boletim bibliográfico: mia couto

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 - Boletim Bibliográ fico 9 - O Escritor do mês - outubro de 2015 - Mia Couto -  Mia Couto é a renomeação de um nome, António Emílio Leite Couto, que se tornaria uma dimensão humana e literária de um criador de atmosferas emocionais . Nascido em Sofala, na Beira, a cinco de julho de 1955, fez a sua formação na área da Biologia e cedo se dedi- cou ao jornalismo. Dirigiu, após a independência de Moçambique, três  órgãos de comuni- cação: a Agência de Informação de Moçambique (1976 a 1979),  a Revista Tempo (1979 a 1981) e o Jornal Notícias (1981 a 1985). A partir do fm dos anos oitenta, regressou à Biolo- gia e desenvolveu a sua formação na área da Ecologia. No início dos anos noventa, reinici - ou uma colaboração estreita com diferentes jornais, cadeias de rádio e televisão de diver- sos países. Mia Couto é o mais importante escritor moçambicano e um dos mais relevan- tes e originais da língua portuguesa. Os seus principais títulos variam entre o conto, o ro- mance, a crónica e a poesia, dos quais destacamos:  Raiz de Orvalho (1983); Vozes Anoitecidas (1986); Cronicando (1986); Terra Sonâmbula (1992); Cada homem é uma raça (1990);  A Varanda do Frangipani  (1996); Mar me quer (1998); Vinte e Zinco (1999); O Último Voo do Flamingo (2000); Um Rio Chamado Tempo, Uma Casa Chamada Terra (2002);  A Chuva Pasmada (2004); O Outro Pé da Sereia (2006);  Venenos de Deus, Remédios do Diabo (2008);  Jesusalém (2009); Tradutor de Chuvas (2011);  A Conssão da Leoa (2012); Vagas e Lumes (2014). Mia Couto tem uma obra de grande relevância, traduzida em diversas línguas. A sua cria- ção literária tem sido premiada em diferentes continentes. Foi Prémio Camões em 2013.  Mia Couto construiu um universo, uma geograa de afetos, onde as palavras se inventam para dar corpo a uma memória, a um território, a uma poética, como forma deslumbrada de ver o que podem ser os dias. Mia Couto construiu com palavras “abensonhadas” ima- gens, faces, olhares que se albergam nos sentimentos, como formas emotivas de viver o quotidiano. Em Mia Couto, vemos descrita a solidão, as possibilidades menos altivas que as mazelas de alma colocam; vemos surgir esses olhos da alma para reinventar o corpo, os sonhos. Mia Couto é na sua essência um poeta, constrói as múltiplas dimensões do ser humano com as suas palavras, para o encantamento, para o confronto com a pequena formalidade do medo. Com Mia Couto as palavras são instrumentos e formas de abrir o rosto ao que nos é dado, construído como elevado ou dolorido, expresso em lágrimas e intenso como as cores da terra ou a água que se formaliza em rios contínuos de tempo e saudade, vida. As palavras são inventadas em Mia Couto para a r itualização das nossas for- mas de vida, o mais profundo amor de estar com os outros, a poesia dos momentos que inventamos para nos sabermos vivos. E a força moral da consciência que se alberga em cada respiração como uma força de vida. Os nomes e as histórias conduzem narrativas que descobrem formas de ser, as divergentes essências de cada um, nos diferentes t empos em que cada vida se compõe. Nas histórias que nos identicam e constroem, os lugares tecem connosco formas de memória, traços que revelam a casa que em nós mora, a ideia da nos- sa cumplicidade com a intimidade. Nesta cam espaços e objetos que alimentam um cami- nho de ideias e sonhos, esperanças e assombro. Dessas paredes de tempo, ca um pouco da história de cada um, um pouco da nossa eternidade, ainda que lapidada do que já não se vê, mas viva de t udo o que não zemos, das sobras de sonhos imaginados. A memória e as palavras dão-nos esse corpo balançado entre as nossas pequenas grandezas e as nossas mais imperfeitas contradições. Em Mia Couto, a literatura tenta encontrar a palavra capaz de absorver o mundo e, mesmo sabendo dessa impossibilidade, ela traduz as formas para um assombro contínuo que o real pode oferecer. As palavras de Mia Couto vivem de uma procura generosa do outro, dos rostos esquecidos da sua ignorância, onde se alberga uma miséria maior, aquela onde o sonho se perdeu. E é desse nada, feito entidade plena, que muitos esqueceram os universos possíveis, desenhados nas suas mãos e em todas as vo- zes que poderiam encantar mundos próximos. Todos aqueles em que vivemos, em que tentamos traduzir em palavras gestos maiores. A interminável forma das aves que se dese- nha sobre a terra, asas eternas de tudo o que cada ser vivo vive e dessa companhia entre nós e as palavras.  Eu sou o viajante do deserto que, no regresso, diz: viajei apenas para procurar as minhas próprias pegadas. Sim, sou aquele que viaja apenas para se cobrir de saudades. Eis o deserto, e nele me sonho; eis o oásis, e nele não sei vi- ver. " Mia Couto - Entrevista. Rio de Janeiro. 02.2013. Cada palavra inventada como que adivinha a secreta natureza daquilo a que se refere, e entendemo -la co- mo se nenhuma outra pudesse ter sido utilizada em seu lugar. As imagens de Mia Couto evocam necessari- amente em nós a intuição de mundo fantásticos e em certa medida um pouco surrealistas, subjacentes ao mundo em que vivemos, que nos envolvem de uma ambiência terna e pacíca de sonhos – o mundo vivo das histórias. Através delas, consegue manter -nos em contacto com um pulsar in- terno que coincide com a própria respiração da terra." Mia Couto - Entrevista. Rio de Janeiro. 02.2013. 

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