bancário não é vendedor

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Page 1: Bancário não é vendedor

Cartilha:

BANCÁRIO NÃO É VENDEDOR!

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APRESENTAÇÃO

Diariamente os bancários são convencidos pela patronal, por meio de discursos nas reuniões,informativos da empresa, cursos de formação, etc., de que devem trabalhar como vendedores. Sãoconvencidos de que “o trabalhador é quem faz seu próprio salário”, ou seja, quanto mais vendermais acesso terá a cargos e comissões mais elevadas, e assim por diante. São levados a construir umambiente de individualismo e isolamento entre os trabalhadores.

Somos contra esse discurso. O trabalho bancário não é simplesmente um trabalho de venda.Bancários são prestadores de serviço, não apenas vendedores. Essa diferença está nos manuaisacadêmicos de qualquer curso de administração ou assemelhados. Para ficar em apenas umexemplo, vejamos:

“O marketing de produtos destina-se a bens de consumo não duráveis, como alimentação, produtosde higiene pessoal, vestuário; produtos duráveis, com eletrodomésticos, automóveis, objetos de arte,moveis. Este bens tem uma característica tangível ou seja podem ser produzidos, examinados, comocolocados em estoque, transportados pelo comprador antes que a transação seja finalizada com ovendedor que oferece e, eventualmente efetua a venda.”(…)

“Os serviços são intangíveis , isto é, não é possível ver suas características antes dos mesmos seremcomprados e usados pelos usuários.

Ao contrário dos produtos os serviços não podem ser colocados em ” estoque” ou seja, devem serproduzidos e usados no momento da transação, por exemplo: quando um cliente perde um horáriomarcado no médico, o profissional não colocar em estoque a hora ociosa; da mesma forma se nãohouver horas marcadas o horário vazio do profissional será inevitavelmente perdido em termos derenda.

A terceira diferença entre serviços e produtos está no fato de que quem presta o serviço deveránecessariamente estar em contato com quem recebe, por exemplo: em uma boa aula de ginástica,sempre haverá um trainner e um aluno. (http://www.portaldomarketing.com.br/Artigos/Marketing%20de%20servicos.htm)”

Em resumo, na venda de um produto a relação entre comprador e o vendedor se encerra com aentrega da mercadoria. Na prestação de um serviço a relação entre o prestador e o clientepermanece ao longo do tempo. Ora, os chamados “produtos bancários” criam uma relação em queos correntistas, donos de cartões de crédito, seguros, planos de previdência, etc., permanecemfreqüentando as agências bancárias e demandando atendimento dos trabalhadores. Atendimentosignifica trabalho por parte do bancário, cuja jornada não se resume, portanto, ao ato de vender.

O banco pressiona os trabalhadores a apenas vender, e faz de conta que o atendimento não existe. Ovolume de serviço é subestimado e a quantidade de mão de obra é subdimensionada. Os bancos têmcada vez menos funcionários, os quais precisam atender uma quantidade maior de clientes. Dianteda insatisfação dos trabalhadores, os bancos respondem que a saída é a busca individual pormelhores cargos e comissões.

Nós respondemos que a saída é a luta coletiva de todos aqueles que sofrem com a constantedegradação das condições de trabalho.

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No texto que apresentamos a seguir fazemos a discussão sobre algumas das características dotrabalho bancário nas últimas décadas. Na primeira parte, temos um breve histórico dastransformações que os bancos têm imposto à categoria bancária nas últimas duas décadas. Nasegunda parte, fazemos o estudo do dinheiro, a “matéria-prima” do trabalho bancário e suas funçõesna economia. Na terceira parte, finalmente, apresentamos alguns detalhes sobre os chamados“produtos bancários”.

A partir de um estudo científico do funcionamento do negócio bancário, buscamos fornecerelementos para a luta por melhores condições de trabalho nas agências e departamentos.

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I- ATAQUES DOS BANQUEIROS CONTRA A CATEGORIA NOS ÚLTIMOS 20 ANOS

1.1.Desemprego em massa.

Uma característica dos bancos é uma alta composição orgânica do capital, isto é, uma maiorproporção do capital fixo (imóveis, máquinas, computadores, terminais eletrônicos, etc) em relaçãoao capital variável (salário). O setor bancário é altamente informatizado, empregando pouca mão-de-obra. Na medida em que avança a informatização de serviços, menos necessário é o trabalhovivo, prestado pelos bancários. Por isso que cada reestruturação produtiva/administrativa vemsempre acompanhada de demissões em massa.

Esse movimento foi muito intenso na década de 1990, com a abertura do mercado nacional e, aomesmo tempo, a reestruturação produtiva das empresas. Essa mudança radical exigiu um aumentoainda maior do capital fixo em relação ao variável no conjunto da economia. Para que as empresastivessem capital-dinheiro para investir, e financiar a reestruturação produtiva brasileira, foinecessário readaptar o sistema financeiro e os bancos. Essa adaptação se intensificou após aimplantação do Plano Real, que tornou ainda obsoleta uma grande quantidade de agências e formasde atendimento de balcão. Havia a necessidade de “enxugar a estrutura corporativa”

O resultado disso foi um forte processo de demissão em massa, principalmente após 1994. Foramdesencadeados diversos planos de demissão voluntária (PDVs), nos quais milhares de bancários sedesligaram da categoria. Este processo foi ainda mais radical nos bancos estatais, sobretudo noBanco do Brasil. Sob o governo do PSDB, além do PDV de 1995, o BB simplesmente demitia semjusta causa.

1.2. Fusões e incorporações

Ao contrário do que pregam os teóricos burgueses, a livre-concorrência tende para a concentraçãode capital e ao monopólio/oligopólio. As empresas maiores compram as menores ou suas rivaisderrotadas na concorrência, diminuindo o número de concorrentes no mercado e estabelecendo umasituação de monopólio/oligopólio. Com o perecimento de várias instituições financeiras no curso dareestruturação dos anos 1990, alguns bancos fecharam e outros foram adquiridos pelas instituiçõesmaiores. Nos últimos 20 anos podemos aqui citar as principais aquisições: O BRADESCO adquiriu,o BCN, FINASA, etc; o ITAÚ adquiriu o BANERJ, UNIBANCO, BANK BOSTON, o Santanderadquiriu o Noroeste, o Banespa, o Real. O Banco do Brasil comprou o BEP, o BESC, a Nossa Caixae ultimamente adquiriu 49% do Banco Votorantim.

Cada fusão/aquisição traz a necessidade de uma nova reestruturação corporativa para viabilizarretornos e maximizar lucros. Setores “redundantes” nas duas empresas precisam ser reduzidos parase enquadrar nas necessidades da nova empresa unificada. Daí a necessidade de demitir em massa,forçar aposentadorias “compulsórias”, precarizar as relações trabalhistas e impor uma maiorintensificação do trabalho. Com a diminuição do número de funcionários nos bancos e aintensificação da exploração sobre a mão-de-obra remanescente, a saída foi fraudar a jornada de 6horas, conquista histórica da categoria bancária, mediante a criação de funções de “gerência” e“assistentes” com jornadas de 8 horas.

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1.3. Segmentação da categoria

A segmentação da categoria bancária é mais uma criação típica da ideologia neoliberal, sob ajustificativa de “modernizar as relações de trabalho”. Trata de excluir juridicamente, mas não naprática, determinados trabalhadores dos bancos. No início, esta ficção se restringia às atividades quenão eram a finalidade da atividade bancária, como serviços de copa, segurança, telefonistas,secretaria, etc. Todos os trabalhadores destes setores deixaram de ser considerados formalmentecomo bancários, ainda que trabalhem nos bancos e continuem a contribuir para os lucros bilionáriosdas instituições financeiras. Essa medida serve para afundar o nível dos salários da categoria emaximizar os lucros. Os trabalhadores terceirizados recebem até ¼ dos salários dos bancários devinculo direito.

Ainda no governo de FHC, o Banco Central baixou a Resolução nº 2.707/2000, a qual permitiu queos bancos terceirizassem atividades-fim, como processamento de envelopes de depósito e aberturade contas. Esses serviços passaram a ser feitos por trabalhadores terceirizados que recebem saláriosmuito inferiores em relação aos bancários de vinculo direto formal.

Por último, os bancos montam estabelecimentos inteiros para conceder crédito pessoal e paraatender os clientes que não têm condições de abrir contas bancárias e são por isso discriminadospelos gestores como meros “usuários”. Assim, praticamente todos os bancos possuem umafinanceira especializada em empréstimos para trabalhadores que precisam pagar suas contas eresolver pendências administrativas.

1.4. Transformação dos bancários em vendedores (comerciários)

Conforme vimos, nos últimos 20 anos, os banqueiros fizeram de tudo que foi possível para afundaro nível dos salários e aumentar a jornada de trabalho. A terceirização criou uma subcategoria dequase 200.000 trabalhadores com salários rebaixados(http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:lYTU9n38bzAJ:jus.uol.com.br/revista/texto/13517/empresarios-e-trabalhadores-diante-da-regulamentacao-da-terceirizacao-no-brasil+numero+terceirizados+bancos&cd=3&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br&source=www.google.com.br).

Agora a “moda” é bombardear ideologicamente o bancário para fazê-lo acreditar que não ébancário, mas um vendedor de produtos, como se fosse comerciário. Caso os banqueiros consigamconvencer os bancários de que são vendedores, isso trará desdobramentos práticos desastrosos: osbancários poderiam ser equiparados à comerciários. Isso implica em mudanças como a remuneraçãovariável (em que as comissões por venda se tornam cada vez mais importantes em relação aosalário), trabalho aos finais de semana e feriados, jornadas infindáveis de trabalho e condições detrabalho ainda piores, salários rebaixados, etc. A meta dos banqueiros é acabar com as conquistassociais da categoria bancária em termos de jornada, condições de trabalho, etc., de modo que ostrabalhadores deixem de ser bancários, ainda que na prática todos ainda trabalhem em bancos.

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II – DINHEIRO COMO MERCADORIA DOS BANCOS.

2.1. O que é dinheiro;

O dinheiro é, antes de mais nada, uma relação social que se cristaliza numa mercadoria. Nacivilização antiga, o dinheiro poderia ser qualquer coisa que viabilizasse a troca entre produtos dediferentes produtores. Os trabalhadores agrícolas, pastores, pescadores, artesãos de diversos tipos,precisavam de um meio de troca comum pelo qual pudessem trocar produtos de qualidadesdiferentes segundo quantidades mais ou menos fixas. Esse meio de troca comum é uma mercadoriaespecial, que assume assim a função de dinheiro. Diversas mercadorias especiais foram usadas nafunção de dinheiro, como o sal, o gado, e por fim os metais preciosos como prata e ouro. Oestabelecimento do dinheiro como meio de troca permitiu que todas as outras mercadoriaspudessem ser reduzidas a uma quantidade determinada de dinheiro.

Com o desenvolvimento do capitalismo, o dinheiro passou a ter também a função de capital. Masnum sistema socioeconômico fundado sobre a desigualdade, a quantidade de dinheiro (meio decirculação) começava a ser um entrave para dar vazão à produção e à acumulação capitalista, sejapelo esgotamento das minas de metais preciosos, seja pelo desgastes das moedas metálicas (osvalores das moedas eram medidas pelo seus pesos, o que possibilitaria a fraudes). Por isso se tornounecessário substituir os metais preciosos por papel moeda, o que veio junto com o desenvolvimentodo sistema de crédito. A emissão de papel moeda tinha que corresponder a uma quantidadedeterminada de metal precioso depositado no Tesouro. Assim, o papel-moeda não é dinheiro, masseu símbolo.

Não adentraremos nos pormenores da relação do papel-moeda com o seu lastro, que acabaria pordesviar do objetivo central deste material. Assim, para fins didáticos, adotaremos o papel-moedacomo dinheiro propriamente dito, bem como os créditos e débitos de acertos contábeis.

2.2 Funções do dinheiro: a) meio de compra e b) meio de pagamento;

Vimos que, antes do capitalismo, o dinheiro era uma mercadoria cuja única utilidade era viabilizaras trocas de outras mercadorias. Todas elas eram mensuráveis em dinheiro. Neste sistema deprodução e circulação simples das mercadorias, o movimento era a seguinte: M-D-M. Traduzindo:as pessoas de posse das mercadorias excedentes, confrontavam-se comprador e vendedor. Um comdinheiro e outro com a mercadoria, no momento em que se dá a metamorfose em que a mercadoriavira dinheiro e o dinheiro se converte em mercadoria ao mesmo tempo. Mas a preocupação de tantodo comprador quanto do vendedor não era de fazer da troca um negócio. No presente caso ninguémobteve lucro com a transação. A preocupação de ambos era resolver uma questão prática da vidacotidiana numa sociedade pré-capitalista:Ambos tinham excedentes e ambos precisavam de uma mercadoria específica.

Com surgimento do capitalismo, o movimento da riqueza mudou de qualidade. Antes, o detentor damercadoria o convertia em dinheiro para conseguir uma outra mercadoria de sua necessidade.Agora, o movimento de circulação é D-M-D’, em que D’= d + m, em que m= mais-valia ou lucro.O burguês entra no mercado com dinheiro, com o qual adquire mercadorias para vendê-las e comisso extrair da circulação mais dinheiro do que investiu. Com este montante, o burguês reinveste naprodução, adquire novas mercadorias a serem trocadas por mais dinheiro, e a circulação recomeça oseu ciclo. Nesta situação de circulação simples, o dinheiro é empregado como meio de circulação,

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ou trocado em miúdos, um “toma-lá-dá-cá”. O dinheiro é também conhecido como meio de compra,ou seja, quando a metamorfose de dinheiro em mercadoria e vice-versa (e ao mesmo tempo) éinstantânea, encerrando assim a efêmera relação comercial. Aqui não há qualquer preocupação deambos sobre o que os detentores do dinheiro e da mercadoria vão fazer com o resultado datransação. Porém, para facilitar os nossos estudos, o meio de compra, ou meio de circulação, é onome que se dá para o dinheiro empregado como recurso próprio para pagamento à vista, na“bucha”, “uma em cima da outra”.

Ocorre que o processo de circulação e acumulação de capital não funciona como um “reloginho”com sincronia perfeita entre oferta e procura, seja porque as mercadorias ficam distantes domercado consumidor, seja porque o processo de produção de determinadas mercadorias demandaum longo tempo, etc. Assim, é comum que os compradores não tenham as mercadorias à suadisposição, ou ainda que as tenham, não possuem dinheiro para adquiri-las naquele momento.Manifestou-se assim a necessidade de se vender sem comprar, o que necessariamente significa quena outra ponta da transação há alguém que compra sem vender. Isso na pratica significa pagar oureceber a mercadoria antes da venda ou compra, processo que é formalizado em algum título(duplicata, por exemplo). Um atacadista compra um lote de refrigerantes diretamente da indústria,mas não dispõe de dinheiro para efetuar a transação. No meio comercial, o negócio é fechado e oprodutor entrega o lote pedido de bebidas e emite uma duplicata com vencimento futuro (30 dias,por exemplo), sem ter recebido um centavo sequer no ato da entrega das mercadorias para ocomerciante. O pagamento se dará no termo final da duplicata. Muitas vezes, o prazo para opagamento leva em consideração as possibilidades de escoamento das mercadorias para que elas “sepaguem”. O nosso comerciante (nas condições “normais de temperatura e pressão”) vende todo olote de refrigerantes e com o montante obtido das vendas paga a duplicata emitida na entrega dasmercadorias, já deduzidos todas as despesas inerentes (funcionários, aluguéis, etc).

Por outro lado, o industrial entregou as mercadorias, mas o dinheiro que espera obter com a vendapara o atacadista só ingressará após 30 dias, sem que, no entanto, a indústria possa cessar aprodução e deixar de satisfazer todas as despesas ordinárias recorrentes necessárias para permitirque se vendam mais lotes de refrigerantes. É necessário que a fábrica de bebidas tenha capital, quepode ser obtido alienando as duplicatas a receber, ou recorrendo a um fundo de reserva da fábrica(uma espécie de “poupança”), ou ainda, poderá recorrer aos empréstimos bancários. Isso tambémserve para o atacadista, caso ele não consiga vender o lote de refrigerantes até o vencimento daduplicata, isto é, quando as vendas “não se pagam”.

Assim, vender sem comprar e comprar sem vender significa necessariamente falarmos de crédito. Enestes casos, o dinheiro tem a função de meio de pagamento, pois uma das partes do pólo dametamorfose da circulação D-M-D’ foi feita antes de se completar o seu movimento inversocorrespondente: o fabricante entrega a mercadoria (M) antes de receber a quantia correspondentepelo atacadista (D, mas face ao fabricante, é D’). Caso ambos movimentos se dessem de formasimultânea, o dinheiro teria função de meio de circulação, que foi objeto de nosso estudo acima.

O dinheiro como meio de pagamento também é usado pelo consumidor final para compras à prazo efinanciamentos. Este crédito pode ser obtido diretamente com o vendedor, ou também recorrendoaos bancos mediante crédito direto ao consumidor, por exemplo. Mas nesses casos o dinheirocumpre as duas funções e ao mesmo tempo. Os recursos levantados no banco para a compra de umaTV de plasma são meio de compra face à loja, e o banco entra no lugar que seria da loja nestarelação. Assim, as prestações a serem pagas pelo feliz proprietário do aparelho seriam meio depagamento face à instituição financeira que concedeu o crédito

Disso se conclui que o crédito é um “milagre” do capitalismo, pois permite fazer circular asmercadorias sem que haja lastro correspondente. Isso faz com que se acelere a circulação das

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mercadorias e permite maior crescimento econômico… Mas esse crescimento é fictício, pois odesenvolvimento do mercado de crédito é acompanhado pelo aumento do endividamento, que éuma contradição. A sustentação deste processo é a capacidade de saldamento das dívidas. Uma vezesgotada esta capacidade pela inadimplência, interrompe-se bruscamente o processo de circulação enão há mais escoamento de mercadorias, comprometendo todo o sistema produtivo. São as criseseconômicas, como esta que vivenciamos desde finais de 2007 em escala mundial.

2.3 Movimento simples do dinheiro nos bancos D-D’

No item anterior começamos a ver como os bancos são importantes para o desenvolvimento dosistema de crédito e para o funcionamento do processo de circulação e acumulação do capital.Também vimos qual a função do dinheiro no processo de circulação. Agora estudaremos a relaçãodos bancos com o dinheiro.

Como já foi dito, o processo de circulação e acumulação não funciona em sincronia fina, como umrelógio, ou guiado por uma “mão-invisível”. Muitas vezes, ainda que haja oferta e demanda, podehaver outros elementos que perturbem este processo, como quebra de safra, problemas climáticos,falta de infraestrutura, taxas alfandegárias, etc. Pode inclusive acontecer que, ao contrário, algumas(ou todas) as condições mudem favoravelmente, de forma que a oferta seja exaurida muito maisrápido do que se esperava. Assim, haverá ocasiões no processo de circulação em que determinadossetores da economia terão sobra de capital-dinheiro, bem como haverá ocasiões em quedeterminados setores necessitarão recorrer a uma fonte externa de recursos para manter o processoem funcionamento. Desta forma, quando há sobra de capital-dinheiro, deposita-se no banco. Masquando há falta, recorre-se aos bancos para levantar capital-dinheiro para dar continuidade aoprocesso. É esta entrada e saída de dinheiro que caracteriza o setor bancário: recebe e repassa. Deum lado, os depositantes confiam no banqueiro para que guardem o vil metal, oferecendo umapequena remuneração, que são os juros pagos ao poupador ou aplicador para deixar seu dinheiroinvestido; do outro lado, o banqueiro concede empréstimos (com garantia ou não) utilizando osmesmos recursos depositados na sólida instituição financeira, recebendo em troca um valor maiorem juros.No papel que cabe aos bancos no processo de circulação e acumulação do capital, a mercadoriautilizada é o próprio dinheiro, dentro daquele movimento D-M-D’. Como o “M” aqui é nada maisdo que dinheiro, isto é “D”, então a movimentação é D-D-D’. Simplificando a movimentaçãoacima, então temos D D’, em que D’= d+l, em que “l” é o lucro do banqueiro.

Trata-se do supra-sumo do fetiche capitalista: captar dinheiro para emprestar e fazer mais dinheiro,mediante cobrança de juros. O banco capta dinheiro barato (pagando juros baixos aos poupadores) epara “vendê-lo” mais caro (cobrando juros altos dos devedores). A diferença entre o juro que é pagopelo banqueiro ao aplicador e o juro que é recebido pelo banqueiro do devedor é chamado de“spread” bancário, é a fonte do seu lucro. É a isso que se resume o trabalho bancário deintermediação financeira. O banco não produz nenhuma mercadoria física, ele trabalha com umamercadoria especial, que é o dinheiro.O lucro do banco, conforme explicaremos adiante, é uma parte do lucro total do setor capitalista,que é apropriado pelo setor financeiro em troca desse serviço de facilitar e acelerar a circulação demercadorias adiantando meio de pagamento na forma de crédito.

A afirmação de que o bancário não é um prestador de serviços financeiros, mas um vendedor, nãopassa de um devaneio, de uma ignorância sem precedentes. Primeiro porque o banco não produzmercadorias físicas; e segundo, exatamente por isso, os bancos não produzem mais-valia. O lucro

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dos bancos se origina na agiotagem, na diferença entre juros pagos e juros recebidos, e não naprodução ou circulação de mercadorias. Assim, a afirmação de que o bancário é um vendedor temuma função puramente ideológica de convencer os trabalhadores a aceitar formas cada vez maisintensas de exploração.

Agora convém saber o que determina o lucro dos bancos, isto é, o juro. Do ponto de vista daaparência, basta jogar uma percentagem sobre a base de cálculo do montante e a partir daí teríamoso juro. Ocorre que não nos contentamos com as aparências. Queremos chegar à essência das coisas.Diante disso, surge outra pergunta: o que determina que num determinado tempo e espaço a taxa dejuros seja “x”, “y”, ou “z”?

O que determina que alguém fixe um número como parâmetro para servir de taxa de juros?

A resposta é a taxa de lucro, ou lucratividade média dos setores produtivos de um determinado paísou grupo de países. Quanto maior é a taxa de lucro realizada pelos patrões, maior é a taxa de juros.Mas isso serve apenas para períodos de estabilidade econômica. Isso explica, por exemplo, porqueas taxas de juros praticadas pelos bancos aqui no Brasil são muito maiores do que qualquer paísdesenvolvido, pois aqui a taxa de lucro é maior do que nos países desenvolvidos. É evidente que emtempos de crise cíclica ou estrutural (como a atual) há outros fatores que também influenciam a altaou a baixa dos juros. Em épocas de crise, por exemplo, o dinheiro (na sua forma de meio depagamento, ou seja, crédito) é mais escasso, de forma que as pessoas estão dispostas a pagar jurosmaiores para captação do capital-dinheiro, e os bancos, por sua vez, elevam as taxas de juros pelofato do meio circulante estar escasso.

Até agora, explicamos o movimento simplificado do dinheiro nos bancos. Capta-se para depoisemprestar.

Com o desenvolvimento do sistema financeiro, as formas de captação e de empréstimos sãomúltiplas. Porém apenas vamos deter nossas atenções para as formas de captação de recursos pelosbanqueiros, que podem ser públicos e privados. Por ora, não consideraremos os recursos públicos(como o Fundo de Amparo ao Trabalhador, que curiosamente é utilizado para o patrão obter lucros)e privados (como fundos de pensão). Trabalharemos com as formas de captação de capital-dinheirosurgidas no dia-dia das agências, causa de tantas doenças e sofrimentos psíquicos a que nósbancários estamos submetidos.

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III – “PRODUTOS” BANCÁRIOS (captação)

3.1. Impropriedade do termo “produto”;

Nas linhas acima vimos, de forma simplificada, que os bancos captam dinheiro barato e emprestammediante juros, auferindo, assim, um lucro. Os banqueiros não colocam a mão no bolso para fazerfuncionar o seu negócio. Os recursos utilizados para tal mister são oriundos, em boa parte, de suabase própria de clientes depositários. Esta entrada e saída de dinheiro (seja para meio de compra oumeio de pagamento) se realiza por meio dos diversos serviços bancários executados pelostrabalhadores dos bancos. Logo, o nome de “produto” dados pelos gestores aos serviços prestadosde intermediação financeira pelos bancários é bastante inapropriado.

Isso significa que os banqueiros e sua tropa de choque de administradores são burros? Não, pois asua ignorância teórica esconde a esperteza prática de quererem equiparar os bancários a vendedores.A tentativa de convencer o bancário de que não é um prestador de serviços, de que não é umbancário, visa impor uma forma de relacionamento que é a mesma que vigora no comércio(remuneração variável, trabalho aos fins de semana, etc.), ou seja, impor a condição de comerciárioao trabalhador dos bancos, retirando todos os direitos conquistados com muita luta, como, porexemplo, a jornada de seis horas. Essa transformação gradual de bancários em comerciáriosacontece em etapas, por meio de processos como a terceirização. Ou ainda, o tratamento queclassifica como bancários apenas aqueles trabalhadores que nas agências celebram o contrato decaptação de dinheiro diretamente com o cliente, excluindo da condição de bancários todos osdemais trabalhadores que não trabalham nas agências, embora estes dêem todo o suporte necessáriopara a viabilidade do serviço de captação, como, por exemplo, análise de documentos paracontratação de crédito imobiliário, etc.

Portanto, não são os nomes das funções que determinam o que o bancário faz, mas é o que ele faz éque determina os nomes, por mais que os banqueiros e o governo digam o contrário. Por isso, queos meios de captação nas agências executados por nós SÃO SERVIÇOS DE INTERMEDIAÇÃOFINANCEIRA e que nós bancários SOMOS PRESTADORES DE SERVIÇOS, SIM.

3.2. O que está por trás do assédio para a contratação de serviços bancários (fidelização)

Com o desenvolvimento do sistema financeiro, combinado com o processo de concentração decapital na forma de uma tendência ao oligopólio (domínio do mercado por um grupo restrito deempresas) é muito comum que as instituições financeiras façam algum teatro de uma fictíciaconcorrência, como se houvesse diferenças entre os serviços que oferecem. No setor bancário, asformas de captação são exatamente iguais.

Os serviços existentes em cada banco são os mesmos oferecidos por todos os outros. Toda equalquer instituição financeira oferece títulos de capitalização, seguros, planos de previdência,consórcio, investimentos, etc, etc, etc. Todos os dias somos assediados para “vender” esses“produtos”, bater metas (muitas vezes pelos métodos mais questionáveis e ilegais) para alavancar osresultados do banco. Mas se observarmos bem, os resultados financeiros advindos da prestaçãodestes serviços são bastante modestos.

Vejamos os seguintes números:

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“No terceiro trimestre de 2010, a participação dos produtos de seguridade nos lucros do Bradescofoi de 29%, no Itaú Unibanco esse número foi de 13%. No Banco do Brasil, a participação tambémé de 13%.” (Fonte: Brasil Econômico – 17/11/2010 – http://www.blog.leonseg.com.br/seguros-elevam-lucro-dos-bancos/)

Ou ainda:

“O Bradesco é o banco que prioriza a atividade de seguros e previdência com mais ênfase dentro dosistema financeiro e por isso tem o maior ganho entre seus concorrentes. As seguradoras de bancoscomo BB, Itaú e Caixa, por exemplo, apresentam, em média, ganho equivalente a 10% do totalconsolidado do conglomerado.”(http://vocesa.abril.com.br/blog/seguro-sa/2011/01/.)

O grosso do lucro dos bancos provém da concessão de crédito. Coloca-se assim uma perguntaóbvia: por que massacrar os bancários com metas “inúteis” de venda tendo em vista que o impactoda contratação de tais serviços nos lucros bancários é muito pequeno?

O objetivo do banco com a prestação de tais serviços não é diretamente a captação de recursos, masa fidelização dos correntistas. Tendo em vista que é muito fácil abrir e fechar conta-corrente, ouentão, que é possível ter contas em diversos bancos, os serviços de captação fazem com que osclientes mantenham um vínculo mais forte com os bancos que oferecem tais serviços. Ao contratarum seguro ou título de previdência com determinado banco, o cliente mantém uma relação maisestreita com este banco, concentrando seus recursos, viabilizando a captação de recursos por umlongo tempo. Por exemplo, a “venda” de um título da capitalização em 48 mensalidades transformao cliente numa fonte permanente de captação de recursos por 4 anos com uma única simplesassinatura do correntista. Com isso, o banco pode especular para obter lucros no mercado de créditoou ainda na bolsa. O raciocínio serve para os demais serviços de captação prestados por nósbancários, dentro das características peculiares de cada serviço.

Assim, o que está por trás de toda e qualquer meta é transformar cada correntista em uma fontemais duradoura possível de recursos, também conhecido pelo simpático nome de “fidelização”. Masna verdade trata-se de lançar ao cliente diversos grilhões para servir aos bancos. O lucro não está noserviço de captação em si, mas o que se faz com o resultado dele no ato do recebimento dos jurosdos empréstimos concedidos

Vejamos a seguir as principais formas de captação dos banqueiros, bem como as suaspeculiaridades.

3.3. Título de capitalização;

Trata-se de um contrato bancário em que o correntista se compromete a fazer depósitos periódicos(mas pode ser depósito único também) na instituição financeira e em troca, concorre a prêmios emdinheiro, como se fosse uma loteria. Caso o correntista não seja sorteado até o final do planocontratado, ele receberá, ou não, o valor corrigido apenas pela TR, isto é, uma rentabilidade menordo que a poupança. Torna-se evidente que o atrativo do plano só poder ser a POSSIBLIDADE deser sorteado para ganhar uma bolada em dinheiro, pois como investimento é um péssimo negócio.

O fato dos depósitos serem corrigidos apenas pela TR faz com que sejamos diariamentebombardeados com metas envolvendo este tipo de contrato. Afinal, o dinheiro que é captado viacapitalização é usado para que o banqueiro empreste a juros exorbitantes. Ademais, o Título de

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Capitalização tem sua liquidez bastante reduzida em comparação com a poupança. Os planoscostumam desencorajar a desistência do correntista antes do final do prazo retendo parte dosdepósitos efetuados. Por exemplo, num plano de 36 depósitos mensais, caso o correntista queira sairdo plano depois de, digamos, 15 meses, tendo efetuado 15 depósitos, ele não vai receber de volta ototal que depositou, mas, por exemplo, apenas levantará o equivalente à 10 depósitos. Desta forma,por meio dessas cláusulas de retenção, os bancos “convencem” os correntistas a ficarem até o finaldo plano. Na poupança, ao contrário, o correntista faz os depósitos quando quiser, saca quandoquiser e o quanto puder, e permanece com a conta até quando quiser. Os bancos têm muito menoscontrole sobre os correntistas através da poupança, o que faz do título de capitalização uma de suasalternativas preferidas de captação de recursos. A pressão pela venda desses títulos é uma das fontesde tantos adoecimentos da categoria.

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3.4. Seguros;

Trata-se de um contrato de serviços em que o segurado se compromete a pagar uma mensalidadechamada de prêmio à seguradora, para que receba alguma indenização, caso haja algum sinistrocom o bem segurado, que pode ser bem diverso (vida, automóvel, imóveis, etc). Em outras palavras:o pagamento do prêmio é certo, mas a indenização não. A seguradora cobra como prêmio um valorsuficiente para cobrir as despesas de pagamento de sinistros, suas despesas administrativas, e auferirainda uma margem de lucro.

Além do mais, as seguradoras lançam mão da “franquia”, uma taxa que deve ser paga pelo seguradopara fazer uso da indenização, como forma de dificultar o pagamento da indenização. A franquianada mais é do que a participação do segurado no pagamento de sua própria indenização.

Hoje, o mercado de seguros se desenvolveu tanto a ponto de poder mapear as possibilidades derisco a partir das características individuais do bem segurado e os hábitos de vida da pessoa dosegurado.

Conforme for o maior a possibilidade de sinistro, maior é o prêmio que o segurado deverá pagar.Esta forma de captação pelos bancos é ainda mais vantajosa, pois os banqueiros não tem de darsatisfação ao segurado com o que faz com os recursos recebidos como prêmio (enquanto que notítulo de capitalização, há o compromisso de devolver o valor depositado pelo correntista, ainda queparcialmente) .

Findo o prazo do contrato de seguro e não tendo acontecido sinistro algum, o banco não tem aobrigação de devolver os valores pagos como prêmio. Ou ainda, se houver um sinistro, aindenização somente será efetuada se o segurado pagar a tal franquia.

Uma vez que os pagamentos dos prêmios são a única certeza neste tipo de contrato, o banco nãotem obrigação alguma de dar satisfação sobre os recursos recebidos dos segurados. Se o bancoquiser especular na bolsa, pode. Se quiser emprestar a juros exorbitantes, também pode. Se quiserdar 152% de aumento para os diretores da instituição financeira (como aconteceu no BB no inícioda década de 2000, quando o funcionalismo já sofria com 6 anos de congelamento salarial) tambémpode.

É por todas estas vantagens para os bancos é que somos obrigados a cumprir metas interplanetáriasde contratação de seguro. O lucro obtido com este tipo de contrato é irrisório frente o lucroconseguido com os juros dos empréstimos. Por ser praticamente de graça a captação de recursos, osseguros também são fontes de adoecimentos dos bancários .

3.5. Previdência Privada;

Primeiramente, só há mercado para planos de previdência privada por conta da conveniente falênciada previdência pública. Empreende-se um ataque ideológico permanente sobre a previdênciapública com a afirmação falsa de que há um “rombo da previdência”, que seria o resultado doaumento vertiginoso do número de beneficiários. Mas na verdade, tal rombo tem como origem odesvio de recursos da previdência para pagamento de juros da dívida pública, sem mencionar o fatode que o Estado não dá a sua contrapartida na contribuição da Seguridade Social como estádeterminado na Constituição. Por outro lado, a mesma mídia que propaga a mentira do “rombo daprevidência” omite a informação que as próprias estatais, assim como os bancos privados, estão

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entre as maiores devedoras do INSS. Os cinco maiores bancos privados do país, “Bradesco, Itaú,Unibanco, Santander e ABN-Amro Real devem, juntos, R$ 135,9 milhões. Os dois maiores bancosestatais (Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal) são responsáveis por R$ 293,6 milhões emdívidas” (Folha de São Paulo de 17/05/2009).

Assim, o mercado para o plano de previdência privada a partir de uma suposta falência daprevidência pública é convenientemente criado de maneira artificial pelo Estado. Feitas estasconsiderações, passemos a estudar o plano de previdência privada.

Diferentemente da previdência pública, em que a geração de trabalhadores que estão na ativa bancaa aposentadoria da geração anterior de trabalhadores que já estão inativos, no plano de previdênciaprivada o cliente banca a sua própria aposentadoria por meio da formação de uma poupança dereserva. A reserva formada pelos depósitos do cliente é investido pelos bancos, geralmente emaplicações de longo prazo, como títulos públicos ou ações de primeira linha. Os recursosdepositados são administrados pelos bancos de acordo com o permitido no contrato e com o gostodo cliente.

Até o início da década de 2000, os planos eram de Benefício Definido, isto é, os bancos seresponsabilizavam por garantir o valor da pensão contratado no final de um período longo (de 20 a30 anos, por exemplo). Depois, com a mudança muito conveniente em favor dos bancos, só passoua ser oferecido o PGBL (Plano Gerador de Benefícios Livres) e do VGBL (Vida Gerador deBenefícios Livres), que se diferenciam entre si apenas pelo regime tributário. O termo “Livre”significa “livre de responsabilidades com o cliente”. Desde então, nestas novas modalidades deplano, a única coisa certa é a contribuição do cliente, e os bancos não tem qualquer responsabilidadede garantir a pensão do beneficiário caso haja problemas de ordem conjuntural, como queda dabolsa, ou desvalorização dos títulos públicos. Em outras palavras: os bancos transferiram o ônus daadministração dos recursos para os clientes.

Diferentemente dos seguros, aqui os bancos têm que prestar contas do dinheiro depositado pelosclientes. Ao conseguir o fim do modelo de benefício definido, os bancos obtém liberdade para lidarcom os recursos e se desresponsabilizar por eventuais prejuízos. Via de regra, os depósitos sãoaplicados em fundos de renda fixa, fundo de ações, ou ainda em fundos mistos (mescla de rendafixa com ações). Todo o dinheiro suado do trabalhador é torrado na especulação com papéis domercado financeiro. E por incrível que pareça, os bancos ainda cobram uma taxa de administraçãopor esse serviço, a qual é descontada do patrimônio do fundo (que geralmente é milionário), masque é rateada entre os felizes poupadores dos planos.

Por ser um contrato de longo prazo, o plano de previdência é um excelente produto para“fidelização” do correntista, isto é, torna-se mais difícil a quebra do vínculo do cliente com o banco.Um plano de 20 anos, por exemplo, garante que este mesmo correntista, ao longo de todos essesanos, se endivide no cartão de crédito, no cheque especial, faça financiamentos, etc, etc. O clientepode até optar por usar o montante do dinheiro depositado no plano de previdência antes dovencimento do plano, ou seja, resgatar a reserva antes da aposentadoria, mas as alíquotas de IRincidentes no ato do saque desencorajam tais possibilidades. Ademais, o cliente não pode fazerquantos saques forem necessários. Sempre há um período longo permitido entre um saque e outro (6meses, por exemplo).

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3.6.Consórcio;

O consórcio não é uma fonte de captação tão interessante quanto as opções anteriores, exceto pelofato de também ser um contrato de longo prazo. Consórcio nada mais é do que uma associação depessoas para adquirir um bem, de forma parcelada, porém sem pagar juros. É isso que osadministradores chamam de “produto”. Tendo em vista que um grupo de consórcio autônomo éinviável do ponto de vista legal e burocrático, os bancos cedem toda a sua estrutura para formaçãomais prática e simplificada de grupos e cobram uma taxa para isso.

As pessoas do grupo contribuem periodicamente até formar um montante mínimo para aquisição dobem. A partir daí, o integrante recebe o bem por uma das duas hipóteses: 1-por meio de sorteio, ou2-por meio de um lance (tal e qual um leilão). Tanto num caso quanto no outro, o consorciado,embora com o bem em posse, pagará o saldo parceladamente sem juros.

Como visto, o consórcio é um contrato que a pessoa não tem pressa para receber o bem. Na cabeçado cliente é como se estivesse fazendo uma poupança vinculada à compra do bem desejado (umautomóvel, por exemplo)

3.7. Ainda sobre os serviços bancários

Acabamos de desdobrar em linhas gerais os “produtos” mais comuns no meio bancário, masexplicá-las de forma sistemática ainda não caracteriza os bancários como bancários. Nosso serviço,de maneira simplificada, se resume a captar recursos para cedê-los cobrando o juro. Agora veremosde forma mais inequívoca, que os ‘produtos” não são produtos. A diferença entre um produto e umserviço é que no produto a relação entre comprador e vendedor se encerra com a transação decompra-venda. No serviço, há uma série de desdobramentos práticos que seguem se desenrolandodepois da celebração do contrato, de modo que a relação se prolonga no tempo.

No meio financeiro, cada “produto” vendido cria uma relação que torna possível a prestaçãocontinuada de diversos serviços para a manutenção de cada contratação específica. Ao “vender” umtítulo da capitalização, podem-se criar uma série de demandas como saque parcial, encerramentoprematuro do contrato, etc. Sobre os seguros o cliente pode fazer endosso, pode aumentar ou reduzira base de cobertura, etc. Na previdência privada, o cliente pode aumentar ou reduzir o prazo decontribuição, aumentar ou diminuir a contribuição, fazer contribuição esporádica, pode atésuspender e sacar a reserva monetária, etc. Para cada conta aberta, haverá a possibilidade deaumento ou redução de limite de cheque especial, por exemplo, ou contratação de cartão de crédito,e assim por diante, etc, etc…

Diante de todas essas possibilidades, a quem o cliente procurará nas agências bancárias, senão obancários para executar cada um destes serviços? O “vendedor”? Não. O BANCÁRIO. Cadacontrato celebrado entre o banco e o cliente implica necessariamente numa série de serviços que ocircundam, serviços esses que terão que ser prestados por uma categoria específica detrabalhadores, que são os bancários. É necessário ter alguém de carne e osso para executar essesserviços. Assim, cada contrato firmado implica mais serviços a ser executados por nós, bancários.Significa que o ato de assinar um contrato de seguro, abertura de conta corrente, capitalização,etc… é, na verdade, o INÍCIO de uma relação comercial-financeira com os clientes e não o seufinal. Para cada “produto” vendido surgirá um cliente que procurará a agência bancária paraexecutar algum serviço correlato com o contrato.

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Certamente não é o empregado do comércio e/ou correspondentes bancários que executará essesserviços. É justamente por isso que os banqueiros e o governo se esforçam tanto para nos convencerque somos vendedores, pois tal discurso esconde o fato de que cada contrato firmado demanda umasérie de serviços para a sua manutenção, que justificaria a contratação de mais bancários e reduçãoda jornada de trabalho.

IV – CONCLUSÃO.

Como se nota, a idéia de que o bancário é vendedor e de que os serviços prestados nos bancos são“produtos” não resiste ao menor questionamento de seus fundamentos. Vimos que os trabalhadoresbancários são sim prestadores de serviços de intermediação financeira, o que permite que os bancoscaptem recursos junto à sua base de clientes (evidentemente que não computamos aqui os recursospúblicos jorrados do erário). Em outras palavras: é o bancário de, um modo geral, que é a forçamotriz do movimento da mercadoria dinheiro em D D’.

No entanto, os banqueiros e o Estado fazem uma verdadeira campanha ideológica sobre a categoriapara nos convencer de que bancário é vendedor de “produtos”. Mais do que subestimar a nossainteligência, os patrões querem, pelo menos, três coisas: 1-que percamos a identidade enquantocategoria para assim criar um cenário subjetivo para: 2- retirar direitos, reduzir o nível dos salários;e 3-promover uma luta fraticida de todos contra todos, intensificando o estranhamento entre oscolegas de trabalho e a divisão da categoria.

Reconhecer esses pontos traz algumas conseqüências importantes para nossa luta e organização:

A principal delas é a mudança no eixo das campanhas salariais. Devemos lutar por salário, não porremuneração variável.

Nas últimas campanhas salariais o grande chamariz tem sido a PLR. Merecemos uma fatia do lucrodos bancos que tanto trabalhamos para construir, por isso merecemos a PLR, e lutamos que sejalinear, ou seja, para que a parcela do lucro do banco seja dividida em partes iguais para todos ostrabalhadores, da diretoria aos escriturários. Mas a nossa campanha salarial não pode ser umacampanha por PLR. O acordo da PLR deve ser negociado em separado e fora do período decampanha salarial. A idéia de que o objetivo da campanha salarial é uma PLR maior legitima opróprio discurso do banco: o trabalhador deve vender mais, para que o banco tenha um lucro maior,para que o próprio trabalhador tenha uma PLR maior…

Ora, como acabamos de ver, o lucro dos bancos não depende necessariamente das vendas deprodutos, mas de um relacionamento continuado com os clientes, que requer um trabalhopermanente e bem feito de atendimento, o qual buscamos fazer, mesmo em péssimas condições. Porisso merecemos salários maiores!

O índice que reajusta o salário é o mesmo que reajusta todas as demais verbas e benefícios, como13º, férias, FGTS, INSS, vale-refeição e alimentação, etc. Além disso, por lei, o salário não pode serrebaixado: uma vez reajustado, não pode haver redução. Ou seja, aquilo que conquistamos numacampanha salarial tem resultados de longo prazo, com influência em toda nossa vida, até aaposentadoria.