alimentos fortificados para cálcio - nestlé - tudo que ... · digestivo da faculdade de medicina...
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12 •
São
Pau
lo •
ISSN
217
6-84
63
17nutrição baseada em evidência utilidade e limitações
cirurgia bariátrica um novo tratamento para diabetes?
Por que gostamos tanto de gordura? o papel da língua
Alimentos fortificados para ingestão recomendada de
cálcio
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ingestão recomendada de
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Juan Carlos MarroquínPresidente da Nestlé Brasil
Direção Editorial: Juan Carlos Marroquín, Izael Sinem Jr. e Célia Suzuki
Consultor Editorial: Claudio Galperin
Colaboradores: Juliana Lofrese, Maria Helena Sato, Mariana Kanki, Henrique Vianna, Silvia Araujo, Roseli Borghi, Hélvio Kanamaru
Editor: Claudio Galperin Jornalista-responsável: Flávia Benvenga (MTb 17.339) Assistente Editorial: Maria Fernanda Elias Llanos Assistente de Redação: Betina Galperin
Edição de Arte e Pré-Media: D’Lippi Comunicação Integrada — (11) 3031.2900 — Direção de Arte: Rosalina Sasaki Arte-final: Ricardo Lugo
Fotografia: Egydio Zuanazzi, Thinkstock e Shutterstock Capa: Shutterstock Revisão: Maeve Faiani
Impressão: Matavelli Tiragem: 30.000 exemplares
A ciência como ferramenta de transformação
A revista Nestlé Bio é um produto informativo da Nestlé Brasil destinado a promover pesquisas e práticas no campo da ciência da nutrição realizadas no país e no exterior, sob os cuidados de um criterioso processo editorial. Alinhada ao histórico papel da Nestlé no apoio à difusão da informação científica, a revista abre espaço para a diversidade de opiniões, que consideramos ser essencial para o intercâmbio de ideias e conceitos inovadores. As declarações expressas na revista não refletem necessariamente o posicionamento institucional da companhia com relação aos temas tratados.
editorial
O universo dinâmico das descobertas científicas encerra a possibilidade, e também o desafio, de traduzir co-
nhecimento em práticas que possam melhorar a qualidade de vida das pessoas.
É ao redor desse eixo que gravita grande parte dos artigos desta edição da Nestlé Bio.
Por um lado, os doutores Raul Manhães de Castro e Carol Virgínia Gois Leandro, Professores do Programa de
Pós-graduação em Nutrição da Universidade Federal de Pernambuco, avaliam como a Nutrição Baseada em
Evidência pode beneficiar a prática cotidiana de profissionais de saúde.
Por outro, os doutores Marco Aurélio Santo e Daniel Riccioppo, acadêmicos da Disciplina de Cirurgia do Aparelho
Digestivo da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, discutem criticamente o emprego da cirurgia
bariátrica como forma de tratamento para pacientes obesos com diabetes do tipo II.
Já no artigo assinado pelo doutor Claudio Galperin, Editor da Nestlé Bio, podemos apreciar como a descoberta de um
receptor para gordura na língua pode impactar a maneira como lidamos com a epidemia de obesidade no mundo.
Nesta edição, ainda, sentimos orgulho de apresentar iniciativas da Nestlé que, a um só tempo, geram conhe-
cimento e contribuem ativamente para a promoção da saúde e do bem-estar da população. Como a parceria
com a International Osteoporosis Foundation, organização que atua na prevenção e combate à osteoporose, e
o Programa de Estágio Jovens Nutricionistas, no qual estudantes do quarto ano de Nutrição ganham uma bolsa
de estudos da Nestlé para que possam aprofundar seu aprendizado em ambiente hospitalar.
A todos, uma boa leitura
Aguardamos seus comentários e sugestões no e-mail [email protected], com seu nome completo, registro profissional, local de trabalho e cidade de origem. Trechos das mensagens poderão ser eventualmente publicados.
íNDICEintercâmbio
nest
lé
Sou nutricionista da área clínica e apro-veito para parabenizar a toda a equipe pela excelência da nestlé bio. Sempre com assuntos atuais sendo discutidos e apresentados de forma completa e com muita qualidade. Parabéns!cibeleSão Paulo/SP
Trabalho no SAE DST/Aids Campos Elí-seos da Prefeitura de São Paulo. Rece-bo a Revista nestlé bio Nutrição e Saú-de, que considero excelente. Parabéns pela qualidade da mesma. Janice São Paulo/SP
Sou nutricionista do SESI de Leme (SP) e utilizo muito a nestlé bio em atividades de educação nutricional que realizo com os alunos. Gostaria de saber da possibilidade de a revista ser enviada em nome da escola, para consulta na Biblioteca.Marílialeme/SP
Sou profi ssional da área de Ciência e Tecnologia de Alimentos. Recebi um exemplar da revista nestlé bio Nutri-ção e Saúde e fi quei muito interes-sada em seu conteúdo, já que os te-mas são tão relevantes para minha vida pessoal e profi ssional.MaynaraMariana/Mg
21 ponto de vistaNutrição baseada em evidência: utilidade e limitações. A opinião dos doutores Raul Manhães de Castro e Carol Virgínia Gois Leandro, da Universidade Federal de Pernambuco.
22nutrição e culturaEm tempos de e-mail e SMS, selos ilustrados por comidas e pratos típicos de países cruzam fronteiras ao redor do mundo.
28capaConheça a variedade de produtos fortificados com cálcio da Nestlé, que contribui para a ingestão adequada do mineral no dia a dia.
31 dossiê bioAs nutricionistas Márcia Regina Vitolo e Fernanda Rauber, da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre, escrevem a segunda parte do artigo Nutrição e Gestação.
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04palavraDr. Bruno Muzzi Camargos, presidente da Sociedade Brasileira de Densitometria Clínica, fala sobre a pesquisa realizada recentemente pelo IBOPE sobre prevenção, conhecimento e tratamento da osteoporose.
10focoLaranja: o que sabemos sobre a história e as virtudes nutricionais desta fruta ancestral.
16conhecerA parceria entre o Programa Nestlé Nutrir Crianças Saudáveis e o Instituto Fernanda Keller transforma a rotina e o futuro das crianças de Niterói (RJ).
36resultadoPrograma de Estágio Jovens Nutricionistas: formação profissional e assistência nutricional hospitalar, patrocinadas pela Nestlé.
42sabor e saúdeA descoberta de um receptor para gordura na língua adiciona uma nova peça ao quebra-cabeça da obesidade.
46leitura críticaCirurgia bariátrica: uma nova modalidade de tratamento para o diabetes em pacientes obesos?
palavra
por _Claudio Galperinfo to _Egydio Zuanazzi
A palavra do Dr. Bruno Muzzi Camargos – Presidente da ABRASSO
Os números falam por si. No Brasil, cerca de 10 milhões
de pessoas sofrem de osteoporose. No entanto, somente uma
a cada três pessoas com a doença é diagnosticada e dessas,
apenas uma, em cada cinco, recebe algum tipo de tratamento.
Estima-se em 121 mil o número de fraturas de fêmur
ao ano no País. Valor que deve subir para 140 mil em 2020 e
160 mil em 2050. Em 1999 ocorriam 153 fraturas de fêmur
por 100.000 pessoas maiores de 50 anos. Em 2004, este nú-
mero mais do que dobrou, atingindo a cifra de 343 fraturas de
fêmur por 100.000 pessoas maiores de 50 anos.
Ao olharmos para estes dados, há que se levar em conta,
ainda, o fato de que a osteoporose não é uma doença de noti-
ficação compulsória. Deste modo, apenas as fraturas de fêmur
são capturadas. Embora graves, estas fraturas representam
apenas a ponta de um iceberg que encerra fraturas em corpos
vertebrais, membros superiores e outras partes do esqueleto.
palavra 5
OSTEOPOROSE: O GRAU DE CONHECIMENTO DA POPULAçãO BRASILEIRA
Como vimos na edição de número 15 da Nestlé Bio, até
2010 não havia nenhuma ferramenta validada, em amostra-
gem consistente, para identificar indivíduos com maior risco
para osteoporose e fraturas por fragilidade, visando a preven-
ção. Esta realidade passou a mudar com a realização de im-
portantes estudos epidemiológicos como o Brazilian Osteo-
porosis Study (BRAZOS).
Agora, em 2012, uma pesquisa encomendada ao Ibope
pela Associação Brasileira de Avaliação Óssea e Osteoemetabo-
lismo — ABRASSO — soma-se a estas iniciativas, na tentativa
de se obter informações detalhadas sobre o grau de conheci-
mento das mulheres brasileiras com relação à prevenção, diag-
nóstico e tratamento da osteoporose. A convite da Nestlé Bio,
o Dr. Bruno Muzzi Camargos, médico ginecologista e obstetra,
Presidente da ABRASSO, compartilha conosco os principais re-
sultados desta pesquisa.
6 palavra
Qual foi a motivação para encomendar a pesquisa ao
Ibope?
A ABRASSO queria entender com maior profundida-
de o grau de consciência das mulheres brasileiras e da
população em geral sobre a osteoporose. Esta informa-
ção é fundamental para que as futuras ações da Campa-
nha de Conscientização Popular Seja Firme e Forte Con-
tra a Osteoporose possam levar informações relevantes
ao público. Nosso objetivo é conscientizar as pessoas
de que a prevenção da doença começa na infância.
Qual foi a amostra e o perfil dos entrevistados?
O Ibope realizou duas pesquisas: uma quantitati-
va, com 1.008 mulheres com idade a partir dos 45 anos
nas principais regiões metropolitanas do País; a outra,
também quantitativa, com 2.002 entrevistados em todo
o País numa amostra representativa nacional, com ho-
mens e mulheres acima de 16 anos de idade.
Vale dizer que a estratégia de coleta de dados do
Ibope é a mais representativa da população brasileira. Por
esta razão, investimos na qualidade de seus serviços.
O que a pesquisa revelou em relação à prática de ativi-
dade física?
Em relação à atividade física, a pesquisa revelou que,
entre as mulheres com mais de 45 anos, somente 26%
praticam exercícios regularmente. Consideramos este nú-
mero muito baixo para estratégia de prevenção em massa.
Embora haja iniciativa do setor público na abertura de aca-
demias ao ar livre, o fator motivacional, eventualmente de-
sempenhado por um instrutor ou educador físico, poderia
aumentar a prática regular de exercícios físicos.
E em termos de hábitos alimentares?
Apesar da maioria da população brasileira consu-
mir leite e derivados diariamente (67%), a quantidade
recomendada para se prevenir a osteoporose não é ha-
bitualmente alcançada.
Cada porção de alimentos ricos em cálcio, como
por exemplo o leite e seus derivados, deve conter de 250
a 350 mg de cálcio. O ideal seria que uma mulher adulta
após os 50 anos consumisse 1.200 mg de cálcio ao dia.
Apesar de a maioria da população brasileira consumir leite e derivados diariamente, a quantidade recomendada para prevenir a
osteoporose não é habitualmente alcançada.
palavra 7
A maioria, contudo, consome apenas uma porção
(29%) ou duas porções (31%). Menos de 20% das mu-
lheres com mais de 45 anos de idade consome três ou
mais porções de leite e derivados diariamente. Entre as
mulheres adultas jovens (abaixo dos 45 anos), o quadro
é ainda mais grave: menos de 10% das mulheres nessa
faixa etária consomem leite e derivados nas proporções
recomendadas pela Organização Mundial da Saúde.
Qual foi o grau de conhecimento dos alimentos que são
fonte de cálcio?
A maioria das entrevistadas com mais de 45 anos
de idade (mais de 70%) reconhecem as principais fon-
tes de cálcio como brócolis, leite integral, sardinha,
salmão, queijo branco e iogurte. Entre a população em
geral, 90% dos entrevistados consideraram leite e seus
derivados como fonte de cálcio e 80% citaram as verdu-
ras verdes escuras e peixes como fontes não lácteas de
cálcio alimentar.
Apenas 30% das entrevistadas com mais de 45 anos de idade já fizeram o exame de desintometria óssea.
Qual foi o nível de conhecimento da osteoporose no que
diz respeito às suas causas?
Mais da metade dos entrevistados (58%) acredi-
tam que a principal causa da osteoporose seja a dieta
pobre em cálcio; seguida pelo sedentarismo (24%) e ida-
de (24%). Outras causas da doença, no entanto, como
uso de certas medicações, por exemplo, permanecem
pouco conhecidas.
A menopausa foi relacionada à osteoporose apenas
em 10% dos casos, demonstrando desconhecimento da
associação entre a falência hormonal e a perda óssea.
Qual a percepção sobre o impacto da osteoporose na qua-
lidade de vida?
Mais da metade das mulheres (62%) que já sofre-
ram alguma fratura após os 40 anos, relatam piora da
sua qualidade de vida após a ocorrência da fratura.
Apesar das fraturas reduzirem a qualidade de vida,
36% das entrevistadas, com mais de 45 anos de idade,
relatam que a qualidade de vida melhorou muito após
o tratamento e 30% que melhorou um pouco. A melho-
ra com o tratamento parece ser uma constante, mesmo
que em graus diferentes.
O que aponta a pesquisa em termos da realização de exa-
mes para o diagnóstico da doença?
Apenas 30% das entrevistadas com mais de 45
anos de idade já fizeram o exame de desintometria óssea.
Porém, pouco mais da metade das entrevistadas (55%)
realizaram esse exame pela primeira vez aos 55 anos.
8 palavra
Existe uma estimativa de quantos exames de densitome-
tria óssea são feitos por ano na rede pública do País?
A maioria das capitais dispõe de densitometria
óssea na rede pública, mas em escala muito reduzida.
Dos 1850 aparelhos instalados no Brasil, apenas 3%
pertencem à rede pública. Na medicina privada, o tempo
médio de espera para uma densitometria é de um dia e
no serviço público de seis meses. Vale destacar, contu-
do, que não é somente a densitometria que pode fazer o
diagnóstico. A história de fraturas por fragilidade óssea
também conferem o diagnóstico de osteoporose.
De um modo geral, as medidas preventivas adotadas são
adequadas?
Como visto acima, a percepção da importância da
regularidade na prática de exercício físico e da ingesta
de quantidades adequadas de cálcio está abaixo daquilo
que é recomendado para preservação da saúde óssea.
Grande parte da população acredita que duas porções
de leite e derivados são suficientes.
Para esclarecimento, as medidas de prevenção e com-
bate à osteoporose são:
1) Aporte satisfatório de cálcio e níveis normais de vita-
mina D a todas as pessoas conforme cada faixa etária.
2) Prática de atividade física regular, segura e orientada
por profissional capacitado.
3) Utilização de agentes terapêuticos eficazes quando
necessário.
4) Adoção de intervenções domiciliares facilitadoras de
acesso e minimizadoras do risco de quedas.
A maioria das capitais dispõe de densitometria óssea na rede pública, mas
em escala muito reduzida. Dos 1.850 aparelhos instalados no Brasil, apenas
3% pertencem à rede pública.
No alto, ilustração de osso saudável. Acima, osso com osteoporose.
palavra 9
Como o senhor interpreta a dicotomia entre o elevado ní-
vel de conhecimento da doença e a baixa prática de medi-
das preventivas?
Na minha opinião, a dicotomia demonstra a neces-
sidade da criação de espaços onde os bons hábitos com
a saúde sejam colocados em prática.
Além das salas de aula e programas de televisão, é
necessário conduzir programas de saúde voltados espe-
cificamente para a população em risco de sofrer fraturas
osteoporóticas, como já existem nos casos de outras
doen ças crônicas como hipertensão e diabetes.
Qual o grau de conhecimento sobre o tratamento da
doença?
Apenas uma pequena parcela da população rece-
be o tratamento específico. Muitas vezes, o suplemento
de cálcio é confundido com os agentes farmacológicos
desenvolvidos especificamente para o tratamento da
osteoporose. A Vitamina D é confundida com cálcio que,
por sua vez, é confundido com bisfosfonatos e outros
agentes. Em resumo: a pesquisa revela que, para a po-
pulação, as medidas preventivas são confundidas com
as medidas terapêuticas em osteoporose.
Muitas vezes, o suplemento de cálcio é confundido com os agentes farmacológicos desenvolvidos especificamente para o tratamento da osteoporose.
Quais as conclusões mais importantes revelados pela
pesquisa da Abrasso / Ibope?
Analisando os resultados, percebemos um alto
índice de conhecimento sobre a osteoporose, tanto na
amostra feminina (mulheres mais velhas e mais jo-
vens), como também entre a população em geral.
No entanto, a distância entre conhecimento e
prática preventiva é clara: menos de 20% das mulheres
com 45 anos ou mais consome pelo menos 3 porções
de leite e derivados.
Desse modo, tanto em prevenção, como em diag-
nóstico e tratamento, há um longo caminho a ser percor-
rido para transformar a consciência sobre a doença em
prática efetiva, especialmente quando consideramos o
envelhecimento da população.
Em que medida o resultado da pesquisa fundamenta a
adoção de medidas concretas para melhora da prevenção
e do tratamento da osteoporose no País?
Os dados levantados pela pesquisa nortearão o
planejamento das ações de comunicação da ABRASSO
e foram aplicados na confecção do material informati-
vo que está sendo veiculado desde o dia 20 de outubro,
escolhido como o Dia Mundial de Prevenção e Combate
à Osteoporose.
L A R A N J A
Na tradução de vários idiomas, as laranjas são consideradas as cobiçadas “maçãs douradas”, que eram protegi-das por ninfas e por um dragão de 100 cabeças, no Jardim das Hespérides.
foco
Hércules, filho de Zeus e o maior herói da mitologia grega, lutou incansavel-mente para obter as frutas e, conse-quentemente, cumprir o último de seus doze trabalhos [1].
por_Maria Fernanda Elias Llanos
foco 11
A laranja protagonizou o que se considera o primeiro ensaio clínico da história da medicina.
Inicialmente, as plantas eram cultivadas em pomares na
Bahia, e em 1502 foram levadas para São Paulo [2].
Os missionários Manuel da Nóbrega e José de An-
chieta, em cartas à Companhia de Jesus, mencionaram
as condições propícias para o desenvolvimento dos fru-
tos no Brasil [3]:
"Nesta terra, se dão bem arvoredos de espinhos,
que vieram de Portugal, como laranjeiras, cidreiras, li-
moeiros, limeiras e todo ano têm frutos bons sem ser
regados, porque o céu tem esse cuidado e é a terra fértil
dessas árvores que se dão pelos montes e campos ... e
deles se fazem conservas, como a laranjada, cidrada, ..."
O cultivo dessas espécies também é observado nas
obras do pintor Jean-Baptiste Debret e do cientista Char-
les Darwin, que chegaram ao Brasil depois de 1800.
E foi nessa época de navegações e descobrimen-
tos que a laranja protagonizou o que se considera o pri-
meiro ensaio clínico da história da medicina. O médico
escocês James Lind, interessado nas patologias que di-
zimavam as tripulações de marinheiros durante as lon-
gas jornadas intercontinentais, conduziu um experimen-
to a bordo do navio HMS Salisbury em 1747. O objetivo
de Lind era estudar as causas do escorbuto — deficiên-
cia de vitamina C que apresenta como alguns dos sinais
clínicos: sangramento das gengivas, perda dos dentes,
dor nas articulações e hemorragias [4].
O pesquisador selecionou 12 tripulantes que so-
friam de escorbuto e os dividiu em seis pares. Os grupos
foram orientados a seguir a dieta básica do navio e a
Alguns pesquisadores afirmam que a dúvida exis-
tente sobre quais eram as verdadeiras “maçãs douradas”
se deve ao fato de os gregos terem informações incom-
pletas sobre as laranjas, que eram cultivadas em regiões
longínquas. Referida como fonte da eterna juventude, a
fruta surge também em outros momentos da mitologia
grega, assim como na mitologia nórdica. Nos contos de
fadas europeus, ela é constantemente roubada de um rei
por um vilão ou por uma ave, sendo que o papel do herói
é resgatá-la [1].
A origem da laranja também é controversa. De acor-
do com o botânico Manuel Pio Corrêa, o cultivo da fruta
remonta a um período de mais de 2.000 anos a.C. e que,
assim como as demais espécies do gênero citrus, se ori-
ginou no continente asiático. Entretanto, o local exato não
foi definido, e os historiadores sugerem as regiões que
incluem hoje índia, China, Butão, Birmânia e Malásia [2].
Do leste asiático, a laranja teria sido levada para o
norte da África e chegado à Europa apenas durante a Idade
Média. Os portugueses foram responsáveis por introduzir
a fruta no Brasil logo após o Descobrimento, no século XVI.
I M P O R T Â N C I A E C O N Ô M I C ANa década de 80, o Brasil tornou-se o maior produtor mundial de plan-
tas cítricas, com mais de 1 milhão de hectares plantados. Segundo o Institu-
to de Economia Agrícola, a produção atual de laranja no Estado de São Paulo
é estimada em cerca de 400 milhões de caixas por ano e representa 70%
do volume nacional. Junto com a Flórida (EUA), segundo maior produtor, os
dois Estados são responsáveis por 40% da produção mundial de laranja.
12 foco
consumirem um item adicional, exclusivo a cada par, que
poderia incluir: cidra, água do mar, uma mistura de tempe-
ros, vinagre ou laranjas e limões. A dupla que recebeu as
laranjas e os limões se beneficiou de um rápido restabele-
cimento físico [4,5].
Lind publicou seu trabalho em 1753, mas a intro-
dução das frutas cítricas na alimentação de bordo só
aconteceu quatro décadas depois. Curiosamente, os ma-
rinheiros britânicos que levavam consigo o suco de lima-
-da-pérsia, para consumirem durante a viagem, passaram
a ser chamados de limies. O composto ativo, ácido ascór-
bico, foi isolado em 1932 por uma equipe de pesquisado-
res húngaros [5].
aspectos nutricionaisDurante anos, os benefícios do consumo de laran-
ja para a saúde estiveram intimamente associados ao
elevado conteúdo de vitamina C (nutriente antioxidante
e cofator na biossíntese do colágeno, da carnitina e de
neurotransmissores), potássio (mineral envolvido no
estímulo neuromuscular, transmissão de impulsos nervo-
sos e equilíbrio osmótico), carotenoides (compostos an-
tioxidantes e, em alguns casos, precursores de vitamina
A) e fibras (relacionadas com manutenção do hábito in-
testinal e do peso saudável, e com os níveis de colesterol
e glicemia) [6].
Na atualidade, pesquisadores direcionam seus
esforços para entender a relação entre os flavonoides cí-
tricos e os distúrbios metabólicos, as patologias neoplá-
sicas, os processos inflamatórios e o fortalecimento do
sistema imunológico.
Dentre os flavonoides cítricos, a hesperidina é con-
siderada a mais abundante, sendo que a literatura reporta
diferentes vantagens para a saúde que incluem benefí-
cios antioxidantes, anti-inflamatórios e anticarcinogêni-
cos, entre outros [7,8].
O composto ativo, ácido ascórbico, foi isolado em 1932 por uma equipe de pesquisadores húngaros.
Laranja-da-baíaTambém conhecida como
laranja-de-umbigo, devido à
saliência na porção inferior. Tem
sabor adocicado, polpa muito
suculenta e casca amarelo-gema.
Produz bastante suco, podendo
ser consumida ao natural, em
refrescos ou como ingrediente
em receitas.
Laranja-da-terraPossui sabor ácido e polpa
suculenta. Seu consumo ocorre
na forma de suco ou no preparo
de compotas, em que a casca
também pode ser utilizada. Em
algumas regiões é conhecida
como laranja-cavala ou laranja-
azeda. É pequena, tem cor
amarelo-forte e forma achatada.
Laranja-limaVariedade com menor teor de
acidez e maior sabor doce.
Possui casca fina amarelo-clara.
Ideal para ser consumida em
gomos e é pouco utilizada na
culinária.
Laranja-seletaFruta de tamanho grande e muito
suculenta. De sabor adocicado,
pouco ácido e casca amarelo-
clara. Pode ser consumida ao
natural ou em sucos.
Laranja-peraMenor que as outras variedades,
é ideal para o preparo de sucos e
geleias. Sua casca é fina e lisa,
de cor amarelo-avermelhada e
polpa suculenta.
Laranja-barãoCom formato semelhante ao
da laranja-pera, é indicada para
o preparo de sucos e como
ingrediente em receitas. É
pequena e possui coloração mais
clara. Sua casca é fina e lisa e a
polpa muito suculenta.
V A R I E D A D E D E L A R A N J A S N O B R A S I LNo Brasil, as variedades de laranjas mais conhecidas e cultivadas são:
foco 13
O conteúdo de hesperidina na laranja varia, con-
sideravelmente, de acordo com a variedade da fruta e a
época da colheita, sendo que o teor máximo é observado
no início da safra. A concentração da molécula nos sucos
de laranja brasileiros, quando espremidos manualmente,
varia de 104 mg/L a 537 mg/L [9].
Durante o processo digestivo, a hesperidina é des-
glicosilada por bactérias do intestino, resultando em mo-
léculas de hesperitina e metabólitos conjugados. Estudos
sugerem que a hesperidina seja o fator responsável pelos
benefícios referidos à hesperidina. Um estudo conduzido
na Finlândia mostrou que a hesperidina representava 50%
do total de flavonoides ingeridos por meio da dieta [10].
atividade antioxidanteUm estudo conduzido em ratos, com isquemia
miocárdica induzida, mostrou que a hesperidina foi ca-
paz de promover um efeito cardioprotetor nos animais
que foram tratados com a substância. O mecanismo de
ação sugerido envolveu as suas propriedades antioxi-
dantes e antiperoxidativas [11].
A capacidade antioxidante da hesperidina foi con-
firmada em um teste in vitro, contra o radical livre difenil
picrilhidrazil (DPPH). O mesmo ensaio verificou a cito-
toxicidade do flavonoide contra linhagens de célula de
carcinoma de laringe, cérvice, seio e fígado e concluiu
uma atividade antineoplásica pronunciada [12].
A hesperidina tem sido associada ao aumento da resistência da parede vascular, com diminuição da permeabilidade capilar.
benefícios vascularesO aumento da permeabilidade capilar é fator de
risco para algumas patologias que se manifestam por
sintomas como edema, hemorragias e hipertensão. A hes-
peridina, juntamente com outros flavonoides, tem sido
associada ao aumento da resistência da parede vascular,
com diminuição da permeabilidade capilar [13].
Um ensaio randomizado, controlado e cruzado, ve-
rificou a ação da hesperidina em 24 homens saudáveis,
com excesso de peso. Durante 4 semanas, os voluntários
consumiram, diariamente, 500 ml de suco de laranja,
500 ml de controle mais hesperidina ou 500 ml de contro-
le mais placebo. Amostras de sangue foram coletadas an-
tes e após o experimento. Os resultados mostraram uma
redução significativa na pressão diastólica dos indivídu-
os que consumiram o suco de laranja ou o controle mais
hesperidina. Além disso, os mesmos indivíduos apresen-
taram melhor reatividade endotelial microvascular pós-
-prandial, quando comparados àqueles que consumiram
controle mais placebo [14].
Um outro estudo clínico, conduzido no interior de
São Paulo com 141 homens (de 20 a 60 anos), mostrou
correlação negativa da pressão arterial sistólica (PAS)
e diastólica (PAD) com o consumo de suco de laranja. A
elevação na pressão arterial relacionada à idade foi menor
entre os indivíduos que consumiam pelo menos um copo
de suco de laranja por dia [15].
14 foco
Efeito cardioprotetorUm grupo de pesquisadores da Faculdade de Ciên-
cias Farmacêuticas da Universidade Estadual Paulista
Júlio de Mesquita Filho investigou o efeito do consumo
habitual de suco de laranja no perfil dos lípides e lipopro-
teínas em homens e mulheres normolipidêmicos. Todos
os voluntários (n=29) consumiram 750 mL/dia de suco
de laranja, durante 60 dias. Variáveis bioquímicas foram
medidas antes e após o período de suplementação com
suco de laranja. O consumo crônico de suco de laranja
reduziu significativamente o colesterol total e o HDL-C em
ambos os gêneros [16].
Estudo semelhante, publicado no American Jour-
nal of Clinical Nutrition, concluiu que o consumo regular
de 750 mL/dia de suco de laranja aumentou os níveis de
HDL-C e de triacilgricerol, ao mesmo tempo em que redu-
ziu a razão LDL/HDL [17].
aspectos nutrigenômicosNa França, um grupo de cientistas determinou que
o consumo regular de 500 ml de suco de laranja por 4 se-
manas altera a expressão gênica dos leucócitos para um
perfil anti-inflamatório e antiaterogênico. Eles concluíram
também que a hesperidina desempenha um papel rele-
vante no efeito genômico da bebida [18].
A conclusão foi obtida por meio de um estudo ran-
domizado, controlado e cruzado. O consumo de suco de
laranja induziu mudanças na expressão de 3.422 ge-
nes, enquanto que a ingestão de hesperidina modulou a
expressão de 1.819 genes. Muitos desses genes estão
envolvidos nos processos de quimiotaxia, adesão, infil-
tração e transporte de lipídios, sugerindo menor recruta-
mento e infiltração de células circulantes para a parede
vascular e menor acúmulo de lipídeos.
biodisponibilidadeApesar de todas as evidências que associam a hes-
peridina a benefícios para a saúde, existe consenso que
sua biodisponibilidade é limitada em humanos, devido à
ligação de um retinosídeo [19].
Cientistas do Nestlé Research Center, em Lausanne
(Suíça), começaram, então, a estudar a hesperitina (o
componente não glicosado da molécula de hesperidina)
e obtiveram descobertas valiosas sobre a absorção e o
aumento da biodisponibilidade dessa substância.
A equipe verificou, por exemplo, que o tratamento
da hesperidina com uma determinada enzima forma o
composto hesperitina-7-glicosídeo, com absorção 4 ve-
zes mais rápida e eficiente no intestino delgado. Outras
análises verificaram se os metabólitos excretados foram
semelhantes entre a hesperidina ingerida e o composto
mais biodisponível. Não foram observadas diferenças
significativas entre eles [20].
Os pesquisadores ressaltam que essas desco-
bertas poderão afetar positivamente as futuras inter-
venções que envolvem flavonoides cítricos e benefícios
para a saúde.
Cientistas do Nestlé Research Center obtiveram descobertas valiosas sobre o aumento da biodisponibilidade da hesperitina.
foco 15
[1] Bulfi nch T. O Livro de Ouro da Mitologia: Histórias de Deuses e Heróis. Martin Claret, 2006. [2] Corrêa MP. Dicionário das Plantas Úteis do Brasil e das Exóticas Cultivadas. Rio de Janeiro: IBDF, 1975. [3] Dourado GM. Vegetação e quintais da casa brasileira. Paisagem Ambiente: ensaios - n. 19. 2004, pp. 83-102. [4] BBC History. Historic Figures: James Lind (1716-1794). [Acesso online: 23 de Julho de 2012] http://www.bbc.co.uk/history/historic_fi gures/lind_james.shtml. [5] Friedman School of Nutrition Science & Policy. Orange You Glad…. Health and Nutrition Letter. [Acesso online: 23 de Julho de 2012] http://www.tuftshealthletter.com/ShowArticle.aspx?rowId=770. [6] O'Neila CE et al. One hundred percent orange juice consumption is associated with better diet quality, improved nutrient adequacy, and no increased risk for overweight/obesity in children. Nutrition Research. 2011: V 31, Issue 9, pp. 673–682. [7] Chiba H et al. Hesperidin, a citrus fl avonoid, inhibits bone loss and decreases serum and hepatic lipids in ovariectomized mice. J Nutr. 2003 Jun;133(6):1892-7. [8] Garg A et al. Chemistry and pharmacology of the Citrus biofl avonoid hesperidin. Phytother Res. 2001 Dec;15(8):655-69. [9] Vinueza JC et al. Hesperidina diminui o colesterol sanguíneo de ratos alimentados com gordura saturada. Alimentos e Nutrição (UNESP), v. 19, p. 473-479, 2008. [10] Knekt P et al. Flavonoid intake and risk of chronic diseases. Am J Clin Nutr. 2002;76:560–8. [11] Selvaraj P et a. Hesperidin, a fl avanone glycoside, on lipid peroxidation and antioxidant status in experimental myocardial ischemic rats. Redox Report 2010 Vol 15 No 5. [12] El-Sheltawy HA et al. Antioxidant capacity of hesperidin from Citrus peel using electron spin resonance and cytotoxic activity against human carcinoma cell lines. Pharmaceutical Biology. 2011: V 49, N 3, pp. 276-282. [13] Chiou C et a. Effects of hesperidin on cyclic strain-induced endothelin-1 release in human umbilical vein endothelial cells. Clinical and Experimental Pharmacology and Physiology (2008) 35, 938–943. [14] Morand C et al. Hesperidin contributes to the vascular protective effects of orange juice: a randomized crossover study in healthy volunteers. Am. J. Clin. Nutr. 2011;93:73–80. [15] Bonifácio NP, César TB. Infl uência da ingestão crônica do suco de laranja na pressão arterial e na composição corporal. Rev. Bras. Hipertens. vol.16(2):76-81, 2009. [16] César TB et al. Orange juice decreases low-density lipoprotein cholesterol in hypercholesterolemic subjects and improves lipid transfer to high-density lipoprotein in normal and hypercholesterolemic subjects. Nutr Res. 2010 Oct;30(10):689-94. [17] Kurowska EM et al. HDL-cholesterol-raising effect of orange juice in subjects with hypercholesterolemia. Am. J. Clin. Nutr. 2000;72:1095–100. [18] Milenkovic D et al. Hesperidin Displays Relevant Role in the Nutrigenomic Effect of Orange Juice on Blood Leukocytes in Human Volunteers: A Randomized Controlled Cross-Over Study. PLoS ONE 6(11): e26669. [19] Nielsen ILF et al. Bioavailability Is Improved by Enzymatic Modifi cation of the Citrus Flavonoid Hesperidin in Humans: A Randomized, Double-Blind, Crossover Trial. J. Nutr. February 2006 vol. 136 no. 2 404-408. [20] Bredsdorff L et al. Absorption, conjugation and excretion of the fl avanones, naringenin and hesperetin from -rhamnosidase-treated orange juice in human subjects. Brit J Nutr, 2010; 103:1602-09.
rEFErênciaS
Leia na íntegra artigos clínicos e experimentais recentes sobre as propriedades da hesperidina.
A hesperidina desempenha um
papel relevante no efeito
genômico do suco de laranja.
Nutrientes Valor Unidade
C E N T E S I M A I S
Energia 47 kcal
Proteína 0,94 g
Gordura total 0,12 g
Carboidrato 11,75 g
Fibra alimentar 2,4 g
M I N E R A I S
Cálcio 40 mg
Ferro 0,1 mg
Magnésio 10 mg
Fósforo 14 mg
Potássio 181 mg
Sódio 0 mg
Zinco 0,07 mg
Cobre 0,045 mcg
Manganês 0,025 mg
Selênio 0,5 mcg
Nutrientes Valor Unidade
V I T A M I N A S
Vitamina A 225 UI
Tiamina 0,087 mg
Riboflavina 0,04 mg
Niacina 0,282 mg
Ac. Pantotênico 0,25 mg
Vitamina B6 0,06 mg
Folato 30 mcg
Vitamina B12 0 mcg
Vitamina C 53 mg
Composição Nutricional Laranja crua, todas as variedades comerciais (100 g)
Nome científico: Citrus sinensis
Fonte: USDA National Nutrient Database for Standard Reference.
conhecer
por _ Juliana Ghelardi
fotos _ Eny Miranda
Parceria do Programa Nestlé Nutrir Crianças Saudáveis com Instituto Fernanda Keller muda a rotina e o futuro de milhares de crianças de comunidades carentes em Niterói, RJ
CORRER, COMER, VENCERHá um ano, Ana Clara Saldanha, na época com 13
anos, tinha dificuldade para acompanhar as brincadeiras
dos amigos, devido ao excesso de peso, que provocava
cansaço e falta de ar. Silvia Lins, aos 12 anos, sofria do
mesmo problema. Inibida, saía pouco de casa e, durante
o recreio da escola, preferia ficar sozinha em um canto a
interagir com as outras crianças que se divertiam.
Com uma alimentação baseada em “muitas bestei-
ras”, como ela mesma ressalta, Lívia Tolentino, quando
tinha 12 anos, pesava apenas 20 kg. E Tiago dos Santos,
aos 11 anos, esteve prestes a atingir o nível máximo de
normalidade de glicose no sangue. Se ultrapassasse
esse nível, ele teria de começar a tomar insulina. Feliz-
mente, não foi necessário.
Ana Clara, Silvia, Livia e Tiago são alguns casos das
centenas de integrantes do projeto Correndo por um Ideal,
uma parceria do Programa Nestlé Nutrir Crianças Saudá-
veis (veja o box) com o Instituto Fernanda Keller (IFK), em
Niterói (RJ), que deu seus primeiros passos em 2008*. Se-
gundo Fernanda — triatleta das mais admiradas no Brasil
e no mundo — há 14 anos, a entidade desenvolve e imple-
menta projetos que, além de educar para o esporte, visam
à formação do indivíduo como um todo, por meio, por exem-
plo, de noções de cidadania, entre outros conhecimentos.
O projeto Correndo por um Ideal faz parte de uma
das ações do IFK e atende entre 400 e 500 crianças de
várias comunidades de baixa renda e duas escolas públi-
cas de Niterói, cidade carioca onde a esportista nasceu e
pela qual conserva um enorme carinho. “Percebemos que
várias das crianças participantes de atividades físicas no
Instituto também precisavam de orientação nutricional
para ganhar ou perder peso. Daí, a necessidade de ter o
apoio de uma empresa de qualidade e engajada em ques-
tões sociais e de qualidade de vida como a Nestlé”, expli-
* Os nomes das crianças mencionadas neste artigo foram substítuídos por nomes fictícios.
conhecer 17
CORRER, COMER, VENCERca Fernanda Keller. “E a Nestlé participa ativamente do
trabalho. Temos um diálogo frequente, sempre trocando
informações e resultados. Como atleta, pretendo passar
para a sociedade todos os valores de superação e perse-
verança que aprendi com a prática do esporte, e o apoio
da Nestlé tem sido muito importante para isso”, completa
Fernanda, que faz questão de dizer que sua relação com a
Nestlé é antiga: ela foi a primeira atleta a ser patrocinada
individualmente pela empresa, nos anos 80.
Vale lembrar que trabalhos como o de Fernanda são
também muito importantes para a Nestlé, pois é graças
a eles que os programas desenvolvidos pela Companhia
são ampliados e aperfeiçoados. Essa parceria foi uma das
que impulsionou a consolidação do Nestlé Nutrir Crianças
Saudáveis, um programa desenvolvido em âmbito global
pela organização, que tem como objetivo prevenir a obe-
sidade e a desnutrição, a partir da educação nutricional.
Dentro de uma abordagem holística, fundamental
para o combate da obesidade e da desnutrição, vale a
pena destacar, ainda, importantes parcerias locais que
Nestlé: compromisso socialAlém de oferecer produtos alimentícios de qualidade, a
Nestlé se preocupa com o acesso à informação e à nutrição
saudável. A Criação de Valor Compartilhado norteia tudo o que a
Companhia adota mundialmente como responsabilidade social,
com investimentos em diversas áreas. Um dos programas mais
representativos é o Nestlé Nutrir, com foco na educação nutricio-
nal, em atuação desde 1999. Seu objetivo é ajudar a combater a
desnutrição e a obesidade infantil, disseminando o conhecimen-
to por meio da capacitação de professores, merendeiras e nutri-
cionistas de escolas públicas, em parceria com as Secretarias
Municipais de Educação. Em 13 anos, o Nutrir capacitou mais de
13,4 mil educadores e alcançou mais de 1,7 milhão de crianças.
Além do projeto Correndo por um Ideal, do Instituto Fernan-
da Keller, outros programas recebem o apoio da Nestlé, como o
Instituto Bola pra Frente, no Rio de Janeiro, a Casa do Zezinho,
em São Paulo e o Bairro da Juventude, em Criciúma (SC). Assim
como acontece com o IFK, há uma triagem para medir o índice
de massa corporal para identificar crianças e jovens com excesso
de peso ou obesidade e desnutrição. A partir daí, os participantes
têm acesso a atividades esportivas, exames, brincadeiras e ofici-
nas de nutrição saudável e higienização de alimentos.
o IFK mantém, por exemplo, com o Exército Brasileiro —
21º GAC, o Corpo de Bombeiro Militar — Área IX, a Funda-
ção Municipal de Educação, a Superintendência de Des-
portos do Estado do RJ — SUDERJ, o Programa Médico de
Família da Prefeitura Municipal de Niterói, a Universidade
Estácio de Sá e Proteína — Consultoria Nutricional.
Triagem fundamentalO projeto Correndo por um Ideal abrange as modali-
dades esportivas do triathlon — natação, ciclismo e corri-
da — e é voltado para crianças e jovens com idade entre
7 e 18 anos, que também passam por um processo de
reeducação alimentar. “A base do IFK é o esporte. Aqui se
aprende a nadar, a pedalar e a correr, e também a comer
de forma mais saudável. No entanto, ninguém deixa de
brincar nem de se divertir”, afirma Fernanda Keller.
18 conhecer
COMERAs aulas são gratuitas e acontecem diariamente
com turmas no turno da manhã e da tarde. Os alunos
recebem merenda e uniforme próprio para o esporte que
praticam. Para participar, as crianças das comunidades
se submetem a uma triagem bem minuciosa coordena-
da por Carla Pires Bogea, nutricionista da entidade. “O
primeiro passo é avaliar estatura, peso, índice de massa
corporal (IMC) e a curva de crescimento, segundo pa-
drões da Organização Mundial de Saúde, de cada crian-
ça”, conta a especialista.
A partir daí, é possível identificar dois tipos de ca-
sos extremos: os de excesso de peso ou obesidade e os
de desnutrição, quadro apresentado por Lívia, a garota
que, no início desta reportagem, admitiu que se alimenta-
va mal. “A etapa seguinte é enviar uma carta para os pais,
avisando sobre o diagnóstico e o trabalho que pretende-
mos desenvolver com o filho. E, assim que a criança ou o
jovem decide participar, iniciamos o processo”, diz Carla.
Com a ajuda de uma planilha elaborada especial-
mente para o Instituto Fernanda Keller, Carla e uma
avaliadora física desenvolvem dietas individualizadas
e atividades esportivas para cada participante. “Seja
para gastar mais calorias ou diminuir o consumo ener-
gético, nosso objetivo é sempre estimular a alimentação
saudável”, avisa a nutricionista. É feita uma avaliação,
a cada dois meses, para checar os resultados. O tempo
de permanência nas atividades do projeto dura cerca de
um ano, mas esse período pode se estender, conforme a
necessidade de cada criança.
Desde o início do apoio da Nestlé, cerca de 1,4 mil
crianças e adultos — as famílias estão incluídas no pro-
grama por seu papel na alimentação saudável das crian-
ças — foram atendidos pela parceria. “Nossa intenção,
agora, é investir no trabalho dentro da comunidade e con-
tinuar a mostrar a importância de hábitos saudáveis, para
que, tanto os jovens, quanto seus pais, possam compar-
tilhar os valores que aprenderam no projeto Correndo por
um Ideal”, destaca a idealizadora Fernanda.
Experiências saborosasUma das metas do programa é fazer com que as
crianças levem os novos hábitos alimentares para a vida
toda, em vez de comer de forma equilibrada somente
quando estão no IFK ou durante o tempo de permanência
no projeto. Para que isso aconteça, a nutricionista Car-
la ressalta que as mudanças vão sendo realizadas aos
poucos, para que as crianças se habituem devagar ao
consumo regular de legumes, verduras e frutas. “Procuro
montar cardápios bem variados, com sugestões de equi-
valentes nutricionais, para evitar a monotonia”, conta.
Antes de integrarem o Correndo por um Ideal, muitos
sequer sabiam a aparência de determinados alimentos
— não conseguiam diferenciar um pepino de um chuchu,
por exemplo. Ao provar novos sabores, a maioria se sente
motivada a experimentar coisas diferentes — e aprendem
a preparar sopas, sucos e saladas saborosos e nutritivos.
Utilizando uma planilha elaborada especialmente para o Instituto Fernanda Keller, uma nutricionista e uma avaliadora física desenvolvem dietas e atividades individualizadas.
conhecer 19
Fernanda Keller: trajetória campeãAos 49 anos, a carioca Fernanda Keller é o maior
nome do triathlon brasileiro de todos os tempos. Forma-
da em Educação Física, ela é a única atleta do mundo
que disputou e completou todas as provas do Ironman
do Havaí, considerada a mais difícil competição de tria-
thlon. Para se ter uma ideia, são 3,8 km de natação, 180
km de ciclismo e 42 km de corrida, totalizando quase
10 horas de esforço contínuo. Fernanda participou das
provas durante 22 anos consecutivos e as concluiu 14
vezes entre as 10 melhores atletas. Por aqui, foi cinco
vezes campeã do Ironman Brasil.
Desde 1998, ela coordena o Instituto Fernanda Kel-
ler, em Niterói, entidade sem fins lucrativos, com ativida-
des que já beneficiaram cerca de 6 mil crianças e jovens
da população de baixa renda. “Em 2013, completo 30
anos de carreira. Tenho muito orgulho da minha trajetória,
sou muito grata a tudo o que conquistei, por isso quis divi-
dir os frutos com as comunidades menos favorecidas da
cidade em que nasci”, conta a atleta.
Além do projeto Correndo por um Ideal, o IFK man-
tém uma escola de triathlon e o projeto Competir, com
alunos entre 13 e 24 anos que optaram por aprofundar-se
no esporte, treinando todos os dias da semana. “Muitos
participantes desse grupo também participam do Proje-
to Universidade Já, que tem parceria com a Universidade
Estácio de Sá, e estão cursando várias faculdades como
psicologia, engenharia, educação física ou administração.
Eles têm que nos representar, e também à Universidade,
até o término do curso”, explica Priscilla Accorsi Voss, co-
ordenadora pedagógica e gerente de projetos do Instituto
Fernanda Keller, que diz, ainda, que dois desses alunos já
se formaram e, hoje, integram o quadro de professores do
IFK. A entidade dispõe também de atividades relacionadas
ao meio ambiente, à culinária sustentável e até às artes.
Por conta de sua rotina intensa, com palestras e
presença em eventos por todo o Brasil, Fernanda Keller
não comparece todos os dias no Instituto. “Conto com a
Priscilla e com minha mãe, Terezinha, que é meu braço
direito. Elas coordenam tudo e sempre me mantêm a par
dos acontecimentos. Sempre que posso, porém, tento
acompanhar as atividades e conversar com as crianças”,
diz a triatleta, que vive em busca de novas ideias e parce-
rias. No segundo semestre, por exemplo, pretende colocar
em prática outro sonho antigo: o lançamento de uma grife
de roupas esportivas que leva o seu nome.
20 conhecer
VENCERUma das experiências mais recentes (e ricas) do IFK
relacionadas à educação nutricional acontece na Escola
Maria Angela de Educação Infantil e Fundamental, em Ni-
terói. Ali, os alunos participam de várias ações como, por
exemplo, a feira de sabores, em que as crianças recebem
dinheiro simbólico e vão à “feira” acompanhadas das pro-
fessoras, nutricionistas, merendeiras e equipe do Instituto,
para “comprar” alimentos. Depois, na sala de aula, apren-
dem sobre os grupos de alimentos e a importância da ali-
mentação variada. Na sequência, acompanham as meren-
deiras da escola na preparação do almoço com os produtos
que “compraram” e, por fim, almoçam a comida feita ali.
Associada à alimentação correta, a prática regular
do esporte traz uma lista imensa de benefícios: sensação
de bem-estar, consciência corporal, fôlego, sono de melhor
qualidade, maior concentração, elevação da autoestima
etc. E Fernanda Keller e sua equipe têm consciência da im-
portância do projeto para a formação de seus participantes
como pessoas. “Essas crianças passam a acreditar mais
nelas mesmas e em seu próprio futuro. Aqui mostramos, na
prática, que com disciplina, garra e determinação se chega
aonde se quer e que vale a pena lutar por aquilo que você
acredita”, declara a triatleta, emocionada. “No Instituto tam-
bém ensinamos que apostar no conhecimento e no respei-
to pode garantir uma perspectiva melhor de vida.”
Fernanda se sente gratificada ao ver, na instituição
— que desde os tempos de atleta sonhou em ter o sor-
riso das crianças — as palavras de incentivo e estímulo
que umas trocam com as outras. Em tempos de violência
e casos chocantes de bullying nas escolas, não é exage-
ro dizer que o trabalho da triatleta ultrapassa a esfera da
comunidade — é uma ação voltada, sem dúvida alguma,
para um Brasil mais digno e melhor de se viver.
“Eu trabalho pela inclusão social através do espor-
te. Acredito que o esporte muda a vida das pessoas e, por
isso, deve ser acessível”, salienta Fernanda que, quando
anda pelas ruas de Niterói, volta e meia é abordada por al-
gum pai ou mãe que faz questão de cumprimentá-la pela
iniciativa — e, na maior parte das vezes, contar que o filho
participou dos programas do Instituto e que isso fez toda
a diferença na vida dele.
Hoje, os garotos apresentados no início da reporta-
gem têm histórias de sucesso para contar. Aos 14 anos,
Ana Clara Saldanha já foi liberada do programa e, além de
colher os frutos, busca compartilhar tudo o que aprendeu.
Lívia, que completou 13 anos, superou o quadro de desnu-
trição e conseguiu aumentar 12 kg na balança, mas ainda
necessita de cuidados e acompanhamento específicos,
assim como Silvia. Tiago, aos 12 anos, continua partici-
pando assiduamente das atividades do projeto Correndo
por um Ideal, nas quais teve a oportunidade de fazer mui-
tos amigos. E diz, sem se dar conta da sabedoria e riqueza
implícitas em suas palavras: “Agora, eu gosto mais de co-
mer tomate. Corto, coloco azeite e sal e pronto!”.
Exemplos de que, com jeito, disponibilidade para
experimentar e pequenas — porém poderosas — adapta-
ções é possível, sim, modificar antigos hábitos e ganhar
ainda mais qualidade de vida. Para vidas que estão ape-
nas começando, então, os ganhos são incomensuráveis.
Associada à alimentação equilibrada, a prática regular de esportes traz uma lista imensa de benefícios para o desenvolvimento infantil.
ponto de vista
DR. RAUL MANHãES DE CASTRODoutor em Ciências da Vida pela Université de Paris VI (Pierre et Marie Curie). Professor dos Programas de Pós-graduação em Nutrição e de Neuropsiquiatria e Ciências do Comportamento da Universidade Federal de Pernambuco. Coordenador do Programa de Pós-graduação em Nutrição da UFPE. Membro da Academia Pernambucana de Ciências.
DRA. CAROL VIRGíNIA GOIS LEANDRODoutora em Ciências do Desporto pela Universidade do Porto. Professora do Programa de Pós-graduação em Nutrição (nível 5 da Universidade Federal de Pernambuco).
É fácil constatar no planeta que não há vida
sem nutrição, nem nutrição sem vida. Vida e nutri-
ção são fenômenos, portanto, imanentes. A nutrição
é um processo cujos organismos vivos, utilizando-se
de alimentos, assimilam nutrientes para a realização
e manutenção de suas funções. Decorre daí que a
Nutrição é um vasto campo de estudo e sua compre-
ensão permite estratégias eficazes de manutenção da
higidez dos organismos e prevenção de doenças, isso
em todas as espécies. A visão das doenças humanas,
sob a ótica da teoria das espécies, oferece novas pers-
pectivas científicas de entendimento[1]. Interessa-
-nos, no presente artigo, a abordagem científica dessa
relação estreita entre a saúde humana (ou ausência
dessa) e a nutrição.
Para cada enfermidade, existe terapia nutricio-
nal específica e adequada. O nutricionista emprega
critérios clínicos em nível ambulatorial ou hospitalar
na prevenção e no tratamento de doenças. Pacientes
necessitam de acompanhamento nutricional rigoroso
para melhorar a remissão do quadro de suas enfermi-
dades. Segundo Mann, 2010, o papel já largamente
aceito da nutrição na prevenção e no tratamento de
doenças crônicas exige uma abordagem normatizada,
baseada em provas científicas [2]. A Nutrição Baseada
em Evidências (NBE) é fundamentada nos mesmos
pressupostos da Medicina Baseada em Evidências,
na qual a prática clínica está intimamente associada à
pesquisa científica, às provas científicas[3]. Por con-
seguinte, a NBE, para formar seu corpo de conheci-
mentos, adota técnicas de meta-análises, análises de
risco-benefício, estudos controlados, experimentais,
clínicos randomizados e epidemiológicos. Na prática,
aplicar a NBE significa atuar como um pesquisador,
buscar à luz da literatura científica, interpretar e apli-
car os resultados dos estudos científicos aos problemas
clínicos individuais de seus pacientes. Imperiosas são
as evidências científicas atualizadas, tratadas sob a luz
da ética profissional, respeitando direitos e preferên-
cias do paciente, para possíveis aplicações de seus re-
sultados na prática.
A NBE contribui para a tomada de decisões na
solução de enfermidades, ou seja, na empregabili-
dade de modalidades terapêuticas, baseando-se em
pesquisas metodologicamente rigorosas. O processo
da NBE passa pela formulação da pergunta condu-
tora, de maneira clara e precisa, a partir do problema
clínico, pela busca na literatura de artigos clínicos
pertinentes e apropriados sobre o problema, pela ava-
liação crítica da validade e da utilidade dos resultados
encontrados e pela implementação dos resultados da
avaliação na prática clínica visando ao tratamento
personalizado dos pacientes. A NBE é uma ferramen-
ta útil para o desenvolvimento de recomendações e
diretrizes clínicas, bem como para identificar o esta-
do atual da nutrição humana, incluindo as lacunas de
conhecimento e a necessidade de mais estudos sobre
determinados temas.
Muitos profissionais da saúde já se baseiam em
evidências científicas em suas práticas cotidianas.
Todavia, essas evidências são, por vezes, limitadas em
muitas áreas do conhecimento em nutrição. Assim,
alguns argumentam que a “falta de evidência de be-
nefícios” e “falta de benefícios” de um procedimento
terapêutico são conceitos distintos. Outrossim, outros
apontam, por exemplo, a complexidade das ações dos
nutrientes, que nem sempre podem ser detectadas e
reveladas através de estudos clínicos randomizados.
A prática da NBE, contudo, tem cada vez mais
efetividade e sucesso, sugerindo diretrizes sólidas
para a orientação do nutricionista no tratamento dos
pacientes. Enfim, é inadmissível nos dias atuais que
o profissional de saúde, mesmo com grande experiên-
cia e autoridade, realize qualquer procedimento tera-
pêutico sobre um paciente, sem tentar fundamentá-
-lo em estudos científicos.
Nutrição baseada em evidência: utilidade e limitações
[1] Gluckman PD et al. Early life events and their consequences for later disease: a life history and evolutionary perspective. Am J Hum Biol. 2007 Jan-Feb;19(1):1-19. [2] Mann JI. Evidence-based nutrition: Does it differ from evidence-based medicine? Ann Med. 2010 Oct;42(7):475-86. [3] Projeto Diretrizes, volume IX / [coordenação do Projeto Fabio Biscegli Jatene, Wandeley Marques Bernardo] – São Paulo: Associação Médica Brasileira Brasília, DF: Conselho Federal de Medicina, 2011.
nutrição e cultura
Selos ilustram comidas típicas dos países e provocam água na boca de quem recebe as cartas
por _ Teodoro Ferrer
Banquete postalBanquete postalÉ tão raro receber uma carta em tempos de e-mail, SMS e hiperconectividade
nos telefones celulares mais modernos, que talvez seja difícil prestar atenção ao selo,
aquele quadradinho colorido no canto dos envelopes de correspondência. Todos sabem
que ele serve para fazer a carta chegar a seu destino, mas, a não ser que remetente ou
destinatário sejam fanáticos ardorosos da filatelia, não é tão comum se dar conta da
enorme variedade de temas que possam adornar um selo.
Aqueles mais famintos, interessados ou não em estudos filatélicos — a ciência
dos selos —, já devem ter notado, no entanto, que selos com ilustrações de comidas, de
pratos típicos a ingredientes-chave na culinária do país de origem do selo, viajam com
A França, com uma das tradições gastronômicas mais reverenciadas do planeta, não ficaria de fora desse banquete filatélico.
nutrição e cultura 23
fartura por aí. Se o assunto da carta é o relato de uma ex-
periência gastronômica ímpar, talvez a escolha do selo
venha ainda mais a calhar, mas é curioso que haja selos
celebrando de tudo, de um tradicional café da manhã mi-
neiro a verduras e legumes crus.
Mesmo às vésperas de suas tumultuadas eleições
presidenciais, o México, por exemplo, acabou de lançar,
em parceria com o Brasil, dois selos comemorativos de
comidas típicas dos dois países. Diplomatas brasileiros
não se deixaram afogar na agenda intensa de encontros
da Rio+20 e negociaram com mexicanos a criação de
selos editados em conjunto. Estão estampados, do lado
brasileiro, com um café da manhã bem tradicional e, do
lado de lá, com um prato clássico da cozinha mexicana.
Com a inscrição “comida tradicional”, o selo brasilei-
ro mostra espigas de milho e uma raiz de mandioca, além
de comidas feitas com essas plantas, como broa, bolo de
milho, pamonha, bolo de mandioca, pão de queijo e tapio-
ca. No selo dos mexicanos, está o pozole, prato típico do
país vizinho dos Estados Unidos, uma espécie de sopa
ou guisado à base de milho com carne e caldo de porco e
temperos. Além do prato de origem pré-colombiana, está
também um copo do tradicional suco à base de hibisco,
refresco que os mexicanos chamam de jamaica.
Um bolo de milho também aparece numa série de
selos sobre a gastronomia tradicional de Moçambique.
No país africano, o chef local Marcos Graça foi encarre-
gado pelos correios moçambicanos de ilustrar uma série
especial de selos postais. De suas 15 propostas, três foram escolhidas e tiveram gran-
de aceitação no país, esgotando-se em pouco tempo. Além do bolo de milho, nos outros
dois selos criados por Graça, há um prato de quiabo com camarão e coco e caranguejo
também com camarão e coco. Não muito longe dali, Angola, outro país lusófono da Áfri-
ca, lançou uma série de selos com pratos famosos do país, como receitas de ensopados
e pratos mais elaborados com peixe, frango e uma grande variedade de verduras.
No mesmo espírito, o Peru circulou selos postais com as comidas mais típicas
do país em exemplares bastante patrióticos. Um deles traz em primeiro plano um copo
do tradicional drinque pisco sour, numa cave com iluminação dramática, ao lado da
inscrição: “O pisco é do Peru”. Na mesma série das comidas do Peru, um selo mostra um
prato apetitoso de ceviche, a tradicional receita peruana de peixe cru temperado com
coentro, enquanto um terceiro selo celebra a chicha de maiz morado, uma espécie de
groselha local feita à base de milho roxo, apresentado no selo como refresco nacional.
Yang
chao
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Igor
Golo
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Yang
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24 nutrição e cultura
Alguns anos atrás, os tchecos também decidiram colocar o prato preferido do
país num selo postal. A simpática ilustração, em estilo de cartum, mostra um frango
assado rodeado por batatas e o tradicional knedliky, uma espécie de pão feito de fari-
nha de trigo ou batata, que é cozido, fatiado e servido quente como acompanhamento
à carne assada. A bebida, longe do refresco de hibisco dos mexicanos ou do cafezinho
brasileiro, é um canecão de cerveja, a escolha mais celebrada da República Tcheca.
Não por acaso, o país tem o maior consumo per capita de cerveja no mundo. Nos
mercados da República Tcheca, é possível encontrar até 470 tipos da bebida, todos
fabricados em território nacional.
A França, com uma das tradições gastronômicas mais reverenciadas do plane-
ta, não ficaria de fora desse banquete filatélico. Em selos que circulam somente em
território francês, quase todos os pratos típicos do país já foram retratados em algum
momento. São todas ilustrações em tons quentes de todo tipo de comida que faz a ale-
gria dos franceses, como quenelles, os bolinhos empanados e temperados de carne,
frango ou peixe, escalopes de vitela da Normandia, maroilles, o tradicional queijo inven-
tado nas abadias do norte da França, clafoutis, a torta de cerejas negras, servida ain-
da fumegante, lagostas da Bretanha, peixe na manteiga branca, chaource, o queijo da
região de Champanhe, damascos com mel, tian, uma espécie de lasanha de vegetais,
e o Paris-Brest, docinho redondo inventado para comemorar a famosa rota de bicicleta
entre Paris e Brest, no final do século 19.
À beira do mar Adriático, a Croácia também exaltou
seus frutos do mar em selos postais. Um deles mostra o
famoso caranguejo-aranha, um crustáceo que cozinhei-
ros locais comparam com um cavaleiro medieval em
armadura. Em formato de coração, ele tem uma carapa-
ça duríssima e cheia de espinhos e pelos, além de duas
enormes pinças — é tão difícil de comer que seu sabor
acabou se tornando supercelebrado. Ostras locais, que só
vivem no mar croata e na costa marroquina, consideradas
espécie raríssima no mundo, também são comemoradas
em selos, já que atingem pleno e marcante sabor num pe-
ríodo curtíssimo de tempo, na transição do inverno para
a primavera. Polvos, antes considerados uma comida das
classes mais baixas, também ganharam um selo próprio
depois que o prato conquistou um lugar no pódio das prin-
cipais comidas nacionais. Na Croácia, o modo perfeito de
preparo do polvo indica que ele deve ser martelado sobre
pedra 99 vezes para garantir a maciez da carne.
Em 2004, a Indonésia, na mesma direção, lançou
uma série de sete selos comemorativos de pratos típi-
cos do país. Mas em vez da ilustração fofa dos tchecos
ou das fotografias dramáticas dos peruanos, os pratos
do país asiático surgem em imagens bem convencio-
nais, sem muita graça. São quase selos protocolares,
Na Croácia, os polvos — antes considerados uma comida das classes mais baixas — também ganharam um selo próprio.
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para constar que ali se conhece e se valoriza a tradição
gastronômica local. Entre os pratos, estão a lagosta da
região de Sulawesi, preparada com leite de coco, além
de iguarias sem tradução muito simples para línguas
ocidentais, como o gulai iga kemba’ang, costelas de
carneiro ao molho curry, típico da região de Bengkulu, e
lapis palaro, ensopado de camarão com molho doce de
tamarindo, da região de Maluku. Outros pratos da série
são o ayam cincane, frango apimentado, asam padeh
padeh baung, peixe frito ao molho de tamarindo, e lem-
pah kuning, peixe ao molho curry.
Alimentos isolados, fora de refeições típicas, tam-
bém tiveram seus tempos de glória em selos nacionais.
No caso, variam entre a mera celebração de uma planta,
fruta ou ingrediente e tentativas de valorizar a produção
de um segmento agrícola específico. Ou seja, algumas
foram iniciativas filatélicas para turbinar setores da eco-
nomia, uma política de Estado que resultava em cartas
circulando por aí, portando ramalhetes de trigo no selo ou
uma singela banana. Isso sem contar selos comemorando
guaraná, milho, cebola, soja, laranjas, mel, abacaxis, me-
lancias, mamões, arroz, cajus e providenciais mandiocas.
Só a banana, fruta símbolo por excelência de um
país tropical como o Brasil, já foi tema de três emissões
postais distintas, em dois anos seguidos no final da
década de 1990 e também em 2000. Trabalhadores da
colheita de banana, uva e café também foram tema de
selos específicos, exaltando não só o sabor desses ali-
mentos, mas também o poder que tiveram na mobiliza-
ção econômica do país. Outros trabalhadores, como os
da colheita da cana-de-açúcar ou mesmo vendedores de coco, já apareceram em selos.
Além da esfera de hortaliças, plantas e afins, pescadores e peixes também já figuraram
em selos brasileiros.
Fora do Brasil, selos comemorativos ilustrados com frutas e verduras também
fizeram parte de campanhas de educação alimentar, acreditando no poder sutil dessas
imagens circulando em cartas. Com base num estudo científico que sugeria o consumo
de seis porções diárias de determinados alimentos, como banana, maçã, morango, ba-
tata, couve-flor, alho, cebola, pêssego, rabanete e ervilha, o governo da Nova Zelândia
lançou uma série de selos estampados com essas comidas. Batizada “Vida Saudável”,
a série, que circulou há dez anos, pretendia melhorar os hábitos alimentares entre
crianças daquele país insular.
Difícil é medir o impacto que essas ilustrações bem comportadas, de cestos de
frutas retratados com muito esmero, pudessem ter entre infantes, que estão longe de
ser o alvo habitual de lançamentos filatélicos. Talvez mais eficaz e direto ao ponto te-
nha sido um selo emitido em Gana. No país africano, com sérios problemas de seguran-
ça alimentar e subnutrição infantil, circulou um selo com ninguém mesmo que Popeye,
o herói dos desenhos animados. Na ilustração, que em nada lembra Gana, o marinheiro
mais famoso entre as crianças aparece em viagem a Amsterdã empunhando sua tradi-
cional latinha de espinafre e engolindo tudo com voracidade. Se alguma carta chegou
com Popeye, o encanto ou impacto deve ter sido maior do que entre baixinhos neozelan-
deses com seus cestos de frutas.
Os Estados Unidos fizeram circular um selo que mostrava soldados da Marinha sendo alimentados com a inscrição “temos mais do que precisamos para comer”.
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26 nutrição e cultura
Nem sempre, no entanto, o assunto do selo com te-
mática gastronômica é a exaltação ou promoção de uma
fruta ou prato nacional qualquer. Esse tipo de selo, em
alguns casos, já serviu de testemunho histórico da con-
dição de remetentes vivendo estados de exceção. Numa
das muitas guerras que travaram ao longo do século 20,
os Estados Unidos fizeram circular um selo que mostra-
va soldados da Marinha sendo alimentados com a inscri-
ção “temos mais do que precisamos para comer”. Outro
cartum, em estilo de tirinha de jornal, o selo que mostra
um soldado recusando um bife servido por um colega de
uniforme era uma forma de tranquilizar familiares em
casa com relação ao tratamento que os soldados rece-
biam durante a guerra. Também nos Estados Unidos, um
selo chegou a circular com dizeres como “comida para
paz”, um manifesto contra a fome que chegou a castigar
regiões do país durante a Grande Depressão, na virada
da década de 1920 para 1930.
Mas, antes de qualquer tipo de comida e outros
temas mais mundanos, vale lembrar que selos postais,
pelo valor de face e por franquear uma correspondência
para que chegasse com segurança a seu destino, co-
meçaram homenageando figuras régias, autoridades e
outros nomes de grande importância social. Surgido no
Reino Unido, o primeiro selo da história dos correios no
planeta, aliás, trazia nada menos que o rosto da rainha
Vitória, selo único que viajou afixado em cartas do país
por 60 anos, o famoso penny black.
Criado em 1840, o penny black, desenhado por Rowland Hill, é considerado o pio-
neiro dos selos na história da filatelia e seus exemplares são ainda cobiçadíssimos por
colecionadores. Do outro lado do Atlântico, o Brasil foi o primeiro país das Américas a
fazer circular selos postais, começando três anos depois, em 1843. Mas o imperador
dom Pedro II não quis saber de ter o rosto carimbado por funcionários dos Correios e
decidiu que os primeiros selos, conhecidos como olho de boi, tivessem uma estampa
nada excitante.
Valendo 30, 60 e 90 réis, as três versões dos olhos de boi traziam estampados
só o valor de face, algo direto ao ponto, que dizia quanto o remetente pagou e que de-
terminava a distância que sua correspondência viajaria, além da rapidez com que per-
correria esse caminho. Talvez por vaidade, dom Pedro II acabou cedendo o próprio rosto,
para uma série de selos criada 20 anos depois, em que o monarca aparecia, com sua
grande barba, no selo de cem réis, em tom esverdeado, e 500 réis, alaranjado. Com a
introdução da cor, os olhos de boi ganharam o simpático apelido de olhos de gato, tendo
versões também em vermelho, azul e violeta, entre outros.
Claro que com maior ousadia cromática, dom Pedro II e sua barba deixaram de ser
tema único nas estampas dos selos nacionais. Logo vieram cenas históricas, como a
Primeira Missa dos jesuítas na conversão dos índios e alegorias da República, imagens
que sustentavam um novo país que se afirmava. No Brasil, o selo mais popular da his-
tória, no entanto, não foi um imperador nem um personagem político. Estampando o
rosto do cardeal Eugenio Maria Giuseppe Giovanni Pacelli, o apoiador de Adolf Hiltler que
veio a se tornar o papa Pio XII, o selo lançado em 1934, ano da passagem do pontífice
pelo Brasil, virou coqueluche entre maníacos da filatelia, sendo obrigatório em qualquer
coleção que se preze. Só não se sabe ao certo quando o primeiro selo com tema gastro-
nômico ganhou a primeira caixa de correio.
Peruanos, moçambicanos, brasileiros, mexicanos, tchecos, todos já dedicaram selos nacionais a pratos servidos no dia a dia de sua gastronomia.
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nutrição e cultura 27
Mesmo que pareça trivial, não é qualquer coi-
sa que pode aparecer num selo postal. Pelo menos no
Brasil, um longo processo burocrático separa uma ideia
simpática de sua realização plena como desenho de um
selo que vá circular. No caso, é uma comissão filatélica
no Ministério das Comunicações que pode pleitear a
criação de um selo comemorativo. Só depois de aprova-
do no governo é que esse selo pode ser criado, sendo a
decisão publicada no “Diário Oficial da União”. Ou seja,
até selos que homenageiam diferentes espécies de fru-
tas, verduras ou pratos típicos dependem desse ritual
um tanto solene para conseguirem existir.
Já nos Estados Unidos, com leis bem mais flexíveis
a esse respeito, a coisa é mais simples. Há até sites na
internet que permitem encomendar selos com o desenho
desejado. Os pedidos com maior saída no Zazzle.com, um
desses sites, são selos no valor de US$ 0,45 estampados
com hambúrgueres salsichas e linguiças (e toda a para-
fernália de cozinha necessária para fritá-los), cupcakes
de chocolate, bolos de casamento, bolinhos de arroz e
cozinheiros fofos fazendo churrasco — o tradicional BBQ
do Dia da Independência norte-americana comemorado
no verão. Em tom humorístico, alguns desses selos mos-
tram personagens em apuros com acidentes domésticos,
como churrasqueiras em chamas ou frituras que perde-
ram o controle. Mais sóbrios, os selos com garrafas de
vinho, frutas e queijos também estão disponíveis, talvez
com apelo maior entre a clientela mais sofisticada.
Outro site permite encomendar uma série de selos, ideais para convidar para fes-
tas infantis, estampados com bolos, doces e os adorados cupcakes, pequenos bolinhos
com espessa cobertura de creme de todos os sabores imagináveis. Cada desenho vem
acompanhado de frases de efeito como “eu amo cupcakes”, “cupcakes o tempo todo”,
“delícia” e interjeições afins.
No fim das contas, todos esses selos refletem a relação de cada cultura com a
comida. Enquanto norte-americanos assumem que gostam de junk food e não hesi-
tam em se retratarem como glutões desajeitados, em selos cheios de hambúrgueres e
churrascos, os franceses mantêm a pompa em pratos tradicionalíssimos e rebuscados.
Peruanos, moçambicanos, brasileiros, mexicanos, tchecos, todos já dedicaram selos
nacionais a pratos servidos no dia a dia de sua gastronomia. Sem contar as inúmeras
tentativas de promover algum tipo de alimento em detrimento de outro, campanhas
pelo consumo saudável ou o aumento do uso de determinado ingrediente.
Selos nas cartas que chegam e muitas vezes se acumulam sobre a mesa da co-
zinha ou de jantar podem ser tão corriqueiros ou tão especiais quanto o ato de comer.
Quem sabe cozinheiras e cozinheiros mundo afora já não se inspiraram em fazer um
prato diferente com a chegada de um selo ou aprenderam sobre a existência de alguma
comida exótica ao apanhar na caixa de correio uma carta com um desses afixados na
extremidade. Na era da globalização e do encurtamento das distâncias, é algo sem dú-
vida capaz de acontecer. Nessas horas, é bom pensar no vaivém das correspondências
com a mesma água na boca que costuma acompanhar a hora de cada refeição.
qualidade
Alimentos fortificados
para a ingestão recomendada de cálcio
qualidade 29
Nesse sentido, a ingestão adequada do mineral
está associada à prevenção da osteoporose — patologia
diretamente relacionada a perdas significativas na quali-
dade de vida e ao risco alto de mortalidade [1].
Previsões afirmam que, em um futuro bem próximo,
os impactos econômicos e de saúde da osteoporose no
mundo serão extraordinários, devido à alta prevalência de
inadequação da ingestão de cálcio e de outros nutrientes
que interferem na saúde óssea [2].
As melhores fontes dietéticas de cálcio são leite,
queijo e iogurte, sendo que, sem eles, dificilmente se con-
segue atender às recomendações diárias deste mineral,
quando comparado a outros alimentos, como os vegetais
verdes-escuros [3,4].
Os trabalhos na área de biodisponibilidade têm de-
monstrado que alguns nutrientes podem interagir, quan-
do ingeridos de forma concomitante. Essas interações
podem ser tanto positivas como negativas, ou seja, po-
dem facilitar a absorção e utilização das substâncias ou
prejudicá-las.
No caso específico do cálcio, trabalhos realizados na
década de 1990 levaram os pesquisadores a acreditar que
a ingestão do mineral em valores superiores às DRIs (Dieta-
ry Reference Intakes) poderia prejudicar a biodisponibilida-
de do ferro. O fato levou os profissionais a orientarem a su-
plementação de cálcio, quando necessária, nos intervalos
das refeições principais, momentos em que ocorre grande
parte do consumo de alimentos fontes de ferro [4].
Entretanto, estudos mais recentes têm demonstra-
do resultados diferentes, apontando para muito pouca ou
nenhuma interação entre cálcio e ferro. A divergência de
conclusões surge a partir do aperfeiçoamento das meto-
dologias, pois os primeiros estudos avaliavam refeições
únicas e as pesquisas mais recentes consideram a análi-
se em longo prazo. As investigações atuais incluem crian-
ças e adultos nas observações [4].
A dieta brasileira usual apresenta deficiência de
A literatura científica oferece amplo conhecimento sobre a importância do cálcio para as diversas funções biológicas e seu envolvimento na saúde óssea.
cálcio, sendo que a carência de micronutrientes, de modo
geral, afeta cerca de dois milhões de pessoas. De acordo
com estimativas, a prevalência de desnutrição no Brasil
seguirá com índices altos até o ano de 2020 [5].
A determinação do consumo de minerais em dietas
brasileiras, realizada por meio de análise laboratorial dos
componentes de alimentos e preparações comuns em di-
ferentes regiões do País, mostra que a ingestão de cálcio
se mantém entre 300 mg e 500 mg por dia. As recomen-
dações atuais são de, aproximadamente, 1.000 mg por
dia, para a população adulta e crianças a partir de 4 anos.
Para adolescentes, incluindo gestantes, a recomendação
chega a 1.300 mg por dia [1].
A ingestão adequada de vitamina D é fundamental
para que o cálcio seja absorvido e incorporado aos ossos.
A Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) 2008-2009
revelou que os brasileiros estão ingerindo quantidade
muito abaixo das recomendadas para o micronutriente.
O estudo constatou inadequação acima de 99% entre ho-
mens e mulheres com mais de 19 anos. Entre crianças
e adolescentes, o quadro foi semelhante, apresentando
inadequação de 99,4% entre meninos de 10 a 18 anos e
de 99% e 98,8% entre meninas de 10 a 13 anos e de 14 a
18 anos respectivamente [6].
Os valores são similares aos encontrados em popu-
lações da Europa e Estados Unidos e podem ser facilmen-
te justificados, já que as fontes alimentares de vitamina
D são restritas, assim como a exposição ao sol (os raios
ultravioletas são fundamentais para que a vitamina D se
torne ativa e exerça suas funções) [1,7].
Outro estudo, realizado por pesquisadores da
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
(FMUSP) e da Universidade Federal de São Paulo (Uni-
fesp), publicado no periódico Clinical Nutrition, reforçou
os dados da POF e afirmou que o brasileiro sofre carência
de vitamina D, mesmo vivendo em um país tropical, com
luz solar em abundância [7].
30 qualidade
tunidade para melhorar o estado nutricional dos indivíduos a
um custo tão baixo e em tão pouco espaço de tempo [8].
A biodisponibilidade das formas de cálcio utilizadas
para suplementos e fortificação de alimentos depende da
forma química do composto, da solubilidade e do pH do meio.
O componente mais utilizado é o carbonato de cálcio, devido,
principalmente, ao teor disponível do mineral, que é superior
ao de outros produtos. De modo geral, a biodisponibilidade do
cálcio dos alimentos e dos compostos utilizados para fortifi-
cação é semelhante, variando entre 30% e 40% [4,9].
A Nestlé oferece uma diversidade de produtos fortifi-
cados com cálcio, que contribuem para a ingestão adequa-
da do mineral em diferentes momentos do dia.
Pensando nisso, a Nestlé firmou uma parceria mun-
dial com a International Osteoporosis Foundation (IOF), or-
ganização que atua na prevenção e combate à osteoporose
por meio de uma série de ações que incluem pesquisas,
treinamentos, elaboração de diretrizes e outras atividades
em nível global. A parceria inclui a criação do selo Ame seus
Ossos, que facilitará a identificação de produtos fontes de
nutrientes relacionados ao metabolismo ósseo.
Existe consenso de que a fortificação dos alimentos
pode contribuir para a ingestão recomendada de cálcio, as-
sim como de ferro e outros nutrientes essenciais. Dentre as
vantagens da fortificação, destacam-se a alta cobertura popu-
lacional, a não modificação dos hábitos alimentares e o baixo
risco de toxicidade. Segundo o Banco Mundial (World Bank
Group), nenhuma outra tecnologia oferece tão ampla opor-
rEFErênciaS
Saiba mais detalhes sobre a parceria mundial da Nestlé com o International Osteoporosis Foundation (IOF).
dial com a International Osteoporosis Foundation (IOF), or-
ganização que atua na prevenção e combate à osteoporose
por meio de uma série de ações que incluem pesquisas,
treinamentos, elaboração de diretrizes e outras atividades
em nível global. A parceria inclui a criação do selo
Ossos
nutrientes relacionados ao metabolismo ósseo.
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• São desnatados
• Não têm adição de açúcares
[1] Institute of Medicine. Dietary Reference Intakes for Calcium and Vitamin D. Report Brief. Washington: IOM, 2010. [2] Morais GQ, Burgos MGPA. Impacto dos nutrientes na saúde óssea: novas tendências. Rev. Bras. Ortop. 2007;42(7):189-94. [3] Philippi ST. Pirâmide dos alimentos: fundamentos básicos da nutrição. Barueri, São Paulo: Manole, 2008. [4] Cozzolino SMF. Parecer Técnico: interação cálcio e ferro. Nestlé Brasil, 2012. [5] Cozzolino SMF. Defi ciências de minerais. Estud. Av. 2007; v.21, n.60, p.119-126. [6] Instituto brasileiro de geografi a e estatística (IBGE). Pesquisa de orçamentos familiares, 2008-2009 (POF): análise do consumo alimentar no Brasil. Rio de Janeiro, 2011. [7] Unger et al. Vitamin D status in a sunny country: Where has the sun gone? Clinical Nutrition, 2010; 29 (6), p.784-788. [8] Llanos MFE. Fome Oculta: A palavra da Professora Dra. Andréa Ramalho. Revista Nestlé Bio Nutrição e Saúde, 2011. [9] Silva AGH, Cozzolino SMF. Cálcio. In: Cozzolino SMF. Biodisponibilidade de Nutrientes. São Paulo: Manole, p.513-41, 2009.
* 1 porção equivale a 20 g (2 colheres de sopa) de Molico TotalCálcio Leite em Pó Desnatado ou 1 unidade (170 g) de Molico TotalCálcio Iogurte Líquido ou 1 unidade (100 g) de Molico TotalCálcio Frutas Vermelhas Pedaços, por exemplo.
Nota importante: O aleitamento materno é a melhor opção para a alimentação do lactente proporcionando não somente benefícios nutricionais e de proteção, como também afetivos. É fundamental que a gestante e a nutriz tenham uma alimentação equilibrada durante a gestação e amamentação. O aleitamento materno deve ser exclusivo até o sexto mês e a partir desse momento deve-se iniciar a alimentação complementar mantendo o aleitamento materno até os 2 anos de idade ou mais. O uso de mamadeiras, bicos e chupetas deve ser desencorajado, pois pode prejudicar o aleitamento materno e difi cultar o retorno à amamentação. No caso de utilização de outros alimentos ou substitutos de leite materno, devem-se seguir rigorosamente as instruções de preparo para garantir a adequada higienização de utensílios e objetos utilizados pelo lactente, para evitar prejuízos à saúde. A mãe deve estar ciente das implicações econômicas e sociais do não aleitamento ao seio. Para uma alimentação exclusiva com mamadeira será necessária mais de uma lata de produto por semana, aumentando os custos no orçamento familiar. Deve-se lembrar à mãe que o leite materno não é somente o melhor, mas também o mais econômico alimento para o bebê. A saúde do lactente pode ser prejudicada quando alimentos artifi ciais são utilizados desnecessária ou inadequadamente. É importante que a família tenha uma alimentação equilibrada e que, no momento da introdução de alimentos complementares na dieta da criança ou lactente, respeitem-se os hábitos culturais e que a criança seja orientada a ter escolhas alimentares saudáveis.Em conformidade com a Lei 11.265/06; Resolução ANVISA n° 222/02; OMS - Código Internacional de Comercialização de Substitutos do Leite Materno (Resolução WHA 34:22, maio de 1981); e Portaria M.S. n° 2.051 de 08 de novembro de 2001.
dossiê bio
O tema Nutrição na Gestação é complexo por
envolver diversos fatores que interferem na saúde
da mãe e da criança. No primeiro trimestre ges-
tacional, a ingestão energética materna deve ser
semelhante à ingestão no período pré-gestacional,
considerando que não há acréscimos nesse pe-
ríodo. Os sintomas de náuseas e vômitos podem
limitar a capacidade de manter a ingestão energé-
tica, contudo, a perda de peso dentro dos limites
considerados adequados é uma situação prevista e
que não compromete a saúde da mãe e do feto.
No segundo e no terceiro trimestres, recomenda-se
um adicional de 300 kcal, considerando a ingestão
diária recomendada (RDA). Ressalta-se que esse
adicional energético deve ser gradativo, levando-
-se em consideração o ganho de peso da gestante e
sua atividade física. A tabela 1.1 mostra a ingestão
dietética recomendada de alguns nutrientes para
gestantes de acordo a idade materna.
As modificações hormonais presentes na
gestação promovem ajustes no metabolismo do
cálcio, possibilitando aumento do aproveitamento
biológico desse nutriente durante esse período.
Assim, apesar dos requerimentos de cálcio esta-
rem aumentados na gestação, as recomendações
dietéticas permanecem as mesmas das recomen-
dadas para as mulheres não grávidas. Esses valo-
res podem ser obtidos pela ingestão de dois copos
de leite (500 ml), uma fatia de queijo (30 g) e
um pote de iogurte (150 g). Os vegetais e os fei-
jões são considerados alimentos fontes de cálcio,
mas destaca-se que a biodisponibilidade é menor,
sendo necessário o consumo de porções diárias
relevantes para contribuírem com um percentual
razoável em relação à recomendação.
A vitamina C também deve ser consumida
diariamente, considerando que não há reserva
dessa vitamina. A concentração plasmática de
FErnanda raubErNutricionista, Mestre e
Doutoranda em Ciências da Saúde. Núcleo de
Pesquisa em Nutrição da Universidade Federal de Ciências da Saúde de
Porto Alegre-RS.
Márcia rEgina ViToloNutricionista, Doutora em
Ciências Biológicas, Pós-doutorado em Nutrição.
Departamento de Nutrição da Universidade Federal de Ciências da Saúde de
Porto Alegre-RS.
Nutrição na gestação
A primeira parte desse artigo – Nutrição na Gestação – foi publicada na edição de número 16 da Nestlé Bio.noTa do EdiTor
32 dossiê bio
vitamina C diminui progressivamente durante a gesta-
ção, provavelmente devido à hemodiluição e à transfe-
rência desta para o feto. Contudo, as recomendações de
vitamina C são facilmente alcançadas quando há presen-
ça, na alimentação diária, de pelo menos um alimento
fonte, como uma porção de laranja, kiwi, mamão ou goia-
ba. Destaca-se ainda, que a ingestão máxima tolerada é
de 2 g ao dia (DRI), não sendo recomendada a ingestão
de suplementos com quantidades acima desse valor.
Em relação ao requerimento de ferro na gestação, é
necessário que a mulher possua reserva de 500 mg de fer-
ro para manter o adequado balanço hematopoiético [1].
O adicional energético do período gestacional (300 kcal)
não é suficiente para aumentar significativamente o
aporte de ferro, além do requerimento diário elevado de
27 mg de ferro que não é possível obter por meio da ali-
mentação básica. Considerando que em cada 1.000 kcal
de uma alimentação saudável obtém-se 6 mg de ferro, a
ingestão média recomendada para mulheres adultas de
2.000 kcal fornecerá 12 mg de ferro. Estima-se que a
biodisponibilidade do ferro da alimentação rica em ce-
reais, raízes e tubérculos com negligenciáveis quantida-
des de carne, peixe ou vitamina C seja de 5% a 10% [2].
Assim, com a ingestão de 12 mg de ferro aliada à bio-
disponibilidade de 5%, a absorção será de 0,6 mg, valor
abaixo do recomendado, que é de 1,36 mg diariamente
para uma mulher adulta. Dessa forma, esse balanço ne-
gativo vai esgotar a reserva de ferro materno, a qual deve
ser garantida por meio de alimentação que forneça ferro
de alta biodisponibilidade e alimentos enriquecidos [3].
O ferro de alta biodisponibilidade é o ferro heme
que é derivado de alimentos de origem animal e não é
influenciado por fatores inibidores da absorção. Já o fer-
ro não heme, presente em alimentos de origem vegetal,
apresenta baixa biodisponibilidade e sua absorção pode
Tabela 1.1 – Ingestão dietética recomendada
Nutrientes EAR RDA ou AI UL
Gestante < 18 anos
Cálcio (mg) 1.000 1.300 2.500
Ferro (mg) 23 27 45
Folato (µg) 520 600 800
Vitamina A (µg) 530 750 2.800
Vitamina B12 (µg) 2,2 2,6 -*
Vitamina C (mg) 66 80 1.800
Zinco (mg) 10,5 12 34
Gestantes 19-50 anos
Cálcio (mg) 800 1.000 2.500
Ferro (mg) 22 27 45
Folato (µg) 520 600 1.000
Vitamina A (µg) 550 770 3.000
Vitamina B12 (µg) 2,2 2,6 -*
Vitamina C (mg) 70 85 2.000
Zinco (mg) 9,5 11 40
EAR = Requerimento médio estimado; RDA = Recomendação dietética de ingestão; UL = Limite superior tolerável de ingestão. Fatores de conversão: 1 DFE (equivalente de folato dietético) = 1 µg de folato de alimento = 0,6 µg de ácido fólico de alimentos fortificados ou de suplemento consumido com alimentos = 0,5 µg de ácido fólico consumido em jejum. Fatores de conversão: 1 µg de ERA (Equivalente de Retinol Ativo) = 1 RE de retinol (vitamina A) = 1 µg de retinol = 2 µg de betacaroteno em óleo; 12 µg de betacaroteno em mistura de alimentos e 24 µg de outros carotenoides (precursores da vitamina A) em mistura de alimentos. 1 UI (Unidades Internacionais de vitamina A) = 0,3 µg de vitamina. Fonte: IOM, 2006; IOM, 2011.
dossiê bio 33
sofrer influência de fatores facilitadores (ácido ascórbico,
carotenoides, frutose, citrato e alguns aminoácidos pre-
sentes em carnes — cisteína, histidina e lisina) e inibido-
res (fitatos, fibras, cafeína, oxalatos, compostos fenólicos,
cálcio, fósforo e zinco). Portanto, a orientação alimentar
deve priorizar a ingestão de ferro heme e/ou melhorar a
biodisponibilidade do ferro não heme. A tabela 1.2 apre-
senta o conteúdo de ferro heme e não heme nos alimen-
tos. Enfatiza-se que o consumo de vísceras uma vez por
semana constitui-se em prática alimentar que fornece
ferro de alta biodisponibilidade e de baixo custo [4].
Com relação à prática da suplementação de ferro,
recomenda-se para todas as gestantes a suplementação
de 30 mg a 40 mg no último trimestre, como medida
profilática para garantir a manutenção das reservas de
ferro e suprir os requerimentos gestacionais [5]. Na pre-
sença de anemia ou deficiência de ferro, recomenda-se
suplementação de 60 mg a 80 mg, devendo ser evitadas
suplementações com doses maiores do que essas, em
razão da possibilidade de se aumentar o requerimento
de zinco e levar-se à deficiência desse nutriente na pre-
sença de ingestões marginais. Além do mais, suplemen-
tações medicamentosas excessivas acentuam os efeitos
colaterais, diminuindo a adesão ao tratamento [6].
No Brasil, as farinhas de milho e trigo são fortifica-
das com ferro e ácido fólico desde 2004, sendo que, a cada
100 g de farinha, obtém-se 4 mg de ferro e 150 µg de
ácido fólico. Nessa proporção, seriam necessários cinco
pães franceses, ou a mesma quantidade de outro ali-
mento equivalente, para fornecer um terço da quanti-
dade diária de ferro que é recomendada na alimentação
saudável para mulheres adultas. Para gestantes, essa
quantidade equivaleria a aproximadamente um sétimo,
constituindo-se em medida fraca para colaborar com a
ingestão adequada de ferro.
Tabela 1.2 – Conteúdo de ferro por alimento
Alimento Quantidade (g) Medida caseira Ferro (mg)
Leite
Humano 100 - 0,50
Vaca 100 ½ copo TR
Ferro heme
Fígado bovino cozido 100 1 bife grande 10,66
Sardinha em óleo 83 1 lata pequena 2,90
Carne bovina cozida 100 1 bife médio 2,20
Atum em óleo 135 1 lata 1,62
Carne suína cozida 100 1 bife médio 0,50
Peixe filé cozido 120 1 filé médio 0,48
Frango cozido 140 1 peito pequeno 0,42
Ferro não heme
Melado 41 2 colheres de sopa 2,20
Feijão-preto cozido 140 1 concha média 2,10
Farinha de trigo* 40 2 colheres de sopa 1,86
Aveia em flocos 36 2 colheres de sopa 1,51
Lentilha cozida 100 1 concha média 1,50
Ovo cozido 45 1 unidade 0,70
Banana 80 1 unidade média 0,32
Laranja 180 1 unidade média 0,18
Beterraba cozida 75 1 unidade pequena 0,15
Espinafre cozido 25 1 colher de sopa 0,15
* Farinha de trigo fortificada, fonte NUTWIN - Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Fonte: TACO, 2006; Sociedade Brasileira de Pediatria, 2007; Pinheiro et al., 2005.
34 dossiê bio
Apesar da variedade de alimentos que contêm fo-
lato (tabela 1.3), foi demonstrado que somente 8% das
mulheres americanas consomem a recomendação desse
nutriente diariamente [7]. Uma dieta equilibrada e com
a presença de alimentos fontes, considerando o valor
de 2.000 kcal a 2.200 kcal, fornece aproximadamente
250 µg de folato ao dia. Segundo as recomendações
dietéticas, as mulheres em idade fértil devem consumir
400 µg/dia de ácido fólico proveniente de suplementos
e/ou alimentos fortificados em adição a uma dieta com
fontes naturais de folato, e mulheres grávidas 600 µg/dia,
também providos por suplementos, já que esses são
valores difíceis de serem alcançados por alimentação
básica. Além disso, durante a gravidez há diminuição
de folato sérico, que pode ser explicada, em parte, pelo
aumento do volume plasmático, sendo mais frequente
na segunda metade da gestação, quando as necessida-
des de folato se encontram no limiar máximo.
A maioria dos suplementos pré-natais contém 1
mg de folato (1.000 µg), quantidade suficiente para
atender às necessidades e repor os depósitos no caso
de deficiência da vitamina. Contudo, quando há dis-
túrbios hemolíticos (por exemplo, doença falciforme) a
recomendação é suplementar com 5 mg/dia. Destaca-se
a necessidade de se diferenciar as doses fisiológicas de
ácido fólico (abaixo de 1.000 µg) com propósitos pro-
filáticos das doses farmacológicas (acima de 1.000 µg)
para tratamentos terapêuticos de pacientes, por exem-
plo, aqueles com anemia megaloblástica [8].
Em relação à vitamina A, a recomendação para
gestantes (770 µg/dia) é muito próxima dos valores indi-
cados para mulheres adultas não grávidas (700 µg/dia).
Apesar de sua importância na gestação, essa vitamina
pode ser tóxica quando ingerida em grandes quantidades
e parece ser teratogênica quando quantidades excessi-
vas são utilizadas nos primeiros meses gestacionais [9].
A suplementação com betacaroteno poderia ser admi-
nistrada a mulheres grávidas por aumentar as suas
reservas corporais e concentrações no leite, pois não
apresenta risco comprovado de teratogenicidade e pos-
sui maior disponibilidade e melhor custo-benefício em
relação à suplementação com retinol [10].
É importante ressaltar que não há comprovações
de toxicidade da vitamina A proveniente dos alimentos
in natura, mesmo em altas concentrações. A recomen-
dação é facilmente atingida quando os alimentos-fontes
fazem parte do esquema alimentar, uma vez que a in-
gestão não precisa ser diária. A tabela 1.4 mostra o con-
teúdo de vitamina A em alimentos-fontes.
Tabela 1.3 – Conteúdo de folato nos alimentos
Alimentos Quantidade (g) Medida caseira Folato (µg)
Fígado de frango cozido 100 2 unidades grandes 770
Levedo de cerveja 16 1 colher de sopa 626
Fígado bovino 100 1 unidade média 220
Lentilha cozida 100 1 concha média 179
Quiabo cozido 92 2 colheres de sopa 134
Feijão-preto cozido 86 1 concha média 128
Espinafre cozido 95 4 colheres de sopa 103
Banana 92 1 unidade média 76
Beterraba cozida 85 4 colheres de sopa 68
Abacate 100 2 colheres de sopa 62
Brócolis cozido 85 2 ramos médios 52
Caju 65 1 unidade pequena 44
Fonte: Hands, 2000; Pinheiro et al, 2005.
dossiê bio 35
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[18] Institute of Medicine. Dietary Reference intakes. Calcium, Vitamin D. The National Academies Press. Washington, D.C., 2011.
Tabela 1.4 – Conteúdo de vitamina A nos alimentos
Alimentos Quantidade (g) Medida caseira Vitamina A (µg ER)
Fígado bovino cozido 100 1 bife médio 11.116,3
Fígado de frango cozido 100 2 unidades grandes 7.695,9
Couve cozida 90 3 folhas médias 1.300,1
Espinafre cozido 95 4 colheres de sopa 1.170,1
Cenoura cozida 75 3 colheres de sopa 990,0
Manga 207 1 unidade grande 420,0
Abóbora 50 1 pedaço médio 262,5
Melão 160 2 fatias médias 185,6
Batata-doce assada 60 2 colheres de sopa 151,2
Leite 245 1 copo duplo 95,5
Mamão 140 1 fatia média 64,4
Tomate 90 1 unidade média 60,0
Fonte: Pinheiro et al, 2005; USDA, 2009.
resultado
por _ Luiza de Andrade
Formação profissional e assistência clínica que são promovidas pela Nestlé
Programa de Estágio Jovens Nutricionistas
resultado 37
Um professor de Estudos Sociais desafia seus alunos:
observem o mundo e tentem consertar o que julgam estar erra-
do. Um dos garotos propõe a seguinte ideia: você faz uma boa
ação para alguém, que deve retribuí-la não de volta, mas para
frente, fazendo boas ações para outras três pessoas.
O que se sucede nessa reação em cadeia, contada no fil-
me A Corrente do Bem (2000), de Mimi Leder, é que todas as
pessoas envolvidas naquele processo passam a ser multipli-
cadoras. Neste sentido, elas podem ilustrar a rede gerada pelo
Programa Jovens Nutricionistas, da Nestlé — no qual, estudan-
tes do quarto ano de nutrição ganham uma bolsa para que pos-
sam ir a campo e vivenciar a rotina hospitalar.
Com o Programa, a Nestlé possibilita que o aluno tenha
complementada sua formação prática, saindo da faculdade
mais preparado para o mercado de trabalho. Já sua atuação
no hospital contribui assistencialmente para o atendimento
de qualidade aos pacientes, uma vez que espelha avaliações
diagnósticas e proposições terapêuticas concebidas por super-
visores de alto nível vinculados à Universidade e à Nestlé. Os
próprios pacientes também são beneficiados do ponto de vista
educacional, uma vez que terminam por compreender melhor
como a nutrição participa de forma ativa no seu tratamento.
Além disso, um subproduto importante do Programa con-
siste na sistemática coleta de dados que se presta a estudos
e publicações científicas. O conhecimento reunido nestes tra-
balhos alcança uma ampla gama de profissionais de saúde,
podendo influenciar positivamente o cuidado de pacientes em
diferentes locais e instituições. Foi assim, por exemplo, que o
Programa Jovem Nutricionista da Nestlé nasceu.
a origemPreocupada em investigar o índice de desnutrição hos-
pitalar no País, a Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e
Enteral — SBNPE — realizou uma pesquisa multicêntrica, em
1996, envolvendo 4.000 pacientes internados em hospitais
da rede pública de 12 Estados, mais o Distrito Federal [1]. Em
síntese, o Inquérito Brasileiro de Avaliação Nutricional Hospita-
lar — Ibranutri — revelou que 48,1% dos pacientes internados
apresentavam algum grau de desnutrição: 12,6% de desnutri-
dos graves e 35,5% de desnutridos moderados.
Um professor de Estudos Sociais desafia seus alunos: observem o mundo e tentem consertar o que julgam estar errado. Um dos garotos propõe a seguinte ideia: você faz uma boa ação para alguém, que deve retribuí-la não de volta, mas para a frente, fazendo boas ações para outras três pessoas.
38 resultado
O Ibranutri identificou, ainda, uma significativa diferença
no tempo médio de internação: 6 dias para pacientes eutró-
ficos, 13 dias para pacientes desnutridos. E, como esperado,
detectou um incremento no risco de desnutrição associado ao
maior tempo de internação.
De acordo com Waitzberg DL e demais autores do estudo,
as causas para este achado são múltiplas e não excludentes.
Como, por exemplo, os vários níveis de catabolismo determi-
nado pelo tipo e a extensão da doença de base que acomete
o paciente e a ingestão ou reposição nutricional inadequadas.
Entre as condições encontradas no ambiente hospitalar
que contribuíram para a piora do estado nutricional, destaca-
ram-se a falta de avaliação nutricional básica — muitas vezes
sequer o peso e a altura do paciente eram aferidos — , a ausên-
cia de acompanhamento do consumo alimentar, intervenções
cirúrgicas em pacientes desnutridos sem reposição nutricio-
nal, uso prolongado de soros por via venosa ao lado de dieta
zero, ausência de terapia nutricional em estados hipermetabó-
licos e retardo no início da terapia nutricional.
VALOR COMPARTILHADO: O EXEMPLO DO CAMPOInvestir na capacitação técnica dos produtores de ver-
duras e legumes é o foco da parceria firmada entre a Nestlé e
a ESALQ/USP. Os alunos do último ano de Agronomia ajudam
os produtores de São José do Rio Pardo a desenvolverem
suas culturas, preparando-se assim para o mercado de traba-
lho. Eles são orientados por um coordenador especialista e as
experiências realizadas em campo são utilizadas como fonte
de pesquisas pela Universidade.
Os produtores são capacitados a desenvolver as boas
práticas agrícolas, o que envolve adubação, irrigação, contro-
le fitossanitário, entre outras ações. São estimulados a fazer
um manejo integrado de suas propriedades para o controle de
ervas daninhas, de pragas e de doenças e recebem recomen-
dações sobre como trabalhar com as sementes. Aprendem
a planejar suas atividades e depois a avaliá-las — desde a
preparação do solo até a entrega na fábrica. Isso proporciona
ótimos resultados, pois reduz o desperdício, corrige desvios,
aumentando a qualidade e a produtividade.
A desnutrição hospitalar é um grave problema no Brasil e se agrava durante a internação do paciente.
Foi a partir deste estudo — no qual ficaram patentes a
reduzida consciência das equipes de saúde quanto à importân-
cia do estado nutricional e a baixa freqüência de intervenções
nutricionais — que, há três anos, surgiu o Programa de Estágio
Jovens Nutricionistas.
Roseli Borghi, nutricionista da Nestlé, especialista em
nutrição clínica e responsável pelo programa, conta que a deci-
são de contribuir para melhora deste cenário apoiou-se no prin-
cípio adotado pela Empresa de criar valor compartilhado — em
moldes semelhantes ao que já acontecia no convênio firmado
em 2007 entre a Nestlé e a Escola Superior de Agricultura “Luiz
de Queiroz” da Universidade de São Paulo — ESALQ/USP (leia
mais no box abaixo).
resultado 39
Seleção e treinamentoPara participar do Programa de Estágio Jovens Nutricio-
nistas, ligado à Nestlé Health Science (leia box acima) os can-
didatos passam por uma triagem online, na qual fazem suas
inscrições e provas, por dinâmicas de grupo e por entrevistas
presenciais. Todos os selecionados passam, então, por um pe-
ríodo de treinamento, antes de ficarem alocados nos hospitais
parceiros. Nesta fase, recebem aulas específicas sobre nutri-
ção enteral e parenteral, aprendem como são feitas as avalia-
ções nutricionais do Programa, como registrar os dados coleta-
dos e interpretá-los. Durante o treinamento, os estagiários têm
a oportunidade de conhecer a divisão da Nestlé Health Science
e demais unidades que têm projetos de valor compartilhado
em Nutrição. Além disso, entram em contato com os produtos
da Nestlé destinados aos hospitais e fazem degustações na
cozinha experimental da Companhia.
Em 2010, Simone Souza Rocha, estudande de nutrição
no Centro Universitário São Camilo, na região sul de São Paulo,
foi uma das selecionadas.
NESTLÉ HEALTH SCIENCEO Programa de Estágio Jovens Nutricionistas, que leva es-
tudantes aos hospitais para que eles possam aprender a identi-
ficar necessidades nutricionais específicas de pacientes interna-
dos e a propor terapias adequadas para cada caso, faz parte da
Nestlé Health Science.
A Nestlé Health Science foi criada com a intenção de aliar ali-
mentos e medicamentos em uma única empresa.
O objetivo central dessa nova divisão, que começou a operar
em janeiro de 2011, é desenvolver uma área de ciência da saúde e
nutrição personalizada para prevenir e tratar doenças.
Paralelamente, o Nestlé Institute of Health Sciences, de nível
internacional, instalado no ambiente científico e multidisciplinar
do Instituto de Tecnologia Federal da Suíça, em Lausanne, faz pes-
quisas em áreas da ciência biomédica que auxiliam a criação de
estratégias nutricionais para melhorar a saúde e a longevidade.
Os estagiários têm a oportunidade de conhecer a divisão da Nestlé Health Science.
40 resultado
a teoria na práticaNo início de 2011, Simone ajudou a monitorar a dieta
de pacientes do Hospital Santa Paula, na capital paulista.
Sob a coordenação da nutricionista responsável, ela conta
que fazia a rotina diária de visitar pacientes, supervisionar
sua alimentação e realizar adequação nutricional. “No andar
de oncologia, onde eu era estagiária fixa, o maior problema
era a inapetência. Era preciso oferecer suplementação para
suprir a energia e nutrientes não ingeridos.” Hoje, formada,
atuando no Hospital Sancta Maggiore, na unidade do Itaim
Bibi, em São Paulo, Simone lembra de seu aprendizado ao
lidar com pacientes críticos, muito debilitados. “Era preciso
mudar constantemente suas dietas e oferecer atenção in-
dividualizada todos os dias.” E recorda a satisfação de ver
o resultado do trabalho empreendido. Nos conta, por exem-
plo, de uma de suas pacientes que conseguiu o desmame
da nutrição parenteral. “Quando ela passou a receber dieta
Para participar do Programa de Estágio Jovens Nutricionistas, os candidatos passam por uma triagem, que inclui provas, dinâmicas de grupo e entrevistas presenciais.
enteral, pudemos começar a oferecer suplementos. Com
isso, ela apresentou uma grande melhora. De um quadro de
desnutrição severa, ela melhorou seu estado clínico geral e
recebeu alta.”
Para Maria Alice Gouveia, mestre em nutrição pela
Unifesp, especialista em nutrição clínica pela Associação
Brasileira de Nutrição (Asbran) e professora do Centro Uni-
versitário São Camilo — o primeiro a firmar parceria com o
Programa — a parte fundamental do estágio reside na cole-
ta de dados de pacientes internados.
Para entender a importância desta sistematização, basta
voltarmos para os resultados do Ibranutri. Segundo o estudo,
procedimentos simples e objetivos, que ajudariam na identifi-
cação do estado nutricional, não eram realizados. Anotações
referentes ao estado nutricional dos pacientes eram encontra-
das apenas em cerca de 20% dos prontuários avaliados. Ape-
nas 14,6% dos pacientes apresentavam seu peso anotado à
admissão, embora, em 75% dos casos, os pacientes encontra-
vam-se a menos de 50 metros de uma balança.
Não há dúvida de que o papel supervisionado do estagiá-
rio no preenchimento de formulários de avaliação subjetiva
global e na avaliação objetiva do estado nutricional constituem
uma ferramenta da maior importância para identificação pre-
coce de pacientes em risco nutricional, área em que a Nestlé já
participa ativamente há muitos anos (vide box acima).
Somando esforçosSegundo a nutricionista Clara Rodrigues, especializada
em nutrição clínica e em fisiologia do exercício, o que se per-
cebe no Hospital Geral do Grajaú, na região sul de São Paulo, é
que o Programa de Estágio Jovens Nutricionistas “veio somar o
atendimento que o nutricionista tem frente ao paciente que está
internado”. Isso porque os estudantes, sob supervisão de seus
[1] Waitzberg DL, Caiaffa WT, Correia MI. Hospital malnutrition: The Brazilian national survey (IBRANUTRI): a study of 40000 patients. Nutrition 2001; 17 (7-8): 573-80. [2] Guigoz Y. The Mini-Nutritional Assessment (MNA®) review of the literature – what does it tell us?, J Nutr Health Aging 2006; 10:465-487. [3] Cuervo M, García A, Ansorena D, et al. Nutritional assessment interpretation on 22,007 Spanish community-dwelling elders through the Mini Nutritional Assessment test. Public Health Nutr. 2009; 12 (1):136. [4] Cereda E. Mini nutritional assessment. Curr Opin Clin Nutr Metab Care. 2012;15(1):29-41.
rEFErênciaS
IDENTIFICAçãO DE PACIENTES COM OU SOB RISCO DE DESNUTRIçãOA Nestlé fomenta mundialmente a necessidade de ava-
liação nutricional com o objetivo de diminuir a prevalência da
desnutrição. No caso específico da população idosa, esse ris-
co aumenta dramaticamente em indivíduos hospitalizados
e naqueles com deficiência cognitiva. Diante disso, a Nestlé
associou-se a geriatras de reputação internacional para criar a
Mini Avaliação Nutricional, MAN — uma ferramenta específica
de controle e avaliação para identificar pacientes idosos que
tenham ou estejam sob risco de desnutrição. Por meio dela, é
possível que profissionais de saúde intervenham mais precoce-
mente para fornecer o apoio nutricional adequado de forma te-
rapêutica ou preventiva. Validada por diferentes estudos [2-3],
essa ferramenta tem sido amplamente utilizada em hospitais e
ambiente comunitário por profissionais de saúde no Brasil e no
mundo. E, como não poderia deixar de ser, é instrumental no dia
a dia do Programa de Estágio Jovens Nutricionistas.
Enquanto o Ibranutri avaliou pacientes adultos e idosos
por meio da avaliação subjetiva global (ASG), o Programa de
Estágio Jovens Nutricionistas estudou a população idosa com
a especificidade da MAN. Como explica Roseli Borghi, trata-se de
uma ferramenta fundamental para o Programa — uma vez que
permite intervenção adequada em pacientes desnutridos ou
com risco nutricional.
Em síntese, ao levar em conta aspectos característicos
ditados pela idade dos pacientes, o Programa de Estágio Jovens
Nutricionistas concretiza um abrangente plano de intervenção
nutricional para que os pacientes não sofram de desnutrição
durante o período de internação hospitalar.
Validada por diferentes estudos, a Mini Avaliação Nutricional (MAN) tem sido amplamente utilizada em hospitais e ambiente comunitário.
resultado 41
orientadores e dos nutricionistas de cada hospital, atendem pa-
cientes individualmente e desenvolvem dietas personalizadas,
que respeitam características específicas de cada caso.
A desnutrição hospitalar é um grave problema no Brasil
e se agrava durante a internação do paciente. As anotações
nos prontuários médicos, via de regra, são insuficientes e
incompletas, faltando dados importantes para o diagnóstico
do estado nutricional. Combater este cenário é fundamental
para a saúde da população e a razão de existir do Programa
de Estágio Jovens Nutricionistas da Nestlé.
sabor e saúde
Por que gostamos tanto de gordura?Língua: uma nova peça no quebra-cabeça da obesidade
Recentemente, estudos em nutrigenômica e nutrigenética têm contribuído de forma decisiva para a
compreensão de princípios básicos da Nutrição Funcional. Enquanto a primeira investiga a influência dos
nutrientes na expressão dos genes e como eles regulam os processos biológicos, a segunda avalia como
as variações genéticas diferem em reposta a nutrientes específicos e eventualmente promovem distintos
estados de saúde e doença nas pessoas.
Entre os princípios básicos da nutrição funcional influenciados pelos conhecimentos da nutrigenô-
mica e nutrigenética destaca-se a Individualidade Bioquímica. Segundo ela, cada ser humano possui ne-
cessidades nutricionais únicas baseadas em seu perfil genético, estilo de vida e exposições ambientais, e
responde de maneira particular a diferentes componentes da dieta.
Tal individualidade pode se manifestar tão logo o alimento alcança a boca. Não é difícil enumerar ca-
racterísticas como doce e cremosa para uma torta de morango, certo? Aprofunde, contudo, esta pergunta
e uma considerável dose de subjetividade tornará a descrição qualquer coisa, menos universal. Pelo sim-
ples fato de que a língua e suas papilas gustativas são singulares de cada um. E o que pode parecer doce
demais para uma pessoa, pode apresentar-se pouco ou quase nada doce para outra. Além disso, não se
pode ignorar a considerável variação individual que existe em relação ao prazer e a saciedade que cada um
experimenta ao provar, por exemplo, uma mesma torta de morango.
Neste contexto, pode a percepção do gosto influenciar o peso de uma pessoa? O surgimento da obe-
sidade como a doença passível de prevenção de maior prevalência no mundo, torna esta pergunta urgente.
por _ Claudio Galperin
Como sabemos, a língua possui receptores para dois dos três macronutrientes que
precisamos nos alimentos: doce, que corresponde aos carboidratos, e umami, que indica
proteína. Como aponta Russel Keast, da Universidade Deakin, em Melbourne, na Austrália,
faz sentido que tenhamos alguma forma de resposta ao terceiro macronutriente: gordura.
Atualmente, embora persista o debate sobre se a gordura é de fato um gosto, es-
tudos bem conduzidos estão mais propensos a dizer que sim. Em 2010, Keast e cols.
constataram que os participantes de um estudo conduzido por eles podiam detectar áci-
dos graxos em uma substância cremosa quando todos os sinais sensoriais para além
do sabor foram removidos [2]. Assim como os carboidratos e proteínas são revelados
pelo sabor de seus subprodutos, os pesquisadores formularam a hipótese de que seria
possível sentir o gosto de uma substância oriunda da quebra da gordura: os ácidos gra-
xos. Curiosamente, Keast e cols. observaram que pessoas com sobrepeso ou obesidade
parecem ser menos sensíveis para a detecção de gordura e, mais intrigante ainda, nota-
ram que indivíduos com baixa sensibilidade para ácidos graxos tendem a consumir uma
quantidade significativamente maior de gordura na dieta e apresentar um índice de mas-
sa corporal (IMC) maior do que aqueles com uma maior sensibilidade a este sabor [2].
Como veremos a seguir, este estudo seria aprofundado por outro grupo, dois anos
depois.
décadas de contradiçãoAs pesquisas que vinculam uma maior apreciação
por doces ao peso corporal datam, pelo menos, dos anos
1950. As evidências geradas por elas, contudo, têm sido
contraditórias. Linda Bartoshuk, da Universidade da Fló-
rida, em Gainesville, oferece uma explicação para isso.
A pesquisadora argumenta que um sabor descrito como
"extremamente doce" por uma pessoa magra pode não
ser tão doce assim para um indivíduo obeso — porque
suas experiências sensoriais são diferentes. "Nós des-
cobrimos algo que deveria ser óbvio", diz ela, em uma re-
visão seminal sobre o assunto, de 2006 [1]. "Se você é
obeso, você gosta mais de doce e de gordura. Isto é parte
do que mantém você assim", conclui.
Embora estudos como os do grupo de Bartoshuk
apontem para uma discreta preferência por comidas do-
ces entre pessoas obesas, investigações mais recentes,
voltadas para um eventual vínculo entre peso corporal e
preferências de sabor, revelam que o que está fortemente
associado à obesidade não é a ingestão de carboidratos
ou doces, mas sim, o consumo de gordura.
um novo sabor?A gordura é um componente importante da dieta, e
tanto os seres humanos quanto os animais geralmente
preferem alimentos com alto teor deste ingrediente, den-
sos em energia. Embora não se encontre entre os cinco
gostos estabelecidos — doce, azedo, salgado, amargo e
umami —, um número crescente de pesquisadores sus-
peita que o sentido do paladar possa estar implicado no
seu reconhecimento.
Estudos recentes, voltados para o vínculo entre peso corporal e preferências de sabor, revelam que a obesidade está predominantemente associada à ingestão de gordura.
um receptor para ácidos graxosO primeiro candidato para receptor de sabor de ácidos graxos na língua é uma
proteína denominada CD36. As evidências iniciais surgiram a partir de modelos mu-
rinos geneticamente alterados para não expressarem esta proteína. Na ausência de
CD36, verificou-se que os camundongos perdiam sua natural preferência por gordura,
enquanto sua afinidade por outros sabores permanecia inalterada.
Em 2012, Marta Yanina Pepino e cols., da Universidade de Washington, em St. Louis,
estudaram variações genéticas em seres humanos que levam à uma expressão aumen-
tada ou diminuída do gene de CD36 [3]. A hipótese do grupo era a de que indivíduos que
pertencem ao grupo onde ocorre maior expressão de CD36 possuem maior sensibilidade
para detectar gordura em menor concentrações. Foi exatamente isso que encontraram.
sabor e saúde 43
Corte transversal de uma língua saudável exibindo a musculatura central rodeada por
células epiteliais formando numerosas papilas (pequenas projeções na superfície externa)
44 sabor e saúde
AsAssim como no estudo de Keast e cols., o prin-
cipal objetivo da pesquisa conduzida pelo Centro para
Nutrição Humana da Universidade de Washington foi o
de compreender como nossa percepção da gordura pode
influenciar quais comidas escolhemos e a quantidade
de gordura ingerimos.
Publicado em março de 2012, no Journal of Lipid
Research, o estudo de Pepino e cols. incluiu 21 pesso-
as consideradas obesas — com IMC maior ou igual a
30. Todos os participantes do estudo provaram três
soluções com uma textura viscosa semelhantes e fo-
ram solicitados a identificar qual delas era diferente. Os
participantes que produziam maiores quantidades de
CD36 escolhiam mais frequentemente a única solução
que continha uma pequena quantidade de óleos graxos,
sugerindo que fossem mais sensíveis a eles. De fato,
pessoas estudadas que produziam as maiores quanti-
dades de CD36 se mostraram 8 vezes mais sensíveis à
presença de gordura do que aqueles que produziam 50%
menos da proteína [3].
Como no trabalho do grupo australiano, os pes-
quisadores norte-americanos buscaram limitar pistas
visuais e olfativas, iluminando a área de testes com
luz vermelha e utilizando clipes no nariz dos indivíduos
participantes. Isto se fez necessário porque, como sabe-
mos, a percepção do alimento se dá por vias distintas.
Indivíduos que expressam maiores quantidades de CD36 possuem maior sensibilidade para detectar gordura em menores concentrações.
conceitos básicosVoltemos, por um instante, ao exemplo do início deste artigo. Para a língua, sozi-
nha, uma torta de morango tem gosto predominantemente doce. Não é até que o nariz
fica envolvido, que experimentamos o sabor de morango. Isto explica também porque
os alimentos que você não gosta podem descer goela abaixo mais facilmente, se você
apertar o nariz; ou porque o seu jantar é menos agradável quando seus seios nasais
estão congestionadas, no curso de um resfriado [4]. Além disso, também experimen-
tamos a comida através de um terceiro sistema sensorial que é baseado no toque e in-
termediado pelo trigêmeo. Ramos deste nervo vão para os olhos, nariz, língua e dentes,
onde sentem dor, irritação e temperatura. Isso inclui a sensação de ardor da pimenta e a
de resfriamento causada por, por exemplo, enxaguatórios bucais de hortelã.
A gordura também é percebida através do nervo trigêmeo, que envia sinais ao
cérebro de que a boca está experimentando algo viscoso, escorregadio ou cremoso.
o papel da lipase
Nossa dieta contém gordura, principalmente sob a forma de triglicérides, produ-
zidos pela união de ácidos graxos com glicerol. Pepino e cols. tinham conhecimento, a
partir de estudos experimentais, de que CD36 é ativado por ácidos graxos mas não por
triglicérides. Seres humanos, contudo, são capazes de sentir o gosto de ambos. Pepino
acredita que isso se deva à atividade da enzima lipase, presente na saliva, que quebra
os triglicérides, liberando os ácidos graxos enquanto a gordura ainda se encontra na
boca. Ratos, por exemplo, podem produzir lipase salivar e esta rapidamente digere tri-
glicérides e os converte em ácidos graxos.
Nos experimentos de Pepino e cols., os participantes conseguiram detectar
gordura seja sob a forma de ácido graxo, seja sob a forma de triglicérides. Mas quan-
do os pesquisadores adicionaram Orlistat às soluções, os indivíduos testados con-
tinuavam a sentir o gosto dos ácidos graxos, mas tornaram-se menos capazes de
detectar triglicérides. Orlistat, como sabemos, inibe a lipase na boca, estômago e
intestino e é frequentemente prescrito para indivíduos obesos para prevenir a absor-
ção de gordura dos alimentos.
Os autores argumentam que Orlistat fez com que fosse mais difícil para as pes-
soas para sentirem o gosto da gordura — que a solução precisava conter quantidades
maiores de triglicérides para que os participantes pudessem detectá-la. Com ácidos
graxos livres, no entanto, não houve diferença [3].
sabor e saúde 45
o ovo ou a galinha?Com a descoberta do receptor para gordura, inaugurou-se um novo debate de gran-
de repercussão para saúde pública. Uma capacidade diminuída para detectar ácidos gra-
xos leva alguém a consumir excessivamente comidas gordurosas ou uma alimentação
rica em gordura diminui a sensibilidade para a percepção do sabor de ácidos graxos?
Como em tantos outros modelos, nos quais convivem genética e epigenética, a
resposta, provavelmente, reside em ambas as circunstâncias — ditadas pelo patrimô-
nio dos genes e pela influência do meio ambiente.
O quanto você gosta de comidas gordurosas depende de diferentes razões, co-
meçando por aquilo que você é exposto na vida intra-uterina e neonatal. Ao mesmo
tempo, estudos têm demonstrado que uma alteração no padrão da dieta pode causar
uma mudança de preferências. Para melhor ou pior.
Os primeiros trabalhos sobre isso foram conduzidos com sal. Seu consumo exces-
sivo — associado à hipertensão arterial e doenças cardiovasculares —, se reduzido ao
longo de um período de tempo, leva a diminuição do desejo por comidas salgadas [5].
Recentemente, Sartor e cols. demonstraram que uma reprogramação para o consumo
de açúcar também pode ocorrer, mas em sentido contrário. No estudo, pediram a um
grupo de jovens adultos que consumissem duas "bebidas esportivas" doces ao dia,
além de sua dieta normal. O resultado, surpreendente, foi uma mudança de comporta-
mento no curto período de tempo de apenas um mês. Jovens que não tinham preferên-
cia por alimentos doces no início do estudo passaram a preferí-los no final [6].
Atualmente, começam a surgir evidências seme-
lhantes em relação à percepção de gordura. Em um estu-
do recente, tanto pessoas magras quanto pessoas obe-
sas responderam à uma dieta com muito baixos teores
de gordura, por 4 semanas, tornando-se mais sensíveis
à gordura. Os pesquisadores, agora, conduzem protoco-
los de longo prazo para acessar o quanto este aumento
de sensibilidade pode se traduzir em uma menor prefe-
rência por (e portanto um menor consumo de) comida
gordurosa [7].
A obesidade é uma doença multifacetada para a
qual não existe uma única causa. Independentemente
disso, a promoção de hábitos alimentares e de um estilo
de vida saudáveis encontra-se sempre na primeira linha
de tratamento. O mais recente argumento para isso re-
side nas evidências de que a indução a uma menor sen-
sibilidade à gordura pode ser grande valor no combate à
esta epidemia.
[1] Bartoshuk LM, Duffy VB, Hayes JE, et cols. The influence of sodium on liking and consumption of salty food. Philos Trans R Soc Lond B Biol Sci. 2006;361(1471):1137-48. [2] Stewart JE, Feinle-Bisset C, Golding M, et cols. Oral sensitivity to fatty acids, food consumption and BMI in human subjects. Br J Nutr. 2010;104(1):145-52. [3]Pepino MY, Love-Gregory L, Klein S, Abumrad NA. The fatty acid translocase gene CD36 and lingual lipase influence oral sensitivity to fat in obese subjects. J Lipid Res. 2012;53(3):561-6. [4] Bakalar N. Sensory science: Partners in flavour. Nature. 2012;S4–S5. [5] Lucas L, Riddell L, Liem G, et cols. The influence of sodium on liking and consumption of salty food. J Food Sci. 2011;76(1):S72-6. [6] Sartor F, Donaldson LF, Markland DA et cols. Taste perception and implicit attitude toward sweet related to body mass index and soft drink supplementation. Appetite. 2011;57(1):237-46. [7] Stewart, J. E. & Keast, R. S. J. Int J Obes (Lond). 2012;36(6):834-42. Recent fat intake modulates fat taste sensitivity in lean and overweight subjects.
rEFErênciaS
Leia na íntegra o artigo de pesquisadores da Universidade de Bourgogne, na França, sobre o papel de CD36 na percepção oral de lipídeos da dieta.
A preferência por alimentos gordurosos é fruto de influências de natureza genética e epigenética.
leitura crítica
A obesidade é uma pandemia. A sua cres-cente incidência mundial, e das doenças a ela associadas, é um dos principais desafios à medi-cina na atualidade. No Ocidente, já é um problema de saúde pública, e em regiões onde esta ques-tão era secundária, como a Ásia, o cenário mu-dou, com a ocidentalização dos hábitos de vida, tornando-se um problema bastante relevante.
Das doenças associadas à obesidade, o diabetes mellitus tipo II (DM2) é talvez a co-morbidade mais preocupante. A deficiência da manutenção da homeostase da glicose, seja por resistência dos tecidos aos efeitos da insulina, seja por falência da função endócrina pancreá-tica, gera consequências diversas, basicamente por lesão microvascular. Lesões em órgãos-al-vo, com insuficiência coronariana, vasculopatia cerebral, obstrução arterial crônica, neuropa-tias, nefropatias e retinopatia, entre outras, são causas maiores de IRC, hemodiálise, transplan-te renal, amputações de membros, IAM, AVC e cegueira. Em termos de custos ao sistema de saúde, chegamos à casa de bilhões de dólares anuais, só nos EUA. O DM2, associadamente às comorbidades cardiovasculares, pulmonares e à síndrome metabólica, é uma doença na qual o tratamento da obesidade tem influência positi-va direta na redução da mortalidade.
O tratamento clínico da obesidade tem resultado pobre em todas as suas variações, com altos índices de recidiva. Hoje, a cirurgia bariátrica representa a melhor opção terapêu-tica para obesidade grau III (IMC>40) ou grau II (35<IMC<40) com doenças associadas. O tratamento cirúrgico também é visto hoje como importante opção terapêutica para o DM2 em pa-cientes obesos mórbidos. É bem documentado o bom controle do DM2 com a derivação gástrica
em Y de Roux, ou com cirurgias disabsortivas (derivações biliopancreáticas). Os efeitos des-tas cirurgias são evidentes precocemente, antes do emagrecimento, mostrando os efeitos incretí-nicos da mudança arquitetural do trato digestivo e consequente modulação de neuropeptídeos intestinais, com efeitos diretos sobre o pâncreas.
Baseando-se nos bons resultados obti-dos nos obesos mórbidos, e na dificuldade de controle do DM2 com os melhores tratamentos clínicos disponíveis, também é foco de estudo, hoje, os efeitos das cirurgias bariátricas com de-rivações intestinais sobre o DM2 em pacientes com sobrepeso (25<IMC<30) e obesidade grau I (30<IMC<35), assim como os efeitos de técni-cas experimentais e técnicas de menor comple-xidade, como a gastrectomia vertical (GV).
A GV entrou no rol de procedimentos ba-riátricos aprovados pelos órgãos reguladores e sociedades da especialidade, após evidências científicas de bons resultados no controle da obesidade mórbida. A GV era inicialmente en-tendida como técnica puramente restritiva, no entanto, hoje, há também evidências de efei-tos incretínicos, obtidos pelo consequente au-mento da velocidade de esvaziamento gástrico após a diminuiçao do volume do órgão, e pela ressecção do fundo gástrico, principal fonte de produção de grelina, com consequente altera-ção na modulação hormonal entero-neural.
Essas premissas levaram à intensifica-ção das pesquisas sobre os efeitos de diversos procedimentos bariátricos sobre o DM2, asso-ciado ou não a diferentes graus de obesidade.
No artigo Cirurgia Bariátrica versus tra-tamento clínico intensivo em pacientes obesos com diabetes, foram comparados, prospectiva e randomizadamente, a eficácia do tratamento
clínico com o tratamento cirúrgico do DM2 por meio de duas técnicas, a gastroplastia redutora com derivação gástrica em Y de Roux (DGYR) e a gastrectomia vertical (GV).
Na DGYR é realizada a redução significati-va do volume gástrico, com a confecção de uma bolsa gástrica de volume bastante reduzido, e um desvio do intestino delgado inicial, onde o duodeno e os primeiros 150 cm a 200 cm do je-juno são desviados do trânsito alimentar. Essas alterações levam a alterações na regulação dos estímulos de fome e saciedade, assim como na homeostase energética e no metabolismo da gli-cose. Sabemos hoje que a manutenção da maior porção do estômago excluso do trânsito alimen-tar, assim como a aceleração do trânsito alimen-tar, com a chegada do quimo mais rapidamente ao íleo, e a exclusão do duodeno e do jejuno ini-cial do contato com os alimentos, leva a estímu-los incretínicos, com mudanças na regulação de entero-hormônios e neuropeptídeos intestinais, entre eles a grelina, o GLP-1, GLP-2, GIP, oxintomo-dulina e leptina, responsáveis pela regulação de complexos eixos entero-neuroendócrinos, mui-tas vezes inter-relacionados, que afetam a pro-dução, e a sensibilidade periférica e hepática de insulina, e que com isso promovem mudanças impactantes na fisiopatologia do DM2.
A GV consiste em ressecção da grande curvatura gástrica, longitudinalmente, do antro até a transição esôfago gástrica. Desse modo, promove-se a redução de volume e tubulização do estômago. Com a remoção total do fundo gás-trico, área de armazenamento, tem-se aumento da saciedade e restrição do volume alimentar in-gerido. A ressecção do fundo gástrico, principal fonte de produção de grelina, hormônio orexigê-nico, também leva à diminuição de estímulos
Cirurgia bariátrica versus terapia médica intensiva em pacientes obesos com diabetes
dr. Marco aurélio Santo e dr. daniel riccioppo - unidade de cirurgia bariátrica e Metabólica, disciplina de cirurgia do aparelho digestivo, departamento de gastroenterologia (Hospital das clínicas da Faculdade de Medicina da universidade de São Paulo Hc-FMuSP).
Schauer PR, Kashyap SR, Wolski K, et al. Bariatric Surgery versus Intensive Medical Therapy in Obese Patients with Diabetes. N. Engl. J. Med. april 26, 2012; 366(17):1567-76.
leitura crítica 47
hipotalâmicos, responsáveis pela sinalização de fome. Associadamente, estas alterações cau-sam aceleramento do trânsito alimentar, que leva à chegada do quimo mais precocemente às porções distais do intestino, promovendo, da mesma forma, ainda que em parte e em diferen-tes proporções, estímulos neuro-hormonais já descritos na técnica da DGYR.
Nesta série de 140 pacientes do estudo em questão, três grupos foram divididos de maneira randomizada, para os três tratamentos propostos, e avaliados por um ano. Como meta primária foi estipulada a hemoglobina glicada (A1c) em níveis menores ou iguais a 6,0%, e como metas secundárias foram avaliados os níveis de glicose e de insulina de jejum, lípides, proteína C reativa, índice HOMA-IR, perda de peso, níveis pressóricos, efeitos adversos, efei-tos em outras comorbidades e, finalmente, as alterações no uso de medicações.
O tratamento clínico baseou-se nos con-ceitos de tratamento intensivo propostos pela Associação Americana de Diabetes, com pro-moção de mudanças de estilo de vida e perda de peso, controle domiciliar frequente da glice-mia, e uso das terapias mais modernas aprova-das pelo FDA — por exemplo, análogos do GLP-1.
Enquanto 12% do grupo em tratamento clínico chegou à meta primária, no grupo ci-rúrgico 42% e 37% dos pacientes submetidos à DGYR e à GV a atingiram, respectivamente. Houve diferença estatística entre os grupos ci-rúrgico e clínico, mas não entre os dois grupos cirúrgicos quando avaliados entre si.
No grupo submetido a DGYR, todos que atingiram a meta o fizeram sem uso associado de medicações, enquanto 28% dos pacientes onde foi realizada GV obtiveram A1c<6% com auxílio de medicações antidiabetes. Quanto ao
uso de insulina, 38% dos pacientes em trata-mento clínico mantiveram seu uso, enquanto, nos operados, isso ocorreu em apenas 4% dos pacientes submetidos a DGYR e em 8% dos pa-cientes submetidos a GV .
Quanto à perda de peso, enquanto a perda média do grupo clínico manteve-se em torno de 5% do peso inicial (13% de perda de excesso de peso), no grupo cirúrgico, esta ficou em torno de 25% do peso inicial, com perda de peso um pouco maior no grupo submetido a DGYR (88% de perda de excesso de peso para DGYR versus 81% para a GV, p<0,001).
Os outros parâmetros avaliados, metas secundárias, também se mostraram significa-tivamente melhores no grupo cirúrgico. A preva-lência de Síndrome Metabólica foi menor após um ano no grupo operado, com diminuição de níveis de insulina, do HOMA-IR, de triglicérides (apenas na DGYR) e de PCR, e houve maior ele-vação do HDL no grupo operado. Os níveis de LDL não diferiram, mas, após cirurgia bariátrica, os dois grupos operados puderam reduzir as medicações para dislipidemia. Houve também redução de uso de drogas anti-hipertensivas nos grupos cirúrgicos, porém sem diferenças nos níveis pressóricos entre os 3 grupos.
Mesmo havendo críticas ao método, es-pecialmente quanto ao grupo estudado, em que todos os pacientes são obesos mórbidos, com tempo de doença médio abaixo de 10 anos, relativamente jovens, e em que 22% ape-nas utilizavam insulina, grupo este no qual há pouca controvérsia sobre o potencial sucesso do tratamento cirúrgico sobre o controle do DM2, este estudo demonstra claramente as di-ferenças entre o tratamento clínico e cirúrgico da obesidade graus II e III e, por conseguinte, das doenças associadas à obesidade mórbida.
Os pacientes avaliados tinham índices mé-dios de massa corpórea em torno de 37 kg/m2, e nestes níveis de obesidade é, hoje, consenso como melhor tratamento, a cirurgia bariátrica, tendo o tratamento clínico resultados incom-paráveis em termos de controle do peso e das doenças associadas à obesidade, em médio e longo prazo.
Diante das vantagens do tratamento cirúr-gico, hoje se discute a ampliação da sua indica-ção, para tratamento de doenças metabólicas, sobretudo o DM2, e em pacientes não obesos severos. Os efeitos das diversas técnicas bariá-tricas sobre a fisiopatologia do DM2 é foco de pesquisas intensivas. A dissociação, hoje bem documentada entre o emagrecimento obtido com a cirurgia bariátrica e o controle do DM2 e a homeostase glicêmica, ampliou os horizontes do uso das intervenções cirúrgicas sobre o trato digestivo em termos de efeitos metabólicos.
A grande fronteira a ser transposta hoje é a definição de fatores preditores do resultado de diferentes técnicas bariátrico-metabólicas, em diferentes pacientes, e os efeitos do peso corporal, da idade, do tempo de instalação do DM2 e dos níveis de reserva pancreática so-bre os resultados. O melhor entendimento das inter-relações entre todos esses fatores e pa-râmetros poderá nortear diferentes indicações de tratamento, inclusive diferentes técnicas ci-rúrgicas, com menores ou maiores efeitos me-tabólicos, e mesmo a associação entre cirurgia e tratamento medicamentoso, como melhor op-ção para diferentes pacientes.
O discernimento entre diferentes subgru-pos de pacientes obesos e/ou diabéticos levará, futuramente, à seleção entre tratamentos clíni-cos ou cirúrgicos, e selecionará procedimentos cirúrgicos diferentes, para pacientes diferentes.