avaliação da pprofissao segundo psicólogos da área organizacional

5
A avaliação da profissão, segundo os psicólogos da área organizacional. Jairo Eduardo Borges-Andrade (Pesquisador do Departamento de Recursos Humanos da EMBRAPA e Professor no Departamento de Psicologia Social e do Trabalho da UNB) O objetivo do presente texto é o de descrever como os psicólo- gos organizacionais avaliam o exercício de sua profissão. Os dados utilizados foram os dos Conselhos Federal e Regionais de Psi- cologia, obtidos em pesquisa que ti- nha como finalidade caracterizar o perfil do psicólogo, sob os aspectos da formação, atuação e condições de tra- balho. De um universo de mais de 60.000 inscritos nos Conselhos, du- rante 1985 e 1986, uma amostra de 2447 psicólogos respondeu um ques- tionário para coleta de dados. Apesar de se ter trabalhado com a meta de cobrir todo o país, não houve um re- torno representativo de respostas da região norte. Somente um pequeno segmento das respostas fornecidas será objeto de estudo neste trabalho. Trata-se dos dados referentes à parte V do questio- nário, denominada "Avaliação do Exercício Profissional Atual". O autor do presente texto já analisou e descre- veu estes mesmos dados (1) enquanto anteriormente se discutiu como os psi- cólogos em geral avaliam sua profis- são e como estas opiniões variam de região para região e de uma área para outra área profissional; neste texto, o foco principal serão os psicólogos da área organizacional. Consideram-se nesta categoria todos os 666 respon- dentes que assinalaram no questioná- rio que, no momento da pesquisa, atuavam nesta área da profissão. Mais seis áreas podiam ser assinaladas: clí- nica (1428 respostas), escolar (525 res- postas), docência (415 respostas), pes- quisa (95 respostas), comunitária (174 respostas) e outras (176 respostas). Tendo havido permissão para se dar mais de uma resposta, certamente há na amostra estudada psicólogos que atuam em mais de uma área. Des- te modo, é mais exato ter em conta que se estará descrevendo e analisan- do respostas e não indivíduos. A avaliação da profissão foi concebida em três dimensões: status profissional, dificuldades no exercício profissional e desejos de mudança. A opinião sobre status foi solicitada através de uma escala de intensidade de ocorrência (1 = nenhuma; 2 = pou- ca; 3 = média; 4 = elevada e 5 = muito elevada), que deveria ser utilizada pa- ra responder a seis afirmativas. Esta mesma escala deveria ser aplicada pa- ra avaliar vinte dificuldades descritas em seguida no questionário. Final- mente, havia questões sobre satisfação em relação à profissão, a serem res- pondidas em termos de desejos de mu- dança, assinalando-se "sim" ou "não". Status profissional A Tabela 1 mostra que o status profissional é avaliado em torno do ponto médio da escala, entre os psicó- logos que atuam na área organizacio- nal. A opinião mais favorável refere-se à importância ou relevância da profis- são para a comunidade, enquanto a pior refere-se à adequabilidade da re- muneração. Este padrão não é muito diferente daquele dos psicólogos em geral (incluindo os da área organiza- cional), embora as médias de respos- tas dos profissionais da área organiza- cional sejam ligeiramente mais favorá- veis em 4 das 6 situações avaliadas. A principal diferença detectada nos dados desta Tabela, através de Análise de Variância (A NOVA) e tes- te de Duncan, está na disponibilidade de recursos para o exercício da profis- são. As opiniões são mais favoráveis a esta situação, entre os que atuam na área organizacional, do que as opi¬

Upload: wandela-maria-araujo

Post on 05-Nov-2015

214 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

esse artigo fala sobre a avaliação da profissão de psicólogo organizacional por psicólogos organizacionais.Vale ressaltar que o artigo não é de minha autoria, mas um assunto pelo qual tenho interesse.

TRANSCRIPT

  • A avaliao da profisso, segundo os psiclogos da rea organizacional. Jairo Eduardo Borges-Andrade (Pesquisador do Departamento de Recursos Humanos da EMBRAPA e Professor no Departamento de Psicologia Social e do Trabalho da UNB)

    Oobjetivo do presente texto o de descrever como os psiclo-gos organizacionais avaliam o exerccio de sua profisso. Os dados utilizados foram os dos Conselhos Federal e Regionais de Psi-cologia, obtidos em pesquisa que ti-nha como finalidade caracterizar o perfil do psiclogo, sob os aspectos da formao, atuao e condies de tra-balho.

    De um universo de mais de 60.000 inscritos nos Conselhos, du-rante 1985 e 1986, uma amostra de 2447 psiclogos respondeu um ques-tionrio para coleta de dados. Apesar de se ter trabalhado com a meta de cobrir todo o pas, no houve um re-torno representativo de respostas da regio norte.

    Somente um pequeno segmento das respostas fornecidas ser objeto de estudo neste trabalho. Trata-se dos dados referentes parte V do questio-nrio, denominada "Avaliao do Exerccio Profissional Atual". O autor do presente texto j analisou e descre-veu estes mesmos dados (1) enquanto anteriormente se discutiu como os psi-clogos em geral avaliam sua profis-so e como estas opinies variam de regio para regio e de uma rea para outra rea profissional; neste texto, o foco principal sero os psiclogos da rea organizacional. Consideram-se nesta categoria todos os 666 respon-dentes que assinalaram no question-rio que, no momento da pesquisa, atuavam nesta rea da profisso. Mais seis reas podiam ser assinaladas: cl-nica (1428 respostas), escolar (525 res-postas), docncia (415 respostas), pes-quisa (95 respostas), comunitria (174 respostas) e outras (176 respostas).

    Tendo havido permisso para se dar mais de uma resposta, certamente h na amostra estudada psiclogos que atuam em mais de uma rea. Des-te modo, mais exato ter em conta que se estar descrevendo e analisan-do respostas e no indivduos.

    A avaliao da profisso foi concebida em trs dimenses: status profissional, dificuldades no exerccio profissional e desejos de mudana. A opinio sobre status foi solicitada atravs de uma escala de intensidade de ocorrncia (1 = nenhuma; 2 = pou-ca; 3 = mdia; 4 = elevada e 5 = muito elevada), que deveria ser utilizada pa-ra responder a seis afirmativas. Esta mesma escala deveria ser aplicada pa-ra avaliar vinte dificuldades descritas em seguida no questionrio. Final-mente, havia questes sobre satisfao em relao profisso, a serem res-pondidas em termos de desejos de mu-dana, assinalando-se "sim" ou "no".

    Status profissional

    A Tabela 1 mostra que o status profissional avaliado em torno do ponto mdio da escala, entre os psic-logos que atuam na rea organizacio-nal. A opinio mais favorvel refere-se importncia ou relevncia da profis-so para a comunidade, enquanto a pior refere-se adequabilidade da re-munerao. Este padro no muito diferente daquele dos psiclogos em geral (incluindo os da rea organiza-cional), embora as mdias de respos-tas dos profissionais da rea organiza-cional sejam ligeiramente mais favor-veis em 4 das 6 situaes avaliadas.

    A principal diferena detectada nos dados desta Tabela, atravs de Anlise de Varincia (A NOVA) e tes-te de Duncan, est na disponibilidade de recursos para o exerccio da profis-so. As opinies so mais favorveis a esta situao, entre os que atuam na rea organizacional, do que as opi

  • nies vindas de todas as demais reas. Tambm a remunerao parece ser mais adequada nesta rea, quando comparada com as demais, exceto a rea de pesquisa.

    Dificuldades profissionais As maiores dificuldades relati-

    vas formao e experincia (ver Ta-bela 2), na rea organizacional, refe-rem-se falta de vivncia administra-tiva do psiclogo. As menores refe-rem-se sua falta de conhecimento da realidade scio-econmica, embora neste segundo caso seja tambm esta a menor dificuldade relatada no conjun-to de todas as reas profissionais.

    A Tabela 3 mostra que as maio-res dificuldades sentidas, nas relaes com os outros, referem-se ao desco-nhecimento dos outros profissionais da contribuio que o psiclogo pode lhes oferecer. As menores dificuldades esto no relacionamento com outras pessoas. Esta a menor avaliao de dificuldades, dentre as vinte situaes julgadas. Nestes dois casos, no h qualquer diferena entre os psiclogos organizacionais e os demais.

    As dificuldades com interfern-cia inadequada de outros profissionais no trabalho tcnico do psiclogo so significativamente maiores na rea or-

    ganizacional do que nas reas escolar e de docncia.

    Na Tabela 4 encontram-se as mdias de intensidade de ocorrncia de dificuldades com condies de tra-balho. A pior situao aquela con-cernente falta de infra-estrutura para desenvolver o trabalho. Ao contrrio, no parecem ser intensas as dificulda-des com falta de motivao para o tra-balho. Tambm nestes dois casos, os psiclogos da rea organizacional no apresentam discrepncias em compa-rao com o conjunto de todos os psi-clogos.

    A Tabela 5 mostra os julgamen-tos relativos s dificuldades com con-dies sociais, econmicas e culturais no exerccio profissional. A ordenao destas dificuldades tampouco dife-rente para o conjunto dos psiclogos e para os da rea organizacional. A me-nor avaliao de dificuldade com discriminao sexual. A maior refe-re-se s dificuldades provocadas pela poltica scio-econmica do pas. Este o caso em que aparecem as maiores mdias de intensidade de ocorrncia, dentre as vinte situaes submetidas avaliao.

    Os resultados da A NOVA e teste de Duncan indicam algumas diferen

  • as significativas entre a rea organi-zacional e as demais reas. So meno-res, entre os psiclogos organizacio-nais do que entre os de clnica e comu-nitria, as dificuldades com falta de estabilidade profissional.

    Uma outra importante discre-pncia aparece no caso de discrimina-o sexual: as dificuldades avaliadas pelos psiclogos organizacionais so mais intensas do que as de seus colegas de todas as outras reas profissionais.

    Desejos de mudana profissional

    A Tabela 6 apresenta os percen-tuais de resposta afirmativas dadas a trs perguntas, em que os psiclogos deveriam julgar se gostariam de mu-dar de rea de atuao dentro da Psi-cologia, de trabalho (emprego), per-manecendo na mesma rea de atuao e de profisso. A finalidade destas, co-mo explicitava o questionrio, era avaliar a satisfao em relao pro-

    fisso. Testes de qui-quadrado foram utilizados, para que diferenas fossem identificadas entre as respostas das di-versas reas profissionais.

    H uma quantidade muito pe-quena (por volta de 5%) de psiclogos que desejam mudar de profisso, se-guidos dos que gostariam de mudar de rea de atuao e, finalmente, dos que gostariam de mudar de trabalho ou emprego. Embora esta ordem no se altere, entre os psiclogos organiza-cionais e o conjunto de todos os res-pondentes, existem importantes dife-renas a considerar.

    O percentual dos psiclogos da rea organizacional, que desejam mu-dar de rea de atuao dentro da Psi-cologia, bem mais elevado do que o dos psiclogos em geral. Esse nmero quase iguala o dos que gostariam de mudar de trabalho ou emprego. As-sim, no causam surpresa os resulta-dos do teste de qui-quadrado. A quan-tidade dos psiclogos organizacionais que esto insatisfeitos com sua rea de atuao significativamente maior que os nmeros de todas as demais reas.

    Tambm maior, entre os da rea organizacional, a freqncia re-lativa dos que gostariam de mudar de trabalho ou emprego. A diferena estatisticamente diferente, quando os desta rea so comparados com aque-les de docncia e pesquisa.

    Por ltimo, foi tambm propos-to, a todos que expressaram que gos-tariam de mudar de profisso, que ex-plicitassem as razes deste desejo. Considerando-se que muito poucos desejariam mudanas dessa natureza, foi pequeno o nmero de respostas obtidas. Mesmo assim, foi possvel se-par-las em cinco categorias. Os resul-tados dessa classificao se encontram na Tabela 7.

    As razes de mercado e/ou oportunidade so as alegadas em me-nor quantidade, pelos psiclogos da rea organizacional, para quererem mudar de profisso. Este percentual, contudo, no muito diferente daque-le do conjunto de psiclogos. As gran-des diferenas entre este conjunto e os daquela rea se encontram basica-mente nas razes citadas com mais freqncia, como se descrever a se-guir.

    Os psiclogos organizacionais que desejam mudar de profisso ci-tam, em primeiro lugar, razes con-cernentes insatisfao com as carac-tersticas sociais desta profisso. Ao contrrio, os psiclogos em geral jus

  • tificam-se com razes econmicas e de remunerao. Ao que parece, esta po-de ser a chave para entender algumas grandes diferenas anteriormente des-critas: so os psiclogos organizacio-nais que, mais do que seus colegas de qualquer outra rea, julgam ter mais

    disponibilidade de recursos para o exerccio profissional e os que mais gostariam de mudar de rea de atua-o.

    A conjugao de pelo menos trs fatores pode explicar este estado de coisas. Tais fatores tm sido, com fre-

    qncia, citados na literatura sobre a Psicologia Organizacional no Brasil: eles referem-se ao papel social espera-do do psic'ogo no pas, formao acadmica recebida que ao mesmo tempo determinada por este papel e tambm o fortalece, e s atuais condi-es de mercado de trabalho para a profisso.

    O papel social esperado do psi-clogo, na sociedade brasileira, est quase sempre intimamente ligado atuao clnica. A formao dada pe-las escolas de nvel superior tambm segue predominante e majoritaria-mente este tipo de atuao. Contudo, ao se verem no mercado de trabalho, muitos so atrados pela rea organi-zacional, que freqentemente oferece oportunidades de emprego mais re-compesadoras financeiramente e em termos de estrutura de recursos para o exerccio profissional.

    O resultado , em muitos casos, uma latente insatisfao, dos que per-manecem na rea organizacional, com as caractersticas sociais da profisso, ao mesmo tempo em que h uma maior satisfao com as caractersti-cas econmicas da mesma. Para solu-cionar este problema, a alternativa mais mo (embora tampouco seja fcil) a de procurar modificar aquela expectativa de papel, simultaneamente

  • eles avaliam sua profisso? As respos-tas a esta pergunta sero dadas a se-guir.

    O status profissional ligeira-mente mais bem avaliado pelos psic-logos organizacionais, especificamen-te no que tange disponibilidade de recursos e remunerao.

    So maiores as dificuldades nas relaes com outros, somente na que concerne interferncia inadequada de outros profissionais.

    Quanto s dificuldades com as condies sociais, econmicas e cultu-rais, na rea organizacional h avalia-es mais favorveis referentes esta-bilidade profissional e mais desfavor-veis no que tange discriminao se-xual.

    Os desejos de mudana tm tam-bm diferenas muito marcantes. Os psiclogos da rea organizacional so o grupo que mais gostaria de mudar de rea, quando comparado a todos os outros. H tambm mais insatisfa-o com o emprego, embora neste ca-so a diferena s aparea em compa-rao com algumas reas.

    Entre os que gostariam de mu-dar de profisso, as razes dos psic-logos organizacionais, concernentes insatisfao com as caractersticas so-ciais da profisso, so mais freqen-tes. So menos freqentes, por outro lado, no que se refere a fatores econ-micos e de remunerao.

    Assim a rea de psicologia orga-nizacional parece oferecer mais recur-sos, melhor remunerao e estabilida-de profissional. Os problemas que a diferenciam so os de discriminao sexual e de interferncia de outros profissionais. Sero estes problemas suficientes para explicar a maior insa-tisfao dos psiclogos com a rea e com o emprego? Parece que no. De um lado, caractersticas sociais, mui-tas vezes presentes na rea organiza-cional, podem tambm explicar esta insatisfao. De outro lado, o presente autor acredita que igualmente pesa, na determinao deste fenmeno, a gran-de discrepncia entre uma formao eminentemente voltada para a rea clnica e para a atuao liberal e um mercado de trabalho que sinaliza para uma atuao como empregado e que apresenta ofertas irrecusveis na rea organizacional.

    atravs de atuao sistemtica nos meios de comunicao social e de alte-rao profunda nas estruturas curri-culares dos cursos de formao de psi-clogos.

    Concluso Para sintetizar, que poderia ser

    dito sobre as caractersticas mais mar-cantes e diferenciadoras dos psiclo-gos da rea organizacional, quando

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS BORGES-ANDRADE J.E. Avaliao do exer-ccio profissional. In Conselho Federal de Psco logia-CFP Quem o Psiclogo Brasileiro! So Paulo, Edicon, 1988 p. 252-272.