a barragem de montante do baixo sabor. aspetos relevantes de projeto e...

10
Encontro Nacional BETÃO ESTRUTURAL - BE2012 FEUP, 24-26 de outubro de 2012 A Barragem de Montante do Baixo Sabor. Aspetos Relevantes de Projeto e Construção. Alexandre Teixeira Gomes 1 Júlio Sarmento Gonçalves 2 Domingos Silva Matos 3 Manuel Pinho Miranda 4 RESUMO O aproveitamento hidroelétrico que a EDP-Energias de Portugal tem em construção no troço final do Rio Sabor, afluente da margem direita do rio Douro, inclui duas grandes barragens que distam, respetivamente, cerca de 3 km e 12 km da foz daquele rio. A barragem de montante é do tipo abóbada de dupla curvatura, com uma altura máxima de 123 m, um desenvolvimento no coroamento de 505 m e um volume total de betão de 670.000 m 3 . Na zona central do coroamento da barragem, insere-se um descarregador de cheias do tipo lâmina livre, que possui quatro vãos controlados por comportas, com uma capacidade de vazão total de 5.000 m³/s, e que restitui os caudais para uma bacia de receção e dissipação de energia, localizada no pé de jusante da barragem (leito do rio). Após uma descrição dos principais aspetos do projeto da barragem, esta comunicação apresenta as particularidades mais relevantes do projeto de execução e da estratégia construtiva da obra. Entre outros, são abordados o projeto da bacia de receção e dissipação do jato proveniente do descarregador de cheias, e respetivo faseamento construtivo, os elementos de apoio dos equipamentos dos órgãos de segurança, a estratégia construtiva para materialização das abóbadas das galerias de visita e da consola de jusante do descarregador de cheias, e o plano de observação. Palavras-chave: Barragem Abóbada, Descarregador de cheias, Bacia de Dissipação, Sistema de Observação. 1. INTRODUÇÃO Os trabalhos de construção do Aproveitamento Hidroelétrico do Baixo Sabor iniciaram-se em Junho de 2008 e a sua entrada em serviço está prevista para Setembro de 2013. A albufeira criada pela barragem de montante terá uma capacidade de cerca de 1095 hm 3 para o nível de pleno armazenamento (NPA) à cota (234,00) correspondendo a uma área inundada de cerca de 2819 ha, e de cerca de 1275 hm 3 para o nível de máxima cheia (NMC) à cota (235,00), sendo a correspondente área inundada igual a cerca de 3100 ha [1]. Na Figura 1 está representada uma antevisão do escalão de montante, na qual se podem ver a barragem e a central situada na margem direita, e na Figura 2 apresenta-se a planta geral do aproveitamento. 1 EDP Gestão da Produção de Energia, S.A. Direção de Projetos e Investimentos [email protected] 2 EDP Gestão da Produção de Energia, S.A. Direção de Projetos e Investimentos [email protected] 3 EDP Gestão da Produção de Energia, S.A. Direção de Projetos e Investimentos [email protected] 4 EDP Gestão da Produção de Energia, S.A. Direção de Projetos e Investimentos [email protected]

Upload: dominh

Post on 28-Nov-2018

213 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: A Barragem de Montante do Baixo Sabor. Aspetos Relevantes de Projeto e ...paginas.fe.up.pt/~be2012/Indice/BE2012/pdf-files/004_Artigo.pdf · A Barragem de Montante do Baixo Sabor

Encontro Nacional BETÃO ESTRUTURAL - BE2012

FEUP, 24-26 de outubro de 2012

A Barragem de Montante do Baixo Sabor. Aspetos Relevantes de

Projeto e Construção.

Alexandre

Teixeira Gomes1

Júlio Sarmento

Gonçalves2

Domingos Silva

Matos3

Manuel Pinho

Miranda4

RESUMO

O aproveitamento hidroelétrico que a EDP-Energias de Portugal tem em construção no troço final do

Rio Sabor, afluente da margem direita do rio Douro, inclui duas grandes barragens que distam,

respetivamente, cerca de 3 km e 12 km da foz daquele rio.

A barragem de montante é do tipo abóbada de dupla curvatura, com uma altura máxima de 123 m, um

desenvolvimento no coroamento de 505 m e um volume total de betão de 670.000 m3. Na zona central

do coroamento da barragem, insere-se um descarregador de cheias do tipo lâmina livre, que possui

quatro vãos controlados por comportas, com uma capacidade de vazão total de 5.000 m³/s, e que

restitui os caudais para uma bacia de receção e dissipação de energia, localizada no pé de jusante da

barragem (leito do rio).

Após uma descrição dos principais aspetos do projeto da barragem, esta comunicação apresenta as

particularidades mais relevantes do projeto de execução e da estratégia construtiva da obra. Entre

outros, são abordados o projeto da bacia de receção e dissipação do jato proveniente do descarregador

de cheias, e respetivo faseamento construtivo, os elementos de apoio dos equipamentos dos órgãos de

segurança, a estratégia construtiva para materialização das abóbadas das galerias de visita e da consola

de jusante do descarregador de cheias, e o plano de observação.

Palavras-chave: Barragem Abóbada, Descarregador de cheias, Bacia de Dissipação, Sistema de

Observação.

1. INTRODUÇÃO

Os trabalhos de construção do Aproveitamento Hidroelétrico do Baixo Sabor iniciaram-se em Junho

de 2008 e a sua entrada em serviço está prevista para Setembro de 2013. A albufeira criada pela

barragem de montante terá uma capacidade de cerca de 1095 hm3 para o nível de pleno

armazenamento (NPA) à cota (234,00) correspondendo a uma área inundada de cerca de 2819 ha, e de

cerca de 1275 hm3 para o nível de máxima cheia (NMC) à cota (235,00), sendo a correspondente área

inundada igual a cerca de 3100 ha [1]. Na Figura 1 está representada uma antevisão do escalão de

montante, na qual se podem ver a barragem e a central situada na margem direita, e na Figura 2

apresenta-se a planta geral do aproveitamento.

1 EDP – Gestão da Produção de Energia, S.A. – Direção de Projetos e Investimentos [email protected]

2 EDP – Gestão da Produção de Energia, S.A. – Direção de Projetos e Investimentos [email protected]

3 EDP – Gestão da Produção de Energia, S.A. – Direção de Projetos e Investimentos [email protected]

4 EDP – Gestão da Produção de Energia, S.A. – Direção de Projetos e Investimentos [email protected]

Page 2: A Barragem de Montante do Baixo Sabor. Aspetos Relevantes de Projeto e ...paginas.fe.up.pt/~be2012/Indice/BE2012/pdf-files/004_Artigo.pdf · A Barragem de Montante do Baixo Sabor

A Barragem de Montante do Baixo Sabor. Aspetos Relevantes de Construção e Projeto

2

Figura 1 – Antevisão.

Figura 2 – Planta geral.

Na Figura 3 a) apresenta-se a fase final das escavações e o início das betonagens da barragem

(Fevereiro de 2011) e na Figura 3 b) o estado da construção em Agosto de 2012.

a) b)

Figura 3 – Estaleiro a) Início das betonagens b) Estado dos trabalhos em Agosto de 2012

Page 3: A Barragem de Montante do Baixo Sabor. Aspetos Relevantes de Projeto e ...paginas.fe.up.pt/~be2012/Indice/BE2012/pdf-files/004_Artigo.pdf · A Barragem de Montante do Baixo Sabor

Gomes, Gonçalves, Matos e Miranda

3

2. ASPETOS GERAIS DO PROJETO DA BARRAGEM

A barragem está dividida em blocos através de 32 juntas de contração verticais dotadas de caixotões

pré-fabricados com forma esférica. As juntas de contração estão divididas por lâminas de

estanquidade formando compartimentos para injeção com 10,00 m de altura. Na Figura 4 apresenta-se

o alçado de montante, estando representadas as juntas, a descarga de fundo, os quatro vãos do

descarregador de cheias e a galeria do desvio provisório.

Figura 4 – Alçado de Montante.

No interior da barragem existem seis galerias de visita (GV1 a GV6), com soleiras às cotas (129,00),

(149,00), (169,00), (189,00), (209,00) e (229,00), e uma galeria geral de drenagem que acompanha o

contacto com a fundação, conforme pode ser visto na Figura 5 onde se apresenta o perfil desenvolvido

pela superfície de referência. Na zona central da abóbada existe também uma galeria de fundação (e

de drenagem) a jusante, que comunica com a de montante por galerias radiais.

A barragem está dotada de cinco poços de escadas, um em cada encontro, dois que estabelecem a

ligação entre o coroamento e a GV1 (ver Figura 5), localizados nas extremidades do descarregador de

cheias (blocos 15-16 e 19-20), e um poço vertical de escadas e de elevador, a toda a altura da

barragem e localizado no bloco (18-19), permitindo a ligação entre todas as galerias, e o coroamento.

Com o intuito de aumentar os ritmos de betonagem em obra, as lajes correspondentes aos lanços de

escadas foram pré-fabricadas e as abóbadas das galerias de visita (horizontais) foram materializadas

por intermédio de cofragens perdidas constituídas por elementos de betão armado pré-fabricado. O

traçado em planta das galerias foi definido por tramos rectilíneos de comprimento variável entre 0,75

m e 2,00 m. Apesar de as zonas de interseção entre galerias serem todas distintas, optou-se também

nestes casos por utilizar elementos de betão armado pré-fabricado para materializar a geometria do

projeto.

Figura 5 – Perfil desenvolvido pela Superfície de Referência.

Na zona central do coroamento da barragem (J15 a J20), existe um descarregador de cheias do tipo

lâmina livre, que possui quatro vãos com 16 m de largura cada, com as cristas formando uma

poligonal (diretriz) inserida na curvatura da barragem. A superfície descarregadora de cada vão é

Page 4: A Barragem de Montante do Baixo Sabor. Aspetos Relevantes de Projeto e ...paginas.fe.up.pt/~be2012/Indice/BE2012/pdf-files/004_Artigo.pdf · A Barragem de Montante do Baixo Sabor

A Barragem de Montante do Baixo Sabor. Aspetos Relevantes de Construção e Projeto

4

delimitada lateralmente pelas faces dos pilares, paralelas entre si, pelo que os pilares apresentam

espessura variável, decrescente para jusante. A montante, os pilares estão dotados de ranhuras que

permitem a colocação de comportas ensecadeiras, para manutenção das comportas de serviço. Os

caudais são descarregados para uma bacia de dissipação localizada no pé de jusante da barragem,

antes de serem restituídos ao leito natural do rio.

No bloco central (17-18), localiza-se a descarga de fundo, cuja soleira se encontra à cota (140,00),

com secção transversal retangular blindada com 2,10x3,10 m2 e capacidade de vazão de 220 m

3/s. A

montante será dotada de uma comporta de guarda e respetiva conduta de arejamento e a jusante, terá

uma comporta de serviço do tipo segmento. O desvio provisório do rio foi realizado por intermédio de

uma galeria escavada na margem esquerda, com secção transversal em forma de ferradura com

aproximadamente 7,00 m de diâmetro, parcialmente revestida por betão armado.

O comportamento estrutural da estrutura Barragem-Fundação foi estudado recorrendo a modelos de

elementos finitos. De acordo com a regulamentação portuguesa [2], [3] as combinações de ações

consideradas para cenários correntes englobaram o peso próprio dos blocos (na hipótese de juntas

abertas durante a construção), a pressão hidrostática no paramento de montante para o Nível de

Máxima Cheia (NMC) e para o Nível de Pleno Armazenamento (NPA), as variações de temperatura

associadas aos períodos de Verão/Inverno (tendo como referencia a temperatura aquando da injeção

de juntas) e o Sismo Base de Projeto. Considerou-se que quer o betão quer a rocha de fundação são

materiais com comportamento isotrópico e linear com valores do Módulo de Elasticidade E = 20 GPa,

Coeficiente de Poisson ν = 0.2 e Coeficiente de Dilatação Térmica α = 10 x 10-6

/ºC de acordo com o

Eurocódigo 2 [4].

A quantificação da ação sísmica, por meio do espetro de resposta do Sismo Base de Projeto, foi

definida de acordo com o Regulamento Português correspondendo a uma aceleração máxima de

0,084 g (período de retorno de 949 anos). O comportamento estrutural verificado é adequado, tendo-se

chegado a valores de 1.7 MPa para a tensão de tração e 7.0 MPa para a tensão de compressão [5].

A segurança da barragem foi também verificada para os designados cenários de rotura [3], em estudos

elaborados pelo Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC). Esses estudos envolveram a

avaliação do coeficiente de segurança da barragem para cenários de deterioração do betão, a

verificação da segurança em relação a roturas no contacto barragem-fundação ou pela fundação e a

análise do comportamento da barragem para a atuação do sismo máximo de projeto (SMP).

Relativamente ao primeiro cenário verifica-se o esmagamento do betão nos arcos às cotas superiores,

na zona central da barragem, precedida da rotura por tração na face de montante na zona de contacto

entre a barragem e a fundação, ao longo das margens. A análise de rotura pela fundação foi

desenvolvida recorrendo a modelos que consideram diversas combinações tendo em conta as

principais falhas e famílias de diaclases do maciço, as juntas da barragem e a superfície de contacto

barragem-fundação. A avaliação dos coeficientes de segurança foi efetuada a partir da redução das

propriedades de resistência dos materiais, tendo-se chegado a valores similares aos verificados noutros

estudos e satisfazendo as disposições das Normas de Projeto de Barragens [3].

Na análise sísmica para o Sismo Máximo de Projeto, considerou-se a aceleração de 0.522 g o que

traduz um evento com 10% de probabilidade de excedência num período de 1000 anos

(correspondente a um período de retorno de 10 000 anos). Com as tensões de compressão máximas

inferiores a 16 MPa, adotaram-se valores de 1% para o coeficiente de amortecimento, o que conduz a

tensões de tração máximas de 5 MPa, que podem dar origem à abertura de fissuras horizontais na base

da barragem. Considerando o coeficiente de amortecimento de 10%, sendo este um valor mais realista

tendo em conta o comportamento não elástico da estrutura, as fissuras horizontais não se chegam a

desenvolver, mesmo considerando a ação da albufeira. Todo este conjunto de estudos permitiram

comprovar a segurança estrutural da barragem.

Page 5: A Barragem de Montante do Baixo Sabor. Aspetos Relevantes de Projeto e ...paginas.fe.up.pt/~be2012/Indice/BE2012/pdf-files/004_Artigo.pdf · A Barragem de Montante do Baixo Sabor

Gomes, Gonçalves, Matos e Miranda

5

3. O MACIÇO DE FUNDAÇÃO E O TRATAMENTO SUPERFICIAL DE FALHAS

O escalão de montante localiza-se num troço de rio aproximadamente retilíneo (com cerca de 1 km de

desenvolvimento), com orientação aproximada N-35º-E. No local da barragem o fundo do vale situa-

se próximo da cota (125,00), sendo o fundo achatado com cerca de 25 m de largura. No local da

barragem o vale é relativamente simétrico em forma de V, apresentando a margem direita inclinação

média, com a horizontal, de 25º desde aproximadamente a cota (255,00) até cerca da cota (162,00) e

41º desde esta até ao fundo do vale. A margem esquerda apresenta inclinação média de 32º desde o

fundo do vale até cerca da cota (150,00), 25º desde esta até à cota (222,00) e 18º até à cota (255,00).

Sob o ponto de vista litológico o maciço rochoso é constituído por granito porfiroide, de duas micas,

essencialmente biotítico, de matriz média a grosseira. Levando em linha de conta a qualidade da rocha

traduzida no parâmetro W, a fracturação F, o RQD, o módulo de deformabilidade e a partir dos

ensaios sísmicos, procedeu-se ao zonamento do maciço de fundação segundo a superfície de

referência da barragem [6]. A zona ZG1 é caracterizada por ter um grau de alteração W1 a W2, grau

de fracturação F1 a F3, RQD entre 90% e 100 %, módulo de deformabilidade igual a 17,5 GPa e

velocidade de propagação das ondas longitudinais oscilando entre 4000 e 6400 m/s. Na zona ZG2 o

grau de alteração é de W2 a W3, o grau de fracturação F2 a F4, RQD compreendido entre 50% e 90%,

módulo de deformabilidade igual a 7,5 GPa e velocidade de propagação das ondas longitudinais

compreendida entre 3000 e 4500 m/s. A zona ZG3 é caracterizada por um grau de alteração W3 a W5,

grau de fracturação F3 a F5, RQD inferior a 50, módulo de deformabilidade inferior a 5 GPa e

velocidade de propagação das ondas longitudinais inferior a 3200 m/s. As cotas de fundação da

barragem foram definidas de modo a garantir, por um lado, um bom encastramento da barragem na

fundação e, por outro, que o contacto da superestrutura com a fundação se fizesse a profundidades

abaixo da zona de descompressão e alteração superficiais, preferencialmente fundada nas zonas ZG2

ou ZG1, zonas que, do ponto de vista das suas características mecânicas, se consideram adequadas às

exigências de uma barragem do tipo abóbada.

O volume de escavações ascende aos 560.000 m3, tendo-se efetuado diversas recravas para tratamento

da fundação. Na margem esquerda, de modo a garantir a estabilidade do talude afetado por uma falha

importante, realizou-se uma parede/escora fundada à cota (210,00) com cerca de 8,50 m de altura e

aproximadamente 30,00 m de comprimento. Simultaneamente foi executada uma viga de contenção,

pregada ao terreno por intermédio de ancoragens pré-esforçadas com 17,00 m a 29,00 m de

comprimento. Na Figura 6 a) está representada a escavação da parede/escora e a viga de contenção e

na Figura 6 b) está representada a parede escora já executada.

a) b)

Figura 6 – a) Falha b) Parede/escora

Na margem direita foram encontradas e tratadas diversas falhas de pequenas dimensões, tendo-se

procedido ao tratamento preconizado no projeto, substituindo o material da falha por recravas tipo de

Page 6: A Barragem de Montante do Baixo Sabor. Aspetos Relevantes de Projeto e ...paginas.fe.up.pt/~be2012/Indice/BE2012/pdf-files/004_Artigo.pdf · A Barragem de Montante do Baixo Sabor

A Barragem de Montante do Baixo Sabor. Aspetos Relevantes de Construção e Projeto

6

betão armado. No leito do rio, e de acordo com o previsto no reconhecimento geológico, apareceram

algumas falhas já com alguma expressão que obrigaram à remoção do seu preenchimento e à execução

de recravas de betão armado adaptadas à configuração das caixas de falha (ver Figura 7a)).

Em acréscimo, e para permitir o melhor tratamento em profundidade de uma das falhas por injeções

de calda de cimento, inseriu-se no bloco (19-20) uma galeria adicional, dotada de tubos para o referido

tratamento (ver Figura 7b)).

a) b)

Figura 7 – a) Falhas do leito rio b) Betão armado e tubos para injeção.

4. PROJETO E ASPETOS CONSTRUTIVOS DO DESCARREGADOR DE CHEIAS

4.1 Pilares e soleira descarregadora

O descarregador de cheias do tipo lâmina livre é equipado com comportas segmento e dispõe da

possibilidade da inserção de ensecadeiras a montante. A implantação do descarregador foi

condicionada pela necessidade de dotar o coroamento da barragem de um viaduto, que permite

estabelecer a ligação rodoviária entre as duas margens, e simultaneamente pela necessidade de

implantar a estrada na zona central do coroamento. De modo a minimizar a dimensão das consolas a

jusante e dada a reduzida frequência da utilização das comportas ensecadeiras, estas ficaram situadas

sob o viaduto. Assim, este ficou dotado de aberturas obturadas com tampas amovíveis para

introdução, quando necessário, das referidas comportas ensecadeiras. As consolas de jusante do

descarregador desenvolvem-se entre as cotas (206,00) e (216,3243) estando a crista à cota (224,00).

Na Figura 8 estão representados os cortes pelo eixo do descarregador e pelo eixo do pilar do poço de

escadas.

Na extremidade de jusante do descarregador de cheias, de acordo com o ensaio em modelo reduzido

realizado pelo LNEC [7], foram introduzidos defletores de modo a promover uma melhor dissipação

da energia do jato de água. As faces de jusante dos pilares arrancam à cota (206,00), terminando num

plano vertical que se desenvolve entre a cota (223,52) e a cota do coroamento (236,00). Os planos

inclinados das consolas de jusante serão executados por intermédio de cofragens tradicionais, que

serão posicionadas em obra por intermédio de duas gruas fundadas à cota (203,00), e cujas estruturas

ficarão parcialmente embebidas no betão em massa da barragem. As camadas de betonagem, com

1,50 m a 2,00 m de altura, estão dotadas nesta zona de armaduras construtivas que permitem a

sustentação do peso próprio da consola durante a fase de construção, bem como o apoio da cofragem e

a solicitação resultante do betão fluido.

Page 7: A Barragem de Montante do Baixo Sabor. Aspetos Relevantes de Projeto e ...paginas.fe.up.pt/~be2012/Indice/BE2012/pdf-files/004_Artigo.pdf · A Barragem de Montante do Baixo Sabor

Gomes, Gonçalves, Matos e Miranda

7

a) b)

Figura 8 – Descarregador de Cheias a) Secção pelo eixo do descarregador b) Secção pelo eixo do pilar.

4.2 Elementos de apoio do suporte dos órgãos de segurança

A solução adotada para as comportas de serviço, quer da descarga de fundo quer dos descarregadores

de cheias, envolve a construção de estruturas de suporte em betão armado, nas quais se introduzem

peças fixas metálicas (definidas pelo fornecedor de equipamentos hidromecânicos) que estabelecem a

ligação entre os braços das comportas e as estruturas de betão armado de apoio.

No caso da descarga de fundo, a solução adotada consistiu na materialização de uma consola no

paramento de jusante delimitada por paredes laterais unidas por uma viga-munhão que recebe as peças

fixas para apoio da comporta, como se pode ver na Figura 9. A comporta de serviço tem 6.00 m de

raio, secção transversal de 2.10x3.10 m2 e para o NMC à cota (235.00) terá uma pressão hidrostática

correspondente a 95 m.c.a. (esforços no munhão da ordem dos Fv = 2350 kN e Fh = 3750 kN de

acordo com o fornecedor de equipamentos). Foram efetuados modelos de elementos finitos para

avaliar o comportamento desta estrutura para a ação das forças acima indicadas, verificando-se ser

possível absorver os correspondentes esforços por intermédio de armaduras ordinárias, ainda que com

secções fortemente armadas.

Figura 9 – Corte pelo eixo da Descarga de Fundo

Page 8: A Barragem de Montante do Baixo Sabor. Aspetos Relevantes de Projeto e ...paginas.fe.up.pt/~be2012/Indice/BE2012/pdf-files/004_Artigo.pdf · A Barragem de Montante do Baixo Sabor

A Barragem de Montante do Baixo Sabor. Aspetos Relevantes de Construção e Projeto

8

Quanto às comportas de serviço do descarregador de cheias, adotou-se a solução convencional de

dotar os pilares da barragem de consolas curtas nas quais apoiam os braços das comportas. Estas

consolas terão 1.50 m de vão, 4.00 m de altura, 3.50 m de comprimento na zona inferior e 3.90 m na

zona superior, conferindo desta forma uma superfície perpendicular ao alinhamento do braço da

comporta (na sua posição fechada – ver Figura 8 a)) na qual será colocada a respetiva peça fixa para

apoio. Na Figura 10 a) pode ver-se a consola de jusante da descarga de fundo, e na Figura 10 b) o

arranque das consolas de jusante do descarregador de cheias à cota (206,00), bem como as gruas que

ficarão parcialmente embebidas no betão do corpo da barragem.

a) b)

Figura 10 – Descarregador de Cheias - Arranque das consolas de jusante

Cada comporta tem 11.00 m de raio, 16,00 m de vão e para o NMC à cota (235.00) terá uma pressão

hidrostática máxima correspondente a cerca de 12 m.c.a. que originam forças no munhão da ordem

dos Fv = 2000 kN e Fh = 8500 kN (de acordo com o fornecedor de equipamentos). A análise

estrutural da consola e respetiva ligação ao pilar foi efetuada por intermédio de modelos de elementos

finitos. Conforme prática que tem sido habitual, optou-se pela utilização de armaduras ordinárias para

absorção dos esforços, solução que apesar de conduzir a elevadas densidades de armadura envolve

uma maior facilidade construtiva.

4.3 Bacia de dissipação

A bacia de dissipação da energia do jato proveniente do descarregador de cheias, localizada no pé de

jusante da barragem, é constituída por 23 blocos (ver Figura 11) separados por juntas verticais,

inserindo-se no vale em forma de concha.

A laje de fundo, em betão armado, tem 3.00 m de espessura, o contacto com a fundação está à cota

(119.00), sensivelmente 6,00 m abaixo do nível da água do rio a jusante, garantindo um colchão de

água dentro da bacia de dissipação. Lateralmente a bacia está confinada por muros com 3,00 m de

espessura em betão armado que se desenvolvem até à cota (150,00). Na definição da bacia de

dissipação foram consideradas pressões hidrodinâmicas resultantes de uma diferença súbita entre a

pressão nas faces superior e inferior da laje de fundo [8]. De modo a minimizar o efeito das

subpressões na face inferior da laje, foi introduzida uma rede de drenagem horizontal, composta por

drenos afastados de 7.20 m conectados a uma galeria perimetral de drenagem.

A laje de fundo foi executada em duas camadas de betonagem, a primeira com 2.10 m de altura e

betão do tipo C20/25 e a segunda com 0,90 m com betão C30/37, tendo-se colocado uma proteção

térmica durante 7 dias. Nas juntas entre os blocos foram colocadas duas lâminas de estanquidade,

próximas da face superior e inferior da laje. De modo a promover o monolitismo entre a laje de fundo

e o maciço de fundação, foi efetuado um tratamento da fundação antes da betonagem e foram

introduzidas pregagens ɸ32 mm, afastadas de 1.80 m, penetrando 4.00 m no maciço de fundação e

2,00 m na laje de betão armado.

Page 9: A Barragem de Montante do Baixo Sabor. Aspetos Relevantes de Projeto e ...paginas.fe.up.pt/~be2012/Indice/BE2012/pdf-files/004_Artigo.pdf · A Barragem de Montante do Baixo Sabor

Gomes, Gonçalves, Matos e Miranda

9

Figura 11 – Planta geral da bacia de dissipação

5. PLANO DE OBSERVAÇÃO

O Plano de Observação, tem como principal objetivo definir o sistema de observação a implementar e

os critérios para a sua exploração, de forma a permitir interpretar o comportamento das obras nas

diferentes fases da sua vida, com base em resultados de observação e em modelos. Pretende-se que

seja possível prever o comportamento futuro das estruturas e aferir os métodos de cálculo e as

hipóteses de projeto. O acompanhamento e a monitorização dos valores fornecidos pelos instrumentos

aplicados na barragem, permitem avaliar as condições de segurança das estruturas durante a

construção, primeiro enchimento e exploração, e ainda contribuir para melhorar os próprios critérios e

técnicas utilizadas no controlo de segurança deste tipo de obras [9].

O sistema de observação a instalar na barragem foi definido tendo em conta os objetivos gerais atrás

mencionados, e seguiu os critérios definidos nas Normas de Observação e Inspeção de Barragens

NOIB [10] que indicam, para esta obra, a obrigatoriedade de observação das seguintes grandezas:

deslocamentos, movimentos de juntas e fissuras, temperaturas no betão, tensões e extensões, caudais

drenados e infiltrados, subpressões, meteorologia e sismologia.

Os deslocamentos horizontais serão medidos quer por 5 fios-de-prumo invertidos quer por métodos de

geodesia (triangulação por pontos no paramento de jusante e poligonação nas galerias de visita

horizontais), e os deslocamentos verticais serão registados por 15 extensómetros de fundação e por

nivelamentos de precisão (no coroamento e nas galerias de visita horizontais mais elevadas). Salienta-

se que foram colocados termómetros nos extensómetros de fundação de modo a possibilitar a respetiva

correção térmica em profundidade. Os movimentos relativos entre blocos serão registados pelas 101

bases tridimensionais e pelos 152 medidores de juntas.

Page 10: A Barragem de Montante do Baixo Sabor. Aspetos Relevantes de Projeto e ...paginas.fe.up.pt/~be2012/Indice/BE2012/pdf-files/004_Artigo.pdf · A Barragem de Montante do Baixo Sabor

A Barragem de Montante do Baixo Sabor. Aspetos Relevantes de Construção e Projeto

10

As extensões no betão serão monitorizadas por 40 extensómetros de resistência elétrica, as tensões por

10 células tensométricas e por 6 medidores de pressão, enquanto a deformabilidade do betão será

acompanhada por 3 células de fluência. A temperatura do betão da barragem será registada por 52

termómetros de resistência elétrica e por medidores de junta. Os caudais serão registados pelos drenos,

as subpressões pelos piezómetros a colocar na galeria geral de drenagem, e o nível da albufeira será

registado por um limnígrafo. As ações sísmicas estão a ser acompanhadas desde o início das

escavações por sismógrafos instalados na zona envolvente da obra, estando ainda prevista a colocação

de 5 sismógrafos no interior da barragem.

CONCLUSÕES

O Aproveitamento Hidroelétrico do Baixo Sabor é um investimento estratégico para a gestão da bacia

hidrográfica nacional do Rio Douro. A albufeira criada pela barragem de montante traduz-se numa

reserva estratégica de água e contribui para a segurança do abastecimento energético, para a

regularização dos caudais do rio Douro, controlando as cheias, e para o crescimento da energia eólica

e redução das emissões de CO2. O Projeto está em construção e estão envolvidos diversos técnicos da

EDP bem como de outras empresas consultoras, estando em desenvolvimento um conjunto de estudos

multidisciplinares e complexos. Os aspetos de projeto e construção, apresentados neste artigo, foram

estudados e analisados de modo a obter uma solução económica e otimizada para a barragem e para o

aproveitamento no seu conjunto.

REFERÊNCIAS

[1] Energias de Portugal, SA. Aproveitamento Hidroelétrico do Baixo Sabor. Projeto. Escalão de

Montante. Volume I. Tomo B. Barragem, 2005 (Documento Interno).

[2] Regulamento de Segurança de Barragens (RSB), Decreto-Lei n.º 344/2007 de 15 de Outubro,

2007

[3] Normas de Projeto de Barragens (NPB) Portaria n.º 846/93 de 10 de Setembro, 1993

[4] NP ENV 1992 1-1, Eurocódigo 2, Projeto de Estruturas de Betão.

[5] Silva Matos, D., Paixão, J., Antunes, N., Arch Dam Design of the Baixo Sabor Upstream Scheme.

5th International Conference on Dam Engineering, February 2007, Lisbon, Portugal.

[6] Energias de Portugal, SA. Aproveitamento Hidroelétrico do Baixo Sabor. Projeto. Escalão de

Montante. Apêndices Volume II - Estudos Geológicos e Geotécnicos, 2005 (Documento Interno).

[7] Laboratório Nacional de Engenharia Civil, Estudo Hidráulico em Modelo Reduzido do

Descarregador de Cheias do Aproveitamento Hidroelétrico do Baixo Sabor. Escalão de Montante,

2006 (Documento Interno).

[8] Bollaert, E.F.R., A new procedure to evaluate dynamic uplift of concrete linings or rock blocks in

plunge pools, Intl. Symp. on Hydraulics of Dams and River Structures, Teheran, Iran, pp. 125-

132, 2004.

[9] Energias de Portugal, SA. Aproveitamento Hidroelétrico do Baixo Sabor. Projeto. Escalão de

Montante. Plano de Observação e Primeiro enchimento, 2005 (Documento Interno).

[10] Normas de Observação e Inspeção de Barragens (NOIB) Portaria nº 847/93 de 10 de Setembro,

1993.