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Maceió - AL, 14 a 17 de agosto de 2016 SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural A COMERCIALIZAÇÃO DO AÇAÍ E A AGRICULTURA FAMILIAR: UM ESTUDO SOBRE A FORMAÇÃO DE PREÇOS NO ACRE Márcio Bonfim Santiago Instituto Federal do Acre E-mail: [email protected] Raimundo Cláudio Gomes Maciel Universidade Federal do Acre E-mail: [email protected] Francisco Bezerra de Lima Junior Instituto Federal do Acre E-mail: [email protected] Francisco Diétima da Silva Bezerra Instituto Federal do Acre E-mail: [email protected] Grupo de Pesquisa: Grupo 1 Comercialização, Mercados e Preços Resumo O presente trabalho tem por objetivo estudar a formação de preços do açaí no Estado do Acre. A utilização da formação de preços pelos agentes mercantis no mercado de açaí no Acre traz efeitos positivos? A hipótese deste trabalho reside no sentido de que grande parte dos agentes mercantis deste mercado desconhece a formação de preços, inexiste controle para identificar custos, a precificação se dá por meio do que se pratica no mercado, há a prática de atividades paralelas e o intermediário se apropria da maior parte do preço. É nas relações de mercado que reside grande parte das dificuldades dos produtores/coletores. Isso porque os agentes mercantis da cadeia de comercialização, principalmente o intermediário, se apropriam da maior parcela do preço cobrado ao consumidor final. Os procedimentos metodológicos baseiam-se no levantamento de informações a fim de identificar e descrever a estrutura e agentes mercantis das cadeias de comercialização, bem como mensurar quais são as margens de comercialização referentes ao açaí produzido/coletado no Acre. Os resultados demonstraram que alguns agentes, em especial o produtor/coletor, ignoram a formação de preços e não fazem cálculo algum a respeito de seus custos. Percebeu-se que todos os agentes mercantis envolvidos têm uma grande margem de comercialização sobre os produtos e que a oferta não supre a demanda de mercado, uma vez que o açaí é bem aceito no mercado acreano, possuindo uma ótima qualidade. Palavras-Chave: Formação de Preços. Açaí. Acre. Amazônia.

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Maceió - AL, 14 a 17 de agosto de 2016

SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

A COMERCIALIZAÇÃO DO AÇAÍ E A AGRICULTURA FAMILIAR: UM ESTUDO

SOBRE A FORMAÇÃO DE PREÇOS NO ACRE

Márcio Bonfim Santiago

Instituto Federal do Acre

E-mail: [email protected]

Raimundo Cláudio Gomes Maciel

Universidade Federal do Acre

E-mail: [email protected]

Francisco Bezerra de Lima Junior

Instituto Federal do Acre

E-mail: [email protected]

Francisco Diétima da Silva Bezerra

Instituto Federal do Acre

E-mail: [email protected]

Grupo de Pesquisa: Grupo 1 – Comercialização, Mercados e Preços

Resumo

O presente trabalho tem por objetivo estudar a formação de preços do açaí no Estado do Acre.

A utilização da formação de preços pelos agentes mercantis no mercado de açaí no Acre traz

efeitos positivos? A hipótese deste trabalho reside no sentido de que grande parte dos agentes

mercantis deste mercado desconhece a formação de preços, inexiste controle para identificar

custos, a precificação se dá por meio do que se pratica no mercado, há a prática de atividades

paralelas e o intermediário se apropria da maior parte do preço. É nas relações de mercado que

reside grande parte das dificuldades dos produtores/coletores. Isso porque os agentes mercantis

da cadeia de comercialização, principalmente o intermediário, se apropriam da maior parcela

do preço cobrado ao consumidor final. Os procedimentos metodológicos baseiam-se no

levantamento de informações a fim de identificar e descrever a estrutura e agentes mercantis

das cadeias de comercialização, bem como mensurar quais são as margens de comercialização

referentes ao açaí produzido/coletado no Acre. Os resultados demonstraram que alguns agentes,

em especial o produtor/coletor, ignoram a formação de preços e não fazem cálculo algum a

respeito de seus custos. Percebeu-se que todos os agentes mercantis envolvidos têm uma grande

margem de comercialização sobre os produtos e que a oferta não supre a demanda de mercado,

uma vez que o açaí é bem aceito no mercado acreano, possuindo uma ótima qualidade.

Palavras-Chave: Formação de Preços. Açaí. Acre. Amazônia.

Maceió - AL, 14 a 17 de agosto de 2016

SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

Abstract

This work aims to study the formation of acai prices in Acre. The use of pricing by market

agents in açaí market in Acre has positive effects? The hypothesis of this work lies in the sense

that most of the market players in this market unaware of the pricing, control does not exist to

identify costs, the pricing is through what is practiced in the market, there is the practice of

parallel activities and intermediate appropriates most of the price. It is the market relations lies

much of the difficulties the producers / collectors. This is because market agents in the supply

chain, especially the intermediate, if appropriate the largest share of the price charged to the

final consumer. The methodological procedures are based on survey information to identify and

describe the structure and mercantile agents marketing chains and measure what the marketing

margins for the açaí produced / collected in Acre. The results showed that some agents,

especially the producer / collector, ignore the pricing and do some calculations about costs. It

was noticed that all market players involved have a large marketing margin on the products and

the supply does not meet the market demand, since acai is well accepted in the Acre market,

having a great quality.

Keywords: Price Formation. Acai. Acre. Amazon.

1. Introdução

Os pequenos estabelecimentos rurais têm demonstrado ser importantes para a sociedade,

uma vez que contribuem para a produção de alimentos no país. Contudo, existem problemas

dentro e fora destes estabelecimentos, sendo que a comercialização de seus produtos no

mercado encontra dificuldades, como a existência de intermediários, que acabam por se

apropriar de boa parte do preço que poderia ser destinado ao produtor.

Recentemente os produtos florestais não madeireiros vêm ganhando destaque no cenário

nacional, pois se tornaram alternativas de geração de renda e conservação do meio ambiente.

Dentre eles dar-se-á ênfase ao açaí, foco de estudo desta pesquisa.

A partir da década dos anos de 1990 o açaí vem ganhando destaque não somente a nível

nacional, bem como também a nível internacional. No Brasil como um todo, a partir da década

dos anos de 1990, a produção começou a deixar de ser exclusivamente nativa para ser obtida,

também, de açaizais nativos manejados e de cultivos implantados em áreas de várzea e de terra

firme. Em sua grande maioria o açaí provém de açaizais nativos. No Acre o uso do açaí nativo

ainda representa grande parte da totalidade da produção.

O potencial do açaí para comercialização é enorme. Não se trata de uma demanda

insatisfeita em nível local ou regional, mas a nível nacional e internacional. É um produto que

conta com uma enorme aceitação no mercado possuindo vários derivados, porém o mercado

acreano necessita se organizar desde a base da cadeia produtiva para que possa comercializá-lo

em todo o país e fora dele também.

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Por conseguinte, é necessário analisar a formação de preços do açaí no Acre. É aqui

onde reside à questão central do presente trabalho: identificação dos agentes mercantis

envolvidos na cadeia de comercialização do açaí, análise dos preços de compra e venda dos

agentes mercantis envolvidos neste setor e avaliação do desempenho da comercialização do

açaí. O problema está na indagação: a utilização da formação de preços pelos agentes mercantis

no mercado de açaí no Acre traz efeitos positivos?

A hipótese deste trabalho reside no sentido de que grande parte dos agentes mercantis

deste mercado desconhece a formação de preços, inexiste controle para identificar custos, a

precificação se dá por meio do que se pratica no mercado, há a prática de atividades paralelas e

o intermediário se apropria da maior parte do valor. Além da regulação do mercado existem

problemas relacionados ao transporte, armazenagem, isolamento e, principalmente, apropriação

de grande parte do valor por intermediários.

Os procedimentos metodológicos baseiam-se no levantamento de informações a fim de

identificar e descrever a estrutura e agentes mercantis das cadeias de comercialização, bem

como mensurar quais são as margens de comercialização referentes ao açaí produzido/coletado

no Acre. A coleta de dados foi realizada por meio de fontes documentais, método primário e

secundário, tendo o apoio do grupo de pesquisa do projeto Análise Socioeconômica de Sistemas

Básicos da Produção Familiar Rural no Estado do Acre - ASPF, onde se utiliza avaliação por

meio de indicadores econômicos, sociais e produtivos.

A presente pesquisa pretende contribuir para a discussão sobre a construção de políticas

favoráveis à comercialização do açaí no Acre, principalmente no que diz respeito à geração de

informações acerca do mercado e demanda, de forma a se buscar um preço capaz de remunerar

os custos de produção e garantir receita para os produtores/coletores.

2. A Agricultura Familiar e o Açaí

Para Schneider (2006), a expressão “agricultura familiar” emergiu no Brasil a partir de

meados da década dos anos de 1990. No campo político, tal expressão parece ter sido

encaminhada como uma nova categoria-síntese pelos movimentos sociais do campo,

capitaneados pelo sindicalismo rural ligado à Confederação Nacional dos Trabalhadores na

Agricultura (CONTAG). A agricultura familiar mostrou-se capaz de oferecer guarida a um

conjunto de categorias sociais (assentados, arrendatários, parceiros, integrados às

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agroindústrias, entre outros), que não mais podiam ser confortavelmente identificados como

rurais as noções de pequenos produtores ou, simplesmente, de trabalhadores.

Guanziroli et al. (2009, p.15) afirma que os países capitalistas que ostentam os melhores

indicadores de desenvolvimento humano são justamente aqueles que adotaram a estratégia de

desenvolvimento baseado na atividade familiar e não na patronal como ocorrera no Brasil, onde

a gestão e o trabalho foram dissociados provocando uma imensa desigualdade social.

Dois importantes autores, Abramovay e Guanziroli, contribuíram para o

aprofundamento do debate da agricultura familiar. A definição dada por Abramovay (1997, p.

03) é:

A agricultura familiar é aquela em que a gestão, a propriedade e a maior parte do

trabalho vêm de indivíduos que mantêm entre si laços de sangue ou de parentesco.

Que esta definição não seja unânime e muitas vezes tampouco operacional é

perfeitamente compreensível, já que os diferentes setores sociais e suas representações

constroem categorias científicas que servirão a certas finalidades práticas: a definição

de agricultura familiar, para fins de crédito, pode não ser exatamente a mesma daquela

estabelecida com finalidades de quantificação estatística num estudo acadêmico. O

importante é que estes três atributos básicos (gestão, propriedade e trabalho

familiares) estão presentes em todas elas.

Daí conclui-se que nesta visão há a necessidade da presença de uma relação familiar

entre aqueles que gerenciam, são donos e trabalham a terra. Olhando por este prisma parece até

que sua importância é ínfima. Porém, os países desenvolvidos a veem conforme definiu

Guanziroli et al (2001, p. 15):

A expansão e dinamismo da agricultura familiar baseou-se na garantia do acesso à

terra em que cada país assumiu de forma particular, desde a abertura da fronteira oeste

americana aos farmers até a reforma agrária compulsória na Coréia e em Taiwan. Em

todos esses países, além de contribuir para dinamizar o crescimento econômico, a

agricultura familiar desempenhou um papel estratégico e tem sido relevado em muitas

análises: o de garantir uma transição socialmente equilibrada entre uma economia de

base rural para uma economia urbana e industrial.

Lima & Wilkinson (2002) já concluíram que para os agricultores possuírem acesso a

mercados mais promissores, deveriam combinar a competência herdada de suas proles com

novos conhecimentos e novas práticas. Assim, o desenvolvimento de novas habilidades,

principalmente de natureza técnica, pode ser o principal desafio a ser enfrentado pelos

agricultores familiares rurais.

Neste sentido, cabe destacar que o extrativismo do açaí é uma atividade típica da

agricultura familiar. É demandante de mão-de-obra e exige, sobremaneira nos maciços de

igarapés, muita habilidade para o manejo e colheita dos frutos. É fonte principal de renda destes

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agricultores. Cerca de 80% do açaí é obtido de extrativismo, enquanto apenas 20% provêm de

açaizais manejados e cultivados (BRASIL, 2006).

Para o SEBRAE (2014) o açaí é um alimento muito tradicional na dieta da população

da Amazônia. É encontrado, principalmente, em florestas nativas da região, sendo uma

alternativa de renda para a população tradicional. O açaizeiro se destaca, entre os diversos

recursos vegetais, pela sua abundância e por produzir, importante alimento para as populações

locais, além de ser a principal fonte de matéria-prima para a agroindústria de palmito no Brasil.

A produção de frutos, que provinha quase que exclusivamente do extrativismo, a partir da

década de 1990, passou a ser obtida, também, de açaizais nativos manejados e de cultivos

implantados em áreas de várzea e de terra firme (BRASIL, 2006).

Devido à grande valorização e crescimento da demanda pelo fruto, este passou a ser

responsável por uma grande movimentação na economia, crescendo sua importância tanto no

mercado nacional quanto no internacional. Seu uso chegou à indústria de cosméticos, tanto

nacional quanto internacional, para a produção de cremes, shampoos dentre outros. Suas

sementes são utilizadas no artesanato da região norte, as folhas para a produção de produtos

trançados (bolsas, redes, sacolas, etc) e, devido sua resistência, serve como cobertura de casas

(produção de telhados). Assim, o açaí é rentável não somente para o produtor/coletor, mas

também para os demais agentes da cadeia de comercialização.

O estudo dessa palmeira será o foco desse trabalho, onde será feito um levantamento de

sua cadeia produtiva e, principalmente, uma avaliação de como se comporta o preço entre os

agentes mercantis. A cadeia produtiva do açaí foi pouco estudada, o que dificulta uma análise

em bases sólidas. Contudo, através das entrevistas feitas diretamente com os agentes mercantis

e agentes públicos foram suficientes para identificar problemas comuns na atividade, sendo os

principais: a) Organização dos produtores/coletores quase inexistente; b) Pouca assistência

técnica; c) Dificuldade no escoamento da produção; d) Presença de intermediário no mercado;

e) Oferta sazonal; f) Produtores/coletores têm pouco acesso a informações da cadeia produtiva.

3. Formação de Preços e Comercialização de Produtos Agrícolas

3.1. Formação de Preços: Teorização

O mercado surgiu em virtude da interação entre compradores e vendedores. Pindyck &

Rubinfeld (2010) definiram o mercado como sendo um grupo de compradores e vendedores

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que, por meio de suas reais ou potenciais interações, determinam o preço de um produto ou de

um conjunto de produtos.

Para se falar em preços é necessário ter em mente as estruturas de mercado, em especial

para este estudo tem-se o oligopólio. De maneira bem simples o oligopólio é uma situação de

mercado em que poucas empresas possuem o controle da maior parcela do mercado.

Nesta pesquisa foi observado que o mercado do açaí, voltado para o comércio além da

fronteira acreana, tende a ser concentrado nas mãos de poucas empresas devido ao processo de

agro industrialização que vem ocorrendo, mesmo que de forma lenta. Além da empresa Acre

Polpas em Plácido de Castro (produz polpa congelada e vende toda sua produção para São

Paulo) tem-se o surgimento de cooperativas no estado, que compram a produção local,

beneficiam e a comercializam no mercado. Aqui devemos desconsiderar os inúmeros

vendedores existentes, pois estes comercializam apenas o vinho e no mercado local, na

circunvizinhança onde residem.

O debate acerca da formação de preços não vem de hoje. As escolas econômicas deram

contribuições importantíssimas com suas abordagens. Para Dias (1994), Jevons, Menger e

Walras, que foram considerados fundadores da Escola Neoclássica, explicaram de maneira

lógica e independente a interdependência das atividades econômicas, dando à economia uma

estrutura científica não alcançada pelos teóricos do liberalismo econômico. A questão da

formação de preços foi assim definida por Jevons, Menger e Walras.

Possas (1987) identificou e analisou as seguintes abordagens:

Abordagem Clássica: os preços deveriam ser determinados por resultado do trabalho

humano, onde o valor “é apresentado na troca como um conteúdo gerado pelo trabalho humano,

em que se torna possível estabelecer a relação de troca entre duas mercadorias”;

Abordagem Neoclássica: estabelece que “os preços são resultantes da razão de

intercâmbio que configuram um sistema de equilíbrio”.

Princípio do Custo Total: em 1939, Robert Hall e Charles J. Hitch introduzem o

princípio do “custo total” buscando respostas de como é formado o preço de venda dos produtos

e se há a preocupação com a questão das curvas de custo e receita marginal e,

fundamentalmente, com a questão da maximização do lucro (HALL e HITCH, 1986).

Do princípio do custo total surgiram ramificações teóricas que deram ênfase aos

elementos dinâmicos de formação de preços em mercados oligopolísticos. Kalecki abordou a

teoria do “grau de monopólio” que propunha articular os determinantes dos preços e margens

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de lucro em oligopólio com a distribuição macroeconômica da renda. Por outro lado, J. Bain e

Sylos-Labini abordaram a teoria de “preços-limite”, que versou acerca da importância das

barreiras à entrada na determinação do preço no oligopólio e da conformação e modificação

das estruturas de mercado. (POSSAS, 1987)

R. Hall e C. Hitch introduziram o princípio do custo total que representou um avanço

na teoria dos preços, pois foram sistematizadas evidências empíricas sustentadoras da

microeconomia neoclássica: a importância do custo marginal (crescente) e da demanda, através

da receita marginal, na determinação dos preços; e a maximização do lucro como norma de

comportamento das empresas. O argumento principal deste princípio é que as firmas

oligopolistas (sua maioria) tomam como base para fixar seus preços os custos diretos

acrescentando sobre eles um percentual para cobrir os custos diretos e uma margem para o lucro

(POSSAS, 1987).

3.2. Comercialização de Produtos Agrícolas

Limitadamente, a comercialização agrícola pode ser pensada como um simples ato do

agricultor que consiste na transferência de seu produto para outros agentes que compõem a

cadeia produtiva em que ele está inserido. Esta é a ótica tradicional da comercialização agrícola,

a qual é definida pela transferência de propriedade do produto num único ato após o processo

produtivo, ainda dentro ou logo depois dos limites da unidade de produção agrícola. (WAQUIL

et al, 2010)

A comercialização agrícola é tratada por Padilha Junior (2006) como um processo

contínuo e organizado de direcionamento da produção agrícola por um canal ou sistema de

comercialização, no qual o produto sofre transformações, diferenciações e agregações de valor.

As mudanças que os produtos agrícolas sofrem são de posse, forma, tempo e lugar, adequando-

os a preferência dos consumidores finais.

O conceito de comercialização deve ser associado à coordenação existente entre a

produção e o consumo dos produtos agropecuários, incluindo a transferência de direitos de

propriedade, a manipulação de produtos e os arranjos institucionais que contribuem para a

satisfação dos consumidores. É, portanto, um conceito amplo, em que se atribui a essa atividade

a função de transferir os produtos ao consumidor final. (MENDES & PADILHA JUNIOR,

2007)

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Outro conceito diz que a comercialização é um processo social no qual agentes

econômicos interagem através de instituições apropriadas, como o mercado, que pode ser

definido como o “local” onde ocorre transferência de mercadorias através de vendedores e

compradores – forças da oferta e demanda (BARROS, 1987).

O processo de comercialização inicia-se no momento da produção, passando pelo

beneficiamento, embalagem, compra, venda e atividades de logística. Para permanecer no

mercado os produtores precisam de volume, qualidade, diversidade e regularidade de oferta, já

que os consumidores diariamente têm necessidades de consumo.

Conforme Carvalho & Costa (2011), a comercialização agrícola é a atividade mais

complexa quando se fala do sistema agrícola, pois se trata do momento em que a produção

assume a condição de mercadoria. Tal condição reflete a dinâmica que a atividade assume sob

o modo de produção capitalista e que atualmente envolve a integração de mercados,

compreendendo diversos segmentos e setores que se apropriam da produção e passam a impor

metas de quantidade e qualidade, formando cadeias, redes ou arranjos produtivos.

3.2.1 Preços fixos e flexíveis e o mercado de derivativos agrícolas

Para Silva (1994) a maior parte dos capitalistas reage a variações da demanda de forma

parecida, assim como a persistência no tempo do processo predominante é outro fator

importante, porém pouco é afetado pelas frequentes alterações em variáveis como intensidade

da demanda e grau de utilização da capacidade. Daí se tem a necessidade de que a natureza do

processo de ajuste deva ser considerada, em certa medida, uma propriedade do mercado, e não

simplesmente uma escolha arbitrária do capitalista. Na ótica capitalista, o ajuste da oferta à

demanda ocorre dentro do período de mercado, o fenômeno se dá durante seu período de

operação, pois demandantes e ofertantes só entram em contato quando o mercado opera.

Mercados de preços administrados, de preços rígidos ou fix são aqueles nos quais o

ajuste entre oferta e demanda se dá apenas via quantidade. Neles, as empresas operam,

predominantemente, com base em curvas de oferta horizontais. Já os chamados mercados de

leilão, de preços flexíveis ou mercados flex são aqueles nos quais o processo de ajuste se dá,

parcial ou totalmente, com base em variações no preço (Kalecki, 1954; Hicks, 1974 e 1989;

Okun, 1981).

Silva (1994) de forma resumida caracterizou os mercados de preços em:

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Flex (do inglês flexprices): durante o período de operação do mercado, a oferta

está dada e equivale à disponibilidade total do produto (não há produção).

Fix (do inglês fixprices): neste mercado a curva de oferta é horizontal e variações

na demanda são acompanhadas por variações na oferta; tendem a não alterar a escassez

do ativo transacionado.

Costa et al (2001) também contribuíram para a discussão dos mercados de preços,

enxergando a maior contribuição de Hicks na publicação de um livro editado em homenagem

a Eric Lindahl, no qual tentou expor a relação entre o método ex-ante/ex-post dos suecos e o

método de Keynes. A ideia dos modelos dinâmicos é uma relação entre capital e tempo,

analisando processos, mais do que resultados estáticos. Hicks também separou dois tipos de

mercados:

1. Mercado de flexprice - onde o equilíbrio é estabelecido pela igualação da oferta e

demanda, com a ajuda do jogo de mercado.

2. Os mercados fixprice são organizados e administrados. É um método de desequilíbrio,

preocupa-se com os estoques; as firmas são formadoras de preços e as variações de

preços são devidas a flutuações de custos, fazendo com que a produção tenda a ajustar-

se às vendas e à demanda.

A utilização de contratos de derivativos, no qual os agricultores fixam preços futuros

para os seus produtos, têm o objetivo de eliminar as incertezas com relação às oscilações do

mercado spot e proteger seus investimentos na propriedade. Estes contratos podem ser

negociados tanto em mercado de balcão como em mercado de bolsa. No mercado de balcão, as

partes negociam diretamente entre si, estabelecendo contratos específicos e flexíveis,

livremente, conforme as necessidades dos compradores e vendedores e as possibilidades de

aportes de garantias para a realização da transação. (WAQUIL et al, 2010)

4. Metodologia

Este trabalho tem como objeto de estudo a comercialização do açaí no Estado do Acre.

A metodologia utilizada baseia-se no levantamento de informações a fim de identificar e

descrever a estrutura e agentes mercantis das cadeias de comercialização, bem como quantificar

quais são as margens e markups de comercialização referentes ao açaí produzido no Acre.

As informações contidas neste trabalho são procedentes de informações da pesquisa de

campo realizada pelo projeto de pesquisa “Análise Socioeconômica de Sistemas de Produção

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Familiar Rural no estado do Acre”, denominado ASPF1, desenvolvido pelo Centro de Ciências

Jurídicas e Sociais Aplicadas (CCJSA), da Universidade Federal do Acre (UFAC).

Os dados apresentados neste trabalho foram obtidos através de pesquisa (amostragem)

em que foram entrevistados agentes mercantis que comercializam açaí e seus derivados no

Estado, especificamente nos municípios de Capixaba, Cruzeiro do Sul, Feijó, Marechal

Thaumaturgo, Plácido de Castro, Rio Branco, Sena Madureira e Tarauacá, no período de janeiro

de 2014 a dezembro de 2015.

Para o levantamento de informações foi utilizado um questionário dividido em cinco

seções: 1) Dados sobre os agentes mercantis; 2) Dados de mercadorias compradas (quantidade,

preços, período de compra/venda, forma de pagamento); 3) Dados de mercadorias vendidas

(quantidade, preços, período de compra/venda, forma de pagamento); 4) Informações de

infraestrutura existente, empregados, capital; 5) Informações sobre a satisfação sobre a

comercialização do produto (demanda insatisfeita/potencial, preço do produto).

Com a finalidade de avaliação dos resultados da pesquisa, considerando a formação de

preços da agroindústria bem como os agentes mercantis que compõem a cadeia de

comercialização do açaí no estado do Acre, será utilizado neste trabalho a abordagem do

estabelecimento com foco no estudo dos custos, margens e markup de comercialização.

Margem de comercialização (M), segundo Padilha Junior (2006, p. 54) corresponde às

despesas cobradas dos consumidores pela execução de alguma função de comercialização por

parte dos intermediários do sistema de comercialização.

LCM (1)

Onde:

M = Margem; C = Custo; L = Lucro ou prejuízo dos intermediários.

Margem Total, consiste na diferença entre preço do varejo (Pv) de um produto qualquer

e o pagamento recebido pelo produtor pela quantidade equivalente na propriedade rural (Pp).

Em termos absolutos,

pv PPMT (2)

A margem total relativa é expressa como proporção do preço no varejo, ou seja:

100].P/)PP[('MT vpv (3)

1 O projeto ASPF desenvolve pesquisas socioeconômicas na área da produção familiar rural na região acreana

desde 1996, com diversas publicações sobre o tema. Para maiores informações ver: http://aspf.wordpress.com

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O markup (Mk), de acordo com Padilha Junior (2006), é a diferença entre o preço de

venda e o preço de compra (ou de custo), ou seja, ele mostra quanto que cada intermediário do

sistema de comercialização acrescentou de preço sobre o produto antes de repassá-lo ao

próximo intermediário, nos diversos níveis do sistema. Em termos absolutos, markup é igual à

margem de comercialização.

100].P/)PP[(Mk ccv (4)

Em que:

Mk = markup; Pv = preço de venda no mercado; Pc = preço de compra no mercado.

Apropriação Efetiva (AEi) consiste no lucro bruto total efetivamente apropriado por cada

tipo de intermediário. Desta forma, a Apropriação Efetiva pode ser calculada a partir da margem

de lucro bruto, multiplicada pela participação proporcional de cada tipo de intermediário no

valor total do produto comprado, representada através da seguinte expressão:

Pc

Pc.MkAE i

i (5)

Onde:

AEi = Apropriação Efetiva; Mk = markup; Pci = Participação proporcional de cada tipo de

intermediário no preço; Pc = Preço de compra no mercado.

Custo Unitário consiste no resultado da razão entre os custos totais de produção e a

quantidade produzida de um determinado produto. Desta forma o custo unitário de produção é

determinado pela seguinte expressão:

q

CTCUP (6)

Em que:

CUP = Custo Unitário de Produção; CT = Custo Total; q = Quantidade Produzida.

Os custos totais de produção (CT), por sua vez, são determinados a partir da soma dos

custos fixos e variáveis de produção, Desta forma:

CVCFCT (7)

Onde:

CT = Custo Total; CF = Custo Fixo; CV = Custo Variável.

Os custos fixos de produção (CF) são aqueles em que os valores não se alteram em caso

de aumento ou diminuição da produção, ou seja, possíveis variações na produção não irão afetá-

los, uma vez que seus valores já estão fixados.

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Já os custos variáveis (CV), são aqueles que variam de forma proporcional ao nível de

produção ou atividades. Seus valores são dependentes do volume a ser produzido ou volume de

vendas efetivado em um determinado período.

O markup pode ser encontrado através de diversas maneiras. De acordo com a literatura

econômica, destaca-se o cálculo através do markup divisor. Desta forma:

%)]Mc%ITV(%100[%100MKP (8)

Em que:

MKP = Markup de Produção; ITV% = Impostos e Taxas de Vendas (ICMS, PIS, Cofins,

Comissões de Vendas, etc.); Mc% = Margem de Contribuição2 [custos/despesas fixas mais

lucro (nível aceitável de lucro determinado pelo mercado)].

Através do cálculo do markup divisor, pode-se determinar o preço de venda para o

açaí, através da razão entre os custos unitários de produção e o markup divisor:

PMK

CVPV (9)

Pelo qual:

PV = Preço de Venda; CV = Custos Variáveis; MKP = Markup de Produção.

Por fim, o preço potencial (preço máximo que os agentes mercantis estão dispostos a

pagar), será determinado através da pesquisa de mercado, obtida através dos resultados da

aplicação do questionário com os agentes mercantis participantes do processo de

comercialização.

5. Resultados e Discussões

É notória a falta de controle nas vendas como também na produção, o que torna muito

difícil a obtenção de dados exatos da cadeia produtiva. Alinhado a esse pensamento Maciel

(2007) observou que é a baixa organização da cadeia produtiva que dificulta a ampliação do

mercado de produtos florestais não madeireiros, e isso repercute em baixa qualidade e volume

comercializados. A razão para isso, muitas vezes, são os costumes tradicionais da população, a

presença de atravessadores, a falta de técnicas e tecnologia adequadas, a distância dos mercados

consumidores, a dificuldade de escoamento da produção, entre outros.

Esta pesquisa compreendeu os anos de 2014 e 2015 onde foram entrevistados os agentes

mercantis que compõem a cadeia de comercialização do açaí e seus derivados. As categorias

2 Ver Cogan (1990, p. 134)

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de agentes mercantis foram entrevistadas nos municípios de Capixaba, Cruzeiro do Sul, Feijó,

Marechal Thaumaturgo, Plácido de Castro, Rio Branco, Sena Madureira e Tarauacá. Na capital

encontram-se todas as categorias, já no interior o predomínio é de intermediários e pequenos

comerciantes, em sua maioria, informais.

Destacam-se, como se observa na no gráfico 1, os mercantis, mercearias, supermercados

e comerciantes que representam 26% do total dos entrevistados. Apesar de o resultado da

pesquisa apresentar 18% de intermediários, notou-se, em campo, a existência de muitos agentes

nesta categoria distribuídos pelo estado. No outro extremo, tanto o produtor/coletor como a

indústria/sorveteria representou cada uma, apenas 2% do total; no caso do produtor/coletor tal

percentual justifica-se pela dificuldade de acesso ao mesmo.

Gráfico 1 – Categoria de Agentes Mercantis

Fonte: Resultados de Pesquisa (2015)

Quanto ao preço pago pela lata da fruta o gráfico 2 demonstra o mínimo de R$ 7,00, o

médio de R$ 20,78 e o máximo de R$ 30,00. A lata padrão tem capacidade de 14 kg, muito

embora a comercialização seja feita de maneiras diferentes dependendo da regional. Por

exemplo, na Regional do Juruá a comercialização se dá por meio de sacas, a mais comum de

60 kg, podendo ser usada também a de 50 kg. Ao se transformar o preço da lata em kg temos

que o menor preço comprado por kg foi de R$ 0,50, o médio girou em torno de R$ 1,47 e o

máximo saiu por R$ 2,14. O menor preço pago foi no município de Marechal Thaumaturgo, o

mais aproximado da média foi Feijó e, em Capixaba paga-se o preço máximo.

No que diz respeito à polpa, que corresponde a 1 litro de vinho, os preços mínimo, médio

e máximo foram respectivamente, R$ 4,00, R$ 5,36 e R$ 6,00. O primeiro praticado em Feijó,

os outros dois em Tarauacá.

18,00%

20,00%

8,00%2,00%

16,00%

26,00%

2,00% 8,00%Intermediário

Sorveteria/Pizzaria/Restaurante

Indústria/Empresa/Associação/Cooperativa

Indústria/Sorveteria

Lanche

Mercantil/Mercearia/Supermercado/Comerciante

Produtor/Coletor

Sorveteria/Distribuidora

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Gráfico 2 – Preços de Compra Mínimo, Médio e Máximo

Fonte: Resultados de Pesquisa (2015).

Pelo lado da venda o gráfico 3 demonstra como se comportaram os preços. O menor

preço comercializado foi de R$ 3,00 para o vinho em Marechal Thaumaturgo, local que destoa

do que se pratica no mercado acreano, tendo em vista o baixo poder aquisitivo da população e

o produto é totalmente comercializado no município. O preço médio girou em torno de R$ 5,60

e o máximo ficou em R$ 7,99. O preço máximo é praticado por supermercados, o mínimo

geralmente é por produtor/coletor que beneficia e vende diretamente ao consumidor final. A

lata da fruta apresentou como preço de venda mínimo o valor de R$ 19,00 em Feijó. A média

girou em torno de R$ 30,00 e o preço máximo foi de R$ 36,00 em Capixaba.

Gráfico 3 - Preços de Venda Mínimo, Médio e Máximo

Fonte: Resultados de Pesquisa (2015).

Sopchaki (2014), calculou a margem de comercialização dos principais produtos

derivados do açaí. Infere-se da tabela 1 que a margem de comercialização dos derivados do açaí

demonstra-se bastante alta, chegando a alcançar 245% no caso do açaí cremoso de 150 ml. A

menor taxa ficou por conta da polpa congelada de 400g apresentando algo em torno de 41%.

Em termos gerais o markup é um índice aplicado sobre o custo de um produto ou serviço

para a formação do preço de venda, baseado na ideia de cost plus pricing3. Na tabela 1 o índice

3 Método que consiste em somar-se ao custo unitário do produto ou serviço uma margem de lucro para

obter-se o preço de venda.

R$ 0,00

R$ 20,00

R$ 40,00

Mínimo Médio Máximo

R$ 7,00

R$ 20,78

R$ 30,00

R$ 4,00 R$ 5,36 R$ 6,00Fruta

Polpa

R$ 0,00

R$ 20,00

R$ 40,00

Mínimo Médio Máximo

R$ 19,00

R$ 30,00R$ 36,00

R$ 3,00 R$ 5,60 R$ 7,99Fruta

Polpa

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foi obtido pela razão entre o preço de venda e o custo (preço médio de compra), visto que o

preço de venda é igual ao produto dos custos pelo markup de produção, assim PV = CV . MKp.

Tabela 1 - Margens de comercialização do açaí e derivados

Tipo Preço Médio de

Compra (R$)

Preço Médio de

Venda (R$) Margem % Índice Markup

Polpa congelada (400g) 3,26 4,59 41 1,41

Sorvete 200ml 1 1,5 50 1,50

Picolé 0,61 1,11 81 1,82

Sorvete (bola) 0,58 1,42 143 2,45

Cremoso (350ml) 3,04 7,44 145 2,45

Suco (300ml) 1,26 4,17 231 3,31

Cremoso (150ml) 1,3 4,5 245 3,46

Fonte: Resultados de Pesquisa, Adaptado de Sopchaki (2014).

O markup de comercialização neste circuito varia de acordo com a localidade. O cálculo

feito na tabela 2 levou em consideração o preço de compra da fruta que o intermediário pagou

junto ao produtor/coletor e o preço de venda do litro do vinho ao consumidor final; as

informações se referem a um estabelecimento por município. Para uma análise mais detalhada

é necessário considerar que uma lata com 14 Kg produz 8,16 litros de vinho e que os agentes

mercantis (principalmente o produtor/coletor) desconsideram seus custos, apesar de existirem

como água e mão-de-obra. O markup mostra o percentual do preço que foi acrescido sobre o

produto antes de repassá-lo, neste acréscimo devem estar todos os custos. De acordo com o

entrevistado em Marechal Thaumaturgo o markup chegou ao patamar de 249,71%, já em

Capixaba ficou em 95,84% e, no entrevistado de Cruzeiro do Sul 149,85%; entretanto sem

informações quanto ao custo não há como auferir o lucro, pois markup alto não necessariamente

significa lucratividade alta.

Tabela 2 – Markup do açaí fruta/vinho

Município Preço de

Compra R$

Preço de Venda

Litro R$

Preço de venda lata

beneficiada* R$ Markup %

Índice

Markup

Marechal Thaumaturgo 7,00 3,00 24,48 249,71 3,50

Capixaba 25,00 6,00 48,96 95,84 1,96

Cruzeiro do Sul 16,33 5,00 40,80 149,85 2,50

*Quantidade de litros padrão 8,16 multiplicado pelo preço de venda

Fonte: Resultados de Pesquisa (2015)

No geral o circuito de comercialização é representado conforme a figura 1. Durante a

pesquisa foi observado que o produtor/coletor, principalmente no interior, por vezes processa,

beneficia e comercializa o vinho diretamente com o consumidor. O intermediário trabalha mais

diretamente com o fruto, comprando-o do produtor/coletor e repassando-o para as indústrias de

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processamento e beneficiamento. Esta última o leva ao comércio via derivados, os quais são

comercializados junto ao consumidor final.

No município de Feijó foi constatado que o proprietário do comércio conhecido como

República do Açaí exerce o papel do intermediário, da indústria de processamento, da indústria

de beneficiamento e o de comerciante. O açaí também é comprado para fins de ser

comercializado na forma cremosa, onde o rendimento e os ganhos são bem maiores.

Figura 1 Circuito da cadeia de comercialização do açaí fruto/vinho

Fonte: Resultados de Pesquisa (2015).

A pesquisa demonstrou, de acordo com a tabela 3, uma demanda insatisfeita para o fruto

no montante de 152.504 latas, o que equivale a aproximadamente 2.135 toneladas. O vinho de

1 litro apresentou uma demanda insatisfeita de 58.830 litros.

Tabela 3- Demandas satisfeita e insatisfeita de açaí no Acre

Tipo Quantidades Demandadas - unidade/ano Potencial

Satisfeita Insatisfeita Potencial (%)

Fruta (latas) 102.972 152.504 255.476 60

Vinho (1 litro) 10.440 58.830 69.270 85

Fonte: Resultados de Pesquisa (2015).

Dentre as questões feitas aos entrevistados era perguntado acerca da quantidade de açaí

comprado e se compraria mais em caso de uma oferta maior. Dentre os entrevistados foram

citados apenas a fruta (latas), vinho (1 litro) e polpa congelada de 400 gramas. Destes, 63,64%

acenaram positivamente afirmando estarem dispostos a comprar mais, enquanto que 36,36%

não, conforme dispões o gráfico 4.

Circuito Geral

Produtor/Coletor Intermediário

Indústria/Beneficiamento Indústria/Processamento

Comércio

Consumidor Final

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Gráfico 4- Disposição em comprar mais açaí

Fonte: Resultados de Pesquisa (2015).

Quanto a comprar uma quantidade maior de açaí mesmo havendo um aumento no preço,

consoante gráfico 5, um total de 90% afirmou que continuariam comprando e apenas 10% não

comprariam. Segundo os entrevistados, mesmo com aumento no preço, o açaí é vendido, isto

é, o mercado é capaz de absorver o aumento, pois o açaí é um produto bastante apreciado.

Gráfico 5 - Disposição a pagar mais pelo açaí

Fonte: Resultados de Pesquisa (2015).

Outros pontos abordados foram à qualidade do produto, a disponibilidade de compra

junto ao fornecedor e a aceitação no mercado. Foi feita uma média para cada item dentro de

uma escala de 0 a 10, como demonstrado no gráfico 6. A média da nota da qualidade ficou em

9,66, a disponibilidade de compra junto ao fornecedor recebeu nota 9 e a aceitação no mercado

consumidor obteve a nota 9,92. Isso demonstra que este produto não encontra dificuldades para

ser negociado no Acre.

Gráfico 6 - Notas de qualidade, disponibilidade de compra e aceitação no mercado

Fonte: Resultados de Pesquisa (2015).

36,36%

63,64%

Não Sim

10,00%

90,00%

Não Sim

0 2 4 6 8 10

Qualidade

Compra junto ao fornecedor

Aceitação no mercado

9,66

9,00

9,92

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6. Conclusão

Ficou evidente com a pesquisa a falta de conhecimento de formação de preços

principalmente pelo produtor/coletor, bem como de outros agentes mercantis. Muitos não têm

ideia de seus custos e não demonstram interesse no assunto, baseando-se pelo tempo de

experiência no ramo e, por vezes, alcançam rendimentos satisfatórios por possuírem atividades

paralelas que lhes geram renda.

Atualmente existe uma demanda crescente no que diz respeito a sucos e polpas de frutos

tropicais, como é o caso do açaí. Seu mercado está em rápido crescimento já há alguns anos,

provocando o aumento da demanda, do preço dos frutos e uma consequente atração de novos

investimentos. Um potencial enorme limitado pela falta de oferta na entressafra.

Constatou-se a existência de demanda insatisfeita, a qual ocorre também em outras

regiões. O Acre precisa, necessariamente, voltar o seu olhar para uma produção em escala e não

depender exclusivamente da extração do fruto nativo.

O açaí é um produto bem visto no mercado que traz benefícios a saúde além de ter um

sabor agradável. Seus derivados são comercializados nos mais diversos ambientes como

sorveterias, pizzarias, restaurantes, mercados, supermercados, mercearias, lanchonetes dentre

outros, o que demonstra sua aceitabilidade no mercado consumidor. Além do mais há no

mercado acreano disponibilidade por parte dos agentes mercantis de comprar mais e até pagar

mais por este produto.

O caminho para uma melhoria no setor passa pela saída de cena do intermediário,

incentivo a criação de cooperativas geridas pelos próprios coletores/produtores, ação dos órgãos

governamentais em conjunto com o setor privado no sentido de dar suporte implementando

tecnologias, bem como criação de linhas de crédito que atendam de forma satisfatória aos

anseios da base da cadeia produtiva, o que lhes dará condições auferir uma renda maior.

Os dados levantados através das entrevistas e das teorias apresentadas demonstram que

a formação de preços traz efeitos positivos como a sobrevivência, lucratividade e

posicionamento dos agentes mercantis no mercado do açaí no Acre. Os pressupostos se

confirmaram através desta pesquisa: existe desconhecimento quanto ao assunto por grande

parte dos agentes, praticamente não há controles para identificar custos, os preços são fixados

conforme o que a maioria pratica, há a prática de atividades paralelas pelos agentes e o

intermediário se apropria da maior parte do preço. A formação de preço é uma referência para

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a tomada de decisões, o desafio é encontrar um preço ótimo que satisfaça o comprador e o

vendedor.

7. REFERÊNCIAS

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