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Intercom Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sudeste São Paulo - SP 03 a 09/09/2016 A mudança histórica nas embalagens de Toddy: 80 anos de evolução. 1 Beatriz Braga Moura 2 Silvio Nunes Augusto Junior 3 Universidade de São Paulo, São Paulo, SP RESUMO Com base na análise 95 embalagens da marca Toddy, essa pesquisa possui como objetivo explorar as mudanças ocorridas nas embalagens e rótulos segundo uma perspectiva histórica, ocorrida ao longo dos 80 anos da marca. As características estéticas das embalagens foram sistematizadas em um banco de dados e posteriormente analisadas com objetivo de interpretar eventuais alterações em relação ao período histórico de sua circulação. PALAVRAS-CHAVE: embalagens; estética; design; achocolatado; Toddy. INTRODUÇÃO Esta apresentação é o resultado de dois trabalhos apresentados à disciplina de Teoria e Técnica Publicitária, sob a supervisão do professor Eneus Trindade e do monitor PAE Silvio Nunes Augusto Junior, no ano de 2015. Após imersão em alguns textos e autores que abordam o estudo da publicidade segundo uma perspectiva cultural (BARBOSA, 1995; TRINDADE, 2005; 2009), considerou-se pertinente uma reflexão sobre as embalagens da marca Toddy e sua transformação ao longo dos anos, enfatizando aspectos da emissão da mensagem por meio dos rótulos e do formato da embalagem em si. Com base na análise de 95 embalagens da marca Toddy, presente no Brasil desde 1933, essa pesquisa possui como objetivo explorar as mudanças ocorridas nas embalagens e rótulos segundo uma perspectiva histórica, destacando de que forma as mudanças estão relacionadas com as características comunicativas da emissão da mensagem. Historicamente, os produtos Toddy eram vendidos na década de 1930 como suplementos alimentares e destinados às mães shoppers. Com o tempo, adquiriu status de achocolatado em pó, usado para misturar-se ao leite quente. Em seguida a marca permaneceu inovando não só na categoria “achocolatado em pó” - como foi o caso das linhas light, 1 Trabalho apresentado no DT 2 Publicidade e Propaganda do XXII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sudeste realizado de 05 a 09 de setembro de 2016. 2 Estudante de Graduação do 4º semestre do Curso de Publicidade e Propaganda da ECA-USP, email: [email protected]. 3 Mestrando do PPGCOM ECA-USP. Integrante dos grupos de pesquisa GESC3 Grupo de Estudos Semióticos em Comunicação, Cultura e Consumo; e 4C Centro de Comunicação e Ciências Cognitivas, ambos vinculados à ECA-USP. email: [email protected]; [email protected].

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XXII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sudeste – São Paulo - SP – 03 a 09/09/2016

A mudança histórica nas embalagens de Toddy: 80 anos de evolução. 1

Beatriz Braga Moura2

Silvio Nunes Augusto Junior3

Universidade de São Paulo, São Paulo, SP

RESUMO

Com base na análise 95 embalagens da marca Toddy, essa pesquisa possui como

objetivo explorar as mudanças ocorridas nas embalagens e rótulos segundo uma perspectiva

histórica, ocorrida ao longo dos 80 anos da marca. As características estéticas das embalagens

foram sistematizadas em um banco de dados e posteriormente analisadas com objetivo de

interpretar eventuais alterações em relação ao período histórico de sua circulação.

PALAVRAS-CHAVE: embalagens; estética; design; achocolatado; Toddy.

INTRODUÇÃO

Esta apresentação é o resultado de dois trabalhos apresentados à disciplina de Teoria e

Técnica Publicitária, sob a supervisão do professor Eneus Trindade e do monitor PAE Silvio

Nunes Augusto Junior, no ano de 2015. Após imersão em alguns textos e autores que

abordam o estudo da publicidade segundo uma perspectiva cultural (BARBOSA, 1995;

TRINDADE, 2005; 2009), considerou-se pertinente uma reflexão sobre as embalagens da

marca Toddy e sua transformação ao longo dos anos, enfatizando aspectos da emissão da

mensagem por meio dos rótulos e do formato da embalagem em si.

Com base na análise de 95 embalagens da marca Toddy, presente no Brasil desde

1933, essa pesquisa possui como objetivo explorar as mudanças ocorridas nas embalagens e

rótulos segundo uma perspectiva histórica, destacando de que forma as mudanças estão

relacionadas com as características comunicativas da emissão da mensagem.

Historicamente, os produtos Toddy eram vendidos na década de 1930 como

suplementos alimentares e destinados às mães shoppers. Com o tempo, adquiriu status de

achocolatado em pó, usado para misturar-se ao leite quente. Em seguida a marca permaneceu

inovando não só na categoria “achocolatado em pó” - como foi o caso das linhas light,

1 Trabalho apresentado no DT 2 – Publicidade e Propaganda do XXII Congresso de Ciências da Comunicação na Região

Sudeste realizado de 05 a 09 de setembro de 2016. 2 Estudante de Graduação do 4º semestre do Curso de Publicidade e Propaganda da ECA-USP, email:

[email protected]. 3Mestrando do PPGCOM ECA-USP. Integrante dos grupos de pesquisa GESC3 – Grupo de Estudos Semióticos em

Comunicação, Cultura e Consumo; e 4C – Centro de Comunicação e Ciências Cognitivas, ambos vinculados à ECA-USP.

email: [email protected]; [email protected].

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orgânico e instantâneo, para ser consumido com o leite frio - mas também em uma nova

produção “achocolatado pronto”.

Em linhas gerais, as embalagens são o meio físico pelo qual a intenção do anunciante

e do cliente se materializam, refletindo características e peculiaridades de cada época da

sociedade. Relacionada com invólucro, recipiente ou embrulho de um material, trata-se de

uma necessidade, portanto uma forma primitiva de armazenar alimentos ou transportar

objetos. (MADI; COSTA; REGO, 2010, p. 111).

Com a Revolução Industrial e a produção em massa, a embalagem adquiri a tarefa de

fazer o produto ser reconhecido pelo consumidor, além de somente protegê-lo (YANAZE,

2006). Em resumo, pode-se dizer que o design estrutural e gráfico adquiriu uma função

comunicativa em suporte à venda das mercadorias.

Assim, estudar embalagens implica na investigação do impacto relacionado tanto à

emissão, quanto à recepção de um produto: as transformações dos rótulos e compartimentos

envolvem uma mudança na elaboração do design de acordo com sua época, pois

transformações culturais podem alterar a maneira como a comunicação das peças e

campanhas são elaboradas. Por exemplo, nos anos 50 a imagem de crianças fumando ou

manuseando um cigarro era comum de se ver em propagandas e produções cinematográficas.

Com o tempo, as próprias marcas de cigarro foram proibidas de veicular anúncios

incentivando o consumo de seus produtos, de modo que hoje o Conar tem um anexo de seu

Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária o qual restringe as peças relacionadas

a “Produtos de Fumo” (Anexo J).

Uma releitura sobre o caso dos cigarros de chocolate Pan, da década de 1980, por

exemplo, contribui para salientar em que medida as mudanças sociais impactam na produção

das peças publicitárias. Se a peça fosse ao ar em 2016 certamente sofreria críticas e seria

prejudicial à imagem da marca.

Dito isto, propõe-se apresentar os materiais coletados e métodos utilizados.

1. MATERIAIS E MÉTODOS

Com base em uma busca no portal da própria marca e via internet (google images),

foram encontradas 95 embalagens, submetidas ao formato de planilha para uma análise

descritiva das categorias consideradas pertinentes para uma investigação inicial, conforme

exemplo da Tabela 1:

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Tabela 1

Organização e categorização de imagens das embalagens Toddy

fonte: elaborado pelos autores.

As embalagens foram categorizadas de acordo com: 1) seu ano de produção/veiculação;

2) tipo do produto (achocolatado em pó, achocolatado líquido – ou pronto - e biscoitos); 3)

sabores (chocolate original, chocolates especiais, morango e baunilha); 4) peso (em

gramas/ml), formato (cilíndrico, quadrado ou em sachês); 5) materiais (plástico, alumínio,

vidro e papel); 6) cores, e 7) tipos de animação.

Considerou-se fundamental a sistematização das informações em uma planilha para que

o banco de dados pudesse ser posteriormente interpretado tanto de forma qualitativa quanto

quantitativa, fosse por meio da análise de conteúdo (BARDIN; KRIPPENDORF) ou por meio

de outras ferramentas, como seria o caso do software estatístico SPSS, por exemplo.

Em uma investigação qualitativa sobre as informações coletadas, observou-se que o

logo da marca Toddy é historicamente tipográfico e não foi alterado em termos de cor, pois

sempre foi vermelho, mas teve alteração no formato da letra. Seu contorno variou ao longo

do tempo, sendo que antes as letras eram serifadas e, mais recentemente, a tipografia

adequou-se a outros formatos que remetem a ideias de jovialidade, como ondulações e

impressões 3D - 58 embalagens analisadas continham ondas e splashs.

Esse tipo de alteração, como foi o caso da transição de serifa para formas mais

onduladas, motivou a pergunta de pesquisa que guiou esse texto: como as mudanças

ocorridas ao longo da história teriam influenciado a elaboração tanto da embalagem quanto

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da identidade visual do produto? Com objetivo de entender as mudanças ocorridas ao longo

dos 80 anos da marca, elaborou-se uma linha do tempo para situar as embalagens

historicamente, conforme Tabela 2:

Tabela 2

Os tipos de características foram dispostas nas linhas, enquanto que os anos considerados

relevantes foram dispostos nas colunas

fonte: elaborado pelos autores.

Em 1930 as embalagens de lata começaram a tornar-se populares, e eram utilizadas

desde em produtos alimentícios até em graxas de sapato ou cremes para cabelo. Nessa época,

as latas de Toddy eram vendidas em farmácias como suplemento alimentar às mulheres. Nos

próximos 30 anos, a embalagem sofreu poucas alterações. Adquiriam o forma de um cilindro

e possuíam dois tamanhos: o de 500g, que abria com uma chavinha, e o de 2kg, com tampa

de pressão.

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Talvez o vidro tenha vindo em 1962 para tirar essa concepção de produto medicinal

ou suplementar e começar a adquirir um visual mais estiloso e voltado ao universo das

bebidas; outros produtos bebíveis como foi o caso dos refrigerantes, por exemplo, eram

engarrafados em vidro. A mudança para o plástico duro - o polipropileno, que compõe 28

(29%) das embalagens do banco formado, pode ter ocorrido em virtude de maior proteção do

consumidor, evitando acidentes graves com a embalagem, e menor custo de produção.

No início de sua história, as embalagens Toddy não apresentavam tantas variações

estéticas de acordo com os tipos de produtos, sendo que o crescimento do portfólio em termos

de variedade é um processo recente para a marca. Entende-se que eram menos desenvolvidas

em termos de segurança, praticidade e apelo visual, sendo que não havia uso de muitas cores

e mascotes, por exemplo. Outra característica está relacionada à quantidade de texto disposta

nas embalagens mais antigas (mais texto, menos imagens).

Apenas 6 das 95 imagens coletadas apresentavam o primeiro símbolo de Toddy:

meninos brancos com gorros na cabeça, pintados em branco e vermelho. Essa ilustração

permaneceu no rótulo das embalagens de 1958 a 1967 nos achocolatados em pó com o

formato cilíndrico.

Na década de 80, feitas de plástico e com tampa de rosca, as embalagens já possuíam

um rótulo com mais ilustrações: o amarelo do fundo talvez tenha sido utilizado com objetivo

de destacar a marca Toddy em relação às marcas concorrentes nos pontos de venda. Nesse

período, os mascotes utilizados como Toddynhos e Indiozinhos passaram a ilustrar o produto.

O amarelo é a cor do “Toddy original”, mas também pode ser usada para biscoitos

com sabor tradicional, Toddynho de Doce de Leite ou Baunilha. O azul claro, a partir de

2004, se refere a produtos lights ou cujo sabor seja Brigadeiro; o azul escuro foi adotado para

a linha de biscoitos Toddy, simbolizando o sabor tradicional; o laranja, roxo, rosa utilizados

para biscoitos, achocolatados em pó e prontos, com sabores diferenciados como Napolitano,

Frutas, Brownie, entre tantos outros.

As informações apresentadas sobre as cores das embalagens coletadas estão

resumidas conforme informações do Gráfico 1.

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Gráfico 1

Dispersão de Cores em Embalagens do Banco Coletado

fonte: elaborado pelos autores.

Quanto ao peso das embalagens, pode-se notar que os mais leves, de 27g a 61g, são

bem recentes - a maioria é de 2012 - e correspondem a biscoitos e bolachas em embalagens

menores, utilizadas talvez para intervalos no trabalho ou na escola: a estratégia de pequenas

embalagens pode estar associada ao perfil do consumidor final.

A crescente demanda por refeições saudáveis tende a favorecer a oferta de

produtos em porções menores ou individuais. Dessa forma, as embalagens

podem contribuir para um consumo controlado e também aliar a questão da

saudabilidade à conveniência, com relação à portabilidade e facilidade de

consumo. (MADI; COSTA; REGO, 2010, p.116)

Ao isolar apenas as embalagens cilíndricas do banco, as quais numeram 39 ao todo,

nota-se que 13 delas são de “Cilíndro inteiro” - sem modulações em sua estrutura - e estão em

sua maioria entre os anos de 1958-1980 produzidas por vidro ou lata de aço.

Dentro deste universo ainda, 3 tem leves entradas espessas em seu formato e 2

possuem essas entradas mais estreitas do que as anteriores (ver Figura 1). São todas de

achocolatado em pó podendo ser feitas de polipropileno ou vidro - no caso das mais antigas.

Por último, 21 das 39 embalagens cilíndricas contém uma entrada fina em sua estrutura. Essa

tendência surgiu em 2008, se estendendo até hoje, e são formadas de polipropileno,

igualmente. O rótulo aumenta conforme diminui a espessura das modulações no pote de

achocolatado em pó, como foi descrito anteriormente.

Com objetivo de ilustrar as diferenças encontradas, algumas imagens das embalagens

encontradas foram agrupadas na Figura 1:

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Figura 1

Evolução do formato cilíndrico das embalagens de Achocolatado em Pó. Da esquerda para a

direita: 1970; 1980; 2000; 2015.

fonte: elaborado pelos autores.

Em resumo, nota-se que existem características que permaneceram ao longo das

gerações, como é o caso da cor amarela, como existem características que passaram por

transformações mais significantes, como o tamanho e o material das embalagens de

achocolatado em pó.

2. DISCUSSÃO: Mudanças na Estrutura Social e na Linguagem Publicitária

Nesta pesquisa, procurou-se verificar as mudanças ocorridas nas estruturas sociais e o

seu reflexo na comunicação publicitária da marca Toddy. Conforme explica Carrascoza

(2004), a escolha léxico-semântica de um texto publicitário ocorre em função do repertório

do público-alvo, com objetivo de aproximar marcas, produtos e consumidores. Por exemplo,

pode-se observar em uma peça publicitária de Toddy, veiculada na década de 80, a utilização

de duas crianças consumidoras para apresentar as embalagens de plástico. Nota-se, entre

outros detalhes, que o adulto responsável pelas crianças o qual aparece na gravação é uma

empregada: “Idolina, vou fazer meu Toddy” é uma das frases ditas pela personagem infantil.

Em uma análise sobre a estrutura social, a época e a semântica utilizada, Toddy, tanto

em relação às peças quanto em relação às embalagens, permite um questionamento sobre os

estereótipos utilizados como pontos de contato entre consumidores, produtos e marcas.

No caso do estereótipo da empregada que cuida das crianças, há um paralelo com o

núcleo familiar tradicional e idealizado da classe média, que era mantida pelo figura do pai

que trabalhador (GOLDANI, 1994)

A aproximação com o produto em si, nesse caso, ocorre pelos estereótipos que

reproduzem uma situação social e uma relação de consumo com a marca, pois não se trata de

"fazer um achocolatado", mas sim de "fazer um Toddy". O discurso publicitário reveste o

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produto achocolatado com a marca Toddy, que por sua vez passa a fazer parte da rotina de

quem consome o produto com nome de marca. Como explica Umberto Eco (1997, p. 180):

Se um anúncio implica uma grande quantidade de articulações lógicas e, no

entanto, é compreendido num relance, isso significa que os argumentos e

premissas que comunica já estavam assim codificados e sob a mesma forma

que aí assumiram, tanto que puderam ser compreendidos através de um

simples reclame.

Para Vander Casaqui (2008), as estratégias da linguagem publicitária tomam como

base o enunciatário, isto é, aquele para quem as mensagens são destinadas. Se antes a

utilização de crianças acompanhadas de uma empregada era considerada um estereótipo

adequado, pode-se observar uma mudança no discurso utilizado tanto pelas peças

publicitárias quanto pelos rótulos das embalagens. O estereótipo da emprega e a palavra

"família" não fazem mais parte do léxico-semântico que estabelece o ponto de contato entre a

marca e o consumidor. De acordo com a linha do tempo proposta na Tabela 2, atualmente

predomina a utilização do mascote e outras ilustrações.

Essa mudança na comunicação da marca teria ocorrido devido às mudanças sociais e

demográficas ocorridas na estrutura familiar brasileira a partir dos anos 70 e 80 (GOLDANI,

1994). De acordo com Ana Maria Goldani (1994), mudanças significativas ocorreram nos

núcleos e arranjos familiares, no número de casais com filhos e de mulheres ingressaram no

mercado de trabalho, contribuindo para a renda da família. O diagnóstico é de uma inevitável

mudança e adaptação de valores e práticas sociais.

O processo criativo, de acordo com Carrascoza (2007), se assemelha ao de um

bricoleur, o qual se trata de um profissional que compõe discursos de origens diversas com

objetivo de persuadir o público alvo:

Os “criativos” atuam cortando, associando, unindo e, conseqüentemente,

editando informações que se encontram no repertório cultural da sociedade.

A bricolagem, assim como o pensamento mítico, é a operação intelectual

por excelência da publicidade. (CARRASCOZA, 2007, p. 2)

Sobretudo nas campanhas de Toddy veiculadas na década de 1960 a 1980, a mulher

aparece sozinha segurando recipientes contendo o achocolatado. Poucas explicitam a relação

familiar, apesar da palavra "filho" ser recorrente nessas peças. Essa característica poderia

estar relacionada aquilo que aponta Goldani (1994) nas características dos perfis

demográficos encontrados em sua pesquisa, a qual destaca o aumento de mulheres que criam

seus filhos sem a formação de uma família tradicional.

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Foi encontrada em apenas uma peça de Toddy pronto, veiculada na década de 1980, a

utilização da palavra família: "Toddy Prontinho é ideal para sua família". eram os seus

dizeres, sob a imagem de um menino tomando a latinha de achocolatado pronto. Quando a

estrutura social iniciou sua transformação, aparentemente a marca parou de dar ênfase a esse

quesito e começou a valorizar a individualidade do jovem nos anos 2000 e seu contato com

os amigos.

De acordo com o relatório Brasil Foods Trends, que propõe uma divisão das

tendências alimentares em cinco categorias, a saber 1) sensorialidade e prazer; 2)

conveniência e praticidade, 3) saúde e bem-estar; 4) ética e sustentabilidade; 5) qualidade e

confiabilidade, nota-se que a marca Toddy está inserida na categoria de conveniência e

praticidade.

Classificações como “Toddypronto”, o “ToddyInstantâneo” e o “Toddyferente”, por

exemplo, tornaram-se mais frequentes para se adequarem às exigências do ritmo acelerado da

vida contemporânea. Essa é, de forma geral, uma característica dos produtos achocolatados,

uma vez que são produtos de rápido preparo e que exigem pouco trabalho em sua preparação.

As embalagens, nesse sentido, também são fáceis de abrir e descartar, pois parte de

uma lógica na qual o recipiente do produto deve colaborar para a agilidade do processo de

preparo. O polipropileno e a tampa com rosca, extinguindo a necessidade de uma chave para

abrir a lata - como era comum nos primeiros anos da marca, quando a embalagem ainda era

de alumínio - colaboram do mesmo modo para o ajuste de Toddy frente a estas tendências.

Além disso, o Toddynho é um exemplo de embalagem individual, a qual auxilia nas

chamadas refeições on the go, aquelas realizadas fora de casa, no trânsito ou na escola.

Por outro lado, Toddy também adequa sua estratégia comunicacional com tendências

alimentares ao lançar linhas de produtos voltada ao bem-estar, configurando a busca por um

estilo de vida mais saudável. Exemplos como Toddy Vitamina, Fit, Orgânico e Soja são

alternativas da marca frente a essa necessidade do mercado.

Das 95 embalagens analisadas, 18 apresentaram alguma informação que remete à

preocupação com a saúde do consumidor, seja informando a presença de menos gordura ou

utilizando a palavra “Saúde”, estratégia recorrente nas primeiras embalagens da marca. 58

das embalagens continham informações sobre vitaminas com objetivo de reforçar a ideia de

que a marca poderia complementar as refeições.

Os dizeres como “Contém 7 vitaminas”, “Vitaminado” e “Reforçado” também são

recursos discursivos que a marca Toddy utiliza para dar credibilidade ao produto, com o

objetivo não apenas de informar, mas também persuadir cada vez melhor o seu consumidor

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por meio do rótulo das embalagens. A sustentabilidade vem através do símbolo de reciclagem

presente no verso das embalagens, assim como nas brincadeiras de Toddynho as quais sempre

incentivam a criança ao consumo crítico e consciente dos alimentos.

Em relação às informações contidas nos rótulos, a lei n° 8.078 de 11 de setembro de

1990 do Código de Defesa do Consumidor estabelece que as informações não podem induzir

o consumidor a erro ou engano quanto a suas características. A Anvisa (Agência Nacional de

Vigilância Sanitária), o Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade

Industrial) e o Código de Defesa do Consumidor prezam pela presença dos itens presentes na

tabela 3, dentre outros, em rótulos de embalagens de alimentos.

Tabela 3

Informações obrigatórias em rótulos de embalagens segundo a Anvisa, Inmetro e Código de

Defesa do Consumidor.

Denominação de venda do produto e marca

Identificação da origem (país -

fabricante/produtor/importador/distribuidor)

Prazo de validade

Indicação quantitativa do conteúdo líquido

Instruções sobre o produto

Contato do serviço de atendimento ao consumidor

Cuidados de conservação

Simbologia indicativa de reciclabilidade do material e de

descarte seletivo

Lista de ingredientes

Declaração dos aditivos alimentares na lista de ingredientes

Declaração do valor calórico

Declaração de quantidade e/ou tipo de gordura e

informação nutricional complementar. fonte: elaborada pelos autores.

Assim, desde 2011, as informações nutricionais são colocadas na frente do rótulo de

Toddy, sempre seguidas do símbolo de reciclagem e da especificação de aroma do produto

assim como a identificação de glúten e outros ingredientes sintéticos. Da mesma forma,

foram encontradas informações que comunicam o consumidor sobre a existência de produtos

sintéticos, glúten ou até mesmo informações da própria empresa fornecedora em 16

embalagens da amostra utilizada para análise.

Uma das limitações desta pesquisa, nesse sentido, está relacionada à falta de acesso ao

material original, tanto das embalagens físicas e dos rótulos, quanto das peças publicitárias.

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Entende-se que essa limitação impediu uma análise e conhecimento mais detalhado sobre

outras informações eventualmente dispostas nos rótulos e versos das embalagens.

Tendo em vista a existência de agências reguladoras como o Conar, a Conanda e o

Procon, entre outros órgãos, há uma pressão para que os dados contidos nos rótulos sejam

cada vez mais claros e precisos, sem margem para interpretações incorretas que culminem em

uma experiência deceptiva.

3. CONSIDERAÇÕES

Tomando Toddy neste estudo como referência, podemos chegar a refletir sobre a

estratégia visual das marcas na tentativa de fidelizar e se adequar ao modo de vida do

consumidor ao longo do tempo. Toddy mudou o formato, o material e as cores de seus

compartimentos e criou personagens que reforçassem sua existência enquanto marca a fim de

facilitar a associação do consumidor no ponto de venda.

Limitamo-nos a analisar os fenômenos e a mudança diacrônica do design de Toddy,

mas estudos futuros poderiam tomar como objeto ainda mais o exercício de entender em que

medida a percepção dos dizeres em um rótulo afetam o momento de compra. Atrelando a isso

o aspecto da presença do mascote: será que este personagem distrai ou facilita de fato o

processo cognitivo do consumidor?

A marca de achocolatados teve que se modernizar para acompanhar o mercado.

Talvez daqui a alguns anos os rótulos adquiram texturas, cheiros e sons. A partir disso, novas

hipóteses poderão ser desenvolvidas e novos aspectos serão levantados. Por ora, as

ondulações, as cores, a extensa gama de produtos e o material resistente mostram que Toddy

está disputando considerável espaço no mercado da alimentação infantil, mas deve estar

atento a todos os desafios que certamente virão daqui em diante.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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