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44 Diário da República, 1.ª série — N.º 4 — 7 de janeiro de 2013 4 - A Comissão inicia funções com a nomeação do último dos seus membros, devendo proceder à primeira reunião até ao dia 4 de janeiro de 2013. 5 - A Comissão permanece em funcionamento durante um período de três anos, podendo o seu mandato ser reno- vado por despacho do Secretário de Estado do Mar. Artigo 5.º Entrada em vigor A presente portaria entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação. O Secretário de Estado do Mar, Manuel Pinto de Abreu, em 21 de dezembro de 2012. SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 1/2013 Proc. nº 1187/09.2TDLSB.L2-A.S1- 3ª Recurso de Fixação de Jurisprudência Acordam no Supremo Tribunal de Justiça - No processo nº 1187/09.2TDL.SB.LA-, do Tribunal da Relação de Lisboa, veio o arguido José Augusto Dias de Carvalho Belo, id. nos autos, interpor recurso de fixação de jurisprudência, em 31 de Janeiro de 2012 (via fax), do acórdão proferido pela 3ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa, em 14 de Dezembro de 2011, e transitado em julgado em 23 de Janeiro de 2012, formulando as seguintes conclusões: “1. No acórdão recorrido é exposto o entendimento que o Principio da Adesão - art. 71º e 72º do CPP - per- mite por si só a apreciação do pedido de indemnização cível enxertada em processo penal deduzido pela Se- gurança Social referentes a cotização não liquidadas muito embora a responsabilidade criminal não esteja em apreciação. 2. O Acórdão enunciado contrasta clamorosamente com o Acórdão proferido em 23 de Março de 2010 pela 2ª Secção Criminal da Tribunal da Relação de Évora, no processo 628/07.8TAELV.EI, que desenvolve o entendi- mento que um pedido de indemnização cível formulado pela Segurança Social não tem natureza civil e que por isso extravasa o Principio da Adesão e o atinente regime o que obsta ao seu conhecimento. 3. Quando é deduzido o pedido de indemnização cível, a administração fiscal já dispunha de um título executivo porque ele é um dos pressupostos da reacção penal; 4. O título executivo reporta-se aos danos indem- nizáveis, de acordo com as normas fiscais, ou seja, à prestação retida e juros de mora e tem por sujeitos da obrigação os responsáveis pelo imposto; 5. A natureza da prestação em dívida não se altera pela interposição de um processo-crime; 6. Reflexo desta constatação é o artº 9º do RGIT que refere que o “cumprimento da sanção aplicada não exonera do pagamento da prestação tributária devida e acréscimos legais; 7. Tal significa que o dever de pagamento não radica na prática do crime mas na relação contributiva, que lhe é anterior e subsiste e só paralelamente lhe é atribuída dignidade penal; 8. A natureza da divida não ser resultado da vicis- situde decorrentes da aplicação de uma normal penal, porque o princípio é de que acção civil enxertada man- têm a sua potencial autonomia; 9. A viabilidade do pedido de indemnização cível ser deduzido nos termos do art. 72.º CPP depende da natureza civilística do facto gerador da indemnização; 10. Não tendo essa natureza a acção é inviável sem que seja necessário buscar considerações sobre a natu- reza do ilícito penal do facto; 11. Temos que não é pelo facto de aquela precisa indemnização ter sido exigida anteriormente, no âmbito de um enxerto civil, quando permitida a sua autonomi- zação que se deve aplicar necessariamente o regime substantivo civil; 12. Este só é de aplicar como decorrência da natu- reza civil da obrigação até porque a natureza da divida decorre da relação jurídica ou da fonte de onde emerge a obrigação; Assim, 13. A obrigação de pagamento das contribuições e acréscimos legais à Segurança Social emerge de relações jurídica administrativa - tributária especial e rege-se pela legislação de direito público; 14. O princípio da Adesão ao processo penal (art. 71 e ss CPP) apenas admite a formulação e conhecimentos de pedidos de indemnização cível conexa com o facto crime, portanto indemnização cuja obrigação se situe no âmbito das relações jurídicas privadas; 15. A competência material dos tribunais judiciais determina-se pela sua não atribuição a outra ordem jurisdicional. Nesta medida ainda que se admita a emer- gências de danos civis advindo do incumprimento de obrigações tributárias, esses danos nunca se podem confundir com as consequências tributárias fixadas para esse incumprimento; 16. Só podem ser dedutíveis pedidos de indemniza- ção cível quando o facto ilícito tributário causou danos indemnizáveis na esfera jurídico privada de algum le- sado; 17. Só assim se respeitam as regras de delimitação de competências próprias de cada ordem jurisdiciona1 e se evita que a esfera jurisdicional civil, comum, invada a esfera jurisdicional administrativa tributária especial; 18. As dívidas de contribuições à Segurança social não emergem de responsabilidade civil contratual, nem de responsabilidade civil extracontratual. O mesmo significa que não emerge de negócio jurídico celebrado entre entidade empregadora e a Segurança Social nem emerge de facto ilícito extra-negocial no sentido do disposto do 483º CC. Estas têm por fonte a própria lei, que se inscreve no direito público, designadamente na Lei de Bases da Segurança Social e legislação comple- mentar, não se regendo pela lei civil; 19. As prestações e juros de emergentes da relação tributária entre o arguido e a Segurança Social espe- cialmente depois do processo de reversão está sob a alçada da Secção de Processos Executivos de Lisboa, estando a referida relação jurídica sujeita ao Principio da legalidade tributária, pelo que o incumprimento das obrigações estabelecidas, quer nos seus pressupostos,

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  • 44 Dirio da Repblica, 1. srie N. 4 7 de janeiro de 2013

    4 - A Comisso inicia funes com a nomeao do ltimo dos seus membros, devendo proceder primeira reunio at ao dia 4 de janeiro de 2013.

    5 - A Comisso permanece em funcionamento durante um perodo de trs anos, podendo o seu mandato ser reno-vado por despacho do Secretrio de Estado do Mar.

    Artigo 5. Entrada em vigor

    A presente portaria entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicao.

    O Secretrio de Estado do Mar, Manuel Pinto de Abreu, em 21 de dezembro de 2012.

    SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIA

    Acrdo do Supremo Tribunal de Justia n. 1/2013

    Proc. n 1187/09.2TDLSB.L2-A.S1- 3

    Recurso de Fixao de JurisprudnciaAcordam no Supremo Tribunal de Justia

    -No processo n 1187/09.2TDL.SB.LA-, do Tribunal da

    Relao de Lisboa, veio o arguido Jos Augusto Dias de Carvalho Belo, id. nos autos, interpor recurso de fixao de jurisprudncia, em 31 de Janeiro de 2012 (via fax), do acrdo proferido pela 3 seco do Tribunal da Relao de Lisboa, em 14 de Dezembro de 2011, e transitado em julgado em 23 de Janeiro de 2012, formulando as seguintes concluses:

    1. No acrdo recorrido exposto o entendimento que o Principio da Adeso - art. 71 e 72 do CPP - per-mite por si s a apreciao do pedido de indemnizao cvel enxertada em processo penal deduzido pela Se-gurana Social referentes a cotizao no liquidadas muito embora a responsabilidade criminal no esteja em apreciao.

    2. O Acrdo enunciado contrasta clamorosamente com o Acrdo proferido em 23 de Maro de 2010 pela 2 Seco Criminal da Tribunal da Relao de vora, no processo 628/07.8TAELV.EI, que desenvolve o entendi-mento que um pedido de indemnizao cvel formulado pela Segurana Social no tem natureza civil e que por isso extravasa o Principio da Adeso e o atinente regime o que obsta ao seu conhecimento.

    3. Quando deduzido o pedido de indemnizao cvel, a administrao fiscal j dispunha de um ttulo executivo porque ele um dos pressupostos da reaco penal;

    4. O ttulo executivo reporta-se aos danos indem-nizveis, de acordo com as normas fiscais, ou seja, prestao retida e juros de mora e tem por sujeitos da obrigao os responsveis pelo imposto;

    5. A natureza da prestao em dvida no se altera pela interposio de um processo-crime;

    6. Reflexo desta constatao o art 9 do RGIT que refere que o cumprimento da sano aplicada no exonera do pagamento da prestao tributria devida e acrscimos legais;

    7. Tal significa que o dever de pagamento no radica na prtica do crime mas na relao contributiva, que lhe anterior e subsiste e s paralelamente lhe atribuda dignidade penal;

    8. A natureza da divida no ser resultado da vicis-situde decorrentes da aplicao de uma normal penal, porque o princpio de que aco civil enxertada man-tm a sua potencial autonomia;

    9. A viabilidade do pedido de indemnizao cvel ser deduzido nos termos do art. 72. CPP depende da natureza civilstica do facto gerador da indemnizao;

    10. No tendo essa natureza a aco invivel sem que seja necessrio buscar consideraes sobre a natu-reza do ilcito penal do facto;

    11. Temos que no pelo facto de aquela precisa indemnizao ter sido exigida anteriormente, no mbito de um enxerto civil, quando permitida a sua autonomi-zao que se deve aplicar necessariamente o regime substantivo civil;

    12. Este s de aplicar como decorrncia da natu-reza civil da obrigao at porque a natureza da divida decorre da relao jurdica ou da fonte de onde emerge a obrigao;

    Assim,13. A obrigao de pagamento das contribuies e

    acrscimos legais Segurana Social emerge de relaes jurdica administrativa - tributria especial e rege-se pela legislao de direito pblico;

    14. O princpio da Adeso ao processo penal (art. 71 e ss CPP) apenas admite a formulao e conhecimentos de pedidos de indemnizao cvel conexa com o facto crime, portanto indemnizao cuja obrigao se situe no mbito das relaes jurdicas privadas;

    15. A competncia material dos tribunais judiciais determina-se pela sua no atribuio a outra ordem jurisdicional. Nesta medida ainda que se admita a emer-gncias de danos civis advindo do incumprimento de obrigaes tributrias, esses danos nunca se podem confundir com as consequncias tributrias fixadas para esse incumprimento;

    16. S podem ser dedutveis pedidos de indemniza-o cvel quando o facto ilcito tributrio causou danos indemnizveis na esfera jurdico privada de algum le-sado;

    17. S assim se respeitam as regras de delimitao de competncias prprias de cada ordem jurisdiciona1 e se evita que a esfera jurisdicional civil, comum, invada a esfera jurisdicional administrativa tributria especial;

    18. As dvidas de contribuies Segurana social no emergem de responsabilidade civil contratual, nem de responsabilidade civil extracontratual. O mesmo significa que no emerge de negcio jurdico celebrado entre entidade empregadora e a Segurana Social nem emerge de facto ilcito extra-negocial no sentido do disposto do 483 CC. Estas tm por fonte a prpria lei, que se inscreve no direito pblico, designadamente na Lei de Bases da Segurana Social e legislao comple-mentar, no se regendo pela lei civil;

    19. As prestaes e juros de emergentes da relao tributria entre o arguido e a Segurana Social espe-cialmente depois do processo de reverso est sob a alada da Seco de Processos Executivos de Lisboa, estando a referida relao jurdica sujeita ao Principio da legalidade tributria, pelo que o incumprimento das obrigaes estabelecidas, quer nos seus pressupostos,

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    quer nas suas consequncias subordinam-se s normas de direito administrativo-tributrio pr-existente data da prtica do facto danoso;

    20. S jurisdio administrativa-tributria cabe a apreciao da conduta danosa e a fixao dos seus efeitos;

    21. Em consequncia, o pedido de indemnizao cvel formulado pela Segurana Social extravasa o Principio da adeso e o explanado regime jurisdicional, pelo que se verifica uma excepo dilatria inominada, que de-termina o arquivamento do pedido erradamente dito de cvel, o que obsta ao seu conhecimento.

    Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Exas doutamente supriro, dever conceder-se provimento ao recurso, revogando-se o Acrdo recorrido, declarando a absolvio do Recorrente do pedido de indemnizao cvel deduzido.

    E assim se far justia!

    -Cumprido o disposto nos artigos 439 e 440 do CPP,

    veio este Supremo Tribunal, por acrdo de 12 de Julho de 2012, concluir pela oposio de julgados, prosseguindo o recurso, nos termos da 2 parte do artigo 441 n 1, e cum-prindo-se o disposto no art 442 n 1, ambos do CPP.

    -Notificados os sujeitos processuais para apresentarem

    no competente prazo as alegaes escritas, apresentaram alegaes:

    O Recorrente, concluindo:A) A competncia material dos tribunais judiciais

    determina-se pela sua no atribuio a outra ordem jurisdicional. Nesta medida ainda que se admita a emer-gncias de danos civis advindo do incumprimento de obrigaes tributrias, esses danos nunca se podem confundir com as consequncias tributrias fixadas para esse incumprimento;

    B) S podem ser dedutveis pedidos de indemniza-o cvel quando o facto ilcito tributrio causou danos indemnizveis na esfera jurdico-privada de algum le-sado;

    C) S assim se respeitam as regras de delimitao de competncias prprias de cada ordem jurisdicional e se evita que a esfera jurisdicional civil, comum, invada a esfera jurisdicional administrativa-tributria especial;

    D) As dvidas de contribuies a Segurana Social, per si, no emergem de responsabilidade civil contratual, nem de responsabilidade civil extracontratual. O mesmo significa que no emerge de negcio jurdico celebrado entre entidade empregadora e a Segurana Social nem emerge de facto ilcito extra-negocial no sentido do disposto do 483 CC. Estas tm por fonte a prpria lei, que se inscreve no direito pblico, designadamente na Lei de Bases da Segurana Social e legislao comple-mentar, no se regendo pela lei civil;

    E) Logo, extravasa-se o Principio da Adeso quando atribuda natureza de obrigao civil a qualquer obri-gao extra-penal conexa com a infraco criminal, pe1o que, deste Princpio necessariamente se exclui a efectivao de responsabilidade financeira, tributria disciplinar ou administrativa porquanto nestes casos h uma independncia de ordenamentos jurdicos;

    F) As prestaes e juros de emergentes da relao tributria entre o contribuinte e a Segurana Social es-pecialmente depois do processo de reverso est tambm sujeita ao Princpio da Legalidade tributria, pelo que o incumprimento das obrigaes estabelecidas, quer nos seus pressupostos, quer nas suas consequncias subor-dinam-se as normas do direito administrativo-tributrio pr existente a data da pratica do facto danoso;

    G) S jurisdio administrativa-tributria cabe a apreciao da conduta danosa e a fixao dos seus efeitos;

    H) Em consequncia, o pedido de indemnizao c-vel formulado pela Seguradora Social e assente na no entrega tempestiva de prestaes tributrias extravasa o Principio da adeso e o explanado regime jurisdicio-nal, pelo que no caso em que seja deduzido verifica-se uma excepo dilatria inominada, que determina o arquivamento do pedido erradamente dito do cvel, o que obsta ao seu conhecimento;

    E assim se far justia!

    O Ministrio Pblico, concluindo da seguinte forma:1. A possibilidade da jurisdio penal se pronunciar,

    ao abrigo das normas do artigo 71. e seguintes do C-digo de Processo Penal, sobre o objecto da aco cvel dependente de causa penal, restringe-se s consequn-cias, com natureza materialmente civil, do crime.

    2. O devedor substituto tem a obrigao tributria de deduzir, remunerao do trabalhador, o montante da contribuio por este devida Segurana Social, e de proceder sua entrega a esta.

    3. A obrigao tributria de entrega nasce logo que a entidade patronal deduz, na remunerao do trabalhador, a contribuio.

    4. A partir de momento em que a obrigao de entrega se vence e no cumprida, verifica-se o prejuzo decor-rente desse incumprimento, traduzido em no entrada do valor da respectiva contribuio, nos cofres da Segu-rana Social, na data em que deveria ter ocorrido.

    5. No crime de abuso de confiana contra a Segurana Social, p. e p. no artigo 107. do RGIT, o comportamento do agente, que no caso uma omisso pura, integrador do tipo de ilcito e do tipo de culpa, consiste em no entregar, dolosamente, Segurana Social, no venci-mento da obrigao tributria que sobre ele impende enquanto devedor contributivo substituto, o valor das contribuies devidas pelos trabalhadores e membros dos rgos sociais Segurana Social, que deduzira das remuneraes destes.

    6. A incriminao da omisso da obrigao tributria devida surge, nomeadamente, como uma forma de cons-tranger o devedor tributrio substituto ao cumprimento, ainda que tardio, dessa obrigao.

    7. A consumao deste ilcito penal ocorre com a no entrega, dolosa, Administrao Tributria, das presta-es a esta devidas, isto , logo que se mostre violada a obrigao do devedor tributrio substituto, ou seja, logo que termine o prazo para cumprimento do respectivo dever tributrio de entrega, pois que a condio objec-tiva de punibilidade prevista no artigo 105., n. 4 , do RGIT, aplicvel ao crime de mera inactividade previsto no artigo 107., n. 1, por fora do seu n. 2, no pertence nem ao tipo de ilcito, nem ao de culpa.

    8. A mesma conduta omissiva - no entrega, pelo devedor tributrio, substituto Segurana Social, da

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    contribuio deduzida - valorada, simultaneamente, em sede tributria e em sede penal.

    9. A violao da obrigao tributria de entrega no anterior ao comportamento criminoso, pois que este consiste precisamente nessa violao.

    10. A responsabilidade tributria e a responsabilidade penal no tm causas diversas. Radicam-se em normas distintas, de natureza tributria e de natureza penal, mas a conduta omissiva a mesma.

    11. Com a criminalizao da conduta violadora da re-ferida obrigao tributria no emerge - no que concerne aos valores contributivos, juros tributrios e acrscimos legais - qualquer consequncia que consubstancie um dano, para a Administrao, diferente daquele que ine-rente ao simples incumprimento da obrigao tributria (dano tributrio), ou seja, a no entrada nos cofres da Segurana Social do montante das contribuies, cuja entrega devia ter sido feita e no foi. Assim, da prtica do crime no decorre uma diminuio do patrimnio desta.

    12. Danos de natureza civil, mas que no so valores da dvida tributria, podero, porventura, resultar da referida omisso de entrega e, nesse caso, serem sus-ceptveis de integrar um pedido de indemnizao civil em processo penal.

    13. No pode falar-se em dano civil, decorrente da prtica do crime de abuso de confiana, p. e p. no artigo 107. do RGIT, relativamente a valores de contribui-es descontadas aos trabalhadores e no entregues Segurana Social.

    14. A condenao em indemnizao civil no traz vantagem em responsabilizar solidariamente o devedor tributrio subsidirio, pois que, s podendo o processo penal tributrio prosseguir depois de assente definitiva-mente a dvida tributria, como consta dos artigos 42., n. 4, e 47., n. 1, do RGIT, muito antes de ter lugar essa condenao dispunha j a Administrao Tributria de ttulo executivo para executar a dvida no patrimnio do devedor principal e, por efeito do mecanismo da reverso, fazer pagar-se pelo patrimnio do devedor tributrio subsidirio.

    15. O nosso entendimento no implica, para a Segu-rana Social, qualquer diminuio das garantias legais que visam efectivar os interesses que lhe compete pro-mover e acautelar.

    16. A soluo que defendemos afigura-se mais harmnica com os ordenamentos de direito adminis-trativo-tributrio, civil e penal, quer substantivo quer processual, convocados no presente recurso extraor-dinrio, no conflituando assim com o princpio da adeso consagrado no art. 71. do Cdigo de Processo Penal, uma vez que o pedido de pagamento de valores respeitantes a contribuies Segurana Social, juros sobre os mesmos e acrscimos legais extravasa o mbito da adeso; e obvia, por outro lado, a um sem nmero de dificuldades, perplexidades e incompatibilidades de direito substantivo e processual, com que a referida jurisprudncia se confronta.

    17. No constituindo a falta de pagamento de valo-res correspondentes a contribuies em dvida, juros e demais acrscimos um dano decorrente da prtica do crime de abuso de confiana contra a Segurana Social, tendo essa matria natureza tributria, inadmissvel, em aco cvel enxertada em processo penal, a deduo de pedido do pagamento desses valores, por a mesma estar reservada jurisdio fiscal.

    este o sentido em que a jurisprudncia deve ser fixada.

    O Instituto de Segurana Social, concluindo nos se-guintes termos:

    1No processo penal deve ser arbitrada indemniza-

    o no s quando os factos preenchem os requisitos da responsabilidade criminal, mas ainda quando, no existindo responsabilidade criminal, os factos preen-chem os requisitos da responsabilidade civil conexa, de mbito menor.

    2Por outro lado, recorde-se que a indemnizao, no

    caso, no assenta na responsabilidade contratual, mas, como acima se evidenciou, nos mesmos pressupostos da responsabilidade penal (acto ilcito} ainda que de mbito menor, por prescindir apenas do pressuposto (dolo) bastando para a verificao da responsabilidade civil a mera culpa.

    3O art. 377, n. 1, do CPP, obriga condenao do

    arguido e/ou do responsvel civil, na indemnizao, mesmo em caso de absolvio penal, sempre que o pedido de indemnizao se vier a mostrar fundado.

    4No caso dos autos, verificando-se a descriminalizao

    das condutas dos arguidos, sendo extinta a sua respon-sabilidade criminal, ao demandado passa a ser aplicvel o estatuto de parte civil, sendo que o ora Recorrente viu ser atingida a tutela das suas expectativas legtimas.

    5Do mesmo modo, atente-se no n. 1 do artigo 73.

    do CPP, que refere:O pedido de indemnizao civil pode ser deduzido

    contra pessoas com responsabilidade meramente civil e estas podem intervir voluntariamente no processo penal.

    6Pode ler-se no douto acrdo do TRL) proferido no

    processo n. 5573/2007-3, e publicado in www.dgsi.pt.O ora recorrente deduziu tempestivamente nos au-

    tos, o pedido de indemnizao civil e com fundamento na responsabilidade civil conexa com a criminal, mais concretamente, por facto ilcito extracontratual ou aqui-liana; o que significa que a extino desta no implica, sem mais a extino daquela responsabilidade civil (cfr. citado Assento n 7/99).

    Por outro lado, refira-se que o Despacho ora recor-rido viola ainda o acrdo de fixao de jurisprudncia n. 3/2002 do STJ, que estabeleceu a seguinte jurispru-dncia:

    Extinto o procedimento criminal por prescrio, depois de proferido o despacho a que se refere o ar-

  • Dirio da Repblica, 1. srie N. 4 7 de janeiro de 2013 47

    tigo 311 do Cdigo de Processo Penal mas antes de realizado o julgamento, o processo em que tiver sido deduzido pedido de indemnizao civil prossegue para conhecimento deste.

    7O citado acrdo de fixao de jurisprudncia aplica-

    se ao despacho ora recorrido que determinou a extino da responsabilidade penal imputada nos autos aos ar-guidos, por efeito da descriminalizao das suas con-dutas.

    8E tal como bem refere o STJ A lei indica com sufi-

    ciente clareza, que os Acrdos para fixao de juris-prudncia tm um peso prprio, que lhes dado pelo facto de provirem do Plenrio das Seces Criminais do Supremo Tribunal de Justia. H, pois, que lhes conceder o benefcio, para no dizer a presuno, de que foram lavrados aps ponderao exaustiva, face legislao, doutrina e jurisprudncia existentes sobre o assunto.

    9Deste modo, embora os tribunais sejam livres de

    seguirem, a jurisprudncia que julgam mais adequada, j que o STJ no faz lei parece despropositado tomar outro caminho que no o acolhido no Plenrio do STJ, a no ser que se invoquem argumentos novos, no con-siderados na deciso que fixa a jurisprudncia, ou que, considerando a legislao no seu todo, a jurisprudncia fixada se mostre j ultrapassada (Cfr acrdo do STJ, n. 04P711, datado 29/04/2004, no qual foi relator o Exmo. Senhor Juiz Conselheiro Santos Carvalho, dis-ponvel in www.dgsi.pt.).

    10Da mesma forma, encontra-se igualmente inobser-

    vado o n. 3 do artigo 445. do CPP que dispe:A deciso que resolver o conflito no constitui juris-

    prudncia obrigatria para os tribunais judiciais, mas estes devem fundamentar as divergncias relativas jurisprudncia fixada naquela deciso, e no acrdo de fixao de jurisprudncia n 3/2002 do STJ, bem como, no fundamenta porque diverge do STJ.

    11Uma vez que est em causa responsabilidade civil

    extracontratual por factos ilcitos (crime de abuso de confiana contra a Segurana Social), nos termos do artigo 483.

    12Como sustenta o Acrdo da Relao do Porto de

    28/02/2007, o pedido civil que deduzido e conhecido no processo crime de abuso de confiana no respeita a qualquer acto de natureza tributria, mas sim obrigao de indemnizar por danos causados, baseada na respon-sabilidade civil por facto ilcito e culposo, nos termos do art. 483., n. 1, do Cdigo Civil, que se subsume - como vimos - no principio da adeso.

    13Nos termos dos arts. 283. e 284. do CPP os factos

    indiciariamente criminosos so fixados na Acusao deduzida pelo Ministrio Pblico (e/ou pelo Assistente, desde que no importe alterao substancial daqueles), constituindo-se assim como limite nec pus ultra do pe-dido de indemnizao civil emergente desses mesmos factos. Esta a razo pela qual foi correcta a condenao do ISS,IP em custas sempre que o pedido civil dedu-zido incluiu factos que no constavam da Acusao, Novos factos criminosos devero - isso sim - merecer tratamento autnomo, um novo Inqurito, uma nova Acusao, etc.

    14Ainda que esteja a correr termos uma execuo na

    Seco de Processos Executivos do Instituto de Segu-rana Social, IP., abreviadamente designado por SPE mantm o interesse em agir em sede de pedido de in-demnizao civil num processo por crime de abuso de confiana, como alis sustenta o Acrdo da Relao de Lisboa de 03/03/2010, destruindo o argumento da inexistncia de tal interesse pelo facto de o ISS,IP estar munido de um ttulo executivo contra os arguidos, ttulo esse que segundo uns poucos definiria com suficiente preciso os seus direitos.

    15O ttulo executivo na SPE e a sentena condenatria

    no se referem mesma obrigao, pois a responsabili-dade pelo pagamento das contribuies no se confunde com a responsabilidade civil emergente da eventual pr-tica do crime de abuso de confiana contra a segurana social, como sustenta o Prof. Germano Marques da Silva (Direito Penal Tributrio - Sobre as Responsabilidades das Sociedades e dos seus Administradores Conexas com o Crime Tributrio, Lisboa 2009).

    16No se pode dizer que o demandante ISS, IP pretende

    usar o processo declarativo para definir um direito que j se encontrava estabelecido em termos idnticos num ttulo com manifesta fora executiva, como o que est presente nas execues nas SPE, porque tal no corres-ponde verdade.

    17Como refere o Acrdo da Relao do Porto de

    25/02/2009, a causa de pedir invocada no pedido civil deduzido pelo ISS, IP no a obrigao legal que impen-dia sobre os arguidos de descontar nas remuneraes dos trabalhadores da sociedade arguida as suas contribuies obrigatrias para a segurana social e de as entregar respectiva entidade, bem como a percentagem que por lei cabe entidade patronal, mas antes o facto ilcito de que os arguidos esto acusados em co-autoria e que constitui o crime de abuso de confiana previsto e pu-nido no n. 1 do art, 107. do RGIT.

    18Assim, a causa de pedir subjacente ao titulo no pro-

    cesso executivo o incumprimento da obrigao legal

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    de entregar as prestaes devidas segurana social, enquanto que a causa de pedir subjacente ao pedido de indemnizao civil a responsabilidade civil emergente da prtica do crime de abuso de confiana em relao segurana social que a acusao imputa em co-autoria aos arguidos.

    19Ora a boa jurisprudncia (v.g. Acrdos de STJ de

    11/12/2008 e de 29/10/2009) sustenta que a indemniza-o pedida nos processos crime por abuso de confiana contra a segurana social no se destina como vimos a liquidar uma obrigao tributria para com a segurana social, sendo antes fixada segundo critrios da lei civil, apesar de os factos geradores da obrigao de indemni-zar e da obrigao tributria poderem ser parcialmente coincidentes no podendo naturalmente ser confundidos os seus fins e regimes.

    20Nem h identidade da causa de pedir, pois a pretenso

    deduzida nas execues nas SPE e a pretenso formu-lada nos pedidos de indemnizao civil no procedem do mesmo facto jurdico (cfr. art. 498., n. 4, do CPC), o que determina a impossibilidade de verificao de litispendncia.

    21Estamos perante causas de pedir diferentes no pro-

    cesso executivo e no pedido de indemnizao civil no processo-crime, os sujeitos a quem imputada respon-sabilidade so distintos.

    22Como enuncia o Acrdo da Relao de Lisboa de

    03/03/2010, a responsabilidade do gerente da sociedade , quanto s obrigaes perante a segurana social, de natureza subsidiria (arts. 22 n. 3 e 24 da LGT), s se efectivando como enunciam os Acrdos do STJ de 26/01/2006 e de 11/12/2008, por reverso do processo de execuo nas SPE, o que est sujeito aos condiciona-lismos previstos na lei (art. 23. ns. 1 e 2 da LGT).

    23No demais sublinhar, como faz o Acrdo da Re-

    lao de vora de 30/06/2004: nos termos do art. 162. do CPPT a execuo na SPE s pode ser intentada con-tra a sociedade, devedora originria, s depois poder reverter.

    24Por outro lado, na responsabilidade civil por facto

    ilcito o arguido gerente, como co-autor, responde so-lidariamente com a sociedade arguida pelo pagamento da indemnizao por danos causados segurana social, nos termos do art. 497. do Cdigo Civil - art. 3. do RGIT, arts. 8. e 129, do CP, razo pela qual, para obter titulo executivo contra todos os arguidos - incluindo os no susceptveis de figurar originariamente no ttulo na SPE - sempre o ISS, IP ter que formular o pedido civil contra todos no processo crime (Neste sentido, Cf. Antnio Santos Abrantes Geraldes, Temas Judicirios,

    vol. I, Almedina, 1998, pgs. 232-234, e Ablio Neto, Cdigo De Processo Civil Anotado, 16. ed., pg. 630, nota 15.).

    25.Como afirma o Acrdo da Relao do Porto de

    25/02/2009, faz toda a diferena em termos de garantias de exequibilidade patrimonial por parte da segurana social.

    26Como tambm decidiu o acrdo da Relao de

    Coimbra de 13/06/2007, a existncia de titulo executivo ou ttulo de igual valor, no impede que se demandem os arguidos no enxerto civil deduzido em processo penal, Sendo embora o titulo executivo presente nas SPE equi-parvel sentena criminal, a verdade que, como re-fere o Acrdo da Relao de Guimares de 21/10/2002, o valor de um e outra so diferentes, pois enquanto que a oposio execuo baseada em sentena s pode ter por base algum dos fundamentos do art. 813. do CPC, na execuo baseada no titulo emitido pela segurana social, os fundamentos de oposio so muito mais alar-gados, como resulta do art, 286. do C.P.Tributrio.

    27. que o ttulo executivo de que a Segurana Social

    dispe nas SPE no lhe garante os mesmos direitos de exequibilidade relativamente ao gerente, cuja responsa-bilidade meramente subsidiria, isto , s pode fazer reverter a execuo contra este depois de executado o patrimnio da sociedade.

    28.Enquanto que, obtendo uma sentena condenatria

    que o responsabilize solidariamente pelo pagamento das mesmas prestaes, o assistente pode accion-lo imediatamente e a ttulo principal e executar desde lodo o seu patrimnio individual, sem qualquer moratria.

    29A nica consequncia que o assistente no poder

    servir-se ao mesmo tempo dos dois ttulos executivos para cobrar a mesma quantia (podendo contudo utilizar os dois ttulos executivos para cobrar quantias distin-tas), cobrando-a atravs de um dos ttulos, o outro fica inutilizado.

    30E, como alerta o Acrdo da Relao do Porto de

    25/02/2009, no se diga que, com o reconhecimento dos crditos a favor do Estado em dois processos dife-rentes, acarreta prejuzo para a Arguida, pois que esse prejuzo s se efectivar com o pagamento em dupli-cado. E, desde que pague uma vez, a arguida poder ento requerer, nessa altura, a extino da divida, pelo pagamento. E se por mero absurdo pagasse duas vezes, sempre poderia alegar o enriquecimento sem causa por parte do Estado.

    31Por ltimo so distintos os mecanismos prescricio-

    nais previstos para as execues fiscais (art. 49 n. 1

  • Dirio da Repblica, 1. srie N. 4 7 de janeiro de 2013 49

    da Lei de Bases da Segurana Social e 175. CPPT), e para os processos criminais (art. 21. do RGITL pelo que podemos dizer, quanto ao efeito que a prescrio do procedimento em curso nas SPE ter na responsa-bilidade civil emergente da prtica de crime de abuso de confiana contra a segurana social, que o mesmo nenhum.

    32No configura excepo regra o facto de a legisla-

    o tributria permitir ao demandante obter o pagamento das quantias em dvida por outros meios, concretamente pela execuo fiscal,

    33No obstante o Instituto ser portador dum ttulo exe-

    cutivo, a verdade que a responsabilidade da Socie-dade demandada assume, a natureza de responsabilidade subsidiria e a responsabilidade conjunta dos gerentes assumir a natureza de responsabilidade solidria.

    34Resulta inequivocamente, aps a factualidade dada

    como provada, por sentena proferida no Tribunal de 1. Instncia confirmada por Acrdo do Tribunal da Relao de Lisboa, que esto preenchidos todos os pres-supostos da responsabilidade civil por factos ilcitos, impondo-se a condenao solidria dos arguidos.

    Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Exas doutamente supriro, dever ser mantida a Mui Douta Sentena proferida no mbito do presente processo, mantida e confirmada por Acrdo do Tribunal da Re-lao, e na qual o Recorrido se louva,

    Assim se fazendo por Vossas Excelncias, serena, s e objectiva JUSTIA

    Colhidos os vistos legais, e reunido o Pleno, cumpre deliberar.

    Sobre a oposio de julgadosUma vez que o acrdo que reconheceu a existncia

    de oposio de julgados no vincula o pleno das seces criminais, h que reapreciar a mesma questo.

    Reapreciando:Consta do acrdo recorrido, proferido em 14 de De-

    zembro de 2011, pela 3 Seco do Tribunal da Relao de Lisboa, no proc. n 1187/09.2TDLSB.L2, transitado em julgado em 27 de Janeiro de 2012:

    IPor Sentena proferida nestes Autos foram os deman-

    dados Jos Augusto Carvalho Belo e TPSI - Tecnologia de Ponta em Sistemas de Informao Lda. condenados solidariamente no pagamento Segurana Social de uma indemnizao no valor de 12.312,48, acrescido dos correspondentes juros moratrios e compensat-rios vencidos e vincendos, taxa legal at integral pagamento.

    Previamente a esta condenao, foi proferida de-ciso, j transitada em julgado, que declarou extinto, por descriminalizao, o procedimento criminal contra os demandados pela prtica de um crime de abuso de confiana Segurana Social.

    []O recorrente impugnou a Sentena proferida nestes

    Autos por entender, em sntese, que esta no o poderia ter condenado no pagamento do pedido cvel deduzido pelo demandante em virtude de considerar que s jurisdio administrativa-tributria cabe a apreciao da conduta danosa e a fixao dos seus efeitos pelo que o pedido de indemnizao cvel formulado pela Recor-rida extravasa o Princpio da adeso e o explanado regime Jurisdicional.

    O pedido de indemnizao cvel formulado pela Se-gurana Social extravasa o Princpio da adeso e o explanado regime jurisdicional, pelo que se verifica uma excepo dilatria inominada, que deveria ter determinado a absolvio do Recorrente do pedido cvel deduzido.

    Entende este Tribunal da Relao carecer esta ar-gumentao do necessrio suporte legal.

    Na verdade, cabendo exclusivamente jurisdio administrativa-tributria a apreciao e conhecimento das obrigaes advenientes das relaes jurdicas tri-butrias, o procedimento criminal da competncia dos Tribunais Judiciais pode albergar tambm um pedido cvel de indemnizao pelos danos resultantes de uma dada conduta criminal.

    Este , alis, o entendimento dominante da Jurispru-dncia: (...) XLII - A competncia do tribunal crimi-nal para conhecer da aco penal e da conexa aco cvel enxertada no se confunde com a competncia dos tribunais da jurisdio administrativa e fiscal em processo de execuo.

    XLIII - Nestes casos no est em causa apurar da responsabilidade do recorrente perante os credores sociais, quando pela inobservncia culposa das disposi-es legais ou contratuais destinadas proteco desses credores, o patrimnio social se tome insuficiente para a satisfao dos respectivos crditos - n. 1 do art. 78. do CSC -, mas de apurar a sua responsabilidade civil pela prtica de ilcito de natureza criminal que no foi objecto de condenao, que no exige o preenchimento dos pressupostos referidos.

    XLIV - O tribunal criminal tem competncia em razo da matria para julgar a aco cvel interposta pelo ISS, no havendo lugar neste tipo de processos figura da reverso (1) [1 n 657/08.4 TDLSB.Ll, Relatora Des. Ma Luz Baptista]

    Nestes Autos, a conduta do Arguido ao no entregar Segurana Social as quantias que lhe so devidas constitui a causa de pedir na aco cvel enxertada.

    A lei processual penal estatui como regra geral o princpio da adeso obrigatria do pedido cvel ao procedimento criminal - artigos 71 e 72 do CPP.

    E muito embora a sua responsabilidade criminal no esteja em apreciao uma vez que por deciso transi-tada em julgado, foi descriminalizada a sua conduta, mantm-se a competncia do Tribunal criminal para a apreciao da vertente civil dos factos em causa.

    []

    VITermos em que se acorda em, negando provimento

    ao recurso, confirmar integralmente a Sentena re-corrida.

    Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justia nos mnimos legais.

  • 50 Dirio da Repblica, 1. srie N. 4 7 de janeiro de 2013

    Por sua vez explicita o acrdo fundamento, proferido pelo Tribunal da Relao de vora, em 25 de Maro de 2010, no proc. n 628/07.8TAELV.E1, transitado em jul-gado em 29 de Abril de 2010:

    I Relatrio:Em processo comum, com interveno do Tribunal

    Singular, foram pronunciados:G. Ld, e P., residente, em Elvas,Pela prtica de um crime de abuso de confiana

    contra a Segurana Social, na forma continuada, p. e p. pelos arts 107, 105/1, 2, 4 alneas a) e b) e 7, e 7/1 e 3, todos da Lei n. 15/2001, de 05/07, com as alteraes introduzidas pelas Leis n.s 107-B/2003, de 31/12, e 53-A/2006, de 29/12.

    Foi deduzido pedido de indemnizao civil pelo Ins-tituto da Segurana Social, I.P., Centro Distrital de Portalegre, contra ambos os arguidos, com fundamento em que o arguido P., em nome e com proveito da so-ciedade G., no entregou demandante os valores que descontou nos salrios dos trabalhadores desta, a ttulo de contribuies para a Segurana Social, relativas a vrios meses, entre Maro de 2005 e Julho de 2006, no montante de 5.254,14, peticionado, bem como os juros, a calcular nos termos do art 16 do DL 411/91, de 17/10.

    []Realizado julgamento:a) - O arguido P foi condenado pela prtica, em

    autoria material, de um crime de abuso de confiana contra a Segurana Social, na forma continuada, p. e p. pelos arts. 30/2 e 79/1 do CP, e 105/1 e 7, 107 e 7/3, do R.G.I.T., na pena de 80 dias de multa, ra-zo diria de 3,00, o que perfaz a quantia total de 240,00, a que correspondem, subsidiariamente, 53 dias de priso.

    b) A arguida G, Ld, foi condenada pela prtica, em autoria material e na forma continuada, de um crime de abuso de confiana contra a Segurana Social, p. e p. pelos arts. 30/2 e 79/1 do CP, e 105/1 e 7, 107 e 7/1 todos do R.G.I.T., na pena de 200 dias de multa, razo diria de 6,00, o que perfaz a quantia total de 1.200,00.

    c) Ambos os demandados civis foram condenados no pagamento ao Instituto de Segurana Social, I.P. Centro Distrital de Segurana Social de Portalegre, da quantia de 3.195,38, acrescida dos juros de mora vencidos e vincendos at integral pagamento.

    II- Questes a decidir:[]As questes colocadas pelos recorrentes, arguidos,

    so:A) Quanto condenao de natureza criminal:[]B) Quanto condenao no pedido de indemnizao

    civil a questo colocada reconduz-se inadmissibili-dade do pedido de indemnizao civil (concluses JJJ) a final).

    []

    V- Fundamentos de direito:A) Quanto condenao de natureza criminal:[]

    Em concluso: Est provada a materialidade da conduta, consistente na deduo, por parte dos argui-dos, dos montantes das contribuies devidas Segu-rana Social sobre os salrios e na sua no entrega Segurana Social, at ao dia 15 dos meses seguintes a que respeitavam, nem nos 90 dias subsequentes; est provado que os arguidos agiram dessa forma, com conscincia e inteno de benefcio prprio, apesar de saberem do dever de entrega. Tanto basta para se mostrar preenchido o tipo doloso e ilcito p. e p. no dito art 107/1 do RGIT, por parte de ambos os arguidos.

    ***B) Quanto condenao no pedido de indemnizao

    civil:[]A) Da inadmissibilidade do pedido de indemnizao

    civil:[]Em concluso:1) A obrigao de pagamento das contribuies e

    acrscimos legais a favor da Segurana Social emerge de relao jurdica administrativa-tributria especial e rege-se pela legislao de direito pblico;

    2) O princpio da adeso ao processo penal e o ati-nente regime constante dos artigos 71 e segs, do CPP, apenas admite a formulao e conhecimento de pedido de indemnizao de natureza civil conexa com o facto crime, portanto indemnizao cuja obrigao se situa no mbito das relaes jurdicas privadas.

    3) Consequentemente, o pedido de indemnizao civil formulado pela Segurana Social extravasa esse princ-pio da adeso e o atinente regime, pelo que se verifica uma excepo dilatria inominada, que determina o arquivamento do pedido erradamente dito cvel, o que obsta ao seu conhecimento.

    Assim se resolve a questo, a nosso ver, respei-tando os diversos factores de interpretao da norma (art 129/CP). A soluo defendida tem, alm do mais, a capacidade de resolver as mltiplas questes que se vm colocando na decorrncia do entendimento de que o pedido de indemnizao civil relativo ao pagamento das prestaes tributrias e juros (ou melhor, de valor equivalente) dedutvel em sede de enxerto no processo penal (ou autonomamente, o que indiferente).

    Retomando ao caso concreto, resulta evidente que o pedido de indemnizao civil deduzido se reporta ao pagamento das contribuies devidas e juros, estes a calcular nos termos do art 16 do DL 411/91, de 17/10.

    As referidas prestaes e juros emergem da relao tributria que se estabeleceu entre a Segurana Social e a arguida sociedade, no tendo que ver com qualquer pretenso indemnizatria de ndole jurdico-privada.

    Essa relao est sujeita ao princpio da legalidade tributria, pelo que o incumprimento das obrigaes que lhe subjazem se subordina, quer nos seus pressupos-tos, quer nas suas consequncias, s normas de direito administrativo-tributrio pr-existentes data da pr-tica do facto danoso (que no coincide com o momento da consumao do crime de abuso de confiana).

    Apenas jurisdio administrativa-tributria cabe a apreciao da conduta danosa e a fixao dos seus

  • Dirio da Repblica, 1. srie N. 4 7 de janeiro de 2013 51

    efeitos. No pois admissvel o pedido de indemnizao formulado, no mbito do processo de adeso, por no ser o meio prprio para o efeito, pelo que se impe a revogao da sentena recorrida quanto condenao no pedido de indemnizao civil, o que determina que no se conhea do pedido indemnizatrio deduzido.

    Face concluso retirada no h lugar apreciao das questes colocadas pelos recorrentes como funda-mento da revogao da deciso, porque prejudicadas.

    VI- Deciso:Acorda-se, pois, concedendo parcial provimento ao

    recurso, em:- Manter a condenao penal contida na deciso

    recorrida;- Revogar a sentena recorrida quanto condena-

    o em pedido de indemnizao civil, de que no se conhece, por ser inadmissvel a sua deduo em face do princpio de adeso.

    Custas criminais pelos recorrentes, fixando-se a taxa de justia em 3 ucs.

    Custas do recurso, na parte relativa ao pedido de in-demnizao civil, pelo recorrido, Instituto da Segurana Social, I.P., Centro Distrital de Portalegre.

    Ambos os acrdos - recorrido e fundamento pro-nunciaram-se, em recurso, sobre a condenao havida dos demandados em pedido de indemnizao civil, tendo por objecto as quantias referentes a prestaes devidas e no entregues Segurana Social, constituindo alis, tal conduta omissiva, crime de abuso de confiana contra a Segurana Social.

    No acrdo recorrido considerou-se que a conduta do Arguido ao no entregar Segurana Social as quantias que lhe so devidas constitui a causa de pedir na aco cvel enxertada.

    A lei processual penal estatui como regra geral o princ-pio da adeso obrigatria do pedido cvel ao procedimento criminal - artigos 71 e 72 do CPP.

    E muito embora a sua responsabilidade criminal no esteja em apreciao uma vez que por deciso transitada em julgado, foi descriminalizada a sua conduta, mantm-se a competncia do Tribunal criminal para a apreciao da vertente civil dos factos em causa.

    E veio a negar provimento ao recurso, confirmando a deciso recorrida.

    J, porm, o acrdo fundamento, considerou que Ape-nas jurisdio administrativa-tributria cabe a aprecia-o da conduta danosa e a fixao dos seus efeitos. No pois admissvel o pedido de indemnizao formulado, no mbito do processo de adeso, por no ser o meio prprio para o efeito ().

    E, assim, decidiu revogar a sentena recorrida quanto condenao em pedido de indemnizao civil de que no conheceu, por ser inadmissvel a sua deduo em face do princpio de adeso.

    Ambos os acrdos recorrido e fundamento - assenta-ram pois, em situao de facto idntica atinente a pedido de indemnizao civil em processo penal, decorrente de ilcito penal fiscal, relativo ao valor de prestaes tribu-trias devidas, e no entregues Segurana Social, perfi-lhando solues de direito opostas, no domnio da mesma

    legislao, sobre a exigncia dos respectivos montantes em pedido de indemnizao civil.

    Conclui-se, pois, pela oposio entre os julgados.

    Identificao do objecto do presente recurso:A questo objecto do presente recurso centraliza-se

    exclusivamente na admissibilidade ou no do pedido de indemnizao civil em processo penal, que tenha por ob-jecto o ressarcimento da quantia correspondente ao mon-tante de contribuies - prestaes tributrias, incluindo os respectivos juros - devidas e no entregues Segurana Social, contempladas no art 107 n 1, do Regime Geral das Infraces Tributrias (RGIT), cuja conduta omissiva constitui de crime de abuso de confiana contra a Segu-rana Social.

    A questo consiste em saber se o valor dessas contri-buies, devidas e no entregues Segurana Social, que integram a materialidade desse ilcito penal fiscal, pode ser reclamado em processo penal desencadeado por tal crime, face ao princpio da adeso, ou se o ressarcimento do referido valor por tais dvidas Segurana Social, no pode constituir objecto de pedido de indemnizao civil em processo penal, por ser da exclusiva competncia da juris-dio administrativa fiscal a sua liquidao e cobrana.

    Explicitando de outra forma:Cabendo embora exclusivamente jurisdio adminis-

    trativa-tributria a apreciao e conhecimento das obri-gaes advenientes das relaes jurdicas tributrias, isso no obsta a que esteja includo na competncia material dos tribunais judiciais o conhecimento do pedido cvel de indemnizao pelos danos resultantes de uma dada conduta criminal, formulado pela Segurana Social nos termos do artigo 71. do Cdigo de Processo Penal?

    Ou ainda como questiona a Exma Magistrada do Mi-nistrio Pblico em suas doutas alegaes:

    O pedido de indemnizao civil fundado na prtica de um crime de abuso de confiana contra a segurana social, previsto e punido no artigo 107. do RGIT, pode incluir valores de contribuies deduzidas e no entre-gues segurana social?

    Posio da JurisprudnciaA jurisprudncia quase unnime, vai no sentido de que

    a competncia do tribunal criminal para conhecer da aco penal e da conexa aco cvel enxertada no se confunde com a competncia dos tribunais da jurisdio administra-tiva e fiscal, em processo de execuo., tendo o tribunal criminal competncia em razo da matria para julgar a aco cvel interposta pelo Instituto de Segurana Social (ISS.IP)

    As aces que tm por objecto os actos tributrios de liquidao e execuo de tributos, e as aces de indem-nizao resultante da prtica de crimes fiscais, tm causas de pedir e pedidos diferentes.

    Pelos danos causados pelos crimes tributrios respon-dem os agentes do crime no nos termos da Lei Geral Tributria, mas nos termos da lei civil

    No pedido civil deduzido em processo penal, atinente prtica de um crime de abuso de confiana contra a Segu-rana Social [artigo 107., do RGIT], a fonte da obrigao a responsabilidade civil decorrente da prtica de um crime e no a lei que define a obrigao de entregar certas quantias Segurana Social.

  • 52 Dirio da Repblica, 1. srie N. 4 7 de janeiro de 2013

    A qualificao como crime do acto do agente confere uma substancial especificidade causa de pedir do en-xerto cvel: o facto jurdico concreto que a enforma no se identifica com o mero incumprimento de uma obrigao fiscal, mas com o incumprimento portador dos elemen-tos objectivo-subjectivos do crime de abuso de confiana contra a Segurana Social.

    Servem de exemplo, entre outros, os seguintes acr-dos todos disponveis em www.dgsi.pt - dos seguintes tribunais:

    Supremo Tribunal de JustiaAcrdo de 15-09-2010, Proc. n 322/05.4TAEVR.

    E1.S1, 3 seco; Acrdo de 04-02-2010, Proc. n 106/01.9IDPRT.S1, 3 seco; Acrdo de 11-12-2008, Proc. n 3850/08, 5. seco;

    Tribunal da Relao de GuimaresAcrdo de 21-11-2011, Proc. n. 1453/07.1TAVCT.

    G2; Acrdo de 23-11-2009, Proc. n. 214/03.1LDBRG; Acrdo de 19-07-2007, Proc. n. 857/07-1 ; Acrdo de 22-06-2005, Proc. n. 921/05-1.

    Tribunal da Relao do PortoAcrdo de 13-06-2012, Proc. n. 1970/07.3TAGDM.

    P1; Acrdo de 01-02-2012, Proc. n. 109/10.2TAPFR.P1; Acrdo de 23-11-2011, Proc. n. 2237/07.2TAMTS.P1; Acrdo de 22-06-2011, Proc. n. 378/05.0TALSD.P1; Acrdo de 23-02-2011, Proc. n. 690/06.0TAMCN.P1; Acrdo de 12-03-2003, Proc. n. 0212572.

    Tribunal da Relao de CoimbraAcrdo de 28-03-2012, Proc. n. 1133/10.0IDLRA.

    C1; Acrdo de 08-02-2012,Proc. n. 4/02.9IDMGR.C1; Acrdo de 02-11-2005, Proc. n. 2296/05; Acrdo de 13-06-2007, Proc. n. 11773/04.1TDLSB.C1; Acrdo de 09-07-2008, Proc. n. 81/05.0IDMGR.C1; Acrdo de 01-10-2008, Proc. n. 187/06.9IDACB.C1, Acrdo de11-02-2009 ,Proc. n. 930/04.0TACBR-A.C1; Acrdo de 08-11-2011, Proc. n. 668/09.2TDLSB.L1-5; Acrdo de 15-12-2009, Proc. n. 11110/05.8TD.LSB.L1-5; Acrdo de 03-12-2009, Proc. n. 7133/07.0TDLSB.L1-9.

    Tribunal da Relao de voraAcrdo de 08-05-2012, Proc. n. 2149/07.0TAFAR.

    E1; Acrdo de 17-01-2012 Proc. n. 3/09.0IDFAR.E1; Acrdo de 08-11-2011, Proc. n. 151/09.6TALGS.E1; Acrdo de 12-07-2011, Proc. n. 384/08.2TALGS.E1; Acrdo de 22-11-2011, Proc. n. 405/09.1TATVR.E1; Acrdo de 27-09-2011, Proc. n. 185/09.0TABJA.E1; Acrdo de 20-09-2011, Proc. n. 532/08.2TAABF.E1; Acrdo de 19-04-2005, Proc. n. 2686/04-1; Acrdo de 09-12-2003, Proc. n. 2318/03-1.

    Por sua vez, a tese oposta, encontra-se aqui legitimada pelo acrdo fundamento, proferido pelo Tribunal da Relao de vora, em 25 de Maro de 2010, no proc. n 628/07.8TAELV.E1, ao entender que a apreciao do pedido de indemnizao civil deduzido pela Segurana Social referente ao pagamento de indemnizao, corres-pondente ao valor das prestaes em dvida, acrescidos de juros, pressupe, necessariamente, duas circunstncias: a adequao do meio (enxerto civil em processo crime)

    ao fim visado (pedido de indemnizao) e a natureza civil do pedido.

    Segundo esta tese:- O princpio da adeso limita-se unificao de pro-

    cedimentos criminais e civis e restringe-se ao mbito civil das consequncias dos factos com relevncia penal. Dele se exclui a efectivao da responsabilidade disciplinar, administrativa, financeira e tributria, casos em que h uma independncia de aces. Ora, o regime dos arts 71 e segs do CPP, que traduz o princpio da adeso, apenas adjectiva o artigo 129/CP;

    - A relao jurdica que est subjacente ao crime de abuso de confiana contra a Segurana Social tem a na-tureza de jurdica administrativa-tributria (art 11/a), do RGIT) - e da que, na execuo por dvida de contribuies Segurana Social, as questes jurisdicionais sejam da competncia dos Tribunais Tributrios (art 62 do ETAF). Resulta de um acto de gesto pblica, praticado no exerc-cio de uma funo pblica para os fins de direito pblico da pessoa colectiva, ou seja, regido pelo direito pblico e, consequentemente, por normas que atribuem pessoa colectiva pblica poderes de autoridade (ius imperii) para tais fins.

    - Essa relao est sujeita ao princpio da legalidade tributria, pelo que o incumprimento das obrigaes que lhe subjazem se subordina, quer nos seus pressupostos, quer nas suas consequncias, s normas de direito admi-nistrativo-tributrio pr existentes data da prtica do facto danoso (que no coincide com o momento da consumao do crime de abuso de confiana).

    - Apenas jurisdio administrativa-tributria cabe a apreciao da conduta danosa e a fixao dos seus efeitos. No pois admissvel o pedido de indemnizao formu-lado, no mbito do processo de adeso, por no ser o meio prprio para o efeito

    - A dvida de contribuies Segurana Social no emerge de responsabilidade civil contratual, nem emerge de responsabilidade civil extracontratual. O mesmo vale por dizer: no emerge de negcio jurdico celebrado en-tre a entidade empregadora e a Segurana Social, nem emerge de facto ilcito extra-negocial no sentido do dis-posto no artigo 483/CC. Tem sim por fonte a prpria lei, que se inscreve no direito pblico, designadamente o DL n 103/80 de 09/05 (Lei de Bases da Segurana Social), o DL n 42/2001, de 09/02 e legislao complementar. A dvida de contribuies Segurana Social no se rege pela lei civil.

    - O regime da dvida e da sua cobrana obedece a regras especficas constantes desse acervo de direito pblico, designadamente:

    1) A obrigao de pagamento das contribuies e acrs-cimos legais a favor da Segurana Social emerge de relao jurdica administrativa-tributria especial e rege-se pela legislao de direito pblico;

    2) O princpio da adeso ao processo penal e o atinente regime constante dos artigos 71 e segs, do CPP, apenas admite a formulao e conhecimento de pedido de in-demnizao de natureza civil conexa com o facto crime, portanto indemnizao cuja obrigao se situa no mbito das relaes jurdicas privadas.

    3) Consequentemente, o pedido da de indemnizao civil formulado pela Segurana Social extravasa esse prin-cpio da adeso e o atinente regime, pelo que se verifica uma excepo dilatria inominada, que determina o arqui-

  • Dirio da Repblica, 1. srie N. 4 7 de janeiro de 2013 53

    vamento do pedido erradamente dito cvel, o que obsta ao seu conhecimento.

    Equacionada a questo, cumpre apreciar e decidir.Antes de mais, convm, para melhor compreenso da

    questo in judicio efectuar uma breve panormica sobre a relao jurdica tributria.

    IA relao jurdica tributria

    A Lei Geral TributriaO Decreto-Lei n. 398/98, de 17-12-98 - DR n. 290/98

    SRIE I-A, - com subsequentes actualizaes - aprovou a Lei Geral Tributria (LGT), que enuncia e define os princpios gerais que regem o direito fiscal portugus e os poderes da administrao tributria e garantias dos contribuintes.1

    Integram a relao jurdica tributria:a) O crdito e a dvida tributrios;b) O direito a prestaes acessrias de qualquer natureza

    e o correspondente dever ou sujeio;c) O direito deduo, reembolso ou restituio do

    imposto;d) O direito a juros compensatrios;e) O direito a juros indemnizatrios.2

    Na determinao do sentido das normas fiscais e na qualificao dos factos a que as mesmas se aplicam so observadas as regras e princpios gerais de interpretao e aplicao das leis.3

    Consideram-se relaes jurdico-tributrias as esta-belecidas entre a administrao tributria, agindo como tal, e as pessoas singulares colectivas e outras entidades legalmente equiparadas a estas.4

    O sujeito activo da relao tributria a entidade de direito pblico titular do direito de exigir o cumprimento das obrigaes tributrias, quer directamente quer atravs de representante.5

    O sujeito passivo a pessoa singular ou colectiva, o patrimnio ou a organizao de facto ou de direito que, nos termos da lei, est vinculado ao cumprimento da pres-tao tributria, seja como contribuinte directo, substituto ou responsvel.6

    Constitui obrigao principal do sujeito passivo efec-tuar o pagamento da dvida tributria.

    So obrigaes acessrias do sujeito passivo as que visam possibilitar o apuramento da obrigao de imposto, nomeadamente a apresentao de declaraes, a exibio de documentos fiscalmente relevantes, incluindo a conta-bilidade ou escrita, e a prestao de informaes.7

    A substituio tributria verifica-se quando, por im-posio da lei, a prestao tributria for exigida a pessoa diferente do contribuinte e, efectivada atravs do meca-nismo da reteno na fonte do imposto devido.8

    Salvo disposio da lei em contrrio, quando os pressu-postos do facto tributrio se verifiquem em relao a mais de uma pessoa, todas so solidariamente responsveis pelo cumprimento da dvida tributria.

    No caso de liquidao de sociedades de responsabili-dade ilimitada ou de outras entidades sujeitas ao mesmo regime de responsabilidade, os scios ou membros so solidariamente responsveis, com aquelas e entre si, pelos impostos em dvida.9

    A responsabilidade tributria abrange, nos termos fi-xados na lei, a totalidade da dvida tributria, os juros e demais encargos legais.

    Para alm dos sujeitos passivos originrios, a respon-sabilidade tributria pode abranger solidria ou subsidia-riamente outras pessoas, sendo que a responsabilidade tributria por dvidas de outrem , salvo determinao em contrrio, apenas subsidiria.

    As pessoas solidrias ou subsidiariamente responsveis podero reclamar ou impugnar a dvida cuja responsabi-lidade lhes for atribuda nos mesmos termos do devedor principal, devendo, para o efeito, a notificao ou citao conter os elementos essenciais da sua liquidao, incluindo a fundamentao nos termos legais.10

    Sobre a responsabilidade dos membros de corpos so-ciais e responsveis tcnicos, o Artigo 24 da referida Lei, determina:

    1 Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exeram, ainda que somente de facto, funes de administrao ou gesto em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados so subsidiariamente responsveis em relao a estas e solidariamente entre si:

    a) Pelas dvidas tributrias cujo facto constitutivo se tenha verificado no perodo de exerccio do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o patrimnio da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfao;

    b) Pelas dvidas tributrias cujo prazo legal de paga-mento ou entrega tenha terminado no perodo do exerccio do seu cargo, quando no provem que no lhes foi impu-tvel a falta de pagamento.

    2 A responsabilidade prevista neste artigo aplica-se aos membros dos rgos de fiscalizao e revisores oficiais de contas nas pessoas colectivas em que os houver, desde que se demonstre que a violao dos deveres tributrios destas resultou do incumprimento das suas funes de fiscalizao.

    3 A responsabilidade prevista neste artigo aplica-se tambm aos tcnicos oficiais de contas em caso de viola-o dolosa dos deveres de assuno de responsabilidade pela regularizao tcnica nas reas contabilstica e fiscal ou de assinatura de declaraes fiscais, demonstraes financeiras e seus anexos

    A responsabilidade subsidiria efectiva-se por reverso do processo de execuo fiscal.

    A reverso contra o responsvel subsidirio depende da fundada insuficincia dos bens penhorveis do devedor principal e dos responsveis solidrios, sem prejuzo do benefcio da excusso.

    Caso, no momento da reverso, no seja possvel de-terminar a suficincia dos bens penhorados por no estar definido com preciso o montante a pagar pelo responsvel subsidirio, o processo de execuo fiscal fica suspenso desde o termo do prazo de oposio at completa ex-cusso do patrimnio do executado, sem prejuzo da pos-sibilidade de adopo das medidas cautelares adequadas nos termos da lei.

    A reverso, mesmo nos casos de presuno legal de culpa, precedida de audio do responsvel subsidirio nos termos da presente lei e da declarao fundamentada dos seus pressupostos e extenso, a incluir na citao.

  • 54 Dirio da Repblica, 1. srie N. 4 7 de janeiro de 2013

    O responsvel subsidirio fica isento de juros de mora e de custas se, citado para cumprir a dvida tributria prin-cipal, efectuar o respectivo pagamento no prazo de opo-sio, mas no prejudica a manuteno da obrigao do devedor principal ou do responsvel solidrio de pagarem os juros de mora e as custas, no caso de lhe virem a ser encontrados bens.11

    Em caso de substituio tributria, a entidade obri-gada reteno responsvel pelas importncias retidas e no entregues nos cofres do Estado, ficando o substi-tudo desonerado de qualquer responsabilidade no seu pagamento.12

    O pagamento das dvidas tributrias pode ser realizado pelo devedor ou por terceiro.

    O terceiro que proceda ao pagamento das dvidas tri-butrias aps o termo do prazo do pagamento voluntrio fica sub-rogado nos direitos da administrao tributria, desde que tenha previamente requerido a declarao de sub-rogao e obtido autorizao do devedor ou prove interesse legtimo.13

    A cobrana da prestao tributria suspende-se no processo de execuo fiscal em virtude de pagamento em prestaes ou reclamao, recurso, impugnao da liquidao e oposio execuo que tenham por objecto a ilegalidade ou inexigibilidade da dvida exequenda.

    A suspenso da execuo nesse mbito, depende da prestao de garantia idnea nos termos das leis tributrias, podendo a administrao tributria exigir ao executado o reforo da garantia no caso de esta se tornar manifesta-mente insuficiente para o pagamento da dvida exequenda e acrescido.14

    O procedimento tributrio, compreende toda a suces-so de actos dirigida declarao de direitos tributrios, designadamente:15

    a) []b) A liquidao dos tributos quando efectuada pela ad-

    ministrao tributria;c) []d) []e) []f) As reclamaes e os recursos hierrquicos;g)[]h) A cobrana das obrigaes tributrias, na parte que

    no tiver natureza judicial.

    O processo de execuo fiscal tem natureza judicial, sem prejuzo da participao dos rgos da administrao tributria nos actos que no tenham natureza jurisdicional, sendo garantido aos interessados o direito de reclamao para o juiz da execuo fiscal dos actos materialmente administrativos praticados por rgos da administrao tributria.16

    O Cdigo de Procedimento e de Processo TributrioH que ter ainda em conta o Cdigo de Procedimento e

    de Processo Tributrio (CPPT), aprovado pelo Decreto-Lei n. 433/99, de 26 de Outubro, que se aplica, sem prejuzo do disposto no direito comunitrio, noutras normas de direito internacional que vigorem directamente na ordem interna, na lei geral tributria ou em legislao especial, incluindo as normas que regulam a liquidao e cobrana dos tributos parafiscais:

    a) Ao procedimento tributrio;b) Ao processo judicial tributrio;

    c) cobrana coerciva das dvidas exigveis em pro-cesso de execuo fiscal;

    d) Aos recursos jurisdicionais.

    O procedimento tributrio compreende, para efeitos do presente Cdigo:

    []b) A liquidao dos tributos, quando efectuada pela

    administrao tributria;[]g) A cobrana das obrigaes tributrias, na parte que

    no tiver natureza judicial;h)[]i) Todos os demais actos dirigidos declarao dos

    direitos tributrios.17

    A cobrana das dvidas tributrias pode ocorrer sob as seguintes modalidades:

    a) Pagamento voluntrio;b) Cobrana coerciva.18

    A concesso da moratria ou a suspenso da execuo fiscal fora dos casos previstos na lei, quando dolosas, so fundamento de responsabilidade tributria subsidiria, a qual depende de condenao disciplinar ou criminal do responsvel.19

    O processo judicial tributrio compreende:20

    a) A impugnao da liquidao dos tributos, incluindo os parafiscais e os actos de autoliquidao, reteno na fonte e pagamento por conta;

    []n) O recurso, no prprio processo, dos actos praticados

    na execuo fiscal;o) A oposio, os embargos de terceiros e outros inci-

    dentes e a verificao e graduao de crditos;p) O recurso contencioso do indeferimento total ou

    parcial ou da revogao de isenes ou outros benefcios fiscais, quando dependentes de reconhecimento da admi-nistrao tributria, bem como de outros actos administra-tivos relativos a questes tributrias que no comportem apreciao da legalidade do acto de liquidao;

    q) Outros meios processuais previstos na lei.[]

    A nvel da execuo fiscalO processo de execuo fiscal abrange a cobrana co-

    erciva das seguintes dvidas:21

    a) Tributos, incluindo impostos aduaneiros, especiais e extrafiscais, taxas, demais contribuies financeiras a favor do Estado, adicionais cumulativamente cobrados, juros e outros encargos legais;

    b) Coimas e outras sanes pecunirias fixadas em deci-ses, sentenas ou acrdos relativos a contra-ordenaes tributrias, salvo quando aplicadas pelos tribunais comuns.

    2 Podero ser igualmente cobradas mediante pro-cesso de execuo fiscal, nos casos e termos expressamente previstos na lei:

    a) Outras dvidas ao Estado e a outras pessoas colectivas de direito pblico que devam ser pagas por fora de acto administrativo;

    b) Reembolsos ou reposies.

  • Dirio da Repblica, 1. srie N. 4 7 de janeiro de 2013 55

    Considera-se, para efeito do Cdigo, rgo da exe-cuo fiscal o servio perifrico local da administrao tributria onde deva legalmente correr a execuo ou, quando esta deva correr nos tribunais comuns, o tribunal competente.22

    Compete ao tribunal tributrio de 1 instncia da rea onde correr a execuo, depois de ouvido o Ministrio Pblico nos termos do presente Cdigo, decidir os inci-dentes, os embargos, a oposio, incluindo quando incida sobre os pressupostos da responsabilidade subsidiria, a graduao e verificao de crditos e as reclamaes dos actos materialmente administrativos praticados pelos rgos da execuo fiscal. 23

    Esta situao, contudo, no se aplica quando a execuo fiscal deva correr nos tribunais comuns, caso em que cabe a estes tribunais o integral conhecimento das questes referidas 24

    As dvidas exigveis em processo executivo podero ser pagas em prestaes mensais e iguais, mediante requeri-mento a dirigir, no prazo de oposio, ao rgo da execuo fiscal, s no aplicvel s dvidas de recursos prprios comunitrios e s dvidas liquidadas pelos servios por falta de entrega, dentro dos respectivos prazos legais, de imposto retido na fonte ou legalmente repercutido a terceiros, salvo em caso de falecimento do executado, contando-se nesse caso o prazo para o requerimento do pagamento a partir da citao nos termos do n. 4 do artigo 155.

    excepcionalmente admitida a possibilidade de paga-mento em prestaes das dvidas referidas, requerido no prazo de oposio, sem prejuzo da responsabilidade con-tra-ordenacional ou criminal que ao caso couber, quando esteja em aplicao plano de recuperao econmica de que decorra a imprescindibilidade da medida, desde que se preveja a substituio dos administradores e gerentes responsveis pela no entrega das prestaes tributrias em causa.

    O pagamento em prestaes pode ser autorizado desde que se verifique que o executado, pela sua situao econ-mica, no pode solver a dvida de uma s vez, no devendo o nmero das prestaes exceder 36, mas podendo ser alargado at 60 se a dvida exequenda exceder 50 unidades de conta no momento da autorizao.25

    II

    A relao contributiva no sistema previdencial de segurana social

    O art 63 da Constituio da Repblica Portuguesa es-tabelece no n1 que todos tm direito segurana social, e afirma no n 2 que incumbe ao Estado organizar, coordenar e subsidiar um sistema de segurana social []

    A Lei n. 4/2007 de 16 de Janeiro - que revogou a Lei n. 32/2002, de 20 de Dezembro, mas, at revogao ex-pressa, manteve em vigor as disposies legais e regu-lamentares aprovadas ao abrigo das Leis n. 28/84, de 14 de Agosto, n. 17/2000, de 8 de Agosto -. aprovou as bases gerais do sistema de segurana social e definiu as bases gerais em que assenta o sistema de segurana social, adiante designado por sistema, bem como as iniciativas particulares de fins anlogos.

    Todos tm direito segurana social, que efectivado pelo sistema e exercido nos termos estabelecidos na Cons-tituio, nos instrumentos internacionais aplicveis e na presente lei.26

    O sistema previdencial visa garantir, assente no prin-cpio de solidariedade de base profissional, prestaes pecunirias substitutivas de rendimentos de trabalho per-dido em consequncia da verificao das eventualidades legalmente definidas.27

    So abrangidos obrigatoriamente pelo sistema previ-dencial, na qualidade de beneficirios, os trabalhadores por conta de outrem ou legalmente equiparados e os tra-balhadores independentes.28

    O sistema previdencial abrange o regime geral de se-gurana social aplicvel generalidade dos trabalhadores por conta de outrem e aos trabalhadores independentes, os regimes especiais, bem como os regimes de inscrio facultativa abrangidos pelo n. 2 do artigo 51.29

    O sistema previdencial deve ser fundamentalmente au-tofinanciado, tendo por base uma relao sinalagmtica directa entre a obrigao legal de contribuir e o direito s prestaes.30

    So condies gerais de acesso proteco social ga-rantida pelos regimes do sistema previdencial a inscrio e o cumprimento da obrigao contributiva dos trabalha-dores e, quando for caso disso, das respectivas entidades empregadoras. 31

    determinao do montante das quotizaes e das contribuies alude o Artigo 57.32

    As entidades empregadoras so responsveis pelo pa-gamento das quotizaes dos trabalhadores ao seu servio, devendo para o efeito proceder, no momento do pagamento das remuneraes, reteno na fonte dos valores corres-pondentes.33

    As quotizaes e as contribuies no pagas, bem como outros montantes devidos, so objecto de cobrana coerciva nos termos legais.34

    Como j referia LOPES DIAS, sobre o regime ante-rior: A relao jurdica contributiva , portanto, uma obrigao ex lege e nasce ou constitui-se com o facto tributrio (art 36, n1 da LGT), ou seja, quando se ve-rificarem os pressupostos de facto previstos na lei, que no caso se d com o incio do exerccio da actividade profissional (art 60, n 2 da Lei n 17/2000), tornando-se certa ou lquida com a declarao da entidade em-pregadora, exigvel no termo do prazo definido na lei, extinguindo-se no acto do pagamento ou por outra causa legalmente equiparada.

    Como se verifica, esta relao entre sujeitos (ente p-blico sujeito activo, e entidade empregadora/trabalha-dor sujeitos passivos), em que ao sujeito activo assiste o direito de exigir do sujeito passivo uma certa quantia, em tudo semelhante relao jurdica tributria (Cfr. art 1, n 2 da LGT).

    Igualmente as contribuies visam no s a satisfao das necessidades financeiras das instituies competen-tes para o pagamento das prestaes substitutivas de rendimentos de trabalho perdidos, em virtude de con-tingncias previstas na lei, ou compensatrias de certos encargos, mas tambm visam a promoo da justia social e a correco das desigualdades na distribuio da riqueza e do rendimento (art 5, n 1 da Lei Geral Tributria). 35

    E, mais adiante: aquela relao jurdica nasce a partir de uma outra relao jurdica constituda no domnio de outro ramo do Direito - uma relao jurdica laboral fa-zendo incidir sobre o rendimento colocado disposio do sujeito passivo (salrio ou remunerao), uma taxa contributiva.

  • 56 Dirio da Repblica, 1. srie N. 4 7 de janeiro de 2013

    Esta imputao do objecto a uma pessoa ou entidade determina a sua capacidade contributiva e, em princpio, a consequente qualidade de sujeito passivo.

    Dissemos em princpio, porque embora geralmente o sujeito passivo seja o titular da capacidade contributiva (art 18, n 3 da Lei Geral Tributria), pode acontecer que outras pessoas, que no o contribuinte ou sujeito passivo, sejam legalmente responsveis pelo cumprimento da obri-gao contributiva (ou tributria), ou seja, quando outro sujeito se substitui quele relativamente ao qual se veri-ficou o facto tributrio. Trata-se, como se sabe, da figura da substituio tributria (art 20 da Lei Geral Tributria), caso em que o sujeito passivo torna-se estranho relao tributria no sentido de que no parte desta relao por no lhe poder ser exigido o comportamento devido pelo sujeito activo.

    Esta responsabilidade do substituto tributrio legitima-se atravs da reteno na fonte (arts 20 n 2, e 34 da Lei Geral Tributria), pois o substituto s ser admiss-vel se efectivamente se vier substituir ao sujeito passivo propriamente dito, pagando o imposto ao Estado com rendimentos ou riqueza do sujeito dotado de capacidade contributiva.

    A reteno na fonte uma tcnica, uma operao fi-nanceira pela qual determinado indivduo detm, para efeito de entrega ao Estado, um determinado montante (...) antes de proceder ao pagamento de uma quantia que deva a outrem.36

    Todavia, a lei expressa no sentido de responsabilizar exclusivamente as entidades empregadoras pelo pagamento quer das contribuies por si devidas, quer das cotizaes correspondentes aos trabalhadores ao seu servio, devendo descontar nas remuneraes a estes pagas o valor daque-las cotizaes (art 47, da Lei n 32/2002).37

    A respeito do instituto da substituio relevante notar que grande parte da doutrina considera que ela tpica do Direito Fiscal, no se podendo reconduzir a institu-tos jurdicos de outros ramos do Direito. Mas na relao jurdica contributiva, como vimos, tambm a entidade empregadora responsvel pelo pagamento das cotizaes correspondentes aos trabalhadores ao seu servio, utili-zando igualmente a tcnica da reteno na fonte (art 47, n 1 da Lei n 32/2002, de 20 de Dezembro).

    O certo que a substituio, em qualquer dos casos, uma obrigao ex lege e altera a vertente passiva da obrigao.38

    III

    O Regime Especial de Execuo de Dvidas ao Sistema de Solidariedade e Segurana SocialDecorrente da aprovao da anterior Lei de Bases da

    Solidariedade e Segurana Social - Lei n 32/2002, o De-creto-Lei n 42/2001, procedeu criao das seces de execuo tendo em vista uma maior celeridade ao processo de cobrana coerciva, que tanta falta vinha fazendo Se-gurana Social, para poder arrecadar, no mais breve espao de tempo, as contribuies devidas e no cobradas.39

    O Regime Especial de Execuo de Dvidas ao Sis-tema de Solidariedade e Segurana Social, passou pois, a constar do Decreto-Lei n 42/2001, de 9 de Fevereiro, que criou as seces de processo executivo do sistema de solidariedade e segurana social, define as regras especiais daquele processo e adequa a organizao e a competncia dos tribunais administrativos e tributrios.40

    O presente diploma aplica-se ao processo de execuo de dvidas segurana social.

    Para efeitos do presente diploma, consideram-se dvidas segurana social todas as dvidas contradas perante as instituies do sistema de solidariedade e segurana social pelas pessoas singulares e colectivas e outras entidades a estas legalmente equiparadas, designadamente as relativas a contribuies sociais, taxas, incluindo os adicionais, juros, reembolsos, reposies e restituies de prestaes, subsdios e financiamentos de qualquer natureza, coimas e outras sanes pecunirias relativas a contra-ordenaes, custas e outros encargos legais.41

    competente para a instaurao e instruo do processo de execuo de dvidas segurana social a delegao do Instituto de Gesto Financeira da Segurana Social do distrito da sede ou da rea de residncia do devedor.

    Para efeitos do nmero anterior, as instituies de so-lidariedade e segurana social remetem as certides de dvida delegao do Instituto de Gesto Financeira da Segurana Social competente.42

    So ttulos executivos as certides de dvida emitidas, nos termos legais, pelas instituies de solidariedade e segurana social.43

    Compete ao tribunal tributrio de 1. instncia da rea onde corre a execuo decidir os incidentes, os embargos, a oposio, incluindo quando incida sobre os pressupostos da responsabilidade subsidiria, a graduao e a verifica-o de crditos e as reclamaes dos actos materialmente administrativos praticados pelos rgos de execuo.

    Das decises dos tribunais de 1. instncia cabe recurso nos termos da lei.44

    Ao processo de execuo das dvidas segurana social aplica-se, em tudo o que no estiver regulado no presente diploma, a legislao especfica da segurana social, a Lei Geral Tributria e o Cdigo de Procedimento e de Processo Tributrio.45

    Tm personalidade e capacidade judicirias para o pro-cesso de execuo de dvidas segurana social as insti-tuies do sistema de solidariedade e segurana social, as pessoas singulares e colectivas e outras entidades a estas legalmente equiparadas., mas a legitimidade para reclamar os crditos da segurana social em processo executivo a correr nos tribunais comuns pertence ao Instituto de Gesto Financeira da Segurana Social, atravs das respectivas delegaes.46

    Nos tribunais comuns e nos tributrios, as instituies do sistema de solidariedade e segurana social so repre-sentadas por mandatrio judicial, nomeado pela delegao competente do Instituto de Gesto Financeira da Segurana Social.47

    A competncia para autorizao de pagamento em pres-taes das dvidas em processo de execuo do Instituto de Gesto Financeira da Segurana Social.48

    IV

    O crime de abuso de confiana contra a Segurana Social

    Em termos de criminalizao, como assinala Lopes Dias: - Poderemos mesmo dizer que, por causa de alguma ligeireza ou esquecimento do legislador no tratamento da inteleco do bem jurdico e dos critrios de legitimao, se mostraram to ineficazes as sucessivas criminalizaes no domnio da Segurana Social, pelo menos desde que foi publicado o Decreto-Lei n 511/76, de 3 de Julho, o

  • Dirio da Repblica, 1. srie N. 4 7 de janeiro de 2013 57

    qual dispunha no seu art 5: As entidades empregado-ras que no efectuem o pagamento das contribuies dos beneficirios do regime geral de previdncia descontadas nos respectivos salrios, estaro sujeitas s sanes pre-vistas no artigo 453 do Cdigo Penal, se houver abuso de confiana.

    Tal interveno do direito penal mantm-se ainda na redaco do art 6 do Decreto-Lei n 103/80, de 9 de Maio, que estabeleceu o novo regime jurdico das contribuies para a previdncia. Este ser, sem dvida, um exemplo da forma como a interveno do direito penal tem apenas um valor promocional do bem jurdico, (para utilizar uma expresso da Dr Anabela Rodrigues), errada do ponto de vista do enquadramento dogmtico das infraces fis-cais.

    Mas as imprecises tcnicas continuaram, ainda no m-bito da Segurana Social, com a Lei de Bases do Sistema (Lei n 28/84, de 14 de Agosto), onde se preceituava no seu art 46, n 3, que o desvio, pelas entidades empregadoras, das importncias deduzidas nas retribuies a ttulo de contribuies para o regime geral punido, nos termos da legislao geral, como crime de abuso de confiana.

    De facto, a eficcia desta disposio foi igualmente nula, na medida em que a diferena de sentido atribudo s expresses desviar e apropriar determinou na ge-neralidade dos casos, sentenas de absolvio por parte dos tribunais.

    Na sequncia do enquadramento criminal dos ilcitos tributrios com a publicao do Decreto-Lei n 20-A/90, de 15 de Janeiro, que aprovou o regime jurdico das infraces fiscais no aduaneiras (RJIFNA), foi alargado implicita-mente aos ilcitos contributivos da segurana social o tipo de crime de abuso de confiana fiscal.

    No consta, porm, nenhuma deciso judicial tomada na vigncia deste diploma no mbito da segurana social...

    Apenas com a entrada em vigor do Decreto-Lei n 140/95, de 14 de Junho veio a ser introduzido no RJI-FNA um captulo II denominado Dos crimes contra a Segurana Social, onde se inseriam, nomeadamente, os crimes de fraude segurana social, abuso de confiana em relao segurana social e frustrao de crditos da segurana social49

    Na verdade o Decreto-Lei n 140/95, de 14 de Junho introduziu no RJIFNA o captulo II etiquetado Dos crimes contra a Segurana Social, e no art 27-B do RJIFNA, o crime de abuso de confiana em relao segurana social

    A Lei n. 15/2001, de 5 de Junho, ao aprovar o Regime Geral das Infraces Tributrias (designado pela sigla RGIT), criou num nico diploma, sob a designao de Crimes Tributrios, os crimes aduaneiros, fiscais e contra a segurana social, diploma este que est presentemente em vigor, - e que, tem como penas aplicveis aos crimes tributrios a priso e a multa Art.s 87 a 10750

    Os crimes contra a segurana social esto tipificados nos artigos 106.( Fraude contra a segurana social), e 107. (Abuso de confiana contra a segurana social)

    Refere COSTA PINTO,a generalidade dos crimes tri-butrios visa em ltima instncia proteger realidades patri-moniais afectas a finalidades de direito pblico: de forma genrica, o errio pblico e o patrimnio da segurana social. Em regra, o legislador orienta a seleco tpica dos factos em funo dessa idoneidade lesiva ou do dano patrimonial efectivo, embora noutros casos seja relevante (normalmente em termos instrumentais) a violao de

    deveres de colaborao, de lealdade e de informao dos agentes econmicos.51

    O Artigo 107. Abuso de confiana contra a segurana social, dispe:

    1 - As entidades empregadoras que, tendo deduzido do valor das remuneraes devidas a trabalhadores e membros dos rgos sociais o montante das contribuies por estes legalmente devidas, no o entreguem, total ou parcial-mente, s instituies de segurana social, so punidas com as penas previstas nos n.s 1 e 5 do artigo 105. [pena de priso at trs anos ou multa at 360 dias, ou quando a entrega no efectuada for superior a (euro) 50 000, a pena a de priso de um a cinco anos e de multa de 240 a 1200 dias para as pessoas colectivas.]

    2 - aplicvel o disposto nos n.s 4, 6 e 7 do artigo 105. 52

    Como resulta do Acrdo deste Supremo Tribunal, de 4-2-2010, proc. n 106/01.9IDPRT.S1, 3seco:

    - No crime de abuso de confiana fiscal, previsto no art. 105. do RGIT, objecto da omisso de entrega, total ou parcial, a prestao tributria, conceito referido no art. 1., n. 1, al. a), e definido no art. 11., al. a), do RGIT, englobando os impostos e outros tributos cuja cobrana caiba administrao tributria, abrangendo o art. 105. trs tipos de prestaes pecunirias cuja no entrega faz recair sobre o agente a responsabilidade penal por tal crime para alm da prestao tributria deduzida nos termos da lei, prevista no n. 1, o objecto alargado pela definio extensiva dos n.s 2 e 3 (aqui abrangendo prestaes com natureza parafiscal) do citado preceito legal.53

    No crime de abuso de confiana contra a segurana social objecto da omisso de entrega, total ou parcial, o montante das contribuies devidas ao sistema de solida-riedade e segurana social art. 1., n. 1, al. d), e definidas no art. 11., n. 1, al. a), in fine, do mesmo RGIT, como tributos parafiscais cuja cobrana caiba administrao da segurana social, abrangendo, nos termos do n. 1 do art. 107., o montante das contribuies legalmente devidas por trabalhadores e membros de rgos sociais, deduzido pela entidade empregadora, do valor das remuneraes devidas a uns e outros.

    No crime de abuso de confiana contra a segurana so-cial, a aco positiva pressuposto da subsequente conduta tpica omissiva, consubstanciada no desconto, na reteno na fonte, das contribuies deduzidas no valor das remu-neraes pagas aos trabalhadores, incide sobre um valor, consistindo a subsequente omisso, estruturante do crime, na no entrega, no desvio, no descaminho de uma quantia pecuniria, que por via dessa omisso deixa de integrar, como direito de crdito, a esfera jurdica patrimonial da administrao da segurana social.

    Em ambas as infraces esto em causa crditos de impostos ou de tributos fiscais ou parafiscais devidos ao Estado, estabelecendo-se uma relao entre o Estado - Administrao Fiscal ou Estado - Administrao da Segurana Social, enquanto sujeito da relao jurdica tributria, titular do direito de exigir o cumprimento das obrigaes tributrias, titular do crdito do imposto ou do direito de crdito de quotizaes/contribuies; por outro lado, o sujeito passivo que, nos termos da lei, est vinculado ao cumprimento da prestao tri-butria, seja como contribuinte directo, substituto ou responsvel.

  • 58 Dirio da Repblica, 1. srie N. 4 7 de janeiro de 2013

    Acresce que na interpretao do art. 107., mesmo an-tes de 2009, estava sempre presente na determinao da penalidade aplicvel a necessidade de chamada colao do critrio do valor, o que se impe, pois as contribuies deduzidas tm uma dimenso econmica, traduzida em valor pecunirio, o qual se reflecte na qualificao do crime em termos de maior ou menor gravidade e demais aspectos, o que se reconduz a patrimonialidade. Independentemente da catalogao e definio do bem jurdico tutelado, o que est em causa em ambos os casos a arrecadao de receitas, o patrimnio tributrio.

    Pressupem, ambos os crimes uma relao em que in-tercedem trs sujeitos: o Estado - Administrao Fiscal, titular do direito do crdito de quotizaes; o contribuinte originrio propriamente dito, que o sujeito substitudo, e, por ltimo, um terceiro, o substituto, o nico sujeito em posio de cometer o crime.

    Quer o art. 105., quer o art. 107., tm em vista situa-es de substituio tributria, mas no primeiro caso, seja a substituio prpria ou imprpria, no se reconduzindo aos casos em que usada a tcnica de reteno na fonte do imposto devido.

    Em ambos os casos estamos perante crimes omissivos, crimes de mera inactividade, em que a omisso integradora do ilcito antecedida de uma aco, de um comporta-mento actuante, positivo, de facere, consubstanciado numa conduta legal, de prvia deduo (obrigao de reteno), no caso da segurana social, do valor das remuneraes devidas a trabalhadores e membros de rgos sociais, que conduz a que o substituto se converta num depositrio das quantias deduzidas, figurando como um intermedirio no processo de arrecadao da receita, constituindo-se na obrigao de entrega do retido, consubstanciando-se na no entrega, total ou parcial, do que estava obrigado a entregar administrao tributria ou s instituies de segurana social.

    Assentam ambos os crimes numa conduta bifsica, se-guindo-se a uma primeira fase de actuao perfeitamente lcita a deduo que funciona como seu pressuposto, uma outra traduzida numa omisso.

    A opo do legislador na soluo do art 27-B do RJI-FNA foi a de acentuar a leso patrimonial como resultado tpico, ao centrar a ilicitude no dano causado ao errio pblico, ou da segurana social, e, portanto, primacial-mente no desvalor do resultado, impondo que, para a consumao tpica do abuso de confiana a no entrega das contribuies retidas fosse acompanhada de apropriao, a qual se traduz necessariamente, na inverso do ttulo de posse ou deteno, passando o agente a comportar-se relativamente coisa, que recebera uti alieno, como uti dominus.

    Noutros termos, o propsito de restituio s exclui a apropriao se o agente no se tiver colocado na situao de impossibilidade fctica expressa, nomeadamente, na falta ou insuficincia de meios patrimoniais de pagar, entregar ou restituir54

    Com o RGIT houve mudana do estatuto normativo do facto.

    Como salienta COSTA ANDRADE, tambm do lado da Segurana Social desapareceram da estrutura tpica da incriminao as referncias leso da propriedade, j sob a forma de apropriao ou descaminho, j sob a forma de uma inteno de obter vantagem indevida ou de causar prejuzo, frmula que, [] se confunde, no raro, com a mesma apropriao.55

    Com efeito, A conduta agora sancionada penalmente j no corresponde a uma apropriao de bens patrimoniais alheios, no configurando, como tal, aquela danosidade so-cial prpria da figura do abuso de confiana como um dos crimes paradigmticos contra a propriedade. Nem sequer se exige - como acontecia na verso originria do RJIFNA - uma inteno de apropriao. Para se consumar o crime, basta agora a mera violao do dever legal de entrega tempestiva das prestaes deduzidas ou retidas. 56

    Como se assinala nas alegaes do Ministrio P-blico:

    Assim, o comportamento do agente, que no caso uma omisso pura, integrador do tipo de ilcito e do tipo de culpa, consiste em no entregar, dolosamente, Segurana Social, no vencimento da obrigao tributria que sobre ele impende enquanto devedor contributivo substituto, o valor das contribuies devidas pelos tra-balhadores e membros dos rgos sociais Segurana Social, que deduzira das remuneraes destes.

    V

    O princpio da adeso o pedido de indemnizao civil em processo penal

    O pedido de indemnizao civil fundado na prtica de um crime deduzido no processo penal respectivo, s o podendo ser em separado, perante o tribunal civil, nos casos previstos na lei.57

    Refere MAIA GONALVES:A prtica de uma infraco criminal possvel fun-

    damento de duas pretenses dirigidas contra os seus agentes, uma aco penal, para julgamento, e, em caso de condenao, aplicao das reaces criminais ade-quadas, e uma aco cvel, para ressarcimento dos danos patrimoniais e no patrimoniais a que a infraco tenha dado causa.

    A unidade de causa impe entre as duas aces uma estreita conexo. Mas certo que se no confundem, e por isso mesmo se tem discutido se devero ser objecto do mesmo processo, ou se devero antes ser decididas em processos autnomos, e mesmo em jurisdies di-ferentes.

    Assim, apareceram os sistemas da identidade, o da absoluta independncia e o da interdependncia, tam-bm designado por sistema da adeso.

    a) O sistema da identidade s pode ter hoje um inte-resse histrico. Apelidando-o de sistema da confuso total, Figueiredo Dias, Sobre a reparao de perdas e danos em processo penal, estudo in memoriam do Prof. Beleza dos Santos, Bol. da Fac. de Dir. de Coimbra, 1966, pg. 88 e separata, diz que corresponde a uma fase de evoluo em que se confunde ainda o direito penal como o civil e a uma concepo do processo penal onde no est ainda presente o interesse da sociedade na punio do culpado, mas apenas o interesse da vtima em obter vingana e reparao, indicando um estdio primitivo das legislaes.

    b) O sistema da absoluta interdependncia arranca das diferentes finalidades que as aces penal e cvel se propem realizar. o sistema perfilhado pelas legis-laes inglesas, americana e brasileira. Vejam-se, entre ns, sobre este sistema, Cavaleiro de Ferreira, Curso, I pgs 16-17; Castanheira Neves, Sumrios, pg. 74 e

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    Figueiredo Dias, loc. cit. pg. 89 e Direito Processual Penal, I, 540 e segs.

    c) O sistema da interdependncia ou da adeso perfilhado pela maioria das legislaes e comporta um sem nmero de cambiantes que tm como denominador comum a possibilidade ou, obrigatoriedade de juntar a a aco cvel penal, permitindo que o juiz penal decida tambm a aco cvel.58

    A indemnizao de perdas e danos emergentes de crime assumia-se, na tradio jurdica portuguesa, como uma consequncia jurdica de carcter penal, dimenso de po-ltica criminal ligada reaco criminal.

    o que testemunhava o art 75 3 do Cdigo Penal de 1886.

    O arbitramento oficioso da indemnizao era uma con-sequncia jurdica do crime que no se identificava com a indemnizao civil, quer nos fins, quer nos fundamentos, nem tinha que coincidir com o seu montante.

    Na verdade, embora fosse legalmente possvel o exer-ccio da aco cvel em conjunto com a aco penal, con-forme arts 29 a 34 do Cdigo de Processo Penal de 1929, - referindo-se o art 29 indemnizao por perdas e danos - j o art 34 referindo-se reparao por perdas e danos determinava que o juiz, no caso de condenao, arbitrar aos ofendidos uma quantia como reparao por perdas e danos, ainda que lhe no tenha sido requerida.

    O quantitativo da indemnizao era determinado se-gundo o prudente arbtrio do julgador, que atenderia gravidade da infraco, ao dano material e moral por ela causado, situao econmica e condio social do ofendido e do infractor. 2

    No domnio do direito anterior ao Cdigo Penal de 1982, a reparao por perdas e danos arbitrada em processo penal tinha natureza especificamente penal. Com efeito, na me-dida em que se postergava o princpio da necessidade do pedido e se considerava a indemnizao como um efeito necessrio da condenao penal, definiam-se critrios pr-prios da sua avaliao, distintos dos estabelecidos pela lei civil (arts. 34.. e 450.., n. 5, do CPP de 1929) e no se previa a possibilidade de transaco ou de renncia ao direito e, desistncia do pedido.

    Era esta a posio dominante da jurisprudncia, bem como de vria doutrina da Escola de Coimbra Figueiredo Dias, Castanheira Neves e Eduardo Correia,

    Porm, a doutrina dominante considerava a indemniza-o arbitrada como de natureza civil, - Vaz Serra, Cavaleiro de Ferreira, Gomes da Silva e Pereira Coelho.59

    Passando a ser determinada de acordo com os pressupostos e critrios, substantivos, da lei civil, por fora da norma do art. 128. do CP de 1982 (reproduzida posteriormente, no art. 129., do CP/95), a reparao passou a considerar-se, como pura indemnizao civil que, sem embargo de se lhe reconhecer uma certa funo adjuvante, no se confunde com a pena.

    No plano do direito adjectivo, o actual Cdigo de Pro-cesso Penal (CPP), mantendo o sistema de adeso, veio conferir quela aco de indemnizao pela prtica de um crime, formalmente enxertada no processo penal, a estrutura material de uma autntica aco cvel, acolhendo, inequivocamente, os princpios da disponibilidade e da necessidade do pedido (arts. 71, 74. a 77. e 377, do CPP) e prescrevendo que a deciso final, ainda que absolutria, que conhea do pedido cvel, constitui caso julgado nos termos em que a lei atribui eficcia de caso julgado s sentenas civis (art. 84. do CPP).

    Este efeito no penal da condenao ligada, porm, pr-tica de crime a fonte ou causa de pedir era o crime mas a indemnizao assentava nos pressupostos de natureza cvel - continuou a afirmar-se no universo jurdico-criminal portu-gus, de forma que pelo acrdo do Plenrio das Seces Criminais do Supremo Tribunal de Justia, de 16 de Outu