aprendizagem organizacional e situada referenciais enanpad 2009

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Aprendizagem Organizacional e Situada: Referenciais Possíveis Para Compreensão do Marketing de Relacionamento?

Autoria: Fabiano Larentis, Claudia Simone Antonello

Resumo: Relacionamentos entre organizações e as ações de marketing de relacionamento, que pressupõem principalmente interações interpessoais e intergrupais, estão baseadas fundamentalmente na confiança, no comprometimento e na cooperação de indivíduos que se encontram nas fronteiras organizacionais, aprendendo nesse contexto a partir de suas práticas. Assim com o objetivo de discutir os processos de aprendizagem na área de marketing, a partir das práticas do marketing de relacionamento, o presente ensaio teórico, além da revisão de literatura, parte de dois pressupostos: (a) o processo de aprendizagem nas ações de marketing de relacionamento ocorre em um nível interorganizacional e (b) esse processo de aprendizagem ocorre de forma situada, entre determinados indivíduos e grupos de diferentes organizações - o denominado “pessoal de fronteira”. Vislumbra-se nos relacionamentos de marketing que os envolvidos nas interações entre as organizações aprendem principalmente porque estão interagindo e participando de grupos: não somente compartilhando informações e conhecimentos, mas negociando significados. Gera-se, principalmente, conhecimento tácito, que não depende apenas de instruções sobre trato com clientes ou treinamentos sobre como melhorar as negociações e fidelizar clientes. 1. Introdução

A área de Marketing pode ser tratada como uma área de fronteira ou de interface das organizações, uma vez que lida diretamente com outras organizações, principalmente clientes. Por outro lado, relacionamentos entre organizações estão cada vez mais complexos e importantes: parcerias e alianças possibilitam agregar valor às ofertas e sustentar vantagens competitivas.

Empresas e clientes que interagem e cooperam entre si, que trabalham, desenvolvem projetos, produtos e serviços em conjunto, constroem relacionamentos baseados no comprometimento e na confiança, que adotam ações de marketing de relacionamento, podem aprender e gerar conhecimentos em conjunto. Ou seja, processos de aprendizagem podem ocorrer a partir dos relacionamentos entre organizações e nas ações de marketing de relacionamento em um nível interorganizacional.

No entanto, onde, quando e como ocorrem esses processos de aprendizagem entre organizações? Todos os integrantes de cada organização estarão ou devem estar envolvidos? Os gestores das organizações participam de alguma forma? Ou estarão mais envolvidos os indivíduos e grupos pertencentes a diferentes organizações que interagem e se relacionam entre si, que estão nas fronteiras de suas organizações? O conhecimento compartilhado e gerado permaneceria restrito apenas ao grupo de indivíduos diretamente envolvido neste processo? Afinal, relacionamentos interorganizacionais ocorrem primariamente em um nível interpessoal, uma vez que no centro de cada relacionamento comprador vendedor há uma série de interações individuais entre representantes das duas organizações em questão (WEBSTER, Jr, 1991): relacionamentos interorganizacionais pressupõem relacionamentos interpessoais.

Desta forma, poder-se-ia pressupor que os relacionamentos e a aprendizagem, não ocorrem de maneira ampla e bem distribuída entre todos os integrantes das organizações envolvidas, mas principalmente entre determinados indivíduos e grupos de diferentes organizações, tais como profissionais de marketing de uma empresa e profissionais de suprimentos/compras de outra. Grupos que, conforme a qualidade e o tempo de interação, podem estar aprendendo em conjunto e compartilhando significados, não somente informações e conhecimentos.

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Assim, com o objetivo de discutir os processos de aprendizagem na área de marketing, a partir das práticas do marketing de relacionamento, o presente ensaio teórico, além da revisão de literatura, parte de dois pressupostos: (a) o processo de aprendizagem nas ações de marketing de relacionamento ocorre em um nível interorganizacional e (b) esse processo de aprendizagem ocorre de forma situada, entre determinados indivíduos e grupos de diferentes organizações - o denominado “pessoal de fronteira”. Para isso, primeiramente apresentam-se as principais definições sobre marketing de relacionamento. Em seguida, a aprendizagem organizacional de natureza situada e em nível interorganizacional. Por fim, as relações entre marketing de relacionamento e aprendizagem situada e algumas reflexões nas considerações finais.

Cabe destacar que se tomou por base o conceito de aprendizagem organizacional numa perspectiva sociológica apresentado por Antonello e Godoy (2007), que consideram a aprendizagem integrada no cotidiano da vida das pessoas, oriunda em grande parte da fonte informal das relações sociais. A esta proposta associou-se a definição de aprendizagem organizacional apresentada por Weick e Westley (2004): o ato de evidenciar a experiência contínua. Além disso, considera-se como foco de análise os relacionamentos interorganizacionais, entre fornecedores e clientes, principalmente entre indivíduos e grupos de fornecedores e de clientes.

Por fim, ressalta-se que este artigo teve também como base para a construção de suas argumentações as questões de investigação referentes à aprendizagem organizacional apresentadas por Antonello e Godoy (2007). Conforme as autoras é relevante que se reflita sobre a pesquisa existente em Aprendizagem Organizacional, lançando luzes sobre os resultados estabelecidos e as questões que permanecem com necessidade de maior investigação considerando quatro questões principais para discussão :

(a) a aprendizagem organizacional recorre ao indivíduo e suas interações (grupal, intergrupal, organizacional e inteorganizacional), logo em nível interpessoal (nível da aprendizagem); (b) a aprendizagem pode ser vista tanto como algo bom como algo ruim (neutralidade da meta); (c) nem toda aprendizagem leva à mudança (noção de mudança); (d) aprendizagem é um processo (natureza processual).

2. Marketing de Relacionamento

Marketing, como área organizacional, em sua essência procura entender e atender mercados, principalmente clientes (RICHERS, 2000). Ou seja, é a área da organização de relacionamento com o mercado e aqui estão incluídos pessoas e setores envolvidos com a concepção, apreçamento, promoção, venda e distribuição de produtos e serviços. Pode-se dizer, portanto, que é uma área de fronteira ou de interface das organizações, uma vez que procura coordenar demandas externas e recursos internos (RUEKERT; WALKER, Jr., 1987).

Dentro da área de marketing, as práticas do marketing de relacionamento vêm ganhando cada vez mais importância. Cada vez mais se fala em complementaridades de capacidade, gestão de conflitos, cooperação, gestão da cadeia de suprimentos, alianças estratégicas e redes de empresas. Organizações que compõem uma cadeia de valor reconhecem os benefícios que relacionamentos bem estruturados, baseados em confiança, comprometimento e cooperação podem trazer aos seus desempenhos. Cannon e Perreault (1999) já enfatizavam que relacionamentos mais efetivos auxiliam ambas as partes em gerenciar incertezas e dependência, aumentam eficiência pela redução de custos e melhoram o desenvolvimento de produtos e a orientação para o mercado, através do melhor conhecimento dos clientes e de suas necessidades. A seguir, portanto, são apresentadas as principais

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definições e dimensões constituintes dos relacionamentos, assim como os conceitos de díade e interfaceador (boundary spanner).

O Marketing de Relacionamento, termo utilizado inicialmente em estudos relacionados ao mercado organizacional (business-to-business) e de serviços (GUMMESSON, 2005), é definido como um processo de engajamento que estabelece, desenvolve e mantém relacionamentos cooperativos de longo prazo mutuamente benéficos entre a empresa e seus públicos - fundamentalmente fornecedores e clientes organizacionais - (MORGAN; HUNT, 1994; NICKELS; WOOD, 1999; SHETH; PARVATIYAR, 2000 a; GUMMESSON, 2005), ou então, de outra perspectiva, o marketing baseado em interações dentro da rede de relacionamentos (GUMMESSON, 2005). Ressalta-se, conforme indicado por Hakansson e Snehota (1995), que um relacionamento é um lugar onde alguns tipos de interação ocorrem e algo é produzido, onde vínculos de atividades, ligações de recursos e laços entre atores são estabelecidos.

Acima de tudo, o Marketing de Relacionamento reflete uma estratégia e um processo que integra clientes, fornecedores e outros parceiros para dentro dos processos de desenho, desenvolvimento, manufatura e vendas de uma empresa (CANNON; SHETH, 2000). Leva, além disso, a uma maior produtividade de marketing, o que possibilita uma maior disposição e habilidade entre as organizações envolvidas de se engajar e em manter relacionamentos de longo prazo (SHETH; PARVATIYAR, 2000 b).

No marketing de relacionamento, enfatiza-se, dentre outras características, orientação para o longo prazo e longevidade nas interações, interesse de ambas as partes em vendas múltiplas e em relacionamentos duradouros, alto nível de compromisso com os clientes e pesquisa contínua utilizada para melhorar os relacionamentos, resultando em clientes leais, níveis elevados de interação entre indivíduos envolvidos, comprometimento, confiança e cooperação, riscos e incertezas reduzidos e compras repetidas (NICKELS; WOOD, 1999; GUMMESSON, 2005). Isso, todavia, não significa que efetuar ações de marketing de relacionamento seja uma tarefa fácil e de resultados rápidos.

Pelas características abordadas até aqui apontadas, pode-se dizer que o marketing de relacionamento, portanto, reforça a perspectiva de marketing como área de fronteira organizacional, uma vez que dá importância maior às interações entre as empresas e seus clientes, mais especificamente entre indivíduos de diferentes organizações. Quanto a isso, tal como indicam Ballantyne, Christopher e Payne (2003), relacionamentos cooperativos interorganizacionais - e aqui insere-se o marketing de relacionamento - podem ser vistos como dutos entre fronteiras organizacionais.

Convém comentar, além disso, que relacionamento pressupõe no mínimo uma díade, e que díade pressupõe interação, conjunção de dois atores, dependente de contextos econômicos, sociais e psicológicos (SOLOMON et al., 1985; HAKANSSON; SNEHOTA, 1995). Especificamente sobre a função de díade, Hakansson e Snehota indicam que se bem sucedida a construção e continuidade de um relacionamento, os recursos, atividades e atores das duas empresas são ligados, combinados de uma forma única. O relacionamento é descrito, então, como uma quase-organização, onde, em conjunto, as duas empresas podem executar atividades, utilizar recursos e gerar aprendizagens que nenhuma delas poderia obter se estivesse isolada, o chamado “efeito de equipe”. Assim, a função do relacionamento como uma quase-organização adquire importância na proporção de quantos novos recursos são criados, novas combinações de atividades emergem e conhecimentos gerados.

Faz-se necessário, também, apresentar o conceito de boundary spanner, ou interfaceador, termo ligado ao pessoal de fronteira das organizações. Como o marketing de relacionamento remete principalmente à relação entre fornecedores e clientes, mais especificamente pessoas da área de marketing de diferentes organizações, ou de pessoas da área de marketing de uma empresa e da área de aquisição/compras de outra, estes indivíduos

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indicados são os chamados boundary spanners ou interfaceadores, membros organizacionais que ligam sua organização com o ambiente externo, interagindo e se comunicando em uma base regular (WEITZ; JAP, 2000).

Quanto a isso, vale a pena destacar os resultados da meta-análise de Palmatier et al. (2006), que indicam que estratégias focadas em construir relacionamentos interpessoais entre boundary spanners podem ser mais efetivas que aquelas focadas em construir relacionamentos cliente-empresa, mais impessoais (como programas de lealdade orientados pela freqüência de compra). Segundo esses autores, gerentes podem utilizar boundary spanners (como o pessoal de vendas) ao invés dos serviços de atendimento centralizados para solucionar conflitos: os relacionamentos interpessoais - entre pessoal de vendas e clientes - podem reduzir os conflitos mais eficazmente. Nesse aspecto, Ring e Van de Ven (1994) indicam que relacionamentos pessoais e reputação entre membros interfaceadores têm um importante papel para facilitar e ampliar as trocas interorganizacionais.

3. Aprendizagem Organizacional de Natureza Situada

Antonello e Godoy (2007, p. 4) argumentam que “toda a atividade na vida dos indivíduos é uma oportunidade para aprendizagem e que a aprendizagem em situações sociais casuais é tão importante quanto experiências de aprendizagens formais”. Conforme Nicolini, Gherardi e Yanow (2003), a aprendizagem não ocorre somente na mente dos indivíduos, mas também na sua participação em atividades sociais. Assim, a aprendizagem é vista como integrada no cotidiano da vida das pessoas, oriunda em grande parte da fonte informal das relações sociais, ou então o ato de evidenciar a experiência contínua: o que as pessoas aprendem são significados intersubjetivos inseridos na cultura (WEICK; WESTLEY, 2004). A aprendizagem é, portanto, um fenômeno principalmente cultural e social, e não somente cognitivo (NICOLINI; GHERARDI; YANOW, 2003; ELKJAER, 2004; GHERARDI, 2005; ANTONELLO; GODOY, 2007). Dentro desta linha de pensamento são apresentados a seguir os conceitos de prática e de aprendizagem situada.

O conceito de prática é central para se compreender a aprendizagem vista como processo informal e situado. Conforme Gherardi (2005), práticas são situadas em contextos específicos de poder e conhecimento. Por outro lado, o conhecimento é situado dentro das formas de vida e é o resultado de interesses, ideologias e as circunstâncias das negociações sociais. A prática, segunda a autora, então, conecta conhecer com fazer. Como afirmam Brown e Duguid (2001), entender as práticas de trabalho parece ser crítico para entender a aquisição de identidade e conhecimento no trabalho. Gherardi (2005), assim, define prática como um modo, relativamente estável no tempo e socialmente reconhecida, de ordenar itens heterogêneos em um conjunto coerente. Nesse sentido, aprender é uma atividade social e não meramente cognitiva. Práticas inscrevem posições sociais e relações caracterizadas por expectativas particulares, regras e procedimentos.

Lave e Wenger (1991) argumentam que o aprendizado sempre ocorre em função da atividade, contexto e cultura no qual ocorre ou se situa. A interação social é um componente crítico da aprendizagem situada; nela, os aprendizes ficam envolvidos em “Comunidades de Prática”, que portam certas convicções e definem comportamentos a serem adquiridos. Brown e Duguid (1992) descrevem este tipo de local de trabalho como um processo de aprendizagem que acontece por “teias de participação”. Wenger e Lave (1998), caracterizaram estas teias de aprendizagem informais como Comunidades de Prática e Boland e Tenkasi (1995) as denominam comunidades de saber. Ao invés de representar aprendizagem como o que acontece dentro de sistemas formais, por exemplo, pelo treinamento ou uso de banco de dados, esta abordagem volta-se a para aprendizagem que acontece pela participação

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no trabalho. O aprendizado ocorre de maneira não intencional, não deliberada. Conforme Antonello (2005) a transferência de conhecimento e aprendizagem mais integrados é facilitada por meio da autêntica interação social. Aprendizagem situada coloca pensamento e ação num lugar e tempo específicos. Situar significa envolver indivíduos, o ambiente e as atividades para criar significado.

Para Lankard (2000), aprende-se em contextos que refletem como o conhecimento será devidamente usado em situações da vida real. A estratégia está baseada na premissa de que conhecimento não é independente, mas fundamentalmente situado, sendo em parte um produto da atividade, contexto e cultura nos quais é desenvolvido (BROWN; DUGUID, 1992). Orey e Nelson (1994, p.623) elaboram uma explicação: “aprendizagem requer mais que só pensamento e ação, ou uma situação física ou social particular, ou de receber um corpo de conhecimento; também requer participação nas atuais práticas da cultura”. Assim, a aprendizagem situada é o autêntico contexto social no qual a aprendizagem acontece, fornecendo ao indivíduo o benefício do conhecimento ampliado e o potencial para aplicar este conhecimento de novas formas em novas situações. Na teoria da aprendizagem situada o “conhecimento é visto como co-produzido pelas pessoas e a situação; compromisso e o engajamento do indivíduo são críticos na situação”(ANTONELLO, 2005, p.7).

Nicolini, Gherardi e Yanow (2003) salientam que conhecimento e aprendizagem são principalmente fenômenos sociais e culturais. Conforme estes autores, fenômenos como conhecimento, significado, atividade humana, poder, linguagem, organizações e transformações históricas e tecnológicas ocorrem e são componentes do campo das práticas. Aprendizagem situada, portanto, é aquela que acontece dentro de um contexto material, histórica e sócio-economicamente definido, um “onde “ e um “quando” específicos”.

4. Aprendizagem Interorganizacional

Segundo Knight (2002), aprendizagem interorganizacional é a aprendizagem no contexto de grupos ou pares de organizações que estão proativamente cooperando, ou seja, em organizações que possuem relacionamentos cooperativos. No entanto, mesmo que o foco desse conceito seja em organizações, não se pode esquecer, assim como no marketing de relacionamento, que os relacionamentos ocorrem primariamente entre pessoas e grupos de pessoas. Foca-se aqui, então, os processos de utilização e exploração (exploitation e exploration) e a geração de conhecimento tácito e explícito, considerando o nível interorganizacional de aprendizagem.

Em relação aos processos de aprendizagem interorganizacional, conforme apresentado por Holmqvist (2003), a indicação que processos interorganizacionais favorecem a exploração (exploration) e processos intraorganizacionais a utilização (exploitation) tem sido mantida em vários estudos recentes de aprendizagem organizacional. No entanto, esse autor argumenta que aprendizagem interorganizacional cria condições tanto para exploração como para a utilização intraorganizacional.

Holmqvist (2003) reforça que eventualmente as partes podem conseguir consensualmente validar algumas experiências interorganizacionais conjuntas, o que pode permitir sua internalização pelos membros envolvidos, trazendo variedade às experiências individuais. Segundo o autor, com o passar do tempo, essas experiências podem ser reproduzidas dentro de cada organização, levando a sua utilização. No entanto, essa utilização é necessária para novos processos que impliquem no “experimentar” entre organizações. Holmqvist conclui que uma organização, ao utilizar um conjunto de habilidades, conseqüentemente cria condições para a exploração que pode ocorrer entre organizações.

Quanto à geração de conhecimento tácito e explícito na aprendizagem interorganizacional, segundo Child (2001), deve haver disposição das partes em compartilhar

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tanto conhecimento explícito quanto conhecimento tácito. Já Lane (2001) indica que ligações mais próximas e estáveis, particularmente em relacionamentos baseados na confiança, encorajam maior abertura e, assim, oportunidades múltiplas para aprender e permitir abertura de conhecimento confidencial. Conforme esse autor, a abertura de conhecimento está condicionada ao aumento da confiança: confiança mútua é condição básica e primeira para ampliar a aprendizagem interorganizacional. Child destaca a importância dos interfaceadores (boundary spanners) para nesses processos.

Portanto, vislumbra-se nos relacionamentos de marketing que os envolvidos nas interações entre as organizações aprendem principalmente porque estão interagindo e participando, não somente compartilhando informações e conhecimentos, mas negociando significados. Aprendem principalmente de maneira informal, explorando novos contextos, conceitos e significados e utilizando-os internamente em sua organização. Gera-se, principalmente, conhecimento tácito, que não depende apenas de instruções sobre trato com clientes ou treinamentos sobre como melhorar as negociações e fidelizar clientes.

A seguir são abordadas as relações entre marketing de relacionamento e aprendizagem organizacional, onde se enfoca o nível interorganizacional e a aprendizagem situada. Mais especificamente, o conhecimento tácito e explícito, a área de fronteira das organizações, o papel dos interfaceadores, as comunidades de prática e as questões de legitimidade da aprendizagem e conhecimento gerado nas fronteiras organizacionais.

5. Aprendizagem Interorganizacional Situada e Marketing de Relacionamento: um Referencial Possível?

Um considerável volume de estudos em Marketing de Relacionamento (MORGAN; HUNT, 1994; MORGAN, 2000; PALMATIER et al., 2006; WILSON, 2000) focam nas dimensões de confiança, comprometimento e cooperação. Já estudos acerca de aprendizagem interorganizacional, aprendizagem em alianças estratégicas e aprendizagem em redes (CHILD, 2001; LANE, 2001; KNIGHT, 2002; HOLMQVIST, 2003) indicam a aprendizagem colaborativa, ou o aprender a cooperar.

A partir destas colocações pode-se dizer que a cooperação possibilita a constituição de capacidades organizacionais através da transferência ou combinação de recursos, a capacidade em aprender e as interações sociais e políticas (HARDY; PHILLIPS; LAWRENCE, 2003). Todavia, sendo cooperação conseqüente de confiança e comprometimento (PALMATIER et al., 2006), para se aprender a cooperar, compreende-se que é necessário que se aprenda a confiar e a se comprometer.

A confiança é um dos elementos mais estudados pela academia em marketing de relacionamento (PALMATIER et al., 2006). No momento em que organizações permitem que outras aprendam sobre seus processos e práticas, explorando novos conceitos, idéias e significados e reproduzindo-os, transformando-os e utilizando-os internamente, conforme destaca Holmqvist (2003), também estão aprendendo a confiar. Isso em muitos momentos pode tornar-se complicado, considerando a área em questão e o nível de competitividade dos mercados e, determinadas ações, muitas vezes de natureza ética questionável, que podem decorrer disso.

Outro ponto importante é que confiança, um dos aspectos-chave dos relacionamentos, por sua natureza, dificilmente se aprende de forma explícita. Como Strati (2003) afirma, a confiança deve ser colocada dentro do conhecimento tácito, pois dificilmente pode ser considerada um tipo de conhecimento explícito, formal e científico.

Ademais, ainda quanto aos principais elementos constituintes dos relacionamentos, tais como confiança, comprometimento e cooperação (MORGAN; HUNT, 1994; MORGAN, 2000; PALMATIER et al., 2006; WILSON, 2000), depende-se, para sua apropriação pelos

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indivíduos envolvidos, muito mais das interações sociais provindas dos relacionamentos interpessoais e intergrupais do que de processos formais de aprendizagem. Embora alguns autores reforcem a importância do treinamento dos funcionários para interagir com clientes, trabalhar em equipes e para gerenciar expectativas dos relacionamentos (SHETH; PARVATIYAR, 2000 a), sabe-se que isso não é suficiente, pois se lida com questões principalmente de ordem afetiva e social.

Por outro lado, não se pode esquecer, como já comentado anteriormente, que relacionamentos interorganizacionais pressupõem relacionamentos interpessoais e intergrupais (WEBSTER, Jr, 1991), de indivíduos com determinados papéis, especificamente aqueles envolvidos com as práticas que ocorrem entre as fronteiras organizacionais, ou seja, as práticas dos interfaceadores. Afinal, como ressaltam Nicolini, Gherardi e Yanow (2003), práticas não respeitam fronteiras e conectam coisas, pessoas e eventos que estão distantes e somente parcialmente congruentes. Neste ponto da discussão torna-se relevante abordar a noção de Comunidades de Prática (CoPs).

Lave e Wenger (1991) foram os primeiros autores a introduzir o conceito de Comunidade da Prática. Os autores descreveram uma CoP como um conjunto de relações entre pessoas, atividade e mundo, em determinado período de tempo, e na relação com outras comunidades de prática tangenciais e sobrepostas. Nestas comunidades, os recém-chegados aprendem com os mais antigos por meio da permissão de sua participação em determinadas tarefas relativas à prática da comunidade. Com o passar do tempo os recém-chegados se movem da posição periférica para a participação plena na comunidade.

Wenger (1998) diferencia Cops de equipes de trabalho no ambiente organizacional (vide quadro 1) e determina como principais indicadores para a constatação sobre a formação de uma CoP: relacionamentos mútuos sustentados; compartilhamento de informações sobre melhores procedimentos de trabalhos em grupo; rápido fluxo de informação e propagação da inovação; ausência de preâmbulos, como se as interações e conversas fossem apenas uma continuação de um processo em andamento; rápida configuração sobre um problema a ser discutido; conhecimento do grupo sobre o que os seus membros sabem, o que podem fazer, e de que modo podem contribuir para a organização; definição mútua de identidades; habilidade em avaliar a conveniência de ações e produtos; ferramentas específicas, representações e outros artefatos; coletânea de fatos, estórias, e tradições locais e específicas; jargões e atalhos para a comunicação, assim como a facilidade para criação; estilos reconhecidos para demonstração de pertencimento ao grupo; discurso compartilhado refletindo determinada visão sobre o mundo.

Os componentes estruturais de uma comunidade de prática, segundo Wenger (1998), são: objetos que delimitem fronteiras (boundaries), artefatos, documentos, termos e expressões, conceitos, entre outras formas que permitam a organização da interação nas comunidades de prática. Desta forma, as comunidades de prática consistem nos blocos básicos de construção de um sistema de aprendizagem social, pois funcionam como “contêineres” sociais de conhecimentos que permitem o crescimento de um sistema, mantêm a troca de significados e identidade (WENGER, 2000).

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Comunidades de Prática Grupos Formais de Trabalho

Equipes de Projeto

Objetivo Compartilhamento de informações sobre temas e paixões em comum; troca de experiências e significados

Estabelecido pela organização para a realização de desenvolvimento de produtos e serviços

Completar uma tarefa especifica

Seleção para

participação no grupo

Os próprios componentes das comunidades de prática selecionam seus novos componentes.

Realizada pela gerência da organização.

Realizada pela gerência da organização.

Legitimação no grupo

Seguindo a teoria sobre participação periférica legitimada (LAVE; WENGER, 1991), os iniciantes participam na zona periférica e aos poucos passam a ser legitimados no grupo.

Realização efetiva das tarefas solicitadas

Realização efetiva das tarefas solicitadas

Elementos que

mantêm a coesão

Paixão, compromisso e identificação com a competência e a expertise do grupo

Objetivo comum dos membros para a realização das tarefas solicitadas.

Objetivos do projeto

Tempo de duração

Enquanto houver interesse em manter o grupo

Permanece até que a gerência solicite alteração, ou quando houver troca de líderes e reestruturação.

Papéis, formulários, instrumentos da organização.

Elementos comparti-

lhados

Artefatos, símbolos, estórias, expressões.

Permanece até o término do projeto ou troca de equipe.

Papéis, formulários, instrumentos da organização.

Quadro 1 - Comunidades de Prática, grupos formais de trabalho e equipes de projeto Fonte: Wenger (2003)

A CoP é visualizada por Lave e Wenger (1991) como uma condição intrínseca para a existência do conhecimento. A aprendizagem toma espaço nestas comunidades não apenas como uma restrita aprendizagem situada onde os exemplos da prática são simplesmente replicados, mas pela “aprendizagem com a Participação Periférica Legitimada (PPL)”. A PPL não consiste meramente na aprendizagem situada na prática, mas na aprendizagem como uma parte integral da prática, ou seja, na aprendizagem como “a prática social generativa no mundo vivido”. A Participação Periférica Legitimada é de natureza complexa. Cada um dos três aspectos – legitimidade, região periférica e participação - são indispensáveis e não podem ser considerados de forma isolada. Legitimidade e participação definem as maneiras características de pertencer a uma comunidade, enquanto região periférica e participação tratam da posição e a identidade no mundo social. Lave e Wenger (1991) enfatizam o caráter composto dos três componentes da PPL, portanto de seus inter-relacionamentos.

A legitimidade em uma CoP incide na dimensão que diz respeito a relações de poder e autoridade perante o grupo. A noção de peripherality (periferia) de Lave e Wenger (1991) não é um conceito físico relacionado à posição no núcleo ou na periferia, nem uma medida simples da quantidade de conhecimento que tenha sido adquirida. Na medida em que os novatos se movem da periferia destas comunidades para o centro, eles se tornam mais ativos e engajados na construção da cultura destas e, então, assumem o papel de experts. Nesse sentido, o aprendizado ocorre de maneira não intencional, não deliberada. A transferência de conhecimento e aprendizagem mais integrados são facilitadas através da autêntica interação social. Situar significa localizar num setting particular os processos de pensar e fazer utilizados pelos experts para criar conhecimento e habilidades para as atividades. O conhecimento é obtido pelos processos descritos como" “way in” e prática. “Way in” é um período de observação na qual um aprendiz assiste um expert/mestre e faz uma primeira

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tentativa de resolver um problema. Na prática está o refinamento e aperfeiçoamento do uso do conhecimento adquirido. Os autores utilizam os termos de periferia e participação plena para denotar o grau de engajamento e de participação na comunidade. Assim, a noção de participação fornece a chave para compreender as CoPs, onde não necessariamente implica na co-presença, em um grupo bem definido e identificável, ou ainda em fronteiras sociais visíveis.O contato pessoal é relevante na transmissão do conhecimento tácito; a informalidade permite que os próprios participantes das comunidades estipulem o mecanismo de funcionamento do grupo e a participação voluntária, contribui para o comprometimento dos membros para com a disseminação do conhecimento. De acordo com Wenger (1998), nas CoP’S os significados são negociados por meio de um processo de participação e reificação. As comunidades de prática produzem abstrações, ferramentas, símbolos, histórias, expressões e conceitos que reificam algo de suas práticas.

Entretanto, as CoPs implicam participação em uma atividade sobre a qual todos os participantes têm uma compreensão comum sobre o que é e o que significa para suas vidas. A comunidade e o grau de participação nela estão em alguns sentidos inseparáveis da prática (LAVE; WENGER, 1991). Para Antonello (2002) nas Cops os indivíduos elaboram seus próprios mecanismos de confiança, porque sabem o que cada um deles é capaz de fazer, possibilitando que as idéias fluam mais facilmente dentro da comunidade.

As idéias e práticas compartilhadas, segundo Nicolini, Gherardi e Yanow (2003), surgem de um conhecimento e aprendizado baseados predominantemente através de fenômenos sociais e culturais. Quer dizer, o conhecimento e aprendizagem não seriam concebidos pelos processos mentais que residem na cabeça dos indivíduos, mas seriam vistos como formas de expertise, ou seja, como um conhecimento situado na ação em contextos históricos, sociais e culturais.

A CoP, portanto, consiste em um grupo de pessoas com interesses semelhantes e que se reúnem num determinado lugar (físico ou não) para discutir e partilhar conhecimento. Para que isto aconteça, e em conseqüência disto, são criados documentos, utilizadas ferramentas e são definidos valores. Uma comunidade de prática é, portanto, diferente de uma equipe, por ser criada em torno de tópicos de interesse, não por uma tarefa a ser realizada, sendo também distinta de uma rede informal pelo fato de adotar tais tópicos, tendo, assim, uma identidade. Uma comunidade de prática pode ser definida, desta forma, pela existência de um tópico de interesse, pela possibilidade de interação e relações entre os indivíduos em torno do tópico e, finalmente, por haver uma prática e não meramente um interesse compartilhado (ANTONELLO, 2002).

Segundo Wenger (2003), comunidades de prática são aquelas que compartilham práticas culturais refletindo suas aprendizagens coletivas. Nesse ínterim, Wenger, considerando as fronteiras entre comunidades de práticas, indica que uma interação na fronteira é geralmente uma experiência de estar exposto a uma competência estrangeira. Em relação a isso, ele define como broker - semelhante a noção de interfaceador apresentada anteriormente nesse artigo - as pessoas que atuam entre comunidades, introduzindo elementos de uma prática em outra. Além disso, o autor comenta que nos encontros de fronteira ocorrem práticas de fronteira e que projetos interdisciplinares, considerando a perspectiva do desenvolvimento de práticas, são projetos de fronteira. Embora Wenger faça referência a fronteiras para comunidades de prática, suas argumentações podem servir também para as questões interorganizacionais tratadas nesse artigo, em função do foco em práticas e aprendizagem situada. Há, ademais, a possibilidade de existir comunidades de prática nas fronteiras de diferentes organizações interagindo entre si.

Assim, considerando as comunidades de prática em um nível interorganizacional, Brown e Duguid (2001) ao referirem-se ao conhecimento que surge das diversas comunidades, esclarecem que elas interagem com parte do ambiente da organização,

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desenvolvem soluções locais para seus problemas, e direcionam-se ao conhecimento de suas conexões de rede. Nesse ínterim, é permitido que os conhecimentos compartilhados entre comunidades, através de suas conexões, se “soltem” (leakiness) e não fiquem “presos” (stickiness). De forma semelhante ao proposto por Wenger (2001), surgem os tradutores ou interfaceadores entre as duas comunidades. Estes tipos de conexões freqüentemente tornam as redes informais dentro de uma empresa muito mais importantes para disseminar práticas, que as maneiras formais.

Quanto à aprendizagem e conhecimento gerado nas fronteiras em questão - no caso os relacionamentos interorganizacionais –, à medida que ocorrem interações entre indivíduos e grupos de diferentes organizações, seria de se esperar, como ressalta Yanow (2004), que poderiam ser desenvolvidos conhecimentos valiosos às organizações. Mesmo que prevaleça a disseminação informal de conhecimento no nível interorganizacional, tal como afirma Lane (2001), Yanow questiona por que determinados gerentes revelam-se tão desinteressados sobre o trabalho daqueles que eles gerenciam, especialmente quando o trabalho produz conhecimento local que tem implicações estratégicas para as organizações. A partir da análise de achados em campo, Yanow comenta que uma das razões para que isso ocorra é que os trabalhadores em níveis de base possuem maior conhecimento local, enquanto que os gerentes possuem o conhecimento especialista (expert). Os trabalhadores em questão encontram-se mais na periferia das organizações, que pode ser tanto hierárquica (direção vertical: os níveis mais baixos indicam periferia) quanto geográfica (direção horizontal: pessoas que interagem mais com outras organizações). Os altos gestores estariam posicionados mais ao centro das organizações.

Yanow considera como conhecimento local aquele baseado na prática, específico do contexto, derivado interativamente, baseado em experiência vivida, com razão prática, de natureza mais tácita, do dia-a-dia, portanto, mais não-verbal. Já o conhecimento especialista (expert) é baseado em teoria, abstrato, construído cientificamente, baseado academicamente, técnico-profissional, explícito e acadêmico, portanto, mais verbal. Para a pesquisadora, os trabalhadores periféricos interagem entre domínios, “poluindo” o sistema de categorias e as definições de fronteira no processo – tornam-se, desta forma, os “outros”. Em relação a isso, Webster, Jr. (1991) coloca que como os indivíduos de fronteira interagem principalmente com pessoas de fora da organização, eles são alvo de certa desconfiança e temor por parte dos indivíduos de dentro da organização. Desta forma, termina não sendo legitimado o conhecimento dos trabalhadores periféricos que é aprendido junto a indivíduos de outras organizações.

Então, poder-se-ia dizer que a aprendizagem interorganizacional, no tocante às práticas do marketing de relacionamento e área de Marketing, enquanto área de fronteira, acontece de forma situada, tanto na exploração (exploration) quanto na sua utilização (exploitation). Inclui as fronteiras, os indivíduos e grupos envolvidos, as interações vendedor-cliente (inclusive suas histórias) e as questões políticas e de poder, muito presentes nesta área da organização que lida com as relações com os mercados. Ao mesmo tempo, levando em conta que grande parte dos indivíduos envolvidos neste processo não são considerados como pertencentes aos centros das organizações (eles são, tais como os vendedores, pertencentes a periferia hierárquica e geográfica da organização), termina ocorrendo a falta de confiança e legitimidade acerca do que é produzido pelas práticas desse contexto.

6. Considerações Finais

Relacionamentos cada vez mais estreitos entre diferentes organizações, que implicam na maior freqüência, rapidez e qualidade nas interações, elevados níveis de confiança,

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comprometimento e cooperação, pressupõem que indivíduos situados nas fronteiras das organizações irão interagir, principalmente, de maneira informal e tácita, repercutindo no marketing de relacionamento.

Desta forma, tal como apresentado por Antonello e Godoy (2007), vislumbrar os processos de aprendizagem a partir de uma perspectiva baseada em práticas e, portanto, situada, implica em compreender os microprocessos por trás das práticas contínuas dos atores em um sistema social. No marketing de relacionamento diz respeito a perceber que suas ações dependem em grande parte de processos informais de aprendizagem, de microprocessos que estão por trás de práticas de atores que se encontram em fronteiras (periferias) organizacionais.

Muito do conhecimento produzido pelos trabalhadores de fronteira da área de marketing, por sua natureza local e seu espaço de produção fronteiriço, pode ser extremamente valioso e trazer subsídios importantes no tocante ao desenvolvimento de novos produtos e serviços, novas formas de distribuição, negociação e promoção, gestão de conflitos e na melhoria dos níveis de satisfação e do próprio relacionamento. Afinal, diz respeito a indivíduos e grupos que mantêm relações com os clientes, ou seja, que lidam com a essência do que vem a ser marketing.

No entanto, o que fazem e compartilham esses indivíduos e grupos, que podem fazer parte de comunidades de prática, pode gerar desconfiança e falta de legitimidade junto aos outros membros da organização, principalmente aos que ocupam posições centrais na organização. É interessante ressaltar que nos estudos desenvolvidos acerca do marketing de relacionamento, conforme indicado por O’Malley e Tynan (2005), poucas pesquisas são realizadas sobre a relevância e o papel dos funcionários nos relacionamentos interorganizacionais.

Portanto, mesmo que as organizações alardeiem a importância do marketing de relacionamento, em muitos casos não tem sido possível identificar os resultados desejados a partir da implementação de métodos, ações e ferramentas. Isto porque nem todas as empresas desejam estabelecer relacionamentos mais duradouros (o que existe neste caso é geralmente apenas o discurso), pois isto exige níveis elevados de confiança, comprometimento e cooperação, e também porque relacionamentos interorganizacionais dependem fundamentalmente de pessoas, o que demonstra a complexidade das ações de marketing de relacionamento.

Por outro lado, deve-se ter em mente que para se avançar em marketing de relacionamento, poderá ser necessário aprender a confiar, comprometer-se e, portanto, a cooperar. E isso se aprende fundamentalmente de maneira informal e tácita, por meio das interações, principalmente entre indivíduos e grupos de fronteira, o que não ocorre no curto prazo. Estes indivíduos e grupos, muitas vezes, são de certa forma “discriminados” por seus pares nas organizações, principalmente quando o modelo de gestão é do tipo mais centralizador e controlador e os gestores revelam grande dificuldade para lidar com questões de ordem informal, social e situada.

Portanto, considerar nas ações de marketing de relacionamento a aprendizagem situada e de nível interorganizacional implica compreender melhor os microprocessos e as práticas dos atores envolvidos, principalmente dos funcionários de fronteira, implica em se atentar para o contexto no qual estão inseridos estes indivíduos. Pode-se atentar, desta forma, à aprendizagem organizacional e situada, em nível interorganizacional, como um referencial possível e valioso para o aprofundamento da compreensão das dimensões e das práticas do marketing de relacionamento.

Como sugestão para futuros estudos, considerando as quatro questões de investigação de Antonello e Godoy (2007) - relacionadas a níveis de aprendizagem, neutralidade da meta, noção de mudança e natureza processual - e os pressupostos utilizados nesse ensaio teórico,

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poder-se-ia procurar analisar como interagem os níveis de aprendizagem grupal, intergrupal, organizacional e interorganizacional nas práticas de marketing de relacionamento, uma vez que estão envolvidos indivíduos e grupos de diferentes organizações, que se relacionam dentro e fora de suas organizações. Além disso, como a aprendizagem, em nível interorganizacional, que é de natureza processual e situada, possibilita mudanças, ou não, na organização? Como ocorre o processo de legitimação, ou não, de determinados grupos que se constituem de indivíduos de diferentes organizações e atuam na zona de fronteira das organizações?

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