a indústria farmacêutica em portugal

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Ficha Técnica

Coordenação globalJosé António Aranda da Silva

Coordenação editorialJoão Moreira dos Santos

Coordenação executiva e produçãoBoa Disposição, Lda.

Design gráficoBoa Disposição, Lda.

Revisão de textoAdelaide Correia

EdiçãoApifarma – Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica.

ImpressãoJorge Fernandes, Lda.

Dep. legal??????? ISBN978-989-99258-0-9 1.ª edição, 1000 exemplares – Dezembro, 2014.

Este livro foi escrito segundo o antigo Acordo Ortográfico.

Créditos fotográficos Apifarma: páginas. 77, 79, 87 (diteita), 95, 117, 125-128, 133-135, 139 (inferior), 141-142; 206, 213, 216. Arquivo Diário de Notícias: pág. 78; Arquivo Nacional da Torre do Tombo/DGARQ: capa, sobrecapa e páginas. 61, 64, 74, 76; Atral-Cipan: 87 (esquerda), 98 (direita), 105, 108, 109 (superior); Bayer Portugal: 121, 132; BIAL: 71, 72 (superior), 139, 149, 151; Biblioteca de Arte – Fundação Calouste Gulbenkian: 72, 81 (inferior), 81-83, 85, 88, 89 (inferior), 93, 98 (esquerda), 100, 102-103, 107 (superior), 119; Biblioteca Nacional: 63, 68, 69, 70 (superior), 91, 105, 107 (inferior), 108, 109 (superior), 112, 116, 120, 123 (inferior); Bluepharma: 136,137, (superior); Câmara Municipal de Lisboa - Divisão de Arquivo Municipal Fotográfico: 66, 99; Centro de Documentação Farmacêutica - Ordem dos Farmacêuticos: 65 e 70 (inferior); Iberfar: 109 (inferior); Infarmed: 130, 131 (inferior); João Moreira dos Santos: 114-114; Medinfar: 122; Museu da Farmácia: 12, 30, 58, 144, 154, 162, 190, 202, 208, 218, 222; Pfizer: 110; Tecnimede: 129. Nota: As ilustrações dos separadores de capítulos deste livro fazem parte da colecção iconográfica do Museu da Farmácia, representando excertos de uma colecção de cartazes de publicidade farmacêutica e parafarmacêutica (na época, as águas minerais e os vinhos nutritivos eram considerados produtos medicinais) produzida no início do século XX pela Empresa Técnica Publicitária, de Raúl de Caldevilla, e também pela Litografia Luzitana (Água Oxigenada da Companhia Portuguesa Higiene) e por A Editora, Lda. (Aseptal).

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Agradecimentos

A Apifarma agradece a todas as individualidades e autores que participaram neste livro e também às personalidades e instituições

que, através do seu testemunho ou da cedência de documentos e materiais fotográficos, contribuíram para a investigação histórica

sobre o estabelecimento e desenvolvimento da indústria farmacêutica em Portugal: António José de Barros Veloso (médico); Arquivo

Nacional da Torre do Tombo/DGARQ; AtralCipan; Bayer; Bial; Biblioteca de Arte da Fundação Calouste Gulbenkian; Biblioteca Nacio-

nal; Bluepharma; Câmara Municipal de Lisboa - Divisão de Arquivo Municipal Fotográfico; Centro de Documentação Farmacêutica da

Ordem dos Farmacêuticos; Grupo Tecnimede; Irene Flunser Pimentel (investigadora); José Pedro Sousa Dias (Faculdade de Farmácia

da Universidade de Lisboa); Labesfal-Fresenius Kabi; Maria das Neves; Maria João Macieira; Medinfar; Museu da Farmácia/Associação

Nacional das Farmácias; Laboratórios Pfizer, Lda.; Nuno Coelho Rodrigues (farmacêutico de indústria); Sofarimex.

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Índice

INTRODUÇÃO 11

João Almeida Lopes

I. TESTEMUNHOS INSTITUCIONAIS 12

Eurico Castro Alves (Presidente do Infarmed) 15

José Manuel Silva (Bastonário da Ordem dos Médicos) 17Carlos Maurício Barbosa (Bastonário da Ordem dos Farmacêuticos) 19

Laurentina Pedroso (Bastonária da Ordem dos Médicos Veterinários) 21Orlando Monteiro da Silva (Bastonário da Ordem dos Médicos Dentistas) 23

Germano Couto (Bastonário da Ordem dos Enfermeiros) 25

Associações de Doentes 26

II. PASSADO PRESENTE E FUTURO 30 II.1 Uma Visão da Indústria Farmacêutica 33

Luís Portela 34

Thebar Miranda 37

II.2 Duas Lideranças, Duas Perspectivas 40 João Gomes Esteves 41

Luiz Chaves Costa 46

II.3 Testemunhos Apifarma 48Eduardo Pinto Leite 49

Leonardo Santarelli 50 Eduardo Leyva 51

Antónia Nascimento 52

António Chaves Costa 53

Cristina Lains 54

Mafalda Araújo 55

Manuel Dargent Figueiredo 56

Teresa Alves 57

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III. A INDÚSTRIA FARMACÊUTICA EM PORTUGAL: PERSPECTIVA HISTÓRICA 58Da Companhia Portuguesa Higiene ao primeiro medicamento original de patente mundial:120 anos de Indústria Farmacêutica em Portugal

João Moreira dos Santos 61

IV. INVESTIGAÇÃO, DESENVOLVIMENTO E SEU CONTRIBUTO PARA A EVOLUÇÃO CIENTÍFICA E PARA A SAÚDE PÚBLICA 144

Francisco Batel Marques 147

Patrício Soares da Silva 149

V. O VALOR DO MEDICAMENTO E O SEU CONTRIBUTO PARA A SOCIEDADE 154

José Aranda da Silva 157

VI. O SECTOR FARMACÊUTICO NACIONAL E MUNDIAL 162

Mercado do Medicamento Mundial, Europeu e NacionalHeitor Costa 165

Medicamento VeterinárioHelena Ponte 186

Diagnósticos in vitroIsabel Abreu 188

VII. VALOR DOS RECURSOS HUMANOS E SUA EVOLUÇÃO 190 Helda Azevedo 193

VIII. IMPORTÂNCIA ECONÓMICA E ESTRATÉGICA DA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA 202

Pedro Ferraz da Costa 205

IX. RESPONSABILIDADE SOCIAL E PLATAFORMAS DE COLABORAÇÃO E DESENVOLVIMENTO 208

Apifarma 211

X. RELAÇÕES INTERNACIONAIS 218

Apifarma 221

XI. DIAGRAMA ILUSTRATIVO DE MOMENTOS-CHAVE DA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA EM PORTUGAL 222

João Moreira dos Santos 224

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“Iremos, enfim,até onde as circunstâncias

nos permitirem no sentido daperfeição da nossa indústria”.

Excerto do discurso de Francisco Cortez Pinto, primeiro Presidente do Grémio, na cerimónia de entrega do Alvará do GNIEF, em 14 de Fevereiro de 1939.

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INTRODUÇÃO

Celebrar os 75 anos da Apifarma – Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica é uma oportunidade única para reconhecer o forte compromisso das empresas farmacêuti-cas com a disponibilidade contínua de respostas mais ade-quadas às necessidades em Saúde dos portugueses e, si-multaneamente, assinalar a capacidade demonstrada para construir soluções de futuro para o País.

Desde o Grémio Nacional dos Industriais de Especialida-des Farmacêuticas, criado em 1939, até hoje, foram inúme-ras, e muitas vezes complexas, as mudanças atravessadas pelas empresas farmacêuticas em Portugal.

João Almeida Lopes Presidente da Direcção da Apifarma

As transformações sociais e tecnológicas vividas pelo País repercutem-se directamente na investigação, desenvolvi-mento e produção de medicamentos e meios de diagnóstico in vitro em Portugal e obrigam a saber acompanhar perma-nentemente a mudança, sem colocar em causa a missão de inovação da Indústria Farmacêutica.

Um exemplo desta capacidade de adaptação e criação da Indústria Farmacêutica em Portugal está no contínuo cres-cimento das parcerias entre empresas e centros nacionais de mérito reconhecido internacionalmente, procurando au-mentar a taxa de sucesso entre a investigação de novas mo-léculas e o seu desenvolvimento clínico.

Simultaneamente, e porque a inovação farmacêutica só assume verdadeiramente o seu valor quando é colocada à disposição dos doentes que dela necessitam, o garantir da acessibilidade ao medicamento e aos meios de diagnóstico in vitro assume-se, também, como uma missão das empre-sas farmacêuticas em Portugal e da sua Associação.

Repercutindo a postura dos seus associados na sua in-tervenção, a Apifarma soube, também, ao longo destas dé-cadas, procurar modelos mais dinâmicos e representativos da diversidade empresarial que a constitui, tendo sempre presente que o envolvimento das empresas associadas é fundamental para a solidez da sua acção.

Com a edição desta obra, pretendemos dar a conhecer o que foram esses momentos de mudança e o que caracteriza o investimento em inovação por parte das empresas farma-cêuticas associadas da Apifarma, bem como o impacto po-sitivo da sua actividade na Saúde, na Ciência e na Economia nacionais.

É, ainda, extremamente gratificante constatar, através dos nomes que assinam os vários capítulos desta obra, a dispo-nibilidade de tantas personalidades de mérito reconhecido para se associarem à Apifarma nesta iniciativa.

Tal só pode ser entendido como uma demonstração de que, enquanto associação, soubemos ser parceiros respon-sáveis de todos os que pensam e se preocupam com a Saú-de em Portugal.

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1.Excerto de cartaz publicitário do «Sanogenol: Poderoso Tónico» Companhia Portuguesa de Higiene (1910-1916)

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TESTEMUNHOS INSTITUCIONAIS

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Há quem diga, e as estatísticas confirmam, que atingem maior longevidade aqueles que mais aniversários cele-bram! Este princípio, que alguns interpretam como graça, encerra, contudo, em si uma filosofia de vida. Na verdade, são os que melhor sabem fazer o seu caminho que mais aniversários cumprem.

É acreditando nisso, e considerando que estas datas são sempre bons motivos para expressar o que pensamos, que saudamos e cumprimentamos a Apifarma pela sua já lon-ga existência, destacando o papel preponderante que tem tido ao longo destes anos na Indústria Farmacêutica por-tuguesa. Conforme disse Louis Pasteur, “a sorte joga a fa-vor de uma mente preparada” e, portanto, pode afirmar-se que esta instituição alcançou já uma notável maturidade do alto dos seus 75 anos de vida.

É incontornável reconhecer que a Apifarma é hoje, gra-ças ao empenho que tem demonstrado em apoiar a ciên-cia, uma instituição que tem merecido o respeito de todo

Eurico Castro AlvesPresidente do Infarmed

o sector da Saúde e que vem conquistando e contando com o apreço dos nossos parceiros internacionais enquan-to mediador e elemento proactivo e estabilizador, sendo mesmo por muitos considerada um alicerce iniludível da indústria dos medicamentos.

Acompanhando esse esforço, o Infarmed, I.P., enquanto regulador e supervisor do sector dos medicamentos de uso humano, não pode deixar de elogiar tal empenho.

Ciente de que vem cumprindo a sua missão, notamos, positivamente, a atenção e o apoio entregues ao desen-volvimento de terapias inovadoras que vêm contribuindo para dar resposta às constantes buscas de novos trata-mentos num mundo sujeito a riscos e desafios e onde o conhecimento pode significar, em último ratio, a resposta para o futuro da Humanidade.

Foi Isaac Newton que lembrou: “o que sabemos é uma gota, o que ignoramos é um oceano”. Imbuído deste senti-mento de compromisso e seguro do sucesso deste esforço de harmonia entre os vários agentes da Indústria Farma-cêutica, o Infarmed releva a vontade expressa pela prática diária da Apifarma em defender a segurança necessária aos que lutam pelo desenvolvimento da verdadeira e sé-ria ciência de inovação, proporcionando o alargamento da longevidade e o bem-estar das pessoas e contribuindo também, de forma inquestionável, para o desenvolvimento económico e social do nosso País.

Não menos importante, e enquanto testemunhas da sua firmeza em defender os seus associados e os seus inte-resses, é de toda a justiça referir que apreciamos a forma como o tem feito, guiando-se por regras de uma sociedade ocidental livre e democrática e no respeito pelos princí-pios sagrados de um Estado de Direito.

Ainda recentemente, a par com o sentido de responsa-bilidade social adequado ao funcionamento do sector do medicamento, num momento tão delicado para o nosso País como o atual, soube reger-se por princípios éticos e deontológicos, observando sempre padrões de rigorosa defesa da qualidade.

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Na área da Saúde, os desafios estabelecidos represen-tam um equilíbrio difícil entre a manutenção e a aplicação de medidas que visam a sustentabilidade do Sistema de Saúde. Por um lado, é necessário garantir a qualidade e equidade no seu acesso, mas, por outro lado, é necessário permitir a redução da despesa sem sacrificar o acesso equitativo de todos os cidadãos aos cuidados de Saúde.

É conhecida a pressão que os agentes envolvidos no cir-cuito do medicamento têm suportado nos últimos anos. No entanto, é necessário ter em consideração a impor-tância de garantir o acesso a medicamentos seguros, de qualidade, eficazes e a preços comportáveis, reduzindo o esforço financeiro dos cidadãos.

Neste contexto, todos têm sido chamados a contribuir e a fazer parte da solução, e o Infarmed tem encontrado junto dos agentes do sector, nomeadamente nos represen-tantes da Indústria Farmacêutica, um espírito de missão que muito nos tem impressionado.

Reconhecendo esse empenho, o Infarmed assistiu à sua materialização através de diversos compromissos assumi-dos entre a Apifarma e o Ministério da Saúde no âmbi-to do controlo da despesa com medicamentos. É justo e merecido o agradecimento ao contributo que a Indústria Farmacêutica tem realizado neste domínio, bem como no cumprimento dos objectivos estruturais assumidos no contexto do Programa de Assistência.

Associando-se a este alento, não podemos deixar passar esta ocasião sem destacar o melhor exemplo deste espíri-to de compromisso, que é o Banco de Medicamentos.

Este projecto, que permite vincar os valores que nos unem enquanto sociedade – a entreajuda e a solidarieda-de –, mediante pontes de entendimento entre o Ministério da Solidariedade, Emprego e Segurança Social, o Ministério da Saúde (através do Infarmed), a Indústria Farmacêutica e a União das Misericórdias Portuguesas, concretizou um sistema de apoio complementar à população mais vulnerá-vel, promovendo o acesso dos mais idosos ao medicamen-to. Desde o início do projecto do Banco de Medicamentos,

a 1 de Dezembro de 2012, já foram doadas cerca de 145 mil embalagens, correspondentes a um Preço de Venda ao Público de aproximadamente um milhão e 500 mil euros.

O Infarmed encontra-se, actualmente, a implementar um sistema de avaliação de tecnologias de Saúde aplicado aos medicamentos e dispositivos médicos. Este sistema con-templa a selecção das tecnologias de Saúde com base em critérios de custo-efectividade e permitirá a monitorização da sua utilização, estimulando e premiando o desenvolvi-mento de inovação relevante.

A finalidade é garantir a equidade de acesso a nível na-cional de medicamentos e dispositivos médicos, disponi-bilizando os tratamentos mais aconselhados à situação clínica de cada doente, adequando-os aos recursos do Sis-tema de Saúde Nacional.

Ao nível da Agência Europeia do Medicamento, têm-se promovido diversos projetos-piloto no âmbito da avaliação de tecnologias de Saúde, nos quais o Infarmed participa, que visam redefinir os modelos de avaliação custo-efecti-vidade de medicamentos e dispositivos médicos utilizados a nível europeu, com vista a estabelecer as bases para a implementação de um futuro Sistema Europeu de Avalia-ção de Tecnologias de Saúde. O objectivo é permitir uma maior celeridade na introdução de inovação e, acima de tudo, tornar mais equitativo o acesso entre os cidadãos dentro do espaço europeu, no seio do qual, estamos cer-tos, a Apifarma desempenhará um papel preponderante, como tem sido sua prática.

Termino com uma palavra de apreço e reconhecimento a todos os dirigentes e funcionários da Apifarma que, ao longo destes anos, a souberam dignificar e tornar num tão importante parceiro na complexa cadeia de Saúde, de tal forma que não é possível vislumbrar um futuro em que a Indústria Farmacêutica não esteja presente.

Ao actual presidente da Apifarma, Dr. Almeida Lopes, endereço um especial cumprimento e formulo votos dos maiores sucessos na continuidade do excelente trabalho até agora desenvolvido.

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Um aniversário de diamante é um tempo de congratular, festejar, parabenizar, mas também de analisar, repensar, futurar.

Para um médico comum, a Apifarma não diz muito, visto que com ela não tem contactos directos.

São os laboratórios da Indústria Farmacêutica, individual-mente, que contactam com os médicos, simbolizando a in-vestigação, o medicamento, a terapêutica, a recuperação.

É através dos recursos desenvolvidos essencialmente pela Indústria Farmacêutica que o médico exerce a sua nobre e difícil missão, que visa a cura, o tratamento ou o alívio do sofrimento.

Foi o desenvolvimento da investigação e da Indústria Far-macêutica que permitiram o crescimento da Medicina e a realização do médico como verdadeiro médico.

É o apoio da Indústria Farmacêutica que facilita, e em

José Manuel Silva Bastonário da Ordem dos Médicos

muitos casos é a única forma de tal ser possível, o acesso dos profissionais de Saúde ao conhecimento científico ac-tualizado, às reuniões científicas e discussão interpares, à assinatura de revistas científicas, a tratados de medicina, a tecnologia inovadora, a projectos de investigação, etc.

A Indústria Farmacêutica faz tudo aquilo que o Estado também devia fazer, mas não faz e critica!...

Felizmente, e com a cooperação da Apifarma, a relação entre indústria e profissionais de Saúde é cada vez mais escrutinada e transparente. Ainda bem que assim é por-que ninguém deve ter nada a esconder.

Os tempos actuais são bem diferentes daqueles em que foi criado, há 75 anos, o Grémio Nacional dos Industriais de Especialidades Farmacêuticas.

São os problemas próprios de um País perdido nos labirin-tos de uma democracia jovem e impreparada, em crise de evolução e austeridade, com o desbravar de novos, desa-fiantes e contraditórios caminhos para a Indústria Farma-cêutica.

Cada vez mais, o associativismo é essencial para a so-brevivência colectiva. Por isso mesmo, a Apifarma adquire agora um maior protagonismo e visibilidade públicas, que se renovam ciclicamente na dialética dos complexos acor-dos com o Governo.

Tigre de papel, a Apifarma deve reconstruir-se para o futuro.

Fazer 75 anos em tempos de grave crise, cuja espiral se continuará a agravar, impõe novos paradigmas e obriga a um reflexivo e audaz desbravar das estradas do futuro.

Da parte dos médicos e dos doentes, num caminho que tem algumas pedras e alçapões, felizmente em menor nú-mero do que os êxitos, tem o reconhecimento pelo insubs-tituível papel como parceiro na locomotiva do desenvolvi-mento da Medicina científica.

A Apifarma vista por um Médico

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Carlos Maurício Barbosa Bastonário da Ordem dos Farmacêuticos

Fundada em 1975, sucedendo ao Grémio Nacional dos Industriais de Especialidades Farmacêuticas, criado em 1939, a Apifarma tem sabido congregar as empresas far-macêuticas que operam em Portugal, nacionais e multina-cionais, defendendo os seus legítimos interesses, procu-rando corresponder às suas necessidades e expectativas e contribuindo para o desenvolvimento do cluster português da Saúde e para a modernização do Sistema de Saúde e, por conseguinte, para o fortalecimento da competitivida-de do País.

A Apifarma tem, por razões de história, de função e de competência, um lugar na primeira linha do sector da Saúde em Portugal. Assume-se e é considerada como um importante parceiro e interlocutor para a definição das po-líticas do sector.

A História da Apifarma e da Indústria Farmacêutica em Portugal cruzam-se em muitos pontos com a História da profissão farmacêutica dos últimos 75 anos.

Numa época em que Portugal era um País relativamente rural e pouco industrializado, com fronteiras predominan-temente fechadas e com uma população de baixos níveis de qualificação escolar, em que, aliás, o analfabetismo era vulgar, os industriais do sector farmacêutico, muitos dos quais farmacêuticos de formação, iniciaram um caminho de desenvolvimento de uma indústria que, hoje, tem um papel essencial na redução da mortalidade e da morbili-dade e na promoção da qualidade de vida das populações. E, simultaneamente, reveste-se de interesse estratégico para o País, assumindo uma posição de elevado relevo na economia nacional e na captação de investimento.

Ao longo destes anos, centenas de farmacêuticos têm sido parte integrante, por mérito próprio, do desenvolvi-mento da Indústria Farmacêutica em Portugal. Recordo, em particular, a criação, pouco depois da transformação do Grémio na Apifarma, do Grupo de Farmacêuticos de Indústria (na época conhecido por GRUFIS), cuja primeira reunião teve lugar em 1977, e que, mais tarde, veio a dar origem ao actual Conselho do Colégio de Especialidade de Indústria Farmacêutica da Ordem dos Farmacêuticos.

Actualmente, o título de especialista em Indústria Farma-cêutica, atribuído pela Ordem dos Farmacêuticos, é condi-ção consagrada na lei para o exercício da direcção técnica das unidades industriais de produção de medicamentos. E, de forma crescente, os farmacêuticos têm vindo a exer-cer funções de maior diferenciação e responsabilidade na Indústria Farmacêutica, designadamente nas áreas da in-vestigação científica, desenvolvimento tecnológico e ino-vação, gestão, planeamento, produção, controlo de quali-dade, assuntos regulamentares, farmacovigilância, acesso ao mercado, avaliação económica, logística, comercial, promoção, informação e formação científica.

Neste momento de comemoração, gostaria de prestar a minha homenagem aos fundadores da Apifarma, pela sua visão estratégica e pelo importante contributo que deram ao sector da Indústria Farmacêutica em Portugal. E na pessoa do seu ilustre presidente, Dr. João Pedro Almeida

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Lopes, gostaria de homenagear todos os dirigentes, desde a fundação, que souberam construir o prestígio institu-cional da Apifarma. Todos colocaram o seu empenho, co-nhecimento e bom nome ao serviço do sector e do capital intangível que, hoje em dia, a Apifarma detém.

Nos anos mais recentes, a cadeia de valor do medica-mento tem sido chamada a contribuir de forma marcada para a redução da despesa pública com medicamento, de que são exemplo os sucessivos acordos assinados pela Apifarma com o Ministério da Saúde. Reconhecidamente, esta constitui uma situação sem par no sector da Saúde e mesmo nos outros sectores da economia portuguesa.

Neste contexto, parece ser de elementar prudência que se registem preocupações sobre o uso recorrente e cumu-lativo de um tal mecanismo de política orçamental (é dis-so que, no fundo, se trata), pois ele pode afectar alicerces da viabilidade empresarial, despromover a estabilidade e a previsibilidade do sector, desincentivar o investimento e o reinvestimento das empresas.

A Ordem dos Farmacêuticos cultiva o espírito de coope-ração, diálogo, auscultação e, tanto quanto possível, en-tendimento com todas as entidades do sector da Saúde em geral e da área farmacêutica em particular. Sempre em absoluto respeito pelas posições institucionais de cada um. Estes são princípios fundamentais que assumi e que norteiam a minha acção na direcção da Ordem.

Ora, no caso das relações com a Apifarma, há natural-mente confluências e complementaridades, o que muito me apraz registar, porque são condições propiciadoras de elevados graus de cooperação entre as duas instituições, em prol da valorização do papel do Farmacêutico e da In-dústria Farmacêutica na sociedade.

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Os desafios colocados hoje em dia à Classe Médico-Vete-rinária são, em tudo, coincidentes com os princípios de-fendidos pela Indústria Farmacêutica, nomeadamente no que se relaciona com a inovação, a responsabilidade ética e social do bem-estar e Saúde animal, a defesa da quali-dade dos produtos de consumo produzidos em Portugal, bem como com a preservação da qualidade do Ambiente.

A Classe Médico-Veterinária, representada pela OMV, sempre atenta e receptiva, em primeira mão, à inovação do conhecimento ligada à Farmacologia e produtos para o tratamento animal, não pode deixar de se associar a um marco tão significativo, em Portugal, reafirmando o empenho dos seus membros na continuidade do desenvol-vimento de uma cada vez maior evidência e necessidade de “Uma Só Saúde”.

Não há fronteiras e são cada vez menores as barreiras entre os organismos patogénicos que afectam, simulta-neamente, o Homem e o animal.

O desenvolvimento de produtos inovadores é um facto reconhecido e da responsabilidade e cooperação entre a indústria e os diversos profissionais de Saúde.

O utente destes produtos mudou significativamente nos últimos 75 anos, bastando por si só uma pequena análise à esperança e qualidade de vida da população portuguesa. Em grande parte, o profissional Médico Veterinário esteve presente, ajudando e aplicando a inovação da Indústria Farmacêutica.

Hoje, são ambos (Indústria e Classe Médico-Veterinária) colocados perante novos desafios, não podendo deixar de ser referida a luta contra as bactérias e organismos resis-tentes aos antibióticos.

O passado e a ligação de parcerias entre a OMV (e ante-riores organismos de Classe) e a indústria, representada em Portugal pela ApifarmaVet, são a razão e um desafio cada vez maior de futuro ao empenho de muitas das em-presas da Apifarma e profissionais que trabalham juntos no mesmo sentido.

Cabe-me, portanto, em nome de todos os profissionais Veterinários, uma palavra de reconhecimento e felicitação pelo actual momento, agradecendo à presente Direcção a continuidade desta ligação.

Laurentina Pedroso Bastonária da Ordem dos Médicos Veterinários

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Orlando Monteiro da Silva Bastonário da Ordem dos Médicos Dentistas

Em nome de todos os médicos dentistas portugueses, saúdo a Apifarma por este aniversário especial. De facto, 75 anos são um marco que certamente orgulha todos os associados, mas deve orgulhar, também, todos os portu-gueses. A Vossa instituição é um dos garantes da evolução dos nossos Sistemas de Saúde e da evolução do exercício das profissões da Saúde no País. Uma representação dig-na, dinâmica e activa da indústria responsável pela produ-ção e importação de medicamentos.

Por vezes, não é fácil e evidente ver para além do que nos é dado pela nossa realidade. Realidade muito forma-tada pelas circunstâncias de cada um e por um sistema mediático que nos leva a processar e a simplificar muita da informação que nos chega. São estes momentos, es-tes marcos temporais, que nos fazem reflectir um pouco mais e ver um pouco mais além. Quando me pediram, en-quanto bastonário da Ordem dos Médicos Dentistas, um texto sobre os 75 anos da Apifarma, o primeiro impulso

foi escrever sobre o relacionamento institucional entre as nossas duas instituições. E seria fácil. O relacionamento é bom e o País tem nestas duas instituições dois parceiros leais, empenhados na construção diária de um Portugal com mais Saúde e mais força económica. Seriam palavras verdadeiras e com sentido.

Mas este é o momento de ver e ir mais além. Achei que não me podia deixar tomar pelo fácil, pelo apenas politi-camente correcto. Assim, considerei que este é momento de homenagear os associados da Apifarma, uma comuni-dade dinâmica e activa que, pela sua acção – nem sempre visível ao primeiro olhar, tem levado a que muitos jovens portugueses nela vejam uma referência, um modelo, e in-vistam numa formação nestas áreas, e se entreguem a ambiciosos projectos de investigação. Projectos que co-locam, hoje, Portugal, apesar da sua dimensão e escas-sez de meios, na primeira linha da Indústria Farmacêutica mundial. Vários são os prémios conquistados, várias são as referências internacionais às nossas universidades, vá-rios são os galardões de reconhecimento a empresas e centros de investigação nacionais. Este é um sector que encarna bem o potencial do conhecimento português. Esta capacidade de gerar conhecimento é motivante e ala-vanca o País.

Obrigado, Apifarma!

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No ano em que a Apifarma comemora os seus 75 anos, a Or-dem dos Enfermeiros (OE) comemora o seu 16.º aniversário. Apesar do sector da Saúde estar a passar por vários cortes orçamentais, as duas entidades continuam a pugnar, cada uma na sua vertente, pela manutenção do Sistema de Saúde português, tendo sempre em vista a segurança e a qualidade de vida da população residente em Portugal.

Ao longo dos seus 75 anos de existência, a Apifarma tem evoluído e contribuído, de forma inequívoca, para o desenvol-vimento e a melhoria da Saúde no nosso País e, consequente-mente, para o aumento da esperança média de vida dos portu-gueses. A aposta na inovação, tanto ao nível do medicamento como nos meios de diagnóstico, faz da Apifarma uma parceira de relevo na área da Saúde, na medida em que permite que os doentes tenham acesso a novas terapias e tratamentos.

A área do medicamento tem evoluído exponencialmente ao longo das últimas décadas e esta realidade tem reflexo na so-ciedade na medida em que permite ao cidadão ter uma vida mais prolongada, mas, acima de tudo, com mais qualidade.

Germano Couto Bastonário da Ordem dos Enfermeiros

Esta melhoria na qualidade de vida da população traduz-se também no desenvolvimento económico e social do País visto que permite que o cidadão seja mais produtivo, a nível pro-fissional. O acesso a medicamentos de qualidade reflecte-se, também, na diminuição da procura de outros cuidados de Saúde e, consequentemente, na redução de encargos a médio e a longo prazo.

Numa sociedade em que a esperança média de vida tem vindo a aumentar e, em contraste, a taxa de natalidade a di-minuir, é fundamental a existência de uma instituição como a Apifarma, que tem como missão «fomentar a inovação e o desenvolvimento de terapêuticas que respondam às neces-sidades de tratamento e prevenção de novas patologias». A investigação clínica e o conhecimento científico são factores essenciais para o desenvolvimento de uma sociedade, e o do-mínio destas áreas permite que o País e os seus profissionais de Saúde se destaquem a nível internacional.

O trabalho desenvolvido ao longo dos anos, tanto pela Api-farma, como pela Ordem dos Enfermeiros, tem como princi-pal destinatário o cidadão. Neste sentido, ambas as institui-ções zelam pela defesa de elevados padrões de qualidade e segurança e, no actual contexto económico, em que sofremos as consequências dos cortes impostos pelo Memorando da Troika, é importante que todas as entidades da área da Saúde se mobilizem e caminhem lado a lado, para transmitir aos de-cisores políticos que é fundamental o investimento no sector.

Não é fácil, na actual conjuntura, conseguir mudar menta-lidades, mas não é impossível. Os avanços tecnológicos per-mitem melhorar a qualidade de vida da população cada vez mais envelhecida. Contudo, a Saúde deve ser encarada como um investimento e não apenas como um custo. Como refere o ponto 1, do artigo 64.º, da Constituição da República Portu-guesa, «todos têm direito à protecção da Saúde e o dever de a defender e promover». Neste sentido, a Apifarma e a Ordem dos Enfermeiros têm um papel preponderante no desenvolvi-mento da Saúde e, acima de tudo, na defesa da qualidade dos cuidados de Saúde prestados.

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Vitórias de uma Parceria

Em 75 anos o padrão da doença alterou-se radicalmente. E, com ele, a própria sociedade e as suas expectativas relativa-mente à Saúde. Neste processo, as empresas farmacêuticas souberam acompanhar a evolução e, dando destaque ao es-tabelecimento de parcerias, procurar responder às necessi-dades dos doentes, os seus primeiros interlocutores.

Se, no início do século XX, as doenças transmissíveis cons-tituíam a principal preocupação em Portugal, a melhoria das condições de higiene e de vida das populações, e um cres-cente acesso à mais recente investigação farmacêutica, con-tribuíram, decisivamente, para alterar este cenário e reduzir drasticamente a incidência daquelas doenças no País.

Este tremendo ganho para a Saúde Pública em Portugal elevou, naturalmente, as expectativas, legítimas, da socieda-de portuguesa face à sua Saúde, para as quais é imperativo saber continuar a encontrar respostas vencedoras.

A emergência de novos problemas de Saúde, associados a estilos de vida mais sedentários, que ganharam peso com as mudanças sociais dos últimos 30 anos, e a crescente pre-ponderância das doenças não transmissíveis, com carácter crónico, geraram um novo contexto desafiador para a Saúde. Simultaneamente, a capacidade de adaptação e emergência dos microrganismos contribuiu para o aparecimento de no-vas doenças e para o ressurgimento de patologias anterior-mente controladas.

Actualmente, as doenças crónicas constituem uma das principais causas de mortalidade e, de acordo com a Orga-nização Mundial de Saúde, representam um dos principais factores a contribuir para o contínuo crescimento das despe-sas em Saúde.

A par da maior prevalência das doenças crónicas na popu-lação, o crescimento da despesa é também impulsionado pelo aumento da esperança média de vida, que, por sua vez, beneficiou de um considerável incremento devido à contínua melhoria nos tratamentos disponíveis.

Associações de Doentes Além dos custos directos na Saúde, as doenças crónicas colocam também pressão em muitas outras áreas da vida social, como é o caso da Economia, tendo em conta as limitações à actividade diária que acarretam para os seus portadores.

Desde sempre que as empresas farmacêuticas se consti-tuíram como parceiro dos Sistemas de Saúde na busca de soluções que contribuam para o crescente bem-estar das populações. O forte investimento que estas organizações aplicam à sua missão, a contínua investigação e desenvol-vimento de novos medicamentos e exames de diagnóstico – são elementos com um papel decisivo nas alterações positivas registadas no controlo das doenças transmissí-veis e no aumento da esperança média de vida a que se assistiu nos últimos anos.

Perante os novos desafios que se perfilam na Saúde, as empresas farmacêuticas têm respondido com capacida-de de adaptação para acompanhar a crescente exigência e complexidade na investigação e desenvolvimento (I&D) de medicamentos inovadores e na busca de terapias cada vez mais seguras e eficazes. Neste processo, ganha cada vez mais relevo a capacidade de assegurar parcerias com todos os agentes da Saúde – doentes, serviços e profissio-nais, de modo a que o investimento em I&D se traduza em reais ganhos em Saúde e em maior qualidade de vida.

Para a concretização deste objectivo, é necessário que o Sistema de Saúde coloque o doente no centro da sua atenção e, simultaneamente, que o doente seja um par-ticipante activo e envolvido na intervenção da sua doen-ça. Primeiro que tudo, porque o cuidado da maioria das doenças crónicas envolve directamente o paciente numa base diária. É ele o responsável pelas decisões que toma e que impactam, de forma determinante, o seu estado de Saúde e a sua qualidade de vida. E quando os doentes são encorajados a um maior envolvimento nas opções para a sua patologia, melhores são os resultados em Saúde, tan-to para o próprio paciente como para o Sistema de Saúde que o apoia.

Neste investimento na capacitação do doente para gerir

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a sua patologia, a educação é uma ferramenta fundamen-tal, pelo que o primeiro passo na preparação dos doentes para assumirem um papel mais activo na gestão da sua patologia é a sua educação para a Saúde. Doentes mais informados sobre o que envolve e implica a sua patologia são também os principais agentes da mudança no senti-do de um melhor controlo da mesma, com consequentes resultados positivos na sua qualidade de vida. Também a mudança de hábitos e comportamentos que o controlo das doenças crónicas implica exige, igualmente, um paciente informado e motivado e que saiba construir a mudança na sua vida através de passos sucessivos.

A educação para a Saúde e a informação ao doente são áreas em que as empresas farmacêuticas têm, desde há vários anos, desenvolvido um trabalho contínuo, cientes de que pacientes mais informados serão também os me-lhores utilizadores dos medicamentos e das tecnologias de Saúde desenvolvidos em seu benefício. Este trabalho, realizado em conjunto com as associações que represen-tam os doentes e com os profissionais de Saúde, passa por elementos tão diversos como a disponibilização de in-formação actualizada sobre as patologias, acções de for-mação sobre as mesmas e o seu controlo, até à contínua clarificação da linguagem utilizada, adequando termos científicos às decisões com que o doente é confrontado no seu dia-a-dia.

Para as empresas farmacêuticas associadas da Apifar-ma, este investimento contínuo na educação para a Saúde concretizou-se em 1999, com a criação de uma Parceria entre a Associação e as associações de doentes, visando congregar esforços que permitissem beneficiar crescente-mente um maior número de pessoas em matéria de aces-so a informação transparente e credível sobre Saúde. As quatro primeiras associações que se reuniram com a Api-farma foram a Associação Protectora dos Diabéticos de Portugal, a Associação Portuguesa de Familiares e Amigos de Doentes de Alzheimer, a Sociedade Portuguesa de Es-clerose Múltipla e a Associação Portuguesa de Doentes de Parkinson. Hoje, são 42 as Associações que fazem parte

desta Parceria, cujos objectivos passam pela permuta de informações sobre patologias, uma melhor acessibilidade dos doentes às terapêuticas e a sua crescente participa-ção nas estratégias da área da Saúde.

Ao longo de 15 anos a Parceria desenvolveu inúmeras actividades, respeitando sempre a independência e a au-tonomia das associações que a integram e actuando com a máxima transparência para um crescente acesso dos doentes a informação sobre Saúde.

No ano em que a Apifarma assinala o seu 75.º aniversá-rio, a celebração desta Parceria é essencial, representan-do um caminho que, sem dúvida, é o do futuro.

AFID – Associação Nacional de Famílias para a Integração da Pessoa DeficienteDomingos Rosa – Presidente do Conselho de Administração Alzheimer Portugal – Associação Portuguesa de Familiares e Amigos de Doentes de AlzheimerJoão António Carneiro da Silva – Presidente ADEB – Associação de Apoio aos Doentes Depressivose BipolaresDelfim Oliveira – Presidente da Direcção ANDAR – Associação Nacional de Doentes com Artrite ReumatóideArsisete Saraiva – Presidente ANEA – Associação Nacional da Espondilite AnquilosanteJustino Romão – Presidente ANEM – Associação Nacional Esclerose de MúltiplaMaria José Meyer – Presidente da Direcção ANFQ – Associação Nacional de Fibrose QuísticaChristian Bastos Andersen – Presidente

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APADP – Associação de Pais e Amigos de Deficientes ProfundosFernando Valente – Presidente da Direcção APAHE – Associação Portuguesa das Ataxias HereditáriasVera Brito – Presidente APART – Associação de Pais e Amigos de Portadoresdo Síndrome de Rubinstein – TaybiElvira Dias – Presidente APCDG-DMR – Associação Portuguesa Síndrome CDGe outras Doenças Metabólicas RarasVanessa Ferreira – Presidente da Direcção APCL – Associação Portuguesa de Paralisia CerebralNúcleo Regional do SulJosé Manuel Antelo – Presidente APDI – Associação Portuguesa da Doença Inflamatóriado Intestino, doença de Crohn e Colite UlcerosaJoão Carlos Silva Machado – Presidente da Direcção APDPk – Associação Portuguesa de Doentes de ParkinsonJosé Luís Quental Mota Vieira – Presidente da Direcção Nacional APDPróstata – Associação Portuguesa de Doentesda PróstataJoaquim da Cruz Domingos – Presidente da Direcção APELA – Associação Portuguesa de Esclerose Lateral AmiotróficaConceição Pereira – Presidente APIR - Associação Portuguesa de Insuficientes RenaisJoão Augusto Cunha Cabete – Presidente da Direcção

APLL – Associação Portuguesa de Leucemias e LinfomasIsabel Leal Barbosa – Presidente da Direcção APN – Associação Portuguesa de Doentes NeuromuscularesJoaquim Brites – Presidente da Direcção APNF – Associação Portuguesa de NeurofibromatoseLúcia Lemos – Presidente APOFEN – Associação Portuguesa de Fenilcetonúriae Outras Doenças MetabólicasRui Barros Silva – Presidente da Direcção APSA – Associação Portuguesa de Síndrome de AspergerPiedade Líbano Monteiro – Presidente ARP – Associação de Retinopatia de PortugalRui Manuel Fontinha Vasconcelos – Presidente Associação Grupo de Apoio SOS Hepatites Emília Rodrigues – Presidente Associação Portuguesa de FertilidadeCláudia Vieira – Presidente Europacolon Portugal – Apoio ao Doente com Cancro DigestivoVitor Neves – Presidente Fundação Rui Osório de CastroKarla Osório de Castro – Presidente Myos – Associação Nacional Contra a Fibromialgiae Síndrome de Fadiga CrónicaCristina Fidalgo Sequeira – Presidente

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PSOPortugal – Associação Portuguesa da PsoríaseJoão António Lopes Vaz Martins – Presidente RARÍSSIMAS – Associação Nacional de Deficiências Mentais e RarasPaula Brito e Costa – Presidente Respira – Associação portuguesa de Pessoas com DPOCe outras Doenças Respiratórias CrónicasLuísa Soares Branco – Presidente SER+ Associação Portuguesa para a Prevenção e Desafioà SidaMargarida Prieto – Presidente da Direcção SPEM – Sociedade Portuguesa de Esclerose MúltiplaManuela Duarte Neves – Secretária-Geral

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Excerto de cartaz publicitário do «Aseptal: O Anti-séptico - Perfume» Farmácia Normal (1910-1917)

2.

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PASSADO, PRESENTE E FUTURO

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II.1 UMA VISÃO DA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA

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INDÚSTRIA FARMACÊUTICA EM PORTUGAL: UMA APOSTA DE FUTURO

A Indústria Farmacêutica em Portugal tem já uma história longa de mais de um século, que resulta de um proces-so de especialização de competências e profissões ainda mais longo.

No final do século XIX, surgiram em Portugal os primei-ros investimentos industriais, como a criação da Compa-nhia Portuguesa Higiene, em 1891. No início do Século XX, começaram a surgir as primeiras presenças de com-panhias estrangeiras em Portugal, empresas químicas de origem, com produção de especialidades farmacêuticas, como a Bayer, em 1909.

Portugal não foi precursor de mecanismos de protec-ção na doença para os trabalhadores, como foram outros países europeus, no contexto das transformações sociais propiciadas pela Revolução Industrial. Apenas em 1935, surgiram, no contexto do Estado Novo, os primeiros me-canismos mais amplos de proteção, com a criação das instituições de previdência. Mas só em 1950 foi regulada

Luís Portela Presidente da Bial

a “assistência medicamentosa”, um primeiro regime de comparticipações, que permitiu alargar o acesso aos me-dicamentos.

Grandes mudanças surgiram durante a Segunda Guer-ra Mundial, pelo papel que os antibióticos, a penicilina, as tetraciclinas e a estreptomicina, os anti-histamínicos, as anfetaminas, os antimaláricos, proporcionados pelas empresas farmacêuticas europeias, permitiram na grande evolução no combate a diversas doenças, com grande pre-valência na época, em particular no controlo das doenças epidémicas.

Nos trinta anos a seguir à guerra houve uma mudan-ça radical da resposta colectiva às doenças. A articulação das políticas de protecção social prosseguidas pelos Esta-dos, com o desenvolvimento científico e com o investimen-to das empresas farmacêuticas internacionais, potenciou essas mudanças, diminuindo a mortalidade, aumentando fortemente a esperança de vida e proporcionando condi-ções de vida em melhoria constante.

Em Portugal, essas mudanças foram mais tardias. Ape-nas nos anos 60 foi alargado o regime de comparticipação dos medicamentos aos familiares dos abrangidos pelos regimes de previdência.

O impacto virtuoso que os Países mais avançados tive-ram na articulação entre as políticas de protecção social e o esforço industrial foi muito menor no nosso País. A opção por um “regime de cópias”, na resposta às neces-sidades crescentes de medicamentos, num contexto de um mercado protegido pelo condicionamento industrial e pela protecção aduaneira, permitiu criar um mercado abastecido pela produção local, de companhias nacionais e internacionais, a que acresciam os mercados africanos de domínio português.

Salientaram-se, nessa época, dois grandes projectos in-dustriais portugueses que visaram a produção própria de matérias-primas e a internacionalização: o Grupo Luso- -Fármaco, liderado por Diogo Bravo, e o Grupo AtralCipan, liderado por Sebastião Alves. Do primeiro, resta atualmen-

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te a Lusomedicamenta, essencialmente dedicada à produ-ção para terceiros, e a Tecnifar, focada na comercialização de algumas marcas próprias e de licenças de multinacio-nais. O segundo grupo mantém-se activo na produção e comercialização de matérias-primas e medicamentos, embora com uma dimensão bastante menor.

A seguir ao 25 de Abril, foi alargado o acesso aos regi-mes de protecção social e, especificamente, o acesso aos medicamentos, por redefinição dos regimes de comparti-cipação, independentemente da sua origem. O mercado de medicamentos cresceu e o papel da indústria de medi-camentos também.

Mas a dinâmica económica induzida foi algo limitada. Se, num primeiro período, o esforço de investimento in-dustrial associado a capacidades produtivas internas cresceu e surgiram bons projectos, o impacto da criação do mercado interno europeu e do alargamento a leste teve consequências na Indústria Farmacêutica, com uma cres-cente presença das empresas multinacionais, que foram adquirindo algumas das mais importantes empresas na-cionais e encerrando um considerável número de unida-des produtivas no País.

Deste modo, o período final do Século XX e os anos mais recentes têm um balanço algo contraditório. Se é bem pa-tente uma enorme evolução das qualificações e das com-petências, as quais permitiram, por impulso de políticas públicas e de investimentos privados, a estruturação dum sistema científico mais forte e mais orientado para a I&D; se é também patente um dinamismo forte em novos pro-jectos centrados no conhecimento; é ainda evidente que as plataformas industriais do medicamento são menos fortes do que o desejável.

Algumas empresas, como a Bial e a Medinfar, focaram-se na produção e comercialização de licenças de medi-camentos inovadores de multinacionais, outras, como os Laboratórios Azevedos e a Iberfar, dedicaram-se sobretu-do à produção para terceiros, e ainda outras, como a Tec-nimede, a Generis, a Bluepharma e a Basi, focaram-se na

produção e comercialização de genéricos. A Edol focou-se na produção e comercialização de produtos de especiali-dade. Várias destas empresas têm investido na internacio-nalização dos seus produtos.

Apesar do sistema das Ciências da Vida ter hoje uma abran-gência, complexidade e dimensão que em muito extravasa a tradição industrial em torno dos medicamentos, tanto ao ní-vel da oferta de cuidados de Saúde, de diversidade de produ-tos e serviços especializados, Portugal tem um forte défice comercial em medicamentos, um baixo nível de investimen-to em I&D empresarial e uma baixa capacidade de atracção de investimentos estruturantes neste domínio.

Contudo, em 2009, a Bial empresa fundada em 1924 por Álvaro Portela e que, hoje, é gerida pela quarta gera-ção da família, conseguiu fazer aprovar pela EMA (Europe-an Medicines Agency) e iniciar a comercialização, a nível internacional, do primeiro novo medicamento de origem portuguesa, o antiepiléptico Zebinix. Esta empresa tem vindo a investigar outros novos medicamentos, que irá comercializar nos próximos anos, procurando robustecer um forte projecto de internacionalização.

Outras empresas farmacêuticas nacionais e algumas startups, como a Technophage, a Luzitin, a Cell2B e a Biotecnol, têm anunciado terem em investigação e desen-volvimento outros novos fármacos, que poderão vir a ser lançados nos próximos anos, contribuindo para dar conti-nuidade ao notável crescimento das exportações do sector no último quinquénio.

Mas a dimensão do mercado português do medicamen-to, em termos comparados com os países da OCDE, não tinha, antes do início do processo de ajustamento, um pa-drão muito diferenciado dos valores médios. Nem em ter-mos estruturais, nem em termos de taxas de crescimento. Também no que se refere à despesa global em Saúde ou em Medicamento, os nossos valores comparavam bem.

O impacto global do recente processo de ajustamento sobre o sector do medicamento e o seu futuro ainda não é totalmente claro.

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A opção por concentrar o essencial do ajustamento em Saúde num forte corte administrativo na despesa com me-dicamentos não tem como explicação a existência de um diferencial de despesa, nem um diferencial de preços ou de custos de intermediação com padrões anormais, pare-cendo ser ditada por uma solução de oportunidade política. O papel das instituições da Troika neste domínio não foi es-trutural, de melhor organização dos mercados, de eficiência na utilização dos recursos, de objectivos consistentes na des-pesa, mas por sobrevalorização dos aspectos financeiros e menorização das consequências económicas.

No período do ajustamento, cerca de um terço da despesa pública total com medicamentos foi cortada, sendo esse cor-te muito mais acentuado no segmento ambulatório, basica-mente por resultado de cortes administrativos dos preços.

O limitado impacto da reforma do sistema hospitalar, a continuação de problemas estruturais de atrasos de paga-mentos e o atraso no acesso aos produtos inovadores são situações que colocam sérias questões ao modo como deve o sistema evoluir para garantir o bom acesso dos doentes, a valorização dos produtos inovadores e o controlo dos custos da política do medicamento.

Neste domínio, parece que alguns elementos nucleares de-vem ser equacionados:

- Acordos de médio prazo entre o Estado e a Indústria, ali-viando a enorme pressão restritiva dos últimos anos;

- Aposta consistente na prevenção, nos cuidados primários e nos cuidados continuados;

- Avaliação e definição de preços sensatos e prazos decisio-nais curtos para os produtos inovadores;

- Fortes estímulos fiscais e financeiros à I&D mantidos no longo prazo;

- Ajustamento dos regimes de comparticipação, com dimi-nuição dos factores de excesso na despesa;

- Melhor articulação entre centros de investigação e empre-sas, com mobilidade de investigadores, e incentivos à ligação entre empresas nacionais e internacionais;

- Alocação à inovação dos ganhos de eficiência.

Em Portugal, a Saúde em geral, e a Indústria Farmacêutica em particular, têm um enorme potencial de desenvolvimento futuro, no sentido de servir adequadamente os interesses das populações. Mas importa criar espaço para que essa capaci-dade de realização se transforme numa bonita realidade.

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Quando me lançaram o convite para escrever um testemunho para e sobre os 75 anos da Apifarma que começo, desde já, por felicitar por tão honrosa data, comecei de imediato a percorrer, no pensamento, a minha ligação a este uni-verso. Pertenço a uma família que esteve, desde sempre, ligada ao medicamento, sendo eu um dos elementos da terceira geração com essa relação à Saúde. Na verdade, uma das primeiras memórias que tenho da minha infância é estar, de bata branca, na farmácia do meu avô, a ajudar na preparação de manipulados.

No entanto, a história começa antes. Remonta a 1755, ano em que a marca Azevedos lançou as bases do que é hoje o grupo farmacêutico português de origem mais anti-go e um dos mais históricos da Europa. Actuamos em todo o circuito do medicamento – Investigação & Desenvolvi-mento, Produção e Distribuição, comercializamos marcas próprias e licenciadas. Somos dos primeiros produtores de medicamentos em Portugal e líderes na exportação. Empregamos cerca de 650 colaboradores e temos presen-

ça directa em quatro mercados: Portugal, Brasil, Angola e Moçambique. Os medicamentos que produzimos estão presentes em mais de quarenta países.

Mas a história não acaba aqui. Há mais estórias a contar para se perceber as circunstâncias em que surge a Apifar-ma, há 75 anos atrás, e essas estórias são protagonizadas por pessoas e empresas como o Grupo Azevedos. Porque a razão de existir da nossa empresa, bem como de todos os players do sector da Saúde, é melhorar e prolongar a vida das pessoas.

No nosso caso, a base industrial tem sido um dos pilares estratégicos do negócio. É, na minha opinião, uma das fa-ses mais críticas e importantes do ciclo do medicamento. A nossa unidade de produção, a Sofarimex, fabrica para empresas de todo o mundo e mais de 75% da sua produ-ção tem como destino o mercado internacional. Estamos, dessa forma, não só a assegurar emprego altamente espe-cializado, como a fomentar o equilíbrio da balança comer-cial portuguesa, contribuindo largamente para o aumen-to das exportações nacionais. A visão internacional tem sido, desde sempre, parte da nossa ambição. A dimensão do mercado português é muito limitada e limitante para quem pretende desenvolver uma Indústria Farmacêutica competitiva. Além disso, quem investe numa estrutura industrial e em todo o know-how e rigor tecnológico exi-gidos, necessita de capitalizar o esforço e, para isso, há que levantar a cabeça e procurar oportunidades por esse mundo. Foi o que fizemos há mais de 30 anos. Na década de oitenta do século XX, iniciámos um processo de pes-quisa e estudo de mercados internacionais para identificar destinos para os nossos produtos. África foi a opção inicial. Começámos por Marrocos, seguiu-se Cabo Verde e, de-pois, Angola, Moçambique e Brasil. Neste momento, os mercados lusófonos são core para o Grupo Azevedos.

Não podemos deixar de contemplar nesta história, tam-bém, a importância que representa, em todo o universo da Saúde, o tema da Investigação & Desenvolvimento (I&D). Essa aposta é fundamental enquanto estratégia de diferen-

Thebar MirandaPresidente do Grupo Azevedos

AS ESTÓRIAS QUE FAZEM A HISTÓRIA DA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA EM PORTUGAL

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ciação. Na disponibilização de melhores soluções terapêu-ticas, a opção do Grupo Azevedos assenta na manipulação e estudo de moléculas conhecidas com o objectivo de me-lhoria e aperfeiçoamento. Deste investimento, surgem no-vos medicamentos genéricos e novas combinações, além de novas formas de aplicação. Os medicamentos genéricos são, aliás, um fenómeno importante e têm vindo a ganhar escala e dimensão em Portugal. Ainda bem. De certa forma, democratizam o acesso à Saúde. O que não pode aconte-cer é um desvirtuar do “bem” medicamento. Uma caixa de medicamentos para uma doença crónica, como a Diabetes, não pode custar o mesmo do que um refrigerante. Quan-do isto acontece, é porque algo está errado. É desprezar todos os recursos e exigências tecnológicas que suportam o fabrico de um medicamento. Temos, também, situações irrealistas em medicamentos inovadores que, por oposição, apresentam níveis de preços absolutamente inacessíveis, o que não favorece nem beneficia a Saúde Pública, nem o mercado. É necessário alcançar um sistema de maior jus-tiça social e económica, e, nesse contexto, o Estado deve intervir de forma responsável e conciliadora de interesses, procurando o equilíbrio e o bem comum e evitando as dis-torções no sector. Já que os Estados sociais induzem a po-litização do medicamento, espera-se que o papel do Estado se oriente para a sustentação do Sistema de Saúde numa óptica de longo prazo e não em soluções imediatistas.

Pensando em sustentabilidade, e agora na vertente em-presarial, surgem outros desafios, entre eles, a questão da dimensão reduzida das companhias, nomeadamen-te as nacionais, de origem familiar, no mercado global. Coincidência (ou talvez não) é verificarmos que, no nosso País, não existiram processos de fusões/aquisições entre empresas de capital nacional. Quando, mais uma vez, le-vantamos a cabeça e olhamos lá para fora, constatamos que fenómenos de fusões e aquisições são comuns entre as empresas farmacêuticas, o que não se passa entre os players lusos. Pode ser um traço da nossa característica e cultura, somos muito individualistas, mas sem dúvida que

esse traço acaba por ter um impacto profundo na ambição e na capacidade de desenvolver e internacionalizar os ne-gócios. Sem ganhar escala e dimensão, o que pode surgir através de fenómenos de concentração, é mais difícil às nossas empresas encetarem processos de expansão inter-nacional. Numa altura como a que vivemos, de elevada con-tracção e estagnação do mercado interno, é algo em que os líderes da Indústria Farmacêutica nacional devem reflectir.

Afigura-se, também, como fundamental uma mudança de paradigma no nosso sector. Este imperativo de mudança não está, necessariamente, relacionado com a crise finan-ceira e económica. Está, isso sim, associado à evolução vertiginosa do nosso mundo e das percepções e hábitos da população em geral, relativamente a uma permanente expectativa de mais e melhor Saúde.

A Indústria Farmacêutica caiu do pedestal, se assim podemos dizer. Deixou de ser um “mundo à parte”, eli-tista e com mais recursos que as demais. Somos, nes-te momento, uma indústria igual a tantas outras, como a aeronáutica ou a electrónica, de elevada componente tecnológica. Temos, por isso, de nos reger pelos padrões de eficiência e produtividade que as congéneres de outras indústrias têm feito desde sempre. Com níveis de rigor e eficácia elevados e sem espaço para desperdícios. Temos, nesse campo, ainda um longo caminho a percorrer. Mas ele tem de ser percorrido, para bem de todos. Literalmen-te todos. A começar pela opinião pública, que necessita ajustar a imagem e as expectativas que tem relativamente à Indústria Farmacêutica. Não podemos ser vistos como uma commoditie. Como fabricantes de bens cujo valor é im-perceptível, todo o bem que desenvolvemos, produzimos e comercializamos é muito mais valioso. A Indústria Farmacêu-tica dá vida. Melhora e trata a dor e o sofrimento, com todo o impacto que isso tem no mundo. Não há muito tempo, ainda existiam pessoas a morrer de sarampo ou de diarreia. Por vezes temos memória curta e não valorizamos quem nos faz bem. Esta relação tem que evoluir para bem do progresso e do desenvolvimento.

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Quero, de facto, acreditar que ainda vou viver num País em que a Indústria Farmacêutica vai ser vista e reconhecida pelo seu contributo na geração de valor e riqueza para a nação, a criação de emprego qualificado, o aumento das exporta-ções nacionais e a internacionalização da marca Portugal. Para esta esperança e ambição contribui ver que a História é feita de evolução e de pequenas estórias. Que, ao contrá-rio do que aconteceu comigo, a quinta geração da nossa família não anda de bata branca a preparar manipulados numa farmácia. Anda, sim, a percorrer a nossa unidade de produção e a descobrir como desenvolver e fabricar melhor os milhões de medicamentos que têm como destino Países dos cinco continentes. Porque são estórias como esta que fazem a nossa História.

Para concluir, deixo os meus sinceros parabéns à Apifar-ma pelo seu 75.º aniversário e, principalmente, por tudo o que tem feito e continua a fazer na defesa dos interes-ses da Indústria Farmacêutica em geral, nomeadamente, na conciliação dos denominadores comuns entre todos os stakeholders do mercado. No final do dia, os sucessos e as vitórias da Apifarma são, sem dúvida, em prol e benefício do sistema do medicamento e da Saúde em Portugal.

Parabéns à Apifarma e a todos os seus associados, cujas estórias, como algumas das que conto hoje, são as que fa-zem a História destes 75 anos.

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II.2 DUAS LIDERANÇAS, DUAS PERSPECTIVAS

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A Apifarma faz 75 anos! Três quartos de século, dos quais cerca de 30 correspondem a uma parte da minha vida no associativismo. Comecei no século passado e, por pe-ríodos distintos, fui Presidente da Direcção da Apifarma durante mais de uma dezena de anos.

E, embora mantendo a ligação à Apifarma, presidindo à mesa da Assembleia-Geral, é sobre estes anos, dos quais guardo boas memórias e grandes Amigos, que vos falarei em jeito de viagem, recordando os temas que enquadra-ram as transformações regulamentares e institucionais necessárias e obrigatórias pela adesão à Comunidade Eu-ropeia, que balizaram a intervenção pública da Indústria, e moldaram o seu relacionamento com sucessivos Governos e diferentes parceiros, criando um espaço e projectando uma imagem que se espelhou na Apifarma.

E é, também, a todos os que me acompanharam neste percurso, tanto nas sucessivas Direcções, como nos qua-dros da instituição, que presto tributo ao empenho e profis-sionalismo, lealdade e entrega que permanentemente de-

monstraram, ajudando, muitas vezes de forma anónima, ao sucesso das intervenções e ao brilho das cerimónias.

Sempre defendi, e esse foi o entendimento das Direcções a que presidi, que quando falamos de Apifarma falamos de associados, as Empresas da Indústria Farmacêutica, e que a sua acção devia assentar em dois pilares: repre-sentar e defender de forma inequívoca e organizada os interesses dos seus sócios.

E esta representação organizada foi sempre a par com o reforço de representatividade, bem demonstrado nas Comissões Especializadas, que têm liderado, com grande autonomia e indiscutível capacidade técnica, as matérias da Saúde Animal, dos Medicamentos de Venda Livre, dos Meios de Diagnóstico, dos Assuntos Hospitalares e das Vacinas, áreas específicas do negócio farmacêutico de grande valia para o Sector da Saúde. A representatividade reflectida nesta estrutura organizativa estava acompanha-da de Órgãos igualmente eleitos, que sempre ajudaram e aconselharam a Direcção.

Juntamente com a representatividade, o segundo pilar de acção consistiu em assegurar uma Apifarma independente, aberta à cooperação com a Sociedade e o Estado, assertiva e rigorosa, projectando ideias e princípios, antecipando alte-rações estruturais, influenciando o olhar dos decisores.

A visão equilibrada da Indústria Farmacêutica, situada entre os problemas de Saúde Pública e os interesses econó-micos, promotora de emprego qualificado, da investigação e do desenvolvimento tecnológico, contribuinte activa para a riqueza do País e, sobretudo, para a Saúde e Qualidade de vida dos Portugueses, foi sempre o norte das acções da Api-farma enquanto tive a responsabilidade e gosto de a dirigir. A ECONOMIA, O MERCADO E AS EMPRESAS

A Indústria Farmacêutica é um sector com característi-cas pouco usuais. Totalmente regulamentada, espartilha-da entre a indispensável protecção da Saúde Pública e o necessário desenvolvimento empresarial, submetida a

João Gomes EstevesPresidente da Direcção da Apifarma (1991-1993 e 1998-2006)Presidente da Mesa da Assembleia-Geral (desde 2007)

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normas estritas e escrutínios regulamentares em todo o seu ciclo produtivo, é também um dos sectores que mais investe em Pesquisa e Desenvolvimento, contribuindo, como poucos, para o desenvolvimento tecnológico do País.

Acresce que os bens que produz são, na maioria dos mer-cados, subsidiados pelo Estado, por instituições públicas ou por entidades privadas, facto que torna sensível e con-troversa a matéria dos preços dos medicamentos.

Os aspectos regulamentares, traduzidos pelo esforço de transpor para a ordem jurídica interna mais de 30 anos de Legislação Comunitária, foram acompanhados na segun-da metade dos anos 90 do Século XX por uma crescente preocupação do Ministério da Saúde com o crescimento da factura dos medicamentos, uma, senão a única, rubri-ca da despesa do Ministério que, na época, era conhecida em tempo real.

A tentação de utilizar o factor “preço” de medicamentos era de difícil resistência, pois sendo tecnicamente fácil era também politicamente compensadora.

No entanto, e na opinião da Apifarma, outros elementos mereciam urgente reflexão e cuidada análise, pois tam-bém eles induziam despesa em Saúde, como, por exem-plo, a crescente e qualificada oferta de cuidados de Saúde traduzida em mais médicos, mais consultas, novos hospi-tais com melhores condições e diversificadas valências, o aumento da esperança de vida, patologias emergentes e o progresso científico acelerado, tanto nas terapêuticas, como nos meios de diagnóstico.

Na época, um relatório da OCDE sobre a Saúde em Por-tugal reconheceu progressos, comparou diversas variáveis e evidenciou distorções na despesa pública e privada com Saúde e na despesa com medicamentos, ajudando a clari-ficar ideias e equacionar tendências.

Partindo de um modelo complexo, a que acrescentámos as variáveis da criação do Mercado Interno, da adopção do Euro e da Declaração do Conselho de Ministros que considerou a Indústria Farmacêutica um Sector Estratégi-co, iniciámos um trabalho em várias frentes, colaborando,

sempre que possível, com o Governo, num quadro de afir-mação da valia do nosso contributo para o País.

A estabilidade legislativa foi uma das exigências que emer-giu da nossa reflexão interna, pois sem ela não havia estraté-gia empresarial ou sectorial que conseguisse chegar ao fim.

Mas também nos chegavam sinais preocupantes nas áreas das autorizações de introdução de novos medica-mentos no mercado, dos preços e das comparticipações, com referências espaçadas e mais ou menos explícitas a um sistema de preços de referência, primo direito dos medicamentos genéricos, que ainda não tinham o devido enquadramento num Código da Propriedade Industrial ali-nhado pelos valores da protecção dos direitos referentes a Patentes e Registos de Marcas.

À medida que o mercado se desenvolvia e o Serviço Nacio-nal de Saúde se aprofundava, emergia o problema dos atra-sos de pagamento dos hospitais. A tudo isto acudimos.

Lançámos inquéritos destinados a avaliar, quantifi-cadamente, prazos de concessão de AIM e de compar-ticipações, bem como os prazos, montantes e hospitais em incumprimento continuado. Deste último inquérito, e após análises e negociações demoradas, foi constituída a PRESIF, empresa prestadora de serviços aos associados que entendessem confiar-lhe os créditos que detinham so-bre os hospitais.

Promovemos encontros, debates e seminários, onde tive-mos como oradores políticos e académicos, administrado-res hospitalares, directores-gerais, jornalistas, consultores internacionais, dirigentes associativos europeus e interna-cionais, altos funcionários da Comissão Europeia, advoga-dos ilustres e dirigentes de Organismos do Estado.

Promovemos, tanto quanto julgo saber, pela primeira vez, um ciclo de conferências dedicado à Economia da Saúde, tema que veio a revelar-se central nas preocupações dos Governos e das Empresas.

Trabalhámos e ouvimos. Problemas foram esclarecidos, legislação rectificada, crispações esbatidas, soluções en-contradas. E, de todo este movimento, nasceram estudos,

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livros e publicações, notícias, tomadas de posição, cartas, muitas cartas a todos os que, directa ou indirectamente, tinham capacidade para interferir no sector e na vida das empresas, dando testemunho da urgência de mantermos em Portugal uma indústria competitiva, geradora de ri-queza e de emprego qualificado.

Sendo coerentes com os princípios que defendíamos e os Planos de Acção que aprovávamos, fomos pioneiros na contratualização do crescimento do Mercado – primeiro só ambulatório e mais tarde hospitalar, celebrando três Proto-colos com o Estado, os quais tiveram como enquadramen-to a co-responsabilidade e a estabilidade numa perspectiva de estabelecer a confiança dos agentes económicos.

Estes Protocolos, inicialmente olhados com suspeição, revelaram-se, também, instrumentos promotores de conhe-cimento e estabilizadores da sustentabilidade financeira do SNS. Os mecanismos reguladores do mercado hospitalar e a sua monitorização, bem como a discussão de um tema até então interdito, uma nova metodologia da formação dos preços, foram inovações que permitiram, dentro de parâmetros amplamente discutidos com as empresas, o envolvimento institucional e técnico da Apifarma em níveis e temas dificilmente conseguidos sem esta estrutura.

Criámos um Centro de Estudos da Indústria Farmacêuti-ca – CEIF, com o objectivo de dotar a Apifarma de um con-junto de informações e estudos temáticos que, em ligação com centros congéneres e instituições académicas, per-mitissem uma defesa fundamentada dos pontos de vista da Indústria Farmacêutica, bem como a possibilidade de antecipar e responder a políticas potencialmente gravosas para o sector e para a Saúde.

Atentos às necessidades de crescimento das empresas e em parceria estratégica com empresas de capital nacio-nal, o Infarmed e o ICEP, criámos a PharmaPortugal, que, com êxito, promoveu a internacionalização das empresas, introduzindo os seus medicamentos em mercados onde a presença da Indústria Farmacêutica Portuguesa era prati-camente inexistente.

Esta actividade interna era acompanhada de uma inten-sa representação internacional, traduzida pela presença na Direcção da EFPIA - European Federation of Pharma-ceutical Industry Associations, com sede em Bruxelas, e ainda na Direcção da IFPMA – International Federation of Pharmaceutical Manufacturers Associations, com sede em Genebra.

No âmbito desta representação, tive oportunidade de par-ticipar em diversas acções que, na época, deram grande visibilidade à Indústria Farmacêutica, graças ao trabalho conjunto entre as associações nacionais e instituições eu-ropeias, nomeadamente a Federação Europeia, parceiros da área da Saúde e a Comissão Europeia, que elaboraram um conjunto de Recomendações relacionadas com Aces-so ao Mercado, Regimes de Preços e Comparticipações, Reconhecimento da Inovação, matérias que, entre outras, condicionam a competitividade da Indústria Farmacêuti-ca. O ponto de partida para este trabalho ficou a dever-se ao reconhecimento de que a Indústria Farmacêutica, sen-do embora uma das mais inovadoras no contexto europeu, estava, por comparação com os Estados Unidos, a perder competitividade. Uma das métricas foi a verificação do nú-mero de moléculas inovadoras que chegavam ao mercado Europeu e ao mercado Americano.

Por outro lado, a Directiva da Transparência, que tinha vindo a balizar as condicionantes temporais e técnicas para a concessão de Preços e Comparticipações, procu-rando, em nome da construção do Mercado Interno, uma certa harmonização de procedimentos dos Estados-Mem-bros, revelou, após alguns anos de experiência, que a con-vergência nesta matéria não só não tinha sido conseguida como, no limite, a cada Estado Membro correspondia um sistema de Preços e Comparticipações.

Foi um tempo determinante, e talvez único até hoje, para a Indústria Farmacêutica – tradicionalmente olhada como geradora de despesa e não como investimento –, que co-meçou a ser encarada como indústria chave para o desen-volvimento tecnológico.

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E se na Federação Europeia, as questões de enquadra-mento económico do sector eram preponderantes, na Fe-deração Internacional, privilegiavam-se as matérias da Propriedade Industrial, o contacto com a Organização Mundial de Saúde e os problemas de ajuda e apoio aos Países menos desenvolvidos.

Muitas das acções humanitárias em que a Apifarma cola-borou tiveram o apoio da IFPMA.

A SOCIEDADE E OS PARCEIROS

O comprometimento com a Economia, o Mercado e as Em-presas não impediu uma atenção especial à Sociedade e aos Parceiros. Neste contexto, reconhecida que foi a necessi- dade de estruturar a informação para os diferentes parceiros, bem como de dar corpo a normas que a auto regulassem, foi reformulado o Código Deontológico e complementada a sua actividade com o regulamento do seu Conselho. Protocolos com a Ordem dos Médicos e dos Farmacêuticos fecharam um círculo de colaboração institucional que projectava a dig-nidade das instituições e dos seus colaboradores.

Reconhecendo a necessidade de dar a conhecer a Indús-tria Farmacêutica e o seu contributo para a Saúde e Qua-lidade de Vida, foram realizadas diversas campanhas pú-blicas na televisão, rádio, imprensa escrita e outdoors, que abrangeram áreas tão diversas como a automedicação e a diabetes, e, pela primeira vez, desencadeou-se uma acção pedagógica junto das escolas, no sentido de explicar a im-portância dos medicamentos.

Também nesta perspectiva, e no âmbito da Conferência Internacional, realizou-se a exposição itinerante “Mãos que Partilham Vida”, composta por vários módulos temáticos, onde as novas linhas de investigação e desenvolvimento molecular, a revolução genética e a dimensão da pessoa humana eram explicadas com recurso às novas tecnolo-gias de informação.

Aceitámos, também, o desafio para, em conjunto com um grupo de empresas, patrocinarmos a reconstrução do

Laboratório Chimico da Faculdade de Ciências de Lisboa, reconstrução esta realizada com materiais originais, o que o torna único na Europa.

Preocupados com as questões ambientais, fundámos, juntamente com a ANF-Associação Nacional das Farmá-cias, a FECOFAR Federação de Cooperativas de Distribuição Farmacêutica e a GROQUIFAR Associação de Grossistas de Produtos Químicos e Farmacêuticos, a empresa Valomed, integralmente financiada pela Indústria Farmacêutica e responsável pela gestão dos resíduos de embalagens e de medicamentos.

Ainda, e não por último, uma referência a um projecto que ultrapassou as fronteiras institucionais e que fez e faz parte do mundo dos afectos e da responsabilidade social: traba-lho com as Associações de Doentes. Este projecto revelou- -se de uma grande riqueza humana. Tive a oportunidade de conhecer novos mundos de edificação e generosidade e de perceber melhor a capacidade de superação e de resiliência a situações adversas que existem em cada um.

A Parceria com as Associações de Doentes tem como pressuposto o direito de participação dos doentes nos processos de decisão que tenham a ver com a sua doença e, no espaço de pouco mais de um ano, dobrou o número de associações participantes, demonstrando a valia e in-teresse da iniciativa.

O perfil histórico e clínico das Associações foi compilado e projectaram-se o trabalho, as expectativas e os objectivos de todos os que o quiseram fazer, através de múltiplas activi-dades na área da formação, em programas de televisão, em encontros com outros parceiros e, também, com a tutela.

Foi das tarefas mais recompensadoras, cuja recordação faz parte do grupo das boas memórias que guardo da mi-nha actividade na Apifarma.

A APIFARMA, AS PESSOAS

Tenho como primeira memória de quando cheguei à Apifar-ma um andar de habitação adaptado a escritório, sombrio

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e solene, com móveis pesados e tristonhos reposteiros de veludo. Com um corpo técnico reduzido, mantinha-se a casa administrativamente arrumada. No rigor dos factos, deve dizer-se que pouco mais se esperava da estrutura interna, recaindo sobre as Direcções as tarefas de representação e de contactos institucionais.

Cedo, porém, foi percebido que uma reestruturação era necessária como forma de dotar a Apifarma de um corpo profissional que, em estreita colaboração com a Direccão, assegurasse, de forma continuada, o que se pedia de uma instituição representativa da Indústria Farmacêutica: com-petência técnica, rigor e credibilidade nas intervenções, vi-sibilidade e independência.

A escolha de um Director executivo foi o primeiro passo, a contratação de recursos técnicos e a adequação da orga-nização interna o segundo, e a aquisição de novas instala-ções adequadas, o terceiro.

Estou convicto de que, sem esta sequência e sem as pes-soas que a corporizaram, não teria sido possível projectar a Indústria Farmacêutica e obter o reconhecimento do seu valor e da sua capacidade de intervenção.

Ao longo dos anos e das Direções a que presidi, ou com as quais colaborei, fui acompanhado por homens e mulheres com diversos perfis e diferentes personalidades que, sem prejuízo de divergências, tiveram sempre em comum o inte-resse pela vida associativa e o respeito pela instituição.

Alguns já partiram e recordo o António Ferreira de Almeida, uma força da natureza; o Luís Seita, sempre a fervilhar de ideias e iniciativas; o António Cavaco, tranquilo e prudente.

Outros mantêm uma presença activa na vida associativa, como a família Chaves Costa, que, já na terceira geração, continua a colaborar com a Apifarma.

Outros, ainda seguiram caminhos distintos, como vários elementos da família Baptista de Almeida, que, em diferen-tes épocas, deixaram marca na Associação.

Todos eles colaboraram na busca do talento, na pesquisa do local mais adequado para a sede, na definição da es-trutura interna. Foi com a colaboração de todos, e de cada

um, que se alargou o quadro de pessoal e de consulto-res, que foi reformulado o funcionamento e a comunicação interna, utilizando as novas tecnologias da informação, e que foram encontradas e recuperadas instalações adequa-das às necessidades e à imagem da Indústria.

Em todos eles confiei nos momentos de exaltação e na inquietação das derrotas, mas foi com a Isabel Saraiva, o esteio desta corrente feita de esforço e de dedicação, que todos sempre contámos.

Trabalhadora infatigável, adversária temível, tecnicamen-te segura, coordenou a estrutura interna, representou a As-sociação em momentos difíceis em que muitos viraram a cara, viu chegar e partir Presidentes, Directores, Ministros e Secretários de Estado, servindo a Apifarma com lealdade e eficácia durante mais de duas décadas.

Ao quadro de pessoal da Apifarma, em todos os seus escalões, é devido um tributo de gratidão. Sem eles, as tarefas teriam sido mais árduas, os objectivos mais difíceis de conseguir, a visibilidade da Apifarma bem menor.

A componente humana é o mais importante; são as pes-soas o que fica na minha memória e no balanço final da minha actividade.

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A pedido da Apifarma e conforme sugestão do meu amigo e actual Presidente, João Almeida Lopes, é com todo o gosto que incluo algumas notas referentes à minha passagem en-quanto Presidente da Direcção da Apifarma (1986-1989).

Indico, seguidamente, um esboço resumido, com co-mentários posteriores que acho oportunos.

Na elaboração do esboço, tive o contributo inestimável da minha amiga, Dra. Isabel Saraiva, que foi admitida como Directora Executiva no meu primeiro mandato, sen-do inovador ter-se escolhido uma senhora para este cargo. A história dos anos seguintes, a capacidade de trabalho, inteligência e lealdade à minha e posteriores direcções, vieram a demonstrar o acerto e benefício para a institui-ção da decisão então tomada.

Assim, podemos resumir com o seguinte:A Presidência foi marcada por um conjunto de factores

de carácter externo e interno, cujas consequências enfor-maram as estruturas e o posicionamento da Apifarma e,

também, o enquadramento político, regulamentar e eco-nómico da Indústria Farmacêutica em Portugal. FACTORES EXTERNOS

Em 1985, um ano antes do início da Presidência, tinha sido assinado o Tratado de Adesão de Portugal à Comuni-dade Económica Europeia, que previa uma derrogação de cinco anos para a transposição de trinta anos de Directivas referentes ao Medicamento e à Indústria Farmacêutica.

Também em 1985, tinha terminado o Segundo Progra-ma de Ajustamento do FMI.

O PIB per capita era, em 1986, de 2777,7 Euros (em 2012, a previsão apontou para 15 702) e crescia ao ritmo de 3,23 % ao ano (em 2012, -2,84%).

Em 1986, a Despesa total do SNS per capita era de 83,3 Euros (em 2012, 894).

Foi o início de um processo de crescimento económico de alteração de comportamentos e de modernização das estruturas, tanto dos serviços do Estado como da socie-dade em geral.

O Ministério da Saúde iniciou um conjunto de altera-ções, das quais se salientam a criação da Direccção-Geral dos Assuntos Farmacêuticos, com competências próprias na área do Medicamento e da Indústria Farmacêutica. Exis-tiam, então, 3597 marcas registadas (em 2012, 8738).

A preocupação com o crescimento das despesas com Medicamentos ganhou preponderância e condicionou o re-lacionamento da Indústria Farmacêutica, reunida na Api-farma, com o Ministério da Saúde.

FACTORES INTERNOS

A Apifarma em 1986, tinha completado um delicado pro-cesso de unificação com a estrutura associativa que repre-sentava os importadores de medicamentos, conseguindo ser uma voz única na defesa dos interesses das empresas nacionais e internacionais. Posteriormente, as associações

FALTA FOTO

Luiz Chaves CostaPresidente da Direcção da Apifarma (1986-1989)Presidente da Mesa da Assembleia-Geral (1990-2006)

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dos sectores da “venda livre” e dos meios de diagnóstico também se juntaram à Apifarma.

Procedeu-se à reestruturação interna, profissionalizando os serviços e diversificando o apoio aos associados, ganhan-do capacidade técnica e política, bem como visibilidade nos Órgãos de Comunicação Social.

Iniciou-se um amplo debate público sobre as questões da Indústria Farmacêutica, nomeadamente as relaciona-das com a Adesão de Portugal à CEE.

Realizou-se a primeira Campanha de Sensibilização, ex-plicando a função social da Indústria Farmacêutica.

Adaptou-se o Primeiro Código Deontológico da Indús-tria Farmacêutica.

Pela primeira vez, a Apifarma integrou a Direcção da EFPIA e da IFPMA, dando inicio a um processo de recipro-cidade e de entreajuda que muito beneficiou o espaço de intervenção da Apifarma, tanto internamente como a nível internacional.

Traçadas as linhas gerais, não quero deixar de referir a dificuldade que eu, pessoalmente, tive no relacionamento com os Ministros Arlindo Carvalho e Leonor Beleza. Por- ventura, o mandato de Leonor Beleza foi o mais difícil para nós, pois é bastante inteligente e determinada na activida-de que desenvolve.

Era, na época, Bastonário da Ordem dos Médicos o Pro-fessor Manuel Eugénio Machado Macedo, um grande se-nhor e um grande profissional, presidente da Associação Europeia de Cirurgia Toráxica, se a memória não me falha e coube-lhe defender a classe de algumas generalizações que resultaram da disciplina que o Ministério pretendia, e bem, impor no exercício dos actos médicos e que era consensual ser necessária.

Nesse meu mandato, foi também criado o Conselho Deontológico, a que presidi, e incluía como elementos os três Bastonários: Médicos, Advogados e Farmacêuticos.

A curto prazo, verificou-se não ser exequível que o em-presário da Indústria Farmacêutica, ainda que Presidente, pudesse integrar esse órgão, que poderia decidir, porven-

tura, sobre actividades de colegas seus. Se bem recordo, o cargo passou a ser ocupado por um juiz, independente da Apifarma.

Para terminar este curto depoimento, quero referir que a Apifarma integrou, pela primeira vez, a direcção da EFPIA, através da minha representação, tendo ocupado o lugar vago deixado por Espanha, e, mais tarde foi meu sucessor o representante da associação da indústria grega.

Integrámos, também, a representação europeia que, em Washington, votou no Dr. Alberto Aleotti, da Menarini, para a associação internacional, sendo ele na época o Pre-sidente da associação da Indústria Farmacêutica italiana.

Com a minha saída, foi eleito Presidente da Apifarma o Dr. José António Baptista de Almeida, a que se seguiu o Dr. João Gomes Esteves, cujo contributo foi determinante para a valorização da indústria e para consolidar a ideia da importância económica para Portugal desta actividade, quer a nível da Saúde quer a nível da investigação e produ-ção industrial para exportação.

Hoje, podemos dizer que, com o trabalho de muitos, se valorizou um segmento importante da actividade econó-mica em Portugal e um contributo muito valioso para a melhoria da assistência médica à nossa população.

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II.3 TESTEMUNHOS APIFARMA

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Convidado a prestar um testemunho no âmbito da come-moração dos 75 anos da Apifarma, como Vice-Presidente da Direcção, pareceu-me missão impossível, considerados os escassos anos de actividade profissional desenvolvida em Portugal de prática associativa.

Assim sendo, não posso exprimir-me sobre um passado não vivido. Posso, sim, falar na experiência presente duma associação que reflecte todo um percurso histórico que se revela herança de grande valia no suporte à afirmação e defesa da Indústria Farmacêutica enquanto sector estra-tégico nacional.

A Apifarma é, hoje, um interlocutor incontornável junto dos organismos tutelares, o centro agregador das diferentes áreas representadas, onde se equacionam as melhores, ou possíveis, soluções para os muitos obstáculos recentes ao expectável desenvolvimento das empresas, desencadeados pela grave conjuntura económica dos últimos anos, por sua vez geradora de medidas políticas de grande incidência no sector da Saúde e na Indústria Farmacêutica em particular.

A este propósito, não posso deixar de aqui evocar intermi-náveis horas de reflexão conjunta em busca de modelos de cooperação que, sem comprometer a viabilidade das empre-sas associadas, permitissem contribuir para a sustentabili-dade do Serviço Nacional de Saúde; intermináveis horas de reflexão conjunta para desenhar soluções de superação do impacto das reduções de preços e da descapitalização das empresas por avultadas e prolongadas dívidas do Estado pe-los fornecimentos ao SNS; intermináveis horas de reflexão conjunta para reequacionar a revitalização da debilitada ca-deia de valor do medicamento.

Comemorar o 75.º aniversário da Apifarma é, na minha perspectiva, o momento propício para olhar para o futuro da Indústria Farmacêutica em Portugal e exortar à capacidade de reagir aos novos paradigmas, reafirmar e desenvolver o espaço de intervenção da associação, repensar abordagens que ajudem as empresas a fortalecer a missão de com-promisso com as populações, contribuindo para melhores cuidados de Saúde no nosso país, congregar esforços para que não se ergam barreiras ao acesso dos doentes portu-gueses à Inovação farmacêutica, pugnar por um ambiente regulamentar de estabilidade e sustentabilidade financeira das empresas que estimule o investimento em Portugal. Sob pena de perda da sua identidade, a Apifarma não poderá nunca abdicar do princípio fundador, e patriótico desígnio, de reivindicar para os doentes portugueses o direito de ace-derem aos melhores padrões de Saúde e a novas terapias disponíveis nos restantes países da Europa desenvolvida.

Eduardo Pinto Leite Vice-Presidente da Direcção

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Constitui para mim uma honra fazer parte desta homena-gem aos 75 anos de actividade da Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica – Apifarma, que, desde a sua fundação, em 1939, tem contribuído para o prestígio da In-dústria Farmacêutica em Portugal. Se não fosse a entrega, muitas vezes sacrificada, à causa do associativismo, desde os primeiros tempos do Grémio e, depois, da Associação, dificilmente teríamos alcançado a notoriedade que hoje temos. É em memória desse trabalho, esforçado, tenaz, determinado, que ganhámos impulso para continuar.

Enquanto profissionais que operam, há décadas, numa área com as especificidades da Indústria Farmacêutica, estamos conscientes de que, unindo esforços e pontos de vista, temos um contributo único a prestar a todos os cida-dãos. É por isso que as empresas do sector são membros desta Associação. Sentimo-lo como um dever decorrente da nossa própria cidadania e do sentido do nosso impor-tante papel social.

Acreditamos que todos os portugueses devem ter acesso a medicamentos inovadores, de qualidade e de reconhe-cido valor acrescentado para as pessoas. É nesse sentido que temos caminhado a par e passo para que, em conjun-to, as empresas farmacêuticas e os seus dirigentes, nacio-nais e internacionais, das mais diversas nacionalidades, actuem, de forma construtiva e sinérgica, com o objectivo de transformar este objectivo em realidade. Para as empre-sas associadas, produzir e disponibilizar medicamentos de uso humano e animal, vacinas, e meios de diagnóstico in vitro cada vez mais eficazes e seguros, para o tratamento e prevenção de um maior número possível de patologias, é a mais importante acção que podemos realizar junto da comunidade. Ajudar a que os nossos concidadãos vivam mais tempo e com mais qualidade.

Por outro lado, num mundo em constante mutação, com desafios que se impõem por si mesmos, sabemos que é cada vez mais necessário um pensamento interactivo e interdisciplinar. A convergência dos diferentes saberes e perspectivas, adquiridos nos mais diversos ambientes, na-cionais e de outros países, é, também, cada vez mais, uma realidade que não podemos desprezar. É todo este capital de conhecimento e de experiência que a heterogeneidade da Apifarma nos transmite e que deve ser colocado ao ser-viço de todos os portugueses.

Ocorre-me parafrasear António Gedeão, poeta e homem de ciência: “[…] sempre que o Homem sonha, o Mundo pula e avança […]”

Leonardo Santarelli Vice-Presidente da Direcção

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DESAFIOS ACTUAIS E FUTUROS

Parabéns!Orgulho é a primeira palavra que me surge na comemora-

ção do 75.º aniversário da Apifarma. Orgulho por fazer parte dos elementos da Direcção da Associação que representa uma das mais prestigiadas indústrias em Portugal e uma das que mais contribuiu para o desenvolvimento do sector técnico ou especializado.

A Indústria Farmacêutica tem fomentado o desenvolvi-mento da sociedade em todo o mundo e Portugal não é ex-cepção. A Saúde das pessoas é uma marca indiscutível de evolução social e a Indústria Farmacêutica é, sem sombra de dúvidas, uma das raízes e, certamente, uma bandeira dessa evolução.

Ao longo dos anos, a Indústria Farmacêutica contribuiu para o progresso no ensino avançado, salientando a neces-sidade de criação de novas especializações nas áreas das ciências e das engenharias. Para muitos, a Indústria Far-

macêutica é, apenas, uma componente do fabrico químico, limitada à elaboração de novos compostos e novas terapêu-ticas. Mas não é só isto: a Indústria Farmacêutica contri-buiu para o desenvolvimento de um leque muito alargado de intervenções na população, com um impacto notável na sociedade.

Os novos medicamentos são apenas uma amostra da ca-pacidade de investigação, inovação e produção da Indústria Farmacêutica. Nos laboratórios das empresas, são produ-zidos, diariamente, avanços científicos que constituem, na sua génese, o passo para uma nova realidade no campo da Saúde, na investigação e, por seu todo, na Humanidade.

Apreciar o desenvolvimento da Indústria Farmacêutica portuguesa ao longo dos 75 anos da sua existência, en-quanto associação industrial em Portugal, é em si uma vitória e um orgulho da história conseguida. Portugal al-cançou um nível de excelência na investigação e desenvol-vimento, que nos coloca sob observação de universidades e centros de investigação em todo o mundo.

Hoje, ao escrever as linhas deste texto de celebração, aper-cebo-me da experiência conseguida e, simultaneamente, da jovialidade na vontade de aprendizagem. A evolução desta indústria e as descobertas permanentes fazem-me acredi-tar que há, ainda, um longo caminho para percorrer neste conhecimento. A experiência dá-nos o sentido crítico para observar a realidade nacional e entender que a contribuição da indústria só fará sentido se trabalhar com o objectivo da sustentabilidade do Serviço Nacional de Saúde e no inte-resse no investimento em novas soluções. A jovialidade está no espírito de descoberta e assombro que deve guiar uma indústria que busca fazer a diferença e está, também, na procura constante de novos caminhos e de novas soluções. Deve, igualmente, estar na irreverência com que devemos encarar a realidade e os obstáculos que nos são colocados.

A indústria celebra 75 anos da sua associação, e esta idade deve significar experiência, maturidade e seguran-ça, sem perder de vista a capacidade de se admirar para inovar, evoluir e desafiar.

Eduardo Leyva Vice-Presidente da Direcção

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Antónia Nascimento Vice-Presidente da Comissão Especializada de Meiosde Diagnóstico In Vitro

É muito gratificante prestar um testemunho comemorativo de 75 anos de história da Apifarma na dupla condição de membro da Direcção e de Vice-Presidente da Comissão Especializada de Meios de Diagnóstico in vitro. Olhar pelo lado de dentro, com o saber de experiência feita, reforça a minha compreensão sobre a extensão e profundidade da missão envolvida.

Neste percurso associativo, a Apifarma tem constituído o suporte agregador necessário para as empresas me-lhor conseguirem perspectivar os caminhos de defesa do sector, ultimamente atingido pelos efeitos devastadores de uma das mais graves crises económicas da história do País, com todas as perplexidades e interrogações de quem, diariamente, tem de tomar as melhores decisões empresariais, contribuindo para a segurança e bem-estar dos doentes e promovendo ganhos em Saúde.

Para a Comissão Especializada de Meios de Diagnóstico in vitro, o foco de trabalho dos últimos anos concentrou-se

muito em torno do gravíssimo problema dos atrasos nos pagamentos do Estado às empresas, pelos fornecimentos ao Serviço Nacional de Saúde; atingiram-se prazos e valo-res desmedidos e a globalidade das empresas teve de re-correr a reestruturações para sobreviver, com deslocação geográfica dos centros de decisão e inerente sacrifício de recursos humanos.

Sob esta conjuntura, foi com o suporte da Apifarma que se promoveu a realização de diversos estudos, em 2013 e 2014, que ajudaram a suprir lacunas informativas, cons-tituindo ferramentas de suporte à gestão empresarial e ao próprio conhecimento sobre a visão dos diversos in-tervenientes no sector da Saúde, incluindo a dos doentes, primeiros destinatários da nossa actividade. Pela sua va-lia, destaco “A Percepção de Valor das Análises Clínicas”, “Caracterização do Sector dos Diagnósticos in vitro em Portugal”, “Valor do Sector dos Diagnósticos in vitro em Portugal”, “Estudo Simetria – Caracterização do Mercado de Tiras-Teste de Glicémia”.

Os Diagnósticos in vitro são uma das tecnologias de Saú-de mais sujeitas a um permanente desafio de inovação para responder às exigências dos avanços da Medicina, das novas patologias civilizacionais e acompanhar o ritmo da contínua evolução tecnológica, acelerando os tempos de resposta e qualidade de resultados. Cerca de 70% das decisões clínicas são sustentadas pelos resultados dos testes laboratoriais, permitindo direccionar com precisão a opção terapêutica ou monitorizando a eficácia do trata-mento, em suma, encurtando caminho, gerando benefí-cios clínicos e económicos, obviando a melhores decisões nos cuidados de Saúde.

Acreditamos que o grande desafio para os decisores po-líticos e gestores de Saúde radica na resolução do para-digma: Custos de Saúde, Despesa ou Investimento?

Porventura, a mais difícil das missões, para a qual con-tinuamos a contar com a Apifarma.

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No ano em que celebra os seus 75 anos de instituição, a Apifarma depara-se com desafios decisivos para a sua iden-tidade, missão e relevância no sector da Saúde. Está nas mãos dos associados, através do seu empenho e partici-pação construtivos, contribuir para que estes desafios se-jam conduzidos no sentido de termos uma Apifarma ainda mais forte, à altura das exigências actuais e futuras do Sistema de Saúde e da economia do País.

Esta minha convicção assenta no privilégio de ter par-ticipado em todas as Direcções presididas pelo Dr. João Pedro Almeida Lopes, desde 2007, o que me permite ter uma perspectiva histórica e evolutiva da Associação nos últimos anos, sobre a qual melhor possa apontar cami-nhos para o futuro.

Ao longo deste período, pautado pelos constrangimentos crescentes impostos ao sector do medicamento, já sobe-jamente conhecidos e analisados, a Apifarma promoveu uma maior participação dos seus associados, espelhada no alargamento dos órgãos sociais e no reforço de várias

Comissões e Grupos de Trabalho, conseguindo, assim, fa-zer face aos importantes desafios que se lhe depararam.

Este caminho trouxe, naturalmente, alguma complexida-de acrescida na governação, coordenação das Comissões e Grupos de Trabalho e comunicação da Associação. São estes aspectos que deverão, do ponto de vista interno, re-querer maior atenção e trabalho. Não devemos, por outro lado, diminuir, de uma forma relevante, a representativi-dade e participação dos associados que o modelo actu-al encerra, e que se revelaram tão importantes para, por exemplo, concluirmos, no presente ano, o Acordo de Sus-tentabilidade entre a Apifarma e o Governo.

O nosso maior esforço deverá, no entanto, ser materia-lizado no plano externo. A Apifarma tem de se apresentar como uma associação forte e una na defesa dos interesses da Indústria Farmacêutica na sua globalidade. O doente é também ele único e, a cada momento, anseia, legitima-mente por um acesso adequado às melhores propostas terapêuticas que a indústria investiga, produz e disponibi-liza, independentemente da forma como lhe chegam.

Neste espírito, a Apifarma deve prosseguir a sua missão e a implementação do seu plano estratégico com um reforço acrescido nas áreas da comunicação do valor do medica-mento, da cooperação institucional, com enfoque no contri-buto para a sustentabilidade do Sistema de Saúde e, por úl-timo, liderando proactivamente os temas de agenda comum com as outras associações da fileira do medicamento.

António Chaves Costa Vice-Presidente da Comissão Especializada de Produtores e Exportadores

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Passaram mais de dois séculos desde que foi desenvolvi-da a primeira vacina que permitiu erradicar a varíola. Um feito único na História da Medicina. Desde então, a ciência evoluiu muito e as actuais vacinas encontram-se entre as medidas de Saúde Pública mais custo-efectivas e de maior sucesso para a prevenção de doenças e a diminuição da mortalidade do século XXI.

A Comissão Especializada de Vacinas (CEV), da Apifarma, tem, desde a sua criação em 2005, focado a sua missão na defesa do valor da vacinação como a mais importante estratégia de Saúde Pública. Trabalhamos há vários anos desenvolvendo parcerias e acções, de carácter educativo e institucional, que promovem ‘o valor da vacinação’ e onde está integrada a visão de todos os intervenientes: autori-dades, academia, sociedades médicas e associações ou ordens profissionais, sociedade civil, comunicação social, organizações não-governamentais, entre outros.

Outro aspecto que acrescenta valor a esta complexa ma-

triz diz respeito à perícia técnica e científica altamente qua-lificada que a indústria das vacinas, a par com universidades e instituições públicas e privadas, tem promovido em Portu-gal. A indústria contribui para que Portugal tenha acesso a soluções inovadoras que respondem a necessidades médi-cas não satisfeitas e a contextos epidemiológicos locais.

Existe cada vez mais evidência que demonstra que a va-cinação conduz a benefícios durante toda a vida do indi-víduo, com substanciais ganhos em Saúde e ganhos eco-nómicos transversais a toda a sociedade. E é inegável que estes benefícios têm contribuído para a melhoria significa-tiva de muitos dos indicadores de Saúde em Portugal.

A prevenção é uma das melhores formas de ajudar a po-pulação a ser mais saudável e a viver mais anos com quali-dade, aumentando a produtividade e gerando riqueza para o País. Ao valorizar políticas de prevenção versus políticas de tratamento, estamos a centrar os nossos esforços na Saúde e não na doença e estamos a utilizar os recursos financeiros de forma mais eficiente.

Na Apifarma, pretendemos fortalecer a concretização destes objectivos com ética, rigor, profissionalismo e se-riedade, lado a lado com os parceiros do sector, para que, em conjunto, possamos ultrapassar os actuais desafios sociais, económicos e demográficos e contribuir para uma vida mais saudável, uma sociedade mais justa e uma eco-nomia mais forte.

Cristina Laíns Vice-Presidente da Comissão Especializada de Vacinas

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Em 75 anos de História, a Apifarma converteu-se num par-ceiro incontornável no sector da Saúde em Portugal, mode-rando o diálogo da Indústria Farmacêutica com uma multi-plicidade de interlocutores que inclui diferentes instituições de Saúde, públicas e privadas, associações de profissionais de Saúde e numerosas associações de doentes, interagindo também com vários organismos nacionais e internacionais, junto dos quais representa os interesses nacionais.

A evolução acelerada do sector do medicamento, moti-vada por sucessivos impactos legislativos e pelas exigên-cias dos próprios cidadãos, colocou um desafio adicional à Apifarma: o de ampliar a sua actuação, representando e conciliando interesses de sectores tão diversos como me-dicamentos sujeitos a receita médica, medicamentos não sujeitos a receita médica (OTC), diagnóstico in vitro, vacinas e veterinária.

A área dos medicamentos não sujeitos a receita médica (MNSRM) tem vindo a evoluir muito rapidamente, enfren-

tando desafios de grande complexidade e tendo a particu-laridade de ser impactada não só por medidas específicas do sector como pelas dos medicamentos de uso humano em geral.

Liberalização de preços e margens de comercialização, abertura de novos canais de distribuição, norma sobre no-mes de medicamentos e, mais recentemente, a terceira lista de medicamentos não sujeitos a receita médica de dispensa exclusiva em farmácias, são apenas exemplos de desafios significativos, nos quais a credibilidade e a cooperação da Apifarma/OTC com as autoridades foram determinantes.

A representação da Indústria Farmacêutica portuguesa junto das organizações internacionais é, igualmente, uma constante, sendo os resultados mais visíveis a isenção dos MNSRM na Directiva Europeia sobre Falsified Medicines e o êxito da 49.ª Conferência Anual da AESGP – Associação Europeia de Medicamentos de Venda Livre, realizada em Lisboa, em Junho de 2013, com uma forte presença de au-toridades e organizações nacionais e internacionais.

Hoje, a Apifarma/OTC mantém-se dinâmica e inovado-ra, lançando projectos como o “Tratar de Mim”, destina-do a informar o cidadão, a apoiá-lo nas suas escolhas em self-medication e a promover uma atitude proactiva e res-ponsável para a manutenção da sua Saúde.

Olhando sempre para o futuro, a Apifarma/OTC continua motivada para antecipar e propor acções que simplifiquem e salvaguardem os interesses dos seus associados, com o objectivo último de proporcionar os melhores cuidados de Saúde ao cidadão português.

Mafalda Araújo Vice-Presidente da Comissão Especializada Apifarma/OTC

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A comemoração de 75 anos de vida da Apifarma é, por si só, uma evidência da importância do associativismo em-presarial e um testemunho de que, bem cedo, a Indústria Farmacêutica em Portugal se organizou através de uma estrutura representativa para defesa do seu desenvolvi-mento. Desde cedo, também, há já cerca de 40 anos, e por idênticas razões, que o sector da Indústria Farmacêu-tica de Saúde Animal aceitou e se organizou como parte integrante da Apifarma.

Em sintética retrospectiva histórica, recordo que o sec-tor da Veterinária se integrou funcionalmente na Apifarma nos anos 80 do século passado, constituindo-se estatuta-riamente em Comissão Especializada de Saúde Animal, em 1990, sob o acrónimo CESA, passando a designar-se ApifarmaVET desde 2013, designação que melhor se en-tendeu dar maior foco e visibilidade quer ao sector que representa, quer ainda ao âmbito global da Apifarma. Foi sob este chapéu agregador que as empresas associadas foram desenvolvendo a sua actividade e através deste que

a Comissão se tornou membro efectivo da então FEDESA – Federação Europeia da Saúde Animal, actual IFAH Euro-pe, estreitando laços de trabalho com os organismos de cúpula internacionais.

Não cabe fazer aqui um balanço exaustivo do trabalho realizado, mas cumpre evidenciar, como denominador co-mum do passado e do presente, que a nossa actividade está primordialmente centrada na defesa da Saúde Públi-ca, através de uma atenção particular à Saúde e bem-estar animal, e Segurança Alimentar, reflectidas em permanente articulação com as autoridades tutelares, universidades, Ordem dos Médicos Veterinários, associações sectoriais, entre muitas outras. Foram, e são, temas centrais o per-manente acompanhamento dos assuntos regulamentares, a promoção da Farmacovigilância, a defesa do Código De-ontológico de Boas Práticas de Comercialização, a divulga-ção das recomendações sobre Boas Práticas no Uso de Antimicrobianos em animais destinados ao consumo hu-mano (EPRUMA) e a participação activa no âmbito do Pla-no de Acção Nacional para a Redução do Uso de Antibióticos nos Animais (PANRUAA). Uma menção muito especial para o Simposium Veterinário Apifarma de Medicamentos e Produ-tos de Saúde Animal, que se constituiu como instrumento de referência e utilização, não só da própria indústria mas também das Faculdades de Medicina Veterinária nacionais e dos profissionais de Saúde do sector.

Uma palavra de especial apreço a todas as associadas e diferentes Direcções pela forma empenhada que têm demonstrado na afirmação da importância da presença e contributo da ApifarmaVET nas organizações Europeias de Saúde Animal.

Parabéns à Apifarma, com votos de que prossiga a sua importante missão, contribuindo positivamente para os grandes desafios que se perfilam no horizonte futuro da Indústria Farmacêutica ao serviço da Saúde Animal.

Manuel Dargent Figueiredo Vice-Presidente da Comissão Especializada da ApifarmaVET

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A biotecnologia tem sido fundamental na exploração e ma-nipulação das estruturas e processos da vida a um nível mo-lecular, tendo marcado o ritmo de inovação da Medicina moderna.

Nos últimos vinte anos, a biotecnologia permitiu avan-ços muito relevantes, e muitos milhões de doentes, em todo o mundo, beneficiam de centenas de medicamentos ou terapias de base biotecnológica. Além disso, as ino-vações introduzidas pela biotecnologia ajudam a revelar e descobrir mecanismos de doença, alvos terapêuticos, e a desenvolver novas moléculas terapêuticas ou terapias inovadoras. Adicionalmente, têm um impacto positivo em ensaios clínicos, métodos de diagnóstico, medicina per-sonalizada, monitorização das terapias, providenciando marcadores, modelos, plataformas, etc.

Graças aos desenvolvimentos conseguidos pela biotec-nologia, a Indústria Farmacêutica fornece tratamentos para doenças para as quais havia poucas ou nenhuma opção terapêutica, aumentando as taxas de sobrevivência

para alguns tipos de cancro, VIH/SIDA, artrite reumatóide e Hepatite C, entre tantas outras patologias. Resumindo, estas tecnologias e os novos biofármacos têm melhorado a qualidade de vida e a longevidade de doentes em todo mundo, sendo que os avanços em Medicina Personalizada prometem uma cada vez maior segurança e eficácia dos medicamentos e terapias.

Não menos importante é o facto de estes avanços re-sultarem de uma dinâmica e de um investimento em in-vestigação e desenvolvimentos colossais e da capacidade produtiva da própria Indústria Farmacêutica, a qual, tam-bém por estes motivos, é um dos principais pilares para a competitividade das economias.

A Indústria Farmacêutica, que tem como principal motor a inovação, está consciente de que a investigação e desen-volvimento de hoje conduzirão aos medicamentos inova-dores de amanhã. No futuro, à medida que as empresas farmacêuticas continuam o seu ciclo de inovação e envol-vem cada vez mais neste processo centros académicos e outros centros de investigação, a biotecnologia continuará a transformar e a melhorar a qualidade de vida de milhões de pessoas em todo o mundo.

A Apifarma, como associação da Indústria Farmacêutica, continuará a suportar todas as empresas suas associadas no sentido de garantir o respeito de todos os aspectos relevantes do sector, nomeadamente o apoio e desenvol-vimento de actividades relacionadas com a investigação e inovação em Saúde.

Teresa Alves Vice-Presidente da Comissão Especializada de Biotecnologia

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Excerto de cartaz publicitário do «Fosfo-Iodo Metilarsinado» Farmácia Souza (1916-1919)

3.

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A INDÚSTRIA FARMACÊUTICA EM PORTUGAL:PERSPECTIVA HISTÓRICA

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DA COMPANHIA PORTUGUESA HIGIENE AO PRIMEIRO MEDICAMENTO ORIGINAL DE PATENTE MUNDIAL: 120 ANOS DE INDÚSTRIA FARMACÊUTICA EM PORTUGALJoão Moreira dos Santos* (Remissão para o final)

A Indústria Farmacêutica despontou em Portugal no último quartel do século XIX, não obstante a existência prévia das oficinas de farmácia e do papel pioneiro desempenhado, entre outros, pelos farmacêuticos Manuel Vicente de Jesus (1825-1889), celebrizado pelas suas pílulas de proto-iodeto de ferro, e Pedro Augusto Franco, da Farmácia Franco, famo-so pelo popular vinho nutritivo de carne.

As origens da fase industrial encontram-se intimamente liga-das à criação da Companhia Portuguesa Higiene (CPH), que representou o primeiro investimento de monta na Indústria Farmacêutica em Portugal, tendo contado com capital anga-riado fora deste sector e com a colaboração de um conjunto de médicos, farmacêuticos e comerciantes de drogas. Fun-dada em Abril de 1891, a partir da antiga casa Estácio & C.ª,

Empacotamento de produtos na Companhia Portuguesa Higiene (1932).

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vou, todavia, as sucessivas inovações que a Companhia veio a implementar em Portugal, muito especificamente a produ-ção de medicamentos dosimétricos, comprimidos – de que foram primeiros representantes as “pastilhas comprimidas” de cloreto de potássio e de bicarbonato de sódio –, de cáp-sulas de essência de sândalo e de sais efervescentes, de ex-tractos fluidos e de mediscos medicinais. Sobre as pastilhas comprimidas, explicitava a CPH no seu boletim de Março de 1894: “Têm-se nos últimos tempos generalizado as pastilhas comprimidas, preparadas pela Companhia Portuguesa Higie-ne na sua fábrica do Campo Pequeno, com o maior esmero e escrúpulo na pureza dos produtos”.

Estes fármacos eram, em 1895, vendidos através de mais de 40 depositários, sendo muitos deles, claramente, de inspi-ração estrangeira, como se depreende de um artigo publica-do na edição de Agosto de 1894 do Boletim da Companhia Por-tuguesa Higiene, o qual é, também, um testemunho do início da Indústria Farmacêutica em Portugal e, em certa medida, uma resposta aos seus críticos:

O que é a indústria farmacêutica, senão a laboração em gran-de, servida ou não de aparelhos industriais, dos produtos que a farmácia emprega?E quais são esses produtos?Noutros tempos eram apenas extractos, espíritos, emplas-tros, etc., hoje a indústria estrangeira introduziu novas for-mas de medicamentos, como os grânulos, sais efervescentes, pastilhas comprimidas, vesicatório já preparado, etc., etc.Pois a indústria farmacêutica portuguesa não pode ser outra coisa, senão a laboração destes produtos, e todos eles real-mente produz.A indústria nacional pode sim aperfeiçoar, melhorar o que se tem feito; inventar é difícil, é impossível mesmo atendendo à idade dessa indústria em Portugal, que pode dizer-se saída das faixas da infância.Exigir, pois, dela que construa de todas as peças um formulá-rio completamente novo é querer o impossível […].

o seu principal mentor foi Emílio Faria Estácio (1854-1919), farmacêutico empreendedor cujas maiores marcas eram a Farmácia Estácio, estabelecida no Rossio em 1883, e tam-bém a Fábrica a Vapor de Produtos Químicos e Farmacêuti-cos, iniciada em 1888. A CPH emergiu, porém, num período muito particular e adverso da histórica política e económi-ca de Portugal. Com efeito, o seu parto deu-se no rescaldo do ultimato inglês de 1890 e em plena crise financeira de 1891, beneficiando, todavia, da promulgação, em 1892, de uma pauta aduaneira proteccionista, emanada do Ministério da Fazenda, então dirigido por Oliveira Martins (1845-1894). Consequentemente, em Fevereiro de 1893, e não obstante o atraso face às congéneres europeias e americanas, estabele-cidas industrialmente entre o primeiro e terceiro quartéis do século XIX, já a CPH anunciava no seu boletim:

Os grânulos da Companhia Portuguesa Higiene, fabricados por meio de máquinas perfeitíssimas, contêm os princípios activos da maior pureza dosados com o mais absoluto rigor, e nada cedem aos similares dos diferentes fabricantes estran-geiros, seja na perfeição da sua preparação, seja na eficácia da sua acção, como provam numerosos atestados de distin-tos médicos. São mais baratos que os estrangeiros. À venda em todas as farmácias.

O pioneirismo e o esforço de qualidade assumidos pela Companhia Portuguesa Higiene levantam, todavia, reacções desfavoráveis por parte de diversos farmacêuticos, nomeada-mente entre os reunidos na Sociedade Farmacêutica Lusita-na. Em causa estava, entre outras questões, a contenda que, no quadro da reforma do exercício farmacêutico, se vivia, então, entre farmacêuticos e droguistas, por um lado, e mé-dicos, por outro, sendo certo que a CPH se colocou no olho do furacão ao agregar ambos os grupos na composição dos subscritores do seu capital social. A referida oposição não tra-

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Primeiro número do Boletim da Companhia Portu-guesa Higiene (1893).

64Laboratório da Companhia Portuguesa Higiene (1932).

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Apesar do pioneirismo da Companhia Portuguesa Higie-ne, tal não assegurou o seu sucesso comercial e, tão pou-co, a sua constituição como marco no desenvolvimento técnico-científico da Indústria Farmacêutica portuguesa. Concorreu para tal o alheamento de Emílio Estácio em re-lação às aplicações farmacêuticas da Biologia – nomeada-mente no desenvolvimento de vacinas e de antitoxinas –, ciência que em rigor desconhecia em função da sua espe-cialização académica nas áreas da farmácia e da química. A colmatar tal lacuna, surgiram o Parque Vacinogénico de Lisboa, fundado em 1888 pelos médicos Carlos Barral Mo-niz Tavares (1844-?) e Guilherme José Enes (1839-1920), o Instituto Pasteur de Lisboa, fundado em 1895 por Virgí-nio Leitão Vieira dos Santos (1873-1946) – que no início da sua actividade se limitava, porém, à importação, sendo depositário de todos os soros e vacinas do Instituto Pas-teur e do Instituto de Vacina Animal de Paris –, e os labora-tórios da farmácia dos irmãos Francisco (?-1885) e Albino Freire de Andrade (1856-1955). Deve-se a estes últimos o início da preparação em Portugal de medicamentos injec-táveis em ampolas de vidro, cuja produção remonta à úl-tima década do século XIX, tendo contado com o decisivo apoio e o incentivo de Câmara Pestana, então director do Instituto Bacteriológico.

ANOS 1900: DA FARMÁCIA OFICINAL À FARMÁCIAINDUSTRIAL

Nos últimos anos do regime monárquico, já em pleno século XX, assistiu-se à constituição em Portugal de diversos labo-ratórios que tiveram como embrião, tal como sucedera com diversos colossos da Indústria Farmacêutica mundial, uma farmácia comunitária ou de oficina.

Instalaram-se, assim, gradualmente, as bases para a produ-ção em série de medicamentos, num regime semi-industrial, processo que, ao longo dos anos, tornou obsoleta e fez cair em desuso a tradição oficinal de preparar os fármacos em doses unitárias e de forma personalizada em função de cada doente. Enquanto alguns dos novos laboratórios se dedica-ram, sobretudo, à produção de preparados galénicos, como foi o caso do Laboratório Farmacêutico J. Neves & Cª, funda-do em Lisboa, em 1892, pelo farmacêutico José Vicente das Neves, outros enveredaram pelas especialidades farmacêuti-cas. Foi o caso, entre outros, da firma João José da Costa & C.ª, da farmácia e drogaria Pires & Barata, dos laboratórios da Farmácia Formosinho e da sociedade Pires & Mourato. Esta última foi criada em 1904 pelos farmacêuticos Manuel Adriano Mourato Vermelho e Serafim Pires Coelho David, que adquiriram a Farmácia Costa, instalada na actual Rua da Prata, tendo mudado o seu nome para Farmácia Normal. Um dos seus produtos bandeira nos anos seguintes foi o célebre Dynamol.

Embalagem de soro dos laboratórios da Farmácia Normal.

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Esta década marcou, também, o estabelecimento em Por-tugal da Bayer, que iniciou actividade no País através da su-cursal Federico Bayer & Companhia, pondo fim à representa-ção anterior através de agentes.

Além da componente industrial, é de assinalar a criação, em 1900, da Associação de Farmacêuticos Portugueses, cuja atividade se prolongou até 1933, ano de entrada em vigor da nova Constituição Portuguesa e do início do Estado

corporativo, o que implicou a reorganização do movimento associativo. Deram-se também passos importantes no ensi-no da farmácia, devido, em parte, ao papel que a Sociedade dos Farmacêuticos, fundada em 1835, desenvolveu junto dos sucessivos governos. Foi assim que, em 1902, Hintze Ribeiro, Presidente do Conselho de Ministros, levou ao parlamento a sua reforma do ensino farmacêutico, apresentando-o como “o mais abandonado do todos os ramos de ensino nacional”.

Fachada da Farmácia Formosinho, em Lisboa.

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Embora importantes, as mudanças limitaram-se à extinção do curso irregular de Farmácia, mantendo as Escolas de Far-mácia anexas às Escolas Médicas.

ANOS 1910: ARRANQUE EM TEMPO DE GUERRA

Após a Implantação da República, em 5 de Outubro de 1910, assistiu-se a um significativo surto de desenvolvi-mento da Indústria Farmacêutica de origem nacional, o qual ficou a dever-se, em larga medida, à eclosão da Pri-meira Guerra Mundial (1914-1918). Com efeito, se a su-perveniente dificuldade de manter o fluxo de importações da Alemanha – principal País fornecedor nacional das es-pecialidades farmacêuticas e onde se haviam registado enormes progressos devido à colaboração de farmacolo-gistas, químicos e bacteriologistas – levou à escassez, e ao consequente encarecimento dos medicamentos, abriu também portas ao desenvolvimento de um conjunto de la-boratórios industriais portugueses aptos a seguir, de certa forma, o exemplo da Companhia Portuguesa Higiene.

Ao repto lançado pelo vespertino A Capital, que, em ar-tigo publicado em Março de 1915, indagava se não havia “maneira de substituir esses indispensáveis medicamentos [alemães]?”, parecem ter respondido, entre outros, os Labo-ratórios Sicla, iniciados nesse mesmo ano pela Sociedade de Indústria Chímica, Lda., com o objectivo de fazer face à referida carência de fármacos, nomeadamente de éter etíli-co, o Laboratório Únitas, constituído em 1916 pelo farma-cêutico António Ferreira Pinto, o Laboratório Farmacológico J. J. Fernandes, Lda., criado em 1917 pelo farmacêutico José Joaquim da Costa Fernandes – que o sediou na Rua Filipe da Mata, em Lisboa, tendo sido pioneiro na introdução em Por-tugal do fabrico de drageias com cobertura de glúten e que-

ratina –, o Laboratório Sano, fundado em 1918, em Vila Nova de Gaia, pelo farmacêutico Alcibíades de Barros, e ainda o Laboratório Farmacêutico Saúde, estabelecido em 1919 pelo farmacêutico José Bento de Almeida. Data também desta década, provavelmente, o Laboratório Farmacêutico de Ós-car Alvim, sediado na Anadia.

Antes destes, e previamente à eclosão da Primeira Guerra Mundial, tinham já arrancado os Laboratórios Sanitas – fun-dados em Abril de 1911, por iniciativa do major e médico Francisco Cortez Pinto (1885-1974) e do farmacêutico Horá-cio Pimentel – e a sociedade farmacêutica Davita, Lda., que Álvaro Pereira de Lacerda impulsionara por volta de 1912. Uma publicação dos anos 50 do Laboratório Sanitas dá bem conta do panorama da Indústria Farmacêutica nacional nos

Instalações dos Laboratórios J. J. Fernandes, em Lisboa.

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anos 1910 e do contexto que levou à fundação daquela so-ciedade:

Situa-se em 1911 esse primeiro balbuciar de indústria farma-cêutica. Todas as tentativas feitas, até então, não tinham qual-quer carácter de continuidade, eram meramente esporádicas e, na maior parte dos casos, cingiam-se a um só produto.Todavia a infiltração das especialidades farmacêuticas es-trangeiras no nosso mercado agigantava-se de ano para ano, aproveitando-se do campo que lhe estava aberto por ausência de uma indústria nacional efectiva e de quaisquer disposições oficiais que dificultassem essa infiltração.

Também o Instituto Pasteur de Lisboa iniciara em 1913 a industrialização do processo de fabrico de medicamen-tos, evidenciando uma dinâmica, uma organização e umas instalações praticamente ímpares, na época, ao nível da In-dústria Farmacêutica.

Além do referido conflito bélico, terá, igualmente, contri-buído para o desenvolvimento da Indústria Farmacêutica na-cional o regulamento do imposto do selo das especialidades farmacêuticas, aprovado pelo Decreto n.º 162, de 14 de Ou-tubro de 1913. De facto, segundo o relatório da direcção do Grémio Nacional das Indústrias de Especialidades Farma-cêuticas (GNIEF), de 1946, deveu-se-lhe “em grande parte o progresso da indústria nacional, [...]. Instituiu ele taxas di-ferentes para a especialidade nacional, para a especialidade estrangeira e para a estrangeira fabricada em Portugal”.

Na década da introdução dos compostos arsenicais anti--sifilíticos, de que foi exemplo o «606», o primeiro fármaco desenvolvido para a terapêutica da, então, temível e devasta-dora Sífilis, desenvolveu-se também – ainda que timidamen-te, e uma vez mais seguindo o exemplo da Companhia Por-tuguesa Higiene – o processo de comunicação directa dos laboratórios com a classe médica. Foi precursora neste do-mínio a Sociedade Pires & Mourato, do Laboratório Normal,

que, em Junho de 1914, iniciou a publicação de Esculápio: Pequena Revista Médica. Os termos da sua apresentação re-velam a existência, à época, de uma significativa acção de propaganda médica, sabendo-se que também o Laboratório Farmacêutico de Óscar Alvim iniciou, em 1917, uma “publi-cação gratuita de propaganda”:

Diariamente chegam às mãos do médico dezenas de papéis de todos os feitios e tamanhos que visam a conquistar-lhe as suas graças e a dar-lhe conhecimento das mil e uma substân-cias que o comércio farmacêutico, excitado pela concorrên-cia, pela febre de produção e pelo veloz rodopio das doutrinas médicas, lança em roldão, sob vários rótulos.No meio desta avalanche de papéis figuram vários jornais que têm, justamente logrado chamar a atenção do médico, e me-recer-lhe o interesse, porque servem de veículo a notícias e a conhecimentos que lhe aproveitam e que uma vida afadigada impede ou dificulta ir buscar noutras fontes melhores, mas menos acessíveis: livros e revistas especiais.

Laboratório de Farmácia do Instituto Pasteur de Lisboa, Secção do Norte, Porto (1913).

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ESCULÁPIO é mais uma folha que o vento do reclamo far-macêutico vem trazer à mão do médico. Visa, honestamente se deve confessar, a dar-lhe conhecimento dos produtos que a Farmácia Normal de Lisboa vem, de há muito, pondo à sua disposição.

Em paralelo ao desenvolvimento laboratorial e à reorga-nização, em 1911, dos Serviços de Saúde e Higiene em Portugal – com a autonomização da Direcção-Geral da Saúde face à Beneficência Pública (à qual se encontra-

va agregada desde a sua criação em 1899) e a assunção da sua Direcção por Ricardo Jorge (1858-1939) –, deu-se, igualmente, um importante passo na reformulação do en-sino farmacêutico em Portugal. Com efeito, as reformas de 1911, 1915 e 1918 vieram trazer mudanças significa-tivas, nomeadamente a almejada autonomia face ao ensi-no médico e uma maior exigência no grau académico que dava acesso ao curso de Farmácia. A estrutura dos cursos ministrados apresentava, porém, pouca ou nenhuma liga-ção com o processo de industrialização em curso.

ANOS 1920: DESENVOLVIMENTO CONTRA TODAS AS PROBABILIDADES

Os anos 1920 ficaram marcados politicamente por uma acentuada instabilidade, fruto da rápida sucessão de go-vernos, alguns dos quais duravam escassos dias, o que conduziu à dificuldade de realizar e, sobretudo, manter reformas políticas, nomeadamente no que se refere ao sector farmacêutico. Economicamente, foi determinante a nova pauta aduaneira de 1923, que exerceu um inques-tionável efeito pernicioso junto dos laboratórios farma-cêuticos instalados em Portugal, pois não só diminuiu a protecção alfandegária às especialidades nacionais, ao reduzir os direitos sobre os produtos manufacturados, como encareceu as matérias-primas. Ao nivel industrial, faltavam em Portugal grandes indústrias químicas, con-forme notou Raúl Lupi Nogueira, em palestra realizada, em Março de 1925, na Sociedade Farmacêutica Lusitana, constituindo excepção a fábrica da Solvay, na Póvoa de Santa Iria: “A Farmácia portuguesa é largamente tributá-ria da indústria química estrangeira”. Positivamente, a In-dústria Farmacêutica beneficiou, no final da década, do

Boletim informativo do Laboratório Normal (1914).

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Decreto n.º 17.636, de 19 de Novembro de 1929, que era já um princípio de condicionamento industrial, pois fazia depender de autorização ministerial a instalação de novos laboratórios.

Apesar de tão adverso, e até contraditório, contexto, a indústria nacional conseguiu, na segunda década do sécu-lo XX, lançar três raízes importantes, alargando as bases que suportaram a transição da Farmácia de Oficina para a Farmácia Industrial.

A primeira delas remonta a Junho de 1923, data de fun-dação da Sociedade Industrial Farmacêutica, S.A.R.L., proprietária dos famosos Laboratórios Azevedos, a qual teve por base a Farmácia Azevedo, Irmão & Veiga, loca-lizada em Lisboa. Um ano volvido, em 1924, surgiu um pequeno laboratório farmacêutico nas traseiras da Far-mácia Padrão, localizada na Baixa do Porto. O seu men-tor foi Álvaro Portela que, juntamente com o proprietário da referida farmácia, o senhor Almeida, criou a Bial, cuja designação resultou da junção do duplo “AL” de Álvaro e Almeida. Cinco anos depois, em 1929, foi registada a pri-meira marca de grande sucesso do laboratório, a Benzo- -Diacol, um produto para a tosse. A importância que a Bial rapidamente alcançou encontra-se patente num eluci-dativo testemunho do então Ministro da Instrução, o Pro-fessor Alfredo de Magalhães (1870-1957), que, no final desta década, escreveu: “A visita que acabo de fazer aos laboratórios Bial deixa-me plenamente, sinceramente sa-tisfeito, e não é preciso ser profeta para lhes assegurar um futuro excelente que também me desvanece como portu-guês e como médico”. Também os Laboratórios J.A.B.A. tiveram a sua génese numa farmácia, devendo-se a sua criação, em 1927, ao farmacêutico José António Baptista d’Almeida (1887-1950).

Estatutos da Sociedade Industrial Farmacêutica (1923).

Embalagem de preparações esterilizadas dos Laboratórios JABA.

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Sede dos Laboratórios Bial, no Porto(anos 1940).

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Laboratórios Bial, no Porto (anos 1940).

Escritórios da Bayer, em Lisboa, situados no andar inferior ao consultório do Dr. Egas Moniz.

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Além das referidas sociedades, iniciaram, ainda, activi-dade, nos primeiros anos desta década, os Laboratórios de Biologia e Quimioterapia do Dr. Seixas Palma. Funda-dos por José Seixas Palma, docente e investigador da Fa-culdade de Farmácia da Universidade de Lisboa, e pelo farmacêutico José Carvalho da Fonseca Júnior, coube-lhes o pioneirismo da introdução em Portugal da opoterapia, isto é, a terapêutica farmacológica baseada em drogas de origem animal. Relativamente aos laboratórios internacio-nais, destacou-se a Bayer, Lda., empresa, que nos anos 1920 representava em Portugal os produtos químicos e farmacêuticos da Bayer, I.G.

Sobre o panorama global da Indústria Farmacêutica nes-ta década, testemunhou José do Souto Teixeira quando da realização, em 1968, do I Congresso Nacional da Indústria Farmacêutica:

Dava então a indústria farmacêutica nacional os seus pri-meiros passos, sequência natural da evolução industrial dos fins do século passado, em virtude da qual foram de-saparecendo as fórmulas galénicas da antiga usança e nas-cendo um novo conceito completamente novo de aproveita-mentos das drogas.

O referido evento sucedeu ao realizado 41 anos antes em Lisboa. Com efeito, em Dezembro de 1927 teve lu-gar na sede da Sociedade Farmacêutica Lusitana (SFL) o Primeiro Congresso Nacional de Farmácia, promovido, entre outros, pela própria SFL, pela Associação dos Far-macêuticos Portugueses e pelas Faculdades de Farmácia de Lisboa, Porto e Coimbra. Ocorreu o mesmo num perío-do-chave na História da Farmácia, o da referida transição da oficina para a indústria, processo que acarretou o es-tabelecimento de uma nova e diferente relação dos farma-cêuticos e dos médicos entre si e com os medicamentos,

assim como acrescidas necessidades de incentivo e regu-lação por parte dos executivos políticos. Não surpreende, portanto, que entre as “questões de interesse colectivo” inscritas na lei orgânica do congresso para debate pelos cerca de quinhentos participantes inscritos se encontras-sem as “medidas a propor aos Poderes Públicos para o desenvolvimento da Indústria Farmacêutica”, as “possibi-lidades da criação da indústria químico-farmacêutica no País” e a eterna e sempre presente questão das “especia-lidades farmacêuticas estrangeiras”. Sobre a indústria em si, testemunhou neste congresso António Maria da Gama Júnior, salientando que a mesma existia “em Portugal muito desenvolvida e adiantada”, e estimando que devia “empregar uns 40 mil contos de capital e alguns milhares de pessoas, muito especializadas e com difícil colocação em outros ramos de actividade”. Advogou, aliás, o inves-timento da indústria nacional nas Colónias face à invasão do mercado nacional pelas especialidades estrangeiras. Destas últimas – mas também da necessidade de maior investimento público no ensino farmacêutico e nos labora-tórios –, ocupou-se o professor Dr. Raúl de Carvalho na sua conferência sobre a “Farmácia Moderna”, apresentando- -as como “tentáculos sugadores do nosso ouro e do nosso sangue de farmacêuticos” e salientando “o nosso atraso; que há-de ser a nossa ruína, se mão hercúlea e bem avi-sada não fechar essa torneira de dupla via por onde sai o nosso ouro e por onde entra a miséria em nossos lares”. Paralelamente ao congresso, decorreu uma exposição da Indústria Farmacêutica portuguesa, concebida para de-monstrar a “competência e honestidade profissional dos farmacêuticos portugueses, revelando ao público, à Classe Médica e mesmo à Classe Farmacêutica, até que ponto a Indústria Nacional pode, desde já, competir com os produ-

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tos estrangeiros”. Organizado por uma comissão de farma-cêuticos liderada por Manuel Adriano Mourato Vermelho, o referido certame granjeou a participação de laboratórios oriundos,maioritariamente, de Lisboa – nomeadamente os Laboratórios Davita, Iatria, Gaya, Saúde, Mattos Cid, Sicla, Jaba, Unitas, Laboratório de Biologia e Quimioterapia - Dr. Seixas Palma, Instituto Pasteur de Lisboa, Farmácia Freire de Andrade & Irmão, Laboratório de Dr. Mendes Ribeiro, etc – e do Porto, cidade onde, entre outros, se encontrava sediado o Laboratório Therapia (Isis). Fizeram-se igualmen-te representar no referido evento laboratórios e farmácias do Algarve, de Viseu (Laboratório Vaz), da Figueira da Foz (Laboratórios Sigma), de Tomar, de Vila Nova de Famalicão e até do Funchal. Nas palavras de José do Souto Teixeira, nesta exposição, “ainda a farmácia tradicional estava lar-

Esta exposição é um testemunho eloquente do adiantamen-to da técnica farmacêutica, tão necessária no combate e na prevenção das enfermidades. Demonstra o valor e a utilidade das especialidades, sobre as quais tantos prejuízos reinaram. O êxito obtido é um penhor da sua crescente actividade e um incentivo para que o Estado, por todos os modos, favoreça o progresso da indústria farmacêutica que é ao mesmo tempo uma riqueza pública além de necessidade e benefício para todos.

Stand da CPH, na exposição do Primeiro Congresso de Farmácia (1927).

gamente representada, mas já se antevia que dela devia nascer a Indústria Farmacêutica moderna”. Também Ricar-do Jorge, à época dirigente da Direcção-Geral de Saúde, deixou o seu testemunho, tendo escrito no livro de honra da referida exposição:

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diploma publicado, genericamente, com tal objectivo foi o Decreto n.º 19.354, de 3 de Janeiro de 1931, relativa-mente à Indústria Farmacêutica, em particular, aplicou- -se-lhe, inicialmente, o Decreto n.º 29 537, de 18 de Abril de 1939. No respectivo preâmbulo, que assumia a “con-veniência de proteger a Indústria Farmacêutica nacional”, encontram--se entre os motivos para o condicionamento “o aperfeiçoamento técnico” e a obtenção de “garantias de pureza dos seus produtos”, mas também “os incon-venientes que resultariam da multiplicação de pequenos laboratórios por todo o País, sem nenhum interesse in-dustrial e sem as funções de assistência farmacêutica que pertencem às farmácias”.

A formação, neste mesmo ano de 1939, do Grémio Na-cional dos Industriais de Especialidades Farmacêuticas (GNIEF) não pode ser entendida fora deste novo contexto legislativo. Com efeito, os procedimentos de implemen-tação do condicionamento industrial – que se aplicavam aos novos empreendimentos, às alterações de empresas já existentes e também às transferências de localização – eram geridos pelo Ministério do Interior, com parecer da Direcção-Geral da Saúde, mas neles participavam, igual-mente, os Grémios, tendo uma palavra a dizer nos novos empreendimentos industriais a realizar sectorialmente. Por outro lado, a criação do GNIEF surgiu, também, quan-do já se vislumbrava no horizonte a criação da Comissão Reguladora dos Produtos Químicos e Farmacêuticos e a promulgação do Regulamento do Comércio dos Medica-mentos Especializados, que entrou em vigor dois anos de-pois, após um longo processo de debate entre as partes interessadas.

Foi, pois, neste quadro global que, quatro aos após a fun-dação do Sindicato Nacional dos Farmacêuticos (1935)

De referir que, nesta década, em 1921, foi concedido às Escolas de Farmácia o estatuto de Faculdades, passando a existir três: a de Lisboa, a de Coimbra e a do Porto. As res-pectivas leis orgânicas foram definidas em 1926, revelando uma estrutura curricular na qual se incluía uma cadeira tri--semestral de Farmácia Galénica e, agregado a esta, um curso semestral de Indústria Farmacêutica. A nível gover-namental, destacou-se a criação, mediante o Decreto n.º 12 447, de 12 de Outubro de 1926, da Inspecção do Exer-cício Farmacêutico, organismo colocado na dependência da Direcção-Geral de Saúde. Neste mesmo ano, fundou o médico Ernesto Roma (1887-1978) a Associação Pro-tectora dos Diabéticos Pobres, a primeira associação de diabéticos criada a nível mundial.

ANOS 1930: CONDICIONAMENTO INDUSTRIAL, AGREMIAÇÃO E INTERNACIONALIZAÇÃO

Na década em que a Indústria Farmacêutica começou a desenhar-se tal como a conhecemos actualmente, e em que se massificou a produção das sulfonamidas e da in-sulina, em Portugal, entrava-se em pleno no Estado Novo. Alicerçado numa nova constituição, a de 1933, e marca-do pelo corporativismo, com a criação de grémios do co-mércio e da indústria, uma das medidas do novo regime político foi o condicionamento industrial, o qual, nas pa-lavras do então Ministro do Comércio e da Indústria, João Pinto da Costa Leite (1905-1975), servia para “evitar que se prejudiquem iniciativas já estabelecidas sem vantagem para a economia nacional, mas [...] também para estimu-lar o aparecimento no País de novas indústrias, o florescer de novas técnicas, para promover em suma o desenvolvi-mento industrial e económico da Nação”. Se o primeiro

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e um ano volvido sobre a criação da Ordem dos Médicos (1938), veio a ser formalmente constituída – fruto da ac-ção de uma comissão organizadora presidida por Cortez Pinto (Sanitas) – a primeira associação da Indústria Far-macêutica a operar em Portugal, cujos estatutos merece-ram, em Fevereiro de 1939, a aprovação pelo Subsecretá-rio de Estado das Corporações e Previdência Social.

Instituído ao abrigo do Decreto-Lei n.º 24.715, de 3 de Dezembro de 1934, que estabelecia que as “empresas so-ciedades ou firmas que exerçam a sua actividade no mes-mo ramo de comércio, desde que se agrupem em termos de reunir, pelo menos 50 por cento do número total das empresas, sociedades ou firmas comerciais existentes no seu distrito e representem 50 por cento, pelo menos, do valor médio das transacções do respectivo ramo de comér-

1.º – Estudar e submeter à aprovação do Governo enquanto não estiver constituída a Corporação os regulamento que […] vierem a ser elaborados, bem como todas as medidas que possam vir a concorrer para garantir o aperfeiçoamen-to da indústria a bem da saúde pública e da Nação;2.º – Exercer as funções políticas conferidas pela lei aos elementos primários da organização corporativa;3.º – Prestar aos associados as informações que lhe sejam solicitadas e por sua iniciativa todas as que interessem à respectiva indústria;4.º – Dar parecer sobre os assuntos da sua especialidade ou de interesse para a indústria acerca dos quais for con-sultado pelos órgãos corporativos de grau superior ou pelo Estado, nomeadamente sobre:

a) – Situação, condições e necessidades do seu ramo de indústria ou modalidades de exploração económica e meio de lhes promover o desenvolvimento ou suprir as insuficiências, e bem assim a forma de coordenar com outros a respectiva actividade;b) – Situação do pessoal e maneira de melhorar as suas condições económicas e sociais;c) – Higiene e segurança dos locais de trabalho.

5.º – Assegurar por todos os meios legítimos ao seu alcance a execução dos acordos e contratos colectivos de trabalho e demais compromissos de carácter corporativo, fazendo fiscalizar o bom cumprimento das disposições adoptadas e promovendo a aplicação de sanções aos delinquentes.6.º – Cooperar na fundação progressiva de instituições sin-dicais de previdência destinadas a proteger todos os que se empreguem nos respectivos ramos de indústria da área da sua influência, contra a doença, a invalidez e o desem-prego involuntário, e a garantir-lhes pensões de reforma;7.º – Desempenhar quaisquer outras funções que lhes fo-rem incumbidas pelo Regimento das corporações.

Os associados, que pagavam uma quota mensal de 30$00, eram, estatutariamente, “as empresas singulares ou colectivas que, no continente, explorem laboratórios de

cio da mesma área, podem requerer […] a sua constituição em grémios”, o GNIEF apresentava os seguintes objectivos estatutários:

Entrega do Alvará ao GNIEF (Fev. 1939).

77Alvará do GNIEF (Fev. 1939). O primeiro logótipo do Grémio surgiu nos anos 1940.

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Entrou ontem em funcionamento legal um novo organismo corpo-rativo: o Grémio dos Laboratórios de Especialidades Farmacêuticas Nacionais [sic]. Os respectivos trabalhos de organização começaram há mais de um ano. Nessa altura, foi nomeada uma comissão, com-posta pelos srs. Manuel Leite da Silva, pelos Laboratórios «Bial», dr. Francisco Cortez Pinto, pelos Laboratórios «Sanitas», e Valentim Du-que, pelos Laboratórios J. Nobre, que elaborou os estatutos e ontem recebeu a aprovação oficial e o alvará do Subsecretário de Estado das Corporações.

O acto foi presidido pelo sr. dr. Mário Madeira, secretário-adjunto do Instituto Nacional do Trabalho, assistindo, entre outras pessoas, os srs. Dr. França Vigon, chefe dos Serviços de Acção Social do I.N.T.; dr. Guilhermino Nunes, deputado; José Maria Alvarez, presidente da Associação Industrial Portuguesa; general Teixeira Botelho e os indus-triais Álvaro Portela, coronel Correia dos Santos, Horácio Pimentel, comandante Morais, Alfredo Cavalheiro, Álvaro de Lacerda, Ribeiro da Costa, Cruz, Raúl Machado, etc.

O sr. dr. Mário Madeira mostrou a sua satisfação pelo bom êxito dos trabalhos da comissão organizadora, que ficou constituída em direcção até Janeiro de 1940, data das primeiras eleições de corpos gerentes. Assegurou-lhes a melhor colaboração por parte do Instituto Nacional do Trabalho e exortou os dirigentes do novo Grémio a que seguissem a orientação tomada no sentido de dignificarem a indústria dentro das bases da organização corporativa.

Terminou afirmando que deveria existir sempre bom entendimento entre dirigentes e dirigidos e acrescentou que os directores do novo Grémio, entre os quais tem alguns amigos, poderão contar com a me-lhor cooperação do Subsecretariado das Corporações para a execução do seu programa.

Em nome dos industriais falou o sr. dr. Cortez Pinto, que apresentou agradecimentos ao sr. dr. Mário Madeira e às individualidades presen-tes e referiu-se depois às vantagens da constituição do novo Grémio, afirmando:

– É Portugal um dos países mais abertos à entrada das especiali-dades estrangeiras, e isto dá-se quando a maior parte procura nacio-nalizar esta indústria. Somos de opinião que, facilitando a entrada de todos os produtos de reconhecido valor científico e terapêutico e que se não fabricam em Portugal, deveremos, a pouco e pouco, defender a nossa economia, os diplomados portugueses e a mão de obra na-cional. Sem usurpações ou atropelos, nem constrangimentos de qual-quer espécie, antes com aplauso de todos, esperamos chegar a uma salutar disciplina do fabrico, condições de venda, base indispensável da honestidade industrial e comercial, à verificação científica em la-boratório adequado, para que o crédito da nossa técnica produtora possa afrontar vantajosamente o da produção similar de procedência estrangeira; iremos, enfim, até onde as circunstâncias nos permitirem no sentido da perfeição da nossa indústria. Regista a comissão com imenso prazer a possibilidade, que por este diploma lhe é conferida, de incluir no seu Grémio, como aliás estava naturalmente indicado, todos os fabricantes de especialidades farmacêuticas.

Os industriais do novo Grémio reúnem-se amanhã num almoço de confraternização, a que preside o sr. dr. Mário Madeira.

Reprodução do texto da reportagem publicada no Diário de Notícias de 15

de Fevereiro de 1939, por ocasião da constituição do GNIEF.

O GRÉMIO DOS LABORATÓRIOS DE ESPECIALIDADESFARMACÊUTICAS NACIONAIS RECEBEU ONTEMO ALVARÁ DO SUB-SECRETARIADO DE ESTADODAS CORPORAÇÕES

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especialidades farmacêuticas” e as “empresas proprietá-rias de farmácias que exerçam […] em larga escala a in-dústria de especialidades farmacêuticas”, estando, porém, vedada a admissão a “falidos”. O Primeiro Presidente da Direcção foi Cortez Pinto, integrando, ainda, o executivo Va-lentim Duque (F. Nobre), Manoel Leite da Silva (Bial), Joa-quim Novaes (Sicla), Alfredo Cavalheiro (Sociedade de Pro-dutos Ciência), Neves Pereira (Apirol), Correia dos Santos (Farmacológico), Manuel Mourato Vermelho (Laboratório Normal) e Álvaro Pereira de Lacerda (Davita, Lda.). A título de curiosidade, refira-se que a constituição do Grémio foi celebrada, a 16 de Fevereiro de 1939, com um banquete realizado no restaurante do café Chave d’Ouro, no Rossio, no qual participaram Cortez Pinto, Mário Madeira, Secretá-rio-Adjunto do Instituto Nacional do Trabalho, e José Maria Álvares, Presidente da Associação Industrial Portuguesa.

No que se refere à actividade da Indústria Farmacêutica, saliente-se que, em 1933, tinham sido fundados, no Porto, os Laboratórios Vitália – Sociedade Comercial Farmacêuti-ca, Lda., ligados à Farmácia Vitália, o Laboratório Lemos e a sociedade Paracélsia. Também os Laboratórios Horus, presumivelmente sediados em Guimarães, terão iniciado a sua actividade nesta década, período em que se licen-ciou na Universidade do Porto (1932) o seu fundador, o farmacêutico Manuel de Jesus de Sousa, especializado em Ciências Bromatológicas. Foram igualmente fundados nes-ta década os laboratórios Lab, iniciativa do Major farma-cêutico e Professor Bernardo Augusto da Costa Simões, os laboratórios de Quimiatria Kevel, da firma Eduardo de Almeida & C.a, os laboratórios Zimaia, estabelecidos por Carlos Cândido Coutinho e por José Pedro Alves, e o labo-ratório Isis, dirigido pelo Professor Afonso de Albuquerque, da Faculdade de Farmácia do Porto.Ficha de sócio da Sociedade Industrial Farmacêutica (1939).

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Entre as indústrias já estabelecidas nas décadas anterio-res, destacou-se o Laboratório Sanitas, que adquiriu uma dimensão inédita no cômputo da Indústria Farmacêutica nacional, como deixou, aliás, bem claro no seu Catálogo Geral de 1934: “Tal como está actualmente organizado, o Laboratório Sanitas é um dos melhores estabelecimentos do género na Europa, não só pela proficiência como estão montadas todas as suas secções, como ainda pela orga-nização científica que a elas preside. As suas instalações são constantemente visitadas por Médicos, Professores de Medicina e pelos cursos dos últimos anos de medicina das

Por toda a parte se admiram os mais modernos maquinis-mos, tanto nos laboratórios propriamente ditos, com os seus aparelhos de emulsionar, comprimir, encher ampolas, fabrico de pastas, pensos e outros produtos, como nas sa-las de estufa, empacotamentos, galeria de máquinas, ins-talação de caldeiras, gabinete de consultas e tratamento e oficinas de lavagem de garrafas e frascos.Os serviços são extraordinariamente simplificados pelo emprego mecânico, que lhes assegura o máximo da produ-ção com um mínimo de pessoal.Nos mesmos edifícios encontram-se os depósitos de em-balagens. A colagem de rótulos, o encher dos frascos, dos tubos, a rolhagem, tudo tem o seu maquinismo apropriado a assegurar-lhe a perfeição do acabamento.Nos vastos terrenos onde se encontram os laboratórios es-tão situadas todas as instalações fabris da Sanitas, num conjunto de edifícios. Assim, logo à entrada fica a secção de contabilidade, numa casa própria e os armazéns de dro-gas num grande pavilhão com anexos, onde se faz a distri-buição dos produtos químicos e se recebem os já manufac-turados, a fim de serem transportados para as secções de Expedição e Exportação.Há também um serviço especial de bacteriologia, com sa-las de preparação, salas de estufa, geleiras, etc., sob a di-recção de três técnicos especializados, distintos bacterio-logistas, ocupando outro edifício, em cujo primeiro andar fica a sala de Conferências.

Escolas Médicas, que todos os anos fazem uma visita de instrução ao nosso Laboratório”. Fruto do desenvolvimento comercial que alcançara em menos de 20 anos, em Junho de 1930, o Sanitas inaugurou novas instalações, concen-trando perto das Amoreiras, na então Rua Silva Carvalho, toda a componente fabril. Num conjunto edificado que ocupava mais de 7000 metros quadrados, os laboratórios em si encontravam-se instalados em seis edifícios com 40 metros de comprimento e 8 de largura. Destas novas ins-talações deu eco o jornal O Século, que, em notícia publi-cada quando da inauguração das mesmas, reportou:

Cortez Pinto, primeiro Presidente do Grémio.

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A par do sucesso alcançado ao nível das exportações para as então províncias ultramarinas e para mercados como a Índia inglesa e os Congos belga e francês, o Labo-ratório Sanitas iniciou, nesta década, um verdadeiro pro-cesso de internacionalização. Em 1930, fruto do sucesso dos seus produtos no mercado brasileiro, e por intermé-dio de Thomaz Pimentel, foi instalado um laboratório na cidade de São Paulo, denominado Laboratório Sanitas do

Brasil. Relativamente ao mercado português, o posiciona-mento era outro, alinhando com o pleito da indústria na-cional pela limitação das importações de especialidades: “Preferindo os medicamentos nacionais, V. Exa. combate o desemprego dos portugueses. Preferindo produtos es-trangeiros contribuirá V. Exa. para o desemprego dos por-tugueses, protegendo os estrangeiros”.

Nos anos 30, o Instituto Pasteur de Lisboa era também já

Sede do Laboratório Sanitas, na Avenida D. João V, em Lisboa (anos 1960).

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Sede do Instituto Pasteur de Lisboa, na Rua Nova do Almada (anos 1940).

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um importante laboratório, possuindo delegações em Lis-boa (chefiando a direcção farmacêutica Alberto Malafaya Baptista, licenciado em Farmácia e assistente da Faculda-de de Medicina do Porto), em Coimbra e no Porto (com a direcção farmacêutica confiada a Manuel de Lucena Sam-paio, licenciado em Farmácia) e agências na Madeira, nos Açores e, também, nas Colónias, nomeadamente na Guiné, na Índia Portuguesa e em Macau, S. Tomé e Príncipe, An-gola e Moçambique. O facto do Instituto Pasteur represen-tar em Portugal os laboratórios Lilly permitiu-lhe comer-cializar a insulina Lilly, “a primeira lançada nos mercados de todo o mundo”, como a anunciava nos anos 30, a qual concorria, por exemplo, com a Sintalina-B, antidiabético de administração interna da Schering S.A. Portuguesa.

Ao nível dos laboratórios estrangeiros, assinala-se a en-trada da Merck em Portugal, cuja primeira representação data de 1934, e também dos Produtos CIBA, Lda, pre-sentes no mercado nacional, pelo menos, desde 1939, com sede na Rua da Madalena, em Lisboa, e da Schering alemã, com actividade no País desde, pelo menos, 1934, através da Schering, S.A. Portuguesa, tendo sede em Lis-boa, no Largo da Anunciada. Na Bayer, por seu lado, foi nesta década que se incrementou a acção dos delegados de propaganda médica, elo de contacto personalizado en-tre a Indústria Farmacêutica e os médicos, e que começou a circular pelo País uma carrinha que, através da projec-ção de filmes promocionais, procedia à divulgação de pro-dutos da marca não sujeitos a receita médica.

Viatura promocional do Instituto Pasteur de Lisboa (anos 1940).

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A indústria química, em geral, estacionou: pouco tem pro-gredido. Na parte farmacêutica, em especial, tem-se cami-nhado consideravelmente. Assim, por exemplo, o fabrico de produtos injectáveis, nos laboratórios portugueses, é tão perfeito como nos laboratórios estrangeiros. A indús-tria dos comprimidos desagregáveis, que tem uma grande importância, como v. sabe, não existia, antes da guerra, en-tre nós. Usava-se o comprimido «pedra», que atravessava o corpo humano, sem perder a sua rigidez.

ANOS 1940: DESENVOLVIMENTO, ASSOCIATIVISMO, INVESTIGAÇÃO E REGULAÇÃO

Os anos 1940 foram marcados pelos notórios progressos alcançados no desenvolvimento e na produção industrial de sulfonamidas, de antibióticos – nomeadamente a peni-cilina e a estreptomicina, que revolucionaram a terapêuti-ca antituberculosa – e de anti-histamínicos, mas também pela Segunda Guerra Mundial.

Não obstante a neutralidade de Portugal, o conflito bélico, que se desenvolveu entre 1939 e 1945, teve um iniludível impacto na Indústria Farmacêutica nacional. Impotentes, os laboratórios assistiram ao enorme aumento do preço das matérias-primas, que, em alguns casos, atingiu 200% ou mesmo 300%, e à rarefacção das mesmas, fenómeno que foi mitigado mediante a intervenção do GNIEF, que, através de entidades estatais, recebia matérias-primas in-dispensáveis à indústria, provenientes principalmente dos EUA, procedendo, posteriormente, à sua distribuição pe-los associados. Somou-se a estas dificuldades o imposto lançado sobre os lucros de guerra dos laboratórios. A par-tir de 1945, finda a contenda bélica, foi a quebra dos pre-ços das matérias-primas e dos produtos estrangeiros que colocou dificuldades à indústria nacional, obrigada, por questões de concorrência, ao desagravamento dos preços de fármacos produzidos ainda com matérias-primas que haviam sido adquiridas a preços elevados. Por outro lado, o fim da guerra levou os laboratórios estrangeiros a tentar restabelecer as suas anteriores posições, assistindo-se a “uma invasão de medicamentos especializados estrangei-ros” em Portugal, conforme o Grémio deixou expresso no seu relatório de 1947.

Apesar das contrariedades, o volume de vendas de me-

Francisco Cortez Pinto, fundador do Laboratório Sanitas, esteve, no âmbito da Associação Industrial Portuguesa, li-gado à Grande Exposição Industrial Portuguesa de 1932, realizada no Pavilhão de Exposições do Parque Eduardo VII, tendo sido um dos seus idealizadores e organizado-res. Nela participaram vários ramos da indústria nacional, nomeadamente da farmacêutica. Foi neste contexto que o coronel Correia dos Santos, do Laboratório Farmacoló-gico, deu ao jornal O Século o seu testemunho sobre os progressos da indústria química em Portugal:

Importa ainda salientar que uma das áreas subsidiárias da Indústria Farmacêutica que conheceu significativos de-senvolvimentos na década de trinta foi a da distribuição de medicamentos. Com efeito, em Setembro de 1935 criou- -se a União dos Farmacêuticos de Portugal (UFP). Sediada em Lisboa, na Rua da Madalena, a UFP granjeou de ime-diato a adesão de 96 farmacêuticos, tendo-se mantido até meados dos anos 60 como única cooperativa do sector. A logística nesta época era, porém, rudimentar já que as en-comendas de medicamentos para as farmácias da área da grande Lisboa eram levantadas nas instalações da União dos Farmacêuticos de Portugal ou, em alternativa, distri-buídas através de uma carroça puxada por burro.

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dicamentos nacionais e estrangeiros aumentou sempre durante os anos 1940. Movidos, porventura, pelas opor-tunidades que se abriam, foram criados, nesta década, quatro importantes sociedades farmacêuticas em Portu-gal: os Laboratórios Vitória, os Laboratórios Atral, o Insti-tuto Luso-Fármaco e a Medicamenta. Presidiu à fundação do primeiro o objectivo de instalar no País um laboratório moderno e apto a suprir as carências que, então, se fa-

ziam sentir no mercado nacional, muito particularmente na preparação de arsenicais. Para tal, em Abril de 1943, a antiga sociedade por quotas de responsabilidade limitada foi transformada em sociedade anónima e viu o seu capi-tal social aumentado de 180 000$00 para 5 000 000$00, tendo como accionistas e administradores três engenhei-ros: Paulo Teixeira Queiroz de Barros, que assumiu a pre-sidência da empresa, Luiz de Sá Pereira e José Humberto

Sede e fábrica dos Laboratórios Vitória, na Venda Nova (anos 1960).

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Vieira da Silva Zimbarra. Para cumprir o seu objecto so-cial – “Importar, adquirir, transformar, elaborar, vender e exportar toda a espécie de matérias, produtos químicos e especialidades farmacêuticas, de acordo com os alvarás ou licenças que actualmente possui ou venha a possuir” –, iniciara-se já a construção de instalações próprias no pólo industrial da Venda Nova. A guerra em curso ditou, porém, atrasos significativos na conclusão do projecto, o que pre-judicou o início dos testes de fabrico, realizados a partir de Março de 1943, e, consequentemente, o arranque da acti-vidade comercial, que só veio a concretizar-se na Primavera de 1944. Não obstante a carestia e as dificuldades na ob-tenção de matérias-primas e de materiais de embalagem, em 1946, os Laboratórios Vitória encontravam-se já em pleno funcionamento, tendo lançado, nesse ano, cerca de 20 novos produtos, distribuídos através de uma delegação instalada no norte do País (Porto) e outra na região cen-tro (Coimbra). A produção de antibióticos teve início ainda nesta década, por volta de 1948, notoriamente influencia-da pelo exemplo norte-americano:

Quando da iniciação do estudo por nós feito sobre possi-bilidades de lançar antibióticos e, consequentemente, das melhores técnicas a utilizar quanto às manipulações várias a que podiam sujeitar-se, consultámos diversos livros e re-vistas que, citando factos, nos esclareceram «teoricamen-te» de como deveríamos trabalhar. Algo, contudo, nos obri-gava a «desconfiar» um pouco das facilidades que alguns livros e revistas deixavam ver em tais manipulações e nem uma súmula de fórmulas citadas em revistas americanas e por outras estrangeiras transcritas, nos obrigavam a acre-ditar em tudo tal qual se «escrevia». Não fomos enganados, é certo, mas a tal simplicidade «teórica» não se aliava à simplicidade de pormenor, este o que mais cativou a nossa atenção; aquele que constitui efectivamente o grande êxito de uma preparação de antibióticos. Assim foi reconhecida indispensável uma viagem de estudo aos Estados Unidos, para completar os nossos conhecimentos teóricos.

Da visita realizada a algumas fábricas no “País dos an-tibióticos”, expressão utilizada pela delegação dos servi-ços técnicos dos Laboratórios Vitória que se deslocou, na época, aos Estados Unidos da América, ficou o “assombro causado pelos números” e pelas máquinas de enchimen-to e capsulagem dos frascos de penicilina e estreptomi-cina, mas sobretudo o conhecimento para avançar para a produção nacional de antibióticos, sendo que em 1949 a sociedade apresentava já um significativo catálogo de produtos próprios. Mereceu também especial atenção de benchmarking a produção de arsenobenzóis, concluindo- -se que “se é verdade que a nossa produção por compa-ração é demasiado pequena, também é verdade serem os nossos ensaios mais rigorosos”.

Comparativamente aos Laboratórios Vitória, as origens dos Laboratórios Atral foram mais modestas e, sobretudo, menos planeadas. Esta sociedade iniciou a sua existência em 1947 sob a forma de uma modesta farmácia localiza-da no bairro de Alcântara, em Lisboa. A grave crise finan-ceira que se fez sentir um ano depois colocou Sebastião Alves (1920-2012), então agente de propaganda médica, na gestão do negócio. Sob a sua direcção, foram contrata-dos novos técnicos e iniciou-se, com o objectivo da expor-tação, um alargado processo de contacto com mercados estrangeiros, esforços de que resultou o incremento do volume de facturação da empresa.

O processo de constituição, em 1948, do Instituto Luso--Fármaco, o terceiro importante laboratório criado nes-ta década, é bem paradigmático de como se fundavam, então, em Portugal, as novas indústrias farmacêuticas. O testemunho dessas já remotas origens ficou registado numa publicação editada em Outubro de 1975 pelo refe-rido Instituto:

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Grandes foram as barreiras a vencer para se obter o indis-pensável alvará de laboratório, dado que, na época, além de outras, imperava a da exigência de uma farmácia atingir 1000 contos de vendas de especialidades farmacêuticas, aprovadas então pela Comissão Reguladora dos Produtos Químicos e Farmacêuticos e fabricadas na própria farmá-cia, que pretendia ultrapassar esta importante fase para requerer o seu pedido de alvará.Conseguiu-se, assim, efectuar um contrato com uma far-mácia, situada então na Rua Damasceno Monteiro – Farmá-cia ALB – e ali, em condições difíceis, iniciou-se, por assim dizer, o arranque para se alcançarem os nossos objectivos. Trabalhou-se afanosamente, dia e noite, sem quaisquer au-xílios ou compreensões oficiais.

Na origem deste laboratório encontravam-se António Dio-go Bravo e Miguel Cocco. A produção artesanal inicial deu lugar, progressivamente, à industrialização, para o que con-tribuiu a deslocação que os referidos fundadores realiza-ram, no início dos anos 50, aos EUA, País onde adquiriram

equipamentos para a criação da primeira unidade nacional de síntese farmacêutica dos antibióticos e dos seus sais: “Os meses que passámos nos Estados Unidos deram-nos a co-nhecer a necessidade de enveredarmos por novos caminhos que não só o da importação de matérias-primas, e sim a possibilidade de sintetizarmos, também nós, algumas das substâncias então de maior relevância”.

Entre os quatro principais laboratórios fundados nesta dé-cada, encontrava-se ainda a Medicamenta, criada em 1949 mediante a aquisição, por cessão, dos direitos do alvará do Laboratório Cardita, propriedade da Cardita, Lda. Além des-te, mas com menor importância, surgiram, também neste período, os Laboratórios Delta, constituídos em 1943, e os Laboratórios Fidelis, propriedade da empresa Laboratórios Bios, Lda., tendo como director técnico Ferreira Pinto. É também possível que datem dos anos 40 o Laboratório Cas-

Sede dos Laboratórios Atral (anos 1940). Ficha de sócio do Instituto Luso-Fármaco (1948).

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telo, dirigido pelo farmaceutico A. Matos do Vale, que, no final da década, passou a designar-se Laboratório Ulzurrun, os laboratórios de Biologia e Quimioterapia Vicente Ribeiro & Carvalho e os Laboratórios de Benfica, propriedade da so-ciedade Cunha Reis, Lda. e sediados na Estrada de Benfi-ca, em Lisboa, tendo como director técnico o farmacêutico Carlos Macedo Pires.

Pasteur de Lisboa e os laboratórios Vitória, Bial, Farmacoló-gico J.J. Fernandes, Únitas e Zimaia –, em 15 de Dezembro de 1944, foi formalmente fundado o Instituto Nacional Bio-terapêutico. O seu objecto social era o “fabrico de produtos químicos, de vitaminas, de soros e vacinas, de produtos opo-terápicos, de alcalóides e de glicósidos” e “a transformação ou aproveitamento de matérias-primas existentes no País e no Império Colonial Português, que tenham ou possam vir a ter aplicação terapêutica”.

A dimensão e os recursos financeiros adquiridos pelos la-boratórios mais antigos, nomeadamente por via da interna-cionalização e da exportação, permitiu, pela primeira vez, o seu investimento no apoio à investigação científica desen-volvida pelo mundo académico. Foi neste contexto que os Laboratórios Sanitas, em parceria com a Sociedade de Ciên-cias Médicas de Lisboa, instituíram, em 1946, cinco prémios “com o fim de estimular a produção científica, tão necessá-ria à Indústria Farmacêutica portuguesa, que se deve apoiar, precisamente, nas mais modernas aquisições das ciências médicas”. Com um valor global anual de 25 000$00, os pré-mios Sanitas sucederam ao prémio trienal oferecido pelo Instituto Pasteur à Faculdade de Medicina de Lisboa, mar-cando, como referiram, entre outros, os eminentes médicos e professores Egas Moniz, Celestino da Costa e Salazar de Sousa, “uma etapa nova e importantíssima no movimento de colaboração entre as ciências médicas e as indústrias que para elas trabalham”. A referida colaboração materializou-se, igualmente, nas publicações periódicas que alguns laborató-rios desenvolveram nesta década como parte do seu esforço de comunicação com os médicos, nomeadamente a Terapêu-tica: Revista de Informação Médico-Farmacêutica, publicada a partir de 1947 pelos Laboratórios Vitória, e os Summarium JABA e Anais Azevedos, ambos iniciados em 1949. É tam-

Os anos 1940 testemunharam, igualmente, um primeiro e importante esforço de associativismo por parte dos in-dustriais farmacêuticos. Com efeito, por iniciativa de Alfre-do Cavalheiro, começou a desenhar-se no seio do GNIEF a constituição de um “grande Laboratório para preparação de produtos que a Indústria não fabricava, tornando-nos por completo independentes do estrangeiro, no que respeita à importação dos referidos produtos”. Granjeada a adesão ex-clusiva de cerca de 60% dos associados do Grémio, num total de 30 laboratórios de variadas dimensões – sendo maiores accionistas os laboratórios Sanitas, Lab e Cardita, o Instituto

Laboratórios de Benfica.

89Laboratório Normal, Mem Martins (anos 1940).

Brochura do Prémio Sanitas (1948).

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Sussurram outras «vozes», se porventura não são as mes-mas, em tom agora lamentoso, que as farmácias, em face da invasão dos produtos farmacêuticos especializados, já não são mais do que meras lojas de venda, decaídas da sua dignidade de laboratórios manipuladores, Mercearias de drogas!Neste sussurro se encerra um lastimoso «de profundis».A Farmácia, porém, continua a ser inalteravelmente, uma unidade imprescindível da Indústria Farmacêutica.

No início dos anos 40, o sector farmacêutico encontrava--se, porém, não só desregulado ao nível da concorrência e dos preços praticados, como apresentava agentes pou-co especializados, sobretudo na área da comercialização, confundindo-se as funções dos importadores com as dos

armazenistas. Foi neste contexto que se deu a criação, me-diante o Decreto n.º 30 270, de 12 de Janeiro de 1940, da Comissão Reguladora dos Produtos Químicos e Farma-cêuticos (CRPQF). Organicamente dependente do Ministério do Comércio e Indústria, os seus objectivos foram definidos nos seguintes termos:

1.º – Orientar, disciplinar e fiscalizar as actividades relacio-nadas com a importação, o comércio interno e a indústria dos produtos químicos e farmacêuticos, tendo principal-mente em vista a garantia do normal abastecimento do país, o desenvolvimento da produção nacional e a manu-tenção do justo preço dos produtos;2.º – Criar a consciência corporativa e fomentar a solida-riedade e a compreensão dos interesses comuns entre os componentes das actividades que coordena.

Entre as suas competências contavam-se a regulação da “actividade económica das indústrias química e farmacêu-tica” e a fiscalização do “exacto cumprimento das normas legais e das suas próprias determinações pelas actividades que disciplina”, podendo “aplicar penalidades às infracções verificadas”, mas também a fixação de preços. Por outro lado, ao abrigo do referido decreto e do despacho ministerial de 13 de Maio de 1940, o exercício de actividade no ramo dos produtos químicos e farmacêuticos passou a ficar sujei-to à inscrição obrigatória na CRPQF de “laboratórios de pro-dutos farmacêuticos”, “armezenistas-importadores e arma-zenistas de medicamentos especializados” e “armazenistas e importadores de drogas medicinais, produtos farmacêu-ticos e produtos químicos medicinais e para análise”. Uma das suas primeiras medidas foi a criação do Regulamento do Comércio dos Medicamentos Especializados, que entrou em vigor em 1941, procurando disciplinar o sector, como se infere do relatório da CRPQF sobre Fabrico e Importação de Medicamentos Especializados, publicado em 1948:

bém muito significativo o facto de, a partir do início dos anos 1940, o Instituto Pasteur de Lisboa ter começado a editar, através dos seus Serviços de Bibliografia Científica, um boletim com extractos de artigos científicos publicados em revistas nacionais e estrangeiras, do qual foram dados à estampa pelo menos 30 números.

Ao nivel da investigação e desenvolvimento na indústria assumiu pioneirismo o Laboratório Normal, que, em 1949, contratou para dirigir esta área Alberto Ralha (1921-2010), então regente da disciplina de Química Orgânica Farmacêu-tica, da Escola de Farmácia, da Universidade de Lisboa.

A preponderância que os laboratórios de especialidades farmacêuticas foram conquistando nesta década levantou, porém, algum “cepticismo da parte de uns, malquerenças da parte de outros, incompreensão de bastantes”. Era as-sim que os Laboratórios Vitória caracterizavam, no seu Me-morandum Therapêutico de 1945, a reacção ao impacto eco-nómico das novas indústrias e à mudança de paradigma de produção que lhes estava subjacente, com a crescente subs-tituição da farmácia de oficina pela farmácia industrial:

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Ao abrigo deste regulamento, os preços de venda ao públi-co dos medicamentos especializados eram propostos pelos fabricantes à CRPQF e por esta aprovados, só podendo ser alterados a requerimento dos interessados ou por iniciativa da referida comissão. Esta questão desagradava ao GNIEF, que invocava não poder “a indústria nacional de especialida-des farmacêuticas, ao contrário do que sucede com a tota-lidade ou quase totalidade das restantes indústrias, fixar e alterar livremente os preços dos seus preparados”. No rela-tório da direcção do Grémio, de 1942, afirmava-se mesmo:

[…] tem sido a Comissão Reguladora tão escrupulosamen-te cautelosa, que, ao ser-lhe submetido algum pedido de fixação ou alteração de preços, exige do requerente uma justificação detalhada e documentada, só concedendo a solicitada autorização, depois de se assegurar de que nos preços a autorizar não há sombra de especulação.Para esse fim, exige dos requerentes a mais minuciosa discriminação e justificação do preço exacto do custo, e, por vezes, não se conformando com os preços propostos, altera-os, reduzindo-os.

Outra das medidas iniciais tomadas pela CRPQF foi a cria-ção, em Março de 1941, de um Laboratório de Ensaio e Ve-rificação de Medicamentos e Substâncias Medicinais, o qual entrou em funcionamento em 1942, sob direcção de José do

Souto Teixeira, tendo ficado sediado na Estrada de Benfica, em Lisboa. Este organismo era, aliás, uma das “mais anti-gas aspirações” do Grémio, representando para a “Indústria das Especialidades Farmacêuticas enorme elevação do nível moral e material” e “a mais segura garantia da pureza e ge-nuinidade das especialidades farmacêuticas”.

O GNIEF, por seu turno, teve como primeiros passos visíveis a participação no referido Regulamento do Comércio dos Medicamentos Especializados – para o que encetou negocia-ções com o Grémio dos Armazenistas de Drogas, Produtos Químicos e Farmacêuticos, o Grémio Distrital dos Proprie-tários de Farmácias e o Sindicato Nacional dos Farmacêu-ticos –, o registo de marcas na Repartição de Propriedade

A desordem existente neste sector em 1940, e já então com grandes raízes, era altamente prejudicial para todas as classes interessadas na produção e venda de medica-mentos e designadamente para as farmácias; era-o tam-bém para a saúde pública, pois a concorrência sem limites no campo dos medicamentos afecta, mais cedo ou mais tarde, a sua composição e valor terapêutico.Elaborou-se e, depois de largamente discutido por repre-sentantes de todos os interessados, foi aprovado por des-pacho de 15 de Abril de 1941 de Sua Excelência, o Ministro da Economia, o Regulamento do Comércio de Medicamen-tos Especializados…”.

Fachada do Laboratório de Ensaio da CRPQF, em Benfica (anos 1940).

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Industrial e, sobretudo, a defesa de “um melhor e mais efi-caz condicionamento da Indústria Farmacêutica, tendente a contribuir para o seu aperfeiçoamento, evitando uma mon-tagem inútil de novos laboratórios, a sua transferência para a propriedade de empresas estrangeiras e o lançamento de novos produtos, que, não correspondendo a uma verificada necessidade, só servirão para alimentar uma concorrência prejudicial”. Esta questão colocou-se logo em 1940, já que, em Outubro daquele ano, a direcção do Grémio submeteu ao Ministro do Interior um parecer que sintetizava a sua po-sição face a esta matéria:

A Direcção deste organismo corporativo é de parecer:

1.º – O fabrico em Portugal de medicamentos estrangeiros ou de marca estrangeira que já tenham venda no País só não prejudicará a indústria nacional se esta não fabricar preparados similares ou não estiver apta a fabricá-los.2.º – No caso de estar apta a fabricá-los, mas ainda os não fabricar, só deverá ser concedida licença para o fabrico no País de medicamentos estrangeiros quando a indústria na-cional se desinteressar da concorrência, não se obrigando, depois de consultada, a fabricá-los em um prazo a deter-minar, devendo, neste último caso, a licença ser concedida por prazos limitados (não superiores a cinco anos), embo-ra com a possibilidade de renovação.

No final da década, defendia o Grémio a imperiosa ne-cessidade de regulamentar o Decreto-Lei n.º 29 337, de 1939 – que, como vimos, estabelecera o condicionamen-to da Indústria Farmacêutica –, legislação que considerava “deficiente e incompleta” face à “evolução que a técnica e o aperfeiçoamento industrial fizeram no segundo quartel do presente século”. Foi precisamente nesse período, em 1949, que o GNIEF foi chamado a dar parecer sobre um processo remetido ao Ministro do Interior pela Sociedade Portuguesa de Produtos Wander, fundada em 1945 por

J. P. Beck e V. Chagas Franco, a qual “pretendia ser auto-rizada a «instalar um laboratório de medicamentos espe-cializados farmacêuticos»” e a “«preparar no País os medi-camentos de marca e patente suíças Wander»”. Apesar da aguerrida oposição do Grémio, que considerava o referido projecto uma “«audaciosa pretensão» do início da instala-ção entre nós da indústria estrangeira”, foi o mesmo apro-vado, em Julho de 1949, pelo Subsecretário de Estado da Assistência Social. Tal levou a direcção do GNIEF à reali-zação de diversas audiências com o Ministro do Interior, nas quais expôs “os inconvenientes económicos que para a indústria nacional inexoravelmente advêm da instalação da indústria estrangeira entre nós”. Goradas as expecta-tivas, o Grémio conseguiu, no entanto, autorização para “dar conhecimento às entidades interessadas dos docu-mentos que constituem o processo de autorização”, o que veio a concretizar em 1950, mediante a publicação de um livro intitulado A Instalação do Laboratório Wander.

Associada ao condicionamento industrial estava a defesa do condicionamento das especialidades farmacêuticas im-portadas, tida como premente em face da participação de Portugal na Organização Europeia de Cooperação Econó-mica, a qual deixava antever o fim das restrições adminis-trativas à importação de medicamentos. Foi com tal propó-sito que, na segunda metade dos anos 1940, a Direcção do Grémio se correspondeu, directamente, com o Presidente do Conselho de Ministros, Oliveira Salazar. Além da referi-da questão, o GNIEF respondeu, também, à intervenção do deputado José Martins de Mira Galvão (1887-1961), na As-sembleia Nacional, que afirmara, em Dezembro de 1946, que a Indústria Farmacêutica era “rica” e que “os lucros auferidos pelos fabricantes de especialidades farmacêuti-cas são muito grandes”. Contrapôs o GNIEF:

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O seu desenvolvimento [indústria farmacêutica] e evolu-ção, nos últimos dez anos, é evidente, orgulhando-se de ter prestado largo contributo à Economia Nacional. E, se lhe forem dados os elementos de protecção necessários, a sua quota parte será apreciável, quer na Economia, quer no bom nome da produção científica em Portugal.Pelo volume dos capitais investidos nesta indústria, pelo número e qualidade dos elementos ao seu serviço, pela soma das contribuições e impostos pagos ao Estado, pe-los importantes subsídios que dá a outras indústrias, pelo serviço que presta à saúde pública e, até, pelo serviço que prestou durante a guerra contribuindo para o abastecimen-to do País em medicamentos – este sector da indústria merece ser acarinhado pelos Poderes Públicos.

Outro elemento importante da actuação do GNIEF nesta década foi a negociação, com o Sindicato Nacional dos Ajudantes de Farmácia e Ofícios Correlativos dos Distritos de Lisboa e do Porto, do Contrato Colectivo de Trabalho na Indústria Farmacêutica, o qual entrou em vigor em Se-tembro de 1946. Considerava o Grémio, no seu relatório da direcção de 1947, que, com tal acordo, “se elevou o nível não só da prestação de trabalho pelos empregados e assalariados, como também o da situação material de uns e outros, sem prejuízo, e antes com manifesto benefício,

Instalações dos Laboratórios Wander, em Cabo Ruivo (anos 1960).

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para os resultados práticos da exploração industrial”. O GNIEF investiu também na propaganda da Indústria Far-macêutica. Nesse âmbito, realizou, logo em 1941, uma campanha, tendo endereçado aos médicos portugueses uma elucidativa circular sobre os propósitos da mesma:

[…] ousamos vir apelar para o patriotismo de V. Exa., so-licitando-lhe que, sempre que o entender possível, dê pre-ferência, no seu receituário, às especialidades nacionais contribuindo, por essa forma, para dar trabalho a muitos milhares de portugueses e evitando que saiam do nosso País somas avultadíssimas, que, em benefício de todos, aqui poderão ficar.

Esta campanha não terá sido alheia ao artigo que um “Farmacópola” lograra publicar, em 10 de Fevereiro de 1940, no Jornal do Comércio e das Colónias, sob o escla-recedor título “Farmacopistas”. Referia-se o seu autor à Indústria Farmacêutica como um “raquítico ramo de acti-vidade nacional”, considerando que as especialidades far-macêuticas nacionais pecavam, “na sua maioria, pelo de-feito da técnica de decalque, única que lhes é conhecida” e por não terem, “na sua maior parte, o valor terapêutico dos moldes estrangeiros, nem sequer se lhes [assemelha-rem] na eficácia que o doente ou o médico procuram”. O GNIEF respondeu ao abrigo da lei de imprensa, tendo a carta do seu presidente sido publicada a 12 de Março de 1940. Bernardo A. Costa Simões deixava entender que tal artigo fora obra de um “representante ou importador de especialidades estrangeiras”, defendendo a indústria nacional e apontando, simultaneamente, más práticas de alguns laboratórios estrangeiros:

É também para estranhar que o mesmo senhor ignore, ou finja ignorar, que cerca de 90% das especialidades que nos vêm do estrangeiro são simples misturas de drogas, sem qualquer dificuldade de preparação ou de inovação na téc-

Em Maio de 1947, foi o Diário de Lisboa que publicou uma série de três artigos sobre o “alto preço dos medicamentos portugueses”, tendo como ponto de partida as exposições que o deputado Artur Águedo de Oliveira (1894-1978) apresentara na Assembleia Nacional sobre esta matéria. A questão levantada nestas peças, não assinadas, era não só de foro económico, mas também técnico, já que o seu autor argumentava que os medicamentos manipulados, preparados de forma personalizada pelos farmacêuticos, por indicação dos médicos, eram, além de mais baratos, superiores às modernas especialidades standardizadas de origem industrial: “Hoje, as coisas passam-se de modo diferente: fazem-se remédios em série, com composições em série, que se receitam em série – processos que des-prezam o indivíduo, tomando o todo, segundo escalas, bitolas, gráficos, que, na grande parte dos casos, só em

nica farmacêutica. Deve saber também que um laborató-rio estrangeiro, acusado em tribunal do seu país de ter no mercado um produto que não correspondia às indicações do rótulo, se defendeu alegando que essa especialidade não era para consumo interno, mas se destinava a ser ex-portado para Portugal, facto que veio relatado nos jornais desse tempo.O artigo não merecia referência se não estivesse eivado de falsas afirmações, escritas com transparente má fé.Em primeiro lugar, qualquer indústria, em qualquer país, tem sempre produtos similares de outra indústria estran-geira; o que se pretende com as indústrias nacionais é precisamente evitar a importação de produtos congéneres e impedir, por essa forma, a exportação de ouro nacio-nal.

Mas os laboratórios não se limitam a copiar o que a indús-tria estrangeira, algumas vezes com pouco escrúpulo, tem enviado para Portugal: existem no mercado nacional es-pecialidades originais e mesmo naquelas que o articulista chama «decalques com defeitos de técnica» pode citar-se o exemplo frisante dos solutos injectáveis de gluconato de cálcio.

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teoria dão a média exacta de cada caso clínico”. Outra questão abordada era a proliferação de especialidades, com as consequentes dificuldades que tal colocava:

E aqui surge, portanto, o outro aspecto moral da questão: não há conhecimento médico que abranja, por exemplo, mais de uma centena de rótulos de cálcio; e não há far-mácia que possa ter nas vitrinas tantos frascos de idên-tico preparado. Por isso, a receita vai rolando, de bairros mais distantes, até aos grandes magnates da Baixa que são ao mesmo tempo armazenistas e, como tais, de tudo dispõem. Nesta pesquisa angustiosa, de farmácia em far-mácia, perdeu-se tempo, dinheiro – e quantas vezes a vida do doente, se o caso não é de cálcio mas de coisa de apli-cação mais urgente?

O GNIEF não só rebateu na Assembleia Nacional as questões levantadas por Águedo de Oliveira, como reagiu também aos artigos do Diário de Lisboa, cujos títulos, an-tetítulos e subtítulos eram notoriamente contrários aos

interesses da indústria: “Os remédios estão caros porque se multiplicaram à roda da sua industrialização interesses que é preciso restringir”; “As «especialidades farmacêuti-cas»: Os lucros fabulosos das indústrias e a via sacra do doente que paga caros medicamentos baratos”. Na carta que Luís Figueira endereçou, em representação do Gré-mio, ao referido jornal detecta-se, porém, uma tomada de posição muito discreta: “aguardar que se pronunciem so-bre o caso debatido os Poderes Públicos, em especial a Assembleia Nacional”. Esta atitude foi mantida nos anos imediatamente seguintes, revelando a direcção da GNIES, no seu relatório de 1948: “A Direcção julgou dever man-ter-se alheia ao ataque [da imprensa], evitando entrar em polémica, pois continua a não reputar vantajoso para a defesa do bom nome da indústria este sistema”. A ques-tão não ficou, porém, resolvida, pois, um ano volvido, em Maio de 1949, foi o jornal O Século que, animado pela

Ficha de sócio individual do GNIEF: António Pereira Forjaz (1948).

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intervenção do deputado João Cerveira Pinto (n. 1908) na Assembleia Nacional, e pela contenda mediática entre o deputado Manuel França Vigon (1906-1974) e o bastonário da Ordem dos Médicos, Manuel Cerqueira Gomes (1894- -1973), relançou para o debate público o elevado preço dos medicamentos, pedindo a intervenção, neste âmbito, dos poderes públicos.

Ainda relativamente ao GNIEF, esta década marcou a filiação de várias farmácias e empresas proprietárias de farmácias – as quais puderam ser associadas por terem atingindo a revenda de especialidades em larga escala, conforme previsto no artigo 10.º dos Estatutos do Grémio – e também dos Laboratórios Pecus, que, ao abrigo de um alvará emitido em Abril de 1949, iniciaram a produção de “soros, vacinas e produtos similares para uso veterinário”. O crescimento registado no número de associados permi-tiu ao GNIEF chegar ao final dos anos 40 com uma repre-sentação total de 100 laboratórios, os quais tinham à sua disposição uma pequena sede que, desde 1942, se encon-trava instalada – por acção de Cortez Pinto, então presi-dente da Associação Industrial Portuguesa – no edifício da AIP, localizado na Avenida da Liberdade, em Lisboa.

Importa, ainda, referir que foi nos anos 40 que se cons-tituiu o Grémio dos Armazenistas de Drogas e Produtos Químicos do Norte, cujos estatutos foram aprovados em Julho de 1942, entidade corporativa que representava os armazenistas e importadores com actividade nos distritos de Aveiro, Braga, Bragança, Coimbra, Guarda, Porto, Viana do Castelo, Vila Real e Viseu. Três anos antes, em Maio de 1939, fora criado o Grémio dos Armazenistas de Drogas e Produtos Químicos do Sul, que representava as empre-sas sediadas nos distritos de Beja, Castelo Branco, Évora, Faro, Leiria, Lisboa, Portalegre, Santarém e Setúbal.

ANOS 1950: ENTRE O MINISTÉRIO DA SAÚDEE A ACREDITAÇÃO PELA FDA

Marcados, mundialmente, pelo desenvolvimento da psico-farmacologia e dos corticosteróides, os anos 50 represen-taram, em Portugal, um maior investimento do Estado na gestão do Sistema de Saúde Pública, o que ficou consubs-tanciado pela criação do Ministério da Saúde e Assistência – mediante o Decreto-Lei n.º 41 825, de 13 de Agosto de 1958 –, cujas funções tinham sido anteriormente desempenhadas pelo Ministério do Interior.

Pouco antes, começara a debater-se a reorganização da In-dústria Farmacêutica, processo que teve início em Junho de 1957, quando o GNIEF organizou uma série de colóquios em que participaram representantes da indústria e da CRPQF. Da parte do Governo, a motivação de fundo era a redução do preço dos medicamentos, preconizando-se, para o efeito, a concentração industrial como via para uma produção em maior escala, mais económica e em melhores condições. A indústria, por seu turno, via a reorganização como pertinente e actual em função, entre outros factores, da rápida evolução das técnicas e dos meios de produção, do desenvolvimento inédito da investigação científica aplicada ao sector, da cres-cente democratização do medicamento industrializado e da formação de um mercado comum europeu – no âmbito da fundação, em 1957, da Comunidade Económica Europeia – possuidor de um nível técnico e económico superior ao nacional. Um dos industriais que participou activamente no debate desta questão foi Manuel Adriano Mourato Vermelho, que, em Julho de 1957, publicou, numa separata da Revista Portuguesa de Farmácia, a sua «Contribuição ao estudo para reorganização da Indústria Farmacêutica Portuguesa». Entre outros pontos, defendia este farmacêutico a constituição de

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agrupamentos empresariais coordenados pelo GNIEF, no âm-bito dos quais se procederia à redução de marcas e produtos similares, à normalização das embalagens e à diminuição “voluntária e gradual” do número de unidades fabris.

A ambicionada reorganização foi sediada, governamental-mente, numa comissão criada, para o efeito, pela Portaria n.º 17 147, de 2 de Maio de 1959, a qual se encontrava colocada na dependência da Direcção-Geral dos Serviços In-dustriais do Ministério da Economia. Seria, contudo, neces-sário esperar pelos anos 60 para que surgissem os primeiros resultados desta unidade de missão.

Ao nível da actividade industrial, o panorama era cada vez mais marcado pela preponderância dos modernos laborató-rios face às farmácias de oficina. De facto, dos 90 prepara-dores nacionais inscritos no GNIEF, em 1954, a maioria (59) era laboratórios detidos por sociedades comerciais e os res-tantes (31) eram propriedade de farmácias, empregando, no total, cerca de 4300 pessoas e apresentando um valor global de venda ao público de, aproximadamente, 315 milhões de escudos. Esta nova realidade foi descrita por Carlos Silveira e Manuel Mourato Vermelho, no artigo “Apontamentos sobre o exercício da profissão farmacêutica em Portugal e no Es-trangeiro”, publicado, em 1959, numa separata da Revista Portuguesa de Farmácia:

A indústria nacional continuava, porém, a sofrer de várias condicionantes, como apontou a CRPQF em relatório de 1956. Desde logo, “a sua dispersão por grande número de pequenos laboratórios sem a necessária especialização e, em alguns casos, carecendo até de uma organização técni-ca adequada, aliada à ausência de uma séria investigação científica”, o que não invalidava a existência de “umas tan-tas unidades modernas que meritoriamente se esforçam por acompanhar a evolução dos processos de trabalho que cor-rentemente se verificam nos laboratórios estrangeiros”. Por outro lado, detectava-se, em grande parte, a “dependência dos fornecimentos estrangeiros, não só da especialidade farmacêutica, produto de alta e cara investigação científica […], mas também até do medicamento banal, que poderia, ou melhor, que já é capazmente fabricado no País, mas em que o público ou o médico muitas vezes pouco acredita”. A indústria nacional era, também, penalizada pela “gama de variedades de medicamentos que correm e que em im-petuoso afluxo se lançam no mercado”, questão entendida como podendo contribuir “para que o avanço quantitativo se faça à custa do qualitativo”. Finalmente, e de extrema im-portância, uma “outra circunstância desfavorável, mas cuja responsabilidade não pode ser imputada ao sector […], é a ausência de uma indústria químico-farmacêutica nacional”, argumentando a CRPQF que um “País que não disponha de um certo número de indústrias químicas não pode alimentar esperanças de criar verdadeiros laboratórios de especialida-des farmacêuticas que, no essencial, o ponham a coberto da dependência dos mercados fornecedores estrangeiros”.

Neste enquadramento, foram fundados, na presente déca-da, vários laboratórios nacionais, nomeadamente os Novil (constituídos em 1950 por Henrique António Rodrigues, pro-prietário da Farmácia Novil), a Labesfal (1951), a Iberfar (que

“[…] um laboratório da indústria farmacêutica constitui hoje um todo complexo cuja direcção ultrapassa a compe-tência de um só técnico especializado, havendo que, para o dirigir, constituírem-se equipas de técnicos especializados, de que o farmacêutico fará naturalmente parte tal como o médico, o químico, o engenheiro, o farmacologista e tantos outros.[…]Para desempenharem convenientemente a sua missão, tais laboratórios precisam de largas somas de capitais consti-tuindo empresas de grandes dimensões. Em geral, só so-ciedades anónimas consentem a sua realização.

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iniciou a sua actividade industrial em 1951, sendo detida pela firma Ferraz Lynce, S.A., estabelecida em 1924 como agente da empresa alemã Boehringer Mannheim), a Edol (1952), a Confar – Consórcio Farmacêutico, Lda. (fundada, em 1954, por João Afonso Tavares e Alberto Rodrigues), a Produfarma, Lda. (criada, em 1955, por Luís Alexandre Branquinho e Lau-ra de Jesus Henriques Lucas), a Basi (1956), os Laborató-rios de Investigação Técnica – Laquifa (1956) e os Laborató-rios Dávi, estes últimos estabelecidos em meados de 1950, quando Manuel Rasoilo Cristiano adquiriu a Farmácia Jaime José da Costa, alterando o seu nome para Farmácia Dávi.

Um caso à parte, porque atípico, foi o estabelecimento da Hovione em Portugal, fundada em 1959 por três refu-giados húngaros – Ivan Villax (e a sua mulher, Diane Villax),

Nicholas de Horthy e Andrew Onody –, de cujos apelidos (Horthy, Villax, Onody) esta empresa derivou a sua deno-minação.

Além dos referidos, encontravam-se em funcionamento outros laboratórios cuja data de criação se revela difícil de determinar, tendo ocorrido, previsivelmente nos anos 50: Asclepius (Lisboa), Profinal (Porto), Nostrum (Aveiro) e Efil (Estoril). É ainda de referir que, em 1958, as instalações fabris dos Laboratórios Atral foram aprovadas pela Food

Laboratórios Novil.

Laboratórios Atral (1958).

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and Drug Administration (FDA), o que abriu as portas à ex-portação para os Estados Unidos, via ilhas Virgens, de im-portantes quantidades de produtos semiterminados desta empresa. Neste mesmo ano, ganhou o prestigiado Prémio Valmor o novo edifício dos laboratórios do Instituto Pasteur de Lisboa, projectado pelo arquitecto Carlos Manuel Ventu-ra Ramos (1922-2012).

Os Laboratórios Vitória tiveram também uma boa presta-ção comercial nesta década, tendo lançado, entre outros antibióticos, a Ebercina (cloroanfenicol), a Biocina (com base na estreptomicina), a Penil-Estreptomicina (associa-ção de penicilina e estreptomicina), a Bronco-Penil e a Bi--Estreptomicina. E se a sucessiva diminuição do preço de venda ao público dos antibióticos se agravou no final da década, tal quebra foi, todavia, compensada pelo aumento das exportações para Países tão díspares como o Vietna-me, a Arábia, as Honduras, S. Salvador, a Grécia e o Peru. Por outro lado, foram estabelecidos importantes contratos com laboratórios estrangeiros, nomeadamente a Rhône-

-Poulenc, com vista à preparação nacional dos seus produ-tos, o que implicou novos investimentos na modernização e no apetrechamento das unidades de produção, tendo le-vado à construção de um novo edifício contíguo aos já exis-tentes. Os Laboratórios Vitória beneficiaram, também, do fim do Instituto Nacional Bioterapêutico – Bioter, Lda., o qual, numa acção litigiosa que perdeu por incumprimento contratual, se viu obrigado a entregar-lhes a sua unidade industrial, a maquinaria e os direitos industriais.

Facto iniludível foi a eclosão, nos anos 50, de um pri-meiro surto de estabelecimento de sucursais portuguesas pelas multinacionais farmacêuticas. Contavam-se entre es-sas os Laboratórios Lepetit (empresa italiana representada em Portugal pela Soc. Química Lepetit, Lda.), a Química Hoechst, Lda., a Abbott Laboratórios, Lda., os Produtos Sandoz, Lda., a Hubber Farmacêutica Portuguesa, Lda., a OM Portuguesa e a Pfizer Portuguesa, sociedade esta que já se encontrava anteriormente representada em Portugal, tendo criado, em 1955, os prémios Pfizer. Outros laborató-

Edifício do Instituto Pasteur de Lisboa, na Avenida Marechal Gomes da Costa (1971).

100Sede da Química Hoechst, Lda., em Lisboa (anos 1960).

Sede da Pfizer, em Lisboa (anos 1960).

Sede da Lepetit, em Lisboa (anos 1960).

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rios estrangeiros mantinham, apenas, presença indirecta, sendo representados por firmas portuguesas, destacan-do-se a Abecassis (Irmãos) & C.ª, que comercializava es-pecialidades produzidas, entre outros, pela Lederle, pela Schering Corporation (Americana) e pela Winthrop Products, e a Crocker Delaforce & CIA, SARL, que repre-sentava a Merck, Sharp & Dohme.

A robustecida presença internacional veio agravar a con-corrência, que era crescente, tal como testemunha o rela-tório de 1954 da Sociedade Industrial Farmacêutica (Labo-ratórios Azevedos): “No decorrer do Exercício findo houve que enfrentar as mesmas dificuldades dos anos anteriores, avolumadas pelos desvarios duma concorrência comercial ainda mais impiedosa”. Agravou também o elevado núme-ro de medicamentos especializados, que, de acordo com um relatório da CRPQF, se cifrava, em 1956, em 22 846 fármacos, dos quais cerca de 30% eram importados. A proliferação de especialidades conduziu, aliás, ao início da publicação, nesta década, do Simposium Terapêutico: Enciclopédia de Especialidades Farmacêuticas, tal como se depreende do texto que os respectivos editores publicaram na primeira edição, em 1956:

Esta publicação anual dá-nos, por seu lado, uma perspec-tiva bastante aproximada do que foi a evolução quantitativa dos laboratórios nos anos 50. Se, na edição de 1956, es-tavam inscritos 47 nacionais e 64 estrangeiros, em 1957, eram já 69 nacionais e 116 estrangeiros, a esmagadora

O número sempre crescente de especialidades farmacêuti-cas existentes no nosso País atingiu uma cifra de tal modo elevada que se impunha, por manifesta necessidade, a existência de um elemento informativo claro e fidedigno, que junto de médicos e farmacêuticos facilitasse o traba-lho árduo do receituário para os primeiros e a efectivação do mesmo, para os segundos.

Os inconvenientes desta situação são grandes e tendem a acentuar-se. Do primeiro aspecto, a abundância de mar-cas, resultam os seguintes: Os médicos vêem-se impossibi-litados de conhecer todos os produtos que a indústria lhes oferece e nem podem seleccionar os de maior interesse. Os laboratórios industriais vêem-se forçados a fabricar uma grande variedade de produtos de pouca venda, com grande aumento de trabalho e despesas de estudo e propaganda, sem que recebam compensação material para o seu esfor-ço. As farmácias são prejudicadas no seu comércio, pois não conseguem abastecer-se de todos os produtos existen-tes no mercado, e são obrigadas, além disso, a empregar uma parte considerável dos seus lucros na aquisição das novas especialidades.Do segundo aspecto da situação, a insuficiência de «con-trole», resultam inconvenientes cuja gravidade pode ser maior ou menor mas que, em todos os casos, são grandes, como seja a preparação e venda de produtos nem sempre bem realizados.

Atento a esta problemática, o GNIEF efectuou ao mais alto nível governamental a defesa da indústria nacional e do condicionamento das especialidades estrangeiras, para o que o Governo não dispunha, porém, de instru-

maioria sediada em Lisboa, e, em 1958, ambos ascendiam, respectivamente, a 85 e 184 laboratórios.

Que a questão, em concreto, da proliferação de medica-mentos preocupava a indústria nacional, prova-o o artigo que Alberto Mourato publicou, em 1954, numa separata da Revista Portuguesa de Farmácia, intitulado “Aspectos da In-dústria Farmacêutica Nacional: Sugestões para o Condicio-namento das Especialidades Farmacêuticas”. Segundo este autor, a “falta de critério no lançamentos das especialidades farmacêuticas” tinha gerado uma situação inconveniente e marcada pela “Abundância de marcas e a Inexistência ou insuficiência de «controle»”. Tal problema tinha já sido apon-tado pela imprensa dos anos 40, mas era agora visto pela perspectiva da indústria:

102Laboratório Normal.

mentos legais adequados. Foi com esse propósito que, em Setembro de 1954, o Grémio realizou uma “exposição, muito circunstanciada”, ao Presidente do Conselho, invo-cando o princípio da preferência pelos produtos nacionais que se encontrava consagrado no Decreto n.º 22 037, de 27 de Dezembro de 1932. Além de assinalar a “assus-tadora evolução da venda, entre nós, dos medicamen-tos estrangeiros, desde o ano de 1940, em que fora de 64 468 785$60, até ao de 1952, em que atingira a cifra de 28 949 0260$00!”, rogava-se “que fossem adoptadas as providências necessárias para a justa e pronta solução deste momentoso problema – de tão grande repercussão, quer na nossa indústria, quer na Economia Nacional”.

Foi, pois, com “prazer” que o GNIEF acolheu a criação da Comissão Técnica dos Novos Medicamentos (CTNM), insti-tuída mediante o Decreto n.º 41.448, de 18 de Dezembro de 1957, com o objectivo de resolver muitos dos incon-venientes elencados pela indústria e não só. Colocada na dependência da Direcção-Geral de Saúde (DGS), a CTNM deu corpo ao primeiro verdadeiro sistema de autorização de medicamentos no País, o qual implicou que os labora-tórios passassem a depender de três entidades distintas para o lançamento de novos produtos: a DGS, que pro-cedia à autorização da introdução dos medicamentos, a CTNM, que emitia um parecer técnico em função da avalia-ção segundo critérios farmacológicos, terapêuticos e eco-nómicos, e a CRPQF, que aprovava os respectivos preços de venda. Refira-se que esta Comissão era pluridisciplinar, sendo composta pelo Director-Geral de Saúde, que presidia à mesma, por um representante da CRPQF, por um médico indicado pela Ordem dos Médicos, por um Professor ou Assistente da Faculdade de Farmácia ou de uma das Esco-las de Farmácia, por um Professor ou Assistente da uma das Faculdades de Medicina e por um Farmacêutico indica-do pelo Sindicato Nacional dos Farmacêuticos.

103

O próprio GNIEF registou importantes desenvolvimentos nos anos 50. De facto, logo no primeiro ano da década, passou por uma importante remodelação, com a criação de oito secções: antibióticos; sulfonamidas; vitaminas; opote-rápicos e hormonas; soros e vacinas; dietéticos; produtos para uso veterinário; medicamentos galénicos e outros. O objectivo era, como ficou patente no Relatório e Contas da direcção de 1950, “a obtenção de um meio expedito que mantivesse assíduo e estreito contacto entre os industriais e a Direcção”. A cada uma destas secções foram atribuídas as seguintes responsabilidades:

estudar, relatar e dar parecer sobre todos os assuntos que a Direcção lhe cometa;propor à Direcção a adopção de quaisquer normas que sejam de interesse para o respectivo sector industrial;acompanhar e estudar a movimentação e desenvolvi-mento da actividade comercial dos seus componen-tes, de forma a evitar que entre si façam concorrência desleal, designadamente através do aviltamento de preços;defender os legítimos interesses e direitos dos seus componentes;promover e realizar os inquéritos e estudos que foram determinados pela Direcção;desempenhar quaisquer outras funções que lhe forem cometidas pela Direcção.

A secção de antibióticos interveio logo em 1952, data em que o Ministério das Finanças, através do Decreto n.º 38 791, de 21 de Junho, criou um novo regime aduaneiro para os antibióticos estrangeiros, o qual o GNIEF considera-va estar em “acabada colisão com os legítimos direitos e in-teresses do sector da indústria nacional de medicamentos especializados que prepara produtos cujo princípio activo é

um antibiótico”. A questão de fundo, para a indústria, era que tal decreto determinava que “o medicamento especia-lizado estrangeiro e a matéria-prima para o medicamento especializado manipulado em Laboratórios nacionais – pa-guem agora os mesmos direitos”, razão pela qual o Grémio pediu a reposição da anterior pauta aduaneira, estabelecida pelo Decreto n.º 37.977, de 21 de Setembro de 1950.

Além das já referidas questões, e das preocupações com o impacto exercido na indústria pelo sistema de forneci-mento de medicamentos aos Serviços Médicos-Sociais das Caixas de Previdência, a acção do GNIEF, crescente-mente mais complexa, centralizou-se, ao longo da década, em quatro áreas fulcrais: condicionamento da indústria de especialidades farmacêuticas, patentes, regulamenta-ção das amostras e propaganda da Indústria Farmacêu-tica. De entre estas questões, mereceu especial atenção

a)

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d)

e)

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Laboratório Normal.

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o novo regime de condicionamento, estabelecido median-te os Decretos n.º 2052, de 11 de Março de 1952, e n.º 39 633, de 5 de Maio de 1954, com o pressuposto do sector “só comportar um número reduzido de empresas em condições óptimas de produção”. Em duas exposições que dirigiu ao Governo, a Direcção do Grémio defendeu a neces- sidade de introduzir alterações no referido diploma – para cuja elaboração não fora ouvido –, muito especificamente no art.º 18.º, referente às “autorizações para montagem, renovação ou substituição de equipamento fabril ou indus-trial”. Neste mesmo ano, e no âmbito do condicionamento em vigor, foi o GNIEF chamado a pronunciar-se sobre um projecto para a instalação em Portugal de uma fábrica de antibióticos promovida por um grupo holandês, para o que decidiu ouvir, mediante inquérito, os agremiados prepara-dores de antibióticos. A resposta que o Grémio endereçou à Direcção-Geral dos Serviços Industriais (DGSI) passou não só pela rejeição da referida unidade industrial, me-diante “dados objectivos e ponderosos”, mas também pela expressão do “desejo sincero” e da “possibilidade real dos Laboratórios nacionais porem de pé uma unidade indus-trial portuguesa produtora de antibióticos. A direcção do GNIEF iniciou, desde logo, contactos internacionais com vista à criação da referida fábrica, tendo, em articulação com a DGSI, dialogado com empresas dinamarquesas, nor-te-americanas e espanholas. O processo foi, porém, inter-rompido “quando um laboratório nacional informou estar de posse de uma nova técnica, altamente eficiente e muito mais económica, para o fabrico de antibióticos”, como se revelava no Relatório e Contas da Direcção de 1954.

A década de 1950 trouxe, também, para o debate a ques-tão das patentes. A visão do GNIEF sobre esta questão en-contra-se explicitada no Relatório e Contas da Direcção de 1957:

Ensinados por uma experiência que nós ainda não apren-demos, os grandes gigantes industriais não tardaram a estabelecer, à escala mundial, uma política comum, cujos traços fundamentais são os seguintes: segurar em suas mãos o processo geral da produção, da matéria prima ao produto acabado, defendendo-o com patentes que lhes as-segurem o exclusivo comercial das vendas e lhes garantam a absorção dos lucros integrais das diversas fases de pro-dução; especializar cada uma delas em linhas coerentes de fabrico, que as defenda de uma concorrência infrutífera entre si.E desta maneira, nos últimos dois ou três anos, foi o nosso país invadido por pedidos de patentes de invenção, na sua maioria desprovidos de um mínimo de condições legais, ou então, mesmo quando as possuíam, destinados não a obter um exclusivo de fabrico mas a obter um monopólio comercial. Esta transgressão do fim da lei é de tal maneira flagrante que não podemos deixar de chamar para ela a maior atenção das repartições portuguesas sobre que re-cai a responsabilidade da sua apreciação.O nosso clamor parece-nos tanto mais justificado quanto é certo dever reunir-se em 1958 o Congresso Internacional de Marcas e Patentes, em Lisboa, e tudo indicar que os países industriais mais evoluídos pretendem modificar a lei portuguesa em sentido que lhes seja ainda mais favorável.

Não pode também ser ignorada, na acção do Grémio, a questão das amostras, a qual remontava à década anterior, tendo levado o GNIEF a colaborar com o Grémio Nacional das Farmácias para “ser feita, junto da Exma. Classe Mé-dica, uma diligência no sentido de se tentar pôr cobro aos graves abusos que neste domínio se têm verificado e se acentuam cada vez mais”. O citado relatório resumia as-sim esta problemática:

É do conhecimento geral que a Farmácia portuguesa luta com dificuldades de vária ordem – a que ainda não foi possí-vel prestar uma solução decisiva. Parte dessas dificuldades, porém, parece relacionar-se com o facto dos laboratórios excederem largamente os limites razoáveis da distribuição de amostras dos seus preparados, verificando-se que doen-

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Registos de patentes dos LaboratóriosAtral-Cipan (anos 1970).

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Finalmente, a Direcção do GNIEF continuou, nos anos 1950, a investir na propaganda do sector, elevando-a a no-vos patamares. Com o objectivo de “mostrar a importân-cia e a perfeição da nossa indústria”, decidiu, por volta de 1950, realizar um filme sobre “a vida dos laboratórios portugueses”, o qual recebeu o título Ao Serviço da Saúde – A Indústria Portuguesa de Medicamentos Especializados. Para a sua realização, foi convidado Sousa Pimentel, tendo a estreia do filme ocorrido em 1951 num dos principais ci-nemas da capital, a que se seguiu um périplo pelas provín-cias. Este projecto não pode ser desligado das críticas que a imprensa continuou, nos anos 1950, a dirigir, ainda que pontualmente, à Indústria Farmacêutica. Afirmava-se, a este propósito, no Relatório e Contas da Direcção de 1957: “O assunto é velho e apresenta-se sob o mesmo aspecto de sempre: medicamentos a mais, medicamentos caros, me-dicamentos falsificados”. “[…] ainda não foi possível encon-trar uma forma de reacção adequada a estas campanhas, quase sempre marcadas com o sinal da irresponsabilida-de”. Também Luís da Silva Carvalho, Director Técnico dos Laboratórios Atral, se manifestou publicamente sobre as notícias negativas veiculadas pela imprensa durante esta década, nomeadamente pelo Diário Ilustrado, tendo, em 1959, publicado, em separata da Revista Portuguesa de Farmácia, um artigo intitulado «A Indústria Farmacêutica Nacional». Referia o autor:

A indústria farmacêutica nacional representa hoje uma força enorme no concerto da economia da Nação e uma posição de prestígio no campo das realizações técnicas do País.Milhares de pessoas de todas as categorias sociais, desde a simples empregada até aos técnicos de diversa natureza (farmacêuticos, médicos, químicos, engenheiros, veteriná-rios, etc.), trabalham nesta indústria, representando mui-tas famílias que vivem desta já vultuosa actividade.A par desta importância económica que ocupa e que deve ser considerada quando a ela se façam referências, procu-ra a indústria farmacêutica nacional trabalhar em condi-ções de seriedade que devem merecer respeito a todas as pessoas esclarecidas e conscientes.Não obstante tudo isto constituir uma verdade evidente, certas pessoas, não suficientemente esclarecidas, não dei-xam de denegrir esta indústria e, concomitantemente, o bom nome dos profissionais que nela laboram, atingindo, igualmente, em última análise, o prestígio pátrio, todas as vezes que a elas se referem.A insistência com que o facto se está a assinalar é deveras preocupante e inadmissível.

tes de todas as categorias sociais se aproveitam abusiva-mente das facilidades encontradas na obtenção de uma amostra que substitua a embalagem receitada.Também a Exma. Classe Médica, incomodada por uma legião crescente de doentes, conhecidos e amigos, que transformaram o significado da amostra para ensaio clí-nico num abuso que atinge proporções que se torna ne-cessário refrear, se mostra interessada num movimento colectivo que ponha cobro à liberalidade excessiva de cer-tos laboratórios.

Dois eventos houve, porém, nesta década, através dos quais a indústria do medicamento pôde melhorar a sua imagem pública. O primeiro foi o 2.º Congresso Luso- -Espanhol de Farmácia, que decorreu, em Maio de 1952, na Faculdade de Farmácia do Porto (FFP). A indústria es-teve representada na quarta secção – Farmácia galénica e Indústria Farmacêutica –, tendo-se destacado, entre as comunicações apresentadas, a de Silvina Fontoura de Car-valho, Directora da revista Eco Farmacêutico, com o título «Definição Legal de Especialidade Farmacêutica». Concluiu a autora, após uma significativa revisão bibliográfica, pela seguinte formulação: “Especialidade Farmacêutica é todo o produto de acção medicamentosa, simples ou composto, cuja preparação apresente inovação de ordem científica ou técnica, sem similares até então conhecidos e resultantes do estudo, investigação e trabalho do farmacêutico que o elabore e acondicione em embalagem própria, com nome

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Stand dos Laboratórios da Farmácia Barral na Feira das Indústrias (1957).

Exposição da indústria farmacêutica no II Congresso Luso-Espanhol de Farmácia, vendo-se à direita o painel do GNIEF (1952).

e marca privativos”. No âmbito deste congresso, decorreu, ainda, uma exposição histórico-bibliográfica e da Indústria Farmacêutica, tendo esta última sido realizada no corredor central da FFP, no qual foram dispostos mostruários de di-versos laboratórios da Indústria Farmacêutica portuguesa – tendo participado, entre outros, a Companhia Portugue-sa Higiene, Laboratórios Vitória, Instituto Luso-Fármaco, Laboratório Saúde, Laboratório Únitas, Cortez Pinto & Pi-mentel, Lda., Laboratório Zimaia e a Sociedade Industrial Farmacêutica – e também do GNIEF.

Alguns laboratórios nacionais participaram, cinco anos de-pois, na Feira das Indústrias Portuguesas, realizada, entre 26 de Maio e 16 de Junho de 1957, na Feira Internacional de Lisboa. Estiveram presentes, entre outros, o Instituto Pasteur de Lisboa, os Laboratórios Dávi, os Laboratórios Novil e os Laboratórios da Farmácia Barral.

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Ainda relativamente ao GNIEF, no que concerne à sua vida interna, chegou o mesmo ao final dos anos 50 com 126 associados e com sede própria, localizada no n.º 31 da Rua Camilo Castelo Branco, para onde se mudou em 1956, beneficiando da proximidade geográfica com a CRPQF, esta sediada na Rua Barata Salgueiro. Ao Grémio, foram também atribuídas, contra a sua vontade, compe-tências disciplinares, impostas pelo Decreto n.º 41 204, de 24 de Julho de 1957, o que o obrigou a aplicar sanções a alguns laboratórios que transgrediram o Regulamento do Comércio dos Medicamentos Especializados.

ANOS 1960: DESENVOLVIMENTO, EXPORTAÇÃOE ESBOÇO DE REORGANIZAÇÃO

Os anos 1960 abriram, no que concerne à Indústria Farma-cêutica nacional, com a inauguração, na Vala do Carregado, do complexo fabril da CIPAN – Companhia Industrial Pro-dutora de Antibióticos, ocorrida oficialmente em Outubro de 1965, fruto de um investimento global de cerca de 70 mil contos, muito embora a produção se tivesse já iniciado cerca de um ano antes. Fundada em 1963, na sequência de experiências realizadas numa fábrica-piloto adquirida em 1956, a actividade da CIPAN centrava-se “no fabrico de antibióticos de larga escala bacteriana, nomeadamente a tetraciclina, a oxitetraciclina, a clorotetraciclina, a eri-tromicina e respectivos sais”. Cerca de 30% da produção destinava-se à exportação, a granel, para diversos Países, nomeadamente os EUA – tendo as instalações fabris da CIPAN sido aprovadas pela Food and Drug Administration –, África do Sul, Austrália, Espanha, Holanda, Inglaterra, Turquia e Vietname do Sul. Neste mesmo conjunto indus-trial, integrava-se, também, a futura fábrica dos Laborató-

rios ATRAL, empresa líder de um grupo de expressão inter-nacional presidido por Sebastião Alves, ao qual pertencia a CIPAN. No seu conjunto, as instalações fabris do grupo Atral-Cipan ocupavam uma área coberta de 32 mil metros quadrados, com uma capacidade de produção de cerca de 350 mil contos anuais, contemplando, ainda, um infantário, uma escola, uma cantina com capacidade para mais de 500 pessoas e um bairro habitacional com 150 fogos destinados aos trabalhadores, o qual foi edificado nos anos 70.

Sebastião Alves durante o discurso de inauguração da Cipan (1965).

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Ao nível fabril, merece também destaque a mudança dos Laboratórios Azevedos para as modernas e amplas instala-ções da Portela da Ajuda, ocorrida em 1963, e a sua gra-dual aposta na produção local para conceituadas marcas estrangeiras, nomeadamente a Schering AG e a E. Merck. Igualmente importante foi a inauguração, em 1968, das fábricas da Medicamenta e da Pfizer (Coina) e o arranque do complexo industrial da Hovione, instalado em Loures a partir de 1969, mas que somente em 1970 iniciou as acti-vidades de produção. Já entre as sociedades criadas nes-ta década, destacaram-se o Laboratório Mundial (1960),

a Euro-Labor, a Iberfar (1965), a Crefar (1965), a Seber Portuguesa (1967), a Farmofer (1967) e a Tecnifar (1969), esta última inicialmente ligada ao Instituto Luso-Fármaco e à Medicamenta. Ainda que a braços com algumas debili-dades crónicas, nomeadamente a dificuldade de obtenção de patentes e de matérias-primas novas, a crescente con-corrência estrangeira e a falta de adequação das indústrias subsidiárias às exigências de qualidade, a Indústria Farma-cêutica nacional registou, nos anos 60, uma taxa média anual de expansão de cerca de 13,5%, representando cerca de 1% do Produto Interno Bruto. Uma parte significativa deste contributo para a economia nacional, cerca de 12%, era proveniente da exportação, que aumentou fortemente. Com efeito, nesta década os medicamentos portugueses chegavam já a cerca de 60 Países, podendo identificar-se três grupos bem distintos de mercados-alvo. O primeiro, e mais importante porque com maior volume de vendas, era formado pelo Reino Unido, E.U.A. e Holanda. O segun-do, com menor volume, integrava, entre outros, o Japão, a França, a Alemanha Ocidental e a Grécia. No último grupo encontravam-se Países como o Líbano, o Vietname do Sul, a Suécia, Israel e a Argentina. Também os Países do Ultramar eram muito significativos como mercados de exportação, representando, em 1969, cerca de 12% e tendo registado, a partir de 1967, uma taxa de crescimento de dois dígitos. A actividade exportadora da Indústria Farmacêutica nacio-nal deparava-se, porém, com alguns problemas, nomeada-

Panorâmica do complexo fabril da Atral-Cipan, na Vala do Carregado (anos 1960).

Manuel Ferraz da Costa com funcionárias na inauguração da fábrica da Iberfar (1965).

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John E. Mcken (Presidente da Pfizer Inc.) e comitiva observam a maqueta do complexo industrial e administrativo da Pfizer, por ocasião da cerimónia de lançamento da primeira pedra dos futuros edifícios. (Coina, Janeiro de 1966).

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mente a dificuldade de prospecção de novos mercados, o que se devia à falta de quadros especializados e de fundos para o efeito, a dificuldade em obter seguros de crédito à exportação em condições vantajosas e a existência de um tecido empresarial fragmentado e composto por unidades de reduzida dimensão.

Os anos 1960 ficaram também marcados pela entrada em Portugal dos grandes laboratórios estrangeiros, alguns dos quais tinham estado presentes através de represen-tantes, mas passaram a operar com sucursais próprias criadas para o efeito. Assim sucedeu com a Lilly – que, em 1964, entrou no mercado nacional através da linha de pro-dutos de cosmética Elizabeth Harden –, a Beiersdorf Por-tuguesa, a Boehringer-Ingelheim, Lda. (C. H. Boehringer Sohn, Lda.), a Farmacêutica Knoll Portuguesa, os Labora-tórios Roussel, Lda., a Sterling Farmacêutica Portuguesa, os Laboratórios UpJohn, Co., a Merck Portuguesa, Lda., a Schering Lusitana – representante da Schering AG, tendo, em 1963, lançado no mercado nacional a primeira embala-gem de pílula contraceptiva (Anovlar 21) –, a Inibsa Portu-guesa Químico-Farmacêutica, Lda. e a Gist Brocades (que, em 2005, passou a denominar-se Astellas Farma, Lda.,). Algumas destas empresas, e também as já anteriormente implantadas no País, investiram na investigação científica, como foi o caso da Hoecht, que,em 1968, em parceria com a Sociedade Portuguesa da Cardiologia, instituiu o «Pré-mio Hoechst de Cardiologia».

O facto porventura mais importante da década de sessen-ta foi o estudo da reorganização da Indústria Farmacêuti-ca, iniciado, como vimos, nos anos 1950, mas prejudicado por sucessivos atrasos, pois a comissão nomeada para o efeito pela Portaria n.º 17.147, de 2 de Maio de 1959, teve breve e infrutífera existência e a designada pela Portaria n.º 18.947, de 12 de Janeiro de 1962, não chegou a ser empossada. O processo só arrancou verdadeiramente em

1965, data em que uma Portaria conjunta do Ministério da Economia e do Ministério da Saúde e Assistência, pu-blicada em 30 de Junho, ordenou a constituição de uma nova “comissão para proceder ao estudo da reorganização da indústria de produtos farmacêuticos”. Integravam este organismo, presidido por Rui da Fonseca Garcia Pestana, auditor jurídico junto da Presidência do Conselho, repre-sentantes de cinco entidades: Serviço Técnico do Exercício de Farmácia e Comprovação de Medicamentos, Instituto Nacional de Investigação Industrial, Comissão Reguladora dos Produtos Químicos e Farmacêuticos, laboratórios far-macêuticos dos serviços hospitalares e industriais de es-pecialidades farmacêuticas. Participaram também, como agregados, representantes das farmácias preparadoras de produtos especializados, do Ministério do Ultramar e do Ministério das Corporações e Previdência Social.

O relatório resultante desta comissão foi entregue em 1966 e publicado um ano depois, sistematizando bem as diversas dificuldades, endógenas e exógenas, que se colo-cavam então à Indústria Farmacêutica nacional:

Acentuada dependência do estrangeiro, no que se re-fere a elevada percentagem das matérias-primas que utiliza;Larga dependência de firmas estrangeiras, quanto às patentes necessárias para produção de muitas espe-cialidades;Dispersão da produção por um grande número de uni-dades, com dimensões e condições tecnológicas mui-to diferenciadas e níveis de custo muito diferenciados, mas geralmente bastante elevados;Produções pulverizadas por grande número de fór-mulas, deficientemente racionalizadas, com evidente influência numa elevação e distorção dos respectivos custos;

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Deficiência de equipamento conveniente, pela carên-cia dos investimentos necessários e pela sua não ren-tabilidade em virtude da falta de racionalização das produções e consequente diminuto volume destas;Dificuldade de recrutamento de pessoal técnico nos vários sectores e graus de especialização exigidos, pela falta de técnicos necessários, em número e em qualidade;Insuficiência da actividade de investigação científica, manifesta no que se refere à descoberta de novos pro-dutos, e ainda acentuada, nalguns sectores da produ-ção, quanto ao progresso da tecnologia dos fabricos e seus controlos;Insuficiente garantia da boa qualidade dos medica-mentos, nalguns sectores da produção;Mercado muito heterogéneo e oscilante, com grande dificuldade de fixação de critérios que se adaptem de forma satisfatória às condições da procura;Forte e agressiva concorrência dos importadores de medicamentos estrangeiros, especialmente dirigida

aos consumidores e às zonas do mercado com maior poder de compra;Elevados encargos de propaganda e distribuição, in-dispensáveis na competição com a importação, mas com apreciáveis reflexos nos preços;Dificuldades burocráticas na entrada nas províncias ultramarinas das especialidades farmacêuticas nacio-nais, mercê dos regimes legais naquelas vigentes;Dificuldade de obtenção, nas indústrias nacionais, de materiais de acondicionamento com as característi-cas legais exigidas ou nas condições indispensáveis para o ritmo e processos de produção.

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Capa do relatório da Comissão Reorganizadora da Indústria dos Produtos Farmacêuticos.

Entre as medidas enunciadas para responder a estas difi-culdades contavam-se a concentração (mediante a aposta em processos voluntários, mas impulsionados por apoios estatais às pequenas empresas e pelo estabelecimento de medidas obrigatórias de carácter tecnológico), a conten-ção de nova dispersão da indústria (mantendo-se o regime de condicionamento), a abertura ao capital estrangeiro, o estabelecimento de protocolos de fabrico, o fomento da produção de matérias-primas pelos próprios produtores de medicamentos, o alargamento do âmbito da indústria (concedendo aos laboratórios o exclusivo no fabrico dos cosméticos e permitindo-lhes a produção, também, de ar-tigos de fitofarmácia, de higiene, dietéticos e produtos se-melhantes), a criação de um corpo consultivo para apoio técnico-científico aos Serviços da Propriedade Industrial (agindo na área das patentes), a garantia da efectiva explo-ração das patentes, a necessidade de denunciar o acordo de Madrid (que criou o registo internacional das marcas de fábrica ou de comércio), a normalização das embalagens, a gestão pelos organismos corporativos das aquisições de medicamentos pelos serviços hospitalares e assistenciais,

l)

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tância a defesa da necessidade de regulamentar o diploma que criara a Comissão Técnica dos Novos Medicamentos, a negociação de um novo regulamento do comércio de me-dicamentos especializados, as negociações para a fixação pela CRPQF duma nova fórmula de cálculo do preço dos medicamentos e o incremento das relações com a Reparti-ção da Propriedade Industrial, “para estudo de problemas da maior importância para a indústria”, ou seja, a questão das patentes. O que estava em causa era a reivindicação do Grémio de que as patentes depositadas e não aplicadas pelos laboratórios estrangeiros deviam caducar ao fim de um período a estabelecer ou, em alternativa, obrigar ao fabrico industrial do produto patenteado.

Algumas destas questões arrastaram-se, tal como a re-organização, por toda a década de sessenta, ficando órfãs de resolução, como sucedeu, em particular, com a revisão do acordo com a Caixa de Previdência e com a revisão da fórmula de cálculo do preço dos medicamentos especializa-dos nacionais. Mas se houve um ponto de sistemática frus-tração por parte do GNIEF, foi ele, sem dúvida, o carácter infrutífero dos pareceres que emitiu ao longo desta década, e também na anterior, a propósito dos diferentes pedidos de alvarás para instalação de novos laboratórios no País. Começou, também, a surgir nos relatórios da direcção a questão dos débitos das entidades assistenciais, isto é, dos atrasos nos pagamentos devidos aos laboratórios fornece-dores por parte dos hospitais e das misericórdias.

Não obstante a dificuldade de encontrar uma solução ade-quada para as questões de fundo e para as que decorriam do alargamento dos Sistemas de Saúde e de assistência medicamentosa, a década de sessenta consubstanciou-se num período de expansão para o GNIEF, que viu alarga-da a sua actividade a vários níveis. Desde logo, pelo início da filiação por parte de alguns laboratórios estrangeiros,

e a reorganização como condição, por via da diminuição dos custos de produção, para uma baixa generalizada dos preços dos medicamentos.

Em face de tais medidas, compreende-se a enorme ex-pectativa que o Grémio colocou nesta reorganização, a qual tem de ser equacionada no quadro da profunda re-formulação que este organismo via desenhar-se, nos anos 1960 ao nível da Indústria Farmacêutica internacional, com a tendência para a concentração empresarial e para a criação de grandes conglomerados, o alargamento da área de actividade e da gama de produtos dos laboratórios – ao contrário da especialização que caracterizara o perío-do anterior à Segunda Guerra Mundial –, a protecção dos medicamentos por patentes exclusivas, a aposta dos labo-ratórios multinacionais na presença directa nos diferentes mercados e a eliminação das barreiras alfandegárias pe-los poderes políticos. Toda esta dinâmica tinha contornos entendidos pelo Grémio como desfavoráveis à indústria nacional, os quais eram agravados pela preferência dos portugueses pelos produtos estrangeiros.

Sucede, porém, que a tão ambicionada reorganização nunca veio a ser implementada. Foi neste contexto que o GNIEF se movimentou durante esta década, pugnando, isoladamente, pela resolução de algumas das questões mais impactantes, negativamente, no desenvolvimento da Indústria Farmacêutica nacional. Uma delas foi, desde logo, a renegociação do acordo celebrado em 1961 com os Serviços Médico-Sociais da Federação de Caixas de Previ-dência (FCP), o qual tinha sido considerado pelo Grémio “um passo muito positivo no caminho da normalização do circuito comercial dos medicamentos”, mas evoluiu para a discriminação dos produtos nacionais face aos estrangeiros no que se referia à desigualdade nos descontos realizados nas farmácias a favor da FCP. Assumiram também impor-

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como os Roussel e Pfizer, processo obviamente conecta-do com a aludida proliferação nacional das farmacêuticas multinacionais. Por outro lado, o próprio GNIEF ampliou a sua esfera de influência mediante o ingresso, em 1960, na Pharmaceutical Industries’ Association (PIA), adesão que teve, conforme se infere do Relatório e Contas da Direcção para o ano de 1960, o seguinte contexto:

Como é já do conhecimento de todos os associados, a P.I.A. formou-se, sem que o nosso Grémio tenha sido pre-viamente consultado, apenas nos tendo sido solicitada a nossa adesão quando aquele organismo se encontrava já em funcionamento. A nossa entrada era sem dúvida a úni-ca alternativa válida na presente conjuntura internacional e, por isso mesmo, ela foi decidida por toda a classe sem hesitação. Os trabalhos realizados por aquele organismo são já hoje numerosos e todos eles tendem a procurar arti-cular medidas que levem, no domínio dos medicamentos, à realização prática dos princípios de integração europeia tal como os definiram os respectivos governos.

Iniciaram-se, assim, as relações internacionais do GNIEF, sendo muito importante o contacto com as associações es-trangeiras congéneres, as quais levaram a que, em 1964, o Grémio publicasse e distribuísse, pelos associados e pela autoridades de regulação do sector, as Regras Básicas da Indústria Farmacêutica e um Código de Conduta. O próprio GNIEF procedeu à revisão dos estatutos, os quais foram aprovados em 1968, pondo fim ao longo período de vigên-cia dos homologados originalmente em 1939.

A partir de 1964, o GNIEF começou, também, a desen-volver, pelo menos de forma mais visível, relações institu-cionais com diversas entidades ligadas ao sector da Saú-de, tendo estabelecido protocolos de colaboração com a Ordem dos Médicos e com o Sindicato Nacional dos Far-macêuticos. Iniciou, ainda, uma política de patrocínios a actividades científicas, tendo apoiado as jornadas far-macêuticas, projectos de investigação – sobretudo os re- Faça Segundo a Arte (1965).

alizados pelos laboratórios de Indústria Farmacêutica da Faculdade de Farmácia do Porto e pelos laboratórios de química farmacêutica da Escola de Farmácia da Universi-dade de Coimbra – e, ainda, a deslocação ao estrangeiro de finalistas do Centro Universitário da Escola de Farmácia de Lisboa. A nível internacional, destacou-se o patrocínio concedido, em conjunto com o Ministério da Saúde, para o apetrechamento mobiliário e sonoro de uma sala de reuni-ões da Organização Mundial de Saúde, em Genebra, espa-ço baptizado “Sala de Portugal”, no qual foi colocado uma placa com os dizeres “Oferecida pela Indústria Farmacêu-tica Portuguesa”. No quadro das já antigas actividades de propaganda, a direcção do GNIEF entendeu que era ne-cessário “levar ao público a confiança que é justo ter nos produtos farmacêuticos nacionais”. Para tal, patrocinou, em 1964, o documentário Faça Segundo a Arte, realizado por Manuel Guilherme Faria de Almeida (n. 1934), com a participação de Alfredo Tropa, filme que estreou no cinema em 1965.

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Procurando responder à aludida falta de mão-de-obra qua-lificada para a Indústria Farmacêutica, a acção do Grémio estendeu-se igualmente à formação. Foi nesse âmbito que, em 1967, disponibilizou a sua nova sede – inaugurada, nes-te mesmo ano, no n.º 95, da Avenida Duque de Ávila – para o primeiro curso da Escola de Preparação de Delegados de Propaganda Médica, cujo sindicato fora criado em meados da década. Dois anos depois, e com o apoio do GNIEF, ini-ciou-se na Faculdade de Farmácia da Universidade de Coim-bra o primeiro curso livre aplicado à farmácia industrial, cujo modelo foi baseado em curso idêntico ministrado no Instituto de Farmácia Industrial, integrado na Faculdade de Farmácia de Montepellier. Refira-se que, mediante o Decre-to-Lei n.º 48 696, as Escolas de Farmácia tinham, em 1968, sido transformadas, novamente, em Faculdades.

Neste mesmo ano de 1968, concretizou-se aquela que foi a maior realização do GNIEF nesta década, o I Congresso Nacional da Indústria Farmacêutica, que decorreu, de 19 a 23 de Junho, na Feira das Indústrias de Lisboa (FIL), com a participação de industriais, técnicos, professores e dirigentes de serviços públicos e privados de Saúde. Este evento começou a ser preparado em 1965, ano de nomea-ção da referida nova comissão para o estudo da reorganiza-ção da Indústria Farmacêutica nacional, tendo a direcção do Grémio vislumbrado “a oportunidade e necessidade da

realização de uma reunião magna da indústria onde todos os seus problemas de fundo, específicos ou mais gerais, fossem avivados e debatidos”. A alocução de abertura de Sebastião Alves, deputado, presidente do Congresso e do Grupo Atral-Cipan, ilustrou bem que os objectivos políticos não eram alheios a este congresso:

Cópia do documentário Faça Segundo a Arte(Cinemateca Nacional).

Quando ao Governo pareceram essenciais certas produções básicas, como electricidade, os adubos e o aço, cuidaram os seus órgãos, e bem, de estabelecer normas, facilitar li-cenças, ceder meios e erguer defesas para as respectivas actividades nascentes.Com a indústria farmacêutica, ao invés, ainda há bem pou-co tempo parecia até contestar-lhe o mérito de existir! Ele eram organismos de assistência que pareciam – e às vezes ainda parecem – apostados em preferir o que é estrangei-ro, ele são os consumidores a mostrarem frequentemente a mesma estranha e hoje sempre injusta preferência, ele são tribunais e certos técnicos a hesitarem perante evidên-cias legais bem gritantes, ele são repartições públicas a aceitarem pedidos de patentes que, na maioria dos casos, não correspondem a coisa nenhuma, ele eram e são os Serviços Médico-Sociais da Federação das Caixas de Previ-dência que pareciam e parecem actuar fora das fronteiras, por tão alheados da produção portuguesa, ele é um mundo de coisas e factos que se discutem e se descrêem, digo-o com profunda amargura e digo-o porque são coisas e fac-tos portugueses!Pois há-de ser nestes pontos que havemos de ser firmes no reclamar e decididos no prosseguir.

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No âmbito do congresso, foram, aliás, aprovados 14 votos para a Indústria Farmacêutica nacional, os quais permitem perceber qual a posição do sector nesta década:

1. Que o poder público estude e ponha em vigor medidas adequadas para impulsionar a investigação científica nas empresas da Indústria Farmacêutica, designadamente atra-vés de isenções fiscais, autorizações de desvalorização rápi-da e financiamento directo de projectos de investigação;

2. Que se promova o estudo e execução de projectos con-certados de investigação científica e tecnológica em que participem as Universidades, os laboratórios do sector pú-blico e as empresas da Indústria Farmacêutica nacional e nacionalizada;

3. Que no sector da investigação fundamental, necessaria-mente consignada às instituições do ensino superior devido às condições e recursos do País, sejam particularmente fo-mentadas as actividades que se mostrarem mais pertinen-tes à expansão e progresso da Indústria Farmacêutica;

4. Que seja dada urgentemente ao ensino da farmácia uma estrutura adequada à formação de pessoal universitá-rio, devidamente habilitado a integrar-se nas necessidades actuais da indústria;

5. Que se considere e promova a preparação de quadros de pessoal técnico auxiliar e de promoção de vendas, atra-vés de cursos apropriados e de nível conveniente;

6. Que seja ponderada pelo poder público a manifesta inconveniência de qualquer acordo internacional que con-duza à alteração do actual regime de registo de patentes, devido aos graves prejuízos que resultariam dessa altera-ção para a indústria nacional de produtos farmacêuticos;

7. Que seja chamada a atenção da Administração para as vantagens que adviriam da substituição do sistema de licença obrigatória definido no art.º 30.º do Código da Pro-priedade Industrial pelo sistema de caducidade das paten- Capa do programa do I Congresso Nacional da Indústria Farmacêutica (1968).

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tes não efectivamente exploradas no País, isto é, que não sejam objecto de fabricação do produto patenteado;

8. Que seja criado um corpo consultivo para apoio técni-co-científico dos Serviços da Propriedade Industrial no que se refere a patentes da indústria química ou, não se con-siderando viável esse propósito, que seja imediatamente constituída para aquele fim uma comissão especializada, com representação universitária e corporativa;

9. Que seja dada preferência à indústria nacional nas aquisições de medicamentos pelos serviços do Estado, da Assistência Pública e da Previdência Social;

10. Que seja urgentemente revisto o acordo da Indústria Farmacêutica com os Serviços Médico-Sociais da Federa-ção das Caixas de Previdência;

11. Que a Comissão Reguladora dos Produtos Químicos e Farmacêuticos tenha em atenção, ao fixar os preços de ven-da ao público, a necessidade de estimular a investigação científica e tecnológica na indústria, estabelecendo para esse efeito uma verba apropriada e variável em função dos

Stand do Grémio no I Congresso Nacional da Indústria Farmacêutica (1968).

encargos suportados pelas empresas com essa actividade nos casos em que ela seja efectivamente exercida;

12. Que o esforço exportador da indústria de produtos farmacêuticos seja eficaz e positivamente apoiado pelo sec-tor público, designadamente no que respeita a estudos de mercado, crédito e ajudas de comercialização;

13. Que seja considerada pelos serviços oficiais compe-tentes a simplificação dos condicionalismos burocráticos que dificultam e oneram as actividades da indústria, e que seja suprimida a aposição obrigatória do selo fiscal nas embalagens;

14. Que seja chamada a atenção do poder público para a necessidade de se adoptarem, com urgência, as providên-cias necessárias a um «controlo» analítico global de toda a produção farmacêutica.

Política à parte, o congresso acolheu diversas palestras sobre temas como investigação e desenvolvimento e forma-ção de pessoal. Paralelamente, organizou-se uma exposi-ção – na qual participaram, com stands próprios, algumas

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empresas do sector e a própria Apifarma – e procedeu-se à exibição de filmes e documentários sobre a Indústria Far-macêutica e sobre diversos temas na área da Educação para a Saúde.

ANOS 1970: DO GRÉMIO À APIFARMA E AO SERVIÇO NACIONAL DE SAÚDE

As mudanças políticas introduzidas em Portugal pela revo-lução de 25 de Abril de 1974 e fixadas pela Constituição de 1976 tiveram um impacto determinante nas políticas de Saúde Pública e na própria Indústria Farmacêutica.

Um dos primeiros sinais de mudança de regime, com o fim do Estado corporativo, foi a substituição do antigo Gré-mio Nacional dos Industriais de Especialidades Farmacêu-ticas pela Associação Portuguesa da Indústria Farmacêuti-ca, criada ao abrigo do Decreto-Lei n.º 315-C/75, de 30 de Abril de 1975. A primeira Direcção, eleita em 2 de Outubro do mesmo ano, foi dirigida por José Luís Costa Ribeiro Go-mes (Laquifa), integrando o secretário Luís João da Mata Caldeira Pires (Instituto Pasteur de Lisboa – Virgínio Leitão Vieira dos Santos & Filhos), o tesoureiro Luís Filipe Castela (Zimaia) e os vogais Ulrich Eberhard Althoff (Centrofarma), Pedro Ferraz da Costa (Farmácia Internacional), João Bap-tista d’Almeida (J. A. Baptista de Almeida), Luís Filipe Va-ladas Preto Martins (Abbott Portuguesa), António Almeida Igreja Ramos (Roussel) e Luís Manuel Mexia Chaves Costa (Medicamenta). Através desta e das seguintes direcções, a actuação da Apifarma abrangeu ao longo da década, seis grandes eixos: a revisão dos preços dos medicamentos; o acompanhamento da situação económica e financeira das empresas do sector farmactêutico, a qual, como veremos adiante, foi uma questão preocupante; o posicionamento da Indústria Farmacêutica no novo enquadramento político

do País, o que foi realizado em articulação com o Minis-tério dos Assuntos Sociais e o Ministério da Indústria e Tecnologia; as relações internacionais, com a manutenção na EFPIA – European Federation of Pharmaceutical Indus-tries and Associations (anterior PIA), a adesão à IFPMA – International Federation of Pharmaceutical Manufacturers

Primeiro logótipo e símbolo da Apifarma.

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& Associations, e a participação nas reuniões da Associa-ção Europeia das Especialidades do Grande Público e da Federação Mundial dos Produtores de Medicamentos do Grande Público; a contratação colectiva, tendo a Apifarma participado na negociação do Contrato Colectivo de Traba-lho Vertical; e a prestação de informação e de formação aos associados.

As entidades de gestão, promoção e regulação da Saú-de passaram, também, nos anos 1970, por um profundo processo de mudança. Em Setembro de 1971, a reorgani-zação dos serviços do Ministério da Saúde e Assistência, mediante o Decreto-Lei n.º 413/71, levou à criação do Ins-tituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge, que substituiu o anterior Instituto Superior de Higiene Dr. Ricardo Jorge. A este novo organismo foi confiada a comprovação de me-dicamentos, ali passando a funcionar, também, a antiga CTNM. A reorganização em causa não alterou, todavia, a tutela dos medicamentos e da actividade farmacêutica, que se manteve na Direção-Geral de Saúde, através da Di-recção de Serviços de Farmácia e Medicamentos, ficando a fixação dos preços cargo da Direçcão-Geral do Comércio Não-Alimentar, organismo do Ministério do Comércio. Dois anos depois, em 1973, foi criado o Ministério da Saúde, que se autonomizou face à Assistência, através do Decreto--Lei n.º 584/73, de 6 de Novembro. A instauração do re-gime democrático levou à transformação deste organismo na Secretaria de Estado da Saúde, que ficou integrada, até 1983, no Ministério dos Assuntos Sociais. Foi neste enqua-dramento político e institucional que se deu a criação do Serviço Nacional de Saúde (SNS), estabelecido pela Lei n.º 56/79, de 15 de Setembro, e no âmbito do artigo 64.º da nova Constituição, o qual consagrava o direito universal à Saúde. O SNS teve como consequência o alargamento sem precedentes do mercado do medicamento.

Sede da Ciba, em Lisboa (anos 1960).

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Ao nível da Indústria Farmacêutica, acentuou-se, nes-ta década, o investimento estrangeiro, o qual foi expres-so pelo estabelecimento de contratos de produção com produtores nacionais e, sobretudo, pelo fabrico local em unidades próprias, de que foram exemplo as instalações industriais da Bayer, inauguradas, em 1972, em S. Mar-tinho do Bispo, e as unidades fabris edificadas em Mem Martins pela Hoechst (1971), pela Essex/Soprol/Schering USA (1974), vocacionada para a produção de corticoeste-róides, e pela Schering Lusitana. Este fenómeno foi a ex-pressão do processo de representação directa em Portugal dos grandes laboratórios multinacionais, o qual continuou ao longo dos anos setenta, tendo-se estabelecido, entre ou-tras empresas, a Merck, Sharp & Dohme, Lda., a Wellcome de Portugal, Lda., a Ciba-Geigy Portuguesa, Lda., a Wyeth Laboratórios (cujos produtos eram fabricados em Portugal pelo Instituto Pasteur de Lisboa), a Beecham Portuguesa – Produtos Farmacêuticos e Químicos, Lda., a Glaxo Farma-cêutica, Lda, a Johnson & Johnson, Lda., a Roche Farma-cêutica Química, Lda., a Squibb Farmacêutica Portuguesa,

Lda., a Smith Kline & French Portuguesa e a Sidefarma.De iniciativa nacional, foram criadas, entre outras em-

presas farmacêuticas, a Medinfar (1970), a Centrofarma (1970), a Gestafarma (1971), a Vetlima (1972), a Cosmo-farma (1976) e a Sofex Farmacêutica (1977).

A Indústria Farmacêutica não teve, porém, existência fácil no Portugal dos anos 1970. Desde logo, porque as mudanças de Abril de 1974 e a agudização, em 1975, do clima político e social levaram não só à ocupação de instalações, de que foi exemplo a ocorrida, neste último ano, nos Laboratórios Novil, como, de acordo com Ferraz da Costa, conduziram, também, o governo presidido por Vasco Gonçalves a ponderar a nacionalização da Indústria Farmacêutica: “Recordo, aliás, um convite para almoçar do Tenente Rosário Dias, Chefe de Gabinete do Primeiro-Mi-nistro, para que eu lhe fornecesse argumentos para justifi-car politicamente a não-nacionalização do sector na onda de nacionalizações que se seguiram ao 11 de Março desse ano [1975]”. O contexto revolucionário afectou, também, as empresas de capital estrangeiro, como a Hovione, que

Maqueta das instalações da Hoechst Portuguesa, em Mem Martins, vendo-se à esquerda a fábrica para os produtos farmacêuticos (anos 1970).

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Fábrica da Schering Lusitana, em Mem Martins.

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se debateu com a inoperância de certos organismos esta-tais, tal como relatado no livro do seu 50.º aniversário:

Economicamente, a década apresentou desafios de con-texto enormes, sendo marcada por altos índices de inflac-ção, pela limitação do crédito bancário e pela intervenção do Fundo Monetário Internacional, em 1977, a qual condu-ziu à desvalorização do Escudo e ao consequente aumento exponencial do custo das matérias-primas importadas pela indústria, já de si difíceis de obter devido aos entraves bu-rocráticos à obtenção das necessárias licenças de impor-tação. Agravou esta situação a continuidade dos atrasos registados no pagamento aos laboratórios por parte dos organismos estatais e para-estatais do sector da Saúde, a falta de liquidez dos clientes privados e o aumento, pelos Serviços Médico-Sociais da Previdência, da taxa de imposto

Os maiores problemas foram, porventura, criados pelos organismos governamentais, mais até do que pela atmos-fera revolucionária. Nunca houve um risco real de nacio-nalização porque a firma era pequena e o seu negócio in-compreensível para a maioria do povo. 50% do capital era de origem estrangeira, as patentes eram, na época, ainda detidas individualmente e os trabalhadores eram bem tra-tados e não tinham queixas.No entanto, a Hovione era um grande exportador e também um importador de matérias-primas e equipamentos. Todas as formalidades de import/export e de controlo cambial se tornaram muito pesadas e demoradas, envolvendo infinitas justificações, formulários e selos. Além disso, a burocracia estava constantemente a mudar, as leis eram concebidas mas ficavam por implementar, nada era fácil.

de selo sobre o preço de venda ao público das especialida-des farmacêuticas, a qual passou, em 1978, de 0,5% para 5%. Nem tudo correu, porém, mal. Se a descolonização comprometeu, por um lado, os mercados de exportação de língua portuguesa, ampliou, por outro, o mercado nacional, tal como descreveu a administração dos Laboratórios Vitó-ria no relatório de actividades referente ao ano de 1976: “o mercado interno apresentou durante o ano findo um cres-cimento muito elevado, devido essencialmente ao aumento da população pelo regresso das populações do ex-ultramar português, que se traduziu num alargamento do mercado, permitindo uma evolução muito satisfatória do nosso vo-lume de vendas”. A indústria considerou também positivo o facto de, em 1977, ter sido concedido, pela Direcção- -Geral do Comércio Não-Alimentar, o tão ambicionado au-mento dos preços de venda ao público dos medicamentos. Ainda no âmbito industrial, na segunda metade dos anos 1970, foi criado o Grupo de Farmacêuticos de Indústria (GRUFIS), cuja primeira reunião decorreu em 1977 e que veio a dar origem ao Conselho do Colégio de Especialidade de Indústria Farmacêutica da Ordem dos Farmacêuticos. Foi no âmbito do GRUFIS que se realizou, em Junho de 1978, no anfiteatro da Feira Internacional de Lisboa, um simpósio sobre «Tratamento e Controlo de Água na Indús-tria Farmacêutica», no qual participaram representantes dos laboratórios Sanitas (Arminda Pereira), do Laboratório Normal (Ascensão Ceia), da Iberfar (Céu Seabra e Elisa-beth Franco), da Hoechst Portuguesa (Guerreiro Gomes e

Instalações da Medinfar (anos 1990).

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Teresa Azevedo), da Schering Alemã (Martinho Cabeça), da Wyeth-Pasteur (Orlando Silva) e do Laboratório Imunológi-co de Lisboa (Queiroz da Fonseca).

Foram também dados passos importantes no domínio da distribuição farmacêutica, que era, até esta década, ainda bastante rudimentar e limitada, sendo assegurada,

Medicamentos da Atral-Cipan (anos 1970).

Aspecto do simpósio do GRUFIS, realizado, em 1978 , no anfiteatro da FIL.

entre outras, pela União dos Farmacêuticos de Portugal, fundada nos anos 1930, e pela COFANOR – Cooperativa dos Farmacêuticos do Norte, CRL., estabelecida em 1967. Com efeito, em Agosto de 1973, foi fundada a Codifar – Cooperativa Distribuidora Farmacêutica, S.C.R.L. Dois anos depois, em 1975, iniciou actividade a Cooprofar Far-mácia. Nas décadas seguintes, surgiram novas empresas, nomeadamente as internacionais, de que se destaca a Alliance Healthcare, resultante da parceria entre o Grupo Alliance Boots, a Associação Nacional das Farmácias e a José de Mello Participações II, SGPS.

ANOS 1980: NOVAS OPORTUNIDADES E NOVOSDESAFIOS EM CONTEXTO EUROPEU

A Indústria Farmacêutica instalada em Portugal conheceu, nos anos 1980, um novo conjunto de oportunidades e de-safios. Desde logo, o desenvolvimento do Serviço Nacional de Saúde (SNS), ao qual foi concedida autonomia admi-nistrativa e financeira. Assim, foram criadas, em 1982, as Administrações Regionais de Cuidados de Saúde (ARS), que sucederam às Administrações Distritais dos Serviços

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de Saúde – desenvolvidas, sem sucesso, a partir de 1975 –, e em 1983, foi aprovado, pelo Despacho Normativo n.º 97/83, de 22 de Abril, o regulamento dos Centros de Saú-de, dando lugar aos chamados Centros de Saúde de segun-da geração. Neste mesmo ano, mediante o Decreto-Lei n.º 344-A/83, de 25 de Julho, que aprovou a Lei Orgânica do IX Governo Constitucional, foi criado, novamente, o Minis-tério da Saúde. Finalmente, em 1984, deu-se a criação da Direcção-Geral dos Cuidados de Saúde Primários, através do Decreto-Lei n.º 74-C/84, de 2 de Março, a qual mar-cou o fim dos Serviços Médico-Sociais da Previdência e a expansão do SNS. O ano de 1984 foi, aliás, importante para a Indústria Farmacêutica já que testemunhou a cria-ção da Direcção-Geral de Assuntos Farmacêuticos (DGAF), organismo que assumiu a tutela da Comissão Técnica de Novos Medicamentos e recebeu as atribuições da CRPQF, que foi formalmente extinta em 1988, na sequência do Decreto-Lei n.º 466/88, de 15 de Dezembro. Antes disso, em 1982, fora publicada a Lista de Produtos Comparti-cipáveis, estabelecido o regime da codificação dos medi-camentos e autonomizadas, legalmente, as especialidades farmacêuticas de venda livre.

Constituiu, também, um desafio à Indústria Farmacêuti-ca a adesão de Portugal à Comunidade Económica Euro-peia (CEE), iniciada em 1977, mas formalizada somente em 1985. O novo paradigma emergente foi bem retratado por Luís Chaves Costa, à época Presidente da Apifarma, que, em editorial do boletim Informação CEE, publicado em Junho de 1986 pela Associação, afirmou:

O desafio que se nos coloca é duplo: por um lado, temos de vencer rapidamente o atraso que nos separa dos nossos parceiros europeus; por outro, em plena terceira revolução industrial, a própria CEE se encontra numa fase crucial da sua política de desenvolvimento, já que corre o risco de

De forma a informar os seus associados sobre este proces-so, a Apifarma não só desempenhou um importante papel na interpretação e debate das primeiras directivas da CEE transpostas para a legislação nacional no sector das es-pecialidades farmacêuticas, como promoveu, em 1985 e 1986, dois seminários subordinados ao tema “A Indústria Farmacêutica portuguesa e a CEE”, nos quais participa-ram especialistas nacionais e estrangeiros. Do primeiro, evento resultaram quatro grandes conclusões e linhas de força a este respeito:

1.º – Torna-se indispensável que o Governo defina, urgente-mente, uma correcta política industrial para o sector. […];2.º – Torna-se fundamental, igualmente, que o Governo de-senvolva uma política de Saúde transparente e sem ambi-guidades, designadamente ao nível orçamental e no enqua-dramento do medicamento nessa política. […]; 3.º – A indústria farmacêutica portuguesa, por razões de natureza de política económica, é um sector ainda bastan-

perder competitividade em face dos colossos Estados Uni-dos e Japão. […].O desenvolvimento da economia assentará, no futuro, em modelos diferentes dos que caracterizaram a expansão da década de 60. Estamos mergulhados no que já se classi-fica de sociedade da informação – ficando para trás a so-ciedade da indústria – que obriga os agentes económicos, principalmente dirigentes e empresários, a actuações ino-vadoras e lúcidas. A informação, hoje, transformou-se num importante valor económico na nova sociedade.Acresce dizer que a indústria farmacêutica portuguesa tem vindo, nos últimos anos, por motivos conhecidos, a ser afectada por uma forte e incorrecta, às vezes, inter-venção estatal. Daí que, para além de ter de enfrentar os factores de crise comuns à economia, luta, também, com problemas específicos que lhe são postos pela adesão ao Mercado Comum. Que Direito comunitário aplicar? Que condições para concorrer com as indústrias farmacêuti-cas mais desenvolvidas dos seus parceiros? Que políticas a realizar pelo Governo para que ela possa competir em pé de igualdade e desenvolver-se? Que regime de patentes?

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Somavam-se a estas questões a unificação das patentes, a introdução do IVA e da Tarifa Aduaneira Comum e, de forma mais abrangente, a necessidade de reformar o qua-dro legislativo português, imposta pela transcrição para o Direito nacional de regras e normas comunitárias, noma-damente ao nível do sector do medicamento. Intrinseca-mente, a Indústria Farmacêutica debatia-se, no início dos anos 1980, com dois grandes problemas: o preço dos me-dicamentos e o imposto de selo sobre especialidades far-macêuticas. Estas questões foram abordadas, em Outubro de 1980, pelo jornalista Fernando Ulrich, que as enqua-drou no jornal Expresso sob o título “O controverso exemplo dos produtos farmacêuticos”. O problema dos preços, que transitou da década anterior, tinha a ver com a fórmula uti-lizada para a sua formação – considerando a Apifarma que o método da Direcção-Geral do Comércio Não-Alimentar (DGCNA), ao partir dos custos do ano anterior, ignorava a inflacção e a desvalorização do Escudo – e, também, com os atrasos registados no processo de fixação e revisão dos

Capa do boletim Informação CEE, publicado, em Junho de 1986, pela Apifarma.

te dependente do exterior, no plano científico e tecnológico. Cabe ao Governo elaborar políticas que fomentem uma mais frutuosa ligação escola/indústria e permitam às empresas e ao sector modernizarem-se, para no futuro poderem concor-rer com êxito num mercado alargado como o da CEE. […]; 4.º A adesão à CEE, com a supressão das barreiras aduanei-ras e a livre circulação de mercadorias e capitais, cria um novo quadro ao comércio do medicamento.

Seminário promovido pela Apifarma a propósito da Adesão de Portugal à CEE.

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A esta problemática, que foi tratada, a partir de 1984, por quatro grupos de trabalho criados no âmbito da Api-farma (Assuntos Económicos, Política Industrial, Politica do Medicamento e Integração na CEE), somaram-se duas outras dificuldades de contexto. Por um lado, a adopção pelo Ministério dos Assuntos Sociais de medidas que vi-saram a redução do consumo de medicamentos. Por ou-tro lado, o agravamento da situação económica do País,

Esta questão marcou, aliás, os primeiros anos da déca-da, tendo levado a Apifarma a criar, em 1984, um gru-po de trabalho dedicado às relações públicas, o qual se encarregou do posicionamento e da imagem da Indústria Farmacêutica e da própria Associação, agindo junto dos órgãos de comunicação social, da Administração Pública

Na primeira metade do ano a Associação não foi ouvida nem atendida pelos órgãos do poder que exerciam a tutela sobre o Sector. Não foi ouvida na metodologia dos preços; não foi ouvida no estudo do redimensionamento das emba-lagens; não foi ouvida sempre que solicitou à Tutela uma política correcta e estável para o Sector. Por outro lado, apesar de parceiros indispensáveis na construção do sis-tema de saúde do País, os seus legítimos interesses têm vindo a ser, dum modo geral, ignorados.

que culminou, em 1983, com a segunda intervenção do FMI em Portugal. Sectorialmente, tiveram impacto muito negativo os crónicos atrasos no pagamento dos serviços públicos aos fornecedores de medicamentos, o que criou dificuldades acrescidas às empresas, que não só se encon-travam descapitalizadas, em função da conjuntura adver-sa, e impedidas de recorrer a um inexistente mercado de capitais, como dificilmente conseguiam atrair novos inves-tidores, dado que os títulos do Estado e os depósitos a pra-zo proporcionavam taxas de juro anuais na ordem dos dois dígitos. Este difícil contexto explicou que empresas como a Sociedade Industrial Farmacêutica tenham apresentado, pela primeira vez, resultados negativos.

Nos anos 1980, a Indústria Farmacêutica foi, também, afectada por uma incompreensão sem precedentes por parte do poder político, significativamente indiferente às suas reivindicações e posições, tal como a Direcção da Api-farma deixou expresso, por exemplo, no seu Relatório e Contas de 1986:

Não foi ainda em 1980 que se concretizaram as esperadas e desde há muito reclamadas correcções das anomalias já referidas em anteriores Relatórios, designadamente [a] abolição da taxa do imposto de selo de 5% sobre especiali-dades farmacêuticas que por imposição arbitrária não nos é consentido reflectir nos preços de custo.[…] Em face porém da rápida evolução dos custos todos os dias agravados das matérias-primas, energia, e encargos de toda a ordem, impõe-se que seja revista e melhorada a metodologia utilizada pela Direcção Geral do Comércio Não Alimentar por forma a que os processos de revisão de preços sejam apreciados não só de forma mais célere, mas também com mais realismo. De contrário a indústria farmacêutica nacional continuará a definhar, enquanto se favorece a expansão dos grandes consórcios mundiais do sector. Não é assim certamente que os poderes públicos apoiarão a reestruturação da indústria nacional por forma a que a adesão de Portugal à C.E.E. se processe sem gran-des perturbações na vida das Empresas.

mesmos, o que causava prejuízos ao sector. Não satisfa-ziam também a Apifarma os 5% de imposto de selo apli-cado aos medicamentos e, ainda menos, os critérios de isenção definidos em Janeiro de 1981, ano em que o refe-rido imposto foi extinto, sendo substituído por uma taxa de 1%. A posição da Associação espelhava, naturalmente, a das empresas do sector, entre as quais se encontrava a So-ciedade Industrial Farmacêutica (Laboratórios Azevedos), que, no seu Relatório e Contas referente a 1980, deu nota da imperiosa necessidade de sanar estas questões:

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das, nesta década, as primeiras campanhas de sensibili-zação para a Saúde e para a Segurança na utilização dos medicamentos, tendo a primeira decorrido em 1981, com a impressão de um poster subordinado ao tema “Não deixe os medicamentos ao alcance das crianças”. Um ano antes, arrancara o boletim da Apifarma, projecto que remontava a 1978, mas que só em 1980 se concretizou, graças à iniciativa do seu Gabinete de Imprensa, que se responsabi-lizou pela edição mensal do Informativo Apifarma.

1.º Seminário da Apifarma para Industriais e Importadores Associados.

e da Assembleia da República. Neste contexto, realizou-se, em Julho de 1986, um seminário para industriais e impor-tadores associados, o primeiro de dois eventos promovidos pela Apifarma com o objectivo de “expressar publicamente a valia intrínseca da indústria e os critérios éticos em que a mesma se move”, tendo, sob a temática da contribuição para uma política do medicamento em Portugal, sido deba-tidos diversos temas, nomeadamente o dimensionamento das embalagens dos medicamentos, a influência dos servi-ços nacionais de Saúde estatais nos medicamentos e nos cuidados médicos em geral e, ainda, as perspectivas para o sector farmacêutico em Portugal. Dois anos depois, em 1988, decorreu, também por iniciativa da Associação, uma importante campanha de imagem do sector farmacêutico, iniciativa suportada por 62 empresas do sector, que com-participaram com cerca de 80 mil contos. A Apifarma terá sido, aliás, pioneira neste domínio, ao realizar, enquanto associação sectorial, a primeira campanha nacional de de-fesa e promoção da imagem de um sector de actividade económica. Ao nível do público em geral, foram promovi-

Primeira campanha públicade sensibilização promovidapela Apifarma (1981).

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Apesar do amplo investimento efectuado na comunicação com diferentes stakeholders, a Apifarma viu-se confrontada, no final dos anos 1980 com duas decisões importantes por parte do poder político que escaparam substancialmente à sua intervenção. A primeira delas remonta a 1988, ano em que, não obstante os contactos da Associação com os quatro ministros responsáveis pela Portaria 973/88, de 31 de Dezembro, foi decidido o congelamento, por nove me-ses, do preço dos medicamentos de venda ao público com preço superior a 250 escudos. Seguiu-se a divulgação do projecto de Decreto-Lei dos medicamentos genéricos, em 1989, facto que levou a uma “tomada de posição pública de inequívoca rejeição e denúncia de alguns aspectos contidos na redacção do projecto”, conforme a Apifarma comunicou no Relatório e Contas relativo a esse mesmo ano:

Sucederam-se as 4 Cartas-Abertas à Sra. Ministra da Saú-de, às quais foi dada a mais ampla divulgação, foram con-cedidas entrevistas em diversos meios de comunicação so-cial e houve até um debate na Radiotelevisão em que nos defrontámos com a posição da A.N.F. Isto, obviamente, a par dos diversos documentos críticos enviados à Adminis-tração Pública.

Ao nível interno, os anos 1980 marcaram o alargamento do âmbito da Apifarma às empresas ligadas às activida-des de importação, de medicamentos de venda livre, de produtos auxiliares de diagnóstico, de substâncias activas e do sector da veterinária, o que levou ao aumento do nú-mero de associados, que, em 1986, passou de 82 para 100, atingindo os 111 membros no final da década. A ex-pansão atingiu também as relações internacionais, tendo a Apifarma aderido, em 1989, à FEDESA – Fédération Euro-péenne de la Santé Animal e sido eleita, pela primeira vez, para os órgãos directivos da EFPIA e da IFPMA. Remontam também aos anos 80 os primeiros códigos deontológicos

da Apifarma. Assim, o Código Deontológico de Promoção de Medicamentos foi adoptado em 1987, e o Código de Práticas de Comercialização de Medicamentos foi apresentado publi-camente em Janeiro de 1988. Toda esta nova dinâmica foi, simultaneamente, causa e consequência da reestruturação da Apifarma, processo que teve como expressão mais visí-vel a admissão de uma Directora Executiva.

Quanto à actividade industrial e comercial, a década de oitenta foi berço, entre outras empresas farmacêuticas, da Tecnimede (criada em 1980 por Jorge Ruas da Silva), da Labialfarma (1981) e da Lecifarma (1985), esta últi-ma apostada no desenvolvimento galénico de produtos, de produtos farmacêuticos, de suplementos alimentares, de cosméticos e de produtos de cuidado corporal, produzindo exclusivamente para terceiros. Os Laboratórios Azevedos,

Capa do primeiro Código Deontológicoda Apifarma (1987).

129Sede do Grupo Tecnimede.

por seu turno, instalaram, nesta década, um novo bloco de antibióticos, “projecto pioneiro em Portugal, utilizando tecnologias de ponta”. Desenvolveu-se, também, a JABA, que construiu uma unidade industrial em Sintra (Abrunhei-ra) para o fabrico de sólidos e de injectáveis, de cremes, de líquidos e de supositórios. Quanto ao investimento estran-geiro, destacou-se a Hikma Farmacêutica (Portugal), S.A., criada em 1989 como subsidiária portuguesa de um grupo farmacêutico multinacional baseado na Jordânia. Foi tam-bém nos anos 80 que se instalaram em Portugal as so-ciedades Angelini, BioMérieux Portugal - Aparelhos e Rea- gentes de Laboratório, Lda., Bristol-Myers Squibb, Calier Portugal, Izasa Portugal – Distribuições Técnicas, Lda., e Novo Nordisk Comércio de Produtos Farmacêuticos, Lda., Ferring Portuguesa, Quimedical, Daiichi Sankyo Portugal e UCB Pharma.

ANOS 1990: SOB AS DIRECTIVAS COMUNITÁRIASE UMA NOVA REGULAÇÃO

Os anos 1990 foram extraordinariamente importantes no do-mínio da Saúde, particularmente no sector do medicamento. Com efeito, na esteira da adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia, e face à necessidade de transpor directi-vas comunitárias para o Direito interno do País, produziram-se não só diversos diplomas legais determinantes – nomeada-mente a Lei de Bases da Saúde (1990), o Estatuto do Ser-viço Nacional de Saúde (1993) e, muito particularmente, o primeiro Estatuto do Medicamento (Decreto-Lei n.º 72/91) e o que criou o Sistema Nacional de Farmacovigilância (Despacho Normativo n.º 107/92) –, como surgiu, igualmente, a necessi-dade de se organizar um sistema de garantia da qualidade e da segurança do medicamento, tendo por base uma institui-ção eficaz e credível em três frentes bem diferenciadas: profis-sionais de Saúde, consumidores e Indústria Farmacêutica.

Foi neste contexto, e quando se davam passos determinantes no sistema europeu de avaliação e supervisão do medicamen-to – nomeadamente com a criação, no início dos anos 1990, da Agência Europeia do Medicamento, arquitectada em Lis-boa –, que, em Janeiro de 1993, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 10/93, emergiu o Infarmed – Instituto Nacional da Farmácia e do Medicamento, ao qual foi atribuída exclusiva responsabili-dade “pela orientação, avaliação e inspecção da actividade far-macêutica”. Dotado de autonomia financeira e administrativa, e financiado através das taxas de comercialização dos medi-camentos, este organismo centralizou competências anterior-mente dispersas pela Direcção-Geral de Saúde, pelo Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge e pela Direcção-Geral dos Assuntos Farmacêuticos, tendo esta última sido extinta pelo referido diploma. Presidido por José Aranda da Silva (1993-2000), o Infarmed integrou a antiga Comissão Técnica dos

130Sede do Infarmed no Parque da Saúde, em Lisboa.

Novos Medicamentos, entretanto renomeada Comissão Técni-ca de Medicamentos (pela Portaria 258/91), a qual passou a constituir um órgão consultivo deste Instituto, sendo posterior-mente designada por Comissão de Avaliação de Medicamen-tos. A nível estrutural, o Infarmed ficou sediado no interior do Hospital Júlio de Matos, que passara a denominar-se Parque de Saúde de Lisboa. Em 1999, o seu laboratório, que estivera durante três anos instalado, provisoriamente, no Instituto Na-cional de Investigação Industrial, situado no Lumiar, transitou para um novo edifício construído de raiz no referido Parque, o qual recebeu a denominação Tomé Pires, em homenagem ao destacado boticário português do século XVI.

Ao nível da indústria, os anos 1990 ficaram indelevelmente marcados pelas grandes fusões internacionais, tendo surgido novos e importantes players no sector farmacêutico, muito

particularmente a Aventis, nascida da fusão da Rhône-Poulenc com a Hoechst Marion Roussel, a Novartis, formada pelo pro-cesso de fusão da Ciba-Geigy com a Sandoz, e, também, a AstraZeneca, surgida da união da Astra com o grupo Zeneca, e a Janssen-Cilag, empresa que nos anos 90 construiu uma nova e moderna fábrica em Queluz.

Em Portugal, despontaram novos e importantes inves-timentos industriais, nomeadamente a Sofarimex, per tencente ao Grupo Azevedos, que se orientou, sobretudo, para a produção para terceiros, tendo como clientes, entre outros, a Sanofi-Aventis, a Novartis, a GlaxoSmithkline e a Pfizer. Inau-gurada em 1994, no Cacém, esta fábrica especializou-se na produção farmacêutica de pequenas e médias séries à escala europeia, fabricando sólidos (pós, granulados, com-primidos, comprimidos revestidos, drageias e cápsulas),

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líquidos (xaropes, soluções, suspensões e solutos), pastosos (pomadas e cremes) e estéreis (colírios, injectáveis líquidos de pequeno volume e liofilizados), tendo desenvolvido, ao longo dos anos, um portefólio superior a 650 produtos e exportando, para os cinco continentes, 75% dos seus produtos fabricados. Em complemento à indústria, refira-se que a área da distribui-ção grossista de produtos farmacêuticos contou, nesta década, com um novo membro, a Distrifarma, fundada em 1993.

Quanto aos laboratórios estrangeiros, instalaram-se em Por-tugal as seguintes empresas: Amgen - Biofarmacêutica, Lda., Baxter Médico-Farmacêutica, Almirall (estabelecida em 1997 por fusão com a Prodesfarma, que estava presente em Portugal desde 1993), Divasa Farmavic de Portugal – Produtos e Equi-pamentos Veterinários, Esteve Farma, Grunenthal (através da Euro-Labor), Leo Farmacêuticos, Lda., Ipsen Portugal, Servier Portugal, Merial Portuguesa Saúde Animal, Lda. (fundada em

Agosto de 1997 pela fusão dos negócios de Saúde Animal da Rhône Mérieux e da MSD Agve), Zambon – Produtos Farmacêu-ticos, Lda., Bio-Rad Laboratories – Aparelhos e Reagentes para Laboratórios, Lda., Satis – Radioisótopos e Protecções Contra Sobretensões Eléctricas, Lda., Byk Portugal, Actavis, Fresenius e Mepha. Por outro lado, a promulgação, no início dos anos 90, dos primeiros diplomas que vieram regular, em Portugal, os medicamentos genéricos – o Decreto-Lei n.º 81/90, de 12 de Março, o Decreto-Lei n.º 72/91, de 8 de Fevereiro, e a Porta-ria 623/92, de 1 de Julho, que alterou o regime de formação dos preços dos medicamentos genéricos, estabelecendo que os mesmos deveriam situar-se 20% abaixo do PVP do medicamen-to de referência – abriu oportunidades às empresas multinacio-nais que já actuavam neste mercado. Foi em tal contexto que a Ratiopharm se estabeleceu no País, em 1990, beneficiando da primazia para alcançar a liderança neste segmento.

A questão dos genéricos suscitou, todavia, reacções por parte da indústria nacional, tendo levado a Apifarma a endereçar, em 1995, uma detalhada exposição ao Ministério da Saúde, “enu-merando razões e explicitando fundamentos, os quais, espera-mos, contribuam definitivamente para a compreensão de que o posicionamento que a associação vem tomando assenta em preocupações e visa objectivos de alcance bem mais sério do que meras intenções de obstrução”, tal como se lia no Relatório e Contas referente ao ano em causa:

Edifício Tomé Pires, no Parque da Saúde, em Lisboa, sede do Laboratório do Infarmed.

Partindo do princípio da aceitação pacífica de que os ge-néricos poderão ter um contributo específico a desempe-nhar no mercado dos medicamentos, a Apifarma outra po-sição não poderia assumir que não fosse a de alertar para a necessidade essencial de fazer condicionar a introdução

Instalações fabris da Sofarimex, Agualva-Cacém.

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Presente em Portugal desde 1909, a Bayer inaugurou, em 1991, uma nova sede, localizada em Carnaxide.

desta classe de medicamentos à criação, por parte dos or-ganismos de tutela, das condições básicas e instrumentos necessários à garantia técnica e cientificamente comprova-da da qualidade dos mesmos. Não parece credível, aliás, que possa ser implementada uma medida desta natureza, descurando implicações de Saúde Pública, sacrificando elementares regras de concorrência ou até permitindo a subversão dos diferentes papéis legalmente definidos para os agentes económicos envolvidos, como chegou a parecer desenhar-se no horizonte do sector.

Além da problemática dos genéricos – que levou a Apifar-ma a propor, em 1992 e em 1993, a criação, pelo Ministério da Saúde, de um Instituto da Qualidade do Medicamento –, a actividade da Associação centrou-se, nesta década, no desenvolvimento das relações institucionais. Desde logo, com a Ordem dos Médicos (OM), com a qual assinou em Junho de 1992 um protocolo de cooperação que visava o cumprimento dos códigos deontológicos pelos membros de ambas as instituições. O referido documento foi revis-to e complementado pelos protocolos subscritos em 1997

e em 1999, tendo o último destes criado uma Comissão Paritária de acompanhamento presidida por uma persona-lidade independente, à qual foi acometida a atribuição de observar o cumprimento do protocolo e dar conhecimento das eventuais violações aos Conselhos Deontológico e Dis-ciplinar da OM e da Apifarma.

Mais tensas foram as relações com o Ministério da Saú-de, não obstante o novel Infarmed ter possibilitado uma melhoria muito substancial no relacionamento da Associa-ção com a regulação. Em causa estavam as dívidas dos hospitais aos laboratórios farmacêuticos, que se agudiza-ram nos primeiros anos desta década, tendo atingido uma inédita mediatização. Foi neste contexto, e para evitar a ruptura institucional, que a Apifarma e o Ministério da Saú-de estabeleceram, em Novembro de 1993, um protocolo que conduziu à criação de uma Comissão Paritária cons-tituída por representantes da Apifarma, da Direcção-Geral da Concorrência e Preços (DGCP), do Instituto de Gestão Informática e Financeira do Ministério da Saúde (IGIF) e do Infarmed. Esta comissão reuniu por diversas vezes e levou, também, à criação, na Apifarma, de seis Grupos de Traba-lho – Autorização de Introdução no Mercado, Comparticipa-ções, Mercado Ambulatório, Dívidas Hospitalares, Preços, Promoção/Publicidade – constituídos por representantes das empresas suas associadas. Ao referido protocolo suce-deu um outro, firmado em Março de 1997 pela Apifarma e pelos Ministérios da Saúde e da Economia, o qual levou a uma nova Comissão Paritária. No âmbito desta estrutura debateu a Associação questões tão prementes como o re-lacionamento da Indústria com os médicos, a informação médica e as regras de acesso de delegados de informação médica, as comparticipações, a autorização de introdução no mercado, os preços, os genéricos, a I&D no âmbito do PEDIP II e a Economia e Saúde.

Outro importante ponto de preocupação da Apifarma, ao

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longo dos anos 1990, foi a questão ambiental, sobretudo, quando se começou a perspectivar a entrada em vigor da legislação nacional decorrente da transposição parcial da Directiva Europeia 94/62/CE, que regulamentou a gestão de embalagens e de resíduos de embalagens. A Associação participou, para o efeito, na Comissão de Acompanhamen-

Newsletter Notícias Apifarma (1992).

to e de Gestão de Embalagens e Resíduos de Embalagens (CAGERE), procurando encontrar as melhores soluções para o sector farmacêutico, o que a levou, também, a efec-tuar um processo de benchmarking com práticas imple-mentadas noutros Países comunitários. Deste processo, e das reuniões realizadas com a Associação Nacional das Farmácias (ANF), a Associação de Grossistas de Produtos Químicos e Farmacêuticos (GROQUIFAR) e a Federação das Cooperativas de Distribuição Farmacêutica (FECOFAR), re-sultou a criação, em 1999, da Valormed, que iniciou activi-dade um ano depois. Foi confiada a esta sociedade sem fins lucrativos a gestão do Sistema Integrado de Gestão de Resí-duos de Embalagens (SIGREM), que integrou todo o circuito de comercialização dos medicamentos, incluindo a produ-ção, a distribuição e a comercialização nas farmácias.

Mereceu também crescente atenção por parte da Asso-ciação a questão deontológica, tendo a década de 90 fica-do marcada pelo início de funções da Comissão Executiva do Conselho do Código Deontológico, cujo regulamento foi aprovado em Assembleia-Geral de Novembro de 1990. Cin-co anos depois, e em resultado de notícias amplamente veiculadas pelos meios de comunicação social sobre “ale-gadas práticas de promoção de medicamentos, violadoras dos princípios éticos defendidos pela Apifarma”, propôs a Direcção um novo Código Deontológico de Práticas de Comercialização, que veio a ser aprovado pela Assembleia- -Geral Extraordinária de 5 de Junho de 1995.

A imagem da Indústria Farmacêutica foi, porém, afectada pelas referidas notícias e por outras que se lhes seguiram, nomeadamente em 1997. Por isso mesmo, a Apifarma pro-moveu, na Primavera de 1998, uma alargada campanha de comunicação pública sob o lema «Saúde para si. Saúde para todos», a qual marcou presença na comunicação so-cial através de spots radiofónicos e televisivos, de outdoors e de anúncios na imprensa. O objectivo foi, uma vez mais,

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sensibilizar a opinião pública para a importância e o papel desempenhado pela indústria a nível social e económico.

É de sublinhar que a Apifarma se desenvolveu significati-vamente ao longo dos anos 1990, o que ficou patente não só no aumento do número de associados, que, em 1999, totalizava 130 membros, mas também na mudança para uma nova sede, a qual ficou, a partir de 1993, instalada no n.º 22 da Rua Pero da Covilhã, no Restelo. Subjacentes a esta dinâmica de progresso estiveram importantes passos,

Brochura institucional da Apifarma (1997/1998).

nomeadamente a criação, em 1990, da Comissão Espe-cializada de Saúde Animal (CESA) e o início, em 1991, do Grupo de Trabalho Meios de Diagnóstico. Neste mesmo ano, iniciou a Associação um importante investimento na formação profissional, tendo beneficiado das verbas dis-ponibilizadas para o efeito pelo Fundo Social Europeu, e instituiu, também, conjuntamente com a Escola Nacional de Saúde Pública, um prémio anual de investigação com o objectivo de “promover e incentivar a investigação no do-mínio do desenvolvimento da administração de hospitais e outros serviços de Saúde”. Já no final da década, em Dezembro de 1999, realizou-se um workshop que marcou o início de uma importante parceria entre a Apifarma e as associações de doentes, a qual teve como objectivo funda-dor o debate de questões relacionadas com a qualidade dos serviços médicos, o acesso dos doentes a novas terapêuti-cas, os medicamentos órfãos, as doenças raras e as gran-des prioridades de investigação da Indústria Farmacêutica.

ANOS 2000 E 2010: DOS GENÉRICOS AO PRIMEIRO MEDICAMENTO ORIGINAL DE PATENTE MUNDIAL

O novo milénio abriu com os medicamentos genéricos no horizonte, impulsionados pelo Ministério da Saúde, que os perspectivou como importante medida de redução e con-trolo do aumento da despesa do Estado com os fármacos. Para vencer a estagnação que caracterizara, na última déca-da, este mercado, o qual não representava sequer 0,5% do total de vendas do sector farmacêutico, o Infarmed iniciou, no ano 2000, um Programa Integrado de Promoção dos Medicamentos Genéricos, envolvendo, simultaneamente, a indústria, os profissionais de Saúde e o público em geral. Consubstanciou-o um significativo conjunto de legislação, particularmente o Decreto-Lei 205/00, de 1 de Setembro, que introduziu uma majoração de 10% na comparticipação

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do Estado no preço desta classe de medicamentos, e o De-creto-Lei 271/02, de 2 de Dezembro, que instituiu a pres-crição obrigatória por denominação comum internacional (DCI) para substâncias activas com medicamentos gené-

Sede actual da Apifarma, no Restelo.

ricos autorizados. Paralelamente, o Infarmed desenvolveu um conjunto de iniciativas de sensibilização e educação, nomeadamente através de uma equipa de Técnicos de Di-vulgação de Genéricos – que realizaram centenas de ses-sões a nível nacional, tendo contactado com cerca de 6300 médicos, em ambiente hospitalar e em Centros de Saúde, e mais de 900 farmacêuticos –, mediante a criação de uma linha telefónica informativa, de um website específico, de campanhas de publicidade – realizadas entre 2001 e 2004 – e pela publicação periódica do Guia de Medicamentos Ge-néricos, destinado a médicos e farmacêuticos.

A posição da Apifarma relativamente a esta matéria foi, desde logo, explicitada numa brochura publicada no ano 2000, sob o título Sobre os Medicamentos Genéricos em Portugal: Algumas Notas & Reflexões, à qual se seguiu, em

Como se fossem o tema de uma sinfonia sempre incom-pleta, os medicamentos genéricos surgem ciclicamente no debate sobre o SNS.Para muitos, supostos de saber o que dizem e de cumprir o que prometem, os genéricos seriam o remédio santo para todos os problemas que afligem a saúde dos portugueses. Derramando-os sobre o País, este transformar-se-ia num verdadeiro paraíso. E a saúde, que a Constituição consagra como um direito de todos e cada um, estaria para sempre assegurada.[…] os medicamentos genéricos não são o remédio decisi-vo para a doença que mina, na União Europeia, os meios dos serviços públicos de saúde. E que, sobre ser injusto, será incorrecto e perigoso dar a entender, ou deixar acre-ditar, que eles devem constituir-se como a prioridade das prioridades de uma política de saúde responsável e eficien-te. Convém, com efeito, ter presente que, nas grandes pato-logias, os genéricos não são medicamentos decisivos, não obstante poderem, e deverem, ser utilizados em termos complementares.

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2001, o Livro Branco sobre Genéricos:

Pese embora o pioneirismo da Ciclum Farma, fundada no ano 2000, e da Generis, iniciada em 2001, foi sobretudo a partir de 2002, com a publicação do referido Decreto-Lei 271/02, que a indústria nacional apostou no mercado dos genéricos, como sucedeu com a ToLife, que iniciou a sua actividade em 2003.

Este segmento interessou também aos laboratórios já existentes, alguns dos quais reorientaram a sua acção co-mercial e produtiva para estes fármacos, merecendo des-taque, entre outros, a Farmoz – criada em 1995 para a co-mercialização e promoção de medicamentos no mercado hospitalar, mas que, em 2002, lançou uma gama de produ-tos farmacêuticos genéricos –, a Tecnimede e a Basi. Foi, aliás, fruto da iniciativa de nove empresas dedicadas à pro-dução e comercialização de medicamentos genéricos com actividade em território português que se fundou, em Maio de 2003, a APOGEN – Associação Portuguesa de Medica-

Procedimento de embalagem de medicamento genérico da Bluepharma.

mentos Genéricos, com a missão de “divulgar o conceito do medicamento genérico, contribuindo activamente para o desenvolvimento deste mercado em Portugal”. Refira-se que a abertura do mercado dos genéricos atraiu, também os players internacionais, que, nesta década, abriram em Portugal sucursais para o efeito, como sucedeu com a Germed Portugal (2004), a Teva Portugal (2004), a Phar-makern Portugal (2005) e a Mylan Portugal (2008). A par destas, e para além dos genéricos, instalaram-se, igualmen-te, no País as seguintes sociedades: Alfa Wassermann (por aquisição da BioSaúde), Bene Farmacêutica, Codilab, Covi-dien, Diasorin Ibéria, Eisai Farmacêutica, Isdin – Laboratório Farmacêutico, Kironfarma – Produtos Farmacêuticos, Lda., Laboratórios Galderma, SA, Lundbeck Portugal, Medac Por-tugal, Norgine Portugal Farmacêutica, Phadia, Reckitt Ben-ckiser Healthcare, Smith & Nephew, Takeda - Farmacêuticos Portugal, Lda., Vetoquinol, ViiVHIV Healthcare e Virbac de

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Instalações fabris da Bluepharma, em Coimbra.

Instalações fabris da Labesfal-Fresenius Kabi, em Tondela.

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Portugal – Laboratórios, Lda. Posteriormente, já em 2012, chegaram a Beckman Coulter, a BSG Pharmaceuticals, a Fer-rer Hospitalar, a Stago Portugal e a Zoetis Portugal, Lda.

O arranque do mercado de genéricos, mas também o aprofundamento do Mercado Comum Europeu e a deslo-calização geográfica da indústria, iniciada globalmente e transectorialmente nos anos 1990, conduziram, nesta década, ao desinvestimento das multinacionais nas unida-des de produção que tinham estabelecido em Portugal nos últimos 30 anos, sendo uma das excepções a OM Phar-ma, que em 2009, desenvolveu a sua fábrica de Alfragi-de. Diversos grupos e empresas portugueses do sector farmacêutico aproveitaram a oportunidade que se abriu com a desindustrialização, local, dos colossos farmacêuti-cos mundiais, tendo adquirido algumas das suas fábricas. Assim sucedeu com o Grupo Medinfar – que, em 2001, comprou a Farmalabor à Grunenthal, passando a deter o complexo fabril de Condeixa-a-Nova –, com a Bluepharma – fundada em Coimbra, em 2001, por um grupo de profis-sionais do sector farmacêutico, na sequência da aquisição à Bayer das suas instalações industriais em S. Martinho do Bispo – e, ainda, com a Lusomedicamenta – instalada em 2004 na antiga unidade fabril da Janssen-Cilag, em Queluz – e com a Generis Farmacêutica, SA, empresa criada em 2001 e que, em 2008, adquiriu a fábrica da Sanofi Aventis, em Loures, a qual pertencia, desde 2005, ao Grupo JABA. O processo de desinvestimento pelas farmacêuticas mul-tinacionais teve continuidade na década seguinte, período em que a Merck, Sharp & Dohme encerrou a fábrica do Cacém, anteriormente pertencente à Schering norte-ame-ricana, e em que a Bayer alienou a unidade de produção que comprara, em 2007, à Schering Lusitana.

Em sentido contrário, assistiu-se nesta década à aqui-sição de importantes grupos industriais portugueses por

parte de empresas estrangeiras, de que são exemplo a ven-da da Labesfal à Fresenius, ocorrida em 2004, e a compra do Grupo JABA pelo Grupo Recordati, realizada em 2006, poucos anos depois da JABA ter efectuado um importante investimento numa nova fábrica localizada na Abrunheira, visando reforçar a sua capacidade de produção no fabrico e embalagem de comprimidos, cápsulas e saquetas (líquidos e sólidos).

O aludido processo de desinvestimento, por um lado, e de aquisições, por outro, conduziu a um menor conjun-to de indústrias farmacêuticas a operar em Portugal, mas também a uma maior capacidade de produção, o que se deveu à modernização das unidades fabris e ao aumento da produtividade registado pela incorporação de novos mé-todos e equipamentos.

Se algumas indústrias portuguesas se dedicaram, como vimos, aos genéricos, outras houve que se focaram na pro-dução e comercialização de licenças de medicamentos inovadores de multinacionais e, também, de produtos pró-prios, como foi o caso da Bial. Em 2014, este quase cen-tenário laboratório logrou entrar no mercado norte-ameri-cano com um medicamento original, o qual se tornou no primeiro fármaco de patente e investigação portuguesas a ser aprovado pelo regulador do mercado farmacêutico dos Estados Unidos. Comercializado na Europa desde 2009, sob a marca ZEBINIX, este anti epiléptico, que recebeu nos EUA o nome comercial APTIOM, ficou disponível nos cerca de 40 Países a que a Bial fez chegar os seus produtos me-diante a aposta na internacionalização, possuindo, desde 2012, uma fábrica e um centro de pesquisa e desenvol-vimento em Bilbau. Neste campo particular, teve a com-panhia, entre outros, do Grupo Azevedos, que, em 2000, inaugurou uma unidade industrial no Brasil, a Laboris. Foi precisamente a pensar na internacionalização que a Api-

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Complexo da Bial nos arredores do Porto.

Brochura institucional do PharmaPortugal.

farma, o Infarmed e a Agência para o Investimento e Co-mércio Externo de Portugal (AICEP) lançaram, em 2005, o PharmaPortugal, um projecto estratégico para exportação e internacionalização da Indústria Farmacêutica.

Outro fenómeno que começou a ganhar maior expressão nesta década, apesar de remontar aos anos 1990, foi o de-senvolvimento das biofarmacêuticas. Além dos laboratórios internacionais que se instalaram em Portugal – como a Ge-nibet Biopharmaceuticals, SA, a Gilead Sciences (anterior Nexstar Farmacêutica), a Celgene Portugal e a Biogen Idec

Portugal –, surgiram, também, empresas nacionais, de que são exemplo a Ecbio – Investigação e Desenvolvimento em Biotecnologia, fundada em 1999 como empresa consulto-ra na área da biotecnologia, mas que iniciou, em 2003, o seu próprio laboratório de I&D, a Technophage e a Cell2B. Foi também nesta década que iniciaram actividade algumas startups – como a Luzitin (2010) e a Biotecnol, esta última sediada originalmente em Oeiras, mas incorporada, poste-riormente, no Reino Unido – e também as empresas Korangi – Produtos Farmacêuticos, Lda. e CPCH – Companhia Portu-guesa Consumer Health. Constituiu-se, igualmente, no domí-nio da distribuição grossista, a Udifar, fundada em 2009.

Ao nível da regulação e fiscalização, os anos 2000 pre-senciaram um robustecimento da actividade do Infarmed, que, em 2006, se transformou em Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, IP, mantendo, porém, o anterior acrónimo. Com efeito, em 2001, foram encerra-dos diversos laboratórios – sobretudo devido ao funciona-mento dos mesmos sem os respectivos directores técnico e laboratorial ou por apresentarem instalações degradadas –, procedimento que foi amplamente mediatizado pelos ór-gãos de comunicação social.

Igualmente importante no sector do medicamento foi a constituição, em 2005, da Comissão de Ética para a In-vestigação Clínica (CEIC), organismo que veio responder a uma velha aspiração da Apifarma, que, já na década de noventa, tinha solicitado ao Ministério da Saúde legislação adequada sobre os ensaios clínicos de novos medicamen-tos. As origens da CEIC remontam ao final dos anos 1980, com a criação do Centro de Estudos de Bioética, do qual surgiu, em 1990, o Conselho Nacional de Ética para as

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Ciências da Vida. Na década seguinte, foi determinante a publicação do Decreto-Lei 97/94, de 9 de Abril – que es-tabeleceu as normas a que deviam obedecer os ensaios clínicos a realizar em seres humanos, obrigando à obten-ção do parecer favorável de uma comissão de ética –, e do Decreto-Lei 97/95, de 10 de Maio, que definiu a composi-ção e funcionamento das Comissões de Ética para a Saúde (CES), definindo a criação de uma CES por cada instituição e Serviço de Saúde público e privado e outorgando-lhes a responsabilidade de se pronunciarem sobre os pedidos de autorização para a realização de ensaios clínicos e de fiscalizar a respectiva execução. Este modelo não se ade-quava, porém, às novas exigências do sector farmacêutico, revelando-se impossível de compaginar, também, com a Directiva 2001/20/CE, do Parlamento e do Conselho Euro-peus, a qual subentendia a criação, em cada País da União Europeia, de uma única comissão de ética com compe-tência para avaliar os ensaios clínicos com medicamentos

com carácter de obrigatoriedade e, também, por expor as implicações subjacentes. Informou a Apifarma no seu Re-latório de Actividade de 2002:

De facto, a prescrição e dispensa de medicamentos com a utilização obrigatória da DCI altera a cadeia de respon-sabilidades dos intervenientes neste processo. O acto de escolha do medicamento deixa de ser baseado em conhe-cimentos médicos e técnico-científicos, passando para a cadeia de distribuição e/ou para o utente. Com a obriga-toriedade de prescrição por DCI e com as modalidades de dispensa de medicamentos na farmácia não há garantia da consistência do tratamento nem de adesão do doente a esse tratamento. Por outro lado, não há garantia, por parte do Ministério da Saúde, de que o medicamento dispensado nas farmácias cumpra as disposições legais. Isto é: não há garantia de que seja o «medicamento com um preço mais baixo», como manda a lei. Para além destes princípios, desde o início deste processo, a Apifarma defendeu que a DCI não deveria ser aplicada a todas as categorias de medi-camentos, facto que acabou por se reflectir na legislação.

para uso humano. A CEIC nasceu, precisamente, da lei que transpôs para a legislação portuguesa o conteúdo desta Directiva – a Lei 46/2004, de 19 de Agosto –, tendo ficado responsável, a partir de 2005, de emitir parecer ético e científico sobre a realização de ensaios clínicos com medi-camentos de uso humano e deliberando o Infarmed sobre os benefícios e os riscos envolvidos. Dotada de indepen-dência técnica e científica, e funcionando na dependência do Ministro da Saúde, foi instituidor da CEIC e seu primei-ro presidente o médico António José de Barros Veloso.

Quanto à actuação da Apifarma, foi marcada, desde logo, pela eclosão de novas realidades no sector do medicamen-to, as quais decorreram de medidas legislativas tomadas pelos diferentes Governos. Uma delas foi a da prescrição por Denominação Comum Internacional (DCI), tendo a po-sição da Associação passado por explicitar que Portugal seria o único País da Europa a implementar tal medida

Outro vector importante foi o dos prazos de introdução dos novos medicamentos no mercado, tendo a Associação realizado várias iniciativas para alertar para esta ques-tão, nomeadamente através do workshop «A Espera dos Doentes por Novos Medicamentos: Pode a Europa Fazer Melhor?», que, em Outubro de 2005, organizou, conjunta-mente com a EFPIA, no Centro Cultural de Belém. Também o novo Estatuto do Medicamento, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 176/2006, de 30 de Agosto, e a dispensa de medica-mentos por unidose – regulamentada pelas Portarias n.º 697/2009, de 1 de Julho, e n.º 455-A/2010, de 30 de Ju-nho –, medida tomada pelo Ministério da Saúde com o ob-jectivo de “evitar o desperdício e permitir uma maior pou-pança”, foram alvo da atenção da Associação. Finalmente, e tal como no passado mais recente, a Apifarma continuou, nos anos 2000 e 2010, a acompanhar e a gerir o constante

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aumento das dívidas dos hospitais à indústria, as quais se agravaram, tendo atingido, em Dezembro de 2000, cerca de 86,5 milhões de contos e um prazo médio de pagamen-to de 402 dias. Neste âmbito, foram celebrados protocolos trianuais com o Ministério da Saúde, procurando-se, assim, criar “condições de estabilidade e de desenvolvimento sus-tentado da Indústria Farmacêutica, num quadro de alguma previsibilidade de evolução do Sector e de colaboração da Indústria relativamente às dificuldades financeiras do SNS nas despesas com medicamentos”.

Porventura motivada pela Resolução do Conselho de Mi-nistros, de 28 de Junho de 2001, que declarou a Indústria Farmacêutica como estratégica para Portugal, a Apifarma realizou, em Novembro deste mesmo ano, o «1.º Fórum da Indústria Farmacêutica», o qual teve lugar no Centro de Congressos da AIP. Em análise e debate estiveram temas tão diversos quanto a Investigação, as Ciências Biomédicas,

Exposição «Mãos que Partilham Vida».

as questões éticas e o futuro do mercado farmacêutico. Em simultâneo, decorreram um ciclo de cinema dedicado a temas da Medicina e dos medicamentos, uma mostra de desenvolvimento tecnológico aplicado ao diagnóstico in vitro e as exposições «Os Doentes e a Arte» e «Mãos que Partilham Vida», esta última de âmbito interactivo e direc-cionada, especificamente, para os mais jovens, envolvendo as escolas e as comunidades.

O ênfase na Deontologia, que transitara das anteriores décadas, acentuou-se, nos anos 2000 e 2010, mediante a renovação, em 2001, do Protocolo Deontológico com a Ordem dos Médicos, a celebração, em 2003, de um Pro-tocolo Deontológico com a Ordem dos Farmacêuticos, a aprovação, em 8 de Novembro de 2005, de um novo Código Deontológico das Práticas Promocionais da Indústria Farmacêu-tica, e a adopção, em 2008, de um Código de Conduta para as Relações entre a Indústria Farmacêutica e as Associações de

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Doentes. Aprofundaram-se, também, as relações internacio-nais, tendo a Apifarma reforçado a sua participação nos prin-cipais organismos do sector ao integrar a Direcção da EFPIA (no ano 2000 e entre 2004 e 2008) e o Executivo da IFPMA (em 2001 e entre 2004 e 2006).

Uma das áreas de actividade que mais progressos registou foi a da Comunicação. De facto, a Apifarma deu um salto qualitativo nos anos 2000, o que se materializou na abertura do site institucional, lançado no ano 2000, e sucessivamente melhorado e renovado, na produção do programa televisivo Bem-Estar, sediado no Canal Saúde (2003), na criação de uma extranet para comunicação com os associados, a qual teve início em Maio de 2005, e na gestão da identidade visual da Associação, que foi renovada, em 2007, mediante a cria-ção de um novo logótipo e de um novo símbolo, este último inspirado numa cadeia de ADN. Em simultâneo, a Apifarma investiu, também, mais na investigação científica, que fo-

mentou através de diversas parcerias, nomeadamente com a Fundação Calouste Gulbenkian, no desenvolvimento susten-tável, tendo subscrito, em 2007, o Pacto Global das Nações Unidas, e na responsabilidade social, actuando ao nível dos doentes, dos cidadãos e das empresas, da ciência e da inves-tigação científica, do ambiente e da deontologia. No âmbito dos doentes e dos cidadãos, mereceram especial destaque as campanhas públicas de sensibilização realizadas pela As-sociação nos domínios do diagnóstico, da prevenção e da informação para a Saúde.

BIBLIOGRAFIA Fontes ApifarmaArquivo Diário de Notícias

Campanha de adesão à terapêutica, desenvolvida, em 2007, pela Apifarma.

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Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTTBiblioteca NacionalBlog «Restos de Colecção»Centro de Documentação Farmacêutica - Ordem dos Farmacêuticos Monografias seleccionadas

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(*) Doutorando em Ciências da Comunicação pelo ISCTE/IUL, é autor de vários livros presentes nas colecções da Library of Con-gress, da New York Public Library e das bibliotecas das universi-dades de Harvard e Columbia. Foi Director de Comunicação das empresas ABB Portugal e Ericsson Telecomunicações e desempe-nhou cargos de assessoria e consultoria no Ministério da Saúde, na Comissão de Luta contra a SIDA, no programa Saúde XXI e na Sociedade Portuguesa de Medicina Interna. A convite do Dr. Antó-nio José de Barros Veloso, participa, actualmente, no livro «Para a História da Medicina Portuguesa no Século XX».

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Excerto de cartaz publicitário do «Invicta Quina:Velho Quinado – Preciosa Jóia»Farmácia Souza (1919-1923)

4.

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INVESTIGAÇÃO, DESENVOLVIMENTO E SEU CONTRIBUTO PARA A EVOLUÇÃO CIENTÍFICA E PARA A SAÚDE PÚBLICA

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147

Francisco Batel MarquesFaculdade de Farmácia de CoimbraAIBILI Coimbra

A Indústria Farmacêutica funcionou, classicamente, com o objectivo de encontrar soluções terapêuticas para necessi-dades médicas. Actualmente, procura opções que acres-centem valor terapêutico e, na perspectiva da sociedade, rácios custo/efectividade mais favoráveis. Com a hierar-quização da robustez da natureza de prova da relação cau-sa-efeito a comandar as avaliações das relações benefício/risco e com a regulação e regulamentação farmacêutica e do medicamento a convergir para a efectividade compara-tiva, é a perspectiva do financiamento dos ganhos docu-mentados pela utilização do medicamento que se afigura, e não a do financiamento do medicamento em si mesmo.

Contudo, tornar disponíveis medicamentos inovadores destinados ao tratamento de patologias, ainda, não-tra-táveis, ou insuficientemente tratadas, depende, em muito larga extensão, dos esforços de investimento que a Indús-tria Farmacêutica multinacional, baseada e orientada por princípios e valores de mercado, esteja disposta e disponí-vel a realizar e concretizar.

Porém, o modelo clássico de Indústria Farmacêutica, en-quanto linha sequencial e integrada dos desenvolvimentos químico, farmacêutico, clínico, industrial e comercial, mo-delo típico dos meados do século XX, já não existe.

Desde um mosaico de entidades de filiação pública e pri-vada, algumas com forte componente universitária (empre-sas de história operacional limitada – start-up – ou baseadas num produto ou serviço de alta tecnologia – spin-off), até à emancipação de projectos exclusivamente fabris, passan-do pela externalização dos desenvolvimentos pré-clínico e clínico, por exemplo, criaram-se novos processos identitá-rios do que é, hoje, a Indústria Farmacêutica.

Se é verdade que o velho figurino de Indústria Farma-cêutica contribuiu para disponibilizar medicamentos que,

sem qualquer sombra de dúvida, melhoraram a Saúde Hu-mana num contributo insubstituível para o aumento da esperança e da qualidade da vida, não é menos verdade que a universalização do acesso ao medicamento, o vale da queda cronológica da protecção das patentes e a entra-da de novas empresas não oriundas do tradicional mundo ocidental industrializado, rapidamente tornadas gigantes, a transfigurou, conferindo-lhe uma imagem mais genera-lista e uma identidade muito mais próxima de outras in-dústrias baseadas na investigação e no desenvolvimento.

A construção dos equilíbrios necessários à compatibi-lização de necessidades sociais, à eficiência industrial farmacêutica e à sustentabilidade económico-financeira dos sistemas, públicos ou privados, de financiamento dos medicamentos, tem sido um desafio constante para os de-cisores políticos em Saúde. Porém, num país pobre, com um Estado fraco, os fracassos de Estado tornam-se mais acentuados, pelo que a expectativa relativamente aos con-tributos mútuos deverão permanecer baixas.

Numa pesquisa orientada para avaliar o contributo cien-tífico da Indústria Farmacêutica, entre nós, apenas con-seguimos identificar, de forma consistente, um caso em que a publicação proveniente de colaborações Indústria Farmacêutica/universidade se saldou por um período de tempo relativamente longo numa sequência de publica-ções internacionais indexadas e arbitradas, com muito bons indicadores de impacto, designadamente citações.

Tal é revelador da existência de capacidade instalada, da possibilidade da sua potenciação, da viabilidade da coope-ração inter-institucional, bem como da exequibilidade, entre nós, da translação rápida entre momentos sequenciais.

Não se detectam, porém, movimentos do lado da Saúde Pública, exceptuando a produção, a intervalos de tempo

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Research», 2010. Consultado em 18/10/2014 http://www.glo-balissues.org/article/52/pharmaceutical-corporations-and-me-dical-research.

Pharmaceuticals and public health in the EU: Proposals to the high level committee on health for policies and actions in the framework of the Treaty of Amsterdam, 2000, March.

regulares, do Plano Nacional de Saúde, que não identifica movimentos de articulação, nomeadamente o de ajusta-mento de prioridades ao financiamento.

A Indústria Farmacêutica de capital nacional tem-se as-sociado, sobretudo, à produção industrial de medicamen-tos, ao passo que a investigação e desenvolvimento clíni-cos se associam, em muito maior extensão, às empresas multinacionais, de capital internacional.

Portugal verifica, ainda e no presente, a centralização da inovação terapêutica quase exclusivamente nos hospitais. É cedo para identificar as consequências e os impactos deste brutal alargamento do perímetro terapêutico hospi-talar, muito alicerçado em questões de natureza orçamen-tal pública, em preços livres e em negociações directas do número de doentes a tratar.

A evolução dos padrões epidemiológicos de doença, bem como as determinantes do seu desenvolvimento e ocor-rência, continuarão forças orientadoras da actividade da Indústria Farmacêutica, agora moduladas por outras de-terminantes dos processos de investigação e desenvolvi-mento de novas entidades com potencial utilização clínica. Cremos, contudo, que a grande área de negócio futuro da Indústria Farmacêutica será transaccionar conhecimento e translacionar utilidades. BIBLIOGRAFIA

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Anup Shah. «Pharmaceutical Corporations and Medical

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Patricio Soares da SilvaFaculdade de Medicina do PortoLaboratórios Bial

A Indústria Farmacêutica é um sector de actividade a ní-vel mundial que canaliza em média 14-17% do volume de negócios para a vertente da investigação e desenvolvimen-to (I&D) [1]. Esta política de forte investimento em I&D pretende assegurar a disponibilização de novas opções te-rapêuticas, um dos sustentáculos de uma melhor Saúde Pública. O facto de ser a Indústria Farmacêutica o garante da inovação do medicamento, e consequente melhoria das medidas terapêuticas disponibilizadas às populações, ra-dica no princípio, ainda que não de todo linear, de não per-tencer ao Estado Providência este tipo de actividade. Esta tem sido uma prática mais do que secular, em distintos territórios e culturas, que, de parte a parte, não é desin-teressada. O sector público concentra-se em proporcionar às populações melhores condições assistenciais, Cuidados Médicos de Saúde Primários e Hospitalares, na expecta-tiva de que a Indústria Farmacêutica cumpra com o seu desígnio investigue e desenvolva novos medicamentos e as-segure os investimentos necessários. Nesta vertente, são por demais conhecidos os custos elevados referentes ao investimento para desenvolver um medicamento, as altas taxas de insucesso que esta actividade comporta e a longa duração que estes projectos exigem.

A Bial-Portela & C.ª S.A., desde há longa data a maior companhia farmacêutica portuguesa, apostou, nas duas últimas décadas, numa estratégia de desenvolvimento de novos medicamentos, sob a orientação inicial do Profes-sor José Ruiz de Almeida Garrett, a quem sucedi a partir de 1995. Contando com uma sólida equipa em diversas vertentes científicas, a Bial sintetizou e tem vindo a inves-tigar, nas vertentes farmacodinâmica, farmacocinética, to-xicológica e clínica, várias novas entidades químicas (NEQ)

Instalações laboratoriais da Bial.

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destinadas à terapêutica de patologias do sistema nervoso central e cardiovascular. A estratégia da Bial nesta maté-ria assentou em dois pontos: 1) a identificação precisa de áreas de investigação susceptíveis de gerar oportunidades, como o são as doenças cerebrais e cardiovasculares, e 2) a incorporação na companhia de competências científicas e tecnológicas. Presentemente, o processo de descoberta e o lançamento de um novo medicamento envolve equipas interdisciplinares, reunindo competências diversas, sendo que a Bial centraliza as fases estruturantes e sigilosas do processo, estabelecendo acordos e contratos de coopera-ção com diversas instituições – centros de ensaios clínicos, hospitais, universidades – nas fases posteriores. A investi-gação faz-se em rede, em cooperação, e nesse sentido, en-tre 1993 e 2013, a Bial estabeleceu contratos de I&D com 116 instituições. Este ambicioso programa de I&D tem sido alimentado por consideráveis investimentos, que, no caso vertente correspondem anualmente a cerca de 20% da facturação, 40 milhões de euros, o que está acima da média dos investimentos da Indústria Farmacêutica.

O acetato de eslicarbazepina (com o nome de código BIA 2-093 e comercializado sob as designações de Zebinix® e Aptiom®) foi o primeiro dos novos medicamentos que a Bial se prontificou desenvolver. Tratava-se de um fármaco destinado ao tratamento da epilepsia e, à data de 1993, resultou de uma opção estratégica de testar os objectivos ambiciosos da companhia na área habitualmente reserva-da às grandes companhias farmacêuticas multinacionais, com um mínimo de investimento inicial. Sublinho o facto de este projecto ter sido concebido em 1993, em parceria com o químico Jan Benes, e os primeiros compostos te-rem ainda sido testados nesse mesmo ano num espartano

laboratório de farmacologia, em que pontuava o sistema de aplicação de electrochoques cerebrais por via de eléc-trodos corneanos. Avaliou-se o perfil farmacodinâmico de quase duas centenas de NEQ e a nossa escolha, em 1994, recaiu sobre o composto número 93 [2]. Seguiram-se o pe-dido de patente em 1996, concedido pelo European Patent Office e pelo United States Patent Office em 1998 [3] e [4], e o início da avaliação toxicológica em 1997. Três anos depois, em 2000, foi administrado, pela primeira vez, na espécie humana (voluntários saudáveis), e, em Fevereiro de 2002, iniciou-se a avaliação terapêutica em doentes epi-lépticos, envolvendo perto de 150 doentes e 17 centros de investigação de nove países da Europa Central, um marco histórico na Farmacologia Clínica portuguesa. Por fim, re-alizaram-se os ensaios confirmatórios de eficácia (fase III), alargados a grande número de doentes em distintas regi-ões do globo e que visaram, para além de provar a eficácia, determinar a tolerabilidade e a segurança do novo fárma-co. Nesta etapa, o acetato de eslicarbazepina foi testado em mais de 1400 doentes refractários aos antiepilépticos convencionais em diferentes pontos do globo. Resultado de 14 anos de investigação e de investimentos na ordem dos 300 milhões de euros, em Abril de 2009, o acetato de eslicarbazepina, sob a marca comercial Zebinix®, foi aprovado pela Comissão Europeia para o tratamento ad-juvante de adultos com crises epiléticas parciais, com ou sem generalização secundária. A aprovação do acetato de eslicarbazepina pela Food and Drug Administration teve lugar em Novembro de 2013 e a comercialização nos Es-tados Unidos da América, sob a designação de Aptiom®, iniciou-se em 2014, vinte anos depois da respectiva desco-berta. De salientar que o processo de desenvolvimento do

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Departamento de I&D do Grupo Bial.

acetato de eslicarbazepina ainda não terminou. Estão em curso estudos que se destinam a avaliar novas indicações terapêuticas, nomeadamente a sua utilização na epilepsia em regime de monoterapia em adultos e como tratamento adjuvante em crianças epilépticas. Sublinha-se que a epi-lepsia é uma das doenças neurológicas mais comuns, afec-tando aproximadamente uma em cada cem pessoas. Em Portugal, estima-se que, em cada mil portugueses, quatro a sete sofrem da doença. Aproximadamente 50 milhões de pessoas em todo o mundo sofrem de epilepsia.

Cada vez mais, pensamos os novos medicamentos como sabotadores moleculares, em que os seus efeitos curativos se manifestam através da anulação do trabalho de proteí-nas-chave existentes no organismo. Os medicamentos mais

eficazes e mais bem tolerados acomodam-se intimamente nas reentrâncias das superfícies de dadas proteínas-alvo e deixam outras intocáveis. Por não ser fácil conceber medi-camentos que escolham os seus alvos com esta eficiência, é aceitável o facto de o desenvolvimento de medicamentos no passado se ter baseado em ensaios de tentativa e erro, testando milhares de potenciais medicamentos e encon-trando poucos que efectivamente curam sem prejudicar. Para quem concebe medicamentos, o futuro passa pela utilização exaustiva das novas tecnologias da genómica, proteómica e bioinformática, de forma a dar resposta à procura de melhores alvos para obter medicamentos mais eficazes e seguros. O segundo produto de investigação Bial, um novo agente para tratamento da doença de Parkinson,

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a opicapona, surge já como resultado de um processo de investigação radicalmente diferente do primeiro, em que pontuou a capacidade de delinear a nível molecular a inte-racção da estrutura química com a entidade biológica, re-correndo-se a sofisticados meios bioinformáticos [5] que, em devido tempo, foram incorporados no departamento de investigação e desenvolvimento da Bial. A opicapona, cujos ensaios confirmatórios de eficácia já estão concluídos com assinalável êxito, foi alvo de um contrato de licenciamento exclusivo com uma empresa japonesa, tendo em vista o seu desenvolvimento e comercialização no Japão.

Resultado do trabalho consistente que tem vindo a ser re-alizado, a Bial tem, em diversas fases de desenvolvimento, uma gama de outros potenciais novos medicamentos em distintas áreas terapêuticas, explorando inovadores meca-nismos de intervenção. Hoje, é reconfortante pensar que os medicamentos disponíveis durante o século XX tiveram como alvo apenas 300 diferentes entidades biológicas, exis-tindo a promessa de que 3000 a 5000 produtos proteicos oriundos de genes humanos e patogénicos se venham a pro-var como interessantes novos alvos para medicamentos.

As próximas décadas perspectivam-se francamente di-nâmicas sob o ponto de vista científico e podem levar a desvendar mistérios que ainda fazem parte de uma ver-tente parcial ou totalmente incompreensível. Ainda que as oportunidades sejam muitas, as dificuldades no percur-so do desenvolvimento de novos medicamentos são uma constante, pelo que o mais esperado sejam os permanen-tes desafios à inventividade e o prazer de os ultrapassar. A crise de produtividade da Indústria Farmacêutica, sobre que tanto se escreve [6] e [7], é também uma oportuni-dade para alterar rotinas e criar novas formas de atingir

objectivos, a menor custo, com mais assertividade, e de onde possa resultar um melhor e maior benefício colectivo. Para aqueles cuja vida se apresenta doente e sem esperan-ça, um fármaco em fase experimental é uma alternativa e, se este prova ser eficaz e bem tolerado, então o novo medicamento é uma segunda oportunidade para muitos. Cabe-nos, a cada qual, na medida da sua capacidade e responsabilidade sectorial – porque são muitos e diversos os intervenientes, nomeadamente cientistas, empresários, reguladores, legisladores e governantes, fazer com que as novas terapias medicamentosas cheguem em tempo útil àqueles que mais delas necessitam. Que se valorize o que a ciência e a técnica podem permitir, a um custo aceitável sob o ponto de vista social e que seja economicamente sustentável.

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153

Patent number EP0751129B1. Date of grant 1998-11-18. [4] Benes J, Soares-da-Silva P. Substituted dihydrodibenzo/b,f/

azepines, method of their preparation, their use in the treatment of some central nervous system disorders, and pharmaceutical compositions containing them. Application number 673,819. Pat-ent number US 5,753,646. Grant date 1998-05-19.

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Excerto de cartaz publicitário do «Urol:Dissolvente Enérgico do Ácido Úrico»Farmácia Formosinho (1916-1919)

5.

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O VALOR DO MEDICAMENTO E O SEUCONTRIBUTO PARA A SOCIEDADE

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157

O VALOR DO MEDICAMENTO E O SEU CONTRIBUTO PARA A SOCIEDADE

As últimas décadas foram caracterizadas por um eleva-do ritmo de inovação científica e tecnológica nas diversas áreas da Ciência. A inovação é mais visível na área das tec-nologias de informação e comunicação (telemóveis, com-putadores, televisão, por exemplo), cuja utilização está massificada e tem impacto no dia-a-dia do cidadão, tanto dos países mais desenvolvidos, como nos países em vias de desenvolvimento.

Muitas destas tecnologias permitiram que países menos desenvolvidos galgassem etapas em poucos meses, as quais os países mais desenvolvidos levaram anos a percorrer.

No entanto, as tecnologias com impacto na comunica-ção e informação só serão totalmente úteis se os seres hu-

manos que as utilizam conseguirem atingir um bem-estar que permita a utilização dessas tecnologias de forma efi-ciente e ao longo da vida.

As tecnologias da Saúde, nomeadamente o medicamen-to, apesar de não terem no dia-a-dia do cidadão a mesma visibilidade que as tecnologias associadas a bens de con-sumo corrente, têm sido determinantes para que indica-dores como a esperança de vida à nascença e a mortali-dade infantil tenham melhorado espectacularmente nos últimos cinquenta anos.

Por outro lado, o desenvolvimento económico não é pos-sível sem populações saudáveis. A criação, nos finais do século XIX, de Sistemas de Saúde organizados (Alemanha, por exemplo) resultou, em parte, da necessidade da Revo-lução industrial, então em marcha, ter mão-de-obra sau-dável. A necessidade do desenvolvimento económico e de aumento de competitividade das economias do centro da Europa, na sequência da Revolução Industrial, levou a que os governos propusessem às organizações patronais e às organizações sindicais a implementação de sistemas de protecção social, nomeadamente na área da Saúde. O de-senvolvimento económico não era possível com uma for-ça de trabalho fragilizada e com fraca produtividade, pelo que era necessário dar resposta a esse problema melho-rando o estado de Saúde dos trabalhadores. Entretanto, em muitos países tinham sido criadas, por iniciativa dos trabalhadores, organizações mutualistas e cooperativas.

Em meados do século XX, o desenvolvimento económico resultante da reconstrução Europeia esteve associado à organização de Sistemas de Saúde por toda Europa, com figurinos Bismarkianos, Beveridgeanos ou, na esmagado-ra maioria dos casos, mistos.

Com efeito, poucos sistemas actuais (se é que algum)

José Aranda da SilvaPrimeiro Presidente do Infarmed (1993-2000)Bastonário da Ordem dos Farmacêuticos (2001-2007)

158

têm todas as características dos modelos iniciais, pois evolu-íram ao longo do tempo, adaptando-se às condições sociais, económicas e políticas, com complexidade variável e a dife-rentes ritmos de crescimento.

É de notar que estes modelos surgem no pós-guerra, numa fase de grandes dificuldades e de crise económica e finan-ceira, em que os governos dispunham de poucos recursos e em que era necessário estabelecer prioridades. A criação e desenvolvimento de Sistemas de Saúde, com financiamento público, foi uma prioridade em todos os países hoje consi-derados os mais desenvolvidos da Europa. Eles foram um suporte indispensável ao desenvolvimento económico, só interrompido pela crise petrolífera do início da década de setenta.

Portugal, dada a natureza do Regime Ditatorial, o atraso económico e o isolamento internacional, só no final dos anos setenta arrancou definitivamente com a criação do Serviço Nacional de Saúde (SNS).

É, no entanto, a partir da segunda metade do século XX, com o desenvolvimento dos Sistemas de Saúde e a criação de novas necessidades, que aparecem novas tecnologias as-sociadas ao emergente mercado da Saúde. As tecnologias de diagnóstico e os medicamentos, a cobertura total da popula-ção por sistemas de saneamento público, e o crescente nível educacional vão modificar radicalmente o estado de Saúde das populações, com incrementos nunca vistos em diversos indicadores. A esperança de vida à nascença aumentou nos países da OCDE mais de dez anos, desde 1960 e a média da esperança de vida após os 65 anos é de cerca de 20 anos nas mulheres e de 17 anos nos homens.

Alguns autores (Miguel Gouveia, 2013/CIP) ao reflectirem sobre o valor criado pelos Cuidados de Saúde e interrogando-

-se sobre a proporção do aumento da esperança de vida que se deve às inovações nos cuidados de Saúde, consideram que esse valor é de 10%. Consideram ainda que o valor anual da esperança de vida gerado nos cuidados de Saúde é de cerca de 3,1% do PIB per capita em 2010. Analisando o aumento médio anual dos custos reais per capita com Saúde concluem que o Sistema de Saúde português terá gerado benefícios in-crementais 9,2 vezes maiores que os acréscimos de custos.

No que se refere aos medicamentos, analisemos o que se passou nas últimas décadas e qual o contributo que deram à sociedade.

A descoberta das sulfonamidas, em 1940, foi uma verda-deira revolução no tratamento das doenças infecciosas, à qual se seguiu a descoberta de outros anti-infecciosos como as penicilinas, o cloranfenicol, as tetraciclinas e a estreptomi-cina. Obtiveram-se, assim, resultados nunca antes imagina-dos no controlo das infecções, consideradas na época, como uma das principais causas de morte.

Antes dos anos cinquenta, o tratamento da tuberculose envolvia estruturas complexas e com elevados custos, base-ando-se, fundamentalmente em tratamentos sintomáticos. A descoberta de medicamentos antituberculosos, como o PAS, e de antibióticos, como a estreptomicina, alterou totalmente os paradigmas existentes, observando-se resultados espec-taculares ao nível do tratamento.

A evolução científica nas áreas da Fisiologia e da Biologia humanas permitiu que fossem identificadas estruturas e re-ceptores que ajudaram a compreender a patofisiologia de numerosas doenças. A evolução da Química, nomeadamente da Química Orgânica, permitiu a síntese de numerosas molé-culas, numa primeira fase tentando imitar produtos naturais com acções terapêuticas e, numa segunda fase, tentando

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responder aos conhecimentos adquiridos sobre o mecanis-mo de diversas patologias (doenças cardiovasculares, neu-rológicas e do foro psiquiátrico).

Da fase da investigação química, em que se colocaram no mercado centenas de moléculas (anti-histamínicos, an-ti-convulsivantes, anti-hipertensores, anti-psicóticos, anti- -ácidos, anti-inflamatórios, entre outros), assiste-se a uma fase em que aparecem numerosas entidades terapêuticas de natureza proteica, produtos que actuam ao nível dos sistemas enzimáticos e de origem biotecnológica, nomea-damente as vacinas.

Actualmente, têm sido aplicadas, em diversas áreas, novas entidades terapêuticas, como os anticorpos monoclonais, e a terapêutica celular e a terapêutica génica estão na ordem do dia.

A utilização de biomarcadores como testemunhos de um processo normal ou patológico tem cada vez mais impor-tância, nomeadamente em oncologia.

A nanotecnologia aplicada a diversas áreas da ciência desperta grandes esperanças na terapêutica com substân-cias medicamentosas.

Tal como tinha acontecido na década de sessenta do sé-culo XX com a tuberculose, as doenças infecciosas, como o VIH/SIDA, que há vinte anos eram prioridade das autori-dades sanitárias de todos os continentes, estão hoje con-troladas, não só pela prevenção primária, mas fundamen-talmente devido ao contributo dos medicamentos. Existem diversos estudos publicados que comprovam o papel de-terminante dos medicamentos na diminuição do número de mortes por VIH (Lichtenberg FR, 2009).

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Com base em estudos efectuados no Canadá (Lichtenberg FR. 2009), calcula-se que a introdução de novos medi-camentos nas últimas três décadas reduziu, na população estudada, o risco de morte em 51%.

As doenças cardiovasculares são, nas sociedades desen-volvidas, ainda, a principal causa de morte, seguida pelas doenças oncológicas.

Nos últimos anos foram introduzidos no mercado nume-rosos medicamentos na área cardiovascular (anti-hiperten-sores, anti-arrítmicos, anti-dislipidémicos) que, associados ao investimento da prevenção primária, conseguiram in-verter a carga social desse tipo de patologias. Num estudo publicado (Cutler DM, 2007) referente aos EUA, concluiu--se que, entre 1999 e 2000, a média estimada de pres-são arterial era 10% a 13% mais elevada sem o uso de anti-hipertensores. O uso de novos medicamentos cardio-vasculares promoveu, também, a diminuição do tempo de hospitalização (Lichtenberg FR, 2009).

Os resultados obtidos no aumento da esperança de vida de-ram lugar a questões associadas ao envelhecimento, nomea-damente o incremento da carga das doenças oncológicas, o que tem trazido novos desafios à investigação clínica. O número de medicamentos oncológicos aprovados pelas auto-ridades reguladoras tem aumentado nos últimos anos e pre-vê-se que corresponda a mais de 60% das novas entidades terapêuticas a serem aprovadas nos próximos cinco anos.

A investigação clínica reorienta-se ao longo do tempo para áreas referentes a patologias com maior importância para os Sistemas de Saúde, respondendo às necessidades dos Sistemas de Saúde e à procura de rentabilidade em-presarial por parte das companhias farmacêuticas.

O balanço das últimas dezenas de anos sobre o papel da terapêutica medicamentosa na melhoria do estado de

Saúde das populações é muito positivo. Os medicamentos, a par com outras medidas sanitárias, tiveram um papel determinante na evolução positiva de diversos indicadores que traduzem ganhos significativos em Saúde.

Para além da influência directa em resultados em Saúde, os medicamentos têm efeitos na melhoria da capacidade das sociedades para produzirem bens e serviços.

Alguns autores (Lichtenberg FR, 2009) consideram que o benefício dos novos medicamentos no aumento da capaci-dade de trabalho é nove vezes maior que o custo dos novos medicamentos.

Quando se aborda o tema dos medicamentos, a actualida-de é dominada pelas dificuldades existentes no seu finan-ciamento. Vivemos num período de contenção orçamental, sendo que grande parte do financiamento dos medicamen-tos é público (60% em Portugal).

Por outro lado, há a percepção, por parte das autoridades financiadoras e do público em geral, que os preços dos medi-camentos inovadores são demasiado elevados tendo em con-ta a capacidade de financiamento dos Sistemas de Saúde.

Há países que consideram que a Indústria Farmacêutica tem grande importância no desenvolvimento do sistema científico nacional e na promoção de riqueza e emprego qualificado (Alemanha, França, Itália, Reino Unido e Suíça).

Outros países mais periféricos, apesar de considerarem, nas sucessivas declarações dos governos, que a Indústria Farmacêutica nacional tem interesse estratégico e é gera-dora de exportações significativas e muito importantes na conjuntura actual, acabam por tomar medidas que denotam encararem a actividade da Indústria Farmacêutica como ge-radora de despesa pública.

Não se conhecem alternativas à Indústria Farmacêutica na geração de inovação terapêutica. Mesmo que se considere

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importante criarem-se alternativas a essa dominância cientí-fica, a obtenção de resultados levaria mais de uma década.

Queremos com isto dizer que estamos perante uma situ-ação em que, para bem dos doentes, os principais benefi-ciários da inovação terapêutica, é necessário encontrar so-luções que alterem os paradigmas e comportamentos das diversas partes que neste contexto são interdependentes.

Os medicamentos, com os impressionantes resultados obtidos, provaram ao longo dos anos o seu valor social e económico.

Num quadro global em que a Saúde e o Bem-Estar das po-pulações é unanimemente considerada uma prioridade por parte do poder político e dos cidadãos, e em que os recur-sos são limitados, é necessário encontrarem-se soluções.

A diabolização mútua reflecte uma prática medieval que não aponta soluções e leva-nos para o abismo.

São condenáveis práticas de abuso de posição dominante na fixação de preços num mercado imperfeito. Serão também condenáveis medidas administrativas cegas, que pretendem efeitos a curto prazo de contenção de despesa, não tendo em conta o interesse dos doentes e a importância económica de um sector dinâmico e gerador de novidade e inovação.

As soluções passam pelo estabelecimento de pontes de diálogo transparente, por procedimentos com base na evi-dência científica que valorizem a eficiência e efectividade, e não, apenas, os interesses de curto prazo.

BIBLIOGRAFIA

Cutler DM et al. The value of antihypertensive drugs ;Health Aff 2007;26;97-110.

Lichentberg et al. The impact of Drug Vintage on Patient Survival.;Value in Health 2009; 12:6.

Miguel Gouveia. O Valor Económico da produção de um Sistema de Saúde; Conferências CIP 2013.

Pierre Joly.; Les Médicaments du futur. Odile Jacob 2009.

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Excerto de cartaz publicitário do «Plasma Phosphatado»Instituto Doyen (1916-1919)

6.

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O SECTOR FARMACÊUTICO NACIONAL E MUNDIAL

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MERCADO DO MEDICAMENTO MUNDIAL, EUROPEU E NACIONAL

Heitor Costa Director Executivo da Apifarma

1939-1975: A ERA DO GRÉMIO NACIONAL DOS INDUSTRIAIS DAS ESPECIALIDADES FARMACÊUTICAS

Em 1939, enquanto a Europa vivia sob o fantasma da Gran-de Guerra e da consequente degradação da condição hu-mana, em Portugal, um grupo de homens une esforços e forma o Grémio Nacional dos Industriais de Especialidades Farmacêuticas, com o objectivo de organizar o sector.

Com a Guerra, o desenvolvimento de recursos e medica-mentos para o tratamento dos feridos e das doenças surgi-das pelas más condições existentes, catapultam a Indústria Farmacêutica para um dos seus pontos mais altos.

Conta-nos uma acta do ano de 1939:

Pela primeira vez na História da Indústria Farmacêutica Por-tuguesa, estavam consagradas as regras de comercialização de medicamentos entre as empresas da Indústria Farma-cêutica, os Armazenistas e as Farmácias – o Regulamento do Comércio dos Medicamentos Especializados.

Também inovadoras eram as elevadas preocupações des-tes industriais relativamente às questões de registo de mar-cas na Repartição de Propriedade Industrial e as questões relacionadas com a importação de medicamentos estran-geiros e de fabrico nacional.

Nos primeiros anos da década de 1950, a propriedade industrial ganha importância. É assim na Europa e em Por-tugal, com a regulamentação do comércio dos medica-mentos especializados pela Comissão Técnica dos Novos Medicamentos.

“Que se dê conhecimento ao Grémio Distrital dos Proprietá-rios de Farmácia de Lisboa, das resoluções tomadas quanto a descontos, justificando-os, como medida transitória imposta pelo estado actual de coisas, frisando-se que se terá em aten-ção, em melhor oportunidade, uma melhoria que se repute razoável, visto que de interesses comuns se tratar e não ser intenção do Grémio, ao proceder assim, sacrificar o interes-se próprio, o justo e legiítimo interesse farmacêutico, que à mesma entidade se peça, por parte dos seus agremiados, o rigoroso respeito pelo preço marcado, pondo-se assim cobro à irregularidade do desconto de favor, que de tal modo já entrou nos hábitos do público, sobretudo do dos grandes centros, que a sua existência, o que leva a pensar numa margem de lucros que nunca existiu, mas que, concedido como tem sido, permite o relaxamento de preços, em concorrência desleal, com o consequente descrédito das classes interessadas”, in Relatório da Direcção do GNIEF, Exercício de 1940.

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Primeiras estatísticas de vendas da Indútria Farmacêutica (Relatório e Contas da Direcção 1960)

O País registava vendas de 9 254 127 de unidades de especialidades farmacêuticas nacionais, pela importân-cia de 199 910 200$00. O preço médio de medicamen-to situava-se nos 21$60. E em termos de unidades de especialidades farmacêuticas estrangeiras, registavam- -se vendas de 6 042 321 unidades, pela importância de 184 500 220$00, e com um custo médio de 30$53.

Estes números evidenciavam já os benefícios da indús-tria nacional de especialidades farmacêuticas para os do-entes e para a economia do País.

Os anos 1950 marcam, ainda, o lançamento no mercado dos antibióticos manipulados, o que fez com que se regis-tasse uma subida efectiva do preço dos medicamentos. Por outro lado, a concorrência gerada entre laboratórios nacionais e estrangeiros originou a baixa dos preços dos antibióticos e, em consequência, a descida do preço mé-dio das especialidades importadas que, também, benefi-ciaram de uma redução dos direitos alfandegários.

Por sua vez, os anos 1960 ficam marcados por um mo-vimento mais geral de concentração de meios, quer eco-nómicos, quer tecnológicos e científicos, no sentido da criação de grandes complexos industriais. Na verdade, so-bretudo nos países mais desenvolvidos, assiste-se, nestes anos, a um movimento vertiginoso de fusão de empresas, gerador de grande concentração de meios.

Simultaneamente, a Medicina organiza-se, a Assistência Médica institucionaliza-se e o fornecimento de medica-mentos assume carácter de utilidade pública.

Para além disso, as empresas asseguram, por meio de patente, o direito ao uso exclusivo das especialidades far-macêuticas, para as venderem directamente ao público.

É nesta década de 60 que se regista uma taxa média anual de crescimento da produção de 14,5%. É uma taxa que supera, para a época, as previsões do planeamento

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e ultrapassa, francamente, os índices de crescimento da economia nacional, sendo, nomeadamente, superior em cerca de 50% à da indústria transformadora.

Em 1970, os valores da produção ascendem a 2 458 000 contos, o que representa um contributo de 1,5% para o PIB. Estes números referentes à produção assumem particular significado, se tivermos em consideração que o conjunto das indústrias transformadoras participa na constituição do PIB com cerca de 36,9% e que o valor acrescentado no sector dos medicamentos ronda os 63%.

A realidade da época evidencia que a indústria nacional perde prosperidade face à indústria internacional que se instala em Portugal, directamente ou através dos seus pro-dutos, ocupando uma parcela cada vez maior do mercado.

Paralelamente, verificam-se valores médios de cresci-mento das exportações e de fornecimentos ao Ultramar de 11,4% desde 1963. Nesta altura, são significativos os principais países importadores de medicamentos e maté-rias-primas portuguesas, revelando que a Indústria Farma-cêutica não se dirige somente, nem mesmo predominan-temente, aos países menos desenvolvidos, sinal claro de elevados padrões de qualidade.

Ainda nesta década, o mercado interno regista uma taxa média de crescimento de 13%. Dado que a propensão e necessidade de consumo de medicamentos ainda estava longe do ponto de saturação, verifica-se, na presente déca-da, uma evolução favorável da taxa de crescimento.

Nos anos 1970, começam a verificar-se alterações pro-fundas no exercício e enquadramento da actividade da In-dústria Farmacêutica que opera em Portugal, alterações essas que acompanham outras áreas na sociedade.

A institucionalização do Serviço Nacional de Saúde (SNS), em 1979, o regime de comparticipação de medicamentos, a valorização da profissão farmacêutica incentivada por

instituições como a Associação Nacional das Farmácias, e, depois, mais tarde, a entrada de Portugal na Comunidade Económica Europeia (CEE) foram decisivas para a revalori-zação da Farmácia e do Farmacêutico.

O peso da tecnologia e da investigação começa, agora, a impor-se, e como sector altamente inovador, a qualidade e a técnica são factores essenciais. De facto, a década de setenta marca, também, a aquisição, de forma generali-zada, de novas tecnologias, com o objectivo de melhorar a produtividade, de tornar mais apurada a preparação e o controlo das especialidades farmacêuticas, de comprovar a eficácia dos produtos e, ainda, de melhorar as condições de embalagem e conservação ou facilitar o manuseamento pelos doentes.

Assim, a década de setenta marca, também, o surgimento de novos produtos, cada vez mais específicos, que tornaram obsoletas algumas das matérias-primas em utilização.

Para além disso, a concorrência acentua-se e as em-presas vêem-se, agora, obrigadas a aumentar os custos comerciais. Neste condicionamento, a definição de uma política de preços impõe-se, por forma a garantir a viabili-dade da Indústria Farmacêutica Portuguesa. Os industriais desta época manifestam a preocupação no controlo dos preços, à margem das leis da concorrência, sobretudo com o constante aumento dos diferentes componentes nos pre-ços dos medicamentos: aumento do custo do dinheiro, da mão-de-obra e dos produtos subsidiários, mas, também, as exigências de renovação tecnológica – a substituição constante do equipamento fabril e de controlo, a utilização de novas técnicas de pesquisa em relação a novos produ-tos ou ao aperfeiçoamento dos existentes, e a renovação da organização administrativa e o consequente aumento do seu custo.

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O PÓS-25 DE ABRIL DE 1974

A 30 de Abril de 1975, o Grémio Nacional dos Industriais das Especialidades Farmacêuticas transforma-se na As-sociação Portuguesa da Indústria Farmacêutica. Os prin-cipais temas de destaque para a época são a contratação colectiva de trabalho; a situação económico-financeira das empresas, designadamente na área dos preços; e o po-sicionamento da Indústria Farmacêutica no quadro da polí-tica geral do País. O problema da viabilidade económica e financeira da generalidade das empresas constitui uma das principais preocupações vigentes na época, para além da in-flação e da desvalorização cambial do Escudo.

Em 1980, a formação dos preços dos medicamentos par-te dos custos do ano anterior (custos históricos), ignoran-do a inflação e a desvalorização do Escudo, bem como os prejuízos provocados pelos atrasos dos despachos dos pro-cessos de fixação ou revisão de preços. Destes problemas, emergem, também, baixos índices de rentabilidade e uma profunda debilidade da estrutura financeira das empresas.

O ano de 1982 fica marcado por uma recessão económi-ca, especialmente devido à incorrecta política de preços

seguida pelo Governo e às restrições de mercado resultan-te da entrada em vigor das taxas moderadoras. Em Junho de 1982, é introduzida a incorporação nos preços da des-valorização cambial do Escudo.

O ano de 1983 é, particularmente, relevante em termos de política do Medicamento: é publicada a lista de produ-tos não comparticipáveis; é estabelecido o regime de co-dificação dos medicamentos; as especialidades farmacêu-ticas de venda livre recebem tratamento legal autónomo; é proposto diferenciar os níveis de comparticipação, por parte dos serviços de Saúde do Estado, de acordo com o grupo ou natureza terapêutica do medicamento, tema com influência directa nas condições do mercado e no planea-mento das empresas.

Em 1984, um relatório de diagnóstico sobre a posição da Indústria Farmacêutica face à CEE, conclui que “[…] a posição do sector no quadro internacional é débil, confron-tando-se com dificuldades (a despeito de alguns aspectos positivos) cuja amplitude é de natureza a comprometer a sua recuperação e o arranque para uma evolução mais dinâmica. Daí a necessidade de inversão da situação actual e que, entre outros aspectos, passa, necessariamente, por uma reorienta-ção do sector no sentido de uma maior especialização e da acentuação da sua vocação exportadora (condições essen-ciais a um maior equilíbrio na balança comercial do sector e de um melhor ajustamento às exigências do consumo) e por um novo enquadramento económico e concorrencial para o sector (liberalização dos preços dos medicamentos) […]”.

De 1979 a 1984, a projecção do sector da Indústria Far-macêutica no conjunto da economia portuguesa não sofreu alteração significativa. Com efeito, o peso do sector no total nacional do PIB situa-se à volta dos 0,3% a 0,4%.

Ao nível do conjunto da CEE, a participação do sector no total das trocas comunitárias, em 1983, era de 0,7% para as importações e de 1,8% para as exportações, verificando-se,

“Não e possível admitir que, num mundo que não dominou nem está em vias de dominar a inflação, se possa atingir o desiderato da contenção dos preços, quanto mais o de provocar a sua descida. Felizes seremos todos se formos capazes de manter a sua subida dentro de limites razoáveis, porque a estabilização só se poderá conseguir a custo da sobrevivência das empresas. Mas, esta seria a melhor for-ma de provocar, depois, de uma subida galopante, porque, ninguém tenha dúvidas, os preços dos medicamentos nos últimos 20 anos só mantiveram a estabilidade que todos conhecem porque existiu uma indústria nacional válida, sem ela a subida teria sido em flecha”, in Relatório da Direcção do GNIEF, Exercício de 1970.

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portanto, que, tanto em Portugal como na CEE, a Indústria Farmacêutica ocupava no conjunto das trocas comerciais uma posição análoga (à volta dos 2,5%), embora o peso das importações do sector no nosso País fosse mais importante que na CEE (respectivamente, 1,8% e 0,7%), sendo a situa-ção respeitante às exportações o contrário (Portugal = 0,9%; CEE = 1,8%).

Apesar disso, verifica-se um crescimento mais rápido do comércio de exportação (+26,1%) do que da importação (+22,1%), em valores médios de 1980 a 1983, devendo-se essencialmente à forte progressão que registaram as ven-das de matérias-primas ao exterior (+38,1%). Por outro lado, é de referir que tanto as importações como as exportações globais do sector (matérias-primas e especialidades farma-cêuticas) cresceram menos rapidamente do que o comércio externo português em geral, sendo esse desnível particular-mente sensível no comércio de exportação – 26,1% para as exportações globais do sector e 30,7% para as exportações totais do País. Trata-se de um sector dependente das impor-tações (representam 4/5 do VBP), e sendo as exportações de valor mais reduzido (cerca de 3 milhões de contos, em média, entre 1980 e 1983), o sector é deficitário. Com efeito, entre 1980 e 1983, o défice da balança comercial do sector quase que duplicou, tendo subido de 6,5 milhões de contos para 11,3 milhões. Para esse défice – que representa quase 60% do VBP do sector –, contribuem fundamentalmente os produtos farmacêuticos (75%). Por outro lado, é de salien-tar que o sector ocupa no PIB da indústria transformadora comunitária uma posição mais forte (1,8%, com valores que atingem os 2,4% para Itália e os 2,6% para a Dinamarca) do que em Portugal (1,1% em 1981).

Na verdade, durante este período, o índice de preços no consumidor em termos globais acusa um crescimento médio na ordem dos 20% ao ano, enquanto no sector esse cresci-mento não é superior a 8,2%. Esta disparidade respeitante à

evolução dos preços é, em grande parte, resultado do bloque-amento imposto pelo Governo aos preços das especialidades farmacêuticas, constituindo, assim, um poderoso freio à livre expansão do sector, resultando num agravamento contínuo da situação com incidências fortemente negativas ao nível da estrutura financeira das empresas.

Durante o período de 1979 a 1982, a produção na Indús-tria Farmacêutica regista uma evolução francamente positiva quando comparada com a expansão que, durante o mesmo período, se verifica para o conjunto da produção nacional. Entre 1979 e 1982, a taxa média de crescimento do VAB na Indústria Farmacêutica é, em termos reais, três vezes supe-rior à taxa de expansão verificada para o PIBpm a nível nacio-nal; a preços correntes, a diferença entre as taxas médias de crescimento (respectivamente, 23,8% e 19,8%) já não é tão acentuada, o que se deve, fundamentalmente, ao facto de os preços na Indústria Farmacêutica crescerem a um ritmo muito mais lento do que o verificado para o conjunto da eco-nomia portuguesa.

A estrutura da produção do sector, bem como a contribui-ção de cada produto para o crescimento global da produção, encontra-se concentrada, fundamentalmente, em quatro produtos – medicamentos para o aparelho digestivo e me-tabolismo, anti-infecciosos, medicamentos para o aparelho cardiovascular e para o sistema nervoso central – os quais representam em conjunto 56% da produção.

O sector ocupa, no conjunto do volume de emprego da in-dústria transformadora, uma expressão bastante reduzida (1,1%). A taxa média de crescimento do volume de emprego no sector é de -0,8%, entre 1979 e 1982, sendo no total da indústria transformadora de 2,1%. Nos restantes países euro-peus, a evolução do volume de emprego no sector é bastante divergente. A Holanda, o Reino Unido e a Espanha registam uma tendência para a redução, com o contrário a registar- -se em países como a França, Itália e Escandinávia.

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A tendência na produtividade, na Indústria Farmacêutica é, neste período, de uma baixa acentuada, ao ponto de, em 1981, já não atingir o nível de produtividade constatada para o conjunto da indústria transformadora, depois de, em 1979 e 1980, ser superior em 1/4 e 1/5, respectivamente.

Entre 1979 e 1982, o consumo total de medicamentos para uso humano (que representa 93% do consumo total de medicamentos), medido em Escudos, cresce à taxa média anual de 17,8%, com uma redução drástica em 1982, em grande parte resultado das medidas de contenção de utili-zação de medicamentos postas em prática pelo Governo.

Importa frisar que uma boa parte do crescimento do con-sumo é satisfeito com recurso à produção nacional, não obstante as importações deterem, ainda, uma parte bas-tante significativa no consumo de medicamentos em Por-tugal. A parte do consumo de produção nacional sobe de 45%, em 1979, para 56%, em 1983, enquanto a relativa às importações desce de 40% para 35% no mesmo período. O que revela o esforço desenvolvido pelo sector produtivo no sentido de satisfazer as exigências do mercado, em termos quantitativos e qualitativos, e a consequente necessidade de um menor recurso aos fornecimentos do exterior.

Não obstante as elevadas taxas de crescimento do consu-mo de medicamentos verificadas, o consumo per capita de medicamentos em Portugal é dos mais baixos da Europa, o que traduz as profundas carências que se verificavam no nosso País em matéria de assistência medicamentosa, e o esforço que era necessário desenvolver para nos aproxi-marmos da situação vigente nos países mais desenvolvi-dos. À semelhança dos medicamentos, também os gastos com a Saúde em Portugal são consideravelmente inferio-res aos despendidos por outros países europeus: Espanha gasta, em termos de despesas per capita, mais do dobro do que Portugal, o Reino Unido 5 vezes mais, a República Federal Alemã 7 e a França e a Holanda 10.

A metodologia de preços em vigor, em Julho de 1985, é completamente adulterada em 1986, com a imposição de limites aos aumentos dos preços dos medicamentos, originando uma descida de 0,6% nos preços dos produtos, comparativamente aos preços em Dezembro de 1985.

No ano de 1985, é adoptado o regime de I.V.A. para o sector da Indústria Farmacêutica, de particular importân-cia no que se refere ao problema das matérias-primas e excipientes incorporados nos produtos.

Num relatório de 1981-1985, refere a Direcção da Apifar-ma, que “as medidas impostas no sector continuam a ser feitas sem se ter em atenção a realidade prática do que é uma empresa; têm sido tomadas como se de um exemplo teórico se tratasse. A alteração de preços provocada pela Portaria de 10 de Janeiro de 1987 é um bom exemplo do desfasamento entre quem faz as leis e quem as tem que praticar. A ambiguidade e a falta de conhecimento quanto às próximas acções das entidades governativas, no sector da Saúde, continuam a constituir um entrave ao desenvolvi-mento de todos os sectores da actividade farmacêutica”.

O ano de 1987 é particularmente difícil, porque não são claras para a Indústria as orientações do Governo para o sector, porque se desconhecem os tempos necessários para a alteração da legislação portuguesa e a sua adapta-ção à legislação comunitária, e, ainda, porque a ideia de uma Política de Saúde, e mais particularmente do Medica-mento, assente na base da livre iniciativa, da competição e no livre funcionamento do mercado, é bastante difusa.

O ano de 1988 assinala a publicação do novo Regime de Comparticipação dos Medicamentos e a revisão das Espe-cialidades Farmacêuticas. As empresas vêem determinado o congelamento dos preços dos medicamentos – de PVP superior a 250 escudos – por um período de seis meses, fundamentado na necessidade de proceder à revisão da metodologia e formação de preços em vigor. Posteriormen-

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te, com data de 13 de Agosto, é publicada a Portaria n.º 548/88 e o Despacho Normativo n.º 69/88, que regula-mentam a formação e o aumento dos preços para vigora-rem de Outubro de 1988 a Abril de 1989.

O sector entra nos anos 1990 com um enquadramento conjuntural de grande expectativa. Diz o Relatório da Direc-ção do Exercício de 1991, que “[…] não nos enganámos na mudança de relacionamento que efectivamente se operou, mas encerramos o ano com a mesma carga de expectativa e interrogações quanto ao futuro”.

O ESTATUTO DO MEDICAMENTO

Na legislação portuguesa, o Decreto-Lei n.º 72/91, de 8 de Fevereiro, é o primeiro diploma oficial a abordar o medica-mento com base nas directivas europeias e ficou conheci-do por “Estatuto do Medicamento”. Com a sua publicação, “inicia-se uma nova era no sector farmacêutico, designa-damente no domínio da introdução no mercado, controlo de qualidade e fabrico de medicamentos de uso humano”, conforme preâmbulo do referido diploma. Revoga a legis-lação existente, alguma dela dos anos 1930 e inadequada face aos progressos sociais, económicos, técnicos e cien-tíficos. Este diploma vem modernizar o sistema de regula-ção do medicamento desde a introdução no mercado até à comercialização, introduzindo tópicos inovadores em di-versas áreas do medicamento: os processos nacionais e europeus de autorização de introdução no mercado (AIM), as regras a observar no que diz respeito a medicamentos derivados de sangue e do plasma humano, bem como me-dicamentos imunológicos e radiofármacos.

Nesta altura, assinala-se, também, a alteração em termos de rotulagem e do folheto informativo, que surge mais por-menorizado e mais virado para o aconselhamento ao utente.

A publicidade é amplamente alterada com o Decreto-Lei

de 1991. As inovações a nível da legislação da publicidade a medicamentos são profundas, quer para medicamentos su-jeitos a receita médica obrigatória, como para medicamen-tos não sujeitos a receita médica, visando a defesa da Saúde, a sua protecção, a satisfação das necessidades da popula-ção e a racionalização do consumo dos medicamentos.

O Decreto-Lei n.º 176/2006, de 30 de Agosto, revoga o Decreto-Lei n.º 72/91, de 8 de Fevereiro. Este novo Estatuto do Medicamento, transpõe para o Direito português novas directivas comunitárias sobre o fabrico, controlo da quali-dade, segurança e eficácia, introdução no mercado e co-mercialização dos medicamentos para uso humano.

Neste diploma, foi necessário legislar de acordo com o progresso das ciências e das técnicas, bem como, os avan-ços operados no sector da regulação do mercado do medi-camento, das políticas de Saúde e do Medicamento e que necessitavam de leis e de regulamentos adaptados.

A intervenção do Estado na área do medicamento é to-tal – AIM, preços, comparticipações, publicidade, farma-covigilância, ensaios clínicos, etc., sendo que as razões de Saúde Pública obrigam ao reforço da supervisão do sector. Por isso, do ponto de vista institucional, o diploma de 2006 vem dotar a Autoridade Reguladora Nacional de ferramen-tas para uma acção mais activa no plano da fiscalização relativamente ao cumprimento da legislação em vigor e no vector do aconselhamento científico da Indústria Farma-cêutica em Portugal, tendo em conta o contexto europeu.

INDÚSTRIA FARMACÊUTICA EM PORTUGAL: CONTRIBUTO PARA A PRESTAÇÃO DE MAIS E MELHORES CUIDADOS DE SAÚDE

Em 1991, surgem as primeiras preocupações relacionadas com as dívidas dos hospitais aos Laboratórios. Em Maio de 1992, a dívida dos hospitais às empresas associadas atinge

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os 16 milhões de contos e o atraso nos pagamentos dos for-necimentos hospitalares atinge os 17 meses.

A Direcção da Apifarma desenvolve esforços no sentido de resolver o problema, alertando o Ministério da Saúde para o agravamento da situação e chegando, até, a propor a ce-lebração de um protocolo financeiro. Isto sem êxito, uma vez que o montante das dívidas a mais de 90 dias cresceu 136,6% entre Maio de 1991 e Maio de 1992. Esta situação de não satisfação dos compromissos por parte das institui-ções dependentes do Ministério da Saúde, bem como o mon-tante dos valores em causa, colocava as empresas no limite do esforço financeiro que podiam suportar. Não obstante, as empresas farmacêuticas asseguravam, através do forneci-mento de medicamentos aos hospitais, a prestação de mais e melhores cuidados de Saúde e a sua contribuição para um bom funcionamento dos cuidados hospitalares.

Em 1994, as empresas decidem, pela primeira vez, ela-borar um contrato de factoring, numa tentativa de resolu-ção definitiva das dívidas dos hospitais. Ao mesmo tempo, o Orçamento de Estado para 1995 prevê um montante de 70 milhões de contos para pagamento de dívidas atrasa-das do Serviço Nacional de Saúde, onde está incluída a In-dústria Farmacêutica, facto que condiciona a aplicação da solução de factoring. Em Dezembro de 1999, o valor atinge os 80 milhões de contos e um prazo médio de recebimen-to de 378 dias e, no ano seguinte, atinge 86,5 milhões de contos e um prazo médio de recebimentos de 402 dias.

Em 2001, a dívida atinge o nível mais elevado de sem-pre, chegando aos 140 milhões de contos, no mês de Agosto, correspondendo a um atraso médio da ordem dos 493 dias. Após a publicação do Despacho Conjunto n.º 791-A/2001, de 30 de Agosto, os hospitais são dotados de 290 milhões de contos, com o objectivo de liquidar as dí-vidas vencidas até Dezembro de 2000 pelos fornecimentos

ao SNS. Desse montante, e na sequência da monitorização dos pagamentos dos hospitais, realizada pela Apifarma, a Indústria apura o recebimento de apenas 59,5 milhões de contos, ficando por liquidar cerca de 25% da dívida glo-bal anterior a 31 de Dezembro de 2000. Assim, após um período de redução dos prazos médios de recebimento, resultante do reforço de verbas atrás referido, as dívidas hospitalares sobem de novo, registando-se, em Dezembro de 2001, uma dívida de 110,490 milhões de contos e um prazo médio de cobrança de 368 dias.

O início do novo milénio regista o contínuo agravamento dos valores em dívida, apesar dos sucessivos esforços dos Governos para inverter esta tendência de crescimento. Ac-tualmente, a dívida dos hospitais do SNS à Indústria Far-macêutica totalizou, em Setembro de 2014, 1073 M€, com um prazo médio de recebimento na ordem dos 506 dias, o que representa já mais de um ano e meio de fornecimentos sem juros.

Fonte: IMS.

173

Devido à falta de protecção de patente de produtos até 1995, e o consequente permitir de um mercado de cópias com pre-ços inferiores aos dos medicamentos originadores, os genéri-cos têm o seu espaço ocupado por produtos mais baratos.

Com a entrada no ano de 2000, o tema dos medicamen-tos genéricos está na ordem do dia. O Governo anuncia um conjunto de medidas com o objectivo de reforçar a quota de mercado destes medicamentos, sendo que o ano de 2002 marca o início das medidas relativas à prescrição por Deno-minação Comum Internacional (DCI) e à introdução do siste-ma de preços de referência.

No que se refere ao mercado de genéricos, os últimos anos mostram um forte crescimento e consolidação do mercado, que atinge, no mercado total, uma quota em vo-lume unitário de 35,3% e de 18,6% em valor.

A 25 de Novembro de 1993, a Apifarma, o Minis-tério da Saúde e o Ministério do Comércio e Turis-mo assinam um protocolo que conduz a uma redu-ção no preço global dos medicamentos para 1994. Desde 1997, têm vindo a ser assinados diversos Protoco-los entre o Governo e a Indústria Farmacêutica, visando o

estabelecimento de limites de crescimento da despesa com medicamentos e acordando a contribuição das empresas, caso o crescimento do mercado viesse a ser superior ao es-tipulado. Corporiza-se, deste modo, a colaboração das em-presas farmacêuticas na procura de soluções para os proble-mas do financiamento do SNS, criando condições de apoio ao desenvolvimento sustentado da Indústria Farmacêutica.

A CRISE ECONÓMICA E A TROIKA

O ano de 2009 é marcado pelo impacto da crise económica e pela discussão em torno de eventuais modificações do re-gime de preços e margens, bem como pela necessidade de desencadear acções face a situações de verticalização e limi-tações da concorrência existentes no sector.

O ano de 2010 fica sujeito a medidas sucessivas e ines-peradas de reduções no preço dos medicamentos e de res-trições no seu acesso ao Sistema de Saúde. A Saúde surge como a principal área de medidas de contenção, com en-

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Protocolos

Limite Crescimento dos encargos do SNS com medicamentos comparticipados

+Valor máximo da contribuição

% da Contribuição +

Valor real da contribuição

1997

1998

% de Contribuição da Indústria64,3% do crescimento dos encargos do SNScom a comparticipação de medicamentos.

Valor da contribuição6,3 Milhões de contos 31,420 Milhões €. (crescimento:11,48% => Contribuição. Máxima)

Contribuição máxima6,3 Milhões de contos 31,420 Milhões €.

LimiteEntre 4% e 11% relativamente ao ano 1996.

Contribuição máxima6 Milhões de contos 29,928 Milhões €.

LimiteAcima de 4% acrescido de 75% do valorda taxa de inflação do ano anterior.

% de Contribuição da Indústria64,3% do crescimento dos encargos do SNS com a comparticipação de medicamentos.

Valor da contribuição3,3 Milhões de contos 16,470 Milhões €.

1999Contribuição máxima5,5 Milhões de contos 27,434 Milhões €.

LimiteAcima de 4% acrescido de 80% do valorda taxa de inflação.

% de Contribuição da Indústria64,3% do crescimento dos encargos do SNS com a comparticipação de medicamentos.

Valor da contribuição3,3 Milhões de contos 26,302 Milhões €.

LimiteEntre 6,5% e 10,5% relativamente ao ano anterior.

% de Contribuição da Indústria64,3% do crescimento dos encargos do SNS com a comparticipação de medicamentos.

Valor da contribuição19,783 milhões €.

2001

PROTOCOLOS DE COLABORAÇÃOIndústria Farmacêutica/Governo

2004

LimiteAcima de 8% dos encargos do SNSverificados no ano anterior.

% de Contribuição da Indústria64,3% do crescimento dos encargos do SNS com a comparticipação de medicamentos.

Valor da contribuição9,980 Milhões €.

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Protocolos

Limite Crescimento dos encargos do SNS com medicamentos comparticipados

+Valor máximo da contribuição

% da Contribuição +

Valor real da contribuição

2006

2007

2011

2012

2013

2014

Contribuição máxima35 Milhões €.

LimiteAté 4% do crescimento dos encargos do SNSde 2006 em relação a 2005

% de Contribuição da Indústria69,6% do crescimento dos encargos do SNS com a comparticipação de medicamentos.

Valor da contribuição(Não se atingiu o limite de crescimento Enc. SNS)

% de Contribuição da Indústria69,6% da parte dos encargos que ultrapas-saram os limites previstos.

Valor da contribuição0€ (Não houve crescimento dos Enc. SNS)

Contribuição máxima45 Milhões €.

LimiteAté 4% acima do crescimento do PIB previsto p/ 2007 [a partir do crescimento do PIB para 2007 e até + 4%]

Valor da contribuição(Cumpridos os objectivos dos Enc. SNS)

Limite dos encargos do SNS: • 1440 Milhões € - M. Amb.• 2% Inferior ao valor de 2010 - M. Hosp.

Valor da contribuição136,7 Milhões €.

Contribuição máxima300 Milhões € • 130 Milhões € => M. Amb.• 170 Milhões € => M. Hosp.

Limite dos encargos do SNS: 2.038 Milhões €• 1196 Milhões € => M. Amb.• 842 Milhões € => M. Hosp.

Valor da contribuição122 Milhões €.Contribuição máxima

122 Milhões €.

Limite Não estabelecido

Valor da contribuição160 Milhões €.Contribuição máxima

160 Milhões €.

Limite Mercado total do SNS de 2000 Milhões €

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foque particular no medicamento, traduzidas em reduções de preços que atingem os 13%, sem paralelo em qualquer outro ano e em qualquer outro sector.

Ente 2011 e 2013, período em que Portugal esteve sob programa de assistência económica e financeira, com a as-sinatura do Memorandum of Understanding (MoU), em Maio de 2011 (com o Fundo Monetário Internacional, a Comis-são Europeia e o Banco Central Europeu), o País está sob fortes medidas de austeridade, o que condiciona fortemen-te a actividade económico-financeira com implicações no agravamento do desemprego, na desaceleração do consu-mo privado e do investimento público.

Com a taxa de desemprego a disparar para níveis iné-ditos, atingindo o máximo de 17,7%, no 1.º trimestre de 2013, uma redução constante deo PIB, que atingiu um mí-nimo de contracção de -4% no 1º trimestre de 2013.

Uma das áreas públicas mais atingida é a área da Saúde, e em particular do medicamento, que contribui com mais de 50% para a redução de encargos do sector. Durante estes anos, as medidas de contenção de custos sobre o medicamento fazem-se sentir com a produção de muita legislação específica. Destacam-se:

- a implementação total da obrigatoriedade de prescrição electrónica para efeitos de comparticipação pelo SNS;

- a alteração das margens de comercialização dos medi-camentos;

- a revisão anual de preços com escolha de países de refe-rência que estão entre os que têm dos preços mais baixos a nível europeu;

- o incentivo à prescrição de medicamentos genéricos; - o controlo e monitorização de prescrições, através das

Normas de Orientações Cliínicas; - o controlo dos gastos a nível hospitalar, com o alarga-

mento da instituição da compra centralizada.Neste contexto, a Indústria Farmacêutica tem um papel

de grande responsabilidade, contribuindo para a Sustenta-

Fonte: Infarmed.

bilidade do SNS, não só por encaixar o efeito das medidas, que se repercutem a nível da perda de postos de trabalho e da capacidade de investimento, mas, sobretudo, porque tem colaborado activamente com o Governo, assinando Acordos para a redução de encargos do SNS com medica-mentos, em ambulatório e a nível hospitalar, durante vá-rios anos consecutivos – 2011, 2012, 2013 e 2014 -, os quais se saldam numa contribuição total efectiva por par-te dos associados da Apifarma em 325 milhões de euros (418,7 M€ de toda a Indústria Farmacêutica). Os resulta-dos de tal contexto encontram-se espelhados nas figuras abaixo.

O valor do mercado farmacêutico Português está em con-tracção desde 2010, tendo totalizado 3421 milhões de eu-ros em 2013, ou seja, menos -20% do valor registado em 2010.

Este decréscimo é o resultado das sucessivas medidas na área do medicamento, focalizadas na redução dos preços.

Em termos de classes terapêuticas, verificou-se que, em 2013, as vendas em valor no mercado ambulatório con-

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Já para o mercado hospitalar, em 2013, verificou-se que os medicamentos responsáveis por 58,8% da despesa foram os Imunomoduladores, Antivíricos e Citotóxicos. Sendo que, em termos de tendências, se destaca o crescimento dos Citotóxi-cos (+3,5%) e, em sentido oposto, os Factores estimulantes da hematopoiese (-34,6%) e Antibacterianos (-17,8%), devido

A INDÚSTRIA FARMACÊUTICA A NÍVEL NACIONAL

Actualmente, as empresas farmacêuticas estabelecidas em Portugal são, na sua maioria, de capital estrangeiro. Este panorama está relacionado com o historial do condicio-namento industrial em Portugal e a capacidade de inova-ção das indústrias farmacêuticas portuguesas. Isto poderia fazer-nos entrar, igualmente, na questão das patentes e nas alterações operadas a este nível com a entrada em vigor, em 1996, do Registo de Patentes de Produto em substituição do Registo de Patentes de Processo, que terá contribuído para o declínio da quota de mercado de capital nacional existente na indústria farmacêutica no nosso País.

Fonte: IMS.

Fonte: OCDE; * dados de Portugal referem-se a 2011.

centraram-se nos medicamentos para a hipertensão, para a diabetes, os antidislipidémicos e para a saúde mental, muito em linha, aliás, com o que se observa no mercado mundial. As oito principais classes terapêuticas na figura abaixo representaram 45% das vendas registadas no mer-cado ambulatório.

à introdução de medicamentos genéricos e biossimilares.O enquadramento do mercado farmacêutico em Portugal

com os restantes países da Europa, para que tenha uma base comparável, deve ser realizado em valor per capita, e corrigido pela paridade do poder de compra. Tal compa-ração, de acordo com os dados mais recentes da OCDE, mostra que, já em 2011, antes dos cortes registados em 2012 e 2013, Portugal estava abaixo da média europeia.

178

São mais de 140 as empresas farmacêuticas (importadoras ou produtoras de medicamentos) a operarem em Portugal.

De acordo com os dados mais recentes, a indústria far-macêutica é responsável por mais de 8000 postos de tra-balho directos no nosso País (Apifarma, 2013).

A produção em Portugal de matérias-primas e de produtos farmacêuticos registou, nos últimos anos, uma tendência de decréscimo, com excepção do ano de 2013, em que a produ-ção voltou a crescer, registando 1434 milhões de euros.

Em termos da balança comercial, a indústria farmacêu-tica em Portugal é dependente das importações, mas o rácio de exportações face às importações tem vindo a crescer em resultado do crescimento das exportações, que, em 2013, totalizaram 732 milhões de euros, corres-pondendo a um crescimento homólogo de 4%.

Em 2013, os principais destinos de exportação foram a União Europeia com 64%, seguida dos países dos PALOP com 13% do valor das exportações.

Fonte: INE.

Fonte: INE.

Fonte: INE.

179

Relativamente a empresas portuguesas, em 2013, o seu volume de negócios cifrou-se em 340,6 milhões de euros (valor PVA) no mercado ambulatório, o que representou 18,2% do total das vendas do ambulatório. Comparativa-mente com o seu peso em 2010, a sua importância relativa no mercado aumentou em 1,7%.

Embora as empresas líderes de mercado em Portugal sejam as grandes multinacionais, detentoras dos medica-mentos de marca, se analisarmos no contexto estrito na-cional, e para o mercado ambulatório, podemos verificar que as principais empresas portuguesas a operarem no mercado, em ternos de vendas em valor, são as que se encontram na figura, que considera os grandes Grupos far-macêuticos portugueses e o seu posicionamento relativo, em 2013, no âmbito do mercado ambulatório total.

COMPARTICIPAÇÕES EM PORTUGAL

Os apoios/benefícios sociais aparecem em Portugal em 1919, com o Seguro Social Obrigatório na Doença, uma vi-ragem na História da Assistência Social e na História da Saúde em Portugal. Em 1935, foram criadas as instituições de Previdência Social do Estado Novo Corporativo. Inicial-mente, os apoios/benefícios não incluíam os medicamen-tos e só o Decreto n.° 37 762, de 1950, é que vem regular a assistência medicamentosa, como era à altura conhecida, dos beneficiários das instituições e seus familiares.

Mas havia muitas instituições de previdência que, já antes, concediam medicamentos injectáveis, sulfamidas e vacinas aos seus beneficiários, restrição abolida pelo referido decre-to. Limitava-se o receituário aos medicamentos, injectáveis, ou não, constantes de lista ou formulário adequado. Foram estabelecidas senhas de consulta e um limite máximo de tempo para usufruir de assistência medicamentosa.

O alargamento efectivo das comparticipações aos familia-res só ocorre em 1960, bem como a comparticipação dos medicamentos de origem nacional. Medicamentos estran-geiros só eram comparticipados se não houvesse equivalen-te nacional. As fases que se seguiram foram o alargamento a medicamentos originários de países da EFTA e, mais tarde, a todos os medicamentos, independentemente da origem. Os escalões de comparticipação são estabelecidos pela pri-meira vez em 1984. O Estatuto do Medicamento incluiu um capítulo referente à comparticipação de medicamentos (Ca-pítulo VI), mas que não introduziu grandes novidades.

Em 2000, dá-se também início à revisão do sistema de comparticipações de medicamentos pelo SNS. Politica-mente recompensadora e tecnicamente de fácil aplicação,

Fonte: INE.

180

a utilização dos regimes de preços e do regime de compar-ticipações é uma constante destes últimos anos.

Seguem-se cortes nas percentagens de comparticipação do Estado, a criação do Regime Especial e mais uma série sucessiva de alterações até à actualidade, sempre com o objectivo último de alcançar a tão desejada sustentabilida-de do sistema.

Em consequência de todos os reajustamentos e cortes de preços, verifica-se que a taxa média de comparticipação registou uma forte redução em 2010, verificando-se que foi de 63,6% em 2013, implicando um dos mais elevados níveis de co-pagamento em Portugal, quando comparado com os restantes países europeus.

I&D em Portugal

Em Portugal, só em finais da década de oitenta, surge o Centro de Estudos de Bioética, que dá origem, em 1990, ao Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, vocacionado para a reflexão teórica e para a definição das grandes directrizes no campo da Bioética. Em 1994, foi publicado o Decreto-Lei 97/94, que estabelece “as normas

a que devem obedecer os ensaios clínicos a realizar em seres humanos” e que obriga, entre outros requisitos, ao parecer favorável de uma Comissão de Ética. Mas este di-ploma só se torna exequível com a publicação do Decreto-Lei 97/95, que define a composição e funcionamento das Comissões de Ética para a Saúde (CES). Uma por cada instituição, as CES possuem um vasto conjunto de compe-tências entre as quais a de se pronunciar sobre os pedidos de autorização para a realização de ensaios clínicos e a de fiscalizar a sua execução.

A Directiva 2001/20/CE, vem procurar obter uma har-monização das várias legislações europeias e uma maior rapidez na apreciação dos projectos de ensaios clínicos, emitindo, também, um claro sinal no sentido do parecer único que apontava para a criação, em cada país europeu, de uma só comissão de ética com competência para avaliar os ensaios clínicos com medicamentos para uso humano.

A Lei 46/2004, que transpõe para a legislação portugue-sa o conteúdo da Directiva, cria a Comissão de Ética para a Investigação Clínica (CEIC) que, a partir de Junho de 2005, passa a ser a autoridade competente para emitir parecer sobre a realização de ensaios clínicos com medicamentos de uso humano.

A maioria dos ensaios clínicos realizados em Portugal é pro-movida por empresas farmacêuticas multinacionais. Por cada euro investido, estima-se que haja um retorno de quase dois euros no total da economia portuguesa, tornando esta uma das actividades com maior retorno de investimento do País.

No entanto, o número de ensaios clínicos submetidos em Portugal, entre 2006 e 2012, caiu 26%, de 160 para 118 estudos, colocando a taxa de ensaios clínicos, por milhão de habitantes em Portugal, entre as mais baixas da Europa Ocidental.

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De acordo com os dados mais recentes do IPCTN 2011, do total de despesas em I&D em 2011, 47% foram reali-zadas pelo sector empresas, no qual a “Fabricação de pro-dutos farmacêuticos de base e de preparações farmacêu-ticas” representou 7,2% do valor, ocupando a 4.ª posição em termos de despesa por actividade económica.

Ao longo dos últimos três anos, a despesa em I&D no sector da IF tem vindo a aumentar, atingindo, em 2011, 87,5 M€, correspondendo a um aumento de 12,3% face a 2010. De ressalvar que 80,6% do investimento provém de fundos próprios, isto é, das próprias empresas.

No ano de 2012, o investimento realizado por estas em-presas na actividade de ensaios clínicos atingiu o valor de 36 milhões de euros, contribuindo, adicionalmente, para uma poupança da despesa pública em medicamentos e meios complementares de diagnóstico no valor 3,5 mi-lhões de euros.

No mesmo ano, a análise dos dados de empregabilidade revelou a existência de mais de mil postos de trabalho de-dicados aos ensaios clínicos.

A actividade de ensaios clínicos foi responsável por um VAB global de 72 milhões de euros, em 2012, e, por cada euro investido, estima-se que haja um retorno de 1.,98 eu-ros no total da economia portuguesa, sendo assim uma das actividades com maior retorno de investimento do País.

Para além disso, é recentemente publicada a Lei n.º 21/2014, de 16 de Abril, que cria um quadro de referência global para a Investigação Clínica em Portugal, aplicável a todas as áreas da iInvestigação Clínica.

Generaliza-se o registo dos estudos pelas próprias ins-tituições e a apreciação e acompanhamento pelas comis-sões de ética, Comissão de Ética para a Investigação Clí-nica (CEIC) e o Infarmed, I.P., ao mesmo tempo que se clarificam as responsabilidades e papéis do promotor, in-vestigador, monitor e centro de estudo clínico.

É também criado o Registo Nacional de Investigação Clí-nica e a obrigação implícita de os vários intervenientes no processo se registarem no mesmo, constituindo a criação de uma plataforma total e completa para o registo dos es-tudos clínicos, com base na Plataforma Nacional de En-saios Clínicos dinamizada pelo Infarmed, I.P.

A INDÚSTRIA FARMACÊUTICA A NÍVEL MUNDIAL

A indústria farmacêutica a nível mundial é dominada por empresas de larga escala, multinacionais, que comerciali-zam os seus produtos em todo mundo.

Na indústria farmacêutica, existem as empresas que in-vestem em I&D, trazendo novos medicamentos para o mer-cado, e empresas que fabricam produtos genéricos (que são produtos já sem patente).

As vinte maiores empresas a nível mundial que formam mais de metade do valor do mercado, investem activamente

Fonte: IPCTN 2011.

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em I&D e são extremamente dependentes do sucesso da inovação. Estas empresas utilizam as marcas e patentes para proteger os novos medicamentos descobertos e maxi-mizarem o seu lucro potencial. Os lucros obtidos estão, em larga medida, dependentes do número de medicamentos que ainda têm patente. São estes lucros que geram a re-ceita necessária para conduzir o dispendioso processo de descoberta e desenvolvimento de um novo medicamento. Como o desenvolvimento de um medicamento é intensivo em investigação, as companhias farmacêuticas reinvestem em I&D maior percentagem dos seus lucros do que qual-quer outra indústria.

No continente europeu, a indústria farmacêutica é um elemento essencial da economia e representa um dos sec-tores com melhor desempenho ao nível da elevada tecno-logia.

O VALOR DO MERCADO FARMACÊUTICO MUNDIAL

De acordo com o IMS, as vendas globais da indústria far-macêutica totalizaram, em 2012, 964 mil milhões de US dólares, correspondendo a um crescimento de 2,4%, em re-sultado, fundamentalmente, do crescimento nos mercados emergentes (China, Brasil, Rússia, etc.), já que nos merca-dos maduros se assistiu ao pico da queda de patentes e forte contenção de custos por parte dos financiadores.

Os Estados Unidos continuam a ser o maior mercado, mas o resto do mundo, onde se incluem os países emer-gentes, já representam 29,4% do valor de mercado.

Nos últimos anos, a indústria farmacêutica é marcada pelo crescimento dos genéricos e a expiração de grande número de patentes. Esperando-se que o mercado de ge-néricos continue a crescer, para além do surgimento de

uma nova área dos biossimilares, é também verdade que, para a indústria inovadora, a pior fase de queda de paten-tes já foi ultrapassada. No entanto, continuarão a entrar no mercado novos genéricos à medida que o período de protecção das patentes vai caducando, mas já não terá o impacto dos últimos anos.

Em termos de classes terapêuticas, em 2012, as vendas concentram-se nos medicamentos oncológicos, para o tra-tamento da dor, anti- hipertensores, anti- diabéticos e para a Saúde Mental, totalizando 29,5% do valor de mercado.

Por outro lado, de acordo com o IMS, a dinâmica de cres-cimento é retomada, estimando-se que o mercado chegue aos 1,2 mil milhões de USD, em 2016, representando uma taxa de crescimento anual composta (CAGR) de 3-6%, de 2012 a 2016.

Em termos de inovação, é também expectável o apare-cimento de soluções disruptivas, isto é, de medicamentos muito mais específicos e eficazes, que curam a doença,

183

como é já o exemplo da Hepatite C. Estes medicamentos serão essencialmente de base biotecnológica e direcciona-dos, em grande parte, para as doenças oncológicas, auto-imunes e neurológicas.

EMPRESAS LÍDERES

As empresas líderes na Indústria Farmacêutica são, simul-taneamente, das maiores empresas a nível mundial.

São empresas internacionais em termos de vendas, de actividade de produção, com subsidiárias e filiais. O do-mínio de empresas de larga escala tem vindo a aumentar, principalmente nos últimos anos, em resultado de movi-mentos de concentração via aquisições e fusões.

Em 2012, as 15 maiores empresas farmacêuticas mun-diais concentraram 52% das vendas globais.

TENDÊNCIAS DO MERCADO

Apesar da contínua expansão do mercado farmacêutico, a dinâmica subjacente continua a alterar-se. Segundo o IMS, os produtos em que as vendas excediam os 18 mil milhões de dólares perderam a patente em sete mercados- chave, incluindo o dos EUA, que representa 14 mil milhões das suas vendas. Os genéricos têm vindo a assumir cada vez mais um papel central na restrição das despesas de saú-de, com a elevada adesão a terapêuticas de baixo custo, substituindo os produtos de marca em classes como os antidislipidémicos, antidepressivos, inibidores de agrega-ção plaquetária, antieméticos e agentes respiratórios.

Um outro factor a influenciar o mercado é o forte au-mento do papel dos doentes ao cuidarem da sua Saúde e procurarem o acesso a tratamentos que melhorem ou prolonguem a sua vida. Dado que são consumidores finais,

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ganham influência em relação às decisões relativas ao acesso aos medicamentos. As empresas de maior sucesso serão aquelas que têm o foco nos consumidores finais e doentes, sem perderem a perspectiva do crucial papel dos médicos.

Para manter o crescimento, as empresas farmacêuticas terão de estar conscientes da dinâmica do mercado mun-dial, designadamente as oportunidades dos mercados ma-duros e emergentes e um compromisso para melhor de-monstrar o valor dos seus medicamentos junto das partes interessadas-chave, incluindo os pagadores.

Segundo um relatório sobre o futuro da Indústria Farma-cêutica, publicado pela Pricewaterhouse Coopers, intitu-lado Pharma 2020: The Vision - Which Path Will You Take?, haverá uma expansão do mercado farmacêutico global, podendo atingir 1,3 trilião de Dólares em 2020. Este cres-cimento é baseado, sobretudo, no maior recurso a trata-mentos preventivos, à medida que a população mundial cresce e que aumenta a proporção de idosos e de obesos, em virtude da maior esperança de vida e do maior poder de compra.

Estas últimas previsões apontam para a tendência de crescimento do mercado farmacêutico mundial, de acordo com o que se tem verificado nos últimos anos. Desse modo, países emergentes como a Índia, a China, a Indonésia, o México, a Rússia e a Turquia deverão ser responsáveis por 1/5 das vendas globais de produtos farmacêuticos. O es-tudo prevê, ainda, que o quadro de doenças crónicas nos países em desenvolvimento será cada vez mais similar ao do mundo desenvolvido. No entanto, o actual modelo de negócios da Indústria Farmacêutica é economicamente di-fícil de sustentar e operacionalmente incapaz de produzir, ao ritmo necessário, os tratamentos inovadores exigidos

pelo mercado global. Para aproveitar essa futura oportuni-dade de crescimento, a indústria tem, fundamentalmente, vindo a mudar o seu modus operandi.

O relatório da Pricewaterhouse Coopers afirma, ainda, que, apesar da procura sem precedentes, a Indústria Far-macêutica encontra-se num momento decisivo em que precisa de aperfeiçoar a sua capacidade para poder apro-veitar as oportunidades de desenvolvimento. As empresas enfrentam uma situação de escassez no desenvolvimento de novos produtos, de fraco desempenho financeiro (o ín-dice FTSE Global Pharmaceuticals registou um crescimen-to de 1,3% nos seis anos encerrados em 30 de Março de 2007, enquanto o índice Dow Jones World cresceu 34,9%), de maiores restrições legais e regulatórias e de problemas de reputação. Ao mesmo tempo, os fornecedores e utentes dos sistemas de Saúde em todo o mundo estão a perceber que a despesa está a tornar-se insustentável, a menos que disponham de benefícios tangíveis e de equilíbrio na rela-ção custo-benefício no longo prazo.

“O desafio para a indústria farmacêutica é aumentar a sua produtividade em I&D para poder capitalizar as oportuni-dades. Embora o investimento nessa área tenha duplicado nos últimos 10 anos, a produção de novos medicamentos caiu 60%, isso indica que o actual modelo de negócios é insustentável”, afirma o Dr. Steve Arlington, líder global em consultoria de I&D da indústria farmacêutica global da Pricewaterhouse Coopers e coordenador do estudo.

TENDÊNCIAS DA INOVAÇÃO E I&D NA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA MUNDIAL

A Indústria Farmacêutica é uma das maiores contribuintes privadas para fundos de I&D a nível mundial.

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As empresas de sucesso da Indústria Farmacêutica inovam e fazem I&D em tempo útil e de forma eficaz. Para esta in-dústria, a maior parte dos lucros e do valor da organização depende da actividade de I&D. Em média, o tempo de desen-

volvimento de um novo medicamento é de 10 a 15 anos e custa cerca de 1,2 mil milhões de Dólares (PhRMA, 2014).

A análise dos dados de empregabilidade revela a existên-cia de 810 mil postos de trabalho directos dedicados às actividades de I&D (PhRMA, 2014).

Entre 2000 e 2013, há mais de 400 novos medicamen-tos aprovados e encontram-se em fase de desenvolvimento mais de 400 novos potenciais medicamentos. Por exemplo, em relação às doenças oncológicas, houve, desde 1980, um aumento de 83% da esperança de vida destas doenças devido a novos tratamentos. Já em relação às doenças car-diovasculares, de acordo com uma estatística de 2013 da Sociedade Americana de Cardiologia, verifica-se uma redu-ção de 39% do número de mortes provocados por doenças cardiovasculares. Em relação à infecção pelo VIH/SIDA, e desde a aprovação dos anti-retrovíricos, em 1995, a taxa de mortalidade diminuiu mais de 80%. Actualmente, os doen-tes com VIH/SIDA aos 20 anos podem esperar viver até aos 70 anos de vida, mantendo, assim, uma esperança média de vida próxima da população em geral (PhRMA, 2014).

O investimento do processo de I&D está concentrado, sobretudo, na fase de ensaios clínicos (43,1%), sendo a fase III destes ensaios a de maior investimento, totalizando 25,3% do investimento do total do processo de I&D. De se-guida, a etapa do processo de I&D de maior investimento é a dos ensaios pré-clínicos (25,7%) e, por fim, a fase IV (13,3%). Os restantes 11% de investimento são considera-dos como não categorizados (PhRMA, 2014).

Em 2012, a Indústria Farmacêutica investiu mais de €30 000mil milhões de euros em I&D na Europa.

Fonte: EFPIA.

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MEDICAMENTO VETERINÁRIOHelana Ponte Médica Veterinária

Os medicamentos veterinários foram, inicialmente, regu-lamentados na União Europeia pela Directiva n.º 81/851/CEE e, posteriormente, pela Directiva n.º 2001/82/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de Novembro, que estabelece um código comunitário relativo aos medica-mentos veterinários, alterada pela Directiva n.º 2004/28/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de Mar-ço, e demais legislação comunitária complementar.

Este enquadramento, distinto da moldura legal do medi-camento de uso humano, cria, também, Comités distintos ao nível da Comissão Europeia, designadamente o Comité Permanente de Medicamentos Veterinários e o Comité Far-macêutico de Medicamentos Veterinários e envolve, igual-mente distintos Grupos de Trabalho, ao nível do Conse-lho, da Agência Europeia do Medicamento (EMA), da EFSA (Agência Europeia da Segurança Alimentar) e do Codex Alimentarius, cuja actividade é um reflexo da especificida-de e complexidade das matérias relacionadas com medi-camentos veterinários, Saúde Animal e Bem-Estar animal, Saúde Pública Veterinária e Proteção Ambiental. Também a OIE (Organização Mundial da Saúde Animal) engloba, no contexto da sua missão, a observância da regulação do medicamento veterinário que, na União Europeia, é legis-lado no que respeita à sua autorização de introdução no mercado, fabrico, comercialização e utilização.

Inicialmente, a definição de “medicamento veterinário” era, apenas, a de “um medicamento destinado aos ani-mais”, mas, desde 2008, passou a ter redacção própria, porque a política do medicamento veterinário, inicialmen-te decalcada da do medicamento humano com as adap-tações possíveis, cedo se afirmou pelas suas particulari-dades ou diferenças, modelando-se progressivamente e

adequadamente a sua moldura legal. “The veterinary sys-tem needs its own specific organization and regulation and no longer being a mirror legislation of the human legislation” (E.C – EMA January 2010. Final Report).

Em Medicina Veterinária, o valor do medicamento vete-rinário, mais do que o de um medicamento, encontra-se intimamente ligado ao respectivo impacte clínico e eco-nómico, sobretudo nos animais produtores de alimentos para consumo humano, de forma que, no seu desenvolvi-mento, se torna importante seleccionar variáveis de res-posta apropriadas e o tipo de investigação apropriada, de acordo com as espécies, sistemas orgânicos, condições patológicas envolvidas, e géneros alimentícios de origem animal a produzir, em quantidade e com a qualidade, quí-mica, microbiológica e organoléptica exigida, pelo que o critério de segurança, primária e secundária, de um me-dicamento veterinário é, certamente, o que maiores dife-renças evidencia e maiores investimentos acarreta, relati-vamente ao medicamento de uso humano.

O equilíbrio deste binómio, condiciona a disponibilida-de de medicamentos veterinários no mercado, por vezes bastante crítica para as espécies ditas menores, que, sem definição comunitária, são, afinal, aquelas que menos con-sumo têm na União Europeia, mas não forçosamente em cada um dos seus Estados-Membros.

O medicamento veterinário é uma ferramenta de trabalho da Medicina Veterinária de que a Saúde Animal beneficia, quando utilizado sob orientação e controlo adequados, de acordo com as boas práticas veterinárias, quer na clínica dos animais de companhia, comoquer na clínica dos ani-mais de pecuária.

E é por isso que, na óptica da DGAV, enquanto Autorida-

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de Nacional Competente para o Medicamento Veterinário, o medicamento veterinário sempre foi algo mais do que um medicamento que se destina aos animais, sem com-prometer a Saúde Pública, cumprindo-lhe, antes, a defesa e observância da relação risco/benefício para os animais, para o ser humano e para o ambiente, reconhecendo, des-de muito cedo, na ApifarmaVET um parceiro de uma enor-me facilidade de comunicação, responsável, à altura do papel que desempenha neste sector.

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DIAGNÓSTICOS IN VITRO Isabel AbreuFarmacêutica

Os dispositivos médicos para diagnóstico in vitro (DIV) são componentes cruciais usados na prestação de cuidados de Saúde, imprescindíveis para a tomada de decisão clínica, orientando o tratamento ou intervenção mais adequada, po-dendo evitar ou retardar as doenças e as suas complicações.

São instrumentos fundamentais na eficiência e sustentabi-lidade dos Sistemas de Saúde. O diagnóstico precoce, forne-cido por um DIV, permite a obtenção de melhores resultados em Saúde a longo prazo ou mudanças significativas no esti-lo de vida das populações. Os DIV, a par de outras tecnolo-gias de Saúde, contribuem para que as pessoas vivam com mais Saúde, que sejam mais produtivas, socialmente activas, constituindo tudo isto um pré-requisito para o bem-estar e a prosperidade económica

Abrangem uma vasta gama de produtos, desde testes de autodiagnóstico, usados pelo cidadão comum, até sistemas sofisticados, usados na análise de um largo número de amos-tras e para múltiplos parâmetros em áreas da Química Clíni-ca, da Imunologia, da Imunoterapia, do Diagnóstico Molecu-lar, da Hematologia, da Microbiologia, entre outras.

A segurança dos utilizadores de DIV tem sido objecto de crescente atenção e preocupação por parte das autoridades nacionais e internacionais, designadamente a OMS e a Co-missão Europeia, reflectindo-se esta preocupação na elabora-ção e publicação de vários diplomas legislativos com o fim de garantir a qualidade, a segurança e o desempenho funcional destes dispositivos.

Até 1997, os DIV eram colocados no mercado sob a res-ponsabilidade exclusiva do fabricante, sem qualquer controlo pelas autoridades nacionais. A ocorrência de incidentes com dispositivos médicos para diagnóstico in vitro para a detecção de marcadores de infecção por HIV deu origem, por decisão

governamental, à publicação do Decreto-Lei nº. 306/97, de 11 de Novembro.

A decisão de publicar legislação nacional, quando estava em curso a discussão de uma directiva comunitária para este sector, não foi isenta de dificuldades e de sérios constran-gimentos colocados pela Comissão Europeia. É importante realçar o papel e a atitude positiva da indústria de DIV que, em colaboração com o Infarmed, permitiram que a mesma fosse implementada, dentro dos prazos definidos.

A legislação nacional previa a obrigatoriedade de uma au-torização de colocação no mercado para os dispositivos uti-lizados no contexto da grupagem sanguínea e na detecção, confirmação e quantificação de marcadores de infecção usa-dos nos estudos de unidades de sangue, sendo esta avalia-ção baseada em critérios científicos, relativos à sensibilidade analítica, à sensibilidade clínica, à especificidade clínica e à especificidade – interferentes para a área da Virologia e, à especificidade, à sensibilidade e à potência para a área da Imuno-hematologia. Iguais critérios suportam as “Especifica-ções Técnicas Comuns” publicadas como EN (Normas Euro-peias) e utilizadas na avaliação da conformidade dos disposi-tivos médicos para diagnóstico in vitro, no âmbito da Directiva 98/79/CE.

A publicação da Directiva 98/79/CE, relativa a dispositivos médicos para diagnóstico in vitro, procedeu à harmonização das legislações nacionais dos diferentes Estados-Membros no que diz respeito à concepção, fabrico, colocação no mer-cado e supervisão do mercado e foi transposta para o Direito interno pelo Decreto-Lei nº. 189/2000, de 12 de Agosto.

Seguiu a técnica e a filosofia legislativa da Nova Abordagem e da Abordagem Global, tal como para as restantes directi-vas relativas a dispositivos médicos, permitindo a garantia

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da qualidade, da segurança e do desempenho funcional dos DIV, bem como a eliminação de barreiras ao comércio e a livre circulação de produtos. Por outro lado, dá resposta à procura das soluções inovadoras desenvolvidas pela indús-tria, garantindo o acesso atempado a dispositivos com ní-veis mais elevados de especificidade e sensibilidade, com evidente reflexo na maior robustez dos resultados obtidos e na tomada de decisão clínica.

A directiva descreve a amplitude e o conteúdo dos requi-sitos essenciais aplicáveis a cada tipo de dispositivo e os possíveis processos de avaliação de conformidade, conside-rados susceptíveis de proporcionarem o nível de protecção necessário, estabelecendo os critérios que determinam as condições em que o fabricante pode fazer a sua opção, caso exista mais de uma opção prevista.

A avaliação e o controlo dos dispositivos médicos para diag-nóstico in vitro em todo o seu ciclo de vida é suportada pela aplicação de um sistema gradual de controlo corresponden-te ao nível do risco potencial inerente ao tipo de dispositivo, de acordo com critérios relacionados com o uso pretendido e as indicações de utilização definidas pelo fabricante, a ex-periência técnica, científica, clínica do utilizador, a impor-tância da informação para o diagnóstico, tendo em atenção o racional da doença ou da alteração fisiológica, incluindo a presença de sinais ou sintomas que possam dar orientação ao médico, e o impacto do resultado para um doente e/ou para a Saúde Pública.

A adaptação ao progresso técnico e à inovação está, tam-bém, reflectida na proposta de Regulamento que irá substi-tuir a Directiva 98/79/CE e que prevê o alargamento da de-finição e do âmbito de aplicação de modo a incluir os testes genéticos, os testes para selecção terapêutica, os dispositi-vos de alto risco utilizados numa só instituição e o software

médico. A determinação do gradiente de risco que suporta a classificação dos DIV seguindo os princípios elaborados pelo GHTF (Global Task Force Harmonization) e introduzindo diferentes classes de risco mediante regras bem definidas e objectivas. Os requisitos aplicados aos estudos clínicos que suportam a avaliação do desempenho funcional e que são proporcionais à classe de risco. A Identificação Única do Dis-positivo (IUD) enquanto elemento fundamental para a ras-treabilidade dos dispositivos bem como para a identificação dos intervenientes no circuito comercial. A possibilidade de designação de laboratórios de referência com intervenção na verificação da conformidade de DIV de maior risco ou que envolvam perigo ou tecnologias específicas.

O sector dos DIV é composto por diferentes stakeholders com funções diferentes e bem definidas, desde a concep-ção ao acesso ao mercado, destacando-se os fabricantes, os distribuidores, os organismos notificados, os organismos de normalização nacionais e internacionais, as entidades regu-ladoras e as entidades financiadoras.

Apesar de, no mercado Português, não haver um número significativo de empresas da indústria dos DIV que se de-diquem a actividades associadas à produção, e tendo as empresas nacionais como principal função a venda e distri-buição de DIV, importa chamar a atenção para a actividade científica de desenvolvimento e concepcção praticada em diferentes pólos de investigação nacionais. Importa criar e reforçar sinergias entre estes centros de investigação, a au-toridade competente e as empresas, no sentido de transfor-mar a actividade científica de desenvolvimento e concepcção em actividade produtiva, permitindo a comercialização e in-ternacionalização de DIV de produção nacional, com reflexos na prosperidade económica do País.

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Excerto de cartaz publicitário das «Águas de Pedras Salgadas» Águas de Pedras Salgadas (1910-1917)

7.

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VALOR DOS RECURSOS HUMANOSE A SUA EVOLUÇÃO

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VALOR DOS RECURSOS HUMANOS E A SUA EVOLUÇÃOHelda Azevedo Economista

O investimento em Saúde é definido como prioridade no Pacote de Investimento Social da Comissão Europeia, adoptado a 20 de Fevereiro de 2013, (European Com-mission, 2013-a), onde se reconhece a Saúde como par-te integrante da Estratégia Europa 2020, no sentido de se impulsionar um crescimento inteligente, sustentável e inclusivo da União Europeia (UE). Este pacote foi prece-dido por um comunicado da Comissão a 18 de Abril de 2012 – Towards a Job Rich Recovery (Pacote Emprego) – o qual integra o Action Plan for the EU Health Workforce, sa-lientando-se os Cuidados de Saúde como um factor-chave no desenvolvimento económico e na criação de emprego especializado. O referido documento define o sector da Saúde como intensivo em mão-de-obra e realça o facto de este ser responsável por cerca de 8% dos empregos em toda a UE, com perspectiva de criar oito milhões de novos postos de trabalho diferenciados entre 2010 e 2020. O envelhecimento da população e o aumento da procura de cuidados de Saúde têm sido factores reconhecidos como determinantes na criação de emprego. O Annual Growth Sur-vey 2014 (European Commission, 2013-b) também realça o potencial que pode ser aproveitado futuramente no sector através do desenvolvimento de competências adequadas.

Por outro lado, a escassez, a má distribuição e os di-ferentes níveis de qualidade e desempenho dos recursos humanos para a Saúde são desafios que afectam a ge-neralidade dos países e que se agravam em tempos de fortes restrições orçamentais. De acordo com a Proposta do Governo – “Um Estado melhor” (Governo de Portugal, 2013) –, Portugal também se depara com a questão do “insuficiente financiamento global do Sistema de Saúde, da escassez de profissionais, da pressão demográfica e

da gestão de unidades desadequadas em termos clínicos, geográficos e com necessidades de modernização”. Adicio-nalmente, o desemprego e a emigração em Saúde têm sido uma realidade que suscita especial preocupação pelo forte desinvestimento que representa. De acordo com o relatório do 3.º Fórum Global sobre RHS, os Países que têm con-seguido uma melhor atracção de médicos e profissionais de Saúde têm as suas necessidades satisfeitas, enquanto outros podem ver os benefícios dos seus investimentos em educação a reverter para outros Países da região (Norwe-gian Directorate of Health, WHO and the Alliance, 2013).

Urge, portanto, os Sistemas de Saúde encontrarem solu-ções inovadoras, através de novas tecnologias, produtos e mudanças organizativas, que dependem de profissionais al-tamente motivados e com competências ajustadas à procu-ra crescente de cuidados de Saúde (European Commission, 2012). O Plano de Acção tem como objectivo ajudar os Es-tados-Membros a dar resposta a estes desafios e a estabele-cer acções para promover a cooperação europeia com vista à melhoria do planeamento e previsão da força de trabalho e o recrutamento e retenção dos profissionais de Saúde, de forma a mitigar os efeitos negativos da migração.

CORTAR OU INVESTIR EM SAÚDE? UMA MUDANÇA DE PARADIGMA

É, naturalmente, reconhecido que maior riqueza gera mais Saúde, mas será o contrário verdade? Saúde gera riqueza? Esta foi a base de trabalho da Commission on Macroeconomics and Health (WHO, 2001), cujo relatório deu um forte contributo à alteração do debate político, chamando-se a atenção para a relação bidireccional entre

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Saúde e Desenvolvimento Económico. Se este estudo teve por base os Países em desenvolvimento, incentivou outras análises semelhantes na UE, como é exemplo a de Suhrcke , Mckee, Arce, Tsolova e Mortensen – The contribution of health to the economy in the European Union (2005) –, que demonstrão uma forte evidência dos benefícios económicos através de melhorias na Saúde da população.

Em 2008, os Países da região Europeia da Organização Mundial da Saúde (OMS) reuniram-se em Tallinn, para discutir esta nova forma de pensar sobre os Sistemas de Saúde, reafirmando-se a despesa pública enquanto inves-timento. Os participantes abordaram um modelo de rela-ções bidireccionais entre Sistemas de Saúde, Saúde e Ri-queza, valorizando-se o facto da Saúde, para além do seu valor intrínseco, contribuir para o bem-estar social através do seu impacto no desenvolvimento económico, compe-titividade e produtividade (WHO, 2008). A resolução da conferência incitou os Estados-Membros a assegurar que os seus Sistemas de Saúde continuem a proteger os mais vulneráveis, demonstrem eficácia na prestação de serviços e, também, que se comportem como actores económicos responsáveis em áreas como o investimento, a despesa e o emprego (Mladovsky et al 2012).

Na sequência da crise económica internacional, em Abril de 2009, a OMS, em cooperação com o Ministério da Saú-de norueguês, organizou um encontro em Oslo (Abril de 2009), levantando-se a questão da Saúde em tempos de crise nos Países da UE. Esta discussão foi retomada em Abril de 2013 na conferência Health Systems in Times of Global Economic Crisis: an Update of the Situation in the WHO European Region, cujas conclusões chamam a atenção para os cortes excessivos e prolongados nos orçamentos da Saúde, na medida em que as necessidades em Saú-de das populações aumentam rápida e significativamente com o aumento do desemprego e reduções no rendimento das famílias, excepto quando é claro que esses ajustamen-tos no orçamento não ameaçam o acesso da população a cuidados de Saúde.

Existem, portanto, fortes argumentos para uma aborda-gem anticíclica da despesa pública, no sentido de se man-ter ou aumentar a prestação de serviços num momento de procura crescente que, por sua vez, requer políticas fiscais e económicas responsáveis durante os períodos de crescimento económico. Intervenções na Saúde Pública podem desempenhar um papel de relevo na recuperação económica através, por exemplo, da protecção da Saúde mental, do aumento da produtividade e de intervenções que poupam gastos futuros ao Sistema de Saúde.

A necessidade de criar um novo ciclo de investimento em Saúde por parte dos Governos Europeus está inteiramente relacionada com o debate da Agenda de Lisboa, que tem como objectivo fazer com que a economia Europeia seja a mais competitiva de todo o mundo, sendo necessário aumentar o conhecimento dos benefícios do investimento em capital humano, nomeadamente ao nível da Saúde da população. A Agenda de Lisboa e a consequente Agenda da UE 2020 pretendem valorizar a competitividade económi-ca e a coesão social, bem como desafiar a visão simplista de que a despesa em Saúde é uma ameaça à viabilidade financeira (Figueras et al, 2012).

Assiste-se, portanto, a uma mudança de paradigma, onde a Saúde e os Sistemas de Saúde não são vistos ape-nas pela pressão que exercem sobre a despesa pública mas também como indutores do crescimento económico.

Numa perspectiva microeconómica, uma população mais saudável aufere maiores rendimentos e recorre menos ao absentismo e às reformas antecipadas, é mais produtiva no trabalho e, prevendo-se uma vida mais longa, é espera-do que invista mais em educação e que poupe mais para a reforma, disponibilizando dinheiro para investimento de capital (McKee et al, 2009), resultando, ao nível macroe-conómico, numa sociedade mais produtiva e próspera (Figura 1). Adicionalmente, uma melhor Saúde permite reduzir a procura de Cuidados de Saúde e apoios sociais, com um forte impacto na riqueza do País, libertando-se recursos para outras áreas prioritárias.

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Por sua vez, o sector da Saúde, para além de contribuir para a Saúde da população e sua produtividade, é um factor de de-senvolvimento económico, simplesmente pela sua dimensão, tendo um peso significativo no PIB, que, por sua vez, contribui para um investimento substancial em capital e tem um papel significativo enquanto dinamizador e consumidor de inovação tecnológica e I&D. Adicionalmente, o investimento em Saúde é responsável pela geração de emprego com um elevado grau de diferenciação técnica, o que se traduz num motor para o desenvolvimento da sociedade (Silva, 2010). A participação média deste sector no emprego total tem aumentado e ronda actualmente os 10% nos Países da OCDE, com os níveis mais

elevados para os Países da Escandinávia (20% na Noruega). O emprego no sector da Saúde em Portugal é relativamente bai-xo (5.9%), o que indica que melhorias podem ser feitas a favor do bem-estar da população e do desenvolvimento económico.

Desta forma, o sector da Saúde não só é importante para uma melhor produtividade laboral e bem-estar social, como também é essencial na geração de empregos e oportunida-des de negócio, com efeitos multiplicadores significativos no crescimento económico (Poças, 2012).

As inter-relações evidenciadas na Figura 1 mostram-se de-sequilibradas com a política de austeridade seguida em Por-tugal, na medida em que as restrições aos recursos económi-

Fig 1. Riqueza, Sistemas de Saúde e Saúde

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cos e financeiros afectam o sector da Saúde, dificultando, de várias formas, o acesso aos Cuidados de Saúde e desvalori-zando o investimento em reformas estruturais que preparam o Serviço Nacional de Saúde (SNS) para o futuro.

Os gastos em Saúde não podem, portanto, “ser avaliados de forma míope, descurando a natureza de ‘investimento’ que lhe está associada e as suas repercussões na competitividade do cluster e da economia” (Mateus, 2010).

EVOLUÇÃO DOS RECURSOS HUMANOS EM PORTUGAL NO CONTEXTO DA CRISE ECONÓMICA INTERNACIONAL

A austeridade na Europa teve um impacto negativo muito su-perior ao esperado na economia e na perda de postos de tra-balho, resultado do multiplicador orçamental se revelar ex- -post muito mais elevado do que o previsto, questão abor-dada pelos Working Papers do FMI (Blanchard e Leigh, 2013).

Portugal passou por um período de forte recessão, com impactos devastadores na criação de emprego, provocan-do novos e preocupantes fenómenos demográficos – à imigração menos qualificada verificada nos últimos anos, junta-se agora uma emigração notória dos quadros mais qualificados, sendo este outro factor de empobrecimento do País. Segundo o Secretário de Estado das Comunida-des, emigraram, em 2012, mais de 100 mil Portugueses, um número que se aproxima à onda migratória dos anos 60 (Ribeiro, 2013).

No que se refere ao sector da Saúde, a realidade diverge da generalidade dos sectores, dado haver um grande e crescente número de profissionais nos Países da OCDE, resultado do envelhecimento da população, do progresso tecnológico e das expectativas dos cidadãos. Contudo, a preocupação com a escala da mobilidade tem aumentado nos últimos anos.

Portugal foi um País “importador” de profissionais de Saúde desde os anos 90 tendência que se tem vindo a inverter. Actualmente, o País é exportador de profissionais

de Saúde, com destaque para os enfermeiros, conforme noticia um artigo do Expresso Emprego (Mateus, 2013).

A emigração de profissionais de Saúde deve-se essen-cialmente à procura de melhores condições de trabalho e a mais oportunidades de desenvolvimento profissional e, no caso concreto de Portugal, acresce-lhe a dificuldade recente de enfermeiros, dentistas e técnicos de diagnósti-co e terapêutica encontrarem emprego, os baixos salários nos sectores público e privado, a sobrecarga de trabalho, a remuneração não relacionada com o desempenho, as baixas perspectivas de progressão na carreira e a falta de incentivos para trabalhar nas regiões do interior. Desde 2009, o contexto de crise económica, com elevadas taxas de desemprego, cortes nos salários, maior tributação, re-dução de efectivos no sector público, pode ser considerado o maior incentivo à saída destes profissionais.

Os efeitos negativos da migração para os Países de ori-gem, como a perda do investimento na formação de pro-fissionais qualificados ou a redução do acesso a Cuidados de Saúde, tem sido motivo de preocupação, levando a que a Assembleia Mundial da Saúde adoptasse, em 2010, o Código de Práticas sobre o Recrutamento Internacional de Profissionais de Saúde, de forma a restringir o recrutamen-to de profissionais de Saúde em Países que apresentam grande escassez de recursos humanos.

Por outro lado, a acrescentar aos profissionais que imi-gram para Portugal por sua iniciativa, o Ministério da Saú-de (MS) tem contratado profissionais estrangeiros para colmatar a escassez de recursos humanos no SNS em al-gumas zonas do País, essencialmente no interior. Segun-do Ribeiro et al (2014), o MS contratou, desde 2006, 50 médicos de Cuba, Costa Rica, Colômbia e Uruguai para ocuparem vagas disponíveis no SNS, argumentando que os profissionais Portugueses não estão dispostos a trabalhar em regiões mais pobres e isoladas e que o Estado tem o dever de dar acesso a serviços de Saúde à população des-sas regiões. As organizações médicas têm-se oposto, em-bora sem sucesso, a esta estratégia, argumentando que a

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questão não é a falta de médicos, mas a falta de incentivos para que os médicos concorram a essas posições Concei-ção et al, 2011; Ribeiro et al, 2014).

Neste contexto, importa perceber o comportamento dos profissionais de Saúde e seus efeitos na alteração da dis-ponibilidade de recursos em tempos de recessão económi-ca. Apesar de não haver monitorização da emigração dos profissionais de Saúde de Portugal, este fenómeno pode ser analisado indirectamente pelo uso de proxys como o número de pedidos de declaração de reconhecimento de qualificações profissionais fora de Portugal.

É notório o interesse por parte dos enfermeiros em tra-balhar no exterior, com um número de pedidos de decla-rações a mais do que triplicar entre 2009 e 2012, tendo havido 2,814 pedidos no último ano em análise (Figura 2). A Ordem dos Enfermeiros divulgou que, em 2008, 929 en-fermeiros Portugueses suspenderam ou cancelaram a sua licença, o que não significa que saíram do País (Ribeiro et al, 2014). A emigração tem sido, portanto, uma solução para os problemas de empregabilidade que assolam este grupo profissional, mostrando uma imagem real do nível de aproveitamento de recursos humanos em Portugal.

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Em relação aos médicos, a realidade é bem diferente dado não ser, ainda, conhecido o desemprego nesta classe profissional; no entanto, é bem visível o interesse crescen-te na emigração pelo aumento do número de pedidos de declaração nos últimos anos (81%, entre 2009 e 2013). Segundo a Ordem dos Médicos, em 2013, foi solicitada a isenção do pagamento de quotas por ausência no estran-geiro por 133 médicos.

As agências de recrutamento, mais direccionadas para a retenção de enfermeiros, estão activas em Portugal, for-necendo informação e dando apoio aos candidatos que decidam emigrar. Por exemplo, em Abril decorreu na Es-cola Superior de Enfermagem de Lisboa a primeira edição do evento Healthcare Mobility Day, com aproximadamente 700 postos de trabalho, essencialmente para enfermeiros. É evidente o desaproveitamento do investimento realizado na formação destes profissionais, agravado pelo facto de Portugal também ter carências ao nível de recursos huma-nos. A emigração de médicos não era preocupante, mas esta situação parece estar a mudar. O evento Medpharm Careers, que ocorreu no início do ano corrente em Portugal, trouxe 300 vagas, na maioria para médicos especialistas.

No que se refere ao sector farmacêutico, este é o que mais tem contribuído para a redução da despesa total em Saúde nos últimos anos, com consequências ao nível da insolvência de farmácias, nas dificuldades financeiras de alguns grossistas e na redução do investimento e despedi-mentos na indústria financeira. Segundo João Almeida Lo-pes, presidente da Apifarma, as empresas farmacêuticas perderam cerca de 1500 postos de trabalho entre 2012 e 2013, havendo uma tendência crescente para concentrar numa gestão ibérica actividades que, até então, possuíam estruturas autónomas em Portugal e em Espanha (Lopes, 2013). As dificuldades financeiras que grande parte das farmácias atravessam devem reflectir-se na redução de novas contratações e, por conseguinte, no aumento do de-semprego nesta classe.

Como acontece com a classe médica e de enfermagem,

não é fácil estimar o número real de desempregados no sector farmacêutico, bem como o número dos que emi-graram, dado que os profissionais não são obrigados a notificar a sua situação à Ordem dos Farmacêuticos. Os números mais fidedignos são, por isso, as declarações so-licitadas para exercer actividade no estrangeiro. Em 2013, segundo dados da Ordem, foram emitidas 138 declara-ções para efeitos de exercício profissional no estrangeiro. A Ordem refere, ainda, que 260 profissionais comunica-ram a sua situação de desemprego e 267 comunicaram a sua decisão de emigrar, representando a realidade actual para os licenciados em Ciências Farmacêuticas.

Sendo a formação farmacêutica um investimento maio-ritariamente público, urge perceber como aproveitar os re-cursos e utilizá-los da forma mais adequada. Silva (2011) defende que a Farmácia tem de ser encarada como uma unidade de Saúde, como os Centros de Saúde e Unidades de Saúde Familiar, indo para além da componente comer-cial, devendo as farmácias e farmacêuticos privilegiar a prestação de serviços no acto da dispensa e outros asso-ciados à promoção da Saúde e prevenção da doença.

NECESSIDADE DE PLANEAMENTO DE RECURSOS HUMANOS EM SAÚDE

Segundo o Relatório Europeu das Ofertas de Emprego e de Contratação (European Commission, 2014), as profissões de Saúde pertencem às principais profissões com escas-sez de mão-de-obra na Europa, sendo um dos sectores com maior potencial na criação de emprego. Os critérios de distribuição dos recursos humanos em Saúde também se mostram insuficientes, havendo uma distribuição irre-gular, com consequências ao nível da acessibilidade de al-guns grupos populacionais (Biscaia et al, 2007; Dussault e Fronteira, 2010). A título de exemplo, Lapão e Dussault (2012) referem que a falta de recursos humanos no âmbi-to dos Cuidados de Saúde Primários, mais acentuada em ACES rurais, tem limitado a disponibilidade de serviços

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e o acesso aos cuidados. Se, até 2008/2010, a preocu-pação política passava por haver pessoal suficiente, des-de então os Países têm referido como questões principais da política de recursos humanos em Saúde a distribuição geográfica dos médicos, as especialidades médicas, com destaque para as falhas em Medicina Geral, a melhor divi-são de funções entre profissionais e uma melhor prestação de serviços em equipa (Norwegian Directorate of Health, WHO and the Alliance, 2013).

Em Portugal, não se verifica um pensamento estratégico de recursos humanos. A ausência de critérios e estratégias para a formação, alocação e combinação de competências profissionais tem resultado numa gestão ineficiente dos re-cursos humanos em Saúde, que se traduz pela existência de disparidades entre a procura e a oferta de Cuidados de Saúde. Como resultado, assiste-se, nos últimos anos, à saída de profissionais que, não sendo devidamente mo-nitorizada, pode resultar em reduções críticas no stock de profissionais, com consequências para a acessibilidade aos serviços de Saúde e para a perda de acessibilidade por utentes de comunidades que têm dificuldade na fixa-ção dos mesmos. Segundo Ribeiro et al (2014), apesar de a imigração de outros Países da UE estar limitada, esta questão pode-se alterar com a entrada da Directiva de Cui-dados transfronteiriços, sendo necessário que as autori-dades façam uma avaliação dos possíveis cenários e seus efeitos nos profissionais de Saúde.

Portugal apresenta, portanto, uma combinação de gran-des desafios: envelhecimento da força de trabalho, escas-sez e excesso, devido a uma combinação de competências desequilibrada, ausência de processos e mecanismos que ajustem a formação às mudanças de necessidades em Saúde e desequilíbrios geográficos e entre níveis de cuida-dos (Ribeiro et al, 2014). Simultaneamente, verifica-se um aumento expressivo na “exportação” de profissionais de Saúde. A ausência de discussão no sentido de responder a estas questões dificultará a identificação de respostas adequadas.

Há uma necessidade óbvia de um sistema de informação integrado que permita fazer uma análise válida da situação dos profissionais de Saúde, bem como a monitorização do de-semprego e dos fluxos migratórios, para que seja possível o planeamento estratégico dos recursos humanos em Saúde.

CONCLUSÃO

Não obstante a importância económica da Saúde e dos Serviços de Saúde ser cada vez mais reconhecida a nível internacional, verifica-se, com a crise económica actual, um desinvestimento no sector da Saúde. A perda de ca-pital humano, através do desemprego e da emigração é um tema que suscita especial preocupação, na medida em que tem sido ignorada por parte dos responsáveis pelas políticas públicas nacionais e europeias nestes domínios. Sendo inquestionável a escassez de profissionais de Saúde no futuro e dado haver elevados investimentos na forma-ção, como é possível continuar a tolerar a perda de capital humano que hoje tem lugar na Saúde?

A “exportação” de portugueses, maioritariamente jovens qualificados, acarreta um custo económico considerável, sendo que muitos dos que partem não regressam, havendo um forte investimento público que é desperdiçado e apro-veitado pelos Países de acolhimento. A emigração de capi-tal humano representa, assim, uma perda de investimento dos Países de origem que é aproveitada por outros a custo zero.

Um diálogo aberto no que respeita às necessidades de profissionais de Saúde, ao aumento da sua eficiência e à sua melhor distribuição geográfica, bem como à mobiliza-ção dos recursos existentes, parece necessário.

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8.Excerto de cartaz publicitário da «Salutaris: Grande Água Purgativa» Águas Minerais Salutaris (1924-1929)

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IMPORTÂNCIA ECONÓMICA E ESTRATÉGICADA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA

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Pedro Ferraz da CostaPresidente da Direcção da Apifarma (1980-1981)Presidente da Mesa da Assembleia-Geral (1982-1990)Presidente da CIP (1981-2001)

IMPORTÂNCIA ECONÓMICA E ESTRATÉGICADA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA

“It was a good business, now it’s only a business”

Desde o início dos anos 1950, ou seja, desde que fui para o colégio infantil, que vi e ouvi falar da Indústria Farma-cêutica. Não posso, no entanto, referir-me aos 75 anos da Apifarma com conhecimento integral da sua vida. Mas posso, com certeza, falar do que foi a sua evolução.

Nos anos 1950 a distribuição de medicamentos era tão limitada que muitas empresas, entre as quais a nossa que foi fundada em 1924, distribuíam os medicamentos nuns enormes cestos transportados às costas.

A percentagem da população com acesso a medicamen-tos era muito reduzida em qualquer País do mundo nessa época.

A criação do Serviço Nacional de Saúde no Reino Unido e o progressivo alargamento, em todos os Países europeus, do acesso aos medicamentos, representaram um crescimen-to exponencial do sector. Em muitos casos, uma só fábrica abastecia o mercado interno e todas as exportações de qual-quer grande País. Hoje, algumas grandes empresas interna-cionais têm mais de 100 fábricas. Mas querem vendê-las.

A partir dos anos 60, do século XX, a criação dos Serviços Médico-Sociais pela Previdência permitiu subsidiar o consu-mo e simultaneamente diferenciar favoravelmente os produ-tos fabricados localmente dos que eram importados, dando origem ao crescimento da fabricação de medicamentos em Portugal, através da celebração de contratos de licença ou por “cópia”, versão da época de genéricos com marca.

As entidades oficiais eram da opinião que Portugal, com um mercado interno muito reduzido, não deveria apostar na investigação e desenvolvimento nesta área. E nos anos que se seguiram à revolução de 1974, apesar do objecti-vo proclamado de ter uma economia socialista, não havia nem a reflexão necessária a lançar programas de desen-volvimento industrial nesse sentido, nem o irrealismo de afrontar os Países mais desenvolvidos, cerceando impor-tações que poderiam levar a deixar as prateleiras das far-mácias portuguesas tão vazias como acontecia, por exem-plo, em Cuba. Foi, aliás, uma visita de Otelo Saraiva de Carvalho a esse País, em 1975, que levou Vasco Gonçalves a desistir de nacionalizar a Indústria Farmacêutica. Re-cordo, aliás, um convite para almoçar do Tenente Rosário Dias, Chefe de Gabinete do Primeiro-Ministro, para que eu

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lhe fornecesse argumentos para justificar politicamente a não-nacionalização do sector na onda de nacionalizações que se seguiram ao 11 de Março desse ano.

Até aos anos 1990, foi possível infringir as patentes de medicamentos estrangeiros, sem grandes restrições, e a maioria das empresas portuguesas desenvolveu-se dessa maneira. A aprovação do chamado “TRIPS”, no quadro do acordo da World Trade Organisation, veio pôr fim a esta estratégia de desenvolvimento, como contrapartida exigi-

da pelos Países mais desenvolvidos para a abertura do seu mercado interno às importações de países terceiros.

O crescimento contínuo das vendas e o alinhamento dos pre-ços dos novos produtos pelos que eram praticados nos países de origem levaram a um crescimento substancial do peso dos medicamentos nas despesas totais do sector da Saúde.

Em 2005, o Governo decidiu privilegiar o consumo de genéricos, dando início a uma profunda mudança das con-dições económicas em que o sector vivia. A prescrição por

Brochura institucional do 60.º aniversário da Apifarma (1999).

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DCI e a progressiva redução dos preços de venda, quer dos genéricos quer dos medicamentos de marca, têm signifi-cado uma marcada deterioração das margens das empre-sas. A primeira resposta foi a redução das actividades de marketing – o que já tinha acontecido nos outros Países da União Europeia e a redução da actividade em Portugal de muitas filiais de empresas internacionais. Tinham entrado para tirar partido do crescimento do mercado, ao abrigo da liberdade de estabelecimento no período pós-adesão à CEE, e viriam a sair nestes últimos anos.

Fechou-se, assim, um ciclo de expansão da actividade e, a partir de 2008, a produção de matérias-primas e produ-tos farmacêuticos tem vindo a descer, com uma quebra que, desde 2011, ultrapassou os 10% anuais.

No entanto, as exportações subiram desde 2005 a uma taxa média de 11,4% e o sector passou duma fase virada quase exclusivamente para o mercado interno, com algu-mas e honrosas excepções, para uma actividade cada vez mais virada para o exterior.

A Indústria Farmacêutica é um dos quatro sectores com aumento de emprego de 2010 a 2012, sendo os outros o vestuário, o calçado e os automóveis e seus componentes.

No fundo, saem os que podem sair e os nacionais não têm outro remédio senão redescobrir-se e virar-se para o exterior.

Durante todos estes anos a Apifarma foi acompanhando, que não precedendo, esta evolução e o seu papel foi mais o de tentar conquistar tempo para que as empresas se pu-dessem adaptar – e todos sabemos – como as mudanças em Portugal são lentas, difíceis e caras do que o de impor uma agenda de mudança rápida para uma actividade mais internacionalizada.

O reduzidíssimo papel do Ministério da Economia peran-te o Ministério da Saúde comprador tem dificultado a com-preensão da necessidade para nós evidente, de não deixar baixar tanto os preços que venham a inviabilizar a exporta-ção. Para exportar e enfrentar a incerteza, inevitavelmente associada à presença em novos mercados, é preciso ter margens. E, em muitos casos elas baixaram a zero. A visão

de curto-prazo mata cenários mais ambiciosos de desen-volvimento a longo-prazo.

O crescimento das despesas de investigação e desenvol-vimento do sector, que representaram, aliás, 19% do inves-timento da indústria em I&D e 6,2% do investimento total do País em 2012, deixa prever que teremos no futuro um sector mais inovador e bem inserido na necessidade de Por-tugal aumentar a sua quota de exportação no mercado dos produtos mais evoluídos e de maior valor acrescentado.

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Excerto de cartaz publicitário do «Sudorol»Farmácia Sousa (1916-1949)

9.

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RESPONSABILIDADE SOCIAL E PLATAFORMAS DE COLABORAÇÃO E DESENVOLVIMENTO

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RESPONSABILIDADE SOCIAL E PLATAFORMAS DE COLABORAÇÃOE DESENVOLVIMENTO

A Indústria Farmacêutica, porventura mais do que qual-quer outra, contribui activamente para prolongar e me-lhorar a qualidade de vida dos cidadãos, nomeadamente através dos medicamentos cada vez mais avançados que desenvolve e produz. Não obstante tal papel social intrín-seco, as empresas que integram este sector ampliam a sua missão essencial ao desempenharem, em simultâneo, uma cidadania activa inserida no quadro das boas práticas de responsabilidade social. Fazem-no, principalmente, ao fo-mentar melhores condições sociais, apoiando causas meri-tórias, sendo solidárias e pedagógicas e desenvolvendo es-forços para uma maior sustentabilidade ambiental da sua actividade industrial.

Também a Apifarma, que representa cerca de 120 empre-sas do sector, tem, ao longo dos últimos anos, realizado um extensivo trabalho de cooperação, solidariedade e incentivo ao desenvolvimento social, científico e pedagógico dos por-tugueses. A sua participação activa na comunidade assenta em cinco pilares de responsabilidade social – doentes, cida-dãos e empresas, ciência e investigação científica, ambiente e deontologia – no âmbito dos quais tem desenvolvido múl-tiplas iniciativas.

DOENTES

Assume especial importância, neste domínio, a parceria estabelecida, em Dezembro de 1999, com as associações de doentes, visando debater questões relacionadas com a qualidade dos serviços médicos em Portugal, o acesso dos doentes a novas terapêuticas, os medicamentos órfãos, as doenças raras e as grandes prioridades de investigação da Indústria Farmacêutica. Iniciada com a Associação Protecto-

ra dos Diabéticos de Portugal, a Associação Portuguesa de Familiares e Amigos de Doentes de Alzheimer, a Sociedade Portuguesa de Esclerose Múltipla e a Associação Portuguesa de Doentes de Parkinson, a referida parceria evoluiu, gradu-almente, para 42 membros, excluindo quaisquer actividades de financiamento por parte da Apifarma ou a promoção dos serviços desta por parte das associações de doentes, ambas incompatíveis com o código de conduta que, desde Julho de 2008, vincula, ao nível dos Países membros da União Euro-peia, a relação entre as empresas da Indústria Farmacêuti-ca e as associações de doentes. Para cumprir os objectivos delineados nos princípios que presidem à referida colabora-ção, foi criada a plataforma “Somos Doentes”, um espaço de encontro e de diálogo na Internet que permite a partilha de conhecimentos e de experiências entre as associações de doentes, os familiares, o público em geral e os profissio-nais de Saúde. Além deste, têm sido desenvolvidos outros projectos informativos, designadamente a Newsletter digital ADN - Associações de Doentes News – criada em 2009 para dar a conhecer as actividades das associações de doentes parceiras e fomentar a partilha entre as mesmas – e a edição de factsheets comemorativas dos dias em que se assinalam as doenças representadas pelas associações parceiras, con-tribuindo para uma melhor e mais aprofundada informação pública sobre questões de Saúde.

Um cuidado especial tem merecido o esclarecimento dos doentes relativamente aos ensaios clínicos, nos quais estes desempenham um papel fundamental. Inseriram-se neste âmbito as sessões de formação realizadas em Lisboa em 2011, sob o tema «Ensaios clínicos: da molécula ao medica-mento, nas quais participaram com ampla participação das associações de doentes portuguesas.

Apifarma

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A Apifarma vem, igualmente, desenvolvendo esforços no sentido do bem-estar dos doentes em contexto hospitalar. Foi com tal propósito que, em 2009, assinou, conjuntamente com o Instituto Português de Oncologia de Lisboa Francisco Gentil e a Associação Portuguesa de Música nos Hospitais e Instituições de Solidariedade (APMHIS), um protocolo de colaboração e mecenato para a implementação do projec-to “Música nos Hospitais”. Desenvolvida no IPO de Lisboa, esta iniciativa visou melhorar a qualidade de vida de doen-tes, familiares e profissionais de Saúde, contribuindo para um ambiente hospitalar mais humanizado.

Finalmente, foram também realizadas diversas iniciativas no domínio da formação, nomeadamente a Convenção Eu-ropeia de Doentes, que decorreu em Portugal em 2006.

CIDADÃOS E EMPRESAS

Remontam ao início dos anos 1980 as primeiras iniciativas dirigidas pela Apifarma ao grande público, nomeadamen-te através de campanhas de sensibilização para as boas práticas de Saúde, a defesa do medicamento e o combate aos riscos da contrafacção. Tais acções têm prosseguido até ao presente, cobrindo temas como o diagnóstico labo-ratorial, a diabetes, a adesão à terapêutica, a vacinação da gripe e a embalagem original.

A criação do Banco de Medicamento Solidário, no âm-bito do Programa de Emergência Social, elevou, porém, a um novo patamar a prática de responsabilidade social pela Apifarma, tendo presidido à sua realização a promo-ção do acesso dos mais idosos e necessitados à Saúde e ao medicamento. Ao abrigo do protocolo firmado, em Novembro de 2012, entre o Ministério da Solidariedade

e da Segurança Social, a Apifarma, o Infarmed e a União das Misericórdias Portuguesas, as empresas farmacêuticas passaram a poder doar medicamentos e produtos de Saúde com prazo de validade não inferior a seis meses de modo a serem utilizados, em perfeitas condições de qualidade e de segurança, por utentes de instituições particulares de soli-dariedade social (IPSS). Até ao final de Março 2014, as em-presas farmacêuticas associadas já tinham entregue mais de 135 mil embalagens de medicamentos a 78 instituições.

Outra das áreas em que a Apifarma tem sido particular-mente interventiva no acompanhamento do plano nacional para a redução, é a redução do consumo de antibióticos e, consequentemente contribuindo para a diminuição da taxa de bactérias resistentes aos mesmos, preservando- -se, assim, a eficácia dos fármacos, que permitiram baixar a mortalidade devida a doenças infecciosas e aumentar significativamente a esperança de vida média na segunda metade do século XX. Nesse sentido, a Apifarma foi uma das vinte entidades nacionais signatárias da Aliança Por-tuguesa para a Preservação do Antibiótico (APAPA), apre-sentada no Porto em Novembro 2011, por ocasião do Dia Europeu do Antibiótico.

Também a contrafacção de medicamentos é um fenó-meno cada vez mais actual e preocupante, colocando em causa a Saúde dos cidadãos que os consomem. Esta questão levou a Apifarma a celebrar, em Junho de 2011, um protocolo com o Infarmed, a Direcção-Geral das Alfân-degas e Impostos Especiais sobre o Consumo e a Valor-med – Sociedade Gestora de Resíduos de Embalagens de Medicamentos. O objecto desta colaboração tripartida é a destruição dos medicamentos e produtos de Saúde trans-portados por via postal ou por carga expresso que, por terem

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sido alvo de processo de contrafacção ou por não serem con-formes, constituem uma ameaça para a Saúde Pública.

A nível internacional, e ainda no âmbito dos protocolos, foi relevante a subscrição, em 2007, do Pacto Global das Nações Unidas, instituído em 1999 por Kofi Annan, quando do seu exercício das funções de Secretário-Geral da ONU, ao abrigo do qual a Apifarma submete anualmente às Nações Unidas a sua Communication on Progress (COP). O referido pacto advoga, actualmente, dez princípios universais deri-vados da Declaração Universal dos Direitos Humanos, da Declaração da Organização Internacional do Trabalho, da Declaração do Rio sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimen-to e da Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção.

A Apifarma desempenha também um importante papel no domínio cultural, abrangendo diversas áreas. No qua-dro da sua actividade de patrocínio e mecenato, tem con-tribuído para diversos projectos editoriais, nomeadamen-te os livros ARS de Lisboa e Vale do Tejo (editado em 2010 por ocasião dos 30 anos da criação do Serviço Nacional de Saúde), Um Livro para os Pais (editado pela Acreditar Associação de Pais e Amigos das Crianças com Cancro), Clínica, Arte e Sociedade: A Sífilis no Hospital do Desterro e na Saúde Pública (2011), Omnia Sanctorum Histórias da História do Hospital Real de Todos-os-Santos e seus sucessores (2012) e Regulamentação Farmacêutica nos PALOP (2013). Museolo-gicamente, destaca-se a participação no desenvolvimento do Museu da Saúde – visando a criação de uma área dedicada à Indústria Farmacêutica e ao medicamento, através de pro-tocolo instituidor assinado, em 2008, pelos presidentes do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA) e da Apifarma – e o apoio, juntamente com as suas empresas associadas, à recuperação e abertura ao público do Labo-

ratorio Chymico da Escola Politécnica, estrutura integrada no Museu Nacional de História Natural e da Ciência da Uni-versidade de Lisboa, que reúne uma das mais importantes colecções de Química da Europa.

Newsletter Notícias Apifarma (2005).

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CIÊNCIA E INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA

O contributo da Apifarma para a ciência e a investigação científica tem-se materializado através de vários progra-mas de apoio a cursos ministrados por prestigiadas uni-versidades e instituições. Inseriu-se neste âmbito o Mas-ter in Clinical Research, iniciado em 2010 pela Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa, em parceria com a Northeastern University (Estados Unidos), e o Programa de Formação Médica Avançada, promovi-do pela Fundação Calouste Gulbenkian, pelo Ministério da Saúde, pela Fundação Champalimaud e pela Fundação para a Ciência e Tecnologia. Lançado em 2008, e destina-do a médicos internos ou jovens especialistas, o referido programa teve por objectivo incentivar a ligação entre a actividade médica diária e a investigação clínica, encora-jando o desenvolvimento de projectos de investigação clíni-ca de qualidade e internacionalmente competitivos. É ainda de assinalar que, em 2005, foi celebrado um protocolo com a Fundação Calouste Gulbenkian que teve como intuito a instalação em Portugal de novos grupos de investigação bio-médica. A iniciativa foi considerada inovadora por fomentar o intercâmbio de conhecimentos entre as universidades por-tuguesas e as empresas da Indústria Farmacêutica.

O apoio à investigação tem passado, de igual forma, pelos programas de estágios na Indústria Farmacêutica, nomeadamente o desenvolvido conjuntamente com a Or-dem dos Farmacêuticos, a Associação Portuguesa de Es-tudantes de Farmácia (APEF) e a Associação Portuguesa de Jovens Farmacêuticos (APJF). Em Maio de 2011, as três instituições assinaram um protocolo de colaboração destinado a reforçar as qualificações técnico-profissionais

dos estudantes e jovens farmacêuticos, promovendo o seu contacto directo com a realidade do mundo empresarial. Similar objectivo presidiu à parceria da Apifarma com o Instituto Superior de Ciências da Saúde Egas Moniz (ISC-SEM), que deu início, em 2014, a um programa conjunto com o propósito de fomentar o intercâmbio entre os meios académico e empresarial e estimular a interacção dos es-tudantes de ciências farmacêuticas e dos jovens farma-cêuticos com as empresas nacionais e internacionais do sector a operarem em Portugal.

A Apifarma tem, também, mantido um envolvimento di-recto no apoio a conferências na área da Saúde – nomea-damente a primeira Conferência Internacional sobre a gri-pe A (2009) e o IV Congresso Ibero-Americano de Ciências Farmacêuticas (2011) – e sobre grandes temas da actuali-dade política e económica, entre as quais o seminário “O Orçamento de Estado e Medidas de Austeridade – Políticas Alternativas para o Crescimento e o Emprego”, organizado em 2010 pelo Fórum para a Competitividade.

Finalmente, com o objectivo de facilitar a transmissão pública de informação científica actualizada e relevante sobre as áreas da Saúde e do medicamento, foram estabe-lecidas parcerias com diversos meios de comunicação glo-bal, designadamente os programas Especial Saúde (RTP Informação) e Sociedade Civil (RTP2) e as publicações Jor-nal Saúde Pública e Revista Saúde & Sociedade.

AMBIENTE

As preocupações ambientais assumem uma importância crucial para as sociedades contemporâneas. De igual for-ma, também para a Apifarma, a promoção de comporta-

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mentos ambientalmente responsáveis constitui uma prio-ridade, nomeadamente na área de actuação da Indústria Farmacêutica: o medicamento.

Foi neste contexto que, juntamente com a Associação Nacional de Farmácias (ANF), a Federação das Coopera-tivas de Distribuição Farmacêutica (Fecofar) e a Associa-ção de Grossistas de Produtos Químicos e Farmacêuticos (Groquifar), foi fundada em 1999, a Valormed, o primeiro Sistema Integrado de Gestão de Resíduos de Medicamen-tos (SIGREM). Exclusivamente financiado pela Indústria Farmacêutica, este programa é responsável pela elimina-ção dos resíduos das embalagens de medicamentos e dos medicamentos fora de uso, antecipando-se à legislação que enquadra tal matéria. Com efeito, a Valormed abrange todo o ciclo do medicamento, agrupando consumidores, farmácias, grossistas e Indústria Farmacêutica. Para ga-rantir total segurança e salvaguarda da Saúde Pública, o destino final deste circuito integrado é a incineração com aproveitamento energético.

Ainda no âmbito da responsabilidade ambiental, em Maio de 2011, a Apifarma assinou com a ANF, a Groquifar e a Valormed um protocolo de entendimento sobre o siste-ma de tratamento de devoluções de medicamentos. O re-ferido protocolo tem como objectivo, entre outros, definir um novo sistema de tratamento das devoluções por for-ma a assegurar a qualidade e segurança do medicamento nos diferentes processos de armazenamento e transporte, bem como promover um manuseamento mais cuidado na embalagem.

A nível internacional, a Apifarma passou a acompanhar o grupo de trabalho criado pela European Federation of Pharmaceutical Industries and Associations (EFPIA) para

gerir as crescentes preocupações da Indústria Farmacêu-tica com o meio ambiente, cujo projecto Pharmaceuticals in the Environment tem como objectivo a promoção da sustentabilidade ambiental deste sector.

DEONTOLOGIA

As questões deontológicas têm constituído ao longo dos anos uma preocupação constante da Indústria Farmacêu-tica portuguesa. Imbuídas deste imperativo normativo, a Apifarma e as empresas suas associadas foram precurso-ras na delimitação e aprovação de princípios de condu-ta internos que visam conciliar, de forma responsável e transparente, os interesses económicos das empresas, as relações com os profissionais de Saúde e a responsabili-dade perante os doentes e a sociedade.

Com efeito, há três décadas que a Apifarma vem desen-volvendo um importante processo de auto-regulação, o qual teve o seu início em 1987, ano em que foi adoptado o primei-ro Código Deontológico de Promoção de Medicamentos.

Reflectindo a evolução legislativa nacional e comunitária, bem como a permanente necessidade de clarificar concei-tos e práticas, os códigos que a Indústria Farmacêutica se auto impôs têm sofrido alterações ao longo dos anos. Presentemente, encontram-se em vigor três normativos deontológicos cujas regras foram livremente discutidas e voluntariamente aceites, vinculando todas as empresas associadas da Apifarma:

– Código Deontológico para as Práticas Promocionais da Indústria Farmacêutica e para as Interacções com os Pro-fissionais de Saúde e Instituições, Organizações ou Asso-ciações Constituídas por Profissionais de Saúde. A versão

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aprovada na Assembleia-Geral Extraordinária de 9 de De-zembro de 2013 defende uma informação científica objecti-va que permita uma utilização racional dos medicamentos e meios de diagnóstico in vitro comercializados pelas empre-sas da Indústria Farmacêutica associadas da Apifarma.

– Código de Conduta para as Relações entre a Indústria Farmacêutica e as Associações de Doentes (versão aprovada na Assembleia-Geral Extraordinária de 28 de Novembro de 2011). No sentido de assegurar uma relação ética e trans-parente neste domínio, a Apifarma transpôs para Portugal o Código de Conduta da EFPIA para as Relações entre a In-dústria Farmacêutica e as Associações de Doentes de forma a vincular as relações entre as empresas suas associadas e qualquer organização de doentes, independentemente des-ta estar, ou não, constituída em associação.

– Código Deontológico para as Práticas Promocionais da Indústria Farmacêutica Veterinária (versão aprovada em reunião geral de empresas, em 22 de Novembro de 2010). Visa assegurar um ambiente em que o público em geral, em especial os produtores pecuários e proprietários de animais de companhia, possa estar seguro de que as escolhas relativas aos seus medicamentos são efectuadas pelos profissionais de Saúde animal com base no mérito de cada produto e nas necessidades clínicas dos animais.

Em reforço da importância desta matéria, foi também em 9 de Dezembro de 2013 que a Assembleia-Geral aprovou a alteração estatutária que consagrou o Conselho Deontológi-co como órgão da Apifarma constituído por três personali-dades independentes, a eleger em Assembleia Geral.

Na prossecução dos objectivos de auto-regulação, a Api-farma celebrou, igualmente, protocolos com a Ordem dos Médicos e com a Ordem dos Farmacêuticos, os quais vi-

Newsletter Notícias Apifarma (2005).

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sam promover a cooperação entre instituições, valorizando a inovação e a melhoria da terapêutica medicamentosa.

PLATAFORMAS DE COLABORAÇÃO

Ao nível das plataformas de colaboração, destaca-se a cria-ção, em 2005, do PharmaPortugal – Projecto Estratégico para Exportação e Internacionalização da Indústria Far-macêutica. Foram seus instituidores a Apifarma, o Infar-med e a Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP), que protocolaram a conjugação de esforços para dar a conhecer a capacidade de inovação e investigação das empresas portuguesas, aumentar as exportações de produtos e serviços nacionais – desenvol-vendo os actuais mercados e visando a abertura de novos pontos comerciais para os medicamentos portugueses – e projectar e consolidar a imagem industrial de Portugal como exportador de produtos e serviços tecnologicamen-te evoluídos. Este projecto tem-se mostrado, ao longo dos anos, bastante relevante e profícuo, com as exportações de medicamentos e produtos farmacêuticos portugueses a abrangerem cerca de 70 Países e representando, em 2012, cerca de 700 milhões de euros, valor que mais do que du-plicou os 331 milhões de euros atingidos no ano de início do projecto. Tem contribuído para tal sucesso a actuação complementar das três instituições participantes: a Apifar-ma e as empresas farmacêuticas, através da valorização dos seus produtos e serviços – mediante o incremento da Investigação e Desenvolvimento (I&D) obtidos pela coope-ração com universidades e empresas de base tecnológica –, da identificação de mercados prioritários e da coopera-ção entre si e com sectores afins, nacionais e internacio-

nais; o Infarmed, que assegura a agilização dos contactos e procedimentos regulamentares, no sentido de promover o reconhecimento entre autoridades reguladoras homólogas, e presta assistência técnica nas áreas da sua competência; a AICEP, cujo contributo passa por agilizar e fomentar con-tactos com o estrangeiro, criando oportunidades relevantes para a afirmação da Indústria Farmacêutica portuguesa nos mercados externos. O PharmaPortugal desenvolve, também um importante efeito intramuros, consubstanciado no seu papel de catalisador para o desenvolvimento mais estrutu-rado da actividade industrial em Portugal. Com efeito, para melhor competir no mercado internacional, o tecido em-presarial português tornou-se não só mais robusto, como ampliou o seu contributo para a empregabilidade nacional.

218

Excerto de cartaz publicitário do «LYSINE: Desinfectante Ideal»Farmácia Santos (1910-1916)

10.

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RELAÇÕES INTERNACIONAIS

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221

RELAÇÕES INTERNACIONAISApifarma

O ano de 1977 marca o ano em que a Apifarma participa, pela primeira vez, embora ainda não na qualidade de sócia, nas reuniões anuais da então P.I.A. (Pharmaceutical Industries Association) actual EFPIA (Federação Europeia da Industria Farmacêutica [1]) e da IFPMA (Federação Internacional da Indústria Farmacêutica [2]) efectivando, em 1978, a sua condição de associada nas duas organizações. A partir de então, mantém um relacionamento estreito com as matérias regulamentares e legislativas em discussão na Europa.

No entanto, só anos mais tarde, mais precisamente em 1989, é que a Apifarma é convidada, pela primeira vez, a integrar a Direcção de ambos os organismos internacionais. Desde então e até à actualidade, a Apifarma tem mantido regular presença nas reuniões dos diferentes grupos de trabalho e integrando, com regularidade, as Direcções desses mesmos organismos.

Com o alargamento estatutário a novas áreas sectoriais, nomeadamente Medicamentos Não Sujeitos a Receita Médica, Meios de Diagnóstico in Vitro e Saúde Animal, a Apifarma passou a integrar, nos anos de 90, as respectivas associações europeias AESGP (Associação Europeia dos Medicamentos de Venda Livre) EDMA[3] (Associação Europeia dos Produtores de Diagnósticos) e IFAH Europa e Internacional (Associação Europeia e Internacional de Saúde Animal).

Em 2008, para além da habitual presença nas reuniões anuais da EFPIA, da IFPMA e restantes associações referenciadas, a Apifarma decidiu reforçar a sua presença internacional, alargando a participação nos principais grupos de trabalho da EFPIA e criou, internamente, um grupo de trabalho para coordenação dos assuntos europeus e internacionais, com o objectivo de articular a informação entre os representantes e optimizar as matérias tratadas. A Apifarma passa a

acompanhar mais de quinze grupos de trabalho, destacando-se o Comité de Política Económica e Social e os grupos de trabalho em áreas dedicadas à contrafacção, codificação de medicamentos, marcas, boas práticas de fabrico, informação aos doentes e avaliação de tecnologias de Saúde.

O aprofundamento das relações com as associações homólogas internacionais iniciou-se ainda nos anos de 90 e foi sendo incrementado até ao presente, particularmente com os Países de referência para Portugal em matéria de política do medicamento.

BIBLIOGRAFIA

[1] European Federation of Pharmaceutical Industries and Associations.

[2] International Federation of Pharmaceutical Manufacturers & Associations.

[3] European Diagnostic Manufacturers Association

222

11.Excerto de cartaz publicitário da «Água Oxigenada Pura»Companhia Portuguesa Higiene (1910)

223

DIAGRAMA ILUSTRATIVO DE MOMENTOS-CHAVEDA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA EM PORTUGAL

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1890 1900 1910 1920

• 1926Inspecçãodo ExercícioFarmacêutico.

• 1927I CongressoNacionalde Farmácia.

• 1891CompanhiaPortuguesaHigiene.

• 1895InstitutoPasteurde Lisboa.

• 1904LaboratórioNormal.

• 1911LaboratóriosSanitas.

• 1923SociedadeIndustrialFarmacêutica.

• 1911Autonomizaçãoda Direcção-Geralde Saúde.

• 1913Regulamentodo imposto de selodas especialidadesfarmacêuticas.

. 1892Pauta aduaneira proteccionistada indústria nacional.

• 1924Bial.

• 1927Laboratórios Jaba.

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1930 1940 1950

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• 1939Grémio Nacionaldos Industriaisde EspecialidadesFarmacêuticas.

• 1930LaboratórioSanitas do Brasil.

• 1935União dos Farmacêuticosde Portugal.

• 1939Grémio dos Armazenistasde Drogas e ProdutosQuímicos do Sul.

• 1935SindicatoNacionaldos Farmacêuticos.

• 1938Ordem dos Médicos.

• 1940Comissão Reguladorados Produtos Químicos e Farmacêuticos.

• 1943Laboratórios Vitória.

• 1947Laboratórios Atral.

• 1948Instituto Luso-Fármaco.

• 1949Medicamenta.

• 1942Grémio dos Armazenistasde Drogas e ProdutosQuímicos do Norte.

• 1944Instituto NacionalBioterapêutico.

• 19461.º Contrato Colectivo de Trabalhona Indústria Farmacêutica.

• 1958Fábrica dos Laboratórios Atral aprovada pela FDA.

• 1959Hovione.

• 1951Documentário Ao Serviço daSaúde - A Indústria Portuguesade Medicamentos Especializados.

• 19561.ª sede própria do Grémio,na Rua Camilo Castelo Branco.

• 19391.ª lei de condicionamento da Indústria Farmacêutica.

• 1941Regulamento do Comérciodos Medicamentos Especializados.

• 1952Novo Regime Aduaneiropara os antibióticos.

• 1957Comissão Técnicados Novos Medicamentos.

• 1958Ministério da Saúde e Assistência.

• 19591.ª Comissão de Reorganizaçãoda Indústria Farmacêutica.

• 1951Labesfal; Iberfar.

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.

• 1975Apifarma.

• 1978Adesão da Apifarma à IFPMA e à EFPIA.

• 1973Codifar.

• 1971Fábrica da Hoechst em Mem Martins.

• 1970Inauguração do Complexo Fabrilda Hovione, em Loures.Medinfar.

• 1972Fábrica da Bayer, em Coimbra.

• 1974Fábrica Essex / Soprol / Schering USA, em Mem Martins.

• 1989Hikma Farmacêutica.

• 1980Tecnimede.

• 1984Direcção-Geral dos Assuntos Farmacêuticos.

• 1982Administrações Regionais de Saúde.

• 1965Nova Comissão de Reorganizaçãoda Indústria Farmacêutica.

• 1967Publicação do Relatório da ComissãoReorganizadora da Indústria dos Produtos Farmacêuticos.

I• 1960ngresso do Grémio na PIA.

• 19671.º Curso Livre aplicado à Farmácia Industrial.Nova sede da Apifarma, na Avenida Duque d´Ávila.

• 1968I Congresso Nacional da Indústria Farmacêutica.

• 1964Documentário Faça Segundo a Arte.

• 1967Seber Portuguesa.

• 1963Cipan.

• 1969Tecnifar.

• 1973Autonomização do Ministério da Saúdeface à Assistência.

• 1979Serviço Nacional de Saúde.

• 1971Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge.

. 1972Ordem dos Farmacêuticos.

• 1985-1986Seminários «A Indústria Portuguesa e a CEE».

• 1989Apifarma adere à Fedesa.Apifarma convidada pela primeira vez aintegrar a direcção da EFPIA e da IFPMA.

• 1987Código Deontológico de Promoçãode Medicamentos.Comissão Especializada de Venda Livre(ApifarmaOTC).

• 1983Ministério da Saúde.Centros de Saúde.

• 1965Iberfar; Euro-Labor.

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Indú

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1990 2000 2010.

• 1994Sofarimex.

• 1993Distrifarma.

• 1995Farmoz.

• 2005Comissão Ética para a Investigação Clínica.

• 2002Prescrição obrigatória por DCI.

• 2012Fábrica e Centro de Pesquisada Bial, em Bilbau.

• 20141.º fármaco de patente deinvestigação portuguesa aprovado nos EUA, produzidopela Bial.

• 2005Pharma Portugal.Comissão Especializada de Vacinas;Comissão Especializada de Produtorese Exportadores.

. 2010 Comissão Especializada de Biotecnologia.

• 1992Sistema Nacional de Farmacovigilância.

• 1991Primeiro Estatuto do Medicamento.Ordem dos Médicos Veterinários.

• 1990Lei de Bases da Saúde.

• 1993Infarmed.

• 1999Laboratório do Infarmed.

• 2000Ciclum FarmaInauguração da Laboris, fábricado Grupo Azevedos, no Brasil.

• 2004Lusomedicamenta.Aquisição da Labesfal pelaFresenius.Aquisição do Grupo Jabapela Recordati.

• 1993Nova sede da Apifarma, no Restelo.Comissão Especializada de Meios deDiagnóstico in vitro.

• 1999Valormed / Sigrem.

• 1995Código Deontológico de Práticasde Comercialização.

. 1990Comissão Especializada de SaúdeAnimal (Apifarma VET).

. 1998 Ordem dos Médicos Dentistas.Ordem dos Enfermeiros.

• 2001Bluepharma; Generis.

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