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CAPÍTULO UM “Glória mais brilhante na esfera ocidental”: monarquia, império e o Novo Mundo K687-01(Civilização).p65 9/7/2008, 12:21 35

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CAPÍTULO UM “Glória mais brilhante na esferaocidental”: monarquia, impérioe o Novo Mundo

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Em 1803, o estadista português Rodrigo de Souza Coutinho, chefe doTesouro Real, apresentou ao príncipe regente Dom João uma avaliaçãoda “situação política” européia. Na guerra em curso entre a França e aGrã-Bretanha, advertiu ele, a própria “independência” da monarquiaportuguesa estava em jogo. A manutenção da neutralidade mostrava-secada vez mais ilusória e, como resultado, Portugal e outros pequenos Es-tados europeus estavam prestes a se perder no interior do “mostruozoColosso” do império de Napoleão. Em contraste com a enganosa diplo-macia e a beligerância da Europa, contudo, “a situação Política interior”dos “vastos Domínios” do príncipe regente além da Europa era caracteri-zada por “prosperidade pública”. Com efeito, observou Souza Coutinho,“Portugal por si mesmo [...] não he a melhor e mais essencial Parte daMonarquia”. Conseqüentemente, se uma guerra fosse devastar Portugal,ele propunha ao “[s]eo Soberano e aos seus Povos o irem crear humpoderozo Imperio no Brasil”. Esse novo império serviria como base apartir da qual Dom João poderia tanto “reconquistar o que se possa terperdido na Europa” como punir “o fero Inimigo” que se recusara a reco-nhecer a sua honrosa tentativa de permanecer fora de tão ignóbeis guerras.1

Embora uma proposta tão dramática fosse recusada na época, menosde quatro anos depois a visão de Souza Coutinho de um império america-no tornou-se a base de uma nova política imperial no mundo português.2

Em 1807, a Coroa decidiu a transferência da corte real para o Rio deJaneiro, e uma extraordinária inversão das hierarquias políticas, econô-micas e culturais que tinham guiado três séculos de expansão européiacomeçou a tomar forma. Os significados e as conseqüências dessa invasãoserão examinados ao longo deste livro. Aqui, começo com um levanta-

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mento das fundações ideológicas e históricas para o ideal de um impérioamericano. Souza Coutinho certamente não foi nem o primeiro nem oúltimo a promover o estabelecimento de uma corte e uma capital no NovoMundo. Proposta inicialmente no século XVI, a visão do potencial brasi-leiro tanto desencadeou como confirmou uma crítica setecentista ao etosimperial português. Embora Souza Coutinho tenha se empenhado paratransformar essa crítica em um programa de longo prazo de reforma im-perial na década de 1790, foi durante a crise dos primeiros anos do sécu-lo XIX que ele e outros estadistas portugueses transformaram o ideal deum império americano em realidade.

RENOVAÇÃO, COMÉRCIO E O CONTINENTE AMERICANO:

DISCURSO IMPERIAL SETECENTISTA

A idéia de criar uma corte real portuguesa no Novo Mundo parece tersurgido pela primeira vez nos anos 1580. Depois que o rei espanhol Fili-pe II reivindicou, com sucesso, o direito ao trono português que estavavago, um conselheiro do prior do Crato, o rival português de Filipe, iden-tificou o Brasil como um possível porto para a corte exilada. Não obstante,a França foi escolhida em seu lugar.3 Essa mesma recomendação foi entãorefeita nos anos 1640, quando a União de Coroas criada por Filipe che-gou ao fim. Preocupados com a ameaça permanente que a Espanha repre-sentava à nova monarquia independente portuguesa da Casa de Bragança,os conselheiros reais, inclusive o missionário jesuíta Antônio Vieira, acon-selharam a Coroa a partir e estabelecer um novo reinado na América.4

Nesse caso, contudo, a criação de uma corte americana não figurava comouma solução de curto prazo para a crise, como ocorrera nos anos 1580,mas antes como a fundação de uma era imperial inteiramente nova.

Para explicar essa fundação, Vieira invocou o ideal de renovação im-perial. “A imagem de um império como o objeto de ‘renovações’ sucessi-vas ao longo do tempo”, como explicou Anthony Pagden, era centralpara a identidade política dos impérios modernos que encontravam assuas origens em Roma. Nesse sentido, o império foi o meio para um fim

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providencial: uma verdadeira cristandade universal, a culminação de umasérie de passagens através de etapas espirituais e históricas. Ainda que, naEuropa, a Espanha fosse mais freqüentemente objeto dessa às vezes pro-fética “trasladação de império”,5 Vieira evocou a própria tradiçãomessiânica local de Portugal para revelar que a monarquia portuguesa erao Quinto Império universal do Livro de Daniel. Inspirando-se na obra deum profeta popular de nome Bandarra e na cultura política dosebastianismo — a crença de que o Rei Sebastião, supostamente morto nabatalha de Alcácer Quibir (Marrocos) em 1578, retornaria para libertarPortugal do domínio espanhol —, Vieira afirmou que era o duque deBragança, Dom João VI (1640-1656), e não um Sebastião ressurreto, quemrepresentava a encarnação messiânica profetizada. O novo rei era, comoexplicou Vieira, a cabeça de um império perpétuo que podia ser realizadona América.6 Com efeito, para Vieira, como argumentou Thomas Cohen,o Novo Mundo, onde ele havia vivido como missionário, representavanada menos que “um lócus de profecias que os portugueses foram exclu-sivamente escolhidos para revelar”, um lugar abençoado onde a renova-ção do império e o triunfo tanto temporal como espiritual da monarquiapoderiam finalmente realizar-se. Trata-se de uma visão que resultava doque Cohen argumenta que Vieira reconhecera como “uma verdade fun-damental”: que as valorizadas e hierárquicas “distinções entre o centrometropolitano e a periferia colonial” eram “um impedimento para o em-preendimento imperial”, em vez de a sua sólida fundação. Na seqüênciada morte do seu protetor João VI, contudo, o endosso de Vieira à profe-cia popular e a sua insistência no lugar privilegiado do Novo Mundo nahistória pós-bíblica seguiram o mesmo caminho que seu outro conselhopolêmico (como a tolerância em relação aos cristãos-novos), quando tan-to ele como o rei foram investigados pela Inquisição (o rei postumamen-te). Anos mais tarde, em 1667, Vieira foi censurado tanto pelo papa quantopelo Santo Ofício de Coimbra.7

Apesar de as previsões de Vieira não terem sido levadas em conta e avitória de um monarca messiânico português parecer cada vez mais re-mota, a vulnerabilidade geopolítica de Portugal na Europa que corro-borava a visão de Vieira ainda era motivo de preocupação para os conselheiros

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reais no fim do século XVII. As guerras travadas durante a União Ibéricatinham transtornado o império, e os estadistas portugueses enfrentaramentão o triste fato de que, depois que os holandeses expulsaram os portu-gueses das Índias Orientais, como observou um conselheiro da Coroabritânica, a imagem do império português na Europa desmoronou. Emoutras palavras, Portugal deixara de ser um símbolo de glória imperialpara tornar-se, em vez disso, como argumentou Pagden, um exemplonegativo da íntima associação existente entre manutenção de “reputa-ção” e manutenção de poder.8 Ao enfrentar a crise imperial, contudo, aCoroa portuguesa não estava só. Os conflitos do século XVII com osholandeses também cobraram o seu preço da monarquia espanhola. Como fim da Guerra de Sucessão (1701-1714), a Espanha perdeu as suaspossessões imperiais européias e, como observa Pagden, sua pretensãoideológica de um império universal. Sem o império europeu, a posiçãoda Espanha como metrópole também estava em risco. Conforme obser-vou Montesquieu em O espírito das leis (1748), ao mesmo tempo que “asÍndias e a Espanha [eram] duas potências sob o mesmo senhor”, a Coroaespanhola, “as Índias [eram] o principal em relação a um secundário”.Com efeito, juntos, Espanha e Portugal formavam um estudo de caso dascausas e efeitos da derrocada do poder imperial, derrocada que, no fimdo século XVIII, havia chamado a atenção não só de Montesquieu, mastambém de Diderot, David Hume e Adam Smith.9

Os estadistas espanhóis responderam à crise imperial acatando e de-senvolvendo muitas das observações feitas por seus críticos. Juntamentecom seus contrapartes britânicos e franceses, conforme mostrou Pagden,os teóricos espanhóis articularam o que equivale a um afastamento dahonra em direção ao bem-estar público no discurso e na prática imperiais,“um deslocamento das considerações sobre direitos e legitimidade parauma preocupação com lucros e benefícios”. No processo, eles passaram aver o comércio, em vez de a conquista, como a fonte de poder no mundomoderno. Para aumentar o potencial do império, o ministro das Finançasespanhol, Pedro Rodríguez Campomanes (1723-1803), argumentou queera necessário redefinir o alcance das relações comerciais nos territóriosespanhóis. Abrir o comércio para todos os súditos da Coroa espanhola,

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explicou ele, não somente expandiria o comércio e levaria, portanto, aum aumento dos lucros, mas também, no curso do processo, aproximariaas partes constituintes do império. Em outras palavras, uma nova eqüida-de comercial promoveria um novo sentido de unidade. Não obstante,nem relações comerciais equânimes nem unidade econômica implicavamo fim de propósitos e sentidos fundamentalmente imperiais. Assim, Cam-pomanes também reconfigurou “os domínios das Índias” como “provín-cias ultramarinas” e “colônias”, comunidades que existiam para serviraos interesses comerciais da metrópole acima de tudo. “[P]ela primeiravez”, escreve Pagden, “as Américas espanholas começaram a ser definidasem termos que as tornavam claramente parte de uma periferia.” A defesade uma monarquia universal (monarchia universalis) fora suplantada porum “cálculo [hierárquico] de benefícios”.10

Os estadistas portugueses do século XVIII enfrentaram a crise do seuimpério com tentativas semelhantes de redefinir seu etos. No caso deles,entretanto, prevalecer sobre a perda (de grande parte de seu empreendi-mento asiático) e restaurar o prestígio da Coroa portuguesa foi facilitadopela descoberta, ao final do século XVII, de ouro e diamantes no Brasil.Com efeito, na primeira metade do século XVII, essas novas fontes derenda financiaram uma esplendorosa renovação da “figura” da monar-quia, tanto dentro como fora do império português: o pretenso reinadode João V (1706-1750) como o “Rei-Sol” português, como explica o his-toriador português Rui Bebiano. O objetivo retórico da arte estatal oficialde João V era “refletir uma nova imagem do reinado, que celebre o pres-tígio e a glória da monarquia absolutista”. A autoridade una, a devoçãoinigualada e o “fausto” sublime do monarca foram exibidos em-blematicamente não apenas em Portugal, mas igualmente no restante daEuropa — contratos de casamento real foram celebrados fora de Portugalcom a construção de monumentos ao rei português. Roma, em particular,tornou-se o foco de uma “diplomacia espetacular” que culminou na pró-diga entrada da embaixada do marquês de Fontes em 1716. Em Lisboa,como observa Angela Delaforce, a procissão de carros alegóricos doura-dos foi relatada como o “triunfo romano” de Dom João.11

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As intensas relações e a emulação de João V com o Vaticano remeti-am a uma trasladação mais antiga, providencialista do império. Lisboafoi remodelada como uma “Nova Roma”, e uma linguagem messiânicaexplícita figurava proeminentemente nas narrativas panegíricas do seureinado.12 Todavia, como seus contrapartes na Europa, os estadistas ememorialistas portugueses de meado do século XVIII começaram a privi-legiar o comércio ao redefinir o império. Assim como os teóricos espa-nhóis rejeitaram o “espírito de conquista” que havia inspirado a expansãoterritorial primitiva, também os portugueses deixaram de descrever o seuimpério como uma cruzada. Eles celebraram as dimensões mercantisdo império, as quais, como argumentou Richard Helgerson, o grandepoeta do século XVI Luís de Camões tinha buscado suprimir em favordos feitos épicos aristocráticos. Assim, conforme insistiu um panegirista,o reinado de João V foi uma época em que “os Grandes” de Portugal“vivião sem inquietação [...] no socego dos seus Palacios: florecia semperigo o commercio, assim dentro do Reyno, como nas suas Colonias:navegavão sem susto as Frotas, transportando a sua Corte as riquezasBrasilicas, e as drogas Asiaticas”.13 Nesse caso, contudo, oferecendo aimagem das origens da riqueza comercial portuguesa como igualmentebrasileira e asiática, os panegiristas de Dom João V produziram outrasupressão da realidade imperial. Como o Brasil tinha literal e figurativa-mente se tornado a jóia da Coroa portuguesa, os domínios orientais re-manescentes declinaram. Com efeito, os portugueses enfrentavam omesmo dilema que Montesquieu atribuiu à Espanha: o império era tãoesmagadoramente americano, que o resto, incluindo a própria metrópo-le, parecia cada vez mais insignificante.

Para um diplomata português, essa preeminência americana era evi-dente mesmo antes de a maior parte da riqueza mineral brasileira ter sidoexplorada. Em um memorando secreto que prefigurava a própria afirma-ção de Montesquieu de uma inversão no seio dos primeiros impériosmodernos, Luiz da Cunha, embaixador em Paris e delegado nas negocia-ções dos Tratados de Utrecht, observou que, enquanto o Brasil era virtual-mente um continente, Portugal não passava de “huma ourela de terra”. Asolução desse problema, propôs então Cunha, era mudar a corte para o

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Brasil, onde João V poderia tomar o título de “Emperador do Ociden-te”.14 Embora Cunha tenha defendido as suas afirmações citando propos-tas semelhantes feitas a Filipe V pelo duque espanhol de Medina Sidoniano curso das negociações de Utrecht, ele também antecipou que tais pla-nos seriam do maior interesse em Portugal, considerando a situação maisdelicada da Coroa portuguesa na Europa. O Tratado de Methuen (1703),observou Cunha, deu aos ingleses o comando da indústria do vinho doPorto, o que significava, argumentou ele, que se a Coroa permanecesse naEuropa, “[nós] sempre estaremos dependentes de Inglaterra”. Para Cu-nha, tal relegação dos portugueses ao domínio de um outro império eraum destino muito pior do que a inversão de hierarquias no interior dosdomínios da Coroa portuguesa. O seu “império do Ocidente” represen-tava, assim, uma tentativa de conter essa tendência e de opor-se à idéia,como declarou poucos anos mais tarde o duque de Choiseul, ministrode Luís XV, de que “Portugal dev[ia] ser encarada como uma colôniainglesa”. Entretanto, como também argumentou Cunha, a relação pro-blemática entre Portugal e a Grã-Bretanha não era a única preocupaçãoda Coroa. Historicamente, a monarquia portuguesa fora vítima da ex-pansão imperial espanhola e, embora a Casa de Bragança tivesse desfru-tado mais de meio século de independência, este ainda era o caso, comoadvertiu Cunha, ao dizer que “a conquista deste Reino [Portugal]” pelaEspanha “he o negocio de huma campanha.” Isso significava, insistiaele, que, mesmo com um aumento da renda e um exército e uma mari-nha maiores em Portugal, o rei “já mais poderá dormir com descanço esegurança”.15

Embora a visão de Cunha de um império do Novo Mundo tenha co-meçado, portanto, com uma análise da posição problemática de Portugalna da Europa, ela também dependia de mais do que apenas uma compreen-são defensiva da política imperial. Pois, como também afirmou Cunha,referindo-se retrospectivamente a Vieira, uma mudança para o NovoMundo equivalia a uma transferência providencial do império. Em vez dea fruição de um império espiritual iminentemente perfeito, contudo, acorte real no Brasil estabeleceria uma mudança do etos e da geografiaimperial da conquista européia para a prosperidade americana. “A Divina

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Providencia”, explicou Cunha, “permitio esta mesma reciproca falta decertos generos em hum e outro hemispherio, para que as naçoens decommunicassem e se formase a sociedade da Republica Universal”, eproveu a propagação da cristandade para as pessoas que são “não [...]menos creaturas [de Deus], que as mais da Europa”. Não obstante, esseprimeiro momento de império tinha chegado ao fim, conforme argumen-tava Cunha, e pareceu então que não houvesse nada a produzir em Portu-gal que não pudesse ser produzido no Brasil. Ao mesmo tempo, não havia“aplicação nem industria” suficientes para utilizar em Portugal os recur-sos do Brasil. Conseqüentemente, era “mais commodo e mais seguro”,concluía ele, “estar onde se tem o que sobeja, que onde se espera o de quese carece”.16 A história triunfou sobre a exegese no esforço para definir odestino imperial da monarquia. E ainda que a corte americana como ca-pital do império fosse um elemento do desígnio providencial, a sua legiti-midade derivava da prática racional do comércio que tal reorganizaçãodo império permitiria.17

Como Cunha buscasse esclarecer a difícil situação de Portugal no con-texto de um discurso imperial europeu em transição, sua proposta de umnovo império ocidental também refletia a sua compreensão da naturezaespecífica do império português e dos aspectos importantes nos quais eladiferia daquela da Coroa de Castela. No início, o império espanhol mo-derno era, como os antigos impérios que lhe serviram de inspiração, ba-seado na terra, forjado por meio da expansão de um centro político egeográfico no interior da Península Ibérica e além. Do outro lado do Atlân-tico, o padrão foi reproduzido, pois a colonização espanhola irradiou apartir de capitais coloniais no México e no Peru. Em contraste, o impérioportuguês era, como António Manuel Hespanha e Maria Catarina Santosargumentaram, oceânico, uma rede global de rotas marítimas, entrepostoscomerciais e missões que se estendia de Macau ao Brasil. Viajar e comer-ciar, em vez de estabelecer uma colonização extensiva, davam forma a umempreendimento imperial que, apesar de inicialmente inspirado pelo es-pírito da cruzada e tido como fonte de honra e glória, todavia foi impeli-do por “uma lógica mais pragmática” em vez do “esplendor do poder”.18

Enquanto os monarcas espanhóis, “reis de uma majestade sedentária”,

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governavam o seu império a partir de “um centro poderosamente consti-tuído”, o nexo do império português não era uma cidade, mas o própriomar; e a capital política do império era necessariamente um porto.19

Para defender um império em que o mar constituía o “proprio corpodo império”, o discurso imperial português buscou estabelecer o direitode domínio sobre a navegação, em vez da colonização per se. A doutrinade mare clausum foi desenvolvida sistematicamente nos anos 1620 pelofrei Serafim de Freitas, professor de lei canônica da Universidade deValladolid, que questionava o ataque aos interesses portugueses feito porHugo Grotius em Mare Liberum (1608), e a noção geral de que, segundoa lei natural, os mares seriam comuns, afirmando o direito de posse origi-nal, a legitimidade divinamente sancionada da doação papal e da con-quista por meio de guerra justa, bem como a idéia mais tenuementesustentada de que um príncipe não estava submetido à lei natural. Acontrapartida prática dessa justificação ideológica da expansão imperial,por sua vez, foi “uma arquitectura do império”, as ciências náuticas, quese empenhavam em garantir a viabilidade de rotas marítimas em vez docontrole de vastos territórios.20 Essa relativa ausência de preocupação coma ocupação territorial efetiva também era evidente na administração im-perial. Em vez de reproduzir modos tradicionais europeus de organiza-ção e expansão de poder, como uma rede abrangente de funcionárioscom deveres mais ou menos claramente definidos, o império portuguêscompreendia vários arranjos administrativos ad hoc e, em alguns casos,relativamente autônomos (conselhos municipais, fortalezas-feitorias, bemcomo um domínio ainda mais indireto, estabelecido em tratados de paz).Mesmo no Brasil, onde a presença portuguesa se parecia muito com otipo de colonização encontrado na América espanhola, a administraçãoimperial era fragmentada, tênue e esparsa. Enquanto a monarquia espa-nhola tentou centralizar a autoridade real no Novo Mundo no começodo seu empreendimento americano estendendo a instituição da vice-rea-leza, usada primeiro nos reinos da Catalunha e de Aragão, o governadorgeral do Brasil só veio a ser chamado de “vice-rei” no século XVIII, emesmo então a sua autoridade sobre os outros capitães-gerais permane-ceu consideravelmente mais limitada do que a do seu contraparte espa-

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nhol.21 Tal pluralidade administrativa, como argumentaram Hespanha eSantos, redundou em uma estrutura imperial flexível que levava em con-sideração a exploração das circunstâncias locais. Como conseqüência, aCoroa portuguesa pôde construir e manter um império extensivo apesardos limitados recursos do próprio reino de Portugal.22

Para os estadistas do século XVIII, como Luiz da Cunha, a naturezaoceânica e plural do império português também significava que sua capi-tal política podia situar-se em qualquer das suas partes constituintes sempôr em risco interesses comerciais ou políticos. Como explicou Cunha,“a união dos dous dominios portuguezes”, no caso a Europa e a América,foi promovida “[pel]os interesses de comercio”. Assim, mudar a cortereal para o Brasil não implicaria em nenhuma mudança no relacionamen-to entre a Coroa e as outras partes do império, porque as rotas comerciaisentre as Américas, a África, a Ásia e a Europa permaneceriam as mesmas.Em outras palavras, Cunha compreendia, como Valentim Alexandre re-centemente argumentou, que, embora Portugal fosse historicamente o“centro em torno do qual gira toda a actividade política e económica”, asua posição não representa “uma situação imposta pela prevalência dosvalores nacionais, e por isso definitiva, mas o resultado de uma opçãoreversível, dependente de considerações de ordem geo-estratégica”.23 Porsua vez, o principal objetivo político de tais considerações estratégicas eraaumentar o poder da Coroa, a figura em que todas as diferenças epluralidades se resolvem. Essa compreensão do império representou umdistanciamento significativo daquela da Espanha do século XVIII. En-quanto Campomanes, por exemplo, questionava o ideal de uma comuni-dade transatlântica “encarnada na pessoa legal do rei”,24 a reconfiguraçãoportuguesa do império fiava-se precisamente na defesa não apenas damonarquia transoceânica, mas também da comunidade transoceânica devassalos e da rede de interesses comerciais que ela presidia.

Contudo, se o “Império do Ocidente” de Cunha provia uma continui-dade ao histórico império oceânico português, tornando o comércio des-te “mais seguro” e “conveniente”, ele também representava uma rupturana história imperial portuguesa. Mudar o centro político do império parao Brasil, afirmou Cunha, serviria como ponto de partida para a transfor-

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mação dos domínios americanos da Coroa, para uma administração maisracional da economia do Brasil e uma exploração mais completa dos seusrecursos por meio de “descubrimentos” adicionais. Como Cunha tam-bém previu, as perdas territoriais na Europa podiam ser compensadaspela expansão territorial no Novo Mundo. O Rio da Prata podia substi-tuir Portugal, explicou Cunha, enquanto o Chile podia substituir o Algarve,sem ser “totalmente impraticavel o acomodamento de trocar”, acrescen-tou, que serviria aos interesses de ambas as coroas ibéricas.25 Desse modo,o potencial americano tanto respondia quanto deslocava as vulne-rabilidades européias. Um império centrado no Novo Mundo, certa feitameramente imaginado como refúgio para os conflitos e intrigas da Euro-pa do século XVI, agora não só promovia o princípio do comércio oceâ-nico (tanto atlântico como, considerando o interesse no Chile, pacífico),mas também prometia legar o império baseado em terras de dimensões“continentais” que foi negado à Coroa portuguesa na Europa.

A PRÁTICA DE IMPÉRIO NO SÉCULO XVIII

Embora nos anos 1730, quando Cunha estava escrevendo, não houvesse,é claro, nenhuma transferência da corte, sua idéia de que a chave parauma renovação do poder global da Coroa portuguesa era o desenvolvi-mento do potencial da América tornou-se a base para forjar uma novapolítica imperial na segunda metade do século XVIII. Essa política centrou-se em parte no estabelecimento de fronteiras entre os territórios das Co-roas portuguesa e espanhola na América do Sul e, como descreveuDemétrio Magnoli, representou a “reativação da controvérsia sobre ofantasmagórico Meridiano de Tordesilhas”. Inspirada pela descoberta deouro nos seus territórios americanos, a Coroa portuguesa começou a de-fender e a fomentar os seus interesses lá, promovendo o reconhecimentoda região e estudos cartográficos. Segundo Magnoli, esses esforços supe-riores, quando comparados àqueles da Coroa espanhola rival, culmina-ram em 1750 com a vitória diplomática portuguesa do Tratado de Madri,negociado por Alexandre de Gusmão. O Tratado de Madri suplantou o

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Tratado de Tordesilhas (1494) ao sustentar o princípio de uti possidetis(ocupação) na África e na Ásia, bem como no Novo Mundo. Assim, otamanho do território português na América dobrou e incluiu a vastabacia do Rio Amazonas, ao passo que uma exceção ao princípio de ocu-pação foi aplicada ao Rio da Prata: os portugueses desistiram das suasreivindicações sobre a Colônia do Sacramento em troca do Território dasSete Missões. Embora essa exceção e as fronteiras meridionais da Améri-ca portuguesa continuassem a gerar disputas, as novas fronteiras ociden-tais perduraram.26

Coube, então, ao sucessor de João V, José I (1750-1777), responderaos imperativos administrativos criados pelo tratado. A tarefa foi desem-penhada energicamente por seu primeiro-ministro, Sebastião José de Car-valho e Melo, futuro marquês de Pombal, com uma reforma sistemáticada administração e da economia do império. Pombal, como Cunha, eraum ex-diplomata, e suas habilidades políticas tinham sido observadas pelopróprio Cunha em seu testamento político.27 Embora não previsse quePortugal fosse renunciar ao seu status metropolitano, Pombal comparti-lhava a preocupação de Cunha com a vulnerabilidade portuguesa na Eu-ropa. Para dar fim ao que Cunha havia caracterizado como dependênciada Inglaterra, Pombal promoveu a manufatura, visando reduzir importa-ções, e estabeleceu a Companhia do Alto Douro, para restringir o contro-le inglês sobre a indústria vinícola, contrariando acordos firmados emtratados anteriores.28 Fora da Europa, de forma semelhante, Pombal bus-cou desenvolver economias coloniais locais no interesse tanto da segu-rança como do comércio imperial. Sob a administração de FranciscoInnocencio de Souza Coutinho (1764-1772), por exemplo, foram feitastentativas de diversificar a economia angolana além da limitada funçãode depósito de escravos. Contudo, foi sobretudo o Brasil que se tornou ofoco das reformas imperiais de Pombal. Para substituir as rendas da anteslucrativa economia mineira americana, então diminuída, e estabelecer, naprática, a soberania garantida em princípio pelo Tratado de Madri, elepromoveu a colonização de territórios americanos, particularmente alémda costa e da região do Rio Amazonas. Lá, para diversificar e comercializaruma agricultura que compreendia principalmente atividades extrativas e

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de subsistência, a Coroa promoveu o uso extensivo da mão-de-obra es-crava africana; a criação de companhias de comércio; o assentamento deimigrantes açorianos; reformas de governo, educação e construção nasaldeias indígenas; e a fundação de novas cidades baseadas em padrões deplanejamento que manifestassem uma ordem espacial e administrativaesclarecida.29

As reformas fiscais e administrativas que Pombal iniciou em Portugaltambém foram estendidas ao Brasil como um todo. Em reconhecimento àimportância econômica e estratégica crescente do sul brasileiro e parareforçar o controle português dos seus territórios fronteiriços na região,a capital foi deslocada de Salvador, na Bahia, para o Rio de Janeiro. Regi-mentos auxiliares de cavalaria e infantaria foram organizados em todo oBrasil, juntas de fazenda (conselhos fiscais) foram implantadas em cadacapitania, e reformas administrativas adicionais foram realizadas median-te o recrutamento de elites nascidas no Brasil. A junta comercial de Lis-boa também começou a promover manufaturas locais no Brasil: umafundição, uma fábrica de couro e o cultivo da seda. As embarcações nãoeram mais obrigadas a navegar no sistema de frotas, dando aos mercado-res mais flexibilidade para conciliar oferta e procura. Em resposta à to-mada britânica de Havana em 1762, Pombal também patrocinou umasérie de projetos que visavam à fortificação da negligenciada costa brasi-leira. Além disso, estrangeiros foram sistematicamente barrados nos por-tos do Brasil, uma atitude coerente com o esforço de Pombal paraminimizar o papel dos intermediários comerciais “estrangeiro[s]”, princi-palmente ingleses, na economia do império.30

Pombal garantiu o legado da sua administração imperial reformandoa educação portuguesa. No final da década de 1770, os currículos dasfaculdades de direito e de medicina da Universidade de Coimbra foramrevisados, e foram criadas faculdades adicionais de matemática e filoso-fia, que incluíam as ciências naturais. A ciência natural, em particular,como ferramenta para entender as leis e a economia da natureza, tornou-se uma questão de Estado crucial, a base para promover reformas funda-mentadas que promoveriam a “pública prosperidade” e o “bem público”.Em 1764, para garantir o acesso ao aprendizado necessário para esse tipo

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de estudos no mundo português, Pombal nomeou Domenico Vandelli(1735-1816), um médico italiano e correspondente de Carlos Lineu,para a Universidade de Coimbra.31 Vandelli recrutou vários estudantese, quando a Coroa fundou a Academia Real de Ciências, em 1779, aciência natural foi introduzida na sua correspondência e nos seus proce-dimentos. Conforme o autor de um prólogo congratulatório às Memó-rias da Academia propôs a questão da inspiração dos seus membros: “Emhum seculo, em que a Natureza tem pago melhor que nunca ao laboriosoobservador com riquezas até ahi escondidas, ou seja nas entranhas, nasuperficie, e na região atmosferica da Terra [...] como ficaria em ocio aNação Portugueza?”32

A questão, retórica, não só celebrava o potencial de realizações daAcademia, mas também aludia ao status quo científico local, contra oqual os seus membros lutavam. A investigação limitada pelas ortodoxiasreligiosa e política tinha mantido, e ainda ameaçava manter, os portugue-ses afastados das correntes de inovação e esclarecimento que os cientistasde outras potências imperiais estavam mais livres para empreender. As-sim, enquanto alguns estadistas denunciavam a confluência entre pensa-mento político subversivo e ciência, os membros da Academia respondiamargumentando que a viabilidade do empreendimento imperial portuguêsbaseava-se nas suas investigações. Como explicou o fundador da acade-mia, o abade José Correia da Serra, nascido no Brasil: “A triste experienciado passado” mostrou “a necessidade de estudarmos, porque a substanciada Nação, e sua riqueza vimos por largo tempo passar aos estranhos emtroco de generos que ou de si crescião em nossas terras, ou pouca industriase precisava para naturalizallos”.33 Na esteira da queda de Pombal do poder,explica José Luiz Cardoso, a Academia, demonstrando a complexidadedo legado da própria reforma pombalina, também fomentou uma refle-xão sistemática sobre a economia portuguesa, baseada em um confrontocom a teoria fisiocrática, que incluía uma crítica nascente à intervençãoreal nos mercados e regimes de propriedade e produção, associada com omercantilismo pombalino, tornando este mercantilismo, como argumen-tou Fernando Novais, “ilustrado”.34 O interesse dos membros da Acade-

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mia em identificar as condições necessárias para o desenvolvimento daagricultura também coincidiu com esforços para promover uma explora-ção mais abrangente dos recursos naturais do império português. “O pri-meiro passo de huma Nação, para aproveitar suas vantagens”, aconselhouCorrea da Serra, “he conhecer perfeitamente as terras que habita, o queem si encerrão, o que de si produzem, o de que são capazes”.35 Como nocaso de Cunha e Pombal, para os cientistas naturais de Portugal do finaldo século XVIII, os territórios imperiais com mais resultado estavam forada Europa, na África e, acima de tudo, na América. “Se do Brasil se tirassemas utilidades, que os seus objectos offerecem”, perguntou o correspondenteda Academia Joaquim Amorim Castro, “que vantagens não tiraria o Esta-do, e que massas de Commercio não fornecerião?”36 Para executar o queVandelli caracterizou como “huma exacta Historia Natural de tão vastoContinente”, a Coroa patrocinou então uma série de expedições científicaslideradas por graduados treinados por Vandelli em Coimbra.37 Com essasexpedições, conhecidas como viagens filosóficas, a Coroa promoveu culti-vos experimentais e a primeira aclimatação sistemática de plantas tropicais,empreendimento que já se mostrara lucrativo para os holandeses, francesese britânicos, rivais de Portugal na Ásia e na América.38

Promovendo a diversificação da economia imperial iniciada antes porPombal, juntamente com outras pesquisas e correspondências entre estu-dantes de ciência natural em Portugal e no Brasil, as expedições científi-cas também consolidaram a visão de Cunha das dimensões continentais edo potencial econômico do Brasil entre a elite imperial portuguesa. Essefoi sem dúvida o caso de Rodrigo de Souza Coutinho, estadista, teóricodo império e estudante de ciência natural. Como diplomata e posterior-mente como ministro da Marinha e Domínios Ultramarinos (1796-1801),ele retomou o projeto de onde Pombal havia parado e promoveu o planodo primeiro-ministro de combater a vulnerabilidade política de Portugalna Europa por meio do desenvolvimento da América portuguesa. Con-vencido da necessidade de explorar os recursos desconhecidos do Brasil,Souza Coutinho buscou afiançar e proteger o patrocínio real às pesquisase estudos botânicos sobre novos modos de cultivo e produção. Ele fun-

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dou uma nova oficina de imprensa, a Casa Literária Arco do Cego, paraeditar e traduzir obras sobre agricultura tropical. Seu diretor, o padrebrasileiro José Mariano da Conceição Velloso, foi encarregado da tarefade criar um compêndio dos produtos botânicos em território português,a fim de promover a integração produtiva dos recursos do império.39

Conforme estava ciente Souza Coutinho, uma exploração mais amplae completa do território americano da Coroa também exigia dedicaçãoao tipo de reformas administrativas e políticas iniciadas por Pombal. Paraesse fim, em um discurso feito em 1797, ele propôs uma série de inova-ções na administração do Brasil. Auditorias administrativas e judiciais,juntamente com padrões mais elevados e melhores salários para os fun-cionários coloniais, argumentou ele, facilitariam uma governança régiamais eficiente e imparcial. Um clero colonial com melhor nível educa-cional e mais estritamente supervisionado, sugeriu ele ainda, tambémseria necessário se a Coroa pretendia completar a missão real de trazer opovo indígena brasileiro para o seio do catolicismo e da civilização eassim cumprir o desejo do monarca de consolidar “a Baze da Grandezado nosso Augusto Throno”.

Porém esse que seria um segundo esforço de colonização do Brasilresultaria inútil, insistiu Souza Coutinho, sem outras reformas que inte-grassem a América e o restante do império. Para levar a cabo essa integraçãoe o que ele descreveu como uma “defesa mútua e recíproca”, SouzaCoutinho centrou sua atenção no contingente militar e administrativo.Num plano que lembrava a “mutual e reciproca defeza” de Olivares, esta-dista espanhol do século XVII, ele argumentou que soldados para os exér-citos metropolitanos deveriam ser recrutados em todos os territóriosultramarinos, pois “o primeiro assento e Baze da Monarquia deve serigualmente defendido por todas as partes que compoem o todo”. Aomesmo tempo que uma presença militar mais plena também asseguraria adefesa do Brasil, a “naturalização” dos recrutas metropolitanos lá basea-dos por meio do casamento com mulheres locais, especulou ainda, pro-moveria “ainda mais a consolidação, e reunião de todas as Partes daMonarquia”. Essas e outras formas de unidade e integração, afirmou Souza

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Coutinho, garantiriam que “o Portuguez nascido nas Quatro Partes doMundo se julgue somente Portuguez”.40 Essa nova versão da mais antigaunião das armas espanhola, contudo, também se apoiava numa divergên-cia crucial da política imperial espanhola. Enquanto a Espanha excluía osespanhóis nascidos na América dos cargos mais elevados, Souza Coutinhobuscou integrar os brasileiros aos escalões superiores da administraçãoimperial. De fato, enquanto ele servia no gabinete real, vários brasileiros,inclusive alguns que antes tinham mostrado sinais de descontentamentopolítico, receberam responsabilidades administrativas não só no Brasil,mas também na África e em Portugal. Isso, argumentou Souza Coutinho,restaurava o propósito inicial do império. Embora Portugal fosse o “Pon-to de reunião” “natural” das partes constituintes dispersas do império,explicou ele, não era na hierarquia geográfica e política, mas antes no“inviolavel e sacrosanto principio [original] da Unidade”, aqui expressonuma elite imperial, que tanto a monarquia quanto o império sebaseavam.41

O esforço de Souza Coutinho para restaurar a vitalidade do impériofez dele o herdeiro preeminente de Pombal no final do século XVIII. ComoPombal, Souza Coutinho reconheceu o papel do comércio no estabeleci-mento e na manutenção do poder da monarquia, e buscou incrementar ocomércio imperial usando, acima de tudo, a pesquisa científica e a explo-ração racional dos recursos americanos. Diante dos limites do reino dePortugal e das dimensões continentais do Brasil, ambos empenharam-seem aproximar mais do que nunca Portugal e o “mais essencial dos nossosDominios Ultramarinos”. Talvez tenham conjecturado que marginalizarou alienar as elites nascidas no Brasil ou criar uma federação, como oconde de Aranda propôs para os territórios espanhóis, eram luxos aosquais os portugueses não podiam dar-se.42 Com efeito, quando compara-do com outros Estados europeus, Portugal, ao que parece, tinha mais aperder. Embora a Inglaterra tenha sobrevivido à perda das suas treze co-lônias norte-atlânticas, explicou Souza Coutinho, sem seu império ameri-cano, Portugal não seria tão afortunado. Se com o Brasil Portugal podiadesfrutar riquezas de dimensões continentais, “reduzido à si só”, con-

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cluiu ele num discurso ministerial freqüentemente citado, “seria dentrode huma breve periodo hua provincia d’Espanha”.43

CRISE E CONSUMAÇÃO DE UM IDEAL

No mesmo momento em que sua visão reformista estabelecia continuida-des com as tentativas de Pombal de revigorar o empreendimento imperial,Souza Coutinho também enfrentou novos desafios ao império. No fim doperíodo em que foi ministro da Marinha e Domínios Ultramarinos eletestemunhara não só a conquista da independência norte-americana, mastambém as revoluções francesa e haitiana. Conseqüentemente, o desafiodo estadista português tornara-se não apenas revitalizar o império, maspreservá-lo no agora revolucionário mundo atlântico. Essa tarefa, comoSouza Coutinho sabia, era bastante complicada devido à notóriavulnerabilidade geopolítica de Portugal.

A Coroa portuguesa respondeu inicialmente às crises políticasprovocadas pelas guerras revolucionárias da Europa afirmando neutrali-dade, uma neutralidade ativa alcançada por meio do cultivo de relaçõescom várias monarquias européias. Um precedente para essa neutralidadeda virada do século XIX fora estabelecido durante a guerra norte-ameri-cana de independência, quando a Coroa portuguesa não apoiou nem acausa britânica nem a norte-americana. Uma série de casamentos entre asrealezas portuguesa e espanhola ao longo do século XVIII, inclusive o deDom João com a irmã de Fernando VII, Carlota Joaquina, também serviupara mitigar potenciais hostilidades na Península Ibérica e minou ainevitabilidade de uma aliança com um inimigo da Espanha, a Grã-Bretanha. Tanto em 1796 quanto em 1803, a Coroa portuguesa compro-meteu-se a manter sua posição de neutralidade em relação aos conflitosque se acirravam entre os britânicos e os franceses.

Entretanto a manutenção da neutralidade dependia de mais do queapenas a vontade da Coroa portuguesa. Em 1801, Napoleão exigiu queos portugueses fechassem as portas do império aos britânicos. Quando

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os portugueses não concordaram, as relações com a Espanha se arrui-naram de uma vez por todas, e tropas espanholas invadiram Portugalem nome de Napoleão. O curto e humilhante conflito conhecido comoa “Guerra das Laranjas” resultou na perda de Olivença e num tratadoque estipulava, entre outras coisas, o fechamento dos portos portugue-ses aos ingleses. Negociações adicionais com os franceses levaram àassinatura de um tratado no mesmo ano, o qual reafirmava o futurofechamento dos portos portugueses, proibia os portugueses de ajuda-rem inimigos da França, expandia a Guiana Francesa em detrimento doterritório setentrional brasileiro e estipulava um pagamento regular aoregime de Napoleão.44

Foi nesse contexto que os estadistas portugueses começaram a recon-siderar a criação do tipo de império americano proposto por Luiz daCunha. Durante as negociações com os franceses, o marquês de Alornarecomendou à Coroa que anunciasse as suas intenções de retirar-se para oBrasil. Segundo a especulação de Alorna, se o monarca português apenasameaçasse partir e se tornar imperador dos seus territórios na América,— os quais, acrescentou ele, podiam ser facilmente estendidos para in-cluir colônias da Espanha —, os franceses poderiam retirar as suas exi-gências. Se, ao contrário, o blefe não desse certo, considerando a situaçãona Europa, ele concluiu que o príncipe regente deveria, da mesma manei-ra, estabelecer residência no estrangeiro.45 O conde de Ega também sus-tentou que tinha chegado a hora de mudar a corte real. Não era somenteo reino de Portugal, explicou ele, mas o próprio império que estava emjogo. “Ou Portugal há-de-fechar os seus portos aos ingleses e corer orisco de perder por algum tempo a posse das suas colónias”, escreveu ele,“ou o Principe Nosso Senhor [...] irá estabelecer no Novo Mundo umaNova Monarquia [...]”. Nesse caso, argumentou ele, o príncipe regentenão só evitaria a desastrosa servidão aos franceses, mas poderia tornar-seele próprio “um imperador de estatura muito maior”.46 Apenas dois anosmais tarde, Souza Coutinho publicou o seu endosso à transferência dacorte, insistindo semelhantemente, como vimos no começo deste capítu-lo, que a criação de um império no Novo Mundo permitiria à Coroa

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portuguesa punir Napoleão por sua recusa em honrar a sua nobre posi-ção de neutralidade.47

A noção de que a transferência da corte para o Brasil seria uma mano-bra brilhante para tirar a Coroa do conflito europeu e forjar um impériomaior e mais independente não foi, contudo, compartilhada pela corteportuguesa como um todo. Ao mesmo tempo que a idéia alienava os mem-bros da nobreza que não tinham interesses no Brasil, também era percebi-da como algo que servia aos interesses britânicos e, conseqüentemente,ameaçava quaisquer possibilidades de neutralidade que ainda restassem.De fato, os proponentes da transferência da corte freqüentemente reco-nheciam as suas simpatias por uma aliança anglo-portuguesa na guerra.Ega sugeriu que, se forçado a escolher, era melhor ser aliado a ser inimigoda Grã-Bretanha, a monarquia mais apta a prejudicar o império portu-guês. Souza Coutinho também era sabidamente a favor de uma facçãopró-britânica na corte. Este aparente alinhamento entre os que apoiavama transferência da corte e a Grã-Bretanha foi então confirmado quando aprópria corte britânica anunciou o seu apoio ao plano de estabelecer acapital portuguesa no Brasil. Em 1806 e 1807, atuando para evitar umaanexação napoleônica da Península Ibérica, os britânicos intensificaramos esforços diplomáticos para promover essa posição em Lisboa, instruin-do o representante britânico, visconde de Strangford, a fortalecer a fac-ção que apoiava tanto a Grã-Bretanha como a transferência da corte. Umfolheto anônimo, escrito em francês e publicado em Londres em 1807,reiterava observações anteriores atribuídas a William Pitt em apoio aoimpério luso-americano.48 E em meado de novembro de 1807, Sir SidneySmith estava estacionado ao largo do porto de Lisboa com uma esquadra,uma força de 7 mil homens, e ordem de ou bem escoltar a família real aoBrasil ou bloquear o porto e salvar a frota portuguesa se Lisboa estivesseprestes a cair diante dos franceses.

Nesse ínterim, os franceses também pressionavam a Coroa portugue-sa para desmobilizar a sua política de neutralidade. Se os britânicos nãoassinassem um tratado, prometeu Napoleão, tropas francesas ocupariamPortugal. Em resposta, os conselheiros reais portugueses tanto continua-

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ram a negociar com os franceses quanto mantiveram conversações comStrangford sobre uma possível partida de Lisboa. Num esforço final paraevitar a guerra com a França, os portugueses tentaram ceder às exigênciasde Napoleão simulando hostilidades contra os britânicos. O passaportede Strangford foi cancelado, e os britânicos tiveram o acesso aos portosportugueses proibido, enquanto negociações secretas com a Coroa britâ-nica estabeleceram compensações para quaisquer eventuais confiscos.Contudo, esses esforços diplomáticos intensos e às vezes convolutos fo-ram abandonados de uma vez por todas em novembro de 1807, quandochegaram notícias a Lisboa de que tropas francesas sob o comando deJunot tinham cruzado a fronteira hispano-portuguesa. A oposição à trans-ferência da corte desintegrou-se, e quando Strangford retornou a Lisboa,apenas alguns dias após ter partido, a família real e a nobreza já haviamembarcado.49 O príncipe regente estabeleceu a regência, aconselhou a nãooferecer resistência armada aos franceses e garantiu que Portugal sofreriaa sua ausência apenas “athe a Pas Geral” ser alcançada.50 Então, juntocom a escolta britânica, ele e seus cortesãos içaram velas para o Rio deJaneiro, a capital vice-real brasileira.

Com a transferência da corte, o Brasil tornou-se o refúgio de curtoprazo para uma monarquia portuguesa sitiada, conforme previsto no fi-nal do século XVI. Contudo, a partida do príncipe regente também seinspirava num discurso e numa prática imperiais mais recentes. ComoSouza Coutinho imaginou e fomentou, a mudança para a América ba-seou-se em uma avaliação positiva das possibilidades de reorganizar oespaço imperial e redefinir o etos do império. E essa renovação imperialdependia, acima de tudo, da percepção do Brasil como uma parte essen-cial e central dos domínios da monarquia; um continente de recursosque, como estadistas do século XVIII haviam sustentado, a pesquisa ra-cional e científica poderia transformar num grande império de riqueza eutilidade comercial. Menos de um ano depois, a “Declaração de Guerraaos Francezes”, redigida por Souza Coutinho em sua nova e mais podero-sa posição de ministro de Negócios Estrangeiros e da Guerra, refletia aforça dessa promessa de renovação imperial no Novo Mundo. Com ela, o

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príncipe regente se dirigiu a Napoleão e aos monarcas da Europa não deum exílio humilhado, mas antes, como descrevia a declaração, “do seiodo novo império, que [ele ia] crear”.51

Não obstante, como veremos, no mesmo momento em que o prínciperegente e seus cortesãos celebravam a salvação da monarquia e do im-pério independentes, eles também começaram a ponderar que a transferên-cia da corte representava uma mudança mais fundamental e potencialmenteameaçadora: o que Ega descrevera como “a maior de todas as revoluçõesno sistema geral político”.52 Para a Coroa portuguesa alcançar o que umobservador britânico saudou como uma “glória mais brilhante na esferaocidental”,53 a legitimidade da monarquia e do império teria que serredefinida de maneiras que levassem em consideração os desenvolvimen-tos recentes. A nova corte do Rio de Janeiro tornou-se o local crucial ondeessas redefinições foram forjadas.

Notas

1. Rodrigo de Souza Coutinho, “Quadro da situação política da Europa...” (16 deagosto de 1803), em Ângelo Pereira, D. João VI, príncipe e rei, v. 1, Lisboa, Empre-sa Nacional de Publicidade, 1953, p. 127-136.

2. A proposta de Souza Coutinho foi rejeitada pelos cortesãos portugueses, nobres emercadores que, sem propriedades extensivas no Brasil, nada tinham a ganhar coma mudança da capital portuguesa para o Novo Mundo. Logo depois, Souza Coutinhopediu demissão de seu cargo. Ver Kenneth Maxwell, “The Generation of the 1790sand the Idea of Luso-Brazilian Empire”, em Dauril Alden (org.), Colonial Roots ofModern Brazil, Berkeley, University of California Press, 1973, p. 141; e AndreeMansuy Diniz Silva, “Introdução”, em Rodrigo de Souza Coutinho, Textos políti-cos, económicos e financeiros (1783-1811), t. 1, Lisboa, Banco de Portugal, 1993,p. xlviii.

3. Ver Luiz da Cunha, Instruções inéditas de D. Luiz da Cunha a Marco António deAzevedo Coutinho, 1736, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1930, p. 208-209;e Joaquim Veríssimo Serrão, Do Brasil filipino ao Brasil de 1640, São Paulo, Com-panhia Editora Nacional, 1968, p. 13-15.

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