a internacionalização das comunicações no brasil

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  • 7/25/2019 A Internacionalizao Das Comunicaes No Brasil

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    Revista de Economa Poltica de las Tecnologas de la Informacin y Comunicacinwww.eptic.com.br, vol. IX, n. 2, mayo ago. / 2007

    A internacionalizao das comunicaes no Brasil: Rede Globo, Telefnica,Telmex e os mercados de telecomunicaes, TV de massa e segmentada e TV

    digital terrestre.

    Csar Ricardo Siqueira BolaoVerlane Arago Santos1

    rea Temtica

    rea Especial

    18. Brasil e Amrica Latina no Capitalismo Contemporneo

    Joo Antonio de Paula (UFMG), Franklin Serrano (UFRJ) e Rosa Maria Marques (PUC-SP)

    Formato de Apresentao:Submetido s sesses ordinrias

    Introduo

    O Brasil, durante dcadas, teve seu mercado de televiso completamente protegido por

    uma lei que proibia a participao estrangeira na propriedade de empresas de radiodifuso. Issono impediu que, em um dado momento, a TV Globo pudesse entrar no mercado com o respaldo

    de um acordo tcnico com o grupo Time-Life (considerado posteriormente inconstitucional),

    dando-lhe uma vantagem de precedncia que nenhum dos seus concorrentes jamais teve.

    Ao final do governo de Fernando Henrique Cardoso, no entanto, a regra mudou e passou-

    se a aceitar a participao estrangeira em at 30% do capital das empresas de comunicaes. A

    TV segmentada, por sua vez, entendida como servio de telecomunicaes, no impe limites

    participao estrangeira. Este ltimo fato conseqncia de movimentos iniciados tambm sob apresidncia Cardoso, que privatizou o setor de telecomunicaes, cuja principal parte ficou com

    as empresas Telefnica e Telmex, que possuem tambm importantes posies na Amrica Latina,

    inclusive no mercado de televiso.

    1 UFS, Brasil.

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    Revista de Economa Poltica de las Tecnologas de la Informacin y Comunicacinwww.eptic.com.br, vol. IX, n. 2, mayo ago. / 2007

    O debate em torno da implantao da Televiso Digital Terrestre no Brasil pode ser

    pensado com base nesse quadro. As disputas que culminaram com a escolha do padro japons

    ao final do primeiro governo de Luis Incio Lula da Silva, opunham, ao menos, grosso modo, trs

    tendncias: a do padro nacional, defendido pela sociedade civil organizada (movimentos pelademocratizao da comunicao), a do padro japons, cujo principal defensor era a rede Globo

    de Televiso, e a do padro europeu, de interesse, em especial, no que nos interessa, da

    Telefnica.

    A vitria, ao final, do padro japons no pode ser entendida simplesmente, nessas

    condies, como uma vitria do capital nacional, mas, ao contrrio, deve ser entendida como um

    movimento particular no interior de uma dinmica muito mais complexa de estratgias poltico-

    industriais, determinada pelas mudanas decorrentes da privatizao das telecomunicaes noBrasil, que promoveu uma importante internacionalizao do macro-setor das comunicaes no

    pas, colocando em xeque, em decorrncia da digitalizao e da convergncia, as posies

    hegemnicas consolidadas no longo perodo anterior privatizao2.

    Assim, ao final de 2006, o setor de TV a pagamento passava a ser disputado por duas

    grandes coligaes: Globo-Embratel-Televisa e TVA-Telefnica, evidenciando que a disputa no

    setor est definitivamente enquadrada nas tendncias da disputa global que tornam Telefnica e

    Telmex, as empresas que disputam a hegemonia no macro-setor das comunicaes na Amrica

    Latina.

    Sobre a privatizao das telecomunicaes no Mxico, Espanha e Brasil

    O movimento de reposicionamento de empresas multinacionais na rea das comunicaes

    durante as ltimas dcadas, principalmente a partir da dcada de 90, relaciona-se diretamente aos

    processos de desregulamentao, liberalizao e privatizao dos setores de infra-estrutura. Com

    a internacionalizao dos servios de telecomunicaes e a opo definida por cada pas quandoda mudana do marco regulatrio de seus mercados, definiu-se um novo quadro de participao

    dos grandes operadores no mercado mundial.

    2Enquanto articula para manter o negcio mais fechado possvel no Brasil, a Globo desenvolve vrios movimentosde internacionalizao. A respeito disso, ver Brittos (2005).

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    Revista de Economa Poltica de las Tecnologas de la Informacin y Comunicacinwww.eptic.com.br, vol. IX, n. 2, mayo ago. / 2007

    No mbito dos chamados pases desenvolvidos, a Telefnica ampliou consideravelmente,

    a partir de fins da dcada de 90, sua participao na receita operacional do mercado das

    telecomunicaes mundial e melhorou sua posio em termos de capitalizao em bolsa. As

    tabelas 1 e 2 apresentam os dados referentes a essas duas variveis, respectivamente, para ospases desenvolvidos e os chamados mercados emergentes.

    Chama a ateno que, nos anos s vsperas da privatizao, a Telebrs no apenas

    liderava o ranking nos chamados pases emergentes, tanto em termos de receita operacional,

    como de capitalizao em bolsa, situando-se bem acima dos resultados apresentados pela

    operadora que ocupava o segundo lugar no ranking, a Telmex, do Mxico, como se apresentava

    tambm, se somarmos os dados das tabelas 1 e 2, em posio superior, no que se refere segunda

    varivel, a de empresas como MCI (15 posio), da Telefnica (16), ou da Telecom Italia (21),posicionando em 10 lugar no ranking global de 1997, acima tambm da Telmex (19) e da

    Telekom Malasya (17), esta ltima praticamente empatada com a Telefnica.

    O Sistema Telebrs demonstrava, assim, a despeito dos cortes de investimento para o

    setor, ser bastante produtivo e rentvel, com nmeros superiores aos daquelas empresas que se

    tornariam hegemnicas no mercado brasileiro, aps a privatizao. O quadro 1 apresenta o

    mesmo rankingem 1999 e 2004, mostrando a subida meterica da Telefnica, da 15 para a 5

    posio, acompanhando o avano de sua atuao no mercado mundial, principalmente latino-

    americano. A Telebrs, evidentemente, j no aparece na lista.

    Tabela 1

    Ranking of Telecoms Operators (Developed Countries):by Operating Revenue and Market Capitalisation - 1995

    Operating revenue (US$m) Market capitalisation (US$m)

    1 AT&T 79,609 NTT 112,896

    2 NTT 73,500 AT&T 83,790

    3 Deutsche Telekom 48,049 GTE 39,344

    4 France Telecom 31,233 BT 36,913

    5 STET 26,470 BellSouth 36,654

    6 BT 22,572 SingaporeTelecom

    35,703

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    10. Mannesmann 10. Bell South

    11. Bell Atlantic 11. TEM

    12. Bell South 12. TIM

    13. Telecom Itlia 13. Telecom Itlia14. China Telekom 14. Telstra

    15. Telefnica 15. AT&T WirelessFonte: Relatrio Anual da Telefnica, 2003.

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    RevistadeEconomaPolticadelasTecnologasdelaInformacinyCo

    municacin

    www

    .eptic.com.br,vol.IX,n.

    2,mayo

    ago.

    /2007

    T

    abela2

    RankingofTelecomsOperators(EmergingMarkets):byOperatingRevenueand

    MarketCapitalisation-1995

    Operatingreven

    ue(US$m)

    Marketcapitalisation

    (US$m)

    1

    Telebras(TelecomunicacesBrasileiras)

    8,856

    Telebras(TelecomunicacoesBrasileiras)

    23,284

    2

    Telemex(Telefonos

    deMexico)

    5,542

    TelekomMalaysia

    17,292

    3

    TelefonicadeArgentina

    2,732

    Telmex(TelefonosdeMexico)

    15,938

    4

    Bezeq

    2,284

    PTTelekomunikasiIndon

    esia

    13,106

    5

    PTTelekomunikasiIndonesia

    2,172

    TelefonicadeArgentina

    5,612

    6

    TelekomMalaysia

    2,101

    TelefonicadelPeru

    5,489

    7

    Rostelecom

    2,047

    PakistanTelecomCorporation

    Limited(PTCL)

    5,165

    8

    TelecomArgentina

    1,992

    CompaniadeTelecomunicacionesdeChile

    4,800

    9

    KoreaMobileTelecom

    1,708

    SPTTelecom

    4,147

    10

    CompaniadeTelec

    omunicacionesde

    Chile(CTC)

    1,031

    TelecomAsia

    4,058

    11

    TelefonicadelPeru

    1,020

    KoreaMobileTelecom

    3,981

    12

    SPTTelecom

    1,001

    TelecomArgentina

    3,790

    13

    Matav(HungarianTelecommunicationCo)

    967

    PhilippineLongDistance

    Telephone

    Company(PLDT)

    3,266

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    RevistadeEconomaPolticadelasTecnologasdelaInformacinyCo

    municacin

    www

    .eptic.com.br,vol.IX,n.

    2,mayo

    ago.

    /2007

    14

    PhilipineLongDistanceTelephone

    Company(PLDT)

    964

    Indosat

    3,239

    15

    PakistanTelecomC

    orporation

    Limited(PTCL)

    931

    AdvancedInfoService

    3,046

    16

    UnitedCommunica

    tions(UCOM)

    559

    TotalAccess

    2,859

    17

    DACOM

    478

    UnitedCommunications(U

    COM)

    2,320

    18

    Indosat

    445

    DACOM

    2,156

    19

    TechnologyResour

    cesIndustries(TRI)

    439

    Rostelecom

    2,135

    20

    AdvancedInfoService

    395

    TechnologyResourcesInd

    ustries(TRI)

    1,989

    Fonte:KhairulAnnuarAziz

    andShafikAzleeMashar,

    GlobalTelecommunications.

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    O processo de desregulamentao, privatizao e liberalizao na Amrica Latina deve

    ser avaliado tendo como contexto as alteraes do marco produtivo e regulatrio do capitalismo,

    contrapondo-os aos casos da Inglaterra e dos Estados Unidos, de um lado, e a outros casos

    europeus, de outro (BOLAO, 1977; 2000). Esse processo de redefinio do marco regulatriodo setor d-se para cada pas, segundo as formas de estruturao e articulao de interesses

    sociais, bem como das condies de construo dos compromissos sociais caractersticas de cada

    sistema poltico (Carvalho Neto, 1998). O interessante dessas experincias que, se verdade

    que existe uma convergncia entre elas o propsito de reestruturar o setor de

    telecomunicaes em busca de vantagens competitivas em nvel internacional tambm

    verdade que as formas pelas quais buscam atingir tal fim, variam bastante (LARANGEIRA,

    s/d: 4-5).Na Espanha, o ordenamento jurdico em que se inseria a Telefnica foi alterado pela Lei

    de Ordenao das Telecomunicaes (LOT), que entrou em vigor em 01 de janeiro de 1988 para

    regulamentar as novas reas de atuao e competncia da estatal, que interpretou a aprovao da

    lei como uma oportunidade de ganhar acesso a novos negcios em regime de concorrncia. Nesse

    contexto, adotou uma nova imagem e um novo nome: Telefnica de Espaa, S.A. essa empresa

    que firma, em 1991, um novo contrato com o Estado, com uma vigncia de 30 anos, que veio

    substituir o anterior, vigente desde 1946.

    Inicia-se, assim, a reestruturao da empresa, pautada pelas exigncias da poltica de

    liberalizao adotada pela Unio Europia. Em 1995, o Governo tinha decidido desprender-se de

    12% do capital da Companhia, de propriedade estatal, iniciando assim a privatizao. Para tanto,

    foi criado um ncleo estvel de acionistas, formado pelos bancos Bilbao-Vizcaya, Argentaria y

    La Caixa (TELEFNICA, 1999). Em princpios de 1997, enquanto outras operadoras no

    continente punham em marcha seus respectivos processos de privatizao e em consonncia com

    aquelas polticas maiores, que determinavam a liberalizao completa do setor em 01 de

    dezembro de 1998, o governo espanhol tomou a deciso de vender o lote de aes da Telefnicaque ainda estava sob o controle do Estado, equivalente a 20,9% do capital da empresa. Ao mesmo

    tempo, foi criada a Comisso do Mercado das Telecomunicaes (CMT), com funes

    reguladoras, que iniciou suas atividades em fevereiro de 1997.

    Entre suas funes estava, em primeiro lugar, proteger e incentivar a concorrncia no

    setor das telecomunicaes, que se pretendia aumentar atravs da criao de uma segunda

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    operadora, constituda atravs da privatizao da empresa pblica Retevisin, fruto do

    desmembramento da rede de transmisso da Radio Television Espaola (RTVE). Assim, 70% da

    nova sociedade foi adjudicada mediante leilo a um consrcio encabeado pela Endesa e

    Telecom Italia e os 30% restantes permaneceram nas mos do Estado. Isso deu origem a umasituao anmala em que a segunda operadora acabava sendo "mais pblica" que a Telefnica,

    que j estava ento completamente privatizada.

    No ms de janeiro de 1998, a Retevisin, segunda operadora de telefonia fixa da Espanha,

    iniciou suas operaes com servios interprovinciais e internacionais em concorrncia com a

    Telefnica. A Telefnica responde ao desafio com uma reordenao societria pela qual se

    desenvolveria uma estrutura que permitiria a cada linha de negcios ter sua prpria identidade

    jurdica, com perfis definidos em relao a patrimnio e resultados. A Telefnica SA, comosociedade matriz, passaria a personificar o ncleo corporativo de que dependem as principais

    subsidirias que, por sua vez, atuariam como pontas-de-lana das distintas linhas de atividade

    (figura 1). Figura 1

    OS NEGCIOS DO GRUPO TELEFNICA,com a reestruturao por linhas de negcios

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    Fonte: Telefnica, 2005.

    Nesse mesmo ano, acontece a privatizao do sistema telefnico brasileiro (Telebrs). Um

    consrcio liderado pela Telefnica saiu vencedor no leilo da empresa Telesp, que opera no

    estado de So Paulo. Ao mesmo tempo, outros grupos em que tambm estava presente a

    Telefnica arremataram duas das operadoras mveis do Brasil, que cobrem os estados do Rio de

    Janeiro, Esprito Santo, Bahia e Sergipe. Foi a maior operao empreendida at ento pela

    empresa.

    Ao fim de 1998, apresentada a nova imagem corporativa da empresa. Essa mudana de

    identidade tinha como finalidade adotar uma nica marca em todos os mercados em que ela

    operava. Ademais, em 01 de dezembro, se deu a completa liberalizao da telefonia bsica, o que

    possibilitou que novas operadoras pudessem se instalar na Espanha e requisitar suas licenas paraprestar esse servio. Desde ento, todos os servios de telecomunicaes, sem exceo, passaram

    a ser prestados na Espanha em regime de concorrncia. Em janeiro de 1999, a empresa matriz

    transferiu o ramo de atividades dos negcios espanhis de telecomunicaes para outra empresa

    que adotou o nome Telefnica de Espaa. Nesse ano, tambm foram colocadas na Bolsa aes da

    Terra Networks e TPI.

    Assim, a Telefnica entra no sculo XXI comoplayerinternacional de primeira grandeza,

    numa trajetria ascendente impressionante, como vimos, graas, em boa medida, a sua expanso

    na Amrica Latina, para a qual a aquisio de operaes no Brasil, especialmente a Telesp, foi

    absolutamente crucial.

    No Mxico, por sua vez, aconteceu um acordo que reuniu governo e sindicato, com o

    intuito de barrar a desnacionalizao e garantir que a privatizao no incorresse em demisses

    em massa e que no fossem perdidos os direitos trabalhistas conquistados (LARANGEIRA, s.d.),

    mas na perspectiva de introduzir novas formas de contratao no mbito da modernizao da

    Telmex, a empresa que monopolizou o servio telefnico no pas de 1950 a 1996, sendo que, a

    partir de 1990, como companhia privada novamente (BARRERA HERRERA, 1997). Enquanto

    seu monoplio, como para outros casos nacionais, baseou-se na exclusividade estatal legal do

    Estado, sua reprivatizao um exemplo de privatizao sem desnacionalizao

    (GARZATOLEDO & MELGOZA VALDIVIA, 1998). O resultado foi a constituio de outro

    importanteplayerinternacional, que disputa hoje com a Telefnica, o mercado latino-americano

    das telecomunicaes:

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    A Telmex foi adquirida [pelo clebre empresrio mexicano Carlos] Slim em dezembrode 1990, em sociedade com a estatal francesa France Tlcom e com a texana SBC.Mais tarde, os franceses se retirariam da empresa e a SBC reduziu sua participao amenos de 9%. Em 1995, Slim criou a Amrica Mvil para assumir as operaes detelefonia celular da Telmex. Para controlar todo o grupo, ele criou a Amrica Telecom.

    Dominando firmemente o mercado mexicano, mas sofrendo, como seria de se esperar,crescente concorrncia, em seu prprio terreno, de outras empresas internacionais, Slimlanou a Amrica Telecom, atravs de seus dois braos, conquista da Amrica Latina,entrando tambm no mercado estadunidense (DANTAS, 2007).

    Em fevereiro de 2007, a Amrica Mvil incorporou a Amrica Telecom, numa operao

    em que o valor de mercado dos seus papis passaria de US$ 79,61 bilhes para US$ 117, 59

    bilhes, tornando-se a empresa de maior valor de mercado da Amrica Latina, ultrapassando a

    Petrobrs (FOLHA DE S. PAULO, 17/2/2007).

    A opo brasileira de reforma do setor de telecomunicaes foi posterior e oposta aos

    casos descritos, constituindo-se basicamente em quebra do monoplio pblico, fragmentao e

    privatizao do Sistema Telebrs, preferencialmente ao capital estrangeiro, segundo a estratgia

    traada pelo ministro Srgio Motta e levada integralmente a cabo durante o primeiro mandato do

    presidente Fernando Henrique Cardoso. O processo passou por uma emenda constitucional e a

    promulgao de uma Lei Geral das Telecomunicaes, que rompia a unidade do velho Cdigo

    Brasileiro de Telecomunicaes, de 1962, ainda vigente hoje para a radiodifuso (BOLAO,

    2007), e criava uma agncia reguladora independente, a Anatel. A nova regulamentao deixava

    totalmente aberta a possibilidade de propriedade sem limites das empresas de telecomunicaespelo capital internacional.

    O peso da privatizao das telecomunicaes brasileiras foi significativo no s pelo

    montante vendido em uma s vez no mundo, mas pela participao absoluta e relativa no mbito

    das privatizaes dos setores de infra-estrutura. As tabelas 3 e 4 situam o quadro de leiles

    ocorridos no pas, a partir das prerrogativas estabelecidas pelos programas de desestatizao,

    levados com maior nfase pelo Governo FHC. A tabela 3 registra como as privatizaes

    alcanaram preferencialmente os setores de infra-estrutura, que historicamente estiveram nas

    mos do Estado.

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    Revista de Economa Poltica de las Tecnologas de la Informacin y Comunicacinwww.eptic.com.br, vol. IX, n. 2, mayo ago. / 2007

    Tabela 3Valores arrecadados com a privatizao

    SETORESRECEITA

    DE VENDA(US$ milhes)

    %

    Infra-Estutura/Servios 63.281 80

    Indstria 10.852 14

    Participaes Minoritrias 4.481 6

    Total 78.614 100

    Fonte: BNDES, 2002.

    Entre os setores de infra-estrutura, de longe as telecomunicaes tiveram um resultado

    mais impactante nos leiles de privatizao, pelo montante vendido, o maior entre todos os

    setores envolvidos (tabela 4). Um fato a se destacar relaciona-se participao de capital

    estrangeiro, que aumentou significativamente no perodo 1995-2002, representando 53% do total

    arrecadado com a desestatizao (BNDES, 2002).

    Tabela 4Resultado setorial dos leiles de privatizao e a dvida transferida

    ao setor privado no perodo 1995-2002 (US$ milhes)SETORES RECEITA

    DE VENDA

    DVIDA

    TRANSFERIDA

    RESULTADO

    TOTAL

    Indstria

    Petroqumica

    Petrleo

    Minerao

    10.852

    816

    4.840

    5.196

    4.265

    706

    -

    3.559

    15.117

    1.522

    4.840

    8.755

    Infra-estrutura/Servios

    Financeiro

    Eltrico

    Transporte

    Porturio

    63.281

    6.329

    22.238

    2.321

    421

    2.111

    10.545

    -

    7.510

    -

    -

    88

    73.826

    6.329

    29.748

    2.321

    421

    2.199

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    Gs/Saneamento

    Telecomunicaes

    Informtica

    29.811

    50

    2.947

    -

    32.758

    50

    Participaes Minoritrias Decreto 1.068

    Estaduais

    4.481753

    3.728

    --

    -

    4.481753

    3.728

    Total 78.614 14.810 93.424

    Fonte: BNDES, 2002.

    Se o impacto da privatizao da Telebrs foi significativo sobre o investimento direto

    externo (IED) brasileiro, j no perodo seguinte venda, este comea a apresentar uma tendncia

    de queda para o setor das telecomunicaes. A tabela 5, alm de indicar uma tendncia de queda

    do IED, tanto para o total de ingressos no Brasil quanto para as Telecomunicaes e Correios3, a

    partir de 2000, mostra-nos, se avaliarmos os dados para o perodo todo em questo (1996 a 2005),

    que corresponde poca imediatamente anterior privatizao at o ano mais recente para onde

    h dados disponveis, que houve um crescimento dos ingressos de IDE no Brasil (de US$ 9,644

    milhes, em 1996, para US$ 21,638 milhes, em 2005) como um todo e nas telecomunicaes e

    correios (US$ 611 milhes, em 1996, para US$ 3,958 milhes, em 2005).

    Tabela 5

    Ingressos de IDE de Participao no capital (US$ milhes)

    Telecomunicaes e Correios TOTAL BRASIL %1996 611 9.644 6,34

    1997 831 17,879 4,65

    1998 2,565 26,346 9,74

    1999 8,120 31,235 26,00

    2000 10,914 33,331 32,74

    2001 4,130 21,042 19,63

    2002 4,190 18,778 22,31

    2003 2,810 12,902 21,78

    2004 2,970 20,265 14,66

    3Os dados avaliados pelo Banco Central de IDE referem-se s atividades de telecomunicaes e correios, porm amaior parte das operaes est concentrada na rea de telecomunicaes. Sendo assim, os dados apresentados natabela 5 podem dar sem perdas uma idia do comportamento dos ingressos de IDE de participao de capital nastelecomunicaes.

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    2005 3,958 21,638 18,29

    Fonte: Teletime (2006:50)

    O grande salto observado em 1998, quando telecomunicaes e correios receberam US$

    2,565 milhes, corresponde aos ingressos de divisa relativos privatizao do Sistema Telebrs.Nos anos subseqentes, h os investimentos relativos s necessidades de responder s metas

    impostas pela Anatel. Porm, nos ltimos anos, onde se apresenta uma tendncia mais acentuada

    de queda dos ingressos de IDE, importante observar que o ingresso de capital estrangeiro no

    Brasil esteve mais associado a operaes no mercado financeiro ou de reestruturao

    societria(TELETIME, 2006: 52).

    Enquanto pases como Estados Unidos, Frana e Alemanha investiam no fortalecimento

    de seus sistemas nacionais de telecomunicaes, desburocratizando e dinamizando o setor

    (PESSINI & MACIEL, 1995), tendo em vista a liberalizao determinada em primeira instncia

    pelas mudanas provocadas, a partir de 1984, com a reforma norte-americana e, em ltima, pela

    reestruturao capitalista iniciada com a crise dos anos 1970 (BOLAO, 2000), e outros, como

    Mxico e Espanha, aproveitavam a situao para reposicionar-se, alavancando os seus campees

    nacionais, dando-lhes competitividade internacional, o Brasil desnacionalizava o setor,

    sucateando, diga-se de passagem, em decorrncia, o seu lendrio centro de pesquisa e

    desenvolvimento e inserindo-se a partir de ento no mercado mundial como consumidor de

    produtos, importador de tecnologia e campo de ao estratgico das empresas transnacionais quedisputam o mercado global.

    Telefnica, Telmex, Globo e os mercados de TV e telecomunicaes no Brasil

    A atuao da Telefnica no Brasil inicia-se com a aquisio da CRT, empresa

    independente, pertencente ao estado do Rio Grande do Sul, que a privatizar, anos antes da

    privatizao do sistema Telebrs. poca do leilo de privatizao da Telebrs, a empresa tratar

    de alar vos bem mais altos, colocando-se frente a frente com a Globo pela primeira vez.

    No caso da Telefnica, sua aquisio da Telesp (considerada a jia da coroa) gerouconflitos entre seus scios. O resultado foi fruto de uma jogada de ltima hora por parteda empresa que, poucas horas antes do prazo final para a entrega das propostas, em julhode 1998, decidiu dar um lance para a aquisio da Telesp e no da Tele Centro Sul,enganando at mesmo seus scios gachos da RBS que, no mercado de televiso, soligados Globo. Esta ltima, que j havia conquistado uma posio na telefonia celularem Minas Gerais (Banda B), acabou ficando, em associao com a Telecom Itlia, com a

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    Tele Nordeste Celular e a Tele Celular Sul (Banda A), muito aqum do desejado(BOLAO & FARIAS, 2000: 48).

    De fato, havia um acordo informal entre a Globo e sua afiliada RBS, em que esta seconcentraria na regio sul, enquanto a Globo ficaria com a Telesp. Surpreendidos com o lance

    de ltima hora da Telefnica, a Globo perde a Telesp e a RBS fica impossibilitada de concorrer

    para outra rea (idem). Todo um processo se desenrolar posteriormente, ao final do qual a

    Telefnica ter de desfazer-se da CRT, tendo em vista que, pela Lei Geral de Outorgas, o grupo

    Telefnica, integrante da TBS, no pode ter participao superior a 20% em outra operadora de

    telefonia fixa(idem).

    A estratgia da Telefnica estava exatamente em conseguir a posio privilegiada de

    concessionria no principal mercado brasileiro, o estado de So Paulo. A compra da Telesp

    representava tornar-se a empresa de referncia no s no Brasil, mas na Amrica Latina.

    Ademais, o Brasil tornou-se a partir de ento um espao privilegiado para a empresa, pois se trata

    do primeiro mercado, fora da Espanha, do Grupo Telefnica. A evoluo dos investimentos no

    perodo 2002 a 2005 (grfico 1) e o percentual relativo ao mercado brasileiro demonstram

    claramente a importncia do Brasil dada pela global playerespanhola.

    Grfico 1Telefnica - Distribuio do Investimento por pases

    Fonte:

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    A entrada da Telmex no Brasil se dar em 2003, quando a sua controladora, a Amrica

    Mvil, adquiriu a Embratel da americana MCI/Worldcom, vencedora no leilo de privatizao

    que, em 2002, iria bancarrota na esteira de um momentoso escndalo contbil, depois de ter

    j protagonizado o episdio das fitas do BNDES, gravaes divulgadas pela mdia, em que,antes mesmo de consumados os leiles, o ento ministro das comunicaes, Luis Carlos

    Mendona de Barros, em telefonema para Jerry de Martino, executivo da MCI, j comemorava a

    aquisio, por esta, da empresa brasileira, como lembra Dantas (2007). Com a falncia, a

    Embratel ser posta venda, em 2003.

    Era a grande oportunidade que se oferecia ao Governo Lula para comear a desfazer oequvoco do retalhamento da Telebrs e iniciar a recuperao, para o Brasil, do controleda empresa e de seus satlites. difcil entender e ainda h que se explicar porque omesmo Governo que, atravs de hbil manobra do ento presidente do BNDES, CarlosLessa, evitou a desnacionalizao da Vale do Rio Doce, no agiu, com ainda maiorfirmeza, no caso da Embratel. Um consrcio formado pela Telemar e Brasil Telecomqueria compr-la. Na Telemar, o Governo detm 75% do capital social, sendo 25%atravs do BNDES e quase 50% atravs dos fundos de penso do Banco do Brasil,Petrobrs e de outras estatais. Na Brasil Telecom, o Governo detm o prprio controle(v l que indireto!), atravs da mesma Previ e outros fundos de penso. No entanto, noapoiou a proposta. Em que pese a oferta brasileira fosse melhor do que a da AmricaTelecom/Telmex, quem decidiu o futuro da Embratel foi um juiz de Nova York: mandoua MCI entreg-la a Slim (DANTAS, 2007).

    Consolidar-se-ia, assim, com Lula, a perda do controle brasileiro sobre os rumos da sua

    indstria das telecomunicaes. A Telmex est presente hoje, alm do Mxico e Estados Unidos,

    em Honduras, Cuba, Haiti, Costa Rica, Panam, Venezuela, nas trs Guianas, na Bolvia, Peru,

    Paraguai e, sobretudo, no Brasil. Aqui, a Amrica Telecom, agora Amrica Mvil, controla a

    Claro e a Embratel(DANTAS, 2007). No caso da Embratel, a sua condio de carrier de longa

    distncia, desmembrada da antiga Telebrs, coloca-a em condies de enfrentar cada uma das

    suas concorrentes no mercado de telecomunicaes em seu prprio territrio, na medida em que

    sua licena nacional.A Globo, por sua vez, derrotada, como vimos, acabar com a crise de endividamento

    externo que enfrentaria logo em seguida, decorrente da desvalorizao do real de 19994, tendo

    que desfazer-se de todas as pequenas posies que assumira no setor das telecomunicaes. O

    problema que, com a convergncia e a digitalizao, ambos os setores tornam-se fundamentais

    4Sobre a Globo e seus processos de gesto, ver BRITTOS (2000).

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    na disputa global entre as empresas de telecomunicaes e, no caso da Amrica Latina,

    Telefnica e Telmex passaro a disputar a hegemonia, no apenas no seu negcio de origem, mas

    crescentemente tambm na indstria de televiso.

    Uma vez bem situadas no mercado brasileiro de telecomunicaes, ambas procuraroexplorar as possibilidades que a evoluo tecnolgica e da regulamentao abrem. O mercado da

    TV de massa (hertziana, gratuita, financiada essencialmente pela publicidade) continua

    defendido, privilgio do capital nacional, j que a mudana (crucial) da legislao, representada

    pela Emenda Constitucional 36, que altera o artigo 222 da Constituio Federal, permitindo a

    entrada do capital estrangeiro em empresas de comunicao at o limite de 30% do capital

    votante, no desperta o interesse do capital multinacional.

    Isso pode mudar com a implantao da televiso digital terrestre (TDT), que oferecepossibilidades de convergncia e interao novas, constituindo-se em uma nova plataforma

    tecnolgica, que poderia abrigar servios de teledifuso, teledistribuio, telefonia ou internet, o

    que a torna tambm um instrumento ideal para a incluso digital (RICHERI, 1994). A disputa

    pela adoo do padro tecnolgico da TDT reproduz de, alguma forma, outras disputas

    anteriores, comuns no campo das tecnologias da informao e da comunicao (TIC), como a do

    padro de TV a cores, com implicaes importantes em termos de poltica industrial, afetando,

    neste caso, os setores de telecomunicaes, informtica e eletro-eletrnico, alm, evidentemente,

    de toda a indstria de produo de contedos.

    O mercado mundial de TDT est sendo disputado hoje por trs padres (norte-americano,

    europeu e japons), alm de um quarto (chins), ainda em fase de desenvolvimento. O Brasil,

    durante boa parte do primeiro mandato do presidente Lula, definiu uma estratgia de

    desenvolvimento tambm de um padro nacional, proposto no incio, inclusive, em colaborao

    com a China. Para isso foi criado, por decreto presidencial em novembro de 2003, o Sistema

    Brasileiro de Televiso Digital (SBTVD), que mobilizou, em dois anos, R$ 65 milhes e boa

    parte da inteligncia tcnica brasileira da rea. Desde o incio dos debates sobre o tema, noentanto, os radiodifusores, capitaneados pela Globo, defendiam o padro japons.

    Os testes oficiais, realizados poca do governo de Fernando Henrique Cardoso, por um

    consrcio privado capitaneado pela Sociedade de Engenharia de Televiso (SET) e pela poderosa

    Associao Brasileira de Emissoras de Rdio e Televiso (ABERT), com o apoio da

    Universidade Mackenzie, j haviam definido o padro japons como tecnicamente superior. Ao

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    final do primeiro mandato de Lula, o Brasil acabar adotando efetivamente o padro japons.

    Bolao e Brittos (2007) analisam em detalhe todo o processo, desde as suas origens. No que nos

    interessa aqui, basta dizer que o resultado representa uma vitria da Globo em relao a eventuais

    pretenses dos operadores de telecomunicaes no mercado da TV de massa.Na TV segmentada, o mercado se re-configura em 2006, alinhando-se claramente na

    disputa entre Telefnica e Telmex. Assim, a primeira adquire, do grupo Abril, em outubro de

    2006, 100% das aes preferenciais e ordinrias no limite imposto pela lei, das suas operaes

    de TV a cabo, e 100% das de MMDS, para as quais esse limite no vale (BOLAO &

    BRITTOS, 2007: 136). No mesmo ms, a Globo firma um acordo semelhante com a primeira: a

    famlia Marinho permanece com a maioria das aes ordinrias da Net, como manda a lei, mas

    a Telmex, de Carlos Slim, atravs da Embratel, que tem a maioria do capital total da empresa(idem, p. 135).5

    Esses movimentos foram possveis, na forma e extenso em que ocorreram, porque a Lei

    da TV a Cabo, de 1995, determina que as empresas do setor podero ter a participao do capital

    estrangeiro em at 49% do capital votante, ao passo que a legislao posterior, referente s outras

    tecnologias de TV segmentada (DTH, MMDS), baixada sem a influncia do movimento social

    pela democratizao da comunicao, como a anterior, as considera como servios de

    telecomunicaes, sujeitas portanto, s determinaes da lei de reforma destas ltimas, que

    permitem a participao estrangeira em at 100% da propriedade, como vimos. Assim, as

    decises tomadas em relao ao setor de telecomunicaes, prvias privatizao, continuam

    influenciando de forma importante os movimentos na rea de radiodifuso, a depender, em cada

    caso, das disputas de mercado e regulamentares determinadas pela evoluo da tecnologia.

    No caso da TV digital, como em inmeras outras ocasies ao longo da histria das

    polticas de comunicao no Brasil, a deciso oficial favoreceu os interesses dos radiodifusores,

    especialmente a Globo, mantendo defendido o mercado da TV de massa. Na verdade, a corrente

    liberal, que comandou o processo de privatizao das telecomunicaes, sob a batuta do ministroSrgio Motta, no foi capaz, ainda durante o governo Fernando Henrique, de completar o projeto

    reformista, atravs da prometida Lei Geral da Comunicao de Massa, que complementaria a Lei

    Geral das Telecomunicaes, base da privatizao, que rompe a unidade do velho Cdigo

    5A nacional Telemar, por sua vez, adquiriu a Way TV, uma operao de TV a cabo, com 70.000 mil assinantes (TVpaga e banda larga) que atua em algumas cidades de Minas Gerais(TELETIME, ano 9, no. 92, set. 2006).

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    Brasileiro de Telecomunicaes, de 1962 (BOLAO, 2007). Todos os movimentos posteriores,

    relacionados com a radiodifuso, foram dominados pela corrente conservadora, inclusive o

    fracasso das iniciativas de mudanas tomadas pelo governo Lula, como a da criao da Agncia

    Nacional do Cinema e do Audiovisual (ANCINAV). O caso da TV digital deve ser entendidonesse mesmo sentido.

    Em essncia, o modelo adotado d s empresas estabelecidas de radiodifuso

    praticamente todo o espao de freqncias economizado com a digitalizao, de modo que fica

    praticamente eliminada a possibilidade de entrada de novos atores, seja da produo nacional

    independente, como pretendiam os defensores do modelo brasileiro (a no ser possivelmente nos

    quatro canais de servio pblico destinados ao Estado), seja de novos atores empresariais. Ao

    contrrio, a ausncia da figura do operador de rede, no modelo brasileiro, torna cada emissora,responsvel pela sua prpria emisso, o que exigir a manuteno de faixas de isolamento, de

    modo que no se abre espao para novos canais(BOLAO & BRITTOS, 2007: 117). Ao que

    consta, a maior parte da economia do espectro disponvel ser utilizada pelas emissoras para a

    oferta de TV de alta definio, sobrando muito pouco para os servios interativos. No est claro

    ainda se estes ltimos, explorados pelas emissoras de TV, sero tambm ofertados gratuitamente.

    Concluso

    Do ponto de vista da competitividade do capital nacional no conjunto dos setores da

    comunicao, podemos concluir que a opo privatista do governo Fernando Henrique Cardoso

    fracassou. Ao contrrio do Mxico, que conseguiu alavancar um capital nacional condio de

    global playerna rea, o Brasil cedeu completamente o controle do setor de telecomunicaes ao

    capital estrangeiro. A ltima oportunidade, surgida da falncia da MCI, foi perdida tambm pelo

    governo Lula.

    Alm disso, a nova configurao do macro-setor das comunicaes em nvelinternacional, marcado pela digitalizao e a convergncia, coloca em cheque a hegemonia das

    empresas do setor de televiso. Por um lado, o mercado de TV por assinatura foi amplamente

    aberto concorrncia internacional, tanto pela Lei do Cabo de 1995, quanto, principalmente, pela

    regulao posterior das outras tecnologias de TV segmentada, que, ao invs de adequar-se s

    definies desta, posto que se trata, obviamente, do mesmo servio, do ponto de vista do usurio,

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    foram definidas como servios de telecomunicao, totalmente abertas, portanto, pela LGT, a lei

    de base da privatizao.

    Nessas condies, o conjunto do macro-setor integra-se s linhas mestras da concorrncia

    global, em que o mercado latino-americano disputado pela Telefnica e a Telmex. verdadeque a TV de massa continua reservada para o capital nacional e que uma batalha crucial na

    regulao da TV digital terrestre foi vencida pelos radiodifusores atuais, deixando as operadoras

    de telecomunicaes, de momento, excludas do negcio. Mas no da perspectiva de ofertar o

    mesmo tipo de servio via internet, inclusive servios de TV de todo tipo, como j ocorre, apesar

    das limitaes ainda existentes (no mais de ordem essencialmente tecnolgica, diga-se de

    passagem, mas de capacidade das redes existentes).

    Assim, a barreira poltico-institucional que os radiodifusores lograram impor, neste caso,limita-se TV de massa digital, estendendo, portanto, a reserva de mercado de que j dispem na

    radiodifuso convencional, mas no ao conjunto da indstria do audiovisual, onde as operadoras

    de telecomunicaes j esto fortemente implantadas, como vimos no caso da TV segmentada.

    claro que a Globo, ator hegemnico tambm no caso da TV por assinatura, dispe

    tambm de vantagens de mercado, reforadas pela aliana com a Telmex. Assim, a NET Servios

    ampliou recentemente sua oferta de voz, dados e vdeos, definindo uma estratgia de atuao,

    com a disponibilizao de servios de telefonia fixa, via cabo, em conjunto com a Embratel. Mas

    trata-se, por um lado, no mais simplesmente da velha Globo, mas de um consrcio internacional

    encabeado por um capital do ramo das telecomunicaes, infinitamente mais poderoso.

    A fora que a prpria Globo tem, no mercado brasileiro de televiso, frente a esse scio

    poderoso, est em grande parte relacionada sua capacidade de ao junto ao Estado brasileiro

    no sentido de manter aquela barreira poltico-institucional. Mas claro que o poder de mercado e

    o know-howacumulado no pas lhe confere a confortvel posio de parceiro ideal para qualquer

    capital estrangeiro interessado no mercado brasileiro e a aliana com a Telmex, nesse sentido, lhe

    favorece na disputa pelo mercado do audiovisual de massa na Amrica Latina frente suaprincipal concorrente na rea, a tambm mexicana Televisa, que mantm acordos de cooperao

    com o SBT, segunda rede em audincia do Brasil, ainda que fortemente ameaada pela terceira, a

    Record, propriedade da Igreja Universal do Reino de Deus.

    Por outro lado, todas essas vantagens da Globo esto fortemente centradas no velho

    negcio da TV de massa. As mudanas por que passa o conjunto da economia da cultura e da

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    comunicao, em coerncia com as transformaes do sistema, trazidas pela reestruturao

    produtiva decorrente da crise estrutural iniciada nos anos 1970, no ameaam simplesmente esta

    ou aquela empresa, mas o conjunto do modo de regulao que est se transformando,

    provocando uma verdadeira revoluo cultural, a partir do surgimento e expanso, especialmentejunto ao pblico mais jovem, de novas modalidades de consumo cultural, diametralmente opostas

    ao padro hegemnico da TV de massa.

    Se a gerao de telespectadores dos anos 70 e 80 do sculo passado, perodo de auge da

    penetrao da Rede Globo de Televiso, encabeada pelo falecido jornalista Roberto Marinho,

    ainda guardava semelhanas, em termos de aspiraes e modo de vida, com aquela do ps-guerra,

    quando a TV se implanta, tudo isso hoje muito distante das novas geraes, habituadas

    internet, aos jogos em rede, aos softwares livres, interatividade. O que se vive agora aexpanso acelerada de uma nova cultura capitalista de consumo, ensejando novos modos de vida,

    mais adequados nova estrutura do sistema.

    Nessas condies, o bastio da Globo (a TV de massa) que se fragiliza frente s outras

    opes de dispndio do tempo livre oferecidas ao pblico, justamente no momento em que as

    ameaas que pairam sobre ela so infinitamente maiores que aquelas provenientes dos capitais

    tradicionais instalados no mercado brasileiro de televiso. Mesmo o seu inquestionvel poder de

    ao junto ao governo brasileiro, que tem atuado, invariavelmente, a seu favor, no lhe permite

    mais escolher os seus concorrentes. Nem seus aliados.

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