um olhar sobre os neologismos na obra de mia couto

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Web-Revista SOCIODIALETO www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras UEMS/Campo Grande Mestrado em Letras UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 Volume 4 Número 11 Novembro 2013 323 O PORTUGUÊS MOÇAMBICANO: UM OLHAR SOBRE OS NEOLOGISMOS NA OBRA DE MIA COUTO “TERRA SONÂMBULA” Alexandre António Timbane (UNESP) 1 [email protected] RESUMO: A presente pesquisa é uma reflexão sobre neologismos, empréstimos e estrangeirismos no português escrito em Moçambique, país este que tem características sociolinguísticas bem complexas, devido a diversidade linguística. A pesquisa tem por objetivo identificar e explicar os neologismos em texto literário por forma a sugerir um bom tratamento deste aspecto em sala de aula. O corpus da pesquisa é a obra Terra sonâmbula de Mia Couto. Com o Programa “Léxico-3” identificamos e estudamos a frequência do léxico e concluiu-se que a maioria de estrangeirismos provêm do inglês e das LB. Assinalamos que a criatividade lexical se manifesta por meio de neologismos e empréstimos. Há neologismos que se formaram por justaposição, por aglutinação, por meio de afixos (prefixos e sufixos), por transformação de nomes em verbos, por meio de diminutivos, por reduplicação entre outras formas. Em textos literários, a liberdade pareceu-nos mais ampla chegando a identificar formações inesperadas do tipo “maistravés” e “ninguéns”. Em contato com LB surgem os “moçambicanismos” que são construções específicas a nível lexical, sintático-semântico tipicamente usados em Moçambique e que caracterizam o português escrito e falado atualmente, tanto na literatura como nos meios de comunicação. PALAVRAS-CHAVE: Português de Moçambique. Neologismos. Mia Couto. ABSTRACT: This research is a reflection on neologisms, borrowings and loanwords in Portuguese written in Mozambique, a country that has features sociolinguistics complex due to linguistic diversity. The research aims to identify and explain the neologisms in literary text in order to suggest a good treatment of this aspect in the classroom. The corpus of research is the work land sleepwalking of Mia Couto. With the program “Lexicon 3” we identify and study the frequency of the lexicon and we concluded that most loanwords come from English and BL. We note that the lexical creativity is manifested through neologisms and borrowings. That there are new words formed by juxtaposition, agglutination by means of affixes (prefixes and suffixes) for processing names verbs through, among other ways by reduplication. In literary texts, the freedom it seemed wider reaching identifying unexpected formations like “maistravés” and “ninguéns”. Contact with BL arise “mozambicanisms” constructions that are level specific lexical, syntactic-semantic typically used in Mozambique and featuring the Portuguese written and spoken today, both in literature and in the media. KEYWORDS: Portuguese of Mozambique. Neologisms. Mia Couto. Considerações iniciais O presente trabalho resulta de uma reflexão sobre os fenômenos linguísticos que ocorrem no português escrito em Moçambique, com particular ênfase na obra de Mia Couto intitulada Terra sonâmbula. O português em Moçambique convive com mais de 1 Doutor em Linguística e Língua portuguesa. Foi Bolsista do CNPq/MCT-Moçambique.

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O PORTUGUÊS MOÇAMBICANO: UM OLHAR SOBRE OS

NEOLOGISMOS NA OBRA DE MIA COUTO “TERRA

SONÂMBULA”

Alexandre António Timbane (UNESP)1

[email protected]

RESUMO: A presente pesquisa é uma reflexão sobre neologismos, empréstimos e estrangeirismos no

português escrito em Moçambique, país este que tem características sociolinguísticas bem complexas,

devido a diversidade linguística. A pesquisa tem por objetivo identificar e explicar os neologismos em

texto literário por forma a sugerir um bom tratamento deste aspecto em sala de aula. O corpus da pesquisa

é a obra Terra sonâmbula de Mia Couto. Com o Programa “Léxico-3” identificamos e estudamos a

frequência do léxico e concluiu-se que a maioria de estrangeirismos provêm do inglês e das LB.

Assinalamos que a criatividade lexical se manifesta por meio de neologismos e empréstimos. Há

neologismos que se formaram por justaposição, por aglutinação, por meio de afixos (prefixos e sufixos),

por transformação de nomes em verbos, por meio de diminutivos, por reduplicação entre outras formas.

Em textos literários, a liberdade pareceu-nos mais ampla chegando a identificar formações inesperadas do

tipo “maistravés” e “ninguéns”. Em contato com LB surgem os “moçambicanismos” que são construções

específicas a nível lexical, sintático-semântico tipicamente usados em Moçambique e que caracterizam o

português escrito e falado atualmente, tanto na literatura como nos meios de comunicação.

PALAVRAS-CHAVE: Português de Moçambique. Neologismos. Mia Couto.

ABSTRACT: This research is a reflection on neologisms, borrowings and loanwords in Portuguese

written in Mozambique, a country that has features sociolinguistics complex due to linguistic diversity.

The research aims to identify and explain the neologisms in literary text in order to suggest a good

treatment of this aspect in the classroom. The corpus of research is the work land sleepwalking of Mia

Couto. With the program “Lexicon 3” we identify and study the frequency of the lexicon and we

concluded that most loanwords come from English and BL. We note that the lexical creativity is

manifested through neologisms and borrowings. That there are new words formed by juxtaposition,

agglutination by means of affixes (prefixes and suffixes) for processing names verbs through, among

other ways by reduplication. In literary texts, the freedom it seemed wider reaching identifying

unexpected formations like “maistravés” and “ninguéns”. Contact with BL arise “mozambicanisms”

constructions that are level specific lexical, syntactic-semantic typically used in Mozambique and

featuring the Portuguese written and spoken today, both in literature and in the media.

KEYWORDS: Portuguese of Mozambique. Neologisms. Mia Couto.

Considerações iniciais

O presente trabalho resulta de uma reflexão sobre os fenômenos linguísticos que

ocorrem no português escrito em Moçambique, com particular ênfase na obra de Mia

Couto intitulada Terra sonâmbula. O português em Moçambique convive com mais de

1 Doutor em Linguística e Língua portuguesa. Foi Bolsista do CNPq/MCT-Moçambique.

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vinte línguas bantu (LB), espalhadas pelo país, línguas que influenciam direta ou

indiretamente na variação e mudança linguísticas. Como ponto de partida, questionamos

que tipo de neologismos a obra apresenta e quais processos linguísticos que participam

do processo de formação dessas novas palavras. O trabalho tem como enfoque a

criatividade lexical do português moçambicano, mas tendo como objetivo central,

identificar os neologismos bem como explicar a sua origem e formação. Sabe-se de

antemão que os textos literários entram na sala de aula e explorados

linguístico/gramaticalmente como material de ensino. Os textos de Couto não são

exceção, daí a importância da presente pesquisa.

Há vários trabalhos publicados no Brasil sobre os neologismos no português

brasileiro, mas poucos falam acerca do português falado na África. Ao nosso ver, este

trabalho vem preencher essa lacuna, procurando compreender as variedades desta nossa,

a “Língua Portuguesa” (LP) que tanto no Brasil como em países africanos foi imposta

pelo colonizador. O contexto sociolinguístico em que Moçambique se encontra permite

que haja interferência tanto de palavras vindas de línguas bantu como do inglês.

O trabalho tentará recuperar os contextos sociolinguísticos que envolvem

Moçambique, concretamente a situação linguística, os debates sobre os conceitos de

moçambicanismo e de neologismo antes de apresentar os dados e a sua respectiva

discussão. O trabalho tem como enfoque a criatividade lexical do Português

Moçambicano (PM), mas tendo como objetivo identificar os neologismos, explicar a

sua origem e formação. O contexto sociolinguístico em que Moçambique se encontra

permite que haja interferência tanto de palavras vindas das LB como do inglês.

1. Situação linguística atual de Moçambique

A LP em Moçambique é oficial e convive com LB espalhadas pelo país.

Entretanto não é língua materna da maioria da população possuindo 38,7% (Censo

realizado em 2007) da população escolarizada. A maioria da população (71,4%) vive

nas zonas rurais e utiliza as várias LB na comunicação cotidiana. O português é falado

especialmente por pessoas escolarizadas ou por aquelas que vivem nas cidades. Cumpre

dizer que a LP goza de estatuto político privilegiado quando comparada com as LB. De

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acordo com o parágrafo n.º 1 do artigo 5º da Constituição da República de

Moçambique (revisão de 2004) “Na República de Moçambique, a LP é a língua

oficial”. E no parágrafo n.º 2 do mesmo artigo, acrescenta-se: “O Estado valoriza as

línguas nacionais e promove o seu desenvolvimento e utilização crescente como línguas

veiculares e na educação dos cidadãos” numa referência às numerosas LB faladas em

Moçambique.

A intenção desse artigo da Constituição não é “politizar”, mas cumpre lembrar

que a valorização das LB passaria, pela oficialização de cada uma delas nas regiões

onde ocorrem. É sabido que a maioria da população não fala português, e dizer que “o

Estado valoriza as línguas nacionais” sem dar o devido espaço (manifestação plena e

completa) seria uma forma de “dizer para o inglês ouvir”. Por isso que as LB

moçambicanas ainda não são ensinadas na escola e tendem a reduzir o número de

falantes principalmente nas zonas urbanas (Timbane; Berlinck, 2012).

Algumas vozes, assumem um “tom político”, ao argumentar que o português

funciona como “língua de união” frente à diversidade linguística do país. Mas também é

preciso mostrar que as línguas locais deveriam ser oficializadas nas regiões onde elas

ocorrem, por uma questão da conservação de valores sociais e culturais, bem como o

respeito à identidade. Apesar disso, o número de falantes da LP tem aumentado nestes

últimos anos devido à massificação da educação2 inclusiva, devido ao aumento dos

meios de comunicação, tais como a rádio, o jornal e a televisão.

Hoje, considera-se a LP como língua nacional devido ao número crescente de

falantes que atinge 89%, segundo Timbane (2012b) e Instituto Nacional de Estatística

(2008). A LP é patrimônio cultural dos moçambicanos. Na qualidade de língua materna

o português é falado por 10.7% dos mais de 20 milhões de habitantes (Instituto

Nacional de Estatística, 2008). Com isso queremos afirmar que Moçambique, tem uma

população majoritariamente “bantófona”, e que cada uma das vinte LB deveria ser

reconhecida como língua oficial pelo menos nas regiões onde ocorrem. Couto (2009),

2 “A taxa de analfabetismo no país diminui de 60,5% em 1997 para 51,9% em 2005” (Instituto Nacional

de Estatística, 2008, p.47).

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escritor moçambicano, em seu livro E se Obama fosse africano? e outras

interinvenções, diz o seguinte:

O que advogo é um homem plural, munido de um idioma plural. Ao lado de

uma língua que nos faça ser mundo, deve coexistir uma outra que nos faça

sair do mundo. De um lado, um idioma que nos crie raíz e lugar. Do outro,

um idioma que nos faça ser asa e viagem. Ao lado de uma língua que nos

faça ser humanidade, deve existir uma outra que nos eleve à condição de

divindade (COUTO, 2009, p.26).

Ouve-se frequentemente que Moçambique é um país lusófono e não

“bantófono”. Mais ainda se pode dizer que, muitos cidadãos, principalmente na zona

rural, nunca se identificam com a LP. Os argumentos que sustentam essas afirmações

são os dados estatísticos fornecidos pelo Instituto Nacional de Estatística (2008) que

apenas apontam 10.7% da população moçambicana fala o português como língua

materna. Esta percentagem não nos permite afirmar com segurança que a população

moçambicana é lusófona. Sob o ponto de vista político, Moçambique é lusófono, mas

sob o ponto de vista da vida prática e cotidiana, Moçambique possui uma população

“bantófona”. Esta é uma realidade concreta que vai interferir na variação do português

falado em Moçambique e em outros países de língua oficial portuguesa.

Sobre o debate que incide na escolha da língua a utilizar, Dias (2002, p.61)

defende que “as línguas e os dialetos vão ser comparados e avaliados em relação a

língua oficial ou ao dialeto de prestígio eleito pelo Estado, pela elite e pela classe

dominante nesse país.” O prestígio e a superioridade ou a falta de prestígio e a

inferioridade conferidos a uma língua provocam a desigualdade linguística, são

socialmente motivados. É por esta razão que a LP ganha campo sob o ponto de vista

político, mas na prática e junto às populações, pode encontrar-se outra realidade bem

diferente: o domínio das LB. A língua materna mais difundida é o emakuwa (26,3%)

falada na província de Nampula, ao norte do país; em segundo lugar está o xichangana

(11,4%) falado no sul do país, e em terceiro lugar, o élomwé (7,9%), uma língua falada

no norte de Moçambique. É preciso ainda reconhecer a presença marcante da

comunidade asiática radicada em Moçambique desde os tempos da colonização. Essa

comunidade é falante das línguas urdu e de gujarati, para além do árabe utilizado na

religião muçulmana com mais incidência no norte de Moçambique.

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1. 1. Línguas bantu versus ensino da língua portuguesa e o impacto na vida social

Para uma melhor compreensão do fenômeno dos neologismos em Moçambique

é importante perceber como se dá o contato entre a LP versus LB versus Ensino. A LP

passou a ser uma língua moçambicana, na medida em que já tem falantes nativos. A LP

tem causado muitos problemas de aproveitamento escolar desde o início da nova era

(pós-independência) porque a maioria das crianças só pratica a LP na escola, na

interação com o professor e no meio familiar ainda prevalecem as LB. Uma vez que a

maior parte da população usa as LB, seria importante que se avançasse para uma

educação bilíngue em que a LP concorra com uma LB. Ngunga (2002) defende que

É imperioso, pois, que as línguas moçambicanas sejam incluídas no sistema

de educação nacional de Moçambique, quer por razões políticas, quer por

razões pedagógicas, para a maioria das crianças moçambicanas. É injusto que

uma criança não avance na sua carreira escolar só porque lhe é imposta uma

barreira que todos sabem intransponível. O uso na escola de uma língua

desconhecida como veículo de ensino-aprendizagem fomenta timidez no

estudante e desenvolve a arrogância do professor. Não é por acaso que os

alunos das zonas rurais falam menos do que os das zonas urbanas

(NGUNGA, 2002, p.8 ).

Resultado: Alguns deputados na Assembleia da República têm medo de colocar

suas opiniões por causa do fator língua. Já que o “português” falado é difícil, somente

os escolhidos é que tomam a palavra para expressar opiniões em sessões. Quem conhece

Moçambique confirmará esta realidade: há deputados que terminam o mandato sem que

sua voz tenha sido ouvida.

Na perspectiva que o Ngunga acaba de mostrar revela as dificuldades que as

crianças da zona rural enfrentam no sistema educativo, pelo fato de não ser sua língua

materna. É importante que se diga que “a verdadeira manutenção linguística reside em

última instância no reconhecimento do estatuto oficial das línguas bantu e ao mesmo

tempo na implementação de diversos programas bilíngues na sociedade, e em particular

o uso do bilinguismo inicial na educação” (Lopes, 2004, p.52).

Apesar de a escola ser considerada a guardiã da norma culta e do bom-uso

linguístico, não consegue controlar o uso de certas formas gramaticais características no

meio social em que o indivíduo está envolvido. Estamos falando da interferência das LB

no português, fato que resulta numa variedade. Se observarmos com atenção, os livros

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didáticos e paradidáticos perceberemos que se privilegia a literatura moçambicana.

Excertos desses textos literários são ricos em neologismos (da matriz interna e externa)

também explorados gramaticalmente. Por vezes, essa prática passa despercebida e isso

significa que se por um lado incute-se nos alunos que “o modelo certo de falar

português” é a norma-padrão europeia, por outro lado, camufla-se a realidade

sociolinguística da variedade moçambicana, quer dizer, os moçambicanismos, tal como

veremos mais adiante.

É importante sublinhar que a maioria dos alunos do ensino primário em

Moçambique tem o português como língua segunda e os programas de ensino primário3

não orientam como os professores devem proceder no caso de encontrarem

neologismos, estrangeirismos e empréstimos nos textos usados em sala de aulas, cuja

sua maioria são escritos por moçambicanos. Outra questão é a seguinte: que

procedimento a seguir quando um aluno escreve um neologismo visto num dos textos

escritos por escritores moçambicanos? Na correção das redações, o professor deve

colocar certo ou errado? O Programa do Ensino de Português da 12ª classe defende que

Os alunos deverão ser encorajados a ler obras diversas e a fazer comentários

sobre elas e seus autores, a escrever sobre temas variados, a dar opiniões

sobre factos ouvidos ou lidos nos órgãos de comunicação social, a expressar

ideias contrárias ou criticar de forma apropriada, a buscar informações e a

sistematizá-la. Particular destaque deverá ser dado à literatura representativa

de cada uma das línguas e, no caso da língua oficial e das línguas

moçambicanas, o estudo de obras de autores moçambicanos constitui um

pilar para o desenvolvimento do espírito patriótico e exaltação da

moçambicanidade (Ministério da Educação, 2010, p.6).

Num espaço em que ainda há vozes que olham para português europeu como

“modelo correto a ser seguido” (“Um molde de vestido onde todas as mulheres do

3 Em Moçambique o ensino fundamental está organizado da seguinte forma: Ensino Primário do 1º grau

(1ª a 5ª classes); Ensino Primário do 2º grau (6ª e 7ª classes). O ensino médio abrange de 8º ao 12º ano de

escolaridade. Programa de português da 12ª classe determina que “ao longo do 1º e 2º Ciclos, o aluno

deverá ler obras e extractos de autores moçambicanos que marcaram a história da literatura do país, no

período anterior à independência tais como Rui de Noronha, Noémia de Sousa, José Craveirinha, Rui

Knopfli, Marcelino do Santos, Orlando Mendes, Luís Bernardo Honwana, Rui Nogar, Sérgio Vieira,

Armando Guebuza, Albino Magaia entre outros. Serão ainda estudadas obras e textos de autores que se

destacaram no período pós independência, nomeadamente Mia Couto, Ungulani Ba Ka Kossa, Lília

Momplé, Paulina Chiziane, Eduardo White, Suleimane Cassamo, Aníbal Aleluia, Calane da Silva,

Heliodoro Baptista, Sebastião Alba, José C. Patraquim, Leite de Vasconcelos, entre outros (Ministério da

Educação, 2010, p.10).

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mundo vão caber nesse no vestido sem exceção”)4 parece não ser possível desenvolver

esta ideia. Os moçambicanismos que vamos debater a seguir refletem o português que

está sendo falado/escrito nos dias de hoje por moçambicanos. Os neologismos e os

estrangeirismos refletem a dinâmica das línguas em geral, a nível morfológico, lexical,

fonético, semântico/pragmático e o português não seria exceção. A produtividade

lexical é uma característica normal de todas as línguas vivas e isso não é uma anomalia,

nem erro, mas sim a dinâmica a que nos referimos com muita insistência neste trabalho.

O estudo do léxico em sala é um mito tanto em Moçambique quanto no Brasil. Antunes

(2012) mostra que

a maioria dos livros didácticos, sobretudo os do ensino fundamental, o estudo

do léxico fica reduzido a um capítulo em que são abordados os processos de

formação de palavras, com a especificação de cada um desses processos,

acrescida de exemplos e de exercícios finais de análise de palavras. O destino

que terão as palavras é silenciado. O significado que tem a possibilidade de

se criar novas palavras pouco importa (Antunes, 2012, p.20-21).

Esse é, na verdade, um aspecto pedagógico que caminha para uma educação que

limita a criatividade do aluno bem como da análise de todo tipo de texto. É exatamente

este assunto que faz com que os alunos sejam desmotivados e repetem a classe

constantemente. Isto porque, “para a escola aceitar a variação linguística como um fato

linguístico, precisa mudar toda a sua visão de valores educacionais” (Cagliari, 2009,

p.70). Segundo Cagliari, “aprender português [...], não é só aprender como a língua

funciona, mas também estudar ao máximo os usos linguísticos; e isso não significa só

aprender a ler e escrever, mas inclui ainda a formação para aprender e a usar variedades

linguísticas diferentes, sobretudo o dialeto-padrão” (Cagliari, 2009, p.72). A tentativa de

ensinar um modelo ideal de língua homogênea, quer dizer, “uma norma de contornos

(supostamente) bem definidos, se vincula ao mesmo projeto, mais ou menos explícito

na maioria dos livros didáticos, de promover o ensino transmissivo da gramática

normativa com toda a sua nomeclatura.” (Bagno, 2013, p.117). É simplesmente essa

atitude que incentiva o insucesso escolar tanto no Brasil quanto em Moçambique.

Retomando as discussões, conclui-se que a escola moçambicana enfrenta problemas no

ensino do português provocado pelos contextos sociolinguísticos dos quais a língua está

4 (cf. Bagno, 2009, p.39-43)

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inserida. O uso dos textos literários em sala de aula é uma grande armadilha para os

professores mal formados ou desavisados porque os escritores têm uma liberdade ampla

que em muitas vezes se opõem à norma-padrão. Por outro lado, o texto literário tem um

“caráter revolucionário” (Antunes, 2012, p.123).

2. Debatendo conceito “moçambicanismos”

As línguas mudam com o tempo, com o lugar, com o grupo social, mudam

também de acordo com gênero, com o nível de escolaridade (educação formal), com a

idade, com lugar de residência, etc. Sabemos que a LP falada hoje deriva do latim

vulgar que ao longo do tempo evoluiu dando origem as línguas diferentes: o italiano, o

francês, o romeno entre outras. No que concerne ao sistema lexical de uma língua, vale

retornar algumas ideias essenciais antes de avançar.

o léxico é o conjunto das palavras fundamentais, das palavras ideais duma

língua; o vocabulário é o conjunto dos vocábulos realmente existentes num

determinado lugar e num determinado tempo, tempo e lugar ocupados por

uma comunidade linguística; - o léxico é o geral, o social e o essencial; o

vocabulário é o particular, o individual e o acessório (Vilela, 1995, p.13).

Ao chegar em Moçambique (no século XVI), a LP encontrou um território

complexo do ponto de vista linguístico. Os moçambicanos estavam organizados em

diferentes etnias bem dispersos numa extensão de 801.590 km² e cada uma falando sua

língua. Nesse contexto, o ensino da LP só foi possível devido ação das missões

religiosas católicas e suíças que ensinavam o catecismo em igrejas. Foram portanto,

quatro séculos de dominação colonial que não trouxeram nenhum avanço na

aprendizagem do português, isto porque o sistema colonial não estava interessado em

ensinar aos moçambicanos . Durante todo esse período o contato entre portugueses e

moçambicanos era limitado, pois os moçambicanos conservaram as suas línguas locais

mesmo depois da independência em 1975. O contato entre a LP e as LB é uma das

razões que justificam o aparecimento de unidades lexicais a que designamos por

“moçambicanismos”.

Segundo Dias (2002, p.20) denominam-se moçambicanismos “todas as palavras

(neologismos, estrangeirismos e empréstimos) que são mais tipicamente usadas em

Moçambique e que mostram e particularizam a regionalização léxico-semântica do

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português em Moçambique.” Partindo-se do princípio de que as línguas mudas com o

tempo, é importante lembrar que embora aconteçam em diferentes em diferentes níveis

linguísticos, as mudanças são sempre mais evidentes no nível lexical. Estudos

sociolinguísticos mostram que a gramática é a última a ser afetada pela variação. Os

moçambicanismos, na visão de Vilela (1995) seriam

indícios claros de afirmação de norma própria: na maneira original como

adopta o seu vocabulário de origem bantu ao sistema português divergindo

inclusivamente da norma europeia (lusitana), no modo como simplifica a

morfologia flexional do português, como começa a optar pela ordenação dos

elementos frásicos na sequência discursiva e, sobretudo, como força o léxico

do português a adaptar-se à mentalidade africana, tanto nos semas inerentes

como semas classemáticos: o que implica, por vezes, uma reformulação do

esquema frásico em alguns dos seus modelos proposicionais (Vilela, 1995,

p.68).

Essas características apontadas por Vilela são as que distinguem a fala de um

africano da fala de um português ou de um brasileiro. É que os moçambicanismos têm

características próprias, específicas, que criam uma diferença notável a nível fonético,

semântico, lexical e morfossintático. As línguas naturais constituem configurações que

mudam lentamente, moldadas pelo curso invisível e impessoal que é a vida da língua.

Essas mudanças ocorrem em todos os níveis da língua (semântico, fonético-fonológico,

sintático e lexical, pragmático), pois, com o decorrer do tempo, verificam-se em

diversas línguas certas alterações na percepção de nomes de objetos que podemos

designar de mudanças semânticas. Desses processos de mudança não se exclui a LP,

pois também vem sendo modificada na pronúncia, na gramática e no discurso; vai

incorporando novas formas de expressão; vai construindo uma certa identidade moldada

pelo espaço histórico, plurilinguístico e multicultural onde se encontra inserida.

Timbane (2012a) no artigo os estrangeirismos e os empréstimos no português falado

em Moçambique observou a presença das unidades lexicais: matorritori (cocada),

tchovaxitaduma (carinho de mão grande), matapa (folhas de mandioqueira ou prato

feito a base de folhas de mandioca), matequenha, timbila (xilofone), khanimanbo

(obrigado) e tontonto (cachaça) (Timbane, 2012a, p.292) todas provenientes da língua

xichangana. Estas novas unidades lexicais estão presentes no cotidiano dos

moçambicanos.

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Este fenômeno que pressupõe apropriação, recriação e enriquecimento da LP por

falantes moçambicanos, adaptando-a ao seu contexto sociocultural, segundo Dias

(2002), constitui a moçambicanização da língua. De acordo com esta autora, os

linguistas de Moçambique se dividem segundo duas opiniões distintas:

Opinião 1: Um grupo que defende a oficialização imediata das mudanças em

curso e adopção de uma LP moçambicana nos órgãos oficiais, na escola e nos

meios de comunicação de massa. Este grupo é, muitas vezes, movido por

sentimentos de nacionalismo, lealdade, orgulho e emancipação linguística.

Opinião 2: Outro grupo que afirma não existir uma LP moçambicana e que

há apenas uma variedade moçambicana em formação, pois não existem dados

suficientes que permitem padronização de uma variedade moçambicana da

LP. Tais estudiosos defendem que as diferenças linguísticas, sincronicamente

observáveis, não constituem verdadeiras mudanças linguísticas, pois estão

sujeitas a muita variação e flutuação (Dias, 2009, p.390).

Se o português falado atualmente não foi o mesmo falado nos séculos passados

em Portugal, por que o português de Moçambique deveria permanecer estático,

imutável e sólido? Concordamos plenamente com a primeira opinião, pois as mudanças

nunca avisam nem alertam aos seus falantes. É o que Naro (2004, p.43) designa por “O

dinamismo das línguas”. O autor defende que “as mudanças se processam de forma

gradual em várias dimensões, de forma silenciosa, atacando a parte lexical, passando

pelo fonético, morfossintático, até ao semântico.” Para o autor, “a mudança linguística

não é absolutamente mecânica regular a curto prazo”. Os estudiosos partidários da

segunda opinião talvez não tenham atentado para as mudanças a que nos referimos: as

variáveis sociais (idade, sexo, nível de escolaridade, grupo social) e as sim podem

provocar mudanças na língua.

Quanto aos argumentos que sustentam a primeira opinião, cumpre ponderar que

ainda são insuficientes não se especifica, por exemplo, que quantidade de dados seriam

necessários para se considerar uma variação/mudança. Pesquisas de Dias (2002, 2009,

1991) mostraram claramente a existência de variações. Moçambique alcançou

independência política em 1975, mas a independência linguística ainda não foi

declarada5. Em 2002, a linguista Hildizina Norberto Dias, publicou o primeiro

5 Este argumento se baseia no fato de que as pessoas ainda pensam que só quem nasceu e cresceu em

Portugal é que fala melhor a língua portuguesa. Bagno (2013, p.61) afirma que “a norma-padrão não faz

parte do espectro contínuo de variedades linguísticas reais, efetivamente faladas numa comunidade” e por

isso não existem falantes do padrão em nenhuma parte do mundo.

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Minidicionário da Moçambicanismos, que vem comprovar mais uma vez a mudança

lexical do português falado em Moçambique. Esta obra contém 1500 verbetes ricos em

neologismos e empréstimos. A elaboração do dicionário, segundo Dias (2002), foi

motivada pelo fato de “a língua portuguesa em Moçambique ter vindo a sofrer uma série

de mudanças a todos níveis, por influencia de vários fatores, destacando-se o contato

com as línguas bantu e os fatores socioeconômicos e políticos inerentes à actual

conjuntura moçambicana” (Dias, 2002, p.12).

Este dicionário contém cerca de 1540 verbetes organizados alfabeticamente de A

à Z, cuja macroestrutura traz nomes que designam animais, plantas, rituais, ações,

sabores, trajes, instrumentos e acontecimentos. A obra compila moçambicanismos,

dando continuidade, segundo a autora, ao trabalho realizado anteriormente por outros

estudiosos. Trata-se de moçambicanismos do registro oral da língua, recolhidos em

contextos de comunicação familiar ou popular, em três cidades do país: Maputo,

Quelimane e Pemba. Ainda segundo Dias (2002, p.18), o seu principal objetivo é

“mostrar algumas palavras e significados novos usualmente utilizados por alguns

moçambicanos e que não aparecem nos dicionários portugueses”. No entanto, conforme

a autora realça, não é sua intenção impor uma norma linguística nem sequer padronizar

a língua portuguesa falada em Moçambique.

O Minidicionário de Moçambicanismos apresenta estrangeirismos, empréstimos

e neologismos com as respectivas transcrições fonéticas e com informações

etimológicas das unidades lexicais coligidas. No que diz respeito à estrutura do

dicionário, a autora dedica 36 páginas situando o leitor: faz pequenas explanações sobre

as motivações, e objetivos do dicionário, faz referência à metodologia de recolha de

dados usada, apresenta uma breve reflexão sobre a ortografia, transcrição fonética e

outros aspectos julgados importantes. Há que se realçar a importância do Dicionário

eletrônico de moçambicanismos que nos ajuda a compreender melhor essa questão.

Trata-se de um dicionário em construção, mas que já configura primeiro passo

importante na construção de um português moçambicano. Já há muita literatura sobre

moçambicanismos. Timbane (2009) dando exemplos dos moçambicanismos mais

frequentes no português oral de Maputo aponta que “as palavras afinar (apertar pessoas

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no machimbombo ou autocarro), guevar (fazer comprar para revender), bala-bala

(andar sem parar), minhar (segregar), txovar (empurrar), são exemplos típicos do nosso

português” (Timbane, 2009, p.26-36) que precisam ser reconhecidas porque mostram as

especificidades da variedade moçambicana. O reconhecimento e o estudo da língua em

seu contexto real defende a teoria de que “não existe um padrão predeterminado,

compacto, homogêneo e perfeito [...]” (Bagno, 2013, p.118). É neste âmbito que Bagno

propõe uma reeducação sociolinguística na qual os professores mostrarão aos seus

alunos a complexidade da dinâmica social sob ponto de vista linguístico ilustrando que

eles “sabem português e que a escola vai ajudar a desenvolver ainda mais esse saber”

(Bagno, 2013, p.177). Passemos ao conceito de neologismo.

3. Debatendo conceito de neologismos

Freitas, Ramilo e Arim (2005, p.51) definem neologismos como sendo “palavras

novas da língua, isto é, as palavras que entraram há pouco tempo ou que ainda estão

num processo de integração no léxico da língua.” Sabe-se que o termo neologismo é

composto pelos elementos neo (novo) e do grego logos (palavra), do latim significa

“palavra nova” (Alves,1994; Carvalho, 2009). Segundo Vilela (1995, p.23) define

neologismos como “algo de novo que entra na língua.” Há neologismos semânticos

implicam a mudança total, um acrescentamento de significado ao de uma forma

existente.

Concordamos com a forma como Freitas, Ramilo e Arim (2005) e Vilela (1995)

definiram os conceitos, mas a definição de Alves (2003) nos parece mais completa na

medida em que apresenta limites. Alves define “neologismo” como uma “unidade

lexical é neológica se foi criada em um período recente; ou se não está registrada nos

dicionários de língua; ou se é percebida como nova pelos falantes; ou, ainda, se

apresenta instabilidade em aspetos morfológicos, gráficos ou fonéticos” (Alves, 2003, p.

262).

É com base nesse conceito que vamos desenvolver este trabalho, serão

analisadas unidades lexicais que ainda não estão registradas no Dicionário Houaiss da

língua português (2009). As outras definições não especificam como identificar os

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neologismos. E acreditamos que este critério é um argumento válido. Não se procuram

neologismos em espaços vagos, mas sim em um lugar preciso: no dicionário. A

ausência de itens em uma obra lexicográfica passa a ser desse ponto de vista, um dado

bastante significativo. Os neologismos são “palavras criadas para designar novas

situações, conceitos, factos, objectos, etc, sendo que um neologismo só é sentido como

tal durante algum tempo, pois passados anos ou séculos deixam de ter sentido como tal,

porque a realidade que ele designa também já não é nova.” (Revista E-Ciência, 2006,

p.1).

A criação de neologismos segue regras específicas da língua de chegada. É o que

Carvalho (2006, p.192-195) designa por neologismo formal para “as palavras que ainda

não constam no verbete dos dicionários” e neologismos conceptuais seriam aquelas que

trazem novo significante semântico. O exemplo mais próximo no português de

Moçambique é a palavra chapa que significa tanto como remendo que se coloca na

roupa; veículo automóvel para transporte semicoletivo de passageiros (cf. Dias, 2002,

p.82). Carvalho defende ainda que o

processo de formação dos neologismos é gradual. Historicamente toda

palavra foi, um dia, nova, isto é, a partir de certo momento é que passou a

fazer parte de uma comunidade. O reconhecimento do estado de uma língua

implica no reconhecimento intuitivo do caráter de novidade de certas

palavras. Algumas pertencem à fala, mas ainda não à língua, porque têm

condição provisória (Carvalho, 2006, p.193).

Segundo Capucho (2008, p.278) as novas palavras aparecem em contexto de

mundialização, é o caso de “antieuropeísta, desburocratização, desaceleração,

desmultiplicação, Eurotúnel, descapitalização; de novas tecnologias: cibercafé,

ciberespaço, telejornalismo, videoporteiro, videoconferência, videoclube.” Esta é a

dinâmica que as línguas têm quando são usadas. Barbosa esclarece o seguinte:

Os neologismos carregam consigo os valores socio-culturais. Do ponto de

vista diacrônico, o percurso do neologismo, [..], já indica que um

neologismo, criado em determinada etapa da língua, se não desaparece, se

desneologiza, ou seja, integra-se a uma norma, torna-se lexia memorizada na

competência de um grupo de falantes, efetiva, disponível para a atualização;

por vezes, integra-se à norma geral, do conjunto dos sujeitos falantes-

ouvintes do idioma (Barbosa, 2001, p.38-39).

Em outras palavras, a mudança linguística é fenômeno permanente que responde

às necessidades da comunidade dos falantes, sejam elas de ordem social ou técnica.

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Contudo, “é sempre lenta e gradual; a realidade, a criação de novos objetos sempre

precederá a criação dos itens lexicais que os denominarão. O importante é que essa

dinâmica não contrarie a norma e o sistema da língua.” (Carvalho, 2001, p.66).

Concordo com a perspectiva da existência da LP e de suas variantes em

Moçambique, do Brasil, de Angola, de São Tomé e Príncipe, de Cabo Verde, de Timor

Leste e de Portugal. Embora sejamos falantes de português e tenhamos noções de

linguística encontramos dificuldades na comunicação com brasileiros ao chegar ao

Brasil em 2010. As palavras camisola, bermuda, blusa, apelido, biquíni, bicha, sussa,

abacaxi, goleiro, checar, estartar, xerocar, entre muitas outras unidades lexicais próprias

da variante brasileira causaram-me estranheza e constrangimento na interação com

brasileiros.

A dificuldade de comunicação e de compreensão prova que essas unidades

apresentam significados diferentes daqueles que eu conhecia na variante falada em

Moçambique. O estrangeirismo show no Brasil significa espetáculo teatral ou

cinematográfico em que há música, dança coreografia e, geralmente, está montado em

torno de um cantor ou animador, funciona como um substantivo, mas em Moçambique

significa bom, ótimo, espetacular, maravilhoso, ou seja, funciona como um adjetivo. O

conhecimento da LP não basta, a comunicação pressupõe o conhecimento dos contextos

socioculturais nos quais essas unidades lexicais são usadas, pois o valor semântico pode

diferir de povo para povo. A presença de neologismos sustenta a tese de que a língua

deve ser entendida como “um sistema complexo, dinâmico e adaptativo” (Viotti, 2013,

p.149). Segundo a autora, a mudança linguística “é constante e perene. Não há

instancias de uso de língua em que mudanças não se verificam. A comunicação não é

uma troca de mensagens empacotadas pelo falante num momento e desempacotadas por

seu interlocutor num momento subsequente” (Viotti, 2013, p.157). Feitas as

considerações inicias a cerca dos conceitos básicos e os devidos debates passaremos a

tratar do aspecto metodológico subjacente à pesquisa.

4. Metodologia e apresentação dos resultados

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O estudo de textos literários para o estudo da variação vem sendo pesquisado há

muito tempo. Martinet explique que “basta, para um francês, percorrer la chanson de

Roland ou sem subir mais alto, ler Rabelais ou Montaigne em texto original para se

convencer de que as línguas mudam ao longo do tempo” (Martinet, 1967, p.172,

tradução nossa). A literatura é um rico material para o estudo da língua, a escolha do

texto de Mia Couto. A literatura está sempre presente nas aulas de português nas escolas

moçambicanas e em todas as províncias. O Ministério da Educação elabora manuais e

coloca textos originais e adaptados para que os alunos tenham acesso à literatura desde

as classes iniciais. As obras literárias originais não chegam nas mãos dos alunos porque

são caros e a pobreza é extrema para a maioria da população. Por isso que Moçambique

ocupa o 185º (o 3º de baixo para cima) no ranking mundial do desenvolvimento

humano, segundo Malik (2013).

Com isso pretendemos dizer que o único texto literário que chega nas mãos do

aluno moçambicano (principalmente na zonas rurais) é o texto adaptado ou colocado na

íntegra nos livros escolares elaborados pelo Ministério da Educação de Moçambique.

Sendo assim, para a constituição do corpus utilizamos o livro original do romance

Terra sonâmbula de Mia Couto com intuito de observar a criação lexical presente na

sua obra.

Após a identificação de unidades lexicais, seguiu-se a fase de codificação e

organização por forma a obter dados através do Programa Léxico-3. Objetivo era de

extrair a frequência desse léxico, mas com especial atenção a frequência de

neologismos, empréstimos e estrangeirismos. O princípio para identificação de

neologismos foi com base no corpus de exclusão metodologia sugerida por Carvalho e

Silva (2001, p.111-116). O Dicionário integral da língua portuguesa (2008) e o

Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2009) foram utilizados como referência

de exclusão. A sustentação teórica dessa metodologia encontra-se em Rio-Torto (2007,

p.25) que defende o seguinte: “por via de regra, para apurar se uma palavra pode ou não

ser marcada como neológica, torna-se por universo de exclusão um conjunto de fontes,

mais amplo possível, de um dado momento epocal.”

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Sendo assim, a escolha do Dicionário integral da língua portuguesa (2008) se

justifica pelo fato de que é o recomendado pelo Ministério da educação de Moçambique

e circula com mais frequência nas escolas. O segundo, quer dizer, Dicionário Houaiss

da língua português (2009), se justifica pelo fato de que é referência na variedade do

português brasileiro e é, sem dúvidas o mais recente e completo. Da pesquisa obtivemos

os seguintes resultados:

4.1. A obra Terra sonâmbula de Mia Couto

A obra Terra sonâmbula teve por motivação os conflitos desestabilizadores da

chamada “guerra de desestabilização” ou “guerra pela democracia” vivenciados pela

sociedade de Moçambique dois anos após a proclamação da independência do país

1975, e que chegaram ao fim apenas em outubro de 1992. Couto vale-se da palavra

para, “comunicar-se diretamente com a alma profunda de uma terra conturbada à qual

foi negado o direito ao sono - a terra sonâmbula- mas não ao sonho e à arte, as vias

mágicas por excelência de resgate da vida humana”. Em 204 páginas, Couto (2010)

mostra ao leitor a capacidade de “brincar” ou de fazer “brincriações” com as palavras,

criando neologismos de todo tipo. Vejamos, então primeiramente os neologismos

formais e os estrangeirismo/empréstimos provenientes da língua xichangana.

Couto nasceu na cidade de Beira (interior de Moçambique) e talvez pela

convivência com pessoas do sul do país acabou assimilando mais estrangeirismos do

xichangana ao invés da língua ndau falada na província de Sofala (cidade da Beira). Da

recolha feita identificamos 223 neologismos. Neste trabalho procuramos indicar o

capítulo (cap.) e a página (p.) onde encontramos a unidade lexical. Vejamos (no Quadro

1) a distribuição de uso dessas unidades em capítulos:

Capítulo I II III IV V VI VII VIII IX X XI Total

Quantidade de

neologismos

25 18 15 14 6 25 15 37 38 25 5 223

Quadro 1: Distribuição de neologismos em capítulos do livro

Uma das características mais marcantes dos neologismos presentes nesta obra é

a formação lexical por composição. Segundo Cunha e Cintra (2008, p.119), no processo

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de composição, podem-se criar palavras com elementos simplesmente justapostos,

conservando cada qual a sua integridade. Vejamos os exemplos:

Neologismos

Localização na obra

Neologismos

Localização na obra

filho-dentro

madeira-e-zinco

arco-iriscando

mau-olhado

marido-defunto

viúvo-solteiro

bem-disposto

mal-fragado

lusco-focaram

vira-revira

casinha-natal

guerra-fantasma

exército-fantasma

meia-fechada

cap. 1, p.22

cap.1, p.29

cap. 2, p.37

cap. 2, p.40

cap. 2, p.45

cap. 2, p.45

cap. 2, p.46

cap.3, p.57

cap.4, p.64

cap.4, p.79

cap. 6, p.105

cap. 6, p.111

cap. 6, p.111

cap. 6, p.112

pisca-piscando

formigas-cadáver

olho-zarolho

camarada-chefe

chora- minguante

logo-logo

zuca-zaruca

nua-vem

nua-vai

nuvem-macho

recém-recente

longas-lengas

camarada-em-chefe

pau-mandado

cap. 8, p.144

cap.8, p.146

cap.8, p.146

cap.8, p.146

cap.8, p.149

cap.8, p.149

cap.9, p.153

cap.9, p.153

cap.9, p.153

cap.9, p.153

cap.9, p.154

cap.9, p.159

cap.9, p.165

cap.9, p.171

Quadro 2: Formação de compostos por justaposição

Estas unidades são novas na variante de Moçambique, pelo menos não constam

da nomenclatura no dicionário consultado, e sua composição está intimamente ligada ao

estilo do autor e à beleza do texto. A Quadro 2 é apenas uma amostra das muitas outras

unidades que podem ser flagradas ao longo do romance. Mas as palavras podem se

“unir e pode-se perder a ideia da composição, caso em que se subordinam a um único

acento tônico e sofrem perda de sua integridade silábica.” (Cunha; Cintra, 2008, p.119).

Nesse caso, Couto cria várias novas palavras a partir da aglutinação de pelo menos duas

outras. No processo de aglutinação, diferentemente do que ocorre na composição por

justaposição, perde-se a noção das unidades tomadas isoladamente. As palavras da

tabela 3 são alguns exemplos desse tipo de formação.

Em “Terra sonâmbula” de Couto observa-se a transformação de verbos a partir

de adjetivos. Na sua “arte neologística”, Couto transforma adjetivos em verbos, algo

que a gramática da LP não aceitaria, não fosse a prerrogativa que ele tem de ser

inovador na literatura. Os exemplos são: pequenava (cap.4, p.78), sozinhar-me (cap.1,

p. 28) e azarava (cap.2, p.43) formas derivadas dos adjetivos pequeno, sozinho e azar

respectivamente.

Outro processo de formação de palavras que merece ser observada é derivação.

Nesse caso temos a criação por meio de afixos: prefixos e sufixos. Vejamos no Quadro

3, alguns exemplos de neologismos construídos por meio de afixos.

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Quadro 3: Formação de neologismos por afixação

No Quadro 3, observa-se que em vários capítulos da obra, Couto cria

neologismos usando prefixos: des-, im-, in-, dis-, a- e os sufixos –mente, -dade entre

outros. Há situações em que aparece sufixos e prefixos simultaneamente, como é o caso

da terceira coluna do Quadro 3.

Uma outra forma de criação neológica recorrente a obra de Couto é a

transformação de nomes (sobretudo substantivos comuns) em verbos. Vejamos alguns

exemplos na tabela:

Transformação de nomes em verbos Diminutivo Localização Diminutivo Localização Diminutivo Localização

cabritoteava cap. 3, p.61 infanciando cap.9, p.158 varadeando cap.9, p.158

desvizinham-se cap. 4, p.68 nenecar cap.1, p.19 machambar cap.1, p.17

ameijoaram cap. 4, p.76 praiava cap.1, p.20 faquinhado cap.9, p.154

historiava cap.7, p.131 mulatar cap.1, p.25 arco-iriscando cap.2, p.37

luzinhou cap.8, p.144 raivando cap.1, p.26

Quadro 4: Formação de verbos a partir de nomes

No processo de transformação de nomes todos os verbos se enquadram na

primeira conjugação. Todos os exemplos apresentados na Quadro 4, mostram a

integração dos verbos na primeira conjugação. Aliás, a língua portuguesa obriga que

todas as palavras, concretamente os verbos provenientes de outras línguas sejam

integrados na primeira conjugação e terminados em –ar. A criação de verbos a partir de

adjetivos e nomes ocorre de forme recorrente ao longo do romance Terra sonâmbula.

Faz parte do estilo literário usado por Couto na sua “brincriação”.

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O professor de português que trabalha com estes textos em sala de aula precisa

explicar mostrando aos alunos a criatividade lexical que é uma marca recorrente em

textos de Mia Couto. Com certeza, os alunos não encontrarão essas palavras no

dicionário por serem novas. Assim, é necessário que o aluno saiba o conceito

neologismo para que não fique frustrado ao consultar um dicionário.

4.2. Empréstimos vindos de inglês

A palavra biznés (cap. 6, p.113) é recente no português de Moçambique e

chegou ao país com o advento da globalização e dos negócios. Tem origem na língua

inglesa (biznés do inglês bussines). Segundo o Dicionário de Moçambicanismos provém

da forma biznar (forma verbal da primeira conjugação) que significa vender.

Provavelmente, não se trata de um moçambicanismo em sentido estrito, Em

Moçambique, parece prevalecer o uso transitivo, no sentido de “vender”, e não o uso

intransitivo significando “fazer negócios”. É importante assinalar que a escrita ainda

varia. A insegurança ortográfica pode ser flagrada em alguns documentos escritos, onde

se grafa ora business ora bizness, ou ainda bizne.

A unidade lexical maningue foi criada por jovens para dizer “muito” ou seja, o

neologismo funciona como um advérbio. Segundo o Dicionário de Moçambicanismos,

maningue é um dos moçambicanismos mais famosos, se não mesmo o mais famoso. O

dicionário Porto Editora e o dicionário Priberam online registram ambos a palavra. A

palavra maningue é comum a várias línguas locais, como assinalam Lopes, Sitoe e

Nhamuende apud Lindegaard (s.d.), em Moçambicanismos, dando o exemplo de

manyingui na língua tsonga. Mas sei que a palavra é também usada em ndau, por

exemplo. Segundo estes autores, as palavras de línguas bantas de que deriva o maningue

do português moçambicano vêm, por sua vez, do inglês many, “muito”. Todos os

dicionários consideram maningue um advérbio, e o dicionário Porto Editora considera

também que a palavra pode ser um pronome. Presumo que esta classificação de

“pronome” corresponda à minha ingênua classificação de “adjectivo” (igual, aliás, à que

propõem Lopes, Sitoe e Nhamuende, em Moçambicanismos) em frases como “estava lá

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maningue malta” ou “estavam lá maningues pessoas” (Lopes, Sitoe e Nhamuende apud

Lindegaard, s.d.).

Podemos conferir no verbete do Dicionário de moçambicanismos que as origens

do advérbio maningue são controversas. Na nossa posição, essa construção francesa?

Na qualidade de falante nativo vai ao encontro da ideia de que maningue tenha sido

originada na língua inglesa, concretamente entre falantes jovens. Há muitas

composições de músicos moçambicanos que fazem alusão ao verbete maningue, por

vezes acompanhado do adjetivo naice que vem do nice, do inglês (maningue

naice/muito bem).

4.3. Casos de reduplicação vindos da língua xichangana

Quando defendemos a existência de “moçambicanismos” pode parecer que

defendemos “ideias patrióticas” e não linguísticas. Na verdade, os fenômenos

linguísticos que ocorrem no português moçambicano refletem o contato com as LB que

são as línguas maternas da maioria dos moçambicanos. Em muitos casos, as crianças

têm o primeiro contato com o português apenas aos seis anos, quando entram na 1ª

classe do Ensino Fundamental. Nessa idade, já está solidificada a base de sua língua

materna que é uma LB. Dificilmente essa criança poderá pensar sem que recorra de

alguma forma à sua língua materna. Vejamos o caso da reduplicação, fenômeno

linguístico próprio do xichangana, língua falada no sul de Moçambique, a mais

marcante no texto de Mia Couto.

Para Ngunga (2004, p.181) a reduplicação “é um processo de repetição de uma

parte ou de todo o tema que pode ocorrer em todas as categorias e posições

morfológicas.” A reduplicação pode ser total ou parcial e serve para exprimir interação,

frequência, tempo, força, tamanho ou forma. Nas línguas xichangana (S53), cicopi

(S61), ekoti (P35), emakhuwana (P31), echuwabo (P34), cinyungwe (N43), cinsena

(N44), por exemplo são mais frequentes. Neste trabalho, apresentaremos exemplos de

reduplicação total na língua xichangana que é um processo morfológico em que o

reduplicante e a base são idênticos (a nível segmental). Na escrita sempre aparece o

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hífen. Os exemplos a seguir foram extraídos de Ngunga (2004, p.181-191) e de Langa

(2001, p.22-30):

ku famba-famba “andar repetidamente” (ku famba “andar”)

ku kwela-kwela “subir repetidamente” (ku kwela “subir”)

ku tlanga-tlanga “brincar repetidamente” (ku tlanga “brincar”)

ku koma-koma “pegar repetidamente” (ku koma “pegar”)

ku hundza-hundza “passar repetidamente” (ku hundza “passar”)

ku baba-baba “persuadir repetidamente” (ku baba “persuadir”

Essa repetição do verbo também existe no português brasileiro e europeu, só que

o significado é diferente podendo variar de país para país. As formas anda-anda, sobe-

sobe, brinca-brinca, passa-passa e persuada-persuada não são usuais. Mas pega-

pega aparece no Brasil tanto com o significado de conflito, briga ou como o nome de

uma “brincadeira de crianças”, já em Moçambique significa acariciar, namorar ou

mesmo trabalhar, vindo do xichangana koma-koma. No português do Brasil, também é

muito usual o substantivo “corre-corre”, forma derivada do verbo “correr” com o

significado de “correria”, “agitação”, “muita pressa”, e ainda “pula-pula”, brinquedo

infantil, semelhante a uma cama elástica, substantivo derivado do verbo “pular”.

Sociolinguisticamente falando, não haveria outra justificação para o surgimento desta

reduplicação no português moçambicano, tendo em conta os contextos socioculturais

em que o português está inserido. Outra sustentação baseada em Cunha e Cintra (2008,

p.89-131), fala sobre “classe, estrutura e formação de palavras”, mas em nenhum

momento explica a formação de palavras por meio de reduplicação. Em nosso corpus,

nem todas as unidades não são formadas a partir de verbos. Considerem-se as formas:

pisco-piscando (cap. 8, p.144); advérbios: logo-logo (cap. 8, p.149); muito-muito (cap.

10, p.190) e quase-quase (cap.9, p.164). Esse fenômeno que não acontece com as LB,

também afeta os crioulos de base portuguesa na Guiné Bissau, em São Tomé e Príncipe

e em Cabo Verde. Considerem-se os exemplos abaixo. Foram extraídos de Couto e

Mello (2009, p.73-74) no artigo intitulado Os compostos no crioulo português da

Guiné Bissau:

baja ‘dançar’: baja-baja ‘dançar sem parar’

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ianda ‘andar’: ianda-ianda “andar por todos os lados”

fura ‘furar’: fura-fura “penetrar em todos os lados”

Concluindo, as reduplicações no PM se justificam pelo decalque das LB para a

LP, fenômeno este que se mostra nos textos de Mia Couto. É importante sublinhar que

existem reduplicações no português brasileiro, mas as motivações são diferentes com as

dos moçambicanos.

4.4. A pluralização de nomes (substantivos) bantu

Para melhor entendermos, quais as transformações gramaticais ocorrem nos

empréstimos vindos das línguas bantu temos que falar de classes. É porque as LB estão

organizadas em classes. O xichangana, por exemplo tem 12 classes :

SINGULAR PLURAL SINGULAR PLURAL

mu (classe 1) va (classe 2) xi (classe 7) svi (classe 8)

mu (classe 3) mi (classe 4) yi (N) (classe 9) ti (N) (classe 10

ri (classe 5) ma (classe 6) ji (classe 21) ma (classe 6)

Quadro 5: Marcação de classes na língua xichangana, segundo Sitoe (1996, p.310).

A utilização de classes nominais na LB é uma característica normal e recorrente.

Por isso que este grupo de línguas africanas foram classificadas desta forma. Ao

observarmos o Quadro 5, os prefixos nominais já indicam a flexão em número. Vejamos

a seguir alguns exemplos extraídos do corpus:

xipocos (cap.4, p.83) = fantasma matsangas (cap.3, p.49)= bandido

babalazes (cap.6, p.110)=ressaca naparamas (cap.3, p.49)= rebeldes

machongos (cap.6, p.121)=tirano xicuembos (cap.2, p.44)= deuses

Tendo em conta as regras da gramática do xichangana, o plural das unidades

lexicais xipoco, babalaze, xicuembo seria svipoco, mababalaze, svicuembo

respectivamente. No entanto, notamos nesse conjunto, o uso das regras da LP (o uso do

grafema -s) para marcar o plural. A construção da LP mais simples, parece servir de

modelo. É por isso que as palavras da LB ficaram aportuguesadas com o acréscimo do -

s final. Entendemos que houve duas regras de pluralização de duas línguas: -s do

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português e ma- da língua xichangana. Exemplo: matrangas, isto porque o singular

seria tsanga em LB.

4.5. Variação semântica e transformações de português para xichangana e depois

para português

a) A palavra xicalamidade (cap.3, p.57)

Num primeiro momento, a palavra calamidade pertence ao repertório lexical da

LP foi assimilada pelos falantes e passou a fazer parte do léxico do xichangana sob

forma de xicalamidade, cujo plural é svicalamidade. Num segundo momento, as

unidades assimiladas pela LB voltaram a ser incorporadas ao português moçambicano

como xicalamidades com “s” final. No contexto moçambicano, xicalamidade ou

calamidade significa “roupa usada importada” (Dias, 2002, p.74). A palavra

“calamidade” perdeu o valor semântico de origem e ganhou outro significado em

Moçambique, resultado de contextos sócio-históricos do país.

b) A palavra satanhoca (cap.4, p.67) provém de satanás, forma da LP que passou

para a língua xichangana como “satanhoco”, ou “sàthanyokò” de sàthana “diabo”+

nhòka (cobra) forma usada tanto no xichangana como no português de Moçambique

para insultar o interlocutor (Sitoe, 1996, p.207). Ao longo dos tempos evoluiu para

musathànhyokò como moçambicanismo (cf. Lindegaard, s.d.). Conforme se pode notar

nesse exemplo, a padronização da ortografia dos moçambicanismos ainda não é

consenso.

c) O verbo “bichar”.

“Elas primeiro se alarmam, depois fazem uma roda, bichanando.” (p.187)

Nesta frase, bichanando vem do verbo “bichar” que significa “fazer fila” no

português brasileiro. Em Moçambique fala-se “vou bichar” ou “vou fazer bicha” para se

referir ao fazer fila. É claro que existe a palavra “fila”, mas a palavra usada no contexto

moçambicano é “bicha” exatamente como na variante de Portugal.

d) O substantivo “quinhenta”

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“Quem estiver contra mim não vai cheirar quinhenta.” (p.128)

No português falado em Moçambique a unidade lexical “quinhentas” refere-se a

“dinheiro”. Quando entrou na nova moeda (o Metical) que veio substituir a moeda

colonial (o escudo) surgiram notas (cédulas) e moedas (em centavos). A moeda de 50

centavos de meticais ficou conhecido por “quinhentas”. Ao longo do tempo quinhenta

passou a ser usada para designar “dinheiro”. Se alguém disser: “Não tenho nem um

quinhentas!” estará dizendo que “não tem dinheiro algum”. Quinhenta é substantivo,

feminino segundo Dias (2002, p.206). Mia Couto também usa essa unidade do léxico

moçambicano em sua obra para se referir a “dinheiro”.

Os neologismos sangues (cap.8, p.146), maistravez (cap.1, p.33) e ninguéns

(cap.6, p.121) marcaram, ao nosso ver, o ponto mais alto da criatividade linguística de

Couto, pois em nenhum momento pensa que seria possível fazer o plural de sangue e

ninguém resultando em sangues e ninguéns. Não imaginávamos podia juntar

mais+travez. Reparemos que não conheço travez com “z” mas sim com través com

“s”. Mas Couto foi mais longe ao nosso ver, de tal forma que não entendemos o que ele

quis dizer com o neologismo maistravez no contexto da frase. Na verdade, os escritores

têm essa liberdade de criar, de manipular a língua, criações que podem permanecer por

muito tempo outras desaparecem ou ficam no texto. Essa liberdade dos escritores é

pouco tolerada na comunicação cotidiana, isto porque a língua oral é bem diferente com

a escrita.

Considerações finais

É importante sublinhar que os alunos do Ensino Fundamental, Médio e Superior

nas escolas moçambicanas são incentivados a ler, ou melhor, a valorizar a literatura

moçambicana em primeiro lugar. E cumpre-nos igualmente reconhecer que os

estrangeirismos, os empréstimos e os neologismos são frequentes tanto na mídia

imprensa como na literatura moçambicana. Entretanto, os textos jornalísticos, bem

como os textos literários de Mia Couto, são lidos (explorados gramaticalmente) em sala

de aula e os professores não toleram o uso de neologismos e estrangeirismos. A

realidade do ensino /aprendizagem da LP é por demais contraditória em Moçambique.

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Em nenhum momento acabemos as nossas forças procurando conservar e proteger

português Europeu, visto que os empréstimos e os estrangeirismos são fenômenos

naturais e a evolução das línguas é um movimento inexorável. Várias leis foram e

continuam sendo criadas na tentativa de preservar o português de Moçambique dessa

“invasão” de palavras estrangeiras, mas trata-se de força inelutável. As línguas são

dinâmicas quando são usadas. O contato cada vez mais premente entre povos línguas

propicia a expansão cada vez mais. As palavras surgem no contexto de uso. Algumas

ficam outras desaparecem com o tempo. Somente a necessidade do uso definirá quais as

palavras novas serão dicionarizadas. No caso do ensino em Moçambique, as crianças

que têm acesso à literatura moçambicana na escola serão os futuros usuários da língua e

inevitavelmente desses neologismos. Os estrangeirismos usados no dia a dia não apenas

deveriam ser reconhecidos na escola, como deveriam servir de tema para reflexão e

análise como testemunho da mudança linguística.

Concluímos que no romance de Couto, há predominância de estrangeirismos

vindos das línguas bantu já que nas cartas de opinião do leitor, para além do bantu

temos a presença do inglês e latim. Nessas cartas não há neologismos bem elaborados

como no romance. Couto “brinca” com as palavras, cria palavras novas por meio de

afixos, por justaposições e aglutinações. Tudo indica que a formação dos neologismos

em Couto foi bem pensada, intencionalmente elaborada com objetivo de impressionar o

público. Nas cartas, não há essa preocupação e parece-nos que os que o leitor escreve tal

como fala. No caso do léxico de Couto, improvável que ele se comunique no cotidiano

usando repertório lexical semelhante.

Observando o Comparando os dois corpora notamos que nos empréstimos

vindos do xichangana seguiu-se a mesma regra de formação do plural das palavras em

LP ao invés da regra da língua de origem, a LB. Em Mia Couto temos xipalapala-

xipalapalas, xicuemebo-xicuembos. O estrangeirismo xipefo “lamparina” (do

xichangana) foi encontrado nos dois corpora com grafias diferentes. Vimos que a

instabilidade ortográfica é problema grave nas LB, embora estas estejam padronizadas

desde 1999, ainda há dificuldade e insegurança na escrita.

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Sendo as criações lexicais não só estão presentes na literatura, mas também na

comunicação cotidiana, como mostram Dias (1991, 2009), Timbane (2012a,b) e Lopes

(2004). Acredito que neste artigo perceberam marcas do português moçambicano que

aparece de forma natural na nossa fala. O português moçambicano existe da mesma

forma que o português angolano, brasileiro existem na fala/escrita de angolanos e

brasileiros respectivamente.

O importante a ser retido nesta pesquisa é que já que os textos literários entram

na sala de aula através de manuais escolares é necessário que os professores estejam

preparados psico-pedagogicamente. Em Mia Couto notou a formação de novas palavras

por meio de afixos (dentro da matriz interna) bem como os estrangeirismos (matriz

externa). Os estrangeirismos, na sua maioria, provêm das diversas línguas bantu faladas

em Moçambique. O autor do texto tem contato com essas línguas e as suas personagens

obviamente recebem interferências destas. É importante referir que o cenário principal

do romance Terra sonâmbula é Moçambique e logo, as características

sociolinguísticas dos personagens refletem essa realidade.

Sabendo que as crianças são o futuro, ao aprender alguns neologismos em

textos, alguns ficarão na memória outras ainda serão esquecidas. As que permanecem

podem servir de reforço lexical para a variedade do português moçambicano. As

palavras xicandarinha (chaleira), xiconhoca (traidor da pátria) apareceram com mais

ênfase na literatura moçambicana, concretamente em texto de José Craveirinha.

Terminamos esta pesquisa rematando que o estudo da variedade moçambicana é um

desafio para todos os professores e linguistas porque ainda não existe dicionário nem

gramática. É importante Moçambique caminhar de forma determinada para a descrição

da sua variedade, divulgando pesquisas para que o preconceito diminua com relação à

variedade de Moçambique. O português de Moçambique faz parte da vida dos

moçambicanos. Pode-se sentir isso nos meios de comunicação, na sala de aula e na

literatura (tal como tentamos mostrar nesta pesquisa). O ensino em Moçambique ainda

continua refém do “padrão-europeu” de tal forma a que os índices de reprovações

continuam elevados fato que resulta no abandono escolar, principalmente nas zonas

rurais onde o português é segunda ou terceira língua.

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Recebido Para Publicação em 04 de outubro de 2013.

Aprovado Para Publicação em 23 de novembro de 2013.