braillepad: o desenvolvimento de um produto de...

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BRAILLEPAD: O DESENVOLVIMENTO DE UM PRODUTO DE TECNOLOGIA ASSISTIVA PARA USO DO COMPUTADOR POR DEFICIENTES VISUAIS Arthur Harry F. R. Kramer (UFPB) [email protected] Marcel de Gois Pinto (UFPB) [email protected] Danilo Felipe Silva de Lima (UFPB) [email protected] Widelene Menezes Tavares Santos (UFPB) [email protected] O presente artigo visa apresentar o resultado da aplicação de um modelo de Processo de Desenvolvimento de um Produto (PDP), Rozenfeld et al. (2006), adaptado ao projeto de produtos de Tecnologia Assistiva (TA) - produtos e serviços destinaddos a facilitar a vida de portadores de deficiência psicomotoras (BERSCH, 2008). O produto em questão, denominado BraillePad é destinado aos deficientes visuais, e tem como objetivo promover maior acessibilidade no uso do computador. Tomadas essas características do trabalho, pode-se afirmar que este trabalho é aplicado, metodológico e intervencionista, relativamente aos seus fins. Por sua vez, para atingir os resultados esperados, fez-se uso da metodologia bibliográfica, estudo de caso e pesquisa-ação. Através de informações de mercado, coletas por entrevistas com deficientes e pedagogos, foi possível a identificação de necessidades específicas dos deficientes visuais. Uma pesquisa tecnológica foi realizada, visando descobrir melhores formas de atuar na solução de tais necessidades. Diante disso, foram desenvolvidas diversas atividades de adaptação e aplicação de um modelo de PDP, com aplicação de algumas ferramentas (QFD, modelo baseado em nota e CAD - Desenho Assistido por Computador). O resultado do trabalho é um produto simples e de baixo custo: o BraillePad. Esse produto é utilizado para facilitar a digitação de textos, consistindo em uma película de silicone sobreposta ao teclado que traduz as letras em alfabeto latino em Braille. Tais atributos conferem ao produto um bom atrativo mercadológico em relação a outros produtos já disponíveis aos portadores de necessidades especiais da visão. Palavras-chaves: Desenvolvimento de Produtos; Tecnologia Assistiva; Acessibilidade; Baixo Custo; Braille; Deficiência Visual XXX ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO Maturidade e desafios da Engenharia de Produção: competitividade das empresas, condições de trabalho, meio ambiente. São Carlos, SP, Brasil, 12 a15 de outubro de 2010.

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BRAILLEPAD: O DESENVOLVIMENTO

DE UM PRODUTO DE TECNOLOGIA

ASSISTIVA PARA USO DO

COMPUTADOR POR DEFICIENTES

VISUAIS

Arthur Harry F. R. Kramer (UFPB)

[email protected]

Marcel de Gois Pinto (UFPB)

[email protected]

Danilo Felipe Silva de Lima (UFPB)

[email protected]

Widelene Menezes Tavares Santos (UFPB)

[email protected]

O presente artigo visa apresentar o resultado da aplicação de um

modelo de Processo de Desenvolvimento de um Produto (PDP),

Rozenfeld et al. (2006), adaptado ao projeto de produtos de Tecnologia

Assistiva (TA) - produtos e serviços destinaddos a facilitar a vida de

portadores de deficiência psicomotoras (BERSCH, 2008). O produto

em questão, denominado BraillePad é destinado aos deficientes

visuais, e tem como objetivo promover maior acessibilidade no uso do

computador. Tomadas essas características do trabalho, pode-se

afirmar que este trabalho é aplicado, metodológico e intervencionista,

relativamente aos seus fins. Por sua vez, para atingir os resultados

esperados, fez-se uso da metodologia bibliográfica, estudo de caso e

pesquisa-ação. Através de informações de mercado, coletas por

entrevistas com deficientes e pedagogos, foi possível a identificação de

necessidades específicas dos deficientes visuais. Uma pesquisa

tecnológica foi realizada, visando descobrir melhores formas de atuar

na solução de tais necessidades. Diante disso, foram desenvolvidas

diversas atividades de adaptação e aplicação de um modelo de PDP,

com aplicação de algumas ferramentas (QFD, modelo baseado em

nota e CAD - Desenho Assistido por Computador). O resultado do

trabalho é um produto simples e de baixo custo: o BraillePad. Esse

produto é utilizado para facilitar a digitação de textos, consistindo em

uma película de silicone sobreposta ao teclado que traduz as letras em

alfabeto latino em Braille. Tais atributos conferem ao produto um bom

atrativo mercadológico em relação a outros produtos já disponíveis

aos portadores de necessidades especiais da visão.

Palavras-chaves: Desenvolvimento de Produtos; Tecnologia Assistiva;

Acessibilidade; Baixo Custo; Braille; Deficiência Visual

XXX ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO Maturidade e desafios da Engenharia de Produção: competitividade das empresas, condições de trabalho, meio ambiente.

São Carlos, SP, Brasil, 12 a15 de outubro de 2010.

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1. Introdução

O cotidiano das pessoas que têm alguma limitação, seja ela física ou mental, é dificultado,

pois dos diversos produtos e serviços que são utilizados no dia-a-dia, poucos são projetados

tendo em vista a possibilidade de utilização por um portador de deficiências. Uma das razões

para tal abordagem de projeto pode estar ligada a noção de que este grupo de pessoas, que

caracterizam um mercado, não é grande o suficiente para justificar projetos adaptados.

Entretanto, os dados mostram o contrário. O Censo Demográfico do Brasil realizado em 2000

mostra que 14,4% da população brasileira apresenta, ao menos, um tipo de deficiência. Deste

percentual, 16,8% encontra-se no Nordeste, região onde foi realizado este trabalho. Isso

equivale a 2,4% da população brasileira. (IBGE, 2000).

Considerando o público-alvo deste trabalho, a referida pesquisa mostrou que no país há 148

mil pessoas cegas e 2,4 milhões com grande dificuldade de enxergar. Do total de cegos,

77.900 eram mulheres e 70.100, homens. A região Nordeste, por sua vez, concentrava o maior

número de pessoas cegas: 57.400 (IBGE, 2000).

Assim sendo, parece ser justificável economicamente a oferta de bens e serviços de caráter

adaptado, visando incluir no mercado de consumo as pessoas deficientes. Nesse bojo, surge o

desenvolvimento de tecnologias específicas que auxiliam tais pessoas no seu dia-a-dia,

denominadas por alguns autores de Tecnologias Assistivas (TA).

O campo de TA cresce de tal maneira que é possível encontrar produtos que atendem diversas

necessidades. Dentre elas, ganha especial destaque as que visam tornar o computador

acessível a pessoas com privações sensoriais e motoras. A razão disto é por que na atual

conjuntura, garantir que um deficiente, em especial o visual, utilize o computador é garantir

que ele seja inserido no mercado de trabalho e na sociedade como um todo.

Assim sendo, esse artigo visa apresentar o desenvolvimento de um produto de baixo custo

voltado ao público deficiente visual que proporcione maior independência, qualidade de vida

e inclusão social, através da ampliação de sua comunicação, facilitando seu acesso ao

computador.

2. Processo de desenvolvimento de produtos (PDP)

Os profissionais e pesquisadores que atuam no campo da engenharia do produto têm

desenvolvido, no passar dos anos, várias metodologias e ferramentas para dar suporte ao

processo de desenvolvimento de produto. Atualmente é possível sintetizar o conhecimento

desenvolvido na área e agrupá-lo, por exemplo, em correntes de pensamento ou abordagens.

Tais correntes vêm evoluindo desde o princípio da administração científica, onde o

desenvolvimento dos produtos era realizado de maneira sequencial. O princípio aqui é utilizar

uma ordem lógica para o desenvolvimento dos produtos, onde determinada área funcional

deveria entregar resultados para o próximo setor iniciar suas atividades, havendo pouca

interação entre elas.

Posteriormente surgiram estudos que visavam determinar a melhor metodologia de projeto. A

proposta era encontrar a sequência de etapas e atividades considerada mais racional para se

desenvolver um produto (ROZENFELD et al., 2006). Nessa abordagem cada setor da

empresa realiza apenas as atividades que são relacionadas com sua especialidade.

A partir da evolução das metodologias de projetos surgiu, entre outras, a engenharia

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simultânea, que visava ampliar a integração entre as diferentes áreas funcionais, enfatizando a

importância da realização de atividades simultaneamente. Além disso, nesse viés verificou-se

a importância de introduzir os fornecedores e os clientes no processo de desenvolvimento.

Seguindo a cronologia constante na literatura, a próxima abordagem de desenvolvimento de

produtos é a do funil de desenvolvimentos. Para autores como Wheelwright e Clark apud

Klement e Morales (2009) desenvolver produtos consiste em levar uma ideia do conceito à

realidade, começando com um leque de idéias e gradualmente refinando e selecionando-as.

Assim, apenas uma fração das ideias iniciais é totalmente desenvolvida em produtos.

Para Cooper (1990) o PDP, como qualquer outro processo, precisa ser gerenciado; e é esta

ideia que origina a abordagem do stage-gate. A intenção é obter uma maior qualidade no

produto final a partir de uma análise formal que compara resultados esperados e atingidos em

cada mudança de estágio no PDP. A passagem para uma nova fase só é feita após a validação

dos resultados da fase anterior de modo a garantir a qualidade do processo.

Rozenfeld et al. (2006) desenvolveu um modelo unificado de desenvolvimento de produtos

que se originou da união de metodologias, estudos de casos, modelos e experiência em

desenvolvimento de produtos adquiridas por equipes de pesquisadores. Este modelo promove

uma integração entre as diversas abordagens para a gestão do PDP, sendo assim um modelo

bastante genérico, podendo ser adaptado e aplicado ao desenvolvimento de diversos tipos de

produtos. O modelo proposto por Rozenfeld et al. (2006) está representado na figura 1.

Figura 1 – Modelo de PDP proposto por Rozenfeld et al. (2006)

O modelo divide o PDP em três macrofases, pré-desenvolvimento, desenvolvimento e pós-

desenvolvimento, que são subdivididas em fases. Na macrofase de pré-desenvolvimento

encontram-se as fases de planejamento estratégico dos produtos e planejamento do projeto.

Na primeira fase é realizado o alinhamento estratégico dos produtos com a estratégia da

unidade de negócios e é decidido o portfólio de produtos. Na última fase, cada ideia é

avaliada individualmente como um novo projeto, requerendo uma equipe, plano e recursos.

Na macrofase de desenvolvimento as necessidades de mercado identificadas são atendidas por

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novos bens desenvolvidos e implantados na produção. Aqui são realizadas as fases de projetos

informacional, conceitual e detalhado, além da preparação do produto para a produção e seu

lançamento no mercado.

No pós-desenvolvimento é dada ênfase, primeiramente, ao acompanhamento do produto no

mercado e no processo de produção. Posteriormente, é estudado como será descontinuada a

produção do produto, bem como sua retirada do mercado, seu destino após a utilização e a

finalização de todo tipo de assistência técnica prestada pela empresa.

Em cada fase do PDP Rozenfeld et al. (2006) sugere uma porção de atividades que devem ser

realizadas para finalizar a fase com sucesso. O autor utiliza-se ainda de diversas ferramentas

como a análise do ciclo de vida e matriz QFD – Quality Function Deployment, no projeto

informacional, análise da viabilidade econômica, no projeto conceitual, sistemas CAD/CAE,

FMEA – Failure Mode and Effect Analysis, no projeto detalhado entre outras.

Por fim, deve-se destacar que o modelo de PDP apresentado por Rozenfeld et al. (2006) é

uma referência genérica e flexível. Assim, cabe ao gestor adaptá-lo às suas necessidades de

projeto, tendo para isso em mente os graus de inovação e complexidade do produto. Por outro

lado, tais características do PDP se relacionam com sua aplicabilidade em produtos de

diversas indústrias e tecnologias, sendo assim, aplicável ao desenvolvimento de produtos de

tecnologia assistiva (TA).

3. Tecnologia Assistiva

É difícil determinar quando surgiram os primeiros dispositivos de auxílio às limitações

psicomotoras das pessoas, entre outras necessidades. Desde tempos distantes o homem busca

utilizar lentes para ampliar a capacidade de visão ou conchas nos ouvidos para superar uma

dificuldade de audição. Dispositivos como estes podem ser considerados o embrião daquilo

que veio a ser chamado atualmente de Tecnologia Assistiva (TA).

Na literatura existem diversas definições sobre o que é TA. Dentre elas, destaca-se a

conceituação de Cook e Hussey apud Bersch (2008), segunda a qual TA representa uma

ampla gama de equipamentos, serviços, estratégias e práticas concebidas e aplicadas para

minorar os problemas funcionais encontrados pelos indivíduos com deficiências.

Atualmente é possível encontrar tantos produtos (bens ou serviços) cuja função é prestar

assistência ao deficiente que já é possível vislumbrar algumas categorizações. Nesse sentido,

várias organizações criaram classificações de TAs, tais como: ADA – American With

Disabilities Act, EUSTAT – Empowering Users Through Assistive Technology, IPAT - Iowa

Program for Assistive Technology e ISO. (BERSCH, 2008).

Na literatura ganha especial atenção a ISO 9999:2002 - Technical aids for persons with

disabilities - Classification and terminology, pelo fato desta classificação ser desenvolvida

por uma organização internacional que busca o desenvolvimento de padrões que são usados

em todo o mundo. A ISO 9999:2002 classifica as ajudas técnicas em onze níveis diferentes

subdivididos em classes e subclasses de acordo com suas funções.

Outra classificação que merece destaque é a de Bersch (2008), pois é uma classificação

ampla, detalhada e que é aplicável e adequada ao problema abordado. A autora divide as TAs,

também, em onze categorias, quais sejam: (1) auxílio para a vida diária e vida prática, (2)

comunicação aumentativa e alternativa, (3) recursos de acessibilidade ao computador, (4)

sistemas de controle de ambiente, (5) projetos arquitetônicos para acessibilidade, (6) órteses e

próteses, (7) adequação postural, (8) auxílios de mobilidade, (9) auxílios para cegos ou para

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pessoas com visão subnormal, (10) auxílios para pessoas com surdez ou com déficit auditivo e

(11) adaptações em veículos. No Quadro 1 podem ser visualizadas as categorias de TA

propostas pela autora, cada definição e exemplos de produtos em cada categoria.

Neste trabalho foi desenvolvido um produto alinhado ao terceiro tipo de TA apontado por

Berch (2008): recursos de acessibilidade ao computador. Tal produto consiste em um

hardware para adaptação de um dispositivo de entrada de dados para deficientes visuais.

TA Definição Exemplos

Auxílio para a vida diária e

vida prática

Produtos que auxiliam em tarefas rotineiras como

se alimentar e vestir-se

Talheres

modificados

Comunicação aumentativa e

alternativa

Destinada a pessoas com defasagem entre sua

necessidade comunicativa e sua habilidade de falar

e/ou escrever

Pranchas de

comunicação

Recursos de acessibilidade ao

computador

Hardwares e Softwares desenvolvidos para tornar

o computador acessível para pessoas com

deficiências

Impressoras Braille

Sistemas de controle de

ambiente

Dispositivos que permitem às pessoas com

limitações motoras controlar aparelhos eletro-

eletrônicos

Controles remotos

Projetos arquitetônicos para

acessibilidade

Projetos de edificações e urbanismo que garantem

acesso, funcionalidade e mobilidade a todos Rampas de acesso

Órteses e próteses Peças artificiais que substituem partes ausentes do

corpo ou que garantam uma maior estabilidade Pernas mecânicas

Adequação postural Produtos que proporcionem uma postura estável e

confortável Poltronas posturais

Auxílios de mobilidade Produtos que possibilitem a melhoria na

locomoção dos usuários Cadeiras de rodas

Auxílios para cegos ou para

pessoas com visão subnormal

Equipamentos que visam à independência dos

deficientes visuais Relógios falados

Auxílios para pessoas com

surdez ou com déficit auditivo

Acessórios que tornem os deficientes auditivos

mais independentes

Aparelhos para

surdez

Adaptações em veículos

Adaptações que permitem que pessoas com

deficiência física dirijam e que facilitem o

embarque e desembarque

Elevadores para

cadeira de rodas

Quadro 1 – Categorias das TAs (Fonte: adaptado de Bersch, 2008)

4. Metodologia

Um trabalho científico pode ser classificado segundo diversos critérios de acordo com o autor

utilizado como referência. Vergara (1997) põe dois critérios básicos para a classificação das

pesquisas: quanto aos fins e quanto aos meios.

Quanto aos fins, o trabalho realizado e aqui apresentado pode ser classificado em aplicado,

metodológico e intervencionista. A primeira categorização justifica-se pelo fato do trabalho se

relacionar com o seu valor prático, visando à solução de problemas dos deficientes visuais. A

segunda categoria refere-se ao uso de métodos e procedimentos aplicados ao desenvolvimento

de produtos. A última, por sua vez, está ligada ao caráter de mudança da realidade a partir da

aplicação do produto pelos deficientes visuais no uso do computador. (FERRARI apud

ZANELLA, 2006; ZANELLA, 2006; VERGARA, 1997).

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No que tange aos meios empregados, este trabalho classifica-se em: bibliográfico, utilizando a

literatura relativa a desenvolvimento de produtos e TA; estudo de caso, pois procura conhecer

a realidade de um grupo de pessoas; e pesquisa-ação, que procura resolver problemas

específicos deste grupo trabalhado, notadamente, os deficientes visuais. (VERGARA, 1997).

O referido grupo engloba mais de 20 milhões de pessoas no país, entre cegos e pessoas com

visão subnormal (IBGE, 2000). Porém, devido à necessidade de profundidade no

levantamento de dados, a estratégia do estudo de caso foi a adotada.

Para o levantamento de dados primários foram realizadas entrevistas não-estruturadas com

pessoas que se enquadram nesse grupo, bem como com educadores a eles ligados. Tais

levantamentos foram realizados na FUNAD (Fundação Centro Integrado de Apoio ao

Portador de Deficiência, situada em João Pessoa-PB).

Por sua vez, o levantamento de dados secundários foi realizado a partir de buscas em sítios na

internet especializados em TA e bases de dados de publicações científicas relacionadas aos

temas abordados nesse trabalho.

As informações coletadas permitiram a identificação de oportunidades de desenvolvimento de

produtos para atender necessidades específicas dos deficientes visuais. O método utilizado

para preencher esta lacuna foi a metodologia do PDP desenvolvido por Rozenfeld et al.

(2006). Entretanto, a proposta dos autores é de um modelo genérico que deve ser adaptado

para a realidade em que se deseja projetar um novo produto.

Destarte, a atividade de projeto foi precedida desta adaptação, sendo realizada mediante

reuniões de projeto, sessões de braintorming, uso de softwares CAD, chegando à elaboração

de um mock-up (protótipo não funcional do produto) e a previsão de como serão as atividades

de pós-desenvolvimento. Tais atividades são apresentadas na próxima sessão deste trabalho.

5. Aplicação do PDP adaptado para desenvolvimento de um produto de TA

O processo de desenvolvimento de produtos proposto por Rozenfeld et al. (2006) foi

elaborado para a aplicação empresarial, correspondendo a uma referência flexível e adaptável

a diversas situações, seja relativa ao tipo de projeto ou sua complexidade.

Assim sendo, procedeu-se a uma adaptação do modelo de referência de modo que houvesse

uma maior aplicabilidade. O principal critério utilizado para tal empreendimento foi a

tradução da linguagem empresarial para a de pesquisa acadêmica, sem deixar de considerar a

questão da inovação e da complexidade do produto. O resultado é apresentado no Quadro 2.

A partir do modelo do PDP adaptado (Quadro 2), foram realizadas as atividades de pré-

desenvolvimento, desenvolvimento e pós-desenvolvimento. Entretanto, é importante ressaltar

que algumas atividades de desenvolvimento e, principalmente, do pós-desenvolvimento ainda

encontram-se em fase de planejamento.

5.1 Pré-desenvolvimento

A macrofase de pré-desenvolvimento de produtos, como pode ser visualizada na Figura 1, é

composta das atividades de Planejamento Estratégico de Produtos (PEP) e Planejamento do

Projeto (PP). Relativamente ao PEP, foram realizadas as atividades de (1) decidir sobre a área

de atuação no que tange ao produto a ser desenvolvido, (2) a coletar informações sobre

tecnologia e mercado, (3) a geração de um portfólio de idéias e (4) a seleção da ideia a ser

desenvolvida.

As primeiras atividades, (1) e (2) respectivamente, foram realizadas de maneira iterativa e

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tiveram a intenção de verificar a existência de necessidades não atendidas, ou parcialmente

atendidas, dos portadores de deficiências. Adicionalmente, tais etapas visavam dar suporte à

decisão de se trabalhar com TA e para qual deficiência especificamente.

As informações do mercado consumidor potencial foram obtidas através de uma pesquisa em

uma instituição especializada no auxílio aos deficientes (FUNAD). Foram constatadas

diversas oportunidades de melhoria na qualidade de vida das pessoas com necessidades

especiais que poderiam ser atendidas por dispositivos de baixo conteúdo tecnológico.

Dentre as necessidades identificadas, a que mais chamou atenção foi o acesso ao computador

por pessoas com deficiência visual. No mercado já existem produtos para o auxílio ao uso do

computador, como linhas Braille, softwares de leitura de tela, teclados especiais, impressoras

Braille, entre outros (Figura 2). Porém, estes dispositivos possuem um razoável conteúdo

tecnológico embutido, acarretando num elevado preço de aquisição.

Macrofase Fase Atividades

Pré

-

des

env

olv

imen

to

Planejamento

estratégico de

produtos

1. Decidir estratégias sobre a área de atuação;

2. Coletar informações sobre tecnologia e mercado;

3. Gerar o portfólio de ideias;

4. Selecionar a ideia a ser desenvolvida;

Planejamento do

projeto

5. Definir escopo do produto;

6. Definir escopo do projeto;

7. Adaptar o modelo de referência;

Des

env

olv

imen

to

Projeto Informacional

8. Identificar necessidades dos clientes;

9. Definir os requisitos dos clientes;

10. Definir os requisitos técnicos do produto;

Projeto Conceitual

11. Analisar funcionalmente o produto;

12. Definir arquitetura do produto;

13. Definir ergonomia e estética do produto;

Projeto Detalhado

14. Definir tecnologia de processo;

15. Criar material de suporte do produto;

16. Projetar embalagem;

Divulgar e Produzir

17. Divulgar o produto em meios acadêmicos;

18. Decidir sobre a conveniência de patentear o produto;

19. Divulgar o produto em instituições de apoio ao deficiente

(governamentais ou não);

20. Identificar organizações interessadas em produzir o produto;

s-

des

envolv

imen

to

Acompanhar produto 21. Identificar resultados da aplicação do produto;

22. Registrar lições aprendidas;

Retirada do produto 23. Identificar impactos ambientais;

24. Planejar o descarte.

Quadro 2 – Adaptação do PDP (Fonte: elaborado pelos autores)

Por outro lado, quando os deficientes visuais precisam digitar em teclados comuns, encontram

apenas indicações de poucos pontos de referência em algumas teclas, obrigando-os a

memorizar as posições das demais.

Com essa perspectiva sobre mercado e tecnologia, foram concebidas algumas ideias de

produtos que proporcione às pessoas com deficiência visual maior independência, qualidade

de vida e inclusão social, através da ampliação de sua comunicação.

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(a) Teclado Braille (b) Linha Braille (c) Computador Braille

Figura 2 – Produtos existentes. Fontes: (a) configurarequipos.com (b) laratec.org.br (c) tecnologia-assistiva.org

Com o alvo bem definido no PEP foi gerado um portfólio de ideias (3) com três alternativas:

(i) uma película que encaixe no teclado contendo o alfabeto latino ampliado e o alfabeto

Braille, facilitando a digitação; (ii) um conjunto de adesivos com os caracteres em Braille que

seriam fixados diretamente nas teclas e (iii) um teclado adaptado na linguagem Braille.

Realizou-se a análise e seleção da idéia a ser desenvolvida através de um modelo baseado em

notas. Em tal sistemática é analisado o desempenho de cada ideia em diversos critérios

considerados importantes. A esses parâmetros são atribuídos pesos (valores numéricos)

relativos à sua importância.

O resultado de tal análise, e consequente seleção da ideia a ser desenvolvida (4), pode ser

visualizado no Quadro 3, o qual mostra a seleção da ideia da Película Braille para teclados

segundo os critérios escolhidos, destacando-se no desempenho em Inovação e Praticidade.

Relativamente à fase de Planejamento do Projeto (PP), foram realizadas as atividades de (5)

definição do escopo do produto, (6) definição do escopo do projeto e a (7) adaptação o

modelo de referência.

O produto deverá ser bastante prático, fácil de fabricar e possuir um preço acessível. Ele

desempenhará as funções de facilitar a digitação dos deficientes visuais e auxiliar no seu

aprendizado. O utensílio consiste em uma película com os caracteres em Braille

correspondentes às teclas do teclado comum, sendo utilizado como uma espécie de capa. Isto

consiste no escopo do produto (5).

PORTFÓLIO DE

IDEIAS

CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO

Inovação (2) Praticidade (4) Custo (5) Viabilidade

técnica (5)

Flexibilidade de

Produção (1) Resultado

Película Braille

para teclados 4 4 3 3 3 57

Adesivo Braille

para teclados 3 3 3 3 4 52

Teclado Braille 1 2 2 5 5 50

Quadro 3 – Modelo baseado em notas (Fonte: elaborado pelos autores)

A partir disso, foi concebido o nome para esse produto utilizando sessões de Brainstorming.

A ideia do nome foi determinada pela justaposição do nome Braille com a palavra inglesa

Pad, que pode ser associada com Mouse Pad – produto utilizado para dar suporte ao mouse.

Sendo assim, tem-se o nome BraillePad, que se julgou facilmente associável ao público-alvo e

ao objetivo do produto.

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O escopo do projeto aqui apresentado, atividade (6), insere-se em um escopo maior

relacionado a um projeto embrionário de desenvolvimento de TAs em uma Instituição de

Ensino Superior (IES), como grupo de pesquisa. Classificável como uma ação de pesquisa e

extensão, a idéia escolhida atenderá a uma população que necessita de uma maior inclusão

social por meio da inclusão digital.

Este benefício aos usuários – maior facilidade no aprendizado e participação na sociedade –

consiste na justificativa para prosseguir com o desenvolvimento do produto.

Consequentemente, custos, cronogramas e resultados foram avaliados segundo critérios

relacionáveis com a pesquisa acadêmica.

A adaptação do modelo de referência, atividade (7), visa à eliminação de atividades

desnecessárias, seja por não agregar valor ao produto, ou por não se aplicarem ao tipo de

projeto em questão. Nesse momento do pré-desenvolvimento voltou-se a esta etapa para

proceder a ajustes na adaptação inicial, sendo considerados os mesmos critérios supracitados.

Identificou-se que o projeto é do tipo derivativo, ou seja, baseado em uma plataforma ou

produto previamente desenvolvido e em produção. A ideia foi derivada de dois produtos de

TA existentes, quais sejam: uma peça em acrílico com orifícios a ser colocada sobre o teclado

para garantir digitação de uma tecla por vez e do conjunto de adesivos Braille para teclados

(Figura 3). O primeiro produto é dirigido a pessoas com deficiência motora, enquanto o

segundo é destinado aos deficientes visuais. A junção destas duas ideias gerou a ideia da capa

em Braille para teclados (BraillePad).

(a) Adesivos Braille (b) Máscara de acrílico para teclados

Figura 3 – Produtos que inspiraram o BraillePad. Fontes: (a) adapt-it.org.uk; (b) assistiva.org.br.

Assim sendo, a atenção a essas diretrizes resultou na adaptação do modelo constante no

Quadro 2. A realização das atividades de (1) a (7), tornou possível iniciar a macrofase de

desenvolvimento do produto em questão: o BraillePad.

5.2 Desenvolvimento

A partir do que está expresso na Quadro 2, tem-se que a macrofase de desenvolvimento é

composta das fases de Projeto Informacional (PI), Projeto Conceitual (PC) e Projeto

Detalhado (PD), além da Divulgação e Produção (DP).

O PI caracteriza-se como o momento de coletar e analisar um conjunto de informações que

especifiquem o produto com a maior clareza a fim de orientar a geração de futuras soluções

de projeto, convergindo para identificar das necessidades dos clientes (8), definir os requisitos

dos clientes (9) e definir os requisitos técnicos do produto (10).

Nesta fase se destaca a ferramenta Quality function deployment (QFD), que “consiste em um

processo sistemático para traduzir os requisitos dos clientes em características da qualidade

dos produtos, possibilitando documentar as informações necessárias para o processo de

desenvolvimento”. (MIGUEL et al., 2003).

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10

De acordo com a pesquisa de mercado realizada, foram identificados necessidades dos

deficientes visuais (8) que foram traduzidos nos seguintes (9) requisitos dos clientes (RCs):

flexibilidade, preço, portabilidade, praticidade e acessibilidade. A partir daí, tais requisitos

foram inseridos em uma matriz QFD para a determinação dos (10) Requisitos Técnicos dos

Produtos (RTPs). O resultado da aplicação do QFD pode ser visualizado no Quadro 4.

Utilizando uma nova sessão de braintorming foram selecionados cinco RTPs, quais sejam:

embalagem em Braille, venda conjunta, compatibilidade com o teclado, profundidade das

teclas e material. Posteriormente, foi verificada a correlação entre RCs e RTPs, sendo

atribuídas notas negativas (-9 e -3) e positivas (3 e 9). As primeiras indicavam prejuízo no

atendimento do RC por parte do componente técnico e as últimas representavam o inverso.

À direita da matriz foi realizado, primeiramente, um benchmarking da ideia em

desenvolvimento relativamente a dois produtos concorrentes existentes no mercado: o teclado

Braille e o Braille Keyboard Stickers. Nesta atividade foram atribuídas notas de 1 a 5 aos

produtos em análise que quantificam o grau de atendimento de cada do requisito do cliente

(RC). (MIGUEL et al., 2003).

Para cada RC, a nota obtida pelo produto em projeto foi dividida pela maior obtida entre os

dois produtos concorrentes. Deste modo obteve-se Índice de Melhoria a ser obtido nas

atividades seguintes de projeto. (MIGUEL et al., 2003).

Em

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Bra

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C

Flexibilidade de

uso do produto9 9 1 1 3 4 3,0 1 12

Preço -3 -3 3 1 5 4 3 0,8 1,5 3,6

Portabilidade 9 3 2 1 4 5 2,0 1 10

Praticidade 3 3 9 3 3 4 5 4 1,3 1,2 6

Acessibilidade 9 3 4 4 4 4 1,0 1,5 6

Peso Absoluto do

RTP61,2 25,2 10,8 252 156

Peso Relativo do

RTP12,1% 5,0% 2,1% 49,9% 30,9%

Requisitos técnicos do produto (RTP)

Req

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RC

)

Quadro 4 – Matriz QFD (Fonte: elaborado pelos autores)

Finalizando o exame dos aspectos valorizados pelos clientes, foi calculado o Peso Absoluto

de cada um dos RCs. Este cálculo envolve a multiplicação do Índice de Melhoria, do Grau de

Importância (GI) de Cada RC e do Argumento de vendas (AV). O GI indica o quando cada

requisito é valorizado pelo cliente, enquanto o AV consiste na força que o RC tem na decisão

de compra do produto, assumindo os valores 1; 1,2 e 1,5. (MIGUEL et al., 2003).

Concluindo o Projeto Informacional, os Pesos Absolutos de cada RC foram multiplicados

pelos valores de correlação entre RCs e RTPs, gerando um somatório da importância de cada

RTP para o desenvolvimento projeto. Como resultado, tem-se que os RTPs “Compatibilidade

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11

com o teclado” (49,9%) e “Profundidade das teclas” (30,9%) foram os norteadores principais

das fases subsequentes.

O Projeto Conceitual relaciona-se com a busca, criação, representação e seleção de soluções

para o problema do projeto (Rozenfeld et al., 2006). Diante disso, nesta fase foi realizada a

análise funcional do produto (11); a definição da arquitetura do produto (12) e a definição da

ergonomia e a estética do produto (13), com intuito de definir as fronteiras e espaço do

problema. (BAXTER, 1998).

A análise funcional (11) utilizou a tipologia de Warell apud Rozenfeld et al. (2006), que

divide as funções em técnicas e interativas, sendo as primeiras divididas em estruturais e

operativas e as últimas em ergonômicas e comunicativas. O resultado da atividade pode ser

visto no Quadro 5.

As atividades (12) e (13) foram realizadas de maneira iterativa e buscaram atender os RTPs

destacados no Quadro 4 e as funções explicitadas no Quadro 5. O produto foi idealizado de tal

forma, que fosse o mais simples possível. Contendo apenas um componente, a arquitetura

desse produto é de fácil compreensão para facilitar tanto a fabricação quanto a utilização dos

usuários no seu dia-a-dia. O resultado da atividade pode ser visualizado na Figura 3.

Com relação à ergonomia e estética (13), o BraillePad, foi projetado de modo que um mínimo

esforço seja necessário para a sua utilização. Isto é obtido devido ao material utilizado

(silicone), proporcionando conforto aos usuários. Ainda relativamente a esse aspecto, pensou-

se em colocar o alfabeto latino aumentado nas teclas para pessoas que têm visão subnormal.

FUNÇÕES TÉCNICAS FUNÇÕES INTERATIVAS

Funções Estruturais

Adaptar-se ao teclado

Funções Operativas

Auxiliar na digitação e

no aprendizado

Possibilitar a

identificação das teclas

através do tato

Funções Ergonômicas

Facilitar a digitação

Funções Comunicativas

Transmitir informações

sobre as teclas do

teclado ao operador

Quadro 5 – Funções do produto (Fonte: Warell apud Rozenfeld et al., 2006)

Após a definição do conceito, partiu-se para a fase de Projeto Detalhado (PD). Aqui são

finalizadas todas as especificações do produto, para então serem encaminhadas à manufatura e

as outras fases do desenvolvimento. Relativamente ao processo produtivo, através de pesquisa

sobre tecnologia de processos de fabricação (14), definiu-se que a injeção seria a melhor

forma de produzir. Na injeção a matéria-prima aquecida e derretida é adicionada a um molde,

sob alta pressão e temperatura. Posteriormente, o molde é prensado e resfriado, sendo então

aberto e retirado o produto final.

Figura 3 – Arquitetura do Produto (Fonte: elaborado pelos autores)

(a) Frente (b) Verso

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12

Atividades 15 e 16 foram executadas em conjunto, pois se definiu que o suporte do produto

(15) ficaria na embalagem (16). A embalagem consiste basicamente em uma caixa de papelão,

que pode ser reciclado, contendo o nome do produto, suas especificações e instruções de

escritas em português e em Braille. A embalagem pode ser visualizada na Figura 4.

Figura 4 – Embalagem do Produto (Fonte: elaborado pelos autores)

Finalizando a macrofase de desenvolvimento, na fase de Divulgar e Produzir este produto

foram planejadas algumas atividades de modo que o produto pudesse concretamente chegar

aos maiores interessados, os deficientes visuais. Assim, foram decididas às seguintes

atividades: (17) divulgar o produto em meios acadêmicos, (18) decidir sobre a conveniência

de patentear produto, (19) divulgar o produto em instituições de apoio aos deficientes

(governamentais ou não) e (20) identificar organizações interessadas em realizar a produção.

A elaboração desse artigo foi uma forma de divulgar o produto no meio acadêmico (17), bem

como, gerar maior visibilidade a questão da acessibilidade e colher contribuições para a

continuidade do projeto. As demais atividades, por sua vez, ainda não foram realizadas,

constando apenas como planejamento.

5.3 Pós-desenvolvimento

O pós-desenvolvimento é uma macrofase que para muitos autores e empresas é visto como

uma atividade não relacionada com a engenharia do produto. Entretanto, esta não é a

abordagem escolhida para este trabalho.

Sendo assim, foram previstas algumas atividades relacionadas com o final do ciclo de vida do

produto, bem como com sua aceitação no mercado. Deste modo, essa macrofase foi dividida

em Acompanhar o Produto e Retirada do Produto, como pode ser visualizado no Quadro 2.

Na fase de Acompanhar o Produto estão previstas as atividades de identificar resultados da

aplicação do produto (21), onde serão pesquisados os benefícios e os pontos a melhorar no

produto sob o ponto de vista dos usuários, e registrar lições aprendidas (22), onde a equipe de

projeto identificará os pontos de melhoria a ser realizado no PDP e em projetos que visem ser

uma evolução do BraillePad ou seu substituto.

A retirada do produto engloba Identificar os impactos ambientais (23) e o planejamento do

descarte (24) após o uso. Tais atividades tem estreita ligação com o(s) material (is) utilizados

como matéria-prima.

O silicone, definido como matéria-prima (23), tem como características sua longevidade e

compatibilidade com os meios de aplicação. Por ser inerte, não traz malefícios para o meio

ambiente, não contamina o solo, a água e o ar ou desenvolve reações alérgicas no ser humano.

Umas das consequências disso, é a possibilidade do descarte do produto (24) se realizar pelas

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vias comuns da coleta pública de resíduos.

O Braillepad, por ser feito de silicone, não tem um limite de vida útil conhecido, sendo assim,

a forma como o usuário manuseia o produto será o fator determinante do seu tempo médio de

vida.

6. Considerações finais

A inclusão da pessoa com deficiência nos diversos aspectos da sociedade é um aspecto

relacionado com dignidade humana e justiça social. Tal processo de inserção ocorre por meio

de produtos e/ou serviços, aqui denominados de tecnologia assistiva (TA).

No que se refere aos deficientes visuais, este atendimento remota a casos oriundos tanto da

evolução de dispositivos funcionais de operacionalização, quanto da crescente introdução de

novas escolas e instituições como fonte de integração, aprendizado, inclusão e respeito ao

indivíduo.

O produto apresentado, por suas características, envolve esses dois aspectos. Neste contexto,

o educador terá uma maior facilidade no processo sócio-educativo e o deficiente visual terá

uma maior probabilidade de sucesso na aprendizagem, tanto do recurso de informática quanto

da aplicação deste recurso em outras matérias ou realidades da sua vida.

Apesar disso, o BraillePad encontra-se ainda em fase de desenvolvimento, pois questões

como o melhor acoplamento com o teclado, a melhor combinação de cores ou como

comunicar acentuação ainda precisam ser melhoradas. Deste modo, ainda é necessário

aguardar algumas definições para o lançamento no mercado.

Do ponto de vista da engenharia do produto, pode-se dizer que o modelo adaptado do PDP se

mostrou adequado para o desenvolvimento do BraillePad. Isso permite afirmar que é possível

utilizar o modelo para o desenvolvimento de TA e que para produtos baixa complexidade se

faz necessário a realização de uma pequena porção das atividades propostas por Rozenfeld et

al. (2006).

Finalmente, não obstante as melhorias a serem identificadas e realizadas no BraillePad, o

projeto permitiu o surgimento de ideias de futuros produtos que atuem em conjunto com este

produto, tais como softwares para a conversão do alfabeto latino em Braille. Somado a isso, o

projeto fez a equipe perceber a realidade da pessoa com deficiência, transformando

paradigmas pessoais: partindo da ignorância da realidade do deficiente para o respeito e a

busca da inclusão, ou seja, uma ação de inclusão social por meio de um projeto de engenharia.

Referências

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Paulo/SP, 1998.

BERSCH, R. Introdução à Tecnologia Assistiva. Centro Especializado em Desenvolvimento Infantil Porto

Alegre/RS, 2008.

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<http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/27062003censo.shtm> Acesso em: 17.03.2010.

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persons with disabilities - Classification and terminology. 2002.

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ROZENFELD, H. FORCELLINI, F.A.; AMARAL, D.C.; TOLEDO, J.C.; SILVA, S.L.; ALLIPRANDINI,

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