universidade sÃo judas programa de pós-graduação stricto

138
UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu Mestrado em Educação Física DIEGO PINTO JABOIS CARTAS PEDAGÓGICAS E A NARRATIVIDADE DOCENTE: O (ser) fazer no território escolar nas aulas de Educação Física São Paulo - Brasil 2020

Upload: others

Post on 03-Jul-2022

3 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

UNIVERSIDADE SÃO JUDAS

Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu

Mestrado em Educação Física

DIEGO PINTO JABOIS

CARTAS PEDAGÓGICAS E A NARRATIVIDADE DOCENTE: O (ser) fazer

no território escolar nas aulas de Educação Física

São Paulo - Brasil

2020

Page 2: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

1

DIEGO PINTO JABOIS

CARTAS PEDAGÓGICAS E A NARRATIVIDADE DOCENTE: O (ser) fazer

no território escolar nas aulas de Educação Física

Dissertação apresentada à Universidade São Judas Tadeu

como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em

Educação Física na linha de pesquisa Estudos Socioculturais e

Pedagógicos da Educação Física, sob orientação da Profª. Dra.

Bruna Gabriela Marques.

São Paulo – Brasil

2020

Page 3: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

2

Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca da

Universidade São Judas Tadeu

Bibliotecária: Adriana Aparecida Magalhães - CRB 8/10264

Jabois, Diego Pinto.

J11c Cartas pedagógicas e a narratividade docente: o (ser) fazer no território

escolar nas aulas de Educação Física / Diego Pinto Jabois. - São Paulo,

2020.

f. 137: il.; 30 cm.

Orientadora: Bruna Gabriela Marques.

Dissertação (mestrado) – Universidade São Judas Tadeu, São

Paulo, 2020.

1. Cartas Pedagógicas. 2. Saberes Docentes. 3. Educação Física

Escolar. I. Marques, Bruna Gabriela. II. Universidade São Judas Tadeu,

Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação Física. III. Título.

CDD 22 – 796

Page 4: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

3

CARTAS PEDAGÓGICAS E A NARRATIVIDADE DOCENTE: O (ser) fazer no

território escolar nas aulas de Educação Física

BANCA EXAMINADORA TITULAR:

__________________________________________

Profª. Drª. Isabel Porto Filgueiras

Universidade São Judas Tadeu – USJT

__________________________________________

Profª. Drª. Bruna Gabriela Marques

Universidade São Judas Tadeu – USJT

__________________________________________

Profª. Drº. Mesaque Silva Correia

Universidade Federal do Piauí – UFPI

BANCA EXAMINADORA SUPLENTE:

__________________________________________

Profª. Drª. Elisabete dos Santos Freire

Universidade São Judas Tadeu – USJT

__________________________________________

Profº. Drº. Luiz Sanches Neto

Universidade Federal do Ceará – UFC

São Paulo – Brasil

2020

Page 5: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

4

Dedico este trabalho aos meus familiares, em especial ao

meu pai Jesus Jabois Torres que não está mais entres nós,

mas continua sendo eterna fonte de inspiração.

Page 6: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

5

AGRADECIMENTO

Durante todo o processo da produção acadêmica aqui apresentada,

foram inúmeros os momentos de fragilidade, dúvidas e renúncias cotidianas

envolvendo minhas escolhas e caminhos a seguir frente nessa jornada de

engrandecimento.

Contudo, hoje tenho a clareza de que o processo é tão ou mais

importante do que o produto, pois é nele em que depositamos intensas reflexões

e ampliamos nossa resiliência e determinação, requisitos necessários para trilhar

o caminho escolhido.

Consequentemente, e a partir dessa experiência, acredito que sozinho

não chegaria a lugar nenhum, pois, em minha opinião, ninguém constrói nada

na companhia da solidão. Nessa direção, estendo sinceros agradecimentos aos

meus familiares, em especial a minha esposa Christiane Vilar Monteiro que

envolvida nas ditas “renúncias cotidianas” se fez presente não só como esposa,

mas como dedicada e atenta conselheira em diversos momentos.

Aos amigos e amigas do programa de Pós - Graduação da Universidade

São Judas Tadeu, que aqui não sou capaz de identificá-los individualmente, com

o receio de ser injusto com quem certamente entre os corredores da

universidade ou até mesmo em conversa “digitais” despretensiosa, foram

capazes de colaborar, amparar minhas angústias e celebrar minhas conquistas

de forma fraterna.

Contudo, destaco a parceria dos amigos Paulo Clepard Silva Januário

e Daiana Machado dos Santos pela amizade sincera e escuta sensível em

momentos de grande importância.

Aos docentes participantes, comprometidos e companheiros, que

prontamente ao meu pedido e com a coragem necessária aceitaram o desafio.

É com amizade verdadeira e profundo respeito que estendo minha eterna

gratidão pela doação do tempo e das palavras, aqui respeitosamente

representadas.

Page 7: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

6

Ao meu novo amigo e colaborador incansável Prof. Dr. Mesaque Silva

Correia, fonte de inspiração, no privilégio de sua amizade e atenção dispensada,

sempre que possível, em diversos momentos.

A minha estimada orientadora Profª Drª Bruna Gabriela Marques, cuja

amizade sincera, rigor metodológico e gentileza, característica de sua

personalidade, foi capaz de despertar minhas potencialidades como

pesquisador. Obrigado por acreditar no desafio, desde o início.

Aos professores e professoras da Universidade São Judas Tadeu em

especial: Drª. Elisabete dos Santos Freire, Drª. Isabel Porto Filgueiras, Drª

Graciele Massoli Rodrigues e Dra. Maria Luiza de Jesus Miranda queridas

professoras, presentes durante todo o meu percurso, com estendida

generosidade bem como profundo respeito a minha condição de aprendiz.

A equipe de apoio da secretaria de Pós - Graduação da Universidade

São Judas Tadeu, sempre atentas e solícitas com a gentileza característica em

todos os momentos.

A todos meus alunos e alunas do ensino fundamental que ao longo

desses anos, no território escolar, dividiram com esse professor mais alegrias do

que tristezas. Minha eterna e presente gratidão.

A todos aqueles e aquelas que porventura não tive a capacidade de

evidenciar, mas certamente, sendo coerente com minhas reflexões iniciais,

estiveram presentes nesse percurso.

E finalmente sou grato à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal

de Nível Superior - CAPES, por ter financiado parte desse estudo.

Page 8: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

7

RESUMO

A escola, enquanto equipamento público, assumindo o papel na formação continuada dos seus docentes em exercício, ao conduzir uma nova e/ou reorganizada proposta curricular normalmente reconhece, em linhas gerais, a importância da composição dos saberes docentes associados ao fazer pedagógico para o êxito da ação. Contudo, na maioria dos casos, pouco ou nada se compreende sobre os docentes que estão lá como verdadeiros artífices dos processos de desenvolvimento do ensino e da aprendizagem acerca do fazer pedagógico. Partindo de oportuna observação e frente ao reconhecimento de experiências positivas associadas ao fazer pedagógico do componente curricular de Educação Física o estudo reflete sobre o que de fato orienta e/ou organiza o desenvolvimento integral do fazer pedagógico? Quais fatores auxiliam na construção desse tipo de fazer? Sobre o cotidiano docente, em distintos contextos, existem elementos em comum no desenvolvimento e sustentação de tais construções? Diante disso, o objetivo do trabalho consiste em compreender a construção integral do fazer pedagógico dos docentes, seus desafios e/ou dilemas e perspectivas futuras por intermédio da produção de cartas pedagógicas. A pesquisa de abordagem qualitativa justifica sua escolha metodológica por reconhecer na produção a potencialidade interlocutora e reflexiva que destaca a “voz” docente, por vezes sem o devido espaço de escuta acolhedora no território escolar dado à complexidade do exercício pedagógico. A rede municipal de ensino, situada no litoral sul de São Paulo - Brasil no município de Itanhaém foi o lócus deste estudo por intermédio de seus docentes. A produção das cartas contou com quatro participantes de escolha intencional em efetivo exercício na rede cuja correspondência foi organizada metodologicamente em cinco encontros programados e orientados por análise interpretativa textual. O estudo buscou ancoragem no referencial teórico do educador brasileiro Paulo Freire com destaque para a obra intitulada: “Pedagogia da autonomia, saberes necessários à prática educativa” como fonte inspiradora. O estudo apresentou no espaço correspondente, criado por intermédio das cartas, um destaque significativo para o exercício docente centrado nas relações humanas e seus saberes que são estabelecidas ao longo do exercício docente no território escolar de grande relevância para o sustento e reorganização de suas práticas pedagógica que certamente merece a atenção de estudos complementares nessa direção.

Palavras – Chave: Cartas Pedagógicas. Saberes Docentes. Educação Física

Escolar.

Page 9: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

8

ABSTRACT

The school, as a public facility, assuming the role in the continuous training of its

teachers in practice when conducting a new and / or reorganized curricular

proposal normally recognizes, in general lines, the importance of the composition

of the teaching knowledge associated with making pedagogical for the success

of action. However, in most cases, little or nothing is understood about the

teachers who are there as true creators of the processes of development of

teaching and learning about pedagogical practice. Starting from a timely

observation and facing the recognition of positive experiences associated with

the pedagogical doing of the Physical Education curricular component, does the

study reflect on what actually guides and / or organizes the integral development

of pedagogical doing? What factors help in the construction of this type of doing?

About the daily teaching, in different contexts, are there elements in common in

the development and support of such constructions? Therefore, the objective of

the work is to understand the integral construction of the pedagogical practice of

teachers, their challenges and / or dilemmas and future perspectives through the

production of teaching letters. The research with a qualitative approach justifies

its methodological choice because it recognizes in the production the interlocutor

and reflective potential that highlights the teaching “voice”, sometimes without the

proper space for welcoming listening in the school territory given the complexity

of the pedagogical exercise. The municipal education network, located on the

south coast of São Paulo - Brazil in the municipality of Itanhaém was the locus of

this study through its teachers. The production of the letters had four intentionally

chosen participants in effective exercise in the network whose correspondence

was organized methodologically in five scheduled meetings and guided by

interpretative textual analysis. The study sought to anchor in the theoretical

framework of the Brazilian educator Paulo Freire with emphasis on the work

entitled: “Pedagogy of autonomy, knowledge necessary for educational practice”

as an inspiring source. The study presented in the corresponding space, created

through letters, a significant highlight for the teaching exercise centered on

human relations and their knowledge that are established throughout the

teaching exercise in the school territory of great relevance for the support and

reorganization of their pedagogical practices. which certainly deserves the

attention of further studies in this direction.

Keywords: Pedagogical Letters. Teaching Knowledge. School Physical

Education.

Page 10: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

9

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Elaboração do autor, inspirado em Tardif, 2002.............................. 21

Figura 2 - Elaboração do autor, evidenciando aproximações entre os docentes

e suas práticas pedagógicas centradas nas interações humanas.................... 25

Figura 3 - Carta pedagógica de Paulo Freire (Documento Original 1989 – Diário

Oficial do Município de São Paulo) ................................................................... 37

Figura 4 - Elaboração do autor – representação gráfica da conexão entre os

campos disparadores ....................................................................................... 49

Figura 5 - Elaboração do autor ilustrando a organização metodológica destinada

ao encontro individual e apresentação da síntese dos campos via google meeting

ao participante .................................................................................................. 53

Page 11: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

10

SUMÁRIO

1. APRESENTAÇÃO E COSTURAS NECESSÁRIAS ..................................... 12

2. A Educação Física no espaço escolar e os saberes de seus “artífices”

.......................................................................................................................... 16

3. Os caberes e a construção de suas relações ........................................... 23

4. A identidade docente e seus contornos profissionais ............................ 27

5. Cartas pedagógicas: Diálogos correspondentes ..................................... 31

6. Processos metodológicos: Escolas e construção do percurso ............. 38

7. PRODUÇÃO DE DADOS: Acesso ao cenário como escolha metodológica

.......................................................................................................................... 41

7.1. Os participantes: escolha individual ........................................................... 47

7.2. Campos disparadores: composição e conexões interpretativas ................ 48

8. As cartas: Reflexões sincrônicas correspondentes ................................ 50

8.1. Cara professora Francislene ...................................................................... 55

8.2. Caro professor Luiz .................................................................................... 73

9. Apresentação das cartas pedagógicas – o (ser) fazer docente nas aulas

de Educação Física ......................................................................................... 54

10. Cartas pedagógicas: o reencontro com a pedagogia da autonomia de

Paulo Freire ..................................................................................................... 89

11. CONSIDERAÇÕES PROVISÓRIAS: Carta aos professores ................... 96

REFERÊNCIAS ................................................................................................ 99

Page 12: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

11

APÊNDICE A – PERFIL DOCENTE GERAL (DIGITAL) ................................ 106

APÊNDICE B – DOCENTE PARTICIPANTE (PRODUÇÃO DAS CARTAS

PEDAGÓGICAS) ........................................................................................... 107

APÊNDICE C – QUESTIONÁRIO DIGITAL ................................................... 108

ANEXO 1 – CARTA PEDAGÓGICA PROFESSOR BRUNO ......................... 110

ANEXO 2 – CARTA PEDAGÓGICA PROFESSORA THAYARA .................. 135

ANEXO 3 – DECLARAÇÃO DE RESPONSABILIDADE INSTITUCIONAL ... 136

ANEXO 4 – PARECER – COMITÊ DE ÉTICA E PESQUISA (CEP) ............ 137

Page 13: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

12

1. Apresentação e costuras necessárias

“... é no espaço para palavras que se

podem produzir verdades de si.”

Hannah Arendt

Durante muito tempo, em particular percepção, a presença da Educação

Física enquanto componente curricular presente no espaço escolar brasileiro foi

palco de inúmeras mudanças acompanhadas de grandes disputas por validação

de significados, crises e alguns avanços comumente alinhados ao desenho

social vigente.

No entanto, distante nesse momento de definições epistemológicas, de

sua constituição histórica propriamente dita, penso no que de fato o componente

curricular representa na atualidade, para os docentes que estão lá, no cotidiano

de sua prática, e com a devida licença poética “entretecendo fios”, e renovando

percursos e significados de seus “tecidos”, amparados por experiências

pedagógicas e reflexões cotidianas.

Pensando nisso, acredito que determinadas ações e/ou decisões

promovidas por intermédio dos docentes no seu fazer pedagógico no território

escolar, carrega parte substancial de suas histórias de vida, que colaboram

certamente na construção de outras histórias e assim sucessivamente como na

confecção de um grande tecido em “costuras necessárias” na maior parte do

tempo.

Portanto, é de suma importância e coerência interna localizar nessa

produção o meu lugar de fala “costurando os fios” do meu “‘tecido” e relacionado

com intimidade a minha trajetória profissional, dando amplo sentido e

intencionalidade ao envolvimento com o estudo e seus desdobramentos aqui

apresentados.

Filho de pai estrangeiro (espanhol) e mãe brasileira, nascido na cidade

de Santos - SP, (1978) tive boa parte de minha infância desfrutada,

naturalmente, na década de 80, com passagem discente pelo ensino particular

(fundamental) e posteriormente público (médio) com saudosas recordações.

Page 14: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

13

Contudo, minhas maiores e mais significativas memórias, paralelas ao

período escolar, estão associadas principalmente aos momentos vividos nas

“brincadeiras de rua”, aproveitando o tempo livre e passando horas em

companhia dos meus amigos, compartilhando saudosos momentos, hoje retidos

na linha do tempo e recordados aqui com carinho.

Sem dúvida, tais vivências, dentre outros fatores, tiveram influência

direta e/ou indireta em importantes decisões ao longo de minha história e

seguramente em minha constituição profissional, e em meu reconhecimento

como sujeito e cidadão na sociedade.

Em comunhão aos fatos apresentados, destaco minha opção em cursar

a faculdade de Educação Física na cidade de Santos, no litoral de São Paulo,

onde na época, ainda sob o teto dos meus pais buscava a sonhada formação no

ensino superior.

Estar sob o teto dos meus pais, aqui me entendo como um privilegiado,

principalmente quando identifico nos relatos de alguns colegas de profissão,

histórias de dificuldades na primeira formação, pois para muitos o financiamento

e/ou a seguridade da manutenção dos estudos nunca foi tarefa fácil.

Um tempo mais tarde, e após a conclusão do ensino superior, ao acaso,

por indicação de um colega de sala, fui convidado e convencido a prestar o

concurso público para a prefeitura de Itanhaém no litoral de São Paulo (cidade

vizinha). Nesse momento tinha como objetivo conquistar uma oportunidade de

atuação no ensino fundamental como docente, caso aprovado, garantindo assim

o meu ingresso no serviço público sem nenhuma experiência anterior para além

das poucas horas de estágio requerido pelo programa obrigatório de formação

inicial.

O tempo parece passar muito rápido, mas lembro com perfeita exatidão

do meu primeiro dia de aula, que certamente marcaria meu percurso profissional

para sempre. Em breve lembrança, tinha a sensação de ver o dobro de crianças

presentes (imaginação ou talvez choque com a realidade) correndo de forma

“alucinada” pelo pátio, esperando “meu comando” ou uma ação disciplinadora

direta em alguma direção.

Page 15: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

14

Certamente agora no exercício docente e não mais como discente, os

desafios e dilemas se somavam integralmente no sentido de organizar e

reconduzir toda aquela “alegria” contagiante, vinda dos educandos e educandas

já sob uma percepção vivida como docente. Foram momentos significativos

entre descobertas, erros, acertos e incertezas quase que permanentes no

cotidiano da minha realidade.

Além disso, reconhecer a “liturgia” e os “ritos” escolares, naquele

momento, no início de minha carreira se fez necessário quase como um exercício

“obrigatório” e diário, pois definitivamente estava em um rico e renovado universo

que teria muito a contribuir em minha constituição enquanto docente.

A essa altura desenvolvo a percepção de que ninguém se forma

professor ou professora os docentes vão se constituindo ao longo do tempo,

inclusive no compartilhamento de visão de mundo enquanto pessoa.

No momento, continuo exercendo a função docente na mesma unidade

escolar de ingresso com breve passagem pela coordenação pedagógica (2009)

a convite do departamento de educação da prefeitura, sobre supervisão da

gestão vigente na época, mesmo sem ter a experiência necessária para atuação

no cargo (em minha opinião). Neste episódio, tive o que reconheço como uma

oportunidade ímpar de acesso, por intermédio de visitas regulares ao espaço do

fazer pedagógico de alguns colegas professores e professores em suas

respectivas unidades de ensino. Essas visitas foram se configurando, mas com

frequência inconstante, devido às dificuldades de locomoção, dado o número de

unidades e a distância entre elas e horários convergentes com o exercício dos

docentes.

Então, me vi exercendo a função de “observador”, inerente às

atribuições da função de coordenador de área, assim denominado o responsável

em colaborar com o desenvolvimento do componente curricular da rede quando

possível. Contudo, às vivências intermediadas pelos docentes, e por mim

observadas, despertaram rapidamente minha atenção no que tange à qualidade,

entusiasmo e empenho prontamente revelados no fazer pedagógico das aulas

de Educação Física, ministradas pelos colegas docentes de rede.

Page 16: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

15

Em minha percepção, referentes às observações relatadas, esse “fazer”

se tratava de algo de indiscutível autoria por parte dos docentes envolvidos, a

contento das necessidades dos educandos e educandas com princípios

pedagógicos coerentes dentro das possibilidades e recursos disponíveis.

Destaco inclusive que não havia sido adotado, até aquele momento, na rede

municipal de ensino um material didático específico de auxílio institucional

(apostilas, livros, matrizes etc.) direcionado aos docentes no amparo e apoio

metodológico para elaboração de seus planos de ensino.

Portanto, na esteira dos fatos, boa parte das decisões entre O que?

Como? E quando fazer? Estavam de certa forma relacionadas às decisões

curriculares particulares dos docentes envolvidos, assim como todo o conjunto

de ações presentes em seu fazer pedagógico no espaço educacional definindo

o território escolar1.

Partindo das observações apresentadas, alguns questionamentos se

fizeram presentes. O que de fato orienta e sustenta o desenvolvimento do fazer

pedagógico no território escolar? Quais fatores auxiliam na construção desse

fazer? Sobre o cotidiano docente, em contextos diversificados, existem

elementos em comum que auxiliam tais construções?

Em particular apontamento, sobre o fazer pedagógico em questão

estendo minhas reflexões para o predomínio dos “currículos próprios” na

construção cotidiana do fazer pedagógico constituído principalmente pelo campo

da experiência e na integridade docente enquanto pessoa como propulsores das

decisões e ações sobre a prática no contexto desse território (espaço escolar).

No que tange a expressão “currículos próprios”, definido para o contínuo

dessa reflexão como toda ação e/ou decisão curricular, promovida pelos

docentes no ato pedagógico subsidiado pela composição plural de seus saberes

ao longo do tempo.

Diante do exposto e alinhado a problemática apresentada, o estudo

busca compreender a constituição integral do fazer pedagógico docente, seus

1 Em defesa do termo “território escolar”, entendemos em particular reflexão, que a Educação

Física enquanto área do conhecimento transita nesse espaço com características particulares e distintas do outros espaços em que está presente bem como representada pelos seus profissionais (academia, clubes, spas médicos, etc.).

Page 17: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

16

desafios e/ou dilemas e perspectivas futuras por intermédio da produção

correspondente de cartas pedagógicas.

Tal escolha como estratégia metodológica, se deu pelo fato de

compreender a potencialidade reflexiva das cartas pedagógicas uma vez que

promove o diálogo e viabiliza a voz docente, por vezes, sem o devido espaço de

escuta acolhedora.

2. A Educação Física no Espaço Escolar e os saberes de seus

“artífices”

O território escolar é frequentemente compreendido como um espaço

privilegiado de ações e interações, mas, sobretudo de constantes e significativas

reflexões, todavia, parte dessas reflexões estão associadas à nossa própria

história de vida e como ela se articula e influencia em nossas decisões

cotidianas, inclusive, contextualizadas no ato pedagógico enquanto docente.

Nesse sentido e entre as ditas “aventuras” (do latim “ad ventura” que

significa literalmente o que vêm pela frente) os docentes vão se constituindo

dentro de um contexto por intermédio, inclusive, de suas ações e decisões.

Ações e decisões, por vezes, repletas de incertezas, erros e acertos

configurando o literal sentido do enfrentamento do que vêm pela frente ao

considerar e reconhecer o território escolar um composto de imprevisibilidades,

desafios e dilemas.

No entanto, diante de inevitáveis mudanças, características da

contemporaneidade, se faz necessário promover o reconhecimento dos

docentes e seus saberes, para melhor compreender a composição dessas

“aventuras” que têm nesse recorte e como principal produto a produção

correspondente de cartas pedagógicas.

Para organizar a “confecção” deste estudo, considero relevante,

reconhecer parte do percurso histórico que evidencia a presença da Educação

Física no território escolar, bem como as relações e o lugar de centralidade de

seus principais artífices, os docentes.

Page 18: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

17

No Brasil, em linhas gerais, uma corrente histórica com alternâncias de

distintas tendências, principalmente, centradas nas áreas médicas, militares e

esportistas foi se destacando historicamente ao longo do tempo e com isso

“negociando” determinados significados para diversificados contextos.

Contudo, destaco por escolha narrativa da figura do então, eminente

parecerista do Império, Rui Barbosa de Oliveira, como uma das primeiras

autoridades representativas do regime vigente, a valorizar a Educação Física no

contexto escolar, sobretudo quando em 1882 pede a inclusão das ginásticas nas

escolas e a equiparação de seus professores aos das outras disciplinas

(Marinho, 1980).

Rui Barbosa considerava ser necessário ter um corpo saudável para

ativar o intelecto, segundo os preceitos médicos, movimento que acontece um

tempo depois da significativa reforma Couto Ferraz2 de 1851, a qual tornou

obrigatória a Educação Física nas escolas do município da corte, certamente o

início oficial da educação fiscal escolar brasileira (CANTARINO FILHO 1982,

apud Betti 1991).

As conexões entre indivíduo e a conjuntura histórica devem ser

compreendidas como trajeto de mão dupla, no qual o personagem interfere na

realidade a partir de suas opções pessoais e o contexto histórico, que por sua

vez, intervém diretamente nas opções do indivíduo (Bediaga, 2017).

Entretanto, na época, a efetiva implantação da Educação Física ficou

restrita, até os primeiros anos da década de 30, á escolas do Rio de Janeiro,

enquanto município da corte imperial e capital da República, e as escolas

militares (Betti, 1991).

Contudo, e ciente de evidentes contradições apresentadas,

principalmente nas reflexões contidas na obra intitulada “Educação Física no

Brasil a história que não se conta” do professor Lino Castellani Filho (1988),

2 Natural da cidade do Rio de Janeiro, Luís Pedreira do Couto Ferraz, também conhecido como

“Visconde do Bom Retiro” nasceu em 1818, filho de um desembargador de mesmo nome, que paralelamente à carreira jurídica foi deputado suplente pela Bahia na Assembleia Constituinte de 1823 e exerceu mandato na Câmara dos Deputados de 1826 a 1829. Regulou a reforma do ensino primário e secundário do Município da Corte (Rio de Janeiro). Portanto, elaborou um projeto que traçava linhas gerais sobre a instrução pública do Império (BEDIAGA, 2017).

Page 19: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

18

consideramos o recorte narrativo histórico escolhido como um marco significativo

na presença da Educação Física no espaço escolar.

No entanto, o mero fato de a Educação Física ser considerada como

atividade relegada a algo sem importância, simples executora de tarefas,

vinculada ao trabalho físico e manual é um exemplo da dificuldade em legitimar-

se enquanto área de conhecimento no sistema escolar brasileiro (Castellani

Filho, 1988).

Apenas em 1937, na elaboração da Constituição, é que se fez a primeira

referência explícita a Educação Física em textos constitucionais federais,

incluindo-a no currículo como prática educativa obrigatória e não como disciplina

curricular (Brasil, 1997). Na promulgação do texto final da primeira Lei de

Diretrizes e Bases da Educação de (Lei, 4024/61), de 20 de dezembro ficou

determinada a obrigatoriedade da Educação Física para o ensino primário e

médio.

Logo, na esteira dos fatos, a Educação Física ganhou, nos contornos da

década de 1970, novamente, funções importantes para a manutenção da ordem

e do progresso inclusive no que tange o uso do esporte amparado pela

campanha da seleção brasileira de futebol, na campanha da copa do mundo de

futebol de 1970 estreitaram-se assim vínculos entre esporte e nacionalismo

(Betti, 1991).

Já a década de 1980 foi de grande relevância para o contexto da

Educação Física no espaço escolar, inclusive, pelo desenvolvimento e confronto

de algumas abordagens pedagógicas organizadas sinalizando certo

distanciamento de seu caráter exclusivamente biológico e instrumental que

visava a priori o desempenho técnico e físico dos alunos (Betti, 1991; Kunz,

2006). Ainda na década de 1980, um processo intenso de reflexão sobre a área

deu origem a uma crise acadêmico-conceitual. Esta crise gerou inúmeras críticas

a todos os objetivos e propostas historicamente produzidos (Freire; Oliveira,

2004).

Contudo, ciente da distância histórica dos apontamentos apresentados

e mais próximo dos dias atuais foi certamente na nova LDB, Lei de Diretrizes e

Bases da Educação Brasileira (9394/96), o grande avanço para a Educação

Page 20: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

19

Física no que diz respeito a sua presença no território escolar como componente

curricular obrigatório em vigência até os dias atuais. A destacada Lei de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), de 1996 é a legislação que

regulamenta o sistema educacional (público ou privado) do Brasil e estabelece

no seu artigo 26 que a Educação Física, integrada à proposta pedagógica da

escola, é um componente obrigatório da Educação Básica constituída por três

etapas: educação infantil, ensino fundamental e médio.

Na sequência e com a intenção de sustentar renovados apontamentos

para o componente curricular, o surgimento, a ampla divulgação, dos

documentos intitulados: “Parâmetros Curriculares Nacionais” (1997) coloca a

Educação Física em outro estado de significação ampliando o debate reflexivo

da constituição do componente a luz da então reorganizada LDB de 1996.

Por extensão, a Educação Física, para ser reconhecida como um

componente curricular tão importante quanto os demais, deve apresentar

objetivos claros e um corpo de conhecimentos específico e organizado, cuja

aprendizagem possa colaborar para que os objetivos da educação escolar sejam

alcançados (Freire, 1999).

Nesse sentido, inúmeras ações de reconhecimento, ampliação e

modificação dos currículos bem como as perspectivas da disciplina ganham

certo espaço, como um todo no espaço escolar na tentativa de atender aos

anseios da sociedade e do sistema educacional vigente, o que certamente não

foi exclusividade desse componente.

Contudo, desde que a Educação Física foi inserida nas escolas

brasileiras, tentamos convencer as pessoas de sua importância criando

argumentos e elaborando propostas de trabalho, sempre acompanhando à

conjuntura política e social vivida pelo país e pelo sistema educacional assim

como nos mostram Freire e Oliveira (2004).

No entanto, constata-se que a Educação Física não apresenta um corpo

estável de conhecimento durante seu processo histórico. Nas décadas de 1980

e 1990 houveram tentativas de delimitar o conhecimento dessa disciplina; no

entanto, a discussão permaneceu no campo teórico e não alcançou de forma

significativa a realidade da escola (Ventura et al, 2006).

Page 21: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

20

No cenário apresentado, destaca-se para o recorte desse estudo parte

da composição histórica da presença do componente curricular de Educação

Física no espaço escolar. bem como o avanço da centralidade dos seus

principais artífices, os docentes. O conjunto que ampara essa centralidade

envolve, inclusive, histórias de vida e de formação que ao longo do tempo

constituem os docentes enquanto sujeitos e no exercício de sua profissão.

Possivelmente, esse conjunto fornece subsídios significativos ao fazer

pedagógico que organiza uma estrutura quase que simbiótica, envolvendo a

pessoa e o profissional professor, essa estrutura, então organizada, vai se

transformando gradativamente ao longo do tempo impactando na construção de

seus saberes. Nesse sentido não podemos perder de vista a pessoa que é o

professor, ao se estudar os saberes que estes possuem, pois que não se deixa

de ser a pessoa que é quando adentra a sala de aula (Nóvoa, 1992).

Já Saviani (1996), renomado filósofo e pedagogo brasileiro, destaca que

os professores no exercício docente precisavam ter uma visão de mundo, uma

concepção de educação, e de ensino, logo essas concepções determinariam

quais os tipos de saberes deveriam ser mobilizados em situações de sala de

aula e/ou fora dela. Dada essa importância, Sacristán (2000), relaciona inclusive

o fazer pedagógico ao currículo e evidencia o papel dos professores como

elementos de primeira grandeza na concretização dessa relação.

Todavia, o papel dos professores na articulação do processo curricular

é fundamental. Eles são de fato os grandes artífices, queira ou não, da

construção dos currículos que se materializam nas escolas e nas salas de aula

(Moreira; Candau, 2007).

Diante disso, reflexões do pesquisador canadense Maurice Tardif,

apontam ser muito difícil em determinados casos, cindir o trabalho do docente

da pessoa do docente, evidencia, inclusive, o papel significativo dos “saberes”

como um elemento para melhor orientar os pressupostos que voltam o olhar para

a centralidade dos docentes no contexto escolar (Tardif, 2008).

Tardif (2008), na conhecida obra, intitulada: “Saberes Docentes e

Formação Profissional” descreve a respeito dos saberes docentes e a sua

relação com a formação profissional dos professores, com o próprio exercício da

Page 22: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

21

docência e a pessoa do docente em cuidadosa análise. Em síntese o autor

apresenta um panorama das pesquisas educacionais a partir dos anos 1990

destacando a avaliação das reformas implantadas com ênfase na formação

profissional dos professores e à visão dos seus saberes.

Segundo Tardif (2008) o saber não é uma coisa que flutua no espaço: o

saber dos professores é um saber pessoal e está relacionado com a pessoa e a

identidade do indivíduo, com a sua experiência profissional e também de vida.

Diante disso, destaco os saberes experienciais ou da experiência dos

professores para organização de parte dessa investigação. Por definição, os

saberes experienciais são específicos, baseados no cotidiano e no

conhecimento do meio, resultado de um processo de construção individual, mas,

ao mesmo tempo, compartilhados e legitimados por meio de processos de

socialização profissional constante. Esses saberes brotam da experiência e são

por ela validados (Tardif; Lessard; Lahayne, 1991).

Tardif (2008) aponta, inclusive, para à existência de quatro tipos

diferentes de saberes constitutivos da prática docente, classificados como:

saberes disciplinares; saberes curriculares; saberes de formação profissional e

os saberes experienciais ou da experiência.

(Figura 01: Elaboração do autor, baseado em Tardif, 2002)

SABERES DOCENTES

DISCIPLINARES CURRICULARES FORMAÇÃO EXPERIÊNCIAIS

PLURAL

Page 23: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

22

Tardif (2008) destaca de forma enfática a composição plural dos saberes

na prática e sua estreita relação com a composição da formação profissional ao

longo da vida, orientada principalmente por saberem relacionados ao campo das

experiências.

Os saberes experiências ou da experiência, são aqueles que resultam

especificamente do próprio exercício profissional dos professores. Esses

saberes são produzidos por intermédio das vivências de situações

contextualizadas no ambiente educacional e suas relações estabelecidas,

considerando que:

“[...] Esses saberes brotam da experiência e são por ela validados. Eles incorporam-se à experiência individual e coletiva sob a forma de habitus e de habilidades, de saber-fazer e de saber ser”. Podemos chamá-los de saberes experiências ou práticos [...]” (TARDIF, 2008, pág. 39).

No recorte desta investigação, e consciente da existência de outras

reflexões acerca da temática, destaco os saberes da experiência do trabalho

cotidiano como elemento que parece constituir o alicerce da prática e da

competência profissional, pois essa experiência é, para o professor, a condição

para a aquisição e produção de seus próprios saberes profissionais (Tardif,

2008).

Tardif; Lessard; Lahayne (1991), acreditam que os docentes, a partir de

seus saberes oriundos da experiência, desenvolvem inclusive um olhar crítico

em relação a sua formação inicial. Com a experiência de ensino, o professor

começa a elaborar sua forma de lidar com as mais diversas situações que

ocorrem na sala de aula e na sua profissão como um todo.

É por meio de um movimento de articulação entre os saberes que os

professores podem se tornar capazes de perceber as peculiaridades de sua

atividade profissional e com base nisso reconfiguraram suas formas de saber-

fazer docente de modo sistemático, dinâmico e contínuo (Pimenta, 2000).

Diante disso, destaco em particular reflexão, que os saberes docentes

não provêm de uma única fonte, na medida em que o tempo passa, novas

atitudes e decisões despertam por intermédio das experiências práticas, pois

ninguém se forma professor ou professora, esses vão se constituindo ao longo

do tempo.

Page 24: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

23

No entanto, o estudo apresentado não tem como objetivo analisar e/ou

discutir elementos legitimadores nem tão pouco epistemológicos que

fundamentam em definitivo os saberes e/ou conceitos de educação e ensino,

mas, sobretudo busca promover uma articulação mais perceptiva sobre os

saberes e a constituição de suas relações associados ao fazer (ato) pedagógico

docente no fomento de espaços de escuta atentos e acolhedores a medida do

possível.

3. OS SABERES E A CONSTITUIÇÃO DE SUAS RELAÇÕES

Certamente, a busca pela compreensão que antecede o conhecimento

das relações e constituição dos saberes docente, e suas relações não é tarefa

muito simples, partindo do exposto e distante de demasiada “ingenuidade” não

existe maneira de compreender os saberes docentes sem ouvir, ver, investigar

e reconhecer elementos significativos dessa constituição, sobretudo presentes

no ato pedagógico.

O (ato), fazer pedagógico pode ser entendido, em particular definição,

como uma ação de cunho didático pedagógico intencional e adequado às

necessidades dos educandos e educandas na medida em que a relação entre o

ensino e aprendizagem se constituiu ao longo de um processo em um

determinado tempo.

Essa relação envolve variáveis distintas para além daquelas de emprego

instrumental ou de ordem didático e/ou técnico - científico e formativo centrado

apenas no resultado, pois a relação dos docentes com os saberes não se reduz

a uma função de transmissão dos conhecimentos construídos (Tardif, 2008).

A forma de entender os saberes e a relação existente entre eles,

destacada nos estudos de Gauthier, (1998) e reafirmada por Tardif, (2008)

esclarece que é muito mais pertinente conceber o ensino como a mobilização de

vários saberes que formam uma espécie de reservatório, no qual o professor se

abastece para responder a exigências específicas de sua situação concreta de

ensino.

Page 25: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

24

Tardif (2008) evidencia inclusive que na maioria das vezes os docentes

precisam tomar decisões e desenvolver estratégias de ação em plena atividade

do fazer pedagógico, sem se apoiar num "saber-fazer técnico – científico” que

lhes permita controlar a situação.

Em Schön (2000), encontramos também a reflexão que esses

profissionais (docentes) não atuam no mundo real como técnicos ou cientistas

em laboratórios; a atividade não é um modelo de ciências aplicada (pragmática),

pois esta é em grande parte improvisada e construída durante seu

desenvolvimento prático.

Diante do exposto, certamente não podemos desconsiderar também os

saberes “curriculares” e/ou “disciplinares” em reconhecimento a composição de

um saber plural, formado pelo amálgama, mais ou menos coerente, de saberes

oriundos de saberes disciplinares, curriculares e experienciais que são

igualmente de grande importância na composição do fazer pedagógico (Tardif,

2008).

Logo os saberes “curriculares” por definição, são conhecimentos

relacionados à forma como as instituições educacionais fazem a gestão dos

conhecimentos socialmente produzidos e que devem ser ensinados aos

estudantes, já os saberes “disciplinares” apresentam-se, concretamente, sob a

forma de programas escolares (objetivos, conteúdos, métodos) que os

professores devem aprender e aplicar (Tardif, 2008).

Concordamos com Gauthier (1998) e Tardif (2008), que dominar os

conteúdos específicos não garante uma prática pedagógica eficaz. Trata-se de

uma questão histórica, no sentido de que a atividade docente, durante muito

tempo, foi pautada pela ênfase na transmissão de conteúdos prontos e

inquestionáveis.

No entanto, outras relações são fundamentais para o exercício da

atividade docente nesse processo para além dessa transmissão do “pronto e

inquestionável”.

Ao entrar na sala de aula o docente penetra em um ambiente de trabalho

construído, sobretudo de interações humana. Essa ação revela um dos maiores

Page 26: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

25

desafios na construção do ato pedagógico e na mobilização dos seus saberes

(Tardif, 2008).

(Figura - 02: Elaboração do autor evidenciando aproximações entre os docentes e práticas

pedagógicas centradas nas interações humanas).

Contudo, não podemos considerar os agentes sociais envolvidos nesse

processo de forma isolada, sem dar conta dos aspectos fundamentais que dão

sentido ao que acontece em sala de aula, envolvendo a dimensão pessoal, ou

seja, os vínculos e a constituição das relações entre os sujeitos escolares. Por

esse motivo, não é possível reconhecer os saberes docentes sem considerar as

interações estabelecidas nas situações de ensino e de trabalho (Borges, 2004).

Portanto, nesse estudo, estendemos o olhar para aspectos dos saberes

docentes mobilizados na prática do ato pedagógico na dimensão experiencial ou

da própria experiência centrada, sobretudo, nas interações e/ou relações

humanas.

A relação entre o fazer (ato) pedagógico e as relações humanas são

“estreitas” demais e ao pensarmos o que de fato define uma boa prática

pedagógica estamos ao mesmo tempo refletindo sobre essas relações no

cotidiano.

O sociólogo e filósofo francês Edgard Morin na obra intitulada: “Os Sete

Saberes Necessários à Educação do Futuro (2000)” destaca a condição humana

(reflexão) e suas relações (social) como um objeto essencial para todo o contexto

do ensino. Concordando com as reflexões de Morin (2000), somos culturais, mas

precisamos refletir que somos também míticos, psíquicos, físicos, imaginários na

Interações humanas

Práticas

Pedagógicas

Docentes

Page 27: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

26

ideia de “multidimensionalidade do ser” um princípio fundamental a ser

considerado na construção do fazer pedagógico para além das questões

didáticas, técnico - científicas e formativas.

Ainda sobre as reflexões de Morin (2000), as interações humanas

consistem em compreender não só os outros, mas a si mesmo, bem como

entender o ser humano como parte essencial da construção da sociedade e vice-

versa.

Com mudanças significativas acontecendo na sociedade

contemporânea, o ato de olhar para os processos educativos e

consequentemente, para o espaço escolar e seus territórios não podemos

desconsiderar a centralidade dessas relações e seus impactos no exercício

docente traduzido por vezes no fazer pedagógico.

Contudo e alinhado a essa perspectiva, a prática pedagógica das aulas

de Educação Física, que já foi identificada pelo controle, rigidez e colaboração

na dita “produção de corpos dóceis e saudáveis” para o mercado de trabalho,

hoje transita por intenções renovadas voltadas para o espaço escolar e suas

relações estabelecidas no trânsito desse espaço (Betti, 1991; Coletivo de

Autores, 1992).

Diante disso, identificamos no componente curricular de Educação

Física no espaço escolar uma maior representatividade na atualidade, centrada

em relações mais amplas que compreendem a importância da organização bem

como problematização dos diversos aspectos associados aos elementos da

cultura corporal.

Portanto, nas reflexões de Morin (2000) não basta ter um modelo

educacional baseado apenas na técnica e/ou na racionalidade, pois a educação

deve ter o papel fundamental centrado nas humanidades, que enriquece nosso

destino e dos outros.

Distante de definições que destacam perspectivas e/ou abordagens

curriculares, em torno do componente curricular de Educação Física, essa

construção capitular evidencia, de forma sucinta, aspectos e transformações

relevantes com potencial de impactar a esfera profissional docente definindo,

inclusive, contornos e significados identitário.

Page 28: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

27

4. A IDENTIDADE DOCENTE E SEUS CONTORNOS PROFISSIONAIS

A identidade, distante da característica do que é idêntico, é

compreendida como um conjunto de características no ser humano, que

distinguem, de certa forma, uma pessoa da outra e por meio das quais é possível

individualizá-las.

Embora a ideia de identidade venha sendo tratada ao longo da história

de diversas formas, a modernidade possibilitou o rompimento com o passado

bem como o surgimento de uma nova e decisiva forma de individualismo, que

por sua vez permitiu uma nova concepção do sujeito individual e de sua

identidade (Silva, 2009).

Segundo Hall (2006), a concepção de identidade atualmente sinaliza

para uma identidade móvel, inacabada em franco movimento e construção,

distante inclusive da ideia de algo fixo (como no passado) naturalizado

principalmente pelos princípios biológicos e amparados por uma sociedade de

certa forma reguladora, considerando:

“[...] A identidade torna-se então uma “celebração móvel” formada e transformada continuamente em relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam. É definida historicamente e não biologicamente. O sujeito assume identidades diferentes em diferentes momentos, identidades que não são unificadas ao redor de um “eu” coerente [...]” (HALL, 2006, p. 13).

A construção indenitária depende sempre do retorno de informações

propiciadas dos outros. Há sempre muitas identidades que nos atravessam, tais

como a pessoal, a familiar, a social, a profissional e assim por diante, na verdade

o que muda é o sistema de representações ao qual nos referimos e diante do

qual ocorre nosso reconhecimento que pode ser simbólico e por vezes

inconsciente.

A identidade não é uma essência: não é um dado ou um fato, seja da

natureza, seja da cultura. A identidade seguramente não é fixa, estável, coerente

e unificada, permanente. A identidade tampouco é homogênea. Por outro lado,

a identidade é uma construção:

Page 29: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

28

“A afirmação "sou brasileiro", na verdade, é parte de uma extensa cadeia de "negações", de expressões negativas de identidade, de diferenças. Por trás da afirmação "sou brasileiro" deve-se ler: "não sou argentino", "não sou chinês", "não sou japonês" e assim por diante, numa cadeia, neste caso, quase interminável [...]” (SILVA, 2008, p. 75).

Tão logo, o processo de profissionalização docente atrelado à

constituição de sua identidade, ganha contornos definitivos no espaço escolar

na medida em que os questionamentos sobre o ensino e a aprendizagem

buscam compreender processos não mais centrados exclusivamente na

aprendizagem, mas também no ensino.

Morgado (2011) e Flores (2014) consideram que o conceito de

profissionalidade docente inclui, o entendimento de como os docentes se situam

e agem no contexto de trabalho, forjando uma identidade que tanto afeta como

é igualmente afetada por esse contexto. Assim, esses autores concordam que o

contexto de trabalho é fundamental para a constituição de profissionalidade

docente.

A profissionalização docente opera a partir da adesão coletiva (implícita

ou explícita) de um conjunto de normas e de valores. No princípio do século XX,

este é alimentado pela crença generalizada nas potencialidades da escola e na

sua expansão ao conjunto da sociedade.

Para Morgado (2011) a docência deve ser vista como uma profissão que

não tem encontrado o necessário reconhecimento social como agente de

mudança, e a importância atribuída à escola depende, basicamente, da

autonomia curricular a ser construída pelo corpo docente em relação aos

seguintes aspectos: competência profissional, identidade profissional e

profissionalidade docente.

Já os principais dilemas apontados por Nóvoa (1995) na década de 90

estavam direcionados a retomada de um processo legitimador da docência.

Pautado inclusive na existência de uma brecha entre a visão idealizada e a

realidade concreta do ensino. Outro dilema está pautado nos desafios frente ao

distanciamento dos interesses exclusivamente mercadológicos presentes,

destacando a necessidade de adesão a novos valores. Tal afirmação ganha

novos significados, pois apesar de certa distância do impacto da ocorrência

Page 30: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

29

social apresentada por Nóvoa (1995), seus apontamentos são de grande

relevância na contemporaneidade do cenário educacional.

A adesão a novos valores pode facilitar a redução das margens de

ambiguidade que afetam a profissão. Não mais como doutrinador, mas sim como

mediadores, não mais o único agente cultural das relações, mas sim um

compartilhador integrado a um grupo representado no seu exercício profissional

(Nóvoa, 1995)

Certamente a função escolar na atualidade está confusa e com isso tem

suas expectativas reduzidas. Diante desse cenário a figura do professor como

agente da representação social encontra-se literalmente localizado no “olho do

furacão” termo muitas vezes evidenciado pelo educador português Rui Canário

(2006) que destaca, inclusive, o ambiente escolar com um espaço de promessas

e incertezas.

Nóvoa (1999) reconhece que a atividade docente é um processo de

construção social e que apesar das inevitáveis lutas e conflitos, tem-se

construído em torno de duas dimensões básicas: a organização de um conjunto

de normas e valores orientadores do exercício da atividade docente e a

construção de um corpo de conhecimentos e de técnicas específicas da

profissão.

Nesse contexto, a identidade profissional dos docentes pode ser vista

como uma construção social na qual participam múltiplos fatores que interagem

continuamente entre si, resultando numa série de representações por meio das

quais os professores estabelecem, consciente e inconscientemente, diversas

negociações (SILVA; JUNIOR, 2019).

As identidades sociais e profissionais típicas, não são nem somente as

expressões psicológicas de personalidades individuais nem somente os

produtos de estruturas ou de políticas econômicas impostas lá do alto. Elas são

construções sociais que pressupõem a interação entre as trajetórias individuais

e os sistemas de emprego, trabalho e formação (Dubar, 1996).

Para o sociólogo e psicólogo clínico Italiano Alberto Melucci (2004),

quando falamos de identidade, três elementos estão sempre presentes: a

continuidade de um sujeito, apesar das variações no tempo e das inevitáveis

Page 31: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

30

adaptações ao meio ambiente; a delimitação desse sujeito em relação aos

demais; e a capacidade de reconhecer-se e de ser reconhecido.

A identidade se constitui nas relações sociais, pois nossas ações não

são o simples reflexo dos nossos vínculos exclusivos biológicos e ambientais,

são produções simbólicas de sentidos que, ao serem reconhecidas por nós

mesmos, se tornam nossa propriedade e possibilitam a troca com os outros de

forma compartilhada (Melucci, 2004).

À medida que os discursos pedagógicos e sociais acentuam o papel dos

professores em relação à prática pedagógica, verifica-se que os discursos

atribuem aos docentes uma hiper-responsabilidade tanto em relação à prática

pedagógica como em relação à qualidade de ensino. Essa situação reflete um

sistema escolar centrado na figura do professor como condutor dos processos

institucionalizados de educação (Silva, 2009).

A participação do sujeito em ambientes coletivos é fundamental na

construção das identidades profissionais. Algumas mudanças sociais como a

implantação da industrialização e a universalização da educação, provocando o

rebaixamento salarial e a descaracterização do status docente, transformaram

radicalmente a identidade docente pautada tradicionalmente na imagem de

sacerdócio, mudando-a para educadores de ensino e posteriormente os

trabalhadores da educação (Silva, 2009).

Concordando com Nóvoa (1999), certo da atualidade de suas reflexões,

no apontamento que evidencia que ao olharmos para a história verificamos que

nunca a fragilidade associativa dos professores foi tão grande, o que não deixa

de ser preocupante. A profissionalização dos professores está dependente da

possibilidade de construir um saber pedagógico que não seja puramente

instrumental. Por isso, é natural que os momentos de produção de um discurso

científico em educação sejam, também, momentos de afirmação profissional.

Certo da presença do discurso pedagógico que acentua o papel social

do professor e da instituição, por vezes, os docentes são “invisibilizados” e com

isso não são representados na centralidade e amplitude necessária. Então,

mesmo diante de diversos contornos em torno de sua constituição identitária e

associada à sua profissionalização, torna-se fundamental e igualmente

Page 32: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

31

necessário fomentar espaços de escuta acolhedores dentro dos contextos e

territórios educacionais emergentes.

5. CARTAS PEDAGÓGICAS: DIÁLOGOS CORRESPONDENTES

Em todos os tempos, entre diferentes povos, culturas e classes sociais,

escrever e receber cartas significou (e significa) um gesto amoroso e de gratidão

entre as pessoas. Isto é escrever cartas sempre foi uma forma de se comunicar

(Camini, 2012).

Cartas, enquanto recursos pedagógicos, já foram utilizadas por Paulo

Freire há muitos anos no Brasil e no mundo. As cartas e seus livros cartas eram

uma maneira de dialogar, inclusive, com os seus alunos e possíveis leitores

(Paula, 2018).

No caso de Paulo Freire chama a atenção à quantidade de cartas

recebidas por ele depois do exílio. O assédio missivista foi tão grande que por

maior esforço que ele fizesse, não dava conta de responder tudo. É óbvio que

essa expansão das missivas recebida por ele se deu em razão da divulgação do

seu trabalho pelo mundo (Coelho, 2011).

As Cartas Pedagógicas consistem, em linhas gerais, no fomento

dialógico por intermédio de produções alinhadas a livre reflexão de quem as

produz estimuladas por fases, via cartas, sempre no intuito de ampliar a

compreensão e estimular o diálogo sensível frente ao que se tematiza. Uma carta

só terá cunho pedagógico se seu conteúdo conseguir interagir com o ser

humano, comunicar o humano de si para o humano do outro, provocando este

diálogo pedagógico (Camini, 2012).

A carta é um documento, peça para o diálogo, prosa, comunicação mais

direta, coloquial, direcionada a um interlocutor. Há nelas um sentido, ao mesmo

tempo, objetivo e subjetivo, coloquial e formal, prosaico e poético. No âmbito da

troca de informações e de saberes, as epístolas pressupõem mais diretamente

uma relação entre o eu e o outro (Moraes; Paiva, 2018).

Page 33: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

32

É relevante nos perguntarmos qual o objetivo de escrever cartas

pedagógicas, pois, toda escrita é um discurso e, assim, tem uma

intencionalidade. Uma carta pedagógica, certamente quer iniciar um diálogo

sobre o que se decidiu provocar, portanto, qual a diferença de uma carta

pedagógica para carta convencional? A resposta é que a carta pedagógica tem

dois elementos que uma carta convencional não tem: deseja produzir

conhecimento e tem uma postura política. Isso é o que diferencia a carta

pedagógica. Portanto, nesse contexto, a carta é pedagógica porque é política, e

é política porque é pedagógica. A reflexão compartilhada pelo remetente

estimula uma nova prática do receptor, ou uma nova reflexão, que é devolvida

ao remetente. É o diálogo se fazendo no vai e vem dos textos (Paulo; Dickmann,

2020).

Diante do pressuposto, destacamos que a gênese das cartas

pedagógicas, aqui referenciadas, ganham definitivos contornos no movimento

denominado Educação Popular, que tem no educador brasileiro Paulo Freire uns

dos seus mais destacados representantes. É importante salientar que Educação

Popular não se trata de uma educação informal ou de educação que acontece

nas comunidades. Ao falar em popular, dialogando com Freire, nos remetemos

à Educação Popular enquanto atividade teórico-prática coletiva na busca da

libertação. Isto é, educação como processo de humanização (Paulo, 2020).

A Educação Popular objetiva a formação de sujeitos com conhecimento

transformador. Assim, conscientização e organização do trabalho político-

pedagógico são inerentes ao processo de humanização com vistas à

transformação social. A Educação Popular está comprometida com o

desenvolvimento do ser humano em sua totalidade, entendendo a educação com

sentido amplo (Paulo; Dickmann, 2020).

Sabemos que o paradigma predominante da Educação Popular

brasileira nos anos 70/80, foi um conjunto de ideias políticas, filosóficas e

pedagógicas que nasceu com os Movimentos de Educação de Base e Cultura

Popular no final dos anos de 1950 e início de 1960 (Gohn, 2017). Nas décadas

de 1970 e 1980 o movimento de Educação Popular foi essencial para a

construção dos referenciais que predominaram nas atividades de formação dos

movimentos sociais que se consolidaram na época.

Page 34: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

33

Toda carta pedagógica tem seu início na história de vida e na realidade

de quem escreve. Em outras palavras, escrevemos a partir do que vivemos e de

onde vivemos. Logo, uma carta pedagógica sempre expressará vida. Embora

óbvio, este elemento, ele nos ajuda a compreender a dimensão humana

concreta das cartas em suas linhas (Paulo; Dickmann, 2020).

No entanto, a temática central desse estudo, alinhada às reflexões do

educador Paulo Freire e o seu modo de escrever cartas, foram inspirados, a

priori, e principalmente nas obras do autor intituladas: “Cartas à Guiné-Bissau:

registros de uma experiência em processo”, “Cartas a Cristina, reflexões sobre

minha vida e minha práxis” e “Professora sim, tia não: cartas a quem ousa

ensinar”.

Cartas a Guiné-Bissau de 1978, contém correspondência dirigida a

Mário Cabral e aos companheiros dele. Nos dois casos Paulo Freire não queria

se dirigir meramente a uma pessoa específica, mas além da comunidade de

Guiné Bissau, queria provocar a reflexão dos educadores de todo o mundo.

Embora se dirija a uma pessoa historicamente existente, as cartas também

foram publicadas (Coelho, 2011).

Na minha primeira carta já lhe havia expressado o desejo de todos nós de trabalhar com vocês, de dar a nossa contribuição, por mínima que seja, à busca em que necessariamente se encontram de uma nova prática como de uma visão da educação, que responda aos objetivos que a Guiné-Bissau, em processo de recriação, exige [...] (FREIRE, 1978, p. 86).

As cartas consistem em instrumentos poderosos de comunicação, pois

possibilitam um canal direto entre o remetente e o destinatário, no qual o emissor

tem a possibilidade de transmitir e construir a sua mensagem de forma completa,

sem ser interrompido, o que acreditamos ser sua maior característica no sentido

de viabilizar reflexões mais profundas, talvez uma espécie de “conversa” com

nós mesmos (Portal, 2013).

A leitura de suas obras nos permite amadurecer conceitos como a

necessidade de uma educação a partir de uma perspectiva mais crítica e

autônoma, para a formação de sujeitos capazes de transformar política e

socialmente suas realidades, em outras palavras objetiva empoderar os sujeitos,

tornando-os mais ativos e conhecedores de seu papel diante da história.

Page 35: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

34

Então, se concebemos a educação enquanto humanização, em uma

perspectiva de mudança da realidade, relaciona-se a uma proposta pedagógica

que vislumbre um mundo mais humanizado consideramos as reflexões de Paulo

Freire extremamente atuais centradas no diálogo. A propósito, é bem provável

que não encontremos nenhuma obra de Paulo Freire que não tenha como

centralidade o diálogo nas suas diversas facetas e a busca da mais acessível

comunicabilidade (Coelho, 2011).

As cartas pedagógicas oportunizam aos seus leitores e leitoras uma

visão dinâmica das atividades desenvolvidas e a reflexão de alguns problemas

que elas suscitam, as cartas recolocam a educação no espaço do coloquial e do

afetivo (Freire, 2003).

Contudo, analisando o conceito de educação de Paulo Freire (2003),

temos a pedagogia como humanização, pois Freire também se utilizou do

recurso de cartas, destinadas à sua sobrinha Cristina. Essas cartas foram, para

ele, o fortalecimento do vínculo familiar alicerçado na escrita de si o que

evidencia a amplitude desse recurso.

Paulo Freire abordava questões que considerava fundamentais e

relaciona as dimensões pessoais ao contexto histórico vigente, porém em Cartas

a Cristina embora se dirigindo a uma pessoa real (sua sobrinha) ele, na verdade

dirigia-se ao mundo, como exposto:

Cheguei Cristina, ao fim do primeiro momento destas cartas a você. Está é por min mesmo, uma carta de transição entre as que, atendendo a sua solicitação inicial. falei preponderantemente de mim. De mim menino, de min jovem, de min homem. Ou também em torno de mim, de como penso, de como submeto sempre minha prática a uma reflexão teórica, de como, se martirizar-me e punir-me, procuro ser coerente [...] (FREIRE, 2019, pág. 226).

Ao exemplo apresentado na obra “Cartas a Cristina, reflexões sobre

minha vida e minha práxis”, nitidamente, Paulo Freire se volta para aspectos

profundos com a intenção de analisar crítica e filosoficamente sua própria vida,

como sujeito de forma liricamente realista, em seu tempo histórico endereçado

a sua sobrinha Cristina, atendendo sua solicitação (Freire, 2019).

À ideia de perscrutar, fuçando os “segredos” do remetente; uma dada

missiva, direcionada ao destinatário específico, mas que passa a se tornar

Page 36: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

35

pública, intencionalmente de domínio geral, assume certa configuração de “Carta

Pedagógica” (Moraes; Paiva, 2018).

Dentre as referências literárias, intermediadas pela pedagogia da

dialogicidade de Paulo Freire destacamos também a obra “Cartas a Guiné-

Bissau registros de uma experiência em processo”, como um marco significativo

na compreensão de tal perspectiva, estimulando o diálogo reflexivo e sensível

dotado de franca intencionalidade libertadora.

Já na obra intitulada: “Professora sim, tia não: cartas a quem ousa

ensinar” Paulo Freire utiliza o gênero literário carta, enumerando-as em dez,

revelando mais uma vez seu compromisso ético-político, sempre acompanhado

de uma delicadeza pouco comum no meio acadêmico. Nele, a razão crítica está

aliada ao desejo, às emoções, aos sentimentos, mas nem por isso se mostra

menos exigente, não havendo dicotomia entre razão e emoção (Coelho, 2011).

Nos apontamentos de Coelho (2011) em “Professora sim, tia não:

cartas a quem ousa ensinar”, identificamos cartas endereçadas “a quem ousa

ensinar” nas quais, Paulo Freire põe acento à questão política, nos alerta para o

risco da acomodação fatalista em que muitos de nós, educadores, nos

instalamos e afirma:

Esta é na verdade a posição mais cômoda, mas é também a posição de quem se demite da luta, da História. É a posição de quem renuncia ao conflito, sem o qual negamos a dignidade da vida. Não há vida nem humana existência sem briga e sem conflito. O conflito parteja nossa consciência. Negá-lo é desconhecer os mais mínimos pormenores da experiência vital e social. Fugir a ele é ajudar a preservação do status quo (FREIRE, 2003, p. 64).

Esse instrumento vai além, proporciona mais do que possíveis

indicadores, favorece momentos de reflexão, tanto de quem elabora a escrita

como de quem faz a leitura, provocando a análise sob diferentes olhares e

perspectivas de quem escreve a quem se destina (Portal, 2013).

O uso de cartas a partir da análise de trechos delas, procura dar ênfase

às narrativas que tratam do cotidiano, no qual estão descritas/representadas

situações vivenciadas no dia-a-dia, destacando os significados atribuídos e

sinaliza que seu uso contribui pelo seu caráter espontâneo, levando a uma leitura

Page 37: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

36

muito mais rica em detalhes que favorece uma análise detalhada do cotidiano

(Cunha, 2008).

O gênero carta, é dialógico e pedagógico (dialogicidade) na sua própria

natureza. A escrita em forma de carta ou por meio do gênero carta nos leva a

um envolvimento pessoal em nossas relações com os outros, certamente um

convite permanente ao diálogo (Coelho, 2011).

Portanto as cartas consistem em instrumentos poderosos de

comunicação, pois possibilita um canal direto entre o remetente e o destinatário,

no qual o emissor tem a possibilidade de transmitir e construir a sua mensagem

de forma completa, sem ser interrompido. A troca de cartas possibilita um diálogo

mediado pela escrita, permitindo levantar questões, esperar respostas,

prolongar a compreensão de uma noção de um texto, até o mais profundo de si

mesmo (Brandão, 2005).

Poetizar saberes referente a este terreno significa tornar esses saberes

mais leves e instigantes para todos aqueles que buscam inspirações para suas

intervenções cotidianas como educadores, seja no papel de professores, pais,

representantes políticos dentre outros (Moraes; Paiva, 2018).

Nessa direção, Paulo Freire, então secretário de educação da cidade de

São Paulo, no governo de Luiza Erundina, propõe a carta como um dos meios

importantes para manter o diálogo entre ele, equipe de trabalho e educadores.

Podemos observar, em linhas gerais abaixo, que ele (Paulo Freire) não se coloca

no centro da comunicação, informando que as cartas poderiam e deveriam ser

escritas também por outros educadores e educadora (Coelho, 2011):

Page 38: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

37

(Figura 04– D.O.M.; São Paulo, 34 (021), 1º fev. 1989 – Suplemento p, 03)

Cartas Pedagógicas, mais que uma ferramenta de caráter formativo ou um

instrumento de comunicação, é um convite a uma “pedagogia correspondente” mais

sensível, humana, engajada ética e politicamente.

Portanto, nesse estudo faremos o uso metodológico de Cartas Pedagógicas,

pautadas principalmente na produção intelectual do educador brasileiro Paulo Freire,

com a intencionalidade de fomentar a criação de espaços de escuta mais acolhedores

no exercício dialógico correspondente com os docentes.

Page 39: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

38

Diante disso, e para o contínuo investigativo do estudo, objetivando a produção

das cartas, é necessário reconhecer os contornos dos contextos que envolvem os

saberes articulados de seus artífices no fazer (ato) pedagógico.

6. PROCESSOS METODOLÓGICOS: ESCOLHAS E CONSTRUÇÃO DO

PERCURSO

O processo metodológico como um todo, é uma escolha de grande

relevância para realização da maioria dos estudos. É o processo metodológico

que dá forma, ao definir limites e possibilidades, sua escolha deve ser, sempre

que possível, a mais adequada em relação ao que se propõe investigar.

Nessa direção, o estudo aqui apresentado é de cunho qualitativo, pois

esse tipo de pesquisa, em linhas gerais, envolve uma abordagem interpretativa

do mundo por tratar de questões que se relacionam com singularidades no que

tange a compreensão das experiências humanas.

Contudo, é importante destacar que o tipo de pesquisa aqui escolhida,

representada neste exemplar, se relaciona com o propósito da investigação

envolvendo os docentes do componente curricular de Educação Física no

espaço escolar (territórios) na medida em que as inquietações vão sendo

reveladas e metodologicamente conduzidas.

Ao realizar a investigação científica, através da abordagem qualitativa,

não se investiga em razão de resultados, mas para construir e obter a

compreensão do comportamento a partir da perspectiva dos sujeitos da

investigação, correlacionado com o contexto de que fazem parte (Bogdan;

Biklen, 1994).

A finalidade desse tipo de pesquisa é a capacidade de gerar teoria,

descrição ou compreensão, busca-se compreender o processo mediante o qual

os agentes constroem significados sobre o tema a ser investigado. A abordagem

pressupõe que o mundo seja examinado com a ideia de que nada é trivial, que

tudo tem potencial para construir pistas que nos permita estabelecer uma

compreensão mais esclarecedora do nosso objeto de estudo (Bogdan; Biklen,

1994).

Page 40: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

39

O termo qualitativo implica uma partilha densa com pessoas, fatos e

locais que constituem objetos de pesquisa, para extrair os significados visíveis e

latentes (não aparentes) que somente são perceptíveis a uma atenção sensível

os significados do seu objeto de pesquisa (Chizzotti, 2003).

Logo, a evolução histórica da pesquisa qualitativa, com todas as

questões e tensões ainda sobre restantes e inovações crescentes, têm sido

sintetizadas por diversos autores (Erikson, 1986; Kirk, Miller, 1986; LeCompte,

Millroy, Preissle, 1992; Bodgan e Biklen, 1994; Denzin e Lincoln, 2000; Vidich e

Lyman, 2000), que resumiram as transformações e progressos nas ciências

humanas e sociais demarcando os momentos mais significativos de seu

desenvolvimento (Chizzotti, 2003).

Por questões conceituais a pesquisa qualitativa é em si mesma, um

campo de investigação. Ela atravessa disciplinas, campos e temas. Em torno do

termo pesquisa qualitativa, encontramos uma família interligada e complexa de

termos, conceitos e suposições. Certo de que a pesquisa qualitativa em uma

proposta mais contemporânea é uma atividade situada que localiza o observador

no mundo. Consiste em um conjunto de práticas materiais e interpretativas que

dão visibilidade ao mundo (Denzin; Lincoln, 2006).

O campo da pesquisa qualitativa se caracteriza por um embaraço de

opções, pois nunca houve tantas estratégias de investigação, tantos paradigmas

ou métodos de análise para serem utilizados pelos pesquisadores que configura

certamente um momento de descobertas e redescobertas (Denzin; Lincoln,

2006).

Esse tipo de pesquisa, como um conjunto de atividades interpretativas,

não privilegia nenhuma única prática metodológica em relação à outra. É difícil

definir claramente a pesquisa qualitativa como um terreno de discussão ou de

discurso. Ela não pertence a uma única disciplina nem possui um conjunto

distintos de métodos ou práticas que seja inteiramente seu.

A pesquisa qualitativa é um campo interdisciplinar, transdisciplinar e, às vezes, contra disciplinar, que atravessa as humanidades, as ciências sociais as ciências físicas. A pesquisa qualitativa é muita coisa ao mesmo tempo. Tem um foco multiparadigmático [...] (DENZIN; LINCOLN, 2006, p. 21).

Page 41: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

40

A competência da pesquisa qualitativa é, portanto, o mundo da

experiência vivida, pois é nele que a crença individual, a ação e a cultura

entrecruzam-se e representa muitas coisas para muitas pessoas, pois a

pesquisa qualitativa é uma atividade situada que localiza o observador no mundo

(Denzin; Lincoln, 2006).

Contudo, a pesquisa qualitativa, em seus diferentes tipos, tem se

ampliado consideravelmente no Brasil. Principalmente a partir dos anos 1980,

diversos tipos de investigação qualitativa têm contribuído para o maior

conhecimento da escola, desde as políticas educacionais até as práticas

educativas cotidianas da sala de aula (EUGENIO; TRINDADE, 2017).

Nesse estudo, parte do problema consiste em viabilizar elementos com

a potencialidade de revelar, sobretudo, o processo reflexivo do percurso docente

que se misturam e se intercruzam entre a dimensão pessoal e profissional.

Para atender a essa justificativa em comunhão com a problemática

destacada, foi escolhida como estratégia metodológica à produção de Cartas

Pedagógicas, por reconhecer a singularidade de sua construção, presente nas

narrativas que compõe o gênero bem como sua potencialidade frente à

correspondência docente gerada no que diz respeito à composição do seu (ato)

fazer pedagógico.

Apropriado à análise dessas narrativas, é importante considerar a

inserção do pesquisador no campo de pesquisa e o cenário pesquisado como

componentes analíticos e por isso, as descrições devem ser densas e

interpretativas, uma das funções do pesquisador qualitativo está em interpretar

os fenômenos em termos dos significados que as pessoas a eles conferem

(Denzin; Lincoln, 2006).

Ao considerar as narrativas, elas não só nos fornecem histórias

individuais, mas também, uma ideia de coletivo, pois estrutura e ação se fazem

presentes no ato em que a trajetória do indivíduo é reconstruída no ato de narrar.

Essas narrativas podem ser consideradas como representações ou

interpretações de uma história, no qual não se deve julgar como um relato

verdadeiro ou falso, que não permite sua comprovação, pois são caracterizadas

Page 42: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

41

por expressar a verdade sobre um ponto de vista em seu determinado contexto

de tempo e espaço (Muylaert et al, 2014).

A narrativa nos permite essa troca, esse ouvir o outro em suas

experiências na verdade as narrativas são infinitas em suas variedades, e nós

as encontramos em todos os lugares. Não há experiência humana que não

possa ser expressa na forma de uma narrativa (Jovchelovitch; Bauer, 2015).

O exercício narrativo pode significar inclusive um reencontro reflexivo

sobre teoria e prática no cotidiano docente. No entanto, distante da crença em

que os docentes não refletem sobre sua prática pedagógica, o que seria um

apontamento inoportuno para natureza do estudo e sem elementos tangíveis

para justificar tal afirmação.

Certamente, temos a clareza de que a produção das Cartas

Pedagógicas aqui apresentadas, de certa forma com características singulares,

estimuladas pela correspondência é o que certamente vai diferenciar esse tipo

de produção de outros, mas com características aproximadas.

Diante disso, como escolha metodológica e o reconhecimento do cenário

com um todo, o que certamente define um potencial significativo para análise e

melhor compreensão por intermédios da estratégia de produção viabilizada por

intermédio das cartas pedagógicas.

7. PRODUÇÃO DE DADOS: ACESSO AO CENÁRIO COMO ESCOLHA

METODOLÓGICA

A importância do reconhecimento parcial de um cenário de maior

amplitude (lócus da pesquisa), para melhor compreensão dos elementos

constituintes do estudo, foi considerada de grande relevância, sobretudo para

escolha intencional dos participantes e condução sincrônica do estudo.

Todavia, o reconhecimento desse espaço, mesmo amparado por

instrumentos que auxiliam de forma direta o levantamento dos dados seu

resultado pode ser considerado como algo transitório, visto inevitável velocidade

Page 43: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

42

que estão sujeitas às transformações de diversas ordens (social, política,

funcional dentre outras) de impacto reorganizador do cenário apresentado.

Diante disso, apresento um cenário perceptivo e claramente reconhecido

pelos seus aspectos transitórios mencionados anteriormente, mas que no

momento da pesquisa foi de grande importância para o estudo, apresentado na

esfera qualitativa.

Situado no litoral sul de São Paulo e integrante da região metropolitana

da baixada santista, o município de Itanhaém localiza-se entre os municípios de

Mongaguá e Peruíbe. O atendimento do ensino fundamental no município de

Itanhaém tem sido oferecido nas três redes de ensino: estadual, municipal e

particular.

No município de Itanhaém está em funcionamento um total de 48

(quarenta e oito) unidades de ensino com atividades destinadas a educação

básica, sendo 08 (oito) estaduais, 31 (trinta e uma) municipais e 09 (nove)

particulares3 Contudo, interessa a esse estudo somente o cenário referente à

rede municipal de ensino, e consequentemente os docentes do componente

curricular de e Educação Física presentes no quadro estatutário vigente.

Com o propósito de compreender um pouco mais sobre os docentes, em

perspectiva mais estendida elaborou-se um formulário digital (apêndice C) com

perguntas direcionadas a aspectos sociodemográficos e profissionais dos

docentes. O procedimento para acessar os docentes da disciplina de Educação

Física exclusivamente do município de Itanhaém nessa primeira fase do estudo

respeitou os seguintes critérios e procedimentos:

1- Posse da declaração de responsabilidade institucional (anexo 03);

2- Submissão aprovação da pesquisa pelo Comitê de Ética (anexo 04);

3- Elaboração TCLE digital em duas fases, aceite e acesso (apêndice A);

3 . Dados obtidos no último censo escolar registrado no plano municipal de educação de Itanhaém LEI Nº 4.027, de 02 de julho de 2015. Sujeitos a alterações bem como atualizações em todas as esferas administrativas supracitadas.

Page 44: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

43

4- Comunicação com a assessora pedagógica via departamento, em auxílio

disparador do questionário por intermédio do e-mail institucional vigente das

unidades no período da produção (dados coletados).

Destaco que anteriormente a solicitação enviada à assessora

pedagógica, a responsável foi devidamente esclarecida sobre a autorização

institucional concedida e da não obrigatoriedade, associada às questões

laborais do cargo, assegurando aos docentes participantes desta fase do estudo

o caráter facultativo da colaboração.

Portanto, para o início dessa fase da produção dos dados amparado no

parecer número: 4.052.650 do CEP (Comitê de ética e pesquisa) CAAE

31326620.5.0000.0089, AMC Serviços Educacionais S/C Ltda. Instituição

Proponente, o estudo pode ser conduzido dentro das perspectivas e dos limites

apresentados.

Os docentes receberam o questionário via e-mail (institucional) por

intermédio da ferramenta digital intitulada Google Formulários4, com anuência

do departamento responsável respeitando todos os procedimentos legais e

termos de livre esclarecimento para cada etapa do processo.

No decorrer do estudo e da produção dos dados, nenhuma reclamação

foi registrada, dando seguimento ao estudo conforme planejado. Como princípio

metodológico, para o entendimento parcial do cenário e de seus representantes

essa primeira fase do estudo buscou compreender a relação do todo dentro de

um contexto em auxílio direto a escolha individual dos participantes destinados

à segunda fase.

Os participantes receberam o questionário via e-mail (institucional) e/ou

aplicativos de mensagens. As participações dos docentes convidados foram

estimuladas inclusive com o auxílio de “grupos virtuais” dentro de aplicativos

organizados para um corpo de professores e professoras destinado ao

componente de Educação Física.

Ao receber os dados, em análise posterior, constatou-se que a rede

municipal contava no momento com aproximadamente 38 (trinta e oito)

4 Formulário disponível no domínio https://forms.gle/XQwvQTPAMJ4Dt5Rr7

Page 45: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

44

professores em efetivo exercício de Educação Física no contexto escolar até a

data da produção desses dados.

Um pouco mais da metade desse total, mais precisamente 55%, dos

docentes, responderam ao questionário nessa primeira fase, lembrando que a

participação foi facultativa, como comunicada no TCLE (apêndice A) que

antecede o acesso direto do participante ao questionário.

Entretanto, identificamos que a rede conta com a presença de um

número maior de docentes de Educação Física para além da média

contabilizada, devido aos afastamentos e funções gratificadas dentre outros

aspectos que se distanciam das relações com o espaço escolar e seus territórios

que por escolha e coerência interna do estudo foram desconsiderados para o

recorte.

Temos a clareza de se tratar de um recorte simples não sendo possível,

nesse momento, creditar as respostas tabuladas ao “espelho” da rede muito

menos de seus docentes com exatidão. Contudo as informações aqui

registradas declaram à constituição de um perfil diversificado e de relevância

para a escolha individual (segunda fase) em atendimento aos propósitos deste

estudo.

Diante do exposto, e passado exatos dois meses em posse dos dados

produzidos, foi possível tecer algumas linhas transitórias sobre os resultados,

até o momento da produção desses dados consideramos que:

O perfil dos docentes que responderam ao formulário é representado em

sua maioria pelo gênero masculino (61%), grande parte dos participantes se

reconhece (raça) branca (59%), com primeira e única formação de nível superior

concluída, na maioria dos casos, entre os anos de 2003 a 2005.

Dos participantes a grande maioria possui pós-graduação em nível “lato-

sensu” especialização (70%), curiosamente em pedagogia, no entanto poucos

apresentam formação complementar nível “stricto-sensu” (mestrado) e até o

momento nenhum em nível de doutorado completo até o momento.

Os docentes apresentam experiência média superior a 10 (dez) anos em

efetivo exercício no ambiente escolar, sendo a maioria com atuação, nesse

Page 46: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

45

momento, nas séries iniciais do ensino fundamental (1º ao 5ª ano) com cargas

horárias de trabalho equilibradas e as maiorias distribuídas entre 20h e 30h

semanais.

Uma parte significativa dos docentes não possui acúmulo de cargo ou

função gratificada extra ao serviço público. A maioria dos participantes (95%),

sempre que possível declara apresentar disponibilidade para frequentar eventos

de formação continuada de diversas naturezas teórica, prática e se necessário

à distância.

No que tange às referências acadêmicas (formação) muitos apontaram

influências de autores conhecidos (destacados na área da Educação Física no

ambiente escolar), tais como: Mauro Betti, João Batista Freire, Suraya Darido,

Marcos Garcia Neira e Go Tani. O que, de certa forma, sinaliza o assentamento

da perspectiva teórica curricular compartilhada entre os territórios de atuação

dos docentes.

Como principal obra, ainda destacam nos dados a presença e influência

dos PCNs (Parâmetros Curriculares Nacionais) de 1997, referência que em

minha opinião, em breve, será superada pela presença da BNCC (Base Nacional

Comum Curricular) bem como o Currículo Paulista de forma normativa.

Os principais blocos temáticos desenvolvidos no fazer pedagógicos

segundo os participantes correspondem aos Jogos e Brincadeiras seguidos dos

Esportes e das Ginásticas. Destaque para o crescimento do bloco abordado

intitulado: Práticas Corporais de Aventura em relação às Lutas e Danças,

certamente ainda nos domínios classificatórios dos parâmetros curriculares

nacionais.

Quanto à organização de registros, a maioria respondeu positivamente

a essa ação, tendo como principais instrumentos: vídeos e fotografias para os

devidos fins. Destaque crescente para a organização dos registros utilizando

“rodas de conversas” elemento apontado por boa parte dos docentes (45%) ao

final das experimentações propostas no cotidiano de sua prática pedagógica.

Ainda sobre a prática pedagógica, a maioria indica o redirecionamento

frequente quando necessário de suas ações didático pedagógico, o que chama

a atenção são os motivos apresentados que estão associados principalmente às

Page 47: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

46

questões climáticas, de espaço e falta de material adequado na maioria dos

casos evidenciados.

Ainda na esteira do fazer pedagógico a maiorias dos docentes (85%)

apontam a utilização de materiais diversificados, no campo das linguagens

audiovisuais, seguido de textos (impressos) com destaque crescente para as

TICs disponíveis (tecnologias de informação e comunicação).

Entretanto, boa parte dos docentes (45%) evidencia que o componente

curricular de Educação Física não ocupa um lugar significativo (espaço de

escuta) em reuniões de conselho de classe e de avaliação interna no espaço

escolar certamente ao olhar para o seu território (individual).

Todavia, uma parte considerável dos docentes (72%) aponta a equipe

gestora (diretores, coordenadores e supervisores) como parceiros frente ao

reconhecimento e apoio dado a legitimidade do componente curricular, o que

parece um tanto incoerente quando comparado com o apontamento anterior

referente a não ocupação de um lugar significativo do componente em

representatividade nas reuniões, conselho de classe e afins no espaço escolar

de seus territórios.

Por fim, dos 23 docentes que responderam o formulário (75%)

encontram-se na maioria das vezes, satisfeitos com o exercício docente e estão

disponíveis para o compartilhamento reflexivo e material do seu fazer

pedagógico com os demais colegas da rede, caso solicitados.

Diante disso, acreditamos que o cenário aqui apresentado, poderá

impactar na produção das Cartas Pedagógicas, pois o contexto social e

formativo docente não deve ser negligenciado na constituição das narrativas,

para o gênero metodológico escolhido nesse estudo.

Portanto, com a produção e breve análise dos dados aqui apresentados,

um importante cenário foi revelado, auxiliando, inclusive, na escolha intencional

dos docentes que construíram suas narrativas por intermédio das Cartas

Pedagógicas como estratégia metodológica, transcorrida na segunda fase do

estudo (escolha individual).

Page 48: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

47

7.1 OS PARTICIPANTES: ESCOLHA INDIVIDUAL

Após a dita primeira fase do estudo (refinamento da escolha individual

dos participantes) como critério de escolha intencional, foi considerado para a

segunda fase quatro participantes, representantes de ambos os gêneros,

efetivos da rede, com mais de cinco anos em exercício no cargo do componente

curricular e dispostos à correspondência.

A escolha individual dos participantes, extraídos do questionário5, foi

somada a elementos empíricos e de ordem pessoal para a definição dos

professores participantes da segunda fase do estudo (produção principal).

No entanto, em franca adequação, referente ao imposto distanciamento

social6, recomendado no combate a pandemia do novo coronavírus (COVID-19)

presente na fase de produção dos dados, foram instituídos os contatos pelos

meios digitais (disponíveis) por intermédio inicial de uma carta convite.

A princípio, tínhamos a intenção de fazer o convite aos docentes

pessoalmente respeitando os horários acordados para a produção das cartas,

no sentido de melhor fomentar e esclarecer o processo da produção em franca

correspondência.

Os participantes convidados para segunda fase do estudo, são

estimados colegas de profissão que ao longo de minha trajetória como docente,

na mesma rede, tive a oportunidade de observar como se relacionavam com a

docência no território escolar por intermédio de algumas (muitas) de suas

práticas, sobretudo, testemunhadas em resenhas despretensiosas em rodas de

conversas, sempre na oportunidade dos encontros muitas vezes promovidos

pela própria rede.

Isto posto, a produção das cartas foram prontamente viabilizadas por

intermédio dos meios digitais (mídias) disponíveis: e- mail, watsapp e google

5 No questionário continham perguntas que associavam a satisfação pessoal no exercício da

função docente bem como a possibilidade de compartilhar experiências e vivências com outros colegas de profissão e com o pesquisador. 6 Protocolos de biossegurança de isolamento social ampliando o período de quarentena em todo

estado pela secretaria da saúde de São Paulo na data vigente do estudo no combate a pandemia do novo coronavírus (COVID – 19).

Page 49: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

48

metting , respeitando o distanciamento social imposto bem como a integridade

da redação de seus respectivos Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

(TCLE) formulados especificamente para segunda fase deste estudo (anexo

apêndice B).

7.2 CAMPOS DISPARADORES: COMPOSIÇÃO E CONEXÕES

INTERPRETATIVAS

Os estímulos contidos na intencionalidade das cartas, denominados aqui

por mera escolha terminológica organizacional de “campos disparadores”, têm

como principal função, ampliar e estimular o diálogo correspondente no

intermédio da produção das Cartas Pedagógicas, divididas em quatro etapas

interconectadas (campos).

Ao considerar que a elaboração dos ditos campos disparadores, deu-se

pelo fato de compreender em reflexão constante (autoanálise) o meu próprio

percurso enquanto docente que se relaciona diretamente com minha pessoa,

meu fazer pedagógico, meus dilemas e desafios e certamente minhas

perspectivas futuras na integridade (composição) reflexiva da docência exercida.

Para melhor esclarecimento é de considerável importância exemplificar,

em linhas gerais, e de forma sucinta, o composto presente na intenção dos

disparadores articulados metodologicamente com o corpo das cartas (texto)

disparadas em correspondência:

Page 50: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

49

(Figura- 04- Elaboração do autor – representação gráfica da conexão entre os

campos disparadores)

1ª campo disparador – PESSOA

Uma importante fase, que consiste em solicitar ao participante a

produção de sua carta de apresentação (autobiográfica), não muito extensa

sobre si, e/ou demais apontamentos se assim desejado pelo participante.

2ª campo disparador – PRÁTICA PEDAGÓGICA

Essa articulação reflexiva solicitou em correspondência uma situação

e/ou prática pedagógica cotidiana, episódica ou generalista (mais ampla) de

escolha pessoal do participante para compor sua narrativa no gênero escolhido

das cartas, nesse momento já amparada pela composição da carta de

apresentação, ou seja, diferente para cada participante, mas com o objetivo

comum.

3ª campo disparador – DILEMAS E DESAFIOS

Interconectado com as etapas anteriores e também, nesse momento,

já sob influência das etapas anteriores, solicitou destaque para os desafios e

Pessoa

Práticas

Desafios

Futuro

Page 51: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

50

dilemas presentes e/ou superados em sua percepção do fazer pedagógico

cotidiano no território de sua ação.

4ª campo disparador – PERSPECTIVAS FUTURAS

Solicitou livres considerações, acerca de suas perspectivas futuras, em

linhas gerais, orientadas da mesma forma pelo diálogo construído nas produções

anteriores de caractere terminal quando relacionada à correspondência.

8. AS CARTAS: REFLEXÕES SINCRÔNICAS CORRESPONDENTES

“Um relato era uma carta que o autor escrevia a si mesmo

para contar coisas que, de outro modo, não poderia descobrir.”

CARLOS RUIZ ZAFÓN

Como produto principal desse estudo, as cartas aqui

compartilhadas representam textualmente o diálogo construído em franca

correspondência com os docentes participantes, seguindo a metodologia de

produção anteriormente exemplificada.

O desenvolvimento dessa etapa, considerando o acesso aos

participantes, desde o envio do primeiro campo disparador, até a análise

colaborativa (último encontro), teve duração média de aproximadamente 35 dias,

com intervalo de uma semana entre um disparador (carta) e outro.

Atentos à natureza do estudo, os colegas participantes, Luiz,

Francislene, Bruno e Thayara tiveram como princípio, o pleno aceite de seus

nomes, identificados nessa produção bem como seus registros (fotos)

compartilhados na composição do produto correspondente.

As cartas seguiram o mesmo ritmo de produção e critério de

correspondência sendo posteriormente (ao término) devolvidas na íntegra aos

seus produtores pelo pesquisador em momento individualizado de encontro.

Faço lembrar que durante o processo de produção, as cartas foram

enviadas de forma separada respeitando o intervalo de produção individual

(média) de uma semana como já mencionado, portanto ao receber uma nova

carta o participante não tinha como editar ou reescrever a produção anterior,

Page 52: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

51

apenas no resgate dos fatos a correspondência recebida estimulada pelo

pesquisador.

Importante destacar, que à medida que os disparadores (cartas) eram

enviados, ao mesmo tempo foi submetida à análise textual discursiva inspirada

nos apontamentos metodológicos contidos nas reflexões de Moraes (2003),

como procedimento sincrônico a correspondência propriamente dita, numa

espécie de “espiral” entre análise e produção. Em outras palavras a análise foi

realizada no mesmo tempo destinado à produção das cartas, assim se

distanciando da reserva de um tempo específico para tal finalidade.

A análise textual discursiva tem como procedimento, a desmontagem

dos textos, com objetivo de examinar os detalhes; o estabelecimento de

relações, ou seja, construir associações entre os elementos do texto.

Corresponde a uma metodologia que pode ser compreendida como um processo

de auto-organizado de construção da compreensão (Moraes; Galiazzi, 2006).

Esse tipo de análise, tem da escrita seu fundamento enquanto

ferramenta mediadora na produção de significados e por isso, em processos

recursivos, a análise se desloca do empírico para a abstração teórica, que só

pode ser alcançada se o pesquisador fizer um movimento intenso de

interpretação e produção de argumentos (Moraes; Galiazzi, 2006).

Ao considerar que a compreensão que os docentes constroem, em

interação com o pesquisador, se articula a projetos, cujo interesse de

investigação se baseia acerca de um aspecto da sua prática profissional. Em

consequência, o papel do pesquisador, no referido projeto colaborativo, se

articula essencialmente em função de balizar e orientar a compreensão

construída durante a investigação (Desgagné, 2007).

Evidentemente que essa posição epistemológica nos remete a uma

concepção do docente, a qual impregna o próprio objeto da pesquisa. De fato,

para fins de investigação, solicitar que os docentes exponham seu ponto de vista

acerca de certo aspecto de sua prática em desenvolvimento, numa proposta de

investigação colaborativa, supõe o reconhecimento e interesse desses

profissionais “competência de ator em contexto”. (DESGAGNÉ, 2007).

Page 53: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

52

Para melhor compor a análise dos campos, de forma integrada, foi

organizada ao término da produção das cartas um encontro individual com cada

participante, por intermédio dos meios digitais, na intenção, sobretudo, de

compartilhar parte da análise interpretativa apresentando ao participante a “carta

síntese” como produto da conexão entre os campos.

A “carta síntese” tem como intenção apresentar aos docentes envolvidos

uma composição interpretativa e poética dos campos produzidos no fomento de

uma análise colaborativa com os produtores das cartas uma vez que na opção

individual do encontro o espaço de escuta para complemento, supressão e/ou

recusa do produto síntese apresentado pelo pesquisador estava aberto e atento

ao diálogo caso necessário.

Dessa maneira, na medida em que as cartas chegavam, os respectivos

campos disparadores foram sendo reduzidos e transformados em textos

menores com informações organizadas com a finalidade de capturar os pontos

mais significativos produzidos na correspondência com o pesquisador.

O último encontro, por escolha metodológica e reflexão sobre os limites

interpretativos da investigação deste estudo, foi solicitado de forma individual a

cada participante com o objetivo de expor maiores detalhes sobre o destino da

produção.

Para promover a reconstrução, caso necessário, e a validação da

síntese dos campos produzidos pelo pesquisador, orientado pela composição

das cartas anteriores, foi apresentado ao participante previamente ao encontro,

um roteiro distribuído em sete passos para orientar o encontro como

exemplificado abaixo por intermédio da ferramenta digital disponível: google

meeting:

Page 54: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

53

(Figura - 05: Elaboração do autor ilustrando a organização metodológica destinada ao

encontro individual e apresentação da síntese dos campos via google meeting ao participante.)

Ficou evidente em contato com os participantes, nesse momento, como

a apresentações dos campos representados pela carta síntese foi, de certa

forma, o elemento mais surpreendente revelado aos participantes.

Certamente uma forma diferente de apresentar ao participante a síntese

dos campos “dele” para a pessoa “dele mesmo”, pois a síntese, buscou

sobretudo a fidelidade interpretativa nas produções anteriores apresentadas e

possibilitou o espaço de intervenção, complemento e supressão caso

necessário.

Importante destacar que nenhum dos participantes declarou não estar

representado na produção apresenta pelo pesquisador, o que certamente pelo

produtor, valida a análise interpretativa da síntese dos campos produzidos,

permitindo nesse momento um reencontro com a perspectiva de Freire (1997),

condutora do itinerário reflexivo da análise desse estudo.

Como escolhas expositivas para o objeto da dissertação, todas as cartas

produzidas, a considerar os quatro participantes, foram de sensível e importante

relevância para o entendimento e análise geral do estudo.

A partir desse ponto o intuito de apresentar a íntegra das cartas na sua

correspondência tem com a finalidade expor as produções de forma relevante

para melhor compreensão da proposta apresentada nessa produção.

Data: ___/___/___ Participante: ____________ 1- Saudação – agradecimento pela correspondência (produção das cartas); 2- Participação – perguntar de forma ampla sobre a participação na produção; 3- Cartas pedagógicas - explicar (de forma sucinta) origem e a base do estudo que organiza a proposta; 4- Análise – evidenciar objetivos, questionamentos, processo de construção e a representação dos disparadores (campos); 5- Apresentação do texto – carta síntese (leitura); 6- Solicitar contribuição no fomento de estimular a intervenção docente na análise (complemento, supressão ou reformulação caso necessário); 7- Encerramento – agradecer novamente e propor uma frase ou palavra que represente a experiência e colaboração com a produção das cartas (projeto) no intuito de estimular reflexões finais.

Page 55: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

54

A escolha das imagens apresentadas nas cartas foi conduzida em

parceria com seus produtores, pois elas vão ilustrando as etapas dos

disparadores para cada correspondência construída durante o processo.

Reservamos os cuidados com as imagens presentes dos alunos, tendo

apenas a permissão de seus produtores concedida, mantendo seus nomes em

sustento a suas reflexões traduzidas nas palavras apresentadas.

9. APRESENTAÇÃO DAS CARTAS PEDAGÓGICAS – O (SER) FAZER

DOCENTE NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA

As produções (cartas), apresentadas abaixo (por simples escolha

expositiva representativa) revelam a produção da professora Francislene e do

professor Luiz. Colegas de profissão que ao longo do tempo testemunho, em

fraterna condição, o envolvimento sensível com a docência no espaço escolar

de seus territórios, que desde o início desse estudo foram de grande solicitude

e entusiasmo dedicado à produção correspondente.

Page 56: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

55

Page 57: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

56

Page 58: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

57

Page 59: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

58

Page 60: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

59

Page 61: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

60

Page 62: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

61

Page 63: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

62

Page 64: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

63

Page 65: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

64

Page 66: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

65

Page 67: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

66

Page 68: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

67

Page 69: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

68

Page 70: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

69

Page 71: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

70

Page 72: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

71

Page 73: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

72

Page 74: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

73

Page 75: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

74

Page 76: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

75

Page 77: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

76

Page 78: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

77

Page 79: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

78

Page 80: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

79

Page 81: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

80

Page 82: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

81

Page 83: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

82

Page 84: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

83

Page 85: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

84

Page 86: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

85

Page 87: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

86

Page 88: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

87

Page 89: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

88

Page 90: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

89

10. CARTAS PEDAGÓGICAS: O REENCONTRO COM A PEDAGOGIA DA

AUTONOMIA DE PAULO FREIRE

Como produto associado à síntese interpretativa dos campos

disparadores, as cartas aqui analisadas representam um texto interpretativo da

carta síntese, construídas pelo pesquisador, fruto do avanço no diálogo do

espaço de escuta destinado a produção.

Ao analisar os dados produzidos, encontramos nos escritos de Paulo

Freire, amparados pela obra intitulada “Pedagogia da Autonomia: saberes

necessários à prática educativa (1997)” o reencontro com diversas de suas

reflexões, uma vez que a metodologia inspirada em Cartas Pedagógicas tem no

educador brasileiro um dos seus mais célebres representantes.

Na análise da conexão dos campos correspondente das Cartas

Pedagógicas, foram encontrados elementos evidenciados pelos seus produtores

que, mesmo escritos individualmente sem compartilhamento, apresentam

consideráveis semelhanças.

Nessa perspectiva, as cartas foram organizadas para melhor

compreensão do objetivo do estudo que busca compreender os elementos que

sustentam e auxiliam na construção do fazer (ato) pedagógico de forma

integrada em diferentes contextos.

Fica bastante evidente que os docentes, mesmo com anseios cotidianos,

mas certos da escolha de sua profissão, estão sempre dispostos a fomentar o

diálogo como forma de resistir a uma prática acomodada e ancorada apenas na

execução instrumental do se - movimentar. O que nos remete ao reencontro com

a reflexão de que ensinar exige disponibilidade para o diálogo (Freire, 1997).

A produção das Cartas Pedagógicas demonstra, uma forma de produção

e conhecimento com íntima articulação entre teoria e prática. Na obra intitulada

“Cartas a Cristina: reflexões sobre minha vida e minha práxis” Paulo Freire

(1994), destaca que as práticas educativas ancoram uma compreensão crítica

da educação onde o diálogo é o caminho orientador da práxis. Como observado

no trecho da carta da professora Thayara.

Page 91: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

90

“Acredito que o movimento deve ser vivido, por ironia do destino é o nosso maior desafio. Roda de conversa, debate e sugestões são ações promovidas pelo professor com foco na integração, estimulando em todos os alunos a participação.”

Já em “Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática

educativa” de Paulo Freire (1997), postulou alguns saberes necessários à

experiência educativa. Foi à última obra publicada em vida, onde ele faz uma

reflexão e apresenta orientações a respeito da compreensão da prática docente

enquanto dimensão social da formação do ser humano. Dentre algumas dessas

orientações, considera que ensinar exige também querer bem aos educandos e

a convicção de que a mudança é possível como observado no trecho da carta

do professor Bruno:

“Respeito mútuo entre professores e alunos, estímulo em conviver em harmonia com as diferenças bem como o engajamento social estimulado pelo protagonismo juvenil será a chave para despertar o prazer dos jovens em estar na escola...”

Nos apontamentos dos docentes, muitas questões estão direcionando

para além de um fazer essencialmente e demasiado técnico pedagógico, na

verdade sinalizam para constantes ações e atitudes orientadas pelas relações

humanas que construídas em seus territórios de prática.

Há uma relação entre a alegria necessária à atividade educativa e a

esperança. A esperança de que professor e alunos juntos podem aprender e

ensinar, inquietar-nos, produzir e juntos igualmente resistir aos obstáculos à

nossa alegria (Freire, 1997).

Portanto, ensinar exige alegria e esperança. Ensinar exige querer bem

aos educandos como fica evidente no trecho da carta representada pelos

professores Bruno e Thayara em perspectiva e sensível exposição:

“Certamente com isso vou mantendo em meu coração uma esperança viva e pretendo continuar contagiando todos ao meu redor”.

“Que sejam propagadores de uma aprendizagem como esperança e de um futuro melhor, repleto de confiança, de uma vida mais justa, digna e vitoriosa...”

Page 92: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

91

Na apreensão da realidade e livre da ingenuidade poética expressa, a professora

claramente deixa evidente a alegria e o carinho presente no momento de sua escrita,

na perspectiva de Freire (1997), ensinar é uma especificada humana e exige também

segurança e generosidade, evidenciados pela professora Francislene:

“Na verdade, quem resiste à alegria dos abraços sinceros e carinhosos das crianças quando eu, “a professora”, chega ao portão”. Nem sempre a vida nos recebe com a mesma alegria “no portão”.

A arrogância que nega a generosidade, nega também a humildade. O

clima de respeito que nasce de relações justas, sérias, humildes, generosas em

que a autoridade docente e as liberdades dos alunos se assumem eticamente,

autentica o caráter formador do espaço pedagógico (Freire, 1997). Evidenciados

claramente pelo professor Luiz:

“Na competição tive que aprender que o mais importante é estender a mão, não importa se não for campeão, na verdade o mais importante está na união. Atitude e empenho, na minha profissão, é sempre motivo de razão... Acho que a Educação Física tem o poder de transformar, se o professor pelas boas atitudes se orientar”.

Não há docência sem discência, as duas se explicam e seus sujeitos,

apesar das diferenças que os conotam, não se reduzem à condição de objeto

um do outro. Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao

aprender (Freire, 1997). Reflexões textualizadas respectivamente nos

apontados dos professores Luiz e Bruno:

“Sou competitivo, mas inspirado, por ocasião, em um colega de profissão, sem pretensão, acabei descobrindo uma renovada intenção...”

Prof. Luiz

“Certamente foram grandes os momentos de aprendizagem e descobertas no “chão da escola”, entretanto para superar o famoso “Rola Bola” decidi pela inovação...”.

Prof. Bruno

Quem pensa certo, está cansado de saber que palavras a que falta a

corporeidade do exemplo pouco ou quase nada valem. Pensar certo é fazer

certo. É próprio do pensar certo, a disponibilidade ao risco, a aceitação do novo

que não pode ser negado ou acolhido só porque é novo (Freire, 1997).

Page 93: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

92

Além disso, Freire (1997), considera que a docência não existe sem a

deiscência e os sujeitos não se reduzem à condição de objeto um do outro. Na

educação libertadora ambos se influenciam mutuamente. Evidente nos trechos

respectivos das professoras Francislene e Thayara:

“Tenho a certeza que parte de minha motivação está em no exemplo para os pequenos que sempre nos dão o exemplo...”

Profª Francislene

“Na verdade, isso parece loucura, mas precisamos às vezes, encarar, despertar e largar nossas “armaduras”. Essa é nossa realidade, sempre perto da verdade...”

Profª Thayara

Nas reflexões de Paulo Freire (1997) sobre o exercício docente,

consideramos a ética e a estética, a competência profissional demonstrando o

respeito pelos saberes do aluno e o reconhecimento da identidade cultural bem

como rejeição de todas e quaisquer formas de discriminação como evidenciado

nas palavras da professora Thayara:

“No projeto “SUPERAÇÃO” o meu olhar foi para inclusão”. Brincadeiras, convivência e atenção sempre estimular nos adolescentes a participação. Sou uma professora divertida, e gosto de agitar, respeito os limites e adoro dançar, pois a Educação Física no campo das emoções também é para os “fora dos padrões”.

A maneira como os alunos me percebem tem grande importância para o

meu desempenho. Não há como sendo professor não revelar minha maneira de

ser, de pensar politicamente, diante de meus alunos, pois ensinar exige

comprometimento (Freire, 1997). Reflexões aqui evidenciadas pelo professor

Bruno:

“... certamente tenho a clareza de que os problemas vão continuar existindo, o que vai mudar é nossa capacidade de reagir”

“Atitudes como coragem e apreço ao espaço escolar farão toda a diferença. Políticas Públicas ajustáveis às necessidades da escolar e acesso a tecnologias trazem bons horizontes para nós professores”.

Page 94: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

93

Sei que sou inacabado, porém consciente disto, sei que posso ir mais

além, através da tensão entre o que herdo geneticamente e o que herdo social,

cultural e historicamente. Lutando deixo de ser apenas objeto, para ser também

sujeito da história (Freire, 1997).

A consciência do mundo e de si como ser inacabado, inscrevem o ser

num permanente movimento de busca. E nisto se fundamenta a educação como

processo permanente (Freire, 1997). Evidentes em trechos apontados

respectivamente pelos professores Thayara e Luiz:

“E quanto a nós professores? Espero que a cada dia possamos avançar, melhorar e se preciso recomeçar, mas, nunca, deixar de acreditar. Para o futuro tenho esperança, mas sem cobrança... Para essa professora a vida é como uma dança...”.

Profª Thayara

“Como disse: “Na vida pessoal e profissional desafios e dilemas vão aparecer, mas minha motivação é fazer acontecer, pois ser professor é também renovar e renascer”.

Prof. Luiz

Reconhecemos que é preciso insistir: este saber necessário ao

professor, que ensinar não é transferir conhecimento não apenas precisa ser

apreendida por ele e pelos educandos nas suas razões de ser ontológica,

política, ética, epistemológica, pedagógica, mas também precisa ser

constantemente testemunhado, vivido. A considerar evidências reflexivas

sinalizadas pela professora Francislene:

“Acho que estou no lugar certo, entre mais “sim” do que “não” aqui o que não falta é emoção. Somos importantes na escola, mas principalmente na vida dos nossos alunos, pois o futuro é reflexo do passado, precisamos acreditar sempre que somos mais, que podemos mais...”

Por isso é que, na formação permanente dos professores, o momento

fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática. É pensando criticamente a

prática de ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática (Freire, 1997).

O próprio discurso teórico, necessário à reflexão crítica, tem de ser de

tal modo concreto que quase se confunda com a prática. Portanto ensinar exige

Page 95: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

94

reflexão crítica sobre a prática (Freire, 1997). Aqui exposto nas reflexões do

professor Luiz:

“E agora, passada mais de uma década, é hora de refletir. Apaixonado por Educação Física foi na “Escola da Família” os primeiros passos como parte de minha trilha. Um percurso que pretendo seguir, melhorar, participar e se possível, assim chegar...”

Outro saber que devo trazer comigo e que tem que ver com quase todos

os de que tenho falado é o de que não é possível exercer a atividade do

magistério como se nada ocorresse conosco. Como impossível seria sairmos na

chuva expostos totalmente a ela, sem defesas, e não nos molhar (Freire, 1997).

Certamente ensinar exige comprometimento, mesmo que por vezes

pareça mais complicado do que de fato possa ser. Aqui encontramos evidências

de uma prática, por vezes, vivida com resiliência frente aos desafios. Apontados

pela professora Francislene:

“Nem sempre a vida nos recebe com a mesma alegria “no portão”, às vezes reconheço episódios mais complicados, porém acredito que a melhor saída é de fato enfrentar os desafios...”

A prática pedagógica como especificidade humana se completa em sua

relação com a afetividade na percepção docente em que a considera:

[...] como professor, não me acho tomado por este outro saber, o de que preciso estar aberto ao gosto de querer bem, às vezes, à coragem de querer bem aos educandos e à própria prática educativa de que participo. Esta abertura ao querer bem não significa, na verdade, que, porque professores me obrigam a querer bem a todos os alunos de maneira igual. Significa, de fato, que a afetividade não me assusta que não tenho medo de expressá-la [...] (FREIRE, 1997, p. 141).

A minha abertura ao querer bem, significa a minha disponibilidade à alegria de

viver, alegria de viver, que, assumida plenamente, não permite que me transforme num

ser “adocicado” nem tampouco em um ser amargo (Freire, 1997). Reflexões em

reencontro evidenciadas respectivamente pelas professoras Thayara e Francislene:

“Para essa professora a vida é como uma dança. Se na estrada da vida um ex – aluno encontrar que esses dêem um saudoso e acolhedor abraço ao chegar, e digam: Essa foi minha professora, reconheço no olhar, pois no meu coração sempre terá o seu lugar...”

Profª. Thayara

Page 96: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

95

“E quanto à min? Sigo como uma poesia, pois “não consigo ser menos que um exagero, não gosto de nada pouco, não gosto de nada morno”. Não me peça pra ir com calma; pois minha pressa, essa com certeza, vêm da alma...”

Profª Francislene

Segundo Paulo Freire (1997), não na diferença na “distância” entre a

ingenuidade e a criticidade, entre o saber de pura experiência feito e o que

resulta dos procedimentos metodicamente rigorosos, uma ruptura, mas uma

superação. A superação e não a ruptura se dá na medida em que a curiosidade

ingênua, sem deixar de ser curiosidade, pelo contrário, continuando a ser

curiosidade, se criticiza. Logo ensinar exige criticidade.

Por que não discutir com os alunos a realidade concreta a que se deva

associar a disciplina cujo conteúdo se ensina, a realidade agressiva em que a

violência é a constante e a convivência das pessoas é muito maior com a morte

do que com a vida? Por que não estabelecer uma necessária “intimidade” entre

os saberes curriculares fundamentais aos alunos e a experiência social que eles

têm como indivíduos (Freire, 1997). Evidenciados em reflexivo reencontro pelo

professor Luiz:

“Na competição tive que aprender que o mais importante é estender a mão, não importa se não for campeão, na verdade o mais importante está na união. Atitude e empenho, na minha profissão, é sempre motivo de razão. Acho que temos que dar um tempo olhando apenas para a competição...”

Diante disso, e no amparado das reflexões, promovidas no reencontro

com a pedagogia da autonomia de Paulo Freire (1997), encontramos de forma

bastante cristalina, elementos produzidos pelos docentes nas produções

(correspondentes) sobre suas práticas, semelhanças repletas de sensibilidade,

ética e compromisso de suas práticas centradas, sobretudo nas relações

humanas.

Apesar de seus dilemas e desafios constantes presentes, não ganha no

território escolar, pelo contrário, parece em muitos momentos fornecer estímulos

ao fazer pedagógico (ato) crítico e reflexivo para recondução e/ou reorganização

de suas atitudes e princípios envolvendo o ato pedagógico.

Page 97: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

96

Percebe-se, assim, a importância do papel do educador, o mérito da paz

com que viva a certeza de que faz parte de sua tarefa docente não apenas

ensinar os conteúdos, mas também ensinar a pensar certo (Freire, 1997).

Segundo Paulo Freire (1997), o professor que pensa certo deixa

transparecer aos educandos que uma das bonitezas de nossa maneira de estar

no mundo e com o mundo, como seres históricos, é a capacidade de intervindo

no mundo, conhecer o mundo. Mas, histórico como nós, o nosso conhecimento

do mundo tem historicidade.

No entanto, reconhecemos que o estudo se trata de um recorte e que

nossa “ingenuidade” não seja responsável por eclipsar as tensões e abrandar a

necessidade de mantermos o posicionamento, com a grandeza docente no

engajamento ético- político social e vigilante as injustiças.

Por fim, as cartas aqui apresentadas, nesse reencontro, testemunham

evidências de um fazer pedagógico repleto de saberes ancorados, sobretudo

nas relações humanas, que dão sustento, inclusive, a novas ações numa

espécie de sincronismo envolvendo o processo de ação e reflexão que ao longo

do tempo reverbera nos territórios das práticas docentes.

11. CONSIDERAÇÕES PROVISÓRIAS: REFLEXÕES NECESSÁRIAS

Sempre que penso no espaço escolar, são inúmeras as reflexões em

minha mente, mas certamente estou convencido de que não há neutralidade

diante a posição da realidade. Tenho como esperança partilhar de uma

educação mais libertadora capaz de amparar, sobretudo aqueles envoltos a uma

lógica estruturalmente excludente que infelizmente parece acender com

velocidade nos dias atuais.

Contudo, o meu envolvimento com a produção das cartas, revelou uma

perspectiva mais esperançosa. Creio na impossibilidade da cisão da “pessoa

humana” e da “prática (ato) pedagógica” docente, que nos desafios e dilemas

parecem encontrar estímulos para superar os obstáculos.

Page 98: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

97

Ancorados pela produção, das cartas aqui apresentadas, estendem as

minhas reflexões sobre o quanto é importante querer bem a nós mesmos e aos

educandos e educandas, pois é nesse movimento que nos percebemos e damos

sentidos e significados às experiências formativas, sobretudo orientadas pela

condição de ser mais no mundo.

Fica evidente que na escuta se reconhece o outro, e a experiência da

criação desse espaço (cartas pedagógicas) foi capaz de nos esperançar. Uma

oportunidade muitas vezes invizibilizada pela falta, pelo excesso, pelo espaço

não criado ou até mesmo pelo “diálogo” não correspondido.

Destaco na exposição das cartas, que mesmo em tempos, sobretudo

tecnologicamente complexos, as relações humanas que em minha opinião se

configura como o grande achado dessa produção ocupam justa centralidade em

cada ato pedagógico cotidiano. Inspirado nas reflexões e no otimismo crítico do

educador Paulo Freire, encontro a melhor definição de educação que diz:

“Educar é impregnar de sentido o que fazemos a cada instante, cada ato

cotidiano”.

Sinalizo minhas considerações, cercado de intermináveis dilemas e

desafios, mas certo de que muitas das perspectivas futuras são construídas no

presente. Ser irmão, mãe, filho e professor, são essas as características que

edificam integralmente os saberes associados ao fazer pedagógico docente? Em

outras palavras o campo “pessoa” sustenta e orienta por completo essas

práticas?

No entanto, na produção das Cartas Pedagógicas apresentadas na

referida dissertação destacam evidências sobre a importância da constituição da

“pessoa docente”, que se apresenta como um promissor campo de investigação,

pois fica evidente que ninguém se forma professor ou professora, nossas

relações vão aos constituindo, e no exercício docente vivido com amorosidade,

ética, bom senso, criticidade, respeito à condição de aprendiz e no

reconhecimento de ser condicionado, encontramos os elementos necessários

para uma prática educativa libertadora.

Não poderia ser diferente em concluir minhas reflexões destacando que

a produção de Cartas Pedagógicas, traz a tona ressonâncias de um pensamento

Page 99: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

98

de Paulo Freire (1997), que postula inúmeros saberes necessário, à prática

educativa, mas certamente para essa produção se faz evidente que: “Ensinar é

uma especificidade humana, exige a convicção de que a mudança é possível a

começar pela consciência do inacabamento.”

Enfim, o estudo apresentou, no espaço correspondente criado por

intermédio das cartas, um destaque significativo para o exercício docente

centrado, sobretudo nas relações humanas e seus saberes que são

estabelecidas ao longo desse exercício no espaço escolar de grande relevância

para o sustento e reorganização de suas práticas.

Considero também, que o estudo apresentado expõe, naturalmente, os

limites da escolha metodológica e certas contradições no que diz respeito ao

aprofundamento, compartilhamento e centralidade (escolha) dos campos

abordados por cada um dos participantes, pois fica evidente que os campos

receberam maiores e distintas atenções no espaço identitário e particular de

cada participante

Sendo assim, reforço que a temática merece a atenção de estudos

futuros complementares, pois a complexidade do fazer pedagógico no território

escolar assentado nas relações humanas demostra evidente potencialidade

para revelar renovados caminhos investigativos.

Page 100: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

99

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALARCÃO, Isabel. Ser professor reflexivo. In: ALARCÃO, I. (org.). Formação reflexiva de professores: estratégias de supervisão. Porto: Porto Ed. 1996, p. 171-189.

CHIZZOTTI, Antonio. A pesquisa qualitativa em ciências humanas e sociais: evolução e desafios. Revista Portuguesa de Educação, 2003, 16 (2), pp. 221-236 © 2003, CIEd - Universidade do Minho.

BEDIAGA, Begonha. Discreto personagem do império brasileiro: Luís Pedreira do Couto Ferraz, visconde do Bom Retiro (1818-1886) Topoi (Rio J.), Rio de Janeiro, v. 18, n. 35, p. 381-405, maio/ago. 2017. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/topoi/v18n35/2237-101X-topoi-18-35-00381.pdf. Acesso em 22 de ago de 2019.

BETTI, Mauro. Educação Física e Sociedade. São Paulo, Editora Movimento, 1991.

BLOCK, Osmarina; RAUSCH, Rita Buzzi. Saberes Docentes: Dialogando com Tardif, Pimenta e Freire. UNOPAR Cient., Ciênc. Human. Educ., Londrina, v. 15, n. 3, p. 249-254, Out. 2014. Disponível em: https://revista.pgsskroton.com/index.php/ensino/article/view/493. Acesso em 28 de jul de 2020.

BOGDAN, Roberto C.; BIKLEN, Sari Knopp. Investigação qualitativa em educação. Porto: Porto Ed. 1994.

BOGDAN, Roberto C.; BIKLEN, Sari Knopp. Investigação qualitativa em educação: uma introdução à teoria e aos métodos. Portugal: Porto Editora, 1994.

BORGES, Cecília M. Ferreira. O professor de Educação Física e a construção do saber. Campinas: Papirus, 1998.

______. O professor de Educação Física e a construção do saber. Campinas: Papirus, 1998.

Page 101: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

100

BRANDÃO, Ana Carolina Perrusi. Leitura e produção de textos na alfabetização. Belo Horizonte: Autêntica, 2005.

CAMINI, Isabela. Cartas Pedagógicas: aprendizados que se entrecruzam e se comunicam. Porto Alegre: ESTEF, 2012.

CANÁRIO, Rui. A escola tem futuro? Das promessas às incertezas. Porto Alegre: Artmed, 2006.

CANDAU, Vera Maria Ferrão (org) Sociedade, educação e cultura(s): Questões e propostas. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.

CASTELLANI FILHO, Lino. Educação Física no Brasil: a história que não se conta. Campinas: Papirus, 1988.

COELHO, Edgar Pereira. Pedagogia da correspondência: Paulo Freire e a educação por cartas e livros. Brasília: Líber Livro, 2011.

COLETIVO DE AUTORES. Metodologia do Ensino de Educação Física. São Paulo: Cortez, 1992.

DENZIN, Norman K.; LINCOLN, Yvonna S. Planejamento da pesquisa qualitativa: teorias e abordagens. Porto Alegre: Artmed, 2006.

DESGAGNÉ, Serge. O conceito de pesquisa colaborativa: a ideia de uma aproximação entre pesquisadores universitários e professores práticos. Revista Educação em Questão, Natal, v. 29, n. 15, p. 7-35, maio/ago. 2007.

DUBAR, Claude. Formação, trabalho e identidades profissionais. In: ESTRELA, Albano; CANÁRIO, RUI; FERREIRA, Júlia (org) Formação, saberes profissionais e situações de trabalho. Lisboa: Universidade de Lisboa, 1996, pp 45-52.

EUGÊNIO, Benedito; TRINDADE, Lucas Bonina. A entrevista narrativa e suas contribuições para a pesquisa em educação. Pedagogia. Foco, Iturama, v.12, n.7, p.117-132, jan/jun 2017.

Page 102: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

101

FERREIRA-ALVES, José; GONÇALVES, O. F. Educação narrativa do professor. Coimbra: Quarteto Editora, 2001.

FLORES, Maria Assunção (org). Formação e desenvolvimento profissional de professores: contributos internacionais. Coimbra: Almedina, 2014.

FREIRE, E. L.; OLIVEIRA, J. G. M. Educação Física no Ensino Fundamental: identificando o conhecimento de natureza conceitual, procedimental e atitudinal. Revista Motriz, Rio Claro, v.10,n.3, p. 140-151, set./dez. 2004.

FREIRE, Elisabete dos Santos. Educação Física e conhecimento escolar nos anos iniciais do ensino fundamental. 1999. 99f. Dissertação (Mestrado) - Escola de Educação Física, Universidade de São Paulo, São Paulo.

FREIRE, Paulo. Cartas a Cristina: reflexões sobre minha vida e minha práxis. (3ª ed.) São Paulo: Paz & Terra, 2019.

______. Pedagogia da indignação: cartas pedagógicas e outros escritos. São Paulo, UNESP, 2000.

______. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz & Terra, 1997.

______. Cartas à Guiné-Bissau: registros de uma experiência em processo. 2ª ed., Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1978.

FREITAS, Denise de; GALVÃO, Cecília. O uso de narrativas autobiográficas no desenvolvimento profissional de professores. Ciências & Cognição; Ano 04, vol. 12, 2007. Disponível em: http://www.cienciasecognicao.org/pdf/v12/m347196.pdf. Acesso em: jun. 2018.

GAUTHIER, Clermont. et al. Por uma teoria da pedagogia: pesquisas contemporâneas sobre o saber docente. Ijuí: Ed. da Unijuí, 1998.

GODOY, Arilda Schmidt. Pesquisa qualitativa tipos fundamentais. Revista de Administração de Empresas São Paulo, v. 35, n.3, pp 20-29 Mai./Jun. 1995.

Page 103: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

102

HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 2006.

JOSSO, Marie-Christine. Experiências de Vida e Formação. São Paulo: Cortez, 2004.

JOVCHELOVITCH, Sandra; BAUER, Martin. W. Entrevista narrativa. In: BAUER, Martin W.; GASKELL, George. Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som: Um manual prático. Tradução de Pedrinho A. Guareschi – 13ª. Ed. Petrópolis: Vozes. 2015.

KUNZ, Elenor. Educação física: ensino & mudanças. Ijuí, RS: Ed. da Unijuí, 2006.

MARINHO, Inezil Penna. Rui Barbosa: o paladino da Educação Física no Brasil. 2ª ed. Brasília: Eixo, 1980.

MELUCCI, Alberto. O jogo do Eu: a mudança de si em uma sociedade global. São Leopoldo: Ed. da Unisinos, 2004.

MORAES, Ana Cristina; PAIVA, Alan Lima. Cartas Pedagógicas: reflexões de docentes da educação básica e superior - Fortaleza: EdUECE, 2018.

MORAES, Roque. Uma tempestade de luz: a compreensão possibilitada pela análise textual discursiva. Ciência & Educação: Bauru, SP, v. 9, n. 2, p. 191-210, 2003.

MORAES, Roque; GALIAZZI, Maria do Carmo. Análise textual discursiva: processo reconstrutivo de múltiplas faces. Ciência & Educação, v. 12, n. 1, p. 117-128, 2006.

MOREIRA, Antonio Flávio; CANDAU, Vera Maria. Indagações sobre currículo. Currículo, Conhecimento e Cultura. Ministério da Educação, Brasília, 2007.

Page 104: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

103

MORGADO, José Carlos. Identidade e profissionalidade docente: sentidos e (im) possibilidades. Ensaio: Avaliação e Políticas Públicas Educacionais, Rio de Janeiro, v. 19, n. 73, p. 793-812, OUT./DEZ. 2011.

MORIN, Edgar. Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro. 3ª ed. São Paulo: Cortez, Brasília, 2001.

MUYLAERT, Camila Junqueira et al. Entrevistas Narrativas: um importante recurso em pesquisa qualitativa. Revista da Escola de Enfermagem da USP, p. 193-199, 2014.

NÓVOA, António. Firmar a posição como professor, afirmar a profissão docente. In: Cadernos de Pesquisa, vol. 47, nº 166, outubro-dezembro, 2017, PP 1106-1133.

______. Os professores na virada do milênio: do excesso dos discursos à pobreza das práticas. Revista Educação e Pesquisa, São Paulo, FEUSP, vol. 25, n. 1, p 1-21, jan-jun, 1999.

______. Profissão Professor. Porto: Porto Editora,1995.

______. Os professores e as Histórias da sua vida. In: NÓVOA. António (org.) Vidas de professores. Portugal: Porto Editora, 1992.

PAULA, Ercília Maria A. Teixeira. Cartas pedagógicas: estratégias didáticas revisitadas para novos tempos. (org) – Curitiba: CRV, 2018, p. 196.

PAULO, Fernanda dos Santos; DICKMANN, Ivo (org.). Cartas pedagógicas: tópicos epistêmico-metodológicos na educação popular. 1ª. ed. – Chapecó: Livrologia, 2020. (Coleção Paulo Freire; v. 2).

PIMENTA, Selma Garrido (org.). Saberes pedagógicos e atividade docente. São Paulo: Cortez, 2000.

PIMENTA, Selma Garrido; GHEDIN, Evandro (org.). Professores reflexivos no Brasil, gênese e crítica de um conceito. São Paulo; Cortez, 2008.

Page 105: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

104

SACRISTÁN J. Gimeno. O Currículo: Uma reflexão sobre a prática. Porto Alegre: Artmed, 3ª ed., 2000.

SAVIANI, Demerval. Os saberes implicados na formação do educador. In: BICUDO, Maria Aparecida; SILVA JÚNIOR, Celestino Alves (org.) Formação do educador: dever do Estado, tarefa da Universidade. São Paulo: UNESP, 1996.

SCHÖN, Donald. Educando o profissional reflexivo: um novo design para o ensino e a aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000.

SCHÜTZE, Fritz. Pesquisa biográfica e entrevista narrativa. In: WELLER, Wivian; PFAFF, Nicole. (org.) Metodologias da pesquisa qualitativa em educação: teoria e prática. 2. ed -. Petrópolis: Vozes, 2011.

SILVA, Maria de Lourdes Ramos. A complexidade Inerente aos Processos Identitários Docentes. CEMOrOC – Feusp / IJI – Universidade do Porto, 2009.

SILVA, Tomaz Tadeu da. Identidade e diferença: a perspectiva dos estudos culturais / Tomaz Tadeu da Silva (org.) Stuart Hall, Kathryn Woodward. 8. ed - Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.

SOUZA, Elizeu Clementino; ABRAHÃO, Maria H. Menna. Barreto. (org.). Tempos, narrativas e ficções: a invenção de si. Porto Alegre: EDIPUCRS; Salvador: EDUNEB, 2006.

SOUZA, Elizeu Clementino; MIGNOT, Ana C. Venâncio (org.). Histórias de vida e formação de professores. Rio de Janeiro: Quarteto: FAPERJ, 2008.

TARDIF, Maurice. Saberes docentes e formação profissional. 9. Ed. – Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.

TARDIF, Maurice; LESSARD, Claude; GAUTHIER, C. Formação dos Professores e contextos sociais. Porto: Rés, 2001.

TARDIF, Maurice; LESSARD, Claude; LAHAYE, Louise. Os professores face ao saber: um esboço de uma problemática do saber docente. Teoria e Educação: Porto Alegre, 1991.

Page 106: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

105

VENTURA, Paulo R. et al. A interiorização da formação continuada: um desafio para a educação física. Revista Estudos. Goiânia, V. 33, n. /10, p. 725-758, Set / Out., 2006.

Page 107: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

106

APÊNDICE A

PERFIL DOCENTE GERAL (DIGITAL)

Page 108: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

107

APÊNDICE B

DOCENTE PARTICIPANTE (PRODUÇÃO DAS CARTAS

PEDAGÓGICAS)

Page 109: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

108

APÊNDICE C

QUESTIONÁRIO DIGITAL

1. Nome?

2. U.E. de atuação no município?

3. Idade?

4. Gênero?

5. Você saberia dizer qual é sua Cor ou Raça/Etnia? Caso positivo indique.

6. Ano de formação (Educação Física):

7. Você tem outra formação de nível superior?

8. Caso outra formação de nível superior indique curso e ano.

9. Com relação à formação em Educação Física indique instituição.

10. Caso outra formação indique.

11. Nível de formação (Educação Física):

12. Tempo médio do exercício docente na rede municipal de ensino:

13. Ciclo de atuação atual na rede municipal:

14. Carga horária média semanal na rede municipal:

15. Acumula cargo ou função gratificada no exercício docente?

16. Costuma frequentar eventos, seminários, palestras, grupo (s) de estudo (s),

cursos dentre outros ligados ao exercício docente quando possível ?

17. Caso positivo, qual a frequência aproximada:

18. Dentre os autores (as) e/ou obras abaixo ligados ao exercício docente na

Educação Física qual(is) o(s) mais significativo(s) em sua formação:

19. Quais os blocos temáticos abordados com mais frequência em seu plano de

ensino?

20. Na sua prática docente costuma produzir, organizar e/ou arquivar algum

tipo de registro ou documentação das atividades realizadas pelos alunos

(as)?

21. Caso positivo, qual (is) o(s) instrumento(s) mais utilizado(s) na organização

de seus registros e/ou arquivos?

22. Durante o ano letivo costuma redirecionar sua prática?

23. Caso positivo, qual (is) o(s) principal (is) motivo(s)?

24. Além dos materiais destinados as vivências práticas (bolas, cones, cordas

etc) costuma fazer uso de outros no auxílio didático-pedagógico?

25. Caso positivo, qual (is)?

Page 110: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

109

26. Nas reuniões destinadas ao conselho interno de avaliação do município

(CAI) em sua percepção a disciplina de Educação Física ocupa um espaço

significativo?

27. Em sua percepção no ambiente escolar a equipe gestora, na figura dos

diretores (as) e coordenadores (as), reconhecem a importância e o percurso

curricular da disciplina de Educação Física?

28. No contexto geral e na maior parte do tempo encontra-se satisfeito (a) com

o exercício docente no ambiente escolar?

29. Estaria disposto (a) a compartilhar suas experiências práticas com colegas

da rede?

30. Caso positivo de segunda a sexta, qual o melhor dia da semana para um

possível encontro no período da tarde nas dependências da rede no

município?

https://forms.gle/XQwvQTPAMJ4Dt5Rr7

Page 111: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

110

ANEXO 01

CARTA PEDAGÓGICA – PROFESSOR BRUNO

Page 112: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

111

Page 113: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

112

Page 114: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

113

Page 115: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

114

Page 116: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

115

Page 117: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

116

Page 118: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

117

Page 119: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

118

Page 120: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

119

Page 121: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

120

Page 122: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

121

Page 123: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

122

Page 124: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

123

Anexo 02

Carta Pedagógica – Professora Thayara

Page 125: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

124

Page 126: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

125

Page 127: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

126

Page 128: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

127

Page 129: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

128

Page 130: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

129

Page 131: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

130

Page 132: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

131

Page 133: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

132

Page 134: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

133

Page 135: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

134

Page 136: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

135

Page 137: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

136

ANEXO - 03

DECLARAÇÃO DE RESPONSABILIDADE INSTITUCIONAL

Page 138: UNIVERSIDADE SÃO JUDAS Programa de Pós-Graduação Stricto

137

ANEXO - 04

PARECER – COMITÊ DE ÉTICA E PESQUISA (CEP)