universidade sÃo judas programa de pós-graduação stricto
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UNIVERSIDADE SÃO JUDAS
Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu
Mestrado em Educação Física
DIEGO PINTO JABOIS
CARTAS PEDAGÓGICAS E A NARRATIVIDADE DOCENTE: O (ser) fazer
no território escolar nas aulas de Educação Física
São Paulo - Brasil
2020
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DIEGO PINTO JABOIS
CARTAS PEDAGÓGICAS E A NARRATIVIDADE DOCENTE: O (ser) fazer
no território escolar nas aulas de Educação Física
Dissertação apresentada à Universidade São Judas Tadeu
como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em
Educação Física na linha de pesquisa Estudos Socioculturais e
Pedagógicos da Educação Física, sob orientação da Profª. Dra.
Bruna Gabriela Marques.
São Paulo – Brasil
2020
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Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca da
Universidade São Judas Tadeu
Bibliotecária: Adriana Aparecida Magalhães - CRB 8/10264
Jabois, Diego Pinto.
J11c Cartas pedagógicas e a narratividade docente: o (ser) fazer no território
escolar nas aulas de Educação Física / Diego Pinto Jabois. - São Paulo,
2020.
f. 137: il.; 30 cm.
Orientadora: Bruna Gabriela Marques.
Dissertação (mestrado) – Universidade São Judas Tadeu, São
Paulo, 2020.
1. Cartas Pedagógicas. 2. Saberes Docentes. 3. Educação Física
Escolar. I. Marques, Bruna Gabriela. II. Universidade São Judas Tadeu,
Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação Física. III. Título.
CDD 22 – 796
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CARTAS PEDAGÓGICAS E A NARRATIVIDADE DOCENTE: O (ser) fazer no
território escolar nas aulas de Educação Física
BANCA EXAMINADORA TITULAR:
__________________________________________
Profª. Drª. Isabel Porto Filgueiras
Universidade São Judas Tadeu – USJT
__________________________________________
Profª. Drª. Bruna Gabriela Marques
Universidade São Judas Tadeu – USJT
__________________________________________
Profª. Drº. Mesaque Silva Correia
Universidade Federal do Piauí – UFPI
BANCA EXAMINADORA SUPLENTE:
__________________________________________
Profª. Drª. Elisabete dos Santos Freire
Universidade São Judas Tadeu – USJT
__________________________________________
Profº. Drº. Luiz Sanches Neto
Universidade Federal do Ceará – UFC
São Paulo – Brasil
2020
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Dedico este trabalho aos meus familiares, em especial ao
meu pai Jesus Jabois Torres que não está mais entres nós,
mas continua sendo eterna fonte de inspiração.
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AGRADECIMENTO
Durante todo o processo da produção acadêmica aqui apresentada,
foram inúmeros os momentos de fragilidade, dúvidas e renúncias cotidianas
envolvendo minhas escolhas e caminhos a seguir frente nessa jornada de
engrandecimento.
Contudo, hoje tenho a clareza de que o processo é tão ou mais
importante do que o produto, pois é nele em que depositamos intensas reflexões
e ampliamos nossa resiliência e determinação, requisitos necessários para trilhar
o caminho escolhido.
Consequentemente, e a partir dessa experiência, acredito que sozinho
não chegaria a lugar nenhum, pois, em minha opinião, ninguém constrói nada
na companhia da solidão. Nessa direção, estendo sinceros agradecimentos aos
meus familiares, em especial a minha esposa Christiane Vilar Monteiro que
envolvida nas ditas “renúncias cotidianas” se fez presente não só como esposa,
mas como dedicada e atenta conselheira em diversos momentos.
Aos amigos e amigas do programa de Pós - Graduação da Universidade
São Judas Tadeu, que aqui não sou capaz de identificá-los individualmente, com
o receio de ser injusto com quem certamente entre os corredores da
universidade ou até mesmo em conversa “digitais” despretensiosa, foram
capazes de colaborar, amparar minhas angústias e celebrar minhas conquistas
de forma fraterna.
Contudo, destaco a parceria dos amigos Paulo Clepard Silva Januário
e Daiana Machado dos Santos pela amizade sincera e escuta sensível em
momentos de grande importância.
Aos docentes participantes, comprometidos e companheiros, que
prontamente ao meu pedido e com a coragem necessária aceitaram o desafio.
É com amizade verdadeira e profundo respeito que estendo minha eterna
gratidão pela doação do tempo e das palavras, aqui respeitosamente
representadas.
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Ao meu novo amigo e colaborador incansável Prof. Dr. Mesaque Silva
Correia, fonte de inspiração, no privilégio de sua amizade e atenção dispensada,
sempre que possível, em diversos momentos.
A minha estimada orientadora Profª Drª Bruna Gabriela Marques, cuja
amizade sincera, rigor metodológico e gentileza, característica de sua
personalidade, foi capaz de despertar minhas potencialidades como
pesquisador. Obrigado por acreditar no desafio, desde o início.
Aos professores e professoras da Universidade São Judas Tadeu em
especial: Drª. Elisabete dos Santos Freire, Drª. Isabel Porto Filgueiras, Drª
Graciele Massoli Rodrigues e Dra. Maria Luiza de Jesus Miranda queridas
professoras, presentes durante todo o meu percurso, com estendida
generosidade bem como profundo respeito a minha condição de aprendiz.
A equipe de apoio da secretaria de Pós - Graduação da Universidade
São Judas Tadeu, sempre atentas e solícitas com a gentileza característica em
todos os momentos.
A todos meus alunos e alunas do ensino fundamental que ao longo
desses anos, no território escolar, dividiram com esse professor mais alegrias do
que tristezas. Minha eterna e presente gratidão.
A todos aqueles e aquelas que porventura não tive a capacidade de
evidenciar, mas certamente, sendo coerente com minhas reflexões iniciais,
estiveram presentes nesse percurso.
E finalmente sou grato à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal
de Nível Superior - CAPES, por ter financiado parte desse estudo.
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RESUMO
A escola, enquanto equipamento público, assumindo o papel na formação continuada dos seus docentes em exercício, ao conduzir uma nova e/ou reorganizada proposta curricular normalmente reconhece, em linhas gerais, a importância da composição dos saberes docentes associados ao fazer pedagógico para o êxito da ação. Contudo, na maioria dos casos, pouco ou nada se compreende sobre os docentes que estão lá como verdadeiros artífices dos processos de desenvolvimento do ensino e da aprendizagem acerca do fazer pedagógico. Partindo de oportuna observação e frente ao reconhecimento de experiências positivas associadas ao fazer pedagógico do componente curricular de Educação Física o estudo reflete sobre o que de fato orienta e/ou organiza o desenvolvimento integral do fazer pedagógico? Quais fatores auxiliam na construção desse tipo de fazer? Sobre o cotidiano docente, em distintos contextos, existem elementos em comum no desenvolvimento e sustentação de tais construções? Diante disso, o objetivo do trabalho consiste em compreender a construção integral do fazer pedagógico dos docentes, seus desafios e/ou dilemas e perspectivas futuras por intermédio da produção de cartas pedagógicas. A pesquisa de abordagem qualitativa justifica sua escolha metodológica por reconhecer na produção a potencialidade interlocutora e reflexiva que destaca a “voz” docente, por vezes sem o devido espaço de escuta acolhedora no território escolar dado à complexidade do exercício pedagógico. A rede municipal de ensino, situada no litoral sul de São Paulo - Brasil no município de Itanhaém foi o lócus deste estudo por intermédio de seus docentes. A produção das cartas contou com quatro participantes de escolha intencional em efetivo exercício na rede cuja correspondência foi organizada metodologicamente em cinco encontros programados e orientados por análise interpretativa textual. O estudo buscou ancoragem no referencial teórico do educador brasileiro Paulo Freire com destaque para a obra intitulada: “Pedagogia da autonomia, saberes necessários à prática educativa” como fonte inspiradora. O estudo apresentou no espaço correspondente, criado por intermédio das cartas, um destaque significativo para o exercício docente centrado nas relações humanas e seus saberes que são estabelecidas ao longo do exercício docente no território escolar de grande relevância para o sustento e reorganização de suas práticas pedagógica que certamente merece a atenção de estudos complementares nessa direção.
Palavras – Chave: Cartas Pedagógicas. Saberes Docentes. Educação Física
Escolar.
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ABSTRACT
The school, as a public facility, assuming the role in the continuous training of its
teachers in practice when conducting a new and / or reorganized curricular
proposal normally recognizes, in general lines, the importance of the composition
of the teaching knowledge associated with making pedagogical for the success
of action. However, in most cases, little or nothing is understood about the
teachers who are there as true creators of the processes of development of
teaching and learning about pedagogical practice. Starting from a timely
observation and facing the recognition of positive experiences associated with
the pedagogical doing of the Physical Education curricular component, does the
study reflect on what actually guides and / or organizes the integral development
of pedagogical doing? What factors help in the construction of this type of doing?
About the daily teaching, in different contexts, are there elements in common in
the development and support of such constructions? Therefore, the objective of
the work is to understand the integral construction of the pedagogical practice of
teachers, their challenges and / or dilemmas and future perspectives through the
production of teaching letters. The research with a qualitative approach justifies
its methodological choice because it recognizes in the production the interlocutor
and reflective potential that highlights the teaching “voice”, sometimes without the
proper space for welcoming listening in the school territory given the complexity
of the pedagogical exercise. The municipal education network, located on the
south coast of São Paulo - Brazil in the municipality of Itanhaém was the locus of
this study through its teachers. The production of the letters had four intentionally
chosen participants in effective exercise in the network whose correspondence
was organized methodologically in five scheduled meetings and guided by
interpretative textual analysis. The study sought to anchor in the theoretical
framework of the Brazilian educator Paulo Freire with emphasis on the work
entitled: “Pedagogy of autonomy, knowledge necessary for educational practice”
as an inspiring source. The study presented in the corresponding space, created
through letters, a significant highlight for the teaching exercise centered on
human relations and their knowledge that are established throughout the
teaching exercise in the school territory of great relevance for the support and
reorganization of their pedagogical practices. which certainly deserves the
attention of further studies in this direction.
Keywords: Pedagogical Letters. Teaching Knowledge. School Physical
Education.
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LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Elaboração do autor, inspirado em Tardif, 2002.............................. 21
Figura 2 - Elaboração do autor, evidenciando aproximações entre os docentes
e suas práticas pedagógicas centradas nas interações humanas.................... 25
Figura 3 - Carta pedagógica de Paulo Freire (Documento Original 1989 – Diário
Oficial do Município de São Paulo) ................................................................... 37
Figura 4 - Elaboração do autor – representação gráfica da conexão entre os
campos disparadores ....................................................................................... 49
Figura 5 - Elaboração do autor ilustrando a organização metodológica destinada
ao encontro individual e apresentação da síntese dos campos via google meeting
ao participante .................................................................................................. 53
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SUMÁRIO
1. APRESENTAÇÃO E COSTURAS NECESSÁRIAS ..................................... 12
2. A Educação Física no espaço escolar e os saberes de seus “artífices”
.......................................................................................................................... 16
3. Os caberes e a construção de suas relações ........................................... 23
4. A identidade docente e seus contornos profissionais ............................ 27
5. Cartas pedagógicas: Diálogos correspondentes ..................................... 31
6. Processos metodológicos: Escolas e construção do percurso ............. 38
7. PRODUÇÃO DE DADOS: Acesso ao cenário como escolha metodológica
.......................................................................................................................... 41
7.1. Os participantes: escolha individual ........................................................... 47
7.2. Campos disparadores: composição e conexões interpretativas ................ 48
8. As cartas: Reflexões sincrônicas correspondentes ................................ 50
8.1. Cara professora Francislene ...................................................................... 55
8.2. Caro professor Luiz .................................................................................... 73
9. Apresentação das cartas pedagógicas – o (ser) fazer docente nas aulas
de Educação Física ......................................................................................... 54
10. Cartas pedagógicas: o reencontro com a pedagogia da autonomia de
Paulo Freire ..................................................................................................... 89
11. CONSIDERAÇÕES PROVISÓRIAS: Carta aos professores ................... 96
REFERÊNCIAS ................................................................................................ 99
11
APÊNDICE A – PERFIL DOCENTE GERAL (DIGITAL) ................................ 106
APÊNDICE B – DOCENTE PARTICIPANTE (PRODUÇÃO DAS CARTAS
PEDAGÓGICAS) ........................................................................................... 107
APÊNDICE C – QUESTIONÁRIO DIGITAL ................................................... 108
ANEXO 1 – CARTA PEDAGÓGICA PROFESSOR BRUNO ......................... 110
ANEXO 2 – CARTA PEDAGÓGICA PROFESSORA THAYARA .................. 135
ANEXO 3 – DECLARAÇÃO DE RESPONSABILIDADE INSTITUCIONAL ... 136
ANEXO 4 – PARECER – COMITÊ DE ÉTICA E PESQUISA (CEP) ............ 137
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1. Apresentação e costuras necessárias
“... é no espaço para palavras que se
podem produzir verdades de si.”
Hannah Arendt
Durante muito tempo, em particular percepção, a presença da Educação
Física enquanto componente curricular presente no espaço escolar brasileiro foi
palco de inúmeras mudanças acompanhadas de grandes disputas por validação
de significados, crises e alguns avanços comumente alinhados ao desenho
social vigente.
No entanto, distante nesse momento de definições epistemológicas, de
sua constituição histórica propriamente dita, penso no que de fato o componente
curricular representa na atualidade, para os docentes que estão lá, no cotidiano
de sua prática, e com a devida licença poética “entretecendo fios”, e renovando
percursos e significados de seus “tecidos”, amparados por experiências
pedagógicas e reflexões cotidianas.
Pensando nisso, acredito que determinadas ações e/ou decisões
promovidas por intermédio dos docentes no seu fazer pedagógico no território
escolar, carrega parte substancial de suas histórias de vida, que colaboram
certamente na construção de outras histórias e assim sucessivamente como na
confecção de um grande tecido em “costuras necessárias” na maior parte do
tempo.
Portanto, é de suma importância e coerência interna localizar nessa
produção o meu lugar de fala “costurando os fios” do meu “‘tecido” e relacionado
com intimidade a minha trajetória profissional, dando amplo sentido e
intencionalidade ao envolvimento com o estudo e seus desdobramentos aqui
apresentados.
Filho de pai estrangeiro (espanhol) e mãe brasileira, nascido na cidade
de Santos - SP, (1978) tive boa parte de minha infância desfrutada,
naturalmente, na década de 80, com passagem discente pelo ensino particular
(fundamental) e posteriormente público (médio) com saudosas recordações.
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Contudo, minhas maiores e mais significativas memórias, paralelas ao
período escolar, estão associadas principalmente aos momentos vividos nas
“brincadeiras de rua”, aproveitando o tempo livre e passando horas em
companhia dos meus amigos, compartilhando saudosos momentos, hoje retidos
na linha do tempo e recordados aqui com carinho.
Sem dúvida, tais vivências, dentre outros fatores, tiveram influência
direta e/ou indireta em importantes decisões ao longo de minha história e
seguramente em minha constituição profissional, e em meu reconhecimento
como sujeito e cidadão na sociedade.
Em comunhão aos fatos apresentados, destaco minha opção em cursar
a faculdade de Educação Física na cidade de Santos, no litoral de São Paulo,
onde na época, ainda sob o teto dos meus pais buscava a sonhada formação no
ensino superior.
Estar sob o teto dos meus pais, aqui me entendo como um privilegiado,
principalmente quando identifico nos relatos de alguns colegas de profissão,
histórias de dificuldades na primeira formação, pois para muitos o financiamento
e/ou a seguridade da manutenção dos estudos nunca foi tarefa fácil.
Um tempo mais tarde, e após a conclusão do ensino superior, ao acaso,
por indicação de um colega de sala, fui convidado e convencido a prestar o
concurso público para a prefeitura de Itanhaém no litoral de São Paulo (cidade
vizinha). Nesse momento tinha como objetivo conquistar uma oportunidade de
atuação no ensino fundamental como docente, caso aprovado, garantindo assim
o meu ingresso no serviço público sem nenhuma experiência anterior para além
das poucas horas de estágio requerido pelo programa obrigatório de formação
inicial.
O tempo parece passar muito rápido, mas lembro com perfeita exatidão
do meu primeiro dia de aula, que certamente marcaria meu percurso profissional
para sempre. Em breve lembrança, tinha a sensação de ver o dobro de crianças
presentes (imaginação ou talvez choque com a realidade) correndo de forma
“alucinada” pelo pátio, esperando “meu comando” ou uma ação disciplinadora
direta em alguma direção.
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Certamente agora no exercício docente e não mais como discente, os
desafios e dilemas se somavam integralmente no sentido de organizar e
reconduzir toda aquela “alegria” contagiante, vinda dos educandos e educandas
já sob uma percepção vivida como docente. Foram momentos significativos
entre descobertas, erros, acertos e incertezas quase que permanentes no
cotidiano da minha realidade.
Além disso, reconhecer a “liturgia” e os “ritos” escolares, naquele
momento, no início de minha carreira se fez necessário quase como um exercício
“obrigatório” e diário, pois definitivamente estava em um rico e renovado universo
que teria muito a contribuir em minha constituição enquanto docente.
A essa altura desenvolvo a percepção de que ninguém se forma
professor ou professora os docentes vão se constituindo ao longo do tempo,
inclusive no compartilhamento de visão de mundo enquanto pessoa.
No momento, continuo exercendo a função docente na mesma unidade
escolar de ingresso com breve passagem pela coordenação pedagógica (2009)
a convite do departamento de educação da prefeitura, sobre supervisão da
gestão vigente na época, mesmo sem ter a experiência necessária para atuação
no cargo (em minha opinião). Neste episódio, tive o que reconheço como uma
oportunidade ímpar de acesso, por intermédio de visitas regulares ao espaço do
fazer pedagógico de alguns colegas professores e professores em suas
respectivas unidades de ensino. Essas visitas foram se configurando, mas com
frequência inconstante, devido às dificuldades de locomoção, dado o número de
unidades e a distância entre elas e horários convergentes com o exercício dos
docentes.
Então, me vi exercendo a função de “observador”, inerente às
atribuições da função de coordenador de área, assim denominado o responsável
em colaborar com o desenvolvimento do componente curricular da rede quando
possível. Contudo, às vivências intermediadas pelos docentes, e por mim
observadas, despertaram rapidamente minha atenção no que tange à qualidade,
entusiasmo e empenho prontamente revelados no fazer pedagógico das aulas
de Educação Física, ministradas pelos colegas docentes de rede.
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Em minha percepção, referentes às observações relatadas, esse “fazer”
se tratava de algo de indiscutível autoria por parte dos docentes envolvidos, a
contento das necessidades dos educandos e educandas com princípios
pedagógicos coerentes dentro das possibilidades e recursos disponíveis.
Destaco inclusive que não havia sido adotado, até aquele momento, na rede
municipal de ensino um material didático específico de auxílio institucional
(apostilas, livros, matrizes etc.) direcionado aos docentes no amparo e apoio
metodológico para elaboração de seus planos de ensino.
Portanto, na esteira dos fatos, boa parte das decisões entre O que?
Como? E quando fazer? Estavam de certa forma relacionadas às decisões
curriculares particulares dos docentes envolvidos, assim como todo o conjunto
de ações presentes em seu fazer pedagógico no espaço educacional definindo
o território escolar1.
Partindo das observações apresentadas, alguns questionamentos se
fizeram presentes. O que de fato orienta e sustenta o desenvolvimento do fazer
pedagógico no território escolar? Quais fatores auxiliam na construção desse
fazer? Sobre o cotidiano docente, em contextos diversificados, existem
elementos em comum que auxiliam tais construções?
Em particular apontamento, sobre o fazer pedagógico em questão
estendo minhas reflexões para o predomínio dos “currículos próprios” na
construção cotidiana do fazer pedagógico constituído principalmente pelo campo
da experiência e na integridade docente enquanto pessoa como propulsores das
decisões e ações sobre a prática no contexto desse território (espaço escolar).
No que tange a expressão “currículos próprios”, definido para o contínuo
dessa reflexão como toda ação e/ou decisão curricular, promovida pelos
docentes no ato pedagógico subsidiado pela composição plural de seus saberes
ao longo do tempo.
Diante do exposto e alinhado a problemática apresentada, o estudo
busca compreender a constituição integral do fazer pedagógico docente, seus
1 Em defesa do termo “território escolar”, entendemos em particular reflexão, que a Educação
Física enquanto área do conhecimento transita nesse espaço com características particulares e distintas do outros espaços em que está presente bem como representada pelos seus profissionais (academia, clubes, spas médicos, etc.).
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desafios e/ou dilemas e perspectivas futuras por intermédio da produção
correspondente de cartas pedagógicas.
Tal escolha como estratégia metodológica, se deu pelo fato de
compreender a potencialidade reflexiva das cartas pedagógicas uma vez que
promove o diálogo e viabiliza a voz docente, por vezes, sem o devido espaço de
escuta acolhedora.
2. A Educação Física no Espaço Escolar e os saberes de seus
“artífices”
O território escolar é frequentemente compreendido como um espaço
privilegiado de ações e interações, mas, sobretudo de constantes e significativas
reflexões, todavia, parte dessas reflexões estão associadas à nossa própria
história de vida e como ela se articula e influencia em nossas decisões
cotidianas, inclusive, contextualizadas no ato pedagógico enquanto docente.
Nesse sentido e entre as ditas “aventuras” (do latim “ad ventura” que
significa literalmente o que vêm pela frente) os docentes vão se constituindo
dentro de um contexto por intermédio, inclusive, de suas ações e decisões.
Ações e decisões, por vezes, repletas de incertezas, erros e acertos
configurando o literal sentido do enfrentamento do que vêm pela frente ao
considerar e reconhecer o território escolar um composto de imprevisibilidades,
desafios e dilemas.
No entanto, diante de inevitáveis mudanças, características da
contemporaneidade, se faz necessário promover o reconhecimento dos
docentes e seus saberes, para melhor compreender a composição dessas
“aventuras” que têm nesse recorte e como principal produto a produção
correspondente de cartas pedagógicas.
Para organizar a “confecção” deste estudo, considero relevante,
reconhecer parte do percurso histórico que evidencia a presença da Educação
Física no território escolar, bem como as relações e o lugar de centralidade de
seus principais artífices, os docentes.
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No Brasil, em linhas gerais, uma corrente histórica com alternâncias de
distintas tendências, principalmente, centradas nas áreas médicas, militares e
esportistas foi se destacando historicamente ao longo do tempo e com isso
“negociando” determinados significados para diversificados contextos.
Contudo, destaco por escolha narrativa da figura do então, eminente
parecerista do Império, Rui Barbosa de Oliveira, como uma das primeiras
autoridades representativas do regime vigente, a valorizar a Educação Física no
contexto escolar, sobretudo quando em 1882 pede a inclusão das ginásticas nas
escolas e a equiparação de seus professores aos das outras disciplinas
(Marinho, 1980).
Rui Barbosa considerava ser necessário ter um corpo saudável para
ativar o intelecto, segundo os preceitos médicos, movimento que acontece um
tempo depois da significativa reforma Couto Ferraz2 de 1851, a qual tornou
obrigatória a Educação Física nas escolas do município da corte, certamente o
início oficial da educação fiscal escolar brasileira (CANTARINO FILHO 1982,
apud Betti 1991).
As conexões entre indivíduo e a conjuntura histórica devem ser
compreendidas como trajeto de mão dupla, no qual o personagem interfere na
realidade a partir de suas opções pessoais e o contexto histórico, que por sua
vez, intervém diretamente nas opções do indivíduo (Bediaga, 2017).
Entretanto, na época, a efetiva implantação da Educação Física ficou
restrita, até os primeiros anos da década de 30, á escolas do Rio de Janeiro,
enquanto município da corte imperial e capital da República, e as escolas
militares (Betti, 1991).
Contudo, e ciente de evidentes contradições apresentadas,
principalmente nas reflexões contidas na obra intitulada “Educação Física no
Brasil a história que não se conta” do professor Lino Castellani Filho (1988),
2 Natural da cidade do Rio de Janeiro, Luís Pedreira do Couto Ferraz, também conhecido como
“Visconde do Bom Retiro” nasceu em 1818, filho de um desembargador de mesmo nome, que paralelamente à carreira jurídica foi deputado suplente pela Bahia na Assembleia Constituinte de 1823 e exerceu mandato na Câmara dos Deputados de 1826 a 1829. Regulou a reforma do ensino primário e secundário do Município da Corte (Rio de Janeiro). Portanto, elaborou um projeto que traçava linhas gerais sobre a instrução pública do Império (BEDIAGA, 2017).
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consideramos o recorte narrativo histórico escolhido como um marco significativo
na presença da Educação Física no espaço escolar.
No entanto, o mero fato de a Educação Física ser considerada como
atividade relegada a algo sem importância, simples executora de tarefas,
vinculada ao trabalho físico e manual é um exemplo da dificuldade em legitimar-
se enquanto área de conhecimento no sistema escolar brasileiro (Castellani
Filho, 1988).
Apenas em 1937, na elaboração da Constituição, é que se fez a primeira
referência explícita a Educação Física em textos constitucionais federais,
incluindo-a no currículo como prática educativa obrigatória e não como disciplina
curricular (Brasil, 1997). Na promulgação do texto final da primeira Lei de
Diretrizes e Bases da Educação de (Lei, 4024/61), de 20 de dezembro ficou
determinada a obrigatoriedade da Educação Física para o ensino primário e
médio.
Logo, na esteira dos fatos, a Educação Física ganhou, nos contornos da
década de 1970, novamente, funções importantes para a manutenção da ordem
e do progresso inclusive no que tange o uso do esporte amparado pela
campanha da seleção brasileira de futebol, na campanha da copa do mundo de
futebol de 1970 estreitaram-se assim vínculos entre esporte e nacionalismo
(Betti, 1991).
Já a década de 1980 foi de grande relevância para o contexto da
Educação Física no espaço escolar, inclusive, pelo desenvolvimento e confronto
de algumas abordagens pedagógicas organizadas sinalizando certo
distanciamento de seu caráter exclusivamente biológico e instrumental que
visava a priori o desempenho técnico e físico dos alunos (Betti, 1991; Kunz,
2006). Ainda na década de 1980, um processo intenso de reflexão sobre a área
deu origem a uma crise acadêmico-conceitual. Esta crise gerou inúmeras críticas
a todos os objetivos e propostas historicamente produzidos (Freire; Oliveira,
2004).
Contudo, ciente da distância histórica dos apontamentos apresentados
e mais próximo dos dias atuais foi certamente na nova LDB, Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Brasileira (9394/96), o grande avanço para a Educação
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Física no que diz respeito a sua presença no território escolar como componente
curricular obrigatório em vigência até os dias atuais. A destacada Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), de 1996 é a legislação que
regulamenta o sistema educacional (público ou privado) do Brasil e estabelece
no seu artigo 26 que a Educação Física, integrada à proposta pedagógica da
escola, é um componente obrigatório da Educação Básica constituída por três
etapas: educação infantil, ensino fundamental e médio.
Na sequência e com a intenção de sustentar renovados apontamentos
para o componente curricular, o surgimento, a ampla divulgação, dos
documentos intitulados: “Parâmetros Curriculares Nacionais” (1997) coloca a
Educação Física em outro estado de significação ampliando o debate reflexivo
da constituição do componente a luz da então reorganizada LDB de 1996.
Por extensão, a Educação Física, para ser reconhecida como um
componente curricular tão importante quanto os demais, deve apresentar
objetivos claros e um corpo de conhecimentos específico e organizado, cuja
aprendizagem possa colaborar para que os objetivos da educação escolar sejam
alcançados (Freire, 1999).
Nesse sentido, inúmeras ações de reconhecimento, ampliação e
modificação dos currículos bem como as perspectivas da disciplina ganham
certo espaço, como um todo no espaço escolar na tentativa de atender aos
anseios da sociedade e do sistema educacional vigente, o que certamente não
foi exclusividade desse componente.
Contudo, desde que a Educação Física foi inserida nas escolas
brasileiras, tentamos convencer as pessoas de sua importância criando
argumentos e elaborando propostas de trabalho, sempre acompanhando à
conjuntura política e social vivida pelo país e pelo sistema educacional assim
como nos mostram Freire e Oliveira (2004).
No entanto, constata-se que a Educação Física não apresenta um corpo
estável de conhecimento durante seu processo histórico. Nas décadas de 1980
e 1990 houveram tentativas de delimitar o conhecimento dessa disciplina; no
entanto, a discussão permaneceu no campo teórico e não alcançou de forma
significativa a realidade da escola (Ventura et al, 2006).
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No cenário apresentado, destaca-se para o recorte desse estudo parte
da composição histórica da presença do componente curricular de Educação
Física no espaço escolar. bem como o avanço da centralidade dos seus
principais artífices, os docentes. O conjunto que ampara essa centralidade
envolve, inclusive, histórias de vida e de formação que ao longo do tempo
constituem os docentes enquanto sujeitos e no exercício de sua profissão.
Possivelmente, esse conjunto fornece subsídios significativos ao fazer
pedagógico que organiza uma estrutura quase que simbiótica, envolvendo a
pessoa e o profissional professor, essa estrutura, então organizada, vai se
transformando gradativamente ao longo do tempo impactando na construção de
seus saberes. Nesse sentido não podemos perder de vista a pessoa que é o
professor, ao se estudar os saberes que estes possuem, pois que não se deixa
de ser a pessoa que é quando adentra a sala de aula (Nóvoa, 1992).
Já Saviani (1996), renomado filósofo e pedagogo brasileiro, destaca que
os professores no exercício docente precisavam ter uma visão de mundo, uma
concepção de educação, e de ensino, logo essas concepções determinariam
quais os tipos de saberes deveriam ser mobilizados em situações de sala de
aula e/ou fora dela. Dada essa importância, Sacristán (2000), relaciona inclusive
o fazer pedagógico ao currículo e evidencia o papel dos professores como
elementos de primeira grandeza na concretização dessa relação.
Todavia, o papel dos professores na articulação do processo curricular
é fundamental. Eles são de fato os grandes artífices, queira ou não, da
construção dos currículos que se materializam nas escolas e nas salas de aula
(Moreira; Candau, 2007).
Diante disso, reflexões do pesquisador canadense Maurice Tardif,
apontam ser muito difícil em determinados casos, cindir o trabalho do docente
da pessoa do docente, evidencia, inclusive, o papel significativo dos “saberes”
como um elemento para melhor orientar os pressupostos que voltam o olhar para
a centralidade dos docentes no contexto escolar (Tardif, 2008).
Tardif (2008), na conhecida obra, intitulada: “Saberes Docentes e
Formação Profissional” descreve a respeito dos saberes docentes e a sua
relação com a formação profissional dos professores, com o próprio exercício da
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docência e a pessoa do docente em cuidadosa análise. Em síntese o autor
apresenta um panorama das pesquisas educacionais a partir dos anos 1990
destacando a avaliação das reformas implantadas com ênfase na formação
profissional dos professores e à visão dos seus saberes.
Segundo Tardif (2008) o saber não é uma coisa que flutua no espaço: o
saber dos professores é um saber pessoal e está relacionado com a pessoa e a
identidade do indivíduo, com a sua experiência profissional e também de vida.
Diante disso, destaco os saberes experienciais ou da experiência dos
professores para organização de parte dessa investigação. Por definição, os
saberes experienciais são específicos, baseados no cotidiano e no
conhecimento do meio, resultado de um processo de construção individual, mas,
ao mesmo tempo, compartilhados e legitimados por meio de processos de
socialização profissional constante. Esses saberes brotam da experiência e são
por ela validados (Tardif; Lessard; Lahayne, 1991).
Tardif (2008) aponta, inclusive, para à existência de quatro tipos
diferentes de saberes constitutivos da prática docente, classificados como:
saberes disciplinares; saberes curriculares; saberes de formação profissional e
os saberes experienciais ou da experiência.
(Figura 01: Elaboração do autor, baseado em Tardif, 2002)
SABERES DOCENTES
DISCIPLINARES CURRICULARES FORMAÇÃO EXPERIÊNCIAIS
PLURAL
22
Tardif (2008) destaca de forma enfática a composição plural dos saberes
na prática e sua estreita relação com a composição da formação profissional ao
longo da vida, orientada principalmente por saberem relacionados ao campo das
experiências.
Os saberes experiências ou da experiência, são aqueles que resultam
especificamente do próprio exercício profissional dos professores. Esses
saberes são produzidos por intermédio das vivências de situações
contextualizadas no ambiente educacional e suas relações estabelecidas,
considerando que:
“[...] Esses saberes brotam da experiência e são por ela validados. Eles incorporam-se à experiência individual e coletiva sob a forma de habitus e de habilidades, de saber-fazer e de saber ser”. Podemos chamá-los de saberes experiências ou práticos [...]” (TARDIF, 2008, pág. 39).
No recorte desta investigação, e consciente da existência de outras
reflexões acerca da temática, destaco os saberes da experiência do trabalho
cotidiano como elemento que parece constituir o alicerce da prática e da
competência profissional, pois essa experiência é, para o professor, a condição
para a aquisição e produção de seus próprios saberes profissionais (Tardif,
2008).
Tardif; Lessard; Lahayne (1991), acreditam que os docentes, a partir de
seus saberes oriundos da experiência, desenvolvem inclusive um olhar crítico
em relação a sua formação inicial. Com a experiência de ensino, o professor
começa a elaborar sua forma de lidar com as mais diversas situações que
ocorrem na sala de aula e na sua profissão como um todo.
É por meio de um movimento de articulação entre os saberes que os
professores podem se tornar capazes de perceber as peculiaridades de sua
atividade profissional e com base nisso reconfiguraram suas formas de saber-
fazer docente de modo sistemático, dinâmico e contínuo (Pimenta, 2000).
Diante disso, destaco em particular reflexão, que os saberes docentes
não provêm de uma única fonte, na medida em que o tempo passa, novas
atitudes e decisões despertam por intermédio das experiências práticas, pois
ninguém se forma professor ou professora, esses vão se constituindo ao longo
do tempo.
23
No entanto, o estudo apresentado não tem como objetivo analisar e/ou
discutir elementos legitimadores nem tão pouco epistemológicos que
fundamentam em definitivo os saberes e/ou conceitos de educação e ensino,
mas, sobretudo busca promover uma articulação mais perceptiva sobre os
saberes e a constituição de suas relações associados ao fazer (ato) pedagógico
docente no fomento de espaços de escuta atentos e acolhedores a medida do
possível.
3. OS SABERES E A CONSTITUIÇÃO DE SUAS RELAÇÕES
Certamente, a busca pela compreensão que antecede o conhecimento
das relações e constituição dos saberes docente, e suas relações não é tarefa
muito simples, partindo do exposto e distante de demasiada “ingenuidade” não
existe maneira de compreender os saberes docentes sem ouvir, ver, investigar
e reconhecer elementos significativos dessa constituição, sobretudo presentes
no ato pedagógico.
O (ato), fazer pedagógico pode ser entendido, em particular definição,
como uma ação de cunho didático pedagógico intencional e adequado às
necessidades dos educandos e educandas na medida em que a relação entre o
ensino e aprendizagem se constituiu ao longo de um processo em um
determinado tempo.
Essa relação envolve variáveis distintas para além daquelas de emprego
instrumental ou de ordem didático e/ou técnico - científico e formativo centrado
apenas no resultado, pois a relação dos docentes com os saberes não se reduz
a uma função de transmissão dos conhecimentos construídos (Tardif, 2008).
A forma de entender os saberes e a relação existente entre eles,
destacada nos estudos de Gauthier, (1998) e reafirmada por Tardif, (2008)
esclarece que é muito mais pertinente conceber o ensino como a mobilização de
vários saberes que formam uma espécie de reservatório, no qual o professor se
abastece para responder a exigências específicas de sua situação concreta de
ensino.
24
Tardif (2008) evidencia inclusive que na maioria das vezes os docentes
precisam tomar decisões e desenvolver estratégias de ação em plena atividade
do fazer pedagógico, sem se apoiar num "saber-fazer técnico – científico” que
lhes permita controlar a situação.
Em Schön (2000), encontramos também a reflexão que esses
profissionais (docentes) não atuam no mundo real como técnicos ou cientistas
em laboratórios; a atividade não é um modelo de ciências aplicada (pragmática),
pois esta é em grande parte improvisada e construída durante seu
desenvolvimento prático.
Diante do exposto, certamente não podemos desconsiderar também os
saberes “curriculares” e/ou “disciplinares” em reconhecimento a composição de
um saber plural, formado pelo amálgama, mais ou menos coerente, de saberes
oriundos de saberes disciplinares, curriculares e experienciais que são
igualmente de grande importância na composição do fazer pedagógico (Tardif,
2008).
Logo os saberes “curriculares” por definição, são conhecimentos
relacionados à forma como as instituições educacionais fazem a gestão dos
conhecimentos socialmente produzidos e que devem ser ensinados aos
estudantes, já os saberes “disciplinares” apresentam-se, concretamente, sob a
forma de programas escolares (objetivos, conteúdos, métodos) que os
professores devem aprender e aplicar (Tardif, 2008).
Concordamos com Gauthier (1998) e Tardif (2008), que dominar os
conteúdos específicos não garante uma prática pedagógica eficaz. Trata-se de
uma questão histórica, no sentido de que a atividade docente, durante muito
tempo, foi pautada pela ênfase na transmissão de conteúdos prontos e
inquestionáveis.
No entanto, outras relações são fundamentais para o exercício da
atividade docente nesse processo para além dessa transmissão do “pronto e
inquestionável”.
Ao entrar na sala de aula o docente penetra em um ambiente de trabalho
construído, sobretudo de interações humana. Essa ação revela um dos maiores
25
desafios na construção do ato pedagógico e na mobilização dos seus saberes
(Tardif, 2008).
(Figura - 02: Elaboração do autor evidenciando aproximações entre os docentes e práticas
pedagógicas centradas nas interações humanas).
Contudo, não podemos considerar os agentes sociais envolvidos nesse
processo de forma isolada, sem dar conta dos aspectos fundamentais que dão
sentido ao que acontece em sala de aula, envolvendo a dimensão pessoal, ou
seja, os vínculos e a constituição das relações entre os sujeitos escolares. Por
esse motivo, não é possível reconhecer os saberes docentes sem considerar as
interações estabelecidas nas situações de ensino e de trabalho (Borges, 2004).
Portanto, nesse estudo, estendemos o olhar para aspectos dos saberes
docentes mobilizados na prática do ato pedagógico na dimensão experiencial ou
da própria experiência centrada, sobretudo, nas interações e/ou relações
humanas.
A relação entre o fazer (ato) pedagógico e as relações humanas são
“estreitas” demais e ao pensarmos o que de fato define uma boa prática
pedagógica estamos ao mesmo tempo refletindo sobre essas relações no
cotidiano.
O sociólogo e filósofo francês Edgard Morin na obra intitulada: “Os Sete
Saberes Necessários à Educação do Futuro (2000)” destaca a condição humana
(reflexão) e suas relações (social) como um objeto essencial para todo o contexto
do ensino. Concordando com as reflexões de Morin (2000), somos culturais, mas
precisamos refletir que somos também míticos, psíquicos, físicos, imaginários na
Interações humanas
Práticas
Pedagógicas
Docentes
26
ideia de “multidimensionalidade do ser” um princípio fundamental a ser
considerado na construção do fazer pedagógico para além das questões
didáticas, técnico - científicas e formativas.
Ainda sobre as reflexões de Morin (2000), as interações humanas
consistem em compreender não só os outros, mas a si mesmo, bem como
entender o ser humano como parte essencial da construção da sociedade e vice-
versa.
Com mudanças significativas acontecendo na sociedade
contemporânea, o ato de olhar para os processos educativos e
consequentemente, para o espaço escolar e seus territórios não podemos
desconsiderar a centralidade dessas relações e seus impactos no exercício
docente traduzido por vezes no fazer pedagógico.
Contudo e alinhado a essa perspectiva, a prática pedagógica das aulas
de Educação Física, que já foi identificada pelo controle, rigidez e colaboração
na dita “produção de corpos dóceis e saudáveis” para o mercado de trabalho,
hoje transita por intenções renovadas voltadas para o espaço escolar e suas
relações estabelecidas no trânsito desse espaço (Betti, 1991; Coletivo de
Autores, 1992).
Diante disso, identificamos no componente curricular de Educação
Física no espaço escolar uma maior representatividade na atualidade, centrada
em relações mais amplas que compreendem a importância da organização bem
como problematização dos diversos aspectos associados aos elementos da
cultura corporal.
Portanto, nas reflexões de Morin (2000) não basta ter um modelo
educacional baseado apenas na técnica e/ou na racionalidade, pois a educação
deve ter o papel fundamental centrado nas humanidades, que enriquece nosso
destino e dos outros.
Distante de definições que destacam perspectivas e/ou abordagens
curriculares, em torno do componente curricular de Educação Física, essa
construção capitular evidencia, de forma sucinta, aspectos e transformações
relevantes com potencial de impactar a esfera profissional docente definindo,
inclusive, contornos e significados identitário.
27
4. A IDENTIDADE DOCENTE E SEUS CONTORNOS PROFISSIONAIS
A identidade, distante da característica do que é idêntico, é
compreendida como um conjunto de características no ser humano, que
distinguem, de certa forma, uma pessoa da outra e por meio das quais é possível
individualizá-las.
Embora a ideia de identidade venha sendo tratada ao longo da história
de diversas formas, a modernidade possibilitou o rompimento com o passado
bem como o surgimento de uma nova e decisiva forma de individualismo, que
por sua vez permitiu uma nova concepção do sujeito individual e de sua
identidade (Silva, 2009).
Segundo Hall (2006), a concepção de identidade atualmente sinaliza
para uma identidade móvel, inacabada em franco movimento e construção,
distante inclusive da ideia de algo fixo (como no passado) naturalizado
principalmente pelos princípios biológicos e amparados por uma sociedade de
certa forma reguladora, considerando:
“[...] A identidade torna-se então uma “celebração móvel” formada e transformada continuamente em relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam. É definida historicamente e não biologicamente. O sujeito assume identidades diferentes em diferentes momentos, identidades que não são unificadas ao redor de um “eu” coerente [...]” (HALL, 2006, p. 13).
A construção indenitária depende sempre do retorno de informações
propiciadas dos outros. Há sempre muitas identidades que nos atravessam, tais
como a pessoal, a familiar, a social, a profissional e assim por diante, na verdade
o que muda é o sistema de representações ao qual nos referimos e diante do
qual ocorre nosso reconhecimento que pode ser simbólico e por vezes
inconsciente.
A identidade não é uma essência: não é um dado ou um fato, seja da
natureza, seja da cultura. A identidade seguramente não é fixa, estável, coerente
e unificada, permanente. A identidade tampouco é homogênea. Por outro lado,
a identidade é uma construção:
28
“A afirmação "sou brasileiro", na verdade, é parte de uma extensa cadeia de "negações", de expressões negativas de identidade, de diferenças. Por trás da afirmação "sou brasileiro" deve-se ler: "não sou argentino", "não sou chinês", "não sou japonês" e assim por diante, numa cadeia, neste caso, quase interminável [...]” (SILVA, 2008, p. 75).
Tão logo, o processo de profissionalização docente atrelado à
constituição de sua identidade, ganha contornos definitivos no espaço escolar
na medida em que os questionamentos sobre o ensino e a aprendizagem
buscam compreender processos não mais centrados exclusivamente na
aprendizagem, mas também no ensino.
Morgado (2011) e Flores (2014) consideram que o conceito de
profissionalidade docente inclui, o entendimento de como os docentes se situam
e agem no contexto de trabalho, forjando uma identidade que tanto afeta como
é igualmente afetada por esse contexto. Assim, esses autores concordam que o
contexto de trabalho é fundamental para a constituição de profissionalidade
docente.
A profissionalização docente opera a partir da adesão coletiva (implícita
ou explícita) de um conjunto de normas e de valores. No princípio do século XX,
este é alimentado pela crença generalizada nas potencialidades da escola e na
sua expansão ao conjunto da sociedade.
Para Morgado (2011) a docência deve ser vista como uma profissão que
não tem encontrado o necessário reconhecimento social como agente de
mudança, e a importância atribuída à escola depende, basicamente, da
autonomia curricular a ser construída pelo corpo docente em relação aos
seguintes aspectos: competência profissional, identidade profissional e
profissionalidade docente.
Já os principais dilemas apontados por Nóvoa (1995) na década de 90
estavam direcionados a retomada de um processo legitimador da docência.
Pautado inclusive na existência de uma brecha entre a visão idealizada e a
realidade concreta do ensino. Outro dilema está pautado nos desafios frente ao
distanciamento dos interesses exclusivamente mercadológicos presentes,
destacando a necessidade de adesão a novos valores. Tal afirmação ganha
novos significados, pois apesar de certa distância do impacto da ocorrência
29
social apresentada por Nóvoa (1995), seus apontamentos são de grande
relevância na contemporaneidade do cenário educacional.
A adesão a novos valores pode facilitar a redução das margens de
ambiguidade que afetam a profissão. Não mais como doutrinador, mas sim como
mediadores, não mais o único agente cultural das relações, mas sim um
compartilhador integrado a um grupo representado no seu exercício profissional
(Nóvoa, 1995)
Certamente a função escolar na atualidade está confusa e com isso tem
suas expectativas reduzidas. Diante desse cenário a figura do professor como
agente da representação social encontra-se literalmente localizado no “olho do
furacão” termo muitas vezes evidenciado pelo educador português Rui Canário
(2006) que destaca, inclusive, o ambiente escolar com um espaço de promessas
e incertezas.
Nóvoa (1999) reconhece que a atividade docente é um processo de
construção social e que apesar das inevitáveis lutas e conflitos, tem-se
construído em torno de duas dimensões básicas: a organização de um conjunto
de normas e valores orientadores do exercício da atividade docente e a
construção de um corpo de conhecimentos e de técnicas específicas da
profissão.
Nesse contexto, a identidade profissional dos docentes pode ser vista
como uma construção social na qual participam múltiplos fatores que interagem
continuamente entre si, resultando numa série de representações por meio das
quais os professores estabelecem, consciente e inconscientemente, diversas
negociações (SILVA; JUNIOR, 2019).
As identidades sociais e profissionais típicas, não são nem somente as
expressões psicológicas de personalidades individuais nem somente os
produtos de estruturas ou de políticas econômicas impostas lá do alto. Elas são
construções sociais que pressupõem a interação entre as trajetórias individuais
e os sistemas de emprego, trabalho e formação (Dubar, 1996).
Para o sociólogo e psicólogo clínico Italiano Alberto Melucci (2004),
quando falamos de identidade, três elementos estão sempre presentes: a
continuidade de um sujeito, apesar das variações no tempo e das inevitáveis
30
adaptações ao meio ambiente; a delimitação desse sujeito em relação aos
demais; e a capacidade de reconhecer-se e de ser reconhecido.
A identidade se constitui nas relações sociais, pois nossas ações não
são o simples reflexo dos nossos vínculos exclusivos biológicos e ambientais,
são produções simbólicas de sentidos que, ao serem reconhecidas por nós
mesmos, se tornam nossa propriedade e possibilitam a troca com os outros de
forma compartilhada (Melucci, 2004).
À medida que os discursos pedagógicos e sociais acentuam o papel dos
professores em relação à prática pedagógica, verifica-se que os discursos
atribuem aos docentes uma hiper-responsabilidade tanto em relação à prática
pedagógica como em relação à qualidade de ensino. Essa situação reflete um
sistema escolar centrado na figura do professor como condutor dos processos
institucionalizados de educação (Silva, 2009).
A participação do sujeito em ambientes coletivos é fundamental na
construção das identidades profissionais. Algumas mudanças sociais como a
implantação da industrialização e a universalização da educação, provocando o
rebaixamento salarial e a descaracterização do status docente, transformaram
radicalmente a identidade docente pautada tradicionalmente na imagem de
sacerdócio, mudando-a para educadores de ensino e posteriormente os
trabalhadores da educação (Silva, 2009).
Concordando com Nóvoa (1999), certo da atualidade de suas reflexões,
no apontamento que evidencia que ao olharmos para a história verificamos que
nunca a fragilidade associativa dos professores foi tão grande, o que não deixa
de ser preocupante. A profissionalização dos professores está dependente da
possibilidade de construir um saber pedagógico que não seja puramente
instrumental. Por isso, é natural que os momentos de produção de um discurso
científico em educação sejam, também, momentos de afirmação profissional.
Certo da presença do discurso pedagógico que acentua o papel social
do professor e da instituição, por vezes, os docentes são “invisibilizados” e com
isso não são representados na centralidade e amplitude necessária. Então,
mesmo diante de diversos contornos em torno de sua constituição identitária e
associada à sua profissionalização, torna-se fundamental e igualmente
31
necessário fomentar espaços de escuta acolhedores dentro dos contextos e
territórios educacionais emergentes.
5. CARTAS PEDAGÓGICAS: DIÁLOGOS CORRESPONDENTES
Em todos os tempos, entre diferentes povos, culturas e classes sociais,
escrever e receber cartas significou (e significa) um gesto amoroso e de gratidão
entre as pessoas. Isto é escrever cartas sempre foi uma forma de se comunicar
(Camini, 2012).
Cartas, enquanto recursos pedagógicos, já foram utilizadas por Paulo
Freire há muitos anos no Brasil e no mundo. As cartas e seus livros cartas eram
uma maneira de dialogar, inclusive, com os seus alunos e possíveis leitores
(Paula, 2018).
No caso de Paulo Freire chama a atenção à quantidade de cartas
recebidas por ele depois do exílio. O assédio missivista foi tão grande que por
maior esforço que ele fizesse, não dava conta de responder tudo. É óbvio que
essa expansão das missivas recebida por ele se deu em razão da divulgação do
seu trabalho pelo mundo (Coelho, 2011).
As Cartas Pedagógicas consistem, em linhas gerais, no fomento
dialógico por intermédio de produções alinhadas a livre reflexão de quem as
produz estimuladas por fases, via cartas, sempre no intuito de ampliar a
compreensão e estimular o diálogo sensível frente ao que se tematiza. Uma carta
só terá cunho pedagógico se seu conteúdo conseguir interagir com o ser
humano, comunicar o humano de si para o humano do outro, provocando este
diálogo pedagógico (Camini, 2012).
A carta é um documento, peça para o diálogo, prosa, comunicação mais
direta, coloquial, direcionada a um interlocutor. Há nelas um sentido, ao mesmo
tempo, objetivo e subjetivo, coloquial e formal, prosaico e poético. No âmbito da
troca de informações e de saberes, as epístolas pressupõem mais diretamente
uma relação entre o eu e o outro (Moraes; Paiva, 2018).
32
É relevante nos perguntarmos qual o objetivo de escrever cartas
pedagógicas, pois, toda escrita é um discurso e, assim, tem uma
intencionalidade. Uma carta pedagógica, certamente quer iniciar um diálogo
sobre o que se decidiu provocar, portanto, qual a diferença de uma carta
pedagógica para carta convencional? A resposta é que a carta pedagógica tem
dois elementos que uma carta convencional não tem: deseja produzir
conhecimento e tem uma postura política. Isso é o que diferencia a carta
pedagógica. Portanto, nesse contexto, a carta é pedagógica porque é política, e
é política porque é pedagógica. A reflexão compartilhada pelo remetente
estimula uma nova prática do receptor, ou uma nova reflexão, que é devolvida
ao remetente. É o diálogo se fazendo no vai e vem dos textos (Paulo; Dickmann,
2020).
Diante do pressuposto, destacamos que a gênese das cartas
pedagógicas, aqui referenciadas, ganham definitivos contornos no movimento
denominado Educação Popular, que tem no educador brasileiro Paulo Freire uns
dos seus mais destacados representantes. É importante salientar que Educação
Popular não se trata de uma educação informal ou de educação que acontece
nas comunidades. Ao falar em popular, dialogando com Freire, nos remetemos
à Educação Popular enquanto atividade teórico-prática coletiva na busca da
libertação. Isto é, educação como processo de humanização (Paulo, 2020).
A Educação Popular objetiva a formação de sujeitos com conhecimento
transformador. Assim, conscientização e organização do trabalho político-
pedagógico são inerentes ao processo de humanização com vistas à
transformação social. A Educação Popular está comprometida com o
desenvolvimento do ser humano em sua totalidade, entendendo a educação com
sentido amplo (Paulo; Dickmann, 2020).
Sabemos que o paradigma predominante da Educação Popular
brasileira nos anos 70/80, foi um conjunto de ideias políticas, filosóficas e
pedagógicas que nasceu com os Movimentos de Educação de Base e Cultura
Popular no final dos anos de 1950 e início de 1960 (Gohn, 2017). Nas décadas
de 1970 e 1980 o movimento de Educação Popular foi essencial para a
construção dos referenciais que predominaram nas atividades de formação dos
movimentos sociais que se consolidaram na época.
33
Toda carta pedagógica tem seu início na história de vida e na realidade
de quem escreve. Em outras palavras, escrevemos a partir do que vivemos e de
onde vivemos. Logo, uma carta pedagógica sempre expressará vida. Embora
óbvio, este elemento, ele nos ajuda a compreender a dimensão humana
concreta das cartas em suas linhas (Paulo; Dickmann, 2020).
No entanto, a temática central desse estudo, alinhada às reflexões do
educador Paulo Freire e o seu modo de escrever cartas, foram inspirados, a
priori, e principalmente nas obras do autor intituladas: “Cartas à Guiné-Bissau:
registros de uma experiência em processo”, “Cartas a Cristina, reflexões sobre
minha vida e minha práxis” e “Professora sim, tia não: cartas a quem ousa
ensinar”.
Cartas a Guiné-Bissau de 1978, contém correspondência dirigida a
Mário Cabral e aos companheiros dele. Nos dois casos Paulo Freire não queria
se dirigir meramente a uma pessoa específica, mas além da comunidade de
Guiné Bissau, queria provocar a reflexão dos educadores de todo o mundo.
Embora se dirija a uma pessoa historicamente existente, as cartas também
foram publicadas (Coelho, 2011).
Na minha primeira carta já lhe havia expressado o desejo de todos nós de trabalhar com vocês, de dar a nossa contribuição, por mínima que seja, à busca em que necessariamente se encontram de uma nova prática como de uma visão da educação, que responda aos objetivos que a Guiné-Bissau, em processo de recriação, exige [...] (FREIRE, 1978, p. 86).
As cartas consistem em instrumentos poderosos de comunicação, pois
possibilitam um canal direto entre o remetente e o destinatário, no qual o emissor
tem a possibilidade de transmitir e construir a sua mensagem de forma completa,
sem ser interrompido, o que acreditamos ser sua maior característica no sentido
de viabilizar reflexões mais profundas, talvez uma espécie de “conversa” com
nós mesmos (Portal, 2013).
A leitura de suas obras nos permite amadurecer conceitos como a
necessidade de uma educação a partir de uma perspectiva mais crítica e
autônoma, para a formação de sujeitos capazes de transformar política e
socialmente suas realidades, em outras palavras objetiva empoderar os sujeitos,
tornando-os mais ativos e conhecedores de seu papel diante da história.
34
Então, se concebemos a educação enquanto humanização, em uma
perspectiva de mudança da realidade, relaciona-se a uma proposta pedagógica
que vislumbre um mundo mais humanizado consideramos as reflexões de Paulo
Freire extremamente atuais centradas no diálogo. A propósito, é bem provável
que não encontremos nenhuma obra de Paulo Freire que não tenha como
centralidade o diálogo nas suas diversas facetas e a busca da mais acessível
comunicabilidade (Coelho, 2011).
As cartas pedagógicas oportunizam aos seus leitores e leitoras uma
visão dinâmica das atividades desenvolvidas e a reflexão de alguns problemas
que elas suscitam, as cartas recolocam a educação no espaço do coloquial e do
afetivo (Freire, 2003).
Contudo, analisando o conceito de educação de Paulo Freire (2003),
temos a pedagogia como humanização, pois Freire também se utilizou do
recurso de cartas, destinadas à sua sobrinha Cristina. Essas cartas foram, para
ele, o fortalecimento do vínculo familiar alicerçado na escrita de si o que
evidencia a amplitude desse recurso.
Paulo Freire abordava questões que considerava fundamentais e
relaciona as dimensões pessoais ao contexto histórico vigente, porém em Cartas
a Cristina embora se dirigindo a uma pessoa real (sua sobrinha) ele, na verdade
dirigia-se ao mundo, como exposto:
Cheguei Cristina, ao fim do primeiro momento destas cartas a você. Está é por min mesmo, uma carta de transição entre as que, atendendo a sua solicitação inicial. falei preponderantemente de mim. De mim menino, de min jovem, de min homem. Ou também em torno de mim, de como penso, de como submeto sempre minha prática a uma reflexão teórica, de como, se martirizar-me e punir-me, procuro ser coerente [...] (FREIRE, 2019, pág. 226).
Ao exemplo apresentado na obra “Cartas a Cristina, reflexões sobre
minha vida e minha práxis”, nitidamente, Paulo Freire se volta para aspectos
profundos com a intenção de analisar crítica e filosoficamente sua própria vida,
como sujeito de forma liricamente realista, em seu tempo histórico endereçado
a sua sobrinha Cristina, atendendo sua solicitação (Freire, 2019).
À ideia de perscrutar, fuçando os “segredos” do remetente; uma dada
missiva, direcionada ao destinatário específico, mas que passa a se tornar
35
pública, intencionalmente de domínio geral, assume certa configuração de “Carta
Pedagógica” (Moraes; Paiva, 2018).
Dentre as referências literárias, intermediadas pela pedagogia da
dialogicidade de Paulo Freire destacamos também a obra “Cartas a Guiné-
Bissau registros de uma experiência em processo”, como um marco significativo
na compreensão de tal perspectiva, estimulando o diálogo reflexivo e sensível
dotado de franca intencionalidade libertadora.
Já na obra intitulada: “Professora sim, tia não: cartas a quem ousa
ensinar” Paulo Freire utiliza o gênero literário carta, enumerando-as em dez,
revelando mais uma vez seu compromisso ético-político, sempre acompanhado
de uma delicadeza pouco comum no meio acadêmico. Nele, a razão crítica está
aliada ao desejo, às emoções, aos sentimentos, mas nem por isso se mostra
menos exigente, não havendo dicotomia entre razão e emoção (Coelho, 2011).
Nos apontamentos de Coelho (2011) em “Professora sim, tia não:
cartas a quem ousa ensinar”, identificamos cartas endereçadas “a quem ousa
ensinar” nas quais, Paulo Freire põe acento à questão política, nos alerta para o
risco da acomodação fatalista em que muitos de nós, educadores, nos
instalamos e afirma:
Esta é na verdade a posição mais cômoda, mas é também a posição de quem se demite da luta, da História. É a posição de quem renuncia ao conflito, sem o qual negamos a dignidade da vida. Não há vida nem humana existência sem briga e sem conflito. O conflito parteja nossa consciência. Negá-lo é desconhecer os mais mínimos pormenores da experiência vital e social. Fugir a ele é ajudar a preservação do status quo (FREIRE, 2003, p. 64).
Esse instrumento vai além, proporciona mais do que possíveis
indicadores, favorece momentos de reflexão, tanto de quem elabora a escrita
como de quem faz a leitura, provocando a análise sob diferentes olhares e
perspectivas de quem escreve a quem se destina (Portal, 2013).
O uso de cartas a partir da análise de trechos delas, procura dar ênfase
às narrativas que tratam do cotidiano, no qual estão descritas/representadas
situações vivenciadas no dia-a-dia, destacando os significados atribuídos e
sinaliza que seu uso contribui pelo seu caráter espontâneo, levando a uma leitura
36
muito mais rica em detalhes que favorece uma análise detalhada do cotidiano
(Cunha, 2008).
O gênero carta, é dialógico e pedagógico (dialogicidade) na sua própria
natureza. A escrita em forma de carta ou por meio do gênero carta nos leva a
um envolvimento pessoal em nossas relações com os outros, certamente um
convite permanente ao diálogo (Coelho, 2011).
Portanto as cartas consistem em instrumentos poderosos de
comunicação, pois possibilita um canal direto entre o remetente e o destinatário,
no qual o emissor tem a possibilidade de transmitir e construir a sua mensagem
de forma completa, sem ser interrompido. A troca de cartas possibilita um diálogo
mediado pela escrita, permitindo levantar questões, esperar respostas,
prolongar a compreensão de uma noção de um texto, até o mais profundo de si
mesmo (Brandão, 2005).
Poetizar saberes referente a este terreno significa tornar esses saberes
mais leves e instigantes para todos aqueles que buscam inspirações para suas
intervenções cotidianas como educadores, seja no papel de professores, pais,
representantes políticos dentre outros (Moraes; Paiva, 2018).
Nessa direção, Paulo Freire, então secretário de educação da cidade de
São Paulo, no governo de Luiza Erundina, propõe a carta como um dos meios
importantes para manter o diálogo entre ele, equipe de trabalho e educadores.
Podemos observar, em linhas gerais abaixo, que ele (Paulo Freire) não se coloca
no centro da comunicação, informando que as cartas poderiam e deveriam ser
escritas também por outros educadores e educadora (Coelho, 2011):
37
(Figura 04– D.O.M.; São Paulo, 34 (021), 1º fev. 1989 – Suplemento p, 03)
Cartas Pedagógicas, mais que uma ferramenta de caráter formativo ou um
instrumento de comunicação, é um convite a uma “pedagogia correspondente” mais
sensível, humana, engajada ética e politicamente.
Portanto, nesse estudo faremos o uso metodológico de Cartas Pedagógicas,
pautadas principalmente na produção intelectual do educador brasileiro Paulo Freire,
com a intencionalidade de fomentar a criação de espaços de escuta mais acolhedores
no exercício dialógico correspondente com os docentes.
38
Diante disso, e para o contínuo investigativo do estudo, objetivando a produção
das cartas, é necessário reconhecer os contornos dos contextos que envolvem os
saberes articulados de seus artífices no fazer (ato) pedagógico.
6. PROCESSOS METODOLÓGICOS: ESCOLHAS E CONSTRUÇÃO DO
PERCURSO
O processo metodológico como um todo, é uma escolha de grande
relevância para realização da maioria dos estudos. É o processo metodológico
que dá forma, ao definir limites e possibilidades, sua escolha deve ser, sempre
que possível, a mais adequada em relação ao que se propõe investigar.
Nessa direção, o estudo aqui apresentado é de cunho qualitativo, pois
esse tipo de pesquisa, em linhas gerais, envolve uma abordagem interpretativa
do mundo por tratar de questões que se relacionam com singularidades no que
tange a compreensão das experiências humanas.
Contudo, é importante destacar que o tipo de pesquisa aqui escolhida,
representada neste exemplar, se relaciona com o propósito da investigação
envolvendo os docentes do componente curricular de Educação Física no
espaço escolar (territórios) na medida em que as inquietações vão sendo
reveladas e metodologicamente conduzidas.
Ao realizar a investigação científica, através da abordagem qualitativa,
não se investiga em razão de resultados, mas para construir e obter a
compreensão do comportamento a partir da perspectiva dos sujeitos da
investigação, correlacionado com o contexto de que fazem parte (Bogdan;
Biklen, 1994).
A finalidade desse tipo de pesquisa é a capacidade de gerar teoria,
descrição ou compreensão, busca-se compreender o processo mediante o qual
os agentes constroem significados sobre o tema a ser investigado. A abordagem
pressupõe que o mundo seja examinado com a ideia de que nada é trivial, que
tudo tem potencial para construir pistas que nos permita estabelecer uma
compreensão mais esclarecedora do nosso objeto de estudo (Bogdan; Biklen,
1994).
39
O termo qualitativo implica uma partilha densa com pessoas, fatos e
locais que constituem objetos de pesquisa, para extrair os significados visíveis e
latentes (não aparentes) que somente são perceptíveis a uma atenção sensível
os significados do seu objeto de pesquisa (Chizzotti, 2003).
Logo, a evolução histórica da pesquisa qualitativa, com todas as
questões e tensões ainda sobre restantes e inovações crescentes, têm sido
sintetizadas por diversos autores (Erikson, 1986; Kirk, Miller, 1986; LeCompte,
Millroy, Preissle, 1992; Bodgan e Biklen, 1994; Denzin e Lincoln, 2000; Vidich e
Lyman, 2000), que resumiram as transformações e progressos nas ciências
humanas e sociais demarcando os momentos mais significativos de seu
desenvolvimento (Chizzotti, 2003).
Por questões conceituais a pesquisa qualitativa é em si mesma, um
campo de investigação. Ela atravessa disciplinas, campos e temas. Em torno do
termo pesquisa qualitativa, encontramos uma família interligada e complexa de
termos, conceitos e suposições. Certo de que a pesquisa qualitativa em uma
proposta mais contemporânea é uma atividade situada que localiza o observador
no mundo. Consiste em um conjunto de práticas materiais e interpretativas que
dão visibilidade ao mundo (Denzin; Lincoln, 2006).
O campo da pesquisa qualitativa se caracteriza por um embaraço de
opções, pois nunca houve tantas estratégias de investigação, tantos paradigmas
ou métodos de análise para serem utilizados pelos pesquisadores que configura
certamente um momento de descobertas e redescobertas (Denzin; Lincoln,
2006).
Esse tipo de pesquisa, como um conjunto de atividades interpretativas,
não privilegia nenhuma única prática metodológica em relação à outra. É difícil
definir claramente a pesquisa qualitativa como um terreno de discussão ou de
discurso. Ela não pertence a uma única disciplina nem possui um conjunto
distintos de métodos ou práticas que seja inteiramente seu.
A pesquisa qualitativa é um campo interdisciplinar, transdisciplinar e, às vezes, contra disciplinar, que atravessa as humanidades, as ciências sociais as ciências físicas. A pesquisa qualitativa é muita coisa ao mesmo tempo. Tem um foco multiparadigmático [...] (DENZIN; LINCOLN, 2006, p. 21).
40
A competência da pesquisa qualitativa é, portanto, o mundo da
experiência vivida, pois é nele que a crença individual, a ação e a cultura
entrecruzam-se e representa muitas coisas para muitas pessoas, pois a
pesquisa qualitativa é uma atividade situada que localiza o observador no mundo
(Denzin; Lincoln, 2006).
Contudo, a pesquisa qualitativa, em seus diferentes tipos, tem se
ampliado consideravelmente no Brasil. Principalmente a partir dos anos 1980,
diversos tipos de investigação qualitativa têm contribuído para o maior
conhecimento da escola, desde as políticas educacionais até as práticas
educativas cotidianas da sala de aula (EUGENIO; TRINDADE, 2017).
Nesse estudo, parte do problema consiste em viabilizar elementos com
a potencialidade de revelar, sobretudo, o processo reflexivo do percurso docente
que se misturam e se intercruzam entre a dimensão pessoal e profissional.
Para atender a essa justificativa em comunhão com a problemática
destacada, foi escolhida como estratégia metodológica à produção de Cartas
Pedagógicas, por reconhecer a singularidade de sua construção, presente nas
narrativas que compõe o gênero bem como sua potencialidade frente à
correspondência docente gerada no que diz respeito à composição do seu (ato)
fazer pedagógico.
Apropriado à análise dessas narrativas, é importante considerar a
inserção do pesquisador no campo de pesquisa e o cenário pesquisado como
componentes analíticos e por isso, as descrições devem ser densas e
interpretativas, uma das funções do pesquisador qualitativo está em interpretar
os fenômenos em termos dos significados que as pessoas a eles conferem
(Denzin; Lincoln, 2006).
Ao considerar as narrativas, elas não só nos fornecem histórias
individuais, mas também, uma ideia de coletivo, pois estrutura e ação se fazem
presentes no ato em que a trajetória do indivíduo é reconstruída no ato de narrar.
Essas narrativas podem ser consideradas como representações ou
interpretações de uma história, no qual não se deve julgar como um relato
verdadeiro ou falso, que não permite sua comprovação, pois são caracterizadas
41
por expressar a verdade sobre um ponto de vista em seu determinado contexto
de tempo e espaço (Muylaert et al, 2014).
A narrativa nos permite essa troca, esse ouvir o outro em suas
experiências na verdade as narrativas são infinitas em suas variedades, e nós
as encontramos em todos os lugares. Não há experiência humana que não
possa ser expressa na forma de uma narrativa (Jovchelovitch; Bauer, 2015).
O exercício narrativo pode significar inclusive um reencontro reflexivo
sobre teoria e prática no cotidiano docente. No entanto, distante da crença em
que os docentes não refletem sobre sua prática pedagógica, o que seria um
apontamento inoportuno para natureza do estudo e sem elementos tangíveis
para justificar tal afirmação.
Certamente, temos a clareza de que a produção das Cartas
Pedagógicas aqui apresentadas, de certa forma com características singulares,
estimuladas pela correspondência é o que certamente vai diferenciar esse tipo
de produção de outros, mas com características aproximadas.
Diante disso, como escolha metodológica e o reconhecimento do cenário
com um todo, o que certamente define um potencial significativo para análise e
melhor compreensão por intermédios da estratégia de produção viabilizada por
intermédio das cartas pedagógicas.
7. PRODUÇÃO DE DADOS: ACESSO AO CENÁRIO COMO ESCOLHA
METODOLÓGICA
A importância do reconhecimento parcial de um cenário de maior
amplitude (lócus da pesquisa), para melhor compreensão dos elementos
constituintes do estudo, foi considerada de grande relevância, sobretudo para
escolha intencional dos participantes e condução sincrônica do estudo.
Todavia, o reconhecimento desse espaço, mesmo amparado por
instrumentos que auxiliam de forma direta o levantamento dos dados seu
resultado pode ser considerado como algo transitório, visto inevitável velocidade
42
que estão sujeitas às transformações de diversas ordens (social, política,
funcional dentre outras) de impacto reorganizador do cenário apresentado.
Diante disso, apresento um cenário perceptivo e claramente reconhecido
pelos seus aspectos transitórios mencionados anteriormente, mas que no
momento da pesquisa foi de grande importância para o estudo, apresentado na
esfera qualitativa.
Situado no litoral sul de São Paulo e integrante da região metropolitana
da baixada santista, o município de Itanhaém localiza-se entre os municípios de
Mongaguá e Peruíbe. O atendimento do ensino fundamental no município de
Itanhaém tem sido oferecido nas três redes de ensino: estadual, municipal e
particular.
No município de Itanhaém está em funcionamento um total de 48
(quarenta e oito) unidades de ensino com atividades destinadas a educação
básica, sendo 08 (oito) estaduais, 31 (trinta e uma) municipais e 09 (nove)
particulares3 Contudo, interessa a esse estudo somente o cenário referente à
rede municipal de ensino, e consequentemente os docentes do componente
curricular de e Educação Física presentes no quadro estatutário vigente.
Com o propósito de compreender um pouco mais sobre os docentes, em
perspectiva mais estendida elaborou-se um formulário digital (apêndice C) com
perguntas direcionadas a aspectos sociodemográficos e profissionais dos
docentes. O procedimento para acessar os docentes da disciplina de Educação
Física exclusivamente do município de Itanhaém nessa primeira fase do estudo
respeitou os seguintes critérios e procedimentos:
1- Posse da declaração de responsabilidade institucional (anexo 03);
2- Submissão aprovação da pesquisa pelo Comitê de Ética (anexo 04);
3- Elaboração TCLE digital em duas fases, aceite e acesso (apêndice A);
3 . Dados obtidos no último censo escolar registrado no plano municipal de educação de Itanhaém LEI Nº 4.027, de 02 de julho de 2015. Sujeitos a alterações bem como atualizações em todas as esferas administrativas supracitadas.
43
4- Comunicação com a assessora pedagógica via departamento, em auxílio
disparador do questionário por intermédio do e-mail institucional vigente das
unidades no período da produção (dados coletados).
Destaco que anteriormente a solicitação enviada à assessora
pedagógica, a responsável foi devidamente esclarecida sobre a autorização
institucional concedida e da não obrigatoriedade, associada às questões
laborais do cargo, assegurando aos docentes participantes desta fase do estudo
o caráter facultativo da colaboração.
Portanto, para o início dessa fase da produção dos dados amparado no
parecer número: 4.052.650 do CEP (Comitê de ética e pesquisa) CAAE
31326620.5.0000.0089, AMC Serviços Educacionais S/C Ltda. Instituição
Proponente, o estudo pode ser conduzido dentro das perspectivas e dos limites
apresentados.
Os docentes receberam o questionário via e-mail (institucional) por
intermédio da ferramenta digital intitulada Google Formulários4, com anuência
do departamento responsável respeitando todos os procedimentos legais e
termos de livre esclarecimento para cada etapa do processo.
No decorrer do estudo e da produção dos dados, nenhuma reclamação
foi registrada, dando seguimento ao estudo conforme planejado. Como princípio
metodológico, para o entendimento parcial do cenário e de seus representantes
essa primeira fase do estudo buscou compreender a relação do todo dentro de
um contexto em auxílio direto a escolha individual dos participantes destinados
à segunda fase.
Os participantes receberam o questionário via e-mail (institucional) e/ou
aplicativos de mensagens. As participações dos docentes convidados foram
estimuladas inclusive com o auxílio de “grupos virtuais” dentro de aplicativos
organizados para um corpo de professores e professoras destinado ao
componente de Educação Física.
Ao receber os dados, em análise posterior, constatou-se que a rede
municipal contava no momento com aproximadamente 38 (trinta e oito)
4 Formulário disponível no domínio https://forms.gle/XQwvQTPAMJ4Dt5Rr7
44
professores em efetivo exercício de Educação Física no contexto escolar até a
data da produção desses dados.
Um pouco mais da metade desse total, mais precisamente 55%, dos
docentes, responderam ao questionário nessa primeira fase, lembrando que a
participação foi facultativa, como comunicada no TCLE (apêndice A) que
antecede o acesso direto do participante ao questionário.
Entretanto, identificamos que a rede conta com a presença de um
número maior de docentes de Educação Física para além da média
contabilizada, devido aos afastamentos e funções gratificadas dentre outros
aspectos que se distanciam das relações com o espaço escolar e seus territórios
que por escolha e coerência interna do estudo foram desconsiderados para o
recorte.
Temos a clareza de se tratar de um recorte simples não sendo possível,
nesse momento, creditar as respostas tabuladas ao “espelho” da rede muito
menos de seus docentes com exatidão. Contudo as informações aqui
registradas declaram à constituição de um perfil diversificado e de relevância
para a escolha individual (segunda fase) em atendimento aos propósitos deste
estudo.
Diante do exposto, e passado exatos dois meses em posse dos dados
produzidos, foi possível tecer algumas linhas transitórias sobre os resultados,
até o momento da produção desses dados consideramos que:
O perfil dos docentes que responderam ao formulário é representado em
sua maioria pelo gênero masculino (61%), grande parte dos participantes se
reconhece (raça) branca (59%), com primeira e única formação de nível superior
concluída, na maioria dos casos, entre os anos de 2003 a 2005.
Dos participantes a grande maioria possui pós-graduação em nível “lato-
sensu” especialização (70%), curiosamente em pedagogia, no entanto poucos
apresentam formação complementar nível “stricto-sensu” (mestrado) e até o
momento nenhum em nível de doutorado completo até o momento.
Os docentes apresentam experiência média superior a 10 (dez) anos em
efetivo exercício no ambiente escolar, sendo a maioria com atuação, nesse
45
momento, nas séries iniciais do ensino fundamental (1º ao 5ª ano) com cargas
horárias de trabalho equilibradas e as maiorias distribuídas entre 20h e 30h
semanais.
Uma parte significativa dos docentes não possui acúmulo de cargo ou
função gratificada extra ao serviço público. A maioria dos participantes (95%),
sempre que possível declara apresentar disponibilidade para frequentar eventos
de formação continuada de diversas naturezas teórica, prática e se necessário
à distância.
No que tange às referências acadêmicas (formação) muitos apontaram
influências de autores conhecidos (destacados na área da Educação Física no
ambiente escolar), tais como: Mauro Betti, João Batista Freire, Suraya Darido,
Marcos Garcia Neira e Go Tani. O que, de certa forma, sinaliza o assentamento
da perspectiva teórica curricular compartilhada entre os territórios de atuação
dos docentes.
Como principal obra, ainda destacam nos dados a presença e influência
dos PCNs (Parâmetros Curriculares Nacionais) de 1997, referência que em
minha opinião, em breve, será superada pela presença da BNCC (Base Nacional
Comum Curricular) bem como o Currículo Paulista de forma normativa.
Os principais blocos temáticos desenvolvidos no fazer pedagógicos
segundo os participantes correspondem aos Jogos e Brincadeiras seguidos dos
Esportes e das Ginásticas. Destaque para o crescimento do bloco abordado
intitulado: Práticas Corporais de Aventura em relação às Lutas e Danças,
certamente ainda nos domínios classificatórios dos parâmetros curriculares
nacionais.
Quanto à organização de registros, a maioria respondeu positivamente
a essa ação, tendo como principais instrumentos: vídeos e fotografias para os
devidos fins. Destaque crescente para a organização dos registros utilizando
“rodas de conversas” elemento apontado por boa parte dos docentes (45%) ao
final das experimentações propostas no cotidiano de sua prática pedagógica.
Ainda sobre a prática pedagógica, a maioria indica o redirecionamento
frequente quando necessário de suas ações didático pedagógico, o que chama
a atenção são os motivos apresentados que estão associados principalmente às
46
questões climáticas, de espaço e falta de material adequado na maioria dos
casos evidenciados.
Ainda na esteira do fazer pedagógico a maiorias dos docentes (85%)
apontam a utilização de materiais diversificados, no campo das linguagens
audiovisuais, seguido de textos (impressos) com destaque crescente para as
TICs disponíveis (tecnologias de informação e comunicação).
Entretanto, boa parte dos docentes (45%) evidencia que o componente
curricular de Educação Física não ocupa um lugar significativo (espaço de
escuta) em reuniões de conselho de classe e de avaliação interna no espaço
escolar certamente ao olhar para o seu território (individual).
Todavia, uma parte considerável dos docentes (72%) aponta a equipe
gestora (diretores, coordenadores e supervisores) como parceiros frente ao
reconhecimento e apoio dado a legitimidade do componente curricular, o que
parece um tanto incoerente quando comparado com o apontamento anterior
referente a não ocupação de um lugar significativo do componente em
representatividade nas reuniões, conselho de classe e afins no espaço escolar
de seus territórios.
Por fim, dos 23 docentes que responderam o formulário (75%)
encontram-se na maioria das vezes, satisfeitos com o exercício docente e estão
disponíveis para o compartilhamento reflexivo e material do seu fazer
pedagógico com os demais colegas da rede, caso solicitados.
Diante disso, acreditamos que o cenário aqui apresentado, poderá
impactar na produção das Cartas Pedagógicas, pois o contexto social e
formativo docente não deve ser negligenciado na constituição das narrativas,
para o gênero metodológico escolhido nesse estudo.
Portanto, com a produção e breve análise dos dados aqui apresentados,
um importante cenário foi revelado, auxiliando, inclusive, na escolha intencional
dos docentes que construíram suas narrativas por intermédio das Cartas
Pedagógicas como estratégia metodológica, transcorrida na segunda fase do
estudo (escolha individual).
47
7.1 OS PARTICIPANTES: ESCOLHA INDIVIDUAL
Após a dita primeira fase do estudo (refinamento da escolha individual
dos participantes) como critério de escolha intencional, foi considerado para a
segunda fase quatro participantes, representantes de ambos os gêneros,
efetivos da rede, com mais de cinco anos em exercício no cargo do componente
curricular e dispostos à correspondência.
A escolha individual dos participantes, extraídos do questionário5, foi
somada a elementos empíricos e de ordem pessoal para a definição dos
professores participantes da segunda fase do estudo (produção principal).
No entanto, em franca adequação, referente ao imposto distanciamento
social6, recomendado no combate a pandemia do novo coronavírus (COVID-19)
presente na fase de produção dos dados, foram instituídos os contatos pelos
meios digitais (disponíveis) por intermédio inicial de uma carta convite.
A princípio, tínhamos a intenção de fazer o convite aos docentes
pessoalmente respeitando os horários acordados para a produção das cartas,
no sentido de melhor fomentar e esclarecer o processo da produção em franca
correspondência.
Os participantes convidados para segunda fase do estudo, são
estimados colegas de profissão que ao longo de minha trajetória como docente,
na mesma rede, tive a oportunidade de observar como se relacionavam com a
docência no território escolar por intermédio de algumas (muitas) de suas
práticas, sobretudo, testemunhadas em resenhas despretensiosas em rodas de
conversas, sempre na oportunidade dos encontros muitas vezes promovidos
pela própria rede.
Isto posto, a produção das cartas foram prontamente viabilizadas por
intermédio dos meios digitais (mídias) disponíveis: e- mail, watsapp e google
5 No questionário continham perguntas que associavam a satisfação pessoal no exercício da
função docente bem como a possibilidade de compartilhar experiências e vivências com outros colegas de profissão e com o pesquisador. 6 Protocolos de biossegurança de isolamento social ampliando o período de quarentena em todo
estado pela secretaria da saúde de São Paulo na data vigente do estudo no combate a pandemia do novo coronavírus (COVID – 19).
48
metting , respeitando o distanciamento social imposto bem como a integridade
da redação de seus respectivos Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
(TCLE) formulados especificamente para segunda fase deste estudo (anexo
apêndice B).
7.2 CAMPOS DISPARADORES: COMPOSIÇÃO E CONEXÕES
INTERPRETATIVAS
Os estímulos contidos na intencionalidade das cartas, denominados aqui
por mera escolha terminológica organizacional de “campos disparadores”, têm
como principal função, ampliar e estimular o diálogo correspondente no
intermédio da produção das Cartas Pedagógicas, divididas em quatro etapas
interconectadas (campos).
Ao considerar que a elaboração dos ditos campos disparadores, deu-se
pelo fato de compreender em reflexão constante (autoanálise) o meu próprio
percurso enquanto docente que se relaciona diretamente com minha pessoa,
meu fazer pedagógico, meus dilemas e desafios e certamente minhas
perspectivas futuras na integridade (composição) reflexiva da docência exercida.
Para melhor esclarecimento é de considerável importância exemplificar,
em linhas gerais, e de forma sucinta, o composto presente na intenção dos
disparadores articulados metodologicamente com o corpo das cartas (texto)
disparadas em correspondência:
49
(Figura- 04- Elaboração do autor – representação gráfica da conexão entre os
campos disparadores)
1ª campo disparador – PESSOA
Uma importante fase, que consiste em solicitar ao participante a
produção de sua carta de apresentação (autobiográfica), não muito extensa
sobre si, e/ou demais apontamentos se assim desejado pelo participante.
2ª campo disparador – PRÁTICA PEDAGÓGICA
Essa articulação reflexiva solicitou em correspondência uma situação
e/ou prática pedagógica cotidiana, episódica ou generalista (mais ampla) de
escolha pessoal do participante para compor sua narrativa no gênero escolhido
das cartas, nesse momento já amparada pela composição da carta de
apresentação, ou seja, diferente para cada participante, mas com o objetivo
comum.
3ª campo disparador – DILEMAS E DESAFIOS
Interconectado com as etapas anteriores e também, nesse momento,
já sob influência das etapas anteriores, solicitou destaque para os desafios e
Pessoa
Práticas
Desafios
Futuro
50
dilemas presentes e/ou superados em sua percepção do fazer pedagógico
cotidiano no território de sua ação.
4ª campo disparador – PERSPECTIVAS FUTURAS
Solicitou livres considerações, acerca de suas perspectivas futuras, em
linhas gerais, orientadas da mesma forma pelo diálogo construído nas produções
anteriores de caractere terminal quando relacionada à correspondência.
8. AS CARTAS: REFLEXÕES SINCRÔNICAS CORRESPONDENTES
“Um relato era uma carta que o autor escrevia a si mesmo
para contar coisas que, de outro modo, não poderia descobrir.”
CARLOS RUIZ ZAFÓN
Como produto principal desse estudo, as cartas aqui
compartilhadas representam textualmente o diálogo construído em franca
correspondência com os docentes participantes, seguindo a metodologia de
produção anteriormente exemplificada.
O desenvolvimento dessa etapa, considerando o acesso aos
participantes, desde o envio do primeiro campo disparador, até a análise
colaborativa (último encontro), teve duração média de aproximadamente 35 dias,
com intervalo de uma semana entre um disparador (carta) e outro.
Atentos à natureza do estudo, os colegas participantes, Luiz,
Francislene, Bruno e Thayara tiveram como princípio, o pleno aceite de seus
nomes, identificados nessa produção bem como seus registros (fotos)
compartilhados na composição do produto correspondente.
As cartas seguiram o mesmo ritmo de produção e critério de
correspondência sendo posteriormente (ao término) devolvidas na íntegra aos
seus produtores pelo pesquisador em momento individualizado de encontro.
Faço lembrar que durante o processo de produção, as cartas foram
enviadas de forma separada respeitando o intervalo de produção individual
(média) de uma semana como já mencionado, portanto ao receber uma nova
carta o participante não tinha como editar ou reescrever a produção anterior,
51
apenas no resgate dos fatos a correspondência recebida estimulada pelo
pesquisador.
Importante destacar, que à medida que os disparadores (cartas) eram
enviados, ao mesmo tempo foi submetida à análise textual discursiva inspirada
nos apontamentos metodológicos contidos nas reflexões de Moraes (2003),
como procedimento sincrônico a correspondência propriamente dita, numa
espécie de “espiral” entre análise e produção. Em outras palavras a análise foi
realizada no mesmo tempo destinado à produção das cartas, assim se
distanciando da reserva de um tempo específico para tal finalidade.
A análise textual discursiva tem como procedimento, a desmontagem
dos textos, com objetivo de examinar os detalhes; o estabelecimento de
relações, ou seja, construir associações entre os elementos do texto.
Corresponde a uma metodologia que pode ser compreendida como um processo
de auto-organizado de construção da compreensão (Moraes; Galiazzi, 2006).
Esse tipo de análise, tem da escrita seu fundamento enquanto
ferramenta mediadora na produção de significados e por isso, em processos
recursivos, a análise se desloca do empírico para a abstração teórica, que só
pode ser alcançada se o pesquisador fizer um movimento intenso de
interpretação e produção de argumentos (Moraes; Galiazzi, 2006).
Ao considerar que a compreensão que os docentes constroem, em
interação com o pesquisador, se articula a projetos, cujo interesse de
investigação se baseia acerca de um aspecto da sua prática profissional. Em
consequência, o papel do pesquisador, no referido projeto colaborativo, se
articula essencialmente em função de balizar e orientar a compreensão
construída durante a investigação (Desgagné, 2007).
Evidentemente que essa posição epistemológica nos remete a uma
concepção do docente, a qual impregna o próprio objeto da pesquisa. De fato,
para fins de investigação, solicitar que os docentes exponham seu ponto de vista
acerca de certo aspecto de sua prática em desenvolvimento, numa proposta de
investigação colaborativa, supõe o reconhecimento e interesse desses
profissionais “competência de ator em contexto”. (DESGAGNÉ, 2007).
52
Para melhor compor a análise dos campos, de forma integrada, foi
organizada ao término da produção das cartas um encontro individual com cada
participante, por intermédio dos meios digitais, na intenção, sobretudo, de
compartilhar parte da análise interpretativa apresentando ao participante a “carta
síntese” como produto da conexão entre os campos.
A “carta síntese” tem como intenção apresentar aos docentes envolvidos
uma composição interpretativa e poética dos campos produzidos no fomento de
uma análise colaborativa com os produtores das cartas uma vez que na opção
individual do encontro o espaço de escuta para complemento, supressão e/ou
recusa do produto síntese apresentado pelo pesquisador estava aberto e atento
ao diálogo caso necessário.
Dessa maneira, na medida em que as cartas chegavam, os respectivos
campos disparadores foram sendo reduzidos e transformados em textos
menores com informações organizadas com a finalidade de capturar os pontos
mais significativos produzidos na correspondência com o pesquisador.
O último encontro, por escolha metodológica e reflexão sobre os limites
interpretativos da investigação deste estudo, foi solicitado de forma individual a
cada participante com o objetivo de expor maiores detalhes sobre o destino da
produção.
Para promover a reconstrução, caso necessário, e a validação da
síntese dos campos produzidos pelo pesquisador, orientado pela composição
das cartas anteriores, foi apresentado ao participante previamente ao encontro,
um roteiro distribuído em sete passos para orientar o encontro como
exemplificado abaixo por intermédio da ferramenta digital disponível: google
meeting:
53
(Figura - 05: Elaboração do autor ilustrando a organização metodológica destinada ao
encontro individual e apresentação da síntese dos campos via google meeting ao participante.)
Ficou evidente em contato com os participantes, nesse momento, como
a apresentações dos campos representados pela carta síntese foi, de certa
forma, o elemento mais surpreendente revelado aos participantes.
Certamente uma forma diferente de apresentar ao participante a síntese
dos campos “dele” para a pessoa “dele mesmo”, pois a síntese, buscou
sobretudo a fidelidade interpretativa nas produções anteriores apresentadas e
possibilitou o espaço de intervenção, complemento e supressão caso
necessário.
Importante destacar que nenhum dos participantes declarou não estar
representado na produção apresenta pelo pesquisador, o que certamente pelo
produtor, valida a análise interpretativa da síntese dos campos produzidos,
permitindo nesse momento um reencontro com a perspectiva de Freire (1997),
condutora do itinerário reflexivo da análise desse estudo.
Como escolhas expositivas para o objeto da dissertação, todas as cartas
produzidas, a considerar os quatro participantes, foram de sensível e importante
relevância para o entendimento e análise geral do estudo.
A partir desse ponto o intuito de apresentar a íntegra das cartas na sua
correspondência tem com a finalidade expor as produções de forma relevante
para melhor compreensão da proposta apresentada nessa produção.
Data: ___/___/___ Participante: ____________ 1- Saudação – agradecimento pela correspondência (produção das cartas); 2- Participação – perguntar de forma ampla sobre a participação na produção; 3- Cartas pedagógicas - explicar (de forma sucinta) origem e a base do estudo que organiza a proposta; 4- Análise – evidenciar objetivos, questionamentos, processo de construção e a representação dos disparadores (campos); 5- Apresentação do texto – carta síntese (leitura); 6- Solicitar contribuição no fomento de estimular a intervenção docente na análise (complemento, supressão ou reformulação caso necessário); 7- Encerramento – agradecer novamente e propor uma frase ou palavra que represente a experiência e colaboração com a produção das cartas (projeto) no intuito de estimular reflexões finais.
54
A escolha das imagens apresentadas nas cartas foi conduzida em
parceria com seus produtores, pois elas vão ilustrando as etapas dos
disparadores para cada correspondência construída durante o processo.
Reservamos os cuidados com as imagens presentes dos alunos, tendo
apenas a permissão de seus produtores concedida, mantendo seus nomes em
sustento a suas reflexões traduzidas nas palavras apresentadas.
9. APRESENTAÇÃO DAS CARTAS PEDAGÓGICAS – O (SER) FAZER
DOCENTE NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA
As produções (cartas), apresentadas abaixo (por simples escolha
expositiva representativa) revelam a produção da professora Francislene e do
professor Luiz. Colegas de profissão que ao longo do tempo testemunho, em
fraterna condição, o envolvimento sensível com a docência no espaço escolar
de seus territórios, que desde o início desse estudo foram de grande solicitude
e entusiasmo dedicado à produção correspondente.
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10. CARTAS PEDAGÓGICAS: O REENCONTRO COM A PEDAGOGIA DA
AUTONOMIA DE PAULO FREIRE
Como produto associado à síntese interpretativa dos campos
disparadores, as cartas aqui analisadas representam um texto interpretativo da
carta síntese, construídas pelo pesquisador, fruto do avanço no diálogo do
espaço de escuta destinado a produção.
Ao analisar os dados produzidos, encontramos nos escritos de Paulo
Freire, amparados pela obra intitulada “Pedagogia da Autonomia: saberes
necessários à prática educativa (1997)” o reencontro com diversas de suas
reflexões, uma vez que a metodologia inspirada em Cartas Pedagógicas tem no
educador brasileiro um dos seus mais célebres representantes.
Na análise da conexão dos campos correspondente das Cartas
Pedagógicas, foram encontrados elementos evidenciados pelos seus produtores
que, mesmo escritos individualmente sem compartilhamento, apresentam
consideráveis semelhanças.
Nessa perspectiva, as cartas foram organizadas para melhor
compreensão do objetivo do estudo que busca compreender os elementos que
sustentam e auxiliam na construção do fazer (ato) pedagógico de forma
integrada em diferentes contextos.
Fica bastante evidente que os docentes, mesmo com anseios cotidianos,
mas certos da escolha de sua profissão, estão sempre dispostos a fomentar o
diálogo como forma de resistir a uma prática acomodada e ancorada apenas na
execução instrumental do se - movimentar. O que nos remete ao reencontro com
a reflexão de que ensinar exige disponibilidade para o diálogo (Freire, 1997).
A produção das Cartas Pedagógicas demonstra, uma forma de produção
e conhecimento com íntima articulação entre teoria e prática. Na obra intitulada
“Cartas a Cristina: reflexões sobre minha vida e minha práxis” Paulo Freire
(1994), destaca que as práticas educativas ancoram uma compreensão crítica
da educação onde o diálogo é o caminho orientador da práxis. Como observado
no trecho da carta da professora Thayara.
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“Acredito que o movimento deve ser vivido, por ironia do destino é o nosso maior desafio. Roda de conversa, debate e sugestões são ações promovidas pelo professor com foco na integração, estimulando em todos os alunos a participação.”
Já em “Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática
educativa” de Paulo Freire (1997), postulou alguns saberes necessários à
experiência educativa. Foi à última obra publicada em vida, onde ele faz uma
reflexão e apresenta orientações a respeito da compreensão da prática docente
enquanto dimensão social da formação do ser humano. Dentre algumas dessas
orientações, considera que ensinar exige também querer bem aos educandos e
a convicção de que a mudança é possível como observado no trecho da carta
do professor Bruno:
“Respeito mútuo entre professores e alunos, estímulo em conviver em harmonia com as diferenças bem como o engajamento social estimulado pelo protagonismo juvenil será a chave para despertar o prazer dos jovens em estar na escola...”
Nos apontamentos dos docentes, muitas questões estão direcionando
para além de um fazer essencialmente e demasiado técnico pedagógico, na
verdade sinalizam para constantes ações e atitudes orientadas pelas relações
humanas que construídas em seus territórios de prática.
Há uma relação entre a alegria necessária à atividade educativa e a
esperança. A esperança de que professor e alunos juntos podem aprender e
ensinar, inquietar-nos, produzir e juntos igualmente resistir aos obstáculos à
nossa alegria (Freire, 1997).
Portanto, ensinar exige alegria e esperança. Ensinar exige querer bem
aos educandos como fica evidente no trecho da carta representada pelos
professores Bruno e Thayara em perspectiva e sensível exposição:
“Certamente com isso vou mantendo em meu coração uma esperança viva e pretendo continuar contagiando todos ao meu redor”.
“Que sejam propagadores de uma aprendizagem como esperança e de um futuro melhor, repleto de confiança, de uma vida mais justa, digna e vitoriosa...”
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Na apreensão da realidade e livre da ingenuidade poética expressa, a professora
claramente deixa evidente a alegria e o carinho presente no momento de sua escrita,
na perspectiva de Freire (1997), ensinar é uma especificada humana e exige também
segurança e generosidade, evidenciados pela professora Francislene:
“Na verdade, quem resiste à alegria dos abraços sinceros e carinhosos das crianças quando eu, “a professora”, chega ao portão”. Nem sempre a vida nos recebe com a mesma alegria “no portão”.
A arrogância que nega a generosidade, nega também a humildade. O
clima de respeito que nasce de relações justas, sérias, humildes, generosas em
que a autoridade docente e as liberdades dos alunos se assumem eticamente,
autentica o caráter formador do espaço pedagógico (Freire, 1997). Evidenciados
claramente pelo professor Luiz:
“Na competição tive que aprender que o mais importante é estender a mão, não importa se não for campeão, na verdade o mais importante está na união. Atitude e empenho, na minha profissão, é sempre motivo de razão... Acho que a Educação Física tem o poder de transformar, se o professor pelas boas atitudes se orientar”.
Não há docência sem discência, as duas se explicam e seus sujeitos,
apesar das diferenças que os conotam, não se reduzem à condição de objeto
um do outro. Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao
aprender (Freire, 1997). Reflexões textualizadas respectivamente nos
apontados dos professores Luiz e Bruno:
“Sou competitivo, mas inspirado, por ocasião, em um colega de profissão, sem pretensão, acabei descobrindo uma renovada intenção...”
Prof. Luiz
“Certamente foram grandes os momentos de aprendizagem e descobertas no “chão da escola”, entretanto para superar o famoso “Rola Bola” decidi pela inovação...”.
Prof. Bruno
Quem pensa certo, está cansado de saber que palavras a que falta a
corporeidade do exemplo pouco ou quase nada valem. Pensar certo é fazer
certo. É próprio do pensar certo, a disponibilidade ao risco, a aceitação do novo
que não pode ser negado ou acolhido só porque é novo (Freire, 1997).
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Além disso, Freire (1997), considera que a docência não existe sem a
deiscência e os sujeitos não se reduzem à condição de objeto um do outro. Na
educação libertadora ambos se influenciam mutuamente. Evidente nos trechos
respectivos das professoras Francislene e Thayara:
“Tenho a certeza que parte de minha motivação está em no exemplo para os pequenos que sempre nos dão o exemplo...”
Profª Francislene
“Na verdade, isso parece loucura, mas precisamos às vezes, encarar, despertar e largar nossas “armaduras”. Essa é nossa realidade, sempre perto da verdade...”
Profª Thayara
Nas reflexões de Paulo Freire (1997) sobre o exercício docente,
consideramos a ética e a estética, a competência profissional demonstrando o
respeito pelos saberes do aluno e o reconhecimento da identidade cultural bem
como rejeição de todas e quaisquer formas de discriminação como evidenciado
nas palavras da professora Thayara:
“No projeto “SUPERAÇÃO” o meu olhar foi para inclusão”. Brincadeiras, convivência e atenção sempre estimular nos adolescentes a participação. Sou uma professora divertida, e gosto de agitar, respeito os limites e adoro dançar, pois a Educação Física no campo das emoções também é para os “fora dos padrões”.
A maneira como os alunos me percebem tem grande importância para o
meu desempenho. Não há como sendo professor não revelar minha maneira de
ser, de pensar politicamente, diante de meus alunos, pois ensinar exige
comprometimento (Freire, 1997). Reflexões aqui evidenciadas pelo professor
Bruno:
“... certamente tenho a clareza de que os problemas vão continuar existindo, o que vai mudar é nossa capacidade de reagir”
“Atitudes como coragem e apreço ao espaço escolar farão toda a diferença. Políticas Públicas ajustáveis às necessidades da escolar e acesso a tecnologias trazem bons horizontes para nós professores”.
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Sei que sou inacabado, porém consciente disto, sei que posso ir mais
além, através da tensão entre o que herdo geneticamente e o que herdo social,
cultural e historicamente. Lutando deixo de ser apenas objeto, para ser também
sujeito da história (Freire, 1997).
A consciência do mundo e de si como ser inacabado, inscrevem o ser
num permanente movimento de busca. E nisto se fundamenta a educação como
processo permanente (Freire, 1997). Evidentes em trechos apontados
respectivamente pelos professores Thayara e Luiz:
“E quanto a nós professores? Espero que a cada dia possamos avançar, melhorar e se preciso recomeçar, mas, nunca, deixar de acreditar. Para o futuro tenho esperança, mas sem cobrança... Para essa professora a vida é como uma dança...”.
Profª Thayara
“Como disse: “Na vida pessoal e profissional desafios e dilemas vão aparecer, mas minha motivação é fazer acontecer, pois ser professor é também renovar e renascer”.
Prof. Luiz
Reconhecemos que é preciso insistir: este saber necessário ao
professor, que ensinar não é transferir conhecimento não apenas precisa ser
apreendida por ele e pelos educandos nas suas razões de ser ontológica,
política, ética, epistemológica, pedagógica, mas também precisa ser
constantemente testemunhado, vivido. A considerar evidências reflexivas
sinalizadas pela professora Francislene:
“Acho que estou no lugar certo, entre mais “sim” do que “não” aqui o que não falta é emoção. Somos importantes na escola, mas principalmente na vida dos nossos alunos, pois o futuro é reflexo do passado, precisamos acreditar sempre que somos mais, que podemos mais...”
Por isso é que, na formação permanente dos professores, o momento
fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática. É pensando criticamente a
prática de ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática (Freire, 1997).
O próprio discurso teórico, necessário à reflexão crítica, tem de ser de
tal modo concreto que quase se confunda com a prática. Portanto ensinar exige
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reflexão crítica sobre a prática (Freire, 1997). Aqui exposto nas reflexões do
professor Luiz:
“E agora, passada mais de uma década, é hora de refletir. Apaixonado por Educação Física foi na “Escola da Família” os primeiros passos como parte de minha trilha. Um percurso que pretendo seguir, melhorar, participar e se possível, assim chegar...”
Outro saber que devo trazer comigo e que tem que ver com quase todos
os de que tenho falado é o de que não é possível exercer a atividade do
magistério como se nada ocorresse conosco. Como impossível seria sairmos na
chuva expostos totalmente a ela, sem defesas, e não nos molhar (Freire, 1997).
Certamente ensinar exige comprometimento, mesmo que por vezes
pareça mais complicado do que de fato possa ser. Aqui encontramos evidências
de uma prática, por vezes, vivida com resiliência frente aos desafios. Apontados
pela professora Francislene:
“Nem sempre a vida nos recebe com a mesma alegria “no portão”, às vezes reconheço episódios mais complicados, porém acredito que a melhor saída é de fato enfrentar os desafios...”
A prática pedagógica como especificidade humana se completa em sua
relação com a afetividade na percepção docente em que a considera:
[...] como professor, não me acho tomado por este outro saber, o de que preciso estar aberto ao gosto de querer bem, às vezes, à coragem de querer bem aos educandos e à própria prática educativa de que participo. Esta abertura ao querer bem não significa, na verdade, que, porque professores me obrigam a querer bem a todos os alunos de maneira igual. Significa, de fato, que a afetividade não me assusta que não tenho medo de expressá-la [...] (FREIRE, 1997, p. 141).
A minha abertura ao querer bem, significa a minha disponibilidade à alegria de
viver, alegria de viver, que, assumida plenamente, não permite que me transforme num
ser “adocicado” nem tampouco em um ser amargo (Freire, 1997). Reflexões em
reencontro evidenciadas respectivamente pelas professoras Thayara e Francislene:
“Para essa professora a vida é como uma dança. Se na estrada da vida um ex – aluno encontrar que esses dêem um saudoso e acolhedor abraço ao chegar, e digam: Essa foi minha professora, reconheço no olhar, pois no meu coração sempre terá o seu lugar...”
Profª. Thayara
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“E quanto à min? Sigo como uma poesia, pois “não consigo ser menos que um exagero, não gosto de nada pouco, não gosto de nada morno”. Não me peça pra ir com calma; pois minha pressa, essa com certeza, vêm da alma...”
Profª Francislene
Segundo Paulo Freire (1997), não na diferença na “distância” entre a
ingenuidade e a criticidade, entre o saber de pura experiência feito e o que
resulta dos procedimentos metodicamente rigorosos, uma ruptura, mas uma
superação. A superação e não a ruptura se dá na medida em que a curiosidade
ingênua, sem deixar de ser curiosidade, pelo contrário, continuando a ser
curiosidade, se criticiza. Logo ensinar exige criticidade.
Por que não discutir com os alunos a realidade concreta a que se deva
associar a disciplina cujo conteúdo se ensina, a realidade agressiva em que a
violência é a constante e a convivência das pessoas é muito maior com a morte
do que com a vida? Por que não estabelecer uma necessária “intimidade” entre
os saberes curriculares fundamentais aos alunos e a experiência social que eles
têm como indivíduos (Freire, 1997). Evidenciados em reflexivo reencontro pelo
professor Luiz:
“Na competição tive que aprender que o mais importante é estender a mão, não importa se não for campeão, na verdade o mais importante está na união. Atitude e empenho, na minha profissão, é sempre motivo de razão. Acho que temos que dar um tempo olhando apenas para a competição...”
Diante disso, e no amparado das reflexões, promovidas no reencontro
com a pedagogia da autonomia de Paulo Freire (1997), encontramos de forma
bastante cristalina, elementos produzidos pelos docentes nas produções
(correspondentes) sobre suas práticas, semelhanças repletas de sensibilidade,
ética e compromisso de suas práticas centradas, sobretudo nas relações
humanas.
Apesar de seus dilemas e desafios constantes presentes, não ganha no
território escolar, pelo contrário, parece em muitos momentos fornecer estímulos
ao fazer pedagógico (ato) crítico e reflexivo para recondução e/ou reorganização
de suas atitudes e princípios envolvendo o ato pedagógico.
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Percebe-se, assim, a importância do papel do educador, o mérito da paz
com que viva a certeza de que faz parte de sua tarefa docente não apenas
ensinar os conteúdos, mas também ensinar a pensar certo (Freire, 1997).
Segundo Paulo Freire (1997), o professor que pensa certo deixa
transparecer aos educandos que uma das bonitezas de nossa maneira de estar
no mundo e com o mundo, como seres históricos, é a capacidade de intervindo
no mundo, conhecer o mundo. Mas, histórico como nós, o nosso conhecimento
do mundo tem historicidade.
No entanto, reconhecemos que o estudo se trata de um recorte e que
nossa “ingenuidade” não seja responsável por eclipsar as tensões e abrandar a
necessidade de mantermos o posicionamento, com a grandeza docente no
engajamento ético- político social e vigilante as injustiças.
Por fim, as cartas aqui apresentadas, nesse reencontro, testemunham
evidências de um fazer pedagógico repleto de saberes ancorados, sobretudo
nas relações humanas, que dão sustento, inclusive, a novas ações numa
espécie de sincronismo envolvendo o processo de ação e reflexão que ao longo
do tempo reverbera nos territórios das práticas docentes.
11. CONSIDERAÇÕES PROVISÓRIAS: REFLEXÕES NECESSÁRIAS
Sempre que penso no espaço escolar, são inúmeras as reflexões em
minha mente, mas certamente estou convencido de que não há neutralidade
diante a posição da realidade. Tenho como esperança partilhar de uma
educação mais libertadora capaz de amparar, sobretudo aqueles envoltos a uma
lógica estruturalmente excludente que infelizmente parece acender com
velocidade nos dias atuais.
Contudo, o meu envolvimento com a produção das cartas, revelou uma
perspectiva mais esperançosa. Creio na impossibilidade da cisão da “pessoa
humana” e da “prática (ato) pedagógica” docente, que nos desafios e dilemas
parecem encontrar estímulos para superar os obstáculos.
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Ancorados pela produção, das cartas aqui apresentadas, estendem as
minhas reflexões sobre o quanto é importante querer bem a nós mesmos e aos
educandos e educandas, pois é nesse movimento que nos percebemos e damos
sentidos e significados às experiências formativas, sobretudo orientadas pela
condição de ser mais no mundo.
Fica evidente que na escuta se reconhece o outro, e a experiência da
criação desse espaço (cartas pedagógicas) foi capaz de nos esperançar. Uma
oportunidade muitas vezes invizibilizada pela falta, pelo excesso, pelo espaço
não criado ou até mesmo pelo “diálogo” não correspondido.
Destaco na exposição das cartas, que mesmo em tempos, sobretudo
tecnologicamente complexos, as relações humanas que em minha opinião se
configura como o grande achado dessa produção ocupam justa centralidade em
cada ato pedagógico cotidiano. Inspirado nas reflexões e no otimismo crítico do
educador Paulo Freire, encontro a melhor definição de educação que diz:
“Educar é impregnar de sentido o que fazemos a cada instante, cada ato
cotidiano”.
Sinalizo minhas considerações, cercado de intermináveis dilemas e
desafios, mas certo de que muitas das perspectivas futuras são construídas no
presente. Ser irmão, mãe, filho e professor, são essas as características que
edificam integralmente os saberes associados ao fazer pedagógico docente? Em
outras palavras o campo “pessoa” sustenta e orienta por completo essas
práticas?
No entanto, na produção das Cartas Pedagógicas apresentadas na
referida dissertação destacam evidências sobre a importância da constituição da
“pessoa docente”, que se apresenta como um promissor campo de investigação,
pois fica evidente que ninguém se forma professor ou professora, nossas
relações vão aos constituindo, e no exercício docente vivido com amorosidade,
ética, bom senso, criticidade, respeito à condição de aprendiz e no
reconhecimento de ser condicionado, encontramos os elementos necessários
para uma prática educativa libertadora.
Não poderia ser diferente em concluir minhas reflexões destacando que
a produção de Cartas Pedagógicas, traz a tona ressonâncias de um pensamento
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de Paulo Freire (1997), que postula inúmeros saberes necessário, à prática
educativa, mas certamente para essa produção se faz evidente que: “Ensinar é
uma especificidade humana, exige a convicção de que a mudança é possível a
começar pela consciência do inacabamento.”
Enfim, o estudo apresentou, no espaço correspondente criado por
intermédio das cartas, um destaque significativo para o exercício docente
centrado, sobretudo nas relações humanas e seus saberes que são
estabelecidas ao longo desse exercício no espaço escolar de grande relevância
para o sustento e reorganização de suas práticas.
Considero também, que o estudo apresentado expõe, naturalmente, os
limites da escolha metodológica e certas contradições no que diz respeito ao
aprofundamento, compartilhamento e centralidade (escolha) dos campos
abordados por cada um dos participantes, pois fica evidente que os campos
receberam maiores e distintas atenções no espaço identitário e particular de
cada participante
Sendo assim, reforço que a temática merece a atenção de estudos
futuros complementares, pois a complexidade do fazer pedagógico no território
escolar assentado nas relações humanas demostra evidente potencialidade
para revelar renovados caminhos investigativos.
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106
APÊNDICE A
PERFIL DOCENTE GERAL (DIGITAL)
107
APÊNDICE B
DOCENTE PARTICIPANTE (PRODUÇÃO DAS CARTAS
PEDAGÓGICAS)
108
APÊNDICE C
QUESTIONÁRIO DIGITAL
1. Nome?
2. U.E. de atuação no município?
3. Idade?
4. Gênero?
5. Você saberia dizer qual é sua Cor ou Raça/Etnia? Caso positivo indique.
6. Ano de formação (Educação Física):
7. Você tem outra formação de nível superior?
8. Caso outra formação de nível superior indique curso e ano.
9. Com relação à formação em Educação Física indique instituição.
10. Caso outra formação indique.
11. Nível de formação (Educação Física):
12. Tempo médio do exercício docente na rede municipal de ensino:
13. Ciclo de atuação atual na rede municipal:
14. Carga horária média semanal na rede municipal:
15. Acumula cargo ou função gratificada no exercício docente?
16. Costuma frequentar eventos, seminários, palestras, grupo (s) de estudo (s),
cursos dentre outros ligados ao exercício docente quando possível ?
17. Caso positivo, qual a frequência aproximada:
18. Dentre os autores (as) e/ou obras abaixo ligados ao exercício docente na
Educação Física qual(is) o(s) mais significativo(s) em sua formação:
19. Quais os blocos temáticos abordados com mais frequência em seu plano de
ensino?
20. Na sua prática docente costuma produzir, organizar e/ou arquivar algum
tipo de registro ou documentação das atividades realizadas pelos alunos
(as)?
21. Caso positivo, qual (is) o(s) instrumento(s) mais utilizado(s) na organização
de seus registros e/ou arquivos?
22. Durante o ano letivo costuma redirecionar sua prática?
23. Caso positivo, qual (is) o(s) principal (is) motivo(s)?
24. Além dos materiais destinados as vivências práticas (bolas, cones, cordas
etc) costuma fazer uso de outros no auxílio didático-pedagógico?
25. Caso positivo, qual (is)?
109
26. Nas reuniões destinadas ao conselho interno de avaliação do município
(CAI) em sua percepção a disciplina de Educação Física ocupa um espaço
significativo?
27. Em sua percepção no ambiente escolar a equipe gestora, na figura dos
diretores (as) e coordenadores (as), reconhecem a importância e o percurso
curricular da disciplina de Educação Física?
28. No contexto geral e na maior parte do tempo encontra-se satisfeito (a) com
o exercício docente no ambiente escolar?
29. Estaria disposto (a) a compartilhar suas experiências práticas com colegas
da rede?
30. Caso positivo de segunda a sexta, qual o melhor dia da semana para um
possível encontro no período da tarde nas dependências da rede no
município?
https://forms.gle/XQwvQTPAMJ4Dt5Rr7
110
ANEXO 01
CARTA PEDAGÓGICA – PROFESSOR BRUNO
111
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Anexo 02
Carta Pedagógica – Professora Thayara
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134
135
136
ANEXO - 03
DECLARAÇÃO DE RESPONSABILIDADE INSTITUCIONAL
137
ANEXO - 04
PARECER – COMITÊ DE ÉTICA E PESQUISA (CEP)