capacitores e dielétricos um capacitor é um sistema elétrico

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IBM1018 – Física Básica II – FFCLRP – USP – Prof. Antônio Roque – Aula 9 1 Capacitores e Dielétricos Um capacitor é um sistema elétrico formado por dois condutores separados por um material isolante, ou pelo vácuo. Imaginemos uma configuração como a de um capacitor em que os dois condutores estejam inicialmente descarregados (com carga líquida nula). O processo chamado de carregamento de um capacitor consiste em transferir elétrons de um dos condutores para o outro de maneira que, no fim do processo, um dos condutores esteja com carga líquida positiva +Q e o outro condutor esteja com carga líquida negativa -Q. Note que a carga líquida total do sistema formado pelos dois condutores continua nula. Após o carregamento de um capacitor, dizemos que ele armazena ou possui carga Q. Note que entre os dois condutores de um capacitor carregado existe um campo elétrico que aponta do condutor com carga +Q para o condutor com carga -Q. Consequentemente, o condutor com carga +Q está a um potencial maior que o condutor com carga -Q.

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Capacitores e Dielétricos

Um capacitor é um sistema elétrico formado por dois condutores

separados por um material isolante, ou pelo vácuo.

Imaginemos uma configuração como a de um capacitor em que os

dois condutores estejam inicialmente descarregados (com carga

líquida nula). O processo chamado de carregamento de um capacitor

consiste em transferir elétrons de um dos condutores para o outro de

maneira que, no fim do processo, um dos condutores esteja com

carga líquida positiva +Q e o outro condutor esteja com carga

líquida negativa −Q. Note que a carga líquida total do sistema

formado pelos dois condutores continua nula.

Após o carregamento de um capacitor, dizemos que ele armazena ou

possui carga Q.

Note que entre os dois condutores de um capacitor carregado existe

um campo elétrico ��� que aponta do condutor com carga +Q para o

condutor com carga −Q. Consequentemente, o condutor com carga

+Q está a um potencial maior que o condutor com carga −Q.

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Nos diagramas de circuitos elétricos, representa-se um capacitor

pelo símbolo abaixo:

.

Uma maneira de carregar um capacitor é ligar fios metálicos aos

condutores e conectá-los aos terminais opostos de uma bateria.

Espera-se até que as cargas +Q e −Q se estabeleçam nos dois

condutores e depois desconectam-se os fios da bateria. Como as

cargas não podem passar de um condutor para outro, a carga

armazenada no capacitor permanece constante. A voltagem Vab entre

os condutores (Va − Vb) permanece constante e é igual à voltagem da

bateria.

Capacitor de placas planas e paralelas

Consideremos um capacitor cujos condutores sejam placas metálicas

planas e paralelas carregadas com cargas +Q e −Q. Vamos supor que

as placas têm área A e estejam separadas por uma distância d.

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Se a distância d for muito menor que a área das placas, podemos

tratá-las, aproximadamente e longe das bordas, como se fossem

planos infinitos. Neste caso, como visto em aulas anteriores, o

campo elétrico entre as placas é uniforme, aponta da placa carregada

positivamente para a carregada negativamente e seu módulo vale

� = ����� = ���

, (1)

onde σ é a densidade superficial de carga nas placas do capacitor,

� = �� . (2)

A diferença de potencial entre as duas placas é

� = �� − �� = � ��� ∙ �ℓ���

�= ��, (3)

o que implica que, substituindo (1) em (3):

� = ����

= �����. (4)

A diferença de potencial entre as placas é proporcional à carga Q

armazenada.

Este resultado vale para qualquer capacitor: a diferença de potencial

V entre dois condutores, de qualquer forma, carregados com carga Q

é proporcional a Q.

Invertendo a equação (4), podemos escrever Q em função de V:

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� = ���� �. (5)

Define-se

� ≡ ���� (6)

como a capacitância do capacitor (como vimos, esta relação vale

para qualquer capacitor). Portanto, a relação entre a carga

armazenada num capacitor e a diferença de potencial entre os

condutores é

� = ��. (7)

A unidade de capacitância é o farad (F), em homenagem a Michael

Faraday (veja a aula 3).

1 farad = 1 F = 1 !" = 1

#$%&$'()$&* .

Quanto maior for a capacitância de um capacitor, maior a carga Q

armazenada no capacitor para uma mesma diferença de potencial.

A equação (6) nos permite escrever as unidades da constante ε0 em

termos do farad:

+��, = +�, +�,+�, = F

m, ou

ε0 = 8,85 × 10−12 F/m.

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Capacitor esférico

Um capacitor esférico é formado por uma esfera condutora interna

de raio ra e uma casca esférica condutora concêntrica de raio rb. As

duas estão separadas pelo vácuo. A esfera interna tem carga +Q

distribuída por sua superfície externa e a casca esférica externa tem

carga −Q distribuída por sua superfície interna (figura abaixo).

Para calcular a capacitância desse capacitor, vamos usar a relação

(7), que é válida para qualquer capacitor:

� = �� . (8)

Para determinar V, precisamos determinar o campo elétrico ��� entre a

esfera e a casca esférica.

Tomemos uma superfície gaussiana de raio r entre a esfera e a casca

esférica. O fluxo elétrico por essa superfície vale Q/ε0:

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Φ1 = 2 ��� ∙ ��� = ���

. Por simetria, ��� é constante em módulo ao longo dessa superfície

gaussiana. Ele também aponta na direção radial, que coincide com a

direção de ���. Logo

Φ1 = �� = �4345 = ���

. Então,

� = 143��

�45.

O campo elétrico entre a esfera e a casca esférica é igual ao de uma

carga puntiforme +Q colocada no centro delas. Como o campo

elétrico é o mesmo de uma carga puntiforme no centro, o potencial

elétrico também o será:

� = 143��

�4 .

Portanto, a diferença de potencial entre a esfera de raio ra e a casca

esférica de raio rb é

�67 = �6 − �7 = �43��46

− �43��47

= �43��

8 146

− 147

9

= �43��

47 − 464647

. A capacitância do capacitor esférico é então

� = ��67

= 43��4647

47 − 46. (9)

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Um caso particular da equação (9) ocorre para o caso em que a casca

esférica de raio rb está muito longe da esfera de raio ra. Se a

distância entre elas for tão grande que se possa aproximar rb → ∞, a

capacitância do sistema torna-se

� = 43��464747

= 43��46, (10)

ou seja, a capacitância depende apenas do raio da esfera interna.

Podemos então definir a capacitância de uma esfera condutora de

raio R como:

� = 43��<. (11)

As linhas de força entre a esfera de raio R e a casca esférica de raio

“infinito” se estendem até o “infinito”.

Por exemplo, se pudermos tratar a Terra como uma esfera condutora

esférica, sua capacitância vale (o raio da Terra é R ≅ 6,37 × 103 km)

CTerra ≅ 7,1 × 10−4 F = 710 µF.

Este é um valor bastante grande. Tão grande que podemos supor, em

geral, que quando se escoa uma quantidade de carga ∆Q para a Terra

a alteração no seu potencial é desprezível (veja abaixo)

� = �� .

É por isso que a Terra é um bom “terra”.

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Capacitor cilíndrico

Um capacitor cilíndrico é formado por um cilindro condutor de raio

ra e densidade linear de carga λ1 circundado por uma casca cilíndrica

condutora coaxial de raio interno rb e densidade linear de carga −λ

(veja a figura abaixo).

Para calcular a diferença de potencial entre os cilindros, lembremos

que p potencial em um ponto externo a um cilindro carregado a uma

distância r do centro vale

� = >23��

ln 4�4 ,

onde r0 é uma distância arbitrária onde V = 0. Podemos usar esta

expressão aqui porque a carga elétrica sobre a casca cilíndrica

externa não contribui para o potencial no interior do cabo coaxial.

1 Para relacionar a densidade linear de carga λ com a densidade superficial de carga σ, mais usual quando se trata de superfícies, basta lembrar que a carga total em um comprimento L do cilindro é Q = λ L = σA = 2πraLσ. Isto nos dá: λ = 2πraσ.

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Vamos escolher r0 = rb, o raio da parte de dentro da casca cilíndrica

externa. Então, o potencial em ra será

�67 = �(A) − �(B) = >23��

ln 4746

− 0 = >23��

ln 4746

. (12)

Essa diferença é positiva, pois V(a) > V(b).

Para calcular a capacitância, vamos usar a fórmula C = Q/Vab. A

carga Q é dada por Q = λL, de maneira que

� = 23��Cln D4746E. (13)

A capacitância por unidade de comprimento é, então

�C = 23��

ln D4746E. (14)

Note que, assim como nos casos dos capacitores de placas planas

paralelas e esférico, a capacitância do capacitor cilíndrico depende

apenas das dimensões do capacitor.

Substituindo ε0 = 8,85 × 10−12 F/m = 8,85 pF/m em (14), obtemos

uma expressão útil para a capacitância por unidade de comprimento:

�C = 55,6 pF/m

ln D4746E . (15)

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Capacitores em série e em paralelo

A figura (a) abaixo mostra o diagrama de circuitos para um arranjo

de capacitores denominado de arranjo em série. Em um arranjo

desse tipo, dois ou mais capacitores são conectados um após o outro

(em série) por fios condutores. Os terminais do circuito estão ligados

aos polos de uma bateria, de maneira que a diferença de potencial

entre eles é V.

A placa superior do capacitor de capacitância C1 acumula carga +Q.

Portanto, a placa inferior desse capacitor possui carga −Q. Os

elétrons que se acumulam nessa placa vieram da placa superior do

segundo capacitor (com capacitância C2). Desta forma, a placa

superior desse segundo capacitor também tem carga +Q e a placa

inferior tem carga −Q.

Quando capacitores são conectados em série, cada um deles possui a

mesma carga.

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A partir deste resultado, podemos escrever que as diferenças de

potencial entre os pontos a e c e c e b na figura são:

�6H = �I = ��I

e �H7 = �5 = ��5

. Isto implica que

�67 = � = �I + �5 = � 8 1�I

+ 1�5

9. Isto sugere que podemos substituir os dois capacitores em série no

circuito acima por um único capacitor equivalente com capacitância

�LM = 1�I

+ 1�5

. A figura (b) acima mostra o capacitor equivalente.

Generalizando, se tivermos N capacitores em série em um circuito

eles podem ser substituídos por um capacitor equivalente com

capacitância

�LM = 1�I

+ 1�5

+ ⋯ + 1�O

. (16)

A figura abaixo mostra um arranjo de capacitores em um circuito

denominado de arranjo em paralelo.

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Note que os terminais dos capacitores estão ligados aos mesmos

polos da bateria, de maneira que as diferenças de potenciais entre

eles são todas iguais a V.

Vamos supor que a carga total presente no circuito vale Q e ela se

encontra distribuída pelos capacitores de maneira que o primeiro

possui carga Q1 e o segundo possui carga Q2:

Q = Q1 + Q2. (17)

Temos, então

� = �I� + �5� = (�I + �5)�. Isto sugere que podemos substituir os dois capacitores em paralelo

no circuito acima por um único capacitor equivalente com

capacitância

�LM = �I + �5. O capacitor equivalente está mostrado na figura (b) acima.

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Generalizando, se tivermos N capacitores em paralelo em um

circuito eles podem ser substituídos por um capacitor equivalente

com capacitância

�LM = �I + �5 ⋯ �O . (18)