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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ INSTITUTO DE CIÊNCIAS DAS ARTES FACULDADE DE ARTES VISUAIS Ana Paula Ferreira de Oliveira ABORDAGEM TRIANGULAR NA PRÁTICA DO ARTE-EDUCADOR: APROXIMAÇÕES, DILEMAS E DIFICULDADES NO COTIDIANO DA SALA DE AULA Belém 2009

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Page 1: ABORDAGEM TRIANGULAR NA PRÁTICA DO … FEDERAL DO PARÁ INSTITUTO DE CIÊNCIAS DAS ARTES FACULDADE DE ARTES VISUAIS Ana Paula Ferreira de Oliveira ABORDAGEM TRIANGULAR NA PRÁTICA

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

INSTITUTO DE CIÊNCIAS DAS ARTES FACULDADE DE ARTES VISUAIS

Ana Paula Ferreira de Oliveira

ABORDAGEM TRIANGULAR NA PRÁTICA DO ARTE-EDUCADOR:

APROXIMAÇÕES, DILEMAS E DIFICULDADES NO

COTIDIANO DA SALA DE AULA

Belém 2009

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ INSTITUTO DE CIÊNCIAS DAS ARTES

FACULDADE DE ARTES VISUAIS

Ana Paula Ferreira de Oliveira

ABORDAGEM TRIANGULAR NA PRÁTICA DO ARTE-EDUCADOR:

APROXIMAÇÕES, DILEMAS, E DIFICULDADES NO

COTIDIANO DA SALA DE AULA

Trabalho de conclusão de curso,

apresentado como requisito para obtenção

do grau em Educação Artística habilitação:

Artes Plásticas da Universidade Federal

do Pará, orientado pelo Prof.Dr. Ubiraelcio

da Silva Malheiros

Belém 2009

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ INSTITUTO DE CIÊNCIAS DAS ARTES

FACULDADE DE ARTES VISUAIS

Ana Paula Ferreira de Oliveira

A Abordagem Triangular na prática do Arte-Educador: Aproximações,

Dilemas, e Dificuldades no Cotidiano da Sala de Aula.

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade de Artes Visuais,

como requisito para obtenção do grau de licenciado em Educação Artística com

habilitação em Artes Plásticas, orientado pelo prof.Dr. Ubiraelcio da Silva Malheiros.

Data da Defesa: 25 / 06 / 2009 Conceito: Excelente

Banca Examinadora

Dr. Ubiraelcio da Silva Malheiros

Faculdade de Artes Visuais/UFPA – Orientador

Dr. Roberto Neder Charone

Faculdade de Artes Visuais/UFPA - Membro

Dra. Ana Del Tabor

Faculdade de Artes Visuais/UFPA - Membro

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DEDICATÓRIA:

Dedico este trabalho

aos meus pais,Diva e Antonino;

à minha avó Ester e minha tia Ivone pelo apoio;

à minha mestra Denise, meu exemplo de profissional.

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AGRADECIMENTOS

Foram muitos, os que me ajudaram a concluir este trabalho.

Meus sinceros agradecimentos...

A Deus, pois, sem seu Amor, nada teria sido possível;

...à minha família, pelo apoio incansável;

...aos professores Mauricio, Amélia e Alice pela colaboração;

...à direção e instituições que participaram deste trabalho;

...ao Prof. Dr.Ubiraélcio Malheiros, por aceitar a orientação

deste estudo e conduzir seu

desenvolvimento, com muita paciência e ética.

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“É fundamental diminuir a distância entre o que se diz e o que se faz, de tal forma

que, num dado momento, a tua fala seja a tua prática”.

Paulo Freire

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RESUMO

O presente trabalho enfoca concepções sobre a Proposta Triangular, baseada na

leitura, contextualização e fazer artístico, para o ensino de arte e se é colocada em

prática por três professores de duas instituições de ensino fundamental e médio da

região metropolitana de Belém do Pará: Escola de Aplicação da UFPa e Colégio

Paes de Carvalho, com carga horária, metodologias e recursos diferentes. Teorizada

por Ana Mae Barbosa, (com base na proposta inglesa e norte americana da década

de 60 e sistematizada em 1982), preconiza um ensino de arte fundamentado em três

eixos de ação: o fazer artístico; a leitura (apreciação da obra de arte) e

contextualização da imagem (história da arte). De natureza qualitativa; a pesquisa

analisa dados empíricos obtidos em entrevistas com os professores e comparação

das ementas dos planos de curso utilizados pelas instituições com as metodologias

observadas em sala de aula. Também busca abordar as principais dificuldades

enfrentadas no ensino de Arte e dialogar com os principais teóricos da Arte-

Educação brasileira. Os resultados mostraram professores que possuindo o

conhecimento da Proposta Triangular, desenvolvem práticas diferentes, indo além

do ensino de Artes Visuais, tido como convencional e construindo novas

perspectivas para a educação na área.

Palavras-chave: Proposta Triangular, Arte-Educação, Ensino de Arte.

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SUMÁRIO

RESUMO................................................................................................................... vii

LISTA DE FIGURAS .................................................................................................. ix

INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 10

CAPÍTULO 1 – A Proposta Triangular e Histórico da Arte-Educação Brasileira 12

1.1 A Proposta Triangular ........................................................................................ 12

1.2 Breve Histórico da Arte-Educação Brasileira ...................................................... 12

1.3 As Instituições .................................................................................................... 21

1.3.1 Escola de Aplicação da UFPA .................................................................. 21

1.3.2 A Escola Estadual de Ensino Médio "Paes de Carvalho” ......................... 22

CAPÍTULO 2 – Uma Proposta, Três Metodologias - A Abordagem Triangular no

Cotidiano de três Arte-Educadores ...................................................................... 24

2.1 Uma Proposta .................................................................................................... 24

2.2 O Perfil dos Educadores Entrevistados .............................................................. 24

2.3 Escola Estadual de Ensino Médio “Paes de Carvalho” ...................................... 25

2.4 Pesquisa com a Professora Alice Miranda ...........................................................25

2.5. Escola de Aplicação da UFPa ........................................................................... 36

2.6 Pesquisa com o Professor Maurício Calderaro .................................................. 37

2.7 Pesquisa com a Professora Amélia Guerra ........................................................ 44

2.8 Dificuldades do Ensino de Arte ........................................................................... 54

2.9 Pluralidade Cultural ............................................................................................ 65

CAPÍTULO 3 – DESENVOLVENDO UM ENSINO DE ARTES VISUAIS DE

QUALIDADE ............................................................................................................ 69

CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 79

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................... 80

ANEXOS ................................................................................................................... 83

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Escola de Aplicação da UFPA ................................................................. 21

Figura 2 – Colégio Estadual de Ensino Fundamental e Médio Paes de Carvalho ... 23

Figura 3 – Improvisação teatral ministrada pelo professor Francisco Chagas ......... 29

Figura 4 – Improvisação teatral ministrada pelo professor Francisco Chagas ......... 29

Figura 5 – Palestra sobre a linguagem teatral para turmas do primeiro ano do ensino

médio ....................................................................................................................... 30

Figura 6 – Palestra sobre a linguagem teatral para turmas do primeiro ano do ensino

médio ....................................................................................................................... 30

Figura 7 - Atividade de releitura de obras de Pablo Picasso, em aula ministrada pelo

professor Mauricio Calderaro ................................................................................... 43

Figura 8 - Atividade de releitura de obras de Pablo Picasso, em aula ministrada pelo

professor Mauricio Calderaro ................................................................................... 43

Figura 9 - Atividade de releitura de obras de Pablo Picasso, em aula ministrada pelo

professor Mauricio Calderaro ................................................................................... 44

Figura 10 - Influências de desenhos animados se mostram frequentes entre as

crianças ................................................................................................................... 47

Figura 11 - Influências de desenhos animados se mostram frequentes entre as

crianças ................................................................................................................... 47

Figuras 12- Atividade de estudo da cor através das obras de Van Gogh ................ 53

Figuras 13- Atividade de estudo da cor através das obras de Van Gogh ................ 53

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1. INTRODUÇÃO

Teorizada por Ana Mae Barbosa, A Abordagem Triangular preconiza um

ensino de arte fundamentado em três eixos de ação: o fazer artístico; a leitura

(apreciação da obra de arte) e contextualização da imagem (história da arte).

Foi desenvolvida com base na proposta inglesa e norte americana da

década de 60 e sistematizada em 1982, originárias do estudo de pontos em comum

presentes em escolas com reconhecida qualidade de ensino artístico.

De natureza qualitativa; a pesquisa se baseia em dados obtidos em

entrevistas com professores de Arte e na observação das ações realizadas na sala

de aula. Além disso, questiona como estes educadores vêem a proposta e como

buscam aplicá-la em sua metodologia pedagógica.

O Objetivo Geral desta pesquisa se propõe à investigação das concepções

que os Arte-Educadores possuem sobre a Proposta Triangular, e como ela é

incorporada nos planejamentos de aula no ensino fundamental e médio pelos

professores entrevistados. Como objetivos específicos têm:- Observar a aplicação

da Proposta Triangular na prática de Arte-Educadores, que afirmam basear-se nela

como metodologia em seu trabalho; Indagar sobre as dificuldades e perspectivas do

Arte-Educador encontrados no cotidiano da sala de aula; Comparar as ementas das

instituições para o curso com a prática em sala de aula.

Como estratégia metodológica foi realizada a pesquisa qualitativa baseada

em observação de campo, análise de documentos (através de comparação das

propostas, ementas e objetivos descritos com a metodologia dos educadores

observada em sala de aula) e entrevistas estruturadas, com as questões focadas no

conhecimento da Proposta Triangular e nos objetivos específicos da pesquisa.

O Cronograma se deu no período de março a junho sendo dividido em:

Março-Início do Estágio Curricular Supervisionado e Registro das Atividades; Abril:

continuidade do registro das atividades; Maio: registro das Atividades, entrevistas,

análise dos dados; junho: análise dos dados e finalização da pesquisa.

Assim, essa monografia desenvolveu-se segundo a seguinte ordem:

Capítulo 1 - A Proposta Triangular e Breve Histórico da Arte-Educação

Brasileira apresenta a situação-problema, ou seja, como a Proposta Triangular é

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compreendida por instituições e educadores, e a aplicação adequada ou se está

havendo algum tipo de distorção ou distanciamento dela em suas práticas

pedagógicas. Assim sendo, segue um breve histórico do Ensino de Artes, no Brasil,

e das instituições, onde se deu a pesquisa e a fundamentação teórica para esse

estudo.

Em seguida o Capítulo 2 - Uma Proposta, Três Metodologias-A

Abordagem Triangular no Cotidiano de três Arte-Educadores, abrange a

pesquisa em si, com as entrevistas realizadas com três professores atuantes no

ensino fundamental e médio, e as constatações obtidas na observação de campo

sob observação em sala e análise comparativa com as ementas dos planos de curso

da Escola de Aplicação, para o ensino fundamental e a proposta curricular para o

ensino médio da Secretaria Executiva de Educação.

Finalizando, no Capítulo 3 - Desenvolvendo um Ensino de Artes visuais

de Qualidade, a análise dos resultados obtidos na pesquisa será apresentada

dialogando com os teóricos, que serviram de base para este estudo, além de

apontar algumas das experiências bem sucedidas e dilemas da Arte-Educação que

ainda persistem. Os resultados mostraram acertos, experiências com a abordagem

triangular, e ações que buscam mudar o ensino de Artes transformando o cenário

educacional brasileiro.

Nesse sentido, a monografia procurou dialogar com diversos autores e

pesquisadores da Arte-Educação com Paulo Freire, Maura Penna, Terezinha Rios,

Irene Tourinho, Rejane G. Coutinho, Gadotti e obviamente Ana-Mae Barbosa,

buscando levantar os principais aspectos que envolvem uma correta aplicação da

Proposta Triangular.

Constatou vários pontos positivos, dentro das metodologias dos professores

entrevistados, procurando um ensino de Arte eficiente, mais completo e uma maior

interação com os espaços museológicos e de pesquisa.

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_________________________________________________________________________________

¹ Gadotti,(1998, p. 230).

12

CAPÍTULO 1 - A PROPOSTA TRIANGULAR E HISTÓRICO DA ARTE-

EDUCAÇÃO BRASILEIRA

1.1 A Proposta Triangular

Esta pesquisa não pretende generalizar ou tomar como típico os exemplos

aqui observados, mas antes considerá-los significativos no que se refere a

constatação de uma realidade observada. Nem tem a pretensão de oferecer

respostas definitivas para as questões aqui levantadas, mas sim de dar continuidade

na investigação desses questionamentos, na constante reflexão sobre a condição do

Arte-Educador e contribuir para a pesquisa e debate acadêmico, carente de

professores-pesquisadores mesmo em um centro urbano como Belém do Pará.

Para se falar da Proposta Triangular é relevante rever um breve histórico da

Arte-Educação no Brasil, complementando o apresentado nos Parâmetros

Curriculares Nacionais, página 22 (ver anexos), e das teorias pedagógicas que a

influenciaram até os dias atuais, revendo assim as condições que levaram à

necessidade de uma pesquisa que modificasse o ensino de Artes no país, como a

proposta desenvolvida pela Drª Ana-Mae Barbosa.

1.2 Breve Histórico da Arte-Educação Brasileira

A história da Arte-educação no Brasil é caracterizada por uma crescente

proposta de democratização da educação, não como um processo natural da boa

vontade dos governantes ou competência das autoridades, mas como resultado de

constante militância popular por melhores condições de ensino no país e acesso à

cultura, tanto por parte das elites que podem pagar, quanto de toda a população.

Com o desembarque dos conquistadores portugueses, vieram juntamente os

jesuítas, iniciando assim em território brasileiro suas primeiras atividades

educacionais, de caráter “verbalista”, retórico, repetitivo, que estimulava a

competição através de prêmios e castigos. Era uma educação que reproduzia uma

sociedade dividida entre analfabetos e doutores” ¹.

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___________________________________________________________________________ ² O grupo, que viria a ser chamado Colônia Lebreton, revolucionaria as artes na corte tropical do Rio de Janeiro. A Missão chegou em um momento em que o Brasil, procurava se atualizar e reorganizar depois da imprevista transferência da Família Real portuguesa e beneficiou-se do clima favorável propiciado pelo estabelecimento de acordos comerciais entre França e Brasil em 1815, e do desejo da coroa de desenvolver as Artes e Ofícios na América.Integravam o grupo Joachim Lebreton (1760-1819), o líder do grupo; Jean Baptiste Debret (1768-1848), pintor histórico; Nicolas-Antoine Taunay (1755-1830), pintor de paisagens e de batalhas; Auguste Henri Victor Grandjean de Montigny (1776-1850), arquiteto; Jean Baptiste Leve, ferreiro; Nicolas Magliori Enout, serralheiro; Pelite, peleteiro; Fabre, peleteiro; Charles-Simon Pradier (1783-1847), gravador; François Ovide, mecânico; Louis Jean Roy, carpinteiro; Hypolite Roy, carpinteiro; Charles de Lavasseur, arquiteto; Louis Ueier, arquiteto; François Bonrepos, escultor; Félix Taunay (1795-1881), filho de Nicolas-Antoine, Auguste Marie Taunay (1768-1824), escultor; Marc Ferrez (1788-1850), escultor (tio do fotógrafo Marc Ferrez); Zéphyrin Ferrez (1797-1851), gravador de medalhas.

13

A Academia Imperial de Belas-Artes, criada em 1816 com a Missão Artística

Francesa² convocada por D. João VI e o Conservatório de Música do Rio de Janeiro,

fundado em 1847, foram as primeiras escolas, onde o ensino de Arte estabeleceu-se

no país, assim como a Faculdade de Direito, Faculdade de Medicina e Escola Militar,

sendo que o Brasil, antes como colônia sem direito ao Ensino superior, de repente

se viu com uma estrutura de ensino de Artes melhor do que Portugal.

Estrutura criada para atender à demanda das elites, estabelecida nos

centros culturais e políticos do Império. Essas escolas de Arte possuíam caráter

técnico, visando formar aqueles que pudessem proporcionar o entretenimento que

esse público restrito exigia.

Na década de 1920, começou a se desenhar as primeiras linhas do que viria

a se difundir como Escola Nova, que pregava na década seguinte, com a crescente

industrialização e urbanização, a fundamentação do ato pedagógico à ação.

Na segunda metade do século XX, a Escola Nova veio a ser criticada como

uma educação voltada para preparar a conduta e mentalidade das crianças. no

sentido de reproduzirem a sociedade ao invés de transformá-la, onde sua

capacitação serviria para atender as necessidades da burguesia, incentivando a

competição, produção e atividade prática. Não foi uma teoria nociva em si, dando

abertura para o que se seguiu: Trouxe importantes contribuições ao cenário

educacional brasileiro.

Com a Era Getúlio Vargas e continuidade do crescimento urbano e

industrial, começou-se a rever a necessidade de formação de mão de obra

qualificada para esse novo modelo socioeconômico, antes baseado em um modelo

agro-exportador, de produção de produtos primários, que não necessitava de

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amplas exigências de escolaridade e reprodução de força de trabalho qualificada

entre a população.

É então criado o Ministério da Educação e Saúde Pública, em 1930, visando

à estruturação do sistema de ensino para atender a nova demanda e cenário

nacional.

A Lei 5692, de 1971, que pretendeu, através da chamada “Educação

Artística” como componente curricular obrigatório, colocar a arte em todas as

escolas de 1º e 2º graus do país, particulares e públicas, urbanas e rurais, mas não

estabeleceu que seria em todas as séries, ocasionando assim, uma falta de

continuidade do ensino de Artes ao longo da vida escolar do aluno.

No Estado Novo, a política educacional diferenciava os cursos de nível

médio. Os cursos técnicos não davam acesso à universidade, ocasionando chances

desiguais para as diferentes camadas sociais, pois não garantiam credenciais para

se concorrer no vestibular.

Temas como diversidade cultural, diferenças étnicas e de gênero começam

a ganhar espaço no pensamento pedagógico brasileiro e internacional a partir dos

anos 90, gerando discussões sobre a integração dessas temáticas, buscando um

consenso nas diferentes disciplinas e que aspectos a serem trabalhados

regionalmente.

A Lei de Diretrizes e Bases (LDB) de 1961 (Lei 4024), que estabeleceu o

ensino básico em apenas quatro anos, não se pronunciando quanto à garantia da

gratuidade e a Lei 5692/71 estendendo o ensino básico para oito anos, sendo o

Estado comprometido com o caráter público e gratuito do ensino, foram inícios de

transformações mais objetivas, frutos de reivindicações, debates e militância, mas

ainda incompletas.

Apesar de um maior acesso da população à escola, a elitização da

educação continua por outras vias muito mais perversas.

A expansão da rede escolar, das oportunidades físicas de escolarização, não corresponde, na prática, a um aumento das oportunidades pedagógicas de escolarização, o resultado da escolarização tem sido absolutamente insuficiente e insatisfatório. (CUNHA, 1985, p.57-58).

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Sem uma base adequada do aluno, o acesso aos próximos níveis

educacionais vai se afunilando, devido à precariedade dos saberes básicos

necessários para novos aprendizados, tornando cada vez mais difícil a permanência

do aluno na escola, sendo um dos principias motivos de desistência e um dos

fatores dos altos índices de evasão escolar.

A Proposta Triangular foi idealizada e divulgada pela Dra. Ana-Mae Barbosa

com base no projeto Discipline Based Art Education (DBAE), desenvolvido pela

Getty Foundation. Esta proposta pedagógica nos Estados Unidos enfoca quatro

áreas: a história da arte, a estética, a crítica artística e a produção artística,

buscando “resgatar conteúdos que vinham desaparecendo ou sendo mal

encaminhados dentro das escolas”. (Marinho.pg 47)

O DBAE por sua vez teve suas origens nas Escuelas al Aire Libre criadas no

México como fruto do Movimento Muralista Mexicano por volta de 1910, (segundo

Ana-Mae teria na verdade originado o Movimento Muralista) com seus objetivos

engajados em valores sócio-políticos de resgate e valorização da cultura nacional,

sobretudo através do ensino da arte e expressão artística, utilizando como padrões

estéticos as obras de artistas mexicanos em sobreposição aos modelos norte-

americanos e europeus, ainda hoje mais utilizados do que a criação local dos

diversos países latino-americanos.

O Basic Design Movement, surgido nos anos 50, na Inglaterra, foi outra

influência do DBAE e conseqüentemente da Proposta Triangular.

Em sua estruturação em 1965, o DBAE sofreu muitas críticas e acusado de

conservadorismo e um possível retorno ao academicismo, por estabelecer pontos

em comum presente nas metodologias aplicadas nas escolas em experiência e

afirmar serem estes eixos essenciais em qualquer metodologia de Arte-Educação, e

que sem eles não poderia haver um ensino de qualidade.

Estabelecer esses pontos não significa necessariamente rigidez ou

conservadorismo. A resistência a uma proposta de organização do ensino de artes

poderia evidenciar o estranhamento diante de “regras” para se lecionar uma

disciplina considerada de “livre-expressão da alma”.

Não estariam na verdade protestando contra a idéia de que Arte é, sim,

ensinada e que possui seu próprio conteúdo, e não intuitiva ou fruto de “dom”? Uma

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nova proposta de que a Arte possuía sua própria metodologia e conteúdos a serem

trabalhados, exigiram essa quebra de paradigma, e toda quebra de um modelo

estabelecido de pensamento provoca resistências.

Como sistema epistemológico, a Proposta Triangular foi, durante os anos de

1987 a 1993, realmente testada e sistematizada no MAC-Museu de Arte

Contemporânea da Universidade de São Paulo, USP, através de leitura de obras

originais.

Na rede de ensino começou a ser experimentada nas escolas municipais de

1989 a 1992, sendo difundida na rede de ensino de paulista. Por meio de

reproduções e originais nas vistas ao MAC, os alunos puderam ser colocados em

contato com a nova abordagem.

Experimentações com vídeo vieram a ser realizadas em 1989, através de

pesquisa financiada pela Fundação IOCHPE, na época coordenada por Analice

Pillar e Denyse Vieira, em Escolas particulares e públicas de Porto Alegre.

As experimentações se deram com o auxílio de classes controle, tanto na

rede pública quanto privada. Foi usado nessas classes apenas o fazer artístico, sem

o eixo da leitura da obra ou conteúdo histórico. As turmas submetidas à abordagem

triangular obtiveram melhor desenvolvimento e rendimento, com mais desenvoltura

no falar de arte e criação artística.

Desde então, a autora Ana-Mae vem buscando difundir, capacitar e estudar

as experiências desenvolvidas em diversas regiões do Brasil. Seus estudos

procuram avaliar os erros, acertos e resultados que diversos Arte-Educadores vêm

obtendo em suas metodologias utilizando a Proposta Triangular.

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O erro mais grave é o de restringir o fazer artístico, parte integrante da triangulação, à releitura de obras. Outro é pensar que há uma hierarquia de atividades, isto é, primeiro a leitura da obra de arte, depois a contextualização e finalmente o fazer, a criação. Esta não é uma interpretação correta. Já testemunhei ou li relatos de trabalhos realizados nas mais diferentes regiões do Brasil, como Rondonópolis,Vitória,Recife,Caruaru e Palmeira dos Ìndios, que começavam com o fazer e só então, a partir da semelhança formal ou conteudística com a obra da criança, o professor escolhia a obra do/da artista a ser analisada ou apreciada, como dizem os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). Em outros casos, como vi em Feira de Santana, Blumenau e Jacareí, os professores podem começar analisando um contexto social e histórico para depois escolher as obras e objetos a serem decodificados a partir das pistas dadas pelo contexto. E nem sempre, felizmente, um professor inventivo usa a mesma seqüência dos componentes em diferentes aulas, com o mesmo grupo de alunos. (BARBOSA, 1998, p.39).

Os Parâmetros Curriculares Nacionais buscam definir a adequação do

ensino de Artes, embora de forma muito generalista, deixando ainda indefinido o que

seria esperado de cada linguagem em sua especificidade, ou soluções para a

implantação do ensino adequado dessas linguagens na escola.

Em relação aos Parâmetros Curriculares Nacionais para o ensino fundamental, a proposta para Arte no ensino médio é bem mais sucinta e menos detalhada: não há, por exemplo, uma proposta específica para cada linguagem artística. Na edição em volume único (e formato grande) dos PCNEM, o trecho relativo a Arte resume-se a 11 páginas de texto – entremeadas por algumas com ilustrações. Mas vale salientar que, comparativamente, a maioria das propostas para disciplinas específicas consta de 7 a 9 páginas de texto. (PENNA, 2003, p.18).

As instituições escolares levam em consideração, na hora de adotar uma

das linguagens artísticas no currículo, primeiramente o fator custo-benefício, pois se

torna dispendioso contratar diferentes professores para cada uma das linguagens.

Onde não há fiscalização, acabam por adotar a aproximação perigosa de

professores de outras disciplinas, como matemática e literatura, para complementar

o ensino, desvirtuado do contexto inicialmente proposto. A formação do professor de

Arte fica também indefinida, há apenas uma indicação de formação em cursos

específicos.

Com o trabalho de divulgação principalmente por parte da autora Ana-Mae,

A Proposta Triangular ficou conhecida na década de 80, e tornou-se a nova

referência pedagógica para a educação em Arte, baseada na história, crítica e

produção estética (ler-fazer-contextualizar).

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(...) Contextualizar a obra estudada, situando-a enquanto produto de uma época. Faz-se importante observar como épocas posteriores têm com ela se relacionado, inclusive levando em consideração a interpretação que os próprios alunos fazem dessa obra. (...) Leitura da obra de arte, feita pela análise estética e crítica da produção artística, situada historicamente, proporcionando ao aluno a sua apreciação e compreensão - tanto do ponto de vista dos elementos da linguagem quanto do ponto de vista temático/filosófico. (...) fazer artístico resultando de uma ação consciente, que pode se dar através de releituras das obras estudadas ou de outras formas de criação, a partir da vivência e da leitura crítica da realidade. Este fazer, então, fundamenta-se tanto no conhecimento técnico e estético, quanto no conhecimento histórico. (MARINHO, 1994. p.55-56).

O devido cuidado deve ser tomado, para que a contextualização se dê

juntamente com a compreensão de que essas obras não estão distantes do

cotidiano dos alunos, no tempo e espaço. Que muitas vezes estão presentes no dia

a dia, influenciando vestuário, publicidade, design, arquitetura, mídias até mesmo

comportamento. A idéia generalizada de que a história é linear, e não apenas

organizada dessa forma para melhor entendimento dela, poderia ser bem

esclarecida e trabalhada pelos educadores que se propõem a utilizar o eixo de

contextualização em suas metodologias.

A leitura de obra compromete o devido domínio de simbologias e signos

universais para uma compreensão efetiva, aliado a apreensão de significados

culturais e temáticos contextualizados. O fazer sem o pensar é técnica, o pensar

sem o fazer é apenas filosofia: O fazer artístico sem a contextualização e a reflexão

estética não ultrapassa a repetição mecânica de técnica e exercício da

materialidade. Segundo os PCN´s a proposta elaborada é colocada como se segue:

Realizar produções artísticas, individuais e/ou coletivas, nas linguagens da arte (música, artes visuais, dança, teatro, artes audiovisuais) analisando, refletindo e compreendendo os diferentes processos produtivos, com seus diferentes instrumentos de ordem material e ideal, como manifestações socioculturais e históricas. (PCNEM, p.174). Apreciar produtos de arte, em suas várias linguagens, desenvolvendo tanto a fruição quanto a análise estética, conhecendo, analisando, refletindo e compreendendo critérios culturalmente construídos e embasados em conhecimentos afins, de caráter filosófico, histórico, sociológico, antropológico, psicológico, semiótico, científico e tecnológico, dentre outros. (PCNEM, p. 177).

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Analisar, refletir, respeitar e preservar as diversas manifestações da arte – em suas múltiplas linguagens – utilizadas por diferentes grupos sociais e étnicos, interagindo com o patrimônio nacional e internacional, que se deve conhecer e compreender em sua dimensão sócio histórico. (PCNEM, p. 179).

Ainda não sendo o ideal, pois muita discussão ainda precisa ser feita em

cima desses parâmetros, para que sejam definidas as especificidades para cada

linguagem e seu ensino nas escolas, deve ser encarado como ponto de partida para

a elaboração de parâmetros realmente condizentes com um Ensino em Artes

eficiente, para que exista a possibilidade de efetivação da quarta proposta: “Valorizar

o trabalho dos profissionais e técnicos das linguagens artísticas, dos profissionais da

crítica, da divulgação e circulação dos produtos de arte”.(PCNEM, p.179).

Apesar do discurso de que os PCNs foram organizados de acordo com “uma

ampla e democrática discussão de âmbito nacional”, na verdade um número ínfimo

de técnicos estiveram envolvidos, em comparação com um universo de um milhão e

meio e docentes, autores e pesquisadores pedagógicos. Após dois anos de sua

elaboração, o documento ainda era desconhecido da maioria dos professores, pois

não foi dada continuidade na divulgação do documento após sua elaboração.

A visão da atividade pedagógica no meio acadêmico é embalada por textos

de vários autores, que buscam esclarecer e mostrar o caminho a ser percorrido, não

devem ser desprezados, pelo contrário, mas na prática pouco pode fazer por nós,

quando a realidade da sala de aula se apresenta e nos desafia ,não nos mostramos

dispostos a criar as circunstâncias favoráveis que nos faltam.

Os desafios são inúmeros no cenário da educação brasileira, e ainda mais

na disciplina de arte que um pouco mais tardiamente tem conquistado suas vitórias,

se comparada a outras mais valorizadas pela suposta “hierarquia de saberes”

difundida histórica e culturalmente, como Matemática ou Literatura. Vitórias sempre

efetuadas através de militância constante e incansável por parte de poucos.

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3 Marcus Raskin, crítico social, filósofo e ativista político norte-americano

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Desafios são necessários para que haja evolução, e somente verdadeiros

educadores éticos e profissionais comprometidos com sua atividade, poderão fazer a

diferença. Segundo Apple (1995, p.41):

As teorias, diretrizes e práticas envolvidas na educação não são técnicas. São intrinsecamente éticas e políticas e em última analise envolvem escolhas profundamente pessoais em relação ao que Marcus Raskin3 denomina o bem comum. O ensino escolar é complexo e dinâmico e as questões sobre arte não se abstêm dessas condições.

Há novos obstáculos a serem derrubados na educação de hoje, diferentes e

além dos já existentes na época de Paulo Freire ou Ana Mae Barbosa, que precisam

ser confrontados por novos pesquisadores que vivam essas realidades. A Arte deve

ser encarada como um campo do conhecimento humano como qualquer outro, com

suas próprias finalidades, habilidades específicas e conceitos, necessitando de seu

próprio espaço.

Há 98 Licenciaturas em Artes no país, mas apenas cinco cursos de pós-

graduação com linha específica de Pesquisa em Arte-Educação: USP, UFRG,

Universidade de Goiânia, UFMG e Universidade Federal de Santa Maria, muito

longe de atender a demanda. O professor-pesquisador precisa deixar de ser

exceção à regra, para se tornar uma realidade desde a universidade.

A pesquisa e a construção do conhecimento é um valor tanto para o educador quanto para o educando, rompendo com a relação sujeito/objeto do ensino tradicional. Este processo poderá ser desafiador. Delimitar o ponto de partida e o ponto de chegada será resultante da experimentação. Dessa forma, o ensino da arte estará intimamente ligado ao interesse de quem aprende. (FREIRE, 2009).

Como campo de pesquisa para este trabalho, as observações, entrevistas e

análises comparativas da prática pedagógica e das ementas de plano de curso,

ocorreram principalmente na Escola de Aplicação da UFPa e no Colégio Estadual de

Ensino Médio “Paes de Carvalho”, instituições da região metropolitana de Belém.

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Desenvolveu-se no período de março a junho de 2009, com três professores

de arte com metodologias e recursos distintos: Mauricio Calderaro, Alice Miranda e

Amélia Guerra.

As experiências observadas em campo com os professores dialogam com

os estudos dos autores abordados nesta monografia e propostas curriculares do

ensino fundamental e médio, em que a sala de aula adquire dinamismo e atribui vida

às teorias pedagógicas vistas na academia, continuando através da discussão das

metodologias, planos de curso, acertos e dificuldades encontradas pelos educadores

na rede de ensino.

1.3 As Instituições

1.3.1 Escola de Aplicação da UFPA

Em 07 de março de 1963, foi fundada a Escola Primária da Universidade

Federal do Pará, na gestão do magnífico Reitor José Rodrigues da Silveira Neto,

com função de oferecer escolaridade aos filhos de funcionários da UFPA, em idade

escolar. Em 1964, foi criado o Colégio Universitário visando atender aos alunos que

alcançavam o nível que na época era denominado de ginasial (fundamental e

médio). Em 1975, foi implantado o núcleo pedagógico integrado (NPI) do centro de

educação, que absorveu a escola primária e o colégio universitário, acrescentando a

finalidade de servir como campo de estágio para alunos de licenciatura da UFPA.

Figura 1 - Escola de Aplicação da UFPA

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Em 2008, o núcleo pedagógico integrado passou a ser denominado em seu

regimento como Escola de Aplicação reforçando sua configuração como campo de

experimentação pedagógica privilegiada da UFPA.

A Escola de Aplicação da UFPA (EA/UFPA), de acordo com o estatuto da

UFPA (2006), é uma unidade acadêmica especial: órgão de ensino, que também

realiza atividades de pesquisa e extensão, e cuja natureza é a de experimentação

estágio e complemento da formação. Com estrutura administrativa própria,

desenvolve Educação Básica e configura-se como campo de Estágio, voltado para

experimentação pedagógica.

A Coordenação de Estágios da EA/UFPA (CEEA) é o setor responsável pelo

recebimento e acompanhamento dos estágios na Escola de Aplicação. Possui

ensino de Artes em todas as séries do Ensino Fundamental, sendo o fator principal

para a escolha desta instituição como campo de pesquisa desta monografia. O

ensino de Arte no nível médio ainda está em projeto, devendo ser implantado no

próximo ano, juntamente com o ensino de Música.

1. 3.2 A Escola Estadual de Ensino Médio "Paes de Carvalho”

Situada na Praça Saldanha Marinho Nº10, bairro do Comércio, a Escola

Estadual de Ensino Médio "Paes de Carvalho" é uma instituição pública de renome

e respeito nacional. Na república tomou nome de "Paes de Carvalho", substituído

por "Ginásio Paraense" depois da revolução de 1930, para mais tarde se transformar

em Colégio Estadual, em cumprimento à lei federal que transformou os ginásios em

colégios. Fundado pelo então presidente da província do Pará: Bernardo de Souza

Franco, no dia 28 de Julho de 1841, com denominação de Liceu Paraense, sendo

hoje o prédio tombado como patrimônio histórico. Isso dificulta alterações no prédio,

como ampliação do auditório ou salas adequadas para laboratórios de Arte.

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Figura 2 - A Escola Estadual de Ensino Médio "Paes de Carvalho”

É hoje a instituição pública de ensino mais antiga ainda em funcionamento

no Brasil e a mais tradicional do Estado do Pará, com 168 anos de história. Situa-se

nas proximidades do Complexo de Museus da cidade, ou Sistema Integrado de

Museus (SIM) que inclui a Casa das Onze Janelas, com acervos permanentes de

arte contemporânea, o Museu de Arte Sacra da Igreja de Santo Alexandre, O Museu

do Estado e o Museu de Arte de Belém-MABE, dentre outros pontos de exposição e

divulgação artística.

O ensino de Artes na instituição se dá apenas no primeiro ano do ensino

Médio. O colégio é conhecido por ter tido muitos alunos que atuam ou atuaram nos

cenários políticos, acadêmico, profissional e empresarial do Brasil, como por

exemplo, alguns dos governadores do Estado do Pará: Jarbas Passarinho, Simão

Jatene, Alacid Nunes e José Malcher; jornalistas e escritores como Dalcídio Jurandir

e ministros como Jader Barbalho e Visconde de Souza Franco. Foi escolhido para

esta pesquisa como campo de observação do ensino de Arte, o primeiro ano do

ensino médio, por sua estrutura tradicional de ensino.

A atual diretoria é constituída por Maria do Socorro Teles Maciel e Edna

Maria G. Dias (vice-diretora), Possui 1.841 alunos, segundo os dados de 2009,

divididos em turnos da Manhã em 24 turmas; Tarde: 20 turmas e Noite, apenas 6

turmas.

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Capítulo 2 - Uma Proposta, Três Metodologias - A Abordagem

Triangular no Cotidiano de três Arte-Educadores

2.1 A proposta

Neste capitulo será abordado como cada Arte-Educador compreende e

desenvolve seu conteúdo de acordo ou não com os Parâmetros Curriculares

Nacionais e a Proposta Triangular.

Algumas instituições apresentam ao educador o Plano de Curso, (ver

anexos) em cima do qual o profissional pode planejar suas aulas, como é o caso da

Escola de Aplicação, mas na maioria da rede de ensino, cada educador é livre para

definir o que achar mais adequado para ser desenvolvido.

Dependendo da origem escolar, pode ser a primeira vez que os alunos

tomam contato com o conteúdo de Artes, e talvez a última em seu histórico, visto

que nem sempre é dada uma progressão ao ensino de arte ao longo da educação

básica em outras instituições.

2.2 O Perfil dos Educadores Entrevistados

Todos os professores entrevistados possuem formação acadêmica, sendo

devidamente licenciados para o ensino em Artes Visuais, mas isso se deve a

exigência das instituições pesquisadas que são mais rigorosas nessa seleção.

Tiveram contato com a Proposta Triangular ainda na formação acadêmica e

através de cursos de capacitação dentro da Abordagem.

As questões colocadas aos professores buscaram expor a visão que eles

possuem referentes à Proposta Triangular, e suas perspectivas quanto à própria

atividade e a rede de ensino.

O roteiro de entrevista (ver anexos) objetivou avaliar se os educadores

possuem conhecimento da Abordagem Triangular, onde tiveram contato com ela

pela primeira vez, tempo de atuação como educadores e dificuldades na atuação

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profissional e na aplicação da triangulação das ações em sua metodologia

pedagógica.

2.3 Escola Estadual de Ensino Médio “Paes de Carvalho”

A pesquisa se deu em turmas do primeiro ano do ensino médio da

professora Alice Miranda, no período de 03 de março a 20 de junho de 2009,

período da tarde, com 48 alunos em média cada turma. Atua na instituição a menos

de um ano.

Nesta instituição a disciplina é ministrada uma vez por semana, com 45

minutos de aula. Segundo a educadora, tempo suficiente para uma boa aula, mas

sente que a carga horária semanal deveria ser maior. Cada turma tem contato com a

disciplina apenas uma vez semanalmente, enquanto Matemática e língua

portuguesa são vistas de duas a três vezes por semana e possuem mais de um

professor.

2.4 Pesquisa com a professora Alice Miranda

A disciplina Artes é ministrada apenas no 1º ano do ensino médio nesta

instituição, e não possui livro didático (prometido para 2010 pelo MEC), tendo a

educadora que recorrer a outros livros que julgarem mais adequados a suas

metodologias.

A Proposta Curricular para o Ensino Médio (ver anexos), organizada pela

Secretaria Executiva de Educação é uma das principais referências para o

planejamento da educadora.

Mesmo que houvesse um livro didático, dificilmente ele abarcaria todas as

particularidades de cada região brasileira. Sendo conhecidas as dificuldades que se

tem ao formular livros que atendam à disciplina de geografia do Brasil, por exemplo,

sem dúvida haveria a necessidade da elaboração de diferentes materiais para

atender aos professores de Arte, que também lidam com uma multifacetada herança

cultural presente na realidade brasileira.

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Esse tipo de material padronizado não é capaz, certamente, de contemplar as particularidades de cada situação pedagógica, nem as vivências culturais e artísticas de turmas específicas. No entanto, também não adianta deixar o professor sem bases e perdido. Cabe, então, tanto investir na produção de diferentes materiais didáticos que possam embasar a atuação do professor de Arte, quanto na sua própria formação, de maneira que ele possa se relacionar com tais materiais de modo crítico, sendo capaz de utilizá-los através de uma reapropriação pessoal e consciente, de acordo com as exigências de cada situação escolar concreta. (PENNA, 2003, p.36).

Neste contexto o professor acaba sendo o responsável pelo conteúdo

ministrado, não havendo uma linha geral para guiar a metodologia como um todo.

Insere o que achar mais adequado e exclui o que entender desnecessário ou mais

difícil de ministrar, ou ainda tudo aquilo que não encontrar condições de aplicar em

sua aula, segundo as condições.

A educadora pesquisada busca utilizar livros voltados para o professor,

associando o conteúdo com pesquisas na internet e contato com artistas plásticos e

educadores de outras linguagens artísticas.

Em entrevista (ver anexos), a professora Alice relatou que sua decisão de

atuar como educadora, só chegou após superar o temor que tinha em relação ao

cenário educacional:

(...) Isso por conta até de um receio que eu tinha de me envolver de forma mais afetiva com os alunos, porque eu sei que além das dificuldades da educação, eles têm uma carência afetiva muito grande, então de certa forma isso contribui para que eles tenham uma dificuldade maior. Isso é muito fácil de observar no contato que a gente vai tendo com eles. Estou aprendendo a lidar com isso sem deixar de virar as costas pra essa situação, porque eu acho que é necessário que o professor tenha um desenvolvimento, não só ao nível de educação, mas até em nível de ser humano, de estar interagindo com eles. Não só ser o que manda o que sabe mais. É preciso que o professor fique ao nível do aluno no sentido de estar entendendo, compreendendo essas situações, porque elas também interferem na educação. ( 2009).

Sobre essa questão, Paulo Freire discute no livro Pedagogia da Autonomia

quanto ao adequado senso de afetividade ao aluno e ao oficio de educador:

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E o que dizer, mas, sobretudo o que esperar de mim, se, como professor não me acho tomado por este outro saber, o de que preciso estar aberto ao gosto de querer bem, às vezes, aos educandos e a própria prática educativa de que participo. Esta abertura ao querer bem não significa que por que professor me obrigo a querer bem a todos os alunos de maneira igual. Significa de fato que a afetividade não me assusta, que não tenho medo de expressá-la, significa esta abertura ao querer bem a maneira que tenho de selar meu compromisso como os educandos, numa prática específica do ser humano. (1996, p. 52)

A Instituição não possui outros professores de Arte, sendo que a educadora

é a responsável por todas as turmas do 1º ano, (nove, distribuídas entre manhã e

tarde), enquadrando-se nos dados do Censo Escolar do Instituto Nacional de

Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira:

No ensino fundamental, aparecem diferenças entre os professores de anos iniciais e os dos anos finais. Cerca de 70% dos professores dos anos iniciais atuam em apenas uma turma e são multidisciplinares (73%), enquanto 43% dos professores dos anos finais atuam em mais de cinco turmas, porém com uma única disciplina (60%). Já no ensino médio, os professores são especialistas de disciplina: 74,4% ministram apenas uma disciplina e 18,7% ministram duas. Em relação ao número de turmas, verifica-se uma ampla distribuição: 50,2% atuam em uma a quatro turmas. 32,4% atuam em cinco a oito turmas e 17,4% atuam em mais de nove turmas. (INEP, 2008).

Os tópicos do plano de curso desenvolvidos pela educadora (ver anexos)

com base na Proposta Curricular para o Ensino Médio (1999) foram divididos em:

Fevereiro e Março: O que é Arte?-Definição. Dentro deste tópico a

professora começou buscando quais as idéias dos alunos sobre que é a Arte, quais

os (pré) conceitos que eles tinham a respeito e de onde eles adquiriram essas

informações, idéias, conceitos limitadores ou superficiais sobre o assunto.

Dependendo das respostas, ela buscou mostrar aos alunos que a arte está presente

no cotidiano de todos, dando diversos exemplos do dia a dia, como a música,

estampas das roupas, quadrinhos, comerciais de TV, revistas, objetos, design de

jóias, etc. Imagens em cartão com obras contemporâneas e revistas foram

distribuídas e cada aluno procurou dar sua definição do que via.

Alguns expressaram surpresa durante a aula, com a variedade de atividades

ligadas à Arte, pois o conceito que absorveram ao longo de idéias propagadas no

dia a dia e no processo educacional, foi de que a disciplina sempre serviu apenas

para a “recreação e relaxamento“ nos primeiros anos de escola, ou absorvem a

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imagem da Arte sendo exercida apenas por “pessoas excêntricas que expõem

trabalhos estranhos” em mostras de galerias e museus em que nunca visitaram. Em

A Arte no dia a dia, segunda aula, os educandos apresentaram mais exemplos de

onde a arte pode ter influência no cotidiano. A educadora expôs imagens de

campanhas publicitárias e divulgação de produtos e marcas veiculados em revistas,

TV e outdoors e buscou uma introdução à discussão sobre a influência das Artes

Visuais no consumo da sociedade. Procurou criar um debate sobre essa “cultura de

consumo” entre a turma, dialogando com as influências vistas no próprio vestuário,

material escolar, imagens de propaganda do Shopping e “tribos” de preferência dos

jovens.

Em Linguagens da Arte, após a explanação, os alunos foram novamente

questionados sobre mais exemplos de onde a arte pode ser aplicada, e novas

respostas surgiram bem mais diversificadas do que as tímidas tentativas nas aulas

anteriores.

Campos de atuação dos profissionais de arte também foram discutidos em

sala, e uma lista surgiu a partir do que os alunos puderam exemplificar além do que

a professora expôs. Os alunos puderam exemplificar o que entendiam por

linguagens artísticas, seus próprios conceitos a respeito. Nas respostas a principio

demonstraram confundir termos e trocar as questões.

Na primeira semana de abril, a programação era de que as turmas

recebessem a visita de professores convidados pela educadora, para falarem a

respeito de suas respectivas linguagens artísticas de atuação, como: dança, teatro e

cinema, seguindo o tópico sobre “Funções da Arte”, do planejamento de curso. No

dia 03 de abril, o professor e diretor teatral Francisco Chagas Franco falou sobre a

história do teatro, desde suas origens gregas até o teatro contemporâneo.

Obviamente de forma muito reduzida devido ao tempo limitado.

Expôs a situação do teatro no cenário paraense e sobre os campos de

atuação dos profissionais de diversas áreas artísticas dentro da linguagem teatral,

como maquiagem, sonoplastia, figurino, iluminação, cenografia e inúmeros outros.

Ao final, dois alunos puderam participar de uma pequena performance, muito

divertida e simples, mostrando aos alunos que o teatro pode ser realizado com

recursos básicos: o ator e o público.

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Figura 3 - Improvisação teatral ministrada pelo professor Francisco Chagas

Figura 4 - Improvisação teatral ministrada pelo professor Francisco Chagas

Três turmas foram reunidas em uma mesma sala, para que todas pudessem

ouvir todos os palestrantes nos respectivos dias programados. A proposta inicial era

de que seriam três linguagens a serem debatidas, mas somente o teatro foi possível

ser exposto no dia programado, devido a mudanças de última hora nas datas das

provas, e a não disponibilidade dos outros palestrantes em dias alternativos.

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Figura 5 - Palestra sobre a linguagem teatral para turmas do primeiro ano do Ensino Médio

Figura 6 - Palestra sobre a linguagem teatral para turmas do primeiro ano do ensino médio

Em Elementos da Linguagem Visual-Composição, o tema foi trabalhado

com o auxílio de imagens em cartão, provenientes de exposições visitadas pela

professora, e exemplificação no quadro. As imagens por serem muito pequenas,

eram passadas de mão em mão entre os quarenta alunos, que não podiam observar

com maior atenção. Alguns materiais como o ArteBR de autoria do projeto Arte na

Escola, é um kit que conta com imagens fixas em dimensões A4 e de distribuição

gratuita para Arte-Educadores, mas pouco divulgado e as vezes de difícil acesso

pelas poucas unidades produzidas. Facilita muito esse tipo de atividade, mas na

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maioria dos casos os professores precisam recorrer ao que está disponível e

improvisar.

Uma estratégia que a educadora revelou usar sempre foi a de utilizar o

quadro o mínimo possível, sempre buscando ditar o conteúdo ministrado, obrigando

os alunos a ficarem atentos e anotarem tudo dentro de um tempo mínimo, não se

dispersando ou demorando demais escrevendo.

Eles costumavam pedir “as apostilas” o tempo todo sobre tudo, revelando o

hábito de estudarem somente na véspera das provas, e limitando-se apenas ao

conteúdo dos textos, ou retirando a “cola” para as provas desse material,

memorizando-os mecanicamente.

É visível nas provas esse hábito, pois eles costumam trocar os termos, como

“textura simétrica” ou “composição lisa”. Não buscam refletir sobre a questão dada,

mesmo que parte da resposta esteja implícita em outras perguntas ou na imagem. O

hábito de “decorar” palavras mortas e respostas para perguntas estáticas e sem

significado para o aluno, ainda é a norma que direciona os “estudos” do aluno

brasileiro. Afirma à educadora.

Sobre as dificuldades dos alunos, afirma ainda “O desinteresse e apatia são

considerados uma coisa normal da idade” por algumas pessoas. Qualquer nação,

que encare a educação de seus jovens dessa forma, não leva a sério seu próprio

futuro ou não tem consciência dos danos causados à sociedade. Muitos dos maus

hábitos propagados no ambiente da escola são “de conhecimento dos professores, e

nada ou muito pouco é feito para se corrigir isso.“

Estudar na véspera da prova, deixar questões em branco para sair mais

cedo, pesquisas em grupo serem concluídas por apenas um ou dois integrantes da

equipe por desleixo ou abandono do trabalho por parte dos outros alunos... São

apenas alguns dos vícios ou conseqüências do não-aprendizado, que

aparentemente não possuem nada demais, ou já viraram algo que cultural, mas que

acabarão por se refletir na vida acadêmica do aluno, se ele vir a entrar na

universidade. A base de tudo está na escola; qualquer nação que possua alguma

pretensão de desenvolvimento real seja cultural, social, político ou econômico,

precisa direcionar seus esforços para um sistema educacional eficiente na formação

de cidadãos consciente de seus deveres e direitos.

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Como esperar uma sociedade consciente e crítica, se os jovens não são

formados como seres pensantes e críticos desde o principio? Como exigir que os

universitários estejam preparados para atuar como questionadores, se a base

necessária é deficiente e fornecida de forma insuficiente pela escola e pela

sociedade? Poderia se argumentar então: Mas a Escola também não possui

estrutura para esse tipo de qualidade da educação que lhe é exigida. A escola não é

um ser impessoal e amorfo. Ela é formada por agentes de conhecimento, entre

professores e diretores, pedagogos e pesquisadores e onde existem profissionais

com um mínimo de boa vontade e inconformidade com a carência de seus

educandos e de seu meio de trabalho, haverá espaço para ações que modifiquem

esse status quo, essa aceitação de um comportamento que não é natural como se

costuma acreditar.

A professora pesquisada no colégio Paes de Carvalho procurou desenvolver

ações focadas na crítica, mesmo tendo que desenvolver suas atividades em um

espaço com uma estrutura mais ou menos rígida e estática de ensino, onde a

Tradição é algumas vezes confundida com Inflexibilidade e falta de dinamismo.

Através da proposta de apresentarem trabalhos sobre períodos da História da Arte, a

educadora buscou levá-los a pesquisar, aprender e apreender o conteúdo. Não

foram deixados livres: um roteiro foi dado a cada um dos grupos, para pesquisarem

e montarem suas apresentações. A programação era de que cada grupo

apresentasse suas pesquisas no período de abril a maio, mas até a metade de maio

apenas um grupo, de Arte Bizantina, tinha algo a mostrar na data prevista.

Nos meses de abril e maio o tópico foi História da Arte (Noções) - a

educadora apresentou os temas que deveriam ser pesquisados por cada grupo,

divididos por sorteio. Foram divididos em: Pré-história, Arte Grega, Arte Romana,

Arte Egípcia, Arte Bizantina e Renascimento. Até metade do mês de maio, nenhum

grupo se dizia preparado para apresentar sua pesquisa.

No período de avaliação, a educadora incluiu nas prova questões subjetivas

sobre o que o aluno já havia pesquisado sobre o assunto. A maioria das questões

voltou em branco. “É muito frustrante ver que os alunos não se sentem motivados a

desenvolver um trabalho, inventam desculpas esdrúxulas e buscam adiar o máximo

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possível qualquer tarefa. Mesmo que eu desse a eles mais um mês ou até dois de

prazo, ainda assim não mostrariam trabalhos satisfatórios. ”-Desabafa a educadora.

O sabor do aprendizado se perde em meio à obrigação de cumprir uma

tarefa dentro de um prazo para se conseguir uma nota no boletim. O prazer para

adquirir, apropriar-se de um conhecimento desbota diante da sensação de

“obrigação”, onde o processo deveria ser de descoberta e expansão da consciência

do aluno diante da perspectiva de que a Arte não é algo distante e restrito a uma

elite ou a um mundo ao qual ele não pode ter acesso.

Durante o período da pesquisa, em nenhum momento foi desenvolvido um

trabalho com os alunos junto ao complexo de museus situado a apenas poucos

quarteirões da escola. O planejamento da educadora busca esse tipo de

programação, mas dificilmente é possível aplicar dentro das datas do calendário

escolar e de provas.

Um verdadeiro desperdício considerando as exposições conceituadas fixas

ou itinerantes, que são realizadas no complexo de museus situado no bairro.

O planejamento da educadora raramente sai da idealização, já que não há

muito apoio para que pelo menos 30 alunos se desloquem a pé da instituição para o

museu nas proximidades, e prazos são cobrados para que o conteúdo seja

ministrado até as datas das provas.

Com a criação da Academia Imperial de Belas-Artes durante o Império,

propagou-se juntamente a idéia de que a Arte era apenas entretenimento fútil para

elites entediadas, e que não poderia ter caráter mais sério ou serventia além da de

decorar as igrejas, ou adornar os palácios e moradias dos mais abastados.

“O artista, categoria institucionalizada em nossa sociedade com a vinda da Missão Francesa, não desfrutava a mesma importância social atribuída ao escritor, ao poeta” (BARBOSA, 1999, p.17)

Na cultura brasileira, a Arte adquiriu um ranço de “coisa de burguesia”, não

indo além das galerias e “espaços de segregação social”, devido à permanência dos

termos sofisticados e métodos acadêmicos.

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“Nos primeiros tempos a Academia Imperial não atraía a atenção tendo os poucos alunos sido recrutados. A arte estava associada à elite, era considerada símbolo de distinção e refinamento”. (FONSECA, 2009)

A arte feita pelo povo fechou-se em suas comunidades tradicionais, como se

a “arte das elites” e as “artes populares” não pudessem jamais se misturar assim

como as camadas sociais. Sendo assim, no Brasil essas “duas artes” vêm ao longo

da história se “estranhando” e se desencontrando, como se ambas fossem

incompatíveis.

Ainda assim, ambas continuam sendo vistas como supérfluas pela

sociedade em geral, diferente de países em que a valorização da Arte acompanha o

cidadão desde a escola e no seio familiar, onde se tem o hábito de levar os filhos

para apreciar uma exposição, permitindo que museus possam sustentar-se apenas

com a renda obtida com visitantes residentes na própria cidade. Não há razão para

que esse tipo de hábito não se propague na sociedade brasileira, desde que

políticas públicas e privadas se integrem para promover a valorização das

comunidades excluídas e acesso aos espaços de Arte. O erudito precisa do popular

e vice-versa.

“A mobilidade social depende da inter-relação entre os códigos culturais das diferentes classes sociais e o entendimento do mundo depende de uma ampla visão que integre o erudito e o popular” (BARBOSA, 2007. p.20).

O Sistema Integrado de Museus é muito freqüentado pelos alunos da

instituição, mas raramente as exposições são visitadas pelos educandos. Muitos

jamais entraram nesses espaços, vistos como locais segregantes, organizados para

atender uma camada popular de poder aquisitivo elevado.

A professora Alice Miranda busca desenvolver atividades com as turmas,

para que desenvolvam o hábito de visitar com mais freqüência os espaços

museológicos, mas relata as dificuldades:

Andei fazendo uma pesquisa conversando com a Nina Matos, que é a diretora da Casa das 11 Janelas, e eles fazem algumas propostas interessantes para a rede de ensino, inclusive quando tem exposições. A única dificuldade é que às vezes, por exemplo, houve uma oficina de fotografia e a capacidade máxima era de 10 alunos e numa turma de 30 alunos fica difícil estar dividindo, administrando esse tempo com os alunos.

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Um diálogo maior entre o colégio e os museus, separados apenas por um ou

dois quarteirões poderia ser mais bem explorado e com certeza renderia resultados

excelentes no ensino de Arte da instituição e para as propostas culturais do Sistema

Integrado de Museus, que já desenvolve programas voltados para a visita de alunos

da rede pública e até mesmo estudantes com deficiências visuais.

É preciso que o trabalho do professor de Arte não fique isolado entre as paredes da escola. A escola precisa com urgência abrir suas portas e acolher a produção cultural de sua comunidade e de outros lugares e épocas. A comunidade precisa também apoiar a escola, facilitando a construção e circulação dos conhecimentos ali produzidos. (COUTINHO, 2007, p.159).

A professora Alice, quando inquirida sobre seus planos de aula, apresentou-

os devidamente organizados em uma pasta, e divididos em datas aproximadas para

serem ministrados durante o mês correspondente aos tópicos a serem tratados.

Planejamento louvável e infelizmente raro na prática de muitos professores. Com a

defragação da greve de professores estaduais, o projeto inicial das turmas

apresentarem suas pesquisas foi adiado, estendendo-se até o mês de junho.

Os poucos grupos de pesquisa que se apresentaram, conseguiram mostrar

trabalhos satisfatórios. Para não ver as aulas serem resumidas à atividade de

apresentação desses poucos grupos, a professora procurou trabalhar textos sobre a

indústria cultural e de massa.

Segundo a Arte-Educadora, 60% de uma turma de 30 alunos, não

conseguem desenvolver uma boa leitura e compreensão de textos simples. Essas

deficiências acabam por influenciar no desenvolvimento das demais atividades.

A professora Alice, além de atuar com o ensino médio coordena os eventos

da Quadra Junina, que vem se tornando uma forte manifestação cultural na cidade e

atração turística. Seu trabalho durante o período de pesquisa se deu dividindo o

tempo entre a sala de aula e a coordenação dos eventos, mas a programação do

plano de curso, apesar dos percalços foi seguida com sucesso, até a finalização

desta pesquisa.

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2.5. Escola de Aplicação da UFPa

A pesquisa se deu no período de 23 de março a 15 de junho de 2009, com

os professores Maurício Calderaro e Amélia Guerra, responsáveis por turmas da 1ª,

2ª, 3ª e 4ª séries do ensino fundamental (1º e 2º ciclos), com faixa etária entre sete e

12 anos.

A Escola de Aplicação possui o complexo artístico “Professora Deolinda de

Oliveira Neves”, onde todas as atividades são desenvolvidas. Laboratórios de Artes,

com espaço ventilado, materiais diversos, mesas apropriadas e pias, são um recurso

raro segundo os professores e os profissionais que dispõem de tal recurso podem se

considerar privilegiados.

Segundo o Plano de Curso 2009, (ver anexos) fornecido pela instituição a

todos os professores a “Importância da arte na escola é a possibilidade progressiva

de propiciar aos alunos a ”linguagem da arte“-compreendendo e sabendo identificar

a arte, contextualizando as diversas culturas e identificando a existência de

diferenças nos padrões artísticos e estéticos, e que situem o saber artístico como

patamar ético-filosófico que iluminem os outros saberes”.

O plano de curso também deixa clara a metodologia que norteia o ensino de

artes na instituição:

“A metodologia utilizada baseia-se na Metodologia Triangular, de Ana Mae

Barbosa, onde se prioriza a percepção, a contextualização e o fazer artístico,

trabalharemos a partir de projetos que partem da problematizarão organizada em

sistemas que interligam diversos temas e saberes da linguagem visual”.

O objetivo geral ou seriam objetivos?- (ver anexos) é apontado como:

“Apreciar obras de arte, produções próprias e dos colegas, com prazer, empenho e

respeito, decodificando as diversidades, qualidades estéticas e significados artísticos

no cotidiano e em diferentes épocas e culturas. Observar e conhecer formas

artísticas nas diferentes linguagens, bem como materiais, elementos expressivos,

informações e princípios que regem suas combinações, historicidade e diversidade.

Criar formas artísticas nas diferentes linguagens, valorizando e articulando o fazer e

o conhecer com sensibilidade, imaginação, investigação, curiosidade e reflexão.”

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Analisando-se as ementas de 1ª a 4ª série do ensino fundamental, percebe-

se que em todas elas o fazer artístico está presente e bem especificado, mas a

contextualização não é colocada de forma clara ou mais objetivamente. O exercício

da Percepção na 1ª, 2ª, 3ª e 4ª séries são vistas de forma superficial, possibilitando

que acabe por ser ignorada na prática de um professor menos atento.

Como cada professor entende esses tópicos do plano de curso da Escola de

Aplicação e como as desenvolve em suas aulas? Suas metodologias estão em

acordo com uma educação atual, ou ainda se arrastam como tímidas ou

equivocadas tentativas de aproximação da Proposta Triangular?

2.6 Pesquisa com o Professor Maurício Calderaro

O perfil do educador pesquisado é de curiosidade e reflexão sobre a prática

pedagógica que desenvolve, buscando soluções e identificando as dificuldades dos

alunos.

No primeiro dia de pesquisa o educador levou a turma composta de 22

crianças (3ª série), para a Sala de Multimídia, para uma aula expositiva sobre o

Modernismo. Um grande desafio, em turmas com essa faixa etária é manter a

disciplina e o interesse das crianças. A aula teve que ser interrompida pela agitação

dos alunos, que corriam pela sala em direção ao telão para apontar as obras de

Tarsila do Amaral, que consideravam mais curiosas.

A proposta que o professor fez aos alunos antes de iniciar a aula, foi de que

se eles não se comportassem adequadamente na sala cedida por autorização da

diretoria, a aula teria que ser interrompida. Para manter a firmeza, após duas

advertências, o educador teve que parar a apresentação e retornar ao laboratório

com a turma. Fez um discurso de como foi decepcionante o mau comportamento da

maioria. Os alunos também expressaram suas dificuldades que sentiram e motivos

de tal comportamento. Com esse tipo de abordagem o professor vem buscando

educar os alunos para as futuras vistas aos museus e outros espaços fora da escola.

Na entrevista realizada durante a pesquisa, o professor responde quanto à

questão do desenvolvimento de atividades fora da escola: “Com certeza, pois é um

erro pensar só o espaço escolar. É importante que o universo escolar não se resuma

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só às quatro paredes, então as aulas são fora da escola também, no campo se

possível, tirar o aluno o máximo possível do espaço da sala e também, pensar o

resto da cidade também como parte do espaço escolar. Pensar esse espaço de

aprendizagem só como a escola é ”castrador” no caso. Acho fundamental não só

tirar o aluno da escola, mas também do espaço escolar. Argumenta.

A aula foi retomada com os alunos mais atentos ao trabalho. Após as

atividades, o professor comentou sua reflexão: “A verdadeira aula, no meu entender,

foi esta aqui. A partir do momento em que as crianças são colocadas diante de uma

reflexão sobre si mesmo, ela já está adquirindo conhecimento que levarão para sua

vida. Podem não ter prestado atenção na aula, mas aqui na nossa conversa sobre o

comportamento que tiveram, puderam olhar para o problema e buscaram resolvê-lo.

Prestarão mais atenção da próxima vez”.

A preocupação em encontrar soluções para os pontos falhos é uma

constante do “professor-pesquisador”, como visto na metodologia do educador

Maurício. Uma inquietação perante os desafios e necessidades dos educandos que

não deve ser esquecida durante toda a trajetória do Arte-Educador, aponta para o

aperfeiçoamento e qualidade de um ensino progressista.

A acomodação diante dessas necessidades, é um fator presente no

cotidiano da maioria dos seguidores (conscientes ou não) da “educação bancária”

(termo utilizado por Paulo Freire, para designar o acúmulo de conhecimentos e

informações sem reflexão), mas incompatível com a Proposta Triangular. Devido ao

episódio, ao invés de desânimo, o educador pesquisado vê um novo desafio a ser

solucionado. A dificuldade da turma em concentrar-se reflete a necessidade de uma

nova abordagem e não de um obstáculo intransponível ou de alunos inacessíveis,

como muitas vezes é encarado.

O professor procurou trabalhar a percepção dos alunos através da

observação do próprio espaço escolar ou de interação com o meio e pesquisa, como

entrevistas com os professores e funcionários da instituição sobre a opinião deles

com relação a conceitos de Clássico e de Moderno.

A atividade se deu em turmas da 3ª série, de acordo com a proposta

presente na ementa do plano de curso da instituição sob o título “De volta para o

Passado”, página 15. (ver anexos)

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Os alunos receberam folhas de papel para anotar as respostas e foram

divididos em grupos de cinco, no máximo. Alguns professores e funcionários

buscaram responder o melhor possível, mas outras pessoas praticamente “fugiram”

das entrevistas. O desconforto era visível em algumas pessoas, dando desculpas

para não responder ou ignorando as crianças. Com algumas respostas obtidas,

retornaram e compararam seus questionários em sala. Poucas entrevistas anotadas

se aproximaram do conceito de Clássico ou de Moderno ou estavam incompletas.

Segundo Michael Parsons, na obra Compreender a Arte, há cinco estágios

de desenvolvimentos estéticos. Esses estágios seriam de forma sintética preferência

(gosto intuitivo sem consciência do ponto de vista dos outros), beleza e realismo (já

há um reconhecimento do ponto de vista do outro, o tema é representado do ponto

de vista do realismo), expressividade (contato e consciência do próprio íntimo), estilo

e forma (o juízo estético como racional e passível de objetividade, interpretação

baseada em uma história) e autonomia (arte como meio de levantar questões, busca

de fundamentos para juízos e interpretações interpretação como reconstrução do

sentido). Segundo o autor, cada estágio é manifestado de acordo ou não com as

oportunidades que se apresentam ao indivíduo, e nem sempre na mesma ordem,

mas se produzem no sentido da dependência para a autonomia do sujeito.

Os alunos nas observações de aula apresentam a preferência, beleza e

realismo em seus primeiros trabalhos. Ao longo do processo, começam a fazer mais

perguntas sobre sua própria produção e questionam mais os trabalhos de artistas

reconhecidos, não mais apenas baseados no juízo de gosto.

Adequar o vocabulário ao entendimento infantil é um dos critérios mais

pontuais para o sucesso da aula. Apesar disso, não se deve tratar os alunos como

se fossem incapazes de absorver os termos próprios da disciplina. Com o devido

cuidado em traduzi-los para a experiência prática, os estudantes começam a

identificar e a associar os termos do jargão artístico, como “explosão da forma”,

“ponto de fuga”, “abstrato” e “textura”.

Muitos professores subestimam capacidade das crianças de

compreenderem certos conceitos da disciplina, mas elas são sem sombra de dúvida

capazes de absorver esses conceitos e usar os termos correspondentes,

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dependendo da forma como é apresentado a eles. Pode parecer um principio óbvio

da pedagogia, mas é muitas vezes ignorado por muitos educadores.

Sendo introduzidos no assunto da Perspectiva, os alunos da 4ª série foram

novamente levados a assistir a uma aula expositiva apresentando os principais

aspectos que compõem o tema. Puderam ver em uma apresentação em PowerPoint

conceitos como linha, altura, largura e profundidade, na verdade revisando uma

base que eles já adquiriram nas séries passadas. Com isso puderam compreender o

que seria os conceitos de 2D e 3D, identificando as imagens que apresentavam tais

características.

Esse embasamento facilitou com que a aula fluísse naturalmente e

ganhasse dinamismo, principalmente no exercício pratico após a aula teórica, sendo

que alguns alunos conseguiram segundo o proposto, desenhar ruas utilizando dois

pontos de fuga. Os que tiveram dificuldade na tarefa estavam vendo o assunto pela

primeira vez, sendo orientados posteriormente nas aulas seguintes de fixação do

assunto.

Sem uma base sólida, dificilmente será possível corrigir as deficiências que

o aluno trouxer consigo. Quando o professor poderia estar passando novos

conteúdos, tempo é perdido procurando sanar as dificuldades que deveriam ter

ficado para trás em séries anteriores. E se essas deficiências não forem detectadas

ou ignoradas, seguirão com o aluno prejudicando seu desempenho e em casos mais

graves, sua auto-estima, por o aluno acreditar-se menos capaz que seus colegas.

As carências do aluno não desaparecerão nem serão corrigidas no ano

seguinte, como se gostaria de ingenuamente acreditar. Pelo contrário, se acumulam

como uma bola de neve, até chegarem a ponto de imobilizarem a criança diante de

conteúdos que não mais consegue contornar como vinha fazendo.

No sistema educacional brasileiro, a falta de competências ou deficiências

delas em alguns educandos, reflete em alguns casos de forma grave, em alunos que

chegam ainda analfabetos em séries mais avançadas, ou não conseguem mais

seguir adiante nos estudos, engrossando os números estatísticos de repetência.

O professor consciente precisa estar preparado para detectar essas

deficiências e dificuldades, suas origens e posicionar-se para saná-las da melhor

forma possível evitando que siga com o aluno. Precisa posicionar-se também no que

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se refere à política de “passar o aluno adiante” sob a pressão de diretores e

coordenadorias para aprovar o maior número possível no ensino básico, mesmo que

não estejam devidamente preparados.

Essa política seria de exclusiva responsabilidade daqueles que coordenam a

Escola? A prática de negligência e condescendência com os alunos deve ser vista

como inadmissível em nosso Sistema Escolar, por todos os envolvidos.

Em sua analise dos PCNs no texto Parâmetros Curriculares Nacionais:

possibilidades, Limites e Implicações, Fábio do Nascimento Fonseca avalia os vários

pontos questionáveis na sua elaboração. No que se refere à divisão e a nova

nomenclatura de Ciclos para as séries, expõe:

(...) as quatro séries iniciais corresponderiam aos 1º e 2º ciclos e as quatro últimas aos 3º e 4º ciclos. As justificativas apresentadas para a adoção dos ciclos baseiam-se na suposição de que essa forma de organização proporciona uma maior flexibilização das dimensões do tempo escolar, evitando, com isso, a excessiva fragmentação do percurso escolar e as rupturas freqüentes, assegurando-se, dessa forma, a continuidade do processo educativo. (FONSECA, 2001, p.25)

Maior flexibilidade das dimensões do tempo escolar, poderia na verdade

significar uma tentativa de camuflar a disparidade causada pela repetência dos

alunos, em que muitas vezes a criança acaba inserida em séries que não

correspondem adequadamente a sua idade. A solução dessas diferenças não será

realizada com a mudança de nomenclaturas, e sim com a reformulação mais

profunda e pontual dos problemas que afetam o desenvolvimento desses

estudantes.

O trabalho de Arte-Educadores conscientes sem dúvida leva em

consideração todos os documentos e planejamentos disponíveis para elaborar sua

estratégia pedagógica, mas não deve se limitar a eles com se fossem uma “receita

de bolo”.

Segundo Ana-Mae Barbosa, expressando sua inquietação diante dos

Parâmetros Curriculares Nacionais, os PCNs:

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(...) Então, eu acho que ainda está para se avaliar se os parâmetros, com essa distorção, e por força de lei, que é uma coisa extremamente chata, o professor ser obrigado, não estar entendendo o que está fazendo e é obrigado a fazer. Eu não sei se isto vai resultar positivamente ou negativamente. Daqui a uns dois anos, já estará na hora de avaliar isto porque já decorreram dez anos, em 1996, dos primeiros parâmetros e, em 97, os de quinta a oitava. Já está na hora de fazer pesquisa para analisar. Eu não vejo pesquisa. Eu não estou vendo nenhuma pesquisa em arte-educação acerca dos Parâmetros Curriculares e, o pior ainda, dos Parâmetros em Ação, porque eu acho que são considerados como uma cartilha. Eu não vi pesquisa ainda para saber se foram benéficos ou maléficos. Assim, não se sabe se, caso não tivesse havido esta intervenção oficial, a abordagem triangular não teria sido apropriada melhor, mais pessoalmente por cada professor e se transformaria numa metodologia pessoal. Eu não sei. Isto é uma questão a se pensar. Porque há professores que vêm dizendo: Eu não estou interessado nos parâmetros. Estou muito mais interessado na abordagem triangular (...). (BARBOSA, 2003)

A pesquisa constante sobre os elementos presentes na comunidade em que

atua, pode ser o ponto de partida e a base para excelentes aulas de Arte.

Há diversas experiências de sucesso nesse sentido, que mostram infinitas

possibilidades, gerando novas perspectivas para a comunidade escolar, como

exemplificado através dos projetos divulgados pelo Arte na Escola e outras ONGs de

fundamental contribuição no cenário educacional brasileiro. As próprias Escolinhas

de Arte, originadas da experiência iniciada em 1948, no Rio de janeiro pelo trabalho

conjunto de Augusto Rodrigues (1913 - 1993) artista Pernambucano, da artista

gaúcha Lúcia Alencastro Valentim (1921) e da escultora norte-americana Margareth

Spencer (1914) foram de vital importância para a ampliação do repertório artístico

pela inclusão de elementos da arte popular e do folclore no ensino de Artes.

O professor Maurício busca despertar o olhar dos alunos com relação ao

espaço em que a escola está inserida, sendo que as crianças passam a re-ler o que

antes passaria despercebido pelo olhar cotidiano já habituado. Os elementos visuais

e estéticos da arquitetura, vestuário de passantes, propaganda e ilustrações passam

por uma redescoberta dos alunos, ganhando novos significados.

Uma das atividades de releitura trabalhada nas aulas foi realizada com obras

de Pablo Picasso, obtendo resultados que demonstram a qualidade de

desenvolvimento da turma. A capacidade de ler as obras, e de discutir os elementos

compositivos era demonstrada ao longo da atividade nas conversas entre as

crianças. Nenhuma apresentou o comportamento de querer copiar o mais fiel

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possível o original, mas sim de refazer o trabalho dando sua própria resignificância à

composição.

Figura 7 - Atividade de releitura de obras de Pablo Picasso, em

aula ministrada pelo professor Mauricio Calderaro.

Figura 8 - Atividade de releitura de obras de Pablo Picasso,

em aula ministrada pelo professor Mauricio Calderaro.

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Figura 9 - Atividade de releitura de obras de Pablo Picasso,

em aula ministrada pelo professor Mauricio Calderaro.

De fato, no desenvolvimento das atividades ao longo da pesquisa, os alunos

das turmas do professor Maurício mostraram maior autonomia e propriedade dos

conteúdos ministrados. A realidade constatada foi de um maior desenvolvimento dos

educandos devido ao trabalho contínuo em atividades baseadas na triangulação ler-

fazer-contextualizar, bem aplicadas pelo educador no caso estudado.

Até a finalização desta pesquisa, o professor realizou trabalhos com os

alunos utilizando câmaras escuras, confeccionadas com caixas e latas, em

atividades de fotografia do espaço da instituição.

2.7 Pesquisa com a Professora Amélia Guerra

Ocorreu em turmas de 1ª e 2ª séries, com pouca diferença de metodologia,

ocorrendo apenas mudança dos conteúdos de acordo com o plano de curso. Na

metodologia da educadora a apreciação de uma obra escolhida é abordada

primeiramente, seguindo-se da contextualização e prática de releitura com diversas

técnicas plásticas, com preferência à pintura.

Segundo a educadora, atuante como Arte-Educadora há 14 anos, a

dificuldade de obter imagens de boa qualidade gráfica é um custo a mais, mas de

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fundamental importância para uma boa aula e desenvolvimento do trabalho das

crianças.

“Acho que uma dificuldade em minhas aulas é a obtenção de boas imagens

fixas. É muito caro mandar fazer reproduções coloridas e trabalhar, só uma fica difícil

de enxergar e muito longe para todos os alunos. Uma avaliação boa por eles

depende da qualidade da imagem que fornecemos também.” - Afirma a professora.

A releitura vem sendo trabalhada na proposta triangular muitas vezes como

mera cópia, como afirma a autora Ana-Mae, embasada em sua observação das

metodologias de diversos professores de várias regiões do Brasil, que afirmam

utilizar a Proposta Triangular. O educador deve estar ciente de que a releitura requer

criação sobre o referencial observado, transformação e interpretação e que há

grande diferença entre o tipo de procedimento e a simples imitação.

O observado em sala no caso de algumas crianças são tentativas frustradas

de copiar a imagem o mais próximo possível do original, frustração evidenciada nos

pedidos das mesmas de que os estagiários desenhassem por elas, afirmando de

que “não eram capazes de desenhar igual”.

Deficiências logo detectadas e sanadas pela professora, resultando em

trabalhos muito mais originais, onde a criança demonstrou mais confiança em

transformar a imagem apresentada.

A releitura como cópia acaba assim por discriminar as crianças que não

conseguem aproximar-se com maior precisão do modelo apresentado, gerando o

natural afastamento do original e frustração pro acreditarem ser menos capazes.

Releitura é um termo inadequadamente interpretado por alguns como

“refazer” ou “fazer de novo”, sugerindo o ato puramente mimético. É preciso que haja

uma consistência na proposta da maioria dos educadores, quando se utilizam da

releitura.

Um tipo de “Educação Bancária” ainda pode ser presenciado na prática de

alguns professores quando a contextualização da obra é abordada, sendo o

processo limitado ao estudo da biografia do artista e questões sobre seu cotidiano.

Como se esses tópicos fossem mais pontuais em detrimento da leitura visual, ou

mais significantes do que o conjunto de sua trajetória poética.

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Em lugar de comunicar-se, o educador faz ‘comunicados’ que os educandos, meras incidências recebem pacientemente, memorizam e repetem. Eis ai a concepção bancária da educação, em que a única margem de ação que se oferece aos educandos e a de receberem os depósitos, guardá-los e arquivá-los. Margem para serem colecionadores e fichadores das coisas que arquivam. (FREIRE, 1987, p.33)

A professora Amélia buscou detectar esse tipo de tendência copiativa nos

alunos, mostrando a eles que a imagem pode ser resignificada e transformada,

tornando a releitura em um “novo fazer”.

Segundo o plano de curso da instituição, no 2º bimestre para as turmas da

2ª série, o tema “Explosão de cores”, página 13 (ver anexos) deve ser trabalhado

buscando que o aluno adquira a capacidade de “compreensão de que não há

padrões rígidos de beleza; tenha a disponibilidade para realizar produções artísticas,

expressando e comunicando idéias, valorizando sentimentos e percepções”.

A aula foi desenvolvida com exercícios práticos em pintura, usando formas

básicas como quadrados e círculos. As crianças conseguem manter alguma atenção

no exercício, desenvolvendo trabalhos muitas vezes relacionados a personagens de

sucesso da mídia como “Ben10” e “Yu-Gi-Ho” (desenhos veiculados pela televisão

na atualidade).

As atividades desenvolvidas por eles refletem essas influências. Apesar de

sugerir exercícios relacionados ao exposto na aula, algumas crianças não aceitam

desenhar outra coisa a não serem os personagens vistos na TV, como alienígenas

em batalha e duelos ou seres saídos de “Animes” (desenhos animados japoneses).

Essas influências não são discutidas na aula na maioria dos casos, são vistas

simplesmente como mais uma moda das crianças, tanto por professores ou pelos

pais.

Em nossa vida diária, estamos rodeados por imagens veiculados pela mídia, vendendo produtos, idéias, conceitos, comportamentos, slogans políticos, etc. Como resultado de nossa capacidade de ler essas imagens, nos apreendemos por meio delas inconscientemente. (BARBOSA, 2007, p.19).

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É inegável que a principal influência imagética das crianças hoje é a

televisão e mais recentemente a Internet. Esses referenciais cada vez mais ocupam

espaço tornando-se fonte criativa (ou não) desses estudantes, reproduzindo esses

paradigmas em trabalhos muitas vezes repetitivos e carentes de riqueza simbólica.

Figura 10 - Influências de desenhos animados se mostram frequentes entre as crianças.

Figura 11 - Influências de desenhos animados se mostram frequentes entre as crianças.

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A Cultura Visual tem se mostrado mais presente no cotidiano, e se tornou

quase inevitável a necessidade de compreender melhor os fatores que levam a uma

“cultura de consumo”.

Somos bombardeados o tempo todo por imagens fixas e móveis vendendo

idéias, produtos e comportamentos. A disciplina de Arte hoje se torna responsável

por preparar o aluno para a leitura adequada e crítica desse material a que é

exposto todo o dia.

Uma postura crítica deveria ser aplicada em cima do que é absorvido pelas

crianças nesses programas. Que valores estão passando para elas? Estariam

estabelecendo novos padrões rígidos? Estariam expressando e comunicando quais

idéias? Segundo a fala de Paulo Freire, o educador não pode ignorar o poder da

televisão, mas sim usá-la e discuti-la.

Na verdade, toda comunicação é comunicação de algo, feita de certa maneira em favor ou na defesa, sutil ou explícita, de algum ideal contra algo ou contra alguém, nem sempre claramente referido. Daí também o papel apurado que joga a ideologia na comunicação, ocultando verdades, mas também a própria ideologização no processo comunicativo. (FREIRE, 2002)

Entraria aí então, a oportunidade de desenvolver o poder crítico das crianças

em relação ao que assistem e não simplesmente entregarem-se diante da sucessão

de imagens veiculadas diante de si todos os dias através da TV, outdoors e

propaganda.

Espectadores freqüentemente passivos, temos por hábito consumir toda e qualquer produção imagética, sem tempo para deter sobre ela um olhar mais reflexivo, o qual a inclua e considere como texto visual visível e, portanto possuídos por elas, e requer contamos com elementos para questionar esse intrincado processo de enredamento e submissão. (BUORO, 2003, p.34)

Durante a aula, os alunos facilmente se deixam influenciar por qualquer

distração ou modelo durante os exercícios, copiando quadros ou desenhos na

parede ou o trabalho do colega ao lado, reproduzindo os mesmos padrões de cores

e composição. Há uma resistência em realmente tentar criar algo próprio, sob o

temor de não agradar aos professores ou de receber críticas a respeito de “certo” ou

“errado”.

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Uma passagem de Marjorie e Brent Wilson, mencionada no livro Da

Camiseta ao Museu-O Ensino das Artes na Democratização da Cultura, do Grupo de

Estudos do Departamento de Artes da UFPB, parece se aplicar perfeitamente ao

constatado na sala de aula e se mantem atual:

(...) acreditamos que não haja nada inerentemente errado com o fato de crianças serem influenciadas por professores ou então com seus comportamentos copiativos. Estes são os meios primários pelos quais as habilidades de construir símbolos visuais são expandidas. Pensamos ser um mal, entretanto, que haja tão pouco para influenciar os estudantes em suas aulas de arte, pois estas influências derivam muito mais de assuntos fora do campo das artes(...). (WILSON, l982, p.l4-l6)

As influências que estes alunos sofrem da mídia, além de desviar da atividade

sugerida pela educadora, empobrecem seus trabalhos. As aulas parecem não se

distanciar muito do fazer artístico, sem interpretação, criação reflexiva ou

contextualização, desaguando nos descaminhos do laissez-faire e desviando-se do

domínio dos padrões (culturais) de representação visual ou da compreensão desses

padrões.

“Expressar e comunicar idéias, valorizando sentimentos e percepções” como

sugere os objetivos atitudinais do plano de curso, estariam mesmo sendo praticados

pelos educandos, no simples exercício de desenhar segundo um tema? A tentativa

de reflexão das crianças na turma de 1ª e 2ª séries se resumiu em alguns casos a

falar do trabalho de que mais gostaram.

Não foi questionado o porquê de retratarem os personagens dos desenhos

animados. As comunicações de suas idéias não podem ser resumidas ao

sentimento: discussões sobre o que re(produzem) em seus trabalhos poderiam ser

mais bem explorados.

A metodologia de análise é de escolha do professor, o importante é que as obras de arte sejam analisadas para que se aprenda a ler a imagem e avalia-la; Esta leitura é enriquecida pela informação histórica e ambas partem ou desembocam no fazer artístico. (BARBOSA, 1991, p.37).

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Mesmo com um plano de curso fornecido pela instituição, é necessário que

seja feito um planejamento por parte do professor para suas aulas. Como área de

conhecimento, a Arte requer que o educador estruture sua ação e sua metodologia

para que os objetivos que pretende alcançar não fiquem perdidos em meio à falta de

foco, ao sabor do expontaneismo. Ana Mae busca esclarecer incansavelmente a

respeito de como os professores devem evitar esse tipo de atividade sem uma busca

dos significados e significantes para os alunos sobre essas imagens.

Qualquer um que tenha tido um contato um pouco mais sério, fundamentado e consistente com o fazer artístico sabe e conhece o labor e o rigor necessários para a produção de trabalhos de arte; qualquer um que tenha produzido arte com algum compromisso sabe da necessidade de estudo e de pesquisa, de conhecimento das técnicas e das linguagens que o artista tem que ter sobre os seus focos de trabalho para poder criar algo minimamente relevante. Mesmo nos ”artistas-produto” criados pela indústria do entretenimento - lançados e trabalhados como se fossem um sabão-em-pó - mesmo nesses, é possível perceber empenho e engenho maior do que a liberdade ilimitada e displicente suposta pelo senso-comum. (MARQUES-BRAZIL, 2006).

Nas datas da Páscoa e Dia das mães, as produções se resumiram a pintar

máscaras de coelhos e confeccionar cartões e desenhos para as mães. Prática não

muito bem vista pela autora Ana-Mae e distante da Abordagem Triangular, mas que

acaba por se tornar uma cobrança até mesmo dos pais, que acreditam ser um tipo

de tradição a produção dessas “lembranças” na aula de Artes dos filhos.

Diversas máscaras foram recortadas em E.V.A, (sucessor do famigerado

papel crepom, muito criticado na prática de alguns professores como sinônimo de

produção manual sem reflexão) e foram pintadas com tinta guache segundo o gosto

do aluno, sem que se pudesse aplicar pelo menos os conhecimentos de mistura de

cores primárias e secundárias ou elementos de composição, ou houvesse uma

contextualização sobre a história por trás dos símbolos da Páscoa. A professora

buscou desenvolver a atividade direcionando-a para a quebra de paradigmas com

relação à cor.

As crianças ficaram livres para pintar como desejassem. O mesmo se deu

na produção dos desenhos e mensagens para as mães, não indo além de algumas

poucas interferências por parte dos alunos a respeito da composição dos elementos

no papel.

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Algumas crianças fizeram trabalhos praticamente idênticos, copiando os

corações vermelhos que os colegas desenharam. Os trabalhos se resumiram a

corações vermelhos e padronizados, numa cristalização de idéias já desgastadas

referentes à data que continuarão com a criança sem que algo de novo ou crítico

seja adicionado.

Como maiores vítimas da sucessão de “Imagens pré-fabricadas” as crianças

são massacradas por mídias cada vez mais acessíveis, tornando essas imagens

mais “descartáveis”. O olhar é diluído, a capacidade de pensar por imagens

originais é congelada, a criatividade é reduzida pela reprodução de modelos

impostos pela cultura midiática.

Esses velhos ícones serão propagados e multiplicados, dificilmente trazendo

algo de diferente em sua formação do que o conservadorismo, a falta de

inventividade e imobilidade de idéias. É conhecido o fato de que uma formação

adequada através da Arte, forma profissionais mais criativos e eficientes para

encontrar novas soluções, diante do que lhes é colocado como desafio na profissão.

A educadora busca corrigir esses efeitos, mas sem dúvida eles necessitarão

de tempo, para que esses paradigmas sejam quebrados.

O expontaneismo dificilmente forma leitores ou produtores de arte críticos e

conscientes. Atitudes como essa propagam o senso comum de que a Arte é “um

reino de liberdade ilimitada regido pelas intempéries da inspiração, da intuição, da

sensibilidade especial, do momento em que acontece”. (MARQUES-BRAZIL, 2006)

Produção para posterior exposição é uma cobrança da qual a educadora diz

não poder se esquivar. Os trabalhos dos alunos são expostos no fim do bimestre

para apreciação dos pais, alunos e professores.

As estantes, prateleiras e armários da sala de Artes estão repletos de

papéis com pinturas, desenhos, telas e trabalhos em massa e argila que parecem

perdidos, esquecidos sob a falta de contexto e reflexão, que parecem apenas

reforçar a atitude daqueles que criticam a arte e a rotulam como recreação

desnecessária e sem objetivos.

Por outro lado também existe, uma opinião equivocada de que se não há

produção de trabalhos de desenho e pintura nas aulas de artes, isso seria uma

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evidência de que os alunos não estão adquirindo conhecimento ou recebendo o

conteúdo da disciplina. Como se a quantidade de trabalhos manuais produzidos

fosse diretamente proporcional ao rendimento das crianças.

Por isso muitos professores preocupam-se com a quantidade de exercícios,

de produção material, sem que eles sejam necessariamente indispensáveis. O

resultado muitas vezes é de excessiva produção que não encontra espaço nas salas

ou que perdem seu valor aos olhos da criança, caindo logo no esquecimento e

desinteresse.

Alguns educadores como o professor pesquisado Maurício Calderaro,

desenvolvem em suas aulas o reaproveitamento de alguns trabalhos ou

transformação deles através de uma seqüência de conhecimentos adquiridos ao

longo das aulas. Um mesmo trabalho sobre cores primárias pode ser convertido em

um estudo de composição, e depois finalizado como obra sobre o abstracionismo, re

(transformado) pelo educando que acompanha a metamorfose de sua ação à

medida que aprende.

Em sua metodologia, a professora Amélia enfatiza o fazer, criando uma

numerosa produção de pinturas e desenhos. Esse tipo de abordagem aproxima-se

perigosamente de um fazer vazio, onde a criança acaba por realizar a atividade

apenas como obrigação.

Uma variação de atividades poderia despertar nos alunos um interesse e

curiosidade maiores com relação ao proposto durante cada aula. Segundo os

objetivos atitudinais do Planejamento de Artes da instituição para o 1º bimestre da 2ª

série (ver anexos), página13, seria importante desenvolver na criança o “interesse e

respeito pela própria produção artística”.

No constatado durante a pesquisa, talvez por esse excesso de produção,

algumas crianças demonstram justamente o oposto: logo perdem o interesse pelo

trabalho, sem demonstrar que se importam sobre o que será feito deles.

A produção artística deve ser uma conseqüência do conhecimento, da

técnica e da reflexão, não necessariamente o objetivo final, como vem sendo

encarada.

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O fazer artístico (...) é o resultado de uma ação consciente, que pode se dar através de releituras das obras estudadas ou de outras formas de criação, a partir da vivência e da leitura crítica da realidade. Este fazer, então, fundamenta-se tanto no conhecimento técnico e estético, quanto no conhecimento histórico. (MARINHO, 1994, p.47).

Figura 12 - Atividade de estudo da cor através das obras de Van Gogh

Figura 13 - Atividade de estudo da cor através das obras de Van Gogh

Embora enfatize o eixo de ação do fazer em sua metodologia, a professora

Amélia consegue levar os educandos a um bom nível de domínio dos conteúdos,

sendo que as crianças demonstram as competências exigidas pela proposta

curricular da instituição. Não são ações mal intencionadas, mas antes fruto de pouca

variação das propostas de exercícios.

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Corrigindo essa abordagem, sua prática pedagógica apresenta uma boa

eficiência no desenvolvimento das turmas. Os exercícios de alguns alunos

demonstraram expressividade, ótimos domínio dos conteúdos e do uso das cores na

composição.

2.8 Dificuldades do Ensino de Arte

Pela Lei de Diretrizes e Bases da educação, LDB, o ensino de Artes é

obrigatório no ensino fundamental e no ensino médio, mas não especificou que

fosse exercido em todas as séries. Sendo assim, algumas escolas empregam a

disciplina em apenas uma das séries, não havendo uma continuidade do

aprendizado em Artes pelo aluno ao longo da vida escolar.

No ensino médio o termo “interdisciplinaridade” tem sido a desculpa de

algumas secretarias de educação para incluir todas as Artes na disciplina de

Literatura, ficando tudo a cargo do professor de Língua Portuguesa e Literatura.

Segundo Ana Mae Barbosa

(2007) “Essa é uma forma de eliminar as outras linguagens de Arte, fazendo

prevalecer o espírito educacional hierárquico da importância suprema da linguagem

verbal e conseqüente desprezo pela linguagem visual”.

Não há nem mesmo, na rede de ensino público, um livro didático específico

produzido pelo MEC até o presente momento, sendo necessário que o professor

escolha por sua própria conta algum que achar adequado para guiar seu plano de

curso.

Os professores de arte consultados relataram sofrer cobranças com relação

à produção de trabalhos para exposição, como se na disciplina, a não-produção de

trabalhos significa-se ausência de conteúdo ministrado ou não aquisição de

conhecimento pelos alunos.

Ainda há o assédio à arte-educadora em datas comemorativas para deixar

de lado seu próprio plano de curso, para direcionar os alunos à produção de

“lembrancinhas” ou cartazes e faixas para comemorações da escola ou datas

especiais. Muitos professores não sabem como defender sua posição a

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coordenadores, diretores ou até diante de colegas para justificar que possuem seu

próprio conteúdo para desenvolver com suas turmas e não podem “fazer por fazer”

brindes que nada tem a ver com as aulas de Arte ou o plano de aula.

O professor de Arte ainda é visto como o “decorador” da escola, pronto para

largar tudo quando chamado. A disciplina é vista como um meio para ensinar sobre

outras disciplinas, e não como fonte de conhecimento humano tão importante quanto

outro qualquer, e ainda há confusão entre improvisação e criatividade ou Arte e

artesania, sem reflexão e produção de conhecimento.

O “esquartejamento mental” (Duarte, 1994) ainda é estimulado nas escolas,

incentivando os alunos a separarem o racional do emocional, compartimentando os

saberes entre o que a sociedade considera o “útil” do “lazer”, ou do que se considera

supérfluo. A Arte ainda é considerada como supérflua até mesmo entre outros

educadores.

Um dos educadores entrevistados relatou que certa vez, teve que ser firme

em sua posição de não aceitar a tarefa de recortar e colar enfeites juninos para a

festa da instituição, trazidos por uma colega. Ele argumenta:

“Colaborar é uma coisa bem diferente de ser praticamente coagido...Eu

colaboraria com todo o prazer se todos estivessem envolvidos na tarefa de decorar a

escola, e que o tema fosse contextualizado por cada disciplina, mas o que

aconteceu foi que a tarefa me foi apresentada como se fosse minha obrigação

exclusiva, pelo simples fato de ser o Professor de Arte...”.

Situações como essa são mais comuns do que se pensa e frequentes nos

relatos de muitos outros professores.

“Na educação, o subjetivo, a vida interior e a vida emocional devem progredir, mas não ao acaso. Se a arte não é tratada como um conhecimento, mas somente como um ‘grito da alma’, não estaremos oferecendo uma educação nem no sentido cognitivo, nem no sentido emocional. Por ambas a escola deve se responsabilizar”. (BARBOSA, 2007)

A escola como “Instituição de Transmissão da Cultura”, e aqueles que

integram essa instituição, devem ser os primeiros a reconhecer a importância da

Arte para que sua missão seja efetuada de forma completa e não pela metade. A

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disciplina ainda é encarada como “hierarquicamente inferior” diante das linguagens

discursivas e científicas.

“Enfrenta-se ainda no campo da educação escolar, a desvalorização da área de arte em função do preconceito de toda a ordem. Não se compreende o conhecimento artístico estético como um campo propício para a inserção do aluno no universo artístico-cultural. As várias tendências pedagógicas revelam a compreensão do ensino-aprendizagem de cada época e estão presentes na formação do professor de arte e nas práticas educativas correntes”. (MAGALHÃES, 2007, p.163)

A importância da Arte começará a ser incorporada à consciência da

sociedade a partir da conscientização dos próprios professores de Arte. Enquanto

houver alguma dúvida ou crise de identidade contaminando os próprios profissionais

que deveriam defender sua prática, será difícil que qualquer um de fora seja

convencido de que ela é fundamental e indispensável.

Na fala da professora Jurema Sampaio, mestre em Artes Visuais da PUC-

Campinas: “Se você perguntar a qualquer pessoa o que é preciso para ser professor

de matemática, por exemplo, certamente a resposta será algo como ser formado

para isso”. A licenciatura em Arte é exatamente isso, a formação da arte-educador.

Por que motivo as pessoas acreditam que para dar aula de arte seria diferente? O

termo Arte-Educador tem sido adotado indiscriminadamente por muitas pessoas com

uma visão equivocada do que seria realmente ser um profissional da área, ou que

não buscaram questionar quando começaram a ser assim denominadas. Existem

organizações não governamentais realmente sérias desenvolvendo projetos que só

tem a adicionar dentro da educação brasileira, mas é necessário ter critério ao sair

denominado qualquer professor atuante dentro da área como um Arte-Educador.

Para que se tenha uma base sólida e argumentos para embasar a defesa de sua

prática, o Arte-Educador necessita buscar constante reciclagem e aperfeiçoamento,

como em qualquer outra área profissional, para não cair no imobilismo e em

metodologias ultrapassadas. Precisa estar constantemente envolvido com o

pensamento que envolve sua profissão e em um exercício permanente de

autocrítica.

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A professora Amélia Guerra, em entrevista (ver anexos) comenta:

“No contato que tenho com outros professores, eles não estão tão engajados

como nós. Aqui temos um plano de curso, fazemos reuniões periódicas e realizamos

um plano para todo o ensino fundamental e médio. E tem escolas que não fazem

nada disso, os professores recebem um “plano de curso” de cima pra baixo e o

professor não sabe pra onde se guiar. Ainda tem muitas vezes que desempenham

outras linguagens, habilitações além da sua, mas aqui desempenhamos apenas a

nossa área: Artes Visuais. Não tenho uma proposta concreta para melhorar esse

cenário, porém acho que o que posso mesmo fazer é continuar me aprimorando,

continuamente estudando, adequar a imagem à idade dos alunos e ir a busca de

coisa novas, imagens novas.”

“O Brasil conta atualmente com 2,6 milhões de professores, sendo que, destes, 220.000 lecionam no Ensino Superior. Pesquisas apontam ainda que, entre 1996 e 2002, cresceu, entre os docentes, a busca por uma melhor qualificação. Do total de professores no Ensino Superior, 54% têm mestrado ou doutorado concluídos, 31% possuem especialização e cerca de 15% terminaram somente a graduação”. (INEP, 2008).

Apesar do crescimento, ainda persiste o problema do desestímulo aos

professores em buscarem cursos de aperfeiçoamento, reciclagem e aprofundamento

na prática. É uma realidade observável a tensão que se pode criar com a diretoria de

algumas escolas menos flexíveis, para simplesmente conseguir uma licença e

comparecer a uma palestra no meio da semana, imaginem então a dificuldade e a

situação causada pela atitude de buscar uma Pós-Graduação.

Quando alguns educadores alcançam um alto grau de formação, costumam

desligar-se do ensino básico e dedicar-se ao ensino superior, devido aos melhores

salários e perspectivas profissionais. As bases do ensino se tornam fracas,

imobilizadas pela ausência de projetos e experiências educacionais fundamentadas

em reflexão consciente, pois elas estão direcionadas para a universidade e suas

problemáticas e não para a origem do ciclo.

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Segundo a fala do professor Raimundo Matos de Leão (2009):

“O ensino da arte deve estar em consonância com a contemporaneidade. A sala de aula deve ser um espelho do atelier do artista ou do laboratório do cientista. Neles são desenvolvidas pesquisas, técnicas são criadas e recriadas, e o processo criador toma forma de maneira viva, dinâmica. A pesquisa e a construção do conhecimento é um valor tanto para o educador quanto para o educando, rompendo com a relação sujeito/objeto do ensino tradicional. Este processo poderá ser desafiador. Delimitar o ponto de partida e o ponto de chegada será resultante da experimentação. Dessa forma, o ensino da arte estará intimamente ligado ao interesse de quem aprende”.

No entanto, este cenário não deve ser cobrado apenas do profissional, mas

também de todo um sistema que precisa funcionar em harmonia, visando à

formação tanto de melhores profissionais da educação quanto dos jovens por quem

se responsabiliza.

A Escola pode por meio de parcerias com ONGs sérias e pesquisadores,

transformar a sala de aula em laboratório para o desenvolvimento de projetos

pedagógicos eficientes. Sem dúvida essas experiências devem contar com uma

maior participação da comunidade em que a escola estiver inserida.

O professor Mauricio Calderaro citou como uma das dificuldades

enfrentadas em sua metodologia, a cobrança de alguns pais que não compreendem

o processo envolvido nas aulas ministradas aos filhos:

“Creio que deveria haver uma maior participação dos pais em relação ao ensino de arte, por incrível que pareça. Até a coordenação aqui e os professores tem uma visão muito atual do ensino, não é aquela visão tradicional só voltada para o fazer, para o desenho”.

Segundo o autor Vanildo Mousinho Marinho, no livro Da Camiseta ao Museu

várias medidas são necessárias para que a Proposta Triangular seja implantada de

forma efetiva no ensino de Arte em qualquer escola comprometida com abertura

para culturalidade da comunidade em que atua:

a) Aproveitamento do acervo e da produção local, organizando-se visitas a

museus, galerias e ateliers dos artistas da comunidade onde a escola está inserida.

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Procedimento presente na metodologia dos educadores entrevistados.

Precisa contar também com o apoio da Escola.

b) Organização de arquivos com reproduções de boa qualidade, que

poderiam ser mantidos pelas Secretarias de Educação do Estado e do Município, ou

em convênio com outras instituições. Estes arquivos emprestariam peças de seu

acervo para serem utilizadas nas escolas. Livros e textos para consulta poderiam ser

mantidos neste esquema.

Iniciativas como essa, raramente partem do poder público, sendo

desenvolvido por Organizações Não Governamentais, como o projeto “Arte na

Escola”. Os professores entrevistados citaram a internet como principal fonte de

pesquisa, pela objetividade e possibilidade de contato com outros Arte-educadores.

c) Implantação de um sistema de videoteca, a exemplo do “Vídeo Escola”

tratando especificamente de obras de arte e seus criadores.

Este projeto, fantástica iniciativa da Fundação IOCHPE, ainda é pouco

conhecido da maioria dos Arte-Educadores, que se surpreendem ao tomar

conhecimento dele. Muitas vezes é procurado até por professores de outras

disciplinas, como Matemática e Literatura.

d) Cursos de reciclagem, para possibilitar aos professores que atuam nessa

área aprofundar seus conhecimentos específicos e se inteirar de metodologias

apropriadas para o desenvolvimento desta proposta.

Ainda há pouco incentivo para uma formação continuada dos professores.

e) Reformulação curricular nos cursos de formação de professores de arte, no

sentido de redefini-los quanto à filosofia e objetivos, introduzindo disciplinas, tanto da

área específica, quanto da área pedagógica, que preparem para uma atuação nos

moldes da metodologia triangular, nas escolas de 1º e 2º graus. Reformulação

gradual, mas que vem se mostrando em alguns cursos.

Segundo dados do Censo da Educação Básica de 2007, realizado pelo

INEP, instituto de pesquisas ligado ao Ministério da Educação, dos professores de

quinta a oitava série, em um universo de 1,8 milhão de profissionais de escolas

públicas e particulares, 27% não possuem diploma de ensino superior, a habilitação

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legal exigida. Esses educadores dão aula para cerca de 600 mil alunos, segundo o

levantamento.

Acredita-se que grande parte desses professores iniciou sua carreira antes

de 1996, quando a Lei de Diretrizes e Bases da Educação determinou como

formação mínima, o curso normal de nível médio ou superior com licenciatura para

quem trabalha com turmas até a quarta série. Não tendo a lei efeito retroativo esse

profissional continuou em atividade, 0,8% desse contingente estudou somente até a

oitava série.

Esses dados refletem de um modo global a formação deficiente dos

educadores atuantes no Brasil, o que se pode esperar então da Arte-Educação?

Devido à precariedade da formação dos professores de arte em nosso país, a

Proposta Triangular tem sido equivocadamente implantada, isso quando o professor

possui conhecimento dela ou se propõe a utilizar os três eixos de ação em sua

metodologia. Alguns professores aplicam os eixos de ação da triangulação como

“fases”, ou excluindo um deles por ver algum tipo de “impossibilidade” de aplicação.

Sem uma formação continuada, uma constante reciclagem de

conhecimentos e técnica pedagógica, corre-se o risco da Proposta Triangular se

transformar em mais uma receita equivocada e nociva dentro do sistema

educacional brasileiro, ou utilizada com algum sucesso em apenas algumas escolas

que dispõem de infraestrutura ou recursos apropriados, como uma nova teoria

escolanovista, com conseqüências elitistas e excludentes contrariando tudo o que a

proposta objetiva em seu discurso.

Os educadores entrevistados demonstraram buscar sempre

aperfeiçoamento quanto à sua metodologia, mas não pensam no presente momento

em seguir em busca de continuidade quanto à formação.

A Abordagem Triangular tem sido bem divulgada pelos teóricos que buscam

difundi-la Brasil afora, mas ainda há poucos estudos sobre os resultados obtidos

durante o período que tem sido implantada. É necessário que se faça uma produção

maior de estudos baseados em experiências brasileiras, pois afinal de contas, as

experiências e vivências de outros países poucas vezes podem ser aplicadas a nós

ou comparáveis à estrutura de ensino do país.

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São respostas a problemas de suas sociedades e dificilmente se aplicam

aos questionamentos e problemáticas da educação brasileira. Podem servir de

exemplo e ponto de partida, mas não de modelos estáticos para sabermos o que

esperar das vivências de uma sala de aula em um país de dimensões continentais, e

uma diversidade cultural tão extensa com alunos muitas vezes sem pré-condições

requeridas para a compreensão de muitos conceitos do universo da arte.

Nas poucas experiências em que há um tratamento da herança cultural do

aluno, em muitos casos há o equivoco de se tratar essa bagagem histórica do

educando sem o devido dinamismo que lhe é próprio, cristalizando-o como se a

Tradição fosse sinônima de estagnação.

O Brasil possui suas próprias peculiaridades, e por isso deve ser estudado

dentro de suas próprias características por professores-pesquisadores, que

conheçam a realidade em que sua escola está inserida. Metodologias sem conteúdo

são simplesmente vazias. As experiências de outros países são extremamente

relevantes, mas não se deve esquecer a necessidade de formação de um corpo de

pesquisadores atuantes na Arte-Educação brasileira, não só nos centros urbanos.

(...) é sempre bom lembrar que, num país com tão grandes dimensões e diversidades, as discussões sobre educação não podem se pautar apenas pela realidade dos maiores centros urbanos, como muitas vezes acontece, já que tais centros costumam concentrar a produção científica e/ou maiores facilidades para a sua divulgação. (PENNA-SANTOS. p. 26).

Os educadores entrevistados mostram preocupação em buscar uma maior

interação com as experiências de outros professores, e atualizar-se quanto ao

desenvolvimento de suas metodologias pedagógicas.

Na pesquisa deste trabalho, houve a oportunidade de registrar comentários

na sala de professores de uma das instituições, o que realmente alguns educadores

pensam sobre sua prática pedagógica. A discussão acalorada passava pelos

reajustes salariais e carga horária até as condições das salas de aula. Debates

sobre o significado de estar ali apesar de todas as dificuldades são comuns.

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_________________________________________________________________________________ 4 Em meio ao mês de maio de 2009, os professores do município de Belém defragaram uma greve por melhores condições de trabalho e salários. Na pauta de reivindicações do Sintepp (Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Pará), constava ainda, entre outros pedidos, o de pagamento de R$ 300 para todos os setores e o abono de faltas. Muitos questionaram se a greve dos professores era justificável: A opinião pública chegou a ridicularizar a paralisação em maio de 2009, com frases na mídia do tipo “Chega de reclamar, vai é trabalhar”.Os próprios alunos, se entrevistados, em alguns casos julgam que a culpa das precárias condições da educação disponível compete exclusivamente aos educadores. Os professores por sua vez argumentam que não é só por dinheiro que reivindicam, mas também por melhores condições de desenvolver seu trabalho, pois estão sujeitos a diversos problemas e até a condições insalubres de trabalho, dependendo da instituição de ensino, como poluição sonora, péssima ventilação das salas de aula, perigo de assaltos em áreas de alto risco onde a escola está situada, ameaças de estudantes envolvidos com gangues e trafico de drogas (fora e dentro da escola), tudo isso sem mencionar a precária infraestrutura da rede pública de ensino. Os educadores alegam que sua luta não é apenas por melhores salários, mas também por condições dignas de desempenhar sua profissão na sociedade e oferecer uma educação de qualidade. A greve dos educadores municipais teve fim no dia 26 de maio, sem que os professores conseguissem um reajuste diferenciado, tendo dez dias da greve descontados de suas remunerações. A paralisação das atividades durou 14 dias.

62

“Em que medida certas professoras querem mesmo deixar de serem tias para assumirem-se como professoras? Seu medo à liberdade as conduz à falsa paz que lhes parece existir na situação de tias, o que não existe na aceitação plena de sua responsabilidade de professoras”. (FREIRE, 1997, p.10).

A responsabilidade de ser professor estende-se além da sala de aula. Ela

vai além de corrigir provas, orientar exercícios, ministrar conteúdo. Não se deixa de

ser professor da porta da escola para fora. Ser professor é um exercício constante

de reflexão, de autocrítica e defesa do ofício. Os professores pesquisados sabem

que há dificuldades como em qualquer profissão, mas contornam utilizando

aprimoramento constante de suas práticas pedagógicas e busca de novas

perspectivas educacionais. São frequentes relatos de alguns educadores sobre os

fatores insalubres de trabalho que enfrentam4 (carga horária excessiva para se

atingir um mínimo de remuneração suficiente para uma vida digna, por exemplo),

mas que ainda assim persistem em promover ações exemplares de Arte-educação.

Paulo Freire argumenta em seu livro “Professora sim, Tia não” de 1997, que

a visão de valorização da profissão deve partir primeiramente do próprio educador.

Busca diferenciar o que cada termo, Tia ou Professora podem acarretar na

compreensão da missão pedagógica do educador.

Assumir-se como professor e não como “tio”, parece ser ainda o principal

dilema tanto de profissionais já atuantes quanto de professores ainda em formação.

A “Tia” é boazinha e não tem o direito de entrar em greve e prejudicar seus

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“sobrinhos”, ou de reivindicar melhores condições salariais ou de trabalho para

desempenhar sua profissão. A Professora é uma profissional com deveres, mas

também com direitos e amparo das leis que regulamentam sua atividade.

A Tia aceita abrir mão de seu plano de curso ou horários se assim for

exigido pela escola ou até mesmo pelos colegas, em nome da comemoração dos

alunos em datas ou de atividades mais “importantes” de disciplinas como

Matemática ou Língua Portuguesa.

A Professora sabe como argumentar e defender sua prática diante do

assédio de coordenadores e diretores, embasada em fundamentações teóricas

sólidas e conhecimento das leis que apóiam sua atividade. Cabe como competência

do educador não só o domínio do conteúdo ou da metodologia pedagógica, mas

também postura ética e profissional perante sua própria atividade.

É sempre sensato vigiar se nós mesmos não estamos sabotando o que

defendemos. “A atitude cínica configura uma crise moral, ou um desafio à ética,

porque significa uma indiferença diante dos valores”.(RIOS, 2008, p.77)

Os valores de um professor devem se basear na ética e na consciência de

que está lidando com vidas humanas, e que uma simples palavra ou simples gesto

de encorajamento ou desaprovação podem mudá-las, segundo a interpretação que

o aluno fará. Ele poderá se lembrar pelo resto da vida de um único ato de incentivo,

buscando fazer o melhor possível para corresponder à apreciação que seu esforço

alcançou.

Há também professores cheios de expectativas por estarem começando a

carreira, ainda com uma visão romântica e ilusória da prática. Carregam a imagem

da Tia, moldada a partir de algum professor muito querido do passado, como fonte

de inspiração para sua “vocação”. Ao confrontarem com a realidade, a reação é de

espanto.

Dependendo de sua formação, pode transformar essa constatação em

apatia e desesperança, ou em ação revigorante de uma comunidade escolar

sedenta de ações criativas. Os professores nesta pesquisa atuam entre seis e

dezesseis anos na rede de ensino, e tiveram contato com a Proposta Triangular

ainda na Universidade Federal do Pará. Sabem das dificuldades enfrentadas, mas

que se dispõem a ser agentes de mudanças reais, inovadoras e significativas no

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cenário da Arte-educação no Brasil. Que pensam sua prática, buscam soluções para

criar as condições de um bom aprendizado das turmas em que atuam.

A realidade entre a teoria educacional e o cotidiano da sala de aula é

deveras dissonante, de fato. Muitos pesquisadores colocam sua visão de como

turmas se comportam ou de como uma aula deve ser ministrada, mas é preciso não

esquecer a importância da experiência de cada educador, diante de uma turma de

“carne e osso”, que pode revelar as minúcias da didática para cada caso. Percebe-

se que cada turma é única, composta de indivíduos únicos, embora sejam

classificadas como turmas A ou B do turno X pela escola.

Os textos dos grandes pesquisadores e teóricos da Arte-Educação não

devem ser desprezados, obviamente, mas é no dia a dia de uma escola que o

profissional recém saído da universidade encontrará sua expressão e metodologia

pessoal no desenvolvimento da sua tarefa.

Não basta também conhecer todos os grandes teóricos e não provocar as

mudanças ou oportunidades na comunidade escolar em que se atua. “Muitos

professores pensam criticamente, mas não buscam ser agentes de

mudança”.(RIOS, 2008)

Não há espaço para a falta de ação diante dos desafios encontrados. No

texto Rasas Razões de Regina Machado, presente no livro “Inquietações e

Mudanças no Ensino da Arte”, a autora cita o dito de Guimarães Rosa: Se não fosse

a borboleta, a lagarta teria razão?”

Existem os professores que mesmo tendo condições e estruturas para

planejar suas aulas, acomodam-se como típicos representantes da “Educação

Bancária” não indo além de seu confortável casulo de rasas razões. Há as

borboletas que não admitem mais as paredes desse casulo claustrofóbico, que não

mais conseguem conter suas inquietações, curiosidade e inconformidade com a

postura das lagartas (sim, as lagartas podem ser também diretores, pais e

coordenadores; uma comunidade inteira).

Segundo a educadora Alice Miranda (2009) comenta que demorou algum

tempo para se decidir pela docência, por certo receio das condições que encontraria

e se seria capaz de lidar com esse cenário:

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Isso por conta até de um receio que eu tinha de me envolver de forma mais afetiva com os alunos, porque eu sei que além das dificuldades da educação, eles têm uma carência afetiva muito grande, então de certa forma isso contribui para que eles tenham uma dificuldade maior. Isso é muito fácil de observar no contato que a gente vai tendo com eles. Estou aprendendo a lidar com isso sem deixar de virar as costas pra essa situação, porque eu acho que é necessário que o professor tenha um desenvolvimento não só ao nível de educação, mas até ao nível de ser humano, de estar interagindo com eles.

O terreno fértil para a aprendizagem precisa ser trabalhado como a terra

para plantio. Onde a aridez é difícil de domar, o cuidado, planejamento e carinho

devem ser redobrados.

Entre 1995 e 2008, segundo informação da coordenação do Curso de Artes

Visuais da Universidade Federal do Pará, 308 estudantes obtiveram a licenciatura,

mas poucos seguem adiante como educadores. Um dos fatores pode ser a carência

de Bacharelados, só recentemente sendo estruturados onde antes só havia a antiga

habilitação em Educação Artística (termo definido pela Lei. 5.692 de 1971) os

estudantes fazem planos de direcionarem sua formação para outras áreas como

Design, Vídeo, Moda ou a carreira de Artistas Plásticos, sem ligação com a

docência.

Com uma formação direcionada exclusivamente para a formação de

professores e com ênfase no desenvolvimento e capacitação dentro da Proposta

Triangular, o quadro pode ser revertido, com reflexos nos futuros trabalhos

acadêmicos e pesquisas em sala de aula.

2.9 Pluralidade Cultural

No plano de curso da Escola de Aplicação, (sob o título A Arte no Paleolítico

Superior e Neolítico-Abordagem sobre a Cultura Africana) a “atenção, juízo de valor

e respeito às diferenças culturais” é abordado constando nos objetivos atitudinais do

segundo bimestre da 1ª série do ensino fundamental. Mas não fica claro como essas

diferenças devem ser abordadas, nem como a contextualização desses elementos

africanos deve ser colocada para os alunos. A “autonomia na manifestação pessoal

para fazer e apreciar arte” pode acabar sendo aplicada equivocadamente como livre-

expressão.

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Segundo um dos objetivos para a Arte-Educação presentes no livro dos

PCN’s (1998, p.50) que é “acolher a diversidade do repertório cultural que a criança

traz para a escola”. Ana-Mae Barbosa é uma grande defensora do respeito à

pluralidade cultural na educação. Apesar desses referenciais, a cultura de

comunidades oprimidas e/ou carentes dificilmente é explorada nas aulas, sendo

ignoradas em detrimento do que se considera mais significativo, rico e “correto”.

A tendência, no ensino de Arte é reproduzir conceitos de Arte Modernistas largamente aceitos nos meios acadêmicos. Este enfoque exclui todas as Artes chamadas “menores”, e com elas toda a possibilidade de um trabalho multicultural em Arte.(...). (RICHTER, 2007, p.91).

Conquistar o interesse dos estudantes, muitas vezes visto como uma

dificuldade , pode partir desse principio, passando pela aproximação do seu mundo

interior e da visão que possuem de seu cotidiano. A face perversa do processo de

globalização, decorrente do aumento do consumo e do individualismo, se reflete no

aumento da miséria, segregação e desigualdades sociais. A Arte ainda é vista por

muitas comunidades carentes como algo distante de suas realidades, podendo

provocar o distanciamento.

Na sala de aula, criar uma atmosfera de investigação a cerca da vida

cotidiana do grupo em que se encontra inserida a escola, é o caminho para não se

cair apenas no que Ana-Mae e outros autores criticam como “multiculturalidade

aditiva”: apenas adicionar tópicos de outras culturas a uma cultura dominante, sem

levar em consideração que cada um de nós participa de mais de um grupo social.

Para que os alunos comecem a aceitar e valorizar sua própria identidade

plural, o processo deve se iniciar a partir da escola, que precisa fazer uma avaliação

do quanto está distanciada ou não da comunidade carente ou oprimida em que se

encontra inserida. A indiferença deve-se ao costume do olhar e da rotina, não indo

além de uma indignação tímida ou muda, mas que não pode tornar-se hábito do

verdadeiro profissional comprometido com a Educação.

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Nos PCNs de Arte de 5ª a 8ª séries, elaborados posteriormente, as elaboradoras optaram por uma abordagem mais coloquial e mais inquiridora. Neles foi feita a substituição do termo “reflexão” pelo termo “contextualização”. É claro que trata-se de mudança de conceito e não de apenas de termo. A ênfase na contextualização é essencial em todas as vertentes da educação contemporânea, quer seja ela baseada em Paulo Freire, Vygotski, Apple, ou genericamente construtivista, para parecer original como quis para nós César Coll. Sem o exercício da contextualização corremos o risco de que, do ponto de vista da arte, a pluralidade cultural se limite a uma abordagem meramente aditiva. (BARBOSA, 1998, p.93).

Nas comunidades carentes a luta precisa ir além das condições precárias

encontradas: Necessita de autocrítica por parte do Arte-Educador diante de suas

próprias metodologia e ações. A auto-análise deve ser constante, para que não se

caia na armadilha de levar aos alunos apenas símbolos que nada dialogam com a

realidade que vivenciam, caindo no vazio de termos distantes, só porque o educador

considera que são os mais corretos e significativos para ensinar Arte.

Reforçar a herança cultural e estética local é de suma importância para um

ensino de Artes completo, mas como alerta a autora Ana-Mae Barbosa, o Arte-

Educador deve ter o cuidado para não incentivar a criação de guetos culturais e

impossibilitar a apreensão e decodificação dos “Códigos de Poder”. Estes devem ser

apreendidos por aqueles que não possuem acesso às camadas mais eruditas, mas

os códigos que também fazem parte de sua cultura devem se articular com esses

conteúdos.

É através da contextualização de produtos e valores estéticos que a atitude multiculturalista é desenvolvida. Daí minha oposição à triangulação explicitada pelos PCNs, 1ª a 4ªa séries, qual seja a ação, apreciação e reflexão. Considero que a reflexão é operação envolvida tanto na ação como na apreciação. Insistir em destacá-la seria subscrever a estética escolástica, que desprezava a arte ”interessada no social” e temia o pelo aos sentidos, isto é , à sensorialidade e à sensualidade conatural à arte, como Platão já antes o demonstrara. Exacerbava a intelectualizarão da arte como correção aos seus aspectos sensoriais considerados enganadores da mente. (BARBOSA, 1998, p. 92).

No caso da Arte-Educação local, os artistas paraenses são pouco

trabalhados ainda, como Eliene Tenório, Miguel Chikaoka, Theodoro Braga, Paula

Sampaio, Julieta de França, Mario Klautau, Luiz Braga, Emmanuel Nassar e

inúmeros outros, ou tradições e manifestações como Grafite ou cerâmica Marajoara,

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com exceções exemplificadas na Escola de Aplicação e Paes de Carvalho, em que

se busca essa aproximação dos signos locais.

A educadora Alice Miranda busca aproximar seus alunos desses trabalhos

incentivando atividades nos museus, principalmente na época de exposição de

salões como o Arte-Pará, que ocorrem no segundo semestre, como relata em

entrevista. (Ver anexos)

A professora Amélia Guerra buscou trabalhar com os elementos da tradição

de festas juninas, fazendo uma leitura dos signos compositivos e das cores. As

crianças desenharam as ruas onde moram, decoradas e com cenas típicas da época

e o que seria “caipira” em seu cotidiano.

No que diz respeito à cultura local, pode-se constatar que quase sempre apenas o nível erudito dessa cultura e admitido na escola (Tarsila, Portinari, etc.). As culturas de classes sociais economicamente desfavorecidas continuam a ser ignorados pelas instituições educacionais mesmo pelos que estão envolvidos na educação dessas classes. (BARBOSA, 2007, p.19-20).

Dificilmente um professor encontrará condições prontas e satisfatórias, ou

alunos já preparados com uma boa base de conhecimentos para desenvolver sua

função. Em alguns casos encontrará educandos ainda analfabetos, ou que estão

tendo contato com a disciplina pela primeira vez, mas podem reverter esses quadros

através de ações conscientes e focadas em metodologias sérias, bem

fundamentadas e constante aprimoramento pedagógico.

Um dos erros mais funestos que podemos cometer, enquanto estudamos como alunos ou professores é recuar em face do primeiro obstáculo com que nos defrontamos. É o de não assumirmos a responsabilidade que a tarefa de estudar nos impõe, como, de resto, qualquer tarefa o faz a quem a deve cumprir. (FREIRE, 1995 p. 28) .

Trabalhar essas diferenças, principalmente em uma diversidade cultural tão

rica quanto a do Brasil, sem dúvida se configura como um desafio, mas que pode

render ações importantes que promovam a auto-estima dos alunos e despertem

neles a consciência da herança que muitas vezes ignoram em suas comunidades e

história de vida.

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CAPÍTULO 3 – DESENVOLVENDO UM ENSINO DE ARTES VISUAIS DE

QUALIDADE

Alguns dos educadores colocaram em suas metodologias muito da Proposta

Triangular, buscando formular seus conteúdos de acordo com o que acreditam ser a

aproximação mais efetiva de cada um dos eixos de ação. Segundo os planos de

curso (ver anexos) disponibilizados para guiá-los em suas práticas, buscaram

trabalhar esses tópicos, conseguindo resultados ora bastantes satisfatórios, que

instigaram os alunos a refletirem em cima do que foi visto e transformaram suas

aulas em Ensino através da Arte efetivamente.

Na observação geral da experiência de cada professor, nem sempre todos

os eixos de ação são desenvolvidos no processo, sendo que algumas vezes é dada

uma ênfase maior na prática da materialidade, do fazer artístico, ou da crítica da

obra, ou da história da Arte, dependendo da dinâmica das aulas.

O que se observa é que não é a Escola (com as meritórias exceções) que

está procurando adaptar-se a Proposta Triangular para o ensino de Arte, mas sim o

educador que está buscando adaptar sua metodologia à Escola e às condições

oferecidas por ela. Ao não buscar essa adaptação, corre o risco de ver sua prática

reduzir-se a uma metodologia vazia e infrutífera.

Como no caso do Colégio Paes de Carvalho, com carga horária apenas de

45 minutos por aula, é necessário que se faça uma redução muito drástica dos

processos idealizados pela professora, ou que se negocie com outros professores

sobre seus horários de aula para que se possa fazer algo mais extenso e contínuo

com as turmas, sem que aconteça um desinteresse por parte dos mesmos devido ao

intervalo entre uma aula e outra durante a semana.

A quantidade de aulas muitas vezes é limitada ainda mais pelos inúmeros

feriados, de modo que ao final do semestre, as aulas efetivamente ministradas não

chegam nem à metade do inicialmente programado. A falta de continuidade, aliada

aos poucos minutos de aula dificulta o trabalho da educadora.

Alguns professores sem disporem dos meios adequados para desenvolver

sua disciplina, buscam da melhor forma possível criar as oportunidades e soluções

que permitam um ensino de Artes de qualidade. Estes de fato conseguem realizar a

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Educação através da Arte, utilizar a Arte como conhecimento e não como devaneio

criativo sem objetivos ou pura recreação.

A profissão de Arte-Educador (o professor brasileiro de uma forma geral)

encontra-se ainda em dilemas e crises de identidade que tem afastado cada vez

mais potenciais profissionais para a área, desistindo ainda na sala da universidade

perante o choque da realidade do estágio. Mas segundo a fala de Ana-Mae Barbosa

(2007):

Somente a ação inteligente e empática do professor pode tornar a Arte ingrediente essencial para favorecer o crescimento individual e o comportamento de cidadão como fruidor de cultura e conhecedor da construção de sua própria nação.

É necessário que se comece a parar de culpar “o Sistema que não funciona”

por todas as mazelas do ensino brasileiro. Ter a consciência de que o Sistema é

composto de pessoas, e que a ação e competência delas é que fazem ou não com

que essa rede intrincada funcione. Como professores também fazem parte desse

sistema que não titubeamos em criticar.

Nos três casos estudados, os educadores com o espaço adequado e carga

horária de duas horas para cada aula, enfatizaram mais o fazer artístico e a

apreciação.

Um dos educadores manteve como cuidado na contextualização, utilizar

com freqüência os recursos audiovisuais disponíveis na escola. Por trabalhar com

educação infantil, imagens são utilizadas com mais freqüência ao texto.

Alguns educadores ao utilizar a contextualização, preocuparam-se mais com

o teor biográfico do que com a análise da significância da obra do artista para o

momento em que foi concebida e sua estrutura como linguagem visual. Anamelia

Buoro (2003, Pg.65) comenta:

Já afirmei mais de uma vez que a formação do educador de arte brasileiro tem privilegiado a força do fato histórico ou biográfico sobre o conhecimento da estrutura da linguagem da obra de arte. A persistência dessa visão historicizada, no bojo da qual o renascimento desponta como momento máximo da História da Arte, será assunto retomado na segunda parte deste trabalho. Tal condicionamento não está, contudo, restrito à visão do professor de arte no Brasil. De acordo com Jean Galard, diretor cultural do Louvre, em artigo publicado no caderno de Resenhas da Folha de São Paulo, de 8/1/2000 sobre a exposição “O Barroco Brasileiro”, montada no

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Petit Palais de Paris, “A imprensa francesa, não nos espantemos, estendeu-se longamente sobre o destino do Aleijadinho, sobre sua biografia assombrosa, na fala de poder analisar sua obra de outro modo, repetindo, a propósito desse artista, que ele é o Michelangelo brasileiro. (GALARD, 2000).

No caso da instituição que não dispõe de laboratório para aula de artes, é

privilegiada a contextualização em detrimento do fazer, ou seja, as aulas se

resumem muitas vezes à História da Arte e a cópia de conteúdos no caderno. A

apreciação esteve presente em todas as metodologias observadas, na Escola de

Aplicação ela se dá também com relação aos trabalhos realizados pelas turmas,

oportunizando reflexão e descoberta do aluno de seu próprio potencial criativo.

Existe essa oportunidade quando os alunos podem produzir.

Quando não há elaboração de trabalhos plásticos ou exercício da

materialidade, a apreciação se restringe a reprodução de obras de artistas

reconhecidos.

A proposta triangular é sistema cuja proposição depende da resposta que damos à pergunta: ”Como se dá o conhecimento em arte?”. Portanto, qualquer conteúdo, de qualquer natureza visual e estética, pode ser explorado, interpretado e operacionalizado através da Proposta Triangular. (BARBOSA, 1998, p.38).

Segundo a autora Ana Mae Barbosa, a Proposta Triangular pode ser

aplicada a partir do Fazer Artístico, mas quando não há a possibilidade de um

espaço para criação plástica, alguns educadores observados por ela em seus

estudos sentem-se impossibilitados de realizar algo.

Uma cultura de atelier ainda é muito propagada quando se refere ao ensino

de Arte, em que se imagina logo aulas com tintas, telas, papéis, argila e materiais

recicláveis para que possa realizar uma escultura ou pintura.

Essa atitude é equivocada, já que trabalhos como uma instalação ou

exposição podem ser planejados a partir do uso de elementos disponíveis. Como,

por exemplo, o simples uso do recurso fotográfico presente nos celulares dos

alunos, como exemplificado por um estagiário da Escola de Aplicação, que registrou

um grupo de crianças montando uma composição com flores na areia.

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Ele fotografou o processo e o resultado final: Uma flor em um canudo

plástico, utilizando à areia como ‘vaso’, em uma composição que se equilibrava entre

o artificial e o orgânico.

Criar é, basicamente, formar. É poder dar uma forma a algo novo. Em qualquer que seja o campo de atividade, trata-se, nesse ‘novo’, de novas coerências que se estabelecem para a mente humana, fenômenos relacionados de modo novo e compreendidos em termos novos. O ato criador abrange, portanto, a capacidade de compreender; e esta, por sua vez de relacionar, ordenar, configurar, significar. (OSTROWER, 1991, p.9).

O estagiário soube enxergar a poética em um ato aparentemente comum de

crianças brincando na areia, para idealizar, resignificar e reconfigurar em um

trabalho futuro. Por que não propor aos alunos que façam o mesmo a partir de

recursos comuns entre eles ou dentro de suas possibilidades? Sentindo-se em

dificuldade de elaborar algo, o educador pode observar os recursos disponíveis e

elaborar estratégias para contornar as carências presentes no meio em que atua.

“A perplexidade e a crise de paradigmas não podem se constituir num álibi para o imobilismo”. (GADOTTI, 2000).

Um educador pode ensinar apenas aquilo que conhece e sendo assim, para

que tenha sucesso na tarefa de formar leitores visuais, deve capacitar-se ele próprio

no domínio dessa habilidade. O ambiente é retransformado pelo leitor visual através

do olhar diferenciado que lança sobre o que para a maioria é fixo e imutável. É

necessário fazer-se analista, observador, antes de fazer-se critico.

Muitas vezes é possível elaborar aulas de Arte com muito pouco sem que se

perca a qualidade do aprendizado.

O excesso de estrutura em alguns casos pode até mesmo atrapalhar

dependendo da proposta, pois ter várias tintas, argila, mesas para trabalhar, telas ou

pincéis em abundância não são garantia de uma aula satisfatória ou produtiva.

Alguns alunos durante a pesquisa na Escola de Aplicação (2º ciclo) expressaram

certa preferência por aulas mais academicistas, questionando o porquê de não

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utilizarem as telas do laboratório com mais freqüência em aulas de pintura de

paisagens ou de naturezas mortas.

Alguns demonstram surpresa e questionam sobre a necessidade de terem

um caderno para Arte, como constatado em uma turma da 1ª série, quando uma

aluna perguntou, gesticulando com o caderno em mãos: “Pra que, professor? Pra

que caderno pra Arte?” Ou mostram-se mais acostumados com a atitude mecânica

de copiar conteúdos do quadro, demonstrados em turmas de adolescentes do 1º

ano.

São dificuldades herdadas do longo processo histórico de experiências

equivocadas na arte-educação do país, que aos poucos poderão ser combatidas,

seguindo a tradição de lutas da educação em artes no Brasil, com a perseverança

de educadores conscientes e mais preparados, e escolas que realmente busquem

coerência em sua missão sócio-pedagógica.

Ainda há muito que se pesquisar sobre o cenário da Arte-educação no país,

e mais ainda em regiões como o Norte e o Estado do Pará. Este trabalho, que se

limitou a instituições da região metropolitana, buscou também ser uma abertura para

que novas pesquisas sejam feitas voltadas para a realidade e aspectos da região,

principalmente no interior do Estado.

O Estado do Pará possui suas próprias particularidades que merecem

investigação e aprofundamento. Para isso será necessário que o professor em

formação esteja engajado quanto às necessidades que a cultura local requer.

Também precisa analisar se suas percepções dessas necessidades estão de acordo

com conceitos realistas, ou se estão baseados em preconceitos ou perspectivas

irreais.

Um exemplo seria a facilidade de acesso à imagem e avanços na qualidade

gráfica das reproduções de obras de arte que melhoraram consideravelmente nos

últimos anos, garantindo ao professor material abundante para sua metodologia,

mas que dificilmente se aplica aos educadores sem recursos como Internet ou livros

atualizados em localidades distantes dos grandes centros urbanos. Há ainda o

questionamento sobre a qualidade conceitual do que está ao alcance desses

professores para suas aulas.

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Cabe a região uma maior articulação entre os Arte-Educadores da capital e

do interior do estado, através do compartilhamento de experiências e debates; como

os realizados pelo Projeto Arte na Escola pelas localidades ribeirinhas, ou

dificilmente se terá um panorama coerente das necessidades e possíveis soluções.

Essas mudanças devem ser pensadas em conjunto e estruturadas passo a passo,

de forma a se estabelecerem de forma sólida e objetiva.

O Arte-Educador não conseguirá desempenhar sua função de forma

eficiente sem assumir de fato sua identidade como tal, correndo o risco de se perder

em metodologias sem foco ou levar o conteúdo como simples expontaneismo, sem

nada adicionar ou até mesmo prejudicar a formação estética, crítica e cultural dos

alunos.

“Reconhecer a importância de nossa tarefa (professor) não significa pensar que ela é a mais importante entre todas. Significa reconhecer que ela é fundamental. Algo mais: indispensável à vida social”. (FREIRE, 1995, p.32).

A visão de mundo do aluno, formada do diálogo entre sua vivência interior e

os códigos exteriores apreendidos de forma crítica e consciente através da Arte, é

um “letramento” tão importante quanto à alfabetização dentro da língua pátria,

propiciando ao sujeito condições de (re) transformar seu meio e sua realidade, como

verdadeira liberdade de escolha e avaliação das perspectivas disponíveis na

comunidade em que se encontra inseridos.

Com plena consciência de seus deveres e direitos, o cidadão devidamente

educado pode ser o agente modificador de uma nação verdadeiramente evoluída.

Esse é o único caminho para qualquer país comprometido com progresso real e não

ilusório. Nenhum progresso verdadeiro pode ter alicerces sólidos com uma

população mergulhada na ignorância de seus direitos básicos ou de seu patrimônio

cultural.

O pensamento pregado precisa se refletir no campo da prática. A Arte é

construção humana, comunicadora de idéias. É texto visual. Através dela também se

amplia o universo, através da adequada leitura de seus elementos e contextos. Não

significa mais somente entender sobre artistas e obras famosas, em um acúmulo de

informações desprovidas de significação e proximidade do cotidiano, morrendo no

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papel logo esquecido nas pilhas de trabalhos escolares. É a ampla e profunda

compreensão das coisas, da vida e da sociedade que a produziu, abrindo caminho

para a transformação de suas falhas e carências.

Em entrevista concedida para Rita Inês Petrykowski Peixe, Mestre em

Educação pelo programa de Mestrado UnC/UNICAMP, Ana-Mae Barbosa (2003)

comenta:

A imagem visual está cada vez mais prioritária no mundo. Você vive bombardeado de imagens através da televisão, do computador, do outdoor; você entra num supermercado e as imagens obrigam-no a comprar. Você deve ser capaz de desenvolver a capacidade de ler tudo isso, ser crítico e não ser presa fácil do consumo; é ser capaz de analisar o produto, mesmo que a visualidade deste produto seja absolutamente atraente, ser capaz de pensar no “Reebock” não somente como um sapato que a televisão está vendendo como objeto de desejo de um adolescente, mas como uma fábrica, que utiliza crianças em todo o mundo subdesenvolvido, as explora no trabalho escravo em países como Filipinas. Você percebe que é preciso os governos, a UNESCO interferirem para que acabem estas distorções. Isto é o desenvolvimento da leitura visual do mundo para você fazer uma crítica social deste mundo.

Os professores pesquisados constatam no cotidiano, que a participação dos

pais e da comunidade na educação visual dos alunos tem se tornado essencial, pois

muitos ainda questionam a importância da disciplina. Ainda possuem a velha

imagem do ensino de Arte baseado apenas no desenho e pintura livre. Ficam

surpresos ao constatar que há todo um planejamento e trabalho teórico no ensino,

que hoje é ministrado aos seus filhos.

Pelo desconhecimento dessa abordagem contemporânea no ensino de Arte,

acabam por vezes sem compreender o trabalho do Arte-educador. Episódios como

esses vem se tornando menos freqüentes, graças ao trabalho dos professores no

incentivo de participação da família e da comunidade no acompanhamento da

educação dos alunos.

A participação dos pais torna-se importante, a partir do momento que

compreendem melhor o processo de trabalho do professor de Arte. Sendo que a

continuidade da educação se dá fora da escola, na comunidade e no meio familiar,

as ações devem estender-se também para a conscientização da comunidade e

família, para que o processo não seja prejudicado.

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Ana-Mae Barbosa (2006), em entrevista cedida a Carta Maior, responde ao

questionamento sobre o porquê de se ensinar Arte na escola é tão importante:

Para trabalhar construção e cognição. Na construção da Arte utilizamos todos os processos mentais envolvidos na cognição. Existem pesquisas que apontam que a Arte desenvolve a capacidade cognitiva da criança e do adolescente de maneira que ele possa ser melhor aluno em outras disciplinas. A música desenvolve diversos processos cognitivos, comparando, organizando, selecionando. Em Arte, opera-se com todos os processos da atividade de conhecer. Não só com os níveis racionais, mas com os afetivos e emocionais. As outras áreas também não afastam isso, mas a Arte salienta ou dá mais espaço. Para desenvolver a criatividade em ciência, a criança tem que ter certo QI racional. Para desenvolver através da Arte, a necessidade de QI é muito menor. Significa que ele procura outros caminhos cognitivos. Eu acho que, em primeiro lugar, a função da Arte na Educação é essa, desenvolver as diferentes inteligências.

Ainda em outra entrevista cedida à mesma revista, a autora critica o descaso

com o ensino de Artes no país e o argumento das escolas, de que o custo com

professores especialistas para cada linguagem inviabiliza a adoção de projetos mais

completos, e eliminação da prática de educadores multidisciplinares:

Eu estou cansada dessa conversa de que custa caro. Custa caro colocar os menores na FEBEM. Um país que gasta mais dinheiro com prisão do que com educação tem que mudar. É factível. Acontece que, em países como a Inglaterra, Portugal e Canadá eles estão atentos a isso e defendem a Arte na Educação. Eles fazem o trabalho em conjunto do professor com o artista. É preciso aliar esse trabalho. O contato do artista é importante para provocar e trazer os debates contemporâneos para as salas de aula, abrindo os olhos para diferentes codificações. (BARBOSA, 2006).

Há os exemplos de excelentes iniciativas desenvolvidas pela Escola de

Aplicação e o Sistema Integrado de Museus, que devem servir como exemplo e

ponto de partida para novas experiências na rede de ensino. Por exemplo, oficinas

de fotografia para o ensino médio, ministrada por importantes nomes da área, têm

aberto novas perspectivas para esses alunos, ainda acostumados com o ensino de

arte baseada apenas nas linguagens tradicionais.

A formação acadêmica continua não preparando de forma satisfatória os

professores que estão ingressando na carreira, sendo que o choque entre o que é

estudado na faculdade e a realidade da sala de aula ainda é muito grande. Apesar

disso, há avanços que não devem parar diante do que já foi feito, devem instigar

novas pesquisas e experiências para que a educação em Artes avance e persista na

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conquista de um cenário educacional de qualidade e valorização de educadores e

educandos, que todos desejam.

Nos casos pesquisados, foi possível constatar que os educadores de hoje

estão buscando mais a unidade, a integração e troca de experiências, para um

melhor aperfeiçoamento de suas metodologias. Os professores pesquisados

responderam em entrevista ter tido contato com a Abordagem Triangular ainda na

universidade, e através de contato direto com Ana-Mae Barbosa, em cursos de

capacitação e Formação Continuada.

Antigos na carreira, ou ainda inexperientes, os Arte-Educadores atuantes

hoje sabem que, como em qualquer outra área profissional, precisam estar em

constante busca pelo conhecimento, ou correm o risco de se tornarem obsoletos.

Estão cientes de que, além de prejudicarem a si mesmos, a falta de reciclagem e

aperfeiçoamento prejudicará também aos educandos sob a responsabilidade desses

profissionais.

A visão de que a Arte está presente na vida diária e não apenas nas

galerias, ateliers e espaços museológicos também vem se ampliando, não só entre

professores e alunos, mas também entre os pais, que vem sendo também

conscientizados sobre o atual ensino de Artes.

(...) a arte nem sempre se apresenta no cotidiano como obra de arte. Mas pode ser observada na forma dos objetos, no arranjo de vitrines, na música dos puxadores de rede, nas ladainhas entoadas por tapeceiras tradicionais, na dança de rua executada por meninos e meninas, nos pregões de vendedores, nos jardins, na vestimenta, etc. O incentivo à curiosidade pela manifestação artística de diferentes culturas, por suas crenças, usos e costumes, pode despertar no aluno o interesse por valores diferentes dos seus, promovendo o respeito e o reconhecimento dessas distinções; ressalta-se assim a pertinência intrínseca de cada grupo e de seu conjunto de valores, possibilitando ao aluno reconhecer em si e valorizar no outro a capacidade artística de manifestar-se na diversidade. (PCNS. p.37).

Afinal, como enfatizado pelo professor Maurício Calderaro, é importante que

o espaço de aprendizagem não se resuma somente ao espaço escolar: toda a

cidade pode ser explorada como laboratório pelo olhar atento e desperto de alunos

devidamente estimulados por um ensino de Artes de qualidade.

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O mundo atual caracteriza-se por uma utilização da visualidade em quantidades inigualáveis na história, criando um universo de exposição múltipla para os seres humanos, o que gera a necessidade de uma educação para saber perceber e distinguir sentimentos, sensações, idéias e qualidades. Por isso o estudo das visualidades pode ser integrado nos projetos educacionais. Tal aprendizagem pode favorecer compreensões mais amplas para que o aluno desenvolva sua sensibilidade, afetividade e seus conceitos e se posicione criticamente. (PCNs, 1997, p.45).

Os professores pesquisados buscam a qualidade do seu ensino pelo

constante aprimoramento, pesquisa e estudo de novas formas de metodologia, pelos

mais diversos recursos, seja por livros, internet ou no contato com outros arte-

educadores. Esse compartilhamento de experiências é de vital importância para que

a Abordagem Triangular não caia no vazio metodológico.

A Internet, sendo vista por muitos como uma fonte não confiável de

informações, não pode ser ignorada como meio importante de interação entre os

professores, se bem usada.

Os sites (como do Projeto Arte na Escola) voltados para a Arte-Educação,

tem auxiliado muitos professores na divulgação das experiências de sucesso

baseadas na triangulação Ler-Fazer-Contextualizar, por meio de discussões on-line

e integração de diversas regiões do país.

Outra constante nos três casos é o planejamento cuidadoso das aulas e

conteúdos, não ficando apenas no direcionamento dado pelas instituições através

das Propostas Curriculares e Planos de Curso.

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4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Um trabalho como esse leva a muitas reflexões quanto à qualidade do

ensino brasileiro, ainda com fortes deficiências e escolas carentes de recursos. Mas

é gratificante constatar que mudanças estão sendo feitas, gerando experiências que

aos poucos tem formado cidadãos mais críticos e conscientes através da

alfabetização visual.

Como enfatizado durante o terceiro capítulo desse trabalho, ainda há muito

que se pesquisar sobre a Proposta Triangular, as experiências e resultados obtidos

pela sua aplicação na metodologia dos Arte-Educadores brasileiros.

Se há uma carência de estudantes da Licenciatura em Artes, engajados em

pesquisas dentro da área de Arte-Educação após a conclusão do curso, já é um

assunto para ser pensado e investigado mais de perto.

Mas as pesquisas voltadas para a educação em Artes que já surgem,

demonstram avanços significativos na mudança de paradigmas educacionais da

área, graças às metodologias transformadas por um maior interesse dos professores

em efetuar a auto-avaliação e constante reciclagem, comunidades escolares mais

conscientes de sua cultura, e escolas mais presentes na discussão de um melhor

ensino de Artes.

Sem dúvida há muitos outros educadores buscando a transformação do

Ensino de Artes, com base em experiências bem sucedidas na Proposta Triangular,

que merecem reconhecimento e estudo, porém o período para o desenvolvimento

desta monografia tornou-se curto diante da extensão de material. Apesar dos

poucos casos estudados, os momentos vivenciados em sala de aula foram muito

significativos e ricos, mostrando bons exemplos de qualidade pedagógica em Artes.

A reflexão sobre a própria prática torna-se característica do perfil de

profissionais competentes e preocupados com o direcionamento de suas ações.

Espera-se que essa característica esteja presente em um número cada vez maior de

Arte-Educador, Brasil afora.

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____________. Pedagogia da Autonomia - Saberes Necessários à Prática

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____________. Pedagogia da Indignação - Cartas Pedagógicas e outros

Escritos. São Paulo: Editora UNESP, 2000.

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Peregrino, Lívia Marques Carvalho, Fábio do nascimento Fonseca. Grupo Integrado

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Acessado em: 17/05/2009.

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Conheça o INEP. Disponível em: <http://www.inep.gov.br/institucional/>. Acessado

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ANEXOS

ANEXO 1 - Termos de Consentimento para Entrevistas

ANEXO 2 - Entrevista com Mauricio Calderaro

ANEXO 3 - Entrevista com Amélia Guerra

ANEXO 4 - Entrevista com Alice Miranda

ANEXO 5 - Planejamento de Arte para o ensino de 1ª a 4ª série - Escola de

Aplicação da UFPa

ANEXO 6 - Proposta Curricular para o Ensino Médio

ANEXO 7- Parâmetros Curriculares Nacionais-Artes

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