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A Insercao Do Som No Cinema

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A inserção do som no cinema:percalços na passagem de um meio visual para audiovisual

 Fernando Morais da Costa - [email protected] FEDERAL FLUMINENSE

s pontos que pretendemos ressaltar nesta rápida revisão da passagem do cinema

mudo para o cinema sonoro são: primeiro, desde o nascimento do cinema

pretendeu-se que o som estivesse unido às imagens. Essa união só não existiu

desde o início por conta de limitações técnicas, e não por falta de tentativas ou de interesse.

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É importante frisar este argumento, uma vez que quando se diz que o chamado período

mudo durou cerca de trinta anos, isso pode levar a crer que o advento do som não era

desejado, quando, na verdade, se verifica o oposto; o que nos leva à questão: por que

existiam essas limitações em relação à gravação e reprodução do som, enquanto a imagem

já passava por esses processos de forma satisfatória? E ainda: por que o advento do cinema

sonoro, quando finalmente aconteceu, cunhou um modo de unir os sons e as imagens que

deu margem ao argumento de que o som seria um mero acompanhamento daquelas? Ou

seja, como se forjou uma hierarquização entre os dois elementos, onde a imagem, na teoria

e na análise dos filmes, via de regra, prepondera sobre o som?

Para começarmos a pensar a construção dessa preponderância da imagem: o cinema

pode ser entendido, e demonstraremos como realmente o é, como sendo um jovem rebento,

nascido na virada do século XIX para o XX, de uma longa tradição de aparatos tecnológicos

visuais. Tradição essa que, por sua vez, é uma faceta da primazia da visão que caracteriza a

sociedade ocidental desde, pelo menos, o século XV.

O que queremos dizer com primazia da visão? Na obra de Marshall McLuhan

encontramos uma análise dessa preponderância da visão nos processos comunicacionais da

sociedade ocidental, em sua relação dialética com outro dos sentidos, a audição. McLuhan

afirma que em um primeiro momento da civilização, quando a cultura oral era a forma vigente

de transmissão de conhecimento, a audição tinha um papel preponderante nesses

processos, uma vez que a informação era sempre ouvida e assimilada para sua posterior

retransmissão. McLuhan analisa então os meios pelos quais a cultura ocidental deixou esse

reinado da audição, e caminhou rumo a um novo primado, o da visão.

McLuhan cita, como uma primeira ruptura, a criação do alfabeto fonético, o fonema

como uma tradução visual, escrita, de um som. Em suas palavras: “com o alfabeto fonético a

divisão paralelítica entre os mundos visual e auditivo foi violenta e impiedosa. A palavra

fonética escrita sacrificou mundos de significação e percepção (...). O alfabeto fonético

produz uma divisão clara da experiência, dando-nos um olho por um ouvido” (McLUHAN,

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1974, p.102-103). Esse era o primeiro passo para que nossa cultura viesse a se tornar

aquela que conhecemos hoje. Com o alfabeto escrito estava dado o pontapé inicial para o

que McLuhan chama de “intensificação e extensão da função visual”, com a inevitável

“redução do papel dos sentidos do som, do tato, do paladar em qualquer cultura letrada”

(idem, p.103).

Vale lembrar que, na opinião de McLuhan, o que ocorre é uma redução das sutilezas

da palavra falada para a rigidez objetiva do signo escrito. Citando-o: “quando as palavras são

escritas tornam-se, naturalmente, parte do mundo visual, tornam-se coisas estáticas e

perdem, como tal, o dinamismo que é tão característico do mundo da audição em geral, e da

palavra falada em particular”.( McLUHAN, 1977, p.43.)

McLuhan situa em um momento específico da cultura ocidental uma grande

acentuação da visão, o “salto visual”, como ele o chama. Esse momento é do o advento da

palavra impressa de Gutemberg. Com a reprodução e divulgação serial da informação

escrita, a apreensão visual dessa informação começava a consolidar seu reinado. Segundo

McLuhan, “o simples aumento da quantidade do fluxo de informação favoreceu a

organização visual do conhecimento”( idem, p.160).1 Ainda como agente complementar

desse salto visual, McLuhan lembra que, em um momento próximo, no princípio do século

XV, houve a instauração da perspectiva na pintura, atribuída a Van Eyck, na Holanda, e a

Meraccio, na Itália. O relevo na pintura era uma complexificação da visão, uma acentuação

do visual.

1 Neste ponto, um rápido comentário: esse dado do aumento da quantidade de informação decorrente da ferramenta da palavra impressa é o avô de outro, contemporâneo, sobre o assustador crescimento da produção de informação digital. Os pesquisadores americanos Peter Lyman e Hal Varian, da Universidade da Califórnia, coordenaram um projeto destinado a estimar a quantidade de informação produzida anualmente no mundo. Eis a assombrosa conclusão a que chegaram. Até 1999, a quantidade de informação produzida pela humanidade, armazenada em formato digital, seria o equivalente a 12 exabytes (1 exabyte equivale a 1 trilhão de megabytes, uma unidade que usamos no cotidiano. Este texto, por exemplo, em formato digital deverá ter cerca de, digamos, 100 kilobytes, ou 0,1 megabytes). O que há de assombroso é que disso, 1,5 exabyte foi gerado em 1999, ou seja, um oitavo de toda a informação da história da humanidade. Mais estarrecedor: essa taxa de crescimento é estimada em 100% ao ano, o que quer dizer que em 2003 deverão estar sendo produzidos os mesmos 12 exabytes. Em um ano se produzirá tanta informação quanto se havia produzido desde o início da civiização até 1999. Esses dados foram tirados da coluna Trilha Zero, de B. Piropo, em O Globo de 10 de dezembro de 2001. Os resultados da pesquisa citada podem ser encontrados no endereço www.sims.berkeley.edu/how-much-info/

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Esses dois fatores são usados por McLuhan para concluir que a partir da Idade Média,

“o som perde muito em importância na Europa Ocidental” (idem, p.161). A partir daí, para o

europeu, “ver é acreditar”, enquanto em outras culturas o ouvido continuava a ser o principal

órgão de recepção. McLuhan contrapõe, para dar um exemplo, o europeu ocidental, “que

vive no mundo da visão” com a população rural africana, “que vive no mundo dos

sons.”(idem, p.43).2

Ainda é citada por McLuhan, como um dos dispositivos visuais da Renascença, a

câmera escura, sendo um exemplo do interesse pelas experiências com a visão que

proliferaram na época. Tal exemplo nos é importante, pois como o próprio McLuhan cita

rapidamente, a câmera escura pode ser tomada, e efetivamente o é, por uma gama extensa

de teóricos, como um parente ancestral do cinema, o que nos faz retomar o ponto onde nos

encontrávamos, a inserção do cinema nessas pesquisas de aparatos visuais.

O pesquisador Tom Gunning é quem faz tal genealogia, reconhecendo um parentesco

que remonta à lanterna mágica, datada do século XIV, passando pela câmera escura, pela

fotografia já no século XIX, e, nos últimos anos daquele século, chegando ao cinema.

(GUNNING, 1996). Tom Gunning, em seus estudos sobre o cinema das origens, chama

atenção para um dos nomes com o qual ele foi batizado: “fotografias animadas”. Tal nome,

coloca Gunning, “relacionava o cinema com um grande número de tecnologias da visão que

já tinham se tornado populares durante o século XIX, todas elas manipulando imagens para

fazê-las mais intensas e mais excitantes, pela adesão do movimento, da cor, etc.” Para

Gunning “a busca das ‘fotografias animadas’ ao longo do século revela a imbricação do

cinema nas novas experiências de tecnologias de representação visual”(idem, p.26).

Gunning faz o que ele mesmo chama de “genealogia do cinema”, voltando mais na

história, e estabelecendo uma filiação com os experimentos de luz e de ótica que se

iniciaram no século XVI, que deram frutos mais concretos na lanterna mágica e na câmera

2 Sobre esse assunto, há de ser citado o trabalho do antropólogo Philip Reek, que insere em suas pesquisas sobre culturas africanas diagnósticos sobre o papel do som naqueles sistemas comunicacionais. Reek descreve ainda o papel do silêncio e a importância dada a ele nos processos de comunicação em sociedades africanas, asiáticas e americanas nativas, ou seja, nas sociedades assumidas pelo eurocentrismo como não-européias.

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escura citada por McLuhan. A lanterna mágica, inventada por Christian Huygens, em 1659,

seria o primeiro ancestral direto do cinema, tendo sido, segundo Gunning, o primeiro

instrumento de projeção que usava luz artificial e uma lente (idem, p.27).

Gunning coloca que as pesquisas visuais do século XIX levaram à invenção da

fotografia, preconizada pela invenção de Daguerre, o daguerreótipo, e cita especificamente

os estudos fotográficos sobre o movimento, de Eadweard Muybridge, nos Estados Unidos, e

de Étienne-Jules Marey e Georges Demeny, na França, a cronofotografia, como “o momento

em que a fotografia antecipou o cinema”, sendo “reproduções mecânicas de atrações

visuais”. Nessas duas linhas de frente, tal processo iria dar, nos Estados Unidos, no

kinetoscope de Edison, patenteado em 1891 (MANNONI, 2000, p.394), e, segundo Gunning,

“a primeira utilização comercial generalizada da fotografia em movimento”(GUNNING, op.cit.

p.34-38). O kinetoscope era então, como diz o próprio Gunning, em outro texto, “o mais

avançado tipo de entretenimento visual de sua época” (GUNNING, 1995, p.55); no mesmo

ano, porém, Demeny desenvolvia, na França, com o mesmo fim, o phonoscope, “o primeiro

projetor cronofotográfico”, segundo o francês Laurent Mannoni. Deixando de lado a disputa

entre norte-americanos e franceses pela paternidade das imagens em movimento, o que nos

interessa sublinhar é que o phonoscope recebeu esse nome, com o prefixo relativo ao som e

não a imagem, porque tinha o intuito de reproduzir os movimentos labiais de uma pessoa

falando, como explica Mannoni. Demeny serviu de modelo ao seu próprio invento,

pronunciando as frases “Je vous aime” e “Vive la France”. O ato de pronunciar a frase era

registrado por um número entre 18 e 30 fotografias, que projetadas de forma contínua

garantiam a ilusão de movimento, reproduzindo as alterações da fisionomia de quem falava,

e tornando o som “visível”. O espectador lia perfeitamente os lábios do modelo fotografado, o

que vinha, de certa forma, a suprir a falta real de som (MANNONI, op.cit. p.354-5). O

phonoscope de Demeny é uma prova de que, como defendemos, apesar da união do som às

imagens só se concretizar no fim da década de 1920, a intenção de uni-los existia desde os

primórdios do cinema, ainda no século XIX.

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Gunning observa que havia nesses primórdios do cinema o que ele chama de uma

“obsessão pelo realismo”, e que tal preocupação tinha reflexo na expectativa do público, que

em geral respondia bem à representação nas imagens de fatos cotidianos, dos quais o

cinema em seu início é recheado de exemplos, desde a própria chegada do trem à estação,

dos irmãos Lumière, até os filmes de Edison, onde temos, só para citar um caso, a série de

filmes com a bailarina Annabelle. Daí, Gunning desvenda uma situação paradoxal: quanto

mais reais eram essas ilusões, mais suas deficiências ficavam evidentes, como, por

exemplo, as faltas da cor e do som. (GUNNING, 1996, p.39-40)

O teórico do cinema Nöel Burch ratifica a evidência da falta que o som fazia nesse

momento inicial do cinema. Burch comenta que parte dos realizadores e do público haveria

constatado rapidamente a “necessidade de um acompanhamento sonoro (musical) para as

imagens, cujo silêncio parecia insuportável” (BURCH, 1992, p.115). Testemunho da

frustração que o mutismo do registro da realidade causava encontra-se em um texto, escrito

em 1896, por um célebre espectador das primeiras sessões dos irmãos Lumière. Máximo

Gorki comenta o registro do cotidiano das cidades, com automóveis que passam pela

câmera, e pedestres que atravessam as ruas, que lhe foi apresentado:

É tudo estranhamente silencioso. Tudo se desenvolve sem que ouçamos o ranger das rodas, o barulho dos passos ou qualquer palavra. Nenhum som, nem uma só nota da sinfonia complexa que acompanha sempre o movimento da multidão. Sem barulho, a folhagem cinzenta é agitada pelo vento e as silhuetas das pessoas condenadas a um perpétuo silêncio. Seus movimentos são plenos de energia vital e tão rápidos que mal são percebidos, mas seus sorrisos nada têm de vibrante. Ver-se-ão seus músculos faciais se contraírem, mas não se ouve seu riso (GORKI, 1896).

O norte-americano Rick Altman, estudioso do som no cinema, vem lembrar que os

processos de gravação e reprodução do som são muito posteriores aos da imagem, os quais

estamos citando em nossa rápida genealogia. Em contraposição à longa pesquisa

relacionada aos processos fotográficos, o início da gravação de sons está situado no último

quarto do século XIX, mais precisamente no ano de 1877, data da invenção do fonógrafo

(SCHAFER, 1992, p.173), e suas pesquisas mais profícuas datam dos últimos anos do

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século XIX e do início do século XX, quando o cinema já se estabelecia (ALTMAN, 1992,

p.171). O canadense Murray Schafer confirma que foram necessárias algumas décadas para

que a qualidade do som do fonógrafo chegasse a um nível em que os discos soassem de

forma natural. Daí surge uma possível explicação para o mutismo dos filmes que só se

resolveu de forma definitiva em 1927, mais de 30 anos após a data que é aceita como a do

nascimento do cinema.

Falemos sobre o processo que culminou com a inclusão do som nos filmes. Uma

breve explicação desse processo nos será útil uma vez que consigamos demonstrar como a

busca do cinema sonoro foi, na verdade, um enorme esforço, por parte da indústria

cinematográfica norte-americana, que tinha como objetivo maior o sincronismo da voz dos

atores, já presentes pela imagem. Tal início acarretou em uma série de questões e

problemas que estão relacionados ao papel secundário que alguns teóricos, realizadores, e

parte da imprensa reservaram ao som em suas análises.

O quadro que vamos desenhar não se trata, nem poderia, de uma visão que dê conta

do processo inteiro através do qual se chegou ao som nos filmes. Esse processo foi marcado

por um grande número de aparatos tecnológicos e procedimentos variados que tentaram

resolver a questão, falhando sucessivamente em seus objetivos. Uma tentativa de cobrir a

multiplicidade de alternativas que existiu na busca pelo som se concretizaria em um trabalho

extenso, o que seria radicalmente diferente de nosso rápido contexto histórico. Tomemos

então o caminho de situar tal processo de forma sucinta.

Já adiantamos que, ao contrário do que se pode pensar, o desejo e as tentativas de

unir o som às imagens em movimento têm a mesma data do início do cinema, e a tentativa

citada de Demeny de, de alguma forma, inscrever sons antes que existissem as condições

para tanto é exemplo disso. De acordo com os biógrafos de Thomas Edison, W.K.L. Dickson

e sua irmã, Antonia Dickson, seu desejo ao inventar o kinetoscope era conceber um aparato

que projetasse a imagem e o som dos eventos previamente gravados, como confirma um

manuscrito do próprio Edison, do qual citamos o início:

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No ano de 1887, me ocorreu a idéia de que era possível desenvolver um instrumento que fizesse para o olho o que o fonógrafo faz para o ouvido, e que isso se daria pela combinação dos dois. Ambos, movimento e som, poderiam ser gravados e reproduzidos simultaneamente (apud DICKSON, 1895).3

Assim, o kinetoscope, seu projetor, precursor direto do cinematógrafo dos irmãos

Lumière, deveria ser, segundo o desejo inicial de Edison, o phono-kinetoscope, bem como

sua câmera, o kinetograph, deveria ser o kineto-fonograph (DICKSON, 2000, p. 6-19).

Devido ao insucesso da metade sonora de seu invento, e havendo desenvolvido de forma

satisfatória apenas o kinetoscope, Edison apresentava em 1894 uma alternativa mais

simples, que prescindia dos sons gravados simultaneamente às imagens: o kinetophone,

aparelho que tinha a função de executar música ao mesmo tempo em que eram exibidas as

imagens animadas de números de dança pelo kinetoscope. Há relatos de que o kinetophone,

em sua estrutura rudimentar, que ainda passava ao largo da sincronização, e sua simples

junção de música às imagens, foram recebidos com indiferença (GOMERY, 1985, p.6).

Na França, em 1902, Leon Gaumont fazia a primeira demonstração de seu

Chronophone, um sistema de exibição que unia o projetor a dois fonógrafos através de cabos

que tinham o objetivo de garantir o sincronismo entre os sons e as imagens. Gaumont logo

faria a primeira exibição pública de seu invento, em Londres, vendendo-o para negociantes

norte-americanos, que importam o sistema para os Estados Unidos. Não houve, porém, o

sucesso esperado, devido a falhas incontornáveis no funcionamento do aparelho: os sons

não amplificados não preenchiam um auditório, e a sincronização não se mantinha por

longos períodos de exibição. O Chronophone de Gaumont chegava ao Rio de Janeiro dois

anos mais tarde, em 1904, trazendo para o Brasil essas primeiras tentativas de sincronização

entre sons e imagens. Assim, estreava no Rio de Janeiro o “cinematógrafo falante”, em 26 de

novembro de 1904, segundo dados coletados por Vicente de Paula Araújo. A Gazeta de

Notícias informa que foram exibidos filmetes franceses onde “as figuras animadas falam e

3 Tradução direta do original em inglês. O livro ao qual nos referimos, History of the kinetograph, kinetoscope and kineto-phonograph, dos irmãos Dickson, acaba por ser, ao documentar o resultado das pesquisas de Edison, um dos primeiros livros sobre cinema de que se tem notícia. Pudemos ter acesso a ele através de uma edição em fac-símile lançada pelo MoMA, em 2000.

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cantam com uma verdade assombrosa” (apud ARAÚJO, 1986, p.160-161). No intervalo entre

1904 e 1908, alguns modelos similares chegaram ao Rio de Janeiro, garantindo a

continuidade dos “filmes falantes”. Aparelhos denominados, por exemplo, Syncrophone, ou

Syncronoscopio lírico, conviveram, naqueles anos, com o Chronophone Gaumont (idem,

p.229). Embora houvesse o entusiasmo da imprensa na divulgação dos novos aparatos de

exibição de filmes, esse modelo de sincronização sucumbe no Brasil, assim como sucumbira

no exterior.

Em 1913, nos Estados Unidos, Edison anunciava a volta do kinetophone. Dessa vez,

ele impressiona as platéias com a evolução de seu invento. Um grande fonógrafo garantia a

amplificação, e o sincronismo já era refinado a ponto de garantir a voz unida aos movimentos

labiais dos atores. Porém, o resultado ainda não era satisfatório, pois apesar de um fugaz

primeiro momento de bom funcionamento, o sistema começava a perder o sincronismo a

partir de 10 a 12 segundos de fala contínua (GOMERY, op.cit, p.7).

Não é demais lembrar que paralelamente à pesquisa para unir, através de

procedimentos mecânicos, o som à imagem nos filmes, havia toda uma gama de tentativas

de forjar essa união que passava ao largo do desenvolvimento tecnológico. Tentativas mais

rudimentares de sincronização passavam por subterfúgios como: ter atores atrás da tela

procurando dublar ao vivo os lábios silenciosos no momento em que o público os via4;

maquinaria escondida na sala de projeção para criar, sempre em sincronismo, os ruídos

sugeridos por objetos presentes nos filmes, quando mostrados em situações onde deveriam

fazer barulho, entre outros.

Esta é, aliás, uma boa ocasião para desmentir um pressuposto repetido à exaustão

que pesquisas recentes sobre a era do cinema mudo vieram a provar falso. Desafiando o

senso comum que diz que os filmes nunca foram silenciosos, Rick Altman mostra, baseado

em ampla documentação, que antes da década de 1910, exibir filmes em silêncio era uma

4 Lembrando que este procedimento específico teve um momento de grande sucesso no cinema brasileiro. Tratavam-se dos “filmes cantantes”, que, segundo Vicente de Paula Araujo, tiveram seu apogeu no ano de 1909. A viúva alegre, por exemplo, alcançou a marca de 300 exibições no Rio de Janeiro. A sátira política Paz e Amor também obteve grande sucesso. O cantor Eduardo das Neves, por exemplo, podia ser encontrado frequentemente atrás da tela de sucessos como Sangue Espanhol, cantando e declamando como se sua voz fosse a dos atores dos filmes (ARAUJO, 1976, p.281-316).

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das muitas práticas correntes nas salas de exibição norte-americanas. Altman diz que no ano

de 1908 determinadas salas ofereciam, no espaço de um dia, exibições acompanhadas por

ruídos, por vozes atrás da tela, por um comentador, por música executada ao vivo, e

meramente por silêncio. Em certas regiões, diz ele, a projeção em silêncio era a regra. Em

1909, as exibições silenciosas e aquelas acompanhadas por música se equivaliam em

número. É somente entre os anos de 1911 e 1913 que se nota um processo de

uniformização que elege a música como acompanhamento ideal das imagens. Entretanto,

até o início da década de 20, segundo Altman, ainda se podia encontrar donos de salas de

exibição que exibiam os filmes em silêncio, prescindindo da música (ALTMAN, 1996).

Apenas no início da década de 1920 a indústria americana já apresentava o aparato

tecnológico necessário para uma reprodução satisfatória de sons previamente gravados, o

que incluía um microfone de alta qualidade, um amplificador que não distorcesse os sons,

um gravador elétrico de discos, caixas de som potentes e um sistema que garantisse a

sincronização sem variações de velocidade.

Em 1925, A Warner Brothers resolve investir no aparelho desenvolvido pela Western

Electric para garantir o som sincrônico nos filmes, através de cabos que ligavam o toca-

discos, que trazia o som do filme, ao projetor. A intenção dos irmãos Warner era, uma vez

levando ao público a melhor tecnologia da época, ganhar espaço no mercado, e competir

com os estúdios maiores. O Vitaphone fazia então sua estréia em 6 de agosto de 1926, com

a exibição de alguns curta-metragens, seguidos do longa Don Juan. Com a obtenção do

sincronismo dos ruídos e da música, que entrava nos momentos certos, o Vitaphone

alcançava o sucesso. No final do mesmo ano, a Western Electric oferecia seus serviços às

outras grandes companhias, e em fevereiro de 1927 era assinado um acordo para a

utilização do Vitaphone pelos cinco maiores estúdios de cinema americanos, além da

Warner. Em 6 de outubro de 1927 estreava O cantor de Jazz (The jazz singer), e os quatro

números cantados por Al Jolson, com o perfeito sincronismo entre sua voz e sua imagem,

fariam do filme o maior sucesso do ano (GOMERY, op.cit, p.10-15).

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Paulo Emílio Salles Gomes lembra que, em 1928, no ano seguinte ao sucesso do

cinema falado nos Estados Unidos, agentes de companhias norte-americanas visitavam o

Brasil, preparando o terreno para a inserção do som. Executivos da Paramount vinham

averiguar as condições para a inauguração do Vitaphone. Em abril de 1928, São Paulo

assistia à primeira exibição brasileira de um filme falado: Alta traição (The patriot), de Ernst

Lubitsch. Dois meses depois, no Rio de Janeiro, estreava Melodia da Broadway (Broadway

melody) de Harry Beaumont, precedido, na sessão inaugural, de um curta-metragem onde o

cônsul do Brasil em Nova York introduzia o espetáculo da noite. Sua voz foi a primeira a ser

ouvida pela platéia carioca, havendo sido, após inúmeras tentativas, inaugurado o cinema

sonoro de forma definitiva (AUGUSTO, 1989, p.75-76).

Em 1929, Enquanto São Paulo dorme, de Francisco Madrigano, era o primeiro longa-

metragem nacional a ter cenas sonorizadas. No mesmo ano, Acabaram-se os otários, de

Luis de Barros, seria o primeiro filme completamente sonorizado (VIANY, 1959, p.98). Em

1930, o norte-americano Wallace Downey dirige Coisas nossas, o primeiro sucesso do

cinema falado brasileiro, um musical com samba título de Noel Rosa.

Nos Estados Unidos, paralelamente ao processo do som gravado em discos, outra

forma de unir o som à imagem era desenvolvida. A Fox Film Corporation mostrava interesse

nos esforços do cientista Theodore Case, que desde de 1913 vinha trabalhando em um

sistema que gravava o som na própria película, diferente da gravação em disco que

separava o som da imagem até o momento de sua execução conjunta. Em fevereiro de

1927, a Fox finalmente fazia a primeira demonstração pública de sue aparelho, o Movietone

(idem, p.15-17). Outro estúdio, a RCA (Radio Corporation of America) pesquisava a mesma

tecnologia. Em parceria com a General Electric, a RCA desenvolveu, entre 1922 e 1923, a

gravação do som na película de imagem de forma que ela ocupasse apenas 1,5 mm na

borda do filme de 35 mm, o que permitia facilmente o acompanhamento, no mesmo suporte

físico, da imagem pelo som. Em fevereiro de 1927, acontecia a primeira exibição pública do

Photophone. Estava posta a disputa pelo mercado dos dois sistemas que davam fim à

impossibilidade do som estar unido à imagem nos filmes. Em 1929, a RCA, através da RKO,

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sua subsidiária criada para cuidar exclusivamente dos filmes, lançava seus primeiros filmes

falados (GOMERY, op.cit, p.19-22).

Tornara-se claro para os estúdios americanos que o fator que levava o público aos

cinemas era a voz sincronizada, e não os outros elementos sonoros dos filmes, música e

ruídos. A pesquisadora Mary Ann Doane diz que havia uma demanda do público de ter

certeza de que se ouvia o que se via na tela, ou seja, se os lábios dos atores se moviam,

deveria se ouvir o som correspondente. Se tal fenômeno não ocorresse, a platéia sentir-se-ia

enganada (DOANE, 1991, p.458). Em janeiro de 1929, a Paramount lançava o primeiro filme

falado do início ao fim, Lights of New York (ALTMAN, 1985, p.45). Em maio, a Paramount

produzia apenas filmes totalmente falados, em oposição aos musicais com os quais o cinema

sonoro tinha sido introduzido. Em setembro do mesmo ano, todos os estúdios já haviam

completado essa mesma transição e produziam filmes em que os diálogos estavam

presentes o tempo todo (GOMERY, op.cit. p.22).

Rick Altman inclui um pressuposto técnico que teria contribuído para essa eleição da

voz como o elemento sonoro preponderante nos filmes. Segundo Altman, as limitações

técnicas da gravação e da edição de som da época tiveram sua dose de influência sobre

esse fenômeno: a tecnologia de edição daqueles dias praticamente impunha a existência de

uma única pista de som no filme, uma vez que havia uma grande perda de qualidade ao se

juntar sons no mesmo espaço da película. Tornava-se evidente que, havendo a necessidade

de se colocar apenas um som de cada vez na trilha sonora, esse espaço deveria ser dado à

voz dos atores, sem que houvesse musica ou ruídos que disputassem com ela o espaço. A

situação da pista única se manteve até 1933, quando os filmes falados já haviam imperado

por, pelo menos, quatro anos (ALTMAN, op.cit. p.46).

Assim, pode-se dizer, resumindo, que o modo padronizado, dominante até hoje, onde

a voz tem papel central no som dos filmes foi produto de: uma demanda de mercado, posto

que o público queria ouvir a voz dos atores; uma capitalização exacerbada desse desejo dos

espectadores por parte da indústria cinematográfica norte-americana, que no espaço de dois

anos já havido preenchido os filmes com vozes do começo ao fim; deficiências técnicas de

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um aparato ainda rudimentar que corroboraram com a manutenção daquela divisão do

espaço destinado ao som dos filmes.

O sucesso do modelo americano repercutiu imediatamente na Europa, onde a

chegada do som, com a imposição comercial do bem-sucedido cinema falado, teve o efeito

de enfraquecer os reflexos das vanguardas pós Primeira Guerra Mundial no cinema

europeu. Perdiam espaço, por exemplo, o impressionismo no cinema francês, juntamente

com as outras facetas do cinema experimental produzido até 1929, bem como o

Expressionismo Alemão, que ainda contabilizou algumas obras faladas, enquanto não se

dava o cerceamento da liberdade criativa naquele país. Assim, a chegada do som, da forma

como se deu, ajudou a reduzir diversidades e atuou contra aqueles que se opunham ao

cinema hollywoodiano (WILLIAMS, 1992. p.135-136).

Nesse contexto surgiam as primeiras teorias sobre o cinema sonoro, preocupadas

tanto com o uso redundante do som em si, ou seja, com a subutilização do novo elemento da

linguagem dos filmes, quanto com o sucesso da proliferação do modelo norte-americano e o

reducionismo que trazia. Realizadores e teóricos europeus, como Sergei Eisenstein,

Pudovkin, René Clair, e mesmo o brasileiro, atuante na Inglaterra, Alberto Cavalcanti, se

manifestaram, a partir daquele momento, em prol de um cinema que utilizasse o som de

forma que o novo elemento viesse a acrescentar novas possibilidades narrativas. Tal

argumento se colocava em clara oposição ao uso redundante instaurado pelos talkies

americanos, que apenas “colava” o som onde a imagem já estava, com o agravante de

limitar todos os possíveis lugares e situações, dentro de um filme, onde o som pudesse ser

colocado a um, de resto, óbvio: a boca dos atores e das atrizes.

Como hoje sabemos, essas teorias, urgentes em sua época, e sua aplicação nos

filmes dos respectivos realizadores europeus, não impediram a consolidação do modelo

norte-americano. Apesar dessa resistência, o que houve foi um incontestável domínio do

cinema estadunidense, e da estética naturalista de se unir imagens e sons. Rick Altman

dizia, em 1985, que os cinqüenta anos que se seguiram (ao que podemos acrescer mais

dezoito, até chegarmos aos nossos dias), estabeleceram a posição dominante da voz pelo

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diálogo, em detrimento dos outros elementos sonoros dos filmes, bem como de outras

formas de uso (ALTMAN, 1985, p.52).5 Tal utilização redundante do som em seus primeiros

anos, conclui Altman, teve um reflexo imediato na teoria e na análise fílmicas.

Altman diagnostica nas primeiras teorias sobre o cinema falado o que ele considera

dois erros seminais no modo de entender a chegada do som. Duas falácias, para usar seu

termo, e que, não obstante estarem equivocadas em sua época, se perpetuaram. Para

Altman, tais idéias acabaram por fundar uma teoria e uma análise fílmicas atadas à imagem,

justificando pelo século XX afora o lugar secundário ocupado pelo som, no âmbito teórico.

A primeira é a que ele define como falácia histórica.6 Sua falha consiste em não tratar

os filmes sonoros como sendo compostos por dois fenômenos simultâneos: imagem e som.

Ao invés disso, ordena os dois elementos cronologicamente, hierarquizando-os. Se

historicamente o som foi adicionado à imagem, a teoria e análise fílmicas colocam-no até

hoje em segundo lugar como fenômeno inscrito nos filmes, pensando a imagem antes.

Projetam a sombra de um fato histórico para as relações entre som e imagem intrínsecas a

cada filme.

Aliada a isso, está a falácia ontológica.7 Assim que o som se uniu à imagem, surgiram

teorias que, ao procurarem uma solução para o problema da influência da linguagem teatral

que se instaurava com os filmes falados, elegeram a imagem como sendo a essência do

cinema, relegando ao som o papel de artífice da impureza na matéria fílmica. Altman

enumera teóricos que mantiveram essa posição, como Rudolph Arnheim e Sigfried Kracauer.

A esses podemos acrescentar Erwin Panofsky. Seu ensaio Estilo e meio no filme é um

exemplo completo dessa corrente de pensamento. Para eles, falar sobre a linguagem

cinematográfica em seu estado puro seria tratar da imagem (ALTMAN, 1985, p.51-52). É

quase desnecessário dizer que era aquela uma batalha contra o alvo errado. O vilão a ser

combatido não deveria ser o som nos filmes, e sim a utilização teatral da voz, que devido à

5 Michel Chion, com certo humor, declarava em 1990, que desde o advento do som, com a escolha do cinema falado como modelo para o cinema sonoro, já se faziam 60 anos de arrependimento. (CHION, 1994, p.141)6 Tradução direta do original, em inglês, historical falacy.7 No original, ontological falacy.

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sua onipresença nos primeiros filmes falados norte-americanos foi tomada não como um dos

elementos constituintes da matéria sonora dos filmes, mas confundida com a totalidade

dessa matéria.

A imprensa brasileira, segundo o crítico e teórico de cinema Alex Viany, reproduzia,

argumentando contra o cinema falado, “as mesmas controvérsias que ocorreram por todo o

mundo”. Otávio de Faria e Pedro Sussekind publicavam, no fim da década de 1920, na

revista O Fã, “imprecações, xingamentos e lamentações contra o cinema falado”, afirmando

a imagem como a essência do cinema, em contraposição ao falatório de origem teatral

(VIANY, 1959, p.95-96). Enquanto aqueles jornalistas se insurgiam contra o cinema falado,

Adhemar Gonzaga, produtor em Minas Gerais e editor, com Pedro Lima, da revista Cinearte,

se interessava pela questão. Gonzaga, como narra Paulo Emílio Salles Gomes, viaja para os

Estados Unidos a fim de aprender sobre a mudança no modo de produção dos filmes.

Paralelamente, o paulista Joaquim Canuto Mendes coloca o cinema falado na pauta dos

grandes jornais de São Paulo.8 Gonzaga volta de viagem entusiasmado com a idéia de

produzir filmes sonoros. Há a esperança de que a passagem para o cinema sonoro dê o

impulso necessário para alavancar a indústria nacional.

Gonzaga funda a Cinédia, produzindo dois filmes concomitantes, Lábios sem beijos

(1930) e Mulher (1931). Delega a direção dos dois a, respectivamente, Humberto Mauro e

Otávio Gabus Mendes. Mulher, que se alongou em sua produção, deveria ter sido, pela

vontade de Gonzaga, o primeiro filme sonoro brasileiro. Quando fica pronto, em 1931, a

sonorização pelo Vitaphone, que reproduzia orquestrações e trechos de diálogos já não

constitui primazia. O próximo filme de Humberto Mauro produzido por Gonzaga, Ganga

Bruta, já era, segundo João Luiz Vieira, “defasado em relação a sua técnica sonora, falado

apenas em alguns momentos, e com ruídos que não se aproximavam do padrão sonoro mais

realista, já demonstrado pelo cinema norte-americano” (VIEIRA, 1987, p.139).

8 Canuto Mendes seria o autor do primeiro livro importante sobre cinema editado no Brasil, Cinema contra cinema, em 1931, como informa Paulo Emílio (GOMES, 1986, p.66).

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As dificuldades com a aceitação de seus primeiros projetos sonoros, em contraposição

ao sucesso do musical Coisas nossas, de Wallace Downey, faz com que Gonzaga siga nas

próximas produções o modelo musical, unindo-se ao norte-americano. A voz do carnaval

(1933) é um semi-documentário, com som direto da festa citada no título. Alô alô Brasil marca

a estréia de Carmem Miranda no cinema. Em 1935, o próprio Gonzaga assume a direção de

Alô alô carnaval, onde os números musicais cantados pelos artistas de sucesso do rádio

perpassam o filme.9 O publico se interessava em ver Francisco Alves, Mário Reis, Almirante,

João de Barro, a própria Carmem Miranda, entre outros, cantando na tela. Para João Luiz

Vieira, a novidade da visualização das vozes dos cantores e cantoras já populares no rádio,

possibilitada pela inserção do som no cinema, foi o principal fator responsável pelo sucesso

das produções que adotaram essa forma (idem, p.141). João Luiz Vieira afirma que a

ocupação da tela pelos filmes carnavalescos nacionais ocorrida naquela época se deveu

prioritariamente à relação do cinema com a música:

“Embora como via de saída frente à competição estrangeira, ou enquanto proposta estética,

esse rumo tenha sido combatido durante muitos e muitos anos, não resta dúvidas que, nas

décadas de 1930, 40 e 50, a união entre o cinema e a música brasileira, identificada para

sempre com o cinema que se fez no Rio de Janeiro, possibilitou a sobrevivência e garantiu a

permanência do cinema brasileiro nas telas do país” (ibid, p.141)

Assim, apesar de uma certa reverberação da mesma discussão na crítica

especializada da época quanto à utilidade do então novo elemento da linguagem do cinema,

verificamos no Brasil a importância do advento do som como o artífice da própria

consolidação do cinema nacional naquele momento crucial, onde foram dados os primeiros

passos para a, até hoje claudicante, caminhada em busca de uma indústria cinematográfica

brasileira.

9 Alô alô carnaval foi exibido recentemente no Rio de Janeiro, em cópia restaurada. É um raro exemplo de preservação da história do cinema brasileiro. Hernani Heffner, pesquisador da Cinédia, e um dos restauradores, informa que se trata do filme sonoro nacional mais antigo totalmente preservado. Todos os anteriores, que citamos, não existem de forma a ser exibidos integralmente. Há trechos de alguns, outros se perderam por inteiro. De Coisas nossas, o primeiro sucesso comercial, hoje existe apenas a trilha sonora, sem a imagem, como exemplo dessa situação vexatória.

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