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MINISTÉRIO DA PREVIDtNCIA SOCIAL ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO Consultoria Jurídica Esplanada dos Ministérios, Bloco F, 9° andar, Sala 901 - CEP: 70.059-900 - Brasllia-DF Tel.: (61) 2021-5353- Fa-x: (61) [email protected] PARECER/CON]UR/MPS/Nº .3:Q1_ /2011 Processo SIPPS 345010164 Assunto: Consulta sobre a cobrança de valores recebidos a maior por segurados e pensionistas em razão de falha no sistema que gerou duplicidade de vínculos empregatícios que compuseram o período de cálculo. I - RELATÓRIO: EMENTA: CGPRE. PREVIDENCIÁRIO. PAGAMENTO DE BENEFÍCIOS EM VALOR A MAIOR QUE O DEVIDO POR ERRO DO SISTEMA DE CÁLCULO DA ADMINISTRAÇÃO. PROBLEMA DEVIDAMENTE CORRIGIDO. REVISÃO IMPLEMENTADA. RESSARCilvfENTO AO ERÁRIO DESSES VALORES. IMPOSSIBILIDADE. 1. In casu, 0,44% dos benefícios previdenciários concedidos no período foram calculados equivocadamente por falha no sistema de processamento, gerando valores a maior. 2. O problema foi devidamente corrigido e igualmente houve a revisão dos benefícios para o valor adequado. 3. Considerando a excepcionalidade do caso e o universo dos benefícios, entende-se impossível a restituição das quantias percebidas enquanto perdurou o lapso. 4. Situação especial que não se enquadra no Parecer MPS/CJ n 2 2.467/2001, tampouco no Parecer CONJURIMPS n 2 616/2010. 5. Discussão já conduzida ao Poder Judiciário, com decisão liminar determinando que o INSS se abstenha de efetivar a cobrança de tais valores. Trata-se de consulta técnica formulada pela Diretoria de Benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social - DIRBEN/INSS, de 3.2.2011 (fls. 1-4), a respeito de providências referentes à revisão de benefícios concedidos com a utilização de vínculos e remunerações em duplicidade, de forma indevida, em razão de falha no sistema de processamento dos benefícios por incapacidade detectada em 2008.

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MINISTÉRIO DA PREVIDtNCIA SOCIAL

ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO Consultoria Jurídica

Esplanada dos Ministérios, Bloco F, 9° andar, Sala 901 - CEP: 70.059-900 - Brasllia-DF Tel.: (61) 2021-5353- Fa-x: (61) [email protected]

P ARECER/CON]UR/MPS/Nº .3:Q1_ /2011 Processo SIPPS nº 345010164 Assunto: Consulta sobre a cobrança de valores recebidos a maior por segurados e pensionistas

em razão de falha no sistema que gerou duplicidade de vínculos empregatícios que

compuseram o período de cálculo.

I - RELATÓRIO:

EMENTA: CGPRE. PREVIDENCIÁRIO. PAGAMENTO DE BENEFÍCIOS EM VALOR A MAIOR QUE O DEVIDO POR ERRO DO SISTEMA DE CÁLCULO DA ADMINISTRAÇÃO. PROBLEMA DEVIDAMENTE CORRIGIDO. REVISÃO JÁ IMPLEMENTADA. RESSARCilvfENTO AO ERÁRIO DESSES VALORES. IMPOSSIBILIDADE. 1. In casu, 0,44% dos benefícios previdenciários concedidos no período foram calculados equivocadamente por falha no sistema de processamento, gerando valores a maior. 2. O

problema já foi devidamente corrigido e igualmente houve a revisão dos benefícios para o valor adequado. 3. Considerando a excepcionalidade do caso e o universo dos benefícios, entende-se impossível a restituição das quantias percebidas enquanto perdurou o lapso. 4. Situação especial que não se enquadra no Parecer MPS/CJ n2 2.467/2001, tampouco no Parecer CONJURIMPS n2 616/2010. 5. Discussão já conduzida ao Poder Judiciário, com decisão liminar determinando que o INSS se abstenha de efetivar a cobrança de tais valores.

Trata-se de consulta técnica formulada pela Diretoria de Benefícios do Instituto

Nacional do Seguro Social - DIRBEN/INSS, de 3.2.2011 (fls. 1-4), a respeito de providências referentes à revisão de benefícios concedidos com a utilização de vínculos e remunerações em duplicidade, de forma indevida, em razão de falha no sistema de processamento dos

benefícios por incapacidade detectada em 2008. ~

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Ref: SJPPS nº 345010164

2. Explica a DIRBEN/INSS que a falha consistia na duplicação dos vínculos empregatícios, gerando, desta forma, acréscimo indevido na apuração do salário de benefício e na renda mensal inicial de alguns benefícios. Esclarece que essa falha correspondeu a 0,44% do total de benefícios concedidos no período (mais de 17 milhões de benefícios por íncapacidade). Registra que o defeito em questão no Sistema de Administração de Benefícios por Incapacidade - SABI foi definitivamente corrigido desde 2009. Salienta que procedeu à revisão dos benefícios, atendidos o prazo decadencial e o contraditório, nos termos dos Memorandos­Circulares de fls. 5-10 e em conformidade com a Lei nº 10.666/2003, art. 11, que instituiu o programa permanente de revisão da concessão e da manutenção dos benefícios da Previdência Social, a fim de apurar irregularidades e falhas existentes.

3. Instrui a consulta com os seguintes documentos: 1) Ofício nQ NDPU­RJ/110/2010/GAB/DHTC/ ASO, de 9.12.2010, no qual a Defensoria Pública da União recomenda a irrepetibilidade das verbas de natureza alimentar percebidas de boa-fé (fls. 11-15); 2) Parecer/CON}UR/MPS N9 616/2010, de 23.12.2010 (fls. 17-28); 3) PARECER :MPS/CJ NQ 2.467, de 10.5.2011 (fls. 29-31v); 4) Nota Técnica PFE/INSS/CGMBEN/DIVCONS NQ 103/2009, aprovada pelo DESPACHO NQ 90/2010-PFE-INSS/CGMBEN (fls. 32-38); 5) Parecer NQ 73/2010/DIVCONS/CGMBEN/PFE-INSS, de 25.8.2010 (fls. 39-40); 6) Instrução Normativa nQ 49/INSS/PRES, de 16.12.2010 (fls. 41-46v); 7) Parecer NQ 14/2011/DIVCONS/CGMBEN/PFE­INSS, de 25.8.2010, aprovado pelo Despacho W 1/2011-PFE-INSS/CGMBEN, de 14.2.2011 (fls. 47-55); 8) Recomendação do Ministério Público Federal no Inquérito Civil nº 1.29.000.000551/2010-80 (fls. 56-62); 9) Acórdão do TCU nº 2.205/2009, Plenário (fls. 72-116); 10) Petição inicial da ação civil pública n 9 5002218-21.2011.404.7100 (fls. 120-153); 11) Decisão judicial concedendo parcialmente a antecipação da tutela recursal para que o INSS abstenha-se de efetivar qualquer cobrança administrativa ou judicial referente a valores supostamente recebidos a maior por segurados ou pensionistas em face de benefícios atingidos pela revisão objeto da ação civil pública, até o julgamento final da demanda.

4. É o relatório.

II - ANÁLISE fURÍDICA:

5. Inicialmente, antes de ingressar no mérito da consulta em questão, faz-se necessário um levantamento geral sobre as normas em vigor que tratam do pagamento

indevido de benefícios.~

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Ref.: SIPPS 11º 345010164

6. Nesse sentido, observe-se a previsão do art. 115 da Lei nº 8.213/90:

Art. 115. Podem ser descontados dos benefícios: I - contribuições devidas pelo segurado à Previdência Social; II - pagamento de benefício além do devido; ( ... ) § lll Na hipótese do inciso II, o desconto será feito em parcelas, conforme dispuser o regulamento, salvo má-fé. (Incluído pela Lei nº 10.820, de 17.12.2003) § 2Q Na hipótese dos incisos II e V1, haverá prevalência do desconto do inciso II. (Incluído pela Lei nQ 10.820, de 17.12.2003) ( ... )

7. Por seu turno, assim dispõe o Regulamento da Previdência Social - RPS,

aprovado pelo Decreto nº 3.048/99:

Art. 154. O Instituto Nacional do Segmo Social pode descontar da renda mensal do benefício: I - contribuições devidas pelo segurado à previdência social; II - pagamentos de benefícios além do devido, observado o disposto nos§§ 2º ao SQ;

( ... ) § 2° A restituição de importância recebida indevidamente por beneficiário da previdência social, nos casos comprovados de dolo, fraude ou má-fé, deverá ser atualizada nos moldes do art. 175, e feita de uma só vez ou mediante acordo de parcelamento na forma do art. 244, independentemente de outras penalidades legais. (Redação dada pelo Decreto nº 5.699, de 2006) § 32 Caso o débito seja originário de erro da previdência social, o segurado, usufruindo de benefício regularmente concedido, poderá devolver o valor de forma parcelada, atualizado nos moldes do art. 175, devendo cada parcela corresponder, no máximo, a trinta por cento do valor do benefício em manutenção, e ser descontado em número de meses necessários à liquidação do débito. § 4Q Se o débito for originário de erro da previdência social e o segmado não usufruir de benefício, o valor deverá ser devolvido, com a correção de que trata o parágrafo anterior, da seguinte forma: I - no caso de empregado, com a observância do disposto no art. 365; e II - no caso dos demais beneficiários, será observado: a) se superior a cinco vezes o valor do benefício suspenso ou cessado, no prazo de sessenta dias, contados da notificação para fazê-lo, sob pena de inscrição em Dívida Ativa; e b) se inferior a cinco vezes o valor do benefício suspenso ou cessado, no prazo de trinta dias, contados da notificação para fazê-lo, sob pena de inscrição em Dívida Ativa.@,

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Rej: SIPPS 11° 345010164

§ 52 No caso de revisão de benefícios em que resultar valor superior ao que vinha

sendo pago, em razão de erro da previdência social, o valor resultante da diferença

verificada entre o pago e o devido será objeto de atualização nos mesmos moldes do art. 175.

( ... )

8. Livre dos entendimentos doutrinários sobre a questão, a interpretação literal das normas acima transcritas visivelmente permite a conclusão no sentido . de que os valores recebidos além do devido por ocasião do pagamento dos benefícios PODEM ser descontados de benefícios futuros, e não DEVEM. É dizer, não haveria, necessariamente, obrigatoriedade nesse ressarcimento ao Erário. O que está dito na letra da lei é o seguinte: quando do recebimento indevido, pode haver desconto; se não houve má-fé, o desconto será feito em parcelas. A contrario sensu, nos casos comprovados de dolo, fraude ou má-fé, a restituição deve ser feita de uma vez só 1.

9. Ocorre que se disseminou na doutrina o entendimento no sentido de que a restituição nesse caso seria imperiosa, inclusive quando há errônea interpretação da norma por culpa da Administração, e independentemente de boa-fé do beneficiário. Foi sob influência dessa linha de pensamento o pronunciamento exarado no PARECER MPS/CJ nº 2.467/2001, publicado no DOU de 10.5.2001, reiterado no PARECER/CONJUR/MPS Nº 616/2010, de 23.12.2010, publicado no DOU de 24.12.2010, ambos com força normativa.

10. Com efeito, esta Consultoria Jurídica, por oportunidade da NOTA/ CONJURIMPS Nº 902/2007, já chegou a reconhecer o equívoco dessa lógica disseminada quanto à obrigatoriedade de devolução de valores indiscriminadamente, bem como a necessidade de aperfeiçoamento da legislação previdenciária, especialmente no sentido de adequá-la ao entendimento já assente quanto ao ponto em matéria de servidor público, a

exemplo dos enunciados a seguir:~

1 Perceba-se que a lei presumiu a continuidade da percepção de beneficios, deixando de contemplar a hipótese em que há cessação de pagamento, a qual recebeu o tratamento constante do art. 154, § 42, do RPS, sugerindo a cobrança por intermédio da ação de execução fiscal. Tendo extravasado os limites da legalidade, tal solução não vem sendo acolhida pela jurisprudência pátria, sob o fundamento de que tais valores carecem de certeza e liquidez necessárias ao aparelhamento da execução fiscal (REsp 1172126/SC, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, Segunda Turma, DJe de 25/10/2010; REsp 1125508/GO, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, Segunda Turma, DJe de 24/08/2010; REsp 867718/PR, Rel. Ministro TEOR! ALBINO ZAVASCKI, Primeira Turma, DJe de 04/02/2009; REsp 414916/PR, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, Primeira Turma, DJ de 20/05/2002)

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Ref.: SJPPS nº 345010164

Enunciado nº 34 da Súmula da AGU (DOU 19.09.2008) Não estão sujeitos à repetição os valores recebidos de boa-fé pelo servidor público, em decorrência de errônea ou inadequada interpretação da lei por parte da Administração Pública. Precedentes citados: Resp. nº 643.709/PR, AgRg no Resp nº 711.995, Resp. n2 488.905/RS e AgRg no Resp nº 679.479/RJ (Quinta Turma); ROMS nº 18.121/RS, Resp nQ 725.118/RJ, Resp n2 651.081/RJ e AgRg no REsp. n2 597.827/PR (Sexta Turma); MS nº 10.740/DF (Terceira Seção).

Enunciado nº 249 da Súmula do TCU (DOU 11. 9 .2007) É dispensada a reposição de importâncias indevidamente percebidas, de boa-fé, por servidores ativos e inativos, e pensionistas, em virtude de erro escusável de interpretação de lei por parte do órgão/entidade, ou por parte de autoridade legalmente investida em função de orientação e supervisão, à vista da presunção de legalidade do ato administrativo e do caráter alimentar das parcelas salariais. Fundamento Legal: - Constituição Federal, art. 71, incs. II e ill; - Lei n 8.443, de 16/07/1992, art. 1º. incs. I e V; - Lei n.º 8.112, de 11/12/1990, art. 46.

Lei n2 8.112/90, arl 185, § 2• (Interpretação a contrario sensu) Art. 185. ( ... ) § 2º O recebimento indevido de benefícios havidos por fraude, dolo ou má-fé, implicará devolução ao erário do total auferido, sem prejuízo da ação penal cabível.

11. Como se vê, não existe razão lógica para o discrímen em tela referente, de um

lado, às quantias recebidas de boa-fé pelos servidores públicos, que não estão sujeitas ao ressarcimento; e, de outro, os valores percebidos de boa-fé por beneficiários do INSS, os quais devem ser objeto de cobrança, à luz do entendimento exarado no PARECER MPS/CJ nQ

2.467/2001 e no PARECER/CONJUR(MPS Nº 616/2010.

12. ln casu, restou evidenciado que o pagamento dos beneficias em valores a maior decorreu de erro da Administração, não emanado de inadequada interpretação ou aplicação da lei, mas em razão de falha no sistema de processamento dos benefícios por incapacidade (Sistema de Administração de Benefícios por Incapacidade - SABI), responsável pelo cálculo. Além disso, igualmente se consignou que tal problema atingiu, tão-somente, 0,44% do total de

benefícios concedidos no período. ~

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Ref.: SJPPS 11º 345010164

13. Tais cirCllllstâncias evidenciam a peculiaridade do caso concreto e já anunciam a necessidade de adotar uma solução consentânea com o contexto.

14. Outrossim, deve-se registrar que a inconsistência em questão já foi objeto de minuciosa auditoria de natureza especial, realizada pelo Tribunal de Contas da União, cujas recomendações constantes do Acórdão n 2 2.205/2009 (Plenário) foram atendidas pelo INSS, seja quanto à correção do SABI, seja quanto à revisão dos benefícios que vinham sendo pagos em valores a maior. Saliente-se que, por ocasião da referida revisão, foi obedecido o devido processo legal, em conformidade com a Lei nº 10.666/2003, art. 11, que instituiu o programa permanente de revisão da concessão e da manutenção dos benefícios da Previdência Social, de forma que os benefícios hoje já estão sendo pagos nos valores adequados.

15. Ora, o caso em análise merece solução análoga ao entendimento consolidado no enunciado n2 106 da Súmula de Jurisprudência do TCU, in verbis: "O julgamento, pela ilegalidade, das concessões de reforma, aposentadoria e pensão, não implica por si só a obrigatoriedade da reposição das importâncias já recebidas de boa-fé, até a data do conhecimento da decisão pelo órgão competente.". Seguindo essa linha, enquanto os pagamentos vinham sendo considerados corretos e devidos, na medida em que foram regularmente processados pelo sistema, não se tem irregularidade a ensejar o ressarcimento respectivo.

16. Defendendo a posição de que o desconto para compensar o recebimento de valores indevidos somente seria possível em caso de má-fé ou dolo do segurado, cite-se a lição do Professor Fábio Zambitte Ibrahim:

Acredito que a vedação do desconto para os valores recebidos de boa-fé, (sic) seja correta. É certo que os jurisdicionados devem ter alguma segurança nas relações com a Administração, de modo a preservar as relações jurídicas estabelecidas e produzir algum conforto para os segurados, os quais, na atualidade, se veem cercados pelo constante temor de alguma revisão administrativa que produza redução de suas rendas mensais, o que não é incomum na complexa legislação vigente. (Curso de Direito Previdenciário. 16. ed. Niterói: lmpetus, 2011, pp. 578-579).

17. Perceba-se que, em circunstância na qual o benefício é recebido de forma ainda mais precária, não se tem exigido o ressarcimento de valores pagos pelo INSS. À guisa de ilustração, os benefícios previdenciários concedidos e pagos por força de antecipação de tutela judicial, que posteriormente é revogada, não são objeto de restituição, conforme reiterada jurisprudência do STJ. Nesse sentido, transcrevem-se os seguintes arestos: {!j2

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PROCESSO CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL AFASTADA. RESTITUIÇÃO DE PARCELAS PREVIDENCIÁRIAS PAGAS POR FORÇA DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. VERBA ALIMENTAR RECEBIDA DE BOA FÉ PELA SEGURADA. RECURSO ESPECIAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. 1. A questão da possibilidade da devolução dos valores recebidos por força de antecipação dos efeitos da tutela foi inequivocamente decidida pela Corte Federal, o que exclui a alegada violação do artigo 535 do Código de Processo Civil, eis que os embargos de declaração não se destinam ao prequestionarnento explicito. 2. O pagamento realizado a maior, que o INSS pretende ver restituído, foi decorrente de decisão suficientemente motivada, anterior ao pronunciamento definitivo da Suprema Corte, que afastou a aplicação da lei previdenciária mais benéfica a benefício concedido antes da sua vigência. Sendo indiscutível a boa-fé da autora, não é razoável determinar a sua devolução pela mudança do entendimento jurisprudencial por muito tempo controvertido, devendo-se privilegiar, no caso, o princípio da irrepetibilidade dos alimentos. 3. Negado provimento ao recurso especial. (REsp 991030/RS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 14/05/2008, DJe 15/10/2008)

AGRAVO INTERNO. RESERVA DE PLENÁRIO. INAPLICABILIDADE. MA TÉRlA CONSTITUCIONAL. PREQUESTIONAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. PENSÃO POR MORTE. TUTELA ANTECIPADA. REVOGAÇÃO. NATUREZA ALIMENTAR DO BENEFÍCIO. IMPOSSIBLIDADE DE RESTITUIÇÃO. 1. Decidida a questão sob o enfoque da legislação federal aplicável ao caso, inaplicável a regra da reserva de plenário prevista no artigo 97 da Constituição da República. 2. Conforme entendimento pacificado, a via especial não se presta à apreciação de alegada ofensa a dispositivo da Constituição Federal, ainda que para fins de prequestionamento, não sendo omisso o julgado que silencia acerca da questão. 3. Em razão da natureza alimentar das verbas previdenciárias, não se impõe a restituição das parcelas previdenciárias recebidas em antecipação de tutela, 4. Agravo ao qual se nega provimento. (AgRg no Ag 1097402/RS, Rel. Ministro CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), SEXTA TIJRMA, julgado em 05/05/2009, DJe 25/05/2009)

AGRAVO REGIMENTAL. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE TUTELA ANTECIPADA POSTERJORMENTE REVOGADA. DEVOLUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 83/STJ. 1. O Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento no sentido de que, em se tratando de verbas de natureza alimentar, como as decorrentes de benefícios previdenciários, os valores pagos pela Administração Pública, por força de

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antecipação de tutela posteriormente revogada, não devem ser restituídos. Incide a Súmula 83/STJ. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no Ag 1249809/RS, Rel. Ministro ADILSON VIEIRA MACABU (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RJ), QUINTA TURMA, julgado em 17 /03/2011, DJe 04/04/2011)

18. De fato, não parece ser possível conferir, ao beneficiário que percebeu valores de boa-fé, um tratamento mais gravoso do que aquele que vem sendo dado aos indivíduos que somente receberam benefícios previdenciários por força de decisão judicial em caráter precário. Ora, se estes últimos, quando a decisão é reformada ou cassada, ficam liberados da restituição, mais razão se tem para igualmente deixar de cobrar quantias regularmente pagas aos beneficiários, conforme a sistemática legal, e cujo valor equivocado somente depois foi conhecido.

19. Nesse sentido, inclusive, já começam a se firmar alguns precedentes na jurisprudência dos tribunais, conforme os seguintes arestas:

PREVIDENCIÁRIO. CUMULAÇÃO DE PENSÕES. PAGAMENTO INDEVIDO. ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. OCORRÊNCIA. VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ PELO SEGURADO. RESTITUIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Esta Segunda Turma deste egrégio Tribunal vem entendendo não ser admissível a cobrança, ou o desconto em folha, de verbas recebidas indevidamente, a título de benefício previdenciário, quando isso tenha ocorrido por erro da Administração. 2. Precedentes: AC 384063/CE. Rel. Des. Federal Luiz Alberto Gurgel De Faria. DJ 04.10.2007, p. 851. 3. Não há que se falar em ofensa à cláusula de reserva de plenário, haja vista ter se dado interpretação cabível ao art. 115 da Lei nº 8.213/91, que destoa do entendimento almejado pelo INSS. Precedente do STJ: STJ -AgRg-Al 1.070.528 - (2008/0153400-3) - 5' T- Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho - DJe 25.05.2009 - p. 2086 4. Constatou-se que o pagamento a maior decorreu de erro atribuído exclusivamente ao INSS, não havendo sequer alegação de que o ora apelado tenha agido com fraude, dolo ou má-fé. 5. Remessa Oficial e Apelação do INSS não providas. (TRF da 5ª Região, APELREEX 200985000053590, Desembargador Federal Francisco Barros Dias, Segunda Turma, 14/10/2010)

CONSTITUCIONAL. MANDADO PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR

DE SEGURANÇA MORTE. PAGAMENTO

BENEFÍCIO INDEVIDO

CONSTATADO POR AUDITORIA. BOA FÉ. RECONHECIMENTO. RESTITUIÇÃO AO ERÁRIO. INEXIGIBILIDADE. SUCUMBÊNCIA A CARGO DA UNIÃO.A

( ... ) LJ-8

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4. In casu, o pagamento tido como indevido pelo INSS originou-se da constatação de erro no pagamento do benefício de pensão por morte, com animo em auditoria realizada pelo Instituto, no valor, em favor do INSS, de R$ 2.559,51 (dois mil, quinhentos e cinqüenta e nove reais e cinqüenta e um centavos), referente ao período de 05/99 a 04/2005. 5. Verificado o erro, inexiste direito adquirido a se manter montante irregular; todavia, o já recebido, por encontrar-se amparado pela visível boa-fé da pensionista, não deve ser descontado de seus proventos. 6. Ante a necessidade de preservarem-se os valores supremos do ordenamento jurídico: a segurança jurídica e a certeza do direito, e considerando que a implementação dos valores em questão foi percebida de boa-fé, impõe-se reconhecer a inexigibilidade da restituição ao erário. 7. Apelação do particular provida. (TRF da 5ª Região, AMS 95903/PB. Rel. Des. Fed. Joana Carolina Lins Pereira (convocada). Data do julgamento: 16/10/2007. DJ 26/12/2007, p. 92)

20. Além disso, observa-se que o caso em exame não se enquadra no PARECER/

CONJUR/.MPS NQ 616/2010, de 23.12.2010. Senão, vejamos:

Questão 15. A boa-fé do segurado é fator impeditivo para a restituição de valores de benefícios equivocadamente concedidos ou majorados administrativamente, por força de errônea interpretação da norma? 88. No âmbito do RGPS, para que fique delineada a situação de pagamento de benefício indevido, no todo ou em parte, é necessário que o fato fique comprovado em sede de processo administrativo no qual deve ser assegurada ampla defesa e contraditório ao beneficiário, por força da garantia constitucional ao devido processo legal (art. SQ, inciso LIV, da Constituição). 89. Por outro lado, a legislação em vigor não permite o perdão da divida ao segurado recebedor de benefício indevido, mesmo se ficar caracterizada sua boa-fé. Permite-se apenas o parcelamento do débito ou a sua consignação, quando o beneficiário for recebedor de outro benefício do INSS. É o que se extrai da leitura do art. 115, inciso TI e § lQ, da LBPS. 90. O Regulamento da Previdência Social, no seu art. 154, contém alguns parâmetros mais detalhados sobre como proceder ao ressarcimento do erário.

21. Da leitura do trecho acima, vislumbra-se claramente que a situação em análise

não está contemplada no PARECER/CONJUR!MPS Nº 616/2010, de 23.12.2010. Aqui, houve

erro decorrente do Sistema de Administração de Benefícios por Incapacidade - SABI, e não

errônea interpretação da norma. Assim, a repetibilidade dos valores defendida no referido

parecer normativo não alcançaria a hipótese su~ examine. {j2

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MINISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL

ADVOCACIA-GERAL DA UNIÁO

Consultoria Jurídica

Rej.: S!PPS 11º 345010164

22. Com efeito, registre-se, ainda, que a Defensoria Pública da União ajuizou a ação civil pública nº 5002218-21.2011.404.7100, cuja petição inicial figura nas fls. 120-153, pugnando que o INSS se abstenha de efetuar qualquer cobrança ou desconto quanto ao recebimento desses valores recebidos por conta do erro no SABI em questão. Nos autos desta ação, em 10.3.2011, foi concedida antecipação parcial dos efeitos da tutela recursal, nos seguintes termos: "Ante o exposto, concedo parcialmente a antecipação da tutela recursa[, para que o INSS abstenha-se de efetivar qualquer cobrança administrativa ou judicial referente a valores supostamente recebidos a maior por segurados ou pensionistas em face de beneficias atingidos pela revisão objeto da presente ação até o julgamento final.".

23. Desta forma, por mais este motivo, deve prevalecer o entendimento quanto à inadmissibilidade da pretensão de ressaTcirnento ao Erário no caso concreto.

III - CONCLUSÃO:

Ante o exposto, a Consultoria Jurídica do Ministério da Previdência Social, no exercioo da atribuição prevista no art. 11 da Lei Complementar nº 73/1993, conclui sua análise, conforme a argumentação acima aduzida, no seguinte sentido:

a) Considerando que o pagamento de beneficios em valor a maior ocorreu em decorrência de erro no Sistema de Administração de Benefícios por Incapacidade - SABI, e não de errônea interpretação da norma; que a falha já foi devidamente corrigida; que os benefícios objeto da inconsistência foram revisados em conformidade com a Lei nQ 10.666/03; que o problema correspondeu a apenas 0,44% do total de benefícios concedidos no período, entende-se que a situação é excepcional e não se enquadra sob a égide do Parecer .MPS/CJ n2 2.467/2001, tampouco do Parecer CONJUR/MPS nº 616/2010, já exarados por esta Consultoria Jurídica junto ao Ministério da Previdência Social;

b) Conforme a argumentação acima aduzida, tem-se que o quadro fático em questão justifica a impossibilidade de cobrança dos valores referidos; e~

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Ref.: SIPPS 11º 345010164

e) Por fim, tendo em vista que a discussão já foi conduzida ao Poder Judiciário e que se encontra pendente a ação civil pública n 2 5002218-21.2011.404.7100 sobre o episódio em tela, com decisão liminar determinando que o INSS se abstenha de efetivar qualquer cobrança administrativa ou judicial de tais valores, fica reforçada, por mais este motivo, inadmissibilidade da pretensão de ressarcimento ao Erário na presente circunstância.

À consideração superior. Brasília, 08 de junho de 2011.

~~~-ROBERT A SIMÕES NASCIMENTO

Coordenadora-Geral de Direito Previdenciário

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Ref: SJPPS 11º 345010164

DESPACHO/CONTUR/MPS/Nº 4 33 /2011

Aprovo o P ARECER/CONJUR/MPS/Nº 32 J /2011. Encaminhe-se à Diretoria de Benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social - DIRBEN/INSS, para as providências cabíveis, com cópia para Procuradoria Federal Especializada junto ao INSS, para ciência.

Brasília, 13 de junho de 2011.

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