indústria farmacêutica digitalmente adormecida

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36 Um dos comportamentos mais usuais de Indústrias ou Sectores que têm por hábito serem detentores da informação é fazerem de conta que o crescimento do “ambiente online” não está a acontecer à velocidade da luz. Comunicação Paulo Morais Managing Partner da T-Evolution Marketing Consultant da JRS Pharmarketing A Indústria digitalmente adormecida

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Page 1: Indústria farmacêutica digitalmente adormecida

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Um dos comportamentos

mais usuais de Indústrias

ou Sectores que têm

por hábito serem

detentores da informação

é fazerem de conta que o

crescimento do “ambiente

online” não está a

acontecer à velocidade da

luz.

Comunicação

Paulo Morais

Managing Partner da T-Evolution

Marketing Consultant da JRS Pharmarketing

A Indústria digitalmente

adormecida

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A ideia de fazer de conta que

não é nada connosco – e que

mais de 59% da população

portuguesa não está já está

nas redes sociais, com a faixa

etária do maior número de

utilizadores entre os 25 e os

34 anos – é o caminho mais

fácil. Theodore Levitt utiliza o

termo perfeito para descrever

este cenário – Miopia de

Marketing – o que não

queremos ver, não vemos.

Para o profissional de

Marketing, é mais fácil

continuar a publicitar

empresas de genéricos (por

exemplo) na televisão em

prime time, porquê? Porque

efectivamente nunca se

consegue medir a eficácia

do anúncio. Bem que podem

dizer que determinado canal

de televisão teve X% de

share de audiências mas,

na prática, quantas pessoas

terão visto e memorizado a

mensagem do anúncio?

O mesmo se passa, por

exemplo, com os OTC. Não

quero ser inoportuno quanto

a este tipo de canal de

comunicação, que é bastante

eficaz quando bem utilizado,

mas um medicamento ou um

produto médico vende muito

mais e muito melhor quando

“receitado” por um amigo que

A Indústria Farmacêutica

tem demonstrado, em

Portugal, algumas tentativas

de entrar neste meio, mas

a generalidade não quer

acreditar que a Internet

começa a ser um canal de

comunicação indispensável

e quase obrigatório para

qualquer estratégia de

Marketing do século XXI.

A incoerência e a falta

de conhecimento das

plataformas digitais levam

a que não exista estratégia

definida, e andem todos a

fazer as mesmas coisas,

sem qualquer factor de

diferenciação e sem qualquer

inovação associada.

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teve uma boa experiência

com a sua utilização. A

comunicação massificada,

com a abundância de

informação interruptora, já

não tem a eficácia que tinha

no passado, por mais que

custe aceitar.

Se eu precisar de um

medicamento para as dores

de garganta, vou acreditar no

anúncio que vi na televisão ou

no meu amigo que teve dores

de garganta recentemente

e ficou bom ao tomar

determinado medicamento?

Ou ainda, vou acreditar

nesse anúncio ou em alguém

que disse nas redes sociais

ou num blogue que “tomei

o medicamento X e fiquei

bem melhor”? Os anúncios

massificados sem qualquer

mensagem personalizada,

sem estarem focados num

“nicho”, têm os dias contados.

Por outro lado, não só

pela credibilidade e pela

aceitação da informação,

recorrendo a plataformas e

soluções digitais, tudo pode

ser monitorizado, ou seja,

rapidamente percebemos se

uma estratégia está, ou não,

a causar algum efeito. Vamos

ficar a saber se estamos

efectivamente a conseguir

passar uma mensagem para

o nosso público-alvo. Este

cenário aparentemente é

muito interessante, mas

o grande problema é que

continuamos a gerir empresas

e a definir estratégias em

prol dos nossos objectivos

pessoais e não da nossa

empresa (culpa da gestão

de topo!). Temos medo de

ser despedidos e queremos

“salvar a nossa pele”, não

estamos formatados a

arriscar.

Quero com isto dizer que, por

vezes, é muito complicado

assumir que errámos e

que o caminho não é o que

definimos. No mundo digital,

o mindset tem de estar

formatado para os ajustes. Se

a análise e a monitorização

nos ajudam a perceber se não

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"Os anúncios massificados

sem qualquer mensagem

personalizada, sem estarem focados

num “nicho”, têm os dias

contados”

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dos laboratórios estarem

demasiado focados no

profissional de saúde.

Ninguém está a dizer que

o profissional de saúde não

tem um papel indispensável.

Claro que tem, mas o

cidadão também o tem, e

cada vez mais é dono de

muita informação. Pode

parecer “bizarro” o que

vou dizer, mas se eu quiser

reunir informação sobre

determinada patologia,

estudos científicos e tudo

mais, vou ter tanta ou

mais informação do que

muitos médicos, e vou estar

preparado para discutir com

ele “frente a frente” sobre

as melhores soluções para o

meu problema. Quem me der

a informação mais credível

vai certamente conquistar

a minha opinião e serei

um influenciador perante a

prescrição do médico.

Um estudo da TNS mostra

que os portugueses estão

na Internet essencialmente

em busca de informação –

Knowledge-Seekers

(33%) –, mas o crescimento

de actividades como a

procura de novos contactos

estamos no caminho certo,

temos de ter a ousadia e a

responsabilidade de definir

um novo caminho. Temos

de dar a cara e assumir o

nosso erro. Esta mudança de

padrões mentais é obrigatória

para quem quer investir em

estratégias de Marketing

Digital, onde quem dita as

regras são os utilizadores,

é o mercado e, felizmente,

conseguimos monitorizar,

em tempo real, toda a nossa

estratégia.

Outro ponto essencial é

o facto de grande parte

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– Networking (20%) – e os

que encaram a Internet como

uma ferramenta de trabalho –

Functionals (19%) – estão em

grande crescimento.

Como referi, a Indústria

Farmacêutica tem procurado

dar alguns passos neste novo

ambiente, mas está a ficar

para trás. Grande parte do

que vemos vive no antigo

paradigma da Internet,

a chamada WEB 1.0. A

comunicação é unidireccional

e há pouca ou nenhuma

intervenção do “público-

-alvo”. O conteúdo é estático,

as pessoas têm de ir ao

encontro da informação e não

há qualquer interacção com o

utilizador.

Algumas sugestões a

considerar:

• Antigamente, tudo na

Web era complexo. Hoje

em dia vence o que for

mais simples (vejamos o

sucesso dos motores de

busca);

• Definir como público-alvo

as “massas” só porque

todos podemos precisar

de um medicamento é

um erro imperdoável.

Devemos definir a

nossa estratégia com

públicos bem definidos,

começando pelos

“inovadores” e passando

para o mercado de

massas de forma gradual

e natural. Devemos

trabalhar os inovadores

para que sejam estes a

transmitir a informação

para as massas. O Worth

of Mouth (boca-a-boca)

é das ferramentas de

comunicação mais

eficazes e com maior

crescimento nos próximos

anos. Nada é mais

credível do que aquilo que

os líderes de opinião nos

contam;

• Proteger a informação em

vez de a partilhar é uma

vantagem competitiva

enganadora. Proteger

informação é uma

postura antiquada. Mais

dia, menos dia, essa

informação vai estar

disponível de alguma

forma. O mercado exige

transparência e partilha;

• Actualmente, a

necessidade é sermos

rápidos a criar e a

implementar novas

soluções. A obsessão

pela “excelência” tem

os dias contados. Não

quero com isto dizer

que devemos deixar

de produzir excelência,

mas a excelência vai-se

trabalhando. É preciso

ter muito cuidado com o

tempo que demoramos

a implementar algo. É

muito frequente uma

empresa ter uma ideia

fantástica e, por questões

burocráticas ou para fazer

tudo de forma excelente,

serem ultrapassados

pela concorrência com

um projecto idêntico,

mas muito mais fraco. O

primeiro a chegar tem o

trabalho muito facilitado;

• Disponibilizar/publicar

conteúdo estático é

passado. No presente

e no futuro as pessoas

querem participar,

comentar e ter poder

de opinião. Seja qual

for o nosso público-alvo

(utentes ou profissionais

de saúde) devemos ter o

cuidado de promover a

participação;

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Podemos também focar um

pouco as nossas atenções

em questões éticas ou até

sociais. A assimetria entre

médicos e utentes é óbvia.

Muitos dos médicos dão

explicações a utentes que

saem do consultório sem

perceber nada do que lhes foi

dito.

Estes doentes, quando

medicados, muitas vezes

não cumprem o que lhes

foi prescrito, ou deixam de

dar importância porque,

por exemplo, a dor que

tinham passou. Para evitar

este frequente cenário, as

soluções digitais podem não

só ajudar em termos de

visualização de determinada

patologia como, também,

promover a relação médico-

-utente e familiares.

• O conceito de

“comunidade” ganha

uma importância sem

precedentes. Temos de

ser extraordinários a criar

comunidades à volta da

nossa marca ou do nosso

produto.

A Indústria Farmacêutica,

pela sua postura

conservadora, está a permitir

que outros players estejam

a tirar proveito (muito

proveito!) com temas que

são especialidade da nossa

Indústria. O Marketing

Farmacêutico está estagnado

à espera de ver o que vai

acontecer, mas no mundo

digital isso não funciona.

Quando derem por ela

“perderam o comboio” e já

estamos noutra nova geração

em que tudo volta a mudar e

os primeiros a chegarem são

os “vencedores”.

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Na Europa, há médicos

que já perceberam esta

realidade e, segundo

Dr. Cohen (2007), um

médico (ou outro qualquer

profissional de saúde) pode

dar ao seu paciente com

diabetes, por exemplo, um

endereço de Internet para

obter mais informação

sobre determinada dúvida

ou para visualizar o que lhe

foi explicado nos escassos

minutos do consultório.

Grande parte do cidadão

comum pode saber que a

diabetes é caracterizada

pelo aumento dos níveis

de açúcar no sangue (o

resto da explicação já

não é tão comum saber)

mas, em termos práticos,

como é que o meu corpo

sofre com isso? Para além

de toda a informação que

pode estar associada sobre

a alimentação, cuidados

(entre outros), que tal ter

uns vídeos a demonstrar

como se faz o exercício e até

umas receitas? Que tal ter

um espaço de atendimento

para perguntas/respostas?

Que tal ter aplicações que

ajudem o doente a perceber

o seu estado de saúde? E se

o doente se pudesse registar

e pudesse colocar toda a

informação que o médico lhe

deu (medicação, posologia,

período de tempo, etc.)? E,

melhor ainda, um espaço

para o doente colocar o seu

testemunho sobre o médico

ou sobre o tratamento?

O exemplo anterior serve

apenas de contexto, mas

é certo que no Marketing

Digital não há limites,

independentemente do

público-alvo em questão.

Isto pode parecer tudo

muito complicado, porque

queremos que pareça

complicado, temos receio

de toda esta transparência.

Na verdade, é muito mais

fácil fazer tudo isto do que

organizar uma campanha

nacional de rastreios ou um

simposium nacional.

Os meios tradicionais são

úteis, mas não são solução

única. Não há melhor

estratégia de comunicação

do que procurar algo

diferenciador e inovador (um

processo, uma mensagem,

uma estratégia) de que se

fale e que, de alguma forma,

promova o Worth of Mouth.

A postura da Indústria

Farmacêutica tem de mudar

e tem de colocar no

Marketing aquilo que tão bem

sabe fazer – Inovar!

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