campus impresso - ano 43 número 395

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Brasília, 21 a 27 de fevereiro de 2013 | Número 395 Ano 43 Um mercado que cai Pirataria, internet e TVs por assinatura são responsáveis por fechar 391 locadoras no DF nos últimos seis anos. Lojas se especializam para sobreviver O metal é nosso Ato extremo Com 98% das reservas de nióbio, Brasil vive conflito sobre exportação (pág. 3) Rogerio Verçoza Campus Cura pela fala No DF, mais de 130 grupos anônimos tratam neuroses e obsessões (pág. 7) Alto índice de suicídios na capital preocupa especialistas (pág. 6) Suor da noite Cronobiologia explica as consequências da malhação noturna (pág. 4)

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Jornal-laboratório da Faculdade de Comunicação (FAC) da Universidade de Brasília (UnB).

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Page 1: Campus impresso - ano 43 número 395

Brasília, 21 a 27 de fevereiro de 2013 | Número 395 Ano 43

Um mercado que caiPirataria, internet e TVs por assinatura são responsáveis por fechar 391 locadoras no DF nos últimos seis anos. Lojas se especializam para sobreviver

O metal é nosso Ato extremoCom 98% das reservas de nióbio, Brasil vive conflito sobre exportação (pág. 3)

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Campus

Cura pela falaNo DF, mais de 130 grupos anônimos tratam neurosese obsessões (pág. 7)

Alto índice de suicídios na capital preocupa especialistas (pág. 6)

Suor da noiteCronobiologia explica as consequências da malhação noturna (pág. 4)

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Marina Baldoni Amaral

Na última edição do semestre, o Campus traz um cardápio sortido de notícias, revelando a variedade de olhares na redação. A matéria de capa, Procura-se locadora, sobre fechamento das locadoras no DF, tem por trás a peregrinação da repórter Isabela Bon-fim pelos setores comerciais de Brasí-lia em busca de uma fonte, o sindicato das videolocadoras. A dificuldade em encontrá-lo tinha explicação: ele es-tava fechando as portas, assim como a maioria das lojas que representa. O faro da repórter encontrou no cenário dramático o gancho da matéria.

O Campus é um jornal-labo-ratório que, nesta edição, enfrentou uma situação comum no mercado: a publicação da mesma pauta por um outro veículo. O Correio Braziliense

Diagramação: Ananda Borges

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Carta da Editorade 17 de fevereiro trouxe, às vésperas de nosso fechamento, matéria sobre as dificuldades enfrentadas no ramo de aluguel de filmes. É direito do leitor saber que o texto do Campus não é uma reprise. Quem conhece a rotina de produção do jornal sabe que isso não seria possível.

Apesar de sair semanalmente, o processo de produção de cada edi-ção leva duas semanas. Isso porque o Campus é resultado do trabalho de duas turmas, que intercalam publi-cações. Procura-se locadora começou a ser apurada na primeira semana de janeiro e o texto foi escrito e editado há três semanas. Se fôssemos um jor-nal diário, a matéria estaria nas ruas há mais de um mês, mas, nessa situ-ação excepcional, ficou “na gaveta” (como os jornalistas chamam o ma-terial produzido muito tempo antes

de sua publicação) para garantir a participação da repórter na última edição da turma. Desde o início de fevereiro, Isabela Bonfim está na Ho-landa, onde participa do programa Ciência sem Fronteiras.

Talvez um jornal diário na mesma situação desistisse de publi-car a matéria para evitar uma sus-peita de cópia. Aqui no Campus, decidimos mantê-la na capa, como definido na reunião de pauta, por-que a reportagem é relevante, bem apurada e de interesse do leitor (que talvez nem tenha visto a publicação do Correio). Apesar de “furados”, te-mos convicção da qualidade do ma-terial e das circunstâncias em que foi escrito. O que vale no jornal-laboratório é o aprendizado. Apren-demos na prática o risco de segurar a publicação de uma matéria.

A pauta de Vanessa Arcoverde nos fez lidar com um grande tabu do jornalismo, o suicídio. Tema estuda-do por diversas áreas do saber, ainda é evitado pela imprensa. Já em 1897 o sociólogo Émile Durkheim desmis-tificou a ideia de que o suicídio seja apenas decisão do indivíduo e passou a tratá-lo como fenômeno coletivo, fato de causa social. A mudança no olhar é a chave para que o jornalismo também possa abordar o assunto.

Na matéria Duas tentativas por dia, a repórter consegue enfrentar o desafio e retrata a questão sem sen-sacionalismo. Com o cuidado de não mencionar métodos e não in-centivar a prática, faz um raio-X do suicídio no Distrito Federal.

Grupos anônimos de terapia são tema de Um passo de cada vez. Moni-que Rodrigues frequentou reuniões

e falou com neuróticos, comedores compulsivos e outros. Se viu revelan-do a própria intimidade para conquis-tar a confiança das fontes e conhecer o funcionamento dos grupos. Res-peitando o sigilo, a repórter transmite informação e mata a curiosidade de quem não conhece o tratamento.

João Bosco, em O dilema do ni-óbio, expõe as duas frentes de debate que permeiam o destino do uso e ex-portação do metal estratégico que tem quase todas suas reservas no Brasil. Em Hora de dormir, tempo de malhar, Talita Amorim busca explicações para um hábito comum nas metrópoles, a malhação noturna. Já no artigo O que restará da Copa no Brasil, Luana Luizy comenta a herança que o evento dei-xará para o país, as imposições da Fifa para realização do torneio e a forma como as obras têm sido tocadas.

Ombudskvinna*Ana Paula Lisboa

O Campus 394 cativa o lei-tor na capa e mostra merecer a atenção até a última página: é de uma categoria de jornalismo que se lê “devorando” com gana por mais informação. As repórteres se esforçaram nesta viagem e a equi-pe entregou uma edição especial impactante e com um propósito justíssimo: evitar que uma chaci-

na de 50 anos atrás caia no esque-cimento sem ser resolvida.

Ao escrever Ipatinga segue calada, a repórter foi transparen-te sobre o processo de apuração e consegue atiçar a curiosidade para dúvidas que só serão sanadas nas próximas matérias. A linha do tempo foi muito bem aplicada em Os mistérios por trás da fuma-ça da siderúrgica, deixando para o texto o papel de contextualizar a

época próxima ao Regime Mili-tar, além de penetrar nas contra-dições entre o registro oficial e a memória das testemunhas.

A entrevista a um policial que participou do conflito é um ponto alto do suplemento, mas as respos-tas “soam” artificiais. Entrevistas maiores exigem um cuidado a mais para não destoar do jeito de falar do entrevistado. Lembranças da beira da morte deixa o leitor cara a cara

com quem, por pouco, escapou da chacina. As fotos muito bem tiradas e o texto se harmonizam sem sensa-cionalismo, mas com muita sensibi-lidade, e tem-se a impressão de estar conversando com estes senhores.

A bela crônica In memoriam comove e remete às possibilidades tiradas das vítimas fatais – bem como de familiares, amigos e mo-radores – no massacre de Ipatinga, cidade que, na época, colocou uma

pedra no passado para poder se-guir em frente. Os oito – ou mais – chacinados são motivos de sobra para tirar esta pedra e fazer justiça. O Campus cumpriu uma grande função social ao investigar o caso e colaborar para que esta história seja desvendada. A diagramação elegan-te foi digna de uma edição tão ex-pressiva, mas faltaram fotografias de Ipatinga e da Usiminas para mos-trar o cenário (atual) da chacina.

MemóriaEnquanto alguns cinemas

fechavam as portas, o Campus edição 94, publicado em junho de 1986, retratava o sucesso do Cine Ritz. Inaugurado dois me-ses antes da publicação, o cine-ma que combinava sessões de filme com shows de strip-tease comemorava os bons resultados e faturamentos.

O repórter Fabio Guima-rães usa o fato de vários cinemas enfrentarem dificuldades como gancho para falar do entusias-

mo e dos planos de investimen-to que o proprietário tinha para o Ritz.

O local ficava aberto para apresentações semanalmente e nos fins de semana, após o meio-dia. Além disso, a matéria abor-da a movimentação que o Cine Ritz trouxe para os comércios próximos. Fabio também escre-ve sobre a beleza das artistas, que se apresentavam durante os intervalos dos filmes, e o perfil dos espectadores, entre eles sol-

Expediente: Campus Jornal-laboratório da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília Editora chefe: Marina Baldoni Amaral Secretária de redação: Rafaella Felix Editores: Gabriela Alcuri, Jorge Macedo e Pedro Menezes Repórteres: Isabela Bonfim, João Bosco Lacerda, Luana Luizy, Monique Rodrigues, Talita Amorim e Vanessa Arcoverde Diretora de arte e foto: Ananda Borges Pimentel Fotógrafos: Luana Luizy, Rafaela Lima e Rogerio Verçoza Diagramadores: Dayana Hashim, Guilherme Alves e Ramilla Rodrigues Projeto gráfico: Celina Guerra, Ivan Sasha Stemler, Lorena Soares, Rafaela Lima, Ramilla Rodrigues e Vanessa ArcoverdeProfessores: Sérgio de Sá e Solano Nascimento Jornalista: José Luiz Silva Monitores: Patrick Cassimiro e Paulo PimentaGráfica: Palavra Comunicação Tiragem: 4 mil exemplares

Campus Darcy Ribeiro, Faculdade de Comunicação, ICC Ala Norte. Contato: 61 3107-6498/6501 CEP: 70.910.900 E-mail: [email protected]

dados, estudantes e funcionários públicos, que trabalhavam perto do cinema, localizado no Setor de Diversão Sul, Conic.

Vinte e sete anos depois, o Campus fala novamente de ci-nema, mas dessa vez aborda os fechamentos das videolocadoras em Brasília. Em meio à crise, locadoras especializadas em “ci-nema e arte” ainda têm êxito e sobrevivem, sendo opção para quem ainda conserva o hábito de locar DVDs, e não apenas

*Feminino do termo sueco ombudsman, que significa “provedor de justiça”, discute a produção do jornal a partir da perspectiva do leitor.

assistir a filmes em telas de com-putadores ou TV por assinatura.

Ideias inovadoras e seg-mentação de público também foi o que motivou a boa fase do Cine Ritz, na década de 80, que faturava por dia entre 4 e 5 mil Cruzados. Infelizmente, criativi-dades nos negócios não foram o bastante para manter em funcio-namento o cinema pornô, fecha-do em julho de 2009. Resta saber se as videolocadoras terão um fi-nal diferente e mais otimista.

Campus | Brasília, 21 a 27 de fevereiro de 2013

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João Bosco Lacerda

Edição: Gabriela Alcuri Diagramação: Dayana Hashim

O dilema do nióbio Brasil tem as maiores reservas do metal estratégico, mas vende a maior partepara o exterior e não investe em desenvolvimento tecnológico nacional

Campus | Brasília, 21 a 27 de fevereiro de 2013

Exportação

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Nióbe é, na mitologia grega, uma rainha transformada em rocha por Zeus, destinada a chorar para sempre pela morte de seus catorze filhos. O mito da antiguidade serviu de ins-piração para batizar um miné-rio inicialmente chamado co-lúmbio, descoberto em 1801 pelo inglês Charles Hatchett, mas que teve o nome mudado para nióbio pelo químico ale-mão Heinrich Rose.

Apesar de ser desconhecido por grande parte dos brasileiros, o nióbio tem grande impor-tância para o país. De acordo com relatório do Departa-mento Nacional de Produção Mineral (DNPM) de 2011, 98% das reservas explo-ráveis de nióbio estão em território brasileiro. O Canadá, com 1,5% das reservas mundiais, tem um distante segundo lugar, segui-do de países com quantidades muito pequenas do mineral. O professor do Instituto de Geociências da Universida-de de Brasília (UnB) Farid Chemale explica a relevância do metal: “É estratégico por se localizar praticamente em apenas um lugar do mundo e por sua utilização em setores de alta tecnologia”.O professor Carlos Kleber

Zago, do Instituto de Química da UnB, aponta as principais ca-racterísticas do nióbio: “Tem alta resistência ao calor, à corrosão, é um bom condutor elétrico, é resis-tente ao impacto mecânico”. Além disso, o metal pode se tornar um supercondutor, material que ten-de a conduzir corrente elétrica em temperaturas extremamente bai-xas. Por conta desses atributos, o metal é utilizado nos mais variados produtos: de lâminas de barbear a turbinas de avião e foguetes (ver quadro). “A adição de apenas 400 gramas de nióbio por tonelada de aço são suficientes para que esses efeitos sejam conseguidos”, expli-ca o secretário de Geologia, Mi-neração e Transformação Mineral do Ministério de Minas e Energia (MME), Carlos Nogueira. Essas qualidades fazem do nióbio um metal ainda mais resistente que o titânio, por exemplo.

Todo esse potencial de mer-cado nem sempre se converte em riquezas ao país. A forma como o nióbio é comercializado gera con-trovérsias. No Brasil, há apenas duas empresas que extraem o mi-nério e elaboram produtos finais a partir dele: a Mineração Catalão de Goiás, controlada pelo grupo Anglo American do Brasil, de capital bri-tânico; e a Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM).

As empresas processam o ni-óbio majoritariamente em duas formas: as ligas de ferro-nióbio, destinadas à produção de aço com grande resistência, e as superligas de óxido de nióbio de alta pureza, uti-lizadas em capacitores, catalisadores e lentes óticas. A CBMM é a maior produtora mundial, responsável pela entrega de cerca de 90% da liga de ferro-nióbio e a totalidade das superligas de óxido de nióbio. O Estado fica com uma porcentagem dos lucros das empresas. No caso da CBMM, com 25% dos rendimen-tos líquidos da companhia, valor em torno de R$ 500 milhões em 2011.

Divergências

Apesar do retorno financeiro ao país, não são todos que concor-dam com esse modelo. “O Brasil está perdendo a chance de desenvol-ver tecnologia própria ao exportar

nióbio sem transformá-lo em pro-dutos de grande valor agregado”, argumenta Chemale. “Além disso, a forte presença de capital estran-geiro nas empresas produtoras pode ir de encontro aos interesses do país.” Os números reforçam seu ar-gumento: segundo o DNPM, das ligas produzidas no Brasil, me-nos de 10% do ferro-nióbio é consumido no mercado inter-no, enquanto todo o óxido de nióbio é exportado.

A CBMM, que até 2011 era dirigida somente pela família Mo-reira Salles, vendeu 30% de suas ações para companhias da China, Japão e Coreia do Sul. “Eu acre-dito que, na verdade, essa tenha sido uma manobra para integrar os grandes produtores de tecnologia à produção de nióbio para que novos usos sejam descobertos, sem matar a galinha dos ovos de ouro”, explica o secretário Carlos Nogueira.

Reverter a situação não é tare-fa fácil: “O decreto de lavra garante às empresas o direito de explorar o produto obtido da forma como desejarem, desde que cumpram os acordos. Além disso, caso diminu-íssemos a exportação, nada garante

que outras ligas e materiais não po-deriam substituir os usos do nióbio”, diz Nogueira. De acordo com o atual Código de Mineração, de 1967, desde que uma em-presa mantenha a exploração de suas minas em patamares estabelecidos por estudos pré-vios, tem o direito de explorar indefinidamente a lavra.

Com previsão de ser enviado em março ao Congresso Nacional, um novo decreto de lei estabelecerá critérios de produtividade e um teto

de 35 anos, posteriormente renová-veis, para que uma empresa explo-re a lavra. O marco regulatório da mineração permitirá ao Estado ter mais controle sobre as atividades das empresas produtoras.

Por ser a firma líder na produ-ção do nióbio mundial, a CBMM baliza o preço do produto no mer-cado internacional, hoje em torno de US$ 90 mil a tonelada. Esse valor equivale a 750 vezes o preço da tonelada de ferro. No entanto, o Ministério Público de Minas Ge-rais investiga a empresa por suposta fraude na precificação do minério.

O órgão desconfia que o nió-bio vendido para o exterior tenha o valor da tonelada subfaturado. O MP acredita que, depois do nióbio deixar o Brasil, as subsidiárias nos três continentes revendem o mi-neral para o resto do mundo com valor maior do que o estipulado no país, lesando o cofre do governo de Minas, que tem participação nos lu-cros da mineradora. De acordo com Nogueira, “o novo marco regulató-rio tornará mais fácil apurar esses valores na contabilidade das empre-sas, possibilitando a conta precisa do imposto devido”. A reportagem tentou contatar a CBMM, mas a empresa não quis se manifestar.

O nióbio é, assim como o pré-sal, uma oportunidadede desenvolver o país”

Farid Chemale, professor de Geociências da UnB

Amostra de nióbio do professor Carlos Zago, do Instituto de Química da UnB

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Construção civil – Diminui o peso e aumenta a resistência das obras, como na Ponte JK.

Indústria automobilística – A adição de cem gramas de nióbio em cada tonelada de aço reduz em 10% o peso do veículo.

Indústria aeroespacial e naval – Diminui o peso e aumenta a resistência das naves e embarcações, além de ser resistente a mu-danças extremas de temperatura.

Supercondutores – Foi utilizado, por exemplo, no Grande Colisor de Hádrons, o maior acelerador de partículas do mundo, responsá-vel por importantes descobertas na física, por sua alta condutivida-de e resistência ao frio.

!Para que serve?

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Talita Amorim

Edição: Gabriela Alcuri Diagramação: Dayana Hashim

Hora de dormir, tempo de malhar Mais da metade dos alunos de academias brasilienses praticam atividades físicas durante a noite. Além da falta de tempo, o fenômeno é explicado pela cronobiologia

Campus | Brasília, 21 a 27 de fevereiro de 2013

Vida noturna

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Jorge Valença, 23 anos, estudante de Engenharia da Universida-de de Brasília (UnB), malha à noite há um ano por conta da falta de disponibilidade de horários. “A UnB me conso-me até seis da tarde, e aí é só o tempo de descansar, estudar e vir pra cá. No início, eu ficava muito cansado e dormia logo depois. Mas depois de uns três, quatro meses, foi o efeito con-trário: eu vinha para a acade-mia e perdia o sono. Aí come-cei a dormir duas da manhã.” Desde que o homem inven-

tou a luz elétrica, o ritmo de vida não foi mais o mesmo. Pessoas como Jorge dormem cada vez mais tarde, trabalham mais e malham no período noturno. Segundo o Sindicato das Academias do Distrito

Federal, existem aproximadamente 700 estabelecimentos na cidade e todos funcionam à noite. “O maior movimento é no período noturno: 60% dos alunos malham no horário das 18h às 21h. Embo-ra poucas academias fiquem aber-tas até meia-noite, a maioria vai até 22h, 23h”, confirma Fábio Padi-lha, diretor do sindicato e sócio de uma academia.

Além da falta de tempo, ou-tro motivo para a malhação no-turna é o período no qual a pessoa sente disposição. “Eu poderia vir mais cedo, mas eu me sinto bacana à noite, não me atrapalha a dormir. E de manhã eu não funciono, se fechassem uma hora da madruga-da eu poderia chegar aqui às dez da noite”, conta Antenor Corrêa, 51 anos, engenheiro elétrico que ma-lha há cinco anos, sempre de noite. A explicação para pessoas como

Os cronotipos podem ser matutinos ou vespertinos. As pessoas matutinas são as que dormem e acordam cedo, tendo mais energia durante o dia. As vespertinas têm dificuldade para acordar cedo e sentem-se dispostas ao final da tarde e durante a noite. Isso não significa que os vespertinos tenham insônia, eles apenas têm o re-lógio biológico oposto aos matutinos.

O núcleo supraquiasmático, localiza-do no hipotálamo anterior, que marca todas as funções do organismo e dita os ritmos da duração do dia (níveis de luz) e da temperatura da pele.

Movimento nas academias é mais intenso durante a noite: cerca de 60% das pessoas malham entre 18h e 21h

Corrêa está nos cronotipos, ob-jeto de estudo da cronobiologia, ramo dedicado ao estudo dos rit-mos biológicos, podendo, ou não, ter relação com o tempo.

Outro elemento que de-sempenha papel importante na cronobiologia é a luz, por conta do ciclo claro/escuro. Esse processo, combinado a herança genética, é um dos principais fatores para que o corpo funcione num período de 24 horas e é o responsável na atuação em ciclos biológicos como o sono.

No caso de quem malha à noi-te, podem acontecer duas influências sobre o sono. Segundo Jomar Souza, médico especialista em Medicina do Esporte e presidente da Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e do Esporte, “cada tipo de pessoa funciona de um jeito. Para aquelas

que têm a sensação de relaxamento após o exercício, o mais comum é uma liberação de endorfinas, o que ajuda a ter um bom sono”.

Para outros, o exercício funcio-na como um carregador de baterias. “Nesses casos, as maiores liberações costumam ser de adrenalina, nora-drenalina e cortisol. Quando isso acontece, os atletas ficam muito ati-vos após o final dos exercícios e isso pode provocar insônia ou um sono apenas superficial, não reparador”, acrescenta Souza.

O relógio biológico é con-trolado por uma estrutura ner-vosa do cérebro que recebe as informações sobre níveis de luz do ambiente e sinaliza o que acontece fora do organismo, estabelecendo parâmetros determinantes para as reações internas.

Ao mesmo tempo, a glân-dula pineal, responsável pela produção da melatonina, au-menta ou diminui a fabrica-ção do hormônio de acordo com os dados de iluminação colhidos pela retina e envia-dos ao cérebro.

Não há contraindicação para malhar à noite, o melhor horário vai depender do cronotipo de cada pessoa. No entanto, o professor Fer-nando Louzada, do Laboratório de Cronobiologia Humana da Univer-sidade Federal do Paraná, explica que “a prática de atividade física deve ser feita pelo menos três horas antes do início do sono. Além disso, como em

geral a atividade é feita em ambientes com iluminação intensa, o estímulo luminoso inibe a secreção de melato-nina, que é o principal sinalizador da noite no organismo. Ou seja, nosso cérebro interpreta que ainda não es-cureceu e não desencadeia os proces-sos que promovem o sono”.

Nutrição adequada

A alimentação também não pode ser descuidada. Aline Santos da Silva, 27 anos, advogada, concor-da: “Se eu tiver me alimentado bem durante o dia, e feito menos esforço, à noite eu estou com toda energia. Se não, eu fico mais cansada para malhar”. Segundo a Associação Bra-sileira de Nutrição Esportiva, os nu-trientes são absorvidos durante o dia todo, sempre que houver ingestão

de alimentos. Após a mastigação, o processo de digestão é iniciado e não é interrompido durante o sono, ou seja, o alimento, depois de digerido e degradado em pequenas partículas, passa do intestino para o sangue.

O que difere a alimentação de quem malha no período noturno é a quantidade ingerida de alimentos. A quantidade de nutrientes deve ser a mesma. O que pode mudar é a pra-ticidade na escolha dos alimentos. Se o treino acontece de madrugada, o ideal é absorver, ao longo do dia, os nutrientes necessários à produção de energia até o momento do treino. Após os exercícios, deve-se comer somente a quantidade e o tipo de nutriente necessários para a recupe-ração muscular. Nada de fazer uma grande refeição.

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Isabela Bonfim

“O sindicato fechou. Ninguém mais quer abrir videolocadora”, diz o funcionário por entre a fres-ta da porta. Lá dentro, é pos-sível ver um pedaço de sala vazia, sem móveis, caixas en-costadas no canto da parede, um cenário de abandono. A si-tuação do Sindicato das Em-presas Videolocadoras do Dis-trito Federal (Sindevideo), no Setor Comercial Sul, reflete o mesmo contexto encontra-do em uma busca pela cida-de: portas fechadas. “Locado-ra? Isso ainda existe? Acho que tinha uma por aqui há muitos anos...”, tenta lembrar o cha-veiro da 405 Norte.Em 2007, 480 videolocadoras

funcionavam no Distrito Federal. Atualmente, apenas 89 se mantêm na ativa. Paolo Piacesi, presiden-te do Sindevideo, não recomenda a ninguém abrir uma. “É muito caro e não dá retorno”, explica, e estima em R$ 120 mil o custo inicial do negócio. O desafio do Sindevideo é o mesmo: menos de 20 lojas ainda contribuem financeiramente com

Edição: Pedro Menezes Diagramação: Ramilla Rodrigues

Procura-se locadoraDownloads, pay-per-view e on demand levam à anunciada morte das videolocadoras. No Distrito Federal, restam 89

Campus | Brasília, 21 a 27 de fevereiro de 2013

Drama

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o sindicato, apenas 17 empresários estão associados e quatro diretorias não têm dirigente responsável. Se-gundo Piacesi, o sindicato, mesmo com escritório fechado, continua-rá a representar os interesses de em-presas videolocadoras.

Pirataria (venda, compra ou distribuição sem licença) e down- loads na internet (piratas ou não) tendem a ser os principais acusa-dos pela ruína do mercado de vi-deolocadoras no Brasil. De acordo com relatório divulgado em 2012 pelo Instituto de Pesquisa Econô-mica Aplicada (Ipea), 34,7 millhões de internautas brasileiros (36,8% do total) baixam músicas e filmes na in-ternet. As porcentagens são altas in-dependentemente de faixa etária ou classe social (ver gráfico). Odair Correa, 27, só vê filmes no compu-tador: “Com a enorme facilidade de se encontrar qualquer filme na inter-net, o download se tornou uma fer-ramenta muito mais útil do que as locadoras. É uma tendência geral”.

Entretanto, as perspectivas mais atuais demonstram que a gran-de vilã na guerra contra as locadoras de vídeo são as TVs por assinatura. Levantamento da Agência Nacional

de Telecomunicações (Anatel) apon-ta que as assinaturas de TV cresce-ram de 3,2 para 14,5 milhões nos últimos dez anos. Além de trabalhar com o mesmo público, esse setor não apresenta as desvantagens dos downloads de internet, como a ne-cessidade de alta velocidade de co-nexão. Marcus Vinícios Oliveira, 21, tem TV por assinatura em casa há pelo menos oito anos e, desde então, deixou de visitar a locadora. Para ele, a TV já vale mais a pena que o cinema: “Acho bem mais prá-tico, os filmes chegam à TV a cabo cada vez mais rápido, evito filas e a muvuca”, explica.

Ameaça à vista

Novas tecnologias permitem a realização de outro sonho de consu-mo: a locadora virtual. Conhecido como video on demand (vídeo por demanda), o serviço é um catálo-go de filmes online. Diferentemente do pay-per-view , é possível esco-lher o filme e assistir quando dese-jar. Em aparelhos mais novos de TV e Blu-ray, com acesso à internet, é possível receber o filme diretamen-te na televisão. O serviço também

funciona por meio das principais plataformas de videogame.

Há um ano e meio chegou ao Brasil o Netflix, serviço on demand conhecido por ter le-vado a rede de locadoras Block-buster à falência. Atualmente a empresa oferece mais de 24 mil títulos no cardápio, entre fil-mes e seriados. Sem ter divulga-do ainda dados específicos sobre o Brasil, a empresa contabiliza aproxi-madamente um milhão de usuários em toda a América Latina. Uma as-sinatura mensal de R$ 15 dá acesso ao conteúdo completo do Netflix, o que equivale ao custo médio de loca-ção de dois filmes em Brasília.

Em tradução literal, “pagar por visualização” (PPV) é um serviço com custo extra para adquirir um programa específico, como luta, jogo ou filme. Diferentemente do on demand, o PPV não fica dispo-nível a qualquer momento, é exibido na mesma hora para todos que contratam o serviço ou por determinado período.

Vinicius Neuhauss, 23, é usu-ário do on demand e há pelo menos dois anos não aluga um vídeo. Para ele, o cinema e a locadora não são opção: “Há pouca variedade por-que esses segmentos costumam in-vestir em filmes mais comerciais”. Existem, no entanto, pontos nega-tivos. Usuários reclamam de só en-contrar filmes antigos no Netflix, além de haver dificuldades na exi-bição devido a problemas com a qualidade de sinal da internet.

Locadoras sobreviventes

Mas ainda há quem loque ví-deos. Edson Curto, 51, aluga pelo

menos dois filmes por mês. Para ele, a vantagem está na variedade e no atendimento: “Aqui posso es-colher, não é como na TV a cabo, e ainda tem a Neide que conhece tudo quanto é filme e sempre me recomenda”, conta. Rachel Rabe-lo, 32, é contra comprar ou bai-xar filmes piratas: “Não é do meu perfil”, comenta. “Na TV os filmes são mais comerciais, por isso tem coisas que você só encontra na lo-cadora”, diz ao devolver o francês As neves do Kilimanjaro.

Mesmo com a atmosfe-ra sombria que paira sobre as videolocadoras, existem lojas que se renovam e fide-lizam clientes em Brasília. Na Loc Vídeo, 104 Sul, são feitas entre 15 e 20 mil locações por mês, mais que o dobro do ne-cessário para uma loja conse-guir pagar as contas – 8 mil lo-cações, segundo o presidente do Sindevideo, Paolo Piacesi. A Oscarito, 407 Norte, funciona há 21 anos e tem como diferencial o enfoque no “cinema de arte”. Com perfil semelhante, a Cult Video está no mercado há 17 anos e hoje conta com três lojas. Das 20 prateleiras da loja da 215 Sul, oito são dedicadas a grandes diretores, assim o cliente pode buscar o filme não só pelo tí-tulo, mas também pelo sobrenome.

Para Alexandre Costa, dono da rede Cult Video, mais do que novas tecnologias ou pirataria, a maior ameaça às locadoras em Brasília é a especulação imobiliária. “No futu-ro, pequenos comerciantes de qual-quer segmento não vão conseguir se manter nas superquadras, porque o aluguel é muito caro”, diz Alexan-dre, que paga R$ 7,5 mil mensais por uma loja de 140 m² na 204 Sul. Quando perguntado se as locado-ras estão chegando ao fim, responde conformado: “A gente se preocupa, mas acho que ainda tenho alguns anos para queimar”.

Classe A

Classe B

Classe C

Classes D e E

Baixadores de �lmes e músicas

54%

47%43%

47%39%

10 a 15 anos

16 a 24 anos

25 a 34 anos

35 a 44 anos

47%29%

44 a 59 anos

60 anos ou mais42%

48%

58%

54%10 a 15 anos 47%

63%

Locadoras como esta da 216 Norte se tornaram lojas de conveniência para continuar no mercado

Luan

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Ramilla Rodrigues

Fonte: Ipea

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Vanessa Arcoverde

Edição: Jorge Macedo Diagramação: Guilherme Alves

Duas tentativas por diaSem atuação efetiva do poder público, Distrito Federal apresenta alto índice de suicídios. Trabalho do CVV se mantém como referência em prevenção

Campus | Brasília, 21 a 27 de fevereiro de 2013

Saúde

Ramilla Rodrigues

6

Stéphanie Sabarense,psicóloga especialista em suicídio

A pessoa que tenta suicídio está em um sofrimento psíquico grande. Em vez de julgar, o que deve ser feito é acolher”

Dados da Secretaria de Saúde do Distrito Federal referentes a 2012 mostram que pelo me-nos duas pessoas tentam se suicidar por dia no DF. O Ser-viço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) atende 69 chamadas mensais que re-sultam em uma média de sete suicídios consumados. O DF, com uma taxa de 5,3 suicídios por 100 mil habitantes, apro-xima-se da média nacional, que é de 5,7 mortes, segundo dados do Ministério da Saúde. A coordenadora de Prevenção

do Suicídio da Diretoria de Saúde Mental da Secretaria de Saúde do DF (Disam), Beatriz Montenegro, afirma que esse número, no entan-to, não reflete com precisão a rea-lidade. “Em Brasília temos vários exemplos de subnotificação de ten-tativas e também de suicídios con-sumados que, em função de precon-ceito, são computados como outro tipo de morte”, afirma.

A psicóloga especialista em suicídio Stéphanie Sabarense con-corda com Beatriz: “Não é possível ter certeza sobre as taxas de suicídio porque muitos profissionais não sa-bem identificar a causa da morte, fora as pessoas que negam quando há tentativa”. E acrescenta: “Além dos casos explícitos, é preciso tam-bém investigar acidentes suspeitos”. Causas

A presença de transtorno men-tal é um dos fatores de risco mais im-portantes para o suicídio (presente em 90% a 100% dos casos). Os quadros mais comuns são depressão, alcoolismo e esquizofrenia, sendo frequente a asso-ciação de mais de um deles.

Algumas características so-

ciodemográficas também identifi-cam os grupos de maior risco. Os homens morrem três vezes mais por essa causa, enquanto as mulhe-res tendem a fazer três vezes mais tentativas de suicídio. “As taxas pa-recem aumentar para os dois sexos, mas a proporção de três para um se mantém”, afirma Beatriz Mon-tenegro. Os homens se suicidam mais por conta do método utiliza-do por eles que é, em geral, mais letal que o das mulheres.

“O que mais eleva a taxa de suicídio é o índice de deses-perança, que é a percepção de que as coisas não vão melho-rar. Existem escalas de suicídio e estresse, que medem, dentre outros fatores, depressão e ansiedade. Se a pessoa tem um grande nível de de-sesperança, consideramos que o po-tencial suicida dela é alto”, explica a psicóloga Stéphanie Sabarense.

Apoio

Em setembro de 2011, o Go-verno do Distrito Federal (GDF) lançou a Política Distrital de Preven-ção ao Suicídio (PDPS), com o ob-jetivo de capacitar profissionais do Corpo de Bombeiros e psicólogos, além de campanhas de conscienti-zação. No entanto, o projeto ainda precisa sair do papel.

Criado há 50 anos, o Centro de Valorização da Vida (CVV) é referência no trabalho de preven-ção aos suicídios. Presente no DF há 33 anos, o CVV funciona em um pequeno escritório no Setor Comercial Sul. A voluntária Mazé pede para ser identificada pelo nome como é conhecida dentro da instituição. De acordo com ela, o posto de atendimento está com pouca gente. Há apenas 48 pesso-as que se revezam em plantões de quatro horas para atender quem

liga em busca de apoio.Em 2012 o Centro fez quase

A portaria nº 184, publicada em setembro de 2012 no Diário Oficial do Distrito Federal, instituiu a Política Distrital de Prevenção do Suicídio, primeira do tipo no Brasil, que tem como finalidade promover a preven-ção de tentativas e suicídios consumados, a realização de campanhas socioeducativas de conscientização da sociedade e a educação permanente dos profissionais de saúde das uni-dades de atenção básica.

8 mil atendimentos. Em 15 anos como voluntária, Mazé diz que ninguém nunca tirou a vida quan-do foi atendida por ela, algo raro entre os atendentes: “Já teve vo-luntário que chamou o Corpo de Bombeiros”, lamenta.

Relatório da OMS publi-cado no ano passado mostra que entre 30 e 40% das pessoas que

recorrem ao suicídio tentam uma segunda vez. Mazé afirma, porém, que não é função do voluntário do CVV encaminhar o paciente para terapia: “A gente não julga, só acolhe. O que fazemos é apenas uma escuta qualificada”. Diferen-temente do CVV, a abordagem psicoterapêutica visa o tratamento e, por vezes, a intervenção. “Caso a pessoa esteja em risco sério de cometer suicídio, ela será interna-da e a família avisada”, explica a psicóloga Stéphanie.

Para ela, o preparo de profis-sionais de saúde é vital para que haja diminuição no índice de sui-cídios na cidade. “É veiculado que a medida a ser tomada é chamar o Corpo de Bombeiros. No entanto, muitas vezes eles estão desprepara-dos psicologicamente para a tare-fa. Estão prontos para medicar e conter a vítima, mas nem sempre isso é o mais indicado.”

A coordenadora de Preven-ção do Suicídio da Disam, Beatriz Montenegro, explica que existem

diferentes tipos de medidas a serem tomadas de acordo com o grau de angústia psíquica da vítima. “Se a pessoa está em uma situação de ris-co iminente, com acesso aos meios que pretende usar para realizar uma tentativa de suicídio, os serviços de urgência devem ser acionados: Samu, Corpo de Bombeiros ou a própria polícia quando envolver arma de fogo. Se houver indício de sofrimento psíquico, deve-se procu-rar o Centro de Atenção Psicossocial (Caps) mais próximo de casa para ser acolhida e inserida no tratamen-to mais adequado.”

Serviço

CVV Brasília141 ou (61) 3326-4111

Centro de Atenção Psicossocial – Caps(61) 3381-6957(61) 3567-1967

Sinais de alerta

Não aguento m

ais”

Preferia estar morto”Sou um perdedorNão posso fazer nada

“As pessoas ficam melhor sem mim”

Atentar a mudanças no comportamento das pessoas próximas a você pode evitar que elas cometam suicídio. Frequentemente pessoas em situação de risco se sentem solitárias e sem ter com quem con-versar. Mostre-se receptivo e aberto ao diálogo: escute sem fazer juízo de valor. Permita que a pessoa expresse seus sentimentos e a encoraje a procurar ajuda pro�ssional.

j Instabilidade

emocional

Adotar comportamento

de risco

Não assumir responsabilidades

Abandonar atividades que traziam prazer

Ter um plano de suicídio estruturado

!

Page 7: Campus impresso - ano 43 número 395

Grupos Familiares Narcóticos Anônimos do Brasil (Nar-Anon)naranon.org.br

Narcóticos Anônimos (NA)(61) 9238-9606 | 8582-5282

Alcoólicos Anônimos (AA) alcoolicosanonimos.org.br

Dependentes de Amor e Sexo Anônimos (Dasa)slaa.org.br

Serviço !

Mulheres que Amam Demais Anônimas (Mada)grupomada.com.br

Neuróticos Anônimos (N/A)neuroticosanonimos.org.br

Alcoólicos Anônimos (AA) alcoolicosanonimos.org.br

Comedores Compulsivos Anônimos (CCA)comedorescompulsivos.org.br

Um passo de cada vezNeuróticos, mulheres que amam demais e comedores compulsivos: mais de 130grupos anônimos se encontram no DF para tratamento dessas e outras obsessões

Campus | Brasília, 21 a 27 de fevereiro de 2013

Terapia

7

Monique Rodrigues

São 19h30 de uma terça-feira, ho-rário e dia marcados para o encontro dos Dependentes de Amor e Sexo Anônimos (Dasa). Três pessoas estão na sala; elas conversam sobre o dia a dia enquanto esperam outros companheiros che-garem. Passam-se 15 minu-tos, começa a reunião. A co-ordenadora do encontro inicia a leitura do preâmbu-lo, com instruções e descrição do grupo, procedimento ne-cessário especialmente quan-do alguém está ali pela pri-meira vez. Logo, pede para que todos se levantem e se re-únam ao centro para fazer a oração da serenidade de mãos dadas. A frase “só por hoje”, dita

ao final da oração, marca o com-promisso diário dos dependentes que buscam recuperação. Cada um volta ao seu lugar para a lei-tura do passo do dia – um dentre os 12 inspirados no programa de recuperação dos Alcoólicos Anô-

nimos (AA). Ao término, a co-ordenadora indica que a palavra está aberta e aguarda um volun-tário iniciar seu depoimento.

O Dasa é um grupo anônimo que busca recuperar pessoas com comportamento obsessivo e com-pulsivo em relação a amor e sexo. Em 2013, completa 20 anos no Brasil, com cerca de 30 grupos es-palhados em 16 estados e no Dis-trito Federal. Define-se como uma irmandade e, apesar de não se-guir doutrina religiosa, tem forte cunho espiritual. Assim como ou-tros do mesmo tipo, usa as diretri-zes dos Alcoólicos Anônimos como fundamento. “Aqui encontrei um lugar de apoio, um refúgio, quan-do estava vivendo a situação difí-cil de um problema afetivo”, conta Ana*, 41 anos, coordenadora do

encontro que frequenta as reuniões há três anos.

Em Brasília, diversos grupos anônimos atuam na recuperação de indivíduos com doenças físicas, mentais e emocionais, como Nar-cóticos Anônimos, Comedores Compulsivos Anônimos, Neuró-ticos Anônimos, entre outros. O princípio desses programas é que apenas pessoas com tais problemas participem da reunião. Não há acompanha-mento de profissionais, não se pode interferir nos depoi-mentos nem dar conselhos. “A doença sai pela boca e a cura entra pelos ouvidos”, comen-ta Maria, 54 anos, participante das Mulheres que Amam Demais Anônimas (Mada).

Origem

A maioria desses grupos sur-giu a partir dos Alcoólicos Anô-nimos. O programa nasceu em 1935 em Ohio, nos Estados Uni-dos, com o encontro de dois al-coólicos que buscavam se recupe-rar. Eles viram nos problemas em comum uma chance de se ajudar mutuamente. Em 1939 foi lança-da a primeira edição do livro Al-coólicos Anônimos; na época, a irmandade contava com cerca de 100 adeptos. Com a publicação de artigos sobre o tema em peri-ódicos norte-americanos, o nú-

mero saltou para 8 mil pessoas ao final de 1941, e assim conti-nuou crescendo.

O AA está em cerca de 150 países, com mais de 100 mil grupos. Não é possível precisar

quantos participantes frequen-tam as reuniões, porque, em razão

do anonimato, não se fazem regis-tros. No Brasil, o primeiro encon-tro aconteceu em maio de 1969 no Rio de Janeiro. Hoje, existem cerca de 4,6 mil grupos divididos entre as 27 unidades federativas.

Os passos

O programa de recuperação baseia-se em 12 passos que orien-tam quem busca ajuda. Entre as di-retrizes estão, por exemplo, a ne-cessidade de admitir impotência perante o problema, fazer uma de-talhada análise sobre a própria vida, listar pessoas prejudicadas e reparar danos causados a elas, além de re-passar a mensagem a outros.

Há também 12 tradições – au-tonomia, anonimato, autossustenta-bilidade, entre outras –, que existem para assegurar o êxito e a continu-ação dos grupos. Uma delas, por exemplo, indica o requisito para participar das reuniões. “A única exigência é o desejo de mudar, só a pessoa pode sentir isso. No meu caso, foi importante reconhecer que sou impotente perante a comida, e isso ajuda a me dar sanidade”, expli-ca Juliana, 31 anos, frequentadora dos Comedores Compulsivos Anô-nimos (CCA) há um ano.

Juliana conta que conheceu o grupo pela internet, mas foi resis-tente no começo. “Nesse momento minha dependência já estava pre-judicando meu casamento. Procu-rei dietas, terapias, mas nada deu certo. Resolvi então participar das reuniões do CCA e a recuperação física veio rapidamente, mas a emo-cional e mental demorou mais.” Ela

Edição: Pedro Menezes Diagramação: Ramilla Rodrigues

explica que continua voltando nos encontros para garantir a recupera-ção e não voltar a cair nos proble-mas antigos. “Sinto que agora sou menos egoísta e mais serena, meu casamento melhorou e as relações ao meu redor também.”

Saúde

A professora Valeska Zanello, do Departamento de Psicologia Clí-nica da Universidade de Brasília, es-tuda os métodos terapêuticos dos grupos anônimos e explica que eles se baseiam na “técnica de espelhos”. “O participante dá seu depoi-mento, e isso cria a possibili-dade de narrar, nomear a pró-pria história. Assim, é possível ter uma clareza da questão, além de poder nomear a his-tória de outra pessoa, se iden-tificar com ela.”

Os participantes dos grupos anônimos consideram incuráveis as doenças que possuem. Portanto, estão sempre “em recuperação”, e as reuniões ajudam a manter o trata-mento. “Venho para as reuniões do CCA há 15 anos e aqui sei que vou ficar até morrer. Aprendi um novo modo de viver, um passo por dia”, conta Alice, 64 anos.

Concedei-nos, Senhor, a Serenidade necessária para aceitar as coisas que não podemos modificar, Coragem para modificar aquelas que podemos, e Sabedoria para distinguir umas das outras.

* Os nomes dos participantes de grupos são fictícios.

Lia

Mag

alhã

es

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O que restará da Copa no BrasilArtigoPágina 8

Enquanto a bola rola no gramado, direitos humanos são jogados para escanteio

Luana Luizy

Vai ser maravilhoso! Um espetácu-lo com direito a samba e belas mulatas. Soube que vão cha-mar até índio. O mundo todo olhará para nós, lá no estádio de Itaquera, em São Paulo, no dia 12 de junho de 2014. Como o Brasil é bonito, país de diversi-dades culturais e que respeita as diferenças. Só que não!A Copa no Brasil impulsiona

o aumento das desigualdades so-ciais. Segundo dados do Comi-tê Popular da Copa, entidade civil que fiscaliza a organiza-ção do evento, 170 mil pessoas foram retiradas de suas casas ou ameaçadas de remoção em função dos jogos. Isso significa que aproximadamente um em cada mil brasileiros perdeu sua moradia nas 12 cidades-sede. A maior par-te das remoções, segundo o próprio Comitê, é feita com direito a pouca ou nenhuma indenização.

Não bastassem as remoções, os organizadores da Copa tenta-ram derrubar o Museu do Índio, no Rio de Janeiro. O prédio, construí-do em 1862, pertenceu a princesa Leopoldina, filha do imperador D. Pedro II. No local estava prevista a construção de um estacionamen-to. Conhecido como Aldeia Mara-canã, o caso repercutiu em todo o país e graças à mobilização popular, a liminar judicial que determinava a derrubada do prédio foi anulada.

O museu foi fundado pelo Marechal Rondon em 1910 e foi es-colhido como primeira sede do Ser-viço de Proteção aos Índios (SPI), hoje Fundação Nacional do Índio (Funai). Em 1953, o antropólogo Darcy Ribeiro transformou o lugar em Museu do Índio, hoje tombado

Edição: Jorge Macedo Diagramação: Guilherme Alves

Campus | Brasília, 21 a 27 de fevereiro de 2013

pelo Instituto do Patrimônio His-tórico e Artístico Nacional (Iphan). Segundo o site da instituição o lo-cal é a única instituição oficial no país exclusivamente dedicada às culturas indígenas.

O governador do Rio de Ja-neiro, Sérgio Cabral (PMDB), com a política de privatização, utilizou todos os meios possíveis para derrubar o museu. O local, além de preservar valor cultural e histórico para os índios é tam-bém ponto de resgate e impor-tância central para o movimento indígena brasileiro.

Legalidade na ilegalidade

O custo para a organização da Copa de 2014 já atingiu R$ 26,5 bilhões. O valor é R$ 2,7 bilhões maior que o previsto no primeiro balanço orçamentário da União. O dinheiro vem dos governos federal, estaduais e municipais. De tudo o que foi desembolsado até agora para realizar a competição, ape-nas R$ 3,8 bilhões são oriun-dos da iniciativa privada. Ou-tros R$ 14,9 bilhões foram injetados pelo governo federal por meio de empréstimos ou investimento direto nas obras. Os R$ 7,7 bilhões restantes sa-íram dos estados e das respec-tivas cidades-sede.

Considerado o valor atual de R$ 26,5 bilhões, o país vai custear 85,5% das obras relacionadas ao even-to. Anunciada como a Copa da iniciativa privada, o que se vê é exatamente o oposto. Os investi-mentos nos estádios, por exemplo, chegam a 97% via dinheiro públi-co. O dinheiro de muitos benefi-ciará o lucro de poucos. A África

do Sul, sede da Copa de 2010, fi-cou com dívida de US$ 4 bilhões ao fim da competição, os mesmos US$ 4 bilhões que a Fifa anunciou como lucro.

Tão ou mais grave que a farra privada com os recursos públicos, é a instauração do estado de exceção. Decretos, leis, e medidas provisórias definem a constitucionalidade desse estado. Prova disso é a Lei Geral da

Copa – Lei 12.663, sancionada no dia 6 de junho de 2012.

A lei define as regras para a re-alização do Mundial e estipula que

Isabella Corrêaa União colaborará com os esta-

dos, o Distrito Federal e os mu-nicípios que sediarão os even-tos, a fim de assegurar à Fifa autorização para divulgar mar-cas e vender ou realizar propa-gandas de produtos e serviços

nas imediações das arenas que abrigarão os jogos, tudo isso com total exclusividade.

O monopólio de serviços concedido à Fifa restringe a gera-ção de emprego e renda no país. Camelôs, ambulantes, catadores e artesãos que estiverem nas proxi-midades do evento serão severa-mente penalizados, o que inclui até repressão policial. Em suma, a Fifa terá todas as condições de fazer o que quiser no Brasil, tudo com aval do Estado.

A legislação brasileira prevê a educação como di-reito de todos e como res-ponsabilidade do Estado,

no entanto, os parlamenta-res violaram tal direito com a

proibição de aulas na rede pú-blica e privada durante o Mun-dial. É preocupante ainda o au-mento de casos de prostituição infantil. Segundo dados da rede britânica de televisão BBC, na Copa do Mundo de 2010, realiza-da na África do Sul, o número de prostitutas na capital sul-africana era de aproximadamente 100 mil pessoas. Durante os jogos este nú-mero cresceu em 40%.

Está claro que a Copa não bene-ficiará nossos bolsos, está óbvio que a Copa não favorecerá os anseios da po-pulação. Não é para o Brasil, não é para as pessoas que amam futebol. Como dizia o escritor português José Sarama-go: “Penso que não cegamos, penso que estamos cegos. Cegos que veem. Cegos que, vendo, não veem”.