2012-09-20 - a barragem de jusante do baixo saboraspectos...

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Encontro Nacional BETÃO ESTRUTURAL - BE2012 FEUP, 24-26 de outubro de 2012 A Barragem de Jusante do Baixo Sabor. Aspectos Relevantes de Projecto e Construção Ricardo Pimentel 1 Júlio Sarmento Gonçalves 2 Domingos Silva Matos 3 Manuel Pinho Miranda 4 RESUMO O aproveitamento hidroelétrico que a EDP-Energias de Portugal tem em construção no troço final do Rio Sabor, afluente da margem direita do rio Douro, inclui duas grandes barragens, que distam cerca de 12 e 3 km da foz do rio Sabor. A barragem de jusante, do tipo gravidade e com uma altura de 45 m, apresenta um desenvolvimento retilíneo em planta com um comprimento de 315 m, ao nível do coroamento, e um volume total de betão de 130.000 m 3 . Destina-se a constituir o contra-embalse da barragem de montante, permitindo regularizar caudais e garantir condições de bombagem adequadas a partir do rio Douro. Após uma descrição dos aspectos de projecto mais relevantes, esta comunicação apresenta aspectos particulares do projecto de execução e da estratégia construtiva. Entre outros, são abordados a estratégia de construção, a integração do canal de desvio provisório na construção e projecto da barragem, a construção em avanço dos blocos das margens e a utilização experimental de betão com prévia colocação de agregado, num conjunto limitado de betonagens de um dos blocos da barragem de menor altura. Palavras-chave: barragem gravidade, métodos construtivos, sistema de observação 1. BREVE DESCRIÇÃO DO APROVEITAMENTO HIDROELÉTRICO DO BAIXO SABOR O aproveitamento hidroeléctrico do Baixo Sabor encontra-se situado no concelho de Torre de Moncorvo, distrito de Bragança, no troço inferior do rio Sabor, afluente margem direita do rio Douro. É constituído por dois escalões, estando o de montante situado a cerca de 12.6 km da confluência do Sabor com o Douro e o de jusante a cerca de 3.3 km. Este aproveitamento reveste-se de uma importância fundamental para o sector eléctrico nacional, devido à sua localização, no Douro Superior a montante da cascata do Douro Nacional, e às suas características, com grande capacidade de armazenamento e grupos reversíveis em ambos os escalões. Acresce o facto de poder ser também encarado num quadro de fins múltiplos, na medida em que gera outras valias que extravasam claramente o âmbito do sector eléctrico. Na Figura 1, apresenta-se esquematicamente a inserção das barragens do aproveitamento hidroeléctrico do Baixo Sabor na cascata do Douro. [1] O escalão de jusante (Figura 2), integra uma central em poço localizada na margem direita, imediatamente a jusante da barragem que aloja dois grupos reversíveis alimentados por circuitos hidráulicos subterrâneos independentes, uma barragem gravidade em cuja parte central está instalado um descarregador de cheias controlado por comportas, cuja soleira se prolonga para jusante ligando-se a uma bacia de dissipação de energia do tipo rolo (“roller buckett”). 1 EDP – Gestão da Produção de Energia, S.A. – Direção de Projetos e Investimentos [email protected] 2 EDP – Gestão da Produção de Energia, S.A. – Direção de Projetos e Investimentos [email protected] 3 EDP – Gestão da Produção de Energia, S.A. – Direção de Projetos e Investimentos [email protected] 4 EDP – Gestão da Produção de Energia, S.A. – Direção de Projetos e Investimentos [email protected]

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Encontro Nacional BETÃO ESTRUTURAL - BE2012 FEUP, 24-26 de outubro de 2012

A Barragem de Jusante do Baixo Sabor. Aspectos Relevantes de Projecto e Construção

Ricardo Pimentel1 Júlio Sarmento Gonçalves2

Domingos Silva Matos3

Manuel Pinho Miranda4

RESUMO O aproveitamento hidroelétrico que a EDP-Energias de Portugal tem em construção no troço final do Rio Sabor, afluente da margem direita do rio Douro, inclui duas grandes barragens, que distam cerca de 12 e 3 km da foz do rio Sabor. A barragem de jusante, do tipo gravidade e com uma altura de 45 m, apresenta um desenvolvimento retilíneo em planta com um comprimento de 315 m, ao nível do coroamento, e um volume total de betão de 130.000 m3. Destina-se a constituir o contra-embalse da barragem de montante, permitindo regularizar caudais e garantir condições de bombagem adequadas a partir do rio Douro. Após uma descrição dos aspectos de projecto mais relevantes, esta comunicação apresenta aspectos particulares do projecto de execução e da estratégia construtiva. Entre outros, são abordados a estratégia de construção, a integração do canal de desvio provisório na construção e projecto da barragem, a construção em avanço dos blocos das margens e a utilização experimental de betão com prévia colocação de agregado, num conjunto limitado de betonagens de um dos blocos da barragem de menor altura. Palavras-chave: barragem gravidade, métodos construtivos, sistema de observação 1. BREVE DESCRIÇÃO DO APROVEITAMENTO HIDROELÉTRICO DO BAIXO SABOR O aproveitamento hidroeléctrico do Baixo Sabor encontra-se situado no concelho de Torre de Moncorvo, distrito de Bragança, no troço inferior do rio Sabor, afluente margem direita do rio Douro. É constituído por dois escalões, estando o de montante situado a cerca de 12.6 km da confluência do Sabor com o Douro e o de jusante a cerca de 3.3 km. Este aproveitamento reveste-se de uma importância fundamental para o sector eléctrico nacional, devido à sua localização, no Douro Superior a montante da cascata do Douro Nacional, e às suas características, com grande capacidade de armazenamento e grupos reversíveis em ambos os escalões. Acresce o facto de poder ser também encarado num quadro de fins múltiplos, na medida em que gera outras valias que extravasam claramente o âmbito do sector eléctrico. Na Figura 1, apresenta-se esquematicamente a inserção das barragens do aproveitamento hidroeléctrico do Baixo Sabor na cascata do Douro. [1] O escalão de jusante (Figura 2), integra uma central em poço localizada na margem direita, imediatamente a jusante da barragem que aloja dois grupos reversíveis alimentados por circuitos hidráulicos subterrâneos independentes, uma barragem gravidade em cuja parte central está instalado um descarregador de cheias controlado por comportas, cuja soleira se prolonga para jusante ligando-se a uma bacia de dissipação de energia do tipo rolo (“roller buckett”).

1 EDP – Gestão da Produção de Energia, S.A. – Direção de Projetos e Investimentos [email protected] 2 EDP – Gestão da Produção de Energia, S.A. – Direção de Projetos e Investimentos [email protected] 3 EDP – Gestão da Produção de Energia, S.A. – Direção de Projetos e Investimentos [email protected] 4 EDP – Gestão da Produção de Energia, S.A. – Direção de Projetos e Investimentos [email protected]

A Barragem de Jusante do Baixo Sabor. Aspetos Relevantes de Construção e Projeto

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Figura 1. Inserção das barragens do Aproveitamento Hidroeléctrico do Baixo Sabor na cascata do Douro

a) b)

Figura 2. Arranjo geral do escalão de jusante - a) planta geral e b) antevisão 3D Na Figura 3 apresenta-se uma vista do estado dos trabalhos, na zona central da barragem no mês de Julho através de uma vista obtida a partir da margem direita.

Figura 3. Estado dos trabalhos no mês de Julho

2. DESCRIÇÃO DA BARRAGEM DE JUSANTE No local da barragem o vale do rio Sabor é largo e de fundo relativamente plano. Morfologicamente é um vale que se adequa à construção de barragens do tipo gravidade, nomeadamente de betão, tendo sido esta uma das principais razões para a escolha da solução contemplada no projecto. Tendo em consideração os requisitos ao nível do descarregador de cheias, verificou-se que barragens do tipo aterro ou enrocamento não eram economicamente viáveis. Na barragem distinguem-se as seguintes zonas: uma zona não galgável (Figura 4 – a)), correspondente aos blocos das margens, sendo constituída por 8 blocos na margem esquerda e 7 blocos na margem direita; uma zona galgável, constituída por 7 blocos no fundo do vale, (Figura 4 – b)) onde se situa o descarregador de cheias. O descarregador de cheias encontra-se dividido em quatro tramos com 16 m

Pimentel, Sarmento Gonçalves, Silva Matos e Pinho Miranda

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de vão, separados por pilares com 5 m de espessura e com forma adequada aos requisitos hidráulicos, onde se inserem as consolas curtas de apoio das articulações das comportas. Na zona do pé de jusante da barragem localiza-se a bacia de dissipação delimitada nas margens por meio de muros laterais, inserindo-se a descarga de fundo no muro situado na margem direita. A superfície de referência da barragem é um plano vertical coincidente com o paramento de montante dos blocos galgáveis. No total a barragem é constituída por 22 blocos com desenvolvimentos que variam entre 21,00 m no encontro direito e 7 m no encontro esquerdo.

a) b)

Figura 4. Corte transversal da barragem: a) zona não galgável e b) zona galgável O paramento de montante da barragem é vertical mas o seu alinhamento, não é contínuo. Na zona dos blocos galgáveis o paramento é coincidente com o plano da superfície de referência e nos blocos não galgáveis o paramento de montante situa-se 4,25 m para montante da superfície de referência. O paramento de jusante tem uma definição teórica com uma inclinação de 0,8H/1V, intersectando o paramento de montante 2 m acima do NPA/NMC. Nas cotas mais elevadas este paramento foi adaptado de forma a acomodar o coroamento e uma plataforma exterior de acesso a equipamentos de observação. Em perfil transversal cada bloco possui uma superfície de fundação horizontal. Os planos de fundação, ao longo do seu desenvolvimento entre margens, têm declives com pendentes constantes, com excepção dos blocos J4-J5, J5-J6 e J6-J7, devido a condicionamentos derivados da metodologia adoptada para o desvio provisório do rio. A barragem é dotada de três galerias: uma galeria geral de drenagem (GGD) com soleira plana e tecto circular, com 3,00 m de altura e 2,50 de largura, atravessando a barragem na maioria dos blocos; uma galeria de drenagem de jusante (GDJ), que atravessa o pé de jusante da zona onde se insere o descarregador da barragem, com uma secção semelhante à da (GGD) mas com dimensões mais reduzidas (2,50 m de altura e 2,00 m de largura); e uma galeria de visita (GV) com secção igual à da (GDJ), atravessando os blocos entre a junta 6 e a junta 17 à cota (117,00). Estas galerias permitem: executar os tratamentos de impermeabilização da fundação que venham a ser necessários, mesmo em fases futuras da vida da obra; realizar a rede de drenagem da fundação; reunir todos os caudais infiltrados; controlar subpressões na fundação; proceder à instalação de equipamentos de observação; realizar a observação da fundação e leitura dos equipamentos colocados na barragem; efectuar eventuais tratamentos complementares de impermeabilização da barragem. Na Figura 5 apresentam-se os alçados de montante e de jusante da barragem.

A Barragem de Jusante do Baixo Sabor. Aspetos Relevantes de Construção e Projeto

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a)

b)

Figura 5. Alçados da barragem a) Montante e b) Jusante Ao nível da fundação, refira-se que se está na presença de formações rochosas constituídas por uma sequência turbidítica finamente estratificada, com filitos cinzentos escuros a negros predominantes, por vezes esverdeados, com intercalações de metassiltitos, metagrauvaques e metaquartzovaques, os dois últimos podendo ocorrer, localmente, em bancadas de espessura métrica. Com base em toda a informação obtida nos estudos geológico-geotécnicos, foi efectuado o zonamento da fundação da barragem ao longo da superfície de referência, classificando-se o maciço de fundação da barragem em 4 zonas geomecânicas, fixado-se a cota de fundação da barragem nas duas zonas de melhor qualidade (ZG1 e ZG2). 3. PRINCIPAIS ASPECTOS ASSOCIADOS AO DIMENSIONAMENTO DA ESTRUTURA 3.1 Análise estrutural para cenários correntes e cenários de rotura A análise estrutural da barragem foi efectuada através de dois modelos desenvolvidos com o programa de elementos finitos Ansys: um modelo bidimensional que permitiu analisar os blocos não galgáveis (Figura 6-a) ) e um modelo tridimensional para a análise de um dos blocos galgáveis (Figura 6-b) ). Dos referidos modelos foram retirados e analisados os deslocamentos nodais e as tensões principais no centro dos elementos finitos. As acções e combinações consideradas foram as consideradas nas Normas de Projecto de Barragens [3]. Neste âmbito foram realizadas análises para os cenários correntes, associados a situações de exploração corrente, e para cenários de rotura envolvendo situações extremas, nomeadamente a acção do sismo máximo de projecto (SMP), o qual, dada a proximidade da falha da Vilariça é caracterizado por um valor elevado da aceleração de pico, valor que foi estimado através de um estudo sismológico específico.

a) b) Figura 6. Modelos de elementos finitos: a) blocos não galgáveis e b) blocos galgáveis

Pimentel, Sarmento Gonçalves, Silva Matos e Pinho Miranda

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No que respeita aos cenários correntes, e como é habitual em estruturas deste tipo, as tensões de tracção devidas ao efeito da pressão hidrostática só assumem valores relevantes no pé de montante e nos pilares, na vizinhança da zona de inserção dos munhões das comportas. Ao nível dos esforços de tracção devidos às variações de temperatura, estes apenas assumem valores significativos nos paramentos da barragem. Na Figura 7 apresentam-se as tensões principais na secção intermédia de um bloco não galgável para a combinação que inclui o peso próprio da estrutura, a pressão hidrostática para o nível de pleno armazenamento, a variação de temperatura associada à estação fria (Inverno) (Figura 7-a)) e a associada à estação quente (Verão) (Figura 7-b)), e incluindo também a actuação do Sismo Base de Projecto (SBP). As tensões de compressão assumem valores moderados quando comparados com a resistência à compressão do betão dimensionado para esta obra. Cálculos de estabilidade global demonstraram adequados valores para o factor de segurança ao deslizamento ao longo da superfície de fundação. O comportamento dos blocos não galgáveis para o sismo máximo de projecto (cenários de rotura) foi analisado por intermédio de modelos de elementos finitos também desenvolvidos com o programa ANSYS. A definição da acção sísmica seguiu o preconizado nas Normas de Projecto de Barragem (NPB) e nas recomendações da ICOLD-Boletim 72 [3], através da consideração dos níveis de intensidade sísmica designados por Sismo Base de Projecto (SBP) e Sismo Máximo de Projecto (SMP).

a)

b)

Figura 7. Tensões em MPa na secção intermédia de um bloco descarregador para : peso próprio+pressão+hidrostática+sismo base de projecto+ a) acção térmica de inverno e b) acção térmica de verão

A acção sísmica foi aplicada sob a forma de uma série temporal de deslocamentos prescritos, aplicados em fase nos nós da malha localizados no limite inferior da discretização do maciço de fundação. Esta série foi gerada a partir de um acelerograma [4] previamente interpolado linearmente para um passo de 0,001s. Considerou-se um amortecimento do material do tipo Rayleigh com adopção de parâmetros que conduziram um amortecimento médio de cerca de 5% no domínio espectral entre 5 e 20Hz. Os efeitos hidrodinâmicos da albufeira no paramento de montante foram simulados através da distribuição de massas adicionais segundo a formulação de Westergaard. Foi efectuada uma análise dinâmica considerando a ocorrência de fissuração com deslizamento e subpressões ao longo das fissuras. Foram analisados 3 modelos. O modelo “A” com um comportamento elástico, um modelo “B” com elementos de junta ao longo da superficie de contacto barragem-maciço de fundação, permitindo deslocamentos relativos de abertura/fecho e deslizamento adoptando um modelo constitutivo Mohr-Coulomb, e um modelo “C”, semelhante ao “B” mas com uma junta adicional betão/betão localizada 24 m acima da fundação que permitiu simular uma fissura horizontal nesta zona da barragem.

A Barragem de Jusante do Baixo Sabor. Aspetos Relevantes de Construção e Projeto

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Da análise admitindo comportamento elástico linear (modelo “A”) constata-se que os níveis de tensões se podem considerar genericamente compatíveis com as características resistentes dos materiais associados às diferentes zonas do perfil. No que se refere à segurança face ao deslizamento ao longo do contacto barragem-fundação assinala-se que os valores da relação T/N indiciam a probabilidade de ocorrência de deslizamentos irreversíveis, embora de pequena expressão, não comprometendo a segurança global da obra. No que concerne às análises não lineares (modelos “B” e C”), estas permitiram a quantificação dos deslocamentos ao longo do contacto barragem-fundação e a determinação das tensões máximas no pé de montante. Os resultados obtidos estão de acordo com comportamento de barragens do tipo gravidade quando sujeitas à acção de sismos, onde deslocamentos limitados na superfície de contacto com a fundação são permitidos, mantendo-se os valores de tensão dentro dos valores admissíveis. 3.2 Dimensionamento específico de elementos singulares Para além dos cálculos referidos no ponto anterior, ao longo do projecto foram desenvolvidos outros modelos numéricos para o dimensionamento de elementos singulares da barragem, nomeadamente galerias de visita, poço de bombagem, poço de escadas e elementos associados aos órgãos de descarga tais como o envolvimento das blindagens da descarga de fundo, pilares da barragem e consolas de apoio dos munhões das comportas do descarregador de cheias. Para estes elementos foram utilizados modelos de elementos finitos de casca como o apresentado na Figura 8 a) (poço de bombagem), modelos de elementos finitos em estado plano de tensão (Figura 8 b)) (secção do poço de escadas), modelos de elementos finitos tridimensionais e modelos de escoras e tirantes. Estes modelos permitiram apoiar o dimensionamento e o detalhe construtivo dos elementos singulares referidos. A titulo de exemplo apresenta-se na Figura 9 alguns pormenores do projecto de execução da consola de apoio do munhão das comportas de serviço (a) e do envolvimento da blindagem da descarga de fundo (b). 4. PRINCIPAIS ASPECTOS ASSOCIADOS À ESTRATÉGIA DE EXECUÇÃO 4.1 Desvio provisório do rio e consequentes implicações no projecto Inicialmente, estava previsto no projecto de licenciamento que a barragem seria construída parcialmente com recurso à técnica do betão compactado com cilindros (RCC). Neste âmbito, os blocos não galgáveis e o núcleo dos blocos galgáveis seriam construídos com RCC. Os pilares de apoio das comportas do descarregador de cheias, a zona superior e o paramento de jusante dos vãos do descarregador de cheias, a estrutura de dissipação de energia do tipo rolo (“roller bucket”) e o plinto de fundação de montante (para selagem de uma membrana de impermeabilização a instalar no paramento da barragem) seriam executados em betão convencional. Adicionalmente, também se previa a utilização de betão convencional em todo o bloco onde se encontra inserida a descarga de fundo. Esta opção justificava-se pela estratégia de desvio provisório do rio que estava prevista e que consistia na construção de um canal inserido neste bloco, alinhado com a galeria da descarga de fundo, numa primeira fase, passando o rio a passar na própria galeria da descarga de fundo posteriormente. Nas fases iniciais da obra, optou-se por uma nova alternativa para o desvio provisório, com o objectivo de permitir uma maior flexibilidade no desenvolvimento dos trabalhos e reduzir o risco associado a galgamentos, aumentando consideravelmente a vazão do canal de desvio [5]. Esta nova solução consiste num canal implantado no quarto bloco da margem esquerda (Figura 10), escavado em rocha, não sendo assim necessário construir um dique longitudinal para materializar o canal.

Pimentel, Sarmento Gonçalves, Silva Matos e Pinho Miranda

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a) b)

Figura 8. Modelos de elementos finitos – a) Modelo de casca – Poço de bombagem b) EPT – Poço de Escadas

a) b) Figura 9. Desenhos de detalhe – a) alçado da consola de apoio do munhão das comportas de serviço do

descarregador de cheias b) – corte pelo eixo na zona de envolvimento da blindagem da descarga de fundo

a) b)

Figura 10. Desvio provisório do rio – a) esquema e b) vista aérea Na zona onde este atravessa a barragem, foi necessária a construção de um muro de betão, delimitado por uma das juntas da barragem (J4) que irá ser parcialmente demolido, sendo a restante parte integrada na barragem. Neste âmbito foi necessário dotar esta estrutura de dispositivos adequados tais como lâminas de estanquidade, ranhuras e tubos de injecção para a sua melhor integração no corpo da barragem. Na Figura 11 apresenta-se alguns dos pormenores associados a esta integração e uma imagem do muro executado em obra. 4.2 Construção em avanço dos blocos das margens De forma a maximizar a utilização dos meios disponíveis em obra e a minimizar os prazos da empreitada), foi avaliada a necessidade de avançar com a construção dos blocos nas encostas, em avanço relativamente aos blocos inferiores.

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Esta situação pouco habitual neste tipo de obras, só pode ser equacionada tendo em consideração os baixos declives das encostas (~18,5º na margem direita e um valor máximo de 32,9º na margem esquerda) e a posição lateral do canal de desvio provisório na margem esquerda, que obrigaria sempre à betonagem de alguns blocos em avanço.

Figura 11. Muro de betão do desvio do rio a integrar parcialmente na barragem a) definição dos pormenores

construtivos e b) muro executado em obra Após análise cuidada das condições geológico-geotécnicas e realização de uma análise de estabilidade considerou-se aceitável e adequada a betonagem em avanço de quatro blocos em cada margem cujo bloco com maior dimensão tem uma altura máxima de 26 m. Na Figura 12, apresentam-se imagens da obra correspondentes aos blocos betonados em avanço. 4.3 Utilização experimental de Betão com Prévia Colocação de Agregado (BPCA) A EDP tem vindo a desenvolver uma metodologia de construção de barragens de betão que consiste na colocação prévia dos agregados e no posterior preenchimento dos vazios existentes com argamassa autocompactável aplicada por gravidade (BPCA). Após a realização de aplicações experimentais, quer em laboratório quer na ensecadeira de jusante da barragem de montante, considerou-se adequada a aplicação numa estrutura definitiva. Neste âmbito, três camadas de betonagem (duas com 2 m e uma com 1 m de altura) de um dos blocos de menor dimensão da barragem foram executadas com recurso a esta técnica. Na Figura 13 é possível observar a execução de uma das camadas com BPCA, já com o agregado colocado e com o equipamento de distribuição de argamassa já instalado.

a) b)

Figura 12. Construção em avanço dos blocos das margens: a) margem esquerda e b) margem direita

Pimentel, Sarmento Gonçalves, Silva Matos e Pinho Miranda

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5. PLANO DE OBSERVAÇÃO DA BARRAGEM O plano de observação envolve a definição de um sistema de observação e dos critérios para a sua exploração e visa possibilitar a interpretação do comportamento e a avaliação das condições de segurança das obras durante toda a sua vida útil, designadamente nas fases de construção, primeiro enchimento da albufeira e exploração [6]

Figura 13. Betonagem experimental com recurso a betão com prévia colocação de agregado

A definição do sistema de observação a instalar na barragem seguiu os critérios preconizados nas Normas de Observação e Inspeção de Barragens (NOIB) [7], que, seguindo recomendações da Comissão Internacional das Grandes Barragens (ICOLD), definem o conjunto mínimo de grandezas a observar em função de factores de apreciação de risco, os quais são determinados tendo em conta aspectos relacionados com factores exteriores ou ambientais, com factores relacionados com a fiabilidade da barragem e com factores humanos e económicos. Para esta estrutura em particular o conjunto mínimo recomendável de grandezas a observar inclui deslocamentos, movimento de juntas e fissuras, caudais drenados, subpressões e a meteorologia. Opcionalmente são referidas a medição de temperaturas no betão e de tensões ou deformações também no betão. Os deslocamentos horizontais e verticais serão medidos por intermédio de 3 fios de prumo invertidos, selados em profundidade na fundação e por 5 extensómetros de fundação, sistema que será complementado com a observação das componentes horizontais e verticais de deslocamentos por métodos geodésicos. As extensões no betão serão avaliadas através de 6 rosetas de extensómetros, compostas por 5 extensómetros Carlson activos e um corrector, distribuídas em 3 secções da barragem e posicionados nas zonas mais críticas da obra - na zona de montante e de jusante próximo do contacto da barragem com a fundação. No que se refere aos movimentos de juntas, salienta-se a instalação de 47 bases tridimensionais e 38 medidores de juntas (com medição de temperatura). As temperaturas serão avaliadas, para além da sua medição nos grupos extensómetros e nos medidores de juntas, por intermédio de 73 termómetros. Os caudais serão registados em alguns dos drenos, e nas 4 bicas totalizadores previstas. As subpressões pelos piezómetros (24) a colocar na galeria geral de drenagem galeria de drenagem de jusante. O nível da albufeira será registado por um limnígrafo. CONCLUSÕES O aproveitamento hidroelétrico do Baixo Sabor reveste-se de uma importância fundamental para o sector elétrico nacional, devido à sua localização, no Douro Superior a montante da cascata do Douro Nacional, e às suas características, com grande capacidade de armazenamento e grupos reversíveis em

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ambos os escalões a que acresce o facto de poder ser também encarado num quadro de fins múltiplos, na medida em que gera outras valias que extravasam claramente o âmbito do sector elétrico. O aproveitamento encontra-se atualmente em construção, envolvendo um conjunto significativo de técnicos da EDP e consultores externos no desenvolvimento de estudos complexos e multidisciplinares. Apesar de constituir uma obra de dimensões moderadas, o seu projecto e a sua construção actualmente em curso, envolveram aspectos particulares e de interesse relevante, que se considerou ser oportuno apresentar nesta comunicação. REFERÊNCIAS

[1] Energias de Portugal, SA. Aproveitamento Hidroelétrico do Baixo Sabor. Projeto. Escalão de Jusante. Volume I. Tomo B. Barragem, 2005 (Documento Interno).

[2] Normas de Projeto de Barragens (NPB) Portaria n.º 846/93 de 10 de Setembro, 1993

[3] ICOLD, 1989 - Selecting seismic parameters for large Dams, Boletim 72.

[4] IST/ISIST, Julho de 2005 – Estudo Sismológico do sítio da barragem do Baixo Sabor. Relatório final. Estudo realizado para EDP Produção, EM.

[5] GIBB, AHBS, Escalão de Jusante, Empreitada Geral de Construção, Desvio Provisório do Rio Sabor – Projecto de Execução, 2009

[6] Energias de Portugal, SA. Aproveitamento Hidroelétrico do Baixo Sabor. Projeto. Escalão de Jusante. Plano de Observação e Primeiro enchimento, 2005 (Documento Interno).

[7] Normas de Observação e Inspeção de Barragens (NOIB) Portaria nº 847/93 de 10 de Setembro, 1993.