capÍtulo v oscilaÇÕes e ondas - instituto de plasmas e ...varandas/capitulo5.pdf · ... as ondas...

20
CAPÍTULO V OSCILAÇÕES E ONDAS 5.1. INTRODUÇÃO Este capítulo apresenta alguns conceitos fundamentais de dois fenómenos físicos que são muito correntes no nosso quotidiano: as oscilações e as ondas. As oscilações ocorrem quando um sistema físico é afastado ligeiramente da sua posição de equilíbrio estável. Como exemplos de osciladores podemos referir o movimento para cima e para baixo de um barco âncorado no alto-mar, o pêndulo de um relógio antigo de parede, uma massa suspensa na extremidade de uma mola 1 , um circuito eléctrico constituido por uma bobina e um condensador 2 e o movimento das partículas carregadas de um plasma 3 em torno da suas posições de equilíbrio. Como veremos na secção seguinte, as oscilações são caracterizadas por um movimento sinusoidal, mais ou menos amortecido, de uma grandeza característica do oscilador (por exemplo, o ângulo do pêndulo com a direcção vertical ou o deslocamento em relação à posição de equilíbrio da massa do sistema massa-mola ou a corrente eléctrica que percorre um circuito LC (Figura 5.1)) As ondas correspondem a oscilações no tempo que são geradas num dado ponto (emissor) e que se propagam no espaço, de modo a transmitirem informação sob a forma de energia e momento, sem contudo transportarem matéria. Este facto significa que se um observador analisar uma onda num ponto do espaço vê uma oscilação no tempo; se esta 1 Vulgarmente designado por sistema massa-mola. 2 O chamado circuito LC. 3 Um plasma é um meio ionizado, quase neutro, com comportamento colectivo. 1

Upload: trantuyen

Post on 25-Jan-2019

221 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: CAPÍTULO V OSCILAÇÕES E ONDAS - Instituto de Plasmas e ...varandas/capitulo5.pdf · ... as ondas electromagnéticas e o ... Em resumo, e atendendo a que 6 1 ... a som a da energia

CAPÍTULO V

OSCILAÇÕES E ONDAS

5.1. INTRODUÇÃO

Este capítulo apresenta alguns conceitos fundamentais de dois fenómenos físicos que são

muito correntes no nosso quotidiano: as oscilações e as ondas.

As oscilações ocorrem quando um sistema físico é afastado ligeiramente da sua

posição de equilíbrio estável. Como exemplos de osciladores podemos referir o movimento

para cima e para baixo de um barco âncorado no alto-mar, o pêndulo de um relógio antigo de

parede, uma massa suspensa na extremidade de uma mola1, um circuito eléctrico constituido

por uma bobina e um condensador2 e o movimento das partículas carregadas de um plasma3

em torno da suas posições de equilíbrio. Como veremos na secção seguinte, as oscilações são

caracterizadas por um movimento sinusoidal, mais ou menos amortecido, de uma grandeza

característica do oscilador (por exemplo, o ângulo do pêndulo com a direcção vertical ou o

deslocamento em relação à posição de equilíbrio da massa do sistema massa-mola ou a

corrente eléctrica que percorre um circuito LC (Figura 5.1))

As ondas correspondem a oscilações no tempo que são geradas num dado ponto

(emissor) e que se propagam no espaço, de modo a transmitirem informação sob a forma de

energia e momento, sem contudo transportarem matéria. Este facto significa que se um

observador analisar uma onda num ponto do espaço vê uma oscilação no tempo; se esta 1 Vulgarmente designado por sistema massa-mola. 2 O chamado circuito LC. 3 Um plasma é um meio ionizado, quase neutro, com comportamento colectivo.

1

Page 2: CAPÍTULO V OSCILAÇÕES E ONDAS - Instituto de Plasmas e ...varandas/capitulo5.pdf · ... as ondas electromagnéticas e o ... Em resumo, e atendendo a que 6 1 ... a som a da energia

análise for realizada num instante de tempo4, o observador vê uma oscilação no espaço. Como

exemplo de ondas, podemos referir as ondas sonoras, as ondas electromagnéticas e o

movimento da água de um grande lago originado pelo lançamento de uma pedra para o seu

interior.

Figura 5.1 – Representação esquemática de um pêndulo (à esquerda), de um sistema massa-mola (ao centro) e

de um circuito LC (à direita)

Problema 5.1 – Um pequeno pedaço de madeira está a flutuar na água calma de um grande lago. Diga, justificando, o que acontece ao pedaço de madeira quando uma pedra cai na vertical no lago.

5.2. OSCILAÇÕES

5.2.1. Oscilador harmónico simples

Um oscilador harmónico simples é um sistema físico cujo comportamento dinâmico é regido

por uma equação diferencial5 de 2a ordem6 do tipo

0)(202

)(2=+ ts

dt

tsd ω (5.1)

em que s(t) é uma grandeza característica do sistema e ω0 é a frequência ângular de

oscilação.

Esta equação diferencial admite uma solução do tipo

s(t) = SM cos (ω0

t + α) (5.2)

em que SM e α são duas constantes de integração7 cujos valores são calculados a partir das

condições iniciais8. A grandeza

Φ(t) = ωt + α (5.3)

4 Através, por exemplo, de uma fotografia. 5 Equação que contém pelo menos uma derivada. 6 Equação diferencial em que a derivada de ordem superior é de segunda ordem. 7 Para resolvermos uma equação diferencial de 2a ordem é preciso efectuar duas integrações. Em cada uma destas operações é introduzida uma contante (dado que a derivada de uma constante é zero), pelo que a solução desta equação contém duas constantes de integração. 8 As condições iniciais correspondem às condições a que o sistema tem de obedecer quando, na origem do tempo, é afastado da sua posição de equilíbrio.

2

Page 3: CAPÍTULO V OSCILAÇÕES E ONDAS - Instituto de Plasmas e ...varandas/capitulo5.pdf · ... as ondas electromagnéticas e o ... Em resumo, e atendendo a que 6 1 ... a som a da energia

é designada por fase no instante t. A análise das equações (5.2) e (5.3) permite concluir que

SM e α correspondem, respectivamente, à amplitude9 da oscilação e à desfazagem na origem

do tempo. Problema 5.2 - Verifique que a função (5.2) é uma solução da equação (5.1). Resolução: Para resolvermos este problema vamos começar por calcular a primeira e a segunda derivadas da função (5.2) em ordem ao tempo

)0

(0

αωω +−= tsenM

Sdt

ds (5.4)

)0

cos(202

2αωω +−= t

MS

dt

sd (5.5)

Substituindo (5.5) e (5.2) em (5.1) obtemos uma identidade

0)0

(cos20

)0

(cos20

=+++− αωωαωω tM

StM

S o que significa que a função (5.2) é solução da equação (5.1). Problema 5.3. a) Verifique que as funções

)0()( βω += tsenMSts (5.6) e

)0()(

ϕω +=

tjeMSts (5.7)

também são soluções da equação (5.1). b) Explique, do ponto de vista matemático, a razão porque as funções (5.2), (5.6) e (5.7) são soluções da equação (5.1). c) O que distingue, do ponto de vista físico, as funções (5.2) e (5.6)? Problema 5.4 – Considere um sistema massa-mola cujo deslocamento em relação a posição de equilíbrio é dada por

x (t) = (1.2 metros) cos ( t / 2 + π /6) a) Calcule a amplitude, a frequência ângular e o período do movimento (Solução: A=1.2 m, ωo=0.5 rad/s, T=12.6 s) b) Determine a localização da massa em t=1 s (Solução: x(t=1 s) = 0.624 m) Problema 5.5 - Considere o circuito representado na Figura 5.2.

Figura 5.2 – Circuito LC a) Verifique que este circuito é um oscilador harmónico simples.

9 Valor máximo.

3

Page 4: CAPÍTULO V OSCILAÇÕES E ONDAS - Instituto de Plasmas e ...varandas/capitulo5.pdf · ... as ondas electromagnéticas e o ... Em resumo, e atendendo a que 6 1 ... a som a da energia

b) Determine as funções vC(t), i(t) e vL(t), admitindo que no instante em que se fecha o interruptor i(0)=0 e vC(0)=100 V. Resolução – a) A aplicação da Lei das Malhas a este circuito conduz à equação

(5.8) 0)()( =+ tLvtCv em que

∫= dttiC

tCv )(1

)( (5.9)

e

dt

tdiLt

Lv

)()( = (5.10)

Derivando (5.9) em ordem ao tempo obtemos

)(1)(

ticdt

tc

dv= (5.11)

pelo que

dt

tc

dvCti

)()( = (5.12)

Substituindo (5.8) obtemos

02

)(2

)( =+dt

tc

vdLCt

cv (5.13)

que é uma equação diferencial do tipo da equação (5.1), com

LC

120 =ω (5.14)

b) A equação (5.13) admite uma solução do tipo

)0cos()( αω += tCMVtCv (5.15)

que, atendendo a (5.12) e (5.10). permite obter:

)0(0)( αωω +−= tsenCMVCti (5.16)

e

(5.17) )0cos()0cos(20)( αωαωω +−=+−= tCMVtCMVLCtLv

As condições fronteiras são

αcos1000)0( CMVCv ⇒= (5.18)

e

αω senCMVCi 000)0( −=⇒= (5.19)

Esta última igualdade implica que

sen α = 0

4

Page 5: CAPÍTULO V OSCILAÇÕES E ONDAS - Instituto de Plasmas e ...varandas/capitulo5.pdf · ... as ondas electromagnéticas e o ... Em resumo, e atendendo a que 6 1 ... a som a da energia

ou seja

α = 0 (5.20)

Substituindo este resultado em (5.18) obtemos

VCM = 100 V (5.21)

Em resumo, e atendendo a que

16101

0−== rads

LCω (5.22)

podemos escrever que:

)6

10(cos100)( ttc

v = (5.23)

)610(1.0)( tsenti −= (5.24)

)610(cos100)( ttLv −= (5.25)

Vamos agora calcular o periodo (T) e a frequência (f) das oscilações. A definição de

período

)()( tsTts =+ (5.26)

aplicada à função (5.2) permite escrever que

)0cos())(0cos( αωαω +=++ tTt (5.27)

ou seja10

παωαω 20)(0 ++=++ tTt

donde concluimos que

T = 2π / ω0 (5.28)

A definição de frequência

f = 1 / T (5.29)

permite concluir que

f = ω0 / 2π (5.30)

Esta expressão mostra que a frequência das oscilações apenas depende das

características do oscilador11, sendo independente da amplitude das oscilações. Este facto

10 Uma vez que a função coseno tem um período de 2π. 11 Por exemplo, no caso do circuito LC dos valores da capacidade do condensador e da inductância da bobina (ver equação (5.14)).

5

Page 6: CAPÍTULO V OSCILAÇÕES E ONDAS - Instituto de Plasmas e ...varandas/capitulo5.pdf · ... as ondas electromagnéticas e o ... Em resumo, e atendendo a que 6 1 ... a som a da energia

significa que, quando carregamos numa tecla de um piano, a frequência da nota emitida é

sempre a mesma, independentemente da força com que tocamos na tecla.

Problema 5.6 – Determine o período e a frequência das oscilações do circuito LC representado na Figura 5.2. (Solução: f = 159.16 kHz, T = 6.28 µs)

5.2.2. Oscilador harmónico amortecido

Os osciladores descritos na secção anterior correspondem a situações ideais já que a energia

total do sistema e, consequentemente, a amplitude das oscilações permanecem constantes no

tempo12. Contudo, a realidade é diferente. De facto, devido ao “atrito”, há sempre dissipação

de energia sob a forma de calor, pelo que a energia total do oscilador e, consequentemente, a

amplitude das oscilações diminuem no tempo13. Como veremos mais à frente, a forma como

a amplitude das oscilações decresce depende da intensidade da “força de atrito”. Problema 5.7 – a) Verifique que a energia total do circuito LC representado na Figura 5.2. é constante no tempo. b) Interprete o funcionamento deste oscilador em termos energéticos Resolução: a) Como já sabemos do capítulo II, o condensador e a bobina armazenam, respectivamente, energia eléctrica e energia magnética dadas por

We = C vC2 / 2 (5.31)

e Wm = L i2 / 2 (5.32)

Substituindo (5.23) e (5.24) nestas equações obtemos

Joulest

t

tC

vCe

W

)610(2cos6105

)610(2cos4109102

1

)(22

1

−×=

×−×=

=

(5.33)

Joulestsen

tsen

tiLm

W

)610(26105

)610(22103102

1

)(22

1

−×=

−×−×=

=

(5.34)

pelo que a energia total do sistema é dada por

12 Por exemplo, a soma da energia cinética e da energia potencial do pêndulo e a soma da energia eléctrica e da energia magnética do circuito LC são constantes no tempo. 13 O “atrito” é devido ao ar no pêndulo e no sistema massa-mola e à resistência eléctrica do fio da bobina no caso do circuito LC.

6

Page 7: CAPÍTULO V OSCILAÇÕES E ONDAS - Instituto de Plasmas e ...varandas/capitulo5.pdf · ... as ondas electromagnéticas e o ... Em resumo, e atendendo a que 6 1 ... a som a da energia

Joules

tsent

mW

eWW

6105

)610(26105)610(2cos6105

−×=

−×+−×=

+=

(5.35)

já que

1)610(2)610(2cos =+ tsent

A expressão (5.35) mostra que a energia total do circuito LC é constante no tempo.

b) A Figura 5.3 representa as variações no tempo da energia eléctrica armazenada no condensador e da

energia magnética armazenada na bobina.

Figura 5.3 – Variação das energias eléctrica e magnética armazenadas num circuito LC.

A análise desta figura permite concluir que, do ponto de vista energético, o circuito LC representa uma

oscilação no tempo das energias eléctrica e magnética, de tal forma que a energia total permanece constante.

De facto, quando a energia eléctrica armazenada no condensador é máxima a energia magnética armazenada

na bobina é nula; e, vice-versa, quando Wm é máxima, We é nula. Ou seja, a oscilação do circuito LC

corresponde a uma troca de energia entre o condensador e a bobina.

Um oscilador harmónico amortecido é um sistema físico cujo comportamento

dinâmico é descrito por uma equação diferencial do tipo

0)(20

)(22)(2

=++ tsdt

tds

dt

tsd ωβ (5.36)

cujo segundo termo é devido à força de atrito.

7

Page 8: CAPÍTULO V OSCILAÇÕES E ONDAS - Instituto de Plasmas e ...varandas/capitulo5.pdf · ... as ondas electromagnéticas e o ... Em resumo, e atendendo a que 6 1 ... a som a da energia

Esta equação admite uma solução da forma

tseA

tseAts 2

21

1)( += (5.37)

em que s1 e s2 são soluções da chamada equação característica. Esta equação obtem-se a

partir da equação diferencial (5.36) substituindo a derivada de ordem n por sn:

02022 =++ ωβ ss (5.38)

Esta equação do 2o grau admite as seguintes soluções

2201 βωβ −+−= js (5.39)

e

2202 βωβ −−−= js (5.40)

Se o amortecimento for fraco, isto é, se β«ω0, a equação característica tem duas

soluções complexas conjugadas e a equacao (5.37) pode ser escrita na forma

)cos(0)( αωβ +−= tteSts (5.41)

que representa oscilações com amplitude decrescente no tempo, com um período dado por

T = 2 π / ω (5.42)

em que

220 βωω −= (5.43)

representa a frequência ângular, amortecida, das oscilações.

A quantidade

τ = 1 / β (5.44)

é designada por tempo de decaímento e representa o tempo ao fim do qual a amplitude das

oscilações diminuiu de um factor 1/e14. Este é o chamado regime oscilatório amortecido

(Figura 5.4).

14 Quanto menor for o tempo de decaímento mais amortecido é o movimento oscilatório.

8

Page 9: CAPÍTULO V OSCILAÇÕES E ONDAS - Instituto de Plasmas e ...varandas/capitulo5.pdf · ... as ondas electromagnéticas e o ... Em resumo, e atendendo a que 6 1 ... a som a da energia

Figura 5.4 – Regime oscilatório amortecido

Quando o amortecimento aumenta, o tempo de decaímento e a frequência ângular das

oscilações diminuem. Quando β=ω0 atinge-se uma situação crítica em que ω = 0 (T=∞)

e em que a equação característica tem duas raízes reais e iguais. Este é o chamado regime de

amortecimento crítico (Figura 5.5). Quando β>ω0 as raízes da equação característica são reais

e diferentes e o sistema regressa à situação de equilíbrio sem qualquer oscilação. Este é o

chamado regime de sobre-amortecimento (Figura 5.5).

Sobre-amortecimento Amortecimento crítico

Figura 5.5 – Regimes de amortecimento crítico e de sobre-amortecimento

Problema 5.8 – Considere o circuito representado na Figura 5.6

Figura 5.6 – Circuito RLC

9

Page 10: CAPÍTULO V OSCILAÇÕES E ONDAS - Instituto de Plasmas e ...varandas/capitulo5.pdf · ... as ondas electromagnéticas e o ... Em resumo, e atendendo a que 6 1 ... a som a da energia

a) Verifique que este sistema é um oscilador harmónico amortecido. b) Classifique o regime do oscilador. c) Determine o tempo de decaímento e a frequência das oscilações. d) Calcule o valor da resistência que conduz à situação de amortecimento crítico. Resolução – a) A aplicação da Lei das Malhas ao circuito conduz a seguinte equação

∫ =++ 0)(1)(

)( dttiCdt

tdiLtRi (5.45)

que, após algumas operações matemáticas, podemos escrever na forma

020

22

2=++ i

dt

di

dt

idωβ

em que

LR

2=β (5.46)

e

LC12

0=ω 15 (5.47)

b) Como

srad /6100

=ω β=5×103

estamos perante um regime oscilatório amortecido.

c) ≅×−=== 6102512101

ωβ

Γ

d) A situação de amortecimento crítico e obtida quando:

R = 2 L ωο = 2 x 10-3 x106 = 2 kΩ

5.3. ONDAS

5.3.1. Introdução

Como veremos nas secções seguintes, uma onda é um fenómeno que corresponde à

materializacao física de uma função matemática que é solução de uma equação de onda.

De entre os vários tipos de ondas assumem importância especial as ondas

electromagnéticas e as ondas mecânicas que serão estudadas em pormenor nos capítulos VI e

VII. As ondas electromagnéticas compreendem, por exemplo, à luz do Sol e dos lasers, às

ondas de rádio e de televisão, às micro-ondas dos aparelhos usados na preparação de

alimentos e das comunicações móveis e via satélite e os raios-X usados na medicina e nos

15 Este valor é exactamente igual à frequência angular de oscilação do circuito LC.

10

Page 11: CAPÍTULO V OSCILAÇÕES E ONDAS - Instituto de Plasmas e ...varandas/capitulo5.pdf · ... as ondas electromagnéticas e o ... Em resumo, e atendendo a que 6 1 ... a som a da energia

aeroportos para a detecção de metais. Como exemplos das ondas mecânicas podemos referir

as ondas acústicas e as vibrações de uma corda e de uma mola. Convém referir, desde já, que

existe uma diferença fundamental entre estas duas espécies de ondas. As ondas mecânicas

necessitam de um meio material para se propagarem enquanto as ondas electromagnéticas

até se propagam no vácuo16.

As restantes secções deste capítulo apresentam aspectos gerais que são comuns a todos

os tipos de ondas.

5.3.2. Equação de onda

Uma onda é um fenómeno físico que é descrito por uma equação diferencial do tipo

02),(2

21

2),(2

=∂

∂=∂

ttxs

vxtxs 17,18 (5.48)

que admite uma solução particular19,20 da forma

s(x,t) = SM cos (ωt – kx + α) (5.49)

em que SM é a amplitude, ω é a frequência ângular, k é o número de onda e α é a desfasagem

na origem do espaço e do tempo.

Admitindo que

)()(),( txXtxs Γ= (5.50)

e como

2

2

2

2

dx

Xd

x

sΓ=

∂ (5.51)

e

2

2

2

2

dt

dXt

s Γ=

∂ (5.52)

16 Existem autores que designam as ondas mecânicas por ondas materiais dado que a sua geração pressupõe a existência de um meio material onde a onda se propaga. 17 Esta equação representa uma onda que se propaga no sentido positivo do eixo dos Xs. 18 O símbolo ∂ representa a chamada derivada parcial. A função s depende de duas variáveis (x e t), pelo que

podemos calcular as suas derivadas em ordem a x

x

se a t

t

s. A derivada em ordem a uma variável

determina-se admitindo que a outra variável é constante. 19 Veremos na secção seguinte a forma da solução geral da equação de onda. 20 Esta solução, embora particular, e muito importante pelas razões que já foram explicadas anteriormente.

11

Page 12: CAPÍTULO V OSCILAÇÕES E ONDAS - Instituto de Plasmas e ...varandas/capitulo5.pdf · ... as ondas electromagnéticas e o ... Em resumo, e atendendo a que 6 1 ... a som a da energia

esta equação diferencial pode ser escrita na forma

02

2

21

2

2=

Γ−Γ

dt

dXvdx

Xd (5.53)

e decomposta nas seguintes duas equações diferenciais

022

2=+ Xk

dx

Xd (5.54)

022

2=Γ+ ωτ

dt

d (5.55)

do tipo da equação do oscilador harmónico simples, interligadas pela seguinte relação

ω = k v (5.56)

a que chamamos relação de dispersão.

Este facto significa que uma onda pode ser vista como o resultado de duas oscilações,

uma no tempo e a outra no espaço, ligadas entre si pela relação de dispersão. A oscilação no

espaço é caracterizada por um periodo espacial que se designa por comprimento de onda

λ = 2 π / k (5.57)

5.3.3. Função de onda

Vamos, agora, estabelecer a forma das soluções gerais da equação de onda. Para isso, vamos

admitir que uma onda transversal se propaga, com velocidade v, no sentido positivo do eixo

dos Xs (Figura 5.7).

Figura 5.7 – Propagação de uma onda com velocidade v

12

Page 13: CAPÍTULO V OSCILAÇÕES E ONDAS - Instituto de Plasmas e ...varandas/capitulo5.pdf · ... as ondas electromagnéticas e o ... Em resumo, e atendendo a que 6 1 ... a som a da energia

Num referencial (x* e y*) que se move com velocidade v, a amplitude da onda apenas

depende de x*

y*=f (x*) (5.58)

Mas, como

y=y* (5.59)

e

x=x*+vt (5.60)

temos que

y=f (x-vt) (5.61)

ou seja, qualquer função deste tipo, que designamos por função de onda, é uma solução da

equação de onda.

Problema 5.9 – Verifique que uma função do tipo y=f(x-vt) é uma solução da equação de onda. Problema 5.10 – Diga em que condições uma solução do tipo y=Ym sen(ωt-kv) é uma função de onda. Problema 5.11 – Determine a expressão da função de onda correspondente a propagação da onda no sendo negativo do eixo dos Xs.

5.3.4. Ondas transversais e ondas longitudinais

Nas ondas transversais a informção está contida no plano perpendicular à direcção de

propagação da onda. As ondas electromagnéticas e as vibrações de uma mola representadas

na Figura 5.8 são exemplos de ondas transversais.

Figura 5.8 – Ondas transversais de uma mola

Nas ondas longitudinais a informação existe na própria direcção de propagação da

onda. As ondas acústicas e as vibrações de uma mola representadas na Figura 5.9 são

exemplos de ondas longitudinais.

13

Page 14: CAPÍTULO V OSCILAÇÕES E ONDAS - Instituto de Plasmas e ...varandas/capitulo5.pdf · ... as ondas electromagnéticas e o ... Em resumo, e atendendo a que 6 1 ... a som a da energia

Figura 5.9 – Ondas longitudinais de uma mola

5.3.5. Velocidade de propagação de uma onda

A velocidade de propagação de uma onda num meio depende de algumas propriedades do

meio. Por exemplo, a velocidade das ondas electromagnéticas depende de propriedades

eléctricas e magnéticas do meio

εµ1

=v (5.62)

em que ε é a contante dieléctrica e µ é a permeabilidade magnética do meio.

Problema 5.12 – Determine a velocidade de propagação de ondas electromagnéticas num meio com µ=µο e

ε=1.21εο

A velocidade das ondas mecânicas depende, em geral, de uma propriedade elástica e

de uma propriedade inercial do meio21.

5.3.6. Velocidade de fase e velocidade de grupo

Consideremos uma onda descrita pela seguinte equação

s(x,t) = SM cos (ωt-kx) (5.63)

Tal como nos osciladores, a função

φ = ωt-kx (5.64)

designa-se por fase.

A velocidade de fase (vf) e a velocidade a que um observador se tem de deslocar para

“ver” a fase da onda constante. A condição

φ = Constante (5.65)

implica que

ω dt – k dx = 0 (5.66)

pelo que

21 Ver secção 7.3.

14

Page 15: CAPÍTULO V OSCILAÇÕES E ONDAS - Instituto de Plasmas e ...varandas/capitulo5.pdf · ... as ondas electromagnéticas e o ... Em resumo, e atendendo a que 6 1 ... a som a da energia

vf = dx / dt = ω / k (5.67)

Nos meios dispersivos a velocidade de fase depende da frequência. Em certos meios, a

velocidade de fase pode ser maior que a velocidade da luz no vácuo. Este facto não viola a

Teoria da Relatividade, uma vez que a velocidade de fase é um conceito matemático, que não

está associado à transmissão de informação.

A velocidade de grupo é definida pela expressão

kgv∂∂

=ω (5.68)

Esta velocidade coincide, na maioria dos meios, com a velocidade de transmissão de

energia, sendo, por isso, menor que a velocidade da luz no vácuo.

Problema 5.13 – Considere um meio descrito pela seguinte relação de dispersão

2222 CkC += ωω (5.69)

em que ωC é uma constante1 e C é a velocidade de propagação das ondas electromagnéticas no vácuo. a) Verifique que este meio é dispersivo b) Calcule a velocidade de grupo. Resolução – a) para vermos se o meio é dispersivo, vamos começar por calcular a velocidade de fase

2

1

221

=

==

ω

ω

ωω

ωω

C

C

CCkfv

(5.70)

e concluímos que o meio é dispersivo porque a velocidade de fase depende da frequência ângular da onda. b) Para calcularmos a velocidade de grupo vamos diferenciar a equação (5.69)

dkkCd 222 =ωω

pelo que

2

1

22

−=

===

ω

ω

ω

ω

CC

fv

CkC

dk

dgv

(5.71)

15

Page 16: CAPÍTULO V OSCILAÇÕES E ONDAS - Instituto de Plasmas e ...varandas/capitulo5.pdf · ... as ondas electromagnéticas e o ... Em resumo, e atendendo a que 6 1 ... a som a da energia

5.3.7. Diagrama de dispersão

Um diagrama de dispersão é uma representação gráfica da relação de dispersão.

Num diagrama de dispersão existem duas classes de frequências particularmente

importantes: as frequências de corte e as frequências de ressonância. Estas frequências

correspondem, respectivamente, às situações em que o número de onda é nulo (frequência de

corte) e infinito (frequência de ressonância).

Suponhamos que uma onda se propaga num meio, cujas propriedades variam ao longo

de uma dada direcção. Quando a onda atinge uma região em que se verificam as condições de

corte, a onda é reflectida e a informação nela contida passa a propagar-se no sentido do

emissor. Ou seja, o meio comporta-se como um espelho. Esta propriedade é muito usada em

Física Experimental (no desenvolvimento de técnicas de diagnóstico dos meios físicos) e em

Telecomunicações (por exemplo, na propagação das chamadas ondas curtas). Quando a onda

atinge uma região em que se verificam as condições de ressonância, a onda é absorvida pelo

meio. Esta propriedade é muito usada em Física Experimental para procedermos ao

aquecimento de um meio.

Problema 5.14 – Considere o meio descrito pela relação de dispersão (5.69). a) Determine a frequência de corte b) Verifique que o vf>C e vg<C c) Trace o diagrama de dispersão Resolução: a) Como

221CC

k ωω −=

a condição k=0 acontece quando ω=ωC. Para ω>ωC há propagação da onda porque k é real. Para ω<ωC não há propagação da onda porque k é imaginário puro. b) A velocidade de fase é maior que C porque resulta do quociente de C por um número menor do que 1 (ver equação (5.70)). A velocidade de grupo é menor que C porque resulta do produto de C por um número menor que 1 (ver equação 5.71)).

Figura 5.10 - Diagrama de dispersão da relação de dispersão

16

Page 17: CAPÍTULO V OSCILAÇÕES E ONDAS - Instituto de Plasmas e ...varandas/capitulo5.pdf · ... as ondas electromagnéticas e o ... Em resumo, e atendendo a que 6 1 ... a som a da energia

5.3.8. Ondas planas e ondas esféricas

Chama-se superfície de onda ao lugar geométrico dos pontos do espaço em que a onda tem a

mesma fase, num dado instante de tempo.

Na vizinhança de uma fonte de ondas electromagnéticas as superfícies de onda são

esferas concêntricas com a fonte (ondas esféricas) (Figura 5.11).

À medida que nos afastamos da fonte, os raios das esferas vão aumentando e, nas

zonas muito afastadas da fonte, as superfícies de onda são planos (ondas planas) (Figura

5.11). Estas ondas são muito importantes porque: (i) São soluções das equações de onda; (ii)

As outras ondas podem ser decompostas num somatório de ondas planas.

Figura 5.11 – Superfícies de onda de ondas electromagnéticas que se propagam a partir de um emissor

5.3.9. Princípio da Sobreposição

O Princípio da Sobreposição diz que, quando duas ou mais ondas se combinam, a onda

resultante é a soma algébrica das ondas individuais.

Consideremos duas ondas, da mesma frequência e amplitude, que se propagam no

sentido positivo do eixo dos Xs.

y1=y0 sen (ωt - kx) (5.72)

y2=y0 sen (ωt – kx+ θ) (5.73)

O efeito global, isto é a soma das duas ondas, é

y1+y2=y0 [sen (ωt – kx) + sen (ωt – kx +θ)] (5.74)

Como

sen a + sen b = 2 cos [(a-b)/2] sen [(a+b)/2] (5.75)

podemos escrever que

y(x,t) = y1(x,t) + y2(x,t)

= 2y0 cos θ/2 sen (ωt – kx - θ/2) (5.76)

17

Page 18: CAPÍTULO V OSCILAÇÕES E ONDAS - Instituto de Plasmas e ...varandas/capitulo5.pdf · ... as ondas electromagnéticas e o ... Em resumo, e atendendo a que 6 1 ... a som a da energia

Figura 5.12 – Propagação de duas ondas da mesma frequência segundo o sentido positivo do eixo dos Xs

Problema 5.15 – Duas ondas, da mesma frequência e amplitude, propagam-se no sentido positivo do eixo dos Xs. a) Qual é a amplitude da onda resultante se a diferença de fase for π/2 e a amplitude de cada onda 4 cm? (Solução: 5.66 cm) b) Determine a diferença de fase das duas ondas que conduz a uma amplitude da onda resultante igual a 4 cm. (Solução: 120 ou 240)

Consideremos, agora, dois casos particulares:

As duas ondas estão em fase (Figura 5.13).

Neste caso, a amplitude duplica, ou seja há uma interferência construtiva.

ONDA RESULTANTEONDA 2

ONDA 1

Figura 5.13 – Sobreposição de duas ondas que se propagam em fase no sentido positivo do eixo dos Xs

As duas ondas estão em oposição de fase (Figura 5.14).

Neste caso, as ondas anulam-se, ou seja temos uma interferência destrutiva.

18

Page 19: CAPÍTULO V OSCILAÇÕES E ONDAS - Instituto de Plasmas e ...varandas/capitulo5.pdf · ... as ondas electromagnéticas e o ... Em resumo, e atendendo a que 6 1 ... a som a da energia

ONDA 2ONDA RESULTANTE

ONDA 1

Figura 5.14 – Sobreposição de duas ondas que se propagam em oposição de fase no sentido positivo do eixo dos Xs

5.3.10. Onda estacionária

Consideremos, agora, que as duas ondas se propagam em sentidos opostos do eixo dos Xs.

y1 (x,t) = y0 sen (ωt – kx) (5.77)

y2 (x,t) = y0 sen (ωt + kx + θ) (5.78)

pelo que

y (x,t) = y1+y2= 2y0 cos (kx+θ/2) sen (ωt+θ/2) (5.79)

Esta expressão traduz uma onda estacionária na qual não há uma verdadeira

propagação porque nos pontos em que

cos (kx + θ/2) = 0 (5.80)

não há vibração

5.3.11. Grupo de ondas

Suponhamos que as duas ondas se propagam no mesmo sentido do eixo dos Xs, mas que

possuem frequências muito próximas

y1(x,t) = y0 sen (ω1t - k1x) (5.81)

y2(x,t) = y0 sen (ω2t – k2x) (5.82)

A soma das duas ondas conduz a:

y(x,t)=2y0cos[(ω2−ωt-(k2-k1)x]/2sen [(ω2+ωt-(k2+k1)x]/2 (5.83)

Fazendo

k1+k2=k ω1+ω2=ω

e

k2-k1=2 ∆k ω2−ω1= 2 ∆ω

19

Page 20: CAPÍTULO V OSCILAÇÕES E ONDAS - Instituto de Plasmas e ...varandas/capitulo5.pdf · ... as ondas electromagnéticas e o ... Em resumo, e atendendo a que 6 1 ... a som a da energia

vem que

y(x,t)=2y0 cos (∆ωt−∆kx) sen (ωt-kx)

ou seja, uma onda com um comprimento de onda quase igual ao das duas ondas, mas com a

amplitude modulada. A esta estrutura chama-se grupo de ondas. Corresponde a uma onda de

frequência f que se propaga com velocidade

v= ω/k

organizada em grupos, resultantes de uma modulação, que se propagam com a chamada

velocidade de grupo

vg=∆ω/∆k

Figura 5.15 – Propagação de duas ondas com frequências muito próximas

Já referimos anteriormente que as ondas monocromáticas não transmitem informação.

Esta propaga-se através de grupos de onda22.

22 A frequência de um emissor de rádio ou de televisão corresponde à frequência da portadora, a qual, por si só, não transmite informação. A informação (o som e/ou as imagens) e adicionada a portadora através da modulação da sua amplitude (amplitude modulada (AM)) ou da sua frequência (frequência modulada (FM)).

20