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  • 8/19/2019 A EMPRESA SOCIAL.pdf

    1/121

    MUH MM D YUNUS

    PRÉ M IO NOBEL D P Z

    NOV

    DIMENSÃO DO C PIT LISMO P R F ZER F CE

    ÀS

    NECESSID DES

    M IS PREMENTES

    D HUM NID DE

    «Muhammad Yunus um visionár.io com sentido ·

    prático que fez prosperar milhões

    ~

    pessoas no

    Bangladeclle e noutras partes do-·rn8ndo;})

    Los ngeles Times . .

    «O

    Banco Grameen tornou-se a meca dos

    economistas do desenvolvimento e o seu modelo

    esta a ser copiado em todo o mundo.'>

    he

    conomist

    ~

    EDITORI L

    PRESENC

    I

    i

    I

    t

     

  • 8/19/2019 A EMPRESA SOCIAL.pdf

    2/121

      uhammad unus nasceu em Chittagong

    no Bangladeche.

    Estudou na Universidade de

    Dhaka

    e

    recebeu uma

    bolsa

    Fulbr

    ight para

    estudar Econom ia na Universidade de Vander-

    bilt. Tornou se

    director do Departamento de

    Econom ia

    da

    Universidade de Chittagong em

    1972. o

    precursor

    do microcrédito a popula-

    ções muito pobres e

    de

    muitos outros projec-

    tos

    de

    combate à pobreza e à fome. Yunus

    recebeu

    o Prémio Nobel da Paz em

    2006.

    ·I

    l

    i

    I :

  • 8/19/2019 A EMPRESA SOCIAL.pdf

    3/121

    \

    l

    MUH MM D

    YUNUS

    I

    NOV DIMENSÃO O C PIT LISMO P R

    F ZER

    F CE

    ÀS NECESSID DES

    M IS

    PREMENTES D

    HUM NID DE

    Tradução

    de

    na Saldanha

  • 8/19/2019 A EMPRESA SOCIAL.pdf

    4/121

    FICHA TÉCNICA

    A todos aqueles que estão dispostos

    a dedicar-se a

    mudar

    o mundo

    Título original: Building Social Business The New Kind

    of

    Capitalism that

    Serves

    Humanitys

    Most Pressing Needs

    Autor:

    Muhammad Yunus

    Copyright

    ©

    2010

    by

    Muhammad

    Yunus

    Tradução © Editorial

    Presença Lisboa 2011

    Tradução:

    Ana

    Saldanha

    Revisão técnica: Eng

    o

    Carlos Braga

    Capa: Vera Espinha I Editm· ial

    resença

    Composição impressão e acabamento: Multitipo - Arter Gráficas Lda.

    1.•

    edição

    Lisboa

    Maio 2011

    Depósito

    legal n. 326

    200/11

    Reservados

    todos os direitos

    para

    Portugal

    à

    EDITORIAL PRESENÇA

    Estrada das Palmeiras 59

    Queluz de Baixo

    2730-132 Barcarena

    E-mail: [email protected]

    Internet:

    http://www.

    presenca.pt

    ÍNDI E

    INTRODUÇÃO I A Empresa Social - do sonho à realidade

    .............

    9

    Capítulo 1 I Porquê a empresa social? ............................................... 29

    Capítulo 2 I

    Os

    problemas do

    crescimento

    ........................................ 61

    Capítulo 3 I A criação

    de

    uma

    empresa

    social

    ................................. . 86

    Capítulo 4 I Curar uma criança ... , .................................................. . 124

    Capítulo 5 I Enquadramento legal e financeiro da empresa social ..... 140

    Capítulo 6 I A Grameen Veolia

    Water

    163

    Capítulo 7 I Criar uma infra-estrutura global para a empresa social ...... 182

    Capítulo 8 I

    Vislumbres do

    futuro

    Capítulo 9 I O

    fim da

    pobreza

    202

    224

    7

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    5/121

    INTRODUÇÃO

    A Empresa

    Social

    -

    do

    sonho à

    realidade

    Um

    minúsculo

    passo

    inicial

    Inicialmente envolvi-me no

    problema

    da pobreza em termos

    aca

    démicos

    e

    depois pessoalmente quase

    por acaso.

    Envolvi-me

    porque

    a

    pobreza estava à

    minha volta por

    todo

    o

    Bangladeche. Em par

    ticular a fome de 1974

    empurrou-me para

    fora

    do c mpus universitá

    rio

    e obrigou-me a

    tornar-me activista

    social

    além

    de professor.

    É

    uma

    experiência comum

    claro. Em situações

    de

    catástrofe a

    maioria

    das pessoas

    assume

    sem hesitação os papéis sociais que a

    com

    paixão

    humana impõe. Mas

    no meu caso o que

    começou num período

    de crise

    tornou-se

    uma vocação

    para toda

    a

    vida. Desisti da minha

    carreira

    académica

    e

    fundei um b an co

    um

    banco para

    os pobres.

    Foi

    o primeiro

    passo numa jornada

    que continua até

    hoje.

    O

    estádio

    mais

    recente dessa jornada como explicarei neste livro

    consiste

    em

    criar e concretizar uma ideia para

    uma

    nova forma de

    capitalismo e um novo tipo de

    empreendimento

    baseado na abne

    gação das

    pessoas

    a

    que

    chamo empresa

    sociaL

    um

    tipo

    de

    empresa dedicada à resolução de problemas sociais económicos e

    ambientais que há muito atormentam a humanidade - a fome

    a

    falta

    de habitação a

    doença

    a

    poluição

    a

    ignorância.

    No

    início da

    década de

    1970 o Bangladeche um

    país recém

    -independente encontrava-se

    numa

    situação terríveL As

    conse

    quências

    da Guerra de

    Libertação

    -

    com

    a destruição

    causada

    pelo

    Exército paquis tanês- combinadas com inundações

    secas e mon

    ções

    criaram uma situação desesperada para

    milhões de pessoas.

    Depois veio

    a

    fome.

    Eu

    sentia

    uma

    dificuldade crescente em ensi-

    9

  • 8/19/2019 A EMPRESA SOCIAL.pdf

    6/121

    nar elegantes

    teorias económicas

    na

    sala de aulas enquanto urna

    terrível fome grassava

    fora. Subitamente, apercebi-me da

    vacui

    dade

    dos conceitos económicos

    tradicionais em face

    de

    uma

    situa

    ção

    de fome

    e

    de pobreza

    avassaladoras.

    Compreendi que tinha

    de

    estar com

    a população

    vitimizada de ]obra,

    a

    localidade vizinha

    da

    Universidade de

    Chittagong, e

    de

    alguma forma

    encontrar maneira

    de a

    ajudar.

    O que

    eu tinha

    a

    esperança

    de

    conseguir era apenas ser

    capaz de

    me

    tornar útil

    a pelo menos

    urna pessoa

    por

    dia.

    Ao tentar descobrir

    o

    que

    poderia fazer

    para

    ajudar, fiquei a

    saber

    muitas coisas sobre obra, sobre as pessoas que lá

    viviam

    e sobre a

    sua

    impotência perante a adversidade. Testemunhei os esforços dos

    pobres

    para

    arranjarem

    quantias

    irrisórias,

    necessárias para

    subsidiar

    as suas

    tentativas de

    ganhar

    a

    vida.

    Chocou-me

    particularmente

    o caso

    de uma

    mulher

    que conheci,

    que tinha

    pedido um

    empréstimo

    de cinco

    t k s o equivalente a

    sete cêntimos em divisa

    americana)

    a

    um

    prestamista e

    negociante.

    Ela precisava desta pequena quantia

    para

    comprar bambu, com o

    qual fabricava bancos que em seguida

    vendia.

    A taxa de juros

    des

    ses empréstimos era muito e l ev d

    chegava

    a atingir os 10 por

    cento por

    semana. Mas

    o pior era a

    condição

    especial imposta com

    o

    empréstimo:

    a

    mulher teria de vender todos

    os

    seus produtos ao

    prestamista

    a

    um

    preço determinado

    por ele.

    Aquele empréstimo de cinco

    t k s

    transformou-a virtualmente

    numa

    escrava.

    Por

    mais

    que trabalhasse, ela

    e a

    sua família jamais

    conseguiriam escapar

    pobreza.

    Para avaliar

    a

    dimensão d e ~ t prática de empréstimos

    na

    povoa

    ção,

    elaborei uma lista com

    o

    nome das pessoas

    que

    tinham con

    traído empréstimo com

    os prestamistas. A

    lista completa

    tinha

    quarenta e

    dois nomes.

    Essas pessoas tinham pedido emprestado

    um total

    de 856 t k s o equivalente a mais ou menos 27 dóla

    res americanos à

    taxa

    de câmbio da época. Parecia absurdo

    que

    urna

    quantia

    tão pequena pudesse causar tanto infortúnio

    Para libertar

    essas quarenta e

    duas pessoas das garras

    dos

    pres

    tamistas, meti a mão ao bolso e dei-lhes o dinheiro para pagarem

    o

    empréstimo.

    A

    excitação causada

    na

    localidade por este pequeno

    acto tocou-me profundamente. Pensei:

    «Se

    este pequeno gesto

    fez

    tantas

    pessoas

    felizes,

    porque

    não repeti-lo mais vezes?»

    10

    É

    o que

    tenho tentado

    fazer desde essa

    altura.

    A primeira

    coisa

    que fiz foi tentar

    persuadir

    o

    banco do

    c mpus

    universitário a

    emprestar dinheiro

    aos

    pobres. Mas

    o

    gerente ban

    cário recusou. Disse:

    «Os pobres

    não satisfazem

    os

    critérios neces

    sários para

    terem acesso

    ao

    crédito - não

    são credores

    viáveis.»

    Argumentei com ele, mas sem qualquer

    resultado.

    Avistei-me

    com

    altos funcionários bancários

    a vários níveis

    para

    tentar encontrar

    alguém disposto a abrir as portas do seu banco aos

    pobres.

    Este

    processo desenrolou-se ao longo

    de

    meses, mas

    não

    fui capaz de

    fazer

    com que mudassem de opinião.

    Finalmente,

    surgiu-me urna ideia.

    Ofereci-me

    para ser

    fiador

    de

    empréstimos

    aos

    pobres.

    Após muitas

    hesitações, o

    banco aceitou esta

    minha

    proposta.

    Em

    meados de

    1976,

    comecei

    a

    distribuir

    emprés

    timos

    aos

    pobres da povoação, assinando todos

    os

    papéis

    que o

    banco

    me pedia

    para avalizar

    pessoalmente

    os

    empréstimos

    e

    desempenhar

    o papel de urna espécie de

    banqueiro informaL

    Como

    eu queria

    assegurar-me

    de

    que

    os

    contraentes

    de

    empréstimos não

    se

    depara

    riam com dificuldades para dirimir

    a

    sua dívida, instituí

    regras

    sim

    ples, tais

    como

    a

    dívida

    ser paga em

    pequenas

    prestações mensais e o

    funcionário

    bancário

    visitar

    as pessoas

    em vez

    de elas

    serem obrigadas

    a

    deslocarem-se

    ao

    banco. Estas

    ideias resultaram.

    As

    pessoas

    pagavam

    sempre

    as suas

    dívidas

    dentro

    dos prazos

    estipulados.

    Parecia-me

    que, afinal, emprestar dinheiro aos

    pobres

    não

    era

    tão

    difícil

    como geralmente

    se

    imaginava. Parecia-me até que

    ser

    vir

    as suas necessidades financeiras poderia ser

    um negócio viável.

    Seria de

    esperar

    que

    um

    banqueiro esperto fosse capaz de

    reconhe

    cer

    esta oportunidade

    mais rapidamente

    do

    que

    um

    mero

    professor

    de Economia sem qualquer

    experiência

    da

    banca. Mas

    não. Eu con

    tinuava

    a

    confrontar-me com

    dificuldades ao

    tentar

    expandir

    o

    pro

    grama

    de empréstimos através dos bancos existentes.

    Finalmente,

    constatando que não havia outra opção, decidi

    criar um

    banco autónomo

    para

    os

    pobres. Foi

    um processo

    longo

    e

    árduo.

    Mas,

    com o apoio do então ministro das Finanças do Bangladeche,

    consegui

    criar um novo

    banco,

    um

    banco ao serviço dos pobres.

    Chamámos-lhe

    Banco

    Grameen - ou seja, «banco da

    aldeia»,

    na língua bengali.

    Actualmente, o Banco Grameen é uma

    instituição

    bancária a

    nível

    nacional ao serviço dos pobres

    em

    todos os povoados do Bangladeche.

    11

  • 8/19/2019 A EMPRESA SOCIAL.pdf

    7/121

    Dos oito milhões

    de clientes

    que pedem empréstimos,

    97

    por cento

    são mulheres.

    No

    início

    da criação

    do banco, decidimos concentrar

    -nos

    deliberadamente

    nos

    empréstimos

    a

    mulheres

    -

    inicialmente

    como

    forma

    de protesto contra a prática dos bancos convencionais,

    que se recusavam a

    conceder

    crédito a mulheres, mesmo q ue elas

    per

    tencessem a um

    estrato económico

    desafogado. Constatámos também

    que as mulheres do Bangladeche t inham o talento e as capacidades

    necessárias para desenvolverem

    uma

    actividade rentáveL O nosso

    objecrivo inicial era assegurarmos a paridade do número de homens

    e de mulheres

    que

    contraíam empréstimos. Mas, com a experiência,

    não tardámos a descobrir

    que

    as mulheres

    que

    contraíam empréstimos

    traziam muitos mais benefícios às suas famílias do que os

    homens.

    As

    crianças beneficiavam imediatamente do rendimento das suas mães.

    As

    mulheres estavam mais motivadas para

    ultrapassar

    a pobreza.

    Compreendemos que emprestar dinheiro às mulheres dos povoados

    pobres do

    Bangladeche era

    uma

    maneira eficaz de combater a pobreza

    em

    toda a

    sociedade.

    O Banco Grameen tem ainda outras características pouco usuais.

    propriedade dos seus clientes, os quais,

    enquanto

    accionistas,

    elegem nove dos treze

    membros

    do

    conselho

    de administração.

    O Banco

    Grameen

    disponibiliza mais de

    cem

    milhões de dólares

    por mês em empréstimos sem garantia, numa média de cerca

    de

    duzentos dólares

    por

    empréstimo. A taxa

    de pagamento

    dos emprés

    timos continua

    a ser

    muito

    elevada, cerca

    de 98 por

    cento, apesar

    de

    o Banco Grameen servir as pessoas mais pobres - aquelas que os

    bancos convencionais

    ainda

    consideram credores não viáveis.

    O Banco Grameen até empresta

    dinheiro

    a pedintes. Estes usam

    os

    empréstimos para entrar

    no negócio

    da venda de produtos porta

    a po r t a -

    brinquedos,

    utensílios domésticos,

    al imentos - com

    binado

    com a

    prática da mendicidade.

    Ao contrário

    do que algu

    mas

    pessoas

    esperariam, os pedintes

    apreciam a ideia de serem

    capazes de se

    sustentar através dessa

    actividade, em vez

    de depen

    derem apenas da

    caridade

    dos

    outros.

    Contamos

    agora

    com

    mais

    de 100

    000

    pedintes

    neste

    programa.

    Nos

    quatro

    anos

    desde

    o

    lançamento

    do programa, mais de 18

    000

    pedintes

    deixaram de se

    dedicar à mendicidade. A

    maior

    parte dos

    pedintes

    vai já no seu

    segundo ou terceiro empréstimo.

    12

    O Banco Grameen

    também

    apoia os filhos dos seus clientes nos

    estudos, concedendo

    empréstimos

    com

    condições

    acessíveis

    para

    a

    frequência

    de

    cursos superiores. Mais de

    50

    000 alunos

    frequentam

    neste

    momento

    escolas médicas, institutos de

    engenharia e

    univer

    sidades com

    o apoio

    do

    financiamento

    do

    Banco Grameen.

    Incentivamos estes jovens

    a comprometerem-se a não entrarem

    no mercado

    de

    trabalho à

    procura

    de

    emprego por conta

    de

    outrem.

    Serão eles próprios criadores de emprego. Explicamos-lhes:

    «As

    vossas mães são proprietárias de um grande banco, o Banco Gra

    meen. Têm dinheiro que chegue para financiar qualquer

    empreen

    dimento que decidam iniciar, por isso, para quê perder tempo à

    procura de

    um

    emprego por conta

    de

    outrem? Sejam

    empregado

    res, não

    empregados.» O

    Banco Grameen quer impulsionar

    o

    empreendedorismo e a auto-suficiência entre o povo do Banglade

    che

    - não a dependência.

    O

    Banco Grameen

    é financeiramente

    auto-suficiente. Os

    seus

    fundos provêm exclusivamente de depósitos. Mais de metade

    dos

    depósitos são dos próprios contraentes de empréstimos, a

    quem

    é

    solicitado que aforrem uma pequena quantia todas as semanas.

    Temos um balanço de poupança colectiva de mais de 500 000

    milhões

    de dólares americanos.

    Por si só tudo isto

    seria

    um feito admirável com origem na

    minúscula faísca que o

    despoletou-

    aqueles

    27 dólares do emprés

    timo que eu

    paguei

    na vez

    dos

    pobres de Jobra. Mas o trabalho do

    Banco Grameen no Bangladeche acabou por ser

    apenas

    o início.

    Actualmente, a ideia de

    pequenos

    empréstimos sem garantia

    concedidos a mulheres pobres, conhecida como «microcrédito» ou

    «microfinança», alastrou

    por

    todo

    o

    mundo.

    agora

    progra

    mas

    do

    tipo do

    Banco

    Grameen

    em quase todos

    os

    países do

    mundo. A primeira delegação abriu

    na

    zona de Queens,

    em

    Nova

    Iorque,

    em

    2008, para providenciar pequenos

    empréstimos sem

    garantia em média, de 1500

    dólares cada)

    para que

    as mulheres

    dessa zona

    pudessem

    montar pequenas

    empresas

    ou expandir

    empresas já existentes. Na

    maior

    parte

    dos

    casos, são

    mães

    solteiras

    a

    esforçarem-se

    por

    ganhar a vida com

    dignidade.

    A Grameen America está agora a abrir

    novas

    delegações em

    Brooklyn Nova Iorque), em

    Omaha

    Nebrasca) e em São

    Francisco

    13

  • 8/19/2019 A EMPRESA SOCIAL.pdf

    8/121

      Califórnia).

    O

    seu sucesso demonstra que

    até

    mesmo no país

    mais

    rico e com o sistema bancário mais sofisticado do mundo há

    uma

    enorme necessidade de bancos dedicados ao serviço dos milhões de

    pessoas com um acesso

    limitado ou

    inexistente a serviços ban cários.

    Porque é

    que atribuo

    tanta

    importância

    ideia

    de

    fornecer

    ser

    viços

    bancários

    aos pobres? Em parte,

    é claro,

    devido

    à

    forma

    como

    descobri

    acidentalmente o

    papel que os

    prestamistas exploradores

    desempenhavam

    na

    manutenção

    das

    suas vítimas

    na pobreza. Mas

    é

    também porque cada

    vez

    estou

    mais

    convencido de que

    a pobreza

    ão

    é criada

    pelos

    próprios pobres.

    Quando me encontro com contraentes de empréstimos do Ban

    co Grameen,

    é

    frequente conhecer pares constituídos por

    mãe e

    filho

    ou mãe

    e

    filha nos quais

    a

    mãe

    é

    analfabeta, enquanto

    a

    filha

    ou

    o filho

    são médicos ou engenheiros. Passa-me sempre um pen

    samento pela cabeça: «Esta mãe

    também

    poderia ter

    sido médica

    ou engenheira. Tem

    as

    mesmas

    capacidades

    que

    a

    filha ou

    o

    filho.

    A

    única razão por que não

    conseguiu

    desenvolver

    o

    seu potencial

    foi o

    facto

    de a sociedade

    nunca lhe ter dado essa hipótese. Nem

    sequer pôde ir escola para aprender

    o alfabeto.»

    Quanto mais tempo passamos entre pessoas pobres, tanto mais

    nos convencemos de

    que

    a pobreza não é o resultado de qualquer

    incapacidade

    da

    parte dos pobres. A pobreza não é criada pelas

    pessoas pobres. É criada

    pelo sistema que

    construímos, pelas insti

    tuições

    que

    organizámos e pelos conceitos que formulámos.

    A pobreza é criada por deficiências nas nossas ins t i tu içõ s por

    exemplo,

    nas instituições financeiras.

    Os

    bancos recusam-se a for-

    necer

    serviços

    financeiros a

    quase

    dois terços

    da população mundial.

    Ao longo de gerações,

    têm

    afirmado

    que não

    é possível emprestar

    dinheiro

    aos

    pobres

    e

    toda

    a

    gente

    aceita

    essa justificação.

    Esta

    ati

    tude criou as condições necessárias· para que os prestamistas

    sem

    escrúpulos

    prosperassem em

    todo o

    mundo.

    O Banco

    Grameen

    questionou

    este

    pressuposto e

    demonstrou que

    não só é possível

    emprestar dinheiro

    aos

    mais pobres como também é lucrativo.

    Durante a crise

    financeira

    global

    que

    começou

    em

    2008, a fal

    sidade

    desses velhos pressupostos tornou-se

    ainda

    mais evidente.

    Enquanto os grandes bancos globais, com todas as suas garantias,

    entravam

    em

    colapso, por todo

    o

    mundo

    os programas de

    micro-

    14

    crédito, que não dependem

    de

    garantias,

    continuavam

    a

    manter

    -se tão fortes como

    sempre. Será que

    esta demonstração irá fazer

    com

    que

    as instituições financeiras

    convencionais mudem de

    opi

    nião

    em

    relação à

    sua definição tradicional do que

    constitui

    um

    contraente

    de empréstimo fiável? Abrirão

    finalmente as suas

    por

    tas aos pobres?

    Faço

    esta

    pergunta

    com

    toda

    a

    seriedade embora

    saiba

    muito bem

    qual é a

    resposta

    provável). Quando uma crise atinge o seu ponto

    máximo, pode proporcionar uma enorme oportunidade. Quando

    as coisas se desmoronam, podemos voltar a conceber, remodelar e

    reconstruir.

    Não

    deveríamos perder esta oportunidade de

    converter

    as nossas

    instituições

    financeiras em instituições inclusivas. O acesso

    a

    serviços financeiros não deveria ser vedado

    a

    ninguém. Como

    estes

    serviços

    são de importância vital

    para

    a auto-realização das

    pessoas,

    eu

    acredito vivamente que deveria ser atribuído ao

    crédito

    o estatuto

    de

    direito humano.

    Que

    a pobreza

    não

    é criada

    pelos

    pobres mas pelas suas circuns

    tâncias diz-nos algo importante algo sobre

    o potencial dos

    pró

    prios

    seres

    humanos.

    Cada

    ser

    humano vem

    ao

    mundo

    não

    com a capacidade

    de

    cui

    dar

    de si

    próprio

    mas

    também de

    contribuir para o

    bem-estar do

    mundo

    na globalidade. Algumas pessoas

    têm

    a

    oportunidade

    de

    explorar o

    seu

    potencial, mas muitas outras

    nunca

    conseguem desen

    volver

    os

    maravilhosos dotes

    com

    que nasceram. Morrem

    sem

    explo

    rar esses dotes e o

    mundo

    fica

    privado do seu contributo.

    A

    Grameen deu-me uma

    inabalável na criatividade humana

    e a

    firme crença de que os seres humanos não nascem para sofrer

    os

    horrores

    da

    fome

    e

    da pobreza.

    A pobreza é

    uma imposição

    artificial

    e

    externa sobre

    as

    pessoas.

    E, como

    é

    externa, pode

    ser

    removida.

    Nós somos capazes de criar um

    mundo

    livre

    de pobreza

    se

    refor

    mularmos

    o nosso sistema

    de modo

    a

    eliminar as

    graves

    falhas que

    geram a pobreza. P odemos criar um mundo no

    qual

    o único lugar

    onde

    a

    pobreza poderá ser vista

    será

    em

    «museus da pobreza».

    Um

    dia, as crianças farão visitas

    de

    estudo a esses museus da

    pobreza.

    Ficarão

    horrorizadas

    ao verem o

    sofrimento

    e

    as

    indignidades

    por

    que

    inúmeras

    pessoas tiveram de passar

    sem

    qualquer culpa pró-

      5

  • 8/19/2019 A EMPRESA SOCIAL.pdf

    9/121

    pria. Responsabilizarão os

    seus

    antepassados por terem tolerado

    esta

    situação desumana durante tanto t em p o

    e

    terão razão para

    o fazer

    Para mim as pessoas pobres são como bonsais. Quando se planta

    a melhor semente da

    árvore

    mais alta num vaso minúsculo obtém

    -se

    uma réplica da

    árvore mais

    alta

    mas

    com

    poucos centímetros.

    Não há

    nada

    de errado na semente que

    se

    plantou;

    a

    terra em que

    foi

    plantada

    é

    que

    é

    inadequada. Os pobres são pessoas

    bonsais.

    Não há

    nada

    de errado

    na

    semente que lhes deu

    origem

    mas

    a

    sociedade nunca

    lhes

    proporcionou a terra adequada ao seu cresci

    mento.

    Para

    tirar as

    pessoas

    da

    pobreza basta criar

    um

    meio

    que

    lhes seja propício. Quando

    os pobres conseguirem

    libertar

    a sua

    energia e a sua criatividade a pobreza desaparecerá rapidamente.

    O

    conceito de empresa social

    Dei

    os

    primeiros passos

    no

    sentido de ajudar as

    pessoas pobres

    em meados da década de 1970. Embora

    a

    pobreza tenha

    continuado

    a ser a minha principal

    preocupação

    desde

    então

    avancei para outras

    questões por

    as

    considerar muito

    relevantes para a

    minha preocupa

    ção dominante. Ao longo dos anos

    tenho-me envolvido

    nos sectores

    da

    agricultura

    da

    pesca das energias renováveis

    da tecnologia da

    informação da educação

    da

    saúde dos têxteis artesanais dos servi

    ços

    de

    emprego e

    em muitos

    outros sectores e subsectores similares.

    Pareceu-me que

    cada

    um deles poderia

    contribuir para

    ultrapassar

    a pobreza se concebido

    de

    forma correcta. Criei

    uma

    empresa para

    cada sector

    e

    subsector

    para

    ver

    se

    poderia abordar

    o

    problema da

    pobreza de forma

    sustentável. A

    pobreza

    é

    um estado de

    vida. Tem

    muitas

    facetas Tem

    de ser abordada

    a

    partir de muitas direcções

    e

    nenhuma

    abordagem deve

    ser menosprezada.

    Enquanto experimentava todas

    estas

    abordagens dei

    comigo

    a

    passar de um nível do meu enquadramento conceptual para

    outro. Avancei

    do microcrédito para um conceito

    muito

    mais alar

    gado que também o inclui. Este novo conceito trará uma mudança

    fundamental

    à

    arquitectura da

    nossa

    economia capitalista aproxi

    mando-a

    de um

    enquadramento completo

    e

    satisfatório

    ao libertá-

    16

    -la

    das falhas básicas que conduzem à pobreza e a outros males

    sociais e ambientais. Trata-se do conceito

    de

    empresa social

    que

    é

    o tópico deste livro.

    Permita-se-me

    voltar

    por

    um momento à crise financeira de

    2008-2009.

    Infelizmente a cobertura dos

    meios

    de

    comunicação

    a

    impressão de

    que

    quando

    resolvermos

    esta crise todos

    os

    nossos problemas acabarão: a economia começará a crescer de novo

    e poderemos

    regressar de

    modo rápido e confortável ao «negócio

    como

    de

    costi une»

    Mas mesmo que fosse desejável o «negócio como de costume»

    não é realmente

    uma

    opção viável.

    Esquecemos que

    a crise

    finan

    ceira é

    apenas uma de

    várias

    crises que ameaçam

    a humanidade.

    Todos nós

    estamos

    a sofrer

    uma

    crise global

    de alimentos uma crise

    de energia uma crise ambiental uma crise no sector da saúde e as

    crises sociais

    e

    económicas persistentes da po breza mundial

    maciça.

    Estas

    crises são

    tão

    importantes como

    a crise financeira embora

    não estejam a receber

    tanta

    atenção como ela.

    Além

    disso a cobertura dos meios

    de comunicação

    pode

    dar

    a impressão

    de

    que estas crises não

    estão

    relacionadas que

    estão

    a

    ocorrer

    simultaneamente

    por

    mero acaso Pura e simplesmente não

    é verdade.

    De

    facto estas crises

    têm

    uma origem om um uma

    falha

    fundamental no nosso

    edifício teórico

    do capitalismo.

    A

    maior

    falha na

    teoria

    vigente do

    capitalismo

    reside na

    sua

    representação

    incorrecta da natureza

    humana. Na

    actual

    interpreta

    ção

    do

    capitalismo os seres

    humanos envolvidos

    em

    negócios são

    representados

    como

    seres

    unidimensionais cuja única

    missão é

    maxi

    mizar o lucro. Supostamente

    os

    seres humanos

    tentam

    alcançar este

    objectivo económico d e

    uma

    forma

    que

    exclui

    qualquer outro.

    Esta

    é

    uma

    imagem distorcida do

    que

    é realmente um ser

    humano.

    Como um momento de reflexão bastará para demonstrar

    os

    seres humanos não

    são robôs programados unicamente para

    fazerem dinheiro. O facto essencial sobre os seres humanos é

    que

    eles são seres multidimensionais. A felicidade advém-lhes de mui

    tas fontes não só da produção

    de

    riqueza.

    E no entanto os economistas

    construíram

    toda a sua teoria

    de

    negócios

    assente no pressuposto

    de que

    do ponto de vista eco

    nómico

    os

    seres humanos não

    fazem

    mais nada

    a não ser

    tentar

    17

  • 8/19/2019 A EMPRESA SOCIAL.pdf

    10/121

    atingir

    os seus

    objectivos

    egoístas. A teoria

    conclui

    que o

    melhor

    resultado

    para

    a sociedade ocorrerá

    quando

    cada indivíduo tiver

    rédeas soltas

    para

    procurar benefícios pessoais. Esta

    interpreta

    ção

    dos

    seres humanos nega qualquer papel

    a outros aspectos

    da

    vida -

    políticos, sociais, emocionais, espirituais,

    ambientais e

    outros.

    Não há dúvida de que os seres humanos são seres

    egoístas,

    mas

    também são seres altruístas. Ambas as qualidades coexistem

    em

    todos

    os seres humanos. O interesse pessoal e a

    busca do

    lucro

    explicam

    muitas

    das nossas acções, mas

    muitas

    outras não fazem

    sentido quando

    vistas através

    desta

    lente deformadora. Se só o

    motivo do lucro

    controlasse

    todos os

    comportamentos

    humanos, as

    únicas

    instituições existentes seriam

    as

    concebidas para gerar

    o

    nível

    máximo de riqueza individuaL Não haveria igrejas, mesqui

    tas ou sinagogas,

    não

    haveria escolas, museus, parques públicos,

    centros de saúde ou centros comunitários.

    (Ao

    fim

    e

    ao

    cabo,

    ins

    tituições como essas não

    fazem de ninguém

    um multimilionário )

    Não haveria organizações

    de

    beneficência, fundações ou organiza

    ções

    sem

    fins lucrativos.

    Obviamente, os seres humanos também são movidos por moti

    vações altruístas. Demonstra-o

    a

    existência de um

    grande

    número

    de

    instituições

    de beneficência

    sustentadas

    pela generosidade

    das

    pessoas. É verdade que em muitos

    países

    os donativos para

    obras

    de solidariedade social desfrutam de

    benefícios fiscais.

    Mas estes

    benefícios

    fiscais só afectam uma parte

    do capital doado. Mesmo

    assim, é necessária

    uma

    moti_vação

    altruísta para tornar

    possível

    uma atitude de solidariedade

    sociaL) E, no

    entanto, esta

    dimensão

    de abnegação não

    desempenha

    qualquer papel nas

    teorias econó

    micas.

    Esta

    visão distorcida da

    natureza

    humana

    é a falha fatal

    que

    torna

    o

    nosso

    pensamento

    económico

    incompleto e impreciso. Ao longo

    do tempo,

    tem

    contribuído

    para criar

    as

    múltiplas crises

    com que

    nos

    deparamos

    actualmente. As

    nossas regulamentações governa

    mentais, os

    nossos

    sistemas

    educativos

    e

    as nossas estruturas sociais

    baseiam-se

    no pressuposto de que

    somente

    as

    motivações egoístas

    são

    «reais»

    e

    merecem

    a nossa atenção.

    Por

    consequência,

    investi

    mos enormes

    quantidades

    de tempo,

    energia, dinheiro e

    outros

    18

    recursos no desenvolvimento

    e

    na manutenção de

    empresas com

    fins

    lucrativos. Partimos

    do

    princípio

    de

    que as empresas com

    fins lucra

    tivos

    são a

    principal fonte de criatividade humana

    e a

    única forma

    de abordar

    os

    problemas da sociedade.

    E,

    mesmo quando

    os

    nossos

    problemas se agravam, não questionamos

    os

    pressupostos subjacen

    tes que contribuíram para criar

    esses

    problemas.

    Uma

    vez reconhecida esta falha na nossa estrutura teórica, a solu

    ção é óbvia. Temos de

    substituir

    o indivíduo unidimensional

    na

    teoria económica

    por um

    indivíduo

    multidimensional- um indi

    víduo que tem, simultaneamente, interesses

    egoístas e altruístas.

    Quando

    o fazemos, a nossa

    imagem do mundo

    dos negócios

    muda

    imediatamente. Vemos

    a necessidade

    de

    dois tipos

    de empre

    sas:

    um para obter

    ganhos pessoais e

    um outro dedicado

    a

    ajudar

    as

    pessoas.

    N um

    tipo

    de

    empresa,

    o

    objectivo

    é maximizar os

    lucros

    dos seus proprietários,

    com

    pouca

    ou

    nenhuma consideração

    pelos

    outros.

    (De facto,

    na tentativa

    de

    obter

    o

    máximo

    lucro possível,

    muitas pessoas não

    se

    importam de

    causar conscientemente

    danos

    à

    vida de outras pessoas.) No outro tipo de empresa, tudo se

    faz

    para o

    benefício

    dos

    outros

    e nada

    em

    benefício dos seus proprie

    t á r o s excepto o prazer

    de

    servir

    a

    humanidade.

    Ao segundo tipo

    de

    empresa,

    assente

    na parte altruísta da natureza humana, chamei

    empresa social. o que tem faltado

    à

    nossa teoria económica.

    Numa empresa social,

    o

    investidor tem

    o

    objectivo de ajudar

    as

    outras pessoas sem obter

    qualquer contrapartida financeira para

    si

    próprio. A empresa social é

    uma

    empresa porque deve ser

    auto

    -sustentável

    -

    ou seja,

    deve

    produzir um rendimento suficiente

    para

    cobrir os seus próprios custos.

    Parte

    do super vit que a empresa

    social cria é investida na expansão da empresa e

    uma

    outra parte

    fica

    de

    reserva

    para

    cobrir imprevistos. Assim,

    a

    empresa

    social

    poderia ser descrita como «uma empresa sem prejuízos nem divi

    dendos» dedicada inteiramente

    a

    atingir

    um objectivo sociaL

    Podemos pensar numa empresa

    social

    como um negócio abnegado

    cujo objectivo

    é

    pôr fim

    a

    um problema

    social.

    Neste tipo de empresa,

    existe

    lucro -

    mas ninguém

    fica

    com

    ele.

    Como

    a

    empresa está

    inteiramente dedicada à causa social, a ideia de obter lucros pessoais

    está

    arredada da

    empresa. O proprietário só pode retirar, ao longo de

    um determinado período, a

    quantia

    que investiu.

    19

  • 8/19/2019 A EMPRESA SOCIAL.pdf

    11/121

    Alguém

    no

    mundo

    real estará

    interessado em

    cnar empresas

    com objectivos abnegados? De onde viria o dinheiro para uma

    empresa social?

    Há seres humanos reais,

    que todos

    nós conhecemos que ficariam

    encantados

    por

    poderem criar empresas com objectivos abnegados.

    A única coisa que teremos de

    fazer

    é libertá-los da atitude mental

    que

    põe a obtenção do lucro no centro de todas as empresas uma

    ideia

    que lhes impusemos através da nossa teoria económica defei

    tuosa.

    Poderíamos perguntar-nos de onde virá o dinheiro para criar

    uma

    empresa

    que não tem qualquer intenção de produzir lucro.

    A resposta não é tão misteriosa quanto poderia supor-se. Uma das

    fontes será o dinheiro

    que

    actualmente

    se

    destina ao apoio a obras

    filantrópicas. Pensemos

    nas

    grandes fundações assim como

    nas

    organizações sem fins lucrativos que prosperam graças

    generosi

    dade de milhões de doadores grandes e pequenos.

    Só nos

    Estados

    Unidos as receitas

    anuais das organizações sem fins lucrativos num

    ano recente

    atingiram mais de

    um

    bilião de dólares.

    Como

    este

    montante sugere as pessoas não

    se

    importam de

    dar dinheiro para apoiar organizações quando acreditam que

    elas

    estão a

    fazer

    do mundo

    um

    lugar melhor. Se as pessoas consegui

    rem

    ver que a empresa social pode atingir estes mesmos objectivos

    de uma maneira melhor não transfeririam de bom grado cada vez

    mais os donativos que

    fazem

    a

    obras

    de beneficência para negócios

    sociais?

    Para além de filantropos

    ricos

    como Bill Gates e Warren Buffett

    muitas

    outras

    pessoas

    investirâo

    em empresas

    sociais

    só para pode

    rem

    partilhar

    a

    alegria de melhorar

    a

    vida

    dos seus semelhantes.

    As pessoas não só doarão dinheiro

    mas também

    a sua criatividade

    as

    suas

    capacidades

    de

    estabelecer contactos as

    suas

    aptidões

    tec

    nológicas experiência de vida e outros recursos para criar empresas

    sociais que

    possam

    mudar o

    mundo.

    Uma

    vez

    divulgada a ideia

    da

    empresa social muitas

    pessoas

    reservarão

    algum do capital das suas empresas com

    fins

    lucrativos

    para empresas sociais. Essa será uma outra

    fonte

    de capital para as

    empresas sociais. Alguns dos fundos governamentais que

    são

    tra

    dicionalmente aplicados em programas sociais serão usados em

    20

    empresas

    sociais. Os fundos de

    responsabilidade

    social criados por

    empresas com fins

    lucrativos podem também

    ser

    disponibilizados

    para empresas sociais.

    Quando

    a nossa teoria económica

    se

    ajustar à realidade multidi

    mensional da natureza humana os alunos aprenderão

    nas

    escolas e

    nas

    universidades

    que

    há dois tipos de empresas: as empresas

    tra

    dicionais com fins lucrativos e as empresas sociais.

    Quando

    forem

    crescidos pensarão

    em que tipo de empresa investirão e em que tipo

    de empresa

    quererão trabalhar.

    E muitos

    jovens

    que sonham com

    um

    mundo

    melhor pensarão

    no tipo de empresa

    social que gosta

    riam de

    criar.

    Quando

    ainda estiverem

    na

    escola,

    alguns

    jovens

    poderão começar a conceber empresas sociais e

    até mesmo

    a lançar

    empresas sociais

    individual ou

    colectivamente

    para

    exprimirem o

    seu talento

    criativo para

    mudar

    o mundo.

    Não

    u sonho

    mas uma

    realidade

    Tal como qualquer nova ideia o conceito de empresa social

    necessita de ser demonstrado

    na

    prática.

    Por

    isso, comecei a criar

    empresas sociais

    no Bangladeche.

    Algumas delas

    tornaram-se

    mais conhecidas porque foram

    cria

    das

    como jo nt v ntur s

    de empresas

    da

    Grameen e

    de grandes gru

    pos

    económicos

    mundialmente

    famosos. O primeiro empreendimento

    conjunto desse

    tipo

    foi

    criado em

    2005

    em

    parceria com a

    empresa

    francesa

    de lacticínios Danone e

    tem como

    objectivo

    reduzir

    os

    níveis de subnutrição das crianças do Bangladeche. A Grameen

    Danone produz

    um

    delicioso

    iogurte para

    crianças

    e

    vende-o

    a

    um

    preço acessível

    aos pobres. A este iogurte são acrescentados

    todos

    os micronutrientes de que carece a dieta normal das nossas crian

    ças : ferro zinco iodina etc. Se

    uma

    criança

    comer

    dois

    boiões de

    iogurte

    por semana ao

    longo de um

    período

    de

    oito ou

    nove

    meses

    obterá

    todos os micronutrientes

    necessários

    e tornar-se-á uma

    criança saudável

    e

    activa.

    Como

    empresa social a Grameen Danone segue o princípio

    básico

    de

    que

    deve ser

    auto-sustentável

    e

    de

    que os

    seus proprietá

    rios devem respeitar o compromisso de não retirar quaisquer

    divi-

    21

  • 8/19/2019 A EMPRESA SOCIAL.pdf

    12/121

    dendos para

    além do

    montante original

    que

    investiram.

    O

    sucesso

    da

    empresa é

    avaliado

    todos

    os anos

    não pelo lucro gerado mas

    pelo

    número de

    crianças que escapam à

    subnutrição nesse

    ano.

    Contei

    a

    história

    da

    fundação

    da Grameen

    Danone

    no meu

    último livro riar

    Um Mundo

    sem Pobreza

    e mais

    adiante

    neste

    livro actualizarei

    os

    dados sobre

    ela.

    Como

    os

    leitores

    verão tem

    sido uma interessante

    experiência

    de aprendizagem que propor

    ciona

    muitas

    lições sobre

    como

    criar

    e

    desenvolver

    uma empresa

    social

    bem-sucedida.

    O

    que

    é

    mais

    importante

    ainda

    é que a

    Grameen Danone

    tem

    servido como modelo

    a

    imitar atraindo atenções por todo

    o mundo.

    Muitas outras grandes firmas têm abordado

    a

    Grameen com

    pro

    postas

    para

    criarmos empresas

    sociais

    conjuntas.

    Pretendem

    a

    cola

    boração

    da Grameen para

    garantirem

    que

    o

    processo

    se

    desenrola de

    forma

    correcta

    porque sabem

    que

    fomos

    os

    originadores deste novo

    conceito.

    Quando adquirirem

    experiência

    na

    área

    da

    empresa social

    levarão o

    conceito aonde houver necessidade

    dele.

    A

    nossa

    empresa

    social

    em

    parceria com

    a

    Veolia

    uma grande

    empresa

    francesa

    de água mineral chama-se

    Grameen

    Veolia Water

    Company

    e foi criada

    para fornecer água potável às zonas rurais

    do

    Bangladeche onde

    a

    contaminação por arsénico

    é

    um enorme

    pro

    blema.

    As

    pessoas compram a água à

    empresa

    a um preço

    acessível

    em

    vez

    de

    beberem água contaminada. Ao

    longo do tempo medi

    remos

    o

    impacto

    do fornecimento

    de

    água potável

    sobre

    a saúde

    dos habitantes locais.

    Uma outra grande empresa mundial a BASF da Alemanha

    assinou

    um acordo de joint venture com a Grameen para produzir

    mosquiteiros no Bangladeche com um tratamento químico.

    Quando

    estes

    mosquiteiros

    são

    usados sobre

    as

    camas

    proporcio

    nam

    protecção contra doenças

    transmitidas

    por mosquitos

    como

    por exemplo

    a

    malária.

    A

    joint venture BASF

    Grameen produzirá e

    venderá estes mosquiteiros a

    um

    preço

    tão baixo

    quanto possível .

    para que os

    seus benefícios sejam

    acessíveis

    aos pobres.

    A

    nossa joint venture com

    a Intel

    Corporation

    a Grameen Intel

    tem

    como objectivo

    usar as

    tecnologias de informação

    e

    da comu

    nicação para ajudar

    a

    resolver os problemas dos

    pobres

    das zonas

    rurais

    - por exemplo

    providenciando

    cuidados

    de saúde

    em áreas

    22

    rurais dos países

    em

    vias de desenvolvimento onde há falta de

    médicos

    e

    de enfermeiras

    e

    existem poucas clínicas. Como explica

    rei mais adiante

    neste

    livro

    o objectivo é

    criar novas tecnologias

    de

    ponta que

    proporcionem

    o acesso

    aos conceitos de

    cuidados de

    saúde mais avançados aos pobres de

    áreas

    r u r i s

    e

    em

    seguida

    criar um quadro de pequenos empresários

    que

    forneçam

    estes

    ser

    viços

    vitais de um modo economicamente

    sustentável.

    A nossa joint venture com a Adidas tem como

    objectivo

    a produ

    ção

    de calçado a preços económicos para

    pessoas

    de baixo rendi

    menta. O objectivo da Grameen Adidas é que ninguém

    criança

    ou

    adulto ande

    descalço.

    Evidentemente é mais

    agradável

    e

    con

    fortável caminhar calçado

    em

    estradas

    de

    terra

    batida mas no

    fundo trata-se de

    uma

    intervenção

    ao nível

    da

    saúde

    pública que

    visa

    contribuir

    para

    que os

    habitantes de

    zonas rurais principal

    mente as crianças deixem de sofrer

    das

    doenças que podem ser

    transmitidas por parasitas quando se anda

    descalço.

    A

    Adidas está

    a

    colaborar

    com a Grameen para trazer estes benefícios às

    pessoas

    mais pobres dos países em

    vias de

    desenvolvimento usando um

    modelo de empresa social economicamente viável.

    Uma outra empresa alemã a

    Otto GmbH

    uma empresa líder

    na área das vendas

    por

    catálogo está

    muito

    interessada

    em

    criar

    uma

    empresa

    social

    para fabricar têxteis

    e

    artigos de vestuário

    para

    exportação do

    Sul da

    Ásia

    para

    países

    do

    mundo desenvolvido.

    A

    Otto

    Grameen

    está

    a

    planear montar

    uma

    fábrica

    de

    confecções

    no Bangladeche

    que

    envidará todos os

    esforços para

    empregar

    pes

    soas

    frequentemente

    tratadas

    como

    economicamente marginais

    como

    por

    exemplo mães

    solteiras

    e portadores

    de deficiência. Os

    lucros serão aplicados

    no melhoramento da

    qualidade de vida dos

    trabalhadores dos seus filhos

    e

    dos

    pobres

    da

    zona.

    Como estes exemplos

    demonstram a

    empresa social não

    é só

    uma

    ideia agradável. É

    uma

    realidade

    uma

    realidade

    que

    come

    çou

    a provocar

    mudanças

    positivas na

    vida das pessoas para além

    de atrair

    verdadeiro

    interesse por

    parte de

    alguns dos grupos eco

    nómicos mais avançados do mundo.

    Muitas outras

    empresas

    sociais estão

    em

    marcha. Uma área

    interessante será

    a

    criação de emprego

    em

    localizações específicas

    ou

    para pessoas

    que se encontrem

    em condições

    particularmente

    23

  • 8/19/2019 A EMPRESA SOCIAL.pdf

    13/121

    desfavorecidas. Como

    os negócios sociais

    funcionam

    sem a

    pres

    são

    de gerar lucro para os seus proprietários, o leque de oportuni

    dades de investimento é muito

    mais

    amplo do que

    no

    caso

    de

    empresas com

    fins

    lucrativos. Antes

    de

    um

    empresário motivado

    pelo lucro decidir

    fazer um investimento, tem de

    garantir

    um

    mínimo

    predeterminado de

    retorno do seu investimento, digamos

    25

    por

    cento.

    Não fará

    o investimento se esse

    retorno

    não

    for pos

    sível, porque tem outras oportunidades de investimento que lho

    proporcionarão. Como o investidor procura o lucro, será motivado

    para certos projectos pela dimensão do lucro

    a

    obter.

    Mas

    a

    decisão do investimento numa empresa social não

    se

    baseia no

    lucro potenciaL

    Baseia-se

    na

    causa

    sociaL Se essa

    causa

    for

    criar

    emprego,

    a

    empresa social avançará

    se

    houver garantias de

    que pode ser auto-sustentáveL Este facto dá à empresa social

    um

    enorme poder

    na

    criação

    de postos de

    trabalho. Podem

    até fazer-se

    investimentos em projectos em

    que

    o retorno é quase nulo e, atra

    vés deste processo, criar oportunidades de emprego para muitas

    pessoas. Num mundo de negócios com

    fins

    meramente lucrativos,

    estes empregos nunca seriam criados. Que

    lástima

    A saúde é um outro

    sector

    com

    um grande potencial para

    a

    empresa

    sociaL A prestação

    pública de

    cuidados

    de

    saúde

    num

    grande número de países

    é

    ineficiente

    e

    muitas

    vezes

    não chega às

    pessoas que mais precisam deles.

    As clínicas

    privadas servem

    as

    necessidades das

    pessoas com

    rendimentos

    elevados. O

    grande

    fosso entre

    os

    dois

    tipos de serviço pode

    ser

    ocupado por

    empresas

    SOClalS.

    No

    Bangladeche,

    a

    Grameen Healthcare

    [Grameen

    Cuidados de

    Saúde}

    está

    a

    desenvolver

    um protótipo

    de

    centros

    de

    gestão

    de cui

    dados de saúde nas

    zonas

    rurais

    que

    se

    concentrará

    na

    medicina

    preventiva e

    disponibilizará serviços

    de

    diagnóstico

    e de

    check-ups

    seguros de saúde, sensibilização para questões de saúde e

    de nutri

    ção, etc. A

    Grameen Cuidados de

    Saúde

    está

    a

    tentar explorar

    o

    acesso generalizado aos telemóveis

    colaborando

    com empresas líde

    res de mercado

    na

    concepção de equipamento de diagnóstico que

    permita transmitir imagens e dados em tempo real para técnicos

    de saúde localizados

    nas

    cidades. Explorando

    a nova

    eficiência que

    a

    tecnologia torna possível, acredito que

    a

    Grameen Cuidados de

    24

    Saúde

    conseguirá

    fazer baixar de

    tal

    forma os preços dos

    cuida

    dos

    de saúde que até mesmo

    a zona

    rural mais desfavorecida poderá

    ser servida,

    cumprindo

    simultaneamente o

    objectivo

    de

    auto-sus

    tentabilidade

    económica que

    define a

    empresa

    sociaL

    A

    empresa social pode também desempenhar

    um

    importante

    papel no

    melhoramento

    das infra-estruturas do sistema de

    saúde.

    A

    Grameen Cuidados de

    Saúde

    está já

    a criar escolas

    de

    enferma

    gem para formar as filhas das famílias clientes do Banco Grameen.

    Há uma grande procura de enfermeiras qualificadas,

    tanto

    no Ban

    gladeche

    como nos países ricos.

    Não

    vejo

    porque

    é que grandes

    números de jovens hão-de ficar sem fazer nada

    nas zonas

    rurais

    enquanto

    estas interessantes

    oportunidades de emprego

    ficam

    por

    preencher.

    As

    escolas de enfermage m geridas como empresas sociais

    podem ocupar esta lacuna.

    A

    Grameen

    Cuidados de Saúde está a planear abrir centros de

    prestação de cuidados de

    saúde

    a

    nível secundário

    e terciário, tam

    bém concebidos como

    empresas

    sociais. (Mais adiante,

    contarei

    a

    história de

    um desses

    centros, que está já em desenvolvimento,

    uma unidade para realizar algumas das intervenções cirúrgicas mais

    avançadas do mundo para

    tratar

    crianças que sofram de talassemia,

    um distúrbio

    genético que,

    se não

    for tratado,

    é fataL

    Para

    for

    mar

    uma nova geração de

    médicos

    para

    esta unidade,

    a Grameen

    Cuidados de Saúde está a planear a criação de uma Universidade

    de Ciências e

    Tecnologia

    da Saúde.

    Muitos

    outros segmentos

    do

    sector

    dos cuidados de saúde são

    apropriados para criar

    empresas sociais bem-sucedidas: a

    nutrição,

    o

    fornecimento de água,

    os seguros

    de

    saúde, os

    cursos superiores

    e

    estágios

    na

    área

    da

    saúde,

    os

    cuidados oftalmológicos,

    os

    cuidados

    materno-infantis, os serviços de

    diagnóstico,

    etc.

    Os

    protótipos

    levarão algum

    tempo

    a serem desenvolvidos. No entanto, quando

    mentes criativas concebem uma empresa social e um protótipo

    é desenvolvido com sucesso, ele pode ser replicado vezes sem conta.

    Conceber cada um

    dos

    pequenos negócios sociais é como desen

    volver uma semente. Depois

    de

    a semente estar desenvolvida,

    qualquer

    pessoa poderá plantá-la onde

    ela

    for

    necessária.

    Como

    cada unidade é

    auto-sustentável,

    os fundos necessários não

    consti

    tuem uma limitação.

    25

  • 8/19/2019 A EMPRESA SOCIAL.pdf

    14/121

    Entre

    outras coisas, a empresa social é uma maneira de

    dar

    apli

    cação

    às

    tecnologias mais

    potentes

    da actualidade.

    O mundo actual dispõe de tecnologias incrivelmente poderosas.

    O seu

    crescimento

    tem

    sido

    muito rápido e elas têm-se

    tornado

    mais

    potentes a cada dia que passa. Quase toda esta tecnologia é proprie

    dade de empresas com

    fins

    lucrativos que a controlam. As empresas

    usam esta tecnologia somente

    para fazer mais dinheiro,

    porque é essa

    a

    missão

    de

    que

    são incumbidas

    pelos

    seus accionistas.

    No

    entanto,

    encarada

    de

    uma forma mais abrangente, a tecno

    logia

    é

    apenas

    uma

    espécie de veículo. Pode

    ser conduzida a qual

    quer destino que se queira. Como os actuais proprietários da

    tecnologia querem

    deslocar-se

    para os

    picos mais altos do

    lucro,

    a

    tecnologia

    leva-os

    até

    lá. Se

    outra

    pessoa

    decidir usar

    a

    tecnolo

    gia existente para pôr

    fim

    à pobreza,

    ela levará

    o seu

    utilizador

    a

    esse

    destino.

    Se outra

    pessoa quiser

    usá-la para pôr fim à

    doença,

    a tecnologia

    chegará

    lá. A escolha é nossa. O único

    problema

    é

    que

    o

    enquadramento teórico actual do capitalismo

    não

    nos faculta esta

    opção. Mas

    a inclusão da

    empresa social

    cria

    esta

    opção.

    Um outro ponto a ponderar: de facto,

    não

    há necessidade de

    escolher. Usar a tecnologia para um

    determinado

    fim

    não

    a torna

    menos eficaz para

    servir

    um fim

    diferente.

    N a

    realidade,

    é

    precisa

    mente o contrário.

    Quantos

    mais

    usos

    diversificados dermos à tec

    nologia,

    tanto mais potente ela se tornará. Usar a tecnologia para

    resolver problemas sociais não reduzirá a sua eficácia na produção

    de

    riqueza, aumentá-la-á.

    Os proprietários de empresas sociais podem canalizar o poder

    da tecnologia

    para

    a solução da lista

    crescente

    de problemas sociais

    e económicos e obter resultados rápidos. Com este processo, pos

    sibilitarão

    o

    aparecimento de

    novas ideias,

    que

    futuras

    gerações

    de

    cientistas e

    de

    engenheiros

    poderão desenvolver.

    O

    mundo

    da

    empresa social beneficiará

    não

    só os

    pobres

    mas

    também toda a

    humanidade.

    Quando o conceito de empresa social se

    tornar

    amplamente

    conhecido,

    aparecerão pessoas criativas com concepções atraentes

    de novas

    empresas

    sociais. Haverá jovens que desenvolverão pla

    nos empresariais

    para abordar os problemas sociais mais difíceis

    através de

    empresas sociais. As

    boas ideias,

    é

    claro, terão de

    ser

    26

    financiadas.

    com

    prazer que posso

    dizer

    que

    existem

    já iniciativas

    na

    Europa

    e no

    Japão

    para criar fundos de empresas sociais desti

    nados

    a fornecer capital e empréstimos a empresas sociais.

    A seu tempo, mais fontes de financiamento serão

    necessárias.

    Cada

    nível

    de governo

    internacional, nacional, estatal e

    local

    pode criar fundos

    de

    empresas

    sociais.

    Estes incentivarão os cidadãos

    e as

    empresas

    a criarem

    empresas

    sociais

    concebidas para

    abordar

    problemas específicos o desemprego, a

    doença,

    o

    tratamento

    de

    resíduos, a poluição, a velhice, as

    drogas,

    o crime, as carências de

    grupos com necessidades especiais,

    como,

    por

    exemplo,

    os deficien

    tes, etc.). Os doadores bilaterais e multilaterais podem também criar

    fundos

    de empresas

    sociais.

    As

    fundações poderão reservar

    uma

    percentagem

    dos seus capitais

    para

    o

    apoio

    a

    empresas sociais

    e

    poderão usar os seus

    orçamentos de responsabilidade

    social

    para

    financiar este tipo

    de

    empresas.

    A certa altura, haverá a

    necessidade de

    criar uma

    bolsa

    de

    valo

    res separada

    para

    facilitar

    o investimento em empresas sociais. Só

    estas

    empresas

    serão

    listadas

    nessa bolsa social de valores e os inves

    tidores saberão desde o início que

    não

    receberão dividendos. A sua

    motivação

    será desfrutar do orgulho e do prazer de

    contribuir para

    a resolução de problemas

    sociais

    difíceis.

    A empresa social

    a toda a gente a oportunidade de partici

    par

    na

    criação do tipo de mundo em que

    todos

    nós queremos

    viver.

    Graças ao conceito de empresa social, os cidadãos não têm de deixar

    todos os problemas nas mãos do governo

    e

    depois passar a vida a

    criticar

    o governo

    por

    não os

    resolver).

    Agora, os cidadãos têm

    acesso a um

    espaço completamente novo

    no

    qual

    podem mobilizar a

    sua criatividade e o seu

    talento para resolver

    os problemas dos

    nos

    sos tempos. Ao constatarem a eficácia da empresa social, os governos

    poderão

    decidir

    criar as

    suas próprias empresas

    sociais,

    estabelecer

    parcerias

    com

    empresas

    sociais

    dirigidas

    por

    cidadãos e incorporar

    as

    lições

    destes projectos na melhoria

    da

    eficácia dos seus próprios

    programas.

    Os

    governos terão

    um importante papel a

    desempenhar na pro

    moção das empresas

    sociais.

    Terão de aprovar legislação para conce

    der

    um

    estatuto

    legal

    à empresa social e criar entidades reguladoras

    para

    garantir

    a transparência, a integridade e a honestidade do sec-

    27

  • 8/19/2019 A EMPRESA SOCIAL.pdf

    15/121

    tor.

    Podem

    também conceder incentivos fiscais para o investimento

    em empresas

    sociais

    assim como às

    próprias

    empresas

    sociais.

    O

    carácter maravilhosamente promissor da empresa social

    torna

    ainda

    mais importante que

    redefinamos

    e alarguemos o âmbito do

    nosso enquadramento

    económico

    actual. Temos necessidade de

    uma nova maneira de pensar

    a economia que não

    seja propícia

    à

    criação

    de uma série de

    crises;

    em

    vez disso,

    ela deveria ser

    capaz

    de pôr fim às crises de uma vez por

    todas.

    Chegou a hora de pen

    sarmos de forma ousada e criativa - e temos de avançar depressa,

    porque

    o

    mundo está

    também a

    mudar depressa.

    A primeira

    peça

    deste novo enquadramento deverá

    ser

    encontrar um lugar

    para

    a

    empresa

    social

    como

    parte integrante da estrutura

    económica.

    Em

    apenas alguns anos,

    a empresa social

    desenvolveu-se,

    passando

    de

    uma

    mera

    ideia

    a

    uma realidade viva

    e em

    rápido

    crescimento.

    Está

    a

    melhorar

    as vidas de

    muitas

    pessoas e

    está

    prestes a

    tornar

    -se uma

    das tendências

    sociais e

    económicas mais

    importantes do

    mundo. No resto deste livro,

    explicarei mais

    pormenorizadamente a

    teoria

    da

    empresa

    social

    contarei

    as histórias de vários

    exemplos

    concretos

    de empresas sociais que

    estão

    já em

    funcionamento

    e farei

    sugestões práticas para

    que os

    leitores possam

    envolver-se

    no apoio

    a

    este novo movimento.

    28

    CAPÍTULO

    1

    Porquê

    a

    empresa

    social?

    A

    empresa

    social

    é

    um

    novo

    tipo

    de

    conceito.

    É

    bastante distinto

    quer

    do

    de

    uma

    empresa

    com fins

    lucrativos que descreve pratica

    mente todas

    as

    empresas privadas

    do

    mundo actual) quer do de

    uma

    organização sem

    fins

    lucrativos que depende de

    doações

    de caridade

    ou

    filantrópicas).

    também bastante

    distinto

    de outros termos

    fre

    quentemente

    usados, tais como «empreendimento

    social»,

    «em

    preendedorismo social»

    ou

    «empresa socialmente

    responsável»,

    que

    geralmente descrevem algumas variantes de empresas com

    fins

    lu

    crativos.

    Uma empresa social não

    se integra

    no mundo dos negócios

    com

    fins lucrativos.

    O

    seu objectivo

    é a

    resolução

    de um problema social

    usando métodos próprios das empresas, incluindo

    a

    produção

    e a

    venda de produtos

    ou

    de serviços. A Grameen Danone, por exem

    plo, está

    a

    contribuir para

    resolver

    o problema

    da subnutrição

    vendendo iogurtes fortificados com micronutrientes a um

    preço

    acessível. A Grameen

    Veolia

    Water contribui para

    resolver

    o pro

    blema

    da

    água contaminada com

    arsénico

    vendendo água

    pura

    a

    um preço acessível aos pobres.

    A

    BASF

    Grameen

    reduzirá

    a

    inci

    dência de doenças transmitidas por mosquitos através da produção

    e

    comercialização de mosquiteiros com um tratamento químico.

    Existem muitos outros x mp lo s alguns já

    em

    funcionamento,

    outros em processo de criação.

    dois tipos de empresa

    social.

    Um deles

    é uma

    empresa sem

    prejuízos auto-sustentada) nem dividendos dedicada à

    resolução

    de um problema social, cujos proprietários

    são

    investidores que

    reinvestem

    todos

    os

    lucros

    para expandir e

    melhorar

    a empresa. Os

    29

  • 8/19/2019 A EMPRESA SOCIAL.pdf

    16/121

    exemplos mencionados

    acima

    inserem-se nesta

    categoria.

    Chama

    mos

    a

    este

    tipo de empresa

    social

    tipo

    O

    segundo tipo

    é uma

    empresa

    com

    fins lucrativos

    cujos

    pro

    prietários são pessoas pobres, quer

    directamente

    quer através

    de

    um

    fundo

    dedicado a uma

    causa social predefinida. Chamamos

    a

    este

    tipo de negócio tipo

    II.

    Como os lucros

    recebidos

    pelas pes

    soas pobres estão a aliviar a pobreza, um negócio desses, por defi

    nição,

    estará, a contribuir para a

    resolução

    de um problema social.

    O

    Banco

    Grameen,

    cujos

    proprietários são as p s s o ~ pobres que

    depositam

    o

    seu dinheiro

    e

    contraem empréstimos,

    é

    um exemplo

    deste tipo

    de

    empresa social. E, como explicarei mais

    adiante

    neste

    livro,

    a

    fábrica

    têxtil

    Otto

    Grameen, actualmente

    em

    fase de

    pla

    neamento,

    será

    um

    segundo exemplo.

    O

    seu proprietário será

    o

    Fundo

    Otto Grameen,

    que

    usará os lucros em benefício das pessoas

    da comunidade onde a fábrica se localiza.

    Ao contrário de uma organização sem fins lucrativos,

    uma

    em

    presa social tem

    investidores

    e

    proprietários.

    No entanto, numa

    empresa social de t po I, os investidores

    e

    os proprietários não rece

    bem lucros, dividendos ou

    qualquer

    outra forma de benefício finan

    ceiro.

    Os investidores de

    uma

    empresa social

    podem

    reaver

    a quantia

    que

    investiram

    inicialmente ao longo de um período de

    tempo

    defi

    nido

    por eles.

    Pode ser um período muito

    curto,

    de um

    ou

    dois anos,

    ou

    um

    período

    muito

    longo,

    de

    cinquenta

    anos ou mais. Mas,

    se os

    investidores receberem uma

    quantia

    que ultrapasse

    o

    investimento

    original, essa

    empresa deixará

    de poder

    considerar-se uma empresa

    social.

    Esta regra

    aplica-se até

    a ajustamentos para ter em

    conta

    a

    infla

    ção. Numa

    empresa

    social,

    um dólar

    é

    um dólar.

    Quem

    investir

    mil dólares

    numa

    empresa social

    poderá

    reaver

    mil

    dólares

    -

    nem

    mais um cêntimo.

    Somos

    bastante

    rigorosos

    quanto

    a

    esta regra,

    porque

    queremos deixar

    bem

    claro que

    a

    ideia

    de

    benefício finan

    ceiro pessoal não

    tem

    qualquer cabimento na empresa social.

    Como a empresa

    social

    é uma nova ideia, dediquei muito do

    meu

    tempo

    e

    da

    minha energia a defini-la

    com precisão

    e a con

    ceber maneiras

    de

    comunicar

    a

    sua natureza ao público de for

    ma

    clara

    e

    atraente. U m

    importante

    aliado neste

    meu

    esforço

    foi

    Hans Reitz,

    o director do

    Grameen Creative Lab GCL),

    em Wies-

    30

    baden,

    na

    Alemanha.

    Reitz colaborou

    comigo

    na formulação dos

    sete princípios da empresa

    social, que

    condensam particularmente

    bem

    as

    principais

    características

    de uma empresa

    social do

    tipo

    I:

    1.

    O objectivo do negócio é ultrapassar a pobreza ou um ou mais

    problemas

    (nas áreas da educação,

    da

    saúde,

    do

    acesso

    às

    tec

    nologias e

    do ambiente) que afligem

    os

    indivíduos

    e

    as

    socie

    dades - não

    maximizar

    o

    potencial de

    lucro.

    2.

    A empresa atingirá a sua própria sustentabilidade financeira e

    económica.

    3. Os investidores só poderão reaver a

    quantia que

    investiram.

    Nenhum

    dividendo é

    atribuído para além do

    reembolso

    da

    quantia

    investida originalmente.

    4. Quando

    a

    quantia investida

    for reembolsada, o

    lucro

    fica

    na

    empresa, para a sua expansão e melhoramento.

    5. A empresa é responsável do

    ponto de

    vista ambiental.

    6.

    Os seus trabalhadores recebem

    um

    salário

    de

    mercado, com

    condições

    de trabalho acima da média.

    7. Faça-o com alegria

    O

    último destes

    sete

    princípios

    foi uma

    sugestão

    de

    Reitz

    e

    devo

    dizer que gosto dele. No

    ambiente

    agressivo

    do mundo

    dos negó

    cios

    convencionais, esquecemos que

    os negócios podem

    ter algo a

    ver com

    a

    alegria.

    A

    empresa social

    tem

    tudo

    a

    ver

    com a

    alegria.

    Quando as

    pessoas

    se

    envolvem nela,

    continuam a

    descobrir

    a

    ale

    gria ilimitada que

    se

    obtém.

    Os sete

    princípios

    são o

    fulcro

    da

    empresa

    social. Mantenha-os

    em mente

    ao

    ler o resto deste

    livro.

    Notará que

    estes

    princípios se

    aplicam ao

    descrevermos empresas sociais específicas que

    estão

    em

    funcionamento, assim como ideias

    para

    novas

    empresas

    sociais que não foram ainda lançadas. Quando as empresas

    e

    os

    empresários

    têm

    reuniões connosco para

    se

    informarem sobre

    o

    conceito

    de

    empresa social

    e

    explorarem

    as

    hipóteses

    de

    se envol

    verem neste

    movimento, partilhamos

    os sete princípios

    com eles.

    São uma pedra-de-toque e

    um

    lembrete

    constante dos valores

    que

    subjazem à ideia

    da

    empresa

    social.

    3

  • 8/19/2019 A EMPRESA SOCIAL.pdf

    17/121

    O

    que é a empresa

    social

    - e o que não é

    Termos como

    «empreendimento

    social», «empreendedorismo

    social» e

    muitos

    outros são

    frequentemente

    usados nos textos

    sobre

    as tentativas de contribuir para a

    resolução

    de problemas como a

    pobreza. Embora estes termos sejam usados de formas

    variadas

    por

    diferentes autores,

    referem-se

    geralmente

    a subconceitos, quer

    no

    mundo

    dos negócios com fins lucrativos quer no sector das orga

    nizações sem fins

    lucrativos.

    Não

    são efectivamente o

    mesmo

    que

    aquilo a

    que se chama

    empresa

    sociaL

    «Empreendedorismo social» refere-se a uma pessoa. Descreve

    uma

    iniciativa

    com consequências sociais

    criada

    por

    um

    empreende

    dor com uma visão sociaL Esta iniciativa pode

    ser

    não económica,

    uma obra

    de

    caridade, ou

    uma

    iniciativa

    de negócio com ou sem

    lucro pessoaL Alguns empreendedores sociais albergam os seus pro

    jectos em organizações não governamentais ONG), enquanto outros

    estão envolvidos em

    actividades

    com fins lucrativos.

    Em

    contraste

    com o empreendedorismo social, a empresa social é um tipo muito

    específico de empresa -

    uma

    empresa sem lucros nem

    dividendos,

    com um objectivo social. Uma empresa social pode ter objectivos

    similares

    aos

    definidos

    por

    alguns empresários sociais

    mas

    a

    estru

    tura de negócio específica

    da

    empresa social torna-a distinta e única.

    Algumas organizações que promovem o

    conceito

    de empreende

    dorismo social como a Fundação

    Ashoka,

    classificam o meu trabalho

    e o do

    Banco

    Grameen

    sob

    esta rubrica.

    Eu

    não ponho objecções a

    que o façam e

    considero

    que a Fundação Ashoka tem feito um bom

    trabalho no estabelecimento de ligações entre pessoas de todo

    o

    mundo, por

    um

    lado,

    e a

    história do movimento Grameen

    e o

    con

    ceito de

    microcrédito,

    por

    outro. Mas

    seria um erro

    associar

    o meu

    trabalho ao

    de todos os

    outros

    empreendedores

    sociais ou partir do

    princípio de

    que

    o «empreendedorismo social» e a «empresa social»

    são simplesmente

    duas

    expressões para designar a mesma realidade.

    Algumas

    pessoas pensam que

    uma

    empresa social é

    uma

    espécie

    de

    organização

    sem

    fins lucrativos. Esta noção não é correcta.

    Notem-se,

    por

    exemplo, algumas das características que distin

    guem

    uma empresa social das formas típicas das organizações

    sem

    fins lucrativos.

    32

    Uma

    fundação,

    por exemplo, é uma

    organização

    de

    beneficência

    criada para distribuir fundos provenientes de um ou mais

    doadores,

    que procura criar benefícios sociais através

    da

    sua actuação.

    Uma

    fundação não

    é

    uma

    empresa

    social:

    não é

    financeiramente auto

    -sustentável, normalmente não é geradora de rendimento através

    de

    actividades de

    negócios

    e não tem um «proprietário», como é o

    caso da empresa sociaL

    Ao

    abrigo das leis da maior parte

    dos

    paí

    ses as fundações e outras organizações

    sem

    fins

    lucrativos

    não são

    propriedade

    de

    ninguém, sendo dirigidas por um conselho

    de

    administração segundo directrizes

    definidas

    pelo Estado.)

    No

    entanto, uma fundação poderia ser proprietária de uma em

    presa

    sociaL

    De

    facto, estabelecer empresas sociais

    dentro

    da

    esfera

    de interesses da organização poderia ser uma excelente maneira de

    usar o

    seu

    capitaL

    Quando uma

    fundação concede

    um

    subsídio a

    uma

    O N G tradicional, o dinheiro é aplicado na

    criação

    de programas

    de beneficência ou no seu

    apoio

    e espera-se que

    proporcione

    alguns

    benefícios à comunidade.

    Mas,

    de qualquer forma, o dinheiro não

    tarda a

    ser

    gasto e na

    maior

    parte dos casos a

    O N G

    estará dentro

    de

    pouco

    tempo

    a solicitar novo subsídio para prosseguir o seu tra

    balho.

    Em

    contraste, se uma fundação concedesse um subsídio para

    lançar

    uma

    empresa social, esse

    negócio

    poderia criar benefícios

    sociais ao

    mesmo

    tempo que geraria o

    rendimento

    necessário

    para

    se manter. Ao longo do tempo, o investimento inicial poderia

    ser

    reembolsado, o que significa que a

    fundação

    recuperaria o seu

    dinheiro e poderia usá-lo

    para um outro

    objectivo válido.

    Entre

    tanto,

    a empresa social continuaria a funcionar e, se fosse bem

    dirigida, poderia

    expandir-se

    e

    espalhar

    a

    sua

    influência

    em

    cír

    culos cada

    vez mais alargados

    por toda

    a sociedade.

    Como explicarei mais tarde, existem regras legais e fiscais nal

    guns países, incluindo

    os Estados

    Unidos,

    que

    tornam o investi

    mento

    numa

    empresa

    por

    parte

    de

    uma

    fundação

    uma iniciativa

    complicada. No

    entanto,

    estes

    entraves

    poderiam ser

    ultrapassados.

    Eu gostaria

    de

    ver as fundações a usarem alguns dos seus fundos

    para estabelecer empresas sociais nas suas áreas

    de

    interesse:

    saúde,

    educação

    e

    agricultura

    sustentáveL Espero que algumas das prin

    cipais fundações

    existentes estejam

    a

    considerar essa possibilidade.

    33

  • 8/19/2019 A EMPRESA SOCIAL.pdf

    18/121

    De

    forma similar

    uma

    O N G tradicional

    que é uma

    organiza

    ção sem fins lucrativos de solidariedade

    social

    poderia também

    ser proprietária de uma empresa social. Esta teria de ser autóno

    ma

    em

    termos legais fiscais e financeiros. Contudo desde que a

    empresa

    social

    partilhe os objectivos sociais da ONG parece-me

    que esse investimento seria um

    instrumento

    inteligente e poten

    cialmente importante

    para

    tentar atingir

    os

    objectivos de

    benefi

    cência da

    ONG.

    As

    ONG fazem

    muito

    e

    bom trabalho em todo

    o

    mundo.

    Mas o modelo de

    beneficência

    tem algumas fraquezas intrínsecas

    que me

    levaram

    a

    criar

    o

    conceito

    de

    empresa social como alter

    nativa.

    Depender de

    donativos não

    é

    uma

    forma sustentável

    de gerir

    uma

    organização.

    Obriga os dirigentes das ONG a gastar muito

    tempo

    energia

    e dinheiro em iniciativas de angariação de fundos.

    Mesmo quando

    estas iniciativas são bem-sucedidas

    a maior parte

    das ONG sofre

    de

    uma permanente falta de fundos e

    sente dificul

    dade em manter os

    seus

    programas mais eficazes

    para não falar

    em expandi-los. Em

    contraste

    uma empresa

    social

    é

    concebida para

    ser sustentável. Este facto

    permite

    aos

    seus

    proprietários não se

    concentrarem n a angariação de fundos e dedicarem-se a aumentar

    os

    benefícios

    que

    podem

    proporcionar aos pobres ou a outras pes

    soas na sociedade. A capacidade da empresa

    social

    de «reciclar» o

    dinheiro de modo permanente dá-lhe potencialmente um impacto

    muito

    maior do que até mesmo a organização de beneficência

    mais

    bem dirigida.

    Além disso a

    empresa

    social

    proporciona

    aos seus beneficiários

    uma dignidade pessoal

    e uma autonomia

    muito

    maiores

    do

    que as

    organizações de beneficência. Mesmo os programas de solidarie

    dade

    social

    mais bem

    intencionados

    e

    bem

    concebidos têm o efeito

    inevitável de retirar iniciativa a quem recebe os

    seus benefícios.

    Os

    pobres que se tornam dependentes da caridade não se sentem

    moti

    vados para assumir o

    controlo

    da sua situação.

    Em

    contraste

    as

    pessoas

    que pagam um

    preço justo

    pelos bens

    e

    serviços

    que recebem estão a dar

    um

    passo

    gigantesco

    na direcção

    da autonomia. Em vez de aceitarem donativos passivame nte es tão

    a participar activamente no sistema económico tornando-se agen-

    34

    tes por direito próprio na

    nossa economia

    de

    mercado

    livre. Este

    facto

    proporciona um

    alto

    grau de autonomia e conduz muito

    mais

    directamente a

    soluções

    genuínas a longo prazo

    de

    problemas

    como

    o da

    pobreza

    da

    desigualdade

    e da

    opressão.

    Evidentemente nem todas as iniciativas de beneficência deve

    riam

    ser

    substituídas por

    empresas sociais. Por vezes é essencial

    simplesmente ajudar

    pessoas

    em

    situações

    de grande

    c rênci

    por

    exemplo quando um

    desastre natural

    como o tsun mi de

    2004 ou

    o

    terrível sismo que

    devastou

    o Haiti em 2010

    destrói

    infra-estruturas

    e casas e cria uma

    necessidade

    premente de

    alimentos

    medicamen

    tos e vestuário.

    As famílias beira da

    fome não

    podem

    esperar até

    lançarem

    as

    suas próprias

    empresas para se sustentarem -

    precisam

    de comida

    e

    precisam

    dela rapidamente.

    A

    caridade

    é a

    única

    res

    posta imediata em tais casos. Mas as

    situações

    de

    emergência passam

    rapidamente para uma fase em que as intervenções

    da empresa social

    podem ser muito

    apropriadas

    e imensamente

    úteis.

    Foi

    por

    essa

    razão que organizámos

    um

    Fundo

    de

    Empresa Social

    para

    o Haiti

    a

    fim de

    criar uma

    série de

    empresas sociais como

    soluções susten

    táveis

    a longo prazo para o

    povo

    do Haiti.

    Tanto

    a caridade como

    as empresas sociais são necessárias

    mas

    devemos compreender como

    e até que ponto cada

    um

    pode contribuir para reduzir o infortúnio

    das pessoas.

    Há também alguns tipos

    de

    pessoas que infelizmente têm

    de

    depender da caridade

    porque

    lhes é

    virtualmente

    impossível

    serem

    autónomas. Refiro-me a pessoas que

    sofrem

    de extrema

    incapacidade

    física ou

    mental

    assim como aos muito idosos ou

    muito

    novos. Como

    sociedade simplesmente temos o dever de ajudar estas pessoas e seria

    cruel

    insistir

    com

    elas

    para

    que fossem auto-suficientes.

    Por

    conse

    guinte há lugar

    no

    nosso

    mundo

    para

    a

    caridade

    assim como

    há lugar

    para

    a empresa sociaL

    No entanto

    gostaria de

    salientar que a esfera potencial da em

    presa social

    em

    que os pobres podem tornar-se auto-suficientes é

    mais vasta do que muitas pessoas julgam. Já

    mencionei

    o programa

    através

    do qual o Banco Grameen

    proporciona

    aos pedintes a opor

    tunidade

    de

    se

    transformarem

    em

    pequenos

    negociantes com o

    recurso

    a empréstimos mínimos. Este programa demonstrou que

    mesmo as pessoas mais pobres - sem

    quaisquer

    aptidões ou recur-

      5

  • 8/19/2019 A EMPRESA SOCIAL.pdf

    19/121

    sos óbvios - são capazes de se tornarem auto-suficientes quando os

    instrumentos de

    que

    necessitam para o fazer são postos ã

    sua

    dispo

    sição.

    programas implementados

    por

    outras organizações que

    fize

    ram «milagres>>

    similares

    com outro