alimentação escolar um enfoque em alimentos funcionais

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Alimentação Escolar: Um Enfoque em Alimentos Funcionais Marta Fonseca Paschoa Avaliar este artigo A função do nutricionista De acordo com a resolução CFN nº 200/98, o nutricionista deve, em uma escola, planejar, organizar, dirigir, supervisionar, realizar a avaliação do estado nutricional, avaliar o serviço de alimentação e de nutrição, além de promover programas de educação alimentar e nutricional, visando a saúde das crianças, pais, professores, funcionários e membros da diretoria 1 . Alimentação escolar Rede pública O PNAE (Programa Nacional de Alimentação Escolar) é um programa do Ministério da Educação - também conhecido como merenda escolar -, de caráter suplementar, e coordenado pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. Sua execução prevê a transferência de recursos federais para estados, municípios e Distrito Federal, com o objetivo de comprar os alimentos para a merenda escolar e suprir, em parte, as necessidades nutricionais dos alunos da Educação Pré- Escolar e Ensino Fundamental, tanto em escolas públicas como em instituições mantidas por entidades filantrópicas 2,3 . Criado em 1954 pelo MEC, conforme Artigos 205 e 208, inciso VII, Constituição Federal de 1988, é um dos mais antigos programas de suplementação alimentar em execução no país e o maior projeto do mundo na área de alimentação, atendendo 21% da população brasileira. Representa hoje um dos mais importantes instrumentos do governo para redistribuição de renda entre as camadas mais pobres. Por ter como principal foco a criança, caracteriza-se como um dos programas-chave na área alimentar, mesmo em tempos de Fome Zero 3 . O objetivo do PNAE é complementar a alimentação dos alunos, contribuindo para que permaneçam na escola, tenham bom desempenho escolar e bons hábitos alimentares 2,3 . Os cardápios devem ser elaborados de modo a fornecer uma refeição saborosa e adequada que supra, pelo menos, 15% das necessidades nutricionais diárias dos alunos. Cada refeição deve conter, pelo menos, um alimento de cada grupo alimentar: construtores, energéticos e reguladores 3 .

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Page 1: Alimentação Escolar Um Enfoque em Alimentos Funcionais

Alimentação Escolar: Um Enfoque em Alimentos Funcionais Marta Fonseca PaschoaAvaliar este artigo

A função do nutricionista

De acordo com a resolução CFN nº 200/98, o nutricionista deve, em uma escola, planejar, organizar,

dirigir, supervisionar, realizar a avaliação do estado nutricional, avaliar o serviço de alimentação e de

nutrição, além de promover programas de educação alimentar e nutricional, visando a saúde das

crianças, pais, professores, funcionários e membros da diretoria 1.

Alimentação escolar

Rede pública

O PNAE (Programa Nacional de Alimentação Escolar) é um programa do Ministério da Educação -

também conhecido como merenda escolar -, de caráter suplementar, e coordenado pelo Fundo Nacional

de Desenvolvimento da Educação. Sua execução prevê a transferência de recursos federais para

estados, municípios e Distrito Federal, com o objetivo de comprar os alimentos para a merenda escolar e

suprir, em parte, as necessidades nutricionais dos alunos da Educação Pré-Escolar e Ensino

Fundamental, tanto em escolas públicas como em instituições mantidas por entidades filantrópicas 2,3.

Criado em 1954 pelo MEC, conforme Artigos 205 e 208, inciso VII, Constituição Federal de 1988, é um

dos mais antigos programas de suplementação alimentar em execução no país e o maior projeto do

mundo na área de alimentação, atendendo 21% da população brasileira. Representa hoje um dos mais

importantes instrumentos do governo para redistribuição de renda entre as camadas mais pobres. Por ter

como principal foco a criança, caracteriza-se como um dos programas-chave na área alimentar, mesmo

em tempos de Fome Zero 3.

O objetivo do PNAE é complementar a alimentação dos alunos, contribuindo para que permaneçam na

escola, tenham bom desempenho escolar e bons hábitos alimentares 2,3. Os cardápios devem ser

elaborados de modo a fornecer uma refeição saborosa e adequada que supra, pelo menos, 15% das

necessidades nutricionais diárias dos alunos. Cada refeição deve conter, pelo menos, um alimento de

cada grupo alimentar: construtores, energéticos e reguladores 3.

Para execução do programa existem dois modelos 2,3:

• Modelo centralizado, em que os alimentos da merenda são comprados pela prefeitura e distribuídos às

escolas;

• Modelo escolarizado, em que a prefeitura repassa o dinheiro da merenda para as escolas ou para as

creches, que ficam responsáveis pela compra dos alimentos.

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O modelo mais comum é o centralizado, mas, no caso das redes estaduais, que possuem escolas

espalhadas por todo o estado, a opção pelo modelo escolarizado também é freqüente 2,3.

Algumas prefeituras adotam um modelo misto, chamado de “escolarização parcial”, em que alguns

produtos (os não perecíveis) são comprados pela prefeitura e outros (os alimentos perecíveis) são

comprados pelas escolas 2,3.

Rede particular

Na rede particular, os objetivos da alimentação escolar são os mesmos instituídos na rede pública: suprir

parcialmente as necessidades nutricionais dos alunos, melhorar a capacidade no processo ensino-

aprendizagem e formar bons hábitos alimentares.

A principal diferença está no fato de que hoje, na rede privada, não há um índice nutricional a ser

cumprido, razão pela qual cada instituição tem a liberdade de defini-lo, uma vez que, diferentemente da

realidade de boa parte dos freqüentadores da escola pública, a refeição oferecida ao aluno da escola

privada não é a única do dia.

Cantina

O tratamento desse assunto deve merecer especial atenção por parte das escolas, sejam públicas ou

particulares. As cantinas podem ser administradas pela própria escola (autogestão) ou podem ser

terceirizadas. Independentemente dessa condição, cantinas, escolas e autoridades de ensino não podem

negligenciar a qualidade da alimentação oferecida, pois é na escola que as crianças e os adolescentes

passam pelo menos cinco horas por dia e, como já visto, o que eles comem durante esse período pode

não só comprometer o rendimento nas aulas, como também implicar prejuízos ao seu crescimento.

Diante disso, muitas escolas já reformularam suas cantinas com o objetivo de melhorar os hábitos

alimentares dos alunos e, conseqüentemente, aumentar a qualidade de vida, prescindindo da força do

exemplo.

Proibição

A proibição da venda de determinados produtos alimentícios considerados menos saudáveis em cantinas

escolares pode funcionar para chamar a atenção de autoridades públicas, diretores e donos de escolas,

pais ou responsáveis para a quantidade excessiva de gordura, sal e açúcar presentes em algumas

refeições. Outra vantagem dessa conduta é fazer com que administradores de cantinas, que geralmente

não possuem informações adequadas sobre alimentação, não coloquem à disposição das crianças

somente alimentos pouco saudáveis, uma vez que se sentem motiva dos pela facilidade da venda desse

tipo de produto e pela margem de lucro, que é maior.

A discussão da proibição leva a uma reflexão mais profunda sobre os perigos do crescimento da

obesidade, da formação de maus hábitos alimentares e da falta de atividade física. É quase um contra-

senso falar em proibição já que a ciência da nutrição defende a variedade, a proporcionalidade e a

moderação.

Entretanto, o que deve ser feito é selecionar alimentos mais adequados para a venda e orientar, além de

manter hábitos alimentares saudáveis e preparar as refeições da maneira mais adequada.

Prevenção

Atualmente, o excessivo consumo de gorduras, principalmente a saturada, açúcares e sal, originou a

indivíduos com estado nutricional carente que, em conseqüência disso, desenvolvem doenças crônico-

degenerativas entre as quais doenças cardiovasculares, câncer, diabetes, obesidade e outras 4,5.

A evidência que os riscos de sofrer doenças crônicas começam na vida fetal e persistem até a velhice é

cada vez maior 4,5. Desse conjunto de sintomas, a obesidade é hoje um dos mais graves

problemas de saúde pública, manifestando-se cada vez mais precocemente e provocando o incremento

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de problemas metabólicos já na adolescência. Um número importante de patologias está associado à

obesidade: doenças cardiovasculares, diabetes, hipertensão 4,5,6,7,8.

Estudos realizados em algumas cidades brasileiras mostram que o sobrepeso e a obesidade já atingem

30% ou mais das crianças e adolescentes. Em Recife, por exemplo, esse índice chega a 35% dos

escolares avaliados. O trabalho de Leão et al. mostrou uma prevalência de 15,8% de obesidade em 387

escolares de Salvador, sendo que esta foi significativamente maior nas escolas particulares (30%) em

comparação com as públicas (8,2%). Dados semelhantes podem ser verificados em um estudo realizado

por Fisberg et al. na cidade de Santos (SP) com toda a população de escolares da rede pública e privada

(10.821 alunos). Os dados constantes nessa pesquisa dão conta de que, nas crianças de sete a 10 anos

de idade, 15,7% indicavam sobrepeso e 18,0% apresentavam obesidade, com os maiores índices

aparecendo em escolares de instituições privadas 8.

Por todas essas razões, conclui-se que o trabalho de prevenção deve iniciar o mais cedo possível, motivo

pelo qual a escola tornou-se um dos principais agentes promotores da educação nutricional.

A importância da educação nutricional

Se levado em consideração que é na infância que se fixam os hábitos alimentares a serem adotados no

futuro, ficam bastante nítidas a importância e a necessidade dos programas de educação nutricional 9.

A educação nutricional tem o papel de ajudar na adequação das seleções alimentares, promovendo uma

modificação e uma melhora do hábito alimentar em longo prazo. Tal esforço deve envolver todos os que,

de alguma forma, influenciam na escolha alimentar da criança 10. O educador nutricional converte teoria

em prática e ciência em arte, tendo como principal objetivo a independência do educando 10. Não se pode

esquecer que a linguagem e as ações devem ser compatíveis com o público-alvo. Se essa regra básica

não for obedecida, corre-se o risco do trabalho não ser bem-sucedido 10.

O aprendizado deve ser informal e natural. Portanto, o que precisa ficar claro é que a educação

nutricional não se faz apenas na sala de aula. Qualquer oportunidade deve ser utilizada para fornecer

informação nutricional e promover atitudes positivas sobre os alimentos. Alguns exemplos:

• Teatro;

• Aulas;

• Visitas a serviços de alimentação;

• Divulgação de informações;

• Seleção de alimentos adequados para o consumo;

• Palestras para os alunos, pais ou responsáveis, diretores, funcionários da área pedagógica, área

administrativa e operacional etc.

Introdução de alimentos funcionais na alimentação escolar

Os alimentos funcionais, embora ainda não estejam com suas recomendações nutricionais quantitativas

bem estabelecidas, apresentam efeitos benéficos comprovados por vários estudos, de tal modo que já

existem algumas tendências de recomendações quantitativas em curso 11.

Embora as recomendações dos alimentos funcionais necessitem de mais estudos, especialmente em

longo prazo, não há como negar a importância de uma dieta balanceada na prevenção e tratamento de

doenças 11.

Por conta disso, soja, repolho, couve-flor, brócolis, tomate, alho, frutas cítricas, cereais, uvas, chá verde,

laticínios, peixes e óleos de peixe, estão na lista dos chamados nutracêuticos 12. A utilização desses

alimentos na realidade escolar é possível, porém não muito fácil. Vivencia-se uma transição nutricional

caracterizada por mudanças tanto qualitativas quanto quantitativas da dieta.

Hoje a dieta possui maior densidade energética, o que significa mais gordura e mais açúcar, com

diminuição na ingestão de carboidratos complexos, fibras, frutas e hortaliças 4.

Page 4: Alimentação Escolar Um Enfoque em Alimentos Funcionais

Por outro aspecto, não se pode esquecer que os vários hábitos alimentares são adquiridos principalmente

na infância e comumente se estendem pelo resto da vida. A escola oferece às crianças e adolescentes o

alicerce para a edificação de suas vidas. Ao promover o ensino formal, seqüenciado, gradual e

sistematizado e ao dispor de pessoal especializado, a instituição de ensino constitui o campo ideal para

se iniciar e conduzir o estudo sobre alimentação e nutrição 13,14.

A refeição que é oferecida na escola tem um significado muito importante na formação dos hábitos

alimentares dos alunos, pois representa o consumo de alimentos fora do âmbito familiar, prática que, para

a criança, representa uma novidade. Existe uma associação estabelecendo que o que é oferecido na

escola é o correto. Dessa forma, a merenda escolar deve ser de ótima qualidade nutricional.

Sugestão de cardápio:

• Pão de aveia com requeijão

• Fruta (uva);

• Suco de laranja.

• Tomate em gomos;

• Bolo simples;

• Suco de limão.

• Grãos de soja torrado e salgado;

• Fruta (maçã);

• Leite com morango.

• Pão de centeio com queijo;

• Cenoura baby;

• Suco de uva.

• Cereal;

• Fruta (banana);

• Leite com chocolate.

Uso de alimentos funcionais na alimentação escolar: perspectivas para o futuro

Os benefícios que frutas, verduras e grãos podem propiciar ao organismo estão cada vez mais

comprovados por meio de pesquisas. Até pouco tempo atrás, o médico ou o nutricionista sugeria esses

alimentos pensando nas qualidades nutricionais que, em um e em outro, são importantes na prevenção

de muitas doenças carenciais. Por exemplo, frutas e vegetais amarelo-alaranjados têm alta concentração

de caroteno, precursor da vitamina A, importante para a visão e para a pele.

Quem tem deficiência de vitamina C deve consumir frutas cítricas15. O que há de novo hoje é a

descoberta de que os alimentos, além de suas qualidades nutricionais, têm substâncias que ajudam na

prevenção e controle de doenças 15.

A expectativa é de que, assim como está ocorrendo no Japão, Estados Unidos e Europa, o Brasil também

deve entrar com força no mercado de alimentos funcionais graças ao avanço das pesquisas. Os

consumidores confiam cada vez mais nos efeitos saudáveis de certas substâncias contidas nos alimentos

e acreditam que a alimentação é um fator crítico para o controle da saúde. É importante lembrar que na

escola o aluno consome de 15 a 20% da necessidade calórica diária. A escola é o segundo local

socializador para a criança. É nesse contexto que devemos enxergá-la. Ela pode ajudar, por exemplo, na

mudança de hábitos alimentares mediante o desenvolvimento, com os alunos, de temas que tratem dos

alimentos funcionais, e por meio da orientação, para os pais, a respeito da melhor forma de usá-los,

dando-lhes o exemplo do que oferecer para a criança se alimentar.

Diante do exposto, conclui-se que é incontestável a importância da alimentação saudável, completa,

variada e agradável ao paladar para a promoção da saúde, sobretudo dos organismos jovens em fase de

desenvolvimento, e para a prevenção e o controle de doenças crônicas, cuja prevalência vem

aumentando significativamente.

Referências Bibliográficas

Page 5: Alimentação Escolar Um Enfoque em Alimentos Funcionais

(1) Resolução CFN N° 200/1998 CFN de 08/03/98 (D.ºU. 20/04/98) – Dispõe sobre o cumprimento das

normas de definição de atribuições principais e específicas dos nutricionistas, conforme área de atuação.

Disponível em http://www.cfn.org.br. Acesso em 15 de março de 2005.

(2) Cartilha para conselheiros do Programa Nacional de alimentação Escolar (PNAE). Brasília, 2004.

(3) Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Disponível em http://www.fnde.gov.br. Acesso

em: 15 de março de 2005.

(4) Consulta Mixta OMS/FAO de Expertos em Régimen Alimentario, Nutrición y Prevención de

Enfermedades Crónicas. Genebra, 2002. Disponível em: http://www.nutrociencia.com.br. Acesso em: 17

de março de 2005.

(5) Consenso Latino-Americano em Obesidade. São Paulo, 2002.

(6) KAIN, J., VIO, F., ALBALA, C. Obesity Trends and Determinant Factors in Latin America. Cad. Saúde

Pública. vol 19, suppl.1, p.77-86. 2003.

(7) STORY, M. School-based Approaches for Preventing and Treating Obesity. International Journal of

Obesity. vol. 23, suppl. 2, p. 43-51. 1999.

(8) FISBERG, M., OLIVEIRA, C. L. Obesidade na infância e adolescência – uma verdadeira epidemia.

Disponível em: http://www.nutrociencia.com.br. Acesso em:15 de março de 2005.

(9) PHILIPPI ST e col. Alimentação saudável na infância e na adolescência. Curso de atualização em

alimentação e nutrição para professores da rede pública de ensino. Escola Superior de Agricultura Luiz de

Queiroz (Esalq).2000 maio/jun. 31-01.

(10) BOOG, M. C. F. Educação nutricional em serviços públicos de saúde. Cad. Saúde Pública v. 15

supl.2. Rio de Janeiro, 1999.

(11) II Seminário sobre alimentos funcionais. São Paulo, 2004. Disponível em: http://brasil.ilsi.org. Acesso

em: 16 de março de 2005.

(12) HASLER CM. Functional foods: benefits,concerns and challenges - a position paper from the

American Council on Science and Health. J. Nutr. (132) 3772-3781, 2002.

(13) MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO (BRASIL). Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 - Estabelece as

diretrizes e bases da educação nacional.

(14) RAMALHO, R. A., SAUNDERS, C. O papel da educação nutricional no combate às carências

nutricionais. Rev. Nutr. vol.13, no.1, p.11-16. jan./abr. 2000.

(15) SALGADO, J.M. de Brito. Faça do alimento o seu medicamento. São Paulo: Madras, s.d.

Publicado na Revista Nutrição Profissional 1 (Maio/Junho 2005)

Atualizado em Qui, 29 de Julho de 2010 17:11 Lido 2795 vezes Publicado emAlimentação EscolarTag's

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