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VIVÊNCIA E INVESTIGAÇÃO DA INTERVENÇÃO ARTÍSTICA NO PROGRAMA ESCOLA INTEGRADA MAGALHAES, SELMA ELIAS DE (1); MOREIRA, JÉSSICA DE SOUSA (2); REZENDE, EDSON JOSÉ CARPINTERO (3) 1. Universidade do Estado de Minas Gerais, Escola de [email protected]. 2. Universidade do Estado de Minas Gerais, Escola de Design. [email protected]. 3. Universidade do Estado de Minas Gerais, Escola de Design. [email protected]. RESUMO Apresenta-se de forma sistemática uma experiência com Intervenção Artística vivida no Programa Escola Integrada, por intermédio do Centro de Extensão da Escola de Design da Universidade do Estado de Minas Gerais. São relatados os aspectos da monitoria de Intervenção Artística com alunos de 6 a 15 anos em escola municipal e da equipe de coordenação, em prática como agente cultural (profissional que acompanha o andamento das oficinas nas escolas) dentro do programa. Dados a respeito de Intervenção Artística, como uma forma de arte aplicada à paisagem urbana, contribuem para sua contextualização. Esses dados constituem a primeira parte da pesquisa, que trata da Intervenção como uma vertente da arte pública. A relevância da pesquisa e da investigação sobre educação e arte são destacadas no decorrer do relato. Trata-se discutir o envolvimento e interesse do educador com seu ofício como fatores fundamentais, independente do cargo e ocupação que lhe é atribuído durante sua prática educativa. Além disso, discute os impactos que a arte causa no ambiente escolar e na paisagem de seu entorno. Palavras-chave: Intervenção Artística; Educação e arte; Experiência educacional.

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VIVÊNCIA E INVESTIGAÇÃO DA INTERVENÇÃO ARTÍSTICA NO

PROGRAMA ESCOLA INTEGRADA

MAGALHAES, SELMA ELIAS DE (1); MOREIRA, JÉSSICA DE SOUSA (2); REZENDE,

EDSON JOSÉ CARPINTERO (3)

1. Universidade do Estado de Minas Gerais, Escola de [email protected].

2. Universidade do Estado de Minas Gerais, Escola de Design.

[email protected].

3. Universidade do Estado de Minas Gerais, Escola de Design.

[email protected].

RESUMO

Apresenta-se de forma sistemática uma experiência com Intervenção Artística vivida no Programa Escola

Integrada, por intermédio do Centro de Extensão da Escola de Design da Universidade do Estado de Minas

Gerais. São relatados os aspectos da monitoria de Intervenção Artística com alunos de 6 a 15 anos em

escola municipal e da equipe de coordenação, em prática como agente cultural (profissional que

acompanha o andamento das oficinas nas escolas) dentro do programa. Dados a respeito de Intervenção

Artística, como uma forma de arte aplicada à paisagem urbana, contribuem para sua contextualização.

Esses dados constituem a primeira parte da pesquisa, que trata da Intervenção como uma vertente da arte

pública. A relevância da pesquisa e da investigação sobre educação e arte são destacadas no decorrer do

relato. Trata-se discutir o envolvimento e interesse do educador com seu ofício como fatores fundamentais,

independente do cargo e ocupação que lhe é atribuído durante sua prática educativa. Além disso, discute

os impactos que a arte causa no ambiente escolar e na paisagem de seu entorno.

Palavras-chave: Intervenção Artística; Educação e arte; Experiência educacional.

3° COLÓQUIO IBERO-AMERICANO PAISAGEM CULTURAL, PATRIMÔNIO E PROJETO - DESAFIOS E PERSPECTIVAS Belo Horizonte, de 15 a 17 de setembro

1. INTRODUÇÃO

A experiência relatada com Intervenção Artística e a maturação deste termo

nas práticas educativas vivenciadas deram-se de forma processual. As etapas deste

processo evidenciam-se no seguinte relato, porém de maneira inversa: primeiramente

apresentar-se-á o levantamento teórico sobre essa área artística, feito somente ao final de

toda a vivência prática. É uma breve apresentação do termo Intervenção Artística que faz-

se necessária para contextualização do assunto.

Objetiva-se também descrever as metodologias e conteúdos ministrados como

bolsista de Intervenção Artística em escola municipal no ano de 2011 e início de 2012.

Trabalho realizado através de parceria do Programa Escola Integrada com o Centro de

Extensão da Universidade do Estado de Minas Gerais-UEMG.

Posteriormente a essa prática, houve a vivência como Agente Cultural na

antiga Equipe de Coordenação da Oficina de Intervenção Artística, em que ora na

Secretaria de Educação, ora nas escolas municipais, investigava as práticas de outros

bolsistas e monitores. Para compreender essa dinâmica, será relatado a rotina e os

processos desenvolvidos por esta equipe.

2. INTERVENÇÃO ARTÍSTICA – UMA VERTENTE DA ARTE PÚBLICA

O termo intervenção possui diversos significados de acordo com o contexto

que é inserido. Mesmo no campo das artes é empregado com múltiplos sentidos,

permeando desde a área de arquitetura e urbanismo até interferências em imagens e

objetos de arte já existentes. “Como prática artística no espaço urbano, a intervenção

pode ser considerada uma vertente da arte urbana” (Itaú Cultural, 2012).

Segundo Silva (2005) “intervenções em espaço público” existem desde a pré-

história, quando os homens pintavam nas cavernas visando a comunicação e a

sobrevivência. Ao longo da história, a arte pública foi tomando outras dimensões,

presente em templos, palácios, praças, onde as pessoas se reuniam para glorificar

deuses e governantes. Sua função era social. No século XIX, com a modernidade, a

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experiência artística que propõe transformações nos âmbitos estético, social e político

passa a compor a arte pública.

A arte pública durante muito tempo possuiu a função de ser monumental e bela

para compor o ambiente urbano, mapear e definir os lugares como praças, jardins e

palácios. Muitas vezes, a produção dessas obras não considerava o público como

frequentador e fruidor do espaço.

A ampliação da arte para um modelo com maior interatividade com o público,

de acordo com Silva (2005), emerge dos movimentos urbanos da contracultura do século

XX que demonstram a importância de extrapolar as paredes de museus e galerias de

arte, propiciando um olhar diferenciado através de manifestações artísticas sobre e no

espaço público.

Artistas dos anos 1960 e 1970, com suas propostas alternativas, abordavam

temas de ordem política, ambiental e comportamental. A ideia desses artistas era ampliar

“o campo artístico até o limite entre arte e vida” contribuindo “para a construção de uma

nova visão de arte pública” (SILVA, 2005, p. 41).

Como exemplo, tem-se Helio Oiticica com seus bólides e parangolés, Ligia

Pape e Lygia Clark, com diversas abordagens ao cotidiano, devendo o público explorar os

sentidos e interagir com suas obras.

Como nos aponta Silva (2005), outros dos principais precedentes da arte

pública atual foram os happenings – uso do corpo e do movimento para construir um

trabalho artístico efêmero que dura apenas o momento de execução de uma ação,

algumas vezes divulgada através de registros fotográficos e audiovisuais –, originados em

1959, em Nova York. Já no Brasil foi marcante, a partir de 1960, as manifestações da

arte ambiental e ecológica, com obras que interferem numa situação espacial, envolvendo

os sentidos das pessoas. Além destes, tem-se a Land Art, forte movimento de ruptura dos

espaços de referência em arte como museus e galerias através de obras realizadas em

mares, montanhas e outros ambientes naturais. E ainda a Arte Conceitual, que discute o

conceito e a ideia da obra de arte.

Trata-se de tirar as obras das instituições culturais dos circuitos de exibição estabelecidos, dos padrões convencionais de classificação, e levá-las a um diálogo mais amplo. Não tomar as obras isoladamente, mas como intervenções num espaço mais complexo. Redefinir o lugar da obra de arte contemporânea, a partir da sua integração com outras linguagens e outros suportes. Sítio que não é necessariamente uma localização topográfica, mas o campo criado por essas articulações. Os trabalhos específicos ao lugar levam para fora do ateliê tradicional, substituído pela indústria, a mídia e o urbanismo (PEIXOTO, 2003, p. 14).

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A arte escultórica também foi ressignificada nesse período na inserção de

monumentos no ambiente urbano como os trabalhos de Amilcar de Castro e Franz

Weissmann, que repensam a forma e o recorte da paisagem.

Numa outra linha, mas de igual importância e com significados que extrapolam

“os limites da permanência”, tem-se a arte efêmera que, no Brasil possui marco a partir de

1960. A interferência, nesse caso, se dá de forma que considere a participação do público

que caminha pela cidade e, além disso, servindo como forma de protesto contra a

ditadura militar. Outra característica é o uso de materiais e recursos alternativos. Foram

diversas as manifestações da Arte Efêmera com artistas de referência da Arte

vanguardista brasileira como Cildo Meireles, Frederico Morais, Artur Barrio, entre outros

(SILVA, 2005).

Uma manifestação urbana importante para a reflexão da arte pública é a arte

do grafite, comparado com o registro gráfico mais antigo da humanidade, pois assemelha-

se a arte rupestre. No contexto urbano é caracterizado como a forma de expressão das

minorias, do ambiente periférico que invade o centro urbano com o objetivo de provocar e

transgredir. São desenvolvidas as emoções do artista para trabalhar a emoção do público

provocando reações e interrompendo o fluxo normal da vida cotidiana.

Silva (2005) aponta que a arte do grafite traz percepções sobre o ambiente

fazendo pensar a seu respeito. O grafite também é uma forma de marcar os lugares de

encontro, promovendo cultura, o que contribui na definição de arte pública. De acordo

com Peixoto:

As contruções, coladas umas às outras, formam um frontão que limita a visão. As ruas não permitem um olhar em perspectiva, uma vez que são curvas ou desembocam não em um cruzamento, mas em uma outra rua. Não há um ponto de vista privilegiado (PEIXOTO, 2003, p. 204).

Nesse sentido, o grafite cria paisagens inexistentes no ambiente urbano, suas

imagens, cores e projeções transportam o transeunte – aquele que transita pelo lugar.

Trazem uma dimensão que pertence ao lugar, mas não é possível de se ver ali. Como

exemplo, o artista de referência no grafite, Jean-Michel Basquiat que revela em suas

obras experiências em diversas direções, fazendo “visíveis suas reações às coisas do

mundo, no contexto de seu tempo e lugar, por meio da criação artística” (MARTINS et al,

2009, p. 38).

A partir desses precedentes, afirma-se que o papel oficial da arte pública se

altera, surgindo uma representatividade maior da voz da rua, trazendo algo de novo e

“apresentando-se como elemento perturbador da ordem estabelecida, abrindo

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possibilidades para o diálogo com as diversas comunidades urbanas (SILVA, 2005, p. 40

e 41).

Para Neto a arte pública é a

[...] arte que se faz no espaço público, o gesto, a intervenção, o evento, a instalação, o espetáculo, a apresentação, a arquitetura - que é, enquanto arte, pública por excelência -, tudo isso exerce sobre o social preexistente um impacto, em que talvez a hegemonia seja confirmada ou desafiada, mas, mais importante que isso, em que algo do novo desse social passa a ter existência (NETO in PALLAMIN, 2000, p. 10).

A relação entre arte e cidade hoje possui uma dimensão maior do que em

qualquer outro tempo. É assunto corriqueiro nas produções de artistas contemporâneos

independente da técnica desenvolvida ou linha seguida. Todos comungam da ideia de

“construir imagens da cidade que sejam novas, que passem a fazer parte da própria

paisagem urbana” (PEIXOTO, 2003, p. 15).

No Brasil, a utilização das artes visuais no espaço público e para pensar o

mesmo é cada vez mais explorada. Envolver a comunidade nessas produções

“despertando o sentimento de cidadania e de melhoria na qualidade de vida, visando à

ampliação do universo cultural” (SILVA, 2005, p. 19) é uma iniciativa interessante para a

situação do país que não possui uma coletividade e em que os indivíduos precisam

desenvolver a noção de pertencimento e respeito ao lugar.

Na vida cotidiana atual, os cidadãos levam muito tempo de deslocamento entre

casa e trabalho, fato que gera impacto na vida familiar e comunitária (PAZZANESE in

SINGER, 2011). Esse impacto refere-se ao fato de não circularem pelos espaços, não

convivendo nos mesmos.

Para haver participação em políticas desenvolvidas nos espaços públicos é

necessário que haja, também, circulação, pois, desta forma, pode-se influenciar estes

espaços de modo que os sujeitos não se tornem alienados a eles. A intervenção artística,

nesse sentido, é uma forma de chamar esse sujeito, seja ele ator da produção ou da

fruição da obra, para se atentar a esse território, fugir do “ciclo vicioso”, construindo

subjetividades do local (PAZZANESE in SINGER, 2011).

Segundo Silva (2005) a arte pública vai além da própria edificação, tem uma

dimensão social e cultural, permeia o imaginário, podendo assumir formas distintas,

dependendo do artista e da proposta. Dentre as suas características principais está o

diálogo com a pluralidade, os aspectos lúdicos e poéticos, o envolvimento com o entorno

e respeito a demanda local em relação às mensagens universais que possa transmitir.

O transeunte que usufrui da imagem de arte voltada para espaço público é indefinido e heterogêneo, pertencente a várias camadas sociais e de formação

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cultural diversificada. Assim, um dos principais objetivos da arte pública é estabelecer o diálogo com a diversidade, fato desafiador para o artista que cria no ambiente urbano. O artista, por sua vez, além dos cuidados estéticos com o seu trabalho, deve estar atento às possibilidades de comunicação que sua obra possa estabelecer com a pluralidade dos olhares dos transeuntes urbanos (SILVA, 2005, pág. 25).

Pode-se dizer que o termo intervenção artística refere-se ao conjunto de

práticas diversas, seja técnica ou ideologicamente, que interferem no lugar através da

linguagem artística. O artista interventor deseja se aproximar da vida cotidiana e tornar a

arte mais acessível ao público. Sendo assim, é uma tendência que faz parte da arte

contemporânea ligada “às linguagens artísticas, ao circuito da arte ou ao contexto

sociopolítico” (Itaú Cultural, 2012).

Sobre a multiplicidade de possibilidades desse tipo de trabalho nos explica a

Enciclopédia Itaú Cultural de Artes Visuais que as intervenções vão desde as ações

efêmeras até ocupações e inserções na paisagem. A diversidade de técnicas e linguagens

é imensa, sendo bastante comum o uso de cartazes, adesivos, lambe-lambes, esculturas,

performances, instalações, vídeos, dentre outras. Como características que marcam essa

forma de arte, a Enciclopédia ainda acrescenta:

[...] relação entre a obra e o meio (espaço e público), a ação imediata sobre determinado tempo e lugar, o intuito de provocar reações e transformações no comportamento, concepções e percepções dos indivíduos, um componente de subversão ou questionamento das normas sociais, o engajamento com proposições políticas ou problemas sociais, a interrupção do curso normal das coisas através da surpresa, do humor, da ironia, da crítica, do estranhamento (Itaú Cultural, 2012).

Para exemplificar essa multiplicidade pode-se citar o grupo Poro – Intervenções

e ações efêmeras. O grupo é composto pelos artistas Brígida Campbell e Marcelo Terça-

Nada! Desde 2002 realizam trabalhos que exploram “questões sobre os problemas das

cidades através de uma ocupação poética dos espaços”. Para isso contam com a

apropriação de técnicas diversas, como apontadas no parágrafo anterior.1

Melendi (2005) afirma que o trabalho do grupo Poro busca uma relação afetiva

com espaços esquecidos da cidade, partes que foram degradadas e/ou abandonadas.

São obras efêmeras que se destroem juntamente com a cidade, mas que “por um

momento reluzem e brilham antes de se fundir e confundir com a parafernália impressa

que alastra por muros e tapumes, por viadutos, postes e jardins” (MELENDI, 2005, p. 40).

As intervenções do Grupo Poro são realizadas em diversos estados brasileiros

e inclusive em outros países. Dentre elas, a intervenção “Azulejos de papel” (FIG. 3) foi

1 Informações sobre o grupo Poro. Disponível em: <http://poro.redezero.org>. Acesso em: 29 Set. 2013.

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uma das mais marcantes. Trata-se de um projeto realizado entre 2007 e 2011, envolvendo

diversas pessoas. Azulejos de papel foram confeccionados e instalados em diversos

locais, dentre eles casas e lotes abandonados, muros parcialmente destruídos e, além

disso, distribuídos entre amigos e outras pessoas para que pudessem fazer suas próprias

instalações, inclusive em locais privados.

Sobre outro trabalho, intitulado “Jardim”, realizado nos anos de 2003 e 2004 o

grupo aponta:

Nas cidades, o tempo e o descuido transformam vários canteiros em espaços secos e sem vida. Daí vem o desejo de se criar manchas de cor no cinza indistinto da cidade. Salpicar um pouco de poesia para quem passa. Para esse trabalho, produzimos centenas de flores de papel celofane vermelho e as plantamos em canteiro abandonado, em uma das principais avenidas de Belo Horizonte. Para quem passa de carro, em alta velocidade, é uma grande mancha de cor. Para quem passa caminhando, são flores de papel. É uma intervenção singela, que ao mesmo tempo é sutil e gritante e que resgata um espírito ativo e poético de querer tornar a cidade um lugar melhor (Artistas do grupo Poro, 2005, p. 50).

Já o projeto Arte/Cidade, coordenado por Nelson Brissac Peixoto desde 1994,

realizado em São Paulo traz a tona os locais que perderam sua funcionalidade inicial,

sendo excluídos do circuito de arte (SILVA, 2005).

Originou-se da idéia de oferecer uma alternativa ao modo tradicional, compartimentalizado, de incentivo público da produção cultural, implantando um projeto que, tendo a cidade como espaço catalisador, articulasse as diferentes linguagens e suportes da criação artística contemporânea (PEIXOTO apud SILVA, 2005, p. 88).

Segundo Silva (2005), as intervenções contam com a participação de artistas,

arquitetos e instituições. A participação das equipes é fundamental para a escolha das

áreas, discussão teórica e prática, busca de patrocínio até a efetivação prática da ideia,

que considera a participação ativa do público.

De acordo com Silva (2005), o projeto Arte/Cidade SP que ocupa lugares

específicos da cidade como o Matadouro da Vila Mariana (1994), Viaduto do Chá, no Vale

do Anhangabaú (1996), um trecho ferroviário entre a estação Luz e a indústria Matarazzo

(1997), Zona Leste da cidade (2000), procura em cada intervenção considerar relações

entre escalas urbanas, questões sociais e políticas, além das formas de visitação dos

locais, divulgação e comunicação.

Segundo o coordenador do projeto:

A função da arte é construir imagens da cidade que sejam novas, que passem a fazer parte da própria paisagem urbana. Quando parecíamos condenados às imagens uniformemente aceleradas e sem espessura, típicas da mídia atual, reinventar a localização e a permanência. Quando a fragmentação e o caos parecem avassaladores, defrontar-se com o desmedido das metrópoles como uma nova experiência das escalas, da distância e do tempo. Através dessas paisagens, redescobrir a cidade (PEIXOTO, 2009, p. 15).

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Nesse sentido, o projeto atua de forma bastante paralela a essa afirmativa, pois

“leva a pensar as inúmeras mudanças sofridas pelas intervenções de arte pública no

decorrer de sua história” (SILVA, 2005, p. 92).

O projeto sofreu alterações no decorrer de sua trajetória. Se no início buscava-

se para as intervenções o uso de sítios específicos, caminhou para uma “abordagem por

meio de mapeamentos, buscando situações urbanas indicadoras das rupturas e tensões

voltadas para readequações de uma organização urbana tradicional num espaço amplo e

com uma perspectiva global” (SILVA, 2005, p. 90).

Pode-se dizer que, no que se refere ao público, o projeto intensifica a

percepção para esses processos que vive a cidade. As intervenções propostas na cidade

de São Paulo tornam-se elementos em potencial para promover nos transeuntes a

reflexão, o despertar para algo além do que é visto na ordem comum do dia-a-dia. No

projeto Arte/Cidade SP o público fruidor/participador é heterogêneo e, apesar de não

participar da concepção e construção da obra, atinge-se um número considerável de

pessoas. Além de possuir um histórico consistente, a Intervenção Artística é uma prática

possível de ser explorada na contemporaneidade por diversos artistas.

3. VIVÊNCIA NO PROGRAMA ESCOLA INTEGRADA COMO BOLSISTA DE

INTERVENÇÃO ARTÍSTICA

Durante o ano de 2011 e início de 2012 houve a atuação no Programa Escola

Integrada-PEI, com cumprimento de carga horária de estágio como bolsista de

Intervenção Artística. Preocupações em relação ao conteúdo e à didática surgiram, mas

para saná-las, nos momentos de maior dificuldade, contava-se com o apoio da professora

responsável pela orientação dos bolsistas do PEI na Escola de Design – UEMG.

Dificuldades apareceram no decorrer da prática, afinal a comunicação entre

Secretaria de Educação, escola e universidade, muitas vezes era falha. O esforço em

buscar informação segura e recursos de forma correta era duplo, criando momentos de

desmotivação. Porém, com a vontade de aprender e de fazer, os empecilhos eram aos

poucos superados. Além disso, surgia o interesse no processo burocrático em que

submetiam os bolsistas. Desse modo, a busca pelo acesso a contratos de estágio,

regulamentos, dos Parâmetros da Oficina de Intervenção Artística, oferecidos pela

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Secretaria de Educação, dentre outras coisas, era constante, para adquirir segurança e

confiança no decorrer do trabalho.

Como aponta Freire (1996):

[...] é fundamental que, na prática da formação docente, o aprendiz de educador assuma que o indispensável pensar certo não é presente dos deuses nem se acha nos guias de professores que iluminados intelectuais escrevem desde o centro do poder, mas, pelo contrário, o pensar certo que supera o ingênuo tem que ser produzido pelo próprio aprendiz em comunhão com o professor formador (FREIRE, 1996, p. 38 e 39).

Pode-se dizer que essa comunhão existiu, pois era possível unir o aprendizado

técnico adquirido nas aulas de Prática de Ensino e outras disciplinas, o conhecimento

provindo das práticas educativas da professora orientadora e o saber construído na

vivência com os alunos. A cópia não existiu, mas sim a referência. Uma

atividade/intervenção nunca era a mesma que outro educador já aplicara, sempre surgia

com o novo significado.

Quando o vínculo com a escola iniciou, foi no propósito de substituir uma

colega de curso, que já iniciara um trabalho de Intervenção Artística nas paredes internas

da escola. Seu objetivo era trabalhar em torno do tema “Identidade”, no qual as crianças

riscavam o contorno do corpo dos colegas e vice-versa, e, posteriomente pintavam esses

corpos, preenchendo-os de significados e possibilidades. Logo surgiu a ideia de dar

continuidade a essa iniciativa, mas adaptando métodos e construindo, aos poucos, novos

objetivos.

Nessa experiência ficou evidente a importância de um planejamento das

atividades desenvolvidas, pois o trabalho ficava muito vago quando não estavam claros

os objetivos desejados. Além disso, pôde-se perceber que quando a proposta da oficina

era semi-estruturada a resposta dos alunos era mais consistente. De acordo com Piletti

(1984), a prática do planejar é importante por evitar improvisos, auxiliar no alcance dos

objetivos, garantir a segurança e a economia de tempo e energia.

A capacidade de indagação e pesquisa diante da realidade é tida como ponto

fundamental para um planejamento adequado, em que se atende às necessidades dos

alunos (PILETTI, 1984). É importante ressaltar que, independente de quais são essas

necessidades, o educando deverá ter sempre preservada a autonomia para construção e

reconstrução do que lhe é ensinado, juntamente com o educador, também sujeito deste

processo (FREIRE, 1996). Por isso, o educador não pode perder essa iniciativa de um

olhar crítico diante do mundo.

FREIRE (1996) novamente incita:

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Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino. Esses que-fazeres se encontram um no corpo do outro. Enquanto ensino continuo buscando, reprocurando. Ensino porque busco, porque indaguei, porque indago e me indago. Pesquiso para constatar, constatando, intervenho, intervindo educo e me educo. Pesquiso para conhecer o que ainda não conheço e me comunicar ou anunciar a novidade (FREIRE, 1996, p. 29).

Houve um outro fator que auxiliou esse primeiro momento, no que compete

essa busca e ao acesso as respostas: o acompanhamento de agentes culturais pela

coordenação a oficina. Nas primeiras semanas recebia a visita de uma agente cultural

que auxiliou as primeiras abordagens. Em pouco tempo houve o desligamento da mesma

e só depois de alguns meses o acompanhamento voltou com uma nova agente cultural.

Esta observava, trocava informações, ajudava os alunos. Era uma presença muito

positiva, que ampliava a dimensão da prática, tanto para educador como para educandos.

Além disso era um contato direto com a Secretaria de Educação, caso houvesse

problemas ou fosse necessário obter informações sobre eventos e formações.

3.1 Trabalhos desenvolvidos

Com consciência da importância da presença da arte no cotidiano escolar, o

trabalho foi realizado nesse período ampliando ao máximo seus significados com as

crianças e adolescentes.

Todas as atividades eram pensadas em diálogo com a Abordagem Triangular

de Ana Mae Barbosa, em que o fazer, o conhecer e o contextualizar coexistiam. É

importante ressaltar que houve predominância no fazer. Isso talvez se deva ao fato de, na

escola regular, a oportunidade dos alunos lidarem com pincel, tinta e criação de imagens

fosse mínima. De alguma forma, buscou-se suprir essa carência.

Utilizou-se basicamente técnicas de pintura, pois era o material mais disponível

na escola. Apesar da amplitude de possibilidades da Intervenção Artística, foi o recurso

que oportunizou um contato com materiais e espaços que os alunos não possuem na sala

de aula da escola regular.

O primeiro trabalho realizado foi um caminho, nos arredores da escola, com

diversos postes pintados com autorretratos de crianças que participaram da oficina,

revezadas em grupos de três a quatro crianças. Elas vivenciavam um processo de

aproximadamente duas semanas, resultando cerca de doze horas de atividade. O

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FIGURA 1 – Intervenção de autorretratos em postes a) Aluna riscando com giz o esboço da pintura com o auxílio de colegas b) Aluna assinando o trabalho concluído c) Alunos auxiliando o colega a pintar seu autorretrato no poste

Fonte: Fotos de arquivo pessoal da autora, respectivamente tiradas em 08/09/2011; 13/09/2011; 25/08/2011.

primeiro encontro era destinado a uma conversa sobre autorretrato. Com uma mostra de

imagens de artistas com suas pinturas, discutia-se a necessidade de nos mostrarmos no

mundo, de forma realista ou até mesmo nos reinventando através da imagem. Os alunos

construiam o esboço do que seria a pintura no poste. Os demais encontros eram

destinados à pintura nos postes do entorno escolar. Cada dois alunos dividia um poste,

ficando um autorretrato de cada lado do poste, salvo algumas excessões em que o

formato e tamanho do poste ou do desenho não permitia essa divisão.

Um dos principais propósitos dessa ação era resgatar a presença, a força e a

forma das crianças no entorno escolar da comunidade a qual pertenciam. Uma forma de

dizer “Estamos aqui!” para aqueles que pudesem ter esquecido a existência da infância.

Além disso, pode-se observar as dimensões que a intervenção alcançou, através do

seguinte relato coletado de uma aluna participante:

Me pintei como uma sereia. Foi legal, gostei. Pintura é diferente de desenhar. O desenho é com lápis e é muito fino. A pintura é com pincel, é diferente de lápis de colorir e escrever. No pincel tem que usar a tinta. Achei estranho pintar no poste porque é redondo, é diferente da parede. Minha mãe nunca tinha me visto pintando. Eu contei pra ela que eu pintei no poste e que dava para todo mundo ver (aluna de 10 anos).

O aspecto lúdico da intervenção, a experiência com uma técnica diferente da

que habitualmente utiliza para criar imagens, o estranhamento de um novo suporte e os

vínculos sociais que a intervenção estabelece são ilustradas nessa fala. Um outro aluno,

além de tratar em seu depoimento desse último aspecto, trata inclusive do momento

anterior à pintura, a fase de apreciação e elaboração, que precedia o fazer: “Mostrei

minha mãe e ela gostou. O que eu mais gostei foi o tênis colorido. Ver as imagens dos

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artistas que pintaram o retrato deles foi importante para saber como é a pintura, tive a

ideia de aprender a pintar muito mais legal” (aluno de 7 anos).

Simultaneamente ao trabalho feito nos postes, que ocorria no turno matutino,

com os alunos de 6 a 10 anos, era desenvolvido um outro projeto com os adolescentes,

também destinado ao trabalho com o autorretrato. Porém, numa técnica diferente: os

jovens aprenderam o estêncil, que consiste em, a partir de uma fotografia em preto e

branco, destacar sombras e linhas do rosto, construindo um molde que ao receber tinta

sobre um suporte, deixa as marcas pintadas, fazendo referência aos trabalhos de Andy

Warhol (1928-1987) na Pop Art.

Esse processo ocorria em três encontros, com grupos de aproximadamente

quatro adolescentes. Nos encontros, o ponto de partida era uma conversa sobre

identidade, com referências como: o nome de cada um, a digital e o próprio rosto. Os

alunos desenhavam o próprio nome e, junto à grafia, colocavam informações pessoais,

gostos, vontades e perspectivas sobre o mundo. Essa era a abertura para iniciar a fala

sobre o autorretrato e, posteriomente, começar a produzi-lo. Desta forma, o autorretrato

teria um vínculo com o aluno não só em relação à imagem produzida, mas também em

seu significado. Um exemplo dessa primeira etapa:

Eu gosto de música, mulheres, animais, amizades, etc. Minha mãe é bem mais preciosa na minha vida. Eu sou muito chato. Às vezes eu não gosto de conversar com ninguém, porque tem coisas inexplicáveis para dizer. Quando eu estou nervoso não entre na minha frente porque quando eu estouro não tem nada pra me parar. Quando eu gosto de uma pessoa, eu gosto de verdade; eu odeio amizade falsa como umas que eu tenho que aturar (aluno de 14 anos).

Com esses alunos era muito comum ouvir comentários pejorativos sobre a

auto-imagem e sobre a imagem do outro. Além disso, eram muito críticos em relação à

própria produção gráfica, por não obterem resultados desejados. Esses foram dois

motivos para a escolha do estêncil. Já que a técnica proporciona a experiência com a

auto-imagem e traz um resultado preciso, quase realista, no jogo de luz e sombra,

chamando, assim, a atenção dos alunos.

É interessante ressaltar que este trabalho não foi propriamente uma

intervenção. Apesar de ser uma técnica utilizada para a reprodução em grande escala da

mesma imagem em diversos suportes e em ambientes públicos, não foi desenvolvido

dessa forma na atividade. As imagens produzidas ficavam em suportes de papel e o

molde do estêncil era devolvido aos alunos. Faltou segurança para usar essa técnica

como forma de intervir, mas só foi possível perceber isto após toda a vivência e toda a

investigação das possibilidades de intervenção.

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FIGURA 2 – Intervenções Artísticas na Escola Municipal Jonas Barcellos Corrêa a) Pintura imitando mosaico nas rampas de acesso b) Flores – Releitura da obra “Operários” de Tarsila do Amaral c) Parte do painel inspirado em Literatura de Cordel

Fonte: Fotos do arquivo pessoal da autora, respectivamente tiradas em 29/09/2011; 29/11/2011; 07/05/2012.

Porém, num dos eventos realizados na escola, fez-se uma exposição com

todos os autorretratos. Nessa exposição buscou-se apresentar as imagens de forma

diferente, pendurando os trabalhos no espaço em que se encontrava o público. Os

trabalhos suspensos, então, ficavam misturados aos rostos ali presentes e à paisagem.

Os alunos e familiares se reconheciam e reconheciam seus colegas em meio ao espaço.

Posteriormente, houve ainda uma intervenção nas rampas de acesso à escola,

em que os alunos pintaram um mosaico, que deu uma vida diferente ao lugar (FIG. 2).

Essa intervenção surgiu da vontade do professor coordenador, na época denominado

professor comunitário, que queria um trabalho de mosaicos. Como o trabalho com

mosaicos exigiria gasto com material e apropriação de uma habilidade que não existia no

momento, bolsista e professora orientadora em conversas criaram uma solução para

atender essa vontade, que seria a de pintar o mosaico. A pintura surgiu como forma

alternativa de fazer alusão aos mosaicos de forma rápida, sem gastos e com a habilidade

dos próprios alunos e bolsista.

Foi a intervenção mais rápida feita na escola nesse período. Todos os alunos

do Programa Escola Integrada participaram, os monitores concordaram em ceder o tempo

de suas oficinas por duas semanas, para, em forma de revezamento, levar suas turmas

inteiras para pintar as formar geométricas riscadas nas paredes. As rampas da escola

transformaram-se num outro lugar, totalmente diferente do que era antes da pintura. As

pessoas que transitavam pelo pátio, quadra e salas de aula apontavam e comentavam.

Na sequência, em parceria com a monitora de artesanato, ocorreu uma

releitura do trabalho de Tarsila do Amaral, Os operários (1933), numa parede próxima ao

pátio da escola. Devido a constante presença de flores nos desenhos das crianças, optou-

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se por explorar essa característica, porém, fugindo dos estereótipos, sendo que cada um

criou sua própria flor. No processo de pintura, em que cada aluno pintou sua flor na

parede, surgiu um autorretrato coletivo, onde todos se identificavam no agrupamento de

flores, reconhecendo de seu próprio traço. Consequentemente criou-se um jardim

imaginário que deu vida e cor ao lugar.

Além deste, um painel baseado na literatura de cordel foi feito nos muros

internos da casa alugada, a qual se prestavam as oficinas. Os alunos produziram os

textos com auxílio da bolsista de português e as ilustrações em encontros de Intervenção

Artística. A casa também obteve um novo aspecto com a intervenção, tornando-se mais

próxima de um ambiente educativo do que outrora.

Foi um trabalho totalmente interdisplinar, afinal texto e imagem se

comunicavam desde o início das atividades. A dimensão espacial do trabalho foi algo que

também chamou atenção, pois criou-se uma nova paisagem para a casa que, antes da

intervenção, era limitada pelo muro totalmente chapado. Haviam muitos alunos pequenos

no desenvolvimento do trabalho e estes produziram imagens, em alguns casos, que

chegavam ao dobro da própria estatura.

Todos os trabalhos citados eram intercalados com atividades de planejamento

das ações nos locais de intervenção e com atividades de artes visuais diversas como

desenho e pintura. Pode-se afirmar que os resultados efetivos das intervenções se deram

em âmbitos diversos: na aprendizagem dos alunos quanto a alguns elementos das artes

visuais, na mudança da relação dos alunos com o lugar e no encontro com o olhar do

público: outros alunos, professores, demais profissionais da escola, pais, vizinhos e

transeuntes. Todos, de alguma forma, percebendo as mudanças provocadas no

ambiente, levando o olhar para outro lugar, que não o que já estara habituado.

4. VIVÊNCIA NA SECRETARIA DE EDUCAÇÃO COMO AGENTE CULTURAL DE

COORDENAÇÃO DA OFICINA DE INTERVENÇÃO ARTÍSTICA

Em meio a prática artística com os alunos do Programa Escola Integrada, no

ano de 2012, surge a possibilidade de mudar. Um convite para compor a Equipe de

Coordenação de Educomunicação e Arte do PEI, em que a atuação seria como agente

cultural. Nesse cargo, o acompanhamento de outros monitores era feito, auxiliando o

processo de investigação da área e planejamento de ações. A perspectiva sobre a

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Intervenção Artística, bem como sobre a educação mudou, cumulativamente com o que já

se observara na experiência anterior.

A equipe de Educomunicação e Arte era subdividida em três eixos: Dança e

Teatro, Intervenção Artística e Educomunicação (rádio, jornal e vídeo). A Subequipe de

Intervenção Artística era composta pela coordenadora geral de Educomunicação e Arte,

dois coordenadores de área e treze agentes culturais. Muitas dificuldades foram

descobertas nessa inserção, questões que envolvem o Programa Escola Integrada num

âmbito maior do que o vivenciado no cotidiano escolar. Porém, a vontade e o esforço de

fazer acontecer eram grandes.

Além do acompanhamento de monitores de Intervenção Artística, fazia parte do

cotidiano de agente cultural: a participação em seminários, em planos de ação – método

utilizado pela equipe de coordenação de Intervenção Artística para intervir em escolas

com maiores dificuldades de desenvolver a oficina –, reuniões semanais, organização e

prática de formações e uma breve experiência no Programa Escola nas Férias.

Pôde-se constatar que muitos monitores não possuiam preparo para estarem

no lugar que se encontravam. Para suprir essa deficiência, a equipe de coordenação

buscava estratégias constantemente, refletidas nas ações, nas metodologias levadas aos

monitores, nas formações, na divulgação e participação em eventos.

Essas estratégias eram renovadas e acrescidas de outras constantemente.

Havia um estudo teórico muito intenso, com revezamento de apresentações de pesqusias

sobre artistas nas reuniões, formulação de documentos de apoio como: os Parâmetros da

Oficina de Intervenção Artística, lista com sugestão de materiais (pois alguns monitores

sequer sabiam com que tipo de material deveriam trabalhar), sugestão de organização de

oficina, entre outros. Também era feito um relatório de cada visita e posteriormente o

relatório semanal ou mensal de cada escola, apontando as deficiências, os destaques

positivos e negativos, os trabalhos desenvolvidos, tudo para ter uma visão total sobre a

Intervenção Artística no Programa e para direcionar aos casos de maior dificuldade, que

exigiam atenção especial.

Essa experiência acrescentou muito no aprendizado sobre o trabalho em

equipe, sobre o estudo da arte e da educação através da vivência como interventora e

com ações coletivas. Essas ações foram desenvolvidas em diversos momentos e

eventos: Fórum de educação integral, participação em dois seminários do “Teias da

cidadania” e formulação dos encontros de formação dos monitores e bolsistas. Essas

formações tinham como tema: o não-convencional na arte, desenho de criança e a

técnica da pintura, sendo que na primeira desenvolveu-se uma ação coletiva com todos

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os agentes culturais e com interação dos monitores, na segunda houve a experiência

como modelo vivo para desenho de observação e na terceira o trabalho de intervenção

com pinturas diversas.

Observou-se também nesse período diversas intervenções nas escolas,

algumas parecidas com as que já havia vivenciado, outras totalmente distintas, fazendo

também com que o olhar pudesse se ampliar para essa área.

As escolas em que o contato foi mais próximo foram as da Regional Barreiro.

De um modo geral, essa regional possuía um número menor de interventores e os que

atuavam nas escolas possuíam ainda mais dificuldades em relação às demais regionais.

Confundida com artesanato, aula de desenho, caricatura e grafite, a oficina de

intervenção artística atingia seus objetivos com bastante dificuldade.

No acompanhamento de algumas escolas alguns casos foram amenizados

com bastante esforço e outros não obtiveram sucesso. Numa delas a iniciativa do monitor

era presente, além disso ele já era um interventor, conhecia as técnicas e didática, porém

a gestão escolar não incentivava o trabalho. Mesmo com dificuldades, durante sua

atuação, percebeu-se que desenvolveu trabalhos de intervenção com sutileza, alguns

efêmeros e outros em grande escala.

Em algumas escolas, equivocadamente, à intervenção artística era atribuída a

pintura do muro da escola. Haviam muitos monitores que exerciam esse papel, às vezes

sendo eles mesmos os proponentes, contando apenas com o apoio braçal dos alunos e

isso, definitivamente, não era considerado pela equipe de coordenação como uma

intervenção. E de fato, não é. O trabalho de pintar um local, mesmo que haja a criação de

imagens, não é por si só uma intervenção. Para que seja, é necessário estar embutido ao

trabalho uma série de outras características estéticas, relação com o entorno e aspectos.

Houve um caso que o acompanhamento surtiu maior efeito, pois a gestão

estava aberta para a intervenção artística e o monitor também. Apesar de não ter

formação, ele possuía predisposição para a área artística. Antes de iniciar o

acompanhamento, desenvolvera um trabalho de pintura no parquinho da escola. A partir

da análise e das críticas em relação a esse trabalho, planejou-se uma próxima

intervenção, que funcionou muito melhor em relação à primeira. E o trabalho foi

acontecendo dessa forma. Na avaliação feita com o monitor, foi unânime a opinião sobre

a melhoria do desenvolvimento da oficina e das intervenções para os alunos e para o

monitor.

Todo esse trabalho seria ainda mais rico se houvesse o apoio total da

Coordenação Geral do Programa Escola Integrada. Essa coordenação deveria incentivar

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a formação continuada dos coordenadores do programa dentro de cada escola, a

formação cada vez melhor dos monitores e bolsistas, o diálogo crescente com as

universidades, garantir o uso correto das verbas destinadas ao programa em cada escola.

Porém, esse apoio não existiu, pois, durante uma instabilidade política, perdeu-se tudo o

que fora construído em mais de cinco anos de tragetória da equipe de Educomunicação e

Arte. Esse fator alterou o formato da equipe e da rotina de trabalho construída. Além

disso, foi determinante para o desligamento de vários profissionais dessa equipe e

também para o encerramento das minhas atividades no Programa Escola Integrada.

5. Conclusão

A experiência obtida no Programa Escola Integrada com Intervenção Artística,

seja como bolsista ou como agente cultural foi muito rica. Isto devido a própria dimensão

do trabalho com Intervenção Artística, independente do lugar em que haja a prática. E

devido também ao posicionamento como educadora aprendiz perante os processos de

ensino/aprendizado, um posicionamento aberto, crítico e curioso sobre os potenciais dos

indivíduos e dos lugares.

Por um lado, algumas convicções como educadora foram reafirmadas: a

convicção da importância da força de vontade do educador, da consciência deste em

relação à sua área de atuação, de um bom planejamento e de flexibilidade perante as

adversidades.

Por outro lado, a visão sobre Intervenção Artística foi ampliada desde o início

dessa jornada, bem como as reflexões sobre Educação Integral, principalmente no que se

refere ao Programa Escola Integrada. Percebeu-se o potencial desse programa e de

outros com a mesma iniciativa, porém essa visão foi atrelada à observação dos impactos

de uma má gestão e sobre como isso pode afetar um trabalho tão grande e rico para o

município e sua paisagem cultural, como era a Intervenção Artística

Referências

3° COLÓQUIO IBERO-AMERICANO PAISAGEM CULTURAL, PATRIMÔNIO E PROJETO - DESAFIOS E PERSPECTIVAS Belo Horizonte, de 15 a 17 de setembro

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