chs 2014 - apostila de gerenciamento de crises

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  GOVERNO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO POLÍCIA MILITAR DIRETORIA DE ENSINO E INS TRUÇÃO E PESQUISA CENTRO DE FORMAÇÃO E APERFEIÇOAMENTO Divisão Técnico Pedagógica (DTP) MATERIAL DIDÁTICO DA DISCIPLINA DE GERENCIAMENTO DE CRISES CHS 2014

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Apostila do Curso de Habilitação de Sargentos da Polícia Militar do Estado do Espírito Santo - PMES. 2014.

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POLÍCIA MILITAR
CENTRO DE FORMAÇÃO E APERFEIÇOAMENTO
Divisão Técnico Pedagógica (DTP)
2 HISTÓRICO DO GERENCIAMENTO DE CRISES .................................................. 7 
3 O TERMO CRISE ................................................................................................... 11 
3.1 MODALIDADES DE CRISES POLICIAIS ............................................................ 11 
3.2 O GERENCIAMENTO DE CRISES ..................................................................... 12 
4 LOCAL DA OCORRÊNCIA ................................................................................... 14 
4.1 ORGANIZAÇÃO DO LOCAL ............................................................................... 14 
4.2 RELACIONAMENTO COM A IMPRENSA .......................................................... 17 
4.3 O GERENTE DA CRISE ..................................................................................... 18 
4.4 O GABINETE DE GERENCIAMENTO DE CRISES ............................................ 19 
5 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO GERENCIAMENTO DE CRISES .................. 21 
5.1 CARACTERÍSTICAS DA CRISE ......................................................................... 21 
5.2 NECESSIDADES POLICIAIS EM OCORRÊNCIAS DE CRISE .......................... 22 
5.3 OBJETIVOS DO GERENCIAMENTO DE CRISES ............................................. 24 
5.4 CRITÉRIOS PARA TOMADA DE DECISÃO ....................................................... 24 
6 FASES DO GERENCIAMENTO DE CRISES ........................................................ 27 
6.1 1ª FASE - PRÉ-CONFRONTAÇÃO OU PREPARO ............................................ 27 
6.2 2ª FASE - RESPOSTA IMEDIATA ...................................................................... 28 
6.3 3ª FASE - PLANO ESPECÍFICO ......................................................................... 28 
6.4 4ª FASE - A RESOLUÇÃO .................................................................................. 29 
6.5 5ª FASE: PÓS-EVENTO ..................................................................................... 29 
7 TIPOLOGIA DOS TOMADORES DE REFÉNS ..................................................... 30 
8 AS ALTERNATIVAS TÁTICAS ............................................................................ 33 
8.1 NEGOCIAÇÃO, A 1ª ALTERNATIVA TÁTICA .................................................... 33 
8.2 TIPOS DE NEGOCIAÇÃO .................................................................................. 34 
8.3 QUEM DEVE SER O NEGOCIADOR? ............................................................... 36 
 
 
8.6 A SÍNDROME DE ESTOCOLMO ........................................................................ 38 
8.7 REGRAS DE NEGOCIAÇÃO EM OCORRÊNCIA DE CRISE – AS AÇÕES DO 1º INTERVENTOR ......................................................................................................... 40 
8.7.1 Estabilize e contenha a situação................................................................... 41 
8.7.2 Escolha a ocasião correta para fazer contato ............................................. 41 
8.7.3 Procure ganhar tempo ................................................................................... 42 
8.7.4 Deixe o transgressor falar ............................................................................. 42 
8.7.5 Não ofereça nada ao transgressor................................................................ 42 
8.7.6 Minimize as exigências .................................................................................. 43 
8.7.7 Procure abrandar as exigências .................................................................. 43 
8.7.8 Evite dirigir sua atenção às vítimas com muita freqüência e não as chame de reféns .................................................................................................................. 44 
8.7.9 Seja tão honesto quanto possível e evite truques ...................................... 44 
8.7.10 Atenda exigências pequenas, se for possível ........................................... 44 
8.7.11 Nunca diga "não" e procure evitar a linguagem negativa ........................ 45 
8.7.12 Nunca estabeleça um prazo final e procure não aceitar um..................... 46 
8.7.13 Não faça sugestões alternativas ................................................................. 46 
8.7.14 Não envolva não-policiais no processo de negociação ........................... 46 
8.7.15 Não permita qualquer troca de reféns ........................................................ 47 
8.7.16 Evite negociar cara a cara ........................................................................... 47 
8.8 ALGUNS COMENTÁRIOS SOBRE O PROCESSO DE NEGOCIAÇÃO ............ 48 
8.9 NEGOCIAÇÃO COM SUICIDAS ......................................................................... 49 
8.10 O EMPREGO DE TÉCNICAS NÃO-LETAIS, A 2ª ALTERNATIVA TÁTICA ..... 50 
8.11 TIRO DE COMPROMETIMENTO, A 3ª ALTERNATIVA TÁTICA ...................... 53 
8.12 INVASÃO TÁTICA, A 4ª ALTERNATIVA TÁTICA ............................................. 54 
9 REFERÊNCIAS ...................................................................................................... 57 
constituição de pseudo-organizações com o objetivo da prática de ilícitos penais,
entre outros fatores, agravam o cenário atual, no Brasil e no mundo, no que tange à
Segurança Pública.
Seguindo nessa esteira, a prática de diversas modalidades criminosas que superam
os esforços ordinários das polícias  – conhecidas pelo termo genérico de crise  – 
demanda respostas especiais e analíticas das organizações responsáveis pela
preservação da ordem pública.
 Até pouco antes da década de 1970, as polícias do mundo inteiro enfrentavam as
situações de crise impondo-se pela força do número, com ataque frontal e direto,
sem nenhuma metodologia especial.
 Além disso, muitas decisões eram tomadas com base no amadorismo e na repetição
de métodos empíricos que foram adotados com sucesso em situações anteriores,
ainda que, se hoje analisados, sejam considerados totalmente equivocados e
atentatórios contra a segurança de todos os envolvidos. Assim sendo, policiais eram
escalados para desempenhar funções no teatro de operações consoante sua
posição hierárquica ou seu prestígio na corporação, independente de seu
conhecimento técnico, fazendo com que ocorressem muitas mortes e ferimentos,
não só de criminosos e reféns, mas também de policiais e terceiros inocentes.
Por conta de tal cenário se percebeu a necessidade de substituir o empirismo das
estratégias das operações policiais por atuações mais eficientes, planejadas e
embasadas em aspectos doutrinários fundamentados  –  as já citadas respostas
especiais das polícias.
Entre outras medidas adotadas pelas polícias do mundo, cabe ressaltar a doutrina
de gerenciamento de crises adotada nos Estados Unidos da América e difundida
pelo Federal Bureau of Investigation (FBI), aplicada na resolução de eventos críticos
que exijam uma resposta especial da polícia a fim de assegurar uma solução
 
 
estudadas e ressaltadas.
 A doutrina do FBI, com as devidas adaptações e adequações à realidade policial e
social brasileira, é a doutrina vigente hoje no Brasil e, por conseguinte, no Espírito
Santo, quando o assunto é crise policial . Assim, todas as obras que serviram de
base para a formulação do presente curso e até mesmo de nossa apostila estão
fundamentadas nessa doutrina.
Quando se fala em crise policial (e pensamos na doutrina e no conjunto de
conhecimentos para solucioná-la), o primeiro pensamento que se vem à cabeça é a
lembrança de uma ocorrência com reféns. Tal fato é totalmente justificável pelo
apelo psicológico e moral que envolve a situação de reféns, por conta do risco às
vidas diretamente envolvidas, pela exposição direta ao perigo do efetivo policial que
atua na ação, pelos questionamentos que se fazem às autoridades governamentais
e por toda a exposição midiática do fato.
Entretanto, deve-se ter em mente que toda ocorrência com reféns será uma crise,
mas nem toda crise é uma ocorrência com reféns, podendo vir configurada em
diversas modalidades, desde uma ocorrência com um suicida (um único indivíduo)
até uma ocorrência de rebelião em estabelecimentos prisionais (com mais de dois
mil detentos).
 As ocorrências com reféns localizados, inegavelmente, são o principal fator gerador
da doutrina de gerenciamento de crises, pois se encaixam perfeitamente no conceito
de crise policial, que veremos logo a seguir.
Em um passado não muito distante, quando “uma certa”  organização policial que
você, aluno, certamente já ouviu falar, era acionada para uma ocorrência com refém,
o quadro que se via era, provavelmente, o seguinte: a presença de inúmeros
 
 
se trocar com os reféns; a presença da imprensa em meio ao aparato policial,
gerando por vezes conflitos e desentendimentos, informações equivocadas e até
mesmo se arriscando próximo aos criminosos; autoridades políticas e eclesiásticas,
advogados e parentes dos envolvidos querendo “negociar” o fim da ocorrência;
populares, atraídos pela curiosidade, dificultando o serviço policial e mesmo se
colocando em situações perigosas face o perigo da ocorrência. Tudo isso deixava a
situação ainda mais tensa e fora de controle, uma vez que com um grande número
de pessoas presentes não é possível estabelecer um cenário adequado que
colabore com a solução da crise. Isso parece familiar para você?
 A doutrina de gerenciamento de crises, portanto, vem com o intuito de minimizar e,
fundamentalmente, extinguir tal cenário catastrófico de desorganização e
descontrole e de fazer desaparecer os conflitos, particularmente entre as polícias
estaduais e entre essas e as autoridades políticas no que tange à definição dos
papéis numa crise.
 As ocorrências de crises no Brasil, de modo geral, e as com reféns localizados, de
maneira particular, são, em sua maioria, considerando-se o perfil dos criminosos
envolvidos, ocorrências simples, não obstante outras complexidades que da própria
ocorrência podem advir.
Isso porque raramente as polícias do país se deparam com criminosos religiosa ou
politicamente motivados ou mesmo com terroristas, dispostos a morrer por um ideal
ou uma causa, levando consigo o maior número de vítimas a fim de atrair atenção
para sua causa.
Na maioria das vezes são criminosos comuns que têm sua ação delituosa
interrompida e, com o objetivo de obter “garantias” do grupamento policial  e evitar o
enfrentamento com o mesmo, passam a figurar como tomadores de reféns (TR).
E então, policial aluno, como garantir a vida dos reféns e dos tomadores de reféns e,
sobretudo, fazê-los acreditar nesta intenção, com o local totalmente desorganizado?
Como garantir a sua vida numa ocorrência como essa? Como trazer o transgressor
da lei à calma e estabelecer com ele uma relação de confiança? Como convencê-los
 
 
instante por outros policiais? Como encerrar essa ocorrência de maneira satisfatória
e aceitável?
Não há uma receita infalível ou uma fórmula mágica. Mas o esforço, o estudo, a
postura profissional sem preconceitos e a massificação da doutrina de
gerenciamento de crises podem dar garantias razoáveis de sucesso: comecemos
por um local de ocorrência devidamente isolado; sigamos com policiais calmos e
orientados, na condição de exercerem o papel de 1º Interventor; foquemos no fato
de os transgressores da lei e os reféns estarem confinados em um único local;
solicitemos a presença de um negociador competente em condições de conduzir o
processo de negociação; tenhamos em mente que o objetivo da polícia, nessas
situações é preservar as vidas de todos os envolvidos e aplicar a lei, acima de
qualquer outra percepção ou motivação pessoal.
Tais posturas, em conjunto com outras ferramentas disponíveis para casos
particulares (como a presença de atiradores de elite ou grupos táticos) certamente
tirarão a corporação de uma atmosfera de amadorismo, evitarão a repetição de
tragédias, como Carandiru, Eldorado dos Carajás e Ônibus 174, e darão prestígio e
confiança às polícias.
Nossa apostila tem por objetivo  discutir   a expor a doutrina de gerenciamento de
crises vigente na PMES e, acima de tudo, ser um guia para você aluno que, na
maioria dos casos, estará envolvido numa ocorrência de crises como o 1º
Interventor. Você está preparado?
2 HISTÓRICO DO GERENCIAMENTO DE CRISES
Como mencionado na introdução da apostila, o tema gerenciamento de crises é um
tema recente, tanto no mundo como no Brasil. Diversas ocorrências, em um
determinado período de tempo por volta das décadas de 1970 a 1990, em que as
corporações policiais e mesmo militares se viram envolvidas em ações desastrosas
diante de cenários de crises, motivaram a criação de uma doutrina a fim de evitar
novos e tão alarmantes erros.
Podemos brevemente citar, à guisa de histórico:
a) as ações terroristas primitivas, nas quais a Organização para Libertação da
Palestina (OLP) resolveu incorporar atentados terroristas mundo afora às
suas estratégias de divulgação da causa, após a Guerra dos 6 Dias: em 1970,
o alvo foi um avião belga; no mesmo ano, o seqüestro simultâneo de 5 aviões
acabou com 3 deles explodidos na Jordânia, pouco após serem evacuados;
em 1971, reservatórios de petróleo em Hamburgo e Roterdã foram sabotados;
em 05 de setembro de 1972, o incidente nos Jogos Olímpicos de Munique,
 Alemanha, sendo que a cinco dias do término dos Jogos, oito terroristas do
grupo árabe denominado “Setembro Negro” invadem o alojamento da
delegação de Israel, matam de imediato dois atletas e exigem a libertação de
cerca de 250 presos que se encontram detidos naquele país. Entre os atletas
sobreviventes, apenas um consegue escapar e outros nove são mantidos
reféns. No desenrolar das negociações, as autoridades alemãs decidem levar
seqüestradores e reféns a um aeroporto militar, de onde poderiam seguir em
uma aeronave para o Egito  – lá seria feita a troca dos reféns pela libertação
dos prisioneiros  – porém, tudo não passava de um embuste... Helicópteros
começaram a sobrevoar a área e dentro deles atiradores de elite alemães
começaram a disparar sobre os terroristas. Estes, cegos pelos refletores do
terminal aéreo, responderam atirando em todas as direções, incluindo no
lugar onde estavam os reféns. O resultado foi dramático: 16 mortos (os nove
atletas de Israel, cinco dos oito terroristas, um policial alemão e o piloto de um
 
 
decolara em Atenas. O piloto foi obrigado a pousar no Liga Airport, em Malta,
para reabastecer a aeronave. As autoridades locais se recusaram a fornecer
combustível e os seqüestradores imediatamente mataram dois passageiros e
feriram gravemente outros três. Após 30 horas de negociações frustradas, um
grupo de elite egípcio atacou e, da ação, morreram cinqüenta e seis
passageiros e dois terroristas, além de restarem trinta e cinco feridos;
b) os incidentes de repercussão internacional envolvendo as polícias brasileiras:
em 02 de outubro de 1992, uma rebelião na Casa de Detenção do Carandiru
é contida pela Polícia Militar com a morte de 111 detentos no episódio que
ficou conhecido como o "Massacre do Carandiru"; em 17 de abril de 1996, em
Eldorado dos Carajás, 1.500 sem-terra estavam acampados na região e
decidiram fazer uma marcha em protesto contra a demora da desapropriação
de terras. A Polícia Militar foi encarregada de tirá-los do local, pois estavam
obstruindo a rodovia, PA-150, que liga Belém ao Sul do Pará. A ordem partiu
do Secretário de Segurança do Pará, Paulo Sette Câmara, que declarou,
depois do ocorrido, que autorizara "usar a força necessária, inclusive atirar".
De acordo com os sem-terra ouvidos pela imprensa na época, os policiais
chegaram jogando granadas de gás lacrimogêneo. Os sem-terra revidaram
com paus e pedras. Dezenove pessoas morreram no confronto e 67 ficaram
feridas; em 09 de dezembro de 1996, em Aparecida de Goiânia, na área de
segurança máxima do CEPAIGO, cerca de 50 presos, liderados pelo
criminoso Leonardo Pareja, tomaram os visitantes e alguns funcionários como
reféns. A crise durou 151 horas e fugiram 43 presos levando reféns. Uma
estudante morreu em uma barreira da Polícia Militar. O assaltante Leonardo
Pareja já havia ganhado fama em 1995, quando ludibriou a Polícia baiana
após assaltar um apartamento em Salvador e manter uma menina de 16 anos
como refém por três dias. Durante mais de um mês, brincou de esconde-
esconde com as autoridades, desmoralizando as polícias brasileiras
envolvidas no processo de sua captura; em 12 de junho de 2000, O morador
de rua Sandro Barbosa do Nascimento decide roubar um ônibus da linha 174,
mas a situação evolui e ele acaba mantendo 10 reféns sob a mira de seu
 
 
c) as ocorrências concernentes às ações da PMES cujas ações e mesmo alguns
desfechos foram desastrosos por conta da inexistência da doutrina de
gerenciamento de crises ou por sua não aplicação: no fórum de São Mateus,
em 1984, na qual dois policiais e os tomadores de refém acabam mortos; na
antiga Casa de Detenção de Vila Velha, em que o Secretário de Justiça da
época e dezenove membros da imprensa são feitos reféns dentro de um
pavilhão do citado presídio; na loja Elmo, no centro de Vila Velha, que
culminou com a ação de um atirador improvisado e a morte do tomador de
reféns; a ocorrência no norte do estado, em Rio Bananal, envolvendo o
criminoso conhecido pela alcunha de Bequinha, e mais recentemente na
transportadora em Cariacica, onde a desorganização e o conflito interna
corporis  contribuíram para um desfecho quase trágico para todos os
envolvidos, sendo que um dos perpretadores se suicidou.
Por conta de todas essas situações que as polícias do mundo e do Brasil sentiram a
necessidade de criar uma doutrina a fim de padronizar ações e minimizar erros.
 A já citada doutrina do FBI serviu de base para os precursores do assunto no Brasil.
Podemos citar o Delegado da Polícia Federal Roberto das Chagas Monteiro, que
publicou uma apostila sobre o assunto, adaptando literalmente o conhecimento norte
americano ao contexto nacional. Temos ainda o Tenente Coronel Wanderley
Mascarenhas de Souza, da PMESP, que produziu monografia de especialização
abordando a temática, em 1995.
Na realidade capixaba, cabe destacar as figuras do Coronel PM RR Juarez Monteiro
da Silva, como o primeiro profissional de segurança pública a colocar em prática o
Gerenciamento de Crises no âmbito da PMES; do Coronel PM RR Carlos Eduardo
Magnago, que juntamente com o Major Daltro Antônio Ferrari Júnior e o Major
 Alexandre Ofranti Ramalho, conduziu o primeiro Curso de Gerenciamento de Crises
da PMES, no BME, em 2001; novamente o Major Alexandre Ofranti Ramalho, que
buscou se destacar no assunto, produzindo também monografia de especialização e
tendo, ao lado do Tenente Coronel Dejanir Braz Pereira da Silva, publicado um livro
que disseminou a doutrina de Gerenciamento de Crises no âmbito da corporação;
dos oficiais que foram buscar o conhecimento em outras polícias do país a fim de
 
 
em Santa Catarina/2001, os então Maj Dejanir Braz Pereira da Silva, Cap Alexandre
Ofranti Ramalho e Cap Jocarly Martins de Aguiar Júnior, em São Paulo/2004 e Cap
 Alessandro Juffo Rodrigues, em Minas Gerais/2005; e dos Tenentes Irio Doria Junior
e José Roberto da Silva Fahning, que escreveram o Curso de Gerenciamento de
Crises Policiais para a Secretaria Nacional de Segurança Pública, através do
sistema de Ensino à Distância, e José Antônio Lopes Cardoso, que trouxe para o
estado a doutrina hoje vigente na PMES de negociação de crises com reféns
localizados.
Vemos, assim, que a necessidade da resposta adequada e doutrinária às crises,
aliada às primeiras abordagens acadêmicas no país, motivou integrantes de outras
polícias, particularmente da PMES, a buscar o conhecimento citado, trazendo as
respostas para os anseios de suas respectivas realidades.
Portanto, atualmente no Brasil, as crises são tratadas de uma maneira quase
uniforme, observando-se pequenas variações de um estado para outro por conta de
diferenças de legislação específica ou doutrina particular e secundária, sendo que se
pode afirmar que as organizações policiais, militares ou civis, adotam uma mesma
doutrina de trabalho com relação a esse assunto, falando uma linguagem
padronizada.
“Um evento ou situação crucial que exige uma resposta especial
da Polícia, a fim de assegurar uma solução aceitável”. 
3 O TERMO CRISE
Uma situação chamada de crise, quando se refere a uma crise policial, ou seja, a
uma ocorrência policial de alta complexidade, pode ser definida como todo fato
de origem humana ou natural, que alterando a ordem pública, supere a capacidade
de resposta dos esforços ordinários de polícia, exigindo intervenção de forças
policiais através da estruturação de ações e operações especializadas, ou típicas de
bombeiros militares, com objetivo de proteger e socorrer o cidadão.
Quando falamos, portanto, de crise policial, estamos nos referindo a um evento
crítico. Existem várias definições para crise policial, que com termos ou expressões
diferentes acabam por dizer e direcionar para o mesmo conceito.
Uma delas, que consegue sintetizar de maneira bem objetiva todas as variáveis que
envolvem esse fato complexo da natureza social humana, é a criada pelo FBI e
adotada pelas polícias brasileiras, que define crise como:
3.1 MODALIDADES DE CRISES POLICIAIS
São consideradas modalidades de crises policiais as seguintes ocorrências:
a) assalto com tomada de reféns;
b) seqüestro de pessoas;
c) ocorrências envolvendo suicidas;
f) atos terroristas;
 j) outras ações criminosas que possam ser definidas como tal.
3.2 O GERENCIAMENTO DE CRISES
Gerenciar crises não é algo pontual, não é uma habilidade particular nem deve ser
fruto do improviso. Gerenciar crises é um processo que engloba diversas e
dinâmicas variáveis.
O conceito vigente, também oriundo do FBI, define o gerenciamento de crises como
“o processo de identificar, obter e aplicar recursos necessários à antecipação,
 prevenção e resolução de uma crise”.
Identificar
recursos
A polícia vai precisar de que para resolver a crise?
Negociadores? Atiradores de elite? Policiais treinados
para atuar como 1º Interventor? Equipamentos de
escuta? Rádios de comunicação? Cavaletes para fazer
isolamento? Etc.
Obter recursos
cursos da PMES a forma correta de atuar numa crise.
Adquirir equipamentos para esse tipo de ocorrência.
Etc.
isolamento. Acionar os negociadores. Aplicar o
conhecimento adquirido e não o “achismo”. 
 Antecipar e
Ministrar aulas sobre “o que é uma crise”. Treinar os
policiais que vão atuar como interventores,
negociadores, atiradores, etc.
envolvidos, até mesmo para o causador da crise, se
possível for.
4 LOCAL DA OCORRÊNCIA
Numa situação de crise, a tensão é máxima, principalmente no momento em que ela
eclode. A tendência natural é que ocorra desorganização exacerbada, sendo que
curiosos, imprensa e autoridades políticas acabam por se sentirem atraídas para o
local do evento, tendo em vista o destaque do fato. O natural então é que comecem
a surgir dificuldades para os policiais encarregados de agir...
 Além disso, existem as dificuldades próprias da corporação policial, sendo que
muitas vezes os agentes envolvidos não possuem conhecimento para intervir ou
equipamento adequado para proporcionar um bom isolamento.
Daí a importância de conhecermos o cenário da ocorrência e termos em mente
como montá-lo para, em seguida, buscarmos as ferramentas para agir.
4.1 ORGANIZAÇÃO DO LOCAL
Devemos saber, antes de falarmos da organização propriamente dita, que o primeiro
policial de serviço que chegar à ocorrência para estabelecer contato com os
causadores da crise será chamado de 1º Interventor . Suas atribuições específicas
bem como dicas para a sua atuação serão discutidas em capítulo próprio, mas a
organização do cenário  – pelo menos as primeiras medidas para que ela aconteça  – 
 já é responsabilidade sua e de sua guarnição de serviço bem como das primeiras
que lhe vierem em apoio.
 A primeira conduta a ser adotada, quanto à organização do local, deve ser conter os
transgressores da lei (CONTENÇÃO), bem como os eventuais reféns ou pessoas
que com eles (os causadores) estejam, limitando seu deslocamento e
movimentações em um local determinado, impedindo fugas ou acesso a outros
espaços físicos, a outras pessoas ou a objetos que possam auxiliar no cometimento
 
 
 A contenção bem realizada diminui o espaço físico ocupado pelos transgressores da
lei e pelos reféns, facilitando o processo de negociação e também a eventual
aplicação de outras alternativas táticas.
 A segunda conduta a ser adotada é isolar o local do mundo exterior
(ISOLAMENTO), de modo que os chamados perímetros táticos de segurança
surjam (perímetro tático interno e perímetro tático externo) ao redor do ponto crítico
 – que é o local específico onde o causador da crise se encontra.
O objetivo do isolamento é, a grosso modo, restringir o acesso das pessoas de fora
da ocorrência ao local onde está o causador da crise e limitar o acesso daquelas
que participam da ocorrência, mas não estão diretamente relacionadas com os fatos
no ponto crítico (como negociação ou entrega de algum item, por exemplo).
Como pode ser visto na figura abaixo, entre o ponto crítico e o perímetro tático
interno não devem permanecer pessoas, sendo que ao haver necessidade de
contato com o causador do evento, policiais devidamente autorizados poderão
transitar momentaneamente e somente durante o tempo necessário para o
contato  (tal conduta será explicada detalhadamente no capítulo sobre as
alternativas táticas), como no caso de negociadores ou integrantes do time tático.
Ou seja, somente o pessoal especializado para aplicar as alternativas táticas é que
deve permanecer no perímetro tático interno.
O perímetro tático interno é definido pela contenção, ou seja, quando o policial faz a
contenção do causador da crise, ele está determinado o perímetro tático interno.
Fica fácil perceber que nem sempre essa contenção poderá ser feita por policiais ou
por cordas, fitas zebradas, etc, assumindo na verdade um limite virtual, e que não há
como se falar em uma distância padrão ou pré-determinada. Por exemplo, imagine
um tomador de reféns dentro de uma pequena casa de três cômodos: o ponto crítico
será toda a casa. A contenção terá por objetivo impedir que ele saia da casa. Um
limite de alguns metros ao redor da construção (cerca de dez ou quinze) será o
suficiente para determinar sua contenção e garantir a segurança dos policiais (veja
que para isso não será preciso rodear a casa com cordas ou que os policiais dêem
as mãos e façam um círculo ao redor da casa, mas será preciso que haja policiais
devidamente abrigados e dentro da distância citada com suas atenções voltadas
para o ponto crítico).
 
 
O perímetro tático externo é definido pelo isolamento. Nesse caso deve-se adotar
uma distância bem maior que a da contenção, desde que o efetivo policial seja
suficiente para garantir a sua manutenção, e utilizar até mesmo obstáculos físicos
para manter curiosos e pessoas que não participam da ocorrência afastadas (como
fitas zebradas ou cavaletes).
 A área entre o perímetro tático interno e o externo é o local onde o gerente da crise,
ao se fazer presente, instalará posto de comando (PC). No PC ficará, além do
gerente, do chefe da equipe de negociação e do líder do grupo tático (posto de
comando tático  –  PCT), o chamado comitê de crise, composto por pessoas
destinadas a assessorar o gerente em suas decisões.
Nesse local ficam também outros órgãos de apoio obrigatórios, como médico,
ambulância, companhias de gás, de eletricidade, de água, corpo de bombeiros, etc.
Fora do isolamento, isto é, após o perímetro tático externo, a movimentação é livre,
seja para imprensa ou curiosos. É interessante que nessa área haja pessoal
especializado de trânsito para controle de fluxo de veículos ou desvio do mesmo, se
preciso for.
Como comentado, a forma e o tamanho dos perímetros táticos vão depender da
natureza, da localização e do grau de risco do ponto crítico. Nessas condições,
normalmente é esperado que o isolamento de um ponto comercial em uma rua do
interior do estado, onde ocorre um assalto, não possua as mesmas características e
o mesmo grau de dificuldade se esse comércio estiver localizado na Av. Jerônimo
Monteiro, no centro da capital capixaba.
 
 
Contudo, um ponto muito importante deve sempre ser lembrado: não importam quais
as dificuldades, o isolamento do ponto crítico deve sempre ser realizado, sob pena
de comprometer o êxito da missão de gerenciamento da crise.
É importante lembrar que, ao ser estabelecido o contorno dos perímetros táticos,
quanto mais amplo for o perímetro tático mais difícil se torna a sua manutenção, por
exigir um maior número de policiais e causar maiores transtornos na rotina das
pessoas que vivem nas proximidades do ponto crítico ou dele se utilizam.
Somente após proceder a contenção e o isolamento é que o policial 1º Interventor  
fará contatos no intuito de iniciar as negociações, sem proceder concessões e
objetivando acalmar os envolvidos, adotando diálogo racional, através das dicas
listadas na alternativa tática da negociação.
4.2 RELACIONAMENTO COM A IMPRENSA
 As ocorrências de alta complexidade atraem sobremaneira o interesse da imprensa,
ávida por dar informações em primeira mão, principalmente se conseguir uma
exclusividade ou o chamado “furo de reportagem”.   A presença maciça desses
profissionais tem sido uma preocupação a mais para ser administrada pelo gerente
da crise, preocupado em não fornecer informações desnecessárias ao causador do
evento ou ainda em causar alarde desnecessário à sociedade como um todo  – além
da preocupação natural com a vida dos próprios integrantes da imprensa, que por
vezes não medem o risco a que se submetem atrás da notícia.
Devemos ter em mente a importância social do papel da imprensa, no entanto,
sobretudo no cenário de uma ocorrência policial, o direito à vida das pessoas
transcende o dever de informar da imprensa e o direito de saber do público.  A
interpretação desta frase deve garantir a tão proclamada liberdade de imprensa,
desde que não ofereça risco ao trabalho daqueles que, por força da doutrina e da lei,
têm o dever legal de atuar na solução do evento crítico.
Por outro lado, não deve o aparato policial simplesmente ignorar a presença da
mídia no local da crise. Como o repórter precisa dar a notícia e produzir informações
 
 
poderá tomar a liberdade de falar o que quiser, até mesmo complicando o cenário da
ocorrência por transmitir informações equivocadas ou falsas (temos diversos
exemplos na realidade policial brasileira, como recentemente em rebelião na UNIS,
em Cariacica).
Nos primeiros instantes de uma crise, o 1º Interventor deve garantir que os
integrantes da imprensa não se coloquem em risco, não comprometam a segurança
da operação e não interfiram na ocorrência.
Com a chegada do gerente e o estabelecimento do cenário da ocorrência,
recomenda-se então designar um policial como assessor de imprensa, sendo que
este irá escolher um local seguro para acomodação de todo o pessoal da imprensa e
lhes informar que, a cada 30 minutos, por exemplo, serão divulgadas informações
sobre o andamento das operações policiais. Isto tem gerado, na prática, resultados
interessantes, pois todos ficam satisfeitos e o gerente da crise passa a ter, através
do assessor de imprensa, o controle desses profissionais.
 A mídia tem o papel de relatar as notícias, obtendo-as em primeira mão. A polícia
tem o papel de garantir o cerco e o isolamento para o desfecho aceitável da
ocorrência. Assim sendo, dentro do espectro democrático, a imprensa poderá obter
seus relatos e informações, desde que não coloque vidas em risco (nem a de seus
componentes) nem interfira na missão constitucional da polícia de preservar vidas e
aplicar a lei.
 A falta de habilidade para conduzir as relações com a imprensa pode gerar
problemas como: interferência nas negociações; divulgação de preparativos da
polícia; divulgação de dados dos reféns; incentivo à resistência; relato exagerado,
capaz de causar reação adversa do público; falta de apoio; favoritismo; entre outros.
4.3 O GERENTE DA CRISE
 As ocorrências de crise são, claramente, ocorrências em que há uma perturbação da
ordem pública. Não há dúvidas de que cabe às Polícias Militares a atribuição de
preservação da ordem pública, pois é o que assegura a nossa lei maior  –  a
Constituição Federal.
 
 
Uma crise com reféns localizados, por exemplo, é uma atribuição específica de
restabelecimento da ordem pública, portanto, missão das Polícias Militares
exclusivamente. Não há que se falar que seja atribuição de padres, pastores,
advogados, repórteres, juízes ou promotores de justiça, ainda que essas pessoas
possam contribuir de maneira salutar para a resolução do problema, mas nunca
serem as responsáveis por isso. Normalmente são os policiais militares os primeiros
a tomar conhecimento desse tipo de evento crítico e dessa forma, enquanto assim
as coisas acontecerem, recomenda-se que o gerente da crise seja o policial militar
de maior graduação ou posto, presente no local, cabendo-lhe então toda a
responsabilidade pelo gerenciamento da crise, sendo ele a única autoridade do local
com poder decisório.
Todo staff   (gabinete) formado para assessoramento, o grupo de negociadores e o
grupo tático deverão estar subordinados ao gerente da crise. É um erro comum de
estratégia quando as autoridades do Poder Executivo determinam atribuições em
conjunto, por exemplo, entre as polícias militar e civil, ou ainda, designam membros
de suas secretarias para “assumir o comando” das operações policiais . Outro erro é
quando a própria corporação policial se exime de assumir sua responsabilidade
constitucional ou é vitimada por interferências políticas, o que sempre culmina em
resultados indesejados.
O gerente da crise também é denominado de comandante do teatro de operações.  
4.4 O GABINETE DE GERENCIAMENTO DE CRISES
O gerente da crise, sendo o policial responsável por coordenar e comandar todas as
ações policiais, deverá tomar diversas decisões, desde a simples entrega de água
ou comida a um tomador de reféns até determinar que uma tropa de choque invada
um pavilhão de presídio rebelado para debelar o movimento ou ainda que o time
tático invada um cativeiro para liberar reféns e, se preciso for, neutralizar criminosos.
Muitas vezes, porém, tais ações podem ser vistas de maneira distorcida pela
sociedade, imbuída pela idéia de que a polícia quer “exterminar bandidos”. Além
disso, dificilmente será o gerente um perfeito dominador de diversas áreas do
conhecimento humano, como as ciências jurídicas e a psicologia.
 
 
Daí a importância de ser formar o chamado gabinete de gerenciamento de crises (ou
simplesmente gabinete de crises), que será constituído por pessoas delegadas ou
convidadas para tal, tais como juiz da vara de execuções penais, membro da
promotoria pública, membro da OAB, integrante de pastoral carcerária ou órgãos de
direitos humanos, etc, conforme a situação e a necessidade. Seus objetivos
principais são:
- dar respaldo às ações da polícia, constatando in loco que todas as ações
necessárias e legais foram tomadas para o desfecho da ocorrência (se, por
exemplo, for necessário invadir o ponto crítico, essas pessoas estarão
acompanhando o processo e constatarão que não foi uma “execução sumária” por
parte da PM);
- assessorar o gerente quanto às dúvidas específicas, como questões legais e
 jurídicas ou de cunho psicológico acerca dos causadores do evento e suas
eventuais vítimas (conforme situação acima, se a polícia estará embasada por
excludentes de ilicitude, por exemplo).
Os gabinetes podem ser constituídos de duas maneiras: formar grupos ad hoc  para
responder a cada ocorrência de situação de crise ou desenvolver uma organização
mais permanente, do tipo Gabinete de Crise, para responder a todas as situações de
crise.
Grupos ad hoc (formados para cada caso, cada crise) costumam ser menos
eficientes, pois são constituídos por pessoas sem entrosamento e, às vezes, que
nem desejam participar do processo.
Os Gabinetes de Crise formalmente nomeados são organizados de maneira que
cada órgão importante para a resposta à crise está representado. A autoridade e a
responsabilidade estão claramente delineadas num documento de planejamento.
Costuma haver entrosamento e conhecimento da atividade policial e de suas
necessidades. Os membros do gabinete estão habituados ao ambiente da crise e
sabem que a polícia vai trabalhar para aplicar a lei, preservar todas as vidas
possíveis e atender necessidades e não desejos dos envolvidos, quando isso for
possível e fundamental para o desfecho da ocorrência.
 
 
5.1 CARACTERÍSTICAS DA CRISE
 As crises possuem três caracterís ticas bás icas :
a) imprevisibilidade: a crise é não-seletiva e inesperada, isto é, qualquer pessoa
ou instituição pode ser atingida a qualquer instante, em qualquer local, a
qualquer hora. Sabemos que ela vai acontecer, mas não podemos prever
quando. Portanto, devemos estar preparados para enfrentar qualquer crise.
Ela pode ocorrer assim que você acabar de ler este parágrafo;
b) compressão do tempo: embora as crises possam perdurar por dias, os
processos decisórios que envolvem deliberações para adoção de posturas na
ambiência operacional devem ser efetivadas em um curto espaço de tempo.
 As ocorrências de alta complexidade impõem às autoridades policiais
responsáveis pelo seu gerenciamento urgência, agilidade e rapidez   nas
decisões.
 Além disso, as medidas iniciais (conter, isolar, etc, que serão discutidas mais
à frente) também devem ser tomadas o mais rapidamente possível.
Contudo, não se deve confundir a compressão de tempo para tomar as
medidas iniciais e para que o gerente tome suas decisões com pressa para
resolver a ocorrência. Ao contrário do que se acredita e até mesmo de
depoimentos esdrúxulos e sem cabimento algum veiculados pela mídia, não
há um prazo para se resolver uma ocorrência de crise policial. Se for possível
resolver a crise em poucos minutos, num ambiente de segurança, assim o
será. Se for preciso aguardar quatro meses, como no caso da embaixada do
Japão em Lima, no Peru, assim também o será; e
 
 
 A experiência no tratamento destas questões permite destacar ainda outros
três fatores que podem também caracterizar uma situação de crise:
- alto grau de pressão psicológica;
- conflitos de competência;
- alto poder desestabilizador do clima de segurança subjetivo. 
 A conjugação da imprevisibilidade, compressão de tempo e ameaça à vida fazem
com que as ocorrências de alta complexidade se desenvolvam em um clima
conturbado e de alto grau de pressão psicológica.
Isto gera ansiedade e estresse que, fora de determinados padrões, reduzem a
capacidade de desempenho a nível mental e físico dos profissionais de polícia
ostensiva que tenham de atuar no teatro de operações.
No contexto das crises, como um fator complicador a mais, os conflitos de
competência, invariavelmente, emergem em meio à confusão de autoridades,
políticos, organizações policiais, imprensa e outros segmentos da comunidade que
se apresentam para participarem dos esforços de restauração da ordem pública.
Outra característica marcante das situações aqui estudadas é o seu alto poder
desestabilizador do clima de segurança subjetiva da comunidade. As ocorrências de
alta complexidade são, em sua grande maioria, amplamente noticiadas e ganham
repercussão até internacional, em muitas ocasiões. A crise, retratada em todas as
suas facetas, passa a se constituir no núcleo dos noticiários.
5.2 NECESSIDADES POLICIAIS EM OCORRÊNCIAS DE CRISE
 Ao se deparar com uma crise, a polícia precisa dar uma resposta especial, ou seja,
uma resposta diferente, de acordo com a situação, pois a crise, por definição, é
aquela ocorrência que foge da normalidade, da rotina de atuação policial. Sendo
assim, seus esforços de rotina (aquela dupla do policiamento a pé ou da bike,
aquela equipe de radiopatrulha com seis ou oito policiais) não serão suficientes para
 
 
cuidar de reféns liberados, falar com a imprensa, dar satisfação da ocorrência aos
seus superiores e ao CIODES... fácil, não?
Por essas razões, as instituições policiais necessitam de algumas posturas, entre
quais destacamos: 
a) postura organizacional não-rotineira: a organização policial necessita de um
preparo e um treinamento prévio para o enfrentamento de eventos críticos e,
mais ainda, de colocar esse preparo em prática quando houver uma crise. Se
a organização adotar as mesmas posturas para resolver ocorrências
consideradas rotineiras e as consideradas crises estará caminhando para
fracassos e descrédito;
b) planejamento analítico especial e capacidade de implementação: ao ser
acionada para uma crise, a corporação policial precisa planejar sua ação com
base em uma análise específica do caso. Não é preciso salientar que cada
caso é um caso e, portanto, cada crise demandará um planejamento em cima
de uma análise exclusiva. Deve-se optar ainda pelas soluções simples e
possíveis de serem levadas a termo em detrimento às soluções
cinematográficas, impossíveis de serem executadas. Ou seja, a polícia deve
ser capaz de implementar a solução que acha a melhor para resolver o
problema ou então buscar uma que seja; e
c) considerações legais especiais: em eventos críticos são necessárias reflexões
sobre temas como estado de necessidade, legítima defesa, estrito
cumprimento de dever legal, responsabilidade civil, etc, como em qualquer
outra ação policial. Porém, embora amparada por estas excludentes de
ilicitude, a ação policial precisa também considerar fatores intrínsecos à crise
e até mesmo a aceitabilidade pela opinião pública. Numa situação, por
exemplo, onde o pai que ameaça matar o filho com uma faca, embora exista o
amparo legal para atuar, a sociedade certamente irá questionar: será que o
pai teria mesmo coragem de matar o próprio filho? Era mesmo necessário
matar o pai na frente do filho?
 
 
5.3 OBJETIVOS DO GERENCIAMENTO DE CRISES
Grande parte dos erros cometidos e distorções que são observadas durante a
estruturação de ações de resposta, por ocasião do gerenciamento de uma crise,
decorrem da inexistência ou do desrespeito a conceitos essenciais a este tipo
específico de trabalho policial.
Isto compromete a compreensão do fato delituoso, inibe a adoção de posturas na
ambiência operacional e induz a operacionalizar estratégias equivocadas. É preciso
estabelecer os objetivos que direcionarão a atuação de uma força policial nas
situações de crise.
Em uma crise, todos os esforços para a preservação da ordem devem ser
desenvolvidos com os seguintes objetivos gerais :
1) Preservação de vidas , sem distinções:
a) Dos reféns;
c) Dos policiais;
d) Dos criminosos.
a) Prisão dos infratores protagonistas da crise;
b) Proteção do patrimônio público/privado;
c) Garantir o estado de direito.
5.4 CRITÉRIOS PARA TOMADA DE DECISÃO
Deve ficar bem claro, como apresentado anteriormente, que toda a decisão em uma
crise é da responsabilidade da instituição policial militar. Sendo assim, por ser o
gerente da crise o policial mais antigo no local ou aquele que foi designado para
essa função, todas as decisões caberão a ele. Não pode haver mais de uma pessoa
decidindo. Em uma crise, assim como numa simples abordagem policial, devemos
primar pelo princípio da unidade de comando.
 
 
Porém, no início da crise, onde muitas vezes nem o CPU da área se fez presente,
quanto mais o dito gerente da crise, o que fazer? O policial que primeiro se depara
com a ocorrência deve ou não tomar decisões?
O correto é buscar adotar quatro medidas básicas, que são: conter, isolar,
estabelecer contato com o causador da crise (“negociar”) sem fazer concessões, e
estabilizar os ânimos - inclusive o seu!
Mas pode ser que nesses primeiros contatos, ainda antes da chegada do gerente e
dos negociadores, enquanto você habilmente tenta acalmar um tomador de reféns,
por exemplo, seja preciso tomar uma ou outra decisão. Pode ser que esse tomador
de reféns lhe faça a proposta de troca um dos reféns por uma garrafa de água. E aí?
O que fazer? Devo ou não tomar essa decisão?
 A fim de alcançar os objetivos apresentados (preservar vidas e aplicar a lei), o
policial envolvido numa ocorrência de alta complexidade poderá se ver numa
situação na qual deverá tomar decisões pertinentes aos campos de gerenciamento
aqui abordados, desde as mais simples às mais complexas, como o fornecimento de
água ou alimentação para os reféns e para os delinqüentes, atendimento médico de
urgência a uma vítima no interior do ponto crítico, o corte de linha telefônica e
fornecimento de eletricidade, ou até mesmo o emprego de força.
 Assim, para fundamentar as decisões e nortear o processo decisório nesses casos,
a doutrina do FBI preconiza três critérios para a tomada de decisões:
O critério de NECESSIDADE  indica que toda e qualquer ação somente deve ser
implementada quando for indispensável. Se não houver necessidade de se tomar
determinada decisão, não se justifica a sua adoção. O que se pretende fazer é
realmente necessário?
 
 
O critério da VALIDADE DO RISCO estabelece que toda e qualquer ação tem que
levar em conta se os riscos dela advindos são compensados pelos resultados. A
pergunta que deve ser feita é: vale a pena correr este risco?
Este critério é muito difícil de ser avaliado, pois envolve fatores de ordem subjetiva
(já que o que é arriscado para um não é para outro) e de ordem objetiva (o que foi
proveitoso em uma crise poderá não sê-lo em outra).
O terceiro critério, ACEITABILIDADE, implica em que toda decisão deve ter respaldo
legal, moral e ético.
 A aceitabilidade legal significa que toda decisão deve ser tomada com base nos
princípios ditados pelas leis. Uma crise, por mais séria que seja, não dá à
organização policial a prerrogativa de violar leis.
 A aceitabilidade moral  implica que toda decisão para ser tomada deve levar em
consideração aspectos de moralidade e bons costumes.
 A aceitabilidade ética está consubstanciada no princípio de que o responsável pelo
gerenciamento da crise, ao tomar uma decisão, deve fazer isso lembrando que o
resultado de sua ação não pode exigir de seus comandados a prática de ações que
causem constrangimentos “ interna corporis”.
Questões para discussão: o TR quer trocar um refém por um cigarro de maconha;
um refém teve um ataque cardíaco e o TR quer que o policial deixe o médico entrar
no cativeiro; um policial deseja se trocar pela refém que está grávida de nove
meses.
6 FASES DO GERENCIAMENTO DE CRISES
Como estudado anteriormente, o gerenciamento de crises é um processo que se
destina a ajustar recursos para a corporação policial a fim de que a mesma possa,
satisfatoriamente, solucionar uma crise.
Vimos também que esse processo não se foca apenas na crise em si, mas ele está
preocupado na obtenção de recursos de modo a antecipar e a prevenir a crise.
Por conta disso, fica estabelecido que o gerenciamento de crises se divide em cinco
fases, que vão desde antes da eclosão da crise até o momento posterior ao seu
encerramento.
Tais fases objetivam que as crises sejam tratadas de modo individualizado e com
caráter analítico, proporcionando melhor adequação de solução a cada caso e uma
posterior avaliação da atuação policial.
De todas elas, para os objetivos de nosso curso, a mais importante é a 2ª Fase,
chamada de Resposta Imediata, pois é nela que o 1º Interventor estará de fato
atuando e sofrendo todas as pressões possíveis e imagináveis até o desfecho ou a
rendição.
6.1 1ª FASE - PRÉ-CONFRONTAÇÃO OU PREPARO
É a fase que antecede a eclosão de um evento crítico. É aquela em que a polícia
não ficará somente esperando a crise acontecer para depois tomar uma atitude.
Tem a preocupação com a difusão do conhecimento, com a troca de experiências,
com o treinamento dos elementos que poderão participar de uma ocorrência de alta
complexidade. É isso que estamos fazendo neste momento: lendo, estudando,
ouvindo o instrutor a fim de nos prepararmos para a próxima crise em que vamos
operar.
6.2 2ª FASE - RESPOSTA IMEDIATA
É a fase em que a crise acabou de se iniciar e a polícia dá a sua primeira resposta.
Na imensa maioria dos casos a resposta não é dada pela tropa especializada
nessas ocorrências, justamente por conta da imprevisibilidade das crises.
 Aqui as ações policiais se resumem principalmente em CONTER, ISOLAR e
INICIAR AS NEGOCIAÇÕES SEM FAZER CONCESSÕES, estabilizando os ânimos
dos envolvidos. Você, como 1º Interventor, deverá conhecer algumas dicas de como
negociar sem fazer concessões até a chegada dos negociadores especializados e
de como acalmar os envolvidos, o que será ensinado logo, logo. Aqui também serão
determinados o grau de risco e o nível de resposta, tentará se identificar a tipologia
dos criminosos. Nesta fase, de forma preliminar, deverão ser observados ainda os
elementos essenciais da informação que auxiliarão o processo de gerenciamento de
crises, tais como:
a) Causadores da crise: número, motivação, estado mental, condição física,
habilidade no manuseio de armas, experiências anteriores em delitos semelhantes,
etc.
b) Reféns: número, idade, condição física, localização no ponto crítico, proeminência
ou relevância social, etc.
escalar?), peculiaridades (edifício? aeronave? navio?), condições do terreno
circundante e condições metereológicas, etc.
d) Armamento: quantidade, tipo, letalidade, localização no ponto crítico, etc.
6.3 3ª FASE - PLANO ESPECÍFICO
É a fase em que o gerente da crise e seus assessores discutem e elaboram uma
 
 
Nesta fase, o papel da equipe de informações, conhecida também como setor de
inteligência, é preponderante. As informações colhidas e devidamente analisadas é
que vão indicar qual a solução para a crise.
6.4 4ª FASE - A RESOLUÇÃO
É a fase na qual se executa ou implementa o plano específico. Várias podem ser as
soluções encontradas para um evento crítico, como a rendição dos perpetradores
através da saída negociada ou o uso de força letal.
Não importando qual a solução a ser adotada, ela deve ser executada através de um
esforço organizado, sendo importante encaminhar a solução da crise dentro do que
foi planejado durante a fase anterior, evitando haver perda do controle da situação
por parte da polícia.
6.5 5ª FASE: PÓS-EVENTO
É a fase posterior ao evento crítico onde a Instituição, por meio dos policiais
envolvidos na ação, reavalia todos os treinamentos, elabora estudos de casos e
corrige procedimentos. Com as conclusões tomadas na fase pós-evento, a fase de
pré-confrontação ou preparo será atualizada e assim a corporação se preparará
melhor para outros eventos críticos que poderão ocorrer, criando um ciclo de auto-
avaliação e correção das medidas que se mostraram ineficientes.
 
 
7 TIPOLOGIA DOS TOMADORES DE REFÉNS
Um homem armado faz uma mulher e uma criança reféns dentro de uma casa. Seria
ele o marido dela? Ou um assaltante? Possui problemas mentais? Já tem passagem
pela polícia ou cumpriu pena em presídios? Tem alguma motivação religiosa? É um
suicida “disfarçado”? 
Essas são perguntas que, num primeiro momento podem parecer não tão
importantes, mas, na verdade, conhecer o tipo de causador de uma crise é
fundamental para direcionarmos nossas ações, nos acautelarmos quanto à
segurança dos envolvidos e alcançarmos as soluções aceitáveis para todos.
Na tentativa de auxiliar os gestores policiais nessa difícil tarefa de coleta de dados
acerca dos tomadores de reféns, os estudiosos da disciplina Gerenciamento de
Crises têm procurado desenvolver uma tipologia dos causadores de eventos críticos.
O Capitão Frank Bolz Junior, do Departamento de Polícia de Nova Iorque, EUA, na
sua obra Como ser um refém e sobreviver , classifica-os em três tipos fundamentais,
que são os mesmos que seguimos em nossa realidade:
O primeiro deles é o criminoso comum  (também conhecido como criminoso
contumaz, criminoso “profissional” ou criminalmente motivado). É o indivíduo que se
mantém através de repetidos furtos e roubos e de uma vida dedicada ao crime. Essa
espécie de criminoso, geralmente, provoca uma crise por acidente, devido a um
confronto inesperado com a polícia, na flagrância de alguma atividade ilícita. Com a
chegada da polícia, o indivíduo agarra a primeira pessoa ao seu alcance como refém
e passa a utilizá-la como garantia para a fuga, neutralizando, assim, a ação dos
policiais. O grande perigo desse tipo de causador de evento crítico certamente está
nos momentos iniciais da crise. Em média, os primeiros quinze a quarenta e cinco
minutos são os mais perigosos. Esse tipo de causador de crise representa a maioria
dos casos ocorridos no Brasil.
O segundo tipo é o emocionalmente perturbado.  Pode ser um indivíduo com
alguma psicopatia ou que esteja completamente divorciado da realidade ou ainda
simplesmente alguém que não conseguiu lidar com seus problemas de trabalho ou
 
 
normalmente envolve as relações familiares. Estatisticamente, nos Estados Unidos,
esse é o tipo de indivíduo que causa a maioria dos eventos críticos. Brigas
domésticas, problemas referentes à custódia de menores, empregados revoltados
ou alguma mágoa com relação a uma autoridade podem ser o estopim para a
prática de atos que redundem em crises. Não há no Brasil dados estatísticos
confiáveis que possam indicar, com exatidão, o percentual representado por esse
tipo de causadores de eventos críticos no universo de crises registradas no país,
verificando-se nos noticiários que algumas dessas situações se vinculam à prática
de crimes chamados passionais.
O terceiro e último tipo é o terrorista por motivação política.  Apesar de não
ostentar uma liderança estatística, essa espécie de causadores de eventos críticos
é, de longe, a que causa maior estardalhaço. Basta uma olhada nos jornais para se
verificar as repercussões causadas por esse tipo de evento ao redor do mundo. É
que pela própria essência desses eventos, geralmente cuidadosamente planejados
por grupos com motivação política ou ideológica, a repercussão e a divulgação
constituem, na maioria das vezes, o principal objetivo da crise, que se revela como
uma oportunidade valiosa para críticas a autoridades constituídas e para revelação
dos propósitos ou programas do grupo.
Um subtipo dessa categoria de causadores de eventos críticos é o terrorista
por motivação religiosa. É muito difícil lidar com esse tipo de elemento porque não
pode haver nenhuma racionalização através do diálogo, o que praticamente
inviabiliza as negociações. Ele não aceita barganhar as suas convicções e crenças.
Quase sempre, o campo de manobra da negociação fica reduzido a tentar
convencer o elemento de que, ao invés de morrer pela causa, naquele evento
crítico, seria muito mais proveitoso sair vivo para continuar a luta. Para esse tipo de
causador de crise pode parecer, em dado momento, ser mais conveniente sair da
crise carregado nos braços dos seus seguidores como um herói.
Seja qual for o tipo do causador do evento crítico, deve-se evitar, no curso da
negociação, a adoção de posturas estereotipadas com relação à tipologia e à
motivação. A classificação aqui apresentada, a par de suas imperfeições, deve servir
apenas como um ponto de orientação na diagnose dos tomadores de reféns, dado o
papel primordial que eles desempenham no processo de negociação.
 
 
E, certamente, tratando-se de criminosos emocionalmente perturbados, é
fundamental a participação de um profissional de saúde mental para auxiliar a
negociação e o processo decisório.
 
 
Para resolução de ocorrências com reféns localizados
 As chamadas alternativas táticas são ferramentas de que as polícias dispõem (ou
pelo menos deveriam dispor) para empregar nas situações de crise a fim de
alcançar a resolução da mesma.
Surgiram ao longo dos anos pela confrontação das necessidades em ocorrências de
crise com a capacidade de resposta das corporações policiais. Sendo assim, já
sofreram muitas mudanças e evoluções, sendo um recurso altamente dinâmico, de
modo que as alternativas hoje empregadas diferem das primeiras e, certamente no
futuro, há que se crer na reformulação de uma ou outra ou mesmo existência de
novidades nesse campo.
No início, a idéia das polícias era forçar os criminosos a se entregar. Como nem
sempre isso ocorria, percebeu-se a necessidade de outros meios de persuasão. Daí
começou o emprego de gás lacrimogêneo. Para casos mais extremos, viu-se que
era preciso empregar policiais específicos para fazer disparos com precisão cirúrgica
ou ainda policiais que possuíssem treinamento e disposição para invadir um
cativeiro.
 As alternativas táticas, então, vêm sofrendo adequações e mudanças para melhor
resolução de ocorrências de alta complexidade. No Brasil, as quatro alternativas
táticas empregadas são denominadas mais comumente como: negociação,
emprego de técnicas não-letais, tiro de comprometimento ou sniper  e invasão
tática.
8.1 NEGOCIAÇÃO, A 1ª ALTERNATIVA TÁTICA
 A negociação costuma ser chamada de “a rainha  das alternativas táticas”. Isso
porque, na quase totalidade das ocorrências em nosso país, o transgressor da lei faz
o refém de forma ocasional, ou seja, foi percebido na sua ação criminosa, teve sua
fuga frustrada e, temendo o confronto com a polícia, cria a situação de refém. Note-
 
 
qualquer policial pode aplicar para resolver uma ocorrência dessa natureza. Em
outras palavras, se faz necessário demonstrar ao transgressor da lei que ele terá
sua vida preservada se entregar as armas e liberar os reféns, mas será preso.
No entanto, como conseguir atingir esse objetivo dentro de um cenário de crise,
envolvendo reféns localizados, com dezenas de policiais falando ao mesmo tempo,
posicionando-se de qualquer forma, portando armas sem segurança, com repórteres
fazendo o seu trabalho a qualquer preço e familiares e vizinhos em estado de
desespero? Como transmitir confiança ao criminoso, trazendo-o à calma necessária
para que possa refletir e concluir que só lhe resta ir para a prisão?
 A resposta é iniciar o processo de negociação, que consiste em conduzir o
transgressor da lei à calma, estabelecendo uma relação de confiança entre ele e o
negociador de forma a convencer o transgressor de que a melhor solução é
entregar-se para que lhe seja garantida a vida e a integridade física. Se essa
negociação for a realizada pelo 1º Interventor, deve ser feita sem concessões. Como
no Brasil, devido a uma série de fatores culturais e legais, a maior parte das
ocorrências tem se resolvido assim, a negociação assume papel preponderante
frente às demais alternativas.
 A negociação, seja a do negociador especializado, seja a do 1º Interventor, tem por
objetivos: ganhar tempo, abrandar exigências, colher informações e prover, se
preciso, um suporte tático (nesse último caso, o 1º Interventor somente o faz se
estiver apoiado pela equipe de negociação).
8.2 TIPOS DE NEGOCIAÇÃO
 A negociação pode ser real ou tática.
 A negociação real, também chamada de pura, é o processo de convencimento de
rendição dos criminosos por meios pacíficos, trabalhando a equipe de negociação
com técnicas de psicologia, barganha ou atendimento de reivindicações razoáveis.
Ou seja, é aquela negociação em que o policial tentará a todo instante, por meio
somente do convencimento, fazer com que o causador do evento crítico se entregue
às autoridades. É, como se diz, “gastar o verbo”. 
 
 
Já a negociação tática (também conhecida por preparatória) é o processo de coleta
e análise de informações para suprir as demais alternativas táticas, caso sejam
necessários os seus empregos, ou mesmo para preparar o ambiente, reféns e
criminosos para este emprego. Nesses casos, o negociador ainda mantém a
negociação, mas seu objetivo é acarretar uma distração no causador do evento
crítico a fim de que outra alternativa seja empregada, como, por exemplo, a invasão
do local.
Pela importância que se verifica no processo de negociação, ela não deve ser
confiada a qualquer um. Dela ficará encarregado um policial com treinamento
específico, denominado negociador. Esse policial terá um papel de suma
responsabilidade no processo de gerenciamento de crises, sendo muitas as suas
atribuições. Servirá de intermediário entre os causadores do evento crítico e o
gerente da crise. A figura do negociador está atrelada às ações do grupo tático,
dada à possibilidade de evolução crítica do evento.
No caso de se optar pela solução tática, na qual a negociação então passará a ser
tática (preparatória para outra alternativa tática), o negociador assumirá um papel
tático de suma importância no curso da crise, que poderá ser desempenhado de três
maneiras:
a) através da coleta de informações, durante as negociações;
b) através da utilização de técnicas de negociação que otimizem a efetividade do
risco de uma ação tática; e
c) pelo uso de técnicas de negociação específicas, como parte de uma ação
tática coordenada.
Cabe aqui ressaltar que o 1º Interventor não é o Negociador , sendo que essas
são funções distintas numa ocorrência de crises. Inclusive, dependendo do nível de
atuação do 1º Interventor, ele poderá atuar sendo ajudado por negociadores
experientes, que lhe darão dicas e suporte técnico e emocional, mas também poderá
ser substituído por esses mesmos negociadores se não estiver conduzindo
adequadamente o processo de barganha e convencimento.
Para o 1º Interventor atuando sozinho, sem o estabelecimento do cenário completo
de gerenciamento de crises, os objetivos de ganhar tempo, abrandar exigências e
 
 
restrições uma vez que o 1º Interventor não atuará na negociação tática, cabendo a
ele a negociação real apenas e sem fazer concessões, a não ser em limitadíssimas
exceções que serão explicadas.
8.3 QUEM DEVE SER O NEGOCIADOR?
O negociador deve ser um policial com curso de Negociação de Crises que, além
do conhecimento técnico, possua algumas qualidades pessoais específicas, como: a
respeitabilidade, a confiança em si, o otimismo, a confiança na doutrina, a
capacidade de trabalhar em grupo e a comunicabilidade, entre outras.
É indispensável ainda que o negociador conheça profundamente as outras
alternativas táticas para, de forma integrada, criar o cenário ideal para a solução da
crise, se essa não puder ser a solução negociada.
Durante muito tempo se discutiu se a função do negociador poderia ser
desempenhada por pessoa que não fosse policial. O uso de negociadores não-
policiais é uma experiência por que já passaram quase todas as organizações
policiais, especialmente quando, historicamente, as primeiras crises necessitaram da
intervenção de alguém para servir de intermediário ou interlocutor entre os
causadores dos eventos críticos e as autoridades policiais. Pode-se até afirmar, e
com certa segurança, que os primeiros negociadores foram, historicamente, não-
policiais. E essa realidade teve suas razões de ser.
Tal concepção, contudo, é superada e perigosa. Hoje se pode dizer, com certeza,
que a utilização de negociadores não-policiais é uma opção de alto risco.
Psicólogos, psiquiatras e até outros especialistas em ciências comportamentais
podem e devem ser bem-vindos ao local da crise, mas a sua atuação se deve limitar
tão-somente à prestação de assessoria ao gerente da crise e aos negociadores
policiais.
 
 
Imagine você tentando ganhar tempo na negociação (o que é fundamental) e
quando o TR lhe pede um carro você diz que vai verificar com seu comandante para
ver se ele autoriza. Essa é uma medida eficiente a fim de fazer o tempo passar  – e
veremos o porquê em breve. Agora imagine a mesma cena só que em vez de você,
quem está lá negociando é o seu comandante. O que ele vai fazer para ganhar
tempo, se a decisão é dele? Fora isso, como ele vai conseguir falar com o TR e ao
mesmo tempo coordenar o isolamento, atender as ligações, dar declarações à
imprensa, tomar suas decisões?
 A experiência, portanto, tem demonstrado que o comandante da cena de   ação
geralmente não é um bom negociador, pois o negociador não pode ter poder de
decisão, por estar justamente diretamente envolvido na negociação.   Além disso, ao
se tornar negociador, o gerente da crise desvia seus esforços e a sua concentração
mental de inúmeros outros assuntos importantes que envolvem a sua missão de
gerenciar a crise.
Outra questão é que os comandantes estão habituados a comandar, ou seja, a
determinar. Se esse profissional não souber separar as situações, como ele irá para
a negociação, que é um processo pautado na barganha e não na imposição?
8.5 ESTRUTURA BÁSICA PARA UMA EQUIPE DE NEGOCIAÇÃO
Pela complexidade da ocorrência de crise, o negociador não deve atuar sozinho
nessa função.
 A configuração mínima sugerida de uma equipe de negociação seria a seguinte:
a) chefe da equipe (é o consultor sobre negociação do gerente da crise);
b) anotador (mantém o quadro de situação e o quadro-horário atualizados);
c) negociador principal (falar com o perpetrador, adquirir informações);
d) negociador secundário (escutar as negociações, anotar dados da negociação,
sugerir pontos de abordagem de conversação para o negociador principal,
proporcionar apoio moral ao negociador principal, estar disposto e apto para
substituir o negociador principal); e
e) psicóloga policial (esboça o perfil psicológico do tomador de reféns. Existirá
numa equipe ideal).
 Atualmente, no BME, existem negociadores desde a graduação de Soldado até o
posto de 1º Tenente, que formam as equipes de negociação. Apesar da composição
citada, pelas características do processo de negociação, não há que se pensar que
sempre o mais antigo será o chefe da equipe e o mais moderno o anotador. Há um
constante rodízio nas funções, de modo que conforme a ocorrência, o ânimo, a
conversa entre a equipe, poderemos ter o Soldado João como 1º Negociador, o
Soldado José como chefe da equipe e o Tenente Pedro como anotador.
8.6 A SÍNDROME DE ESTOCOLMO
 A Síndrome de Estocolmo é um mecanismo de tolerância tão involuntário quanto
respirar.
O crime de seqüestro deixa o indivíduo na situação de refém e quando numa
situação de isolamento em um cativeiro, acaba desgastando essa pessoa física e
psicologicamente de tal forma que as conseqüências após a libertação são graves.
Uma das mais comuns é a Síndrome de Estocolmo. Essa expressão foi criada pelo
Dr. Harvey Schlossberg, um detetive policial que mais tarde se tornou psicólogo
clínico.
Essa síndrome foi descoberta em razão do assalto ao “Sveriges Kreditbank of
Stockholm”, na Suécia, às 10:15 horas, do dia 23 de agosto de 1973, por Jan -Erik
Olsson, de 32 anos, recém-foragido da prisão, com o uso de submetralhadoras.
Com a chegada da polícia, o assaltante tomou três mulheres e um homem como
reféns e entrou com eles na caixa-forte do banco, com aproximadamente 48 m²,
durante 131 horas (cinco dias e meio). Exigiu que a polícia trouxesse ao local um
seu antigo cúmplice, que se encontrava na prisão. Atendida essa exigência, o
assaltante e seu companheiro mantiveram os reféns em seu poder, no interior da
caixa-forte, tendo ao final desse tempo se entregado sem qualquer resistência.
 Ao saírem da caixa-forte, os quatro reféns usaram seus próprios corpos como
 
 
mesmo tempo em que pediram aos policiais para não atirarem. Após a libertação, os
reféns estavam totalmente confusos, reagiam como se ainda estivessem sendo
mantidos como reféns. Mais tarde, ao ser entrevistada, uma das jovens que estivera
como refém expressou sentimentos de muita simpatia para com um dos bandidos,
chegando mesmo a dizer que esperaria até o dia em que ele saísse da cadeia para
se casarem – o que de fato ocorreu.
Muitas pessoas ficaram chocadas ao ouvirem isso, chegando mesmo a imaginar que
tivesse acontecido algum envolvimento sexual entre aquela moça e o bandido,
durante o tempo em que estiveram confinados. Na verdade, não ocorrera nenhum
contato sexual ou relacionamento amoroso. Muito pelo contrário, por várias vezes,
durante a crise, o bandido exibira a referida moça aos policiais, com uma arma sob o
seu queixo. Soube-se também que, a certa altura, ao desconfiarem que a polícia
pretendia jogar gás lac