1963) - forum abel varzim€¦ · sariament e de con~iriuar mobilizada ao servigo da "desordem...

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D IRE IT0 A I N FOR M A Q A 0 PerguntavaNa~oleao como se poderia manter a ordem no Esta- do sem uma Religiao. Melhor epigrafe naoencontrariamospara este numero. Somos daquele~ cristaos que perguntam porque 0 Evangelho perdeu aqui a sua for9a e sea Igrejaem Portugal tera neces- sariament e de con~iriuar mobilizada ao servigo da "desordem es tabelecida". Sofremos porvera face da Igreja, Mae e Mestra, desfigu- rada. No entanto 0 Evangelho nao nos permite julgar osbis- pos que, em bengaos, hanquetes e inauguragoes, aparecemao grande publico com tcdo 0 peso de uma cau<;ao moral que os en- candeia ao regime.Enem mesmo podemos julgar certos padres que, ,ainda ern muitas re~i5es e ern jornais catolicos, susten- t~m abertamente 0 Estado Novo. Tudo isto~ tamb~m traigao de todos nos, e temos consciencia de quanto ternpesado asn~~sas fraquezas eomiss5es. Entao,porque falamos? Nos nao passamos de uma parcela do Povo de Deus que reJ8l- ta a instalagao,0 longosilencio adormecido de quarentaanos, que serao mais uma ve~omemorados com todas as bengaos ecle- siasticas. Connosco e~ta 0clamordos pobres, pobres de pao, pobres de liberdadee de dignidade, que sac llultidao em todo o chamado "mun~o portugues". Sofremos porque, perante tais clamores, a Igr~ja em Portugal nao fala. A voz do Evangelho, dos Papas, do Concilio nao se fazouvir. A verdade ~tralda como pre90 pela "paz II e pea "ordem".Os pobres sofrem, e a Igreja das bemaventuran9as, a Igreja servaepobre, nao esta comeles. Os homens sac oprimidos, ea Igreja da liberdade perde-seem distin90es subtis, manda acatar ~s autoridades, relembra atodos que nao sac do mundo,tenta explicar 0 ter- mo I\liberdade" quando se tornou urgent e emprega-la edefen- de-la. Mas"quandoa Igreja se transforma em maquina de fa- bricar resignados e bem-pensantes, ela fabrica ainda mais efi- cazmente na nossa epoca ateus e revel tados 1t Este 0 testemu- nho insuspeito de urnmarxista, com quemtemos deestar de acordo. A situa9ao ~ grave, e nos queremosver outra face na nossa Igreja. Uma face que resplande9a de amor e servi90 em vez de instrumento de apoio a urnregime que esmaga em nos aimagem de Deus.

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Page 1: 1963) - Forum Abel Varzim€¦ · sariament e de con~iriuar mobilizada ao servigo da "desordem estabelecida". Sofremos por vera face da Igreja, Mae e Mestra, desfigu-rada. No entanto

D IRE I T 0 A I N FOR M A Q A 0

Perguntava Na~oleao como se poderia manter a ordem no Esta-do sem uma Religiao. Melhor epigrafe nao encontrariamos paraeste numero.

Somos daquele~ cristaos que perguntam porque 0 Evangelhoperdeu aqui a sua for9a e se a Igrejaem Portugal tera neces-sariament e de con~iriuar mobilizada ao servigo da "desordemestabelecida".

Sofremos por vera face da Igreja, Mae e Mestra, desfigu-rada. No entanto 0 Evangelho nao nos permite julgar os bis-pos que, em bengaos, hanquetes e inauguragoes, aparecemaogrande publico com tcdo 0 peso de uma cau<;ao moral que os en-candeia ao regime. E nem mesmo podemos julgar certos padresque, ,ainda ernmuitas re~i5es e ern jornais catolicos, susten-t~m abertamente 0 Estado Novo. Tudo isto ~ tamb~m traigao detodos nos, e temos consciencia de quanto tern pesado as n~~sasfraquezas e omiss5es.

Entao, porque falamos?Nos nao passamos de uma parcela do Povo de Deus que reJ8l-

ta a instalagao, 0 longo silencio adormecido de quarenta anos,que serao mais uma ve~omemorados com todas as bengaos ecle-siasticas. Connosco e~ta 0 clamor dos pobres, pobres de pao,pobres de liberdade e de dignidade, que sac llultidao em todoo chamado "mun~o portugues". Sofremos porque, perante taisclamores, a Igr~ja em Portugal nao fala. A voz do Evangelho,dos Papas, do Concilio nao se faz ouvir. A verdade ~ traldacomo pre90 pela "paz II e pea "ordem". Os pobres sofrem, e aIgreja das bemaventuran9as, a Igreja serva e pobre, nao estacom eles. Os homens sac oprimidos, e a Igreja da liberdadeperde-se em distin90es subtis, manda acatar ~s autoridades,relembra a todos que nao sac do mundo, tenta explicar 0 ter-mo I\liberdade" quando se tornou urgent e emprega-la edefen-de-la. Mas"quando a Igreja se transforma em maquina de fa-bricar resignados e bem-pensantes, ela fabrica ainda mais efi-cazmente na nossa epoca ateus e revel tados1t• Este 0 testemu-nho insuspeito de urn marxista, com quem temos de estar deacordo. A situa9ao ~ grave, e nos queremos ver outra face nanossa Igreja. Uma face que resplande9a de amor e servi90 emvez de instrumento de apoio a urn regime que esmaga em nosa imagem de Deus.

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(Atinge por vezes as raias do ridiculo a forma irrespons~velcomo S8 emb~ulham ~s realidades Deus e P~tria, Igreja e Es-tado Novo, Providencia e Salazar, Damos aiguns textos paraamostra, num campo onde s6 0 espn90 falta~ que nao 0 material)

Jornal "A VOZ", 27.4.65:Domingo de P~scoa - Misss so-lene na Madalens-."Cuivres"· daOrquestra Lamoureux, coros da

"Madeleine". Missa em mi de L.Saint ~arti~. Una prece pedin-do saude para 0 nosso queridoDoutor Salazar e todos as seuscolaboradores e amigos dedica-dos, como 0 ilustre director deA VOZ. Na caixa das esmolaspus uma nota de banco portugue-sa em que esarevi: - PriezpourSaiazar3 saint et h~roi-que defenseur de Christ, dePortugal et de In civilisation<

Discurso do Arcebispo de Lou-ren90 Marques, no jornal A VOZ,18.4,.1961:

A conclusao e que a mensa-gem pacifica de Jesus ainda~n;o pCLotruu ~m tod08 OB sereshumanOfl, Bssa dooe e austerafigura de Mestre e de Pastore ainda urn desconhecido paramuita gente, Ja isso e mristee grande mal; maior ainda encon-trarem-se baptizedos entre astraidores a Patria. Significaisso ~ue antes 0 foram a JesusCristo e ao seu Evangelho ••.

A ASSEMBLEIA NACIONAL PRESTOU HOMENAGEM,.A D, ANTONIO BENTO IVIAR'I'INSJUNIORj GRANDE ARGEBISPO DE BRAGA E GRANDE PATRIO~A, CUJA MEM6RIAFOI E-gOCADA PELO DEPUTADO COIVlENDADORSANTOS :DA CUNHA.

(Titulo de lINOVIDADES&, 5 de Dezembro de 1963)E foi por isso um Prelado que na devida altura sempre soube «'es

tar justiga ao hornem que permitiu que durante estes anos se esta1f5le-cesse 0 clima necess~ri0 ao florescimento da Igreja em Portugal, 0Senhor ~residente do Consalho. .Recordo doisf.actos apenas., Primeiro ~ numa hora If,a ei.l~. ,.,uealguem pretendeu perturbar a paz religiosa neste palSy 0 Sr. D, int6nio Bento~Martins J~nior~ em plena Catedral de Braga~ per ocasi§o da comemora-g§o do Estatuto Nacional do Trabalho1 sondo Ministro das Corporagooso nosso ilustre colega sr, dr. Veiga de Macedo, ergueu a sua voz paraprestar justiga a quem a merecia e repor as coisas no devi10 lugar.c.

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HOlilliNAGEMDO ARCEBISPODE BRAGANO TE-DEUM PELO 3ANIVERSAR10DE ~4LAZAR. (Diario de Noticias, 29,4059)

o , ,0 Veneranc1c Preladop:::,oferiu liIin homilia em que salientoua irnportancia da data p20ra a Nar;;ao portugLl.e,la. E recordandouma pasAagem daSagrada Esorit",-ra .. q'1.ando M(lj.fH~S procuralevanta:r 0 animo ao povo elei to .. disss: IISta te et "..ridete!"Levantai·-vos e cobrai animo, recordando 0 qUE;Testes e 0 quesois, gragas a obra do homenageado.Ontem, na c~tedra universitaria, espRlha~do a jorr0s 3. luz dos

. 2imeiros e preparando a geragao do resgate;log0 ao leme da<l)barca naci Ollal, preparando -lhe e infundind.o-lhE? alma ~00Ya; e

con·ridancio iodof:> 6s portugues-E 8, unHio ("Ill volta do ideal dobem comu."'l; e relevando os tesouros preci080s daB v.irtudes The-

gnanimas, latentes na alma lusitana; e restabelece~d0 a unidadeespiritual da Patria, em volta do simbolo sacrossanto da Cruzredentora; e pondo ci~ncia e honradez na administragao p~blica;e orientando a riqueza nacional num senti do social e humano~ eimplantando; POI' essas provincias alem, monumentos iillportantesoque ai ficam como li vro aberto a dar testemunho ir:r-ecu82.,.rel da'epoca de progresso como poucas que conhecera 110 passado 0 110S80palS; e defendendo a Terra port-ugue'sa, aquem e aleffi mar:, contraa cobiga dos outros povos estrangeiroso.,• '0 Paremos aqui um pouco, contemplando 8stas ma:r:avilhas .de De"J.8"operadas pelos homens quen'Ele cream e e adoram. Admiremos astransformag5es operadas desde h~ 30 anos no nossopais, gragasao Espirito novo que felizmente contin~a soprando em todos osquadrantes da vida naci onal] com vigoro:vi impeto renovador, MasA.O mesmo tempo pegamos a Deus qae cont5.nue iluminando e gUiando

tr\QS homens p~blico s que governam 0 p'~lise nomeadamente 0 Sr 0: ,Pre-'ljGidente do Canselha, arrojado.e tenaz timolleiro, a fim de que

possam ser satisfei t as e quanto antes, e pOI' inteiro ~ as aspira.-';I5es do povo portugues que ainda 0 nao foram e de que sejam f.i.~·~lalmente removidos as obst~culos que dentro 01.1 fora das frontei~·ras constituam ameaga ou perigo pa~a a paz, a ordem e a tranqui-lidade publicas, Epara isso forgoso e que a.sta nos sa homenageme ardentes votos de longa vida que fazemos junto do altar daPadroeira'se traduzam nu11lapronta, desinteressada e firme cola-boragao com os olhos postos na patria terrena, mas sem os tirarda Patria celeste que e a unica Patria eterna~ mansao autendJicada';"erdadeira Ordeme Paz inexauriveis a que todos aspiramos."

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"AINDA GOA, DAMAO E DIUIt 4(do semanirio portuense itAP~lavra&, nQ 19, 7.4.95)Parece que na Asia as coisas nao andam muito bem. A 1ndia e a

China andam continuamente a pegar-se e, se nao foram problemas demaior monta no mesmo continente, e em que a Chinatambem toma par-te, talvez que a 1ndia estivesse ja a bragos com uma guerra.E era muito bem feito!Eu acredito em Deus. Por isso rezo todos os dias para pedir a Deusgue permita que a China e.a 1ndia se envolvam numa guerra; umac~guerra nao muito grande, mas guerra.~ que podiamos assim emprestar a China, a titulo temporario, gracioso ou nao, 0 Estado portugues da 1ndia para as suas operagoes mili=tares. E como - assim esta escrito rio Tribunal Internacional da Haia- esses territorios sac portugueses, talvez essa fosse uma maneirade eles voltarem a estar sob a nossa administragao. Que felicidadepara os goeses, ora escravizados, tao frequentemente perseguidos,as vezes assassinados!Mas a China e comunista, e nao parece possivel que 0 nosso Governoreconhega esse regime. Alem disso essa tai guerra nao se mostra, paraja, muito possivel.Da Deus as nozes a quem nao tem dentes!

do DIARIO DE NOTICIAS, 28.6.64Perante a formatura, sob 0 comando do sr. Tenente-coronel Garces

de Lencastre, 0 Capelao do Governo Militar de Lisboa celeBrou missae, na altura propria, -proferiu uma homilia que rematou com estas pa-lavras:"80ldados! 'remos querela jus~a. Naquela vespera da batalha de AC;ubaErota, NunlAlvares falou tambem a rapazes como vas, a Ala dos Namorams.E falou-lhes desta maneira:ItEm nome de Deus e da Virgem, sejamos pres-tos e fortes, temos querela justalt. ~ justo 0 sacrificio em que vamosempenhar-nos, em nome de Deus e da V~rgem, que sejamos prestos e for-tes, audazes, valentes e saibamos que estamos apenas a defender a li-berdade de todo 0 mundo, a dignidade, a honra, e a servir a Paz que 0mundo parece recusar. N6s trabalhamos a favor da Patria, a favor de to-das as patrias e a favor do mundo inteiro.E neste juramento, a que todos nos vamos assistir, todos, intimamente,militares ou civis, tomamos parte para vos dizer: bem hajam e Deus vosguarde e abengoe".

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A "INDEPENDENCIA" DA IGREJA PERANTE A pOL1TICA... 5(de ItA Voz do Domingo" - 8.6.58- Semanario catolico de Leiria,propriedade da Diocese, diii~id~ por um Conego, 4ue assina:)

"as Bispos nao podem fala' mais claro. Mas nos podemos~ EfalamoS. Eescravembs.

Nada de vio18ncias! Nada de medo! Vamos todos as urnas!Vamos todos \rotar! :li1 todos em Americo Tomas! Ii

ElIlEditorial: "Votar em Humberto Delgado Cluer dizer: Uniao como comunismo, reatamento de relagoes diplomaticas com a RussiaSovietica, invasao oficial do pais por uma legiao de propagan-distaR e agitadores sovieticos, preparagao das noras ae des-truigoes; de.sangue, de lagrimas, de fome, de lama, de roubos;de vnlencjas, de sacrilegios, de assassinatos Clue, nao ha muito~ensanguel1taram a terra de Espanha •••

Votar em Humberto Delgado e rasgar a lei fundamental da Na-gao, abolir a Concordata com a Santa Se e talvez 'cortar as '.re;-la90es diplomaticas existentes~ e perder 0 direito de proprie-dade, pois tudo fica a pertencer ao Estado; e abdic~r d6 direj.···to. de prestar a Deus 0 cuIto Clue Ihe e devido ••••

. Votar em Humberto Delgado e eSCluecer e renegar Goda a histo-ria de Portugal, desfazer-se de toda a gloria Clueherdamos dosnossos antepassados, e trair os mais altos e sagrados deveresde amar e servir a patria Cluenos foi berl);loe Cluenao paderasobreviver, longe de Deus e da religiao, como 0 candidato e asseus apaniguados e os seus protectores Cluerem."

TRONa E ALTAR, FE E IMPERIO, CRUCIFIXO E PUNHAL(do "Diario de Lisboa" - 3.6.65):

"Em seguida, 80m a banda da Forga Aerea executando marchasmilitares, os recrutas desfilaram, espagados, cruzando-sefrente a bandeiranacional, Clue beijaram.

Diante da qandeira, 0 capelao do regimento, rev. capitaoAntonio Martins, segurava urn crucifixo e 0 comandante Argen-tino Seixas segurava urn punhal, "slmbolos do espiri to edaforga". E esteo unico regimento do Pais em Clue'se,efectuaeste acto. It

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UM TESTEllliNHODA IGREJA DO SIL~NCIO(carta de um crist§o, 1~.12.l959)

" A fe, a fidelidade, a obediencia, tornaram-se entre nos extre-mamente dificeis e n§o nos demos admirar que estas virtudes caiamno desespero. (Exceptuam-se, e claro, a fe milagreira,a fidelidadea ordem estabelecida e a obediencia passiva - formas requintadas deidolatria e d~ traigio). Talvez sempre tivessem sido dificeis. Mashoje e demais, e Deus ha-de ter piedade dos desertores.

Quando a Igreja condena uma heresia abre 0 caminho a heresia ~ .traria. Se nem sempre assim acontece e, julgo eu, porque 0 trabalh;e 0 dialogo dos crist§os restabelec~m.o equilIbria. Quando os cris-t§os que deviam faze-lo 0 n§o fazem, ou porque n§o quere24 ou por-que nio s§o capazes, ou porquen§o ha condigoes externas para isso,quem e responsavel pelo facto de alguns crist§os se desviarem da he-resia conilRria, saltando desesperidamente fora da carroga?

Deve ser assim que muitos coragoes generosos saltam a trincheira,mas nio me parece que seja POl' esse caminho que se perde a fe - a n§oser a fe naquilo que n§o e 0 seu objecto verdadeiro. De resto, mesmoque se salte a trincheira e se perca a fe ou se julgue perder a fe,mesmo assim n§o e facil dizer quem e que combate 0 bom combate: seaquele que se acomodaa tudo, ameita tudo e tem fe em tudo e defendeem nome de Deus os seus interesses e as suas comodidades, se aqueleque se revolta, que resiste, que recalcitra e passa aos barbaros,que por fim, para combatcr a Deus, acaba por combater aquilo que n§oe Deus, aquilo que nao vom de Deus, aquilo que compromete Deus, querdizer, aquilo precisamente que Deus quer que se cJombata.Decerto, n§o e para desejar que a gente se fa9atransfuga para coIlkS.,bater 0 que ha de impuro na cristandade, a imensa hipocrisia da c~':-lizagao crista, incluindo a impureza e a hipocl'isia clerical. Mas,se isso acontecer, quem tem 0 direito de julgar?

Peca~o por pecado, acho que e maior 0 de se instalar no sepulcrocaiado do que 0 de sair ca para fora de armas na m§o: no sepulcrocaiado nao pode haver fe (e al mesmo que ela morre); sair pode afigu-rar-se a certas almas a unica maneira de salvar a fe em qualquer coi-sa - um acto de homenagem ao Deus Desconhecido. E se essa "qualquercoisa" for mais pura do que os interesses sordidos que se camuflam nonome do Senhor, e melhor que ela se salve atrav8S duma infidelidadeaparente do que ofender a Deus por meio de uma fidelidade convencional.

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"A REBELIAO DOS CATOLICOS"(C.Perena, no diario catolicos de Madrid,lYA", 7/2/65)

Muitos cristaos querem a todo 0 custo viver a mensagem evangelica do amor na plenitude do mundo moderno. Nao tern medo do-progresso, da tolerancia, do socialismo, do ateismo. Para serevoltarem contra 0 mundo, comegaram por se rebelar contra simesmos, contra a sua propria inercia e cobardia, contra os

/7peus proprios compromissos e privilegios. Revoltam-se contra\~ hipocrisia, contra 0 medo de dizer a verdade e de a ouvir.

Renunciaram a ser conformistas, conservadores, intransigentes:Repugna-Ihes uma vida emburguesada e causa-lhes nausea uma so-ciedade falsa e malsa, destruidora de tudo 0 que ha de essen-cial no homem.

Foi necessario que 0 marxismo sacudisse os fundamentos maissolidos da "ordem", que 0 capitalismo degradasse os valoressupremos do esplrito, para se assistir a esta renovagao da con~ciencia atrofiada e quase insenslvel a injustiga social. EmEspanha, como noutros palses, vai-se difundindo esta conscien-cia crista de rebeliao contra a injust~ga e aintolerancia •••

\

•••Podemos deter os ecos de tal consciencia, podemos desacredi-ta-Ia e ate mesmo langar suspeitas sobr~ a sua ortodoxia, mas

\nunca seremos capazes de destruir os seu13 sentimentos cristaosde rebeliao contra urn mundo deformado pe\o odio e pelo egolsmo,muitas vezes sob a camuflagem da religia~ ou do patriotismc ••,

(~ra certa gente isto e incompreenslvel; ~ara muitos nada ha\\~ais clare. Renunciam a ser cidadaos de p~imeira classe' para

serem irmaos de todos; querem regressar a ~m cristianismo pri-mitivo, mas vitalizadc, actualizado e adap\ado ao seculo XX •

•••Tais cristaos encontram sempre lugar ao \ado de todos aque-les que lutam pela transformagao da sociedad'e e pela Iiberdl;a;l;gaodos oprimidos. 0 seu comprometimento est~ fundado na con-cepgao crista do homem que conduz a verdadeir~ democracia so-cial, a igualdade e a justiga soeial, a aboli~ao da opressao,pelas ragas mais evoluldas, a liberdiagao das donsciencias queaprendem a julgar por si mesma's~ e ao abandono de toda a es-pecie de materialismo.

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INTERVENgAO DO BISPO DO PORTO NO CONCILIO VATICANO II. SOBRE 0 8DEVER PASTORAL DOS BISPOS (1.11.1963)

•••Nem e de admirar se os filhos deste seculo e tambem no fundo doCOra9ao as filhos da luz digam ou sintam que os homens da Igreja,entre as virtudes cardiais, preferem a prudencia e a temperan9a enao amam suficient~mente a justi9a e a fortaleza. Isto e evidente-mente falso a respeito de muitos e e injurioso para a Igreja mili-tante. Todos nos sabemosque 0 nosso seculo e digno de se Ihe cha-m~r.a idade dos_martires, como os primeiros seculos da nossa Hi~torla. ~.

Temos aqui diantc Q8 pas verdadeiros confes30ros da f€? os quaisja houve oportunidade de aplaudir ••• Ja ouvimos os testemunhos dealguns deles7 expressa e colectivamente do egregio e corajoso Epis-copado da Polonia •••

-No Evangelho nao encontramos distin90es entre 0 Cesar pagao eateu e 0 Cesar cristao e tradicionalista. Com efeito, 0 problemaea sua contesta9ao pode nascer e nasce junto dos povos que culti-yam as tradi90es da "bela epoca", que servem e conservam as coisasanteriormente institu:Ldas, das quais 0 "catolicismo" ou princlpia de"ordem" era parte integrante, em geralno costume concordatario enas rela90es diplomaticas com a S~nta Se. Em tal regime de orden eautoridade, de certo paternal e talvez excessiva, assim como as ove-Ihas que dormem, ignoro seos pastores, tern os olh<lllspesados: noG~tsemani, enquanto :so Ele agonizava, todos os Apostolos dormiamexcepto Judas ••••Se.6 Bispo, em defesa do uma causa justa, ainda que apenas mo-·ral e teoricamente, esta com os pobres e a doutrina da Igreja, decerteza que incomoda: e isto tanto num regime democratico como ~regime autocratico. Simplesmente num regime autocratico, alem d\fl .que tais ocasioes sac muito mais graves e frequent es,· 0 chefe. poll-tico muito e muito pode, senao tudo ••••••Que fazer portanto? 0 Bisp 0 ouviu na sw consagra9ao :"Ao Bispo cogpete julgar, interpretar, ordenar, etc. Recebe 0 baculo do deverpastoral; para que sejas piamente violento em corrigir os V:LClas.julgando sem ira •.• Impomos Senhor, na cabega deste antlstite e teuatleta 0 capacete da defesa e salva9aO, de forma a que apare9aterrlvel diante dos adversarios da verdade •.• lutador robusto".A mesma Igreja pede a Deus que 0 bispo cOJ:.ltinueeapascente naSuaforQa e na sublimidade do Seu nome.

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CATOLICOS ESCREVEM AOS BISPOS(de Informs,tions Catholiques Internationales

nQ 251 15.12.65)

Urn grupo de catolicos portugueses dirigiu a todos os PadresConciliares presentes em Roma uma carta na qual, "alimentadose vivificados pelo Concilio" e confiantes na importancia quetomara 0 Sinodo Episcopal, pretendem iniormar os bispos sobrea presente situa9ao da Igreja em Portugal."E uma por9ao da Igreja do Silencio, duma Igreja pobre ehumilhada, que se dirige nesta carta aqueles a quem 0 SenhorJesus confiou as chaves do Reino dos C~US'I, diz 0 texto.

Em Portugal, continuam os anonimos autores, 0 catolicismo,religiao tradicional, tern por fun9ao essencial a integra9aodas consciencias individuais na be ordem politica. Neste con-texto, a unica forma de religiao aceite pelo regime ~ uma reli-giao conduzida a urn fenomeno puramente individual e cultural,que considera todas as reaolidades sociais e politicas como urncampo impuro que deve ser deixado ao Estado,

Em seguida a carta enumera as consequencias das rela90esentre a Igreja e 0 Estado. sJ, por urn lado, a imprensa e a te-levisao dao grande relevo as manifesta90es religiosas "inocen-tes" (procissoes, missas oficiais, etc), os acontecimentos doConcilio e as mensagens pontificias mais significativas sao,pelo contrario, sistematicamente deformadas ou at~, como acon-teceu com a viagem do Papa a Bombaim, pura e simplesmente si-·lenciados. A censura corta as enciclicas sociais e impede 0episcopado au qualquer outro grupo, catolico ou nao, de se pro-nunciar sobre problemas tao fundamentais como a vida infra--humanas dos trabalhadores, a mistificagao que repr8sentam ospseudo-sindicados estatais, as lacunas e deficiencias da previ-dencia social e da assistencia medica, a instru9ao das camadaspopulares onde a escolaridade obrigat6ria e apenas de quatroanos, e 0 sistema de auto-censura que impede qualquer discussaolivre.

OBispo do Porto foi exilado por ter chamado a aten9ao, empublico, para as exigencias do Evangelho e por ter denunciadoos abusos do regime em rela9ao a Igreja. Reduzem-se ao silencicjornais cat61icos. Quando os catolicos atraiem as iras do re-gime, prendem-nos ou fazem-nos passar por comunistas. Padresangolanos encontram-se exilados em Portugal desde 0 come90 daguerra de Angola por se terem oposto ao principio da missiona-

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9ao portuguesa: "Dilatar a Fe e 0 Imperio",Em face de tal situagao, prossegue a carta, nao e alficil

adivinhar a triste reputa9ao de que goza a Igraja de Cristona maior parte dos 8eios5 sobretudo no meio operario> A AC9aoCat61ica atrav8ssagrave crise. A pastoral, baseada numa re11-giao "sociologica" ~ e inef;Gas ~ sobretudo nos D8.ics url)anos,As poucas tentati vas C.e ren cvaC;8,C)que ja forara empreend:i.daspoemem causa a religiao como meio 1e integra9ao social e politica,

Foi par este motivo qUI) quisemo8 ilsrtar as autoridades, di~a carta em conclus30< Nao l1C)c, pertence condenar pessoas nem jUCgar lntengoes, i;Acreditamos ~:il-mementeque s6 da fidelidade a j

=e;:LeJu -iut:: t;;lil :l-;'Uliici co2 renov(-'.;"::8 podera advir a sa1vag8.o, Que estenosso apelo POSSQ contribui~ p~ra a r8novagao conciliar da Igre-ja em Portugal.

Que acontecera? pois, se, ao acreditar nisto e ao realiza--lo (ouapenas ao recusar-se a agir de In.c(to contrario ou a usaI' do fingi-mento, sobretudo quando os proprios dizem: quem nao e pOl' n6s econtra n6s), 0 bispo incomoda os poderosos? 0•• , a liberdade e 0 maior bem da IgrejaJ e 0 mais importan~e, Oraaliberdade da Igreja e e liberdade dos }~ispos. :Nao existe liber-'dade para a Igreja sem a liberdade dos Bispos com 0 sell presbiterio:pOI' causa des ta Iiberclade renunciaram 5, vida e acti vida,des familia-resJ econ6micas e pollticas!,•• Oxala que isto fosse sempre claro~ palo menos em tados os espi-ritos eclesiasticos! Como se descreve nos Aetas dos Apostolos:."Entao eles sairam~ cheios de alegria, da presenga do Sinedrio, parterem sido ,e.chadmdignos de 'serem afrontados par causa do nome de,Jesus", A afronta dos reis e dos PO:ft03 edos seus chefes pode ser'recebida pelo Bispo com alegria;nao assim,porem, a dosirmaos •••

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~R:B&'-PROFETASI

(da 21 carta do Eng. Cunha 1eal ao Cardeal Patriarca de1isboa, 20.2<1965)

•.•Diz Vossa Eminencia que adoptaram este equipamento belieo eesta pose heroieizante, par isso que Ihes ineumbia defender aliberdade religiosa, IVIas- Meu Deus ,-nunea houve em Portugaltantas persegui90es aos catolieos oposicionistas como no decur-so da vida desta ditadura sam que, portal Illotivo,se tenhaquebrada 0 mutismo pouco impareial de V. Eminencia e dos seus

(01 eolegas do Episcopado.,j rtolllenscomo 0 .i:JuCil'eJouquim Al'T8.3C0:rrei.a,a data Superior

dos Missionarios de Espiri to Sarlto no n0880 pais, so POl' setel' atrevido a dar publicidade ~s informag5es pertinazmenterecolhidas pela Exml SrI D. Berta M~ia sabre 0 vil assassinatona noi te tragica de 1!19 de Outulno n do seu marido 1 0 generosoe noBre comandante Carlos da Maia~ foi presQ e forgado a aban-donar Portugal, indo, como ale me escrevia, a ansinar filoso-fia a doutores numa universidade cat61ica do Canada quando asua grande a.spiragao eTa cOl1tinnar 8. Sl:J.aoora de missionagaona Africa Portuguesa. E 1£ morf8u no exilio, deixsndo as tris-tes ossadas em terras estranha~.

o Dr. Abel Varzim, sacerdote inteligente, culto e de pre-claras virtudes cristas, estava desempenhando na freguesia lis·-boeta da Encarnag~o uma autentica e merit6ria obra de apostola-do, mas, sob a acusagao de extrema severidade na interpretag~oda doutrina cat61ica, foi projectado para uma pequer,qf'I'egu3s:tanortenha, onde nao Ihe faltaram persegui95es pol{ticas, atG ~ue

1{J,a morte, talvez misericordiosa, 0 fez transi tar de s'tc~!lundG'--peryerso para 0 saie de Deus e

o Padre Pic, par ter obedecido aos imperativQs morai8 da suareligiao, ao dar guarida, pOl' escassas 24 horas, a u~ foragidoo categorizac!.ocatolico, a.quem a sua revol ta espiri tue.l pro-jectara em movimentag5es subversivas, fo~ preso e julgado,aeaoando pOL entregar a alma ao Criador, talvez em consequen-cia do agravamento dos seus males, ocasionado pelo regimep:J:'isionale

Page 12: 1963) - Forum Abel Varzim€¦ · sariament e de con~iriuar mobilizada ao servigo da "desordem estabelecida". Sofremos por vera face da Igreja, Mae e Mestra, desfigu-rada. No entanto

QUE ACONTECEU AO EVANGELHO EM PORTUGAL? 12(artigo de M. GARRIGOU-LAGRANGE em Temoignage Chretien, 12.12.64)

Para se compreender - que nao justificar - a atitude da Igrejaem Portugal, temos de recorrer a epoca ainda recente em que tudco que tivesse 0 epltetode cristao era banido, escarnecido, per-seguido. Ve~o Salazar e reabriram-se as igrejas, voltou-se a ensi- .nar 0 catecismo, 0 clero comegou a ser respeitado. A Igreja res-pirou, como se saisse de urn subterraneo longo e sombrio; a partirde entao, tudo 0 que evoque e,sses tempos de abominagao ou permit ....supor que eles voltem parece tao negro como 0 mafarrico. As pa~~·vras "socialismo" e "liberalismo" cheiram a enxofre; "progresso"inquieta; "revolugao", "comunismo" e "vanguarda" despertam urn verdadeiro panico.

E a Igreja tornou-se uma das colunas que mais firmemente sus-tentam 0 Estado Novo. Quando Salazar convida todo 0 povo portuguesa manifestar a sua coesao entusiasta quanto ao protlema de Angola,e nos priores que encontra os melhores propagandistas; sac elesque, apas a homilia, indicam aos cristaos os autocarros que os hao-de levar a Lisboa. E pode ver-se" €i.. porta de numerosas igrejas, -urn cartaz onde a Virgem inunda cd!n os seus raios de oiro Guine,Angola e Mogambique .•• Alias os bispos, ja por varias vezes acen-tuaram a solidariedade da Igreja e do Estado nasua missao comumem relagao aos territorios de alem-mar.

Assim neste texto colectivo de Janeiro de 1961:

( ••• )"E a grande tentagao da ordem moral, da instabilidade politi-ca e social, da instalagao. Como e que nao havlamos de nos ale~)~ao ver as comissoes governamentais censurar impiedosamente asimoralidades do teatro e do cinema ••• e com a mesma tesoirada, asideias inquietantes! "

Onde e que a Igreja poderia, melhor que ne siliBquadro solidamenteestabelecido, corresponder as exigencias da sua missao? baptizar,ensinar e sobretudo formar os padres cuja necessidade e tao cruel-mente ~entida em Portugal? Echegamos a este paradoxo, do qual in-felizmente a historia nos apresenta outros exemplos: a Igreja existe,. t~m ate casa propria. Vista do exterior, e salida e de bela a~parencia. Mas os proprietarios venderam os moveis para salvarem afachada. Que aconteceu entao ao Evangelho?