1. estudo br - a finalidade extra-fiscal do tributo
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A FINALIDADE EXTRAFISCAL DO TRIBUTO EAS POLTICAS PBLICAS NO BRASIL
Daniel Cavalcante Silva
1 Introduo
O presente estudo visa realizao de uma anlise sistemtica sobre a utilizao
da finalidade extrafiscal da norma tributria como instrumento de implementao de polticas
pblicas no Brasil. Ao estudar a poltica pblica implementada por intermdio da finalidade
extrafiscal da norma tributria, o presente trabalho visa afastar a falsa noo de ser a
extrafiscalidade algo meramente ocasional ou algo que seja parte secundria do fenmeno do
tributo. Como cedio, diversamente da imposio tradicional (tributao fiscal), que visa
exclusivamente arrecadao de recursos financeiros (fiscais) para promover o custeio dos
servios pblicos, a denominada tributao extrafiscal aquela orientada para fins outros que
no a captao de recursos para o errio. Dessa forma, inserem-se como objetivos da
extrafiscalidade: a redistribuio da renda e da terra, a defesa da economia nacional, a
orientao dos investimentos para setores produtivos ou mais adequados ao interesse pblico,
a promoo do desenvolvimento regional ou setorial e, sobretudo, como mecanismo de
implementao de polticas pblicas.
Dentro dessa perspectiva, observa-se que a implementao de polticas pblicas
por intermdio do tributo, subretudo em face da sua finalidade extrafiscal, tem a propriedade
de corrigir externalidades, positivas e negativas. Nesse sentido, a tributao, como mecanismo
de implementao de polticas pblicas, pode ter como propsito, por exemplo, incentivar a
gerao de empregos ou ser utilizada como instrumento para viabilizar o ingresso deestudantes carentes ao ensino superior.
Na verdade, a finalidade extrafiscal da norma tributria, de acordo com os
preceitos doutrinrios e normativos, passa a ser um arranjo institucional legtimo na
formulao, mecanizao e implementao para que uma poltica pblica seja vivel. Essa
Advogado e Diretor-Executivo do escritrio MBSC Advogados; especialista (MBA) em Direito e PolticaTributria pela FGV - Ncleo Braslia; Mestrando em Direito e Polticas Pblicas pelo Centro Universitrio de
Braslia (UniCEUB); Membro honorrio da Associao Internacional dos Jovens Advogados (AIJA) e membrohonorrio da Associao Internacional dos Advogados (AIA); Membro do Grupo de Pesquisa em FinanasPblicas no Estado Contemporneo. E-mail: [email protected] ou [email protected]
mailto:[email protected]:[email protected]:[email protected]:[email protected] -
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abordagem, situada no Sistema Tributrio Brasileiro a partir dos objetivos extrafiscais dos
tributos e seus valores jurdico-sociais implcitos e explcitos na Carta Magna, tem por intuito
fornecer subsdio para que o formulador de polticas pblicas possa, em razo da falta ou a
incipincia de recursos financeiros, conceber o desenho institucional de uma poltica pblica.
A anlise em epgrafe traz elementos conceituais e fundamentos constitucionais
para a extrafiscalidade da norma tributria, sobretudo como fundamento para que a
implementao de polticas pblicas possa se sobressair quando eventualmente existirem
dvidas quanto a sua legitimidade.
2 A finalidade extrafiscal da norma tributria como mecanismo de implementao depolticas pblicas
Para que as prticas e os objetivos sumariados constitucionalmente sejam
implementados, as cincias que se ocupam das respectivas reas pressupem a capacidade do
Estado tributar, isto , exercer ingerncia sobre a esfera dos indivduos. Ao traduzir esse
fenmeno em linguagem do Direito, necessrio sustentar um fundamento jurdico que
permita ao Estado tributar, afastando os interesses individuais contrrios incidncia
tributria. Revela-se, desse modo, outra faceta do corolrio da supremacia do interesse
pblico sobre o interesse do particular no Direito Tributrio.
Nesse sentido, a atividade financeira do Estado passou a ter uma natureza
nitidamente extrafiscal, sendo utilizada no apenas para fins de natureza fiscal, mas tambm
poltica, econmica e social, desde o momento em que este Estado tornou-se um agente
interventor do desenvolvimento e do bem-estar social, deixando de ser, simplesmente, um
mediador distanciado dos debates sociais.
H muito vem se discutindo os institutos da fiscalidade, da extrafiscalidade e da
parafiscalidade como critrios finalsticos dos tributos. Entretanto, at o presente momento
no se chegou a nenhum denominador comum no que concerne s suas respectivas definies
e valores finalsticos que o legislador desejou imprimir na lei tributria. Ademais, poucas so
as referncias doutrinrias no direito positivo que tratam o tema substancialmente. Em
restrio temtica, aborda-se apenas a finalidade extrafiscal do tributo.
A atividade financeira que o Estado exerce com o intuito de ordenar as relaes
sociais e econmicas interferindo, por exemplo, no mercado, denominada como atividade
extrafiscal. Com efeito, essa atuao extrafiscal do Estado no visa obteno de recursos
para o errio pblico, mas apenas atuao sobre o contexto econmico, alterando o cenrio
social, atravs, por exemplo, da tributao em gastos seletivos ou a sua reteno. Como se
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sabe, as exaes fiscais so receitas derivadas, arrecadadas pelo Estado, para financiar a
despesa pblica. De acordo com Luciano Amaro1, a distino entre tributos com finalidade
fiscal e tributos com finalidade extrafiscal reside, exatamente, no objetivo visado pela lei de
incidncia.
Nesse sentido, Misabel Derzi, em nota de atualizao do livro de Aliomar
Baleeiro, preleciona que o tributo extrafiscal quando no almeja prioritariamente prover o
Estado dos meios financeiros adequados a seu custeio, mas, antes, visa a ordenar a
propriedade de acordo com a sua funo social ou a intervir dados conjunturais (injetando ou
absorvendo a moeda em circulao) ou estruturais da economia. cedio, no entanto, que o
Estado tributa com vistas a auferir receitas e, assim, a supremacia do interesse pblico
consubstancia o princpio da fiscalidade. Quando se apreciam objetivos outros, que se afastamda pura arrecadao, apresenta-se a extrafiscalidade. Eis a extrafiscalidade como princpio,
decorrente da supremacia do interesse pblico, que fundamenta, juridicamente, a tributao
com fins diversos do puramente arrecadatrio.2
Portanto, a extrafiscalidade caracteriza-se pelo exerccio da cobrana para atender
a outros interesses, que no os de mera arrecadao de recursos financeiros. O interesse
geralmente manifestado com a extrafiscalidade o de correo de situaes sociais ou
econmicas anmalas. Segundo Hugo de Brito Machado, o tributo extrafiscal quando seuobjetivo principal a interferncia no domnio econmico, para buscar um efeito diverso da
simples arrecadao de recursos financeiros3. Endossa ainda essa posio Paulo de Barros
Carvalho, ao afirmar que a forma de manejar elementos jurdicos usados na configurao dos
tributos, perseguindo objetivos alheios aos meramente arrecadatrias, d-se o nome de
extrafiscalidade 4.
De acordo com tais entendimentos, pode-se inferir que a extrafiscalidade
constitui-se na aplicao de um modelo jurdico-tributrio para a consecuo de objetivos quepreponderam sobre os fins simplesmente arrecadatrios de recursos financeiros para o Estado.
O valor finalstico da extrafiscalidade que o legislador incute na lei tributria, portanto, deve
atender s necessidades na conduo da economia ou correo de situaes sociais
indesejadas ou mesmo possibilidade de fomento a certas atividades ou ramo de atividades de
acordo com os preceitos constitucionais.
1 AMARO, Luciano. Direito tributrio brasileiro. 2. ed. Revisada. So Paulo: Saraiva, 1998, p. 67.2 GOUVA, Marcus de Freitas. A extrafiscalidade no direito tributrio. Belo Horizonte: Editora Del Rey,
2006, p. 43.3 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributrio. So Paulo: Malheiros, 1997, pg. 129.4 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributrio.9. ed. rev., So Paulo: Editora Saraiva, 1997, p.
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Nesse diapaso, quando o legislador institui uma lei de cunho extrafiscal, enceta
providncias no sentido de prestigiar algumas situaes econmico-sociais. Assim, no caso da
educao superior, pode-se verificar a preocupao estatal na consecuo de valores sociais,
conforme preconiza o art. 6 da Carta Magna5. Deve-se ressaltar, alm disso, o direito
educao como fundamento prestacional do Estado6. Assim, por exemplo, quando o Imposto
Territorial Rural (ITR) busca atender, em primeiro plano, finalidade de ordem social e
econmica e no o incremento da receita, ao fazer incidir a exao de maneira mais onerosa,
no caso dos imveis inexplorados ou de baixa produtividade.
De acordo com a finalidade imediata supra referida, a tendncia moderna do
cunho extrafiscal da legislao apia-se em orientar os indivduos no interesse coletivo,
visando organizar a vida em termos de civilidade e nivelao dos tipos e modos de viver. A
priori, para fundamentar qualquer teoria social aplicada, necessrio analisar a importncia
do princpio do bem comum e do interesse pblico, aspecto no qual incide a finalidade
extrafiscal da lei. Modernamente, toda atividade legislativa tem se orientado para esse
objetivo, que no um objetivo meramente formal ou demasiadamente genrico e terico,
sem contedo determinado, mas um objetivo claro, decorrente da natureza prtica das coisas
em relao com o convvio social.
O conceito de bem comum incide na eterna dialtica do interesse individual e ointeresse coletivo. Ao singularizar o conceito de bem comum, poder-se-ia dizer que seria o
bem particular de cada indivduo, como ente de um todo social. Mas se, ao contrrio, o
conceito de bem comum for ampliado, observar-se-ia que o fim de cada indivduo seria o fim
do todo. Na realidade, ambos os conceitos se complementam, pois o bem da sociedade o
bem do prprio indivduo que a compe.
A atribuio de promover o bem comum cabe ao legislador, por intermdio de
uma atuao voltada s aspiraes sociais, dentre elas o dever de dirimir eventuais conflitosemanados pela prpria autoridade administrativa em face dos interesses sociais. Esses
interesses sociais, hodiernamente, foram diversificados e ampliados em virtude do bem
comum da sociedade, como na noo de interesse pblico, privado, coletivo, individual,
homogneo e difuso.
5 Art. 6. So direitos sociais a educao, a sade, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurana, a previdnciasocial, a proteo maternidade e infncia, a assistncia aos desamparados, na forma desta Constituio.
BRASIL. Constituio da Repblica Federativa do Brasil. Braslia: Planalto, 2006. Disponvel em: Acesso em: 22 nov. 2006.6 MALISKA, Marcos Augusto. O direito educao e a Constituio. Porto Alegre: Srgio Fabris Editor,
2001, p. 243.
http://www.planalto.gov.br/http://www.planalto.gov.br/ -
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Nesse sentido, por exemplo, a legislao do Imposto de Renda e proventos de
qualquer natureza (IR) permite o abatimento de verbas gastas em determinados investimentos,
tidos como de interesse social ou econmico, tal como o reflorestamento, que tem a
possibilidade de justamente incentivar a formao de reservas florestais do pas.
Um exemplo do entrelaamento de efeitos fiscais e extrafiscais encontra-se na
denominada Cide-Tecnologia (Contribuio de Interveno no Domnio Econmico), criada
pela Lei n. 10.168, de 29 de dezembro de 2000 e destinada a financiar (elemento fiscal) o
Programa de Estmulo Interao Universidade-Empresa para Apoio Inovao, cujo
objetivo principal o de estimular o desenvolvimento tecnolgico brasileiro (elemento
extrafiscal), mediante programas de pesquisa cientfica e tecnolgica cooperativa entre
universidades, centros de pesquisa e o setor produtivo.A Cide-Tecnologia somente devida pelas pessoas jurdicas que pagam royalties a
titulares de direitos de propriedade intelectual residentes ou domiciliados no exterior. Com
esse tributo, o Estado brasileiro tem a possibilidade de desestimular esse tipo de pagamento
tornando-o mais oneroso, reduzindo assim o gasto de divisas, ao mesmo tempo em que
incentiva a demanda por tecnologia domstica com vistas a contribuir para o desenvolvimento
autctone. Enquanto isso no se materializa, a receita planejada com a Cide, que se projeta
declinante em razo do antevisto sucesso do programa, financiar a produo de tecnologiadestinada a atender aquela demanda nova por inovaes domsticas.
A extrafiscalidade, portanto, fica adstrita ao interesse pblico que, parafraseando
Hely Lopes Meirelles, so as aspiraes ou vantagens licitamente almejadas por toda a
comunidade administrativa, ou parte expressiva de seus membros.7 A finalidade da
extrafiscalidade da lei tributria, aplicada em vrios campos de atuao do homem, repousa
no bem comum revestido de utilidade coletiva.
Enfim, os efeitos extrafiscais da norma tributria utilizam-se do instrumentofinanceiro para a provocao de certos resultados econmico-sociais, como reprimir inflao
e o desemprego, restaurar a prosperidade, proteger a indstria nacional, promover o
desenvolvimento econmico ou o nivelamento das fortunas ou a correo da iniqidade na
distribuio da renda nacional, entre outros objetivos no menos nobres.
7 MEIRELLES,Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. So Paulo: Editora Malheiros, 1997, pg. 80.
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2.1 A origem da extrafiscalidade: a parafiscalidade
Como finalidade imediata do tributo, a extrafiscalidade teve origem histrica nas
contribuies parafiscais em geral e nas Contribuies de Interveno no Domnio Econmico
(CIDE), desde a sua gnese francesa e italiana8, e por desgnio constitucional no Brasil (art.
149 da Constituio da Repblica), sendo um instituto fadado a desempenhar um papel dubl
aos tributos contemporneos.
A parafiscalidade e a contribuio parafiscal nasceram com a interveno estatal
na ordem econmica e social e com a descentralizao administrativa necessria sua
implementao. Da a essencial, ontolgica e necessria afetao da contribuio como receita
prpria das entidades da Administrao Pblica indireta incumbidas daquela nova tarefa. A
terminologia parafiscalidade exprime um fenmeno histrico que no pode ser olvidado no
estudo das contribuies, que so apenas a conseqncia fiscal (ou parafiscal) da
descentralizao administrativa que se verificou no mundo, especialmente a partir dos anos
1930 e intensamente aps a Segunda Guerra mundial9.
A criao de entidades paraestatais, com personalidade jurdica prpria,
gravitando em torno do Estado, mais especificamente na administrao indireta, e assumindo
funes das quais a Administrao direta no seria capaz, fez surgir a necessidade de novas
receitas paralelas ao oramento fiscal que financiassem as respectivas despesas, assim,
descentralizadas 10, da a origem do termo parafiscal. Afetava-se um patrimnio estatal a um
novo ente administrativo. Afetava-se uma receita prpria para que com ela se desincumbisse
da tarefa a ser descentralizadamente executada. Surgem, assim, as chamadas receitas
parafiscais.
Jos Marcos Domingues de Oliveira conceitua a contribuio parafiscalcomo o
tributo devido a entidades paraestatais em razo de atividades pblicas especiais por elas
desenvolvidas e as classifica em contribuies sociais ou assistenciais, econmicas ou deinterveno na ordem econmica, coorporativas ou profissionais.11
As contribuies parafiscais chegaram no Brasil na dcada de quarenta, pelas
mos do tipo contribuio previdenciria, financiadora de incipiente sistema de Caixas de
8 OLIVEIRA, Jos Marcos Domingues de. O Contedo da extrafiscalidade e o papel das Cides. Efeitosdecorrentes da no-utilizao dos recursos arrecadados ou da aplicao em finalidade diversa. RevistaDialtica de Direito Tributrio, So Paulo: Dialtica, n. 131, p. 47, ago. 2006.
9
Idem, p. 37.10 Idem, p. 37.11 OLIVEIRA, Jos Marcos Domingues de. Contribuies sociais, InCadernos de pesquisas tributrias. v. 17,
So Paulo: Resenha Tributria e Centro de Extenso Universitria, 1992, p. 136.
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Aposentadoria e Penses, para da alcanarem status constitucional em 196912. Veicularam-
se, depois, expressamente como instrumento de atuao (custeio) nas reas de interveno
da Unio Federal dos domnios sociais, corporativos e econmicos. Tiveram origem na
Frana, para subsidiar polticas de desenvolvimento, e na Itlia, para financiar a poltica
sindical, circunstncias que fizeram surgir a clebre polmica entre Mrigot e Morselli a
respeito de sua singularidade de fundamento numa nova solidariedade, a afastar delas a
irrestrita obedincia legalidade tributria13.
Essa relao intrnseca entre as contribuies parafiscais e a interveno do
Estado na Ordem Econmica determinou, por um lado, a autonominao e personificao de
novos servios estatais e, de outro, a afetao das novas receitas aos cofres das recentes
entidades paraestatais encarregadas de desempenhar aquele novo tipo de atuao estatal.Nesse sentido, ressalta Casalta Nabais:
Quanto s contribuies, tributos ou receitas parafiscais [...] se caracterizampor serem tributos [...] que so cobrados das despesas de pessoas colectivaspblicas no territoriais [...], tributos objecto de uma verdadeira consignaosubjetiva de receitas.14
No Brasil, a afetao das contribuies parafiscais s entidades paraestatais
ocorreu em relao a vrias instituies, como aos Institutos de Previdncia, a Embratur, entre
outras. Embora merc de apenas uma jurisprudncia leniente do Supremo Tribunal Federal
que desde o Recurso Extraordinrio n. 138.824-CE15 admite a centralizao da arrecadao
das contribuies, assente no Direito brasileiro que as contribuies se distinguem no
sistema tributrio ptrio como tributos finalsticos. Esses tributos so aqueles cuja instituio
s se pode dar para atender a uma finalidade expressamente admitida na Constituio, por isso
mesmo, os respectivos recursos devem ser consumidos na finalidade assinalada.
Em suma, a finalidade parafiscal do tributo destina-se historicamente ao custeio
do parafisco e, contemporaneamente, serve de instrumento adeso de polticas pblicas decunho regulatrio (Cide-Tecnologia, Lei n. 10.168, de 29 de dezembro de 2000), ou
transformadora das estruturas (Cide-Combustveis, Lei n. 10.336, de 19 de dezembro de
2001)16. Cumpre ressaltar que diante do novo cenrio do Estado contemporneo, conforme
12 Artigos 18 e 19 da Constituio brasileira de 1967. Disponvel em: < http://www.planalto.gov.br > Acesso: 01dez. 2006.
13 FERNANDES, Simone Lemos. Contribuies neocorporativas. Belo Horizonte: Del Rey, 2005, p. 53.14 NABAIS, Casalta. Direito fiscal. 2. ed. Coimbra: Almedina, ApudOLIVEIRA, Jos Marcos Domingues de.
Contribuies sociais, InCadernos de pesquisas tributrias. v. 17, So Paulo: Resenha Tributria e Centro deExtenso Universitria, 1992., p. 48.15 Disponvel em: < http://www.stf.gov.br > Acesso em: 01 dez. 2006.16 Disponvel em: < http://www.planalto.gov.br > Acesso em: 01 dez. 2006.
http://www.planalto.gov.br/http://www.stf.gov.br/http://www.planalto.gov.br/http://www.planalto.gov.br/http://www.stf.gov.br/http://www.planalto.gov.br/ -
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assente a doutrina nacional, a parafiscalidade faria parte da extrafiscalidade, sendo aquela
elemento conceitual da finalidade extrafiscal. Nesse sentido, como as finalidades de ambas
esto imbricadas, no faz mais sentido distingui-las.
3 A tributao extrafiscal e sua aplicabilidade em face dos princpios constitucionais
Os constitucionalistas norte-americanos, seguindo o rastro jurisprudencial dos
tribunais do seu pas, arquitetaram uma distino entre os tributos cobrados com fundamento
no poder de tributar e os exigidos sob o amparo do poder de polcia, ambos inerentes e
inseparveis do Estado. Praticamente, essa diferena equivale de tributos puramente
fiscais e tributos extrafiscais.
Do ponto de vista estritamente jurdico, a separao das duas categorias
supracitadas permite aos tribunais anurem com limitaes ou clusulas constitucionais. Se o
fim almejado pelo poder de polcia est dentro da competncia da pessoa de direito pblico
que exige tributo, esse tolerado no interesse da proteo vida, segurana, liberdade,
sade, higiene, ao bem-estar e moralidade dos cidados.
Seguindo essa tendncia, impostos confiscatrios e proibitivos, que se atritam
com os direitos e garantias constitucionais da propriedade ou do exerccio de profisses e
atividades lcitas muitas vezes so tolerados pela jurisprudncia norte-americana como
manifestaes do poder de polcia, desde que, em caso concreto, se apure sua eficcia na
defesa da segurana, sade e bem-estar do povo. Essa a atribuio moderna da tributao
extrafiscal e a gnese da possibilidade de afastamento da aplicabilidade de princpios
constitucionais, conforme prognosticava Aliomar Baleeiro17.
Aliomar Baleeiro tinha razo, de certa maneira, em tangenciar a jurisprudncia
americana e correlacion-la com a prtica jurisprudencial brasileira, pois alquotas percentuais
progressivas ou regressivas de natureza extrafiscal ou poltica, hipteses em que seenquadram as alquotas com funo punitiva ou seletiva, que variam segundo critrios
relacionados com polticas pblicas. As alquotas assumem a funo de meios extrafiscais de
interveno no domnio econmico ou social, no possuindo fins essencialmente
arrecadatrios.
Quando se pretende uma interveno por intermdio de procedimentos ou
modelos tributrios aplicveis, o Estado ora usa dos efeitos drsticos que uma imposio
17 BALEEIRO, Aliomar. Introduo cincia das finanas. 14.ed., atualizada por Flvio Bauer Novelli, Rio deJaneiro: Editora Forense, 1995, p. 177.
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produz sobre os preos e o valor, ora afasta esses efeitos por meio de imunidades e isenes,
discriminando, para esse fim, as coisas, fatos ou atividades, que deseja preservar e encorajar.
Para fins de esclarecimento, deve-se atentar ao fato de que uma das mais antigas
aplicaes do imposto para desempenho de funes extrafiscais a exigncia de direitos
alfandegrios altamente onerosos para proteo da produo nacional, j que essa poltica
provoca encarecimento das mercadorias estrangeiras, afastando-as da concorrncia ou
permitindo que as nacionais se possam vender por preos mais gratificantes.
Por outro lado, o mesmo resultado pode ser obtido por intermdio de isenes a
certos ramos de atividade nacional, de forma que o custo da produo desta fique na paridade
da mercadoria importada. Em geral, essas duas formas se ordenam ou harmonizam para o
mesmo fim.A tributao fundada em critrios poltico-econmicos baseia-se nos efeitos da
tributao sobre a repartio de encargos pblicos e sobre a redistribuio da renda nacional.
Evidentemente, qualquer tcnica de tributao extrafiscal em bases racionais pressupe o
estudo dos efeitos de cada imposto em dadas conjunturas, notadamente, as tendncias de
ordem econmica.
A interveno do Estado por meio de tributos extrafiscais ou do poder de polcia
oferece vasta casustica na legislao e jurisprudncia ptria. Inicialmente, existemdoutrinadores que entendem ser incompatveis determinados princpios tributrios com a
tributao extrafiscal. O aspecto supracitado traz baila a questo da tributao exacerbada
por razes extrafiscais, que poderia violar, entre outros, o princpio da capacidade
contributiva.
Juliani Fonrouge, com a oposio de outros doutrinadores, entende que o
princpio da capacidade contributiva incompatvel com a tributao extrafiscal. As isenes
e outras tcnicas de exonerao fiscal para alavancar o desenvolvimento econmico, segundoo mestre portenho, partem da idia de que os empreendedores possuem elevada capacidade
econmica, tanto que investem dinheiro em atividades empresariais em troca de aliciantes
fiscais18.
Por outro lado, conforme o mesmo autor, as tcnicas inibitrias de extrafiscalidade s
so possveis pela exacerbao dos encargos fiscais, tornando proibitivos certos consumos e
hiperonerosas certas situaes. Pode-se verificar o seguinte exemplo com o ITR e IPTU
progressivos. O primeiro para desestimular o latifndio, o ausentismo e a improdutividade
18 FONROUGE, Juliani.Derecho financiero. 3. ed., v. I, Buenos Aires: Editora Depalma, 1976, p. 126.
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rural, e o segundo para coibir a especulao imobiliria urbana e a disfuno social da
propriedade nas cidades.
Sem a exacerbao da tributao no haveria como praticar a extrafiscalidade, que se
caracterizaria justamente pelo uso e manejo dos tributos, com a finalidade de atingir alvos
diferentes da simples arrecadao de dinheiro. Nesses casos, conjetura Juliani Fonrouge, a
considerao da capacidade contributiva, que no est em causa, seria demasia.
Na realidade, a tese poderia ser melhor esclarecida quando se analisa alguns casos
prticos em que, tanto a majorao quanto a reduo de impostos, seguindo um critrio
extrafiscal, violariam o princpio da capacidade contributiva. O primeiro caso seria a iseno
de taxa judiciria para os pobres e a reduo ou mesmo iseno da contribuio de melhoria
em relao aos miserveis que, sem querer, foram beneficiados em suas humlimasresidncias por obras pblicas extremamente valorizadas. Obrig-los a vender suas
propriedades para pagar a contribuio seria impensvel e inadmissvel.
Em outro caso, nos tributos chamados indiretos, ou de mercado, em que entra em
cena o contribuinte de fato, a capacidade contributiva realizar-se-ia imperfeitamente no caso
da extrafiscalidade. o exemplo das alquotas menos gravosas do IPI e do ICMS. Supe-se
que o de menor renda (contribuinte de fato) consome artigos necessrios to-somente a uma
existncia sofrida e, por isso, as alquotas so reduzidas, ou at mesmo as concesses deisenes. Ocorre que tanto um Jos da Silva quanto um Ermrio de Moraes compram feijo,
beneficiando-se dos favores pensados para Jos. De acordo com a tese de Juliani Fonrouge,
esposada inclusive por juristas nacionais como Sacha Calmon Navarro Colho, a
extrafiscalidade sempre entraria em choque com o princpio da capacidade contributiva.
Juliani Fonrouge conclui que o princpio da capacidade contributiva junto com
outros princpios, tais como o da igualdade e o da generalidade, poderiam atuar para o
controle poltico e jurisdicional da tributao pervertida ou das perverses da extrafiscalidade. de suma importncia observar que a tributao extrafiscal converge, geralmente, com os
princpios tributrio-constitucionais, razo pela qual no se h como falar em afastabilidade
de princpios constitucionais.
No entanto, mesmo com a observncia divergente de parte da doutrina, os
tribunais ptrios e outra gama de doutrinadores entendem pela aplicabilidade do tributo
extrafiscal quando os objetivos sejam alheios aos meramente arrecadatrios, ou seja, quando
se pretenda prestigiar situaes sociais, poltica e economicamente valiosas. A utilizao do
imposto com carter de extrafiscalidade expediente largamente aceito na doutrina jurdica,
nacional e internacional. Hely Lopes Meirelles preleciona:
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A extrafiscalidade a utilizao do tributo como meio de fomento ou dedesestmulo a atividades reputadas convenientes ou inconvenientes comunidade. ato de polcia fiscal, isto , de ao de governo para oatingimento de fins sociais atravs da maior ou menor imposio tributria.[...]
Modernamente, os tributos so usados como instrumento auxiliar do poderregulatrio do Estado sobre a propriedade particular e as atividades privadasque tenham implicaes com o bem-estar social. At mesmo o Direito norte-americano, to cioso das liberdades individuais, admite essa funoextrafiscal dos tributos, para o incentivo ou represso da conduta doparticular. [..]
Com efeito, atravs da agravao do imposto podem-se afastar certasatividades ou modificar-se a atitude dos particulares reputadas contrrias aointeresse pblico, como pelo abrandamento da tributao pode-se incentivar
a conduta individual conveniente comunidade.
19
Dessa forma, enquanto os impostos chamados fiscais destinam-se somente
obteno de receitas para o gasto pblico, os impostos extrafiscais possuem fins diversos, para
abranger os de poltica econmica ou social, de poltica administrativa, de poltica
demogrfica, de poltica sanitria, de poltica cultural e at mesmo de poltica ambiental e de
proteo dos recursos naturais no renovveis.
A Constituio da Repblica adotou a extrafiscalidade como recurso normal do
procedimento tributrio, sobretudo no que diz respeito implementao de polticas pblicas,
ao permitir a exacerbao do nus fiscal ou de suaviz-lo, em funo dos objetivos
pretendidos. De acordo com Hugo de Brito Machado:
O objetivo do tributo sempre foi o de carrear recursos financeiros para oEstado. No mundo moderno, todavia, o tributo largamente utilizado com oobjetivo de interferir na economia privada, estimulando atividades, setoreseconmicos ou regies, desestimulando o consumo de certos bens eproduzindo finalmente os efeitos mais diversos na economia. A esta funomoderna do tributo se denomina funo extrafiscal. 20
Na verdade, o entendimento da no aplicao da finalidade extrafiscal do tributoem face de princpios tributrio-constitucionais perpassa ao vetusto entendimento de que o
tema seria exterior ao direito e circunscrito esfera econmica, integrando os domnios da
Poltica Pblica Fiscal, ainda que no pudesse prescindir dos regramentos jurdico-
constitucionais, at mesmo pela possibilidade de, obliquamente, ofender direitos ou garantias
individuais. No entanto, hodiernamente, o ordenamento ptrio encampou a extrafiscalidade
sob o plio do direito econmico.
19 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito municipal brasileiro. 6. ed. atualizada por Izabel C. L. Monteiro e YaraD. P. Monteiro. So Paulo: Editora Malheiros, 1993, p. 151.
20 MACHADO, Hugo de Brito. Op. Cit., p. 130.
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Em face desses argumentos, pode-se inferir que a complexidade dos fenmenos
econmico-financeiros justifica que o Estado institua tributos com a finalidade de perseguir
outros objetivos, diversos da mera obteno de receita para custear suas atividades tpicas,
podendo, assim, interferir no direito de propriedade e/ou ao livre exerccio de trabalho,
profisso ou ofcio, caracterizando-se, portanto, a finalidade extrafiscal do tributo.
3.1 Entendimento jurisprudencial sobre a extrafiscalidade na implementao de polticas
pblicas
Para justificar a importncia da extrafiscalidade, o Supremo Tribunal Federal j se
posicionou no sentido de que o tributo extrafiscal prepondera, em alguns casos, sobre os
princpios tributrio-constitucionais. Por conseguinte, pode-se citar o seguinte julgado doSupremo Tribunal Federal:
ADI 1276 / SP - SO PAULO
AO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
Relator(a): Min. ELLEN GRACIE
Julgamento: 29/08/2002 rgo Julgador: Tribunal Pleno
Publicao: DJ DATA-29-11-2002 PP-00017 EMENT VOL-02093-01 PP-00076
Ao instituir incentivos fiscais a empresas que contratam empregados commais de quarenta anos, a Assemblia Legislativa Paulista usou o carterextrafiscal que pode ser conferido aos tributos, para estimular conduta porparte do contribuinte, sem violar os princpios da igualdade e da isonomia.Procede a alegao de inconstitucionalidade do item 1 do 2 do art. 1, daLei 9.085, de 17/02/95, do Estado de So Paulo, por violao ao disposto noart. 155, 2, XII, g, da Constituio Federal. Em diversas ocasies, esteSupremo Tribunal j se manifestou no sentido de que isenes de ICMS
dependem de deliberaes dos Estados e do Distrito Federal, no sendopossvel a concesso unilateral de benefcios fiscais. Precedentes ADIMC1.557 (DJ 31/08/01), a ADIMC 2.439 (DJ 14/09/01) e a ADIMC 1.467 (DJ14/03/97). Ante a declarao de inconstitucionalidade do incentivo dado aoICMS, o disposto no 3 do art. 1 desta lei, dever ter sua aplicao restritaao IPVA. Procedncia, em parte, da ao. (grifos editados)
Deve-se ressaltar que essa Lei Estadual foi declarada inconstitucional em face de
aspectos formais e no por causa do carter extrafiscal, como a prpria leitura do acrdo
explicita. Na verdade, essa preponderncia do aspecto extrafiscal sobre alguns princpios
tributrio-constitucionais est respaldada sob o prisma de um princpio constitucional
implcito, que o princpio da proporcionalidade. O Supremo Tribunal Federal, ao analisar a
extrafiscalidade da lei paulista, adotou o princpio da proporcionalidade para condicionar o
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exerccio da funo legislativa, baseando-se em uma viso estrutural e funcional desse
princpio na justificativa de sua qualidade heternoma, impositiva de limites no somente
negativos, mas especialmente positivos, ao do legislador.
Sob o prisma do Direito Econmico, os tributos cuja finalidade seja
essencialmente extrafiscal devem obedecer ao princpio da proporcionalidade ou da proibio
do excesso, cunhado pelo Direito Constitucional alemo em aperfeioamento noo de
poder de polcia, oriunda do Direito Constitucional norte-americano como fundamento da
extrafiscalidade.
O princpio da proporcionalidade ou da proibio do excesso desdobra-se nos
seguintes aspectos: legitimidade dos fins, significando a relevncia constitucional dos fins
buscados; efetividade do meio, pela qual o meio de ser capaz de realizar o fimconstitucionalmente legtimo; imprescindibilidade do meio, de modo que a finalidade
perseguida deve excluir a adoo de outro meio, pelo menos to eficiente quanto o tributo
extrafiscal e, por fim, a razoabilidade ou proporcionalidade em sentido estrito, pelo qual o
sacrifcio exigido deve estar em relao direta, para mais, com a relevncia da finalidade
objetivada.
Tais aspectos tambm se constituem com elementos do princpio da
proporcionalidade, cuja explicao pode detectar ou repelir vcios substanciais da lei em umaperspectiva diversa daquela tradicional, quando est em causa a mera compatibilidade lgico-
formal das normas constitucionais.
Desse modo, os elementos que constituem o princpio da proporcionalidade so,
segundo Suzana de Toledo Barros21: o juzo de adequao ou idoneidade (medida adotada
para respeitar a congruncia entre na relao meio-fim idoneidade consecuo da
finalidade perseguida), juzo de necessidade (meio mais idneo e de conseqncias menos
gravosas) e oprincpio da proporcionalidade em sentido estrito (otimizao de possibilidadejurdica exaltao da idia de equilbrio entre valores e bens).
Seguindo tal entendimento, o Supremo Tribunal Federal julgou esse pleito judicial
na perspectiva de que, ao instituir incentivos fiscais empresas contratantes de empregados
com mais de quarenta anos, a Assemblia Legislativa Paulista usou apropriadamente o carter
extrafiscal que pode ser conferido aos tributos. Trata-se de uma ponderao entre a medida
adotada para respeitar a congruncia entre na relao meio-fim, o meio mais idneo, as
conseqncias menos agravantes e a exaltao da idia de equilbrio entre valores e bens.
21 BARROS. Suzana de Toledo. O princpio da proporcionalidade e o controle de constitucionalidade dasleis restritivas de direitos fundamentais.2. ed. Braslia: Editora Braslia Jurdica, 2000, p. 74.
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Ora, de acordo com esse aspecto, o STF entende que a instituio de incentivos
fiscais para empresas que contratassem empregados com mais de quarenta anos estaria
respeitando a relao entre meio e fim da lei. Ou seja, um incentivo seria atribudo a quem
contratasse empregados com mais de quarenta anos. Tal atitude geraria conseqncias menos
gravosas e haveria um equilbrio entre valores e bens da sociedade, quais sejam, o direito ao
trabalho e o respeito aos idosos que pudessem estar fora do mercado de trabalho.
Nesse caso, no haveria o afastamento da aplicabilidade de princpios tributrio-
constitucionais, mas a preponderncia da extrafiscalidade, com base no princpio da
proporcionalidade, sem violar os princpios da igualdade e da isonomia. Na mesma
perspectiva, pode-se verificar, novamente, a preponderncia do aspecto extrafiscal sobre
outros princpios tributrio-constitucionais, conforme o julgado a seguir:
RE 199619 / PE PERNAMBUCO - RECURSO EXTRAORDINRIORelator(a): Min. MAURCIO CORRAJulgamento: 26/11/1996 rgo Julgador: Segunda TurmaPublicao: DJ DATA-07-02-97 PP-01376 EMENT VOL-01856-08 PP-016
EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRIBUTRIO. IMPOSTO DEIMPORTAO DE VECULOS USADOS. VEDAO: PORTARIA N8/91-DECEX. VULNERAO AOS PRINCPIOS DA ISONOMIA E DALEGALIDADE. INEXISTNCIA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
1. Imposto de importao. Funo predominantemente extrafiscal, por sermuito mais um instrumento de proteo da indstria nacional do que dearrecadao de recursos financeiros, sendo valioso instrumento de polticaeconmica. 2. A Constituio Federal estabelece que da competnciaprivativa da Unio legislar sobre comrcio exterior e atribui ao Ministrio daFazenda a sua fiscalizao e o seu controle, atribuies essas essenciais defesa dos interesses fazendrios nacionais. 2.1. Importao de veculosusados. Vedao. Portaria DECEX n 08/91. Legalidade. A competncia doDepartamento de Comrcio Exterior, rgo do Ministrio da Fazenda,encontra-se disciplinada no art. 165 do Decreto n 99.244/90 e, dentre outrasatribuies, compete-lhe a de emitir guia de importao, de fiscalizar ocomrcio exterior e a elaborao de normas necessrias implementao da
poltica de comrcio exterior. Improcedncia da alegao de ofensa aoprincpio da legalidade. 3. Princpio da isonomia. Vulnerao. Inexistncia.Os conceitos de igualdade e de desigualdade so relativos: impem aconfrontao e o contraste entre duas ou vrias situaes, pelo que onde suma existe no possvel indagar sobre tratamento igual ou discriminatrio.3.1. A restrio importao de bens de consumo usados tem comodestinatrios os importadores em geral, sejam pessoas jurdicas ou fsicas.Lcita, pois, a restrio importao de veculos usados. Recursoextraordinrio conhecido e provido. (Grifos editados)
No caso supracitado, o STF levou em considerao a iseno extrafiscal como
medida de natureza incentivadora. Nessa circunstncia, o STF utilizou-se de um critrioimediato (extrafiscalidade) na aplicao de um caso especfico na plenitude da sua realidade.
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Implicitamente, a Corte Suprema empregou o princpio da proporcionalidade em sentido
estrito, exaltando da idia de equilbrio entre valores e bens, visando muito mais proteo da
indstria nacional do que arrecadao de recursos financeiros.
Para as isenes extrafiscais, de natureza incentivadora, no se pode exigir
isonomia, pela capacidade contributiva, dos sujeitos passivos nas regras discriminatrias que
objetivem compensar ou minorar as desigualdades derivadas de outros fatores. O principio da
isonomia permite ao legislador fazer discriminaes que atendam situaes desiguais (o que
parte do que a doutrina chama de desisonomia seletiva), desde que o critrio
discriminatrio no seja puramente arbitrrio, existindo razes valiosas, de ordem econmica
e/ou social. por essa razo que o princpio da proporcionalidade sempre utilizado na
possibilidade de afastamento da aplicao de outros princpios tributrio-constitucionais.Outro entendimento pela aplicabilidade do critrio extrafiscal diz respeito
progressividade do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU). O STF entende que a nica
progressividade admitida a de carter extrafiscal, como sendo instrumento de efetivao da
funo social da propriedade, de acordo com os preceitos normativos do art. 182, 4, da
Constituio da Repblica. Nesse caso, essa aplicao est condicionada, ainda, existncia
de lei federal, bem como de previso no plano diretor do municpio. Contudo, refere-se
progressividade no tempo, como forma de desestimular a propriedade no edificada,subutilizada ou no utilizada.
Por fim, vale ressaltar que no h um afastamento da aplicabilidade de
princpios tributrio-constitucionais, de acordo com os julgados da Corte Suprema, mas to
somente a preponderncia do carter extrafiscal da norma tributria, baseado em critrios de
proporcionalidade. Trata-se de uma distino metodolgica no campo do Direito Tributrio,
sendo uma questo hermenutica teleolgica, ou seja, o conhecimento ou explicao que
relaciona um fato com sua causa final.Por outro lado, se for considerado o entendimento de que essa preponderncia
repercute no afastamento da aplicabilidade de princpios tributrios, chegar-se-ia
inevitvel concluso de que o carter extrafiscal da norma tributria, mesmo que
fundamentado em critrios de proporcionalidade, afastaria a aplicao desses princpios.
Portanto, amide metodologia aplicada, pode-se deduzir que a finalidade
extrafiscal tem preponderncia sobre alguns princpios tributrios, afastando a aplicao
desses princpios, na medida em que esteja fundamentada em critrios de proporcionalidade.
O tributo com finalidade extrafiscal, ou seja, situado dentro dos limites do Direito
Econmico-Social e com sua aplicabilidade atual, dever observar o princpio da
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proporcionalidade ou da proibio do excesso, mediante a verificao da legitimidade de seus
fins, da sua efetividade e imprescindibilidade, bem como da proporcionalidade direta entre o
fim buscado e o sacrifcio exigido.
4 A extrafiscalidade e o princpio da justia social
O princpio da justia social-tributria encontra vida, alma e impulso, na virtude
da teoria da justia fundamentada por John Ralws, contida na sua obra Uma teoria da
justia, uma das mais importantes obras desenvolvidas no Sculo XX. Ela serve de
fundamento ao princpio da Justia Social almejada quando verificamos a aplicabilidade da
extrafiscalidade em detrimento de princpios tributrios, de acordo com alguns aspectos
especficos. Pretende John Ralws elaborar uma teoria da justia que seja uma alternativa paraessas doutrinas que h muito tempo dominam a nossa tradio filosfica a utilitria e a
intuicionista. 22
De acordo com John Ralws, a sociedade pode ser vista como uma associao mais
ou menos auto-suficiente de pessoas que, em suas relaes, reconhecem a existncia de regras
de conduta como obrigatrias, as quais, na maioria das vezes, so cumpridas e obedecidas,
especificando um sistema de cooperao social para realizar o bem comum.
Seguindo esse entendimento, surgem tanto identidade de interesses como conflitode interesses entre as pessoas, pois estas podem acordar ou discordar pelos mais variados
motivos quanto s formas de repartio dos benefcios e dos nus gerados no convvio social.
precisamente a que os princpios da justia social desempenham seu papel. Nas palavras de
John Ralws:
Exige-se um conjunto de princpios para escolher entre vrias formas deordenao social que determinam essa diviso de vantagens e para selar umacordo sobre as partes distributivas adequadas. Esses princpios so os
princpios da justia social: eles fornecem um modo de atribuir direitos edeveres nas instituies bsicas da sociedade e definem a distribuioapropriada dos benefcios e encargos da cooperao social. 23
De acordo com John Ralws, existem dois princpios da justia social. O primeiro
ressalta que cada pessoa deve ter um direito igual ao mais abrangente sistema de liberdades
bsicas iguais que seja compatvel com um sistema semelhante de liberdades para as outras.
Por sua vez, para o segundo, as desigualdades sociais e econmicas devem ser ordenadas de
22 RAWLS, John. Uma teoria da justia. So Paulo: Editora Martins Fontes, 2000, p. 3.23 Idem, p. 5.
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tal modo que sejam ao mesmo tempo: (I) consideradas como vantajosas para todos dentro dos
limites do razovel, e (II) vinculadas a posies e cargos acessveis a todos.
Tais princpios, segundo John Ralws, aplicam-se estrutura bsica da sociedade,
presidem a atribuio de direitos e deveres e regem as vantagens sociais e econmicas
advindas da cooperao social. John Ralws observa ainda que os dois princpios so um caso
especial de uma concepo mais geral da justia assim expressa:
Todos os valores sociais liberdade e oportunidade, renda e riqueza, e asbases sociais da auto-estima - devem ser distribudos igualitariamente, a noser que uma distribuio desigual de um ou de todos esses valores tragavantagens para todos.24
V-se, pois, que os princpios de justia social tm um ntido carter substancial
e no meramente formal na teoria de John Ralws. Assim, o objeto primrio da justia, para
John Ralws, a estrutura bsica da sociedade, ou mais exatamente, a maneira pela qual as
instituies sociais mais importantes distribuem direitos e deveres fundamentais e determinam
a diviso de vantagens provenientes da cooperao social. Seguindo esse entendimento, os
princpios de justia social, que regulam a escolha de uma constituio poltica, devem ser
aplicados, em primeiro lugar, s profundas e difusas desigualdades sociais, supostamente
inevitveis na estrutura bsica de qualquer sociedade.
De acordo com a interpretao e a aplicao sistemtica desse princpio, poder-se-
ia dizer que o STF aplicou intuitivamente tal princpio, ao entender que a instituio de
incentivos fiscais para empresas que contratassem empregados com mais de quarenta anos,
estaria respeitando a relao entre meio e fim da lei. Ou seja, um incentivo seria atribudo a
quem contratasse empregados com mais de quarenta anos. O objetivo da lei atende ao
princpio da justia social, sendo uma forma de justia como eqidade (justice as fairness).
nesse nterim que se encontra a preponderncia do carter extrafiscal da norma
em face de princpios tributrios, baseado em critrios de proporcionalidade, sendo umaforma de justia como eqidade, como dizia John Ralws, significando que uma justia
estabelecida numa posio inicial de perfeita eqidade entre contribuintes e fisco, e cujas
idias e objetivos centrais constituem uma concepo para uma democracia constitucional,
como acontece na implementao de polticas pblicas.
24Idem, p. 26.
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5 Os mecanismos da imunidade e da iseno
Sabe-se, por conseguinte, que o efeito extrafiscal da norma tributria utiliza-se do
instrumento financeiro para a provocao de certos resultados econmico-sociais, como
reprimir a inflao, evitar o desemprego, restaurar a prosperidade, proteger a indstria
nacional, promover o desenvolvimento econmico, nivelar as fortunas ou corrigir a iniqidade
na distribuio da renda nacional e, sobretudo, promover o acesso educao superior, alm
de outros objetivos igualmente importantes.
Nesse sentido, a extrafiscalidade da norma tributria fornece a explicao ao fato
de que, praticamente, todos os problemas que convergem para a rea do tributo podem ser
estudados do o ngulo oposto: o da iseno e da imunidade. Tal possibilidade apresenta certa
simetria com o poder de tributar.
Na doutrina ptria, sobejam conceitos de imunidade e principalmente de iseno,
que variam conforme o conceito unitrio ou dualista de tributo adotado. A imunidade tida
como limitao ao poder de tributar ou como norma de estrutura, que subordina a feitura de
normas de comportamento. A iseno, como dispensa do pagamento de tributo devido, norma
de estrutura e norma de no-incidncia uma forma excludente da obrigao.
Para Sacha Calmon Navarro Colho, a iseno, tal qual a imunidade, simples
previso legislativa de intributabilidade25, regra que atua juntamente com as previses
impositivas, no aspecto material da norma tributria, definindo sua dimenso. O autor prope
que a hiptese da norma tributria seja composta por fatos tributveis (segundo a regra
impositiva), subtrados os fatos isentos e imunes.
Sacha Calmon Navarro Colho, em prestgio tcnica jurdica, distingue a
iseno e a imunidade dos demais institutos exoneratrios, portanto aquelas atuam no campo
da hiptese da norma tributria, enquanto os estes atuam na conseqncia da norma. A
distino essencial entre a imunidade e a iseno para o jurista mineiro o statusconstitucional da imunidade, inexistente na iseno. Destaca-se tambm que a imunidade ,
inequivocamente, instituto que delimita a competncia tributria impositiva.
Com relao ao fundamento ontolgico, isenes e imunidades tambm
apresentam aspectos em comum. Podem existir, segundo Marcus de Freitas Gouva26:
25
COELHO, Sacha Calmon Navarro. Teoria geral do tributo e da exonerao tributria. Belo Horizonte: DelRey, 2000, p. 153.26 GOUVA, Marcus de Freitas. A extrafiscalidade no direito tributrio. Belo Horizonte: Del Rey, 2006, p.
211.
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1) como instrumento em favor da capacidade contributiva, para adequara previso genrica e abstrata da norma impositiva;
2) ou, como instrumento de poltica pblica, independente da capacidadeeconmica dos contribuintes. No primeiro caso, tem-se a imunidaderecproca e aquela que beneficia particulares que exercem munus pblico,como a dirigida a instituies de educao e de assistncia social sem finslucrativos e a iseno da primeira faixa de renda do IRPF (Imposto de RendaPessoa Fsica), que protege o chamado mnimo existencial.
No segundo grupo, encontra-se a imunidade dos livros, revistas e peridicos, que,
no obstante possam representar mercado promissor constituem-se veculo de cultura que o
Estado pretende preservar, assim como isenes a determinados produtos, cujo mercado
incipiente o Estado quer estimular.
As isenes podem ser classificadas em condicionais e incondicionais,temporrias e por prazo indeterminado, gerais e individuais, regionais ou irrestritas. A iseno
incondicional aquela que independe da comprovao do preenchimento de qualquer
requisito pelo contribuinte, a ser avaliada pelo fisco. o caso da iseno da primeira faixa de
renda do imposto de renda da pessoa fsica. A iseno condicional que depende do
preenchimento de algum requisito pelo contribuinte, seja a realizao de uma conduta, seja
uma situao jurdica, seja uma situao ftica. Necessariamente, as isenes incondicionadas
sero gerais, alcanando todos os contribuintes ou fatos, conforme seja o benefcio subjetivo
ou objetivo. As isenes condicionais sero individuais e dependero da anlise de cada caso
pela Administrao Tributria.
A iseno pode, tambm, ser temporria, com prazo preestabelecido, mas pode ser
fixada por tempo indeterminado, facultando-se sua revogao por lei posterior ou sua extino
por ato administrativo, se o beneficirio deixou de cumprir os requisitos para sua concesso.
O Cdigo Tributrio Nacional (CTN), em seu art. 176, pargrafo nico, dispe
que a iseno pode ser restrita a determinada regio do territrio da entidade tributante, em
funo de condies a ela peculiares. Em regra, restringe-se aos impostos, conforme
disposio do art. 177 tambm do CTN.
As imunidades aplicam-se, em regra, aos impostos. Algumas so gerais, sem a
imposio de condies. Por exemplo, as dos partidos polticos, que tm efeito extrafiscal
ligado organizao poltica nacional. Outras, como as das instituies de educao sem fins
lucrativos, que prestigiam a finalidade extrafiscal de incentivo educao, so reconhecidas
apenas queles que comprovem o preenchimento dos requisitos legais (art. 14 do CTN).
Tambm h imunidades relativas apenas a contribuies para a seguridade social,
que prestigiam as entidades beneficentes de assistncia social. Como si ocorrer, a
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Constituio da Repblica reconhece a intributabilidade de pessoa privada que se dedica a
prestar assistncia social gratuita, que dever do prprio Estado. Assim, a norma contm
efeito extrafiscal de estmulo atividade assistencial.
De acordo com a classificao, imunidades e isenes apresentam efeitos
extrafiscais distintos. O efeito de induo do comportamento mediante vantagem fiscal ser
especfico a determinados contribuintes que preenchem os requisitos legais, se a iseno for
individual. Ser geral nas isenes gerais.
importante dizer que mesmo a iseno geral pode vir dotada de carga
extrafiscal. Por exemplo, se direcionada, objetivamente, produo do lcool combustvel,
estimula seu consumo em prejuzo do consumo de gasolina. Se direcionada, subjetivamente,
aos fabricantes de malhas txteis, favorece o aparecimento de indstrias desse tipo devesturio em detrimento dos curtumes.
O efeito extrafiscal de isenes pode ser regionalizado em favor do
desenvolvimento de certas partes do pas ou do estado, conforme o benefcio seja federal ou
estadual. Porm, pode ser irrestrito territorialmente, quando os efeitos extrafiscais fazem-se
sentir em todo o territrio do ente federado.
Mizabel Derzi e Sacha Calmon Navarro Coelho27, em parecer sobre o tema de
benefcios regionais, especificamente do estabelecimento de alquotas diferenciadas do IPIpara produtores de acar, de acordo com a regio em que se encontram, afirmam que o
benefcio regionalizado s constitucional se destinado ao desenvolvimento da regio. No
caso analisado, com base na Lei n. 8.393, de 30 de dezembro de 1991, os autores entendem
que o beneficio destinava-se apenas aos industriais de certas regies, e constitua uma
penalizao ao povo e aos empresrios de outras regies. Esse raciocnio no se restringe ao
caso apreciado pelos autores, mas estende-se, igualmente, a toda espcie de benefcio,
inclusive isenes.Cumpre registrar, ainda, a exigncia de benefcios com prazo determinado ou
indeterminado. As isenes temporrias podem, por exemplo, incentivar o incio de uma
atividade, estabelecendo-se a tributao normal com data marcada, de sorte que os
empresrios possam programar-se e capitalizar-se de maneira planejada. Nesses casos,
embora o efeito extrafiscal no perdure alm do tempo em que a norma encontrar-se em
vigor, h a vantagem de impossibilidade de revogao do benefcio para os contribuintes que
comearem a goz-lo. De outra forma, as isenes por prazo indeterminado no permitem que
27 DERZI, Mizabel; COLHO, Sacha Calmon Navarro. Direito tributrio atual. Rio de Janeiro: Forense, 1995,p. 349.
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o destinatrio do benefcio faa programaes por prazo certo, pois podem ser revogadas a
qualquer momento, obedecidas as regras de concretizao do princpio da no surpresa.
Pode-se inferir que de uma forma geral a justificativa doutrinria para a existncia
das normas imunizantes e isencionais est ligada a conceitos de natureza poltica e social de
determinada sociedade em dado perodo histrico, com a finalidade de garantir as liberdades
individuais, via exonerao de tributos, para no embaraar a existncia de direitos
socialmente relevantes. Assim, as normas de impedimento da competncia tributria voltam-
se para a liberdade de expresso, o acesso cultura e liberdade religiosa. Alm disso,
voltam-se s atividades desempenhadas pelas instituies de educao e assistncia social sem
lucratividade, s entidades sindicais de trabalhadores, partidos polticos e suas fundaes.
Para justificar a necessria existncia das normas imunizantes e isencionais,Regina Helena Costa invoca a teoria da densificao das normas constitucionais concebida
por Canotilho, entendendo que as normas imunizantes densificam princpios estruturantes no
sentido jurdico-constitucional e poltico-constitucional. Portanto:
[...] os princpios federativo e da autonomia municipal so densificados pelaimunidade recproca; que o princpio da isonomia densificado pelaimunidade conferida s instituies de educao e assistncia social sem finslucrativos; que o princpio do pluralismo partidrio densificado pela
imunidade outorgada aos partidos polticos; que a liberdade de expresso e olivre acesso cultura so densificados pela imunidade referente aos livros;que a liberdade de culto densificada pela imunidade dos templos e assimpor diante.28
Pode-se entender, portanto, que as imunidades e isenes so meios de realizao
de extrafiscalidade no mbito constitucional. Nesse sentido o magistrio de Geraldo Ataliba
assenta que a extrafiscalidadeconsiste no uso de instrumentos tributrios para obteno de
finalidades no-arrecadatrias, mas estimulantes, indutoras ou coibidoras de comportamentos,
tendo em vista outros fins, a realizao de outros valores constitucionalmente consagrados. 29
Ento, pode-se afirmar que os princpios mais valorosos inseridos na Constituio, tais como
a segurana jurdica, a justia e o bem comum, relacionados aos direitos fundamentais, esto
presentes essencialmente na imunidade e iseno tributria, cuja natureza extrafiscal.
As imunidades tributrias so normas de proteo de outros direitos fundamentais
e constituem, ao mesmo tempo, direitos e garantias de outros direitos e firmam-se com o teor
do art. XIX da Declarao Universal dos Direitos Humanos assim disposto30: Toda pessoa
28 COSTA, Regina Helena. Imunidades tributrias. So Paulo: Dialtica, 2001, p. 59.29 ATALIBA, Geraldo. IPTU e progressividade. RDP 93/223.30 COSTA, Regina Helena. Ob. Cit. p. 85.
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tem direito liberdade de opinio e expresso; este direito inclui a liberdade de, sem
interferncias, ter opinies e de procurar, receber e transmitir informaes e idias por
quaisquer meios e independentemente de fronteiras.
De uma forma geral, verifica-se que isenes e imunidades atuam estimulando
comportamentos mediante a reduo da carga tributria, razo pela qual constata-se, que os
institutos apresentam potencialidade extrafiscal marcante.
6 Concluso
Sendo o processo de implementao de polticas pblicas reflexo de toda uma
fundamentao do Estado Contemporneo, a finalidade extrafiscal da norma tributria emerge
como um arranjo institucional legtimo na formulao, mecanizao e implementao paraque uma poltica pblica seja vivel. Nesse sentido, a finalidade extrafiscal da norma
tributria constitui-se na aplicao de um modelo jurdico-tributrio para a consecuo de
objetivos que preponderam sobre os fins simplesmente arrecadatrios de recursos financeiros
para o Estado. O valor finalstico da extrafiscalidade que o legislador incute na lei tributria,
portanto, deve atender s necessidades na conduo da economia ou correo de situaes
sociais indesejadas ou mesmo possibilidade de fomento a certas atividades ou ramo de
atividades de acordo com os preceitos constitucionais, razo pela qual h uma vasta casusticaa respeito do tema.
Sob o prisma do Direito Econmico, os tributos cuja finalidade seja
essencialmente extrafiscal devem obedecer ao princpio da proporcionalidade ou da proibio
do excesso, entendimento tambm esposado pelo Supremo Tribunal Federal brasileiro, o que
uma forma de justia como eqidade (justice as fairness), como preconizava John Rawls.
Assim, o efeito extrafiscal da norma tributria utiliza-se do instrumento financeiro para a
provocao de certos resultados econmico-sociais, como reprimir a inflao, evitar odesemprego, restaurar a prosperidade, proteger a indstria nacional, promover o
desenvolvimento econmico, alm de outros objetivos no menos nobres. Assim, a
extrafiscalidade da norma tributria fornece a explicao ao fato de que praticamente todos os
problemas que convergem para a rea do tributo podem ser estudados sobre o ngulo oposto:
o da iseno e da imunidade tributria.
Pode-se inferir, nesse sentido, que a utilizao da extrafiscalidade (iseno ou
imunidade) na implementao de polticas pblicas tem por finalidade estimular aes
afirmativas, indutoras ou coibidoras de comportamentos, tendo em vista a realizao de
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valores constitucionalmente consagrados, como o direito educao, sobretudo no que diz
respeito sua forma de acesso.
Artigo recebido em maro de 2007
Aceito para publicao em abril de 2007
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Resumo
O presente estudo visa realizar uma anlisesistemtica sobre a utilizao da finalidadeextrafiscal da norma tributria comoinstrumento de implementao de polticaspblicas. O artigo contextualiza o Estadocontemporneo na perspectiva de situar aatividade estatal brasileira no mbito doque se convencionou a chamar deGlobalizao. Busca-se, a partir da, ummodelo de terico de Estado, levando-seem considerao a sua polticacontempornea aplicada e a redefinio do
papel do Estado em face da Globalizao.Em seguida, o artigo analisa a finalidadeextrafiscal da norma tributria comomecanismo de implementao de polticaspblicas situando tal procedimento noSistema Tributrio Brasileiro a partir dosobjetivos extrafiscais dos tributos e seusvalores jurdico-sociais, como no incentivo educao.
Palavras-chave: Polticas Pblicas;
Extrafiscalidade; Iseno Fiscal.
Abstract
This study aims to achieve a systematicanalysis on the use of extrafiscal purposesof tax norms as an instrument to implementpublic policy. The article outlines thecontext of the contemporary State, whileattempting to position the Brazilian stateactivity amidst the so called globalizationprocess. From this point, the study seeks atheoretical model of the state, taking inconsideration its contemporary policy anda new definition of the state under the
influence of the globalization process.Afterwards, the study analyzes tax normsextrafiscal purposes and their social andlegal values as an incentive to education.
Keywords: .Public Policies; Extrafiscality;Fiscal exemption.