capÍtulo 1 - a questão ambiental

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A Questão Ambiental, A Educação e Suas Aplicações: A ética, A moral e a justiça social 1.1 Contextualizando Três temáticas fundamentam a questão ambiental e a educação: a ética, a moral e a justiça ecológica. Neste sentido, a necessidade da abordagem de tais conteúdos se faz eminente para que você compreenda os alicerces em que está fundamentada a problemática ambiental, constituindo-se assim na base para todo percurso deste livro texto. Chamar sua atenção para esse fato é pertinente nesse momento, pois, à medida que compreendemos o contexto dos problemas ambientais planetários, ficamos sensíveis para assumirmos uma postura que contemple a busca para a resolução dos mesmos. Neste sentido, perceber a importância do conteúdo proposto para este capítulo é ferramenta indispensável para um entendimento coerente a respeito da disciplina Desenvolvimento e Sustentabilidade Ambiental. Assim, esperamos que, ao final deste capítulo, você esteja apto a:

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Homem Sociedade e Meio Ambiente

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Page 1: CAPÍTULO 1 - A Questão Ambiental

A Questão Ambiental, A Educação e Suas Aplicações: A ética, A moral e a justiça social

1.1 Contextualizando

Três temáticas fundamentam a questão ambiental e a educação: a ética, a moral e a justiça ecológica. Neste sentido, a necessidade da abordagem de tais conteúdos se faz eminente para que você compreenda os alicerces em que está fundamentada a problemática ambiental, constituindo-se assim na base para todo percurso deste livro texto.

Chamar sua atenção para esse fato é pertinente nesse momento, pois, à medida que compreendemos o contexto dos problemas ambientais planetários, ficamos sensíveis para assumirmos uma postura que contemple a busca para a resolução dos mesmos.

Neste sentido, perceber a importância do conteúdo proposto para este capítulo é ferramenta indispensável para um entendimento coerente a respeito da disciplina Desenvolvimento e Sustentabilidade Ambiental.

Assim, esperamos que, ao final deste capítulo, você esteja apto a:

Descrever as questões ambientais atuais;

Identificar como a ética, a moral e a justiça estão ligadas às questões ambientais;

Despertar sua responsabilidade individual para a manutenção da qualidade ambiental;

Optar por ações de promoção a justiça ecológica.

Vale salientar que muitas das questões a serem analisadas constituem o nosso dia a dia e cada um de nós tem a responsabilidade para contribuir na formação de uma

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sociedade com cidadania planetária, capaz de cooperar para a inclusão do tema sustentabilidade no seu cotidiano.

Esperamos que esta seja mais uma experiência produtiva e enriquecedora para você.

1.1 Contextualizando

1.2 Conhecendo a teoria - 1.2.1 A questão ambiental na atualidade

Iniciaremos nossa discussão com algumas perguntas:

Ficou inquietado com os questionamentos apresentados na reflexão? Eles são o ponto de partida da nossa conversa. Para que você compreenda melhor a questão ambiental, é preciso fazer uma retrospectiva dos fatos que a cercam, bem como suas consequências para o mundo. Para facilitar seu entendimento, vamos fazer uma retrospectiva de fatos que marcaram a apropriação ambiental a partir da Revolução Industrial.

O começo de tudo: o crescimento pautado no consumismo

Com o advento da Revolução Industrial surge um modelo de crescimento econômico pautado no consumismo imediatista. Esse consumo vem acarretar um colapso nas reservas do planeta, pois, à medida que se retira do ambiente

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mais do que o necessário para a sobrevivência humana, não se dá o devido tempo para sua renovação. Infelizmente, o despertar para essa realidade ainda é muito recente a partir da década de 1960.

Nesse contexto, cabe elencar fatos condicionantes para essa postura reflexiva, responsável por uma nova visão do ambiente. Pode-se considerar um marco nesse processo o ano de 1962, quando a jornalista Rachel Carson publica o livro Primavera Silenciosa. Daquele momento em diante ocorrem inúmeros encontros com a intenção de discutir a crise ambiental, bem como medidas mitigadoras, ou seja, que minimizem os impactos das intervenções humanas na natureza. Observe o quadro 1 e verifique os eventos ocorridos desde a década de 1960:

ANO

EVENTOS

1968

Clube de Roma - Publicação do estudo Limites do crescimento (culpava o crescimento

populacional dos países pobres e não os padrões de consumo). Este momento foi um

marco para a problemática ambiental em nível planetário

1972

Estocolmo (Suécia) - 1ª Conferência Mundial de Meio Ambiente Humano, cujo tema foi a

poluição industrial. Nessa conferência, o Brasil adota a seguinte postura “a poluição é o

preço que se paga pelo progresso”, ainda sobre Estocolmo: educar o cidadão para a

resolução de problemas ambientais, ou seja, Educação Ambiental (EA).

Nesse período, surge o conceito de ecodesenvolvimento, formulado pelo economista

polonês Ignacy Sachs que, anos depois, daria origem à expressão desenvolvimento

sustentável (BUARQUE, 2007).

1975

Belgrado (Iugoslávia) - Carta de Belgrado (objetivos da EA).

1977

Conferência intergovernamental sobre educação ambiental em Tibílissi (Geórgia, ex URSS) –

Tradado sobre EA.

1987

Gro-Brundtland (Ministra da Noruega) – reuniões em várias cidades do mundo resultando

no livro Nosso Futuro Comum ou Relatório de Brundtland (conceito de desenvolvimento

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sustentável mais conhecido).

1992

Rio 92 - AGENDA 21, mudanças climáticas, biodiversidade.

2002

Rio+10 (Johannesburg – África do Sul): poucos avanços, pois os governos dos países

em desenvolvimento ficaram mais preocupados em aplicar o Consenso de Washington e

os programas de ajuste estrutural do FMI do que em implementar as recomendações da

Agenda 21.

2009

Cerca de 180 países se reuniram em Copenhague (Dinamarca) em dezembro para tentar

estabelecer um acordo que substituísse o Protocolo de Kyoto, o principal instrumento da

Organização das Nações Unidas (ONU) contra a mudança climática, que expira em

2012. Os resultados do evento foram inexpressivos.

Quadro 1: Eventos para discutir os efeitos do crescimento pautado no consumismo

Diante desses aspectos, temas como: mudanças climáticas, aquecimento global, escassez de recursos naturais, crise energética, desertificação, reciclagem, entre outros relacionados ao fim, ou a modificação de determinados ciclos da natureza permeiam as discussões nos variados níveis sociais, tendo em vista que todos (sem exceção) já começam a sentir os efeitos da degradação ambiental vigente.

Tratar dos temas apresentados no parágrafo anterior é destacar o quanto as ações humanas têm impactado o ambiente, causando malefícios a todos. Acreditamos, ainda, que tenhamos verificado como tais impactos são provenientes da nossa cultura voltada para o consumo exacerbado, com destaque especial para o povo do Ocidente, a partir de uma visão egocêntrica de mundo visando a atender apenas aos interesses econômicos.

Conforme demonstrado, esse modelo de desenvolvimento, pautado no consumismo, não atende mais a oferta de recursos do planeta. Tal fato torna emergente uma mudança de postura, ou seja, o chamado ecodesenvolvimento, que tem como premissa usufruir os recursos sem comprometer sua utilização futura.

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Agora, retomamos as perguntas iniciais da nossa conversa, acrescentando mais uma: com essa leitura, você é capaz de se sentir responsável pela problemática ambiental da atualidade?

E aí, conseguiu perceber o quanto são emergentes ações que minimizem os impactos ambientais? Neste caso, muito do que precisa ser feito faz parte das decisões tomadas por cada indivíduo na hora do consumo.

1.1 Contextualizando

1.2.2 A sustentabilidade das ações antrópicas

No item anterior, tivemos um panorama da atual situação da problemática ambiental, trazendo os principais apontamentos que permeiam o tema. Ficou perceptível que a ação antrópica (ação do homem) tem grande influência nos números da devastação e que a preocupação com estas questões são oriundas da segunda metade do século XX. Com elas, surge o desafio para a conquista do desenvolvimento voltado para a sustentabilidade.

Assim, iniciam-se as discussões na comunidade internacional para a divisão dos custos desse processo, que prevê nada menos que a revisão do modelo econômico vigente alicerçado no consumismo.

Por isso, tantos encontros, seminários, congressos e

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acordos, conforme elencados no item anterior, ocorreram e continuam ocorrendo visando à solução da crise ambiental mundial. Assim, há uma difusão do discurso da sustentabilidade, entretanto, a prática para alcançar tal premissa anda a passos lentos, pois muito se fala e pouco se faz para alcançá-la.

A incidência dessa situação se dá em função de fatores como as disparidades entre os países ricos e pobres e suas formas de crescimento, bem como seus interesses individuais. “Esses interesses se manifestaram nas dificuldades para conseguir acordos internacionais sobre os instrumentos jurídicos para orientar a passagem para a sustentabilidade” (LEFF, 2008, p. 21). Para que você compreenda o significado de sustentabilidade, é importante conhecer o conceito de desenvolvimento sustentável.

Percebe-se aí não somente uma crise ambiental, mas, sim, uma crise de valores, na qual ninguém quer perder sua fatia de um bolo que já está passando do ponto e que, se não tivermos o cuidado adequado, trará efeitos irreversíveis. Diante disso, é visível como a ação do homem tem relevância no enfrentamento dessa questão, ou seja, a minimização da citada crise perpassa por discussões de ordem econômica, social, ecológica, cultural e espacial.

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Esse impasse pode ser entendido por duas ordens de posicionamento: um macro, que depende das articulações internacionais provenientes dos acordos gerados nas intensas rodadas de negociações dos grandes encontros; e outro micro, que dependente das nossas ações individuais e cotidianas. Para ilustrar essa afirmativa, utilizamos o jargão bastante difundido: agir local, pensar global.

Você deve estar percebendo o quanto nossa conversa gira em torno de uma temática, a ação antrópica como divisor de águas para a minimização dos impactos ao meio ambiente. E que homem é esse? É o Presidente da República, é o grande industrial, o presidente de uma transnacional, é o proprietário de uma madeireira e é você. Ficou surpreso com a sua inclusão no rol dos responsáveis?

Em caso afirmativo, não fique, pois é você quem elege o presidente da república e todos os outros cargos eletivos existentes, cuja responsabilidade é defender nossos interesses. Além disso, você consome os bens e serviços produzidos e comercializados pelas indústrias e corporações transnacionais sem nem perguntar a procedência dos insumos (matéria-prima, energia) tão pouco as condições de trabalho daqueles que os produziram.

Continua achando que não tem nada a ver com isso? Então, responda essa pergunta: você sabe a origem da

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madeira queimada para fabricar o pão que vai para sua mesa todos os dias, ou, se os grãos constantes na sua pirâmide alimentar, bem como a madeira dos móveis da sua casa são fruto de uma área desmatada de forma ilegal ou subtraída de uma população tradicional?

Parece que, individualmente, não estamos isentos da responsabilidade com o quadro crítico em que o planeta se encontra, pois o consumismo desenfreado, ou seja, insustentável, é o grande responsável pelo mesmo. Isso significa dizer que o modelo econômico vigente não tem permitido às reservas naturais o tempo necessário para sua recomposição.

Os condicionantes apresentados até o momento demonstram a necessidade de um caminho em direção a mudança. Nele, verifica-se a educação como um fator

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crucial na tentativa da sensibilização dos indivíduos para a mudança de postura, de modo que cada um se sinta responsável e mobilize esforços para a realização de um trabalho lento e gradual de transformação, semelhante ao das formiguinhas.

A esse respeito, Boff (2004, p.27) destaca que

Importa construir um novo ethos que permita uma nova convivência entre os humanos com os demais seres da comunidade biótica, planetária e cósmica; que propicie um novo encantamento face à majestade do universo e à complexidade das relações que sustentam todos e cada um dos seres. [...] A casa humana hoje não é mais o estado-nação, mas a Terra como pátria/mátria comum da humanidade.

Isso significa dizer que realmente são necessárias novas posturas de sobrevivência, implicando em atitudes de cuidado, tendo por princípio a atenção, o zelo e o desvelo (BOFF, 2004). Por se tratarem de posicionamentos individuais com reflexo no coletivo, é pertinente ressaltar que o compromisso gerado em Estocolmo em 1972 precisa ser reafirmado sempre, ou seja, a educação ambiental permanente (seja ela formal, informal ou não formal), pois é perceptível que, além dos interesses econômicos, estão também incluídas questões socioculturais no contexto ambiental.

1.1 Contextualizando

1.2.3 A educação como ferramenta para o uso sustentado do planeta

Recapitulando nossa conversa inicial, lembra das quatro perguntas que lhe foram feitas? Acreditamos que os dados tratados nesse capítulo explicitam que você e eu somos tão responsáveis por cuidar do planeta quanto os representantes políticos de países como Estados Unidos e China, grande

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poluidores mundiais.

Isso significa lembrá-lo que o ser humano é um animal racional, portanto, desde o nascimento adquire conhecimento e discernimento do que é benéfico ou maléfico, seja usando o senso comum ou por meio do conhecimento científico. Fica evidente que a educação é um processo permanente, sendo importante reforçar a significância de sua contribuição para a utilização sustentável do planeta.

Para que a EA ocorra a contento, é importante sempre retomar seus objetivos e características estabelecidos na Conferência de Tbilisi (CEI, Geórgia) realizada de 14 a 26 de outubro de 1977.

Assim, é interessante observar que, a partir de um

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processo onde apreendamos como funciona o ambiente, a forma como dependemos dele, como nossas atitudes, por mais simples que pareçam, são fornecedoras de impactos, encontraremos mecanismos para a promoção da sustentabilidade. E é nessa premissa que consiste uma EA consciente, crítica e transformadora, capaz de fomentar atitudes revolucionárias para o enfrentamento da problemática vigente. Para reforçar seu entendimento, o esquema, a seguir, demonstra os caminhos para a EA transformadora.

FIGURA 2 - Esquema para EA crítica e transformadora (DIAS, 2004, p. 100)

Diante do exposto, como fazer para conseguir o pressuposto da EA crítica e transformadora? Primeiro, é necessário um exercício individual. Responda às perguntas abaixo, com base no seu cotidiano:

•Ao acordar, quais são as suas primeiras atitudes?•Quanto e como você utiliza seu tempo no banheiro?•Que tipos de alimentos são consumidos nas suas refeições?•Como se dá o uso de equipamentos elétricos em sua

residência? Quais e quantos existem? Qual o consumo de energia por eles dispensado?

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•Quando você vai às compras, você atende às suas necessidades ou aos desejos impostos pela indústria cultural?

•Em sua casa tem jardim? Em caso afirmativo, como ele é regado?

•Como é feito o descarte dos resíduos gerados em sua residência? Existe algum tipo de separação? Qual?

•Que tipo e com que combustível é movido o transporte por você utilizado? No caso de veículo próprio, como ocorre a lavagem do mesmo e em que periodicidade?

•Quantas peças existem em seu armário, incluindo roupas e calçados? Quais você utiliza?

•Qual a origem da água e energia elétrica que chega a sua casa, juntamente com os móveis, equipamentos e utensílios?

•Em seu trabalho, existem medidas para evitar o desperdício de água, energia e papel? Você as utiliza?

•Como estas palavras REDUZIR, REUTILIZAR E RECICLAR estão empregadas no seu cotidiano?

Então, suas respostas são satisfatórias? Viu como você é dependente dos recursos naturais? Não se assuste, pois, assim como seu cotidiano é impactante, também é o de muitos outros ao redor do planeta. O importante é que, a partir de agora, você é menos um sem conhecimento e com discernimento para realizar suas escolhas com mais cuidado e zelo com o meio ambiente.

Toda essa discussão foi para reforçar seu entendimento de quão complexa é a questão ambiental, envolvendo também o enfoque econômico, social, cultural e social, necessitando

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reflexão individual e coletiva com a premissa de uma mudança de postura alinhada com a ética, a moral e a justiça ecológica.

1.1 Contextualizando

1.2.4 A ética, a moral e a justiça ecológica como premissas para a mudança de postura

A grande perversão do nosso tempo, muito além daquelas que são comumente apontadas como vícios, está no papel que o consumo veio representar na vida coletiva e na formação do caráter dos indivíduos. [...] A moda é um desses artifícios com o qual as coisas ficam as mesmas, embora apresentando uma transformação. A moda é a manivela do consumo, pela criação de novos objetos que se impõem ao indivíduo. (SANTOS, 2007, p. 47 e 49).

Acreditamos que o discurso da citação anterior ilustra bem o caminho que pretendemos percorrer ao apresentar a ética, a moral e a justiça ecológica como premissas para a mudança de postura. Isto não significa dizer que, a partir de agora, você deva realizar uma mudança radical nos seus hábitos e posturas, entretanto, é imprescindível que ela ocorra de alguma forma.

Vivemos na sociedade do consumo, representada pelos shoppings centers, grandes redes de supermercados, de lojas de departamentos, de fast foods, entre tantos outros símbolos da vida moderna. Some-se a isso o fato de sermos obrigados a conviver com tais símbolos cotidianamente, especialmente por meio dos apelos criados pelos meios de comunicação de massa em campanhas publicitárias com tamanho requinte e qualidade, que nos seduzem ao ponto de cairmos na tentação do consumismo.

Diante disso, são criadas ou apropriadas pelo comércio

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inúmeras datas comemorativas para o aquecimento das vendas, dentre elas citamos: carnaval, páscoa, dias das mães, dos namorados, dos pais, das crianças e, é claro, o natal (principal fonte de lucro para o comércio).

Santos (2007) ainda reforça esse condicionante, afirmando que esta não é simplesmente uma sociedade do consumo e, sim, do consumo que gera desperdício. Lembra quando dissemos anteriormente que se retiram os recursos da natureza de forma tão veloz que não se permite à mesma o tempo hábil para a regeneração? Pois bem, um grande contribuinte para isso é o desperdício. Gostaríamos que você retomasse ao exercício cotidiano citado anteriormente e verificasse em que respostas o desperdício é perceptível em seu consumo diário.

Para entender melhor o pressuposto do parágrafo anterior, é interessante destacar que existe toda uma cadeia produtiva envolvida para isso, partindo dos insumos primários até a chegada ao consumidor final.

É de extrema importância que você realize o desafio proposto, para uma melhor compreensão do que estamos tentando demonstrar ao enfatizar, em diversos momentos nesse texto, que estamos diante da sociedade do consumo alienado. Essa afirmativa constante tem intenção de nos remeter ao fato de que muitas vezes somos estimulados pelos apelos midiáticos para adquirirmos produtos desnecessários.

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Essa aquisição, além de utilizar recursos de forma excedente, faz com que seja gerado um número maior de resíduos no ambiente, levando a outro problema sério, especialmente dos grandes centros urbanos: a destinação final correta do lixo, desencadeando uma série de outros problemas, inclusive de saúde ambiental provenientes do lixo.

Mais uma vez, retomamos a importância do processo educativo com vistas ao estímulo da ação antrópica, pautada na minimização da problemática ambiental, na qual se verifique a emergência de que a sociedade atual necessita apresentar um novo aprendizado: a reeducação para o consumo.

Baudrillard apud Santos (2007, p. 48) contextualiza esse pressuposto, quando afirma que:

A sociedade do consumo é também a sociedade de aprendizado do consumo, do condicionamento social do consumo - isto é, um modo novo e específico de socialização, em relação com a emergência de novas forças produtivas e a reestruturação monopolística de um sistema econômico a produtividade alta.

Fica evidente que, quando se fala em reeducação para o consumo, não significa apresentar um modelo predefinido para tal, composto por sugestões engessadas. Na verdade, cada um, por meio da análise prévia, é quem vai decidir entre

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a necessidade para sua sobrevivência e o desejo imposto pela mídia na hora da compra. Neste aspecto, é perceptível quão subjetiva é essa questão, perpassando por princípios éticos e morais para nossas escolhas.

A ação baseada na ética e na moral

Ao travar um diálogo em torno da ética e moral, é preciso lembrar a importância de pensarmos e agirmos de modo que os interesses individuais nunca sobreponham os coletivos. Na atualidade, fica cada vez mais difícil pautar ações seguindo esse contexto, pois vivemos num tempo de disputas e jogo de interesses na busca da conquista e acumulação de bens e capital como estilos de vida padrão. “O progresso econômico colocou o mundo às portas de uma sociedade de ‘pós-escassez’, fundada em valores pós-materiais e liberada dos constrangimentos da necessidade”(INGLEHART apudLEFF, 2008, p. 84).

Por isso, é importante frisar que esta é uma crise com características de subjetividade, na qual os valores de cada um devem ser levados em conta para a adoção de mudanças significativas, que reflitam na melhoria das condições ambientais atuais. Em outras palavras, pode-se dizer que a eminência é satisfazermos nossas necessidades, agindo de maneira a não prejudicar as dos outros seres vivos existentes no planeta, ou seja, a cidadania planetária.

Toda a formação social e todo tipo de desenvolvimento estão fundados num sistema de valores, em princípios que orientam as formas de apropriação social e transformação da natureza. A racionalidade ambiental incorpora assim as bases do equilíbrio ecológico como norma do sistema econômico e condição de um desenvolvimento sustentável; da mesma forma se funda em princípios éticos (respeito e harmonia com a natureza) e valores políticos (democracia participativa e equidade social) que constituem novos fins do desenvolvimento e se entrelaçam como normas morais nos fundamentos materiais de

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uma racionalidade ambiental. (LEFF, 2008, p. 85)

Novamente retomamos o discurso da mudança de postura, atrelada ao comportamento humano em harmonia com a natureza, ou seja, uma nova ética traduzida em práticas sociais transformadas por meio de uma racionalidade social e alternativa.

Nossa intenção aqui não é sugerir que você reescreva toda a sua história de vida a partir de uma visão radical para novas posturas e, sim, que você verifique outras possibilidades a respeito de suas escolhas de hoje em diante. Essas devem ter em vista a premissa da adoção de valores humanistas que busquem “a integridade humana, o sentido da vida, a solidariedade social, o reencantamento da vida e a erotização do mundo” (LEFF, 2008, p.87). Essa afirmativa remete ao pressuposto da cidadania, ou seja, da preocupação com outro, independente de quem ele seja.

Isso tudo nos permite afirmar ainda que, ao adotarmos posturas humanistas, estejamos criando condições para a melhoria da qualidade de vida associada ao consumo sustentável.

Page 18: CAPÍTULO 1 - A Questão Ambiental

Com a sugestão acima, encerramos nossa discussão teórica, esperando que ela tenha contribuído para despertá-lo para ações que promovam sua cidadania planetária. Não esqueça a máxima: agir local, pensando no global, pois o planeta Terra é de todos os seres vivos.

No próximo capítulo, aprofundaremos essa discussão, apresentando o conteúdo: princípios e dimensões da sustentabilidade: econômica, social, ecológica, cultural e espacial. Até lá.

1.1 Contextualizando

1.3 Aplicando a teoria na prática

Leia o texto a seguir:

Page 19: CAPÍTULO 1 - A Questão Ambiental

Diante da problemática levantada, vamos ajudar Bia a mudar de postura e a adotar práticas cotidianas sustentáveis.

Inicialmente, é importante propor a Bia a resolução do questionário sobre o exercício cotidiano de nossas ações para que ela possa ter a dimensão do quanto suas atitudes do dia a dia são insustentáveis para o futuro do planeta.

Bia também deve ter ciência que não se muda de um dia para outro, e que as mudanças ocorrem de forma paulatina e pela educação ecológica. Para isso, ela precisa se tornar uma pesquisadora constante, pois, além de consumidora desenfreada, ela é profissional da construção civil, área extremamente impactante e que requer medidas mitigadoras para os impactos que gera.

De acordo com Boff (2004, p. 134), essa engenheira precisa perceber que:

[...] cada pessoa precisa descobrir-se como parte do ecossistema local e da comunidade biótica, seja em seu aspecto de natureza, seja em sua dimensão de cultura. Precisa conhecer os irmãos e irmãs que compartem da mesma atmosfera, da mesma paisagem, do mesmo solo, dos mesmos mananciais, das mesmas fontes de nutrientes; precisa conhecer o tipo de plantas, animais e microorganismos que convivem naquele

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nicho ecológico comum; precisa conhecer a história daquelas paisagens, visitar aqueles rios e montanhas, freqüentar aquelas cascatas e cavernas; precisa conhecer a história das populações que aí viveram sua saga e construíram seu habitat, como trabalharam a natureza, como a conservaram ou a depredaram, quem são seus poetas e sábios, heróis e heroínas, santos e santas, os pais/mães fundadores de civilização local.

É importante que Bia desenvolva e pratique a cidadania planetária capaz de reduzir o consumo, por meio da doação dos bens em excesso que adquiriu, bem como da vigilância para não comprar somente pelos apelos midiáticos. Ela deve também evitar os descartáveis à medida que prioriza os reutilizáveis. A engenheira ainda pode contribuir fazendo a separação do seu lixo, dando a destinação correta para o mesmo, ou seja, retirando os recicláveis, separando inclusive grandes vilões, como pilhas e baterias. Além disso, ela pode utilizar a tecnologia a favor do ambiente por meio da busca de conhecimento sobre formas sustentáveis de consumo e geração de energia.

É preciso destacar que não se trata de desenhar uma nova Bia, esquecendo seu passado, ou ainda, colocá-la como vilã do planeta por causa dos seus erros. O que importa aqui é fazer com ela perceba o quanto tem agido errado e que ela pode corrigir esses erros a partir da adoção de novas posturas de sobrevivência com a premissa de buscar qualidade de vida associada a modo de vida sustentável.

Por isso, é importante que ela perceba que:

O que vale para o indivíduo vale também para a comunidade local. Ela deve fazer o mesmo percurso da inserção no ecossistema local e cuida do meio-ambiente; utilizar seus recursos de forma frugal, minimizar desgastes, reciclar materiais, conservar a biodiversidade. Deve conhecer a sua história, seus personagens principais, seu folclore. Deve cuidar da sua cidade, de suas praças e lugares públicos, de suas casas e escolas, de seus

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hospitais e igrejas, de seus teatros, cinemas e estádios de esporte, de seus monumentos e da memória coletiva do povo. Assim, como exemplo, escolher espécies vegetais do ecossistema local para plantar nos parques e vias públicas, e nos restaurantes valorizar a cozinha local e regional. (BOFF, 2004, p.136)

Mais uma vez, é preciso lembrar que Bia deve ter em mente que, para fazer sua parte e ser uma cidadã comprometida com o mundo, é necessário o exercício diário e a busca constante de novas informações sobre medidas mitigadoras.

Vale lembrar, ainda, que ela deve assumir o compromisso com a difusão e intercâmbio desses novos saberes, bem como incluí-los na sua vida pessoal e profissional. Isto significa dizer que, em termos ambientais, temos só uma vida e o compromisso de contribuir para a salvaguarda da qualidade de todos os seres vivos do planeta Terra, que, aliás, é apenas um.

1.1 Contextualizando

1.4 Para saber mais

BARBIERE, José Carlos. Desenvolvimento e Meio Ambiente. 11. ed. Petrópolis: Vozes, 2009.

O livro discute os seguintes questionamentos atuais: como crescer sem poluir tanto a água, o ar e o solo? Como conciliar crescimento econômico e melhoria do nível de vida? Como explorar os recursos naturais, sem esgotar o planeta?

CARVALHO, Isabel Cristina M. Educação Ambiental: a formação do sujeito ecológico. São Paulo: Cortez, 2004. 256 p.

O livro discute o conceito de sujeito ecológico, entendido como um conjunto de crenças e valores, que serve de

Page 22: CAPÍTULO 1 - A Questão Ambiental

orientação e modelo de identificação para a formação de identidades individuais e coletivas. A proposta educativa, que inspira este livro, é contribuir para a formação de sujeitos capazes de compreender o mundo e agir nele de forma crítica.

DIAS, Genebaldo Freire. Educação ambiental: princípios e práticas. 9. ed. São Paulo: Gaia, 2004.

Este livro, um clássico de referência na literatura ambientalista brasileira, reúne um conjunto de informações fundamentais para a promoção do processo de Educação Ambiental.

SENAC.DN. Se cada um fizer sua parte... ecologia e cidadania. Rio de Janeiro: Senac Nacional, 1998.

O livro traz um panorama de como a preocupação com o meio ambiente diz respeito ao cidadão, fazendo parte do seu cotidiano e de sua condição de agente transformador da realidade por meio de uma solidariedade planetária.

Filme: O DIA DEPOIS DE AMANHÃ. (EUA, 2004. Duração: 124 min.) Dirigido por Roland Emmerich.Roteiro de Roland Emmerich e Jeffrey Nachmanoff. Produção: Roland Emmerich, Ute Emmerich, Stephanie Germain, Mark Gordon, Thomas M. Hammel, Lawrence Inglee, Kelly Van Horn, Kim H. Winther. Distribuição: Fox Film do Brasil.

A Terra sofre alterações climáticas que modificam drasticamente a vida da humanidade. Com o norte se resfriando cada vez mais e passando por uma nova era glacial, milhões de sobreviventes rumam para o sul. Porém, o paleoclimatologista Jack Hall (Dennis Quaid) segue o caminho inverso e parte para Nova York, já que acredita que seu filho Sam (Jake Gyllenhaal) ainda está vivo.