica

existente entre as diferentes nações. A fim de superar tais

realidades, que afetam a humanidade como um todo, impõe-se o

reconhecimento de direitos que também tenham tal abrangência – a

humanidade como um todo -, partindo-se da ideia de que não há

como se solucionar problemas globais a não ser através de soluções

também globais. Tais “soluções” são os direitos de terceira geração”.

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para a sua estruturação. Afora isso, é possível verificar a

materialização do dogma em comento no caput do

artigo 225 da Constituição da República Federativa do

Brasil de 198820. Assim, a atual geração, ao instituir

os espaços protegidos, furta-se à sua utilização normal

(aqui considerada aquela utilização encontradiça fora

desses espaços) para garantir as presentes gerações e,

sobretudo, às futuras, o equilíbrio do meio ambiente,

mediante a manutenção da biodiversidade. Logo, a

adoção do termo “solidariedade intergeracional” busca,

justamente, destacar esse elo de responsabilidade da

atual geração pela existência das futuras. Neste sentido,

é possível trazer à colação o paradigmático entendimento

jurisprudencial construído, no qual acena, com clareza

solar, que:

Ementa: Arguição de Descumprimento de

Preceito Fundamental: Adequação.

Observância do princípio da

subsidiariedade. Arts. 170, 196 e 225 da

Constituição da República.

Constitucionalidade de atos normativos

20 BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República

Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 30 mai. 2015: “Art.

225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,

bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,

impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e

preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

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proibitivos da importação de pneus usados.

Reciclagem de pneus usados: ausência de

eliminação total de seus efeitos nocivos à

saúde e ao meio ambiente equilibrado.

Afronta aos princípios constitucionais da

saúde e do meio ambiente ecologicamente

equilibrado. Coisa julgada com conteúdo

executado ou exaurido: impossibilidade de

alteração. Decisões judiciais com conteúdo

indeterminado no tempo: proibição de novos

efeitos a partir do julgamento. Arguição

julgada parcialmente procedente. 1.

Adequação da arguição pela correta

indicação de preceitos fundamentais

atingidos, a saber, o direito à saúde, direito

ao meio ambiente ecologicamente

equilibrado (arts. 196 e 225 da Constituição

Brasileira) e a busca de desenvolvimento

econômico sustentável: princípios

constitucionais da livre iniciativa e da

liberdade de comércio interpretados e

aplicados em harmonia com o do

desenvolvimento social saudável.

Multiplicidade de ações judiciais, nos

diversos graus de jurisdição, nas quais se

têm interpretações e decisões divergentes

sobre a matéria: situação de insegurança

jurídica acrescida da ausência de outro meio

processual hábil para solucionar a polêmica

pendente: observância do princípio da

subsidiariedade. Cabimento da presente

ação. [...] 4. Princípios constitucionais (art.

225) a) do desenvolvimento sustentável e b)

da equidade e responsabilidade

intergeracional. Meio ambiente

ecologicamente equilibrado: preservação

para a geração atual e para as gerações

futuras. Desenvolvimento sustentável:

crescimento econômico com garantia

paralela e superiormente respeitada da

saúde da população, cujos direitos devem

ser observados em face das necessidades

atuais e daquelas previsíveis e a serem

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prevenidas para garantia e respeito às

gerações futuras. Atendimento ao princípio

da precaução, acolhido constitucionalmente,

harmonizado com os demais princípios da

ordem social e econômica [...] (Supremo

Tribunal Federal – Tribunal Pleno/ ADPF

nº 101/ Relatora: Ministra Cármen Lúcia/

Julgado em 24.06.2009/ Publicado no DJe

em 01.06.2012).

Observar-se-á a existência de duas espécies de

solidariedade intergeracional, tais sejam: uma pautada

na atual geração, denominada, em razão disso, de

sincrônica; e, outra voltada para as futuras gerações,

chamada anacrônica. Com destaque, assinalar faz-se

imprescindível, consoante entendimento explicitado por

Andréia Minussi Facin21, que é possível enumerar três

formas distintas de acesso a bens materiais, quais

sejam: acesso visando o consumo do bem, tal como ocorre

com a captação de água e instrumentos predatórios de

caça e pesca; acesso causando poluição ao meio ambiente,

a exemplo do que se denota no acesso à água ou ao ar,

lançando, para tanto, poluentes ou emitindo poluição

sonora; e, acesso ao meio ambiente para a contemplação

de seus elementos e paisagem. Verifica-se, deste modo, a

21 FACIN, Andréia Minussi. Meio-ambiente e direitos humanos. Jus

Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, 01 nov. 2002. Disponível em:

<http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3463>. Acesso em 30

mai. 2015.

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31

existência do meio ecologicamente equilibrado não se

traduz somente na preservação para a geração atual,

mas, também, para as gerações futuras. Logo, se o

pavilhão desfraldado tremula em direção ao

desenvolvimento sustentável, patente faz-se que a

concepção albergue o crescimento econômico como

garantia paralela e superiormente respeitada da saúde

da população, cujo acervo de direito devem ser

observados, tendo-se em vista não apenas as

necessidades atuais, contudo, também, as que são

passíveis de prevenção para as gerações futuras. Neste

sedimento de exposição, cuida apontar, com ênfase, que

está diretamente vinculado ao corolário em comento o

preceito da precaução, já que a necessidade de

afastamento de perigo, tal como a adoção de

instrumentos que busquem a promoção da segurança dos

procedimentos adotado para a garantia das gerações

futuras, efetivando-se apenas por meio da

sustentabilidade ambiental das nações humanas.

Denota-se, destarte, que o princípio em

comento torna efetiva a busca incansável pela proteção

da existência humana, seja tanto pela proteção do meio

ambiente como pela estruturação de condições que

salvaguardem a saúde e a integridade física,

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considerando-se o indivíduo em sua inteireza. Gize-se

que tal fato decorre da nova visão reinante, na qual há

que se adotar, como política pública, o que se faz

imprescindível para antecipar os riscos de danos que

sejam passíveis de materialização em relação ao meio

ambiente, tanto quanto o impacto que as ações ou as

omissões possam produzir. Ora, o artigo 225 da

Constituição da República Federativa do Brasil de

198822., ao estabelecer o ônus em relação à coletividade e

ao Poder Público, na condição de dever, de defender e

preservar o meio ambiente para as presentes e futuras

gerações, inaugura um dever geral arrimado na

prevenção de riscos ambientais, no patamar de um

ordem normativa objetiva de antecipação de futuros

danos ambientais, os quais encontram como

sustentáculos os dogmas da prevenção, quando tratar de

riscos concretos, e da precaução, quando estiver diante

de riscos abstratos.

No mais, cuida colocar em destaque que a

reserva dos bens ambientais, com a sua não utilização

22 BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República

Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 30 mai. 2015: “Art.

225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,

bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,

impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e

preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

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33

atual, passaria a ser equitativa se fosse demonstrado que

ela ocorrera com o escopo de evitar o esgotamento dos

recursos, com a guarda desses bens para as futuras

gerações. Neste passo, ao se considerar a densidade da

moldura de fraternidade e solidariedade que reveste o

acesso ao meio ambiente, em especial devido ao status de

elemento que assegura o alcance da dignidade da pessoa

humana, considerando o indivíduo em todas as suas

potencialidades e complexidades, não é possível suprimir

que a manutenção da preservação dos bens ambientais

refoge ao ideário ingênuo de meio ambiente intocável,

mas sim lhe confere à contemporaneidade ao tema. “A

equidade no acesso aos recursos ambientais deve ser

enfocada não só com relação à localização especial dos

usuários atuais, como em relação aos usuários

potenciais das gerações vindouras”23.

Com efeito, um posicionamento equânime não

é fácil de ser construído, vindicando considerações

dotadas de ordem ética, científica e econômica das

gerações atuais e uma avaliação prospectiva das

necessidades futuras, nem sempre possíveis de serem

conhecidas e medidas no presente. Neste aspecto, é

23 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental

Brasileiro. 21 ed. São Paulo: Editores Malheiros, 2013, p. 92.

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possível colocar em destaque que o aspecto

intergeracional que tende a caracterizar o discurso de

proteção e preservação ambiental ambiciona conferir

concreção ao ideário de solidariedade que caracteriza o

direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado

enquanto direito de terceira dimensão. Supera-se, com

efeito, a essência de individualidade que caracterizou os

direitos humanos, adotados uma ótica na qual a

preocupação com o semelhante, mesmo em se tratando

de uma geração futura, é dotada de grande

proeminência, analisando-se a coletividade na condição

de unidade, na qual cada um dos indivíduos é dotado de

relevância e substancial atenção. Tal fato decorre,

notadamente, do superprincípio da dignidade da pessoa

humana, o qual só alcança sua materialização por meio

da conjunção de inúmeros, porém carecidos, direitos, os

quais, em um fim último, proporcionam a realização de

todas as complexidades encerradas no ser humano.

Ademais, um aspecto característico

proeminente da sociedade contemporânea está

assentado na sua paradoxal capacidade de controlar e

produzir indeterminações. Entrementes, a forma como

esse dever será atendido constitui tarefa inafastável dos

órgãos estatais, os quais dispõem de ampla liberdade de

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35

conformação, atentando-se para os limites

constitucionais consagrados. Com efeito, as mencionadas

determinações constitucionais objetivam evitar riscos,

encontrando assento, para tanto, no próprio Texto

Constitucional, o que autoriza o Estado a atuar de modo

a evitar riscos para o cidadão em geral, por meio da

adoção de medidas de proteção ou de prevenção da saúde

e do meio ambiente, notadamente em relação ao

desenvolvimento técnico ou tecnológico e suas

consequências para as presentes e futuras gerações. No

controle judicial de políticas públicas do meio ambiente,

a atuação do Poder Judiciário deve buscar a garantia,

inclusive, o mínimo existencial ecológico dos indivíduos

atingidos diretamente e indiretamente em seu

patrimônio de natureza material e imaterial, neste

sentido, visando garantir a inviolabilidade do direito

fundamental à sadia qualidade de vida, bem assim a

defesa e preservação do meio ambiente ecologicamente

equilibrado, em busca do desenvolvimento sustentável

para as presentes e futuras gerações.

4 SOLIDARIEDADE ENTRE ESPÉCIES

NATURAIS? O ALARGAMENTO DA MOLDURA

AXIOLÓGICA DO PRINCÍPIO DA

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36

SOLIDARIEDADE AMBIENTAL

Como desdobramento da projeção normativa do

corolário da solidariedade, na órbita ecológica, há que se

estruturar uma solidariedade entre todas as espécies

vivas, na forma de uma comunidade entre a terra, as

plantas, os animais e os seres humanos, visto que a

ameaça ecológica coloca em risco todas as espécies

existentes no planeta, afetando por igual a todos e ao

todo. Neste diapasão, a necessidade de despertar uma

consciência pautada na solidariedade entre as espécies

naturais é despertada, sobremaneira, em decorrência

das ameaças à vida desencadeadas pelo desenvolvimento

civilizatório fazerem com que o ser humano se reconheça

como um ser natural integrante de um todo ameaçado e,

concomitantemente, responsável por tal situação de

ameaça existencial. Segundo Sarlet e Fensterseifer24, a

ameaça de contaminação propicia que o ser humano

perceba que o seu corpo integra parte das “coisas

naturais” e que, em razão disso, está sujeito à ameaça

supramencionada. A construção de tal consciência leva o

ser humano a reconhecer, forçosamente, uma

24 SARLET, Ingo Wolfgang; FENSTERSEIFER, Tiago. Princípios

do Direito Ambiental. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 77.

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comunidade natural, diante da qual o estabelecimento de

um vínculo de solidariedade e respeito mútuo como

pressuposto para a permanência existencial das espécies

naturais, abarcando-se em tal concepção o ser humano.

Em uma perspectiva jurídica, a vedação das

políticas cruéis contra os animais (não humanos)

encontra repouso no Texto Constitucional, reforçando,

portanto, o ideário axiológico de solidariedade entre as

espécies naturais. Mais que isso, ao analisar o

julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº

1.856/RJ, de relatoria do Ministro Celso de Mello, salta

aos olhos a concreção do dogma em comento, em especial

quando a ementa consagra que “a promoção de briga de

galos, além de caracterizar prática criminosa tipificada

na legislação ambiental, configura conduta atentatória à

Constituição da República, que veda a submissão de

animais a atos de crueldade”25. Ora, há que se

25 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido na

Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.856/RJ. Ação Direta de

Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense nº 2.895/98) -

Legislação estadual que, pertinente a exposições e a competições

entre aves das raças combatentes, favorece essa prática criminosa -

Diploma legislativo que estimula o cometimento de atos de

crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei nº 9.605/98,

art. 32) - Meio Ambiente - Direito à preservação de sua integridade

(CF, art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu caráter de

metaindividualidade - Direito de terceira geração (ou de novíssima

dimensão) que consagra o postulado da solidariedade - Proteção

constitucional da fauna (CF, art. 225, § 1º, VII) - Descaracterização

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reconhecer que essa especial tutela, que tem por

fundamento legitimador a autoridade da Constituição da

República, é motivada pela necessidade de impedir a

ocorrência de situações de risco que ameacem ou que

façam periclitar todas as formas de vida, não só a do

gênero humano, mas, também, a própria vida animal,

cuja integridade restaria comprometida, não fora a

vedação constitucional, por práticas aviltantes,

perversas e violentas contra os seres irracionais. “A ideia

de „solidariedade entre espécies naturais‟, portanto,

também pode transportar o reconhecimento do valor

intrínseco de todas as manifestações existenciais, bem

como o respeito à reciprocidade indispensável ao convívio

harmonioso” 26, estendido a todos os seres vivos. Salta

aos olhos, desta feita, que o princípio da solidariedade,

cuja incidência deve ser maximizada em diversos

âmbitos, inclusive na seara ambiental, passa a ser

desfraldado como pilar sustentador das relações

contemporâneas, em sua senda civilizatória,

considerando todas as suas dimensões, a saber:

da briga de galo como manifestação cultural - Reconhecimento da

inconstitucionalidade da lei estadual impugnada - Ação Direta

Procedente. Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Celso

de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Publicado no DJe em 13 out.

2011. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em 21 jan. 2014. 26 SARLET; FENSTERSEIFER, 2014, p. 77.

Page 39: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

39

intergeracional, intrageracional e interespécies.

5 A PROEMINÊNCIA DA DECLARAÇÃO

UNIVERSAL DOS DIREITOS DOS ANIMAIS NA

AFIRMAÇÃO DA SOLIDARIEDADE ENTRE

ESPÉCIES

Em um primeiro comentário, cuida destacar

que a Declaração Universal dos Direitos dos Animais

considera que todo o animal possui direitos, bem como

que o desconhecimento e o desprezo desses direitos têm

levado e continuam a levar o homem a cometer crimes

contra os animais e contra a natureza. Igualmente, a

Declaração estabelece que o reconhecimento pela espécie

humana do direito à existência das outras espécies

animais constitui o fundamento da coexistência das

outras espécies no mundo, tal como que os genocídios são

perpetrados pelo homem e há o perigo de continuar a

perpetrar outros. No mais, o documento considera que o

respeito dos homens pelos animais está ligado ao respeito

dos homens pelo seu semelhante, assim como que a

educação deve ensinar desde a infância a observar, a

compreender, a respeitar e a amar os animais. Em seu

artigo 1º, a Declaração estabelece que todos os animais

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40

nascem iguais diante da vida,e têm o mesmo direito à

existência. Já o artigo subsequente assinala que: a) cada

animal tem direito ao respeito; b) o homem, enquanto

espécie animal, não pode atribuir-se o direito de

exterminar os outros animais, ou explorá-los, violando

esse direito. Ele tem o dever de colocar a sua consciência

a serviço dos outros animais; c) cada animal tem direito à

consideração, à cura e à proteção do homem.

Preconiza o artigo 3º que: a) nenhum animal

será submetido a maus-tratos e a atos cruéis; b) se a

morte de um animal é necessária, deve ser instantânea,

sem dor ou angústia. Por sua vez, o artigo 4º estabelece

que: a) cada animal que pertence a uma espécie selvagem

tem o direito de viver livre no seu ambiente natural

terrestre, aéreo e aquático, e tem o direito de reproduzir-

se; b) a privação da liberdade, ainda que para fins

educativos, é contrária a este direito. Assinala o artigo 5º

que: a) cada animal pertencente a uma espécie, que vive

habitualmente no ambiente do homem, tem o direito de

viver e crescer segundo o ritmo e as condições de vida e

de liberdade que são próprias de sua espécie; b) toda a

modificação imposta pelo homem para fins mercantis é

contrária a esse direito. Aponta o artigo 6º: a) cada

animal que o homem escolher para companheiro tem o

Page 41: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

41

direito a uma duração de vida conforme sua longevidade

natural; b) o abandono de um animal é um ato cruel e

degradante. Frisa o artigo 7º que cada animal que

trabalha tem o direito a uma razoável limitação do tempo

e intensidade do trabalho, e a uma alimentação

adequada e ao repouso. No mais, ofusca o artigo 8º que:

a) a experimentação animal, que implica em sofrimento

físico, é incompatível com os direitos do animal, quer seja

uma experiência médica, científica, comercial ou

qualquer outra; b) as técnicas substitutivas devem ser

utilizadas e desenvolvidas.

O artigo subsequente destaca que nenhum

animal deve ser criado para servir de alimentação, deve

ser nutrido, alojado, transportado e abatido, sem que

para ele tenha ansiedade ou dor. Já o artigo 10º esclarece

que nenhum animal deve ser usado para divertimento do

homem. A exibição dos animais e os espetáculos que

utilizem animais são incompatíveis com a dignidade do

animal. Assinala o artigo 11 que o ato que leva à morte

de um animal sem necessidade é um biocídio, ou seja, um

crime contra a vida. Por sua vez, o artigo subsequente: a)

cada ato que leve à morte um grande número de animais

selvagens é um genocídio, ou seja, um delito contra a

espécie; b) o aniquilamento e a destruição do meio

Page 42: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

42

ambiente natural levam ao genocídio. No mais, o artigo

13 explicita que: a) o animal morto deve ser tratado com

respeito; b) as cenas de violência de que os animais são

vítimas, devem ser proibidas no cinema e na televisão, a

menos que tenham como fim mostrar um atentado aos

direitos dos animais. Por derradeiro, o artigo 14 destaca

que: a) as associações de proteção e de salvaguarda dos

animais devem ser representadas a nível de governo; b)

os direitos dos animais devem ser defendidos por leis,

como os direitos dos homens.

REFERÊNCIA:

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito

Constitucional. 21 ed. atual. São Paulo: Editora

Malheiros Ltda., 2007.

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em: <www.stf.jus.br>. Acesso em 30 mai. 2015.

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Page 45: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

45

ANOTAÇÕES AOS PRINCÍPIOS INTERNACIONAIS

PARA A PESQUISA BIOMÉDICA ENVOLVENDO

ANIMAIS: BREVE PAINEL

Resumo: O objetivo do presente está alicerçado

na análise dos princípios internacionais para a

pesquisa biomédica envolvendo animais. Como

desdobramento da projeção normativa do

corolário da solidariedade, na órbita ecológica, há

que se estruturar uma solidariedade entre todas

as espécies vivas, na forma de uma comunidade

entre a terra, as plantas, os animais e os seres

humanos, visto que a ameaça ecológica coloca em

risco todas as espécies existentes no planeta,

afetando por igual a todos e ao todo. Neste

diapasão, a necessidade de despertar uma

consciência pautada na solidariedade entre as

espécies naturais é despertada, sobremaneira, em

decorrência das ameaças à vida desencadeadas

pelo desenvolvimento civilizatório fazerem com

que o ser humano se reconheça como um ser

natural integrante de um todo ameaçado e,

concomitantemente, responsável por tal situação

de ameaça existencial. A ameaça de contaminação

Page 46: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

46

propicia que o ser humano perceba que o seu

corpo integra parte das “coisas naturais” e que,

em razão disso, está sujeito à ameaça

supramencionada. A construção de tal consciência

leva o ser humano a reconhecer, forçosamente,

uma comunidade natural, diante da qual o

estabelecimento de um vínculo de solidariedade e

respeito mútuo como pressuposto para a

permanência existencial das espécies naturais,

abarcando-se em tal concepção o ser humano.

Palavras-chaves: Solidariedade entre Espécies.

Direito dos Animais. Pesquisa com Animais.

Sumário: 1 Ponderações Introdutórias: Breves

notas à construção teórica do Direito Ambiental;

2 Comentários à concepção de Meio Ambiente; 3

Solidariedade entre Espécies Naturais? O

Alargamento da Moldura Axiológica do Princípio

da Solidariedade Ambiental; 4 Do

Reconhecimento da Edificação do Direito dos

Animais: O fortalecimento da solidariedade entre

espécies naturais; 5 Anotações aos Princípios

Internacionais para a Pesquisa Biomédica

envolvendo Animais: Breve Painel

Page 47: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

47

1 PONDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS: BREVES

NOTAS À CONSTRUÇÃO TEÓRICA DO DIREITO

AMBIENTAL

Inicialmente, ao se dispensar um exame acerca

do tema colocado em tela, patente se faz arrazoar que a

Ciência Jurídica, enquanto um conjunto multifacetado de

arcabouço doutrinário e técnico, assim como as robustas

ramificações que a integram, reclama uma interpretação

alicerçada nos plurais aspectos modificadores que

passaram a influir em sua estruturação. Neste alamiré,

lançando à tona os aspectos característicos de

mutabilidade que passaram a orientar o Direito, tornou-

se imperioso salientar, com ênfase, que não mais subsiste

uma visão arrimada em preceitos estagnados e

estanques, alheios às necessidades e às diversidades

sociais que passaram a contornar os Ordenamentos

Jurídicos. Ora, infere-se que não mais prospera o

arcabouço imutável que outrora sedimentava a aplicação

das leis, sendo, em decorrência dos anseios da população,

suplantados em uma nova sistemática.

Com espeque em tais premissas, cuida

hastear, com bastante pertinência, como flâmula de

interpretação o “prisma de avaliação o brocardo jurídico

Page 48: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

48

'Ubi societas, ibi jus', ou seja, 'Onde está a sociedade,

está o Direito', tornando explícita e cristalina a relação

de interdependência que esse binômio mantém”27.

Destarte, com clareza solar, denota-se que há uma

interação consolidada na mútua dependência, já que o

primeiro tem suas balizas fincadas no constante processo

de evolução da sociedade, com o fito de que seus

Diplomas Legislativos e institutos não fiquem inquinados

de inaptidão e arcaísmo, em total descompasso com a

realidade vigente. A segunda, por sua vez, apresenta

estrutural dependência das regras consolidadas pelo

Ordenamento Pátrio, cujo escopo primevo é assegurar

que não haja uma vingança privada, afastando, por

extensão, qualquer ranço que rememore priscas eras em

que o homem valorizava a Lei de Talião (“Olho por olho,

dente por dente”), bem como para evitar que se robusteça

um cenário caótico no seio da coletividade.

Ademais, com a promulgação da Constituição

da República Federativa do Brasil de 1988,

imprescindível se fez adotá-la como maciço axioma de

sustentação do Ordenamento Brasileiro, precipuamente

27 VERDAN, Tauã Lima. Princípio da Legalidade: Corolário do

Direito Penal. Jurid Publicações Eletrônicas, Bauru, 22 jun.

2009. Disponível em: <http://jornal.jurid.com.br>. Acesso em 12 jun.

2015.

Page 49: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

49

quando se objetiva a amoldagem do texto legal, genérico

e abstrato, aos complexos anseios e múltiplas

necessidades que influenciam a realidade

contemporânea. Ao lado disso, há que se citar o voto

magistral voto proferido pelo Ministro Eros Grau, ao

apreciar a Ação de Descumprimento de Preceito

Fundamental Nº. 46/DF, “o direito é um organismo vivo,

peculiar porém porque não envelhece, nem permanece

jovem, pois é contemporâneo à realidade. O direito é um

dinamismo. Essa, a sua força, o seu fascínio, a sua

beleza”28. Como bem pontuado, o fascínio da Ciência

Jurídica jaz, justamente, na constante e imprescindível

mutabilidade que apresenta, decorrente do dinamismo

que reverbera na sociedade e orienta a aplicação dos

28 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão em Arguição de

Descumprimento de Preceito Fundamental Nº. 46/DF. Empresa

Pública de Correios e Telégrafos. Privilégio de Entrega de

Correspondências. Serviço Postal. Controvérsia referente à Lei

Federal 6.538, de 22 de Junho de 1978. Ato Normativo que regula

direitos e obrigações concernentes ao Serviço Postal. Previsão de

Sanções nas Hipóteses de Violação do Privilégio Postal.

Compatibilidade com o Sistema Constitucional Vigente. Alegação de

afronta ao disposto nos artigos 1º, inciso IV; 5º, inciso XIII, 170,

caput, inciso IV e parágrafo único, e 173 da Constituição do Brasil.

Violação dos Princípios da Livre Concorrência e Livre Iniciativa. Não

Caracterização. Arguição Julgada Improcedente. Interpretação

conforme à Constituição conferida ao artigo 42 da Lei N. 6.538, que

estabelece sanção, se configurada a violação do privilégio postal da

União. Aplicação às atividades postais descritas no artigo 9º, da lei.

Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Marcos Aurélio.

Julgado em 05 ago. 2009. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso

em 12 jun. 2015.

Page 50: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

50

Diplomas Legais e os institutos jurídicos neles

consagrados.

Ainda neste substrato de exposição, pode-se

evidenciar que a concepção pós-positivista que passou a

permear o Direito, ofertou, por via de consequência, uma

rotunda independência dos estudiosos e profissionais da

Ciência Jurídica. Aliás, há que se citar o entendimento

de Verdan, “esta doutrina é o ponto culminante de uma

progressiva evolução acerca do valor atribuído aos

princípios em face da legislação”29. Destarte, a partir de

uma análise profunda dos mencionados sustentáculos,

infere-se que o ponto central da corrente pós-positivista

cinge-se à valoração da robusta tábua principiológica que

Direito e, por conseguinte, o arcabouço normativo

passando a figurar, nesta tela, como normas de cunho

vinculante, flâmulas hasteadas a serem adotadas na

aplicação e interpretação do conteúdo das leis.

Nas últimas décadas, o aspecto de

mutabilidade tornou-se ainda mais evidente, em especial,

quando se analisa a construção de novos que derivam da

Ciência Jurídica. Entre estes, cuida destacar a

ramificação ambiental, considerando como um ponto de

congruência da formação de novos ideários e cânones,

29 VERDAN, 2009, s.p.

Page 51: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

51

motivados, sobretudo, pela premissa de um manancial de

novos valores adotados. Nesta trilha de argumentação,

de boa técnica se apresenta os ensinamentos de

Fernando de Azevedo Alves Brito que, em seu artigo,

aduz: “Com a intensificação, entretanto, do interesse dos

estudiosos do Direito pelo assunto, passou-se a

desvendar as peculiaridades ambientais, que, por

estarem muito mais ligadas às ciências biológicas, até

então era marginalizadas”30. Assim, em decorrência da

proeminência que os temas ambientais vêm, de maneira

paulatina, alcançando, notadamente a partir das últimas

discussões internacionais envolvendo a necessidade de

um desenvolvimento econômico pautado em

sustentabilidade, não é raro que prospere, mormente em

razão de novos fatores, um verdadeiro remodelamento ou

mesmo uma releitura dos conceitos que abalizam a

ramificação ambiental do Direito, com o fito de permitir

que ocorra a conservação e recuperação das áreas

degradadas.

Ademais, há de ressaltar ainda que o direito

30 BRITO, Fernando de Azevedo Alves. A hodierna classificação do

meio-ambiente, o seu remodelamento e a problemática sobre a

existência ou a inexistência das classes do meio-ambiente do

trabalho e do meio-ambiente misto. Boletim Jurídico, Uberaba,

ano 5, n. 968. Disponível em: <http://www.boletimjuridico.com.br>.

Acesso em 12 jun. 2015.

Page 52: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

52

ambiental passou a figurar, especialmente, depois das

décadas de 1950 e 1960, como um elemento integrante da

farta e sólida tábua de direitos fundamentais. Calha

realçar, com cores quentes, que mais contemporâneos, os

direitos que constituem a terceira dimensão recebem a

alcunha de direitos de fraternidade ou, ainda, de

solidariedade, contemplando, em sua estrutura, uma

patente preocupação com o destino da humanidade31·.

Ora, daí se verifica a inclusão de meio ambiente como um

direito fundamental, logo, está umbilicalmente atrelado

com humanismo e, por extensão, a um ideal de sociedade

mais justa e solidária. Nesse sentido, ainda, é plausível

citar o artigo 3°., inciso I, da Carta Política que abriga

em sua redação tais pressupostos como os princípios

fundamentais do Estado Democrático de Direitos: “Art.

3º - Constituem objetivos fundamentais da República

Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre,

justa e solidária” 32.

Ainda nesta esteira, é possível verificar que a

construção dos direitos encampados sob a rubrica de

31 MOTTA, Sylvio; DOUGLAS, Willian. Direito Constitucional –

Teoria, Jurisprudência e 1.000 Questões 15 ed., rev., ampl. e

atual. Rio de Janeiro: Editora Impetus, 2004, p. 69. 32 BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República

Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 12 jun. 2015.

Page 53: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

53

terceira dimensão tende a identificar a existência de

valores concernentes a uma determinada categoria de

pessoas, consideradas enquanto unidade, não mais

prosperando a típica fragmentação individual de seus

componentes de maneira isolada, tal como ocorria em

momento pretérito. Com o escopo de ilustrar, de maneira

pertinente as ponderações vertidas, insta trazer à colação

o entendimento do Ministro Celso de Mello, ao apreciar a

Ação Direta de Inconstitucionalidade N°. 1.856/RJ, em

especial quando, com bastante pertinência, destaca que:

Cabe assinalar, Senhor Presidente, que os

direitos de terceira geração (ou de

novíssima dimensão), que materializam

poderes de titularidade coletiva atribuídos,

genericamente, e de modo difuso, a todos os

integrantes dos agrupamentos sociais,

consagram o princípio da solidariedade e

constituem, por isso mesmo, ao lado dos

denominados direitos de quarta geração

(como o direito ao desenvolvimento e o

direito à paz), um momento importante no

processo de expansão e reconhecimento dos

direitos humanos, qualificados estes,

enquanto valores fundamentais

indisponíveis, como prerrogativas

impregnadas de uma natureza

essencialmente inexaurível33.

33 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido em

Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 1.856/RJ. Ação Direta De

Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense Nº 2.895/98) -

Legislação Estadual que, pertinente a exposições e a competições

entre aves das raças combatentes, favorece essa prática criminosa -

Page 54: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

54

Quadra anotar que os direitos alocados sob a

rubrica de direito de terceira dimensão encontram como

assento primordial a visão da espécie humana na

condição de coletividade, superando, via de consequência,

a tradicional visão que está pautada no ser humano em

sua individualidade. Assim, a preocupação identificada

está alicerçada em direitos que são coletivos, cujas

influências afetam a todos, de maneira indiscriminada.

Ao lado do exposto, cuida mencionar, segundo Bonavides,

que tais direitos “têm primeiro por destinatários o gênero

humano mesmo, num momento expressivo de sua

afirmação como valor supremo em termos de

existencialidade concreta”34. Com efeito, os direitos de

terceira dimensão, dentre os quais se inclui ao meio

Diploma Legislativo que estimula o cometimento de atos de

crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei Nº 9.605/98,

ART. 32) - Meio Ambiente - Direito à preservação de sua integridade

(CF, Art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu caráter de

metaindividualidade - Direito de terceira geração (ou de novíssima

dimensão) que consagra o postulado da solidariedade - Proteção

constitucional da fauna (CF, Art. 225, § 1º, VII) - Descaracterização

da briga de galo como manifestação cultural - Reconhecimento da

inconstitucionalidade da Lei Estadual impugnada - Ação Direta

procedente. Legislação Estadual que autoriza a realização de

exposições e competições entre aves das raças combatentes - Norma

que institucionaliza a prática de crueldade contra a fauna –

Inconstitucionalidade. . Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator:

Ministro Celso de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Disponível em:

<www.stf.jus.br>. Acesso em 12 jun. 2015. 34 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 21 ed.

atual. São Paulo: Editora Malheiros Ltda., 2007, p. 569.

Page 55: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

55

ambiente ecologicamente equilibrado, positivado na

Constituição de 1988, emerge com um claro e tangível

aspecto de familiaridade, como ápice da evolução e

concretização dos direitos fundamentais.

2 COMENTÁRIOS À CONCEPÇÃO DE MEIO

AMBIENTE

Em uma primeira plana, ao lançar mão do

sedimentado jurídico-doutrinário apresentado pelo inciso

I do artigo 3º da Lei Nº. 6.938, de 31 de agosto de 198135,

que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente,

seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá

outras providências, salienta que o meio ambiente

consiste no conjunto e conjunto de condições, leis e

influências de ordem química, física e biológica que

permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.

Pois bem, com o escopo de promover uma facilitação do

aspecto conceitual apresentado, é possível verificar que o

meio ambiente se assenta em um complexo diálogo de

fatores abióticos, provenientes de ordem química e física,

e bióticos, consistentes nas plurais e diversificadas

35 BRASIL. Lei Nº. 6.938, de 31 de Agosto de 1981. Dispõe sobre a

Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de

formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 12 jun. 2015.

Page 56: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

56

formas de seres viventes. Para Silva, considera-se meio-

ambiente como “a interação do conjunto de elementos

naturais, artificiais e culturais que propiciem o

desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas

formas”36.

Nesta senda, ainda, Fiorillo37, ao tecer

comentários acerca da acepção conceitual de meio

ambiente, coloca em destaque que tal tema se assenta em

um ideário jurídico indeterminado, incumbindo, ao

intérprete das leis, promover o seu preenchimento. Dada

à fluidez do tema, é possível colocar em evidência que o

meio ambiente encontra íntima e umbilical relação com

os componentes que cercam o ser humano, os quais são

de imprescindível relevância para a sua existência. O

Ministro Luiz Fux, ao apreciar a Ação Direta de

Inconstitucionalidade N°. 4.029/AM, salientou que:

(...) o meio ambiente é um conceito hoje

geminado com o de saúde pública, saúde de

cada indivíduo, sadia qualidade de vida, diz

a Constituição, é por isso que estou falando

de saúde, e hoje todos nós sabemos que ele é

imbricado, é conceitualmente geminado com

o próprio desenvolvimento. Se antes nós

36 SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. São

Paulo: Malheiros Editores, 2009, p. 20. 37 FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de Direito

Ambiental Brasileiro. 13 ed., rev., atual e ampl. São Paulo:

Editora Saraiva, 2012, p. 77.

Page 57: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

57

dizíamos que o meio ambiente é compatível

com o desenvolvimento, hoje nós dizemos, a

partir da Constituição, tecnicamente, que

não pode haver desenvolvimento senão com

o meio ambiente ecologicamente

equilibrado. A geminação do conceito me

parece de rigor técnico, porque salta da

própria Constituição Federal38.

É denotável, desta sorte, que a

constitucionalização do meio ambiente no Brasil

viabilizou um verdadeiro salto qualitativo, no que

concerne, especificamente, às normas de proteção

ambiental. Tal fato decorre da premissa que os robustos

corolários e princípios norteadores foram alçados ao

patamar constitucional, assumindo colocação eminente,

ao lado das liberdades públicas e dos direitos

fundamentais. Superadas tais premissas, aprouve ao

Constituinte, ao entalhar a Carta Política Brasileira,

ressoando os valores provenientes dos direitos de terceira

38 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido em

Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 4.029/AM. Ação Direta de

Inconstitucionalidade. Lei Federal Nº 11.516/07. Criação do Instituto

Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Legitimidade da

Associação Nacional dos Servidores do IBAMA. Entidade de Classe

de Âmbito Nacional. Violação do art. 62, caput e § 9º, da

Constituição. Não emissão de parecer pela Comissão Mista

Parlamentar. Inconstitucionalidade dos artigos 5º, caput, e 6º, caput

e parágrafos 1º e 2º, da Resolução Nº 1 de 2002 do Congresso

Nacional. Modulação dos Efeitos Temporais da Nulidade (Art. 27 da

Lei 9.868/99). Ação Direta Parcialmente Procedente. Órgão

Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Luiz Fux. Julgado em 08

mar. 2012. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em 12 jun. 2015.

Page 58: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

58

dimensão, insculpir na redação do artigo 225, conceder

amplo e robusto respaldo ao meio ambiente como pilar

integrante dos direitos fundamentais. “Com o advento da

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988,

as normas de proteção ambiental são alçadas à categoria

de normas constitucionais, com elaboração de capítulo

especialmente dedicado à proteção do meio ambiente”39.

Nesta toada, ainda, é observável que o caput do artigo

225 da Constituição Federal40 está abalizado em quatro

pilares distintos, robustos e singulares que, em conjunto,

dão corpo a toda tábua ideológica e teórica que assegura

o substrato de edificação da ramificação ambiental.

Primeiramente, em decorrência do tratamento

dispensado pelo artífice da Constituição Federal, o meio

ambiente foi içado à condição de direito de todos,

presentes e futuras gerações. É encarado como algo

pertencente a toda coletividade, assim, por esse prisma,

não se admite o emprego de qualquer distinção entre

39 THOMÉ, Romeu. Manual de Direito Ambiental: Conforme o

Novo Código Florestal e a Lei Complementar 140/2011. 2 ed.

Salvador: Editora JusPodivm, 2012, p. 116. 40 BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República

Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 12 jun. 2015: “Art. 225.

Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem

de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,

impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e

preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

Page 59: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

59

brasileiro nato, naturalizado ou estrangeiro, destacando-

se, sim, a necessidade de preservação, conservação e não-

poluição. O artigo 225, devido ao cunho de direito difuso

que possui, extrapola os limites territoriais do Estado

Brasileiro, não ficando centrado, apenas, na extensão

nacional, compreendendo toda a humanidade. Neste

sentido, inclusive, o Ministro Celso de Mello, ao apreciar

a Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 1.856/RJ,

destacou, com bastante pertinência, que:

A preocupação com o meio ambiente - que

hoje transcende o plano das presentes

gerações, para também atuar em favor das

gerações futuras (...) tem constituído, por

isso mesmo, objeto de regulações

normativas e de proclamações jurídicas,

que, ultrapassando a província meramente

doméstica do direito nacional de cada

Estado soberano, projetam-se no plano das

declarações internacionais, que refletem, em

sua expressão concreta, o compromisso das

Nações com o indeclinável respeito a esse

direito fundamental que assiste a toda a

Humanidade41.

41 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido em

Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 1.856/RJ. Ação Direta De

Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense Nº 2.895/98) -

Legislação Estadual que, pertinente a exposições e a competições

entre aves das raças combatentes, favorece essa prática criminosa -

Diploma Legislativo que estimula o cometimento de atos de

crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei Nº 9.605/98,

ART. 32) - Meio Ambiente - Direito à preservação de sua integridade

(CF, Art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu caráter de

metaindividualidade - Direito de terceira geração (ou de novíssima

Page 60: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

60

O termo “todos”, aludido na redação do caput

do artigo 225 da Constituição Federal de 1988, faz

menção aos já nascidos (presente geração) e ainda

aqueles que estão por nascer (futura geração), cabendo

àqueles zelar para que esses tenham à sua disposição, no

mínimo, os recursos naturais que hoje existem. Tal fato

encontra como arrimo a premissa que foi reconhecido ao

gênero humano o direito fundamental à liberdade, à

igualdade e ao gozo de condições de vida adequada, em

ambiente que permita desenvolver todas as suas

potencialidades em clima de dignidade e bem-estar.

Pode-se considerar como um direito transgeracional, ou

seja, ultrapassa as gerações, logo, é viável afirmar que o

meio-ambiente é um direito público subjetivo. Desta

feita, o ideário de que o meio ambiente substancializa

patrimônio público a ser imperiosamente assegurado e

protegido pelos organismos sociais e pelas instituições

dimensão) que consagra o postulado da solidariedade - Proteção

constitucional da fauna (CF, Art. 225, § 1º, VII) - Descaracterização

da briga de galo como manifestação cultural - Reconhecimento da

inconstitucionalidade da Lei Estadual impugnada - Ação Direta

procedente. Legislação Estadual que autoriza a realização de

exposições e competições entre aves das raças combatentes - Norma

que institucionaliza a prática de crueldade contra a fauna –

Inconstitucionalidade. . Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator:

Ministro Celso de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Disponível em:

<www.stf.jus.br>. Acesso em 12 jun. 2015.

Page 61: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

61

estatais, qualificando verdadeiro encaro irrenunciável

que se impõe, objetivando sempre o benefício das

presentes e das futuras gerações, incumbindo tanto ao

Poder Público quanto à coletividade considerada em si

mesma.

Assim, decorrente de tal fato, produz efeito

erga omnes, sendo, portanto, oponível contra a todos,

incluindo pessoa física/natural ou jurídica, de direito

público interno ou externo, ou mesmo de direito privado,

como também ente estatal, autarquia, fundação ou

sociedade de economia mista. Impera, também,

evidenciar que, como um direito difuso, não subiste a

possibilidade de quantificar quantas são as pessoas

atingidas, pois a poluição não afeta tão só a população

local, mas sim toda a humanidade, pois a coletividade é

indeterminada. Nesta senda, o direito à integridade do

meio ambiente substancializa verdadeira prerrogativa

jurídica de titularidade coletiva, ressoando a expressão

robusta de um poder deferido, não ao indivíduo

identificado em sua singularidade, mas num sentido

mais amplo, atribuído à própria coletividade social.

Com a nova sistemática entabulada pela

redação do artigo 225 da Carta Maior, o meio-ambiente

passou a ter autonomia, tal seja não está vinculada a

Page 62: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

62

lesões perpetradas contra o ser humano para se

agasalhar das reprimendas a serem utilizadas em

relação ao ato perpetrado. Figura-se, ergo, como bem de

uso comum do povo o segundo pilar que dá corpo aos

sustentáculos do tema em tela. O axioma a ser

esmiuçado, está atrelado o meio-ambiente como vetor da

sadia qualidade de vida, ou seja, manifesta-se na

salubridade, precipuamente, ao vincular a espécie

humana está se tratando do bem-estar e condições

mínimas de existência. Igualmente, o sustentáculo em

análise se corporifica também na higidez, ao cumprir os

preceitos de ecologicamente equilibrado, salvaguardando

a vida em todas as suas formas (diversidade de espécies).

Por derradeiro, o quarto pilar é a

corresponsabilidade, que impõe ao Poder Público o dever

geral de se responsabilizar por todos os elementos que

integram o meio ambiente, assim como a condição

positiva de atuar em prol de resguardar. Igualmente,

tem a obrigação de atuar no sentido de zelar, defender e

preservar, asseverando que o meio-ambiente permaneça

intacto. Aliás, este último se diferencia de conservar que

permite a ação antrópica, viabilizando melhorias no meio

ambiente, trabalhando com as premissas de

desenvolvimento sustentável, aliando progresso e

Page 63: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

63

conservação. Por seu turno, o cidadão tem o dever

negativo, que se apresenta ao não poluir nem agredir o

meio-ambiente com sua ação. Além disso, em razão da

referida corresponsabilidade, são titulares do meio

ambiente os cidadãos da presente e da futura geração.

3 SOLIDARIEDADE ENTRE ESPÉCIES

NATURAIS? O ALARGAMENTO DA MOLDURA

AXIOLÓGICA DO PRINCÍPIO DA

SOLIDARIEDADE AMBIENTAL

Como desdobramento da projeção normativa do

corolário da solidariedade, na órbita ecológica, há que se

estruturar uma solidariedade entre todas as espécies

vivas, na forma de uma comunidade entre a terra, as

plantas, os animais e os seres humanos, visto que a

ameaça ecológica coloca em risco todas as espécies

existentes no planeta, afetando por igual a todos e ao

todo. Neste diapasão, a necessidade de despertar uma

consciência pautada na solidariedade entre as espécies

naturais é despertada, sobremaneira, em decorrência

das ameaças à vida desencadeadas pelo desenvolvimento

civilizatório fazerem com que o ser humano se reconheça

como um ser natural integrante de um todo ameaçado e,

Page 64: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

64

concomitantemente, responsável por tal situação de

ameaça existencial. Segundo Sarlet e Fensterseifer42, a

ameaça de contaminação propicia que o ser humano

perceba que o seu corpo integra parte das “coisas

naturais” e que, em razão disso, está sujeito à ameaça

supramencionada. A construção de tal consciência leva o

ser humano a reconhecer, forçosamente, uma

comunidade natural, diante da qual o estabelecimento de

um vínculo de solidariedade e respeito mútuo como

pressuposto para a permanência existencial das espécies

naturais, abarcando-se em tal concepção o ser humano.

Em uma perspectiva jurídica, a vedação das

políticas cruéis contra os animais (não humanos)

encontra repouso no Texto Constitucional, reforçando,

portanto, o ideário axiológico de solidariedade entre as

espécies naturais. Mais que isso, ao analisar o

julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº

1.856/RJ, de relatoria do Ministro Celso de Mello, salta

aos olhos a concreção do dogma em comento, em especial

quando a ementa consagra que “a promoção de briga de

galos, além de caracterizar prática criminosa tipificada

na legislação ambiental, configura conduta atentatória à

42 SARLET, Ingo Wolfgang; FENSTERSEIFER, Tiago. Princípios

do Direito Ambiental. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 77.

Page 65: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

65

Constituição da República, que veda a submissão de

animais a atos de crueldade”43. Ora, há que se

reconhecer que essa especial tutela, que tem por

fundamento legitimador a autoridade da Constituição da

República, é motivada pela necessidade de impedir a

ocorrência de situações de risco que ameacem ou que

façam periclitar todas as formas de vida, não só a do

gênero humano, mas, também, a própria vida animal,

cuja integridade restaria comprometida, não fora a

vedação constitucional, por práticas aviltantes,

perversas e violentas contra os seres irracionais. “A ideia

de „solidariedade entre espécies naturais‟, portanto,

também pode transportar o reconhecimento do valor

intrínseco de todas as manifestações existenciais, bem

43 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido na

Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.856/RJ. Ação Direta de

Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense nº 2.895/98) -

Legislação estadual que, pertinente a exposições e a competições

entre aves das raças combatentes, favorece essa prática criminosa -

Diploma legislativo que estimula o cometimento de atos de

crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei nº 9.605/98,

art. 32) - Meio Ambiente - Direito à preservação de sua integridade

(CF, art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu caráter de

metaindividualidade - Direito de terceira geração (ou de novíssima

dimensão) que consagra o postulado da solidariedade - Proteção

constitucional da fauna (CF, art. 225, § 1º, VII) - Descaracterização

da briga de galo como manifestação cultural - Reconhecimento da

inconstitucionalidade da lei estadual impugnada - Ação Direta

Procedente. Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Celso

de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Publicado no DJe em 13 out.

2011. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em 12 jun. 2015.

Page 66: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

66

como o respeito à reciprocidade indispensável ao convívio

harmonioso” 44, estendido a todos os seres vivos. Salta

aos olhos, desta feita, que o princípio da solidariedade,

cuja incidência deve ser maximizada em diversos

âmbitos, inclusive na seara ambiental, passa a ser

desfraldado como pilar sustentador das relações

contemporâneas, em sua senda civilizatória,

considerando todas as suas dimensões, a saber:

intergeracional, intrageracional e interespécies.

4 DO RECONHECIMENTO DA EDIFICAÇÃO DO

DIREITO DOS ANIMAIS: O FORTALECIMENTO

DA SOLIDARIEDADE ENTRE ESPÉCIES

NATURAIS

Em um primeiro comentário, cuida destacar

que o Direito dos Animais ou o movimento de proteção

desses direitos desponta, em um cenário contemporâneo,

como um novo ramo da Ciência Jurídica, objetivando

proteger tais seres vivos como de salvaguardar não

apenas o meio ambiental, o ecossistema e evitar a

extinção de diversas espécies, mas também o leque de

direitos fundamentais, a exemplo do direito à vida, à

44 SARLET; FENSTERSEIFER, 2014, p. 77.

Page 67: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

67

liberdade e o respeito, coibindo, por via de consequência,

os atos de violência, maus-tratos e crueldade. Neste

sentido, ainda, é possível fazer alusão ao Texto

Constitucional, quando, de maneira expressa e ofuscante,

no inciso VII do §1º do artigo 225, explicita que “para

assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder

Público: [omissis] VII - proteger a fauna e a flora,

vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em

risco sua função ecológica, provoquem a extinção de

espécies ou submetam os animais a crueldade”45. Aduz,

ainda, Gomes e Chalfun que:

Na verdade, os animais devem ser

protegidos não apenas em benefício do

homem, mas também como um exercício de

compaixão e solidariedade a espécies mais

vulneráveis e dignas de respeito, o homem

não deve ser o único ser protegido, o único a

ter direitos fundamentais reconhecidos, é

preciso considerar que o homem é também

uma espécie animal, e dentro desta ótica o

animal é o outro do homem46.

Salta aos olhos que a proposição de uma

ramificação jurídica autônoma, pautada exclusivamente

45 BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República

Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 12 jun. 2015. 46 GOMES, Rosangela Maria A.; CHALFUN, Mery. Direito dos

Animais – Um novo e fundamental Direito. Disponível em:

<http://www.conpedi.org.br>. Acesso em 12 jun. 2015, p. 852.

Page 68: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

68

no Direito dos Animais, decorre da desconstrução da

tradicional ótica antropocêntrica. Neste sentido, convém

mencionar que a visão antropocêntrica está alicerçada no

preceito de que o homem se identificava no centro do

mundo - em que usufrui do meio ambiente de modo

indiferente à sua existência-, o ecocentrismo mudou o

paradigma apresentando sentido e valor à vida do ser,

englobando agora a fauna e a flora como ícones

essenciais ao equilíbrio ambiental. Ao lado disso, Abreu e

Bussinguer, oportunamente, destacam que “a concepção

eminentemente antropocêntrica se mantém arraigada

em alguns setores da sociedade contemporânea, o que

impede muitos avanços em projetos que visam a

conservação do meio, em especial, a conservação de

espécies em vias de extinção e a instalação de Unidades

de Conservação”47. Podendo o ecocentrismo ser chamado

também de biocentrismo, abordando a vida do ser de

forma ampla considerando-a como personagem central

da uma tutela ambiental, este segundo termo surgiu com

a Lei nº 6.938/1981, eliminando a visão antropocêntrica.

47 ABREU, Ivy de Souza; BUSSINGUER, Elda Coelho de Azevedo.

Antropocentrismo, Ecocentrismo e Holismo: uma breve análise das

escolas de pensamento ambiental. Derecho y Cambio Social,

2013, p. 01-11. Disponível em:

<http://www.derechoycambiosocial.com/revista034/escolas_de_pensa

mento_ambiental.pdf>. Acesso em 12 jun. 2015, p. 05.

Page 69: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

69

“Assim, a escola ecocêntrica (ou biocêntrica, como muitos

preferem) coloca em primeiro plano de discussão e

proteção o equilíbrio dos ecossistemas e do meio

ambiente natural”48.

Figura 01. Egocentrismo

(antropocentrismo)

Figura 02. Econcentrismo/

Biocentrismo.

O holismo considera e defende as entidades

físicas e biológicas como um sistema único e integrando -

seres vivos e recursos ambientais disponíveis -,

considerado autônomo o meio ambiente não é mais

notado como aquele que nutre somente as necessidades

humanas, mas aquele que carece de cuidados e zelo.

Nessa perspectiva, “a análise do meio ambiente deve

considerar o contexto amplo e global de todas as

48 ABREU; BUSSINGUER, 2013, p. 05.

Page 70: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

70

variáveis intrínsecas e extrínsecas que geram influências

diversas e, primordialmente, a interação entre essas

variáveis, para que não haja uma visão distorcida,

simplória e reducionista do bem ambiental” 49. Assim, no

holismo ambiental tem suas bases sustentadas não

apenas no meio natural e nos seus elementos. A vida

humana e suas expressões também se tornam objeto de

proteção, mas não pelos motivos apregoados pelo

antropocentrismo e sim, pela espécie humana (e os

fatores que se relacionam com sua existência e

desenvolvimento) ser parte do meio ambiente e

indispensável ao equilíbrio ambiental.

É oportuno consignar que o tratamento dos

animais, sobretudo no que se refere à edificação de uma

ramificação jurídica autônoma, deve ser pautado pela

ética e por princípios morais, porquanto esses devem

nortear a conduta humana. “Conduta ética em relação

aos animais oprimidos, e todos devem agir em sua

defesa, como forma de legítima manifestação de

cidadania” 50. Assim, à luz da exposição apresenta, é

notório que o direito dos animais e a proteção dos direitos

fundamentais como inerentes a estes, desponta com um

49 ABREU; BUSSINGUER, 2013, p. 08. 50 GOMES; CHALFUN, s.d., p. 852.

Page 71: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

71

novo ramo do direito, merecedor de estudos,

desenvolvimento e evolução, muito há o que se debater e

estudar, não obstante muito se avançou. Imprescindível

para toda a sociedade, para o meio ambiente, para os

amantes da natureza e dos animais, o direito dos animais

possui sua essência na filosofia, na ética, na moral, e

desponta com um novo seguimento do direito a ser

aprimorado e estudado.

5 ANOTAÇÕES AOS PRINCÍPIOS

INTERNACIONAIS PARA A PESQUISA

BIOMÉDICA ENVOLVENDO ANIMAIS: BREVE

PAINEL

Em um primeiro momento, cuida destacar que

o primeiro princípio anota que o avanço do conhecimento

biológico requer muitas vezes o uso de animais vivos de

perfeita qualidade e de uma larga variedade de espécies.

Já o segundo estabelece que métodos alternativos devem

ser utilizados sempre que apropriados. Adota-se

internacionalmente o principio das 3RS (refinement

reduction and replacement) estabelecido por Russel y

Burch em 1959 e que pode assim ser resumido:

”Qualquer técnica que refine um método existente para

Page 72: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

72

diminuir a dor e o desconforto dos animais, que reduza

seu número em um trabalho particular ou que substitua

o uso de uma espécie animal por outra, de categoria

inferior na escala zoológica, ou por métodos

computadorizados ou “in vitro”, deve ser considerado

como método alternativo”. O terceiro corolário estabelece

que a experimentação animal deve ser conduzida apenas

após consideração de sua relevância para a saúde do

homem e dos animais. O quarto princípio afixa que os

animais selecionados para um protocolo experimental

devem ser de espécie e qualidade apropriada e em um

número mínimo para obter resultados válidos

cientificamente.

O princípio subsequente estabelece que

pesquisadores e outras pessoas envolvidas na pesquisa

devem ter como imperativo ético a conduta de evitar ou

minimizar o desconforto, estresse e dor nos animais. Já o

sexto princípio afixa que se deve assumir que qualquer

procedimento que cause dor no ser humano, causará dor

em outras espécies de vertebrados (ainda que pouco se

saiba sobre a percepção de dor em animais). O sétimo

aclara que é necessário utilizar sedação, analgesia e

anestesia de acordo com as práticas veterinárias.

Proibido o uso de agentes paralisantes (curare). Se o

Page 73: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

73

artigo VII não puder ser obedecido, as justificativas

deverão ser encaminhadas à CEA para discussão e

autorização específica para cada caso. No final ou

durante a experimentação, animais que sofram dor

severa crônica e intenso desconforto, deverão ser

sacrificados sem dor (eutanásia). Condições de

acomodação devem atender as exigências mínimas

definidas neste documento. É de responsabilidade do

Chefe do Departamento assegurar que todos os

pesquisadores e todo o pessoal envolvido na

experimentação siga as boas normas para utilização de

animais.

REFERÊNCIA:

ABREU, Ivy de Souza; BUSSINGUER, Elda Coelho de

Azevedo. Antropocentrismo, Ecocentrismo e Holismo:

uma breve análise das escolas de pensamento ambiental.

Derecho y Cambio Social, 2013, p. 01-11. Disponível

em:

<http://www.derechoycambiosocial.com/revista034/escola

s_de_pensamento_ambiental.pdf>. Acesso em 12 jun.

2015.

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito

Constitucional. 21 ed. atual. São Paulo: Editora

Malheiros Ltda., 2007.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da)

Page 74: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

74

República Federativa do Brasil. Brasília: Senado

Federal, 1988. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 12 jun. 2015.

___________. Lei Nº. 6.938, de 31 de Agosto de 1981.

Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus

fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras

providências. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 12 jun. 2015.

___________. Superior Tribunal de Justiça.

Disponível em: <www.stj.jus.br>. Acesso em 12 jun.

2015.

___________. Supremo Tribunal Federal. Disponível

em: <www.stf.jus.br>. Acesso em 12 jun. 2015.

BRITO, Fernando de Azevedo Alves. A hodierna

classificação do meio-ambiente, o seu remodelamento e a

problemática sobre a existência ou a inexistência das

classes do meio-ambiente do trabalho e do meio-ambiente

misto. Boletim Jurídico, Uberaba, ano 5, n. 968.

Disponível em: <http://www.boletimjuridico.com.br>.

Acesso em 12 jun. 2015.

FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de Direito

Ambiental Brasileiro. 13 ed., rev., atual e ampl. São

Paulo: Editora Saraiva, 2012.

GOMES, Rosangela Maria A.; CHALFUN, Mery.

Direito dos Animais – Um novo e fundamental Direito.

Disponível em: <http://www.conpedi.org.br>. Acesso em

12 jun. 2015.

MOTTA, Sylvio; DOUGLAS, Willian. Direito

Constitucional – Teoria, Jurisprudência e 1.000

Page 75: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

75

Questões 15 ed., rev., ampl. e atual. Rio de Janeiro:

Editora Impetus, 2004.

SARLET, Ingo Wolfgang; FENSTERSEIFER, Tiago.

Princípios do Direito Ambiental. São Paulo: Saraiva,

2014.

SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental

Constitucional. São Paulo: Malheiros Editores, 2009.

THOMÉ, Romeu. Manual de Direito Ambiental:

Conforme o Novo Código Florestal e a Lei

Complementar 140/2011. 2 ed. Salvador: Editora

JusPodivm, 2012.

VERDAN, Tauã Lima. Princípio da Legalidade: Corolário

do Direito Penal. Jurid Publicações Eletrônicas,

Bauru, 22 jun. 2009. Disponível em:

<http://jornal.jurid.com.br>. Acesso em 12 jun. 2015.

Page 76: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

76

COMENTÁRIOS À LEI Nº 11.794/2008:

RECONHECIMENTO DO FORTALECIMENTO DA

SOLIDARIEDADE ENTRE ESPÉCIES NATURAIS

NA PESQUISA ENVOLVENDO ANIMAIS

Resumo: O objetivo do presente está alicerçado

na análise da Lei nº 11.794, de 08 de outubro de

2008, que regulamenta o inciso VII do § 1o do art.

225 da Constituição Federal, estabelecendo

procedimentos para o uso científico de animais;

revoga a Lei no 6.638, de 8 de maio de 1979; e dá

outras providências. Como desdobramento da

projeção normativa do corolário da solidariedade,

na órbita ecológica, há que se estruturar uma

solidariedade entre todas as espécies vivas, na

forma de uma comunidade entre a terra, as

plantas, os animais e os seres humanos, visto que

a ameaça ecológica coloca em risco todas as

espécies existentes no planeta, afetando por igual

a todos e ao todo. Neste diapasão, a necessidade

de despertar uma consciência pautada na

solidariedade entre as espécies naturais é

despertada, sobremaneira, em decorrência das

Page 77: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

77

ameaças à vida desencadeadas pelo

desenvolvimento civilizatório fazerem com que o

ser humano se reconheça como um ser natural

integrante de um todo ameaçado e,

concomitantemente, responsável por tal situação

de ameaça existencial. A ameaça de contaminação

propicia que o ser humano perceba que o seu

corpo integra parte das “coisas naturais” e que,

em razão disso, está sujeito à ameaça

supramencionada. A construção de tal consciência

leva o ser humano a reconhecer, forçosamente,

uma comunidade natural, diante da qual o

estabelecimento de um vínculo de solidariedade e

respeito mútuo como pressuposto para a

permanência existencial das espécies naturais,

abarcando-se em tal concepção o ser humano.

Palavras-chaves: Solidariedade entre Espécies.

Direito dos Animais. Pesquisa com Animais.

Sumário: 1 Ponderações Introdutórias: Breves

notas à construção teórica do Direito Ambiental;

2 Comentários à concepção de Meio Ambiente; 3

Solidariedade entre Espécies Naturais? O

Alargamento da Moldura Axiológica do Princípio

da Solidariedade Ambiental; 4 Do

Reconhecimento da Edificação do Direito dos

Animais: O fortalecimento da solidariedade entre

espécies naturais; 5 Comentários à Lei nº

11.794/2008: Reconhecimento do fortalecimento

da solidariedade entre espécies naturais na

pesquisa envolvendo animais

Page 78: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

78

1 PONDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS: BREVES

NOTAS À CONSTRUÇÃO TEÓRICA DO DIREITO

AMBIENTAL

Inicialmente, ao se dispensar um exame acerca

do tema colocado em tela, patente se faz arrazoar que a

Ciência Jurídica, enquanto um conjunto multifacetado de

arcabouço doutrinário e técnico, assim como as robustas

ramificações que a integram, reclama uma interpretação

alicerçada nos plurais aspectos modificadores que

passaram a influir em sua estruturação. Neste alamiré,

lançando à tona os aspectos característicos de

mutabilidade que passaram a orientar o Direito, tornou-

se imperioso salientar, com ênfase, que não mais subsiste

uma visão arrimada em preceitos estagnados e

estanques, alheios às necessidades e às diversidades

sociais que passaram a contornar os Ordenamentos

Jurídicos. Ora, infere-se que não mais prospera o

arcabouço imutável que outrora sedimentava a aplicação

das leis, sendo, em decorrência dos anseios da população,

suplantados em uma nova sistemática.

Com espeque em tais premissas, cuida

hastear, com bastante pertinência, como flâmula de

interpretação o “prisma de avaliação o brocardo jurídico

Page 79: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

79

'Ubi societas, ibi jus', ou seja, 'Onde está a sociedade,

está o Direito', tornando explícita e cristalina a relação

de interdependência que esse binômio mantém”51.

Destarte, com clareza solar, denota-se que há uma

interação consolidada na mútua dependência, já que o

primeiro tem suas balizas fincadas no constante processo

de evolução da sociedade, com o fito de que seus

Diplomas Legislativos e institutos não fiquem inquinados

de inaptidão e arcaísmo, em total descompasso com a

realidade vigente. A segunda, por sua vez, apresenta

estrutural dependência das regras consolidadas pelo

Ordenamento Pátrio, cujo escopo primevo é assegurar

que não haja uma vingança privada, afastando, por

extensão, qualquer ranço que rememore priscas eras em

que o homem valorizava a Lei de Talião (“Olho por olho,

dente por dente”), bem como para evitar que se robusteça

um cenário caótico no seio da coletividade.

Ademais, com a promulgação da Constituição

da República Federativa do Brasil de 1988,

imprescindível se fez adotá-la como maciço axioma de

sustentação do Ordenamento Brasileiro, precipuamente

51 VERDAN, Tauã Lima. Princípio da Legalidade: Corolário do

Direito Penal. Jurid Publicações Eletrônicas, Bauru, 22 jun.

2009. Disponível em: <http://jornal.jurid.com.br>. Acesso em 12 jun.

2015.

Page 80: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

80

quando se objetiva a amoldagem do texto legal, genérico

e abstrato, aos complexos anseios e múltiplas

necessidades que influenciam a realidade

contemporânea. Ao lado disso, há que se citar o voto

magistral voto proferido pelo Ministro Eros Grau, ao

apreciar a Ação de Descumprimento de Preceito

Fundamental Nº. 46/DF, “o direito é um organismo vivo,

peculiar porém porque não envelhece, nem permanece

jovem, pois é contemporâneo à realidade. O direito é um

dinamismo. Essa, a sua força, o seu fascínio, a sua

beleza”52. Como bem pontuado, o fascínio da Ciência

Jurídica jaz, justamente, na constante e imprescindível

mutabilidade que apresenta, decorrente do dinamismo

que reverbera na sociedade e orienta a aplicação dos

52 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão em Arguição de

Descumprimento de Preceito Fundamental Nº. 46/DF. Empresa

Pública de Correios e Telégrafos. Privilégio de Entrega de

Correspondências. Serviço Postal. Controvérsia referente à Lei

Federal 6.538, de 22 de Junho de 1978. Ato Normativo que regula

direitos e obrigações concernentes ao Serviço Postal. Previsão de

Sanções nas Hipóteses de Violação do Privilégio Postal.

Compatibilidade com o Sistema Constitucional Vigente. Alegação de

afronta ao disposto nos artigos 1º, inciso IV; 5º, inciso XIII, 170,

caput, inciso IV e parágrafo único, e 173 da Constituição do Brasil.

Violação dos Princípios da Livre Concorrência e Livre Iniciativa. Não

Caracterização. Arguição Julgada Improcedente. Interpretação

conforme à Constituição conferida ao artigo 42 da Lei N. 6.538, que

estabelece sanção, se configurada a violação do privilégio postal da

União. Aplicação às atividades postais descritas no artigo 9º, da lei.

Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Marcos Aurélio.

Julgado em 05 ago. 2009. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso

em 12 jun. 2015.

Page 81: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

81

Diplomas Legais e os institutos jurídicos neles

consagrados.

Ainda neste substrato de exposição, pode-se

evidenciar que a concepção pós-positivista que passou a

permear o Direito, ofertou, por via de consequência, uma

rotunda independência dos estudiosos e profissionais da

Ciência Jurídica. Aliás, há que se citar o entendimento

de Verdan, “esta doutrina é o ponto culminante de uma

progressiva evolução acerca do valor atribuído aos

princípios em face da legislação”53. Destarte, a partir de

uma análise profunda dos mencionados sustentáculos,

infere-se que o ponto central da corrente pós-positivista

cinge-se à valoração da robusta tábua principiológica que

Direito e, por conseguinte, o arcabouço normativo

passando a figurar, nesta tela, como normas de cunho

vinculante, flâmulas hasteadas a serem adotadas na

aplicação e interpretação do conteúdo das leis.

Nas últimas décadas, o aspecto de

mutabilidade tornou-se ainda mais evidente, em especial,

quando se analisa a construção de novos que derivam da

Ciência Jurídica. Entre estes, cuida destacar a

ramificação ambiental, considerando como um ponto de

congruência da formação de novos ideários e cânones,

53 VERDAN, 2009, s.p.

Page 82: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

82

motivados, sobretudo, pela premissa de um manancial de

novos valores adotados. Nesta trilha de argumentação,

de boa técnica se apresenta os ensinamentos de

Fernando de Azevedo Alves Brito que, em seu artigo,

aduz: “Com a intensificação, entretanto, do interesse dos

estudiosos do Direito pelo assunto, passou-se a

desvendar as peculiaridades ambientais, que, por

estarem muito mais ligadas às ciências biológicas, até

então era marginalizadas”54. Assim, em decorrência da

proeminência que os temas ambientais vêm, de maneira

paulatina, alcançando, notadamente a partir das últimas

discussões internacionais envolvendo a necessidade de

um desenvolvimento econômico pautado em

sustentabilidade, não é raro que prospere, mormente em

razão de novos fatores, um verdadeiro remodelamento ou

mesmo uma releitura dos conceitos que abalizam a

ramificação ambiental do Direito, com o fito de permitir

que ocorra a conservação e recuperação das áreas

degradadas.

Ademais, há de ressaltar ainda que o direito

54 BRITO, Fernando de Azevedo Alves. A hodierna classificação do

meio-ambiente, o seu remodelamento e a problemática sobre a

existência ou a inexistência das classes do meio-ambiente do

trabalho e do meio-ambiente misto. Boletim Jurídico, Uberaba,

ano 5, n. 968. Disponível em: <http://www.boletimjuridico.com.br>.

Acesso em 12 jun. 2015.

Page 83: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

83

ambiental passou a figurar, especialmente, depois das

décadas de 1950 e 1960, como um elemento integrante da

farta e sólida tábua de direitos fundamentais. Calha

realçar, com cores quentes, que mais contemporâneos, os

direitos que constituem a terceira dimensão recebem a

alcunha de direitos de fraternidade ou, ainda, de

solidariedade, contemplando, em sua estrutura, uma

patente preocupação com o destino da humanidade55·.

Ora, daí se verifica a inclusão de meio ambiente como um

direito fundamental, logo, está umbilicalmente atrelado

com humanismo e, por extensão, a um ideal de sociedade

mais justa e solidária. Nesse sentido, ainda, é plausível

citar o artigo 3°., inciso I, da Carta Política que abriga

em sua redação tais pressupostos como os princípios

fundamentais do Estado Democrático de Direitos: “Art.

3º - Constituem objetivos fundamentais da República

Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre,

justa e solidária” 56.

Ainda nesta esteira, é possível verificar que a

construção dos direitos encampados sob a rubrica de

55 MOTTA, Sylvio; DOUGLAS, Willian. Direito Constitucional –

Teoria, Jurisprudência e 1.000 Questões 15 ed., rev., ampl. e

atual. Rio de Janeiro: Editora Impetus, 2004, p. 69. 56 BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República

Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 12 jun. 2015.

Page 84: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

84

terceira dimensão tende a identificar a existência de

valores concernentes a uma determinada categoria de

pessoas, consideradas enquanto unidade, não mais

prosperando a típica fragmentação individual de seus

componentes de maneira isolada, tal como ocorria em

momento pretérito. Com o escopo de ilustrar, de maneira

pertinente as ponderações vertidas, insta trazer à colação

o entendimento do Ministro Celso de Mello, ao apreciar a

Ação Direta de Inconstitucionalidade N°. 1.856/RJ, em

especial quando, com bastante pertinência, destaca que:

Cabe assinalar, Senhor Presidente, que os

direitos de terceira geração (ou de

novíssima dimensão), que materializam

poderes de titularidade coletiva atribuídos,

genericamente, e de modo difuso, a todos os

integrantes dos agrupamentos sociais,

consagram o princípio da solidariedade e

constituem, por isso mesmo, ao lado dos

denominados direitos de quarta geração

(como o direito ao desenvolvimento e o

direito à paz), um momento importante no

processo de expansão e reconhecimento dos

direitos humanos, qualificados estes,

enquanto valores fundamentais

indisponíveis, como prerrogativas

impregnadas de uma natureza

essencialmente inexaurível57.

57 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido em

Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 1.856/RJ. Ação Direta De

Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense Nº 2.895/98) -

Legislação Estadual que, pertinente a exposições e a competições

entre aves das raças combatentes, favorece essa prática criminosa -

Page 85: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

85

Quadra anotar que os direitos alocados sob a

rubrica de direito de terceira dimensão encontram como

assento primordial a visão da espécie humana na

condição de coletividade, superando, via de consequência,

a tradicional visão que está pautada no ser humano em

sua individualidade. Assim, a preocupação identificada

está alicerçada em direitos que são coletivos, cujas

influências afetam a todos, de maneira indiscriminada.

Ao lado do exposto, cuida mencionar, segundo Bonavides,

que tais direitos “têm primeiro por destinatários o gênero

humano mesmo, num momento expressivo de sua

afirmação como valor supremo em termos de

existencialidade concreta”58. Com efeito, os direitos de

terceira dimensão, dentre os quais se inclui ao meio

Diploma Legislativo que estimula o cometimento de atos de

crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei Nº 9.605/98,

ART. 32) - Meio Ambiente - Direito à preservação de sua integridade

(CF, Art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu caráter de

metaindividualidade - Direito de terceira geração (ou de novíssima

dimensão) que consagra o postulado da solidariedade - Proteção

constitucional da fauna (CF, Art. 225, § 1º, VII) - Descaracterização

da briga de galo como manifestação cultural - Reconhecimento da

inconstitucionalidade da Lei Estadual impugnada - Ação Direta

procedente. Legislação Estadual que autoriza a realização de

exposições e competições entre aves das raças combatentes - Norma

que institucionaliza a prática de crueldade contra a fauna –

Inconstitucionalidade. . Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator:

Ministro Celso de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Disponível em:

<www.stf.jus.br>. Acesso em 12 jun. 2015. 58 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 21 ed.

atual. São Paulo: Editora Malheiros Ltda., 2007, p. 569.

Page 86: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

86

ambiente ecologicamente equilibrado, positivado na

Constituição de 1988, emerge com um claro e tangível

aspecto de familiaridade, como ápice da evolução e

concretização dos direitos fundamentais.

2 COMENTÁRIOS À CONCEPÇÃO DE MEIO

AMBIENTE

Em uma primeira plana, ao lançar mão do

sedimentado jurídico-doutrinário apresentado pelo inciso

I do artigo 3º da Lei Nº. 6.938, de 31 de agosto de 198159,

que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente,

seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá

outras providências, salienta que o meio ambiente

consiste no conjunto e conjunto de condições, leis e

influências de ordem química, física e biológica que

permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.

Pois bem, com o escopo de promover uma facilitação do

aspecto conceitual apresentado, é possível verificar que o

meio ambiente se assenta em um complexo diálogo de

fatores abióticos, provenientes de ordem química e física,

59 BRASIL. Lei Nº. 6.938, de 31 de Agosto de 1981. Dispõe sobre a

Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de

formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 12 jun. 2015.

Page 87: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

87

e bióticos, consistentes nas plurais e diversificadas

formas de seres viventes. Para Silva, considera-se meio-

ambiente como “a interação do conjunto de elementos

naturais, artificiais e culturais que propiciem o

desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas

formas”60.

Nesta senda, ainda, Fiorillo61, ao tecer

comentários acerca da acepção conceitual de meio

ambiente, coloca em destaque que tal tema se assenta em

um ideário jurídico indeterminado, incumbindo, ao

intérprete das leis, promover o seu preenchimento. Dada

à fluidez do tema, é possível colocar em evidência que o

meio ambiente encontra íntima e umbilical relação com

os componentes que cercam o ser humano, os quais são

de imprescindível relevância para a sua existência. O

Ministro Luiz Fux, ao apreciar a Ação Direta de

Inconstitucionalidade N°. 4.029/AM, salientou que:

(...) o meio ambiente é um conceito hoje

geminado com o de saúde pública, saúde de

cada indivíduo, sadia qualidade de vida, diz

a Constituição, é por isso que estou falando

de saúde, e hoje todos nós sabemos que ele é

60 SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. São

Paulo: Malheiros Editores, 2009, p. 20. 61 FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de Direito

Ambiental Brasileiro. 13 ed., rev., atual e ampl. São Paulo:

Editora Saraiva, 2012, p. 77.

Page 88: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

88

imbricado, é conceitualmente geminado com

o próprio desenvolvimento. Se antes nós

dizíamos que o meio ambiente é compatível

com o desenvolvimento, hoje nós dizemos, a

partir da Constituição, tecnicamente, que

não pode haver desenvolvimento senão com

o meio ambiente ecologicamente

equilibrado. A geminação do conceito me

parece de rigor técnico, porque salta da

própria Constituição Federal62.

É denotável, desta sorte, que a

constitucionalização do meio ambiente no Brasil

viabilizou um verdadeiro salto qualitativo, no que

concerne, especificamente, às normas de proteção

ambiental. Tal fato decorre da premissa que os robustos

corolários e princípios norteadores foram alçados ao

patamar constitucional, assumindo colocação eminente,

ao lado das liberdades públicas e dos direitos

fundamentais. Superadas tais premissas, aprouve ao

Constituinte, ao entalhar a Carta Política Brasileira,

62 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido em

Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 4.029/AM. Ação Direta de

Inconstitucionalidade. Lei Federal Nº 11.516/07. Criação do Instituto

Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Legitimidade da

Associação Nacional dos Servidores do IBAMA. Entidade de Classe

de Âmbito Nacional. Violação do art. 62, caput e § 9º, da

Constituição. Não emissão de parecer pela Comissão Mista

Parlamentar. Inconstitucionalidade dos artigos 5º, caput, e 6º, caput

e parágrafos 1º e 2º, da Resolução Nº 1 de 2002 do Congresso

Nacional. Modulação dos Efeitos Temporais da Nulidade (Art. 27 da

Lei 9.868/99). Ação Direta Parcialmente Procedente. Órgão

Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Luiz Fux. Julgado em 08

mar. 2012. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em 12 jun. 2015.

Page 89: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

89

ressoando os valores provenientes dos direitos de terceira

dimensão, insculpir na redação do artigo 225, conceder

amplo e robusto respaldo ao meio ambiente como pilar

integrante dos direitos fundamentais. “Com o advento da

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988,

as normas de proteção ambiental são alçadas à categoria

de normas constitucionais, com elaboração de capítulo

especialmente dedicado à proteção do meio ambiente”63.

Nesta toada, ainda, é observável que o caput do artigo

225 da Constituição Federal64 está abalizado em quatro

pilares distintos, robustos e singulares que, em conjunto,

dão corpo a toda tábua ideológica e teórica que assegura

o substrato de edificação da ramificação ambiental.

Primeiramente, em decorrência do tratamento

dispensado pelo artífice da Constituição Federal, o meio

ambiente foi içado à condição de direito de todos,

presentes e futuras gerações. É encarado como algo

pertencente a toda coletividade, assim, por esse prisma,

63 THOMÉ, Romeu. Manual de Direito Ambiental: Conforme o

Novo Código Florestal e a Lei Complementar 140/2011. 2 ed.

Salvador: Editora JusPodivm, 2012, p. 116. 64 BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República

Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 12 jun. 2015: “Art. 225.

Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem

de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,

impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e

preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

Page 90: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

90

não se admite o emprego de qualquer distinção entre

brasileiro nato, naturalizado ou estrangeiro, destacando-

se, sim, a necessidade de preservação, conservação e não-

poluição. O artigo 225, devido ao cunho de direito difuso

que possui, extrapola os limites territoriais do Estado

Brasileiro, não ficando centrado, apenas, na extensão

nacional, compreendendo toda a humanidade. Neste

sentido, inclusive, o Ministro Celso de Mello, ao apreciar

a Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 1.856/RJ,

destacou, com bastante pertinência, que:

A preocupação com o meio ambiente - que

hoje transcende o plano das presentes

gerações, para também atuar em favor das

gerações futuras (...) tem constituído, por

isso mesmo, objeto de regulações

normativas e de proclamações jurídicas,

que, ultrapassando a província meramente

doméstica do direito nacional de cada

Estado soberano, projetam-se no plano das

declarações internacionais, que refletem, em

sua expressão concreta, o compromisso das

Nações com o indeclinável respeito a esse

direito fundamental que assiste a toda a

Humanidade65.

65 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido em

Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 1.856/RJ. Ação Direta De

Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense Nº 2.895/98) -

Legislação Estadual que, pertinente a exposições e a competições

entre aves das raças combatentes, favorece essa prática criminosa -

Diploma Legislativo que estimula o cometimento de atos de

crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei Nº 9.605/98,

ART. 32) - Meio Ambiente - Direito à preservação de sua integridade

Page 91: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

91

O termo “todos”, aludido na redação do caput

do artigo 225 da Constituição Federal de 1988, faz

menção aos já nascidos (presente geração) e ainda

aqueles que estão por nascer (futura geração), cabendo

àqueles zelar para que esses tenham à sua disposição, no

mínimo, os recursos naturais que hoje existem. Tal fato

encontra como arrimo a premissa que foi reconhecido ao

gênero humano o direito fundamental à liberdade, à

igualdade e ao gozo de condições de vida adequada, em

ambiente que permita desenvolver todas as suas

potencialidades em clima de dignidade e bem-estar.

Pode-se considerar como um direito transgeracional, ou

seja, ultrapassa as gerações, logo, é viável afirmar que o

meio-ambiente é um direito público subjetivo. Desta

feita, o ideário de que o meio ambiente substancializa

patrimônio público a ser imperiosamente assegurado e

(CF, Art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu caráter de

metaindividualidade - Direito de terceira geração (ou de novíssima

dimensão) que consagra o postulado da solidariedade - Proteção

constitucional da fauna (CF, Art. 225, § 1º, VII) - Descaracterização

da briga de galo como manifestação cultural - Reconhecimento da

inconstitucionalidade da Lei Estadual impugnada - Ação Direta

procedente. Legislação Estadual que autoriza a realização de

exposições e competições entre aves das raças combatentes - Norma

que institucionaliza a prática de crueldade contra a fauna –

Inconstitucionalidade. . Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator:

Ministro Celso de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Disponível em:

<www.stf.jus.br>. Acesso em 12 jun. 2015.

Page 92: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

92

protegido pelos organismos sociais e pelas instituições

estatais, qualificando verdadeiro encaro irrenunciável

que se impõe, objetivando sempre o benefício das

presentes e das futuras gerações, incumbindo tanto ao

Poder Público quanto à coletividade considerada em si

mesma.

Assim, decorrente de tal fato, produz efeito

erga omnes, sendo, portanto, oponível contra a todos,

incluindo pessoa física/natural ou jurídica, de direito

público interno ou externo, ou mesmo de direito privado,

como também ente estatal, autarquia, fundação ou

sociedade de economia mista. Impera, também,

evidenciar que, como um direito difuso, não subiste a

possibilidade de quantificar quantas são as pessoas

atingidas, pois a poluição não afeta tão só a população

local, mas sim toda a humanidade, pois a coletividade é

indeterminada. Nesta senda, o direito à integridade do

meio ambiente substancializa verdadeira prerrogativa

jurídica de titularidade coletiva, ressoando a expressão

robusta de um poder deferido, não ao indivíduo

identificado em sua singularidade, mas num sentido

mais amplo, atribuído à própria coletividade social.

Com a nova sistemática entabulada pela

redação do artigo 225 da Carta Maior, o meio-ambiente

Page 93: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

93

passou a ter autonomia, tal seja não está vinculada a

lesões perpetradas contra o ser humano para se

agasalhar das reprimendas a serem utilizadas em

relação ao ato perpetrado. Figura-se, ergo, como bem de

uso comum do povo o segundo pilar que dá corpo aos

sustentáculos do tema em tela. O axioma a ser

esmiuçado, está atrelado o meio-ambiente como vetor da

sadia qualidade de vida, ou seja, manifesta-se na

salubridade, precipuamente, ao vincular a espécie

humana está se tratando do bem-estar e condições

mínimas de existência. Igualmente, o sustentáculo em

análise se corporifica também na higidez, ao cumprir os

preceitos de ecologicamente equilibrado, salvaguardando

a vida em todas as suas formas (diversidade de espécies).

Por derradeiro, o quarto pilar é a

corresponsabilidade, que impõe ao Poder Público o dever

geral de se responsabilizar por todos os elementos que

integram o meio ambiente, assim como a condição

positiva de atuar em prol de resguardar. Igualmente,

tem a obrigação de atuar no sentido de zelar, defender e

preservar, asseverando que o meio-ambiente permaneça

intacto. Aliás, este último se diferencia de conservar que

permite a ação antrópica, viabilizando melhorias no meio

ambiente, trabalhando com as premissas de

Page 94: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

94

desenvolvimento sustentável, aliando progresso e

conservação. Por seu turno, o cidadão tem o dever

negativo, que se apresenta ao não poluir nem agredir o

meio-ambiente com sua ação. Além disso, em razão da

referida corresponsabilidade, são titulares do meio

ambiente os cidadãos da presente e da futura geração.

3 SOLIDARIEDADE ENTRE ESPÉCIES

NATURAIS? O ALARGAMENTO DA MOLDURA

AXIOLÓGICA DO PRINCÍPIO DA

SOLIDARIEDADE AMBIENTAL

Como desdobramento da projeção normativa do

corolário da solidariedade, na órbita ecológica, há que se

estruturar uma solidariedade entre todas as espécies

vivas, na forma de uma comunidade entre a terra, as

plantas, os animais e os seres humanos, visto que a

ameaça ecológica coloca em risco todas as espécies

existentes no planeta, afetando por igual a todos e ao

todo. Neste diapasão, a necessidade de despertar uma

consciência pautada na solidariedade entre as espécies

naturais é despertada, sobremaneira, em decorrência

das ameaças à vida desencadeadas pelo desenvolvimento

civilizatório fazerem com que o ser humano se reconheça

Page 95: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

95

como um ser natural integrante de um todo ameaçado e,

concomitantemente, responsável por tal situação de

ameaça existencial. Segundo Sarlet e Fensterseifer66, a

ameaça de contaminação propicia que o ser humano

perceba que o seu corpo integra parte das “coisas

naturais” e que, em razão disso, está sujeito à ameaça

supramencionada. A construção de tal consciência leva o

ser humano a reconhecer, forçosamente, uma

comunidade natural, diante da qual o estabelecimento de

um vínculo de solidariedade e respeito mútuo como

pressuposto para a permanência existencial das espécies

naturais, abarcando-se em tal concepção o ser humano.

Em uma perspectiva jurídica, a vedação das

políticas cruéis contra os animais (não humanos)

encontra repouso no Texto Constitucional, reforçando,

portanto, o ideário axiológico de solidariedade entre as

espécies naturais. Mais que isso, ao analisar o

julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº

1.856/RJ, de relatoria do Ministro Celso de Mello, salta

aos olhos a concreção do dogma em comento, em especial

quando a ementa consagra que “a promoção de briga de

galos, além de caracterizar prática criminosa tipificada

66 SARLET, Ingo Wolfgang; FENSTERSEIFER, Tiago. Princípios

do Direito Ambiental. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 77.

Page 96: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

96

na legislação ambiental, configura conduta atentatória à

Constituição da República, que veda a submissão de

animais a atos de crueldade”67. Ora, há que se

reconhecer que essa especial tutela, que tem por

fundamento legitimador a autoridade da Constituição da

República, é motivada pela necessidade de impedir a

ocorrência de situações de risco que ameacem ou que

façam periclitar todas as formas de vida, não só a do

gênero humano, mas, também, a própria vida animal,

cuja integridade restaria comprometida, não fora a

vedação constitucional, por práticas aviltantes,

perversas e violentas contra os seres irracionais. “A ideia

de „solidariedade entre espécies naturais‟, portanto,

também pode transportar o reconhecimento do valor

67 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido na

Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.856/RJ. Ação Direta de

Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense nº 2.895/98) -

Legislação estadual que, pertinente a exposições e a competições

entre aves das raças combatentes, favorece essa prática criminosa -

Diploma legislativo que estimula o cometimento de atos de

crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei nº 9.605/98,

art. 32) - Meio Ambiente - Direito à preservação de sua integridade

(CF, art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu caráter de

metaindividualidade - Direito de terceira geração (ou de novíssima

dimensão) que consagra o postulado da solidariedade - Proteção

constitucional da fauna (CF, art. 225, § 1º, VII) - Descaracterização

da briga de galo como manifestação cultural - Reconhecimento da

inconstitucionalidade da lei estadual impugnada - Ação Direta

Procedente. Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Celso

de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Publicado no DJe em 13 out.

2011. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em 12 jun. 2015.

Page 97: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

97

intrínseco de todas as manifestações existenciais, bem

como o respeito à reciprocidade indispensável ao convívio

harmonioso” 68, estendido a todos os seres vivos. Salta

aos olhos, desta feita, que o princípio da solidariedade,

cuja incidência deve ser maximizada em diversos

âmbitos, inclusive na seara ambiental, passa a ser

desfraldado como pilar sustentador das relações

contemporâneas, em sua senda civilizatória,

considerando todas as suas dimensões, a saber:

intergeracional, intrageracional e interespécies.

4 DO RECONHECIMENTO DA EDIFICAÇÃO DO

DIREITO DOS ANIMAIS: O FORTALECIMENTO

DA SOLIDARIEDADE ENTRE ESPÉCIES

NATURAIS

Em um primeiro comentário, cuida destacar

que o Direito dos Animais ou o movimento de proteção

desses direitos desponta, em um cenário contemporâneo,

como um novo ramo da Ciência Jurídica, objetivando

proteger tais seres vivos como de salvaguardar não

apenas o meio ambiental, o ecossistema e evitar a

extinção de diversas espécies, mas também o leque de

68 SARLET; FENSTERSEIFER, 2014, p. 77.

Page 98: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

98

direitos fundamentais, a exemplo do direito à vida, à

liberdade e o respeito, coibindo, por via de consequência,

os atos de violência, maus-tratos e crueldade. Neste

sentido, ainda, é possível fazer alusão ao Texto

Constitucional, quando, de maneira expressa e ofuscante,

no inciso VII do §1º do artigo 225, explicita que “para

assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder

Público: [omissis] VII - proteger a fauna e a flora,

vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em

risco sua função ecológica, provoquem a extinção de

espécies ou submetam os animais a crueldade”69. Aduz,

ainda, Gomes e Chalfun que:

Na verdade, os animais devem ser

protegidos não apenas em benefício do

homem, mas também como um exercício de

compaixão e solidariedade a espécies mais

vulneráveis e dignas de respeito, o homem

não deve ser o único ser protegido, o único a

ter direitos fundamentais reconhecidos, é

preciso considerar que o homem é também

uma espécie animal, e dentro desta ótica o

animal é o outro do homem70.

Salta aos olhos que a proposição de uma

69 BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República

Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 12 jun. 2015. 70 GOMES, Rosangela Maria A.; CHALFUN, Mery. Direito dos

Animais – Um novo e fundamental Direito. Disponível em:

<http://www.conpedi.org.br>. Acesso em 12 jun. 2015, p. 852.

Page 99: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

99

ramificação jurídica autônoma, pautada exclusivamente

no Direito dos Animais, decorre da desconstrução da

tradicional ótica antropocêntrica. Neste sentido, convém

mencionar que a visão antropocêntrica está alicerçada no

preceito de que o homem se identificava no centro do

mundo - em que usufrui do meio ambiente de modo

indiferente à sua existência-, o ecocentrismo mudou o

paradigma apresentando sentido e valor à vida do ser,

englobando agora a fauna e a flora como ícones

essenciais ao equilíbrio ambiental. Ao lado disso, Abreu e

Bussinguer, oportunamente, destacam que “a concepção

eminentemente antropocêntrica se mantém arraigada

em alguns setores da sociedade contemporânea, o que

impede muitos avanços em projetos que visam a

conservação do meio, em especial, a conservação de

espécies em vias de extinção e a instalação de Unidades

de Conservação”71. Podendo o ecocentrismo ser chamado

também de biocentrismo, abordando a vida do ser de

forma ampla considerando-a como personagem central

da uma tutela ambiental, este segundo termo surgiu com

71 ABREU, Ivy de Souza; BUSSINGUER, Elda Coelho de Azevedo.

Antropocentrismo, Ecocentrismo e Holismo: uma breve análise das

escolas de pensamento ambiental. Derecho y Cambio Social,

2013, p. 01-11. Disponível em:

<http://www.derechoycambiosocial.com/revista034/escolas_de_pensa

mento_ambiental.pdf>. Acesso em 12 jun. 2015, p. 05.

Page 100: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

100

a Lei nº 6.938/1981, eliminando a visão antropocêntrica.

“Assim, a escola ecocêntrica (ou biocêntrica, como muitos

preferem) coloca em primeiro plano de discussão e

proteção o equilíbrio dos ecossistemas e do meio

ambiente natural”72.

Figura 01. Egocentrismo

(antropocentrismo)

Figura 02. Econcentrismo/Biocentrismo.

O holismo considera e defende as entidades

físicas e biológicas como um sistema único e integrando -

seres vivos e recursos ambientais disponíveis -,

considerado autônomo o meio ambiente não é mais

notado como aquele que nutre somente as necessidades

humanas, mas aquele que carece de cuidados e zelo.

72 ABREU; BUSSINGUER, 2013, p. 05.

Page 101: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

101

Nessa perspectiva, “a análise do meio ambiente deve

considerar o contexto amplo e global de todas as

variáveis intrínsecas e extrínsecas que geram influências

diversas e, primordialmente, a interação entre essas

variáveis, para que não haja uma visão distorcida,

simplória e reducionista do bem ambiental” 73. Assim, no

holismo ambiental tem suas bases sustentadas não

apenas no meio natural e nos seus elementos. A vida

humana e suas expressões também se tornam objeto de

proteção, mas não pelos motivos apregoados pelo

antropocentrismo e sim, pela espécie humana (e os

fatores que se relacionam com sua existência e

desenvolvimento) ser parte do meio ambiente e

indispensável ao equilíbrio ambiental.

É oportuno consignar que o tratamento dos

animais, sobretudo no que se refere à edificação de uma

ramificação jurídica autônoma, deve ser pautado pela

ética e por princípios morais, porquanto esses devem

nortear a conduta humana. “Conduta ética em relação

aos animais oprimidos, e todos devem agir em sua

defesa, como forma de legítima manifestação de

cidadania” 74. Assim, à luz da exposição apresenta, é

73 ABREU; BUSSINGUER, 2013, p. 08. 74 GOMES; CHALFUN, s.d., p. 852.

Page 102: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

102

notório que o direito dos animais e a proteção dos direitos

fundamentais como inerentes a estes, desponta com um

novo ramo do direito, merecedor de estudos,

desenvolvimento e evolução, muito há o que se debater e

estudar, não obstante muito se avançou. Imprescindível

para toda a sociedade, para o meio ambiente, para os

amantes da natureza e dos animais, o direito dos animais

possui sua essência na filosofia, na ética, na moral, e

desponta com um novo seguimento do direito a ser

aprimorado e estudado.

5 COMENTÁRIOS À LEI Nº 11.794/2008:

RECONHECIMENTO DO FORTALECIMENTO DA

SOLIDARIEDADE ENTRE ESPÉCIES NATURAIS

NA PESQUISA ENVOLVENDO ANIMAIS

A criação e a utilização de animais em

atividades de ensino e pesquisa científica, em todo o

território nacional, obedece aos critérios estabelecidos na

Lei nº 11.794, de 08 de outubro de 200875, que

75 BRASIL. Lei nº 11.794, de 08 de outubro de 2008.

Regulamenta o inciso VII do § 1o do art. 225 da Constituição Federal,

estabelecendo procedimentos para o uso científico de animais; revoga

a Lei no 6.638, de 8 de maio de 1979; e dá outras providências.

Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 12 jun.

2015.

Page 103: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

103

regulamenta o inciso VII do § 1o do art. 225 da

Constituição Federal, estabelecendo procedimentos para

o uso científico de animais; revoga a Lei no 6.638, de 8 de

maio de 1979; e dá outras providências. A utilização de

animais em atividades educacionais fica restrita a: I –

estabelecimentos de ensino superior; II –

estabelecimentos de educação profissional técnica de

nível médio da área biomédica. São consideradas como

atividades de pesquisa científica todas aquelas

relacionadas com ciência básica, ciência aplicada,

desenvolvimento tecnológico, produção e controle da

qualidade de drogas, medicamentos, alimentos,

imunobiológicos, instrumentos, ou quaisquer outros

testados em animais, conforme definido em regulamento

próprio. Não são consideradas como atividades de

pesquisa as práticas zootécnicas relacionadas à

agropecuária.

O disposto na Lei nº 11.794, de 08 de outubro

de 200876, que regulamenta o inciso VII do § 1o do art.

225 da Constituição Federal, estabelecendo

76 BRASIL. Lei nº 11.794, de 08 de outubro de 2008.

Regulamenta o inciso VII do § 1o do art. 225 da Constituição Federal,

estabelecendo procedimentos para o uso científico de animais; revoga

a Lei no 6.638, de 8 de maio de 1979; e dá outras providências.

Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 12 jun.

2015.

Page 104: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

104

procedimentos para o uso científico de animais; revoga a

Lei no 6.638, de 8 de maio de 1979; e dá outras

providências, aplica-se aos animais das espécies

classificadas como filo Chordata, subfilo Vertebrata,

observada a legislação ambiental. A legislação em

comento criou o Conselho Nacional de Controle de

Experimentação Animal – CONCEA, cuja competência: I

– formular e zelar pelo cumprimento das normas

relativas à utilização humanitária de animais com

finalidade de ensino e pesquisa científica; II – credenciar

instituições para criação ou utilização de animais em

ensino e pesquisa científica; III – monitorar e avaliar a

introdução de técnicas alternativas que substituam a

utilização de animais em ensino e pesquisa; IV –

estabelecer e rever, periodicamente, as normas para uso

e cuidados com animais para ensino e pesquisa, em

consonância com as convenções internacionais das quais

o Brasil seja signatário; V – estabelecer e rever,

periodicamente, normas técnicas para instalação e

funcionamento de centros de criação, de biotérios e de

laboratórios de experimentação animal, bem como sobre

as condições de trabalho em tais instalações; VI –

estabelecer e rever, periodicamente, normas para

credenciamento de instituições que criem ou utilizem

Page 105: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

105

animais para ensino e pesquisa; VII – manter cadastro

atualizado dos procedimentos de ensino e pesquisa

realizados ou em andamento no País, assim como dos

pesquisadores, a partir de informações remetidas pelas

Comissões de Ética no Uso de Animais - CEUAs, de que

trata o art. 8o da lei em comento; VIII – apreciar e

decidir recursos interpostos contra decisões das CEUAs;

IX – elaborar e submeter ao Ministro de Estado da

Ciência e Tecnologia, para aprovação, o seu regimento

interno; X – assessorar o Poder Executivo a respeito das

atividades de ensino e pesquisa tratadas na lei em

apreço.

O CONCEA é constituído por: I – Plenário; II –

Câmaras Permanentes e Temporárias; III – Secretaria-

Executiva. As Câmaras Permanentes e Temporárias do

CONCEA serão definidas no regimento interno. A

Secretaria-Executiva é responsável pelo expediente do

CONCEA e terá o apoio administrativo do Ministério da

Ciência e Tecnologia. O CONCEA poderá valer-se de

consultores ad hoc de reconhecida competência técnica e

científica, para instruir quaisquer processos de sua pauta

de trabalhos. O CONCEA será presidido pelo Ministro de

Estado da Ciência e Tecnologia e integrado por: I – 1

(um) representante de cada órgão e entidade a seguir

Page 106: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

106

indicados: a) Ministério da Ciência e Tecnologia; b)

Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e

Tecnológico – CNPq; c) Ministério da Educação; d)

Ministério do Meio Ambiente; e) Ministério da Saúde; f)

Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento; g)

Conselho de Reitores das Universidades do Brasil –

CRUB; h) Academia Brasileira de Ciências; i) Sociedade

Brasileira para o Progresso da Ciência; j) Federação das

Sociedades de Biologia Experimental; l) Colégio

Brasileiro de Experimentação Animal; m) Federação

Nacional da Indústria Farmacêutica; II – 2 (dois)

representantes das sociedades protetoras de animais

legalmente estabelecidas no País.

É condição indispensável para o

credenciamento das instituições com atividades de ensino

ou pesquisa com animais a constituição prévia de

Comissões de Ética no Uso de Animais – CEUAs. As

CEUAs são integradas por: I – médicos veterinários e

biólogos; II – docentes e pesquisadores na área específica;

III – 1 (um) representante de sociedades protetoras de

animais legalmente estabelecidas no País, na forma do

Regulamento. Compete às CEUAs: I – cumprir e fazer

cumprir, no âmbito de suas atribuições, o disposto nesta

Lei e nas demais normas aplicáveis à utilização de

Page 107: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

107

animais para ensino e pesquisa, especialmente nas

resoluções do CONCEA; II – examinar previamente os

procedimentos de ensino e pesquisa a serem realizados

na instituição à qual esteja vinculada, para determinar

sua compatibilidade com a legislação aplicável; III –

manter cadastro atualizado dos procedimentos de ensino

e pesquisa realizados, ou em andamento, na instituição,

enviando cópia ao CONCEA; IV – manter cadastro dos

pesquisadores que realizem procedimentos de ensino e

pesquisa, enviando cópia ao CONCEA; V – expedir, no

âmbito de suas atribuições, certificados que se fizerem

necessários perante órgãos de financiamento de

pesquisa, periódicos científicos ou outros; VI – notificar

imediatamente ao CONCEA e às autoridades sanitárias

a ocorrência de qualquer acidente com os animais nas

instituições credenciadas, fornecendo informações que

permitam ações saneadoras.

Constatado qualquer procedimento em

descumprimento às disposições desta Lei na execução de

atividade de ensino e pesquisa, a respectiva CEUA

determinará a paralisação de sua execução, até que a

irregularidade seja sanada, sem prejuízo da aplicação de

outras sanções cabíveis. Quando se configurar a hipótese

prevista no § 1o do artigo 10, a omissão da CEUA

Page 108: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

108

acarretará sanções à instituição, nos termos dos arts. 17

e 20 da Lei. Das decisões proferidas pelas CEUAs cabe

recurso, sem efeito suspensivo, ao CONCEA. Os

membros das CEUAs responderão pelos prejuízos que,

por dolo, causarem às pesquisas em andamento. Os

membros das CEUAs estão obrigados a resguardar o

segredo industrial, sob pena de responsabilidade.

Compete ao Ministério da Ciência e Tecnologia licenciar

as atividades destinadas à criação de animais, ao ensino

e à pesquisa científica de que trata a legislação em

comento. A criação ou a utilização de animais para

pesquisa ficam restritas, exclusivamente, às instituições

credenciadas no CONCEA. Qualquer instituição

legalmente estabelecida em território nacional que crie

ou utilize animais para ensino e pesquisa deverá

requerer credenciamento no CONCEA, para uso de

animais, desde que, previamente, crie a CEUA. A critério

da instituição e mediante autorização do CONCEA, é

admitida a criação de mais de uma CEUA por

instituição. Na hipótese prevista no § 1o do artigo 1377 da

77 BRASIL. Lei nº 11.794, de 08 de outubro de 2008.

Regulamenta o inciso VII do § 1o do art. 225 da Constituição Federal,

estabelecendo procedimentos para o uso científico de animais; revoga

a Lei no 6.638, de 8 de maio de 1979; e dá outras providências.

Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 12 jun.

2015.

Page 109: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

109

legislação em comento, cada CEUA definirá os

laboratórios de experimentação animal, biotérios e

centros de criação sob seu controle.

O animal só poderá ser submetido às

intervenções recomendadas nos protocolos dos

experimentos que constituem a pesquisa ou programa de

aprendizado quando, antes, durante e após o

experimento, receber cuidados especiais, conforme

estabelecido pelo CONCEA. O animal será submetido a

eutanásia, sob estrita obediência às prescrições

pertinentes a cada espécie, conforme as diretrizes do

Ministério da Ciência e Tecnologia, sempre que,

encerrado o experimento ou em qualquer de suas fases,

for tecnicamente recomendado aquele procedimento ou

quando ocorrer intenso sofrimento. Excepcionalmente,

quando os animais utilizados em experiências ou

demonstrações não forem submetidos a eutanásia,

poderão sair do biotério após a intervenção, ouvida a

respectiva CEUA quanto aos critérios vigentes de

segurança, desde que destinados a pessoas idôneas ou

entidades protetoras de animais devidamente

legalizadas, que por eles queiram responsabilizar-se.

Sempre que possível, as práticas de ensino deverão ser

fotografadas, filmadas ou gravadas, de forma a permitir

Page 110: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

110

sua reprodução para ilustração de práticas futuras,

evitando-se a repetição desnecessária de procedimentos

didáticos com animais.

O número de animais a serem utilizados para

a execução de um projeto e o tempo de duração de cada

experimento será o mínimo indispensável para produzir

o resultado conclusivo, poupando-se, ao máximo, o

animal de sofrimento. Experimentos que possam causar

dor ou angústia desenvolver-se-ão sob sedação, analgesia

ou anestesia adequadas. Experimentos cujo objetivo seja

o estudo dos processos relacionados à dor e à angústia

exigem autorização específica da CEUA, em obediência a

normas estabelecidas pelo CONCEA. É vedado o uso de

bloqueadores neuromusculares ou de relaxantes

musculares em substituição a substâncias sedativas,

analgésicas ou anestésicas. É vedada a reutilização do

mesmo animal depois de alcançado o objetivo principal

do projeto de pesquisa. Em programa de ensino, sempre

que forem empregados procedimentos traumáticos,

vários procedimentos poderão ser realizados num mesmo

animal, desde que todos sejam executados durante a

vigência de um único anestésico e que o animal seja

sacrificado antes de recobrar a consciência.

Page 111: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

111

Para a realização de trabalhos de criação e

experimentação de animais em sistemas fechados, serão

consideradas as condições e normas de segurança

recomendadas pelos organismos internacionais aos quais

o Brasil se vincula. O CONCEA, levando em conta a

relação entre o nível de sofrimento para o animal e os

resultados práticos que se esperam obter, poderá

restringir ou proibir experimentos que importem em

elevado grau de agressão. Todo projeto de pesquisa

científica ou atividade de ensino será supervisionado por

profissional de nível superior, graduado ou pós-graduado

na área biomédica, vinculado a entidade de ensino ou

pesquisa credenciada pelo CONCEA.

REFERÊNCIA:

ABREU, Ivy de Souza; BUSSINGUER, Elda Coelho de

Azevedo. Antropocentrismo, Ecocentrismo e Holismo:

uma breve análise das escolas de pensamento ambiental.

Derecho y Cambio Social, 2013, p. 01-11. Disponível

em:

<http://www.derechoycambiosocial.com/revista034/escola

s_de_pensamento_ambiental.pdf>. Acesso em 12 jun.

2015.

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito

Constitucional. 21 ed. atual. São Paulo: Editora

Malheiros Ltda., 2007.

Page 112: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

112

BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da)

República Federativa do Brasil. Brasília: Senado

Federal, 1988. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 12 jun. 2015.

___________. Lei Nº. 6.938, de 31 de Agosto de 1981.

Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus

fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras

providências. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 12 jun. 2015.

___________. Lei nº 11.794, de 08 de outubro de 2008.

Regulamenta o inciso VII do § 1o do art. 225 da

Constituição Federal, estabelecendo procedimentos para

o uso científico de animais; revoga a Lei no 6.638, de 8 de

maio de 1979; e dá outras providências. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 12 jun. 2015.

___________. Superior Tribunal de Justiça.

Disponível em: <www.stj.jus.br>. Acesso em 12 jun.

2015.

___________. Supremo Tribunal Federal. Disponível

em: <www.stf.jus.br>. Acesso em 12 jun. 2015.

BRITO, Fernando de Azevedo Alves. A hodierna

classificação do meio-ambiente, o seu remodelamento e a

problemática sobre a existência ou a inexistência das

classes do meio-ambiente do trabalho e do meio-ambiente

misto. Boletim Jurídico, Uberaba, ano 5, n. 968.

Disponível em: <http://www.boletimjuridico.com.br>.

Acesso em 12 jun. 2015.

FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de Direito

Ambiental Brasileiro. 13 ed., rev., atual e ampl. São

Page 113: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

113

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GOMES, Rosangela Maria A.; CHALFUN, Mery.

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MOTTA, Sylvio; DOUGLAS, Willian. Direito

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THOMÉ, Romeu. Manual de Direito Ambiental:

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VERDAN, Tauã Lima. Princípio da Legalidade: Corolário

do Direito Penal. Jurid Publicações Eletrônicas,

Bauru, 22 jun. 2009. Disponível em:

<http://jornal.jurid.com.br>. Acesso em 12 jun. 2015.

Page 114: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

114

DO RECONHECIMENTO DA EDIFICAÇÃO DO

DIREITO DOS ANIMAIS: O FORTALECIMENTO DA

SOLIDARIEDADE ENTRE ESPÉCIES NATURAIS

Resumo: O objetivo do presente está alicerçado

na análise da edificação do Direito dos Animais,

na condição de ramo autônomo da Ciência

Jurídica, inspirado, sobremaneira, no princípio da

solidariedade, expressamente positivado no Texto

Constitucional, em uma acepção alargada,

voltada, não apenas para o gênero humano, para

as demais espécies (animais e vegetais)

existentes. Como desdobramento da projeção

normativa do corolário da solidariedade, na órbita

ecológica, há que se estruturar uma solidariedade

entre todas as espécies vivas, na forma de uma

comunidade entre a terra, as plantas, os animais

e os seres humanos, visto que a ameaça ecológica

coloca em risco todas as espécies existentes no

planeta, afetando por igual a todos e ao todo.

Neste diapasão, a necessidade de despertar uma

consciência pautada na solidariedade entre as

espécies naturais é despertada, sobremaneira, em

decorrência das ameaças à vida desencadeadas

Page 115: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

115

pelo desenvolvimento civilizatório fazerem com

que o ser humano se reconheça como um ser

natural integrante de um todo ameaçado e,

concomitantemente, responsável por tal situação

de ameaça existencial. A ameaça de contaminação

propicia que o ser humano perceba que o seu

corpo integra parte das “coisas naturais” e que,

em razão disso, está sujeito à ameaça

supramencionada. A construção de tal consciência

leva o ser humano a reconhecer, forçosamente,

uma comunidade natural, diante da qual o

estabelecimento de um vínculo de solidariedade e

respeito mútuo como pressuposto para a

permanência existencial das espécies naturais,

abarcando-se em tal concepção o ser humano.

Palavras-chaves: Solidariedade entre Espécies.

Direito dos Animais. Dignidade Animal.

Sumário: 1 Ponderações Introdutórias: Breves

notas à construção teórica do Direito Ambiental;

2 Comentários à concepção de Meio Ambiente; 3

A Solidariedade Intergeracional no Direito

Ambiental: O Fortalecimento dos Ideários de

Fraternidade nos Direitos de Terceira

Dimensão; 4 Solidariedade entre Espécies

Naturais? O Alargamento da Moldura Axiológica

do Princípio da Solidariedade Ambiental; 5 Do

Reconhecimento da Edificação do Direito dos

Animais: O fortalecimento da solidariedade entre

espécies naturais

Page 116: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

116

1 PONDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS: BREVES

NOTAS À CONSTRUÇÃO TEÓRICA DO DIREITO

AMBIENTAL

Inicialmente, ao se dispensar um exame acerca

do tema colocado em tela, patente se faz arrazoar que a

Ciência Jurídica, enquanto um conjunto multifacetado de

arcabouço doutrinário e técnico, assim como as robustas

ramificações que a integram, reclama uma interpretação

alicerçada nos plurais aspectos modificadores que

passaram a influir em sua estruturação. Neste alamiré,

lançando à tona os aspectos característicos de

mutabilidade que passaram a orientar o Direito, tornou-

se imperioso salientar, com ênfase, que não mais subsiste

uma visão arrimada em preceitos estagnados e

estanques, alheios às necessidades e às diversidades

sociais que passaram a contornar os Ordenamentos

Jurídicos. Ora, infere-se que não mais prospera o

arcabouço imutável que outrora sedimentava a aplicação

das leis, sendo, em decorrência dos anseios da população,

suplantados em uma nova sistemática.

Com espeque em tais premissas, cuida

hastear, com bastante pertinência, como flâmula de

interpretação o “prisma de avaliação o brocardo jurídico

Page 117: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

117

'Ubi societas, ibi jus', ou seja, 'Onde está a sociedade,

está o Direito', tornando explícita e cristalina a relação

de interdependência que esse binômio mantém”78.

Destarte, com clareza solar, denota-se que há uma

interação consolidada na mútua dependência, já que o

primeiro tem suas balizas fincadas no constante processo

de evolução da sociedade, com o fito de que seus

Diplomas Legislativos e institutos não fiquem inquinados

de inaptidão e arcaísmo, em total descompasso com a

realidade vigente. A segunda, por sua vez, apresenta

estrutural dependência das regras consolidadas pelo

Ordenamento Pátrio, cujo escopo primevo é assegurar

que não haja uma vingança privada, afastando, por

extensão, qualquer ranço que rememore priscas eras em

que o homem valorizava a Lei de Talião (“Olho por olho,

dente por dente”), bem como para evitar que se robusteça

um cenário caótico no seio da coletividade.

Ademais, com a promulgação da Constituição

da República Federativa do Brasil de 1988,

imprescindível se fez adotá-la como maciço axioma de

sustentação do Ordenamento Brasileiro, precipuamente

78 VERDAN, Tauã Lima. Princípio da Legalidade: Corolário do

Direito Penal. Jurid Publicações Eletrônicas, Bauru, 22 jun.

2009. Disponível em: <http://jornal.jurid.com.br>. Acesso em 07 jun.

2015.

Page 118: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

118

quando se objetiva a amoldagem do texto legal, genérico

e abstrato, aos complexos anseios e múltiplas

necessidades que influenciam a realidade

contemporânea. Ao lado disso, há que se citar o voto

magistral voto proferido pelo Ministro Eros Grau, ao

apreciar a Ação de Descumprimento de Preceito

Fundamental Nº. 46/DF, “o direito é um organismo vivo,

peculiar porém porque não envelhece, nem permanece

jovem, pois é contemporâneo à realidade. O direito é um

dinamismo. Essa, a sua força, o seu fascínio, a sua

beleza”79. Como bem pontuado, o fascínio da Ciência

Jurídica jaz, justamente, na constante e imprescindível

mutabilidade que apresenta, decorrente do dinamismo

que reverbera na sociedade e orienta a aplicação dos

79 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão em Arguição de

Descumprimento de Preceito Fundamental Nº. 46/DF. Empresa

Pública de Correios e Telégrafos. Privilégio de Entrega de

Correspondências. Serviço Postal. Controvérsia referente à Lei

Federal 6.538, de 22 de Junho de 1978. Ato Normativo que regula

direitos e obrigações concernentes ao Serviço Postal. Previsão de

Sanções nas Hipóteses de Violação do Privilégio Postal.

Compatibilidade com o Sistema Constitucional Vigente. Alegação de

afronta ao disposto nos artigos 1º, inciso IV; 5º, inciso XIII, 170,

caput, inciso IV e parágrafo único, e 173 da Constituição do Brasil.

Violação dos Princípios da Livre Concorrência e Livre Iniciativa. Não

Caracterização. Arguição Julgada Improcedente. Interpretação

conforme à Constituição conferida ao artigo 42 da Lei N. 6.538, que

estabelece sanção, se configurada a violação do privilégio postal da

União. Aplicação às atividades postais descritas no artigo 9º, da lei.

Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Marcos Aurélio.

Julgado em 05 ago. 2009. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso

em 07 jun. 2015.

Page 119: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

119

Diplomas Legais e os institutos jurídicos neles

consagrados.

Ainda neste substrato de exposição, pode-se

evidenciar que a concepção pós-positivista que passou a

permear o Direito, ofertou, por via de consequência, uma

rotunda independência dos estudiosos e profissionais da

Ciência Jurídica. Aliás, há que se citar o entendimento

de Verdan, “esta doutrina é o ponto culminante de uma

progressiva evolução acerca do valor atribuído aos

princípios em face da legislação”80. Destarte, a partir de

uma análise profunda dos mencionados sustentáculos,

infere-se que o ponto central da corrente pós-positivista

cinge-se à valoração da robusta tábua principiológica que

Direito e, por conseguinte, o arcabouço normativo

passando a figurar, nesta tela, como normas de cunho

vinculante, flâmulas hasteadas a serem adotadas na

aplicação e interpretação do conteúdo das leis.

Nas últimas décadas, o aspecto de

mutabilidade tornou-se ainda mais evidente, em especial,

quando se analisa a construção de novos que derivam da

Ciência Jurídica. Entre estes, cuida destacar a

ramificação ambiental, considerando como um ponto de

congruência da formação de novos ideários e cânones,

80 VERDAN, 2009, s.p.

Page 120: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

120

motivados, sobretudo, pela premissa de um manancial de

novos valores adotados. Nesta trilha de argumentação,

de boa técnica se apresenta os ensinamentos de

Fernando de Azevedo Alves Brito que, em seu artigo,

aduz: “Com a intensificação, entretanto, do interesse dos

estudiosos do Direito pelo assunto, passou-se a

desvendar as peculiaridades ambientais, que, por

estarem muito mais ligadas às ciências biológicas, até

então era marginalizadas”81. Assim, em decorrência da

proeminência que os temas ambientais vêm, de maneira

paulatina, alcançando, notadamente a partir das últimas

discussões internacionais envolvendo a necessidade de

um desenvolvimento econômico pautado em

sustentabilidade, não é raro que prospere, mormente em

razão de novos fatores, um verdadeiro remodelamento ou

mesmo uma releitura dos conceitos que abalizam a

ramificação ambiental do Direito, com o fito de permitir

que ocorra a conservação e recuperação das áreas

degradadas.

Ademais, há de ressaltar ainda que o direito

81 BRITO, Fernando de Azevedo Alves. A hodierna classificação do

meio-ambiente, o seu remodelamento e a problemática sobre a

existência ou a inexistência das classes do meio-ambiente do

trabalho e do meio-ambiente misto. Boletim Jurídico, Uberaba,

ano 5, n. 968. Disponível em: <http://www.boletimjuridico.com.br>.

Acesso em 07 jun. 2015.

Page 121: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

121

ambiental passou a figurar, especialmente, depois das

décadas de 1950 e 1960, como um elemento integrante da

farta e sólida tábua de direitos fundamentais. Calha

realçar, com cores quentes, que mais contemporâneos, os

direitos que constituem a terceira dimensão recebem a

alcunha de direitos de fraternidade ou, ainda, de

solidariedade, contemplando, em sua estrutura, uma

patente preocupação com o destino da humanidade82·.

Ora, daí se verifica a inclusão de meio ambiente como um

direito fundamental, logo, está umbilicalmente atrelado

com humanismo e, por extensão, a um ideal de sociedade

mais justa e solidária. Nesse sentido, ainda, é plausível

citar o artigo 3°., inciso I, da Carta Política que abriga

em sua redação tais pressupostos como os princípios

fundamentais do Estado Democrático de Direitos: “Art.

3º - Constituem objetivos fundamentais da República

Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre,

justa e solidária” 83.

Ainda nesta esteira, é possível verificar que a

construção dos direitos encampados sob a rubrica de

82 MOTTA, Sylvio; DOUGLAS, Willian. Direito Constitucional –

Teoria, Jurisprudência e 1.000 Questões 15 ed., rev., ampl. e

atual. Rio de Janeiro: Editora Impetus, 2004, p. 69. 83 BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República

Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 07 jun. 2015.

Page 122: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

122

terceira dimensão tende a identificar a existência de

valores concernentes a uma determinada categoria de

pessoas, consideradas enquanto unidade, não mais

prosperando a típica fragmentação individual de seus

componentes de maneira isolada, tal como ocorria em

momento pretérito. Com o escopo de ilustrar, de maneira

pertinente as ponderações vertidas, insta trazer à colação

o entendimento do Ministro Celso de Mello, ao apreciar a

Ação Direta de Inconstitucionalidade N°. 1.856/RJ, em

especial quando, com bastante pertinência, destaca que:

Cabe assinalar, Senhor Presidente, que os

direitos de terceira geração (ou de

novíssima dimensão), que materializam

poderes de titularidade coletiva atribuídos,

genericamente, e de modo difuso, a todos os

integrantes dos agrupamentos sociais,

consagram o princípio da solidariedade e

constituem, por isso mesmo, ao lado dos

denominados direitos de quarta geração

(como o direito ao desenvolvimento e o

direito à paz), um momento importante no

processo de expansão e reconhecimento dos

direitos humanos, qualificados estes,

enquanto valores fundamentais

indisponíveis, como prerrogativas

impregnadas de uma natureza

essencialmente inexaurível84.

84 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido em

Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 1.856/RJ. Ação Direta De

Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense Nº 2.895/98) -

Legislação Estadual que, pertinente a exposições e a competições

entre aves das raças combatentes, favorece essa prática criminosa -

Page 123: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

123

Quadra anotar que os direitos alocados sob a

rubrica de direito de terceira dimensão encontram como

assento primordial a visão da espécie humana na

condição de coletividade, superando, via de consequência,

a tradicional visão que está pautada no ser humano em

sua individualidade. Assim, a preocupação identificada

está alicerçada em direitos que são coletivos, cujas

influências afetam a todos, de maneira indiscriminada.

Ao lado do exposto, cuida mencionar, segundo Bonavides,

que tais direitos “têm primeiro por destinatários o gênero

humano mesmo, num momento expressivo de sua

afirmação como valor supremo em termos de

existencialidade concreta”85. Com efeito, os direitos de

terceira dimensão, dentre os quais se inclui ao meio

Diploma Legislativo que estimula o cometimento de atos de

crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei Nº 9.605/98,

ART. 32) - Meio Ambiente - Direito à preservação de sua integridade

(CF, Art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu caráter de

metaindividualidade - Direito de terceira geração (ou de novíssima

dimensão) que consagra o postulado da solidariedade - Proteção

constitucional da fauna (CF, Art. 225, § 1º, VII) - Descaracterização

da briga de galo como manifestação cultural - Reconhecimento da

inconstitucionalidade da Lei Estadual impugnada - Ação Direta

procedente. Legislação Estadual que autoriza a realização de

exposições e competições entre aves das raças combatentes - Norma

que institucionaliza a prática de crueldade contra a fauna –

Inconstitucionalidade. . Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator:

Ministro Celso de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Disponível em:

<www.stf.jus.br>. Acesso em 07 jun. 2015. 85 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 21 ed.

atual. São Paulo: Editora Malheiros Ltda., 2007, p. 569.

Page 124: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

124

ambiente ecologicamente equilibrado, positivado na

Constituição de 1988, emerge com um claro e tangível

aspecto de familiaridade, como ápice da evolução e

concretização dos direitos fundamentais.

2 COMENTÁRIOS À CONCEPÇÃO DE MEIO

AMBIENTE

Em uma primeira plana, ao lançar mão do

sedimentado jurídico-doutrinário apresentado pelo inciso

I do artigo 3º da Lei Nº. 6.938, de 31 de agosto de 198186,

que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente,

seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá

outras providências, salienta que o meio ambiente

consiste no conjunto e conjunto de condições, leis e

influências de ordem química, física e biológica que

permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.

Pois bem, com o escopo de promover uma facilitação do

aspecto conceitual apresentado, é possível verificar que o

meio ambiente se assenta em um complexo diálogo de

fatores abióticos, provenientes de ordem química e física,

86 BRASIL. Lei Nº. 6.938, de 31 de Agosto de 1981. Dispõe sobre a

Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de

formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 07 jun. 2015.

Page 125: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

125

e bióticos, consistentes nas plurais e diversificadas

formas de seres viventes. Para Silva, considera-se meio-

ambiente como “a interação do conjunto de elementos

naturais, artificiais e culturais que propiciem o

desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas

formas”87.

Nesta senda, ainda, Fiorillo88, ao tecer

comentários acerca da acepção conceitual de meio

ambiente, coloca em destaque que tal tema se assenta em

um ideário jurídico indeterminado, incumbindo, ao

intérprete das leis, promover o seu preenchimento. Dada

à fluidez do tema, é possível colocar em evidência que o

meio ambiente encontra íntima e umbilical relação com

os componentes que cercam o ser humano, os quais são

de imprescindível relevância para a sua existência. O

Ministro Luiz Fux, ao apreciar a Ação Direta de

Inconstitucionalidade N°. 4.029/AM, salientou que:

(...) o meio ambiente é um conceito hoje

geminado com o de saúde pública, saúde de

cada indivíduo, sadia qualidade de vida, diz

a Constituição, é por isso que estou falando

de saúde, e hoje todos nós sabemos que ele é

87 SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. São

Paulo: Malheiros Editores, 2009, p. 20. 88 FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de Direito

Ambiental Brasileiro. 13 ed., rev., atual e ampl. São Paulo:

Editora Saraiva, 2012, p. 77.

Page 126: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

126

imbricado, é conceitualmente geminado com

o próprio desenvolvimento. Se antes nós

dizíamos que o meio ambiente é compatível

com o desenvolvimento, hoje nós dizemos, a

partir da Constituição, tecnicamente, que

não pode haver desenvolvimento senão com

o meio ambiente ecologicamente

equilibrado. A geminação do conceito me

parece de rigor técnico, porque salta da

própria Constituição Federal89.

É denotável, desta sorte, que a

constitucionalização do meio ambiente no Brasil

viabilizou um verdadeiro salto qualitativo, no que

concerne, especificamente, às normas de proteção

ambiental. Tal fato decorre da premissa que os robustos

corolários e princípios norteadores foram alçados ao

patamar constitucional, assumindo colocação eminente,

ao lado das liberdades públicas e dos direitos

fundamentais. Superadas tais premissas, aprouve ao

Constituinte, ao entalhar a Carta Política Brasileira,

89 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido em

Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 4.029/AM. Ação Direta de

Inconstitucionalidade. Lei Federal Nº 11.516/07. Criação do Instituto

Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Legitimidade da

Associação Nacional dos Servidores do IBAMA. Entidade de Classe

de Âmbito Nacional. Violação do art. 62, caput e § 9º, da

Constituição. Não emissão de parecer pela Comissão Mista

Parlamentar. Inconstitucionalidade dos artigos 5º, caput, e 6º, caput

e parágrafos 1º e 2º, da Resolução Nº 1 de 2002 do Congresso

Nacional. Modulação dos Efeitos Temporais da Nulidade (Art. 27 da

Lei 9.868/99). Ação Direta Parcialmente Procedente. Órgão

Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Luiz Fux. Julgado em 08

mar. 2012. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em 07 jun. 2015.

Page 127: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

127

ressoando os valores provenientes dos direitos de terceira

dimensão, insculpir na redação do artigo 225, conceder

amplo e robusto respaldo ao meio ambiente como pilar

integrante dos direitos fundamentais. “Com o advento da

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988,

as normas de proteção ambiental são alçadas à categoria

de normas constitucionais, com elaboração de capítulo

especialmente dedicado à proteção do meio ambiente”90.

Nesta toada, ainda, é observável que o caput do artigo

225 da Constituição Federal91 está abalizado em quatro

pilares distintos, robustos e singulares que, em conjunto,

dão corpo a toda tábua ideológica e teórica que assegura

o substrato de edificação da ramificação ambiental.

Primeiramente, em decorrência do tratamento

dispensado pelo artífice da Constituição Federal, o meio

ambiente foi içado à condição de direito de todos,

presentes e futuras gerações. É encarado como algo

pertencente a toda coletividade, assim, por esse prisma,

90 THOMÉ, Romeu. Manual de Direito Ambiental: Conforme o

Novo Código Florestal e a Lei Complementar 140/2011. 2 ed.

Salvador: Editora JusPodivm, 2012, p. 116. 91 BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República

Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 07 jun. 2015: “Art. 225.

Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem

de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,

impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e

preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

Page 128: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

128

não se admite o emprego de qualquer distinção entre

brasileiro nato, naturalizado ou estrangeiro, destacando-

se, sim, a necessidade de preservação, conservação e não-

poluição. O artigo 225, devido ao cunho de direito difuso

que possui, extrapola os limites territoriais do Estado

Brasileiro, não ficando centrado, apenas, na extensão

nacional, compreendendo toda a humanidade. Neste

sentido, inclusive, o Ministro Celso de Mello, ao apreciar

a Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 1.856/RJ,

destacou, com bastante pertinência, que:

A preocupação com o meio ambiente - que

hoje transcende o plano das presentes

gerações, para também atuar em favor das

gerações futuras (...) tem constituído, por

isso mesmo, objeto de regulações

normativas e de proclamações jurídicas,

que, ultrapassando a província meramente

doméstica do direito nacional de cada

Estado soberano, projetam-se no plano das

declarações internacionais, que refletem, em

sua expressão concreta, o compromisso das

Nações com o indeclinável respeito a esse

direito fundamental que assiste a toda a

Humanidade92.

92 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido em

Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 1.856/RJ. Ação Direta De

Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense Nº 2.895/98) -

Legislação Estadual que, pertinente a exposições e a competições

entre aves das raças combatentes, favorece essa prática criminosa -

Diploma Legislativo que estimula o cometimento de atos de

crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei Nº 9.605/98,

ART. 32) - Meio Ambiente - Direito à preservação de sua integridade

Page 129: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

129

O termo “todos”, aludido na redação do caput

do artigo 225 da Constituição Federal de 1988, faz

menção aos já nascidos (presente geração) e ainda

aqueles que estão por nascer (futura geração), cabendo

àqueles zelar para que esses tenham à sua disposição, no

mínimo, os recursos naturais que hoje existem. Tal fato

encontra como arrimo a premissa que foi reconhecido ao

gênero humano o direito fundamental à liberdade, à

igualdade e ao gozo de condições de vida adequada, em

ambiente que permita desenvolver todas as suas

potencialidades em clima de dignidade e bem-estar.

Pode-se considerar como um direito transgeracional, ou

seja, ultrapassa as gerações, logo, é viável afirmar que o

meio-ambiente é um direito público subjetivo. Desta

feita, o ideário de que o meio ambiente substancializa

patrimônio público a ser imperiosamente assegurado e

protegido pelos organismos sociais e pelas instituições

(CF, Art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu caráter de

metaindividualidade - Direito de terceira geração (ou de novíssima

dimensão) que consagra o postulado da solidariedade - Proteção

constitucional da fauna (CF, Art. 225, § 1º, VII) - Descaracterização

da briga de galo como manifestação cultural - Reconhecimento da

inconstitucionalidade da Lei Estadual impugnada - Ação Direta

procedente. Legislação Estadual que autoriza a realização de

exposições e competições entre aves das raças combatentes - Norma

que institucionaliza a prática de crueldade contra a fauna –

Inconstitucionalidade. . Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator:

Ministro Celso de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Disponível em:

<www.stf.jus.br>. Acesso em 07 jun. 2015.

Page 130: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

130

estatais, qualificando verdadeiro encaro irrenunciável

que se impõe, objetivando sempre o benefício das

presentes e das futuras gerações, incumbindo tanto ao

Poder Público quanto à coletividade considerada em si

mesma.

Assim, decorrente de tal fato, produz efeito

erga omnes, sendo, portanto, oponível contra a todos,

incluindo pessoa física/natural ou jurídica, de direito

público interno ou externo, ou mesmo de direito privado,

como também ente estatal, autarquia, fundação ou

sociedade de economia mista. Impera, também,

evidenciar que, como um direito difuso, não subiste a

possibilidade de quantificar quantas são as pessoas

atingidas, pois a poluição não afeta tão só a população

local, mas sim toda a humanidade, pois a coletividade é

indeterminada. Nesta senda, o direito à integridade do

meio ambiente substancializa verdadeira prerrogativa

jurídica de titularidade coletiva, ressoando a expressão

robusta de um poder deferido, não ao indivíduo

identificado em sua singularidade, mas num sentido

mais amplo, atribuído à própria coletividade social.

Com a nova sistemática entabulada pela

redação do artigo 225 da Carta Maior, o meio-ambiente

passou a ter autonomia, tal seja não está vinculada a

Page 131: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

131

lesões perpetradas contra o ser humano para se

agasalhar das reprimendas a serem utilizadas em

relação ao ato perpetrado. Figura-se, ergo, como bem de

uso comum do povo o segundo pilar que dá corpo aos

sustentáculos do tema em tela. O axioma a ser

esmiuçado, está atrelado o meio-ambiente como vetor da

sadia qualidade de vida, ou seja, manifesta-se na

salubridade, precipuamente, ao vincular a espécie

humana está se tratando do bem-estar e condições

mínimas de existência. Igualmente, o sustentáculo em

análise se corporifica também na higidez, ao cumprir os

preceitos de ecologicamente equilibrado, salvaguardando

a vida em todas as suas formas (diversidade de espécies).

Por derradeiro, o quarto pilar é a

corresponsabilidade, que impõe ao Poder Público o dever

geral de se responsabilizar por todos os elementos que

integram o meio ambiente, assim como a condição

positiva de atuar em prol de resguardar. Igualmente,

tem a obrigação de atuar no sentido de zelar, defender e

preservar, asseverando que o meio-ambiente permaneça

intacto. Aliás, este último se diferencia de conservar que

permite a ação antrópica, viabilizando melhorias no meio

ambiente, trabalhando com as premissas de

desenvolvimento sustentável, aliando progresso e

Page 132: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

132

conservação. Por seu turno, o cidadão tem o dever

negativo, que se apresenta ao não poluir nem agredir o

meio-ambiente com sua ação. Além disso, em razão da

referida corresponsabilidade, são titulares do meio

ambiente os cidadãos da presente e da futura geração.

3 A SOLIDARIEDADE INTERGERACIONAL NO

DIREITO AMBIENTAL: O FORTALECIMENTO

DOS IDEÁRIOS DE FRATERNIDADE NOS

DIREITOS DE TERCEIRA DIMENSÃO

Em sede de comentários introdutórios, ao

volver um olhar analítico para o tema colocado em

debate, forçoso é reconhecer que o corolário da

solidariedade intergeracional apresenta-se como reflexo

de direitos de terceira dimensão, denominados direitos

de solidariedade ou fraternidade. Com destaque, os

direitos encampados pela denominação ora expendida

encontra como alicerce de sustentação o ideário de

fraternidade e tem como exemplos o direito ao meio

ambiente equilibrado, à saudável qualidade de vida, ao

progresso, à paz, à autodeterminação dos povos, a

proteção e defesa do consumidor, além de outros

direitos considerados como difusos. “Dotados de altíssimo

Page 133: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

133

teor de humanismo e universalidade, os direitos de

terceira geração tendem a cristalizar-se no fim do século

XX enquanto direitos que não se destinam

especificamente à proteção dos interesses de um

indivíduo, de um grupo”93 ou mesmo de um Ente Estatal

especificamente. Ainda nesta esteira, é possível verificar

que a construção dos direitos encampados sob a rubrica

de terceira dimensão tende a identificar a existência de

valores concernentes a uma determinada categoria de

pessoas, consideradas enquanto unidade, não mais

prosperando a típica fragmentação individual de seus

componentes de maneira isolada, tal como ocorria em

momento pretérito. Com efeito, está-se diante de

valores transindividuais, eis que os direitos abarcados

pela dimensão em comento não estão restritos a

determinados indivíduos; ao reverso, incBRASIL sobre

a coletividade. Ao lado disso, os direitos de terceira

dimensão são considerados como difusos, porquanto não

têm titular individual, sendo que o liame entre os seus

vários titulares decorre de mera circunstância factual.

Nesta feita, importa acrescentar que os

direitos de terceira dimensão possuem caráter

transindividual, o que os faz abranger a toda a

93 BONAVIDES, 2007, p. 569.

Page 134: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

134

coletividade, sem quaisquer restrições a grupos

específicos. Ora, o ideário de solidariedade alberga

justamente um sucedâneo de direitos que contemplam a

coletividade enquanto unidade, não se atendendo a

característicos diferenciadores ou mesmo

particularidades segregadoras. Neste sentido, pautaram-

se Motta e Motta e Barchet, ao afirmarem, em suas

ponderações, que “os direitos de terceira geração

possuem natureza essencialmente transindividual,

porquanto não possuem destinatários especificados,

como os de primeira e segunda geração, abrangendo a

coletividade como um todo”94. Desta feita, são direitos

de titularidade difusa ou coletiva, alcançando

destinatários indeterminados ou, ainda, de difícil

determinação. Nesta esteira de exposição, os direitos em

comento estão vinculados a valores de fraternidade ou

solidariedade, sendo traduzidos de um ideal

intergeracional, que liga as gerações presentes às

futuras, a partir da percepção de que a qualidade de vida

destas depende sobremaneira do modo de vida daquelas.

Dos ensinamentos dos célebres doutrinadores, percebe-se

que o caráter difuso de tais direitos permite a

abrangência às gerações futuras, razão pela qual, a

94 MOTTA, Sylvio; BARCHET, Gustavo. Curso de Direito

Constitucional. Rio de Janeiro: Editora Elsevier, 2007, p. 152.

Page 135: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

135

valorização destes é de extrema relevância. “Têm

primeiro por destinatários o gênero humano mesmo,

num momento expressivo de sua afirmação como valor

supremo em termos de existencialidade concreta”95. A

respeito do assunto, com bastante pertinência, Motta e

Barchet96, em seu magistério, ensinam que os direitos de

terceira dimensão surgiram como “soluções” à

degradação das liberdades, à deterioração dos direitos

fundamentais em virtude do uso prejudicial das

modernas tecnologias e desigualdade socioeconômica

vigente entre as diferentes nações.

Tecidos estes comentários, ao esmiuçar o

corolário da solidariedade intergeracional, também

denominado de princípio da equidade ou princípio do

acesso equitativo dos recursos naturais, salta aos olhos

sua íntima relação com a temática dos espaços

protegidos, eis que configura um dos baldrames robustos

para a sua estruturação. Afora isso, é possível verificar a

95 BONAVIDES, 2007, p. 569. 96 MOTTA; BARCHET, 2007, p. 153. “Duas são as origens básicas

desses direitos: a degradação das liberdades ou a deterioração dos

demais direitos fundamentais em virtude do uso nocivo das

modernas tecnologias e o nível de desigualdade social e econômica

existente entre as diferentes nações. A fim de superar tais

realidades, que afetam a humanidade como um todo, impõe-se o

reconhecimento de direitos que também tenham tal abrangência – a

humanidade como um todo -, partindo-se da ideia de que não há

como se solucionar problemas globais a não ser através de soluções

também globais. Tais “soluções” são os direitos de terceira geração”.

Page 136: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

136

materialização do dogma em comento no caput do

artigo 225 da Constituição da República Federativa do

Brasil de 198897. Assim, a atual geração, ao instituir

os espaços protegidos, furta-se à sua utilização normal

(aqui considerada aquela utilização encontradiça fora

desses espaços) para garantir as presentes gerações e,

sobretudo, às futuras, o equilíbrio do meio ambiente,

mediante a manutenção da biodiversidade. Logo, a

adoção do termo “solidariedade intergeracional” busca,

justamente, destacar esse elo de responsabilidade da

atual geração pela existência das futuras. Neste sentido,

é possível trazer à colação o paradigmático entendimento

jurisprudencial construído, no qual acena, com clareza

solar, que:

Ementa: Arguição de Descumprimento de

Preceito Fundamental: Adequação.

Observância do princípio da

subsidiariedade. Arts. 170, 196 e 225 da

Constituição da República.

Constitucionalidade de atos normativos

proibitivos da importação de pneus usados.

Reciclagem de pneus usados: ausência de

97 BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República

Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 07 jun. 2015: “Art. 225.

Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem

de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,

impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e

preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

Page 137: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

137

eliminação total de seus efeitos nocivos à

saúde e ao meio ambiente equilibrado.

Afronta aos princípios constitucionais da

saúde e do meio ambiente ecologicamente

equilibrado. Coisa julgada com conteúdo

executado ou exaurido: impossibilidade de

alteração. Decisões judiciais com conteúdo

indeterminado no tempo: proibição de novos

efeitos a partir do julgamento. Arguição

julgada parcialmente procedente. 1.

Adequação da arguição pela correta

indicação de preceitos fundamentais

atingidos, a saber, o direito à saúde, direito

ao meio ambiente ecologicamente

equilibrado (arts. 196 e 225 da Constituição

Brasileira) e a busca de desenvolvimento

econômico sustentável: princípios

constitucionais da livre iniciativa e da

liberdade de comércio interpretados e

aplicados em harmonia com o do

desenvolvimento social saudável.

Multiplicidade de ações judiciais, nos

diversos graus de jurisdição, nas quais se

têm interpretações e decisões divergentes

sobre a matéria: situação de insegurança

jurídica acrescida da ausência de outro meio

processual hábil para solucionar a polêmica

pendente: observância do princípio da

subsidiariedade. Cabimento da presente

ação. [...] 4. Princípios constitucionais (art.

225) a) do desenvolvimento sustentável e b)

da equidade e responsabilidade

intergeracional. Meio ambiente

ecologicamente equilibrado: preservação

para a geração atual e para as gerações

futuras. Desenvolvimento sustentável:

crescimento econômico com garantia

paralela e superiormente respeitada da

saúde da população, cujos direitos devem

ser observados em face das necessidades

atuais e daquelas previsíveis e a serem

prevenidas para garantia e respeito às

gerações futuras. Atendimento ao princípio

Page 138: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

138

da precaução, acolhido constitucionalmente,

harmonizado com os demais princípios da

ordem social e econômica [...] (Supremo

Tribunal Federal – Tribunal Pleno/ ADPF

nº 101/ Relatora: Ministra Cármen Lúcia/

Julgado em 24.06.2009/ Publicado no DJe

em 01.06.2012).

Observar-se-á a existência de duas espécies de

solidariedade intergeracional, tais sejam: uma pautada

na atual geração, denominada, em razão disso, de

sincrônica; e, outra voltada para as futuras gerações,

chamada anacrônica. Com destaque, assinalar faz-se

imprescindível, consoante entendimento explicitado por

Andréia Minussi Facin98, que é possível enumerar três

formas distintas de acesso a bens materiais, quais

sejam: acesso visando o consumo do bem, tal como ocorre

com a captação de água e instrumentos predatórios de

caça e pesca; acesso causando poluição ao meio ambiente,

a exemplo do que se denota no acesso à água ou ao ar,

lançando, para tanto, poluentes ou emitindo poluição

sonora; e, acesso ao meio ambiente para a contemplação

de seus elementos e paisagem. Verifica-se, deste modo, a

existência do meio ecologicamente equilibrado não se

98 FACIN, Andréia Minussi. Meio-ambiente e direitos humanos. Jus

Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, 01 nov. 2002. Disponível em:

<http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3463>. Acesso em 07

jun. 2015.

Page 139: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

139

traduz somente na preservação para a geração atual,

mas, também, para as gerações futuras. Logo, se o

pavilhão desfraldado tremula em direção ao

desenvolvimento sustentável, patente faz-se que a

concepção albergue o crescimento econômico como

garantia paralela e superiormente respeitada da saúde

da população, cujo acervo de direito devem ser

observados, tendo-se em vista não apenas as

necessidades atuais, contudo, também, as que são

passíveis de prevenção para as gerações futuras. Neste

sedimento de exposição, cuida apontar, com ênfase, que

está diretamente vinculado ao corolário em comento o

preceito da precaução, já que a necessidade de

afastamento de perigo, tal como a adoção de

instrumentos que busquem a promoção da segurança dos

procedimentos adotado para a garantia das gerações

futuras, efetivando-se apenas por meio da

sustentabilidade ambiental das nações humanas.

Denota-se, destarte, que o princípio em

comento torna efetiva a busca incansável pela proteção

da existência humana, seja tanto pela proteção do meio

ambiente como pela estruturação de condições que

salvaguardem a saúde e a integridade física,

considerando-se o indivíduo em sua inteireza. Gize-se

Page 140: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

140

que tal fato decorre da nova visão reinante, na qual há

que se adotar, como política pública, o que se faz

imprescindível para antecipar os riscos de danos que

sejam passíveis de materialização em relação ao meio

ambiente, tanto quanto o impacto que as ações ou as

omissões possam produzir. Ora, o artigo 225 da

Constituição da República Federativa do Brasil de

198899, ao estabelecer o ônus em relação à coletividade e

ao Poder Público, na condição de dever, de defender e

preservar o meio ambiente para as presentes e futuras

gerações, inaugura um dever geral arrimado na

prevenção de riscos ambientais, no patamar de um

ordem normativa objetiva de antecipação de futuros

danos ambientais, os quais encontram como

sustentáculos os dogmas da prevenção, quando tratar de

riscos concretos, e da precaução, quando estiver diante

de riscos abstratos.

No mais, cuida colocar em destaque que a

reserva dos bens ambientais, com a sua não utilização

atual, passaria a ser equitativa se fosse demonstrado que

99 BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República

Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 07 jun. 2015: “Art. 225.

Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem

de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,

impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e

preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

Page 141: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

141

ela ocorrera com o escopo de evitar o esgotamento dos

recursos, com a guarda desses bens para as futuras

gerações. Neste passo, ao se considerar a densidade da

moldura de fraternidade e solidariedade que reveste o

acesso ao meio ambiente, em especial devido ao status de

elemento que assegura o alcance da dignidade da pessoa

humana, considerando o indivíduo em todas as suas

potencialidades e complexidades, não é possível suprimir

que a manutenção da preservação dos bens ambientais

refoge ao ideário ingênuo de meio ambiente intocável,

mas sim lhe confere à contemporaneidade ao tema. “A

equidade no acesso aos recursos ambientais deve ser

enfocada não só com relação à localização especial dos

usuários atuais, como em relação aos usuários

potenciais das gerações vindouras”100.

Com efeito, um posicionamento equânime não

é fácil de ser construído, vindicando considerações

dotadas de ordem ética, científica e econômica das

gerações atuais e uma avaliação prospectiva das

necessidades futuras, nem sempre possíveis de serem

conhecidas e medidas no presente. Neste aspecto, é

possível colocar em destaque que o aspecto

100 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental

Brasileiro. 21 ed. São Paulo: Editores Malheiros, 2013, p. 92.

Page 142: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

142

intergeracional que tende a caracterizar o discurso de

proteção e preservação ambiental ambiciona conferir

concreção ao ideário de solidariedade que caracteriza o

direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado

enquanto direito de terceira dimensão. Supera-se, com

efeito, a essência de individualidade que caracterizou os

direitos humanos, adotados uma ótica na qual a

preocupação com o semelhante, mesmo em se tratando

de uma geração futura, é dotada de grande

proeminência, analisando-se a coletividade na condição

de unidade, na qual cada um dos indivíduos é dotado de

relevância e substancial atenção. Tal fato decorre,

notadamente, do superprincípio da dignidade da pessoa

humana, o qual só alcança sua materialização por meio

da conjunção de inúmeros, porém carecidos, direitos, os

quais, em um fim último, proporcionam a realização de

todas as complexidades encerradas no ser humano.

Ademais, um aspecto característico

proeminente da sociedade contemporânea está

assentado na sua paradoxal capacidade de controlar e

produzir indeterminações. Entrementes, a forma como

esse dever será atendido constitui tarefa inafastável dos

órgãos estatais, os quais dispõem de ampla liberdade de

conformação, atentando-se para os limites

Page 143: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

143

constitucionais consagrados. Com efeito, as mencionadas

determinações constitucionais objetivam evitar riscos,

encontrando assento, para tanto, no próprio Texto

Constitucional, o que autoriza o Estado a atuar de modo

a evitar riscos para o cidadão em geral, por meio da

adoção de medidas de proteção ou de prevenção da saúde

e do meio ambiente, notadamente em relação ao

desenvolvimento técnico ou tecnológico e suas

consequências para as presentes e futuras gerações. No

controle judicial de políticas públicas do meio ambiente,

a atuação do Poder Judiciário deve buscar a garantia,

inclusive, o mínimo existencial ecológico dos indivíduos

atingidos diretamente e indiretamente em seu

patrimônio de natureza material e imaterial, neste

sentido, visando garantir a inviolabilidade do direito

fundamental à sadia qualidade de vida, bem assim a

defesa e preservação do meio ambiente ecologicamente

equilibrado, em busca do desenvolvimento sustentável

para as presentes e futuras gerações.

4 SOLIDARIEDADE ENTRE ESPÉCIES

NATURAIS? O ALARGAMENTO DA MOLDURA

AXIOLÓGICA DO PRINCÍPIO DA

SOLIDARIEDADE AMBIENTAL

Page 144: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

144

Como desdobramento da projeção normativa do

corolário da solidariedade, na órbita ecológica, há que se

estruturar uma solidariedade entre todas as espécies

vivas, na forma de uma comunidade entre a terra, as

plantas, os animais e os seres humanos, visto que a

ameaça ecológica coloca em risco todas as espécies

existentes no planeta, afetando por igual a todos e ao

todo. Neste diapasão, a necessidade de despertar uma

consciência pautada na solidariedade entre as espécies

naturais é despertada, sobremaneira, em decorrência

das ameaças à vida desencadeadas pelo desenvolvimento

civilizatório fazerem com que o ser humano se reconheça

como um ser natural integrante de um todo ameaçado e,

concomitantemente, responsável por tal situação de

ameaça existencial. Segundo Sarlet e Fensterseifer101, a

ameaça de contaminação propicia que o ser humano

perceba que o seu corpo integra parte das “coisas

naturais” e que, em razão disso, está sujeito à ameaça

supramencionada. A construção de tal consciência leva o

ser humano a reconhecer, forçosamente, uma

comunidade natural, diante da qual o estabelecimento de

um vínculo de solidariedade e respeito mútuo como

101 SARLET, Ingo Wolfgang; FENSTERSEIFER, Tiago. Princípios

do Direito Ambiental. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 77.

Page 145: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

145

pressuposto para a permanência existencial das espécies

naturais, abarcando-se em tal concepção o ser humano.

Em uma perspectiva jurídica, a vedação das

políticas cruéis contra os animais (não humanos)

encontra repouso no Texto Constitucional, reforçando,

portanto, o ideário axiológico de solidariedade entre as

espécies naturais. Mais que isso, ao analisar o

julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº

1.856/RJ, de relatoria do Ministro Celso de Mello, salta

aos olhos a concreção do dogma em comento, em especial

quando a ementa consagra que “a promoção de briga de

galos, além de caracterizar prática criminosa tipificada

na legislação ambiental, configura conduta atentatória à

Constituição da República, que veda a submissão de

animais a atos de crueldade”102. Ora, há que se

102 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido na

Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.856/RJ. Ação Direta de

Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense nº 2.895/98) -

Legislação estadual que, pertinente a exposições e a competições

entre aves das raças combatentes, favorece essa prática criminosa -

Diploma legislativo que estimula o cometimento de atos de

crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei nº 9.605/98,

art. 32) - Meio Ambiente - Direito à preservação de sua integridade

(CF, art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu caráter de

metaindividualidade - Direito de terceira geração (ou de novíssima

dimensão) que consagra o postulado da solidariedade - Proteção

constitucional da fauna (CF, art. 225, § 1º, VII) - Descaracterização

da briga de galo como manifestação cultural - Reconhecimento da

inconstitucionalidade da lei estadual impugnada - Ação Direta

Procedente. Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Celso

Page 146: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

146

reconhecer que essa especial tutela, que tem por

fundamento legitimador a autoridade da Constituição da

República, é motivada pela necessidade de impedir a

ocorrência de situações de risco que ameacem ou que

façam periclitar todas as formas de vida, não só a do

gênero humano, mas, também, a própria vida animal,

cuja integridade restaria comprometida, não fora a

vedação constitucional, por práticas aviltantes,

perversas e violentas contra os seres irracionais. “A ideia

de „solidariedade entre espécies naturais‟, portanto,

também pode transportar o reconhecimento do valor

intrínseco de todas as manifestações existenciais, bem

como o respeito à reciprocidade indispensável ao convívio

harmonioso” 103, estendido a todos os seres vivos. Salta

aos olhos, desta feita, que o princípio da solidariedade,

cuja incidência deve ser maximizada em diversos

âmbitos, inclusive na seara ambiental, passa a ser

desfraldado como pilar sustentador das relações

contemporâneas, em sua senda civilizatória,

considerando todas as suas dimensões, a saber:

intergeracional, intrageracional e interespécies.

de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Publicado no DJe em 13 out.

2011. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em 07 jun. 2015. 103 SARLET; FENSTERSEIFER, 2014, p. 77.

Page 147: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

147

5 DO RECONHECIMENTO DA EDIFICAÇÃO DO

DIREITO DOS ANIMAIS: O FORTALECIMENTO

DA SOLIDARIEDADE ENTRE ESPÉCIES

NATURAIS

Em um primeiro comentário, cuida destacar

que o Direito dos Animais ou o movimento de proteção

desses direitos desponta, em um cenário contemporâneo,

como um novo ramo da Ciência Jurídica, objetivando

proteger tais seres vivos como de salvaguardar não

apenas o meio ambiental, o ecossistema e evitar a

extinção de diversas espécies, mas também o leque de

direitos fundamentais, a exemplo do direito à vida, à

liberdade e o respeito, coibindo, por via de consequência,

os atos de violência, maus-tratos e crueldade. Neste

sentido, ainda, é possível fazer alusão ao Texto

Constitucional, quando, de maneira expressa e ofuscante,

no inciso VII do §1º do artigo 225, explicita que “para

assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder

Público: [omissis] VII - proteger a fauna e a flora,

vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em

risco sua função ecológica, provoquem a extinção de

espécies ou submetam os animais a crueldade”104. Aduz,

104 BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República

Page 148: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

148

ainda, Gomes e Chalfun que:

Na verdade, os animais devem ser

protegidos não apenas em benefício do

homem, mas também como um exercício de

compaixão e solidariedade a espécies mais

vulneráveis e dignas de respeito, o homem

não deve ser o único ser protegido, o único a

ter direitos fundamentais reconhecidos, é

preciso considerar que o homem é também

uma espécie animal, e dentro desta ótica o

animal é o outro do homem105.

Salta aos olhos que a proposição de uma

ramificação jurídica autônoma, pautada exclusivamente

no Direito dos Animais, decorre da desconstrução da

tradicional ótica antropocêntrica. Neste sentido, convém

mencionar que a visão antropocêntrica está alicerçada no

preceito de que o homem se identificava no centro do

mundo - em que usufrui do meio ambiente de modo

indiferente à sua existência-, o ecocentrismo mudou o

paradigma apresentando sentido e valor à vida do ser,

englobando agora a fauna e a flora como ícones

essenciais ao equilíbrio ambiental. Ao lado disso, Abreu e

Bussinguer, oportunamente, destacam que “a concepção

Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 07 jun. 2015. 105 GOMES, Rosangela Maria A.; CHALFUN, Mery. Direito dos

Animais – Um novo e fundamental Direito. Disponível em:

<http://www.conpedi.org.br>. Acesso em 07 jun. 2015, p. 852.

Page 149: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

149

eminentemente antropocêntrica se mantém arraigada

em alguns setores da sociedade contemporânea, o que

impede muitos avanços em projetos que visam a

conservação do meio, em especial, a conservação de

espécies em vias de extinção e a instalação de Unidades

de Conservação”106. Podendo o ecocentrismo ser chamado

também de biocentrismo, abordando a vida do ser de

forma ampla considerando-a como personagem central

da uma tutela ambiental, este segundo termo surgiu com

a Lei nº 6.938/1981, eliminando a visão antropocêntrica.

“Assim, a escola ecocêntrica (ou biocêntrica, como muitos

preferem) coloca em primeiro plano de discussão e

proteção o equilíbrio dos ecossistemas e do meio

ambiente natural”107.

106 ABREU, Ivy de Souza; BUSSINGUER, Elda Coelho de Azevedo.

Antropocentrismo, Ecocentrismo e Holismo: uma breve análise das

escolas de pensamento ambiental. Derecho y Cambio Social,

2013, p. 01-11. Disponível em:

<http://www.derechoycambiosocial.com/revista034/escolas_de_pensa

mento_ambiental.pdf>. Acesso em 07 jun. 2015, p. 05. 107 Ibid.

Page 150: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

150

Figura 01. Egocentrismo

(antropocentrismo)

Figura 02. Econcentrismo/

Biocentrismo.

O holismo considera e defende as entidades

físicas e biológicas como um sistema único e integrando -

seres vivos e recursos ambientais disponíveis -,

considerado autônomo o meio ambiente não é mais

notado como aquele que nutre somente as necessidades

humanas, mas aquele que carece de cuidados e zelo.

Nessa perspectiva, “a análise do meio ambiente deve

considerar o contexto amplo e global de todas as

variáveis intrínsecas e extrínsecas que geram influências

diversas e, primordialmente, a interação entre essas

variáveis, para que não haja uma visão distorcida,

Page 151: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

151

simplória e reducionista do bem ambiental” 108. Assim, no

holismo ambiental tem suas bases sustentadas não

apenas no meio natural e nos seus elementos. A vida

humana e suas expressões também se tornam objeto de

proteção, mas não pelos motivos apregoados pelo

antropocentrismo e sim, pela espécie humana (e os

fatores que se relacionam com sua existência e

desenvolvimento) ser parte do meio ambiente e

indispensável ao equilíbrio ambiental.

É oportuno consignar que o tratamento dos

animais, sobretudo no que se refere à edificação de uma

ramificação jurídica autônoma, deve ser pautado pela

ética e por princípios morais, porquanto esses devem

nortear a conduta humana. “Conduta ética em relação

aos animais oprimidos, e todos devem agir em sua

defesa, como forma de legítima manifestação de

cidadania” 109. Assim, à luz da exposição apresenta, é

notório que o direito dos animais e a proteção dos direitos

fundamentais como inerentes a estes, desponta com um

novo ramo do direito, merecedor de estudos,

desenvolvimento e evolução, muito há o que se debater e

estudar, não obstante muito se avançou. Imprescindível

108 ABREU; BUSSINGUER, 2013, p. 08. 109 GOMES; CHALFUN, s.d., p. 852.

Page 152: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

152

para toda a sociedade, para o meio ambiente, para os

amantes da natureza e dos animais, o direito dos animais

possui sua essência na filosofia, na ética, na moral, e

desponta com um novo seguimento do direito a ser

aprimorado e estudado.

REFERÊNCIA:

ABREU, Ivy de Souza; BUSSINGUER, Elda Coelho de

Azevedo. Antropocentrismo, Ecocentrismo e Holismo:

uma breve análise das escolas de pensamento ambiental.

Derecho y Cambio Social, 2013, p. 01-11. Disponível

em:

<http://www.derechoycambiosocial.com/revista034/escola

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___________. Lei Nº. 6.938, de 31 de Agosto de 1981.

Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus

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<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 07 jun. 2015.

Page 153: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

153

___________. Superior Tribunal de Justiça.

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Page 155: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

155

O REDIMENSIONAMENTO DA FILOSÓFICA

CONCEPÇÃO DE DIGNIDADE ENTRE ESPÉCIES

ANIMAIS À LUZ DA BIOÉTICA: SOLIDARIEDADE

ENTER ESPÉCIES ANIMAIS?

Resumo: O objeto do presente está assentado na

imprescindibilidade de se desenvolver uma nova

acepção do fluído conceito de dignidade a partir da

reafirmação de uma solidariedade entre espécies

animais. Neste aspecto, como desdobramento da

projeção normativa do corolário da solidariedade, na

órbita ecológica, há que se estruturar uma ótica que

abarque todas as espécies vivas, na forma de uma

comunidade formada pela terra, pelas plantas, pelos

animais e pelos seres humanos, visto que a ameaça

ecológica coloca em risco todas as espécies existentes

no planeta, afetando por igual a todos e ao todo. É

perceptível, ainda, a necessidade de fomentar uma

consciência pautada na solidariedade entre as espécies

naturais, sobremaneira, em decorrência das ameaças à

vida desencadeadas pelo desenvolvimento civilizatório

fazerem com que o ser humano se reconheça como um

ser natural integrante de um todo ameaçado e,

concomitantemente, responsável por tal situação de

ameaça existencial. É fato que a ameaça de

Page 156: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

156

contaminação propicia que o ser humano perceba que o

seu corpo integra parte das “coisas naturais” e que, em

razão disso, está sujeito à ameaça supramencionada. A

construção de tal consciência leva o ser humano a

reconhecer, forçosamente, uma comunidade natural,

diante da qual o estabelecimento de um vínculo de

solidariedade e respeito mútuo como pressuposto para

a permanência existencial das espécies naturais,

abarcando-se em tal concepção o ser humano. Denota-

se, portanto, a edificação de um novel painel, no qual o

ecocentrismo é fortalecido, conferindo, de maneira

geral, especial atenção ao meio ambiente e as relações

nutridas entre o ser humano e seus componentes, em

detrimento da anacrônica visão antropocêntrica. Assim

sendo, valendo-se das reflexões fomentadas pela

Bioética, o presente busca pautar um

redimensionamento da concepção tradicional da

dignidade, não mais como um ideário essencialmente

antrópico, mas sim remodelado pelo ecocentrismo e

pela solidariedade entre espécies.

Palavras-chaves: Solidariedade entre Espécies.

Bioética. Dignidade Animal.

Sumário: 1 Apontamentos inaugurais: singelo painel

à edificação teórica da ramificação ambiental do

Direito; 2 Comentários à concepção jurídica de meio

ambiente: singelo painel à Política Nacional de Meio

Ambiente; 3 A solidariedade intergeracional no

Direito Ambiental: O fortalecimento dos ideários

de fraternidade nos direitos de terceira dimensão; 4

Solidariedade entre espécies naturais? O alargamento

da moldura axiológica do princípio da solidariedade

ambiental; 5 Bioética e animais: um recorte

contemporâneo em prol da afirmação da solidariedade

entre espécies; 6 Conclusão

Page 157: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

157

1 APONTAMENTOS INAUGURAIS: SINGELO

PAINEL À EDIFICAÇÃO TEÓRICA DA

RAMIFICAÇÃO AMBIENTAL DO DIREITO

Inicialmente, ao se dispensar um exame acerca

do tema colocado em tela, patente se faz arrazoar que a

Ciência Jurídica, enquanto um conjunto multifacetado de

arcabouço doutrinário e técnico, assim como as robustas

ramificações que a integram, reclama uma interpretação

alicerçada nos plurais aspectos modificadores que

passaram a influir em sua estruturação. Neste alamiré,

lançando à tona os aspectos característicos de

mutabilidade que passaram a orientar o Direito, tornou-

se imperioso salientar, com ênfase, que não mais subsiste

uma visão arrimada em preceitos estagnados e

estanques, alheios às necessidades e às diversidades

sociais que passaram a contornar os Ordenamentos

Jurídicos. Ora, infere-se que não mais prospera o

arcabouço imutável que outrora sedimentava a aplicação

das leis, sendo, em decorrência dos anseios da população,

suplantados em uma nova sistemática.

Com espeque em tais premissas, cuida

hastear, com bastante pertinência, como flâmula de

interpretação o “prisma de avaliação o brocardo jurídico

Page 158: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

158

'Ubi societas, ibi jus', ou seja, 'Onde está a sociedade,

está o Direito', tornando explícita e cristalina a relação

de interdependência que esse binômio mantém”110.

Destarte, com clareza solar, denota-se que há uma

interação consolidada na mútua dependência, já que o

primeiro tem suas balizas fincadas no constante processo

de evolução da sociedade, com o fito de que seus

Diplomas Legislativos e institutos não fiquem inquinados

de inaptidão e arcaísmo, em total descompasso com a

realidade vigente. A segunda, por sua vez, apresenta

estrutural dependência das regras consolidadas pelo

Ordenamento Pátrio, cujo escopo primevo é assegurar

que não haja uma vingança privada, afastando, por

extensão, qualquer ranço que rememore priscas eras em

que o homem valorizava a Lei de Talião (“Olho por olho,

dente por dente”), bem como para evitar que se robusteça

um cenário caótico no seio da coletividade.

Ademais, com a promulgação da Constituição

da República Federativa do Brasil de 1988,

imprescindível se fez adotá-la como maciço axioma de

sustentação do Ordenamento Brasileiro, precipuamente

110 VERDAN, Tauã Lima. Princípio da Legalidade: Corolário do

Direito Penal. Jurid Publicações Eletrônicas, Bauru, 22 jun.

2009. Disponível em: <http://jornal.jurid.com.br>. Acesso em 16 mai.

2015.

Page 159: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

159

quando se objetiva a amoldagem do texto legal, genérico

e abstrato, aos complexos anseios e múltiplas

necessidades que influenciam a realidade

contemporânea. Ao lado disso, há que se citar o voto

magistral voto proferido pelo Ministro Eros Grau, ao

apreciar a Ação de Descumprimento de Preceito

Fundamental Nº. 46/DF, “o direito é um organismo vivo,

peculiar porém porque não envelhece, nem permanece

jovem, pois é contemporâneo à realidade. O direito é um

dinamismo. Essa, a sua força, o seu fascínio, a sua

beleza”111. Como bem pontuado, o fascínio da Ciência

Jurídica jaz, justamente, na constante e imprescindível

mutabilidade que apresenta, decorrente do dinamismo

que reverbera na sociedade e orienta a aplicação dos

111 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão em Arguição de

Descumprimento de Preceito Fundamental Nº. 46/DF. Empresa

Pública de Correios e Telégrafos. Privilégio de Entrega de

Correspondências. Serviço Postal. Controvérsia referente à Lei

Federal 6.538, de 22 de Junho de 1978. Ato Normativo que regula

direitos e obrigações concernentes ao Serviço Postal. Previsão de

Sanções nas Hipóteses de Violação do Privilégio Postal.

Compatibilidade com o Sistema Constitucional Vigente. Alegação de

afronta ao disposto nos artigos 1º, inciso IV; 5º, inciso XIII, 170,

caput, inciso IV e parágrafo único, e 173 da Constituição do Brasil.

Violação dos Princípios da Livre Concorrência e Livre Iniciativa. Não

Caracterização. Arguição Julgada Improcedente. Interpretação

conforme à Constituição conferida ao artigo 42 da Lei N. 6.538, que

estabelece sanção, se configurada a violação do privilégio postal da

União. Aplicação às atividades postais descritas no artigo 9º, da lei.

Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Marcos Aurélio.

Julgado em 05 ago. 2009. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso

em 16 mai. 2015.

Page 160: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

160

Diplomas Legais e os institutos jurídicos neles

consagrados.

Ainda neste substrato de exposição, pode-se

evidenciar que a concepção pós-positivista que passou a

permear o Direito, ofertou, por via de consequência, uma

rotunda independência dos estudiosos e profissionais da

Ciência Jurídica. Aliás, há que se citar o entendimento

de Verdan, “esta doutrina é o ponto culminante de uma

progressiva evolução acerca do valor atribuído aos

princípios em face da legislação”112. Destarte, a partir de

uma análise profunda dos mencionados sustentáculos,

infere-se que o ponto central da corrente pós-positivista

cinge-se à valoração da robusta tábua principiológica que

Direito e, por conseguinte, o arcabouço normativo

passando a figurar, nesta tela, como normas de cunho

vinculante, flâmulas hasteadas a serem adotadas na

aplicação e interpretação do conteúdo das leis.

Nas últimas décadas, o aspecto de

mutabilidade tornou-se ainda mais evidente, em especial,

quando se analisa a construção de novos que derivam da

Ciência Jurídica. Entre estes, cuida destacar a

ramificação ambiental, considerando como um ponto de

congruência da formação de novos ideários e cânones,

112 VERDAN, 2009, s.p.

Page 161: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

161

motivados, sobretudo, pela premissa de um manancial de

novos valores adotados. Nesta trilha de argumentação,

de boa técnica se apresenta os ensinamentos de

Fernando de Azevedo Alves Brito que, em seu artigo,

aduz: “Com a intensificação, entretanto, do interesse dos

estudiosos do Direito pelo assunto, passou-se a

desvendar as peculiaridades ambientais, que, por

estarem muito mais ligadas às ciências biológicas, até

então era marginalizadas”113. Assim, em decorrência da

proeminência que os temas ambientais vêm, de maneira

paulatina, alcançando, notadamente a partir das últimas

discussões internacionais envolvendo a necessidade de

um desenvolvimento econômico pautado em

sustentabilidade, não é raro que prospere, mormente em

razão de novos fatores, um verdadeiro remodelamento ou

mesmo uma releitura dos conceitos que abalizam a

ramificação ambiental do Direito, com o fito de permitir

que ocorra a conservação e recuperação das áreas

degradadas.

Ademais, há de ressaltar ainda que o direito

113 BRITO, Fernando de Azevedo Alves. A hodierna classificação do

meio-ambiente, o seu remodelamento e a problemática sobre a

existência ou a inexistência das classes do meio-ambiente do

trabalho e do meio-ambiente misto. Boletim Jurídico, Uberaba,

ano 5, n. 968. Disponível em: <http://www.boletimjuridico.com.br>.

Acesso em 16 mai. 2015.

Page 162: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

162

ambiental passou a figurar, especialmente, depois das

décadas de 1950 e 1960, como um elemento integrante da

farta e sólida tábua de direitos fundamentais. Calha

realçar, com cores quentes, que mais contemporâneos, os

direitos que constituem a terceira dimensão recebem a

alcunha de direitos de fraternidade ou, ainda, de

solidariedade, contemplando, em sua estrutura, uma

patente preocupação com o destino da humanidade114·.

Ora, daí se verifica a inclusão de meio ambiente como um

direito fundamental, logo, está umbilicalmente atrelado

com humanismo e, por extensão, a um ideal de sociedade

mais justa e solidária. Nesse sentido, ainda, é plausível

citar o artigo 3°., inciso I, da Carta Política que abriga

em sua redação tais pressupostos como os princípios

fundamentais do Estado Democrático de Direitos: “Art.

3º - Constituem objetivos fundamentais da República

Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre,

justa e solidária” 115.

Ainda nesta esteira, é possível verificar que a

construção dos direitos encampados sob a rubrica de

114 MOTTA, Sylvio; DOUGLAS, Willian. Direito Constitucional –

Teoria, Jurisprudência e 1.000 Questões 15 ed., rev., ampl. e

atual. Rio de Janeiro: Editora Impetus, 2004, p. 69. 115 BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República

Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 16 mai. 2015.

Page 163: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

163

terceira dimensão tende a identificar a existência de

valores concernentes a uma determinada categoria de

pessoas, consideradas enquanto unidade, não mais

prosperando a típica fragmentação individual de seus

componentes de maneira isolada, tal como ocorria em

momento pretérito. Com o escopo de ilustrar, de maneira

pertinente as ponderações vertidas, insta trazer à colação

o entendimento do Ministro Celso de Mello, ao apreciar a

Ação Direta de Inconstitucionalidade N°. 1.856/RJ, em

especial quando, com bastante pertinência, destaca que:

Cabe assinalar, Senhor Presidente, que os

direitos de terceira geração (ou de

novíssima dimensão), que materializam

poderes de titularidade coletiva atribuídos,

genericamente, e de modo difuso, a todos os

integrantes dos agrupamentos sociais,

consagram o princípio da solidariedade e

constituem, por isso mesmo, ao lado dos

denominados direitos de quarta geração

(como o direito ao desenvolvimento e o

direito à paz), um momento importante no

processo de expansão e reconhecimento dos

direitos humanos, qualificados estes,

enquanto valores fundamentais

indisponíveis, como prerrogativas

impregnadas de uma natureza

essencialmente inexaurível116.

116 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido em

Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 1.856/RJ. Ação Direta De

Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense Nº 2.895/98) -

Legislação Estadual que, pertinente a exposições e a competições

entre aves das raças combatentes, favorece essa prática criminosa -

Page 164: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

164

Quadra anotar que os direitos alocados sob a

rubrica de direito de terceira dimensão encontram como

assento primordial a visão da espécie humana na

condição de coletividade, superando, via de consequência,

a tradicional visão que está pautada no ser humano em

sua individualidade. Assim, a preocupação identificada

está alicerçada em direitos que são coletivos, cujas

influências afetam a todos, de maneira indiscriminada.

Ao lado do exposto, cuida mencionar, segundo Bonavides,

que tais direitos “têm primeiro por destinatários o gênero

humano mesmo, num momento expressivo de sua

afirmação como valor supremo em termos de

existencialidade concreta”117. Com efeito, os direitos de

terceira dimensão, dentre os quais se inclui ao meio

Diploma Legislativo que estimula o cometimento de atos de

crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei Nº 9.605/98,

ART. 32) - Meio Ambiente - Direito à preservação de sua integridade

(CF, Art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu caráter de

metaindividualidade - Direito de terceira geração (ou de novíssima

dimensão) que consagra o postulado da solidariedade - Proteção

constitucional da fauna (CF, Art. 225, § 1º, VII) - Descaracterização

da briga de galo como manifestação cultural - Reconhecimento da

inconstitucionalidade da Lei Estadual impugnada - Ação Direta

procedente. Legislação Estadual que autoriza a realização de

exposições e competições entre aves das raças combatentes - Norma

que institucionaliza a prática de crueldade contra a fauna –

Inconstitucionalidade. . Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator:

Ministro Celso de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Disponível em:

<www.stf.jus.br>. Acesso em 16 mai. 2015. 117 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 21 ed.

atual. São Paulo: Editora Malheiros Ltda., 2007, p. 569.

Page 165: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

165

ambiente ecologicamente equilibrado, positivado na

Constituição de 1988, emerge com um claro e tangível

aspecto de familiaridade, como ápice da evolução e

concretização dos direitos fundamentais.

2 COMENTÁRIOS À CONCEPÇÃO JURÍDICA DE

MEIO AMBIENTE: SINGELO PAINEL À POLÍTICA

NACIONAL DE MEIO AMBIENTE

Em uma primeira plana, ao lançar mão do

sedimentado jurídico-doutrinário apresentado pelo inciso

I do artigo 3º da Lei Nº. 6.938, de 31 de agosto de 1981118,

que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente,

seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá

outras providências, salienta que o meio ambiente

consiste no conjunto e conjunto de condições, leis e

influências de ordem química, física e biológica que

permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.

Pois bem, com o escopo de promover uma facilitação do

aspecto conceitual apresentado, é possível verificar que o

meio ambiente se assenta em um complexo diálogo de

118 BRASIL. Lei Nº. 6.938, de 31 de Agosto de 1981. Dispõe sobre

a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de

formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 16 mai. 2015.

Page 166: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

166

fatores abióticos, provenientes de ordem química e física,

e bióticos, consistentes nas plurais e diversificadas

formas de seres viventes. Para Silva, considera-se meio-

ambiente como “a interação do conjunto de elementos

naturais, artificiais e culturais que propiciem o

desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas

formas”119.

Nesta senda, ainda, Fiorillo120, ao tecer

comentários acerca da acepção conceitual de meio

ambiente, coloca em destaque que tal tema se assenta em

um ideário jurídico indeterminado, incumbindo, ao

intérprete das leis, promover o seu preenchimento. Dada

à fluidez do tema, é possível colocar em evidência que o

meio ambiente encontra íntima e umbilical relação com

os componentes que cercam o ser humano, os quais são

de imprescindível relevância para a sua existência. O

Ministro Luiz Fux, ao apreciar a Ação Direta de

Inconstitucionalidade N°. 4.029/AM, salientou que:

(...) o meio ambiente é um conceito hoje

geminado com o de saúde pública, saúde de

cada indivíduo, sadia qualidade de vida, diz

a Constituição, é por isso que estou falando

119 SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional.

São Paulo: Malheiros Editores, 2009, p. 20. 120 FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de Direito

Ambiental Brasileiro. 13 ed., rev., atual e ampl. São Paulo:

Editora Saraiva, 2012, p. 77.

Page 167: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

167

de saúde, e hoje todos nós sabemos que ele é

imbricado, é conceitualmente geminado com

o próprio desenvolvimento. Se antes nós

dizíamos que o meio ambiente é compatível

com o desenvolvimento, hoje nós dizemos, a

partir da Constituição, tecnicamente, que

não pode haver desenvolvimento senão com

o meio ambiente ecologicamente

equilibrado. A geminação do conceito me

parece de rigor técnico, porque salta da

própria Constituição Federal121.

É denotável, desta sorte, que a

constitucionalização do meio ambiente no Brasil

viabilizou um verdadeiro salto qualitativo, no que

concerne, especificamente, às normas de proteção

ambiental. Tal fato decorre da premissa que os robustos

corolários e princípios norteadores foram alçados ao

patamar constitucional, assumindo colocação eminente,

ao lado das liberdades públicas e dos direitos

fundamentais. Superadas tais premissas, aprouve ao

121 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido em

Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 4.029/AM. Ação Direta de

Inconstitucionalidade. Lei Federal Nº 11.516/07. Criação do Instituto

Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Legitimidade da

Associação Nacional dos Servidores do IBAMA. Entidade de Classe

de Âmbito Nacional. Violação do art. 62, caput e § 9º, da

Constituição. Não emissão de parecer pela Comissão Mista

Parlamentar. Inconstitucionalidade dos artigos 5º, caput, e 6º, caput

e parágrafos 1º e 2º, da Resolução Nº 1 de 2002 do Congresso

Nacional. Modulação dos Efeitos Temporais da Nulidade (Art. 27 da

Lei 9.868/99). Ação Direta Parcialmente Procedente. Órgão

Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Luiz Fux. Julgado em 08

mar. 2012. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em 16 mai.

2015.

Page 168: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

168

Constituinte, ao entalhar a Carta Política Brasileira,

ressoando os valores provenientes dos direitos de terceira

dimensão, insculpir na redação do artigo 225, conceder

amplo e robusto respaldo ao meio ambiente como pilar

integrante dos direitos fundamentais. “Com o advento da

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988,

as normas de proteção ambiental são alçadas à categoria

de normas constitucionais, com elaboração de capítulo

especialmente dedicado à proteção do meio ambiente”122.

Nesta toada, ainda, é observável que o caput do artigo

225 da Constituição Federal123 está abalizado em quatro

pilares distintos, robustos e singulares que, em conjunto,

dão corpo a toda tábua ideológica e teórica que assegura

o substrato de edificação da ramificação ambiental.

Primeiramente, em decorrência do tratamento

dispensado pelo artífice da Constituição Federal, o meio

ambiente foi içado à condição de direito de todos,

presentes e futuras gerações. É encarado como algo

122 THOMÉ, Romeu. Manual de Direito Ambiental: Conforme o

Novo Código Florestal e a Lei Complementar 140/2011. 2 ed.

Salvador: Editora JusPodivm, 2012, p. 116. 123 BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República

Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 16 mai. 2015: “Art.

225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,

bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,

impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e

preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

Page 169: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

169

pertencente a toda coletividade, assim, por esse prisma,

não se admite o emprego de qualquer distinção entre

brasileiro nato, naturalizado ou estrangeiro, destacando-

se, sim, a necessidade de preservação, conservação e não-

poluição. O artigo 225, devido ao cunho de direito difuso

que possui, extrapola os limites territoriais do Estado

Brasileiro, não ficando centrado, apenas, na extensão

nacional, compreendendo toda a humanidade. Neste

sentido, inclusive, o Ministro Celso de Mello, ao apreciar

a Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 1.856/RJ,

destacou, com bastante pertinência, que:

A preocupação com o meio ambiente - que

hoje transcende o plano das presentes

gerações, para também atuar em favor das

gerações futuras (...) tem constituído, por

isso mesmo, objeto de regulações

normativas e de proclamações jurídicas,

que, ultrapassando a província meramente

doméstica do direito nacional de cada

Estado soberano, projetam-se no plano das

declarações internacionais, que refletem, em

sua expressão concreta, o compromisso das

Nações com o indeclinável respeito a esse

direito fundamental que assiste a toda a

Humanidade124.

124 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido em

Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 1.856/RJ. Ação Direta De

Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense Nº 2.895/98) -

Legislação Estadual que, pertinente a exposições e a competições

entre aves das raças combatentes, favorece essa prática criminosa -

Diploma Legislativo que estimula o cometimento de atos de

crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei Nº 9.605/98,

Page 170: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

170

O termo “todos”, aludido na redação do caput

do artigo 225 da Constituição Federal de 1988, faz

menção aos já nascidos (presente geração) e ainda

aqueles que estão por nascer (futura geração), cabendo

àqueles zelar para que esses tenham à sua disposição, no

mínimo, os recursos naturais que hoje existem. Tal fato

encontra como arrimo a premissa que foi reconhecido ao

gênero humano o direito fundamental à liberdade, à

igualdade e ao gozo de condições de vida adequada, em

ambiente que permita desenvolver todas as suas

potencialidades em clima de dignidade e bem-estar.

Pode-se considerar como um direito transgeracional, ou

seja, ultrapassa as gerações, logo, é viável afirmar que o

meio-ambiente é um direito público subjetivo. Desta

feita, o ideário de que o meio ambiente substancializa

patrimônio público a ser imperiosamente assegurado e

ART. 32) - Meio Ambiente - Direito à preservação de sua integridade

(CF, Art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu caráter de

metaindividualidade - Direito de terceira geração (ou de novíssima

dimensão) que consagra o postulado da solidariedade - Proteção

constitucional da fauna (CF, Art. 225, § 1º, VII) - Descaracterização

da briga de galo como manifestação cultural - Reconhecimento da

inconstitucionalidade da Lei Estadual impugnada - Ação Direta

procedente. Legislação Estadual que autoriza a realização de

exposições e competições entre aves das raças combatentes - Norma

que institucionaliza a prática de crueldade contra a fauna –

Inconstitucionalidade. . Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator:

Ministro Celso de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Disponível em:

<www.stf.jus.br>. Acesso em 16 mai. 2015.

Page 171: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

171

protegido pelos organismos sociais e pelas instituições

estatais, qualificando verdadeiro encaro irrenunciável

que se impõe, objetivando sempre o benefício das

presentes e das futuras gerações, incumbindo tanto ao

Poder Público quanto à coletividade considerada em si

mesma.

Assim, decorrente de tal fato, produz efeito

erga omnes, sendo, portanto, oponível contra a todos,

incluindo pessoa física/natural ou jurídica, de direito

público interno ou externo, ou mesmo de direito privado,

como também ente estatal, autarquia, fundação ou

sociedade de economia mista. Impera, também,

evidenciar que, como um direito difuso, não subiste a

possibilidade de quantificar quantas são as pessoas

atingidas, pois a poluição não afeta tão só a população

local, mas sim toda a humanidade, pois a coletividade é

indeterminada. Nesta senda, o direito à integridade do

meio ambiente substancializa verdadeira prerrogativa

jurídica de titularidade coletiva, ressoando a expressão

robusta de um poder deferido, não ao indivíduo

identificado em sua singularidade, mas num sentido

mais amplo, atribuído à própria coletividade social.

Com a nova sistemática entabulada pela

redação do artigo 225 da Carta Maior, o meio-ambiente

Page 172: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

172

passou a ter autonomia, tal seja não está vinculada a

lesões perpetradas contra o ser humano para se

agasalhar das reprimendas a serem utilizadas em

relação ao ato perpetrado. Figura-se, ergo, como bem de

uso comum do povo o segundo pilar que dá corpo aos

sustentáculos do tema em tela. O axioma a ser

esmiuçado, está atrelado o meio-ambiente como vetor da

sadia qualidade de vida, ou seja, manifesta-se na

salubridade, precipuamente, ao vincular a espécie

humana está se tratando do bem-estar e condições

mínimas de existência. Igualmente, o sustentáculo em

análise se corporifica também na higidez, ao cumprir os

preceitos de ecologicamente equilibrado, salvaguardando

a vida em todas as suas formas (diversidade de espécies).

Por derradeiro, o quarto pilar é a

corresponsabilidade, que impõe ao Poder Público o dever

geral de se responsabilizar por todos os elementos que

integram o meio ambiente, assim como a condição

positiva de atuar em prol de resguardar. Igualmente,

tem a obrigação de atuar no sentido de zelar, defender e

preservar, asseverando que o meio-ambiente permaneça

intacto. Aliás, este último se diferencia de conservar que

permite a ação antrópica, viabilizando melhorias no meio

ambiente, trabalhando com as premissas de

Page 173: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

173

desenvolvimento sustentável, aliando progresso e

conservação. Por seu turno, o cidadão tem o dever

negativo, que se apresenta ao não poluir nem agredir o

meio-ambiente com sua ação. Além disso, em razão da

referida corresponsabilidade, são titulares do meio

ambiente os cidadãos da presente e da futura geração.

3 A SOLIDARIEDADE INTERGERACIONAL NO

DIREITO AMBIENTAL: O FORTALECIMENTO

DOS IDEÁRIOS DE FRATERNIDADE NOS

DIREITOS DE TERCEIRA DIMENSÃO

Em sede de comentários introdutórios, ao

volver um olhar analítico para o tema colocado em

debate, forçoso é reconhecer que o corolário da

solidariedade intergeracional apresenta-se como reflexo

de direitos de terceira dimensão, denominados direitos

de solidariedade ou fraternidade. Com destaque, os

direitos encampados pela denominação ora expendida

encontra como alicerce de sustentação o ideário de

fraternidade e tem como exemplos o direito ao meio

ambiente equilibrado, à saudável qualidade de vida, ao

progresso, à paz, à autodeterminação dos povos, a

proteção e defesa do consumidor, além de outros

Page 174: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

174

direitos considerados como difusos. “Dotados de altíssimo

teor de humanismo e universalidade, os direitos de

terceira geração tendem a cristalizar-se no fim do século

XX enquanto direitos que não se destinam

especificamente à proteção dos interesses de um

indivíduo, de um grupo”125 ou mesmo de um Ente

Estatal especificamente. Ainda nesta esteira, é possível

verificar que a construção dos direitos encampados sob a

rubrica de terceira dimensão tende a identificar a

existência de valores concernentes a uma determinada

categoria de pessoas, consideradas enquanto unidade,

não mais prosperando a típica fragmentação individual

de seus componentes de maneira isolada, tal como

ocorria em momento pretérito. Com efeito, está-se

diante de valores transindividuais, eis que os direitos

abarcados pela dimensão em comento não estão

restritos a determinados indivíduos; ao reverso,

incluindo-se a coletividade. Ao lado disso, os direitos de

terceira dimensão são considerados como difusos,

porquanto não têm titular individual, sendo que o liame

entre os seus vários titulares decorre de mera

circunstância factual.

Nesta feita, importa acrescentar que os

125 BONAVIDES, 2007, p. 569.

Page 175: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

175

direitos de terceira dimensão possuem caráter

transindividual, o que os faz abranger a toda a

coletividade, sem quaisquer restrições a grupos

específicos. Ora, o ideário de solidariedade alberga

justamente um sucedâneo de direitos que contemplam a

coletividade enquanto unidade, não se atendendo a

característicos diferenciadores ou mesmo

particularidades segregadoras. Neste sentido, pautaram-

se Motta e Motta e Barchet, ao afirmarem, em suas

ponderações, que “os direitos de terceira geração

possuem natureza essencialmente transindividual,

porquanto não possuem destinatários especificados,

como os de primeira e segunda geração, abrangendo a

coletividade como um todo”126. Desta feita, são direitos

de titularidade difusa ou coletiva, alcançando

destinatários indeterminados ou, ainda, de difícil

determinação. Nesta esteira de exposição, os direitos em

comento estão vinculados a valores de fraternidade ou

solidariedade, sendo traduzidos de um ideal

intergeracional, que liga as gerações presentes às

futuras, a partir da percepção de que a qualidade de vida

destas depende sobremaneira do modo de vida daquelas.

Dos ensinamentos dos célebres doutrinadores, percebe-se

126 MOTTA, Sylvio; BARCHET, Gustavo. Curso de Direito

Constitucional. Rio de Janeiro: Editora Elsevier, 2007, p. 152.

Page 176: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

176

que o caráter difuso de tais direitos permite a

abrangência às gerações futuras, razão pela qual, a

valorização destes é de extrema relevância. “Têm

primeiro por destinatários o gênero humano mesmo,

num momento expressivo de sua afirmação como valor

supremo em termos de existencialidade concreta”127. A

respeito do assunto, com bastante pertinência, Motta e

Barchet128, em seu magistério, ensinam que os direitos

de terceira dimensão surgiram como “soluções” à

degradação das liberdades, à deterioração dos direitos

fundamentais em virtude do uso prejudicial das

modernas tecnologias e desigualdade socioeconômica

vigente entre as diferentes nações.

Tecidos estes comentários, ao esmiuçar o

corolário da solidariedade intergeracional, também

denominado de princípio da equidade ou princípio do

acesso equitativo dos recursos naturais, salta aos olhos

sua íntima relação com a temática dos espaços

127 BONAVIDES, 2007, p. 569. 128 MOTTA; BARCHET, 2007, p. 153. “Duas são as origens básicas

desses direitos: a degradação das liberdades ou a deterioração dos

demais direitos fundamentais em virtude do uso nocivo das

modernas tecnologias e o nível de desigualdade social e econômica

existente entre as diferentes nações. A fim de superar tais

realidades, que afetam a humanidade como um todo, impõe-se o

reconhecimento de direitos que também tenham tal abrangência – a

humanidade como um todo -, partindo-se da ideia de que não há

como se solucionar problemas globais a não ser através de soluções

também globais. Tais “soluções” são os direitos de terceira geração”.

Page 177: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

177

protegidos, eis que configura um dos baldrames robustos

para a sua estruturação. Afora isso, é possível verificar a

materialização do dogma em comento no caput do

artigo 225 da Constituição da República Federativa do

Brasil de 1988129. Assim, a atual geração, ao instituir

os espaços protegidos, furta-se à sua utilização normal

(aqui considerada aquela utilização encontradiça fora

desses espaços) para garantir as presentes gerações e,

sobretudo, às futuras, o equilíbrio do meio ambiente,

mediante a manutenção da biodiversidade. Logo, a

adoção do termo “solidariedade intergeracional” busca,

justamente, destacar esse elo de responsabilidade da

atual geração pela existência das futuras. Neste sentido,

é possível trazer à colação o paradigmático entendimento

jurisprudencial construído, no qual acena, com clareza

solar, que:

Ementa: Arguição de Descumprimento de

Preceito Fundamental: Adequação.

Observância do princípio da

subsidiariedade. Arts. 170, 196 e 225 da

129 BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República

Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 16 mai. 2015: “Art.

225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,

bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,

impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e

preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

Page 178: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

178

Constituição da República.

Constitucionalidade de atos normativos

proibitivos da importação de pneus usados.

Reciclagem de pneus usados: ausência de

eliminação total de seus efeitos nocivos à

saúde e ao meio ambiente equilibrado.

Afronta aos princípios constitucionais da

saúde e do meio ambiente ecologicamente

equilibrado. Coisa julgada com conteúdo

executado ou exaurido: impossibilidade de

alteração. Decisões judiciais com conteúdo

indeterminado no tempo: proibição de novos

efeitos a partir do julgamento. Arguição

julgada parcialmente procedente. 1.

Adequação da arguição pela correta

indicação de preceitos fundamentais

atingidos, a saber, o direito à saúde, direito

ao meio ambiente ecologicamente

equilibrado (arts. 196 e 225 da Constituição

Brasileira) e a busca de desenvolvimento

econômico sustentável: princípios

constitucionais da livre iniciativa e da

liberdade de comércio interpretados e

aplicados em harmonia com o do

desenvolvimento social saudável.

Multiplicidade de ações judiciais, nos

diversos graus de jurisdição, nas quais se

têm interpretações e decisões divergentes

sobre a matéria: situação de insegurança

jurídica acrescida da ausência de outro meio

processual hábil para solucionar a polêmica

pendente: observância do princípio da

subsidiariedade. Cabimento da presente

ação. [...] 4. Princípios constitucionais (art.

225) a) do desenvolvimento sustentável e b)

da equidade e responsabilidade

intergeracional. Meio ambiente

ecologicamente equilibrado: preservação

para a geração atual e para as gerações

futuras. Desenvolvimento sustentável:

crescimento econômico com garantia

paralela e superiormente respeitada da

saúde da população, cujos direitos devem

Page 179: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

179

ser observados em face das necessidades

atuais e daquelas previsíveis e a serem

prevenidas para garantia e respeito às

gerações futuras. Atendimento ao princípio

da precaução, acolhido constitucionalmente,

harmonizado com os demais princípios da

ordem social e econômica [...] (Supremo

Tribunal Federal – Tribunal Pleno/ ADPF

nº 101/ Relatora: Ministra Cármen Lúcia/

Julgado em 24.06.2009/ Publicado no DJe

em 01.06.2012).

Observar-se-á a existência de duas espécies de

solidariedade intergeracional, tais sejam: uma pautada

na atual geração, denominada, em razão disso, de

sincrônica; e, outra voltada para as futuras gerações,

chamada anacrônica. Com destaque, assinalar faz-se

imprescindível, consoante entendimento explicitado por

Andréia Minussi Facin130, que é possível enumerar três

formas distintas de acesso a bens materiais, quais

sejam: acesso visando o consumo do bem, tal como ocorre

com a captação de água e instrumentos predatórios de

caça e pesca; acesso causando poluição ao meio ambiente,

a exemplo do que se denota no acesso à água ou ao ar,

lançando, para tanto, poluentes ou emitindo poluição

sonora; e, acesso ao meio ambiente para a contemplação

130 FACIN, Andréia Minussi. Meio-ambiente e direitos humanos. Jus

Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, 01 nov. 2002. Disponível em:

<http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3463>. Acesso em 16

mai. 2015.

Page 180: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

180

de seus elementos e paisagem. Verifica-se, deste modo, a

existência do meio ecologicamente equilibrado não se

traduz somente na preservação para a geração atual,

mas, também, para as gerações futuras. Logo, se o

pavilhão desfraldado tremula em direção ao

desenvolvimento sustentável, patente faz-se que a

concepção albergue o crescimento econômico como

garantia paralela e superiormente respeitada da saúde

da população, cujo acervo de direito devem ser

observados, tendo-se em vista não apenas as

necessidades atuais, contudo, também, as que são

passíveis de prevenção para as gerações futuras. Neste

sedimento de exposição, cuida apontar, com ênfase, que

está diretamente vinculado ao corolário em comento o

preceito da precaução, já que a necessidade de

afastamento de perigo, tal como a adoção de

instrumentos que busquem a promoção da segurança dos

procedimentos adotado para a garantia das gerações

futuras, efetivando-se apenas por meio da

sustentabilidade ambiental das nações humanas.

Denota-se, destarte, que o princípio em

comento torna efetiva a busca incansável pela proteção

da existência humana, seja tanto pela proteção do meio

ambiente como pela estruturação de condições que

Page 181: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

181

salvaguardem a saúde e a integridade física,

considerando-se o indivíduo em sua inteireza. Gize-se

que tal fato decorre da nova visão reinante, na qual há

que se adotar, como política pública, o que se faz

imprescindível para antecipar os riscos de danos que

sejam passíveis de materialização em relação ao meio

ambiente, tanto quanto o impacto que as ações ou as

omissões possam produzir. Ora, o artigo 225 da

Constituição da República Federativa do Brasil de

1988131., ao estabelecer o ônus em relação à coletividade

e ao Poder Público, na condição de dever, de defender e

preservar o meio ambiente para as presentes e futuras

gerações, inaugura um dever geral arrimado na

prevenção de riscos ambientais, no patamar de um

ordem normativa objetiva de antecipação de futuros

danos ambientais, os quais encontram como

sustentáculos os dogmas da prevenção, quando tratar de

riscos concretos, e da precaução, quando estiver diante

de riscos abstratos.

No mais, cuida colocar em destaque que a

131 BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República

Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 16 mai. 2015: “Art.

225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,

bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,

impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e

preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

Page 182: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

182

reserva dos bens ambientais, com a sua não utilização

atual, passaria a ser equitativa se fosse demonstrado que

ela ocorrera com o escopo de evitar o esgotamento dos

recursos, com a guarda desses bens para as futuras

gerações. Neste passo, ao se considerar a densidade da

moldura de fraternidade e solidariedade que reveste o

acesso ao meio ambiente, em especial devido ao status de

elemento que assegura o alcance da dignidade da pessoa

humana, considerando o indivíduo em todas as suas

potencialidades e complexidades, não é possível suprimir

que a manutenção da preservação dos bens ambientais

refoge ao ideário ingênuo de meio ambiente intocável,

mas sim lhe confere à contemporaneidade ao tema. “A

equidade no acesso aos recursos ambientais deve ser

enfocada não só com relação à localização especial dos

usuários atuais, como em relação aos usuários

potenciais das gerações vindouras”132.

Com efeito, um posicionamento equânime não

é fácil de ser construído, vindicando considerações

dotadas de ordem ética, científica e econômica das

gerações atuais e uma avaliação prospectiva das

necessidades futuras, nem sempre possíveis de serem

132 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental

Brasileiro. 21 ed. São Paulo: Editores Malheiros, 2013, p. 92.

Page 183: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

183

conhecidas e medidas no presente. Neste aspecto, é

possível colocar em destaque que o aspecto

intergeracional que tende a caracterizar o discurso de

proteção e preservação ambiental ambiciona conferir

concreção ao ideário de solidariedade que caracteriza o

direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado

enquanto direito de terceira dimensão. Supera-se, com

efeito, a essência de individualidade que caracterizou os

direitos humanos, adotados uma ótica na qual a

preocupação com o semelhante, mesmo em se tratando

de uma geração futura, é dotada de grande

proeminência, analisando-se a coletividade na condição

de unidade, na qual cada um dos indivíduos é dotado de

relevância e substancial atenção. Tal fato decorre,

notadamente, do superprincípio da dignidade da pessoa

humana, o qual só alcança sua materialização por meio

da conjunção de inúmeros, porém carecidos, direitos, os

quais, em um fim último, proporcionam a realização de

todas as complexidades encerradas no ser humano.

Ademais, um aspecto característico

proeminente da sociedade contemporânea está

assentado na sua paradoxal capacidade de controlar e

produzir indeterminações. Entrementes, a forma como

esse dever será atendido constitui tarefa inafastável dos

Page 184: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

184

órgãos estatais, os quais dispõem de ampla liberdade de

conformação, atentando-se para os limites

constitucionais consagrados. Com efeito, as mencionadas

determinações constitucionais objetivam evitar riscos,

encontrando assento, para tanto, no próprio Texto

Constitucional, o que autoriza o Estado a atuar de modo

a evitar riscos para o cidadão em geral, por meio da

adoção de medidas de proteção ou de prevenção da saúde

e do meio ambiente, notadamente em relação ao

desenvolvimento técnico ou tecnológico e suas

consequências para as presentes e futuras gerações. No

controle judicial de políticas públicas do meio ambiente,

a atuação do Poder Judiciário deve buscar a garantia,

inclusive, o mínimo existencial ecológico dos indivíduos

atingidos diretamente e indiretamente em seu

patrimônio de natureza material e imaterial, neste

sentido, visando garantir a inviolabilidade do direito

fundamental à sadia qualidade de vida, bem assim a

defesa e preservação do meio ambiente ecologicamente

equilibrado, em busca do desenvolvimento sustentável

para as presentes e futuras gerações.

4 SOLIDARIEDADE ENTRE ESPÉCIES

NATURAIS? O ALARGAMENTO DA MOLDURA

Page 185: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

185

AXIOLÓGICA DO PRINCÍPIO DA

SOLIDARIEDADE AMBIENTAL

Como desdobramento da projeção normativa do

corolário da solidariedade, na órbita ecológica, há que se

estruturar uma solidariedade entre todas as espécies

vivas, na forma de uma comunidade entre a terra, as

plantas, os animais e os seres humanos, visto que a

ameaça ecológica coloca em risco todas as espécies

existentes no planeta, afetando por igual a todos e ao

todo. Neste diapasão, a necessidade de despertar uma

consciência pautada na solidariedade entre as espécies

naturais é despertada, sobremaneira, em decorrência

das ameaças à vida desencadeadas pelo desenvolvimento

civilizatório fazerem com que o ser humano se reconheça

como um ser natural integrante de um todo ameaçado e,

concomitantemente, responsável por tal situação de

ameaça existencial. Segundo Sarlet e Fensterseifer133, a

ameaça de contaminação propicia que o ser humano

perceba que o seu corpo integra parte das “coisas

naturais” e que, em razão disso, está sujeito à ameaça

supramencionada. A construção de tal consciência leva o

133 SARLET, Ingo Wolfgang; FENSTERSEIFER, Tiago. Princípios

do Direito Ambiental. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 77.

Page 186: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

186

ser humano a reconhecer, forçosamente, uma

comunidade natural, diante da qual o estabelecimento de

um vínculo de solidariedade e respeito mútuo como

pressuposto para a permanência existencial das espécies

naturais, abarcando-se em tal concepção o ser humano.

Em uma perspectiva jurídica, a vedação das

políticas cruéis contra os animais (não humanos)

encontra repouso no Texto Constitucional, reforçando,

portanto, o ideário axiológico de solidariedade entre as

espécies naturais. Mais que isso, ao analisar o

julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº

1.856/RJ, de relatoria do Ministro Celso de Mello, salta

aos olhos a concreção do dogma em comento, em especial

quando a ementa consagra que “a promoção de briga de

galos, além de caracterizar prática criminosa tipificada

na legislação ambiental, configura conduta atentatória à

Constituição da República, que veda a submissão de

animais a atos de crueldade”134. Ora, há que se

134 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido na

Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.856/RJ. Ação Direta de

Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense nº 2.895/98) -

Legislação estadual que, pertinente a exposições e a competições

entre aves das raças combatentes, favorece essa prática criminosa -

Diploma legislativo que estimula o cometimento de atos de

crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei nº 9.605/98,

art. 32) - Meio Ambiente - Direito à preservação de sua integridade

(CF, art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu caráter de

metaindividualidade - Direito de terceira geração (ou de novíssima

Page 187: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

187

reconhecer que essa especial tutela, que tem por

fundamento legitimador a autoridade da Constituição da

República, é motivada pela necessidade de impedir a

ocorrência de situações de risco que ameacem ou que

façam periclitar todas as formas de vida, não só a do

gênero humano, mas, também, a própria vida animal,

cuja integridade restaria comprometida, não fora a

vedação constitucional, por práticas aviltantes,

perversas e violentas contra os seres irracionais. “A ideia

de „solidariedade entre espécies naturais‟, portanto,

também pode transportar o reconhecimento do valor

intrínseco de todas as manifestações existenciais, bem

como o respeito à reciprocidade indispensável ao convívio

harmonioso” 135, estendido a todos os seres vivos. Salta

aos olhos, desta feita, que o princípio da solidariedade,

cuja incidência deve ser maximizada em diversos

âmbitos, inclusive na seara ambiental, passa a ser

desfraldado como pilar sustentador das relações

contemporâneas, em sua senda civilizatória,

dimensão) que consagra o postulado da solidariedade - Proteção

constitucional da fauna (CF, art. 225, § 1º, VII) - Descaracterização

da briga de galo como manifestação cultural - Reconhecimento da

inconstitucionalidade da lei estadual impugnada - Ação Direta

Procedente. Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Celso

de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Publicado no DJe em 13 out.

2011. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em 16 mai. 2014. 135 SARLET; FENSTERSEIFER, 2014, p. 77.

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188

considerando todas as suas dimensões, a saber:

intergeracional, intrageracional e interespécies.

A Declaração Universal sobre Bioética e Direitos

Humanos trouxe o comprometimento internacional aos

princípios fundamentais e suas aplicações no âmbito

social (artigo 13º), por tratar de questões éticas e

relacionar todas as ciências que tratam da vida do ser

humano, de forma que os princípios e regras que

norteiam o homem culminem a preservação da sua

dignidade humana, do seu direito individual e de

liberdade considerados fundamentais. Animal racional,

que possui capacidade de definir, identificar, atos

injustos, ilícitos, que procura dar sentido a moral e a

ética, se reconhecer responsabilidades e motivos para

uma cooperação mutua, o ser humano possui a presente

escolha de seus atos para preservar futuras gerações

(artigo 16º).

Reconhecendo que cada ser racional é detentor da

autonomia, vide artigo 5º, que propõe limitações nas

investigações de cunho científico, para que além dos

benefícios a serem alcançados nenhum direito seja

violado, suprindo expectativas de vida e promovendo

amplamente o respeito efetivo dos direitos individuais.

Como explicita a Declaração no seu artigo 3º, 2, que “os

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189

interesses e o bem-estar do indivíduo devem prevalecer

sobre o interesse exclusivo da ciência ou da sociedade”

(ONU, 2005). Assim como a proteção e a dignidade do

homem é requerido e incitado pela declaração em

comento, a proteção ao meio ambiente não pode ser

deixado à parte, como afirma o artigo 17º, ao relatar de

forma importantíssima a preocupação com a biosfera e a

biodiversidade, interação destas com o homo sapiens

contemporâneo com outras formas de vida.

5 BIOÉTICA E ANIMAIS: UM RECORTE

CONTEMPORÂNEO EM PROL DA AFIRMAÇÃO

DA SOLIDARIEDADE ENTRE ESPÉCIES

Após a visão antropocêntrica, quando o homem se

identificava no centro do mundo - em que usufrui do meio

ambiente de modo indiferente à sua existência-, o

ecocentrismo mudou o paradigma apresentando sentido e

valor à vida do ser, englobando agora a fauna e a flora

como ícones essenciais ao equilíbrio ambiental. Ao lado

disso, Abreu e Bussinguer destacam que “a concepção

eminentemente antropocêntrica se mantém arraigada

em alguns setores da sociedade contemporânea, o que

impede muitos avanços em projetos que visam a

conservação do meio, em especial, a conservação de

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190

espécies em vias de extinção e a instalação de Unidades

de Conservação”. Podendo o ecocentrismo ser chamado

também de biocentrismo, abordando a vida do ser de

forma ampla considerando-a como personagem central

da uma tutela ambiental, este segundo termo surgiu com

a Lei nº 6.938/1981, eliminando a visão antropocêntrica.

“Assim, a escola ecocêntrica (ou biocêntrica, como muitos

preferem) coloca em primeiro plano de discussão e

proteção o equilíbrio dos ecossistemas e do meio

ambiente natural”136.

Figura 01. Egocentrismo

(antropocentrismo)

Figura 02. Econcentrismo/

Biocentrismo.

136 ABREU, Ivy de Souza; BUSSINGUER, Elda Coelho de Azevedo.

Antropocentrismo, Ecocentrismo e Holismo: uma breve análise das

escolas de pensamento ambiental. Derecho y Cambio Social,

2013, p. 01-11. Disponível em:

<http://www.derechoycambiosocial.com/revista034/escolas_de_pensa

mento_ambiental.pdf>. Acesso em 16 mai. 2015, p. 05.

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191

O holismo considera e defende as entidades

físicas e biológicas como um sistema único e integrando -

seres vivos e recursos ambientais disponíveis -,

considerado autônomo o meio ambiente não é mais

notado como aquele que nutre somente as necessidades

humanas, mas aquele que carece de cuidados e zelo.

Nessa perspectiva, “a análise do meio ambiente deve

considerar o contexto amplo e global de todas as

variáveis intrínsecas e extrínsecas que geram influências

diversas e, primordialmente, a interação entre essas

variáveis, para que não haja uma visão distorcida,

simplória e reducionista do bem ambiental”137. Assim, no

holismo ambiental tem suas bases sustentadas não

apenas no meio natural e nos seus elementos. A vida

humana e suas expressões também se tornam objeto de

proteção, mas não pelos motivos apregoados pelo

antropocentrismo e sim, pela espécie humana (e os

fatores que se relacionam com sua existência e

desenvolvimento) ser parte do meio ambiente e

indispensável ao equilíbrio ambiental.

A Lei nº 11.794/2008 aborda sobre pesquisas com

animais para fins científicos e acadêmicos, limitando as

pesquisas com animais para que assim sua dignidade

137 ABREU; BUSSINGER, 2013, p. 08.

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192

possa ser preservada, abordando quais são os

procedimentos a ser utilizado no caso do uso desses

animais para a pesquisa, dispondo penalidades aos

indivíduos que a infligirem, previsto no art. 17 e 18 desta

mesma Lei. Já a Lei 11.105, de 24 de Março de 2005, que

regulamenta o dispositivo legal da Constituição 225 § 1°,

a importância destes na prevenção a vida de animais e

vegetais, a Lei de Biossegurança estabelece normas e

mecanismos fiscalizando atividades que envolva

organismos mesmo que geneticamente modificados como

os transgênicos. Apesar de ser uma legislação

considerada atécnica não pode ser ignorada, pois cria o

Conselho Nacional de Biossegurança- CBN, para efetivar

os direitos dos organismos que compõem a vida terrestre.

Estabelecendo preceitos para qualquer intervenção do

ser humano em relação à outro e à vida deste,

estimulando o desenvolvimento técnico-científico visando

proteger a saúde humana, vegetal e animal, precavendo

a existência da biodiversidade, exigindo um instrumento

de ato licito por parte das entidades responsáveis pelo

manuseio das pesquisas.

Encontra-se no artigo 5º desta lei permissão para

pesquisa e terapia com células-tronco embrionárias,

como as fertilizações in vitro, restringindo a

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193

comercialização o material biológico, proibindo o descarte

e clonagem humana no artigo 6º, tipificando crimes e

penas do artigo 24 ao artigo 29. É possível observar nos

direitos de terceira dimensão ou direito fraternal, ha

solidariedade contemporânea entre as espécies, visto que

se dá em âmbito internacional, e pensar nesse ângulo

adquirimos um conceito sem distinção entre animal

racional e o não racional, entre animais e espécies

vegetais, posto que todos são seres viventes e necessitam

do equilíbrio da biosfera para a preservação da vida.

Nesta esteira de exposição, denota-se que a dignidade

nesse meio se torna ícone primordial, se tratando de

respeito mútuo, como apresenta o artigo 3º, inciso I,

quando tratando de justiça, solidariedade e liberdade,

todos estes remetem a um organismo digno sem distinção

qualquer.

Dignidade dos animais não humanos é uma

releitura da relação dos componentes que mantém a

terra equilibrada biologicamente, associando a filosofia

da interação humana com o mundo natural. Refletindo

um compromisso com a existência da vida na terra,

pautando na situação limite em que a espécie humana

vive. Kant preconiza juridicamente dignidade humana

considerando-a um fundamento imutável quando diz

Page 194: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

194

ainda hoje parece estar identificando as bases de uma

fundamentação e, de certa forma, de uma conceituação

de dignidade da pessoa humana. Até que ponto, contudo,

tal concepção efetivamente poderá ser adotada sem

reservas ou ajustes na atual quadra da evolução social,

econômica e jurídica constitui, sem dúvida, desafio

fascinante138 . É imprescindível valorar o reconhecimento

da dignidade à vida de modo geral, principalmente em

época como a que estamos, onde proteger o meio

ambiente indica lutar favoravelmente preservando

recursos naturais e formas de vida no planeta, ainda

refletir enfaticamente em educação ambiental.

Sarlet139 trouxe entendimento contrário ao

Kantiano em relação à dignidade, com intuito de adaptá-

la aproximando tal pensamento a contemporâneos

valores, visões morais e culturais instigados pela

reformulação de configurações ecologicamente corretas,

descartando um conceito individualista, incidindo aos

animais não-humanos e humanos, bem como sua inter-

relação projetando-o como direito fundamental ao ser

vivo e seu estado. O termo bioética que dizer “bio”

138 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e

Direitos Fundamentais na Constituição Federal de 1988. 9

ed., rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012 139 Ibid.

Page 195: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

195

representa o reconhecimento biológico dos sistemas vivos

e “ética” representa o conhecimento dos valores humanos.

O primeiro ponto da bioética explorado por Van

Rensselaer Potter, pai da bioética, diz que se conhecem

as pessoas pelo seu intelecto. Potter coloca a bioética

como ponte entre a ciência biológica e a ética,

conclamando bioética como “ciência da sobrevivência

humana” (POTTER,1971). A bioética não deve ser

limitada, mas colocada em balizas diversas, vez que esta

sua análise se apresenta desconexa à uma atitude

legalista ou funcionalista. Colocando uma visão mais

profunda que outras disciplinas ao abordar tal assunto,

referindo as ações humanas ao todo no campo da saúde –

bem comum-, a ordem ética substancialmente inserida

na vida. Considerada por Potter uma disciplina

independente, mas inter-relacionada aos indivíduos. A

mudança adotada no comportamento e conscientização

dos indivíduos, educação ambiental, implica a ética, a

política, a economia, a ciência, a cultura, a tecnologia e a

ecologia. Essa visão interdisciplinar enfatiza a

interdependência solidaria, que necessária, direciona

essa recente filosofia aos seres viventes. Um grande

problema da humanidade a ser enfrentado é a visão de

que a dignidade está pautada entre o animal não

Page 196: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

196

racional, o meio em que está inserido e o homem, em um

mesmo patamar, assim considerados responsáveis uns

pelos outros. Tal tolerância é um princípio a ser adotado

e segui em direção à solidariedade.

O Estado Democrático de Direito tem o poder-

dever de garantir o bem comum, Estado este formado por

cidadãos, portanto assegurando a liberdade, igualdade-

conquista da Revolução Francesa nos séculos XIX e XX

respectivamente-, procurando desenvolver a fraternidade

– solidariedade no século XXI- direito de terceira

dimensão-. A relação do homem com o meio ambiente se

torna irrenunciável, e menosprezar a responsabilidade

excluiria uma forma de justiça, que é inerente a ética

responsável. Esta disciplina insere certa sensibilidade

moral a comunidade liderada pela simples capacidade de

sentir, tocando a consciência, principalmente ambiental

assegurada jurisprudencialmente pelo magistrado

Candido Alfredo Silva Leal Júnior que amparou, no Rio

Grande do Sul, os animais com a proibição de caça

amadora por meio de sentença. Esta ação projetou

valores culturais nesse meio social de forma que

respeitasse a dignidade animal afirmando a

fraternidade.

Page 197: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

197

6 CONCLUSÃO

Diante das ponderações apresentadas, ao

reconhecer que cada ser racional é detentor da

autonomia, vide artigo 5º, que propõe limitações nas

investigações de cunho científico, para que além dos

benefícios a serem alcançados nenhum direito seja

violado, suprindo expectativas de vida e promovendo

amplamente o respeito efetivo dos direitos individuais.

Cuida explicitar que o vocábulo dignidade, na conjuntura

contemporânea, passou a ser dotado de substancial

fluidez, não estando mais limitado apenas ao gênero

humano. Em que pese sua gênese estar intimamente

associada ao reconhecimento do ser humano,

independente de seus aspectos caracterizadores (etnia,

condição social, condição sexual, gênero), como ser dotado

de dignidade, em decorrência do fato de ser um

indivíduo, na contemporaneidade, sobretudo a partir dos

debates éticos inaugurados pela Bioética, é estabelecida

uma nova ótica acerca da dignidade. Neste cenário, a

concepção trazida à baila no presente busca refletir sobre

a extensão do conceito de dignidade aos animais,

pautando-se em uma perspectiva alargada sobre a

solidariedade entre espécies animais distintas,

Page 198: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

198

Nessa linha de exposição, como explicita a

Declaração de Bioética e Direitos a proteção e a

dignidade do homem é requerida e incitada pela

declaração, a proteção ao meio ambiente, igualmente,

não pode ser deixada à parte, como afirma o artigo 17º,

ao relatar de forma importantíssima a preocupação com

a biosfera e a biodiversidade, interação destas com o

homo sapiens contemporâneo com outras formas de vida.

Supera-se, portanto, a tradicional visão que reconhece o

ser humano como centro de todos os debates, erigindo,

em seu lugar, uma concepção biocêntrica/ecocêntrica que

concede especial destaque ao meio ambiente, no qual

cada espécie é dotada de proeminente relevância, agindo

como catalisador para a manutenção do delicado

equilíbrio entre as demais espécies. Mais que isso, o ser

humano é deslocado da sua condição de protagonismo

para figurar como mais um elemento. Salta aos olhos,

portanto, que o fortalecimento do discurso entre a

solidariedade entre as espécies, em especial os animais,

materializa a reformulação de uma barreira tradicional,

passando a conferir dignidade àqueles que sempre

detiveram statu de coisa.

Page 199: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

199

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Constituição Federal, estabelece normas de segurança e

mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam

organismos geneticamente modificados – OGM e seus

derivados, cria o Conselho Nacional de Biossegurança –

CNBS, reestrutura a Comissão Técnica Nacional de

Biossegurança – CTNBio, dispõe sobre a Política

Nacional de Biossegurança – PNB, revoga a Lei no 8.974,

Page 200: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

200

de 5 de janeiro de 1995, e a Medida Provisória no 2.191-9,

de 23 de agosto de 2001, e os arts. 5o, 6o, 7o, 8o, 9o, 10 e 16

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Page 203: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

203

SOLIDARIEDADE ENTRE ESPÉCIES NATURAIS?

O ALARGAMENTO DA MOLDURA AXIOLÓGICA

DO PRINCÍPIO DA SOLIDARIEDADE AMBIENTAL

Resumo: O objetivo do presente está alicerçado

na análise do princípio da solidariedade,

expressamente positivado no Texto

Constitucional, em uma acepção alargada,

voltada, não apenas para o gênero humano, para

as demais espécies (animais e vegetais)

existentes. Como desdobramento da projeção

normativa do corolário da solidariedade, na órbita

ecológica, há que se estruturar uma solidariedade

entre todas as espécies vivas, na forma de uma

comunidade entre a terra, as plantas, os animais

e os seres humanos, visto que a ameaça ecológica

coloca em risco todas as espécies existentes no

planeta, afetando por igual a todos e ao todo.

Neste diapasão, a necessidade de despertar uma

consciência pautada na solidariedade entre as

espécies naturais é despertada, sobremaneira, em

decorrência das ameaças à vida desencadeadas

pelo desenvolvimento civilizatório fazerem com

que o ser humano se reconheça como um ser

Page 204: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

204

natural integrante de um todo ameaçado e,

concomitantemente, responsável por tal situação

de ameaça existencial. A ameaça de contaminação

propicia que o ser humano perceba que o seu

corpo integra parte das “coisas naturais” e que,

em razão disso, está sujeito à ameaça

supramencionada. A construção de tal consciência

leva o ser humano a reconhecer, forçosamente,

uma comunidade natural, diante da qual o

estabelecimento de um vínculo de solidariedade e

respeito mútuo como pressuposto para a

permanência existencial das espécies naturais,

abarcando-se em tal concepção o ser humano.

Palavras-chaves: Meio Ambiente. Princípio da

Solidariedade. Espécies Naturais. Interpretação

Axiológica.

Sumário: 1 Ponderações Introdutórias: Breves

notas à construção teórica do Direito Ambiental;

2 Comentários à concepção de Meio Ambiente; 3

A Solidariedade Intergeracional no Direito

Ambiental: O Fortalecimento dos Ideários de

Fraternidade nos Direitos de Terceira

Dimensão; 4 Solidariedade entre Espécies

Naturais? O Alargamento da Moldura Axiológica

do Princípio da Solidariedade Ambiental

Page 205: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

205

1 PONDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS: BREVES

NOTAS À CONSTRUÇÃO TEÓRICA DO DIREITO

AMBIENTAL

Inicialmente, ao se dispensar um exame acerca

do tema colocado em tela, patente se faz arrazoar que a

Ciência Jurídica, enquanto um conjunto multifacetado de

arcabouço doutrinário e técnico, assim como as robustas

ramificações que a integram, reclama uma interpretação

alicerçada nos plurais aspectos modificadores que

passaram a influir em sua estruturação. Neste alamiré,

lançando à tona os aspectos característicos de

mutabilidade que passaram a orientar o Direito, tornou-

se imperioso salientar, com ênfase, que não mais subsiste

uma visão arrimada em preceitos estagnados e

estanques, alheios às necessidades e às diversidades

sociais que passaram a contornar os Ordenamentos

Jurídicos. Ora, infere-se que não mais prospera o

arcabouço imutável que outrora sedimentava a aplicação

das leis, sendo, em decorrência dos anseios da população,

suplantados em uma nova sistemática.

Com espeque em tais premissas, cuida

hastear, com bastante pertinência, como flâmula de

interpretação o “prisma de avaliação o brocardo jurídico

Page 206: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

206

'Ubi societas, ibi jus', ou seja, 'Onde está a sociedade,

está o Direito', tornando explícita e cristalina a relação

de interdependência que esse binômio mantém”140.

Destarte, com clareza solar, denota-se que há uma

interação consolidada na mútua dependência, já que o

primeiro tem suas balizas fincadas no constante processo

de evolução da sociedade, com o fito de que seus

Diplomas Legislativos e institutos não fiquem inquinados

de inaptidão e arcaísmo, em total descompasso com a

realidade vigente. A segunda, por sua vez, apresenta

estrutural dependência das regras consolidadas pelo

Ordenamento Pátrio, cujo escopo primevo é assegurar

que não haja uma vingança privada, afastando, por

extensão, qualquer ranço que rememore priscas eras em

que o homem valorizava a Lei de Talião (“Olho por olho,

dente por dente”), bem como para evitar que se robusteça

um cenário caótico no seio da coletividade.

Ademais, com a promulgação da Constituição

da República Federativa do Brasil de 1988,

imprescindível se fez adotá-la como maciço axioma de

sustentação do Ordenamento Brasileiro, precipuamente

140 VERDAN, Tauã Lima. Princípio da Legalidade: Corolário do

Direito Penal. Jurid Publicações Eletrônicas, Bauru, 22 jun.

2009. Disponível em: <http://jornal.jurid.com.br>. Acesso em 21 jan.

2015.

Page 207: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

207

quando se objetiva a amoldagem do texto legal, genérico

e abstrato, aos complexos anseios e múltiplas

necessidades que influenciam a realidade

contemporânea. Ao lado disso, há que se citar o voto

magistral voto proferido pelo Ministro Eros Grau, ao

apreciar a Ação de Descumprimento de Preceito

Fundamental Nº. 46/DF, “o direito é um organismo vivo,

peculiar porém porque não envelhece, nem permanece

jovem, pois é contemporâneo à realidade. O direito é um

dinamismo. Essa, a sua força, o seu fascínio, a sua

beleza”141. Como bem pontuado, o fascínio da Ciência

Jurídica jaz, justamente, na constante e imprescindível

mutabilidade que apresenta, decorrente do dinamismo

que reverbera na sociedade e orienta a aplicação dos

141 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão em Arguição de

Descumprimento de Preceito Fundamental Nº. 46/DF. Empresa

Pública de Correios e Telégrafos. Privilégio de Entrega de

Correspondências. Serviço Postal. Controvérsia referente à Lei

Federal 6.538, de 22 de Junho de 1978. Ato Normativo que regula

direitos e obrigações concernentes ao Serviço Postal. Previsão de

Sanções nas Hipóteses de Violação do Privilégio Postal.

Compatibilidade com o Sistema Constitucional Vigente. Alegação de

afronta ao disposto nos artigos 1º, inciso IV; 5º, inciso XIII, 170,

caput, inciso IV e parágrafo único, e 173 da Constituição do Brasil.

Violação dos Princípios da Livre Concorrência e Livre Iniciativa. Não

Caracterização. Arguição Julgada Improcedente. Interpretação

conforme à Constituição conferida ao artigo 42 da Lei N. 6.538, que

estabelece sanção, se configurada a violação do privilégio postal da

União. Aplicação às atividades postais descritas no artigo 9º, da lei.

Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Marcos Aurélio.

Julgado em 05 ago. 2009. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso

em 21 jan. 2015.

Page 208: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

208

Diplomas Legais e os institutos jurídicos neles

consagrados.

Ainda neste substrato de exposição, pode-se

evidenciar que a concepção pós-positivista que passou a

permear o Direito, ofertou, por via de consequência, uma

rotunda independência dos estudiosos e profissionais da

Ciência Jurídica. Aliás, há que se citar o entendimento

de Verdan, “esta doutrina é o ponto culminante de uma

progressiva evolução acerca do valor atribuído aos

princípios em face da legislação”142. Destarte, a partir de

uma análise profunda dos mencionados sustentáculos,

infere-se que o ponto central da corrente pós-positivista

cinge-se à valoração da robusta tábua principiológica que

Direito e, por conseguinte, o arcabouço normativo

passando a figurar, nesta tela, como normas de cunho

vinculante, flâmulas hasteadas a serem adotadas na

aplicação e interpretação do conteúdo das leis.

Nas últimas décadas, o aspecto de

mutabilidade tornou-se ainda mais evidente, em especial,

quando se analisa a construção de novos que derivam da

Ciência Jurídica. Entre estes, cuida destacar a

ramificação ambiental, considerando como um ponto de

congruência da formação de novos ideários e cânones,

142 VERDAN, 2009, s.p.

Page 209: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

209

motivados, sobretudo, pela premissa de um manancial de

novos valores adotados. Nesta trilha de argumentação,

de boa técnica se apresenta os ensinamentos de

Fernando de Azevedo Alves Brito que, em seu artigo,

aduz: “Com a intensificação, entretanto, do interesse dos

estudiosos do Direito pelo assunto, passou-se a

desvendar as peculiaridades ambientais, que, por

estarem muito mais ligadas às ciências biológicas, até

então era marginalizadas”143. Assim, em decorrência da

proeminência que os temas ambientais vêm, de maneira

paulatina, alcançando, notadamente a partir das últimas

discussões internacionais envolvendo a necessidade de

um desenvolvimento econômico pautado em

sustentabilidade, não é raro que prospere, mormente em

razão de novos fatores, um verdadeiro remodelamento ou

mesmo uma releitura dos conceitos que abalizam a

ramificação ambiental do Direito, com o fito de permitir

que ocorra a conservação e recuperação das áreas

degradadas.

Ademais, há de ressaltar ainda que o direito

143 BRITO, Fernando de Azevedo Alves. A hodierna classificação do

meio-ambiente, o seu remodelamento e a problemática sobre a

existência ou a inexistência das classes do meio-ambiente do

trabalho e do meio-ambiente misto. Boletim Jurídico, Uberaba,

ano 5, n. 968. Disponível em: <http://www.boletimjuridico.com.br>.

Acesso em 21 jan. 2015.

Page 210: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

210

ambiental passou a figurar, especialmente, depois das

décadas de 1950 e 1960, como um elemento integrante da

farta e sólida tábua de direitos fundamentais. Calha

realçar, com cores quentes, que mais contemporâneos, os

direitos que constituem a terceira dimensão recebem a

alcunha de direitos de fraternidade ou, ainda, de

solidariedade, contemplando, em sua estrutura, uma

patente preocupação com o destino da humanidade144·.

Ora, daí se verifica a inclusão de meio ambiente como um

direito fundamental, logo, está umbilicalmente atrelado

com humanismo e, por extensão, a um ideal de sociedade

mais justa e solidária. Nesse sentido, ainda, é plausível

citar o artigo 3°., inciso I, da Carta Política que abriga

em sua redação tais pressupostos como os princípios

fundamentais do Estado Democrático de Direitos: “Art.

3º - Constituem objetivos fundamentais da República

Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre,

justa e solidária” 145.

Ainda nesta esteira, é possível verificar que a

construção dos direitos encampados sob a rubrica de

144 MOTTA, Sylvio; DOUGLAS, Willian. Direito Constitucional –

Teoria, Jurisprudência e 1.000 Questões 15 ed., rev., ampl. e

atual. Rio de Janeiro: Editora Impetus, 2004, p. 69. 145 BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República

Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 21 jan. 2015.

Page 211: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

211

terceira dimensão tende a identificar a existência de

valores concernentes a uma determinada categoria de

pessoas, consideradas enquanto unidade, não mais

prosperando a típica fragmentação individual de seus

componentes de maneira isolada, tal como ocorria em

momento pretérito. Com o escopo de ilustrar, de maneira

pertinente as ponderações vertidas, insta trazer à colação

o entendimento do Ministro Celso de Mello, ao apreciar a

Ação Direta de Inconstitucionalidade N°. 1.856/RJ, em

especial quando, com bastante pertinência, destaca que:

Cabe assinalar, Senhor Presidente, que os

direitos de terceira geração (ou de

novíssima dimensão), que materializam

poderes de titularidade coletiva atribuídos,

genericamente, e de modo difuso, a todos os

integrantes dos agrupamentos sociais,

consagram o princípio da solidariedade e

constituem, por isso mesmo, ao lado dos

denominados direitos de quarta geração

(como o direito ao desenvolvimento e o

direito à paz), um momento importante no

processo de expansão e reconhecimento dos

direitos humanos, qualificados estes,

enquanto valores fundamentais

indisponíveis, como prerrogativas

impregnadas de uma natureza

essencialmente inexaurível146.

146 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido em

Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 1.856/RJ. Ação Direta De

Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense Nº 2.895/98) -

Legislação Estadual que, pertinente a exposições e a competições

entre aves das raças combatentes, favorece essa prática criminosa -

Page 212: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

212

Quadra anotar que os direitos alocados sob a

rubrica de direito de terceira dimensão encontram como

assento primordial a visão da espécie humana na

condição de coletividade, superando, via de consequência,

a tradicional visão que está pautada no ser humano em

sua individualidade. Assim, a preocupação identificada

está alicerçada em direitos que são coletivos, cujas

influências afetam a todos, de maneira indiscriminada.

Ao lado do exposto, cuida mencionar, segundo Bonavides,

que tais direitos “têm primeiro por destinatários o gênero

humano mesmo, num momento expressivo de sua

afirmação como valor supremo em termos de

existencialidade concreta”147. Com efeito, os direitos de

terceira dimensão, dentre os quais se inclui ao meio

Diploma Legislativo que estimula o cometimento de atos de

crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei Nº 9.605/98,

ART. 32) - Meio Ambiente - Direito à preservação de sua integridade

(CF, Art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu caráter de

metaindividualidade - Direito de terceira geração (ou de novíssima

dimensão) que consagra o postulado da solidariedade - Proteção

constitucional da fauna (CF, Art. 225, § 1º, VII) - Descaracterização

da briga de galo como manifestação cultural - Reconhecimento da

inconstitucionalidade da Lei Estadual impugnada - Ação Direta

procedente. Legislação Estadual que autoriza a realização de

exposições e competições entre aves das raças combatentes - Norma

que institucionaliza a prática de crueldade contra a fauna –

Inconstitucionalidade. . Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator:

Ministro Celso de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Disponível em:

<www.stf.jus.br>. Acesso em 21 jan. 2015. 147 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 21 ed.

atual. São Paulo: Editora Malheiros Ltda., 2007, p. 569.

Page 213: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

213

ambiente ecologicamente equilibrado, positivado na

Constituição de 1988, emerge com um claro e tangível

aspecto de familiaridade, como ápice da evolução e

concretização dos direitos fundamentais.

2 COMENTÁRIOS À CONCEPÇÃO DE MEIO

AMBIENTE

Em uma primeira plana, ao lançar mão do

sedimentado jurídico-doutrinário apresentado pelo inciso

I do artigo 3º da Lei Nº. 6.938, de 31 de agosto de 1981148,

que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente,

seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá

outras providências, salienta que o meio ambiente

consiste no conjunto e conjunto de condições, leis e

influências de ordem química, física e biológica que

permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.

Pois bem, com o escopo de promover uma facilitação do

aspecto conceitual apresentado, é possível verificar que o

meio ambiente se assenta em um complexo diálogo de

fatores abióticos, provenientes de ordem química e física,

148 BRASIL. Lei Nº. 6.938, de 31 de Agosto de 1981. Dispõe sobre

a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de

formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 21 jan. 2015.

Page 214: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

214

e bióticos, consistentes nas plurais e diversificadas

formas de seres viventes. Para Silva, considera-se meio-

ambiente como “a interação do conjunto de elementos

naturais, artificiais e culturais que propiciem o

desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas

formas”149.

Nesta senda, ainda, Fiorillo150, ao tecer

comentários acerca da acepção conceitual de meio

ambiente, coloca em destaque que tal tema se assenta em

um ideário jurídico indeterminado, incumbindo, ao

intérprete das leis, promover o seu preenchimento. Dada

à fluidez do tema, é possível colocar em evidência que o

meio ambiente encontra íntima e umbilical relação com

os componentes que cercam o ser humano, os quais são

de imprescindível relevância para a sua existência. O

Ministro Luiz Fux, ao apreciar a Ação Direta de

Inconstitucionalidade N°. 4.029/AM, salientou que:

(...) o meio ambiente é um conceito hoje

geminado com o de saúde pública, saúde de

cada indivíduo, sadia qualidade de vida, diz

a Constituição, é por isso que estou falando

de saúde, e hoje todos nós sabemos que ele é

149 SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional.

São Paulo: Malheiros Editores, 2009, p. 20. 150 FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de Direito

Ambiental Brasileiro. 13 ed., rev., atual e ampl. São Paulo:

Editora Saraiva, 2012, p. 77.

Page 215: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

215

imbricado, é conceitualmente geminado com

o próprio desenvolvimento. Se antes nós

dizíamos que o meio ambiente é compatível

com o desenvolvimento, hoje nós dizemos, a

partir da Constituição, tecnicamente, que

não pode haver desenvolvimento senão com

o meio ambiente ecologicamente

equilibrado. A geminação do conceito me

parece de rigor técnico, porque salta da

própria Constituição Federal151.

É denotável, desta sorte, que a

constitucionalização do meio ambiente no Brasil

viabilizou um verdadeiro salto qualitativo, no que

concerne, especificamente, às normas de proteção

ambiental. Tal fato decorre da premissa que os robustos

corolários e princípios norteadores foram alçados ao

patamar constitucional, assumindo colocação eminente,

ao lado das liberdades públicas e dos direitos

fundamentais. Superadas tais premissas, aprouve ao

Constituinte, ao entalhar a Carta Política Brasileira,

151 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido em

Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 4.029/AM. Ação Direta de

Inconstitucionalidade. Lei Federal Nº 11.516/07. Criação do Instituto

Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Legitimidade da

Associação Nacional dos Servidores do IBAMA. Entidade de Classe

de Âmbito Nacional. Violação do art. 62, caput e § 9º, da

Constituição. Não emissão de parecer pela Comissão Mista

Parlamentar. Inconstitucionalidade dos artigos 5º, caput, e 6º, caput

e parágrafos 1º e 2º, da Resolução Nº 1 de 2002 do Congresso

Nacional. Modulação dos Efeitos Temporais da Nulidade (Art. 27 da

Lei 9.868/99). Ação Direta Parcialmente Procedente. Órgão

Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Luiz Fux. Julgado em 08

mar. 2012. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em 21 jan. 2015.

Page 216: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

216

ressoando os valores provenientes dos direitos de terceira

dimensão, insculpir na redação do artigo 225, conceder

amplo e robusto respaldo ao meio ambiente como pilar

integrante dos direitos fundamentais. “Com o advento da

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988,

as normas de proteção ambiental são alçadas à categoria

de normas constitucionais, com elaboração de capítulo

especialmente dedicado à proteção do meio ambiente”152.

Nesta toada, ainda, é observável que o caput do artigo

225 da Constituição Federal153 está abalizado em quatro

pilares distintos, robustos e singulares que, em conjunto,

dão corpo a toda tábua ideológica e teórica que assegura

o substrato de edificação da ramificação ambiental.

Primeiramente, em decorrência do tratamento

dispensado pelo artífice da Constituição Federal, o meio

ambiente foi içado à condição de direito de todos,

presentes e futuras gerações. É encarado como algo

pertencente a toda coletividade, assim, por esse prisma,

152 THOMÉ, Romeu. Manual de Direito Ambiental: Conforme o

Novo Código Florestal e a Lei Complementar 140/2011. 2 ed.

Salvador: Editora JusPodivm, 2012, p. 116. 153 BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República

Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 21 jan. 2015: “Art. 225.

Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem

de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,

impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e

preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

Page 217: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

217

não se admite o emprego de qualquer distinção entre

brasileiro nato, naturalizado ou estrangeiro, destacando-

se, sim, a necessidade de preservação, conservação e não-

poluição. O artigo 225, devido ao cunho de direito difuso

que possui, extrapola os limites territoriais do Estado

Brasileiro, não ficando centrado, apenas, na extensão

nacional, compreendendo toda a humanidade. Neste

sentido, inclusive, o Ministro Celso de Mello, ao apreciar

a Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 1.856/RJ,

destacou, com bastante pertinência, que:

A preocupação com o meio ambiente - que

hoje transcende o plano das presentes

gerações, para também atuar em favor das

gerações futuras (...) tem constituído, por

isso mesmo, objeto de regulações

normativas e de proclamações jurídicas,

que, ultrapassando a província meramente

doméstica do direito nacional de cada

Estado soberano, projetam-se no plano das

declarações internacionais, que refletem, em

sua expressão concreta, o compromisso das

Nações com o indeclinável respeito a esse

direito fundamental que assiste a toda a

Humanidade154.

154 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido em

Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 1.856/RJ. Ação Direta De

Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense Nº 2.895/98) -

Legislação Estadual que, pertinente a exposições e a competições

entre aves das raças combatentes, favorece essa prática criminosa -

Diploma Legislativo que estimula o cometimento de atos de

crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei Nº 9.605/98,

ART. 32) - Meio Ambiente - Direito à preservação de sua integridade

Page 218: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

218

O termo “todos”, aludido na redação do caput

do artigo 225 da Constituição Federal de 1988, faz

menção aos já nascidos (presente geração) e ainda

aqueles que estão por nascer (futura geração), cabendo

àqueles zelar para que esses tenham à sua disposição, no

mínimo, os recursos naturais que hoje existem. Tal fato

encontra como arrimo a premissa que foi reconhecido ao

gênero humano o direito fundamental à liberdade, à

igualdade e ao gozo de condições de vida adequada, em

ambiente que permita desenvolver todas as suas

potencialidades em clima de dignidade e bem-estar.

Pode-se considerar como um direito transgeracional, ou

seja, ultrapassa as gerações, logo, é viável afirmar que o

meio-ambiente é um direito público subjetivo. Desta

feita, o ideário de que o meio ambiente substancializa

patrimônio público a ser imperiosamente assegurado e

protegido pelos organismos sociais e pelas instituições

(CF, Art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu caráter de

metaindividualidade - Direito de terceira geração (ou de novíssima

dimensão) que consagra o postulado da solidariedade - Proteção

constitucional da fauna (CF, Art. 225, § 1º, VII) - Descaracterização

da briga de galo como manifestação cultural - Reconhecimento da

inconstitucionalidade da Lei Estadual impugnada - Ação Direta

procedente. Legislação Estadual que autoriza a realização de

exposições e competições entre aves das raças combatentes - Norma

que institucionaliza a prática de crueldade contra a fauna –

Inconstitucionalidade. . Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator:

Ministro Celso de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Disponível em:

<www.stf.jus.br>. Acesso em 21 jan. 2015.

Page 219: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

219

estatais, qualificando verdadeiro encaro irrenunciável

que se impõe, objetivando sempre o benefício das

presentes e das futuras gerações, incumbindo tanto ao

Poder Público quanto à coletividade considerada em si

mesma.

Assim, decorrente de tal fato, produz efeito

erga omnes, sendo, portanto, oponível contra a todos,

incluindo pessoa física/natural ou jurídica, de direito

público interno ou externo, ou mesmo de direito privado,

como também ente estatal, autarquia, fundação ou

sociedade de economia mista. Impera, também,

evidenciar que, como um direito difuso, não subiste a

possibilidade de quantificar quantas são as pessoas

atingidas, pois a poluição não afeta tão só a população

local, mas sim toda a humanidade, pois a coletividade é

indeterminada. Nesta senda, o direito à integridade do

meio ambiente substancializa verdadeira prerrogativa

jurídica de titularidade coletiva, ressoando a expressão

robusta de um poder deferido, não ao indivíduo

identificado em sua singularidade, mas num sentido

mais amplo, atribuído à própria coletividade social.

Com a nova sistemática entabulada pela

redação do artigo 225 da Carta Maior, o meio-ambiente

passou a ter autonomia, tal seja não está vinculada a

Page 220: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

220

lesões perpetradas contra o ser humano para se

agasalhar das reprimendas a serem utilizadas em

relação ao ato perpetrado. Figura-se, ergo, como bem de

uso comum do povo o segundo pilar que dá corpo aos

sustentáculos do tema em tela. O axioma a ser

esmiuçado, está atrelado o meio-ambiente como vetor da

sadia qualidade de vida, ou seja, manifesta-se na

salubridade, precipuamente, ao vincular a espécie

humana está se tratando do bem-estar e condições

mínimas de existência. Igualmente, o sustentáculo em

análise se corporifica também na higidez, ao cumprir os

preceitos de ecologicamente equilibrado, salvaguardando

a vida em todas as suas formas (diversidade de espécies).

Por derradeiro, o quarto pilar é a

corresponsabilidade, que impõe ao Poder Público o dever

geral de se responsabilizar por todos os elementos que

integram o meio ambiente, assim como a condição

positiva de atuar em prol de resguardar. Igualmente,

tem a obrigação de atuar no sentido de zelar, defender e

preservar, asseverando que o meio-ambiente permaneça

intacto. Aliás, este último se diferencia de conservar que

permite a ação antrópica, viabilizando melhorias no meio

ambiente, trabalhando com as premissas de

desenvolvimento sustentável, aliando progresso e

Page 221: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

221

conservação. Por seu turno, o cidadão tem o dever

negativo, que se apresenta ao não poluir nem agredir o

meio-ambiente com sua ação. Além disso, em razão da

referida corresponsabilidade, são titulares do meio

ambiente os cidadãos da presente e da futura geração.

3 A SOLIDARIEDADE INTERGERACIONAL NO

DIREITO AMBIENTAL: O FORTALECIMENTO

DOS IDEÁRIOS DE FRATERNIDADE NOS

DIREITOS DE TERCEIRA DIMENSÃO

Em sede de comentários introdutórios, ao

volver um olhar analítico para o tema colocado em

debate, forçoso é reconhecer que o corolário da

solidariedade intergeracional apresenta-se como reflexo

de direitos de terceira dimensão, denominados direitos

de solidariedade ou fraternidade. Com destaque, os

direitos encampados pela denominação ora expendida

encontra como alicerce de sustentação o ideário de

fraternidade e tem como exemplos o direito ao meio

ambiente equilibrado, à saudável qualidade de vida, ao

progresso, à paz, à autodeterminação dos povos, a

proteção e defesa do consumidor, além de outros

direitos considerados como difusos. “Dotados de altíssimo

Page 222: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

222

teor de humanismo e universalidade, os direitos de

terceira geração tendem a cristalizar-se no fim do século

XX enquanto direitos que não se destinam

especificamente à proteção dos interesses de um

indivíduo, de um grupo”155 ou mesmo de um Ente

Estatal especificamente. Ainda nesta esteira, é possível

verificar que a construção dos direitos encampados sob a

rubrica de terceira dimensão tende a identificar a

existência de valores concernentes a uma determinada

categoria de pessoas, consideradas enquanto unidade,

não mais prosperando a típica fragmentação individual

de seus componentes de maneira isolada, tal como

ocorria em momento pretérito. Com efeito, está-se

diante de valores transindividuais, eis que os direitos

abarcados pela dimensão em comento não estão

restritos a determinados indivíduos; ao reverso,

incBRASIL sobre a coletividade. Ao lado disso, os

direitos de terceira dimensão são considerados como

difusos, porquanto não têm titular individual, sendo que

o liame entre os seus vários titulares decorre de mera

circunstância factual.

Nesta feita, importa acrescentar que os

direitos de terceira dimensão possuem caráter

155 BONAVIDES, 2007, p. 569.

Page 223: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

223

transindividual, o que os faz abranger a toda a

coletividade, sem quaisquer restrições a grupos

específicos. Ora, o ideário de solidariedade alberga

justamente um sucedâneo de direitos que contemplam a

coletividade enquanto unidade, não se atendendo a

característicos diferenciadores ou mesmo

particularidades segregadoras. Neste sentido, pautaram-

se Motta e Motta e Barchet, ao afirmarem, em suas

ponderações, que “os direitos de terceira geração

possuem natureza essencialmente transindividual,

porquanto não possuem destinatários especificados,

como os de primeira e segunda geração, abrangendo a

coletividade como um todo”156. Desta feita, são direitos

de titularidade difusa ou coletiva, alcançando

destinatários indeterminados ou, ainda, de difícil

determinação. Nesta esteira de exposição, os direitos em

comento estão vinculados a valores de fraternidade ou

solidariedade, sendo traduzidos de um ideal

intergeracional, que liga as gerações presentes às

futuras, a partir da percepção de que a qualidade de vida

destas depende sobremaneira do modo de vida daquelas.

Dos ensinamentos dos célebres doutrinadores, percebe-se

que o caráter difuso de tais direitos permite a

156 MOTTA, Sylvio; BARCHET, Gustavo. Curso de Direito

Constitucional. Rio de Janeiro: Editora Elsevier, 2007, p. 152.

Page 224: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

224

abrangência às gerações futuras, razão pela qual, a

valorização destes é de extrema relevância. “Têm

primeiro por destinatários o gênero humano mesmo,

num momento expressivo de sua afirmação como valor

supremo em termos de existencialidade concreta”157. A

respeito do assunto, com bastante pertinência, Motta e

Barchet158, em seu magistério, ensinam que os direitos

de terceira dimensão surgiram como “soluções” à

degradação das liberdades, à deterioração dos direitos

fundamentais em virtude do uso prejudicial das

modernas tecnologias e desigualdade socioeconômica

vigente entre as diferentes nações.

Tecidos estes comentários, ao esmiuçar o

corolário da solidariedade intergeracional, também

denominado de princípio da equidade ou princípio do

acesso equitativo dos recursos naturais, salta aos olhos

sua íntima relação com a temática dos espaços

protegidos, eis que configura um dos baldrames robustos

157 BONAVIDES, 2007, p. 569. 158 MOTTA; BARCHET, 2007, p. 153. “Duas são as origens básicas

desses direitos: a degradação das liberdades ou a deterioração dos

demais direitos fundamentais em virtude do uso nocivo das

modernas tecnologias e o nível de desigualdade social e econômica

existente entre as diferentes nações. A fim de superar tais

realidades, que afetam a humanidade como um todo, impõe-se o

reconhecimento de direitos que também tenham tal abrangência – a

humanidade como um todo -, partindo-se da ideia de que não há

como se solucionar problemas globais a não ser através de soluções

também globais. Tais “soluções” são os direitos de terceira geração”.

Page 225: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

225

para a sua estruturação. Afora isso, é possível verificar a

materialização do dogma em comento no caput do

artigo 225 da Constituição da República Federativa do

Brasil de 1988159. Assim, a atual geração, ao instituir

os espaços protegidos, furta-se à sua utilização normal

(aqui considerada aquela utilização encontradiça fora

desses espaços) para garantir as presentes gerações e,

sobretudo, às futuras, o equilíbrio do meio ambiente,

mediante a manutenção da biodiversidade. Logo, a

adoção do termo “solidariedade intergeracional” busca,

justamente, destacar esse elo de responsabilidade da

atual geração pela existência das futuras. Neste sentido,

é possível trazer à colação o paradigmático entendimento

jurisprudencial construído, no qual acena, com clareza

solar, que:

Ementa: Arguição de Descumprimento de

Preceito Fundamental: Adequação.

Observância do princípio da

subsidiariedade. Arts. 170, 196 e 225 da

Constituição da República.

Constitucionalidade de atos normativos

159 BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República

Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 21 jan. 2015: “Art. 225.

Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem

de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,

impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e

preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

Page 226: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

226

proibitivos da importação de pneus usados.

Reciclagem de pneus usados: ausência de

eliminação total de seus efeitos nocivos à

saúde e ao meio ambiente equilibrado.

Afronta aos princípios constitucionais da

saúde e do meio ambiente ecologicamente

equilibrado. Coisa julgada com conteúdo

executado ou exaurido: impossibilidade de

alteração. Decisões judiciais com conteúdo

indeterminado no tempo: proibição de novos

efeitos a partir do julgamento. Arguição

julgada parcialmente procedente. 1.

Adequação da arguição pela correta

indicação de preceitos fundamentais

atingidos, a saber, o direito à saúde, direito

ao meio ambiente ecologicamente

equilibrado (arts. 196 e 225 da Constituição

Brasileira) e a busca de desenvolvimento

econômico sustentável: princípios

constitucionais da livre iniciativa e da

liberdade de comércio interpretados e

aplicados em harmonia com o do

desenvolvimento social saudável.

Multiplicidade de ações judiciais, nos

diversos graus de jurisdição, nas quais se

têm interpretações e decisões divergentes

sobre a matéria: situação de insegurança

jurídica acrescida da ausência de outro meio

processual hábil para solucionar a polêmica

pendente: observância do princípio da

subsidiariedade. Cabimento da presente

ação. [...] 4. Princípios constitucionais (art.

225) a) do desenvolvimento sustentável e b)

da equidade e responsabilidade

intergeracional. Meio ambiente

ecologicamente equilibrado: preservação

para a geração atual e para as gerações

futuras. Desenvolvimento sustentável:

crescimento econômico com garantia

paralela e superiormente respeitada da

saúde da população, cujos direitos devem

ser observados em face das necessidades

atuais e daquelas previsíveis e a serem

Page 227: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

227

prevenidas para garantia e respeito às

gerações futuras. Atendimento ao princípio

da precaução, acolhido constitucionalmente,

harmonizado com os demais princípios da

ordem social e econômica [...] (Supremo

Tribunal Federal – Tribunal Pleno/ ADPF

nº 101/ Relatora: Ministra Cármen Lúcia/

Julgado em 24.06.2009/ Publicado no DJe

em 01.06.2012).

Observar-se-á a existência de duas espécies de

solidariedade intergeracional, tais sejam: uma pautada

na atual geração, denominada, em razão disso, de

sincrônica; e, outra voltada para as futuras gerações,

chamada anacrônica. Com destaque, assinalar faz-se

imprescindível, consoante entendimento explicitado por

Andréia Minussi Facin160, que é possível enumerar três

formas distintas de acesso a bens materiais, quais

sejam: acesso visando o consumo do bem, tal como ocorre

com a captação de água e instrumentos predatórios de

caça e pesca; acesso causando poluição ao meio ambiente,

a exemplo do que se denota no acesso à água ou ao ar,

lançando, para tanto, poluentes ou emitindo poluição

sonora; e, acesso ao meio ambiente para a contemplação

de seus elementos e paisagem. Verifica-se, deste modo, a

160 FACIN, Andréia Minussi. Meio-ambiente e direitos humanos. Jus

Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, 01 nov. 2002. Disponível em:

<http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3463>. Acesso em 21

jan. 2015.

Page 228: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

228

existência do meio ecologicamente equilibrado não se

traduz somente na preservação para a geração atual,

mas, também, para as gerações futuras. Logo, se o

pavilhão desfraldado tremula em direção ao

desenvolvimento sustentável, patente faz-se que a

concepção albergue o crescimento econômico como

garantia paralela e superiormente respeitada da saúde

da população, cujo acervo de direito devem ser

observados, tendo-se em vista não apenas as

necessidades atuais, contudo, também, as que são

passíveis de prevenção para as gerações futuras. Neste

sedimento de exposição, cuida apontar, com ênfase, que

está diretamente vinculado ao corolário em comento o

preceito da precaução, já que a necessidade de

afastamento de perigo, tal como a adoção de

instrumentos que busquem a promoção da segurança dos

procedimentos adotado para a garantia das gerações

futuras, efetivando-se apenas por meio da

sustentabilidade ambiental das nações humanas.

Denota-se, destarte, que o princípio em

comento torna efetiva a busca incansável pela proteção

da existência humana, seja tanto pela proteção do meio

ambiente como pela estruturação de condições que

salvaguardem a saúde e a integridade física,

Page 229: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

229

considerando-se o indivíduo em sua inteireza. Gize-se

que tal fato decorre da nova visão reinante, na qual há

que se adotar, como política pública, o que se faz

imprescindível para antecipar os riscos de danos que

sejam passíveis de materialização em relação ao meio

ambiente, tanto quanto o impacto que as ações ou as

omissões possam produzir. Ora, o artigo 225 da

Constituição da República Federativa do Brasil de

1988161., ao estabelecer o ônus em relação à coletividade

e ao Poder Público, na condição de dever, de defender e

preservar o meio ambiente para as presentes e futuras

gerações, inaugura um dever geral arrimado na

prevenção de riscos ambientais, no patamar de um

ordem normativa objetiva de antecipação de futuros

danos ambientais, os quais encontram como

sustentáculos os dogmas da prevenção, quando tratar de

riscos concretos, e da precaução, quando estiver diante

de riscos abstratos.

No mais, cuida colocar em destaque que a

reserva dos bens ambientais, com a sua não utilização

161 BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República

Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 21 jan. 2015: “Art. 225.

Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem

de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,

impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e

preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

Page 230: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

230

atual, passaria a ser equitativa se fosse demonstrado que

ela ocorrera com o escopo de evitar o esgotamento dos

recursos, com a guarda desses bens para as futuras

gerações. Neste passo, ao se considerar a densidade da

moldura de fraternidade e solidariedade que reveste o

acesso ao meio ambiente, em especial devido ao status de

elemento que assegura o alcance da dignidade da pessoa

humana, considerando o indivíduo em todas as suas

potencialidades e complexidades, não é possível suprimir

que a manutenção da preservação dos bens ambientais

refoge ao ideário ingênuo de meio ambiente intocável,

mas sim lhe confere à contemporaneidade ao tema. “A

equidade no acesso aos recursos ambientais deve ser

enfocada não só com relação à localização especial dos

usuários atuais, como em relação aos usuários

potenciais das gerações vindouras”162.

Com efeito, um posicionamento equânime não

é fácil de ser construído, vindicando considerações

dotadas de ordem ética, científica e econômica das

gerações atuais e uma avaliação prospectiva das

necessidades futuras, nem sempre possíveis de serem

conhecidas e medidas no presente. Neste aspecto, é

162 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental

Brasileiro. 21 ed. São Paulo: Editores Malheiros, 2013, p. 92.

Page 231: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

231

possível colocar em destaque que o aspecto

intergeracional que tende a caracterizar o discurso de

proteção e preservação ambiental ambiciona conferir

concreção ao ideário de solidariedade que caracteriza o

direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado

enquanto direito de terceira dimensão. Supera-se, com

efeito, a essência de individualidade que caracterizou os

direitos humanos, adotados uma ótica na qual a

preocupação com o semelhante, mesmo em se tratando

de uma geração futura, é dotada de grande

proeminência, analisando-se a coletividade na condição

de unidade, na qual cada um dos indivíduos é dotado de

relevância e substancial atenção. Tal fato decorre,

notadamente, do superprincípio da dignidade da pessoa

humana, o qual só alcança sua materialização por meio

da conjunção de inúmeros, porém carecidos, direitos, os

quais, em um fim último, proporcionam a realização de

todas as complexidades encerradas no ser humano.

Ademais, um aspecto característico

proeminente da sociedade contemporânea está

assentado na sua paradoxal capacidade de controlar e

produzir indeterminações. Entrementes, a forma como

esse dever será atendido constitui tarefa inafastável dos

órgãos estatais, os quais dispõem de ampla liberdade de

Page 232: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

232

conformação, atentando-se para os limites

constitucionais consagrados. Com efeito, as mencionadas

determinações constitucionais objetivam evitar riscos,

encontrando assento, para tanto, no próprio Texto

Constitucional, o que autoriza o Estado a atuar de modo

a evitar riscos para o cidadão em geral, por meio da

adoção de medidas de proteção ou de prevenção da saúde

e do meio ambiente, notadamente em relação ao

desenvolvimento técnico ou tecnológico e suas

consequências para as presentes e futuras gerações. No

controle judicial de políticas públicas do meio ambiente,

a atuação do Poder Judiciário deve buscar a garantia,

inclusive, o mínimo existencial ecológico dos indivíduos

atingidos diretamente e indiretamente em seu

patrimônio de natureza material e imaterial, neste

sentido, visando garantir a inviolabilidade do direito

fundamental à sadia qualidade de vida, bem assim a

defesa e preservação do meio ambiente ecologicamente

equilibrado, em busca do desenvolvimento sustentável

para as presentes e futuras gerações.

4 SOLIDARIEDADE ENTRE ESPÉCIES

NATURAIS? O ALARGAMENTO DA MOLDURA

AXIOLÓGICA DO PRINCÍPIO DA

Page 233: Compêndio de Ensaios Jurídicos: Temas de Direito dos Animais - v. 01, n. 01

233

SOLIDARIEDADE AMBIENTAL

Como desdobramento da projeção normativa do

corolário da solidariedade, na órbita ecológica, há que se

estruturar uma solidariedade entre todas as espécies

vivas, na forma de uma comunidade entre a terra, as

plantas, os animais e os seres humanos, visto que a

ameaça ecológica coloca em risco todas as espécies

existentes no planeta, afetando por igual a todos e ao

todo. Neste diapasão, a necessidade de despertar uma

consciência pautada na solidariedade entre as espécies

naturais é despertada, sobremaneira, em decorrência

das ameaças à vida desencadeadas pelo desenvolvimento

civilizatório fazerem com que o ser humano se reconheça

como um ser natural integrante de um todo ameaçado e,

concomitantemente, responsável por tal situação de

ameaça existencial. Segundo Sarlet e Fensterseifer163, a

ameaça de contaminação propicia que o ser humano

perceba que o seu corpo integra parte das “coisas

naturais” e que, em razão disso, está sujeito à ameaça

supramencionada. A construção de tal consciência leva o

ser humano a reconhecer, forçosamente, uma

163 SARLET, Ingo Wolfgang; FENSTERSEIFER, Tiago. Princípios

do Direito Ambiental. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 77.

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comunidade natural, diante da qual o estabelecimento de

um vínculo de solidariedade e respeito mútuo como

pressuposto para a permanência existencial das espécies

naturais, abarcando-se em tal concepção o ser humano.

Em uma perspectiva jurídica, a vedação das

políticas cruéis contra os animais (não humanos)

encontra repouso no Texto Constitucional, reforçando,

portanto, o ideário axiológico de solidariedade entre as

espécies naturais. Mais que isso, ao analisar o

julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº

1.856/RJ, de relatoria do Ministro Celso de Mello, salta

aos olhos a concreção do dogma em comento, em especial

quando a ementa consagra que “a promoção de briga de

galos, além de caracterizar prática criminosa tipificada

na legislação ambiental, configura conduta atentatória à

Constituição da República, que veda a submissão de

animais a atos de crueldade”164. Ora, há que se

164 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido na

Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.856/RJ. Ação Direta de

Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense nº 2.895/98) -

Legislação estadual que, pertinente a exposições e a competições

entre aves das raças combatentes, favorece essa prática criminosa -

Diploma legislativo que estimula o cometimento de atos de

crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei nº 9.605/98,

art. 32) - Meio Ambiente - Direito à preservação de sua integridade

(CF, art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu caráter de

metaindividualidade - Direito de terceira geração (ou de novíssima

dimensão) que consagra o postulado da solidariedade - Proteção

constitucional da fauna (CF, art. 225, § 1º, VII) - Descaracterização

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reconhecer que essa especial tutela, que tem por

fundamento legitimador a autoridade da Constituição da

República, é motivada pela necessidade de impedir a

ocorrência de situações de risco que ameacem ou que

façam periclitar todas as formas de vida, não só a do

gênero humano, mas, também, a própria vida animal,

cuja integridade restaria comprometida, não fora a

vedação constitucional, por práticas aviltantes,

perversas e violentas contra os seres irracionais. “A ideia

de „solidariedade entre espécies naturais‟, portanto,

também pode transportar o reconhecimento do valor

intrínseco de todas as manifestações existenciais, bem

como o respeito à reciprocidade indispensável ao convívio

harmonioso” 165, estendido a todos os seres vivos. Salta

aos olhos, desta feita, que o princípio da solidariedade,

cuja incidência deve ser maximizada em diversos

âmbitos, inclusive na seara ambiental, passa a ser

desfraldado como pilar sustentador das relações

contemporâneas, em sua senda civilizatória,

considerando todas as suas dimensões, a saber:

da briga de galo como manifestação cultural - Reconhecimento da

inconstitucionalidade da lei estadual impugnada - Ação Direta

Procedente. Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Celso

de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Publicado no DJe em 13 out.

2011. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em 21 jan. 2014. 165 SARLET; FENSTERSEIFER, 2014, p. 77.

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