5-o celeiro-forte

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Quinta da Confusão – O nascimento de um império 28 Dia 2 Ataque ao celeiro Época inicial 2 de Janeiro de 2009 Seg Ter Qua Qui Sex Sab Dom 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31

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Páginas 28 a 33

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Quinta da Confusão – O nascimento de um império

28

Dia 2

Ataque ao celeiro

Época inicial

2 de Janeiro de 2009

Seg Ter Qua Qui Sex Sab Dom

1 2 3 4

5 6 7 8 9 10 11

12 13 14 15 16 17 18

19 20 21 22 23 24 25

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1:00 Habitantes: 45

Um dos animais que dormia no celeiro acordou, sem saber porquê. Este, apercebendo-se de que ainda era madrugada, virou-se no soalho de madeira e tentou voltar a adormecer. Não o fez porque ouviu um barulho estranho, vindo do outro lado da parede da porta, semelhante a vozes. Levantou-se e, com cuidado para não pisar os outros animais que dormiam pelo celeiro, pôs-se atrás da porta e espreitou. Para seu espanto, viu Afonso Gomes a falar ao telemóvel a 2 metros da parede do celeiro, ouvido atentamente pelo irmão. O animal conseguiu ouvir o que Afonso estava a dizer:

-Sem dúvida que um ataque repentino impedirá os animais de se defenderem a tempo. Não acha, senhor director? -… -Pois, eu também penso que sim. Agora, falemos de dinheiro. Habitualmente, a vossa empresa recebe 10% do valor da venda dos animais que capturarem. Nós propomos-vos 20% desse valor, se usarem todos os vossos funcionários neste ataque. São quantos? Cem? -… -Ah, são 150. Melhor ainda, quantos mais forem melhor. Nós aqui só temos 45 animais, vai ser canja. E estão todos no celeiro, só têm que o cercar e apanham-nos todos. Então, amanhã às 8:30, mais ou menos? Contando com o tempo de chegada… -… -Então está combinado. Os 150 funcionários estão cá às 8:30 e a vossa empresa recebe 20% do valor da venda dos animais.

O animal não precisou de pensar muito para perceber que os donos andavam a planear um ataque em massa aos animais da Quinta da Confusão, com um número de funcionários 3 vezes maior do que a população da Quinta da Confusão. Não sabia o nome do instrumento para que Afonso Gomes falara, mas sabia que a sua função era falar com alguém distante, neste caso o director da empresa de captura e transporte de animais que habitualmente servia a Quinta da Confusão. E, para seu horror, percebeu que os donos vinham na direcção da porta do celeiro. Deitou-se rapidamente no soalho e fechou os olhos. A silhueta dos donos apareceu no meio do vão da porta, e o animal ainda os ouviu comentar «Daqui a 8 horas, estes animais que dormem descansados sem temerem o futuro vão estar a caminho do mercado. Ah, ah, pensam que venceram, que nos conseguem tirar a casa e a quinta. Quando for manhã, quem lhes tira a casa somos nós. Não perdem pela demora». Depois, foram-se embora pela neve até casa.

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Escusado será dizer que, assim que os donos desapareceram, o animal que ouvira todo o seu plano acordou os companheiros para lhes explicar a situação. Estes rapidamente perceberam que a sua única hipótese de resistirem a 150 funcionários era transformarem o celeiro numa fortaleza. Assim foi. Os animais deitaram patas à obra, e fizeram tudo ao seu alcance pela noite adentro para fortificarem o celeiro. Por sorte, a construção estava cheia de material que os animais identificaram como útil para o seu projecto, como pregos, martelos, réguas de vários tamanhos e tábuas de madeira. Assim, gastaram o resto da noite a fazer o seu forte: fizeram 10 guaritas no telhado do celeiro, com um alçapão para o 1º andar e uma larga abertura virada para fora, de onde os animais poderiam atirar coisas aos funcionários; abasteceram-no com comida colhendo a pouquíssima erva que tinha crescido e a que restava do dia anterior; olearam as dobradiças das portas e janelas, juntamente com as trancas, para serem fáceis de fechar e abrir; repararam cobrindo com madeira os estragos nas paredes; e por último começaram a escavar um túnel, confiando em como andavam sempre em linha recta em direcção às cavalariças. Se os funcionários conseguiram entrar no celeiro, os animais poderiam fugir pelo túnel até à outra margem da ribeira, onde provavelmente estariam a salvo. Baptizaram a sua obra de Celeiro-forte, porque era ao mesmo tempo o celeiro da Quinta da Confusão e a fortificação dos animais.

8:30

Foi dado como concluído o Celeiro-forte, quando a última das guaritas ficou pronta. Os animais, inexperientes na área da construção, tinham levado 7 horas para completar as guaritas, incluindo instalar um alçapão com uma dobradiça para se lá entrar. Essas eram as partes principais da construção, porque permitiam atirar objectos aos funcionários, do alto, em 10 pontos em simultâneo mais as 4 janelas do 1º andar. O problema era: que objectos os animais poderiam usar para bombardear os atacantes? A resposta estava ao mesmo tempo no celeiro e no campo. No celeiro, havia sacos de adubo com 10 kg, tomates, ovos e outros alimentos guardados há tanto tempo que cheiravam bastante mal, acumulados em cantos; e fora do celeiro havia pedras e paus. Foram esses produtos que foram levados para as guaritas e para as 4 janelas do 1º andar, fora do alcance dos funcionários. Mas esses espaços eram apenas uma parte da fortaleza. No rés-do-chão, assim que tudo o que era necessário do exterior foi levado para o celeiro, fecharam-se as portas e janelas com a tranca. As ervas estavam a um canto, prontas a consumir. Quanto ao túnel, segundo as medições dos animais, deveria estar a uns 10 metros das cavalariças. Estava tudo pronto, incluindo o pendão no alto do celeiro a dizer «Celeiro-forte, a oposição dos animais».

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Importa dizer que os animais tinham grande noção do que era a organização. Como cada guarita e janela tinha espaço para dois animais, ficaram 28 ao ataque, mais dois que iam entregando munições aos atacantes à medida que estes as gastavam. Dez dos restantes ficariam a vigiar o estado do celeiro, pois este estava tão velho e desgastado com os anos que, mesmo com as reparações improvisadas dos animais, bastava que alguém se atirasse com força contra a parede para lhe arrancar um pedaço de madeira. Por fim, os últimos 5 prosseguiam com as escavações do túnel, revezando-se entre si. Isso porque, a partir dos 100 metros, o túnel começou a ficar sem oxigénio e, para os trabalhadores não sufocarem, tinham que se revezar entre si para ir ao celeiro respirar ar puro. De manhã, os animais das guaritas viram os donos sair de casa e reparar na sua fortaleza. Estes rapidamente perceberam que, por qualquer motivo, os animais tinham descoberto o seu plano e estavam prontos para, como dizia o pendão a esvoaçar ao vento, se opor aos funcionários. Avisaram os animais das guaritas, com um tom de ironia, de que faltavam 10 minutos para as 8:30, e depois voltaram a casa. Achavam que os animais iriam pensar que se tratava de uma hora normal, mas enganavam-se. Sem o saberem, pois não sabiam que os animais conheciam a hora do ataque, os donos tinham dado aos animais o sinal para que preparassem para atacar a qualquer momento, pois os funcionários vinham aí. Agora, restava-lhes apenas esperar a sua vinda.

De repente, os animais das guaritas e janelas viradas para norte viram, ao longe, vários automóveis a grande velocidade, seguidos por dois camiões. De imediato, deram o alerta aos outros animais. Os que estavam à vista, portanto, nas guaritas e nas janelas do primeiro andar, deitaram-se por debaixo da janela conforme combinado, para que os funcionários não vissem qualquer actividade no celeiro. A táctica resultou, pois quando poucos minutos depois os funcionários chegaram, em 30 carrinhas e dois camiões, ao verem o celeiro pensaram que este estava vazio. Os donos, todavia, insistiram que os animais estavam ali dentro, e que a prova disso estava nas guaritas erguidas no seu telhado. Cada uma tinha um metro de largura por dois de comprimento, com uma abertura a todo o comprimento da guarita virada para fora do celeiro. Como o telhado do celeiro era inclinado, o chão e o tecto das guaritas também o eram, tendo cada uma 1,5 metros de altura. Os funcionários, para verem se o espaço estava mesmo vazio, tentaram abrir a porta da frente do celeiro, virada a norte. Para seu espanto, o que parecia ser fácil de abrir revelou-se impossível, pois os animais tinham posto duas tábuas de madeira a fazer de tranca. Passaram à porta das traseiras, e depois às janelas, mas nada se abria mesmo com 10 funcionários a fazerem força ao mesmo tempo. Estes perceberam então que, para o celeiro estar trancado dessa forma era porque, de facto, os animais estavam barricados lá dentro. O problema era que eles tinham que

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capturar os 45 animais que se escondiam no celeiro para receberem o tão desejado aumento salarial, pois Afonso e Aníbal Gomes iriam pagar o dobro do valor que habitualmente pagavam à empresa que ia buscar os animais.

A única abertura que estavam a ver para entrar no celeiro eram as aberturas das guaritas e as janelas do 1º andar, a 5 metros de altura, pelo que os funcionários começaram a trepar pelas paredes do celeiro. Para sua sorte, a partir dos 2 metros de altura os animais não tinham reparado os buracos nas paredes por não chegarem lá, pelo que os funcionários apenas tiveram que se içar para os buracos. Mas os animais do rés-do-chão estavam atentos, e viram pelas frestas entre as tábuas o que se estava a passar. Os funcionários ouviram berrar «Lancem os objectos!», das guaritas e janelas apareceram vários animais e logo a seguir começaram a cair estranhas coisas à volta do celeiro. Os funcionários que ainda estavam no chão viram que eram tomates, ovos, pedras, paus e terra misturada com neve, que os animais tinham arranjado durante as escavações do seu túnel. Sempre que algum dos trabalhadores do túnel voltava ao celeiro para respirar, vinha com um carrinho de mão cheio de terra para despejar no celeiro, que depois era levada em sacos, misturada com neve, para os animais encarregues de bombardear os funcionários. Os sacos eram descarregados nos locais de ataque e logo levados para baixo, para serem de novo enchidos. Era sobretudo isso que os animais lhes atiravam, pois não tinham dos outros produtos em grandes quantidades. Os sacos de adubo eram a melhor arma dos animais, pois sempre que atingiam algum dos funcionários este, com a pancada, largava a parede e caía. Um deles percebeu isso claramente a 3 metros de altura, quando foi atingido em cheio da cabeça por 10 kg de adubo. Com o choque, largou a parede e caiu como uma pedra, estatelando-se no chão. Para seu azar, os animais tinham levado toda a neve à volta do celeiro para dentro da construção, de modo que se magoou bastante na queda. Mas como não costumava desistir à primeira tentativa, voltou a tentar subir, e poucos minutos depois caía de novo com uma bola de terra e neve na cara, atirada por uma pata certeira. Era esta a única forma que os animais tinham de se defender: atirar coisas com força aos funcionários que subiam as paredes para os fazer cair. E bem tiveram que se esforçar quando um dos funcionários, com 1,90 metros de altura, conseguiu subir mais alto do que os colegas e aproximar-se perigosamente de uma janela do 1º andar. Os dois animais dessa janela bem atiraram bolas de neve ao homem, mas este não vacilou e continuou a subir.

Por fim, quando o funcionário estava a apenas 50 cm da janela, um dos animais teve uma ideia. Fechou uma das persianas da janela, e esperou até o homem estar atrás da persiana, à altura da janela. Antes que este tivesse tempo de se içar para o 1º andar no celeiro, deu um coice na persiana,

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empurrando-a violentamente para trás, e fazendo cair o funcionário. Este, no entanto, era resistente. Conseguiu agarrar-se dois metros mais abaixo, e continuou a subir. Os dois animais dessa janela, ao verem que o homem ainda não desistira de subir, pediram urgentemente aos companheiros que abasteciam os atiradores o objecto mais pesado que conseguissem arranjar. Um deles regressou com uma caixa cheia de latas de conserva velhas, pesando 20 kg. Anunciou alto para o funcionário ouvir «Esta caixa é bem pesada, vamos mandá-la pela janela!» e atirou-a mesmo da janela abaixo. O funcionário, ao ver que ia levar com uma caixa pesada em cima, preferiu atirar-se para o lado e descer a parede por si mesmo., desistindo de tentar chegar às janelas. Quando chegou ao chão, pegou na espingarda e começou a lançar dardos tranquilizantes contra os animais, como vários outros colegas. Os animais usavam, prevendo isso mesmo, o seu escudo feito com a casca das árvores para se defenderem.

Enquanto os funcionários atacavam o Celeiro-forte, a 250 metros dali os trabalhadores do túnel de fuga, iluminados por lanternas potentes encontradas ao pé das pás, chegaram a uma zona de rocha, a apenas 5 metros do local onde se pensava serem as cavalariças. Por mais que os animais tentassem partir a rocha com a pá, pouco mais lhe faziam do que lhe arrancar pedaços. Mas, como não haviam instrumentos mais apropriados para partir rocha no celeiro, tiveram que se desenrascar com as pás. Batendo com força na rocha, sempre lhes conseguiam arrancar pedaços, e os animais tinham noção de que se trabalhassem com esforço conseguiriam escavar os 5 metros que faltavam até ao fim do túnel. Já tinham escavado 245 metros segundo as suas próprias medições, estavam perto da sua meta.

10:00 Habitantes: 8

Hora e meia após o começo do cerco, os animais começaram a dar sinais de fraqueza. Tinham bombardeado os funcionários implacavelmente durante hora e meia, mas à custa de, no fim desse tempo, ficarem quase sem munições. Para as poupar, e para dificultar a vida aos funcionários, fecharam-se as janelas do 1º andar com trancas. Mas as guaritas não tinham persianas para se fecharem, apenas tinham um alçapão que ainda por cima se fechava do lado de dentro. Isso queria dizer que se os funcionários conseguissem alcançar as guaritas, não só apanhariam os animais que lá estivessem como também teriam uma porta de entrada para o celeiro. Atendendo a que haviam 3 funcionários para 1 animal, seria apenas uma questão de tempo até à rendição dos animais barricados no Celeiro-forte. Era precisamente isso que os animais das guaritas queriam evitar, pois