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ELISSANDRA ALVES DE BRITTO A DINÂMICA DO NOVO MUNDO RURAL E O SEU REFLEXO NA RMS SALVADOR 2004

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ELISSANDRA ALVES DE BRITTO

A DINÂMICA DO NOVO MUNDO RURAL E O SEU REFLEXO NARMS

SALVADOR2004

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ELISSANDRA ALVES DE BRITTO

A DINÂMICA DO NOVO MUNDO RURAL E O SEU REFLEXO NARMS

Dissertação apresentada ao curso de Mestrado emEconomia da Universidade Federal da Bahia, comorequisito para obtenção do grau de mestre emEconomia

Orientador: Professor Dr. Vitor de Athayde Couto

Salvador2004

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Dedico este trabalho a toda a minha família, em especial a

minha mãe Joanita, as minhas irmãs Elba, e a minha gêmea

Elisângela, e ao meu esposo Roberto que sempre estiveram

ao meu lado, apoiando-me nos momentos mais difíceis e a

minha filha Laís que apesar de ainda não ter vindo ao

mundo, mas já presente em minha vida, proporcionou-me

coragem para não desanimar.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus e a todas as pessoas que de uma forma direta ou indireta me auxiliaram na

elaboração da Dissertação, em especial a meu orientador Vitor de Athayde Couto que além de

me presentear com a sua sabedoria, mostrou-se um amigo incondicional, dando-me força para

concluir o trabalho, e, dando-me confiança para acreditar na possibilidade de vencer mais esse

obstáculo da vida acadêmica.

A todo corpo de professores e funcionários, em especial a Lurdinha que esteve sempre

disposta a atender as solicitações dos alunos. Aos meus colegas e amigos, em especial a

Eduardo Garcez, Ana Virgínia, Mírtes Aquino, Eva Borges, Eneida, Meirejane, Caroline,

Alex Bruno, Osvaldo e Jubdervan Viana que foram, mesmo sob pressão, companheiros e

solidários durante todo o curso. A minha prima Isnara Souza pela sua dedicação em atender

aos meus pedidos.

A Alynson Rocha pelas suas dicas que foram bastante úteis ao trabalho, a Joseanie Mendonça

que, apesar do pouco tempo de convivência, demonstrou-me uma amizade sincera,

incentivando-me e colocando-se sempre solicita à atender as minhas necessidades. A Ana

Mônica Hughes por me fornecer trabalhos e por me prestar informações bastante úteis à

elaboração da Dissertação. E ao meu esposo Roberto Correia que além de ter paciência para

suportar os meus momentos de nervosismo e angústia, deu-me, com a sua demonstração de

amor e carinho, força para não desistir. A todos muito obrigada.

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“A urbanização prematura, excessiva e desnecessária, que se deu numa sociedade, (...)

profundamente desigual, configurou um padrão de crescimento metropolitano marcado

pelo contraste gritante entre o luxo ostensivo dos bairros nobres e a proliferação das

favelas, (...). Que as grandes cidades brasileiras funcionem no dia-a-dia (...) constitui um

tributo à engenhosidade, à santa paciência e ao esforço dos seus habitantes. Mas em que

pese a sua modernidade aparente, elas se encontram em crise, cuja intensidade se mede

pela violência urbana presente na maioria das grandes e médias cidades brasileiras”

(SACHS, 2002).

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RESUMO

“A dinâmica do novo mundo rural e o seu reflexo na RMS” (Região Metropolitana deSalvador) é um trabalho que tem como propósito analisar o papel da agricultura familiar e acontribuição da reforma agrária para o processo de desenvolvimento rural sustentável nomundo rural baiano. Essas abordagens são elucidadas na perspectiva de que os centrosurbanos baianos possam se tornar vítimas do processo de esvaziamento da zona rural. Nesseaspecto, ao longo do trabalho é dado enfoque sobre os impactos sociais decorrentes dodesemprego da mão-de-obra agrícola baiana e do conseqüente êxodo rural. O objetivo aoelaborá-lo foi verificar se o desenvolvimento rural incentiva as pessoas a permanecerem nocampo, possibilitando a redução do fluxo de migrantes que muitas vezes vão habitar asperiferias e as favelas. Observa-se nas pesquisas realizadas por Machado, Schmitz e Paula queas ocupações não-agrícolas têm-se tornado cada vez mais presentes na zona rural. Ao mostrarpor meio de estudos reais que a composição da renda rural vem mudando consideravelmente,busca-se ressaltar a importância dessas atividades para a redução do fluxo migratório quevêem para as grandes cidades. Esse processo dá fôlego aos centros urbanos para que resolvamou pelo menos amenizem o problema do subemprego acumulado. Para tanto, tem-se comoobjeto de estudo a estrutura e a formação de renda de famílias pluriativas, afim de revelar osprincipais tipos de atividades que empregam e/ ou ocupam as diversas unidades de trabalhofamiliar (UTf), bem como suas respectivas rendas. De posse dessas informações, utiliza-se ametodologia análise-diagnóstico de sistemas agrários, que vem sendo adotada desde 1995pelo Projeto de Cooperação Técnica firmado entre o Instituto Nacional de Colonização eReforma Agrária e a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação. Elaconsiste num instrumento de apoio dos profissionais que atuam na elaboração de diagnósticospara diferentes microrregiões de um país. Através destes, identificam-se os principaisproblemas que as famílias rurais enfrentam, e se estabelecem diretrizes para odesenvolvimento rural local mais coerentes com a necessidade de cada região.

PALAVRAS-CHAVE: Novo Mundo Rural; Agricultura Familiar; Famílias Pluriativas;

Reforma Agrária; Desenvolvimento Rural Sustentável.

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ABSTRACT

“A dinâmica do novo mundo rural e o seu reflexo na RMS” is a work that has as objective toanalyze the issue of the family farming and the contribution of the agrarian reform to theprocess of sustainable development in Bahia’s rural world. Those approaches are elucidatedin the perspective that the urban centers of Bahia could become victims of the emptyingprocess of the rural areas. In this context, this work focuses on the current social impacts ofthe rural labor unemployment and the consequent rural exodus. The objective whenelaborating was to present that the rural development motivates the people to remain on theland, making possible the reduction of the migrant’s flow that, many times, goes to inhabitthe peripheries and the slums of the cities. It was observed in the researches realized byMachado, Schmitz and Paula where the non-farming occupations are, each times more,present in the rural areas, When presenting this work, through real case studies, that the ruralincomes composition is changing considerably, it seeks to emphasize the importance of thoseactivities to the reduction of the migratory flow to the large cities. That process gives breathto the urban centers to solve or, at least, to decrease the accumulated underemploymentproblem. For so much, it has as study object the structure and the composition of thepluriativas families incomes, in order to reveal the main types used and/or occupied by theseveral family labor units (UTf), as well as its respective incomes. With this information, theAnálise Diagnóstico de Sistemas Agrários methodology, which has been adopted by theProjeto de Cooperação Técnica between the Instituto Nacional de Colonização Agrícola andthe United Nations’ Food and Agricultural Organization since 1995, is being used. It consistsin a support instrument for the technicians that act in the diagnoses elaboration for differentregions of the country. Through them, the main problem faced by the rural families areidentified, and the local rural development guidelines are set up, more coherent with theneeds of each area.

KEY-WORDS: new rural world; family agriculture; pluriativas families; agrarian reform;sustainable rural development.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .....................................................................................................8

2 TRANSFORMAÇÕES RECENTES DO MEIO RURAL ................................102.1 CARACTERIZAÇÃO E DESESTRUTURAÇÃO DO CAMPO BAIANO..........172.1.1 A modernização da agricultura ...........................................................................232.1.2 Estrutura fundiária ...............................................................................................262.1.3 Especulação fundiária...........................................................................................31

3 A RELAÇÃO CAMPO-CIDADE NA DISCUSSÃO DA VIOLÊNCIA URBANA........................................................................................33

3.1 ÊXODO RURAL, DESEMPREGO E VIOLÊNCIA URBANA ............................383.2 CENÁRIO ...............................................................................................................46

4 O DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTÁVEL PARAA RMS ....................................................................................................................49

4.1 O DEBATE EM TORNO DA REFORMA AGRÁRIA .........................................574.1.1 O papel da reforma agrária na absorção da mão-de-obra rural ......................604.2 CONFIGURAÇÕES DO CAMPO BAIANO: O NOVO MUNDO

RURAL ...................................................................................................................624.2.1 Agricultura familiar e o novo perfil das atividades rurais

baianas....................................................................................................................69

5 ENSAIOS DE SISTEMAS AGRÁRIOS .............................................................725.1 EXPERIÊNCIA DO MUNICÍPIO DE LAPÃO NA BAHIA.................................785.2 RESULTADOS DE ESTUDOS NA BAHIA .........................................................92

6 PERSPECTIVAS ..................................................................................................1096.1 POLÍTICA DE DESENVOLVIMENTO RURAL .................................................1106.1.1 Estrutura, Ações e limites do PRONAF na Bahia..............................................114

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...............................................................................116

REFERÊNCIAS ....................................................................................................118

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1 INTRODUÇÃO

O estudo contemporâneo sobre a estrutura do campo brasileiro revela que a desestruturação

rural tem uma forte relação com a violência urbana. Através do processo de modernização da

agricultura, da concentração, e especulação fundiária na desocupação da mão-de-obra

agrícola, o êxodo rural foi intensificado. Este movimento agrava o problema da exclusão

social na medida em que eleva o número de pessoas desempregadas nos grandes centros

urbanos, refletindo numa crescente “onda” de violência.

Na perspectiva de que os centros urbanos baianos possam se tornar vítimas do processo de

esvaziamento da zona rural faz-se uma abordagem das alternativas possíveis para fortalecer a

capacidade de fixação das famílias no agrobaiano. Com a criação de medidas que atuem sobre

os fatores de expulsão da população do campo, espera-se que a zona urbana baiana possa se

reestruturar e absorver a mão-de-obra excedente. Assim, este trabalho tem como proposta

analisar o papel da agricultura familiar, bem como a contribuição da reforma agrária para o

processo de desenvolvimento rural sustentável.

O desafio presente está em investigar em que medida o desenvolvimento rural, ao reduzir o

êxodo do campo para as cidades, pode favorecer a Região Metropolitana de Salvador. Para

tanto, têm-se como objeto de estudo a estrutura e a formação de renda de famílias rurais

pluriativas. Esta escolha se justifica por se acreditar que a partir da composição da renda

familiar venham a ser revelados os principais tipos de atividades que empregam e/ou ocupam

as diversas unidades de trabalho familiar (UTf), bem como as suas respectivas rendas. Assim,

apresentam-se proposições acerca da reestruturação agrária e do fortalecimento da agricultura

familiar, a fim de que os campos baianos se tornem mais atrativos, possibilitando a redução

dos habitantes da periferia e das favelas das grandes cidades, bem como dando fôlego aos

centros urbanos para que resolvam o problema do subemprego acumulado.

Este trabalho focaliza o novo papel da Reforma Agrária após as transformações estruturais e

conjunturais que levaram à destruição de postos de trabalho no país e o fortalecimento da

agricultura familiar para o desenvolvimento rural sustentável da Bahia, estado do Nordeste

que apresenta maior evasão populacional. Para tanto, utiliza-se a metodologia análise-

diagnóstico de sistemas agrários, que vem sendo adotada desde 1995 pelo Projeto de

Cooperação Técnica firmado entre o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária e a

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Organização das Nações Unidas para Agricultura e a Alimentação. Ela consiste num

instrumento de apoio dos profissionais que atuam na elaboração de diagnósticos para

diferentes microrregiões de um país. Através destes, identificam-se os principais problemas

que os agricultores enfrentam, passando a estabelecer diretrizes para o desenvolvimento rural

local mais coerentes com a necessidade de cada região.

No que diz respeito à agricultura familiar, a análise é feita sobre o segmento dos agricultores

familiares em processo de decadência. Para fundamentar o trabalho são realizados estudos no

âmbito do projeto “Rurbano”, coordenado por Silva, professor da Unicamp. Através deste,

mensura-se o número de agricultores familiares que se tornam trabalhadores pluriativos. De

acordo com os dados dessa pesquisa há uma tendência de crescimento da pluriatividade,

baseado no trabalho desenvolvido em tempo parcial, e, também, no aumento da ocupação em

atividades não-agrícolas.

Nesse aspecto, propõe-se estudar o papel do desenvolvimento rural sustentável na geração de

empregos e outras formas de ocupação da mão-de-obra, como turismo, gestão do meio

ambiente, comércio e serviços que não estão diretamente vinculados à agricultura, mas

poderão contribuir para manter a população na zona rural, permitindo aos centros urbanos da

Bahia criarem medidas sociais mais eficazes no combate à fonte de alimentação da violência

urbana. Portanto, não somente as atividades agrícolas, como também as não-agrícolas são

alvo de uma investigação minuciosa, a fim de que possa ser revelada a sua importância para

valorização dos campos baianos, ao amenizar o êxodo rural descontrolado.

Este trabalho divide-se em 5 partes, além da introdução e conclusão. Na primeira,

contextualiza-se o problema, através da explanação das causas que levam à desestruturação do

campo e conseqüentemente ao êxodo rural. Na segunda, relata-se o problema do desemprego,

enfatizando-se o seu agravamento como reflexo da desarticulação da zona rural. Na terceira,

procura-se traçar as alternativas viáveis para revalorização do campo, para tanto se focaliza a

relevância do desenvolvimento rural sustentável para a RMS. Na quarta, descreve-se a

metodologia análise-diagnóstico de sistemas agrários, utilizada para identificar os principais

problemas que os agricultores enfrentam e, a título de experiência, relata-se o caso do

município de Lapão na Bahia. Além disso, para dar embasamento às questões levantadas nos

capítulos anteriores é analisado o estudo de caso de três trabalhos apresentados na UFBA. A

última parte é reservada para apresentar as medidas de cunho político criadas com a finalidade

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de promover o desenvolvimento rural sustentável. Neste capítulo são discutidos os principais

potenciais, ações e limites do PRONAF enquanto uma política de desenvolvimento local.

Dessa forma, espera-se que ao fim do trabalho seja confirmada a hipótese de que o

desenvolvimento rural pode favorecer a economia baiana, ao promover a reestruturação

agrária e fortalecer a agricultura familiar.

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2 TRANSFORMAÇÕES RECENTES DO MEIO RURAL

O capitalismo que se desenvolveu na agricultura brasileira desde o pós-guerra causou

mudanças significativas na distribuição populacional. As taxas de migração no sentido

campo-cidade foram elevadas e a estrutura de produção agropecuária passou a desempenhar

importante papel para a expansão do setor externo, além de se concentrar internamente no

fornecimento de matérias-primas para o setor urbano-industrial (MATTEI, 1995, p.35).

No pós-guerra, a indústria passa a ter maior destaque no cenário nacional, transformando-se

em pólo dominante da economia. Nesse período, a agricultura, cumpriu um papel vital para o

processo de industrialização, pois além de fornecer os contingentes da força de trabalho, de

atuar como fornecedora de alimentos e de matérias-primas, de servir como mecanismo de

transferência de capital e de gerar divisas constituiu-se num importante mercado consumidor

dos produtos gerados no setor industrial. Segundo Oliveira (1981, p.20), a agricultura tem

uma nova e importante função, não tão importante por nova, mas por ser qualitativamente

distinta.

Entretanto, alguns autores ligados à linha do pensamento estruturalista da inflação,

compreendiam a agricultura como um entrave ao processo de crescimento econômico do país.

Segundo esta concepção, o atraso neste setor impedia que o crescimento da oferta de produtos

agrícolas acompanhasse a demanda urbana, provocando choques constantes de oferta, que

conduziam à elevação dos preços. A ausência de uma reforma agrária levava, com a

existência de grandes latifúndios, a uma profunda concentração de renda, impedindo assim, a

criação de um mercado consumidor mais amplo para a indústria.1

Apesar dessa concepção estruturalista sobre o desempenho do setor agrícola, a visão que

prevaleceu após o movimento militar de 1964, foi a de que à agricultura cumpriu o seu papel

no processo de expansão do modo de produção capitalista. Dessa forma, ao longo da segunda

metade dos anos 60 e por toda a década de 70 foram se formando as bases para a implantação

do atual modelo agroindustrial. Neste contexto, as políticas nacionais de desenvolvimento

implantadas pelo regime militar foram bastante relevantes para a consolidação deste modelo.

1 Ver a respeito Vasconcellos et al. (1996).

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O processo de modernização agrícola foi alavancado através de mecanismos como o EGF –

Empréstimo do Governo Federal – que permite, sendo uma linha especial de crédito, a

estocagem do produto pelo agricultor para ser comercializado posteriormente e o AGF –

Aquisição do Governo Federal – que caracteriza uma compra feita pelo governo de produtos

com preços prefixados.

Esses dois instrumentos deram início a um novo arcabouço para a política agrícola do país,

configurado na criação do Sistema Nacional de Crédito Rural - SNCR - que tinha a finalidade

de propiciar linhas de crédito baratas aos agricultores e nas políticas de garantias de preços

mínimos - PGPM - que visam garantir um preço de venda mínimo aos produtores.

Até o final dos anos 70, a política agrícola foi assentada no sistema de crédito rural subsidiado

e nos incentivos fiscais. A combinação desses elementos provocou profundas alterações na

base técnico-produtiva, propiciando uma utilização massiva dos insumos modernos. Porém,

essa política não beneficiou de maneira uniforme todas as regiões do país, todos os extratos de

produtores e todos os tipos de produtos, vindo a evidenciar três características marcantes do

desenvolvimento agrícola brasileiro: os desequilíbrios regionais, as desigualdades sociais no

campo e os desequilíbrios inter-setoriais (ibidem, p.36).

Os desequilíbrios regionais se verificam na medida em que algumas regiões se tornaram pólo

atrativo de investimentos governamentais. A região Sul-Sudeste se enquadra nesse contexto

mais expressivamente no auge do processo de industrialização. Enquanto que as demais

regiões como o Norte-Nordeste carecem de recursos governamentais no tocante a economia

regional para que se possa vislumbrar participações mais efetivas dessas regiões no produto

nacional.

Para as desigualdades sociais, constatou-se com base nos dados do Censo Agropecuário

(1985), que menos de 1% do total dos estabelecimentos, com tamanho de área acima de 1000

hectares, possuíam 43,8% do total das terras agrícolas. Como conseqüência deste processo de

concentração fundiária ocorreu, por um lado, um enorme êxodo do campo e, por outro, o

surgimento de uma nova categoria de trabalhadores rurais: os Sem Terra (ibidem, p.37).

No que se refere aos desequilíbrios inter-setoriais, tem-se que as relações de trocas se

estabeleceram em prol dos setores industriais para a agricultura e da agricultura constituídos

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oligopólios em detrimento dos produtores rurais descapitalizados.2 Estes foram intensamente

atingidos pela queda dos preços recebidos (COUTO, 1984, p.12). Com a ineficiência da

política agrícola e o aumento dos custos de produção, registrou-se uma perda de renda dos

agricultores.

Esse quadro, aliado a uma política de abertura comercial e a um intenso processo de

reestruturação produtiva contribui para que o país viva atualmente sob o tormento de uma

profunda crise de desemprego. A situação se agravou em face a implantação do Plano Real.

Neste, à agricultura assumiu o papel de ancorar a redução das taxas de inflação.

Essas medidas associadas ao processo de urbanização descontrolado desencadearam uma fase

a qual Couto (1984, p.13) em seu livro Cinco anos de políticas agrícolas, chamou de

transformação da pax agrária na violenta urbana contemporânea. Portanto, nesse contexto,

para que haja um melhor entendimento sobre a correlação existente entre o êxodo rural e o

crescimento da violência nos grandes centros urbanos, faz-se necessário compreender a

natureza do desenvolvimento do capitalismo na agricultura.

Ao se estudar o desenvolvimento do capitalismo no campo, depara-se, historicamente, com

dois caminhos bastante distintos: a “via democrática” e a “via prussiana”. Enquanto a

primeira promoveu o desenvolvimento do capitalismo na agricultura através da pequena

propriedade, que ao longo do tempo foi se modernizando, a segunda, se caracterizou pela

manutenção dos grandes latifúndios, que foram tecnificados e modernizados, transformados

em grandes propriedades e explorações capitalistas (FILGUEIRAS, 1992, p.1).

A ocorrência destes distintos caminhos tem sido atribuída, segundo Filgueiras, por um lado,

“a existência de diferentes formações históricas com estruturas econômicas e sociais pré-

capitalistas muito distintas e por outro, à forma e ao modo como a burguesia impôs

politicamente a sua hegemonia ao conjunto da sociedade: ora aliando-se à classe dos

proprietários latifundiários, do antigo modo de produção em decadência, contra o

campesinato, o operariado e outras camadas sociais, ora, aliando-se a estas últimas para

derrotar política e economicamente a antiga classe dominante” (ibidem).

2 A distinção feita entre indústria para a agricultura e da agricultura diz respeito à forma como a agricultura sevincula à indústria. A primeira refere-se a indústria de bens de capital e intermediários e a segunda a indústriaprocessadora de matérias-primas agrícolas (Cf MULLER apud COUTO, 1984).

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No Brasil, o capitalismo se tornou, com o início da industrialização, o modo de produção

hegemônico, redefinindo as relações sociais de produção de acordo com a lógica da

acumulação. O seu desenvolvimento na agricultura fez-se de forma similar a “via prussiana”,

o que explica a ausência de uma política que viabilizasse a realização da reforma agrária.3

Com a inserção do capitalismo no campo, a estrutura fundiária tornou-se ainda mais

concentrada. A agricultura passou a exercer, além das funções tradicionais, como a de

fornecer matérias-primas a diversas indústrias, a tarefa de absorver os produtos industriais.

A expansão capitalista ao desencadear um intenso processo de especulação fundiária molda a

agricultura brasileira de acordo com as exigências do capital. A terra perde o seu valor

intrínseco, possuindo um preço na medida em que leve a apropriação da mais-valia (SILVA,

1995, p.66).

De acordo com Silva (1995, p.67):

A importância da posse da terra decresce na medida em que o capitalismose desenvolve no conjunto da economia e, em particular, no campo,eliminando econômica e socialmente a agricultura de subsistência e asformas primitivas de produção agrícola destinada ao mercado, nas quais oprodutor assegura ele mesmo a produção dos bens – ou de grande parte dosbens – necessários à sua subsistência.

Essa situação foi reforçada quando o Estado empreendeu, ao assumir o papel de criar as bases

para que a acumulação capitalista industrial pudesse se reproduzir, políticas econômicas de

grande importância para o desencadeamento do processo que se convencionou chamar de

“modernização conservadora”. Enquanto modernizavam-se a organização, as técnicas e as

relações de produção, houve uma consolidação, ao longo dos diversos governos, dos

interesses econômicos, políticos e sociais articulados em torno da grande propriedade

fundiária.

A política cambial desenvolvida, até a primeira metade da década de 60, ao promover a

transferência de recursos advindos da “taxação” sobre as exportações, para a indústria,

fomentou o processo de “industrialização por substituição de importações”.

3 Ver a respeito Filgueiras (1991)

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A partir de 1965, com a internalização no país da indústria de bens decapital para a agricultura, a política de crédito rural subsidiado uniu,juntamente com a proibição de importações de máquinas e equipamentosagrícolas, os interesses do novo ramo industrial, com necessidade de seacelerar e aprofundar a transformação do processo de produção naagricultura (FILGUEIRAS, 1992, p.21).

Nos anos 80, o Estado foi levado, em face à crise do balanço de pagamentos e aceleração da

inflação, a redefinir a importância do crédito agrícola subsidiado e a colocar em posição de

destaque a política de preços para os produtos agrícolas. Com esse instrumento, passou-se a

interferir nos conflitos de interesses internalizados nos “complexos” – “protagonizados, por

um lado, pelo pequeno e médio capital de natureza estritamente agrária e, por outro, pelo

grande capital "integrado" de caráter multisetorial” (ibidem).

Segundo Couto (1984, p.15) a política econômica adotada foi de caráter global e tinha como

finalidade tornar a agropecuária um setor gerador de divisas em decorrência da dependência

tecnológica e financeira. Tratava-se de criar condições para superar a crise econômica sem

agravar problemas considerados crônicos: a exclusão social e a inflação. A primeira

evidencia-se pelo êxodo rural decorrente da concentração fundiária motivada pela

modernização conservadora e a segunda pela insuficiente oferta de alimentos.

Esse quadro ao estar associado às mudanças estruturais e conjunturais que vem se

processando no plano internacional, entre outras circunstâncias, as inovações ocorridas na

base científico-tecnológica da produção, nos principais países desenvolvidos, e as

modificações na relação Estado-Mercado deram início ao processo de globalização

(PRESSER et al, 1996, p.14).

A globalização é um fenômeno que suscita controvérsias em torno de seus efeitos, pois apesar

de alguns autores defenderem que ela promove a transferência do capital para qualquer país

que ofereça as oportunidades mais produtivas de investimento, outros, numa visão mais

pessimista, prevêem que a crescente competição dos países em desenvolvimento com baixos

salários destruirá empregos, forçando a redução dos salários nas economias hoje ricas, além

de impulsionar um desgaste na capacidade dos governos em fixar suas próprias políticas

econômicas.

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No plano nacional, observa-se a promoção de políticas que provocaram mudanças na estrutura

produtiva nacional e um encolhimento na geração de postos de trabalho. Na década de 80, a

política desenvolvida forçou a obtenção de um superávit comercial destinado ao pagamento

do serviço da dívida externa. Porém, como os estímulos à exportação não alcançaram o êxito

desejado foram adotadas medidas de restrições ao ritmo de atividades econômicas

(MATTOSO; BALTAR, 1996, p.8).

O saldo comercial foi obtido com a estagnação econômica, elevada inflação e deteorização

das finanças públicas. As condições do mercado de trabalho foram agravadas com o lento

crescimento do emprego formal e um aumento da proporção dos trabalhadores por conta

própria e dos assalariados sem contrato de trabalho formalizado. A partir dos anos 90, com as

políticas que passaram a ser empreendidas no país, essa situação agravou-se ainda mais

(ibidem).

O processo de gradual abertura iniciado pelo Governo Sarney e acelerado a partir dos anos 90,

pela política econômica implementada no Governo Collor, contribuiu para que a

reestruturação produtiva fosse intensificada, sendo acompanhada por um desemprego

tecnológico crescente. Entende-se esse fenômeno, iniciado no cenário mundial nos anos 70,

como uma resposta do capital à queda da produtividade provocada pela crise do fordismo, o

qual se caracteriza pela grande especialização do trabalho e pela produção em série. Em

muitos casos, a implantação desse processo levou a desestruturação e até mesmo a

desativação de unidades industriais.

No Governo FHC, a política de estabilização exigiu das empresas transformações em ritmo

acelerado e associações com capitais estrangeiros, para poderem sobreviver (FILGUEIRAS,

1997, p.8). Essa política provocou, consubstanciada no Plano Real, na subvalorização do

dólar frente ao real e numa grande facilidade para importar, flutuações conjunturais nas taxas

de desemprego, que acompanham de perto as flutuações do nível de atividade econômica.

Desde o período de implantação do Plano Real, até os dias atuais, podem-se verificar cinco

fases na flutuação do nível de atividades. A primeira, expansiva, se caracterizou pela queda

abrupta da inflação e ritmo acelerado de crescimento das atividades produtivas e vai de julho

de 1994 a março de 1995; a segunda, recessiva, teve na elevação das taxas de juros o principal

fator da desaceleração da economia e começa em abril de 95 e termina em set/95, a terceira,

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estagnacionista, que vai de out/95 até out/97; a quarta, recessiva, caracterizada por adoção de

medidas contracionistas em decorrência da crise na Ásia, a qual instaurou um clima de

insegurança e instabilidade no mercado financeiro internacional, esta vai de nov/97 até out/98

e a quinta, caracterizada pela estagflação, que associa um elevado nível de desemprego ao

processo inflacionário, esta vai de nov/98 até o presente momento.

Assim, ao analisar fatores conjunturais e estruturais, percebe-se que a desregulação, a

privatização e a estabilização, potencializaram ainda mais os efeitos decorrentes da terceira

Revolução Industrial (CANO, 1996, p.16). As conseqüências das mudanças na forma como o

sistema capitalista resolve os seus problemas quanto à produção, distribuição e consumo de

seu produto global, não podem ser atribuídas apenas a existência de fatores estruturais, mas

também a políticas econômicas desenvolvidas pelo governo nacional.

A participação do Estado, especificamente, na nova dinâmica da agricultura, transformou o

meio rural, tanto no aspecto da reorganização do processo de trabalho, quanto na questão da

base técnica. Trata-se de uma mudança irreversível, que se cria um verdadeiro proletariado

rural, dificultando a reprodução de formas em que o trabalhador detém todo o controle da

atividade.

2.1 CARACTERIZAÇÃO E DESESTRUTURAÇÃO DO CAMPO BAIANO

A idéia central expressa neste item é a inserção da agricultura baiana no novo padrão de

acumulação, tendo como reflexo o agravamento da crise agrária que remete a uma

desestabilização da zona urbana. Para entender esta dinâmica é preciso analisar o contexto em

que a natureza passa estar subordinada ao capital. Este ao promover a industrialização da

agricultura, modifica as relações sociais no campo, produzindo proletariados rurais que serão

responsáveis pelo fornecimento da força de trabalho no campo.

A análise do processo que levou a agricultura perder a sua autonomia, passando a estar

subjugada ao capital financeiro, é feita a luz dos conceitos defendidos por Kageyama e Silva

sobre a existência de vários Complexos Agroindustriais, denominados “micro” Complexos

Agroindustriais que resultam da passagem dos complexos rurais aos complexos

agroindustriais.

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Parte-se do princípio de que as relações intersetoriais verificadas entre a agricultura-indústria

estão inseridas na perspectiva da absorção de inovações tecnológicas na agricultura. As

articulações entre a indústria para a agricultura, conhecido como o setor a montante, a

agricultura propriamente dita e a indústria da agricultura, denominado de setor a jusante,

caracterizam o novo padrão agrícola. O primeiro setor é responsável por fornecer bens de

capital e insumos para a agricultura e o último atua como processador de matéria-prima

agrícola, classificado como agroindústria.

Para Marafon (2003) essas relações além de influenciarem a transformação da agricultura

como setor autônomo, também impactaram na capacidade de decisão dos grupos sociais

rurais. Esta concepção já era percebida por Kautsky (1980) que em seu livro A Questão

Agrária, analisa, no final do século passado, o início da união da agricultura com a indústria,

conforme pode ser observado na citação abaixo:

O camponês deixa de ser, pois, o senhor na sua exploração agrícola. Esta setorna um apêndice da exploração industrial por cujas conveniências deveorientar-se (...). Freqüentemente, também cai sob a dependência técnica daexploração industrial (...). Como nos demais setores da sociedadecapitalista, a indústria acaba por vencer a agricultura (...). A indústriaconstitui a mola não apenas de sua evolução mas ainda da evoluçãoagrícola. Vimos que foi a manufatura urbana que dissociou, no campo, aindústria e a agricultura, que fez do rural um lavrador puro, um produtordependente dos caprichos do mercado, que criou a possibilidade de suaproletarização (...). Foram criadas assim as condições técnicas e científicasda agricultura racional e moderna, a qual surgiu com o emprego demáquinas e deu-lhe, pois, superioridade da grande exploração capitalistasobre a pequena exploração camponesa (KAUTSKY 1980, p.281-318).

O trecho descreve o momento em que o trabalhador rural é despojado dos meios de produção,

tornando-se agente passivo ante a transformação do meio rural. O processo de modernização

que resultou na industrialização, ao se aliar às mudanças nas relações de trabalho favoreceu a

constituição do Complexo Agroindustrial. Para compreender a passagem do “complexo rural”

para uma dinâmica comandada pelos “complexos agroindustriais”, faz-se necessário apontar

as principais características pertinentes a cada período, de forma a esclarecer as implicações

do novo padrão de acumulação para a relação campo-cidade.

O período compreendido entre 1850 e 1945 é conhecido como a fase de decomposição do

complexo rural. Este era caracterizado por uma incipiente divisão do trabalho, onde na própria

fazenda havia a produção de todos os bens intermediários e também dos meios de produção

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utilizados na colheita dos produtos. Geralmente havia apenas um produto de valor comercial e

este era voltado para atender o mercado externo. A mão-de-obra utilizada na produção era

escrava. Este aspecto foi fundamental para desencadear a crise deste complexo, pois a partir

de 1850 há uma imposição dos capitais internacionais, através da proibição efetiva do tráfico

negreiro, para implantação do trabalho livre.

Ainda nesse período, verificou-se a formação do mercado interno, o processo de substituição

de importações e a emergência do novo complexo cafeeiro paulista. Para Kageyama et al

(1990) este foi um longo processo iniciado com a lei de terras e a proibição do tráfico e

consolidado na década de 50 do século XX, com a internalização das indústrias produtoras de

bens de capital.

De acordo com Silva (1998a, p.18), a transição no pós-guerra para uma agricultura

modernizada se deu lentamente, através da incorporação de algumas transformações. Do lado

da produção, de 1930 a 1950, verificou-se a diversificação de produtos e, especificamente, a

passagem da ênfase do mercado externo para o mercado interno; do lado da circulação,

houve, com o desenvolvimento da rede de transportes, a integração do mercado nacional;

quanto à forma de produzir, ocorreu uma transformação, na década de 60, mais efetiva no

momento em que a oferta interna de máquinas e equipamentos torna-se mais expressiva. A

partir deste período, a agricultura inicia um processo de modernização de sua base técnica.

Esse processo, além de contribuir para mercantilização intra-setorial da agricultura, promoveu

a substituição de elementos tradicionais utilizados nos complexos rurais por máquinas e

insumos adquiridos fora do setor, estimulando, assim, a implantação internamente, de

indústrias de bens de capital e insumos para a agricultura. Com a internalização do

departamento produtor de bens de capital para a agricultura, denominado D1, as bases para se

promover a insdustrialização da agricultura e, conseqüentemente, a implantação do novo

padrão agrícola foram lançadas.

A partir de meados da década de 60, a dinâmica da agricultura passa a ser determinada pelo

padrão de acumulação industrial, centrado no desenvolvimento dos complexos

agroindustriais. Para Muller (apud SILVA, 1998a, p.24) este período é caracterizado como

um marco do novo padrão agrícola, face à constituição do complexo agroindustrial (CAI)

brasileiro em negação ao predomínio do complexo agro-comercial vigente. A constituição

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deste complexo surge como produto da modernização, que tem na diversificação das

explorações, industriais e agroindustriais, e na substituição localizada de importações de

matérias-primas estratégicas, como petróleo, os principais atores para a expansão da estrutura

produtiva do CAI brasileiro.

Para Silva (1998a, p.25-26), essa estrutura representa a nova dinâmica da agricultura

brasileira conformada na relação conjunta da indústria para a agricultura - agricultura -

agroindústria. Como forma de viabilizar estas relações foi constituído o Sistema Nacional de

Crédito Rural – SNCR, que juntamente com a política de crédito impulsionaram a

modernização agrícola, modificando a posição ocupada pela agricultura no padrão geral de

acumulação do país. A política de crédito rural, além de estimular a modernização agrícola,

favoreceu a integração de capitais, resultando no estímulo ao processo de concentração e

centralização de capitais e da terra.

Nesse contexto, é importante assinalar a necessidade da participação cada vez maior do

Estado, imposta durante o processo de desarticulação do complexo rural e constituição dos

CAIs, com a finalidade de restabelecer uma regulação geral, em que são definidos os

principais parâmetros para a rentabilidade dos capitais empregados nos distintos ramos e

como fiscalizador das contradições internalizadas nos complexos.

Entretanto, salienta-se que essa participação ao mesmo tempo em que promoveu um “projeto

dominante” não criou mecanismos compensatórios sobre seus efeitos sociais na estrutura

agrária, nos recursos naturais, nos desequilíbrios do abastecimento alimentar, na concentração

da renda, nas disparidades regionais e no êxodo rural (SILVA, 1998a, p.35).

Em relação às disparidades regionais, tem-se que aspectos considerados fundamentais para a

modernização agrícola, como a transição para o trabalho livre, não ocorreram de maneira

uniforme para todas as regiões do país. No caso do Nordeste, como explica Cano (apud

SILVA, 1998a, p.7) a obediência a essa norma era quase formal, uma vez que os antigos

escravos permaneciam nas propriedades como “moradores de condição”.

A existência ainda precária das relações capitalistas de produção nessa região é importante

para se entender o seu atraso histórico em relação ao pólo dinâmico, representado por São

Paulo. Isso significa que o novo padrão de acumulação foi alcançado de maneira tardia no

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Nordeste, o que remete à preocupação deste trabalho, em buscar alternativas viáveis para

promover o desenvolvimento do meio rural baiano, de forma a preservar a sua zona urbana da

rapidez e intensidade alarmante, com que a violência urbana se expande.

Além do mais, o Estado da Bahia, por ocupar uma certa posição periférica no contexto

nacional, reage tardiamente ao processo de mudanças no ciclo econômico do país. No

momento em que as regiões mais desenvolvidas apresentam uma desaceleração no ritmo de

crescimento da população urbana, este Estado registra um crescimento populacional

concentrado nessas áreas, superior a média do país. Chama-se atenção para o fato de que a

Bahia apresentou uma redução no ritmo de crescimento populacional, mas não foi nas

mesmas proporções do conjunto do país.

Enquanto na década de 80 o ritmo de urbanização do país sofreu uma desaceleração, em

conseqüência da queda de fecundidade e dos efeitos da recessão sobre os movimentos

migratórios, a Bahia apresentava a 4ª taxa de crescimento urbano do Nordeste. Este

comportamento pode ser, em parte, explicado pelo desempenho do PIB baiano que, ao

contrário do Centro-Sul, apresentou um crescimento expressivo no período, com início do

funcionamento do Pólo Petroquímico de Camaçari (BORGES, 1993, p.58-59).

A implantação do Pólo Petroquímico de Camaçari no Estado promoveu uma redistribuição

espacial da população, na medida em que atuou como uma alternativa de absorção da mão-de-

obra expulsa nos grandes centros urbanos das regiões Sul e Sudeste do país. A inexistência de

novas áreas de atração contribuiu para que os migrantes se concentrassem no seu próprio

estado.

Apesar do dinamismo de sua economia na década passada, a Bahia ainda se apresenta com

um grau de urbanização inferior ao da maioria dos estados brasileiros.4 Esta questão pode ser

explicada pelo fato de 43,9% da população baiana viver no campo, o que leva o Estado a ser

considerado como o que possui a maior população rural, em termos absolutos. Acredita-se

que esse fenômeno seja devido, em parte, à forte capacidade de fixação do agrobaiano e à

reduzida atração exercida pela maioria das cidades desse Estado.

4 Grau de urbanização é a razão entre a população urbana e a população total do município ou região.

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Para entender esse comportamento é necessário analisar algumas peculiaridades do Estado na

estrutura de posse, uso da terra e nas atividades econômicas. No que diz respeito à área dos

estabelecimentos e à condição do produtor com relação à posse da terra, têm-se que são

características que contribuem para manter o elevado percentual da população na zona rural,

na medida em que o tamanho dos minifúndios proporcionam maior liberdade de ação aos

pequenos produtores, e a condição de proprietário da terra garante a fixação da família do

pequeno produtor (ibidem, p.63).

De acordo com Borges (1993, p.66), o processo de modernização agrícola, aqui implantado,

não se verificou nos moldes das outras regiões do país. Em virtude desta “ocorrer,

principalmente, em áreas escassamente povoadas do Oeste, impediu que esse processo

tivesse, aqui, as mesmas conseqüências demográficas observadas, por exemplo, no

Sul/Sudeste do país”. Um outro importante fator a ser ressaltado é que na região Nordeste do

Estado houve a expansão de culturas tradicionais a exemplo da mandioca, milho e feijão que

são intensivas em mão-de-obra.

A estes fatores, pode-se ainda agregar, embora em menor magnitude, as características

geográficas da região, pois permitiram que os habitantes da zona rural desenvolvesse

atividades como a pesca, não tão importantes como potencial econômico, mas significativa

para a subsistência.

Na década de 90, com os processos de ajuste verificados na economia nacional, essas

características se modificaram. As estratégias de saída, por um período, de alguns membros

da família do pequeno produtor, utilizadas pelos migrantes foram abandonadas em virtude da

redução no nível do emprego nos principais centros urbanos do país.

Com o agravamento do nível de emprego houve mudança no perfil da mão-de-obra

requisitada pelas empresas. Passou-se a exigir trabalhadores com maior nível de qualificação

e de escolaridade, o que dificultou a incorporação dos migrantes nos mercados das regiões

mais desenvolvidas do país. Dessa forma, o aumento do desemprego nestas regiões ao

reverter o fenômeno migratório para fora da RMS promoveu uma intensificação do processo

de urbanização na Bahia.

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Diante da aceleração do processo de urbanização, faz-se necessária a criação de medidas que

atuem sobre os fatores de expulsão da população do campo, a fim de que a zona urbana possa

se reestruturar e assim absorver a mão-de-obra excedente. Assim sendo, os próximos itens

foram reservados para aprofundar os aspectos da modernização da agricultura e caracterizar a

estrutura e especulação fundiária na Bahia. Acredita-se que de posse destas informações,

poder-se-á dimensionar até que medida a Região Metropolitana de Salvador poderá ser alvo

de um processo de urbanização descontrolada.

2.1.1 A modernização da agricultura

No que se refere ao processo de modernização da agricultura, faz-se, aqui, alusão às principais

transformações da base técnica que acarretaram essa modernização. De acordo com

Kageyama et al (1990, p.113), “existem três conceitos que muitas vezes são usados como

sinônimos e na verdade não o são: modernização da agricultura, industrialização da

agricultura e formação dos complexos agroindustriais”. O primeiro refere-se à mudança na

base técnica da produção agrícola. O segundo, à transformação da agricultura num ramo de

produção semelhante a uma indústria e o terceiro, à agricultura industrializada que está

conectada com outros ramos da produção.

As transformações básicas que diferenciam a modernização da agricultura desse processo de

“industrialização” ocorreram em três momentos: no primeiro há mudanças nas relações de

trabalho, no segundo, as atividades passam a ser mecanizadas não mais em função da

substituição da força física, mas substituindo a habilidade manual, e no terceiro, o processo de

modernização da agricultura brasileira sofre transformações que o muda qualitativamente,

através da internalização dos departamentos produtores de insumos, máquinas e equipamentos

(ibidem, p.115-116).

Na década de 60, com a constituição do complexo agroindustrial brasileiro se evidencia que a

nova dinâmica agrícola não pode mais ser apreendida apenas a partir dos mecanismos internos

da própria atividade e nem da segmentação do mercado interno versus externo (SILVA,

1998a, p.26). Nos complexos, o capital assume a função de unir as diversas atividades, dando-

as caráter de unidade.

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O período de constituição dos “complexos agroindustriais” é caracterizado pela inserção do

capital na atividade agrícola. Sabe-se que, a partir do seu estabelecimento, o desenvolvimento

da agricultura passa a depender da dinâmica da indústria. Segundo Kageyama et al (1990,

p.125), tem-se três resultados gerais mais concretos: a) do ângulo do CAI, tem-se um

crescente movimento de subordinação da agricultura à dinâmica industrial; b) do ângulo da

industrialização da agricultura, a mudança da base técnica, torna-se irreversível, tanto do

ponto de vista da reorganização do processo de trabalho, como do ponto de vista da base

técnica. É esse caráter social e irreversível da industrialização da agricultura que permitiu a

criação de um verdadeiro proletariado rural e estreitou a possibilidade de reprodução de

formas independentes da pequena produção ou de formas em que o trabalhador mantém o

controle do processo de trabalho; c) do ângulo da integração de capitais, o Sistema Nacional

de Crédito Rural (SNCR) veio a formar o elo do capital financeiro com a agricultura.

O processo, que alterou a base técnica agrícola, desenvolvendo a indústria de insumos para a

agricultura e ampliando a indústria processadora de alimentos e matéria-prima, teve como

principal instrumento o crédito rural subsidiado. No que diz respeito a esse tipo de

instrumento de política agrícola, Martine (1990, p.6) afirma que, como conseqüência de sua

aplicação, houve aumento da concentração da propriedade e redução do espaço de

arrendatários, parceiros, posseiros e outros pequenos produtores, o que provocou um forte

êxodo rural. O crédito agrícola embora não tenha atingido homogeneamente os diversos

produtores, se constituiu no principal instrumento utilizado para promover a industrialização

do campo.

Para Delgado (apud SILVA, 1998a, p.26) a ruptura do antigo padrão de desenvolvimento e a

implantação de um novo se dá a partir da conjugação de alguns fatores como a consolidação

integrada com o complexo agroindustrial e as mudanças na base técnica de produção agrícola,

a intensa urbanização e o rápido crescimento do emprego não-agrícola, a organização do

SNCR e a política de crédito rural.

O novo padrão agrícola foi consolidado com a integração de capitais intersetoriais sob o

comando do capital financeiro, em meados da década de 70 e início dos anos 80. Após a

concretização do processo de modernização da agricultura, observa-se que as mudanças

implementadas neste setor são irreversíveis e que a agricultura jamais retornará aos padrões

vigentes no modelo anterior. Do ponto de vista da utilização da mão-de-obra ocupada no

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campo, a mudança mais significativa foi a formação de uma mão-de-obra de assalariados

rurais.

As conseqüências imediatas desse processo dizem respeito à perda da “estabilidade” e da

“segurança” do trabalhador rural. Estes, ao serem destituídos dos meios de produção,

migraram para a cidade, passando a fazer parte do exército industrial de reserva destinado a

abastecer as indústrias. Segundo Silva (1998a, p.34)

É o caráter social e irreversível da industrialização da agricultura quepermite a criação de um verdadeiro proletariado rural, estreitando-se apossibilidade de reprodução de formas independentes da pequena produçãoou de formas em que o trabalhador mantém o controle do processo detrabalho.

A modernização da agricultura brasileira do ponto de vista social, significou um processo

desigual em todos os sentidos: foram beneficiados alguns produtos, alguns produtores e

algumas regiões em detrimento dos demais. Em outros termos, os subsetores, que abrange a

agricultura de subsistência, por não possuírem força política e econômica foram desprezados

no processo, levando à composição/manutenção de complexos mais fracos e, até mesmo, de

formas artesanais de produção, com baixíssimo nível de organização por parte dos produtores

(COUTO FILHO, 1997a, p.9).

As novas técnicas de cultivo e a mecanização poupadora de mão-de-obra modificaram a

rotina no campo. A terceirização de tarefas, alterações no plantio, tratos culturais e colheita, a

criação de animais e o beneficiamento de produtos promoveram uma diminuição da mão-de-

obra empregada em atividades agrícolas e um crescimento das ocupações em atividades não-

agrícolas, que são realizadas em tempo integral ou parcial.

Em algumas regiões da Bahia, principalmente nas localidades mais desenvolvidas, já se

verifica pessoas ocupadas em atividades, exclusivamente, não-agrícolas e também pluriativas,

embora continue como uma região onde o trabalho agrícola se mantém expressivo. Trata-se

de um Estado em que a agricultura moderna convive ao lado de uma agricultura atrasada, com

muitos problemas econômicos e sociais. Esta heterogeneidade, peculiar a região, onde se têm

da agricultura capitalista altamente mecanizada à agricultura familiar de subsistência, dificulta

a cararacterização do campo baiano, na perspectiva do que se convencionou chamar de Novo

Mundo Rural.

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A instabilidade econômica da atividade agrícola, em decorrência da queda nos preços das

principais commodities e das terras, associada às transformações e diversificações internas do

próprio setor criou um novo cenário no meio rural baiano. Nas áreas em que houve a

modernização agrícola, há uma nova divisão social do trabalho rural, na qual o trabalhador

torna-se pluriativo, na medida em que dedica parte do seu tempo de trabalho na execução da

atividade agrícola e em outra parte do tempo disponibiliza sua força de trabalho para outras

atividades.

Quanto às mudanças tecnológicas ocorridas no setor primário observa-se uma elevação no uso

de diversas modalidades de tecnologias. A utilização de tratores, máquinas e arados por área é

intensificada, as lavouras passam a fazer uso da irrigação e os insumos destinados a combater

pragas e doenças tem suas demandas elevadas. Em decorrência da modernização agrícola, o

pessoal ocupado é expulso do campo.

2.1.2 Estrutura fundiária

Ao se analisar a estrutura agrária brasileira, verifica-se um padrão de distribuição de terras

altamente concentrada. Segundo a classificação do INCRA em 1992, menos de 2% do

universo dos imóveis cadastrados, representado pelo segmento dos grandes imóveis, detinham

mais de 50% da área cadastrada.

Essa tendência à concentração da propriedade da terra também pode ser observada nos dados

do Censo Agrícola. De acordo com este, 3,1 milhões de pequenos agricultores tem acesso a

apenas 10 milhões de hectares, enquanto no extremo oposto, os 50 mil latifúndios, com áreas

superiores a 1000 ha, detêm, contudo, 165 milhões de hectares.

No que se refere ao estado da Bahia, têm-se que a estrutura agrária baiana se caracteriza por

apresentar uma dimensão impressionante para o grau de concentração da propriedade, posse e

uso da terra, conforme pode ser observado na tabela 1. Com base nesta, verifica-se, para o

período 70/96, que, de um lado, os menores estratos de área são responsáveis por um maior

número de estabelecimentos, correspondendo a uma parcela menor da área total. De outro

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lado, os estratos de área superiores possuem um pequeno número de estabelecimentos

ocupando uma maior parcela da área total.

Tabela 1 - Número e Total da Área dos Estabelecimentos Agropecuários, segundo

Estratos de Área Total para os anos de 1970, 1980 e 1995-96. Bahia

Estratos de 1970 1980 1996

Área Total Estab. Área Estab. Área Estab. Área

(Há) N.A % N.A % N.A % N.A % N.A % N.A %

até 10 297.035 54,85 1.042.466 4,68 347.311 54,5 1.243.191 4,14 401.734 57,46 1.373.887 4,6

10 a 50 162.902 30,08 3.752.337 16,86 195.284 30,65 4.400.489 14,65 208.542 29,83 4.621.549 15,49

50 a 100 39.734 7,34 2.722.649 12,23 45.120 7,08 3.055.200 10,17 43.210 6,18 2.912.703 9,76

100 a 1000 39.687 7,33 9.570.984 42,99 46.050 7,23 11.403.771 37,97 41.874 5,99 10.627.611 35,61

1000 a 10000 2.155 0,4 4.329.986 19,45 3.159 0,5 6.716.413 22,36 3.407 0,49 7.297.229 24,45

10000 e mais 44 0,01 842.405 3,78 136 0,02 3.213.526 10,7 156 0,02 3.009.922 10,09

Não declarado 9 0 --- --- 165 0,03 --- --- 203 0,03 ---- ----

TOTAL 541.566 100 22.260.827 100 637.225 100 30.032.590 100 699.126 100 29.842.901 100Fonte: Censo Agropecuário 1996 – IBGE.

A Sigla N. A significa o número absoluto dos estabelecimentos e da área

Apesar dos dados contidos na tabela 1 não refletirem, exatamente, a realidade que se quer

estudar, em decorrência de alguns fatores como o registro das áreas de terras que estão nas

mãos dos arrendatários e posseiros como estabelecimento levarem a subestimação do grau de

concentração, pode-se observar que a estrutura fundiária baiana ainda é bastante concentrada.

Os grandes proprietários contribuem para esse quadro, na medida em que, visando fugir do

Imposto Territorial (ITR), omitem, nas declarações cadastrais, as reais extensões das suas

propriedades.

Na observação da tabela 1, verifica-se que, em 1970, período de grande especialização da

produção agrícola, os estabelecimentos agropecuários com áreas inferiores a 100 hectares

representavam em torno de 92% do número total em todo o Estado da Bahia e um pouco mais

de 33% do total da área dos mesmos (FILGUEIRAS, 1984, p.30). Vinte e seis anos depois, o

total da área, para a mesma faixa de produtores, representa um pouco mais de 29% das terras

de todos os estabelecimentos, embora a sua participação relativa, em termos de número de

estabelecimentos permanecesse quase inalterada.

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Em contraste, a faixa dos estabelecimentos de mais de 1000 ha, que representava em 1970 um

pouco mais de 0,4% dos estabelecimentos e detinha 23% da área total, passou a ocupar em

1996, aproximadamente, 34,6% dessa área, com um pouco mais de 0,5% do número de

estabelecimentos. Esse comportamento indica que houve no período analisado um pequeno

crescimento e uma concentração significativa da terra em poucas unidades de decisão. O

grupo que compreende os estabelecimentos entre 100 e menos de 1000 ha reduziu a

quantidade e a área controlada de 7% para 6% e 43% para 35,6% respectivamente.

A compreensão desse processo de concentração fundiária remete para a análise do período de

implantação do modelo agroindustrial e das políticas nacionais de desenvolvimento que lhe

deram sustentação, retratadas anteriormente. Nessa época, a política agrícola promoveu, além

de conduzir para as desigualdades sociais no campo, alterações na base técnico-produtiva,

através da introdução na agricultura de modernas tecnologias poupadoras de mão-de-obra,

levando a necessidade de se qualificar o trabalhador rural. Os interesses dos grandes

latifundiários foram preservados, na medida em que essa política contribuiu para a redução do

espaço de arrendatários, parceiros, posseiros e outros pequenos produtores.

Nos anos de 1980-1996 há um movimento oposto, verificando-se uma reduzida

desconcentração de terras. Para o ano de 1980, tem-se que os estabelecimentos com menos de

100 hectares possuíam exatamente 92,23% do número total no estado e 28,96% da área dos

mesmos. Enquanto para os estratos de área superiores a 100 hectares o percentual era de

7,78% e 71,03% respectivamente. No que diz respeito ao período de 96, têm-se para os

mesmos estratos de áreas um percentual de 93,47% dos estabelecimentos para uma área total

de 29,85% e 6,53% dos estabelecimentos para uma área de 70,15%.

Enquanto os estratos de área inferiores a 100 hectares tiveram o número de estabelecimentos e

de áreas ampliados, nos estratos superiores estes foram reduzidos. A análise dessa oscilação

confirma que houve nesse período um processo de desconcentração fundiária. Uma resposta

para esse comportamento pode ser encontrada na tese de Graziano da Silva, “O que é questão

agrária” (SILVA apud LIMA, 1992).

De acordo com este, em épocas de crescimento das atividades econômicas, os grandes

latifúndios tendem a expandir as suas propriedades através da absorção das pequenas. Nos

momentos de recessão, o processo se inverte, os grandes proprietários procurando reduzir os

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custos variáveis, repassam parte da responsabilidade da produção para a pequena propriedade

(LIMA, 1992, p.39).

Essa teoria está em conformidade com o momento de crise ocorrido no país durante o período

mencionado. Na década de 80, a crise do balanço de pagamento e aceleração da inflação leva

o Estado a redefinir a importância do crédito agrícola subsidiado e a colocar em posição de

destaque a política de preços para os produtos agrícolas. Em 96, o país vive uma fase

estagnacionista, onde a grande disparidade entre os preços pagos e os preços recebidos pelos

agricultores levou a redução da área plantada, com reflexos sobre os índices de preços e sobre

a geração de empregos.

As mudanças, que se verificam, atingem o setor agropecuário de forma a promover uma

redistribuição espacial. Muitos proprietários, em decorrência de medidas contracionistas

adotadas pelas autoridades governamentais, como taxa de juros escorchante e arrocho no

crédito rural, são levados a se associarem a outros proprietários.

Conforme os dados contidos na tabela 2, que distribui o número e o total da área do conjunto

dos estabelecimentos agropecuários, segundo a condição do responsável, entre 1970 e 1996,

houve um crescimento no percentual dos estabelecimentos controlados pelos proprietários,

passando de 78,44% para 83,32% e uma redução da área controlada pelos mesmos de 68,27%

para 63,73%. Enquanto os estabelecimentos explorados sob as formas de arrendamento

tiveram uma diminuição no número e na área dos mesmos, bem como os estabelecimentos

cujos produtores são posseiros.

A análise do SNCR é um importante instrumental analítico no entendimento acerca da

concentração e centralização de capitais e da terra. No aspecto da integração de capitais, aos

poucos o padrão de expansão horizontal, através da ocupação de fronteira nos moldes

tradicionais foi substituído. Este tipo de expansão adquire um novo caráter ao se ocorrer

conjuntamente com a expansão vertical, passando a integrar-se com a disseminação dos

complexos agroindustriais. A política de crédito favoreceu os grandes proprietários em

detrimento dos produtores descapitalizados, na medida em que estes por falta de incentivo

foram levados a abandonar a terra, da onde retiravam seu sustento.

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No que se refere ao número de estabelecimentos controlados pelos administradores não houve

alteração, embora a sua área tenha variado de 26,74% para 34,33%. Essa categoria teve a sua

área ampliada devida à expansão da silvicultura e as atividades empresariais de soja e milho

desenvolvidas no Oeste baiano (MACHADO, 1998, p.32).

Tabela 2 – Número e Total da Área dos Estabelecimentos, segundo a Condição do

Responsável para os anos de 1970, 1980 e 1995 – 96. Bahia

Condição 1970 1980 1996Do Estab. Área Estab. Área Estab. ÁreaResponsável N.A % N.A % N.A % N.A % N.A % N.A %Proprietário 424.831 78,44 15.286.146 68,67 529.029 83,02 20.715.559 68,98 582.476 83,32 19.017.263 63,73Arrendatário 24.686 4,56 240.071 1,08 15.949 2,5 120.075 0,4 13.807 1,98 133.718 0,45Ocupante 61.773 11,41 782.472 3,52 65.340 10,25 656.816 2,19 63.748 9,12 441.582 1,48Administrador 30.276 5,59 5.952.138 26,74 26.907 4,22 8.540.146 28,44 39.047 5,59 10.243.904 34,33

Não declarado -- -- -- -- -

- -- -- -- 48 0 6.432 0,02TOTAL 541.566 100 22.260.827 100 637.225 100 30.032.590 100 699.126 100 29.842.899 100Fonte: Censo Agropecuário 1996 – IBGE.

A Sigla N. A significa o número absoluto dos estabelecimentos e da área

Esses dados indicam que houve no período estudado um processo de destruição da pequena

produção. A redução absoluta no número e na área dos estabelecimentos, onde os produtores

são arrendatários ou ocupantes e utilizam essencialmente força de trabalho familiar, não se

verificou, em termos de número dos estabelecimentos, para os produtores na condição de

proprietário.

Embora os produtores na condição de proprietários tenham ampliado o número de

estabelecimentos, muito provavelmente tiveram as áreas reduzidas em decorrência dos

produtores classificados como administradores ampliarem as suas áreas. Além disso, alguns

produtores no ano de 1996 passaram a não declarar a condição do responsável pelo imóvel.

Dessa maneira, verifica-se uma transferência das áreas não somente dos proprietários, assim

como as dos arrendatários e ocupantes para os estabelecimentos controlados pelos

administradores.

Nesse sentido, tem-se que o alto grau de concentração fundiária na Bahia é um dos fatores que

mais atrasam a modernização econômica desse Estado, uma vez que a redução no número da

população rural, através do êxodo rural, contribui para agravar, ainda mais, as tensões sociais

na cidade. Portanto, faz-se necessário uma melhor distribuição da propriedade fundiária a fim

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de que se possa dar cumprimento à função social da terra qual seja a de produzir, gerar

empregos e preservar o equilíbrio ecológico.

2.1.3 Especulação fundiária

A especulação fundiária está relacionada com a introdução do capital financeiro na dinâmica

da agricultura. A partir daí, o mercado de terras, ao permitir ganhos especulativos, torna-se

um meio alternativo para acumulação do capital, passando a ser alvo de cobiça em meio ao

novo padrão agrícola que se instaurou.

O mercado de terras no Brasil é caracterizado por uma intensa especulação. A utilização da

maior parte das terras como reserva de valor se constitui numa prática comum entre os

grandes proprietários, que preferem imobilizar grandes áreas e esperar que se valorizem por

efeito de investimentos públicos e privados de terceiros, do que desenvolver atividades

produtivas. Ao assumir esta atitude, os proprietários contribuem para que o êxodo rural se

intensifique.

Nessa medida, não se pode compreender o fenômeno do êxodo rural sem levar em

consideração o papel do mercado de terras e da especulação destas na desocupação da mão-

de-obra agrícola. Como se sabe, muitos autores atribuem a dificuldade dos Sem Terra ao

acesso a terra pela falta de vontade política para se alterar os padrões de distribuição fundiária

existente. O que é explicado pelo forte poder político dos proprietários, que se mantêm graças

às possibilidades de ganhos diretos e/ ou indiretos oriundos da propriedade da terra. Estes

ganhos, em sua maioria são realizados no mercado, como, por exemplo, a venda da terra

como fator produtivo e/ou como ativo especulativo. Além disto, a propriedade da terra

permite o acesso ao crédito a partir da hipoteca da terra e a exoneração tributária (COUTO

FILHO, 1997, p.17).

Acrescente-se, ainda, que esse processo também conduz à transformação da terra em

mercadoria altamente valorizada, que se apresenta como alternativa lucrativa para

investimentos de capitais oriundos de outros setores da economia e cuja apropriação é feita

para fins especulativos, como forma de proteger o valor do capital contra a inflação e como

meio de acesso aos incentivos fiscais e ao crédito subsidiado (FILGUEIRAS, 1984, p.20).

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Assim, de acordo com Martine (1990, p.7):

Tanto a mudança na escala de produção trazida pelo novo pacotetecnológico, como a tendência especulativa desencadeada pelo processo demodernização, serviram para acentuar ainda mais a concentração dapropriedade da terra, afetando, também, as relações de produção no campo.

Essa expropriação verificada no campo e o conseqüente movimento de êxodo rural fizeram

aumentar, consideravelmente, a oferta de trabalho na cidade. Desta forma, o processo de

modernização, de concentração e de especulação, acabou por reforçar a situação de pobreza

rural, a proletarização e a migração rural-urbano. Nas cidades, foram agravados diversos

problemas sociais como a violência, a marginalização, o subemprego, a favelização, a fome e

a mortalidade infantil (MENEZES, 1991, p.52).

Neste contexto, vive-se atualmente, sob a tensão de que com o intenso fluxo de migração

campo-cidade, a situação do desemprego venha a se agravar nos próximos anos, provocando

uma piora nas condições de vida da população rural e urbana.

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3 A RELAÇÃO CAMPO-CIDADE NA DISCUSSÃO DA VIOLÊNCIA URBANA

A abordagem da relação campo-cidade do ponto de vista da violência urbana é uma tentativa

de relacionar as conseqüências do novo padrão de acumulação no campo com o cenário

apresentado pela zona urbana após a expulsão de parte dos trabalhadores da atividade

agrícola. A violência é apresentada como reflexo da desarticulação dos centros urbanos que

tem no desemprego a sua causa mais eminente.

O forte êxodo rural verificado nos anos 70 e 80, embora neste último tenha sido em menor

intensidade, tem como causa a redução das oportunidades de emprego no campo em função

da crescente tecnificação das atividades agropecuárias. Nos Censos Demográficos de 1970 e

1980, assim como nas Pesquisas Nacionais por Amostra de Domicílios (PNADs) já se

observava para a década de 70 que a população Economicamente Ativa (PEA) total

representava 44,3% dos trabalhadores da atividade agrícola, reduzindo para menos de 23%

em 1990. Este decréscimo atingiu tanto as pessoas que residiam no campo, como as que

moravam na cidade (Tabela 3).

Tabela 3 – Distribuição da PEA de 10 anos ou mais, segundo a situação

do domicílio e ramo da atividade principal: Brasil, 1970/80 e 1981/90 (%)

Anos Urbano Rural Total Agrícola Não-agrícola Agrícola Não-agrícola Agrícola Não-agrícola1970 10,1 89,9 87,8 12,2 44,3 55,71980 7,6 92,4 79,7 20,3 29,3 70,71981 8,1 91,9 77,2 22,8 29,2 70,31990 6,0 94,0 68,4 31,6 22,9 77,1

Fonte: Censos Demográficos de 1970 e 1980; PNADs de 1981 e 1990.

Ao tempo em que a proporção de pessoas ocupadas em atividades agropecuárias sofreu um

decréscimo, verifica-se um aumento da PEA não-agrícola, passando de 55,7% para 77,1%.

Nesse sentido, o crescimento das atividades não-agrícolas na zona rural variando de 12,2%

para 31,6% indica que o campo brasileiro perdeu seu caráter exclusivamente agrícola,

assumindo “novas funções” ao representar local de moradia, de lazer, de serviços e de

emprego para as pessoas ocupadas nas atividades não-agrícolas.

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Em resumo, nos anos 80 houve uma verdadeira “urbanização do meiorural”. Hoje o campo brasileiro não pode mais ser caracterizado como umespaço eminentemente agropecuário: ao contrário, ganham importânciaoutras dimensões, como as de moradia, de transformação industrial einclusive as não-produtivas no sentido estrito do termo, como o lazer e apreservação ambiental (SILVA, 1998b, p.183).

Na zona urbana, o perfil da mão-de-obra requisitada a partir dos anos 80, não é mais de

característica fordista, em que o trabalho é realizado por pessoas de pouca qualificação. Passa-

se a exigir uma flexibilidade não existente nas indústrias na década anterior. Este processo

não favorece os migrantes da zona rural, uma vez que a qualificação destes é bastante

precária. Com o agravamento do nível de emprego, em decorrência dos aspectos estruturais e

conjunturais analisados, passou-se a exigir trabalhadores com maior nível de qualificação e de

escolaridade, o que dificultou a incorporação dos migrantes nos mercados das regiões mais

desenvolvidas do país.

Nos anos 90, a situação se torna ainda mais grave com a informatização de muitos ramos de

serviços que se expandiram na década anterior e da pressão crescente para entrada na força de

trabalho dos jovens nascidos nos anos 70, uma década em que a taxa de natalidade ainda se

mantinha bastante elevada.

Com a difusão das novas técnicas produtivas, houve a eliminação de milhares de postos de

trabalho. Segundo o IBGE, na indústria brasileira, entre 1990 e 95, foram eliminados 2,1

milhões de empregos. É importante ressaltar que embora nesse período a produção industrial

nacional tenha passado por momentos de recuperação, não houve “incorporação” de novos

postos de trabalho.

No tocante à Bahia, identifica-se o caso da indústria de transformação, que reduziu, entre

1990 e 1993, o número de postos de trabalho, em razão dos anos de recessão da “Era Collor”

e da reorganização das empresas face à competição internacional, impulsionada pela alíquota

de importações (FILGUEIRAS, 1996, p.31). A extensão desse processo para o conjunto das

indústrias contribuiu para que a oferta de mão-de-obra ao exceder a demanda pressionasse o

mercado no sentido de reduzir os salários. Nesse sentido, a restrição do ritmo de atividades

associado à desintegração da estrutura da produção levaram a indústria a perder a posição de

destaque que havia adquirido após a Segunda Guerra Mundial, no cenário nacional

(MATTOSO; BALTAR, 1996, p.3).

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De acordo com os dados do IBGE, a taxa de desemprego de outubro de 1997 foi de 5,71% nas

seis principais regiões metropolitanas do país. Em março de 1998 a taxa média de desemprego

aberto já alcançava o patamar de 8,18%.5 Os acontecimentos verificados no mercado mundial

agravaram ainda mais a situação, ao levarem as autoridades econômicas a instituírem pacotes

de caráter recessivo, tais como cortes de gastos correntes e de investimentos, reajustes de

tarifas e elevação na taxa de juros que impactaram sobre o nível de emprego.

Com o aumento do desemprego, os setores que vinham absorvendo mão-de-obra, em

decorrência da modernização industrial e da modernização agrícola, começaram a perder esta

capacidade de absorção, como é o caso dos serviços.6 Este setor, que a princípio serviria como

uma espécie de amortecedor dos impactos provocados pela reestruturação produtiva e pela

globalização sobre a indústria e a agricultura, também foi alvo, com o processo de automação

informatizada, de seus efeitos.

Segundo algumas análises, esse setor, que seria o desaguadouro dos que foram demitidos da

indústria em decorrência da terceirização, também registra saldos negativos e, nos anos em

que os saldos admissões-desligamentos são positivos, o número de vagas é insuficiente para

absorver a mão-de-obra lançada no mercado pelo setor primário e secundário. Tal fato indica

que a reestruturação empresarial não está mais restrita à indústria e que, nos aspectos relativos

ao uso da mão-de-obra, já se disseminou por todos os setores da economia (BORGES;

FILGUEIRAS, 1995, p.31).

Na avaliação de Almeida (2002, p.23) esse processo se verifica para alguns segmentos do

“terciário” soteropolitano, como é o caso da administração pública, e aqueles segmentos de

serviços que conheceram acelerada inovação tecnológica e/ ou processo de privatização

importantes, como os serviços de transporte e armazenagem, de utilidade pública, creditícios e

financeiros, reparação mecânica, assim como os serviços pessoais.

Essa situação, associada ao processo de mecanização verificada na agricultura brasileira, a

concentração fundiária e a influência do mercado de terras e da especulação fundiária na

5 É considerado desemprego aberto quando as pessoas, sem ocupação, estão efetivamente procurando trabalhono período de referência da pesquisa.6 Esse processo se verifica para os segmentos dos serviços caracterizados pela precariedade do trabalho e pelainstabilidade da ocupação e não para os serviços considerados estratégicos, como por exemplo, serviços deeducação e saúde. Ver sobre este ponto, ALMEIDA (2002)

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desocupação da mão-de-obra agrícola, agravaram ainda mais a questão do emprego. No

período de implementação do Plano Real, a agricultura sentiu fortemente os impactos da

estabilização. A grande disparidade entre os preços pagos e os preços recebidos pelos

agricultores levou a redução da área plantada, com reflexos sobre os índices de preços e sobre

a geração de empregos.

Prostituição, marginalidade, violência, criminalidade, favelização e elevado número de

indigentes refletem a incapacidade dos centros urbanos de absorver mão-de-obra excedente,

lançada no mercado de trabalho. Tal situação se agrava com o fluxo migratório contínuo, na

medida em que a expropriação verificada no campo e o conseqüente movimento de êxodo

rural fazem aumentar, consideravelmente, o exército de reserva de trabalhadores na cidade.

Para o Estado da Bahia que é considerado como o que possui a maior população rural, em

termo absoluto, do país, a situação é preocupante, na medida em que a reversão do fluxo

migratório para as grandes cidades torne a capital baiana alvo do processo de aglomeração

urbana descontrolada.

O progresso ao levar à diminuição dos postos de trabalho no campo, com a substituição do

trabalhador rural pela máquina e por outras tecnologias, intensificou o fluxo migratório para

as cidades. De acordo com a PED – RMS, no ano de 98, 24% desse fluxo era composto dos

migrantes provenientes de outros estados, enquanto os 76% restantes saíram de outros

municípios do interior do Estado da Bahia. Nesta medida, faz-se necessária a criação de

mecanismos que permitam a absorção da mão-de-obra no meio rural, para que esta não

continue a pressionar o mercado de trabalho em Salvador (GHIRARDI, 1998, p.15).

Frente à perspectiva de que os centros urbanos baianos, como Salvador, possam se tornar

vítimas do processo de desestruturação do setor agrícola, levando com a exclusão e

desagregação da produção familiar, a um êxodo rural permanente, busca-se fazer uma análise

das alternativas possíveis para a criação de medidas que atuem sobre os fatores de expulsão da

população do campo, a fim de que a zona urbana baiana possa se reestruturar e assim absorver

a mão-de-obra excedente.

Nesse sentido, acredita-se que o incentivo ao desenvolvimento da agricultura familiar,

associado a um processo de reforma agrária possa conduzir ao desenvolvimento rural

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sustentável. A luta pela valorização de ambos pressupõe um trabalho de conscientização dos

trabalhadores rurais para real importância destes fatores no desenvolvimento rural local.

3.1 ÊXODO RURAL, DESEMPREGO E VIOLÊNCIA URBANA

Para se entender de que maneira o êxodo rural, desemprego e violência urbana estão

relacionados é dado continuidade ao estudo das transformações do meio rural após a

consolidação dos complexos. A partir daí, busca-se identificar a origem da prostituição,

marginalidade, violência, criminalidade, favelização e elevado número de indigentes que se

enraizou nos centros urbanos.

A formação dos complexos agroindustriais foi consolidada nos anos 70, a partir da integração

entre as indústrias para a agricultura, a agricultura moderna e as agroindústrias, mas o auge

desta integração, segundo Silva (1998b, p.163) ocorreu somente quando os interesses

agrários, industriais e financeiros se fundiram. Após este processo foram modificados os

planos da concentração e da centralização aplicados no setor agropecuário, na propriedade da

terra e no conteúdo das políticas.

Como resultado, produz-se um Estado neocorporativista onde os interesses da burguesia,

enquanto classe proprietária dos meios de produção são preservados em contrapartida a

expropriação do homem do campo. Neste aspecto, faz-se aqui, um parêntese, para esclarecer

alguma confusão quanto aos termos “corporativismo” que possui forte conotação ideológica e

o neocorporativismo. Para Silva (1998) o novo corporativismo é resultado da articulação de

interesses entre organizações públicas e privadas. Dentro desta abordagem, situa-se a noção

de complexo, o que explica o caráter excludente dos Complexos Agroindustriais no Brasil.

Nos anos 90 a evolução da concentração e da centralização de capitais, além de uma maior

integração dos segmentos modernos da agropecuária com a indústria fornecedora de insumos,

máquinas e equipamentos impactaram num processo de subordinação do trabalho ao capital.

Ao lado da proletarização do trabalho, através da expropriação dos trabalhadores que mantêm

vínculo produtivo com a terra, apresenta-se o grupo de pequenos produtores que perde

gradativamente o seu papel produtivo, tornando-se produtores familiares.

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O grupo dos pequenos produtores é caracterizado por diferentes formas. Enquanto há um

grupo pauperizado, pouco tecnificado e não integrado ao CAIs e que transformam suas terras

num simples local de moradia ou então a sua produção é utilizada apenas para o auto

consumo, existe um outro composto por agricultores familiares integrados aos complexos

agroindustriais. Dessa forma, o setor agrícola passa a estar segmentado entre produtores

integrados ou não integrados aos CAIs.

No Nordeste a grande maioria dos agricultores não está integrada aos CAIs, sendo que a

produção de uma grande parte está voltada para o auto consumo. Esta característica reforça a

necessidade de políticas agrícolas que leve em consideração as particularidades da região, a

fim de que as políticas sociais direcionadas ao desenvolvimento rural, e à manutenção de um

contingente populacional significativo no espaço rural sejam reformuladas.

Os dados do Censo Demográfico de 2000 mostram que a região Nordeste concentra o maior

número de pessoas no campo, em termos absolutos, sendo o Estado da Bahia responsável por

deter 33,0% desta população rural (Tabela 4).

Tabela 4 – População Total, Urbana e Rural 2000

Estados da Federação População Total População Urbana % População Rural %Brasil 169.799.170 137.953.559 81,25 31.845.211 18,75Norte 12.900.704 9.014.365 69,87 3.886.339 30,13Nordeste 47.741.711 32.975.425 69,87 14.766.286 30,93Bahia 13.066.764 8.761.125 67,05 4.305.639 32,95Sudeste 72.412.411 65.549.194 90,52 6.863.217 9,48Sul 25.107.616 20.321.999 80,94 4.785.617 19,06Centro-Oeste 11.636.728 10.092.976 86,73 1.543.752 13,27

Fonte: Censo Demográfico de 2000

Nesse Estado, as modificações implementadas no campo, após a década de 60 se processaram

lentamente. O assalariamento da mão-de-obra foi implantado tardiamente, em relação às

demais regiões e, inicialmente, restringiu-se às áreas de modernização agropecuária. Além do

que, a renda média dos chefes das famílias baianas é de R$ 190,00 na zona rural, situando-se

bem abaixo do valor socialmente necessário para a sobrevivência (Tabela 5).

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Tabela 5 – Rendimento Médio Mensal dos Responsáveis

pelo Domicílio 2000

Estados da Federação Renda Média - R$ Urbana RuralBrasil 769,00 854,00 328,00Norte 577,00 663,00 335,00Nordeste 448,00 549,00 186,00Bahia 480,00 574,00 190,00Sudeste 945,00 993,00 428,00Sul 796,00 868,00 463,00Centro-Oeste 856,00 904,00 518,00

Fonte: Censo Demográfico de 2000

O baixo rendimento é atribuído à estrutura fundiária concentrada nas mãos de poucos

proprietários que possuem grandes extensões de terra, em contraposição a uma infinidade de

minifúndios que ainda mantém uma agropecuária com características predominantemente

rural. É interessante ressaltar que os investimentos agroindustriais, a modernização agrícola,

ocorridos nas décadas de 70 e 80, e a ampliação da fronteira agrícola, não contribuíram para a

reversão dos indicadores socioeconômicos que dimensionam a renda gerada pelas famílias e o

desemprego rural (RIBEIRO, 2004, p. 372)

Essa característica leva ao que Silva (1998b, p.167) chamou de “purificação” das relações de

trabalho assalariadas através da expropriação dos trabalhadores que ainda mantêm vínculo

produtivo com a terra. Para ele (ibidem)

A “purificação” das relações de trabalho, na medida em que elimina ospagamentos não-monetários da força de trabalho – tais como casa demoradia, lenha e acesso a uma horta para produção doméstica -, libera otrabalhador dos vínculos com a terra como forma de garantir, ao menosparcialmente, a sua subsistência, mas também reduz o tempo em que otrabalhador rural está ocupado nas atividades agrícolas ao seu tempo detrabalho. O tempo em que ele se dedicava àquelas outras atividades quecomplementavam sua subsistência transforma-se agora em tempo de não-trabalho – em desemprego ou subemprego do ponto de vista do trabalhadorassalariado. E, dado que o espaço agrário é um espaço privado, só lhe restao refúgio nas periferias das cidades, como bóia-fria.

O fato da reforma agrária e a reestruturação fundiária não se concretizarem no bojo da

modernização contribuiu para que a grande maioria dos produtores não integrados aos CAIs

estivesse condenada à produção para o autoconsumo, ou ainda, abandonassem a sua vida no

campo e fossem “tentá-la” na cidade.

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Na Bahia, de acordo com os dados contidos na tabelas 6, observa-se que houve uma expansão

no número de pessoas residindo na cidade. Os dados do Censo Demográfico de 2000

registram que 67,0% dos baianos vivem na zona urbana, apesar do elevado número de

habitantes na zona rural. Ainda, segundo as informações, os fluxos migratórios significativos

da zona rural para os centros urbanos são provenientes da própria região, e no plano inter-

regional a Região Metropolitana de Salvador (RMS) e o Extremo Sul foram às regiões que

receberam os maiores fluxos populacionais.

Tabela 6 – População Total, Urbana e Rural Bahia – 1980, 1981, 1996 e 2000

Anos População Total População Urbana % População Rural %1980 9.454.346 4.660.304 49,29 4.794.042 50,711991 11.867.991 7.016.770 59,12 4.851.221 40,881996 12.541.675 7.826.834 62,41 4.714.832 37,592000 13.066.764 8.761.125 67,05 4.305.639 32,95

Fonte: Censo Demográfico de 1980/91, Contagem de 96, Censo 2000 (resultados preliminares)

Levando-se em consideração o índice de analfabetismo na zona rural, tem-se que esse fluxo é

composto, em grande parte, por pessoas com um nível de qualificação precário. Os dados da

tabela 7 estão em conformidade com esta observação, já que em todas as regiões analisadas o

analfabetismo ainda persiste na zona rural com taxas elevadas.

Tabela 7 – Taxa de Analfabetismo de Pessoas de 15 anos

e mais - 1999

Brasil Pessoas de 15 anos e maisGrandes Regiões Total Urbana Rural

Brasil 13,3 9,7 29,0Norte 11,6 11,6 ---Nordeste 26,6 19,1 41,0Bahia 24,7 15,8 40,2RMS 7,6 7,1 20,9Sudeste 7,8 6,4 19,4Sul 7,8 6,5 12,4Centro-Oeste 10,8 9,1 18,9

Fonte: PNAD/1999, IBGE.

A inconsistência do sistema educacional na zona rural atinge a RMS na medida em que a

mão-obra originária do campo pressiona o mercado de trabalho dos centros urbanos. De

acordo com as pesquisas que medem a evolução do nível de emprego, a Região Metropolitana

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de Salvador mantém uma taxa de desemprego bastante elevada. No que diz respeito à

Pesquisa Mensal de Emprego (PME/IBGE) o número de pessoas buscando se inserir no

mercado de trabalho sofreu um acréscimo de 18,4% na RMS no mês de fevereiro de 2004,

comparado ao mesmo mês do ano anterior. No confronto com igual período do ano passado a

taxa de desocupação de Salvador passou de 16,2% para 17,1%.

Ao analisar o comportamento do mercado de trabalho da RMS para a primeira metade da

década de 90, verificava-se uma tendência a precarização do trabalho e da ocupação, pois

houve um aumento do número de empregados sem carteira assinada. Este período, para efeito

de estudo, pode ser dividido em duas fases. A primeira (90/92) compreende a queda do nível

de atividade econômica em decorrência da política recessiva do Plano Collor, e a segunda

(93/95) à implantação do Plano Real.

Na primeira fase, o rendimento médio do total de pessoal ocupado, que compreende os

empregados com carteira assinada, por conta própria e os sem carteira assinada, sofre uma

redução acentuada, embora as duas últimas categorias de ocupação tenham elevado o seu

número de integrantes. Já na segunda fase, a massa de rendimento do total do pessoal ocupado

tem um pequeno aumento em virtude dos empregados por conta própria e os sem carteira

aumentaram os seus rendimentos (BORGES; FILGUEIRAS, 1995, p.33).

A Pesquisa de Emprego e Desemprego na RMS (PED/RMS) realizada pela Superintendência

de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEI), autarquia vinculada a SEPLANTEC e

SETRAS, órgãos do governo do Estado, pela Faculdade de Ciências Econômicas/UFBA e

pela Fundação SEADE e DIEESE em 2002, utilizando-se de uma outra metodologia, já

revelava, com uma taxa de 27,3%, que se trata de uma região com altos e crescentes níveis de

desemprego. No que diz respeito ao comportamento desta taxa em relação ao ano de 1997,

têm-se que ela variou em 26,4% no total de desempregados, passando de 292 mil pessoas

neste ano para 440 mil em 2002, tendo o desemprego aberto apresentado uma ampliação de

31,5% e o oculto 19,6%, conforme pode ser observado na tabela 8.7

7 Desemprego oculto se caracteriza quando as pessoas realizam ocasionalmente algum tipo de trabalho (trabalhoprecário) ou pessoas que não possuem trabalho e nem procuram (por desalento).

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Tabela 8 – Taxas de Desemprego segundo Tipo de Desemprego

Região Metropolitana de Salvador 1997 - 2002

Tipo de Desemprego Anos Variações Relativas (%) 1997 2002 2002/1997Total 21,6 27,3 26,4 Aberto 12,4 16,3 31,5 Oculto 9,2 11,0 19,6 Pelo Trabalho Precário 6,0 7,8 30,0 Pelo Desalento 3,2 3,2 0,0

Fonte: Pesquisa de Emprego e Desemprego – PED RMS – SEI/SETRAS/UFBA/DIEESE/SEADE.

Apesar do crescimento da População Economicamente Ativa (PEA), composta por pessoas

ocupadas e desempregadas, tenha, em parte, decorrido do aumento da ocupação, a sua maior

parcela é representada pelo crescimento do desemprego. Este tem sido ampliado com o

significativo fluxo migratório para os centros urbanos.

Em termos absolutos o número de pessoas desempregadas se elevou em 14.000, apesar da

ampliação no número de ocupações. De acordo com a tabela 9 abaixo, a variação relativa no

número de desempregados em 2002, comparado ao ano de 1997, alcançou 50,7%, segundo os

dados da PED/RMS. Esse quadro retrata o “leque” de problemas sociais advindos das

transformações estruturais do capitalismo como modelo de gestão da economia brasileira a

partir de 1990, período em que a abertura da economia, associada ao processo de

reestruturação produtiva levou a destruição maciça de empregos formais.

Tabela 9 – Estimativas Anuais Médias da População em Idade Ativa e da População

Economicamente Ativa, segundo Condição de Atividade 1997 - 2002

Condições de Atividades Estimativas (em 1.000 Pessoas)VariaçõesRelativas

1997 2002 202/1997População em Idade Ativa 2.260 2.589 14,6População Economicamente Ativa 1.354 1.611 19,0Ocupados 1.061 1.171 10,4Desempregados 292 440 50,7 Em Desemprego Aberto 168 263 56,4 Em Desemprego Oculto 125 177 42,3Inativos 906 978 7,9

Fonte: Pesquisa de Emprego e Desemprego – PED RMS – SEI/SETRAS/UFBA/DIEESE/SEADE.

Em face à dificuldade de incorporação de novos contingentes de trabalhadores foi elevada a

parcela da população em extrema situação de pobreza e à desigualdade econômica e social,

resultando na ampliação dos índices de criminalidade e violência na sociedade. O

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agravamento nos indicadores sociais é mais ostensivo nas Regiões Metropolitanas, em função

da pobreza urbana ser maior do que a média do país. Proliferação de favelas, pessoas vivendo

em condições de indigência, violência e epidemias são as variáveis que compõem o cenário

dos grandes centros urbanos.

No quesito da violência, as pesquisas realizadas por diferentes instituições como o Ministério

da Saúde, através do Datasus, Fundação SEADE, IBGE, Núcleo de Estudos da Violência

(USP), etc, tem constatado uma elevação nas taxas de homicídios. De acordo com Baptista

(2001, p.33) a violência está concentrada nas áreas urbanas e regiões metropolitanas. Entre os

anos de 1980 e 1998, houve um crescimento de mortes por homicídios ou agressões violentas

em 262,8%. Este crescimento traz questionamentos sobre a eficácia das políticas sociais

desenvolvidas no país.

Na Bahia, o crescimento da criminalidade também se faz presente na vida dos baianos,

embora em menor intensidade se comparada as regiões Sul e Sudeste e até mesmo em alguns

Estados do Nordeste, como Pernambuco e Alagoas. Na observação da tabela 10, verifica-se

que a taxa geométrica de crescimento anual do número total de óbitos por homicídios é de

1,59% a.a., sendo que na faixa de pessoas entre 15 e 24 anos, parcela mais afetada pela

violência, a taxa é de 1,95%, enquanto no Brasil as taxas são de 4,25% e 4,74%, para as

mesmas categorias (ibidem).

Tabela 10 – Número de óbitos por homicídios e taxa de óbitos

Bahia, 1989 - 1998

Anos Bahia Brasil Total 15 - 24 Total 15 – 24

1989 1085 380 28757 100221990 869 296 31989 109541991 586 171 30566 100361992 825 259 28387 91811993 1504 572 30586 101731994 1743 671 32603 113301995 1533 535 37128 126031996 1580 697 38888 131861997 1975 777 40514 142711998 1251 452 41836 15201

V ar. (%) 1,59 1,95 4,25 4,74Fonte: CID - BR

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No que diz respeito a RMS, de acordo com o relatório sobre crimes de homicídio (RIBEIRO

apud BAPTISTA, 2001, p.34) entre 1996 a 1999 ocorreram 3.369 assassinatos na cidade de

Salvador, nos bairros que possuem em comuns características básicas como a pobreza e

superpopulação.

Apesar da escassez de dados na literatura especializada sobre uma correlação dos níveis de

desemprego e violência na RMS, segundo Baptista alguns estudos efetuados sobre o Brasil, já

trazem essa importante contribuição. Neste aspecto, a perspectiva é a de que as políticas

sociais possam produzir impactos positivos sobre as variáveis de cunho sócio-econômico,

como taxas de desemprego e rendimento.

3.2 CENÁRIO

Ante a falta de infra-estrutura social básica e a insatisfatória política de geração de empregos,

os migrantes da zona rural continuarão provocando o “inchaço” nas regiões metropolitanas.

Com a forte crise no emprego urbano, caracterizada pela eliminação de postos de trabalho e

diminuição dos salários reais, há uma tendência ao agravamento dos indicadores sociais.

O intenso processo de evasão populacional verificado no espaço rural nordestino, durante a

década de 1990, produziu um declínio no grau de ruralização da população regional de 0,39

em 1991 para 0,31 em 2000. No caso da Bahia, a redução absoluta da população rural atingiu

546 mil pessoas (FIGUEIREDO; TARGINO; MOREIRA, 2003, p.3)

Para Figueiredo, Targino e Moreira (ibidem) ao se observar as taxas de crescimento da

população rural dos estados é possível classificá-los em estados de forte, média ou baixa

evasão. De acordo com a tabela 11, a perda de população rural se verificou na maioria dos

estados nordestinos, embora com ritmo e intensidade diferenciados. O estado baiano

apresentou para o período de 1991 a 2000, uma taxa de decréscimo populacional de 1,32%

a.a., fazendo parte do grupo dos estados de média evasão.

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Tabela 11 – Nordeste, evolução e taxas de crescimento da população, segundo os estados

(1991 – 2000)

Estados 1991 2000 Taxas de crescimento média anual Total Rural Total Rural Total RuralMA 4.930.253 2.957.832 5.638.381 2.282.804 1,50 -2,84PI 2.582.137 1.214.953 2.840.969 1.053.922 1,07 -1,57CE 6.366.647 2.204.640 7.417.402 2.113.661 1,71 -0,47RN 2.415.567 746.300 2.770.730 740.145 1,54 -0,09PA 3.201.114 1.149.048 3.436.718 995.085 0,79 -1,59PE 7.127.855 2.076.201 7.910.992 1.858.850 1,16 -1,22AL 2.514.100 1.032.067 2.817.903 900.515 1,28 -1,50SE 1.491.876 488.918 1.779.522 509.093 1,98 0,45BA 11.866.991 4.851.221 13.066.764 4.305.639 1,08 -1,32NO 42.496.540 16.721.180 47.679.381 14.759.714 1,29 -1,38

Fonte: FIBGE. Censos Demográficos de 1991 e 2000

Fatores como o aumento da concentração fundiária, expansão de lavouras mecanizadas, a

exemplo do cultivo de soja nos cerrados baianos, crescimento da pecuária extensiva na região

semi-árida, bem como a ocorrência de duas secas nos anos de 93 e entre o ano de 98 e 99,

entre outras causas, justificam a forte evasão verificada em alguns Estados nordestinos na

década de 90.

Em contrapartida ao esvaziamento na zona rural nordestina ocorrido na década de 90, a zona

urbana amplia o seu contingente populacional. Um aspecto que chama à atenção é o fato da

expansão urbana ser explicada a partir da absorção de parte dos fluxos de origem rural da

própria região (FIGUEIREDO; TARGINO; MOREIRA, 2003, p.4-8).

Esse crescimento ao se dar de forma desordenada remete para a questão do aumento da

violência urbana. Nesse sentido, tem-se que:

A “questão agrária” tornou-se, em boa medida, uma “questão urbana”. A“modernização conservadora”, caminho definido politicamente para odesenvolvimento do capitalismo na agricultura brasileira e que implicou emconcentração da terra, da riqueza e da renda, contribuiu decisivamente parao que se convencionou chamar de dívida social do país: a favelização dascidades, o crescimento da prostituição e da criminalidade em geral, oaumento assustador do número de meninos-de-rua e da sua parceladizimada através das mais variadas formas de violência (FILGUEIRAS,1992, p.23).

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De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, a violência aumentou

nos últimos anos. Entre 1980 e 2000, 598.367 pessoas foram vítimas de homicídios no Brasil,

sendo que dois terços deles se concentraram na década de 90. De 1991 a 2000, as taxas de

mortalidade por homicídios decorrentes do uso de armas de fogo praticadas por homens de 15

a 24 anos aumentaram em 95%.

Ainda segundo as informações do IBGE, as maiores taxas de mortalidade por homicídio com

armas de fogo em jovens do sexo masculino de 15 a 24 anos para um número de 100 mil

habitantes são do Rio de Janeiro, Pernambuco, Espírito Santo e São Paulo. Embora a Bahia

não apareça na relação dos maiores Estados com mortalidade por homicídio na condição

informada, verifica-se que essa taxa aumentou entre os baianos de 6,4% em 1991 para 21,0%

em 2000.

Esse comportamento ascendente da violência na Bahia desenha um cenário pouco otimista

para este Estado, na medida em que a RMS apresente taxas de desocupação superiores a das

Regiões Metropolitanas abrangidas pela pesquisa do IBGE, como a de 16,68% exibida por

esta região, para o período de março a dezembro de 2003. A intensificação das dificuldades de

inserção dos trabalhadores baianos no mercado de trabalho urbano regional, principalmente

para aquelas pessoas menos qualificadas, provenientes da zona rural, poderá ser considerado

como o principal fator para proliferação da violência nesta localidade.

Além do mais, segundo o estudo dos pesquisadores Rafael Guerreiro Osório e Marcelo

Medeiros, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), e publicado pela

Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia, a proporção de pobres no

Estado baiano permanece inalterada há 20 anos, a despeito dos bons resultados verificados em

boa parte do Nordeste. Na hipótese desta tendência ser mantida, acredita-se que a Bahia pode

se transformar no Estado mais pobre do Brasil (KELLY; FARIAS, 2003). Com esta

perspectiva, há o temor que o índice de violência na RMS assuma nos próximos anos

proporções alarmantes.

Nesse aspecto, defende-se medidas alternativas para evitar o “inchaço” na RMS e

conseqüentemente amenizar a violência, semelhante à linha de pensamento levantada por

Silva, onde relaciona a miséria e a fome no semi-árido do Nordeste do país à violência nas

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grandes metrópoles e enfatiza a necessidade de se criar oportunidades de trabalho na área de

expulsão da mão-de-obra. Assim, caso haja um desestímulo à proliferação do êxodo rural,

acredita-se que os problemas sociais que afligem a RMS possam ser melhor administrados.

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4 O DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTÁVEL PARA A RMS

Antes de iniciar o estudo do desenvolvimento rural sustentável é importante esclarecer que

este não postula a preservação da natureza em seu estado original. A idéia é defender um

processo em que as mudanças implementadas no campo, além de possibilitar o convívio

humano, minimizem os impactos negativos, sejam eles sociais, econômicos ou ambientais.

Para melhor compreensão da proposta do trabalho, conceitua-se este desenvolvimento no

campo, de forma exaustiva, a fim de que as dúvidas quanto a sua similaridade com o

desenvolvimento agrícola seja exaurida.

Identificar o desenvolvimento rural com o agrícola, além de restringir a análise do mundo

rural, incorre no erro de negar a necessidade de políticas sociais compensatórias direcionadas

para atender os excluídos do processo de modernização da agricultura. Além do que é fato

indubitável que o problema do atraso da agricultura brasileira já está resolvido.

A análise do desenvolvimento rural sustentável é feita no âmbito da discussão em torno da

agricultura familiar e da reforma agrária. Esta não é abordada no sentido econômico, como

por exemplo, aumentar a produção agrícola e combater a inflação, pois se entende que a

estrutura de produção agrícola no país, montada pela “modernização conservadora” já

resolveu o “gargalo” presente nesse setor. No mesmo sentido, Almeida (1987, p.9) defende

que a reforma agrária não é mais necessária para destruir as relações de produção “semi-

feudais” e subordinar a agricultura aos interesses da grande indústria. Neste aspecto, a

discussão da sua viabilidade é feita apresentando-a como resposta aos problemas

essencialmente sociais.

Os programas de combate à pobreza rural não podem mais ter comoreferência apenas reinserir populações marginalizadas pela modernizaçãoexcludente da nossa agropecuária em outras atividades produtivas –algumas ditas “alternativas” – no âmbito do próprio mundo rural, ignorandoo forte processo de urbanização a que ele está submetido. É preciso ampliara velha noção de setor agropecuário para além das atividades produtivastradicionais (como cultivos e criação de animais) e incluir no espaço agrárioa produção de “serviços” (tais como lazer, turismo, preservação do meioambiente, etc.) e de bens não-agrícolas, como moradia, transporte,artesanato, incluídas aí também novas formas modernas de trabalho adomicílio que permitam absorver parte da força de trabalho das mulheres edos idosos (SILVA, 1998b, p.184).

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Nesse sentido, a análise do desenvolvimento sustentável para a RMS seguindo a premissa de

que a modernização da agricultura trouxe elevados níveis de pobreza, coloca em pauta uma

discussão sobre as alternativas viáveis para amenizar as distorções sociais causadas por este

processo. Entende-se que o esvaziamento do campo e, conseqüentemente, o inchaço nas

cidades, responsável em última análise, pelo agravamento do desemprego e da violência,

representa o outro lado da moeda da introdução do capital no campo. A explanação é feita

sobre o prisma do processo histórico da Reforma Agrária e das transformações recentes

ocorridas no campo baiano que levaram a configuração de um novo mundo rural.

No que diz respeito à Reforma Agrária tem-se que se trata de um movimento social

impulsionado pela luta dos trabalhadores rurais pela posse da terra. Esse embate contra uma

estrutura agrária e fundiária moldada desde os tempos da República Velha onde se privilegia

o grande latifundiário continua fazendo parte dos impasses e tensões geradas pela emergência

de relações sociais no país.

A Reforma Agrária é identificada, atualmente, como uma alternativa capaz de promover, ao

menos parcialmente, a inclusão social e ao mesmo tempo transformar trabalhadores rurais em

agricultores rurais. Assim é que, em resposta às reivindicações dos movimentos sociais

atuantes no meio rural, e na perspectiva de se construir um Programa de Desenvolvimento

Rural Sustentável, implementa-se, em 1995, o Programa Nacional de Fortalecimento da

Agricultura Familiar (PRONAF).

Esse programa passou a estar associado ao de Reforma Agrária, pois na avaliação de Alves

Filho e Salcides (2002) a reforma agrária é uma “fábrica” de agricultores familiares, portanto

havia necessidade de articular as ações desses respectivos programas. Neste sentido, no ano

de 1999, o governo federal unificou os programas de crédito com a extinção do Programa de

Crédito Especial para as Áreas da Reforma Agrária (PROCERA) e criou a linha “PRONAF

A”, no âmbito do crédito PRONAF, destinado aos novos assentados da reforma agrária. No

mesmo ano, esses programas foram reunidos sob a direção do recém criado Ministério do

Desenvolvimento Agrário (MDA).

Apesar dos avanços verificados na institucionalização de políticas de combate aos graves

problemas associados à pobreza rural que atinge grande parte do interior do país, ainda não se

alcançou o grau de dinamização, desenvolvimento social e econômico desejado no meio rural.

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No século XXI, os desafios impostos para viabilizar um desenvolvimento rural sustentável

conduzem a “novos olhares” sobre o campo, através da reformulação do discurso sobre a

Reforma Agrária e da valorização da agricultura familiar.

Nesse contexto, tem surgido, em todo o mundo, muitas discussões arespeito das novas funções do meio rural (ainda que alguns insistam em sereferir apenas à agricultura), como a proteção ambiental, turismo rural, olazer, a moradia e a produção de bens e serviços não-agrícolas. Esse novocontexto requer institucionalidade, mais adequada à agilidade com que osdesafios se apresentam cotidianamente para a agricultura familiar: seja nomundo desenvolvido, seja nos países em desenvolvimento (ALVES FILHO;SALCIDES, 2002, p.5).

Pressupondo que o fortalecimento da agricultura familiar pode contribuir para o resgate social

e a geração de emprego e renda, defende-se a mobilização e a articulação dos atores sociais

nas ações voltadas para o alcance do desenvolvimento rural sustentável, a fim de garantir

maior eficiência e eficácia às políticas públicas implementadas pelos governos federal e

estadual.

As cooperativas de crédito de agricultores familiares, as associações de produtores

responsáveis pela compra e venda conjunta de seus produtos, a iniciativa dos agricultores em

negociar com o poder público local e com instituições bancárias a fim de garantir fundo de

aval, que viabilize o acesso ao financiamento, e o crescimento das atividades não-agrícolas

representam uma reação ao processo de exclusão e degradação da agricultura familiar

(ORTEGA; CARDOSO, 1998, p.266).

Embora essas ações sejam importantes para garantir a sobrevivência desse segmento social,

não se pode atribuí-las, inteiramente, a responsabilidade pela resolução do problema de

exclusão social. Além do mais, no caso de muitas das atividades não-agrícolas, o crescimento

registrado ocorre com baixa remuneração e relações de trabalho precárias, como a de

vendedor ambulante, servente de pedreiro e faxineiro, etc.

Salienta-se que a criação do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável

(CNDRS) no final do século XX e, por conseguinte a implantação de programas semelhantes

nos Estados e Municípios se constituiu num passo importante para o resgate da agricultura

familiar, marginalizada pela política de modernização conservadora da agricultura brasileira

nas últimas décadas.

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Assim, a viabilidade do estudo está em investigar as conseqüências, sob o aspecto social, do

desenvolvimento rural sustentável para Região Metropolitana de Salvador (RMS), que por

possuir a capital do Estado da Bahia apresenta características particulares, como a de se

destacar por ser a região econômica mais populosa e densamente povoada, apesar de ser a

menor em termo de área. Esta região está localizada num Estado onde ao mesmo tempo em

que se observa uma agricultura familiar, de subsistência, pouco rentável e dependente dos

fatores naturais, têm-se uma agricultura especializada, como a produção de grãos em

Barreiras no Oeste.

A RMS é composta de 10 municípios: Camaçari, Candeias, Dias D’ Ávila, Itaparica, Lauro de

Freitas, Madre de Deus, Salvador, São Francisco do Conde, Simões Filho e Vera Cruz.

Analisando-se os períodos de 1980-1991 e 1991-2000, época em que se realizaram os últimos

Censos Demográficos do IBGE, percebe-se que a maioria destas unidades apresentou a

mesma tendência quanto aos movimentos migratórios8 (SEI, 2003).

Da observação da tabela 12, constata-se que o ritmo de crescimento demográfico no segundo

período foi arrefecido, passando de uma taxa de 3,19% para 2,14% ao ano.9 Leva-se aqui, em

consideração, que houve uma redução da fecundidade após melhoramento das técnicas de

prevenção. Entretanto, esta taxa ainda sinaliza para a persistência de ganhos migratórios ou

imigração líquida.

8 O conceito de migratório diz respeito ao saldo entre o movimento de imigração e emigração.9 O ritmo de crescimento demográfico é resultado da combinação do crescimento vegetativo (fecundidade-mortalidade) com o crescimento migratório. Ver respeito Dias (2003)

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Tabela 12 - População Residente Total e Taxa Média Geométrica de Crescimento Anual,

Por Ordem Decrescente. Bahia – Regiões Metropolitanas de Salvador, 2000

Taxa Média GeométricaCrescimento/ População de Crescimento Anual (%)Municípios 1980(1) 1991 2000 1980/1991 1991/2000Lauro de Freitas 35.309 69.270 113.543 6,32 5,64Dias D'Ávila 19.395 31.260 45.333 4,43 4,22Camaçari 69.783 113.639 161.727 4,53 4,00Vera Cruz 13.743 22.136 29.750 4,43 3,34Madre de Deus 8.296 9.183 12.036 0,93 3,05São Francisco do Conde 17.835 20.238 26.282 1,16 2,95Simões Filho 43.578 72.526 94.066 4,74 2,93Itaparica 10.877 15.055 18.945 3,00 2,59Salvador 1.493.685 2.075.273 2.443.107 3,03 1,83Candeias 54.081 67.941 76.783 2,10 1,37Total 1.766.582 2.496.521 3.021.572 3,19 2,14

Fonte: IBGE, Censos Demográficos de 1980, 1991 e 2000, apud Dinâmica Sóciodemográfica da Bahia: 1980 – 2000 (SEI, 2003).

(1) A população dos municípios criados após 1980 e dos que perderam área para estes novos municípios foi ajustada para os limites

municipais de 1991, usando-se a tabela de comparatividade dos setores censitários, do próprio IBGE.

Os municípios que apresentaram os maiores ritmos de crescimento demográfico foram Lauro

de Freitas, Dias D’Ávila e Camaçari. Parte deste crescimento está relacionada as alterações de

limites que ocasionaram avanços das áreas urbanas sobre as rurais. No período de 1991-2000

apenas Salvador e Candeias exibiram taxas de crescimento médio anual dentro do limite

previsto para o crescimento vegetativo, levando a situação de equilíbrio entre os movimentos

migratórios.

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1991/2000

1980/1991

Sem perdas ou ganhos líquidos

Im igração líquida

Em igração líquida

Perdas absolutas < 0 < 0

0,00 a 1,49 0,00 a 0,99

1,50 a 2,49 1,00 a 1,99

> 2,50 > 2,00

FAIXAS DE CRESCIM ENTO M ÉDIO ANUAL (a.a. % )

1980/1991 1991/2000

Fonte: IBG E. Censos Dem ográficos de 1991e 2000

M UNICÍPIOS POR TAXA DE CRESCIM ENTO DEM OG RÁFICO DA PO PULAÇÃO TOTAL

Bahia - Região M etropolitana de Salvador, 1980/2000

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A maioria dos municípios periféricos apresentou crescimento na última década, embora com

tendência declinante, com exceção de Madre de Deus e São Francisco do Conde que

apresentaram ganhos demográficos por imigração.

Quanto à evolução da população urbana, observa-se, através da tabela 13, que houve uma

tendência generalizada entre os municípios de redução dos volumes dos saldos migratórios

para o segundo período, com exceção de Lauro de Freitas e Simões Filho, onde a área urbana

ultrapassou o perímetro de 1991, penetrando na zona rural e Madre de Deus que foi criado

após o Censo Demográfico de 1980.10

Tabela 13 - População Residente Urbana e Taxa Média Geométrica de Crescimento

Anual, por ordem decrescente em 2000. Bahia – Região Metropolitana de Salvador,

1980 - 2000

Taxa Média GeométricaCrescimento/ População de Crescimento Anual (%)Municípios 1980(1) 1991 2000 1980/1991 1991/2000Lauro de Freitas 23388 44374 108385 5,99 10,43Simões Filho 25592 44419 76905 5,14 6,29Dias D’Ávila 15652 29478 42673 5,92 4,20Camaçari 60413 108232 154402 5,44 4,03São Francisco do Conde 7067 15734 21870 7,55 3,73Vera Cruz 12026 20308 27872 4,88 3,58Madre de Deus 7946 8792 11599 0,92 3,13Itaparica 10360 15055 18945 3,46 2,59Salvador 1491642 2073510 2442102 3,04 1,83Candeias 42232 61438 69127 3,47 1,32Total 1696318 2421340 2973880 3,29 2,31

Fonte: IBGE, Censos Demográficos de 1980, 1991 e 2000, apud Dinâmica Sóciodemográfica da Bahia: 1980 – 2000 (SEI, 2003).

(1) A população dos municípios criados após 1980 e dos que perderam área para estes novos municípios foi ajustada para os limites

municipais de 1991, usando-se a tabela de comparatividade dos setores censitários, do próprio IBGE.

Em que pese a observação feita por Guimarães em seu artigo “A insustentável leveza da

urbanização e do êxodo rural da Bahia” sobre a problemática das análises que não levam em

consideração os diversos problemas de ordem metodológica concernentes à maneira de

classificar, contar e divulgar as estatísticas demográficas, a dinâmica social ora apresentada

está focada na causa da migração dos baianos que deixaram o seu município de origem de

acordo com os critérios utilizados pelo IBGE. Essas normas dizem respeito à migração de

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data fixa, onde se questiona o lugar de residência há cinco anos antes da data de referência da

pesquisa.

Segundo Albuquerque (apud IBGE, 2004) ao se comparar o lugar de residência em uma data

fixa anterior, cinco anos, com o lugar de residência atual é possível obter um indicador do

fluxo migratório. Aquele indivíduo que cinco anos antes da data de referência do censo

possuía um local de residência diferente do atual, é considerado migrante, sendo emigrante

em relação ao local de origem e imigrante para o lugar de destino. Dessa forma, o conceito de

migrante utilizado nesse trabalho segue a mesma definição adotada pelo IBGE.

Amaral e Nogueira (apud LOPES, 2003, p.100) apoiados na pesquisa de Eunice Durhan

atribuem que:

A migração, colocada como saída viável, não se constitui fenômenoesporádico desencadeado pelas adversidades da natureza, caracterizadas comosecas ou enchentes. A pesquisa desenvolvida por Durhan ressalta suaincidência ‘como resposta a condições normais de existência’, e com issodemonstra principalmente as desventuras da vida rural, de pobreza contínua,como fator expulsivo destes migrantes.

Dessa forma, chama-se atenção para um processo migratório resultante da expulsão do

homem do campo que se vendo desprovido dos meios de produção abandona a sua terra natal

tentando fugir da condição de pobreza em que estão relegados. Não sendo, portanto, alvo do

trabalho a discussão sobre os limites do rural e urbano, uma vez que, não se levando em

consideração às modificações verificadas nos perímetros urbanos, corre-se o risco de se obter

conclusões inconsistentes.

As alterações na Lei de Perímetro Urbano que é feita sob o arbítrio dos poderes públicos

municipais, sem levar em conta os aspectos geográficos, sociais, econômicos ou culturais, e o

processo de criação de novos distritos, a partir de povoados, contribui para uma “ilusão

estatística”. Ao contabilizar um expressivo contingente de moradores anteriormente

recenseados nas áreas rurais como urbanizados, superestima-se a população urbana e se

subestima a rural (GUIMARÃES, 2002).

10 O instrumento que define a área urbana do município é a Lei do Perímetro Urbano e este indica o limite oficialentre as áreas urbanas e rurais. Ver a respeito (IBGE apud GUIMARÃES, 2002).

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Além do mais, conforme avaliação de Silva (apud GUIMARÃES, 2002, p.182) “o rural é

apenas um corte espacial, de natureza geográfica, que nada define em termos de atividades

econômicas”, podendo ser realizadas tanto atividades agrícolas como não-agrícolas. Dessa

forma, a discussão feita neste capítulo gira em torno das alternativas viáveis para incentivar os

moradores da zona rural a permanecerem no seu hábitat natural.

4.1 O DEBATE EM TORNO DA REFORMA AGRÁRIA

No que se refere à reforma agrária tem-se que esta tem assumido, historicamente, diferentes

significados, conforme o contexto em que se insere, e as forças sociais que a protagonizam

como uma bandeira de luta. Estas concepções vão desde medidas necessárias para promover o

desenvolvimento econômico-industrial, mecanismos necessários para uma melhor

distribuição de renda, uma primeira etapa para construção de um novo modelo político e, por

fim, políticas sociais compensatórias, no sentido de amenizar os efeitos provocados pelas

mudanças estruturais e conjunturais nos planos internacional e nacional ocorridas nos últimos

30 anos.

Nos anos 50/60, o debate sobre a Reforma Agrária situava-se em torno da questão do

subdesenvolvimento. Nesse período, defrontavam-se, basicamente, três concepções de

Reforma Agrária: a dos comunistas, que a viam como uma das etapas da revolução

democrática burguesa destinada a eliminar os traços de feudalismo; a dos nacional-

desenvolvimentistas, que a viam como impulsionadora do desenvolvimento autônomo do

país, por criar um mercado interno capaz de sustentar o processo de industrialização, além de

aumentar a produção agrícola a fim de garantir o abastecimento urbano e de gerar divisas via

agroexportação; e a das Ligas Camponesas, que viam a Reforma Agrária como a garantia da

cidadania para o trabalhador rural e uma etapa para a construção do socialismo

(ALETEJANO, 1996, p.19).

Nos períodos subseqüentes, o avanço da industrialização e a diversificação crescente do

parque industrial não permitiram que o tema do debate permanecesse em torno da superação

do atraso em que o país e a agricultura se encontravam. Os discursos foram reformulados e a

questão central passou a ser a necessidade de se apontar reformas estruturais de combate à

pobreza nos países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento. Apesar dos grandes avanços

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verificados no contexto econômico-produtivo, o crescimento da concentração fundiária e da

renda, o aumento expressivo da miséria, do desemprego e do subemprego provocou um

agravamento dos problemas sociais.

Atualmente, discute-se sobre até que ponto a reforma agrária pode contribuir para ocupar a

mão-de-obra rural, possibilitando amenizar o problema do desemprego que aflige os centros

urbanos. Esse questionamento faz parte do debate atual que se estabelece entre alguns autores

e estudiosos, entre eles, José Graziano da Silva, Wilson Cano e João Pedro Stédile, em torno

da reforma agrária, como forma de amortizar os efeitos sociais provocados pelas mudanças

tecnológicas. O primeiro trata a reforma agrária como uma política social compensatória; o

segundo a defende como uma política distributiva, que além de sustentar a retomada do

crescimento econômico do país, garante a segurança alimentar da população; e, o último,

considera a reforma agrária como uma política voltada para a transformação do modelo de

desenvolvimento vigente, no sentido de direcioná-lo para um projeto socialista. 11

Dentre essas abordagens, a concepção de reforma agrária aqui considerada é a de uma política

social compensatória, voltada para garantir condições de vida àqueles que foram excluídos do

processo de modernização conservadora da agricultura. A opção por esta abordagem está no

fato de se acreditar que o processo de modernização da agricultura seja irreversível, fato este,

que cria a necessidade de políticas sociais compensatórias as quais possibilitem amenizar os

seus efeitos.

Nos últimos 30 anos, o país cresceu economicamente com o processo de modernização da

agricultura, entretanto, este processo implicou no aumento do desemprego e do êxodo rural. O

desemprego crescente provoca uma onda de violência e de ocupações em todo o país. Essa

situação denota uma grande insatisfação por parte da sociedade e, em última análise, um

reflexo da má distribuição de renda.

Nas palavras de Silva (apud ALENTEJANO, 1996, p.23) defende-se:

11 A primeira posição é defendida por Graziano da Silva, Binswanger e De Janvry; a segunda, tem emAbramovay e Carvalho Fº (1994), Veiga (1991) além de Cano (1994) seus principais defensores; e a terceirapode ser encontrada tanto em Stédile (1993 e 1994) como em D’ Incao (1990 e 1994), Gemer (1989, 1990 e1994) e Leite (1992).

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(...) uma reforma agrária que garanta pelo menos casa e comida à populaçãoque não tem mais possibilidade de ser absorvida produtivamente no novopadrão tecnológico que se avizinha. “Terra para quem nela não maistrabalha” talvez venha a ser uma nova e progressista bandeira nesse final deséculo.

Para esse autor, a criação de novas formas de ocupações é de suma importância para se

absorver uma parcela significativa da população despojada dos meios de produção. No início

do século XXI, a reforma agrária desejada é a que permite vislumbrar uma menor pressão dos

migrantes da zona rural sobre os centros urbanos.

O discurso presente entre os atores sociais, após o período marcado por grandes

transformações na agricultura brasileira, reflete a necessidade de se eliminarem os bolsões de

pobreza existentes no país. O final do processo da modernização conservadora verificada no

campo fez surgir um grande contingente de trabalhadores desprovidos, que ao migrarem para

as grandes cidades, vão fazer parte do exército industrial de reserva.

Com o agravamento do desemprego, as conseqüências do rápido processo de urbanização se

difundiu por todas as regiões do país. “As cidades já não comportam mais fluxos rurais.

Saturados pelo crescimento desordenado e pelo desemprego, os centros urbanos acabam

rebatendo esse contingente rural” (BRANCO, 1996). Tal situação preocupa os grandes

centros, levando-os a buscarem mecanismos que venham a diminuir o inchaço na zona

urbana.

4.1.1 O papel da reforma agrária na absorção da mão-de-obra rural

No início do século XXI, a realidade agrária continua marcada por controvérsias entre o poder

público e os atores sociais. Em que pese as avaliações dos autores clássicos dos anos 60,

como Alberto Passos Guimarães, Caio Prado Jr. e Celso Furtado, bem como Ignácio Rangel

que compreendia a questão agrária como o problema do excedente populacional decorrente da

modernização da agricultura, o discurso que se faz presente, atualmente, entre as diversas

correntes diz respeito a abrangência do processo de reforma agrária (SILVA, 2002).

Apesar das disparidades existentes, há um consenso quanto à necessidade de se criar novas

formas de ocupações para uma parcela da população brasileira que se vê a margem do mundo

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de trabalho, estruturado após o impacto das novas tecnologias baseadas na microeletrônica e

informática implantada nos campos. Por conseguinte, a Reforma Agrária pretendida é aquela

em que os ex-parceiros, ex-meiros, ex-bóias-frias, ex-pequenos produtores rurais sejam

reincorporado a zona rural.

Para Silva (2002, p.131) a reforma agrária não precisa ter mais um caráter estritamente

agrícola, uma vez que os problemas da produção e preços já foram resolvidos. O papel

assumido por este processo é o de promover a inclusão social daqueles que foram expulsos do

campo, através da combinação de atividades agrícolas e não-agrícolas.

Nos últimos anos, a luta pela realização da reforma agrária tem sido consubstanciada pela

execução de programas da Reforma Agrária. Estes programas garantiam o seu principal eixo

através da desapropriação de terras improdutivas, da utilização de terras públicas e da

aquisição de novos lotes. Entretanto, muitas vezes essas práticas foram inviabilizadas dadas às

dificuldades em caracterizar o imóvel rural improdutivo, bem como o fato de algumas áreas

serem consideradas não recomendáveis tecnicamente para implementação de assentamentos

de trabalhadores rurais.

Como alternativa tem-se a experiência do Programa “Banco da Terra” ou “Cédula da Terra”

implementado pelo governo federal em parceria com o Banco Mundial que consiste numa

sistemática centrada na compra direta de terras, através de operações realizadas entre

proprietários de imóveis rurais e agricultores sem-terra. Com a implantação deste, o governo

passa a disciplinar as regras de funcionamento do programa, além de disponibilizar os

recursos financeiros.

Para os defensores desse programa, uma Reforma Agrária assentada no mercado, além de

promover uma maior transparência por parte do poder público, representa uma forma mais

dinâmica e flexível de conduzir o processo de aquisição da terra. De acordo com os dados da

Secretaria Nacional, o Banco da Terra beneficiou, transcorridos dois anos da sua criação,

cerca de 40 mil famílias rurais em aproximadamente 1300 municípios do país, numa área de

760 mil hectare (ANJOS; CALDAS, 2003, p.8).

Entretanto, o Programa “Banco da Terra” é alvo de questionamento quanto a sua

aplicabilidade no campo social. Ao praticar a lei de mercado, há um estímulo a especulação,

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acarretando uma distorção ao processo de Reforma Agrária, que tem como carro chefe a luta

pela incorporação de trabalhadores rurais ao mercado de trabalho, seja através de atividades

agrícolas ou não-agrícolas. Nesse aspecto, a defesa pelas políticas públicas de geração de

empregos, assim como o apoio às famílias rurais, dando condições de sobrevivência aos

homens do campo, fortalece a inclusão social, resgatando a dívida com esses trabalhadores.

Com base no relatório de projetos de assentamentos do INCRA/98, calcula-se que 70 mil

pessoas já foram assentadas no Estado baiano. Considerou-se que existem, em média, cinco

pessoas por família e que o número de famílias assentadas é de 14 mil. Nos assentamentos

assistidos pela Coordenação de Reforma Agrária e Associativismo – CORA/SEAGRI estima-

se um total de 20 mil pessoas assentadas para um número de 4 mil famílias beneficiadas, o

que perfaz juntamente com os assentamentos da União um total de 90 mil pessoas assentadas

na Bahia. É interessante ressaltar que esse montante não representa o número total de pessoas

ocupadas nos assentamentos, uma vez que no cálculo do pessoal ocupado não se leva em

consideração o número de crianças e de idosos.

4.2 CONFIGURAÇÕES DO CAMPO BAIANO: O NOVO MUNDO RURAL

O novo mundo rural baiano é discutido sob o ponto de vista das novas atividades que estão

surgindo no meio rural e que são responsáveis pela amenização, verificada nos últimos anos,

do êxodo rural. Defende-se que é preciso tornar desenvolvido o novo atrasado e para tanto são

analisadas as características marcantes dos municípios do interior do Estado, a fim de que

possam ser criadas estratégias de vincular as atividades agrícolas de baixa renda e de tempo

parcial às atividades não-agrícolas, caracterizando assim o novo mundo rural.

Para dar consistência ao trabalho, essa discussão é feita no âmbito do Projeto Rurbano,

desenvolvido pelo Núcleo de Economia Agrícola do Instituto de Economia da Unicamp,

sendo instituído com a finalidade de reconstruir séries históricas a partir dos microdados das

PNADs relativos à população ocupada, emprego e renda para o mundo rural.

Através desse projeto se verificou que o emprego agrícola vem caindo sistematicamente desde

meados dos anos 80, em contrapartida a uma expansão de “novas atividades” não-agrícolas no

meio rural. Assim, analisa-se o reflexo da constituição de um novo mundo rural para a RMS,

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partindo do princípio de que o interior baiano é caracterizado pela diversidade de mundos

rurais, onde ao tempo que se configura o “novo rural desenvolvido”, com a proliferação de

atividades não-agrícolas relacionadas ao turismo rural e às novas atividades agrícolas

modernas, tem-se o “novo mundo rural atrasado” em que o trabalho em tempo parcial é

resultado das estratégias de sobrevivência utilizadas pelo agricultor.

A velha forma de caracterizar o mundo rural já não faz mais sentido, já que o meio rural não é

mais exclusivo das atividades agrícolas. Em decorrência das condições adversas e do próprio

atraso socioeconômico, as famílias rurais nordestinas passam a diversificar as suas atividades

(SEI, 1999, p.10).

Fatores como a queda dos rendimentos médios e a liberação da mão-de-obra agrícola

constituem importantes ferramentas de análise na determinação do novo mundo rural. O

primeiro é conseqüência da redução dos preços mundiais das principais commodities

agrícolas e o segundo da modernização agrícola verificada nos campos. Como estratégia de

sobrevivência, os agricultores ocupam novas atividades não necessariamente agrícolas, assim

como realizam migrações temporárias.

A luta pela sobrevivência favorece o surgimento do trabalho em tempo parcial, da

pluriatividade e das atividades não-agrícolas. Esta última, também impulsiona a

transformação do mundo rural, na medida em que atraem empresas que procuram melhores

condições para o seu funcionamento e o bem-estar de seus empregados, bem como recebem

pessoas oriundas dos grandes centros urbanos (SEI, 1999, p.14).

O novo mundo rural é configurado por atividades emergentes que estão relacionadas com o

turismo, lazer, preservação ambiental, infra-estrutura, etc., e que visam revalorizar o campo.

Para o lazer são estruturadas atividades como pesque-pague, hotel-fazenda, fazenda-hotel,

turismo ecológico, etc. Além dessas, como efeito do processo de urbanização do meio rural,

tem-se uma crescente demanda por serviços públicos e privados.

Essa dinâmica estruturada no campo é responsável também, pelo crescimento das novas

atividades agropecuárias, que geralmente são intensivas em mão-de-obra e estão voltadas para

atender nichos de mercado, como a criação de animais silvestres (javali, capivara, jacaré,

tartaruga, avestruz, etc.) e o cultivo de ervas aromatizantes (SEI, 1999, p.16).

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Nesse aspecto, Silva (2002, p. ix) defende que o “novo rural” compõe-se basicamente de

quatro grandes subconjuntos:

a) uma agropecuária moderna, baseada em commodities e intimamente ligada às

agroindústrias, que vem sendo chamada de o agribusiness brasileiro;

b) um conjunto de atividades de subsistência que gira em torno da agricultura rudimentar

e da criação de pequenos animais...;

c) um conjunto de atividades não-agrícolas, ligadas à moradia, ao lazer e a várias

atividades industriais e de prestação de serviços e;

d) um conjunto de “novas” atividades agropecuárias, localizadas em nichos específicos

de mercados.

Na Bahia, a heterogeneidade presente nos campos reproduz, através das relações

socioeconômicas dos agricultores, características presentes no restante do país. O cenário aí

descrito é marcado por uma agricultura especializada, como a produção de grãos no oeste do

estado e por uma agricultura familiar, geralmente pouco capitalizada da região semi-árida.

Além de se tratar de um Estado em que a retenção da mão-de-obra está ligada à estrutura

agrária, tem-se que a particularidade dos proprietários dos imóveis serem os próprios

produtores possibilita outras formas de ocupar as pessoas e complementar a renda agrícola,

como algum membro da família de um agricultor trabalhar temporariamente nas lavouras de

outras propriedades.

O estudo das configurações dos campos baianos permite identificar que em muitas

microrregiões da Bahia a ausência da modernização agrícola e formação dos Complexos

Agroindustriais (CAIs), processos fortemente difundidos até final da década de 80 no Brasil,

acarretou na inexistência de problemas como o desemprego tecnológico. Entretanto, os

agricultores baianos das regiões atrasadas foram bastante atingidos com a queda dos preços

agrícolas, levando-os, como estratégia de sobrevivência, a intensificação da pluriatividade que

no caso desses baianos não está atrelada somente ao trabalho em tempo parcial, mas também

a migrações temporárias. Essa mudança caracteriza a formação do “novo rural atrasado” que

passa a compor, juntamente com a dinâmica implantada nas regiões modernizadas do Estado,

um novo cenário (SEI, 1999, p. 18).

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Nesse âmbito, para melhor compreender a proposta do trabalho, ressalta-se a importância da

avaliação da nova dinâmica dos campos baianos, através da análise do fluxo migratório de

trabalhadores originários das atividades agrícolas que vieram para a RMS. Entretanto, essa

análise foi inviabilizada pela inexistência desses dados no IBGE. Além do que as tabulações

especiais das PNADs feitas pelo projeto Rurbano não possibilitam conhecer o processo que

caracteriza o perfil interno de cada Unidade da Federação.

Assim sendo, as análises são feitas a partir dos dados para Bahia e não para os municípios.

Através das tabulações especiais do Projeto Rurbano elaboradas para o Estado baiano é

possível medir o peso das atividades agrícolas e não-agrícolas no meio rural e o crescimento

do part-time. A apresentação das tabelas 14, 15,16 e 17 permite identificar o processo de

substituição das atividades agrícolas pelas não-agrícolas na zona rural, não sendo considerado,

para tanto, na análise as taxas de crescimento ao ano para os testes “t” que mostrem níveis de

significância maiores que 20% (SEI, 1999, p.24).

Da observação da tabela 14, infere-se que, embora a atividade agrícola ainda tenha grande

importância na ocupação da mão-de-obra rural baiana, no período correspondente à década de

80-90 houve um decréscimo no número de pessoas ocupadas nesta atividade de 85% para

aproximadamente 81%, em contrapartida a um crescimento do número de ocupados na

atividade não-agrícola que passou de 14% para 17%.

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Tabela 14 – População rural de 10 anos e mais segundo o ramo de atividade (mil

pessoas). Bahia, 1981/1997

Ramos de Atividade Anos Taxa de crescimento (% a.a) 1981 1992 1997 1981/92a 1992/97bPopulação Economicamente Ativa 1.775 2.158 2.235 1,8*** -0,8Ocupados Agrícola 1.515 1.773 1.808 1,4*** -1,3Não-agrícola 240 322 381 2,7*** 2,2 Indústria de Transformação 40 59 72 3,6** 2,0 Indústria da Construção 39 51 47 2,5 0,5 Outras atividades industriais 11 14 10 2,4 -4,9 Comércio de Mercadorias 47 58 47 1,8 -0,2 Prestação de Serviços 51 66 96 2,3* 4,4 Serv. Auxiliares de ativ. econom. 3 6 7 5,9 -2,0 Transporte e Comunicação 10 13 19 2,8 7,4** Social 30 46 51 3,9** 1,0 Administração Pública 7 8 26 1,4 11,6 Outras atividades 2 2 5 -1,7 8,3

Fonte: Tabulações Especiais do Projeto Rurbano, NEA-IE/Unicamp, janeiro 1999 apud SEI, 1999.

a) teste t: indica se a diferença entre os dois anos é significativa ou não.

b) estimativa do coeficiente de uma regressão log-linear contra o tempo.

Neste caso, o teste t indica a existência ou não de uma tendência nos dados.

***,**,* significam respectivamente 5%, 10% e 20%.

Os dados contidos nessa tabela informam que nos anos 80, as ocupações agrícolas cresceram

em 1,4% a.a. e as não-agrícolas em 2,7% a.a., confirmando já nesse período, um movimento

de ascensão das ocupações fora das atividades agropecuárias. Nos anos 90, o quadro descrito

segue na mesma direção, reduzindo o número de ocupados na agricultura (-1,3% a.a.) e

crescendo as não-agrícolas (2,2% a.a.).

Quanto aos ramos que mais se destacaram no segmento das atividades não-agrícolas no

período analisado, tem-se Administração Pública, Transporte e Comunicação, e Prestação de

serviços que apresentaram uma taxa de crescimento do número de ocupados de 11,6%, 7,4% e

4,4%, respectivamente, além de Outras atividades com 8,3%.

Nas análises das tabelas 15 e 16 é possível precisar, com a divisão dos ramos de atividades em

setores e ocupações, onde estão ocupadas as 381 mil pessoas que em 1997 se encontram nas

atividades não-agrícolas.

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Tabela 15 – Principais setores de atividades da população rural não-agrícola ocupada

na semana de referência (mil pessoas). Bahia, 1981/1997

Atividade de Empreendimento Anos Taxa de crescimento (% a.a)1981 1992 1997 1981/92a 1992/97b

Emprego doméstico 21 28 40 2,5 5,5*Construção 39 51 47 2,5 0,5Estab. Ensino público 24 36 41 3,7* 1,3Comércio alimentos 23 24 22 0,2 2,6Indústria alimentos 6 14 8 7,2*** -8,8***Indústria transformação 8 21 19 9,5*** -0,6Restaurantes 7 18 28 8,6*** 6,5Alfaiataria 15 10 8 -3,7* -3,8Administração municipal 4 5 23 2,1 20,9Comércio ambulante 6 14 15 8,3*** 7,0Indústria de madeiras 9 6 16 -3,9 17,4**Transporte de carga 4 5 5 0,6 9,5Assist. técnica - veículos 2 2 6 1,9 12,3Subtotal 169 233 278 3,0*** 3,4***PEA NÃO-AGRÍCOLA 240 322 381 2,7*** 2,2

Fonte: Tabulações Especiais do Projeto Rurbano, NEA-IE/Unicamp, janeiro 1999 apud SEI, 1999.

a) teste t: indica se a diferença entre os dois anos é significativa ou não.

b) estimativa do coeficiente de uma regressão log-linear contra o tempo.

Neste caso, o teste t indica a existência ou não de uma tendência nos dados.

***,**,* significam respectivamente 5%, 10% e 20%.

Como maiores absorvedores da mão-de-obra não-agrícola para o ano de 1997, encontram-se

os seguintes setores e ocupações: Construção, com destaque para a ocupação Ajudante

pedreiro que obteve um crescimento no número de ocupados de 16,2%, na década de 90;

Estabelecimentos de ensino público, apesar do crescimento do número de professores de

primeiro grau ocorrer em ritmo reduzido, na comparação das duas décadas; e Emprego

doméstico que teve o número de ocupação referente a Servente faxineiro ampliado para

11,8%. Esse crescimento é atribuído à intensificação das estratégias de sobrevivência nas

áreas atrasadas.12

Outros setores não tão relevantes, em termos absolutos, quanto aos primeiros, mas que

apresentaram um crescimento vertiginoso na década de 90 foram Administração municipal

com um incremento de 20,9% a.a., impulsionado pelo processo de descentralização de

recursos, bem como pelas novas demandas no meio rural; Indústria de madeiras (17,4% a.a.);

12 Essas análises foram realizadas em ordem decrescente, levando-se em consideração a representatividade decada setor e ocupação dentro da PEA rural não-agrícola.

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e no quesito da ocupação principal, tem-se Motorista que cresce a uma taxa de 16,1% a.a.,

revelando a absorção de uma mão-de-obra mais barata e menos qualificada (SEI, 1999, 26-

30).

Tabela 16 – Principais ocupações não-agrícolas da população rural ocupada

na semana de referência (mil pessoas) Bahia, 1981/1997

Ocupação Principal Anos Taxa ce crescimento (%a.a) 1981 1992 1997 1981/92a 1992/97bServiços domésticos 21 26 36 2,0 4,4*Pedreiro 16 36 25 8,0*** -3,8Serviços conta própria 24 31 34 2,4 2,1*Profes. Prim. Grau inicial 9 21 27 7,4*** 0,7Balconistas atendentes 8 15 14 5,7** 5,2Motorista 8 9 15 0,9 16,1**Ajudante pedreiro 10 9 18 -0,8 16,2***Servente faxineiro 6 6 15 -0,1 11,8Ajudante diversos 9 9 11 -0,5 -10,8Costureiro alfaiate 11 9 8 -1,7 -2,2Forneiro em olaria 4 18 15 14,3*** -3,3Ambulante – outros 5 7 6 3,6 0,0Diversos 1 6 9 14,8*** 10,0Subtotal 134 203 233 3,9*** 2,2*Total 240 322 381 2,7*** 2,2

Fonte: Tabulações Especiais do Projeto Rurbano, NEA-IE/Unicamp, janeiro 1999 apud SEI, 1999.

a) teste t: indica se a diferença entre os dois anos é significativa ou não.

b) estimativa do coeficiente de uma regressão log-linear contra o tempo.

Neste caso, o teste t indica a existência ou não de uma tendência nos dados.

***,**,* significam respectivamente 5%, 10% e 20%.

Observando-se a taxa de crescimento referente ao período de 1981/92 e 1992/97, verifica-se

para as atividades agrícolas no meio rural que as ocupações com maior crescimento foram a

categoria Empregadores e Conta-própria, com uma taxa de crescimento de 10,0% a.a e 0,3%

a.a., respectivamente. Enquanto nas atividades não-agrícolas a expansão foi apenas para

condição de empregados (3,0% a.a.) (Tabela 17).

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Tabela 17 – População rural ocupada na semana de referência segundo a posição

de ocupação por tipo de atividade (mil pessoas) – Bahia, 1981/1997

Ocupação Principal Anos Taxa de crescimento (%a.a) 1981 1992 1997 1981/92ª 1992/97bAtividade Agrícola 1.515 1.773 1.808 1,4*** -1,3 Empregados 471 490 452 0,3 -2,9* Conta-própria 583 558 623 -0,4 0,3 Empregadores 24 14 21 -4,7*** 10,0** Não-remunerados 437 711 711 4,5*** -1,9 Sem-declaração --- ---- --- --- ---Atividade Não-agrícola 240 322 381 2,7*** 2,2 Empregados 136 175 225 2,3** 3,0 Conta-própria 94 121 123 2,4* 0,3 Empregadores 2 6 5 9,9** 1,4 Não-remunerados 8 20 28 8,8*** 6,9 Sem-declaração --- --- --- --- ---Total 1.755 2.095 2.188 1,6*** -0,7

Fonte: Tabulações Especiais do Projeto Rurbano, NEA-IE/Unicamp, janeiro 1999 apud SEI, 1999

a) teste t: indica se a diferença entre os dois anos é significativa ou não.

b) estimativa do coeficiente de uma regressão log-linear contra o tempo.

Neste caso, o teste t indica a existência ou não de uma tendência nos dados.

***,**,* significam respectivamente 5%, 10% e 20%.

Esse processo se dá no meio rural baiano, tanto nas regiões atrasadas, em razão da falta de

competitividade dos agricultores, que não tendo outra alternativa saem da atividade agrícola

ou então passam a desenvolvê-la em tempo parcial, como nas desenvolvidas, devido aos

problemas decorrentes da modernização agrícola, que liberam força de trabalho.

4.2.1 Agricultura familiar e o novo perfil das atividades rurais baianas

A agricultura familiar passa, nos anos 90, a ser o centro das discussões sobre as alternativas

viáveis para se promover o desenvolvimento do campo brasileiro. Apesar de, historicamente,

ela ter enfrentado um quadro macroeconômico adverso, caracterizado pela instabilidade

monetária e inflação elevada há evidências de que este padrão de agricultura conseguiu

sobreviver.

Compreendida como um segmento de grande influência econômica e social, que possui

aspectos positivos como a redução dos custos de transação e de mão-de-obra, a agricultura

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familiar passa a representar a mola propulsora do desenvolvimento rural sustentável. Em

contrapartida, tem-se um desgaste da agricultura patronal que emprega cada vez menos

trabalhadores, promovendo concentração de renda e exclusão social.

A agricultura familiar se apresenta sob três situações díspares. A primeira diz respeito aos

agricultores que conseguem acompanhar o progresso técnico, ampliando a sua estrutura

produtiva, estes são classificados como os agricultores familiares já consolidados. A segunda

é para os que continuam competitivos, pois não se atrasam em imitar a modernização,

compreende o segmento dos agricultores em fase de consolidação. E a terceira, caracterizada

por possuir a maioria dos agricultores familiares em processo de decadência, onde se utilizam

técnicas e instrumentos de produção rudimentares (VEIGA, 2000, p.21).

Na Bahia, a heterogeneidade aí existente permite contemplar os diversos aspectos da

agricultura familiar. Essa característica leva a necessidade de formular políticas de

desenvolvimento rural integrado para o Estado. De maneira que as políticas agrárias e

agrícolas para o fortalecimento da agricultura sejam efetivadas, juntamente com políticas de

geração de novas oportunidades de empregos rurais não-agrícolas. Entretanto, a aplicação

deve ser diferenciada, levando-se em conta que as particularidades resultantes da forte

heterogeneidade dos espaços e técnicas produtivas determinam formas distintas de inserção

dos agricultores baianos no meio rural.

Para Couto Filho (1997a, p.36), “em algumas regiões desenvolvidas, com o progresso técnico

na agricultura e a conseqüente diminuição do tempo de trabalho na lavoura está havendo um

crescimento da demanda por atividades não-agrícolas”. O desenvolvimento de atividades

como pesque-pague, hotel-fazenda, fazenda-hotel e turismo ecológico no meio rural vem se

constituindo como um importante fator de fixação da mão-de-obra. Os serviços públicos e

privados ligados à energia elétrica, água encanada, tratamento sanitário, saúde, educação,

transporte público e o comércio em geral também vêm tendo uma parcela de contribuição

para a fixação dessa mão-de-obra na zona rural.

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As atividades, agrícolas e não-agrícolas, realizam-se dentro e fora da unidade produtiva, ou

seja, no sistema de produção complexo.13 Compreendem tanto os empregos e ocupações das

UTf, não só nos sub-sistemas agrícolas, como também as atividades não-agrícolas (turismo

rural, gestão do meio ambiente, comércio, serviços, etc.), de forma a fixar no campo as

famílias rurais, corrigindo distorções sociais causadas pela adoção de políticas

macroeconômicas e pelo processo de modernização da agricultura.

Alguns autores como Silva (apud COUTO FILHO, 1997b, p.21) afirmam que:

A criação de empregos não-agrícolas nas zonas rurais é a única estratégiapossível capaz de, simultaneamente, reter essa população rural pobre nosseus atuais locais de moradia e, ao mesmo tempo, elevar o seu nível derenda. Não é por outra razão que importantes instituições internacionaisvêm insistindo na proposta de se retomar a idéia de desenvolvimento ruralimpulsionando-se um conjunto de atividades que gerem novas ocupações(não necessariamente empregos) que propiciem maior nível de renda àspessoas residentes no meio rural.

Apesar do Estado da Bahia apresentar nas áreas de desenvolvimento agrícola acentuado uma

forte presença da renda agrícola, a modernização verificada no campo leva ao crescimento do

número de pessoas ocupadas em atividades não-agrícolas, relacionada com a liberação de

mão-de-obra no campo. Entretanto, para algumas localidades do Estado este crescimento é

pautado por uma renda não-agrícola significativamente inferior às rendas das famílias do

Nordeste e do restante do Brasil, levando o agricultor a pluriatividade.

Esse cenário pode ser verificado na cidade de Irecê, Bahia, localizada na região semi-árida.

As constantes secas e quebras da produção fragilizaram a população rural desta cidade, que

passa a se ocupar em qualquer atividade para obter alguma renda. Todavia, a renda gerada é

pouco significativa, em decorrência da precariedade da qualificação desta mão-de-obra.

Em meio a esse processo surgem as famílias “pluriativas” que diversificam as atividades para

que a renda familiar não dependa exclusivamente da agropecuária. As pesquisas sobre a

13 Segundo a metodologia análise-diagnóstico de sistemas agrários, o conceito de unidade produtiva é maisamplo do que a simples delimitação física da propriedade rural ou os limites do terreno cercado. A unidadeprodutiva corresponde ao sistema de produção complexo, compreendendo tanto os sub-sistemas (cultivo,criação, transformação, artesanato, etc.) quanto as atividades realizadas fora dos limites da propriedade rural,principalmente serviços. O que dá unidade ao sistema complexo é a gestão familiar única. No orçamento familiarconsideram-se também os rendimentos oriundos da inatividade e outras transferências (aposentadorias, pensões,auxílio-desemprego, bolsa-escola, vale-gás, etc.).

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expansão das famílias pluriativas no Brasil vêm sendo feitas no âmbito do projeto “Rurbano”,

coordenado por José Graziano da Silva, da Unicamp. Esta pluriatividade abrangia em 1998 a

proporção de um terço dos 3 milhões de agricultores familiares residentes no meio rural e

aproximadamente um quarto do total de 7,5 milhões de domicílios rurais do país (GROSSI;

SILVA apud VEIGA, 2000, p.23).

Na avaliação de Couto Filho (1998, p.8) buscar uma renda complementar e ocupar a mão-de-

obra disponível, no caso do agricultor baiano, não é necessariamente, decorrente das

tecnologias desempregadoras da modernização agrícola, mas, sobretudo, do fenômeno

histórico do superpovoamento e da falta de competitividade nas pequenas propriedades do

Estado.

A emergência das atividades não-agrícolas no meio rural tem levado à hipótese de que se

houver um maior incentivo à proliferação dessas atividades, poder-se-á intensificar o processo

de fixação do homem na zona rural, contribuindo para amenizar o problema do “inchaço” nos

centros urbanos.

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5 ENSAIOS DE SISTEMAS AGRÁRIOS

Neste capítulo é discutido a metodologia análise-diagnóstico de sistemas agrários com o

objetivo de identificar os principais problemas que os agricultores enfrentam, passando a

estabelecer diretrizes para o desenvolvimento rural local mais coerentes com a necessidade de

cada região.

Utiliza-se os conceitos defendidos por Marc Dufumier que compreende o sistema agrário

como uma combinação de variáveis essenciais, como o meio cultivado, instrumentos de

produção, força de trabalho social e relações de troca, além de um conjunto de idéias e

instituições que asseguram a reprodução social, e o Guia Metodológico elaborado pelo

INCRA/FAO que o tem como um modo de exploração do meio ambiente historicamente

constituído. Este meio é específico do trabalho agrícola, resultado de uma associação entre os

meios de produção inertes e vivos para explorar e reproduzir um ambiente cultivado.

Através do conceito de sistema agrário é possível não somente apreender, como caracterizar

as mudanças de estado de uma agricultura, bem como desenvolver uma teoria que permite

distinguir, ordenar e compreender os momentos históricos, e a diferenciação geográfica dos

sistemas agrários (MAZOYER apud INCRA/FAO, 2004).

Para melhor compreender a metodologia deste trabalho é feita uma análise minuciosa do Guia

Metodológico sobre “Análise Diagnóstico de Sistemas Agrários”. Este guia tem como

objetivo oferecer um instrumento de apoio aos profissionais que desejem realizar diagnósticos

de sistemas agrários para subsidiar a elaboração de projetos e políticas de desenvolvimento.

Obedecendo a ordem da elaboração do diagnóstico, busca-se, brevemente, explicar o método,

os seus fundamentos e resultados. A sua elaboração é um convite à reflexão crítica e pessoal,

uma vez que cada um representa uma etapa de reconstrução dos conhecimentos acumulados,

assim como um exercício de escuta, observação, interrogação, interpretação e síntese

(INCRA/FAO, 2004, p.5).

Através da realização de um bom diagnóstico é possível identificar a tendência de evolução

de uma região, constatando se ela aponta para um reforço da agricultura familiar ou, da

agricultura patronal e das grandes empresas. Permite-se, também, verificar se os agricultores

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estão diversificando a produção e mudando suas técnicas. Para tanto, este processo deve ser

rápido e operacionalizável, sem, contudo, perder o rigor científico, através da descrição e

explicação da realidade.

Em relação aos princípios gerais do método, tem-se que este se baseia em passos

progressivos, partindo do geral para o particular. Em outros termos, a análise se inicia em

níveis mais gerais, país, região, em seguida é feita uma especificação, municípios,

assentamentos e unidades de produção, encerrando-se nas particularidades dos cultivos,

criações, etc. A interpretação de cada etapa é confrontada com as análises das fases anteriores

e, as hipóteses daí formuladas se tornam alvo de verificação nas etapas seguintes.

Nesse método não se trabalha com amostras aleatórias, pois elas não permitem a

representação e a análise aprofundada de toda diversidade da atividade agrícola. Para

disseminar o conhecimento entre os agricultores é importante a participação de todos na

elaboração do diagnóstico, uma vez que esse processo tem como objetivo fornecer aos

mesmos informações sobre a realidade na qual atuam, contribuir para que eles formulem

projetos e políticas de desenvolvimento, e facilitar o diálogo dos técnicos, bem como dos

produtores entre si e com outros agentes do desenvolvimento local.

Nas etapas iniciais de um trabalho é necessário realizar uma análise geral da região a ser

estudada, buscando identificar e localizar no espaço os grandes modos de exploração do meio

ambiente e reconhecer os elementos ecológicos, técnicos e sociais que determinaram a sua

evolução recente e a sua localização atual. Com esta análise é possível explicar como os

principais fatores ecológicos, técnicos e sociais determinaram a evolução passada e

condicionam as tendências presentes das diferentes categorias sociais e de suas práticas

agrícolas.

Para realizar um estudo global da região, deve-se proceder à coleta e ao tratamento dos dados

já existentes, e à “leitura de paisagem” que sendo realizada através de percursos sistemáticos

de campo permite identificar as diferentes heterogeneidades dos ecossistemas. Ela deve ser

feita não apenas observando o cenário, mas também, interrogando-se sobre ele e

interpretando-o.

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Outro importante procedimento são as entrevistas históricas realizadas com informantes

“chaves” que geralmente são as pessoas mais antigas na região em contato direto com a

agricultura. O conteúdo da entrevista constitui num levantamento histórico dos fatos

ecológicos, técnicos e sócio-econômicos relacionados às atividades agrícolas. Através desta,

tenta-se identificar as trajetórias de acumulação que levaram à diferenciação dos produtores,

relacionando-as com os diversos fatos levantados e a sua localização, de forma a explicar a

diversidade do modo de exploração dos sistemas agrários.

A metodologia Análise-Diagnóstico de Sistemas Agrários permite estabelecer categorias de

produtores e tipologia dos sistemas de produção. Com o estudo da tipologia, capta-se a

diversidade, já que os produtores trabalham em condições ambientais e sócio-econômicas

distintas. Este fato é relevante para se entender as diferentes escolhas feitas pelos produtores,

no que se refere às culturas, às criações, às técnicas, às práticas agrícolas e econômicas, etc.

Na tipologia dos produtores é possível distinguir os produtores familiares dos patronais ou

dos puramente capitalistas. Nesse aspecto, têm-se as unidades capitalistas que dispõem de

áreas extensas, onde os proprietários não trabalham diretamente na produção, realizada

exclusivamente por trabalhadores assalariados; as unidades familiares, nas quais o trabalho é

quase todo familiar; e as unidades patronais, em que a produção é realizada pela família e,

simultaneamente, por trabalhadores assalariados.

Dentre os produtores familiares, pode-se, ainda, diferenciar três tipos. Os “produtores

familiares capitalizados” que acumulam algum capital e que dispõem de mais recursos para

produção, os “produtores familiares em capitalização” em que o nível de renda pode, em

situações favoráveis permitir alguma acumulação de capital, mas esta não é garantida por

longo prazo, e os “produtores familiares em descapitalização”, onde o nível de renda é

insuficiente para assegurar a reprodução da unidade de produção e a subsistência da família.

O sistema de produção utilizado é definido como uma combinação dos recursos disponíveis

para a obtenção das produções vegetais e animais, podendo, também ser compreendido como

uma combinação de diversos subsistemas produtivos. Nesse sistema é importante observar

alguns aspectos, como a família e a mão-de-obra disponível, a unidade de produção, os

sistemas de culturas, os sistemas de criação, os de processamento dos produtos, as atividades

complementares e as combinações dos sistemas de cultura com os de criação.

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Quanto às relações existentes entre os diferentes subsistemas, pode-se fazer uso de um

fluxograma para descrever a dinâmica de um sistema de produção, como exemplificado na

figura 1 (INCRA/FAO, 2004, p.40).

Fluxos de Produtos e da Fertilidade de um Sistema

de Produção Familiar Diversificado: O caso de Janaúba, em Minas Gerais

sist."cultivo"

sistema cultivo

sist.criaçãosist.criação

pastagem

MANDIOCA

Sorgo

GADO GALINHAS

forragem

grãos

leite

farinha

galinhas, ovos

(consumo e venda)

(consumo e venda)

arrobas

(consumo)

sal mineralvacinas

sistema cultivo

AMENDOIN

MATA sist.cultivo

Arroz/Milho / Feijão

sist.cultivo

ALGODÃO

sementemão-de-obra

(consumo)

agrotóxico

sist.cultivo Horta

(venda) (consumo e venda)amendoin

lenha

frutas

aluguel trator

(consumoe venda)

grãos

(consumo)

aluguel trator

Fonte: Trabalho realizado pelos participantes do curso sobre análise-diagnóstico de sistemas agrários, realizado em Janaúba (Minas

Gerais), em junho de 1997, e sistematizado por Anne Lothoré.(apud INCRA/FAO, 2004)

Para verificar se há sustentabilidade econômica nesse sistema é preciso proceder com a

análise do resultado. Este é obtido pela diferença entre o que foi produzido e o que foi

consumido, podendo ser descrito pela seguinte fórmula:

(1) VA = PB – CI – D, onde VA é o valor agregado; PB é o produto bruto; CI é o consumo

intermediário; e D é a depreciação do capital fixo.

O valor agregado por unidade de área disponível é obtido pela divisão do valor agregado pela

superfície agrícola utilizada, sendo descrito pela fórmula:

(2) Valor agregado por unidade de área = VA/SAU

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E a produtividade do trabalho que é obtida pela divisão entre o valor agregado e o número de

trabalhadores empregados no sistema, sendo representado por:

(3) Produtividade do trabalho = VA/T

Como nem todo o valor agregado pelo produtor se destina à sua remuneração ou à de sua

família, não se pode concluir a avaliação econômica do sistema de produção atribuindo esse

valor à renda obtida pelos produtores. Parte deste deve ser dividido entre os trabalhadores

assalariados; os donos das terras, para aqueles que são arrendatários; o banco ou o Estado.

Dessa forma, a parcela do valor agregado que sobra após as deduções é a renda agrícola,

descrita pela fórmula:

(4) RA = VA – S – I – J – RT, onde S são os salários; I os impostos; J os juros; e RT é a renda

da terra.

No caso dos produtores familiares é importante dividir essa renda pelo número de

trabalhadores familiares, a fim de que se possa comparar à remuneração das outras

oportunidades de trabalho ao seu alcance (RA/UTf).14 Concluindo a sua decisão, o produtor

compara esta renda agrícola por trabalhador familiar com a renda de outras fontes potenciais,

chamado custo de oportunidade da força de trabalho, e com o mínimo necessário para a

manutenção da família, denominado patamar de reprodução simples.

Se a renda obtida superar o custo de oportunidade da força de trabalho, significa que o

produtor deve estar em condições de capitalizar-se. Caso contrário, ele pode ser levado a

buscar outras fontes de renda fora da produção. E na condição abaixo do patamar de

reprodução simples é provável que o agricultor abandone a produção (FIGURA 2).

14 UTf são unidades de trabalho familiar, podendo variar para cada trabalhador em 1; 0,5; ou 0,25, a depender dotempo que disponibilizem para a atividade agrícola (INCRA/FAO, 2004).

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Figura 2

Distribuição dos Estabelecimentos em Função da Renda e da Área Disponível porUnidades de Trabalho Familiar

Fonte: INCRA/FAO, 2004

Quando comparado a renda do trabalhador familiar e a área disponível por trabalhador

familiar é possível confirmar ou negar as hipóteses sobre as estratégias adotadas pelas

diferentes categorias de produtores, assim quanto maior for essa relação, mais intensivo será o

sistema no uso da área disponível. Nesse aspecto, um diagnóstico bem realizado fornece, além

de identificar as estratégias utilizadas pelos produtores, subsídios para elaboração de

propostas que solucionem os problemas enfrentados pelos mesmos.

5.1 EXPERIÊNCIA DO MUNICÍPIO DE LAPÃO NA BAHIA

A parte reservada para relatar uma experiência própria de uma viagem realizada à região de

Irecê na Bahia se refere ao estudo feito no município de Lapão, antigo distrito do município

de Irecê. Por essa ocasião foi possível por em prática os conhecimentos adquiridos com a

leitura do Guia Metodológico sobre “Análise-Diagnóstico de Sistemas Agrários”. Entretanto,

por tratar-se da primeira experiência de pesquisa com dados primários é possível que alguns

aspectos relevantes tenham sido postos de lado.

ha / UTf

RA / UTf

patamar de reprodução simples

custo de oportunidade da força detrabalho

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Nesse aspecto, optou-se por retratar o trabalho de forma detalhada, seguindo a ordem das

etapas de elaboração do diagnóstico, de maneira que a explicação do método, dos seus

fundamentos e resultados é rigorosamente obedecida. Ao longo da viagem, buscou-se fazer a

leitura de paisagem, a fim de obter as primeiras informações relevantes, bem como realizar

entrevistas com informantes-chave. Assim, o trabalho foi elaborado como uma espécie de

relatório, que tem a finalidade de familiarizar o leitor com a localidade estudada.

LEITURA DE PAISAGEM

A observação da região de Irecê permite identificá-la como uma zona onde o sistema de

cultivo é fortemente predominante. Ao longo do trecho conhecido como “estrada do feijão”

verifica-se um sistema com pecuária extensiva, em pequena escala, o solo utilizado é de terra

vermelha, apresentando alta fertilidade natural, as culturas desenvolvidas são

predominantemente de ciclos curtos.

Os lotes disponíveis para o cultivo situam-se na sua grande maioria em torno de 10 a 20 ha,

sendo utilizado técnicas díspares nos seus respectivos manejos, pois ao tempo em que se

observa a utilização de técnicas rudimentares como a enxada, constata-se a utilização de

técnicas mecanizadas, como o uso do trator e da irrigação, através de Pivô Central.

Outra constatação é que não existem casas e nem mesmo barracas, onde se vendem algum

tipo de produto ao longo da estrada. Essa observação leva a um primeiro questionamento no

que diz respeito à forma como a produção é escoada e a realimentação do sistema.

Embora a política adotada durante os anos 70 e 80, ao subsidiar o cultivo do feijão, tenha

caracterizado a região como zona de monocultura, tem-se que a região de Irecê contempla,

atualmente, de maneira homogênea, um plantio diversificado de culturas.

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Foto 1

Fonte: Elaboração da autora, 2003

ECOSSISTEMA

O município de Lapão está localizado na microrregião de Irecê. O relevo dessa região é de

origem calcária, o que permite a formação de diversas grutas. Ela é um dos mais importantes

centros produtores de grãos no Nordeste, sendo constituída por um vasto Platô, em altitudes

que variam de 500 a 800 metros acima do nível do mar e apresentando solos argilosos, com

superfícies aplainadas de calcário, de alta fertilidade natural, clima quente e semi-árido, e

chuvas distribuídas de outubro a março.15

Dentre os rios mais relevantes para a região está o Jacaré, mais conhecido como Vereda de

Romão Gramacho. Segundo Rubem (1997, p. 165) durante o inverno, ás águas percorrem o

curso do rio intensamente, o mesmo não se verifica durante o período de estiagem, formando

pequenas lagoas e poços que servem para abastecer os animais e a população.

No aspecto hidrográfico, ainda de acordo com Rubem (idem, p.168) a região “pertence à

bacia hidrográfica do São Francisco e tem como seus rios principais Riacho do Jaú e Riacho

15 É chamado platô por que a região é absolutamente plana, permitindo cem por cento de mecanização agrícola.

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do Baixão do Gabriel”. Em virtude do alto teor de calcário dificilmente se encontra água

potável nas cacimbas e nos poços tubulares.

Nas décadas passadas, em que houve uma injeção de recursos por parte do Governo Federal

na região, muitos agricultores no afã de ampliarem as áreas irrigáveis promoveram de maneira

descontrolada o desmatamento, levando a uma proliferação de insetos nas lavouras e

conseqüentemente à intensificação do uso de agrotóxicos. Esta ação levou a destruição de

grande parte da vegetação nativa.

SISTEMA AGRÁRIO

A atividade agrícola na região atingiu maior expressividade a partir da década de 40. Período

em que se iniciam as primeiras ações no sentido de mecanizar a agricultura. Até meados dos

anos cinqüenta, a agricultura era voltada para a subsistência dos produtores.

Após a década de 70, período em que o governo atuou de forma mais expressiva na região,

mesmo os mais simples agricultores passaram a fazer uso de um sistema mecânico para

plantar as sementes.

Dessa forma, nessa região a ação do homem sobre a natureza pode ser percebida sob diversos

aspectos. Analisando-a, percebe-se que se trata de uma zona de policultura, onde são

produzidos milho, feijão, mamona, tomate, cenoura, beterraba, pepino, maxixe, quiabo,

mandioca, etc.

As técnicas de cultivo são bastante diversificadas, onde a prática de sequeiro é feita através da

plantação do feijão, ao lado da irrigação, através da cenoura, beterraba, dentre outras culturas

que demandam maiores tratos culturais. Em função da área disponível, os produtores

desenvolvem um sistema intensivo, onde as áreas próximas à estrada são utilizadas na

plantação.

A pecuária é desenvolvida de forma extensiva, sem que haja um manejo adequado no trato

dos animais. Em decorrência do grau de endividamento dos produtores, muitas produções são

abandonadas, conseqüentemente, a mão-de-obra empregada na lavoura tem sofrido uma

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redução, o que contribui para a intensificação do êxodo rural. A falta de uma assistência

técnica quanto à informação e conscientização dos produtores para utilização de agrotóxico,

levou ao uso descontrolado do veneno, promovendo a contaminação da água e dos animais.

Como a região de Irecê está localizada nas zonas mais úmidas, comparadas às demais regiões

do nordeste, desenvolve-se uma agricultura mecanizada. A água utilizada tanto na criação dos

animais, quanto nos tratos das lavouras é proveniente da perfuração de poços artesianos,

sendo esta água canalizada através de técnicas apropriadas aos respectivos sistemas,

promovendo assim a sustentação do agro-sistema.

Foto 2

Fonte: Elaboração da autora, 2003

HISTÓRICO

Com o objetivo de expandir a pesquisa além do que foi captado pela observação, buscou-se

realizar entrevistas históricas com informantes capazes de fornecer elementos que pudessem

explicar as características da estrutura local. O município contemplado pela investigação foi o

de Lapão que foi emancipado pelo decreto-lei Estadual nº 4.441 em 5 maio de 1985.

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Nesse sentido, foi feita uma visita ao povoado de Mosquito. Ao entrevistar a senhora Ana

Cardoso Pimenta de 78 anos de idade, moradora do local e mãe de 10 filhos, obtivemos a

informação de que o povoado foi fundado por seus antepassados portugueses há 200 anos e

que a família Cardoso, Pimenta e Pereira, primeiros moradores de Mosquito é proveniente do

sertão de Macaúbas e de Brotas de Macaúbas.

De acordo com a senhora Ana e seu filho José Henrique Cardoso Pimenta o nome do povoado

é decorrente da existência de muita abelha no local. Nesse período, o gado era criado de

maneira extensiva sem que houvesse nenhum controle sobre o rebanho, como o de marcar os

animais com ferro para caracterizar a propriedade.

As técnicas de cultivo eram feitas de maneiras rudimentares, através do arado animal e da

enxada. Plantava-se apenas para subsistência, milho, feijão, cana-de-açúcar, algodão, café,

etc, bem como criavam ovelha, porcos e galinha.

A área destinada à família foi de 200 ha, sendo dividida entre os herdeiros. Atualmente,

existem no povoado 13 residências as quais são, com exceção de uma, provenientes de uma

mesma família, pois é tradição que os descendentes desta família se casem entre si, de forma a

manter a integração da comunidade.

Um outro relato obtido foi o do senhor José Cardoso Pimenta de 91 anos de idade, pai de 10

filhos, morador de Provisório, local considerado extensão do povoado de Mosquito. De

acordo com a sua informação, o nome Provisório tem origem no fato dele imaginar que a sua

permanência no local seria breve.

A fixação do seu José em Provisório ocorreu em 1940. Nesta época ele se dedicava à criação

de gado, obtendo em média 140 litros de leite por dia para fazer requeijão que era vendido em

Irecê. Possuía três engenhos de onde eram obtidas rapaduras comercializadas em Salvador e

duas casas de farinha, sendo uma parte do produto utilizado para o consumo e a outra vendida

para comprar os produtos que não fabricavam e também para remunerar os 10 trabalhadores

que possuíam na propriedade.

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No sistema de criação possuía além do gado, ovelhas, galinhas e porcos. Andavam em torno

de 6 km para levar o gado para beber água, o trabalho era praticado de forma arcaica,

chegando a roçar as partes restantes dos troncos de árvores com as mãos.

Atualmente existem 8 residências sendo todos os moradores parentes. Destas, 6 unidades se

dedicam ao cultivo através da irrigação. As técnicas de cultivo passaram a ser mecanizadas,

onde se faz uso de três tratores para preparar a terra. Os engenhos e a casa de farinha com sua

prensa foram desativados. Os trabalhadores foram dispensados, sendo recrutados somente no

período de colheita do feijão de sequeiro, para aplicação de agrotóxico e para as culturas de

irrigação. A energia elétrica foi implantada a partir de 1996 e a água encanada ainda está em

fase de projeto.

Foto 3

Senhor José Cardoso Pimenta “informante-chave” do povoadoFonte: Elaboração da autora, 2003

SISTEMA DE PRODUÇÃO

A fim de caracterizar o sistema de produção do povoado de Mosquito, tomou-se como

referência a unidade produtiva do senhor Jurasi Cardoso Pimenta, filho do senhor José

Cardoso Pimenta, primeiro morador de Provisório. Como um dos herdeiros foi destinado para

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o senhor Jurasi, já com a escritura, 180 tarefas, equivalendo um total aproximadamente de 78

ha.

TIPOLOGIA DE PRODUTORES

A unidade em questão é do tipo familiar, onde todo o trabalho desenvolvido na propriedade é

quase exclusivamente familiar. A família do senhor Jurasi possui 6 membros, sendo ele, a

esposa, três filhos, com 17, 18 e 22 anos, respectivamente, além de uma nora. Todos moram e

trabalham em Provisório, não desempenhando nenhuma atividade fora da unidade. O filho

caçula ainda dedica uma parte do tempo para o estudo.

A mão-de-obra não familiar é utilizada nos momentos de colheita do feijão sequeiro e na

aplicação do agrotóxico na lavoura. O valor cobrado por tarefa durante o período de colheita

custa em torno de R$ 25 reais a tarefa, sendo empregado 15 a 20 pessoas e para aplicar o

defensivo é de R$ 15 reais, sendo repetido por quatro vezes. No período de plantio do feijão

se trabalha 24 horas com escala de revezamento de 6 em 6 horas num prazo de 5 a 6 dias,

somente com a mão-de-obra familiar.

Essa unidade familiar possui um trator com arado e semeadeira, sendo os demais implementos

obtidos nas outras unidades familiares que pertencem aos outros herdeiros, possui um poço

com capacidade de 30 mil litros por hora, além de 700 metros de cano santeno para 5 ha, e um

depósito que armazena máquinas e produtos, dentre outras benfeitorias.

A observação feita a essa unidade, permitiu identificar o local como uma área onde predomina

produtores familiares em capitalização, “cujo nível de renda pode, em situações favoráveis,

permitir alguma acumulação de capital” (INCRA/FAO, 2004, p. 27).

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Foto 4

Chefe da família e seus três filhosFonte: Elaboração da autora, 2003

SISTEMA DE CULTIVO

A unidade familiar estudada é bastante diversificada, sendo cenoura, beterraba e feijão seus

principais produtos. Neste aspecto foram considerados quatro subsistemas, sendo três sistema

de cultivo e um de quintal.

Dos subsistemas informados foram considerados os produtos mais representativos. Segundo

as informações do produtor tem sido desenvolvida a prática de rotação de cultura, onde pelo

menos uma vez no ano, reserva-se uma determinada área para ficar em repouso. Para o cultivo

do feijão em sequeiro se utiliza 100 tarefas para o plantio por ano. No ano passado foram

colhidas dessa cultura 17 sacas por tarefa, para essa atividade não se utiliza agrotóxico.

Nas demais culturas são utilizadas agrotóxico e o processo de irrigação é feito através das

técnicas de micro aspersão. A água utilizada na irrigação vem de um poço a 700 metros de

distância, para tanto se utiliza quinze mangueiras padrão.

Segundo informações de Jurasi são utilizadas em média quatro tarefas e meia para o cultivo

da cenoura, uma para beterraba e meia para pimentão e maxixe. Na plantação de cenoura, há

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um processo de raleamento ficando os pés de cenoura há uma distância de 15 centímetros

entre eles.

Foto 5

Fonte: Elaboração da autora, 2003

SISTEMA DE CRIAÇÃO

Na análise da unidade, observa-se a existência de galinhas, porcos e apenas seis cabeças de

gado. Esses animais fornecem produtos para o consumo da própria família.

Para alimentação do gado é utilizada a área reservada para o repouso, aproveitando os restos

de cultivo. Observa-se nesse local que o sistema de pecuária está integrado a agricultura

tradicional.

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SISTEMA DE TRANSFORMAÇÃO

Na localidade não se verifica mais esse tipo de sistema, apesar da pujança existente no

passado de engenhos e casas de farinha que caracteriza o sistema de transformação, onde da

cana-de-açúcar se extrai a rapadura e da mandioca se obtém a farinha.

FLUXOGRAMA DE INTEGRAÇÃO

A análise da integração entre os sistemas de cultivo permite identificar o grau de

complexidade do sistema de produção, podendo ser classificados como integrados, pouco

integrados e sem integração. No caso do povoado de Mosquito em Lapão, considera-se que se

trata de um sistema de produção pouco integrado (FIGURA 3).

Venda Compra Venda Compra Venda Compra

Sementes Sementes, Sementes,

Agrotóxico Agrotóxico

Sistema de cultivo 1 Sistema de cultivo 2 Sistema de cultivo 3

Feijão Beterraba Cenoura

Quintal

Autoconsumo

ANÁLISE ECONÔMICA

A análise econômica foi realizada com o objetivo de avaliar o potencial de capitalização dos

produtores do povoado. Para tanto, procedeu-se com um levantamento sobre o sistema de

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cultivo desenvolvido, o total de hectares disponibilizados para cada cultura, bem como o

número de trabalhadores empregados, os preços e as quantidades auferidas na produção.

Área total da unidade investigada – 78 ha

Sendo:

Quadro 1

Cultura Área UTF Quantidade PreçoFeijão 43 ha 1,65 UTF 15 sacas/tr R$100,00/sacCenoura 2 ha 2,75 UTF 820/ha R$ 7,00/cxBeterraba 0,5 ha 1,1 UTF 820/ha R$ 4,00/cx

Uma caixa equivale a 20 kg

Calendário

12 meses de cultivo da cenoura e da beterraba

5 meses entre o plantio e a colheita do feijão

Quadro 2

ATIVOS PRODUTIVOSVALORATUAL

VIDAÚTIL DEPRECIAÇÃO

Trator/Implementos 60.000 30 2.000Galpão/Depósito 10.000 50 200Cercas 6.000 30 200Tubos/Equip. de irrigação 15.000 4 3.750Total 91.000 ---- 6.150

Nessa análise foram consideradas as variações médias do preço da cenoura e beterraba. Para

essas culturas, as caixas chegaram a custar no período de safra R$ 2,00 (Dois Reais) e R$ 1,50

(Um Real e Cinqüenta centavos) respectivamente, tendo essa última apresentado um

desempenho negativo. Entretanto, considerando os preços médios no período da entressafra,

obteve-se um desempenho satisfatório para cenoura em relação à beterraba e feijão. Para

melhor compreensão do processo, verifica-se o valor agregado e a renda agrícola para cada

cultura (Gráfico 1).

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Gráfico 1

R$

Cenoura4705

Renda (R$) – RA/UTf Beterraba3320

Área (ha) – ha/UTf

Feijão1338

HaFonte: Elaboração da autora

Essa renda ao ser dividida pelo número de trabalhadores familiares e comparada à área

disponível por trabalhador permite analisar a rentabilidade desses cultivos. Conforme se

observa no gráfico 1, a cultura da cenoura é a mais rentável entre as três estudadas. As

fórmulas utilizadas no cálculo foram: VA = PB – CI – D; RA = VA – S - I – J – RT; RA/Utf e

ha/Utf.

Na perspectiva de investigar a representatividade dos tipos de rendas existentes no povoado,

associou-se as diversas rendas agrícolas oriundas dos cultivos de Cenoura, Beterraba e Feijão

e a renda não-agrícola proveniente da existência de aposentadoria no povoado (Gráfico 2).

Essa última é obtida multiplicando o salário mínimo vigente na época de R$ 200,00 (duzentos

reais) pelos 12 meses do ano. Nessa análise, considerou-se a depreciação apenas para o

cultivo do feijão.

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Gráfico 2

R$/Utf

11620

9220 RENDA NÃO-AGRÍCOLA

4515 Cenoura RENDA AGRÍCOLA

Beterraba1195

Feijão Ha /Utf-143 Depreciação

Fonte: Elaboração da autora

Na descrição do gráfico 3, observa-se que a renda agrícola ainda é maioria no povoado. Esse

resultado é justificado pelo fato de existir, na localidade, apenas uma pessoa na condição de

aposentado, não reproduzindo, portanto, a tendência apresentada em outros locais, onde a

renda não-agrícola tem superado a renda agrícola.

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Gráfico 3 - Renda total; Renda agrícola; Renda não-agrícola

0

10000

20000

30000

40000

50000

60000

70000

Renda agrícola Renda não agrícola Renda total

Renda agrícola Renda não agrícola Renda total

Fonte: Pesquisa de campo sistematização da autora, 2003.

Nesse aspecto, da observação feita à região de Irecê, especificamente ao povoado de

Mosquito, verifica-se que se trata de uma região com grande potencial econômico, mas que

por falta de políticas viabilizadoras de um desenvolvimento rural sustentável, difunde-se a

idéia de que a sustentabilidade do local está na monocultura do feijão, generalizando assim, o

seu plantio. Entretanto, essa concepção não é mais compatível com o desenvolvimento da

localidade. De acordo com Rubem (1997, p.210) “a monocultura de feijão é a principal

responsável pela miséria que assolou a região”.

Como não há mais incentivo para o cultivo do feijão, os moradores de Mosquito, a exemplo

de alguns povoados, dedicam pequenos lotes de suas áreas ao plantio de outras culturas,

também de ciclos curtos, como a beterraba e a cenoura. Nesse povoado, de acordo com as

informações obtidas, a rentabilidade da cenoura supera as demais culturas.

Não obstante ao desempenho econômico apresentado pelo povoado com as lavouras

cultivadas, tem-se que a microrregião de Irecê como um todo, padece de uma assistência mais

efetiva por parte do governo. De acordo com Rubem (ibid) a região precisa de investimentos

em armazenamento, abertura de poços tubulares, bem como um incentivo à irrigação, através

da garantia de compra do produto.

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Conforme estudos realizados em grande parte pela CODEVASF até o ano de 1997 existiam

na região quase 5 mil poços perfurados, sendo utilizados menos de 10 por cento dos recursos

hídricos. Este estudo estimulou o projeto Platô de Irecê que contempla dentre diversos

objetivos o de perenizar os rios Verdes e Jacaré, contribuindo para que estes rios, que são

temporários, tenham água todo o ano.

Nesse aspecto, para fortalecer as formas de produção local, tornando a região um centro de

desenvolvimento rural sustentável, é preciso criar uma identidade local, a fim de que se possa

descobrir uma idéia-guia a qual norteará o pacto territorial que poderá conduzir a região

novamente ao “status” de celeiro de produções dos mais variados gêneros alimentícios. Para

tanto, faz-se necessário criar uma infra-estrutura que dê condições aos agricultores

expandirem as suas produções, abolir barreiras de inserção ao mercado, orientá-los para a

importância da análise de conjuntura, bem como instruí-los quanto à falácia em associar a

região com a monocultura de feijão.

5.2 RESULTADOS DE ESTUDOS NA BAHIA

A idéia presente nesta seção é apresentar, em linhas gerais, casos em que o Guia

Metodológico foi posto em prática e analisar os resultados obtidos. Essas experiências dizem

respeito a trabalhos realizados na Bahia e que foram relatados por Paula, Machado e Schmitz

em seus respectivos trabalhos dissertativos: “Análise-Diagnósticos e Planejamento no Mundo

Rural: em estudo de caso”; “Tendências e contradições na formação regional do Extremo Sul

da Bahia entre 1950 e 2000”; e “Ocupação e Renda no Novo Rural Baiano: Um estudo

comparativo de economias em crise”.

No primeiro trabalho foram considerados os resultados da pesquisa de campo nos

assentamentos rurais do município de Ilhéus, região Litoral Sul. Segundo a autora, apesar dos

assentamentos localizarem-se na mesma região possuem sistemas de produção e itinerários

técnicos distintos, o que acarreta níveis diferenciados de renda.16

16 O termo “itinerário técnico” é um conceito atribuído a sucessão lógica e ordenada de operações culturais(INCRA/FAO, 2004).

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No trabalho de Paula foram entrevistadas 35 famílias de produtores rurais, sendo 12 do

Assentamento Fábio Henrique Cerqueira e 23 do Assentamento Frei Vantuy. Além de

entrevistas e coleta de dados secundários e consultas a representantes dos dois assentamentos,

objetivando compor os respectivos sistemas produtivos típicos.

Em relação ao período de existência, verificou-se que o primeiro assentamento estava em fase

de consolidação, já possuindo lavouras irrigadas, enquanto o segundo, com um pouco mais de

três anos de criação, ainda não tinha obtido uma safra satisfatória. Nesse aspecto, levando-se

em consideração o contexto em que os assentamentos estão inseridos foi possível observar

uma diversidade na composição da renda e formação do patrimônio familiar.

Assim, no critério da tipologia dos produtores rurais foram consideradas como

descapitalizadas as famílias que apresentaram renda agrícola mensal abaixo de R$ 200,00 por

unidade de trabalho familiar, que define o nível de subsistência ou patamar de reprodução

simples. Como já elucidado, esta categoria é composta por aqueles estabelecimentos

familiares onde a renda oriunda da própria produção agrícola é insuficiente para manter a

família (PAULA, 2003).

Nesse estudo, restabeleceu-se, com base nas informações extraídas dos questionários

aplicados, todas as fontes possíveis de renda das famílias durante a safra 2000-2001. A

variável renda, considerada como um bom indicador de desempenho econômico, foi analisada

detalhadamente. Através da análise da renda familiar, pôde-se averiguar as estratégias do

mundo rural brasileiro, onde a renda não-agrícola tem crescido a taxas cada vez mais

elevadas.

Quanto à caracterização dos sistemas de produção típicos dos assentamentos foram

observados quatro sistemas de produção predominante, sendo dois em cada assentamento,

considerados entre os mais representativos segundo os três níveis de reprodução: ampliada;

simples; e indigência, que é uma situação de extrema pobreza do agricultor familiar. De

acordo com Paula, as famílias que tiveram acesso ao crédito direcionaram seus investimentos

à expansão de suas roças e as que se encontravam em dificuldades buscaram complementar a

sua renda com trabalhos extras em outras propriedades e frentes de trabalho das prefeituras.

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Ao ser considerada somente a renda agrícola, amplia-se o número de assentados na condição

abaixo do patamar de reprodução simples. Essas famílias passam a depender de outras fontes

de renda, como a aposentadoria, para a sua sobrevivência (GRÁFICOS 4 e 5).

Fonte: Paula, 2003

Fonte: Paula, 2003

Para facilitar a análise, as 35 famílias observadas foram numeradas em ordem crescente.

Dessa forma, verificou-se que em vários casos, a renda não-agrícola iguala-se ou ultrapassa a

renda agrícola na composição da renda total das famílias e que algumas delas foram

Gráfico 4 - Renda Familiar agrícola PA Frei Vantuy

0

100

200

300

400

500

600

0 1 2 3 4 5 6 7 8 9

Área (ha)

Limite superior do nível de indigência

Renda (R$)

Gráfico 5 - Renda Familiar agrícola PA Fábio Henrique Cerqueira

0

50

100

150

200

250

300

350

400

450

500

0 1 2 3 4 5 6 7 8 9

Área (ha)

Limite superior do nível de indigência

Renda (R$)

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deslocadas da condição de indigência para o nível de reprodução simples em virtude do

incremento da renda não-agrícola, como no caso da família 6 e 13 (TABELA 18).

A renda total anual dessas famílias são de R$ 3.272,47 e R$ 1.287,17, e a renda agrícola de

R$ 932,47 e R$ 557,17, para um total de 6 e 3 pessoas, respectivamente. Nesse aspecto, caso

não sejam agregadas as rendas provenientes de atividades não-agrícolas, essas famílias

passam a auferir uma renda per capita de apenas R$ 155,41/ano e R$ 185,72/ano, sendo

inseridas no nível de indigência.

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Tabela 18 - Tamanho da família, renda familiar total, renda familiar agrícola e rendafamiliar não agrícola dos produtores rurais, em 2001.

Família Quantidade depessoas

Renda total Renda agrícola Renda agrícola Renda percapita

1 9 989,47 989,47 989,47 109,942 5 1.036,47 1.036,47 1.036,47 207,293 10 1.007,47 1.007,47 1.007,47 100,754 8 1.322,47 1.322,47 1.322,47 165,315 5 879,47 879,47 879,47 175,896 6 3.272,47 932,47 932,47 155,417 7 1.679,47 1.274,47 1.274,47 182,078 7 1.504,47 1.504,47 1.504,47 214,929 6 2.197,77 1.717,77 1.717,77 286,3010 4 8.144,47 1.904,47 1.904,47 476,1211 3 1.411,47 1.411,47 1.411,47 470,4912 5 1.357,47 1.357,47 1.357,47 271,4913 3 1.287,17 557,17 557,17 185,7214 3 4.563,17 843,17 843,17 281,0615 3 2.614,53 854,53 854,53 284,8416 6 1.833,17 1.583,17 1.583,17 263,8617 1 807,17 557,17 557,17 557,1718 3 3.435,17 1.675,17 1.675,17 558,3919 7 3.809,17 557,17 557,17 79,6020 5 1.522,17 1.522,17 1.522,17 304,4321 6 3.737,17 597,17 597,17 99,5322 5 2.685,17 1.185,17 1.185,17 237,0323 5 2.397,17 557,17 557,17 111,4324 5 727,17 557,17 557,17 111,4325 3 779,13 679,13 679,13 226,3826 4 1.400,00 1.400,00 1.400,00 350,0027 4 1.000,00 1.000,00 1.000,00 250,0028 4 3.253,17 1.241,17 1.241,17 310,2929 5 2.237,17 1.037,17 1.037,17 207,4330 4 2.674,17 662,17 662,17 165,5431 9 937,17 937,17 937,17 104,1332 3 1.103,17 853,17 853,17 284,3933 6 902,17 662,17 662,17 110,3634 4 776,17 776,17 776,17 194,0435 4 1.025,17 1.025,17 1.025,17 256,29Fonte: Pesquisa de campo 2001 / 2002 (PAULA, 2003).

Da observação da tabela 18, verifica-se que 21 famílias obtêm algum tipo de renda não-

agrícola. Das atividades não-agrícolas realizadas, as referentes aos serviços ligados às frentes

de trabalho na prefeitura de Ilhéus são as predominantes.

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Outro aspecto evidenciado nesse trabalho foi o fato do assentamento Frei Vantuy, recém

implantado, apresentar rendas não-agrícolas em quase todos os agricultores,

contraditoriamente ao verificado no de Fábio Henrique Cerqueira, dada a sua trajetória

produtiva e a sua distância à sede do município. A relação da renda total, renda agrícola

familiar e renda não-agrícola presente nos assentamentos em 2001 é descrita nos gráficos 6 e

7 (PAULA, 2003).

Gráfico 6 - Renda total; Renda agrícola; Renda não-agrícola no assentamento FábioHenrique, 2001.

Fonte: Pesquisa de campo 2001 / 2002 (PAULA, 2003).

0

2000

4000

6000

8000

10000

12000

14000

16000

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12

Produtores rurais

R$

Renda TotalRenda agrícolaRenda não agrícola

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Gráfico7 - Renda Total, Renda agrícola e Renda não-agrícola no assentamento FreiVantuy, 2001.

Fonte: Pesquisa de campo 2001 / 2002 (PAULA, 2003).

A constatação de que a maioria das famílias que obtêm rendas não-agrícolas se encontram no

assentamento de Frei Vantuy evidencia que a nova dinâmica do mundo rural surge num local

ou assentamento em que os agricultores não estando presos às práticas da agricultura

tradicional, tornam-se passíveis a novas experiências.

Um fator, também, observado no trabalho é que a grande maioria dos assentados é originária

do próprio município em que se localiza o projeto. Ao fixar a mão-de-obra local, confirma-se

uma característica da reforma agrária, qual seja, a de ser um instrumento essencial para o

desenvolvimento local dos municípios, na medida em que possa ser utilizada para amenizar a

falta de emprego e inchaço urbano (MACHADO apud PAULA, 2003).

O segundo trabalho foi realizado na região econômica do Extremo Sul da Bahia, que é uma

das poucas regiões do Estado que mais se moderniza e diversifica-se tecnologicamente e

como conseqüência apresenta situações paradoxais. Nesse trabalho é feito um estudo do

sistema agrário do eixo intermunicipal Itamaraju-Prado e, também, analisado

microeconomicamente os sistemas de produção dos assentamentos rurais situados nesses

municípios.

0

500

1000

1500

2000

2500

3000

3500

4000

4500

13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35

Produtores rurais

R$

Renda TotalRenda agrícolaRenda não agrícola

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A partir desse trabalho de Machado em que os assentamentos rurais visitados se constituem

numa amostra dirigida, não aleatória, realizada a partir das orientações dos primeiros

informantes-chaves, obtêm-se modelos de sistemas de produção representativos da realidade

dos assentados, ao tempo em que se destaca, semelhante ao trabalho descrito anteriormente, a

importância da renda não-agrícola na renda total das famílias dos beneficiados no processo da

reforma agrária.

A pesquisa de campo foi realizada entrevistando 27 famílias de produtores rurais, sendo 10 do

Assentamento 1o de Abril, 7 do Assentamento Riacho das Ostras, 3 do Assentamento Nossa

Senhora do Rosário, no município de Prado e 7 do Assentamento Bela Vista, no município de

Itamaraju. O quinto assentamento a compor a pesquisa foi o Assentamento de Santa Luzia,

em Prado, onde se realizaram entrevistas qualificadas com alguns produtores rurais. Além

dessas foram consultados os técnicos agrícolas da Cooperativa Regional dos assentamentos

rurais do MST, da Empresa Baiana de Desenvolvimento Agrícola (EBDA) e da Comissão

Especial de Planejamento da Lavoura Cacaueira (CEPLAC) em Itamaraju e os representantes

do Assentamento Santa Luzia, em Prado. Quanto às tipologias de produtores identificadas,

tem-se que elas foram estabelecidas a partir de leituras de paisagem e das entrevistas

qualificadas.

Observou-se nessa pesquisa que os sistemas de produção de cada assentado diferenciavam-se

entre si, quanto à quantidade e combinação de lavouras, criatórios, sistemas de

beneficiamento, quantidades colhidas, nível de integração entre os sub-sistemas, maior

complexidade, e, por conseguinte, níveis de renda diferenciados. A heterogeneidade na forma

de produzir determina a existência de produtores capitalizados ou em processo de

capitalização, assim como há os assentados em via de endividamento e os semi-proletariados

que somente plantão feijão, milho e trabalham em outras atividades agrícolas e em atividades

não-agrícolas temporariamente, fora da unidade familiar.

Dessa forma, no nível de reprodução simples, encontrou-se produtores de 5ha do

Assentamento 1o de Abril e produtores com áreas de 18 a 20ha do Assentamento Bela Vista e

no nível de indigência apenas 3 produtores. Entretanto, tal como o trabalho de Paula,

constatou-se que se considerada somente a renda agrícola, amplia-se o número de assentados

em que a renda total familiar é inferior à cesta básica familiar, conforme se observa no gráfico

8.

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Gráfico 8 - Renda familiar agrícola e cesta básica familiar anual dos sistemas deprodução de assentamentos rurais no Extremo Sul da Bahia, em 1999

Renda agrícola familiar eCesta básica familiar

27

15

Reprodução ampliada 11

18 16 26 24 13 1 25 12 20 62 s. m. (ano)

Reprodução simples 14 4 9 22 8 17 3 Cesta básica (ano) 21 2 23 C 5 7 Indigência

10 0 5 10 15 20 A B 19 Área (ha)

FONTE: pesquisa de campo, 1999 (MACHADO, 2000).Nota: a) os números identificam os 27 produtores rurais. Esse gráfico é uma representação-síntese dos gráficos individuais de cadaprodutor. O preço total da cesta básica é diferente para cada família, não podendo estar explícita sua representação numérica.

b) as figuras circulares mais cheias representam a agregação de situações estimadas iguais. A letra A representa cincoprodutores do Assentamento Santa Luzia, sem renda agrícola, uma vez que as respectivas rendas anuais estimadas em R$1.768,00provêm de aposentadorias. A letra B representa 20 assentados sem renda agrícola, porém com renda anual estimada em R$ 600,00,proveniente de atividade não-agrícola eventual. A letra C representa 24 assentados com renda anual estimada em R$ 600,00,proveniente de plantio de milho, feijão e mandioca (roça) em pequenos lotes no próprio assentamento.

Para efeito de estudo, elaborou-se uma tipologia constituída de três produtores típicos. Nesse

aspecto foram escolhidos os assentados de n.7, 22 e 11, considerados os mais representativos

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entre os sistemas de produção analisados. O primeiro deles, pertencente ao Assentamento 1°

de Abril possui uma renda agrícola familiar anual de R$ 968,00, correspondendo à renda total,

inferior à cesta básica anual de R$ 1.117,20 e ao salário mínimo anual de R$ 1.632,00. Essa

condição, tratando-se de uma família de 5 pessoas que auferem uma renda per capita de R$

193,60/ano, caracteriza o produtor no nível de indigência.

O segundo, n. 22, que é localizado no Assentamento Bela Vista representa o nível de

reprodução simples, onde a renda agrícola obtida está em torno de R$ 2.830,75/ano,

correspondendo à renda total da família. Considerando a existência de 4 membros na família,

a renda per capita anual é de R$ 707,69, superando a cesta básica anual que é de R$ 578,64 e

de R$ 629,05 na relação R/UTf para 4,5 UTf trabalhando por ano, na unidade familiar.

O terceiro, assentado de n.11, representativo do nível de reprodução ampliada possui uma

renda agrícola anual de R$ 9.158,33. Para uma família de 3 pessoas, a sua renda per capita é

de R$ 3.052,78, com uma cesta básica anual de R$ 406,08. E se considerado a quantidade de

UTf igual a 1,5 unidades de trabalho familiar a R/UTf é de R$ 6.105,5, sendo uma das

relações mais altas de todos os produtores.

Nesse aspecto, assim como no trabalho de Paula, o autor também descreveu a dinâmica na

mudança da condição do produtor entre os três níveis de reprodução analisado, quando se

agrega a renda não-agrícola à renda agrícola. Segundo Machado, a dependência por este tipo

de renda é uma tendência nacional, verificada, principalmente na região do Norte e Nordeste

do país.

De acordo com Machado (2000, p. 31), observando a tabela 19, das 27 famílias entrevistadas,

10 obtêm algum tipo de renda não-agrícola, correspondendo a 37% do total da amostra.

Quando consideradas as 49 do Assentamento Santa Luzia, perfazendo um total de 76,

constata-se que 35 obtêm algum tipo de renda não-agrícola, representando 46% do total.

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Tabela 19 - Tamanho da família, cesta básica familiar, renda familiar agrícola, rendafamiliar não-agrícola e renda familiar total de produtores rurais no Extremo Sul daBahia, em 1999.Assentamento 1o

de AbrilTamanhoda família

Cesta básicafamiliar

Renda familiaragrícola

Rendafamiliar não-

agrícola

Rendafamiliar total

Produtor 1 5 1.688,16 4.213,00 0 4.213,00Produtor 2 7 1.368,00 1.158,00 1.768,00 2.926,00Produtor 3 5 924 2.088,00 0 2.088,00Produtor 4 3 907 3.159,50 3.150,00 6.309,50Produtor 5 3 1.194,12 1.134,00 1.440,00 2.574,00Produtor 6 5 1.454,88 3.934,00 0 3.934,00Produtor 7 5 1.117,20 968 0 968,00Produtor 8 3 1.564,80 2.654,20 3.536,00 6.190,20Produtor 9 5 1.041,12 3.025,00 3.536,00 6.561,00Produtor 10 5 1.849,92 721,8 1.768,00 2.489,80AssentamentoRiacho das OstrasProdutor 11 3 406,08 9.158,33 0 9.158,33Produtor 12 11 1.514,76 5.845,00 0 5.845,00Produtor 13 6 1.149,72 5.867,00 0 5.867,00Produtor 14 3 625,32 2.893,70 0 2.893,70Produtor 15 9 817,62 10.928,00 0 10.928,00Produtor 16 6 1.134,24 7.202,50 1.768,00 8.970,50Produtor 17 5 965,04 2.378,00 1.768,00 4.146,00

Assentamento BelaVistaProdutor 18 5 1.076,64 6.634,75 0 6.634,75Produtor 19 5 1.079,16 -18,25 0 -18,25Produtor 20 1 1.383,60 4.003,75 630,00 4.633,75Produtor 21 5 591,48 1.188,75 1.768,00 2.956,75Produtor 22 4 578,64 2.830,75 0 2.830,75Produtor 23 6 1.494,72 1.133,75 0 1.133,75Produtor 24 4 809,28 4.887,95 0 4.887,95Assentamento N.Sra do RosárioProdutor 25 5 441,96 4.150 0 4.150Produtor 26 5 396 6.173,40 0 6.173,40Produtor 27 5 636,72 14.495,00 0 14.495,00AssentamentoSanta LuziaProdutores A (5) 0 n.d. 0 1768,00 1768,00Produtores B (20) 0 n.d. 0 600,00 600,00Produtores C (24) 0,5 n.d. 600,00 0 600,00FONTE: pesquisa de campo, 1999 (apud MACHADO, 2000).

Dos assentamentos analisados, verifica-se que o de 1° de Abril possui 6 pessoas com rendas

não-agrícolas, de um total de 10 entrevistados. A margem de 60% reflete a importância que

esse tipo de renda tem representado na composição do rendimento total do agricultor. Através

da tabela 20 é possível verificar a relevância das rendas não-agrícolas nesse assentamento,

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chegando a corresponder a 71,01% da renda total de um assentado. No Assentamento Santa

Luzia essa participação alcança 100%.

Tabela 20 - Estimação da renda agrícola e renda não-agrícola de produtores-assentados,em 1999.

Produtor Rendaagrícola

(RA)

Renda não-agrícola

(RN)

Renda total(RT)

(RA/RT)*100%

(RN/RT)*100%

1o de Abril1 (A) 4.213,00 0 4.213,00 100,00 02 (A) 1.158,00 1.768,00 2.926,00 39,58 60,423 (A) 2.088,00 0 2.088,00 100,00 04 (A) 3.159,50 3.150,00 6.309,50 50,01 49,995 (A) 1.134,00 1.440,00 2.574,00 44,06 55,946 (A) 3.934,00 0 3.934,00 100,00 07 (A) 968,00 0 968,00 100,00 08 (A) 2.654,20 3.536,00 6.190,20 42,87 57,129 (A) 3.025,00 3.536,00 6.561,00 46,10 53,89

10 (A) 721,80 1.768,00 2.489,80 28,99 71,01Riacho dasOstras

11 9.158,33 0 9.158,33 100,00 012 5.845,00 0 5.845,00 100,00 013 5.867,00 0 5.867,00 100,00 014 2.893,70 0 2.893,70 100,00 015 10.928,00 0 10.928,00 100,00 016 7.202,50 1.768,00 8.970,50 80,29 19,7117 2.378,00 1.768,00 4.146,00 57,35 42,65

Bela Vista18 6.634,75 0 6.634,75 100,00 019 - 18,25 0 - 18,25 100,00 020 4.003,75 630,00 4.633,75 86,40 13,6021 1.188,75 1.768,00 2.956,75 40,20 59,8022 2.830,75 0 2.830,75 100,00 023 1.133,75 0 1.133,75 100,00 024 4.887,95 0 4.887,95 100,00 0

N. Sra. doRosário

25 4.150 0 4.150 100,00 026 6.173,40 0 6.173,40 100,00 027 14.495,00 0 14.495,00 100,00 0

Santa Luzia20 assentados(renda média)

0 600,00 600,00 0 100,00

5 assentados 0 1768,00 1768,00 0 100,0024 assentados 600,00 0 600,00 100,00 0

FONTE: Pesquisa de campo, 1999; sistematização do autor (MACHADO, 2000).

Para o autor o crescimento das atividades não-agrícolas, assim como o aumento do número de

aposentados e pensionistas reflete que a renda familiar vem sendo incrementada tanto por

mudanças na natureza das atividades laborais, quanto pela própria inatividade. A ampliação

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do número de beneficiários aposentados e pensionistas se contrapôs à queda da renda agrícola

nas décadas de 80 e 90.

Esse processo se refletiu na minimização do empobrecimento de segmentos rurais, baseados

na agricultura familiar e, por conseqüência, num efeito residual de contenção do êxodo rural,

para os filhos ainda agricultores desses inativos previdenciários. Dessa forma, tanto a

aposentadoria e a pensão, como as atividades não-agrícolas tipicamente urbanas passam a

representar estratégias de sobrevivência para os filhos dos agricultores que dependem dos

mais velhos para se reproduzir (MACHADO, 2000).

O terceiro trabalho analisado é o de Schmitz, que semelhantemente aos anteriores, identifica o

tipo de renda predominante entre os agricultores rurais, nos últimos anos. A sua avaliação é

centrada nos impactos do modelo de exploração agrícola produtivista sobre as ocupações e

rendas das famílias residentes no meio rural nos municípios de Irecê e Ilhéus, ambos no

Estado da Bahia.

Para compor a sua análise, o autor realizou entrevistas com 25 produtores em Irecê e 15 em

Ilhéus. Da sua observação, inferiu-se que em ambos municípios o predomínio das rendas

exógenas se dá com as aposentadorias, podendo variar entre 39% a 99% da renda total das

famílias que recebem esse tipo de renda.17 Considerando somente as rendas exógenas, as

aposentadorias podem atingir de 47% a 100%.

Na tabela 21 há uma demonstração de quanto cada parcela da renda representa na composição

do rendimento familiar. De acordo com as informações obtidas nesse trabalho, uma grande

parcela das rendas auferidas em Irecê são provenientes das transferências do Governo e as

diárias realizadas. Embora sejam menores do que a participação da aposentadoria, elas

possuem, quando associadas, um caráter distributivo maior. E quando agregadas às

aposentadorias tornam as rendas exógenas mais significantes para o município.

17 O autor considera rendas exógenas como resultado da agregação de outras rendas agrícolas (diárias), outrasrendas provenientes de transferências governamentais, aposentadorias e rendas não-agrícolas.

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Tabela 21 – Composição da renda total líquida, segundo renda agrícola,

aposentadorias e outras rendas não-agrícolas, segundo os produtores pesquisados nos

municípios de Irecê/BA e Ilhéus/BA em 2002

Renda Agrícola(RA) Aposentadorias (AP) Outras Rendas Não-

agrícolas (RNA)

Renda Exógena (RE)(ORA+OR18+AP+RNA

)

Renda Total(RT)

(RA+RE)

Município /

Produtor

R$ % RT R$ % RE % RT R$ % RE % RT R$ % RT R$

Irecê1 5.635 48 0 0 0 6.000 100 52 6.000 52 11.6352 3.604 100 0 0 0 0 0 0 0 0 3.6043 1.710 40 2.520 100 60 0 0 0 2.520 60 4.2304 539 18 2.520 100 82 0 0 0 2.520 82 3.0595 517 74 0 0 0 0 0 0 180 26 6976 507 22 0 0 0 0 0 0 1.815 78 2.3227 1.325 31 0 0 0 2.574 86 60 2.979 69 4.3048 7.734 100 0 0 0 0 0 0 0 0 7.7349 -247 -2 5.040 47 48 5.200 48 50 10.730 102 10.483

10 903 26 2.520 100 74 0 0 0 2.520 74 3.42311 -833 30 0 0 0 0 0 0 580 -144 -25312 1.973 87 0 0 0 0 0 0 300 13 2.27313 2.971 51 2.520 88 43 0 0 0 2.880 49 5.85114 1.206 91 0 0 0 0 0 0 120 9 1.32615 374 27 0 0 0 0 0 0 1.010 73 1.38416 294 19 0 0 0 0 0 0 1.282 81 1.57617 300 10 2.520 95 86 0 0 0 2.646 90 2.94618 411 25 0 0 0 0 0 0 1.230 75 1.64119 -3 -0 7.560 98 98 0 0 0 7.740 100 7.73720 72 0,4 19.340 99 99 0 0 0 19.520 100 19.59221 87 1,7 5.040 100 98 0 0 0 5.040 98 5.12722 545.626 100 0 0 0 0 0 0 0 0 545.62623 387 16 0 0 0 0 0 0 2.032 84 2.41924 1.403 36 2.520 100 64 0 0 0 2.520 64 3.92325 180.886 100 0 0 0 0 0 0 0 0 180.886

Ilhéus1 3.167 100 0 0 0 0 0 0 0 0 3.1672 3.898 100 0 0 0 0 0 0 0 0 3.8983 3.531 100 0 0 0 0 0 0 0 0 3.5314 2.179 100 0 0 0 0 0 0 0 0 2.1795 1.716 100 0 0 0 0 0 0 0 0 1.7166 4.351 100 0 0 0 0 0 0 0 0 4.3517 729 9,2 0 0 0 7.200 100 91 7.200 91 7.9298 876 15 0 0 0 4.800 100 85 4.800 85 5.6769 1.117 31 2.520 100 69 0 0 0 2.520 69 3.637

10 822 20 2.520 76 61 0 0 0 3.320 80 4.14211 3.899 61 2.520 100 39 0 0 0 2.520 39 6.41912 961 98 0 0 0 0 0 0 20 2 98113 7.556 100 0 0 0 0 0 0 0 0 7.55614 - 100 0 0 0 0 0 0 0 0 -125.75115 432.882 100 0 0 0 0 0 0 0 0 432.882

Fonte: pesquisa de campo, 2002 (SCHMITZ, 2003).

A mesma constatação não foi verificada para Ilhéus, em virtude dos programas assistenciais

do governo contemplarem somente famílias residentes em municípios com baixo Índice de

Desenvolvimento Humano (IDH).

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Nessa mesma tabela, verifica-se que as rendas não-agrícolas, embora não tão freqüentes,

quando observadas responde por uma grande parcela da remuneração total da família,

variando de 50% a 91%. Quando comparado às rendas não-agrícolas auferidas em cada

município, observa-se que em Ilhéus elas são bastante altas. Embora esse tipo de renda seja

encontrado em poucos agricultores pesquisados há uma relativa significância, comparadas às

rendas totais das famílias.

A análise do trabalho de Schmitz associado ao de Paula e de Machado, além da experiência

realizada no município de Lapão sugere que a dependência das economias locais,

exclusivamente, em relação à atividade agrícola apresenta-se cada vez mais reduzida. Com

uma amostra de 103 agricultores pesquisados, sendo 1 verificado na viagem à Lapão; 35 do

primeiro trabalho apresentado; 27 do segundo e 40 do terceiro foi possível também perceber

que o crescimento das atividades não-agrícolas e a importância assumida pela aposentadoria

influenciam a decisão dos filhos dos agricultores, ou até mesmo, dos próprios pais em

abandonar a zona rural.

Considerando que no trabalho de Paula foram encontrados 21 assentados recebendo algum

tipo de renda não-agrícola, no de Machado 10 assentados e no de Schmitz 27, percebe-se que

as rendas oriundas da própria atividade agrícola têm se tornado cada vez menos presentes na

zona rural. Essa perspectiva conduz a uma situação em que Silva chamou de Novo Mundo

Rural onde um conjunto de atividades ligadas à moradia, ao lazer, a prestação de serviços,

etc., tem sido ocupadas por pessoas originárias das atividades agrícolas tradicionais.

Com a observação dos resultados apresentados nos respectivos trabalhos, constata-se para

uma amostra de 103 entrevistados, sendo que 59 deles estão inseridos em algum tipo de

atividades não-agrícolas, são aposentados ou recebem algum tipo de transferências

governamentais, um percentual de 57% de pessoas complementando a renda total da família

com outras formas de rendas. Esse resultado é indicativo de que até mesmo nas regiões

consideradas menos desenvolvidas, o crescimento das atividades não-agrícolas já é uma

realidade.

18 OR significa outras rendas agrícolas provenientes de diárias do trabalho rural em outras propriedades.

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Na Bahia, em decorrência da maioria da população rural se concentrar no semi-árido, região

freqüentemente atingida pelas secas, verifica-se o crescimento do número de famílias

pluriativas, que ao buscarem novas ocupações não-agrícolas quaisquer, acabam tendo baixo

nível de remuneração, por serem precárias e devido ao baixo nível educacional da população

rural (SCHMITZ, 2003). Quando analisado os municípios de Irecê, Ilhéus, Itamaraju e Prado,

contemplados nos trabalhos desses autores é possível inferir que cada um tem a sua dinâmica

própria.

No município de Irecê, devido à desqualificação das ocupações e o baixo nível educacional,

não somente as rendas agrícolas, como as não-agrícolas são responsáveis por remunerações

relativamente baixas. Nesse aspecto, a composição da renda familiar por aposentadorias e as

transferências governamentais assumem um papel de agentes revitalizadores da localidade, ao

garantir a alimentação de famílias inteiras e investir na produção agrícola. Dessa forma, nesse

município as rendas exógenas são mais importantes do que em Ilhéus.

Em Ilhéus é possível constatar, através da análise das tabelas apresentadas, que a remuneração

das famílias provenientes da aposentadoria é menos freqüente. As rendas não-agrícolas são

mais significativas, em termos de valores, uma vez que supre as necessidades básicas

familiares. Segundo Schmitz (2003), em virtude das altas rendas não-agrícolas, apesar de

pouco freqüentes, o município possui 36% dos rendimentos provenientes das rendas

exógenas.

Enquanto no eixo Itamaraju – Prado, observa-se que o crescimento das atividades não-

agrícolas e da quantidade de aposentados e pensionistas representam estratégias de

sobrevivência de um grupo familiar. A freqüência encontrada para as rendas não originárias

das atividades agrícolas permite identificar que esse tipo de renda é uma importante

alternativa encontrada pelos produtores da região para minimizar o empobrecimento de

segmentos rurais, baseados na agricultura familiar.

Nesse aspecto, verifica-se que o crescimento apresentado pelas atividades não-agrícolas,

levando-se em consideração a estrutura econômica de cada localidade, remete para a questão

da necessidade de se reformular as políticas voltadas para a agricultura familiar. Entendendo-

se que a proliferação de atividades, tipicamente urbanas, na zona rural, assim como o

fenômeno da política previdenciária como política social compensatória está presente entre os

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produtores rurais, evidencia-se a iminência de que a dinâmica do novo mundo rural possa agir

sobre o processo de expulsão dos moradores da zona rural.

6 PERSPECTIVAS

A idéia presente nesse capítulo é analisar sob o âmbito do Programa Nacional de

Fortalecimento da Agricultura Familiar – PRONAF até que ponto a ação do Estado é eficaz

para conduzir o desenvolvimento rural/local de resgate da agricultura familiar que,

marginalizada pela política de modernização da agricultura brasileira verificada nas últimas

décadas, conduziu ao enraizamento de uma massa de trabalhadores excluídos.

É nesse contexto que se faz uma abordagem da estrutura, ações e limites desse programa na

Bahia, a fim de que possa ser identificados os avanços após a sua implementação para se

atingir o desenvolvimento rural nos campos baianos. Para Buainain, Romeiro e Guanziroli

(2002, p.4) os fatos e a história mostram que apesar das mudanças verificadas no campo, um

projeto de desenvolvimento rural apoiado na produção familiar é de suma importância para

eliminação da pobreza.

Nesse mesmo sentido, Veiga defende que é necessário formular políticas de desenvolvimento

rural integrado, como políticas agrárias e agrícolas para o fortalecimento da agricultura

familiar juntamente com políticas de geração de novas oportunidades de empregos rurais não-

agrícolas (BUAINAIN; ROMEIRO; GUANZIROLI, 2002, p.5).

Assim, acredita-se que o fortalecimento da agricultura familiar é de grande relevância para o

desenvolvimento rural sustentável. Para tanto, necessita-se de um apoio mais efetivo das

instituições governamentais. Uma iniciativa nessa direção surgiu com o PRONAF, programa

que atua no sentido de auxiliar os agricultores familiares a explorarem as possíveis

oportunidades agrícolas e não-agrícolas de geração de renda. Com a consolidação dessa

agricultura, o desenvolvimento rural é desencadeado, passando o PRONAF a agir levando em

consideração as iniciativas de âmbito local.

Esse programa foi criado em 1996 com o objetivo de não somente melhorar o nível de renda,

mas também propiciar condições para o aumento da capacidade produtiva e da geração de

empregos. Assumido como proposta do governo brasileiro para o desenvolvimento rural, ele

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representa um reconhecimento da potencialidade da agricultura familiar em absorver mão-de-

obra e sustentar o homem no campo. A idéia defendida segue no mesmo sentido da concepção

do Banco Mundial, em que as novas políticas públicas devem ser orientadas de forma a

fomentar as potencialidades já existentes em nível local (ORTEGA; CARDOSO, 1998, p.

280).

6.1 POLÍTICA DE DESENVOLVIMENTO RURAL

A primeira iniciativa na direção de um apoio mais efetivo das instituições governamentais

surgiu, segundo Veiga (2000, p.32) com a Lei Complementar 93, de 4 de fevereiro de 1998,

que instituiu o “Fundo de Terras e da Reforma Agrária: Banco da Terra”. Esta determina que

o Banco da Terra permitirá a participação de Estados e Municípios de forma descentralizada

na elaboração e execução de projetos, e que a comunidade assumirá um papel importante na

distribuição de terra e implantação de projetos.

De acordo com Veiga (2000, p.34):

O surgimento de associações de municípios para a elaboração de planos dedesenvolvimento microrregionais, com a participação de cooperativas,escolas, pequenas agroindústrias e outras entidades formais ou informaistanto podem dar origem a projetos de desenvolvimento local, como garantira execução dos programas governamentais voltados a um desenvolvimentorural redutor de pobreza.

Uma outra iniciativa se constitui no PRONAF que na tentativa de atingir o seu objetivo foi

segmentado em diversas linhas de ação, conhecidas como Pronaf-crédito, Pronaf-Infra-

estrutura e Serviço, Pronaf-capacitação, e Negociação de políticas públicas. Apesar dessas

linhas fazerem parte de uma mesma premissa, em que a agricultura familiar é apresentada

como uma condição essencial para o desenvolvimento rural sustentável, há divergências

quanto ao grau de importância das mesmas.

As três primeiras linhas apresentadas são consideradas as mais importantes. A primeira

referente ao financiamento da produção se constitui numa forma de disponibilizar recursos

para custeio e investimento do agricultor familiar. Trata-se de um crédito subsidiado

direcionado para as atividades agropecuárias e não-agropecuárias, sendo os agricultores

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escolhidos mediante a utilização de alguns critérios, como utilizar mão-de-obra familiar,

podendo ter até dois empregados permanentes; ter no mínimo 80% da renda familiar

proveniente da exploração agropecuária, pesqueira, agrícola ou extrativa; e residir na

propriedade ou em povoado próximo; etc.

Nesse contexto, o agricultor hoje é classificado em quatro grupos: A - são os assentados

provenientes do processo de reforma agrária; B - refere-se às famílias muito pobres; C -

famílias com renda bruta anual entre R$ 1.500,00 e R$ 10.000,00; e D - famílias com renda

bruta anual entre R$ 10.000,00 e R$ 30.000,00, este último grupo é responsável pela

contratação da mão-de-obra temporária e de até dois empregados permanentes, existentes nas

propriedades.

A segunda linha responsável pelo apoio financeiro à infra-estrutura e serviços municipais em

prol dos agricultores familiares preconiza ampliar e modernizar a infra-estrutura e os serviços

necessários ao fortalecimento da agricultura familiar. Através desta, incentiva-se a capacidade

de organização e ação dos agentes, direta ou indiretamente ligados à agricultura familiar,

sendo realizados por meio dos Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural (CMDR's).

A terceira linha busca capacitar os agricultores familiares, proporcionando-os conhecimentos

necessários à elaboração de Planos Municipais de Desenvolvimento Rural. E a quarta, refere-

se à articulação feita pelos gestores do Programa em prol da agricultura familiar e das

políticas públicas.

Segundo Ortega e Cardoso (1998, p.282) "o fortalecimento da agricultura familiar é defendido

nos documentos do PRONAF como o caminho para garantir a dinamização não só dos

espaços rurais, como de todo um universo microurbano". Uma pesquisa de campo realizada

em 2001 e que tem o propósito de verificar o impacto da linha de crédito do Pronaf para os

agricultores familiares dos grupos "B", "C" e "D" traz a discussão da operacionalidade do

Pronaf-crédito na Bahia. Esta pesquisa se verificou no âmbito do Projeto de Cooperação

Técnica firmado entre a Secretaria de Agricultura Familiar (SAF), o Ministério do

Desenvolvimento Agrário e o Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura

(IICA), como parte do projeto "Elaboração de uma Metodologia de Monitoramento Contínuo

do Impacto do Pronaf a partir de Informações dos Beneficiários", aplicada em oito estados

brasileiros (COUTO FILHO; CERQUEIRA, 2002).

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Através dessa pesquisa, verifica-se que o crédito influencia de forma positiva, contribuindo

para melhoria dos indicadores, no que diz respeito à produtividade. Entretanto, segundo a

finalidade do crédito de custeio, constatou-se que os agricultores, além de aplicarem os

recursos nas lavouras, também o utilizaram em atividades não-produtivas, como despesas de

ordem pessoal, o que caracteriza que o crédito, embora essencial, deve estar atrelado a um

conjunto de ações capazes de otimizar a tomada de recursos19 (CERQUEIRA; ROCHA, 2002,

p.115).

O caso dos produtores de leite do município de Lapão no Estado da Bahia constitui uma

experiência positiva do PRONAF, cuja proposta é garantir não só a superação das

dificuldades econômicas e sociais dos produtores familiares, mas também, elevar esse

segmento a uma posição estratégica para o desenvolvimento local (ORTEGA; CARDOSO,

1998, p.268).

Ao mesclar os aspectos econômicos aos aspectos sociais, históricos, políticos e ambientais,

desenvolve-se a defesa da garantia da sobrevivência e da melhoria das formas de vida e de

produção preexistentes, como maneira de garantir uma inserção ativa no mercado, sem perda

de identidade e sem exclusão social.

O fortalecimento das formas de produção locais, através de uma concentração de interesses

sedimentada na própria localidade assume uma extrema relevância nesse processo. O

desenvolvimento de uma identidade local na procura da “idéia-guia”, que norteie o pacto

territorial da comunidade é imprescindível, pois só, assim, poder-se-á superar os limites dados

por condições naturais, políticas e econômicas.

Para tanto, um Diagnóstico Rápido Participativo (DRP) deve ser desenvolvido, com o

objetivo de que, ao sistematizar e fazer uma análise da situação social e econômica da

agricultura familiar, se entenda e explicite suas especificidades. Essa medida possibilitará

maior probabilidade de êxito na execução de uma política de desenvolvimento rural, na

medida que se implemente ações mais ajustadas à realidade de cada grupo de produtores.

19 É importante salientar que as informações colhidas se referem ao primeiro ano da pesquisa.

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Além do DRP, pode ser aplicado o Plano Diretor Agrícola Municipal (PDAM) que se

constitui num instrumento de auxílio à formulação de políticas públicas e sistematização de

prioridades. Através desse sistema, as lideranças locais organizam o banco de dados,

treinando técnicos para utilizar todos os recursos de forma autônoma.

Com o PDAM que sistematiza os dados têm-se como resultado a manutenção da agricultura

familiar, juntamente com DRP que tem como finalidade a identificação dos principais

problemas sentidos pelos produtores e as idéias que estes têm de como solucioná-los, assim

como a sistematização dos mesmos e possíveis soluções.

Assim, chamar à atenção para essa realidade, leva à busca de soluções para a ausência de

assistência aos produtores familiares, responsáveis por alimentar um tipo de agricultura que

tem como aspecto positivo a redução dos custos de transação e o custo de gestação da mão-

de-obra, uma vez que ela é de origem familiar.

6.1.1 Estrutura, Ações e limites do PRONAF na Bahia

Neste item é discutido a estrutura, ações e limites do PRONAF na Bahia, de forma a avaliar

os impactos desse programa no estado. Nesse aspecto, o objetivo é auxiliar as propostas de

desenvolvimento rural sustentável, que em última análise deverá exprimir a capacidade de

articulação entre as forças dinâmicas da zona rural baiana, no sentido de evitar que RMS sofra

pressões nos moldes das demais regiões do país.

Considerando o grau de heterogeneidade da agricultura baiana e o grande contingente da sua

população rural, a ação do PRONAF pode, rompendo com alguns aspectos limitantes como o

baixo nível de escolaridade dos beneficiários e a falta de integração entre os diferentes

agentes, contribuir para que a agricultura familiar assuma uma posição estratégica na

construção de alternativas para geração de emprego e renda. Esse programa promove, ao

desburocratizar e democratizar o acesso ao crédito, bem como as linhas de infra-estrutura e

serviços e capacitação, não somente o crescimento econômico de agricultores que

tradicionalmente foram excluídos do financiamento oficial, mas também reduz a pobreza

rural, impactando, em última análise, na zona urbana.

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Nesse aspecto, discute-se os resultados apresentados por uma pesquisa realizada pela

Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEI) no âmbito do Projeto de

Cooperação Técnica, contratado junto à Fundação de Economia de Campinas (Fecamp)

(CERQUEIRA; ROCHA, 2002).

Os dados da pesquisa levantados no período de março de 2002 em três municípios baianos,

Ituaçu, Monte Santo e Maragogipe tiveram como objetivo dar início a um estudo dos

impactos da linha de crédito do PRONAF para os agricultores familiares dos grupos “B”, “C”

e “D”. Através desta, buscou-se captar a percepção dos agricultores quanto às mudanças

ocorridas devido ao uso do crédito e as dificuldades enfrentadas.

Para dar maior consistência ao trabalho, a pesquisa inclui na análise o agricultor que não

utilizou o PRONAF no período de referência da mesma, a fim de que se possa fazer uma

comparação dos dados obtidos. Composta das etapas de coleta de informações em campo,

crítica dos questionários, alimentação da base de dados e elaboração do relatório

regional/estadual, criou-se condições para melhor compreender a dinâmica do PRONAF na

Bahia.

Dos três municípios contemplados, apenas os agricultores de Maragogipe conheciam o

PRONAF. Esse município foi representativo do grupo D, por possuir agricultores com

melhores níveis de renda, e, conseqüentemente, melhor escolaridade. Fatores como esse e

também da qualidade de vida, acesso ao crédito e aos serviços de assistência técnica foram

utilizados na comparação entre os chamados “pronafianos” que tiveram acesso ao crédito e os

“não-pronafianos”. Nesta análise, não foram considerados os dados relativos ao grupo C, em

virtude da não representatividade do número de questionários obtidos (CERQUEIRA;

ROCHA, 2002, p.113).

De acordo com os dados da pesquisa a renda média dos “pronafianos” foi, no ano de 2001,

menor que a dos “não-pronafianos”, o que foi atribuído ao fato de que nesta categoria se

encontrar um maior número de pessoas com idades acima de 65 anos que contam com os

rendimentos da previdência social. Um outro aspecto observado é que no grupo B, onde se

apresenta uma maior diversificação na renda, o rendimento proveniente da atividade agrícola

representa apenas 37% da renda total obtida pela categoria. Confirmando a discussão feita em

capítulos anteriores, onde se constata que a agricultura está se convertendo em uma atividade

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que responde cada vez menos pela renda e pelo tempo de ocupação da família rural,

característica do novo mundo rural.

Quanto à produtividade nos estabelecimentos das famílias entrevistadas, observou-se um

melhor resultado para as famílias que adquiriram o crédito. Entretanto, segundo a finalidade

do crédito de custeio, “os resultados da pesquisa revelaram que, além de aplicarem o recurso

nas lavouras, os agricultores também o utilizaram em atividades não-produtivas, como

despesa de casa, etc” (CERQUEIRA; ROCHA, 2002, p.114).

Diante dos resultados apresentados pela pesquisa, pode-se inferir, embora estes não sejam

suficientes para realizar uma avaliação precisa do impacto do Pronaf – crédito na Bahia, que

uma parcela dos agricultores familiares baianos necessitam de uma capacitação quanto ao

melhor aproveitamento dos recursos advindos do acesso ao PRONAF. Levando-se em

consideração que a Bahia possui a maior população rural, em termos absolutos, do país é

necessário que o conhecimento desse programa seja disseminado entre os agricultores

familiares do Estado. De forma que os aspectos limitantes do programa sejam abolidos, como

a não continuidade da utilização deste pelos pronafianos, a inexistência de aplicação de

recursos em atividades não-agrícolas, como turismo e artesanato, e ou nas atividades agrícolas

não-tradicionais.

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7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise da dinâmica do novo mundo rural e o seu reflexo na RMS traz a discussão sobre os

excluídos do campo, tendo como objetivo mostrar que o desenvolvimento rural incentiva as

pessoas a permanecerem no campo, possibilitando a redução do fluxo de migrantes para as

cidades. O processo de modernização da agricultura brasileira ao promover o agravamento da

questão agrária, não somente aprofundou as desigualdades sociais e aumentou a pobreza nas

áreas rurais, mas também teve reflexo nos grandes centros urbanos, com a intensificação das

tensões sociais.

Após o período marcado por grandes transformações na agricultura brasileira, o discurso

presente entre os atores sociais reflete a necessidade de se eliminarem os bolsões de pobreza

existentes no país. O final do processo da modernização conservadora verificada no campo

fez surgir um grande contingente de trabalhadores desprovidos, que ao migrarem para as

grandes cidades vão fazer parte do exército industrial de reserva.

Apesar dos avanços verificados na institucionalização de políticas de combate aos graves

problemas associados à pobreza rural que atinge grande parte do interior do país, ainda não se

alcançou o grau de dinamização, desenvolvimento social e econômico desejado no meio rural.

No século XXI, os desafios impostos para viabilizar um desenvolvimento rural sustentável

conduzem a “novos olhares” sobre o campo, através da reformulação do discurso sobre a

Reforma Agrária e da valorização da agricultura familiar.

Pressupondo que o fortalecimento da agricultura familiar pode contribuir para o resgate social

e a geração de emprego e renda, defende-se a mobilização e a articulação dos atores sociais

nas ações voltadas para o alcance do desenvolvimento rural sustentável, a fim de garantir

maior eficiência e eficácia às políticas públicas implementadas pelos governos federal e

estadual.

A crise social que se apresenta atualmente não pode mais ser tratada com políticas paliativas,

importa traçar estratégias e formulações de políticas com o objetivo de tornar o campo

brasileiro menos ríspido aos seus habitantes. Dessa forma, chamar atenção para revitalização

do campo brasileiro, especificamente na Bahia, retoma uma discussão que faz parte de um

processo de renovação intelectual verificado no país nos últimos anos, no sentido da

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necessidade da geração de empregos e oportunidades que venham amenizar a expulsão do

homem do campo e/ ou favorecer o processo de inclusão social. Essa discussão é feita no

âmbito do Projeto Rurbano, desenvolvido pelo Núcleo de Economia Agrícola do Instituto de

Economia da Unicamp e instituído com a finalidade de reconstruir séries históricas a partir

dos microdados das PNADs relativos à população ocupada, emprego e renda para o mundo

rural. Esse projeto consubstancia o presente trabalho, identificando que no país, o emprego

agrícola vem caindo sistematicamente desde meados dos anos 80, em contrapartida a uma

expansão de “novas atividades” não-agrícolas no meio rural.

Assim, analisa-se o reflexo da constituição de um novo mundo rural para a RMS, partindo do

princípio de que o interior baiano é caracterizado pela diversidade de mundos rurais, onde ao

tempo que se configura o “novo rural desenvolvido”, com a proliferação de atividades não-

agrícolas relacionadas ao turismo rural e às novas atividades agrícolas modernas, tem-se o

“novo mundo rural atrasado” em que o trabalho em tempo parcial é resultado das estratégias

de sobrevivência utilizadas pelo agricultor.

Os resultados apresentados nesse trabalho estão em conformidade com uma tendência

verificada nacionalmente de que há um crescimento da pluriatividade, baseado no trabalho

desenvolvido em tempo parcial, e, também no aumento da ocupação em atividades não-

agrícolas. Para se demonstrar essa conclusão, a variável renda, considerada como um bom

indicador de desempenho econômico, foi analisada detalhadamente. Através da análise da

renda familiar, pode-se averiguar as estratégias do mundo rural brasileiro, onde a renda não-

agrícola tem crescido a taxas cada vez mais elevadas.

Observou-se nas pesquisas realizadas por Machado, Schmitz e Paula que se considerada

somente a renda agrícola, amplia-se o número de assentados na condição abaixo do patamar

simples de reprodução. Verificou-se que em vários casos, a renda não-agrícola iguala-se ou

ultrapassa a renda agrícola na composição da renda total das famílias e que algumas delas

foram deslocadas da condição de indigência para o nível de reprodução simples em virtude do

incremento da renda não-agrícola. Essa dinâmica pode ser verificada em todo país,

principalmente na região Norte e Nordeste.

O trabalho de Machado, realizado na região econômica do Extremo Sul da Bahia, representa

um estudo do sistema agrário do eixo intermunicipal Itamaraju-Prado. Nessa pesquisa, obtêm-

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se modelos de sistemas de produção representativos da realidade dos assentados, ao tempo em

que se destaca a importância da renda não-agrícola na renda total das famílias dos

beneficiados no processo da reforma agrária.

Nessa pesquisa, entrevistaram-se 27 famílias de produtores rurais, sendo 10 do Assentamento

1° de Abril, 7 do Assentamento Riacho das Ostras, 3 do Assentamento Nossa Senhora do

Rosário, no município de Prado e 7 do Assentamento Bela Vista, no município de Itamaraju.

Além dessas, foram coletadas informações qualificadas junto a lideranças e alguns produtores

rurais do Assentamento de Santa Luzia. Para efeito de estudo, elaborou-se uma tipologia

constituída de três produtores típicos. Numerando as famílias de 1 a 27, escolheram-se os

assentados de números 7, 22 e 11, que respondem pelos tipos mais representativos entre os

sistemas de produção analisados.

Da observação, extraiu-se que o primeiro deles (n.7), pertencente ao Assentamento 1° de

Abril, caracteriza o produtor no nível de indigência, onde para uma família de 5 pessoas,

aufere-se uma renda per capita de R$ 193,60/ano, sendo que a renda agrícola familiar anual

de R$ 968,00 é inferior à cesta básica de R$ 1.117,20 e ao salário mínimo anual de R$

1.632,00. O segundo (n.22), localizado no Assentamento Bela Vista, representa o nível de

reprodução simples, onde para uma renda agrícola de R$ 2.830,75/ano, considerando 4

membros na família, têm-se a renda per capita anual de R$ 707,69, superando a cesta básica

anual de R$ 578,64. O terceiro (11) é representativo do nível de reprodução ampliada, em que

para uma renda agrícola anual de R$ 9.158,33, a renda per capita é de R$ 3.052,78, para uma

cesta básica anual de R$ 406,08, considerando a existência de 3 pessoas na família.

Das 27 famílias entrevistadas, verificou-se que 10 obtêm algum tipo de renda não-agrícola,

correspondendo a 37% do total da amostra. Quando consideradas as 49 do Assentamento

Santa Luzia, perfazendo um total de 76, constata-se que 35 obtêm algum tipo de renda não-

agrícola, representando 46% do total.

No trabalho realizado por Schmitz, a avaliação é centrada nos impactos do modelo de

exploração agrícola produtivista sobre as ocupações e rendas das famílias residentes no meio

rural nos municípios de Irecê e Ilhéus, ambos no Estado da Bahia. Para compor a sua análise,

o autor entrevistou 40 agricultores familiares, sendo 25 no primeiro município e 15 no

segundo, respectivamente.

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Da sua observação, inferiu-se que em ambos municípios, o predomínio das rendas exógenas,

que é a renda auferida fora da unidade agrícola, dá-se com as aposentadorias, podendo variar

entre 39% a 99% da renda total das famílias que recebem esse tipo de renda. Quanto às rendas

não-agrícolas, verifica-se que, embora não tão freqüentes, respondem, quando observadas, por

uma grande parcela da remuneração total da família, variando de 50% a 91%.

No trabalho de Paula foram entrevistadas 35 famílias de produtores rurais, sendo 12 do

Assentamento Fábio Henrique Cerqueira e 23 do Assentamento Frei Vantuy. Esses

assentamentos rurais estão localizados no município de Ilhéus, região Litoral Sul. Para o

critério da tipologia dos produtores rurais, considerou-se como descapitalizadas as famílias

que apresentaram renda agrícola mensal abaixo de R$ 200,00 por unidade de trabalho

familiar, definido como o nível de subsistência ou patamar de reprodução simples.

As 35 famílias foram numeradas em ordem crescente. Dessa forma, tomando-se como

exemplo o caso das famílias 6 e 13, observou-se que a renda total anual dessas famílias são de

R$ 3.272,47 e R$ 1.287,17, e a renda agrícola de R$ 932,47 e R$ 557,17 para um total de 6 e

3 pessoas, respectivamente. Nesse aspecto, caso não sejam agregadas as rendas provenientes

de atividades não-agrícolas, essas famílias passam a auferir uma renda per capita de apenas

R$ 155,41/ano e R$ 185,72/ano, sendo inseridas no nível de indigência. No tocante ao total

das famílias, verifica-se que 21 delas obtêm algum tipo de renda não-agrícola.

Uma outra pesquisa analisada é fruto de uma experiência própria de uma viagem realizada à

região de Irecê. Esse estudo é concentrado no município de Lapão, antigo distrito do

município de Irecê. Por se tratar de um primeiro contato com a metodologia análise-

diagnóstico de sistemas agrários, utilizada nesse trabalho, não foi possível obter resultados

mais consistentes quanto a investigação sobre a prevalência das atividades não-agrícolas no

meio rural.

Observou-se, nesse estudo, que a renda agrícola ainda é maioria no povoado de Mosquito,

localizado em Lapão. Esse resultado é justificado pelo fato de existir no povoado apenas uma

pessoa na condição de aposentado, não reproduzindo, portanto, a tendência apresentada em

outras localidades, onde a renda não-agrícola tem superado a renda agrícola.

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Nesse aspecto, a análise desses trabalhos sugere que a dependência das economias locais,

exclusivamente, em relação à atividade agrícola apresenta-se cada vez mais reduzida. Através

dessas pesquisas foi possível também perceber que o crescimento das atividades não-agrícolas

e a importância assumida pela aposentadoria influenciam a decisão dos filhos dos

agricultores, ou até mesmo, dos próprios pais em abandonar a zona rural.

Considerando que no trabalho de Machado foram encontrados 10 assentados recebendo algum

tipo de renda não-agrícola, no de Schmitz 27 assentados, levando em conta toda renda

auferida fora da unidade agrícola e no de Paula 21, percebe-se que as ocupações não-agrícolas

têm-se tornado cada vez mais presentes na zona rural. Ao se obter, para uma amostra de 103

agricultores, um percentual de 57% das pessoas complementando a renda total da família com

algum tipo de atividade não-agrícola, observa-se que até mesmo nas regiões consideradas

menos desenvolvidas já é possível verificar a nova dinâmica do mundo rural.

A expansão das atividades não-agrícolas, assim como o aumento do número de aposentados e

pensionistas tem-se refletido numa forma de amenizar o empobrecimento dos agricultores

familiares que se encontram descapitalizados. Como conseqüência, verifica-se uma redução

do êxodo rural, já que os mesmos estão utilizando como estratégia de sobrevivência a

diversificação da atividade rural, tornando-se menos presos às práticas da agricultura

tradicional.

O desenvolvimento de atividades como pesque-pague, hotel-fazenda, fazenda-hotel e turismo

ecológico no meio rural vem se constituindo como um importante fator de fixação da mão-de-

obra. Os serviços públicos e privados ligados à energia elétrica, água encanada, tratamento

sanitário, saúde, educação, transporte público e o comércio em geral também têm uma parcela

de contribuição para a fixação dessa mão-de-obra na zona rural.

Nessa perspectiva, a partir da observação das mudanças verificadas no campo, convencionou-

se chamar esse processo de Novo Mundo Rural, onde um conjunto de atividades ligadas à

moradia, ao lazer, à prestação de serviços, etc, são praticadas por pessoas originárias das

atividades agrícolas tradicionais.

É nesse contexto, que se defende que a agricultura familiar passe a ser concebida não como

uma ação específica e sim dentro de um contexto mais amplo, como uma mola propulsora do

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desenvolvimento rural sustentável. Para tanto, as políticas macroeconômicas, agrícolas e de

desenvolvimento rural devem estar integradas num mesmo objetivo, qual seja amenizar o

êxodo rural, contribuindo, assim, para que a zona urbana possa se reestruturar e absorver a

mão-de-obra excedente.

Através do desenvolvimento rural sustentável espera-se que o problema da violência urbana

também venha a ser amenizado, já que o "inchaço" nas regiões metropolitanas deixará de ser

argumento para proliferação do desemprego. Dessa forma, tanto a agricultura familiar, como a

reforma agrária passam a ser identificadas como alternativas capazes de promover a inclusão

social.

As pesquisas de campo realizadas na Bahia pressupõem, ao atestar a significância das rendas

oriundas das atividades não-agrícolas, a necessidade de formularem políticas de

desenvolvimento rural integradas, com políticas de geração de novas oportunidades de

empregos rurais não necessariamente agrícolas, levando-se em consideração a

heterogeneidade existente nos espaços, e técnicas produtivas dos agricultores baianos.

Como iniciativa nessa direção foi criado o PRONAF – Programa Nacional de Fortalecimento

da Agricultura Familiar – que atua no sentido de auxiliar os agricultores familiares a

explorarem as possíveis oportunidades agrícolas e não-agrícolas de geração de renda. Com a

consolidação dessa agricultura, o desenvolvimento rural é desencadeado, passando o

PRONAF a agir levando em consideração as iniciativas de âmbito local.

Nesse aspecto, ao se investigar a dinâmica do novo mundo rural, tem-se a pretensão de

enfatizar a necessidade de repensar a política agrícola praticada num Estado em que uma

grande parcela dos agricultores está na categoria de produtores familiares, bem como

reconhecer a importância destes, tanto em termos sócio econômicos, quanto ambientais para o

desenvolvimento rural sustentável.

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