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CENTRO UNIVERSITÁRIO CURITIBA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO stricto sensu - MESTRADO EM DIREITO ANA BEATRIZ RAMALHO DE OLIVEIRA RIBEIRO AS AÇÕES AFIRMATIVAS NAS RELAÇÕES DE EMPREGO À LUZ DO ORDENAMENTO JURÍDICO PÁTRIO: SUA EFETIVIDADE E EFICÁCIA CURITIBA 2011

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CENTRO UNIVERSITÁRIO CURITIBA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO stricto sensu - MESTRADO EM DIREITO

ANA BEATRIZ RAMALHO DE OLIVEIRA RIBEIRO

AS AÇÕES AFIRMATIVAS NAS RELAÇÕES DE EMPREGO À LUZ DO ORDENAMENTO JURÍDICO PÁTRIO:

SUA EFETIVIDADE E EFICÁCIA

CURITIBA 2011

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ANA BEATRIZ RAMALHO DE OLIVEIRA RIBEIRO

AS AÇÕES AFIRMATIVAS NAS RELAÇÕES DE EMPREGO À LUZ DO ORDENAMENTO JURÍDICO PÁTRIO:

SUA EFETIVIDADE E EFICÁCIA

Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Direito Empresarial e Cidadania do Centro Universitário Curitiba, como requisito parcial para a obtenção do Título de Mestre em Direito.

Orientador Professor Doutor Eduardo Milléo Baracat

CURITIBA 2011

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ANA BEATRIZ RAMALHO DE OLIVEIRA RIBEIRO

AS AÇÕES AFIRMATIVAS NAS RELAÇÕES DE EMPREGO

À LUZ DO ORDENAMENTO JURÍDICO PÁTRIO:

SUA EFETIVIDADE E EFICÁCIA

Dissertação apresentada como requisito parcial para a obtenção do Título de Mestre

em Direito pelo Centro Universitário Curitiba.

Banca Examinadora constituída pelos seguintes professores:

Orientador: _________________________________ Prof. Dr. Eduardo Milléo Baracat

_________________________________ Membro examinador interno

_________________________________ Membro examinador externo

Curitiba, _____ de _________________ de 2011.

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AGRADECIMENTOS

Ao Professor Doutor Eduardo Milléo Baracat, estimado orientador, por quem

nutro profunda admiração e respeito, por toda a paciência e compreensão acerca

das dificuldades no dia-a-dia à elaboração e conclusão do presente trabalho.

Ao Professor Doutor Luiz Eduardo Gunther, cujas preciosas sugestões e

indicações bibliográficas, como também empréstimos de textos, permitiram

corroborar o fundamento deste estudo.

Aos amigos e mestres Helio Gomes Coelho Junior e Mauro Joselito Bordin,

por todo o incentivo e apoio, não só na empreitada de cursar o Mestrado e na

concretização deste trabalho, mas, sobretudo, na minha vida e carreira profissional.

Ao Escritório Gomes Coelho & Bordin, minha segunda casa, onde convivo,

diariamente, com amigos, que mais considero também como uma segunda família,

pelo suporte, compreensão e estímulo sempre presentes.

Ao meu pequeno Enzo, a quem sou devedora de muitas horas de atenção e

companhia, por todo amor e alegria que sempre me cercam quando retorno ao lar.

Ao Cristiano, que, espero, compreenda que os momentos de ausência não

foram em vão.

A todos os meus amigos e familiares que de alguma forma colaboraram para

a realização deste trabalho.

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“Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele,

por sua origem ou ainda por sua religião.

Para odiar, as pessoas precisam aprender e,

se podem aprender a odiar, podem ser ensinadas a amar”.

(NELSON MANDELA)

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RESUMO

O presente trabalho tem o objetivo de investigar a efetividade e eficácia das ações afirmativas já existentes no ordenamento jurídico brasileiro ao acesso e manutenção do emprego. Através da metodologia empregada analisa-se a discriminação das minorias no mercado de trabalho, sua interligação com preconceito e estigma, traçando um panorama sobre seu tratamento nas Convenções e Recomendações da OIT e os aspectos e preceitos constitucionais e ordinários de sua proteção. Diante da real necessidade de promoção da igualdade e das condições de oportunidade de emprego a todos, bem como de erradicação da exclusão e discriminação dos grupos de pessoas historicamente desfavorecidas, necessário se faz ainda examinar as ações afirmativas previstas constitucionalmente, em leis infraconstitucionais e em instrumentos normativo-sindicais nas relações de trabalho, destacando suas vantagens e desvantagens. Vislumbra-se aferir se, pontuando as hipóteses discriminatórias que, observadas pela sociedade, merecem tratamento legal e normativo, via ações afirmativas, é possível instrumentar a inserção e manutenção de trabalhadores no mercado formal de trabalho. Palavras-chave: discriminação – ações afirmativas – acesso e manutenção do emprego – efetividade e eficácia.

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ABSTRACT

The purpose of the present study is to investigate efficacy and effectiveness of positive affirmations in Brazilians laws considering job access and maintenance. Through the methodology is possible to recognize discrimination against minority in labor market, its interconnections with prejudgment and stigma, outlining scenery about its treatment in ILO´s recommendations, recognition and all constitutional aspects of their protection. Facing the need to promote equality and job opportunities to all, as well as exclusion and discrimination eradication of people historically in disadvantage, it is required to evaluate all positive affirmations provided by law and standards defined by labor unions, highlighting its pros and cons. The object is to assess if, pointing discriminatory assumptions that, observed by the society, deserve legal and normative treatment, by positive affirmations, it is possible to define the insertion and maintenance of workers in the formal labor market. Key-words: discrimination, positive affirmation, access and job maintenance, efficacy, effectiveness.

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LISTA DE SIGLAS

ADCT – Ato das Disposições Constitucionais Transitórias

ADFP – Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental

ADIn – Ação Direta de Inconstitucionalidade

AIDS – Acquired immune deficiency syndrome

ANAAD – Associação Nacional dos Advogados Afrodescendentes

APDF – Arguição de descumprimento de preceito fundamental

Celesc – Centrais Elétricas de Santa Catarina

CF – Constituição Federal

CLT – Consolidação das Leis do Trabalho

Conefem – Confederação dos estabelecimentos de ensino

Contec – Confederação Nacional dos Trabalhadores nas Empresas de Crédito

DEM – Partido Democratas

DSR – Descanso semanal remunerado

ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente

EEOC – Equal Employment Opportunity Commission

Febraban – Federação brasileira de bancos

FGTS – Fundo de garantia por tempo de serviço

HIV – Human immunodeficiency virus

IBGE – Instituto brasileito de geografia e estatística

INSS – Instituto Nacional de Seguro Social

IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

LICC – Lei de Introdução do Código Civil

MTE – Ministério do Trabalho e Emprego

OAB – Ordem dos Advogados do Brasil

OIT – Organização Internacional do Trabalho

ONU – Organização das Nações Unidas

PT – Partido dos Trabalhadores

RIT – Repartição Internacional do Trabalho

SEPT/PR – Secretaria de Estado do Trabalho, Emprego e Promoção Social do Paraná

SFIT – Sistema Federal de Inspeção do Trabalho

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Sinapir – Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial

SRTE – Superintendência Regional do Trabalho e Emprego

STF – Supremo Tribunal Federal

SUS – Sistema único de saúde

TRT – Tribunal Regional do Trabalho

TST – Tribunal Superior do Trabalho

UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro

UNB – Universidade de Brasília

Unifem – United Nations Development Fund for Women

USP – Universidade de São Paulo

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SUMÁRIO

RESUMO.....................................................................................................................6

ABSTRACT........................................... ......................................................................7

LISTA DE SIGLAS.................................... ..................................................................8

1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................12

2 DISCRIMINAÇÃO E MERCADO DE TRABALHO: AS NORMAS DA O IT, PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS E LEGISLAÇÃO ORDINÁRIA .. ..................16

2.1 DISCRIMINAÇÃO E MERCADO DE TRABALHO................................................16

2.1.1 Discriminação: Conceito e Distinção de Preconceito e Estigma ................17

2.1.2 As Minorias Frente ao Mercado de Trabalho .............................................20

2.2 O TRATAMENTO DA DISCRIMINAÇÃO NAS CONVENÇÕES E

RECOMENDAÇÕES DA OIT...............................................................27

2.2.1 Origem, Conceito, Fundamentos da OIT e suas Principais Normas ..........28

2.2.2 Forma de Internalização das Normas e seu Status no Ordenamento Jurídico Brasileiro................................................................................................33

2.2.3 A Discriminação Frente às Convenções e Recomendações da OIT..........37

2.3 A CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA NO COMBATE À DISCRIMINAÇÃO ...............40

2.3.1 Dos Princípios da Não Discriminação, da Igualdade e a Garantia ao Trabalho ..............................................................................................................42

2.3.2 Manifestações Discriminatórias a Partir da Constituição Federal de 1988.47

2.3.2.1 Direta.......................................................................................................49

2.3.2.2 Indireta ....................................................................................................49

2.3.2.3 Oculta ......................................................................................................50

2.3.2.4 Legítima...................................................................................................50

2.4 A LEI ORDINÁRIA ANTIDISCRIMINATÓRIA ......................................................51

2.4.1 Práticas discriminatórias à luz da Lei n. 9.029/95 ......................................51

2.4.2 Controvérsia acerca da sua aplicação ao portador do vírus HIV................53

3 CONCEITO, FINALIDADE, ORIGEM, MODALIDADES E PRÓS E CONTRAS DAS AÇÕES AFIRMATIVAS NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASI LEIRO.59

3.1 CONCEITO E FINALIDADE DAS AÇÕES AFIRMATIVAS...................................61

3.2 ORIGEM DAS AÇÕES AFIRMATIVAS................................................................66

3.3 MODALIDADES DE AÇÕES AFIRMATIVAS NA LEI, NOS INSTRUMENTOS

NORMATIVO-SINDICAIS E NAS POLÍTICAS PÚBLICAS...................69

3.3.1 Quanto às Origens Das Fontes Formais: Decorrentes do Estado e na Esfera Privada.....................................................................................................69

3.3.2 Quanto à Obrigatoriedade ou Facultatividade das Medidas: Cogentes e Facultativas ou Estimuladas por Meio de Políticas de Incentivo Fiscal...............71

3.3.3 Quanto à Eleição dos Grupos Tutelados....................................................72

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3.3.3.1 Raça........................................................................................................73

3.3.3.2 Gênero ....................................................................................................79

3.3.3.3 Portadores de Deficiências e Doenças....................................................82

3.3.3.4 Opção sexual, peso e idade ....................................................................85

3.4 VANTAGENS E DESVANTAGENS DAS AÇÕES AFIRMATIVAS .......................87

4 AS AÇÕES AFIRMATIVAS NO ACESSO E MANUTENÇÃO AO EM PREGO NO DIREITO BRASILEIRO: MANIFESTAÇÕES NORMATIVAS DE EFE TIVIDADE E EFICÁCIA......................................... ...............................................................93

4.1 CONCEITOS DE EFETIVIDADE E EFICÁCIA.....................................................94

4.2 REQUISITOS JURÍDICOS COMO CONDIÇÃO DE EFICÁCIA E EFETIVIDADE

DAS AÇÕES AFIRMATIVAS................................................................96

4.3 MANIFESTAÇÕES NORMATIVAS DE EFETIVIDADE E EFICÁCIA ...................99

4.3.1 No Estatuto do Idoso................................................................................102

4.3.2 Na Reserva de Vagas para Pessoas com Deficiência .............................104

4.3.3 No Contrato de Aprendizagem...........................................................113

4.3.4 Em Instrumentos Normativo-Sindicais ...............................................118

CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................... .....................................................127

REFERÊNCIAS.......................................................................................................130

BIBLIOGRAFIA ....................................... ...............................................................136

ANEXOS .................................................................................................................138

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1 INTRODUÇÃO

Em outubro de 2006, o Brasil foi condenado pela Corte Interamericana de

Direitos Humanos em face da negativa de acesso à justiça em crime de

discriminação racial, por adoção de rígida regra de ônus da prova.

O caso teve origem em março de 1997, na cidade de São Paulo. Simone

André Diniz, candidata a um emprego de doméstica, diante de um anúncio publicado

em jornal de grande circulação com a informação “Pref. Branca”, declarou que, após

ligar para o número indicado, não obteve o emprego por ser negra. Aberto o

inquérito policial em face do ilícito do art. 20, da Lei n. 7.716/89, o juiz criminal,

atendendo a solicitação do Ministério Público, arquivou o processo por falta de

provas1. Inconformada, a vítima levou o caso à Corte Interamericana de Direitos

Humanos2.

Para a Corte Interamericana de Direitos Humanos, essa exigência de prova

direta pela Justiça brasileira constituiu discriminação indireta por impedir o exercício

ou gozo do direito do cidadão a acessar a justiça para que repare a violação.

A questão da discriminação está intimamente ligada aos preconceitos e

estigmas da sociedade que, historicamente, excluiu vários grupos de indivíduos,

injustificadamente, seja em razão da cor, raça, gênero, idade, religião, doenças,

deficiências físicas e mentais, dentre outras, das mais diversas relações, inclusive de

trabalho e que, atualmente, têm sido objeto de repensar social, suscitando

controvérsias não apenas coloquiais, como também doutrinárias e legais.

O direito ao trabalho encontra aplicação a todos os cidadãos em qualquer

tipo de relação de trabalho em que se lancem. Contudo o presente estudo analisará

a questão especificamente nas relações de emprego, a fim de investigar se as ações

afirmativas já existentes no ordenamento jurídico brasileiro são efetivas e eficazes

ao acesso e à manutenção do trabalhador no mercado formal de trabalho.

Com efeito, a inclusão social dos trabalhadores em geral no Brasil –

principalmente daqueles discriminados, é um direito constitucional, baseado nos

1 ARANTES, Paulo de Tarso Lugon. O caso Simone André Diniz e a luta contra o racismo estrutural

no Brasil. Direito, Estado e Sociedade . Rio de Janeiro: PUC-RJ, jul-dez/2007, n. 31, p. 128-129. 2 CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Informe 66/2006. Caso 12.001. Simone

André Diniz vs. Brasil. 21/10/2006. Disponível em: <http://www.iidh.ed.cr/comunidades/diversidades/ docs/div_infinteresante/informe%20n%2066-06.htm>. Acesso em: 19 jun. 2011.

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princípios da não discriminação e da igualdade, sem embargo da garantia

constitucional ao trabalho.

Nos dias atuais percebe-se que as relações de emprego, como as demais

relações, estão extremamente complexas. Tal complexidade aumenta quando uma

das partes envolvidas nessa relação é uma pessoa que pertence a um desses

grupos que, historicamente, foi discriminado.

A discriminação está claramente proibida e não é tolerada pelo ordenamento

jurídico brasileiro. Contudo, nem sempre a realidade condiz com a vontade legal.

Assim, na busca de fazer com que a igualdade de tratamento enunciada pela lei

transforme-se, cada vez mais, em realidade, surgem as ações afirmativas que,

superficialmente, caracterizam-se pelo tratamento desigual imposto pela lei, para

compensar a desigualdade existente na realidade.

Esse tema está atualmente em bastante evidência, sobretudo pela edição de

leis estaduais que criam cotas de estudantes vinculados a minorias e desfavorecidos

ao ingresso em universidades públicas. Contudo, as ações afirmativas estão

presentes em várias searas do Direito, inclusive nas relações de trabalho.

Em oposição, alega-se que as ações afirmativas são políticas que,

intrinsicamente, violam a regra de tratamento igual de todos perante a lei.

Assim, a presente pesquisa se justifica pela atualidade e relevância do tema

proposto, em que se questiona a eficácia e a efetividade das ações afirmativas nas

relações de trabalho à luz do ordenamento jurídico brasileiro, almejando uma

reflexão acerca das políticas, instrumentos legais e normativo-sindicais, que

objetivam dar concreção aos princípios constitucionais que resguardam a dignidade

e a igualdade da pessoa do trabalhador.

O húmus está na constatação de que há, no mundo do trabalho, explícitas

ou veladas práticas excludentes de mão de obra, fundadas em discriminações de

variados matizes, malgrado o existir de normas constitucionais e infraconstitucionais

que colimem proibi-las.

Portanto, procurar-se-á pontuar hipóteses discriminatórias que, observadas

pela sociedade, mereceram tratamento legal, via políticas de “discriminação

positiva”, como considerado pelo direito europeu, ou “ações afirmativas”, pelo direito

estadunidense, instrumentando a inserção e manutenção de trabalhadores no

mercado formal de trabalho.

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Embora a doutrina trate nesse particular ambos os termos, optou-se por

desenvolver o presente estudo enfatizando o termo “ações afirmativas”, pela melhor

adequação ao tema, sobretudo porque o verbo discriminar, pelo seu próprio sentido,

possui uma conotação negativa, não se ajustando necessariamente com

discriminações positivas.

A pesquisa terá por objetivo responder ao problema especificamente

proposto de: em que medida o Direito brasileiro se mostra efetivo e eficaz a garantir

dignidade ao trabalhador por meio do acesso e manutenção ao emprego através de

ações afirmativas?

A tanto o estudo adotará marcos teóricos que enfatizam a efetividade dos

direitos fundamentais no âmbito das empresas e da inclusão social como eficácia da

cidadania, não se pretendendo aprofundar em demasia a discussão concernente a

aspectos filosóficos, em face das próprias características desse trabalho.

Para responder ao problema, o trabalho será estruturado em três capítulos,

através de abordagem pelo método dedutivo, partindo-se, no primeiro capítulo, das

noções do que pode ser entendido por discriminação, sua interligação com conceitos

como “preconceito” e “estigma”, quais os grupos que usualmente são discriminados

no mercado de trabalho e o tratamento dado à discriminação nas principais normas

internacionais editadas pela OIT – Organização Internacional do Trabalho, na

Constituição Federal e nas Leis infraconstitucionais antidiscriminatórias, em especial

na Lei 9.029/95.

Serão analisadas as Recomendações e Convenções da OIT específicas

sobre a discriminação, sobretudo as Convenções 100 e 111, bem como a recente

Recomendação 200, que abordam a questão da discriminação nas relações de

trabalho. Nesse aspecto, também será brevemente investigada a forma de

internacionalização das Convenções da OIT e sua classificação no ordenamento

jurídico pátrio, inclusive sob o entendimento do STF.

No estudo ainda serão examinados os princípios fundamentais da não

discriminação, da igualdade e o direito ao trabalho, bem como as principais

manifestações discriminatórias a partir da Constituição Federal de 1988.

Em um segundo capítulo a proposta será de esquadrinhar as ações

afirmativas ou políticas de discriminação positiva: os diversos conceitos doutrinários,

sua finalidade, origem e modalidades existentes no ordenamento jurídico pátrio, para

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a averiguação se essas têm sido verdadeiramente eficazes e efetivas a garantir

dignidade ao trabalhador.

A dissertação adotará o procedimento histórico no levantamento das origens

e do desenvolvimento das normas contra a discriminação, inclusive em relação às

ações afirmativas, além de fazer um estudo comparativo do tratamento normativo

dado ao assunto no ordenamento jurídico brasileiro, seja constitucional,

infraconstitucional, nos instrumentos normativo-sindicais, como também nas políticas

públicas.

Igualmente importante será o estudo no terceiro e último capítulo acerca da

eficácia das ações afirmativas no acesso e manutenção do emprego e sua utilização

como instrumento de transformação e inclusão social e concreção ao princípio

constitucional da igualdade, considerando as manifestações normativas a tanto.

A pesquisa será de natureza teórico-bibliográfica, compulsando-se a melhor

doutrina nacional e estrangeira a respeito do tema, o que igualmente será

pesquisado na jurisprudência pátria, à análise de como a questão vem sendo tratada

pelos tribunais.

Importante ressaltar que o estudo ora proposto tem direta vinculação e

aderência à Linha de Pesquisa do programa de Mestrado dessa Instituição –

Atividade Empresarial e Constituição: inclusão e sustentabilidade –, por dedicar-se à

investigação dos princípios e das regras constitucionais (expressadas pelo respeito

aos direitos fundamentais dos empregados), inclusive no tocante à fixação de cotas,

que limitam a atuação das empresas no ordenamento jurídico brasileiro.

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2 DISCRIMINAÇÃO E MERCADO DE TRABALHO: AS NORMAS D A OIT,

PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS E LEGISLAÇÃO ORDINÁRIA

2.1 DISCRIMINAÇÃO E MERCADO DE TRABALHO

A igualdade de oportunidades começa pelo emprego e pela justa

remuneração, sem o que o indivíduo está fadado à marginalidade e à exclusão.

Não se trata de uma proposição recente. O tema da igualdade e da não

discriminação se encontra na origem do próprio Direito do Trabalho, que surge,

historicamente, como elemento compensador das desigualdades reais existentes

entre empregados e empregadores nas relações de trabalho.

Além disso, incontestável é o fato que, “todos os dias, ao redor do mundo, a

discriminação no trabalho é uma triste realidade para centenas de milhões de

pessoas.”3

Também por questões históricas e culturais vários grupos de pessoas são

discriminados quando se trata de inserção e manutenção no mercado de trabalho,

havendo, portanto, um desfavorecimento das minorias sociais.

Essas minorias são em geral definidas em termos de características atribuídas

de status, tais como raça, sexo, condição econômica e social, deficiência e meios

formativos étnicos ou religiosos, bem como de status adquirido, como também

orientação sexual. Logo, quanto mais visíveis as características que definem a posição

da minoria, mais difícil fica remediar os termos da desigualdade social que se reflete em

todos os campos da sociedade, inclusive nas relações trabalhistas.

O próprio desequilíbrio estrutural da relação trabalhista já pode ensejar

arbitrariedades e quando aliada a um fator discriminatório torna-se ainda mais violenta4.

Em razão disso, e em atendimento ao princípio da igualdade, tanto o Estado

quanto o particular, não podem adotar nas suas relações condutas discriminatórias,

preconceituosas ou racistas.

3 ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. Nota de Imprensa. Disponível em:

<http://www.ilo.org/public/portugue/region/ampro/brasilia/info/download/presskit.pdf>. Acesso em: 15 fev. 2011.

4 RIBEIRO, Ana Beatriz Ramalho de Oliveira. BARACAT, Eduardo Milléo. HIV e AIDS e o Mundo do Trabalho: aplicação da Recomendação 200 da OIT no Brasil. In: RAMOS FILHO, Wilson (Coord.). Trabalho e regulação no Estado constitucional . Curitiba: Juruá, 2011, p. 21.

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Por normas constitucionais e infraconstitucionais, o direito de contratar, ou

mesmo de resilir unilateralmente o contrato de trabalho, mesmo se tratando de direitos

potestativos, devem ser legítimos. Não é conferido ao empregador o direito de abusar

do poder que detém, desviando-o de sua finalidade e impondo situações

discriminatórias.

Contudo, antes de mais nada, importante perquirir o que, efetivamente, pode

ser considerado como discriminação e como ela se exterioriza nas relações de

trabalho.

2.1.1 Discriminação: Conceito e Distinção de Preconceito e Estigma

Ao refletir sobre o tema das ações afirmativas, naturalmente remete-se a

pensar no tratamento das desigualdades, trazendo à tona noções como preconceito,

discriminação e estigma. Os três conceitos estão, de certa forma, interligados.

Discriminação e preconceito guardam uma relação mais estreita por serem,

muitas vezes, confundidos entre si ou utilizados como sinônimos. Como afirma Sales

Augusto dos Santos, ambos os termos “partem de idéias, sentimentos e atitudes

negativas com relação a um grupo social, e positivas em relação a outro grupo social

(geralmente o grupo discriminador).”5

Embora possuam significados similares, esses termos se distinguem. A

discriminação presume a ação de um grupo social ou indivíduo contra outro grupo

social ou indivíduo, enquanto o preconceito pressupõe crenças prévias sobre as

capacidades intelectual, física e moral, entre outras, dos indivíduos ou grupos sociais,

sem levar em conta fatos que contestem essas crenças pré-concebidas6. Como o

preconceito é um sentimento interior, ele pode estar presente nos indivíduos sem

necessariamente se transformar em discriminação.

Se preconceito é a ideia concebida previamente, sem o indispensável

conhecimento do objeto sobre o qual se emite opinião, discriminação pode ser

5 SANTOS, Sales Augusto dos. Racismo, discriminação e preconceitos. Boletim Salto para o

Futuro , v. 1, jun/jul 2004, p. 26-33. 6 Ibid., 2004, p. 4.

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entendida como “o preconceito em movimento”, de sorte a excluir, prejudicar ou

marginalizar outrem7.

Contudo, o preconceito e os atos de discriminação podem produzir estigmas. O

conceito de estigma está invariavelmente associado a um traço depreciativo.

O estigma é definido por Carlos Roberto Bacila como “um sinal ou marca que

alguém possuiu, que recebe um significado depreciativo.”8

Tal noção é enfatizada por Erving Goffman9, que compreende que o estigma

gera profundo descrédito e pode também ser entendido como defeito, fraqueza ou

desvantagem.

Estigma seria, então, um “rótulo” socialmente empregado às pessoas, com

aspectos subjetivos e objetivos, como destacam os autores acima referidos.

O aspecto objetivo, que corresponde a uma marca (sexo, raça, condição social,

defeito físico, doença, religião, dentre outras) e outro subjetivo (valoração negativa ou

depreciativa em razão de possuir a marca).

Goffman classifica os estigmas em três espécies distintas: a primeira,

decorrente de defeitos físicos ou abominações do corpo; a segunda, referente a culpas

de caráter individual, nelas incluídas, por exemplo, a desonestidade, distúrbio mental,

prisão, vícios, homossexualismo, desemprego, radicalismo político, tentativas de

suicídio, entre outras; e a terceira, relacionada às raças, nações, religiões, etnias,

crenças10. Contudo, considera o autor como principais estigmas aqueles referentes à

pobreza, sexo, raça não predominante e religião.

Na verdade, os estigmas atuam como se fossem regras de discriminação,

ferindo a igualdade entre as pessoas e a aplicação do Direito.

O estigma de indivíduo “menos qualificado” cria uma situação de discriminação.

Com efeitos, o indivíduo que não se enquadra no estereótipo do “empregado ideal”

muitas vezes é visto como alguém menos qualificado para o trabalho.

7 JAKUTIS, Paulo. Manual de Estudo da Discriminação do Trabalho. Estudos sobre

Discriminação, Assédio Sexual, Assédio Moral e Ações Afirmativas, por meio de comparações entre o Direito do Brasil e dos Estados Unidos. São Paulo: LTr, 2006, p. 29.

8 BACILA. Carlos Roberto. Um Estudo sobre os Preconceitos . Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 24-25.

9 GOFFMAN, Erving. Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. 4. ed. Tradução de Márcia Bandeira de Mello Leite Nunes. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1988, p. 13.

10 Ibid., p. 14.

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Sales Júnior, ao analisar o processo do estigma racial, demonstra que o

estigma “afeta o corpo com marcas mais sociais do que corporais”. Segundo o autor o

“estigma é uma demarcação corporal de uma relação social de desigualdade.”11

Conceitualmente, pode-se dizer, de forma mais simplificada, que o estigma é a

marca ou rótulo atribuídos a pessoas e grupos, seja por pertencerem a determinada

classe social, por sua identidade de gênero, por sua cor, raça, etnia, religião, entre

outros. É sempre uma forma de simplificação, de desqualificação da pessoa e do grupo.

Os estigmas decorrem de preconceitos e ao mesmo tempo os alimentam, cristalizando

pensamentos e expectativas com relação a indivíduos e grupos.

O preconceito é qualquer atitude negativa em relação a uma pessoa ou a um

grupo social que derive de uma ideia preconcebida sobre tal pessoa ou grupo.

E a discriminação é a ação de discriminar, tratar diferente, anular, tornar

invisível, excluir, marginalizar, exteriorizar o preconceito em relação ao estigmatizado.

Maurício Godinho Delgado conceitua a discriminação como “...conduta pela

qual se nega à pessoa tratamento compatível com o padrão jurídico assentado para a

situação concreta por ela vivenciada.”12

Quando se trata de discriminação no universo do trabalho, forçoso é concluir

que a definição a ser aplicada é aquela descrita pela Convenção n. 111 da OIT de

1958, ratificada pelo Brasil em 196813. Esse é o “texto legal” que fornece a definição

específica para a questão sob a perspectiva do Direito do Trabalho em seu art. 1º,

entendendo-a como qualquer

[...] distinção, exclusão ou preferência fundada em raça, cor, sexo, religião, opinião política, ascendência nacional, origem social ou outra distinção, exclusão ou preferência especificada pelo Estado-Membro interessado, qualquer que seja sua origem jurídica ou prática e que tenha por fim anular ou alterar a igualdade de oportunidades ou de tratamento no emprego ou profissão14.

11 SALES JÚNIOR, Ronaldo. Democracia Racial: o não-dito racista. In: Tempo Social , São Paulo,

USP, 2006, p. 233. 12 DELGADO, Maurício Godinho. Proteções contra discriminação na relação de emprego. In:

RENAULT, Luiz Otávio Linhares. VIANA, Márcio Tulio (Coord). Discriminação : estudos. São Paulo: LTr, 2000, p. 97-108.

13 JAKUTIS, 2006, p. 117. 14 Convenção n. 111 da OIT. In: MARTINS, Sergio Pinto. Convenções da OIT. São Paulo: Atlas,

2009, p. 253.

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20

Portanto, a Convenção 111 da OIT considera como discriminação toda

distinção, exclusão ou preferência que tenha por efeito destruir ou alterar a igualdade de

oportunidades ou de tratamento em matéria de emprego ou profissão.

Tratando, pois, especificamente, das relações de trabalho, o empregador tem o

livre arbítrio de estipular as regras à contratação de seus empregados, todavia, sem que

isso imponha situações discriminatórias.

Assim, o direito de contratar, ou mesmo de rescindir unilateralmente o contrato

de trabalho, mesmo se tratando de direitos potestativos do empregador, devem estar

revestidos de licitude, sob pena de caracterizar abuso de poder, desviando-o de sua

finalidade.

2.1.2 As Minorias Frente ao Mercado de Trabalho

Além da hipossuficiência inerente às relações de trabalho, muitos

trabalhadores, por diversos motivos, e por razões históricas, podem ainda ser

considerados em desvantagem perante outros no acesso e permanência no

mercado de trabalho.

São as chamadas minorias que, entre outros grupos, são as mulheres,

pessoas com deficiências, idosos, trabalhadores sem experiência, negros,

trabalhadores com doenças graves, como AIDS, hepatite, câncer, entre outros.

Também nelas se incluem aqueles grupos decorrentes de discriminação em

razão de orientação sexual, de origem nacional, genética, de origem regional, de

religião, de classe social, idade, de opção filosófica, de estilo de vida (fumante, por

exemplo), e estética (como obesidade e utilização de tatuagens).

Quanto a esses dois últimos, importante advertir que a questão da

discriminação por estilos de vida alternativos, ligados à aparência e aos hábitos

insalubres, é questão ainda pouco explorada no campo geral do direito da igualdade,

sendo certo que a tendência é isso se reverter, na medida em que a sociedade vem

dando excessiva importância e essas questões (estética pessoal e vida saudável)15.

15 JAKUTIS, 2006, p. 150.

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21

Talvez, como ressalta Bacila16, o pior de tudo seja o fato de o estigmatizado

não se ver como tal e passar a contemplar com passividade e aceitação o tratamento

diferenciado que recebe da sociedade.

Sem embargo de haver normas constitucionais e infraconstitucionais de

proteção ao trabalho, é fato a discriminação de determinados grupos de indivíduos

também quando se trata de inserção no mercado formal, consequente da exclusão das

próprias relações sociais. Exclusão essa com fulcro em estigmas e preconceitos, por

falta de percepção de qualidades nesses indivíduos, e também de expectativas ruins

em relação a esses por parte da sociedade e, sobretudo, no mundo corporativo.

No caso especificamente da mulher, em relação à maternidade e eventual

discriminação daí decorrente, embora a Constituição Federal (ADCT, art. 10º, “a”) e a

CLT (art. 391) prevejam regras protetivas à dispensa imotivada, há casos em que o fato

da mulher ser casada ou encontrar-se em estado de gravidez, ou ainda se submetendo

a tratamento para superar infertilidade, são determinantes para sua exclusão do quadro

funcional da empresa.

Essa prática é comum e pode se materializar por meio da requisição, por parte

do empregador, da exigência de exames prévios de não gravidez e de esterilização,

não obstante a vedação da Lei 9.029/95.

Cabe aqui ponderar que a legislação brasileira não prevê regras sobre a licitude

dos métodos utilizados na seleção de pessoal quando de uma contratação ao

emprego17. Assim, a situação fática deve ser analisada à luz do princípio da boa-fé

objetiva, que diz respeito à norma de conduta, como fonte de obrigações, como

assevera Eduardo Baracat18.

Há hipóteses em que são necessárias determinadas perguntas ao(a)

candidato(a) à vaga de emprego, até por questão de segurança, por ser imprescindível

à proteção do(a) próprio(a) candidato(a). Em outras circunstâncias, a mesma pergunta

pode caracterizar inequívoco ato discriminatório19.

É o caso da indagação à candidata a um emprego sobre seu estado de gravidez.

Se a função para a qual a candidata está sendo selecionada for insalubre, perigosa, ou

que possa prejudicar a própria gravidez da trabalhadora, como, por exemplo, auxiliar de

16 BACILA, 2005, p. 34. 17 BARROS, Alice Monteiro de. Proteção à intimidade do empregado. São Paulo: LTr, 1997, p. 61. 18 BARACAT, Eduardo Milléo. A Boa-Fé no Direito Individual do Trabalho. São Paulo: LTr, 2003, p. 227. 19 BARACAT, loc. cit.

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radiologia, pedreiro ou estivador, não se pode considerar descontextualizada e

discriminatória tal indagação20.

É uma questão de boa-fé, pois o empregador tem o dever de proteção do

trabalhador, inclusive na etapa pré-contratual. Assim, como no caso apresentado, o

estado gravídico da candidata, pode, excepcionalmente ser óbice à sua contratação,

pois decorre “de providência que vise à proteção da maternidade.”21

Sob este espectro, a regra analisada anteriormente do inciso I, do art. 2º, da Lei

9.029/95, deve ser interpretada à luz do princípio da boa-fé objetiva, considerando-se a

exigência do teste de gravidez conduta discriminatória ou não, dependendo da função a

ser exercida.

Mesmo nessa hipótese, como recorda Baracat, a empresa deverá esclarecer à

candidata ao emprego o tipo de exame e sua finalidade, sob pena de se presumir o ato

discriminatório22.

Situações como essa são a exceção. A regra geral é que não se pode exigir da

mulher um exame de gravidez à contratação no emprego, sob pena de se considerar,

como não são raros os casos, de discriminação pelo gênero ou sexo.

Outra forma muito comum de discriminação contra a mulher no ambiente de

trabalho, é o caso de assédio sexual. Na maioria das vezes passa-se desapercebido

pelos colegas de trabalho, contudo, pode ter efeitos desastrosos à vítima, com

consequências que leva para o resto da vida.

O estigma da mulher, segundo Bacila, simbolizou historicamente que a mulher

é um ser inferior, impuro, com cérebro pequeno, pervertida moralmente e sujeita às

imundícies que a manchariam para sempre23. O custo da sua consequente

discriminação foi a alienação da mulher da participação social ativa e uma difícil e lenta

integração para conseguir trabalhar em condições próximas à igualdade com o homem.

Mais recentemente, e somente em alguns países, é que a mulher adquiriu

igualdade legal em relação ao homem. Mas isso não quer dizer que as mulheres

estejam livres de preconceitos ou que não tenham que permanecer lutando contra esse

estigma. Em verdade, para poder trabalhar e sobreviver socialmente, a mulher encontra

mais percalços do que normalmente um homem encontraria.

20 BARACAT, 2003, p. 227-228. 21 BARACAT, loc. cit. 22 BARACAT, loc. cit. 23 BACILA, 2005, p. 117.

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Essa é uma discriminação social, que ocorre desde muito tempo, na família, na

escola, no trabalho e em várias outras instituições, como consequência de uma

sociedade patriarcal, que reservou o círculo da produção para os homens e a

reprodução para as mulheres.

Em 1979, a Organização das Nações Unidas aprovou a Convenção sobre a

eliminação de todas as formas de discriminação contra a mulher. O texto entrou em

vigor, no plano internacional, após sua vigésima ratificação em 1981. No Brasil foi

promulgada em 1983 e, posteriormente, em 200224, enfrentando a discriminação contra

a mulher nos mais variados planos.

Quando se trata de lei, o dispositivo que por primeiro chama a atenção, em

matéria de igualdade da mulher, no campo trabalhista, é o artigo 5º da CLT, que

ressalta a importância do pagamento de salários iguais para o trabalho de igual valor,

sem distinção de sexo.

Contudo, como igualdade formal não quer dizer igualdade de fato, mesmo após

a Constituição Federal de 1988, ainda prevalece em jurisprudência a afirmação da

necessidade de tratamento diferenciado da mulher25, o que será melhor detalhado em

item próprio do presente estudo.

Outra discriminação social muito frequente se dá em relação à pobreza. O

pobre é estigmatizado como um indivíduo que não tem a mesma capacidade que as

pessoas de mais posse. Não tem o mesmo status e, consequentemente, não recebe o

mesmo tratamento, pois é tido como “perdedor”, que não obteve sucesso na vida.

Distinta minoria que, atualmente, está sendo visada por políticas públicas à

inserção social é a decorrente da raça não predominante.

Raça pode ser conceituada, como na maioria dos dicionários da língua

portuguesa, como “conjunto de indivíduos cujos caracteres somáticos, tais como a cor

da pele, a conformação do crânio e do rosto, o tipo de cabelo, etc., são semelhantes e

se transmitem por hereditariedade, embora variem de indivíduo para indivíduo”26. Na

raça incluem-se grupos raciais, étnicos, tribos e classes.

Bacila ressalta que uma das consequências das prevenções existentes quanto

às pessoas de raça não predominante no mercado de trabalho é o recebimento de

24 MALLET, Estêvão. Igualdade, Discriminação e Direito do Trabalho. Revista do Tribunal

Superior do Trabalho , Vol. 76, n. 3, (jul./set. 2010), São Paulo: Lex Magister, 2010, p. 20. 25 Ibid., p. 25. 26 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. 5. ed.

Curitiba: Positivo, 2010, p. 1.767.

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salário inferior por trabalhos similares aos de outras pessoas, ou dificuldade superior

para conseguir empregos ou, ainda, quando conseguem o emprego, geralmente o são

para atividades braçais, onde o esforço físico se sobrepõe ao esforço intelectual27.

Assim, as oportunidades de trabalho não são as mesmas e o alcance social é

menor para as pessoas, na medida da raça a qual pertence, criando-se desvantagens

sistemáticas.

Nesse aspecto, não se pode perder de vista que o Brasil, embora haja grande

miscigenação de raças, e de que referida discriminação não é, normalmente, ostensiva,

mas sim, dissimulada, oculta, disfarçada, foi um dos últimos grandes países a abrir mão

da escravidão, após quase 400 anos de tal prática28. E, por certo, os efeitos de tão

longo período de tempo não se apagam em um curto lapso temporal.

Há ainda muitas outras minorias, decorrentes de vários tipos de discriminações.

No inciso XXX do artigo 7º da Constituição Federal se encontra, por exemplo, a

referência à discriminação por motivo de idade e por motivo de estado civil, no tocante

ao salário, exercício de função e critério de admissão29.

Os idosos, embora em grande quantidade, podem ser considerados uma

minoria que tem grande dificuldade de inserção e manutenção no mercado de trabalho,

sem embargo de, desde 1968, haver proibição expressa de discriminação por idade na

Lei n. 5.473/68.

O mesmo se pode dizer a propósito da situação familiar, que é mencionada no

artigo 373 da CLT e na Lei 9.029/95. A filiação como causa de discriminação, embora

também ocorra, não com tanta frequência, mas de forma mais sutil, é completamente

repudiada30.

Há ainda aqueles grupos que sofrem algum modo de discriminação decorrente

da crença e religião. Inúmeros conflitos decorrentes de diferenças religiosas ocorrem e,

na maioria das vezes, não estão amparadas pela doutrina de cada religião.

Conforme Bacila31, o estigma da religião recai sobre aquele que desperta

traços de comportamento contrário à religião predominante e que, de regra, está ligada

ao poder, como usar (ou não) símbolos sagrados, pregar ideias divergentes,

27 BACILA, 2005, p. 148/9. 28 MALLET, 2010, p. 27. 29 Ibid., p. 28. 30 Ibid., p. 29. 31 BACILA, op. cit., p. 155.

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desobedecer as regras sagradas, dentre outras hipóteses, e isso também pode ser alvo

de discriminação nas relações de trabalho.

Da mesma forma, a discriminação por convicção filosófica ou política não é

aceitável, contudo, isso não quer dizer que de fato não ocorra.

Não é raro haver ainda tratamento diferenciado a trabalhadores em razão de

sua origem geográfica, como no caso dos “nordestinos”, nos quais restou estigmatizada

a figura da “preguiça”, mesmo havendo proibição no artigo 20, da Lei n. 7.716, de

discriminação decorrente da procedência da pessoa.

Enfim, as minorias podem ser relacionadas a uma série de características,

ocorrendo a discriminação, não só social, como também relacionada ao trabalho. É o

caso, por exemplo, das pessoas de destacada aparência estética, ou por preferência

sexual, deficiências físicas e mentais e doenças graves, sobretudo a AIDS.

Goffman ainda cita vários outros grupos estigmatizados: como de bastardos,

retardados, aleijados, cegos32, doentes, surdos, imigrantes, adolescentes33,

criminosos34, desempregados35, divorciados, alcoólatras, viciados, obesos, mudos,

homossexuais, mas o que somente têm em comum todos esses grupos é o juízo das

pessoas que os rotulam.

A discriminação por excesso de peso ou obesidade está cada vez mais

frequente. Embora não haja no ordenamento jurídico brasileiro proibição específica a

esse tipo de discriminação, se não houver fato relevante para o exercício daquela

determinada atividade, deixar de admitir empregado por conta de seu peso

excessivo é prática ilegal de discriminação36.

No campo do trabalho, mesmo ex-presidiários ou trabalhadores com

antecedentes criminais, podem ser considerados como uma minoria, já que não rara

é a exigência, para o exercício de certas atividades ou profissões, de apresentação

de atestado de bons antecedentes ou mesmo certidão negativa do distribuidor

criminal, o que cria imensas dificuldades a esses para serem contratados37.

Em decorrência dos avanços científicos e das transformações nos costumes

e hábitos da sociedade, outros grupos alvo de discriminação, ou seja, outras

minorias vêm surgindo.

32 GOFFMAN, 1988, p. 15. 33 Ibid., p. 23. 34 Ibid., p. 24. 35 Ibid., p. 26. 36 MALLET, 2010, p. 33.

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Já se noticiam38 casos de discriminação genética a partir de exames de

DNA, meio pelo qual há possibilidade de antecipar a tendência de certas pessoas

para o desenvolvimento de algumas doenças, o que possibilitaria preteri-las, não

somente no campo do trabalho, como também em matéria de acesso a serviços de

saúde propiciados por planos de assistência médica.

Assim, retorna-se a questão: pode o empregador exigir de um candidato ao

emprego um determinado exame, no caso, genético?

Por esse exame se torna possível analisar o código genético de uma pessoa,

podendo-se obter precisas informações.

Se fosse utilizado tal expediente pelo empregador à contratação de seus

empregados, invariavelmente, ocorreria atos discriminatórios em relação a

candidatos que tivessem maior probabilidade de adquirir determinadas doenças39.

Conforme ressalta Baracat, revelando os genes precisas informações sobre

as características físicas e psíquicas do indivíduo, inclusive predisposição a

determinadas doenças, se o empregador tiver conhecimento dessas informações na

seleção de futuros empregados, é induvidoso que ocorrerão casos de efetiva

discriminação40.

Como na hipótese do exame de gravidez, o exame genético só poderia ser

legalmente utilizado, portanto, quando houvesse contratações à funções específicas,

em que se verificasse o risco de desenvolvimento de certas doenças.

Por fim, sem a pretensão de oferecer rol exaustivo, vale citar outra minoria

muito comum quando se trata de relações de emprego, que é a composta por

autores de reclamações trabalhistas que, ilegalmente, constam de “listas negras”.

Trata-se de discriminação provocada pelo exercício do direito de ação, ressaltada

por Estêvão Mallet. Deixar de admitir o trabalhador, em virtude de ter ele ajuizado

ação em face de antigo empregador, é prática ilícita, já sancionada pelos tribunais

pátrios, com deferimento de indenizações41, sem embargo de haver firme

fiscalização das Secretarias Regionais do Trabalho e Emprego e forte atuação do

Ministério Público do Trabalho contra referida prática.

37 MALLET, 2010, p. 33. 38 Cf. artigo Clandestinidade genética, Folha de São Paulo , mar., Mais!, p. 9, 2008. Na França,

desde 2004 a doutrina considera o problema. Cf. artigo de MATHIEU, Bertrand. Le recours aux testes genétiques em matière d’emploi: um droit em construction. In: Droit Social, 2004, mars, n. 3, p. 257 e segs. Apud MALLET, 2010, p. 31.

39 BARACAT, 2003, p. 230. 40 BARACAT, loc. cit.

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Configura-se discriminação por ofender bem personalíssimo, previsto no

inciso XXXV, do art. 5º da CF, pelo qual todo cidadão tem a prerrogativa de

submeter ao Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.

Ressalta Baracat também a hipótese de discriminação quando o empregador

deixa de contratar um candidato ao emprego, por esse ter se negado a apresentar

certidão negativa da Justiça do Trabalho, para comprovar a inexistência de ação

trabalhista, ou quando deixa de contratar justamente pela certidão ser positiva,

constando ser o candidato um reclamante nessa Justiça Especializada42.

A questão da discriminação no mercado de trabalho de minorias resume-se,

portanto, ao fato de se negar ao trabalhador, injustificadamente a relação de

trabalho por algum tipo de fator desqualificante a vista de determinada pessoa ou de

grupo de pessoas.

Contudo, a não obtenção do trabalho por ato preconceituoso atinge a honra

e a imagem do trabalhador e, portanto, deve ser combatida pela sociedade, e

instigado o direito à integração.

2.2 O TRATAMENTO DA DISCRIMINAÇÃO NAS CONVENÇÕES E

RECOMENDAÇÕES DA OIT

Segundo a Declaração de 1998 da OIT, sobre princípios e direitos

fundamentais do trabalho, o Brasil, pelo simples fato de ser membro dessa

organização, tem como compromisso internacional respeitar, promover e tornar real,

dentre outros, “a eliminação da discriminação em matéria de emprego e ocupação”43.

À melhor compreensão do tema, cabe aqui um breve escorço sobre os efeitos

das normas elaboradas pela OIT no ordenamento jurídico brasileiro, sobretudo

daquelas que tratam especificamente da discriminação nas relações de trabalho.

As principais normas produzidas pela OIT são as Convenções,

Recomendações e Resoluções, em torno das quais tem se gerado grande discussão

doutrinária.

41 MALLET, 2010, p. 34. 42 BARACAT, 2003, p. 231.

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Pertinente se faz, antes de estudar os instrumentos normativos específicos,

perquirir a origem, conceito e fundamentos dessa organização internacional, para então

adentrar a análise das principais normas, sua definição e distinção entre elas.

Importante ainda ao tema, uma breve apresentação sobre a forma de

internalização no Brasil das Convenções e das Recomendações e a questão polêmica

da hierarquia destas normas, já incorporadas dentro de nosso ordenamento jurídico,

para, enfim, analisar a questão específica do tratamento da discriminação nesses

instrumentos normativos.

2.2.1 Origem, Conceito, Fundamentos da OIT e suas Principais Normas

Com o fim da Primeira Guerra Mundial, emergiu uma preocupação global com

o emprego digno a todos, sem qualquer distinção, sobretudo em razão da concorrência

desleal entre os países, decorrente da não observância, por alguns, das mínimas

normas de proteção ao trabalhador.

Surge, nessa época o constitucionalismo social, que culminou na inserção, por

parte de vários países, de preceitos relativos à defesa do cidadão, bem como de

normas de proteção social e garantia de direitos fundamentais.

Nesse contexto social, em 1919, foi fundada a OIT, oficialmente pela

“Conferência de Paz”44, com o objetivo de promover a justiça social, sendo a única das

Agências do Sistema das Nações Unidas que tem estrutura tripartite, na qual os

representantes dos empregadores e dos trabalhadores têm os mesmos direitos que os

do governo.

Sua criação deu-se pelo Tratado de Versalhes – Parte XIII, em 1944, que pôs

fim à Primeira Guerra Mundial, com o intento de, dentro do possível, uniformizar as leis

protetivas do trabalho em todos os Estados-membros, buscando padrões internacionais

para as condições de trabalho45.

43 ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. Declaração sobre princípios e direitos

fundamentais do trabalho. In: MARTINS, Sergio Pinto. Convenções da OIT. São Paulo: Atlas, 2009. p. 621-625.

44 CAMPOS, João Mota de (Coord.). Organizações Internacionais . Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1999, p.388.

45 GUNTHER, Luiz Eduardo. A OIT e o Direito do Trabalho no Brasil . Curitiba: Juruá, 2011, p. 33.

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Sob os efeitos da Grande Depressão a da Segunda Guerra Mundial, a OIT

adotou a “Declaração da Filadélfia” como anexo de sua Constituição. Referido

documento serviu de modelo para a “Carta das Nações Unidas” e, também, para a

“Declaração Universal dos Direitos Humanos”. Em 1946, assumiu o estatuto de

instituição especializada da ONU46.

É, portanto, a OIT uma pessoa jurídica de direito público internacional,

constituída por Estados, que podem se tornar membros segundo regras específicas na

sua Constituição47.

Refletindo seu comprometimento mundial com as transformações constantes

no meio ambiente de trabalho decorrentes do processo de globalização e o avanço

tecnológico, na garantia, através de normas internacionais, de uma proteção mínima em

relação ao trabalho, em 1969, quando completava 50 anos de sua criação, a OIT

recebeu o “Prêmio Nobel da Paz”.

Conforme Arnaldo Süssekind, o Brasil, além de membro nato, “por pertencer à

OIT na precipitada data (1945), foi um dos membros fundadores da Organização em

1919.” 48

Assim, especificamente no Brasil, a OIT tem representação desde 1950, com

programas e atividades que têm refletido seus objetivos, sobretudo após 1998, com a

adoção da “Declaração da OIT sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no

Trabalho e seu Seguimento”, que, na realidade, trata-se de uma reafirmação universal

da obrigação de respeitar, promover e efetivar seus princípios e fundamentos, dentre

eles, o de eliminação da discriminação.

Como visto, a OIT faz parte da ONU como organismo especializado, embora

dotada de personalidade própria e independente, com autonomia administrativa,

financeira e de decisão. Não tem características de entidade supraestatal e não pode

impor obrigações aos Estados-membros, exceto até o limite em que hajam concordado

voluntariamente quando de sua adesão, o que pode implicar em aceitarem determinada

restrição à sua soberania.

É, portanto, a agência especializada das Nações Unidas que busca a

promoção da justiça social e o reconhecimento internacional dos direitos humanos e

trabalhistas, possuindo uma estrutura internacional que torna possível abordar as

46 CAMPOS, 1999, p. 389. 47 GUNTHER, 2011, p. 39. 48 SÜSSEKIND, Arnaldo. Direito internacional do trabalho. In: SÜSEKIND, Arnaldo et al.

Instituições de direito do trabalho. 21. ed. São Paulo: LTr, 2003. v. II. p. 1.509.

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questões como a paz e justiça social e, por sua vez, busca soluções que permitam a

melhoria das condições de trabalho no mundo. É dirigida pelo Conselho de

Administração, que se reúne três vezes ao ano em Genebra – Suíça49.

Para tanto, formula normas internacionais de trabalho, e promove o

desenvolvimento e a interação das organizações de empregadores, trabalhadores e

dos governos, além de prestar cooperação técnica, principalmente nas áreas de

formação e reabilitação profissional, políticas e programas de emprego e de direito,

condições e relações do trabalho, desenvolvimento empresarial, cooperativas,

previdência social, estatísticas e segurança e saúde ocupacional.

Tem como principais objetivos promover os princípios fundamentais e direitos

no trabalho através de um sistema de supervisão e de aplicação de normas, promover

melhores oportunidades de emprego/renda para mulheres e homens em condições de

livre escolha, de não discriminação e de dignidade, aumentar a abrangência e a eficácia

da proteção social e fortalecer o tripartismo e o diálogo social50.

São três os documentos que apresentam os fundamentos e objetivos da OIT: a

Constituição da OIT, de 1919, e seu respetivo anexo – Declaração de Filadélfia, de

1944, com os fundamentos pelos quais se constituiu a OIT, a Declaração dos Princípios

Fundamentais, de 1988, contendo os princípios e direitos fundamentais no Trabalho e

seu seguimento, e a Declaração sobre Justiça Social para uma Globalização Justa, que

expressa a visão contemporânea do mandato da OIT na era da globalização.

Sua estrutura inclui uma rede de 5 escritórios regionais e 26 escritórios de área,

incluído o do Brasil, além de 12 equipes técnicas multidisciplinares de apoio a esses

escritórios e 11 correspondentes nacionais que sustentam, a execução e administração

dos programas, projetos e atividades e de reuniões regionais e nacionais51.

No Brasil, situa-se em Brasília-DF o escritório da OIT, atuando na promoção

dos seus objetivos, com atividades próprias e em cooperação com os demais

escritórios, especialmente com o central, de Genebra – Suíça, na concepção e

implementação de programas, projetos e atividades de cooperação técnica no Brasil

que, atualmente, referem-se aos programas prioritários e reformas sociais do Governo

brasileiro, incluindo o “Plano Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo”, “Fome

Zero”, “Primeiro Emprego” e diversos programas governamentais e não governamentais

49 GUNTHER, 2011, p. 45. 50 OIT. Organização Internacional do Trabalho. Escritório no Brasil . Disponível em:

<http://www.oit.org.br/inst/fund/objetivos.php>. Acesso em: 04 jun. 2011. 51 OIT, loc. cit.

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de erradicação e prevenção do trabalho infantil, de combate à exploração sexual de

menores; de promoção de igualdade de gênero e raça para a redução da pobreza, da

geração de empregos, de fortalecimento do diálogo social e de programas de proteção

social52.

As principais normas produzidas pela OIT são as “Convenções” e as

“Recomendações”. Além dessas ainda há as Resoluções ou Declarações, todos

instrumentos absolutamente distintos.

As Convenções são tratados internacionais que, uma vez ratificados pelos

Estados-membros, passam a integrar a legislação nacional. São divididas, pela própria

OIT, em três tipos: as fundamentais, que integram a Declaração de Princípios

Fundamentais e Direitos no Trabalho, de 1988 e que devem ser ratificadas e aplicadas

por todos os Estados Membros da OIT. Quatro outras convenções, que se referem a

assuntos de especial importância e foram consideradas como prioritárias, e, por fim, as

demais Convenções, que, por sua vez, foram classificadas em 12 categorias agrupadas

por temas.

Tal divisão ocorreu, como ressaltado, quando se debatiam “os limites da

globalização – mundialização, e a validade – universidade dos direitos trabalhistas –

humanos fundamentais” 53, em 1998, na Conferência Internacional do Trabalho, que

declarou que todos os Estados-membros que ainda não tinham ratificado as

Convenções que tratavam dos princípios e direitos fundamentais do trabalho, tinham o

dever, por serem membros, de respeitar, promover e tornar realidade esses princípios.

Os direitos sociais e sindicais passavam, assim, a ser explicitados como

direitos humanos fundamentais.

As principais Convenções fundamentais, portanto, tratam de temas como

Trabalho Forçado (nº 29 – 1930), Liberdade Sindical e Proteção do Direito de

Sindicalização (nº 87 – 1948), Direito de Sindicalização e de Negociação Coletiva (nº 98

– 1949), Igualdade de Remuneração (nº 100 – 1951), Abolição do Trabalho Forçado (nº

105 – 1957), Discriminação em relação a emprego e ocupação (nº 111 - 1958), Idade

Mínima para o trabalho, e Piores Formas de Trabalho Infantil (nº 138 – 1973, e nº 182 –

1999, respectivamente).

52 OIT. Organização Internacional do Trabalho. Escritório no Brasil . Disponível em:

<http://www.oit.org.br/inst/struct/index.php>. Acesso em: 04 jun. 2011. 53 GUNTHER, 2011, p. 76.

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A única das Convenções fundamentais da OIT não ratificada pelo Brasil foi a n.

87, pois o ordenamento jurídico pátrio determina a unicidade sindical, além da cobrança

de contribuição sindical obrigatória54.

Já as Convenções prioritárias, como ressaltado, são de quatro tipos: Consulta

Tripartite (nº 144 – 1976), Inspeção do trabalho (nº 81 – 1947), Inspeção do trabalho na

Agricultura (nº 129 – 1969) e Política de emprego (nº 122 – 1964).

As demais Convenções são classificadas em doze categorias diferentes, a

saber: 1) Direitos humanos básicos, 2) Emprego, 3) Políticas sociais, 4) Administração

do trabalho, 5) Relações industriais, 6) Condições de trabalho, 7) Segurança social, 8)

Emprego de mulheres, 9) Emprego de crianças e jovens, 10) Trabalhadores migrantes,

11) Trabalhadores indígenas, 12) outras categorias especiais.

As Recomendações são similares às Convenções, mas não se confundem com

estas, pois as Convenções, além de não serem autoaplicáveis, têm natureza de tratado

internacional e devem ser submetidas ao processo de internalização, como será

detalhado em seguida. Já as Recomendações, apesar de também ensejarem

princípios, não geram, por sua natureza, a obrigação de serem transformadas em

normas internas. São consideradas como sugestões, orientações da OIT de como os

Estados devem estabelecer seu direito trabalhista interno, através de formulação de

projeto de lei a ser discutido pelo Poder Legislativo.

Assim, a Convenção, uma vez ratificada pelo órgão competente do Estado-

membro, transforma-se, automaticamente, em direito positivo. Já a Recomendação

necessita de uma lei posterior a ratificar seus princípios.

Além das Convenções e Recomendações, que são as normas mais

importantes da OIT, existem outros atos que podem ser adotados pela Conferência

Internacional do Trabalho, denominados de Declarações ou Resoluções55, que não são

considerados como normas internacionais.

As Resoluções representam, em geral, pautas destinadas a orientar os

Estados-membros e a própria OIT. As Declarações, tendo valor exortatório e jurídico,

podem contribuir, efetivamente, para a formação de regras costumeiras, ou,

especialmente, para a criação de princípios gerais de direto. Luiz Eduardo Gunther

54 VILLATORE, Marco Antônio César; GOMES, Eduardo Biacchi. Hierarquia das Convenções

Fundamentais da Organização Internacional do Trabalho na conformidade da Emenda Constitucional 45 de 2004 In: Constituição e Competência Material da Justiça do T rabalho depois da EC 45/2004 . RAMOS FILHO, Wilson (Coord.). Curitiba: Genesis, 2005, p. 77-98.

55 GUNTHER, 2011, p. 53.

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lembra como casos típicos a Declaração de Filadélfia, de 1944, sobre os fins e objetivos

da OIT, e a Declaração sobre Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho, de

199856.

2.2.2 Forma de Internalização das Normas e seu Status no Ordenamento Jurídico

Brasileiro

Assentado o fato de que Convenções são espécies normativas emanadas da

OIT e possuem natureza jurídica de tratados internacionais, cabe investigar como

ocorre a aplicação destas Convenções no ordenamento jurídico brasileiro.

Quando a Conferência Internacional do Trabalho, através de seu rito próprio,

previsto no art. 19 de sua Constituição, dá forma a uma Convenção, é dado

conhecimento a todos os Estados-membros à ratificação. Cada Estado-membro tem o

compromisso de submeter, dentro do prazo de um ano a Convenção à autoridade

competente sobre a matéria, a fim de que esta a transforme ou não em lei57.

Como ressalta Luiz Eduardo Gunther, na verdade a Convenção é “um tratado-

lei de caráter multilateral”, já que desse documento emanam normas jurídicas de caráter

geral58.

As Convenções da OIT devem se submeter ao procedimento de internalização

dos tratados internacionais e depois de internalizadas, adquirem status de lei interna.

Assim, apenas após a publicação de um Decreto as Convenções passam a ter vigência

no ordenamento jurídico brasileiro.

Por outro lado, se a autoridade competente concordar apenas com alguns

capítulos ou preceitos da Convenção, poderá transformá-los em leis ou adotar outras

medidas. Contudo, sua aprovação, e consequente ratificação, não serão possíveis,

salvo se no próprio instrumento houver sido facultada sua ratificação parcial ou

opcional.

Cabe destacar que Arnaldo Süssekind suscita uma peculiaridade sobre o

momento exato da vigência das Convenções da OIT no Brasil. Segundo o autor, deve-

56 GUNTHER, 2011, p. 54. 57 SÜSSEKIND, Arnaldo. Convenções da OIT e outros tratados. 3. ed. São Paulo: LTr, 2007. p.

21. 58 GUNTHER, op. cit., p. 50.

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se diferenciar, quando se trata de OIT, as Convenções self-executing59 daquelas que

não são autoaplicáveis, denominadas por ele de Convenções de princípios. As self-

executing, que são aquelas que têm aplicação imediata, passam a gerar efeitos a partir

da publicação do decreto, de acordo com a LICC60.

Já as Convenções de princípios que também devem ser internalizadas,

apresentam uma característica temporal: com o depósito de sua ratificação na RIT,

abre-se o prazo de 12 meses para que o governo brasileiro providencie a edição de

medidas com vistas a dar cumprimento aos princípios consagrados na Convenção.

Esse prazo de 12 meses a partir do depósito da ratificação na RIT serve para que a

autoridade competente dentro do Estado possa implementar medidas legais para dar

cumprimento ao conteúdo destas Convenções61.

De acordo com o autor, a OIT, considera a heterogeneidade existente entre os

diversos Estados, e produz normas mais genéricas, que são as Convenções de

princípios, não autoaplicáveis. Assim, a OIT possibilita que os Estados-membros

elaborem normas internas compatíveis com suas respectivas realidades sociais, a seu

tempo, no intuito de estabelecer um direito trabalhista universal, visto que adaptado à

feição de cada Estado-membro62.

As Convenções de princípios, por não estabelecerem regras definidas de direito

trabalhista, dependem de uma complementação normativa interna que pode ocorrer por

meio de qualquer espécie normativa63.

De qualquer forma, segundo Gunther, quando ratificadas pelo Brasil, as

Convenções da OIT constituem fontes formais de direito, criando obrigações jurídicas64.

Ainda, como adverte o autor, a norma só passa a viger após oficialmente

publicada, o que ocorre com o decreto de promulgação publicado no Diário Oficial da

União65.

Assim, as Convenções devem ser incorporadas pelo processo ordinário de

internalização dos tratados internacionais. Já as Recomendações não estão sujeitas a

este processo, devendo ser simplesmente adotadas. Por adoção, entende-se que são

59 Autoexecutáveis, do inglês. 60 SÜSSEKIND, Arnaldo. Direito Internacional do Trabalho. São Paulo: LTr, 2000, p. 230. 61 SÜSSEKIND, loc. cit. 62 SÜSSEKIND, loc. cit. 63 SÜSSEKIND, loc. cit. 64 GUNTHER, 2011, p. 51. 65 Ibid., p. 71.

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medidas legais produzidas internamente que visem a dar cumprimento às matérias

consagradas nas Recomendações.

Da mesma forma que no caso das Convenções, a OIT quando cria uma

Recomendação, através de votação na Conferência Internacional do Trabalho, é

remetida a norma aos Estados-membros, para que a considerem, atendendo à sua

efetivação por meio de lei nacional ou por qualquer outra forma66.

Nesse caso, a autoridade competente poderá transformar um dos seus

dispositivos, adotar outras medidas em relação aos mesmos, ou ainda, tomar

simplesmente conhecimento do diploma internacional, sem aprovar qualquer

providência que lhe seja necessária.

Nas Recomendações, inexiste ratificação por parte do Estado-membro, ainda

que a autoridade competente converta suas normas em lei ou que esta já exista em

consonância com o instrumento internacional.

Essas, portanto, não estão abertas à ratificação, atuando apenas como “fontes

materiais de direito, porque servem de inspiração e modelo para a atividade

legislativa”67.

Com efeito, as Recomendações não se submetem ao processo de

internalização, devendo ser aplicadas diretamente. São uma orientação da OIT de

como os Estados devem pautar seu direito trabalhista interno.

Como ainda ressalta Gunther, a diferenciação entre as Convenções e

Recomendações da OIT se encontra no art. 19 de sua Constituição, sendo as primeiras

tratados internacionais celebrados pelos Poderes Executivos dos Estados-membros,

devendo ser aceitas ou recusadas em seus termos, sem que se possam introduzir

nelas modificações, e as últimas sugestões dirigidas aos Estados-membros, com o

objetivo de que, se aceitas, formulem-se um projeto de lei, em harmonia com elas, para

serem discutidos pelo Poder Legislativo68.

Nesse ponto é importante destacar que há fundada controvérsia acerca do

status destas Convenções – tratados internacionais – no ordenamento pátrio: se tem ou

não hierarquia de lei ordinária federal ou de Constituição, quando contem conteúdo de

direitos humanos, por força do parágrafo 2º, do artigo 5º da Constituição Federal. Trata-

se da questão da hierarquia das normas da OIT perante a legislação brasileira.

66 SÜSSEKIND, 2007, p. 21-22. 67 SÜSSEKIND, Arnaldo. Comentários à Constituição. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1990. v. 1.

p. 336. 68 GUNTHER, 2011, p. 53.

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Quando internalizada no Brasil a Convenção 158 da OIT (que estabelece a

obrigatoriedade da motivação da dispensa), em razão da ADIn 1.480-3-DF, o STF

entendeu que a forma de internalização da norma (aprovação pelo Congresso Nacional,

encaminhamento para depósito na OIT e Decreto do Presidente da República), ou seja,

o ingresso dos tratados internacionais no ordenamento jurídico brasileiro se dava por lei

ordinária, não podendo, portanto, substituir a lei complementar exigida para a

regulamentação da dispensa arbitrária ou sem justa causa69.

À época, o então Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso,

denunciou essa Convenção perante a OIT, estando pendente de julgamento pelo

mesmo STF a ação declaratória de inconstitucionalidade.

Contudo, com a Emenda Constitucional n. 45, de 2004, a partir de 01.01.05,

alterou-se a situação. Isso porque foi incluído o parágrafo 3º ao artigo 5º da CF, assim:

Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais70.

Assim, instado o STF a julgar em habeas corpus, o tema da prisão do

depositário infiel, recentemente, diferentemente do outrora julgado, entendeu que

prevalece o Pacto de São José da Costa Rica, tratado este de direitos humanos, sobre

a lei ordinária, ante a hierarquia supralegal daquele71.

Portanto, atualmente, o entendimento do STF, quanto à ordem hierárquica dos

tratados internacionais incorporados ao nosso ordenamento jurídico é de que se

aprovados pelo rito do parágrafo 3º, do art. 5º, da CF, equiparam-se a Emendas

Constitucionais. Se aprovados anteriormente à Emenda Constitucional 45/04, e versam

sobre direitos humanos, equiparam-se às normas supralegais, ou seja, são superiores

hierarquicamente às leis ordinárias, inclusive à CLT72.

Alguns doutrinadores, como Arnaldo Süssekind, sustentam ainda que caberia a

aplicação imediata das Convenções consideradas fundamentais, o que gera como

69 GUNTHER, 2011, p. 12. 70 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: Texto constitucional

promulgado em 5 de outubro de 1988, com as alterações adotadas pelas Emendas Constitucionais n. 1/92 a 62/2009, pelo Decreto n. 186/2008 e pelas Emendas Constitucionais de Revisão n. 1 a 6/94. Senado Federal , Secretaria de Edições Técnicas, Brasília, 2010, p. 20.

71 GUNTHER, op. cit., p. 71. 72 Ibid., p. 12.

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consequência uma maior ingerência pela OIT nos assuntos internos dos Estados, fato

que toca diretamente na sua soberania e que tem sido amplamente discutido pelos

internacionalistas como droit d´ingérence73.

Nesse norte, Cançado Trindade entende que os tratados que ensejam

princípios de proteção à pessoa humana devem sempre prevalecer seja sobre qualquer

ordenamento jurídico, pois estes tipos de tratado têm um status diferente74.

Segundo o autor, os direitos fundamentais que tutelam garantias básicas do

indivíduo em suas relações de trabalho, positivados em tratados internacionais e devido

a sua natureza especial, acabam por adquirir certo grau de obrigatoriedade que os

diferenciam de outros tipos de tratado, haja vista o que prescreve o artigo 5º, parágrafo

terceiro, da Constituição Federal de 198875.

É possível afirmar, portanto, que a Convenção da OIT, quando internalizada

no ordenamento jurídico brasileiro, ou seja, quando aprovada pelo Congresso Nacional

e dada a conhecimento público pelo Poder Executivo, se for mais favorável, prevalece

sobre as normas nacionais, pois direito positivo, sendo possível a exigência de sua

aplicação e cumprimento, de forma individual ou coletiva, pelos trabalhadores e

sindicatos76.

Contudo, se a lei interna for mais favorável, resultante de lei, sentença, costume

ou acordo, a norma internacional não terá eficácia, em razão de sua pertinência à

Constituição Federal77.

2.2.3 A Discriminação Frente às Convenções e Recomendações da OIT

Pelo exposto, as Convenções e Recomendações da OIT são normas

internacionais de trabalho, com o objetivo de promover o desenvolvimento e a interação

das organizações de empregadores, trabalhadores e dos governos, para se

estabelecerem melhores condições de trabalho a todos.

73 Direito de ingerência, do francês. 74 TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. “Memorial em prol de uma nova mentalidade quanto à

proteção dos direitos humanos nos planos internacional e nacional.” In: BOUCAULT, Carlos Eduardo de Abreu, ARAUJO, Nádia (Org.). Os Direitos Humanos e o Direito Internacional . Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 49.

75 TRINDADE, loc. cit. 76 GUNTHER, 2011, p. 12 e 73.

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Nesse sentido, segundo aponta Estevão Mallet78, a luta contra a discriminação

figura como um dos objetivos fundamentais da OIT.

Como visto, na Declaração da OIT de 1998, estabeleceram-se quatro séries de

direitos fundamentais dos trabalhadores, sendo um deles específico ao tema agora

estudado, relativo ao princípio da eliminação da discriminação em matéria de emprego

e ocupação, apoiado nas Convenções n. 100 e 11179. Ressalte-se que ambas as

Convenções se aplicam a todos os trabalhadores, sem exceção, independentemente de

setores ou profissões.

A primeira Convenção a tratar da discriminação é a de n. 100, editada em

1951, e ratificada por 168 países, sendo pelo Brasil através do Decreto Legislativo

41.721, de 25.06.57, e a partir daí aplicada no ordenamento jurídico pátrio,

preconizando a igualdade de remuneração e de benefícios entre homens e mulheres

por trabalho de igual valor80.

O artigo 7º, incisos XX e XXX, da Constituição Federal de 1988, apregoa o

texto contido na referida Convenção, estando amparado por lei infraconstitucional,

mais precisamente, a CLT, em seus artigos 372 a 377, transformada, após

procedimento legal em epígrafe, no Decreto nº 4.377, de 13/09/2002.

Em seguida, no ano de 1958, foi editada pela OIT outra Convenção tratando

de discriminação, mais abrangente, que é largamente debatida e suscitada nas

normais legais brasileiras e ratificada por 169 países. É a Convenção n. 111,

ratificada pelo Brasil por meio do Decreto Legislativo n. 62.150, de 19.01.68, que

trata da discriminação em geral e preconiza a formulação de uma política nacional

que elimine toda discriminação em matéria de emprego, formação profissional e

condições de trabalho por motivos de raça, cor, sexo, religião, opinião política,

ascendência nacional ou origem social, e promoção da igualdade de oportunidades

e de tratamento81.

Em seu art. 1º, define discriminação como toda distinção, exclusão ou

preferência, fundada na raça, cor, sexo, religião, opinião política, ascendência

nacional ou origem social, que tenha por efeito destruir ou alterar a igualdade de

oportunidades ou de tratamento em matéria de emprego ou profissão.

77 GUNTHER, 2011, p. 73. 78 MALLET, 2010, p. 19. 79 SÜSSEKIND, 2007, p. 372-376. 80 GUNTHER, op. cit., p. 83. 81 GUNTHER, loc. cit.

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Não são consideradas discriminação, pelo referido documento, apenas as

distinções, exclusões ou preferências fundadas em qualificações exigidas para um

determinado emprego, as medidas tomadas em relação a uma pessoa que seja objeto

de suspeita legítima de se entregar a uma atividade prejudicial à segurança do Estado,

sendo essa uma forma muito estrita e específica, ou ainda para combater a própria

discriminação, que é o objeto de pesquisa do presente estudo.

A atual Constituição Federal também adota o texto contido na referida

Convenção, sobretudo os incisos XXX, XXXI e XXXII, do artigo 7º.

Outras Convenções se referem, incidentalmente, à promoção da igualdade,

como as de números 117, que trata da política social, 122, sobre política de

emprego, 142, que trata da orientação profissional e a formação profissional no

desenvolvimento de recursos humanos, e 159, sobre reabilitação profissional e

emprego de pessoas deficientes.

Cabe ressaltar, ainda, a Declaração sobre igualdade de oportunidades e de

tratamento para as trabalhadoras, aprovada em 1975, pela 60ª Conferência

Internacional do Trabalho.

Mais recente, a 99ª Reunião da Conferência Internacional do Trabalho,

realizada em 02 de junho de 2010, em Genebra, aprovou a Recomendação 200,

relativa ao vírus HIV, à AIDS e o mundo do trabalho82.

Referida Recomendação enumera algumas definições importantes e

necessárias para o enfrentamento da discriminação das pessoas portadoras do HIV

e da AIDS no local de trabalho, dentre elas a de “estigma”, que representa a marca

social que, ligada a uma pessoa, acarreta geralmente a marginalização ou cria

obstáculo a uma vida em sociedade normal para a pessoa infectada ou afetada pelo

HIV; e a de “discriminação”, que designa toda distinção, exclusão ou preferência que

tem por finalidade destruir ou alterar a igualdade de chances ou de tratamento no

emprego ou profissão, conforme a Convenção n. 111, relativa à discriminação83.

Nela se ressalta a necessidade da informação, como principal arma contra a

discriminação do trabalhador portador do HIV e da AIDS84.

82 GUNTHER, 2011, p. 91. 83 RIBEIRO; BARACAT, 2011, p. 18. 84 Ibid., p. 20.

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Como a Recomendação 200 da OIT não constitui fonte formal de direito,

caberá a sua adoção, como visto, a fim de ser implementada no Brasil.

2.3 A CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA NO COMBATE À DISCRIMINAÇÃO

A inserção das minorias sociais no mercado de trabalho é antes de tudo uma

questão de cidadania. Nesse sentido houve grande avanço com a incorporação de

normas que impedem a discriminação na Constituição Federal de 1988, a mais cidadã

das Constituições brasileiras.

Em seu artigo 3º, a Constituição Federal de 1988 já dispõe que “Constituem

objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: ...IV – promover o bem de

todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de

discriminação85“.

Logo em seguida, no artigo 5º estabelece que “Todos são iguais perante a lei,

sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros

residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à

segurança e à propriedade86“, asseverando em seus incisos:

I – homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição; ... VIII – ninguém será privado de direitos por motivos de crença religiosa, ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei; ... XLI – a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais; XLII – a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;

85 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: Texto constitucional

promulgado em 5 de outubro de 1988, com as alterações adotadas pelas Emendas Constitucionais n. 1/92 a 62/2009, pelo Decreto n. 186/2008 e pelas Emendas Constitucionais de Revisão n. 1 a 6/94. Senado Federal , Secretaria de Edições Técnicas, Brasília, 2010, p. 13.

86 Ibid., p. 15-17.

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O artigo 7º, que cuida de direitos sociais, em especial ao trabalho, prevê que

“são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria

de sua condição social: ...XX – proteção ao mercado de trabalho da mulher, mediante

incentivos específicos, nos termos da lei87”.

Ainda, os incisos XXX e XXXII do mesmo art. 7º, tratam da isonomia salarial e

coíbem as formas de discriminação em relação a sexo, cor, estado civil, deficiência

física, mental ou sensorial, ou entre o trabalho manual, o técnico ou o intelectual.

Nesse diapasão, pertinente verificar que a Constituição Federal coincide, em

vários dispositivos, com os direitos fundamentais reafirmados no art. 2º, da Declaração

de Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho da OIT, já objeto desse estudo,

cabendo ressaltar pelo tema ora tratado o inciso XXXII, do art. 7º, que prevê a

eliminação de qualquer forma de discriminação em matéria de emprego e ocupação88.

No seu artigo 170 e incisos VII e VIII, a Constituição também se preocupou com

a justiça social garantida pela busca do pleno emprego e na redução das desigualdades

sociais e regionais.

Não há negar, assim, que a Constituição Federal de 1988 consagrou os direitos

fundamentais no estímulo ao bem de todos, sem preconceitos e quaisquer outras

formas de discriminação; além da igualdade entre os cidadãos; proibição de distinção

de salários, funções, critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil;

na justiça social garantida pela busca do pleno emprego e na redução das

desigualdades sociais.

Ademais, a Constituição vigente inovou em dispositivos que preveem ações

afirmativas, como trabalho da mulher, cotas para deficientes e progressividade dos

impostos.

A Constituição coloca-se, assim, em consonância com a OIT, que acolhe tais

princípios na Convenção n. 111, como já visto.

Não obstante, a discriminação encontra-se muito presente, apesar da edição de

diversas leis de ação afirmativa em favor das mulheres (Leis n. 9.029/95 e 9.799/99), de

adolescentes (Lei n. 10.097/00) e de pessoas com deficiência (Lei n. 8.213/91 e

Decreto n. 3.298/99), como assevera Ricardo Tadeu Marques da Fonseca89.

87 BRASIL, 2010, p. 21. 88 GUNTHER, 2011, p. 78. 89 FONSECA, Ricardo Tadeu Marques da. O trabalho das pessoas com deficiência e a

lapidação dos direitos humanos : o direito do trabalho, uma ação afirmativa. São Paulo: LTr, 2006, p. 48.

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Nesse sentido, a preocupação de evitar a discriminação nas relações de

trabalho vem desde a contratação do trabalhador, que deve ter como pano de fundo as

garantias e princípios constitucionais que fundamentam o Estado Democrático de

Direito, para que não haja ofensa aos princípios primordiais da Constituição Federal,

concernentes à dignidade da pessoa humana, ao valor social do trabalho, à igualdade,

à não discriminação e à busca do pleno emprego.

Ainda, com relação à dispensa, a empresa privada não se encontra em campo

neutro quando se trata de promover meios de sobrevivência digna ao trabalhador. A

liberdade de iniciativa não representa um aval para dispensas abusivas. Trata-se de

garantia constitucional que deve conviver em harmonia com outros valores

constitucionais, como a dignidade humana, a igualdade e a valorização social do

trabalho.

Nesse particular, releva observar a força normativa dos princípios

constitucionais. Com efeito, a força normativa dos princípios, decorre, sobretudo, de sua

eficácia jurídica positiva, ou seja, reconhecendo-se a pessoa que seria beneficiada pela

norma, direito subjetivo aos efeitos da observância da norma, de forma que lhe seja

possível a obtenção da tutela específica da situação contemplada pelo princípio

constitucional90.

2.3.1 Dos Princípios da Não Discriminação, da Igualdade e a Garantia ao Trabalho

Segundo Estevão Mallet, discriminação supõe desigualdade ilegítima,

intolerável. Daí a importância do princípio da igualdade e a repulsa provocada pela

discriminação91.

Não há como se tratar de não discriminação sem antes tecer alguns

comentários sobre o princípio da igualdade. Nas palavras de J. J. Calmon de

Passos92:

90 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e Aplicação da Constituição . 6. ed. São Paulo:

Saraiva, 2006, p. 377. 91 MALLET, 2010, p. 17. 92 PASSOS, J. J. Calmon de. O princípio de não discriminação. Jus Navigandi , Teresina, a. 6, n.

57, jul. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2990>. Acesso em: 17 ago. 2010.

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em verdade, o princípio de não discriminação é insuscetível de ser construído a partir dele próprio ou de uma direta referência ao homem. É sempre um consectário ou reflexo do princípio da igualdade, como seja entendido e positivado, ao qual se prende umbilicalmente.

Uma das medidas adotadas pelos Estados Democráticos é reforçar a gama

de direitos sociais, criando políticas de inclusão e incentivando a permanência dos

trabalhadores nos postos de trabalho93.

Nas Constituições dos principais Estados Democráticos está garantida a

igualdade de direitos declarada pela Assembleia Geral das Nações Unidas94, em 10

de dezembro de 1948. O seu art. VII, além de conter conceito de igualdade formal,

prevê o direito de que lhe seja garantida esta igualdade, assim:

Art. VII – Todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a igual proteção da lei. Todos têm direito a igual proteção contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação.

A questão das desigualdades e a preocupação em extirpá-las ou, pelo

menos, reduzi-las, é antiga, já que a evolução da humanidade se processa no

sentido de minimizar as desigualdades entre as pessoas95.

Ao longo da história, primeiramente houve a divisão entre os senhores e os

escravos, que eram considerados como objetos. Com o passar do tempo e a

preocupação maior com o elemento humano, as pessoas, inclusive os escravos,

passaram a ser reconhecidos como sujeitos de direitos, pelo menos no aspecto

formal. Contudo, outras distinções subsistiram como, em particular, a estabelecida

entre nobres e servos, onde uns tinham mais direitos que outros96.

Com as revoluções liberais do século XVIII e do século XIX, valorizou-se

ainda mais o elemento humano, e as principais distinções desaparecem. É a

consagração da igualdade formal, a abolição das discriminações em face da lei97.

93 MENEZES, Claudio Armando Couce de Menezes. LOPES, Glaucia Gomes Vergara. CALVET,

Otavio Amaral. SIVONELLA. Roberta Ferme. As Garantias dos Direitos Sociais e Laborais e as Dimensões de sua Efetividade: Direito do Trabalho e a Não Discriminação. Medias Judiciais e Pretensões Cabíveis. Revista IOB Trabalhista e Previdenciária . V. 21, n. 253, julho 2010, Porto Alegre: Síntese. 2010, p. 47.

94 Declaração Universal dos Direitos Humanos. In: MARTINS, Sergio Pinto. Convenções da OIT. São Paulo: Atlas, 2009, p. 708.

95 MALLET, 2010, p. 18. 96 Ibid., p. 17. 97 MALLET, loc. cit.

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No Brasil, o princípio da igualdade se manifestou, pela primeira vez, na

Constituição de 1824, no parágrafo 13º, do artigo 179, que previa: “A Lei será igual

para todos, quer proteja, quer castigue (...)”. Daí em diante, o princípio se manteve

nas Constituições seguintes, apenas com modificações de redação, até a atual, que

prevê, em seu artigo 5º que “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de

qualquer natureza (...)”98.

Em face da lei, portanto, as distinções são inadmissíveis. Todavia, é certo

afirmar que algumas persistem, resquícios de tempos pretéritos.

O processo de inclusão social no Brasil, pois, torna-se fundamental, já que

tem por finalidade colocar todos os cidadãos brasileiros em pé de igualdade,

oferecendo-lhes, equitativamente, as oportunidades de trabalho, de lazer, de saúde,

de escolaridade, enfim, todos os direitos fundamentais constantes na Constituição

Federal de 1988.

Os direitos devem ter como lastro os princípios norteadores, de sorte que, ao

elaborar as normas, o legislador deve levar em conta sua finalidade e seu alcance.

Como ressalta Ricardo Fonseca, “o princípio da igualdade atua na sociedade

inclusiva como uma viga mestra que sustenta todas as condutas e ações em prol da

inclusão” 99.

A Constituição Federal vigente, no seu preâmbulo, coloca a igualdade e a

justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem

preconceitos, fundada na harmonia social. Os objetivos fundamentais da República

Federativa do Brasil estão expressos no seu art. 3º, e dentre eles, o compromisso de

promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e

quaisquer outras formas de discriminação.

No caput do seu art. 5º, está expresso o princípio da igualdade de direitos, o

qual determina que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer

natureza. A Carta Política está prevendo a igualdade de aptidão, uma igualdade de

possibilidades virtuais, ou seja, de que todos os cidadãos têm o direito de tratamento

idêntico pela lei, em consonância com os critérios hospedados pelo ordenamento

jurídico.

Criar meios de igualar é tarefa árdua, pois se deve atentar para não ir além

do estrito e necessário à equiparação. Do contrário, estará o legislador

98 MALLET, 2010, p. 17. 99 FONSECA, 2006, p. 152.

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discriminando em vez de igualar. O tratamento desigual não é discriminatório, eis

que, na verdade, o que se veda são as diferenciações arbitrárias e desarrazoadas.

Destarte, quando se busca criar normas que atendam de forma diferenciada

as minorias, que desempenhem um tratamento distinto dado aos demais, não se

trata de uma desigualdade na lei, mas sim, uma maneira que o legislador encontrou

para tornar menores as diferenças de oportunidades existentes na sociedade.

Contudo, ela deve estar pautada em justificativas razoáveis que fundamentem sua

criação. Do contrário, poderão ser consideradas discriminatórias.

Faz-se necessário, destarte, a criação de mecanismos que busquem a

justiça social, pois na medida em que as sociedades se organizam, maiores se

tomam as diferenças sofridas por aquelas pessoas diferentes das demais. Ou seja,

as pessoas com deficiências, idosos, de raça não predominante, mulheres,

necessitam de normas específicas que as insiram neste contexto social.

José Afonso da Silva argumenta que, historicamente, as Constituições

inscreveram o princípio da igualdade como igualdade perante a lei, de sorte que “a

lei e sua aplicação tratam a todos igualmente, sem levar em conta as distinções de

grupos100”.

Quando a Constituição Federal exprime, no caput do art. 5º, que todos são

iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, não quer dizer que proíba

tratamentos desiguais. Se assim o fizesse, o intérprete estaria aplicando literalmente

o texto legal e indo de encontro à real concepção de igualdade que nela se

contempla. O que o legislador pretendeu é a igualdade real entre todas as pessoas.

Deste modo, tratar de forma diferenciada as minorias não significa

privilegiar, Já que “(...) a verdadeira igualdade consiste em se tratar igualmente os

iguais e desigualmente os desiguais, na justa medida da desigualdade”101.

Com a evolução dos conceitos e das exigências da sociedade, surge a

necessidade de uma igualdade real – e não só formal da letra da lei – que visa a

abolição das desigualdades pela adoção de políticas sociais positivas, e não apenas

repressoras, que recebem a denominação de ação afirmativa, considerando a

terminologia do Direito americano, ou discriminação positiva, se considerado o

Direito europeu.

100 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 26. ed. São Paulo:

Malheiros, 2005, p. 214. 101 A Inclusão das pessoas com deficiência no mercado de trabalho. Brasília: Secretaria de

Inspeção do Trabalho – SIT, 2007, p. 9.

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Nessas políticas, o Estado passa a atuar positivamente na materialização da

igualdade contida nos textos constitucionais102.

Aryon Sayão Romita103 entende se tratar “de conceber o princípio da

igualdade como uma concretização da idéia de justiça social, como um ponto de

chegada e não como um ponto de partida”. E acrescenta:

Proíbe-se a distinção que não assente num fundamento razoável. A distinção é lícita, desde que razoável, não arbitrária. A distinção é aceitável, é plenamente justificável quando não for discriminatória, podendo mesmo ser fator de igualdade.

Como já examinado, o princípio fundamental e universal da não

discriminação é assegurado por diversas normas internacionais e pela Constituição

Federal brasileira, incidindo sobre todos os campos do Direito e, em especial na

seara trabalhista, em razão do grau de sujeição e subordinação de uma das partes

dessa relação104.

O princípio que proíbe qualquer prática discriminatória constitui direito

fundamental da pessoa humana e é um dos objetivos da República do Brasil.

As normas constitucionais possuem eficácia jurídica imediata, ressaltando

em importância axiológica no ordenamento jurídico brasileiro o princípio da

dignidade da pessoa humana e, para a área trabalhista, também o valor social do

trabalho e a ordem econômica fundada na valorização do trabalho humano com o

objetivo de assegurar uma existência digna105.

Os direitos fundamentais expressam valores superiores, onde se encontram

inseridos os direitos sociais, classificados como de segunda dimensão, como o

direito ao trabalho106.

Tal direito encontra aplicação a todos os cidadãos em qualquer tipo de

relação de trabalho em que se lancem, e não apenas nas relações de emprego.

102 MENEZES, 2010, p. 44. 103 ROMITA. Aryon Sayão. Trabalho do deficiente. Revista do Curso de Direito da Universidade

Estácio de Sá , Rio de Janeiro, a.I, n. 3. Disponível em: <http://estacio.br/direito/revista/revista.3/ artigo5>. Acesso em: 20 ago. 2010.

104 CHEHAB, Gustavo Carvalho. O Princípio da Não Discriminação e o Ônus da Prova. ‘in” Revista do Tribunal Superior do Trabalho , Vol. 76, n. 3, (jul/set 2010), São Paulo: Lex Magister, 2010, p. 52.

105 MENEZES, op. cit., p. 53. 106 MENEZES, loc. cit.

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Em reforço ao já argumentado, não se pode esquecer que a não obtenção

ao trabalho por ato discriminatório constitui verdadeira lesão ao direito fundamental

ao trabalho.

O artigo 6º da Constituição Federal inclui, entre os direitos sociais

fundamentais, o direito ao trabalho, e deste decorrem os direitos do trabalho

aplicáveis quando se concretiza a relação de emprego.

Já o artigo 170 do mesmo diploma legal estabelece que um dos princípios

que devem reger a ordem econômica brasileira é, justamente, a busca do pleno

emprego.

A obtenção da relação de trabalho, portanto, constitui o direito à integração,

podendo ser definido como o direito que todo cidadão possui de obter trabalho,

somente sendo viável ao tomador dos serviços recusar a realização dessa relação

jurídica por motivo justificável107, já que é necessário ressaltar que se trata de

implementar o princípio da dignidade da pessoa que é inerente ao trabalho.

O direito ao trabalho, ademais, destaca-se como um direito social tão

importante quanto o direito à educação, à saúde, á habitação, ao lazer, à segurança,

à previdência social, à proteção à maternidade e à infância, à assistência aos

desamparados, tal como preceitua o art. 6º da Constituição Federal108.

Se ainda é reconhecido como direito do empregador a dispensa imotivada de

seus empregados, já não existem dúvidas de que tal direito deve ser exercido dentro

de seus limites, sendo o ato abusivo da dispensa considerado ato ilícito, nos termos

do art. 186 do Código Civil. E referido ato ilícito enseja, prioritariamente, a reparação

específica do retorno ao emprego com o pagamento de todo o tempo de

afastamento, denominado como reintegração.

2.3.2 Manifestações Discriminatórias a Partir da Constituição Federal de 1988

As modalidades de discriminação são classificadas sob diversos enfoques

pela doutrina nacional.

107 MENEZES, 2010, p. 58. 108 FONSECA, 2006, p. 227.

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O Ministro do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa dedica todo o

primeiro capítulo da sua obra Ação Afirmativa & Princípio Constitucional de

Igualdade ao estudo da discriminação, bem como à tipologia e espécies de

classificação desse fenômeno.

Por ele, duas seriam as principais espécies nessa classificação,

comparado ao direito estadunidense: a discriminação intencional ou tratamento

discriminatório disparate treatment109, que seria a mais trivial forma de

discriminação, única e exclusivamente fundada em razão de cor, sexo, raça,

origem ou qualquer outro fator que a diferencie da maioria dominante, e à qual as

normas constitucionais e infraconstitucionais antidiscriminatórias prioritariamente

se endereçam110. E a discriminação por impacto desproporcional ou adverso

Disparate Impact Doctrine111, que seria a discriminação indireta, aquela que

redunda em uma desigualdade não oriunda de atos concretos ou de manifestação

expressa de discriminação por parte de quem quer que seja, mas de práticas

administrativas, empresariais ou de políticas públicas aparentemente neutras,

porém dotadas de grande potencial discriminatório112.

A doutrina estadunidense, quando da análise dessa última espécie de

discriminação, ainda utiliza outro critério de classificação: a discriminação por

tradição (que decorre do comportamento costumeiramente discriminatório perante

determinados grupos), e a discriminação institucional (que se arraiga na própria

estrutura organizacional da sociedade).

Já a doutrina brasileira, nesse particular, como assevera Pinho Pedreira113

propõe três formas de discriminação, em matéria de trabalho, justamente o mote

desse estudo, que são ratificadas por Fonseca114, quais sejam: discriminação direta,

indireta e oculta.

109 Tratamento desigual, do inglês. 110 GOMES, Joaquim B. Barbosa. Ação afirmativa e princípio constitucional da igual dade: o

direito como instrumento de transformação social. A experiência dos EUA. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 21.

111 Doutrina do impacto desproporcional, do inglês. 112 GOMES, op. cit., p. 23. 113 PEDREIRA, Pinho. A discriminação indireta. Revista LTr , vol. 65, n. 4, abril de 2001, p. 402-406. 114 FONSECA, 2006, p. 159.

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2.3.2.1 Direta

A discriminação direta, também conhecida como intencional, advém de

práticas intencionais e conscientes que acarretem prejuízos, exclusões, que anulem

direitos de pessoa ou de determinado grupo de pessoas. É explícita, consciente,

pois plenamente verificada a partir da análise do conteúdo do ato discriminatório115.

É o caso, por exemplo, do empregado que é dispensado pelo simples fato de estar

com uma doença grave e contagiosa.

Como analisado, no direito estadunidense equivale ao disparate treatment,

que na verdade nada mais é do que a discriminação sistemática explícita, que

sintetiza na definição literal, pela empresa, do tratamento diferenciado em favor ou

em prejuízo de grupos específicos, exemplificando-a por meio de classificados de

empregos com previsão de vagas apenas para homens, ou então apenas para

pessoas com “boa aparência116”.

2.3.2.2 Indireta

A discriminação indireta é criação do direito estadunidense, com fulcro na

teoria do impacto desproporcional, ressaltando Fonseca117, como uma regra neutra à

primeira vista, e que se aplica igualmente a todos os empregados, mas que tem

efeito discriminatório por um motivo proibido para um só empregado ou um grupo de

empregados.

Essa modalidade se caracteriza pela falta de intenção declarada do agente

discriminador, mas se evidencia de acordo com os resultados práticos, dos efeitos

de uma determinada regra ou decisão vigente em uma instituição ou empresa.

Nos dizeres de Oliveira Neto118 dá-se:

115 OLIVEIRA NETO, Alberto Emiliano de. O princípio da não discriminação e sua aplicação às

relações de trabalho . Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8950>. Acesso em: 15 fev. 2011.

116 FONSECA, op. cit., p. 159. 117 FONSECA, loc. cit. 118 OLIVEIRA NETO, loc. cit.

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através de medidas legislativas, administrativas ou empresariais, cujo conteúdo, pressupondo uma situação preexistentes de desigualdade, acentua ou mantém tal quadro de injustiça, ao passo que o efeito discriminatório da aplicação da medida prejudica de maneira desproporcional determinados grupos ou pessoas.

Pode ser exemplificada pelo caso de um edital que exija à contratação de

policial que a pessoa tenha, no mínimo, um metro e oitenta e cinco e pese somente

até oitenta quilos. Embora, em princípio, pareçam exigências neutras, as limitações

de altura e peso criarão um impacto negativo nas possibilidades de contratação de

mulheres, pois poucas seriam nesse país as mulheres com um metro e oitenta.

Assim, embora não se tenha a convicção de que o autor do edital tivesse intenção

em discriminar as mulheres, as exigências mínimas ali postas poderiam justificar a

impugnação dessa exigência, em razão do impacto discriminatório detectado.

2.3.2.3 Oculta

A discriminação oculta, oriunda do direito francês, é similar à indireta, contudo

distingue-se dessa quanto ao aspecto intencional, já que na discriminação indireta

inexiste intenção. Na discriminação oculta, implicitamente há a intenção, porque não

declarada, mas consciente, camuflada por medidas aparentemente neutras, como,

por exemplo, na decisão velada de uma empresa só contratar indivíduos de uma

determinada religião119.

Essa modalidade é disfarçada pelo emprego de instrumentos aparentemente

neutros, ocultando real intenção efetivamente discriminatória.

2.3.2.4 Legítima

As discriminações legítimas são aquelas que se justificam em razão do tipo de

atividade profissional a ser desempenhada, como, por exemplo, a exigência de

119 FONSECA, 2006, p. 159.

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mulheres como guardas de presídio feminino, ou então a proibição de mulheres em

atividades que necessitem de força física além da preconizada por lei120.

2.4 A LEI ORDINÁRIA ANTIDISCRIMINATÓRIA

Além da Constituição Federal, que observou as diretrizes das Convenções da

OIT, as práticas discriminatórias também são alvo de legislações infraconstitucionais,

sendo a mais específica nas relações de trabalho a Lei 9.029, de 13 de abril de 1995.

Segundo Paulo Jakutis, a Lei 9.029, de 13 de abril de 1995 “é o diploma

brasileiro específico sobre a discriminação no emprego” 121.

2.4.1 Práticas discriminatórias à luz da Lei n. 9.029/95

A Lei 9.029/95 veio coibir algumas práticas discriminatórias para efeitos

admissionais ou de permanência da relação de emprego.

Ficou expressamente prevista, no seu artigo 1º, que é proibida a adoção de

qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso à relação de emprego,

ou sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar

ou idade, ressalvadas, nesse último caso, as hipóteses de proteção ao menor, previstas

constitucionalmente.

Contudo, afirma Jakutis que a lista de possibilidades discriminatórias apontadas

pelo seu art. 1º é meramente exemplificativa, já que expressamente veda “qualquer

prática discriminatória e limitativa122”.

Especificamente ainda, na referida lei, em relação à mulher empregada,

constituem crime as práticas discriminatórias de exigência de teste, exame, perícia,

laudo, atestado, declaração ou qualquer outro procedimento relativo à esterilização ou a

estado de gravidez, de adoção de quaisquer medidas, de iniciativa do empregador, que

configurem indução à esterilização genética, promoção ou controle de natalidade.

120 FONSECA, 2006, p. 159. 121 JAKUTIS, 2006, p. 159. 122 JAKUTIS, loc. cit.

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Pela predita lei, o próprio empregador – quando se tratar de pessoa física -, seu

representante legal, ou ainda, o dirigente de órgãos públicos e entidades das

administrações públicas diretas, indiretas e fundacionais de qualquer dos Poderes da

União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, podem ser sujeitos dos

referidos crimes, podendo ser apenados com detenção de um a dois anos, sem

embargo de pagamento de multa, e proibição de empréstimo ou financiamento junto a

instituições financeiras oficiais, se o crime resultar de preconceito de etnia, raça ou cor.

O empregador tem o livre arbítrio de estipular as regras à contratação de seus

empregados, todavia, sem que isso imponha situações discriminatórias. Embora

bastante amplo, o direito à dispensa de trabalhadores encontra óbices em inúmeras

barreiras legais representativas de garantias de emprego, bem como em normas de

conteúdo, inclusive, moral, que reprovam a discriminação e o abuso de direito.

É certo que o remédio mais evidente que existe contra a discriminação, no

direito pátrio, é a indenização por danos morais. Contudo, após a publicação da Lei n.

9.029/95, passou o trabalhador a contar também com uma nova opção: a readmissão

com ressarcimento integral de todo o período de afastamento.

Referida lei prevê, em seu artigo 4º, que o rompimento da relação de trabalho

por ato discriminatório, além do direito à reparação pelo dano moral, faculta ao

empregado optar entre a readmissão com ressarcimento integral de todo o período de

afastamento, mediante pagamento das remunerações devidas, corrigidas

monetariamente, acrescidas dos juros legais, ou a percepção, em dobro, da

remuneração do período de afastamento, corrigida monetariamente e acrescida dos

juros legais.

Assim, por tal dispositivo de lei, todo e qualquer indivíduo que entender ter sido

dispensado de sua relação empregatícia, de forma arbitrária e discriminatória, baseada

nos motivos elencados no mesmo diploma legal, pode suscitar judicialmente, além de

indenização por danos morais, a sua readmissão na empresa, com a reparação de todo

o período de afastamento, ou indenização compensatória a tanto.

Contudo, importante destacar que existe relevante controvérsia doutrinária e

jurisprudencial acerca da aplicação deste dispositivo em relação aos trabalhadores

soropositivos, objeto do seguinte tópico.

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2.4.2 Controvérsia acerca da sua aplicação ao portador do vírus HIV

De acordo com Sergio Pinto Martins deve ser evitada qualquer posição

emocional sobre a matéria, afirmando que não faz jus o portador do vírus HIV à garantia

de emprego, por falta de pressuposto legal.123

Afirma Martins que não há lei que determine a reintegração no emprego do

trabalhador soropositivo, dispensado sem justa causa, não se podendo sustentar a

existência de violação ao princípio da igualdade. Aduz o mesmo autor que o inciso XLI,

do art. 5º da Constituição Federal, segundo o qual “a lei punirá qualquer discriminação

atentatória dos direitos e liberdades fundamentais”, trata-se de norma constitucional de

eficácia limitada, que só produzirá efeitos quando houver edição de lei ordinária

versando sobre o tema, inexistente até o momento. Logo, assevera Martins, não há

impossibilidade do despedimento do soropositivo de AIDS com fundamento nesse

mandamento legal, que não é autoaplicável124.

Nesta mesma linha de argumentação, Martins aduz que a garantia no emprego

depende de autorização legal, ou quando houver previsão em norma coletiva da

categoria, sustentando que fora dessas hipóteses, não há direito à estabilidade, salvo

se a dispensa ocorrer em período que o empregado portador do vírus da AIDS estiver

sob os cuidados do INSS125.

Em relação propriamente a aplicação da Lei nº 9.029/95, assevera Martins, que

não é aplicável no tocante aos trabalhadores portadores do vírus HIV/AIDS, pois não

diz respeito a esta doença, inexistindo, portanto, lacuna na lei. Martins advoga que

como inexiste comando legal prevendo garantia de emprego ao trabalhador

soropositivo, não poderá o juiz investir-se na função de legislador e determinar a

reintegração do portador de HIV ao emprego, sob pena de estar desvirtuando a função

do Poder Judiciário, que é julgar e não legislar, violando o princípio constitucional da

separação dos Poderes126.

Da mesma forma, afirma Martins, as Convenções n. 111 e 142 da OIT,

ratificadas pelo Brasil, não tratam especificamente da garantia ou estabilidade de

123 MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho . 26. ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 442. 124 MARTINS, loc. cit. 125 Ibid., p. 444. 126 MARTINS, loc. cit.

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empregado em decorrência de doença, principalmente da AIDS, não sendo fundamento

normativo para o reconhecimento da reintegração do trabalhador soropositivo127.

Observa também Martins que o despedimento discriminatório do empregado

portador do vírus HIV/AIDS não pode ser presumido, já que decorre do direito

potestativo e constitucional de dispensar do qual é titular o empregador, cabendo

apenas o pagamento das verbas rescisórias. O ato abusivo do empregador que

dispensa o portador do vírus da AIDS, de forma discriminatória, aduz o autor, deve ser

provado pelo empregado, afirmando que a dispensa normal se presume, enquanto que

a anormal e fraudulenta deve ser provada pelo empregado128.

Este também é o entendimento de Vólia Bomfim Cassar, segundo a qual “Os

portadores do vírus da AIDS não têm direito à estabilidade pelo simples fato de estarem

acometidos por esta doença, apesar de relevante questão social da matéria. As

estabilidades decorrem de lei e esta não tem amparo legal129”.

Por fim, Martins advoga que a garantia de emprego por decisão judicial para o

trabalhador soropositivo implicaria violação ao princípio da igualdade, já que não seria

estendida aos trabalhadores portadores de outras doenças130.

Em sentido contrário, a dispensa discriminatória do empregado portador do

vírus da AIDS, inspira a presunção de ilicitude como expõe Luís Felipe Lopes Boson e,

por isso, eivada de nulidade, o que justifica a reintegração no emprego131.

De acordo com Boson, a reintegração em virtude de ordem judicial tem lastro

na regra interpretativa de máxima eficácia dos preceitos que asseguram os direitos

fundamentais. Uma das vigas mestras do ordenamento jurídico brasileiro em matéria de

direitos fundamentais, afirma o autor, consiste na vedação de discriminação

injustificada. Portanto, discorre Boson, a despedida discriminatória do portador do vírus

HIV deve ser sancionada com a decretação de nulidade do ato patronal, e consequente

reintegração132.

Para Alice Monteiro de Barros, à luz da legislação brasileira, o empregado

portador do vírus HIV não goza de estabilidade provisória no emprego, salvo se houver

disposição expressa em norma coletiva. Segundo a autora, falta-lhe uma norma de

127 MARTINS, 2010, 244. 128 MARTINS, loc. cit. 129 CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho . 3. ed. Niterói: Impetus, 2009, p. 96. 130 MARTINS, op. cit, p. 444. 131 BOSON, Luís Felipe Lopes. A discriminação na jurisprudência. In: RENAULT, Luiz Otávio

Linhares. VIANA, Márcio Tulio (Coord.). Discriminação : estudos. São Paulo: LTr, 2000, p. 263. 132 BOSON, loc. cit.

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alcance geral, que adote regras específicas destinadas a proteger referidos

empregados infectados contra a prática discriminatória ensejadora de limites aos

seus direitos e expectativas133.

Segundo a autora, a Lei nº 9.029/95 não incluiu o estado de saúde do

empregado como pressuposto para proibir a adoção de qualquer prática

discriminatória para acesso à relação de emprego ou à sua manutenção para as

hipóteses dos portadores do HIV. Assim, sustenta a autora, não se pode aplicar a

Lei nº 9.029/95 aos portadores do HIV, uma vez que contém preceito de natureza

penal, insuscetível de interpretação analógica ou extensiva 134.

Embora a autora entenda não se aplicar aos portadores de HIV a declinada

lei, reconhece que é possível individualizar hipóteses de tutela internacional e

constitucional aos mesmos contra a discriminação, através do disposto na

Convenção 111 da OIT, que prevê “qualquer outra exclusão que tenha por feito

anular ou alterar a igualdade de tratamento no emprego”, bem como no artigo 3º,

IV, da Constituição Federal, que dispõe, como objetivo fundamental da República

Federativa do Brasil, promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça,

sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação, sustentando o princípio da

“máxima eficiência”, segundo o qual a lei não emprega palavras inúteis, o que significa

a impossibilidade de se ignorar, na interpretação da Constituição, um artigo ou parte

dele, podendo-se incluir, portanto, o estado de saúde do soropositivo, na medida em

que, estando delimitadas as possibilidades reais de contágio pelo vírus HIV, não há

razão que justifique a resilição do pacto laboral135.

Barros sustenta que a dispensa do empregado portador do HIV, quando não

comprovado um motivo justificável, presume-se discriminatória e arbitrária, devendo ser

coibida, pois a permanência do trabalhador no emprego, além do caráter de

laborterapia, irá lhe propiciar a aquisição dos benefícios previdenciários que receberá

quando estiver impossibilitado de continuar trabalhando, o que, certamente, ocorrerá,

considerando se tratar de doença fatal136.

Arion S. Romita, por sua vez, defende o argumento de que a omissão da Lei nº

9.029/95 não obstaria sua aplicação em relação a trabalhadores soropositivos. Para

133 BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 6. ed. São Paulo: LTr, 2010, p. 1.204. 134 BARROS, loc. cit. 135 BARROS, loc. cit. 136 Ibid., p. 1.205.

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Romita, não se trata de silêncio eloquente, mas de simples omissão, de lacuna que

pode e deve ser preenchida mediante apelo aos métodos de interpretação da lei 137.

A jurisprudência trabalhista, por seu turno, divide-se em duas correntes: a

primeira, no sentido de que o empregado deve provar a existência do ato discriminatório

do empregador, não se presumindo a discriminação o fato de o empregador ter

conhecimento da doença138.

A segunda corrente, diga-se, majoritária, entende que o fato de o empregador

ter conhecimento da doença gera presunção favorável ao empregado, ou seja, de que a

dispensa foi discriminatória, incumbindo ao empregador a prova para desconstituir esta

presunção139.

Nesse sentido é a atual percepção do TST. A SDI-I do TST firmou

posicionamento no sentido de que, ainda que não exista, no âmbito

infraconstitucional, lei específica asseguradora da permanência no emprego do

empregado portador do vírus HIV, a dispensa de forma arbitrária e discriminatória

afronta o caput do art. 5º da CF/88.

Em recente decisão, o Ministro Lelio Bentes Corrêa, relator do processo que

versava sobre a garantia de emprego de portador do vírus HIV, observou que o TST já

tem entendimento firmado no sentido da garantia provisória no emprego ao trabalhador

137 ROMITA, Arion Sayão. Direitos Fundamentais nas Relações de Trabalho. 3. ed. São Paulo:

LTr, 2009, p. 338. 138 “RECURSO DE REVISTA - REINTEGRAÇÃO - PORTADOR DO VÍRUS HIV - DISPENSA

DISCRIMINATÓRIA. A estabilidade do empregado portador do vírus HIV vincula-se a existência de discriminação em razão da doença, o que não restou demonstrado, tendo em vista que por mais de cinco anos após a ciência da ação o empregado continuou trabalhando. Ilesos, portanto, os dispositivos invocados, não havendo se falar em divergência jurisprudencial sobre a matéria, eis que a questão fática que norteou o julgado não resta assinalada nos paradigmas. Recurso de revista não conhecido. (BRASIL, Tribunal Superior do Trabalho. RR 257200-69.2006.5.01.0243. Data de Julgamento: 20 abr. 2010. Relator Ministro: Aloysio Corrêa da Veiga. 6ª Turma. Data de Divulgação: DEJT 30 abr. 2010 Disponível em: <www.tst.jus.br>. Acesso em: 15 dez. 2010).

139 “EMPREGADO PORTADOR DO VÍRUS HIV. DISPENSA IMOTIVADA. PRESUNÇÃO RELATIVA DE DISCRIMINAÇÃO. REINTEGRAÇÃO. A ordem jurídica pátria repudia a discriminação, cuja presença na voluntas que precede o ato da dispensa implica a sua ilicitude, ensejando nulidade. O exercício do direito potestativo de denúncia vazia do contrato de trabalho sofre limites , na hipótese de ato discriminatório, em função dos princípios da função social da propriedade (art. 170, III, da CF), da dignidade da pessoa humana e dos valores sociais do trabalho (art. 1º, III e IV, da CF), por manifesta incompatibilidade. A jurisprudência desta Corte Superior evoluiu no sentido de presumir discriminatória a dispensa sempre que o empregador tem ciência de que o empregado é portador do vírus HIV, com a conseqüente inversão do encargo probatório (praesumptio juris tantum) (BRASIL, Tribunal Superior do Trabalho. RR 721340-83.2006.5.12.0035. Data de Julgamento: 26 mai. 2010. Relatora Ministra: Rosa Maria Weber. 3ª Turma, Data de Divulgação: DEJT 22 out. 2010 Disponível em: <www.tst.jus.br>. Acesso em: 15 dez. 2010).

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portador de HIV, apesar da ausência de legislação que assegure este direito. Presume-

se discriminatória a dispensa nessa condição140.

Lelio Bentes é membro da Comissão de Peritos em Aplicação de Normas

Internacionais da OIT, e chamou a atenção na decisão ao fato de que o entendimento

do TST está alinhado às normas da OIT, especialmente da Convenção 111 e da

Recomendação 200.

No acórdão, ressaltou o relator que o ônus de comprovar que não tinha ciência

da condição do empregado, ou que o ato de dispensa tinha motivação lícita, é do

empregador.

Todavia, a interpretação doutrinária e jurisprudencial da Lei nº 9.029/95,

embora presuma discriminatória a dispensa do portador do vírus da AIDS, impede a

tutela plena do emprego do trabalhador soropositivo, pois dependerá da prova do

conhecimento do empregador da contaminação pelo empregado.

Assim, é importante observar, por oportuno, que através da negociação

coletiva, é possível obter reconhecimento da garantia no emprego do empregado

soropositivo.

É o caso da cláusula 48ª da Convenção Coletiva celebrada entre o Sindicato

dos Comerciários de São Paulo e o Sindicato dos Lojistas do Comércio e São Paulo,

com vigência de 1º/9/2010 a 31/8/2011, que veda a dispensa do empregado que

comprovadamente seja portador da AIDS, “desde que tenha comunicado essa

circunstância à empresa até 60 dias antes de eventual aviso prévio pela mesma

concedido141”.

140 “EMPREGADO PORTADOR DO VÍRUS HIV. DISPENSA IMOTIVADA. ATITUDE

DISCRIMINATÓRIA PRESUMIDA. REINTEGRAÇÃO. 1. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que se presume discriminatória a dispensa do empregado portador do vírus HIV. Desse modo, recai sobre o empregador o ônus de comprovar que não tinha ciência da condição do empregado ou que o ato de dispensa tinha outra motivação, lícita. 2. Entendimento consentâneo com a normativa internacional, especialmente a Convenção n.º 111, de 1958, sobre Discriminação em Matéria de Emprego e Ocupação (ratificada pelo Brasil em 26.11.1965 e promulgada mediante o Decreto n.º 62.150, de 19.01.1968) e a Recomendação n.º 200, de 2010, sobre HIV e AIDS e o Mundo do Trabalho. 3. Nesse contexto, afigura-se indevida a inversão do ônus da prova levada a cabo pelo Tribunal Regional, ao atribuir ao empregado o encargo de demonstrar o caráter discriminatório do ato de dispensa promovido pelo empregador. 4. Recurso de revista conhecido e provido. (BRASIL, Tribunal Superior do Trabalho RR 61600-92.2005.5.04.0201. Data de Publicação: 01 jul. 2011, Relator Ministro: Lelio Bentes Corrêa, 1ª Turma, Data de Divulgação: DEJT 30 jun. 2011 Disponível em: <www.tst.jus.br>. Acesso em 08 jul. 2011).

141 “48. GARANTIA DE EMPREGO AO PORTADOR DO VÍRUS HIV: Ao empregado comprovadamente portador da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDs) será garantido o emprego até o seu afastamento pelo INSS, desde que tenha comunicado essa circunstância à empresa em até 60 (sessenta) dias antes de eventual aviso prévio pela mesma concedido”.

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Já a cláusula 61ª da Convenção Coletiva ajustada entre o Sindicato da

Categoria Profissional de Empregadores e de Trabalhadores em Empresas de Turismo

no Estado de São Paulo, e o Sindicato das Empresas de Turismo no Estado de São

Paulo, vigente de 1º/11/2010 a 31/10/2011, assegura a estabilidade provisória do

empregado portador de vírus HIV (AIDS) até seu afastamento pelo INSS142.

Por fim, a cláusula 19ª da Convenção Coletiva firmada entre o Sindicato dos

Empregados em Empresas de Segurança e Vigilância do Estado do Sergipe e o

Sindicato das Empresas de Segurança Privada do Estado do Serviço, que vigorou de

1º/3/2011 a 29/2/2012, previa que o empregado portador do vírus HIV faz jus a todos os

direitos dos demais empregados abrangidos pela convenção, garantindo-lhe o

encaminhamento ao órgão da previdência social para as providências necessárias

quando a doença se manifestar, sendo vedada a dispensa sem justa causa ou a

discriminação, sob qualquer pretexto143. Esta cláusula é mais abrangente, pois além de

vedar a dispensa sem justa causa do empregado soropositivo, veda qualquer tipo de

discriminação.

Convenção Coletiva de Trabalho 2010/2011. Disponível em: <http://www.comerciarios.org.br/ convencao/lojistas/Lojistas%202010%202011.pdf>. Acesso em: 10 jan. 2011.

142 CLÁUSULA SEXAGÉSIMA PRIMEIRA – ESTABILIDADE DO FUNCIONÁRIO PORTADOR DO VÍRUS HIV (AIDS). Fica assegurada a estabilidade provisória do funcionário portador de vírus HIV (AIDS) até seu afastamento pelo INSS”. Convenção Coletiva de Trabalho 2010/2011. Disponível em: <http://www.sindetursp.com.br/downloads/setetur_2011.pdf>. Acesso em: 10 jan. 2011.

143 “CLÁUSULA DÉCIMA NONA – ESTABILIDADE AO PORTADOR DO VÍRUS HIV/AIDS. O empregado portador do vírus HIV gozará dos mesmos direitos dos demais empregados abrangidos por esta Convenção, até que se manifeste a doença, sendo que após a manifestação comprovada, será encaminhado ao órgão de providência social para as providências necessárias, ficando vedada a sua dispensa sem justa causa ou a discriminação sob qualquer pretexto”. Convenção Coletiva de Trabalho 2009/2010. Processo n. 46221.002608/2009-11. Disponível em:

<http://www.vigilantecntv.org.br/Convencoes/2011/cct2011sergipe_patrimonial_TV.pdf/>. Acesso em: 10 abr. 2011.

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3 CONCEITO, FINALIDADE, ORIGEM, MODALIDADES E PRÓS E CONTRAS

DAS AÇÕES AFIRMATIVAS NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASI LEIRO

“Todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direito144“. Esse

conceito é utilizado na Declaração dos Direitos do Homem, em 1789, bem como

repetido um século e meio depois, no art. 1º, da Declaração Universal dos Direitos

do Homem.

O ideal da igualdade não é recente e sempre travou embate com a

discriminação presente historicamente na sociedade.

Por essa razão a discriminação é legalmente proibida e intolerável. Contudo,

como afirma Estêvão Mallet145, a realidade nem sempre condiz com tal ideia. A

distância entre o dever ser – a norma legal – e o ser – aquilo que se passa no

mundo dos fatos – é enorme.

Isso porque é fato que há, no mundo do trabalho, explícitas ou veladas

práticas excludentes de mão de obra, fundadas em preconceitos e discriminações

de variados matizes, malgrado o existir de normas constitucionais e

infraconstitucionais que colimem proibi-las.

Nesse aspecto, importante lembrar relevante documento que, já no final do

século XIX, abordou questões delicadas relacionadas à justiça social e a melhores

condições de trabalho: a Encíclica Rerum Novarum146, de autoria do Papa Leão XIII.

A importância histórica da Encíclica é inegável, pois foi publicada em 1891,

mas trouxe avanços na área trabalhista, proporcionados pela intervenção gradativa

do Estado na Economia.

Segundo o jurista José Augusto Rodrigues Pinto, a obra representou “o

veículo de entrada em cena” da Igreja Católica nas mazelas da sociedade industrial,

afirmando ser “um dos marcos da evolução universal do Direito do Trabalho”, já que

seu ponto central foi a “questão social”, principalmente no que tange à dignidade

humana do trabalhador147.

144 BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Tradução de Carlos Nelson Coutinho; apresentação de

Celso Lafer. Nova ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004, p. 127. 145 MALLET, 2010, p. 33. 146 Das Coisas Novas, do latim. 147 PINTO, José Augusto Rodrigues. Curso de Direito Individual do Trabalho. 4. ed. São Paulo:

LTr, 2000. p. 30-31.

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Sergio Pinto Martins destaca-a como “uma fase de transição para a justiça

social, traçando regras para a intervenção estatal na relação entre trabalhador e

patrão”148.

Cabe destacar ainda a afirmação de Gunther de que “é impossível falar em

Direito do Trabalho sem falar na Encíclica Rerum Novarum, que é de 1891, mas se

mantém viva e atual e serviu de fundamento para a própria Consolidação das Leis

do Trabalho”149.

A proibição legal de discriminação não exclui as necessidades específicas

de determinados grupos e seguimentos da sociedade que demandam a introdução

de garantias diferenciadas. Isso porque a efetivação dos direitos fundamentais,

neles inclusos os sociais, reclama, em determinadas áreas ou momentos, normas de

proteção a favor daqueles que estejam sob dependência de quem detém o poder.

Podem ser consideradas garantias diferenciadas as normas de Direito do

Trabalho que protegem os hipossuficientes em relação ao poder econômico dos

empregadores, bem como aquelas em favor de mulheres, crianças, pessoas com

doenças graves ou acidentados, ou ainda portadores de deficiências.

Não raro, essas garantias diferenciadas, que partem da desigualdade de fato

para alcançar a desigualdade real, podem assumir a forma de medidas de ação

positiva, como subsídios e cotas150.

Todavia, para se tornar um instrumento de igualdade real, essas normas

destinadas a resguardar o direito de minorias, devem acompanhar meios de

concreção.

Desse modo, para que os objetivos fundamentais da República Federativa

do Brasil sejam alcançados, reclamam comportamentos ativos ou, dizendo de outro

modo, pedem ações afirmativas, no intuito de assegurar, por meio de formas de

tratamento diferenciado, a igualdade de fato.

As práticas discriminatórias são contestadas pela elaboração de normas que

as coíbem, punindo-as simplesmente, quer civil, quer criminalmente, no denominado

modelo repressor, ou através das ações afirmativas que, além de proibir a prática

148 MARTINS, 2010. p. 35. 149 GUNTHER, Luiz Eduardo. Seminário “A Encíclica Rerum Novarum e o trabalho 120 anos depois”.

Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região. Escola Judicial , Disponível em: <http://www.trt9.jus.br/internet_base/pagina_geral.do?secao=28&pagina=INICIAL>. Acesso em: 07 jun. 2011.

150 MENEZES, 2010, p. 47.

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discriminatória, visam proteger os indivíduos discriminados, no intuito de reduzir os

efeitos da discriminação151.

Todavia, as ações afirmativas, por criarem inevitável discriminação das

pessoas que não estejam incluídas nos grupos a que se destinam, sofrem

exacerbadas críticas, especialmente daqueles que sempre se beneficiaram com a

existência de minorias sociais apartadas.

3.1 CONCEITO E FINALIDADE DAS AÇÕES AFIRMATIVAS

Os Estados Unidos foram o primeiro país a adotar as ações afirmativas,

inicialmente para tentar resolver o abismo social entre brancos e negros152 e,

posteriormente, para fazer justiça social a outras minorias marginalizadas (mulheres,

índios, portadores de deficiência) dentro do denominado Welfare State153.

O Brasil vem marchando na retaguarda, contínua, mas lentamente. O artigo

3º da Constituição Federal de 1988 se constitui a base das ações afirmativas

públicas e privadas, exigindo uma postura proativa do Estado e da sociedade para

que as desigualdades econômicas, políticas e sociais sejam enfrentadas e,

efetivamente, superadas por meio de ações imperativas154.

Referido dispositivo legal centraliza-se em verbos contundentes derivados

da ideia de que constituem objetivos fundamentais da República Federativa do

Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o

desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as

desigualdades sociais e regionais; e IV - promover o bem de todos, sem

preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de

discriminação, que, para serem alcançados, necessitam de comportamentos ativos.

A tanto, importante ressaltar a observação da professora Carmem Lúcia

Antunes Rocha155 que “os verbos utilizados pelo legislador constituinte para definir

151 MENEZES, 2010, p. 50. 152 Ibid, p. 44. 153 Estado-providência, do inglês. 154 FONSECA, 2005, p. 245. 155 ROCHA, Carmen Lúcia Antunes. Ação Afirmativa: o Conteúdo Democrático do Princípio da

Igualdade Jurídica. Revista Trimestral de Direito Público , 15/1996, p. 92.

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os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil são verbos que evocam

ação: construir, erradicar, reduzir, promover”, não mera exortação.

Assim, a Constituição Federal de 1988, como ressalta Lenio Streck156,

“adquire foros de maioridade nessa quadra da história”, sendo:

[...] uma Constituição social, dirigente e compromissária – conforme o conceito que a doutrina constitucional contemporânea cunhou e que já faz parte da tradição -, é absolutamente lógico afirmar que o seu conteúdo está voltado/dirigido para o resgate das promessas da modernidade.

Daí por que o Direito, segundo o mesmo autor, é um campo necessário de

luta para implantação das promessas modernas (igualdade, justiça social, respeito

aos direitos fundamentais, entre outras hipóteses).

Nesse ponto, o ordenamento jurídico brasileiro, investe na implementação

da chamada igualdade real entre as pessoas, dando um passo adiante em relação à

denominada igualdade material, substancial, que é objeto dos direitos sociais.

Isso porque a igualdade de fato ainda está a certa distância da sociedade

atual. O motivo é objeto de reflexão de Norberto Bobbio157, em sua obra “Igualdade

e Liberdade”, cujo trecho merece transcrição:

O fato de que a liberdade e igualdade sejam metas desejáveis em geral e simultaneamente não significa que os indivíduos não desejem também metas diametralmente opostas. Os homens desejam mais ser livres do que escravos, mas também preferem mandar a obedecer. O homem ama a igualdade, mas ama também a hierarquia quando está situado em seus graus mais elevados.

A luta antidiscriminatória, historicamente, evoluiu graças à mobilização dos

grupos discriminados e à incorporação por parte da sociedade da ideia de inclusão

social.

Em um primeiro momento, o direito ignora a discriminação, vindo a proibi-la

em um segundo momento. Já com o objetivo de operacionalizar medidas que

supram desvantagens históricas, passa a discriminar positivamente em um terceiro

momento, surgindo as ações afirmativas.

156 STRECK, Lenio Luiz. Jurisdição Constitucional e Hermenêutica: uma nova crítica do Direito. 2.

ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 15. 157 BOBBIO, Norberto. Igualdade e Liberdade. Tradução de Carlos Nelson Coutinho. 4. ed. Rio de

Janeiro: Ediouro, 2000, p. 9.

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Segundo observa Joaquim Barbosa Gomes, as ações afirmativas consistem

em políticas públicas e privadas voltadas à concretude do princípio constitucional da

igualdade material e à neutralização dos efeitos da discriminação, seja de raça,

gênero, idade, origem nacional e compleição física, que visam combater não

somente as manifestações flagrantes de discriminação, mas também a

discriminação de fundo cultural, estrutural, enraizada na sociedade158.

Nesse sentido, diante da vulnerabilidade e exclusão social de determinados

grupos, foram produzidas políticas e normas – legais e normativo-sindicais – que

procuram assegurar, por meio de formas de tratamento diferenciado, a igualdade de

fato, invertendo o próprio conceito de discriminação e objetivando beneficiar uma

minoria, reafirmando a máxima de Aristóteles: “tratar igualmente os iguais e

desigualmente os desiguais, na medida de sua desigualdade”.

Nesse assunto, cabe destacar a observação que faz Celso Antonio Bandeira

de Mello159:

Como as leis nada mais fazem senão discriminar situações para submetê-las à regência de tais ou quais regras – sendo esta mesma sua característica funcional – é preciso indagar quais as discriminações juridicamente intoleráveis.

Para o autor, a discriminação pode ser legítima, desde que razoável e

justificável. Uma disposição normativa que estabeleça algum tipo de diferenciação

tem que estar sustentada por uma justificativa racional, sob pena de se tornar hostil

à igualdade constitucional.

Esse tratamento diferenciado, individualizado, amparado no conceito de

igualdade material ou substancial, dá ensejo a uma nova forma de discriminação,

conhecida como discriminação positiva, levando em consideração as desigualdades

concretas existentes na sociedade.

Convém, aqui, à guisa de reforço argumentativo, considerar a lição de Flávia

Piovesan160 e reproduzi-la:

158 GOMES, Joaquim B. Barbosa. Ação Afirmativa & Princípio Constitucional da Igual dade ; (o

Direito como instrumento de transformação social. A experiência dos EUA) Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 7.

159 MELLO, Celso Antonio Bandeira de. O Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 18.

160 PIOVESAN, Flávia. Temas de Direitos Humanos . São Paulo: Max Limonad, 1998, p. 130.

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“do ente abstrato, genérico, destituído de cor, sexo, idade, classe social, dentre outros critérios, emerge o sujeito de direito concreto, historicamente situado, com especificidades e particularidades. Daí apontar-se não mais ao indivíduo genérica e abstratamente considerado, mas ao indivíduo especificado, considerando-se categorizações relativas ao gênero, idade, etnia, raça, etc”.

O indivíduo “especificado” se torna alvo, então, de novas políticas sociais. A

essas políticas sociais, que nada mais são do que tentativas de concretização da

igualdade substancial ou material, o já citado Ministro do Supremo Tribunal Federal

Joaquim Barbosa denomina “ações afirmativas” ou, na terminologia do direito

europeu, “discriminação positiva” 161.

Sendo mais específico, poder-se-ia dizer que as ações afirmativas são

ações de incentivo e suporte para os grupos de pessoas a que se destinam, como,

por exemplo, a criação de cursinhos pré-vestibulares para negros e pessoas

oriundas de escolas públicas, ou a criação de horários de reuniões em empresas

que permitam a participação de mulheres com filhos. Já a discriminação positiva

introduz na norma o tratamento desigual dos formalmente iguais, citando-se como

exemplo a reserva de vagas de cargos públicos para deficientes físicos determinada

pela Constituição Federal de 1988, ou ainda a reserva de uma determinada

quantidade de vagas nas universidades públicas para negros ou da rede pública.

Para Fonseca, as ações afirmativas visam combater os efeitos acumulados

em virtude das discriminações ocorridas no passado, compensando condutas de

raízes históricas profundas, e podem decorrer de imposição legal, judicial ou de

ações voluntárias de entidades privadas instigadas ou não por leis abertas, de

política de isenções fiscais, por exemplo, ou bolsas de ensino, e outras tantas162.

A propósito, vale ressaltar a abrangente definição de ações afirmativas de

Joaquim Barbosa163:

[...] conjunto de políticas públicas e privadas de caráter compulsório, facultativo ou voluntário, concebidas com vistas ao combate à discriminação racial, de gênero e de origem nacional, bem como para corrigir os efeitos presentes da discriminação praticada no passado, tendo por objetivo a concretização do ideal de efetiva igualdade de acesso a bens fundamentais como educação e emprego.

161 GOMES, 2001, p. 7. 162 FONSECA, 2006, p. 184. 163 GOMES, op. cit., p. 40.

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Essa definição, que é simples e bastante clara, pode e deve ser aplicada em

relação a outros grupos, tais como pessoas com deficiências ou doenças graves,

homossexuais, ou seja, a outras essenciais questões sociais.

A finalidade das ações afirmativas ou das políticas de discriminação positiva

vem a ser a de promover a inclusão de grupos notoriamente discriminados,

possibilitando-lhes o acesso aos espaços sociais e a fruição de direitos

fundamentais, com o objetivo de realizar a efetiva igualdade constitucionalmente

prevista.

Além de concretização da igualdade de oportunidades, o intuito dessas

medidas seria também o de induzir transformações de ordem cultural, pedagógica e

psicológica, voltadas à implantação do pluralismo, inclusão e da diversidade.

Como adverte Paulo Jakutis as ações afirmativas ou discriminações

positivas não são neutras, “elas tomam partido, são tendenciosas e não tencionam

esconder esse fato164”. Pelo contrário, são medidas que buscam reverter uma

situação real, histórica e crônica de desigualdade, concedendo vantagens a uma

pessoa ou um grupo, com o objetivo de alcançar o equilíbrio das relações sociais

diante de diferentes interesses.

Relevante ressaltar, por oportuno, o caráter provisório, temporário, dessas

medidas, já que o esperado é que a convivência entre as pessoas, enriquecida pela

diversidade, ensine, por si só, a tolerância, a solidariedade e superar as distâncias

sociais até o momento intransponíveis, em razão da carga de preconceito herdada

de condutas seculares.

No mesmo sentido, Álvaro Ricardo Souza Cruz entende que as ações

afirmativas são uma necessidade temporária de correção de rumos na sociedade,

um corte estrutural na forma de pensar, uma maneira de impedir que relações

sociais, culturais e econômicas sejam deterioradas em função da discriminação165.

No intuito de perquirir a eficácia das ações afirmativas, levando em

consideração os seus propósitos de ensinar a tolerância, a solidariedade e superar

as distâncias sociais, bem como verificar se essas medidas são justas, Ronald

164 JAKUTIS, 2006. p. 250. 165 CRUZ, Álvaro Ricardo Souza. O Direito à Diferença. As ações afirmativas como mecanismo de

inclusão social de mulheres, negros, homossexuais e pessoas portadores de deficiência. 2. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2005. p. 134.

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Dworkin166, professor de filosofia jurídica na Universidade de Oxford e professor de

Direito na Universidade de Nova York, em sua obra “A Virtude Soberana. A teoria e

a prática da igualdade”, descreve, minuciosamente, um importante estudo estatístico

sobre as consequências das ações afirmativas em universidades públicas nos

últimos 30 anos nos EUA. Referida pesquisa será objeto de mais considerações no

presente estudo. Contudo, suas conclusões são impressionantes quando considera

a convivência entre as pessoas, enriquecida pela diversidade.

3.2 ORIGEM DAS AÇÕES AFIRMATIVAS

O último quarto do século XX viu nascer a luta antidiscriminatória das

minorias secularmente marginalizadas. As mulheres, os índios, os negros, as

pessoas com deficiência, entre outros grupos, conquistaram direitos a eles sempre

negados em razão de tabus e preconceitos culturalmente hereditários.

As ações afirmativas nasceram na década de 1960, nos Estados Unidos da

América, com o Presidente John F. Kennedy, ao criar a Equal Employment

Opportunity Commission167 (EEOC), em 1961, como forma de promover a igualdade

entre os negros e brancos norte-americanos168.

A EEOC era uma agência federal destinada a proporcionar igual

oportunidade de empregos para os negros e a expressão affirmative action169 surgiu

nas instruções fornecidas às empresas que iriam receber fundos do governo

americano, para garantir que os trabalhadores utilizados por elas seriam eleitos sem

interferência de questões de raça, credo, cor ou origem nacional170.

Ainda nos Estados Unidos da América, em 1964, o Título VII foi publicado

como parte do Civil Rights Act171, visando eliminar a discriminação nas grandes

empresas privadas, com ou sem contratos com o governo.

Em 1965, o então Presidente dos EUA Johnson entabulou a ordem executiva

11.246 determinando que empresas contratadas pelo governo federal adotassem ações

166 DWORKIN, Ronald. A Virtude Soberana. A teoria e a prática da igualdade. São Paulo: Martins

Fontes, 2005, p. 543-607. 167 Comissão de Igualdade de Oportunidades de Emprego, do inglês. 168 JAKUTIS, 2006. p. 250. 169 Ação Afirmativa, do inglês. 170 JAKUTIS, loc. cit. 171 Lei dos Direitos Civis, do inglês.

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afirmativas para garantir acesso ao emprego sem limitação de raça, religião e origem

nacional. Em 1968, o gênero foi adicionado às categorias protegidas172.

De lá até a atualidade, grande número de ações afirmativas foram

implementadas nos Estados Unidos com o intuito de inclusão social.

Já no Brasil, a escassez de obras sobre a origem da discriminação positiva

dificulta a localização da criação da primeira ação afirmativa. Contudo, existe notícia

histórica de oferta de incentivos à vinda de europeus ao Brasil mediante a doação de

terras, aliás, sendo essa uma das razões para a fundação de várias cidades

brasileiras, como, por exemplo, a cidade de Nova Friburgo, no Rio de Janeiro173.

Na década de 60, foi editada a Lei 5.465/1968, que reservava,

preferencialmente, 50% das vagas de estabelecimentos de ensino médio agrícola e

de escolas superiores de Agricultura e Veterinária, mantidos pela União, a

agricultores ou seus filhos, proprietários ou não de terras, que residissem com suas

famílias na zona rural, e 30% a agricultores ou seus filhos, proprietários ou não de

terras, que residissem em cidades ou vilas que não possuíssem estabelecimentos

de ensino médio174.

Ambas as medidas podem ser entendidas como ações afirmativas, já que

visavam oferecer um tratamento diferenciado a grupos específicos.

O texto da Constituição Federal de 1988, ao dispor sobre ações afirmativas,

ao lado de leis que oferecem incentivos a mulheres e deficientes físicos, inaugura a

era moderna da discriminação positiva no Brasil.

No final do século passado, foram realizadas reuniões com setores dos

Movimentos Negros, acadêmicos, dentre outros, sob o patrocínio do Governo

Federal, produzindo os Decretos de 20 de novembro de 1995, de 07 de fevereiro de

1996 e de 20 de março de 1996, voltados para a criação de Grupo de Trabalho

Interministerial, com a finalidade de desenvolver políticas para a valorização da

População Negra, e para a eliminação da discriminação no emprego e na

ocupação175.

172 JAKUTIS, 2006. p. 250. 173 SOUZA, Arivaldo Santos de. Ações afirmativas: origens, conceito, objetivos e modalidades. Jus

Navigandi, Teresina, ano 12, n. 1321, 12 fev. 2007. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/9487>. Acesso em: 22 jun. 2011.

174 SOUZA, loc. cit. 175 SOUZA, loc. cit.

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O Governo brasileiro reconhece ainda a existência de várias assimetrias no

acesso a direitos baseadas em raça, gênero, editando o Decreto n.° 4.228/2002, e a

Portaria 1.156/2001, os quais estabelecem um Programa Nacional de ações

afirmativas no âmbito da Administração Pública Federal, além de oferecer incentivos

para o ingresso no Supremo Tribunal Federal e no Instituto Rio Branco176.

Como visto, as ações afirmativas têm guarida no texto constitucional vigente,

como se depreende do artigo 3º, inciso IV. É um objetivo/princípio fundamental do

Brasil a promoção do bem geral, que deve passar necessariamente pela superação

de preconceitos discriminatórios. A prática do racismo constitui crime inafiançável e

imprescritível (art. 5º, XLII). São invioláveis a liberdade expressão, de consciência,

de crença (art. 5º, VI) e a igualdade entre os homens e mulheres (art. 5º, I). É

obrigação comum de todos os nossos entes federativos a proteção e a garantia das

pessoas portadoras de deficiência (art. 23, II).

No entanto, evidente é a desarmonia entre o texto normativo e a realidade da

sociedade.

A propósito da previsão constitucional da prática de racismo configurar crime

imprescritível, pertinente se faz aqui destacar importante decisão do STF quanto ao

tema.

Em julgamento do Habeas Corpus (HC 82424), o STF, em 2003, por maioria

de votos, manteve a condenação de um editor de livros imposta a ele pelo Tribunal

de Justiça do Rio Grande do Sul, por crime de racismo, já que restou comprovado

que havia escrito, editado, divulgado e comercializado livros fazendo apologia de

ideias anti-semitas, preconceituosas e discriminatórias contra a comunidade judaica,

por ser esse um crime inafiançável177.

A tese da defesa era de que os judeus não podem ser considerados como

“raça” e, portanto, não poderia se considerar crime de racismo, o que levaria à

prescrição do crime.

Contudo, nos votos, ficou assentado o entendimento majoritário que a

genética baniu o conceito tradicional de raça e que a divisão dos seres humanos em

raças decorre de um processo político-social, originado da intolerância dos homens.

176 SOUZA, loc. cit. 177

STF nega Habeas Corpus a editor de livros condenado por racismo contra judeus. Supremo Tribunal Federal. Notícias . Brasília. 17 set. 2003. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=61291&caixaBusca=N. Acesso em 15 mar. 2011.

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Suscitou-se, também, a adesão do Brasil aos tratados internacionais anti-

discriminatórios, e a prevalência dos princípios da dignidade da pessoa humana e da

igualdade jurídica sobre o preceito fundamental da liberdade de expressão, pois esta

é uma garantia constitucional que não se tem como absoluta, dado que um direito

individual não pode constituir-se em salvaguarda de condutas ilícitas, como sucede

com os delitos contra a honra, pois deve-se observar limites morais e jurídicos a

tanto.

Por fim, o habeas corpus foi denegado sob o fundamento que a ausência de

prescrição nos crimes de racismo se justifica “como alerta grave para as gerações

de hoje e de amanhã”, para que se “impeça a reinstauração de velhos e

ultrapassados conceitos que a consciência jurídica e histórica não mais admitem” 178.

3.3 MODALIDADES DE AÇÕES AFIRMATIVAS NA LEI, NOS INSTRUMENTOS

NORMATIVO-SINDICAIS E NAS POLÍTICAS PÚBLICAS

A doutrina brasileira segue a construção jurisprudencial e doutrinária

estadunidense, inclusive quanto à classificação das ações afirmativas, detalhada na

obra de Fonseca179, sendo essas:

3.3.1 Quanto às Origens Das Fontes Formais: Decorrentes do Estado e na Esfera

Privada

Inicialmente, indicam-se as origens das fontes formais como critério de

classificação, que implica a verificação do sujeito institucional editor da medida

protetiva: pode a medida emanar de órgãos públicos, como o Poder Executivo, o

Legislativo e o Judiciário, como também pode decorrer de órgãos privados, como

empresas ou organizações não governamentais.

178 ALVES. Moreira. STF nega Habeas Corpus a editor de livros condenado por racismo contra

judeus. Supremo Tribunal Federal. Notícias . Brasília. 17 set. 2003. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=61291&caixaBusca=N. Acesso em 15 mar. 2011.

179 FONSECA, 2006, p. 186-189.

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Em se tratando das ações afirmativas decorrentes do Estado cabe ressaltar

que em países da Common Law, como os Estados Unidos, onde a jurisprudência

prevalece como fonte formal do direito, vindo a lei posteriormente, o Poder Executivo

e o Judiciário comandam o processo relativo às ações afirmativas180.

O Poder Executivo estabelece políticas públicas relativas à educação,

cargos públicos, benefícios da previdência e assistência social, elegendo os grupos

cuja necessidade de compensação deve ser atendida. O Judiciário, através de

provocação do Ministério Público, de associações, ou de indivíduos lesados,

determina a adoção de cotas para que se componha adequadamente o rol de

participantes de empresas, escolas, ou qualquer outro.

A lei, nesses países, por sua vez, indica parâmetros gerais que decorrem da

jurisprudência reiterada.

Já nos países da Civil Law, como é o caso do Brasil, as ações afirmativas de

ordem pública emanam da lei, fundamentalmente. As constituições elegem critérios

e princípios prioritários que se refletem na ação do Poder Legislativo, vindo a lei a

estabelecer a eleição dos grupos tutelados e a forma de proteção. O Poder

Judiciário apenas atua interpretando as leis, harmonizando-as à Constituição e, a

partir delas, impondo condutas aos particulares181.

Com o intuito, portanto, de discriminar positivamente alguns grupos que

historicamente foram desarrazoadamente discriminados, o Poder Público

implementou o sistema de cotas, procurando proporcionar a participação de todos

os cidadãos no processo democrático e propiciar-lhes o pleno exercício da

cidadania.

Para uma melhor compreensão acerca do assunto, Gláucia Gomes Vergara

Lopes182 define o sistema legal de cotas:

[...] Sistema de reserva legal de vagas ou sistema de cotas é o mecanismo compensatório utilizado para inserção de determinados grupos sociais, facilitando o exercício dos direitos ao trabalho, à educação, à saúde, ao esporte, etc. É uma forma de ação afirmativa com intuito de tentar promover a igualdade e o equilíbrio de oportunidades entre os diversos grupos sociais.

180 FONSECA, 2006, p. 187. 181 FONSECA, loc. cit. 182 LOPES, Glaucia Gomes Vergara. A inserção do portador de deficiência no mercado de

trabalho: a efetividade das leis brasileiras. São Paulo: LTr, 2005. Biblioteca LTr Digital.

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É, portanto, uma política de ação afirmativa pela qual o Estado visa diminuir

as diferenças existentes em certos segmentos sociais que se encontram em

desvantagem, especialmente aqueles que sofrem algum tipo de discriminação

desarrazoada.

Ainda, no tocante às ações afirmativas, salienta Cristiane Ribeiro da Silva183:

[...] são importantes instrumentos de inclusão social e consistem em medidas que objetivam superar a discriminação em relação a certos grupos fragilizados, como aqueles correspondentes às mulheres, índios, negros e também pessoas portadores de deficiência, proporcionando-lhes igualdade de oportunidades.

Efetivamente, com relação à reserva de vagas no trabalho, atualmente, há

vigente o sistema de cotas para aprendizes e também para pessoas portadoras de

deficiências.

Já na esfera privada, com o crescimento do movimento do terceiro setor,

qual seja, aquele das organizações não governamentais sem fins lucrativos, que

refletem uma organização espontânea da sociedade civil, a qual se mobiliza em

razão de motivação assistencial, religiosa, política e ideológica, a fim de patrocinar

interesses que lhes digam respeito diretamente, a atuação da sociedade civil é

voluntária e se dissemina, basicamente, em empresas, clubes, escolas, partidos que

espontaneamente adotam cláusulas regulamentares de ação afirmativa.

3.3.2 Quanto à Obrigatoriedade ou Facultatividade das Medidas: Cogentes e

Facultativas ou Estimuladas por Meio de Políticas de Incentivo Fiscal

Outro critério de classificação refere-se à obrigatoriedade ou facultatividade

das medidas, já que as estratégias de inclusão podem ser cogentes ou

incentivadoras (fomentadoras), estas últimas por meio de políticas de incentivo fiscal

ou renúncia fiscal por parte do Estado.

As ações afirmativas cogentes decorrem sempre do Estado, através de

normas jurídicas ou decisões judiciais, e implicam a utilização de cotas ou a

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eleição de preferências na destinação de recursos públicos, cuja finalidade visa

atender a grupos sociais específicos.

Dirigem-se ao próprio Estado ou aos particulares e comumente exibem

caráter provisório, temporário, perdurando até que os dados estatísticos reflitam a

superação da discriminação que se propunha abrandar.

É da natureza, pois, dessas medidas o resgate histórico de danos

perpetrados a grupos específicos, o caráter excepcional e transitório e a finalidade

integrativa do quadro social inclusivo184.

Há, também, como suscitado, as facultativas ou estimuladas por meio de

políticas de incentivo fiscal.

Essas decorrem de medidas espontâneas ou estimuladas pelo Estado, como

incentivos, por meio de renúncia fiscal ou desconto em tarifas públicas, para que os

particulares, empresas, escolas e outros, incluam determinados grupos de pessoas.

É o caso da Lei 11.770, de 09 de setembro de 2008, que criou o Programa

Empresa Cidadã, destinado à prorrogação da licença-maternidade, mediante

concessão de incentivo fiscal.

Por ela é garantida a prorrogação da licença-maternidade em mais

sessenta dias, sem prejuízo de sua remuneração, à empregada de empresa

pública ou particular que aderir ao programa, por meio de renúncia fiscal do

Estado, já que a empresa tributada com base no lucro real pode deduzir do

imposto devido, em cada período de apuração, o total da remuneração integral da

empregada pago nos sessenta dias de prorrogação de sua licença-maternidade.

Ademais, há iniciativas espontâneas, que independem de qualquer incentivo

ou obrigatoriedade, mas que operam com o intuito de afirmar posições políticas no

sentido de pressionar as instituições públicas.

3.3.3 Quanto à Eleição dos Grupos Tutelados

183 SILVA, Cristiane Ribeiro; FONSECA, Juliana Izar Soares da. A inclusão das pessoas portadoras

de deficiência no mercado de trabalho e a transformação social – a experiência da Serasa. Suplemento Trabalhista 01/08, São Paulo, ano 44, 2008, p. 43.

184 FONSECA, 2006, p. 188.

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A eleição dos grupos sociais protegidos em razão de condições pessoais

imutáveis e involuntárias se faz pela verificação da “história de tratamento desigual

prejudicial, estigmatização, preconceito e hostilidade difusos, estereotipagem,

imutabilidade dos atributos de identidade e irrelevância destes185“.

Isso quer dizer que outra forma de comparação se refere ao critério de

eleição dos grupos tutelados, de acordo com a realidade de cada grupo ou com os

movimentos desencadeados pelo direito internacional: raça, gênero, deficiência ou

doença, opção sexual, entre outros.

Quanto a esse aspecto, historicamente é que surgiram as ações afirmativas.

A luta das mulheres e dos negros, principalmente nos países de Primeiro Mundo,

findou por se refletir na edição de leis, na consolidação da jurisprudência e da

doutrina acerca das ações afirmativas.

Em favor a cada grupo tutelado, sem ter a intenção de esgotar o assunto,

ressaltam-se algumas das principais ações afirmativas ou discriminações positivas

públicas já propostas ou instituídas no Brasil:

3.3.3.1 Raça

Fato relevante que interessa e tem direto envolvimento com o objeto desse

estudo é a saga dos povos negros nas Américas, que evidencia dor, exploração e

crueldade que a Europa branca colonizadora moveu contra aqueles povos

africanos186.

Primeiro, a escravidão. Por mais de centenas de anos, os negros foram

considerados objetos dos brancos e tratados como tais, sendo possível afirmar que

muitos animais tinham melhor tratamento comparado a eles.

Com a abolição formal da escravatura no Brasil, em 1888, esse mesmo

grupo foi objeto de segregação. Baniu-se a mão de obra negra das fazendas,

substituindo-a pelos imigrantes italianos, alemães e poloneses. Por outro lado, o

185 RIOS, Roger Raupp. O princípio da igualdade e o direito da antidiscriminação: discriminação

direta, discriminação indireta e ações afirmativas no direito constitucional estadunidense. Tese de doutorado apresentada perante a Universidade Federal do Rio Grande do Sul . Porto Alegre, fevereiro de 2004.

186 FONSECA, 2006, p. 173.

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processo seguinte de industrialização também não contou com a mão de obra dos

negros, já que os industriais, se não eram eles mesmos imigrantes, preferiam optar

por esse pessoal estrangeiro, considerando a cultura, conhecimento, educação e a

experiência que já tinham do convívio em terras da Europa.

No Brasil, praticamente em todo o século XX os negros foram mantidos em

favelas, morros, ou nas periferias das cidades, sem acesso à educação, ao trabalho

qualificado, a serviços públicos de saúde ou moradia adequada. Foram mais de 400

anos de escravidão oficial e um século de total abandono, sem a reparação que lhes

seria devida187. Urgentes medidas deveriam ser tomadas a respeito.

Nesse diapasão, importante ressaltar as ações afirmativas previstas na

Convenção Internacional da ONU sobre a eliminação de todas as formas de

discriminação racial, promulgada no Brasil através do Decreto nº 65.810, de

09.12.1969.

É fato inconteste que ainda há, atualmente, uma grande defasagem nos

cargos ocupados por negros, mulheres e outras minorias e os salários percebidos

por esses em relação aos homens brancos. A propósito, no Brasil, merece destaque

o estudo “Brasil: Retrato das Desigualdades, Gênero e Raça” realizado pelo Fundo

de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher (UNIFEM) e Instituto de

Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), por intermédio das pesquisadoras Luana

Pinheiro e Vera Soares188, o qual revela quadro de profunda desigualdade salarial e

social entre os grupos já citados.

Em Belo Horizonte, algumas ações afirmativas importantes têm sido

tomadas, sendo uma das mais relevantes a criação da Secretaria Municipal dos

Assuntos da Comunidade Negra, que registra denúncias de discriminações, orienta

quanto a seus direitos e todos os seus interesses e, finalmente, patrocina ações em

favor da inserção do negro na educação (bolsa de estudo) e no emprego (cursos de

qualificação como mão de obra).

Como uma iniciativa tímida e isolada, a Lei n. 7.688/88 cria a Fundação

Cultural Palmares, com o objetivo de integração econômica, política e cultural do

negro.

187 FONSECA, 2006, p. 176. 188 IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Brasil: Retrato das Desigualdades, Gênero e

Raça. Disponível em: <http://www.ipea.gov.br/sites/000/2/pdf/retrato_primeiraedicao.pdf>. Acesso em: 20 jan. 2011.

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O Projeto de Lei n. 4.370, de 1998, do Deputado Federal Paulo Paim, toma a

iniciativa de exigir que os filmes e programas veiculados pelas emissoras de

televisão devam apresentar imagens de pessoas afrodescendentes em proporção

não inferior a 25% do número total de atores e figurantes. Este percentual aumenta

para 40% para peças publicitárias.

O Estado do Rio de Janeiro “reservou” 40% das vagas das duas

universidades estaduais para alunos negros e pardos e de 50% das vagas para

estudantes oriundos da rede pública.

Soma-se a essas medidas o fato de que, quando da primeira eleição do

Presidente Lula a nomeação de 3 ministros negros (Gilberto Gil, para o ministro da

Cultura, Marina Silva, para o do Meio Ambiente e Benedita da Silva, para

Assistência e Promoção Social). Sem esquecer, certamente, da nomeação daquele

que é considerado o primeiro ministro negro do STF, Joaquim Barbosa Gomes.

Cabe ressaltar, ainda, o Estatuto da Igualdade Racial, que foi sancionado em

20.07.2010, pelo então Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, após sete anos de

tramitação, através da Lei n. 12.288/10. O texto prevê garantias e o estabelecimento

de políticas públicas de valorização aos negros.

O documento possui 65 artigos com o objetivo de corrigir desigualdades

históricas no que se refere às oportunidades e aos direitos dos descendentes de

escravos, coroando o esforço de muitos e muitos anos das comunidades negras no

país.

A primeira versão do estatuto havia sido apresentada no ano de 2000, pelo

então deputado Paulo Paim, do PT do Rio Grande do Sul. Em 2003, Paim se tornou

senador e voltou a apresentar o projeto.

O texto do estatuto que chegou a Lula, como sancionado, e diferentemente

de suas primeiras propostas, desviou do tema mais sensível relacionado ao

preconceito no Brasil – a instituição de cotas em universidades, empresas e partidos

políticos –, já que eram os maiores entraves para a aprovação do documento, que,

de fato, constitui-se em uma lista de ações afirmativas.

Resumidamente, o texto prevê que o poder público deverá criar programas e

medidas específicos para reduzir a desigualdade racial; ressalta as religiões

africanas; transforma a capoeira em esporte; estimula ações das financeiras para

viabilizar moradia para os negros; e cria o SINAPIR - Sistema Nacional de Promoção

da Igualdade Racial, que lida com medidas para essa população.

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Leis e decretos deverão regulamentar outros itens do estatuto, como

financiamento agrícola específico, ações de ocupação de espaço e de promoção à

igualdade de oportunidades no mercado de trabalho, com medidas do Governo a

estimular a iniciativa privada a as adotar, concessão de cargos em comissão e

funções de confiança a negros e criação de ouvidorias.

O estatuto da igualdade racial, com o texto sancionado, causou muita

polêmica, já que lhe foram retirados, como mencionado, os dispositivos destinados à

implementação de planos e execução de políticas de saúde que contemplem ações

como redução da mortalidade materna entre negras, bem como todos os tipos de

cotas: para escolas, para trabalho, em publicidade e em partidos políticos.

José Roberto Militão, membro da Comissão de Assuntos Antidiscriminatórios

da OAB/SP, afirmou que o texto é mais positivo do que negativo. “Conseguimos

combater as propostas raciais do estatuto. O que foi aprovado não é um estatuto

racial, e sim uma relação de ações afirmativas”189.

O jurista, que é um dos principais integrantes do movimento negro brasileiro

a se posicionar contra a instituição de cotas em universidades e empresas,

acrescentou ainda que reparações pela escravidão são diferentes de ações

afirmativas. “Discutir reparações é importante, mas não poderia estar no estatuto,

que tem a intenção de reconhecer, sim, oficialmente, que há preconceito racial no

Brasil190“.

Ainda, do ponto de vista jurídico, para o pesquisador do Instituto de Estudos

do Trabalho e Sociedade no Rio de Janeiro, Simon Schwartzman, é perceptível no

texto do estatuto, a violação do princípio constitucional da igualdade, principalmente

da igualdade perante a lei, com a criação de uma nova espécie de cidadãos – afro-

brasileiros –, que são aqueles que se dizem como tais, os negros, os pardos e

também aqueles de definição semelhante. Os demais foram relegados para outra

categoria e não podem participar das políticas públicas porque estão fora da

concessão desses benefícios propiciados pelo Poder Público191.

189 MILITÃO, José Roberto. Lula sanciona estatuto de igualdade racial; para especialistas, texto é

apenas carta de intenções. UOL Notícias , São Paulo, 20 jul. 2010. Entrevista concedida a Mauricio Savarese. Disponível em: <http://noticias.uol.com.br/politica/2010/07/20/sem-cotas-estatuto-racial-de-lula-e-apenas-carta-de-intencoes-dizem-especialistas.jhtm>. Acesso em: 25 maio 2011.

190 Ibid. 191 SCHWARTZMAN. Simon. Das estatísticas de cor ao Estatuto da Raça. In: FRY, Peter et al.

Divisões perigosas: políticas raciais no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 2007, p. 108-109.

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Peter Fry, professor aposentado do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais

da UFRJ, e Yvonne Maggie, professora da mesma Universidade, na disciplina de

Relações Raciais, Desigualdades Sociais, Sistemas Religiosos e Sociedades no

Brasil, Estudos dos Rituais Afro-brasileiros, afirmam que o Estado deve se abster de

legislar sobre matéria referente à raça, porque passa-se a perpetuar justamente

aquilo que deveria ser destruído, que é a crença de uma diversidade racial. E

ratificam que não se pode acabar com o racismo se forem incentivadas políticas que

acabam por reforçar essa concepção mitológica192.

Para o antropólogo Kabengele Munanga, professor de Antropologia das

Populações Afro-Brasileiras da Universidade de São Paulo – USP, a ausência das

cotas desfigura o estatuto193:

O fato de reconhecerem que há preconceito no Brasil e que algo precisa ser feito já é alguma coisa. Mas o texto não contempla a expectativa da população negra, porque um dos problemas do Brasil – a ausência de igualdade – foi removido.

Munanga comparou o estatuto da igualdade racial à Lei Áurea, assinado em

1888, pela Princesa Isabel, que aboliu a escravidão, permanecendo a situação de

desigualdade: “O destino do negro foi uma marginalização igual à que sofria quando

cativo. Em um plano formal é isso no estatuto: não há nenhum mecanismo claro de

combate à desigualdade entre brancos e negros”.

Nesse sentido, o cientista político Jorge da Silva, da Universidade Federal

do Rio de Janeiro – UFRJ, afirmando que esse já foi um grande passo para

desmistificar a ideia de que o Brasil é uma democracia racial, ressaltou que o

principal problema do preconceito no Brasil não foi resolvido pelo estatuto, e nem

mesmo por ele seria resolvível194:

192 FRY, Peter; MAGGIE, Ivone. Política social de alto risco. In: FRY, Peter et al. Divisões perigosas:

políticas raciais no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 2007, p. 281. 193 MUNANGA, Kabengele. Lula sanciona estatuto de igualdade racial; para especialistas, texto é

apenas carta de intenções. UOL Notícias , São Paulo, 20 jul. 2010. Entrevista concedida a Mauricio Savarese. Disponível em: <http://noticias.uol.com.br/politica/2010/07/20/sem-cotas-estatuto-racial-de-lula-e-apenas-carta-de-intencoes-dizem-especialistas.jhtm>. Acesso em: 25 maio 2011.

194 SILVA, Jorge da. Lula sanciona estatuto de igualdade racial; para especialistas, texto é apenas carta de intenções. UOL Notícias , São Paulo, 20 jul. 2010. Entrevista concedida a Mauricio Savarese. Disponível em: <http://noticias.uol.com.br/politica/2010/07/20/sem-cotas-estatuto-racial-de-lula-e-apenas-carta-de-intencoes-dizem-especialistas.jhtm>. Acesso em: 25 maio 2011.

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A questão central é que as companhias aéreas, por exemplo, não contratam negros. Não é uma lei que tem de determinar isso, é o bom senso. Enquanto a discriminação estrutural continuar, haverá lugar para negros e lugar para brancos.

De acordo com o então Ministro da Secretaria de Políticas de Promoção da

Igualdade Racial, Eloi Ferreira de Araujo, o estatuto permite regulamentar o sistema

de cotas sem a necessidade de que o tema seja discutido no Congresso195.

Conformado, o ex-presidente da Comissão do Negro e Assuntos

Antidiscriminatórios da OAB/SP, Marco Antônio Zito Alvarenga, afirmou que o

estatuto é “um passo, (...) poderia ter sido maior, deveria ter sido maior, mas num

país tão continental, sabíamos do grau de dificuldade que teríamos”.

A questão de fixação de cotas, sem dúvida, gera grande celeuma. A respeito

da constitucionalidade do sistema de cotas, ou das ações afirmativas apresentadas

pelas várias instituições de ensino espalhadas pelo território brasileiro, o Supremo

Tribunal Federal ainda não se pronunciou de forma definitiva.

Ao adotar o sistema de cotas em 2004, a UNB foi contestada pelo partido

político DEM, que ajuizou ação no STF, arguindo a inconstitucionalidade da medida,

em uma ADPF.

A ADPF 186 está para ser julgada pelo Supremo, cujo relator é o Ministro

Ricardo Lewandowski, mas a ANAAD, representada, gratuitamente, pelo escritório

do ex-Ministro Márcio Thomaz Bastos, solicitou a admissão formal de sua

intervenção no processo, na qualidade de Amicus Curiae196, previsto no parágrafo 2º,

artigo 7º da Lei 9.868/99, que consiste numa figura jurídica que, não fazendo parte de

determinado processo, solicita audiência em julgamentos de grande relevância para a

sociedade, com o intuito de prover os tribunais de informações sobre questões com

grau elevado de complexidade, como é o caso do sistema de cotas.

Para além do mérito da questão sob análise, a ANAAD questiona a validade

do instrumento jurídico usado pelo DEM - ADPF, que, pela Lei 9.882/99 (artigo 4º, §

1º), só é admitido quando não há “qualquer outro meio eficaz de sanar a lesividade”.

195 ARAUJO, Eloi Ferreira de. Artigos do Estatuto da Igualdade Racial precisam de regulamentação.

G1, São Paulo, 19 jun. 2010. Disponível em: <http://g1.globo.com/brasil/noticia/2010/06/artigos-do-estatuto-da-igualdade-racial-precisam-de-regulamentacao.html>. Acesso em: 25 maio 2011.

196 Amigo da Corte, em latim.

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Já o DEM sustenta que à época da propositura da ação, a ADPF seria o

único meio para questionar a constitucionalidade da reserva de vagas por critérios

raciais nas universidades.

A partir, porém, da entrada em vigor do Estatuto da Igualdade Racial, em

setembro de 2010, houve uma mudança relevante no cenário legislativo, quando

comparados o momento em que a ação foi proposta e o momento atual. As normas

sobre o tema mudaram de tal forma que a ADPF perdeu seu sentido original,

argumenta a ANAAD, porque se antes a política de reserva de vagas da UNB tinha

como único norte a Constituição Federal, o Estatuto, agora, é o seu referencial direto.

Mas é no capítulo sobre as “Razões de mérito” da ação que se encontra o

cerne do debate. Demonstrando que, “a despeito das boas intenções normativas, as

estatísticas apontam desequilíbrios gritantes entre negros e não negros”, argumenta-

se que a política que tem como enfoque apenas a superação das distinções

socioeconômicas não é suficiente para resolver o antigo problema da discriminação

e do preconceito, e que é tarefa do Direito reconhecer critérios legítimos de

distinção, equiparando condições desiguais.

Se eficácia se caracteriza pela capacidade técnica de produzir efeitos

jurídicos concretos, é possível afirmar, portanto, que o Estatuto da Igualdade Racial

pode ser considerado relativamente eficaz, na medida em que previu,

especificamente nas relações de trabalho, a promoção à igualdade de oportunidades

no mercado de trabalho, com medidas do Governo a estimular a iniciativa privada a

as adotar e a concessão de cargos em comissão e funções de confiança a negros,

contudo, dependentes de leis e decretos a regulamentá-los.

3.3.3.2 Gênero

O movimento feminista surgiu em meados do século XIX, motivado pelas

lutas relativas ao processo produtivo. A organização da classe operária e a divisão

social do trabalho introduziram a mulher, ao lado das crianças, nas linhas de

produção, sabidamente em condições de inferioridade em relação aos homens,

consideradas como meia-força. Sem prejuízo dessa inserção, a mulher também

tradicionalmente sempre foi a responsável pela estrutura familiar no que concerne

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ao cuidado com os filhos e o próprio lar, sendo que não poderia simplesmente

ignorar tal fato. Assim, invariavelmente, a mulher acumulava seus encargos de figura

materna e boa dona de casa, com as jornadas nas fábricas.

A discriminação da mulher nas relações de trabalho não ocorre, de fato, por

ela ser considerada como menos capaz, ou mais fraca que o homem, mas sim porque

pode engravidar, o que lhe trará limitações em relação às atividades a serem

desenvolvidas, como também poderá gerar faltas ao trabalho, afastamento das suas

atividades por longínquos meses quando da licença-maternidade, sem embargo de

lhe arrumar uma estabilidade provisória no emprego, desde a concepção até meses

após o parto.

Assim, a luta pela igualdade iniciou pelo direito ao apoio universal, na

Europa e nos EUA, nas primeiras décadas do século XX, chegando ao Brasil apenas

na Constituição de 1934, quando lhes foi assegurado o direito a voto197.

Não por outra razão é que a própria Constituição e legislação ordinária

brasileiras contêm vários dispositivos de ação afirmativa (embora não ressaltem

referido termo), não só quanto à própria condição feminina, como no caso da

licença-maternidade, mas também em decorrência de sua condição social

historicamente desvantajosa.

Cabe destacar o parágrafo único do artigo 373 A da CLT, que foi acrescentado

através da Lei n. 9.799/99, permitindo a adoção de ações afirmativas temporárias,

visando o estabelecimento de políticas de igualdade entre homens e mulheres, em

particular as que se destinam a corrigir as distorções que afetam a formação

profissional, o acesso ao emprego e as condições gerais de trabalho da mulher.

A Lei 9.799/99 ainda estimula planos de formação profissional para as

mulheres, e sugere a proposição de convênios para que as empresas estabeleçam

políticas de incentivo ao trabalho feminino.

O art. 7º, da Constituição Federal determina que a lei proteja o trabalho da

mulher, mediante políticas de incentivo, o que se fez pela Lei n. 9.029/95, como já

visto, que proíbe discriminação no emprego também considerada a questão de sexo.

Além disso, criminaliza a exigência de teste, exame, perícia, laudo, atestado,

declaração ou qualquer outro procedimento relativo à esterilização ou estado de

gravidez, a adoção de quaisquer medidas, de iniciativa do empregador, que

configurem indução ou instigamento à esterilização genética e promoção do controle

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de natalidade, assim não considerando apenas o oferecimento de serviços e de

aconselhamento ou planejamento familiar, realizados por instituições públicas ou

privadas, submetidas às normas do Sistema Único de Saúde – SUS198.

No que se refere à condição materna, a CLT, a jurisprudência e as

negociações coletivas asseguram intervalos para amamentação, oferecimento de

creches no interior das empresas ou convênio com o mesmo fim ou auxílios salariais

para o custeio de creches, além da licença-maternidade, acima mencionada, que

também se estende a mães adotivas.

Além disso, a Lei n. 9.504/97, que estabelece as normas gerais para as

eleições, dispõe, em seu artigo 107, parágrafo 3º, que cada partido ou coligação

deverá reservar o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada

sexo.

Outro exemplo de ação pública que reforça todos esses argumentos pode

ser dado com a indicação no ano de 2000, pelo então Presidente Fernando

Henrique, da primeira mulher a ocupar uma vaga no STF, a Ministra Ellen Grace

Nortfleet. Cabe apenas relembrar que agora, mais recente, foi eleita pelo povo

brasileiro a primeira mulher para Presidente da República Dilma Vana Rousseff, que

tomou posse em 1º de janeiro de 2011.

Ressalte-se, ainda, o projeto de lei estadual n. 26/95, que previa a instituição

do “Sistema Estadual de Habilitação de Interesse Social” no Estado do Rio Grande

do Sul. Em seu artigo 2º, inciso I, previa-se que determinados programas

habitacionais deveriam conceder prioridades para as “mulheres chefes de família”.

Lamentavelmente, o projeto foi vetado pelo governador, sob a alegação de violação

ao princípio da igualdade por via de discriminação reversa.

Todas essas ações afirmativas no trabalho da mulher, embora não assim

denominadas, tiveram como base na Convenção n. 100 da OIT, de 1951, ratificada

pelo Brasil em 1957, na Convenção n. 111 da OIT, ratificada pelo Brasil em 1968, e

na Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de discriminação contra a

mulher, da ONU, de 1979, ratificada pelo Brasil em 2002, através do Decreto 4.377,

de 13.09.02.

197 FONSECA, 2006, p. 165. 198 Ibid., p. 166.

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Assim, como ressalta Fonseca, “no que diz respeito à construção dos direitos

humanos, o papel da mulher consolida, de uma vez por todas, a ideia de igualdade na

diferença e de aceitação dessa diferença199”.

3.3.3.3 Portadores de Deficiências e Doenças

A Convenção n. 159 da OIT, de 1983, ratificada pelo Brasil por meio do

Decreto Legislativo n. 51, de 28 de agosto de 1989, conceitua a pessoa com

deficiência no art. 11, como200:

[...] todo indivíduo cujas possibilidades de obter e conservar um emprego adequado e de progredir no mesmo fiquem substancialmente reduzidas devido a uma deficiência de caráter físico ou mental devidamente reconhecida.

Em favor das pessoas portadoras de deficiência, não há como negar a

existência de um número expressivo de normas de conteúdo afirmativo em seu

favor, o que, infelizmente, não ocorre com as demais minorias.

O art. 6º, da Constituição Federal inclui, entre os direitos sociais

fundamentais, o direito ao trabalho, e deste decorrem os direitos do trabalho

aplicáveis quando se concretiza a relação de emprego.

O inciso XXXI, do art. 7º, também da Constituição, trata do princípio da

igualdade no trabalho, especificando a “proibição de qualquer discriminação no

tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência”.

O inciso VIII, do art. 37 da Constituição determina que “ a lei reservará

percentual de cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de

deficiência e definirá os critérios de sua admissão”.

E ainda, o inciso II, do parágrafo 2º, do art. 227 também da Constituição

estimula políticas públicas para a educação profissional de adolescentes com

deficiência, com o fito de incluí-los no mercado de trabalho. Preconiza, além da

remoção de barreiras atitudinais e arquitetônicas, a adoção de programas que

combinem o Estado e a iniciativa privada e o terceiro setor, sendo de se frisar que a

199 FONSECA, 2006, p. 169.

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Lei n. 11.180/05, visando a dar cumprimento a esse mandamento constitucional,

eliminou o limite teto de idade para pessoas com deficiência submeterem-se a

contratos formais de aprendizagem, os quais podem ser mediados pelo “Sistema S”

ou por entidades não governamentais, segundo a Lei n. 10.097/00. A lei em questão

elevou, aliás, a idade para aprendizagem até 24 anos, o que para os trabalhadores

com deficiência é de grande auxílio, já que a formação profissional vem se tornando

uma necessidade prioritária.

O fundamento legal internacional pode ser encontrado no artigo 2º da

Convenção n. 159 da OIT, que foi ratificada pelo Brasil através do Decreto n. 129/91;

no caput do artigo 3º da Convenção Interamericana da OEA para a eliminação de

todas as formas de discriminação contra as pessoas portadoras de deficiência,

ratificada pelo Brasil em 17.07.01; e no artigo 7º da Declaração da ONU sobre os

direitos das pessoas portadoras de deficiência, pela Resolução n. 3.447, de

09.12.75.

A Lei Federal n. 7.853/89, e seu regulamento, o Decreto n. 3.298/99, em

conjunto, dispõem sobre a política nacional para a integração da Pessoa Portadora

de Deficiência que, entre outras, ressalta a validade do manejo das ações coletivas

no âmbito restrito desses direitos, define como crime (art. 8º) atos discriminatórios

contra o portador de deficiência, entre eles negar emprego/trabalho ou a inscrição do

aluno em estabelecimento de ensino sem justa causa.

No campo educacional, qualquer portador de deficiência tem direito à

educação pública e gratuita, inclusive em sistema próprio de educação especial,

adequada às suas necessidades, como se depreende do artigo 2º, inciso I, da Lei n.

7.583/89, do artigo 58 da Lei n. 9.394/96 e do artigo 24 do Decreto n. 3.298/99.

Nesse sentido, as campanhas nacionais de imunização contra a poliomielite

e paralisia infantil têm conseguido êxito pleno na erradicação dessa doença. O

Poder Público é obrigado a fornecer gratuitamente medicamentos necessários ao

tratamento do portador de deficiência, não podendo haver qualquer impedimento a

sua participação nos planos ou seguros privados de saúde, nos termos do artigo 14

da Lei federal n. 9.658/98. Além disso, o Poder Público deve oferecer, gratuitamente,

próteses que favoreçam sua adequação funcional, auditiva, visual e física.

200 ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. Convenção 159 – Reabilitação Profissional

e emprego de pessoas deficientes. In MARTINS, Sergio Pinto. Convenções da OIT. São Paulo: Atlas, 2009, p. 469-473.

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A Lei estadual n. 11.048/93 estabelece direito de preferência ao portador de

deficiência para aquisição de casa própria, enquanto a Lei federal n. 8.112/90,

regulamentando o artigo 37, inciso VIII da Constituição vigente, estabelece uma

quota de até 20% dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de

deficiência.

Da mesma maneira, na seara da autonomia privada, a Lei federal n.

8.213/91 (artigo 93) garante que a dispensa de empregados contratados por prazo

indeterminado só pode ocorrer caso haja substituição por outro portador de

deficiência. E esse mesmo dispositivo legal dispõe que empresas com 100 ou mais

empregados ficam obrigadas a preencher de 2% a 5% de seus postos com pessoas

portadoras de deficiência ou pessoas reabilitadas.

Na prática, a efetividade de tais direitos tem sido cobrada pela ação das

Secretarias Regionais do Trabalho e Emprego (antigas Delegacias Regionais de

Trabalho), que são órgãos do Ministério do Trabalho, e, particularmente, do

Ministério Público do Trabalho.

Por último, tem-se a questão da acessibilidade, elemento absolutamente

indispensável para a inclusão dos deficientes. O direito à acessibilidade transformou-

se em direito fundamental do portador de deficiência por meio do artigo 227,

parágrafo 2º, bem como do artigo 221, inciso IV da Constituição Federal de 1988. O

primeiro diz respeito à chamada acessibilidade arquitetônica urbanística e nas

edificações, bem como dos meios de transporte. O outro garante, pelo respeito aos

direitos individuais, a acessibilidade do portador de deficiência aos meios de

comunicação.

Cabe destacar, por oportuno, que Marco Antônio César Villatore, trazendo a

experiência argentina nessa questão, ressalta uma forma de contratação específica,

prevista na Lei nº 24.465, de 15 de março de 1995, que não impõe ações

afirmativas, mas exorta e estimula a contratação de pessoas com deficiência por

meio de um contrato especial de trabalho, por prazo determinado de seis meses,

que pode ser prorrogado, sucessivamente, até o máximo de 2 anos, concedendo

isenção de 50% da contribuição previdenciária patronal com relação a tais contratos,

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devendo observar as empresas um determinado percentual de trabalhadores

contratados nessa modalidade201.

No campo do direito comparado a previsão de cotas à admissão de

portadores de deficiências não é novidade. Sem a pretensão de declinar a totalidade

dos casos existentes, mas apenas a título de ilustração, tal política já vem sendo

utilizada indubitavelmente pela Argentina, Venezuela, Itália, Alemanha e França202.

3.3.3.4 Opção sexual, peso e idade

Em favor dos homossexuais, a mais significativa ação afirmativa se constitui

pela recente decisão, de maio de 2011, do STF, que aprovou, por unanimidade203, o

reconhecimento legal da união homoafetiva, passando esses a ter reconhecido o

direito de receber pensão alimentícia, ter acesso à herança de seu companheiro em

caso de morte, ser incluídos como dependentes nos planos de saúde, e ter direito a

adotar filhos e registrá-los em seus nomes, dentre outros.

Até então, pela legislação atual e por decisões de alguns tribunais, as uniões

de pessoas de mesmo sexo eram tratadas como uma sociedade de fato, como um

negócio. Assim, em caso de separação, por exemplo, não havia direito a pensão, e a

partilha de bens era feita medindo-se o esforço de cada um para a formação do

patrimônio adquirido.

Pela decisão do STF, as uniões homoafetivas passam a ser consideradas

como um tipo de família, ao lado dos três tipos já reconhecidos pela Constituição: a

família convencional formada com o casamento, a família decorrente da união

estável e a família formada, por exemplo, pela mãe solteira e seus filhos. E como

entidade familiar, as uniões de pessoas do mesmo sexo passam a merecer a

mesma proteção do Estado.

201 VILLATORE, Marco Antônio César. A pessoa portadora de deficiência no Direito do Trabalho

brasileiro e o tema no Direito do Trabalho comparado. Genesis: Revista de Direito do Trabalho . nº 15 (88) – abril 2000, Curitiba: Genesis, 2000, p. 559.

202 MENEZES, 2010, p. 51. 203 Unanimidade memorável dos Ministros do Supremo: 10 votos (o Ministro Toffoli se absteve por

impedimento, pois, enquanto Advogado-Geral da União, proferiu parecer favorável à procedência da ADPF n.º 132, julgada conjuntamente com a ADIn n.º 4277, por conexão).

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No histórico julgamento da ADPF n.º 132 e da ADIn n.º 4277, o STF conferiu

uma interpretação sistemático-teleológica ao parágrafo 3º, do art. 226, da CF, de

sorte a compatibilizar o referido dispositivo constitucional com os princípios da

igualdade, da dignidade da pessoa humana, da liberdade e da segurança jurídica,

reconhecendo que a redação normativa segundo a qual “Para efeito de proteção do

Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade

familiar...” não traz em si um óbice ao reconhecimento da união estável homoafetiva.

A decisão torna praticamente automáticos os direitos que até então eram

obtidos com dificuldades na Justiça e põe fim, pelo menos, à discriminação legal dos

homossexuais. “O reconhecimento, portanto, pelo tribunal, hoje, desses direitos,

responde a um grupo de pessoas que durante longo tempo foi humilhado, cujos

direitos foram ignorados, cuja dignidade foi ofendida, cuja identidade foi denegada e

cuja liberdade foi oprimida”204, afirmou a ministra Ellen Gracie.

Cabe ressaltar ainda, o posicionamento do Ministro Relator Ayres Britto, que

argumentou que o art. 3º, inciso IV, da CF veda qualquer discriminação em virtude

de sexo, raça, cor e que, nesse sentido, ninguém pode ser diminuído ou

discriminado em função de sua preferência sexual. “O sexo das pessoas, salvo

disposição contrária, não se presta para desigualação jurídica” 205, observou o

ministro, para concluir que qualquer depreciação da união estável homoafetiva

colide, portanto, com o inciso IV do artigo 3º da CF.

O entendimento unânime, que resultou na procedência das ações, com

efeito vinculante, foi no sentido de dar interpretação conforme a CF para excluir

qualquer significado do art. 1.723 do Código Civil que impeça o reconhecimento da

união entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar.

Antes desse importante julgamento do STF, o esforço de afirmação era

discreto, geralmente impulsionado pela participação ativa de movimentos civis não

governamentais, que se organizavam em favor da conquista de direitos

fundamentais desta minoria.

204 GRACIE, Ellen. O que dizem os Ministros do Supremo. Veja. Disponível em:

<http://veja.abril.com.br/complementos-materias/slider-uniao-homossexual/frases-ministros.html>. Acesso em: 01 jul. 2011.

205 BRITTO, Ayres. Supremo reconhece união homoafetiva. Supremo Tribunal Federal. Portal STF Internacional. Brasília. 06 mai. 2011. Disponível em: <http://www2.stf.jus.br/portalStfInternacional /cms/destaquesClipping.php?sigla=portalStfDestaque_pt_br&idConteudo=179003>. Acesso em: 01 jul. 2011.

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Cabe ressaltar o projeto de Lei n. 1.151, de 1995, de autoria da então

deputada federal por São Paulo, Marta Suplicy que, entre outras conquistas, o

projeto dispõe sobre regras da união civil entre duas pessoas do mesmo sexo,

inclusive garantindo amplamente aos contratantes os direitos civis de sucessão

regulados pela Lei n. 8.971/94.

Há também o exemplo da Câmara Municipal de Belo Horizonte, que aprovou

a Lei Municipal n. 8.176, de 29 de janeiro de 2001, que estabelece punições contra

atos discriminatórios, dentre as quais multa, interdição de estabelecimento e, no

caso de servidor público, sua suspensão, chegando até mesmo a seu afastamento

definitivo.

O STJ também já havia se posicionado em estender a inscrição na

Previdência de companheiros ou companheiras homossexuais como dependentes,

inclusive nos casos de segurado empregado ou trabalhador avulso.

Já em relação ao peso, cabe ressaltar o incentivo à prática desportiva pelo

Ministério dos Esportes e a criação de reserva de assentos para pessoas obesas em

cinemas, teatros, espaços culturais e no transporte coletivo pela lei do Estado do

Paraná n. 13.132/2001.

Em favor do idoso, o artigo 28, III, da Lei n. 10.741/03 (Estatuto do Idoso),

permite que o Poder Público crie políticas de discriminação positiva ou ações

afirmativas para esse grupo social, cuja importância deverá crescer nos próximos

anos à medida que o Brasil complete o seu processo de transição demográfica.

Importante decisão, ainda, nesse sentido, ocorreu no dia 19.09.07 em que,

por maioria de votos, o Plenário do STF julgou improcedente a Ação Direta de

Inconstitucionalidade - ADIN 3.768, que questionava a constitucionalidade do caput

do artigo 39, do Estatuto do Idoso, que estabelecia a gratuidade dos transportes

coletivos públicos urbanos e semiurbanos para os maiores de 65 anos.

3.4 VANTAGENS E DESVANTAGENS DAS AÇÕES AFIRMATIVAS

As ações afirmativas nasceram sob o signo da polêmica e dissociá-las dessa

imagem é praticamente irrealizável.

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As discussões acerca do tema vão desde simples conversas quotidianas, até

mesmo a estudos aprofundados de pesquisadores e grandes doutrinadores.

Os argumentos e críticas mais comuns de quem se posiciona contrariamente

aos programas de ações afirmativas se sustentam, basicamente, em que as ações

afirmativas não passam de reverse discrimination206, ou seja, de discriminação às

avessas.

A justificativa é de que se a sociedade pretende, definitivamente, superar a

ideia de discriminação, não se pode utilizar ou manter algumas espécies de

discriminação e fazer desaparecer outras.

Ademais, analisando as pesquisas envolvendo ações afirmativas, como, por

exemplo, nos EUA em que já existem há mais tempo que no Brasil, os resultados

práticos desses programas são insatisfatórios em relação ao fins propostos, ou seja,

não se obteve o sucesso no aumento da participação dos grupos destinados, como

mulheres e minorias na sociedade, sendo consideradas, portanto, ineficientes.

Thomas Sowell (que é negro), no livro Affirmative Action Around the World:

An Empirical Study207, estudou vários programas de ações afirmativas em diferentes

países e, quase na sua totalidade, chegou à conclusão de que os programas em

questão não funcionavam, ou melhor, não apresentavam os resultados que os

idealizadores desses projetos esperavam

Sustenta-se, ainda, o conceito que as ações afirmativas talvez fossem

necessárias no passado, mas não atualmente, em que a situação social é diferente,

em que não há segregação aberta e os direitos previstos em lei são iguais. Defende-

se que hoje existem condições mínimas necessárias para o desenvolvimento

pessoal de qualquer pessoa pertencente a qualquer minoria, bastando a essa ter

persistência e boa-vontade, o que torna dispensável a política de ações

afirmativas208.

Além disso, argumenta-se que a sociedade em geral já não é mais favorável,

como antes, às ações afirmativas, podendo ser constatado tal fato, por exemplo, em

relação às cotas para afrodescendentes nas universidades públicas: as pessoas,

mesmo as que não tiveram um bom resultado, consideram que deixaram de

conseguir a vaga porque há uma injustiça institucionalizada no sistema, privilegiando

206 JAKUTIS, 2006, p. 262. 207 Yale University Press, 2004 apud JAKUTIS, 2006, p. 264. 208 JAKUTIS, 2006, p. 262.

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outros indivíduos de certas e determinadas características. O resultado é que se

acirra o preconceito e a discriminação entre os trabalhadores.

A ideia é de que, em verdade, a maior parcela da sociedade está sendo

marginalizada, causando-lhe muitos prejuízos. Essa é a justificativa de muitos

empregadores, nesse particular, quando se veem obrigados a contratar

determinados grupos de pessoas em razão de cotas estabelecidas legalmente,

como de portadores de deficiência e aprendizes. Sustentam que terão que dispensar

“pais de família” para simplesmente cumprir cotas.

Um forte argumento de quem se opõe às ações afirmativas é de que se

alguns grupos historicamente discriminados ou minorias, como judeus, sem qualquer

política de discriminação positiva, conseguiram avançar economicamente, os demais

teriam as mesmas condições. Não se concebe que apenas a existência da

discriminação seja suficiente para inferiorizar um grupo de pessoas se outros

grupos, também com problemas graves de rejeição e discriminação, têm

apresentado bons resultados de desenvolvimento em certos setores em que outros

grupos não conseguem obter sucesso209.

Alega-se, ainda, que os próprios programas de ações afirmativas tendem a

enfraquecer a autoestima dos grupos a que se destinam. Conquistar uma vaga em

uma faculdade, ou um emprego, não é suficiente para resolver os problemas das

minorias se forem apresentados contra elas o fato de que a escolha foi resultado

não de mérito, mas de uma política privilegiada. Aceitar cargos e vagas concedidos

por meio de ações afirmativas é o reconhecimento de que o indivíduo é

incompetente para obter tais objetivos por meio de uma competição justa,

ampliando, assim, a dependência das minorias em relação a políticas

protecionistas210. Premia-se a incompetência e impede o desenvolvimento regular

das pessoas.

Assim, os efeitos da preferência de determinados grupos de pessoas através

de ações afirmativas torna-se uma espécie de desmoralização, já que a qualidade

que se dá às minorias o direito ao tratamento preferencial é uma implícita

inferioridade.

209 JAKUTIS, 2006, p. 263. 210 JAKUTIS, loc. cit.

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A aprovação de programas de ações afirmativas significa apoio a processos

de seleção baseados em preferências que favorecem candidatos não qualificados

em prejuízo de candidatos qualificados.

Um problema que apontam nas ações afirmativas é que elas indiretamente

encorajam as minorias a explorar o passado de vítimas, como no caso dos negros a

se apoiar ao fato em que foram vítimas da escravidão. Dessa forma, a ação

afirmativa alimenta a identidade de vítima e “envia a mensagem que existe mais

poder no sofrimento do passado que nas conquistas do presente211”. No caso das

cotas para a universidade, muitas pessoas, para poderem se valer do privilégio,

arrumavam qualquer pretexto para serem considerados pardos, mulatos, negros.

Raciocina-se, ainda, de que, na verdade, o Estado, que tem a obrigação de

inserir todos, em igualdade de condições na sociedade em geral, suprindo uma

grande deficiência e tamanha ineficiência está transferindo, de forma totalmente

equivocada, sua responsabilidade aos particulares.

É comum o argumento de que a ação afirmativa é problemática na

sociedade porque demanda-se que ela crie paridade ao invés de assegurar

igualdade de oportunidades, e de que o tratamento preferencial não ensina, educa

ou motiva.

Enfim, sustenta-se que a discriminação não pode ser curada através do uso

de mais discriminação.

Já o argumento mais comum daqueles que se colocam a favor das ações

afirmativas, e em oposição aos contrários a elas, é de que os que se posicionam

contra as ações afirmativas estão, simplesmente, defendendo os seus próprios

interesses e privilégios.

Baseiam-se em que as minorias têm um longo histórico de opressão e

exploração e que, por isso mesmo, as ações afirmativas representam certa

compensação por esses infortúnios.

É possível questionar se sem o recurso às preferências, qual seria a

solução. O impulso à discriminação é sutil e não pode ser detido se não se

consegue revelá-lo por inteiro para as pessoas. Logo, são necessárias políticas

sociais que sejam direcionadas para o desenvolvimento econômico e educacional

das pessoas em desvantagem.

211 JAKUTIS, 2006, p. 267.

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No caso, por exemplo, das diferenças salariais crônicas a negros, mulheres

e outras minorias, que são fruto de imperfeições do mercado que precisam ser

corrigidas externamente. Os programas de ações afirmativas podem representar um

modelo desse tipo de intervenção.

Os fatos, como estatísticas apresentadas em estudos, e até mesmo os

inúmeros casos julgados quotidianamente nos tribunais dão conta de quão longe a

sociedade está da igualdade de todos e justiça social. Nesse contexto, todos os

meios que puderem legalmente ser utilizados, de forma efetiva, para a exclusão, ou

pelo menos, diminuição da discriminação são úteis e as ações afirmativas podem

ser consideradas como exemplo desses meios. Em outras palavras, as ações

afirmativas são um dos instrumentos de combate à discriminação e não o único

instrumento a tanto.

Em resposta àqueles que sustentam que as ações afirmativas não têm

obtido resultado satisfatório nos casos analisados, erguem-se os que argumentam

que o problema das minorias tem existência na sociedade há tanto tempo, por mais

de séculos, que não se pode esperar que em uma ou duas décadas, o quadro seja

revertido. É necessário adaptação.

No mesmo sentido, importante repetir que nos EUA foi publicado por Ronald

Dworkin212 o primeiro exame abrangente e estatístico das consequências reais dos

30 anos de ação afirmativa nas universidades desse país, denominado The Shape

of the River213, de dois ex-reitores de Harvard e Princeton – Willian G. Bowen e

Derek Bok.

O estudo de River, onde analisada uma imensa base de dados de históricos

escolares sobre mais de 80.000 graduados que se matricularam em 28 faculdades e

universidades seletas em 1951, 1976 e 1989 que aplicaram a ação afirmativa,

concluiu que sim, a ação afirmativa alcançou um êxito impressionante: produziu

notas mais altas de formatura entre alunos universitários negros, mais líderes negros

na indústria, nas profissões, na comunidade e nos serviços comunitários, bem como

uma interação e amizade mais duradouras entre as raças do que, caso contrário,

seria possível.

Como afirma Jakutis, é certo que as ações afirmativas, sozinhas, não

resolverão o problema da exclusão e da discriminação, mas podem “contribuir

212 DWORKIN, 2005, p. 546. 213 A Forma do Rio, do inglês.

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efetivamente para a solução desse problema, ou ano menos, minimizar os efeitos

negativos de um sistema injusto que está vigorando há muito tempo” 214.

Sustenta o autor que o próprio Direito do Trabalho é, “confessadamente,

protecionista e, portanto, desigual e tendencioso”215, por ser extremamente

necessário, e nem por isso é desconsiderado ou julgado inconstitucional. Da mesma

forma as ações afirmativas devem ser utilizadas quando verificado que são

necessárias a reparar desigualdades históricas.

Da mesma forma, Mallet, posiciona-se em favor das ações afirmativas,

ressaltando que “são mesmo indispensáveis quando se pretende eliminar de fato – e

não apenas de direito – a discriminação216“.

Assim, levando em consideração os prós e contras acima referidos, bem

como a verificação de existência de casos de injustas discriminações históricas em

relação a determinados grupos de pessoas, os Estados podem decidir por uma

opção neoliberal, marcada pela neutralidade, obrigando-se à mera introdução, nos

respectivos textos legais de igualdade formal, ou agir afirmativamente, ou seja,

ativamente à mitigação das desigualdades sociais217.

O mau êxito da primeira opção vem sendo apresentado, sobretudo nas

sociedades que durante muitos séculos mantiveram certos grupos em posição de

inferioridade, ao longo da evolução das sociedades, pela necessidade de se

tentarem outros mecanismos que impedissem o grande abismo e segregação

sociais.

No caso do Brasil, como até aqui estudado, a Constituição Federal

demonstrou a clara opção do Estado brasileiro em adotar medidas que efetivamente

implementassem a igualdade substancial ou de fato.

214 JAKUTIS, 2006, p. 279. 215 Ibid., p. 280. 216 MALLET, 2010, p. 33. 217 MENEZES, 2010, p. 52.

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4 AS AÇÕES AFIRMATIVAS NO ACESSO E MANUTENÇÃO AO EM PREGO NO

DIREITO BRASILEIRO: MANIFESTAÇÕES NORMATIVAS DE EFE TIVIDADE E

EFICÁCIA

Embora já delineadas algumas ideias nos 1º e 2º capítulos da presente

pesquisa, crucial se cumpre a essas rapidamente retornar, para que se possa

verificar a eficácia e a efetividade das políticas antidiscriminatórias preconizadas no

ordenamento jurídico brasileiro.

Como visto até aqui, a discriminação é proibida e intolerável legalmente.

Contudo, nem sempre a realidade condiz com a vontade legal. Erguem-se, então, as

ações afirmativas como um meio de se buscar a igualdade material.

Com efeito, quem se opõe às ações afirmativas, justifica sua objeção

alegando que são políticas que, no fundo, violam a própria lei que prevê a igualdade

de todos.

Controvérsias à parte, que já foram detalhadas no capítulo anterior da

presente pesquisa, é certo que as ações afirmativas, como afirma Estêvão Mallet,

estão plenamente amparadas pela ideia de igualdade substancial, até porque só se

remove a discriminação com uma desigualdade compensatória, com o tratamento

favorecido, por meio do qual se possa reequilibrar a desigualdade de fato. Não há,

na adoção de medidas promocionais ou de favorecimento de grupos ou pessoas

desfavorecidas, ofensa ao princípio da igualdade218.

Portanto, as ações afirmativas são realmente indispensáveis quando se

pretende eliminar de fato, e não apenas de direito, a discriminação219, já que são

constantemente utilizadas como um recurso compensatório, por meio do qual a lei, o

Judiciário e entidades privadas municiam com instrumental jurídico pessoas ou

grupo de pessoas historicamente vitimados pela discriminação injustificável, como

se denota nas diversas convenções internacionais já estudadas220.

Assentada a questão da necessidade de utilização de programas de ações

afirmativas à eliminação da discriminação, cabe investigar se os instrumentos

existentes no ordenamento jurídico brasileiro a tanto estão sendo efetivos e eficazes.

218 MALLET, 2010, p. 43. 219 Ibid., p. 45. 220 FONSECA, 2006, p. 157.

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4.1 CONCEITOS DE EFETIVIDADE E EFICÁCIA

Do próprio significado do vocábulo pode-se extrair a ideia de que efetividade

é a qualidade de efetivo; atividade real; resultado verdadeiro; realidade,

existência221. E eficácia é a qualidade ou propriedade de eficaz; eficiência; ação,

força, virtude de produzir um efeito; medida da significação da estimativa dum

parâmetro222. É a capacidade de produzir efeitos práticos.

Do ponto de vista jurídico, essa conceituação, ou ainda sua distinção suscita

grandes discussões e teorias acadêmicas, contudo cabe aqui breve escorço sobre a

questão.

Na verdade, efetividade e eficácia da norma não são sinônimos. Efetividade

da norma é a observação da norma por todos, tanto pelo legislador que a criou como

pelo seu destinatário. A eficácia, por sua vez, significa que a norma cumpriu a

finalidade a que se destinava, pois, foi socialmente observada, tendo solucionado o

motivo que a gerou. Uma norma é eficaz quando cumprida a sua função social e

reconhecida pela sociedade que está atendendo a sua finalidade para qual foi

criada.

É possível afirmar que toda norma jurídica eficaz tem efetividade, mas nem

toda norma com efetividade tem eficácia. Isso porque há normas que simplesmente

existem, mas não cumprem sua finalidade, sua função social.

Quando se fala da efetividade de uma norma, os juristas costumam aludir à

existência de direito.

Efetividade, pois, em sentido amplo, significa capacidade que uma norma

jurídica tem para produzir seus efeitos. A efetividade pode ser dividida em

efetividade jurídica e efetividade social.

A efetividade jurídica ocorre quando a norma jurídica tem nos limites

objetivos todos os seus elementos: hipótese, disposição, sanção, podendo assim

produzir efeitos desde logo no mundo dos fatos, seja quando é respeitada ou

quando é violada, ensejando a aplicação de uma sanção.

221 FERREIRA, 2010, p. 756. 222 FERREIRA, loc. cit.

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Já, a efetividade social de uma norma ocorre quando a mesma é respeitada

por boa parte da sociedade, existindo, assim, um reconhecimento do Direito por

parte desta e um amplo cumprimento dos preceitos normativos.

Luís Roberto Barroso, em breve síntese, afirma que223:

a efetividade significa, portanto, a realização do Direito, o desempenho concreto de sua função social. Ela representa a materialização dos fatos, dos preceitos legais e simboliza a aproximação, tão íntima quanto possível, entre o dever-ser normativo e o ser da realidade social.

Neste sentido, na lição de Maria Helena Diniz, existem três planos de

concretização da norma jurídica, para que se consiga atingir a efetividade plena das

regras de direito224:

O plano sintático, pelo qual a norma jurídica, para se realizar no mundo do

ser, deve ter uma estrutura lógica completa com a descrição detalhada da hipótese,

disposição e a respectiva sanção em caso de descumprimento

O plano semântico, em que, além de necessitar de uma estrutura lógica

completa, a norma jurídica, para se efetivar, deve refletir valores que estejam em

consonância com os anseios da sociedade, sendo essencial haver uma sintonia

entre o disposto no plano ideal/normativo, do “dever ser”, e o que está presente nas

ruas e no dia-a-dia do cidadão, no plano da realidade, do “ser”.

E o plano pragmático, pelo qual à completa concretização de uma norma

jurídica e sua plena efetividade, deve haver, além da conexão norma - sistema,

norma – valores sociais, o necessário empenho de governantes/elites e da

população em respeitar o ordenamento jurídico e fazer valer os princípios vetores da

ordem normativa.

Em síntese, para que ocorra a efetividade jurídica e social da norma é

indispensável que seja interpretada sistematicamente, que os valores nela

estabelecidos estejam em consonância com a história e os anseios da coletividade,

e que haja uma pressão popular permanente para que as elites políticas e

223 BARROSO, Luís Roberto. O Direito Constitucional e a efetividade de suas no rmas: limites e

possibilidades da constituição brasileira. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1993, p. 79. 224 DINIZ, Maria Helena. Norma Constitucional e seus efeitos . 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1992, p.

192.

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econômicas cumpram o nela disposto e efetivem os preceitos, princípios e valores lá

previstos.

Já a eficácia do direito, por conseguinte, como conceito, diverge da

efetividade, pois é o poder da norma jurídica de produzir efeitos, em maior ou menor

grau, concerne à possibilidade de aplicação da norma e não propriamente à sua

efetividade.

Dessa forma, eficácia seria a capacidade técnica da norma para produzir

efeitos jurídicos concretos. Quando se trata de eficácia da norma, segundo José

Afonso da Silva, “é a capacidade de atingir objetivos previamente fixados como

metas225“.

Tratando-se de normas jurídicas, complementa o autor, “a eficácia diz

respeito à aplicabilidade, exigibilidade ou executoriedade da norma, como

possibilidade de sua aplicação jurídica”226.

Portanto, tendo em consideração concretamente o significado, do ponto de

vista jurídico, de efetividade e eficácia da norma, passa-se a analisar no presente

trabalho, em que medida as políticas de ações afirmativas já existentes no

ordenamento jurídico brasileiro estão sendo efetivas e eficazes a garantir dignidade

ao trabalhador por meio do acesso e manutenção ao emprego.

4.2 REQUISITOS JURÍDICOS COMO CONDIÇÃO DE EFICÁCIA E EFETIVIDADE

DAS AÇÕES AFIRMATIVAS

Da análise feita no presente trabalho, sobretudo com base na obra de

Joaquim Barbosa Gomes e, ainda, de Paulo Jakutis, que fazem uma comparação

das ações afirmativas e discriminações positivas no Direito do Brasil e dos Estados

Unidos da América, é possível denotar que as Cortes dos EUA e, principalmente a

Suprema Corte têm enfrentado o tema das ações afirmativas frequentemente. Das

várias decisões publicadas sobre o assunto, conclui-se que as Cortes consideram

possível, e também constitucional, a existência de programas de aplicação das

225 SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 3. ed. São Paulo:

Malheiros, 1999, p. 65. 226 Ibid, p. 66.

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ações afirmativas, mas a Suprema Corte tem sido rigorosa na análise dos meios

empregados pelos Estados e também por empresas privadas à implantação desse

tipo de programas.

Paralelamente, não são raros os grupos existentes que promovem

permanente combate aos planos de ações afirmativas e políticas de discriminação

positiva, sustentando-os inconstitucionais, sob o fundamento que representariam, de

fato, um privilégio contra os interesses da maior parte da população americana, uma

discriminação disfarçada.

E no Brasil esse enfretamento no Judiciário não é diferente. Basta relembrar

o processo que está na iminência de convocar o Supremo Tribunal Federal a se

manifestar por ocasião da Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 2.858-8, ajuizada

pela Confederação Nacional de Estabelecimentos de Ensino (CONFENEN), do

sistema de fixação de cotas nas universidades públicas.

É pacífico o entendimento que o tratamento diferenciado não se justifica em

face da Constituição Federal, salvo se alguns requisitos básicos ocorrerem na

realidade.

De fato, a regra é a isonomia, a diferenciação a exceção. Portanto, para que

as ações afirmativas não sejam consideradas inconstitucionais, por violação ao

princípio constitucional de igualdade, é necessário que sua estruturação normativa

observe alguns requisitos:

1º - regra da objetividade: a identificação do grupo desfavorecido e seu

âmbito, deve ser determinada de forma objetiva. Não pode ser definido de forma

arbitrária, sob pena de macular como privilégio a medida que beneficiasse

determinado grupo.

Essa objetividade está traçada na própria Constituição Federal, como no

artigo 3º, II, que assinala a meta de “erradicar a pobreza e a marginalização e

reduzir as desigualdades sociais e regionais”.

2º - regra de medida ou de proporcionalidade: a medida da vantagem

decorrente das regras deve ser ponderada em face da desigualdade a ser corrigida,

ou seja, deve-se observar a proporcionalidade da vantagem à desigualdade a ser

reparada. Do contrário, haverá um privilegiar um grupo beneficiado em relação aos

demais grupos e à sociedade em geral.

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Para que se cumpra o primeiro e segundo requisitos, a discriminação deve

ser justificada com dados oficiais, por exemplo, as estatísticas mostram que os

desempregados deficientes são em maior número do que a média geral227.

3º - regra de adequação ou de razoabilidade: as medidas de conceder

vantagens devem ser adequadas à correção das desigualdades a serem corrigidas.

Referida adequação se exprime na sua racionalidade.

4º - regra de finalidade: a finalidade dessas medidas deve ser a correção de

desigualdades sociais.

5º - regra de temporariedade: como já ressaltado, e previsto na Convenção

Internacional sobre a eliminação de todas as formas de discriminação racial,

referidas medidas devem ser temporárias. Não visam criar um status jurídico

permanente, mas excepcional em favor de algum grupo, propiciando a esse a

igualdade em relação aos demais.

Muito importante, ainda, é a questão da não onerosidade excessiva para

outros grupos ou para a sociedade em geral.

Esses requisitos permitem a distinção entre as diferenciações legítimas em

face da igualdade e as discriminações condenadas pela mesma, ou seja, pela

análise dos requisitos é possível diferenciar as ações afirmativas da

inconstitucionalidade.

Ainda, relativamente à constitucionalidade e legitimidade das ações

afirmativas, importante o posicionamento do professor Álvaro Ricardo Souza

Cruz228, que merece transcrição:

As ações afirmativas são, pois, discriminações lícitas que podem amparar/resgatar fatia considerável da sociedade que se vê tolhida no direito fundamental de participação na vida pública e privada. Permitirmos acesso a cargos e empregos públicos e privados, mandatos políticos; garantir-lhes acesso à saúde, à educação, à liberdade religiosa e de expressão compõe um substrato essencial de democracia atual.

No mesmo sentido, ressalta Ronald Dworkin229 que grande parte dos

ataques políticos e jurídico à ação afirmativa tem-se concentrado em suas

227 MENEZES, 2010, p. 51. 228 CRUZ, 2005, p. 141. 229 DWORKIN, 2005, p. 546.

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consequências: segundo os críticos, em relação à fixação de cotas para negros em

universidades dos Estados Unidos, ela baixou os padrões educacionais ao admitir

alunos que não estão qualificados para se beneficiar da formação que recebem, e

isso exacerbou, em vez de aliviar, a tensão racial.

Contrariamente, e como já visto no capítulo anterior do presente estudo, os

defensores da ação afirmativa quase sempre insistem que os diversos tipos de

políticas sensíveis à raça são essenciais, no curto prazo, se houver a real e genuína

esperança de erradicar ou diminuir o impacto da raça no longo prazo.

Assim, nesse particular, cabe relembrar o resultado do estudo em relação às

consequências reais dos 30 anos de ação afirmativa nas universidades dos EUA, já

detalhado no capítulo anterior da presente pesquisa, em que foram analisados

dados de históricos escolares em faculdades e universidades seletas que aplicaram

a ação afirmativa, e que se concluiu pela sua eficácia ao fim proposto.

4.3 MANIFESTAÇÕES NORMATIVAS DE EFETIVIDADE E EFICÁCIA

Como visto, no ordenamento jurídico brasileiro, o legislador já editou leis e

outras normas que reconhecem o direito à diferença de tratamento para diversos

grupos considerados vulneráveis ou minorias. Neles não consta diretamente o termo

“ações afirmativas”, mas, sem dúvida, a elas se referem.

Em estudo da questão nacional, Luiz Fernando Martins da Silva, apresenta

lista minudente das principais disposições legais que cuidam do assunto, cuja

reprodução é relevante230:

Na Constituição Federal:

- o art. 1º, inciso III (princípio que resguarda o valor da dignidade humana);

- o art. 3º, incisos I, III e IV (constituem objetivos fundamentais da República

Federativa do Brasil construir uma sociedade livre, justa e solidária, bem

como promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo,

230 SILVA, Luiz Fernando Martins da Silva. Políticas Públicas de Ação Afirmativa e seus Mecanismos

para a População Negra no Brasil: Perspectivas Atuais. Revista do Tribunal Superior do Trabalho , Vol. 76, n. 3, (jul/set 2010), São Paulo: Lex Magister, 2010, p. 115-117.

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cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação; e erradicar a (...)

marginalização e reduzir as desigualdades sociais (...);

- o art. 4º, incisos II e VII (a República Federativa do Brasil, no plano das

relações internacionais, deve velar pela observância dos princípios da

prevalência dos direitos humanos e do repúdio ao terrorismo e ao racismo);

- o art. 5º, incisos XLI e XLII (consagra o princípio da igualdade; punição

para qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades

fundamentais; e enuncia que racismo constitui crime inafiançável e

imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei); e parágrafo 2º,

consagrando a incorporação do direito advindo dos tratados internacionais;

- o art. 7º, inciso XXX (no campo dos direitos sociais, proíbe a diferença de

salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de

sexo, idade, cor ou estado civil);

- o art. 23, inciso X (combater (...) os fatores de marginalização);

- o art. 37, inciso VIII (a lei reservará percentual dos cargos e empregos

públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de

sua admissão);

- o art. 145, parágrafo 1º, (sempre que possível, os impostos terão caráter

pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do

contribuinte...);

- o art. 170, incisos VII (redução das desigualdades (...) sociais), e IX

(tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob

as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País);

- o art. 179 (a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios

dispensarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim

definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las

pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias,

previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio

de lei); e,

- o art. 227, inciso II (criação de programas (...) de integração social dos

adolescentes portadores de deficiência).

Das leis ordinárias, pode-se destacar:

- o art. 354 da CLT, que prevê cota de dois terços de brasileiros para

empregados de empresas individuais ou coletivas;

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- o art. 373-A da CLT, que estabelece a adoção de políticas destinadas a

corrigir as distorções responsáveis pela desigualdade de direitos entre

homens e mulheres;

- o art. 5º, parágrafo 2º, da Lei n. 8.112/90, que determina reserva de até

20% para os portadores de deficiência no setor público civil da união;

- o art. 93, da Lei n. 8.213/91, que fixou reserva para as pessoas portadoras

de deficiência no setor privado;

- o art. 24, inciso XX, da Lei n. 8.666/93, que preceitua a inexigibilidade de

licitação para contratação de associações filantrópicas de pessoas

portadoras de deficiência;

- a Lei n. 9.029/95, que proíbe a exigência de atestados de gravidez e

esterilização, e outras práticas discriminatórias, para efeitos admissionais ou

de permanência da relação jurídica de trabalho;

- art. 10º, parágrafo 3º, da Lei n. 9.504/97, que, ao estabelecer para as

eleições, dispõe: “Do número de vagas resultantes das regras previstas

neste artigo, cada partido ou coligação deverá reservar o mínimo de 30% e o

máximo de 70% para candidaturas de cada sexo”.

- a Lei n. 10.260/01, que verte sobre o financiamento ao estudante de ensino

superior.

- a Lei n. 10.639/03, que altera a Lei n. 9394/96, que estabelece as diretrizes

e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de

ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-brasileira”.

Além dos dispositivos citados, importante ressaltar que toda a parte

protecionista da legislação trabalhista no Brasil, que se destina a melhorar as

condições de vida da classe trabalhadora, pode ser considerada também uma forma

de ação afirmativa, por tudo até aqui analisado.

Do ponto de vista jurídico, portanto, considerando o sentido sintático,

semântico e pragmático do conceito de efetividade, pode-se afirmar que referidas

leis são efetivas, já que são interpretadas sistematicamente, com valores nelas

estabelecidos em consonância com a história e os anseios da coletividade, e

considerando a pressão popular ao cumprimento do nelas disposto.

É o que também pode ser constatado em relação ao Estatuto do Idoso, à

“Lei de Cotas”, que reserva vagas para pessoas portadoras de deficiências, à lei que

dispõe sobre o contrato de aprendizagem e, ainda, na esfera particular, em poucos,

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mas relevantes instrumentos normativo-sindicais existentes na atualidade, que

preveem, em seu corpo, políticas de ações afirmativas nas relações de emprego.

À investigação da eficácia dessas normas, deve-se, pois, analisar o quanto

estão produzindo efeitos no mundo dos fatos:

4.3.1 No Estatuto do Idoso

Após sete anos tramitando no Congresso, o Estatuto do Idoso – Lei n°

10.741, de 1° de outubro de 2003 – foi sancionado p elo então Presidente Luiz Inácio

Lula da Silva, ampliando os direitos dos cidadãos com idade acima de 60 anos. Mais

abrangente que a Política Nacional do Idoso, lei de 1994 que dava garantias à

terceira idade, o estatuto institui penas severas para quem desrespeitar ou

abandonar cidadãos da terceira idade.

É considerada idosa a pessoa que tem idade igual ou superior a 60

(sessenta) anos. A propósito, já no nascedouro legislativo, o estatuto gerou

inúmeras discussões, porém estas foram superadas após longo trâmite legislativo,

como se a matéria não fosse de urgência.

Cabe ponderar que o tratamento degradante ao idoso não parte apenas da

sociedade, mas do próprio Estado, que discute formas de fazê-lo o idoso contribuir

mesmo aposentado para a Previdência Social, que lhe impõe aposentadoria ínfima,

que lhe presta um serviço de saúde precário e que não se preocupa em adotar

políticas públicas que os beneficie. Diante de tantos maus-tratos surge como

paliativo, o Estatuto do Idoso, justamente quando a urgência em reduzir o déficit da

previdência propõe reduções nos benefícios, já minúsculos para a maioria da

população em geral231.

A principal função do Estatuto do Idoso é a de funcionar como carta de

direitos, fornecendo meios de controle do Poder Público em relação ao melhor

tratamento do idoso e verdadeira educação cidadã, no tocante ao respeito e à luta

pela dignidade das pessoas com idade mais avançada no Brasil.

231 ALMEIDA, Dayse Coelho de. Estatuto do Idoso. Real proteção aos direitos da melhor idade? Jus

Navigandi, Teresina, ano 8, n. 120, 1 nov. 2003. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista /texto/4402/estatuto-do-idoso>. Acesso em: 26 maio 2011.

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Em relação à saúde, o texto aprovado fixou que o idoso tem atendimento

preferencial no Sistema Único de Saúde (SUS), bem como de que a distribuição de

remédios aos idosos, principalmente os de uso continuado (hipertensão, diabetes,

entre outros), deve ser gratuita, assim como a de próteses e órteses.

Os planos de saúde não podem reajustar as mensalidades de acordo com o

critério da idade, e o idoso internado ou em observação em qualquer unidade de

saúde tem direito a acompanhante, pelo tempo determinado pelo profissional de

saúde que o atende.

Tratando de meios de transportes coletivos, os maiores de 65 anos têm

direito ao transporte coletivo público gratuito, estendendo benefício que antes só era

previsto em algumas cidades do país. É obrigatória a reserva de 10% dos assentos

para os idosos, com aviso legível.

Nos transportes coletivos interestaduais, o estatuto garante a reserva de

duas vagas gratuitas em cada veículo para idosos com renda igual ou inferior a dois

salários mínimos.

Pelo estatuto, ainda, nenhum idoso poderá ser objeto de negligência,

discriminação, violência, crueldade ou opressão, tipificando tais hipóteses crimes,

com penas que variam de seis meses a quatro anos de prisão, sem embargo de

pagamento de multas.

Tais penas e multas podem ser fixadas a quem discriminar o idoso,

impedindo ou dificultando seu acesso a operações bancárias, aos meios de

transporte ou a qualquer outro meio de exercer sua cidadania, a famílias que

abandonem o idoso em hospitais e casas de saúde, sem dar respaldo para suas

necessidades básicas, a quem vier a submeter o idoso a condições desumanas,

privados da alimentação e de cuidados indispensáveis, e, por fim, a qualquer pessoa

que se aproprie ou desvie bens, cartão magnético (de conta bancária ou de crédito),

pensão ou qualquer rendimento do idoso.

Pelo estatuto, todo idoso tem direito a 50% de desconto em atividades de

cultura, esporte e lazer, e é obrigatória a reserva de 3% das unidades residenciais

para os idosos nos programas habitacionais públicos ou subsidiados por recursos

públicos.

Especificamente nas relações de emprego, pelo estatuto, fica proibida a

discriminação por idade e a fixação de limite máximo de idade na contratação de

empregados, sendo passível de punição quem o fizer. Também é um direito do

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idoso o exercício de atividade profissional, respeitados seus limites físicos e

psíquicos.

Além disso, o primeiro critério de desempate em concurso público é o da

idade, com preferência para os concorrentes com idade mais avançada. Nesse

aspecto, pode ser considerado uma ação afirmativa eficaz nas relações de trabalho.

Contudo, importante dispositivo existente no projeto de lei relativo às cotas

foi retirado para ser sancionado, a exemplo do que ocorreu em relação ao Estatuto

da Igualdade Racial, anteriormente visto, justamente aquele relativo à determinação

de adequação das empresas prestadoras de serviço abrigar pelo menos 20% do seu

quadro com pessoas maiores de 45 anos.

Inobstante isso, indubitavelmente, a aprovação do Estatuto do Idoso foi um

avanço para o sistema legal brasileiro, que já previa na Constituição Federal, nos

artigos 229 e 230, alguns princípios e direitos assegurados aos idosos.

Embora não tenha sido sancionado com a política de cotas a ser observada

pelas empresas nos seus quadros de empregados, pode-se afirmar que o Estatuto

do Idoso veio, se não atrasado, no tempo certo, já que estimativas demonstram que

em 2020 o Brasil estará na 6ª posição dentre os países com maior número de

idosos, contando com mais de 30 milhões de idosos232. Tais dados demonstram a

necessidade de se regulamentar e efetivar os direitos existentes dos idosos de

forma a propiciar uma existência digna.

Como instrumento de cidadania, o Estatuto do Idoso marcou a história

jurídica do Brasil, contudo, não com a ênfase que merecia. Assim, referido

documento deve ser tido como primeiro passo à participação ativa do idoso na

sociedade.

4.3.2 Na Reserva de Vagas para Pessoas com Deficiência

A ação antidiscriminatória pode acarretar, e não são raras as vezes que

acarreta, efetiva discriminação, mas de caráter positivo, e essa conduta não lesa o

232 ALMEIDA, Dayse Coelho de. Estatuto do Idoso. Real proteção aos direitos da melhor idade? Jus

Navigandi, Teresina, ano 8, n. 120, 1 nov. 2003. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista /texto/4402/estatuto-do-idoso>. Acesso em: 26 maio 2011.

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princípio da não discriminação, mas sim, reforça-o, o tornando eficaz233. Nesse

diapasão, as ações afirmativas foram renovadas pela Convenção n. 159 da OIT, de

1983, que tratou de ação antidiscriminatória em face de pessoas com deficiência no

trabalho, a qual não só reitera as técnicas adotadas pela Convenção n. 111 da OIT,

já analisada, como as revigora.

Com o intuito, portanto, de discriminar positivamente alguns grupos que

historicamente foram desarrazoadamente discriminados, o Poder Público

implementou o sistema de cotas, procurando proporcionar a participação de todos

os cidadãos no processo democrático e lhes propiciar o pleno exercício da

cidadania.

Embora a legislação e os tratados internacionais garantam ações afirmativas

e coercitivas para a eliminação de práticas discriminatórias, barreiras sociais,

arquitetônicas, urbanísticas e de comunicação, há empresas que só contratam o

profissional deficiente com a intenção de se adaptarem às leis, não o incluindo em

suas rotinas de trabalho e o transformando apenas em um elemento de figuração,

tornando esse o maior dos obstáculos à eficácia das medidas.

Para uma melhor compreensão acerca do assunto, Gláucia Gomes Vergara

Lopes define o sistema legal de vagas ou sistema de cotas como o “mecanismo

compensatório utilizado para inserção de determinados grupos sociais, facilitando o

exercício dos direitos ao trabalho, à educação, à saúde, ao esporte, etc.” 234. Não

deixa de ser uma forma de ação afirmativa com intuito de tentar promover a

igualdade e o equilíbrio de oportunidades entre os diversos grupos sociais.

Trata-se de uma política de ação afirmativa pela qual o Estado visa a diminuir

as diferenças existentes em certos segmentos sociais que se encontram em

desvantagem, especialmente aqueles que sofrem algum tipo de discriminação

desarrazoada.

Nesse particular, importante retornar ao tocante às ações afirmativas,

salientando Cristiane Ribeiro da Silva235:

233 FONSECA, 2006, p. 158. 234 LOPES, 2005. Biblioteca LTr Digital. 235 SILVA, Cristiane Ribeiro; FONSECA, Juliana Izar Soares da. A inclusão das pessoas portadoras

de deficiência no mercado de trabalho e a transformação social – a experiência da Serasa. Suplemento Trabalhista 01/08 , São Paulo, ano 44, 2008, p.43.

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[...] são importantes instrumentos de inclusão social e consistem em medidas que objetivam superar a discriminação em relação a certos grupos fragilizados, como aqueles correspondentes às mulheres, índios, negros e também pessoas portadores de deficiência, proporcionando-lhes igualdade de oportunidades.

Atualmente, com relação à reserva de vagas no trabalho, há o vigente e

eficaz sistema de cotas para aprendizes e também para pessoas portadoras de

deficiências.

Fazendo um breve escorço histórico sobre o tema, tem-se que o sistema de

cotas empregatícias para reabilitados ou portadores de deficiência, teve sua origem

na Europa, no início do século XX. Ele foi utilizado pelos países que participaram da

Primeira Guerra Mundial como um meio alternativo de empregar os ex-combatentes

mutilados nos conflitos, que sobrecarregavam seus sistemas previdenciários.

Frente a essa situação, em 1923, a OIT publicou uma recomendação na

qual aconselhava seus países membros a instituírem leis nacionais que obrigassem

entidades públicas e empresas privadas a contratarem ex-combatentes com

deficiência. Após vinte e um anos, foi publicada nova recomendação na qual a

obrigatoriedade de contratação se estendeu para todas as pessoas com deficiência.

Em detrimento a essa recomendação, os países europeus passaram

gradativamente a adotar as cotas236. Os primeiros países que adotaram essas

medidas foram a Inglaterra e a Holanda, porém, na atualidade ela já alcança cerca

de dois terços dos países europeus.

A legislação brasileira, visando garantir a colocação de pessoas com

deficiência no mercado de trabalho, lançou mão de um programa que reserva vagas

de emprego às pessoas com deficiência, em instituições públicas e privadas,

também conhecido como política de cotas.

Em relação aos cargos e empregos públicos, a Constituição Federal

Brasileira de 1988 estabelece, no inciso VIII do artigo 37, que: “a lei reservará

percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de

deficiência e definirá os critérios de sua admissão”.

Nesse passo, tanto a Lei 8.112, de 11 de dezembro de 1990, como o

Decreto 3298, de 20 de dezembro de 1999 estipulam que deverão ser reservadas no

mínimo 5%, e no máximo 20% das vagas ofertadas em concursos públicos a

candidatos com deficiência.

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No que tange a obrigação das instituições privadas em contratar pessoas

com deficiência, o artigo 93, da Lei 8.213, de 24 de julho de 1991, estabelece que a

empresa com mais de cem empregados está obrigada a contratar beneficiários

reabilitados ou pessoas com deficiência habilitadas, cujo percentual varia de 2% a

5%, de acordo com o número de empregados da empresa.

Em comentário à norma em tela, Fonseca observa que trata de lei que

regulamenta os benefícios da Previdência Social, mas que no particular evidencia-se

tipicamente trabalhista, “eis que impõe uma conduta patronal em favor de alguns

empregados especiais, dirigindo diretamente a contratualidade ao direcionar a

vontade dos sujeitos do contrato237“, na medida em que elege um critério de escolha

prioritária em favor das pessoas com deficiência.

Levando em consideração que a lei reserva vagas a beneficiários

reabilitados e a pessoa com deficiência habilitada, cabe verificar as suas

características.

Entende-se por pessoa com deficiência habilitada, segundo cartilha da

Secretaria de Inspeção do Trabalho238:

[...] Aquela que concluiu curso de educação profissional de nível básico, técnico ou tecnológico, ou curso superior, com certificação ou diplomação expedida por instituição pública ou privada legalmente credenciada pelo Ministério da Educação ou órgão equivalente, ou aquela com certificado de conclusão de processo de habilitação ou reabilitação profissional fornecido pelo INSS. Considera-se, também, pessoa portadora de deficiência habilitada àquela que, não tendo se submetido a processo de habilitação ou reabilitação, esteja capacitada para o exercício da função” (art. 36, §§ 2° e 3°, do Decreto n. 3.298/99).

Ainda, na mesma cartilha, define-se pessoa com deficiência reabilitada

como239:

[...] a pessoa que passou por processo orientado a possibilitar que adquira, a partir da identificação de suas potencialidades laborativas, o nível suficiente de desenvolvimento profissional para reingresso no mercado de trabalho e participação na vida comunitária (art. 31, do Decreto n.° 3.298/99).

236 LOPES, 2005. Biblioteca LTr Digital. 237 FONSECA, Ricardo Tadeu Marques da. O Trabalho da pessoa com deficiência e a lapidação

dos direitos humanos: o direito do trabalho uma ação afirmativa. São Paulo: Saraiva, 2005. 238 A Inclusão das pessoas com deficiência no mercado d e trabalho . Brasília: Secretaria de

Inspeção do Trabalho – SIT, 2007, p. 22. 239 Ibid.

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De acordo com o art. 93, da Lei 8213, de 24 de julho de 1.991, a reserva de

emprego às pessoas com deficiência no âmbito das instituições privadas, é

garantida conforme escala que, dependendo do número de empregados, fixa à

empresa a obrigação de contratar determinado percentual de pessoas com

deficiência.

Essa é a primeira limitação ao poder potestativo do empregador em se

tratando de portadores de deficiências: fixação de cotas com obrigação pelo mesmo

em contratar e manter em seus quadros de empregados reabilitados ou portadores

de deficiência.

Em face ao escalonamento acima, Fonseca faz uma pertinente observação

em relação à eficácia dessa norma, pois segundo ele a peculiaridade é a exclusão

das pequenas e microempresas da obrigatoriedade em questão, “o que afasta as

que mais empregam, segundo estatísticas oficiais, seja em razão da alta incidência

dessas empresas no mercado, seja em razão do processo menos automatizado que

as caracteriza240“.

Outra limitação ao poder potestativo do empregador na norma é o dispositivo

legal que veda a despedida arbitrária de trabalhadores reabilitados ou com

deficiência, exigindo, para tal, a contratação de substituto em condição semelhante.

Não é outro o entendimento dos Tribunais Regionais do Trabalho241, e do

Tribunal Superior do Trabalho242.

240 FONSECA, 2006, p. 280. 241 “REINTEGRAÇAO NO EMPREGO. EFEITOS E LIMITES. De acordo com o art. 93, § 1º, da Lei

n.° 8.213/91, verifica-se que “a dispensa de trabal hador reabilitado ou de deficiente habilitado ao final de contrato por prazo determinado de mais de 90 (noventa) dias, e a imotivada, no contrato por prazo indeterminado, só poderá ocorrer após a contratação de substituto de condição semelhante”, o que não foi cumprido pelos Recorrentes, uma vez que inexiste qualquer prova nos autos indicando a contratação de outro empregado reabilitado ou de deficiente habilitado para o cargo anteriormente ocupado pela Recorrida, o que torna nula a dispensa (art. 9º, CLT, c/c art. 187, CC). Todavia, a referida proteção no emprego somente prevalece enquanto não houver contratação de outro empregado nas mesmas condições, não se podendo estender “ad eternum” a reintegração determinada pelo ilustre Juízo monocrático”. (PARANÁ, Tribunal Regional do Trabalho. RTOrd 06963-2002012-09-00-8-ACO-05379-2007. 4ª Turma. Relator Desembargador Luiz Celso Napp - Publicado no DJPR em 02 mar. 2007. Disponível em: <www.trt9.jus.br>. Acesso em: 15 dez. 2010).

242 “EMPREGADO REABILITADO - RESILIÇÃO - CRITÉRIOS ESTABELECIDOS NO ART. 93, § 1º, DA LEI N. 8213/91 - GARANTIA DE EMPREGO INDIRETA - REINTEGRAÇÃO. I - Enquanto o caput do supracitado art. 93 estabelece cotas a serem observadas pelas empresas com cem ou mais empregados, a serem preenchidas por beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência habilitadas, o seu § 1º cria critério para a dispensa desses empregados (contratação de substituto de condição semelhante), ainda que seja para manter as aludidas cotas. II - Significa dizer que, não obstante o critério de dispensa pudesse visar a manutenção das cotas previstas no artigo 93, a interdição do poder potestativo de resilição consagrado no parágrafo primeiro traz consigo a concessão de garantia de emprego. III - Porém, não se trata de concessão de uma

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Concretamente, observando os dados existentes a se perquirir a efetividade

e eficácia da lei em comento, em relação à situação das pessoas com deficiência no

mercado formal de trabalho, a Federação Brasileira de Bancos (FEBRABAN)

publicou, em agosto de 2006, sob a coordenação de Andréa Schwartz e Jaques

Haber, cartilha em que exibe levantamentos acerca da colocação destas pessoas no

emprego formal, e constataram que 52% delas são inativas. Se fossem

consideradas as que trabalham, somente 10,4% possuem carteira assinada.

Segundo a Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) 2007, dos 37,6

milhões de trabalhadores ativos, 348,8 mil são trabalhadores com deficiência, o que

representa apenas 1% do total de trabalhadores com emprego formal.

Neste sentido, salienta Schwartz que “ainda é um número baixo se

comparado à representatividade da população com deficiência (14,5%, dados

fornecidos pelo CENSO/IBGE/2000) junto à população geral243“.

Vale ressaltar que a Lei de cotas está prestes a completar vinte anos de

existência, entretanto, somente nos últimos anos é que seu cumprimento tem sido

alvo de fiscalização por parte do Ministério Público do Trabalho e do Ministério do

Trabalho e Emprego, através de suas Secretarias Regionais do Trabalho, que vêm

atuando junto às empresas privadas, no intuito de fazê-las cumprir a obrigação legal

imposta pela legislação.

Os dados coletados no Sistema Federal de Inspeção do Trabalho -

SFIT/SIT/MTE, comprovam a afirmação mencionada no parágrafo acima. Através

das informações extraídas deste sistema, o Ministério do Trabalho e Emprego

elaborou e divulgou, no seu site, um quadro comparativo da fiscalização do trabalho

no período de 1990 a 2007.

Em dezessete anos de fiscalização, o MTE, por meio de suas Secretarias

Regionais do Trabalho, averiguou 6,3 milhões de empresas, onde alcançou o

garantia de emprego por tempo indeterminado, mas sim, de garantia provisória subordinada à comprovação de posterior contratação de substituto de condição semelhante. Assim, se a reclamada comprovar, na liquidação de sentença, que após a dispensa do reclamante contratara outro empregado de condição análoga, deve ser convertida a reintegração em indenização substitutiva constituída dos salários e demais direitos trabalhistas do período mediado entre a resilição contratual e a nova admissão. IV - De outro lado, não comprovada a contratação de substituto, poderá a embargante, após a reintegração, exercitar o direito potestativo de resilição se atendido o requisito do parágrafo primeiro do artigo 93 da Lei 8.213/90. V - Recurso conhecido e provido.” (BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. RR 869/2004-242-02-00.3. 4ª Turma, publ. 19 dez. 2006, fl. 1).

243 SCHWARTZ, Andrea; HABER, Jaques. (Desenv. e Coord.). Coleção Febraban de Inclusão Social, população com deficiência no Brasil, fatos e percepções. São Paulo: FEBRABAN – Federação Brasileira de Bancos, 2006.

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número de 390,6 milhões de empregados, autuando cerca de 1,3 milhões delas, ou

seja, 21% do total das empresas fiscalizadas.

Ressalte-se que os dados atinentes à contratação de trabalhadores com

deficiência somente foram lançados no quadro comparativo proferido pelo

SFIT/SIT/MTE, a partir do exercício de 2005, posto que anterior a esta data, não

foram fornecidas quaisquer informações a respeito do assunto.

Não obstante, os números revelam que no período compreendido entre 2005

e 2007, foram contratados pouco mais de 55 mil trabalhadores com deficiência sob a

ação da fiscalização das SRTE’s, cerca de 22% no primeiro ano, no segundo ano o

percentual aumentou para 36%, atingindo 40% no terceiro ano.

Utilizando-se do trabalho publicado por Marcelo Néri, Alexandre Pinto de

Carvalho e Hessia Guillermo Costilia, sobre a inserção de pessoas com deficiência

no mercado de trabalho formal, Gláucia Lopes constatou um aumento na

contratação dessas pessoas a partir da Lei de Cotas, mais precisamente após a

entrada em vigor do Decreto 3.298/99, o que pode indicar eficácia na medida. Eis os

dados244:

[...] 31% do total dos portadores de deficiência encontram-se empregados em empresas que possuem menos de 100 empregados; 29% em empresas que apresentam um número de empregados superior a 1.000 empregados; 14,57% nos estabelecimentos de 100 a 249 empregados; 13,57% naquelas empresas que apresentam de 250 a 499 empregados; e 11,86% para empresas com 500 a 999 empregados.

Curiosamente, constatou-se que a pequena empresa é a que emprega

parcela mais expressiva de trabalhadores com deficiência, mesmo estando

desobrigada ao cumprimento do percentual disposto na Lei de Cotas.

Segundo dados de um site da internet de procura de empregos, denominado

“infojobs.com.br”, independentemente da crise econômica que se arrasta no cenário

mundial, as oportunidades oferecidas a deficientes têm aumentado ano após ano. O

SINE ofereceu mais de 36 mil empregos para deficientes em 2007, todavia, dessas

vagas, apenas 7 mil foram preenchidas. O que se tem constatado, portanto, é a

sobra de vagas para portadores de deficiência.

244 LOPES, 2005. Biblioteca LTr Digital.

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Especificamente no Paraná, levando em consideração dados estatísticos

postados no site da Secretaria de Estado do Trabalho, Emprego e Promoção Social

do Paraná – SEPT/PR, entre janeiro de 2003 e abril de 2009, foram cadastrados

aproximadamente 28 mil pessoas com deficiência, para 27,5 mil vagas de emprego

ofertadas, sendo encaminhados 41,6 mil candidatos para entrevista de emprego.

Das vagas ofertadas, 41% delas foram preenchidas, ou seja, 11,2 mil postos de

trabalho foram ocupados por este seguimento.

Só no período de janeiro a março de 2011, de acordo com os números da

Agência do Trabalhador, da Secretaria de Estado do Trabalho, Emprego e

Promoção Social (SETP), foram abertas 2.621 oportunidades de emprego para

pessoas com deficiência. Destas, apenas 513 foram preenchidas245.

Em âmbito nacional, os dados demonstram que mesmo após o advento da

Lei 8.213/91, regulamentada após oito anos pelo Decreto no 3.298/99, não houve

aumento expressivo do percentual de empresas grandes que cumprem as cotas,

justamente diante das dificuldades que encontram.

Um desses entraves seria a concessão de pensão mensal a todos os

deficientes estipulada pela Lei Orgânica de Assistência Social.

Muitas das pessoas que recebem o benefício preferem complementar a

renda com atividades informais a procurar um trabalho com registro em carteira e

pequenos salários, já que assim perdem o direito à pensão.

Outro problema, seria a dificuldade de encontrar deficientes capacitados e

especializados para ocupar as vagas disponíveis no mercado.

Além disso, não há como ignorar um grave problema nas cidades brasileiras,

qual seja, a ausência de políticas públicas para a implementação de uma

infraestrutura urbana que respeite os portadores de deficiência física, não

exacerbando as suas limitações inerentes, impedindo-os de se deslocar com

independência e dignidade.

E o mais grave, os deficientes se defrontam com os preconceitos e com as

discriminações existentes até então. São excluídos, pela própria família, pelo ensino

com qualidade e participação social plena.

245 MENDES. Karla Losse. Falta de Qualificação causa Desemprego entre Pessoas com Deficiência.

Paraná On line. Curitiba, 24 abr. 2011. Disponível em: http://www.hbjnoticias.com/2011/04/falta-de-qualificacao-causa-desemprego.html. Acesso em: 28 jun. 2011.

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Partindo dessa premissa, não basta o Estado apenas aplicar multa no intuito

de obrigar a empresa a cumprir as cotas, pois, para que o objetivo da norma seja

alcançado, é necessário que se faça indicar, de maneira precisa, como cumprir tal

obrigação.

Para Sérgio Pinto Martins, somadas as porcentagens de aprendizes e a de

pessoas reabilitadas ou portadoras de deficiência, a empresa tem um grande

percentual a destinar a pessoas específicas. “Num contexto de globalização, tais

porcentuais podem diminuir as condições de concorrência da empresa no

mercado246“.

Não há dúvida de que a questão é social e necessita de considerações,

porém a empresa não pode arcar sozinha com tais hipóteses, principalmente

quando empresas de outros países não têm as mesmas obrigações.

Nesse sentido, o Judiciário tem ponderado e analisado criteriosamente

referidas questões, antes de penalizar as empresas, já que tem ciência das

dificuldades em encontrar portadores no mercado em número suficiente para

preencher a cota e reconhecendo os esforços apresentados por muitas empresa a

tanto247.

Pertinente, ainda, a crítica de Mallet, ao analisar a Lei de Cotas (referindo-se

ao art. 93, da Lei n. 8.213/91), eis que o documento legal procura implementar a

246 MARTINS, 2010, p. 609. 247 TRT-PR-19-03-2010 AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONTRATAÇÃO DE PESSOAS COM

DEFICIÊNCIA. ÔNUS DA PROVA QUANTO AO DESCUMPRIMENTO VOLUNTÁRIO E INJUSTIFICADO DA OBRIGAÇÃO LEGAL PREVISTA NO ARTIGO 93 DA LEI 8.213/1991. Cabe à empresa que possui cem ou mais empregados ofertar no mercado de trabalho a quantidade de vagas necessárias ao cumprimento da cota legal mínima prevista no artigo 93 da Lei 8.213/1991, não lhe sendo lícito obrigar o portador de necessidades especiais habilitado ou reabilitado a aceitar o trabalho. Nunca é demais lembrar que a Constituição Federal veda a imposição de trabalho forçado, consoante interpretação que se extrai do seu artigo 5º, incisos II (“ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”), III (liberdade de exercício profissional, aí compreendido o direito de não trabalhar) e XLVII, alínea c (proibição de pena de trabalho forçado), além de tal fato constituir crime tipificado no Código Penal (art. 149 - “Redução a condição análoga à de escravo”). Diante desse contexto, demonstrado pela reclamada a sua atuação diligente na busca em cumprir a determinação prevista no artigo 93 da Lei nº 8.213/1991, inclusive com implementação de projetos de capacitação e inclusão dos portadores de necessidades especiais no mercado de trabalho, caberia ao Ministério Público do Trabalho o ônus de indicar e comprovar especificamente ao menos uma hipótese em que a reclamada teria sido recalcitrante em cumprir sua obrigação legal negando, injustificadamente, a contratação de portador de necessidades especiais habilitado ou reabilitado que tenha se candidatado a uma vaga de emprego ofertada pelas cotas estabelecidas no aludido comando legal. Somente assim poderia se configurar a negligência voluntária da reclamada em cumprir a determinação legal, de modo a justificar a intervenção do Poder Judiciário para impor o cumprimento de obrigação de fazer conforme postulado. Recurso ordinário conhecido e desprovido. (PARANÁ. Tribunal Regional do Trabalho RTOrd 00912-2008-669-09-00-8-ACO-

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igualdade material, contudo o faz de modo imperfeito ao impor aos empregadores a

obrigação de contratação de certo número de trabalhadores deficientes, deixando de

levar em conta dificuldades decorrentes de impossibilidades técnicas ou de

situações em que a liberdade de escolha do empregador não pode se sujeitar a

parâmetros mais rigorosos, como nos casos de cargos de confiança (inciso II, do art.

62 da CLT). Sua opinião é de que se a lei dispensasse certas empresas do

cumprimento, da obrigação de admissão de deficientes, em relação a determinadas

funções, por conta de obstáculos técnicos. “Dessa forma, sem se comprometer a

busca de mais igualdade substancial, deixa-se espaço para o estabelecimento de

disciplina diferenciada em casos que mal se acomodam à disciplina legal de caráter

geral248“.

Cumpre aqui ressaltar que uma das maiores dificuldades para o

cumprimento das obrigações legais pelas empresas, como visto, reside na falta de

escolaridade e de formação profissional das pessoas com deficiência.

Neste diapasão, convém aqui, à guisa de reforço argumentativo, frisar que a

Lei n. 11.180/05, visando a dar cumprimento ao mandamento constitucional, e

procurando dar mais eficácia à norma, além de, elevar a idade para aprendizagem

até 24 anos, eliminou o limite teto de idade para pessoas com deficiência

submeterem-se a contratos formais de aprendizagem, como ressaltado no capítulo

anterior do presente trabalho, o que para os trabalhadores com deficiência é de

grande auxílio, já que a formação profissional vem se tornando uma necessidade

prioritária.

4.3.3 No Contrato de Aprendizagem

Preocupado com a exploração do trabalho do menor, o legislador pátrio,

desde 1946 (Decretos-lei 8.622/46 - aprendizagem industrial e 9.576/46 -

aprendizagem comercial) vem adotando regras inibidoras dessa exploração.

08606-2010. 3ª. TURMA. Relator: Desembargador Altino Pedrozo dos Santos. Publicado no DJPR em 19 mar. 2010. Disponível em <www.trt9.jus.br>. Acesso em 12 nov. 2010).

248 MALLET, 2010, p. 46.

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114

Nesse sentido, a Constituição Federal de 1988 estabelece normas de

proteção ao trabalho do menor e, também, de igual forma, a legislação

infraconstitucional, como a CLT e o Estatuto da Criança e do Adolescente.

Visando, assim, dar eficácia ao ambiente de inserção do jovem no mercado

de trabalho, em 19 de dezembro de 2000 foi editada a Lei nº 10.097, que alterou o

capítulo da CLT que tratava da aprendizagem.

Para efeitos da legislação trabalhista até 15/06/2005 – data da edição da

medida provisória 251, posteriormente aprovada pelo Congresso Nacional e

convertida na lei 11.180/05 - era considerado menor aprendiz o trabalhador maior de

quatorze e menor de dezoito anos.

Após tal data, é considerado trabalhador-aprendiz o maior de 14 e menor de

24 anos, sendo certo que o trabalho para o menor de 16 e maior de 14 anos,

somente pode ser exercido mediante contrato de aprendizagem.

Naturalmente, as inovações trouxeram muitos questionamentos, contudo, é

o entendimento de que a nova regulação disposta nos artigos 428 a 433 da CLT

está em harmonia com a Constituição Federal.

A Constituição vigente estabelece, no art. 227, que é dever da família, da

sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta

prioridade, dentre outros, o direito à profissionalização. E define também como

finalidade da educação o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o

exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (CF/1988 art. 205 c/c Lei

9394/1996 art. 2º).

Contrato de aprendizagem é o contrato de trabalho de natureza especial

firmado entre um empregador e um aprendiz de 14 a 24 anos (salvo se portador de

deficiência, como ressaltado anteriormente), cujo objeto é formação técnico-

profissional metódica, compatível com o desenvolvimento físico, moral e psicológico

do aprendiz que deve executar com zelo e diligência as tarefas necessárias a essa

formação (CLT art. 428, caput).

Tem como pressupostos de validade da contratação a anotação em carteira

de trabalho, que deverá constar, na parte relativa às “ANOTAÇÕES GERAIS”, a

existência do contrato de aprendizagem, a função (p. ex. aprendiz de auxiliar

administrativo) e o prazo do contrato que deverá coincidir com o término do curso

de formação técnico-profissional. Na parte relativa ao contrato de trabalho, deverá

ser anotado normalmente o contrato de trabalho, tal qual se procede com um

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empregado comum, matrícula e frequência à escola para aqueles que não tenham

concluído o ensino fundamental, inscrição em programa de aprendizagem

desenvolvido sob a orientação de entidade qualificada em formação técnico-

profissional (Serviços Nacionais de Aprendizagem, entidades qualificadas em

formação técnico-profissional e entidades sem fins lucrativos), e, como regra, os

aprendizes devem comparecer parte do período na empresa e outro período no

curso de aprendizagem.

A jornada de trabalho do aprendiz que ainda não tiver concluído o ensino

fundamental não poderá exceder de seis horas diárias. Para aqueles que já

completaram o ensino fundamental, a jornada poderá ser de até 08 horas, já

computadas nessa jornada as horas destinadas à aprendizagem teórica. Em ambos

os casos são vedadas a prorrogação e a compensação da jornada.

Com relação à remuneração, o artigo 428, § 2º, da CLT, garante ao aprendiz

pelo menos o salário mínimo hora, acrescido do DSR, salvo condição mais

benéfica249. Se a empresa optar por contraprestação fixa mensal, não será devido o

pagamento do DSR, pois já se encontra embutido no salário mensal.

As férias do empregado aprendiz deverão coincidir com um dos períodos

das férias escolares do ensino regular, em conformidade com o § 2º do art. 136 da

CLT, sendo vedado o parcelamento, nos termos do § 2º do art. 134 da CLT.

Sobre a remuneração paga ao aprendiz, incidem as contribuições para o

INSS e FGTS, sendo a alíquota do FGTS de 2% (Lei 8.036/90, art. 15, § 7º).

O contrato de aprendizagem extinguir-se-á no seu termo ou quando o

aprendiz completar 24 (vinte e quatro) anos, ressalvada a hipótese prevista no § 5o

do art. 428 (aprendizes portadores de deficiência não têm limitação de idade, como

já posto), por desempenho insuficiente ou inadaptação do aprendiz, falta disciplinar

grave, por ausência injustificada à escola que implique perda do ano letivo, ou a

pedido do aprendiz.

Não se aplica, nesse caso, o disposto nos artigos 479 e 480 da CLT, ou

seja, a indenização pela metade do tempo faltante ao término do contrato a termo.

Por fim, o contrato de aprendizagem não poderá ser estipulado por mais de

dois anos.

249 Se a categoria possuir piso de ingresso estipulado em ACT ou CCT, o aprendiz fará jus ao valor

equivalente a, no mínimo, este piso.

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A contar da data de publicação da Lei nº 10.097/00, os estabelecimentos de

qualquer natureza são obrigados a empregar e matricular nos cursos dos serviços

nacionais de aprendizagem, número de aprendizes equivalente a 5%, no mínimo, e

a 15%, no máximo, dos trabalhadores existentes em cada estabelecimento, cujas

funções demandem formação profissional.

A expressão “estabelecimento de qualquer natureza” quer dizer

estabelecimento comercial, industrial, de transporte, de prestação de serviços,

bancário, entre outros.

O percentual será calculado por estabelecimento e não em relação à

empresa toda. Assim, caso a empresa possua mais de um estabelecimento, em

cada um deles deverá ter 5%, no mínimo, a 15% no máximo de aprendizes.

As microempresas250 e as empresas de pequeno porte251 estão dispensadas

da obrigação de contratar aprendizes, nos termos do art. 11 da Lei 9.841/99.

O cálculo do número de aprendizes a serem contratados terá por base o

número total de empregados em todas as funções existentes no estabelecimento

que demandem formação profissional, excluindo-se aquelas que exijam habilitação

profissional de nível técnico ou superior ou, ainda, as funções que estejam

caracterizadas como cargos de direção, de gerência ou de confiança, nos termos do

inciso II, e do parágrafo único, do art. 62, e do parágrafo 2º, do art. 224, ambos da

CLT252.

250 I - microempresa, a pessoa jurídica e a firma mercantil individual que tiver receita bruta anual igual

ou inferior a R$ 433.755,14 (quatrocentos e trinta e três mil, setecentos e cinquenta e cinco reais e quatorze centavos);

251 II - empresa de pequeno porte, a pessoa jurídica e a firma mercantil individual que, não enquadrada como microempresa, tiver receita bruta anual superior a R$ 433.755,14 (quatrocentos e trinta e três mil, setecentos e cinquenta e cinco reais e quatorze centavos) e igual ou inferior a R$ 2.133.222,00 (dois milhões, cento e trinta e três mil, duzentos e vinte e dois reais).

252 Antes da alteração da lei que aumentou o limite de idade para contratação de trabalhador como aprendiz de 18 para 24 anos, havia restrição do aprendiz executar atividades: - desenvolvidas em ambientes que comprometam a formação moral do adolescente; - cuja presunção de insalubridade ou periculosidade, relativa ao serviço ou local de trabalho, não possa ser elidida; - que exijam habilitação profissional de nível técnico ou superior; - cujo exercício requeira licença ou autorização vedadas para menores de dezoito anos; - objeto de contrato de trabalho por prazo determinado, cuja vigência dependa da sazonalidade da atividade econômica; - caracterizadas como cargos de direção, de gerência ou de confiança, nos termos do inciso II e do parágrafo único do art. 62 da CLT; e tais restrições permanecem se o aprendiz for menor de 18 anos. No entanto, com a elevação da idade máxima da aprendizagem para 24 anos, para fins de cálculo da cota, devem ser excluídas as funções que não demandem formação profissional e aquelas caracterizadas como cargos de direção, de gerência ou de confiança, nos termos do inciso II e do parágrafo único do art. 62, e do parágrafo 2º, do art. 224, ambos da CLT.

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As frações de unidade, no cálculo da porcentagem obrigatória, darão lugar à

admissão de um aprendiz.

Assim, a Lei 10.097/2000 introduziu avanços significativos, uma vez que de

modo mais sistematizado, deu ao instituto da aprendizagem novo fôlego para

caminhar em direção à efetividade e eficácia das disposições constitucionais e à

harmonização com a realidade atual do mercado de trabalho.

Como observou Fonseca, em suas primeiras notas após a edição da lei

10.097/2000, o trabalho desempenhado pela comissão pluri-institucional foi

basicamente o de consolidar, na norma celetária, disposições esparsas que desde a

edição do Estatuto da Criança e do Adolescente já vigoravam na órbita trabalhista,

em razão do que dispõe o artigo 8º da CLT253.

Visou-se, portanto, sintetizar a matéria, trazendo-a para o corpo da CLT, a

fim de facilitar o seu conhecimento e a sua aplicação pelos operadores do direito

trabalhista.

O artigo 62 do ECA, passou a conceituar a aprendizagem, dando alcance

maior, antes restrito ao contrato especial de trabalho, disciplinado desde 1943, pelos

artigos 429 e seguintes da CLT.

Reconstruíram-se os parâmetros da aprendizagem do modelo vigente por

décadas. Buscou-se com a nova legislação transformar a aprendizagem num

instrumento de inserção efetiva no mercado de trabalho de modo manter o nível

ideal de empregabilidade dos jovens, tendo em conta que a qualificação da mão de

obra nacional é fator de promoção do desenvolvimento do país.

Afirma Fonseca que a conclusão inelutável é de que ganham espaço os

setores de serviço e de cultura e, mesmo na indústria, o trabalho de tecnologia de

ponta. Esses são os setores que empregarão doravante, e a necessidade de

qualificação do trabalhador se coloca como prioritária, tanto sob o ponto de vista do

desenvolvimento, quanto da própria sobrevivência da sociedade moderna. Aqui está

a única saída diante da reestruturação do modelo produtivo trazida pela

informatização.

A informação é a matéria-prima da nova ordem produtiva. Os trabalhadores

deverão ser devidamente educados para interferir crítica e ativamente no processo

produtivo de bens culturais ou de consumo.

253 FONSECA, Ricardo Tadeu Marques da. A reforma no Instituto da Aprendizagem no Brasil:

Anotações sobre a Lei nº 10.097/2000. São Paulo: Revista LTR. abril/2001.

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Assim, é certo afirmar que o objetivo das alterações no marco legal

pertinente a aprendizagem foi essencialmente assegurar uma formação profissional

moderna e adequada às necessidades do mundo do trabalho no atual mercado

globalizado e competitivo.

Num plano macroeconômico, buscou-se também instrumentalizar o Brasil

para qualificar a mão de obra nacional de modo a ampliar os investimentos

internacionais no país.

Naturalmente, as inovações trouxeram muitos questionamentos. Contudo, o

tema do jovem aprendiz ou do contrato de aprendizagem tem grande relevância no

atual contexto nacional de falta de mão de obra especializada em diversas

atividades econômicas. Para o adolescente ou jovem trata-se de uma grande

oportunidade de aprender novos ofícios, sem prejuízo do acesso à educação regular

nas escolas e faculdades. Para as empresas, trata-se de um ônus legal que

constitui, em verdade, uma grande oportunidade de formar trabalhadores efetivos,

de investir no futuro e de exercer a sua função social254.

Enfim, a obrigação legalmente estabelecida tem fulcro na função social da

propriedade, cujo exercício resulta em benefícios para a sociedade tanto na esfera

social quanto econômica.

Além da vantagem de cunho coletivo, há também ganho individual para as

empresas, pois a ampliação e a modernização do sistema nacional de

aprendizagem profissional tende a se reverter em aumentos qualitativo e quantitativo

de produtividade. Com um conjunto de trabalhadores formados de modo adequado

às necessidades do mercado e integrado às novas tecnologias, adquire-se

competitividade nas relações econômicas nacionais.

4.3.4 Em Instrumentos Normativo-Sindicais

Conquanto a eficácia das normas previstas em convenções e acordos coletivos

de trabalho seja restrita às relações empregatícias havidas no âmbito das respectivas

254 MORI, Amaury Haruo. Aspectos relevantes da legislação aplicável ao jove m aprendiz . Blog

postado em 3 de setembro de 2010. Disponível em: <http://direitodotrabalhoparatodos. blogspot.com>. Acesso em: 20 maio 2011.

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representações dos sindicatos profissionais e econômicos que a subscrevem255, trata-

se de instrumento extremamente útil à concreção dos valores expressos nas normas

aqui estudadas, desde as convenções e recomendações da OIT, os preceitos

constitucionais, como também as leis ordinárias.

Em verdade, a negociação coletiva é o mecanismo mais apropriado para a

conquista de melhorias das condições de trabalho, pois representantes de empregados

e empregadores sentam-se frente e frente, e dialogam diretamente acerca de suas

necessidades e limitações, fazendo concessões recíprocas256.

Como visto, nas próprias Convenções e Recomendações da OIT, há expressa

referência a adoção de políticas e programas nacionais, pelas autoridades

competentes, mediante consulta às organizações de empregadores e de trabalhadores

mais representativas.

Em atenção a essas normas internacionais, e aos preceitos legais e

constitucionais de incentivo às políticas de ações afirmativas já existentes no

ordenamento jurídico brasileiro, existem nos âmbitos das negociações coletivas

estabelecidas no Brasil, já se preveem cláusulas de instrumentos coletivos visando

alguma espécie de ação afirmativa.

Contudo, antes de adentrar a análise específica de convenções e acordos

coletivos de trabalho que contêm previsões de ações afirmativas, e de sua efetividade e

eficácia, necessário se faz investigar a natureza jurídica da negociação coletiva e seus

efeitos nos contratos de emprego dos trabalhadores.

Impende notar que a convenção ou o acordo coletivos de trabalho são produtos

da negociação coletiva que, no dizer de Mauricio Godinho Delgado, é um procedimento

de extrema relevância para o Estado e para as partes, pois viabiliza o entendimento

direto entre “os interlocutores sociais” em uma situação marcada por divergência de

interesses “permitindo a edificação da sociedade sobre bases mais democráticas”257.

Através das negociações coletivas as condições de trabalho podem ser

pactuadas de forma mais específica à determinada categoria, levando em consideração

255 Nos termos do art. 611, § 1º, da CLT “É facultado aos sindicatos representativos de categorias

profissionais celebrar Acordos Coletivos com uma ou mais empresas da correspondente categoria econômica, que estipulem condições de trabalho, aplicáveis no âmbito da empresa ou das empresas acordantes às respectivas relações de trabalho”:

256 RIBEIRO; BARACAT, 2011, p. 21. 257 DELGADO, Mauricio Godinho. Iniciação ao Direito do Trabalho . 27.ed. São Paulo: LTr, 2001,

pág. 1.370.

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inclusive as peculiaridades da atividade profissional e as diversas regiões econômicas

do país e dos estados.

A autonomia privada coletiva, enquanto poder dos sindicatos de autorregulação,

de criação de regras de conduta, está expressamente prevista como direitos

fundamentais sociais da Constituição Federal258.

Segundo Norberto Bobbio, os direitos fundamentais são direitos reconhecidos

pelo Estado, um leque de direitos que historicamente, após conquistas e lutas, vão

sendo modificados, reconhecidos e incluídos no rol dos direitos humanos positivados259.

Quanto à natureza jurídica das negociações coletivas de trabalho no

ordenamento jurídico pátrio, importante ressaltar que há diversas teorias doutrinárias a

respeito, contudo, como não é objetivo do presente estudo uma ampla explanação

acercada de cada uma delas, o que se pretende é identificar o posicionamento adotado

na praxe.

Segundo Ronaldo Lima dos Santos, questionar sobre a natureza jurídica da

negociação coletiva “significa definir qual o seu caráter normativo, ou seja, se trata de lei

ou de um ato normativo sui generis”260.

Segundo a doutrina, as principais teorias sobre a natureza jurídica da negociação

coletiva (as quais subdividem-se em diversas outras) são a contratualista, a normativista

e a mista. A corrente contratualista se baseia no caráter obrigacional das normas

coletivas de trabalho, em decorrência da vontade das partes convenentes261.

Já a corrente normativista defende o caráter normativo do instrumento coletivo

vigente, por se constituir esse de norma geral e abstrata, que abrange todos os

membros de uma determinada categoria, associado ou não262.

E, a corrente mista, que busca conciliar as correntes contratualista e

normativista, para a qual o instrumento coletivo é um instituto híbrido, pois quanto à sua

formação, identifica-se com um contrato, manifestando a vontade das partes, ao passo

que, em relação ao seu conteúdo equivale a uma norma jurídica263.

258 DUARTE, Ícaro de Souza. A Posição Hierárquica da Convenção Coletiva de Trabalho. In: Revista

Magister de Direito Trabalhista e Previdenciário . v. 39 (nov./dez. 2010) Porto Alegre: Magister, 2004. p. 63.

259 BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Tradução de Carlos Nelson Coutinho; apresentação de Celso Lafer. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004, p. 16.

260 SANTOS, Ronaldo Lima dos. Teoria das normas coletivas. 2. ed. São Paulo: LTr, 2009. p.157. 261 DUARTE, op. cit. p.68. 262 Ibid., p. 73. 263 Ibid., p. 74.

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Por força do próprio conteúdo do art. 611 da CLT, é possível afirmar que a

negociação coletiva tem natureza contratual e normativa, portanto, mista. Contratual,

pela livre manifestação de vontade das partes, e normativa, pois cria, através das

cláusulas firmadas no contrato, lei cogente aplicável a toda a categoria profissional por

elas representada.

Enfim, é um instrumento normativo resultante da autonomia privada coletiva264:

Art. 611. Convenção Coletiva de Trabalho é o acordo de caráter normativo , pelo qual dois ou mais sindicatos representativos de categorias econômicas e profissionais estipulam condições de trabalho aplicáveis, no âmbito das respectivas representações, às relações individuais do trabalho.

§ 1º É facultado aos sindicatos representativos de categorias profissionais celebrar Acordos Coletivos com uma ou mais empresas da correspondente categoria econômica, que estipulem condições de trabalho , aplicáveis no âmbito da empresa ou das empresas acordantes às respectivas relações de trabalho. (grifo nosso).

Sem o propósito de muito se aprofundar na questão, mas pertinente à

compreensão da importância e eficácia dos instrumentos normativos, cabe observar

que, quando frustrada a negociação coletiva pelas vias administrativas pode-se

submeter a questão ao crivo do Poder Judiciário, através do dissídio coletivo de

natureza econômica, do qual resultará a decisão denominada de sentença normativa.

Nesse particular, com a Emenda Constitucional nº 45/04, muito se tem discutido

no mundo jurídico, acerca da introdução no parágrafo 2º, do art. 114, da CF, da

seguinte expressão:

Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente . (grifo nosso).

264 RAPASSI, Rinaldo Guedes. Aspectos Processuais da Ação Anulatória de Instrumento Normativo

Trabalhista. Natureza Jurídica. Legitimidade Processual Ativa. Litisconsórcio Necessário e Unitário. Litispendência e Coisa Julgada. Brasil. República Federativa do Brasil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/Rev_46/Artigos/Art_Rinaldo.htm>. Acesso em 15 mai. 2011.

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Segundo Roberto Freitas Pessoa e Rodolfo Pamplona Filho, a nova redação do

art. 114 da CF faz renascer a ultra-atividade das normas estabelecidas em convenções

ou dissídios coletivos já extintos, sustentando que esses deverão viger até fixação de

nova norma coletiva, inclusive até a decisão final da Justiça do Trabalho, em caso de

dissídio coletivo265.

Para Lilian Gonçalves, ultra-atividade significa a eficácia das cláusulas

coletivas de conteúdo normativo sobre os contratos individuais de trabalho por

período superior à sua vigência, ou seja, é a aderência definitiva das cláusulas

normativas aos contratos individuais de trabalho, independentemente da supressão

do benefício ou da extinção da norma convencional instituidora266.

A consequência seria de verdadeira incorporação das cláusulas convencionais

aos contratos individuais de trabalho.

Entende Sergio Pinto Martins que a tese da incorporação das cláusulas da

norma coletiva traz desestímulo à negociação coletiva, já que o empregador não terá

interesse à integração no contrato de trabalho de algo que será permanente e não mais

poderá ser negociado267.

Segundo o autor, a incorporação das condições previstas na norma coletiva no

contrato de trabalho irá ocorrer se assim for a vontade das partes, tacitamente, quando

o empregador simplesmente continua cumprindo as condições, ou porque a norma

coletiva assim determinou268.

O TST prevê na Súmula n. 277 que "As condições de trabalho alcançadas por

força de sentença normativa vigoram no prazo assinado, não integrando, de forma

definitiva, os contratos". A eficácia do instrumento coletivo, portanto, fica limitada no

tempo, por um período máximo de dois anos269.

Como ressalta Alexandre Chedid Rossi, até mesmo por uma questão de extrema

praticidade, as normas coletivas não podem perdurar indefinidamente, seja pela certeza

265 PESSOA, Roberto Freitas; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. A Nova Velha Questão da Ultra-

Atividade das Normas Coletivas e a Súmula nº 277 do Tribunal Superior do Trabalho. In: Rev. TST, Brasília, vol. 76, n. 2, abr/jun 2010. p. 43-55.

266 GONÇALVES, Lilian. Ultra-atividade nas cláusulas normativas . São Paulo: LTr, 2008. p. 101. 267 MARTINS, Sergio Pinto. Incorporação das Cláusulas da Norma Coletiva ao Contrato de Trabalho.

Disponível em: <http://online.sintese.com>. Acesso em: 22 jun. 2011 268 Ibid. 269 ROSSI, Alexandre Chedid. Incorporação das cláusulas normativas aos contratos individuais de

trabalho. Jus Navigandi , Teresina, ano 7, n. 60, 1 nov. 2002. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/3429>. Acesso em: 21 jun. 2011.

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de que se tornarão obsoletas, seja pelo risco de se tornarem extremamente onerosas

para o empregador ou inúteis para os empregados. De uma forma ou de outra, a

duração limitada das normas coletivas decorre da própria natureza da relação de

trabalho, isto é, uma relação continuada, de trato sucessivo e, portanto, sujeita aos

efeitos do fator temporal270.

Por esse entendimento, tanto as cláusulas convencionais e normativas

vantajosas aos empregados, não se incorporam aos contratos individuais dos

trabalhadores, como também os empregadores não poderão se beneficiar de

flexibilização viabilizada por instrumento normativo, por período além do prazo de sua

vigência.

O parágrafo 2º, do art. 114 da CF, assim, sendo ajuizado um dissídio por mútuo

acordo das partes, procura balizar o poder normativo residual atribuído aos Tribunais do

Trabalho, que deverão observar, no momento do julgamento, as disposições

convencionadas anteriormente, estejam elas em vigor ou não271.

Contudo, recentemente, o TST, com claro direcionamento à auto-composição,

seguindo uma tendência gradativa, no intuito de fazer com que, antes do ingresso em

Juízo com dissídio coletivo, as partes busquem entendimento, editou em 24 de maio de

2011, o Precedente Normativo n. 120, que assim prevê:

SENTENÇA NORMATIVA. DURAÇÃO. POSSIBILIDADE E LIMITES. A sentença normativa vigora, desde seu termo inicial até que sentença normativa, convenção coletiva de trabalho ou acordo coletivo de trabalho superveniente produza sua revogação, expressa ou tácita, respeitado, porém, o prazo máximo legal de quatro anos de vigência.

Quer dizer, esse novo note judiciário traz sobrevida à tese da ultra-atividade das

cláusulas de normas coletivas, numa demonstração clara de que o TST está mitigando

seus entendimentos anteriores, notadamente aquele timbrado na Súmula 277.

Pelo parágrafo único, do art. 868, da CLT, é incontroverso que o prazo de

vigência de uma sentença normativa nunca poderá ser superior a quatro anos.

Já o atual parágrafo 2º, do art. 114 da CF, determina que nos dissídios coletivos

devem-se observar as disposições legais mínimas de proteção ao trabalho, bem como

270 ROSSI, Ibid. 271 ROCHA, Andréa Presas. Dissídios coletivos: modificações introduzidas pela Emenda

Constitucional nº 45/2004. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 996, 24 mar. 2006. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/8147>. Acesso em: 21 jun. 2011.

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as convencionadas anteriormente, subsistindo ainda a exigência do “comum acordo”

para a instauração do dissídio coletivo, determinação esta que vem dificultando a

solução das lides coletivas na Justiça do Trabalho.

Nessa conjuntura legal e fática, considerando a crescente dificuldade de

se criar um “comum acordo” para a instauração de um dissídio de natureza

coletiva, é claro o acenamento do TST à composição pelas partes, assegurando

aos trabalhadores a manutenção das condições alcançadas pela sentença

proferida, enquanto não compuserem as partes ou nova sentença normativa

venha a ser prolatada.

Esclarecida a questão da natureza jurídica das negociações coletivas e o efeito

das normas por ela decorrentes no contrato de trabalho do empregado, passa-se à

análise, então, no âmbito das negociações coletivas no Brasil, de exemplos de

convenções e acordos coletivos normatizando algum tipo de ação afirmativa.

É o caso da cláusula 31ª da Convenção Coletiva celebrada entre o Sindicato

dos Empregados no Comércio de Uberlândia e Araguari e o Sindicato do Comércio

Varejista e Atacadista de Araguari-MG, com vigência de 1º/12/2009 a 30/11/10, que

recomenda às empresas reservarem, pelo menos, 20% de seus postos de trabalho a

pessoas de origem afrodescendentes272.

Cabe trazer, ainda à baila o caso da cláusula 36ª da Convenção Coletiva

celebrada entre o Sindicato das Indústrias e Comércio de Bordados de Ibitinga e o

Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Confecção e Bordados de Ibitinga e

Região, com vigência de 1º/6/2010 a 31/5/2011, que coíbe a prática de assédio moral

nas empresas, incentivando políticas de ações afirmativas e de orientação273.

Além disso, em estudo relacionado à negociação coletiva de trabalho e

equidade de gênero e raça do Brasil, feito pelo DIEESE – Departamento Intersindical de

Estatística e Estudos Socioeconômicos, noticiou-se que os trabalhadores dos Correios

conquistaram, em 2004, a garantia de desenvolvimento de políticas de reserva de cotas

em concursos públicos, cujo objetivo era de ampliar o acesso de etnias negra e

272 “CLÁUSULA TRIGÉSIMA PRIMEIRA – POLÍTICAS AFIRMATIVAS DE INCLUSÃO SOCIAL.

Recomenda-se que as empresas reservem pelo menos 20% (vinte por cento) de seus postos de trabalho a pessoas de origem afrodescendentes (raça negra)”. Convenção Coletiva de Trabalho 2009/2010. Disponível em: <http://www.secua.com.br/site/documentos/cct_araguari_2010_2011. pdf>. Acesso em: 10 mar. 2011.

273 “CLÁUSULA TRIGÉSIMA SEXTA - ASSÉDIO MORAL. Os Sindicatos de empregados e de empregadores se comprometem a coibirem a prática de assédio moral nas empresas, através de ações afirmativas e de orientação”. Convenção Coletiva de Trabalho 2010/2011. Disponível em:

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indígena aos quadros da empresa. Essa garantia – que fazia parte de uma cláusula que

assegurava a não discriminação racial, religiosa ou de orientação sexual nos concursos

públicos – não foi renovada, sendo mantidas, entretanto, suas outras disposições274.

Esse mesmo estudo traz a informação de que em 2006, os trabalhadores da

Companhia de Saneamento de Minas Gerais, incluíram em seu acordo coletivo de

trabalho, garantia de discriminação positiva no processo de seleção interna, ou seja,

mulheres e negros que participassem de processo seletivo interno para cargo de

confiança – somente se houvesse empate – teriam acrescidos dois pontos ao total

obtido na avaliação275.

Por fim, documenta o estudo que os trabalhadores das CELESC – Centrais

Elétricas de Santa Catarina negociaram em 2005 e renovaram nos anos subsequentes,

a garantia de políticas afirmativas que contemplem raça, gênero e hipossuficiência

econômica nos concursos públicos276.

Há, ainda, instrumentos normativos que, mesmo não tratando diretamente de

políticas de ações afirmativas, incentivam e aderem a programas do Governo Federal,

que preveem uma série de ações no sentido de mudar a cultura organizacional das

empresas visando a valorização da mulher, como no caso do Banco do Brasil e Caixa

Econômica Federal.

O Banco do Brasil S/A. aderiu ao programa do Governo Federal intitulado “Pró

Equidade de Gênero”277, previsto em seu Acordo Coletivo de Trabalho 2010/2011,

firmado com a Confederação Nacional dos Trabalhadores nas Empresas de Crédito –

CONTEC, prevendo em sua cláusula 46ª, que o Banco como aderente ao programa

Pró Equidade de Gênero da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres – SPM,

<http://www.sintracobi.org.br/2011/05/convencao-coletiva-de-trabalho-20102011.html>. Acesso em: 10 mar. 2011.

274 DIEESE. Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos. Relatório final do estudo Negociação Coletiva de Trabalho e Equidade de Gênero e Raça no Brasil. Nov. 2008. Disponível em: <http://www.dieese.org.br/projetos/OIT/NegociacaoColetivaTrabalho_relatorio Final.pdf>. Acesso em: 10 mar. 2011.

275 DIEESE. loc. cit. 276 DIEESE. loc. cit. 277 O Programa “Pró Equidade de Gênero” do Governo Federal consiste em desenvolver novas

concepções na gestão de pessoas e cultura organizacional para alcançar a equidade de gênero no mundo do trabalho. Presidência da República – Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres. Brasília. Disponível em: <http://200.130.7.5/spmu/docs/folheto_pro-equidade.pdf>. Acesso em: 10 mar. 2011.

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vinculada à Presidência da República, compromete-se a ampliar as políticas que

busquem promover oportunidades iguais e respeito às diferenças278.

Importante ressaltar, por oportuno, que a negociação coletiva pode ser

considerada, por ser mais específica e pela maior proximidade com as pessoas nas

relações de emprego, o meio atual mais eficaz de previsão, nos instrumentos

normativos, sejam convenções, sejam acordos coletivos de trabalho, de ações

afirmativas visando a inserção e manutenção no mercado de trabalho de indivíduos

pertencentes a grupos histórico e culturalmente discriminados, bem como de efetiva

concreção dos fins neles inseridos.

278 “CLÁUSULA QUADRAGÉSIMA SEXTA – EQUIDADE DE GÊNERO. O BANCO como aderente ao

programa Pró Equidade de Gênero da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres – SPM, vinculada à Presidência da República, compromete-se a ampliar as políticas que busquem promover oportunidades iguais e respeito às diferenças”. Acordo Coletivo de Trabalho 2010/2011. Disponível em: <http://www.bb.com.br/docs/pub/inst/dwn/ActContec20102011.pdf>. Acesso em: 10 mar. 2011.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

O princípio universal e fundamental da não discriminação está presente e

permeia o ordenamento jurídico brasileiro, por força da Constituição Federal, das

normas internacionais internalizadas pelo Brasil e por leis ordinárias.

O Brasil, ao incorporar no direito interno as convenções internacionais que

vedam a discriminação, como a Declaração Universal dos Direitos do Homem, a

Convenção Americana sobre Direitos Humanos, e as Convenções n. 100 e 111 da

OIT, entre outras, da mesma forma adotando a Recomendação n. 200 da OIT,

assumiu o compromisso internacional de combater e de eliminar todas as formas

injustificadas de discriminação.

Nesse aspecto, a Constituição Federal de 1988, considerada, a mais cidadã

das constituições brasileiras, preocupa-se em dar cumprimento a esse compromisso,

prevendo, em diversos dispositivos, regras específicas ao combate à discriminação,

inclusive nas relações de emprego, que é o objeto desse estudo.

A não discriminação constitui preceito de índole universal, assegurado como

direito humano decorrente do princípio da igualdade, devendo as manifestações

discriminatórias ser combatidas por meio de normas imperativas e por ações

afirmativas.

Contudo, apenas isso não é o suficiente. Na realidade, somente uma

mudança de postura e educação da sociedade, com a adoção de uma atitude

enérgica que busque meios para dificultar más condutas arraigadas na sociedade, é

que, de fato, podem alterar o quadro de desigualdades ainda existente.

Não é possível conceber que, no mundo atual, globalizado, tão moderno e

com tantos avanços tecnológicos, ainda existam pessoas que sofram perdas de

oportunidades, simplesmente pela cor da sua pele, por seu sexo, pela idade, pela

religião, pela origem, enfim, por qualquer motivo que a desqualifique injustamente.

Além dos princípios fundamentais da igualdade e da não discriminação

previstos na Constituição Federal, não menos importante é a garantia constitucional

ao trabalho a todo e qualquer cidadão brasileiro, indistintamente.

Relevante ter a consciência de que o texto constitucional em si já seria o

suficiente a garantir a proteção e inserção das minorias ao mercado de trabalho, até

porque a participação social, o trabalho, a igualdade, o bem-estar e o direito à vida

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digna, pertence à sociedade e ao Estado, sendo portanto dever de todos. Contudo,

toda vez que são necessárias leis e medidas para efetivar direitos constitucionais é

sinal que há o desrespeito e, por conseguinte, a sociedade se encontra um passo

atrás do espírito constitucional.

Assim, necessário se faz que a igualdade formal, constante das normas, seja

de fato aplicada, tornando-se a igualdade real tanto buscada pelos povos durante a

História e tão rebuscadamente garantida nos diplomas legais.

A igualdade referida, desejada nos dispositivos legais e normativo-sindicais,

estudados na presente pesquisa, é a igualdade de oportunidades e de chances. E,

sem dúvida, as ações afirmativas são um instrumento capaz de atingir a esse

objetivo.

É certo afirmar que há discriminação nas políticas de ações afirmativas,

contudo, faz-se necessário, e constituem uma arma eficaz, desde que observados

os requisitos à sua validade, contra as desigualdades que, notoriamente, ao longo

dos anos, afetam determinados grupos de pessoas.

Logo, a tutela específica da discriminação nas relações de emprego, seja no

acesso, seja na sua manutenção, revela ser medida efetiva e eficaz à transformação

social, único modo de se reverterem posições pessoais preconceituosas,

incentivando o relacionamento humano tolerante.

Nesse aspecto é que as ações afirmativas devem ser objetivas, identificando

o grupo de pessoas desfavorecido e seu âmbito de atuação; proporcionais,

concedendo vantagens ponderadas em face à desigualdade a ser corrigida;

adequadas, exprimindo sua racionalidade; com a finalidade de atingir a igualdade

social; e temporárias, exatamente pelo tempo necessário a propiciar a esse

determinado grupo de pessoas a igualdade em relação aos demais, e sem ser

excessivamente onerosas para a sociedade em geral.

Na presente pesquisa pôde-se observar que, mesmo sendo controvertidas e

duramente por alguns combatidas, nas oportunidades em que as ações afirmativas

efetivamente foram as postas em prática, surtiram efeitos surpreendentes até

mesmo àqueles que as criaram, como no caso do estudo River, descrito na obra de

Dworkin.

Em relação, especificamente, às manifestações normativas existentes no

ordenamento jurídico brasileiro em matéria de emprego, considerando os preceitos

legais, o Estatuto do Idoso, a “Lei de Cotas”, o Contrato de Aprendizagem e,

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sobretudo, instrumentos normativo-sindicais, e respondendo ao problema aqui

proposto, pode-se afirmar que, embora timidamente, as escassas ações afirmativas

têm se mostrado efetivas e vêm surtindo efeito no mundo dos fatos, portanto,

possuem eficácia quando se trata de acesso e manutenção no emprego do

trabalhador.

Contudo, não basta o mero acesso ao emprego por parte do indivíduo que,

por algum determinado estigma, é discriminado. Há que haver trabalho e inclusão

social, que começa no seu local de trabalho, o que implica uma mudança atitudinal

de todos, sobretudo do empregador e dos demais empregados, sejam eles

integrantes de minorias ou não.

Portanto, as ações afirmativas visando o trabalho digno, deverão conter

fórmulas de incentivo ao acesso no mercado de trabalho mas, sobretudo, condições

de permanência neles.

É certo que as medidas de ações afirmativas não têm efeito imediato, já que

lutam contra discriminações arraigadas por muitos séculos na sociedade, sendo

necessário o amadurecimento das ações e a educação da sociedade, a adaptação

na cultura das pessoas, até que se chegue ao ponto em que essas políticas serão

desnecessárias, tendo em vista a mudança natural de postura.

Nesse caminhar, cabe observar que a negociação coletiva, através das

convenções e acordos coletivos de trabalho, configura o mais adequado e eficaz

instrumento à previsão e concretude das ações afirmativas ao acesso e manutenção

do emprego digno ao trabalhador, que merece estimulada e perseguida pela

sociedade, com fulcro nos diplomas internacionais e nas normas constitucionais e

ordinárias que enfatizam a igualdade e a não discriminação.

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ANEXOS

ANEXO A – Constituição da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e seu Anexo (Declaração de Filadé lfia) ...........139

ANEXO B – Declaração da OIT sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho ...............................................154

ANEXO C – Declaração da OIT sobre Justiça Social para uma Glo balização Justa 158 ...........................................................................................158

ANEXO D – Convenção 100 – Sobre a Igualdade de Remuneração de Homens e Mulheres por Trabalho de Igual Valor .....................168

ANEXO E – Convenção 111 – Discriminação em Matéria de Emprego e Ocupação .........................................................................................171

ANEXO F – Recomendação 200 .........................................................................174

ANEXO G – Instrumentos Coletivos analisados no presente traba lho prevendo garantias específicas ao portador do vírus HIV ou

contendo cláusulas de Ações Afirmativas ao acesso e manutenção do emprego ................................................................185

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ANEXO A

CONSTITUIÇÃO DA ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABAL HO (OIT) E

SEU ANEXO (Declaração de Filadélfia)

O texto em vigor da Constituição da Organização Internacional do Trabalho foi aprovado na 29ª reunião da Conferência Internacional do Trabalho (Montreal -- 1946) e tem, como anexo, a Declaração referente aos fins e objetivos da Organização, que fora aprovada na 26ª reunião da Conferência (Filadélfia -- 1944). A Constituição, assim revista, substituiu a adotada em 1919 e que fora emendada em 1922, 1934 e 1945. Sua vigência teve início em 20 de abril de 1948. O Brasil ratificou o instrumento de emenda da Constituição da OIT em 13 de abril de 1948, conforme Decreto de Promulgação n. 25.696, de 20 de outubro de 1948. O texto constitucional que reproduzimos nesse estudo corresponde à revisão de 1946, com as emendas de 1953, 1962 e 1972, todas em vigor no âmbito internacional e ratificadas pelo Brasil. Em 1964 foi aprovada uma emenda ao art. 35, que, todavia, ainda não obteve o número de ratificações necessário para gerar sua vigência. E, em 1986, a 72ª reunião da Conferência, realizada em Genebra, aprovou ampla revisão da Constituição (arts. 1, 3, 6, 7, 8, 13, 16, 17, 19, 21 e 36), que também não entrou em vigor, pois o instrumento de emenda ainda não foi ratificado por dois terços dos Estados-Membros da OIT, incluídos, entre estes, cinco dos dez países de maior importância industrial (o Brasil é um deles), tal como exige o art. 36 do texto vigente. INSTRUMENTO PARA A EMENDA DA CONSTITUIÇÃO DA ORGANI ZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO "A Conferência Geral da Organização Internacional do Trabalho, Convocada pelo Conselho de Administração da Repartição Internacional do Trabalho e reunida em Montreal a 19 de setembro de 1946, em sua vigésima nona sessão, Após haver decidido adotar determinadas propostas para a emenda da Constituição da Organização Internacional do Trabalho, questão compreendida no segundo item da ordem do dia da sessão, Adota, aos nove de outubro de mil novecentos e quarenta e seis, o instrumento seguinte para a emenda da Constituição da Organização Internacional do Trabalho, instrumento que será denominado: Instrumento para a Emenda da Constituição da Organização Internacional do Trabalho, 1946. Artigo 1º A partir da data da entrada em vigor do presente instrumento, a Constituição da Organização Internacional do Trabalho, cujo texto se encontra reproduzido na primeira coluna do anexo ao citado instrumento, vigorará na forma emendada que consta da segunda coluna. Artigo 2º Dois exemplares autênticos do presente instrumento serão assinados pelo Presidente da Conferência e pelo Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho. Um destes exemplares será depositado no arquivo da Repartição Internacional do Trabalho e o outro

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será entregue ao Secretário-Geral das Nações Unidas para fins de registro, de acordo com o art. 102 da Carta das Nações Unidas. O Diretor-Geral transmitirá uma cópia, devidamente autenticada, desse instrumento a cada um dos Estados-Membros da Organização Internacional do Trabalho. Artigo 3º 1. As ratificações ou aceitações formais do presente instrumento serão comunicadas ao Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho, que dará das mesmas conhecimento aos Estados-Membros da Organização. 2. O presente instrumento entrará em vigor nas condições previstas pelo art. 36 da Constituição da Organização Internacional do Trabalho. 3. Assim que o presente instrumento entrar em vigor, tal fato será comunicado, pelo Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho, a todos os Estados-Membros da referida Organização, ao Secretário-Geral das Nações Unidas e a todos os Estados signatários da Carta das Nações Unidas." CONSTITUIÇÃO DA ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABAL HO Preâmbulo "Considerando que a paz para ser universal e duradoura deve assentar sobre a justiça social; Considerando que existem condições de trabalho que implicam, para grande número de indivíduos, miséria e privações, e que o descontentamento que daí decorre põe em perigo a paz e a harmonia universais, e considerando que é urgente melhorar essas condições no que se refere, por exemplo, à regulamentação das horas de trabalho, à fixação de uma duração máxima do dia e da semana de trabalho, ao recrutamento da mão-de-obra, à luta contra o desemprego, à garantia de um salário que assegure condições de existência convenientes, à proteção dos trabalhadores contra as moléstias graves ou profissionais e os acidentes do trabalho, à proteção das crianças, dos adolescentes e das mulheres, às pensões de velhice e de invalidez, à defesa dos interesses dos trabalhadores empregados no estrangeiro, à afirmação do princípio "para igual trabalho, mesmo salário", à afirmação do princípio de liberdade sindical, à organização do ensino profissional e técnico, e outras medidas análogas; Considerando que a não adoção por qualquer nação de um regime de trabalho realmente humano cria obstáculos aos esforços das outras nações desejosas de melhorar a sorte dos trabalhadores nos seus próprios territórios. AS ALTAS PARTES CONTRATANTES, movidas por sentimentos de justiça e humanidade e pelo desejo de assegurar uma paz mundial duradoura, visando os fins enunciados neste preâmbulo, aprovam a presente Constituição da Organização Internacional do Trabalho: CAPÍTULO I ORGANIZAÇÃO Artigo 1 1. É criada uma Organização permanente, encarregada de promover a realização do programa exposto no preâmbulo da presente Constituição e na Declaração referente aos fins e objetivos da Organização Internacional do Trabalho, adotada em Filadélfia a 10 de maio de 1944 e cujo texto figura em anexo à presente Constituição.

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2. Serão Membros da Organização Internacional do Trabalho os Estados que já o eram a 1º de novembro de 1945, assim como quaisquer outros que o venham a ser, de acordo com os dispositivos dos parágrafos 3º e 4º do presente artigo. 3. Todo Estado-Membro das Nações Unidas, desde a criação desta instituição e todo Estado que for a ela admitido, na qualidade de Membro, de acordo com as disposições da Carta, por decisão da Assembléia Geral, podem tornar-se Membros da Organização Internacional do Trabalho, comunicando ao Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho que aceitou, integralmente as obrigações decorrentes da Constituição da Organização Internacional do Trabalho. 4. A Conferência Geral da Organização Internacional do Trabalho tem igualmente poderes para conferir a qualidade de Membro da Organização, por maioria de dois terços do conjunto dos votos presentes, se a mesma maioria prevalecer entre os votos dos delegados governamentais. A admissão do novo Estado-Membro tornar-se-á efetiva quando ele houver comunicado ao Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho que aceita integralmente as obrigações decorrentes da Constituição da Organização. 5. Nenhum Estado-Membro da Organização Internacional do Trabalho poderá dela retirar-se sem aviso prévio ao Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho. A retirada tornar-se-á efetiva dois anos depois que este aviso prévio houver sido recebido pelo Diretor-Geral, sob condição de que o Estado-Membro haja, nesta data, preenchido todas as obrigações financeiras que decorrem da qualidade de Membro. Esta retirada não afetará, para o Estado-Membro que houver ratificado uma convenção, a validez das obrigações desta decorrentes, ou a ela relativas, durante o pedido previsto pela mesma convenção. 6. Quando um Estado houver deixado de ser Membro da Organização, sua readmissão nesta qualidade, far-se-á de acordo com os dispositivos dos parágrafos 3º e 4º do presente artigo. Artigo 2 A Organização permanente compreenderá: a) uma Conferência geral constituída pelos Representantes dos Estados-Membros; b) um Conselho de Administração composto como indicado no art. 7º; c) uma Repartição Internacional do Trabalho sob a direção de um Conselho de Administração. Artigo 3 1. A Conferência geral dos representantes dos Estados-Membros realizará sessões sempre que for necessário, e, pelo menos, uma vez por ano. Será composta de quatro representantes de cada um dos Membros, dos quais dois serão Delegados do Governo e os outros dois representarão, respectivamente, os empregados e empregadores. 2. Cada Delegado poderá ser acompanhado por consultores técnicos, cujo número será de dois no máximo , para cada uma das matérias inscritas na ordem do dia da sessão. Quando a Conferência discutir questões que interessem particularmente às mulheres, uma ao menos das pessoas designadas como consultores técnicos deverá ser mulher. 3. Todo Estado-Membro responsável pelas relações internacionais de territórios não metropolitanos poderá designar, a mais, como consultores técnicos suplementares de cada um de seus delegados: a) pessoas, por ele escolhidas, como representantes do território, em relação às matérias que entram na competência das autoridades do mesmo território; b) pessoas por ele escolhidas como assistentes de seus delegados em relação às questões de interesse dos territórios que não se governam a si mesmos. 4. Tratando-se de um território colocado sob a autoridade conjunta de dois ou mais Estados-Membros, poder-se-á nomear assistentes para os delegados dos referidos Membros. 5. Os Estados-Membros comprometem-se a designar os delegados e consultores técnicos não governamentais de acordo com as organizações profissionais mais representativas, tanto dos empregadores como dos empregados, se essas organizações existirem.

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6. Os consultores técnicos não serão autorizados a tomar a palavra senão por pedido feito pelo delegado a que são adidos e com a autorização especial do Presidente da Conferência. Não poderão votar. 7. Qualquer delegado poderá, por nota escrita dirigida ao Presidente, designar um de seus consultores técnicos como seu substituto, e este, nesta qualidade, poderá tomar parte nas deliberações e votar. 8. Os nomes dos delegados e de seus consultores técnicos serão comunicados à Repartição Internacional do Trabalho pelo Governo de cada Estado-Membro. 9. Os poderes dos delegados e de seus consultores técnicos serão submetidos à verificação da Conferência, que poderá, por dois terços, ou mais, dos votos presentes, recusar admitir qualquer delegado ou consultor técnico que julgue não ter sido designado conforme os termos deste artigo. Artigo 4 1. Cada delegado terá o direito de votar individualmente em todas as questões submetidas às deliberações da Conferência. 2. No caso em que um dos Estados-Membros não haja designado um dos delegados não governamentais a que tiver direito, cabe ao outro delegado não governamental o direito de tomar parte nas discussões da Conferência, mas não o de votar. 3. Caso a Conferência, em virtude dos poderes que lhe confere o art. 3º, recuse admitir um dos delegados de um dos Estados-Membros, as estipulações deste artigo serão aplicadas como se o dito delegado não tivesse sido designado. Artigo 5 As sessões da Conferência realizar-se-ão no lugar determinado pelo Conselho de Administração, respeitadas quaisquer decisões que possam haver sido tomadas pela Conferência no decurso de uma sessão anterior. Artigo 6 Qualquer mudança da sede da Repartição Internacional do Trabalho será decidida pela Conferência por uma maioria de dois terços dos sufrágios dos delegados presentes. Artigo 7 1. O Conselho de Administração será composto de 56 pessoas: 28 representantes dos Governos, 4 representantes dos empregadores e 14 representantes dos empregados. 2. Dos vinte e oito representantes dos Governos, dez serão nomeados pelos Estados-Membros de maior importância industrial e dezoito serão nomeados pelos Estados-Membros designados para esse fim pelos delegados governamentais da Conferência, excluídos os delegados dos dez Membros acima mencionados. 3. O Conselho de Administração indicará, sempre que julgar oportuno, quais os Estados-Membros de maior importância industrial, e, antes de tal indicação, estabelecerá regras para garantir o exame, por uma comissão imparcial, de todas as questões relativas à referida indicação. Qualquer apelo formulado por um Estado-Membro contra a resolução do Conselho de Administração quanto aos Membros de maior importância industrial, será julgado pela Conferência, sem contudo suspender os efeitos desta resolução, enquanto a Conferência não se houver pronunciado. 4. Os representantes dos empregadores e os dos empregados serão, respectivamente, eleitos pelos delegados dos empregadores e pelos delegados dos trabalhadores à Conferência. 5. O Conselho será renovado de três em três anos. Se, por qualquer motivo, as eleições para o Conselho de Administração não se realizarem ao expirar este prazo, será mantido o mesmo Conselho de Administração até que se realizem tais eleições. 6. O processo de preencher as vagas, de designar os suplentes, e outras questões da mesma natureza, poderão ser resolvidas pelo Conselho de Administração, sob ressalva da aprovação da Conferência.

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7. O Conselho de Administração elegerá entre os seus membros um presidente e dois vice-presidentes. Dentre os três eleitos, um representará um Governo e os dois outros, empregadores e empregados, respectivamente. 8. O Conselho de Administração estabelecerá o seu próprio regulamento e reunir-se-á nas épocas que determinar. Deverá realizar uma sessão especial, sempre que dezesseis dos seus Membros, pelo menos, formularem pedido por escrito para esse fim. Artigo 8 1. A Repartição Internacional do Trabalho terá um Diretor-Geral, designado pelo Conselho de Administração, responsável, perante este, pelo bom funcionamento da Repartição e pela realização de todos os trabalhos que lhe forem confiados. 2. O Diretor-Geral ou o seu suplente assistirão a todas as sessões do Conselho de Administração. Artigo 9 1. O pessoal da Repartição Internacional do Trabalho será escolhido pelo Diretor-Geral de acordo com as regras aprovadas pelo Conselho de Administração. 2. A escolha deverá ser feita, pelo Diretor-Geral, sempre que possível, entre pessoas de nacionalidades diversas, visando a maior eficiência no trabalho da Repartição. 3. Dentre essas pessoas deverá existir um certo número de mulheres. 4. O Diretor-Geral e o pessoal, no exercício de suas funções, não solicitarão nem aceitarão instruções de qualquer Governo ou autoridade estranha à Organização. Absterse-ão de qualquer ato incompatível com sua situação de funcionários internacionais, responsáveis unicamente perante a Organização. 5. Os Estados-Membros da Organização comprometem-se a respeitar o caráter exclusivamente internacional das funções do Diretor-Geral e do pessoal e a não procurar influenciá-los quanto ao modo de exercê-las. Artigo 10 1. A Repartição Internacional do Trabalho terá por funções a centralização e a distribuição de todas as informações referentes à regulamentação internacional da condição dos trabalhadores e do regime do trabalho e, em particular, o estudo das questões que lhe compete submeter às discussões da Conferência para conclusão das convenções internacionais assim como a realização de todos os inquéritos especiais prescritos pela Conferência, ou pelo Conselho de Administração. 2. A Repartição, de acordo com as diretrizes que possa receber do Conselho de Administração: a) preparará a documentação sobre os diversos assuntos inscritos na ordem do dia das sessões da Conferência; b) fornecerá, na medida de seus recursos, aos Governos que o pedirem, todo o auxílio adequado à elaboração de leis, consoante as decisões da Conferência, e, também, ao aperfeiçoamento da prática administrativa e dos sistemas de inspeção; c) cumprirá, de acordo com o prescrito na presente Constituição, os deveres que lhe incumbem no que diz respeito à fiel observância das convenções; d) redigirá e trará a lume, nas línguas que o Conselho de Administração julgar conveniente, publicações de interesse internacional sobre assuntos relativos à indústria e ao trabalho. 3. De um modo geral, terá quaisquer outros poderes e funções que a Conferência ou o Conselho de Administração julgarem acertado atribuir-lhe. Artigo 11 Os Ministérios dos Estados-Membros, encarregados de questões relativas aos trabalhadores, poderão comunicar-se com o Diretor-Geral por intermédio do representante do seu Governo no Conselho de Administração da Repartição Internacional do Trabalho, ou, na falta desse representante, por intermédio de qualquer outro funcionário devidamente qualificado e designado para esse fim pelo Governo interessado.

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Artigo 12 1. A Organização Internacional do Trabalho cooperará, dentro da presente Constituição, com qualquer organização internacional de caráter geral encarregada de coordenar as atividades de organizações de direito internacional público de funções especializadas, e também, com aquelas dentre estas últimas organizações, cujas funções se relacionem com as suas próprias. 2. A Organização Internacional do Trabalho poderá tomar as medidas que se impuserem para que os representantes das organizações de direito internacional público participem, sem direito de voto, de suas próprias deliberações. 3. A Organização Internacional do Trabalho poderá tomar todas as medidas necessárias para consultar, a seu alvitre, organizações Internacionais não governamentais reconhecidas, inclusive organizações internacionais de empregadores, empregados, agricultores e cooperativistas. Artigo 13 1. A Organização Internacional do Trabalho poderá concluir com as Nações Unidas quaisquer acordos financeiros e orçamentários que pareçam convenientes. 2. Antes da conclusão de tais acordos, ou, se, em dado momento, não os houver em vigor: a) cada Membro pagará as despesas de viagem e de estada dos seus delegados, consultores técnicos ou representantes, que tomarem parte, seja nas sessões da Conferência, seja nas do Conselho de Administração; b) quaisquer outras despesas da Repartição Internacional do Trabalho, ou provenientes das sessões da Conferência ou do Conselho de Administração, serão debitadas pelo Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho no orçamento da Organização Internacional do Trabalho; c) as regras relativas à aprovação do orçamento da Organização Internacional do Trabalho, à distribuição das contribuições entre os Estados-Membros, assim como à arrecadação destas, serão estabelecidas pela Conferência por uma maioria de dois terços dos votos presentes. Tais regras estipularão que o orçamento e os acordos relativos à distribuição das despesas entre os Membros da Organização deverão ser aprovados por uma comissão constituída por representantes governamentais. 3. As despesas da Organização Internacional do Trabalho serão custeadas pelos Estados-Membros, segundo os acordos vigentes em virtude do parágrafo 1 ou do parágrafo 2 letra c do presente artigo. 4. Qualquer Estado-Membro da Organização, cuja dívida em relação a esta seja, em qualquer ocasião, igual ou superior ao total da contribuição que deveria ter pago nos dois anos completos anteriores, não poderá tomar parte nas votações da Conferência, do Conselho de Administração ou de qualquer comissão, ou nas eleições para o Conselho de Administração. A Conferência pode, entretanto, por maioria dos dois terços dos votos presentes, autorizar o Estado em questão a tomar parte na votação, ao verificar que o atraso é devido a motivo de força maior. 5. O Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho será responsável perante o Conselho de Administração pelo emprego dos fundos da Organização Internacional do Trabalho. CAPÍTULO II FUNCIONAMENTO Artigo 14 1. O Conselho de Administração elaborará a ordem do dia das sessões da Conferência, depois de ter examinado todas as propostas feitas pelos Governos de quaisquer dos Membros, por qualquer organização representativa indicada no artigo 3º, ou por qualquer organização de direito internacional público, sobre as matérias a incluir nessa ordem do dia.

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2. O Conselho de Administração elaborará diretrizes para que a adoção pela Conferência de uma convenção ou de uma recomendação seja, por meio de uma conferência técnica preparatória ou por qualquer outro meio, precedida de um aprofundado preparo técnico e de uma consulta adequada dos Membros principalmente interessados. Artigo 15 1. O Diretor-Geral exercerá as funções de Secretário-Geral da Conferência e deverá fazer com que cada Estado-Membro receba a ordem do dia, quatro meses antes da abertura da sessão. Deverá, também, por intermédio dos referidos Estados-Membros, enviá-la, com essa antecedência, aos delegados não governamentais já nomeados e, ainda, àqueles que o forem dentro desse prazo. 2. Os relatórios sobre cada assunto inscrito na ordem do dia deverão ser comunicados aos Membros de modo a dar-lhes tempo de estudá-los convenientemente, antes da reunião da Conferência. O Conselho de Administração formulará diretrizes para execução deste dispositivo. Artigo 16 1. Cada Estado-Membro terá o direito de impugnar a inscrição, na ordem do dia da sessão, de um, ou diversos dos assuntos previstos. Os motivos justificativos dessa oposição deverão ser expostos numa memória dirigida ao Diretor-Geral, que deverá comunicá-la aos Estados-Membros da Organização. 2. Os assuntos impugnados ficarão, não obstante, incluídos na ordem do dia, se assim a Conferência o decidir por dois terços dos votos presentes. 3. Toda questão, que a Conferência decidir, pelos mesmos dois terços, seja examinada (diversamente do previsto no parágrafo precedente), será incluída na ordem do dia da sessão seguinte. Artigo 17 1. A Conferência elegerá um presidente e três vice-presidentes. Os três vice-presidentes serão, respectivamente, um delegado governamental, um delegado dos empregadores e um delegado dos trabalhadores. A Conferência formulará as regras do seu funcionamento; poderá instituir comissões encarregadas de dar parecer sobre todas as questões que ela julgar conveniente sejam estudadas. 2. As decisões serão tomadas por simples maioria dos votos presentes, exceto nos casos em que outra fórmula não for prescrita pela presente Constituição, por qualquer convenção ou instrumento que confira poderes à Conferência, ou, ainda, pelos acordos financeiros e orçamentários adotados em virtude do artigo 13. 3. Nenhuma votação será válida, se o número dos votos reunidos for inferior à metade do dos delegados presentes à sessão. Artigo 18 A Conferência poderá adir às suas comissões consultores técnicos, sem direito de voto. Artigo 19 1. Se a Conferência pronunciar-se pela aceitação de propostas relativas a um assunto na sua ordem do dia, deverá decidir se essas propostas tomarão a forma: a) de 11 uma convenção internacional; b) de uma recomendação, quando o assunto tratado, ou um de seus aspectos não permitir a adoção imediata de uma convenção. 2. Em ambos os casos, para que uma convenção ou uma recomendação seja aceita em votação final pela Conferência, são necessários dois terços dos votos presentes. 3. A Conferência deverá, ao elaborar uma convenção ou uma recomendação de aplicação geral, levar em conta os países que se distinguem pelo clima, pelo desenvolvimento incompleto da organização industrial ou por outras circunstâncias especiais relativas à indústria, e deverá sugerir as modificações que correspondem, a seu ver, às condições particulares desses países.

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4. Dois exemplares da convenção ou da recomendação serão assinados pelo Presidente da Conferência e pelo Diretor-Geral. Um destes exemplares será depositado nos arquivos da Repartição Internacional do Trabalho e o outro entregue ao Secretário-Geral das Nações Unidas. O Diretor-Geral remeterá a cada um dos Estados-Membros uma cópia autêntica da convenção ou da recomendação. 5. Tratando-se de uma convenção: a) será dado a todos os Estados-Membros conhecimento da convenção para fins de ratificação; b) cada um dos Estados-Membros compromete-se a submeter, dentro do prazo de um ano, a partir do encerramento da sessão da Conferência (ou, quando, em razão de circunstâncias excepcionais, tal não for possível, logo que o seja, sem nunca exceder o prazo de 18 meses após o referido encerramento), a convenção à autoridade ou autoridades em cuja competência entre a matéria, a fim de que estas a transformem em lei ou tomem medidas de outra natureza; c) os Estados-Membros darão conhecimento ao Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho das medidas tomadas, em virtude do presente artigo, para submeter a convenção à autoridade ou autoridades competentes, comunicando-lhe, também, todas as informações sobre as mesmas autoridades e sobre as decisões que estas houverem tomado; d) o Estado-Membro que tiver obtido o consentimento da autoridade, ou autoridades competentes, comunicará ao Diretor-Geral a ratificação formal da convenção e tomará as medidas necessárias para efetivar as disposições da dita convenção; e) quando a autoridade competente não der seu assentimento a uma convenção, nenhuma obrigação terá o Estado-Membro a não ser a de informar o Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho -- nas épocas que o Conselho de Administração julgar convenientes -- sobre a sua legislação e prática observada relativamente ao assunto de que trata a convenção. Deverá, também, precisar nestas informações até que ponto aplicou, ou pretende aplicar, dispositivos da convenção, por intermédio de leis, por meios administrativos, por força de contratos coletivos, ou, ainda, por qualquer outro processo, expondo, outrossim, as dificuldades que impedem ou retardam a ratificação da convenção. 6. Em se tratando de uma recomendação: a) será dado conhecimento da recomendação a todos os Estados-Membros, a fim de que estes a considerem, atendendo à sua efetivação por meio de lei nacional ou por outra qualquer forma; b) cada um dos Estados-Membros compromete-se a submeter, dentro do prazo de um ano a partir do encerramento da sessão da Conferência (ou, quando, em razão de circunstâncias excepcionais, tal não for possível, logo que o seja, sem nunca exceder o prazo de 18 meses após o referido encerramento), a recomendação à autoridade ou autoridades em cuja competência entre a matéria, a fim de que estas a transformem em lei ou tomem medidas de outra natureza; c) os Estados-Membros darão conhecimento ao Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho das medidas tomadas, em virtude do presente artigo, para submeter a recomendação à autoridade ou autoridades competentes, comunicando-lhe, também as decisões que estas houverem tomado; d) além da obrigação de submeter a recomendação à autoridade ou autoridades competentes, o Membro só terá a de informar o Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho -- nas épocas que o Conselho de Administração julgar convenientes – sobre a sua legislação e prática observada relativamente ao assunto de que trata a recomendação. Deverá também precisar nestas informações até que ponto aplicou ou pretende aplicar dispositivos da recomendação, e indicar as modificações destes dispositivos que sejam ou venham a ser necessárias para adotá-los ou aplicá-los. 7. No caso de um Estado federado serão aplicados os dispositivos seguintes: a) as obrigações do Estado federado serão as mesmas que as dos Membros que o não forem, no tocante às convenções e às recomendações para as quais o Governo Federal considere que, de acordo com o seu sistema constitucional, é adequada uma ação federal;

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b) no que disser respeito às convenções e recomendações para as quais o Governo Federal considere que, de acordo com o seu sistema constitucional, uma ação da parte dos Estados, das províncias ou dos cantões que o compõem, é – relativamente a alguns ou a todos os pontos -- mais adequada do que uma ação federal, o referido Governo deverá: I) concluir, segundo a sua própria constituição e as dos Estados componentes, províncias ou cantões interessados, acordos efetivos para que tais convenções ou recomendações sejam, no prazo máximo de 18 meses após o encerramento da sessão da Conferência, submetidas às devidas autoridades federais ou às dos Estados competentes, províncias ou cantões, para fins de uma ação legislativa ou outra de qualquer natureza; II) tomar as necessárias medidas -- sob reserva do consentimento dos Governos dos Estados componentes, províncias ou cantões interessados -- para que, periodicamente, as autoridades federais, de um lado e de outro, a dos Estados componentes, províncias ou cantões, se consultem reciprocamente, a fim de empreenderem uma ação coordenada no sentido de tornarem efetivos, em todo o país, os dispositivos destas convenções e recomendações; III) informar o Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho das medidas tomadas, em virtude do presente artigo, para submeter tais convenções e recomendações às devidas autoridades federais, às dos Estados componentes, províncias ou cantões, comunicando-lhe todas as informações sobre as autoridades consideradas como legítimas e sobre as decisões que estas houverem tomado; IV) relativamente a uma convenção não ratificada, informar o Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho, nas épocas que o Conselho de Administração julgar convenientes, sobre a legislação da federação, dos Estados constituintes, das províncias ou dos cantões, e sobre a prática, por umas e outros, observada, relativamente ao assunto de que trata essa convenção. Deverá, também, precisar até que ponto deu-se ou se pretende dar aplicação a dispositivos da mesma convenção, por intermédio de leis, por meios administrativos, por força de contratos coletivos, ou, ainda por qualquer outro processo; V) relativamente a uma recomendação, informar o Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho, nas épocas que o Conselho de Administração julgar convenientes, sobre a legislação da federação, dos Estados constituintes, das províncias ou dos cantões, e sobre a prática, por umas e outros, observada relativamente ao assunto de que trata essa recomendação. Deverá, também, precisar, nestas informações, até que ponto deu-se ou se pretende dar aplicação a dispositivos da recomendação, indicando as modificações destes dispositivos que sejam ou venham a ser necessárias para adotá-los ou aplicá-los. 8. Em caso algum, a adoção, pela Conferência, de uma convenção ou recomendação, ou a ratificação, por um Estado-Membro, de uma convenção, deverão ser consideradas como afetando qualquer lei, sentença, costumes ou acordos que assegurem aos trabalhadores interessados condições mais favoráveis que as previstas pela convenção ou recomendação. Artigo 20 Qualquer convenção assim ratificada será comunicada pelo Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho ao Secretário-Geral das Nações Unidas, para fins de registro, de acordo com o art. 102 da Carta das Nações Unidas, obrigando apenas os Estados-Membros que a tiverem ratificado. Artigo 21 1. Todo projeto que, no escrutínio final, não obtiver dois terços dos votos presentes, poderá ser objeto de uma convenção particular entre os Membros da Organização que o desejarem. 2. Toda convenção, assim concluída, será comunicada pelos Governos interessados ao Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho e ao Secretário-Geral das Nações Unidas para fins de registro, de acordo com os termos do art. 102 da Carta das Nações Unidas.

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Artigo 22 Os Estados-Membros comprometem-se a apresentar à Repartição Internacional do Trabalho um relatório anual sobre as medidas por eles tomadas para execução das convenções a que aderiram. Esses relatórios serão redigidos na forma indicada pelo Conselho de Administração e deverão conter as informações pedidas por este Conselho. Artigo 23 1. O Diretor-Geral apresentará à Conferência, na sessão seguinte, um resumo das informações e dos relatórios que, de acordo com os artigos 19 e 22, lhe houverem sido transmitidos. 2. Os Estados-Membros remeterão às organizações representativas, reconhecidas como tais, para os fins mencionados no art. 3º, cópia das informações e dos relatórios transmitidos ao Diretor-Geral, de acordo com os arts. 19 e 22. Artigo 24 Toda reclamação, dirigida à Repartição Internacional do Trabalho, por uma organização profissional de empregados ou de empregadores, e segundo a qual um dos Estados-Membros não tenha assegurado satisfatoriamente a execução de uma convenção a que o dito Estado haja aderido, poderá ser transmitida pelo Conselho de Administração ao Governo em questão e este poderá ser convidado a fazer, sobre a matéria, a declaração que julgar conveniente. Artigo 25 Se nenhuma declaração for enviada pelo Governo em questão, num prazo razoável , ou se a declaração recebida não parecer satisfatória ao Conselho de Administração, este último terá o direito de tornar pública a referida reclamação e, segundo o caso, a resposta dada. Artigo 26 1. Cada Estado-Membro poderá enviar uma queixa à Repartição Internacional do Trabalho contra outro Estado-Membro que, na sua opinião, não houver assegurado satisfatoriamente a execução de uma convenção que um e outro tiverem ratificado em virtude dos artigos precedentes. 2. O Conselho de Administração poderá, se achar conveniente, antes de enviar a questão a uma comissão de inquérito, segundo o processo indicado adiante, pôr-se em comunicação com o Governo visado pela queixa, do modo indicado no art. 24. 3. Se o Conselho de Administração não julgar necessário comunicar a queixa ao Governo em questão, ou, se essa comunicação, havendo sido feita, nenhuma resposta que satisfaça o referido Conselho, tiver sido recebida dentro de um prazo razoável, o Conselho poderá constituir uma comissão de inquérito que terá a missão de estudar a reclamação e apresentar parecer a respeito. 4. O Conselho também poderá tomar as medidas supramencionadas, quer ex officio, quer baseado na queixa de um delegado à Conferência. 5. Quando uma questão suscitada nos termos dos arts. 25 ou 26, for levada ao Conselho de Administração, o Governo em causa, se não tiver representante junto àquele, terá o direito de designar um delegado para tomar parte nas deliberações do mesmo, relativas ao caso. A data de tais deliberações será comunicada em tempo oportuno ao Governo em questão. Artigo 27 No caso de ser enviada uma queixa em virtude do art. 26, a uma Comissão de Inquérito, todo Estado-Membro, nela diretamente interessado ou não, comprometer-se-á a pôr à disposição da Comissão todas as informações que se acharem em seu poder relativas ao objeto da queixa.

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Artigo 28 A Comissão de Inquérito, após exame aprofundado da queixa, redigirá um relatório do qual constarão não só suas verificações sobre todos os pontos que permitam bem medir o valor da contestação, como, também, as medidas que recomenda para dar satisfação ao Governo queixoso e os prazos, dentro dos quais, as mesmas medidas devam ser postas em execução. Artigo 29 1. O Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho transmitirá o relatório da Comissão de Inquérito ao Conselho de Administração e a cada Governo interessado no litígio, assegurando a sua publicação. 2. Cada Governo interessado deverá comunicar ao Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho, dentro do prazo de três meses, se aceita ou não as recomendações contidas no relatório da Comissão, e, em caso contrário , se deseja que a divergência seja submetida à Corte Internacional de Justiça. Artigo 30 Caso um dos Estados-Membros não tome, relativamente a uma convenção ou a uma recomendação, as medidas prescritas nos parágrafos 5 b, 6 b, ou 7 b, I do art. 19, qualquer outro Estado-Membro terá o direito de levar a questão ao Conselho de Administração. O Conselho de Administração submeterá o assunto à Conferência, na hipótese de julgar que o Membro não tomou as medidas prescritas. Artigo 31 Será inapelável a decisão da Corte Internacional de Justiça sobre uma queixa ou questão que lhe tenha sido submetida, conforme o art. 29. Artigo 32 As conclusões ou recomendações eventuais da Comissão de Inquérito poderão ser confirmadas, alteradas ou anuladas pela Corte Internacional de Justiça. Artigo 33 Se um Estado-Membro não se conformar, no prazo prescrito, com as recomendações eventualmente contidas no relatório da Comissão de Inquérito, ou na decisão da Corte Internacional de Justiça, o Conselho de Administração poderá recomendar à Conferência a adoção de qualquer medida que lhe pareça conveniente para assegurar a execução das mesmas recomendações. Artigo 34 O Governo culpado poderá, em qualquer ocasião, informar o Conselho de Administração que tomou as medidas necessárias a fim de se conformar com as recomendações da Comissão de Inquérito ou com as da decisão da Corte Internacional de Justiça. Poderá, também, pedir ao Conselho que nomeie uma Comissão de Inquérito para verificar suas afirmações. Neste caso, aplicar-se-ão as estipulações dos arts. 27, 28, 29, 31 e 32, e, se o relatório da Comissão de Inquérito ou a decisão da Corte Internacional de Justiça, for favorável ao referido Governo, o Conselho de Administração deverá imediatamente recomendar que as medidas tomadas de acordo com o art. 33 sejam revogadas. CAPÍTULO III DISPOSIÇÕES GERAIS Artigo 35 1. Excetuados os casos em que os assuntos tratados na convenção não se enquadrem na competência das autoridades do território e aqueles em que a convenção for aplicável,

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dadas as condições locais, os Estados-Membros comprometem-se a aplicar as convenções que -- de acordo com os dispositivos da presente Constituição -- houverem ratificado aos territórios não metropolitanos, por cujas relações internacionais forem responsáveis, inclusive aos territórios sob tutela cuja administração lhes competir, admitindo-se reserva quanto às modificações necessárias para se adaptarem tais convenções às condições locais. 2. Todo Estado-Membro deve, no mais breve prazo, após haver ratificado uma convenção, declarar ao Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho até que ponto se compromete a aplicá-la aos territórios não visados pelos parágrafos 4 e 5 abaixo, e fornecer-lhe, também, todas as informações que possam ser prescritas pela mesma convenção. 3. Todo Estado-Membro, que tiver formulado uma declaração como previsto no parágrafo precedente, poderá, de acordo com os artigos da convenção, fazer, periodicamente, nova declaração que modifique os termos mencionados no parágrafo precedente. 4. Quando os assuntos tratados na convenção forem da competência das autoridades de um território não metropolitano, o Estado-Membro responsável pelas relações internacionais deste território deverá, no mais breve prazo possível, comunicar a convenção ao Governo do mesmo, para que este Governo promulgue leis ou tome outras medidas. Em seguida poderá o Estado-Membro, de acordo com o mencionado Governo, declarar ao Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho que aceita as obrigações da convenção em nome do território. 5. Uma declaração de aceitação das obrigações de uma convenção poderá ser comunicada ao Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho: a) por dois ou mais Estados-Membros da Organização, em se tratando de um território sob sua autoridade conjunta; b) por qualquer autoridade internacional responsável pela administração de um território por força dos dispositivos da Carta das Nações Unidas, ou de qualquer outro dispositivo em vigor que se aplique ao mesmo território. 6. A aceitação das obrigações de uma convenção, segundo os parágrafos 4 e 5, acarretará a aceitação, em nome do território interessado, das obrigações que resultam dos termos da convenção, e, também, daquelas que, de acordo com a Constituição da Organização, decorrem da ratificação. Qualquer declaração de aceitação pode especificar as modificações dos dispositivos da convenção que seriam necessárias para adaptá-las às condições locais. 7. Todo Estado-Membro ou autoridade internacional, que houver feito uma declaração na forma prevista pelos parágrafos 4 e 5 do presente artigo, poderá, de acordo com os artigos da convenção, formular periodicamente nova declaração que modifique os termos de qualquer das anteriores ou que torne sem efeito a aceitação da convenção em nome do território interessado. 8. Se as obrigações decorrentes de uma convenção não forem aceitas quanto a um dos territórios visados pelos parágrafos 4 ou 5 do presente artigo, o Membro, os Membros, ou a autoridade internacional transmitirão ao Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho, um relatório sobre a legislação do mesmo território e sobre a prática nele observada, relativamente ao assunto de que trata a convenção. O relatório indicará até que ponto se aplicaram ou se pretendem aplicar dispositivos da convenção, por intermédio de leis, por meios administrativos, por força de contratos coletivos, ou por qualquer outro processo, expondo, outrossim, as dificuldades que impedem ou retardam a ratificação da dita convenção. Artigo 36 As emendas à presente Constituição, aceitas pela Conferência por dois terços dos votos presentes, entrarão em vigor quando forem ratificadas por dois terços dos Estados-Membros da Organização, incluindo cinco dentre os dez representados no Conselho de Administração como sendo os de maior importância industrial, de acordo com o disposto no artigo 7, parágrafo 3, da presente Constituição.

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Artigo 37 1. Quaisquer questões ou dificuldades relativas à interpretação da presente Constituição e das convenções ulteriores concluídas pelos Estados-Membros, em virtude da mesma, serão submetidas à apreciação da Corte Internacional de Justiça. 2. O Conselho de Administração poderá, não obstante o disposto no parágrafo 1 do presente artigo, formular e submeter à aprovação da Conferência, regras destinadas a instituir um tribunal para resolver com presteza qualquer questão ou dificuldade relativa à interpretação de uma convenção que a ele seja levada pelo Conselho de Administração, ou, segundo o prescrito na referida convenção. O Tribunal instituído, em virtude do presente parágrafo, regulará seus atos pelas decisões ou pareceres da Corte Internacional de Justiça. Qualquer sentença pronunciada pelo referido tribunal será comunicada aos Estados-Membros da Organização, cujas observações, a ela relativas, serão transmitidas à Conferência. Artigo 38 1. A Organização Internacional do Trabalho poderá convocar conferências regionais e criar instituições do mesmo caráter, quando julgar que umas e outras serão úteis aos seus fins e objetivos. 2. Os poderes, as funções e o regulamento das conferências regionais obedecerão às normas formuladas pelo Conselho de Administração e por ele apresentadas à Conferência Geral para fins de confirmação. CAPÍTULO IV DISPOSIÇÕES DIVERSAS Artigo 39 A Organização Internacional do Trabalho deve ter personalidade jurídica, e, precipuamente, capacidade para: a) adquirir bens, móveis e imóveis, e dispor dos mesmos; b) contratar; c) intentar ações. Artigo 40 1. A Organização Internacional do Trabalho gozará, nos territórios de seus Membros, dos privilégios e das imunidades necessárias a consecução dos seus fins. 2. Os delegados à Conferência, os membros do Conselho de Administração, bem como o Diretor-Geral e os funcionários da Repartição, gozarão, igualmente, dos privilégios e imunidades necessárias para exercerem, com inteira independência, as funções que lhes competem, relativamente à Organização. 3. Tais privilégios serão especificados por um acordo em separado, que será elaborado pela Organização para fins de aceitação pelos Estados-Membros.

ANEXO

DECLARAÇÃO REFERENTE AOS FINS E OBJETIVOS DA ORGANI ZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO

A Conferência Geral da Organização Internacional do Trabalho, reunida em Filadélfia em sua vigésima sexta sessão, adota, aos dez de maio de mil novecentos e quarenta e quatro, a presente Declaração, quanto aos itens e objetivos da Organização Internacional do Trabalho e aos princípios que devem inspirar a política dos seus Membros.

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I A Conferência reafirma os princípios fundamentais sobre os quais repousa a Organização, principalmente os seguintes: a) o trabalho não é uma mercadoria; b) a liberdade de expressão e de associação é uma condição indispensável a um progresso ininterrupto; c) a penúria, seja onde for, constitui um perigo para a prosperidade geral; d) a luta contra a carência, em qualquer nação, deve ser conduzida com infatigável energia, e por um esforço internacional contínuo e conjugado, no qual os representantes dos empregadores e dos empregados discutam, em igualdade, com os dos Governos, e tomem com eles decisões de caráter democrático, visando o bem comum. II A Conferência, convencida de ter a experiência plenamente demonstrado a verdade da declaração contida na Constituição da Organização Internacional do Trabalho, que a paz, para ser duradoura, deve assentar sobre a justiça social, afirma que: a) todos os seres humanos de qualquer raça, crença ou sexo, têm o direito de assegurar o bem-estar material e o desenvolvimento espiritual dentro da liberdade e da dignidade, da tranquilidade econômica e com as mesmas possibilidades; b) a realização de condições que permitam o exercício de tal direito deve constituir o principal objetivo de qualquer política nacional ou internacional; c) quaisquer planos ou medidas, no terreno nacional ou internacional, máxime os de caráter econômico e financeiro, devem ser considerados sob esse ponto de vista e somente aceitos, quando favorecerem, e não entravarem, a realização desse objetivo principal; d) compete à Organização Internacional do Trabalho apreciar, no domínio internacional, tendo em vista tal objetivo, todos os programas de ação e medidas de caráter econômico e financeiro; e) no desempenho das funções que lhe são confiadas, a Organização Internacional do Trabalho tem capacidade para incluir em suas decisões e recomendações quaisquer disposições que julgar convenientes, após levar em conta todos os fatores econômicos e financeiros de interesse. III A Conferência proclama solenemente que a Organização Internacional do Trabalho tem a obrigação de auxiliar as Nações do Mundo na execução de programas que visem: a) proporcionar emprego integral para todos e elevar os níveis de vida; b) dar a cada trabalhador uma ocupação na qual ele tenha a satisfação de utilizar, plenamente, sua habilidade e seus conhecimentos e de contribuir para o bem geral; c) favorecer, para atingir o fim mencionado no parágrafo precedente, as possibilidades de formação profissional e facilitar as transferências e migrações de trabalhadores e de colonos, dando as devidas garantias a todos os interessados; d) adotar normas referentes aos salários e às remunerações, ao horário e às outras condições de trabalho, a fim de permitir que todos usufruam do progresso e, também, que todos os assalariados, que ainda não o tenham, percebam, no mínimo, um salário vital; e) assegurar o direito de ajustes coletivos, incentivar a cooperação entre empregadores e trabalhadores para melhoria contínua da organização da produção e a colaboração de uns e outros na elaboração e na aplicação da política social e econômica; f) ampliar as medidas de segurança social, a fim de assegurar tanto uma renda mínima e essencial a todos a quem tal proteção é necessária, como assistência médica completa; g) assegurar uma proteção adequada da vida e da saúde dos trabalhadores em todas as ocupações; h) garantir a proteção da infância e da maternidade; i) obter um nível adequado de alimentação, de alojamento, de recreação e de cultura; j) assegurar as mesmas oportunidades para todos em matéria educativa e profissional.

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IV A Conferência -- convencida de que uma utilização mais ampla e completa dos recursos da terra é necessária para a realização dos objetivos enumerados na presente Declaração, e pode ser assegurada por uma ação eficaz nos domínios internacional e nacional, em particular mediante medidas tendentes a promover a expansão da produção e do consumo, a evitar flutuações econômicas graves, a realizar o progresso econômico e social das regiões menos desenvolvidas, a obter maior estabilidade nos preços mundiais de matérias-primas e de produtos, e a favorecer um comércio internacional de volume elevado e constante -- promete a inteira colaboração da Organização Internacional do Trabalho a todos os organismos internacionais aos quais possa ser atribuída uma parcela de responsabilidade nesta grande missão, como na melhoria da saúde, no aperfeiçoamento da educação e do bem-estar de todos os povos. V A Conferência afirma que os princípios contidos na presente Declaração convêm integralmente a todos os povos e que sua aplicação progressiva, tanto àqueles que são ainda dependentes, como aos que já se podem governar a si próprios, interessa o conjunto do mundo civilizado, embora deva-se levar em conta, nas variedades dessa aplicação, o grau de desenvolvimento econômico e social atingido por cada um."

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ANEXO B

DECLARAÇÃO DA OIT SOBRE OS PRINCÍPIOS E DIREITOS FU NDAMENTAIS NO TRABALHO

Considerando que a criação da OIT procede da convicção de que a justiça social é essencial para garantir uma paz universal e permanente; Considerando que o crescimento econômico é essencial, mas insuficiente, para assegurar a eqüidade, o progresso social e a erradicação da pobreza, o que confirma a necessidade de que a OIT promova políticas sociais sólidas, a justiça e instituições democráticas; Considerando, portanto, que a OIT deve hoje, mais do que nunca, mobilizar o conjunto de seus meios de ação normativa, de cooperação técnica e de investigação em todos os âmbitos de sua competência, e em particular no âmbito do emprego, a formação profissional e as condições de trabalho, a fim de que no âmbito de uma estratégia global de desenvolvimento econômico e social, as políticas econômicas e sociais se reforcem mutuamente com vistas à criação de um desenvolvimento sustentável de ampla base; Considerando que a OIT deveria prestar especial atenção aos problemas de pessoas com necessidades sociais especiais, em particular os desempregados e os trabalhadores migrantes, mobilizar e estimular os esforços nacionais, regionais e internacionais encaminhados à solução de seus problemas, e promover políticas eficazes destinadas à criação de emprego; Considerando que, com o objetivo de manter o vínculo entre progresso social e crescimento econômico, a garantia dos princípios e direitos fundamentais no trabalho reveste uma importância e um significado especiais ao assegurar aos próprios interessados a possibilidade de reivindicar livremente e em igualdade de oportunidades uma participação justa nas riquezas a cuja criação têm contribuído, assim como a de desenvolver plenamente seu potencial humano; Considerando que a OIT é a organização internacional com mandato constitucional e o órgão competente para estabelecer Normas Internacionais do Trabalho e ocupar-se das mesmas, e que goza de apoio e reconhecimento universais na promoção dos direitos fundamentais no trabalho como expressão de seus princípios constitucionais; Considerando que numa situação de crescente interdependência econômica urge reafirmar a permanência dos princípios e direitos fundamentais inscritos na Constituição da Organização, assim como promover sua aplicação universal; A Conferência Internacional do Trabalho, 1. Lembra: a) que no momento de incorporar-se livremente à OIT, todos os Membros aceitaram os princípios e direitos enunciados em sua Constituição e na Declaração de Filadélfia, e se comprometeram a esforçar-se por alcançar os objetivos gerais da Organização na medida de suas possibilidades e atendendo a suas condições específicas; b) que esses princípios e direitos têm sido expressados e desenvolvidos sob a forma de direitos e obrigações específicos em convenções que foram reconhecidas como fundamentais dentro e fora da Organização.

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2. Declara que todos os Membros, ainda que não tenham ratificado as convenções aludidas, têm um compromisso derivado do fato de pertencer à Organização de respeitar, promover e tornar realidade, de boa fé e de conformidade com a Constituição, os princípios relativos aos direitos fundamentais que são objeto dessas convenções, isto é: a) a liberdade sindical e o reconhecimento efetivo do direito de negociação coletiva; b) a eliminação de todas as formas de trabalho forçado ou obrigatório; c) a abolição efetiva do trabalho infantil; e d) a eliminação da discriminação em matéria de emprego e ocupação. 3. Reconhece a obrigação da Organização de ajudar a seus Membros, em resposta às necessidades que tenham sido estabelecidas e expressadas, a alcançar esses objetivos fazendo pleno uso de seus recursos constitucionais, de funcionamento e orçamentários, incluída a mobilização de recursos e apoio externos, assim como estimulando a outras organizações internacionais com as quais a OIT tenha estabelecido relações, de conformidade com o artigo 12 de sua Constituição, a apoiar esses esforços: a) oferecendo cooperação técnica e serviços de assessoramento destinados a promover a ratificação e aplicação das convenções fundamentais; b) assistindo aos Membros que ainda não estão em condições de ratificar todas ou algumas dessas convenções em seus esforços por respeitar, promover e tornar realidade os princípios relativos aos direitos fundamentais que são objeto dessas convenções; e c) ajudando aos Membros em seus esforços por criar um meio ambiente favorável de desenvolvimento econômico e social. 4. Decide que, para tornar plenamente efetiva a presente Declaração, implementarse-á um seguimento promocional, que seja crível e eficaz, de acordo com as modalidades que se estabelecem no anexo que será considerado parte integrante da Declaração. 5. Sublinha que as normas do trabalho não deveriam utilizar-se com fins comerciais protecionistas e que nada na presente Declaração e seu seguimento poderá invocar-se nem utilizar-se de outro modo com esses fins; ademais, não deveria de modo algum colocar-se em questão a vantagem comparativa de qualquer país sobre a base da presente Declaração e seu seguimento. Anexo Seguimento da Declaração I.OBJETIVO GERAL 1. O objetivo do seguimento descrito a seguir é estimular os esforços desenvolvidos pelos Membros da Organização com o objetivo de promover os princípios e direitos fundamentais consagrados na Constituição da OIT e a Declaração de Filadélfia, que a Declaração reitera. 2. De conformidade com este objetivo estritamente promocional, o presente seguimento deverá contribuir a identificar os âmbitos em que a assistência da Organização, por meio de suas atividades de cooperação técnica, possa resultar útil a seus Membros com o fim de ajudá-los a tornar efetivos esses princípios e direitos fundamentais. Não poderá substituir os mecanismos de controle estabelecidos nem obstar seu funcionamento; por conseguinte, as situações particulares próprias ao âmbito desses mecanismos não poderão discutir-se ou rediscutir-se no âmbito do referido seguimento. 3. Os dois aspectos do presente seguimento, descritos a seguir, recorrerão aos procedimentos existentes; o seguimento anual relativo às convenções não ratificadas somente suporá certos ajustes às atuais modalidades de aplicação do artículo 19, parágrafo 5, e) da Constituição, e o relatório global permitirá otimizar os resultados dos procedimentos realizados em cumprimento da Constituição.

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II. SEGUIMENTO ANUAL RELATIVO ÀS CONVENÇÕES FUNDAME NTAIS NÃO RATIFICADAS A. Objeto e âmbito de aplicação 1. Seu objetivo é proporcionar uma oportunidade de seguir a cada ano, mediante um procedimento simplificado que substituirá o procedimento quadrienal introduzido em 1995 pelo Conselho de Administração, os esforços desenvolvidos de acordo com a Declaração pelos Membros que não ratificaram ainda todas as convenções fundamentais. 2. O seguimento abrangerá a cada ano as quatro áreas de princípios e direitos fundamentais enumerados na Declaração. B. Modalidades 1. O seguimento terá como base relatórios solicitados aos Membros em virtude do artigo 19, parágrafo 5, e) da Constituição. Os formulários de memória serão estabelecidos com a finalidade de obter dos governos que não tiverem ratificado alguma das convenções fundamentais, informação sobre as mudanças que ocorreram em sua legislação e sua prática, considerando o artigo 23 da Constituição e a prática estabelecida. 2. Esses relatórios, recopilados pela Repartição, serão examinadas pelo Conselho de Administração. 3. Com o fim de preparar uma introdução à compilação dos relatórios assim estabelecida, que permita chamar a atenção sobre os aspectos que mereçam em seu caso uma discussão mais detalhada, a Repartição poderá recorrer a um grupo de peritos nomeados com este fim pelo Conselho de Administração. 4. Deverá ajustar-se o procedimento em vigor do Conselho de Administração para que os Membros que não estejam nele representados possam proporcionar, da maneira mais adequada, os esclarecimentos que no seguimento de suas discussões possam resultar necessárias ou úteis para completar a informação contida em suas memórias. III. RELATÓRIO GLOBAL A. Objeto e âmbito de aplicação 1. O objeto deste relatório é facilitar uma imagem global e dinâmica de cada uma das categorias de princípios e direitos fundamentais observada no período quadrienal anterior, servir de base à avaliação da eficácia da assistência prestada pela Organização e estabelecer as prioridades para o período seguinte mediante programas de ação em matéria de cooperação técnica destinados a mobilizar os recursos internos e externos necessários a respeito. 2. O relatório tratará sucessivamente cada ano de uma das quatro categorias de princípios e direitos fundamentais. B. Modalidades 1. O relatório será elaborado sob a responsabilidade do Diretor-Geral sobre a base de informações oficiais ou reunidas e avaliadas de acordo com os procedimentos estabelecidos. Em relação aos países que ainda não ratificaram as convenções fundamentais, referidas informações terão como fundamento, em particular, no resultado do seguimento anual antes mencionado. No caso dos Membros que tenham ratificado as convenções correspondentes, estas informações terão como base, em particular, os relatórios (memórias) tal como são apresentados e tratados em virtude do artículo 22 da Constituição. 2. Este relatório será apresentado à Conferência como um relatório do Diretor-Geral para ser objeto de uma discussão tripartite. A Conferência poderá tratá-lo de um modo distinto do inicialmente previsto para os relatórios aos que se refere o artigo 12 de seu Regulamento, e poderá fazê-lo numa sessão separada dedicada exclusivamente a esse informe ou de qualquer outro modo apropriado. Posteriormente, corresponderá ao Conselho de Administração, durante uma de suas reuniões subsequentes mais próximas, tirar as conclusões de referido debate no relativo às prioridades e aos programas de ação em matéria de cooperação técnica que deva implementar durante o período quadrienal correspondente.

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IV.FICA ENTENDIDO QUE: 1. O Conselho de Administração e a Conferência deverão examinar as emendas que resultem necessárias a seus regulamentos respectivos para executar as disposições anteriores. 2. A Conferência deverá, em determinado momento, reexaminar o funcionamento do presente seguimento considerando a experiência adquirida, com a finalidade de comprovar si este mecanismo está ajustado convenientemente ao objetivo enunciado na Parte I. 3. O texto anterior é o texto da Declaração da OIT relativa aos princípios e direitos fundamentais no trabalho e seu seguimento devidamente adotada pela Conferência Geral da Organização Internacional do Trabalho durante a Octogésima sexta reunião, realizada em Genebra e cujo encerramento foi declarado em 18 de junho de 1998. É FÉ DO QUAL foi assinado neste décimo nono dia de junho de 1998. Presidente da Conferência JEAN-JACQUES OECHSLIN O Diretor Geral da Oficina Internacional do Trabalho MICHEL HANSENNE

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ANEXO C

DECLARAÇÃO DA OIT SOBRE A JUSTIÇA SOCIAL PARA UMA GLOBALIZAÇÃO JUSTA

A Conferência Internacional do Trabalho, reunida em Genebra durante sua 97ª reunião, Considerando que o contexto atual da globalização, caracterizado pela difusão de novas tecnologias, a circulação das idéias, o intercâmbio de bens e serviços, o crescimento da movimentação de capital e fluxos financeiros, a internacionalização do mundo dos negócios e seus processos, do diálogo bem como da circulação de pessoas, especialmente trabalhadoras e trabalhadores, transforma profundamente o mundo do trabalho: - por uma parte, o processo de cooperação e integração econômicas têm contribuído a beneficiar certo número de países com altas taxas de crescimento econômico e de criação de empregos, a integrar um número de indivíduos pobres da zona rural na moderna economia urbana, a elevar seus objetivos de desenvolvimento e a estimular a inovação na elaboração de produtos e circulação de idéias; - por outra parte, a integração econômica mundial tem confrontado muitos países e setores com grandes desafios no tocante à desigualdade de ingressos, à persistência de níveis de desemprego e pobreza elevados, a vulnerabilidade das economias diante das crises externas e o aumento, tanto do trabalho precário como da economia informal, que têm incidência na relação de trabalho e na proteção que esta pode oferecer; Reconhecendo que, nestas circunstâncias, faz-se ainda mais necessário obter melhores resultados, equitativamente distribuídos entre todos com o fim de responder à aspiração universal de justiça social, alcançar o pleno emprego, assegurar a sustentabilidade das sociedades abertas e da economia mundial, conquistar a coesão social e lutar contra a pobreza e as desigualdades crescentes; Com a convicção de que a Organização Internacional do Trabalho desempenha um papel fundamental na promoção e conquista do progresso e da justiça social num entorno em constante evolução:

- sobre a base do mandato contido na Constituição da OIT, junto com a Declaração de Filadélfia (1944), que continua plenamente pertinente no século XXI e deveria inspirar a política de seus Membros, e que, dentre outros fins, objetivos e princípios: • afirma que o trabalho não é uma mercadoria e que a pobreza, onde houver, constitui um perigo para a prosperidade de todos; • reconhece que a OIT tem a solene obrigação de promover entre as nações do mundo, programas próprios que permitam alcançar os objetivos do pleno emprego e a elevação do nível de vida, um salário mínimo vital e a extensão das medidas de seguridade social para garantir ingressos básicos a quem precise, junto com os demais objetivos enunciados na Declaração da Filadélfia; • recomenda à OIT examinar e considerar, à luz do objetivo fundamental de justiça social, todas as políticas econômicas e financeiras internacionais; - com base e reafirmando a Declaração da OIT relativa aos princípios e direitos fundamentais no trabalho (1998), em virtude da qual os Membros reconhecem, no cumprimento do mandato da Organização, a importância dos direitos fundamentais, a saber: a liberdade de associação e o reconhecimento efetivo do direito da negociação coletiva, a eliminação de toda forma de trabalho forçado ou obrigatório, a abolição efetiva do trabalho infantil e a eliminação da discriminação em matéria de emprego e ocupação; Estimulada pelo reconhecimento da comunidade internacional de que o trabalho decente é um meio eficaz de enfrentar os desafios da globalização, levando em consideração:

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- os resultados da Conferência Mundial sobre Desenvolvimento Social, realizada em Copenhague em 1995 - o amplo apoio, reiteradamente manifestado nos planos mundial e regional, a favor do conceito do trabalho decente formulado pela OIT, e - a adesão de Chefes de Estado e de governo na Conferência Mundial das Nações Unidas de 2005 a favor de uma globalização equitativa e dos objetivos do produtivo e pleno emprego e o trabalho decente para todos, como metas prioritárias a suas políticas nacionais e internacionais concernentes; Com a convicção de que em um contexto mundial marcado por uma interdependência e complexidade crescentes, assim como pela internacionalização da produção: - os valores fundamentais de liberdade, dignidade humana, justiça social, seguridade e não-discriminação são essenciais para um desenvolvimento e uma eficácia sustentáveis em matéria econômica e social; - o diálogo social e a prática do tripartismo entre os governos e as organizações representativas de trabalhadores e de empregadores, tanto no plano nacional como internacional se tornam ainda mais vigentes para alcançar soluções e fortalecer a coesão social e o Estado de direito, entre outros meios, mediante as normas internacionais do trabalho; - a importância da relação de trabalho deveria ser reconhecida como meio de oferecer proteção jurídica aos trabalhadores; - as empresas produtivas, rentáveis e sustentáveis, junto com uma economia social sólida e um setor público viável, são fundamentais para um desenvolvimento econômico e oportunidades de emprego sustentáveis e, - a Declaração tripartite de princípios sobre as empresas multinacionais e a política social (1977) revisada, que aborda o crescente papel desses atores na consecução dos objetivos da Organização, continua sendo pertinente. Reconhecendo que, face aos atuais desafios, a Organização deve intensificar seus esforços e mobilizar todos seus meios de ação para promover os objetivos constitucionais e, para assegurar uma maior eficácia desses esforços e reforçar sua capacidade para apoiar aos Membros a fim de alcançar seus objetivos no contexto da globalização, deverá: - adotar um enfoque coerente acordado na elaboração de um roteiro global e integrado, em conformidade com a Agenda do Trabalho Decente e os quatro objetivos estratégicos da OIT, baseando-se nas sinergias existentes entre eles; - adaptar suas práticas institucionais e sua governança com o fim de aumentar a sua eficácia e eficiência, respeitando plenamente o marco e os procedimentos constitucionais existentes; - auxiliar os mandantes a satisfazer as necessidades assinaladas no plano nacional sobre a base de uma plena discussão tripartite, subministrando informações de qualidade, consultorias e trabalhos técnicos que contribuam a satisfazer essas necessidades no contexto dos objetivos constitucionais da OIT; - promover a política normativa da OIT como pedra angular de suas atividades realçando sua pertinência para o mundo do trabalho e garantir o papel das normas na realização dos objetivos constitucionais da Organização; Adota, em 10 de junho de dois mil e oito, a presente Declaração I. Alcance e Princípios A Conferência reconhece e declara que: A. Num contexto marcado por mudanças aceleradas, os compromissos e esforços dos Membros e da Organização visando a colocar em prática o mandato constitucional da OIT, particularmente pelas normas internacionais do trabalho, para situar o pleno emprego

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produtivo e o trabalho decente como elemento central das políticas econômicas e sociais, deveriam basear-se nos quatro igualmente importantes objetivos estratégicos da OIT, sobre os quais se articula a Agenda do Trabalho Decente e que podem resumir-se da seguinte forma: i) promover o emprego criando um entorno institucional e econômico sustentável de forma que: - os indivíduos possam adquirir e atualizar as capacidades e competências necessárias que permitam trabalhar de maneira produtiva para sua própria realização pessoal e bem-estar coletivo; - o conjunto de empresas, tanto públicas como privadas, sejam sustentáveis com o fim de favorecer o crescimento e a criação de maiores possibilidades e perspectivas de emprego e renda para todos, e - as sociedades possam alcançar seus objetivos de desenvolvimento econômico e de progresso social, bem como alcançar um bom nível de vida; ii) adotar e ampliar medidas de proteção social – seguridade social e proteção dos trabalhadores – que sejam sustentáveis e estejam adaptadas às circunstâncias nacionais, e particularmente, - a extensão da seguridade social a todos os indivíduos, incluindo medidas para proporcionar ingressos básicos àqueles que precisem dessa proteção e a adaptação de seu alcance e cobertura para responder às novas necessidades e incertezas geradas pela rapidez dos avanços tecnológicos, sociais, demográficos e econômicos; - condições de trabalho que preservem a saúde e segurança dos trabalhadores, e - as possibilidades para todos de uma participação equitativa em matéria de salários e benefícios, de jornada e outras condições de trabalho, e um salário mínimo vital para todos aqueles que têm um emprego e precisam desse tipo de proteção; iii) promover o diálogo social e tripartismo como os métodos mais apropriados para: - adaptar a aplicação dos objetivos estratégicos às necessidades e circunstâncias de cada país; - transformar o desenvolvimento econômico em progresso social e o progresso social em desenvolvimento econômico; - facilitar a formação de consenso sobre as políticas nacionais e internacionais pertinentes que incidem nas estratégias e programas de emprego e trabalho decente, e - fomentar a efetividade da legislação e as instituições de trabalho, em particular o reconhecimento da relação de trabalho, a promoção de boas relações profissionais e o estabelecimento de sistemas eficazes de inspeção do trabalho, e iv) respeitar, promover e aplicar os princípios e direitos fundamentais no trabalho, que são de particular importância, tanto como direitos como condições necessárias para a plena realização dos objetivos estratégicos, tendo em vista que: - que a liberdade de associação e liberdade sindical e o reconhecimento efetivo do direito de negociação coletiva são particularmente importantes para alcançar esses quatro objetivos estratégicos, e - que a violação dos princípios e direitos fundamentais no trabalho não pode ser invocada nem utilizada como legitima vantagem comparativa e que as normas do trabalho não devem servir aos fins comerciais protecionistas. B. Os quatro objetivos estratégicos são indissociáveis, interdependentes e se reforçam mutuamente. A falta de promoção de qualquer um deles prejudicaria a realização dos demais. Para obter maior impacto, os esforços destinados a promovê-los deveriam compor uma estratégia global e integrada da OIT em beneficio do Trabalho Decente. A igualdade entre homens e mulheres e a não-discriminação devem ser consideradas questões transversais no marco dos objetivos estratégicos mencionados anteriormente. C. Corresponde determinar a cada Membro o alcance os objetivos estratégicos, sob observância das obrigações internacionais que tenha assumido e de acordo com os princípios e deveres fundamentais do trabalho, considerando entre outras coisas:

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i) as condições e circunstâncias nacionais, assim como necessidades e prioridades expressadas pelas organizações representativas de empregadores e trabalhadores; ii) a interdependência, solidariedade e cooperação entre todos os Membros da OIT que são mais pertinentes que nunca, no contexto de uma economia globalizada, e iii) os princípios e disposições das normas internacionais do trabalho. II. Método de Aplicação A Conferência reconhece que, numa economia globalizada: A. A posta em prática da Seção I da presente Declaração demanda que a OIT apóie de maneira eficaz os esforços de seus Membros. Com tal finalidade, a Organização deveria revisar e adaptar suas práticas institucionais para melhorar sua governança e reforçar suas capacidades, com o fim de utilizar, da melhor forma possível, seus recursos humanos e financeiros, e a vantagem única que representa sua estrutura tripartite e seu sistema normativo, com vistas a: i)compreender melhor as necessidades de seus Membros, no que concerne a cada um de seus objetivos estratégicos, bem como a ação da desenvolvida pela OIT para responder a essas necessidades, no marco de um ponto recorrente inscrito na ordem do dia da Conferência, de forma a: - determinar de que maneira a OIT pode responder de forma mais eficaz e essas necessidades mediante a utilização coordenada de todos seus meios de ação; - determinar os recursos necessários para responder a essas necessidades e, caso proceda, atrair recursos adicionais, e - orientar o Conselho de Administração e a Oficina no cumprimento de suas responsabilidades; ii) reforçar e coordenar sua cooperação técnica e conhecimentos especializados que oferece, com o fim de: - apoiar os esforços desempenhados por cada Membro avançando sobre uma base tripartite, visando a alcançar todos os objetivos estratégicos, assim como prestar assistência, mediante programas por país em prol do trabalho decente, quando proceda, e no contexto do sistema das Nações Unidas, e - auxiliar, sempre que necessário, a reforçar a capacidade institucional dos Estados Membros, assim como das organizações representativas de empregadores e trabalhadores para facilitar a condução de uma política social pertinente e coerente além de um desenvolvimento sustentável; iii) favorecer a compreensão e intercâmbio de conhecimentos sobre as sinergias existentes entre os objetivos estratégicos mediante uma análise empírica e a discussão tripartite de experiências concretas, com a cooperação voluntária de países interessados, para orientar os Membros na tomada de decisões a respeito das potencialidades e desafios da globalização; iv) assistir, quando necessário, aos Membros que demandem e que desejem promover em conjunto com os objetivos estratégicos no marco dos acordos bilaterais ou multilaterais, sempre e quando sejam compatíveis com suas obrigações a respeito da OIT, e v) estabelecer, em consulta com as organizações nacionais e internacionais representativas de empregadores e trabalhadores, novas parcerias com entidades não-estatais e atores econômicos, tais como as empresas multinacionais e os sindicatos que atuem em nível setorial em escala mundial, com o fim de melhorar a eficácia dos programas e atividades operacionais da OIT, conseguir que lhes prestem apoio de forma apropriada e promover por qualquer outro meio adequado os objetivos estratégicos da OIT. B. Ao mesmo tempo, os Membros devem assumir a responsabilidade fundamental de contribuir, mediante sua política econômica e social, à realização de uma estratégia global e integrada para colocar em prática os objetivos estratégicos, incluindo a Agenda do Trabalho Decente, esboçados na Seção I da presente Declaração. A aplicação da Agenda do

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Trabalho Decente no plano nacional dependerá das necessidades e prioridades dos países e incumbirá aos Estados Membros, decidir, em consulta com as organizações representativas de empregadores e trabalhadores, a forma em que será cumprida essa responsabilidade. Com essa finalidade, poderiam considerar, entre outras formas: i) a adoção de uma estratégia nacional e/ou regional para o trabalho decente, articulada em torno de uma série de prioridades para a consecução integrada dos objetivos estratégicos. ii) o estabelecimento, se necessário com o auxilio da OIT, de indicadores ou estatísticas apropriados, para verificar e validar os progressos realizados; iii) o exame de sua situação em termos de ratificação ou aplicação de instrumentos da OIT visando a alcançar uma cobertura cada vez mais ampla de cada um dos objetivos estratégicos, enfatizando os instrumentos classificados como normas fundamentais do trabalho, bem como aqueles que se consideram mais significativos sob o ponto de vista da governança, que tratam do tripartismo, da política de emprego e da inspeção do trabalho; iv) a adoção de medidas apropriadas para coordenar de forma adequada as posturas expressadas em nome do Estado Membro nos foros internacionais pertinentes e todas as medidas que poderiam ser tomadas à luz da presente Declaração; v) a promoção de empresas sustentáveis; vi) o intercâmbio, de ser necessário, de práticas nacionais ou regionais em relação à aplicação de iniciativas nacionais e/ou regionais bem sucedidas que incluam um elemento de trabalho decente, e vii) a apresentação, sobre uma base bilateral, regional ou multilateral na medida em que seus recursos permitam, de um apoio apropriado aos esforços desenvolvidos por outros Membros, para dar efeito aos princípios e objetivos referidos na presente Declaração. C. Outras organizações internacionais e regionais cujos mandatos abrangem âmbitos interligados têm um papel importante a ser desempenhado na colocação e prática do enfoque integrado. A OIT deveria convidá-los a promover o trabalho decente, tendo presente que cada organismo manterá pleno controle a respeito de seu mandato. Dado que a política comercial e dos mercados financeiros repercute no emprego, incumbe à OIT validar esses efeitos com o fim de alcançar o objetivo de colocar o emprego como elemento fundamental das políticas econômicas. III. Disposições Finais A. O Diretor-Geral da Secretaria Internacional do Trabalho será responsável de que a presente Declaração seja comunicada a todos os Membros e, por seu intermédio, às organizações representativas de empregadores e trabalhadores, às organizações internacionais competentes interligadas nos âmbitos internacional e regional, bem como a toda outra entidade que o Conselho de Administração possa determinar. Os governos, assim como as organizações de empregadores e trabalhadores no âmbito nacional, deverão dar a conhecer a Declaração em todos os foros em que participem ou estejam representados, e difundi-lo de todos os meios possíveis entre as entidades suscetíveis de estar interessadas. B. O Conselho de Administração e o Diretor-Geral da Secretaria Internacional do Trabalho serão os responsáveis de estabelecer as modalidades necessárias para aplicar, à maior brevidade, a Seção II da presente Declaração. C. O impacto da presente Declaração, e particularmente as medidas adotadas para promover sua aplicação serão objeto, no momento em que o Conselho de Administração julgue oportuno e segundo as modalidades que determine de exame por parte da Conferência Internacional do Trabalho com o fim de apreciar quais medidas poderiam ser apropriadas.

ANEXO

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Seguimento da Declaração

I. Objetivo geral e campo de aplicação 1. A finalidade deste seguimento é determinar os meios com os quais a Organização apoiará os esforços desenvolvidos pelos Membros para tornar efetivo seu compromisso de alcançar os quatro objetivos estratégicos importantes para pôr em prática o mandato constitucional da Organização. 2. No marco deste seguimento, procura-se fazer o melhor uso possível de todos os meios de ação disponíveis em virtude da Constituição da OIT para o cumprimento de seu mandato. Algumas das medidas que visam a prestar assistência aos Membros poderão demandar certas adaptações relativas às modalidades de aplicação existentes no artigo 19, parágrafo 5, e), e 6, d), da Constituição da OIT sem aumentar as obrigações de apresentação de relatórios dos Estados Membros. II. Ação por parte da Organização para prestar assi stência a seus Membros Administração, recursos e relações exteriores A. O Diretor Geral tomará as medidas necessárias, incluída a formulação de propostas ao Conselho de Administração, para garantir os meios pelos quais a Organização assistirá os Membros nos esforços desenvolvidos em virtude da presente Declaração. Essas medidas incluirão o exame e revisão de práticas institucionais e da governança da OIT, tal como enunciado na Declaração e deverão considerar a necessidade de assegurar a: i) A coerência, a coordenação e a colaboração no âmbito da Secretaria Internacional do Trabalho em vistas de seu bom funcionamento; ii) O reforço e a manutenção em matéria de políticas e capacidade operacional; iii) Uma utilização eficiente e eficaz de recursos, dos processos de gestão e das estruturas institucionais; iv) A idoneidade das competências e da base de conhecimentos, bem como a eficácia das estruturas de governança; v) A promoção de parcerias eficazes no âmbito do sistema multilateral e das Nações Unidas para reforçar os programas e atividades operacionais da OIT ou promover, de todas as formas possíveis, seus objetivos, e vi) A identificação, atualização e promoção da lista de normas que apresentem maior importância em relação com a governança. Compreender a situação e as necessidades dos Membros e responder a essas necessidades. B. A Organização estabelecerá um sistema de discussões recorrentes pela Conferência Internacional do Trabalho com base nas modalidades determinadas pelo Conselho de Administração, sem duplicar os mecanismos de controle da OIT, com o fim de: i.) compreender melhor a situação e diversas necessidades de seus Membros com relação a cada um dos objetivos estratégicos e responder com melhor eficácia a essas necessidades, utilizando para isso o conjunto de meios de ação de que dispõe, com inclusão da normativa, a cooperação técnica, e as capacidades técnicas e de análise da Secretaria e ajustar, em consequência, suas prioridades e programas de ação, e ii.) avaliar os resultados das atividades da OIT com o objetivo de apoiar as decisões relativas ao programa e orçamento, bem como outros aspectos da governança. Assistência técnica e serviços de assessoramento

C. Prévia demanda dos governos e das organizações representativas de trabalhadores e empregadores, a Organização proporcionará toda a assistência apropriada nos limites de seu mandato, para apoiar os esforços desenvolvidos pelos Membros com o fim de avançar

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na consecução dos objetivos estratégicos no âmbito de uma estratégia nacional e/ou regional integrada e coerente, i.) reforçando e coordenar suas atividades de cooperação técnica no marco de programas nacionais de trabalho decente e no contexto do sistema das Nações Unidas; ii.) proporcionando conhecimentos técnicos e assistência de caráter geral, que cada Membro poderá solicitar, com o fim de formular uma estratégia nacional, explorando a possibilidade de alianças inovadoras para sua colocação em prática; iii.) elaborando ferramentas apropriadas para avaliar eficazmente os progressos realizados e as repercussões que outros fatores e políticas podem ter nos esforços dos Membros, e iv.) considerando as necessidades especiais e as capacidades dos países em desenvolvimento e das organizações representativas de trabalhadores e empregadores, mediante inclusive a mobilização de recursos. Pesquisa, coleta e intercâmbio de informações

D. A Organização adotará todas as medidas apropriadas para reforçar sua capacidade de pesquisa, sua base de conhecimentos empíricos e sua compreensão da forma em que os objetivos estratégicos interagem entre si e contribuem ao progresso social, a sustentabilidade das empresas, o desenvolvimento sustentável e a erradicação da pobreza na economia mundial. Essas medidas poderiam incluir o intercâmbio tripartite de experiências e boas práticas nos planos internacional, regional e nacional, no marco de: i.) estudos realizados sobre uma base ad hoc e sobre a base da cooperação voluntária dos governos e das organizações representativas de empregadores e trabalhadores dos países interessados; ou ii.) quaisquer outros tipos de mecanismos, tais como exames de pares, que os Membros interessados possam querer estabelecer ou nos quais estariam dispostos a participar voluntariamente. III - Avaliação pela Conferência A. O impacto da presente Declaração, particularmente na medida em que tenha contribuído a promover entre os Membros, os fins e objetivos da Organização, pela colocação em prática integrada de seus objetivos estratégicos, será objeto de avaliação pela Conferência, a qual poderá ser renovada num certo tempo, no âmbito de um ponto inscrito em sua ordem do dia. B. A Secretaria preparará para a Conferência uma informação que avaliará as repercussões da Declaração, contendo informação sobre: i.) as ações ou medidas tomadas em virtude da presente Declaração, informação que poderá ser proporcionadas pelos mandantes tripartites mediante os serviços da OIT, em particular nas regiões, ou proceder de qualquer outra fonte fidedigna; ii.) as medidas tomadas pelo Conselho de Administração e a Secretaria para assegurar um seguimento das questões pertinentes relativas à governança, à capacidade e à base de conhecimentos em relação com a consecução dos objetivos estratégicos, com inclusão dos programas e as atividades da OIT e suas repercussões, e iii.os possíveis impactos da Declaração em relação com outras organizações internacionais interessadas. C. As organizações multilaterais interessadas terão a possibilidade de participar na avaliação das repercussões e na discussão correspondente. Outras entidades interessadas poderão assistir à discussão e participar, a convite do Conselho de Administração. D. À luz de sua avaliação, a Conferência deverá pronunciar-se sobre a oportunidade de efetuar novas avaliações ou adotar qualquer outro tipo de medidas apropriadas.

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Resolução sobre o fortalecimento da capacidade da OI T para prestar assistência aos membros em conseq uência de seus objetivos no contexto da globalização .

A Conferência Geral da Organização Internacional do Trabalho, reunida na 97ª reunião, 2008:

Havendo adotado, no marco do sexto ponto da ordem do dia, intitulado “O fortalecimento da capacidade da OIT para prestar assistência aos membros na consecução de seus objetivos no contexto da Globalização”, uma declaração que será denominada a Declaração da OIT sobre a justiça social para uma globalização equitativa;

Recordando que essa Declaração prevê uma série de medidas de caráter marcadamente promocional relacionadas ao trabalho decente e deveria redundar em benefício dos mandantes da OIT o mais rápido possível;

Ciente da importância de que o trabalho visando à melhoria da capacidade da OIT deve ser divulgado o antes possível,

1. Toma nota de que as disposições da Declaração e suas aplicações não deveriam duplicar os mecanismos de controle existentes da OIT, e que esta aplicação não deveria aumentar as obrigações aos Estados Membros em matéria de apresentação de relatórios.

2. Convida o Diretor-Geral a que apresente, em caráter prioritário, um plano de aplicação ao Conselho de Administração em sua reunião de novembro de 2008 e, se o Conselho de Administração considerar necessário, uma série de propostas finais para exame em sua seguinte reunião, que incluam todos os elementos relativos à aplicação prevista na Declaração, com inclusão de:

a) as disposições dos parágrafos A e C da parte II da Declaração, bem como as disposições de seu anexo;

b) sem prejuízo do que precede, os seguintes elementos:

I. Questões de capacidade e de governança, propostas concretas sobre formas de:

a) Fortalecer a capacidade de pesquisa, na base do conhecimento e da elaboração de análises baseadas em dados empíricos, incluindo formas de cooperar com outras instituições de estudo e especialistas externos;

b) assegurar de que o exame da estrutura exterior resulte numa configuração da presença no terreno que permita responder com maior eficácia e eficiência às necessidades dos mandantes;

c) reforçar a coerência e a cooperação na Secretaria e entre a sede e os escritórios exteriores;

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d) reforçar o desenvolvimento dos recursos humanos e adaptá-los em função das necessidades dos mandantes em matéria de conhecimentos;

e) supervisionar e avaliar os programas de maneira adequada, assegurar a transmissão ao Conselho de Administração das lições extraídas, com inclusão de formas de avaliação independente;

f) melhorar os métodos de trabalho do Conselho de Administração e o funcionamento da Sessão anual da Conferência Internacional do Trabalho;

g) adaptar e revisar as práticas institucionais, a gestão e a governança;

h) assegurar o seguimento e avaliação da aplicação dos programas de trabalho decente por pais (PTDP);

I) aplicar plenamente a gestão com base nos resultados, incluindo a plena utilização dos sistemas de informática;

II. Pontos recorrentes da ordem do dia da Conferência Internacional do Trabalho, propostas sobre:

a) a seqüência e a freqüência dos pontos recorrentes na ordem do dia da Conferência Internacional do Trabalho;

b) a relação existente entre as discussões dessas questões na Conferência Internacional do Trabalho e o relatório global em virtude do seguimento da Declaração da OIT sobre os princípios e direitos fundamentais no trabalho.

c) a relação com o Marco de Políticas e Estratégias;

d) a função da estrutura exterior

e) a consolidação e racionalização da apresentação de relatórios pelos Membros e a Secretaria, e

III. Parcerias - propostas relativas à cooperação com outras organizações internacionais e regionais, assim como atores

c) a tomada em consideração das preocupações dos mandantes, como convém, tal como manifestadas no Relatório da Comissão do fortalecimento da capacidade da OIT na presente reunião da Conferência.

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3. Considera que o Conselho de Administração talvez considere oportuno estabelecer um mecanismo apropriado e confiável para colocar em prática o referido programa, à luz dos ensinamentos extraídos da experiência positiva adquirida no marco da discussão deste ponto na presente reunião da Conferência, eventualmente mediante a instituição de um comitê diretor.

4. Indica que confia em que os resultados desse trabalho serão alcançados utilizando os recursos de maneira eficaz, eficiente e econômica possível, inclusive determinando possíveis reduções de custos.

5. Decide que as medidas adotadas em conformidade com a presente resolução formarão parte integrante de toda avaliação pela Conferência das repercussões da Declaração em virtude da Parte III do seguimento da Declaração.

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ANEXO D

CONVENÇÃO 100 OIT

SOBRE A IGUALDADE DE REMUNERAÇÃO DE HOMENS E MULHER ES POR TRABALHO DE IGUAL VALOR*

A Conferência Geral da Organização Internacional do Trabalho, Convocada em Genebra pelo Conselho de Administração do Secretariado da Organização Internacional do Trabalho e reunida, em 6 de junho de 1951, em sua Trigésima Quarta Reunião; Tendo decidido adotar proposições relativas ao princípio da igualdade de remuneração de homens e mulheres trabalhadores por trabalho de igual valor, o que constitui a sétima questão da ordem do dia da reunião; Tendo decidido que essas proposições se revistam da forma de uma convenção internacional, adota, no dia vinte e nove de junho do ano de mil novecentos e cinqüenta e um, a seguinte Convenção que pode ser citada como a Convenção sobre a Igualdade de Remuneração, de 1951: Artigo 1º Para os fins desta Convenção: a) o termo “remuneração” compreende o vencimento ou salário normal, básico ou mínimo, e quaisquer vantagens adicionais pagas, direta ou indiretamente, pelo empregador ao trabalhador em espécie ou in natura, e resultantes do emprego; b) a expressão “igual remuneração de homens e mulheres trabalhadores por trabalho de igual valor” refere-se a tabelas de remuneração estabelecidas sem discriminação baseada em sexo. Artigo 2º 1. Todo País-membro deverá promover, por meios apropriados aos métodos em vigor para a fixação de tabelas de remuneração, e, na medida de sua compatibilidade com esses métodos, assegurar a aplicação, a todos os trabalhadores, do princípio da igualdade de remuneração de homens e mulheres trabalhadores por trabalho de igual valor. 2. Esse princípio pode ser aplicado por meio de: a) leis ou regulamentos nacionais; b) mecanismos legalmente estabelecidos e reconhecidos para a fixação de salários; c) convenções ou acordos coletivos entre empregadores e trabalhadores, ou d) a combinação desses meios. Artigo 3° 1. Quando esta ação facilitar a aplicação das disposições desta Convenção, medidas serão tomadas para promover uma avaliação objetiva de empregos com base no trabalho a ser executado. 2. Os métodos a serem seguidos nessa avaliação serão decididos pelas autoridades responsáveis pela fixação de tabelas de remuneração ou, onde forem fixadas por convenções, acordos ou contratos coletivos, pelas partes contratantes. 3. As diferenças entre as tabelas de remuneração, que correspondem, sem consideração de sexo, a diferenças no trabalho a ser executado, conforme verificadas por essa avaliação objetiva, não serão consideradas como contrárias ao princípio da igualdade de remuneração de homens e mulheres trabalhadores por trabalho de igual valor.

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* Data da entrada em vigor: 23 de maio de 1953. Artigo 4° Todo País-membro deverá colaborar, com as organizações de empregadores e de trabalhadores interessadas, da maneira mais conveniente para fazer cumprir as disposições desta Convenção. Artigo 5° As ratificações formais desta Convenção serão comunicadas, para registro, ao Diretor Geral do Secretariado da Organização Internacional do Trabalho. Artigo 6° 1. Esta Convenção obrigará exclusivamente os Países-membros da Organização Internacional do Trabalho cujas ratificações tiverem sido registradas pelo Diretor Geral. 2. Esta Convenção entrará em vigor doze meses após a data em que as ratificações de dois Países-membros tiverem sido registradas pelo Diretor Geral. 3. A partir de então, esta Convenção entrará em vigor para qualquer País-membro doze meses após a data do registro de sua ratificação. Artigo 7° 1. As declarações enviadas ao Diretor Geral do Secretariado da Organização Internacional do Trabalho, nos termos do Parágrafo 2 do Artigo 35 da Constituição da Organização Internacional do Trabalho, indicarão: a) os territórios a respeito dos quais o País-membro interessado compromete-se a aplicar, sem alterações, as disposições desta Convenção; b) os territórios a respeito dos quais assegura que as disposições da Convenção serão aplicadas, embora sujeitas a modificações, juntamente com os detalhes das ditas modificações; c) os territórios a respeito dos quais a Convenção é inaplicável e, nesse caso, as razões de sua inaplicabilidade; d) os territórios a respeito dos quais adia suas decisões para uma avaliação mais profunda da situação. 2. Os compromissos a que se referem as alíneas a) e b) do Parágrafo 1 deste Artigo serão considerados como parte integrante da ratificação e produzirão os mesmos efeitos. 3. Todo País-membro, com base nas alíneas b), c) ou d) do Parágrafo 1 deste Artigo, poderá cancelar, em qualquer tempo, no todo ou em parte, por uma declaração subsequente, quaisquer restrições feitas em sua declaração anterior 4. Todo País-membro poderá, em qualquer tempo em que a Convenção estiver sujeita à denúncia, de acordo com as disposições do Artigo 9°, enviar ao Diretor Geral declaração que modifique em qualquer outro sentido os termos de qualquer declaração anterior e informe sobre a situação atual desses territórios especificados. Artigo 8º 1. As declarações enviadas ao Diretor Geral do Secretariado da Organização Internacional do Trabalho, nos termos do Parágrafo 4 ou 5 ou do Artigo 35 da Constituição da Organização Internacional do Trabalho, indicarão se as disposições serão aplicadas no território concernente sem modificações ou sujeitas a modificações; quando a declaração indicar que as disposições da Convenção serão aplicadas sob reserva de modificações, especificarão as modificações. 2. O País-membro ou os Países-membros ou uma autoridade em causa poderão, em qualquer tempo, por declaração subseqüente, renunciar total ou parcialmente ao direito de invocar qualquer modificação indicada em declaração anterior. 3. O País-membro ou os Países-membros ou uma autoridade internacional em causa poderão, em qualquer tempo em que esta Convenção estiver sujeita a denúncia, de acordo com as disposições do Artigo 9º, enviar ao Diretor Geral declaração que modifique em

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qualquer outro sentido os termos de qualquer declaração anterior e informe sobre a situação atual com referência à aplicação da Convenção. Artigo 9º 1. O País-membro que ratificar esta Convenção poderá denunciá-la ao final de um período de dez anos, a contar da data de sua entrada em vigor, mediante comunicação, para registro, ao Diretor Geral do Secretariado da Organização Internacional do Trabalho. A denúncia não produzirá efeito antes de se completar um ano a contar da data de seu registro. 2. Todo País-membro que ratificar esta Convenção e que, no prazo de um ano após expirado o período de dez anos referido no parágrafo anterior, não tiver exercido o direito de denúncia previsto neste Artigo, ficará obrigado a um novo período de dez anos e, daí em diante, poderá denunciar esta Convenção ao final de cada período de dez anos, nos termos deste Artigo. Artigo 10° 1. O Diretor Geral do Secretariado da Organização Internacional do Trabalho dará ciência a todos os Países-membros da Organização do registro de todas as ratificações, declarações e denúncias que lhe forem comunicadas pelos Países-membros da Organização. 2. Ao notificar os Países-membros da Organização sobre o registro da segunda ratificação que lhe tiver sido comunicada, o Diretor Geral lhes chamará a atenção para a data em que a Convenção entrará em vigor. Artigo 11 O Diretor Geral do Secretariado dá Organização Internacional do Trabalho comunicará ao Secretário Geral da Organização das Nações Unidas, para registro, em conformidade com o Artigo 102 da Carta das Nações Unidas, informações circunstanciadas de todas as ratificações, declarações e atos de denúncia por ele registrados, nos termos do disposto nos artigos anteriores. Artigo 12 Quando considerar necessário, o Conselho de Administração do Secretariado da Organização Internacional do Trabalho encaminhará relatório à Conferência Geral sobre o desempenho desta Convenção e examinará a conveniência de incluir na ordem do dia da Conferência a questão de sua revisão total ou parcial. Artigo 13 1. No caso de adotar a Conferencia uma nova convenção, que reveja total ou parcialmente esta Convenção, a menos que a nova convenção disponha de outro modo, a)a ratificação, por um País-membro,da nova convenção revista implicará, ipso jure, a partir do momento em que entrar em vigor a Convenção revista, a denúncia imediata desta Convenção, não obstante as disposições constantes do Artigo 9º supra; b) a partir da data de entrada em vigor da convenção revista, esta Convenção deixará de estar sujeita a ratificação pelos Países-membros. 2. Esta Convenção continuará de qualquer maneira em vigor, na sua forma e conteúdo, para os Países membros que a ratificaram, mas não ratificarem a Convenção revista. Artigo 14 As versões em inglês e francês do texto desta Convenção são igualmente oficiais.

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ANEXO E

CONVENÇÃO 111 OIT

SOBRE A DISCRIMINAÇÃO EM MATÉRIA DE EMPREGO E PROFI SSÃO* A Conferência Geral da Organização Internacional do Trabalho, Convocada em Genebra pelo Conselho de Administração do Secretariado da Organização Internacional do Trabalho e reunida, em 4 de junho de 1958, em sua Quadragésima Segunda Reunião; Tendo decidido adotar diversas proposições relativas à discriminação em matéria de emprego e profissão, o que constitui a quarta questão da ordem do dia da reunião; Tendo decidido que essas proposições se revistam da forma de uma convenção internacional; Considerando que a Declaração de Filadélfia afirma que todos os seres humanos, sem distinção de raça, credo ou sexo, têm o direito de buscar tanto o seu bem-estar material quanto seu desenvolvimento espiritual, em condições de liberdade e de dignidade, de segurança econômica e de igual oportunidade; Considerando ainda que a discriminação constitui uma violação dos direitos enunciados na Declaração Universal dos Direitos Humanos, adota, aos vinte e cinco dias de junho do ano de mil novecentos e cinquenta e oito, esta Convenção que pode ser citada como a Convenção sobre a Discriminação (Emprego e Profissão), de 1958: Artigo 1º 1. Para os fins desta Convenção, o termo "discriminação" compreende: a) toda distinção, exclusão ou preferência, com base em raça, cor, sexo, religião, opinião política, nacionalidade ou origem social, que tenha por efeito anular ou reduzir a igualdade de oportunidade ou de tratamento no emprego ou profissão; b) qualquer outra distinção, exclusão ou preferência que tenha por efeito anular ou reduzir a igualdade de oportunidade ou tratamento no emprego ou profissão, conforme pode ser determinado pelo País-membro concernente, após consultar organizações representativas de empregadores e de trabalhadores, se as houver, e outros organismos adequados. 2. Qualquer distinção, exclusão ou preferência, com base em qualificações exigidas para um determinado emprego, não são consideradas como discriminação. 3. Para os fins desta Convenção, as palavras "emprego" e "profissão" compreendem o acesso à formação profissional, acesso a emprego e a profissões, e termos e condições de emprego. Artigo 2º Todo País-membro, no qual vigore esta Convenção, compromete-se a adotar e seguir uma política nacional destinada a promover, por meios adequados às condições e à prática nacionais, a igualdade de oportunidade e de tratamento em matéria de emprego e profissão, objetivando a eliminação de toda discriminação nesse sentido. Artigo 3º Todo País-membro, no qual vigore esta Convenção, compromete-se, por meios adequados às condições e à prática nacionais, a: * Data de entrada em vigor: 15 de julho de 1960.

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a) buscara cooperação de organizações de empregadores e de trabalhadores e de outros organismos apropriados, para promover a aceitação e observância dessa política; b) promulgar leis e promover programas educacionais de natureza que assegurem a aceitação e observância dessa política; c) revogar quaisquer disposições legais e modificar quaisquer normas ou práticas administrativas incompatíveis com essa política; d) pôr sob o controle direto de uma autoridade nacional a execução dessa política referente a emprego; e) assegurar a observância dessa política nas atividades de orientação profissional, de formação profissional e de oferta de empregos; f) indicar, em seus relatórios anuais sobre a aplicação da Convenção, as medidas adotadas na execução da política e os resultados por elas alcançados. Artigo 4 º Quaisquer medidas que afetem uma pessoa sobre a qual recaia legítima suspeita de estar se dedicando ou se achar envolvida em atividades prejudiciais à segurança do Estado, não serão consideradas discriminatórias, contanto que à pessoa envolvida assista o direito de apelar para uma instância competente de acordo com a prática nacional. Artigo 5 º 1. Não são consideradas discriminatórias medidas especiais de proteção ou de assistência providas em outras convenções ou recomendações adotadas pela Conferência Internacional do Trabalho. 2. Todo País-membro pode, mediante consulta a organizações representativas de empregadores e de trabalhadores, se as houver, definir, como não-discriminatórias, outras medidas especiais destinadas a atender a necessidades particulares de pessoas que, por motivo de sexo, idade, invalidez, encargos de família ou nível social ou cultural, necessitem de proteção ou assistência especial. Artigo 6 º Todo País-membro que ratifique esta Convenção compromete-se a aplicá-la nos territórios não metropolitanos de acordo comas disposições da Constituição da Organização Internacional do Trabalho. Artigo 7 º As ratificações formais desta Convenção serão comunicadas, para registro, ao Diretor Geral do Secretariado da Organização Internacional do Trabalho. Artigo 8 º 1. Esta Convenção obriga unicamente os Países-membros da Organização Internacional do Trabalho cujas ratificações tenham sido registradas pelo Diretor Geral. 2. Esta Convenção entrará em vigor doze meses após a data do registro, pelo Diretor Geral, das ratificações de dois Países-membros. 3. A partir de então, esta Convenção entrará em vigor para todo País-membro doze meses após a data do registro de sua ratificação. Artigo 9 º 1. Todo País-membro que ratificar esta Convenção poderá denunciá-la ao final de um período de dez anos, a contar da data de sua entrada em vigor, mediante comunicação ao Diretor Geral do Secretariado da Organização Internacional do Trabalho, para registro. A denúncia não terá efeito antes de se completar um ano a contar da data de seu registro. 2. Todo País-membro que ratificar esta Convenção e que, no prazo de um ano após expirado o período de dez anos referido no parágrafo anterior, não tiver exercido o direito de denúncia provido neste Artigo, ficará obrigado a um novo período de dez anos e, daí em

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diante, poderá denunciar esta Convenção ao final de cada período de dez anos, nos termos deste Artigo. Artigo 10 º 1. O Diretor Geral do Secretariado da Organização Internacional do Trabalho dará ciência a todos os Países-membros da Organização do registro de todas as ratificações e denúncias que lhe forem comunicadas pelos Países-membros da Organização. 2. Ao notificar os Países-membros da Organização sobre o registro da segunda ratificação que lhe tiver sido comunicada, o Diretor Geral lhes chamará a atenção para a data em que entrará em vigor a Convenção. Artigo 11 O Diretor Geral do Secretariado da Organização Internacional do Trabalho comunicará ao Secretário Geral da Organização das Nações Unidas, para registro, em conformidade com o Artigo 102 da Carta das Nações Unidas, informações circunstanciadas sobre todas as ratificações e atos de denúncia por ele registrados, nos termos do disposto nos artigos anteriores. Artigo 12 O Conselho de Administração do Secretariado da Organização Internacional do Trabalho apresentará à Conferência Geral, quando considerar necessário, relatório sobre o desempenho desta Convenção e examinará a conveniência de incluir na pauta da Conferência a questão de sua revisão total ou parcial. Artigo 13 1. No caso de adotar a Conferência uma nova convenção que reveja total ou parcialmente esta Convenção, a menos que a nova convenção disponha de outro modo, a) a ratificação, por um País-membro, da nova convenção revista implicará, ipso jure, a denúncia imediata desta Convenção, a partir do momento em que entrar em vigor a Convenção revista, não obstante as disposições constantes do Artigo 9º; b) a partir da datada entrada em vigor da convenção revista, esta Convenção deixará de estar sujeita a ratificação pelos Países-membros. 2. Esta Convenção continuará, entretanto, em vigor, na sua forma e conteúdo atuais, para os Países-membros que a ratificaram, mas não ratificarem a convenção revista. Artigo 14 As versões em inglês e francês do texto desta Convenção são igualmente oficiais.

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ANEXO F

RECOMENDAÇÃO 200 OIT

RECOMENDAÇÃO SOBRE A INFECÇÃO HIV E AIDS E O MUNDO DO TRABALHO

A Conferência Geral da Organização Internacional do Trabalho, Convocada para Genebra pelo Conselho de Administração da Organização Internacional do Trabalho e tendo-se reunido em 2 de Junho de 2010, na sua nonagésima nona sessão; e Observando que o HIV e AIDS têm um forte impacto na sociedade e na economia, no mundo do trabalho, nos sectores formal e informal, nos trabalhadores, nas suas famílias e pessoas a cargo, nas organizações de empregadores e de trabalhadores e nas empresas públicas e privadas, pondo em causa a realização do trabalho digno e do desenvolvimento sustentável; e Reafirmando a importância da função desempenhada pela Organização Internacional do Trabalho relativa ao HIV e AIDS no mundo do trabalho, bem como a necessidade de que a Organização redobre os seus esforços para realizar a justiça social e combater a discriminação e estigmatização relacionadas com o HIV e AIDS em todos os aspectos da sua atividade e do seu mandato; e Recordando a importância de reduzir a economia informal que afeta o trabalho digno e o desenvolvimento sustentável para melhor mobilizar o mundo do trabalho na resposta ao HIV e AIDS; e Observando que o elevado nível de desigualdade social e económica, a falta de informação e de sensibilização, a ausência de confidencialidade, o insuficiente acesso ao tratamento e a não-adesão contribuem para aumentar o risco de transmissão do HIV, os níveis de mortalidade, o número de crianças que perderam um dos progenitores ou ambos, bem como o número de trabalhadores que executam trabalho informal; e Considerando que a pobreza, a desigualdade social e económica e o desemprego aumentam o risco da dificuldade de acesso à prevenção, ao tratamento, aos cuidados e apoio, aumentando assim o risco de transmissão; e Observando que o estigma, a discriminação e a ameaça da perda de emprego sofridos pelas pessoas afetadas pelo HIV ou AIDS constituem obstáculos ao conhecimento pelas mesmas do seu estado serológico em termos de HIV, aumentando assim a vulnerabilidade dos trabalhadores ao HIV e afetando o seu direito aos benefícios sociais; e Notando que o HIV e AIDS têm um impacto mais grave sobre os grupos vulneráveis e de risco; e Registando que o HIV afeta tanto homens como mulheres, muito embora as mulheres e raparigas estejam em maior risco e sejam mais vulneráveis à infecção por HIV do que os homens e sejam afetadas de modo desproporcionado por esta pandemia em resultado da desigualdade de género, pelo que o reforço dos direitos das mulheres é um elemento essencial da resposta mundial ao HIV e AIDS; e

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Relembrando a importância de proteger os trabalhadores através de programas mundiais de segurança e saúde no trabalho; e Recordando a importância do código de práticas da OIT, Coletânea das Diretivas Práticas da OIT sobre o HIV/AIDS e o mundo do trabalho, 2001, bem como a necessidade de reforçar o seu impacto dada a existência de limites e lacunas na sua execução; e Registando a necessidade de promover e aplicar as convenções e recomendações internacionais do trabalho e outros instrumentos internacionais pertinentes em relação ao HIV e AIDS e ao mundo do trabalho, incluindo aqueles que reconhecem o direito de beneficiar do melhor estado de saúde possível e de condições de vida dignas; e Recordando o papel específico das organizações de empregadores e de trabalhadores no sentido de promover e apoiar os esforços nacionais e internacionais desenvolvidos em resposta ao HIV e AIDS no mundo do trabalho; e Constatando o importante papel desempenhado pelo local de trabalho no que diz respeito à informação, sobre o acesso à prevenção, tratamento, assistência e apoio na resposta nacional ao HIV e AIDS; e Afirmando a necessidade de prosseguir e intensificar a cooperação internacional, em especial no âmbito do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre o HIV/AIDS, a fim de apoiar os esforços tendo em vista a aplicação da presente Recomendação; e Relembrando o valor da colaboração a nível nacional, regional e internacional com os organismos dedicados ao HIV e AIDS, nomeadamente com o sector da saúde e com as organizações pertinentes, especialmente as que representam as pessoas com HIV; e Afirmando a necessidade de estabelecer uma norma internacional destinada a orientar os governos e as organizações de empregadores e trabalhadores na delimitação das funções e competências a todos os níveis; e Tendo deliberado sobre a adopção de certas propostas relativas ao HIV e AIDS e ao mundo do trabalho, e Tendo determinado que essas propostas tomariam a forma de uma Recomendação, adopta, aos dezessete de Junho de dois mil e dez, a Recomendação que se segue, que será denominada “Recomendação sobre HIV e AIDS, de 2010”. I. DEFINIÇÕES 1. Para os fins da presente Recomendação, entende-se por: a) “HIV”, o vírus da imunodeficiência humana, que enfraquece o sistema imunitário humano. A infecção pode ser prevenida através de medidas adequadas; b) “AIDS”, a síndrome da imunodeficiência adquirida resultante da infecção com HIV em fase avançada, e que se caracteriza pelo aparecimento de infecções ou cancros oportunistas relacionados com o HIV, ou de ambos; c) “pessoas com HIV”, pessoas infectadas com HIV; d) “estigma”, a marca social que, quando associada a uma pessoa, causa normalmente a sua marginalização ou representa um obstáculo a um vida plena em sociedade por parte da pessoa infectada ou afetada pelo HIV; e) “discriminação”, qualquer distinção, exclusão ou preferência que tenha como efeito anular ou alterar a igualdade de oportunidades ou de tratamento no emprego ou na profissão, tal como referido na Convenção e na Recomendação relativas à Discriminação no Emprego e na Profissão, de 1958; f) “pessoas afetadas”, as pessoas cuja vida é alterada pelo HIV ou AIDS devido ao vasto impacto da pandemia;

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g) "adaptação adequada", qualquer modificação ou adaptação de um emprego ou local de trabalho que seja razoavelmente viável e que permita a uma pessoa que viva com HIV ou AIDS ter acesso ao emprego e participar ou progredir no trabalho; h) "vulnerabilidade", a desigualdade de oportunidades, a exclusão social, o desemprego ou o emprego precário resultantes dos fatores sociais, culturais, políticos e económicos que tornam a pessoa mais susceptível à infecção por HIV e ao desenvolvimento de AIDS; i) “local de trabalho”, qualquer local onde os trabalhadores exerçam a sua atividade; j) “trabalhador”, qualquer pessoa que trabalhe sob qualquer forma ou em qualquer modalidade. II. ÂMBITO DE APLICAÇÃO 2. A presente Recomendação abrange: a) todos os trabalhadores, independentemente do tipo ou regime de trabalho ou do local onde exercem a sua atividade profissional, incluindo: i) as pessoas que exercem qualquer emprego ou profissão; ii) as pessoas em fase de formação, incluindo os estagiários e aprendizes; iii) os voluntários; iv) as pessoas que procuram trabalho e os candidatos a emprego; v) os trabalhadores afastados das suas funções ou suspensos; b) todos os sectores da atividade económica, incluindo os sectores privado e público e a economia formal e informal; e c)as forças armadas e militarizadas. III. PRINCÍPIOS GERAIS 3. Os princípios gerais seguintes devem aplicar-se a todas as ações desenvolvidas no âmbito das medidas nacionais de combate ao HIV e AIDS no mundo do trabalho: a) a resposta ao HIV e AIDS deve ser reconhecida pelo seu contributo para a realização dos direitos humanos e das liberdades fundamentais e da igualdade de género para todos, incluindo os trabalhadores, as suas famílias e pessoas a cargo; b) o HIV e AIDS devem ser reconhecidos e tratados como uma questão que afeta o local de trabalho, a qual deve figurar entre os elementos essenciais da resposta nacional, regional e internacional à pandemia, mediante a plena participação das organizações de empregadores e de trabalhadores; c) não devem ser exercidas discriminações nem estigmatizações de trabalhadores, em especial das pessoas que procuram trabalho ou dos candidatos a emprego, em função do seu estatuto HIV real ou suposto ou pelo facto de pertencerem a regiões do mundo ou a segmentos da população considerados como estando mais expostos ou vulneráveis à infecção de HIV; d) a prevenção de todos os modos de transmissão do HIV deve ser uma prioridade fundamental; e) os trabalhadores, as suas famílias e pessoas a cargo devem ter acesso e poder beneficiar da prevenção, tratamento, assistência e apoio em relação ao HIV e AIDS, e o local de trabalho deve contribuir para facilitar o acesso a esses serviços; f) a participação e o empenho dos trabalhadores na concepção, execução e avaliação dos programas adoptados a nível nacional e no local de trabalho devem ser reconhecidos e reforçados; g) os trabalhadores devem beneficiar de programas destinados a prevenir riscos específicos de transmissão, no âmbito da profissão, do HIV e das doenças transmissíveis que lhe estão associadas, como a tuberculose; h) os trabalhadores, as suas famílias e seus dependentes devem beneficiar da proteção da sua privacidade, incluindo a confidencialidade relacionada com o HIV e AIDS, especialmente no que se refere ao seu próprio estatuto HIV; i) nenhum trabalhador deve ser obrigado a submeter-se a um teste de HIV nem a revelar o seu estatuto HIV; e

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j) as medidas relativas ao HIV e AIDS no mundo do trabalho devem fazer parte das políticas e programas nacionais de desenvolvimento, incluindo os relacionados com o trabalho, a educação, a proteção social e a saúde; k) deve ser assegurada proteção aos trabalhadores que, no âmbito da sua profissão, estão particularmente expostos ao risco da transmissão do HIV. IV. POLÍTICAS E PROGRAMAS NACIONAIS 4. Os Membros deverão: a) adotar políticas e programas nacionais em matéria de HIV e AIDS e relativamente ao mundo do trabalho e à segurança e saúde no trabalho, caso não existam; e b) integrar as suas políticas e programas sobre HIV e AIDS e o mundo do trabalho em planos de desenvolvimento e estratégias de redução da pobreza, incluindo estratégias para o trabalho digno e para empresas sustentáveis, bem como nas estratégias geradoras de rendimentos, conforme adequado. 5. Na elaboração das políticas e programas nacionais, as autoridades competentes devem ter em conta o código de boas práticas da OIT sobre HIV/AIDS de 2001, bem como as suas posteriores revisões, outros instrumentos relevantes da Organização Internacional do Trabalho e outras orientações internacionais adoptadas neste domínio. 6. As políticas e programas nacionais devem ser desenvolvidos pelas autoridades competentes mediante consulta das organizações mais representativas dos empregadores e trabalhadores, bem como das organizações representativas das pessoas afetadas pelo HIV, tendo em conta os pareceres dos sectores pertinentes, especialmente do setor da saúde. 7. Na concepção das políticas e programas a nível nacional, as autoridades competentes devem ter em conta a função do local de trabalho na prevenção, tratamento, assistência e apoio, nomeadamente promovendo conselhos e rastreios a título voluntário, em colaboração com as comunidades locais. 8. Os Membros devem aproveitar todas as oportunidades para difundir informações sobre as políticas e programas adoptados em matéria de HIV e AIDS e o mundo do trabalho, através das organizações de empregadores e de trabalhadores, de outras entidades competentes para o HIV e AIDS e dos órgãos de comunicação social. 9. Após consulta das organizações mais representativas dos empregadores e trabalhadores, os governos devem ponderar a concessão de uma proteção semelhante à prevista pela Convenção relativa à Discriminação no Emprego e na Profissão, de 1958, a fim de impedir a discriminação com base no estatuto HIV, quer seja real ou suposto. 10. O estatuto HIV, quer seja real ou presumido, não deve ser um motivo de discriminação que impeça o recrutamento ou a manutenção do emprego, nem a procura da igualdade de oportunidades prevista na Convenção relativa à Discriminação no Emprego e na Profissão, de 1958. 11. O estatuto HIV real ou suposto não deve ser causa de despedimento. A ausência temporária do trabalho por motivos de doença ou de assistência a doentes atingidos pelo HIV e AIDS deve ser tratada como qualquer ausência por motivos de saúde, tendo em conta a Convenção sobre a Cessação da Relação de Trabalho, de 1982. 12. Quando as medidas existentes contra a discriminação no local de trabalho não forem adequadas para uma proteção efetiva contra a discriminação face ao HIV e AIDS, os Membros deverão adaptar estas medidas ou recorrer a novas soluções, assegurando a sua execução efetiva e transparente. 13. As pessoas que têm doenças relacionadas com o HIV não devem ser privadas da possibilidade de continuarem a exercer as suas funções, com adaptações razoáveis se necessário, enquanto estiverem clinicamente aptas para assumir essas funções. Devem ser incentivadas medidas tendo em vista a reafectação dessas pessoas para empregos razoavelmente adaptados às suas aptidões, que lhes permitam encontrar outro trabalho através de uma formação ou que facilitem o seu regresso ao trabalho, tendo em conta os instrumentos aplicáveis da Organização Internacional do Trabalho e das Nações Unidas. 14. Deverão ser adoptadas medidas no local de trabalho ou por intermédio deste com vista a reduzir a transmissão do HIV e atenuar o seu impacto. Estas medidas devem passar por:

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a) garantir o respeito dos direitos humanos e das liberdades fundamentais; b) garantir a igualdade de género e o reforço dos direitos das mulheres; c) promover ações que previnam e proíbam a violência e o assédio no local de trabalho; d) incentivar a participação ativa dos trabalhadores de ambos os sexos na luta contra o HIV e AIDS; e) promover a participação e capacitação de todos os trabalhadores, qualquer que seja a sua orientação sexual e quer pertençam ou não a um grupo vulnerável; f) promover a proteção da saúde sexual e reprodutiva e os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres e dos homens; g) garantir a efetiva confidencialidade dos dados pessoais, nomeadamente dos dados médicos. Prevenção 15. As estratégias de prevenção devem ser adaptadas às circunstâncias nacionais e ao tipo de local de trabalho, e devem ter em conta os fatores de gênero, culturais, sociais e económicos. 16. Os programas de prevenção devem assegurar: a) a disponibilização e o acesso a todos de informações corretas, atualizadas, pertinentes e oportunas num formato e linguagem adaptados ao contexto cultural, através dos diferentes meios de comunicação disponíveis; b) programas educativos generalizados destinados a ajudar as mulheres e os homens a compreender e reduzir os riscos associados a todos os modos de transmissão do HIV, incluindo a transmissão de mãe para filho, e a compreender a importância de mudar os comportamentos de risco relacionados com a infecção; c) medidas eficazes de saúde e segurança no trabalho; d) medidas de incentivo aos trabalhadores para que conheçam a sua condição HIV através de aconselhamento e realização de testes voluntários; e) acesso a todos os meios de prevenção garantindo, a disponibilidade dos recursos necessários para esse fim, como preservativos masculinos e femininos e, se necessário, o acesso a informações sobre a sua correta utilização, bem como a disponibilidade de uma profilaxia pós-exposição; f) medidas eficazes destinadas a reduzir os comportamentos de alto risco, sem esquecer os grupos mais expostos ao risco, a fim de diminuir a incidência do HIV; g) estratégias de redução dos riscos baseadas em orientações publicadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS), o Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS (ONUAIDS) e o Gabinete das Nações Unidas contra a Droga e o Crime (UNODC), bem como noutras diretrizes pertinentes. Tratamento e assistência 17. Os Membros devem garantir que as suas políticas e programas nacionais para as intervenções sanitárias no local de trabalho sejam determinados após consulta dos empregadores e trabalhadores e dos seus representantes e articulados com os serviços públicos de saúde. Deverão proporcionar o conjunto mais amplo possível de intervenções adequadas e eficazes a fie prevenir o HIV e AIDS e controlar o seu impacto. 18. Os Membros devem garantir que os trabalhadores com HIV e as pessoas a seu cargo beneficiem do pleno acesso aos cuidados de saúde, quer estes sejam prestados no âmbito dos sistemas de saúde pública, da segurança social, de seguros privados ou de outros regimes. Os Membros devem igualmente velar pela educação e sensibilização dos trabalhadores a fim de lhes facilitar o acesso aos cuidados de saúde. 19. Todas as pessoas abrangidas pela presente Recomendação, incluindo os trabalhadores com HIV, bem como as suas famílias e pessoas a cargo, devem ter direito a serviços de saúde. Esses serviços devem incluir o acesso gratuito ou a preço razoável a: a) Aconselhamento e testes com carácter voluntário; b) tratamento anti-retrovírico, bem como educação, informação e apoio na observância desses tratamentos;

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c) nutrição adequada, compatível com o tratamento; d) tratamento das infecções oportunistas, e das infecções sexualmente transmitidas e de quaisquer outras doenças relacionadas com o HIV, em especial a tuberculose; e e) programas de apoio e prevenção, incluindo apoio psicossocial, para as pessoas com HIV. 20. Os trabalhadores e as pessoas a seu cargo não devem ser alvo de discriminação fundada no seu estado serológico, real ou suposto, no acesso aos sistemas da segurança social e aos regimes de seguro de saúde, ou em relação às prestações decorrentes desses regimes, nomeadamente no que se refere às prestações de saúde, invalidez, morte e sobrevivência. Apoio 21. Os programas de assistência e apoio devem incluir medidas de adaptação adequada no local de trabalho para as pessoas que vivem com o HIV ou com doenças relacionadas com o HIV, tendo em conta as circunstâncias nacionais. O trabalho deve ser organizado de forma a ter em conta o carácter episódico do HIV e AIDS, bem como os possíveis efeitos secundários do tratamento. 22. Os Membros devem promover a retenção no trabalho e o recrutamento das pessoas com HIV. Deverão igualmente ponderar a possibilidade de continuar a prestar apoio durante os períodos de emprego e desemprego incluindo, se necessário oportunidades geradoras de rendimentos a pessoas com HIV ou pessoas infectadas pelo HIV ou AIDS. 23. Sempre que for possível estabelecer uma ligação direta entre uma profissão e o risco de infecção por HIV devem ser reconhecidos como doença profissional ou acidente de trabalho, em conformidade com os procedimentos e definições nacionais, e tendo em conta a Recomendação sobre a Lista de Doenças Profissionais de 2002, bem como outros instrumentos pertinentes da Organização Internacional do Trabalho. Testes, privacidade e confidencialidade 24. A realização de testes deve ser verdadeiramente voluntária e isenta de qualquer coação, e os programas de rastreio devem respeitar as orientações internacionais sobre confidencialidade, aconselhamento e consentimento. 25. Os trabalhadores, incluindo os trabalhadores migrantes, as pessoas à procura de trabalho e os candidatos a emprego, não devem ser obrigados a submeter-se a um teste ou a outras formas de rastreio do HIV. 26. Os resultados dos testes de HIV devem ser confidenciais e não comprometer o acesso ao emprego, à continuidade no trabalho, à segurança no emprego ou às oportunidades de progressão. 27. Os trabalhadores, incluindo os trabalhadores migrantes, as pessoas à procura de trabalho e os candidatos a emprego, não devem ser obrigados pelos países de origem, de trânsito ou de destino, a revelar informações que digam respeito si próprias ou a outras pessoas relativamente ao HIV. O acesso a essas informações deve reger-se por normas de confidencialidade, compatíveis com o código de práticas da OIT sobre a proteção dos dados pessoais dos trabalhadores, de 1997, e com outras normas internacionais pertinentes sobre proteção de dados. 28. Os trabalhadores migrantes ou os trabalhadores que desejem migrar por motivos de emprego não devem ser impedidos de o fazer pelos países de origem, de trânsito ou de destino devido ao seu real ou suposto estatuto HIV. 29. Os Membros devem adoptar procedimentos de resolução de conflitos facilmente acessíveis que protejam os trabalhadores em caso de violação dos seus direitos acima referidos. Segurança e saúde no trabalho 30. O ambiente de trabalho deve ser seguro e saudável, a fim de prevenir a transmissão do HIV no local de trabalho, tendo em conta a Convenção e Recomendação sobre Segurança e Saúde no Trabalho, de 1981, a Convenção e Recomendação sobre o Quadro Promocional para a Segurança e Saúde no Trabalho, de 2006, bem como outros instrumentos

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internacionais relevantes, como os documentos conjuntos de orientação da Organização Internacional do Trabalho e da OMS. 31. As medidas de segurança e saúde destinadas a prevenir a exposição dos trabalhadores ao HIV no local de trabalho devem incluir medidas universais de precaução e de prevenção de acidentes e riscos, tais como medidas organizativas, medidas técnicas e métodos de trabalho preventivos, equipamentos de proteção individual, se necessário, medidas de controlo do ambiente de trabalho, medidas de profilaxia pós-exposição e outras medidas de segurança destinadas a minimizar o risco de contrair HIV e tuberculose, especialmente nas profissões de maior risco, incluindo o sector da saúde. 32. Quando exista no trabalho a possibilidade de exposição ao HIV, os trabalhadores devem receber informação e formação necessárias sobre os modos de transmissão e as medidas destinadas a prevenir a exposição à infecção. Os Membros devem adoptar medidas destinadas a garantir que a prevenção, segurança e saúde sejam asseguradas nos termos das normas aplicáveis. 33. As medidas de sensibilização devem salientar o facto de o HIV não ser transmitido pelo simples contato físico e de a presença de uma pessoa com HIV não constituir um risco no local de trabalho. 34. Os serviços de saúde no trabalho e os mecanismos existentes no local de trabalho relacionados com a segurança e saúde no trabalho devem abordar a questão do HIV e AIDS tendo em conta a Convenção e Recomendação sobre os Serviços de Saúde no Trabalho, de 1985, as Diretrizes conjuntas OIT/OMS sobre os serviços de saúde e a infecção HIV/AIDS, bem como qualquer revisão posterior, e outros instrumentos internacionais pertinentes. Crianças e jovens 35. Os Membros devem adoptar medidas de combate ao trabalho infantil e ao tráfico de crianças que possam resultar da morte ou doença, com AIDS, dos familiares ou cuidadores e a fim de reduzir a vulnerabilidade das crianças ao HIV, tendo em conta a Declaração da OIT relativa aos Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho, de 1998, a Convenção e Recomendação sobre Idade Mínima, de 1973, e a Convenção e Recomendação sobre as Piores Formas de Trabalho Infantil, de 1999. Devem ser adoptadas medidas especiais para proteger essas crianças dos abusos sexuais e da exploração sexual. 36. Os Membros devem lançar medidas destinadas a proteger os trabalhadores jovens da infecção por HIV e incluir as necessidades específicas das crianças e dos jovens nas estratégias de luta contra o HIV e a AIDS integradas nas políticas e programas nacionais. Estas medidas devem incluir uma educação objetiva em matéria de saúde sexual e reprodutiva, em particular a divulgação de informações sobre HIV e AIDS através da formação profissional e nos programas e serviços para o emprego dos jovens. V. IMPLEMENTAÇÃO 37. As políticas e programas nacionais relativos ao HIV e AIDS e ao mundo do trabalho deverão: a) ser implementada mediante consulta das organizações de empregadores e trabalhadores mais representativas e de outras partes interessadas, incluindo as estruturas públicas e privadas competentes no domínio da saúde no trabalho, através de um ou vários dos meios seguintes: i) legislação nacional; ii) convenções coletivas; iii) políticas e programas de ação à escala nacional e do local de trabalho; iv) estratégias setoriais, com especial incidência nos sectores em que as pessoas abrangidas pela presente Recomendação estão mais expostas ao risco; b) associar as autoridades judiciais competentes em matéria de trabalho, bem como a administração laboral, ao planeamento e implementação das políticas e programas, devendo ser-lhes proporcionada formação neste domínio;

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c) prever medidas na legislação e regulamentação nacionais que contemplem os atos que atentem contra a privacidade e a confidencialidade e contra qualquer proteção facultada ao abrigo da presente Recomendação; d) garantir a colaboração e coordenação entre as autoridades públicas e os serviços públicos e privados em causa, incluindo regimes de seguro e de prestações sociais ou outro tipo de programas; e) promover e apoiar a ação de todas as empresas para pôr em prática as políticas e programas nacionais, nomeadamente através das suas cadeias de fornecimento e redes de distribuição, com a participação das organizações de empregadores e de trabalhadores, e velar pelo seu cumprimento por parte das empresas que operam nas zonas francas de exportação; f) promover o diálogo social, incluindo a consulta e negociação, consistente com a Convenção relativa às Consultas Tripartidas (Normas Internacionais do Trabalho), de 1976, bem como outras formas de cooperação entre as autoridades governamentais, os empregadores e trabalhadores do sector público e privado e os seus representantes, tendo em conta os pareceres do pessoal responsável pela saúde no trabalho, dos especialistas em HIV e AIDS e de outras partes interessadas, incluindo as organizações que representam as pessoas com HIV, as organizações internacionais, as organizações pertinentes da sociedade civil e os mecanismos de coordenação nacionais; g) ser formulados, executados, periodicamente revistos e atualizados, tendo em conta os elementos científicos e sociais mais recentes, bem como a necessidade de integrar as questões da igualdade de gênero e os aspectos culturais; h) ser coordenados, nomeadamente, com as políticas e programas de emprego, segurança social e saúde; i) garantir que os Membros preveem meios razoáveis para a sua implementação, tendo devidamente em conta as circunstâncias nacionais, bem como as capacidades dos empregadores e trabalhadores. Diálogo social 38. A implementação das políticas e programas relativos ao HIV e AIDS deve basear-se na cooperação e confiança entre os empregadores e trabalhadores e os seus representantes, bem como os governos, mediante a participação ativa, no local de trabalho, das pessoas com HIV. 39. As organizações de empregadores e trabalhadores devem promover a sensibilização sobre HIV e AIDS, incluindo a prevenção e não discriminação, através de atividades de formação e informação dos seus membros. Estas atividades devem ter em conta as diferenças de género e culturais. Educação, formação, informação e consulta 40. A formação, as instruções de segurança e a necessária orientação no local de trabalho em matéria de HIV e AIDS devem ser prestadas de forma clara e acessível a todos os trabalhadores e, em especial, aos trabalhadores migrantes, recentemente recrutados ou inexperientes, aos jovens trabalhadores e às pessoas em formação, incluindo estagiários e aprendizes. A formação, instruções e orientações devem ter em conta as diferenças de gênero e culturais e adaptar-se às características dos trabalhadores, não ignorando os fatores de risco a que estão expostos. 41. Devem ser facultadas aos empregadores, gestores e representantes dos trabalhadores informações científicas e sócio-econômicas atualizadas e, se necessário, educação e formação sobre HIV e AIDS, a fim de os ajudar a adoptar as medidas adequadas no local de trabalho. 42. Os trabalhadores, incluindo estagiários, bolseiros e voluntários, devem receber informações de sensibilização e formação adequadas sobre os métodos de controlo da infecção por HIV no contexto dos acidentes e primeiros socorros no trabalho. Os trabalhadores que exerçam funções com risco de exposição a sangue humano, produtos

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sanguíneos e outros fluidos corporais devem receber formação adicional sobre prevenção da exposição, processos de registo de exposição e profilaxia pós-exposição. 43. Os trabalhadores e seus representantes devem ter o direito a ser informados e consultados sobre as políticas e programas relativos ao HIV e AIDS no local de trabalho. Os representantes dos trabalhadores e dos empregadores devem participar nas inspeções aos locais de trabalho de acordo com as práticas nacionais. Serviços públicos 44. O papel dos serviços da administração do trabalho, nomeadamente da inspeção do trabalho e das autoridades judiciais competentes em matéria laboral, na luta contra o HIV e a AIDS deve ser reanalisado e, se necessário, reforçado. 45. Os sistemas de saúde pública devem ser reforçados e seguir as Diretrizes conjuntas OIT/OMS sobre os serviços de saúde e a infecção HIV/AIDS, de 2005, bem como qualquer revisão posterior, a fim de ajudar a garantir maior acesso à prevenção, tratamento, assistência e apoio, e contribuir para reduzir a pressão adicional causada aos serviços públicos, especialmente aos trabalhadores da saúde, pelo HIV e AIDS. Cooperação internacional 46. Os Membros devem cooperar, mediante acordos bilaterais e multilaterais, através da sua participação no sistema multilateral ou de outros meios eficazes, com vista a dar execução à presente Recomendação. 47. Os países de origem, de trânsito e de destino devem adoptar medidas a fim de garantir o acesso à prevenção, tratamento, assistência e apoio em caso de HIV e, sempre que adequado, deverão ser celebrados acordos entre os países visados. 48. Deve ser incentivada a cooperação internacional entre e com os Membros, as suas estruturas nacionais que se ocupam do HIV e AIDS e as organizações internacionais competentes, devendo as mesmas abranger o intercâmbio sistemático de informações sobre todas as medidas tomadas na resposta à pandemia do HIV. 49. Os Membros e organizações multilaterais devem prestar especial atenção à coordenação e aos recursos necessários para corresponder às necesAIDSdes de todos os países, especialmente dos países com forte incidência de HIV, ao desenvolverem estratégias e programas internacionais para a prevenção, tratamento, assistência e apoio relacionados com o HIV. 50. Os Membros e as organizações internacionais devem esforçar-se por reduzir os preços de todos os produtos destinados à prevenção, tratamento e assistência à infecção de HIV, de outras infecções e cancros oportunistas relacionados com HIV. VI. ACOMPANHAMENTO 51. Os Membros devem estabelecer um mecanismo adequado, ou utilizar os existentes, para monitorizar a evolução das respectivas políticas nacionais em matéria de HIV e AIDS e do mundo do trabalho, e a fim de emitir pareceres sobre a sua adopção e execução. 52. As organizações de empregadores e de trabalhadores mais representativas devem participar, em pé de igualdade, no mecanismo de monitorização da evolução da política nacional. Paralelamente, essas organizações devem ser consultadas no âmbito desse mecanismo sempre que necessário, tendo em conta os pareceres das organizações de pessoas que vivem com HIV, bem como os relatórios de peritos ou os estudos técnicos. 53. Os Membros deverão obter de forma tão extensa quanto possível, e tendo em consideração a distribuição de mulheres e homens e outros aspectos pertinentes, informações detalhadas, dados estatísticos e efetuar estudos sobre a evolução a nível nacional e setorial no que se refere ao HIV e AIDS no mundo do trabalho. 54. Além da apresentação de relatórios prevista no artigo 19.º da Constituição da Organização Internacional do Trabalho, um balanço periódico das medidas adoptadas com base na presente Recomendação poderá ser incluído nos relatórios nacionais apresentados à ONUAIDS e nos relatórios apresentados ao abrigo dos instrumentos internacionais relevantes.

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O texto que antecede é o texto autêntico da Recomendação devidamente adoptada pela Conferência Geral da Organização Internacional do Trabalho na sua nonagésima nona sessão realizada em Genebra, a qual foi declarada concluída aos 18 de Junho de 2010. EM FÉ DO QUE foram apostas as assinaturas aos 18 de Junho de 2010: O Presidente da Conferência, O Diretor-Geral do Bureau Internacional do Trabalho,

Anexo Resolução relativa à promoção e aplicação da Recomendação sobre a infecção HIV e AIDS e o mundo do trabalho, de 2010 A Conferência Geral da Organização Internacional do Trabalho, reunida na sua 99.ª Sessão, em 2010, Tendo adoptado a Recomendação sobre a infecção HIV e AIDS e o mundo do trabalho, de 2010, Observando que o êxito da Recomendação irá depender da promoção e aplicação efetivas das suas disposições, Consciente de que o mandato fundamental da Organização consiste em promover o trabalho digno e as empresas sustentáveis, Registando a participação da OIT, como organização tripartida, nas atividades do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre a infecção HIV/AIDS (ONUAIDS) para combater o HIV e a AIDS, 1. Convida o Conselho de Administração da Organização Internacional do Trabalho a atribuir recursos no âmbito do orçamento existente e a procurar recursos extra-orçamentais adicionais a fim de realizar atividades com os membros tripartidos para dar cumprimento à Recomendação no mundo do trabalho. 2. Convida o Conselho de Administração a adoptar medidas destinadas a promover atividades de colaboração com as diferentes organizações internacionais que se ocupam do HIV/AIDS no local de trabalho. 3. Convida o Conselho de Administração a solicitar a elaboração de um Plano de Ação Mundial a fim de alcançar uma ampla execução da Recomendação tendo em vista reduzir o impacto do HIV/AIDS no local de trabalho. Esse Plano deve ser desenvolvido com as organizações de empregadores e trabalhadores representativas, tendo em conta as posições da ONUAIDS, das organizações que representam as pessoas com HIV/AIDS, e de outras partes interessadas. 4. Convida o Conselho de Administração a solicitar ao Diretor-Geral que preste a devida atenção à distribuição equitativa dos recursos de cooperação técnica da OIT aos países. Os Estados-membros e as organizações de trabalhadores e empregadores mais representativos podem solicitar apoio para a aplicação da Recomendação em áreas como: a) a assistência técnica ao desenvolvimento e implementação de políticas, programas e leis nacionais de caráter tripartido a fim de dar cumprimento ao disposto na presente Recomendação; b) a prestação de apoio e o reforço de capacidades para a formação, comunicação, monitorização, execução e a promoção, por exemplo: i) o desenvolvimento de programas e materiais de formação tendo em vista o reforço das capacidades, incluindo os que possuam uma abordagem setorial; ii) a formação de elementos de coordenação e de formação em matéria de HIV/AIDS no local de trabalho, incluindo os representantes dos empregadores e trabalhadores, bem como os gestores de pessoal;

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iii) a elaboração de materiais e ferramentas de promoção e informação relacionados com a Recomendação; e iv) seminários e workshops nacionais e regionais destinados a promover a Recomendação.

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ANEXO G

INSTRUMENTOS COLETIVOS ANALISADOS NO PRESENTE TRABA LHO

• PREVENDO GARANTIAS ESPECÍFICAS AO PORTADOR DO VÍRUS HIV:

• CCT Sindicato dos Comerciários de São Paulo e Sindicato dos Lojistas do Comércio de São Paulo – 2010/2011 – cláusula 48ª;

• CCT Sindicato da Categoria Profissional dos Empregados e de Trabalhadores em Empresas de Turismo no Estado de São Paulo – SETETUR – Inter Municipal e Sindicato das Empresas de Turismo do Estado de São Paulo – 2010/2011 – cláusula 61ª;

• CCT Sindicato dos Empregados em Empresas de Segurança e Vigilância do Estado de Sergipe e Sindicato das Empresas de Segurança Privada no Estado de Sergipe – 2011/2012 – cláusula 19ª.

• CONTENDO CLÁUSULAS DE AÇÕES AFIRMATIVAS AO ACESSO E MANUTENÇÃO DO EMPREGO:

• CCT Sindicato dos Empregados no Comércio de Uberlância e Araguari e

Sindicato do Comércio Varejista e Atacadista de Araguari – 2010 – cláusula 31ª;

• CCT Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Confecção e Bordados de Ibitinga e Região e Sindicato das Indústrias e Comércio de Bordados de Ibitinga – 2010/2011 – cláusula 36ª;

• ACT de Âmbito Nacional Banco do Brasil e Confederação Nacional dos Trabalhadores nas Empresas de Crédito – CONTEC – 2010/2011 – cláusula 46ª.