arecpção espanhola de nietzsche.pdf

Upload: fzyndel

Post on 01-Mar-2018

220 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  • 7/26/2019 ARecpo espanhola de Nietzsche.pdf

    1/28

    Cad. Nietzsche, So Paulo, v.36 n.1, p. 17-44, 2015. 17

    A recepo espanhola de Nietzsche nos ltimos quarenta anos

    A recepo espanhola de

    Nietzsche nos ltimosquarenta anos*

    Diego Snchez Meca**

    Resumo: o artigo analisa a recepo do pensamento de Nietzsche naEspanha nos ltimos quarenta anos, mostrando as muitas vertentes pelas

    quais a obra do filsofo foi lida e as muitas influncias que ela exerceu,como na poltica, na esttica e nas artes. Num primeiro momento, a an-lise apresenta muitos autores que leram Nietzsche e mostra como a cadamomento as ideias do filsofo eram invocadas em busca de renovao,sejam elas morais, estticas ou polticas. Num segundo momento, traz luz os estudos acadmicos e a diversidade de temas da filosofia nietzs-chiana neles abordados.Palavras-chave: recepo - Nietzsche - Espanha - interpretao

    1. A recepo de Nietzsche na Espanha at 1980

    A recepo do pensamento e da obra de Nietzsche no mundohispnico tem sido muito bem tratada e estudada por Gonzalo So-bejano em seu livroNietzsche na Espanha1, em relao ao perodoque parte do incio desta recepo at o final da guerra civil. So-bejano analisa pormenorizadamente por que e de que modo houve

    o interesse e a influncia de Nietzsche neste perodo em uma am-pla quantidade de autores, documentando sua anlise de modocompetente e exaustivo. Como mostra o autor, no plano poltico,

    * Traduo de Hlio Simes.** Professor da Universidade de Madrid (UNED), Madrid, Espanha. E-mail: dsanchez@

    fsof.uned.es.1 SOBEJANO, G.Nietzsche na Espanha. Madrid: Gredos, 1967.

  • 7/26/2019 ARecpo espanhola de Nietzsche.pdf

    2/28

    Cad. Nietzsche, So Paulo, v.36 n.1, p. 17-44, 2015.18

    Meca, D. S.

    o marco desta recepo inicial foi constitudo pelo movimento re-generacionista que surgiu a partir da perda de Cuba, a ltima co-

    lnia do Imprio Espanhol, e que, com uma profunda conscinciada decadncia da Espanha, tratava de impulsionar um maior n-vel cultural e uma melhor integrao do nosso pas na Europa. Noplano esttico-literrio, esse movimento de renovao recebeu onome de modernismo, enquanto no plano mais estritamente filos-fico e pedaggico se polarizou, mais que em nenhum outro lugar,noKrausismo, introduzido por Julin Sanz del Ro e difundido pela

    Institucin Livre de Enseanza. Esse complexo marco intelectuale ideolgico fez seguramente com que, entre as ideias nietzschia-nas, se prestasse mais ateno s que melhor sintonizavam como impulso de renovao com o qual, como um denominador co-mum de todos esses movimentos, se pretendia sair rapidamenteda profunda prostrao da Espanha no aspecto cultural, poltico eeconmico: a afirmao da vida como vontade de potncia, a exal-tao da nobreza e do esprito de autossuperao em oposio aopessimismo, ao nivelamento e a inrcia da ordem social existente, eo esprito crtico que enfrenta o tradicionalismo petrificado em dog-mas religiosos, metafsicos e polticos e trata de abrir ambiciosasperspectivas de um futuro melhor. Nietzsche entusiasma, portanto,muitos jovens dessa poca animados e vidos de um esprito di-ligente de renovao por sua caracterstica exaltao da vontade,com que se cr capaz de empreender grandes realizaes em vezde paralisar-se pelo pessimismo e pela negao de vida tal comopropunha Schopenhauer. Concretamente, apreciava-se na ideia dealm-do-homem essa ideia mesma de superao, que est insepa-

    ravelmente ligada mudana de valores, s novas tbuas e novamoral do homem seleto que devia ser implantada mediante umacrtica que generalizasse uma forte resistncia ao convencional, aotradicionalismo que se convertera em mesquinho disfarce de falsoamor pela grandeza do passado.

    Foi recebido, em ltima instncia, um Nietzsche vitalista,no s no sentido biolgico do termo, mas tambm culturalista, pois

  • 7/26/2019 ARecpo espanhola de Nietzsche.pdf

    3/28

    Cad. Nietzsche, So Paulo, v.36 n.1, p. 17-44, 2015. 19

    A recepo espanhola de Nietzsche nos ltimos quarenta anos

    o cultural aqui interpretado como expresso ou projeo de ideiasvitais, obras literrias e artsticas ou empresas culturais e polticas.

    Assim manifestado no primeiro escrito publicado em castelhanosobre Nietzsche, escrito por Joan Maragall em 1893, no qual apre-senta Nietzsche como o defensor de uma nova ideia de liberdade ede abertura a um novo futuro por construir:

    Nietzsche vem afirmando o livre-arbtrio, a vontade como grandeagente impulsor da vida. Na essncia dos seres afirma Nietzsche no h causas nem influncias, nem meios ambientes, nem necessida-des que valham: a vontade de cada um sua causa e seu meio, e a leide sua existncia2.

    Outro catalo, Pompeu Gener, confessa ser partidrio deNietzsche por seu culto apaixonado vida e seu convencimentoprofundo de que todo o cristianismo tem sido uma obra de morte,anti-humanitria e que seria destrudo3. Mesmo aqueles que noveem Nietzsche com simpatia, se fixam nas mesmas ideias, aindaque estas meream uma avaliao dissemelhante. Assim, por exem-plo, Ricardo Becerro de Bengoa, que, para desacreditar Nietzsche,o trata como um pobre enfermo mental, o associa com Stirner e im-pugna sua ideia de alm-do-homem como o logro do demasiadohomem ou do homem e meio4, acrescentando que o substancial deseu pensamento a doutrina do domnio e preeminncia da aristo-cracia frente aos valores democrticos e igualitrios5.

    2 Maragall, J., Nietzsche, In:LAvenc, Barcelona, Julho de 1893; Cf. Sobejano, G., op. cit.,p. 37.

    3 URALES, F.,La evolucin de la filosofa en Espaa, Barcelona, Ed. Cultura Popular, 1968,p. 181.

    4 BECERRO DE BENGOA, R. Sobre Nietzsche, In:La Ilustracin espaola y americana,Madrid, Fevereiro de 1894. Cf. SOBEJANO, G. Reflejos de Nietzsche en el mundo hispni-co. In:Revista de Occidente de1973 (125-126), p. 303.

    5 significativa, nesse sentido, a recepo do pensamento de Nietzsche nestes anos por partedo movimento anarquista, que o aceita a partir da perspectiva de um acratismo aristocratizan-te por sua oposio frontal e sua crtica radical ao Estado como macroestrutura de dominao

  • 7/26/2019 ARecpo espanhola de Nietzsche.pdf

    4/28

    Cad. Nietzsche, So Paulo, v.36 n.1, p. 17-44, 2015.20

    Meca, D. S.

    Talvez um dos autores que melhor reflete a atitude do modode recepo de Nietzsche dentro do movimento regeneracionista

    Ramiro de Maeztu quem, em sua poca, apareceu como o nietzs-chiano mais exaltado, nas palavras de Unamuno. Isto deu origema exclamaes tais como: que venha o alm-do-homem messinicocujo valor heroico nos mobilize a nos desprender da corcova do pas-sado que nos impede de realizarmos nossos sonhos6. No segundoMaeztu j no se percebe esse fervor nietzschiano, mas permanecesua apreciao positiva do esprito de superao, sua valorao daintuio frente ao objetivismo racionalista e a exigncia de novosvalores, todos juntos com outros elementos j mais polmicos comoa estimao positiva da guerra e um determinado ideal de homemregenerado. Em suma, o que de Nietzsche considerado por Ma-eztu o pensamento estimulante e rendvel frente paralisia e adecadncia da Espanha, e assim se pode falar de influncia clarada ideia de Nietzsche da vontade de potncia na concepo maduraque Maeztu desenvolve sobre os valores objetivos7. H tambm cla-ros vestgios de ideias nietzschianas nas obras e personagens de PoBaroja, que caracteriza com simpatia Nietzsche de mdico rude eimplacvel para com os enfermos da vontade8. Ortega assinaloucom perspiccia o carter nietzschiano de Andrs Hurtano, o per-sonagem deEl rbolde la cincia, que precisamente um mdicoque sonha com realizaes culturais capazes de despertar o esforoda vontade, a fora da vida, frente inercia cinza do objetivismo

    opressiva. Cf. GINER DE LOS ROS, F. Nietzsche, fragmentos de un estudio sobre el anar-

    quismo, Madrid, 1916. Cf. Sobejano, G.,Nietzsche en Espaa, op. cit., p. 61-62.6 MAEZTU, R.,Hacia otra Espaa, 1899; Cf. SOBEJANO, G.,Nietzsche na Espanha, op. cit.,

    p. 57-61 e 318-347.7 Tambm Azorn expressa, em geral, uma atitude muito receptiva diante da obra de Nietzsche,

    e deixa isso patente em seu artigo La Voluntad (1902) e em suas Confesiones de un pequeofilsofo (1904).

    8 BAROJA, Po. Nietzsche y la filosofa. In: Revista Nueva 1899, 15 de Fevereiro e 5 deAgosto. Ver igualmente Nietzsche ntimo. In: El Imparcial 1901, 9 de Setembro e 7 deOutubro, e El xito de Nietzsche. In: El Globo, Dezembro de 1902; Cf. Sobejano, G.,

    Nietzsche na Espanha, op. cit., p. 347-395.

  • 7/26/2019 ARecpo espanhola de Nietzsche.pdf

    5/28

    Cad. Nietzsche, So Paulo, v.36 n.1, p. 17-44, 2015. 21

    A recepo espanhola de Nietzsche nos ltimos quarenta anos

    cientfico que promove o abstracionismo da atitude positivista emecanicista9. Por outro lado, a posio de Antonio Machado frente

    a Nietzsche foi sempre ambivalente. Mairena no simpatiza aber-tamente com Nietzsche. Decerto, a Machado interessa o indiv-duo, a vida, a esttica, o conhecimento intuitivo, o estilo literrioe potico, ou seja, tudo o que interessa aos nietzschianos de seutempo, contudo, h aspectos do pensamento de Nietzsche como amoral aristocrtica e suas derivas polticas que no se encaixamcom a sua sensibilidade. E quase o mesmo pode ser dito, em parte,de Unamuno, que expressamente insiste no pouco apreo e at nahostilidade para com as ideias nietzschianas, com o anarquismotranscendental, filosfico e explosivo. Ele diz que tem contribu-do para criar gnios no pouco tolos e que figurem ter alma delees por terem aprendido seus aforismos... difcil simpatizar comos nietzschianos, sobretudo com os nascidos em pases catlicosonde a ignorncia sobre a religio geral10. No obstante, quandose l atenciosamente Unamuno, no incomum que este autor semostre muito mais nietzschiano do que ele tencione parecer. Poisaspectos estruturais bsicos do seu modo de pensar coincidem comabordagens de Nietzsche, como, por exemplo, em sua crtica razomoderna e em sua afirmao irracional da vida como vida eterna,separando-lhes s no que Nietzsche conclui desta afirmao desdea crena pag no eterno retorno e Unamuno desde o dogma cristoda imortalidade. Por ltimo, quanto presena de Nietzsche em Or-tega y Gasset, talvez ainda seja preciso realizar um estudo em pro-fundidade que analise precisamente essa complexa e rica relao. O

    jovem Ortega se refere a sua leitura da obra de Nietzsche como uma

    travessia de uma zona trrida cuja temperatura lhe proporciona or-gulho e crtica ante a espanhola venerao nacionalista do passado.

    9 ORTEGA Y GASSET, J., Po Baroja: anatoma de un alma dispersa, em Obras Completas,ed. Revista de Occidente, Madrid, Vol. IX, p. 491.

    10 UNAMUNO, M., Voltaire, Rousseau, Nietzsche, em Contra esto y aquello (1912); Cf.SOBEJANO, G.,Nietzsche na Espanha, op. cit., p. 276-318.

  • 7/26/2019 ARecpo espanhola de Nietzsche.pdf

    6/28

    Cad. Nietzsche, So Paulo, v.36 n.1, p. 17-44, 2015.22

    Meca, D. S.

    Nietzsche desperta no primeiro Ortega o entusiasmo pela vitalidadedo homem distinto, para quem viver mais viver, e para quem a

    moral um conjunto de valores que esse homem d a si mesmo deacordo com seu sentido de liberdade. Este alm-do-homem no re-presenta um destino fatdico e imutvel, mas o ponto de partida doque se pode ser. Devem-se denunciar as mltiplas e sutis formas deresignao e ressentimento contra si mesmo que minam e anulam avitalidade e as possibilidades do homem contemporneo: o alm--do-homem o sentido do homem porque a melhoria do homem,e o homem deve ser superado porque ele ainda pode ser melhor11.No Ortega maduro, por outro lado, percebe-se igualmente a afirma-o nietzschiana da vida frente aos limites da razo moderna, mas,nesse caso, essa afirmao no irracional como em Unamuno, masretorna razo mesma com a inteno de reform-la em uma razovital, uma razo capaz de servir a valores vitais, a uma cultura e auma moral da vida e para a vida.

    Entre 1939 e os anos sessenta do sculo passado, ocorreu umsilncio significativo e olvido do pensamento nietzschiano. Sobe-

    jano fala do distanciamento dos jovens intelectuais desta poca emrelao a Nietzsche e sua preferncia maior por Marx, na medidaem que, a partir da perspectiva em que Nietzsche foi recebido einterpretado anteriormente, sua influncia foi nociva em relao Guerra Civil e de suas consequncias: a vontade se faz violn-cia, a aristocracia se degenerou em autoritarismo, o individualismoem anarquia fracassada, a glorificao da vida em desespero comrespeito ao sentido humano e solidrio da vida12. Conquanto noseja possvel estabelecer uma relao direta neste sentido, em todo

    caso certo que o interesse por Nietzsche somente reaparece naEspanha ao cabo de uma profunda mudana poltica resultante

    11 ORTEGA Y GASSET, J. Teora del clasicismo II (1907); ver igualmente El sobrehom-bre (1908), que um comentrio de Ortega sobre o livro de G. Simmel, Schopenhauer und

    Nietzsche (1907); Cf. SOBEJANO, G.Nietzsche na Espanha, op. cit., pp. 527-565.12 SOBEJANO, G.Nietzsche na Espanha, op. cit., p. 664.

  • 7/26/2019 ARecpo espanhola de Nietzsche.pdf

    7/28

    Cad. Nietzsche, So Paulo, v.36 n.1, p. 17-44, 2015. 23

    A recepo espanhola de Nietzsche nos ltimos quarenta anos

    de uma transio democracia, consolidada com a integrao denosso pas na Comunidade Europeia, e da forte transformao cul-

    tural que essa mudana representou. Logo se volatilizaram os l-timos resduos da cultura nacional catlica do tardofranquismo ese rompeu decisivamente com o passado filosfico imediato vistocomo uma etapa de involuo tradicionalista. Entre o final dos anossessenta e incio dos anos setenta, uma gerao de jovens filosfi-cos comeou j a protagonizar esse processo de ruptura a partir detrs reas tericas bem definidas: o marxismo, a filosofia analticae o nietzschianismo. Em seguida, a recepo de Nietzsche naquelapoca a recepo de Nietzsche dos autores franceses do mo-mento, tais como Deleuze, Foucault, Bataille e Klossowski, cujasobras so as primeiras a serem traduzidas e difundidas. Devido influncia francesa, o interesse centralizado em questes como acrtica nietzschiana da linguagem, de modo a refutar as doutrinase sistemas periclitados (Foucault); a afirmao do devir, o jogo, oacaso e o mltiplo como denncia das foras reativas da dialtica,o ressentimento e a m conscincia (Deleuze); a exaltao do mo-mento, da sorte, do talvez, da ligeireza e imanncia (Bataille); apulsionalidade do indivduo que aceita o eterno retorno e a inter-pretao psicanaltica do pensamento nietzschiano (Klossowski).Em suma, Nietzsche visto como o pensador que abre espao a umnovo modo de pensar e a uma nova estrutura a partir da qual os sig-nificados podem adquirir outros significados. J no o Nietzscheenaltecedor da vontade de potncia e da exaltao vitalista, comonos tempos de 1898, nem o terico do alm-do-homem e da moraldos senhores, como em torno de 1914. Agora Nietzsche recebido

    como um crtico da razo, do cristianismo e da cultura modernaque possibilita uma crtica total a partir de uma atitude de niilismoativo, o filsofo que faz do filosofar um experimento, o defensor doacaso e afirmador de um devir inocente.

    Esse o horizonte hermenutico dos artigos que compem olivro que presumi como ponto de partida do novo interesse em Niet-zsche na Espanha:En favor de Nietzsche,publicado em 1972 e com

  • 7/26/2019 ARecpo espanhola de Nietzsche.pdf

    8/28

    Cad. Nietzsche, So Paulo, v.36 n.1, p. 17-44, 2015.24

    Meca, D. S.

    a colaborao de Eugenio Tras, Fernando Savater, S. Gonzlez No-riega, P. Fernndez Flrez, A. Gonzlez Garca, Javier Echeverra

    e Ramn Barce. Esses autores, sobretudo Tras e Savater, sero osque com mais impacto desenvolvem um pensamento original comcertas ressonncias nietzschianas. Como Nietzsche, Tras umescritor cuidadoso e verstil e significativo que, em 1971, pu-blicouLa dispersin, um livro de aforismos de um profundo sabornietzschiano. EmDrama e identidad(1974) recorrente a atenoao sentido trgico da vida, e mais tarde em sua Lgica del li-mite (1991), a experincia trgica mostra seu impulso afirmativoe criativo. Tambm em sua Filosofia del futuro(1983) oferecidauma verstil interpretao do eterno retorno, e sua ocupao comNietzsche reaparece em seu artigo Instante y eternidad (Una apro-ximacin alAs hablo Zaratustra de Nietzsche) e em seu livroElhilo de la verdad, de 2004, no captulo intitulado Las metamorfo-sis del espritu. Quanto a Fernando Savater, sua aproximao ini-cial com Nietzsche esteve muito mais diretamente vinculada a suaatitude crtica caracterstica: para ns, o essencial de Nietzsche a blasfmia... contra as formas de f de Deus, a identidade pessoal,a razo cientfica, as lies e o sentido da histria, as categoriasgramaticais, a compaixo, o autossacrifcio, os direitos dos homens,o democratismo humanista13. O Nietzsche de Savater o crtico daconscincia e da valorizao do corpo como realidade expressiva;o instaurador do acaso que rompe os laos da causalidade e propea fidelidade ao instante, no esquecimento da memria da prpriasubjetividade; e o pensador rebelde disposto a pulverizar verda-des e sistemas estabelecidos que possam representar algum im-

    pedimento liberdade. Em suas obras posteriores,Invitacin a latica,La tarea del hroe,tica como amor propio,Idea de Nietzscheetc., esse impulso nietzschiano de golpear as estruturas sociais e

    13 SAVATER, F. Inventario, Madrid, Taurus, 1973, Prlogo; outros trabalhos de Savater:Nihilismo y accin, Madrid, Taurus, 1971; Conocer Nietzsche y su obra, Barcelona: Dopesa,1979;Idea de Nietzsche, Barcelona: Ariel, 2000.

  • 7/26/2019 ARecpo espanhola de Nietzsche.pdf

    9/28

    Cad. Nietzsche, So Paulo, v.36 n.1, p. 17-44, 2015. 25

    A recepo espanhola de Nietzsche nos ltimos quarenta anos

    ideolgicas para despoj-las de suas anuncias caducas e esclero-sadas pode ser percebido junto ao propsito de promover os valores

    que permitem ao indivduo ser fiel a suas convices e princpios14

    .

    2. Os ltimos trinta anos.

    Em todo caso, a partir dos anos oitenta se esboa, de maneiracada vez mais firme, o interesse pelo pensamento de Nietzsche emseus aspectos mais propriamente filosficos. significativo que, aocontrrio do que aconteceu em outros mbitos geogrficos, na Es-panha no foram os especialistas em tica ou em esttica que sedetiveram mais em Nietzsche, mas os historiadores da filosofia e,sobretudo, os metafsicos. O autor mais determinante para a inter-pretao de Nietzsche foi Heidegger, no entanto os novos intrpre-tes no se limitaram simplesmente a parafrasear sua exegese. Masfoi a partir da topologia metafsica dessa recepo que doravante seinterpretaram e analisaram os problemas ticos, estticos e polti-cos. Exemplos eloquentes disso so as obras que foram publicadasnos anos oitenta. Assim, na monografia de Juan Luis Vermal, Lacrtica de la metafsica en Nietzsche15, se aborda o dilogo ou contro-vrsia entre Nietzsche e Heidegger, na convico de que apresen-tam caminhos decisivos e alternativos ante uma crise da metafsica

    14 Em 1971, Luis Jimnez Moreno publica sua obraEl pensamiento de Nietzsche (Labor,Barcelona), que se prope a apresentao da figura de Nietzsche margem de partidarismos

    e utilizaes, isto , doravante o propsito de leitura em chave filosfica. Dessarte, no solo dafilosofia de Nietzsche, mas tambm de sua formao e de suas consequncias. Para JimnezMoreno, Nietzsche um vitalista que se ope com fora a todo idealismo e que se concentrano problema da vida como vida humana. No mesmo sentido: El pensamiento de Nietzsche,Madrid: Cincel, 1984.

    15 VERMAL, J.L. La crtica de la metafsica en Nietzsche. Barcelona: Anthropos, 1987.Vermal tem prosseguido esse estudo em trabalhos posteriores, tais como Acerca de lasuperacin nietzscheana de la metafsica. In: Nietzsche actual e inatual. Buenos Aires:1994; Nietzsche, el ltimo metafsico. In:Revista de Occidente, 226 (2000). Quin es elNietzsche de Heidegger?. In:Estudios Nietzsche, 1 (2001).

  • 7/26/2019 ARecpo espanhola de Nietzsche.pdf

    10/28

    Cad. Nietzsche, So Paulo, v.36 n.1, p. 17-44, 2015.26

    Meca, D. S.

    que central e determinante para nossa poca. Apesar de admitir,na contramo do que costuma se aceitar atualmente, a pertinncia

    da leitura heideggeriana de Nietzsche, a possibilidade desse di-logo ou controvrsia exige, para Vermal, uma leitura deste ltimoque exceda os limites nos quais reduzido na interpretao de Hei-degger. Desse modo, poderiam ficar desenhadas as possibilidadeshistricas essenciais que se abrem, em nossa poca, entre uma pos-svel assuno de uma fora configuradora (vontade de potncia),mais alm de seus encerramentos metafsicos, ou a necessidade deum passo atrs que requer antes de tudo uma posio de escuta.O livro de Julio Quesada, Un pensamiento intempestivo: Ontologa,esttica y poltica en Nietzsche16, ainda que se centre nos escritos de

    juventude, tambm se refere ao ltimo Nietzsche com a inteno dereavaliar as concluses extradas com respeito s primeiras obras.Trata-se de estabelecer a conexo entre ontologia, esttica e poltica,tomando como fio condutor a noo de intempestividade com res-peito tanto ao nazismo como metafsica platnico-crist. A crticade Nietzsche inverte certas categorias ontolgicas, especialmente ade finalidade, da qual depende diretamente o entendimento da re-lao entre indivduo, Estado e histria. Traado assim o contexto,Quesada adota como modelo a capacidade criadora do artista paraengendrar a noo de unicidade produtiva e a partir dela definiro conceito de individualidade como noo tico-poltica, distintado conceito metafsico de sujeito, que entrecruzam e harmonizampluralidade e singularidade. Essa individualidade e sua capacidadede transformao criadora daphysis(que no dominao tcnicanem negao asctica) a partir do rendimento axiolgico da cultura

    constitui o fundamento diz Quesada ao mesmo tempo intempes-tivo e ilustrado do pensamento de Nietzsche, frente aos diferentespoderes niilistas que preconizam a desindividuao metafsica da

    16 QUESADA, J. Un pensamiento intempestivo: Ontologa, esttica y poltica en Nietzsche,Barcelona: Anthropos, 1988.

  • 7/26/2019 ARecpo espanhola de Nietzsche.pdf

    11/28

    Cad. Nietzsche, So Paulo, v.36 n.1, p. 17-44, 2015. 27

    A recepo espanhola de Nietzsche nos ltimos quarenta anos

    identidade ou o monotesmo do Estado totalitrio. Ao mesmo tempose resgata a noo kantiana de finalidade sem fim para aplicar

    estrutura do devir, em uma espcie de radicalizao ontolgica dojulgamento reflexivo kantiano, junto com a funo produtiva e cria-dora prpria da imaginao no jogo das faculdades do esprito, como fim de interpretar a ideia do eterno retorno como devir aberto dasdiferenas e da pluralidade, sem que tal devir aponte para nenhumfim objetivo, transcendente ou imanente17.

    Dentro desse mesmo horizonte, outros autores adotam compreferncia o motivo do pensamento trgico para apresentar novaspropostas e sadas do crculo de noes e relaes em que as ideiasde Nietzsche esto sob o domnio da interpretao heideggeriana.Assim, por exemplo, o livro de Remedios vila,Nietzsche y lare-dencin del azar18,prope-se a estudar a progressiva configurao,em Nietzsche, de uma tica trgica e, para isso, comea, em suaprimeira parte, clarificando o sentido do trgico, opondo-o tanto aootimismo socrtico do homem de cincia como ao pessimismo est-tico schopenhaueriano. O trgico nietzschiano para a autora um

    pathosafirmativo em relao com a totalidade da vida, incluindoseus aspectos mais terrveis e dolorosos. A tragdia, como obra dearte, oferece assim um modelo ontolgico do mundo e da existnciaque aponta a sua possvel transformao a partir de uma apostatrgica por meio dessepathosafirmativo. Na segunda parte, ana-lisada a crtica nietzschiana cultura tal como se realiza nas obrasdo perodo intermedirio, valorizando a aplicao da genealogianietzschiana aos sistemas de valores da cultura contemporneaque os desvela pela exiguidade de fundamento metafsico, tanto

    no que se refere origem da moral como relativa, como no que diz

    17 Outros trabalhos em que Quesada desenvolve suas propostas iniciais e evolui para outroshorizontes so:El Nihilismo activo. Genealoga de la Modernidad. Mxico: Universidad deGuadalajara, 1999;La Belleza y los humillados, Barcelona: Ariel, 2001, alm de uma grandequantidade de artigos.

    18 VILA, R.Nietzsche y la redencin del azar. Granada: Universidad de Granada, 1987.

  • 7/26/2019 ARecpo espanhola de Nietzsche.pdf

    12/28

    Cad. Nietzsche, So Paulo, v.36 n.1, p. 17-44, 2015.28

    Meca, D. S.

    respeito s construes desenhadas pela vontade de potncia. Oque no significa, no entanto, a renncia a todo projeto tico alter-

    nativo. Por ltimo, na terceira parte, Remedios vila expe esseprojeto tico mergulhando no imoralismo de Zaratustra, baseadona aceitao da morte de Deus (solido metafsica do indivduocomo condio trgica de sua liberdade e responsabilidade), no en-tendimento do mundo como vontade de potncia e na aceitao doeterno retorno como redeno da temporalidade. Desse modo, anoo de alm-do-homem a que encarna esse desenvolvimento dasforas ativas e essa redeno do acaso, atribuindo um sentido in-tramundano ao domnio do absurdo, e especificando em sua figuraa aposta trgica cuja mxima seria ludere aude. Remedios vilacontinuou posteriormente desenvolvendo essa perspectiva do pen-samento trgico, adotada em sua primeira monografia, para aplic--la, concretamente, ao tema da identidade do sujeito na situao defragmentao e crise em que o afunda a modernidade. a temticade seu livroIdentidad y tragedia: Nietzsche y la fragmentacin del

    sujeto19. Partindo de uma detalhada contextualizao do problemana contraposio ilustrao/romantismo, e matizando a anlisecom propostas sobre novasformas possveis de entender a filosofia(como exerccio de desiluso e desengano, como busca da sadeetc.) conclui por reformular a noo de identidade desde a ticada arte e a ideia de individualidade como estilo de carter. Porltimo, em seu livroEl desafio del nihilismo20, Remedios vila pro-pe uma reviso do significado de niilismo retomando a perguntapela possibilidade de super-lo, mas estabelecendo como ponto devista distinto de sua explicao a metafsica e o que esta poderia

    19 VILA, R.Identidad y tragedia: Nietzsche y la fragmentacin del sujet. Barcelona: Crtica,1999.

    20 VILA, R.El desafo del nihilismo. Madrid: Trotta, 2005. Outros trabalhos dessa autora,que enriquecem sua dedicao ao estudo da obra de Nietzsche, so: Heidegger y el proble-ma de la nada. La crtica a la posicin de Nietzsche. In:Pensamiento. Vol. 63 (2007), n. 235;La crtica de Nietzsche al Romanticismo. In: Estudios Nietzsche. Revista de la Sociedad

    Espaola de Estudios sobre F. Nietzsche. Nmero 5 (2005).

  • 7/26/2019 ARecpo espanhola de Nietzsche.pdf

    13/28

    Cad. Nietzsche, So Paulo, v.36 n.1, p. 17-44, 2015. 29

    A recepo espanhola de Nietzsche nos ltimos quarenta anos

    opor ao desafio que o niilismo supe. A autora visa neste sentido antiga noo grega depietascom respeito vida, referida, sobre-

    tudo, a sua complementaridade com o agonismo em que tal noose configura no marco da tragdia clssica. O que talvez chamemais ateno nesse livro a sua sensibilidade para as tendnciase problemas de nossa cultura contempornea, jogando luz sobreelas a partir da grande questo da crise da metafsica ou desdeum uso sugestivo da ideia de duplo, ou vindicando uma reviso dacondenao nietzschiana da figura de Scrates, ou repensando oproblema da compaixo.

    Tambm os livros de Manuel Barrios adotam como ponto de par-tida a noo de pensamento trgico para diversificar as possibilida-des e objetivos de seu interesse central na relao entre Nietzsche eo romantismo. EmLa voluntad de poder como amor21, o autor se pro-pe a confrontar a definio que faz Heidegger da vontade de potn-cia como vontade de domnio tcnico do mundo por parte de umarazo calculadora, manipuladora e exploradora, para, apoiando-seem textos nietzschianos, sobretudo da poca de Zaratustra, perfi-lar uma caracterizao diferente da vontade de potncia em que seentrelaam amor, criatividade, superao e ocaso como desejo deretorno. J anteriormente, e para superar o pessimismo metafsico emoral de Schopenhauer, o jovem Nietzsche sublinhava no conceitode vontade a fora exuberante da natureza em seu inocente prazertrgico que cria e destri sem cessar os mundos. Mas em Zaratus-tra que essa ideia se explicita e se desenvolve a partir de metforascomo a do Sol, que dissipa sua luz dourada e sua potncia revita-lizadora em uma espcie de generosidade prometeica e de amor

    21 BARRIOS, M.La voluntad de poder como amor. Barcelona: Serbal, 1990 (2 edio emArena Libros, 2006, com um prlogo de Eugenio Tras). Cf. tambmHlderlin y Nietzsche:

    Dos paradigmas intempestivos de la modernidad en contacto. Sevilla: Universidad de Sevilla,1992; Voluntad de lo Trgico: el concepto nietzscheano de voluntad. Madrid: Biblioteca Nueva,2002; Expulsar de Nuevo al Poeta? de Arte y Poltica en Nietzsche, In:Estudios Nietzsche2007 (7), 11-36; Nietzsche y el Retorno Romntico a la Naturaleza, In:Estudios Nietzsche2005 (5), 33-66.

  • 7/26/2019 ARecpo espanhola de Nietzsche.pdf

    14/28

    Cad. Nietzsche, So Paulo, v.36 n.1, p. 17-44, 2015.30

    Meca, D. S.

    para com os homens. Essa metfora do Sol, que Nietzsche toma deHlderlin, identifica assim a vontade de potncia como uma super-

    -plenitude que quer transbordar, e que no se contenta com pre-sentear os dons de sua riqueza seno com o desejo de transcenderna criao de algo que esteja acima se si (o alm-do-homem). Porisso, como flecha de anseio para outra margem, essa vontade deveser, ao mesmo tempo, vontade de ocaso (Untergang), felicidade deautossacrifcio como preldio de um novo nascimento e uma novaaurora em um retorno do mesmo sem fim.Narrar el abismo. Ensayos

    sobre Nietzsche, Hlderlin y la disolucin del classicismo22 recolhevrios trabalhos de feitura diversa, mas que conseguem mostrar, emseu conjunto e classificao, uma problemtica de fundo interes-sante por sua atualidade e muito atrativa por seu contedo mesmo.Na introduo, Barrios confessa que sua inteno conferir formafilosfica, narrativa e em ltima instncia histrica experin-cia de dissoluo do mundo moderno, apelando aos dois autoresque em outros livros anteriores me serviram de guia e estmulo:Hlderlin e Nietzsche. E o que os captulos do livro fazem ir des-pregando os contextos, as interrogaes e o conjunto de anlise que,partindo da compreenso de nossa poca como a do descobrimentoda fragmentao de nossa existncia, preparam-se para debater econfigurar aqueles elementos histrico-hermenuticos com os quaistorne possvel recriar efeitos de sentido sem j pressupor referentesdogmticos e metafsicos.

    A tese do livro de Diego Snchez MecaEn torno al Superhom-bre: Nietzsche y la crisis de la modernidade23se desenvolve num fiode uma anlise de confrontao que Nietzsche leva a cabo, ao longo de

    toda sua obra, entre arte e cincia. O propsito dessa confrontao

    22 BARRIOS, M.Narrar el Abismo: Ensayos sobre Nietzsche, Hlderlin y la disolucin delclasicismo, Valencia: pr-textos, 2001.

    23 SNCHEZ MECA, D.En torno al superhombre: Nietzsche y la crisis de la modernidad.Barcelona: Anthropos, 1989; Cf. Tambm Quin es el superhombre de Nietzsche? El juegode las adivinanzas, In: SNCHEZ MECA, D.Metamorfosis y confines de la individualidad.Madrid: Tecnos, 1995, p. 137-198.

  • 7/26/2019 ARecpo espanhola de Nietzsche.pdf

    15/28

    Cad. Nietzsche, So Paulo, v.36 n.1, p. 17-44, 2015. 31

    A recepo espanhola de Nietzsche nos ltimos quarenta anos

    fazer ver a distncia que ainda separa o humano, demasiado humano,ou seja, ao expoente ao mesmo tempo em que resulta da razo moderna,

    com respeito ideia reguladora do alm-do-homem. Alm disso, issomostra uma importante dependncia que Nietzsche tem de Goethe edo primeiro romantismo alemo, e essa conexo o que examina a pri-meira parte do livro, que conclui com a afirmao de uma significativadiferena: enquanto nas formas de arte a criao se produz livremente,sem coao, ou seja, de ummodo aberto ao imaginativo, ao fictcio eao gratuito, na cincia, tal como concebida na poca moderna, oconhecimento se produz como hybris, ou seja, como violncia deli-mitadora e redutora de diferenas. E neste contexto, a tica da artepermite antecipar o que representaria a libertao da criatividadecognitiva de toda limitao imposta pela exigncia de objetivaoe da necessidade de se subordinar a uma tcnica. Isto , alm dapreocupao pela objetividade, pela certeza, pelo consenso, pelasegurana, qualidades todas elas ao servio de um melhor domniode situaes e de outros homens, o conhecimento dionisaco, pr-prio do alm-do-homem, seria aquele que no est determinado jpor uma vontade de segurana, seno por uma vontade de experi-mentao e de aventura. De modo que, em lugar de uma busca deverdades universais e necessrias, o conhecimento seria sinnimode doao de nomes as coisas, exerccio de libertao como movi-mento da interpretao. Assim, o ber do bermensch no aluirianem ao traspassamento de uns impulsos ou instintos na luta pelasobrevivncia, nem tampouco a uma vontade que se desdobra nodomnio cientfico e tcnico do mundo (como cr Heidegger), senoque simplesmente viria a explicitar a estrutura caracterstica da ex-

    perincia hermenutica como caminho ascendente. Em Nietzsche:La experiencia dionisaca del mundo24, trata-se de estruturar o pro-blema concreto do diagnstico do estado fisiopsicolgico do homem

    24 SNCHEZ MECA, D. Nietzsche: la experiencia dionisaca del mundo. Madrid: Taurus,2005 (3 edio 2008).

  • 7/26/2019 ARecpo espanhola de Nietzsche.pdf

    16/28

    Cad. Nietzsche, So Paulo, v.36 n.1, p. 17-44, 2015.32

    Meca, D. S.

    europeu e da evoluo de sua cultura. A primeira parte ocupa-sedo contraste entre a interpretao juvenil nietzschiana da cultura

    grega e a arte de Wagner, discusso sustentada em toda da produ-o primeira do jovem Nietzsche a partir da questo metafsica daexistncia como dor que o despertara a leitura de Schopenhauer. Asegunda parte baseia-se nessa inicial fisiologia dos instintos arts-ticos, apolneo e dionisaco que se desenvolve em O nascimentoda tragdiae que Nietzsche utiliza como paradigma hermenuticoem sua interpretao da cultura grega , e o reelabora como modeloda fora agonstica e artisticamente plasmadora dos instintos comochave para entender a relao do corpo e da cultura. Estabelecidaessa relao, e delimitados os critrios de uma cultura s frente outra decadente, Snchez Meca vai examinando as diferentesformas e tendncias que Nietzsche considera doentes na culturaeuropeia moderna: o Estado democrtico e sua poltica social, o gre-garismo, o feminismo, a mitificao do trabalho e do conforto, a vio-lncia, a compaixo com os dbeis e marginados etc. O livro acabacom trs captulos em que se discutem trs grandes interpretaesdo pensamento de Nietzsche: a de Heidegger, a de Habermas e a deDeleuze. TambmEl nihilismo: perspectivas sobre la historia espiri-tual de Europa25consta de trs partes unidas por um fio condutor.Desde a tica de Nietzsche, entende-se o progresso do niilismo, quepercorre a histria do Ocidente, como a repetio querida, aceitadae lograda da decadncia. Isto , entende-se o niilismo como a inte-riorizao do encadeamento histrico dos diferentes momentos emque a vontade de potncia nega a si mesma. Esquema explicativo,

    25 SNCHEZ MECA, D. El nihilismo: perspectivas sobre la historia espiritual de Europa.Madrid: Sntesis, 2004. Outros escritos recentes de Snchez Meca so: Voluntad de podere interpretacin como supuestos de todo proceso orgnico. In: Estudios Nietzsche 2009 (9),pp.105-122; Nietzsche y la idea romntica de una nueva mitologa. In Estudios Nietzsche2005 (5), p. 129-152; Razones de la moral y exigencias de la vida: Kant contra Nietzsche,In: Daimon. Revista de Filosofa, 2004 (33), p. 157-166; Gnalogie et critique de la phi-lologie aux sources de Choses humaines. trop humaines, In: DIorio, P.-Ponton, O. (eds.),

    Nietzsche. Philosophie de lesprit libre, Paris, Editions rue dUlm, 2004, pp.79-98.

  • 7/26/2019 ARecpo espanhola de Nietzsche.pdf

    17/28

    Cad. Nietzsche, So Paulo, v.36 n.1, p. 17-44, 2015. 33

    A recepo espanhola de Nietzsche nos ltimos quarenta anos

    portanto, que articula uma filosofia da histria nas antpodas dopensamento hegeliano, j que o cume final do progresso aqui no

    a sntese totalizadora, mas o esquecimento de seu prprio percurso.Outros autores estendem o mbito de seus interesses e estudosa uma grande variedade de temticas e de implicaes da figura deNietzsche ou de seu pensamento. Tal o caso de Joan B. Llinares,grande conhecedor da obra de Nietzsche e de seu contexto, cujostrabalhos merecem uma especial meno por seu rigor, erudio egrande acerto exegtico na diversidade do tratado: a linguagem, acincia, o ceticismo, o trgico, a dialtica do senhor e do escravo,a figura de Scrates, as relaes de Nietzsche com Wagner e comBrahms, Nietzsche e Dostoivski, a influncia sobre G. Benn, asexualidade, o teatro, a guerra, a mulher etc.26Quanto aos escritosde Jess Conill, a perspectiva e o enfoque adotados so os pro-vocados pela peculiar forma do pensamento e do estilo de Niet-zsche, seguindo os novos impulsos e orientaes da investigaointernacional. Os aspectos que mais tm atrado sua ateno so:emEl crepsculo de la metafsica27, a crtica radical das tradiesmetafsicas do pensamento e de sua profundidade moral; em Elenigma del animal fantstico28, a concepo do homem como ani-mal fantstico e suas consequncias nos diversos mbitos da vidahumana; em El poder de la mentira. Nietzsche y la poltica de latransvaloracin29, a crtica dos valores e das instituies modernas

    26 LLINARES CHOVER, J.B. Hombre, arte y lenguaje. Una investigacin sobre el jovenNietzsche. Servei de Publicacions de la Universitat de Valncia: 1982; Nietzsche y el es-cepticismo. Ensayo aclaratorio de una pretendida contradiccin. In: Mirar con cuidado (J.

    Marrades y N. Snchez, eds.), Valencia: pr-textos, 1994; Nietzsche en los ensayos del po-eta Gottfried Benn. Una aproximacin. In: Nietzsche, 100 aos despus (ed. J. B. Llinares),Valencia: Pre-textos, 2002; El teatro y la mujer en los escritos de F. Nietzsche sobre R.Wagner. In: Lordim de la llar, Bari, Levante, 2003; Consideraciones sobre la guerra enNietzsche. In:La guerra (Edicin de Nicols Snchez), Valencia: Pre-textos, 2006.

    27 CONILL, J.El crepsculo de la metafsica. Barcelona: Anthropos, 1988.28 Idem.El enigma del animal fantstico. Madrid: Tecnos, 1991.29 Idem. El poder de la mentira. Nietzsche y la poltica de la transvaloracin. Madrid:

    Tecnos, 1997 (1 ed.), com Prlogo de Pedro Lan Entralgo; 2001 (2 ed.), com Eplogo:Orientacin nietzscheana de nuestra tradicin filosfica.

  • 7/26/2019 ARecpo espanhola de Nietzsche.pdf

    18/28

    Cad. Nietzsche, So Paulo, v.36 n.1, p. 17-44, 2015.34

    Meca, D. S.

    (por exemplo, a democracia), a partir da transvalorao e da grandepoltica; e em outros trabalhos, a metfora do alm-do-homem; a

    transformao da crtica kantiana em hermenutica genealgica,como crtica da razo impura, e portanto, a relao de Nietzschecom a hermenutica contempornea; a orientao nietzschiana dopensamento espanhol contemporneo (Unamuno, Ortega, Zubiri,Lan...); e a radicao potica do pensamento e da vida humana30.O que considera que este pensamento tem vigncia e atualidadepara nosso mundo e nossa sociedade espanhola, em concreto, oestilo de pensamento vivo, aberto s diversas cincias, mas semdogmatiz-las, e que toca os aspectos cruciais da vida modernapadronizada, urgindo a repensar seus pressupostos quebradios.

    Luis Enrique de Santiago Guervs se interessou, antes de tudo,pela questo da linguagem e pelos problemas que Nietzsche pro-pe inicialmente cincia filolgica. Da sua edio dos textos deRohde, Wagner e Wilamowitz, que surgiram sob a raiz da polmicafilolgica que se originou em torno da publicao de O nascimentoda tragdia, em cuja introduo insiste na relao entre a inter-pretao e a concepo da arte prpria do jovem Nietzsche. Este o tema desenvolvido emArte y poder. Aproximacin a la estticade F. Nietzsche31, na qual expe o percurso que a reflexo sobre aarte tem na obra de Nietzsche, desde a juvenil e schopenhauerianametafsica de artista at a ltima e genealgica fisiologia daarte. O objetivo determinar em que sentido a arte pode ser pro-posta como o problema filosfico fundamental ao ser manifestaode um poder (Macht) de criar aparncias, de configurar significa-dos e interpretaes com os quais se faz do caos um mundo de for-

    mas, e que o mesmo poder da fora (Kraft) criadora universal danatureza e da essncia da linguagem e do conhecimento. A partir

    30 Cf. em concreto, CONILL, J. Recuperacin postnihilista del individuo y la realidad: lametfora del superhombre, Valencia: Quaderns de Filosofa y Ciencia, 1991, p. 7-17.

    31 SANTIAGO, Luis de.Arte y poder. Aproximacin a la esttica de Nietzsche. Madrid: Trotta,2004.

  • 7/26/2019 ARecpo espanhola de Nietzsche.pdf

    19/28

    Cad. Nietzsche, So Paulo, v.36 n.1, p. 17-44, 2015. 35

    A recepo espanhola de Nietzsche nos ltimos quarenta anos

    dessa hiptese no difcil imaginar as questes que se abrem;por exemplo, que tipo de crtica representa a arte como fico a

    respeito do conceito filosfico-metafsico e cientfico de verdade;ou qual a relao existente entre o ato de criao artstica com asade e a doena, relao decisiva se a toma como queria Niet-zsche como critrio para julgar a decadncia e propor a possvelsuperao do niilismo da cultura ocidental. Em tal caso, uma revo-luo esttica seria a chave de tal superao. Pois enquanto a artenascida da sade atua como sugesto sobre os sentidos, tonifica eaumenta o prazer e a vontade de viver mediante sua glorificao dosensvel, toda a arte decadente moderna no mais que um exagerono clssico, histrica e vulgar dos traos principais, das grandeslinhas e dos efeitos histrinicos que ocultam uma inteno secre-tamente tirnica: a da manipulao dos nervos enfermos por meiosterroristas. Como a moral ou a metafsica niilistas, a arte modernatambm recorre violncia como forma habitual de exercer o podersobre um rebanho de indivduos dbeis e atormentados32.

    A partir de todos esses trabalhos pode ser verificada a recepoe reelaborao de uma imagem nova e diversamente matizada dosconceitos nietzschianos de vontade de potncia, alm-do-homem,eterno retorno, o trgico, o dionisaco, a interpretao, a arte etc.,bem distinta, em qualquer caso, tanto dos centros de gravidade daprimeira recepo espanhola de Nietzsche, como das posterioresprojees sociais e polticas desses conceitos de carter darwinistaou tecnocrtico que predominaram em outras zonas geogrficas daEuropa. Aberto s correntes mais vivas da interpretao internacio-nal, os estudiosos espanhis tm dirigido sua ateno ao Nietzsche

    32 Outros trabalhos de Luis de Santiago so: Nietzsche y los ideales estticos del Sur: la ne-cesidad de mediterraneizar la msica. In:Analecta Malacitana, n 23/1, 2000, p. 131-148;Metfora versus concepto. La generalizacin de la metfora en F. Nietzsche. In: Estudios

    filosficos 49 (2000), p. 261-275; La risa y el consuelo intramundano: el arte de trascender-se y superarse en Nietzsche. In:Estudios Nietzsche 1 (2001), p. 145-168; Cosima Wagner yF. Nietzsche: claves para la interpretacin de una relacin enigmtica. Correspondencia. In:

    Estudios Nietzsche 7 (2007). Madrid: Trotta, p. 155-202.

  • 7/26/2019 ARecpo espanhola de Nietzsche.pdf

    20/28

    Cad. Nietzsche, So Paulo, v.36 n.1, p. 17-44, 2015.36

    Meca, D. S.

    crtico da filosofia ocidental, do cristianismo e da cultura moderna,mas tambm e, sobretudo, ao Nietzsche que abre a possibilidade de

    um novo comeo para o pensar contemporneo; a seu original estilode escrita; s fontes cientficas de seu pensamento, a sua atitudepara com as mulheres, ao alcance tico ou poltico de suas propos-tas etc. E essa a linha que prosseguem os estudiosos da geraomais jovem, que dirigem tambm seu interesse ao estudo dessepensador. Assim, Elvira Burgos, depois de publicar a monografia

    Dionisoen la filosofa del joven Nietzsche33e de ocupar-se no estudoda crtica nietzschiana ao Cristianismo e na figura de Jesus, em umconjunto posterior de trabalhos analisa a obra de Nietzsche a partirde uma perspectiva feminista, e prope como as figuras de mulhe-res em Nietzsche e suas concepes do feminino tm um alcancefilosfico relevante que obriga a revisar o suposto antifeminismoe misoginia desse autor34. Conclui defendendo em Nietzsche ummodo inovador de compreender a categoria mulher que clarificaseu modo de fazer filosofia. Para esta autora, o texto de Nietzsche,ao mesmo tempo em que inaugura uma prtica filosfica distinta metafsica dogmtica e crist, possibilita abrir o feminismo em umanova direo no dogmtica. Marco Parmeggiani, em seus livrossobre Nietzsche35, reflete sobre o tema da natureza e a possibili-dade do conhecimento humano na obra nietzschiana, concentrandoem sua teoria perspectivista do conhecimento para se perguntar o

    33 BURGOS, E.Dioniso en la filosofa de joven Nietzsche. Zaragoza: Prensas Universitariasde Zaragoza, 1993.

    34 Cf. BURGOS, E. Mujer. Mujeres. Figuras polismicas en la escritura de Nietzsche.

    In; Joan B. Llinares (ed.), Nietzsche, 100 aos despus. Valencia: Pre-Textos, 2002, p. 89-112; Afirmando las diferencias. El feminismo de Nietzsche. In: Asparka. InvestigaciFeminista, n 11, 2000, p. 77-93; A propsito de la misoginia de Nietzsche. In:Laguna.

    Revista de Filosofa, n 10, 2002, pp. 133-153; La cuestin del sujeto. Nietzsche y Butler.In: Fina Biruls y Mara Isabel Pea Aguado (eds.).La passi per la llibertat, Universitat deBarcelona, 2004.

    35 PARMEGGIANI, M.Perspectivismo y subjetividad en Nietzsche. Mlaga: Univ. de Mlaga,2002; Nietzsche: Crtica y proyecto desde el Nihilismo. Mlaga: gora, 2002; Cf. tambmInterpretacin y textualidad en la aproximacin de Heidegger a Nietzsche. In: S. Barbera R. Mller-Buck (eds.),Nietzsche nach dem ersten Weltkrieg, Pisa: Edizioni ETS, 2007.

  • 7/26/2019 ARecpo espanhola de Nietzsche.pdf

    21/28

    Cad. Nietzsche, So Paulo, v.36 n.1, p. 17-44, 2015. 37

    A recepo espanhola de Nietzsche nos ltimos quarenta anos

    que pode contribuir Nietzsche elaborao de uma teoria herme-nutica na atualidade. Tambm se destacam as duas monografias

    de Agustn Izquierdo, dedicadas principalmente filosofia prticade Nietzsche36, assim como os estudos de Jos Emilio Esteban En-guita37que se interessa por sua vertente poltica. E assim pode-ramos continuar com mais estudos como os de Enrique Lynch38,David Pujante39, Germn Cano40, Hector J. Prez41, Jos M. RomerCuevas42, E. Ruiz Callejn43, entre outros.

    3. Tradues e edies.

    Conta Gonzalo Sobejano que, em 1908, se tinham traduzidoj ao castelhano as obras mais representativas de Nietzsche, comexceo das Consideraes Extemporneas, em nmero de trintaverses em Madri, Barcelona e Valncia, pois Nietzsche era bas-tante comentado e discutido em revistas, jornais e nas tribunas doAteneu e de algumas Academias. No entanto, a opinio de tais tra-dues no absolutamente boa:

    36 IZQUIERDO, A. El resplandor de la apariencia: el concepto de cultura en Nietzsche.Madrid: Libertarias Produfi, 1993; Friedrich Nietzsche o el experimento de la vida. Madrid:Edaf, 2001.

    37 ESTEBAN ENGUITA, J.E.Poltica y cultura en el pensamiento del joven Nietzsche (1869-1876), Universidad Autnoma de Madrid, 1999;Poltica, historia y verdad en la obra de F.

    Nietzsche, Universidad de Burgos-Huerga & Fierro, 2000; Ecrasez linfme!. Cristianismoe historia en Nietzsche. In:Estudios Nietzsche N.6, 2006, 9-26; El aristocratismo polticode Nietzsche. In: Cuaderno gris, N. 5, 2001, 183-202.

    38 LYNCH, E.Dioniso dormido sobre un tigre: A travs de Nietzsche y su filosofa del lenguaje.

    Barcelona: Destino, 1993.39 PUJANTE, D. Un vino generoso: sobre la esttica nietzschiana. Murcia: Universidad de

    Murcia, 1997.40 CANO, G. Como un ngel fro. Nietzsche y el cuidado de la libertad . Valencia: Pretextos,

    2000;Nietzsche y la crtica de la modernidad. Madrid: Biblioteca Nueva, 2001.41 PREZ, Hctor J.Hacia el nacimiento de la tragdia. Murcia: Res Publica, 2001;Nietzschey la poltica. Murcia: Res Publica, 2001.

    42 ROMERO CUEVAS, J.M.El caos y las forma. Granada: Comares, 2001.43 RUIZ CALLEJN, E.Nietzsche y la filosofa prtica. Granada: Universidad de Granada,

    2004.

  • 7/26/2019 ARecpo espanhola de Nietzsche.pdf

    22/28

    Cad. Nietzsche, So Paulo, v.36 n.1, p. 17-44, 2015.38

    Meca, D. S.

    executadas muitas delas atravs do Francs por publicitrios de bai-xa ou nula competncia filosfica e literria, retiradas luz em sua

    maioria por editoras mais vulgares que informativas, sujeitas a impres-so negligente e reimpresses disfaradas, estragadas pela incria ti-pogrfica, os erros errantes, a exiguidade ou falta de notas... impossvelao bom trabalhador aduzir um texto de Nietzsche se no era deixado emalemo ou propondo verso prpria44.

    Ainda que no seja extremamente deficiente, tampouco acei-tvel a edio de Eduardo Ovejero y Maury, publicada em 1925em Buenos Aires sob o pomposo e falso ttulo de Obras Completas,que aparentemente segue o texto da alem Grossoktavausgabe. uma edio defeituosa basicamente pelo seccionamento arbitrriode um grande nmero de fragmentos, pela inexata reproduo danumerao original dos aforismos e por contnuos descuidos e er-ros no deciframento dos manuscritos registrados na mesma edioalem que lhe serviu de base. Esta e outras que ainda a reproduzemem forma de seleo carecem dos critrios filolgicos elementarese tm sido feitas sem pretenso alguma de rigor.

    Nos ltimos decnios, publicaram-se, tanto na Espanha comona Amrica Hispnica, vrias tradues das obras de Nietzsche dequalidade e de valor muito heterogneos. Destacam, entre elas, adeEscritos sobre retrica(ed. de Luis de Santiago Guervs)45,Es-critos sobre Wagner(ed. de Joan B. Llinares)46,Humano, demasiadohumano (ed. de M. Barrios e A. Brotons)47, El culto griego a losdioses (ed. de Diego Snchez Meca)48, Sobre verdad y mentira en

    sentido extramoral y Segunda consideracin intempestiva (ed. de

    44 SOBEJANO, G., Sobre la recuperacin de Nietzsche. In:Revista de Occidente, 1973(125-126), p. 244.

    45 NIETZSCHE.Escritos sobre retrica. Madrid: Trotta, 2000.46 Idem.Escritos sobre Wagner. Madrid: Biblioteca Nueva, 2003.47 Idem.Humano, demasiado humano. Madrid: Akal, 1996, 2 vols.48 Idem. O culto grego aos deuses. Madrid: Alderabn, 1999.

  • 7/26/2019 ARecpo espanhola de Nietzsche.pdf

    23/28

    Cad. Nietzsche, So Paulo, v.36 n.1, p. 17-44, 2015. 39

    A recepo espanhola de Nietzsche nos ltimos quarenta anos

    Joan B. Llinares)49, Schopenhauer como educador (ed. J. Muoz)50ou as tradues de Germn Cano de Aurora y La ciencia jovial51,

    para citar s alguns exemplos.No ano 2000 fundou-se a Sociedade Espanhola de Estudos so-bre Nietsche (SEDEN)(www.uma.es/nietzsche-seden), para servirde suporte investigao sobre Nietzsche entre os filsofos es-panhis. SEDEN publica anualmente a revista Estudios Nietsche(www.estudiosnietzsche.org), em que alm de temas de cartermonogrfico informa a atualidade bibliogrfica, proporciona mate-riais para a investigao, resenhas e notcias internacionais sobreeventos nietzschianos. E no marco desta Sociedade, e sob a dire-o de Diego Snchez Meca, um grupo de estudiosos tem levado acabo j a edio completa em castelhano dos Fragmentos pstumosde Nietzsche, em quatro grandes volumes: Volume I: Fragmentos

    Pstumos (1869-1874), traduo, introduo e notas de Luis E. deSantiago, Madrid, Tecnos, 2007 (2 ed. 2010); Volume II: Frag-mentos Pstumos (1875-1882), traduo, introduo e notas de Ma-nuel Barrios e Jaime Aspiunza, Madrid, Tecnos 2008; Volume III:Fragmentos Pstumos (1882-1885), traduo, introduo e notasde Jess Conill e Diego Snchez Meca, Madrid, Tecnos 2010; Vo-lume IV: Fragmentos Pstumos (1885-1889), traduo, introduoe notas de Joan B. Llinares e Juan L. Vermal, Tecnos, 2006 (2 edi-cin 2008). Esta mesma equipe continua este labor em uma ediotambm com outros quatro grandes volumes das Obras completasde Nietzsche, cujo volume I:Escritos de juventud tem prevista suapublicao dentro deste ano de 2010 pela Editorial Tecnos. Tam-bm, e sob a direo de Luis de Santiago, se est levando a cabo

    a edio da Correspondencia em seis volumes, dos quais quatrovolumes j publicados entre 2005 e 2010.

    49 In: Llinares, J.B.-Melndez, G. (eds.).Nietzsche: Antologa. Barcelona: Pennsula, 1988.50 NIETZSCHE. Schopenhauer como educador. Madrid: Biblioteca Nueva, 2000.51 Idem. Aurora. Madrid: Biblioteca Nueva, 2000. La ciencia jovial. Madrid: Biblioteca

    Nueva, 2001.

  • 7/26/2019 ARecpo espanhola de Nietzsche.pdf

    24/28

    Cad. Nietzsche, So Paulo, v.36 n.1, p. 17-44, 2015.40

    Meca, D. S.

    Abstract: The article analyses the reception of Nietzsches thoughtin Spain in the last forty years, showing the several ways by which the

    philosophers work was read and the many influences that he carried out,such as in politics, in aesthetics and in the arts. In a first moment, theanalysis presents many authors that read Nietzsche and shows how ineach moment the philosophers ideas were invoked in search of renewal,whether moral, aesthetic or politic. In a second moment, it brings intolight the academic studies and the diversity of subjects form the nietzs-chean philosophy considered in them.Keywords:reception - Nietzsche - Spain - interpretation

    referncias bibliogrficas

    VILA, R.,Nietzsche y la redencin del azar. Granada: Universidad de Granada, 1987._______. Identidad y tragedia: Nietzsche y la fragmentacin del sujeto. Barcelona:

    Crtica, 1999._______.El desafo del nihilismo. Madrid: Trotta, 2005._______. Heidegger y el problema de la nada. La crtica a la posicin de Nietzsche. In:

    Pensamiento. Vol. 63 (2007), n. 235._______. La crtica de Nietzsche al Romanticismo. In:Estudios Nietzsche. Revista de laSociedad Espaola de Estudios sobre F. Nietzsche. Nmero 5 (2005).

    AZORN, J.R.M. Confesiones de un pequeo filsofo. Madri:Espasa-Calpe, 1981.BAROJA, Po. Nietzsche y la filosofa. In:Revista Nueva 1899, 15 de Fevereiro e 5 de

    Agosto._______. Nietzsche ntimo. InEl Imparcial 1901, 9 de Setembro e 7 de Outubro._______. El xito de Nietzsche. In:El Globo, Dezembro de 1902.BARRIOS, M.La voluntad de poder como amor. Barcelona: Serbal, 1990.

    _______.Hlderlin y Nietzsche: Dos paradigmas intempestivos de la modernidad en con-tacto. Sevilla: Universidad de Sevilla, 1992._______. Voluntad de lo Trgico: el concepto nietzscheano de voluntad. Madrid: Biblioteca

    Nueva, 2002._______. Expulsar de Nuevo al Poeta? de Arte y Poltica en Nietzsche, In: Estudios

    Nietzsche 2007 (7), pp.11-36._______. Nietzsche y el Retorno Romntico a la Naturaleza, In: Estudios Nietzsche

    2005 (5), pp. 33-66.

  • 7/26/2019 ARecpo espanhola de Nietzsche.pdf

    25/28

    Cad. Nietzsche, So Paulo, v.36 n.1, p. 17-44, 2015. 41

    A recepo espanhola de Nietzsche nos ltimos quarenta anos

    _______.Narrar el Abismo: Ensayos sobre Nietzsche, Hlderlin y la disolucin del clasi-cismo, Valencia: pr-textos, 2001.

    BECERRO DE BENGOA, R. Sobre Nietzsche, In:La Ilustracin espaola y americana,

    Madrid, Fevereiro de 1894.BURGOS, E.Dioniso en la filosofa de joven Nietzsche. Zaragoza: Prensas Universitarias

    de Zaragoza, 1993._______.Mujer. Mujeres. Figuras polismicas en la escritura de Nietzsche. In; Joan

    B. Llinares (ed.), Nietzsche, 100 aos despus. Valencia: Pre-Textos, 2002, pp.89-112.

    _______. Afirmando las diferencias. El feminismo de Nietzsche. In: Asparka.Investigaci Feminista, n 11, 2000, p. 77-93.

    _______. A propsito de la misoginia de Nietzsche. In: Laguna. Revista de Filosofa,

    n 10, 2002, pp. 133-153._______. La cuestin del sujeto. Nietzsche y Butler. In: Fina Biruls y Mara Isabel

    Pea Aguado (eds.),La passi per la llibertat, Universitat de Barcelona, 2004.CANO, G. Como un ngel fro. Nietzsche y el cuidado de la libertad. Valencia: Pretextos,

    2000;Nietzsche y la crtica de la modernidad. Madrid: Biblioteca Nueva, 2001.CONILL, J.El crepsculo de la metafsica. Barcelona: Anthropos, 1988_______.El enigma del animal fantstico. Madrid: Tecnos, 1991._______. El poder de la mentira. Nietzsche y la poltica de la transvaloracin. Madrid:

    Tecnos, 1997.

    _______. Recuperacin postnihilista del individuo y la realidad: la metfora del su-perhombre, Valencia: Quaderns de Filosofa y Ciencia, 1991, p. 7-17ESTEBAN ENGUITA, J.E.Poltica y cultura en el pensamiento del joven Nietzsche (1869-

    1876), Universidad Autnoma de Madrid, 1999._______.Poltica, historia y verdad en la obra de F. Nietzsche, Universidad de Burgos-

    Huerga & Fierro, 2000._______. Ecrasez linfme!. Cristianismo e historia en Nietzsche. In: Estudios

    Nietzsche N.6, 2006, 9-26._______. El aristocratismo poltico de Nietzsche. In: Cuaderno gris, N. 5, 2001,

    183-202.GINER DE LOS ROS, F. Nietzsche, fragmentos de un estudio sobre el anarquismo.Madrid, 1916.

    IZQUIERDO, A. El resplandor de la apariencia: el concepto de cultura en Nietzsche.Madrid: Libertarias Produfi, 1993.

    _______. Friedrich Nietzsche o el experimento de la vida. Madrid: Edaf, 2001.LLINARES CHOVER, J.B. Hombre, arte y lenguaje. Una investigacin sobre el joven

    Nietzsche. Servei de Publicacions de la Universitat de Valncia,1982.

  • 7/26/2019 ARecpo espanhola de Nietzsche.pdf

    26/28

    Cad. Nietzsche, So Paulo, v.36 n.1, p. 17-44, 2015.42

    Meca, D. S.

    _______. Nietzsche y el escepticismo. Ensayo aclaratorio de una pretendida contra-diccin. In:Mirar con cuidado (J. Marrades y N. Snchez, eds.), Valencia, pr--textos, 1994.

    _______. Nietzsche en los ensayos del poeta Gottfried Benn. Una aproximacin. In:Nietzsche, 100 aos despus (ed. J. B. Llinares), Valencia, Pre-textos, 2002.

    _______. El teatro y la mujer en los escritos de F. Nietzsche sobre R. Wagner. In:Lordim de la llar, Bari, Levante, 2003.

    _______. Consideraciones sobre la guerra en Nietzsche. In: La guerra (Edicin deNicols Snchez), Valencia, Pre-textos, 2006.

    LYNCH, E.Dioniso dormido sobre un tigre: A travs de Nietzsche y su filosofa del len-guaje. Barcelona: Destino, 1993.

    MAEZTU, R., Hacia otra Espaa. Bilbao, Biblioteca Bascongada de Fermn Herrn,

    1899 (tomo 32).MARAGALL, J. Nietzsche. In:LAvenc, Barcelona: Julho de 1893.MORENO, Luis Jimnez.El pensamiento de Nietzsche. Barcelona: Labor, 1971._______.El pensamiento de Nietzsche. Madrid: Cincel, 1984.ORTEGA Y GASSET, J., Po Baroja: anatoma de un alma dispersa. In: Obras Completas,

    ed. Revista de Occidente, Madrid, Vol. IX, 1962, pp. 477-500._______. Teora del clasicismo II (1907). In: Obras Completas, ed. Revista de

    Occidente, Madrid, Vol. I, 1962, pp. 68-75._______.El sobrehombre. In: Obras Completas, ed. Revista de Occidente, Madrid, Vol.

    I, 1962, pp.91-95.PARMEGGIANI, M.Perspectivismo y subjetividad en Nietzsche. Mlaga: Univ. de Mlaga,2002.

    _______.Nietzsche: Crtica y proyecto desde el Nihilismo. Mlaga: gora, 2002._______. Interpretacin y textualidad en la aproximacin de Heidegger a Nietzsche,

    In: S. Barbera R. Mller-Buck (eds.),Nietzsche nach dem ersten Weltkrieg, Pisa:Edizioni ETS, 2007.

    PREZ, Hctor J.Hacia el nacimiento de la tragdia. Murcia: Res Publica, 2001._______.Nietzsche y la poltica. Murcia: Res Publica, 2001.

    PUJANTE, D. Un vino generoso: sobre la esttica nietzschiana. Universidad de Murcia,1997.QUESADA, J. Un pensamiento intempestivo: Ontologa, esttica y poltica en Nietzsche,

    Barcelona: Anthropos, 1988.ROMERO CUEVAS, J.M.El caos y las forma. Granada: Comares, 2001.RUIZ CALLEJN, E.Nietzsche y la filosofa prtica. Granada: Universidad de Granada,

    2004.

  • 7/26/2019 ARecpo espanhola de Nietzsche.pdf

    27/28

    Cad. Nietzsche, So Paulo, v.36 n.1, p. 17-44, 2015. 43

    A recepo espanhola de Nietzsche nos ltimos quarenta anos

    _______. El Nihilismo activo. Genealoga de la Modernidad. Mxico: Universidad deGuadalajara, 1999.

    _______.La Belleza y los humillados. Barcelona: Ariel, 2001.

    SNCHEZ MECA, D.En torno al superhombre: Nietzsche y la crisis de la modernidad.Barcelona: Anthropos, 1989;

    _______. Quin es el superhombre de Nietzsche? El juego de las adivinanzas, In:SNCHEZ MECA, D., Metamorfosis y confines de la individualidad. Madrid:Tecnos, 1995, pp. 137-198.

    _______.Nietzsche: la experiencia dionisaca del mundo. Madrid, Taurus, 2005._______. El nihilismo: perspectivas sobre la historia espiritual de Europa. Madrid:

    Sntesis, 2004._______. Voluntad de poder e interpretacin como supuestos de todo proceso orgnico.

    In:Estudios Nietzsche 2009 (9), pp.105-122._______. Nietzsche y la idea romntica de una nueva mitologa. InEstudios Nietzsche

    2005 (5), pp. 129-152._______. Razones de la moral y exigencias de la vida: Kant contra Nietzsche, In:

    Daimon. Revista de Filosofa, 2004 (33), p. 157-166._______.Gnalogie et critique de la philologie aux sources de Choses humaines. trop

    humaines, In: DIorio, P.-Ponton, O. (eds.), Nietzsche. Philosophie de lespritlibre, Paris, Editions rue dUlm, 2004, pp.79-98.

    SANTIAGO, Luis de.Arte y poder. Aproximacin a la esttica de Nietzsche. Madrid: Trotta,

    2004._______. Nietzsche y los ideales estticos del Sur: la necesidad de mediterraneizar lamsica. In:Analecta Malacitana, n 23/1, 2000, p.p 131-148.

    _______. Metfora versus concepto. La generalizacin de la metfora en F. Nietzsche.In:Estudios filosficos 49 (2000), pp. 261-275.

    _______. La risa y el consuelo intramundano: el arte de trascenderse y superarse enNietzsche. In:Estudios Nietzsche 1 (2001), pp. 145-168.

    _______. Cosima Wagner y F. Nietzsche: claves para la interpretacin de una relacinenigmtica. Correspondencia. In: Estudios Nietzsche 7 (2007). Madrid: Trotta,

    pp. 155-202.SAVATER, F.Inventario. Madrid: Taurus, 1973._______.Nihilismo y accin. Madrid: Taurus, 1971._______. Conocer Nietzsche y su obra.Barcelona: Dopesa, 1979._______.Idea de Nietzsche. Barcelona: Ariel, 2000.SOBEJANO, G.Nietzsche na Espanha. Madrid: Gredos, 1967._______. Reflejos de Nietzsche en el mundo hispnico. In: Revista de Occidente de

    1973 (125-126).

  • 7/26/2019 ARecpo espanhola de Nietzsche.pdf

    28/28

    Meca, D. S.

    _______. Sobre la recuperacin de Nietzsche. In: Revista de Occidente, 1973 (125-126), p. 244.

    UNAMUNO, M., Voltaire, Rousseau, Nietzsche. In Contra esto y aquell. Buenos Aires:

    Espasa-Calpe, 1950.URALES, F.La evolucin de la filosofa en Espaa. Barcelona: Ed. Cultura Popular, 1968.VERMAL, J.L.,La crtica de la metafsica en Nietzsche. Barcelona: Anthropos, 1987._______. Acerca de la superacin nietzscheana de la metafsica. InNietzsche actual e

    inactual. Buenos Aires: 1994._______. Nietzsche, el ltimo metafsico. In:Revista de Occidente, 226 (2000)._______.Quin es el Nietzsche de Heidegger?. In:Estudios Nietzsche, 1 (2001).

    Artigo recebido para publicao em 15/08/2014.Artigo aceito para publicao em 17/11/2014.