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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO – UFRJ INSTITUTO COPPEAD DE ADMINISTRAÇÃO MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃO RAPHAEL JOSÉ ASSAYAG DESAFIOS NA TRANSFORMAÇÃO DE EMPRESAS DESAFIANTES EM LÍDERES DO SETOR: O Caso Fiat do Brasil RIO DE JANEIRO 2012

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO – UFRJ

INSTITUTO COPPEAD DE ADMINISTRAÇÃO

MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃO

RAPHAEL JOSÉ ASSAYAG

DESAFIOS NA TRANSFORMAÇÃO DE EMPRESAS DESAFIANTES EM LÍDERES

DO SETOR: O Caso Fiat do Brasil

RIO DE JANEIRO

2012

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II

RAPHAEL JOSÉ ASSAYAG

DESAFIOS NA TRANSFORMAÇÃO DE EMPRESAS DESAFIANTES EM LÍDERES

DO SETOR: O Caso Fiat do Brasil

Dissertação submetida ao corpo docente do Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Ciências (M.Sc.).

Orientadora Prof.ª. Denise Lima Fleck, Ph.D.

RIO DE JANEIRO

2012

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III

A844d Assayag, Raphael José

Desafios na transformação de empresas desafiantes em líderes do setor: o caso Fiat no Brasil / Raphael José Assayag . – Rio de Janeiro: UFRJ, 2012.

204 f.: il.; 31 cm.

Orientador: Denise Lima Fleck

Dissertação (Mestrado) - Universidade

Federal do Rio de Janeiro, Instituto COPPEAD de Administração, 2012.

1. Desafios Empresariais. 2. Longevidade Saudável da Firma. 3. Indústria Automotiva. 4. Responsabilidade Ambiental e Social Corporativa. 5. Pressões Ambientais. 6. Liderança. 7. Geração e Captura de Valor - Teses. I. Fleck, Denise Lima. II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto COPPEAD de Administração. III. Título.

CDD: 658.4

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IV

RAPHAEL JOSÉ ASSAYAG

DESAFIOS NA TRANSFORMAÇÃO DE EMPRESAS DESAFIANTES EM LÍDERES

DO SETOR: O Caso Fiat do Brasil

Dissertação de Mestrado submetida ao corpo docente do Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Ciências (M.Sc.).

Aprovado em 24 de Setembro de 2012

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________

Orientadora Prof.ª. Denise Lima Fleck, Ph.D. (COPPEAD, UFRJ)

___________________________________________

Prof.ª. Maribel Carvalho Suarez, D.Sc. (COPPEAD, UFRJ)

___________________________________________

Prof. José Geraldo Pereira Barbosa, D.Sc.(MADE, UNESA)

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V

AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a D’us, cuja bondade eterna me permitiu chegar até este

momento.

Agradeço ao carinho, ao apoio incondicional e às constantes palavras de incentivo

durante todo o percurso do mestrado da minha amada esposa, Tathiana.

Agradeço aos meus pais, José Mário e Fátima, exemplos de ética e por quem tenho

grande amor, respeito e admiração, que durante toda a minha vida me estimularam

na busca do saber. Sem eles, indubitavelmente, concluir mestrado não seria

possível.

Agradeço também aos meus demais familiares e amigos, pelo apoio e compreensão

da minha ausência durante este curso.

Agradeço à minha orientadora, Denise Fleck, a quem admiro pela competência,

conhecimento e simplicidade, e que sempre esteve presente e pronta para ouvir e

apoiar durante o processo de elaboração deste trabalho.

Agradeço aos professores Maribel Suarez e José Geraldo Barbosa, por cederem

parte do seu escasso tempo e aceitarem o convite de participar da banca

examinadora.

Agradeço às professoras Maribel Suarez e Letícia Casotti, da cátedra

FIAT/COPPEAD, pelo apoio no momento dos primeiros contatos com a empresa

estudada.

Agradeço à empresa Fiat do Brasil, em especial à equipe da área de pesquisa, que

viabilizaram a visita à fábrica de Betim – MG. Agradeço a cada um dos funcionários

entrevistados pelo tempo dedicado e pelas informações prestadas.

Agradeço a todos os professores do COPPEAD pelos conhecimentos transmitidos,

pelas conversas e conselhos amigos e, principalmente, por me fazerem sentir

orgulho de pertencer a esta instituição de excelência.

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VI

Agradeço aos meus “irmãos” de seminário de pesquisa, que durante mais de dois

anos estiveram rotineiramente debatendo e ajudando uns aos outros: Camila

Caldeira, Monique Stony, Laura Rielo, Gustavo Sarkovas, Rodrigo Tasca e Flávia

Freitas.

Agradeço a todos demais amigos da sempre elogiada turma de mestrado de 2010.

Levo do curso muito mais que conhecimento. Levo a amizade e admiração por cada

um de vocês.

Por fim, agradeço o apoio institucional oferecido pela Secretaria Acadêmica e

demais setores do COPPEAD.

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VII

RESUMO

ASSAYAG, Raphael José. Desafios na Transformação de Empresas Desafiantes

em Líderes do Setor: O caso Fiat no Brasil. Rio de Janeiro, 2012. Dissertação

(Mestrado em Administração) – Instituto Coppead de Administração. Universidade

Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). 2012.

Segundo Fleck (2010) e Hawkins (2006), para atingir os objetivos de expansão e

perenidade, as organizações precisam adotar uma postura ativa e responsável com

todos seus stakeholders, inclusive com o meio ambiente e com a sociedade em que

está inserida. Nesse contexto, este trabalho se propôs a analisar, em um processo

de crescimento organizacional, o que pode explicar a migração de uma empresa da

posição de desafiante (challenger) em uma indústria para a posição de líder do

setor. Assim, buscou-se compreender a influência dos gestores, dos ambientes e

das respostas aos desafios organizacionais durante esse processo (FLECK, 2009;

MINTZBERG et al, 2000; OLIVER, 1991; ROMANELLI, 1991; CHANDLER, 1990;

WEITZEL, JOHNSON, 1989; CAROLL, HUO, 1986). Como técnica de pesquisa,

elaborou-se uma análise combinada da histórica da indústria automotiva nacional e

do estudo de caso da montadora Fiat do Brasil, empresa com 36 anos de atuação

no Brasil, e que se tornou a atual líder de mercado após desafiar importantes first

movers como Volkswagen, Ford Motors e General Motors. Esse trabalho conclui que

não são as pressões e desafios do ambiente que estabelecem toda a pauta das

organizações tornando-as simplesmente passivas ou reativas, conforme sugerido

por teóricos da “escola ambiental” (MINTZBERG et al, 2000). Mas, que as firmas, ao

adotarem um comportamento empreendedor e de monitoramento ativo (scanning),

podem não só se antecipar e neutralizar tais pressões, como mesmo moldar as

configurações ambientais, garantindo continuidade no seu processo de expansão e,

possivelmente, a posição de liderança na indústria. E, por fim, corroborou-se com o

entendimento sobre a importância da incorporação de atitudes sustentáveis tanto

para a manutenção da legitimidade da firma, quanto como incentivador para busca

de inovações e na mitigação de riscos.

Palavras-chaves: DESAFIOS EMPRESARIAIS; LONGEVIDADE; INDÚSTRIA

AUTOMOTIVA; RESPONSABILIDADE AMBIENTAL E SOCIAL CORPORATIVA;

PRESSÕES AMBIENTAIS; LIDERANÇA; VALOR;

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VIII

ABSTRACT

ASSAYAG, Raphael José. Challenges in the Transformation of Challengers Organizations in Market Leader: The Case Fiat of Brazil. Rio de Janeiro, 2012. Dissertation (Master Degree in Administration) – Instituto Coppead de Administração. Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). 2012.

According to Fleck (2010) and Hawkins (2006), in order to achieve the goals of

expansion and sustainability, organizations need to adopt an active and responsible

attitude with all its stakeholders, including the environment and society in which it

operates. In this context, this work aimed to analyze, within a process of

organizational growth, what could explain the migration of a company from a

challenging position (challenger) in an industry to the position of industry leader.

Therefore, we sought to understand the influence of managers, environments and

responses to organizational challenges during this process (FLECK, 2009;

MINTZBERG et al, 2000; OLIVER, 1991; ROMANELLI, 1991; CHANDLER, 1990;

WEITZEL, JOHNSON, 1989; CAROLL, HUO, 1986). As research technique, was

elaborated a combined analysis of the history of the Brazilian automotive industry

and of the case study of vehicle manufacturer Fiat of Brazil, a company with 36 years

experience in this country that became the current market leader after challenging

major first movers as Volkswagen, Ford Motors and General Motors. This work

concludes that pressures and challenges of the environment do not set the entire

agenda of the organizations, making them simply passive or reactive, as suggested

by "environmental school" theorists (MINTZBERG et al, 2000). The companies, by

adopting an entrepreneurial behavior and active monitoring (scanning), actually can

not only anticipate and counteract such pressures, but also shape environmental

settings, ensuring continuity in its expansion process and, possibly, the position of

industry leader. And finally, it corroborated with the understanding of the importance

of incorporating sustainable attitudes both for maintaining the legitimacy of the firm,

and as a stimulus to the search for innovations and risk mitigation.

Keywords: ORGANIZATIONAL CHALLENGERS; LONGEVITY; AUTOMOTIVE

INDUSTRY; CORPORATE ENVIRONMENTAL AND SOCIAL RESPONSIBILITY;

ENVIRONMENTAL PRESSURES; LEADERSHIP; VALUE;

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IX

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AAMA – Associação Americana de Montadoras de Veículos

ABEIVA – Associação Brasileira das Empresas Importadoras de Veículos

Automotores

ANEF – Associação Nacional das Empresas Financeiras de Montadoras

ANFAVEA – Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores

BCB – Banco Central do Brasil

BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Social

CARB – California Air Resources Board

CDC – Crédito Direto ao Consumidor

CET – Companhia Estadual de Trânsito

CMN – Conselho Monetário Nacional

CONAMA – Conselho Nacional do Meio Ambiente

DENATRAM – Departamento Nacional de Trânsito

DETRAN –Departamento Estadual de Trânsito

FENABRAVE – Federação Nacional de Veículos Automotores

FGV – Fundação Getúlio Vargas

FIAT – Fabbrica Italiana Automobili Torino

FCC – Fiat Concept Car

FIEMG – Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais

FSC – Forest Stewardship Council

GEC – Group Executive Council

ICMS – Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços

IMPP – Instituto Minas pela Paz

INMETRO – Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia

IPI – Imposto sobre Produtos Industrializados

MG – Minas Gerais

OICA – Organisation Internationale des Constructeurs d’Automobiles

PBEV – Programa Brasileiro de Etiquetagem Veicular

PIB – Produto Interno Bruto

PROÁLCOOL – Programa Nacional do Álcool

RASC – Responsabilidade Ambiental e Social Corporativa

ROI – Return Over Investment

SELIC – Sistema Especial de Liquidação e de Custódia

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X

LISTA DE FIGURAS

Figura 1.1 – Mapa visual da organização do estudo 20 Figura 2.1 – Requisitos para a propensão à autoperpetuação 25 Figura 2.2 – Estrutura geral do motor de crescimento contínuo 29 Figura 3.1 – Pilares de um estudo acadêmico 54 Figura 3.2 – Temas e autores utilizados na revisão de literatura 56 Figura 3.3 – Exemplo da tabela de agrupamento das principais pressões e desafios por tipo de ambiente

62

Figura 3.4 – Modelo de análise e categorização das evidências 63 Figura 3.5 – Escopo da análise realizada 64 Figura 3.6 – Exemplo do modelo de síntese cronológica 65 Figura 3.7 – Processo de preenchimento do framework durante fase de análise 66 Figura 3.8 – Exemplo de síntese do processo de transição entre ambientes 66 Figura 5.1 – Mapa visual dos principais marcos e inovações do segundo período da Fiat Brasil

116

Figura 5.2 – Mapa visual dos principais marcos e inovações do terceiro período da Fiat Brasil

117

Figura 5.3 – Mapa visual dos principais marcos e inovações do quarto período da Fiat Brasil

118

Figura 5.4 - Marcos do setor e da economia 164 Figura 5.5 – Síntese do processo de transição da Fiat no ambiente de negócios 165 Figura 5.6 – Síntese do processo de transição da Fiat no ambiente institucional 168 Figura 5.7 – Síntese do processo de transição da Fiat no ambiente natural 170 Figura 5.8 – Mapa visual consolidado da trajetória da Fiat entre os ambientes 172

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 5.1 – Quantidade de veículos vendidos pela Fiat no Brasil x total de veículos vendidos no Brasil (1976-2010)

112

Gráfico 5.2 – Representatividade da Fiat nas vendas de veículos e comerciais leves no Brasil (1976-2010)

113

Gráfico 5.3 - Representatividade na produção de veículos no Brasil entre os principais players

167

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XI

LISTA DE TABELAS

Tabela 3.1 – Tempo de duração das entrevistas realizadas para a pesquisa 61

LISTA DE QUADROS

Quadro 2.1 – Resumo dos desafios do crescimento das organizações 27 Quadro 2.2 – Framework proposto de categorização das teorias sobre ambientes 34 Quadro 2.3 – Associação teórica entre Rasc e os Desafios do Crescimento 53 Quadro 5.1 – Evidências de inovações introduzidas pela Fiat no Brasil 105 Quadro 5.2 – Análise das forças do ambiente da primeira fase da Fiat Brasil 120 Quadro 5.3 – Principais desafios e pressões da primeira fase da Fiat Brasil 124 Quadro 5.4 – Análise das forças do ambiente da segunda fase da Fiat Brasil 124 Quadro 5.5 – Principais desafios e pressões da segunda fase da Fiat Brasil 128 Quadro 5.6– Análise das forças do ambiente da terceira fase da Fiat Brasil 128 Quadro 5.7 –- Principais desafios e pressões da terceira fase da Fiat Brasil 137 Quadro 5.8 – Análise das forças do ambiente da quarta fase da Fiat Brasil 137 Quadro 5.9 – Resumo das principais forças do ambiente no quarto período da Fiat

163

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XII

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 15 1.1 OBJETIVO DO ESTUDO 18 1.1.1 Questão principal 18 1.1.2 Demais objetivos 18 1.2 JUSTIFICATIVA 19 1.3 ORGANIZAÇÃO DO ESTUDO 20

2 REVISÃO DE LITERATURA 22 2.1 CRESCIMENTO E LONGEVIDADE ORGANIZACIONAL 23 2.1.1 Empreendedorismo 27 2.1.2 Navegação em um ambiente dinâmico 31 2.1.2.1 Categorias de ambientes 32 2.1.2.2. Respostas aos desafios do ambiente 34 2.2 RESPONSABILIDADE AMBIENTAL E SOCIAL CORPORATIVA 40 2.2.1 Conceituando Rasc 43 2.2.2 Rasc e estratégias empresariais 45 2.2.3 Motivadores de Rasc 47 2.2.4 Sustentabilidade e inovação 50 2.2.5 Estágios da sustentabilidade 51 2.3 RASC E CRESCIMENTO E LONGEVIDADE ORGANIZACIONAL 53

3 METODOLOGIA 54 3.1 DEFINIÇÃO DE TEMA, PERGUNTA E OBJETO DE PESQUISA 54 3.2 ESTRATÉGIA DE PESQUISA 56 3.3 COLETA DE DADOS 58 3.4 ANÁLISE DOS DADOS COLETADOS 62 3.5 NÍVEL DE ANÁLISE 63

4 A INDÚSTRIA AUTOMOTIVA E A HISTÓRIA DA FIAT 67 4.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA 67 4.2 IMPACTOS DA INDÚSTRIA 69 4.3 VEÍCULOS ELÉTRICOS E HÍBRIDOS 73 4.4 MOMENTO ATUAL DA INDÚSTRIA 76 4.5 EVOLUÇÃO DA INDÚSTRIA AUTOMOTIVA NO BRASIL 77 4.6 FATORES QUE INFLUENCIAM A VENDA DOS CARROS E PRINCIPAIS INDICADORES

83

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XIII

FIAT 4.7 FIAT MUNDO: BREVE HISTÓRICO 86 4.8 FIAT BRASIL 89 4.8.1 Período I – da decisão da entrada no Brasil à construção da fábrica (1970 a 1976)

90

4.8.2 Período II – do início da produção ao fim da “década perdida” (1976 a 1989) 91 4.8.3 Período III – da abertura do mercado à liderança de vendas (1990-2003) 92 4.8.4 Período IV – uma gestão brasileira e a mudança estratégica (2004 – 2011) 98

5 ANÁLISE 103 5.1. Desafio do empreendedorismo 103 5.1.1 Criação de valor 104 5.1.2 Serviços empreendedores 109 5.1.3 Responsabilidade socioambiental como geração de valor 114 5.2 Desafio de navegação no ambiente dinâmico 119 5.2.1 Período I – da decisão da entrada no Brasil à construção da fábrica (1970 a 1976)

120

5.2.2 Período II – do início da produção ao fim da “década perdida” (1976-1989) 124 5.2.3 Período III – da abertura do mercado à liderança de vendas (1990-2003) 128 5.2.4 Período IV – uma gestão brasileira e a mudança estratégica (2004 – 2011) 137 5.2.4.1 Gestão dos Stakeholders 139 5.2.4.2 Meio Ambiente 143 5.2.4.3 Sociedade 143 5.2.4.4 Governo e Legislação 146 5.2.4.5 Acionistas 149 5.2.4.6 Clientes e Reputação 150 5.2.4.7 Concorrentes 155 5.2.4.8 Fornecedores 157 5.2.4.9 Concessionárias 158 5.2.4.10 Funcionários 160

5.3 Síntese da análise 163 5.3.1 Ambiente de negócios 165 5.3.2 Ambiente institucional 168 5.3.3 Ambiente natural 170

6 CONCLUSÃO 173 6.1 Respostas à pergunta principal e considerações sobre o processo de crescimento da Fiat

173

6.2 A relação entre o crescimento organizacional e responsabilidade socioambiental

175

6.3 Contribuição ao arcabouço teórico 177 6.4 Implicações do estudo de caso da Fiat para outras organizações do setor automotivo

178

6.5 Sugestões para pesquisas futuras 181

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XIV

REFERÊNCIAS 183

APÊNDICES 192

ANEXOS 202

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15

1 INTRODUÇÃO

Baron (1995) relacionou duas fontes principais de pressões organizacionais:

as de mercado (market) e de “não mercado” (non market). A primeira inclui as

interações entre as firmas e outras partes, voluntárias ou involuntárias, geralmente

envolvendo transações econômicas e trocas de propriedade. De acordo com

Chandler (1990), nas tradicionais indústrias capital-intensivas, as organizações que

fizessem os primeiros grandes investimentos (first movers) rapidamente dominavam

os setores e se mantinham líderes por décadas inteiras. Para conseguir benefícios

de custos comparáveis e ganhar espaço nos mercados em que as “iniciantes” já

estavam estabelecidas, os novos entrantes – ou desafiantes (challengers) – além de

criarem novas estruturas, precisariam: equiparar tais capacidades produtivas

(escala) em quanto à first movers já estavam em fase de aprimoramento dos

processos de produção e de seus produtos, e já possuindo grande aprendizado

disseminado em suas estruturas, por isso eram raros os casos onde as desafiantes

conseguiam dominar o mercado (CHANDLER, 1990, p.132). Quando se observam

as atuais forças de mercado, percebe-se que, desde a intensificação do processo de

globalização, com a dissolução da maioria das barreiras de entrada, essas arenas

de negócios se tornaram mais dinâmicas. Além das inovações tecnológicas, novos

concorrentes e produtos substitutos aparecem em setores onde antes apenas um

pequeno grupo reinava absoluto.

A segunda fonte, segundo Baron (1995), as pressões do “não mercado”,

incluem as interações que são intermediadas pelo governo e instituições públicas,

mídia e demais stakeholders. Incluem os arranjos macroeconômicos, sociais,

políticos e legais que geram a interação da empresa com o ambiente (BARON,

1995). Em um mundo cada vez mais interconectado, as relações entre as

corporações e os diversos stakeholders estão mais ativas, imediatas e

multidirecionais.

Consequentemente, para garantir o processo de expansão e gerar valor para

a organização, é imperativo um constante monitoramento do ambiente e de suas

potenciais pressões. A existência de gestores empreendedores, que se antecipam a

tais pressões, utilizando de respostas estratégicas criativas, tende a garantir uma

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16

redução dos riscos e a manutenção da legitimidade da organização (CHANDLER,

1977; PENROSE, 1980; OLIVER, 1991; FLECK, 2009).

Apesar disso, de acordo com Mintzberg et al (2000), no campo da estratégia,

existem escolas que analisam essa relação entre organização e ambiente por outras

perspectivas. Os que seguem a visão de “ecologia de população”, como Hannan e

Freeman (1977), por exemplo, afirmam que é o ambiente que estabelece toda a

pauta das organizações, onde a missão da estratégia seria apenas fazer uma leitura

deste e garantir adaptação adequada da organização, tornando assim os gestores

(managers) em elementos passivos. Para autores como Child (1972), Chandler

(1977) e Mintzberg et al (2000), que defendem o ponto de vista da teoria da decisão

estratégica (Managerial Choice), negar que os executivos possuam opções

estratégicas seria “completamente insensato” (MINTZBERG et al, 2000. p.218). De

acordo com os últimos autores, a formação da estratégia é composta por outras

duas forças centrais além do ambiente: a organização e a liderança. Chandler

(1977) corrobora com a visão de que a empresa não é simplesmente reflexo de

caprichos imprevisíveis das forças do mercado, ao reforçar o papel do gestor como

de suma importância na condução e destino da empresa (“mão visível”).

A indústria automobilística nacional, setor de grande relevância econômica,

enfrenta vários tipos de pressão. Além da crescente competitividade, e da

necessidade de manter um contínuo processo de expansão para possibilitar ganhos

de escala, as montadoras têm que lidar com crescentes expectativas dos seus

múltiplos stakeholders, dentre eles a sociedade e o meio ambiente (FLECK, 2009;

FREEMAN, 1984; PENROSE, 1980; CHANDLER, 1977).

Atualmente, de acordo com a Associação Nacional dos Fabricantes de

Veículos Automotores (Anfavea), essa indústria é responsável por 18,2% do Produto

Interno Bruto (PIB) industrial brasileiro e emprega diretamente 146.000 funcionários.

As estimativas são de até 1,5 milhão de pessoas estejam envolvidas em toda a

cadeia produtiva, o que a torna foco estratégico nas decisões do governo,

principalmente quando os números da economia não são positivos.

Conforme observado por Dias (2002), apesar de os veículos oferecerem

vantagens inegáveis, como possibilidade de locomoção independente e rápida, e

com conforto, os efeitos negativos e os custos deste modal são notórios. Pela ótica

do consumo de matérias-primas, mais de 50% do total de borracha, 25% do total de

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17

vidro e 15% do total de aço produzidos globalmente são de responsabilidade da

indústria automotiva (CASOTTI; GOLDENSTEIN, 2008).

No Brasil, enquanto a população aumentou 12,5% em uma década, a frota de

veículos do país cresceu 118,1% (SILVA, 2011). Segundo os dados do

Departamento Nacional de Trânsito (Denatran, 2011), a frota circulante ultrapassou

a marca, em 2011, de 37 milhões de automóveis – que representam apenas 57,37%

do total dos 64,8 milhões de veículos registrados. Moreira (2011) afirma que, se

todos esses veículos estivessem rodando, haveria emissão anual de mais de 170

milhões de toneladas de CO2, contribuindo diretamente para o aquecimento global.

Outro efeito colateral mais recente, que cada vez gera mais questionamentos sobre

o produto final dessa indústria, são os impactos na mobilidade urbana e os grandes

congestionamentos e seus reflexos sociais e financeiros.

Com isso, uma das principais pressões do século XXI a desafiar as

organizações, inclusive as desse setor, e a exigir uma postura ativa dos gestores,

será a intensificação das cobranças por ações que envolvam responsabilidade

socioambiental. Tudo indica que, nos últimos anos, os principais players desta

indústria vêm atuando em relação a estas pressões. Inovações como o redesenho

de processos de fabricação, que refletem em ganhos de eficiência de insumos e

energia, a análise de oportunidades intralogísticas, o desenvolvimento de carros

mais econômicos, investimentos em educação do consumidor, além de fortes

pressões por investimentos públicos na área de infraestrutura urbana são apenas

alguns exemplos.

Mesmo assim, o setor automotivo brasileiro continua em forte processo de

expansão. Somente em 2011 foram licenciados 3.425.674 automóveis e comerciais

leves (ANFAVEA, 2012), representando a inclusão de mais de seis novos veículos

por minuto nas ruas. A estimativa do professor de Engenharia de Transportes da

Coppe/UFRJ, Paulo Cezar Ribeiro (PLANETA COPPE, 2012), revela que

somente a frota de automóveis no Estado do Rio de Janeiro será quase o dobro da

atual até 2020, chegando a 3 milhões de unidades. Com a perspectiva otimista de

metas de crescimento das empresas na indústria, é razoável esperar aumento

destes impactos socioambientais ao longo do tempo.

Para gerar e capturar valor, antecipando-se a esta e a demais pressões

ambientais de modo as neutralizar, compatibilizar sustentabilidade socioambiental

com o crescimento das corporações é questão crucial. De acordo com Fleck (2010),

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18

dentre as condições necessárias para que a empresa garanta sucesso a longo

prazo, estão a fomentação de um meio ambiente sustentável e a integração de

práticas de responsabilidade ambiental e social corporativas pela empresa.

Dessa forma, o recorte principal deste trabalho será examinar o processo de

crescimento da atual empresa líder do setor automotivo nacional. Buscar-se-á

também identificar, a partir de uma abordagem longitudinal (YIN, 1989), os padrões

de respostas da empresa voltadas à neutralização das ameaças destes ambientes e

as implicações estratégicas para o crescimento sustentado e a longevidade

saudável da firma (FLECK, 2009). Este trabalho também tem como objetivo

entender como o tema responsabilidade ambiental e social corporativa se relaciona

com o processo de crescimento sustentado e de longevidade saudável.

1.1 OBJETIVO DO ESTUDO

1.1.1 Questão Principal

O que pode explicar a migração de uma empresa da posição de desafiante

(challenger) em uma indústria para a posição de líder do setor?

1.1.2 Demais objetivos

• Contribuir para o entendimento sobre desafios do crescimento saudável das

organizações, na perspectiva do cenário industrial brasileiro.

• Contribuir para o entendimento sobre responsabilidade social, seus

motivadores e os desafios, dilemas e oportunidades geradas nas firmas.

• Contribuir para o entendimento sobre a relação entre os temas

responsabilidade social e ambiental corporativa e crescimento saudável das

organizações

• Contribuir para o entendimento do cenário atual da indústria automotiva

brasileira.

• Avaliar o grau de empreendedorismo da empresa estudada.

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• Avaliar a capacidade de análise ambiental da empresa estudada.

1.2 JUSTIFICATIVA

Fleck (2009) afirma que o crescimento organizacional é uma das condições

necessárias para a continuidade da existência da empresa. Contudo, de acordo com

a autora, esse processo gera grandes desafios para as organizações.

Um desses desafios é a necessidade de promover o empreendedorismo de

forma continuada, por meio de expansões capazes de criar valor para a

organização, mas sem gerar uma exposição exagerada a riscos. Outro é

compreender, de forma sistemática, além das expectativas dos stakeholders, os

ambientes em que a empresa está inserida e quais são as principais pressões,

condições necessárias para que a empresa possa responder corretamente de forma

a captar valor e manter sua legitimidade.

Paralelamente, os debates sobre os riscos e necessidades socioambientais

tomam conta das principais agendas de empresas, governos e da sociedade. Para

Fleck (2010), a maneira pela qual as empresas tratarão essas questões poderá

direcionar a empresa para o declínio ou para o processo de longevidade lucrativa.

Esta pesquisa estudará o caso da empresa Fiat do Brasil. As principais

razões para a escolha dessa unidade de análise são: (i) por ter sido uma empresa

desafiante ao entrar em uma indústria fechada e oligopolizada e ter se tornado líder

(ii) em um setor de extrema relevância para o PIB (iii) e com impactos

socioambientais. (iv) Além disso, é uma empresa considerada, pela imprensa

especializada, como pioneira e benchmark em ações e processos de

responsabilidade social e ambiental.

Por tudo isso, justifica-se o estudo combinado entre os temas propostos, com

o objetivo de entender desafios gerados pelo crescimento e como as empresas do

setor automotivo estão atuando para criar e capturar valor em ambientes em rápida

transformação. Torna-se muito relevante entender como todo esse mecanismo

ocorre em uma indústria de proeminente impacto para a economia, sociedade e para

o meio ambiente.

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20

1.3 ORGANIZAÇÃO DO ESTUDO

Figura 1.1 – Mapa visual da organização do estudo

Conforme exemplificado na Figura 1.1, este estudo está organizado em seis

capítulos. O primeiro contempla a introdução. A seguir, o Capítulo 2, de revisão

bibliográfica, possui duas seções. A primeira analisa as vantagens do crescimento

organizacional e os desafios que esse processo implica, abordando os diferentes

conceitos sobre ambientes e respostas aos desafios gerados a partir do processo de

navegação e empreendedorismo. A seguir, trata-se dos conceitos sobre

responsabilidade social, benefícios e motivações que levam as organizações a

buscar e implantar ações e estratégias de responsabilidade social. No final desde

capítulo, é exposto um framework que será utilizado para posterior análise de quais

ambientes mais representavam determinados momentos do caso estudado, e uma

síntese sobre a associação entre as teorias de crescimento e responsabilidade

socioambiental.

O terceiro capítulo dedica-se à explicação da metodologia da dissertação.

Justifica-se a escolha do tema, da pergunta e do método de pesquisa a partir da

teoria de Yin (1998), além do processo de seleção das teorias utilizadas no Capítulo

2, as fontes de dados e sua relevância. Também é abordado o processo de decisão

da unidade de análise e da seleção dos entrevistados. Descreve-se a estratégia de

pesquisa, suas delimitações e restrições. Trata-se sobre o processo de coleta e

tratamento de dados e é descrito o processo de análise.

O Capítulo 4 engloba a evolução histórica da indústria automotiva mundial,

principais marcos, relevância socioeconômica e potenciais impactos sociais e

ambientais. Logo em seguida, é explorado o histórico da indústria automotiva

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brasileira. Neste capítulo, também é possível, ao leitor, encontrar breve relato da

história da Fiat Mundo e análise histórica da Fiat Brasil.

O quinto capítulo apresenta os resultados da análise. Já o último capítulo

apresenta a conclusão da pesquisa, contribuições para o arcabouço teórico, as

implicações deste estudo de caso para outras organizações do setor, bem como

propostas para futuros estudos.

Cabe ressaltar que não fazem parte do escopo de atuação desse estudo (i)

requisitos técnicos dos carros; (ii) análises financeiras da organização, nem das

demais empresas do setor; (iii) detalhar em profundidade ações de marketing ou o

comportamento do consumidor de veículos.

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2 REVISÃO DE LITERATURA

Considerando que os temas que orientam este estudo se referem tanto a

crescimento e longevidade organizacional quanto a pressões ambientais e respostas

estratégicas aos desafios institucionais em ambientes desafiadores, dentre elas os

dilemas sobre responsabilidade ambiental e social corporativa (denominado neste

trabalho, como já visto, de “Rasc”), a revisão de literatura terá duas seções

principais.

A primeira identifica os principais desafios do processo do crescimento

organizacional. Esta parte irá trabalhar os tipos de resposta dados pelas empresas

aos desafios, bem como classificar as respostas de acordo com a intenção de busca

de benefícios no curto ou longo prazo. Assim, o arcabouço teórico selecionado para

conduzir este estudo será baseado, principalmente, nos textos de Fleck (2009;

2010).

No fim da primeira seção, será explorado, em maior profundidade, o tema

pressões ambientais. Para tanto, inicialmente serão expostas algumas das visões

sobre a influência do ambiente na elaboração das estratégias, além das categorias

de ambiente, com especial atenção aos textos de Carroll e Huo (1986), Weitzel e

Johnson (1989) e Fleck (2009). O objetivo é possibilitar maior entendimento teórico

sobre como as organizações se comportam de acordo com a natureza das pressões

institucionais a partir de Mintzberg et al (2000), Stinchcombe (1965 apud

ROMANELLI, 1991), Christine Oliver (1991) e outros autores.

A segunda seção abordará os conceitos e as principais implicações do tema

Rasc nas estratégias empresariais, bem como os potenciais impactos das

organizações na degradação e preservação do meio ambiente. Fazendo referência a

seções anteriores, busca-se também explicitar os principais motivadores e as

justificativas usadas pelas firmas para implantar ações de Rasc, e quais benefícios

tais ações podem gerar no longo prazo. Por fim, faz-se uma análise sobre as

pressões por inovações do tema Rasc nas organizações.

A abordagem busca entender, a partir da combinação dessas seções, quais os

principais desafios e dilemas do crescimento das organizações, e quais os principais

padrões de respostas das organizações a essas pressões ambientais. E, ainda, se a

incorporação de práticas sustentáveis aumenta as possibilidades de sobrevivência

em ambientes desafiadores.

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2.1 CRESCIMENTO E LONGEVIDADE ORGANIZACIONAL

Não é possível encontrar na literatura acadêmica consenso sobre como medir o

sucesso de uma organização. Para Barnard (1938), a única medida verdadeira de

sucesso é a capacidade de a organização sobreviver. Fleck (2010), na mesma

perspectiva da longevidade, assegura que uma organização de sucesso é aquela

que desenvolve uma propensão de continuar a existir de maneira saudável.

Por ser um processo extremamente desafiador, alguns autores, como Modis

(1994), por exemplo, não acreditam na perpetuação das empresas, e tendem a usar

a analogia com o ciclo de vida biológico para argumentar que, assim como os seres

vivos, todas as organizações estão fadadas à “morte”. Porém, Penrose (1980)

contradiz esse tipo de argumento, ao arguir que não existem evidências de que

comprovem tal analogia. Um ponto interessante levantado pela autora é que, se

todas as empresas estivessem predestinadas a uma mesma trajetória, ou ciclo –

com consequente morte no final –, as decisões humanas seriam praticamente

irrelevantes.

Uma ressalva feita por Fleck (2009) é sobre a distinção entre a existência bem-

sucedida, a partir de corretas respostas aos desafios que o processo de crescimento

gera, e a mera sobrevivência organizacional. Para Meyer e Zucker (1989), algumas

organizações podem ser classificadas como permanently failing organizations (ou

PFO). De acordo com esses autores, por diversas razões e interesses de partes

dependentes, certas organizações podem ser longevas, conseguindo “sobreviver”

por muitos anos, mas permanecem estagnadas ou não são necessariamente

lucrativas.

Diversas são as causas que levam as empresas a buscar o crescimento.

Penrose (1980) afirma que as grandes empresas, por possuírem um superior poder

de concorrência, restringem as opções de crescimento de concorrentes menores.

Child e Kieser (1981) afirmam que o crescimento é a base de segurança para a

firma. Whetten (1987), por sua vez, sintetiza outras causas apontadas na literatura

que levam os gestores das organizações a buscar o crescimento, tais como: a

criação de oportunidades de promoção para os funcionários (DENT, 1959 apud

WHETTEN, 1987), surgimento de mais desafios para os gerentes (STARBUCK,

1965 apud WHETTEN, 1987), a busca por atender aos anseios dos funcionários

(ROBERTS, 1959 apud WHETTEN, 1987), dentre outros. Para Bossidy (1995), o

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processo de crescimento das empresas aumenta a moral dos empregados e atrai os

grandes talentos do mercado. Whetten (1987) também assume que crescimento é

sinônimo de eficiência e sucesso. Por essa perspectiva, uma organização que

mantém estável seu tamanho pode indicar estagnação.

Para Fleck (2009), o crescimento é um processo, não um evento, e é durante

a etapa do crescimento que se encontram os principais desafios para a organização.

Assim, seja qual for a razão que motive a organização a crescer, os gestores

precisarão não só estar cientes de que enfrentarão diversos desafios, como

precisarão ter capacidade de discernimento para não tomar decisões equivocadas.

Barney (1991) alertou que é durante o processo de crescimento que os

gestores devem decidir como irão gerir os recursos (firm resources) que garantirão

vantagens competitivas. Tais recursos incluem todos os bens, capacidades,

processos organizacionais, atributos da firma, informação, conhecimento etc. que

possibilitam à empresa conceber e implantar estratégias que aumentem a eficiência

e eficácia. Ou seja, são as decisões de um corpo gerencial com perfil empreendedor

que determinarão como a empresa enfrentará desafios do crescimento e que podem

transformar limitações do ambiente a favor da organização (CHILD, 1972;

CHANDLER, 1977).

Contudo, teóricos que seguem a visão de ecologia de população, como

Hannan e Freeman (1977), desconsideram a capacidade de um líder agir ativamente

em relação às decisões estratégicas. Esses autores sugerem que a estratégia serve,

no máximo, para maximizar a adaptação ao ambiente ou como forma de tentar

elevar as chances de sobrevivência de uma organização, resumindo as

propriedades das organizações em meras “deficiências” (da pequenez, de ser novo,

do envelhecimento, da adolescência). Acreditam ainda que “toda a estrutura básica

e o caráter de uma organização são fixados pouco depois do seu nascimento”, e as

ações subsequentes, por serem mais rígidas, não podem ser consideradas

“verdadeiramente estratégicas” (MINTZBERG et al, 2000, p. 211-214).

Defensores da visão da escola estratégica de “opção gerencial” (Managerial

Choice), Mintzberg et al (2000) ressaltam outros dois pilares (forças centrais) no

processo de elaboração de estratégia, além do ambiente: a liderança e organização.

E, num processo de desconstrução dos argumentos de Hannan e Freeman (1977),

questionam “como duas organizações podem operar com sucesso no mesmo

ambientes com estratégias muito diferentes?” (MINTZBERG et al, 2000. p.218).

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Para Stinchcombe (1965 apud ROMANELLI, 1991), um dos principais fatores

de influência do ambiente, está no “imprinting”, ou seja, no processo pelo qual

novas organizações refletem as condições ambientais do momento da sua criação.

O autor, entretanto, não minimiza a importância dos indivíduos no processo de

crescimento da firma. Assim, com o mesmo argumento de Bloodgold e Morrow

(2003), esta pesquisa não irá aprofundar o debate acadêmico entre as escolas

“determinísticas” ou de “escolhas estratégicas”, polarizado desde a década de 1970.

Seguirá a compreensão que a estrutura do ambiente pode, ao mesmo tempo,

restringir as opções estratégicas ou prover uma “atmosfera” onde decisões

organizacionais ativas são tomadas.

É importante ressaltar que diferentes problemas poderão surgir com as

mudanças estruturais decorrentes do crescimento. Os desafios de direcionar

corretamente os recursos aumentarão (CHANDLER, 1962), e a diversidade se

ampliará, o que inclusive poderá levar a empresa a um processo de declínio

(FLECK, 2009).

Fleck (2010; 2009) propõe que a gestão responsável do processo de

crescimento pode prevenir que as organizações se tornem “too big to fail

organizations” e, ao analisar etapas e dilemas do crescimento de uma firma, a

autora identificou cinco grandes desafios, cujas respostas são condições

necessárias para permitir a empresa alcançar a autoperpetuação, e os relacionou

por meio de um construto, exposto na Figura 2.1.

Figura 2.1 – Requisitos para a propensão à autoperpetuação

Fonte: Adaptado de FLECK (2009, p. 90)

Gerir a complexidade

Aprovisionar RH

Gerir a diversidade

Navegar no ambiente

Empreender

Folga

Sucesso de LP:

propensão à auto-perpetuação

Crescimento organizacional

e renovação

Integridade organizacional

+/-

+/-

CN

CN

CN

CN

+/-

+/- +/-

CN

1

2

3

4

5

6

7

8

7

7

7

8

8

8

DESAFIOS DO CRESCIMENTO

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Vencer e gerir cada um desses desafios se torna condição necessária (CN)

para a empresa atingir a propensão à autoperpetuação. Cada um desses desafios

será explicado com maior detalhe logo a seguir, porém, para fins didáticos, segue

uma rápida descrição de cada um: empreendedorismo – refere-se à criação de

valor por meio da expansão e exploração em uma gestão responsável de riscos;

navegação em ambiente dinâmico – relaciona-se à compreensão sistemática do

ambiente, de forma não enviesada da realidade, assim como a resposta às pressões

externas, preferencialmente de maneira antecipada, para possibilitar a captura de

valor; gerenciamento da diversidade – tem a ver com a manutenção da

integridade da firma em meio ao crescente aumento da diversidade, demandando

coordenação para harmonizar elementos heterogêneos e homogêneos da

organização, visando promover economias de escala e escopo; provisão de

recursos gerenciais – diz respeito a equipar a organização, no tempo certo, com

pessoas que possuam habilidades necessárias para o desempenho das suas

funções; gerenciamento da complexidade – concerne a resolução de problemas

de forma sistemática, e a promoção de capacidade de aprendizagem organizacional.

Segundo essa perspectiva, o sucesso ou a falha da organização tem a ver com a

capacidade ou incapacidade da firma em gerir e responder a cada um desses cinco

desafios.

A autora defende que, para cada um desses desafios, existem dois tipos

possíveis de resposta da organização. O primeiro orientado ao curto prazo, quando

a firma favorece a velocidade de crescimento. O segundo vinculado a ações que

garantam crescimento mais sólido e sobrevivência no longo prazo. Sintetizando,

para Fleck (2009), o sucesso organizacional está ligado à habilidade ou inabilidade

de a organização lidar com os desafios relacionados ao crescimento.

Abaixo, no Quadro 2.1, encontram-se, além de outra síntese descritiva dos

conceitos de cada desafio, os dois polos de padrão de resposta (arquétipos). As

empresas que se enquadram no arquétipo da autoperpetuação tendem a responder

aos desafios conforme as características do lado direito da última coluna. Já as que

se ajustam ao arquétipo da autodestruição tendem a responder conforme as

respostas características listadas no lado esquerdo da mesma coluna. Porém,

convém registrar que diferentes respostas para idêntico desafio podem coexistir na

mesma corporação.

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Quadro 2.1 – Resumo dos desafios do crescimento das organizações

Fonte: Adaptado de FLECK (2009, p. 85)

A partir de decisões corretas tomadas pelos gestores e, principalmente, da

capacidade de mudança e adaptação, a empresa poderá se aproximar do arquétipo

“autoperpertuante” ou do “autodestrutivo” (FLECK, 2009). Para melhor

compreensão, a seguir detalham-se os dois desafios que fornecerão base para a

análise: empreendedorismo e navegação no ambiente. Esses desafios estão

diretamente relacionados a dois dos três pilares da formação da estratégia de

Mintzberg et al (2000): o ambiente e a liderança. O terceiro pilar: “organização”, que

pauta os desafios de gerenciamento da diversidade, provisão de recursos humanos

e gerenciamento da complexidade, não está contemplado no escopo desta

pesquisa.

2.1.1 Empreendedorismo

De acordo com Fleck (2009), o desafio do empreendedorismo consiste em

prover de forma continuada o processo de expansão, e a busca de forma regular de

oportunidades lucrativas. Este desafio também foi citado por Penrose (1980) como a

Desafio Descrição

Contestável ou pior Alto alcance

Baixo nível de ambição, versatilidade, imaginação, visão, baixa capacidade de levantamento de fundos, engenhosidade e julgamento. Utilizando movimentos motivacionais reativos ou nulos.

Alto nível de ambição, versatilidade, imaginação, visão, alta capacidade de levantamento de fundos,

engenhosidade e julgamento. Utilizando

movimentos motivacionais produtivos ou híbridos

À deriva De Moldagem

Monitoramento pobre, uso de estratégias de resposta inadequadas

Monitoramento regular, uso de estratégias de resposta

oportunas e adequadas

Fragmentado Integrado

Falha ao estabelecer relações e na coordenação de capacitações

Desenvolvimento com sucesso de relações e na

coordenação de capacitações

Tardio Cedo

Just-in-time ou depois de criada a necessidade

Planejada previamente

Ad hoc Sistemático

Capacitação de resolução de problemas pobre, baseado na procura rápida por soluções que impedem o aprendizado

Forte capacitação de resolução de problemas,

promoção da busca organizada de soluções,

incentivando o aprendizado

Provisionamento dos Recursos Humanos

Equipar prontamente a firma com os recursos humanos qualificados

necessário

Gerenciamento da Complexidade

Gerenciamento de questões complexas e solucionar problemas

com complexidade crescente de forma a evitar risco a existência da

organização

Características das Respostas Opostas

Empreendedorismo

Promover o empreendedorismo continuado através do estímulo ao

desejo da empresa de seguir reforçando a expansão, criação de

valor ao mesmo tempo que previne a superexposição da organização

ao risco.

Navegação em um Ambiente Dinâmico

Lidar com os múltiplos stakeholder para assegurar a captura de valor e

a legitimidade organizacional

Gerenciamento da Diversidade

Manutenção da integridade da firma ao se confrontar com conflitos organizacionais crescentes e

rivalidade

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intenção da firma de se submeter a certos riscos, visando a ganhos futuros mas,

simultaneamente, buscando maneiras de evitar outros riscos que a impossibilitem de

crescer.

Além da exposição a riscos, para um processo contínuo de expansão ser

possível, algumas características precisam ser observadas na firma, como a

presença de mecanismos de reforço, o que Fleck (2009) denominou de motor do

crescimento contínuo, e o que Penrose (1980) designou de serviços

empreendedores.

Para Chandler (1977), a capacidade de autoperpetuação de uma empresa

está relacionada a dois processos que ocorrem concomitantemente: crescimento

contínuo e existência continuada. Fleck (2009), por sua vez, indica que

crescimento produz mais crescimento. Esse mecanismo de autorreforço, ou motor

do crescimento contínuo, pode ter início (ou “ignição”) a partir da percepção da

existência de um conjunto diversificado de recursos e habilidades subutilizados,

transferíveis dentro da empresa, por haver desequilíbrio. Isso geraria oportunidades

de expansão e incentivos ou reforços, e consequente pressão para o crescimento da

firma de forma produtiva (PENROSE, 1980; CHANDLER, 1977).

Segundo Penrose, esse pool de serviços produtivos subutilizados, ou folga

(slack), pode ser encontrado em qualquer organização. E isso inclui o conhecimento.

Uma das explicações para a folga estaria na característica de indivisibilidade dos

recursos, principalmente dos humanos, e a diversidade de utilização destes. Em

uma espécie de ciclo virtuoso, conforme ilustrado na Figura 2.2, no processo de

crescimento, a empresa, na busca gerencial por uma utilização mais intensa e

lucrativa das instalações e das habilidades dos recursos, acaba reinvestindo e

adquirindo novos recursos. Estes, por sua vez, criam e alimentam condições

favoráveis para novas expansões (PENROSE, 1980; FLECK, 2003).

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Figura 2.2 – Estrutura geral do motor de crescimento contínuo

Fonte: Adaptado de FLECK (2003, página 16)

Mas é importante entender o que motiva os gestores de uma organização a

buscar o crescimento. Chandler (1977) afirma que uma empresa pode ter,

basicamente, dois tipos de motivador para buscar expansão. Um seria o

produtivo, visando ao aumento de produtividade, e ganhos operacionais, como

economias de escala ou escopo ou mesmo de velocidade, gerando renovação a

partir do crescimento. O segundo seria um processo defensivo, ou seja, a partir da

busca de redução de incertezas e proteção de negócios existentes. Exemplos típicos

de expansão defensiva seriam as integrações verticais e processos de fusão e

aquisição, na tentativa de reduzir as forças competitivas da indústria. Fleck (2009)

sugere dois outros tipos de motivador. Um híbrido, em que a firma busca ações

estratégicas tanto por razões produtivas quanto defensivas, permitindo-se aumentar

a eficiência e proteger os negócios. O último motivador é denominado de “nulo” (nil),

por não partir nem de uma motivação para estabelecer uma posição produtiva nem

mesmo defensiva. Penrose (1980) associou esse tipo de motivação à expansão por

gestores que buscam a criação de impérios.

Os serviços empreendedores, de acordo com Penrose, englobam ambição,

versatilidade, acesso a recursos e capacidade de julgamento e tomada de

decisão.

Ambição é a vontade de crescer, melhorar, ampliar as oportunidades da

firma. Pode ser produtiva, focada na melhora dos produtos e dos serviços, ou pode

ser uma ambição na busca da construção de um império (empire-builder) quando o

foco da empresa está na ampliação do escopo de atuação. Olhando por um prisma

estratégico, a primeira pode ser categorizada pelo que March (1991) chamou de

exploitation strategy, ou seja, priorizando o uso de oportunidades existentes. A

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segunda pode ser associada com a estratégia de exploração (exploration strategy),

pois envolve riscos na busca de novas oportunidades.

Versatilidade é uma questão de imaginação e visão. É a capacidade de a

firma buscar caminhos não convencionais, mais criativos. Está relacionada com a

entrada em novos mercados e a busca de ambientes mais favoráveis para a atuação

da organização. Pode ser associada também com a capacidade de abrir mão de

“receitas de bolo”, táticas que fizeram sucesso no passado. A versatilidade pode

bloquear o que Sull (1999) chamou de “inércia ativa”. Esse processo acontece

quando os gestores tendem a repetir os mesmos padrões de comportamento, as

“fórmulas de sucesso” para vencer a guerra competitiva. Isso acaba atrapalhando os

negócios e fazendo que mesmo algumas empresas excelentes não escapem do

declínio.

Acesso a recursos, habilidade de acessar financiamentos (fund-raising

ingenuity), é vital para os demais serviços empreendedores. Envolve não somente a

capacidade de adquirir recursos, mas de gerar confiança nas fontes financiadoras.

Penrose (1980) afirma que, dependendo da habilidade empreendedora dos

gestores, eles poderão obter recursos, independentemente do tamanho da firma.

Para Lemme (2010), alguns gestores, na busca de recursos, são motivados a

implantar ações de responsabilidade socioambiental, pois assim podem ter mais

acesso a fontes preferenciais de financiamentos com a correspondente redução de

custo de capital.

A capacidade de julgamento e tomada de decisão, ou julgamento

empreendedor (entrepreneurial judgment), conforme denominado por Penrose

(1980), está relacionada à coleta de dados e geração de informações nos vários

departamentos da firma, a fim de mitigar riscos e evitar decisões incertas. Envolve,

de acordo com a autora, mais do que a combinação de imaginação e bom senso,

além de outras características pessoais. Está relacionada ao melhor aproveitamento

da visão e das informações geradas pelos múltiplos stakeholders da organização.

Para Lepak, Smith e Taylor (2007) a criação de valor pela organização

ocorre quando estas desenvolvem novos produtos; processos; tecnologias ou

mesmo nova forma de uso de determinadas matérias-primas. Assim, ao apresentar

inovações ou ao mudar um processo de fabricação de um produto reduzindo a

necessidade de matérias-primas, a empresa estaria criando valor.

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2.1.2 Navegação em um ambiente dinâmico

Enquanto o desafio do empreendedorismo busca a criação de valor, o desafio da

navegação está relacionado a uma gestão bem sucedida dos múltiplos

stakeholders da organização, assegurando legitimidade, e captura de valor em

um ambiente de mudanças (FLECK, 2009). Além de manter o contínuo

monitoramento (scanning) do ambiente, a organização deve fazer o correto uso de

estratégias para responder a pressões que possam vir a ameaçar a legitimidade e

sobrevivência. Segundo Oliver (1991), para sobreviver, as organizações devem ser

posturas estratégicas mais ativas (além de responsivas) às demandas e

expectativas dos diversos stakeholders.

Na literatura sobre administração, existem diversas formas de analisar os

ambientes competitivos e, autores como Fleck, por exemplo, costumam estudar o

ambiente em mais de uma dimensão simultaneamente. Algumas visões categorizam

o ambiente, de acordo com a relação da empresa e fatores produtivos, ou mesmo

fatores de influência externa. Outros, de acordo com o grau de benevolência ou de

rigidez do ambiente em relação à empresa.

Além dessas metodologias, os autores tendem a estudar a arena competitiva

dividindo-a entre ambiente de mercado (market environment) e ambiente de “não

mercado” (non market environment). O primeiro inclui as interações entre as firmas

e outras partes, geralmente envolvendo transações econômicas e trocas de

propriedade (BARON, 1995), e é o mais comum de encontrar na literatura, em

análises, debates e teorias estratégicas. De acordo com Baron, o non market inclui a

reputação da empresa, a legitimidade e as atitudes com todos os stakeholders. Para

Baron, é de fundamental importância a análise do non market para a performance da

firma e no monitoramento (scanning) do ambiente, principalmente em setores onde o

governo exerce grande influência. De acordo com o autor, estar continuamente

“atento” para as oportunidades da organização é um dos fatores mais relevantes

para o sucesso.

O non market possui duas dimensões, a indústria e a organização.

Externamente, seu monitoramento ajuda a empresa a se proteger dos rivais,

principalmente contra novos entrantes ou mesmo produtos substitutos (BARON,

1995). Um dos exemplos de estratégias, segundo o autor, é o uso de ferramentas

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como o lobby, para poder moldar as forças de mercado como regulações,

tributações ou mesmo aumentando as barreiras de entrada, em linha com as táticas

propostas por Oliver (1991).

Internamente, a gestão bem-sucedida dos conflitos entre os stakeholders é

tida como fator fundamental de sucesso. Como as partes tendem a ser conflitantes,

e legítimas, a correta gestão dos interessados é crucial para a longevidade da

empresa. Lepak, Smith e Taylor (2007) assumem que os investidores geralmente

preferem criação de valor de curto prazo. Já os funcionários, usualmente, escolhem

criação de valor que gere estabilidade no longo prazo. Quanto ao meio ambiente,

pode-se dizer que a correta gestão desse stakeholder consiste em promover sua

preservação. Para Oliveira (2007), a correta identificação das necessidades de cada

uma das partes interessadas, considerando a responsabilidade por um bom

desempenho social e ambiental, permite a elaboração de cenários e a criação de

subsídios para melhores decisões estratégicas.

2.1.2.1 Categorias de ambientes

Voltando à questão das diferenças de ambientes, e buscando estruturar os

diversos conceitos, este trabalho propõe dois eixos principais de análise.

O primeiro irá aplicar a análise do ambiente sugerido pela sociologia

organizacional, conforme Carroll e Huo (1986). Porém, além dos ambientes de

negócio e institucional (task and institutional environment), será incluída a interação

da empresa com o meio ambiente, o ambiente natural. O segundo eixo de análise

será analisado conforme Weitzel e Johnson (1989), Fleck (2009; 2010) e outros, ou

seja, pela perspectiva das condições ambientais em que as ações das

organizações podem desenvolver-se. Este framework de Fleck (in print) possibilita

analisar os fatos classificando-os segundo o tipo de ambiente que predominava ao

redor da empresa em estudo.

O task environment engloba fatores diretamente ligados ao “trabalho” da

organização, com especial atenção aos processos e os fluxos de “entrada e saída”

dos produtos, ou os fatores externos potencialmente relevantes para o atingimento

das metas (CARROLL; HUO, 1986). Inclui a relação com fornecedores, clientes,

competidores, mercado, para citar alguns.

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O conceito de institutional environment foi usado inicialmente por Selznick, em

1948. Para Carroll e Huo (1986), são fatores externos que influenciam indiretamente

a organização. Como exemplo, pode-se citar a cultura nacional, os sistemas

políticos, as leis e regulações, a estrutura do mercado, procedimentos, convenções

informais, normas, situações macroeconômicas etc. (LAMMERS; HICKSON, 1979;

CARROLL; HUO, 1986; OLIVER 1992; 1997). A relação da empresa com o “não

mercado” (non market) de Baron (1995) também está associada ao ambiente

institucional.

Por fim, o ambiente natural, ou natural environment, de acordo com Fleck

(2010), inclui a interação da empresa com o meio ambiente. Desde a dependência

dos recursos naturais à eliminação de detritos e pressões ambientais e de

responsabilidade ambiental e social corporativa (Rasc), um dos motes em análise

desse estudo.

Indo para o outro eixo de estudo, analisam-se as condições do ambiente de

negócio, ou seja, as características do ambiente pela ótica da pressão em relação à

empresa. De acordo com Weitzel e Johnson (1989) e Fleck (2009), o ambiente

piedoso (forgiving environment) é generoso e compassivo, o que pode estimular

um comodismo organizacional e, consequentemente, dificuldades de perceber sinais

de declínio organizacional. Neste, nem os mecanismos de mercado (market) ou de

“não mercado” (non market) conseguem “punir” a ineficiência das organizações, ou

mesmo gerar pressões para mudanças. Isto acaba contribuindo para as empresas

fazerem “mais do mesmo” ao invés de buscar inovações ou resolver problemas

internos. De acordo com Fleck (2010), esse era o cenário brasileiro para a maioria

das empresas durante quase todo o século XX.

Mas o ambiente pode ser desafiador (challenging environment) e altamente

competitivo. Neste, somente serão recompensadas as organizações eficientes e que

souberem se antecipar e responder a todos os desafios, sendo punitivo para

organizações com pouca competitividade e ineficientes. Atualmente, com a

globalização e as quedas de fronteiras comerciais, as arenas competitivas provam-

se cada vez mais desafiadoras, principalmente em mercados mais maduros. Para

Lepak, Smith e Taylor (2007), as firmas são mais propensas a inovar quando

enfrentam ambientes de incertezas, cenários competitivos mais dinâmicos, e quando

geridas por gestores empreendedores.

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Existe um terceiro tipo de ambiente, pouco explorado na literatura, porém não

menos importante de ser categorizado: o ambiente inóspito, ou inhospitable

environment. É caracterizado por situações extremas e desafiadoras para o

sucesso de empreendimentos, impondo restrições às atividades da organização, e

onde a criação e a captura de valor são mais restritas (FLECK, 2010). Como

exemplo, é possível citar desde países em guerras, aparecimento de ditaduras,

ambiente de desconfiança institucional, bloqueios de mercados ou mesmo uma

situação natural desfavorável.

Contudo, conforme ressaltado por Mintzberg et al (2000): “Na realidade,

nenhuma organização enfrenta um “ambiente” generoso, complexo, hostil, ou

dinâmico (para não dizer turbulento). Pode haver bolsões periódicos dessas

coisas...” (MINTZBERG et al, 2000, p.217). Assim, chega-se ao Quadro 2.2, de Fleck

(in print), que no momento da análise da empresa em estudo, servirá como

framework-base para categorizar, em cada período estudado, em quais tipos de

ambiente a Fiat estava inserida.

Quadro 2.2 – Framework síntese das teorias ambientais.

Fonte: Fleck (in print)

2.1.2.2 Respostas aos desafios do ambiente

Conforme mencionado, a organização que estará mais propensa à

autoperpetuação é a que mantém uma prática de monitoramento constante

(scanning) do ambiente e stakeholders (FLECK, 2009). Barney (1991) sugere que as

firmas adquirem vantagem competitiva sustentável por meio das forças internas e

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também com as respostas a oportunidades do ambiente, ao neutralizar as ameaças

externas e evitar fraquezas internas. Beer (2002) corrobora afirmando que, num

contexto de grandes mudanças tecnológicas e globalização, as firmas terão de ter

capacidade de adaptação ou sofrerão consequências como baixo desempenho ou

mesmo declínio e morte. O autor chama de organizational fitness a capacidade de

adaptar o desenho da organização, processos, comportamento e cultura para ter o

fit com novas situações como, por exemplo, pressões para maior responsabilidade

social. Segundo o autor, nesse “ambiente econômico darwiniano”, as unfit

organizations não sobreviverão. Para Beer (2002), infelizmente, a maioria das firmas

não parecem ser tão adaptativas.

Sull (1999) observa que mais importante do que a empresa responder às

pressões, é responder da maneira correta. Muitas vezes, empresas que tiveram

sucesso acabam buscando fórmulas antigas no passado de glória tentando

responder a novos desafios com os mesmos “remédios”. O autor descreve como

“inércia ativa” o processo de repetição de determinados comportamentos, outrora

bem-sucedidos, mesmo quando o ambiente tenha mudado. Assim, de acordo com

Mintzberg et al (2000) e Oliver (1991; 1992; 1997), é fundamental que a empresa

mantenha comportamento estratégico para responder aos processos de

institucionalização; e para não ter a legitimidade ameaçada, a empresa deve atuar

com respostas adequadas a cada ameaça, utilizando-se de grande variedade de

respostas estratégias.

Christine Oliver (1991) discorre sobre as maneiras de responder

estrategicamente às leis, estruturas regulatórias, agências reguladoras e demais

instituições que, agrupadas, são chamadas de pressões institucionais, em que a

opinião pública (imagem da organização) também é enquadrada. Para Oliver (1991;

1992), o comportamento das organizações pode variar entre extremos de

conformação passiva até a resistência ou controle, de acordo com a natureza da

pressão. Abaixo, serão detalhadas as estratégias sugeridas por Oliver (1991) que

podem ser adotadas pelas organizações em resposta às pressões ambientais:

1. Aceitação ou submissão (acquiescence): existem diversas formas de a

organização “aceitar” normas, costumes ou pressões institucionais:

I. o hábito é uma aderência inconsciente às regras. São as normas

“tidas como certas”. Padrões históricos que se repetem

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ciclicamente, ou processos que deixam de ser questionados pois

“sempre foi assim”;

II. a imitação, ou seja, o mimetismo de modelos institucionalizados,

de forma consciente ou não. Um exemplo desse padrão de

respostas é quando os gestores, na hora de tomar decisão,

repetem o comportamento de outros “atores” no ambiente,

principalmente de pessoas conhecidas em quem confiam. Oliver

cita, como exemplo, a contratação de consultorias, que replicam

seus modelos (ou pacotes de solução) em firmas de diferentes

setores, em diversos ambientes, com pouca ou nenhuma

customização;

III. a conformidade, a resposta mais ativa, pois é uma forma

consciente de respeitar valores, normas ou requisitos institucionais.

Podem ser formas de se adequar previamente à pressões externas

por serem consideradas necessárias para a condução das

atividades, como adequação à legislações ou regulações

ambientais, por exemplo, para poder continuar operando em

determinado País.

2. Compromisso ou negociação (compromisse): “as organizações são

constantemente confrontadas com demandas institucionais conflitantes ou

com inconsistências entre expectativas institucionais e objetivos internos

relativos à eficiência e à autonomia” (OLIVER, 1991, p. 153). Com essa

definição, a autora propõe outras três táticas que estão no limiar da

resistência da firma às pressões institucionais: balancear, pacificar e

barganhar. Todas, diferentemente das estratégias de aceitação, são

formas parciais de adequação a pressões, em que a empresa busca

promover mais ativamente os próprios interesses:

I. balancear pode ser considerado uma resposta tática aos

processos institucionais e se refere à acomodação das demandas

dos múltiplos stakeholders em resposta às pressões institucionais e

demais expectativas. Ou seja, é uma tentativa organizacional de

atingir paridade entre as partes interessadas. Como exemplo, pode-

se citar a criação de centros de capacitação para a população ao

redor de uma fábrica que, ao mesmo tempo em que atende às

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demandas da sociedade, pode servir de nova fonte de mão de obra

especializada para a firma;

II. técnicas de pacificação (pacify) também são estratégias que

aceitam parcialmente as expectativas institucionais de uma ou mais

partes interessadas. Como exemplo, a autora cita o redesenho de

um produto potencialmente perigoso, para se adequar a demandas

sociais ou legislativas. Uma ressalva é o considerável uso de

energia e recursos para atuar nessas fontes de pressão;

III. barganha é uma forma mais ativa de compromisso do que

pacificação. Pode ser descrita como o esforço da firma, a partir de

negociações, de reduzir demandas ou exigências institucionais de

alguns stakeholders. Pode ser exemplificada pelas relações

empresa versus sindicato ou empresa versus agências

reguladoras.

3. Evitação ou evasão (avoidance): é definida como ações da organização

para evitar uma necessidade de se adequar a demandas ou pressões

institucionais. De acordo com Oliver (1991), diversos teóricos, tanto da

corrente de dependência de recursos, quanto da institucionalização,

reconhecem a importância da estratégia de evitação como resposta às

pressões institucionais. Dentre eles Meyer e Roman (1977 apud OLIVER,

1991), Meyer et al. (1983 apud OLIVER, 1991), Pfeffer e Salancik (1978

apud OLIVER, 1991), para citar alguns. Novamente, a autora difere esta

estratégia em três formas de resposta: dissimulação, amortização e fuga:.

I. dissimulação (concealment), como o próprio nome sugere, são

estratégias usadas para “dar a entender” que a organização está

submetida a determinada pressão institucional quando, na verdade,

não está. É exemplificada por táticas de “maquiagem” da firma em

dias de inspeção de órgãos responsáveis e, ao fim de tal inspeção,

a empresa volta aos processos habituais e “não conformes”;

II. amortização (buffering) é a tentativa da organização de reduzir a

intensidade com a qual é inspecionada, examinada ou avaliada por

agências externas. Teóricos acreditam que o desacoplamento de

certas atividades pode ajudar a empresa a manter a legitimidade e,

ao mesmo tempo, aumentar a autonomia da firma;

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III. fuga é a forma mais drástica de responder a pressões

institucionais. Uma organização pode rever ou até mesmo mudar

drasticamente de objetivos, atividades e mesmo áreas de atuação

para não ter de se submeter a pressões. A mudança física de

empresas químicas da União Europeia ou dos Estados Unidos da

América para países do chamado “mundo em desenvolvimento”,

com leis ambientais mais flexíveis, é um exemplo de estratégia de

fuga.

4. Desafio ou provocação (defiance) é uma forma mais ativa de resistir aos

processos institucionais, principalmente quando os interesses da

organização são fortemente conflitantes com as normas ou expectativas

de stakeholders externos. Geralmente é executado quando a organização

acredita que poderá argumentar e justificar a decisão e quando os

gestores medem os riscos desse confronto e acreditam que, em caso de

perda, esta não impactaria tanto na legitimidade da firma. Pode ser em

forma de ignorar, desafiar ou atacar:

I. ignorar (ignoring), como o nome sugere, é quando a organização

decide, espontaneamente, ignorar regras institucionais,

principalmente quando a pressão externa é baixa. Um exemplo

citado por Oliver (1991) são as ações de afirmação social ou de

gênero, ignoradas por algumas empresas. Um estudo de Salancik

(1979 apud OLIVER, 1991) mostrou que a adequação a tal política

se dava basicamente em empresas que dependiam de recursos

governamentais;

II. desafiar (challenge) é um questionamento ainda ativo de normas,

regras ou mesmo expectativas externas. Quando este tipo de tática

pode ser reafirmada de forma racional pela instituição, tende a ser

mais utilizada. Essa pode ser também uma postura positiva, que

agregue valor para as partes interessadas, como o caso de

empresas que se unem para pressionar o governo a tornar

legislações ambientais ainda mais rigorosas;

III. ataque é a terceira tática da estratégia de desafio, em que a

organização investe energia para desafiar as pressões e

expectativas institucionais de forma mais intensa e agressiva. Essa

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táctica costuma ser empregada, geralmente, quando a organização

percebe que tais pressões são direcionadas especificamente contra

ela, não são expectativas generalizadas, o que pode colocar em

perigo sua existência e autonomia.

5. Manipulação é a resposta mais ativa às pressões institucionais e uma

tentativa proposital para buscar oportunidades ao cooptar, influenciar e até

mesmo controlar ou moldar certos fatores ambientais:

I. cooptação é quando a organização pode cooptar membros de

fontes dessas pressões como forma de resposta. Como exemplo, a

firma pode propagandear parceria com um instituto sobre ética para

trazer a opinião pública para seu lado;

II. influência, caso em que a organização atua de forma mais

genérica, buscando manipular crenças e valores institucionalizados.

É muito observada em indústrias que tendem a ser avaliadas por

altos padrões, quando buscam definir tais padrões. O lobby

governamental, por uma empresa ou associação, também pode ser

considerado tática de influência;

III. controle é a última tática na busca de exercer dominância sobre os

constituintes externos que pressionam a organização. É

considerada mais agressiva que as anteriores, pois não busca a

cooperação, mas o domínio.

Fleck (2009) afirma que, para uma empresa superar o desafio da navegação,

deve manter um processo ativo de monitoramento constante (regular scanning),

podendo assim usar as respostas mais adequadas propostas por Oliver (1991). Com

isso, poderá moldar o ambiente, neutralizar as pressões institucionais ou se

adaptar quando não tem controle sobre a situação. Para moldar o ambiente, por

exemplo, a empresa poderia usar as táticas de desafio ou de manipulação. Para

neutralizar o ambiente, por sua vez, a autora sugere a evitação e, por fim, ao não ter

forças para pressionar o ambiente, adaptar-se usando as estratégias de aceitação e

compromisso. Para Fleck, caso a empresa responda apenas de forma passiva (ou

reativa), poderá usar estratégias equivocadas e não ter sucesso na busca de

captura de valor.

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Para este trabalho, tão importante quanto tratar das formas corretas de

responder aos desafios de crescimento, é ressaltar que existe um direcionamento

oposto que as empresas podem seguir: o declínio organizacional. O declínio, de

acordo com Weitzel e Johnson (1989), acontece quando a organização falha em

antecipar, reconhecer, neutralizar ou adaptar a pressões internas e externas que

ameaçam a sobrevivência de longo prazo da firma.

Uma organização mal sucedida pode ser descrita por carecer de recursos críticos

e, assim, enfrentar sérios riscos de sobrevivência. Fleck (2010) afirma que, além dos

financeiros, esses recursos podem ser relacionados com o conhecimento, valor de

mercado, reputação da firma, gerenciamento, dentre outros. O declínio, tal como o

crescimento, ocorre por etapas, e, se a organização não perceber as primeiras

etapas e agir para resolver, sua sobrevivência no longo prazo estará seriamente

comprometida (BARNARD, 1938; SELZNIC, 1957; FLECK, 2009).

Presenciou-se a migração da era industrial para a era da informação, voltada ao

network, mais complexa, instável, ambígua, caótica e sem direcionamento correto.

Nesta nova era, fatores intangíveis chegam a ter, em determinados momentos, mais

relevância do que resultados financeiros; e, nesse mundo interconectado, as

empresas precisam ser mais flexíveis e adaptativas (VOELPEL; LEIBOLD;

MAHMOUD, 2003). De acordo com Baron (1995), um dos assets mais importantes

para as firmas é a reputação. E reputação de uma firma hoje, em muitos casos, está

diretamente relacionada à forma com que a empresa gere os stakeholders, inclusive

a sociedade e o meio ambiente.

2.2 RESPONSABILIDADE AMBIENTAL E SOCIAL CORPORATIVA

Nos últimos anos, as pressões ambientais envolvendo o tema Rasc vêm

crescendo em todo mundo. O cenário não é diferente no Brasil (FERREIRA, 2009), e

não pode mais ser ignorado por nenhuma organização. Se uma organização quer

continuar a crescer e gerar valor de longo prazo, ela precisa preocupar-se em adotar

uma postura responsável com o meio ambiente, a sociedade onde está inserida e os

demais stakeholders (HAWKINS, 2006). Ainda, acadêmicos de distintas correntes de

pensamento compartilham a percepção de que a atividade de negócios possui uma

dimensão ética, complementar à dimensão econômica e legal.

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Compatibilizar a sustentabilidade socioambiental, a longevidade lucrativa e a

sustentabilidade da corporação é questão crucial (FLECK, 2010). Assim, analisando

as condições necessárias (CN), mas não suficientes, para a autoperpetuação das

empresas, Fleck (2010) aponta os benefícios do comportamento e engajamento

socioambiental, e da integração de práticas sustentáveis às estratégias centrais das

organizações. De acordo com a autora, a Terra deve ser vista como importante

stakeholder da empresa e, como parte interessada, deve ter as necessidades

consideradas em todas as decisões e ações. Isso porque as empresas possuem um

papel central tanto na degradação quanto na preservação do meio ambiente.

Nesse contexto, uma das oportunidades expostas por Fleck (2010) é a

perspectiva de que ações de responsabilidade socioambiental corporativas (Rasc)

podem neutralizar as três questões que levam a organização ao declínio: a síndrome

de simplicidade, a existência de um ambiente piedoso (forgiving environment) e o

crescimento organizacional não sustentável.

A síndrome da simplicidade é explicada como uma super preocupação em

manter quantidade restrita de indicadores, o que poderia gerar baixa percepção das

mudanças do ambiente e, como resultado, a firma não vislumbrar novas

oportunidades ou ameaças. Miller (1993) associa a noção de simplicidade com a

redução da variedade. Para o autor, simplicidade é a preocupação excessiva com

um objetivo único, o que impede que a corporação considere outros nas decisões.

Organizações que ignoram práticas de Rasc, por focar unicamente no retorno ao

acionista, por exemplo, podem ser enquadradas nessa categoria.

Quando ineficiências e fraquezas não são punidas por mecanismos de

mercado ou por outros tipos de mecanismo, a simplicidade se instala e, no longo

prazo, estreita a visão da organização e a leva a realizar “mais do mesmo” (more of

the same), e ao crescimento cujo cunho positivo leva ao não questionamento das

práticas vigentes. Miller (1993) ainda afirma que, no longo prazo, o sucesso acaba

levando muitas organizações a se tornar “simplistas” e, como resultado, não ter

capacidade de responder às mudanças e pressões do ambiente.

A segunda questão que pode levar uma organização de sucesso ao declínio é

a existência de um ambiente piedoso (forgiving environment), em que, por ser

pouco competitivo, as empresas acabam se tornando ineficientes. Conforme falado

anteriormente, Fleck (2010) caracteriza diversos setores econômicos brasileiros,

durante a maior parte do século XX, como pertencentes a um ambiente piedoso.

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Nessa época, no Brasil, existia demanda crescente, altas barreiras de importação,

altas taxas de inflação, o que inibia novos planos de investimentos, e pouca

competitividade, dentre outras características. Empreendedores que vislumbravam

antes dos demais as oportunidades tinham a chance de ver os negócios se expandir

mesmo sem se preocuparem com gestão de custos, eficiência no uso de recursos

ou a obsolescência tecnológica. Com o tempo, as organizações brasileiras se

diversificavam em uma variedade de negócios, mesmo que não gerassem as

vantagens da sinergia. Em geral, quando comparados aos padrões internacionais,

os produtos e serviços nacionais eram caros e com padrões abaixo da média.

Assim, na abertura comercial brasileira nos anos 1990, com o Plano Collor, diversos

competidores estrangeiros entraram no mercado nacional com novas tecnologias,

levando conglomerados nacionais conhecidos à falência ou a situações muito

complicadas (FLECK, 2010).

Fleck (2009) lista alguns sintomas qualitativos que podem indicar se uma

organização é ineficiente, como número excessivo de pessoas, tolerância à

incompetência, procedimentos administrativos ineficientes, poderes

desproporcionais dos setores administrativos, escassez de metas claras,

comportamento de evitação de conflitos, pouca percepção de mudanças do

ambiente, poucos esforços para contratação, treinamento ou retenção de recursos

humanos, dentre outros. Então, conclui a autora, um ambiente piedoso torna quase

impossível a uma organização identificar sintomas que precedem os estágios de

declínio organizacional.

Já a terceira síndrome, do crescimento organizacional não sustentável, é

explicada por Fleck (2010) como práticas que focam o sucesso imediato, de curto

prazo, e que iludem os gestores com rápidos “atalhos” para o crescimento. Esses

gestores falham em pavimentar o caminho para a autoperpetuação e acabam

prejudicando a sobrevivência de longo prazo da organização. Ao não levar em

consideração determinados fatores ambientais, as organizações podem colocar, em

curto período de tempo, a legitimidade em risco. Assim, o comportamento e

engajamento socioambiental, e a integração de práticas sustentáveis às estratégias

centrais das organizações, são condições necessárias para a sobrevivência

(FLECK, 2010).

Oliver (1991) reforça que, quando as normas externas ganham status de fato

social, como as relacionadas à Rasc, as organizações precisam se engajar nessas

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atividades, mesmo que não interesse diretamente a suas metas ou não gerem mais

prestígio. Além da tão almejada sobrevivência, FLECK (2010) ainda lista uma série

de outros benefícios das práticas de Rasc pelas organizações, tais como: (i)

redução de custos com eficiência no uso de recursos naturais; (ii) captura de valor

nos novos “mercados verdes”; (iii) vantagens do first-mover; (iv) estabelecimento de

melhor relação com a comunidade; (v) melhora da imagem (brand equity); (vi) uso se

oportunidades sociais para desenvolver estratégias e vantagens competitivas.

2.2.1 Conceituando Rasc

O tema “desenvolvimento sustentável” recebe cada vez mais atenção, tanto

no campo teórico da administração, quanto na prática das organizações.

Acadêmicos como Dyllick e Hockerts (2002) asseguram que sustentabilidade será o

mantra do século XXI. Ainda assim, existe falta de consenso sobre um conceito que

seja amplamente aceito sobre o que seria, efetivamente, responsabilidade ambiental

e social corporativa (Rasc). Daneke (1985) já afirmava que, mesmo ainda existindo

uma visão muito limitada sobre responsabilidade social corporativa, a percepção do

mercado de que a maximização dos lucros de curto prazo era a única razão de ser

das empresas mudou, principalmente a partir de movimentos sociais que

culminaram com a criação de regulamentações ambientais, da saúde e de

segurança.

Parra (2003 apud SPERS; SIQUEIRA, 2010) aponta que a expressão

“responsabilidade social” já era citada por industriais ingleses no fim do século XIX1.

Spears e Siqueira (2010) citam ainda que o verdadeiro marco dos estudos e debates

sobre responsabilidade social foi o lançamento do livro Responsibilities of the

businessman, de Howard Bowen, em 1953. Contudo, o conceito mais difundido de

desenvolvimento sustentável foi criado no relatório de Brundtland, em 1987.

Diversos autores alegam que foi a partir desse momento que se intensificou a

percepção de que o capitalismo, ideologia dominante no mundo, trouxe, além de

progresso e desenvolvimento, externalidades para a sociedade e ao meio ambiente.

Hart e Milstein (2004) afirmam que, a partir de então, ocorreu elevação das

expectativas dos demais stakeholders em relação ao desempenho ambiental e

1 Em documento, assinado por mais de 120 industriais, atribuía ao gestor a responsabilidade pelo equilíbrio entre interesses públicos e privados.

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social das empresas, com isso, gerando estímulo para proteger os sistemas

naturais.

Puppim (2008) destaca que, apesar de não existir definição consensual,

responsabilidade social envolve uma gestão empresarial mais transparente e ética, e

a inserção de preocupações sociais e ambientais nas decisões e resultados da

empresa: “RSE (Responsabilidade Social Empresarial) diz respeito à maneira como

as empresas agem, como impactam e como se relacionam com o meio ambiente e

suas partes legitimamente interessadas (os chamados stakeholders)”, e que tudo

isso reflete governança corporativa, ou seja, como uma organização é governada e,

consequentemente, afeta os resultados econômicos e financeiros (PUPPIM, 2008, p.

178).

O Business for Social Responsibility (BSR Institute), uma das principais

entidades mundiais na área de responsabilidade social, propõe que o conceito de

empresa socialmente responsável se aplicará àquela que atue no ambiente de

negócios de forma que atinja ou exceda as expectativas éticas, legais e comerciais

do ambiente social na qual se insere (HERRMANN, 2004). Em linha com essa

descrição, o instituto brasileiro Ethos caracteriza como ação socialmente

responsável das empresas “a que tem como principal a coerência ética em suas

práticas empresariais e em sua relação, buscando o desenvolvimento contínuo dos

seus stakeholders” (SPERS; SIQUEIRA, 2010, p. 18).

Machado Filho (2002, apud SPERS; SIQUEIRA, 2010) alega que mesmo

acadêmicos de distintas correntes de pensamento compartilham da percepção de

que, no âmbito de Rasc, a atividade de negócios possui dimensão ética,

complementar à dimensão econômica e legal. Hawkins (2006) afirma que, se uma

organização quer continuar a crescer e gerar valor no longo prazo, ela precisa

preocupar-se e adotar postura responsável com o meio ambiente, com a sociedade

onde está inserida e com os demais stakeholders.

Finalmente, Spers e Siqueira (2010) concluem que Rasc se relaciona à

empresa que atende simultaneamente aos interesses dos diferentes públicos com

os quais se inter-relaciona, sendo capaz de incorporá-los ao planejamento de suas

atividades. Ou seja, a empresa é socialmente responsável quando consegue gerar

valor não apenas para proprietários e acionistas, mas para todos os demais públicos

com os quais se relaciona, dentre eles os empregados, fornecedores, clientes,

governo, meio ambiente e sociedade.

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Infelizmente, algumas organizações ainda não compreenderam o conceito de

Rasc e se preocupam apenas com o greenwash. Este termo se refere à práticas de

propaganda corporativa que tentam mascarar um desempenho ambiental fraco.

Outra falácia que é usada por algumas empresas é implantar práticas de filantropia,

como o simples apoio financeiro a instituições de caridade ou outras ações similares,

alegando que são socialmente responsáveis. Esses movimentos são importantes e

possuem méritos, mas não se trata de Rasc (LEMME, 2010). Em momentos de

dificuldades financeiras, são essas atividades as primeiras a ser eliminadas nas

organizações exatamente por não estar estrategicamente relacionadas ao negócio.

Práticas de Rasc devem estar integradas às estratégias empresariais, às atividades

fins das empresas e incorporadas no dia a dia das operações.

2.2.2 Rasc e estratégias empresariais

Shrivastava (1995) assinala que o desenvolvimento industrial nas últimas

décadas trouxe prosperidade, mas também causou muita degradação ecológica; e,

como resultado, a Terra hoje enfrenta sérios problemas ambientais. Nesse sentido, o

autor aponta uma responsabilidade das corporações no desenvolvimento ecológico

sustentável. As razões principais seriam por estas serem os motores primários do

desenvolvimento econômico, por possuir recursos financeiros, conhecimento

tecnológico e capacidade institucional de implantar soluções ecológicas.

Por outro lado, a corrente crítica argumenta que práticas de Rasc distraem os

gestores do papel econômico fundamental dos negócios, que é gerar lucros, ou que

não passam de programas para criar um sentimento de fell good nas grandes

corporações (FOOTE; GAFFNEY; JAMES, 2010). Para Hart e Milstein (2004), a

maioria dos executivos ainda considera a sustentabilidade não como uma

oportunidade multidimensional, mas, antes, como um incômodo unidimensional.

Mesmo assim, a Rasc tem ganhado muita atenção de pesquisadores nas últimas

décadas, com a maioria das questões focando em se e como as empresas tidas

como socialmente responsável estariam mais propensas a ter maior sucesso

financeiro. Porter e Reinhard (2007) afirmam que, além da geração de benefícios

sociais, ações de Rasc devem ser consideradas pelas empresas como estratégias

para que elas possam permanecer competitivas no longo prazo.

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Para Fleck (2010) e Foote, Gaffney e James (2010) as corporações que

operam com visão de longo prazo e estão cientes da responsabilidade para com a

sociedade em que se inserem tendem a obter melhores resultados quando

comparadas com as que simplesmente focam em resultados de curto prazo. Doh et

al (2009) acreditam que existe consenso na crescente literatura sobre

responsabilidade social corporativa, em que “firmas virtuosas” são constantemente

recompensadas pelo mercado, mesmo existindo dificuldade para gestores e

investidores saberem reconhecer se uma firma está realmente engajada com um

comportamento responsável. Para Hahn et al (2009), dado que as organizações

necessitam não apenas de capital financeiro para operar, mas também de recursos

ambientais e sociais, ao analisar os custos de oportunidade, devem levar em

consideração maneiras mais eficientes de usar todas as fontes de recursos.

Somente assim conseguiriam criar vantagem competitiva sobre os demais players

(BARNEY, 1991). Fleck (2010) afirma que a observação e integração de práticas de

Rasc podem neutralizar o processo de declínio das organizações. Já Spers e

Siqueira (2010) elencam os riscos relacionados a ausência de Rasc, que vão desde

a perda de credibilidade da organização perante a sociedade até deterioração

interna do clima organizacional.

Porter e Kramer (2006) afirmam que, se as corporações analisarem os

prospectos de Rasc usando o mesmo framework que guiam as escolhas do core

business, iriam descobrir que Rasc pode ser muito mais que um custo, uma

limitação ou um ato de caridade. Responsabilidade socioambiental pode “ser uma

fonte de oportunidades, inovação e vantagem competitiva” (PORTER; KRAMER,

2006, p. 80). Corroborando essa visão, Spers e Siqueira (2010) alegam que a

crescente exigência de competitividade está tornando comum a crença de que o

envolvimento com a comunidade é um imperativo no mundo dos negócios, gerando

vantagem competitiva, acarretando inclusive valorização dos preços das ações.

Stakeholders externos estão procurando participar de empresas que se

preocupam com questões sociais, bem como observam o risco potencial para as

empresas que não estão, refletindo assim condutas inaceitáveis. Prova disso são

discussões em diversos países para aprovação de leis pelas quais toda empresa

com ações na bolsa deve informar, no relatório anual, os riscos das suas ações nos

âmbitos sociais, ambientais e éticos. Porém, convém lembrar que apenas publicar

relatórios não é a solução. Tais publicações raramente oferecem um panorama

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coerente sobre as atividades de Rasc e geralmente trazem informações sobre ações

não coordenadas e iniciativas para mostrar a sensibilidade social da empresa

(PORTER; KRAMER, 2006).

Senge, Smith e Kruschwitz (2008) tratam a sustentabilidade como uma

megatendência de proporções e impactos comparáveis à revolução industrial e à

globalização. De acordo com os autores, a maioria dos executivos sabe que a forma

como irão responder ao desafio da sustentabilidade afetará profundamente a

competitividade (e consequentemente a posição de liderança) e até mesmo a

sobrevivência de sua organização. Scherer e Palazzo (2010) evidenciam que nas

últimas décadas as empresas começaram de fato a desempenhar atividades que

tradicionalmente estavam restritas à esfera governamental e, como consequência,

se tornaram atores políticos relevantes na sociedade global. Assim, soluções para

desafios da sociedade não estão mais restritos ao sistema político, mas incluem

uma diversidade de outros atores, como corporações e ONGs. Essa noção impõe

desafios para a evolução da teoria da firma e para a pesquisa da Rasc.

2.2.3 Motivadores de Rasc

Chandler (1962) define estratégia organizacional como a determinação das

metas e dos objetivos básicos no curto e longo prazo da empresa, a adoção de

direcionamentos e ações e a alocação dos recursos necessários para atingir tais

metas. Contudo, é imperativo ressaltar que acabam sendo as motivações dos

gestores que direcionam as estratégias organizacionais na busca da geração de

valor para as companhias.

Os estudos acadêmicos apontam diversos motivadores para a implantação de

práticas de Rasc. Lemme (2010), em linha com Nidumolu, Prahalad e Rangaswami

(2009), destaca algumas vantagens competitivas buscadas pelas empresas que

passam a atuar de forma responsável:

a) eficiência na utilização de materiais, pessoal e equipamentos com

consequente redução dos custos operacionais e impactos ambientais ao

longo de toda cadeia produtiva (eco design ou desenho ecológico de

produtos);

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b) aumento de receitas decorrente da diferenciação dos produtos/serviços e

do posicionamento nos mercados atrelado à rotulagem ambiental, que atrai

consumidores ambientalmente conscientes;

c) gerenciamento de riscos operacionais, que poderiam representar multas à

empresa;

d) acesso a fontes preferenciais de financiamentos com a correspondente

redução de custo de capital.

Por outro lado, Porter e Kramer (2006) declaram que os proponentes de Rasc

estão usando quatro principais argumentos para justificar ações de responsabilidade

ambiental e social corporativa: obrigação moral, sustentabilidade, licença para

operar e reputação.

A obrigação moral sustenta que as empresas possuem um dever em ser boas

cidadãs e de “fazer a coisa certa”. Essa justificativa é proeminente nas metas da

Business for Social Responsibility, a associação não lucrativa líder em

responsabilidade social nos EUA.

O argumento “sustentabilidade” enfatiza o stewardship ambiental e

comunitário, ou seja, a preocupação com as futuras gerações. Essa visão remete ao

relatório de Brundtland, de 1987. As empresas que atuam sobre esse princípio

geralmente citam o “tripé” da performance econômica (triple botton line), onde são

considerados aspectos sociais, econômicos e ambientais nas decisões. Em linha

com o proposto por Fleck (2010), os autores enfatizam que as empresas deveriam

operar de modo que assegurassem boa performance econômica de longo prazo,

evitando comportamentos de curto prazo socialmente contestados ou perigosos para

o ambiente. Gerentes que possuem pouco entendimento estratégico sobre Rasc

estão propensos a postergar esses “custos”, que podem levar a custos ainda

maiores se, no futuro, a companhia vier a ser julgada por ter violado as obrigações

sociais.

A alegação “licença para operar” vem do fato que toda empresa precisa de

permissão tácita ou explicita para operar dos governos, comunidades e vários outros

stakeholders. É uma visão mais pragmática, pois busca uma maneira concreta de o

negócio identificar quais questões sociais efetivamente importam para suas partes

interessadas, e tomar decisões sobre elas. Porém, completam os autores, “essa

busca por satisfazer os stakeholders pode levar a empresa a perder o controle

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primário das funções de Rasc para terceiros” (PORTER; KRAMER, 2006, p. 82). O

risco dessas ações está no fato de que os grupos externos nunca poderão

compreender completamente as capacidades da empresa, o posicionamento

competitivo ou mesmo os trade-offs que precisam e podem ser feitos.

O argumento sobre “reputação da empresa” busca principalmente benefícios

estratégicos. Todavia, de acordo com os autores, raramente são alcançados.

Mesmo nas empresas que se têm distinguido pelo extraordinário compromisso de

longo prazo com a responsabilidade social, é difícil mensurar os impactos sociais e,

principalmente, os benefícios comerciais dessas ações. Os estudos sobre os

impactos da reputação social na preferência dos compradores ou na performance no

mercado de ações são, no mínimo, inconclusivos (PORTER; KRAMER, 2006, p. 83).

Porter e Kramer (2006) alegam que todas as quatro escolas compartilham as

mesmas fraquezas: focam na tensão entre empresas e a sociedade mais do que na

interdependência. Cada uma cria uma racionalização genérica que não está

amarrada à estratégia e operação de nenhuma companhia específica com os locais

em que elas operam. Consequentemente, nenhuma seria suficiente para ajudar uma

organização a identificar, priorizar e direcionar questões sociais que importam mais

ou as que causariam os maiores impactos. O resultado, afirmam os autores, é

geralmente baseado em atividades de filantropia desconectadas da estratégia da

empresa que nem causam impacto significante ou fortalecem a empresa no longo

prazo. A consequência dessa fragmentação é uma grande perda de oportunidades.

De forma similar, Paulraj (2009 apud FLECK, 2010) cita outros três grandes

motivadores de práticas de Rasc: compreensivos, coercivos e competitivos. De

acordo com esta tipologia, as organizações com motivações compreensivas

provavelmente irão engajar-se em ações de Rasc por que acreditam que é a coisa

certa a ser feita. Estas firmas não precisam de nenhum tipo de pressão externa ou

mesmos incentivos. As que são norteadas por motivações coercivas, por sua vez, só

farão aquilo que são forçadas a fazer. Geralmente serão legislações ou pressões de

outros stakeholders que as farão agir de modo mais socialmente ou ambientalmente

responsável. O terceiro grupo seria estimulado por acreditar que, ao se tornar

socioambientalmente responsável, gerará vantagens competitivas na sua arena de

negócios. Fleck (2010) baseia seu paper no terceiro grupo. A autora acredita que, ao

cuidar do meio ambiente, a empresa pode neutralizar o processo de declínio

organizacional.

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Outra corrente acadêmica trata a oportunidade de inovação como um dos

principais motivadores para Rasc. Assim, por entender que o tema merece um

subcapítulo dedicado, parte deste trabalho tratará exclusivamente da relação entre

sustentabilidade e inovação. Por fim, é importante ressaltar que as motivações

listadas não são excludentes, mas constantemente equivalentes e com interseção

entre elas.

2.2.4 Sustentabilidade e inovação

Megatendências exigem adaptações e inovações. E é a partir da inovação

tecnológica, ou de novas formas de fazer negócios, que as organizações poderão

responder aos desafios que as pressões por práticas sustentáveis irão ou já lhes

estão impondo (SENGE; SMITH; KRUSCHWITZ, 2008). Em linha com esses

autores, Nidumolu, Prahalad e Rangaswami (2009) acreditam que a sustentabilidade

é o principal direcionador para as empresas buscarem inovações, que trarão

resultados financeiros tanto no curto quanto no longo prazo. Os autores contestam

as empresas que acreditam que buscar meios mais sustentáveis de gerir os

negócios as torna menos competitivas e dizem que a “inovação verde” pode ter tanto

motivação econômica quanto ecológica, podendo estas ser incrementais ou radicais.

Nunes e Bennet (2006) acreditam que as principais preocupações ambientais

no século XXI serão a poluição atmosférica – e as consequências na saúde humana,

aquecimento global e destruição da camada de ozônio –, a redução das fontes de

água potável e matérias-primas e a escassez de terras. Todos esses impactos

ambientais gerarão grandes desafios para as empresas gerirem os negócios. Logo,

são um direcionador para a busca de inovações.

Nidumolu, Prahalad e Rangaswami (2009) afirmam que os executivos que

acreditam que devem escolher entre investimentos que tragam grandes benefícios

sociais, como inovações em produtos ou processos mais sustentáveis, ou retorno

financeiro estão errados. Ao analisar iniciativas de Rasc de trinta grandes

corporações, os estudos destes acadêmicos chegam à conclusão de que a

sustentabilidade é a fonte das inovações organizacionais e tecnológicas, e que estas

provêm retorno no triple botton line, ou seja, na esfera econômica, ambiental e social

de forma simultânea (ELKINGTON, 1998).

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A corrida pela sustentabilidade já está transformando a arena competitiva, o

que tem forçado as corporações a mudar a forma de pensar sobre produtos,

tecnologias, processos e modelos de negócios. E, em tempos de crises econômicas,

como a que vivemos em 2008, e que ainda perdura em 2012, a chave para o

progresso é a inovação. Nesse cenário, os early movers vão poder desenvolver

competências que os rivais serão pressionados a adquirir (NIDUMOLU; PRAHALAD;

RANGASWAMI, 2009).

2.2.5 Estágios da sustentabilidade

Assim como Oliver (1991) descreveu formas de responder às pressões

ambientais, Nidumolu, Prahalad e Rangaswami (2009) afirmam que as empresas

enfrentam desafios diferentes dependendo do estágio em que se encontram no

processo de Rasc. Em cada etapa, novos desafios apareceram e algumas

capacidades deverão ser desenvolvidas. Porém, ressaltam os autores, junto com

cada desafio a empresa terá também grandes oportunidades.

O primeiro estágio é ver compliance como oportunidade. Aqui, o principal

desafio é garantir que, ao se adaptar às normas e regulamentações, a empresa

torne isso em oportunidades para inovação. Uma competência requerida é a

habilidade de se antecipar e se modelar às regulações, o que pode não ser tão fácil

assim. As regulações sobre meio ambiente e questões sociais diferem não só entre

países, mas entre Estados e até mesmo entre cidades. Assim, a maneira mais

inteligente de se prevenir de problemas é seguir a regra mais abrangente. Logo, a

empresa estaria enquadrada em todas as demais. Empresas dos mais diversos

setores, por exemplo, devem buscar formas criativas e se antecipar às regulações

como forma de obter vantagem competitiva. No caso de mercados emergentes,

como o Brasil, se uma empresa adaptar tecnologias, processos produtivos, uso de

matérias-primas e produtos para padrões europeus, poderia estar se protegendo de

futuras pressões governamentais e sociais locais.

O segundo estágio é tornar toda a cadeia de valor sustentável. Uma vez

que tenham aprendido a se enquadrar às regulações, as empresas se tornam mais

proativas sobre os aspectos de Rasc. Então, o principal desafio é aumentar a

eficiência nas interações entre os parceiros. Mesmo que a intenção inicial possa ser

apenas criar uma imagem melhor perante os stakeholders (greenwash), a maioria

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das empresas acaba reduzindo custos ou mesmo criando novas oportunidades de

negócio (NIDUMOLU; PRAHALAD; RANGASWAMI, 2009). Isso é extremamente

importante, principalmente em momentos de crise econômica, quando as

corporações buscam formas de reduzir custos. Firmas que desenvolvem operações

sustentáveis, ao analisar cada ponto da cadeia de valor, encontram oportunidades

desde o processo de fabricação até o momento da devolução. Análise da pegada de

carbono das empresas fornecedoras, busca de pontos de desperdícios de materiais

e até mesmo incentivos financeiros para adaptações são algumas das

recomendações dos autores. Hahn et al (2009) afirmam, por exemplo, que uma

montadora de carros terá melhor ou menor retorno ao usar os recursos naturais de

maneira mais eficiente que os concorrentes e se souber responder às pressões e

aos desafios de Rasc de maneira mais proativa e com inovações.

A etapa seguinte seria o desenho de produtos e serviços sustentáveis, em

que o desafio principal é desenvolver novas ofertas ou redesenhar as atuais

tornando-as eco-friendly. Para atingir esse nível, as empresas precisam mapear

quais produtos mais afetam o ambiente para, então, conseguir gerar novas ofertas.

Algumas oportunidades de inovações sugeridas são o biomimetismo no

desenvolvimento de novos produtos e embalagens e inovações sustentáveis no uso

de matérias-primas.

A penúltima etapa do framework de Nidumolu, Prahalad e Rangaswami

(2009) envolve o desenvolvimento de novos modelos de negócios. Nesse

estágio avançado, as organizações devem encontrar maneiras não usuais para criar,

entregar e capturar valor, a fim de remodelar a arena competitiva. Para isso, é

preciso ter ampla capacidade de entendimento sobre o que os consumidores

realmente desejam e conjecturar diferentes formas para atender a essa demanda.

Algumas companhias, relatam os pesquisadores, desenvolveram novos modelos

simplesmente se perguntando, em diferentes momentos, como o negócio deles

deveria ser. Assim, desenvolver novas tecnologias, que principalmente intensifiquem

as parcerias na cadeia de valor, ou mudar o foco de produtos para ofertar serviços

são métodos recomendados para gerar vantagens sustentáveis.

Por fim, o quinto estágio está relacionado à criação de próximas

plataformas de negócios. Nesse ponto, os gestores devem questionar-se, através

da lente da sustentabilidade, qual a lógica por trás do negócio. Para tanto, deve-se

entender como os recursos renováveis e não renováveis afetam o ecossistema de

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negócio e a indústria. Nidumolu, Prahalad e Rangaswami (2009) finalizam a análise

orientando as empresas a buscar inovações radicais, como o desenvolvimento de

processos para fabricação sem precisar do uso de água (mesmo aqueles que

tradicionalmente usam muita água, como as montadoras de veículos), ou inventando

modelos de negócio que mudem radicalmente a forma de uso de recursos

energéticos.

2.3 RASC E CRESCIMENTO E LONGEVIDADE ORGANIZACIONAL

Um dos objetivos desta pesquisa é entender como as teorias sobre os

desafios do crescimento abordadas - do empreendedorismo e navegação em

ambientes dinâmicos - se relacionam com as teorias tratadas sobre o tema Rasc.

Assim, foi elaborado um quadro síntese com as duas partes do estudo, onde pode

ser percebida a associação entre os temas.

Quadro 2.3 – Associação teórica entre Rasc e os Desafios do Crescimento

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3 METODOLOGIA

3.1 DEFINIÇÃO DE TEMA, PERGUNTA E OBJETO DE PESQUISA

As motivações para este estudo foram a curiosidade do pesquisador sobre o

processo de crescimento organizacional e sobre responsabilidade ambiental e social

corporativa. Buscou-se compreender a influência das condições ambientais durante

esse processo, e como determinado padrão de respostas aos desafios e pressões

geradas durante o crescimento permite à organização gerar e capturar valor em

busca do arquétipo da longevidade saudável (CHANDLER, 1990; FLECK, 2009).

Assim, o primeiro passo foi definir a pergunta que iria orientar este estudo.

Depois de pesquisas, análises e discussões, o autor concluiu que uma opção de

relevância acadêmica seria: “O que pode explicar a migração de uma empresa da

posição de desafiante (challenger) em uma indústria para a posição de líder do

setor?”.

Para auxiliar no processo de pesquisa científica, Fleck (2010) propôs um

framework com os principais pilares para um estudo acadêmico, ou building blocks

of a scientific study (Figura 3.1). Por esta metodologia, após definida a pergunta

tema, deve-se definir um site, o método e o suporte teórico (framework) que guiará o

projeto de pesquisa.

Figura 3.1 – Pilares de um estudo acadêmico

Fonte: FLECK (2010)

A metodologia de pesquisa selecionada foi o método do caso. Tal decisão foi

feita para viabilizar uma investigação longitudinal sobre a história da unidade de

TEORIA, FRAMEWORK

E MODELO

SITE

MÉTODO

?

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análise escolhida, possibilitando a busca por características relevantes tanto da

organização quanto da indústria, a partir de eventos reais que, junto com a revisão

bibliográfica efetuada, tentariam responder à pergunta sugerida (YIN, 1998).

Embora, conforme ressaltado por Langley (2007), seja difícil estabelecer condições

diretas de causalidade nos estudos de processos estratégicos, uma pesquisa

histórica sobre as organizações ajuda a entender como estas chegaram a posições

competitivas favoráveis ou desfavoráveis.

O passo seguinte foi a decisão sobre o site. O estímulo era explorar uma

indústria que fosse relevante economicamente e, ao mesmo tempo, alinhada à

motivação do estudo, e que pudesse contribuir com a base de conhecimentos sobre

a economia brasileira. O estudo visava se relacionar a um setor com grande

representatividade no PIB brasileiro, que tivesse importância sociocultural e, ao

menos aparentemente, sofresse diversas pressões de caráter socioambiental. Por

diversas razões a indústria automotiva mostrou preencher esses requisitos: por um

lado, durante o processo de decisão do tema, a indústria automotiva nacional

tornara-se a quarta maior do mundo. Além disso, não somente são os automóveis os

maiores responsáveis pelas emissões de gases tóxicos e poluentes nos centros

urbanos, como a indústria automobilística está entre as que mais consomem

diversas fontes de matérias-primas no mundo, inclusive água. Finalmente, por ser a

indústria automotiva muito abrangente, o pano de fundo do estudo constituiu apenas

o setor de fabricação de automóveis de passeio e comerciais leves, o qual

possibilitava a análise à luz de ações de responsabilidade social e ambiental

corporativa (Rasc).

No que tange à empresa, a decisão pela empresa Fiat do Brasil revelou-se

coerente por: (i) esta ter sido uma empresa desafiante e se tornado a líder em

vendas nos últimos dez anos (de 2001 a 2011, exceto 2004), (ii) pelo notável

processo de crescimento, constantes prêmios empresariais recebidos e, ainda, (iii)

por ser considerada pela imprensa especializada como pioneira e benchmark em

ações e processos de responsabilidade social e ambiental.

Por fim, o framework (FLECK, in print) utilizado possibilita uma visão de forma

sistemática e visual dos conceitos de diferentes correntes teóricas sobre ambientes,

como os analisados na sociologia organizacional, e as perspectivas sobre condições

ambientais de desenvolvimento das organizações. Ainda, buscou-se entender se

existia aderência entre os temas crescimento organizacional e Rasc.

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3.2 ESTRATÉGIA DE PESQUISA

A primeira parte da pesquisa (já apresentada) é uma extensa revisão

bibliográfica, buscando apoio teórico para os temas analisados. Na figura 3.2, pode

ser visto o agrupamento dos autores utilizados para cada um dos temas abordados:

Figura 3.2 – Temas e autores utilizados na revisão de literatura

Nessa parte, também foi apresentado um framework (Quadro 2.2) que ajudou,

no capítulo de análise, a entender o processo de mudança das características e

perspectivas das condições ambientais para o desenvolvimento da Fiat. Ademais,

apresentou-se o Quadro 2.3, comprovando a relação entre as teorias sobre Rasc e

os Desafios do Crescimento de Fleck (2009).

O objetivo da segunda parte foi ampliar a compreensão sobre a indústria

automotiva, sua relevância e evolução, bem como fazer um retrospecto histórico da

empresa. Com esta pesquisa, seria possível, posteriormente, analisar os fatores

ambientais em que ela estava inserida, bem como os padrões de resposta aos

desafios desses ambientes. Como o objeto deste estudo situa-se no Brasil, dados

globais da indústria e da organização serviram apenas como pano de fundo para a

contextualização dos principais efeitos e influências no mercado interno. O indicador

Responsabilidade Social e Ambiental

Corporativa

Crescimento e longevidade

organizacional

Revisão de Literatura

Importância do crescimento

organizacional

Desafios do crescimento

Ambientes Organizacionais

Stakeholders e Respostas

Estratégicas

Rasc e declínio organizacional

Conceitos e motivadores de Rasc

Rasc e estratégias empresariais

Fleck (2009; 2010); Bossidy (1995); Whetten (1987); Barnard (1983); Child e Kieser (1981); Penrose (1980);

Fleck (2009; 2010); Winter (2003); Sull (1999); Donald e Preston (1995); Miller (1993); Barney (1991); March (1991); Chandler (1962; 1977; 1990); Freeman (1984); Mintzberg (1985); Barnard (1938); Porter (1980); Penrose (1980);

Lepak, Smith e Taylor (2007); Oliveira (2007); Beer (2002); Sull (1999); Oliver (1991, 1992, 1997); Baron (1995); Donald e Preston (1995); Barney (1991); Weitzel e Johnson (1989); Freeman (1984);

Hawkins (2006); Fleck (2009; 2010); Miller (1993);Oliver (1991);

Fleck (2010); Lemme (2010); Spers e Siqueira (2010); Puppim (2008); Hawkins (2006); Porter e Kramer (2006); Hart e Milstein (2004); Herrmann (2004); Dyllick e Hockerts (2002); Brundtland (1987); Daneke (1985); Bowen (1953); Lemme (2010); Nidumolo, Prahalad e Rangaswami (2009);

Fleck (2010); Scherer e Palazzo (2010); Foote et al (2010); Spers e Siqueira (2010); Doh et al (2009); Hahn et al (2009); Senge et al (2008); Porter e Reinhard (2007); Porter e Kramer (2006); Hart e Milstein (2004); Shivastava (1995); Barney (1991);

Fleck (2009); Voelpel, Leibold e Mahmoud (2003); Mintzberg et al (2000); Chandler (1990; 1977); Romanelli (1991); Oliver (1991, 1992, 1997); Baron (1995); Weitzel e Johnson (1989); Caroll e Huo (1986); Lammers e Hickson (1979); Hannan e Freeman (1977), Child (1972);

Rasc e Inovação e estágios da

sustentabilidade

Hahn et al (2009); Nidumolo, Prahalad e Rangaswami (2009); Senge, Smith e Kruschwitz (2008); Nunes e Bennet (2006); Elkington (1998);

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utilizado para mensurar o crescimento das empresas é o número de veículos

produzidos, seguindo a metodologia mais utilizada pela indústria automotiva, e não

dados de receita.

A terceira parte desta dissertação procurou, a partir da combinação da teoria

selecionada e do estudo do caso em análise, responder à pergunta definida

inicialmente. Visto que foram analisadas pressões ambientais sobre a indústria e

sobre a empresa, o estudo pode ser classificado como um estudo tipo 2 (YIN, 1998),

com análise de um único caso mas com múltiplas unidades de análise.

Conforme sugerido por Yin (1998), o estudo foi orientado para perguntas do

tipo “o que” (quais) e “como”. A justificativa para essa abordagem é, principalmente,

o fato de o pesquisador não ter controle sobre os acontecimentos que serão

investigados e focar em eventos temporais. Os métodos de coleta de evidências e

demais dados secundários foram documentados para a parte exploratória da

pesquisa. As entrevistas sistemáticas e em profundidade efetuadas com integrantes

da empresa foram utilizadas, prioritariamente, mas não de forma exclusiva, para a

parte explanatória da pesquisa.

Por se tratar de uma análise longitudinal, por questões metodológicas, Yin

(1998) orienta que seja feito um corte no tempo, definindo o início e o fim do caso.

Com isso, os eventos analisados foram limitados entre o período da decisão da

construção da fábrica Fiat no Brasil (1970) e o fim do ano de 2011.

Segundo Langley (2007), em algumas narrativas, é conveniente o uso da

técnica de “temporal bracketing”, ou seja, de decomposições temporais dos dados

em períodos menores de tempo, preferivelmente com características similares

dentro de cada período e distintas entre os demais. Isso permite ao pesquisador

analisar como as ações de um determinado período podem alterar contextos ou

afetar ações dos períodos subsequentes. Nesse estudo, a divisão da história da Fiat

em quatro períodos foi feita pelo autor tendo em vista principalmente as

características do ambiente de mercado (task environment). Essa separação foi feita

no decorrer do processo de coleta de evidências sobre a firma e ratificada no

momento da análise.

Yin (1998) também sugere que o escopo de atuação seja delimitado. Com

isso, é importante registrar que não é objetivo deste estudo abordar requisitos

técnicos dos carros; análises financeiras da organização, nem das demais empresas

do setor; detalhar em profundidade ações de marketing ou o comportamento do

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consumidor de veículos. Espera-se que este estudo permita contribuições para o

arcabouço teórico e extrapolações gerenciais para outras organizações do setor

automotivo.

3.3 COLETA DE DADOS

O passo inicial foi um levantamento, a partir de dados secundários, de

informações gerais sobre a indústria e a empresa em estudo. As principais fontes

foram: revistas e sites especializados sobre o setor automotivo, como Quatro Rodas,

Best Cars, Auto Esporte, para citar alguns. Posteriormente, foi feita vasta busca de

informações e análises em anuários e outros relatórios de organizações setoriais,

como a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea),

Organisation Internationale des Constructeurs d’Automobiles (Oica – ou Associação

Internacional dos Fabricantes de Veículos Automotores), e a Associação Brasileira

das Empresas Importadoras de Veículos Automotivos (Abeiva). Esses dados foram

extremamente importantes para comprovar a relevância da montadora e o

crescimento da Fiat nos últimos anos.

Aprofundando o entendimento histórico da empresa, foram analisados

anuários da Fiat do Brasil, bem como dados financeiros, publicações comemorativas

(como a feita pela própria empresa sobre os trinta anos de atuação no Brasil), além

do livro sobre a atual estratégia da Fiat e seu presidente, Belini (TANURE; PATRUS,

2011). Dissertações já publicadas no Brasil sobre a empresa, como as de Nottoli

(1995) e Micaelo (2003), foram importantes fontes para auxiliar na etapa de

descrição da história da empresa. Somaram-se, como base de dados sobre ações

estratégicas da empresa analisada, notícias da mídia e prêmios, entrevistas e

reportagens em revistas e jornais empresariais, como Exame, Época Negócios, Isto

é Dinheiro e Valor Econômico.

Foi criado também um modelo de notificação automática no aplicativo Google

Alertas2, do site Google, para que todas novas informações publicadas na internet,

tanto no Brasil quanto do exterior, com os agrupamentos “Fiat + Estratégia /

Strategy”; “Fiat + Sustentabilidade / Sustainability”; “Fiat + Crescimento / Grow”; “Fiat

2 http://www.google.com.br/alerts

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+ Problemas / Troubles” tivessem seus links direcionados para determinado

endereço de e-mail, uma vez por dia.

Para garantir o sucesso de um processo de coleta de dados em um estudo

exploratório, principalmente em indústrias onde estão disponíveis inúmeras fontes

de informações, era preciso assegurar que a maioria dos dados coletados tivessem

utilidade e relevância para atender ao objetivo do estudo. Após a leitura, separação

e categorização de cada fonte, foi feita uma análise em busca de informações e

valores conflitantes. Caso não fosse possível fazer uma dupla conferência, o dado

era descartado. Um exemplo de informação com fontes conflitantes é a relacionada

com a quantidade de veículos produzidas pelas montadoras. Diversas fontes

apresentavam inconsistências nos números. Com isso, em todos os casos de

números de produção, as fontes utilizadas como confiáveis foram os relatórios

oficiais da Anfavea e da Abeiva, por serem citadas como principais fontes na maioria

das publicações.

Para a coleta de dados primários, efetuou-se uma pesquisa de campo com

visita in loco à fábrica da Fiat em Betim, no Estado de Minas Gerais, no primeiro

semestre de 2011. As percepções geradas e evidências constatadas na visita

apoiaram fortemente o processo de análise. Registra-se que a Cátedra

Fiat/Coppead foi fundamental na articulação e aprovação da visita.

Realizaram-se dez entrevistas em profundidade com funcionários da

empresa. A maioria conduzida durante os dias em visita à fábrica, o que possibilitou

a abordagem de representantes das mais diversas áreas, dentre elas: marketing,

engenharia, comunicação interna, diretoria de qualidade e sustentabilidade,

produtos, Centro Estilo, pesquisa, supervisão de garantia e recursos humanos.

Foram entrevistados de diretores, gerentes executivos e supervisores a analistas.

Todas as conversas foram gravadas com autorização verbal e,

posteriormente, transcritas na íntegra pelo pesquisador para possibilitar as análises.

Um fator limitante da pesquisa foi o processo de escolha de quantidade e relação

dos entrevistados, efetuada pela própria empresa. Entretanto, a empresa respeitou

um dos principais critérios do estudo, que era ter a possibilidade de conversar com

pessoas das mais diversas áreas possíveis. O fato de garantir confidencialidade da

identidade dos entrevistados, no momento dos encontros, pode ter permitido que os

respondentes expusessem de forma mais clara e direta as reais percepções sobre a

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empresa e suas ações. Como as percepções do CEO da empresa não puderam ser

coletadas de forma primária, foram usadas citações de fontes secundárias.

As entrevistas tinham como apoio um roteiro (Apêndice 1). Dentre os principais

pontos abordados estavam o histórico profissional do entrevistado; impressões

gerais sobre a organização, sobre suas ações e valores; compreensão histórica da

empresa; conhecimento sobre ações de responsabilidade socioambiental da Fiat; e

análise de desafios da empresa e da indústria. Porém, de acordo com orientação

recebida, a condução da entrevista não foi “engessada” por esse script, dando

abertura para exploração de outros temas, bem como para possibilitar a percepção

sobre outras informações dos entrevistados e abertura para temas que estes

considerassem importantes.

Também foram feitas duas visitas a concessionárias Fiat na cidade do Rio de

Janeiro, no primeiro semestre de 2012, em processo conhecido como “cliente

oculto”, em que se simulou, sem o uso de roteiros, o interesse de compra de

veículos da montadora com o objetivo de entender o discurso e a percepção dos

vendedores sobre a empresa e seus produtos no momento da venda. As citações

das visitas às concessionárias não foram usadas por não terem sidos consentidas,

porém as informações e percepções foram usadas durante a análise. Paralelamente,

foi entrevistada uma pesquisadora da Coppead que atuou em estudos para a Fiat e

integra a cátedra Fiat/Coppead. Conforme detalha a tabela 3.1, as entrevistas

totalizaram onze horas e quarenta e dois minutos de duração. Para auxiliar no

processo de transcrição, foi utilizado o programa Transcriva for Mac (SOFTONIC,

2011), adquirido por 29,99 dólares em abril de 2011.

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61

Tabela 3.1 – Tempo de duração das entrevistas realizadas para a pesquisa

No Capítulo 5, da história da Fiat, e Capítulo 6, de análise, para manter o acordo

de sigilo de identidade dos entrevistados, as evidências e citações utilizadas,

proveniente destas entrevistas, usaram os códigos da Tabela 1 (E1 a E11), sempre

que necessário.

A limitação de recursos e a distância da fábrica impossibilitaram uma segunda

visita, que poderia ter ajudado a coletar mais evidências. Contudo, o pesquisador

contornou parcialmente essa questão a partir da troca de e-mails com alguns dos

entrevistados para sanar algumas dúvidas que surgiram a posteriori. Não foi

possível entrevistar fornecedores, demais parceiros e ex-funcionários da empresa,

principalmente pela questão da limitação da distância geográfica. Também não

conseguiu-se ter acesso aos valores investidos nos projetos de responsabilidade

socioambiental, ou mesmo o histórico completo de receitas da empresa e resultados

financeiros da empresa.

O pesquisador, durante o processo de elaboração da dissertação, ainda esteve

presente em palestras sobre os temas em estudo. Dentre elas, a do CEO do grupo

Renault-Nissan, Carlos Ghosn, e a de André Trigueiro, referência nacional em

jornalismo ambiental e mobilidade urbana, além de acompanhar discussão online da

consultoria Accenture, no evento Accenture's Sustainability 24.

ENTREVISTADO ÁREA DURAÇÃO (horas)

E1 Diretoria Sustentabilidade 0:45

E2 Relacionamento com Concessionárias 0:51

E3 Centro Estilo 0:35E4 Comunicação Corporativa 1:05

E5 Diretoria Sustentabilidade 1:18E6 Recursos Humanos 1:25

E7 Marketing 0:40E8 Produtos 0:48

E9 Comunicação Interna 0:45

E10 Pesquisa 1:25E11 Pesquisa COPPEAD 0:40

E12 Concessionária 0:50E13 Concessionária 0:35

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62

3.4 ANÁLISE DOS DADOS COLETADOS

Com o objetivo de organizar a massa de dados obtida no processo de coleta,

as informações, papers, demais textos e sites foram divididos em cinco pastas

digitais: (i) revisão de literatura: onde estão depositados os dados teóricos usados

na revisão de literatura. Esta pasta, por sua vez, tinha o seguinte desdobramento:

(a) crescimento e longevidade organizacional; (b) responsabilidade ambiental e

social corporativa; (ii) legislação e informações sobre atuações do governo; (iii)

dados sobre a indústria automotiva; (iv) dados sobre a Fiat; (v) entrevistas

realizadas, palestras e demais evidências.

Uma vez organizado o conteúdo, as evidências compostas por fatos e dados

foram categorizados, codificados e agrupados, conforme ilustra a Figura 3.3. Os

filtros utilizados foram: período do evento; aderência aos desafios de Fleck (2009)

abordados; stakeholder(s) envolvido(s); tipos de ambiente pela sociologia

organizacional; tipos de ambiente pela perspectiva das condições ambientais de

desenvolvimento das organizações; padrões de respostas de acordo com Oliver

(1991).

Figura 3.3 – Exemplo da tabela de categorização e codificação das evidências

O uso da metodologia de mapeamento visual, conforme sugerido por Langley

(2007), se mostrou efetivo e produtivo, tanto pela facilidade de destacar cada um

dos desafios e pressões, quanto por possibilitar a detecção de padrões de gestão da

empresa frente a cada uma das partes interessadas (stakeholders).

PERÍODO DESAFIO/PRESSÃO PRINCIPAIS STAKEHOLDERS AMBIENTE TIPO CLASSIFICAÇÃO RESPOSTA (OLIVER, 1991)I Total inexistência de fornecedores e mão de obra

especializada na região de BetimFornecedores; Comunidade Negócio Inóspito Compromisso por balanceamento

I Lobby das 3 grandes montadoras, tanto com o governo, quanto com os fornecedores;

Governo; Concorrentes; Acionistas Institucional InóspitoManipulação por influência / Evitação por fuga

I Mercado em forte expansão, apesar da concorrência Concorrentes; Clientes; Acionistas Negócio Desafiador Aceitação por conformidade I Dificuldade de recebimento de peças; Fornecedores Negócio Inóspito Aceitação por submissãoI Desconhecimento da marca pelo mercado consumidor Clientes Negócio Inóspito Desafio - AtaqueI Área rural e isolada para a implantação da fábrica; Funcionários; Comunidade Negócio Inóspito Compromisso por balanceamentoI Péssima estrutura logística; Governo; Fornecedores Negócio Inóspito Aceitação por Conformidade e DesafioI Longe dos centros consumidores Clientes Negócio Inóspito Aceitação por Conformidade e DesafioII Estar situada longe do ABC e não sofrer com as greves; Funcionários; Comunidade Negócio Piedoso AmortizaçãoII Forte descontentamento dos clientes com os produtos; Clientes Negócio Desafiador AmortizaçãoII Imagem desgastada; Clientes Negócio Desafiador Desafio - AtaqueII Criação da Autolatina (Ford e Volks) Concorrentes Negócio Desafiador Evitação II Mercado “fechado” para importações Governo; Clientes; Acionistas Institucional Piedoso Desafio - AtaqueII Crise do petróleo; Governo; Concorrentes; Clientes Institucional Desafiador AmortizaçãoII Inflação galopante; Governo; Concorrentes; Clientes Institucional Desafiador AmortizaçãoII Mercado interno em forte estagnação; Governo; Concorrentes; Clientes Negócio Desafiador AmortizaçãoII Redução brusca das vendas do setor; Governo; Concorrentes; Clientes Negócio Desafiador AmortizaçãoII Incertezas políticas Governo; Concorrentes; Clientes Institucional Inóspito AmortizaçãoII Dificuldades logísticas de recebimento de peças e

escoamento dos produtosFornecedores; Governo Negócio Desafiador Desafio - Ataque

III Abertura do mercado e entrada de novos concorrentes; Governo; Concorrentes; Clientes Negócio Desafiador Desafio - AtaqueIII Convencer fornecedores sobre Projeto J – Mineirização; Governos; Fornecedores Negócio Desafiador Compromisso por balanceamento

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Após categorizar e agrupar as evidências por períodos, foi possível classificar

cada um dos tipos de ambientes com o uso do framework base deste trabalho

(Quadro 2.2), conforme exemplificado na Figura 3.4.

Figura 3.4 – Modelo de análise e categorização das evidências

3.5 NÍVEL DE ANÁLISE

De acordo com Yin (1998), a definição da unidade de análise relaciona-se à

maneira como a questão inicial foi determinada. Por conseguinte, para permitir que a

pergunta proposta fosse devidamente respondida, o nível de análise foi tanto a

indústria quanto a empresa, a fim de possibilitar embasamento e contextualização

histórica da evolução do setor, da organização e do ambiente em que estão

inseridas. O espaço de tempo em que a firma foi analisada está restrito entre 1970,

ano da decisão da construção de uma fábrica da FIAT no Brasil, até 2011.

A fase de análise será iniciada com uma abordagem sobre o processo de

criação de valor da empresa, com referência ao desafio de empreender. Em

seguida, será discutido o processo de captura de valor no ambiente, relacionado ao

desafio de navegação no ambiente dinâmico. As duas visões fazem parte do mesmo

bloco que possibilita o crescimento organizacional e a renovação, condição

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necessária (CN) para o sucesso em longo prazo e propensão à autoperpetuação

(Fleck ,2009).

Assim como discutido no segundo capítulo, de revisão de literatura, o modelo de

Fleck (2009) corrobora a teoria sobre a visão global da formação estratégica de

Mintzberg et al (2000). Os dois desafios contemplados no escopo da análise

(navegar no ambiente e empreender) associam-se, respectivamente, aos pilares

“ambiente” e “liderança”, conforme exemplificado pela Figura 3.5.

Como o objetivo deste trabalho – entender como uma empresa desafiante se

torna líder de um setor – focaliza predominantemente a relação empresa-ambiente,

acredita-se ser justificada a abordagem empregada, a qual exclui a análise dos

fatores organizacionais, associados aos desafios da diversidade, de

aprovisionamento de recursos humanos e da complexidade.

Figura 3.5 – Escopo da análise realizada

Cabe ressaltar que a maioria das evidências obtidas tanto nas fontes primárias

quanto nas citações coletadas de fontes secundárias diz respeito a períodos mais

contemporâneos. Dentre as implicações dessa limitação para o estudo está,

principalmente, algumas particularidades da análise em determinados períodos:

• Na análise sobre o desafio de empreender: antes de 2004 não é possível

“personificar” as lideranças, inclusive pelo fato de a empresa exibir um

menor grau de autonomia em relação à matriz italiana. Somente após

2004, com a posse de Cledorvino Belini, primeiro brasileiro a gerir a

montadora, que a filial obteve maior autonomia, possibilitando assim uma

visão mais detalhada do papel do líder perante as ações estratégicas;

• Na análise sobre o desafio de navegar no ambiente: as implicações

recaem, principalmente, sobre o grau de disponibilidade de informações a

Contempladas no escopo do estudo

AMBIENTE

LIDERANÇA

ORGANIZAÇÃO

Empreender

Navegar no Ambiente

Gerir a

Diversidade

Aprovisionar

RH

Gerir a

Complexidade

Não contempladas no escopo do estudo

Mintzberg et

al (2000)

Fleck (2009)

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respeito da forma pela qual a montadora interage com os stakeholders,

incluindo aspectos relativos ao meio ambiente. Como informações

relativas ao tema Rasc referem-se mormente ao último período, à análise

deste período acrescentou-se uma abordagem aos temas Rasc, gestão

dos stakeholders e padrões de respostas ao desafio de navegação.

Buscando auxiliar o leitor a ter uma visão mais didática e integrada das

principais inovações e marcos do setor, após a análise do desafio de empreender,

serão apresentados mapas sintéticos cronológicos sintetizando as informações

previamente apresentadas, conforme exemplificado na Figura 3.6.

Figura 3.6 – Exemplo do modelo de mapa sintético cronológico

Por fim, durante a análise do desafio de navegação, serão usadas

padronagens visuais para configurar o grau de predominância de cada tipo de

ambiente em que a Fiat se encontrava, em cada uma das nove células do framework

utilizado (Quadro 2.2), a partir da quantidade de evidências relevantes listadas,

como exemplificado pela Figura 3.7. Apesar de existirem evidências com diferentes

graus de relevância nesse processo de crescimento, ou com maior influência para

1976

Principais Players Leis e marcos regulatórios

Fiat

1980 1984

Es mulo do

governo p/

exportação

Inicio da

década

perdida

Pico de exportações

da indústria

Principais

Inovaçõ

es para

o m

erc

ado b

rasile

iro

Principais

Marc

os

Principais Marcos Setor e Economia

Principais

Pla

yers

Le

is e

Marc

os Regula

tórios do seto

r M

arc

os Eco

nom

ia /

Sociais

1970 1953

Aviso

288

1956

Plano de

Metas JK

Ford;

GM;

Volks

1967 -

1974

“Milagre

Econômico

Greves

metalúrgicos

ABC

1987 1994 1992 –1993 1990

Plano Collor e

Confisco da

poupança

IPI Reduzido para

1.000 cm3

Plano Real

Novo regime

automo vo

1997

Crise Ásia e

Rússia; Fim

regime banda

cambial

Novas greves

ABC

Abertura do

mercado

Guerra do Golfo

Aumento preço

do petróleo

Medidas câmara

setorial p/

es mular o setor

Toyota

Renault

Mitsubishi

Honda

1998

Peugeot Citroën

Nissan

2001

Crise financeira

internacional

Redução IPI

2008 2010

Brasil torna-se 4

maior

mercado

mundial no

setor

automo vo

Forte déficit

comercial

do setor

1995

Importados

1991

Aumento

importação

2009

ECO 92

Redução IPI

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66

possibilitar a obtenção da posição de liderança pela Fiat, o método utilizado para o

preenchimento das células e, consequente categorização do ambiente foi utilizar:

• Padronagem branca (ou sem preenchimento): Nenhuma evidência

relevante mapeada;

• Padronagem “pontilhada”: Até duas evidências relevantes classificadas

na célula;

• Padronagem com preenchimento mais “denso”: Quando mais de três

evidências relevantes foram classificadas na célula;

Figura 3.7 – Processo de preenchimento do framework durante fase de análise

• • • • • •

Sintetizando as análises sobre navegação do ambiente, foram utilizados

quadros resumos conforme exemplificado pela Figura 3.8. O objetivo foi possibilitar

ao leitor um novo mapa visual sobre o processo de transição ambiental dos períodos

examinados, bem como uma comparação sintetizada entre a configuração do

ambiente entre a Fiat e principais competidores.

Figura 3.8 – Exemplo de síntese do processo de transição entre ambientes.

Ambiente Piedoso

Ambiente Desafiador

Ambiente Inóspito

Ambiente de

Negócio

19xx – 19xx 19xx-19xx

19xx - 20xx

20xx- 20xx

Ambiente Piedoso

Ambiente Desafiador

Ambiente Inóspito

Ambiente de

Negócio

Mercado automotivo em forte expansão, porém oligopolizado por apenas 3 montadoras;

Total inexistência de fornecedores e mão de obra especializada na região de Betim; Área rural e isolada para a implantação da fábrica; Péssima estrutura logística; Dificuldade de recebimento de peças; Longe dos centros consumidores Desconhecimento da marca pelo mercado consumidor

Ambiente

Institucional

Milagre econômico; Lobby das 3 grandes montadoras, tanto com o governo, quanto com os fornecedores;

Ambiente

Natural

Pouca ou nenhuma pressão ambiental

Ambiente Piedoso

Ambiente Desafiador

Ambiente Inóspito

Ambiente de

Negócio

Ambiente

Institucional

Ambiente

Natural

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4 A INDÚSTRIA AUTOMOTIVA E A HISTÓRIA DA FIAT

4.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA INDÚSTRIA AUTOMOTIVA

Dados do British Royal Automobile Club (2011) e The Automobile Club de

France (ACF, 2011) apontam que a história do automóvel começa em 1769, quando

o francês Nicolas Joseph Cuhnot desenvolve o primeiro veículo autopropulsionado a

vapor, com apenas três rodas e todo de madeira. Algumas décadas depois, em

1806, o inglês Richard Trevihick desenvolveu o que é considerado o primeiro motor

de carro movido pela combustão em alta pressão com o uso de gás.

Engenheiros e pesquisadores continuaram buscando formas de melhorar a

invenção e então, entre 1832 e 1839 (o ano é dado como incerto), o escocês Robert

Anderson desenvolve a primeira “carruagem” elétrica. A fabricação dos veículos

elétricos foi impulsionada a partir de 1859, quando o belga Gaston Planté realiza a

primeira demonstração de bateria de chumbo e ácido (OICA, 2011).

Um marco na história do automóvel foi o biênio 1885 e 1886, quando, na

Alemanha, começou a produção dos primeiros carros movidos a gasolina,

desenvolvidos por Karl Friedrich Benz (que patenteou a invenção), Gottlieb Wilhelm

Daimler e Wilhelm Maybach. Curiosamente, os sobrenomes dos três inventores

ainda estampam carrocerias de luxuosos modelos no século XXI (OICA, 2011;

AUTOMOBILE CLUB DE FRANCE, 2011).

Até 1914, a produção dos veículos permanecia prioritariamente artesanal, por

encomenda e com os carros ainda sendo considerados um “brinquedo caro” por

muitos. Esse estigma foi quebrado pela empresa americana Ford, que revolucionou

e dominou o mercado, quando Henry Ford, inspirado pelas ideias de Frederic Taylor,

desenvolveu um novo sistema de produção, denominado posteriormente como

fordismo. O fordismo permitia incríveis ganhos de escala e escopo a partir da busca

da eficiência, do aperfeiçoamento das linhas de montagens, com esteiras rolantes,

simplificação do trabalho e padronização de produtos (ao disponibilizar uma única

cor para os clientes, por exemplo).

Essas medidas tornaram o carro um objeto de desejo mais acessível a ponto

de, durante a década de 1920, cerca de 2 milhões de veículos saírem anualmente

das linhas de montagem, quando antes eram apenas alguns milhares. O alto volume

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de vendas de veículos impulsionou a economia dos países industrializados, além de

estimular diversas outras indústrias, como energia, siderurgia e têxtil, e ainda

potencializar investimentos governamentais em construção de estradas, ampliando

os limites das cidades (CASEY; DODGE; DODGE, 2010).

Por influência dos bons resultados do setor, boa parte da economia industrial

do século XX desenvolveu-se sobre a base da aplicação da eletricidade à produção

e da reorganização das fábricas em torno da linha de montagem. As inovações,

inspiradas pelas ideias de Henry Ford, disseminaram-se e permitiram a produção em

série de mercadorias estandardizadas para mercados de massa. O aprofundamento

da divisão técnica do trabalho, o emprego de mão de obra numerosa e

semiqualificada e a utilização intensiva de energia são as características mais

marcantes associadas a este modelo de produção.

A indústria automotiva continuou a prosperar nas décadas seguintes e se

tornava ainda mais relevante na economia global. O fordismo como sistema

produtivo se manteve como principal característica do setor até o fim da década de

1960. Em meados da década de 1920, outra gigante estadunidense, a General

Motors (GM) assume a liderança do mercado automotivo americano com novos

conceitos de administração, como a descentralização e maior flexibilização da

produção, oferecendo maior diversidade de modelos e atendendo a demandas dos

mais variados nichos de clientes. Com o passar do tempo, tornou-se não só a maior

montadora global tornava-se como a maior empresa do mundo em termos de

receita.

Na mesma década, os choques do petróleo marcam nova virada na indústria

mundial e automotiva em particular, com o retorno aos projetos de carros com

combustíveis alternativos. Paralelamente, o sistema de produção enxuta (lean

manufacturing), da japonesa Toyota, apelidado de toyotismo, começa a ser

implantado na maioria das fábricas de automóveis no mundo, marcando nova

revolução no setor. A indústria automobilística mundial continuou evoluindo, mas

não trazendo nenhuma grande mudança disruptiva – nem no produto, nem nos

processos; sendo, atualmente, constituída de dois grandes complexos responsáveis

pela produção de veículos automotivos: as montadoras e os fornecedores de

autopeças.

As últimas décadas do século XX foram marcadas por processos de fusões e

aquisições, o que aumentou o grau de concentração global. Segundo relatório da

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Oica (2010), apenas dez empresas são responsáveis por 75% da produção mundial

de automóveis. Carvalho (2005) alerta para a intensificação da concorrência da

indústria e sobre as possibilidades viabilizadas pelas novas tecnologias,

principalmente os novos processos de telecomunicações e de tecnologias de

informatização. O autor chama atenção para o uso de estratégias de parcerias e

joint ventures, que se tornaram opções mais eficazes do que fusões e aquisições.

De acordo com Sergio Marchionne, presidente executivo da Fiat, essa tendência de

concentração continuará pelos próximos anos: “Estamos a caminho de continuar a

ver a eliminação de players marginais. Acredito que acabaremos com somente cinco

ou seis players, cujo sucesso se baseará no compartilhamento de plataformas, em

escala global” (REUTERS, 2011). Idêntico argumento foi usado pelo Sr. Carlos

Ghosn3, presidente do grupo Nissan-Renault, em palestra em 6 de outubro de 2011

na sede da FGV Rio.

4.2 IMPACTOS DA INDÚSTRIA AUTOMOTIVA

A revolução causada com o avanço e o largo desenvolvimento da indústria

automobilística gerou alterações nos padrões de empregos, interações sociais,

infraestrutura e distribuição de mercadorias. Ademais, ao longo dos anos, a indústria

automobilística criou uma longa tradição de influenciar tratados comerciais e

políticas nacionais. Os movimentos dessa indústria, ao causar impacto na balança

de pagamento, no nível de emprego e no crescimento dos países, geram grande

poder político para os fabricantes de automóveis, que têm sido capazes de extrair

privilégios governamentais no mundo inteiro há várias décadas (ARAÚJO, 1998).

A indústria automotiva tem grande visibilidade e poder de influenciar outros

setores, direta e indiretamente. De acordo com Nunes e Bennet (2006), essa

indústria teve poucas mudanças disruptivas nos últimos trinta anos, porém, assim

como o fordismo moldou o processo de produção no início do século passado, as

novas evoluções surgidas nesse setor, como o sistema toyotista de produção (lean

manufacturing) e o modelo de parceria com fornecedores, foram replicadas nos

sistemas de produção e montagem de diversas outras indústrias. A transferência de

plantas de montagem para países em desenvolvimento e o outsourcing global são

3 Carlos Ghosn, presidente do grupo Nissan-Renault, palestrou em 6 de outubro de 2011 na sede da FGV Rio. O pesquisador estava presente.

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mudanças estratégicas oriundas desse setor. Ainda sobre inovações, a indústria

automobilística foi pioneira no uso de robôs e atualmente é responsável pelo uso de

mais de 60% de todos os robôs no mundo.

Exemplificando o poder do setor, se a indústria automobilística fosse um país,

ela seria a sexta maior economia do mundo. Os 2,5 trilhões de dólares

movimentados direta e indiretamente representam em média 10% do PIB dos países

onde as fábricas estão instaladas (CASOTTI; GOLDENSTEIN, 2008, p. 149). Na

análise setorial do Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES), mais

números revelados por estes autores:

Os números de consumo de matéria-prima não são menos impressionantes. Estima-se que 50% do total de borracha, 25% do total de vidro e 15% do total de aço produzidos no mundo se destinem à essa indústria. Para movimentar essa gigantesca engrenagem, mais de 8 milhões de funcionários estão empregados diretamente e, para cada emprego direto, mais de cinco indiretos são gerados (CASOTTI; GOLDENSTEIN, 2008, p. 149).

Os gastos com publicidade da indústria também são expressivos. Apenas em

2010 as montadoras gastaram 45 bilhões de dólares em propaganda. De acordo

com relatório publicado pela Advertising Age (2011), dos 100 maiores anunciantes

globais, 17 são fabricantes de carros.

Mas os efeitos dos automóveis na vida cotidiana são tema controverso. A

introdução do automóvel produzido em massa representou uma revolução na

mobilidade, comodidade pessoal e produtividade das empresas, mas o principal

dano apontado pelos críticos é em relação ao consumo de energias não renováveis

e o impacto na poluição mundial. De acordo com os relatórios da OICA (2012), só no

ano de 2011, foram produzidos 80 milhões de unidades de veículos, sendo que 18,4

milhões apenas na China e 3,4 milhões no Brasil, o que elevou os números de

automóveis leves circulando pelo mundo (excluindo caminhões pesados e ônibus) a

mais de 730 milhões.

O Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA, 2011) estima que a

emissão de CO2 pelos veículos já ultrapassa a perigosa marca de mais de 1 milhão

de toneladas por ano no Brasil. De acordo com Carvalho (2011):

O setor de transporte responde por cerca de 20% das emissões globais de CO2, que é um dos principais gases causador do efeito estufa, sem considerar a emissão de outros gases também nocivos ao meio ambiente.

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No Brasil, segundo informações do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), o setor de transporte responde por cerca de 9% das emissões totais.

Aparentemente atentas aos riscos das questões envolvendo responsabilidade

socioambientais, as empresas-líderes do setor se estão mobilizando para tentar

mudar o cenário, com a (re) introdução de veículos movidos a energia limpa (que

possibilitam redução na emissão de CO2), além de investimentos em outras ações e

estratégias ligadas à sustentabilidade, como mudanças referentes ao consumo de

matérias-primas e aos processos de produção.

De acordo com Vergragt e Brown (2006), globalmente, o setor automotivo é

um dos que mais sofre com pressões e cobranças por melhores performances

ambientais. Apesar de os benefícios dos automóveis serem claros, como prover um

meio de transporte “porta a porta”, o que ajuda nas necessidades pessoais e

profissionais, e de o veículo constituir fonte de status social e de diversão, existe um

pesado dano ambiental causado pelos automóveis. Além da poluição do ar e da

emissão de gases de efeito estufa, já citados, grande número de veículos causa

congestionamentos, barulhos, acidentes com mortes ou lesões permanentes, perda

de espaços nas cidades para construção de ruas e estacionamento, dentre outros.

Exemplificando esses danos no cenário brasileiro, dados da Companhia

Estadual de Trânsito (CET) de São Paulo trazem números alarmantes, como o

registrado em junho de 2009: 295 quilômetros de congestionamento (CET, 2009).

Um estudo da Fundação Getúlio Vargas apontou perda econômica anual de mais de

R$ 32,5 bilhões apenas com os congestionamentos na cidade de São Paulo

(CINTRA, 2008, p. 31). Reportagem do website Notícias Automotivas, de 11 de

março de 2011 (NA, 2011), informa que, em 1970, a capital paulista tinha registrado

965.000 veículos para 14.000 quilômetros de vias. Enquanto foram somados apenas

3.000 quilômetros de vias na cidade, o número de veículos circulando pela

metrópole subiu para 7 milhões. A frota de veículos cresceu seis vezes mais rápido

que a população de São Paulo, gerando o índice recorde de 1,63 habitantes por

veículos.

No Rio de Janeiro, são 2,7 pessoas para cada carro licenciado, totalizando

2,4 milhões de veículos em 2011 (Detran-RJ, 2011). De acordo com dados do

Censo 2010, do IBGE (2012), o Rio de Janeiro aparece como a pior região

metropolitana no ranking mobilidade, com 28,6% dos trabalhadores gastando mais

de uma hora para chegar ao trabalho. Com mais veículos nas ruas, aumenta a

exposição ao risco de acidentes. Somente no anuário de 2010 do Detran, foram

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registrados mais de 300.000 acidentes com vítimas (SILVA, 2011, p. 85). Além

desse, estudos como de Resende e Souza (2009) mediram o grau de exposição dos

cidadãos brasileiros aos congestionamentos e descobriram, como consequências,

inúmeros desgastes diante do pesadelo de ficar parado improdutivamente. Os

resultados são preocupantes, como a quantidade de doenças psicológicas,

cardíacas e respiratórias que podem ser causadas pelos congestionamentos.

Ademais, nas contas dos efeitos colaterais, devem ser incluídos os resíduos

produzidos pela necessidade de reposição de peças, a ampla necessidade de

combustíveis fósseis dentre outros.

O discurso dos principais players da indústria é que estão investindo em

práticas de responsabilidade ambiental e social corporativa (Rasc), em inovações

como o redesenho de processos de fabricação, o que refletiria em ganhos de

eficiência de insumo e energia, na análise de oportunidades intralogísticas, na

elaboração de carros mais econômicos, além de investimentos em educação do

consumidor. Esses movimentos refletem a preocupação de que tendem a aumentar

as pressões externas, tanto de consumidores quanto dos governos, para que as

empresas tenham atitudes mais sustentáveis.

Exemplos dessas pressões são vários. Na União Europeia, por exemplo, foi

aprovada lei que impõe, já a partir de 2012, a 65% dos veículos limite de emissão de

gás por quilometro rodado (120 gramas/km). Cada grama emitido a mais, será

cobrado financeiramente do fabricante. A proporção deverá subir para 75% em

2013; 80% em 2014; e 100% em 2015, permitindo ainda um período de adaptação

da indústria (European Comission, 2008). No Brasil, as metas de redução de gases

totais, defendida de forma espontânea pelo governo na COP 15, são de 36,1% a

38,9% até 2020 (BRASIL, 2010).

De acordo com Orsato e Wells (2006), a grande dependência de combustíveis

fósseis e o elevado consumo de matérias-primas lideram os desafios ambientais da

indústria automotiva.

Como resultado, existe pressão pública, esperando-se de todos os players,

em um futuro próximo, iniciativas que visem reduzir os impactos ambientais tanto no

processo de produção quanto no uso dos veículos. Hart e Milstein (2004) analisaram

algumas respostas a essas pressões pelo setor automotivo, observando que as

principais montadoras estão investindo no mercado de motores alternativos, como

os híbridos / elétricos.

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4.3 VEÍCULOS ELÉTRICOS E HÍBRIDOS

Baran e Legey (2011) explicam que foi na década de 1960 que as pressões

sociais sobre a questão de poluição ambiental aumentaram e, até então, a gasolina

ainda continha chumbo e os carros não tinham filtros nem catalizadores. Poucos

anos depois, em 1973, veio o grande choque do petróleo, o que forçou uma onda de

racionamento de combustíveis em diversos países. Mesmo assim, os protótipos das

principais montadoras não chegaram às linhas de produção em massa. Os autores

alertam que os motores híbridos e elétricos, vistos por muitos como grande avanço

tecnológico, já foram fortes concorrentes dos automóveis convencionais, e o

aumento exponencial da proporção de veículos com o uso de combustíveis fósseis

se deu a partir dos anos 1930. Na época, tanto a maior autonomia dos carros

movidos a gasolina quanto a maior facilidade de distribuição do combustíveis foram

fundamentais para tal (BARAN; LEGEY, 2011).

É claro que nos últimos anos presenciou-se grandes inovações nos veículos

elétricos, principalmente nas baterias de lítio e na tecnologia embarcada, porém os

motores elétricos de hoje não são tão diferentes do que se via no início do século

passado.

Pesquisadores, como Carvalho (2005) e Baran e Legey (2011) acreditam que

o ressurgimento do carro elétrico pode ser atribuído, em grande parte, à legislações

e aos novos incentivos dados pelos EUA e governos europeus a fabricantes e

consumidores. Carvalho (2005) evidencia que as exigências regulatórias exercem

forte orientação nas decisões estratégicas da indústria. De acordo com Baran e

Legey (2011), nesses países, essa transição é uma opção estratégica de razões de

segurança energética.

Os incentivos financeiros servem como estímulo para acelerar o processo de

mudança de uma economia do petróleo para uma economia sustentável e, com isso,

os países desenvolvidos reduziriam a dependência do combustível fóssil. Um

exemplo dessa dependência é o setor de transporte nos EUA, com 95% de toda

energia proveniente de fontes não renováveis.

Diversos fatos na década de 1990 foram importantes para a volta das

pesquisas e do desenvolvimento de veículos híbridos e elétricos. Dentre eles:

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• leis com novas regras de emissão, implantadas primeiramente na

Califórnia. A partir de então, foi elaborada uma tabela com a redução

gradual dos limites de CO2 permitidos para novos veículos

comercializados no Estado. Na mesma lei, foram estabelecidas metas

anuais de percentuais de veículos com emissão zero, em que as

montadoras receberiam bônus do governo de até 5.000 dólares para

cada veículo vendido. A lei é considerada um exemplo, tanto que,

pouco tempo depois, outros Estados americanos, como Nova York e

Massachusetts, também a adotaram;

• a Agenda 21, elaborada na Rio-92, considerada um marco mundial no

debate sobre o aquecimento global e suas consequências;

• a nova política de transporte da União Europeia e, consequentemente,

de todos os países-membros. Nessa estratégia, o tema “mobilidade

sustentável” era uma meta a ser alcançada em menos de vinte anos;

• a lei aprovada pelo presidente americano Bill Clinton em 1993,

denominada Parceria para uma Nova Geração de Veículos

(Partnership for a New Generation Vehicles – PNGV). Essa parceria

público-privada buscava incentivar a indústria a produzir veículos

híbridos com consumo de até 25 km/litro. O programa gerou

investimentos na casa de 1 bilhão de dólares;

• na segunda metade da década de 1990, a Toyota, fabricante japonesa

que não estava no programa PNGV, lança o que é considerados por

muitos o primeiro carro híbrido sucesso de vendas – o Prius. Na

mesma época, outras montadoras, como a Honda e a Ford, também

lançaram seu modelo no mercado americano e europeu;

• outras iniciativas do presidente americano Barak Obama, como o

incentivo para a troca da frota de carros que servem funcionários

federais por modelos elétricos e híbridos, também serviram como

incentivo para as montadoras.

• investimentos de montadoras como a Nissan e Toyota, que acreditam

que o mercado de híbridos não será apenas para um nicho, mas de

massa.

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O brasileiro Carlos Ghosn, que preside a Renault-Nissan, em entrevista à

BBC News (2010), afirmou que o futuro da indústria automobilística está nos carros

elétricos, e defende que todo o setor deveria adaptar-se para investimentos em

carros de emissão zero. Para o executivo, essa tendência deverá consolidar-se de

forma gradativa; e, para isso, o mercado e os investidores precisarão ter paciência

sobre o retorno dos atuais investimentos. Ainda nessa reportagem, analistas alegam

que até 2020 os carros elétricos deverão representar 10% do mercado de

automóveis. Contrariando essas visões, o presidente da Fiat do Brasil, Cledorvino

Belini, aposta que os carros elétricos permanecerão apenas em um nicho de

mercado, e sua participação não será dominante devido aos altos custos das

baterias (TANURE; PATRUS, 2011, p. 175).

Interessantes fatos ocorreram, em uma espécie de resposta das corporações

e das indústrias que seriam teoricamente prejudicadas com essas iniciativas

“verdes”.

A associação americana de montadoras de veículos, a American Automobil

Manufactures Association (AAMA), ainda na década de 1990, começou campanha

para argumentar que os preços finais dos carros seriam demasiadamente caros e o

chumbo das baterias seria tão prejudicial para o meio ambiente quanto os

combustíveis fósseis, argumentos usados nas discussões sobre o tema até hoje.

Ainda de acordo com o relatório de Baran e Legey, “as grandes companhias de

petróleo, como Exxon, Shell e Texaco contribuíram financeiramente para

campanhas de políticos contrários aos veículos elétricos e financiavam propagandas

contrárias a este tipo de veículo. Como resultado, em 1996 a Carb (California Air

Resources Board, órgão do governo responsável por monitorar a qualidade do ar no

estado da Califórnia) capitulou e postergou seu cronograma” (BARAN; LEGEY,

2011, p. 216).

Pesquisa apresentada pela consultoria americana Accenture, na Accenture

Sustainability 24 (2012), realizada com 7.000 pessoas de doze países, indica que,

muito embora o índice de consumo de combustível seja apontado como principal

motivador para compra de carro nos próximos anos, ainda há receio dos

consumidores em relação à compra de veículos elétricos ou híbridos, dentre eles:

• preocupação com a diferença no custo em relação a um veículo

tradicional;

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• custo de manutenção e necessidade de reposição de baterias;

• falta de conveniência, ou a não viabilidade de abastecimento a

qualquer momento;

• consumidores “ecologicamente conscientes”, por sua vez, questionam

se a pegada de carbono final será maior ou menor, devido à fonte da

energia elétrica (carvão, nuclear, renovável etc.) e pedem para a

indústria apresentar maiores comparações sobre a questão.

A consultoria afirma que os veículos elétricos precisam de volume para poder

competir em custo com os atuais, e o mercado ainda não está “preparado” para os

carros elétricos, tanto pelo preço, quanto pelo risco percebido.

Tomando o mercado norte-americano como referência, o panorama no final

da primeira década do ano 2000, de acordo com o instituto HybridCars (2011), era

de mais de trinta modelos de produção em série à venda nos EUA. Porém, de 2008

a 2010, as vendas desse tipo de veículos caíram em média 6% ao ano, enquanto as

vendas de carros “convencionais” cresceram 11%. De acordo com os especialistas,

a queda do preço da gasolina e o valor mais barato dos carros convencionais são as

duas principais explicações para este fenômeno.

4.4 MOMENTO ATUAL DA INDÚSTRIA

A mais recente onda que impactou fortemente o setor automotivo foi a crise

financeira iniciada pelo setor hipotecário nos EUA em 2008. A crise afetou tanto as

empresas europeias, quanto asiáticas, mas o principal impacto foi sentido nos

Estados Unidos. A indústria automotiva também foi enfraquecida com a alta do

preço dos combustíveis entre 2003 e 2008, o que desencorajou a compra de

veículos maiores, utilitários (SUVs) e caminhonetes, e aumentou a procura por

veículos com baixo consumo de combustível. Os executivos destacaram o mau

desempenho da indústria nos países desenvolvidos em contraste com o crescimento

do mercado no Brasil, Rússia Índia, China (BRIC) e em outros países emergentes.

Recuperando-se, principalmente a partir de fortes benefícios fiscais e de

concessão de créditos por parte dos governos, a indústria automotiva mundial voltou

a atingir novo recorde no segmento de automóveis e comerciais leves em 2011,

resultado impulsionado pelo mercado chinês e americano, especialmente. No Brasil,

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o segmento de automóveis e comerciais leve alcançou a marca de 3.406.150

unidades produzidas (OICA, 2012).

O atual foco das grandes montadoras são os mercados em desenvolvimento,

principalmente China, Índia e Brasil. Além da maturação dos mercados

desenvolvidos, os incentivos governamentais destes três países para a produção

local têm atraído muitos investimentos. A relevância para o PIB, a visibilidade da

indústria e as especificidades das demandas (preferência de design, normas

ambientais e de segurança, por exemplo) também incentivam a implantação de

fábricas regionais. Esse movimento estimula toda a cadeia de fornecedores além de

aumentar a competitividade.

As regras ambientais, cada vez mais rígidas, farão com que a produção de

veículos mais econômicos e eficientes seja um dos principais desafios dos players

do setor ora em diante. Em relação aos combustíveis, além dos carros elétricos e

híbridos, as estratégias das empresas estão voltadas para o desenvolvimento de

motores movidos a biodiesel e etanol.

4.5 A EVOLUÇÃO DA INDÚSTRIA AUTOMOTIVA NO BRASIL

A história do automóvel no Brasil inicia-se em 1919, com a vinda da Ford

Motors Company para o país; e, seis anos depois, a General Motors (GM) também

começa a operar aqui. Ambas as empresas não produziam veículos no Brasil, mas

na matriz, e aqui importavam e montavam os semi-knock-down (SKD) ou os

complete knock-down (CKD), ou seja, kits inteiros ou parciais de veículos

desmontados, dado que o volume comercializado no país ainda era insuficiente para

grandes investimentos em instalações completas. Nos primeiros anos, a média de

montagem da GM, por exemplo, era de apenas 25 veículos por dia (CARRO

ANTIGO, 2012).

Esse modelo de negócio se manteve até o início da década de 1950, quando

diversas outras empresas impuseram idêntico padrão de importação de peças e

montagem em solo nacional. Em 1952, foi criada pelo governo a chamada

Subcomissão de Jipes, Tratores, Caminhões e Automóveis para desenvolver uma

estratégia de fabricação de veículos, especialmente de transporte de cargas. Um

ano depois, a Subcomissão instaura o Aviso 288, que limitava progressivamente a

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concessão de licenças de importação, dada a deterioração na balança de

pagamentos (SANTOS; BURITY, 2002). Com isso, o governo buscou motivar a

instalação das fábricas no Brasil, como a Volkswagen, cujo modelo Fusca era o mais

popular no país. Ainda, acabou incentivando a indústria de autopeças, que até então

vinha apenas atendendo à demanda do mercado de reposição. Porém, o mercado

ainda era pequeno, demandando cerca de 20.000 unidades/ano, o que ainda

deixava as montadoras reticentes ao decidirem fazer grandes investimentos

(SANTOS; BURITY, 2002).

Na mesma década, a indústria tornou-se prioridade no programa de

crescimento – o Plano de Metas do presidente Juscelino Kubitschek; e, em 1956, o

governo brasileiro institui um novo conceito para incentivar a instalação de fábricas

em solo nacional. O plano restringia as importações e dava um prazo de cinco anos

para que os veículos tivessem um grau de 90% a 95% de nacionalização. Outros

incentivos foram dados, tanto de natureza cambial quanto fiscal, principalmente para

a importação de máquinas e equipamentos.

Existia então uma demanda reprimida, e a procura por veículos crescia e, à

medida que o sistema de transporte ia sendo implantado no Brasil, desenvolvia-se

mais o meio rodoviário que o ferroviário. Assim, além da Ford e GM, outras nove

empresas aderiram ao plano, sem incluir projetos de outras sete montadoras que

foram rejeitados. De acordo com Santos e Burity (2002), em 1957 foram vendidos

30.900 unidades, crescendo para 96.700 em 1959 e chegando a 190.000 em 1962.

Porém, mesmo com o crescente consumo, nem todos os investimentos se

traduziram em lucros para os competidores, e as plantas apresentavam alto grau de

ociosidade. Dados do BNDES apontam capacidade de produtiva de até 500.000

unidades por ano, muito acima da demanda. Somada a esse fator, em virtude da

política de aperto monetário e de restrição de crédito entre 1960 a 1966, apenas

sete empresas mantiveram produção de veículos leves e pesados localmente.

Recuperando-se desse período, entre 1967 e 1974, o Brasil vivenciou o

período do “milagre econômico”. O setor, já reestruturado, cresceu à taxa média de

20% ao ano. O governo voltara a estimular o consumo com instrumentos de

créditos. Pressionou também os sindicatos para reduzir o custo da mão de obra,

barateando assim os carros produzidos no Brasil. A indústria nacional mudou o perfil

de produção, fabricando pela primeira vez mais veículos de passeio do que

caminhões e ônibus. A título de comparação, enquanto a frota de carros se

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multiplicou por oito entre 1956 e 1973, a de caminhões cresceu apenas 2,4 vezes

(SANTOS; BURITY, 2002). Esse boom atraiu novos investimentos, como a fábrica

da Fiat em Betim, Minas Gerais, em 1976. No fim dessa década, o setor chegou a

atingir a marca de um milhão de veículos produzidos, fato que só se repetiria na

década de 1990.

Os anos 1980, chamados por muitos como “a década perdida” da economia

brasileira, marcaram um processo de sucateamento e ociosidade das fábricas

nacionais. Com o mercado nacional sem concorrência, fechado para importações,

os consumidores brasileiros tinham verdadeiras “carroças”, quando comparado aos

modelos e inovações de mercados desenvolvidos. Praticamente todos os carros

vendidos no Brasil saíam das fábricas das quatro grandes montadoras – Ford, GM,

Volks e Fiat. Apenas em 1981, o PIB real cai 4,3%, o PIB da indústria 8,8% e as

vendas de automóveis despencam 43,5%.

De forma geral, essa década foi marcada por amplo rigor no controle de

preços pelo governo, e a forte contração entre 1981 e 1987 gerou os piores

resultados na história do setor. Porém, por ser uma indústria com característica

oligopolista, contando com apenas quatro grandes concorrentes na época, não

existia guerra de preços como forma de ganhar mercado. Ao contrário do esperado,

sempre que havia flexibilização do controle de preços por parte do governo, as

empresas empurravam paralelamente para cima os preços, tanto que o valor médio

do carro cresceu mais que a hiperinflação (GUIMARÃES, 1989), mantendo o volume

de lucro mesmo com a queda de vendas.

A demanda nacional total de veículos durante essa década ficou estável,

entre 550.000 e 650.000 unidades por ano, bem abaixo do volume comercializado

na década de 1970. O montante, quando dividido entre quatro grandes montadoras,

não gerava escala suficiente para a manutenção das operações. A resposta da

indústria automotiva nacional foi a exportação, já que este processo contava com

programas de incentivos por parte do governo. Nesse período recessivo, entre 17%

e 22% da produção era exportada, com o recorde de 41% em 1987. As exportações,

que somavam 493 milhões de dólares em 1977, chegaram a 2 bilhões de dólares

em 1987.

Durante a década de 1980, as montadoras precisaram apresentar “novos”

modelos para o público brasileiro, principalmente para fugir dos programas de

congelamentos de preços do governo. Assim, eram criadas as chamadas “séries

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especiais”, onde eram adicionados um ou outro acessório nos veículos, mas que

permitiam modificações nos preços sem necessariamente descumprir com os

valores congelados nas tabelas oficiais. Em todo o setor, persistia a manutenção

estratégia de manter veículos defasados tecnologicamente, quando comparados aos

oferecidos pelas matrizes em mercados mais maduros, dada a política de proteção

de mercado e restrição de importação de bens de informática.

Com a eleição do presidente Fernando Collor de Melo, em 1989, e a abertura

do mercado nacional para produtos importados, ambiente de negócios da indústria

se torna muito mais competitivo em um período de tempo muito curto. Em 1990, com

o confisco das cadernetas de poupança no Brasil e inflação em permanente

descontrole, somados à Guerra do Golfo e o consequente aumento preço do

petróleo, um novo cenário recessivo começava a instaurar-se no Brasil. Era

consenso que não só o setor automobilístico precisava ser modernizado, mas que

seria preciso estimular e desenvolver o mercado consumidor. Os volumes de vendas

de veículos eram os mesmos da década de 1970, e as plantas tinham baixa

automação e altos custos ao longo de toda a cadeia (SANTOS; BURITY, 2002).

Assim, a última década do século XX foi marcada por grandes políticas de incentivos

para a indústria automotiva nacional, começando pelo ano de 1990, quando um

decreto foi especialmente elaborado para moldar uma característica de produto que

até hoje é marcante no mercado nacional: um regime especial de tributação para

veículos de até 1.000 cilindradas, com redução do Imposto sobre Produtos

Industrializados (IPI) de 40% para 20%, surgindo assim a figura do “carro popular”.

As medidas adotadas entre 1992 e 1993 no âmbito da câmara setorial

automotiva foram de extrema relevância. Os diversos stakeholders – montadoras,

trabalhadores e governo – concordaram em rever a questão tributária (IPI e Imposto

sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS) e salarial e as margens das

montadoras, autopeças e concessionárias. Além disso, o Banco Central (BC)

incentivou o financiamento dos carros de passeio. O acordo ainda previa

investimentos na ordem de 10 bilhões de dólares durante a década de 1990. Como

consequência, foi observada queda no preço dos produtos que chegou até 22%,

incentivando o mercado consumidor. Em 1993, depois de mais de uma década sem

crescimento, o setor voltava a registrar recorde de produção de vendas.

Mas a capacidade produtiva, mesmo eliminando vários gargalos e

aumentando a produtividade, chegara logo ao limite. Com esse fato, associado ao

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novo regime de paridade cambial que entrara em vigor, foi registrado um boom no

volume de importações. Em 1995, por exemplo, o cenário da balança comercial era

desanimador, com déficit no setor de quase 2,2 bilhões de dólares (MICAELO,

2003). A comparação entre modelos nacionais e importados forçou as empresas a

investir em tecnologia e, ainda com defasagem de alguns anos, a produzir aqui

modelos comercializados pelas respectivas matrizes. As pressões por eficácia e

redução de custos, adequando-se ao modelo de produção enxuta, foram

compartilhadas por todas as montadoras instaladas no país. Ainda, o novo regime

automotivo, os acordos comerciais que foram fechados com outros governos, como

o da Argentina, e junto com o amadurecimento do mercado e a estabilização da

economia, incentivaram a vinda de novas montadoras para o país.

Em 1997, o regime automotivo foi novamente reformulado, impulsionando

ainda mais as empresas que investissem em unidades da federação menos

desenvolvidas, com redução de IPI e de até 50% do Imposto de Importação (II) de

veículos, bens de capital, ferramental e moldes para matérias-primas. Declarava-se

uma espécie de “guerra fiscal” entre Estados e Municípios, com propostas de

financiamento de instalações e até de participação no capital (SANTOS; BURITY,

2002). Com quase 18 bilhões de dólares de apoio público entre 1996 e 1999,

catorze novas unidades fabris foram criadas até 2001. Destaque para as japonesas

Honda e Toyota e para as francesas Renault, Peugeot e Citroën, que já haviam

iniciado a atuação no mercado nacional a partir importação.

Entre 2001 e 2008, o setor experimentou anos de constante crescimento.

Com o mercado aquecido, novos competidores foram atraídos para a arena

competitiva, destacando-se as empresas coreanas Kia e Hyundai. Porém, a crise

financeira mundial, no fim de 2008, impactou o desempenho do setor automotivo. De

acordo com a OICA (2011), em um ano a queda na produção global foi de quase 12

milhões de unidades – de 73,2 milhões em 2007 para 61,7 milhões em 2008.

Dados da Anfavea (2011) apontam que, no Brasil, a crise foi percebida em

outubro de 2008, com queda de 6,7% em relação ao mesmo período de 2007. Em

novembro a queda foi de 23,4% e em dezembro de 19,7%, mas, mesmo assim, o

mercado automotivo brasileiro bateu recorde de vendas, com a produção

ultrapassando pela primeira vez 3 milhões de unidades. Em 2009, as vendas

internas cresceram 11,4%; e o Brasil se tornou o quinto maior mercado mundial. Em

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2010, o setor atingiu novos recordes, fazendo o país subir mais uma posição no

ranking mundial (BARROS; PEDRO, 2011).

Ainda de acordo com Barros e Pedro (2011), o crescimento das vendas é

atribuído, dentre outros fatores, ao aumento da renda média dos brasileiros e

ascensão social, principalmente da nova classe média (classe C), a redução dos

níveis de desemprego, ao maior acesso ao crédito e redução das taxas de juros e

alongamento dos prazos de financiamento, o que possibilitou para muitos a

aquisição do primeiro carro.

No Brasil, a indústria automotiva representa atualmente 18,2% do PIB

industrial e 5% do PIB total (ANFAVEA, 2012) e emprega diretamente mais de

146.000 funcionários. O setor soma quase 200.000 empresas e 1,5 milhão de

empregos diretos e indiretos. Apenas em 2011, o faturamento líquido no segmento

ultrapassou 93,5 bilhões de dólares. Enquanto é presenciado grande aumento nas

vendas de veículos, o número de empregos na indústria automotiva não acompanha

o crescimento, mostrando com isso forte ganho de produtividade e de automação.

Dados da Anfavea (2012) indicam que em 1990 eram produzidos 6,6 veículos por

empregado, ao passo que em 2011 essa relação tinha subido para 25,1.

Os números de produção impressionam e não param de bater recordes. A

frota nacional já ultrapassa 37 milhões de veículos e comerciais leves, com

produção nacional em 2011 de 3,4 milhões (DENATRAN, 2011; ANFAVEA, 2012).

Ainda é considerada uma frota antiga, com idade média de 13,3 anos, segundo a

Federação Nacional de Veículos Automotores (FENABRAVE, 2010), o que é uma

oportunidade de incremento de receitas para as montadoras.

No ano 2000, por exemplo, no Brasil eram vendidos apenas 8,8

veículos/1.000 habitantes. Em 2010 foram vendidos 18,4 veículos para cada 1.000

habitantes, contudo bem inferior aos 53,3 registrados em 2007 nos EUA. Porém

esse indicador está em constante evolução.

Outro indicador que vale a pena utilizar para comparar com o mercado

externo é o número de habitantes por veículo. No ano de 1999, o Brasil possuía 8,9

habitantes por veículo e, em 2010, essa razão caiu para 6:1. De acordo com a

Anfavea (2012), a estimativa é chegar em 2020 com quatro habitantes por veículo.

Novamente, relativizando com países como Estados Unidos, Canadá, França e

Alemanha, percebem-se as razões de 1:2, 1:6, 1:7 e 1:9 respectivamente (BARROS;

PEDRO, 2011; ANFAVEA, 2012). Esse fato, associado ao bom momento da

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economia nacional, é percebido pelo mercado como uma vasta oportunidade de

crescimento no país, mesmo com as principais capitais com índices muito próximos

aos de países desenvolvidos, conforme visto anteriormente.

De olho nessas oportunidades de crescimento, estão previstos mais de 38

bilhões de reais em investimentos no setor entre 2011 e 2015, incluindo o setor de

autopeças. Os principais investimentos anunciados foram da Fiat, com previsão de

injeção de quase 10 bilhões de reais, incluindo a nova fábrica no Estado de

Pernambuco e a ampliação e modernização da planta de Betim, Minas Gerais; mais

6,2 bilhões de reais da Volkswagen, na ampliação das quatro fábricas atuais, dentre

outros investimentos; 5 bilhões de reais da GM; 4,5 bilhões de reais da americana

Ford. As coreanas Hyundai e Kia, as francesas Renault e Peugeot e a chinesa

Cherry compõem boa parte do restante dessa cifra (BARROS; PEDRO, 2011).

4.6 FATORES QUE INFLUENCIAM A VENDA DOS CARROS E PRINCIPAIS

INDICADORES

Diversos são os fatores que influenciam direta e indiretamente o volume de

produção e de vendas de veículos. Além das condições macroeconômicas do país e

os níveis de renda e emprego, são relevantes os impostos incidentes, a taxa de

juros e a facilidade de financiamento – mais a disponibilidade de crédito, além do

câmbio favorável.

O Brasil está no topo do ranking mundial de carga tributária sobre veículos,

com média de 30,4% (ANFAVEA, 2012), chegando a mais da metade do preço final

em certos casos. A título de comparação, no segundo lugar desse ranking, a Itália,

os impostos representam pouco mais de 17,3% do valor final dos veículos.

São diversos os impostos cobrados na venda dos carros no país, sendo IPI e

ICMS os mais impactantes. Além desses, ainda incidem o Programa de Integração

Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PIS/Pasep), a

Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e, no caso dos

veículos importados, o Imposto de Importação (II).

O IPI é uma taxa federal. No caso dos veículos, atualmente, varia de acordo

com o tamanho (cilindrada) do motor. Conforme a tabela vigente em dezembro de

2011, é de 7% até 1,0 litro, para motores entre 1,0 litro e 2,0 litros é de 13% para

motores a gasolina e 11% para flex; e 25% acima de 2,0 litros. Como forma de

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incentivo à implantação de fábricas no Brasil, além de proteger os competidores

locais, principalmente dos veículos coreanos e chineses (as empresas coreanas Kia

e Hyundai, por exemplo, que cresceram em vendas 121% e 36% respectivamente

em 2010, e a chinesa JAC, com forte aceitação no mercado nacional com o modelo

J3, lançado em 2011), o governo federal decidiu aumentar em 30 pontos percentuais

o tributo sobre os produtos importados. A regra excluiu os três países com os quais

o Brasil possui acordo setorial bilateral – Argentina, Uruguai e México. O grau de

nacionalização exigido foi de 65% para que o fabricante não pague a sobretaxa,

porém o governo já se mostrou disposto a flexibilizar o tributo para empresas que

começarem a implantar novas fábricas no Brasil – como as chinesas Cherry e JAC

Motors, além da alemã BMW. É interessante ver uma espécie de repetição do efeito

do Aviso 288, de 1952, tratado anteriormente.

Para se ter uma noção da relevância desse tipo de medida, logo após o

anúncio do aumento de 30 pontos percentuais em outubro de 2011, a Associação

Brasileira das Empresas Importadoras de Veículos Automotores (ABEIVA) registrou

queda nos emplacamentos de veículos de 41,2%, sendo que apenas duas das 27

filiadas registraram crescimento no período. Foram 13.264 unidades comercializadas

em outubro, ante 22.569 veículos no mês anterior. O resultado contrasta com o

aumento de quase 98% de emplacamento de veículos importados no período de

janeiro a outubro de 2011 em relação ao mesmo período de 2010, quando o share

de mercado dos importados já era de 21,7% (MATSUBARA, 2011). Cabe ressaltar

que 90% das importações são feitas pelas montadoras instaladas no país. É válido

registrar também que as importadoras recorreram e conseguiram que a medida só

entrasse em vigor depois de três meses de anunciada, com isso o volume de vendas

de novembro e dezembro manteve o ritmo dos primeiros meses do ano.

Contudo, com a mudança súbita do comportamento do governo, algumas

montadoras que tinham grandes planos de investimento no Brasil, como a JAC

Motors e a BMW, anunciaram, ao menos temporariamente, a suspensão dos planos

de investimentos no Brasil até que tais medidas protecionistas sejam revistas pelo

governo federal.

O ICMS é a grande fonte de receita dos Estados, com alíquota não

cumulativa média de 17%, variando de Estado para Estado. Geralmente é usado

como forma de incentivo para atrair investimentos, principalmente em regiões menos

desenvolvidas.

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Outro fator que aparentemente possui correlação com as vendas são as taxas

de juros e a oferta de crédito. Dados da Associação Nacional das Empresas

Financeiras de Montadoras (Anef) mostram que quase 70% dos automóveis

vendidos no Brasil são adquiridos por meio de financiamento, consórcio ou leasing.

O modelo de crédito mais utilizado para financiamento de veículos é o Crédito Direto

ao Consumidor (CDC), cujas regras são definidas pelo subsistema normativo do

Conselho Monetário Nacional (CMN) e controladas pelo Banco Central do Brasil

(BCB). O financiamento permite aquisição do veículo no ato da negociação,

diferente do consórcio, que depende de sorteio para a liberação da carta de crédito

(BARROS; PEDRO, 2011).

De acordo com Silva (2006, p. 21):

essa maior facilidade de compra atrai o consumidor, que busca realizar seu desejo de consumo ou investimento, considerando que as taxas de juros praticadas são as menores taxas do mercado, comparadas às operações de crédito através de cheque especial ou crédito pessoal, que se situam em patamares bem superiores aos praticados pelos contratos de financiamento para automóvel (CDC).

A disponibilidade de crédito também cresce de forma acelerada no país. No

fim de 2011, o total de empréstimos concedidos pelos bancos atingiu a

impressionante marca de 48% do PIB e, de acordo com analistas, irá facilmente

ultrapassar a marca 50% ainda em 2012 (TEIXEIRA, 2012).

O aumento de renda também é considerado por analistas como fator que

influencia a determinação dos juros. Com o mercado mais aquecido, os bancos

tendem a reduzir as taxas junto com a redução do risco e aumento das expectativas

(SILVA, 2006). Ainda de acordo com o autor, as principais montadoras usam os

próprios bancos para coordenar a dinâmica do consumo de veículos e gestão de

custos. Banco GM, Banco FIAT, Banco Volkswagen, Banco Toyota, Banco BMW e

outros fomentam as operações de CDC conforme a necessidade mercadológica de

produção das fábricas. Entra em cena a relação de oferta e demanda que funciona

da mesma forma para todas as marcas.

Silva (2006, p. 37) esclarece que:

A campanha de taxa de juros abaixo da praticada pelo mercado atrai o consumidor disposto a realizar financiamento com taxas menores, ou seja, a marca X possui uma oferta excedente de veículos e a pressão da oferta gera o desejo de ampliar a demanda através de uma redução da taxa de

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juros. Isso pode ocorrer também em um momento onde o banco tenha uma intenção de ampliar seu mercado, pagando a diferença dos juros ou confronto direto entre bancos concorrentes.

Mesmo que o estudo estatístico de Silva (2006) mostre que apenas 3% do

comportamento da demanda são explicados pela variação da taxa do Sistema

Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), estratégias como redução de juros até

0% ou outras taxas abaixo das cobradas pelo mercado pelas montadoras constituem

uma poderosa ferramenta de mídia e alavanca de vendas.

O câmbio influencia principalmente no fator importação / exportação. Com o

real valorizado, foi percebido um aumento no volume de carros importados

emplacados no país, o que foi visto como a maior ameaça para as empresas locais.

Em 2005, por exemplo, os importados representavam pouco menos de 5% dos

emplacamentos no Brasil, e esse número saltou para quase 20% em 2010.

Com o aumento do IPI para carros importados, o ano de 2011, que era

considerado o mais especial da década para os importadores, obrigou-os a rever

planos e estratégias.

Em comum, os fatores listados podem ser, direta ou indiretamente

controlados ou, no mínimo, fortemente influenciados pelo governo, o que mostra a

importância da constante interação entre os stakeholders desse setor.

FIAT

4.7 FIAT MUNDO: BREVE HISTÓRICO

O nome Fiat é um acrônimo de Fabbrica Italiana Automobili Torino (Fábrica

Italiana de Automóveis de Turim). A companhia, fundada em 1899, por Giovanni

Agnelli, rapidamente expandiu as operações, tanto por crescimento orgânico, com a

venda de automóveis e veículos industriais e agrícolas, quanto por aquisições e

diversificações. Ainda no começo das atividades, a companhia entrou em diversos

ramos, como metalurgia, eletricidade, transporte público, para citar alguns.

Desde o início das operações, a Fiat buscou o crescimento como forma de

ganhar vantagens competitivas. Em 1922, terminou a construção e começou a

operar a maior fábrica de automóveis da Europa – a planta de Lingotto, dotada de

cinco andares e uma inovadora pista de teste no telhado.

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Poucos anos depois, iniciou-se a Primeira Guerra Mundial e praticamente

toda a produção da companhia passou a ser direcionada para suprir o exército

italiano. No período, a firma chegou a produzir armamentos bélicos, como

metralhadoras e motores para submarinos.

Com o fim do conflito, a firma passou por uma forte crise, porém, superando

os desafios do ambiente, retomou o crescimento usando a estratégia de baixo custo

para obter vantagens competitivas de escala e escopo com a fabricação em massa

dos produtos. A característica empreendedora e de inovação em produtos mostrou-

se presente e, dentre os inúmeros veículos lançados então, destaca-se o 509, de

1924. Este foi um dos primeiros carros com quatro portas do mundo. Em 1937 foi

iniciada a construção da grande fábrica de Mirafiori.

Durante a tomada do poder pelo fascista Mussolini, a empresa apoiou o novo

regime de forma integral. Por conta do bloqueio do mercado externo a produtos

italianos em represália ao momento político, a Fiat teve de rever os processos e

reduzir a escala de produção, voltando a focar apenas no mercado interno italiano.

Durante a Segunda Guerra Mundial, houve dramática redução da produção de

carros, e a firma direcionou novamente os esforços para a elaboração de veículos

militares e comerciais.

No pós-guerra, o Plano Marshall subsidiou e apoiou a reconstrução das

fábricas; com isso, a empresa retomou o processo de crescimento. A gestão voltou a

usar as características empreendedoras e de inovação, sendo a primeira montadora

a instalar sistemas de ventilação e de aquecimento em veículos de produção em

massa. Pouco antes da década de 1960, a firma já traduzia em altos lucros o bom

período de recuperação econômica. O processo de crescimento se intensifica com a

duplicação das fábricas de Mirafiori. Buscando se fortalecer em novos mercados, a

Fiat começa a abrir fábricas no exterior. Na Europa ainda nos anos 1960, a

proporção de carro por pessoa salta de 1 para cada 96 habitantes para 1 veículo a

cada 28 habitantes (DARGAY; GATELY; SOMMER, 2007).

Porém, a época foi marcada por pressões internas e externas, que colocaram

em risco o crescimento e a sobrevivência da empresa. Por um lado, internamente os

funcionários iniciam uma série de protestos e greves. Apenas em 1969, durante o

movimento chamado “outono quente”, quando a Itália viveu a maior onda de greves

e paralisações, o total de horas inativas na Fiat (horas x funcionários) chegou a 15

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88

milhões. Sistemicamente, a crise do petróleo atingiu a indústria automobilística como

um todo.

Na década de 1970, o processo de crescimento da empresa ganhou mais

força a partir das fusões e aquisições e da entrada em novos mercados, como a

abertura da fábrica brasileira em 1976, objeto de estudo desta dissertação. Ao que

parece, o empreendedorismo e as inovações continuaram a ser um dos principais

impulsionadores da Fiat. Em 1978, a Fiat iniciou o processo de fabricação com a

utilização de robôs e, no ano seguinte, houve a separação da corporação; e a Fiat

Auto S.p.A. foi criada com o objetivo de ser o guarda-chuva das marcas Fiat, Lancia,

Autobianchi, Abarth e Ferrari (http://www.fiat.it/).

Na década de 1980, outras marcas foram adicionadas ao portfólio, como a

Alfa Romeo e a Maserati, e diversas operações foram separadas, criando-se

companhias independentes. Dentre as novas empresas, surgiu a Fiat Ferroviária,

Fiat Avio (aviação), Fiat Trattori (tratores e máquinas pesadas) e a Magneti Marelli.

Na década de 1990, o direcionamento estratégico da empresa voltou-se para

o mercado externo e, pela primeira vez, foram vendidos mais produtos no exterior do

que na Itália. Em vista da competição acirrada nos mercados maduros, a Fiat

concentrou os esforços na exploração dos mercados em expansão. Dentre eles, o

Brasil ganhou destaque, como a criação do Pálio, o primeiro carro global

desenvolvido em parceria com a Fiat do Brasil.

Comemorando o centenário, e para dar mais consistência à nova estratégia, a

empresa renovou a logomarca em 1999. O novo posicionamento era prover

produtos com soluções de vanguarda tecnológica e preços mais acessíveis. De

acordo com a empresa, os carros passaram a receber mais atenção na parte de

inovações tecnológicas e soluções que buscavam simplificar o dia a dia e atender às

necessidades dos consumidores urbanos. Motores com menor consumo de

combustíveis se tornaram uma das metas da empresa. Outra estratégia da empresa

foi proporcionar um relacionamento mais construtivo com os clientes, além de

amplificar as adaptações para cada mercado.

No ano 2000, a Fiat anunciou uma joint venture com a americana GM, via

troca de ações. A GM receberia 20% das ações da italiana; e, em troca, a Fiat seria

dona de 5,85% da montadora estadunidense. Esse era um momento em que todos

os grandes players buscavam consolidação para redução de custos e ganho de

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escala. Pelo acordo, se depois de cinco anos a Fiat desejasse vender os 80%

restantes, a GM seria obrigada a comprar.

Nos anos seguintes, a dívida líquida das atividades industriais do grupo

chegou a 7,4 bilhões de euros em 2002, e o resultado negativo persistiu. A divisão

de veículos da empresa era dada como acabada por diversos analistas de

investimentos e consultores do setor. A previsão era que a empresa seria adquirida

por outra grande montadora, provavelmente a GM, a qualquer momento (TANURE;

PATRUS, 2011). Assim, a Fiat viu nos resultados dos mercados emergentes, como o

Brasil, o único modo de continuar sua existência. Para se reestruturar, foi anunciado

em 2003 a contratação de um novo executivo para a divisão de automóveis com a

meta de promover o turnaround em todas as empresas do grupo.

Em 2005, passados os cinco anos iniciais, o acordo com a GM foi terminado e

2 bilhões de dólares foram pagos pela Fiat para receber as ações de volta. As

empresas que surgiram dessa parceria, a Fiat-GM Powertrain, que fabricava

motores e transmissões para as duas empresas, e a GM-Fiat World ide Purchasing,

que centralizou as compras globais das duas empresas, foram encerradas.

Em 2007, a logomarca foi novamente reformulada para representar a

proposta de ser uma empresa global e preocupada com o meio ambiente. Nos

últimos anos, a empresa tem sido reconhecida como best in class nos principais

índices de sustentabilidade na Bolsa de Nova York (HAHN, T. et al, 2009). Em 2011,

pelo quinto ano consecutivo, a Fiat atingiu os menores índices de emissões de CO2

nos veículos vendidos na Europa. Os veículos atuais da montadora emitem média

de 118,2 g/km, abaixo da meta de estabelecida pela União Europeia para 2015, que

é de 130 g/km (FIAT, 2012). Um fato interessante é que a corporação mantém até

hoje membros da família Agnelli como principais executivos.

4.8 FIAT BRASIL

Conforme indicado no capítulo de métodos, dentre as diversas fontes

utilizadas para historiar a empresa, destacam-se cinco: dados primários das

entrevistas realizadas para o estudo; dissertação de mestrado de Micaelo (2003);

livro comemorativo dos trinta anos da Fiat, cedido pela empresa; informações dos

site da Fiat Brasil e Itália; além do livro de Tanure e Patrus (2011). No capítulo de

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90

métodos, também se encontra a explicação para a decomposição e o agrupamento

dos períodos abaixo, conforme proposto por Langley (2007).

4.8.1 Período I – da decisão da entrada no Brasil à construção da fábrica (1970

a 1976)

A Fiat Automóveis começou a traçar a história no Brasil no princípio da

década de 1970, quando o setor automobilístico crescia a taxa médias de 20% ao

ano, incentivada por instrumentos de crédito específicos. Naquele momento, todo o

polo automotivo nacional encontrava-se no Estado de São Paulo. As três grandes

montadoras, Volks, Ford e GM, dominavam quase a totalidade do mercado e

exerceram grande pressão e lobby sobre o governo paulista para evitar a entrada de

novos concorrentes.

Percebendo uma oportunidade de desenvolvimento para o Estado de Minas

Gerais (MG), o governo mineiro realizou então os primeiros contatos com os

executivos da Fiat na Itália. Mesmo com a barreira criada pelas demais

concorrentes, impedindo-a de se instalar a 500 quilômetros do epicentro industrial,

onde existia mão de obra especializada e os principais mercados consumidores

além de todo polo de fornecedores, a Fiat percebeu que MG seria a porta de entrada

em um mercado emergente e com grande potencial. A empresa sabia que teria

desafios logísticos para o recebimento de peças e com o escoamento dos produtos,

e que precisaria desenvolver mão de obra e uma rede de fornecedores locais.

Em 1972, foi assinada uma carta de intenções (Acordo de Comunhão de

Interesses) e, um ano depois, iniciou-se a construção da fábrica em Betim, Minas

Gerais. A obra contou com fortes incentivos públicos e atraiu um enorme contingente

de trabalhadores rurais, que viam possibilidade de melhoria de vida e migração para

um centro urbano.

Por três anos, mais de 3.000 homens trabalharam dia e noite na construção

da fábrica, com área coberta de 350 mil metros quadrados e 2.245.000 metros

quadrados de área total. No mesmo período, a empresa decidiu não “importar”

profissionais de São Paulo e apostou na capacitação e no treinamento das

comunidades locais, o que foi chamado de “interiorização do desenvolvimento”.

Alguns operários foram mandados para fábricas na Itália, com o intuito de fazer

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intercâmbio de conhecimento sobre tecnologias mais complexas. Ainda, diversos

italianos vieram para o Brasil por conta desse projeto.

No decorrer das obras, 88% de todos os investimentos realizados no setor

automotivo nacional se destinavam à implantação da fábrica da Fiat em MG, o que

incentivou a abertura de novas empresas no entorno, o que transformaria, anos

depois, Betim no segundo polo automotivo do país. A inauguração e início da

produção da Fiat Automóveis S.A. aconteceu no dia 9 de julho de 1976, com a

presença do presidente brasileiro, general Ernesto Geisel, e do presidente da Fiat,

Giovanni Agnelli.

4.8.2 Período II – do início da produção ao fim da “década perdida” (1976 a

1989)

O primeiro modelo a ser produzido em solo nacional foi o Fiat 147. O veículo

trazia características ainda não presentes nos modelos fabricados no Brasil, como

posicionamento transversal dianteiro do motor e tração dianteira. Com previsão de

produção anual de 20.000 unidades, as vendas no primeiro ano chegaram a mais de

60.000 unidades.

Em virtude da persistência da crise do petróleo em 1979, a Fiat colocou em

produção o então protótipo do modelo 147 movido a álcool, apresentado ainda na

inauguração da fábrica. Foi o primeiro modelo nacional com o uso do novo

combustível, atendendo ao chamado do Programa Nacional do Álcool (Proálcool),

lançado pelo governo militar em 1973, com o principal objetivo de reverter o saldo da

balança comercial e a dependência brasileira do petróleo internacional.

Mesmo com tantas inovações, o Fiat 147 começou a formar uma imagem

negativa perante os consumidores, principalmente pelo preço, baixa qualidade

percebida e pouca economia de combustível quando comparado ao principal

concorrente, o Fusca da Volkswagen. No período, o setor automotivo atingira o

impressionante número de 1 milhão de veículos produzidos por ano, marca que só

seria registrada novamente mais de dez anos depois.

Fato interessante é que, ao não se ter instalado na Grande São Paulo, a Fiat

não sofreu com as grandes paralisações do Sindicato dos Metalúrgicos entre 1978 e

1980, comandadas por Luiz Inácio Lula da Silva. A década que se iniciava foi

marcada por grandes mudanças políticas e econômicas. No cenário político, a volta

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gradual à democracia trouxe esperança para a população. Porém, no cenário

econômico, a forte recessão e a inflação descontrolada (“a década perdida”) fizeram

as empresas revisar os processos de produção.

Em 1984, a Fiat começa a fabricação nacional do Uno, lançado nos EUA em

1983. Era um modelo projetado na Itália, para ser um carro global, e uma aposta

para reverter os maus resultados da matriz. Com investimento alto no

desenvolvimento desse produto, em torno de 700 milhões de dólares (valores de

1982), a matriz da montadora conseguiu o que queria. Além do prêmio de “Carro do

Ano da Europa”, os números de venda comprovavam o sucesso de aceitação do

Uno no mercado europeu. No Brasil, o carro teve boa aceitação inicial pelos

consumidores e também ganhou o prêmio de “Carro do ano”.

Assim, nesse mesmo ano, a empresa alcançou a marca de 1 milhão de carros

produzidos no Brasil. Porém, passado pouco tempo, a Fiat voltou a enfrentar

problemas de aceitação e imagem. De acordo com Nottoli (1995), pesquisas

apontavam que 70% dos consumidores brasileiros não queriam automóveis da

marca, principalmente por reclamações referentes à qualidade do modelo Uno.

A companhia realizou grande atualização no modelo de produção, modificou a

linha de montagem, com a introdução de um moderno sistema de soldagem de

carroceria, e criou um extenso programa de qualidade, envolvendo todos os

fornecedores e rede de concessionárias. Nottoli (1995) afirma que nas pesquisas

feitas depois da implantação dessas mudanças, o índice de rejeição apontava

expressiva queda – para menos de 40%. Mantendo o crescimento, impulsionado

pelas exportações, em 1989 foi atingida a marca de 1 milhão de veículos vendidos

no mercado interno e 2 milhões de veículos produzidos no país.

Uma característica da época eram os diversos planos econômicos que

tentavam combater a inflação galopante, como o Plano Verão, de 1989. Com o

controle de preços (tabelados) pelo governo, uma das saídas da Fiat foi criar séries

especiais dos produtos, podendo assim ter mais flexibilidade nos preços e buscar

vantagens econômicas.

4.8.3 Período III – da abertura do mercado à liderança de vendas (1990-2003)

A década de 1990 foi marcada, principalmente, por muitos desafios e

oportunidades. Por um lado, o Plano Collor de 1990, que buscava combater a

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inflação, congelou as cadernetas de poupança, contas correntes e demais

investimentos cujo saldo fosse maior que 50.000 cruzeiros (aproximadamente

10.000,00 reais corrigidos até janeiro 2012), gerando assim um ambiente recessivo

e queda na produção industrial. Por outro, uma grande oportunidade apareceu para

a Fiat. Fernando Collor determinou a criação de um decreto que reduzia de 40%

para 20% a alíquota de IPI dos carros com até 1.000 cm3 de cilindrada.

Prontamente, a Fiat apresentou ao mercado seu motor de 1.000 cilindradas, no Uno

Mille, primeiro em um carro nacional. Naquele momento, a maioria dos competidores

estava apostando em projetos e lançamentos com grande capacidade cúbica e os

rivais demoraram quase dois anos para oferecer o primeiro concorrente com motor

1.0. Surgia, assim, o mercado de carros populares, que viria a influenciar e

revolucionar toda a indústria nacional até os dias atuais.

Em 1992, o cenário econômico para a indústria automobilística teve um

componente favorável, com um acordo automotivo entre governo, montadoras e

trabalhadores. Tal acordo possibilitou a redução dos preços dos automóveis em 22%

na média. Nesse ano, a Fiat apresentou o primeiro popular nacional de quatro

portas, o Mille Eletronic.

Em 1993, a empresa entrou no segmento de carros de luxo, com o Tempra 16

V. Com este modelo, a Fiat deu um passo também na busca de motores menos

poluentes, com índices de emissão de partículas bem inferior ao exigido pela

legislação nacional e dentro dos padrões europeus. No mesmo ano, a Fiat ganhou

os prêmios de Empresa do Ano e Excelência Empresarial, ambos pela revista

Exame. O ano de 1993 rompeu um período de doze anos de estagnação da

indústria nacional, que voltara a quebrar recordes de produção.

Para a montadora, o ano de 1994 foi marcado pela produção do primeiro

carro nacional com motor turbo e o primeiro popular com ar-condicionado. A Fiat

lança o sistema Mille On Line, que possibilitava ao cliente encomendar um carro na

concessionária a preço de tabela, escolhendo cor e opcionais, sem pagar o ágio da

concessionária. No mesmo ano, a Fiat chegaria à marca de 2 milhões de veículos

vendidos no mercado interno, além de 1,5 milhão de unidades exportadas. A

participação dos modelos populares 1.0 mostrou a força, saltando de 11,3% em

1991 para 40% em 1994 – ano que ficaria marcado também pela criação do Plano

Real, que estancou a inflação e gerou estabilidade monetária, o que viria possibilitar

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o planejamento de novos investimentos. Novamente, a Fiat foi eleita a Melhor

Empresa do Setor Automobilístico pela revista Exame.

O ano de 1994 foi marcado pela inauguração da Ilha Ecológica, que se

tornaria o primeiro grande marco sobre preocupação com impactos ambientais pela

montadora no Brasil. Nela, os resíduos industriais são separados por categoria,

armazenados e enviados a empresas recicladoras e de tratamento para correto

destino, possibilitando, atualmente, o reaproveitamento de 98,5% de todo o resíduo

gerado. Além dessas atividades, a Ilha Ecológica da Fiat foi pioneira mundial na

reciclagem do poliestireno expandido (“isopor”). Este material é processado e

transformado em matéria-prima para fabricação de diversos produtos, como

vasilhames, solas para calçados, mangueiras, embalagens dentre outros. De acordo

com dados disponibilizados no site da empresa, desde 1994, a Ilha Ecológica já

permitiu a reciclagem de aproximadamente 30.000 toneladas de papel e papelão

(FIAT, 2012). São mais de 660.000 árvores poupadas a partir da reciclagem de

papel. Além disso, 15.000 toneladas de plásticos diversos e 1.700 toneladas de

isopor foram recolhidas e encaminhadas para reciclagem. Essas quantidades são

equivalentes à utilização de 145 toneladas de petróleo como matéria-prima. É

importante registrar que não existia, até o momento, nenhuma legislação ambiental

exigindo tais padrões de produção, incentivos fiscais do governo, ou mesmo

pressões da sociedade e clientes em relação a ações de responsabilidade

socioambiental.

Outro ano emblemático para a montadora foi 1996. Marcando vinte anos no

Brasil, o principal destaque foram os altos investimentos para a modernização da

planta, com o objetivo de desenvolver e lançar o primeiro carro “global” brasileiro, o

Palio. A empresa também criou, pela primeira vez, o desenvolvimento do conceito

de “família completa”, com o Palio Weekend, Siena e Pick-up Strada. A firma lançou

o primeiro veículo nacional com air-bag, o Tipo 1.6 mpi. No mesmo ano, apresentou

uma das primeiras versões de automóveis com cunho de responsabilidade social: o

Programa Autonomy, que tem como objetivo produzir veículos adaptados de fábrica

para portadores de deficiências dos membros inferiores.

No mesmo período a empresa criou o Projeto J, que visava à

desverticalização do processo produtivo, com a implantação de estrutura de

fornecimento hierarquizado de módulos e sistemas, chamado de processo de

“mineirização” pelos executivos da empresa. A Fiat atraía e incentivava novos

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projetos industriais para o entorno da fábrica, fortalecendo o cinturão de

fornecedores e a implantação do sistema just-in-time, com o abastecimento de

componentes diretamente na linha de montagem, trazendo ganhos de eficiência e

competitividade. De acordo com as estimativas da empresa, a Fiat reduziu os custos

na ordem de 200 dólares a cada carro produzido, somente com a nova logística. As

ações do processo de “mineirização” permitiram também à empresa liberar áreas de

estocagem dentro da fábrica e abrir novas linhas de montagem.

A informática se estabelecia de forma dominante no controle da produção da

fábrica e no atendimento ao cliente. A empresa continuava com o processo de

crescimento, e a produção diária ultrapassava 2.000 mil unidades.

No ano de 1997, a Fiat foi a primeira montadora brasileira de automóveis e

veículos comerciais leves a obter o certificado de qualidade ambiental ISO 14.001 –

um conjunto de normas internacionais para conservação ambiental. Dentre as novas

práticas, iniciou o uso de cabotagem para o transporte de carros dentro do território

nacional.

O ano de 1998 foi conturbado para a economia global, com crises da Ásia e

da Rússia, o que afetou diretamente o cenário brasileiro. A Fiat do Brasil registrou

prejuízos e perda de participação no mercado. Nesse ambiente recessivo, a

empresa precisou reduzir o quadro de funcionários para quase a metade dos então

24.000, buscando como solução a terceirização de diversas operações. Com o

objetivo de melhorar a relação com o quadro funcional, foram introduzidas práticas

mais efetivas de relacionamento com stakeholders internos, como o programas de

participação dos empregados nos processos de decisão e nos diversos comitês da

empresa.

Em 1999, a firma apostou novamente na inovação, com o lançamento da

linha Adventure do modelo Palio Weekend. O nicho de mercado off-road urbano,

ainda não explorado no Brasil, mostrou-se promissor por muitos anos. A empresa

também se tornou a primeira montadora a vender carros pela internet no Brasil, com

o modelo Brava. O ano foi marcado por mais turbulências macroeconômicas,

principalmente pelo fim do regime de banda cambial no Brasil em fevereiro. Naquele

momento, diversas empresas estavam financiando os investimentos em dólar. No

setor automotivo, boa parte dos contratos de compra de veículos estava vinculada à

moeda estrangeira. Assim, inúmeros clientes da Fiat e das demais montadoras

tiveram de renegociar os contratos, ou mesmo se desfazer dos veículos. O governo

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negociou novos “acordos automotivos emergenciais”, que reduziram impostos e o

preço final dos produtos, buscando manter o nível de emprego do setor. Dessa

forma, mesmo com as pressões externas, nesse ano a empresa teve bom

desempenho em vendas e ocupou a liderança de produção (não em vendas) no

setor automobilístico brasileiro, com quase 400.000 automóveis fabricados – 32% do

total nacional. Dados da Anfavea apontam que a Fiat foi responsável por mais de

40% das exportações nacionais.

No ano 2000, o anúncio da aliança internacional entre a Fiat e a GM gerou um

clima de incertezas entre os funcionários da empresa. No início do acordo de troca

de ações, a GM recebeu 20% das ações da Fiat e a Fiat 5,85% da GM. Porém, os

funcionários temiam que a empresa Italiana fosse vendida completamente para a

americana a qualquer momento – fato que não aconteceu. Os executivos da

empresa atuaram fortemente pra reverter essa percepção e apresentar os benefícios

pretendidos. O objetivo da união era unir forças para reduzir custos de compras e de

fabricação de motores. No fim do período, a lucratividade da empresa melhorou

junto com a participação de mercado. Novamente a Fiat ganhou o título de Melhor

Empresa do Ano e liderou o ranking de “As 100 melhores empresas para você

trabalhar”, da revista Exame.

Na virada do milênio, as novas entrantes, principalmente as montadoras

francesas e japonesas, começavam a roubar o mercado das quatro grandes

fabricantes nacionais (Fiat, Volks, Ford e GM). Apenas a Renault roubou 5% do

share de mercado em apenas dois anos, por exemplo. Assim, entre 1997 e 2001, a

participação do quarteto caiu de 96,7% para 87,8%, o que gerou forte incômodo nas

tradicionais empresas. O padrão de qualidade exigido pelos consumidores também

aumentara. A Fiat resolveu, então, responder acelerando o ciclo de novos

lançamentos e explorando o nicho das pick-ups e carros adaptados com uma

proposta de off-road. A direção da empresa, orientada pela matriz italiana, entendia

que a busca da liderança de mercado seria fundamental como estratégia de

sobrevivência, e colocou esta meta como a principal, independente de potenciais

efeitos colaterais, inclusive nas margens. A partir de 2001, a empresa torna-se

então, pela primeira vez, a líder em vendas no mercado nacional, com 27,1% de

participação, desbancando a Volkswagen, que mantivera a posição por 42 anos.

Porém, o lucro líquido do grupo reduziu-se de 233,8 milhões de reais em 2000 para

171 milhões de reais.

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Novamente em 2001, por estar localizada fora de São Bernardo do Campo, a

Fiat não foi afetada por uma greve de cinco dias sofrida pelas principais

concorrentes instaladas em São Paulo. A Volkswagen, por exemplo, relatou perdas

de até 25% da produção mensal de setembro.

Na Fiat intensificava-se o entendimento de que, para continuar a crescer,

seria importante reforçar as práticas de responsabilidade socioambiental. De acordo

com o entrevistado (E2), um dos motivadores era o melhor aproveitamento das

fontes de matéria-prima; outro, a antecipação da empresa a potenciais legislações

ambientais e requisitos governamentais para produção. A partir de 2001, foram

instaladas, na fábrica de Betim, nove estações de tratamento para os efluentes

líquidos gerados nos processos. Com isso, a Fiat conseguiu índices de recirculação

de 99% de toda a água utilizada nos processos industriais. Desde a implantação

completa do complexo até o ano de 2011, o tratamento de efluentes economizou

13,5 bilhões de litros de água, suficiente para abastecer uma cidade com cerca de

180.000 habitantes por um ano. Neste ano, a Fiat tornou-se, pela primeira vez, líder

em vendas no mercado nacional.

Em 2002 a liderança de vendas foi mantida, porém o lucro líquido caiu para

18,8 milhões de reais, mesmo com faturamento de mais de 5 bilhões de reais. A

estratégia da empresa era a redução de conteúdo dos produtos para baixar ao

máximo o custo e o preço dos veículos e manter as vendas mesmo no cenário de

estagnação econômica. Em 2003, empresa manteve a liderança interna, com 25,3%

de participação, porém financeiramente a Fiat Automóveis apresentou prejuízos de

284 milhões de reais. Tal resultado é creditado por muitos executivos da empresa

como reflexo da busca da liderança de vendas a qualquer custo e pela guerra de

preços que tomou conta do mercado nacional, quando os descontos para os clientes

quase dobraram. A empresa estava “pagando para vender”. Mesmo com os

resultados negativos, a Fiat inaugurou o polo de desenvolvimento Giovanni Agnelli,

que viria a englobar três setores: o Centro Estilo, as engenharias de projeto

(eletrônica, carroceria e chassi) e a engenharia experimental.

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4.8.4 Período IV – uma gestão brasileira e a mudança estratégica (2004 – 2011)

O ano de 2004 foi marcante para a empresa por vários motivos. Além dos

prejuízos locais, globalmente, a matriz da Fiat amargava a maior crise da história,

com grandes perdas nos mercados maduros e dependendo dos resultados dos

mercados emergentes para sobreviver. E foi nesse cenário que, em fevereiro de

2004, Cledorvino Belini tornou-se o primeiro brasileiro a presidir a Fiat Brasil.

Belini, formado em Administração, trabalhava no grupo desde 1973, na Fiat

Tratores, em São Paulo. Entrou para a Fiat Automóveis em 1987, como diretor de

compras, onde ficou até 1997, quando foi transferido para outra empresa da holding.

Assumiu o posto de CEO da Magneti Marelli do Brasil até receber convite para

assumir como CEO da Fiat Brasil.

Alinhado com as mudanças globais da Fiat, Belini iniciou um grande processo

de mudanças estratégicas, que viriam a remodelar e dar um novo rumo para a

empresa. Tanure e Patrus (2011) acreditam que esse momento é o início do maior

turnaround da filial brasileira. O principal foco do novo presidente era que a empresa

precisava voltar a ter crescimento rentável, além de buscar como meta melhor

relação com todos os stakeholders.

E os primeiros stakeholders com quem Belini iria rever a relação seriam os

acionistas. O novo presidente sabia que a curva negativa dos resultados financeiros

precisava mudar de direção ainda naquele ano. O prejuízo de 2003 provou que a

guerra de preços praticada no mercado não estava sendo positiva. A cultura de

busca de liderança a qualquer custo, que era, até então, inquestionável

internamente, precisou ser revista imediatamente. O foco da empresa mudou então

de liderança de vendas para liderança de resultados. E isso influenciaria a relação

com todas as demais partes interessadas.

A nova liderança da empresa também precisou lidar com desgastes e com o

clima de insatisfação de executivos e funcionários. No novo modelo estratégico, a

empresa precisaria rever procedimentos tidos como rígidos em relação aos

colaboradores, reflexos da cultura italiana ainda muito presente na empresa.

Reforçou o sistema de comunicação interna, dando mais velocidade aos processos

de gestão e garantindo que a área de comunicação mantivesse o alinhamento de

toda a corporação sobre as decisões estratégicas.

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A orientação em relação aos clientes foi melhorar seus produtos, buscando

agregar valor aos carros. Em uma das ações, a empresa estimulou a oferta de kits

em vez da venda de opcionais separados. Essa estratégia gerava economias de até

30% para os clientes nos acessórios e simplificava o processo de produção e venda.

Outro desafio era compatibilizar as inovações, principalmente as novas tecnologias

embarcadas, com o preço, dado que as principais linhas de venda da Fiat eram os

compactos, como o Uno e a família Palio.

As concessionárias ganharam maior canal de diálogo, com o objetivo principal

de serem catequizadas a buscar resultados e não apenas liderança de vendas. Com

isso, reforçava-se o processo de oferta de serviços e produtos com maior valor

agregado.

O relacionamento com os fornecedores também foi estreitado, principalmente

pelo fato de o novo presidente ter sido diretor de compras por seis anos (1987-1993)

e conhecer os principais motivos de insatisfação na relação entre as partes. Mesmo

com um processo ainda mais agressivo de negociação de prazos e redução dos

estoques, a empresa relata que conseguiu transformar fornecedores em parceiros,

ao mostrar que todos ganhariam com o processo de recuperação da firma.

Até 2004, a Fiat não tinha nenhum programa formal de relacionamento com a

comunidade, quando então uma equipe foi designada para dedicar-se

exclusivamente ao tema, iniciando o programa “Árvore da Vida”.

O resultado financeiro do ano de 2004 para a Fiat foi animador. Mesmo a

empresa tendo perdido a liderança de mercado, o faturamento líquido aumentou

31,2% em relação ao ano anterior. O setor automotivo interno cresceu 9,8%, porém

a Fiat só emplacou 2,4% veículos a mais do que em 2003.

Em 2005, a montadora inovou apresentando o primeiro motor 1.0 flex do

Brasil, presente agora no Uno e no Palio. Com isso, aumentou a participação no

principal mercado nacional – o de carros populares. A empresa bate a marca da

indústria automobilística com 2,5 milhões de veículos exportados para mais de 100

países nesse ano, mesmo com as exportações prejudicadas com a valorização do

real ante o dólar. As vendas resultaram em lucro de 511,2 milhões de reais e,

mesmo com o foco da liderança em resultados, a Fiat voltou a ser a líder em vendas

– posto mantido até o momento atual.

O ano de 2006 fica na história da empresa pelos grandes investimentos na

elaboração do primeiro carro-conceito nacional da montadora, o Fiat Concept Car I

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(FCC I), cujas inovações foram usadas em diversos modelos de linha.

Compartilhando a tendência das outras grandes montadoras, a Fiat desenvolve o

Pálio elétrico, porém sem colocá-lo na linha de produção. Cerca de 20% da

produção total da fábrica foi destinada ao exterior.

Em 2007, pesquisa interna de satisfação mostrou que a empresa precisava

focar nos funcionários, que estavam com alto grau de insatisfação. Foi elaborado um

plano de retenção de talentos e revistos vários procedimentos ortodoxos que ainda

eram fortemente orientados pela cultura da matriz. Comercialmente, a empresa

viveu nesse ano seu melhor momento no Brasil até então, com recorde de produção

e emplacamento. Acompanhando crescimento do PIB de 6,1%, o lucro líquido mais

do que dobrou em relação ao ano anterior. Outros indicadores financeiros

mostravam que a busca por liderança em resultados estava dando certo, como o

Return On Investment (ROI), que cresceu de 29% para 59%, por exemplo. A Fiat foi

considerada novamente a Montadora do Ano e a Melhor Empresa no ranking das

Melhores e Maiores da revista Exame. A empresa lançou também o primeiro motor

tetrafuel do mundo: gasolina brasileira; gasolina pura, usada em países do Mercosul;

álcool hidratado; e Gás Natural Veicular (GNV).

O ano de 2008 será lembrado globalmente como um período de crise e

incertezas, processo desencadeado com a falência de instituições financeiras

internacionais, como o Lehman Brothers. No Brasil, imediatamente após a falência

do banco americano, seguindo o “tsunami financeiro global”, houve retração na

oferta de crédito, e as famílias e empresas postergaram planos de consumo. Um dos

principais setores afetados foi o automobilístico. O setor presenciou queda imediata

de mais de 40% nas vendas; e com isso a Fiat, para evitar um processo de

demissão em massa, preferiu dar férias coletivas até a redução dos estoques.

Como forma de contornar tal cenário, o governo e o BCB elaboraram um

plano com medidas macroeconômicas anticíclicas, dentre elas novas maneiras de

lançar moeda no mercado e estimular o consumo. O governo reduziu a taxa básica

de juros (Selic) e intensificou medidas de oferta de crédito. Com foco na indústria

automotiva, e incentivado pelo lobby do setor, o ministro da economia anunciou forte

redução do IPI na venda de automóveis. A Fiat foi a primeira montadora a conseguir

ajustar os preços ao novo cenário tributário, o que incentivou fortemente as vendas.

Foi listada entre “As empresas que mais respeitam o consumidor no Brasil” pela

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revista Consumidor Moderno e liderou o ranking de Responsabilidade Social e

Ambiental pela revista Época Negócios.

Em janeiro de 2009, a Fiat cancelou as férias coletivas e retomou o ritmo

normal de produção. Em junho, a Fiat internacional e a Chrysler anunciam uma

grande parceria, que buscava reforçar a consolidação global e melhorar custos com

escala, algo imprescindível no setor automotivo. A Fiat, que inicialmente adquiriu

20% das ações da montadora americana, teria o direito de aumentar a participação

ao longo dos próximos anos. Um dos objetivos da empresa era diversificar o

portfólio, incluindo a fabricação de veículos SUVs (utilitários esportivos) com o logo

da Fiat. O ano também foi de inovação no Brasil, com o portal do carro MIO – o

primeiro conceito de criação coletiva mundial, plataforma aberta que utiliza licenças

do Creative Commons. Entre agosto de 2009 e outubro de 2010, mais de 2 milhões

de pessoas de 160 países visitaram o portal e sugeriram como seria o “carro ideal”.

Com a redução do IPI vigorando até outubro, o setor bateu todos os recordes, com

quase 3 milhões de veículos fabricados. A Fiat liderou novamente o mercado

interno, comercializando 736.000 unidades. A redução do IPI foi sendo

gradativamente reduzida pelo governo entre novembro de 2009 até abril de 2010.

Em 2011, a Fiat consolidou a participação acionária na Chrysler e lançou no

Brasil o primeiro SUV, o Fiat Freemont. O carro é quase uma réplica do antigo

modelo Dodge Journey da Chrysler, porém com preço mais acessível. Essa está

sendo uma aposta da montadora em um segmento Premium, em expansão no país.

Contudo, o principal foco da Fiat está nos carros desenvolvidos de acordo

com as peculiaridades do mercado interno. Atualmente o Brasil consegue ser quase

independente em todo o processo de desenvolvimento de um projeto, com exceção

dos testes de batidas (crash tests), que ainda é preciso fazer na Itália. O polo de

desenvolvimento Giovanni Agnelli, em Betim (MG), já soma mais de 1 bilhão de reais

em investimentos desde a criação. Isso vem possibilitando inovações e criação de

novos veículos, além de pesquisas para soluções de problemas técnicos. O Centro

Estilo, por exemplo, agora permite aos engenheiros a visualização detalhada de

novos modelos sem a necessidade da fabricação de protótipos, o que gera grande

redução de custos e velocidade no lançamento de novos modelos.

Os investimentos saltaram de 170 milhões de reais em 2004 para 1,48 bilhão

de reais em 2008 e 1,3 bilhão de reais em 2009. Até 2014 estão previstos

investimentos no Brasil na ordem de 10 bilhões de reais, sendo 7 bilhões de reais no

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aumento da capacidade da fábrica de Minas Gerais, onde a previsão é aumentar a

atual capacidade de 800.000 por ano para 950.000 unidades.

Os outros 3 bilhões de reais serão investidos na construção da nova fábrica

em Pernambuco, cuja decisão foi influenciada pelos incentivos tributários ofertados

pelo governo local, além do que estará localizada ao lado de um gigantesco

empreendimento, o Complexo Industrial de Suape. A nova planta da montadora,

prevista para começar a operar em 2014, terá capacidade para produzir até 200.000

veículos por ano.

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5 ANÁLISE

Neste capítulo são analisadas as respostas da Fiat em relação aos dois

desafios de Fleck (2009) detalhados no capítulo de revisão de literatura

(empreendedorismo e navegação no ambiente) que, conforme já pontuado, estão

associados com os pilares “liderança” e “ambiente” da visão global da formação

estratégica de Mintzberg et al (2000).

Dado o foco do trabalho - a busca de evidências para tentar entender como

uma empresa desafiante (challenger) consegue migrar para a posição de liderança

de uma indústria - examinar o desafio de empreender fez-se necessário

principalmente por estar ligado à criação de valor e a visão de “opções estratégicas”

dos gestores (Mintzberg et al, 2000), além da descrição da “mão visível” do

empreendedor, de Chandler (1990). O desafio da navegação, por sua vez, está

relacionado à captura de valor, com o do uso das “respostas estratégicas” de Oliver

(1991) e é adverso ao pensamento “determinístico” da escola ambiental.

5.1 Desafio do empreendedorismo

O desafio do empreendedorismo consiste em prover, de forma contínua, o

processo de expansão e busca de oportunidades de forma regular e lucrativa. Está

relacionado com o processo de criação de valor e de gestão de riscos que venham a

impossibilitar tal crescimento (FLECK, 2009; LEPAK, SMITH, TAYLOR, 2007;

PENROSE, 1980).

No histórico da montadora Fiat no Brasil, diversas evidências sugerem que a

companhia tende a responder a esse desafio de forma consistente. Os fatos

apontam que, em quase toda a trajetória, existiram esforços de expansão e criação

de valor por parte da empresa, principalmente a partir de metas de incremento na

participação de mercado e pelo constante lançamento de produtos com

características inovadoras. Ademais, a postura ativa em relação à responsabilidade

socioambiental, principalmente nos períodos mais recentes, além de tender a

auxiliar no processo de criação de valor para a companhia, permite mitigação de

riscos pela firma.

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Infere-se que o perfil motivacional para essa característica empreendedora da

Fiat, principalmente ao tomar a decisão de crescer e se instalar no Brasil, se encaixe

no perfil híbrido (FLECK, 2009). Ao mesmo tempo em que a organização buscava

defender-se das incertezas de mercados mais maduros onde se encontrava, tinha

necessidade de expandir as capacidades produtivas, para ter ganhos operacionais

de escala e escopo. Paralelamente, havia grande conhecimento acumulado, e uma

folga (slack) sobretudo no que se refere à experiência e capacidade gerencial, que

poderiam ser transferíveis para novos mercados, como a vinda de executivos e

engenheiros para o Brasil, dando assim evidências da possibilidade de analisar esse

movimento de expansão também pela estrutura do motor do crescimento

contínuo (Figura 2.2) (FLECK, 2009; PENROSE, 1980; CHANDLER, 1977).

5.1.1 Criação de Valor

Desde a entrada, a empresa buscou criar valor a partir da oferta de produtos

com inovações e preços competitivos, além de constante revisão dos seus

processos produtivos (LEPAK, SMITH, TAYLOR, 2007). Conforme visto no Capítulo

4, e sintetizado no Quadro 5.1, raro foi o ano em que a Fiat não apresentou uma

novidade a partir de seus produtos. Desde o primeiro carro a álcool; do primeiro

computador de bordo em veículos nacionais; do carro de 1.000 cm3 (que, por sinal,

foi o responsável por a Fiat quadruplicar sua participação no mercado no início da

década de 1990); do conceito de esportividade em automóveis compactos; a

explorar o nicho de pick-ups urbanas; ao atual FCC-II, a Fiat constantemente buscou

embarcar inovações que gerassem uma percepção de melhor custo-benefício nos

clientes. Desde o fim da década de 1990, se tornou a montadora mais ativa em

lançamentos. Esses fatores foram fundamentais para a empresa destronar, em

2001, a Volkswagen do posto de líder de mercado que esta manteve por 42 anos.

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Quadro 5.1 – Evidências de inovações em produtos introduzidas pela Fiat no Brasil

Fonte: adaptado de Livro comemorativo dos trinta anos da Fiat no Brasil (FIAT 2012); REVISTAS AUTO ESPORTE e QUATRO RODAS

Essa constante busca por inovação é evidenciada em diversos discursos do

atual presidente da empresa e nas entrevistas realizadas com os funcionários

durante o processo de pesquisa.

Inovação é uma peça-chave no mundo empresarial, hoje mais do que nunca. Há dois grupos de empresas: as que inovam sempre e as que seguem as inovações dos concorrentes. As empresas que estão na liderança, que alcançam os melhores resultados e têm os melhores índices de satisfação de seus clientes são exatamente as mais inovadoras (trechos de entrevistas do presidente Belini, extraídos do livro de Tanure e Patrus, 2011, p. 71). (...) espera-se muito isso da Fiat na parte de inovação, sempre espera-se que a Fiat saia na frente com coisas inovadoras e acessíveis. Tem sido assim na história. Acho que grande parte do nosso sucesso também está nisso (E9).

O futuro vai chegar e alguém vai chegar com novidades, e não podemos deitar e ficar esperando o tempo passar e achar que, fazendo a mesma coisa, a gente vai ter sempre o mesmo resultado. Não vai ser assim. Eu

ANO MODELO INOVAÇÕES NO MERCADO BRASILEIRO

1976 147Posicionamento transversal dianteiro do motor; Coluna de direção

articulada; Pneu radial de Série1979 147 Motor a Alcool

1980 Fiorino Furgão Menor caminhão do mundo

1984 Uno Novo Conceito em Design

1985 Uno SX / Prêmio CS Computador de Bordo

1990 Uno Mille Motor 1.000 cm3

1991 Tempra Novos patamares de índices de emissão de gases poluentes

1992 Mille Eletronic Primeiro veículo Segmento "A" com versão 4 portas

1993 Tempra 16V 4 válvulas por cilindro

1994 Uno Turbo e Tempra Turbo Motor Turbo

1994 MilleSistema de pedidos "on line" nas concessionárias, para compra com

preço de fábrica1994 Mille Popular com ar-condicionado

1996 Tipo Air bag

1996 Palio Primeiro Carro Global Nacional

1996 Família PalioPrimeiro conjunto de "Família Completa" (Palio, Palio Weekend, Siena

e pick-up Strada)1996 Programa Autonomy Carros preparados de fábrica para pessoas com deficiências fisicas

1996 Palio Primeiro 1.0 com air bag e freio ABS

1999 Brava Primeiro carro brasileiro a ser comercializado pela internet

1999 Linha Adventure primeira a trazer características off-road para carros menores

1999 Marea Air Bag Lateral (Side bag)

1999 Palio Citymatic Primeiro popular com embreagem eletrônica

2000 Palio Motor Fire by Wire

2001 Doblô Primeira Multivan do Mercado

2005 Uno e Pálio Primeiro motor 1.0 Flex

2005 Idea Teto Solar SkyDome

2006 Palio Elétrico (Protótipo) Motor Elétrico

2007 Siena Tetrafuel Primeiro veículo do mundo a rodar com 4 combustíveis

2008 Uno Mille Econômetro

2009 500 Eco Drive

2009 Fiat Concept Car (FCC II) Primeiro conceito de criação coletiva mundial

PRINCIPAIS INOVAÇÕES INTRODUZIDAS PELA FIAT

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acho que a direção da nossa empresa tem isso muito claro na cabeça. Eu acho que isso é o segredo nosso: a gente fica o tempo todo pensando em o que fazer de diferente. (...) Aqui você pode ir em qualquer área, está todo mundo [pensando] “o que eu posso fazer de novo?” (...) Dificilmente você vê a Fiat parada, esperando alguma coisa acontecer (...) E, outra coisa, não pensamos só lá fora, não, pensamos muito aqui. O que a gente pode fazer para melhorar nossos processos, nossos sistemas, todos os dias (E2). (...) a gente é líder. A Fiat é líder nos últimos nove anos no mercado. Então a gente tem um share médio desses nove anos de 26,24% (...) eu falei no início que a Fiat foi a quarta marca aqui no Brasil, hoje nós temos em média 42 marcas no nosso mercado. E a gente conseguiu fazer um share em nove anos médio de 24%, quer dizer, isso é uma coisa muito diferente, a gente fica tentando através de pesquisas explicar isso, a gente não consegue muito entender o que faz a Fiat fazer isso, e a gente consegue, com os nove anos, ser líder desse mercado. Então mais ou menos hoje a Fiat, a cada quatro carros que vende no Brasil, um é da Fiat. Então um quarto dos carros vendidos no ano passado no Brasil praticamente foram da Fiat. Então, assim, é uma coisa muito poderosa, não sei se tem muita explicação. Então eu acho que uma das explicações é essa vontade que a Fiat tem, essa coisa da gente nunca querer fazer a mesma coisa, sempre inovar... (E10).

O atual polo de pesquisa e desenvolvimento, inaugurado em 2003, com

investimentos iniciais de 400 milhões de reais, permite que a empresa elabore

regionalmente novos projetos desde as etapas básicas até a construção de

protótipos completos. A sala virtual é um dos destaques do centro de

desenvolvimento. Com telão de 5,5 metros por 2,7 metros, é possível a visualização

em 3D dos novos modelos, com possibilidade de testes de componentes, cores e

versões em imagens que fazem as imagens de computadores parecerem reais.

Todo esse investimento, aliado com os bons resultados financeiros,

permitiram que hoje a Fiat do Brasil tenha maior autonomia em relação à matriz. A

partir da metade da década de 2000, empresa adotou a estratégia de local

responsiveness (SCHLIE; YIP, 2000), ou seja, a filial brasileira passou a poder

fazer ajustes em seus produtos, serviços e formas de condução dos negócios a nível

local, levando em consideração a cultura nacional e as necessidades do consumidor

brasileiro, passando a ser a montadora com a gama de automóveis mais adequada

ao mercado nacional.

Além disso, a gente tem um centro de pesquisa e desenvolvimento que fica em Betim. Para vocês terem uma ideia, a gente sempre fala aproximadamente 800 engenheiros, porque cada dia tem vaga nova para a gente, mas a gente tem hoje um número muito grande de pesquisadores dentro de Betim, que inclusive é quem construiu aí junto com o designer, que faz parte do nosso DNA, os projetos 100% desenvolvidos hoje no

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Brasil, como é o caso do Novo Uno. Então é uma criação brasileira nossa, do nosso centro de pesquisa e de todas as áreas (E10). Essa questão da personalização, inovação tecnológica que a gente trouxe para o carro (Novo Uno), que dentro do segmento dele hoje pouquíssimos têm, principalmente no Brasil. Acho que tudo isso valorizou mais e o cliente percebe, essa preocupação que a gente tem em apresentar um produto que seja de acordo com o que ele quer. (E3).

Com o primeiro carro-conceito de criação coletiva mundial, o modelo Mio, de

2009, a Fiat Brasil trouxe para o setor automobilístico mundial a experiência do

Creative Commons. Com mais de dois milhões de acessos de visitantes de mais de

160 países, a partir de um portal e com o uso de redes sociais, a Fiat buscou

entender como será o carro do futuro a partir das expectativas dos clientes. Esse

movimento não só colocou o Brasil na vanguarda do setor, mas agregou valor para a

marca, reforçando o posicionamento de empresa inovadora, atraindo muita mídia

espontânea. Essa característica da Fiat do Brasil de buscar entender o

comportamento e quais são os anseios dos consumidores, a partir de grandes

investimentos em sua área de pesquisa e de outras parcerias, como com a Cátedra

Fiat/Coppead, permite que a empresa, no Brasil, posicione sua marca como se fosse

uma “empresa regional”, conseguindo atender atualmente os mais diversos nichos

de consumidores brasileiros, porém mantendo vantagens de ser uma “empresa

global”, principalmente ao compartilhar tecnologias e conhecimento com o resto do

grupo Fiat.

Outra ação de busca de criação de valor foi através de parcerias (joint

ventures) com outras montadoras. Contudo, os resultados para a Fiat Brasil das

parcerias globais da matriz italiana com a GM (2000) e com a Chrysler (2009)

merecem análise independente, pois tiveram desfecho oposto. A primeira buscou

criar valor internamente para a empresa a partir de ganhos operacionais,

principalmente na fabricação de motores, além de criar uma defesa de mercado e

um suporte financeiro num momento de crise – surgiu assim a Worldwide

Purchasing.

Evidências apontam que no início dessa parceria, foi criado um perigoso

clima de inseguranças entre os funcionários da Fiat Brasil. De acordo com o

entrevistado E10, em reunião no escritório da GM, um executivo apresentou um

organograma da companhia americana em que aparecia a Fiat como empresa

subordinada, e não parceira. Outro entrevistado (E4) afirmou que, durante alguns

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meses, muito esforço foi desperdiçado na Fiat em campanhas de conscientização

sobre a parceria. Esse cenário era mais reflexo da fragilidade financeira da matriz do

que da filial brasileira. Porém, esse movimento estratégico possibilitou ganhos

operacionais para as duas empresas já no primeiro ano. Um fato que ajudou a

melhorar o clima interno é que, no mesmo ano, a Fiat conseguiu alcançar algo que

buscava por mais de uma década: tornar-se a líder de vendas no país.

A aquisição de ações da Chrysler, em 2009, tinha como foco redução de

custos globais de produção e ganhos de escala (CHANDLER, 1977). E também

buscava gerar valor para a marca com a diversificação do portfólio e maior

participação no mercado americano. Com o uso de plataformas e tecnologia da

Chrysler, pela primeira vez no Brasil a Fiat entraria no crescente segmento de SUVs,

onde a margem de lucro tende a ser maior, com o modelo Freemount. De acordo

com o entrevistado E7, a Fiat Brasil acredita que o movimento estratégico de

penetração nesse nicho trouxe forte ganho de imagem para todas as linhas da

empresa. Diferente da parceria com a GM, encerrada em 2005, a Fiat, que possuía

20% das ações da Chrysler, aumentou a participação para 55,8% em 2011 e, de

acordo com dados financeiros de 2011 da matriz, tal parceria tem possibilitado

resultado acima do esperado. Junto com os resultados do Brasil, o lucro do mercado

americano tem mantido as contas da matriz “no azul”, combatendo o atual cenário

de estagnação do mercado europeu.

A mudança do foco estratégico de liderança de vendas para liderança de

resultados, em 2004, possibilitou a criação de valor tanto por reverter os resultados

financeiros da empresa4, quanto por ter sido um fato gerador de grande mudança na

cultura interna. Todos os departamentos da empresa começaram a tomar decisões

ponderando o resultado financeiro, e não apenas o volume de vendas, como era

feito por muitos anos. É importante salientar que, apesar da nova postura

estratégica, a firma manteve a liderança de vendas em todos os demais anos (até o

momento desta pesquisa), exceto 2004.

Quando assumi a presidência da Fiat Automóveis, em 2004, a cultura da empresa era totalmente orientada para a liderança de mercado. Isso estava no sangue. Mas esse direcionamento estratégico estava errado naquele momento. Deixamos de almejar a obtenção dessa liderança a qualquer custo e passamos a buscar a liderança de resultados empresariais.

4 Após a mudança estratégica, o retorno sobre o Investimento (ROI) cresceu do patamar de 29% para 59% no mesmo ano.

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Queríamos ser a empresa do setor com a melhor imagem interna e externa. Com o melhor atendimento aos clientes, a melhor equação de giro de capital, o melhor resultado econômico, o melhor retorno do investimento e a melhor geração de caixa para poder investir em novos produtos, novas tecnologias e novos processos. Queríamos ter o melhor relacionamento com todos os stakeholders. (...) Ser líder de mercado era a palavra de ordem, o norte que a empresa tinha. Qualquer pensamento ou ação da empresa tinha o objetivo de vender. Havia, sim, uma cultura de qualidade e redução de custos, mas não se dava prioridade à rentabilidade e à cultura dos stakeholders (trechos de entrevistas do presidente Belini, extraídos do livro de Tanure e Patrus, 2011, p. 36). (...) não dá para a gente fazer as coisas mais do mesmo jeito, querendo ter resultados diferentes (E6).

5.1.2 Serviços empreendedores

As evidências de características empreendedoras (MINTZBERG et al, 2000;

CHANDLER, 1990) desde processo de decisão de entrada da Fiat no Brasil

permitem uma análise desses fatos à luz do referencial teórico de Penrose (1980),

no que a autora denominou de “serviços empreendedores”. Na década de 1970,

movida pela ambição de seu corpo diretor, a empresa buscou ampliar suas

oportunidades em novos mercados. Apesar de exibir importante atuação na Europa,

o mercado sul-americano era completamente desconhecido para a montadora

italiana. A Fiat mostrou versatilidade ao buscar caminhos não convencionais (ou

“receitas de bolo”) e, perante as restrições de mercado, aceitou não instalar a planta

na área de São Paulo, aceitando a parceria com o governo de Minas Gerais – o que

acabou sendo a opção mais viável naquele momento. Nesse processo de expansão,

a Fiat conseguiu acesso a recursos de diversas instâncias governamentais, dando

como garantia a criação de empregos e desenvolvendo uma região então rural. Por

fim, também mostrou capacidade de julgamento e tomada de decisão, pois, após

coletar dados de diversas fontes e stakeholders, soube ponderar os riscos e evitou

decisões perigosas, como entrar em conflito com os demais concorrentes em São

Paulo. De acordo com um executivo da empresa entrevistado para a pesquisa:

(...) existiam três grandes montadoras em São Paulo, e a Fiat veio em 1976 aqui pra Betim. Essa decisão, já desde a origem da empresa, deixou marcas muito claras de qual seria o caminho que a Fiat ia trilhar no mercado. Então, ela se distancia muito do ponto de vista de comportamento das outras três companhias desde essa origem, trilhando um caminho que seja próprio, não seja do mercado, ou seja, do ponto de vista de desenvolvimento da própria companhia internamente (E10).

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Assim, é provável que tenha acontecido o que Stinchcombe (1965 apud

ROMANELLI, 1991) denominou de “environmental imprinting”. Tanto pelas

dificuldades ambientais que tiveram que ser superadas quanto pela necessidade de

exercer ativamente estes serviços empreendedores pelos gestores da firma, que

precisaram ser inovativos e mantiveram tal característica “impressa” na organização.

A empresa manteve durante sua trajetória fortes traços de ambição e

capacidade de julgamento e tomada de decisão (PENROSE, 1980). Além da

reformulação dos processos produtivos ainda na década de 1980, uma das mais

importantes e ambiciosas decisões da empresa na década de 1990 foi o Projeto J.

Este projeto desverticalizou o processo produtivo, concentrou as compras em um

número menor de fornecedores e impulsionou a migração e criação de diversas

empresas no polo industrial de Betim, no entorno da fábrica da Fiat.

A Fiat foi uma das primeiras montadoras brasileiras a utilizar o modelo just-in-

time, ganhando competitividade com expressiva redução de custos. O fato de

comprar peças em São Paulo, transporta-las para produzir os veículos em Minas

Gerais, para voltar a vender principalmente para o sul e sudeste geravam gastos

com logística bem acima das concorrentes instaladas no ABC Paulista, mais

próximos dos grandes centros consumidores.

Em outra arriscada aposta, a Fiat diminuiu o número de fornecedores de 600

para 180, minimizando a complexidade do setor de compras, mas que por outro lado

potencializava riscos de fornecimento.

Analisada a posteriori como estratégia bem-sucedida pelos executivos da

empresa, que alegam que, além dos ganhos financeiros no processo,

compartilhados com os fornecedores, também melhorou a relação de parceria e

confiança com esses importantes stakeholders.

Diziam que eu era louco de fazer isso, porque o sistema de abastecimento no Brasil não era confiável. Mas seguimos em frente e fomos criando com os fornecedores o compromisso de alavancar a produção da Fiat. Simultaneamente, nossa participação de mercado começou a crescer. (...) Uma das causas de sucesso da mineirização foi o fato de os fornecedores crescerem com a parceria. A Fiat aumentou a participação no mercado. Os fornecedores, portanto, passaram a vender mais (trechos de entrevistas do presidente Belini, extraídos do livro de Tanure e Patrus, 2011, p. 100; 103).

Permitindo que cerca de 70% das compras sejam feitas hoje em Minas

Gerais, a estratégia de mineirização também liberou espaço físico e propiciou a

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expansão de novas linhas de montagem, aumentando a capacidade produtiva da

planta de Betim (MG), que atualmente já é a maior no mundo em capacidade

produtiva. Percebemos aqui a existência de um mecanismo de “ignição” do motor

de crescimento contínuo (FLECK, 2003), onde a folga (slack) física criada

incentivou o processo de expansão e, assim, gerando mais valor para a empresa a

partir da oportunidade do ganho de escala (PENROSE, 1980; CHANDLER, 1977) e

possibilitando a tomada da posição de liderança do setor.

Outra característica presente durante toda a jornada da Fiat Brasil é sua

distinta capacidade de obter acesso a recursos, principalmente com fontes

governamentais, como o BNDES. Desde o exemplo da década de 1970, onde quase

90% dos investimentos do setor eram relacionados a Fiat, ao mais recente regime

automotivo, do final da década de 2010, que visou estimular a criação e ampliação

de fábricas no Brasil. Apesar das principais concorrentes da Fiat terem anunciado

grandes projetos, dentre elas a Volks, que prometeu investimentos de 6,2 bilhões de

reais entre 2009 e 2014; a Ford, com 4,5 bilhões de reais entre 2010 e 2015; a GM,

com 5 bilhões de reais entre 2008 e 2012; a Toyota, com 600 milhões de reais entre

2010 e 2012; e a nova entrante, a JAC Motors, também de 600 milhões de reais

entre 2011 e 2014, para citar algumas; o maior investimento será, novamente da

Fiat, com mais de 10 bilhões de reais entre 2010 e 2014.

Dos investimentos anunciados pela montadora, 7 bilhões de reais estão

sendo destinados à ampliação e melhorias da fábrica de Minas Gerais, onde a

empresa poderá produzir anualmente 950.000 veículos em Betim, 150.000 a mais

que atualmente, e outros 3 bilhões de reais para a nova planta de Pernambuco, dos

quais 2,1 bilhões serão custeados com empréstimos de órgãos públicos.

No novo polo automotivo de Goiana, na Zona da Mata, norte do Estado de

Pernambuco, a Fiat deverá produzir 200.000 veículos por ano e empregar 7.000

pessoas durante as obras, gerando, depois de pronta, 4.500 postos de trabalho

permanentes na região. As primeiras contratações foram em dezembro de 2011, que

contou com grande cerimônia e a presença dos executivos da Fiat, importantes

políticos, além de toda a mídia especializada.

Conforme visto, repetindo o cenário do período da entrada no Brasil, mesmo

com muitos outros players no mercado, atualmente a Fiat continua sendo a empresa

que mais investe no setor automotivo nacional. Os resultados desses investimentos

são lucros que, parcialmente enviados para a matriz italiana, estão sendo capazes

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de reverter constantes resultados negativos em outros países. Esse fluxo financeiro

positivo vem gerado constantes elogios do presidente mundial, Sergio Marchionne,

aos executivos brasileiros. Um reflexo desses investimentos é a consolidação da

Fiat, nos últimos dez anos, como líder de mercado, principalmente pelo volume de

venda do carros populares. Apenas como referência, a fábrica em Betim (MG)

produz atualmente5 três veículos por minuto, dentre quinze modelos em mais de

cinquenta versões. Para o presidente da empresa é fundamental manter esse

processo de crescimento para potencializar os ganhos com escala (CHANDLER,

1977).

Contudo, é importante ressaltar que todo esse processo de crescimento da

montadora, principalmente nos últimos vinte anos, não acompanhou na mesma

proporção a demanda do mercado nacional, conforme se pode acompanhar nos

Gráficos 5.1 e 5.2, fato que pode ser usado como alerta ou um novo incentivo para

seus executivos.

Gráfico 5.1 – Quantidade de veículos vendidos pela Fiat no Brasil x total de veículos vendidos no Brasil (1976-2010)

Fonte: ANFAVEA (2011)

5 Dados do primeiro semestre de 2012

0

500.000

1.000.000

1.500.000

2.000.000

2.500.000

3.000.000

3.500.000

FIAT

VEÍCULOS NOVOS VENDIDOSNO BRASIL

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Gráfico 5.2 – Representatividade da Fiat nas vendas de veículos e comerciais leves no Brasil

(1976-2010)

Fonte: ANFAVEA (2011)

Finalizando o uso do referencial teórico de Penrose (1980) e seus serviços

empreendedores, é possível afirmar que a característica de ambição se manteve

constantemente presente na Fiat. Estar no “topo do pódio” e ser líder de vendas

nortearam as ações da empresa durante toda a década de 1990 até meados dos

anos 2000. A mesma ambição que, na gestão de Belini, a partir de 2004, buscou

conciliar crescimento com lucratividade, podendo entregar resultados para os

acionistas e gerar valor para empresa.

A versatilidade da empresa foi reforçada pela constante orientação à

inovação, lançamento de novas linhas de produtos adaptadas para o mercado

nacional e penetração em diversos segmentos. Os problemas de imagem e

aceitação dos produtos nos primeiros anos de atuação no Brasil, e a forma pela qual

a empresa revisou os processos e os produtos para responder a este desafio,

constituem exemplo de como a empresa pôde reverter grandes falhas. O processo

de criação compartilhada, com o MIO (FCC-II), é forte evidência de que a empresa

acredita no versátil processo participativo na criação dos futuros modelos. Aliada a

versatilidade, a Fiat também atesta a capacidade de julgamento e tomada de

decisão com rapidez para responder a novos cenários e pressões do mercado.

Como evidência, a palavra “agilidade” foi a característica da firma mais citada por

todos os entrevistados, conforme o exemplo:

0,00%

5,00%

10,00%

15,00%

20,00%

25,00%

30,00%

35,00%

1976 1979 1982 1985 1988 1991 1994 1997 2000 2003 2006 2009

% Fiat

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Eu acredito que o nosso grande diferencial é agilidade. A agilidade e a capacidade da gente de atender aos requisitos do cliente, seja por aspectos inovativos, por aspectos mercadológicos, por preço, por posicionamento, seja por agilidade, por produtos inovadores, com design, eu acho que é uma somatória de fatores, mas eu acho que o principal fator nosso é agilidade. Essa agilidade nossa no mercado (E7). Eu acho que esse é o segredo nosso: a gente fica o tempo todo pensando em o que fazer de diferente... dificilmente você vê a Fiat parada, esperando alguma coisa acontecer (E2).

5.1.3 Responsabilidade socioambiental como geração de valor

Apesar de o tema e as principais evidências sobre responsabilidade

socioambiental serem analisadas junto com o desafio de navegação no ambiente

dinâmico (FLECK, 2009), é preciso registrar que as ações de responsabilidade

socioambiental também ajudam no processo de criação de valor para a empresa

principalmente no que se refere à gestão de riscos; por servir como estímulo a

inovação; por possibilitarem acesso a fontes especiais de recursos; dentre outros

benefícios colhidos pela Fiat nos últimos anos.

A percepção da importância do tema Rasc tem feito a empresa investir em

tecnologias e a colocou num trilho de constante busca por inovações em produtos e

processos mais sustentáveis (SENGE; SMITH; KRUSCHWITZ, 2008).

Exemplificando, serão listadas algumas evidências da história recente da Fiat,

facilmente associadas com os principais benefícios de Rasc listados por Nidumolu,

Prahalad e Rangaswami (2009) e Lemme (2010), tais como:

• eficiência na utilização de materiais e redução dos custos operacionais e

impactos ambientais ao longo de toda a cadeia produtiva: com o desenho

ecológico de produtos, tais como o Uno Ecology, e os índices de reciclagem

da Ilha Ecológica. Além dos ganhos financeiros, a firma tem melhorado a sua

reputação.

• a Fiat já é reconhecida pela mídia especializada pela diferenciação com

produtos atrelados à rotulagem ambiental e baixo consumo de combustível.

Tanto consumidores ambientalmente conscientes ou os que simplesmente

buscam veículos mais econômicos são atraídos por esses tipos de produtos.

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• em termos de gerenciamento de riscos operacionais, a Fiat é pioneira em

certificações como ISO 14.001 e por adotar padrões europeus de emissão

desde a década de 1990. Ao se antecipar a futuras legislações ambientais

mais severas, a empresa também gerencia riscos operacionais ou outros

fatos que poderiam representar multas.

• na área de recursos humanos, os projetos de capacitação de moradores de

áreas carentes, no entorno da fábrica, são mais que um retorno para a

sociedade, são garantia de mão de obra no futuro.

• quanto ao acesso a fontes preferenciais de financiamentos, nos últimos três

anos a Fiat S.p.A. foi reconhecida tanto pela Dow Jones Sustainability World

(DJSI) quanto pela Dow Jones Sustainability Europe como referência no setor

automotivo (best-in-class), fato que, de acordo com executivos entrevistados,

vem favorecendo a empresa na hora de obter recursos mesmo em momentos

de instabilidade internacional.

Para sintetizar os fatos e dados sobre inovações introduzidas pela Fiat no

mercado nacional, além dos principais marcos da empresa, foram elaborados mapas

visuais cronológicos para cada uma das três fases da Fiat após a abertura da sua

fábrica, em 1976.

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Figura 5.1 – Mapa visual dos principais marcos e inovações do “segundo período” da Fiat Brasil

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Figura 5.2 – Mapa visual dos principais marcos e inovações do “terceiro período” da Fiat Brasil

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Figura 5.3 – Mapa visual dos principais marcos e inovações do “quarto período” da Fiat Brasil

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5.2 Desafio de navegação no ambiente dinâmico

Conforme visto no Capítulo 2, o desafio de navegação no ambiente dinâmico

está relacionado tanto ao processo de monitoramento contínuo do ambiente quanto

ao uso das devidas respostas estratégicas para garantir legitimidade organizacional

e a captura de valor (FLECK, 2009).

Recapitulando o que foi explicado no capítulo de métodos, a análise sobre o

desafio de navegação no ambiente utilizou o framework de Fleck (in print) (Quadro

2.2) para tentar caracterizar as perspectivas das condições de desenvolvimento para

a Fiat, de acordo com as categorizações dos ambientes pela sociologia

organizacional.

Inicialmente, utilizou-se a estratégia de “temporal bracketing”, ou seja, de

periodização (LANGLEY, 2007). Assim foi possível entender, a partir das evidências,

como as forças de mercado e de “não mercado” (BARON, 1995) pressionavam a

empresa em cada período estudado, e se a empresa respondia a tais pressões de

forma passiva, apenas se adaptando, ou de forma mais ativa, buscando moldar o

ambiente.

Em seguida, uma nova perspectiva é apresentada. Dessa vez, sintetizando a

análise com o apoio didático de mapas visuais, com o intuito de possibilitar ao leitor

compreender, a partir de representações gráficas, o “movimento” feito pela Fiat em

cada tipo de ambiente (de negócios, institucional e natural). Tal síntese buscou,

sempre que possível, comparar o trajeto percorrido pela Fiat com outras empresas

do setor automotivo, com o intuito de embasar a resposta e conclusão deste estudo.

O objetivo dessa estratégia de análise é tentar interpretar o processo de

transição ambiental da Fiat bem como determinar quais foram seus padrões de

resposta aos principais desafios e pressões dos ambientes. De forma geral, as

evidências sugerem que, mais do que se adequar ao ambiente, a Fiat pôde por

diversas vezes capturar valor moldando tanto o ambiente institucional quanto o de

mercado, como, por exemplo, ao atuar ativamente influenciando no processo de

formulação de leis e regulações. Os fatos mais recentes demonstram que o novo

modelo de gestão dos stakeholders da Fiat vem possibilitando a firma manter sua

legitimidade – desde as interações com acionistas, governo, demais atores da

indústria automotiva, funcionários, sociedade e meio ambiente.

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120

5.2.1 Período I – da decisão da entrada no Brasil à construção da fábrica (1970

a 1976)

Quadro 5.2 – Análise das forças do ambiente da primeira fase da Fiat Brasil

A Fiat decide, no fim da década de 1960, em meio ao aumento da

concorrência na Europa, buscar oportunidades de entrada em grandes mercados

ainda pouco explorados, mesmo que para isso tivesse de se submeter a um alto

grau de risco (PENROSE, 1980). Ao praticar o monitoramento do mercado

(scanning), a empresa percebeu no Brasil forte potencial de ganhos futuros para a

indústria automotiva. Era um país com baixa concorrência e com restrições de

importações de veículos. Os investimentos em infraestrutura possibilitavam o

crescimento do sistema rodoviário brasileiro. Aliada a isso, a política de incentivos

de créditos dados pelo governo e a grande demanda reprimida por automóveis

permitiram que a indústria automotiva crescesse a taxas de mais de 20% ao ano. O

Brasil estava no auge do “milagre econômico”, e a Fiat acreditou nessa

oportunidade.

A fazer uma análise do ambiente brasileiro, a empresa percebe que os

desafios institucionais eram, principalmente, uma potencial barreira de entrada

(PORTER, 1980), em razão do lobby feito pelas três principais montadoras aqui

instaladas. A Ford, a GM e a Volkswagen usavam todos os meios possíveis para

tentar evitar a vinda de mais uma grande concorrente para o Brasil. O receio da Fiat

era uma possível retaliação no ambiente de negócios, principalmente com ameaças

aos fornecedores de peças que dependiam do trio instalado em São Paulo. Os

Ambiente Piedoso

Ambiente Desafiador

Ambiente Inóspito

Ambiente de

Negócio

Ambiente

Institucional

Ambiente

Natural

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riscos seriam maiores principalmente caso a Fiat decidisse instalar-se no polo

automotivo de São Paulo.

Como é uma área onde o governo federal possuía grande poder, a Fiat

responde a este desafio do ambiente institucional, então inóspito para uma nova

montadora, usando a tática de manipulação por influência (OLIVER, 1991), com

aproximação de seus executivos ao governo militar e alguns outros setores políticos,

buscando acelerar o processo de aprovação da criação da fábrica no Brasil.

Porém, mesmo conseguindo aprovação para entrar no país, por pressão das

demais concorrentes já instaladas, a empresa não teve acesso à região paulista do

ABC – os municípios de Santo André, São Bernardo e São Caetano –, centro de

toda a indústria automotiva nacional. Com acordo costurado com auxílio de

membros do governo, as demais montadoras aceitaram a implantação da fábrica da

Fiat no Brasil, mas impuseram uma restrição: a empresa deveria instalar-se no

mínimo a 500 quilômetros desse epicentro industrial.

Na época, o governo de Minas Gerais, com o objetivo de desenvolver a região

metropolitana de Belo Horizonte e industrializar a região de Betim, estava disposto a

prover fortes incentivos (oferecendo o terreno e isenção de impostos) e ajudar

grandes empresas a se instalar em seu território, assim como fez com a Refinaria

Gabriel Passos (Regap), da Petrobrás, no fim da década de 1950.

A empresa sabia que o processo logístico de construção da fábrica, em uma

área com mão de obra basicamente rural e longe dos principais centros

consumidores, seria outro relevante desafio do ambiente de negócios a ser

superado. Com o uso de táticas de aceitação por conformidade e compromisso por

balanceamento (OLIVER, 1991), a empresa concordou em se instalar na área de

Betim e se comprometeu com o governo mineiro em capacitar a mão de obra local,

que viria depois a se tornar recursos humanos da fábrica.

A Fiat precisou criar “a partir do zero” toda a estratégia de relacionamento

com a cadeia de negócios. Com os fornecedores nacionais, o grande desafio foi

logístico, ao montar carros em uma área completamente rural, com baixa

infraestrutura, além das novas demandas de peças e sem noção do volume real de

vendas e aceitação dos produtos pelo mercado consumidor. Com os clientes, que

desconheciam a marca italiana, foi preciso grandes investimentos em publicidade

para apresentar a nova marca no mercado local, com apelo de inovações e preços

competitivos.

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Respondendo ao desafio de escassez de recursos humanos habilitados, boa

parte da mão de obra utilizada na construção da fábrica foi capacitada diretamente

pela Fiat e parceiros locais para assumir postos na linha de montagem. Milhares de

trabalhadores rurais, que passaram por experiência na construção civil, eram

estimulados a aprender um novo ofício, o que gerou grandes expectativas de

prosperidade e melhoria de qualidade de vida.

Todos os cargos executivos e grande parte dos cargos gerenciais foram

inicialmente ocupados por italianos. Ao aplicar conceitos de gestão utilizados na sua

matriz, ao mesmo tempo em que a empresa estimulava os funcionários a indicar

parentes e amigos para o preenchimento de posições vagas, tentando criar um clima

interno mais positivo e familiar, a firma trouxe para o interior de Minas Gerais rígidos

métodos de gestão, característicos da cultura italiana.

A empresa, que historicamente sofreu com grandes problemas sindicais na

Itália, buscou atuar neste risco desde antes do início efetivo da operação no Brasil,

investindo em programas de integração entre os funcionários, patrocínio de eventos

sociais e outras ações filantrópicas, buscando garantir um clima interno positivo e

fazer com que o funcionário se sentisse responsável pelos futuros resultados da

empresa.

As evidências apontam que essa estratégia se mostrou fundamental durante

todos os períodos seguintes, conforme foi exposto durante as entrevistas:

Falar que você trabalha na Fiat em Minas é um orgulho que você não tem ideia... quando a Fiat foi para lá, foi um período muito critico, assim, em Minas não tinha quase emprego. Então as pessoas às vezes não tinham condições de ascender socialmente porque não tinha onde trabalhar, ou iam para a mineradora, que também não eram muitas. Então quando chega uma indústria automotiva que te possibilita uma série de questões, inclusive de benefícios... dos mais simples aos mais complexos... o operador que tem benefícios desde fazer a festa de 15 anos da filha e trazer os cadetes (do Exército)... dos shows, a festa de primeiro de maio da Fiat, que é um acontecimento em Minas Gerais. É a chance que você dá para 9.000 operários, que talvez não teria condição nunca de bancar um show, porque vive num outro estado de poder, levar a família inteira. Quando faz as festas de Natal, de Dia das Crianças, casamento coletivo, estação do amor... (E6). Na década de 1970 quando a Fiat se instalou em Betim, ela teve um pilar importante de envolvimento da comunidade local para a própria implantação da fábrica e para os primeiros trabalhadores que aqui vieram. Então uma questão de inclusão social por meio efetivamente do emprego, mas no que se relacionava a temas mais amplos como educação, cultura e envolvimento comunitário geral, ela ficava ainda, como era realmente um padrão na época, muito vinculada a ações pontuais de atuação. Então eram patrocínios, apoios, muitas doações, muitas ações completamente filantrópicas, que caracterizavam mesmo a participação empresarial na vida

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comunitária naquelas décadas. Então no final de década de 1970 e na década de 1980 se caracterizou muito a vivência da Fiat dentro desse panorama (E4).

Com isso, percebe-se que, mesmo em um curto período de tempo, e ainda

sem ter iniciado as atividades em solo brasileiro, a Fiat usou diversas táticas de

respostas para garantir a sua existência, transpondo as barreiras de ambientes

inóspitos, tornando-se a principal desafiante (challenger) do setor:

Então vamos falar um pouquinho da Fiat, como uma história meio pioneira que começou no momento em que a Fiat escolheu ir para Minas Gerais. Nós estamos fazendo 35 anos de Fiat no Brasil neste ano (2011), e era um momento que não era nunca esperado, a Fiat ia para Minas, todas as indústrias de automóveis estavam em São Paulo. Então assim, só aquilo ali já foi um desafio, instalar, fazer um movimento ao contrário do que era esperado, e naquela época não se esperava mais uma marca, eram as três marcas, a Volks, a GM e a Ford. Não tinha essa ideia, e ainda vem uma outra marca que não era esperada nem conhecida na época, e ainda vai para Minas. Então quer dizer, aí já começou uma história diferente (E10).

Em relação à Rasc, é possível categorizar a Fiat no estágio compliance, de

acordo com Nidumolu, Prahalad e Rangaswami (2009).

A empresa assegurou que estaria dentro dos padrões legais, e ainda inovou

e se antecipou como a primeira montadora a utilizar o conceito de garden building

(conceito onde, em cima da edificação, é construído um jardim), o que gera

benefícios de economia de energia, pois necessita menor esforço de resfriamento da

área interna, além de capturar parte das emissões de CO2 da produção.

(...) acho que assim, não sei se eu posso usar a palavra atitude ou a palavra ações, é lógico que isso já permeou desde o início da empresa. Se a gente for pensar no projeto da Fiat em 1976 já trabalhar com a ideia de garden building do ponto de vista pra 1976, isso era “ultra guarda”. Se a gente for pegar o rumo da história, a Fiat fez um trabalho junto com a comunidade desde os seus primórdios, a partir do momento que ela pegou Betim, que era uma cidade satélite de Belo Horizonte, pequena e hoje, se eu não me engano, é a terceira cidade em população de Minas Gerais. É um crescimento grande (E10).

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Quadro 5.3 – Principais desafios e pressões da primeira fase da Fiat Brasil

5.2.2 Período II – do início da produção ao fim da “década perdida” (1976-1989)

Quadro 5.4 – Análise das forças do ambiente da segunda fase da Fiat Brasil

As evidências indicam que essa fase da trajetória da Fiat Brasil é marcada por

ambientes desafiadores tanto na arena de negócios, quanto institucionalmente. O

ambiente natural, por sua vez, permanecia piedoso.

Muito embora o ambiente de negócios pareça ter sido piedoso e pouco

punitivo com as ineficiências das montadoras, dado que o país estava “fechado”

para concorrentes externos e que as opções de escolha dificilmente fugiam do grupo

oligopolista, os fatos analisados apontam que, para todo o setor, foram grandes as

Ambiente Piedoso

Ambiente Desafiador

Ambiente Inóspito

Ambiente de

Negócio

Mercado automotivo em forte expansão, porém oligopolizado por apenas 3 montadoras;

Total inexistência de fornecedores e mão de obra especializada na região de Betim; Área rural e isolada para a implantação da fábrica; Péssima estrutura logística; Dificuldade de recebimento de peças; Longe dos centros consumidores Desconhecimento da marca pelo mercado consumidor

Ambiente

Institucional

Milagre econômico; Lobby das 3 grandes montadoras, tanto com o governo, quanto com os fornecedores;

Ambiente

Natural

Pouca ou nenhuma pressão ambiental

Ambiente Piedoso

Ambiente Desafiador

Ambiente Inóspito

Ambiente de

Negócio

Ambiente

Institucional

Ambiente

Natural

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pressões durante a “década perdida”. Pelo lado institucional, a crise do petróleo

persistia. A situação econômica com uma inflação galopante inviabilizava grandes

investimentos em praticamente todos os setores. Politicamente, a transição da

ditadura militar para a redemocratização gerava esperanças, mas com inseguranças

e incertezas.

Nessa fase, o padrão de respostas da Fiat para as pressões do ambiente foi,

principalmente, com o uso de técnicas de aceitação por conformidade e amortização

para as pressões institucionais, dado que dificilmente a firma conseguiria ter poder

de modificar ou moldar essas forças; e estratégias de desafio (defiance) e

compromisso para o ambiente de negócios (OLIVER, 1991).

O fato de a Fiat ter aceitado instalar-se em Minas Gerais, longe do ABC

paulista, com todas as dificuldades logísticas que a empresa teve que enfrentar, foi

uma demonstração de como uma empresa pode reverter um fator que potencializou

o ambiente de negócios ser considerado inóspito no período anterior para se

fortalecer e pavimentar o caminho para a liderança do setor. Com o fato da distância

física, além das poucas opções de mobilidade de emprego para os funcionários,

obviamente, a firma conseguiu neutralizar os riscos da grande “ameaça sindical”, e

não teve um dia sequer de paralisação, mantendo a produção, enquanto as demais

montadoras sofriam com as temidas greves dos metalúrgicos entre 1978 e 1980.

(...) a Fiat foi muito feliz em escolher Betim, escolher Minas, ali não é um polo industrial, você vê que o polo industrial que se fez em Betim foi em função da Fiat... são nossos fornecedores. Então, se você falar, nós estamos num ambiente muito privilegiado, diferente de São Paulo, que tem mil empresas e mil possibilidades de emprego e as pessoas se movimentam muito mais, além dos problemas com os sindicatos (E6). (...) essa decisão, já desde a origem da empresa, ela deixou marcas muito claras de qual seria o caminho que a Fiat ia trilhar no mercado. Então, ela se distancia muito do ponto de vista de comportamento dessas outras 3 companhias desde dessa origem, trilhando um caminho que seja próprio, não seja do mercado, ou seja, do ponto de vista de desenvolvimento da própria companhia internamente (E10)

Contudo, pouco após o início das operações no Brasil, a empresa já enfrentava o

que seria a principal pressão no período: o forte descontentamento dos clientes com

os produtos. Apesar de a produção inicial do principal carro da montadora na época,

o Fiat 147, ter sido três vezes maior do que o planejado inicialmente, e com isso a

empresa tenha saído de 0% para 12% de participação de mercado em menos de

dois anos, pesquisa feita pela empresa registrou que os consumidores se frustraram

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com a qualidade dos veículos. Mesmo com as inovações de mecânica e o motor a

álcool, uma esperança para gerar economia nos gastos com combustível durante a

crise do petróleo, a baixa qualidade percebida no produto e o preço acima do

principal concorrente (o Fusca, da Volkswagen) fizeram a nova marca ser mal

recebida pelo público. Os consumidores não tiveram as suas expectativas atendidas,

o que colocou em sério risco a sobrevivência da montadora. Para responder a esta

pressão, a Fiat tentou ajustar os principais problemas no modelo 147, buscando

minimizar o desconforto dos clientes e atender às expectativas do consumidores

para manter sua legitimidade, estratégia que pode ser categorizada como

pacificação (OLIVER, 1991).

O ambiente se tornou ainda mais desafiador com a redução brusca da expansão

do setor, devido ao cenário econômico recessivo que acabara de iniciar-se,

deixando ainda mais desafiador o ambiente de negócios. Em 1981, o PIB real cai

4,3%, o PIB da indústria 8,8% e as vendas de automóveis despencam 43,5%.

Precisando reaver parte do grande investimento feito na nova planta, a Fiat

buscou formas de responder aos mecanismos de punição do mercado, e a principal

estratégia foi trazer para a planta nacional a produção do primeiro carro mundial da

montadora: o Uno, lançado em 1983. Com o objetivo de replicar o sucesso que o

modelo teve na Itália, a filial brasileira apresentou, em agosto de 1984, as três

versões nacionais para o Uno (S, CS e SX), com três motores (1050 a gasolina,

1300 a álcool e gasolina e 1300 com carburador duplo). Como parte da estratégia, a

Fiat reposicionou o modelo 147, barateando seu preço para poder disputar no

mercado de carros mais básicos, principalmente combatendo o Fusca, da VW.

Desse modo, a Fiat posicionou o Uno como um modelo acima do 147, e o

anunciou com propagandas que exaltavam os “modernos conceitos de estilo,

esportividade e economia”. De acordo com uma entrevista de Silvano Valentino,

Superintendente da Fiat do Brasil nessa época: “O ideal seria que o Uno não tivesse

nem mesmo o espelho retrovisor externo, pois nossa intenção é de que ele ofereça

a menor resistência possível ao ar e corra com a mesma facilidade de uma faca

quente cortando sorvete”. (NOTTOLI, 1995).

O Uno buscava ser um carro pequeno e compacto, porém com inovações

tecnológicas e de equipamentos, mas se mantendo como opção econômica no

preço final e no consumo. Nos primeiros meses, mesmo sendo recebido com certa

desconfiança, o modelo apresentou elevado volume de vendas e também ganhou o

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título de Carro do Ano no Brasil – além do apelido de “botinha ortopédica” entre os

consumidores, devido ao seu design. Contudo, a Fiat voltou a receber fortes

pressões do ambiente de negócios, com muitas reclamações em relação à

qualidade do produto, o que gerou novo declínio de vendas no mercado interno.

Conforme visto no Capítulo 4, a demanda nacional total de veículos durante

esse período ficou bem abaixo da registrada década de 1970, o que não permitia

manutenção da escala mínima de produção para quatro grandes montadoras. A

solução encontrada pela Fiat foi tornar o Brasil como plataforma de exportação,

tornando-se, proporcionalmente, a maior exportadora do setor, chegando a enviar

para outros mercados 63% de toda sua produção de 1987. Determinados modelos,

como o Uno, um “carro mundial”, tinham mais da metade da produção destinada ao

mercado externo, principalmente para a os Estados Unidos e Itália. É importante

registrar que os modelos de exportação eram adaptados para mercados mais

maduros e exigentes, principalmente para poder ser vendidos em países com

normas de segurança mais rigorosas.

Durante a década de 1980, a demanda por carros menores, que

representavam 62% das vendas até 1979, foi sendo abandonada em prol da nova

preferência do mercado consumidor: carros de maior cilindrada. Assim, os veículos

menores tiveram a representatividade reduzida para 41% do mercado em 1987,

enquanto os veículos mais potentes tiveram a participação ampliada de 8% para

26% no mesmo período. Porém a Fiat, novamente em uma estratégia de desafio

(OLIVER, 1991) e “apostou” diferente do resto da indústria e manteve seu foco em

modelos menores e de baixa cilindrada, como o Uno e suas variações.

Para resolver os sucessivos problemas de aceitação dos seus produtos,

principalmente pelas queixas em relação a qualidade, a empresa buscou responder

a esta pressão com uma profunda reformulação dos seus produtos, processos

produtivos, como o investimento em um novo e moderno sistema de soldagem, e no

relacionamento com os fornecedores. Desta vez, a empresa decidiu incluir nos

projetos boa parte da cadeia de negócios. A ação de trazer representantes dos

fornecedores e das concessionárias para colaborar nos debates estratégicos e na

busca de resolução de problemas, além de estreitar os relacionamentos e aumentar

o grau de parceria com os stakeholders, permitiu à empresa identificar de forma

mais rápida e resolver grande parte dos problemas de qualidade dos seus produtos.

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Como um dos assets mais importantes para as firmas é a reputação (BARON,

1995), a Fiat entendia que precisava mudar a má percepção sobre sua marca e seus

produtos. Além de carros com melhor qualidade, apresentou um novo slogan:

“Mudando para você mudar”. Conforme Nottoli (1995), após essas ações, o índice

de rejeição da marca caiu de 70% para menos de 40% em menos de dois anos.

Quadro 5.5 – Principais desafios e pressões da segunda fase da Fiat Brasil

5.2.3 Período III – Da abertura do mercado à liderança de vendas (1990-2003)

Quadro 5.6 – Análise das forças do ambiente da terceira fase da Fiat Brasil

O terceiro período analisado, que vai da abertura do mercado, em 1990, até o

ano de 2003, também pode ser descrito como desafiador, tanto no ambiente

institucional, quanto de negócios, porém por razões diferentes do ciclo anterior. Na

Ambiente Piedoso

Ambiente Desafiador

Ambiente Inóspito

Ambiente de

Negócio

Estar situada longe do ABC e não sofrer com as greves ou demais pressões sindicais;

Forte descontentamento dos clientes com os produtos; Imagem desgastada; Dificuldades logísticas de recebimento de peças e escoamento dos produtos; Necessidade de reformular os produtos e processos produtivos;

Ambiente

Institucional

Mercado “fechado” para importações Grandes incertezas políticas Crise do petróleo; Inflação galopante; Mercado interno em forte estagnação; Redução brusca das vendas do setor;

Ambiente

Natural

Pouca ou nenhuma pressão ambiental

Ambiente Piedoso

Ambiente Desafiador

Ambiente Inóspito

Ambiente de

Negócio

Ambiente

Institucional

Ambiente

Natural

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arena de negócios, além das pressões geradas com a abertura do mercado, a Fiat

ainda sentia os reflexos dos problemas com a sua imagem e entendia que precisava

reverter definitivamente esse quadro. Somava-se a isso a necessidade de reduzir

seus custos e ganhar mais competitividade. No ambiente institucional, o novo

cenário macroeconômico e as decisões do governo continuaram sendo grandes

“modeladores” do setor. As novas leis, a abertura do mercado, as regulamentações

e acordos automotivos viriam modificar completamente a dinâmica da indústria

automotiva nacional, tornando fundamental para a Fiat o uso de grande leque de

respostas estratégicas para atacar tais desafios e capturar valor nesse ambiente,

buscando manter sua legitimidade e sustentar seu processo de crescimento

alcançando nesse período, a tão desejada liderança de mercado.

Com a eleição de Fernando Collor de Melo para presidente do Brasil em 1989

e as medidas dos planos econômicos de combate à inflação, como o congelamento

das cadernetas de poupança, o cenário econômico nacional tornou-se recessivo.

Conforme visto no Capítulo 4, buscando estimular a indústria automotiva nacional,

em 27 de junho de 1990, é publicado o Decreto nº 99.349, que reduziu o IPI dos

veículos até 1.000 cm³ para 20%, enquanto as demais tarifas giravam entre 37% e

42%.

Diversos jornalistas e analistas do setor automotivo, como Carlos Mauricio

Farjoun e Eduardo Hiroshi, para citar alguns, acreditam que esse decreto foi

“encomendado” via lobby pela montadora italiana ao governo Collor, embora não

existam provas dessa ação. Se verdadeira, poderia ser analisada como um bem-

sucedido caso do uso de estratégias de manipulação (OLIVER, 1991), em que as

implicações dessa influência no ambiente institucional não só moldaram todo o

ambiente de negócios, como pode ser considerado dentre os principais eventos que

mudariam a trajetória de crescimento da Fiat e de toda indústria automotiva no

Brasil.

Analisando as evidências para tentar comprovar esta hipótese, percebe-se

que, no momento deste decreto, nenhum outro fabricante produzia veículos de 1.000

cm3, ou similares, exceto a Fiat, que já fabricava o Uno com motor de 994 cm3 para

exportação, além de outras versões deste modelo e do Fiat 147 com 1.050 cm³, já

negociados no Brasil. Após o anúncio da equipe econômica de Collor, em menos de

dois meses a Fiat apresentou para o mercado o Uno Mille, que teve seu motor de

1.050 cm³ convertido para 1.000 cm³ sem precisar de grandes investimentos ou

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inovações tecnológicas, apenas de ajustes em regulagens de determinados

componentes.

Por outro lado, todos os demais concorrentes só conseguiram apresentar os

modelos 1.0 no mínimo dois anos depois, em 1992 – a Volks com o Gol 1.0 e a GM

com o Chevette Júnior. A Ford, por exemplo, só foi capaz de finalizar um modelo

com a cubagem beneficiada pelo decreto em 1993, com o Escort Hobby. As demais

montadoras, além de precisarem iniciar todo processo de desenvolvimento de um

novo tipo de motor, necessitaram efetuar e testar diversas modificações estruturais

nos modelos, pois eram veículos mais pesados, o que demandou muito tempo e

investimentos. Mesmo com essa defasagem temporal, nenhum dos modelos iniciais

dos concorrentes conseguia superar a relação peso e potência do Uno, e sempre

perdiam em consumo e aerodinâmica. Somente em 1994, o Mille efetivamente

ganhou um concorrente no quesito custo-benefício, com a chegada do Chevrolet

Corsa Wind, da GM. Estava inaugurado assim o chamado mercado de “carros

populares”, que, em 1994, já representava 40% do total de veículos vendidos no

Brasil.

Com tais vantagens competitivas, entre 1990 e 1994, o Uno Mille elevou-se

de quarto para primeiro lugar no ranking de modelos mais vendidos. Independente

de ter havido ou não o uso de lobby, o fato é que a Fiat cresceu nesses quatro anos

o que não tinha conseguido nos catorze anos anteriores. Sua participação (market-

share) saltou de 11,5% em 1989 para 28,7% em 1994, em um mercado em pleno

crescimento, com as suas vendas reais aumentando mais de 500%.

As vendas do setor demonstram que as ações institucionais do acordo

automotivo de 1992 entre as montadoras, governo e sindicatos, funcionaram

impulsionando ainda mais a demanda que estava reprimida e investimentos de

todos os players. Monitorando o crescimento na importação de veículos de luxo, a

Fiat percebeu uma oportunidade de mercado e buscou diversificar seu portfólio e

responder a uma demanda por carros com mais componentes eletrônicos e apelo

esportivo e, em 1993, apresentou o Tempra. Com este modelo, a empresa introduziu

no mercado brasileiro o primeiro veículo nacional com índices de emissão de

poluentes inferiores ao exigido pela legislação local.

Não foi possível obter evidências se foram os debates sobre sustentabilidade

durante a ECO 92 os motivadores para a implantação da Ilha Ecológica, em 1994.

Contudo, este foi o primeiro passo de um grande projeto que viria a tornar referência

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em sustentabilidade ambiental no setor automotivo nacional, permitindo a Fiat ser a

primeira empresa no Brasil certificação ambiental ISO 14.001, ainda na década de

1990. Mesmo sendo um projeto isolado no momento da criação, foi um exemplo de

resposta ativa da empresa, que, por motivação compreensiva (PAULARJ, 2009 apud

FLECK, 2010) – ou seja, sem pressões governamentais ou de legislações - ,

adaptou seu parque produtivo para garantir reutilização e reciclagem do máximo

possível de matéria-prima.

A Ilha ecológica gera até hoje benefícios para a Fiat, seja com a redução na

geração de resíduos, seja no gerenciamento de riscos operacionais que poderiam

gerar multas para a empresa (PRAHALAD; RANGASWAMI, 2009; LEMME, 2010;

FLECK, 2010).

Eu vejo que o setor automotivo, ainda, como grande base, ele está sendo muito reativo às questões compulsórias do governo e sociedade, assim como a maioria dos setores de indústria. Ninguém está fazendo efetivamente alguma coisa diferente pensando assim: “Não, eu tenho que fazer diferente por uma questão maior que é a segurança ambiental do planeta”. Eu colocaria nesses termos. Não vejo ainda ninguém (além da Fiat) que está realmente preocupado com o fato. (...) Na minha percepção, a indústria automotiva, no geral, é reativa, como todas as demais indústrias também são. E nós (Fiat) sempre estamos querendo fazer alguma coisa diferente (E1).

Todavia, mesmo com o ganho de market share e diversificação da linha de

produtos, a “imagem da marca” e a reputação da qualidade dos produtos ainda era

frágil no mercado consumidor interno. Assim, para conseguir investir em qualidade e

ganhar mais competitividade, precisou tomar decisões estratégicas mais arriscadas.

Alguns dos problemas eram a logística de abastecimento de peças e um

gargalo físico na sua planta, que impedia maiores ganhos de escala. Para resolver

ambas as questões, os executivos decidiram “mineirizar” a produção. Surgia ai o

Projeto J, descrito no capitulo 4 e na análise do desafio de empreendedorismo.

Contudo, tal projeto merece uma atenção especial nessa análise sobre o

desafio de navegação, pois além dos seus resultados no aumento da produtividade

e competitividade, foi um importante passo para a Fiat estreitar os laços com um

relevante stakeholder: o fornecedor. Com o correto uso de estratégias de

compromisso por balanceamento (OLIVER, 1991), os gestores da Fiat conseguiram

convencer seus principais fornecedores a efetuar grandes investimentos no polo

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industrial de Betim, mesmo quando a montadora não era a líder em vendas e sem

uma escala – naquele momento - que validasse o retorno dos investimentos.

O compromisso firmado era que, de acordo com estudos e projeções feitas

pela montadora, o retorno dos investimentos iria vir junto com o aumento da

competitividade da Fiat. A expectativa era de aumento no volume de compras de

peças, e de concentração das compras nesses fornecedores parceiros.

No início foi difícil, ninguém acreditava (...) pouco a pouco, as empresas passaram a acreditar em nós e ir para Belo Horizonte, Betim e outros municípios vizinhos (...) começamos com 600 fornecedores e reduzimos para cerca de 180. A estratégia era “enxugar” para dar escala, competitividade aos fornecedores qualificados (trechos de entrevistas do presidente Belini, extraídos do livro de Tanure e Patrus, 2011, p. 101).

Esse capítulo na história da Fiat também é visto pelos gestores como um

ponto de inflexão na maneira de se relacionar com os fornecedores. O

estabelecimento de parcerias gerou um clima de “ganha-ganha”, diferente das

disputas comerciais que aconteciam até então, em que, além do desgaste no

relacionamento, perdia-se tempo e oportunidades. Dessa forma, a firma reduziu

algumas das principais pressões do ambiente de negócio, e o parque que tinha sido

construído para produzir 500 carros por dia, em 1976, poderia chegar até 3.000

veículos, gerando ganhos de escala de produção (CHANDLER, 1977), fundamentais

nesta indústria.

A empresa entendia que também precisava responder às constantes críticas

e pressões dos consumidores quanto à qualidade dos veículos produzidos. Um alvo

recorrente era o sistema de suspensão dos veículos importados da Itália, que não

eram perfeitamente adaptados ao cenário brasileiro, de pistas irregulares. Ademais,

como já citado, o crescente volume de importações, estimulado pelo regime de

paridade cambial e estabilização da economia, elevou ainda mais a exigência por

produtos de qualidade. Usando o que Oliver (1991) denominou de estratégia de

compromisso por pacificação (pacify), a Fiat passou a fazer mais ajustes em seus

produtos, tendo em consideração as características das nossas ruas e estradas e

das necessidades do consumidor brasileiro.

Com os investimentos feitos para ampliar a capacidade da planta, a empresa,

em 1996, move-se estrategicamente para a produção do primeiro carro global

lançado e fabricado no Brasil, dessa vez com desenvolvimento em parceria entre o

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centro de design do Brasil e da Itália. Foi um dos passos mais importantes para o

Centro Estilo nacional. O modelo Palio significaria um ponto especial na história da

Fiat, pois, além de tentar responder às principais críticas feitas ao Uno (design,

qualidade e conforto), colocava o Brasil como fundamental plataforma de exportação

para novos mercados, principalmente os emergentes na América Latina, países

africanos e alguns membros do Leste europeu. Essa tática daria melhores condições

para a empresa se antecipar e prevenir de potenciais crises internas.

A empresa dava novos passos na busca de se diferenciar dos demais

concorrentes em relação a projetos de cunho de responsabilidade sociais, e

apresentou o primeiro carro nacional preparado de fábrica para pessoas com

necessidades especiais (programa Autonomy). Na década de 1990, a Fiat amplificou

sua atuação em programas de filantropias e patrocínios culturais. Um exemplo é o

projeto Recofia, uma parceria com as concessionárias do Rio de Janeiro para a

formação, em comunidades carentes, de mão de obra especializada em tecnologia

automotiva. Em 1998, a Fiat implantou o programa Esportista Cidadão, em Minas

Gerais, também com foco filantrópico para a população de um bairro carente de Belo

Horizonte.

As medidas do regime automotivo de 1997 elevariam o patamar de desafio do

ambiente de negócios. Os US$ 18 bilhões de incentivos governamentais; a guerra

fiscal entre os Estados; as políticas de apoio à importação de bens de capital; e uma

nova redução de IPI; aliados à estabilidade econômica, trouxeram, em poucos anos,

diversos novos concorrentes relevantes para o mercado nacional, implicando

inclusive no índice de fidelização às marcas.

Com catorze novas unidades fabris criadas entre 1996 e 1990, e o início da

produção em solo nacional das principais marcas do Japão e da Franca, foi preciso

que a Fiat aumentasse o entendimento das expectativas dos múltiplos stakeholders,

principalmente os consumidores, que tinham agora opções de produtos nacionais

mais alinhadas com as tendências da indústria nos mercados mais desenvolvidos.

Em uma indústria que ficou estagnada por mais de uma década, em poucos anos os

atores descobriram que a forma de lidar com o ambiente precisaria ser diferente. A

Fiat deu continuidade ao processo de monitoramento (scanning) do mercado e,

buscando gerar e captar valor (FLECK, 2009), acelerou o processo de introdução de

inovações e novos produtos.

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Mudanças no ambiente institucional, como a deterioração da situação

macroeconômica global, com a crise da Rússia e Ásia e, internamente, com o fim do

regime de banda cambial, refletiam em maiores pressões do ambiente de negócios

no fim da década de 1990. Com a confiança dos consumidores abalada, aumentou a

taxa de inadimplência e o setor voltou a observar uma queda nos índices de vendas.

Como resposta a essas pressões, a organização foi reestruturada e a

montadora terceirizou diversas operações, com redução do quadro funcional para

menos da metade. Na linha de produção, apenas as atividades diretamente ligadas

à montagem permaneceram na empresa.

Com as demissões, outro risco potencial aparecia: insegurança e

descontentamento dos funcionários. Como resposta, a firma se fez valer de técnicas

de cooptação (OLIVER, 1991), e formalizou, pela primeira vez, o processo de

participação de representantes dos funcionários nos comitês executivos. Além disso,

buscou estimular que todos os gestores mantivessem total transparência sobre as

suas decisões, compartilhando informações de mercado e da empresa diariamente

com todos os funcionários. De acordo com os entrevistados, essas ações reverteram

o clima interno de forma positiva, além de atender às expectativas de um dos

principais stakeholders da empresa. Outra evidência do sucesso dessa tática é que,

no ano seguinte, a Fiat foi considerada “A melhor empresa para se trabalhar no

Brasil” pela revista Exame. De acordo com o superintendente da empresa da época,

Gianni Coda: “Trabalho em equipe e transparência nas informações. Esse é o nosso

segredo” (EXAME, 2000).

Uma relevante evidência do resultado positivo das ações realizadas no

decorrer da década de 1990 (o Projeto J com a ampliação da planta, com

consequente ganho de escala, operacionais e logísticos; a revisão dos processos de

produção; além da terceirização de boa parte do quadro funcional) como resposta

antecipada à pressões do ambiente, é que, diferentemente dos demais

concorrentes, a Fiat conseguiu manter o resultado financeiro positivo na crise de

1999. Com queda de 3% na produção, em frente a 16% da indústria automotiva, a

empresa passou a liderar o ranking de fabricação, com 32% do total da produção

nacional, além de ser responsável por 40% de toda a exportação de automóveis do

Brasil – resultados obtidos graças ao sucesso do Pálio, o carro global lançado três

anos antes.

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A forte influência do governo no setor foi evidenciada novamente em 1999

com os novos acordos automotivos emergenciais para combater o momento de

crise. Mais uma vez, para socorrer a indústria e incentivar as exportações e o

consumo interno, o governo federal reduziu impostos, com a contrapartida da

redução no preço final dos produtos e da manutenção do nível de emprego do setor.

Com o benefício dessa tática de compromisso (OLIVER, 1991) perante o governo, a

Fiat pôde manter seu plano de expansão.

As novas entrantes (newcomers) se tornaram uma importante pressão do

ambiente de negócio para as montadoras tradicionais, agora já com a Fiat inclusa

nesse grupo, que em menos de três anos perderam juntas mais de 10% de

participação de mercado.

Uma curiosa análise é que, assim como no início dos anos 1980, o fato de a

Fiat estar instalada em Betim (MG), a firma não foi afetada pelos novos movimentos

sindicais. Enquanto as fábricas da região do ABC, em São Paulo, pararam por uma

semana em setembro de 2001, a Fiat não teve sua produção interrompida. Outro

fator relacionado é que, em Betim o custo da mão de obra era bem mais em conta

do que no ABC, gerando vantagens de custo para a Fiat.

O direcionamento estratégico da Fiat, em resposta a essa perda de mercado,

foi buscar implacavelmente a meta de “liderança de vendas”, independente dos

resultados financeiros. De acordo com relatos de um entrevistado, “a busca da

liderança em vendas se tornou quase uma neurose internamente” (E4). Todos os

níveis da empresa acompanhavam diariamente o ranking de vendas interno,

informado pela Anfavea.

Essa preocupação excessiva com um objetivo único (ser líder de vendas),

dificultava a consideração de outros fatores ou possibilidades estratégicas nas

decisões da corporação. A Fiat arriscava sua sobrevivência ao embarcar então em

uma potencial “síndrome da simplicidade” (MILLER, 1993; FLECK, 2010). Embora

em 2001 a Fiat tenha atingido a tão perseguida meta, derrubando a Volks do posto

de líder de vendas depois de mais de 42 anos, esse resultado foi acompanhado de

amargos efeitos colaterais, como a queda da lucratividade, mesmo com aumento

nas vendas.

Contudo, no mesmo período em que perseguia a meta de liderança de

vendas, a Fiat intensificava o processo de busca de manutenção de legitimidade

perante alguns stakeholders-chave. Aumentava o entendimento dentro da Fiat que

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futuras ameaças no ambiente natural ou institucional, como legislações ambientais

mais rigorosas, precisavam ser direcionadas internamente. Mesmo que ainda em

frentes não unificadas, surgiam novos projetos com finalidades de responsabilidade

socioambiental.

Como visto, o governo se mantém durante todo o período como uma das

principais forças ambientais na indústria automotiva brasileira. E um dos principais

instrumentos utilizados por este stakeholder para manipular e influenciar, e até

mesmo mudar o cenário competitivo da indústria são as políticas de alíquotas

tributárias. Em 2002, além de reduzir o IPI para carros entre 1.000 e 2.000

cilindradas como forma de balancear o nível de consumo de carros populares (que

representavam 71% das vendas desse ano) e veículos médios, o governo incentivou

os fabricantes a desenvolver veículos bicombustíveis, os “flex”, então inexistentes.

Os objetivos do governo eram diminuir a dependência de petróleo, estimular a

indústria sucroalcooleira e, paralelamente, possibilitar maior poder de decisão na

hora do consumidor abastecer o veículo.

Em uma corrida contra o relógio, as grandes montadoras responderam ao

novo desafio e, em aproximadamente oito meses, a Volkswagen saía na frente com

o Gol 1.6 Total Flex. Sem a mesma agilidade percebida em eventos anteriores, a

Fiat apresentou somente dois meses depois da sua principal rival os seus modelos

com o motor flex fabricado em conjunto com a montadora americana GM, com a

qual ainda mantinha parceria. Materializando a significância dessa medida do

governo, em um ano os motores flex já representavam 22% das vendas internas de

veículos leves e, em dois anos, mais de 50%.

A Fiat manteve o posto de montadora líder em vendas entre 2001 e 2003.

Contudo, como manter esse posto era o foco dos executivos da época, a Fiat

começou a, praticamente, “pagar para vender”. O principal efeito foi um declínio

financeiro e prejuízos de mais de R$ 280 milhões em 2003.

Globalmente, a matriz continuava apresentando péssimos resultados

financeiros, e alguns acionistas cogitavam exercer o direito de venda para a GM.

Todos esses fatores geravam mais pressão sobre a Fiat do Brasil.

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Quadro 5.7 –- Principais desafios e pressões da terceira fase da Fiat Brasil

5.2.4 Período IV – Uma gestão brasileira e a mudança estratégica (2004-2011)

Quadro 5.8 – Análise das forças do ambiente da quarta fase da Fiat Brasil

Neste período, pode-se afirmar que a Fiat enfrentou um ambiente de negócio

desafiador. O aumento da concorrência, e a consequente pressão para reduzir o

ciclo de vida dos produtos para poder apresentar produtos mais atrativos e

competitivos para o mercado e os efeitos colaterais da busca pela liderança

acenaram para a necessidade de um novo modelo de gestão.

Ambiente Piedoso

Ambiente Desafiador

Ambiente Inóspito

Ambiente de

Negócio

Abertura do mercado e entrada de novos concorrentes; Popularização do Carro 1.0; Desvantagem operacional e necessidade de desenvolver o polo automotivo de Betim (Mineirização); Imagem da Fiat ainda desgastada e associada à produtos de menor qualidade; Descontentamento dos funcionários;

Ambiente

Institucional

Grandes incentivos governamentais para estimular e financiar todo o setor;

Novas leis, acordos e regulamentações para os setor automotivo; Grandes mudanças no cenário macroeconômico; Crises globais; Pressões dos acionistas por melhores resultados financeiros;

Ambiente

Natural

Preocupação com o despejo de detritos e com o reuso de matérias-primas; Primeiras iniciativas de formulação de produtos menos poluentes;

Ambiente Piedoso

Ambiente Desafiador

Ambiente Inóspito

Ambiente de

Negócio

Ambiente

Institucional

Ambiente

Natural

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No ambiente institucional, apesar da boa conjuntura econômica nacional e do

aumento da disponibilidade de instrumentos de crédito, que permitiram o expressivo

crescimento do consumo de bens duráveis pela nova classe C; além dos inúmeros

incentivos governamentais em benefício do setor automotivo, principalmente após a

crise global de 2008, intensificaram-se os desafios de gerir os stakeholders. Dentre

eles, os acionistas que cobravam por melhores resultados, não só para a operação

brasileira, mas que pudessem compensar os maus resultados globais da sua matriz.

O aparecimento das primeiras discussões efetivas sobre o ambiente natural,

aliado ao fato de a Fiat manter um comportamento ativo ao se antecipar e neutralizar

estas forças, destacaram a empresa como uma firma de vanguarda (early mover) no

que se refere à responsabilidade ambiental no setor automotivo nacional.

As evidências desta fase apontam para um correto padrão de respostas aos

desafios do ambiente, com o uso de um amplo repertório de táticas estratégicas por

gestores empreendedores (MINTZBERG et al 2000; OLIVER, 1991; CHANDLER,

1990).

A entrada de Cledorvino Belini, em fevereiro de 2004, além de imprimir um novo

estilo de liderança marcou a grande mudança estratégica da Fiat do Brasil. Passou a

atuar de forma mais ativa em relação às pressões dos ambientes, buscando

capturar valor e garantir a legitimidade da firma a partir de uma gestão diferenciada

dos seus múltiplos stakeholders.

Conforme pontuado no capítulo de métodos, dado que considerável parte dos

dados primários e citações coletadas se refere a este último período, nesta etapa

será feita uma abordagem de análise com uma narrativa distinta das demais

realizadas. As evidências serão agrupadas por stakeholders que tendem a gerar

pressões em cada tipo de ambiente, inclusive possibilitando uma associação mais

direta com as teorias tratadas sobre Rasc.

Inicialmente será abordado como a empresa está gerenciando o ambiente

natural (meio ambiente), e as suas motivações para passar a integrar práticas de

Rasc a sua estratégia. Como parte do ambiente de negócios, serão analisadas as

relações com os fornecedores, clientes, concessionárias, além das ações da

empresa sobre inovações de produtos, e estratégias para combater os concorrentes.

Para o ambiente institucional, serão analisadas as relações com os acionistas, o

governo e com a sociedade.

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5.2.4.1 Gestão dos Stakeholders

Os depoimentos dos entrevistados, exemplificados no trecho da entrevista com o

funcionário E4, sugerem que a Fiat compreende a necessidade da correta gestão

dos múltiplos stakeholders como forma de resposta às pressões de um ambiente em

transformação, e como condição necessária (CN) para a longevidade saudável,

assim como proposto por Fleck (2009). As evidências indicam que, para a Fiat, este

é o caminho correto para continuar na posição de liderança do setor conciliando com

a saúde financeira da organização.

(...) [a Fiat] busca permanentemente uma visão que vai além do presente. Ela busca mesmo entender e estar sempre antenada nos cenários que se apresentam no futuro para que ela possa se adequar de uma forma ágil e de uma forma dinâmica para atender às demandas desses cenários que vão se formando à medida que os anos vão passando. Segundo, pelo dinamismo também da empresa em entender cada vez mais as demandas dos consumidores e buscar oferecer produtos que atendam a essas demandas, que atendam a essas necessidades. E, por fim assim, a forma cautelosa e a forma dedicada que ela tem com o relacionamento com os seus vários públicos. Então assim, seja com os seus empregados, que permanentemente ela busca oferecer as melhores condições possíveis de trabalho, de envolvimento, de dedicação, faz com que isso garanta uma produção efetiva, para que a gente tenha estoque para atender à demanda de mercado, é uma consequência. Com os seus fornecedores, não só buscando envolvê-los, porque hoje a Fiat como montadora ela envolve os fornecedores no desenvolvimento de produtos, não é uma empresa que produz todos os itens que compõem o seu produto final. Então a Fiat tem hoje todo o centro de design, de desenvolvimento de produto e convoca a sua cadeia de fornecedores para, junto com ela, desenvolver esses produtos. Então, assim, o diálogo constante e permanente com esses públicos, com a rede de concessionárias, que é quem está na ponta com o consumidor final representando a marca, o aperfeiçoamento constante para gerar qualidade no pós-venda, que é um grande ponto. Hoje, [somos] (...) entre as marcas, quem pode oferecer no dia a dia daquele produto mais atencioso, mais adequado, mais prático. E a preocupação permanente com todos os demais públicos, com a própria comunidade, com a própria sociedade, o seu relacionamento em buscar o meio ambiente tanto nos processos produtivos totalmente adequados e a gestão ambiental demandada hoje, mas, assim, pensar no seu produto final de uma forma mais harmônica com o meio ambiente. Então tudo isso é uma composição de fatores. E a própria liderança, hoje o corpo técnico, as lideranças da Fiat hoje buscando se reciclar, se atualizar permanentemente, (...) visualizar esses cenários futuros, sem dúvida proporciona à empresa uma linha de atuação muito próxima com o que se espera das empresas-líderes de mercado mesmo (E4).

Uma das linhas de investigação desta pesquisa foi entender o que motivou a

Fiat a passar atuar de forma sistemática em ações de responsabilidade

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socioambiental, ao incluir estes tipos de preocupações nos seus debates

estratégicos.

Para o executivo responsável pela diretoria de responsabilidade social, as

motivações para a atuação em práticas de Rasc são, além das questões éticas e

das obrigações morais e legais, a própria sobrevivência sustentável da firma. Isto

corrobora a visão proposta por Fleck (2010) - de que as empresas deveriam operar

de modo que assegurassem boa performance econômica no longo prazo, evitando

comportamentos de curto prazo socialmente contestados ou perigosos para o

ambiente. O entrevistado E10 também evidencia o entendimento da Fiat sobre a

relação de “condição necessária” (CN) das ações de Rasc para a longevidade da

firma:

Hoje a indústria [automotiva] (...) está gerando muitos problemas para o meio ambiente, isso a gente está percebendo, a gente sabe disso, mas a gente sabe também que, se a gente não conseguisse resolver essa equação, a gente não vai ter um negócio sustentável, a gente não vai ter um negócio lucrativo, que é o objetivo de toda organização (E10).

Tanto depoimentos do presidente da firma, quanto nas entrevistas realizadas,

como com o funcionário E6, fornecem indícios de que empresa compreende as

potenciais consequências que futuras pressões do ambiente institucional podem

gerar, incluindo o questionamento sobre a legitimidade do setor, e que a empresa

precisa neutralizar tais riscos para garantir a sua legitimidade:

A sustentabilidade não é que eu gosto de abraçar árvores ou comer granola, é como posicionamento de empresa assim, de negócio. Se você parar e pensar: “bom, o carro, se a gente não cuidar da indústria automotiva, ele pode ser o que o cigarro foi”, porque o carro polui. “Olha o trânsito que está! Viu? É a Fiat [a culpada]”, brincam comigo: “Vocês estão colocando mais carros na rua!” Então, assim, se a gente não começar a debater mais mobilidade de fazer ações mais co-criadas com o governo, com escolas, tirar um pouco desses muros... bom, se a gente não cuidar de fato do nosso planeta, se a gente não pensar em materiais alternativos... vai chegar uma hora que a empresa não tem mais o que fazer. E aí nós vamos morrer (E6).

Na Fiat, entendemos que tão importante como a conquista de resultados econômicos é a forma como eles são alcançados. A perenidade da empresa e do seu negócio só é possível se os seus resultados forem sustentáveis ao longo do tempo, e essa perspectiva não considera apenas os objetivos econômicos mas também os sociais e ambientais. Ou seja, a empresa precisa ser eficiente no seu negócio, contribuir para a comunidade em que está inserida e cuidar dos recursos naturais, de forma que possa assegurar o futuro. (...) a sustentabilidade não é uma utopia. Ela é, antes, um grande desafio, um caminho de superação, que por isso jamais termina (...)

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(trechos de entrevistas do presidente Belini, extraídos do livro de Tanure e Patrus, 2001, p. 117).

Como exemplo de resposta antecipada para neutralizar futuras pressões dos

ambiente institucional e natural, a firma adotou uma postura mais ativa em relação

aos desafios de Rasc. De acordo com as evidências coletadas, não obstante

diversas frentes de ações conduzidas pela empresa no decorrer dos últimos

períodos, o início de forma estruturada e dentro das estratégias corporativas, das

atividades de responsabilidade socioambiental da empresa em sustentabilidade foi

em 2007, com a criação do Comitê de Sustentabilidade. Este grupo possui

representante de todas as áreas da empresa para pensar de forma conjunta e

compartilhada novas ações de Rasc. O entrevistado E5 comenta que este comitê

passou um ano apenas se dedicando a estudar o tema em profundidade antes de

formular qualquer projeto ou plano de ação:

Começamos a mudar a nossa postura em 2007, depois de um seminário que fizemos e que a gente começou questionar muito essa questão de... o que a gente ia deixar para a geração futura, o que a gente ia deixar para o Brasil, entendeu? Nós vamos deixar o quê? Então esse despertar foi naquele momento. Então naquele momento ali começa a pensar, depois a gente sai com o Comitê de Sustentabilidade (...) a gente já tinha falado que a gente ia passar um ano sem mexer em nada, ia passar um ano só estudando o assunto. Para mim ninguém sabe desse negócio de sustentabilidade porque todo mundo fala que sabe. Quando todo mundo fala que sabe alguma coisa, ninguém sabe. Então vamos passar um ano aqui tentando fazer curso, participar de seminários, para a gente criar um pouco de base. Você [precisa] ter um pouco de crítica, senso crítico do que é sustentabilidade (E5). De certa forma a sociedade está mais antenada com isso não tem muito tempo para cá. Isso é verdade aqui no Brasil. A gente não se preocupava tanto com isso. Mas eu acho que aqui na Fiat não é que foi a centelha, a gente já tinha essa preocupação, mas sempre muito isolado, o pessoal da comunicação preocupava com ações sociais e para lá... A gente preocupava com alguma coisa de produto, consumo, emissões, tanto que a gente foi a primeira empresa a lançar um carro com motor 1.0, isso já tem bem mais de dez anos. Então as coisas aconteceram muito isoladamente, a formação desse comitê [de sustentabilidade] que fortaleceu, a gente começou a unificar as ações, e é uma maneira de pensar em sustentabilidade de uma cabeça única né? (E9).

O entrevistado E10, elucidou sobre a falta de uma estratégica estruturada dos

projetos de Rasc antes de 2007, enquanto o entrevistado E2 comentou que, antigos projetos sobre o tema, que eram tratados isoladamente, passaram a ser visto de forma unificada a partir deste momento:

(...) para falar do ponto de vista ambiental, também foi a primeira montadora a se certificar em ISO14.001, e a Ilha Ecológica... Então, as ações foram sendo desenvolvidas por toda a história da empresa. Eu acho que talvez nos últimos anos o que se teve é uma noção mais concreta do conceito de

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sustentabilidade, trabalhando um pouco dentro do triple botton line e etc. De convergir isso dentro de amarras mais planejadas e ordenadas e estruturadas, mas eu não tenho dúvida que as ações nas diferentes áreas foram crescendo ao longo da empresa (E10). O projeto árvore da vida é um exemplo disso. Ele não é novo, já vem de muito tempo. Mas essas ações eram ações pontuais, muito mais focadas nas áreas afins do que uma coisa transversal na empresa (...) Agora é visto tudo de forma transversal (E2).

Na percepção de integrantes da empresa, o setor automotivo nacional, de

uma maneira geral, ainda é muito reativo às questões compulsórias do governo e da

sociedade, e a Fiat, como líder de mercado, teria a obrigação moral (PORTER;

KRAMER, 2006) de dar o exemplo atuando como first mover na implantação de

processos e práticas de responsabilidade social e ambiental corporativa. Para um

executivo da empresa entrevistado, “a tendência é que depois que a gente faz todo

mundo vem atrás” (E3).

(...) uma empresa que é líder do quarto maior mercado do mundo tem que trazer essa discussão. Ela tem que ser pioneira nessa discussão. Se não for, ela corre o risco de não ser líder em alguns anos (E10).

Então a Fiat é muito proativa nesse sentido [Rasc], ela tem acompanhado e muito. Esses temas estão no dia a dia da empresa. porque ela entende e acredita no seu papel de mobilizadora e de importante hoje ator no mercado automobilístico, por ser líder e por conduzir também questões de inovação, de tecnologias e de diferenciação para se recriar dentro do mercado e dentro da posição da sociedade que ela está hoje (E4)

O entrevistado E5, por sua vez, compreende a importância da Fiat como

incentivadora de ações de Rasc para todos os atores da cadeia produtiva da

organização, e expõe o intento da firma em atuar no tema responsabilidade

socioambiental da maneira mais estruturada possível:

Agora, do ponto de vista de empresa, a empresa entende que ela, para ser eterna, tem que fazer a parte dela, e a parte dela não é só aqui dentro da cerca. Então nós vamos trabalhar nos fornecedores, vamos trabalhar nos concessionários, vamos tentar educar os clientes para utilizar melhor nossos produtos. Então nós vamos tentar fazer a nossa parte da melhor maneira possível, a gente entende que isso é sine qua non. Não é opção, nós temos que fazer isso porque a gente quer que a empresa seja eterna, entendeu? Agora, a empresa não está dentro de uma ilha, isso que eu quero deixar bem claro. A empresa não está dentro de uma ilha, a empresa está dentro de um contexto, e esse contexto chama país, e, por mais que a gente gostaria e por mais que a empresa se esforce, ela não tem essa levada de mudar o país. Quem muda o país é a sociedade. (...) Nós, como Fiat, estamos tentando fazer aquilo que a gente consegue fazer da melhor maneira possível, dentro de um tema extremamente complexo, extremamente complicado, nós estamos tentando fazer o melhor possível (E5).

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5.2.4.2 Meio Ambiente

Em relação à gestão do meio ambiente, a Fiat já investiu, desde a década de

1990, mais de 100 milhões de dólares em tecnologias inovadoras e projetos de

redução de emissão de resíduos e consumo de matéria-prima – conforme já

evidenciado durante a análise de empreendedorismo. Além de modernos processos

de fabricação, as evidências apontam que a empresa entende que sua

responsabilidade é sobre todo o ciclo do produto, não só pela sua produção:

O ciclo de vida [do veículo] é muito maior do que a parte nossa industrial. E é nisso que temos que começar a pensar (E1). O nosso impacto na sociedade, na posição do automóvel, ele não termina quando eu coloco o carro em cima da carreta, ele vai até lá na frente (...) Quem dera eu poder estar produzindo um produto totalmente reciclável, que não poluísse ou consumisse combustível. (...) mas [atualmente] eu posso tomar conta daquilo que eu já consigo fazer (...) controlar meu processo produtivo, já posso controlar meus descartes, já posso trabalhar novas tecnologias de forma a colocar cada vez mais no meu produto componentes recicláveis, componentes verdes, feitos de matéria-prima reciclável (...) (E2).

Com os novos processos produtivos, os números dos resultados na redução

de consumo de energia elétrica, água, recirculação da água, geração de resíduos,

reciclagem de resíduos e lixo produzido são impressionantes. De acordo com os

dados informados pela empresa (FIAT, 2012), destacam-se:

• redução de 56% (kWh/veículo) do consumo de energia elétrica entre

1994 e 2011;

• redução de 68% (m3/veículo) do consumo de água entre 1994 e 2011;

• redução de 44% na geração de resíduos (kg/veículo) entre 1994 e

2011;

• aumento da recirculação de água de 60% em 1994 para 99% em 2011;

• aumento no reaproveitamento de resíduos de 70% em 1994 para

100% em 2011.

5.2.4.3 Sociedade

Com novo olhar para a importância de diversos setores da sociedade, a atuação da organização amadureceu do assistencialismo, na década de 1970 e 1980, para filantropia e projetos pontuais de patrocínio na década de 1990 e início dos anos 2000, até chegar ao verdadeiro entendimento do que seria responsabilidade social. Começando com o reconhecimento da realidade e das

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necessidades do entorno da fábrica, a Fiat observou que o bairro Jardim Teresópolis, com cerca de 35.000 moradores, poderia ser o primeiro passo das atividades de responsabilidade social. Dado que seria um projeto que também envolveria (e beneficiaria) área de atuação dos fornecedores, com capacitação técnica de mão de obra, foi criada a Rede Fiat de Cidadania. Percebe-se nos discursos dos executivos da empresa a preocupação entre tais ações e seu reflexo na longevidade da firma.

A Rede Fiat de Cidadania tem objetivo de criar um arsenal de oportunidades e possibilidades de atuação conjunta, beneficiando não só a comunidade, mas as próprias empresas, seja através do exercício da sua responsabilidade social empresarial, seja através de, eventualmente, formação de mão de obra qualificada para isso (E4).

O programa Árvore da Vida reuniu diversas ações, mapeadas com o objetivo

principal de inclusão social de crianças e jovens por meio de ações socioeducativas

e de capacitação profissional. Posteriormente, o programa foi dividido em quatro

projetos.

• O primeiro, Árvore da Vida – Jardim Teresópolis, é considerado até

hoje como carro-chefe das ações sociais da empresa. Ele pretende

transformar o bairro Jardim Teresópolis (em Betim) em um lugar

melhor para viver, de modo que a transformação pudesse ser mantida

pela própria comunidade (autossustentável). Foram criadas

cooperativas para fabricar produtos utilizando as sobras dos materiais

de produção da Fiat e fornecedores, que pudessem ser

comercializados e gerar renda. São exemplos desses produtos bolsas,

sacolas, jogos e chaveiros feitos com sobras de cinto de segurança,

dentre outros.

• O segundo projeto, o Árvore da Vida – Capacitação Profissional, foi

idealizado para buscar integrar a estratégia da empresa com ações de

responsabilidade social, a partir de um processo de capacitação

técnica dos jovens do entorno e de outras cidades. O foco dessa ação

são jovens de 18 a 24 anos que possam aprender um ofício e ser

contratados para as linhas de montagem da empresa e fornecedores,

ou mesmo integrar o quadro nas concessionárias em outros Estados

do país.

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• O terceiro projeto, o Árvore da Vida – Parcerias, foca na promoção de

parcerias com entidades esportivas, de cultura ou educação ajuda

ONGs como o Instituto Minas pela Paz (IMPP) e a Casa Fiat de

Cultura.

• O quarto projeto, Árvore da Vida – Voluntariado, busca a mobilização e

o incentivo de práticas de voluntariado entre funcionários e parceiros.

No fim de 2010, o programa Árvore da Vida começou a ser expandido para

um movimento denominado “Nossa Betim”, junto com outras grandes empresas da

região que também buscam uma cidade justa e sustentável. Para o responsável do

programa na Fiat (E5), o objetivo inicial é proporcionar um verdadeiro entendimento

sobre a cidade de Betim, dos indicadores econômicos e sociais, a partir da visão dos

múltiplos stakeholders da sociedade: do governo, das empresas mas,

principalmente, da sociedade. O passo seguinte será catalogar de forma

transparente e isenta a verdadeira “fotografia social” de Betim, para que todos os

que queiram atuar em prol de uma sociedade melhor tenham ferramentas para

saber onde ou como atuar.

E5 comentou sobre a profunda desconexão entre a movimentação financeira,

e consequente arrecadação de impostos em Betim, e a situação de degradação

social da cidade. Abordou também sobre a obrigação moral das empresas da região

começarem a atuar, em paralelo com o poder público, nas questões sociais:

Você imagina, só a Fiat tem 37 anos que está em Betim, a Petrobras tem mais de quarenta. Você já foi a Betim? Rapaz... a cidade de Betim é uma coisa horrível! (...) Betim não tem nada! Então eu te falo assim: 37 anos de recolhimento de INSS, impostos etc. e tal, me parece que, se pegar os rankings das cidades brasileiras, eu acho que Betim está entre as vinte que tem maior receita. E a cidade é aquela desgraça que você viu. A cidade em momento nenhum se preparou para o futuro. Então você sabe o que nós fizemos este ano? (...) nós lançamos um programa com a cidade de Betim: “Betim minha cidade”. Nós tivemos que fazer isso, trouxemos uma ONG e dissemos: “Escuta, vamos agora, depois de 37 anos, vamos criar uma Betim do futuro”. Então, só agora, e aí eu te falo mais uma vez, isso prova também o grau de maturidade nosso com relação a assuntos de sustentabilidade. A gente chega e abraça isso, contrata o instituto Ethos, que tem uma corrente de pesquisa, eles têm esse tipo de organização em outras cidades, tem uma série de cidades que estão se mobilizando no mundo. Então nós temos agora que mobilizar a cidade de Betim, é uma coisa apartidária, para fazer isso (E5).

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5.2.4.4 Governo e Legislação

Em relação às pressões, desafios e oportunidades geradas pelo governo,

percebe-se que a Fiat vem utilizando de diversas táticas de respostas estratégicas,

para neutralizar e até mesmo moldar o ambiente institucional. Entre elas destacam-

se a de manipulação e a de desafio (OLIVER, 1991).

Nos últimos anos, a organização estreitou sua relação com o governo, a partir

de outras esferas institucionais. Desde 2010, o presidente da companhia, Cledorvino

Belini, também se tornou o presidente da Anfavea, a principal entidade da indústria

automobilística brasileira, reconhecida pelo poderoso lobby nas mais variadas

esferas de governo e tida como responsável por influenciar questões de incentivos

fiscais, como redução de IPI e criação de barreiras tributárias.

O próprio presidente da Fiat hoje como responsável pela Anfavea (...), levando discussões diretamente para o governo, no que se refere à infraestrutura, a questões de financiamento... Então as próprias questões de tributos que incidem sobre os carros (...) todas essas são discussões que uma empresa-líder como a Fiat tem muita pertinência para falar e discutir com o poder público, porque ela hoje atua diretamente na questão desses temas (E4).

Um exemplo (de 2011) foi a comemorada vitória das montadoras instaladas

no país após a sobretaxa para a importação de veículos de marcas que não

possuam parque produtivo no Brasil, afetando principalmente as montadoras

chinesas, tidas pela associação (ANFAVEA) como a maior ameaça futura da

indústria nacional.

E eu acho que em relação a esse tema que você está falando, de navegação no ambiente, a gente vê que isso é uma questão que preocupa o Belini e que ele, por exemplo, esse aumento do IPI para importados. Isso certamente tem muito esforço dele como presidente da ANFAVEA (E11).

Mais recentemente, Fiat e a Anfavea, vêm atuando em parceria com o

Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro), além de outras

instituições públicas, a fim de criar uma regulamentação que obrigue todos os

veículos vendidos no Brasil a ter nível de eficiência energética categorizado – o

chamado Programa Brasileiro de Etiquetagem Veicular (PBEV). Aqui, claramente

existe uma tentativa de uso de estratégia de desafio (OLIVER, 1991), com uma

postura ativa para buscar moldar o ambiente.

Assim como existe atualmente uma categorização sobre o consumo nos

produtos da chamada “linha branca”, a avaliação PBEV atribui nota de A a E, por

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categorias, do menor para o maior consumo respectivamente. Ou seja, A é o veículo

mais econômico e E o menos econômico. A obrigatoriedade serviria de insumo para

a decisão de compra do consumidor e como incentivo para que toda a indústria

buscasse melhorias tecnológicas e inovações sustentáveis nos produtos.

Além da Fiat, em 2011 somente outras cinco montadoras aderiram ao

programa e, atualmente, a adesão é voluntária e renovada anualmente. Nos

comparativos feitos atualmente pelo Inmetro, o único carro com nota A no ranking,

na categoria de subcompactos, é o Fiat Uno Mille Fire Economy 1.0, com

performance de 8,9 km/L de álcool (ciclo urbano). O modelo já havia obtido a

classificação máxima em 2010. A expectativa é que, a partir de 2012, oito

montadoras, representando mais da metade dos veículos produzidos no país,

participem do programa, o que permitirá ao consumidor fazer um comparativo dos

gastos de combustível dos veículos novos à venda no país, pois as montadoras que

aderiram à iniciativa serão obrigadas a colocar o selos de certificação.

Os analistas do setor acreditam que, em um futuro próximo, os incentivos

fiscais, como redução de IPI, poderão ser baseados de acordo com esse índice de

eficiência energética. Assim, a Fiat estaria novamente se antecipando à pressões do

ambiente institucional.

Ainda na busca sobre motivação para as ações de Rasc, questionou-se todos

os entrevistados sobre legislação ambiental e o papel do governo e demais órgãos

públicos como motivador da empresa. As evidências apontam pouca pressão desse

stakeholder na Fiat, conforme os relatos:

O governo, hoje, se limita a te colocar limites de emissões, geralmente emissões de gás nocivos (E1). A lei potencializa a ação? Eu acredito que sim, e eu acho que a lei deve servir para isso mesmo, é um papel importantíssimo que o governo faz, mas nem só dessa forma que nós gostamos de trabalhar. Não é assim que a gente trabalha. No nosso comitê dificilmente a gente trata de um assunto porque está sendo motivado por uma lei. O que a gente fica pensando é assim: “O que a gente pode fazer em termos de inclusão? O que podemos fazer em termos ambientais? O que podemos fazer em termo de comunidade vizinha?” (E2). (...) eu acho que o papel do governo é muito importante para forçar para que essas coisas aconteçam e movimentar todo o mercado naquela direção da lei. Então eu acho que isso é bem necessário. Só que a gente não faz para cumprir a lei, mas a gente faz também como pesquisa e como maneira de sair na frente no mercado, pensando também em sustentabilidade. Por exemplo, não tem nenhuma lei que fala de carro elétrico hoje, a gente já faz um carro elétrico. Hoje a gente tem um carro elétrico que, se você quiser

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comprar, custa, sei lá, R$ 120.000,00, você pode comprar um Palio Weekend elétrico que é uma parceria da Fiat com a Itaipu. Isso não tem nenhuma lei de governo, nem nada, nem próximo de ser discutido, nenhuma montadora está caminhando nesse sentido aqui no Brasil de fazer um carro elétrico, e nós já temos uma parceria com a Itaipu. Então a preocupação não é só com a lei não. A lei é muito importante para massificar que o sistema é para toda a gama. Quando sai uma lei dessa que você tem que reduzir consumo, tem que fazer alguma coisa, alguma norma de segurança, isso sempre tem um custo envolvido, para obrigar as empresas a colocarem esse custo em toda produção precisa de uma lei, senão você vai acabar atendendo só a um pedaço e não à totalidade (E9). Eu acho legal o governo vir colocando algumas métricas a serem alcançadas (...) porque ele motiva as empresas a buscarem soluções e mexe com aqueles que não estão, talvez, tão ligados ao tema, ou que não querem saber de sustentabilidade (E2). Você tem o caminho que é a pressão e você tem o caminho das escolhas. Eu acho que tem os dois lados. No próprio caso da Fiat mesmo, por questão de legislação ambiental, ela optou como escolha a seguir as normas europeias para uma série de coisas e não as normas brasileiras. As normas brasileiras são muito mais simples, mas é uma escolha e não foi uma obrigação de legislação – ainda. Então, você tem os dois caminhos. Eu não tenho dúvida, quando a gente olha pro nosso mercado, do ponto de vista de evolução de cabeça do consumidor, de que o tema sustentabilidade nos seus diferentes vieses, vai ser cada vez mais central (E10).

Para a empresa, mesmo assim, o governo ainda está muito reativo em

relação aos efeitos colaterais dos veículos, e poderia atuar mais ativamente,

principalmente no tema mobilidade urbana. Ao se questionar alguns executivos,

durante as entrevistas de campo, sobre a atuação da empresa e do setor para

ajudar a resolver a controversa questão de engarrafamentos, esses sustentaram o

discurso de que os grandes responsáveis para solucionar questões de mobilidade

urbana são os órgãos públicos, e não a indústria (que diariamente insere centenas

de novos carros nas ruas).

O problema nosso é na utilização do carro! (...) Não tem problema em você ter carro, inclusive nós queremos até vender mais carros, mas não usa o carro durante a semana, usa transporte público. O carro, como diz no documento do carro, está lá: “veículo de passeio”. O carro é para você usar de noite, quando você for jantar com seu marido, quando precisar levar seu filho em uma emergência. Não é para usar no dia a dia. No dia a dia você tem que usar transporte público. (...) As pessoas aqui no Brasil não vão andar de metrô, não vão andar de ônibus, pois isso é sinal de pobreza. Quando que aqui no Brasil o cara vai assistir a uma ópera, vai sair de casa e entrar num metrô igual você vê em Milão, em Nova York. (...) Então a falta de transporte público no Brasil é um issue. Mas não é só para a indústria automobilística, não. É para todo mundo! (E1).

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5.2.4.5 Acionistas

A primeira grande pressão enfrentada pela nova gestão foi a demanda dos

acionistas por melhores resultados financeiros. A Fiat do Brasil precisava voltar a dar

lucros. Tanto para manter a operação local, quanto para pode cobrir os resultados

financeiros na matriz italiana, que estava na maior crise da centenária história. Com

o início desse grande projeto de reestruturação estratégica da firma, o presidente

Belini reforçou para todos os setores da empresa que a busca da “liderança pelo

resultado econômico” no centro da estratégia seria a única forma de a empresa

evitar o processo de declínio.

Para atender às expectativas dos acionistas, foram revistos os processos

internos, e determinado que a nova meta fosse a busca da “liderança em

resultados”, e não mais a “liderança de vendas”. Essas ações possibilitaram que os

resultados financeiros da Fiat do Brasil voltasse a ser positivo em menos de um ano

e a empresa pôde voltar a contribuir com os resultados globais da Fiat. Ainda,

apesar do novo foco, apenas no ano de 2004 a Fiat perdeu o posto de “liderança em

vendas” no Brasil, conquistado em 2001.

Deixamos de almejar a obtenção dessa liderança (de mercado) a qualquer custo e passamos a buscar a liderança de resultados empresariais. Queríamos ser a empresa do setor com a melhor imagem interna e externa, o melhor atendimento aos clientes, a melhor equação de giro de capital, o melhor resultado econômico, o melhor retorno do investimento e a melhor geração de caixa para poder investir em novos produtos, novas tecnologias e novos processos. Queríamos ter o melhor relacionamento com todos os stakeholders” (trechos de entrevistas do presidente Belini, extraídos do livro de Tanure e Patrus, 2011, p. 36).

O entrevistado E10 elucidou a postura adotada pela empresa, após o ano de

2004, e expôs a sua percepção de que, se a empresa mantivesse a busca somente

pela “liderança em vendas”, poderia pavimentar o caminho para o polo da

autodestruição (FLECK, 2009). Além disso, este relato ilustra como é a atual

percepção dos gestores sobre a importância da gestão dos múltiplos stakeholders:

E o que é essa liderança de resultados? Não basta pra uma empresa como a Fiat ter liderança de mercado. Nós podemos ter liderança de mercado e ter prejuízo, e aí essa empresa acaba. É preciso ter uma liderança de resultados. Ser best in class em retorno do acionista, retorno de investimento e etc. Pra isso a gente precisa ter qualidade, produto e inovação, é um pilar técnico. Competitividade numa noção integrada e de relacionamento. Aqui estamos pensando com todos os stakeholders. Então, quando ele (Belini) vai

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buscar uma liderança de resultados, quando ele vai pensar um modelo de negócios pré-futuro, quando ele vai pensar um modelo de negócio que leve em conta o relacionamento com todos os stakeholders e olha o futuro, ele traz, naturalmente, a noção e o conceito de sustentabilidade (E10).

5.2.4.6 Clientes e Reputação

A empresa entende que é preciso ter os clientes como foco da empresa, e

buscar formas de aumentar o grau de satisfação e fidelização com a marca.

Algumas das ações para atuar de forma positiva com esse stakeholder incluem a

melhoria dos processos de comunicação e a ampliação dos investimentos em

propaganda institucional.

Ademais, a Fiat tem uma constante preocupação com a gestão da imagem,

principalmente depois dos desgastes das primeiras fases da empresa no Brasil, e vê

nas suas ações de responsabilidade socioambiental uma força para preservar no

futuro a atual percepção do consumidor, que, pelas atuais pesquisas feitas pela

empresa, é bem positiva:

Mas, assim, eu diria o seguinte: hoje, qualquer ação que você faça e que tem um impacto econômico financeiro, mas que está ligado a um aspecto sustentável, ele não recebe uma “negativa”, entendeu? Porque a gente sabe que do ponto de vista de percepção da sociedade isso está crescendo muito. Então, assim, no nosso caso especial, nós temos uma preocupação muito grande com imagem, porque nós saímos de trás, né? A Fiat carregou ao longo de anos uma imagem de empresa que tinha qualidade ruim, só fazia carro barato etc. etc. etc., a herança do Fiat 147, tal. (...) hoje se eu faço alguma coisa que você fala, assim, “não, isso aí eu vou aumentar o custo do carro, vou precisar de um maior investimento, mas vai me fornecer por outro lado uma melhor imagem da sociedade”, não é questionado. E hoje a gente sabe que os assuntos ligados a sustentabilidade, seja do ponto de vista ecológico, de responsabilidade social, têm um apelo muito grande da sociedade. (...) eu estou falando do viés econômico-financeiro. Agora, tem outro viés também que impacta nessa tomada de decisão que é a consciência, hoje, que os membros do comitê diretivo têm para o tema, entendeu? Então eu te falo o seguinte: “não vai me dar imagem, vai aumentar o meu custo, vai aumentar o meu investimento, porém é o que temos que fazer!” Por quê? Porque é assim, porque do ponto de vista da sustentabilidade a gente está pensando num país para o futuro, numa empresa para o futuro, nós temos que fazer isso hoje (E5).

Para a empresa, apesar dos seus grandes investimentos nos meios de

comunicação para promover seus produtos, existe preocupação em garantir que só

se iniciará uma intensiva divulgação na mídia sobre as práticas de Rasc quando

todos os “telhados de vidro” (sic) (E2) forem retirados. Ou seja, a empresa não quer

se posicionar publicamente como uma empresa “100% ecologicamente correta”

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enquanto houver risco de, ao aumentar a expectativa dos clientes, se tornar alvo de

criticas e novos questionamentos, pois, conforme visto, imagem e reputação são

fundamentais para a empresa.

Até 2011, os programas de responsabilidade socioambiental e patrocínios

culturais informados para o público e listados no site eram (FIAT, 2012):

• educação no trânsito: Moto Perpétuo; Você Apita; Direção Segura;

• inclusão social: Árvore da vida; Programa Autonomy;

• foco nos funcionários: Fundação Fiat;

• patrocínios culturais (filantropia): Fiat Mostra Brasil; Casa Fiat de

Cultura; Tesouros do Brasil; Um Poema Chamado Brasil; Brasil dos Meus Olhos; e

Retratos do Brasil.

Sobre reputação da marca, é importante registrar que existe um grupo

multidisciplinar na Fiat chamado Comitê de Imagem, que possui ampla autoridade

no processo decisório da Fiat. A empresa não quer mais carregar o peso da antiga

mácula de montadora de carros ruins e baratos, herança dos problemas com o Fiat

147. Assim, todo e qualquer projeto que venha a utilizar recursos próprios da Fiat

precisa passar pela aprovação desse comitê.

Em uma das entrevistas, um executivo (E4) comentou que “realmente só vão

em frente projetos que façam sentido e possam agregar valor à marca”. E ratifica: “O

objetivo não é olhar projetos que gerem resultado no curto prazo, mas que ajudem a

reputação da marca no longo prazo” (E4).

Todas essas demandas, o primeiro receptor, áreas das mais diversas, elas se reúnem num comitê chamado Comitê Imagem, que é um comitê com todas as áreas que de uma forma ou de outra lidam com a imagem da empresa. Todos esses programas são analisados sob um prisma de imagem que a Fiat possui, que ela tenta revisitar permanentemente para ela atuar nisso, e, a partir desse Comitê Imagem, são analisadas as ações mais pertinentes dentro da filosofia de atuação da empresa naquele momento. Então todo projeto ou patrocínio, seja ele realizado com recurso próprio da Fiat, seja realizado com recurso de incentivo fiscal da Fiat, tem um trâmite de Comitê Imagem e Comitê Diretivo, ele precisa dessas duas atas para que ele seja efetivamente realizado. Seja de R$ 200,00, seja de R$ 30.000,00 (E4). Por um lado pode parecer uma burocratização de um processo, mas por outro. se ele é feito com uma metodologia adequada, com uma periodicidade adequada e com um método de análise já alinhado entre as partes, ele é muito bom. Porque realmente só vão em frente projetos que façam sentido e que possam agregar valor à marca, né? Tanto para o seu resultado final quanto para a imagem da marca da Fiat. Então isso é interessante e importante. E, a partir desse ano de 2011, a gente está

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começando a realizar um trabalho de gestão da reputação da Fiat, que é um trabalho diferenciado, em parceria com um instituto chamado Reputation Institute [http://www.reputationinstitute.com] aqui no Brasil, e que a gente vai ter um olhar ainda mais diferenciado, não só sobre imagem, que era a função do comitê até então. E quando a gente fala de imagem, existe uma visão mais imediatista e que pode oscilar um pouco de acordo com o mercado, com a crise, eventos, produtos, concorrência e tudo. E reputação é uma construção da imagem num prazo mais longo, ou seja, as vivências das pessoas em relação àquela marca, o que as pessoas dizem em relação àquela marca e o que a própria empresa diz em relação àquela marca. Então ele é o estudo de um sentimento mais perene do que as pessoas têm em relação àquela marca e menos pontual. Porque às vezes, ao longo dos anos, ela tem uma história diferente com alguns grupos de pessoas (E4).

A Fiat possui uma área de pesquisa que busca, com a ajuda de antropólogos

e instituições de pesquisas, como a Coppead e Dom Cabral, entender em

profundidade o desejo e expectativas dos clientes. De acordo com um entrevistado,

o importante hoje para empresa não é “olhar o cliente”, mas entender “o olhar do

cliente”:

Então hoje a Fiat entende que não é foco no cliente, não é olhar o nosso produto através da lente do cliente, do foco do cliente. Então isso a gente vê que não é o suficiente para a gente ter o negócio. Então a gente hoje tem certeza que a Fiat é uma empresa orientada ao cliente, quer dizer, a gente tem que conseguir, através das necessidades do cliente, conseguir integrar valor aos nossos produtos, só assim a gente vai conseguir realmente ter uma utilidade interessante no negócio. (...) Mas aí vem esse grande desafio, que talvez é o grande desafio das principais organizações hoje no Brasil e no mundo, né, como que a gente vai conseguir fazer através dessa orientação do cliente, através dessa lente do cliente, para a gente satisfazer essas necessidades, esses anseios, esses sonhos dos clientes, que eu falei mais atrás, e conseguir ter lucro, conseguir crescer, conseguir investir, quer dizer, esse hoje é o grande desafio talvez de todas as organizações, né. Então para a gente fazer isso, hoje a gente tem certeza de uma coisa, a gente não pode usar as mesmas ferramentas que a gente vem usando, que as indústrias vêm usando. Então a gente tem que estar sempre fazendo diferente, a gente está sempre tentando pensar diferente. A gente tem que chegar aos resultados não da mesma forma (E10). Então tem a área de pesquisa de mercado, que é uma área também que há doze anos a gente gerou também uma expertise em análise, né, em trabalhar dados, entender o comportamento de consumo, mas é uma expertise não limitada, mas é uma expertise dentro da indústria automobilística (E10).

Esse processo de buscar compreender profundamente todas as o

comportamento do consumidor não fica restrito somente as áreas de pesquisas da

empresa. Conforme evidenciado por uma pesquisadora da Coppead entrevistada

para a pesquisa:

Esse caso eu acho que é interessante porque eu acho que fala um pouquinho dessa liderança da empresa. A (Prof. X) foi fazer uma entrevista na Globo News, num programa que chama Conta Corrente, enfim, essa entrevista passou num sábado a noite, a primeira rodada da entrevista, e na

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segunda-feira quando a (Prof. X) chegou aqui na escola tinha um e-mail escrito assim: “Parabéns!” Esse e-mail era um e-mail que dizia assim: “Sou Belini, presidente da Fiat, eu vi a sua entrevista na Globo News e acho que você pode contribuir com a nossa empresa. Se tiver interesse, por favor, entre em contato.” E aí assinado “Belini”. Foi o único e-mail que a (Prof. X) recebeu da entrevista, quer dizer, mas foi um e-mail importantíssimo. E ele mandou sábado meia noite esse e-mail quase, isso fala um pouquinho desse estado de permanente atenção. Quer dizer, de alguém que está olhando uma entrevista de alguém falando sobre um livro, sobre beleza e comportamento do consumidor e que se interessa por trazer essa discussão para dentro da empresa. E a (Prof. X) respondeu o e-mail agradecendo, dizendo que estava a disposição e em seguida a gente recebeu contato do gerente de pesquisa da empresa (E11).

Eu acho que o Belini talvez seja importante para dar esse exemplo. Quando ele é alguém que pega determinados temas e vai lá em baixo, olha, enfim, o detalhe volta e faz a discussão estratégica. Eu tenho a impressão de que eles fazem esse exercício de pensar a estratégia, mas ir em alguns momentos numa atividade que poderia ser considerada de muito detalhe para voltar, para analisar. Isso me chamou muito a atenção (E11)

Com o marcado mais competitivo, a Fiat efetuou uma série de melhorias nos

veículos, buscando atender aos desejos específicos de cada segmento. Com

investimento nos centros de pesquisas, onde antropólogos e especialistas buscam

entender as aspirações dos consumidores, a Fiat acredita ser hoje a empresa com o

maior conhecimento das expectativas, gosto e desejos dos diversos tipos de

consumidores brasileiros.

Mais recentemente, tem buscado capturar valor com novos processos de

produção, com o uso de materiais mais ecologicamente corretos, e com a oferta de

produtos com apelo de economia no consumo de combustível:

Hoje no design te falo que a gente atua através de busca por materiais que não agridam tanto o meio ambiente e que sejam reciclados também. Então, por exemplo, temos o fio que faz tecido que vem da reciclagem da garrafa pet – então tem o fio que a gente chama de “fio pet” que hoje pode ser utilizado na indústria automobilística (E3). Eu acho que (produtos mais econômicos) são um driver forte, principalmente nos segmentos de entrada (E7). (...) estamos fazendo uma modificação na nossa linha de pintura. Hoje a nossa linha de pintura é a base de solvente que polui muito. A gente vai transformá-la toda à base d´água, que é uma linha muito mais limpa, vamos falar assim. (...) Está mudando todo o sistema de abastecimento, a catalisação. Está aqui dentro, sinto que sim, e na medida do possível ela está acontecendo. É uma obra enorme que, inclusive eu, nem imaginava que fosse acontecer tão rápido, uma medida necessária e também que acrescenta esse valor ecológico no produto (E3). (...) de cinco anos para cá (2011) a gente vem cuidando dessa parte de produtos, de tornar o produto mais sustentável, tornar a Fiat mais

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sustentável. (...) Como produto, o que eu considero mais importante é esse, é a utilização dessas matérias-primas recicláveis, de a gente poder ter produtos que agridam menos a natureza. Esse é o foco principal (E7). (...) estou olhando a parte de produto, quais iniciativas que a gente pode ter que vão envolver sustentabilidade, porque vender carro por si só já não é sustentável, né? Se fosse fazer uma ação de sustentabilidade numa indústria automobilística, seria não vender carro, só que esse é o nosso business. Então a gente tenta fazer isso porque as pessoas precisam disso, e é uma coisa que não vai deixar de existir, a gente precisa fazer isso da maneira melhor possível para o meio ambiente, porque a gente não quer que depois os recursos se esgotem e aí a gente mesmo vai estar acabando com o nosso business (E9).

Outras iniciativas de diferenciação por inovação, com motivação em Rasc, e

no apelo de menor consumo de combustível, que merecem destaque é o Eco Drive

e o Econômetro. O Eco Drive é um sistema desenvolvido na Itália que possibilita o

upload de informações de modo de condução do motorista, indicando como o

condutor poderia dirigir de maneira mais eficiente no uso de combustível e reduzir o

índice de emissão de CO2. A Fiat também publicado no website e entregue, junto

com o manual dos carros, um guia de consumo consciente:6

Eco Drive que nada mais é que um software que te ensina a dirigir da maneira mais econômica possível. Que é o seguinte: você entrou no carro, começa dirigir o carro e colocou o pendrive lá na USB do carro e aí vai monitorando como que você está dirigindo. E aí esse software te fala: “olha, você está passando a segunda marcha muito rápida”, ou então, “está demorando demais para colocar, troca a marcha mais rápido que vai ser mais econômico e vai poluir menos”. E aí depois você joga via USB dentro do computador e aí lá tem um software que te fala tudo isso, te dá um relatório. E aí você tem metas de emissões que você tem que cumprir naquele trajeto que você faz todo dia, e aí vai te educando a dirigir de uma maneira que polui menos. Isso existe na Itália e estamos trazendo para o Brasil (E9). (...) você bota o pendrive, ali você mede a sua maneira de guiar, como você pode economizar, o que você está fazendo de errado, é nisso a gente já está trabalhando, em cima dos nossos produtos para botar o Eco Drive no Brasil. Quando a gente trouxe o 500 em 2009, a gente teve essa ideia, só que a gente não tinha tempo hábil para colocar isso em prática... era um carro importado, a gente ia precisar fazer muitas adaptações que o nosso tempo, nosso lead time, não era suficiente para colocar isso. Então agora nós já vamos trazer isso para o Brasil pensando justamente nessa questão da sustentabilidade, do nível de emissões, como que as pessoas vão dirigir, como que as pessoas vão cuidar do produto, cuidar dessa maneira de poluir o meio ambiente. (E7) A gente tem o Econômetro, que é um instrumento que nós criamos no Mille em 2009, na verdade em 2008, setembro de 2008. (...) Então aquele instrumento que você tem no seu quadro que hoje já está no Mille, está no Palio Fire e no Novo Uno Vivati, que é esse segmento mais de entrada, um carro que consome menos, que emite menos. Ali nada mais é do que um

6 Tanto o manual do Eco Drive quanto o Guia de Consumo Consciente estão disponíveis nos anexos.

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indicador de consumo instantâneo na forma analógica. Só que aquele negócio se tornou tão importante para o cliente, que a gente tem vários depoimentos que o cara já não consegue mais dirigir sem olhar para aquilo ali, para manter o ponteirinho dele no verde. Onde ele está consumindo menos, ele está emitindo menos poluente, aí nessa mesma fase nós criamos um guiazinho7 de como dirigir economicamente e ecologicamente correto de maneira mais eficiente (E7)

5.2.4.7 Concorrentes

Em relação à arena de negócios, diversas evidências sugerem que,

atualmente, o maior desafio visto pela Fiat é como responder à ameaça dos novos

entrantes, principalmente pelo preço dos carros chineses e o custo-benefício dos

modelos coreanos que, como visto no Capítulo 4, vêm ganhando rapidamente

importante participação no mercado brasileiro:

Quando você olha para as coreanas, para as chinesas, para os investimentos e para os benefícios fiscais que elas têm nos países delas e compara o nosso, o nosso custo do carro hoje chega a ser quase 40% mais caro do que esses outros produtos. Então você pensa assim: “poxa, para a gente fazer o mesmo esforço que a China, mesmo assim a China trazendo um carro para o Brasil, o nosso é 40% mais caro”. Daqui a pouco se você tiver a chance de ter dois carros com os mesmos aplicativos, te dando o mesmo conforto, a mesma segurança, você vai comprar um carro 40% mais caro? Para você comprar, ele tem que ter um algo mais, seja a marca, seja a reputação, seja o valor agregado (E6). (...) [um grande risco] são os produtos entrantes no mercado. Do mesmo jeito que há quinze anos atrás, há vinte anos atrás os japoneses não faziam o mínimo peso, hoje já são referência. Há dez anos atrás os franceses não faziam o mínimo peso, hoje já são parte grande desse mercado, e agora os chineses. Então eu acho que os produtos entrantes, os novos entrantes no mercado, são um importante fator de risco (E7). Eu acho que o grande desafio agora é o que todo mercado de consumo está sofrendo de maneira geral, que é a invasão das empresas estrangeiras, com o dólar baixo a gente não é competitivo para suportar... eles são muito competitivos para entrar no país. Então vai vir um leque grande aí de chineses, coreanos, e eu acho que a grande dificuldade pode estar aí. O mercado globalizado, ele vai contra a sustentabilidade da empresa dentro do país, porque eles conseguem chegar com um custo mais baixo do que a gente. Ainda não tem um nível de qualidade muito bom, mas eu acho que isso é questão de tempo, e eles vêm para brigar muito forte. A Hyundai mesmo já mostrou isso, eu acho que o grande desafio nosso está em manter a nossa liderança e a fatia de mercado que a gente tem mesmo com a chegada de tantos novos competidores. Se você pegar, não muito tempo atrás, era Fiat, Ford, GM e Volkswagen, não tinha outro... e ali você tinha o mercado brasileiro para aquilo tudo. Hoje a gente deve ter aqui no Brasil acho que umas treze, quinze montadoras e junto com essas que vem de fora e têm chegado competitivas, eu acho que é aí que está o desafio (E9).

7 O guia de consumo inteligente

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Obviamente a gente tem uma série de fatores de mercados que trazem maior complexidade a ser líder hoje no Brasil. Um deles é um crescimento de competitividade do mercado. Se a gente fosse pegar o mercado hoje, nós estamos em 2011, provavelmente você lembra ali em 1992, 1990, quando a gente sabia falar o nome de todos os modelos que tinham no mercado brasileiro. A gente sabia de cor todos os carros, de todas as marcas. Era fácil. Então, ali no início da década de 1990, você tinha em torno de 21 marcas operando no Brasil e cerca de cinquenta modelos. Quando a gente chegou a 2010, pouco mais de vinte anos depois, já eram 42 marcas operando e mais de 250 modelos. Hoje, eu que trabalho na indústria automobilística, tenho dificuldade de falar todas as marcas e todos os modelos na rua. Ou seja, houve um crescimento de competitividade muito grande. Aliado a isso, o Brasil que foi durante anos vigésimo e depois acho que ali na casa entre décimo e vigésimo maior mercado do mundo, no ano passado se tornou o quarto maior mercado do mundo de automóveis. O mundo com a crise de 2008, todo mercado dando uma flutuada, você vê um Brasil crescendo e se tornando um dos maiores mercados do mundo... é natural que o mundo inteiro olhe pra cá. Então você começa a ter mais montadoras coreanas, chinesas, indianas, fora os outros players que já nem são mais tão novos assim, franceses, japoneses e as quatro grandes. Então é um crescimento de competitividade que se multiplica. Essa talvez seja uma grande ameaça do ponto de vista econômico (E10).

Porém, os fatos indicam que a empresa não está parada. O lobby feito em

conjunto com as demais montadoras tradicionais para pressionar o governo a

aumentar o IPI para carros importados, em 2010, é uma clara evidência da

estratégia de manipulação por influência (OLIVER, 1991).

Para os entrevistados, apesar de todas essas ameaças dos novos entrantes,

a manutenção da Fiat na liderança de vendas e de resultados é possível pela

maneira rápida que a firma monitora e responde às mudanças no ambiente, pelo

conhecimento das preferências e do gosto dos diferentes tipos de consumidores

brasileiros, além das inovações apresentadas pela firma.

(...) eu acho que [a razão da liderança da Fiat] é dessa cultura mesmo de responder rápido ao mercado. Algumas coisas que nós fizemos no mercado que sustentam a liderança nenhuma montadora faz. Então, assim, por exemplo, quando teve a redução do IPI em 2009, né, 2008, final de 2008, quando teve a crise... nós cancelamos todas as notas fiscais. Quando o governo liberou a redução do IPI, nós tínhamos 45.000 carros no estoque da rede, nós cancelamos todas as 45.000 notas e retransmitimos com IPI reduzido, ou seja, com os preços novos em questão de dois ou três dias. Enquanto as outras montadoras gastaram uma a duas semanas. Ou seja, o que a gente vendeu de carro com preço novo e que as outras não conseguiram vender. Então é toda essa agilidade, são em todos os locais da empresa. Você vai no industrial existe isso, você vem no comercial, você vai na engenharia, você vai em compras, você vai na qualidade, financeiro, em todas as áreas existe muito esse espírito de agilidade, de cooperação (E7).

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5.2.4.8 Fornecedores

Além da constante busca de estreitamento de parceria no relacionamento

com os fornecedores, uma das diretrizes da política de responsabilidade

socioambiental da Fiat é levar a cultura de preservação para a cadeia de valor e

demais stakeholders. A montadora investe no aumento da conscientização e no

incentivo de engajamento das empresas fornecedoras, aumentando as suas

expectativas sobre a postura ambiental de cada parceiro comercial.

Nidumolu, Prahalad e Rangaswami (2009) afirmam que o segundo estágio de

responsabilidade socioambiental é tornar toda a cadeia sustentável. Com os

fornecedores, a Fiat reforçou a exigência de comprovação de licenciamentos

perante os órgãos fiscalizadores e observância de boas práticas ambientais. Um

exemplo, citado mais de uma vez na pesquisa de campo, foi o processo de

certificação das gráficas de Belo Horizonte, após a Fiat decidir que todo trabalho

gráfico deveria possuir o selo Forest Stewardship Council (FSC) para impressos, a

partir de 2009. De acordo com o responsável pela área de comunicação interna, a

Fiat foi a grande indutora desse tipo de certificação das gráficas de Minas Gerais:

Eu lembro quando a gente tomou essa decisão. Agora já deve ter feito uns dois anos que, em Minas, nós não tínhamos parque de fornecedores certificados ainda. Então nós chamamos os fornecedores e falamos: “A Fiat está caminhando nessa direção, vem com a gente porque senão nós vamos sair do mercado mineiro”. E hoje é legal ver, porque a gente tem umas seis ou sete boas gráficas, talvez até mais, em Minas, certificadas. É lógico que isso não veio só da Fiat, mas com o tempo virou um mercado próprio também, mas você tem hoje. Então é legal isso, eu estou me colocando na lógica de cliente. e acho que isso vale pra outras coisas (E10). Então, assim, é aí que eu acredito no poder da empresa para fazer mudança na sociedade, você entendeu? Então nós, como Fiat, fomos indutores em Belo Horizonte para trazer gráficas certificadas. Obrigamos as gráficas a se certificar, obrigamos todas as áreas da empresa a comprar papel certificado. Hoje o papel que está na impressora é papel certificado. Hoje o papel com que se faz qualquer material nosso é papel certificado (E5).

Ainda de acordo com um diretor da Fiat entrevistado “no processo de

implantação da nova unidade fabril em Pernambuco, desde as primeiras reuniões

com os fornecedores, sempre o primeiro tema da agenda é sustentabilidade” (E1). A

empresa acredita que terá a chance de iniciar, na nova planta, um verdadeiro marco

no setor automotivo no Brasil no que se refere à responsabilidade socioambiental.

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158

As evidências das entrevistas apontam para um correto entendimento sobre a

corresponsabilidade da Fiat pelas práticas dos fornecedores e sobre o poder de

influência da montadora em toda a cadeia de valor:

Para eu garantir que um produto Fiat esteja totalmente livre de trabalho escravo, eu vou ter que ir até o subfornecedor do meu fornecedor. Porque o que a sociedade enxerga é o produto Fiat (E2). (...) mesmo a gente se esforçando para fazer o melhor, para fazer o diferente, nós estamos preocupados com mão de obra infantil. Aí você fala: “mas aqui na Fiat tem mão de obra infantil?” Aqui não, mas no fornecedor do fornecedor do fornecedor não sei. Eu sou responsável também, não sou só responsável por esta cerca aqui não, sou responsável pelo meu fornecedor, sou responsável pelo meu concessionário, sou responsável pelo carro que eu coloco na mão do cliente (E5).

Dentro do comitê (de sustentabilidade) tem pessoas de compras que são responsáveis pelo contato da fábrica com os fornecedores, e a gente comunica para os fornecedores quais ações de sustentabilidade que a gente está tomando e sugere que eles sigam na mesma linha, acreditando que esse é o caminho correto. Tem uma outra maneira também que, para escolher os fornecedores para vender para a Fiat, a gente tem que atender algumas normas e requisitos que estejam alinhados com essa cultura de sustentabilidade da Fiat (E9). Os fornecedores de tempos em tempos são requalificados a fazer isso, para poder serem aptos a fornecer para a Fiat. Vez ou outra a gente tem notícia de um fornecedor, por exemplo, que não tem um restaurante da maneira que devia, ou então não tem a relação com os funcionários em termos de contrato de trabalho que deveria. Então esse fornecedor a gente nem chama ele para ser um fornecedor da Fiat, mesmo que o preço dele seja mais baixo, seja possivelmente mais baixo (E9).

Uma parceria importante estabelecida pela Fiat em 2010 é com o instituto

Ethos, que será mais um canal multiplicador da visão e das práticas da empresa

entre os fornecedores:

(...) a Fiat tem a pegada de carbono, que foi um trabalho que foi feito e tudo mais, agora passa para os fornecedores, quando entra o Ethos ajudando uma plataforma, você fazer um diálogo com os fornecedores e dizendo para eles assim: “olha, se nós não trabalharmos de uma forma coletiva...” (...) quem que me garante 100% que os meus fornecedores não têm mão de obra escrava ou que não estão comprando de mão de obra escrava? (E6).

5.2.4.9 Concessionárias

O estreitamento da parceria entre fábrica e concessionárias é fundamental

para garantir aderência às estratégias e a postura de rápida resposta ao mercado. O

exemplo mais citado durante a pesquisa é que no dia seguinte ao anúncio da

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medida de redução do IPI, em 2008, a Fiat conseguiu alterar imediatamente o preço

de todos os produtos nas concessionárias, com rápida emissão de novas notas

fiscais. O preço do Fiat Mille, por exemplo, foi de 23.400 reais para 21.600 reais,

enquanto as principais concorrentes demoraram cerca de duas semanas para fazer

a mesma ação de redução de todos os preços dos produtos:

Quanto maior for a parceria da fábrica com a concessionária, melhor será para todo o sistema comercial, industrial e financeiro. Acima de tudo, vamos ter como consequência a demanda correta do mercado no sistema logístico, por modelo, versão, cor etc. (...) É melhor ter uma concessionária saudável, que paga as contas, do que empurrar-lhe vendas e ela ter dificuldades de vender e honrar seus compromissos (trechos de entrevistas do presidente Belini, extraídos do livro de Tanure e Patrus, 2011, p. 88).

Quando observado o tema de responsabilidade ambiental e social, o pilar

concessionária é tido como basilar para a empresa, dado que é lá (na

concessionária) que ocorre a principal interface com o cliente final. Mesmo assim,

até 2011 a Fiat ainda não havia começado um processo sistemático e estruturado de

conscientização e atuação de responsabilidade socioambiental com as

concessionárias. A empresa espera que, em breve, possa implantar uma

metodologia de responsabilidade socioambiental nos quase 500 pontos de

atendimento no Brasil.

Hoje a gente tem 500 pontos de atendimento no Brasil, entre concessionárias e pontos de atendimento, claro que isso não vai se dar de um tempo para outro, elas são empresas autônomas, mas muitas já têm ações próprias de relacionamento social ou ambiental, né? E depois a gente vai tentar alinhar isso numa metodologia mais sistêmica... do que a Fiat entende como atuação sustentável ao longo dos anos e tudo, mas tem alguns pilares que já são superdesenvolvidos, principalmente o relacionamento com o cliente (E4). Do outro lado da cadeia, eu tenho a concessionária, que é meu cartão de visita com o cliente. Aquilo que uma concessionária Fiat está falando, o cliente está ouvindo a Fiat falar. É o nosso ponto de contato com o cliente. Não é o único ponto, mas é um deles, talvez é o que mais está próximo ao cliente. Ele ouve nossas propagandas, os Big Brothers que a gente coloca lá... aquilo tudo vai montando uma imagem do que é Fiat; mas, na hora da verdade, quem vai vender um carro para ele, quem vai atender um carro em pós-venda vai ser nossa concessionária. Então nós temos muito claramente na nossa cabeça que temos que trabalhar da mesma forma a nossa rede de concessionárias. Porque, se eu começo a me posicionar como uma empresa que recicla a água industrial, que utiliza outros recursos energéticos para poder mover as máquinas, que está trabalhando projetos para poder diminuir o consumo de combustível, diminuir o índice de poluição, aumentar o índice de “reciclabilidade” dos carros, estar preocupado com o que os seus fornecedores estão fazendo em relação à formação de emprego, e de repente pego uma concessionária minha

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agredindo o meio ambiente, jogando óleo em um afluente... aquilo ali vai manchar a minha imagem. Eu não consigo separar: isso aqui é a concessionária, e eu não estou falando disso, meu negócio é “daqui” pra trás. Isso é impossível, e eu não estaria sendo responsável. Se eu quero ser, eu tenho que influenciar. O meu papel é influenciá-los (E2).

Apesar de não se tratar de amostragem representativa, o estudo verificou

que, ao menos nas concessionárias visitadas pelo pesquisador como “cliente

oculto”, realmente ainda não é praticado um discurso de empresa sustentável como

diferencial competitivo no momento da venda de veículos. Durante as visitas a duas

concessionárias da Fiat, na cidade do Rio de Janeiro, ao demonstrar interesse em

adquirir um veículo, mas com curiosidade sobre a postura da relação ao meio

ambiente, e se os vendedores tinham algum exemplo, estes apenas mencionaram

sobre os motores com baixo consumo de combustível e sobre o sistema

“econômetro” dos veículos, mas nada sobre o sistema produtivo da empresa ou

demais práticas de Rasc exercidas.

5.2.4.10 Funcionários

Para Penrose (1980), o limite para expansão e crescimento da firma está

diretamente associado à disponibilidade de recursos gerenciais, e a Fiat entende

que um dos desafios para garantir sua legitimidade passa pelo desenvolvimento de

novos líderes.

Conforme entrevistado E6, a Fiat testemunhou, no início dos anos 2000, uma

séria falta de novos líderes que pudessem substituir um grande numero de gestores

que estavam se aposentando. Neste caso, a empresa agiu de forma reativa, com o

desenvolvimento dos programas “Mapeamento de Sucessão” e o “Programa de

Desenvolvimento de Líderes” (PDL I e PDL II). Estes projetos, que agora já estão em

andamento, não atenderam ao requisito de “resposta antecipada” (FLECK,

2009), ou seja, a empresa demorou a responder ativamente e se planejar com

antecedência para evitar os riscos como o atual gargalo de mão de obra.

(...) a gente fez um grande diagnóstico, um diagnóstico interno, até para a gente saber assim, “olha, vamos entender cultura”, e um diagnóstico com uma pesquisa de clima para a gente entender os colaboradores. A pesquisa de clima apontou para a gente uma série de questões, dentre elas, gestão. E qual que era o meu problema de gestão? Basicamente que os líderes ainda estavam fazendo a gestão conforme o modelo de uma década atrás, às vezes mais diretivos, dando pouca autonomia. Então a gente falou: “bom, então nós temos que trabalhar os nossos líderes atuais, porque não é esse o modelo de gestão que a gente quer”. Comparado a isso, uma das coisas

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161

que a gente começou a fazer em 2009 foi o primeiro mapeamento de sucessão. O que eu fiz? Existem hoje 208 lideranças que eu vou chamar assim... são as lideranças mais seniores da empresa. Então eu estou falando de diretor, eu estou falando do que seria um diretor, de um Belini, e de um nível gerencial. Eu sentei com os 208 e fui falando assim, me conta hoje quem é o seu sucessor. E aí o resultado veio catastrófico. (...) Quando mostrava, ele falava, nossa, eu nunca parei para pensar (...). Esses programas (implantados na empresa depois de 2008), eles limpam o passivo, não é que eu estou preparando ainda para o futuro, não, eu só estou fazendo o que eu não fiz nos últimos períodos (...). Hoje eu já não tenho mais só 208 posições executivas, eu tenho 291, porque a empresa cresceu. Ela está expandindo. (...) A gente do RH vê que tudo que a gente está fazendo hoje vai ter reflexo daqui a cinco ou dez anos, porque você está revisitando o software, um modelo mental (E6).

Desde 2010, o tema “pessoas” passou a ser o primeiro tratado nas reuniões

do comitê executivo da Fiat. O objetivo era passar uma mensagem clara para todos

os colaboradores: que a empresa estava ciente que reter talentos e manter os

funcionários motivados seria fundamental para continuar a crescer.

Tem as chinesas e coreanas chegando e querendo levar todo mundo da Fiat. E com isso começou um leilão de salário, que não tinha isso no mercado brasileiro até poucos anos atrás (E6). Tudo na vida pode ser comoditizado, mas as pessoas não (...) somente as pessoas podem fazer a diferença (trechos de entrevistas do presidente Belini, extraídos do livro de Tanure e Patrus, 2011, p. 41).

A montadora também mantém ações educativas e de conscientização para os

funcionários, visando à redução de todos os tipos de desperdício nas mais diversas

áreas da empresa, desde os vetores energéticos (água, ar comprimido, energia

elétrica, vapor e combustíveis) até os hábitos pessoais dos empregados.

A Fiat vem atuando igualmente em processos de conscientização dos

funcionários sobre responsabilidade socioambiental, principalmente com o uso dos

múltiplos processos de comunicação interna e de multiplicadores internos.

(...) quando eu estou falando comunicação interna são 13.000 empregados diretos e contando com familiares chega a 50.000 pessoas. Uma noção mais estendido considerando a família também. Então eu tenho uma revista voltada pra família, essa revista aqui é corporativa, informativos e todo um sistema de comunicação interna (...). Então nós temos um poder muito grande. No momento da sustentabilidade, na lógica de comunicação, a gente vem trabalhando muito numa esfera de nivelar isso como um modelo de pirâmide evolutiva. No primeiro você tem um nível de informação, depois conhecimento, até transformar isso em ação ativa, e o cara vira, no final dessa pirâmide, realmente um multiplicador. Isso aqui vale pra tudo. Se a gente for pensar pela sustentabilidade, a gente está trabalhando muito na base dessa pirâmide, de consolidar esse repertório conceitual de informação sobre as ações da empresa e sobre a noção de sustentabilidade pra gente conscientizar as pessoas pra atitude dentro de casa. A gente

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162

trabalha dentro de um conceito da campanha que se chama “consciência sustentável” (E10). Tem uma prática da área ambiental que eu acho muito interessante que na produção eles criam uma figura que se chama “facilitador ambiental”, que é como se fosse um facilitador mesmo, mas em diferentes equipes. Então você tem uma equipe lá de dez operários. Hoje você tem o facilitador X. Então esses caras vão passando por treinamento, por conscientização e eles têm que desenvolver o olhar deles pro lado ambiental. E depois ele migra, passa a ser outro colega que passa a ser esse facilitador ambiental, mas esse cara continuou carregando isso (E10).

Existe uma preocupação recente em garantir maior diversidade no corpo de

funcionários. Para a Fiat, mais do que uma ação de Rasc, é uma forma de garantir

sucesso no longo prazo a partir dos benefícios gerados pelos processos de inclusão,

como maior inovação:

Então, quando você vem para a indústria (automotiva), você se depara com essa questão demográfica. Dentro dessa indústria você tem o corpo masculino muito maior do que a questão do feminino. E a questão de gênero, de você ter o gênero com uma certa equidade dentro da empresa, não é uma questão só para fazer bonito para a sociedade. Então assim, eu quero aumentar a quantidade de mulher dentro da Fiat, não é só para chegar aqui para você e falar que eu sou uma empresa diferenciada porque eu tenho 30% dos funcionários mulheres. É porque eu estou preocupado com a sustentabilidade econômica e financeira da empresa, e eu sei que a diversidade, a diversidade leva a isso. O diferente no dia a dia da empresa é uma soma. Se eu tiver aqui só homens trabalhando, todo trabalho deles, todo o desenvolvimento, tudo que eles pensaram, eles estão pensando igual homem. Só que eu tenho um mercado lá fora que atende homens e mulheres. (...) Eu não quero ter mulher aqui para chegar, preencher um relatório e falar, não, “30% da minha mão de obra é feminina”, “eu sou uma empresa sustentável”, não! Eu quero fazer isso aqui porque essa diversidade vai, no futuro, no médio, no longo prazo, ela vai se reverter com uma questão econômica para a empresa. Então eu preciso ter diversidade de gêneros, preciso ter diversidade (E5). Aí é que eu te falo que é o bom, porque essa diversidade cultural entre o empregado pernambucano e o empregado mineiro pode dar grandes frutos para a empresa, porque é da diversidade que vem uma série de soluções interessantes (E5). (...) quando a gente fala muito de diversidade em RH, as pessoas focam muito em gênero. Gênero é muito importante, só que olha que interessante: se eu for olhar hoje os demais itens de demografia, a minha demografia é uma demografia extremamente diversa, eu nunca trabalhei numa empresa onde eu tenho tantos profissionais seniores, pessoas de áreas completamente diferentes de formação. Então tem desde os designers, eu tenho engenheiro... (...) Então, se você olhar pelos outros aspectos, idade, é muito interessante, escolaridade. Então tem muitos doutores, muitos mestres, muitos pesquisadores, mas tem gente técnica, sabe, eu tenho uma pluralidade bem interessante. Agora, gênero eu tenho um problema, tenho problema de gênero e tenho problema de raça (...) Um dos meus objetivos é de diversidade. Promover ambientes mais diversos dentro da Fiat. Não é que a empresa acredita porque ela é boazinha de acreditar, é que ele quer

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o que é vital para o negócio dela.(...) a gente acredita também que a diversidade é motor da inovação (E6). Eu preciso ter [diversidade] porque hoje [são] os meus consumidores, essa é a minha demografia brasileira, é nesse cenário que eu estou, e, se eu não tiver, eu tendo a não conseguir fazer as fábricas de tendências e cenários cederem da melhor forma (E6).

Por fim, mesmo com o risco de não ter garantido o desenvolvimento de novas

lideranças de forma antecipada, evidências como os repetidos prêmios de “Melhor

empresa para se trabalhar” e “Great place to work”, além do baixo índice de turnover

da montadora (abaixo de 1% nos cargos de gestão.8) apontam que a empresa

também está conseguindo manter sua legitimidade e capturar valor na relação com

mais este stakeholder.

Quadro 5.9 –- Principais desafios e pressões da quarta fase da Fiat Brasil

5.3 Síntese da Análise

Nesta etapa, as análises foram sintetizadas de forma a permitir ao leitor

compreender o inter-relacionamento dos fatos mais relevantes do setor automotivo,

e como aconteceram as mudanças descritas nos ambientes, usando como apoio

didático e criação de mapas visuais, conforme sugerido por Langley (2007). O

primeiro mapa elaborado (Figura 5.4) buscou resumir os principais marcos do setor e

da economia, bem como o momento de entrada dos principais competidores (first

8 De acordo com entrevistado E6, no último ano, de 291 gestores apenas três saíram da empresa.

Ambiente Piedoso

Ambiente Desafiador

Ambiente Inóspito

Ambiente de

Negócio

Novos concorrentes; Cobrança dos acionistas por melhores resultados financeiros; Novo paradigma no relacionamento com stakeholders;

Mercado automotivo em forte expansão – 4 maior do mundo;

Ambiente

Institucional

Inúmeras leis beneficiando o setor automotivo e protegendo a indústria das crises externas e de novos concorrentes;

Estabilidade Política; Crescimento Econômico; Aumento da disponibilidade de instrumentos de crédito Nova “classe C” com acesso ao mercado de bens duráveis; Gestão dos Stakeholders

Ambiente

Natural

Novos desafios e obrigações no tema Responsabilidade Socioambiental;

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164

movers, challengers e newcomers) ou de representativas mudanças na arena

competitiva.

Figura 5.4 – Marcos do setor e da economia

Adicionalmente, tomando por base o framework utilizado nas seções

anteriores, foi desenvolvida uma análise, para cada tipo de ambiente (de negócio,

institucional e natural), visando a representar graficamente o movimento feito pela

Fiat durante o período em questão, atendendo a um dos objetivos desse estudo:

identificar o processo de transições ambientais durante o crescimento da empresa

líder do setor automotivo nacional.

Essa etapa também buscou estabelecer, sempre que possível, um

comparativo resumido sobre as perspectivas de condições de sobrevivência nos

ambientes entre a Fiat e as demais empresas da indústria automotiva nacional e,

assim tentar compreender fatores que possam ter influenciado o processo de troca

de liderança do setor. Para isso, usou como base as informações apresentadas no

capítulo quatro, sobre a evolução da indústria automotiva brasileira.

Foi possível observar diferenças nas perspectivas de condições ambientais

para o desenvolvimento das organizações atuantes do setor, principalmente no

1976

Principais Players Leis e marcos regulatórios

Fiat

1980 1984

Es mulo do

governo p/

exportação

Inicio da

década

perdida

Pico de exportações

da indústria

Principais

Inovaçõ

es para

o m

erc

ado b

rasile

iro

Principais

Marc

os

Principais Marcos Setor e Economia

Principais

Pla

yers

Le

is e

Marc

os Regula

tórios do seto

r M

arc

os Eco

nom

ia /

Sociais

1970 1953

Aviso

288

1956

Plano de

Metas JK

Ford;

GM;

Volks

1967 -

1974

“Milagre

Econômico

Greves

metalúrgicos

ABC

1987 1994 1992 –1993 1990

Plano Collor e

Confisco da

poupança

IPI Reduzido para

1.000 cm3

Plano Real

Novo regime

automo vo

1997

Crise Ásia e

Rússia; Fim

regime banda

cambial

Novas greves

ABC

Abertura do

mercado

Guerra do Golfo

Aumento preço

do petróleo

Medidas câmara

setorial p/

es mular o setor

Toyota

Renault

Mitsubishi

Honda

1998

Peugeot

Citroën

Nissan

2001

Crise financeira

internacional

Redução IPI

2008 2010

Brasil torna-se 4

maior

mercado

mundial no

setor

automo vo

Forte déficit comercial

do setor

1995

Importados

1991

Aumento

importação

2009

ECO 92

Redução IPI

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165

ambiente de negócios e institucional. Percebeu-se que os desafios e pressões

ambientais enfrentados por uma empresa não necessariamente são compartilhados

por toda a indústria. Além disso, durante as últimas décadas, as empresas tiveram

diferentes posicionamentos estratégicos, o que se deve em grande medida ao

momento em que começaram a atuar no mercado brasileiro (environmental

imprinting).

5.3.1 Ambiente de negócios

Figura 5.5 – Síntese do processo de transição da Fiat no ambiente de negócios

Diferente do cenário encontrado pela Fiat no inicio da sua jornada no Brasil, o

ambiente de negócios, até o meado da década de 1970 era, aparentemente,

piedoso para os demais atores (first movers). Com a baixa concorrência, e ainda

desfrutando dos incentivos do Plano de Metas de 1956, e dos bons resultados de

vendas do “milagre econômico” entre 1967 e 1974, a Ford, a GM e a Volks não

tinham maiores preocupações para investimentos em melhoria de produtos ou

apresentar para o consumidor brasileiro grandes inovações e, mesmo assim, o setor

crescia a uma taxa média de 20% ao ano.

Ambiente Piedoso

Ambiente Desafiador

Ambiente Inóspito

Ambiente de

Negócio

1970 - 1976 1976- 1990

1990 - 2003 2004- 2011

PERÍODO DESAFIO/PRESSÃOI Total inexistência de fornecedores e mão de obra

especializada na região de Betim

AMBIENTE TIPO CLASSIFICAÇÃO RESPOSTA (OLIVER, 1991)Negócio Inóspito Compromisso por balanceamento

I Mercado em forte expansão, apesar da concorrência;I Dificuldade de recebimento de peças;I Desconhecimento da marca pelo mercado consumidor;I Área rural e isolada para a implantação da fábrica;I Péssima estrutura logística;I Estar longe dos centros consumidores;II Estar situada longe do ABC e não sofrer com as greves;II Forte descontentamento dos clientes com os produtos;II Imagem desgastada;II Criação da Autolatina (Ford e Volks)

Negócio Desafiador Aceitação por conformidade Negócio Inóspito Aceitação por submissãoNegócio Inóspito Desafio - AtaqueNegócio Inóspito Compromisso por balanceamentoNegócio Inóspito Aceitação por Conformidade e DesafioNegócio Inóspito Aceitação por Conformidade e DesafioNegócio Piedoso AmortizaçãoNegócio Desafiador AmortizaçãoNegócio Desafiador Desafio - AtaqueNegócio Desafiador Evitação

II Redução brusca das vendas do setor; Negócio Desafiador AmortizaçãoII Dificuldades logísticas de recebimento de peças e

escoamento dos produtosNegócio Desafiador Desafio - Ataque

III Convencer fornecedores sobre Projeto J – Mineirização;III Imagem desgastada da empresa;III Insegurança e o descontentamento dos funcionários

Negócio Desafiador Compromisso por balanceamentoNegócio Desafiador Compromisso por pacificaçãoNegócio Desafiador Cooptação

IV Entrada de novos concorrentes;IV Cobrança dos acionistas por melhores resultados

financeiros;IV Novo paradigma no relacionamento com stakeholders;

IV Mercado automotivo em forte expansão – 4 maior do mundo;

Negócio Desafiador AmortizaçãoNegócio Desafiador Desafio - Ataque

Negócio Desafiador Compromisso por balanceamentoNegócio Piedoso Desafio - Ataque

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166

Como visto, a Fiat, por sua vez, teve que romper a barreira de um ambiente

de negócios inóspito, principalmente pelos seguintes fatores: por ter que construir

uma fábrica em um ambiente rural e longe do polo automotivo e dos principais

centros consumidores (e que conseguisse gerar capacidade produtiva compatível

com as dos demais players), e pela consequente necessidade de superar fortes

desafios logísticos; por ter que iniciar todo um processo de relacionamento com

fornecedores locais; e, finalmente, por ser uma nova marca no mercado dominado

por três grandes montadoras que, juntas, fabricavam 88,5% dos veículos no país

(ANFAVEA, 2011).

Já durante os anos de 1976 a 1990, pode-se dizer que o ambiente de

negócios para todo o grupo das montadoras tradicionais, e agora já com a Fiat como

parte desse “clube”, era desafiador, mesmo que por razões diferentes. Se, por um

lado, na década de 1980 as montadoras instaladas no ABC tiveram problemas

produtivos devido às greves, a Fiat, em Betim, enfrentou sérios problemas de

aceitação dos seus produtos, principalmente por preço e qualidade percebida. Em

comum, todas sofreram com um mercado consumidor fortemente retraído e tiveram

no incentivo à exportação a fórmula de sobrevivência operacional. Gradativamente,

a Fiat conseguiu ganhar mercado e chegaria ao fim da década como a montadora

responsável por 23,27% da produção de veículos no Brasil e 11,46% de participação

de mercado (ANFAVEA, 2011).

No início da década de 1990, após a abertura do mercado pelo presidente

Collor, com as novas políticas de incentivo da indústria, termina o longo período de

estagnação e as montadoras voltam a registrar recordes de produção. Por ter saído

na frente da concorrência com o primeiro motor 1.0 do país, e após as

reformulações no seu processo produtivo, a Fiat praticamente triplicou sua

participação no mercado nacional em 4 anos, chegando ao pico histórico de 29,26%

de market share. Em compensação, a empresa teve que buscar formas de combater

suas desvantagens operacionais e de imagem.

Entre 1990 e 1997, apesar do crescimento do volume de importação e

consequente pressão para a busca de melhoria de processos e produtos, o mercado

interno se manteve basicamente dividido entre as quatro montadoras tradicionais

(Fiat, Volks, GM e Ford). Porém, com a principal consequência do novo regime

automotivo, a entrada de novas montadoras (com destaque para as francesas

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Peugeot, Renault e Citroën, e as japonesas Honda e Toyota), o quarteto perdeu

mais de 10% de market share entre 1997 e 2001.

Gráfico 5.3 - Representatividade na produção de veículos no Brasil entre os principais

players (1976 – 2010)

Fonte: ANFAVEA (2011)

Na década de 2000, com o bom momento econômico do Brasil e o

crescimento do consumo de bens duráveis pela classe C, principalmente pela maior

disponibilidade de instrumentos de créditos, as empresas voltaram a investir no

setor. A competitividade aumentou e todos os players foram estimulados a buscar

inovações e formas de reduzir custos.

A Fiat torna-se a líder de vendas, contudo começou a apresentar um péssimo

resultado operacional. A busca por “liderança de vendas” a qualquer custo tornou a

operação brasileira deficitária. Paralelamente, os problemas financeiros da sua

matriz, em um mercado estagnado, pressionava ainda mais a filial brasileira a buscar

novas formas para rentabilizar as operações locais e europeia da montadora. Com

isso, foi preciso uma forte mudança do direcionamento estratégico da Fiat, a partir

de 2004, para a empresa voltar a ser lucrativa, e ainda mantendo a liderança de

vendas.

0,00%

10,00%

20,00%

30,00%

40,00%

50,00%

60,00%

70,00%

80,00%

90,00%

100,00%

1976 1979 1982 1985 1988 1991 1994 1997 2000 2003 2006 2009

FIAT

FORD + GM + VW

Demais Montadoras

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168

No fim da primeira década do novo milênio, o Brasil se tornou mercado-chave

para todas as grandes montadoras do mundo, que desembarcaram em solo nacional

modelos mais modernos, intensificando a necessidade de diferenciação. Pode-se

afirmar que a nova ameaça às empresas instaladas no Brasil são os veículos

importados, que caíram no gosto do brasileiro principalmente pela qualidade

percebida, no caso do mercado de luxo, ou pelo baixo custo, principalmente

oferecido pelas montadoras chinesas. Provavelmente, mais do ter migrado da

posição de desafiante para a de líder de mercado, o grande desafio para a Fiat será

defender essa posição.

5.3.2 Ambiente institucional

Figura 5.6 – Síntese do processo de transição da Fiat no ambiente institucional

Na década de 1970, as características do ambiente institucional para as

montadoras já instaladas (Volks, Ford e GM) eram completamente opostas quando

comparadas às da Fiat. Enquanto as três empresas encontravam-se em um

ambiente institucional piedoso, devido à proteção de mercado, baixas expectativas

sociais, e aos elevados índices de crescimento no setor devido ao “milagre

Ambiente Piedoso

Ambiente Desafiador

Ambiente Inóspito

Ambiente

Institucional

1970 - 1976 1976- 1990

1990 - 2003 2004- 2011

PERÍODO DESAFIO/PRESSÃO AMBIENTE TIPO CLASSIFICAÇÃO RESPOSTA (OLIVER, 1991)I Lobby das 3 grandes montadoras, tanto com o governo,

quanto com os fornecedores;Institucional Inóspito

Manipulação por influência / Evitação por fugaII Mercado “fechado” para importaçõesII Crise do petróleo;II Inflação galopante;II Mercado interno em forte estagnação;

Institucional Piedoso Desafio - AtaqueInstitucional Desafiador AmortizaçãoInstitucional Desafiador AmortizaçãoInstitucional Desafiador Amortização

II Incertezas políticas Institucional Inóspito AmortizaçãoIII Abertura do mercado e entrada de novos concorrentes; Institucional Desafiador Desafio - AtaqueIII Novos acordos automotivos emergenciais (1999)III Novas leis, acordos e regulamentações para os setor

automotivo;III Incentivo fiscal para consumo de carro 1.000cm3III Grandes mudanças no cenário macroeconômico;III Crises globais;III Leis de incentivo Caros Flex;

Institucional Piedoso Compromisso por balanceamentoInstitucional Desafiador Compromisso por balanceamento

Institucional Desafiador Estratégia de manipulaçãoInstitucional Desafiador AmortizaçãoInstitucional Desafiador AmortizaçãoInstitucional Desafiador Compromisso por balanceamento

IV Nova “classe C” com acesso ao mercado;IV Leis beneficiando o setor e protegendo a indústria das

crises externas e de novos concorrentes;

Institucional Piedoso Desafio - AtaqueInstitucional Piedoso Manipulação por influência

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169

econômico”, a Fiat precisava transpor diversos obstáculos para sair de um ambiente

inóspito para, pelo menos, atuar em um ambiente desafiador.

Conforme visto, a empresa teve que investir tempo e energia para combater

principalmente diversas forças do “não mercado” (BARON, 1995), como o lobby

efetuado pelas concorrentes que pretendia criar barreiras de entrada, tanto na esfera

governamental, quanto do próprio setor. Isto a forçou situar-se fora do grande polo

automotivo nacional, e longe dos principais mercados consumidores.

Do instante em que superou as barreiras e efetivamente “entrou” na arena

competitiva até o momento da abertura do mercado, a Fiat compartilhou as

principais pressões do ambiente institucional com as outras 3 montadoras do setor:

as incertezas políticas; os reflexos da crise do petróleo; a inflação galopante; uma

economia estagnada; políticas de congelamento de preços; dentre outros. Porém, a

empresa passou a se beneficiar, junto com as outras três, pela primeira vez, do que

antes era um desafio: estar “dentro” de um mercado fechado para importações.

No início da década de 1990, os reflexos da nova conjuntura econômica, com

o congelamento das cadernetas de poupanças, e da a abertura de mercado, foram

sentidos de forma similar para as montadoras aqui instaladas. A Fiat, contudo,

conseguiu, a partir de uma decisão do ambiente institucional (o regime especial de

tributação para veículos com até 1.000 cilindradas a montadora), ganhar mais

destaque no ambiente de negócios, por ser a única já preparada para usufruir desse

benefício.

Entre 1994 e 1998, o cenário para a indústria era piedoso para as montadoras

já instaladas e mais desafiador para novas entrantes (newcomers). Aliado à nova

realidade econômica, os diversos acordos automotivos elaborados em parceria com

o governo, além dos robustos aportes financeiros com recursos públicos, permitiram

que as empresas tradicionais atingissem recordes de venda e chegassem ao limite

das suas capacidades produtivas instaladas.

Com o desbalanceamento entre oferta e procura, e o grande déficit na

balança comercial do setor, o governo novamente toma decisões que gerariam

alterações na arena competitiva. O estímulo para a abertura de 14 novas unidades

fabris, e o inicio de produção local de novas marcas, compartilhando os mesmos

benefícios fiscais, gerou fortes desafios para as empresas instaladas.

O cenário institucional do final do milênio foi marcado pelas crises globais

(Ásia e Rússia), com profundos impactos na economia do Brasil, além do fim do

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170

regime de paridade cambial. Como reflexo da queda no volume de vendas e perda

de lucratividade, as montadoras iniciaram processos de demissões e terceirizações.

O panorama obrigou a protelação de planos de expansão, ou mesmo a chegada de

outros concorrentes.

Outro fator de mudança nas características da indústria automotiva que

também pode ser atribuído ao governo é a regulamentação e incentivo para a

produção e consumo de veículos “flex”, que pressionou tanto as montadoras locais

quanto as importadoras a efetuarem grandes investimentos em pesquisa e

desenvolvimento de produtos.

Nos últimos anos, a consolidação do bom momento da economia brasileira; a

ascensão da nova classe C; a redução das taxas de juros e a ampliação dos

instrumentos de credito; além do potencial de crescimento do consumo de veículos

no Brasil, geraram confiança em todo o setor para a ampliação dos investimentos e

tornou, assim, o ambiente ainda mais convidativo para demais players globais.

Por fim, ficou evidenciado que a indústria automotiva continua recebendo, das

mais diferentes esferas de governo, pacotes de incentivo financeiro, além de

redução ou isenção tributárias, e por isso é tida, por muitos, como a indústria

brasileira mais beneficiada e protegida pelo Estado. No entanto, é fundamental

registrar que, por existirem grupos (clusters) de empresas dentro da mesma

indústria, determinadas ações do Estado com o discurso de beneficiar “a indústria”

acabam privilegiando um grupo de empresas em detrimento de outros.

5.3.3 Ambiente Natural

Figura 5.7 – Síntese do processo de transição da Fiat no ambiente natural

Ambiente Piedoso

Ambiente Desafiador

Ambiente Inóspito

Ambiente

Natural

1970 - 1976

1976- 1990

2004- 2011

1990 - 2003

PERÍODO DESAFIO/PRESSÃO AMBIENTE TIPO CLASSIFICAÇÃO RESPOSTA (OLIVER, 1991)I Pouca ou nenhuma pressãoII Pouca ou nenhuma pressãoIII ECO 92 - Discussões sobre necessidade de atuação no

despejo de detritos e reuso de matérias-primas - Inauguração da Ilha Ecológica

Natural Piedoso Aceitação por conformidade Natural Piedoso Aceitação por conformidade Natural Desafiador Desafio

IV Discussões sociais e políticas e novos desafios e obrigações no tema Responsabilidade Socioambiental;

Natural Desafiador Ataque

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171

Em relação às pressões do ambiente natural, o estudo evidenciou que as

primeiras discussões relevantes no setor ocorreram apenas na década de 1990,

provavelmente estimuladas pelo evento da ECO 92, ainda de forma abrangente e

não direcionada especificamente para a indústria automotiva. Somente nos anos

mais recentes, foram iniciados debates mais efetivos e produtivos com o Estado e

sociedade sobre como a indústria deveria cuidar do meio ambiente e sobre os

“efeitos colaterais” dos veículos.

Mesmo assim, comprou-se que, apesar das ditas preocupações com a

poluição, com o nível consumo de combustíveis e com o problema do trânsito, as

atuais legislações brasileiras ainda são mais brandas do que em países como

Estados Unidos e Europa. Ainda, para o governo é mais simples incentivar a venda

de carros do que atuar em políticas efetivas de mobilidade urbana, por exemplo.

A Fiat manteve durante os últimos 20 anos um comportamento de moldagem,

se antecipando às potenciais pressões do ambiente natural, desde ter apresentado o

primeiro carro nacional com padrões europeus de emissão de gases poluentes, à

implantação da Ilha Ecológica na planta de Betim, ainda em 1994. Como resultado,

foi a primeira empresa brasileira – dentre todos os setores – a receber o selo de

certificação ambiental ISO 14.001.

Durante as entrevistas, a questão de preocupação com o meio ambiente foi

claramente expressa pelos representes de todas as áreas internas da Fiat. Foram

exemplificados desde os processos de concepção dos novos veículos; a escolha

preferencial por uso de materiais reciclados; a preocupação com os índices de

reaproveitamento de água e consumo de matérias-primas por veículo; até mesmo o

processo de certificação dos fornecedores e concessionárias buscando influenciar

toda a cadeia produtiva. Esses fatores, além de ajudar na reputação e manutenção

da legitimidade da empresa, reduzem sua exposição a riscos.

Em processo de pesquisa sobre as ações de práticas de responsabilidade

ambiental e social corporativa nos sites e publicações dos principais concorrentes

(Volkswagen, Ford, GM, Toyota, Honda, Peugeot, Renault e Citroën) foi comprovada

a existência de um discurso compartilhado de investimentos em busca de inovações,

produtos e processos, visando reduzir os impactos no meio ambiente e em tornar os

veículos mais econômicos. Muito embora não tenham sido realizadas comparações

em profundidade com outras empresas da indústria automotiva nacional, os

constantes prêmios de “Melhor empresa do setor de veículos e em gestão de

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172

responsabilidade social e meio ambiente” 9 recebidos pela Fiat são, de certa

maneira, interessantes indícios do exercício de uma prática diferenciada pela

empresa estudada.

Figura 5.8 – Mapa visual consolidado da trajetória da Fiat entre os ambientes

9 Lista completa dos principais prêmios ambientais estão destacadas no Apêndice B

Ambiente Piedoso

Ambiente Desafiador

Ambiente Inóspito

Ambiente de

Negócio

Ambiente

Institucional

Ambiente

Natural

1970 - 1976 1976- 1990

1990 - 2003 2004- 2011

1970 - 1976 1976- 1990

1990 - 2003 2004- 2011

1970 - 1976

1976- 1990

2004- 2011

1990 - 2003

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173

6. CONCLUSÃO

Este trabalho analisou o caso Fiat do Brasil descrevendo seu processo de

crescimento e de migração de uma posição de desafiante (challenger) em uma

indústria para a de líder do setor. O presente estudo também visou contribuir para o

entendimento sobre responsabilidade sócio ambiental e como este tema, tão

debatido atualmente, se relaciona com os estudos sobre crescimento e longevidade

organizacional.

Para responder ao questionamento proposto, foram utilizados como base

teórica os frameworks de Fleck (2009) e Fleck (in print). O primeiro possibilitou

entendimento sobre os padrões de respostas da empresa em relação os desafios do

empreendedorismo e de navegação no ambiente, condições necessárias para uma

organização conseguir gerar e capturar valor, possibilitando crescimento e

renovação organizacional e sucesso a longo prazo, e estão associados aos pilares

“ambiente” e “liderança” da formação estratégica de Mintzberg et al (2000). O

segundo permitiu análises sobre as teorias e estudos dos tipos de ambientes

sugeridos pela sociologia organizacional (negócios, institucional e ambiental) e os de

acordo com a perspectiva de condições de desenvolvimento da firma (piedoso,

desafiador e inóspito).

Esta dissertação também possibilita revisitar os questionamentos iniciados na

década de 1970 sobre o “determinismo” versus “escolhas estratégicas”. Partindo do

entendimento que o ambiente pode, ao mesmo tempo, restringir as opções

estratégicas ou prover uma “atmosfera” para decisões ativas de gestores

empreendedores, inferiu-se que, fosse o “ambiente” quem determina o destino das

organizações (como defendido pela ecologia de população), uma empresa

desafiante dificilmente teria condições de se tornar líder de uma indústria.

6.1 Respostas à pergunta principal e considerações sobre o processo de

crescimento da Fiat

Ao encerrar a fase de análise das evidências, confrontando-as com as

proposições teóricas discutidas no capítulo revisão bibliográfica, foi possível sugerir

algumas respostas para a pergunta que orientou este projeto de pesquisa. O estudo

concluiu que a trajetória da Fiat até o “topo do pódio” no ranking brasileiro de

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montadoras, bem como seu processo de crescimento e manutenção de legitimidade

podem ser relacionados ao desenvolvimento de capacidade de responder

satisfatoriamente aos desafios de navegação no ambiente dinâmico e de

empreendedorismo (FLECK, 2009).

No que se refere ao empreendedorismo, o principal foco da empresa foi

tentar aumentar constantemente seu market share e, assim, melhorar seu

desempenho ao ganhar vantagens de escopo e escala. Para isso, desde o momento

da sua criação, a Fiat buscou se diferenciar dos demais concorrentes mantendo um

constante processo de criação de valor a partir de inovações de produtos e

introdução de tecnologias não presentes nos carros nacionais, além da revisão

constante dos seus processos de produção. Aliado a isso, a empresa procurou

aplicar o conhecimento que era adquirido sobre as preferências e especificidades do

mercado brasileiro nos seus carros, com grandes investimentos em áreas de

pesquisas e vincular sua marca com o mercado local.

Quanto ao desafio de navegação em ambientes dinâmicos, foi percebida

uma constante prática de monitoramento (scanning), de um comportamento ativo, e

agilidade para responder às pressões ou mesmo se antecipar aos principais

desafios dos ambientes. Com o uso de uma variedade de táticas estratégicas, a

“mão visível da empresa” (CHANDLER, 1977) não só soube responder às pressões

quanto pode atuar moldando os ambientes em que está inserida.

As evidências apontam que, por opção estratégica da empresa (MINTZBERG

et al 2000), o direcionamento adotado, principalmente após 2004, buscou atender,

de forma simultânea, as demandas dos mais diversos stakeholders, mesmo as

potencialmente divergentes. Além de criar valor para seus clientes não só por

inovações “mecânicas” nos produtos, mais facilmente copiáveis, a empresa passou

a implementar conceitos de interatividade com os clientes, de forma criativa, como o

processo de criação coletiva. Paralelamente, a organização estreitou seu

relacionamento com os fornecedores, obteve maior autonomia da matriz e retornou

melhores dividendos para os acionistas. Também ficou caracterizado um maior

entendimento sobre a necessidade de projetos, produtos e processos voltados à

responsabilidade socioambiental. Embora não seja possível sugerir uma relação de

suficiência, todo este padrão de comportamento atende a uma das condições

necessárias para a longevidade saudável (HAWKINS, 2006; FLECK, 2010).

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175

A partir das evidências pesquisadas, podemos dizer que, em relação ao

desafio do empreendedorismo, empresa manteve um padrão de comportamento de

alto alcance (FLECK, 2009), com busca e avaliação eficaz de riscos e

oportunidades de expansão. A Fiat gerou valor desenvolvendo, de forma

consistente, os serviços empreendedores de ambição, versatilidade, acesso a

recursos além de capacidade de julgamento e tomada de decisão (PENROSE,

1980).

E, em relação ao desafio da navegação, o padrão de resposta da organização

é tipicamente de moldagem do ambiente (FLECK, 2009), com um monitoramento

ambiental abrangente, atuando na construção de regras e práticas inter-

organizacionais e com movimentos proativos para capturar valor e assegurar

legitimidade organizacional.

No que tange às respostas da empresa aos desafios de empreendedorismo e

navegação no ambiente, pode-se dizer que as mesmas vêm possibilitando um

processo de crescimento e renovação organizacional, e que se orienta na direção do

polo de autoperpetuação (FLECK, 2009).

Esse trabalho permite constatar que não cabe às pressões e desafios do

ambiente estabelecer toda a pauta das organizações tornando-as simplesmente

reativas, conforme sugerido por teóricos da “escola ambiental”. Mas que ao adotar

um comportamento empreendedor e de monitoramento ativo do ambiente, as firmas

não só garantem continuidade no seu processo de expansão, como podem ter como

possível consequência alcançar a posição de liderança na indústria.

6.2 A relação entre o crescimento organizacional e responsabilidades

socioambientais

As análises sugerem que, ao passar a considerar a importância da

incorporação de atitudes sustentáveis ao seu negócio, não só atuou a Fiat na

manutenção da sua legitimidade, como contribuiu para o desenvolvimento de um

perfil de empresa inovadora, deixando-a menos exposta a demais riscos

operacionais e legais.

Quando a empresa passou a entender a diferença entre responsabilidade

social e filantropia, por exemplo, e integrou práticas de Rasc às estratégias

empresariais e as incorporou no dia a dia das operações, foram adquiridas

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176

importantes vantagens competitivas, como a maior eficiência na utilização de

matérias-primas no processo de produção de veículos. Pode-se anuir, a partir das

evidências, que as principais fontes de motivação da empresa para a incorporação

de práticas sustentáveis foram a busca de vantagens competitivas, a redução de

riscos operacionais e impactos ambientais, a preocupação com a reputação da

empresa e o entendimento sobre a sua obrigação moral, ou seja, fazer a coisa certa.

Apesar de ser um setor de expressiva demanda de matérias-primas, além de

responsável por grande volume de descartes e de efeitos colaterais no meio

ambiente e na sociedade, o estudo não constatou evidências de que no Brasil as

forças coercitivas do mercado consumidor ou do Estado em relação a Rasc são

intensas. As atuais legislações se restringem basicamente a políticas de emissão de

gases de efeito estufa, ou preocupações básicas com os processos produtivos. Por

exemplo, ainda não existem leis específicas sobre o uso de materiais recicláveis ou

sobre a responsabilidade das montadoras pelo ciclo de vida dos seus produtos.

Outro exemplo é o processo de incentivo ao consumo de veículos, por parte

do governo federal, principalmente com a manipulação das tarifas de IPI, que ainda

adotam a mesma postura do início da década de 1990, ou seja, de acordo com a

cubagem do motor, e não pelo grau de emissão de gases poluentes. Todavia, com o

novo selo de eficiência de consumo, do Programa Brasileiro de Etiquetagem

Veicular (PBEV), é possível que esta realidade mude, o que poderia se tornar um

novo motivador para as montadoras buscarem o desenho de produtos com menor

consumo e consequente redução de impactos ambientais. As iniciativas atuais ainda

se restringem ao âmbito dos governos estaduais como, por exemplo, o projeto “IPVA

Verde”, que entrará em vigor a partir de 2013 no Estado do Rio. A partir desse ano,

este Estado dará descontos ou aumentará o imposto de acordo com a classificação

dos veículos pelo PBEV.

Um dos impactos do crescimento do setor citado durante a parte inicial do

estudo, os grandes engarrafamentos e seus demais efeitos colaterais, não são

vistos pela empresa pesquisada como uma questão a ser resolvida pelo setor, mas

como um problema reservado apenas para o governo solucionar. Mesmo assim, a

organização entende que a mobilidade urbana e a gestão integrada de transporte

coletivo, se não resolvida, pode se tornar um gargalo ou pressão para o atual ritmo

de produção.

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177

6.3 Contribuição ao arcabouço teórico

O estudo de caso sobre a Fiat do Brasil, além validar a aplicação dos modelos

teóricos propostos por FLECK (2009) e FLECK (in print) no setor automotivo

nacional, ratificou a importância do entendimento sobre a correta análise dos

desafios do ambiente, e a relação desses fatores com um potencial sucesso ou

fracasso de uma organização. Ainda, o uso do processo de abordagem histórica e

investigação longitudinal sobre a unidade de análise escolhida, conforme proposto

por YIN (1998), foi fundamental não só para o mapeamento das características dos

ambientes, como para o entendimento sobre os padrões de respostas da firma em

relação aos desafios explorados e seu caminho rumo a liderança do setor.

A pesquisa também mostrou que grupos de empresas no mesmo setor

podem estar enfrentando simultaneamente ambientes diferentes. Ou seja, a

configuração de um ambiente de uma indústria não pode ser considerada “absoluta”

para todo um setor, como geralmente considerado nas abordagens tradicionais de

estudos em estratégia. Tais abordagens tendem a considerar as “características do

ambiente” como algo compartilhado por toda a arena competitiva, ou então

praticamente a desconsideram, como no modelo sobre as forças competitivas de

Porter (1980). Esta constatação tinha sido observada anteriormente por Fleck

(2001), ao pesquisar outra ecologia temporal: a indústria de energia elétrica

americana, no seu estudo comparativo entre as empresas GE e a Westinghouse.

Essa observação ajuda na generalização das teorias para demais indústrias e

na sistematização dos conceitos abordados sobre crescimento e ambientes

organizacionais. Tal resultado deve ser observado por gestores ao se posicionarem

sobre análises ambientais e nas suas decisões estratégicas, reforçando a validade

prática deste referencial teórico.

Em relação a Rasc, a partir da análise pode-se considerar que a observação

e incorporação de práticas de Rasc são práticas esperáveis nas gestões atuais.

Além de estimular a criação de valor por processos de inovação, e gerar diversos

benefícios para a firma, são padrões de comportamentos exigidos cada vez mais

pelos diversos stakeholders, e vitais para a manutenção da legitimidade da firma.

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178

6.4 Implicações do estudo de caso da Fiat para outras organizações do

setor automotivo

Além de corroborar as teorias abordadas, algumas observações a partir do

estudo de caso podem ser generalizadas para a indústria automotiva nacional. Aqui,

a classificação das implicações foram feitas de acordo com os desafios abordados

por este trabalho: empreendedorismo e navegação no ambiente.

Em relação ao processo de empreendedorismo, o aprendizado deste

trabalho confirma as teorias apresentadas e reforça que:

a) No setor automotivo é fundamental buscar a criação de valor a partir

do processo de crescimento, principalmente para poder adquirir

vantagens de escala e escopo. Além do crescimento orgânico, o

setor tem reforçado o uso de estratégias de parcerias e joint

ventures, com o foco de eliminação de players marginais.

b) Investimentos em inovações são essenciais para permitir

diferenciação em mercados cada vez mais competitivos. Essas

inovações devem focar não só nos produtos, mas nos processos e

no uso eficaz de matérias-primas;

c) O uso de plantas como plataformas de exportação são estratégias

eficazes em momentos de crises internas ou estagnação de

mercados. Para isso, cada vez mais as montadoras precisarão

apostar nos seus conceitos de carros globais. Uma condição de

sucesso dessa estratégia é manter e aprofundar o conhecimento

sobre mercados locais, atuando assim na estratégia conhecida

como “Pensar globalmente, agir localmente”;

d) Por outro lado, assim como observado no estudo de Schlie e Yip

(2000), a partir do momento que a Fiat obteve maior responsividade

local (local responsiveness) ou seja, adquiriu mais autonomia e

passou a fazer ajustes em seus veículos, serviços e formas de

condução dos negócios a nível local, tendo em consideração a

cultura nacional e as necessidades do consumidor brasileiro, a

empresa obteve melhor aceitação dos produtos e identificação com

o mercado nacional. Embora esta estratégia possa reduzir os

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179

benefícios de se tornar uma plataforma de exportação e de

padronização de certos produtos, ajuda a empresa não só a atender

as preferências dos gostos dos consumidores locais, mas adaptar

sua estratégia para características dos canais de distribuição e

demandas do governo.

e) Atualmente, no mercado automotivo brasileiro, as novas entrantes

representam a grande ameaça do ambiente de negócios para as

empresas tradicionais, superando a preocupação sobre a

competição entre estes habituais atores. Dentre as novas entrantes,

as montadoras chinesas são consideradas as grandes ameaças a

médio prazo, principalmente pelo baixo preço dos produtos e ainda

oferecendo, em média, 5 anos de garantia;

f) O setor automotivo nacional desde a década de 1950 recebe uma

atenção especial do governo federal, vide os diversos regimes

automotivos e planos de proteção da indústria. Uma evidência mais

recente dessa superproteção e poder de lobby, de acordo com

Dantas (2012), é que entre o início da crise financeira internacional,

em 2008 até o fim de 2011, o governo brasileiro abriu mão de R$ 26

bilhões em impostos para a indústria automotiva. O principal

argumento é a criação e manutenção de empregos e o impacto do

setor no PIB. Contudo, durante esse período, de acordo com Dantas

(2012), o setor criou 27.753 novas vagas de trabalho, significando

que cada nova carteira de trabalho assinada pelas montadoras

custou cerca de R$ 1 milhão em renúncia fiscal aos cofres públicos.

g) Por fim, as evidências sugerem que o consumo de veículos elétricos

ou híbridos não deverá ser relevante no Brasil a curto e médio

prazo. Os principais entraves são a falta de infraestrutura de recarga

e os elevados preços quando comparados aos veículos

convencionais.

Para as implicações inferidas a partir da análise do processo de navegação

do ambiente, é interessante que as constatações do estudo para outras

organizações do setor sejam feitas a partir das perspectivas de interação com os

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múltiplos stakeholders, pois cada parte interessada possui expectativas e uma forma

de troca de valor específica com a organização (LEPAK et al, 2007).

a) Governo: conforme visto, a relevância social e econômica da cadeia

produtiva do setor automotivo transforma a indústria como uma das

prioritárias nas manobras fiscais, de aumento do PIB, e de

manutenção de empregos. Assim, cria-se uma proximidade com

esta parte interessada, o que permite a indústria capturar valor a

partir dos processos de favorecimento do setor, como a ampliação

da demanda por facilitação de instrumentos de crédito, ou por

redução dos preços de venda, com as isenções e incentivos

tributários. Percebeu-se ainda que esta grande influência do

governo brasileiro na indústria automotiva, tem capacidade de

mudar configurações da arena competitiva de forma quase que

imediata.

b) Consumidores: a expectativa dos consumidores é, em geral, receber

produtos com alto valor percebido por um valor de troca menor,

gerando a melhor percepção de bom custo beneficio possível, além

de fatores subjetivos como a identificação com a marca e com um

determinado produto. Assim, é importante interpretar e atender os

desejos e particularidades de cada nicho de mercado. Um profundo

conhecimento dos mercados locais, aliado a agilidade de resposta

na apresentação de inovações, pode ajudar uma empresa a criar e

capturar valor em um mercado cada vez mais competitivo.

c) Fornecedores: este trabalho evidenciou que uma forma eficiente de

capturar valor é trazer a cadeia para próximo da organização. Não

apenas fisicamente, mas incluí-los nos processos e estreitar

relações de parcerias. Ainda, identificou a corresponsabilidade da

montadora sobre os processos produtivos no que se refere à Rasc,

e da consequente necessidade de influenciar o uso de práticas

socioambientalmente responsáveis;

d) Funcionários: as evidências apontam uma captura de valor ao

possibilitar um bom plano de carreira, de fazer o colaborador se

sentir representado nas decisões da firma. Esses processos podem

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181

ser transformados em altos níveis de motivação, baixos índices de

turnover, e em não adesão às propostas greves, ou mesmo em

evidências mais tangíveis como prêmios de “Great Place to Work”,

todos evidenciados no caso em estudo;

e) Sociedade e meio ambiente: além de existirem obrigações da

organização em relação a práticas de Rasc, estas não poderão

sobreviver sem se tornar responsável com a sociedade em que ela

opera. Contudo, mesmo que uma firma se destaque em relação ao

tema, o processo de captação de valor criado nunca é garantido

(LEPAK et al, 2007). Mesmo que este trabalho não tenha

encontrando uma clara mensuração de relação de causa x efeito

entre as ações de Rasc e o processo de crescimento da

organização, existem evidências da captura de valor a partir dos

processos produtivos, como a redução da dependência de matérias-

primas para a fabricação do produto, além de neutralizar os riscos

de multas e outras penalidades por infrações ambientais. Porém os

processos produtivos não são estratégias difíceis de serem

replicadas, o que não só torna um desafio maior manter tais práticas

como diferenciais competitivos, mas as tornarão um pré-requisito de

sobrevivência.

6.5 Sugestões para pesquisas futuras

Finalizando, serão sugeridos algumas propostas para estudos futuros.

Algumas das evidências deste trabalho sugeriram relações que merecem ser

exploradas novamente, se possível igualmente na indústria automotiva nacional,

com o uso do mesmo referencial teórico utilizado, principalmente para poder

confrontar com os resultados alcançados no estudo de caso da Fiat do Brasil.

Tal paralelo possibilitaria robustecer ou contrapor a conclusão sobre a

necessidade dos gestores observarem em maior profundidade as características dos

ambientes em que suas empresas estão navegando, da mesma maneira que este

estudo reforçou os achados de Fleck (2001).

Por fim, ao refazer o estudo em outras empresas do setor, espera-se que o

pesquisador consiga:

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182

• Entender como se comportaram as concorrentes da Fiat e seus movimentos

estratégicos durante o mesmo período estudado, especialmente os a

Volkswagen, que foi líder de mercado por mais de quatro décadas;

• Entender com mais profundidade o que as demais empresas do setor estão

fazendo em relação a Rasc e o quão diferentes são seus processos - e

estratégias - dos da Fiat;

• Entender sobre o processo de institucionalização de práticas de Rasc na

indústria automotiva nacional;

• Investigar em maior profundidade os processos de influência (lobby) da

indústria junto ao governo brasileiro e entender como acontece nos outros

países BRICS;

Um dos achados secundários deste trabalho foi a percepção sobre a velocidade

com que certas decisões do governo mudam, quase que da noite para o dia, o

ambiente competitivo. Assim, seria interessante um segundo estudo que pudesse

comparar, a partir de uma análise histórica, as decisões de outros governos em

relação a indústria automotiva.

Um último estudo sugerido poderia ser uma abordagem sobre o processo de

globalização das montadoras, com um olhar sobre benefícios entre decisões de

padronização global versus “responsividade local”, assim como feito por Schlie e Yip

(2000), e aprofundando a pesquisa sobre as relações entre matriz e filial.

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APÊNDICE A – QUESTIONÁRIO PARA CONDUZIR A ENTREVISTA

Recomendações principais: iniciar entrevista explicando que o foco da minha pesquisa são análises sobre o crescimento organizacional, pressões e desafios do ambiente, inclusive sobre sustentabilidade, mas sem entrar em maiores detalhes, para evitar contaminações ou respostas com vieses. A orientação é sempre usar perguntas abertas.

Garantir que as informações pessoais serão mantidas de forma confidencial,

mas que alguns comentários poderão ser usados como evidências durante a dissertação. Anotar dados pessoais: Nome, Sexo, Formação Acadêmica; Anotar dados profissionais: Área em que trabalha, Cargo, Tempo de empresa;

a) Conte-me um pouco da sua trajetória profissional (antes e durante a FIAT). b) Fale, por favor, como seu setor está relacionado com a questão da

sustentabilidade. c) Fale, por favor, como você atua ou já atuou direta ou indiretamente em

atividades ou projetos ligados à Rasc? d) De que maneiras você percebe que a empresa está atuando nessa questão

Rasc? e) Conte-me, por favor, qual é a sua visão em relação às práticas de

sustentabilidade na empresa? f) Quais são, na sua percepção, os principais desafios que a empresa teve em

relação a Rasc nos últimos anos? g) De acordo com a resposta acima, conte-me quais foram as ações e iniciativas

para responder esses desafios? h) Quais são, na sua opinião, os principais desafios que a empresa deverá ter,

em relação a Rasc?, nos próximos anos? i) De acordo com a resposta acima, conte-me quais ações e iniciativas a

empresa já tem planejadas para responder a estes desafios? j) Quais outras ações, na sua percepção, que a empresa deveria ter, mas que

não estão planejadas, para responder aos desafios de Rasc? que você citou? k) Quanto ao processo de crescimento da empresa, a que práticas você atribui

esse processo? l) Em que momento, na sua percepção, você acredita que a empresa conseguiu

se diferenciar dos concorrentes e alcançar a posição de destaque no ranking nacional?

m) Em quais aspectos você perceberia uma ameaça ao processo de crescimento da empresa?

n) De acordo com a resposta acima, quais ações você percebeu que a empresa fez ou está fazendo para responder à essas ameaças.

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APÊNDICE B – LISTA DOS PRINCIPAIS PRÊMIOS RECEBIDOS PELA FIAT DO

BRASIL10

2011 Revista Isto É Dinheiro; - EMPRESA DO ANO 2011 Revista Isto É Dinheiro – Edição “As Melhores da Dinheiro 2011” - EMPRESA DO ANO 2011 na categoria Veículos e Indústria do Transporte Fiat Automóveis foi eleita Empresa do Ano no XII Prêmio Consumidor Moderno de Excelência em Serviços ao Cliente; Revista Exame/IBRC 7ª melhor empresa em atendimento ao cliente em 2010 e única montadora entre as 10 melhores; International Design Excellence Awards (IDEA) para Fiat MIO na categoria Estratégia de Design; Prêmio “Melhor Hatch” pela 4ª edição dos Melhores do Ano 2012 Auto Press; Prêmio “Melhor Carros Nacional até 1.000 cc” pelo Top Car TV 2011; Prêmio “Melhor Carro Nacional de 1001 até 1.599 cc” pelo Top Car TV 2011; Prêmio “Melhor Popular Imprensa Automotiva 2011” pela Abiauto; Prêmio “Carro do Ano 2012” da revista Auto Esporte com o Novo Palio 2012; Prêmio “Motor do Ano até 2.0” da revista Auto Esporte com o Motor 1.4 MultiAir; Prêmio “Publicidade do Ano” da revista Auto Esporte com a campanha do Fiat 500; Ouro no IDEA/ Brasil 2011 na categoria Estratégia de Design, com o Fiat Mio; Ouro no IDEA/ Brasil 2011 na categoria Transporte, com o Novo Uno; Ouro no IDEA/ Brasil 2011 na categoria Pesquisa, com o Novo Uno Ecology; 12° Compasso d'Oro ADI (Associação de Design Industrial) para Fiat 500; Prêmio Top XXI Design Brasil na categoria Inovação com o projeto do Fiat MIO; Prêmio Top XXI Design Brasil na categoria Destaque Empresa por sua capacidade de desenvolvimento de automóveis no Brasil; Pesquisa CINAU Fiat Palio é novamente o favorito entre os reparadores; Pesquisa CINAU Fiat Strada foi a picape leve mais recomendada pelos profissionais de reparação; 27º Prêmio Colunistas SP ”Anunciante do ano em 2010”; Instituto Datafolha Fiat foi escolhida a marca de automóveis no “Prêmio Top of Mind Internet”, pelo quinto ano consecutivo. XII Prêmio Consumidor Moderno de Excelência em Serviços ao Cliente na categoria Automóveis; The Bees Awards San Francisco, melhor trabalho em redes sociais, com Fiat Mio; Prêmio Discovery de Criatividade e Inovação, com Fiat Mio; 2010 Prêmio ‘’Executivo do Ano’’ para Cledorvino Belini – Presidente Fiat Automóveis S.A. – pela revista Auto Esporte; Prêmio “Melhor Hatch Médio” para Fiat Bravo, pela revista Car and Driver; Prêmio “10 Best” de 2011 na categoria “Melhor 1.0” para Novo Uno, pela revista Car and Driver; Prêmio “Melhor Publicidade de Produto” com a campanha “Novo Uno. Novo Tudo” pela Top Car TV; Prêmio “Melhor Publicidade de Varejo” com a campanha “Saia do quase, vá de Fiat” pela Top Car TV; Prêmio “Empresa do Ano/Minas Gerais e Centro-Oeste” pela Associação Brasileira de Comunicação Empresarial – Aberje; Prêmio “Personalidade de Comunicação do Ano/Minas Gerais e Centro-Oeste” para Marco Antonio Lage - Diretor de Comunicação Corporativa da Fiat, pela Associação Brasileira de Comunicação Empresarial – Aberje; Prêmio “Comunicação de Programas, Projetos e Ações Culturais’’ com o “case” “Rodin e Chagall na Casa Fiat de Cultura” para a Casa Fiat de Cultura, pela Associação Brasileira de Comunicação Empresarial – Aberje; Prêmio AutoData na categoria “Estratégia de Marketing” concedido ao Novo Fiat Uno; Prêmio AutoData na categoria “Veículo Automóvel”concedido ao Novo Fiat Uno;

10 Fontes: site da FIAT, acessado em 10 jun. 2012 e Livro Comemorativo dos 30 Anos da Fiat do Brasil.

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Prêmio “Melhor Carro Nacional” pelo CAR Awards 2011 da revista Car Magazine; Prêmio “Carro do Ano 2011” da revista Auto Esporte; Prêmio “Carro do Ano 2011” pelo voto popular da revista Auto Esporte; Prêmio ‘’Melhor Campanha’’ da revista Auto Esporte; Prêmio “Melhor Carro Imprensa Automotiva” pela Abiauto (Associação Brasileira da Imprensa Automotiva); Prêmio “Melhor Carro Nacional” pela Abiauto (Associação Brasileira da Imprensa Automotiva); Prêmio “Melhor Carro Popular” pela Abiauto (Associação Brasileira da Imprensa Automotiva); Prêmio “Melhor carro até 1.000cc” pelo prêmio Top Car TV; Prêmio “Melhor Carro de 1.000 a 1.599cc” pelo prêmio Top Car TV; 2009 Melhor Empresa do setor de veículos e em Gestão de Responsabilidade Social e Meio Ambiente - ”As Melhores da Dinheiro”, da revista “IstoÉ Dinheiro”; Prêmio Lótus pela revista Frota & Cia; X Prêmio Consumidor Moderno de Excelência em Serviços ao Cliente na categoria Automóveis; Intangíveis dado à marca Fiat pela revista Consumidor Moderno; Prêmio Mineiro de Gestão Ambiental organizado pelo Governo de Minas e Secretaria Estadual de Meio Ambiente; 11º Eleição Melhores Carros pelo Best Cars Website - Melhor Hatch Pequeno (Punto); - Melhor Picape Pequena (Strada); Picape do ano – Revista Auto Esporte (Strada Adventure Cabine Dupla); Melhores do Setor Automotivo (Veículo Comercial Leve) pela revista Autodata com a Strada Adventure Cabine Dupla; Melhor Picape (Strada Adventure Cabine Dupla) - Prêmio Imprensa Automotiva 2009 Abiauto - Associação Brasileira da Imprensa Automotiva; Destaque no MKT – ABMN pelo Case: Punto T-Jet. Não é só turbo. É turbinado. A campanha de comunicação integrada que consolidou a vocação esportiva da Fiat; Carro mais econômico do Brasil e Prêmio EcoMotor (Mille Economy) - pela revista Motor Show; Vencedor do Hospital Best como “marca do veículo” na categoria ambulâncias em 2009 – Organizado pela ABMS (Associação Brasileira de Marketing em Saúde), revista Saúde Best e editora Exímia Comunicação; 7º entre os 20 melhores comerciais do mundo pela revista Creative On Line (Fiat 500); Melhor Carro Importado Abiauto (Associação Brasileira da Imprensa Automotiva) no Prêmio Imprensa Automotiva 2009 (Fiat 500); Motor do Ano – Revista Auto Esporte (Punto); Publicidade do Ano – Revista Auto Esporte (Fiat 500); 2008 IX Prêmio Consumidor Moderno de Excelência em Serviços ao Cliente na categoria Automóveis; Melhores e Maiores pela revista Exame; Auto Data - Montadora do ano; - Melhor carro do ano (Punto); Empresa Automobilística do Ano pela revista Marketing As empresas que mais respeitam o consumidor no Brasil pela revista Consumidor Moderno; Responsabilidade Social e Ambiental pela revista Época Negócios; Prêmio Balanço Anual pela Gazeta Mercantil; Os Eleitos pela revista Quatro Rodas - Stilo (Hatches Médios); - Strada (Picapes Leves); Top Car TV 2008 - Strada; - Palio ADV Locker - Melhor Comercial de Produto pela Top Car TV; Destaque no MKT – ABMN e Veículos e peças - ADVB - Case: “O oceano azul de Fiat Punto”; Carro do Ano 2008 dado ao Fiat Punto pela revista Auto Esporte;

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Abiauto - Carro Nacional do Ano dado ao Fiat Punto; - Carro Abiauto do Ano dado ao Fiat Punto; Big Idea Chair - Prêmio Yahoo Brasil, pela campanha inovadora de lançamento do Fiat Punto pelo celular antes dos formatos tradicionais da internet; Melhor Carro Pequeno (Classe 2) – dado ao Fiat Punto na 10ª Eleição dos Melhores Carros/ Best Cars Web Site; 2007 Prêmio Top of Mind Internet”Prêmio Lótus”, revista Frota & Cia. “Furgão Leve do Ano” e “Furgão do Ano” com Fiorino e Ducato; Punto - Carro do ano Uruguai; - Carro do Ano 2008; - Prêmio Imprensa 2007; - Top Car TV Categorias: “Melhor carro Nacional” e “Melhor comercial do ano”; - Carro Interamericano 2008; Montadora do Ano; Anunciante do Ano “Caboré”; Melhores e maiores 2007, categoria ”Melhor empresa”; Top Of Mind Internet; XIII Prêmio Abemd Cases “Una Passione” e ”Siena Tetra Fuel e Stilo SP” Rally: Prêmio CBA; 2006 Melhor Empresa do Setor Automotivo pela revista Exame; Guia Exame 2000 diploma de classificação - 100 melhores empresas para se trabalhar 2000; II Prêmio Minas Desempenho Empresarial – Mercado Comum - Categoria: Maiores e Melhores 2000; - Categoria: Maiores Exportadores 2000; II Prêmio Minas Desempenho Empresarial – Mercado Comum 2000; Prêmio Auto Data 2000; Motor Fire recebe o prêmio “Marketing Best”; Novo Palio é eleito “O carro do ano” pela revista Auto Esporte e pela Abiauto; Novo Palio é considerado o “Lançamento do ano” pela revista Autodata; Fiat Rally ganha o 2º Prêmio Goodyear Off Road; A equipe Fiat Rally ganha os troféus de primeiro lugar em quatro categorias do 2º Prêmio Goodyear Off Road Prêmio Lótus 2006 com Ducato e Fiorino - A Fiat Automóveis foi uma das grandes vencedoras da edição 2006 do tradicional “Prêmio Lótus”, organizado pela conceituada revista Frota & Cia. A montadora conquistou o primeiro lugar em duas categorias: “Furgão Leve do Ano” e “Van do Ano”; 2005 Melhor Empresa do Setor Automotivo pela revista Exame; TOP CAR TV - Fiat Idea – Melhor carro nacional acima 1001 cc; - Melhor comercial de TV de produto – Fiat Idea; - Melhor comercial de TV de varejo – Paixão Fiat; - Melhor executivo de montadora – Cledorvino Belini; Revista Auto Esporte - Carro do Ano – Fiat Idea; Revista Auto Test - Mejor Auto Mercosur 2006 – Fiat Idea; Associados Minas (Estado de Minas, Diário da Tarde, Rádio Guarani, TV Alterosa) - Fiat Idea – O Melhor do Ano; Revista AUTODATA - Melhores do Setor Automotivo;

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- Responsabilidade Social; - Destaque Exportação; Revista Consumidor Moderno - As empresas que mais respeitam o consumidor na categoria Bens de Consumo – Automóveis; Guia Exame de Boa Cidadania - Relacionamento com funcionários; - Fale com o Superintendente (Prática Destaque); - Centro de Competências; - PROSA (Programa de Saúde do Adolescente); - Meio Ambiente; - Coleta Seletiva de Resíduos; - Projeto de Recirculação de Águas; - Processo de Reciclagem de Isopor; - Fornecedores; - Fórum Fiat de Fornecedores; - Consumidores/Clientes; - Programa Fiat Autonomy; - Pesquisa de Satisfação dos Clientes; - Comunidade; - Árvore da Vida; - Tesouros do Brasil; - Governo e Sociedade; - Programa ABC+; - Programa de Imunização nos Centros de Saúde; Pesquisa Marcas de Sucesso - A marca mais lembrada na categoria Indústria Automobilística; Festival de Cannes - Ponto de Venda - Fiat Ducato; Grand Prix Colunistas - Campanha Impressa Fiat Strada; Grand Prix Festival de Língua Portuguesa - Fiat Stilo; Anunciante do Ano ON Line – MSN Prêmio About de Comunicação Integrada - Fiat Idea; Rally - Fiat Palio: Campeão Brasileiro de Rally 2005, categoria A6 – pela nona vez consecutiva; - Campeão Brasileiro de Rally 2005, categoria N2; - Equipe Fiat Rally – Campeã por equipes do Brasileiro de Rally 2005; - Fiat Palio – Campeão Mineiro de Rally, categoria N2; Capacete de Ouro - Revista RACING - Dupla de Rally Luis Tedesco e Kz Morales; 2004 Presidente Belini ganha título de “Industrial do Ano”, concedido pela Fiemig (Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais) Eleita “A empresa que mais respeita do consumidor”, pela revista Consumidor Moderno Eleita Melhor do Setor Automotivo em Responsabilidade Social” - TNS Interscience A Fiat Automóveis ganha ouro e prata na 22ª Edição do Prêmio Colunistas RS 2004, realizado há mais de 30 anos pela Associação Brasileira dos Colunistas de Marketing e Propaganda (Abracomp). A montadora foi vencedora na categoria “Mídia exterior”, classificando-se para representar o Rio Grande do Sul na final nacional do Prêmio; Cinco modelos da Fiat foram eleitos a melhor compra na edição de junho da Revista Quatro Rodas: Fiat Palio Fire (até 20 mil reais), Fiat Palio ELX 1.3 (de 20 a 25 mil reais), Fiat Siena ELX 1.3 (de 25 a 30 mil reais), Fiat Siena HLX (de 30 a 35 mil reais), Palio Weekend ELX e HLX (melhor Perua); Os Eleitos (Revista Quatro Rodas): Fiat Stilo, Fiat Palio Weekend e Fiat Siena foram eleitos pela revista Quatro Rodas os modelos com o maior índice de satisfação de seus proprietários em seus segmentos. Em seu terceiro ano, a eleição foi é feita em conjunto com o instituto de pesquisas Research International, que ouviu 2.582 proprietários de carros; IX Top of Mind – Mercado Comum – Marcas de sucesso – MG – 2003/2004

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- Categoria liderança – Uno (Carro Nacional Popular); - Categoria Expressão – Palio (Carro Nacional Popular); TOP SOCIAL ADVB - Prêmio Responsabilidade Social, com o Projeto Você Apita Guia Exame de Boa Cidadania - Destaque em Cultura, com o projeto Um Poema Chamado Brasil 2004; Prêmio ABERJ - Relacionamento com a comunidade, com o Projeto Você Apita; 2003 Prêmio Top of Mind (Revista Mercado Comum), baseado em pesquisa realizada em nova regiões do Estado de Minas Gerais - Categoria Liderança – Uno (Carro Nacional Popular); - Categoria Expressão – Palio (Carro Nacional Esportivo); - Categoria Expressão – Indústria Mineira; Prêmio Lótus com Ducato e Fiorino - Pelo décimo ano consecutivo, o modelo Fiorino ganhou o Prêmio Lótus, na categoria “Furgão Leve do Ano”. O veículo conquistou o título em todas as edições do concurso; - O Ducato também foi agraciado, pela segunda vez, como o “Furgão do Ano”; Best Cars Web Site - Stilo, “Melhor Carro Médio-Pequeno do Brasil”; - Strada, “Melhor Picape Pequena do Brasil”; Revista Autoesporte - Carro do Ano 2004; Prêmio Imprensa Automotiva 2003 da Abiauto (Associação Brasileira da Imprensa Automotiva) - Prêmio Imprensa Automotiva 2003 (Categoria Nacional); Prêmio ABERJE Brasil 2003 - O livro O Brasil dos Meus Olhos, que reúne os cem melhores trabalhos inscritos no concurso homônimo promovido pela Fiat Automóveis, foi o vencedor da categoria publicação especial; Prêmio ABERJE Minas - Livro O Brasil dos Meus Olhos; - Categoria Assessoria de Imprensa; - Boletim Externo (com o Stilo News); - Publicação Interna Expresso Fiat; Entre os prêmios pelas ações de internet, a Fiat conquistou em 2003 o Abanet/MSN, com o site Doblò Adventure – categoria Comunicação-Marketing e Destaque de Design – e mais dois prêmios para as campanhas on-line do Stilo – o Cyber Lion do Festival de Cannes e Medalha de Prata no About; Colunistas 2003 - Série Ultrapassagem – Trator/ Caminhão de Lixo – este anúncio conquistou Ouro pelo Voto Popular/ About; Ouro; Festival Internacional do Rio de Janeiro da ABP - Rasgado – este anúncio institucional conquistou Bronze pelo Voto Popular/ About; Lâmpada de Bronze; El Ojo de Iberoamerica 2003 - Faixa, este anúncio para o Marea Turbo conquistou Ouro; Prêmio ABERJE - Publicação Especial, programa “O Brasil dos Meus Olhos”; 2002 Prêmio Lótus com Ducato e Fiorino - Mais uma vez, a Fiat garante o Prêmio Lótus Furgão do Ano com o Ducato, e Furgão Leve do Ano, com o Fiorino; Revista Auto Esporte - Fiat Stilo é eleito o Carro do Ano Revista Quatro Rodas - Stilo, Principal Lançamento Nacional do Ano, eleito pelos internautas do site da revista Imprensa Especializada Argentina - Stilo, O Melhor Auto 2003 TOP CAR TV - Stilo, Melhor Carro Nacional

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Prêmio Abiauto Imprensa Automotiva - Stilo, Categoria Nacional Abanet/MSN - Stilo, Melhor Campanha de Lançamento com os sites www.quecarroeesse.com.br e www.fiatstilo.com.br Revista Quatro Rodas - Palio Weekend conquista o Prêmio Os Eleitos Revistas Transporte Moderno e Technibus - Fiat recebe Prêmio Maiores e Melhores do Transporte e Logística/Categoria Montadora de Veículos Prêmio Empresa Cidadã Amiga da Comunidade Negra - Fiat Automóveis garante prêmio com a Campanha Revendo Conceitos Prêmio ABERJE Cidadania Empresarial - Programa Fiat para os Jovens Prêmio Top Social ADVB - Programa Direção Segura Ação Social Prêmio Marketing Best - Categoria Responsabilidade Social com o Projeto O Brasil Mais Bonito Começa Na Minha Cidade; Prêmio Internacional El Ojo de Iberoamerica - Hotsite do Fiat Doblò ganha prêmio inédito na Categoria Website; Prêmio ABERJE - Melhor Empresa em Comunicação Empresarial - Campanha de Comunicação Externa com “Doblò: você não esperava por isso”; - Melhor Revista Interna com a Expresso Fiat; Prêmio Festival de Londres - Campanha publicitária do Fiat Marea; TOP CAR TV - Melhor Comercial de TV Institucional, com o filme 25 anos da Fiat no Brasil; - Melhor Comercial de TV Produto Top Car TV com a campanha Revendo Conceitos; - Melhor Performance em Comunicação Top Car TV; Prêmio Melhor Empresa com Telemarketing Próprio ou Terceirizado Ativo/Receptivo - Premiação com a Atento do Brasil S.A, responsável pelo Call Center (08007071000); ABERJE (Associação Brasileira de Comunicação Empresarial) - Empresa do Ano; - Cidadania Empresarial, Prêmio ABERJE Regional Minas, com o programa “Fiat para os Jovens”Compromisso com o Futuro, com o programa “Fiat para os Jovens”; - Compromisso com o Futuro, com o programa “Fiat para os Jovens”; TOP SOCIAL ADBV - Pela quarta vez consecutiva, prêmio Ação Social, programa “Test Drive Direção Segura”; MARKETING BEST - 1º Marketing Best Responsabilidade Social, com o projeto “O Brasil mais bonito começa na minha cidade”, título instituído pela Editora Referência, pela Fundação Getúlio Vargas e pelo MadiaMundoMarketing; 2001 Revista About - O Hotsite do Novo Palio Adventure recebeu o prêmio prata na categoria “Marketing - Produtos de Consumo Duráveis”, ficando com o ouro, o Hotsite de lançamento do Marea; Top social 2001 Prêmio Abracaf V Top of Mind Expressão - Palio (Carro Nacional Popular); - Uno (Carro Nacional Popular); Inovação Set/01 Aberje 2001 – Brasil - Empresa do ano em Comunicação Empresarial Aberje 2001 - Minas Gerais Revista Interna II; Prêmio Minas Desempenho Empresarial Mercado Comum 2001 Auto Data - Melhor Empresa - Montadora Fiat; - Melhor Empresa – Veículo Automóvel Fiat Novo Palio;

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UBQ união brasileira para qualidade - VI convenção mineira CCQ – Grupo Campeão – BH 21/05/2001; Fiat Strada é eleita pela imprensa automotiva, a melhor pick-up de 2001 TOP SOCIAL ADVB - Prêmio Responsabilidade Social, com o programa “O Brasil mais bonito começa na minha cidade”; 2000 Revista Exame - Lidera o ranking “Melhores Empresas para Você Trabalhar” - Considerada novamente Melhor Empresa do Ano II Prêmio Minas Desempenho Empresarial Mercado Comum - Categoria: Maiores e Melhores 2000; - Categoria: Maiores Exportadores 2000; Guia Exame 2000 - Diploma de classificação – 100 melhores empresas para se trabalhar 2000; Prêmio Auto Data 2000 II Prêmio Minas Desempenho Empresarial Mercado Comum 2000 “Marketing Best” - Motor Fire; Revista Auto Esporte - Novo Palio é eleito “O carro do ano”; Abiauto - Novo Palio é eleito “O carro do ano”; Autodata - Novo Palio é considerado o “Lançamento do ano”; TOP SOCIAL ADVB - Prêmio Ação Social, programa “Retrato do Brasil”; 1999 Prêmio Lótus - Fiorino, Furgão Leve do Ano; Revista Auto Esporte - Marea é eleito “O carro do ano”; Prêmio Minas Desempenho Empresarial Mercado Comum - Categoria: Empresa Excelência de Minas; - Categoria: Empresa Liderança de Minas - Maior Contribuinte de Impostos de MG; - Categoria: Maior Faturamento de MG; - Categoria: Maior Exportador; ADVB Top social - Prêmio Responsabilidade Social, case “Moto Perpétuo”; Prêmio 400 primeiras empresas de MG II Prêmio Minas de Desempenho Empresarial Mercado Comum - Categoria: Liderança Setorial de Minas Industria Automotiva; - Categoria: Empresa Excelência de Minas - Maiores Receitas Operacionais; - Categoria: Excelência de Minas - Maior Contribuinte de Impostos; - Categoria: Maiores e Melhores; - Categoria: Maiores Exportadores; II Prêmio Minas de Desempenho Empresarial Mercado Comum 1998 Revista Auto Esporte - Marea é eleito “O carro do ano”; Prêmio Cacex Banco do Brasil Prêmio Carta Capital - Empresas mais Admiradas IV Top of Mind - Tempra (Carro de Luxo) - Gazeta Mercantil; - Uno 1998;

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Nordeste Auto Show - Salão Automobilístico - Destaque da Indústria Automobilística Brasileira - Recife 11/11/1998; Prêmio Minas Desempenho Empresarial Mercado Comum - Categoria: Empresa Excelência de Minas; - Categoria: Empresa Liderança de Minas - Maior Contribuinte de Impostos de MG; - Categoria: Maior Faturamento de MG; - Categoria: Maior Exportador; 1997 Revista Exame - Lidera o ranking “Melhores Empresas para Você Trabalhar” Primeira empresa do setor automotivo a ser certificada com certificado ambiental ISO 14001 Revista Carro - O Palio é considerado o melhor carro do Brasil, na categoria compacto; Palio é considerado o melhor carro do Brasil, na categoria carro pequeno Guia Exame 1997 - Diploma de classificação – 100 melhores empresas para se trabalhar; Certificado de honra ao mérito fornecido pela Companhia Mineira de Eventos pelo desenvolvimento social e industrial do Estado de MG Top of mind - Marcas de Sucesso BH; - Tempra (Carro de Luxo); 1996 Top of mind - Marcas de Sucesso BH; - Tempra (Carro de Luxo); Prêmio CNI de incentivo a qualidade e produtividade Revista Carro - “Melhor carro do Brasil” - categoria compacto; 1995 Revista Quatro Rodas - Tempra Turbo é escolhido “O Eleito do Ano”; Prêmio Minas ecologia categoria GR; Prêmio “Excelência e Análise de valor” Revista Exame - Fiat é eleita a melhor empresa para se trabalhar; 1994 Revista Exame - Fiat recebe prêmio “Empresa do Ano”; 1993 Revista Exame - Fiat recebe Diploma “Empresa do Ano”; Prêmio Qualidade MG - jornal O Debate Fundação Getúlio Vargas - Prêmio “Excelência Empresarial”; 1992 Revista Auto Esporte - Uno é eleito “O carro do ano”; 1991 II Top Marketing - Caso: Uno Mille feito para você, Uno Mille feito para vencer;

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1990 Revista Auto Esporte - Uno é eleito “O carro do ano”; 1985 Revista Auto Esporte - Fiat Prêmio é eleito “O carro do ano”; 1984 Revista Auto Esporte - Uno é eleito “O carro do ano”; 1976 Revista Auto Esporte - Fiat 147 é eleito “O carro do ano”.

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ANEXO 1 – POLÍTICA AMBIENTAL: PRINCÍPIOS E DIRETRIZES DA FIASA

POLÍTICA AMBIENTAL

PRINCÍPIOS E DIRETRIZES DA FIASA Considerando que a conservação do meio ambiente é essencial para a qualidade de vida e para o desenvolvimento sustentável, a FIAT Automóveis, como signatária da Carta Empresarial da Câmara do Comércio Internacional - CCI, e em coerência, onde aplicável, com a política para o ambiente da FIAT AUTO, se compromete a: 1- Manter um Sistema de Gestão Ambiental para assegurar o atendimento aos

requisitos legais e outros requisitos, em seus processos, produtos e serviços.

2- Promover a utilização otimizada de recursos energéticos.

3- Gerenciar os resíduos industriais, minimizando a sua geração e otimizando a reciclagem dos mesmos.

4- Buscar a melhoria contínua do desempenho ambiental de suas atividades, visando sempre a prevenção da poluição e aplicando tecnologia economicamente viável.

5- Produzir veículos condizentes com a legislação ambiental vigente.

6- Promover a conscientização e o envolvimento dos seus empregados, contratados e subcontratados que trabalham em suas instalações, para que atuem de forma ambientalmente correta.

O Sistema de Gestão Ambiental abrange a unidade fabril de Betim/MG, nas suas atividades de produção e montagem de veículos automotivos.

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ANEXO 2 – EXEMPLO DE MATERIAIS DE DIVULGAÇÃO DE AÇÕES DE

PROJETOS DE SUSTENTABILIDADE DA FIAT

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ANEXO 3 – NÚMERO DE VENDAS DE AUTOMÓVEIS E PARTICIPAÇÃO DA FIAT

NO MERCADO INTERNO BRASILEIRO

Fonte: ANFAVEA (2012)

ANOVEÍCULOS FIAT

VENDIDOS NO BRASILVEÍCULOS NOVOS

VENDIDOS NO BRASILParticipação da Fiat

1976 3.067 810.178 0,38%1977 63.468 750.685 8,45%1978 93.082 881.610 10,56%1979 111.817 924.690 12,09%

1980 120.670 886.796 13,61%1981 55.215 515.608 10,71%1982 65.611 641.992 10,22%1983 70.727 686.584 10,30%1984 62.958 628.201 10,02%1985 89.370 700.375 12,76%1986 102.402 786.386 13,02%

1987 75.778 513.632 14,75%1988 75.643 679.836 11,13%1989 80.659 703.962 11,46%1990 104.025 661.337 15,73%1991 148.559 732.444 20,28%1992 150.242 724.651 20,73%

1993 243.739 1.081.386 22,54%1994 389.234 1.330.459 29,26%1995 419.178 1.652.278 25,37%1996 447.765 1.673.136 26,76%1997 508.887 1.873.665 27,16%1998 364.414 1.466.423 24,85%

1999 304.235 1.195.609 25,45%2000 361.692 1.403.833 25,76%2001 415.406 1.511.187 27,49%2002 357.715 1.396.141 25,62%2003 340.682 1.346.330 25,30%2004 348.573 1.478.118 23,58%

2005 404.410 1.618.947 24,98%2006 465.543 1.831.712 25,42%2007 607.557 2.341.032 25,95%2008 657.763 2.670.991 24,63%2009 736.969 3.008.742 24,49%2010 760.495 3.328.948 22,84%

2011 754.275 3.425.674 22,02%