cidadania da mulher- uma questão de justiça

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Maria Avelina Imbíriba Hesketh (Organizadora)

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Monografia premiada

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  • Maria Avelina Imbriba Hesketh(Organizadora)

  • CIDADANIA DA MULHER, UMA QUESTO DE JUSTIA

  • M aria Avelina Im biriba Hesketh(Organizadora)

    CIDADANIA DA MULHER, UMA QUESTO DE JUSTIA

    8^ %

    EDITORA

  • R ubens A pprobate M achadoPresidente da OAB e Presidente Honorrio da OAB EDITORA

    Jefferson Luis KravchychynPresidente Executivo da OAB EDITORA

    Projeto Grfico F. J. Pereira

    Capa e Diagramao Rodrigo Pereira

    Reviso Dacio Luiz Osti

    Conselho Editorial Jefferson Luis Kravchychyn (Presidente)

    Cesar Luiz Pasold H erm ann A ss is Baeta

    Paulo B onavides Raim undo Csar Britto Arago

    Sergio Ferraz

    Ficha Catalogrfca Elaborada pela Bibliotecria Beatriz Costa Ribeiro - CRB-14/647

    H584C Cidadania da mulher, uma questo de justia / Maria Aveiina Imbiriba Hesketh (Org.). Braslia : OAB Editora, 2003.

    184p.

    1. Direito, 2. Direito da mulher. I. Hesketh, Maria Aveiina Imbiriba.

    CDD 340

    ISBN - 85-87260-25-1

    EDITORASAS Q uadra 05 Lote 01 Bloco M - Edifcio OAB

    Braslia. DF - CEP 70070-050 Tel. (61) 316-9600

    www.oab.org.br e-mail: gabpreoab.org.br

    [email protected]

  • SUMRIO

    A PR ESE N TA O ..........................................................................7R ubens A pproba te Machado

    IN T R O D U O .............................................................................11M aria Avelina Im biriba H esketh

    CID A D A N IA DA MULHER,U M A QUESTO DE JU S T I A ............................................... 17M aria Jos de Figueiredo Cavalcanti

    MULHER: CDIGOS LEGAIS E CDIGOS SOCIAIS - O PAPEL DOS DIREITOS E OSDIREITOS DE P A P E L .................................................................75O dila de M lo M achado

    MULHERES: UMA VIDADE LUTAS E C O N Q U IST A S................................................. 135M ariana Oliveira Pinto

    REGIME DE BENS N O CASAM ENTO LUZ DO N O V O C DIGO C IV IL .................................... 163M aria Bernadeth Gonalves da Cunha

    M ULHER DE H O J E .................................................................. 171M aria Regina Purri Arraes

    TICA E PR O FISS O ...............................................................177Rosangela M aria Carvalho Viana K arinne M atos de Lima e Melo

  • 7APRESENTAO

    Em m eados da dcada de 1990, q u a n d o P residen te d o Inst itu to dos A dvogados de So Paulo, escrevi u m artigo sob o ttu lo " A s m u lh e re s n o m u n d o d o D ire ito" , n o qual, a lm de consideraes conceituais sobre a a tuao d as m u lh e res no cam po das a tiv idades jurdicas, m ostrei m inha firm e in d ig n a o d e que, a t aquele m om ento , n e n h u m a m u lh e r c o m p u n h a os q u a d ro s d e ju lgadores do S uprem o T ribunal Federal e d o S uperio r T ribunal d e Justia. Passados quase dez anos d a quele trabalho, a lguns avanos se fizeram, no sen tido de ser reconhecido o profcuo trabalho que as m ulheres das d iversas carre iras ju rd icas vm realizando. Ao ap resen ta r , agora , a edio p ro d u z id a pela Com isso N acional da M ulher A d v o gada , c riada na a tual gesto, perm ito -m e hom en ag ea r todas as a d v o g a d a s b rasile iras na figura m p ar d a C onselheira e p r im eira P re s iden te da C om isso N acional da M u lh e r A d v ogada , c riada nesta gesto, M A R IA A V ELIN A IM BIRIBA H ESK ETH , e todas as dem ais profissionais d as carreiras ju r dicas nas pessoas d as p rim eiras m ulheres a com por as m ais A ltas Cortes de Justia brasileira. M inistras ELLEN G R A C IE do STF; F TIM A N A N C Y A L D R IG H I, ELIA N A C A L M O N ALVES e LA URITA H IL R IO VAZ, d o STJ, q u e queb ra ram barre iras e abriram , po r m ritos prprios, cam inhos, trazer recordao aquele artigo que p ro d u z i h q u a se u m decn io , tra n sc re v e n d o -o , com a d e v id a vn ia , na n teg ra , a saber:

  • 8 CIDADANIA DA MULHER, UMA QUESTO DE JUSTIA

    M s mulheres no mundo do Direito. inconcebvel que, n u m pas com m ais de 150 m ilhes de habitantes, no haja, ainda, u m a nica m u lher no Suprem o Tribunal Federal e nem no Superior Tribunal de Justia. Ao g rande n m ero de m inistros, em am bas as Cortes, que j tm se m anifestado , em pblico o u em particu lar, n o sen tido de profligar a lacuna existente, desejam os som ar a nossa voz. s m ulheres, po r esforo p r prio, foi aberto , nestes ltim os cinqenta anos, am plo espao, an te r io rm en te reservado aos hom ens, tanto na v ida econm ica, p ro d u tiv a , quan to na v ida pblica. N as letras, nas artes, nas cincias, as m ulheres vm recebendo lureas e justo realce. Esse espao foi aberto no po r concesso, m as p o r con quista , n u m a constante, d en odada e sofrida luta contra o p re conceito que, infelizm ente, at hoje se faz p resen te , m esm o nos m ais dem ocrticos m eios de com unicao, referindo-se s m ulheres com o sendo o "sexo frgil". A fora das m ulheres no est nos m sculos, m as no crebro; na extrem a ded ica o; na v o n tade de vencer. Essas so as a rm as u til izadas na ve rdade ira guerra que vm travando, pela justa conquista de espao e pe lo reconhecim ento de seus m ritos po r parte de toda a sociedade. Prim eiro na advocacia e nas letras, depois na m ag is tra tu ra e no M inistrio Pblico, em segu ida nos m eios polticos e econmicos, as m ulheres im puseram -se p re conceituosa estuitice dos que queriam fazer crer serem elas fsica e m en ta lm en te inferiores ao sexo m asculino. A sua m e n o r ap tido fora fsica tem, com o con trapartida , o estoicis- m o, a ag udez de esprito, a inteligncia e a indm ita pers is tncia na consecuo de seus objetivos. A lu ta - sem os "femi- n ism os" - foi e rdua e extenuante. M uito especialm ente do p on to de vista psicolgico: que no inconsciente coletivo de u m a sociedade m ultissecularm ente com andada po r hom ens.

  • APRESENTAO 9

    m u lh e r teria sido reservado u m lugar secundrio , de m era coad juvan te d o com panheiro nos seus xitos, o u fracassos. N esse q u a d ro preconceituoso , as m u lh e res - com especial m eno s advogadas - souberam im por a sua presena. So hoje in fo rm adas e inform atizadas; cultas; firmes; corajosas e b em p rep a ra d as p a ra seus misteres. Esto forjadas, com o se forja 0 ao, j que na sociedade m achista no se exige dos h o m ens ficarem "p rovando" de que so capazes. E o repd io que a inda a lguns setores insistem em lhes devo tar, p ro cu ra n do ocultar o seu brilho, faz com que sejam elas obrigadas a um a constan te necessidade de resplandecer. E com o resp lan decem! A toga ou a beca, vestida po r um a m ulher , parece con trariar as leis d a fsica: a vestim enta escura d a toga ou d a beca em ite LUZ. N o a toga ou beca, m as o crebro da m u lher que a veste, d a n d o form a e fora aos argum en tos que expende. D ela v ida e b rilho p rprio a essas vestim entas param entais. s m ulheres foi reservado o d ivino dom de gerar a v ida. Mas no o fazem s no sen tido biolgico. Elas do vida aos a rg u m entos e s expresses de seus pensam entos. A sua p rpria p e rsona lidade o e loqente sm bolo da v ida. As m ulheres, na advocacia e nas carreiras jurdicas, tm transm itido esse seu p o d e r de da r vida a todos os seus trabalhos. s inm eras m ulheres que, ao longo do tem po, se ded icaram justa con quista desses espaos - a inda in justam ente p equenos - as nos sas hom enagens. quelas que ainda viro, a nossa fraterna acolhida. N enhum a , porm , isoladam ente, deve m erecer h o m enagem especial, p o rque o m aior fulgor de u m a estrela no p o d e e nem deve apagar o das dem ais, sob pena de se perder a viso de conjunto da constelao. A constelao - enorm e - a in da vista e considerada, po r a lguns setores, de form a pe quena. Porque, se m uitos as adm iram , outros o tm feito como

  • 1 0 CIDADANIA DA MULHER, UMA QUESTO DE JUSTIA

    se a constelao p rocurassem no ver. Tm elas, con tudo , luz p rp ria e i rrad iam vida, graa, constncia, fora, firm eza e equilbrio. Vida, graa e constncia ag radam e a traem os olhos m asculinos. Fora, firmeza e equilbrio parecem , porm , fazer com que a lguns olhares se desviem , p rocu ran d o ignor-las. E, se o p rim eiro o lhar de adm irao, o segundo est, a inda, e ivado d o m ultissecular preconceito. N a lu ta p a ra a definitiva superao de to descabidos atos discrim inatrios, neste m o m en to em que estam os beira d o terceiro m ilnio da era crist, que conclam am os os m eios jurdicos e em especial a O r d em dos A dvogados d o Brasil, o Poder Judicirio, o M inist rio Pblico, a reconhecerem o fato bvio de que as m ulheres represen tam , quan tita tiva e qualitativam ente , m etade da p o pulao; a adm itirem a justia de sua luta; a considerarem que o am plo espao conqu is tado d im in u to frente relevante participao fem inina na v ida jurdica. Por isso que re itera m os o b rad o de todas as foras a serem som adas, i rm anadas na lu ta d a igualdade , para verm os, po r justia, nas m ais Altas Cortes, a figura segura, soberana, dedicada , in teligente, pe r sistente, da m ulher, a fim de que os nossos pretrios, em todos os seus g raus de jurisdio, possam contar com o brilho, a cu ltura , o equilbrio, a firmeza e a fora das m ulheres q u e tan to h o n ram e dignificam as nobres carreiras jurd icas que ab ra aram: pelo Direito e pela Justia!"

    Rubens Approbate MachadoPresidente Nacional da OAB

  • 11

    INTRODUO

    N o m uito d istan te , q u a n d o se falava na m ulher , de im ed iato se associava a idia de fitas, rosas, sedas, rendas , laos, saias rodadas, curvas sensuais, d en tro de longu inhos pretos ou fora deles. Associava-se, a inda, lgrim as, frag ilidade, p ro teo e cuidados.

    D iante dessa m agia feminina descendente de Eva, longe de se im aginar a existncia das m os calejadas da M aria, auxiliar domstica; da pele da Benedita, en rugada e tostada, pelo trabalho na roa; da Tereza que, s cinco da m anh, enfrenta duas condues para chegar ao trabalho, aps o prim eiro tu rno d o mstico; d o stress d a Mrcia, para ver cum prida a agenda de executiva; d o corre-corre da Sonia nos corredores do Frum, vencendo prazos e enfrentando juizes e oficiais de justia, e de tantas outras situaes que m arcam a presena da m ulher, como fora p rodu tiva e inovadora, na construo da sociedade.

    Isso porque, o tem po em que as m ulheres saam de den tro da casa de seus pais, passavam para d en tro da casa d o m arido e cu idavam dos filhos... at m orrer, j passou . N aquele tem po, elas e ram tranqilas, devotas, ann im as, eficientes, m as subm issas.

    V oltando na histria, na Rom a A ntiga , q u a n d o a ptria corria perigo, em apoio aos seus hom ens e m aridos, as m ulhe-

    Em Grandes Discursos da Histria, de Hernni Donato, Ed. Cultrix, So Paulo, pg. 17.

  • 1 2 CIDADANIA DA MULHER, UMA QUESTO DE JUSTIA

    res contribu am para o sucesso da guerra , com u m a parcela de sacrifcio pessoal; quan d o havia necessidade de acalm ar a fria dos deuses, p o r qua lquer razo, a parcela de sacrifcio delas era m aior; du ran te as guerras havia necessidade de re forar o n im o dos soldados, dando-lhes segurana e m ostrando aos cus q ue as m ulheres con tinuavam castas, m o d es tas e pudicas; enquan to o inim igo rondasse a m u ra lh a e os deuses n o m u d asse m o destino da guerra , com o sacrifcio, as m ulheres , n om eadas p rocuradoras d e seus hom ens d ian te do juzo e da ira celeste, deveriam privar-se de qualquer m eio de conduo, transitavam unicamente a p, no usavam adornos, nem tecidos de cores, pois s podiam se vestir com roupas escuras. Era a Lei Oppia.

    Irresignadas, as m ulheres foram s ruas, levan taram -se em m ovim en to de presso sobre o Senado e consegu iram revo gar a Lei O ppia , no ano 195 a.C.

    Ento Marco Prcio Cato^, censor de Roma, h o m em duro , eruditOy visionrio e p reocupado com aquele m ov im en to das m ulheres, p roferiu o seguin te discurso:

    "Senhores:Se cada um de ns tivesse sabido conservar a autoridade e

    os d ireitos do m arido, no interior do lar, no teram os chegado a este ponto .

    Eis exa tam en te onde estam os neste m om ento: aps haver an iqu ilado nossa liberdade de ao em fa m lia , a tirania das mulheres est pron ta a destru-la tam bm no Senado.

    Lembrem-se do grande trabalho que tem os t ido para m a n ter nossas mulheres tranqilas e para refrear-lhe a licenciosi- dade, o que suceder, daqui por diante, se ta is leis fo re m revo-

    ^ Idem, pgs. 15/16.

  • INTRODUO

    gadas e se as mulheres se puserem, legalm ente considerando, em p de igualdade com os homens!

    O s senhores sabem como so as mulheres: fa a m -n a s suas iguais e im ed ia tam ente elas querero subir s suas costas para govern-los. Acabarem os por a ss is t ir a isto: os hom ens do m undo inteiro, que so hom ens que governam as suas m u lhe res, serem governados pelos lnicos hom ens que se deixam g o vernar pelas suas mulheres - os rom anos."

    Cato tinha razo. N o quanto subm isso da m ulher, mas, p o rque v islum brava que no fu turo a m ulher conquistaria , pela sua capacidade, o poder, sob qua lquer de suas formas.

    Reagindo a essas postu ras, de form a isolada ou em m ovim entos organ izados, a luta pelos Direitos da m u lh e r pau la ti n am en te recrudesceu, e, o m ovim ento fem inista d o sculo XX, com o resu ltado desse em bate m ilenar, rep ag in o u a histria da m ulher.

    Assim , a O rd e m Jurdica Internacional e, particu la rm ente , a d o s p a se s oc id en ta is , rec o n h eceu a C ID A D A N IA D A M U LH ER e, s ina lizando a segurana jurd ica d a regra d e que h om ens e m ulheres so iguais em d ireitos e obrigaes, levou a crer que n ada m ais precisaria ser feito, p o rq u e a conquista d o Direito no rm atizado teria o pod e r de m odificar o corao, a conscincia e a v ida do seres hum anos.

    Qui fosse possvel! A d u ra rea lidade m ostra as rom anas e os C ates de ontem , com u m a ro u p ag em con tem pornea . E a despeito da repaginao da m ulher, a im prensa de la ta as dores e os receios que m u d aram apenas de tem po e lugar.

    A ssim , su rp re e n d en te m e n te , no ano de 1998 d.C., p o r ta n to, 2.193 anos aps C ato, a m esm a p reocupao . A revista V eja , na ed io de 25 de fevereiro, adverte : O s H om ens que se Cuidem.

  • 1 4 CIDADANIA DA MULHER, UMA QUESTO DE JUSTIA

    E os registros policiais, os dados histricos e estatsticos contam situaes m ais do loridas do q ue aquela da Rom a A n tiga. Em todos os pases da Am rica Latina e Caribe, m ais de setenta po r cento da violncia contra a m u lher dom stica e p e rp e trad a po r m aridos, com panheiros, pais e irm os; os n veis salariais d as m ulheres m ais baixo d o que o dos hom ens, a t em pases d o p rim eiro m u n d o , como Estados U nidos, Japo e A lem anha; em algum as c om unidades africanas, as m u lheres so desclitorizadas; o acesso ao poder, sob q ua lque r de suas form as, v isivelm ente boicoitado etc.

    Pois bem. Essa igualdade jurdica que tem assegu rado ta n tos avanos na c idadania da m ulher, no consegu iu vencer, a inda, a d es igua ldade da vida, que sentida na a tua lidade , independen tem en te de pases, econom ias e ndices de d esen vo lv im ento hum ano . A des igua ldade real em todas as cam ad as sociais, esferas de trabalho, categorias profissionais e representao poltica, pondo-se a exigir, p o r responsab ilida de histrica, m ed id as afirm ativas v isando refrear e m in im izar os efeitos perversos desse descom passo.

    Portanto , sensvel a essa realidade, e ac red itando na tran s form ao evo lu tiva da sociedade, o Dr. R ubens A pprobato M achado, corajoso Presidente d o C onselho Federal da O rdem d os A dvogados d o Brasil, em sintonia com a h istria , criou a C N M A - Com isso Nacional da M ulher A dvogada, a qual vem d esenvo lvendo u m trabalho voltado p a ra form ar u m a g rande rede de conscincia da m u lher advogada, sobre a potenciali- zao de seus direitos, como retorno social.

    Assim , o resu ltado d o I Concurso de M onografia Jurdica, in titu lado C idadan ia da M ulher - U m a Q uesto de Justia, realizado pela CN M A , u m dos fru tos dessa conquista da m u lh e r advogada. Dos quinze trabalhos apresen tados, tem os

  • INTRODUO

    a alegria de publicar, jun tam ente com as reflexes das com pa nhe iras M aria Bernadete C unha e M aria Regina Purri Arraes, os trs vencedores: "M ulheres, u m a Vida de Lutas e C onqu is tas Profissionais", da es tudan te M ariana O liveira Pinto; "C id a d an ia da M ulher, u m a Q uesto de Justia", de M aria Jos de F igueiredo Cavalcanti, e "M ulher: Cdigos Legais e C d igos Sociais - O Papel dos Direitos e os Direitos de Papel" , de O dila de M lo M achado, am bos na categoria profissional.

    Tais trabalhos d iscu tem a c idadania da m ulher , no, a p e nas, com o u m direito fundam en ta l d isposto na O rd em C onstitucional, m as como o d ire ito da m ulher ser u m ser q u e tem von tade . V ontade no apenas de chorar, am ar, ser conqu is ta da, parir , receber rosas, cobrir-se, sedu to ram en te , com ren das, sedas e saias, longas, curtas ou rodadas, de ser feminina

    m as v o n tade de ser c idad e ver reconhecido seu d ire ito de ser m u lher , na d im enso do biolgico, do social e d o poltico; de ver respe itado seu direito de gritar, de d izer no , de d izer sim, de pro testar, escolher e lutar; de partic ipar do processo de construo da h u m an id a d e e constru ir sua p rp ria h ist ria e iden tidade , de form a real, sem traum as e e spon tanea m ente. De ser m ulher, d e ser parceira, com panheira e cm p li ce do p r p rio hom em , partilhando com ele, po r inteiro, com respeito e in tegridade , um a vida de sonho e realidade.

    C om estas palavras, a C om isso N acional da M u lh e r A d vogada en trega com un idade jurdica o livro C ID A D A N IA D A M U LH ER, U M A Q U E ST O DE JUSTIA.

    Maria Avelina Imbiriba HeskethPresidente da Comisso Nacional da M ulher Advogada

  • 1 7

    C ID A D A N IA D A MULHER, UM A QUESTO DE JUSTIA

    M aria Jos de F igue iredo C avalcanti

    INTRODUOO escoro em tem a dessa vastido e p ro fu n d id a d e especu

    lativas levou-m e a percorrer u m cam inho que se b ifu rca em dois. O p rim eiro , se reveste d a anlise filosfica d o con tedo p lacentrio d o Direito Positivo, form alista e dogm tico , que vige p o r u m de te rm inado espao de tem po e em u m a d im e n so espacial. Ou, em ou tras palavras, ver-se- o tem a incurso no Direito do d ev e r-se ra o qual se con trape o Direito d o ser e q ue p o r essa razo m esm a suscetvel de ser red iscu tido em nvel de instncia filosfica.

    D estarte, faz-se aqui u m exam e crtico desse preceiturio positivo a oferecer n o rm as de condu ta aos p ro b lem as de con vivncia e respostas problem tica da m ulher , em vrias e ta pas da H istria da H um anidade .

    Portanto, coteja-se o ideal de justia, no pertinente, em pocas diferenciadas. E o procedimento aqui adotado trazer colao vrios exemplos de m ulheres que rom peram com o status quo e decidiram viver o outro lado dessa rup tura , a despeito da contrapartida que se lhes ofereceu em term os de punio ou at de transm utao de sua condio de integrante d o sexo feminino.

  • 1 8 CIDAOAN/A OA MULHER, UMA QUESTO DE JUSTIA

    Especular a essncia da Justia no que tange aos d ireitos d as m ulheres, n as m ais d iversas fases da H u m an id ad e , foi o nc leo d e nosso in tento ao realizar esta m onografia .

    As m u d an as nessa seara so palpveis, e isso vem se de sencadeando desde os clssicos pensadores at aos nossos dias.

    M etodologicam ente, a viso dogm tica d o Direito ser con trastada pelo estofo filosfico da no rm a jurdica, este, cambi- an te e de e terna discusso, e aquela, fixada em critrios de perm anncia .

    A "experincia" d o Direito conduz a cam inhos to rtuosos em face d e um a anttese constante en tre a dogm tica jurdica e a h isto ric idade d o ser hum ano.

    Q u a n to se g u n d a tr i lha p e rc o rr id a - na v e rd a d e en tre - c ru z a n d o -se com a p r im e ira - d iz re sp e ito p o lit izao do D ireito , em es tg io pos te r io r , p rocesso esse em q u e as m u lheres fazem H is t r ia e assim c o n tr ib u em com conte dos concretos p a ra a in sero de les n o n o v o con tex to d o D ire i to. O ferece-se , assim , u m a n ova a rg am assa p a ra q u e se efe tu e o D ireito d e n tro d as rea lid ad es sociais n a q u e le m o m e n to, g e ra n d o n ova ideao de D ireito-Justo, em m o m e n to s c ruc ia is da m a io r significao. E, e v id e n te m e n te , g i ra n d o o eixo da H ist ria .

    Caso assim no fosse, teram os to-som ente u m ideal u t p ico , i r re a l iz v e l , u m a in cu a voeis, e n g e ss a n d o avalorao com o ideao, em choque com as cam biantes circunstncias da vida.

    s ana lisa r a cam inhada de conquista dos d ire itos da m u lher p a ra que se afira a consistncia da afirm ao de que a V ida Humana objetivada desborda na p rem ncia d a m u d a n a dos valo res da v ida e, conseqentem ente, daqueles referidos Axiologia Jurdica.

  • CIDADANIA DA MULHER, UMA QUESTO DE JUSTIA

    nessa d ispu ta en tre idealidade e rea lidade que o Direito recolhe os con tedos concretos que revestem a aven tu ra h u m a n a n o c r i a r n o v o s v a lo r e s , n o v o s m o d e lo s , n o v o s parad igm as.

    CAPTULO 1 DIREITOS COMO JUSTIA - QUAL JUSTIA?

    A considerar toda a h istria de conquista dos d ire itos das m u lh e r e s e a te r c o m o p a n o d e fu n d o essa q u e s t o na lobregu ido em que a m esm a se desenvo lveu len tam en te ao longo dos sculos, h que se considerar aqui u m corte episte- m olgico a fim de que se d istinga o conceito de justia com o algo m ateria l e que vem se substancia lizando ao correr dos tem pos. Essa linha m etodolgica certam ente considerada em cotejo com o conceito de justia form al, que se desenvolveu igualm en te em pretrito m ais acum ulado no m bito d o es tu do d o Direito e da Moral, com o estudos ideais, prospectivos, m as d istanciados de u m a realidade v ivenciada e experienciada no Ser (na realidade), em relao ao Dever-Ser do Direito e da filosofia da Moral.

    A ssim que no processo histrico, n o q u e d iz respeito posio da m u lher a ssum indo espao pblico, existem m u itas contradies, pois o p ensam en to h u m an o nessa seara p e r corre u m cam inho linear, po rm de lu tas en tre a cognoscibili- d a d e do dogm atism o, a pa r de um a estim ativa jurdica que p re s su p u n h a a m u lher com o sexus imhecilitater, e to-som ente procriadora , sexo fraco e a priori sexo d e p e n d en te em face de u m a leitura patriarcal da sociedade, que in fu n d iu aos sculos subseqen tes u m a invarivel in terpre tao de cdigos s im blicos de tr im en tosos ao sexo feminino.

  • 2 0 CIDADANIA DA MULHER. UMA QUESTO DE JUSTIA

    N a v erdade , na lgica do Direito, apenas p a ra falarm os do sen tido jurd ico da justia, como conceito filosfico traba lha do e h a u r id o pela Civilizao H um ana , perm ito -m e d izer que a e iucubrao do significado de justia de term inou a priori um a idia de u m direito den tro de u m a tica dogm atista , ou seja, de u m d ogm atism o jurd ico vivenciado p o r sculos, e alicerce constru do p a ra a recepo d o Direito Positivo.

    E no h q ue se desprezar, aqui, esse p rim eiro sen tir do ser hu m an o , na busca e apreenso desse valor, q ue a igualdade , linha-m estra da especulao dos p rim eiros filsofos, p e n sa dores d a m atria . E aqu i se recolhe a idia do un iversa l q u a n do se investiga o conjunto d o m u n d o que nos cerca. em to rno desse ncleo - un iverso e a sua variegada com plex idade - que o D ireito com o Cincia especulativa vai b uscar na Filosofia os artefatos ideais para a construo de seus conceitos de ig u a ld a d e e de justia , ou m elhor, da justia , cuja essncia se revela na ig ua ldade .

    1.1 - A que regio da filosofia do direito pertence a igualdade

    A histria da idia form al de justia, com o valor jurd ico e de n a tu reza especulativa, veio, no am anhecer da filosofia, dos pitagricos, com o, alis, nos ensina RECASENS STCHES.'

    Segundo aqueles, o conceito de justia est atrelado a um a relao de igualdade. E que aquela se traduz em m edida e em forma matemtica, ou seja, "a justia um nm ero quadrado '\^

    o conce ito p itagrico de jus iia est explanado em Luis Recasens Siches, in: Tratado G enera l de F ilosofia dei Derecho, 7. ed. M xico/DF; Editoria l Porrua, 1981, p. 482.2 Aqui Recasens S iches c ita Aristte les, a tribu indo a frase a P itgoras. Ibidem, p. 482.

  • CIDADANIA PA MULHER, UMA QUESTO DE JUSTIA

    Portanto , estabelece-se, com a justia, u m a relao de iguald a d e en tre as pessoas, sendo estas ltim as os term os da rela o. E n t o , d e n t r o d e u m a p e rs p e c t iv a p o r a s s im d iz e r cabalstica, Pitgoras con tinua afirm ando que o n m ero q u a tro u m esp lnd ido exem plo de ha rm on ia e que, portan to , este valor regu lador de relaes, que limita o ilim itado e iguala o desigual. D estarte, consideram os p itagricos o q u a d ra d o geom trico com o a im agem da justia, p o rq u e tem ele quatro lados iguais.

    N a v e rdade , estabelecia-se, a, um princp io filosfico que seria re to m ad o em in terpre tao m ais ab rangen te e a p ro fu n d a d a p o r filsofos que v iriam em linha diacrnica d o s tem pos, quais sejam, sobre tudo , P lato e Aristteles.

    Q ua is as contribuies adv indas desses p ensado res no to cante ao incansvel desvelam ento d o conceito d e igualdade? E a que serve ele m ulher?

    Sabe-se que Plato erigiu o conceito d e justia com o sendo u m a v ir tu d e universal, da qual todas as dem ais v irtudes p ro vm. Todavia, a dik um valor, o qua l d iz respeito originari- am ente a u m a transgresso que m erecia com pensao . m e d id a que o regim e poltico m u d a os seus caractersticos que envo lvem u m a sociedade aristocrtica, d esb o rd a n d o na d e m ocracia, a justia passa a ser inco rporada sociedade, com o valo r un iversa l e trad u z id a na lei escrita, na nmos, a a ting ir a todos que e ram discip linados p o r essa lei.

    Por ou tro lado, tal va lo r no se inco rpora to ta lidade d a quela sociedade, sab ido que a c idadan ia era restrita a alguns atenienses, excludos vrios segm entos, com o o das m u lh e res, o dos estrangeiros e o dos servos. O reg im e dem ocrtico grego, assen tado n a dem ocracia dire ta , t inha as su as peculia r idades, pois a dem ocracia era p lena ou lim itada , o u com o no

  • 2 2 CIDADANIA DA MULHER. UMA QUESTO DE JUSTIA

    caso das m ulheres, no existia. H avia u m d iv iso r de guas e essa incapacidade relacionada m u lher tinha a sua base ideo lgica, at m esm o em ARISTTELES, ele que tam b m no era considerado c idado ateniense po r ser meteco (estrangeiro).-^

    A filosofia aristoteliana que v inda pos te r id ad e calou o s e n t id o d e ju s tia n o D ire ito de n o sso s d ia s , co m o q u e d o g m atizo u os conceitos de justia d is tr ibu tiva e justia corretiva, esta ltim a subd iv id ida em justia com utativa e justia judicial, o u judiciria.

    V -se, a s s im , q u e o co n c e i to d e ju s t ia , d e s d e o seu nascedouro , vem se m etam orfoseando em face d e avanos cientficos d e ou tras disciplinas, inclusive d o cam inhar da p r p ria Teologia, esta, que em u m m o m en to d a h u m a n id a d e consubstanciava-se no p r p rio Direito o u este se encontrava com aquela de form a inconfundvel, pois o ram o d o pod e r civil achava-se um belicaim ente un id o ao p o d e r de d ize r as "verdades absolu tas" fora d o contexto da noo de DEUS. N a v e rdade , a l inguagem que e m pedern iu as m en ta lidades dizia respeito a calar a m ulher, pois se fazia coro d o verso d o poeta que, " u m m odesto silncio a honra da mulher".**

    Contextualizava-se a questo tem poral - social, econm ica, poltica - com as grandes indagaes teolgicas, a d espe i to de q ue a idia central de justia no im plicava em m u d a r a3 Aristteles era macednio; em havendo fundado o seu Liceu, lucubrou as suas idias filosficas e polticas, mxime as contidas em A Poltica, na qual categoriza a condio de ser humano em an im a l c v ico , o que mostra a aptido natural do humano de viver no seio da Cidade. Sabe-se que o seu sucessor no Liceu foi Teofrasto, tambm no-cidado ateniense. A posse do terreno onde se situava a Escola Peripattica s foi possvel graas influncia de Demtrio, este, cidado ateniense. Sobre essa sucesso e o fato aludido, ver Luciano Canfora, in: A B ib lioteca D esaparec ida- Histrias da Biblioteca de Alexandria, trad, de Federico Carotti, So Paulo; Companhia das Letras, 1989, pp. 29/32.

    A frase refere-se citao feita por ARISTTELES e atribuda a Grgias. Ver Aristteles, in: A Poltica, trad, de Roberto Leal Ferreira, 2, ed. So Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 36.

  • CIDADANIA DA MULHER, UMA QUESTO DE JUSTiA

    cultura da m isogenia ou do antifem inism o (para u sa r de um a expresso m oderna), ou, em ou tras pa lavras, ten tava-se a p a gar qua lque r vestg io de u m a era que p o rv e n tu ra possa ter existido em que a m ulher situava-se em u m p lano de poder po r a lguns considerado de era matriarcal; ou, em tem pos mais recentes, a adorao de deusas com o era o caso da venerao d o s egpcios antigos Isis , deusa poderosa p o r h a v e r liberta do o seu filho H orus de toda a m aldade que lhe havia infligido o irm o Seth aps haver m atado o seu pai, Osris.

    O Direito rom ano ap ropriou-se da filosofia grega a fim de sis tem atizar e d a r epnstme aos seus institutos. U m deles, o da justia, referia-se ao ius simm ciique tribuere, conceito formal q ue tra d u z u m a idia de m edida , ou seja, d a r "a. cada u m o q ue lhe de direito". O que significa seguir de volta o cam in h o p a ra Aristteles.

    A partir da especula-se igualmente se esse direito resultan te d e norm as jurdicas positivas ou de princpios jusnaturalistas, isto , se esse conhecim ento est relacionado a u m a regra de d ire ito natu ra l, o u a u m a n o rm a de direito escrito.

    O brocardo jurdico antes enunciado, atribu do a ULPI ANO, d nova d ire triz ao cham ado direito na tu ra l que p assa a ser en ten d id o com o u m conjunto de leis d a na tu reza , q u e im pele os h om ens a de te rm inadas aes. E aqui estam os apenas d i an te de aes m ecnicas com o a procriao, p ropagao da espcie etc. Trata-se, antes, de um a d e tu rpao d o sen tido ou a inda da p rim itiv idade do conceito que veio a ser reform ulado po r Justin iano, ao ser im prim ido naquele u m car ter claram en te teolgico, ou seja, tal espcie de d ire ito p rom ana de DEUS, po rtan to , con tem porneo d o hom em desd e sem pre.

    N essa linha de raciocnio v-se que a ig u a ld a d e de todos os h o m en s p e rm anece v incu lada condio de direito. N o

  • 2 4 CIOADANiA DA MULHER, UMA QUESTO DE JUSTIA

    entre tan to , no tocante m ulher, o d ire ito na tu ra l pe rm aneceu restrito n a tu reza p rop riam en te dita , ou seja, a m u lh e r na sua m isso de rep roduo do gnero hum ano .

    CAPTULO 2 CIDADANIA PARA CERTAS FUNES; A MULHER VIRIL

    A cidadan ia sem pre esteve ligada questo d o poder. Foi assim no Egito Antigo, na Grcia Clssica e em Rom a, sem falarm os n o p o d e r da Igreja Catlica d u ra n te toda a Idade M dia.

    O domus e ra espao quase sagrado na Rom a Antiga. Era den tro dele que se exercia o am plssim o pod e r d o paterfamilias. O patria potestas era de um a grandeza absoluta. A brangia o pa trim nio , os filhos, a m u lher casada ciim manu, pois o casa m en to sine manu deixava a esposa sob o p o d e r d o pater da famlia de que p rovinha . Portanto , a incapacidade civil e po ltica da m u lher era absoluta.

    O fato curioso que a m u lher para a d q u ir ir u m a certa lib e rd a d e - e a ns consta tam os u m a "c idadan ia" incipiente - deveria ela dirigir-se s organizaes religiosas para u m a vida conventual. Foi assim em Roma, foi assim d u ra n te toda a Ida d e M dia e inclusive em tem pos m ais recentes.

    A v ida consagrada religio trouxe u m espao pblico m ulher , este que lhe era in te iram ente defeso. A m u lh e r ao abraar o Sacerdcio passava a gozar de d e te rm inados p r iv i lg ios d a esfera m asculina, como o a p ren d e r a ler e a escrever e a d a r vazo sua in te lectualidade etc. As Vestais em Roma, p o r exem plo, pod iam tes tem unhar em tribunais , fazer testa m ento , d isp o n d o livrem ente de seus bens, d ire itos esses ne g ados s m atronas. E mais: an d av am nas ruas p reced idas de

  • CIDADftN'AOA MULHER, UMA QUESTO DE JUSTIA

    lictor (oficial rom ano que acom panhava os magistrados).-" N o en tre tan to , para que assim fossem reconhecidas, o seu status sexual era com parado ao do hom em , po r tan to referida ao a r qu tipo viril.^ Afora as restries que lhes e ram exigidas, to das d e n a tu reza fisiolgica: no terem defeitos fsicos, p e rm a necerem virgens etc.

    A m u lh e r qualificada para partic ipar do espao pblico, u sa n d o o seu intelecto, deveria ser equ iparada ao hom em , o que se constitu a u m "encm io", p o r ser-lhe reconhecida essa capacidade.

    Foi assim que por interm dio de um am igo Cristina de Pisan (1364) foi reconhecida pela sua p reparao intelectual em cop ia r m anuscritos e em realizar escritos, inclusive po rtadores de reclam aes de m ulheres. O elogio pa rt iu de seu am igo Joo G erson ao afirm ar que Cristina era insgnis femna virilis femina (m ulher insigne, m u lher viril). Era necessrio atingir essa condio e ser reconhecida com o tal a fim de que fosse possvel 0 exerccio de certas capacidades.^

    Foram necessrios alguns sculos p a ra que "o d ire ito da m u lh e r a ser va lo rizada e educada livre de p a d r es estereo tip ad o s de com portam en to e costum es sociais e cu ltu rais base ados em conceitos de inferioridade ou subordinao" fosse p roc lam ado e respe itado pelo Estado e pela Sociedade.

    ^ Do que se deduz que o seu status era comparado ao dos magistrados, A sua impodncia era tamanha que a elas eram confiados os segredos dos particulares, e s vezes at mesmo os do Estado.

    Sobre as vestais, ver Santiago Montero. in: Deusas e Advinhas - Mulher e Adivinhao na Roma Antiga, trad, de Nelson Canabarro, So Paulo: Musa Editora. 1998, pp. 86-88.' Ver Jos Rivair Macedo, in: A mulher na Idade Mdia. 5, ed. (rev. e amp.). So Paulo: Editora Contexto, 2002, pp. 93-97.

    Conveno Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violncia Contra a Mulher - Art. 6, "b". promulgada pelo Decreto n 1.973. de 01/08/1996, publicado no DOU de 02/08/1996, pp. 14470-14473.

  • 2 6 CIDADANIA DA MULHER, UMA QUESTO DE JUSTIA

    E obviam ente pelo conceito da igua ldade e da eq idade, no se haver de educar as m ulheres apenas para serem v ir tuosas, com o queria ARISTTELES; e, sim, tam bm p a ra serem partic ipa tivas d o processo poltico, at p o rq u e a noo de justia, hoje, lida sob ou tro ngu lo a fim de ver a m u lher com o o O u tro da parcela da H u m an id ad e , ou seja, o tem a da im agem de DEUS, no ser hum ano , assum e h od iernam en te um ca r te r antropolgico , a se ve r a a id en tid ad e h u m a n a da m u lh e r em sua relao de a lteridade com o hom em .

    D epreende-se que o carter dogm tico de justia se im p u n h a na Sociedade a ser v iv ido como ideal jurdico-poltico nas sociedades que nos antecederam .

    A p a r , e contrad itoriam ente , de u m elucubrao b rilhante do con tedo da justia d istributiva,^ ARISTTELES exorta va que: "... a tem perana e a justia diferem at en tre pessoas livres, das quais u m a superio r e a ou tra inferior, po r exem plo, en tre h om em e m ulher. A coragem de u m h om em se ap ro xim aria da pus ilan im idade se fosse apenas igual de u m a m ulher , e a m u lher passaria p o r a trev ida se no fosse m ais rese rvada d o que u m hom em em suas palavras

    C om isso se v q u e o p r p r io conceito de justia sofre gradao e tonalidades, haja vista que, m esm o entre as pesso as livres, h desigualdades. A pus ilan im idade d iz respeito m ulher; o a trev im ento , ao hom em . Ao hom em , a virtude; m ulher, conferida a honra.

    Esses dois vocbulos sofreram m udanas em sua sem nti-

    Em Aristteles, a idia de justia distributiva, a qual integrou o Direito e hoje um ideal igualmente de natureza estruluralmente poUlica, aplica-se diviso das honras e dos bens pblicos e se direciona ao objetivo de que cada cidado receba dessas honras e bens a poro adequada a seu mrito com o qual se afirma o princip io da igualdade.

    Ver Aristteles, op. c i l , p. 51. O destaque na citao meu.

  • CIDADANIA DA MULHER, UMA QUESTO DE JUSTIA

    ca, pois na linguagem dos esteretipos existentes en tre os sexos, aqueles vocbulos de significados p assa ram a significan- tes, isto , a v irtude um a pa lavra que den o ta coragem , v a lentia, fora, v igor m asculino, enquan to a h on ra passou a tra d u z ir o pape l que a m u lher deveria exercer com relao ao seu com portam en to p rivado e pblico. A hon ra a tr ibu to da n a tu reza fem inina. A justia form al descurou-se , pois o d ire ito escrito estabelecia a igualdade jurdica, m as n o hav ia um a p restao positiva no p receiturio jurd ico-positivo no sen tid o de d a r cum prim en to ao estabelecido dogm aticam ente . Isso q u e r d izer q ue a rea lidade que circundava a lei era outra.

    M esm o as m ulheres que escreviam sobre as pessoas d e seu sexo - mulher viril - eram em sua m aioria consideradas rigorosas em suas prdicas e enunciados, ao se referirem m ulher.

    A p rpria Cristina de Pisn, c itada linhas atrs, vista por LEILA M EZA N ALGRANTI com o au to ra rigorosa em seus preceitos sobre a m ulher. Diz essa Autora: "O livro d e Christine de P izan, escrito no incio d o sculo XV e d irig ido s m u lh e res de todas as origens e classes, rene u m conjunto d e a d ver tncias sobre a condu ta e a m oral fem ininas, e n a d a deixa a desejar frente severidade dos conselhos m asculinos

    A hon ra explicitam ente um substan tivo d u p lam e n te fem inino: pela sua etim ologia e pela l inguagem constru da so b re o im aginrio social da poca. E mais: v incu lado sexualid a d e da m ulher. Da, o que no de a d m ira r q ue na prxis da legislao pena l brasileira, "na legtim a defesa da h o n ra" , foi estabelecido um costum e em que esse conceito d iz respeito no a u m a v irtude pessoal, m as ao c o m portam en to sexual fe-

    " Sobre o conceito de honra da mulher colonial brasileira ver Leila Mezan Algranti, in: Honradas e Devolas: Mulheres da Colnia - Condio feminina nos conventos e recolhimentos do Sudeste do Brasil, 1750 - 1822. Rio de Janeiro: Jos Olympic, Braslia: Edunb, 1993, Captulo 3, pp. 109-156.

  • 2 8 CIDADANIA DA MULHER, UMA QUESTO DE JUSTIA

    m inino , que desborda pa ra o espao pblico m asculino, sen d o rejeitado pelo que se considera u m desvio de co m porta m en to social, p o r es ta r l igado ao adu lt rio fem inino . Pelo m enos, esse conceito vigeu po r m uito tem po.

    Fala-se igualm ente d o rigor com que tra tou as m ulheres H ildegard Von Bingen, apontada como um a m ulher que foge aos padres culturais da poca em que viveu. Foi abadessa de u m mosteiro beneditino, no sculo XII, na Alemanha, e que exerceu um a forte influncia sobre as lideranas de seu tempo.

    Q u a n d o se levantou a questo de que H ildegard escrevia a len tados livros, livros q ue m arav ilhavam e q ue e ram p ro d u to de revelao divina, foi tal fato levado ao Papa, o qual d e s ignou u m a com isso que exam inaria o fato in locum. Consta que em pa lavra d irig ida ao Papa A nastcio IV, H ildegard te ria im precado que o Sum o Pontfice estava neg ligenciando a rgia virtude da justia.^

    '2 0 costume vem de muito longe em projeo de tempo passado. As Ordenaes Filipinas concediam ao marido da adltera o direito de a matar, havendo de ser a morte civil ou natural, a depender das circunstncias. (Livro 5, Ttulo XXV). Igualmente 0 marido podia matar o adltero, desde que esteja certo que ambos cometem adultrio. Na hiptese de flagrante delito ou em decorrncia de deciso judicial que aplicasse a pena de morte mulher adltera, todos os bens dela revertiam a favor do marido. (Livro 5, Ttulo XXV).

    Hildegard escreveu muito. Dizem que o Convento por ela fundado no monte Rupert, em Bingen, Alemanha, tornou-se a sa la de espera da E uropa e que pessoas proeminentes da poca vinham aconselhar-se com ela: papas, bispos e prncipes, Cfr Kurt Allgeier, In: Receitas Milagrosas de Mdicos e Msticos - Remdios Naturais de Dois Milnios. Trad, de Clia Maria Wrth Teixeira, [s. local]: Editora Tecnoprint, 1986, p, 61. Ainda sobre Hildegard Von Btngen, ver Jos Rivair Macedo. In: A M ulher na Idade Mdia, 5. ed. (rev. e amp,). So Paulo: Contexto, 2002, p. 87. Igualmente, com a informao de que Hildegard foi estigmatizada por criar problemas em funo de sua inteligncia e de suas idias e em face disso haver sido-lhe negados os sacramentos por seis meses, retirando-lhe, tambm, o direito de ser musicista, ve r Peter Stanford, In: A Papisa ~ A Busca pela Verdade Atrs do Mistrio da Papisa Joana. Trad, de Mrcia Frazo, Rio de Janeiro: Gryphus, 2000, p. 131. E com a conotao de que Hildegard von Bingen adotou a doutrina de Agostinho quanto ao pecado original, e tambm fazendo aluso ao livro sobre medicina natural escrito por aquela Abadessa, no que tange questo da contracepo, ver u ta Ranke- Heinemann, In: Eunucos Pelo Reino de Deus Mulheres, Sexualidade e a Igreja Catlica, 3. ed. Rio de Janeiro: Record - Rosa dos Ventos, 1996. pp. 199 e 216.

  • CIDADANIA DA MULHER, UMA QUESTO OE JUSTIA

    O discurso da justia im prim ia a d es ig u a ld ad e en tre os sexos, ao m esm o tem po que se deb la te rava sobre u m conceito p u ram e n te dogm tico e de justia terrena. H ildegard v iveu en tre 1098 a 1179, m ais d e um sculo an te s d e T om s de A quino , p o rm a Teologia, p ro d u to ra d o Direito d e ento, v ivia a florescncia da Patrstica, que exaltava o pecado original, a q u e d a d o ho m em e com fortes acentos d o conceito m aniquesta , do bem e d o mal.

    O ra , a c u ltu ra re lig iosa ag o s tin ian a im p re g n o u o D ireito e a se seg u e u m esforo de t ra n sc e n d e n ta liz a r a d o u tr in a ju rd ica , ao lado d e u m a concepo pessim is ta e d em erit ria d a n a tu re z a h u m a n a , o q u e lev o u a es tabe lece r d e s ig u a ld a des e n tre os sexos, em v ir tu d e d o p e c a d o o rig ina l. A m u lher, re sp o n s v e l pe la f raqueza no den , lev o u o seu com p a n h e iro a pecar, e d a a d eca da d o ser h u m a n o em toda a su a descendnc ia .

    A filosofia da justia passa a in tegrar a recolha da iusfilosofia do Bispo de H ipona. A questo da justia d o s d ire itos da m ulher achava-se no continente do m aniquesm o cu ltuado por Santo A gostinho d u ran te anos d e sua ju v en tu d e e presen te em suas obras, inclusive na autobiografia que e s c r e v e u .E r a a lu ta d o bem contra o mal. A n a tu reza contra o intelecto. A Biologia contra a C ultura . Restou m ulher, a n a tu reza com a sua capac idade procriadora , p o rm frgil p e lo seu p ecado de ten ta r o hom em A do no Paraso.

    A idia de igua ldade constru da pelos filsofos gregos so fria injuno d e u m a exegese que partia d o m al e do bem - do u tr in a m anique s ta resva lando pa ra a questo da subor-

    Os seus livros mais conhecidos so: De Civitate Dei (A Cidade de Deus), iniciado em 424 d.C., e Confisses, iniciado em 396 e completado em 399, com um Capitu lo sobre a sua v ida aps a converso. Trata-se, aqui, de sua autobiografia.

  • C ID A D A N IA D A MULHER, UMA QUESTO DE JUSTIA

    dinao, da polarizao d a existncia de um ser superio r (sexo m asculino), e de u m ser inferior (sexo fem inino).^

    A ques to da m ate rn id ad e foi elevada condio d e ser a fu n o e x c lu s iv a d a m u lh e r , p o is a r e p r o d u o n o se com patib ilizava com a p roduo , ou seja, era u m a p roduo p a ra trs - re-p roduo u m a funo m eram en te biolgica e socialm ente genealgica. Esse era o p red icam en to aceito pela C u ltu ra d a poca e sed im entou-se com o tal.

    CAPTULO 3 A CIDADANIA: SUBSTANTIVO DUPLAMENTE FEMININO EM MEIO AOS MOVIMENTOS DE MASSA

    Os d ire itos da m ulher e em particu lar os seus d ire itos de c idadan ia p rovm no d e valores sed im en tados na C u ltu ra da H u m a n id a d e , e, sim, de contravalores defen d idos em m o v im entos de m assa da Contracultura.

    N os anos sessenta do sculo XX, irrom pem m ovim en tos de g ru p o s que levan tam bandeiras com o as que tra d u z ia m a em ergncia d o pacifismo, d o m ovim ento ecolgico, e d o m o v im ento de igua ldade de d ireitos entre hom ens e m ulheres, d en tre outros. So os cham ados g rupos de presso, o u seja, pessoas ag ru p a d a s em face de um a p a u ta de reivindicaes

    0 maniquesmo apontado como o ltimo grande movimento reiigioso no O riente. surgido aps o Cristianismo e anterior ao Islamismo. Foi fundado por Mani, de origem persa, o qual se dizia ser o Esprito Santo prometido por Jesus Cristo. A sua doutrina considerava a procriao um ato diablico, de vez que o homem era um ser gerado por uma partcula de luz presa em um corpo gestado por demnios. Por a se deduz a forte influncia dessa doutrina nos conceitos teolgicos e filosficos desenvolvidos por Agostinho, o que levou a Cultura Religiosa a perpassar sculos com conceitos antinmicos sobre o que bom e o que mal. Essa concepo, no que tange exegese religiosa crist, tem se modificado em funo de enfoque antropolgico, trabalhado por telogas, que utilizam a noo de anthrpos. isto , do masculino e do feminino como conceito universal de humanidade. Sobre Mani e a sua doutrina, ver Uta Ranke-Heinemann, in: op. cit., p. 93.

  • CIDADANIA DA MULHER, UMA QUESTO OE JUSTIA.

    q ue tm u m a linguagem de substancialidade, q u an to ao d i reito v ida e d ignidade.

    N o bojo do expressar da C ontracultura, a m u lher reivindica direitos d e cidadania, vistos estes com o u m a gam a de direitos que incluem direitos civis - o de livre expresso, de reunio e de ser tratada com igualdade perante a lei; direitos polticos que abrangem um a ao positiva que, alm de votar e ser votada, seja mais participante do processo poltico, com lideranas em comunidades, parquias etc.; e direitos de natureza socioeconmi- ca, a ter em conta aqui o direito a produzir economicam ente, a ser m em bro ativo da sociedade p rodu tiva e de consum o etc., afora o direito a l idar com o seu corpo e a sua sexualidade.

    H aqui um rom pim en to com a H istria C ontnua, com o d iz FOUCAULT, ou seja, h um a ru p tu ra com os conceitos de con tinu idade histrica. N asce aqui ou tra verso de po d e r, no m ais 0 que inculca estigm as ao corpo e alm a, m as u m a supe rao d o patria protestas, po r m eio de u m a transform ao cu ltural, que v em a pag an d o a noo tradicional rom anstica.

    Essa transform ao , na v e rdade , pa rte do m ov im en to racionalista do Ilum inism o que detecta no sag rado - e aqui o vocbulo extensivo a a tender vrias form as d e m anifestao religiosa - a razo m aior de postu ras identificadas com n o es alegricas d e separao en tre hom ens e m ulheres , sobre tu d o q u a n d o essas ltim as utilizam form as racionais ou no de deteno d e poder. D oravante o p od e r racionalizado , diz WEBER, a travs d e condu tas racionais - legais.

    O direito poltico a ser estendido m ulher m edida m aior a ser conquistada, algo mais que o poder de votar e de ser votada.

    N as peg ad as d a H istria, com relao ao d ire ito de voto, h que se d izer que no Brasil, d esde an tes de sua in d ep e n d n cia form al, um d e p u ta d o baiano , rep re sen ta n te nas C ortes

  • CIDADANIA DA MULHER. UMA QUESTO OE JUSTIA

    G erais p o r tuguesas (1822), contribu iu com u m ad itam en to ao artigo 33 d o projeto da C onstituio que en to se e laborava, no qua l p ro p u n h a que a m ulher que fosse m e d e seis filhos legtim os tivesse d ireito a votar nas eleies.

    A proposio foi d e rro tad a p o r um d e p u ta d o po rtugus , ao afirm ar este em seu parecer que se tra tava d o exerccio de u m d ire ito poltico e que as m ulheres n o o tm p o r serem incapazes. ^ E acrescenta em latim: "Mulier in ecclesia taceat" (a m u lher deve se calar nas reunies).^

    Infere-se assim o estigm a social im p u tad o m ulher, pois m esm o o critrio biolgico de ser m e de seis filhos n o a u to rizou a concesso d o d ire ito de sufrgio,

    N o consta o nom e desse d e p u ta d o ba iano nos anais da C onstitu in te brasile ira d e 1823, e o projeto desenvo lv ido p e los dez m em bros nom eados pelo Im perador, aps a dissolvio d a A sse m b l ia C o n s t i tu in te , a p a r d e a d o ta r o s u fr g io censitrio, no a dm itiu o voto d a m ulher, d e form a a perm itir o d ireito d e participao no processo eleitoral. (Arts. 91 a 97 d a C onstitu io brasileira de 1824).

    O I lum in ism o no h av ia d isp e rsad o a inda o es te re tipo d a m u lh e r b iolgica e a sua incapac idade p a ra o tra to d o es pao pblico. Este ltim o era an tn im o d o espao d o m s ti co e este um significante unvoco ap licado a p e n as s tarefas fem in inas m anuais .

    Tratava-se do Deputado Domingos Borges de Barres, representante da Provncia da Bahia s Cortes Gerais portuguesas incumbidas de elaborar a primeira Constituio de Portugal. A informao colhida de Joo Batista Cascudo Rodrigues acrescenta ser aquele deputado pai da futura Condessa de Barrai, a quem ajunto a informao de ter sido aquela por seu turno uma mulher do tipo viril", pela sua participao intensa na vida social do Segundo Imprio, havendo trocado correspondncia com o Imperador Pedro II. A informao de Cascudo Rodrigues est contida em A M ulher Brasileira - Direitos Polticos e Civis, 3, ed. Braslia; Centro Grfico do Senado Federal. 1993, pp. 43-44.

    A traduo minha.

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    CAPTULO 4A MULHER E A POLTICA DO PODER; A CAA S BRUXAS

    O poder, pa lavra polissmica e que foi t ra d u z id a em lin guagens variadas, subjaz s polticas de m ando , de obed in cia ou, com o d iz MAX WEBER, s relaes d e dominao.^

    Incursionando na H istria da Inquisio h d e se verificar q ue literalm ente a caa s bruxas foi u m a form a de m arg inalizar as m ulheres que agiam na in form alidade do po d e r, no tra to das foras da natu reza, e po rtan to u m a espcie d e cerceam en to da voz fem inina d o no-d ito , com batido pelo Poder Oficial com o apostasia. A bruxa trabalhava s ca ladas e esse silncio tinha voz a ltam ente incm oda.

    U m a fo rm a d e no -dec lara r d ire ito s era a d e p e rseg u ir m ed ian te a abjurao, que tanto se revestiu d e estigm as sociais q u an to d e condenao religiosa. E aqui o im aginrio dos acusadores vai longe ao pon to de revelar que os dem nios p o d em partic ipar da gerao de hum anos, a travs das b ruxas que em conluio carnal com ncubos e scubos,'^ geram seres hum anos. So, assim , m ulheres d enom inad as de b ruxas ou feiticeiras p o r causa d a " m agn itude de seus a tos m alficos". E "enfeitiam a m ente dos hom ens, levando-os loucura, ao dio insano e lascvia desregrada".

    Para o esludo da Sociologia da Dominao, ver MAX W EBER, in: Economia y Sociedad- E.sbozo de Sociologia Compreensiva. Trad, de Jos Medina Echavara et allii. Mxico: Fondo de Cultura Econmica, 1992, pp. 695 a 889.

    ncubos e Scubos so demnios masculinos e femininos que em conluio carnal com as bruxas faziam-nas procriadoras de seres monstruosos. Sobre a matria, ver verbetes n cu bo s e s cu b o s in: Manfred Lurker, Dicionrio de Dioses y Diosas, Diablos y Demnios. Barcelona/Buenos Aires/Mxico; Ediciones Paidos Ibrica (s.d,]," Ver sobre o tema O Martelo das Feiticeiras - Malleus Maleficarum trad, de Paulo Fres, 12, ed. Rio de Janeiro: Record/Rosa dos Tempos, 1997.Ver Introduo Histrica, de Rose Marie Muraro. Ibidem, pp. 5 a 17,

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    m ister deixar claro que aqui feita um a referncia cientfica no sentido da Histria das M entalidades. Trata-se de ao situada no tem po histrico, que se apia em saber terico, como tam bm em regras imaginrias, os quais levaram prtica form as d e agir que vistas a distncia do tem po em que aquelas foram produzidas pode parecer - e parece, efetivam ente - em evento declaradam ente esdrxulo e sem cabida nos dias de hoje.

    O poder, en tre tan to , secularizou-se e se agasalha no d o m nio da Sociologia, da Cincia Poltica e do Direito. A seculari- zao de a lgum a form a u m m odo de dessacralizar. E passa a ser u m valor no com plexo de valores da Era M oderna.

    O u d ito em ou tras palavras: com a secularizao h um en tend im en to en tre religio e cultura, den tro de um processo de historicizao e d e m undificao do sen tim ento religioso. Este expu rgado d os elem entos q ue lhe in q u inavam p o r p e r pe tra r a titudes ortodoxas, ou fundam en ta lis tas e com apoio do p o d e r civil, es tando este a tre lado quele, com o acontecia na Id ad e M dia, e, a inda, no incio da Era M oderna.

    A questo do p o d e r em conexo com o tem a d as b ruxas h de ser vista p o r u m prism a "poltico" d o conceito u n o d o Estado, ao m esm o tem po tem poral e espiritual, ancorado na Igre ja Catlica que en to se institucionalizava. obra resu ltan te de vrios fatores, inclusive na o rdem sincrnica e diacrnica dos fatos. H um delineam ento p ro longado atravs dos tem pos, na configurao d o Estado.

    D esde a Bula d e Inocncio VIII (1484), a qua l reforou o apare lham en to d o Tribunal Inquisitrio, ou d e antes, de vez qu e o T r ib u n a l d o S an to O fcio foi in s t i tu d o p e lo P a p a G regrio IX (1170-1241)^^ com o instituio perm anen te , wrfe;

    Foi esse Papa quem instituiu a Inquisio sob a direo dos dominicanos. C on tudo, sabe-se que o Papa que aprovou o uso de tortura na Inquisio, a fim de

  • CIDADANIA DA MULHER, UMA QUESTO DE JUSTIA

    et orbi, e com vistas ao com bate das heresias. Esse T ribunal sed iado em T oulouse torna-se am pliado jurisd ic ionalm ente p a ra a ting ir a Frana, Espanha, A lem anha e, em m en o r escala, Portugal. H avia, ev identem ente, o apoio d o b rao secular, pois sabe-se que os juizes eclesisticos no p ro n unciavam pe nas capitais, d evendo os rus ser en tregues ao ju lgam en to do p o d e r civil. P raticam ente, este funcionava com o o aparelha- m en to ideolgico daquele Tribunal, haja v ista q ue o substra to filosfico dos processos foi em basado em textos religiosos.

    M ais um a vez, a simbologia est fortem ente presente, pois aqui 0 religioso mescla-se com o m gico, ou seja, a perseguio s b ruxas tem supedneo no m u n d o do imaginrio, em que se creu que o "poder" delas em certa m edida objeto da im aginao de quem tudo podia fazer, ou seja, ter o pod e r aliado ao Dem nio, para tudo realizar, inclusive operaes inacreditveis, como, po r exemplo, criar seres por metamorfose. E, ainda, apoiados os autores do Malleus Melleficaram em filsofos m uu lm anos, sugerem aqueles que o poder da imaginao capaz de, na rea lidade ou na aparncia, modificar os corpos de outras pessoas, desde que esse poder de imaginao no seja reprimido.^^

    colher confisses de heresia, foi Inocncio IV {1200-1254), Assim, o Papa Gregrio IX v is to com o um P ontfice v irtuoso , havendo sido um fo rte de fensor dos franciscanos. Foi ele quem canonizou Francisco de Assis, seu amigo pessoal, em 1228, Antonio de Pdua (ou de Lisboa), em 1232, e Domingos, em 1234. Ao criar a Inquisio, deliberou passar s mos das autoridades civis a questo da pena de morte. Foi o mesmo Papa quem determinou a reabertura da Universidade de Paris, em 1231, modificando o interdito contra obras filosficas de Aristteles. Ver verbetes Gregrio IX e Inocncio IV, in: Richard P. McBrien, Os Papas - Os Pontfices de So Pedro a Joo Paulo II, trad, de Brbara Theoto Lambert. So Paulo: Edies Loyola, 2000, pp. 218-220 e 221-222, respectivamente aos dois verbetes.22 Os filsofos muulmanos citados so AL-GAZALI e AVICENA, o primeiro com uma form ao ecltica, havendo sofrido vrias influncias do pensamento de sua poca (1059/1111), tais como, da filosofia, teologia e do esoterism o e o segundo, na verdade, anterior a este. conhecido pelo nome de AVICENA, nascido em 980 da era crist e famoso como o maior nome da filosofia neoplatnica islmica, bem como da medicina medieval.

  • 3 6 CIDADANIA DA MULHER, UMA QUESTO DE JUSTIA

    C o n tu d o , a ques to da persegu io no tocante s b ru x as significativo de u m a poca em que se com eava a descobrir que o saber gera poder. Essa id en tid ad e com ea a se esboar a p a r t i r d o m a rc o g a l i l e a n o , m a rc o q u e fo i c a p a z d e d e sco n s tru ir d o g m as fo rm ados e aceitos ao longo d o s scu los. com o d ito p o r H ILTO N JAPIASSU, q u e "... o sen tido d o conhecer se converte em ao, em ato d e apodera r-se , em d o m in ao o u apropriao".^^

    N a v e rdade , a Cincia de tonou o saber com o fonte de p o der, conhecim ento universal, capaz d e m u d a r o conhecim en to estabelecido, na interferncia da N a tu reza e no p o d e r da deteno desse conhecim ento. o desafio d o ho m em do sa ber que altera a com posio das es tru tu ras d o poder.

    Torna-se " insuportve l" ver a b ruxa m an ip u lan d o as foras d a N atu reza , com o aquelas desenvolv idas po r benzede iras, cu rande iras e p rinc ipalm ente po r parteiras. A inda que de um a form a no-cientfica.

    E era to forte essa questo da crena nesses elem entos que todo 0 arcabouo da Justia Civil se prestava a colaborar na ultimao desses processos. O prprio Malleus Maleficariirn um a pea jurdico-ideolgica, d ifundida por toda a Europa, em sua prim eira verso latina e, aps, em tradues, e um a pea essencial para o estudo da m entalidade da poca, na qual dois telogos dominicanos - H enry Kramer e James Sprenger - eram professores e delegatrios para os fins de realizao da "justia", com plenos e irrestritos poderes para o exerccio de seus misteres.

    C uriosam ente , em poca m ais recente, ISAAC N EW TO N serve-se de conhecim entos esotricos, a lquim istas, ocultistas, a po n to de Keynes, em 1946, haver declarado que N EW TON,

    Cfr. Hilton Japiassu, in: / is Paixes da Cincia - Estudos de Histria das C incias. So Paulo: Editora Letras & Letras, 1991, p, 300,

  • CIDADANIA DA MULHER, UMA QUESTO DE JUSTIA

    sendo o m aior filho d e C am bridge , foi n o o p r im eiro p e n sa d o r da era d a razo, po rm o ltim o dos mgicos/'^

    A inda segundo JAPIASSU, foi relevante o trato da trad io m gica ou herm tica no pensam en to de N EW TO N , inclu sive h a v e n d o este p recu rso r cientista d o M u n d o M oderno haver rea lizado um estudo transdisciplinar, em que so es tu dad o s P itgoras - o que com parou a Justia perfeio de um n m ero q u a d ra d o - , Virglio, So Paulo, M oiss, Salom o e ou tras f iguras de expresso no m u n d o do pensam en to filosfico e religioso, inclusive afirm ado que P itgoras conhecera no seu tem po a lei da gravitao.

    So postu laes de novas pocas, nas quais falar de "p o d e res ocultos" j no d en o d av am processos de ex term inao de apostasias. E, por via d e conseqncia, j se via Galileu em ou tra tica, e a justia transfigura-se em n om e de um outro e lem ento cham ado razo, e que s vezes n o confirm ava essa confluncia em torno da perfeio d a igualdade da justia do quadrado.

    H um a segunda conciliao en tre a razo e a f. E o Direito abre cam inho pa ra que o ser h u m an o com plete a sua obra social e poltica. D issem os acima que se tra tava de u m a ru p tu ra, m ais ao sabor foucaultiano. C om efeito, h u m a m udana de ru m o den tro d o conceito de sexo, pois a d iscrim inao a constru da parece fazer parte de um a tessitura poltica e lingstica. E com o o Direito tam bm poltica e l inguagem , de se inferir que a m udana do rum o perm eie as regras do Direito Positivo, com u m ingredien te novo: a justia va lo rada pelo e lem ento m aterial. H um a interao en tre a m u d an a social

    ** A frase atribuda a John Keynes acha-se citada em Hilton Japiassu, op. cit., pp. 123 0 segs-, dentro do Captulo 4. O Contexto Mgico - Religioso - Poltico de Newton,

  • 3 8 CIDADANIA DA MULHER, UMA QUESTO DE JUSTIA

    e o apare lho receptor do Direito q ue se im pressiona e percute an te os fenm enos da v ida social.

    E a justia m ateria l se inflete n a igua ldade ex ortada em to dos os prism as: n a construo de u m m u n d o m ais igual, nas relaes p ro d u tiv as m ais equ ilibradas e eqita tivas, n o en cu rt a m e n to d a s d e s ig u a l d a d e s so c ia is e r e g io n a i s {vide p ro g ra m t ic a d a C o n s titu io b ras ile ira de 1988, em seu exrdio , art. 3 e incisos) e na efetivao da ig u a ld ad e entre h o m em e m ulher, den tro do esprito da filosofia dos Direitos H um anos. A se inicia o processo de c idadan ia d a o u tra m eta de d a H um an idade .

    A c idadan ia vista no contexto de um a justia m aterial, esta, na concepo de ser a realizadora d a ig u a ld ad e jurdico- form al. o constructo m aterial, isto , a rea lidade c ircundan te d o Direito, q u e vem a ser tom ada em conta pa ra q u e haja um encontro efetivo do juspositiv ism o com a rea lidade histrica e social, j que n a p rpria tessitura d o Direito form al de h m uito se in seriu o elem ento subjacente d o ius e d a aequitas, v in d o a faltar, apenas, a concreo das rea lidades sociais na construo formalstica da lei.

    H , po r ou tro lado, u m crescim ento ou transio n a construo simblica da cidadania, at, quem sabe, por u m acm ulo d a m en te social coletiva ou pa ra usar da insupervel expres so d e JUNG, m ed ian te a rq u tip o s ancestrais.

    Jung nos d a idia de arqutipos no seguinte exemplo: Permitam-me a seguinte comparao: suponhamos que nos incumbiram de descrever e explicar um edifcio cujo andar mais alto foi construdo no sculo XIX e cujo andar trreo data do sculo XVI. Investigaes mais acuradas das paredes nos revelam ainda que esse edifcio foi reconstrudo a partir de uma torre do sculo XI, No poro descobrimos alicerces romanos e abaixo do poro encontra-se uma caverna soterrada. No fundo dela se encontram instrumentos de pedra na camada superior e restos da fauna da poca na camada inferior. Essa construo se assemelha de certa form a imagem de nossa estrutura psquica: vivemos no andar mais alto e s vagamente sabem os que o andar trreo relativam ente antigo. E sobre o que se encontra

  • CIDADANIA DA MULHER, UMA QUESTO DE JUSTIA

    A considerar essa revivescncia h que se ver que os conceitos de cidadania e de justia atribudos m ulher vm de ser retom ados em pleno sculo XX, a inda que a princpio sob um a tica de Direito N atura l a ser positivado - Declarao U niversal dos Direitos H um anos da ONU, de 1948 e posteriores Acordos e Convenes assinados com vistas igualdade na poltica, no trabalho, na vida social, enfim, no espao pblico.

    O u na tica dos arqutipos, qui h u m a re tom ada d a p a r ticipao poltica da m ulher, igual ao ou tro gnero , cultura essa que seg u n d o estudiosos p ro sperou em civilizaes e po cas arcaicas, ou m ais antigas, no obstan te tal verten te no haver s ido versada pelo preclaro JUNG, a t p o rq u e d u ran te a sua poca, o arqu tipo da m ulher se circunscrevia m e, que identificada ao yin chins, enquan to o a rqu tipo d o pai, re lacionado ao yang, de te rm inava a relao com a lei e com o Estado, po rtan to , acrescento eu, com o poder.

    O ra, h es tudos arqueolgicos que nos levam a asseverar que no d e todo im proceden te tal possib ilidade. N o se quer com isso criar nova tese, con tudo h que se ressaltar que os es tudos e pesqu isas sobre a v ida arcaica da H u m a n id a d e do conta de que h u m im pulso inicial pa ra considerar u m a e ta pa da hum anidade que se assentava em um a igualdade entre hom ens e mulheres, ou at de desequilbrio nessas relaes em detrim ento do hom em . Tal assertiva nos vem de BACHOFEN,^^

    abaixo da superfcie no temos conhecimento algum . Esse exemplo com a informao da complexidade da questo acha-se em CARL G. JUNG, in: Civilizao em Transio. Trad, de Lcia Mathilde Endiich Orth, 2. ed. Petrpolis: Editora Vozes, 2000, pp. 35 e segs." Bachofen citado por Joseph Campbell et allii, in: Todos os nomes da Deusa. trad, de Beatriz Pena, Rio de Janeiro; Record - Rosa dos Tempos, 1997, p. 63. Ver, igualmente, Friedrich Engels, in: A Origem da Famlia da Propriedade Privada e do Estado, trad, de Joo Pedro Gomes, Lisboa-Moscou: Editorial Avante!", 1985, O autor citado Johann Jakob Bachofen (1815-1887), historiador e jurista suo, autor de 0 Direito Materno .

  • CIDADANIA DA MULHER, UMA QUESTO DE JUSTIA

    q ue considerava o m atriarcado com o a form a m ais prim itiva d a sociedade hum ana. Alis, esse ltim o pesqu isado r um dos au tores es tudados por ENGELS quan d o do desenvolv im en to d e suas pesquisas que vieram em basar a sua obra so b re a Famlia e a P ropriedade.

    Por ou tro lado, h evidncias de u m equilbrio de direitos en tre hom em e m ulher no Egito Antigo. Prim eiro, pela rele vncia de sua d eusa ISIS, que encarnava a p r p ria im agem do Egito, seg u n d o a palavra au to rizada da eg iptloga CHRISTI- AN E DESROCHES NOBLECOURT.

    Era o u to rgada liberdade m u lher egpcia que no conhecia a tutela, com o ocorreu com a m ulher rom ana; em m atria d e d ire itos de sucesso, os quinhes eram iguais pa ra os h o m ens e pa ra as m ulheres e pod iam elas escolher o seu m arido, o que no acontecia com as rom anas, e p o r a tav ism o cultu ra l no existia tam bm tal l iberdade s m ulheres d o m u n d o ocidental, particu la rm en te d a Pennsula Ibrica. Por via de conseqncia, as m ulheres brasileiras d a poca colonial no gozavam dessa liberdade, havendo tal fato se es tend ido at a lgum as dcadas atrs.

    D-nos conta NOBLECOURT que a m ulher egpcia gozava de am pla capacidade jurdica - referindo-se m ulher no-es- crava - e o que m ais curioso que a m ulher casada, no incio da XIII dinastia - cerca de 1785 a.C. - era detentora d e um a am pliada capacidade legal, p odendo at convocar o seu pai em Juzo, a fim de proteger os seus prprios interesses p r iv a d o s / '

    Ao revs, at 1962, em nosso pas, m u lher casada era im p u ta d a um a incapacidade relativa, em face d o C digo Civil q ue assim o de te rm inava em seu artigo 6 . Era a m arca pro-2 Sobre a mulher no Egito Antigo, ver Christiane Desroches Noblecourt, in: A Mulher no Tempo dos Faras, trad, de Tnia Pellegrini. Campinas, SP: Papirus, 1994, Sobre as informaes acima, ver pp. 207 a 216, passim.

  • CIDADANIA DA MULHER, UMA QUESTO DE JUSTIA 4 1

    funda d o Direito Rom ano, trazida at ns via Cdigo Civil N apolenico, este, desprestig iador do direito das m ulheres por fora d a velha tese da incapacidade do sexo fem inino. Foi essa verten te que se d ifund iu no Direito O cidental, fo rm ulado ao longo dos sculos e d e forte laivo religioso em face das d o u tr i nas desenvo lv idas d u ran te a Idade M dia, e que no fenm eno da aculturao p e rm eou os vrios o rdenam en tos jurdicos dos pases eu ropeus ocidentais.

    Em resum o do C aptulo, im pende d izer que h u m a lin guagem reducionista constru da em face d e excluir a m ulher da usufru io de d e te rm inados estados, sob re tudo q u an d o se trata d e estados d e "graa intelectual", forjadora do poder, a p o n ta n d o -s e aq u i u m a p r p r ia r u p tu r a com o d isc u rso heurstico sobre o qual a Justia em sua origem est assen ta da. N a v e rd ad e , h u m a lu ta im plcita e silenciosa d e n tro da qual se o peram interesses com o os desenvolv idos pelo T ribu nal Inquisitrio , o qual operava com a apriorizao de certos conceitos com o os expendidos em Bulas e no fam oso Malleus Malleficarum, qu an d o "dogm as" eram estabelecidos p o r vrios p rocessos intelectivos e, p o r via de conseqncia, pelos processos judiciais de na tu reza no-dialtica.

    Ao sabor dos sculos, ver-se- um a ru p tu ra epistem olgi- ca no d iscurso jurdico e p articu larm ente no tem a d o poder.

    CAPTULO 5 O CONVENTO: LOCUS DE CIDADANIA DAS MULHERES?

    Tem os v isto ao longo deste trabalho que a c idadan ia h isto ricam ente expresso de um gnero - m ascu lino - e de um a elite econm ica e cultural d u ran te o processo de conquista daqueles direitos.

  • CIDADANIA DA MULHER, UMA QUESTO DE JUSTIA

    Foi assim em A tenas e em Roma. Foi assim d u ran te a Idade M dia, cujos estam entos senhoriais, ao lado do Clero, de tin h a m a pa lavra e o pod e r decisrio. Foi igualm ente assim por ocasio do Ilum inism o, pois afora a m arginalizao da m u lher no processo poltico, com o vim os, po r exem plo, na C onstitu io francesa d e 1793, esta e a p rpria Revoluo Francesa priv ileg ia ram o princpio censitrio, afora o h aver excludo o d ire ito de voto s mulheres.

    O que se verifica em verdade a prevalncia da lei d o p ro cesso legal form al, vale dizer, que os d ire itos e facu ldades legais esto garantidos, sem que haja qua lq u e r ten ta tiva de se assistir o ind iv duo , no uso desses poderes. Sobretudo , q u a n do esse in d iv duo tem papis sociais femininos.

    Por ou tra parte , os critrios pohticos desenvo lv idos d u ra n te e aps a crescente vaga d o Ilum inism o esbarravam -se na face d a justia form al, po is o sufrgio era exercido o u pelo reg im e censitrio o u pelo princpio capacitrio.

    Pelo p rim eiro , os negcios d a com un idade nacional devem esta r afetos queles que detm interesses reais ou p o r p o ssu rem bens ou po r terem rendas que justifiquem o d ire ito ao voto e participao no negcio pblico.

    M ediante o segundo princpio, esse d ireito seria conferido n o a p en as que les que cap itu lavam na s ituao an terio r, p o rm era baseado tam bm na capacidade, no d iscern im en to, no ter ttulos acadm icos e no ter independncia suficiente, p ressupostos , seg undo a teoria, de que s esses c idados tm tirocnio pa ra a deciso das polticas a serem ado tad as pelos governos.^

    Houve um critrio de voto plural existente no sistema belga de votao, em 1893, O sufrgio masculino universal foi a adotado, porm com caractersticas no m nimo curiosas. Tratava-se dos votos extras concedidos a pres de famille. que houvessem atingido a idade de 35 anos. Essa informao est contida em Reinhard

  • CIDADANIA DA MULHER, LIMA QUESTO DE JUSTIA,

    C om o incluir a as m ulheres, que no sab iam ler ou escrever na m aior pa rte delas? Ora, o saber nas m ulheres sem pre foi es tigm atizado em funo de a rgum en tos que jam ais sub sistiriam no m u n d o atual. A sada pa ra o acesso instruo e cu ltura era a v ida religiosa, sem, en tre tan to , h aver com o exp a n d ir d e te rm inadas vocaes literrias ou ap tides intelectuais m ais conspcuas. Ao contrrio, ten tava-se obstaculizar ou a t p u n ir essas m anifestaes ou "desvarios" d a m ente fem in ina m erg u lh ad a na escurido das letras.

    A Inquisio e spanhola levantou suspeitas sobre Santa Teresa D ' vila , que, segundo ARTHUR STANLEY TURBEVIL- LE, a m aior e m ais am vel de todos os m sticos espanhis. M e sm o a s u a a u to b io g ra f ia e s p ir i tu a l foi d e n u n c ia d a Inquisio, a qual levou dez anos pa ra decid ir se a leitura era o u no conveniente pa ra os cristos.

    U m destino assem elhado ocorreu com Juana Ines de la Cruz. Im pelida pela v o n tad e de desenvolver a le itu ra e h avendo descoberto que no era perm itido s m ulheres dedicar-se a estudos, tom ou a deciso de en trar em u m convento , o n d e leu um a im ensido de livros de Cincias, de H istria e de poesias, afora ser levada a um m isticism o p r p rio d a poca. Fez p ro fu n d a s m editaes e escreveu bastante.

    E considerada a p rim eira voz fem inina d as A m ricas que teve a coragem de d izer que todas as pessoas tinham o m esm o d ireito educao.

    N o foi, en tre tan to , com preend ida pela sua com unidade ,

    Bendix, in: Construo Nacional e Cidadania, trad, de Mary Amazonas Leite de Barros. So Paulo: Editora da Universidade de Braslia, 1996, p. 133. A expresso em francs do original.^ Ver Arthur Stanley Turbeville, La Inqusicion EspaHola. Mxico/DF: Fondo de Cultura Econmica, 1985, p. 96.

  • 4 4 CIDADANIA DA MULHER, UMA QUESTO DE JUSTIA

    h av en d o sido p ro ib ida de continuar a escrever sob p ena de ser expulsa do convento.

    M uitos so os casos ocorridos em q ue m ulheres d 'a n ta n h o v iram na v ida religiosa e conventual a form a m ais vivel de exercer u m a cidadania, a inda que lim itada.

    NATALIE ZEM ON DA VIS pesquisou a histria de M arie de rincam ation , que emigrou para a Amrica, im pulsionada pela v ida religiosa, indo ao Canad onde se dedicou instruo dos autctones. A princpio, escreveu em lngua francesa e, aps, nas lnguas am erndias locais. Corria o incio do sculo XVII.^

    S o C onven to p ropiciava o direito bsico d e c idadan ia , ou seja, o saber ler e o escrever. E em escalada g igante , ver p u b li cados os seus escritos. N as palavras de M N IC A RECTOR:

    "As religiosas ocupam uma posio ambgua dentro da sociedade patriarcal. A representao das freiras, at o sculo XX, sempre ofereceu ao leitor esteretipos que variam desde criaturas impotentes, at seres perversos e at mesmo imorais. Apesar de o convento ser considerado abrigo para mulheres, tornar-se freira muitas vezes significava uma rebelio contra o sistema patriarcal Quando as religiosas puderam escrever, passaram a escrever sobre elas mesmas e a desconstruir os esteretipos, desafiando 0 conceito tradicional associado s freiras"

    30 Juana Ines de Ia Cruz era mexicana e desenvolveu os seus doles de poetisa no mbito do Convento para o qual entrara, Convidada a renunciar literatura religiosa, abandona os seus escritos, vende a sua biblioteca em favor dos pobres. Para mais detalhes, ver Cadernos de Mulheres da Europa, n 37, 1492: P resenas de M ulheres, Comisso das Comunidades Europias, Bruxelas, [s.d.].

    Ver Natalie Zemon Davis, A/as M a rg e n s -T r s Mulheres do sculo XVII, Trad, de Hitdegard Feist, So Paulo: Companhia das Letras, 1997, pp. 65-131.= Ver Mnica Rector, in: Mulher Objeto e Sujeito da Literatura Portuguesa, Porto- Porluga!: Edies Universidade Fernando Pessoa, 1999, p. 112.A Autora relaciona vrias religiosas que usaram de sua aptido intelectual para escrever poesias (Sror Violante do Cu); autos, comdias e hagiograias (Sror Maria do Cu): novelas (Sror Madalena da Glria). E Sror Mariana Alcoforado, que a Autora considera em lugar de realce.

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    O ra, a Idade M dia, longa com o foi, pois d u ro u quase 11 (onze) sculos, u m a e tapa da h u m an id a d e bastan te com plexa p a ra um a anlise rp ida no que tange ao tem a que aqui desenvolv ido .

    De qua lquer ngulo , h que se ratificar q ue a relig iosidade e tu d o que lhe foi inerente - a criao de vrias o rdens religiosas, a sacralidade d o Direito, o m isticism o etc. - a lavancou um estilo d e v ida p rprio , sobre tudo no que d iz respeito condio da m ulher, esta que se desenvo lveu in te lec tualm en te no recinto dessas instituies. Portanto , a "cidadan ia" , que tim idam en te d a em ergia se c ircunscrevia no m bito dos conventos e d a v ida religiosa. Ora, p recisam ente nos conventos e m osteiros o local em que se encon travam bibliotecas, pelo m enos den tro de u m m arco tem poral po r volta do sculo oita vo (VIII) em diante. O Direito escrito era lim itado a de te rm inad as regies em funo das U niversidades, c riadas a partir da de B o lonha e circunscritas ao m u n d o conven tual, o que de u Igreja u m a funo de vang u a rd a q u an to ao aspecto in telectual e de p ropagao da Teologia. M as, p o r ou tro lado, s m ulheres no cabia e no lhes era perm itid o ingressar nessas Escolas, as quais s adm itiam hom ens que p u d e ra m se n o ta bilizar, com o ocorreu com Santo A lberto M agno, So Tom s de A quino, Santo Ivo, A belardo e outros tantos.

    Por ou tro tu rno , sabe-se que nove m ulheres freiras desen vo lveram a tiv idade de copista; tal fato conhecido em do cu m en to religioso existente, o qual foi cop iado pa ra o A rcebispo de Colnia, em p leno sculo IX, sab ido que essa era um a ativ id ad e in telectual de m uita relevncia exercida nos scriptoria dos conven tos e m osteiros.

    A posteridade tomou conhecimento dessas mulheres pelos seus nomes, assinados no prprio documento. So elas: Girbalda, Gisliidis, Agleberta, Aduhic, Altildes,

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    Portan to , o saber e os livros no e ram de acesso pblico. O saber estava p raticam ente concentrado no recinto das O rdens Religiosas e, aps, j na Baixa Idade M dia, nas U n ivers ida des criadas no m bito das g randes Catedrais, e.g., de Oxford, Paris, Salam anca, Pdua etc.

    M esm o assim , a lguns dos regu lam entos das bibliotecas da Idade M dia eram rigorosos, quan to ao uso das m esm as, com o o regu lam en to d a Biblioteca da U nivers idade de Oxford, onde foi estabelecido que s os g rad u ad o s ou religiosos, aps oito anos de es tudo da filosofia, poderiam utiliz-la. Ao lado de que s poderiam u sa r os livros com o zelo necessrio pa ra que n e n h u m dan o ou prejuzo pudesse adv ir d o m anuseio , com o rasu ras e estragos nos cadernos ou flios.

    A propsito , RGINE PERNO UD noticia que o status da m u lh e r n a Igreja da Idade M dia o m esm o que o v iv ido na sociedade civil e o que conferia au tonom ia, independncia e instruo, foi aos poucos sendo retirado da m u lh e r aps a Ida de M dia. E cita aquela A utora a degradao ocorrida em tem pos m odernos q u a n d o o convento da O rdem d e Fontevrault, 0 qual nos p rim eiros anos d o sculo XII, Robert D 'A rbrissel houvera ali fu n d ad o dois conventos, u m m ascu lino e ou tro d e m ulheres. Tal m osteiro foi posto sob a au to r id ad e de um a abadessa, Petronila d e Chem ill, a sua p rim eira d ire to ra , que estava en to com 22 anos.

    N o sculo XVI, o rei da Frana, tom ando a si a com petncia

    Gisledrudis, Eusebia, Vera e Agns. Essa informao acha-se contida no prefcio de autoria de Marina Colasanti, na obra Lais de Maria de Frana, trad, de Antonio L. Furtado, Petrpolis, RJ: Vozes. 2001, p. 12,

    H documento intitulado Monumenta Acadmica or Documents llustrative o f Academ ical Life and Studies a t Oxford, transcrito por Maria Guadalupe Pedrero - Sanchez, in: Histria da Idade t^dia - Textos e Testemunhas. So Paulo; Editora UNESP, 2000, pp. 187-188.

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    de nom ear abadessas e abades, fez de Fon trev rau lt um asilo pa ra as suas velhas am antes.

    Do que se infere ser a monja um a pessoa g ozando de " re ga lias q u e d e o rd inrio n o era com um ter na casa dos pais^ a m enos que se tra tasse d e m ulheres nobres, sendo educadas nos conven tos e a elas era destinada u m a educao esm erada. De qua lquer sorte, nos conventos aprend ia-se a ler, a escrever, a cantar. A lgum as ap rend iam o latim e h casos d e m o n jas que sab iam o grego e o hebraico. o caso d a princesa Isabel, irm d e So Lus, fundadora d a A badia de Longcham p, que, seg u n d o relato de GENEVIEVE D 'H A U C O U R T, conhecia o latim to b em ou m elhor que os seus capeles.^^

    A cidadan ia relacionada m ulher, em sua acepo m ais am pla , no era apang io da v ida civil, pois o lcus on d e era possvel viv-la den tro dos pad res da poca, s ituava-se na v ida c laustral, pois aqui as tarefas fem ininas no e ram apenas as essencialm ente de feitio privado , com o cu ida r d as a tiv ida des dom sticas, o u ou tras tarefas que se d irec ionavam ao p a pel fem inino: saber ler os livros de H oras, q u a n d o se tra tava d e castels ou b u rguesas env iadas aos conven tos p a ra bu r ila rem a educao , b o rd a r pa ra si e pa ra as igrejas etc. O s papis d ito s "m ascu lin o s" tam b m eram ali execu tados , com o j m ostram os antes. Falam os atrs que a A badessa H ildegard Von Bingen foi u m a cientista, m usicista, com posito ra e escritora de livros sobre M edicina, alm de h aver escrito vrios trabalhos msticos. PERN O U D nos revela, igualm ente , q u e foi u m a m ulher, D 'hueda , quem elaborou u m prim eiro tra tado

    Dados colhidos em Rgine Pernoud, in: Idade Mdia: o que no nos ensinaram, trad, de Maurcio Brett Menezes, 2. ed. (rev.). Rio de Janeiro: Agir, 1994, pp. 112- 114.

    " Ver Genevieve DHaucourt, in: A Vida na Idade Mdia, trad, de O linda Fernandes, Lisboa: Edio Livros do Brasil, [s.d.J, p. 112.

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    sobre educao, alis, escrito em latim e esse fato se d em torno d e 841-843.""

    E tu d o isso ocorria enquan to do lado de fora dos claustros, em am bien te fechado das U niversidades, especulava-se sobre tem as p ro fundos da Teologia, da Justia e d a Moral. Pois, na Baixa Idade M dia, renascia o interesse p o r ARISTTELES, rev iv ido p o r seu com entador rabe AVERRIS (1126-1198),^ cabendo a este a ingente tarefa de ten tar institu ir u m dilogo en tre a tradio m uulm ana, o pensam en to de sua contem po- rane idade com a cu ltura grega clssica. A lgica aristotlica era traz ida tona pelas tradues realizadas p o r esse filsofo m uu lm ano , tendo com o fio condu to r a h isto ric idade e a u n iversa lidade d o conhecim ento, levando a Europa a ser d epositria d o saber racional, aps a apreenso d a traduo dos textos clssicos po r A lberto M agno e Tom s d e A quino , du ran te a Escolstica, e, aps, ser rev iv ido pelo Ilum in ism o ao sabor das idias dos enciclopedistas e dos cientistas cartesianos.

    Assim, a categoria do racional foi apropriada pelo m ovim ento iluminista, separando o religioso do laico, o poder espiritual do temporal, v indo a atropelar a prpria Igreja, acusando-a de paralisia, de imobilismo, de usufruidora de privilgios, acarretando um a m udana abrupta de rum o no M undo Ocidental, aps e a partir da Revoluo Francesa. A cidadania continuou sendo privilgio d o gnero masculino, nas relaes mais contraditrias de um m ovim ento de m assas que deslocou o eixo da Histria para frente e pa ra trs, com m archas e recuos, em m eio a um processo quase irracional e incongruente pelos mtodos adotados.

    Ver Rgine Pernoud, op. cit., p. 117.Averris considerava ARISTTELES o mais sbio dos gregos. Dizia o filsofo

    muulmano que todos os que at ento sucederam o insigne filsofo grego no haviam sido capazes de acrescentar nada aos seus escritos. Ver AVERRIS, transcrito em Pedrero-Snchez, op. cit., p. 65.

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    CAPTULO 6 RAZO l/ERSUS DESRAZO: A REVOLUO FRANCESA

    N ada foi m ais real que a Revoluo Francesa. N ada foi mais sim blico que a m esm a Revoluo Francesa.

    N esta, a Razo foi erigida a u m nicho d e adorao. Por ela, criaram -se e destru ram -se m itos que ro laram ao m esm o tem p o em que rolavam as cabeas na guilhotina.

    O liberalism o aconchegado nas idias ilum inistas trouxe o positiv ism o em suas m ais am plas concepes, e nos m ais d i versos dom nios.

    A concepo do m onum ento jurdico, form ado e form ador da lei como expresso da justia, destronca-se daquela juno acadmica do }us e do Fas, quando leis e cnones se fundiram para a formao do Direito Comum. Em outras palavras, do In utroque iure, com vistas a obter o jurisconsulto completo, aquele que fosse versado tanto no Direito Cannico como no Direito Civil.

    Esta um a fase que se inicia a inda no sculo XII, qu an d o Direito R om ano e Direito Cannico e ram braos d iferen tes da realizao d a Justia, para , aps, se encon tra rem na form ao do Direito C om um .

    A p artir da separao do cnone da v e rd ad e cientfica, com GALILEU, e da diviso do especulativo do em pirism o , com N EW TO N , m u d a o contexto e a face do m u n d o , em que quase com o u m m ovim ento pendular, sai de cena o e lem ento m g ico e en tra no proscnio a Razo e o Positivism o q ue se anunc iar em seguida.

    P r im e iro , A U G U S T O C O M T E , n a e s te i r a d a s id ia s ilum inistas, traando os passos da Sociologia; depois , o en con tro desta com a Biologia (SPENCER). O Direito no ficaria infenso a essa vaga retum bante do imprio d a razo, pois desde

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    JO H N LOCKE, 0 princpio su p rem o da justia o de q u e a todos lcito fazer o q ue lhes apetea, na m ed ida que n o lesem com isso a l iberdade igual dos outros. a p ro v a de q ue o d ire ito de u m lim itado pelo direito d o outro. P ostu lado p e r feito d o racionalismo.

    As idias fervilhavam e a questo d a liberdade-igua ldade foi posta na p a u ta das discusses, na m ed id a que se conferiu um p r im a d o p a ra a Razo.

    A Razo foi u m a teortica e um a experincia das m ais d e vastadoras, j na Idade M oderna. A via po r in term dio d a qual o fluxo e refluxo dessas idias tom ou corpo foi n o p r p rio de senro lar da Revoluo Francesa. E em operao m uito reflexiva. po is as aes ou o objeto do M ovim ento recaem no p r p rio sujeito da Revoluo.

    N u n ca se falou tan to de cidadania. E nunca ela foi to ne gada em term os de um a ao de reflexividade. A pa lavra lib