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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO – UFRJ
INSTITUTO COPPEAD DE ADMINISTRAÇÃO
MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃO
RAPHAEL JOSÉ ASSAYAG
DESAFIOS NA TRANSFORMAÇÃO DE EMPRESAS DESAFIANTES EM LÍDERES
DO SETOR: O Caso Fiat do Brasil
RIO DE JANEIRO
2012
II
RAPHAEL JOSÉ ASSAYAG
DESAFIOS NA TRANSFORMAÇÃO DE EMPRESAS DESAFIANTES EM LÍDERES
DO SETOR: O Caso Fiat do Brasil
Dissertação submetida ao corpo docente do Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Ciências (M.Sc.).
Orientadora Prof.ª. Denise Lima Fleck, Ph.D.
RIO DE JANEIRO
2012
III
A844d Assayag, Raphael José
Desafios na transformação de empresas desafiantes em líderes do setor: o caso Fiat no Brasil / Raphael José Assayag . – Rio de Janeiro: UFRJ, 2012.
204 f.: il.; 31 cm.
Orientador: Denise Lima Fleck
Dissertação (Mestrado) - Universidade
Federal do Rio de Janeiro, Instituto COPPEAD de Administração, 2012.
1. Desafios Empresariais. 2. Longevidade Saudável da Firma. 3. Indústria Automotiva. 4. Responsabilidade Ambiental e Social Corporativa. 5. Pressões Ambientais. 6. Liderança. 7. Geração e Captura de Valor - Teses. I. Fleck, Denise Lima. II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto COPPEAD de Administração. III. Título.
CDD: 658.4
IV
RAPHAEL JOSÉ ASSAYAG
DESAFIOS NA TRANSFORMAÇÃO DE EMPRESAS DESAFIANTES EM LÍDERES
DO SETOR: O Caso Fiat do Brasil
Dissertação de Mestrado submetida ao corpo docente do Instituto COPPEAD de Administração, Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Ciências (M.Sc.).
Aprovado em 24 de Setembro de 2012
BANCA EXAMINADORA
___________________________________________
Orientadora Prof.ª. Denise Lima Fleck, Ph.D. (COPPEAD, UFRJ)
___________________________________________
Prof.ª. Maribel Carvalho Suarez, D.Sc. (COPPEAD, UFRJ)
___________________________________________
Prof. José Geraldo Pereira Barbosa, D.Sc.(MADE, UNESA)
V
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a D’us, cuja bondade eterna me permitiu chegar até este
momento.
Agradeço ao carinho, ao apoio incondicional e às constantes palavras de incentivo
durante todo o percurso do mestrado da minha amada esposa, Tathiana.
Agradeço aos meus pais, José Mário e Fátima, exemplos de ética e por quem tenho
grande amor, respeito e admiração, que durante toda a minha vida me estimularam
na busca do saber. Sem eles, indubitavelmente, concluir mestrado não seria
possível.
Agradeço também aos meus demais familiares e amigos, pelo apoio e compreensão
da minha ausência durante este curso.
Agradeço à minha orientadora, Denise Fleck, a quem admiro pela competência,
conhecimento e simplicidade, e que sempre esteve presente e pronta para ouvir e
apoiar durante o processo de elaboração deste trabalho.
Agradeço aos professores Maribel Suarez e José Geraldo Barbosa, por cederem
parte do seu escasso tempo e aceitarem o convite de participar da banca
examinadora.
Agradeço às professoras Maribel Suarez e Letícia Casotti, da cátedra
FIAT/COPPEAD, pelo apoio no momento dos primeiros contatos com a empresa
estudada.
Agradeço à empresa Fiat do Brasil, em especial à equipe da área de pesquisa, que
viabilizaram a visita à fábrica de Betim – MG. Agradeço a cada um dos funcionários
entrevistados pelo tempo dedicado e pelas informações prestadas.
Agradeço a todos os professores do COPPEAD pelos conhecimentos transmitidos,
pelas conversas e conselhos amigos e, principalmente, por me fazerem sentir
orgulho de pertencer a esta instituição de excelência.
VI
Agradeço aos meus “irmãos” de seminário de pesquisa, que durante mais de dois
anos estiveram rotineiramente debatendo e ajudando uns aos outros: Camila
Caldeira, Monique Stony, Laura Rielo, Gustavo Sarkovas, Rodrigo Tasca e Flávia
Freitas.
Agradeço a todos demais amigos da sempre elogiada turma de mestrado de 2010.
Levo do curso muito mais que conhecimento. Levo a amizade e admiração por cada
um de vocês.
Por fim, agradeço o apoio institucional oferecido pela Secretaria Acadêmica e
demais setores do COPPEAD.
VII
RESUMO
ASSAYAG, Raphael José. Desafios na Transformação de Empresas Desafiantes
em Líderes do Setor: O caso Fiat no Brasil. Rio de Janeiro, 2012. Dissertação
(Mestrado em Administração) – Instituto Coppead de Administração. Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). 2012.
Segundo Fleck (2010) e Hawkins (2006), para atingir os objetivos de expansão e
perenidade, as organizações precisam adotar uma postura ativa e responsável com
todos seus stakeholders, inclusive com o meio ambiente e com a sociedade em que
está inserida. Nesse contexto, este trabalho se propôs a analisar, em um processo
de crescimento organizacional, o que pode explicar a migração de uma empresa da
posição de desafiante (challenger) em uma indústria para a posição de líder do
setor. Assim, buscou-se compreender a influência dos gestores, dos ambientes e
das respostas aos desafios organizacionais durante esse processo (FLECK, 2009;
MINTZBERG et al, 2000; OLIVER, 1991; ROMANELLI, 1991; CHANDLER, 1990;
WEITZEL, JOHNSON, 1989; CAROLL, HUO, 1986). Como técnica de pesquisa,
elaborou-se uma análise combinada da histórica da indústria automotiva nacional e
do estudo de caso da montadora Fiat do Brasil, empresa com 36 anos de atuação
no Brasil, e que se tornou a atual líder de mercado após desafiar importantes first
movers como Volkswagen, Ford Motors e General Motors. Esse trabalho conclui que
não são as pressões e desafios do ambiente que estabelecem toda a pauta das
organizações tornando-as simplesmente passivas ou reativas, conforme sugerido
por teóricos da “escola ambiental” (MINTZBERG et al, 2000). Mas, que as firmas, ao
adotarem um comportamento empreendedor e de monitoramento ativo (scanning),
podem não só se antecipar e neutralizar tais pressões, como mesmo moldar as
configurações ambientais, garantindo continuidade no seu processo de expansão e,
possivelmente, a posição de liderança na indústria. E, por fim, corroborou-se com o
entendimento sobre a importância da incorporação de atitudes sustentáveis tanto
para a manutenção da legitimidade da firma, quanto como incentivador para busca
de inovações e na mitigação de riscos.
Palavras-chaves: DESAFIOS EMPRESARIAIS; LONGEVIDADE; INDÚSTRIA
AUTOMOTIVA; RESPONSABILIDADE AMBIENTAL E SOCIAL CORPORATIVA;
PRESSÕES AMBIENTAIS; LIDERANÇA; VALOR;
VIII
ABSTRACT
ASSAYAG, Raphael José. Challenges in the Transformation of Challengers Organizations in Market Leader: The Case Fiat of Brazil. Rio de Janeiro, 2012. Dissertation (Master Degree in Administration) – Instituto Coppead de Administração. Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). 2012.
According to Fleck (2010) and Hawkins (2006), in order to achieve the goals of
expansion and sustainability, organizations need to adopt an active and responsible
attitude with all its stakeholders, including the environment and society in which it
operates. In this context, this work aimed to analyze, within a process of
organizational growth, what could explain the migration of a company from a
challenging position (challenger) in an industry to the position of industry leader.
Therefore, we sought to understand the influence of managers, environments and
responses to organizational challenges during this process (FLECK, 2009;
MINTZBERG et al, 2000; OLIVER, 1991; ROMANELLI, 1991; CHANDLER, 1990;
WEITZEL, JOHNSON, 1989; CAROLL, HUO, 1986). As research technique, was
elaborated a combined analysis of the history of the Brazilian automotive industry
and of the case study of vehicle manufacturer Fiat of Brazil, a company with 36 years
experience in this country that became the current market leader after challenging
major first movers as Volkswagen, Ford Motors and General Motors. This work
concludes that pressures and challenges of the environment do not set the entire
agenda of the organizations, making them simply passive or reactive, as suggested
by "environmental school" theorists (MINTZBERG et al, 2000). The companies, by
adopting an entrepreneurial behavior and active monitoring (scanning), actually can
not only anticipate and counteract such pressures, but also shape environmental
settings, ensuring continuity in its expansion process and, possibly, the position of
industry leader. And finally, it corroborated with the understanding of the importance
of incorporating sustainable attitudes both for maintaining the legitimacy of the firm,
and as a stimulus to the search for innovations and risk mitigation.
Keywords: ORGANIZATIONAL CHALLENGERS; LONGEVITY; AUTOMOTIVE
INDUSTRY; CORPORATE ENVIRONMENTAL AND SOCIAL RESPONSIBILITY;
ENVIRONMENTAL PRESSURES; LEADERSHIP; VALUE;
IX
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AAMA – Associação Americana de Montadoras de Veículos
ABEIVA – Associação Brasileira das Empresas Importadoras de Veículos
Automotores
ANEF – Associação Nacional das Empresas Financeiras de Montadoras
ANFAVEA – Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores
BCB – Banco Central do Brasil
BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Social
CARB – California Air Resources Board
CDC – Crédito Direto ao Consumidor
CET – Companhia Estadual de Trânsito
CMN – Conselho Monetário Nacional
CONAMA – Conselho Nacional do Meio Ambiente
DENATRAM – Departamento Nacional de Trânsito
DETRAN –Departamento Estadual de Trânsito
FENABRAVE – Federação Nacional de Veículos Automotores
FGV – Fundação Getúlio Vargas
FIAT – Fabbrica Italiana Automobili Torino
FCC – Fiat Concept Car
FIEMG – Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais
FSC – Forest Stewardship Council
GEC – Group Executive Council
ICMS – Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços
IMPP – Instituto Minas pela Paz
INMETRO – Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia
IPI – Imposto sobre Produtos Industrializados
MG – Minas Gerais
OICA – Organisation Internationale des Constructeurs d’Automobiles
PBEV – Programa Brasileiro de Etiquetagem Veicular
PIB – Produto Interno Bruto
PROÁLCOOL – Programa Nacional do Álcool
RASC – Responsabilidade Ambiental e Social Corporativa
ROI – Return Over Investment
SELIC – Sistema Especial de Liquidação e de Custódia
X
LISTA DE FIGURAS
Figura 1.1 – Mapa visual da organização do estudo 20 Figura 2.1 – Requisitos para a propensão à autoperpetuação 25 Figura 2.2 – Estrutura geral do motor de crescimento contínuo 29 Figura 3.1 – Pilares de um estudo acadêmico 54 Figura 3.2 – Temas e autores utilizados na revisão de literatura 56 Figura 3.3 – Exemplo da tabela de agrupamento das principais pressões e desafios por tipo de ambiente
62
Figura 3.4 – Modelo de análise e categorização das evidências 63 Figura 3.5 – Escopo da análise realizada 64 Figura 3.6 – Exemplo do modelo de síntese cronológica 65 Figura 3.7 – Processo de preenchimento do framework durante fase de análise 66 Figura 3.8 – Exemplo de síntese do processo de transição entre ambientes 66 Figura 5.1 – Mapa visual dos principais marcos e inovações do segundo período da Fiat Brasil
116
Figura 5.2 – Mapa visual dos principais marcos e inovações do terceiro período da Fiat Brasil
117
Figura 5.3 – Mapa visual dos principais marcos e inovações do quarto período da Fiat Brasil
118
Figura 5.4 - Marcos do setor e da economia 164 Figura 5.5 – Síntese do processo de transição da Fiat no ambiente de negócios 165 Figura 5.6 – Síntese do processo de transição da Fiat no ambiente institucional 168 Figura 5.7 – Síntese do processo de transição da Fiat no ambiente natural 170 Figura 5.8 – Mapa visual consolidado da trajetória da Fiat entre os ambientes 172
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 5.1 – Quantidade de veículos vendidos pela Fiat no Brasil x total de veículos vendidos no Brasil (1976-2010)
112
Gráfico 5.2 – Representatividade da Fiat nas vendas de veículos e comerciais leves no Brasil (1976-2010)
113
Gráfico 5.3 - Representatividade na produção de veículos no Brasil entre os principais players
167
XI
LISTA DE TABELAS
Tabela 3.1 – Tempo de duração das entrevistas realizadas para a pesquisa 61
LISTA DE QUADROS
Quadro 2.1 – Resumo dos desafios do crescimento das organizações 27 Quadro 2.2 – Framework proposto de categorização das teorias sobre ambientes 34 Quadro 2.3 – Associação teórica entre Rasc e os Desafios do Crescimento 53 Quadro 5.1 – Evidências de inovações introduzidas pela Fiat no Brasil 105 Quadro 5.2 – Análise das forças do ambiente da primeira fase da Fiat Brasil 120 Quadro 5.3 – Principais desafios e pressões da primeira fase da Fiat Brasil 124 Quadro 5.4 – Análise das forças do ambiente da segunda fase da Fiat Brasil 124 Quadro 5.5 – Principais desafios e pressões da segunda fase da Fiat Brasil 128 Quadro 5.6– Análise das forças do ambiente da terceira fase da Fiat Brasil 128 Quadro 5.7 –- Principais desafios e pressões da terceira fase da Fiat Brasil 137 Quadro 5.8 – Análise das forças do ambiente da quarta fase da Fiat Brasil 137 Quadro 5.9 – Resumo das principais forças do ambiente no quarto período da Fiat
163
XII
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO 15 1.1 OBJETIVO DO ESTUDO 18 1.1.1 Questão principal 18 1.1.2 Demais objetivos 18 1.2 JUSTIFICATIVA 19 1.3 ORGANIZAÇÃO DO ESTUDO 20
2 REVISÃO DE LITERATURA 22 2.1 CRESCIMENTO E LONGEVIDADE ORGANIZACIONAL 23 2.1.1 Empreendedorismo 27 2.1.2 Navegação em um ambiente dinâmico 31 2.1.2.1 Categorias de ambientes 32 2.1.2.2. Respostas aos desafios do ambiente 34 2.2 RESPONSABILIDADE AMBIENTAL E SOCIAL CORPORATIVA 40 2.2.1 Conceituando Rasc 43 2.2.2 Rasc e estratégias empresariais 45 2.2.3 Motivadores de Rasc 47 2.2.4 Sustentabilidade e inovação 50 2.2.5 Estágios da sustentabilidade 51 2.3 RASC E CRESCIMENTO E LONGEVIDADE ORGANIZACIONAL 53
3 METODOLOGIA 54 3.1 DEFINIÇÃO DE TEMA, PERGUNTA E OBJETO DE PESQUISA 54 3.2 ESTRATÉGIA DE PESQUISA 56 3.3 COLETA DE DADOS 58 3.4 ANÁLISE DOS DADOS COLETADOS 62 3.5 NÍVEL DE ANÁLISE 63
4 A INDÚSTRIA AUTOMOTIVA E A HISTÓRIA DA FIAT 67 4.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA 67 4.2 IMPACTOS DA INDÚSTRIA 69 4.3 VEÍCULOS ELÉTRICOS E HÍBRIDOS 73 4.4 MOMENTO ATUAL DA INDÚSTRIA 76 4.5 EVOLUÇÃO DA INDÚSTRIA AUTOMOTIVA NO BRASIL 77 4.6 FATORES QUE INFLUENCIAM A VENDA DOS CARROS E PRINCIPAIS INDICADORES
83
XIII
FIAT 4.7 FIAT MUNDO: BREVE HISTÓRICO 86 4.8 FIAT BRASIL 89 4.8.1 Período I – da decisão da entrada no Brasil à construção da fábrica (1970 a 1976)
90
4.8.2 Período II – do início da produção ao fim da “década perdida” (1976 a 1989) 91 4.8.3 Período III – da abertura do mercado à liderança de vendas (1990-2003) 92 4.8.4 Período IV – uma gestão brasileira e a mudança estratégica (2004 – 2011) 98
5 ANÁLISE 103 5.1. Desafio do empreendedorismo 103 5.1.1 Criação de valor 104 5.1.2 Serviços empreendedores 109 5.1.3 Responsabilidade socioambiental como geração de valor 114 5.2 Desafio de navegação no ambiente dinâmico 119 5.2.1 Período I – da decisão da entrada no Brasil à construção da fábrica (1970 a 1976)
120
5.2.2 Período II – do início da produção ao fim da “década perdida” (1976-1989) 124 5.2.3 Período III – da abertura do mercado à liderança de vendas (1990-2003) 128 5.2.4 Período IV – uma gestão brasileira e a mudança estratégica (2004 – 2011) 137 5.2.4.1 Gestão dos Stakeholders 139 5.2.4.2 Meio Ambiente 143 5.2.4.3 Sociedade 143 5.2.4.4 Governo e Legislação 146 5.2.4.5 Acionistas 149 5.2.4.6 Clientes e Reputação 150 5.2.4.7 Concorrentes 155 5.2.4.8 Fornecedores 157 5.2.4.9 Concessionárias 158 5.2.4.10 Funcionários 160
5.3 Síntese da análise 163 5.3.1 Ambiente de negócios 165 5.3.2 Ambiente institucional 168 5.3.3 Ambiente natural 170
6 CONCLUSÃO 173 6.1 Respostas à pergunta principal e considerações sobre o processo de crescimento da Fiat
173
6.2 A relação entre o crescimento organizacional e responsabilidade socioambiental
175
6.3 Contribuição ao arcabouço teórico 177 6.4 Implicações do estudo de caso da Fiat para outras organizações do setor automotivo
178
6.5 Sugestões para pesquisas futuras 181
XIV
REFERÊNCIAS 183
APÊNDICES 192
ANEXOS 202
15
1 INTRODUÇÃO
Baron (1995) relacionou duas fontes principais de pressões organizacionais:
as de mercado (market) e de “não mercado” (non market). A primeira inclui as
interações entre as firmas e outras partes, voluntárias ou involuntárias, geralmente
envolvendo transações econômicas e trocas de propriedade. De acordo com
Chandler (1990), nas tradicionais indústrias capital-intensivas, as organizações que
fizessem os primeiros grandes investimentos (first movers) rapidamente dominavam
os setores e se mantinham líderes por décadas inteiras. Para conseguir benefícios
de custos comparáveis e ganhar espaço nos mercados em que as “iniciantes” já
estavam estabelecidas, os novos entrantes – ou desafiantes (challengers) – além de
criarem novas estruturas, precisariam: equiparar tais capacidades produtivas
(escala) em quanto à first movers já estavam em fase de aprimoramento dos
processos de produção e de seus produtos, e já possuindo grande aprendizado
disseminado em suas estruturas, por isso eram raros os casos onde as desafiantes
conseguiam dominar o mercado (CHANDLER, 1990, p.132). Quando se observam
as atuais forças de mercado, percebe-se que, desde a intensificação do processo de
globalização, com a dissolução da maioria das barreiras de entrada, essas arenas
de negócios se tornaram mais dinâmicas. Além das inovações tecnológicas, novos
concorrentes e produtos substitutos aparecem em setores onde antes apenas um
pequeno grupo reinava absoluto.
A segunda fonte, segundo Baron (1995), as pressões do “não mercado”,
incluem as interações que são intermediadas pelo governo e instituições públicas,
mídia e demais stakeholders. Incluem os arranjos macroeconômicos, sociais,
políticos e legais que geram a interação da empresa com o ambiente (BARON,
1995). Em um mundo cada vez mais interconectado, as relações entre as
corporações e os diversos stakeholders estão mais ativas, imediatas e
multidirecionais.
Consequentemente, para garantir o processo de expansão e gerar valor para
a organização, é imperativo um constante monitoramento do ambiente e de suas
potenciais pressões. A existência de gestores empreendedores, que se antecipam a
tais pressões, utilizando de respostas estratégicas criativas, tende a garantir uma
16
redução dos riscos e a manutenção da legitimidade da organização (CHANDLER,
1977; PENROSE, 1980; OLIVER, 1991; FLECK, 2009).
Apesar disso, de acordo com Mintzberg et al (2000), no campo da estratégia,
existem escolas que analisam essa relação entre organização e ambiente por outras
perspectivas. Os que seguem a visão de “ecologia de população”, como Hannan e
Freeman (1977), por exemplo, afirmam que é o ambiente que estabelece toda a
pauta das organizações, onde a missão da estratégia seria apenas fazer uma leitura
deste e garantir adaptação adequada da organização, tornando assim os gestores
(managers) em elementos passivos. Para autores como Child (1972), Chandler
(1977) e Mintzberg et al (2000), que defendem o ponto de vista da teoria da decisão
estratégica (Managerial Choice), negar que os executivos possuam opções
estratégicas seria “completamente insensato” (MINTZBERG et al, 2000. p.218). De
acordo com os últimos autores, a formação da estratégia é composta por outras
duas forças centrais além do ambiente: a organização e a liderança. Chandler
(1977) corrobora com a visão de que a empresa não é simplesmente reflexo de
caprichos imprevisíveis das forças do mercado, ao reforçar o papel do gestor como
de suma importância na condução e destino da empresa (“mão visível”).
A indústria automobilística nacional, setor de grande relevância econômica,
enfrenta vários tipos de pressão. Além da crescente competitividade, e da
necessidade de manter um contínuo processo de expansão para possibilitar ganhos
de escala, as montadoras têm que lidar com crescentes expectativas dos seus
múltiplos stakeholders, dentre eles a sociedade e o meio ambiente (FLECK, 2009;
FREEMAN, 1984; PENROSE, 1980; CHANDLER, 1977).
Atualmente, de acordo com a Associação Nacional dos Fabricantes de
Veículos Automotores (Anfavea), essa indústria é responsável por 18,2% do Produto
Interno Bruto (PIB) industrial brasileiro e emprega diretamente 146.000 funcionários.
As estimativas são de até 1,5 milhão de pessoas estejam envolvidas em toda a
cadeia produtiva, o que a torna foco estratégico nas decisões do governo,
principalmente quando os números da economia não são positivos.
Conforme observado por Dias (2002), apesar de os veículos oferecerem
vantagens inegáveis, como possibilidade de locomoção independente e rápida, e
com conforto, os efeitos negativos e os custos deste modal são notórios. Pela ótica
do consumo de matérias-primas, mais de 50% do total de borracha, 25% do total de
17
vidro e 15% do total de aço produzidos globalmente são de responsabilidade da
indústria automotiva (CASOTTI; GOLDENSTEIN, 2008).
No Brasil, enquanto a população aumentou 12,5% em uma década, a frota de
veículos do país cresceu 118,1% (SILVA, 2011). Segundo os dados do
Departamento Nacional de Trânsito (Denatran, 2011), a frota circulante ultrapassou
a marca, em 2011, de 37 milhões de automóveis – que representam apenas 57,37%
do total dos 64,8 milhões de veículos registrados. Moreira (2011) afirma que, se
todos esses veículos estivessem rodando, haveria emissão anual de mais de 170
milhões de toneladas de CO2, contribuindo diretamente para o aquecimento global.
Outro efeito colateral mais recente, que cada vez gera mais questionamentos sobre
o produto final dessa indústria, são os impactos na mobilidade urbana e os grandes
congestionamentos e seus reflexos sociais e financeiros.
Com isso, uma das principais pressões do século XXI a desafiar as
organizações, inclusive as desse setor, e a exigir uma postura ativa dos gestores,
será a intensificação das cobranças por ações que envolvam responsabilidade
socioambiental. Tudo indica que, nos últimos anos, os principais players desta
indústria vêm atuando em relação a estas pressões. Inovações como o redesenho
de processos de fabricação, que refletem em ganhos de eficiência de insumos e
energia, a análise de oportunidades intralogísticas, o desenvolvimento de carros
mais econômicos, investimentos em educação do consumidor, além de fortes
pressões por investimentos públicos na área de infraestrutura urbana são apenas
alguns exemplos.
Mesmo assim, o setor automotivo brasileiro continua em forte processo de
expansão. Somente em 2011 foram licenciados 3.425.674 automóveis e comerciais
leves (ANFAVEA, 2012), representando a inclusão de mais de seis novos veículos
por minuto nas ruas. A estimativa do professor de Engenharia de Transportes da
Coppe/UFRJ, Paulo Cezar Ribeiro (PLANETA COPPE, 2012), revela que
somente a frota de automóveis no Estado do Rio de Janeiro será quase o dobro da
atual até 2020, chegando a 3 milhões de unidades. Com a perspectiva otimista de
metas de crescimento das empresas na indústria, é razoável esperar aumento
destes impactos socioambientais ao longo do tempo.
Para gerar e capturar valor, antecipando-se a esta e a demais pressões
ambientais de modo as neutralizar, compatibilizar sustentabilidade socioambiental
com o crescimento das corporações é questão crucial. De acordo com Fleck (2010),
18
dentre as condições necessárias para que a empresa garanta sucesso a longo
prazo, estão a fomentação de um meio ambiente sustentável e a integração de
práticas de responsabilidade ambiental e social corporativas pela empresa.
Dessa forma, o recorte principal deste trabalho será examinar o processo de
crescimento da atual empresa líder do setor automotivo nacional. Buscar-se-á
também identificar, a partir de uma abordagem longitudinal (YIN, 1989), os padrões
de respostas da empresa voltadas à neutralização das ameaças destes ambientes e
as implicações estratégicas para o crescimento sustentado e a longevidade
saudável da firma (FLECK, 2009). Este trabalho também tem como objetivo
entender como o tema responsabilidade ambiental e social corporativa se relaciona
com o processo de crescimento sustentado e de longevidade saudável.
1.1 OBJETIVO DO ESTUDO
1.1.1 Questão Principal
O que pode explicar a migração de uma empresa da posição de desafiante
(challenger) em uma indústria para a posição de líder do setor?
1.1.2 Demais objetivos
• Contribuir para o entendimento sobre desafios do crescimento saudável das
organizações, na perspectiva do cenário industrial brasileiro.
• Contribuir para o entendimento sobre responsabilidade social, seus
motivadores e os desafios, dilemas e oportunidades geradas nas firmas.
• Contribuir para o entendimento sobre a relação entre os temas
responsabilidade social e ambiental corporativa e crescimento saudável das
organizações
• Contribuir para o entendimento do cenário atual da indústria automotiva
brasileira.
• Avaliar o grau de empreendedorismo da empresa estudada.
19
• Avaliar a capacidade de análise ambiental da empresa estudada.
1.2 JUSTIFICATIVA
Fleck (2009) afirma que o crescimento organizacional é uma das condições
necessárias para a continuidade da existência da empresa. Contudo, de acordo com
a autora, esse processo gera grandes desafios para as organizações.
Um desses desafios é a necessidade de promover o empreendedorismo de
forma continuada, por meio de expansões capazes de criar valor para a
organização, mas sem gerar uma exposição exagerada a riscos. Outro é
compreender, de forma sistemática, além das expectativas dos stakeholders, os
ambientes em que a empresa está inserida e quais são as principais pressões,
condições necessárias para que a empresa possa responder corretamente de forma
a captar valor e manter sua legitimidade.
Paralelamente, os debates sobre os riscos e necessidades socioambientais
tomam conta das principais agendas de empresas, governos e da sociedade. Para
Fleck (2010), a maneira pela qual as empresas tratarão essas questões poderá
direcionar a empresa para o declínio ou para o processo de longevidade lucrativa.
Esta pesquisa estudará o caso da empresa Fiat do Brasil. As principais
razões para a escolha dessa unidade de análise são: (i) por ter sido uma empresa
desafiante ao entrar em uma indústria fechada e oligopolizada e ter se tornado líder
(ii) em um setor de extrema relevância para o PIB (iii) e com impactos
socioambientais. (iv) Além disso, é uma empresa considerada, pela imprensa
especializada, como pioneira e benchmark em ações e processos de
responsabilidade social e ambiental.
Por tudo isso, justifica-se o estudo combinado entre os temas propostos, com
o objetivo de entender desafios gerados pelo crescimento e como as empresas do
setor automotivo estão atuando para criar e capturar valor em ambientes em rápida
transformação. Torna-se muito relevante entender como todo esse mecanismo
ocorre em uma indústria de proeminente impacto para a economia, sociedade e para
o meio ambiente.
20
1.3 ORGANIZAÇÃO DO ESTUDO
Figura 1.1 – Mapa visual da organização do estudo
Conforme exemplificado na Figura 1.1, este estudo está organizado em seis
capítulos. O primeiro contempla a introdução. A seguir, o Capítulo 2, de revisão
bibliográfica, possui duas seções. A primeira analisa as vantagens do crescimento
organizacional e os desafios que esse processo implica, abordando os diferentes
conceitos sobre ambientes e respostas aos desafios gerados a partir do processo de
navegação e empreendedorismo. A seguir, trata-se dos conceitos sobre
responsabilidade social, benefícios e motivações que levam as organizações a
buscar e implantar ações e estratégias de responsabilidade social. No final desde
capítulo, é exposto um framework que será utilizado para posterior análise de quais
ambientes mais representavam determinados momentos do caso estudado, e uma
síntese sobre a associação entre as teorias de crescimento e responsabilidade
socioambiental.
O terceiro capítulo dedica-se à explicação da metodologia da dissertação.
Justifica-se a escolha do tema, da pergunta e do método de pesquisa a partir da
teoria de Yin (1998), além do processo de seleção das teorias utilizadas no Capítulo
2, as fontes de dados e sua relevância. Também é abordado o processo de decisão
da unidade de análise e da seleção dos entrevistados. Descreve-se a estratégia de
pesquisa, suas delimitações e restrições. Trata-se sobre o processo de coleta e
tratamento de dados e é descrito o processo de análise.
O Capítulo 4 engloba a evolução histórica da indústria automotiva mundial,
principais marcos, relevância socioeconômica e potenciais impactos sociais e
ambientais. Logo em seguida, é explorado o histórico da indústria automotiva
21
brasileira. Neste capítulo, também é possível, ao leitor, encontrar breve relato da
história da Fiat Mundo e análise histórica da Fiat Brasil.
O quinto capítulo apresenta os resultados da análise. Já o último capítulo
apresenta a conclusão da pesquisa, contribuições para o arcabouço teórico, as
implicações deste estudo de caso para outras organizações do setor, bem como
propostas para futuros estudos.
Cabe ressaltar que não fazem parte do escopo de atuação desse estudo (i)
requisitos técnicos dos carros; (ii) análises financeiras da organização, nem das
demais empresas do setor; (iii) detalhar em profundidade ações de marketing ou o
comportamento do consumidor de veículos.
22
2 REVISÃO DE LITERATURA
Considerando que os temas que orientam este estudo se referem tanto a
crescimento e longevidade organizacional quanto a pressões ambientais e respostas
estratégicas aos desafios institucionais em ambientes desafiadores, dentre elas os
dilemas sobre responsabilidade ambiental e social corporativa (denominado neste
trabalho, como já visto, de “Rasc”), a revisão de literatura terá duas seções
principais.
A primeira identifica os principais desafios do processo do crescimento
organizacional. Esta parte irá trabalhar os tipos de resposta dados pelas empresas
aos desafios, bem como classificar as respostas de acordo com a intenção de busca
de benefícios no curto ou longo prazo. Assim, o arcabouço teórico selecionado para
conduzir este estudo será baseado, principalmente, nos textos de Fleck (2009;
2010).
No fim da primeira seção, será explorado, em maior profundidade, o tema
pressões ambientais. Para tanto, inicialmente serão expostas algumas das visões
sobre a influência do ambiente na elaboração das estratégias, além das categorias
de ambiente, com especial atenção aos textos de Carroll e Huo (1986), Weitzel e
Johnson (1989) e Fleck (2009). O objetivo é possibilitar maior entendimento teórico
sobre como as organizações se comportam de acordo com a natureza das pressões
institucionais a partir de Mintzberg et al (2000), Stinchcombe (1965 apud
ROMANELLI, 1991), Christine Oliver (1991) e outros autores.
A segunda seção abordará os conceitos e as principais implicações do tema
Rasc nas estratégias empresariais, bem como os potenciais impactos das
organizações na degradação e preservação do meio ambiente. Fazendo referência a
seções anteriores, busca-se também explicitar os principais motivadores e as
justificativas usadas pelas firmas para implantar ações de Rasc, e quais benefícios
tais ações podem gerar no longo prazo. Por fim, faz-se uma análise sobre as
pressões por inovações do tema Rasc nas organizações.
A abordagem busca entender, a partir da combinação dessas seções, quais os
principais desafios e dilemas do crescimento das organizações, e quais os principais
padrões de respostas das organizações a essas pressões ambientais. E, ainda, se a
incorporação de práticas sustentáveis aumenta as possibilidades de sobrevivência
em ambientes desafiadores.
23
2.1 CRESCIMENTO E LONGEVIDADE ORGANIZACIONAL
Não é possível encontrar na literatura acadêmica consenso sobre como medir o
sucesso de uma organização. Para Barnard (1938), a única medida verdadeira de
sucesso é a capacidade de a organização sobreviver. Fleck (2010), na mesma
perspectiva da longevidade, assegura que uma organização de sucesso é aquela
que desenvolve uma propensão de continuar a existir de maneira saudável.
Por ser um processo extremamente desafiador, alguns autores, como Modis
(1994), por exemplo, não acreditam na perpetuação das empresas, e tendem a usar
a analogia com o ciclo de vida biológico para argumentar que, assim como os seres
vivos, todas as organizações estão fadadas à “morte”. Porém, Penrose (1980)
contradiz esse tipo de argumento, ao arguir que não existem evidências de que
comprovem tal analogia. Um ponto interessante levantado pela autora é que, se
todas as empresas estivessem predestinadas a uma mesma trajetória, ou ciclo –
com consequente morte no final –, as decisões humanas seriam praticamente
irrelevantes.
Uma ressalva feita por Fleck (2009) é sobre a distinção entre a existência bem-
sucedida, a partir de corretas respostas aos desafios que o processo de crescimento
gera, e a mera sobrevivência organizacional. Para Meyer e Zucker (1989), algumas
organizações podem ser classificadas como permanently failing organizations (ou
PFO). De acordo com esses autores, por diversas razões e interesses de partes
dependentes, certas organizações podem ser longevas, conseguindo “sobreviver”
por muitos anos, mas permanecem estagnadas ou não são necessariamente
lucrativas.
Diversas são as causas que levam as empresas a buscar o crescimento.
Penrose (1980) afirma que as grandes empresas, por possuírem um superior poder
de concorrência, restringem as opções de crescimento de concorrentes menores.
Child e Kieser (1981) afirmam que o crescimento é a base de segurança para a
firma. Whetten (1987), por sua vez, sintetiza outras causas apontadas na literatura
que levam os gestores das organizações a buscar o crescimento, tais como: a
criação de oportunidades de promoção para os funcionários (DENT, 1959 apud
WHETTEN, 1987), surgimento de mais desafios para os gerentes (STARBUCK,
1965 apud WHETTEN, 1987), a busca por atender aos anseios dos funcionários
(ROBERTS, 1959 apud WHETTEN, 1987), dentre outros. Para Bossidy (1995), o
24
processo de crescimento das empresas aumenta a moral dos empregados e atrai os
grandes talentos do mercado. Whetten (1987) também assume que crescimento é
sinônimo de eficiência e sucesso. Por essa perspectiva, uma organização que
mantém estável seu tamanho pode indicar estagnação.
Para Fleck (2009), o crescimento é um processo, não um evento, e é durante
a etapa do crescimento que se encontram os principais desafios para a organização.
Assim, seja qual for a razão que motive a organização a crescer, os gestores
precisarão não só estar cientes de que enfrentarão diversos desafios, como
precisarão ter capacidade de discernimento para não tomar decisões equivocadas.
Barney (1991) alertou que é durante o processo de crescimento que os
gestores devem decidir como irão gerir os recursos (firm resources) que garantirão
vantagens competitivas. Tais recursos incluem todos os bens, capacidades,
processos organizacionais, atributos da firma, informação, conhecimento etc. que
possibilitam à empresa conceber e implantar estratégias que aumentem a eficiência
e eficácia. Ou seja, são as decisões de um corpo gerencial com perfil empreendedor
que determinarão como a empresa enfrentará desafios do crescimento e que podem
transformar limitações do ambiente a favor da organização (CHILD, 1972;
CHANDLER, 1977).
Contudo, teóricos que seguem a visão de ecologia de população, como
Hannan e Freeman (1977), desconsideram a capacidade de um líder agir ativamente
em relação às decisões estratégicas. Esses autores sugerem que a estratégia serve,
no máximo, para maximizar a adaptação ao ambiente ou como forma de tentar
elevar as chances de sobrevivência de uma organização, resumindo as
propriedades das organizações em meras “deficiências” (da pequenez, de ser novo,
do envelhecimento, da adolescência). Acreditam ainda que “toda a estrutura básica
e o caráter de uma organização são fixados pouco depois do seu nascimento”, e as
ações subsequentes, por serem mais rígidas, não podem ser consideradas
“verdadeiramente estratégicas” (MINTZBERG et al, 2000, p. 211-214).
Defensores da visão da escola estratégica de “opção gerencial” (Managerial
Choice), Mintzberg et al (2000) ressaltam outros dois pilares (forças centrais) no
processo de elaboração de estratégia, além do ambiente: a liderança e organização.
E, num processo de desconstrução dos argumentos de Hannan e Freeman (1977),
questionam “como duas organizações podem operar com sucesso no mesmo
ambientes com estratégias muito diferentes?” (MINTZBERG et al, 2000. p.218).
25
Para Stinchcombe (1965 apud ROMANELLI, 1991), um dos principais fatores
de influência do ambiente, está no “imprinting”, ou seja, no processo pelo qual
novas organizações refletem as condições ambientais do momento da sua criação.
O autor, entretanto, não minimiza a importância dos indivíduos no processo de
crescimento da firma. Assim, com o mesmo argumento de Bloodgold e Morrow
(2003), esta pesquisa não irá aprofundar o debate acadêmico entre as escolas
“determinísticas” ou de “escolhas estratégicas”, polarizado desde a década de 1970.
Seguirá a compreensão que a estrutura do ambiente pode, ao mesmo tempo,
restringir as opções estratégicas ou prover uma “atmosfera” onde decisões
organizacionais ativas são tomadas.
É importante ressaltar que diferentes problemas poderão surgir com as
mudanças estruturais decorrentes do crescimento. Os desafios de direcionar
corretamente os recursos aumentarão (CHANDLER, 1962), e a diversidade se
ampliará, o que inclusive poderá levar a empresa a um processo de declínio
(FLECK, 2009).
Fleck (2010; 2009) propõe que a gestão responsável do processo de
crescimento pode prevenir que as organizações se tornem “too big to fail
organizations” e, ao analisar etapas e dilemas do crescimento de uma firma, a
autora identificou cinco grandes desafios, cujas respostas são condições
necessárias para permitir a empresa alcançar a autoperpetuação, e os relacionou
por meio de um construto, exposto na Figura 2.1.
Figura 2.1 – Requisitos para a propensão à autoperpetuação
Fonte: Adaptado de FLECK (2009, p. 90)
Gerir a complexidade
Aprovisionar RH
Gerir a diversidade
Navegar no ambiente
Empreender
Folga
Sucesso de LP:
propensão à auto-perpetuação
Crescimento organizacional
e renovação
Integridade organizacional
+/-
+/-
CN
CN
CN
CN
+/-
+/- +/-
CN
1
2
3
4
5
6
7
8
7
7
7
8
8
8
DESAFIOS DO CRESCIMENTO
26
Vencer e gerir cada um desses desafios se torna condição necessária (CN)
para a empresa atingir a propensão à autoperpetuação. Cada um desses desafios
será explicado com maior detalhe logo a seguir, porém, para fins didáticos, segue
uma rápida descrição de cada um: empreendedorismo – refere-se à criação de
valor por meio da expansão e exploração em uma gestão responsável de riscos;
navegação em ambiente dinâmico – relaciona-se à compreensão sistemática do
ambiente, de forma não enviesada da realidade, assim como a resposta às pressões
externas, preferencialmente de maneira antecipada, para possibilitar a captura de
valor; gerenciamento da diversidade – tem a ver com a manutenção da
integridade da firma em meio ao crescente aumento da diversidade, demandando
coordenação para harmonizar elementos heterogêneos e homogêneos da
organização, visando promover economias de escala e escopo; provisão de
recursos gerenciais – diz respeito a equipar a organização, no tempo certo, com
pessoas que possuam habilidades necessárias para o desempenho das suas
funções; gerenciamento da complexidade – concerne a resolução de problemas
de forma sistemática, e a promoção de capacidade de aprendizagem organizacional.
Segundo essa perspectiva, o sucesso ou a falha da organização tem a ver com a
capacidade ou incapacidade da firma em gerir e responder a cada um desses cinco
desafios.
A autora defende que, para cada um desses desafios, existem dois tipos
possíveis de resposta da organização. O primeiro orientado ao curto prazo, quando
a firma favorece a velocidade de crescimento. O segundo vinculado a ações que
garantam crescimento mais sólido e sobrevivência no longo prazo. Sintetizando,
para Fleck (2009), o sucesso organizacional está ligado à habilidade ou inabilidade
de a organização lidar com os desafios relacionados ao crescimento.
Abaixo, no Quadro 2.1, encontram-se, além de outra síntese descritiva dos
conceitos de cada desafio, os dois polos de padrão de resposta (arquétipos). As
empresas que se enquadram no arquétipo da autoperpetuação tendem a responder
aos desafios conforme as características do lado direito da última coluna. Já as que
se ajustam ao arquétipo da autodestruição tendem a responder conforme as
respostas características listadas no lado esquerdo da mesma coluna. Porém,
convém registrar que diferentes respostas para idêntico desafio podem coexistir na
mesma corporação.
27
Quadro 2.1 – Resumo dos desafios do crescimento das organizações
Fonte: Adaptado de FLECK (2009, p. 85)
A partir de decisões corretas tomadas pelos gestores e, principalmente, da
capacidade de mudança e adaptação, a empresa poderá se aproximar do arquétipo
“autoperpertuante” ou do “autodestrutivo” (FLECK, 2009). Para melhor
compreensão, a seguir detalham-se os dois desafios que fornecerão base para a
análise: empreendedorismo e navegação no ambiente. Esses desafios estão
diretamente relacionados a dois dos três pilares da formação da estratégia de
Mintzberg et al (2000): o ambiente e a liderança. O terceiro pilar: “organização”, que
pauta os desafios de gerenciamento da diversidade, provisão de recursos humanos
e gerenciamento da complexidade, não está contemplado no escopo desta
pesquisa.
2.1.1 Empreendedorismo
De acordo com Fleck (2009), o desafio do empreendedorismo consiste em
prover de forma continuada o processo de expansão, e a busca de forma regular de
oportunidades lucrativas. Este desafio também foi citado por Penrose (1980) como a
Desafio Descrição
Contestável ou pior Alto alcance
Baixo nível de ambição, versatilidade, imaginação, visão, baixa capacidade de levantamento de fundos, engenhosidade e julgamento. Utilizando movimentos motivacionais reativos ou nulos.
Alto nível de ambição, versatilidade, imaginação, visão, alta capacidade de levantamento de fundos,
engenhosidade e julgamento. Utilizando
movimentos motivacionais produtivos ou híbridos
À deriva De Moldagem
Monitoramento pobre, uso de estratégias de resposta inadequadas
Monitoramento regular, uso de estratégias de resposta
oportunas e adequadas
Fragmentado Integrado
Falha ao estabelecer relações e na coordenação de capacitações
Desenvolvimento com sucesso de relações e na
coordenação de capacitações
Tardio Cedo
Just-in-time ou depois de criada a necessidade
Planejada previamente
Ad hoc Sistemático
Capacitação de resolução de problemas pobre, baseado na procura rápida por soluções que impedem o aprendizado
Forte capacitação de resolução de problemas,
promoção da busca organizada de soluções,
incentivando o aprendizado
Provisionamento dos Recursos Humanos
Equipar prontamente a firma com os recursos humanos qualificados
necessário
Gerenciamento da Complexidade
Gerenciamento de questões complexas e solucionar problemas
com complexidade crescente de forma a evitar risco a existência da
organização
Características das Respostas Opostas
Empreendedorismo
Promover o empreendedorismo continuado através do estímulo ao
desejo da empresa de seguir reforçando a expansão, criação de
valor ao mesmo tempo que previne a superexposição da organização
ao risco.
Navegação em um Ambiente Dinâmico
Lidar com os múltiplos stakeholder para assegurar a captura de valor e
a legitimidade organizacional
Gerenciamento da Diversidade
Manutenção da integridade da firma ao se confrontar com conflitos organizacionais crescentes e
rivalidade
28
intenção da firma de se submeter a certos riscos, visando a ganhos futuros mas,
simultaneamente, buscando maneiras de evitar outros riscos que a impossibilitem de
crescer.
Além da exposição a riscos, para um processo contínuo de expansão ser
possível, algumas características precisam ser observadas na firma, como a
presença de mecanismos de reforço, o que Fleck (2009) denominou de motor do
crescimento contínuo, e o que Penrose (1980) designou de serviços
empreendedores.
Para Chandler (1977), a capacidade de autoperpetuação de uma empresa
está relacionada a dois processos que ocorrem concomitantemente: crescimento
contínuo e existência continuada. Fleck (2009), por sua vez, indica que
crescimento produz mais crescimento. Esse mecanismo de autorreforço, ou motor
do crescimento contínuo, pode ter início (ou “ignição”) a partir da percepção da
existência de um conjunto diversificado de recursos e habilidades subutilizados,
transferíveis dentro da empresa, por haver desequilíbrio. Isso geraria oportunidades
de expansão e incentivos ou reforços, e consequente pressão para o crescimento da
firma de forma produtiva (PENROSE, 1980; CHANDLER, 1977).
Segundo Penrose, esse pool de serviços produtivos subutilizados, ou folga
(slack), pode ser encontrado em qualquer organização. E isso inclui o conhecimento.
Uma das explicações para a folga estaria na característica de indivisibilidade dos
recursos, principalmente dos humanos, e a diversidade de utilização destes. Em
uma espécie de ciclo virtuoso, conforme ilustrado na Figura 2.2, no processo de
crescimento, a empresa, na busca gerencial por uma utilização mais intensa e
lucrativa das instalações e das habilidades dos recursos, acaba reinvestindo e
adquirindo novos recursos. Estes, por sua vez, criam e alimentam condições
favoráveis para novas expansões (PENROSE, 1980; FLECK, 2003).
29
Figura 2.2 – Estrutura geral do motor de crescimento contínuo
Fonte: Adaptado de FLECK (2003, página 16)
Mas é importante entender o que motiva os gestores de uma organização a
buscar o crescimento. Chandler (1977) afirma que uma empresa pode ter,
basicamente, dois tipos de motivador para buscar expansão. Um seria o
produtivo, visando ao aumento de produtividade, e ganhos operacionais, como
economias de escala ou escopo ou mesmo de velocidade, gerando renovação a
partir do crescimento. O segundo seria um processo defensivo, ou seja, a partir da
busca de redução de incertezas e proteção de negócios existentes. Exemplos típicos
de expansão defensiva seriam as integrações verticais e processos de fusão e
aquisição, na tentativa de reduzir as forças competitivas da indústria. Fleck (2009)
sugere dois outros tipos de motivador. Um híbrido, em que a firma busca ações
estratégicas tanto por razões produtivas quanto defensivas, permitindo-se aumentar
a eficiência e proteger os negócios. O último motivador é denominado de “nulo” (nil),
por não partir nem de uma motivação para estabelecer uma posição produtiva nem
mesmo defensiva. Penrose (1980) associou esse tipo de motivação à expansão por
gestores que buscam a criação de impérios.
Os serviços empreendedores, de acordo com Penrose, englobam ambição,
versatilidade, acesso a recursos e capacidade de julgamento e tomada de
decisão.
Ambição é a vontade de crescer, melhorar, ampliar as oportunidades da
firma. Pode ser produtiva, focada na melhora dos produtos e dos serviços, ou pode
ser uma ambição na busca da construção de um império (empire-builder) quando o
foco da empresa está na ampliação do escopo de atuação. Olhando por um prisma
estratégico, a primeira pode ser categorizada pelo que March (1991) chamou de
exploitation strategy, ou seja, priorizando o uso de oportunidades existentes. A
30
segunda pode ser associada com a estratégia de exploração (exploration strategy),
pois envolve riscos na busca de novas oportunidades.
Versatilidade é uma questão de imaginação e visão. É a capacidade de a
firma buscar caminhos não convencionais, mais criativos. Está relacionada com a
entrada em novos mercados e a busca de ambientes mais favoráveis para a atuação
da organização. Pode ser associada também com a capacidade de abrir mão de
“receitas de bolo”, táticas que fizeram sucesso no passado. A versatilidade pode
bloquear o que Sull (1999) chamou de “inércia ativa”. Esse processo acontece
quando os gestores tendem a repetir os mesmos padrões de comportamento, as
“fórmulas de sucesso” para vencer a guerra competitiva. Isso acaba atrapalhando os
negócios e fazendo que mesmo algumas empresas excelentes não escapem do
declínio.
Acesso a recursos, habilidade de acessar financiamentos (fund-raising
ingenuity), é vital para os demais serviços empreendedores. Envolve não somente a
capacidade de adquirir recursos, mas de gerar confiança nas fontes financiadoras.
Penrose (1980) afirma que, dependendo da habilidade empreendedora dos
gestores, eles poderão obter recursos, independentemente do tamanho da firma.
Para Lemme (2010), alguns gestores, na busca de recursos, são motivados a
implantar ações de responsabilidade socioambiental, pois assim podem ter mais
acesso a fontes preferenciais de financiamentos com a correspondente redução de
custo de capital.
A capacidade de julgamento e tomada de decisão, ou julgamento
empreendedor (entrepreneurial judgment), conforme denominado por Penrose
(1980), está relacionada à coleta de dados e geração de informações nos vários
departamentos da firma, a fim de mitigar riscos e evitar decisões incertas. Envolve,
de acordo com a autora, mais do que a combinação de imaginação e bom senso,
além de outras características pessoais. Está relacionada ao melhor aproveitamento
da visão e das informações geradas pelos múltiplos stakeholders da organização.
Para Lepak, Smith e Taylor (2007) a criação de valor pela organização
ocorre quando estas desenvolvem novos produtos; processos; tecnologias ou
mesmo nova forma de uso de determinadas matérias-primas. Assim, ao apresentar
inovações ou ao mudar um processo de fabricação de um produto reduzindo a
necessidade de matérias-primas, a empresa estaria criando valor.
31
2.1.2 Navegação em um ambiente dinâmico
Enquanto o desafio do empreendedorismo busca a criação de valor, o desafio da
navegação está relacionado a uma gestão bem sucedida dos múltiplos
stakeholders da organização, assegurando legitimidade, e captura de valor em
um ambiente de mudanças (FLECK, 2009). Além de manter o contínuo
monitoramento (scanning) do ambiente, a organização deve fazer o correto uso de
estratégias para responder a pressões que possam vir a ameaçar a legitimidade e
sobrevivência. Segundo Oliver (1991), para sobreviver, as organizações devem ser
posturas estratégicas mais ativas (além de responsivas) às demandas e
expectativas dos diversos stakeholders.
Na literatura sobre administração, existem diversas formas de analisar os
ambientes competitivos e, autores como Fleck, por exemplo, costumam estudar o
ambiente em mais de uma dimensão simultaneamente. Algumas visões categorizam
o ambiente, de acordo com a relação da empresa e fatores produtivos, ou mesmo
fatores de influência externa. Outros, de acordo com o grau de benevolência ou de
rigidez do ambiente em relação à empresa.
Além dessas metodologias, os autores tendem a estudar a arena competitiva
dividindo-a entre ambiente de mercado (market environment) e ambiente de “não
mercado” (non market environment). O primeiro inclui as interações entre as firmas
e outras partes, geralmente envolvendo transações econômicas e trocas de
propriedade (BARON, 1995), e é o mais comum de encontrar na literatura, em
análises, debates e teorias estratégicas. De acordo com Baron, o non market inclui a
reputação da empresa, a legitimidade e as atitudes com todos os stakeholders. Para
Baron, é de fundamental importância a análise do non market para a performance da
firma e no monitoramento (scanning) do ambiente, principalmente em setores onde o
governo exerce grande influência. De acordo com o autor, estar continuamente
“atento” para as oportunidades da organização é um dos fatores mais relevantes
para o sucesso.
O non market possui duas dimensões, a indústria e a organização.
Externamente, seu monitoramento ajuda a empresa a se proteger dos rivais,
principalmente contra novos entrantes ou mesmo produtos substitutos (BARON,
1995). Um dos exemplos de estratégias, segundo o autor, é o uso de ferramentas
32
como o lobby, para poder moldar as forças de mercado como regulações,
tributações ou mesmo aumentando as barreiras de entrada, em linha com as táticas
propostas por Oliver (1991).
Internamente, a gestão bem-sucedida dos conflitos entre os stakeholders é
tida como fator fundamental de sucesso. Como as partes tendem a ser conflitantes,
e legítimas, a correta gestão dos interessados é crucial para a longevidade da
empresa. Lepak, Smith e Taylor (2007) assumem que os investidores geralmente
preferem criação de valor de curto prazo. Já os funcionários, usualmente, escolhem
criação de valor que gere estabilidade no longo prazo. Quanto ao meio ambiente,
pode-se dizer que a correta gestão desse stakeholder consiste em promover sua
preservação. Para Oliveira (2007), a correta identificação das necessidades de cada
uma das partes interessadas, considerando a responsabilidade por um bom
desempenho social e ambiental, permite a elaboração de cenários e a criação de
subsídios para melhores decisões estratégicas.
2.1.2.1 Categorias de ambientes
Voltando à questão das diferenças de ambientes, e buscando estruturar os
diversos conceitos, este trabalho propõe dois eixos principais de análise.
O primeiro irá aplicar a análise do ambiente sugerido pela sociologia
organizacional, conforme Carroll e Huo (1986). Porém, além dos ambientes de
negócio e institucional (task and institutional environment), será incluída a interação
da empresa com o meio ambiente, o ambiente natural. O segundo eixo de análise
será analisado conforme Weitzel e Johnson (1989), Fleck (2009; 2010) e outros, ou
seja, pela perspectiva das condições ambientais em que as ações das
organizações podem desenvolver-se. Este framework de Fleck (in print) possibilita
analisar os fatos classificando-os segundo o tipo de ambiente que predominava ao
redor da empresa em estudo.
O task environment engloba fatores diretamente ligados ao “trabalho” da
organização, com especial atenção aos processos e os fluxos de “entrada e saída”
dos produtos, ou os fatores externos potencialmente relevantes para o atingimento
das metas (CARROLL; HUO, 1986). Inclui a relação com fornecedores, clientes,
competidores, mercado, para citar alguns.
33
O conceito de institutional environment foi usado inicialmente por Selznick, em
1948. Para Carroll e Huo (1986), são fatores externos que influenciam indiretamente
a organização. Como exemplo, pode-se citar a cultura nacional, os sistemas
políticos, as leis e regulações, a estrutura do mercado, procedimentos, convenções
informais, normas, situações macroeconômicas etc. (LAMMERS; HICKSON, 1979;
CARROLL; HUO, 1986; OLIVER 1992; 1997). A relação da empresa com o “não
mercado” (non market) de Baron (1995) também está associada ao ambiente
institucional.
Por fim, o ambiente natural, ou natural environment, de acordo com Fleck
(2010), inclui a interação da empresa com o meio ambiente. Desde a dependência
dos recursos naturais à eliminação de detritos e pressões ambientais e de
responsabilidade ambiental e social corporativa (Rasc), um dos motes em análise
desse estudo.
Indo para o outro eixo de estudo, analisam-se as condições do ambiente de
negócio, ou seja, as características do ambiente pela ótica da pressão em relação à
empresa. De acordo com Weitzel e Johnson (1989) e Fleck (2009), o ambiente
piedoso (forgiving environment) é generoso e compassivo, o que pode estimular
um comodismo organizacional e, consequentemente, dificuldades de perceber sinais
de declínio organizacional. Neste, nem os mecanismos de mercado (market) ou de
“não mercado” (non market) conseguem “punir” a ineficiência das organizações, ou
mesmo gerar pressões para mudanças. Isto acaba contribuindo para as empresas
fazerem “mais do mesmo” ao invés de buscar inovações ou resolver problemas
internos. De acordo com Fleck (2010), esse era o cenário brasileiro para a maioria
das empresas durante quase todo o século XX.
Mas o ambiente pode ser desafiador (challenging environment) e altamente
competitivo. Neste, somente serão recompensadas as organizações eficientes e que
souberem se antecipar e responder a todos os desafios, sendo punitivo para
organizações com pouca competitividade e ineficientes. Atualmente, com a
globalização e as quedas de fronteiras comerciais, as arenas competitivas provam-
se cada vez mais desafiadoras, principalmente em mercados mais maduros. Para
Lepak, Smith e Taylor (2007), as firmas são mais propensas a inovar quando
enfrentam ambientes de incertezas, cenários competitivos mais dinâmicos, e quando
geridas por gestores empreendedores.
34
Existe um terceiro tipo de ambiente, pouco explorado na literatura, porém não
menos importante de ser categorizado: o ambiente inóspito, ou inhospitable
environment. É caracterizado por situações extremas e desafiadoras para o
sucesso de empreendimentos, impondo restrições às atividades da organização, e
onde a criação e a captura de valor são mais restritas (FLECK, 2010). Como
exemplo, é possível citar desde países em guerras, aparecimento de ditaduras,
ambiente de desconfiança institucional, bloqueios de mercados ou mesmo uma
situação natural desfavorável.
Contudo, conforme ressaltado por Mintzberg et al (2000): “Na realidade,
nenhuma organização enfrenta um “ambiente” generoso, complexo, hostil, ou
dinâmico (para não dizer turbulento). Pode haver bolsões periódicos dessas
coisas...” (MINTZBERG et al, 2000, p.217). Assim, chega-se ao Quadro 2.2, de Fleck
(in print), que no momento da análise da empresa em estudo, servirá como
framework-base para categorizar, em cada período estudado, em quais tipos de
ambiente a Fiat estava inserida.
Quadro 2.2 – Framework síntese das teorias ambientais.
Fonte: Fleck (in print)
2.1.2.2 Respostas aos desafios do ambiente
Conforme mencionado, a organização que estará mais propensa à
autoperpetuação é a que mantém uma prática de monitoramento constante
(scanning) do ambiente e stakeholders (FLECK, 2009). Barney (1991) sugere que as
firmas adquirem vantagem competitiva sustentável por meio das forças internas e
35
também com as respostas a oportunidades do ambiente, ao neutralizar as ameaças
externas e evitar fraquezas internas. Beer (2002) corrobora afirmando que, num
contexto de grandes mudanças tecnológicas e globalização, as firmas terão de ter
capacidade de adaptação ou sofrerão consequências como baixo desempenho ou
mesmo declínio e morte. O autor chama de organizational fitness a capacidade de
adaptar o desenho da organização, processos, comportamento e cultura para ter o
fit com novas situações como, por exemplo, pressões para maior responsabilidade
social. Segundo o autor, nesse “ambiente econômico darwiniano”, as unfit
organizations não sobreviverão. Para Beer (2002), infelizmente, a maioria das firmas
não parecem ser tão adaptativas.
Sull (1999) observa que mais importante do que a empresa responder às
pressões, é responder da maneira correta. Muitas vezes, empresas que tiveram
sucesso acabam buscando fórmulas antigas no passado de glória tentando
responder a novos desafios com os mesmos “remédios”. O autor descreve como
“inércia ativa” o processo de repetição de determinados comportamentos, outrora
bem-sucedidos, mesmo quando o ambiente tenha mudado. Assim, de acordo com
Mintzberg et al (2000) e Oliver (1991; 1992; 1997), é fundamental que a empresa
mantenha comportamento estratégico para responder aos processos de
institucionalização; e para não ter a legitimidade ameaçada, a empresa deve atuar
com respostas adequadas a cada ameaça, utilizando-se de grande variedade de
respostas estratégias.
Christine Oliver (1991) discorre sobre as maneiras de responder
estrategicamente às leis, estruturas regulatórias, agências reguladoras e demais
instituições que, agrupadas, são chamadas de pressões institucionais, em que a
opinião pública (imagem da organização) também é enquadrada. Para Oliver (1991;
1992), o comportamento das organizações pode variar entre extremos de
conformação passiva até a resistência ou controle, de acordo com a natureza da
pressão. Abaixo, serão detalhadas as estratégias sugeridas por Oliver (1991) que
podem ser adotadas pelas organizações em resposta às pressões ambientais:
1. Aceitação ou submissão (acquiescence): existem diversas formas de a
organização “aceitar” normas, costumes ou pressões institucionais:
I. o hábito é uma aderência inconsciente às regras. São as normas
“tidas como certas”. Padrões históricos que se repetem
36
ciclicamente, ou processos que deixam de ser questionados pois
“sempre foi assim”;
II. a imitação, ou seja, o mimetismo de modelos institucionalizados,
de forma consciente ou não. Um exemplo desse padrão de
respostas é quando os gestores, na hora de tomar decisão,
repetem o comportamento de outros “atores” no ambiente,
principalmente de pessoas conhecidas em quem confiam. Oliver
cita, como exemplo, a contratação de consultorias, que replicam
seus modelos (ou pacotes de solução) em firmas de diferentes
setores, em diversos ambientes, com pouca ou nenhuma
customização;
III. a conformidade, a resposta mais ativa, pois é uma forma
consciente de respeitar valores, normas ou requisitos institucionais.
Podem ser formas de se adequar previamente à pressões externas
por serem consideradas necessárias para a condução das
atividades, como adequação à legislações ou regulações
ambientais, por exemplo, para poder continuar operando em
determinado País.
2. Compromisso ou negociação (compromisse): “as organizações são
constantemente confrontadas com demandas institucionais conflitantes ou
com inconsistências entre expectativas institucionais e objetivos internos
relativos à eficiência e à autonomia” (OLIVER, 1991, p. 153). Com essa
definição, a autora propõe outras três táticas que estão no limiar da
resistência da firma às pressões institucionais: balancear, pacificar e
barganhar. Todas, diferentemente das estratégias de aceitação, são
formas parciais de adequação a pressões, em que a empresa busca
promover mais ativamente os próprios interesses:
I. balancear pode ser considerado uma resposta tática aos
processos institucionais e se refere à acomodação das demandas
dos múltiplos stakeholders em resposta às pressões institucionais e
demais expectativas. Ou seja, é uma tentativa organizacional de
atingir paridade entre as partes interessadas. Como exemplo, pode-
se citar a criação de centros de capacitação para a população ao
redor de uma fábrica que, ao mesmo tempo em que atende às
37
demandas da sociedade, pode servir de nova fonte de mão de obra
especializada para a firma;
II. técnicas de pacificação (pacify) também são estratégias que
aceitam parcialmente as expectativas institucionais de uma ou mais
partes interessadas. Como exemplo, a autora cita o redesenho de
um produto potencialmente perigoso, para se adequar a demandas
sociais ou legislativas. Uma ressalva é o considerável uso de
energia e recursos para atuar nessas fontes de pressão;
III. barganha é uma forma mais ativa de compromisso do que
pacificação. Pode ser descrita como o esforço da firma, a partir de
negociações, de reduzir demandas ou exigências institucionais de
alguns stakeholders. Pode ser exemplificada pelas relações
empresa versus sindicato ou empresa versus agências
reguladoras.
3. Evitação ou evasão (avoidance): é definida como ações da organização
para evitar uma necessidade de se adequar a demandas ou pressões
institucionais. De acordo com Oliver (1991), diversos teóricos, tanto da
corrente de dependência de recursos, quanto da institucionalização,
reconhecem a importância da estratégia de evitação como resposta às
pressões institucionais. Dentre eles Meyer e Roman (1977 apud OLIVER,
1991), Meyer et al. (1983 apud OLIVER, 1991), Pfeffer e Salancik (1978
apud OLIVER, 1991), para citar alguns. Novamente, a autora difere esta
estratégia em três formas de resposta: dissimulação, amortização e fuga:.
I. dissimulação (concealment), como o próprio nome sugere, são
estratégias usadas para “dar a entender” que a organização está
submetida a determinada pressão institucional quando, na verdade,
não está. É exemplificada por táticas de “maquiagem” da firma em
dias de inspeção de órgãos responsáveis e, ao fim de tal inspeção,
a empresa volta aos processos habituais e “não conformes”;
II. amortização (buffering) é a tentativa da organização de reduzir a
intensidade com a qual é inspecionada, examinada ou avaliada por
agências externas. Teóricos acreditam que o desacoplamento de
certas atividades pode ajudar a empresa a manter a legitimidade e,
ao mesmo tempo, aumentar a autonomia da firma;
38
III. fuga é a forma mais drástica de responder a pressões
institucionais. Uma organização pode rever ou até mesmo mudar
drasticamente de objetivos, atividades e mesmo áreas de atuação
para não ter de se submeter a pressões. A mudança física de
empresas químicas da União Europeia ou dos Estados Unidos da
América para países do chamado “mundo em desenvolvimento”,
com leis ambientais mais flexíveis, é um exemplo de estratégia de
fuga.
4. Desafio ou provocação (defiance) é uma forma mais ativa de resistir aos
processos institucionais, principalmente quando os interesses da
organização são fortemente conflitantes com as normas ou expectativas
de stakeholders externos. Geralmente é executado quando a organização
acredita que poderá argumentar e justificar a decisão e quando os
gestores medem os riscos desse confronto e acreditam que, em caso de
perda, esta não impactaria tanto na legitimidade da firma. Pode ser em
forma de ignorar, desafiar ou atacar:
I. ignorar (ignoring), como o nome sugere, é quando a organização
decide, espontaneamente, ignorar regras institucionais,
principalmente quando a pressão externa é baixa. Um exemplo
citado por Oliver (1991) são as ações de afirmação social ou de
gênero, ignoradas por algumas empresas. Um estudo de Salancik
(1979 apud OLIVER, 1991) mostrou que a adequação a tal política
se dava basicamente em empresas que dependiam de recursos
governamentais;
II. desafiar (challenge) é um questionamento ainda ativo de normas,
regras ou mesmo expectativas externas. Quando este tipo de tática
pode ser reafirmada de forma racional pela instituição, tende a ser
mais utilizada. Essa pode ser também uma postura positiva, que
agregue valor para as partes interessadas, como o caso de
empresas que se unem para pressionar o governo a tornar
legislações ambientais ainda mais rigorosas;
III. ataque é a terceira tática da estratégia de desafio, em que a
organização investe energia para desafiar as pressões e
expectativas institucionais de forma mais intensa e agressiva. Essa
39
táctica costuma ser empregada, geralmente, quando a organização
percebe que tais pressões são direcionadas especificamente contra
ela, não são expectativas generalizadas, o que pode colocar em
perigo sua existência e autonomia.
5. Manipulação é a resposta mais ativa às pressões institucionais e uma
tentativa proposital para buscar oportunidades ao cooptar, influenciar e até
mesmo controlar ou moldar certos fatores ambientais:
I. cooptação é quando a organização pode cooptar membros de
fontes dessas pressões como forma de resposta. Como exemplo, a
firma pode propagandear parceria com um instituto sobre ética para
trazer a opinião pública para seu lado;
II. influência, caso em que a organização atua de forma mais
genérica, buscando manipular crenças e valores institucionalizados.
É muito observada em indústrias que tendem a ser avaliadas por
altos padrões, quando buscam definir tais padrões. O lobby
governamental, por uma empresa ou associação, também pode ser
considerado tática de influência;
III. controle é a última tática na busca de exercer dominância sobre os
constituintes externos que pressionam a organização. É
considerada mais agressiva que as anteriores, pois não busca a
cooperação, mas o domínio.
Fleck (2009) afirma que, para uma empresa superar o desafio da navegação,
deve manter um processo ativo de monitoramento constante (regular scanning),
podendo assim usar as respostas mais adequadas propostas por Oliver (1991). Com
isso, poderá moldar o ambiente, neutralizar as pressões institucionais ou se
adaptar quando não tem controle sobre a situação. Para moldar o ambiente, por
exemplo, a empresa poderia usar as táticas de desafio ou de manipulação. Para
neutralizar o ambiente, por sua vez, a autora sugere a evitação e, por fim, ao não ter
forças para pressionar o ambiente, adaptar-se usando as estratégias de aceitação e
compromisso. Para Fleck, caso a empresa responda apenas de forma passiva (ou
reativa), poderá usar estratégias equivocadas e não ter sucesso na busca de
captura de valor.
40
Para este trabalho, tão importante quanto tratar das formas corretas de
responder aos desafios de crescimento, é ressaltar que existe um direcionamento
oposto que as empresas podem seguir: o declínio organizacional. O declínio, de
acordo com Weitzel e Johnson (1989), acontece quando a organização falha em
antecipar, reconhecer, neutralizar ou adaptar a pressões internas e externas que
ameaçam a sobrevivência de longo prazo da firma.
Uma organização mal sucedida pode ser descrita por carecer de recursos críticos
e, assim, enfrentar sérios riscos de sobrevivência. Fleck (2010) afirma que, além dos
financeiros, esses recursos podem ser relacionados com o conhecimento, valor de
mercado, reputação da firma, gerenciamento, dentre outros. O declínio, tal como o
crescimento, ocorre por etapas, e, se a organização não perceber as primeiras
etapas e agir para resolver, sua sobrevivência no longo prazo estará seriamente
comprometida (BARNARD, 1938; SELZNIC, 1957; FLECK, 2009).
Presenciou-se a migração da era industrial para a era da informação, voltada ao
network, mais complexa, instável, ambígua, caótica e sem direcionamento correto.
Nesta nova era, fatores intangíveis chegam a ter, em determinados momentos, mais
relevância do que resultados financeiros; e, nesse mundo interconectado, as
empresas precisam ser mais flexíveis e adaptativas (VOELPEL; LEIBOLD;
MAHMOUD, 2003). De acordo com Baron (1995), um dos assets mais importantes
para as firmas é a reputação. E reputação de uma firma hoje, em muitos casos, está
diretamente relacionada à forma com que a empresa gere os stakeholders, inclusive
a sociedade e o meio ambiente.
2.2 RESPONSABILIDADE AMBIENTAL E SOCIAL CORPORATIVA
Nos últimos anos, as pressões ambientais envolvendo o tema Rasc vêm
crescendo em todo mundo. O cenário não é diferente no Brasil (FERREIRA, 2009), e
não pode mais ser ignorado por nenhuma organização. Se uma organização quer
continuar a crescer e gerar valor de longo prazo, ela precisa preocupar-se em adotar
uma postura responsável com o meio ambiente, a sociedade onde está inserida e os
demais stakeholders (HAWKINS, 2006). Ainda, acadêmicos de distintas correntes de
pensamento compartilham a percepção de que a atividade de negócios possui uma
dimensão ética, complementar à dimensão econômica e legal.
41
Compatibilizar a sustentabilidade socioambiental, a longevidade lucrativa e a
sustentabilidade da corporação é questão crucial (FLECK, 2010). Assim, analisando
as condições necessárias (CN), mas não suficientes, para a autoperpetuação das
empresas, Fleck (2010) aponta os benefícios do comportamento e engajamento
socioambiental, e da integração de práticas sustentáveis às estratégias centrais das
organizações. De acordo com a autora, a Terra deve ser vista como importante
stakeholder da empresa e, como parte interessada, deve ter as necessidades
consideradas em todas as decisões e ações. Isso porque as empresas possuem um
papel central tanto na degradação quanto na preservação do meio ambiente.
Nesse contexto, uma das oportunidades expostas por Fleck (2010) é a
perspectiva de que ações de responsabilidade socioambiental corporativas (Rasc)
podem neutralizar as três questões que levam a organização ao declínio: a síndrome
de simplicidade, a existência de um ambiente piedoso (forgiving environment) e o
crescimento organizacional não sustentável.
A síndrome da simplicidade é explicada como uma super preocupação em
manter quantidade restrita de indicadores, o que poderia gerar baixa percepção das
mudanças do ambiente e, como resultado, a firma não vislumbrar novas
oportunidades ou ameaças. Miller (1993) associa a noção de simplicidade com a
redução da variedade. Para o autor, simplicidade é a preocupação excessiva com
um objetivo único, o que impede que a corporação considere outros nas decisões.
Organizações que ignoram práticas de Rasc, por focar unicamente no retorno ao
acionista, por exemplo, podem ser enquadradas nessa categoria.
Quando ineficiências e fraquezas não são punidas por mecanismos de
mercado ou por outros tipos de mecanismo, a simplicidade se instala e, no longo
prazo, estreita a visão da organização e a leva a realizar “mais do mesmo” (more of
the same), e ao crescimento cujo cunho positivo leva ao não questionamento das
práticas vigentes. Miller (1993) ainda afirma que, no longo prazo, o sucesso acaba
levando muitas organizações a se tornar “simplistas” e, como resultado, não ter
capacidade de responder às mudanças e pressões do ambiente.
A segunda questão que pode levar uma organização de sucesso ao declínio é
a existência de um ambiente piedoso (forgiving environment), em que, por ser
pouco competitivo, as empresas acabam se tornando ineficientes. Conforme falado
anteriormente, Fleck (2010) caracteriza diversos setores econômicos brasileiros,
durante a maior parte do século XX, como pertencentes a um ambiente piedoso.
42
Nessa época, no Brasil, existia demanda crescente, altas barreiras de importação,
altas taxas de inflação, o que inibia novos planos de investimentos, e pouca
competitividade, dentre outras características. Empreendedores que vislumbravam
antes dos demais as oportunidades tinham a chance de ver os negócios se expandir
mesmo sem se preocuparem com gestão de custos, eficiência no uso de recursos
ou a obsolescência tecnológica. Com o tempo, as organizações brasileiras se
diversificavam em uma variedade de negócios, mesmo que não gerassem as
vantagens da sinergia. Em geral, quando comparados aos padrões internacionais,
os produtos e serviços nacionais eram caros e com padrões abaixo da média.
Assim, na abertura comercial brasileira nos anos 1990, com o Plano Collor, diversos
competidores estrangeiros entraram no mercado nacional com novas tecnologias,
levando conglomerados nacionais conhecidos à falência ou a situações muito
complicadas (FLECK, 2010).
Fleck (2009) lista alguns sintomas qualitativos que podem indicar se uma
organização é ineficiente, como número excessivo de pessoas, tolerância à
incompetência, procedimentos administrativos ineficientes, poderes
desproporcionais dos setores administrativos, escassez de metas claras,
comportamento de evitação de conflitos, pouca percepção de mudanças do
ambiente, poucos esforços para contratação, treinamento ou retenção de recursos
humanos, dentre outros. Então, conclui a autora, um ambiente piedoso torna quase
impossível a uma organização identificar sintomas que precedem os estágios de
declínio organizacional.
Já a terceira síndrome, do crescimento organizacional não sustentável, é
explicada por Fleck (2010) como práticas que focam o sucesso imediato, de curto
prazo, e que iludem os gestores com rápidos “atalhos” para o crescimento. Esses
gestores falham em pavimentar o caminho para a autoperpetuação e acabam
prejudicando a sobrevivência de longo prazo da organização. Ao não levar em
consideração determinados fatores ambientais, as organizações podem colocar, em
curto período de tempo, a legitimidade em risco. Assim, o comportamento e
engajamento socioambiental, e a integração de práticas sustentáveis às estratégias
centrais das organizações, são condições necessárias para a sobrevivência
(FLECK, 2010).
Oliver (1991) reforça que, quando as normas externas ganham status de fato
social, como as relacionadas à Rasc, as organizações precisam se engajar nessas
43
atividades, mesmo que não interesse diretamente a suas metas ou não gerem mais
prestígio. Além da tão almejada sobrevivência, FLECK (2010) ainda lista uma série
de outros benefícios das práticas de Rasc pelas organizações, tais como: (i)
redução de custos com eficiência no uso de recursos naturais; (ii) captura de valor
nos novos “mercados verdes”; (iii) vantagens do first-mover; (iv) estabelecimento de
melhor relação com a comunidade; (v) melhora da imagem (brand equity); (vi) uso se
oportunidades sociais para desenvolver estratégias e vantagens competitivas.
2.2.1 Conceituando Rasc
O tema “desenvolvimento sustentável” recebe cada vez mais atenção, tanto
no campo teórico da administração, quanto na prática das organizações.
Acadêmicos como Dyllick e Hockerts (2002) asseguram que sustentabilidade será o
mantra do século XXI. Ainda assim, existe falta de consenso sobre um conceito que
seja amplamente aceito sobre o que seria, efetivamente, responsabilidade ambiental
e social corporativa (Rasc). Daneke (1985) já afirmava que, mesmo ainda existindo
uma visão muito limitada sobre responsabilidade social corporativa, a percepção do
mercado de que a maximização dos lucros de curto prazo era a única razão de ser
das empresas mudou, principalmente a partir de movimentos sociais que
culminaram com a criação de regulamentações ambientais, da saúde e de
segurança.
Parra (2003 apud SPERS; SIQUEIRA, 2010) aponta que a expressão
“responsabilidade social” já era citada por industriais ingleses no fim do século XIX1.
Spears e Siqueira (2010) citam ainda que o verdadeiro marco dos estudos e debates
sobre responsabilidade social foi o lançamento do livro Responsibilities of the
businessman, de Howard Bowen, em 1953. Contudo, o conceito mais difundido de
desenvolvimento sustentável foi criado no relatório de Brundtland, em 1987.
Diversos autores alegam que foi a partir desse momento que se intensificou a
percepção de que o capitalismo, ideologia dominante no mundo, trouxe, além de
progresso e desenvolvimento, externalidades para a sociedade e ao meio ambiente.
Hart e Milstein (2004) afirmam que, a partir de então, ocorreu elevação das
expectativas dos demais stakeholders em relação ao desempenho ambiental e
1 Em documento, assinado por mais de 120 industriais, atribuía ao gestor a responsabilidade pelo equilíbrio entre interesses públicos e privados.
44
social das empresas, com isso, gerando estímulo para proteger os sistemas
naturais.
Puppim (2008) destaca que, apesar de não existir definição consensual,
responsabilidade social envolve uma gestão empresarial mais transparente e ética, e
a inserção de preocupações sociais e ambientais nas decisões e resultados da
empresa: “RSE (Responsabilidade Social Empresarial) diz respeito à maneira como
as empresas agem, como impactam e como se relacionam com o meio ambiente e
suas partes legitimamente interessadas (os chamados stakeholders)”, e que tudo
isso reflete governança corporativa, ou seja, como uma organização é governada e,
consequentemente, afeta os resultados econômicos e financeiros (PUPPIM, 2008, p.
178).
O Business for Social Responsibility (BSR Institute), uma das principais
entidades mundiais na área de responsabilidade social, propõe que o conceito de
empresa socialmente responsável se aplicará àquela que atue no ambiente de
negócios de forma que atinja ou exceda as expectativas éticas, legais e comerciais
do ambiente social na qual se insere (HERRMANN, 2004). Em linha com essa
descrição, o instituto brasileiro Ethos caracteriza como ação socialmente
responsável das empresas “a que tem como principal a coerência ética em suas
práticas empresariais e em sua relação, buscando o desenvolvimento contínuo dos
seus stakeholders” (SPERS; SIQUEIRA, 2010, p. 18).
Machado Filho (2002, apud SPERS; SIQUEIRA, 2010) alega que mesmo
acadêmicos de distintas correntes de pensamento compartilham da percepção de
que, no âmbito de Rasc, a atividade de negócios possui dimensão ética,
complementar à dimensão econômica e legal. Hawkins (2006) afirma que, se uma
organização quer continuar a crescer e gerar valor no longo prazo, ela precisa
preocupar-se e adotar postura responsável com o meio ambiente, com a sociedade
onde está inserida e com os demais stakeholders.
Finalmente, Spers e Siqueira (2010) concluem que Rasc se relaciona à
empresa que atende simultaneamente aos interesses dos diferentes públicos com
os quais se inter-relaciona, sendo capaz de incorporá-los ao planejamento de suas
atividades. Ou seja, a empresa é socialmente responsável quando consegue gerar
valor não apenas para proprietários e acionistas, mas para todos os demais públicos
com os quais se relaciona, dentre eles os empregados, fornecedores, clientes,
governo, meio ambiente e sociedade.
45
Infelizmente, algumas organizações ainda não compreenderam o conceito de
Rasc e se preocupam apenas com o greenwash. Este termo se refere à práticas de
propaganda corporativa que tentam mascarar um desempenho ambiental fraco.
Outra falácia que é usada por algumas empresas é implantar práticas de filantropia,
como o simples apoio financeiro a instituições de caridade ou outras ações similares,
alegando que são socialmente responsáveis. Esses movimentos são importantes e
possuem méritos, mas não se trata de Rasc (LEMME, 2010). Em momentos de
dificuldades financeiras, são essas atividades as primeiras a ser eliminadas nas
organizações exatamente por não estar estrategicamente relacionadas ao negócio.
Práticas de Rasc devem estar integradas às estratégias empresariais, às atividades
fins das empresas e incorporadas no dia a dia das operações.
2.2.2 Rasc e estratégias empresariais
Shrivastava (1995) assinala que o desenvolvimento industrial nas últimas
décadas trouxe prosperidade, mas também causou muita degradação ecológica; e,
como resultado, a Terra hoje enfrenta sérios problemas ambientais. Nesse sentido, o
autor aponta uma responsabilidade das corporações no desenvolvimento ecológico
sustentável. As razões principais seriam por estas serem os motores primários do
desenvolvimento econômico, por possuir recursos financeiros, conhecimento
tecnológico e capacidade institucional de implantar soluções ecológicas.
Por outro lado, a corrente crítica argumenta que práticas de Rasc distraem os
gestores do papel econômico fundamental dos negócios, que é gerar lucros, ou que
não passam de programas para criar um sentimento de fell good nas grandes
corporações (FOOTE; GAFFNEY; JAMES, 2010). Para Hart e Milstein (2004), a
maioria dos executivos ainda considera a sustentabilidade não como uma
oportunidade multidimensional, mas, antes, como um incômodo unidimensional.
Mesmo assim, a Rasc tem ganhado muita atenção de pesquisadores nas últimas
décadas, com a maioria das questões focando em se e como as empresas tidas
como socialmente responsável estariam mais propensas a ter maior sucesso
financeiro. Porter e Reinhard (2007) afirmam que, além da geração de benefícios
sociais, ações de Rasc devem ser consideradas pelas empresas como estratégias
para que elas possam permanecer competitivas no longo prazo.
46
Para Fleck (2010) e Foote, Gaffney e James (2010) as corporações que
operam com visão de longo prazo e estão cientes da responsabilidade para com a
sociedade em que se inserem tendem a obter melhores resultados quando
comparadas com as que simplesmente focam em resultados de curto prazo. Doh et
al (2009) acreditam que existe consenso na crescente literatura sobre
responsabilidade social corporativa, em que “firmas virtuosas” são constantemente
recompensadas pelo mercado, mesmo existindo dificuldade para gestores e
investidores saberem reconhecer se uma firma está realmente engajada com um
comportamento responsável. Para Hahn et al (2009), dado que as organizações
necessitam não apenas de capital financeiro para operar, mas também de recursos
ambientais e sociais, ao analisar os custos de oportunidade, devem levar em
consideração maneiras mais eficientes de usar todas as fontes de recursos.
Somente assim conseguiriam criar vantagem competitiva sobre os demais players
(BARNEY, 1991). Fleck (2010) afirma que a observação e integração de práticas de
Rasc podem neutralizar o processo de declínio das organizações. Já Spers e
Siqueira (2010) elencam os riscos relacionados a ausência de Rasc, que vão desde
a perda de credibilidade da organização perante a sociedade até deterioração
interna do clima organizacional.
Porter e Kramer (2006) afirmam que, se as corporações analisarem os
prospectos de Rasc usando o mesmo framework que guiam as escolhas do core
business, iriam descobrir que Rasc pode ser muito mais que um custo, uma
limitação ou um ato de caridade. Responsabilidade socioambiental pode “ser uma
fonte de oportunidades, inovação e vantagem competitiva” (PORTER; KRAMER,
2006, p. 80). Corroborando essa visão, Spers e Siqueira (2010) alegam que a
crescente exigência de competitividade está tornando comum a crença de que o
envolvimento com a comunidade é um imperativo no mundo dos negócios, gerando
vantagem competitiva, acarretando inclusive valorização dos preços das ações.
Stakeholders externos estão procurando participar de empresas que se
preocupam com questões sociais, bem como observam o risco potencial para as
empresas que não estão, refletindo assim condutas inaceitáveis. Prova disso são
discussões em diversos países para aprovação de leis pelas quais toda empresa
com ações na bolsa deve informar, no relatório anual, os riscos das suas ações nos
âmbitos sociais, ambientais e éticos. Porém, convém lembrar que apenas publicar
relatórios não é a solução. Tais publicações raramente oferecem um panorama
47
coerente sobre as atividades de Rasc e geralmente trazem informações sobre ações
não coordenadas e iniciativas para mostrar a sensibilidade social da empresa
(PORTER; KRAMER, 2006).
Senge, Smith e Kruschwitz (2008) tratam a sustentabilidade como uma
megatendência de proporções e impactos comparáveis à revolução industrial e à
globalização. De acordo com os autores, a maioria dos executivos sabe que a forma
como irão responder ao desafio da sustentabilidade afetará profundamente a
competitividade (e consequentemente a posição de liderança) e até mesmo a
sobrevivência de sua organização. Scherer e Palazzo (2010) evidenciam que nas
últimas décadas as empresas começaram de fato a desempenhar atividades que
tradicionalmente estavam restritas à esfera governamental e, como consequência,
se tornaram atores políticos relevantes na sociedade global. Assim, soluções para
desafios da sociedade não estão mais restritos ao sistema político, mas incluem
uma diversidade de outros atores, como corporações e ONGs. Essa noção impõe
desafios para a evolução da teoria da firma e para a pesquisa da Rasc.
2.2.3 Motivadores de Rasc
Chandler (1962) define estratégia organizacional como a determinação das
metas e dos objetivos básicos no curto e longo prazo da empresa, a adoção de
direcionamentos e ações e a alocação dos recursos necessários para atingir tais
metas. Contudo, é imperativo ressaltar que acabam sendo as motivações dos
gestores que direcionam as estratégias organizacionais na busca da geração de
valor para as companhias.
Os estudos acadêmicos apontam diversos motivadores para a implantação de
práticas de Rasc. Lemme (2010), em linha com Nidumolu, Prahalad e Rangaswami
(2009), destaca algumas vantagens competitivas buscadas pelas empresas que
passam a atuar de forma responsável:
a) eficiência na utilização de materiais, pessoal e equipamentos com
consequente redução dos custos operacionais e impactos ambientais ao
longo de toda cadeia produtiva (eco design ou desenho ecológico de
produtos);
48
b) aumento de receitas decorrente da diferenciação dos produtos/serviços e
do posicionamento nos mercados atrelado à rotulagem ambiental, que atrai
consumidores ambientalmente conscientes;
c) gerenciamento de riscos operacionais, que poderiam representar multas à
empresa;
d) acesso a fontes preferenciais de financiamentos com a correspondente
redução de custo de capital.
Por outro lado, Porter e Kramer (2006) declaram que os proponentes de Rasc
estão usando quatro principais argumentos para justificar ações de responsabilidade
ambiental e social corporativa: obrigação moral, sustentabilidade, licença para
operar e reputação.
A obrigação moral sustenta que as empresas possuem um dever em ser boas
cidadãs e de “fazer a coisa certa”. Essa justificativa é proeminente nas metas da
Business for Social Responsibility, a associação não lucrativa líder em
responsabilidade social nos EUA.
O argumento “sustentabilidade” enfatiza o stewardship ambiental e
comunitário, ou seja, a preocupação com as futuras gerações. Essa visão remete ao
relatório de Brundtland, de 1987. As empresas que atuam sobre esse princípio
geralmente citam o “tripé” da performance econômica (triple botton line), onde são
considerados aspectos sociais, econômicos e ambientais nas decisões. Em linha
com o proposto por Fleck (2010), os autores enfatizam que as empresas deveriam
operar de modo que assegurassem boa performance econômica de longo prazo,
evitando comportamentos de curto prazo socialmente contestados ou perigosos para
o ambiente. Gerentes que possuem pouco entendimento estratégico sobre Rasc
estão propensos a postergar esses “custos”, que podem levar a custos ainda
maiores se, no futuro, a companhia vier a ser julgada por ter violado as obrigações
sociais.
A alegação “licença para operar” vem do fato que toda empresa precisa de
permissão tácita ou explicita para operar dos governos, comunidades e vários outros
stakeholders. É uma visão mais pragmática, pois busca uma maneira concreta de o
negócio identificar quais questões sociais efetivamente importam para suas partes
interessadas, e tomar decisões sobre elas. Porém, completam os autores, “essa
busca por satisfazer os stakeholders pode levar a empresa a perder o controle
49
primário das funções de Rasc para terceiros” (PORTER; KRAMER, 2006, p. 82). O
risco dessas ações está no fato de que os grupos externos nunca poderão
compreender completamente as capacidades da empresa, o posicionamento
competitivo ou mesmo os trade-offs que precisam e podem ser feitos.
O argumento sobre “reputação da empresa” busca principalmente benefícios
estratégicos. Todavia, de acordo com os autores, raramente são alcançados.
Mesmo nas empresas que se têm distinguido pelo extraordinário compromisso de
longo prazo com a responsabilidade social, é difícil mensurar os impactos sociais e,
principalmente, os benefícios comerciais dessas ações. Os estudos sobre os
impactos da reputação social na preferência dos compradores ou na performance no
mercado de ações são, no mínimo, inconclusivos (PORTER; KRAMER, 2006, p. 83).
Porter e Kramer (2006) alegam que todas as quatro escolas compartilham as
mesmas fraquezas: focam na tensão entre empresas e a sociedade mais do que na
interdependência. Cada uma cria uma racionalização genérica que não está
amarrada à estratégia e operação de nenhuma companhia específica com os locais
em que elas operam. Consequentemente, nenhuma seria suficiente para ajudar uma
organização a identificar, priorizar e direcionar questões sociais que importam mais
ou as que causariam os maiores impactos. O resultado, afirmam os autores, é
geralmente baseado em atividades de filantropia desconectadas da estratégia da
empresa que nem causam impacto significante ou fortalecem a empresa no longo
prazo. A consequência dessa fragmentação é uma grande perda de oportunidades.
De forma similar, Paulraj (2009 apud FLECK, 2010) cita outros três grandes
motivadores de práticas de Rasc: compreensivos, coercivos e competitivos. De
acordo com esta tipologia, as organizações com motivações compreensivas
provavelmente irão engajar-se em ações de Rasc por que acreditam que é a coisa
certa a ser feita. Estas firmas não precisam de nenhum tipo de pressão externa ou
mesmos incentivos. As que são norteadas por motivações coercivas, por sua vez, só
farão aquilo que são forçadas a fazer. Geralmente serão legislações ou pressões de
outros stakeholders que as farão agir de modo mais socialmente ou ambientalmente
responsável. O terceiro grupo seria estimulado por acreditar que, ao se tornar
socioambientalmente responsável, gerará vantagens competitivas na sua arena de
negócios. Fleck (2010) baseia seu paper no terceiro grupo. A autora acredita que, ao
cuidar do meio ambiente, a empresa pode neutralizar o processo de declínio
organizacional.
50
Outra corrente acadêmica trata a oportunidade de inovação como um dos
principais motivadores para Rasc. Assim, por entender que o tema merece um
subcapítulo dedicado, parte deste trabalho tratará exclusivamente da relação entre
sustentabilidade e inovação. Por fim, é importante ressaltar que as motivações
listadas não são excludentes, mas constantemente equivalentes e com interseção
entre elas.
2.2.4 Sustentabilidade e inovação
Megatendências exigem adaptações e inovações. E é a partir da inovação
tecnológica, ou de novas formas de fazer negócios, que as organizações poderão
responder aos desafios que as pressões por práticas sustentáveis irão ou já lhes
estão impondo (SENGE; SMITH; KRUSCHWITZ, 2008). Em linha com esses
autores, Nidumolu, Prahalad e Rangaswami (2009) acreditam que a sustentabilidade
é o principal direcionador para as empresas buscarem inovações, que trarão
resultados financeiros tanto no curto quanto no longo prazo. Os autores contestam
as empresas que acreditam que buscar meios mais sustentáveis de gerir os
negócios as torna menos competitivas e dizem que a “inovação verde” pode ter tanto
motivação econômica quanto ecológica, podendo estas ser incrementais ou radicais.
Nunes e Bennet (2006) acreditam que as principais preocupações ambientais
no século XXI serão a poluição atmosférica – e as consequências na saúde humana,
aquecimento global e destruição da camada de ozônio –, a redução das fontes de
água potável e matérias-primas e a escassez de terras. Todos esses impactos
ambientais gerarão grandes desafios para as empresas gerirem os negócios. Logo,
são um direcionador para a busca de inovações.
Nidumolu, Prahalad e Rangaswami (2009) afirmam que os executivos que
acreditam que devem escolher entre investimentos que tragam grandes benefícios
sociais, como inovações em produtos ou processos mais sustentáveis, ou retorno
financeiro estão errados. Ao analisar iniciativas de Rasc de trinta grandes
corporações, os estudos destes acadêmicos chegam à conclusão de que a
sustentabilidade é a fonte das inovações organizacionais e tecnológicas, e que estas
provêm retorno no triple botton line, ou seja, na esfera econômica, ambiental e social
de forma simultânea (ELKINGTON, 1998).
51
A corrida pela sustentabilidade já está transformando a arena competitiva, o
que tem forçado as corporações a mudar a forma de pensar sobre produtos,
tecnologias, processos e modelos de negócios. E, em tempos de crises econômicas,
como a que vivemos em 2008, e que ainda perdura em 2012, a chave para o
progresso é a inovação. Nesse cenário, os early movers vão poder desenvolver
competências que os rivais serão pressionados a adquirir (NIDUMOLU; PRAHALAD;
RANGASWAMI, 2009).
2.2.5 Estágios da sustentabilidade
Assim como Oliver (1991) descreveu formas de responder às pressões
ambientais, Nidumolu, Prahalad e Rangaswami (2009) afirmam que as empresas
enfrentam desafios diferentes dependendo do estágio em que se encontram no
processo de Rasc. Em cada etapa, novos desafios apareceram e algumas
capacidades deverão ser desenvolvidas. Porém, ressaltam os autores, junto com
cada desafio a empresa terá também grandes oportunidades.
O primeiro estágio é ver compliance como oportunidade. Aqui, o principal
desafio é garantir que, ao se adaptar às normas e regulamentações, a empresa
torne isso em oportunidades para inovação. Uma competência requerida é a
habilidade de se antecipar e se modelar às regulações, o que pode não ser tão fácil
assim. As regulações sobre meio ambiente e questões sociais diferem não só entre
países, mas entre Estados e até mesmo entre cidades. Assim, a maneira mais
inteligente de se prevenir de problemas é seguir a regra mais abrangente. Logo, a
empresa estaria enquadrada em todas as demais. Empresas dos mais diversos
setores, por exemplo, devem buscar formas criativas e se antecipar às regulações
como forma de obter vantagem competitiva. No caso de mercados emergentes,
como o Brasil, se uma empresa adaptar tecnologias, processos produtivos, uso de
matérias-primas e produtos para padrões europeus, poderia estar se protegendo de
futuras pressões governamentais e sociais locais.
O segundo estágio é tornar toda a cadeia de valor sustentável. Uma vez
que tenham aprendido a se enquadrar às regulações, as empresas se tornam mais
proativas sobre os aspectos de Rasc. Então, o principal desafio é aumentar a
eficiência nas interações entre os parceiros. Mesmo que a intenção inicial possa ser
apenas criar uma imagem melhor perante os stakeholders (greenwash), a maioria
52
das empresas acaba reduzindo custos ou mesmo criando novas oportunidades de
negócio (NIDUMOLU; PRAHALAD; RANGASWAMI, 2009). Isso é extremamente
importante, principalmente em momentos de crise econômica, quando as
corporações buscam formas de reduzir custos. Firmas que desenvolvem operações
sustentáveis, ao analisar cada ponto da cadeia de valor, encontram oportunidades
desde o processo de fabricação até o momento da devolução. Análise da pegada de
carbono das empresas fornecedoras, busca de pontos de desperdícios de materiais
e até mesmo incentivos financeiros para adaptações são algumas das
recomendações dos autores. Hahn et al (2009) afirmam, por exemplo, que uma
montadora de carros terá melhor ou menor retorno ao usar os recursos naturais de
maneira mais eficiente que os concorrentes e se souber responder às pressões e
aos desafios de Rasc de maneira mais proativa e com inovações.
A etapa seguinte seria o desenho de produtos e serviços sustentáveis, em
que o desafio principal é desenvolver novas ofertas ou redesenhar as atuais
tornando-as eco-friendly. Para atingir esse nível, as empresas precisam mapear
quais produtos mais afetam o ambiente para, então, conseguir gerar novas ofertas.
Algumas oportunidades de inovações sugeridas são o biomimetismo no
desenvolvimento de novos produtos e embalagens e inovações sustentáveis no uso
de matérias-primas.
A penúltima etapa do framework de Nidumolu, Prahalad e Rangaswami
(2009) envolve o desenvolvimento de novos modelos de negócios. Nesse
estágio avançado, as organizações devem encontrar maneiras não usuais para criar,
entregar e capturar valor, a fim de remodelar a arena competitiva. Para isso, é
preciso ter ampla capacidade de entendimento sobre o que os consumidores
realmente desejam e conjecturar diferentes formas para atender a essa demanda.
Algumas companhias, relatam os pesquisadores, desenvolveram novos modelos
simplesmente se perguntando, em diferentes momentos, como o negócio deles
deveria ser. Assim, desenvolver novas tecnologias, que principalmente intensifiquem
as parcerias na cadeia de valor, ou mudar o foco de produtos para ofertar serviços
são métodos recomendados para gerar vantagens sustentáveis.
Por fim, o quinto estágio está relacionado à criação de próximas
plataformas de negócios. Nesse ponto, os gestores devem questionar-se, através
da lente da sustentabilidade, qual a lógica por trás do negócio. Para tanto, deve-se
entender como os recursos renováveis e não renováveis afetam o ecossistema de
53
negócio e a indústria. Nidumolu, Prahalad e Rangaswami (2009) finalizam a análise
orientando as empresas a buscar inovações radicais, como o desenvolvimento de
processos para fabricação sem precisar do uso de água (mesmo aqueles que
tradicionalmente usam muita água, como as montadoras de veículos), ou inventando
modelos de negócio que mudem radicalmente a forma de uso de recursos
energéticos.
2.3 RASC E CRESCIMENTO E LONGEVIDADE ORGANIZACIONAL
Um dos objetivos desta pesquisa é entender como as teorias sobre os
desafios do crescimento abordadas - do empreendedorismo e navegação em
ambientes dinâmicos - se relacionam com as teorias tratadas sobre o tema Rasc.
Assim, foi elaborado um quadro síntese com as duas partes do estudo, onde pode
ser percebida a associação entre os temas.
Quadro 2.3 – Associação teórica entre Rasc e os Desafios do Crescimento
54
3 METODOLOGIA
3.1 DEFINIÇÃO DE TEMA, PERGUNTA E OBJETO DE PESQUISA
As motivações para este estudo foram a curiosidade do pesquisador sobre o
processo de crescimento organizacional e sobre responsabilidade ambiental e social
corporativa. Buscou-se compreender a influência das condições ambientais durante
esse processo, e como determinado padrão de respostas aos desafios e pressões
geradas durante o crescimento permite à organização gerar e capturar valor em
busca do arquétipo da longevidade saudável (CHANDLER, 1990; FLECK, 2009).
Assim, o primeiro passo foi definir a pergunta que iria orientar este estudo.
Depois de pesquisas, análises e discussões, o autor concluiu que uma opção de
relevância acadêmica seria: “O que pode explicar a migração de uma empresa da
posição de desafiante (challenger) em uma indústria para a posição de líder do
setor?”.
Para auxiliar no processo de pesquisa científica, Fleck (2010) propôs um
framework com os principais pilares para um estudo acadêmico, ou building blocks
of a scientific study (Figura 3.1). Por esta metodologia, após definida a pergunta
tema, deve-se definir um site, o método e o suporte teórico (framework) que guiará o
projeto de pesquisa.
Figura 3.1 – Pilares de um estudo acadêmico
Fonte: FLECK (2010)
A metodologia de pesquisa selecionada foi o método do caso. Tal decisão foi
feita para viabilizar uma investigação longitudinal sobre a história da unidade de
TEORIA, FRAMEWORK
E MODELO
SITE
MÉTODO
?
55
análise escolhida, possibilitando a busca por características relevantes tanto da
organização quanto da indústria, a partir de eventos reais que, junto com a revisão
bibliográfica efetuada, tentariam responder à pergunta sugerida (YIN, 1998).
Embora, conforme ressaltado por Langley (2007), seja difícil estabelecer condições
diretas de causalidade nos estudos de processos estratégicos, uma pesquisa
histórica sobre as organizações ajuda a entender como estas chegaram a posições
competitivas favoráveis ou desfavoráveis.
O passo seguinte foi a decisão sobre o site. O estímulo era explorar uma
indústria que fosse relevante economicamente e, ao mesmo tempo, alinhada à
motivação do estudo, e que pudesse contribuir com a base de conhecimentos sobre
a economia brasileira. O estudo visava se relacionar a um setor com grande
representatividade no PIB brasileiro, que tivesse importância sociocultural e, ao
menos aparentemente, sofresse diversas pressões de caráter socioambiental. Por
diversas razões a indústria automotiva mostrou preencher esses requisitos: por um
lado, durante o processo de decisão do tema, a indústria automotiva nacional
tornara-se a quarta maior do mundo. Além disso, não somente são os automóveis os
maiores responsáveis pelas emissões de gases tóxicos e poluentes nos centros
urbanos, como a indústria automobilística está entre as que mais consomem
diversas fontes de matérias-primas no mundo, inclusive água. Finalmente, por ser a
indústria automotiva muito abrangente, o pano de fundo do estudo constituiu apenas
o setor de fabricação de automóveis de passeio e comerciais leves, o qual
possibilitava a análise à luz de ações de responsabilidade social e ambiental
corporativa (Rasc).
No que tange à empresa, a decisão pela empresa Fiat do Brasil revelou-se
coerente por: (i) esta ter sido uma empresa desafiante e se tornado a líder em
vendas nos últimos dez anos (de 2001 a 2011, exceto 2004), (ii) pelo notável
processo de crescimento, constantes prêmios empresariais recebidos e, ainda, (iii)
por ser considerada pela imprensa especializada como pioneira e benchmark em
ações e processos de responsabilidade social e ambiental.
Por fim, o framework (FLECK, in print) utilizado possibilita uma visão de forma
sistemática e visual dos conceitos de diferentes correntes teóricas sobre ambientes,
como os analisados na sociologia organizacional, e as perspectivas sobre condições
ambientais de desenvolvimento das organizações. Ainda, buscou-se entender se
existia aderência entre os temas crescimento organizacional e Rasc.
56
3.2 ESTRATÉGIA DE PESQUISA
A primeira parte da pesquisa (já apresentada) é uma extensa revisão
bibliográfica, buscando apoio teórico para os temas analisados. Na figura 3.2, pode
ser visto o agrupamento dos autores utilizados para cada um dos temas abordados:
Figura 3.2 – Temas e autores utilizados na revisão de literatura
Nessa parte, também foi apresentado um framework (Quadro 2.2) que ajudou,
no capítulo de análise, a entender o processo de mudança das características e
perspectivas das condições ambientais para o desenvolvimento da Fiat. Ademais,
apresentou-se o Quadro 2.3, comprovando a relação entre as teorias sobre Rasc e
os Desafios do Crescimento de Fleck (2009).
O objetivo da segunda parte foi ampliar a compreensão sobre a indústria
automotiva, sua relevância e evolução, bem como fazer um retrospecto histórico da
empresa. Com esta pesquisa, seria possível, posteriormente, analisar os fatores
ambientais em que ela estava inserida, bem como os padrões de resposta aos
desafios desses ambientes. Como o objeto deste estudo situa-se no Brasil, dados
globais da indústria e da organização serviram apenas como pano de fundo para a
contextualização dos principais efeitos e influências no mercado interno. O indicador
Responsabilidade Social e Ambiental
Corporativa
Crescimento e longevidade
organizacional
Revisão de Literatura
Importância do crescimento
organizacional
Desafios do crescimento
Ambientes Organizacionais
Stakeholders e Respostas
Estratégicas
Rasc e declínio organizacional
Conceitos e motivadores de Rasc
Rasc e estratégias empresariais
Fleck (2009; 2010); Bossidy (1995); Whetten (1987); Barnard (1983); Child e Kieser (1981); Penrose (1980);
Fleck (2009; 2010); Winter (2003); Sull (1999); Donald e Preston (1995); Miller (1993); Barney (1991); March (1991); Chandler (1962; 1977; 1990); Freeman (1984); Mintzberg (1985); Barnard (1938); Porter (1980); Penrose (1980);
Lepak, Smith e Taylor (2007); Oliveira (2007); Beer (2002); Sull (1999); Oliver (1991, 1992, 1997); Baron (1995); Donald e Preston (1995); Barney (1991); Weitzel e Johnson (1989); Freeman (1984);
Hawkins (2006); Fleck (2009; 2010); Miller (1993);Oliver (1991);
Fleck (2010); Lemme (2010); Spers e Siqueira (2010); Puppim (2008); Hawkins (2006); Porter e Kramer (2006); Hart e Milstein (2004); Herrmann (2004); Dyllick e Hockerts (2002); Brundtland (1987); Daneke (1985); Bowen (1953); Lemme (2010); Nidumolo, Prahalad e Rangaswami (2009);
Fleck (2010); Scherer e Palazzo (2010); Foote et al (2010); Spers e Siqueira (2010); Doh et al (2009); Hahn et al (2009); Senge et al (2008); Porter e Reinhard (2007); Porter e Kramer (2006); Hart e Milstein (2004); Shivastava (1995); Barney (1991);
Fleck (2009); Voelpel, Leibold e Mahmoud (2003); Mintzberg et al (2000); Chandler (1990; 1977); Romanelli (1991); Oliver (1991, 1992, 1997); Baron (1995); Weitzel e Johnson (1989); Caroll e Huo (1986); Lammers e Hickson (1979); Hannan e Freeman (1977), Child (1972);
Rasc e Inovação e estágios da
sustentabilidade
Hahn et al (2009); Nidumolo, Prahalad e Rangaswami (2009); Senge, Smith e Kruschwitz (2008); Nunes e Bennet (2006); Elkington (1998);
57
utilizado para mensurar o crescimento das empresas é o número de veículos
produzidos, seguindo a metodologia mais utilizada pela indústria automotiva, e não
dados de receita.
A terceira parte desta dissertação procurou, a partir da combinação da teoria
selecionada e do estudo do caso em análise, responder à pergunta definida
inicialmente. Visto que foram analisadas pressões ambientais sobre a indústria e
sobre a empresa, o estudo pode ser classificado como um estudo tipo 2 (YIN, 1998),
com análise de um único caso mas com múltiplas unidades de análise.
Conforme sugerido por Yin (1998), o estudo foi orientado para perguntas do
tipo “o que” (quais) e “como”. A justificativa para essa abordagem é, principalmente,
o fato de o pesquisador não ter controle sobre os acontecimentos que serão
investigados e focar em eventos temporais. Os métodos de coleta de evidências e
demais dados secundários foram documentados para a parte exploratória da
pesquisa. As entrevistas sistemáticas e em profundidade efetuadas com integrantes
da empresa foram utilizadas, prioritariamente, mas não de forma exclusiva, para a
parte explanatória da pesquisa.
Por se tratar de uma análise longitudinal, por questões metodológicas, Yin
(1998) orienta que seja feito um corte no tempo, definindo o início e o fim do caso.
Com isso, os eventos analisados foram limitados entre o período da decisão da
construção da fábrica Fiat no Brasil (1970) e o fim do ano de 2011.
Segundo Langley (2007), em algumas narrativas, é conveniente o uso da
técnica de “temporal bracketing”, ou seja, de decomposições temporais dos dados
em períodos menores de tempo, preferivelmente com características similares
dentro de cada período e distintas entre os demais. Isso permite ao pesquisador
analisar como as ações de um determinado período podem alterar contextos ou
afetar ações dos períodos subsequentes. Nesse estudo, a divisão da história da Fiat
em quatro períodos foi feita pelo autor tendo em vista principalmente as
características do ambiente de mercado (task environment). Essa separação foi feita
no decorrer do processo de coleta de evidências sobre a firma e ratificada no
momento da análise.
Yin (1998) também sugere que o escopo de atuação seja delimitado. Com
isso, é importante registrar que não é objetivo deste estudo abordar requisitos
técnicos dos carros; análises financeiras da organização, nem das demais empresas
do setor; detalhar em profundidade ações de marketing ou o comportamento do
58
consumidor de veículos. Espera-se que este estudo permita contribuições para o
arcabouço teórico e extrapolações gerenciais para outras organizações do setor
automotivo.
3.3 COLETA DE DADOS
O passo inicial foi um levantamento, a partir de dados secundários, de
informações gerais sobre a indústria e a empresa em estudo. As principais fontes
foram: revistas e sites especializados sobre o setor automotivo, como Quatro Rodas,
Best Cars, Auto Esporte, para citar alguns. Posteriormente, foi feita vasta busca de
informações e análises em anuários e outros relatórios de organizações setoriais,
como a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea),
Organisation Internationale des Constructeurs d’Automobiles (Oica – ou Associação
Internacional dos Fabricantes de Veículos Automotores), e a Associação Brasileira
das Empresas Importadoras de Veículos Automotivos (Abeiva). Esses dados foram
extremamente importantes para comprovar a relevância da montadora e o
crescimento da Fiat nos últimos anos.
Aprofundando o entendimento histórico da empresa, foram analisados
anuários da Fiat do Brasil, bem como dados financeiros, publicações comemorativas
(como a feita pela própria empresa sobre os trinta anos de atuação no Brasil), além
do livro sobre a atual estratégia da Fiat e seu presidente, Belini (TANURE; PATRUS,
2011). Dissertações já publicadas no Brasil sobre a empresa, como as de Nottoli
(1995) e Micaelo (2003), foram importantes fontes para auxiliar na etapa de
descrição da história da empresa. Somaram-se, como base de dados sobre ações
estratégicas da empresa analisada, notícias da mídia e prêmios, entrevistas e
reportagens em revistas e jornais empresariais, como Exame, Época Negócios, Isto
é Dinheiro e Valor Econômico.
Foi criado também um modelo de notificação automática no aplicativo Google
Alertas2, do site Google, para que todas novas informações publicadas na internet,
tanto no Brasil quanto do exterior, com os agrupamentos “Fiat + Estratégia /
Strategy”; “Fiat + Sustentabilidade / Sustainability”; “Fiat + Crescimento / Grow”; “Fiat
2 http://www.google.com.br/alerts
59
+ Problemas / Troubles” tivessem seus links direcionados para determinado
endereço de e-mail, uma vez por dia.
Para garantir o sucesso de um processo de coleta de dados em um estudo
exploratório, principalmente em indústrias onde estão disponíveis inúmeras fontes
de informações, era preciso assegurar que a maioria dos dados coletados tivessem
utilidade e relevância para atender ao objetivo do estudo. Após a leitura, separação
e categorização de cada fonte, foi feita uma análise em busca de informações e
valores conflitantes. Caso não fosse possível fazer uma dupla conferência, o dado
era descartado. Um exemplo de informação com fontes conflitantes é a relacionada
com a quantidade de veículos produzidas pelas montadoras. Diversas fontes
apresentavam inconsistências nos números. Com isso, em todos os casos de
números de produção, as fontes utilizadas como confiáveis foram os relatórios
oficiais da Anfavea e da Abeiva, por serem citadas como principais fontes na maioria
das publicações.
Para a coleta de dados primários, efetuou-se uma pesquisa de campo com
visita in loco à fábrica da Fiat em Betim, no Estado de Minas Gerais, no primeiro
semestre de 2011. As percepções geradas e evidências constatadas na visita
apoiaram fortemente o processo de análise. Registra-se que a Cátedra
Fiat/Coppead foi fundamental na articulação e aprovação da visita.
Realizaram-se dez entrevistas em profundidade com funcionários da
empresa. A maioria conduzida durante os dias em visita à fábrica, o que possibilitou
a abordagem de representantes das mais diversas áreas, dentre elas: marketing,
engenharia, comunicação interna, diretoria de qualidade e sustentabilidade,
produtos, Centro Estilo, pesquisa, supervisão de garantia e recursos humanos.
Foram entrevistados de diretores, gerentes executivos e supervisores a analistas.
Todas as conversas foram gravadas com autorização verbal e,
posteriormente, transcritas na íntegra pelo pesquisador para possibilitar as análises.
Um fator limitante da pesquisa foi o processo de escolha de quantidade e relação
dos entrevistados, efetuada pela própria empresa. Entretanto, a empresa respeitou
um dos principais critérios do estudo, que era ter a possibilidade de conversar com
pessoas das mais diversas áreas possíveis. O fato de garantir confidencialidade da
identidade dos entrevistados, no momento dos encontros, pode ter permitido que os
respondentes expusessem de forma mais clara e direta as reais percepções sobre a
60
empresa e suas ações. Como as percepções do CEO da empresa não puderam ser
coletadas de forma primária, foram usadas citações de fontes secundárias.
As entrevistas tinham como apoio um roteiro (Apêndice 1). Dentre os principais
pontos abordados estavam o histórico profissional do entrevistado; impressões
gerais sobre a organização, sobre suas ações e valores; compreensão histórica da
empresa; conhecimento sobre ações de responsabilidade socioambiental da Fiat; e
análise de desafios da empresa e da indústria. Porém, de acordo com orientação
recebida, a condução da entrevista não foi “engessada” por esse script, dando
abertura para exploração de outros temas, bem como para possibilitar a percepção
sobre outras informações dos entrevistados e abertura para temas que estes
considerassem importantes.
Também foram feitas duas visitas a concessionárias Fiat na cidade do Rio de
Janeiro, no primeiro semestre de 2012, em processo conhecido como “cliente
oculto”, em que se simulou, sem o uso de roteiros, o interesse de compra de
veículos da montadora com o objetivo de entender o discurso e a percepção dos
vendedores sobre a empresa e seus produtos no momento da venda. As citações
das visitas às concessionárias não foram usadas por não terem sidos consentidas,
porém as informações e percepções foram usadas durante a análise. Paralelamente,
foi entrevistada uma pesquisadora da Coppead que atuou em estudos para a Fiat e
integra a cátedra Fiat/Coppead. Conforme detalha a tabela 3.1, as entrevistas
totalizaram onze horas e quarenta e dois minutos de duração. Para auxiliar no
processo de transcrição, foi utilizado o programa Transcriva for Mac (SOFTONIC,
2011), adquirido por 29,99 dólares em abril de 2011.
61
Tabela 3.1 – Tempo de duração das entrevistas realizadas para a pesquisa
No Capítulo 5, da história da Fiat, e Capítulo 6, de análise, para manter o acordo
de sigilo de identidade dos entrevistados, as evidências e citações utilizadas,
proveniente destas entrevistas, usaram os códigos da Tabela 1 (E1 a E11), sempre
que necessário.
A limitação de recursos e a distância da fábrica impossibilitaram uma segunda
visita, que poderia ter ajudado a coletar mais evidências. Contudo, o pesquisador
contornou parcialmente essa questão a partir da troca de e-mails com alguns dos
entrevistados para sanar algumas dúvidas que surgiram a posteriori. Não foi
possível entrevistar fornecedores, demais parceiros e ex-funcionários da empresa,
principalmente pela questão da limitação da distância geográfica. Também não
conseguiu-se ter acesso aos valores investidos nos projetos de responsabilidade
socioambiental, ou mesmo o histórico completo de receitas da empresa e resultados
financeiros da empresa.
O pesquisador, durante o processo de elaboração da dissertação, ainda esteve
presente em palestras sobre os temas em estudo. Dentre elas, a do CEO do grupo
Renault-Nissan, Carlos Ghosn, e a de André Trigueiro, referência nacional em
jornalismo ambiental e mobilidade urbana, além de acompanhar discussão online da
consultoria Accenture, no evento Accenture's Sustainability 24.
ENTREVISTADO ÁREA DURAÇÃO (horas)
E1 Diretoria Sustentabilidade 0:45
E2 Relacionamento com Concessionárias 0:51
E3 Centro Estilo 0:35E4 Comunicação Corporativa 1:05
E5 Diretoria Sustentabilidade 1:18E6 Recursos Humanos 1:25
E7 Marketing 0:40E8 Produtos 0:48
E9 Comunicação Interna 0:45
E10 Pesquisa 1:25E11 Pesquisa COPPEAD 0:40
E12 Concessionária 0:50E13 Concessionária 0:35
62
3.4 ANÁLISE DOS DADOS COLETADOS
Com o objetivo de organizar a massa de dados obtida no processo de coleta,
as informações, papers, demais textos e sites foram divididos em cinco pastas
digitais: (i) revisão de literatura: onde estão depositados os dados teóricos usados
na revisão de literatura. Esta pasta, por sua vez, tinha o seguinte desdobramento:
(a) crescimento e longevidade organizacional; (b) responsabilidade ambiental e
social corporativa; (ii) legislação e informações sobre atuações do governo; (iii)
dados sobre a indústria automotiva; (iv) dados sobre a Fiat; (v) entrevistas
realizadas, palestras e demais evidências.
Uma vez organizado o conteúdo, as evidências compostas por fatos e dados
foram categorizados, codificados e agrupados, conforme ilustra a Figura 3.3. Os
filtros utilizados foram: período do evento; aderência aos desafios de Fleck (2009)
abordados; stakeholder(s) envolvido(s); tipos de ambiente pela sociologia
organizacional; tipos de ambiente pela perspectiva das condições ambientais de
desenvolvimento das organizações; padrões de respostas de acordo com Oliver
(1991).
Figura 3.3 – Exemplo da tabela de categorização e codificação das evidências
O uso da metodologia de mapeamento visual, conforme sugerido por Langley
(2007), se mostrou efetivo e produtivo, tanto pela facilidade de destacar cada um
dos desafios e pressões, quanto por possibilitar a detecção de padrões de gestão da
empresa frente a cada uma das partes interessadas (stakeholders).
PERÍODO DESAFIO/PRESSÃO PRINCIPAIS STAKEHOLDERS AMBIENTE TIPO CLASSIFICAÇÃO RESPOSTA (OLIVER, 1991)I Total inexistência de fornecedores e mão de obra
especializada na região de BetimFornecedores; Comunidade Negócio Inóspito Compromisso por balanceamento
I Lobby das 3 grandes montadoras, tanto com o governo, quanto com os fornecedores;
Governo; Concorrentes; Acionistas Institucional InóspitoManipulação por influência / Evitação por fuga
I Mercado em forte expansão, apesar da concorrência Concorrentes; Clientes; Acionistas Negócio Desafiador Aceitação por conformidade I Dificuldade de recebimento de peças; Fornecedores Negócio Inóspito Aceitação por submissãoI Desconhecimento da marca pelo mercado consumidor Clientes Negócio Inóspito Desafio - AtaqueI Área rural e isolada para a implantação da fábrica; Funcionários; Comunidade Negócio Inóspito Compromisso por balanceamentoI Péssima estrutura logística; Governo; Fornecedores Negócio Inóspito Aceitação por Conformidade e DesafioI Longe dos centros consumidores Clientes Negócio Inóspito Aceitação por Conformidade e DesafioII Estar situada longe do ABC e não sofrer com as greves; Funcionários; Comunidade Negócio Piedoso AmortizaçãoII Forte descontentamento dos clientes com os produtos; Clientes Negócio Desafiador AmortizaçãoII Imagem desgastada; Clientes Negócio Desafiador Desafio - AtaqueII Criação da Autolatina (Ford e Volks) Concorrentes Negócio Desafiador Evitação II Mercado “fechado” para importações Governo; Clientes; Acionistas Institucional Piedoso Desafio - AtaqueII Crise do petróleo; Governo; Concorrentes; Clientes Institucional Desafiador AmortizaçãoII Inflação galopante; Governo; Concorrentes; Clientes Institucional Desafiador AmortizaçãoII Mercado interno em forte estagnação; Governo; Concorrentes; Clientes Negócio Desafiador AmortizaçãoII Redução brusca das vendas do setor; Governo; Concorrentes; Clientes Negócio Desafiador AmortizaçãoII Incertezas políticas Governo; Concorrentes; Clientes Institucional Inóspito AmortizaçãoII Dificuldades logísticas de recebimento de peças e
escoamento dos produtosFornecedores; Governo Negócio Desafiador Desafio - Ataque
III Abertura do mercado e entrada de novos concorrentes; Governo; Concorrentes; Clientes Negócio Desafiador Desafio - AtaqueIII Convencer fornecedores sobre Projeto J – Mineirização; Governos; Fornecedores Negócio Desafiador Compromisso por balanceamento
63
Após categorizar e agrupar as evidências por períodos, foi possível classificar
cada um dos tipos de ambientes com o uso do framework base deste trabalho
(Quadro 2.2), conforme exemplificado na Figura 3.4.
Figura 3.4 – Modelo de análise e categorização das evidências
3.5 NÍVEL DE ANÁLISE
De acordo com Yin (1998), a definição da unidade de análise relaciona-se à
maneira como a questão inicial foi determinada. Por conseguinte, para permitir que a
pergunta proposta fosse devidamente respondida, o nível de análise foi tanto a
indústria quanto a empresa, a fim de possibilitar embasamento e contextualização
histórica da evolução do setor, da organização e do ambiente em que estão
inseridas. O espaço de tempo em que a firma foi analisada está restrito entre 1970,
ano da decisão da construção de uma fábrica da FIAT no Brasil, até 2011.
A fase de análise será iniciada com uma abordagem sobre o processo de
criação de valor da empresa, com referência ao desafio de empreender. Em
seguida, será discutido o processo de captura de valor no ambiente, relacionado ao
desafio de navegação no ambiente dinâmico. As duas visões fazem parte do mesmo
bloco que possibilita o crescimento organizacional e a renovação, condição
64
necessária (CN) para o sucesso em longo prazo e propensão à autoperpetuação
(Fleck ,2009).
Assim como discutido no segundo capítulo, de revisão de literatura, o modelo de
Fleck (2009) corrobora a teoria sobre a visão global da formação estratégica de
Mintzberg et al (2000). Os dois desafios contemplados no escopo da análise
(navegar no ambiente e empreender) associam-se, respectivamente, aos pilares
“ambiente” e “liderança”, conforme exemplificado pela Figura 3.5.
Como o objetivo deste trabalho – entender como uma empresa desafiante se
torna líder de um setor – focaliza predominantemente a relação empresa-ambiente,
acredita-se ser justificada a abordagem empregada, a qual exclui a análise dos
fatores organizacionais, associados aos desafios da diversidade, de
aprovisionamento de recursos humanos e da complexidade.
Figura 3.5 – Escopo da análise realizada
Cabe ressaltar que a maioria das evidências obtidas tanto nas fontes primárias
quanto nas citações coletadas de fontes secundárias diz respeito a períodos mais
contemporâneos. Dentre as implicações dessa limitação para o estudo está,
principalmente, algumas particularidades da análise em determinados períodos:
• Na análise sobre o desafio de empreender: antes de 2004 não é possível
“personificar” as lideranças, inclusive pelo fato de a empresa exibir um
menor grau de autonomia em relação à matriz italiana. Somente após
2004, com a posse de Cledorvino Belini, primeiro brasileiro a gerir a
montadora, que a filial obteve maior autonomia, possibilitando assim uma
visão mais detalhada do papel do líder perante as ações estratégicas;
• Na análise sobre o desafio de navegar no ambiente: as implicações
recaem, principalmente, sobre o grau de disponibilidade de informações a
Contempladas no escopo do estudo
AMBIENTE
LIDERANÇA
ORGANIZAÇÃO
Empreender
Navegar no Ambiente
Gerir a
Diversidade
Aprovisionar
RH
Gerir a
Complexidade
Não contempladas no escopo do estudo
Mintzberg et
al (2000)
Fleck (2009)
65
respeito da forma pela qual a montadora interage com os stakeholders,
incluindo aspectos relativos ao meio ambiente. Como informações
relativas ao tema Rasc referem-se mormente ao último período, à análise
deste período acrescentou-se uma abordagem aos temas Rasc, gestão
dos stakeholders e padrões de respostas ao desafio de navegação.
Buscando auxiliar o leitor a ter uma visão mais didática e integrada das
principais inovações e marcos do setor, após a análise do desafio de empreender,
serão apresentados mapas sintéticos cronológicos sintetizando as informações
previamente apresentadas, conforme exemplificado na Figura 3.6.
Figura 3.6 – Exemplo do modelo de mapa sintético cronológico
Por fim, durante a análise do desafio de navegação, serão usadas
padronagens visuais para configurar o grau de predominância de cada tipo de
ambiente em que a Fiat se encontrava, em cada uma das nove células do framework
utilizado (Quadro 2.2), a partir da quantidade de evidências relevantes listadas,
como exemplificado pela Figura 3.7. Apesar de existirem evidências com diferentes
graus de relevância nesse processo de crescimento, ou com maior influência para
1976
Principais Players Leis e marcos regulatórios
Fiat
1980 1984
Es mulo do
governo p/
exportação
Inicio da
década
perdida
Pico de exportações
da indústria
Principais
Inovaçõ
es para
o m
erc
ado b
rasile
iro
Principais
Marc
os
Principais Marcos Setor e Economia
Principais
Pla
yers
Le
is e
Marc
os Regula
tórios do seto
r M
arc
os Eco
nom
ia /
Sociais
1970 1953
Aviso
288
1956
Plano de
Metas JK
Ford;
GM;
Volks
1967 -
1974
“Milagre
Econômico
Greves
metalúrgicos
ABC
1987 1994 1992 –1993 1990
Plano Collor e
Confisco da
poupança
IPI Reduzido para
1.000 cm3
Plano Real
Novo regime
automo vo
1997
Crise Ásia e
Rússia; Fim
regime banda
cambial
Novas greves
ABC
Abertura do
mercado
Guerra do Golfo
Aumento preço
do petróleo
Medidas câmara
setorial p/
es mular o setor
Toyota
Renault
Mitsubishi
Honda
1998
Peugeot Citroën
Nissan
2001
Crise financeira
internacional
Redução IPI
2008 2010
Brasil torna-se 4
maior
mercado
mundial no
setor
automo vo
Forte déficit
comercial
do setor
1995
Importados
1991
Aumento
importação
2009
ECO 92
Redução IPI
66
possibilitar a obtenção da posição de liderança pela Fiat, o método utilizado para o
preenchimento das células e, consequente categorização do ambiente foi utilizar:
• Padronagem branca (ou sem preenchimento): Nenhuma evidência
relevante mapeada;
• Padronagem “pontilhada”: Até duas evidências relevantes classificadas
na célula;
• Padronagem com preenchimento mais “denso”: Quando mais de três
evidências relevantes foram classificadas na célula;
Figura 3.7 – Processo de preenchimento do framework durante fase de análise
• • • • • •
Sintetizando as análises sobre navegação do ambiente, foram utilizados
quadros resumos conforme exemplificado pela Figura 3.8. O objetivo foi possibilitar
ao leitor um novo mapa visual sobre o processo de transição ambiental dos períodos
examinados, bem como uma comparação sintetizada entre a configuração do
ambiente entre a Fiat e principais competidores.
Figura 3.8 – Exemplo de síntese do processo de transição entre ambientes.
Ambiente Piedoso
Ambiente Desafiador
Ambiente Inóspito
Ambiente de
Negócio
19xx – 19xx 19xx-19xx
19xx - 20xx
20xx- 20xx
Ambiente Piedoso
Ambiente Desafiador
Ambiente Inóspito
Ambiente de
Negócio
Mercado automotivo em forte expansão, porém oligopolizado por apenas 3 montadoras;
Total inexistência de fornecedores e mão de obra especializada na região de Betim; Área rural e isolada para a implantação da fábrica; Péssima estrutura logística; Dificuldade de recebimento de peças; Longe dos centros consumidores Desconhecimento da marca pelo mercado consumidor
Ambiente
Institucional
Milagre econômico; Lobby das 3 grandes montadoras, tanto com o governo, quanto com os fornecedores;
Ambiente
Natural
Pouca ou nenhuma pressão ambiental
Ambiente Piedoso
Ambiente Desafiador
Ambiente Inóspito
Ambiente de
Negócio
Ambiente
Institucional
Ambiente
Natural
67
4 A INDÚSTRIA AUTOMOTIVA E A HISTÓRIA DA FIAT
4.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA INDÚSTRIA AUTOMOTIVA
Dados do British Royal Automobile Club (2011) e The Automobile Club de
France (ACF, 2011) apontam que a história do automóvel começa em 1769, quando
o francês Nicolas Joseph Cuhnot desenvolve o primeiro veículo autopropulsionado a
vapor, com apenas três rodas e todo de madeira. Algumas décadas depois, em
1806, o inglês Richard Trevihick desenvolveu o que é considerado o primeiro motor
de carro movido pela combustão em alta pressão com o uso de gás.
Engenheiros e pesquisadores continuaram buscando formas de melhorar a
invenção e então, entre 1832 e 1839 (o ano é dado como incerto), o escocês Robert
Anderson desenvolve a primeira “carruagem” elétrica. A fabricação dos veículos
elétricos foi impulsionada a partir de 1859, quando o belga Gaston Planté realiza a
primeira demonstração de bateria de chumbo e ácido (OICA, 2011).
Um marco na história do automóvel foi o biênio 1885 e 1886, quando, na
Alemanha, começou a produção dos primeiros carros movidos a gasolina,
desenvolvidos por Karl Friedrich Benz (que patenteou a invenção), Gottlieb Wilhelm
Daimler e Wilhelm Maybach. Curiosamente, os sobrenomes dos três inventores
ainda estampam carrocerias de luxuosos modelos no século XXI (OICA, 2011;
AUTOMOBILE CLUB DE FRANCE, 2011).
Até 1914, a produção dos veículos permanecia prioritariamente artesanal, por
encomenda e com os carros ainda sendo considerados um “brinquedo caro” por
muitos. Esse estigma foi quebrado pela empresa americana Ford, que revolucionou
e dominou o mercado, quando Henry Ford, inspirado pelas ideias de Frederic Taylor,
desenvolveu um novo sistema de produção, denominado posteriormente como
fordismo. O fordismo permitia incríveis ganhos de escala e escopo a partir da busca
da eficiência, do aperfeiçoamento das linhas de montagens, com esteiras rolantes,
simplificação do trabalho e padronização de produtos (ao disponibilizar uma única
cor para os clientes, por exemplo).
Essas medidas tornaram o carro um objeto de desejo mais acessível a ponto
de, durante a década de 1920, cerca de 2 milhões de veículos saírem anualmente
das linhas de montagem, quando antes eram apenas alguns milhares. O alto volume
68
de vendas de veículos impulsionou a economia dos países industrializados, além de
estimular diversas outras indústrias, como energia, siderurgia e têxtil, e ainda
potencializar investimentos governamentais em construção de estradas, ampliando
os limites das cidades (CASEY; DODGE; DODGE, 2010).
Por influência dos bons resultados do setor, boa parte da economia industrial
do século XX desenvolveu-se sobre a base da aplicação da eletricidade à produção
e da reorganização das fábricas em torno da linha de montagem. As inovações,
inspiradas pelas ideias de Henry Ford, disseminaram-se e permitiram a produção em
série de mercadorias estandardizadas para mercados de massa. O aprofundamento
da divisão técnica do trabalho, o emprego de mão de obra numerosa e
semiqualificada e a utilização intensiva de energia são as características mais
marcantes associadas a este modelo de produção.
A indústria automotiva continuou a prosperar nas décadas seguintes e se
tornava ainda mais relevante na economia global. O fordismo como sistema
produtivo se manteve como principal característica do setor até o fim da década de
1960. Em meados da década de 1920, outra gigante estadunidense, a General
Motors (GM) assume a liderança do mercado automotivo americano com novos
conceitos de administração, como a descentralização e maior flexibilização da
produção, oferecendo maior diversidade de modelos e atendendo a demandas dos
mais variados nichos de clientes. Com o passar do tempo, tornou-se não só a maior
montadora global tornava-se como a maior empresa do mundo em termos de
receita.
Na mesma década, os choques do petróleo marcam nova virada na indústria
mundial e automotiva em particular, com o retorno aos projetos de carros com
combustíveis alternativos. Paralelamente, o sistema de produção enxuta (lean
manufacturing), da japonesa Toyota, apelidado de toyotismo, começa a ser
implantado na maioria das fábricas de automóveis no mundo, marcando nova
revolução no setor. A indústria automobilística mundial continuou evoluindo, mas
não trazendo nenhuma grande mudança disruptiva – nem no produto, nem nos
processos; sendo, atualmente, constituída de dois grandes complexos responsáveis
pela produção de veículos automotivos: as montadoras e os fornecedores de
autopeças.
As últimas décadas do século XX foram marcadas por processos de fusões e
aquisições, o que aumentou o grau de concentração global. Segundo relatório da
69
Oica (2010), apenas dez empresas são responsáveis por 75% da produção mundial
de automóveis. Carvalho (2005) alerta para a intensificação da concorrência da
indústria e sobre as possibilidades viabilizadas pelas novas tecnologias,
principalmente os novos processos de telecomunicações e de tecnologias de
informatização. O autor chama atenção para o uso de estratégias de parcerias e
joint ventures, que se tornaram opções mais eficazes do que fusões e aquisições.
De acordo com Sergio Marchionne, presidente executivo da Fiat, essa tendência de
concentração continuará pelos próximos anos: “Estamos a caminho de continuar a
ver a eliminação de players marginais. Acredito que acabaremos com somente cinco
ou seis players, cujo sucesso se baseará no compartilhamento de plataformas, em
escala global” (REUTERS, 2011). Idêntico argumento foi usado pelo Sr. Carlos
Ghosn3, presidente do grupo Nissan-Renault, em palestra em 6 de outubro de 2011
na sede da FGV Rio.
4.2 IMPACTOS DA INDÚSTRIA AUTOMOTIVA
A revolução causada com o avanço e o largo desenvolvimento da indústria
automobilística gerou alterações nos padrões de empregos, interações sociais,
infraestrutura e distribuição de mercadorias. Ademais, ao longo dos anos, a indústria
automobilística criou uma longa tradição de influenciar tratados comerciais e
políticas nacionais. Os movimentos dessa indústria, ao causar impacto na balança
de pagamento, no nível de emprego e no crescimento dos países, geram grande
poder político para os fabricantes de automóveis, que têm sido capazes de extrair
privilégios governamentais no mundo inteiro há várias décadas (ARAÚJO, 1998).
A indústria automotiva tem grande visibilidade e poder de influenciar outros
setores, direta e indiretamente. De acordo com Nunes e Bennet (2006), essa
indústria teve poucas mudanças disruptivas nos últimos trinta anos, porém, assim
como o fordismo moldou o processo de produção no início do século passado, as
novas evoluções surgidas nesse setor, como o sistema toyotista de produção (lean
manufacturing) e o modelo de parceria com fornecedores, foram replicadas nos
sistemas de produção e montagem de diversas outras indústrias. A transferência de
plantas de montagem para países em desenvolvimento e o outsourcing global são
3 Carlos Ghosn, presidente do grupo Nissan-Renault, palestrou em 6 de outubro de 2011 na sede da FGV Rio. O pesquisador estava presente.
70
mudanças estratégicas oriundas desse setor. Ainda sobre inovações, a indústria
automobilística foi pioneira no uso de robôs e atualmente é responsável pelo uso de
mais de 60% de todos os robôs no mundo.
Exemplificando o poder do setor, se a indústria automobilística fosse um país,
ela seria a sexta maior economia do mundo. Os 2,5 trilhões de dólares
movimentados direta e indiretamente representam em média 10% do PIB dos países
onde as fábricas estão instaladas (CASOTTI; GOLDENSTEIN, 2008, p. 149). Na
análise setorial do Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES), mais
números revelados por estes autores:
Os números de consumo de matéria-prima não são menos impressionantes. Estima-se que 50% do total de borracha, 25% do total de vidro e 15% do total de aço produzidos no mundo se destinem à essa indústria. Para movimentar essa gigantesca engrenagem, mais de 8 milhões de funcionários estão empregados diretamente e, para cada emprego direto, mais de cinco indiretos são gerados (CASOTTI; GOLDENSTEIN, 2008, p. 149).
Os gastos com publicidade da indústria também são expressivos. Apenas em
2010 as montadoras gastaram 45 bilhões de dólares em propaganda. De acordo
com relatório publicado pela Advertising Age (2011), dos 100 maiores anunciantes
globais, 17 são fabricantes de carros.
Mas os efeitos dos automóveis na vida cotidiana são tema controverso. A
introdução do automóvel produzido em massa representou uma revolução na
mobilidade, comodidade pessoal e produtividade das empresas, mas o principal
dano apontado pelos críticos é em relação ao consumo de energias não renováveis
e o impacto na poluição mundial. De acordo com os relatórios da OICA (2012), só no
ano de 2011, foram produzidos 80 milhões de unidades de veículos, sendo que 18,4
milhões apenas na China e 3,4 milhões no Brasil, o que elevou os números de
automóveis leves circulando pelo mundo (excluindo caminhões pesados e ônibus) a
mais de 730 milhões.
O Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA, 2011) estima que a
emissão de CO2 pelos veículos já ultrapassa a perigosa marca de mais de 1 milhão
de toneladas por ano no Brasil. De acordo com Carvalho (2011):
O setor de transporte responde por cerca de 20% das emissões globais de CO2, que é um dos principais gases causador do efeito estufa, sem considerar a emissão de outros gases também nocivos ao meio ambiente.
71
No Brasil, segundo informações do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), o setor de transporte responde por cerca de 9% das emissões totais.
Aparentemente atentas aos riscos das questões envolvendo responsabilidade
socioambientais, as empresas-líderes do setor se estão mobilizando para tentar
mudar o cenário, com a (re) introdução de veículos movidos a energia limpa (que
possibilitam redução na emissão de CO2), além de investimentos em outras ações e
estratégias ligadas à sustentabilidade, como mudanças referentes ao consumo de
matérias-primas e aos processos de produção.
De acordo com Vergragt e Brown (2006), globalmente, o setor automotivo é
um dos que mais sofre com pressões e cobranças por melhores performances
ambientais. Apesar de os benefícios dos automóveis serem claros, como prover um
meio de transporte “porta a porta”, o que ajuda nas necessidades pessoais e
profissionais, e de o veículo constituir fonte de status social e de diversão, existe um
pesado dano ambiental causado pelos automóveis. Além da poluição do ar e da
emissão de gases de efeito estufa, já citados, grande número de veículos causa
congestionamentos, barulhos, acidentes com mortes ou lesões permanentes, perda
de espaços nas cidades para construção de ruas e estacionamento, dentre outros.
Exemplificando esses danos no cenário brasileiro, dados da Companhia
Estadual de Trânsito (CET) de São Paulo trazem números alarmantes, como o
registrado em junho de 2009: 295 quilômetros de congestionamento (CET, 2009).
Um estudo da Fundação Getúlio Vargas apontou perda econômica anual de mais de
R$ 32,5 bilhões apenas com os congestionamentos na cidade de São Paulo
(CINTRA, 2008, p. 31). Reportagem do website Notícias Automotivas, de 11 de
março de 2011 (NA, 2011), informa que, em 1970, a capital paulista tinha registrado
965.000 veículos para 14.000 quilômetros de vias. Enquanto foram somados apenas
3.000 quilômetros de vias na cidade, o número de veículos circulando pela
metrópole subiu para 7 milhões. A frota de veículos cresceu seis vezes mais rápido
que a população de São Paulo, gerando o índice recorde de 1,63 habitantes por
veículos.
No Rio de Janeiro, são 2,7 pessoas para cada carro licenciado, totalizando
2,4 milhões de veículos em 2011 (Detran-RJ, 2011). De acordo com dados do
Censo 2010, do IBGE (2012), o Rio de Janeiro aparece como a pior região
metropolitana no ranking mobilidade, com 28,6% dos trabalhadores gastando mais
de uma hora para chegar ao trabalho. Com mais veículos nas ruas, aumenta a
exposição ao risco de acidentes. Somente no anuário de 2010 do Detran, foram
72
registrados mais de 300.000 acidentes com vítimas (SILVA, 2011, p. 85). Além
desse, estudos como de Resende e Souza (2009) mediram o grau de exposição dos
cidadãos brasileiros aos congestionamentos e descobriram, como consequências,
inúmeros desgastes diante do pesadelo de ficar parado improdutivamente. Os
resultados são preocupantes, como a quantidade de doenças psicológicas,
cardíacas e respiratórias que podem ser causadas pelos congestionamentos.
Ademais, nas contas dos efeitos colaterais, devem ser incluídos os resíduos
produzidos pela necessidade de reposição de peças, a ampla necessidade de
combustíveis fósseis dentre outros.
O discurso dos principais players da indústria é que estão investindo em
práticas de responsabilidade ambiental e social corporativa (Rasc), em inovações
como o redesenho de processos de fabricação, o que refletiria em ganhos de
eficiência de insumo e energia, na análise de oportunidades intralogísticas, na
elaboração de carros mais econômicos, além de investimentos em educação do
consumidor. Esses movimentos refletem a preocupação de que tendem a aumentar
as pressões externas, tanto de consumidores quanto dos governos, para que as
empresas tenham atitudes mais sustentáveis.
Exemplos dessas pressões são vários. Na União Europeia, por exemplo, foi
aprovada lei que impõe, já a partir de 2012, a 65% dos veículos limite de emissão de
gás por quilometro rodado (120 gramas/km). Cada grama emitido a mais, será
cobrado financeiramente do fabricante. A proporção deverá subir para 75% em
2013; 80% em 2014; e 100% em 2015, permitindo ainda um período de adaptação
da indústria (European Comission, 2008). No Brasil, as metas de redução de gases
totais, defendida de forma espontânea pelo governo na COP 15, são de 36,1% a
38,9% até 2020 (BRASIL, 2010).
De acordo com Orsato e Wells (2006), a grande dependência de combustíveis
fósseis e o elevado consumo de matérias-primas lideram os desafios ambientais da
indústria automotiva.
Como resultado, existe pressão pública, esperando-se de todos os players,
em um futuro próximo, iniciativas que visem reduzir os impactos ambientais tanto no
processo de produção quanto no uso dos veículos. Hart e Milstein (2004) analisaram
algumas respostas a essas pressões pelo setor automotivo, observando que as
principais montadoras estão investindo no mercado de motores alternativos, como
os híbridos / elétricos.
73
4.3 VEÍCULOS ELÉTRICOS E HÍBRIDOS
Baran e Legey (2011) explicam que foi na década de 1960 que as pressões
sociais sobre a questão de poluição ambiental aumentaram e, até então, a gasolina
ainda continha chumbo e os carros não tinham filtros nem catalizadores. Poucos
anos depois, em 1973, veio o grande choque do petróleo, o que forçou uma onda de
racionamento de combustíveis em diversos países. Mesmo assim, os protótipos das
principais montadoras não chegaram às linhas de produção em massa. Os autores
alertam que os motores híbridos e elétricos, vistos por muitos como grande avanço
tecnológico, já foram fortes concorrentes dos automóveis convencionais, e o
aumento exponencial da proporção de veículos com o uso de combustíveis fósseis
se deu a partir dos anos 1930. Na época, tanto a maior autonomia dos carros
movidos a gasolina quanto a maior facilidade de distribuição do combustíveis foram
fundamentais para tal (BARAN; LEGEY, 2011).
É claro que nos últimos anos presenciou-se grandes inovações nos veículos
elétricos, principalmente nas baterias de lítio e na tecnologia embarcada, porém os
motores elétricos de hoje não são tão diferentes do que se via no início do século
passado.
Pesquisadores, como Carvalho (2005) e Baran e Legey (2011) acreditam que
o ressurgimento do carro elétrico pode ser atribuído, em grande parte, à legislações
e aos novos incentivos dados pelos EUA e governos europeus a fabricantes e
consumidores. Carvalho (2005) evidencia que as exigências regulatórias exercem
forte orientação nas decisões estratégicas da indústria. De acordo com Baran e
Legey (2011), nesses países, essa transição é uma opção estratégica de razões de
segurança energética.
Os incentivos financeiros servem como estímulo para acelerar o processo de
mudança de uma economia do petróleo para uma economia sustentável e, com isso,
os países desenvolvidos reduziriam a dependência do combustível fóssil. Um
exemplo dessa dependência é o setor de transporte nos EUA, com 95% de toda
energia proveniente de fontes não renováveis.
Diversos fatos na década de 1990 foram importantes para a volta das
pesquisas e do desenvolvimento de veículos híbridos e elétricos. Dentre eles:
74
• leis com novas regras de emissão, implantadas primeiramente na
Califórnia. A partir de então, foi elaborada uma tabela com a redução
gradual dos limites de CO2 permitidos para novos veículos
comercializados no Estado. Na mesma lei, foram estabelecidas metas
anuais de percentuais de veículos com emissão zero, em que as
montadoras receberiam bônus do governo de até 5.000 dólares para
cada veículo vendido. A lei é considerada um exemplo, tanto que,
pouco tempo depois, outros Estados americanos, como Nova York e
Massachusetts, também a adotaram;
• a Agenda 21, elaborada na Rio-92, considerada um marco mundial no
debate sobre o aquecimento global e suas consequências;
• a nova política de transporte da União Europeia e, consequentemente,
de todos os países-membros. Nessa estratégia, o tema “mobilidade
sustentável” era uma meta a ser alcançada em menos de vinte anos;
• a lei aprovada pelo presidente americano Bill Clinton em 1993,
denominada Parceria para uma Nova Geração de Veículos
(Partnership for a New Generation Vehicles – PNGV). Essa parceria
público-privada buscava incentivar a indústria a produzir veículos
híbridos com consumo de até 25 km/litro. O programa gerou
investimentos na casa de 1 bilhão de dólares;
• na segunda metade da década de 1990, a Toyota, fabricante japonesa
que não estava no programa PNGV, lança o que é considerados por
muitos o primeiro carro híbrido sucesso de vendas – o Prius. Na
mesma época, outras montadoras, como a Honda e a Ford, também
lançaram seu modelo no mercado americano e europeu;
• outras iniciativas do presidente americano Barak Obama, como o
incentivo para a troca da frota de carros que servem funcionários
federais por modelos elétricos e híbridos, também serviram como
incentivo para as montadoras.
• investimentos de montadoras como a Nissan e Toyota, que acreditam
que o mercado de híbridos não será apenas para um nicho, mas de
massa.
75
O brasileiro Carlos Ghosn, que preside a Renault-Nissan, em entrevista à
BBC News (2010), afirmou que o futuro da indústria automobilística está nos carros
elétricos, e defende que todo o setor deveria adaptar-se para investimentos em
carros de emissão zero. Para o executivo, essa tendência deverá consolidar-se de
forma gradativa; e, para isso, o mercado e os investidores precisarão ter paciência
sobre o retorno dos atuais investimentos. Ainda nessa reportagem, analistas alegam
que até 2020 os carros elétricos deverão representar 10% do mercado de
automóveis. Contrariando essas visões, o presidente da Fiat do Brasil, Cledorvino
Belini, aposta que os carros elétricos permanecerão apenas em um nicho de
mercado, e sua participação não será dominante devido aos altos custos das
baterias (TANURE; PATRUS, 2011, p. 175).
Interessantes fatos ocorreram, em uma espécie de resposta das corporações
e das indústrias que seriam teoricamente prejudicadas com essas iniciativas
“verdes”.
A associação americana de montadoras de veículos, a American Automobil
Manufactures Association (AAMA), ainda na década de 1990, começou campanha
para argumentar que os preços finais dos carros seriam demasiadamente caros e o
chumbo das baterias seria tão prejudicial para o meio ambiente quanto os
combustíveis fósseis, argumentos usados nas discussões sobre o tema até hoje.
Ainda de acordo com o relatório de Baran e Legey, “as grandes companhias de
petróleo, como Exxon, Shell e Texaco contribuíram financeiramente para
campanhas de políticos contrários aos veículos elétricos e financiavam propagandas
contrárias a este tipo de veículo. Como resultado, em 1996 a Carb (California Air
Resources Board, órgão do governo responsável por monitorar a qualidade do ar no
estado da Califórnia) capitulou e postergou seu cronograma” (BARAN; LEGEY,
2011, p. 216).
Pesquisa apresentada pela consultoria americana Accenture, na Accenture
Sustainability 24 (2012), realizada com 7.000 pessoas de doze países, indica que,
muito embora o índice de consumo de combustível seja apontado como principal
motivador para compra de carro nos próximos anos, ainda há receio dos
consumidores em relação à compra de veículos elétricos ou híbridos, dentre eles:
• preocupação com a diferença no custo em relação a um veículo
tradicional;
76
• custo de manutenção e necessidade de reposição de baterias;
• falta de conveniência, ou a não viabilidade de abastecimento a
qualquer momento;
• consumidores “ecologicamente conscientes”, por sua vez, questionam
se a pegada de carbono final será maior ou menor, devido à fonte da
energia elétrica (carvão, nuclear, renovável etc.) e pedem para a
indústria apresentar maiores comparações sobre a questão.
A consultoria afirma que os veículos elétricos precisam de volume para poder
competir em custo com os atuais, e o mercado ainda não está “preparado” para os
carros elétricos, tanto pelo preço, quanto pelo risco percebido.
Tomando o mercado norte-americano como referência, o panorama no final
da primeira década do ano 2000, de acordo com o instituto HybridCars (2011), era
de mais de trinta modelos de produção em série à venda nos EUA. Porém, de 2008
a 2010, as vendas desse tipo de veículos caíram em média 6% ao ano, enquanto as
vendas de carros “convencionais” cresceram 11%. De acordo com os especialistas,
a queda do preço da gasolina e o valor mais barato dos carros convencionais são as
duas principais explicações para este fenômeno.
4.4 MOMENTO ATUAL DA INDÚSTRIA
A mais recente onda que impactou fortemente o setor automotivo foi a crise
financeira iniciada pelo setor hipotecário nos EUA em 2008. A crise afetou tanto as
empresas europeias, quanto asiáticas, mas o principal impacto foi sentido nos
Estados Unidos. A indústria automotiva também foi enfraquecida com a alta do
preço dos combustíveis entre 2003 e 2008, o que desencorajou a compra de
veículos maiores, utilitários (SUVs) e caminhonetes, e aumentou a procura por
veículos com baixo consumo de combustível. Os executivos destacaram o mau
desempenho da indústria nos países desenvolvidos em contraste com o crescimento
do mercado no Brasil, Rússia Índia, China (BRIC) e em outros países emergentes.
Recuperando-se, principalmente a partir de fortes benefícios fiscais e de
concessão de créditos por parte dos governos, a indústria automotiva mundial voltou
a atingir novo recorde no segmento de automóveis e comerciais leves em 2011,
resultado impulsionado pelo mercado chinês e americano, especialmente. No Brasil,
77
o segmento de automóveis e comerciais leve alcançou a marca de 3.406.150
unidades produzidas (OICA, 2012).
O atual foco das grandes montadoras são os mercados em desenvolvimento,
principalmente China, Índia e Brasil. Além da maturação dos mercados
desenvolvidos, os incentivos governamentais destes três países para a produção
local têm atraído muitos investimentos. A relevância para o PIB, a visibilidade da
indústria e as especificidades das demandas (preferência de design, normas
ambientais e de segurança, por exemplo) também incentivam a implantação de
fábricas regionais. Esse movimento estimula toda a cadeia de fornecedores além de
aumentar a competitividade.
As regras ambientais, cada vez mais rígidas, farão com que a produção de
veículos mais econômicos e eficientes seja um dos principais desafios dos players
do setor ora em diante. Em relação aos combustíveis, além dos carros elétricos e
híbridos, as estratégias das empresas estão voltadas para o desenvolvimento de
motores movidos a biodiesel e etanol.
4.5 A EVOLUÇÃO DA INDÚSTRIA AUTOMOTIVA NO BRASIL
A história do automóvel no Brasil inicia-se em 1919, com a vinda da Ford
Motors Company para o país; e, seis anos depois, a General Motors (GM) também
começa a operar aqui. Ambas as empresas não produziam veículos no Brasil, mas
na matriz, e aqui importavam e montavam os semi-knock-down (SKD) ou os
complete knock-down (CKD), ou seja, kits inteiros ou parciais de veículos
desmontados, dado que o volume comercializado no país ainda era insuficiente para
grandes investimentos em instalações completas. Nos primeiros anos, a média de
montagem da GM, por exemplo, era de apenas 25 veículos por dia (CARRO
ANTIGO, 2012).
Esse modelo de negócio se manteve até o início da década de 1950, quando
diversas outras empresas impuseram idêntico padrão de importação de peças e
montagem em solo nacional. Em 1952, foi criada pelo governo a chamada
Subcomissão de Jipes, Tratores, Caminhões e Automóveis para desenvolver uma
estratégia de fabricação de veículos, especialmente de transporte de cargas. Um
ano depois, a Subcomissão instaura o Aviso 288, que limitava progressivamente a
78
concessão de licenças de importação, dada a deterioração na balança de
pagamentos (SANTOS; BURITY, 2002). Com isso, o governo buscou motivar a
instalação das fábricas no Brasil, como a Volkswagen, cujo modelo Fusca era o mais
popular no país. Ainda, acabou incentivando a indústria de autopeças, que até então
vinha apenas atendendo à demanda do mercado de reposição. Porém, o mercado
ainda era pequeno, demandando cerca de 20.000 unidades/ano, o que ainda
deixava as montadoras reticentes ao decidirem fazer grandes investimentos
(SANTOS; BURITY, 2002).
Na mesma década, a indústria tornou-se prioridade no programa de
crescimento – o Plano de Metas do presidente Juscelino Kubitschek; e, em 1956, o
governo brasileiro institui um novo conceito para incentivar a instalação de fábricas
em solo nacional. O plano restringia as importações e dava um prazo de cinco anos
para que os veículos tivessem um grau de 90% a 95% de nacionalização. Outros
incentivos foram dados, tanto de natureza cambial quanto fiscal, principalmente para
a importação de máquinas e equipamentos.
Existia então uma demanda reprimida, e a procura por veículos crescia e, à
medida que o sistema de transporte ia sendo implantado no Brasil, desenvolvia-se
mais o meio rodoviário que o ferroviário. Assim, além da Ford e GM, outras nove
empresas aderiram ao plano, sem incluir projetos de outras sete montadoras que
foram rejeitados. De acordo com Santos e Burity (2002), em 1957 foram vendidos
30.900 unidades, crescendo para 96.700 em 1959 e chegando a 190.000 em 1962.
Porém, mesmo com o crescente consumo, nem todos os investimentos se
traduziram em lucros para os competidores, e as plantas apresentavam alto grau de
ociosidade. Dados do BNDES apontam capacidade de produtiva de até 500.000
unidades por ano, muito acima da demanda. Somada a esse fator, em virtude da
política de aperto monetário e de restrição de crédito entre 1960 a 1966, apenas
sete empresas mantiveram produção de veículos leves e pesados localmente.
Recuperando-se desse período, entre 1967 e 1974, o Brasil vivenciou o
período do “milagre econômico”. O setor, já reestruturado, cresceu à taxa média de
20% ao ano. O governo voltara a estimular o consumo com instrumentos de
créditos. Pressionou também os sindicatos para reduzir o custo da mão de obra,
barateando assim os carros produzidos no Brasil. A indústria nacional mudou o perfil
de produção, fabricando pela primeira vez mais veículos de passeio do que
caminhões e ônibus. A título de comparação, enquanto a frota de carros se
79
multiplicou por oito entre 1956 e 1973, a de caminhões cresceu apenas 2,4 vezes
(SANTOS; BURITY, 2002). Esse boom atraiu novos investimentos, como a fábrica
da Fiat em Betim, Minas Gerais, em 1976. No fim dessa década, o setor chegou a
atingir a marca de um milhão de veículos produzidos, fato que só se repetiria na
década de 1990.
Os anos 1980, chamados por muitos como “a década perdida” da economia
brasileira, marcaram um processo de sucateamento e ociosidade das fábricas
nacionais. Com o mercado nacional sem concorrência, fechado para importações,
os consumidores brasileiros tinham verdadeiras “carroças”, quando comparado aos
modelos e inovações de mercados desenvolvidos. Praticamente todos os carros
vendidos no Brasil saíam das fábricas das quatro grandes montadoras – Ford, GM,
Volks e Fiat. Apenas em 1981, o PIB real cai 4,3%, o PIB da indústria 8,8% e as
vendas de automóveis despencam 43,5%.
De forma geral, essa década foi marcada por amplo rigor no controle de
preços pelo governo, e a forte contração entre 1981 e 1987 gerou os piores
resultados na história do setor. Porém, por ser uma indústria com característica
oligopolista, contando com apenas quatro grandes concorrentes na época, não
existia guerra de preços como forma de ganhar mercado. Ao contrário do esperado,
sempre que havia flexibilização do controle de preços por parte do governo, as
empresas empurravam paralelamente para cima os preços, tanto que o valor médio
do carro cresceu mais que a hiperinflação (GUIMARÃES, 1989), mantendo o volume
de lucro mesmo com a queda de vendas.
A demanda nacional total de veículos durante essa década ficou estável,
entre 550.000 e 650.000 unidades por ano, bem abaixo do volume comercializado
na década de 1970. O montante, quando dividido entre quatro grandes montadoras,
não gerava escala suficiente para a manutenção das operações. A resposta da
indústria automotiva nacional foi a exportação, já que este processo contava com
programas de incentivos por parte do governo. Nesse período recessivo, entre 17%
e 22% da produção era exportada, com o recorde de 41% em 1987. As exportações,
que somavam 493 milhões de dólares em 1977, chegaram a 2 bilhões de dólares
em 1987.
Durante a década de 1980, as montadoras precisaram apresentar “novos”
modelos para o público brasileiro, principalmente para fugir dos programas de
congelamentos de preços do governo. Assim, eram criadas as chamadas “séries
80
especiais”, onde eram adicionados um ou outro acessório nos veículos, mas que
permitiam modificações nos preços sem necessariamente descumprir com os
valores congelados nas tabelas oficiais. Em todo o setor, persistia a manutenção
estratégia de manter veículos defasados tecnologicamente, quando comparados aos
oferecidos pelas matrizes em mercados mais maduros, dada a política de proteção
de mercado e restrição de importação de bens de informática.
Com a eleição do presidente Fernando Collor de Melo, em 1989, e a abertura
do mercado nacional para produtos importados, ambiente de negócios da indústria
se torna muito mais competitivo em um período de tempo muito curto. Em 1990, com
o confisco das cadernetas de poupança no Brasil e inflação em permanente
descontrole, somados à Guerra do Golfo e o consequente aumento preço do
petróleo, um novo cenário recessivo começava a instaurar-se no Brasil. Era
consenso que não só o setor automobilístico precisava ser modernizado, mas que
seria preciso estimular e desenvolver o mercado consumidor. Os volumes de vendas
de veículos eram os mesmos da década de 1970, e as plantas tinham baixa
automação e altos custos ao longo de toda a cadeia (SANTOS; BURITY, 2002).
Assim, a última década do século XX foi marcada por grandes políticas de incentivos
para a indústria automotiva nacional, começando pelo ano de 1990, quando um
decreto foi especialmente elaborado para moldar uma característica de produto que
até hoje é marcante no mercado nacional: um regime especial de tributação para
veículos de até 1.000 cilindradas, com redução do Imposto sobre Produtos
Industrializados (IPI) de 40% para 20%, surgindo assim a figura do “carro popular”.
As medidas adotadas entre 1992 e 1993 no âmbito da câmara setorial
automotiva foram de extrema relevância. Os diversos stakeholders – montadoras,
trabalhadores e governo – concordaram em rever a questão tributária (IPI e Imposto
sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS) e salarial e as margens das
montadoras, autopeças e concessionárias. Além disso, o Banco Central (BC)
incentivou o financiamento dos carros de passeio. O acordo ainda previa
investimentos na ordem de 10 bilhões de dólares durante a década de 1990. Como
consequência, foi observada queda no preço dos produtos que chegou até 22%,
incentivando o mercado consumidor. Em 1993, depois de mais de uma década sem
crescimento, o setor voltava a registrar recorde de produção de vendas.
Mas a capacidade produtiva, mesmo eliminando vários gargalos e
aumentando a produtividade, chegara logo ao limite. Com esse fato, associado ao
81
novo regime de paridade cambial que entrara em vigor, foi registrado um boom no
volume de importações. Em 1995, por exemplo, o cenário da balança comercial era
desanimador, com déficit no setor de quase 2,2 bilhões de dólares (MICAELO,
2003). A comparação entre modelos nacionais e importados forçou as empresas a
investir em tecnologia e, ainda com defasagem de alguns anos, a produzir aqui
modelos comercializados pelas respectivas matrizes. As pressões por eficácia e
redução de custos, adequando-se ao modelo de produção enxuta, foram
compartilhadas por todas as montadoras instaladas no país. Ainda, o novo regime
automotivo, os acordos comerciais que foram fechados com outros governos, como
o da Argentina, e junto com o amadurecimento do mercado e a estabilização da
economia, incentivaram a vinda de novas montadoras para o país.
Em 1997, o regime automotivo foi novamente reformulado, impulsionando
ainda mais as empresas que investissem em unidades da federação menos
desenvolvidas, com redução de IPI e de até 50% do Imposto de Importação (II) de
veículos, bens de capital, ferramental e moldes para matérias-primas. Declarava-se
uma espécie de “guerra fiscal” entre Estados e Municípios, com propostas de
financiamento de instalações e até de participação no capital (SANTOS; BURITY,
2002). Com quase 18 bilhões de dólares de apoio público entre 1996 e 1999,
catorze novas unidades fabris foram criadas até 2001. Destaque para as japonesas
Honda e Toyota e para as francesas Renault, Peugeot e Citroën, que já haviam
iniciado a atuação no mercado nacional a partir importação.
Entre 2001 e 2008, o setor experimentou anos de constante crescimento.
Com o mercado aquecido, novos competidores foram atraídos para a arena
competitiva, destacando-se as empresas coreanas Kia e Hyundai. Porém, a crise
financeira mundial, no fim de 2008, impactou o desempenho do setor automotivo. De
acordo com a OICA (2011), em um ano a queda na produção global foi de quase 12
milhões de unidades – de 73,2 milhões em 2007 para 61,7 milhões em 2008.
Dados da Anfavea (2011) apontam que, no Brasil, a crise foi percebida em
outubro de 2008, com queda de 6,7% em relação ao mesmo período de 2007. Em
novembro a queda foi de 23,4% e em dezembro de 19,7%, mas, mesmo assim, o
mercado automotivo brasileiro bateu recorde de vendas, com a produção
ultrapassando pela primeira vez 3 milhões de unidades. Em 2009, as vendas
internas cresceram 11,4%; e o Brasil se tornou o quinto maior mercado mundial. Em
82
2010, o setor atingiu novos recordes, fazendo o país subir mais uma posição no
ranking mundial (BARROS; PEDRO, 2011).
Ainda de acordo com Barros e Pedro (2011), o crescimento das vendas é
atribuído, dentre outros fatores, ao aumento da renda média dos brasileiros e
ascensão social, principalmente da nova classe média (classe C), a redução dos
níveis de desemprego, ao maior acesso ao crédito e redução das taxas de juros e
alongamento dos prazos de financiamento, o que possibilitou para muitos a
aquisição do primeiro carro.
No Brasil, a indústria automotiva representa atualmente 18,2% do PIB
industrial e 5% do PIB total (ANFAVEA, 2012) e emprega diretamente mais de
146.000 funcionários. O setor soma quase 200.000 empresas e 1,5 milhão de
empregos diretos e indiretos. Apenas em 2011, o faturamento líquido no segmento
ultrapassou 93,5 bilhões de dólares. Enquanto é presenciado grande aumento nas
vendas de veículos, o número de empregos na indústria automotiva não acompanha
o crescimento, mostrando com isso forte ganho de produtividade e de automação.
Dados da Anfavea (2012) indicam que em 1990 eram produzidos 6,6 veículos por
empregado, ao passo que em 2011 essa relação tinha subido para 25,1.
Os números de produção impressionam e não param de bater recordes. A
frota nacional já ultrapassa 37 milhões de veículos e comerciais leves, com
produção nacional em 2011 de 3,4 milhões (DENATRAN, 2011; ANFAVEA, 2012).
Ainda é considerada uma frota antiga, com idade média de 13,3 anos, segundo a
Federação Nacional de Veículos Automotores (FENABRAVE, 2010), o que é uma
oportunidade de incremento de receitas para as montadoras.
No ano 2000, por exemplo, no Brasil eram vendidos apenas 8,8
veículos/1.000 habitantes. Em 2010 foram vendidos 18,4 veículos para cada 1.000
habitantes, contudo bem inferior aos 53,3 registrados em 2007 nos EUA. Porém
esse indicador está em constante evolução.
Outro indicador que vale a pena utilizar para comparar com o mercado
externo é o número de habitantes por veículo. No ano de 1999, o Brasil possuía 8,9
habitantes por veículo e, em 2010, essa razão caiu para 6:1. De acordo com a
Anfavea (2012), a estimativa é chegar em 2020 com quatro habitantes por veículo.
Novamente, relativizando com países como Estados Unidos, Canadá, França e
Alemanha, percebem-se as razões de 1:2, 1:6, 1:7 e 1:9 respectivamente (BARROS;
PEDRO, 2011; ANFAVEA, 2012). Esse fato, associado ao bom momento da
83
economia nacional, é percebido pelo mercado como uma vasta oportunidade de
crescimento no país, mesmo com as principais capitais com índices muito próximos
aos de países desenvolvidos, conforme visto anteriormente.
De olho nessas oportunidades de crescimento, estão previstos mais de 38
bilhões de reais em investimentos no setor entre 2011 e 2015, incluindo o setor de
autopeças. Os principais investimentos anunciados foram da Fiat, com previsão de
injeção de quase 10 bilhões de reais, incluindo a nova fábrica no Estado de
Pernambuco e a ampliação e modernização da planta de Betim, Minas Gerais; mais
6,2 bilhões de reais da Volkswagen, na ampliação das quatro fábricas atuais, dentre
outros investimentos; 5 bilhões de reais da GM; 4,5 bilhões de reais da americana
Ford. As coreanas Hyundai e Kia, as francesas Renault e Peugeot e a chinesa
Cherry compõem boa parte do restante dessa cifra (BARROS; PEDRO, 2011).
4.6 FATORES QUE INFLUENCIAM A VENDA DOS CARROS E PRINCIPAIS
INDICADORES
Diversos são os fatores que influenciam direta e indiretamente o volume de
produção e de vendas de veículos. Além das condições macroeconômicas do país e
os níveis de renda e emprego, são relevantes os impostos incidentes, a taxa de
juros e a facilidade de financiamento – mais a disponibilidade de crédito, além do
câmbio favorável.
O Brasil está no topo do ranking mundial de carga tributária sobre veículos,
com média de 30,4% (ANFAVEA, 2012), chegando a mais da metade do preço final
em certos casos. A título de comparação, no segundo lugar desse ranking, a Itália,
os impostos representam pouco mais de 17,3% do valor final dos veículos.
São diversos os impostos cobrados na venda dos carros no país, sendo IPI e
ICMS os mais impactantes. Além desses, ainda incidem o Programa de Integração
Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PIS/Pasep), a
Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e, no caso dos
veículos importados, o Imposto de Importação (II).
O IPI é uma taxa federal. No caso dos veículos, atualmente, varia de acordo
com o tamanho (cilindrada) do motor. Conforme a tabela vigente em dezembro de
2011, é de 7% até 1,0 litro, para motores entre 1,0 litro e 2,0 litros é de 13% para
motores a gasolina e 11% para flex; e 25% acima de 2,0 litros. Como forma de
84
incentivo à implantação de fábricas no Brasil, além de proteger os competidores
locais, principalmente dos veículos coreanos e chineses (as empresas coreanas Kia
e Hyundai, por exemplo, que cresceram em vendas 121% e 36% respectivamente
em 2010, e a chinesa JAC, com forte aceitação no mercado nacional com o modelo
J3, lançado em 2011), o governo federal decidiu aumentar em 30 pontos percentuais
o tributo sobre os produtos importados. A regra excluiu os três países com os quais
o Brasil possui acordo setorial bilateral – Argentina, Uruguai e México. O grau de
nacionalização exigido foi de 65% para que o fabricante não pague a sobretaxa,
porém o governo já se mostrou disposto a flexibilizar o tributo para empresas que
começarem a implantar novas fábricas no Brasil – como as chinesas Cherry e JAC
Motors, além da alemã BMW. É interessante ver uma espécie de repetição do efeito
do Aviso 288, de 1952, tratado anteriormente.
Para se ter uma noção da relevância desse tipo de medida, logo após o
anúncio do aumento de 30 pontos percentuais em outubro de 2011, a Associação
Brasileira das Empresas Importadoras de Veículos Automotores (ABEIVA) registrou
queda nos emplacamentos de veículos de 41,2%, sendo que apenas duas das 27
filiadas registraram crescimento no período. Foram 13.264 unidades comercializadas
em outubro, ante 22.569 veículos no mês anterior. O resultado contrasta com o
aumento de quase 98% de emplacamento de veículos importados no período de
janeiro a outubro de 2011 em relação ao mesmo período de 2010, quando o share
de mercado dos importados já era de 21,7% (MATSUBARA, 2011). Cabe ressaltar
que 90% das importações são feitas pelas montadoras instaladas no país. É válido
registrar também que as importadoras recorreram e conseguiram que a medida só
entrasse em vigor depois de três meses de anunciada, com isso o volume de vendas
de novembro e dezembro manteve o ritmo dos primeiros meses do ano.
Contudo, com a mudança súbita do comportamento do governo, algumas
montadoras que tinham grandes planos de investimento no Brasil, como a JAC
Motors e a BMW, anunciaram, ao menos temporariamente, a suspensão dos planos
de investimentos no Brasil até que tais medidas protecionistas sejam revistas pelo
governo federal.
O ICMS é a grande fonte de receita dos Estados, com alíquota não
cumulativa média de 17%, variando de Estado para Estado. Geralmente é usado
como forma de incentivo para atrair investimentos, principalmente em regiões menos
desenvolvidas.
85
Outro fator que aparentemente possui correlação com as vendas são as taxas
de juros e a oferta de crédito. Dados da Associação Nacional das Empresas
Financeiras de Montadoras (Anef) mostram que quase 70% dos automóveis
vendidos no Brasil são adquiridos por meio de financiamento, consórcio ou leasing.
O modelo de crédito mais utilizado para financiamento de veículos é o Crédito Direto
ao Consumidor (CDC), cujas regras são definidas pelo subsistema normativo do
Conselho Monetário Nacional (CMN) e controladas pelo Banco Central do Brasil
(BCB). O financiamento permite aquisição do veículo no ato da negociação,
diferente do consórcio, que depende de sorteio para a liberação da carta de crédito
(BARROS; PEDRO, 2011).
De acordo com Silva (2006, p. 21):
essa maior facilidade de compra atrai o consumidor, que busca realizar seu desejo de consumo ou investimento, considerando que as taxas de juros praticadas são as menores taxas do mercado, comparadas às operações de crédito através de cheque especial ou crédito pessoal, que se situam em patamares bem superiores aos praticados pelos contratos de financiamento para automóvel (CDC).
A disponibilidade de crédito também cresce de forma acelerada no país. No
fim de 2011, o total de empréstimos concedidos pelos bancos atingiu a
impressionante marca de 48% do PIB e, de acordo com analistas, irá facilmente
ultrapassar a marca 50% ainda em 2012 (TEIXEIRA, 2012).
O aumento de renda também é considerado por analistas como fator que
influencia a determinação dos juros. Com o mercado mais aquecido, os bancos
tendem a reduzir as taxas junto com a redução do risco e aumento das expectativas
(SILVA, 2006). Ainda de acordo com o autor, as principais montadoras usam os
próprios bancos para coordenar a dinâmica do consumo de veículos e gestão de
custos. Banco GM, Banco FIAT, Banco Volkswagen, Banco Toyota, Banco BMW e
outros fomentam as operações de CDC conforme a necessidade mercadológica de
produção das fábricas. Entra em cena a relação de oferta e demanda que funciona
da mesma forma para todas as marcas.
Silva (2006, p. 37) esclarece que:
A campanha de taxa de juros abaixo da praticada pelo mercado atrai o consumidor disposto a realizar financiamento com taxas menores, ou seja, a marca X possui uma oferta excedente de veículos e a pressão da oferta gera o desejo de ampliar a demanda através de uma redução da taxa de
86
juros. Isso pode ocorrer também em um momento onde o banco tenha uma intenção de ampliar seu mercado, pagando a diferença dos juros ou confronto direto entre bancos concorrentes.
Mesmo que o estudo estatístico de Silva (2006) mostre que apenas 3% do
comportamento da demanda são explicados pela variação da taxa do Sistema
Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), estratégias como redução de juros até
0% ou outras taxas abaixo das cobradas pelo mercado pelas montadoras constituem
uma poderosa ferramenta de mídia e alavanca de vendas.
O câmbio influencia principalmente no fator importação / exportação. Com o
real valorizado, foi percebido um aumento no volume de carros importados
emplacados no país, o que foi visto como a maior ameaça para as empresas locais.
Em 2005, por exemplo, os importados representavam pouco menos de 5% dos
emplacamentos no Brasil, e esse número saltou para quase 20% em 2010.
Com o aumento do IPI para carros importados, o ano de 2011, que era
considerado o mais especial da década para os importadores, obrigou-os a rever
planos e estratégias.
Em comum, os fatores listados podem ser, direta ou indiretamente
controlados ou, no mínimo, fortemente influenciados pelo governo, o que mostra a
importância da constante interação entre os stakeholders desse setor.
FIAT
4.7 FIAT MUNDO: BREVE HISTÓRICO
O nome Fiat é um acrônimo de Fabbrica Italiana Automobili Torino (Fábrica
Italiana de Automóveis de Turim). A companhia, fundada em 1899, por Giovanni
Agnelli, rapidamente expandiu as operações, tanto por crescimento orgânico, com a
venda de automóveis e veículos industriais e agrícolas, quanto por aquisições e
diversificações. Ainda no começo das atividades, a companhia entrou em diversos
ramos, como metalurgia, eletricidade, transporte público, para citar alguns.
Desde o início das operações, a Fiat buscou o crescimento como forma de
ganhar vantagens competitivas. Em 1922, terminou a construção e começou a
operar a maior fábrica de automóveis da Europa – a planta de Lingotto, dotada de
cinco andares e uma inovadora pista de teste no telhado.
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Poucos anos depois, iniciou-se a Primeira Guerra Mundial e praticamente
toda a produção da companhia passou a ser direcionada para suprir o exército
italiano. No período, a firma chegou a produzir armamentos bélicos, como
metralhadoras e motores para submarinos.
Com o fim do conflito, a firma passou por uma forte crise, porém, superando
os desafios do ambiente, retomou o crescimento usando a estratégia de baixo custo
para obter vantagens competitivas de escala e escopo com a fabricação em massa
dos produtos. A característica empreendedora e de inovação em produtos mostrou-
se presente e, dentre os inúmeros veículos lançados então, destaca-se o 509, de
1924. Este foi um dos primeiros carros com quatro portas do mundo. Em 1937 foi
iniciada a construção da grande fábrica de Mirafiori.
Durante a tomada do poder pelo fascista Mussolini, a empresa apoiou o novo
regime de forma integral. Por conta do bloqueio do mercado externo a produtos
italianos em represália ao momento político, a Fiat teve de rever os processos e
reduzir a escala de produção, voltando a focar apenas no mercado interno italiano.
Durante a Segunda Guerra Mundial, houve dramática redução da produção de
carros, e a firma direcionou novamente os esforços para a elaboração de veículos
militares e comerciais.
No pós-guerra, o Plano Marshall subsidiou e apoiou a reconstrução das
fábricas; com isso, a empresa retomou o processo de crescimento. A gestão voltou a
usar as características empreendedoras e de inovação, sendo a primeira montadora
a instalar sistemas de ventilação e de aquecimento em veículos de produção em
massa. Pouco antes da década de 1960, a firma já traduzia em altos lucros o bom
período de recuperação econômica. O processo de crescimento se intensifica com a
duplicação das fábricas de Mirafiori. Buscando se fortalecer em novos mercados, a
Fiat começa a abrir fábricas no exterior. Na Europa ainda nos anos 1960, a
proporção de carro por pessoa salta de 1 para cada 96 habitantes para 1 veículo a
cada 28 habitantes (DARGAY; GATELY; SOMMER, 2007).
Porém, a época foi marcada por pressões internas e externas, que colocaram
em risco o crescimento e a sobrevivência da empresa. Por um lado, internamente os
funcionários iniciam uma série de protestos e greves. Apenas em 1969, durante o
movimento chamado “outono quente”, quando a Itália viveu a maior onda de greves
e paralisações, o total de horas inativas na Fiat (horas x funcionários) chegou a 15
88
milhões. Sistemicamente, a crise do petróleo atingiu a indústria automobilística como
um todo.
Na década de 1970, o processo de crescimento da empresa ganhou mais
força a partir das fusões e aquisições e da entrada em novos mercados, como a
abertura da fábrica brasileira em 1976, objeto de estudo desta dissertação. Ao que
parece, o empreendedorismo e as inovações continuaram a ser um dos principais
impulsionadores da Fiat. Em 1978, a Fiat iniciou o processo de fabricação com a
utilização de robôs e, no ano seguinte, houve a separação da corporação; e a Fiat
Auto S.p.A. foi criada com o objetivo de ser o guarda-chuva das marcas Fiat, Lancia,
Autobianchi, Abarth e Ferrari (http://www.fiat.it/).
Na década de 1980, outras marcas foram adicionadas ao portfólio, como a
Alfa Romeo e a Maserati, e diversas operações foram separadas, criando-se
companhias independentes. Dentre as novas empresas, surgiu a Fiat Ferroviária,
Fiat Avio (aviação), Fiat Trattori (tratores e máquinas pesadas) e a Magneti Marelli.
Na década de 1990, o direcionamento estratégico da empresa voltou-se para
o mercado externo e, pela primeira vez, foram vendidos mais produtos no exterior do
que na Itália. Em vista da competição acirrada nos mercados maduros, a Fiat
concentrou os esforços na exploração dos mercados em expansão. Dentre eles, o
Brasil ganhou destaque, como a criação do Pálio, o primeiro carro global
desenvolvido em parceria com a Fiat do Brasil.
Comemorando o centenário, e para dar mais consistência à nova estratégia, a
empresa renovou a logomarca em 1999. O novo posicionamento era prover
produtos com soluções de vanguarda tecnológica e preços mais acessíveis. De
acordo com a empresa, os carros passaram a receber mais atenção na parte de
inovações tecnológicas e soluções que buscavam simplificar o dia a dia e atender às
necessidades dos consumidores urbanos. Motores com menor consumo de
combustíveis se tornaram uma das metas da empresa. Outra estratégia da empresa
foi proporcionar um relacionamento mais construtivo com os clientes, além de
amplificar as adaptações para cada mercado.
No ano 2000, a Fiat anunciou uma joint venture com a americana GM, via
troca de ações. A GM receberia 20% das ações da italiana; e, em troca, a Fiat seria
dona de 5,85% da montadora estadunidense. Esse era um momento em que todos
os grandes players buscavam consolidação para redução de custos e ganho de
89
escala. Pelo acordo, se depois de cinco anos a Fiat desejasse vender os 80%
restantes, a GM seria obrigada a comprar.
Nos anos seguintes, a dívida líquida das atividades industriais do grupo
chegou a 7,4 bilhões de euros em 2002, e o resultado negativo persistiu. A divisão
de veículos da empresa era dada como acabada por diversos analistas de
investimentos e consultores do setor. A previsão era que a empresa seria adquirida
por outra grande montadora, provavelmente a GM, a qualquer momento (TANURE;
PATRUS, 2011). Assim, a Fiat viu nos resultados dos mercados emergentes, como o
Brasil, o único modo de continuar sua existência. Para se reestruturar, foi anunciado
em 2003 a contratação de um novo executivo para a divisão de automóveis com a
meta de promover o turnaround em todas as empresas do grupo.
Em 2005, passados os cinco anos iniciais, o acordo com a GM foi terminado e
2 bilhões de dólares foram pagos pela Fiat para receber as ações de volta. As
empresas que surgiram dessa parceria, a Fiat-GM Powertrain, que fabricava
motores e transmissões para as duas empresas, e a GM-Fiat World ide Purchasing,
que centralizou as compras globais das duas empresas, foram encerradas.
Em 2007, a logomarca foi novamente reformulada para representar a
proposta de ser uma empresa global e preocupada com o meio ambiente. Nos
últimos anos, a empresa tem sido reconhecida como best in class nos principais
índices de sustentabilidade na Bolsa de Nova York (HAHN, T. et al, 2009). Em 2011,
pelo quinto ano consecutivo, a Fiat atingiu os menores índices de emissões de CO2
nos veículos vendidos na Europa. Os veículos atuais da montadora emitem média
de 118,2 g/km, abaixo da meta de estabelecida pela União Europeia para 2015, que
é de 130 g/km (FIAT, 2012). Um fato interessante é que a corporação mantém até
hoje membros da família Agnelli como principais executivos.
4.8 FIAT BRASIL
Conforme indicado no capítulo de métodos, dentre as diversas fontes
utilizadas para historiar a empresa, destacam-se cinco: dados primários das
entrevistas realizadas para o estudo; dissertação de mestrado de Micaelo (2003);
livro comemorativo dos trinta anos da Fiat, cedido pela empresa; informações dos
site da Fiat Brasil e Itália; além do livro de Tanure e Patrus (2011). No capítulo de
90
métodos, também se encontra a explicação para a decomposição e o agrupamento
dos períodos abaixo, conforme proposto por Langley (2007).
4.8.1 Período I – da decisão da entrada no Brasil à construção da fábrica (1970
a 1976)
A Fiat Automóveis começou a traçar a história no Brasil no princípio da
década de 1970, quando o setor automobilístico crescia a taxa médias de 20% ao
ano, incentivada por instrumentos de crédito específicos. Naquele momento, todo o
polo automotivo nacional encontrava-se no Estado de São Paulo. As três grandes
montadoras, Volks, Ford e GM, dominavam quase a totalidade do mercado e
exerceram grande pressão e lobby sobre o governo paulista para evitar a entrada de
novos concorrentes.
Percebendo uma oportunidade de desenvolvimento para o Estado de Minas
Gerais (MG), o governo mineiro realizou então os primeiros contatos com os
executivos da Fiat na Itália. Mesmo com a barreira criada pelas demais
concorrentes, impedindo-a de se instalar a 500 quilômetros do epicentro industrial,
onde existia mão de obra especializada e os principais mercados consumidores
além de todo polo de fornecedores, a Fiat percebeu que MG seria a porta de entrada
em um mercado emergente e com grande potencial. A empresa sabia que teria
desafios logísticos para o recebimento de peças e com o escoamento dos produtos,
e que precisaria desenvolver mão de obra e uma rede de fornecedores locais.
Em 1972, foi assinada uma carta de intenções (Acordo de Comunhão de
Interesses) e, um ano depois, iniciou-se a construção da fábrica em Betim, Minas
Gerais. A obra contou com fortes incentivos públicos e atraiu um enorme contingente
de trabalhadores rurais, que viam possibilidade de melhoria de vida e migração para
um centro urbano.
Por três anos, mais de 3.000 homens trabalharam dia e noite na construção
da fábrica, com área coberta de 350 mil metros quadrados e 2.245.000 metros
quadrados de área total. No mesmo período, a empresa decidiu não “importar”
profissionais de São Paulo e apostou na capacitação e no treinamento das
comunidades locais, o que foi chamado de “interiorização do desenvolvimento”.
Alguns operários foram mandados para fábricas na Itália, com o intuito de fazer
91
intercâmbio de conhecimento sobre tecnologias mais complexas. Ainda, diversos
italianos vieram para o Brasil por conta desse projeto.
No decorrer das obras, 88% de todos os investimentos realizados no setor
automotivo nacional se destinavam à implantação da fábrica da Fiat em MG, o que
incentivou a abertura de novas empresas no entorno, o que transformaria, anos
depois, Betim no segundo polo automotivo do país. A inauguração e início da
produção da Fiat Automóveis S.A. aconteceu no dia 9 de julho de 1976, com a
presença do presidente brasileiro, general Ernesto Geisel, e do presidente da Fiat,
Giovanni Agnelli.
4.8.2 Período II – do início da produção ao fim da “década perdida” (1976 a
1989)
O primeiro modelo a ser produzido em solo nacional foi o Fiat 147. O veículo
trazia características ainda não presentes nos modelos fabricados no Brasil, como
posicionamento transversal dianteiro do motor e tração dianteira. Com previsão de
produção anual de 20.000 unidades, as vendas no primeiro ano chegaram a mais de
60.000 unidades.
Em virtude da persistência da crise do petróleo em 1979, a Fiat colocou em
produção o então protótipo do modelo 147 movido a álcool, apresentado ainda na
inauguração da fábrica. Foi o primeiro modelo nacional com o uso do novo
combustível, atendendo ao chamado do Programa Nacional do Álcool (Proálcool),
lançado pelo governo militar em 1973, com o principal objetivo de reverter o saldo da
balança comercial e a dependência brasileira do petróleo internacional.
Mesmo com tantas inovações, o Fiat 147 começou a formar uma imagem
negativa perante os consumidores, principalmente pelo preço, baixa qualidade
percebida e pouca economia de combustível quando comparado ao principal
concorrente, o Fusca da Volkswagen. No período, o setor automotivo atingira o
impressionante número de 1 milhão de veículos produzidos por ano, marca que só
seria registrada novamente mais de dez anos depois.
Fato interessante é que, ao não se ter instalado na Grande São Paulo, a Fiat
não sofreu com as grandes paralisações do Sindicato dos Metalúrgicos entre 1978 e
1980, comandadas por Luiz Inácio Lula da Silva. A década que se iniciava foi
marcada por grandes mudanças políticas e econômicas. No cenário político, a volta
92
gradual à democracia trouxe esperança para a população. Porém, no cenário
econômico, a forte recessão e a inflação descontrolada (“a década perdida”) fizeram
as empresas revisar os processos de produção.
Em 1984, a Fiat começa a fabricação nacional do Uno, lançado nos EUA em
1983. Era um modelo projetado na Itália, para ser um carro global, e uma aposta
para reverter os maus resultados da matriz. Com investimento alto no
desenvolvimento desse produto, em torno de 700 milhões de dólares (valores de
1982), a matriz da montadora conseguiu o que queria. Além do prêmio de “Carro do
Ano da Europa”, os números de venda comprovavam o sucesso de aceitação do
Uno no mercado europeu. No Brasil, o carro teve boa aceitação inicial pelos
consumidores e também ganhou o prêmio de “Carro do ano”.
Assim, nesse mesmo ano, a empresa alcançou a marca de 1 milhão de carros
produzidos no Brasil. Porém, passado pouco tempo, a Fiat voltou a enfrentar
problemas de aceitação e imagem. De acordo com Nottoli (1995), pesquisas
apontavam que 70% dos consumidores brasileiros não queriam automóveis da
marca, principalmente por reclamações referentes à qualidade do modelo Uno.
A companhia realizou grande atualização no modelo de produção, modificou a
linha de montagem, com a introdução de um moderno sistema de soldagem de
carroceria, e criou um extenso programa de qualidade, envolvendo todos os
fornecedores e rede de concessionárias. Nottoli (1995) afirma que nas pesquisas
feitas depois da implantação dessas mudanças, o índice de rejeição apontava
expressiva queda – para menos de 40%. Mantendo o crescimento, impulsionado
pelas exportações, em 1989 foi atingida a marca de 1 milhão de veículos vendidos
no mercado interno e 2 milhões de veículos produzidos no país.
Uma característica da época eram os diversos planos econômicos que
tentavam combater a inflação galopante, como o Plano Verão, de 1989. Com o
controle de preços (tabelados) pelo governo, uma das saídas da Fiat foi criar séries
especiais dos produtos, podendo assim ter mais flexibilidade nos preços e buscar
vantagens econômicas.
4.8.3 Período III – da abertura do mercado à liderança de vendas (1990-2003)
A década de 1990 foi marcada, principalmente, por muitos desafios e
oportunidades. Por um lado, o Plano Collor de 1990, que buscava combater a
93
inflação, congelou as cadernetas de poupança, contas correntes e demais
investimentos cujo saldo fosse maior que 50.000 cruzeiros (aproximadamente
10.000,00 reais corrigidos até janeiro 2012), gerando assim um ambiente recessivo
e queda na produção industrial. Por outro, uma grande oportunidade apareceu para
a Fiat. Fernando Collor determinou a criação de um decreto que reduzia de 40%
para 20% a alíquota de IPI dos carros com até 1.000 cm3 de cilindrada.
Prontamente, a Fiat apresentou ao mercado seu motor de 1.000 cilindradas, no Uno
Mille, primeiro em um carro nacional. Naquele momento, a maioria dos competidores
estava apostando em projetos e lançamentos com grande capacidade cúbica e os
rivais demoraram quase dois anos para oferecer o primeiro concorrente com motor
1.0. Surgia, assim, o mercado de carros populares, que viria a influenciar e
revolucionar toda a indústria nacional até os dias atuais.
Em 1992, o cenário econômico para a indústria automobilística teve um
componente favorável, com um acordo automotivo entre governo, montadoras e
trabalhadores. Tal acordo possibilitou a redução dos preços dos automóveis em 22%
na média. Nesse ano, a Fiat apresentou o primeiro popular nacional de quatro
portas, o Mille Eletronic.
Em 1993, a empresa entrou no segmento de carros de luxo, com o Tempra 16
V. Com este modelo, a Fiat deu um passo também na busca de motores menos
poluentes, com índices de emissão de partículas bem inferior ao exigido pela
legislação nacional e dentro dos padrões europeus. No mesmo ano, a Fiat ganhou
os prêmios de Empresa do Ano e Excelência Empresarial, ambos pela revista
Exame. O ano de 1993 rompeu um período de doze anos de estagnação da
indústria nacional, que voltara a quebrar recordes de produção.
Para a montadora, o ano de 1994 foi marcado pela produção do primeiro
carro nacional com motor turbo e o primeiro popular com ar-condicionado. A Fiat
lança o sistema Mille On Line, que possibilitava ao cliente encomendar um carro na
concessionária a preço de tabela, escolhendo cor e opcionais, sem pagar o ágio da
concessionária. No mesmo ano, a Fiat chegaria à marca de 2 milhões de veículos
vendidos no mercado interno, além de 1,5 milhão de unidades exportadas. A
participação dos modelos populares 1.0 mostrou a força, saltando de 11,3% em
1991 para 40% em 1994 – ano que ficaria marcado também pela criação do Plano
Real, que estancou a inflação e gerou estabilidade monetária, o que viria possibilitar
94
o planejamento de novos investimentos. Novamente, a Fiat foi eleita a Melhor
Empresa do Setor Automobilístico pela revista Exame.
O ano de 1994 foi marcado pela inauguração da Ilha Ecológica, que se
tornaria o primeiro grande marco sobre preocupação com impactos ambientais pela
montadora no Brasil. Nela, os resíduos industriais são separados por categoria,
armazenados e enviados a empresas recicladoras e de tratamento para correto
destino, possibilitando, atualmente, o reaproveitamento de 98,5% de todo o resíduo
gerado. Além dessas atividades, a Ilha Ecológica da Fiat foi pioneira mundial na
reciclagem do poliestireno expandido (“isopor”). Este material é processado e
transformado em matéria-prima para fabricação de diversos produtos, como
vasilhames, solas para calçados, mangueiras, embalagens dentre outros. De acordo
com dados disponibilizados no site da empresa, desde 1994, a Ilha Ecológica já
permitiu a reciclagem de aproximadamente 30.000 toneladas de papel e papelão
(FIAT, 2012). São mais de 660.000 árvores poupadas a partir da reciclagem de
papel. Além disso, 15.000 toneladas de plásticos diversos e 1.700 toneladas de
isopor foram recolhidas e encaminhadas para reciclagem. Essas quantidades são
equivalentes à utilização de 145 toneladas de petróleo como matéria-prima. É
importante registrar que não existia, até o momento, nenhuma legislação ambiental
exigindo tais padrões de produção, incentivos fiscais do governo, ou mesmo
pressões da sociedade e clientes em relação a ações de responsabilidade
socioambiental.
Outro ano emblemático para a montadora foi 1996. Marcando vinte anos no
Brasil, o principal destaque foram os altos investimentos para a modernização da
planta, com o objetivo de desenvolver e lançar o primeiro carro “global” brasileiro, o
Palio. A empresa também criou, pela primeira vez, o desenvolvimento do conceito
de “família completa”, com o Palio Weekend, Siena e Pick-up Strada. A firma lançou
o primeiro veículo nacional com air-bag, o Tipo 1.6 mpi. No mesmo ano, apresentou
uma das primeiras versões de automóveis com cunho de responsabilidade social: o
Programa Autonomy, que tem como objetivo produzir veículos adaptados de fábrica
para portadores de deficiências dos membros inferiores.
No mesmo período a empresa criou o Projeto J, que visava à
desverticalização do processo produtivo, com a implantação de estrutura de
fornecimento hierarquizado de módulos e sistemas, chamado de processo de
“mineirização” pelos executivos da empresa. A Fiat atraía e incentivava novos
95
projetos industriais para o entorno da fábrica, fortalecendo o cinturão de
fornecedores e a implantação do sistema just-in-time, com o abastecimento de
componentes diretamente na linha de montagem, trazendo ganhos de eficiência e
competitividade. De acordo com as estimativas da empresa, a Fiat reduziu os custos
na ordem de 200 dólares a cada carro produzido, somente com a nova logística. As
ações do processo de “mineirização” permitiram também à empresa liberar áreas de
estocagem dentro da fábrica e abrir novas linhas de montagem.
A informática se estabelecia de forma dominante no controle da produção da
fábrica e no atendimento ao cliente. A empresa continuava com o processo de
crescimento, e a produção diária ultrapassava 2.000 mil unidades.
No ano de 1997, a Fiat foi a primeira montadora brasileira de automóveis e
veículos comerciais leves a obter o certificado de qualidade ambiental ISO 14.001 –
um conjunto de normas internacionais para conservação ambiental. Dentre as novas
práticas, iniciou o uso de cabotagem para o transporte de carros dentro do território
nacional.
O ano de 1998 foi conturbado para a economia global, com crises da Ásia e
da Rússia, o que afetou diretamente o cenário brasileiro. A Fiat do Brasil registrou
prejuízos e perda de participação no mercado. Nesse ambiente recessivo, a
empresa precisou reduzir o quadro de funcionários para quase a metade dos então
24.000, buscando como solução a terceirização de diversas operações. Com o
objetivo de melhorar a relação com o quadro funcional, foram introduzidas práticas
mais efetivas de relacionamento com stakeholders internos, como o programas de
participação dos empregados nos processos de decisão e nos diversos comitês da
empresa.
Em 1999, a firma apostou novamente na inovação, com o lançamento da
linha Adventure do modelo Palio Weekend. O nicho de mercado off-road urbano,
ainda não explorado no Brasil, mostrou-se promissor por muitos anos. A empresa
também se tornou a primeira montadora a vender carros pela internet no Brasil, com
o modelo Brava. O ano foi marcado por mais turbulências macroeconômicas,
principalmente pelo fim do regime de banda cambial no Brasil em fevereiro. Naquele
momento, diversas empresas estavam financiando os investimentos em dólar. No
setor automotivo, boa parte dos contratos de compra de veículos estava vinculada à
moeda estrangeira. Assim, inúmeros clientes da Fiat e das demais montadoras
tiveram de renegociar os contratos, ou mesmo se desfazer dos veículos. O governo
96
negociou novos “acordos automotivos emergenciais”, que reduziram impostos e o
preço final dos produtos, buscando manter o nível de emprego do setor. Dessa
forma, mesmo com as pressões externas, nesse ano a empresa teve bom
desempenho em vendas e ocupou a liderança de produção (não em vendas) no
setor automobilístico brasileiro, com quase 400.000 automóveis fabricados – 32% do
total nacional. Dados da Anfavea apontam que a Fiat foi responsável por mais de
40% das exportações nacionais.
No ano 2000, o anúncio da aliança internacional entre a Fiat e a GM gerou um
clima de incertezas entre os funcionários da empresa. No início do acordo de troca
de ações, a GM recebeu 20% das ações da Fiat e a Fiat 5,85% da GM. Porém, os
funcionários temiam que a empresa Italiana fosse vendida completamente para a
americana a qualquer momento – fato que não aconteceu. Os executivos da
empresa atuaram fortemente pra reverter essa percepção e apresentar os benefícios
pretendidos. O objetivo da união era unir forças para reduzir custos de compras e de
fabricação de motores. No fim do período, a lucratividade da empresa melhorou
junto com a participação de mercado. Novamente a Fiat ganhou o título de Melhor
Empresa do Ano e liderou o ranking de “As 100 melhores empresas para você
trabalhar”, da revista Exame.
Na virada do milênio, as novas entrantes, principalmente as montadoras
francesas e japonesas, começavam a roubar o mercado das quatro grandes
fabricantes nacionais (Fiat, Volks, Ford e GM). Apenas a Renault roubou 5% do
share de mercado em apenas dois anos, por exemplo. Assim, entre 1997 e 2001, a
participação do quarteto caiu de 96,7% para 87,8%, o que gerou forte incômodo nas
tradicionais empresas. O padrão de qualidade exigido pelos consumidores também
aumentara. A Fiat resolveu, então, responder acelerando o ciclo de novos
lançamentos e explorando o nicho das pick-ups e carros adaptados com uma
proposta de off-road. A direção da empresa, orientada pela matriz italiana, entendia
que a busca da liderança de mercado seria fundamental como estratégia de
sobrevivência, e colocou esta meta como a principal, independente de potenciais
efeitos colaterais, inclusive nas margens. A partir de 2001, a empresa torna-se
então, pela primeira vez, a líder em vendas no mercado nacional, com 27,1% de
participação, desbancando a Volkswagen, que mantivera a posição por 42 anos.
Porém, o lucro líquido do grupo reduziu-se de 233,8 milhões de reais em 2000 para
171 milhões de reais.
97
Novamente em 2001, por estar localizada fora de São Bernardo do Campo, a
Fiat não foi afetada por uma greve de cinco dias sofrida pelas principais
concorrentes instaladas em São Paulo. A Volkswagen, por exemplo, relatou perdas
de até 25% da produção mensal de setembro.
Na Fiat intensificava-se o entendimento de que, para continuar a crescer,
seria importante reforçar as práticas de responsabilidade socioambiental. De acordo
com o entrevistado (E2), um dos motivadores era o melhor aproveitamento das
fontes de matéria-prima; outro, a antecipação da empresa a potenciais legislações
ambientais e requisitos governamentais para produção. A partir de 2001, foram
instaladas, na fábrica de Betim, nove estações de tratamento para os efluentes
líquidos gerados nos processos. Com isso, a Fiat conseguiu índices de recirculação
de 99% de toda a água utilizada nos processos industriais. Desde a implantação
completa do complexo até o ano de 2011, o tratamento de efluentes economizou
13,5 bilhões de litros de água, suficiente para abastecer uma cidade com cerca de
180.000 habitantes por um ano. Neste ano, a Fiat tornou-se, pela primeira vez, líder
em vendas no mercado nacional.
Em 2002 a liderança de vendas foi mantida, porém o lucro líquido caiu para
18,8 milhões de reais, mesmo com faturamento de mais de 5 bilhões de reais. A
estratégia da empresa era a redução de conteúdo dos produtos para baixar ao
máximo o custo e o preço dos veículos e manter as vendas mesmo no cenário de
estagnação econômica. Em 2003, empresa manteve a liderança interna, com 25,3%
de participação, porém financeiramente a Fiat Automóveis apresentou prejuízos de
284 milhões de reais. Tal resultado é creditado por muitos executivos da empresa
como reflexo da busca da liderança de vendas a qualquer custo e pela guerra de
preços que tomou conta do mercado nacional, quando os descontos para os clientes
quase dobraram. A empresa estava “pagando para vender”. Mesmo com os
resultados negativos, a Fiat inaugurou o polo de desenvolvimento Giovanni Agnelli,
que viria a englobar três setores: o Centro Estilo, as engenharias de projeto
(eletrônica, carroceria e chassi) e a engenharia experimental.
98
4.8.4 Período IV – uma gestão brasileira e a mudança estratégica (2004 – 2011)
O ano de 2004 foi marcante para a empresa por vários motivos. Além dos
prejuízos locais, globalmente, a matriz da Fiat amargava a maior crise da história,
com grandes perdas nos mercados maduros e dependendo dos resultados dos
mercados emergentes para sobreviver. E foi nesse cenário que, em fevereiro de
2004, Cledorvino Belini tornou-se o primeiro brasileiro a presidir a Fiat Brasil.
Belini, formado em Administração, trabalhava no grupo desde 1973, na Fiat
Tratores, em São Paulo. Entrou para a Fiat Automóveis em 1987, como diretor de
compras, onde ficou até 1997, quando foi transferido para outra empresa da holding.
Assumiu o posto de CEO da Magneti Marelli do Brasil até receber convite para
assumir como CEO da Fiat Brasil.
Alinhado com as mudanças globais da Fiat, Belini iniciou um grande processo
de mudanças estratégicas, que viriam a remodelar e dar um novo rumo para a
empresa. Tanure e Patrus (2011) acreditam que esse momento é o início do maior
turnaround da filial brasileira. O principal foco do novo presidente era que a empresa
precisava voltar a ter crescimento rentável, além de buscar como meta melhor
relação com todos os stakeholders.
E os primeiros stakeholders com quem Belini iria rever a relação seriam os
acionistas. O novo presidente sabia que a curva negativa dos resultados financeiros
precisava mudar de direção ainda naquele ano. O prejuízo de 2003 provou que a
guerra de preços praticada no mercado não estava sendo positiva. A cultura de
busca de liderança a qualquer custo, que era, até então, inquestionável
internamente, precisou ser revista imediatamente. O foco da empresa mudou então
de liderança de vendas para liderança de resultados. E isso influenciaria a relação
com todas as demais partes interessadas.
A nova liderança da empresa também precisou lidar com desgastes e com o
clima de insatisfação de executivos e funcionários. No novo modelo estratégico, a
empresa precisaria rever procedimentos tidos como rígidos em relação aos
colaboradores, reflexos da cultura italiana ainda muito presente na empresa.
Reforçou o sistema de comunicação interna, dando mais velocidade aos processos
de gestão e garantindo que a área de comunicação mantivesse o alinhamento de
toda a corporação sobre as decisões estratégicas.
99
A orientação em relação aos clientes foi melhorar seus produtos, buscando
agregar valor aos carros. Em uma das ações, a empresa estimulou a oferta de kits
em vez da venda de opcionais separados. Essa estratégia gerava economias de até
30% para os clientes nos acessórios e simplificava o processo de produção e venda.
Outro desafio era compatibilizar as inovações, principalmente as novas tecnologias
embarcadas, com o preço, dado que as principais linhas de venda da Fiat eram os
compactos, como o Uno e a família Palio.
As concessionárias ganharam maior canal de diálogo, com o objetivo principal
de serem catequizadas a buscar resultados e não apenas liderança de vendas. Com
isso, reforçava-se o processo de oferta de serviços e produtos com maior valor
agregado.
O relacionamento com os fornecedores também foi estreitado, principalmente
pelo fato de o novo presidente ter sido diretor de compras por seis anos (1987-1993)
e conhecer os principais motivos de insatisfação na relação entre as partes. Mesmo
com um processo ainda mais agressivo de negociação de prazos e redução dos
estoques, a empresa relata que conseguiu transformar fornecedores em parceiros,
ao mostrar que todos ganhariam com o processo de recuperação da firma.
Até 2004, a Fiat não tinha nenhum programa formal de relacionamento com a
comunidade, quando então uma equipe foi designada para dedicar-se
exclusivamente ao tema, iniciando o programa “Árvore da Vida”.
O resultado financeiro do ano de 2004 para a Fiat foi animador. Mesmo a
empresa tendo perdido a liderança de mercado, o faturamento líquido aumentou
31,2% em relação ao ano anterior. O setor automotivo interno cresceu 9,8%, porém
a Fiat só emplacou 2,4% veículos a mais do que em 2003.
Em 2005, a montadora inovou apresentando o primeiro motor 1.0 flex do
Brasil, presente agora no Uno e no Palio. Com isso, aumentou a participação no
principal mercado nacional – o de carros populares. A empresa bate a marca da
indústria automobilística com 2,5 milhões de veículos exportados para mais de 100
países nesse ano, mesmo com as exportações prejudicadas com a valorização do
real ante o dólar. As vendas resultaram em lucro de 511,2 milhões de reais e,
mesmo com o foco da liderança em resultados, a Fiat voltou a ser a líder em vendas
– posto mantido até o momento atual.
O ano de 2006 fica na história da empresa pelos grandes investimentos na
elaboração do primeiro carro-conceito nacional da montadora, o Fiat Concept Car I
100
(FCC I), cujas inovações foram usadas em diversos modelos de linha.
Compartilhando a tendência das outras grandes montadoras, a Fiat desenvolve o
Pálio elétrico, porém sem colocá-lo na linha de produção. Cerca de 20% da
produção total da fábrica foi destinada ao exterior.
Em 2007, pesquisa interna de satisfação mostrou que a empresa precisava
focar nos funcionários, que estavam com alto grau de insatisfação. Foi elaborado um
plano de retenção de talentos e revistos vários procedimentos ortodoxos que ainda
eram fortemente orientados pela cultura da matriz. Comercialmente, a empresa
viveu nesse ano seu melhor momento no Brasil até então, com recorde de produção
e emplacamento. Acompanhando crescimento do PIB de 6,1%, o lucro líquido mais
do que dobrou em relação ao ano anterior. Outros indicadores financeiros
mostravam que a busca por liderança em resultados estava dando certo, como o
Return On Investment (ROI), que cresceu de 29% para 59%, por exemplo. A Fiat foi
considerada novamente a Montadora do Ano e a Melhor Empresa no ranking das
Melhores e Maiores da revista Exame. A empresa lançou também o primeiro motor
tetrafuel do mundo: gasolina brasileira; gasolina pura, usada em países do Mercosul;
álcool hidratado; e Gás Natural Veicular (GNV).
O ano de 2008 será lembrado globalmente como um período de crise e
incertezas, processo desencadeado com a falência de instituições financeiras
internacionais, como o Lehman Brothers. No Brasil, imediatamente após a falência
do banco americano, seguindo o “tsunami financeiro global”, houve retração na
oferta de crédito, e as famílias e empresas postergaram planos de consumo. Um dos
principais setores afetados foi o automobilístico. O setor presenciou queda imediata
de mais de 40% nas vendas; e com isso a Fiat, para evitar um processo de
demissão em massa, preferiu dar férias coletivas até a redução dos estoques.
Como forma de contornar tal cenário, o governo e o BCB elaboraram um
plano com medidas macroeconômicas anticíclicas, dentre elas novas maneiras de
lançar moeda no mercado e estimular o consumo. O governo reduziu a taxa básica
de juros (Selic) e intensificou medidas de oferta de crédito. Com foco na indústria
automotiva, e incentivado pelo lobby do setor, o ministro da economia anunciou forte
redução do IPI na venda de automóveis. A Fiat foi a primeira montadora a conseguir
ajustar os preços ao novo cenário tributário, o que incentivou fortemente as vendas.
Foi listada entre “As empresas que mais respeitam o consumidor no Brasil” pela
101
revista Consumidor Moderno e liderou o ranking de Responsabilidade Social e
Ambiental pela revista Época Negócios.
Em janeiro de 2009, a Fiat cancelou as férias coletivas e retomou o ritmo
normal de produção. Em junho, a Fiat internacional e a Chrysler anunciam uma
grande parceria, que buscava reforçar a consolidação global e melhorar custos com
escala, algo imprescindível no setor automotivo. A Fiat, que inicialmente adquiriu
20% das ações da montadora americana, teria o direito de aumentar a participação
ao longo dos próximos anos. Um dos objetivos da empresa era diversificar o
portfólio, incluindo a fabricação de veículos SUVs (utilitários esportivos) com o logo
da Fiat. O ano também foi de inovação no Brasil, com o portal do carro MIO – o
primeiro conceito de criação coletiva mundial, plataforma aberta que utiliza licenças
do Creative Commons. Entre agosto de 2009 e outubro de 2010, mais de 2 milhões
de pessoas de 160 países visitaram o portal e sugeriram como seria o “carro ideal”.
Com a redução do IPI vigorando até outubro, o setor bateu todos os recordes, com
quase 3 milhões de veículos fabricados. A Fiat liderou novamente o mercado
interno, comercializando 736.000 unidades. A redução do IPI foi sendo
gradativamente reduzida pelo governo entre novembro de 2009 até abril de 2010.
Em 2011, a Fiat consolidou a participação acionária na Chrysler e lançou no
Brasil o primeiro SUV, o Fiat Freemont. O carro é quase uma réplica do antigo
modelo Dodge Journey da Chrysler, porém com preço mais acessível. Essa está
sendo uma aposta da montadora em um segmento Premium, em expansão no país.
Contudo, o principal foco da Fiat está nos carros desenvolvidos de acordo
com as peculiaridades do mercado interno. Atualmente o Brasil consegue ser quase
independente em todo o processo de desenvolvimento de um projeto, com exceção
dos testes de batidas (crash tests), que ainda é preciso fazer na Itália. O polo de
desenvolvimento Giovanni Agnelli, em Betim (MG), já soma mais de 1 bilhão de reais
em investimentos desde a criação. Isso vem possibilitando inovações e criação de
novos veículos, além de pesquisas para soluções de problemas técnicos. O Centro
Estilo, por exemplo, agora permite aos engenheiros a visualização detalhada de
novos modelos sem a necessidade da fabricação de protótipos, o que gera grande
redução de custos e velocidade no lançamento de novos modelos.
Os investimentos saltaram de 170 milhões de reais em 2004 para 1,48 bilhão
de reais em 2008 e 1,3 bilhão de reais em 2009. Até 2014 estão previstos
investimentos no Brasil na ordem de 10 bilhões de reais, sendo 7 bilhões de reais no
102
aumento da capacidade da fábrica de Minas Gerais, onde a previsão é aumentar a
atual capacidade de 800.000 por ano para 950.000 unidades.
Os outros 3 bilhões de reais serão investidos na construção da nova fábrica
em Pernambuco, cuja decisão foi influenciada pelos incentivos tributários ofertados
pelo governo local, além do que estará localizada ao lado de um gigantesco
empreendimento, o Complexo Industrial de Suape. A nova planta da montadora,
prevista para começar a operar em 2014, terá capacidade para produzir até 200.000
veículos por ano.
103
5 ANÁLISE
Neste capítulo são analisadas as respostas da Fiat em relação aos dois
desafios de Fleck (2009) detalhados no capítulo de revisão de literatura
(empreendedorismo e navegação no ambiente) que, conforme já pontuado, estão
associados com os pilares “liderança” e “ambiente” da visão global da formação
estratégica de Mintzberg et al (2000).
Dado o foco do trabalho - a busca de evidências para tentar entender como
uma empresa desafiante (challenger) consegue migrar para a posição de liderança
de uma indústria - examinar o desafio de empreender fez-se necessário
principalmente por estar ligado à criação de valor e a visão de “opções estratégicas”
dos gestores (Mintzberg et al, 2000), além da descrição da “mão visível” do
empreendedor, de Chandler (1990). O desafio da navegação, por sua vez, está
relacionado à captura de valor, com o do uso das “respostas estratégicas” de Oliver
(1991) e é adverso ao pensamento “determinístico” da escola ambiental.
5.1 Desafio do empreendedorismo
O desafio do empreendedorismo consiste em prover, de forma contínua, o
processo de expansão e busca de oportunidades de forma regular e lucrativa. Está
relacionado com o processo de criação de valor e de gestão de riscos que venham a
impossibilitar tal crescimento (FLECK, 2009; LEPAK, SMITH, TAYLOR, 2007;
PENROSE, 1980).
No histórico da montadora Fiat no Brasil, diversas evidências sugerem que a
companhia tende a responder a esse desafio de forma consistente. Os fatos
apontam que, em quase toda a trajetória, existiram esforços de expansão e criação
de valor por parte da empresa, principalmente a partir de metas de incremento na
participação de mercado e pelo constante lançamento de produtos com
características inovadoras. Ademais, a postura ativa em relação à responsabilidade
socioambiental, principalmente nos períodos mais recentes, além de tender a
auxiliar no processo de criação de valor para a companhia, permite mitigação de
riscos pela firma.
104
Infere-se que o perfil motivacional para essa característica empreendedora da
Fiat, principalmente ao tomar a decisão de crescer e se instalar no Brasil, se encaixe
no perfil híbrido (FLECK, 2009). Ao mesmo tempo em que a organização buscava
defender-se das incertezas de mercados mais maduros onde se encontrava, tinha
necessidade de expandir as capacidades produtivas, para ter ganhos operacionais
de escala e escopo. Paralelamente, havia grande conhecimento acumulado, e uma
folga (slack) sobretudo no que se refere à experiência e capacidade gerencial, que
poderiam ser transferíveis para novos mercados, como a vinda de executivos e
engenheiros para o Brasil, dando assim evidências da possibilidade de analisar esse
movimento de expansão também pela estrutura do motor do crescimento
contínuo (Figura 2.2) (FLECK, 2009; PENROSE, 1980; CHANDLER, 1977).
5.1.1 Criação de Valor
Desde a entrada, a empresa buscou criar valor a partir da oferta de produtos
com inovações e preços competitivos, além de constante revisão dos seus
processos produtivos (LEPAK, SMITH, TAYLOR, 2007). Conforme visto no Capítulo
4, e sintetizado no Quadro 5.1, raro foi o ano em que a Fiat não apresentou uma
novidade a partir de seus produtos. Desde o primeiro carro a álcool; do primeiro
computador de bordo em veículos nacionais; do carro de 1.000 cm3 (que, por sinal,
foi o responsável por a Fiat quadruplicar sua participação no mercado no início da
década de 1990); do conceito de esportividade em automóveis compactos; a
explorar o nicho de pick-ups urbanas; ao atual FCC-II, a Fiat constantemente buscou
embarcar inovações que gerassem uma percepção de melhor custo-benefício nos
clientes. Desde o fim da década de 1990, se tornou a montadora mais ativa em
lançamentos. Esses fatores foram fundamentais para a empresa destronar, em
2001, a Volkswagen do posto de líder de mercado que esta manteve por 42 anos.
105
Quadro 5.1 – Evidências de inovações em produtos introduzidas pela Fiat no Brasil
Fonte: adaptado de Livro comemorativo dos trinta anos da Fiat no Brasil (FIAT 2012); REVISTAS AUTO ESPORTE e QUATRO RODAS
Essa constante busca por inovação é evidenciada em diversos discursos do
atual presidente da empresa e nas entrevistas realizadas com os funcionários
durante o processo de pesquisa.
Inovação é uma peça-chave no mundo empresarial, hoje mais do que nunca. Há dois grupos de empresas: as que inovam sempre e as que seguem as inovações dos concorrentes. As empresas que estão na liderança, que alcançam os melhores resultados e têm os melhores índices de satisfação de seus clientes são exatamente as mais inovadoras (trechos de entrevistas do presidente Belini, extraídos do livro de Tanure e Patrus, 2011, p. 71). (...) espera-se muito isso da Fiat na parte de inovação, sempre espera-se que a Fiat saia na frente com coisas inovadoras e acessíveis. Tem sido assim na história. Acho que grande parte do nosso sucesso também está nisso (E9).
O futuro vai chegar e alguém vai chegar com novidades, e não podemos deitar e ficar esperando o tempo passar e achar que, fazendo a mesma coisa, a gente vai ter sempre o mesmo resultado. Não vai ser assim. Eu
ANO MODELO INOVAÇÕES NO MERCADO BRASILEIRO
1976 147Posicionamento transversal dianteiro do motor; Coluna de direção
articulada; Pneu radial de Série1979 147 Motor a Alcool
1980 Fiorino Furgão Menor caminhão do mundo
1984 Uno Novo Conceito em Design
1985 Uno SX / Prêmio CS Computador de Bordo
1990 Uno Mille Motor 1.000 cm3
1991 Tempra Novos patamares de índices de emissão de gases poluentes
1992 Mille Eletronic Primeiro veículo Segmento "A" com versão 4 portas
1993 Tempra 16V 4 válvulas por cilindro
1994 Uno Turbo e Tempra Turbo Motor Turbo
1994 MilleSistema de pedidos "on line" nas concessionárias, para compra com
preço de fábrica1994 Mille Popular com ar-condicionado
1996 Tipo Air bag
1996 Palio Primeiro Carro Global Nacional
1996 Família PalioPrimeiro conjunto de "Família Completa" (Palio, Palio Weekend, Siena
e pick-up Strada)1996 Programa Autonomy Carros preparados de fábrica para pessoas com deficiências fisicas
1996 Palio Primeiro 1.0 com air bag e freio ABS
1999 Brava Primeiro carro brasileiro a ser comercializado pela internet
1999 Linha Adventure primeira a trazer características off-road para carros menores
1999 Marea Air Bag Lateral (Side bag)
1999 Palio Citymatic Primeiro popular com embreagem eletrônica
2000 Palio Motor Fire by Wire
2001 Doblô Primeira Multivan do Mercado
2005 Uno e Pálio Primeiro motor 1.0 Flex
2005 Idea Teto Solar SkyDome
2006 Palio Elétrico (Protótipo) Motor Elétrico
2007 Siena Tetrafuel Primeiro veículo do mundo a rodar com 4 combustíveis
2008 Uno Mille Econômetro
2009 500 Eco Drive
2009 Fiat Concept Car (FCC II) Primeiro conceito de criação coletiva mundial
PRINCIPAIS INOVAÇÕES INTRODUZIDAS PELA FIAT
106
acho que a direção da nossa empresa tem isso muito claro na cabeça. Eu acho que isso é o segredo nosso: a gente fica o tempo todo pensando em o que fazer de diferente. (...) Aqui você pode ir em qualquer área, está todo mundo [pensando] “o que eu posso fazer de novo?” (...) Dificilmente você vê a Fiat parada, esperando alguma coisa acontecer (...) E, outra coisa, não pensamos só lá fora, não, pensamos muito aqui. O que a gente pode fazer para melhorar nossos processos, nossos sistemas, todos os dias (E2). (...) a gente é líder. A Fiat é líder nos últimos nove anos no mercado. Então a gente tem um share médio desses nove anos de 26,24% (...) eu falei no início que a Fiat foi a quarta marca aqui no Brasil, hoje nós temos em média 42 marcas no nosso mercado. E a gente conseguiu fazer um share em nove anos médio de 24%, quer dizer, isso é uma coisa muito diferente, a gente fica tentando através de pesquisas explicar isso, a gente não consegue muito entender o que faz a Fiat fazer isso, e a gente consegue, com os nove anos, ser líder desse mercado. Então mais ou menos hoje a Fiat, a cada quatro carros que vende no Brasil, um é da Fiat. Então um quarto dos carros vendidos no ano passado no Brasil praticamente foram da Fiat. Então, assim, é uma coisa muito poderosa, não sei se tem muita explicação. Então eu acho que uma das explicações é essa vontade que a Fiat tem, essa coisa da gente nunca querer fazer a mesma coisa, sempre inovar... (E10).
O atual polo de pesquisa e desenvolvimento, inaugurado em 2003, com
investimentos iniciais de 400 milhões de reais, permite que a empresa elabore
regionalmente novos projetos desde as etapas básicas até a construção de
protótipos completos. A sala virtual é um dos destaques do centro de
desenvolvimento. Com telão de 5,5 metros por 2,7 metros, é possível a visualização
em 3D dos novos modelos, com possibilidade de testes de componentes, cores e
versões em imagens que fazem as imagens de computadores parecerem reais.
Todo esse investimento, aliado com os bons resultados financeiros,
permitiram que hoje a Fiat do Brasil tenha maior autonomia em relação à matriz. A
partir da metade da década de 2000, empresa adotou a estratégia de local
responsiveness (SCHLIE; YIP, 2000), ou seja, a filial brasileira passou a poder
fazer ajustes em seus produtos, serviços e formas de condução dos negócios a nível
local, levando em consideração a cultura nacional e as necessidades do consumidor
brasileiro, passando a ser a montadora com a gama de automóveis mais adequada
ao mercado nacional.
Além disso, a gente tem um centro de pesquisa e desenvolvimento que fica em Betim. Para vocês terem uma ideia, a gente sempre fala aproximadamente 800 engenheiros, porque cada dia tem vaga nova para a gente, mas a gente tem hoje um número muito grande de pesquisadores dentro de Betim, que inclusive é quem construiu aí junto com o designer, que faz parte do nosso DNA, os projetos 100% desenvolvidos hoje no
107
Brasil, como é o caso do Novo Uno. Então é uma criação brasileira nossa, do nosso centro de pesquisa e de todas as áreas (E10). Essa questão da personalização, inovação tecnológica que a gente trouxe para o carro (Novo Uno), que dentro do segmento dele hoje pouquíssimos têm, principalmente no Brasil. Acho que tudo isso valorizou mais e o cliente percebe, essa preocupação que a gente tem em apresentar um produto que seja de acordo com o que ele quer. (E3).
Com o primeiro carro-conceito de criação coletiva mundial, o modelo Mio, de
2009, a Fiat Brasil trouxe para o setor automobilístico mundial a experiência do
Creative Commons. Com mais de dois milhões de acessos de visitantes de mais de
160 países, a partir de um portal e com o uso de redes sociais, a Fiat buscou
entender como será o carro do futuro a partir das expectativas dos clientes. Esse
movimento não só colocou o Brasil na vanguarda do setor, mas agregou valor para a
marca, reforçando o posicionamento de empresa inovadora, atraindo muita mídia
espontânea. Essa característica da Fiat do Brasil de buscar entender o
comportamento e quais são os anseios dos consumidores, a partir de grandes
investimentos em sua área de pesquisa e de outras parcerias, como com a Cátedra
Fiat/Coppead, permite que a empresa, no Brasil, posicione sua marca como se fosse
uma “empresa regional”, conseguindo atender atualmente os mais diversos nichos
de consumidores brasileiros, porém mantendo vantagens de ser uma “empresa
global”, principalmente ao compartilhar tecnologias e conhecimento com o resto do
grupo Fiat.
Outra ação de busca de criação de valor foi através de parcerias (joint
ventures) com outras montadoras. Contudo, os resultados para a Fiat Brasil das
parcerias globais da matriz italiana com a GM (2000) e com a Chrysler (2009)
merecem análise independente, pois tiveram desfecho oposto. A primeira buscou
criar valor internamente para a empresa a partir de ganhos operacionais,
principalmente na fabricação de motores, além de criar uma defesa de mercado e
um suporte financeiro num momento de crise – surgiu assim a Worldwide
Purchasing.
Evidências apontam que no início dessa parceria, foi criado um perigoso
clima de inseguranças entre os funcionários da Fiat Brasil. De acordo com o
entrevistado E10, em reunião no escritório da GM, um executivo apresentou um
organograma da companhia americana em que aparecia a Fiat como empresa
subordinada, e não parceira. Outro entrevistado (E4) afirmou que, durante alguns
108
meses, muito esforço foi desperdiçado na Fiat em campanhas de conscientização
sobre a parceria. Esse cenário era mais reflexo da fragilidade financeira da matriz do
que da filial brasileira. Porém, esse movimento estratégico possibilitou ganhos
operacionais para as duas empresas já no primeiro ano. Um fato que ajudou a
melhorar o clima interno é que, no mesmo ano, a Fiat conseguiu alcançar algo que
buscava por mais de uma década: tornar-se a líder de vendas no país.
A aquisição de ações da Chrysler, em 2009, tinha como foco redução de
custos globais de produção e ganhos de escala (CHANDLER, 1977). E também
buscava gerar valor para a marca com a diversificação do portfólio e maior
participação no mercado americano. Com o uso de plataformas e tecnologia da
Chrysler, pela primeira vez no Brasil a Fiat entraria no crescente segmento de SUVs,
onde a margem de lucro tende a ser maior, com o modelo Freemount. De acordo
com o entrevistado E7, a Fiat Brasil acredita que o movimento estratégico de
penetração nesse nicho trouxe forte ganho de imagem para todas as linhas da
empresa. Diferente da parceria com a GM, encerrada em 2005, a Fiat, que possuía
20% das ações da Chrysler, aumentou a participação para 55,8% em 2011 e, de
acordo com dados financeiros de 2011 da matriz, tal parceria tem possibilitado
resultado acima do esperado. Junto com os resultados do Brasil, o lucro do mercado
americano tem mantido as contas da matriz “no azul”, combatendo o atual cenário
de estagnação do mercado europeu.
A mudança do foco estratégico de liderança de vendas para liderança de
resultados, em 2004, possibilitou a criação de valor tanto por reverter os resultados
financeiros da empresa4, quanto por ter sido um fato gerador de grande mudança na
cultura interna. Todos os departamentos da empresa começaram a tomar decisões
ponderando o resultado financeiro, e não apenas o volume de vendas, como era
feito por muitos anos. É importante salientar que, apesar da nova postura
estratégica, a firma manteve a liderança de vendas em todos os demais anos (até o
momento desta pesquisa), exceto 2004.
Quando assumi a presidência da Fiat Automóveis, em 2004, a cultura da empresa era totalmente orientada para a liderança de mercado. Isso estava no sangue. Mas esse direcionamento estratégico estava errado naquele momento. Deixamos de almejar a obtenção dessa liderança a qualquer custo e passamos a buscar a liderança de resultados empresariais.
4 Após a mudança estratégica, o retorno sobre o Investimento (ROI) cresceu do patamar de 29% para 59% no mesmo ano.
109
Queríamos ser a empresa do setor com a melhor imagem interna e externa. Com o melhor atendimento aos clientes, a melhor equação de giro de capital, o melhor resultado econômico, o melhor retorno do investimento e a melhor geração de caixa para poder investir em novos produtos, novas tecnologias e novos processos. Queríamos ter o melhor relacionamento com todos os stakeholders. (...) Ser líder de mercado era a palavra de ordem, o norte que a empresa tinha. Qualquer pensamento ou ação da empresa tinha o objetivo de vender. Havia, sim, uma cultura de qualidade e redução de custos, mas não se dava prioridade à rentabilidade e à cultura dos stakeholders (trechos de entrevistas do presidente Belini, extraídos do livro de Tanure e Patrus, 2011, p. 36). (...) não dá para a gente fazer as coisas mais do mesmo jeito, querendo ter resultados diferentes (E6).
5.1.2 Serviços empreendedores
As evidências de características empreendedoras (MINTZBERG et al, 2000;
CHANDLER, 1990) desde processo de decisão de entrada da Fiat no Brasil
permitem uma análise desses fatos à luz do referencial teórico de Penrose (1980),
no que a autora denominou de “serviços empreendedores”. Na década de 1970,
movida pela ambição de seu corpo diretor, a empresa buscou ampliar suas
oportunidades em novos mercados. Apesar de exibir importante atuação na Europa,
o mercado sul-americano era completamente desconhecido para a montadora
italiana. A Fiat mostrou versatilidade ao buscar caminhos não convencionais (ou
“receitas de bolo”) e, perante as restrições de mercado, aceitou não instalar a planta
na área de São Paulo, aceitando a parceria com o governo de Minas Gerais – o que
acabou sendo a opção mais viável naquele momento. Nesse processo de expansão,
a Fiat conseguiu acesso a recursos de diversas instâncias governamentais, dando
como garantia a criação de empregos e desenvolvendo uma região então rural. Por
fim, também mostrou capacidade de julgamento e tomada de decisão, pois, após
coletar dados de diversas fontes e stakeholders, soube ponderar os riscos e evitou
decisões perigosas, como entrar em conflito com os demais concorrentes em São
Paulo. De acordo com um executivo da empresa entrevistado para a pesquisa:
(...) existiam três grandes montadoras em São Paulo, e a Fiat veio em 1976 aqui pra Betim. Essa decisão, já desde a origem da empresa, deixou marcas muito claras de qual seria o caminho que a Fiat ia trilhar no mercado. Então, ela se distancia muito do ponto de vista de comportamento das outras três companhias desde essa origem, trilhando um caminho que seja próprio, não seja do mercado, ou seja, do ponto de vista de desenvolvimento da própria companhia internamente (E10).
110
Assim, é provável que tenha acontecido o que Stinchcombe (1965 apud
ROMANELLI, 1991) denominou de “environmental imprinting”. Tanto pelas
dificuldades ambientais que tiveram que ser superadas quanto pela necessidade de
exercer ativamente estes serviços empreendedores pelos gestores da firma, que
precisaram ser inovativos e mantiveram tal característica “impressa” na organização.
A empresa manteve durante sua trajetória fortes traços de ambição e
capacidade de julgamento e tomada de decisão (PENROSE, 1980). Além da
reformulação dos processos produtivos ainda na década de 1980, uma das mais
importantes e ambiciosas decisões da empresa na década de 1990 foi o Projeto J.
Este projeto desverticalizou o processo produtivo, concentrou as compras em um
número menor de fornecedores e impulsionou a migração e criação de diversas
empresas no polo industrial de Betim, no entorno da fábrica da Fiat.
A Fiat foi uma das primeiras montadoras brasileiras a utilizar o modelo just-in-
time, ganhando competitividade com expressiva redução de custos. O fato de
comprar peças em São Paulo, transporta-las para produzir os veículos em Minas
Gerais, para voltar a vender principalmente para o sul e sudeste geravam gastos
com logística bem acima das concorrentes instaladas no ABC Paulista, mais
próximos dos grandes centros consumidores.
Em outra arriscada aposta, a Fiat diminuiu o número de fornecedores de 600
para 180, minimizando a complexidade do setor de compras, mas que por outro lado
potencializava riscos de fornecimento.
Analisada a posteriori como estratégia bem-sucedida pelos executivos da
empresa, que alegam que, além dos ganhos financeiros no processo,
compartilhados com os fornecedores, também melhorou a relação de parceria e
confiança com esses importantes stakeholders.
Diziam que eu era louco de fazer isso, porque o sistema de abastecimento no Brasil não era confiável. Mas seguimos em frente e fomos criando com os fornecedores o compromisso de alavancar a produção da Fiat. Simultaneamente, nossa participação de mercado começou a crescer. (...) Uma das causas de sucesso da mineirização foi o fato de os fornecedores crescerem com a parceria. A Fiat aumentou a participação no mercado. Os fornecedores, portanto, passaram a vender mais (trechos de entrevistas do presidente Belini, extraídos do livro de Tanure e Patrus, 2011, p. 100; 103).
Permitindo que cerca de 70% das compras sejam feitas hoje em Minas
Gerais, a estratégia de mineirização também liberou espaço físico e propiciou a
111
expansão de novas linhas de montagem, aumentando a capacidade produtiva da
planta de Betim (MG), que atualmente já é a maior no mundo em capacidade
produtiva. Percebemos aqui a existência de um mecanismo de “ignição” do motor
de crescimento contínuo (FLECK, 2003), onde a folga (slack) física criada
incentivou o processo de expansão e, assim, gerando mais valor para a empresa a
partir da oportunidade do ganho de escala (PENROSE, 1980; CHANDLER, 1977) e
possibilitando a tomada da posição de liderança do setor.
Outra característica presente durante toda a jornada da Fiat Brasil é sua
distinta capacidade de obter acesso a recursos, principalmente com fontes
governamentais, como o BNDES. Desde o exemplo da década de 1970, onde quase
90% dos investimentos do setor eram relacionados a Fiat, ao mais recente regime
automotivo, do final da década de 2010, que visou estimular a criação e ampliação
de fábricas no Brasil. Apesar das principais concorrentes da Fiat terem anunciado
grandes projetos, dentre elas a Volks, que prometeu investimentos de 6,2 bilhões de
reais entre 2009 e 2014; a Ford, com 4,5 bilhões de reais entre 2010 e 2015; a GM,
com 5 bilhões de reais entre 2008 e 2012; a Toyota, com 600 milhões de reais entre
2010 e 2012; e a nova entrante, a JAC Motors, também de 600 milhões de reais
entre 2011 e 2014, para citar algumas; o maior investimento será, novamente da
Fiat, com mais de 10 bilhões de reais entre 2010 e 2014.
Dos investimentos anunciados pela montadora, 7 bilhões de reais estão
sendo destinados à ampliação e melhorias da fábrica de Minas Gerais, onde a
empresa poderá produzir anualmente 950.000 veículos em Betim, 150.000 a mais
que atualmente, e outros 3 bilhões de reais para a nova planta de Pernambuco, dos
quais 2,1 bilhões serão custeados com empréstimos de órgãos públicos.
No novo polo automotivo de Goiana, na Zona da Mata, norte do Estado de
Pernambuco, a Fiat deverá produzir 200.000 veículos por ano e empregar 7.000
pessoas durante as obras, gerando, depois de pronta, 4.500 postos de trabalho
permanentes na região. As primeiras contratações foram em dezembro de 2011, que
contou com grande cerimônia e a presença dos executivos da Fiat, importantes
políticos, além de toda a mídia especializada.
Conforme visto, repetindo o cenário do período da entrada no Brasil, mesmo
com muitos outros players no mercado, atualmente a Fiat continua sendo a empresa
que mais investe no setor automotivo nacional. Os resultados desses investimentos
são lucros que, parcialmente enviados para a matriz italiana, estão sendo capazes
112
de reverter constantes resultados negativos em outros países. Esse fluxo financeiro
positivo vem gerado constantes elogios do presidente mundial, Sergio Marchionne,
aos executivos brasileiros. Um reflexo desses investimentos é a consolidação da
Fiat, nos últimos dez anos, como líder de mercado, principalmente pelo volume de
venda do carros populares. Apenas como referência, a fábrica em Betim (MG)
produz atualmente5 três veículos por minuto, dentre quinze modelos em mais de
cinquenta versões. Para o presidente da empresa é fundamental manter esse
processo de crescimento para potencializar os ganhos com escala (CHANDLER,
1977).
Contudo, é importante ressaltar que todo esse processo de crescimento da
montadora, principalmente nos últimos vinte anos, não acompanhou na mesma
proporção a demanda do mercado nacional, conforme se pode acompanhar nos
Gráficos 5.1 e 5.2, fato que pode ser usado como alerta ou um novo incentivo para
seus executivos.
Gráfico 5.1 – Quantidade de veículos vendidos pela Fiat no Brasil x total de veículos vendidos no Brasil (1976-2010)
Fonte: ANFAVEA (2011)
5 Dados do primeiro semestre de 2012
0
500.000
1.000.000
1.500.000
2.000.000
2.500.000
3.000.000
3.500.000
FIAT
VEÍCULOS NOVOS VENDIDOSNO BRASIL
113
Gráfico 5.2 – Representatividade da Fiat nas vendas de veículos e comerciais leves no Brasil
(1976-2010)
Fonte: ANFAVEA (2011)
Finalizando o uso do referencial teórico de Penrose (1980) e seus serviços
empreendedores, é possível afirmar que a característica de ambição se manteve
constantemente presente na Fiat. Estar no “topo do pódio” e ser líder de vendas
nortearam as ações da empresa durante toda a década de 1990 até meados dos
anos 2000. A mesma ambição que, na gestão de Belini, a partir de 2004, buscou
conciliar crescimento com lucratividade, podendo entregar resultados para os
acionistas e gerar valor para empresa.
A versatilidade da empresa foi reforçada pela constante orientação à
inovação, lançamento de novas linhas de produtos adaptadas para o mercado
nacional e penetração em diversos segmentos. Os problemas de imagem e
aceitação dos produtos nos primeiros anos de atuação no Brasil, e a forma pela qual
a empresa revisou os processos e os produtos para responder a este desafio,
constituem exemplo de como a empresa pôde reverter grandes falhas. O processo
de criação compartilhada, com o MIO (FCC-II), é forte evidência de que a empresa
acredita no versátil processo participativo na criação dos futuros modelos. Aliada a
versatilidade, a Fiat também atesta a capacidade de julgamento e tomada de
decisão com rapidez para responder a novos cenários e pressões do mercado.
Como evidência, a palavra “agilidade” foi a característica da firma mais citada por
todos os entrevistados, conforme o exemplo:
0,00%
5,00%
10,00%
15,00%
20,00%
25,00%
30,00%
35,00%
1976 1979 1982 1985 1988 1991 1994 1997 2000 2003 2006 2009
% Fiat
114
Eu acredito que o nosso grande diferencial é agilidade. A agilidade e a capacidade da gente de atender aos requisitos do cliente, seja por aspectos inovativos, por aspectos mercadológicos, por preço, por posicionamento, seja por agilidade, por produtos inovadores, com design, eu acho que é uma somatória de fatores, mas eu acho que o principal fator nosso é agilidade. Essa agilidade nossa no mercado (E7). Eu acho que esse é o segredo nosso: a gente fica o tempo todo pensando em o que fazer de diferente... dificilmente você vê a Fiat parada, esperando alguma coisa acontecer (E2).
5.1.3 Responsabilidade socioambiental como geração de valor
Apesar de o tema e as principais evidências sobre responsabilidade
socioambiental serem analisadas junto com o desafio de navegação no ambiente
dinâmico (FLECK, 2009), é preciso registrar que as ações de responsabilidade
socioambiental também ajudam no processo de criação de valor para a empresa
principalmente no que se refere à gestão de riscos; por servir como estímulo a
inovação; por possibilitarem acesso a fontes especiais de recursos; dentre outros
benefícios colhidos pela Fiat nos últimos anos.
A percepção da importância do tema Rasc tem feito a empresa investir em
tecnologias e a colocou num trilho de constante busca por inovações em produtos e
processos mais sustentáveis (SENGE; SMITH; KRUSCHWITZ, 2008).
Exemplificando, serão listadas algumas evidências da história recente da Fiat,
facilmente associadas com os principais benefícios de Rasc listados por Nidumolu,
Prahalad e Rangaswami (2009) e Lemme (2010), tais como:
• eficiência na utilização de materiais e redução dos custos operacionais e
impactos ambientais ao longo de toda a cadeia produtiva: com o desenho
ecológico de produtos, tais como o Uno Ecology, e os índices de reciclagem
da Ilha Ecológica. Além dos ganhos financeiros, a firma tem melhorado a sua
reputação.
• a Fiat já é reconhecida pela mídia especializada pela diferenciação com
produtos atrelados à rotulagem ambiental e baixo consumo de combustível.
Tanto consumidores ambientalmente conscientes ou os que simplesmente
buscam veículos mais econômicos são atraídos por esses tipos de produtos.
115
• em termos de gerenciamento de riscos operacionais, a Fiat é pioneira em
certificações como ISO 14.001 e por adotar padrões europeus de emissão
desde a década de 1990. Ao se antecipar a futuras legislações ambientais
mais severas, a empresa também gerencia riscos operacionais ou outros
fatos que poderiam representar multas.
• na área de recursos humanos, os projetos de capacitação de moradores de
áreas carentes, no entorno da fábrica, são mais que um retorno para a
sociedade, são garantia de mão de obra no futuro.
• quanto ao acesso a fontes preferenciais de financiamentos, nos últimos três
anos a Fiat S.p.A. foi reconhecida tanto pela Dow Jones Sustainability World
(DJSI) quanto pela Dow Jones Sustainability Europe como referência no setor
automotivo (best-in-class), fato que, de acordo com executivos entrevistados,
vem favorecendo a empresa na hora de obter recursos mesmo em momentos
de instabilidade internacional.
Para sintetizar os fatos e dados sobre inovações introduzidas pela Fiat no
mercado nacional, além dos principais marcos da empresa, foram elaborados mapas
visuais cronológicos para cada uma das três fases da Fiat após a abertura da sua
fábrica, em 1976.
116
Figura 5.1 – Mapa visual dos principais marcos e inovações do “segundo período” da Fiat Brasil
117
Figura 5.2 – Mapa visual dos principais marcos e inovações do “terceiro período” da Fiat Brasil
118
Figura 5.3 – Mapa visual dos principais marcos e inovações do “quarto período” da Fiat Brasil
119
5.2 Desafio de navegação no ambiente dinâmico
Conforme visto no Capítulo 2, o desafio de navegação no ambiente dinâmico
está relacionado tanto ao processo de monitoramento contínuo do ambiente quanto
ao uso das devidas respostas estratégicas para garantir legitimidade organizacional
e a captura de valor (FLECK, 2009).
Recapitulando o que foi explicado no capítulo de métodos, a análise sobre o
desafio de navegação no ambiente utilizou o framework de Fleck (in print) (Quadro
2.2) para tentar caracterizar as perspectivas das condições de desenvolvimento para
a Fiat, de acordo com as categorizações dos ambientes pela sociologia
organizacional.
Inicialmente, utilizou-se a estratégia de “temporal bracketing”, ou seja, de
periodização (LANGLEY, 2007). Assim foi possível entender, a partir das evidências,
como as forças de mercado e de “não mercado” (BARON, 1995) pressionavam a
empresa em cada período estudado, e se a empresa respondia a tais pressões de
forma passiva, apenas se adaptando, ou de forma mais ativa, buscando moldar o
ambiente.
Em seguida, uma nova perspectiva é apresentada. Dessa vez, sintetizando a
análise com o apoio didático de mapas visuais, com o intuito de possibilitar ao leitor
compreender, a partir de representações gráficas, o “movimento” feito pela Fiat em
cada tipo de ambiente (de negócios, institucional e natural). Tal síntese buscou,
sempre que possível, comparar o trajeto percorrido pela Fiat com outras empresas
do setor automotivo, com o intuito de embasar a resposta e conclusão deste estudo.
O objetivo dessa estratégia de análise é tentar interpretar o processo de
transição ambiental da Fiat bem como determinar quais foram seus padrões de
resposta aos principais desafios e pressões dos ambientes. De forma geral, as
evidências sugerem que, mais do que se adequar ao ambiente, a Fiat pôde por
diversas vezes capturar valor moldando tanto o ambiente institucional quanto o de
mercado, como, por exemplo, ao atuar ativamente influenciando no processo de
formulação de leis e regulações. Os fatos mais recentes demonstram que o novo
modelo de gestão dos stakeholders da Fiat vem possibilitando a firma manter sua
legitimidade – desde as interações com acionistas, governo, demais atores da
indústria automotiva, funcionários, sociedade e meio ambiente.
120
5.2.1 Período I – da decisão da entrada no Brasil à construção da fábrica (1970
a 1976)
Quadro 5.2 – Análise das forças do ambiente da primeira fase da Fiat Brasil
A Fiat decide, no fim da década de 1960, em meio ao aumento da
concorrência na Europa, buscar oportunidades de entrada em grandes mercados
ainda pouco explorados, mesmo que para isso tivesse de se submeter a um alto
grau de risco (PENROSE, 1980). Ao praticar o monitoramento do mercado
(scanning), a empresa percebeu no Brasil forte potencial de ganhos futuros para a
indústria automotiva. Era um país com baixa concorrência e com restrições de
importações de veículos. Os investimentos em infraestrutura possibilitavam o
crescimento do sistema rodoviário brasileiro. Aliada a isso, a política de incentivos
de créditos dados pelo governo e a grande demanda reprimida por automóveis
permitiram que a indústria automotiva crescesse a taxas de mais de 20% ao ano. O
Brasil estava no auge do “milagre econômico”, e a Fiat acreditou nessa
oportunidade.
A fazer uma análise do ambiente brasileiro, a empresa percebe que os
desafios institucionais eram, principalmente, uma potencial barreira de entrada
(PORTER, 1980), em razão do lobby feito pelas três principais montadoras aqui
instaladas. A Ford, a GM e a Volkswagen usavam todos os meios possíveis para
tentar evitar a vinda de mais uma grande concorrente para o Brasil. O receio da Fiat
era uma possível retaliação no ambiente de negócios, principalmente com ameaças
aos fornecedores de peças que dependiam do trio instalado em São Paulo. Os
Ambiente Piedoso
Ambiente Desafiador
Ambiente Inóspito
Ambiente de
Negócio
Ambiente
Institucional
Ambiente
Natural
121
riscos seriam maiores principalmente caso a Fiat decidisse instalar-se no polo
automotivo de São Paulo.
Como é uma área onde o governo federal possuía grande poder, a Fiat
responde a este desafio do ambiente institucional, então inóspito para uma nova
montadora, usando a tática de manipulação por influência (OLIVER, 1991), com
aproximação de seus executivos ao governo militar e alguns outros setores políticos,
buscando acelerar o processo de aprovação da criação da fábrica no Brasil.
Porém, mesmo conseguindo aprovação para entrar no país, por pressão das
demais concorrentes já instaladas, a empresa não teve acesso à região paulista do
ABC – os municípios de Santo André, São Bernardo e São Caetano –, centro de
toda a indústria automotiva nacional. Com acordo costurado com auxílio de
membros do governo, as demais montadoras aceitaram a implantação da fábrica da
Fiat no Brasil, mas impuseram uma restrição: a empresa deveria instalar-se no
mínimo a 500 quilômetros desse epicentro industrial.
Na época, o governo de Minas Gerais, com o objetivo de desenvolver a região
metropolitana de Belo Horizonte e industrializar a região de Betim, estava disposto a
prover fortes incentivos (oferecendo o terreno e isenção de impostos) e ajudar
grandes empresas a se instalar em seu território, assim como fez com a Refinaria
Gabriel Passos (Regap), da Petrobrás, no fim da década de 1950.
A empresa sabia que o processo logístico de construção da fábrica, em uma
área com mão de obra basicamente rural e longe dos principais centros
consumidores, seria outro relevante desafio do ambiente de negócios a ser
superado. Com o uso de táticas de aceitação por conformidade e compromisso por
balanceamento (OLIVER, 1991), a empresa concordou em se instalar na área de
Betim e se comprometeu com o governo mineiro em capacitar a mão de obra local,
que viria depois a se tornar recursos humanos da fábrica.
A Fiat precisou criar “a partir do zero” toda a estratégia de relacionamento
com a cadeia de negócios. Com os fornecedores nacionais, o grande desafio foi
logístico, ao montar carros em uma área completamente rural, com baixa
infraestrutura, além das novas demandas de peças e sem noção do volume real de
vendas e aceitação dos produtos pelo mercado consumidor. Com os clientes, que
desconheciam a marca italiana, foi preciso grandes investimentos em publicidade
para apresentar a nova marca no mercado local, com apelo de inovações e preços
competitivos.
122
Respondendo ao desafio de escassez de recursos humanos habilitados, boa
parte da mão de obra utilizada na construção da fábrica foi capacitada diretamente
pela Fiat e parceiros locais para assumir postos na linha de montagem. Milhares de
trabalhadores rurais, que passaram por experiência na construção civil, eram
estimulados a aprender um novo ofício, o que gerou grandes expectativas de
prosperidade e melhoria de qualidade de vida.
Todos os cargos executivos e grande parte dos cargos gerenciais foram
inicialmente ocupados por italianos. Ao aplicar conceitos de gestão utilizados na sua
matriz, ao mesmo tempo em que a empresa estimulava os funcionários a indicar
parentes e amigos para o preenchimento de posições vagas, tentando criar um clima
interno mais positivo e familiar, a firma trouxe para o interior de Minas Gerais rígidos
métodos de gestão, característicos da cultura italiana.
A empresa, que historicamente sofreu com grandes problemas sindicais na
Itália, buscou atuar neste risco desde antes do início efetivo da operação no Brasil,
investindo em programas de integração entre os funcionários, patrocínio de eventos
sociais e outras ações filantrópicas, buscando garantir um clima interno positivo e
fazer com que o funcionário se sentisse responsável pelos futuros resultados da
empresa.
As evidências apontam que essa estratégia se mostrou fundamental durante
todos os períodos seguintes, conforme foi exposto durante as entrevistas:
Falar que você trabalha na Fiat em Minas é um orgulho que você não tem ideia... quando a Fiat foi para lá, foi um período muito critico, assim, em Minas não tinha quase emprego. Então as pessoas às vezes não tinham condições de ascender socialmente porque não tinha onde trabalhar, ou iam para a mineradora, que também não eram muitas. Então quando chega uma indústria automotiva que te possibilita uma série de questões, inclusive de benefícios... dos mais simples aos mais complexos... o operador que tem benefícios desde fazer a festa de 15 anos da filha e trazer os cadetes (do Exército)... dos shows, a festa de primeiro de maio da Fiat, que é um acontecimento em Minas Gerais. É a chance que você dá para 9.000 operários, que talvez não teria condição nunca de bancar um show, porque vive num outro estado de poder, levar a família inteira. Quando faz as festas de Natal, de Dia das Crianças, casamento coletivo, estação do amor... (E6). Na década de 1970 quando a Fiat se instalou em Betim, ela teve um pilar importante de envolvimento da comunidade local para a própria implantação da fábrica e para os primeiros trabalhadores que aqui vieram. Então uma questão de inclusão social por meio efetivamente do emprego, mas no que se relacionava a temas mais amplos como educação, cultura e envolvimento comunitário geral, ela ficava ainda, como era realmente um padrão na época, muito vinculada a ações pontuais de atuação. Então eram patrocínios, apoios, muitas doações, muitas ações completamente filantrópicas, que caracterizavam mesmo a participação empresarial na vida
123
comunitária naquelas décadas. Então no final de década de 1970 e na década de 1980 se caracterizou muito a vivência da Fiat dentro desse panorama (E4).
Com isso, percebe-se que, mesmo em um curto período de tempo, e ainda
sem ter iniciado as atividades em solo brasileiro, a Fiat usou diversas táticas de
respostas para garantir a sua existência, transpondo as barreiras de ambientes
inóspitos, tornando-se a principal desafiante (challenger) do setor:
Então vamos falar um pouquinho da Fiat, como uma história meio pioneira que começou no momento em que a Fiat escolheu ir para Minas Gerais. Nós estamos fazendo 35 anos de Fiat no Brasil neste ano (2011), e era um momento que não era nunca esperado, a Fiat ia para Minas, todas as indústrias de automóveis estavam em São Paulo. Então assim, só aquilo ali já foi um desafio, instalar, fazer um movimento ao contrário do que era esperado, e naquela época não se esperava mais uma marca, eram as três marcas, a Volks, a GM e a Ford. Não tinha essa ideia, e ainda vem uma outra marca que não era esperada nem conhecida na época, e ainda vai para Minas. Então quer dizer, aí já começou uma história diferente (E10).
Em relação à Rasc, é possível categorizar a Fiat no estágio compliance, de
acordo com Nidumolu, Prahalad e Rangaswami (2009).
A empresa assegurou que estaria dentro dos padrões legais, e ainda inovou
e se antecipou como a primeira montadora a utilizar o conceito de garden building
(conceito onde, em cima da edificação, é construído um jardim), o que gera
benefícios de economia de energia, pois necessita menor esforço de resfriamento da
área interna, além de capturar parte das emissões de CO2 da produção.
(...) acho que assim, não sei se eu posso usar a palavra atitude ou a palavra ações, é lógico que isso já permeou desde o início da empresa. Se a gente for pensar no projeto da Fiat em 1976 já trabalhar com a ideia de garden building do ponto de vista pra 1976, isso era “ultra guarda”. Se a gente for pegar o rumo da história, a Fiat fez um trabalho junto com a comunidade desde os seus primórdios, a partir do momento que ela pegou Betim, que era uma cidade satélite de Belo Horizonte, pequena e hoje, se eu não me engano, é a terceira cidade em população de Minas Gerais. É um crescimento grande (E10).
124
Quadro 5.3 – Principais desafios e pressões da primeira fase da Fiat Brasil
5.2.2 Período II – do início da produção ao fim da “década perdida” (1976-1989)
Quadro 5.4 – Análise das forças do ambiente da segunda fase da Fiat Brasil
As evidências indicam que essa fase da trajetória da Fiat Brasil é marcada por
ambientes desafiadores tanto na arena de negócios, quanto institucionalmente. O
ambiente natural, por sua vez, permanecia piedoso.
Muito embora o ambiente de negócios pareça ter sido piedoso e pouco
punitivo com as ineficiências das montadoras, dado que o país estava “fechado”
para concorrentes externos e que as opções de escolha dificilmente fugiam do grupo
oligopolista, os fatos analisados apontam que, para todo o setor, foram grandes as
Ambiente Piedoso
Ambiente Desafiador
Ambiente Inóspito
Ambiente de
Negócio
Mercado automotivo em forte expansão, porém oligopolizado por apenas 3 montadoras;
Total inexistência de fornecedores e mão de obra especializada na região de Betim; Área rural e isolada para a implantação da fábrica; Péssima estrutura logística; Dificuldade de recebimento de peças; Longe dos centros consumidores Desconhecimento da marca pelo mercado consumidor
Ambiente
Institucional
Milagre econômico; Lobby das 3 grandes montadoras, tanto com o governo, quanto com os fornecedores;
Ambiente
Natural
Pouca ou nenhuma pressão ambiental
Ambiente Piedoso
Ambiente Desafiador
Ambiente Inóspito
Ambiente de
Negócio
Ambiente
Institucional
Ambiente
Natural
125
pressões durante a “década perdida”. Pelo lado institucional, a crise do petróleo
persistia. A situação econômica com uma inflação galopante inviabilizava grandes
investimentos em praticamente todos os setores. Politicamente, a transição da
ditadura militar para a redemocratização gerava esperanças, mas com inseguranças
e incertezas.
Nessa fase, o padrão de respostas da Fiat para as pressões do ambiente foi,
principalmente, com o uso de técnicas de aceitação por conformidade e amortização
para as pressões institucionais, dado que dificilmente a firma conseguiria ter poder
de modificar ou moldar essas forças; e estratégias de desafio (defiance) e
compromisso para o ambiente de negócios (OLIVER, 1991).
O fato de a Fiat ter aceitado instalar-se em Minas Gerais, longe do ABC
paulista, com todas as dificuldades logísticas que a empresa teve que enfrentar, foi
uma demonstração de como uma empresa pode reverter um fator que potencializou
o ambiente de negócios ser considerado inóspito no período anterior para se
fortalecer e pavimentar o caminho para a liderança do setor. Com o fato da distância
física, além das poucas opções de mobilidade de emprego para os funcionários,
obviamente, a firma conseguiu neutralizar os riscos da grande “ameaça sindical”, e
não teve um dia sequer de paralisação, mantendo a produção, enquanto as demais
montadoras sofriam com as temidas greves dos metalúrgicos entre 1978 e 1980.
(...) a Fiat foi muito feliz em escolher Betim, escolher Minas, ali não é um polo industrial, você vê que o polo industrial que se fez em Betim foi em função da Fiat... são nossos fornecedores. Então, se você falar, nós estamos num ambiente muito privilegiado, diferente de São Paulo, que tem mil empresas e mil possibilidades de emprego e as pessoas se movimentam muito mais, além dos problemas com os sindicatos (E6). (...) essa decisão, já desde a origem da empresa, ela deixou marcas muito claras de qual seria o caminho que a Fiat ia trilhar no mercado. Então, ela se distancia muito do ponto de vista de comportamento dessas outras 3 companhias desde dessa origem, trilhando um caminho que seja próprio, não seja do mercado, ou seja, do ponto de vista de desenvolvimento da própria companhia internamente (E10)
Contudo, pouco após o início das operações no Brasil, a empresa já enfrentava o
que seria a principal pressão no período: o forte descontentamento dos clientes com
os produtos. Apesar de a produção inicial do principal carro da montadora na época,
o Fiat 147, ter sido três vezes maior do que o planejado inicialmente, e com isso a
empresa tenha saído de 0% para 12% de participação de mercado em menos de
dois anos, pesquisa feita pela empresa registrou que os consumidores se frustraram
126
com a qualidade dos veículos. Mesmo com as inovações de mecânica e o motor a
álcool, uma esperança para gerar economia nos gastos com combustível durante a
crise do petróleo, a baixa qualidade percebida no produto e o preço acima do
principal concorrente (o Fusca, da Volkswagen) fizeram a nova marca ser mal
recebida pelo público. Os consumidores não tiveram as suas expectativas atendidas,
o que colocou em sério risco a sobrevivência da montadora. Para responder a esta
pressão, a Fiat tentou ajustar os principais problemas no modelo 147, buscando
minimizar o desconforto dos clientes e atender às expectativas do consumidores
para manter sua legitimidade, estratégia que pode ser categorizada como
pacificação (OLIVER, 1991).
O ambiente se tornou ainda mais desafiador com a redução brusca da expansão
do setor, devido ao cenário econômico recessivo que acabara de iniciar-se,
deixando ainda mais desafiador o ambiente de negócios. Em 1981, o PIB real cai
4,3%, o PIB da indústria 8,8% e as vendas de automóveis despencam 43,5%.
Precisando reaver parte do grande investimento feito na nova planta, a Fiat
buscou formas de responder aos mecanismos de punição do mercado, e a principal
estratégia foi trazer para a planta nacional a produção do primeiro carro mundial da
montadora: o Uno, lançado em 1983. Com o objetivo de replicar o sucesso que o
modelo teve na Itália, a filial brasileira apresentou, em agosto de 1984, as três
versões nacionais para o Uno (S, CS e SX), com três motores (1050 a gasolina,
1300 a álcool e gasolina e 1300 com carburador duplo). Como parte da estratégia, a
Fiat reposicionou o modelo 147, barateando seu preço para poder disputar no
mercado de carros mais básicos, principalmente combatendo o Fusca, da VW.
Desse modo, a Fiat posicionou o Uno como um modelo acima do 147, e o
anunciou com propagandas que exaltavam os “modernos conceitos de estilo,
esportividade e economia”. De acordo com uma entrevista de Silvano Valentino,
Superintendente da Fiat do Brasil nessa época: “O ideal seria que o Uno não tivesse
nem mesmo o espelho retrovisor externo, pois nossa intenção é de que ele ofereça
a menor resistência possível ao ar e corra com a mesma facilidade de uma faca
quente cortando sorvete”. (NOTTOLI, 1995).
O Uno buscava ser um carro pequeno e compacto, porém com inovações
tecnológicas e de equipamentos, mas se mantendo como opção econômica no
preço final e no consumo. Nos primeiros meses, mesmo sendo recebido com certa
desconfiança, o modelo apresentou elevado volume de vendas e também ganhou o
127
título de Carro do Ano no Brasil – além do apelido de “botinha ortopédica” entre os
consumidores, devido ao seu design. Contudo, a Fiat voltou a receber fortes
pressões do ambiente de negócios, com muitas reclamações em relação à
qualidade do produto, o que gerou novo declínio de vendas no mercado interno.
Conforme visto no Capítulo 4, a demanda nacional total de veículos durante
esse período ficou bem abaixo da registrada década de 1970, o que não permitia
manutenção da escala mínima de produção para quatro grandes montadoras. A
solução encontrada pela Fiat foi tornar o Brasil como plataforma de exportação,
tornando-se, proporcionalmente, a maior exportadora do setor, chegando a enviar
para outros mercados 63% de toda sua produção de 1987. Determinados modelos,
como o Uno, um “carro mundial”, tinham mais da metade da produção destinada ao
mercado externo, principalmente para a os Estados Unidos e Itália. É importante
registrar que os modelos de exportação eram adaptados para mercados mais
maduros e exigentes, principalmente para poder ser vendidos em países com
normas de segurança mais rigorosas.
Durante a década de 1980, a demanda por carros menores, que
representavam 62% das vendas até 1979, foi sendo abandonada em prol da nova
preferência do mercado consumidor: carros de maior cilindrada. Assim, os veículos
menores tiveram a representatividade reduzida para 41% do mercado em 1987,
enquanto os veículos mais potentes tiveram a participação ampliada de 8% para
26% no mesmo período. Porém a Fiat, novamente em uma estratégia de desafio
(OLIVER, 1991) e “apostou” diferente do resto da indústria e manteve seu foco em
modelos menores e de baixa cilindrada, como o Uno e suas variações.
Para resolver os sucessivos problemas de aceitação dos seus produtos,
principalmente pelas queixas em relação a qualidade, a empresa buscou responder
a esta pressão com uma profunda reformulação dos seus produtos, processos
produtivos, como o investimento em um novo e moderno sistema de soldagem, e no
relacionamento com os fornecedores. Desta vez, a empresa decidiu incluir nos
projetos boa parte da cadeia de negócios. A ação de trazer representantes dos
fornecedores e das concessionárias para colaborar nos debates estratégicos e na
busca de resolução de problemas, além de estreitar os relacionamentos e aumentar
o grau de parceria com os stakeholders, permitiu à empresa identificar de forma
mais rápida e resolver grande parte dos problemas de qualidade dos seus produtos.
128
Como um dos assets mais importantes para as firmas é a reputação (BARON,
1995), a Fiat entendia que precisava mudar a má percepção sobre sua marca e seus
produtos. Além de carros com melhor qualidade, apresentou um novo slogan:
“Mudando para você mudar”. Conforme Nottoli (1995), após essas ações, o índice
de rejeição da marca caiu de 70% para menos de 40% em menos de dois anos.
Quadro 5.5 – Principais desafios e pressões da segunda fase da Fiat Brasil
5.2.3 Período III – Da abertura do mercado à liderança de vendas (1990-2003)
Quadro 5.6 – Análise das forças do ambiente da terceira fase da Fiat Brasil
O terceiro período analisado, que vai da abertura do mercado, em 1990, até o
ano de 2003, também pode ser descrito como desafiador, tanto no ambiente
institucional, quanto de negócios, porém por razões diferentes do ciclo anterior. Na
Ambiente Piedoso
Ambiente Desafiador
Ambiente Inóspito
Ambiente de
Negócio
Estar situada longe do ABC e não sofrer com as greves ou demais pressões sindicais;
Forte descontentamento dos clientes com os produtos; Imagem desgastada; Dificuldades logísticas de recebimento de peças e escoamento dos produtos; Necessidade de reformular os produtos e processos produtivos;
Ambiente
Institucional
Mercado “fechado” para importações Grandes incertezas políticas Crise do petróleo; Inflação galopante; Mercado interno em forte estagnação; Redução brusca das vendas do setor;
Ambiente
Natural
Pouca ou nenhuma pressão ambiental
Ambiente Piedoso
Ambiente Desafiador
Ambiente Inóspito
Ambiente de
Negócio
Ambiente
Institucional
Ambiente
Natural
129
arena de negócios, além das pressões geradas com a abertura do mercado, a Fiat
ainda sentia os reflexos dos problemas com a sua imagem e entendia que precisava
reverter definitivamente esse quadro. Somava-se a isso a necessidade de reduzir
seus custos e ganhar mais competitividade. No ambiente institucional, o novo
cenário macroeconômico e as decisões do governo continuaram sendo grandes
“modeladores” do setor. As novas leis, a abertura do mercado, as regulamentações
e acordos automotivos viriam modificar completamente a dinâmica da indústria
automotiva nacional, tornando fundamental para a Fiat o uso de grande leque de
respostas estratégicas para atacar tais desafios e capturar valor nesse ambiente,
buscando manter sua legitimidade e sustentar seu processo de crescimento
alcançando nesse período, a tão desejada liderança de mercado.
Com a eleição de Fernando Collor de Melo para presidente do Brasil em 1989
e as medidas dos planos econômicos de combate à inflação, como o congelamento
das cadernetas de poupança, o cenário econômico nacional tornou-se recessivo.
Conforme visto no Capítulo 4, buscando estimular a indústria automotiva nacional,
em 27 de junho de 1990, é publicado o Decreto nº 99.349, que reduziu o IPI dos
veículos até 1.000 cm³ para 20%, enquanto as demais tarifas giravam entre 37% e
42%.
Diversos jornalistas e analistas do setor automotivo, como Carlos Mauricio
Farjoun e Eduardo Hiroshi, para citar alguns, acreditam que esse decreto foi
“encomendado” via lobby pela montadora italiana ao governo Collor, embora não
existam provas dessa ação. Se verdadeira, poderia ser analisada como um bem-
sucedido caso do uso de estratégias de manipulação (OLIVER, 1991), em que as
implicações dessa influência no ambiente institucional não só moldaram todo o
ambiente de negócios, como pode ser considerado dentre os principais eventos que
mudariam a trajetória de crescimento da Fiat e de toda indústria automotiva no
Brasil.
Analisando as evidências para tentar comprovar esta hipótese, percebe-se
que, no momento deste decreto, nenhum outro fabricante produzia veículos de 1.000
cm3, ou similares, exceto a Fiat, que já fabricava o Uno com motor de 994 cm3 para
exportação, além de outras versões deste modelo e do Fiat 147 com 1.050 cm³, já
negociados no Brasil. Após o anúncio da equipe econômica de Collor, em menos de
dois meses a Fiat apresentou para o mercado o Uno Mille, que teve seu motor de
1.050 cm³ convertido para 1.000 cm³ sem precisar de grandes investimentos ou
130
inovações tecnológicas, apenas de ajustes em regulagens de determinados
componentes.
Por outro lado, todos os demais concorrentes só conseguiram apresentar os
modelos 1.0 no mínimo dois anos depois, em 1992 – a Volks com o Gol 1.0 e a GM
com o Chevette Júnior. A Ford, por exemplo, só foi capaz de finalizar um modelo
com a cubagem beneficiada pelo decreto em 1993, com o Escort Hobby. As demais
montadoras, além de precisarem iniciar todo processo de desenvolvimento de um
novo tipo de motor, necessitaram efetuar e testar diversas modificações estruturais
nos modelos, pois eram veículos mais pesados, o que demandou muito tempo e
investimentos. Mesmo com essa defasagem temporal, nenhum dos modelos iniciais
dos concorrentes conseguia superar a relação peso e potência do Uno, e sempre
perdiam em consumo e aerodinâmica. Somente em 1994, o Mille efetivamente
ganhou um concorrente no quesito custo-benefício, com a chegada do Chevrolet
Corsa Wind, da GM. Estava inaugurado assim o chamado mercado de “carros
populares”, que, em 1994, já representava 40% do total de veículos vendidos no
Brasil.
Com tais vantagens competitivas, entre 1990 e 1994, o Uno Mille elevou-se
de quarto para primeiro lugar no ranking de modelos mais vendidos. Independente
de ter havido ou não o uso de lobby, o fato é que a Fiat cresceu nesses quatro anos
o que não tinha conseguido nos catorze anos anteriores. Sua participação (market-
share) saltou de 11,5% em 1989 para 28,7% em 1994, em um mercado em pleno
crescimento, com as suas vendas reais aumentando mais de 500%.
As vendas do setor demonstram que as ações institucionais do acordo
automotivo de 1992 entre as montadoras, governo e sindicatos, funcionaram
impulsionando ainda mais a demanda que estava reprimida e investimentos de
todos os players. Monitorando o crescimento na importação de veículos de luxo, a
Fiat percebeu uma oportunidade de mercado e buscou diversificar seu portfólio e
responder a uma demanda por carros com mais componentes eletrônicos e apelo
esportivo e, em 1993, apresentou o Tempra. Com este modelo, a empresa introduziu
no mercado brasileiro o primeiro veículo nacional com índices de emissão de
poluentes inferiores ao exigido pela legislação local.
Não foi possível obter evidências se foram os debates sobre sustentabilidade
durante a ECO 92 os motivadores para a implantação da Ilha Ecológica, em 1994.
Contudo, este foi o primeiro passo de um grande projeto que viria a tornar referência
131
em sustentabilidade ambiental no setor automotivo nacional, permitindo a Fiat ser a
primeira empresa no Brasil certificação ambiental ISO 14.001, ainda na década de
1990. Mesmo sendo um projeto isolado no momento da criação, foi um exemplo de
resposta ativa da empresa, que, por motivação compreensiva (PAULARJ, 2009 apud
FLECK, 2010) – ou seja, sem pressões governamentais ou de legislações - ,
adaptou seu parque produtivo para garantir reutilização e reciclagem do máximo
possível de matéria-prima.
A Ilha ecológica gera até hoje benefícios para a Fiat, seja com a redução na
geração de resíduos, seja no gerenciamento de riscos operacionais que poderiam
gerar multas para a empresa (PRAHALAD; RANGASWAMI, 2009; LEMME, 2010;
FLECK, 2010).
Eu vejo que o setor automotivo, ainda, como grande base, ele está sendo muito reativo às questões compulsórias do governo e sociedade, assim como a maioria dos setores de indústria. Ninguém está fazendo efetivamente alguma coisa diferente pensando assim: “Não, eu tenho que fazer diferente por uma questão maior que é a segurança ambiental do planeta”. Eu colocaria nesses termos. Não vejo ainda ninguém (além da Fiat) que está realmente preocupado com o fato. (...) Na minha percepção, a indústria automotiva, no geral, é reativa, como todas as demais indústrias também são. E nós (Fiat) sempre estamos querendo fazer alguma coisa diferente (E1).
Todavia, mesmo com o ganho de market share e diversificação da linha de
produtos, a “imagem da marca” e a reputação da qualidade dos produtos ainda era
frágil no mercado consumidor interno. Assim, para conseguir investir em qualidade e
ganhar mais competitividade, precisou tomar decisões estratégicas mais arriscadas.
Alguns dos problemas eram a logística de abastecimento de peças e um
gargalo físico na sua planta, que impedia maiores ganhos de escala. Para resolver
ambas as questões, os executivos decidiram “mineirizar” a produção. Surgia ai o
Projeto J, descrito no capitulo 4 e na análise do desafio de empreendedorismo.
Contudo, tal projeto merece uma atenção especial nessa análise sobre o
desafio de navegação, pois além dos seus resultados no aumento da produtividade
e competitividade, foi um importante passo para a Fiat estreitar os laços com um
relevante stakeholder: o fornecedor. Com o correto uso de estratégias de
compromisso por balanceamento (OLIVER, 1991), os gestores da Fiat conseguiram
convencer seus principais fornecedores a efetuar grandes investimentos no polo
132
industrial de Betim, mesmo quando a montadora não era a líder em vendas e sem
uma escala – naquele momento - que validasse o retorno dos investimentos.
O compromisso firmado era que, de acordo com estudos e projeções feitas
pela montadora, o retorno dos investimentos iria vir junto com o aumento da
competitividade da Fiat. A expectativa era de aumento no volume de compras de
peças, e de concentração das compras nesses fornecedores parceiros.
No início foi difícil, ninguém acreditava (...) pouco a pouco, as empresas passaram a acreditar em nós e ir para Belo Horizonte, Betim e outros municípios vizinhos (...) começamos com 600 fornecedores e reduzimos para cerca de 180. A estratégia era “enxugar” para dar escala, competitividade aos fornecedores qualificados (trechos de entrevistas do presidente Belini, extraídos do livro de Tanure e Patrus, 2011, p. 101).
Esse capítulo na história da Fiat também é visto pelos gestores como um
ponto de inflexão na maneira de se relacionar com os fornecedores. O
estabelecimento de parcerias gerou um clima de “ganha-ganha”, diferente das
disputas comerciais que aconteciam até então, em que, além do desgaste no
relacionamento, perdia-se tempo e oportunidades. Dessa forma, a firma reduziu
algumas das principais pressões do ambiente de negócio, e o parque que tinha sido
construído para produzir 500 carros por dia, em 1976, poderia chegar até 3.000
veículos, gerando ganhos de escala de produção (CHANDLER, 1977), fundamentais
nesta indústria.
A empresa entendia que também precisava responder às constantes críticas
e pressões dos consumidores quanto à qualidade dos veículos produzidos. Um alvo
recorrente era o sistema de suspensão dos veículos importados da Itália, que não
eram perfeitamente adaptados ao cenário brasileiro, de pistas irregulares. Ademais,
como já citado, o crescente volume de importações, estimulado pelo regime de
paridade cambial e estabilização da economia, elevou ainda mais a exigência por
produtos de qualidade. Usando o que Oliver (1991) denominou de estratégia de
compromisso por pacificação (pacify), a Fiat passou a fazer mais ajustes em seus
produtos, tendo em consideração as características das nossas ruas e estradas e
das necessidades do consumidor brasileiro.
Com os investimentos feitos para ampliar a capacidade da planta, a empresa,
em 1996, move-se estrategicamente para a produção do primeiro carro global
lançado e fabricado no Brasil, dessa vez com desenvolvimento em parceria entre o
133
centro de design do Brasil e da Itália. Foi um dos passos mais importantes para o
Centro Estilo nacional. O modelo Palio significaria um ponto especial na história da
Fiat, pois, além de tentar responder às principais críticas feitas ao Uno (design,
qualidade e conforto), colocava o Brasil como fundamental plataforma de exportação
para novos mercados, principalmente os emergentes na América Latina, países
africanos e alguns membros do Leste europeu. Essa tática daria melhores condições
para a empresa se antecipar e prevenir de potenciais crises internas.
A empresa dava novos passos na busca de se diferenciar dos demais
concorrentes em relação a projetos de cunho de responsabilidade sociais, e
apresentou o primeiro carro nacional preparado de fábrica para pessoas com
necessidades especiais (programa Autonomy). Na década de 1990, a Fiat amplificou
sua atuação em programas de filantropias e patrocínios culturais. Um exemplo é o
projeto Recofia, uma parceria com as concessionárias do Rio de Janeiro para a
formação, em comunidades carentes, de mão de obra especializada em tecnologia
automotiva. Em 1998, a Fiat implantou o programa Esportista Cidadão, em Minas
Gerais, também com foco filantrópico para a população de um bairro carente de Belo
Horizonte.
As medidas do regime automotivo de 1997 elevariam o patamar de desafio do
ambiente de negócios. Os US$ 18 bilhões de incentivos governamentais; a guerra
fiscal entre os Estados; as políticas de apoio à importação de bens de capital; e uma
nova redução de IPI; aliados à estabilidade econômica, trouxeram, em poucos anos,
diversos novos concorrentes relevantes para o mercado nacional, implicando
inclusive no índice de fidelização às marcas.
Com catorze novas unidades fabris criadas entre 1996 e 1990, e o início da
produção em solo nacional das principais marcas do Japão e da Franca, foi preciso
que a Fiat aumentasse o entendimento das expectativas dos múltiplos stakeholders,
principalmente os consumidores, que tinham agora opções de produtos nacionais
mais alinhadas com as tendências da indústria nos mercados mais desenvolvidos.
Em uma indústria que ficou estagnada por mais de uma década, em poucos anos os
atores descobriram que a forma de lidar com o ambiente precisaria ser diferente. A
Fiat deu continuidade ao processo de monitoramento (scanning) do mercado e,
buscando gerar e captar valor (FLECK, 2009), acelerou o processo de introdução de
inovações e novos produtos.
134
Mudanças no ambiente institucional, como a deterioração da situação
macroeconômica global, com a crise da Rússia e Ásia e, internamente, com o fim do
regime de banda cambial, refletiam em maiores pressões do ambiente de negócios
no fim da década de 1990. Com a confiança dos consumidores abalada, aumentou a
taxa de inadimplência e o setor voltou a observar uma queda nos índices de vendas.
Como resposta a essas pressões, a organização foi reestruturada e a
montadora terceirizou diversas operações, com redução do quadro funcional para
menos da metade. Na linha de produção, apenas as atividades diretamente ligadas
à montagem permaneceram na empresa.
Com as demissões, outro risco potencial aparecia: insegurança e
descontentamento dos funcionários. Como resposta, a firma se fez valer de técnicas
de cooptação (OLIVER, 1991), e formalizou, pela primeira vez, o processo de
participação de representantes dos funcionários nos comitês executivos. Além disso,
buscou estimular que todos os gestores mantivessem total transparência sobre as
suas decisões, compartilhando informações de mercado e da empresa diariamente
com todos os funcionários. De acordo com os entrevistados, essas ações reverteram
o clima interno de forma positiva, além de atender às expectativas de um dos
principais stakeholders da empresa. Outra evidência do sucesso dessa tática é que,
no ano seguinte, a Fiat foi considerada “A melhor empresa para se trabalhar no
Brasil” pela revista Exame. De acordo com o superintendente da empresa da época,
Gianni Coda: “Trabalho em equipe e transparência nas informações. Esse é o nosso
segredo” (EXAME, 2000).
Uma relevante evidência do resultado positivo das ações realizadas no
decorrer da década de 1990 (o Projeto J com a ampliação da planta, com
consequente ganho de escala, operacionais e logísticos; a revisão dos processos de
produção; além da terceirização de boa parte do quadro funcional) como resposta
antecipada à pressões do ambiente, é que, diferentemente dos demais
concorrentes, a Fiat conseguiu manter o resultado financeiro positivo na crise de
1999. Com queda de 3% na produção, em frente a 16% da indústria automotiva, a
empresa passou a liderar o ranking de fabricação, com 32% do total da produção
nacional, além de ser responsável por 40% de toda a exportação de automóveis do
Brasil – resultados obtidos graças ao sucesso do Pálio, o carro global lançado três
anos antes.
135
A forte influência do governo no setor foi evidenciada novamente em 1999
com os novos acordos automotivos emergenciais para combater o momento de
crise. Mais uma vez, para socorrer a indústria e incentivar as exportações e o
consumo interno, o governo federal reduziu impostos, com a contrapartida da
redução no preço final dos produtos e da manutenção do nível de emprego do setor.
Com o benefício dessa tática de compromisso (OLIVER, 1991) perante o governo, a
Fiat pôde manter seu plano de expansão.
As novas entrantes (newcomers) se tornaram uma importante pressão do
ambiente de negócio para as montadoras tradicionais, agora já com a Fiat inclusa
nesse grupo, que em menos de três anos perderam juntas mais de 10% de
participação de mercado.
Uma curiosa análise é que, assim como no início dos anos 1980, o fato de a
Fiat estar instalada em Betim (MG), a firma não foi afetada pelos novos movimentos
sindicais. Enquanto as fábricas da região do ABC, em São Paulo, pararam por uma
semana em setembro de 2001, a Fiat não teve sua produção interrompida. Outro
fator relacionado é que, em Betim o custo da mão de obra era bem mais em conta
do que no ABC, gerando vantagens de custo para a Fiat.
O direcionamento estratégico da Fiat, em resposta a essa perda de mercado,
foi buscar implacavelmente a meta de “liderança de vendas”, independente dos
resultados financeiros. De acordo com relatos de um entrevistado, “a busca da
liderança em vendas se tornou quase uma neurose internamente” (E4). Todos os
níveis da empresa acompanhavam diariamente o ranking de vendas interno,
informado pela Anfavea.
Essa preocupação excessiva com um objetivo único (ser líder de vendas),
dificultava a consideração de outros fatores ou possibilidades estratégicas nas
decisões da corporação. A Fiat arriscava sua sobrevivência ao embarcar então em
uma potencial “síndrome da simplicidade” (MILLER, 1993; FLECK, 2010). Embora
em 2001 a Fiat tenha atingido a tão perseguida meta, derrubando a Volks do posto
de líder de vendas depois de mais de 42 anos, esse resultado foi acompanhado de
amargos efeitos colaterais, como a queda da lucratividade, mesmo com aumento
nas vendas.
Contudo, no mesmo período em que perseguia a meta de liderança de
vendas, a Fiat intensificava o processo de busca de manutenção de legitimidade
perante alguns stakeholders-chave. Aumentava o entendimento dentro da Fiat que
136
futuras ameaças no ambiente natural ou institucional, como legislações ambientais
mais rigorosas, precisavam ser direcionadas internamente. Mesmo que ainda em
frentes não unificadas, surgiam novos projetos com finalidades de responsabilidade
socioambiental.
Como visto, o governo se mantém durante todo o período como uma das
principais forças ambientais na indústria automotiva brasileira. E um dos principais
instrumentos utilizados por este stakeholder para manipular e influenciar, e até
mesmo mudar o cenário competitivo da indústria são as políticas de alíquotas
tributárias. Em 2002, além de reduzir o IPI para carros entre 1.000 e 2.000
cilindradas como forma de balancear o nível de consumo de carros populares (que
representavam 71% das vendas desse ano) e veículos médios, o governo incentivou
os fabricantes a desenvolver veículos bicombustíveis, os “flex”, então inexistentes.
Os objetivos do governo eram diminuir a dependência de petróleo, estimular a
indústria sucroalcooleira e, paralelamente, possibilitar maior poder de decisão na
hora do consumidor abastecer o veículo.
Em uma corrida contra o relógio, as grandes montadoras responderam ao
novo desafio e, em aproximadamente oito meses, a Volkswagen saía na frente com
o Gol 1.6 Total Flex. Sem a mesma agilidade percebida em eventos anteriores, a
Fiat apresentou somente dois meses depois da sua principal rival os seus modelos
com o motor flex fabricado em conjunto com a montadora americana GM, com a
qual ainda mantinha parceria. Materializando a significância dessa medida do
governo, em um ano os motores flex já representavam 22% das vendas internas de
veículos leves e, em dois anos, mais de 50%.
A Fiat manteve o posto de montadora líder em vendas entre 2001 e 2003.
Contudo, como manter esse posto era o foco dos executivos da época, a Fiat
começou a, praticamente, “pagar para vender”. O principal efeito foi um declínio
financeiro e prejuízos de mais de R$ 280 milhões em 2003.
Globalmente, a matriz continuava apresentando péssimos resultados
financeiros, e alguns acionistas cogitavam exercer o direito de venda para a GM.
Todos esses fatores geravam mais pressão sobre a Fiat do Brasil.
137
Quadro 5.7 –- Principais desafios e pressões da terceira fase da Fiat Brasil
5.2.4 Período IV – Uma gestão brasileira e a mudança estratégica (2004-2011)
Quadro 5.8 – Análise das forças do ambiente da quarta fase da Fiat Brasil
Neste período, pode-se afirmar que a Fiat enfrentou um ambiente de negócio
desafiador. O aumento da concorrência, e a consequente pressão para reduzir o
ciclo de vida dos produtos para poder apresentar produtos mais atrativos e
competitivos para o mercado e os efeitos colaterais da busca pela liderança
acenaram para a necessidade de um novo modelo de gestão.
Ambiente Piedoso
Ambiente Desafiador
Ambiente Inóspito
Ambiente de
Negócio
Abertura do mercado e entrada de novos concorrentes; Popularização do Carro 1.0; Desvantagem operacional e necessidade de desenvolver o polo automotivo de Betim (Mineirização); Imagem da Fiat ainda desgastada e associada à produtos de menor qualidade; Descontentamento dos funcionários;
Ambiente
Institucional
Grandes incentivos governamentais para estimular e financiar todo o setor;
Novas leis, acordos e regulamentações para os setor automotivo; Grandes mudanças no cenário macroeconômico; Crises globais; Pressões dos acionistas por melhores resultados financeiros;
Ambiente
Natural
Preocupação com o despejo de detritos e com o reuso de matérias-primas; Primeiras iniciativas de formulação de produtos menos poluentes;
Ambiente Piedoso
Ambiente Desafiador
Ambiente Inóspito
Ambiente de
Negócio
Ambiente
Institucional
Ambiente
Natural
138
No ambiente institucional, apesar da boa conjuntura econômica nacional e do
aumento da disponibilidade de instrumentos de crédito, que permitiram o expressivo
crescimento do consumo de bens duráveis pela nova classe C; além dos inúmeros
incentivos governamentais em benefício do setor automotivo, principalmente após a
crise global de 2008, intensificaram-se os desafios de gerir os stakeholders. Dentre
eles, os acionistas que cobravam por melhores resultados, não só para a operação
brasileira, mas que pudessem compensar os maus resultados globais da sua matriz.
O aparecimento das primeiras discussões efetivas sobre o ambiente natural,
aliado ao fato de a Fiat manter um comportamento ativo ao se antecipar e neutralizar
estas forças, destacaram a empresa como uma firma de vanguarda (early mover) no
que se refere à responsabilidade ambiental no setor automotivo nacional.
As evidências desta fase apontam para um correto padrão de respostas aos
desafios do ambiente, com o uso de um amplo repertório de táticas estratégicas por
gestores empreendedores (MINTZBERG et al 2000; OLIVER, 1991; CHANDLER,
1990).
A entrada de Cledorvino Belini, em fevereiro de 2004, além de imprimir um novo
estilo de liderança marcou a grande mudança estratégica da Fiat do Brasil. Passou a
atuar de forma mais ativa em relação às pressões dos ambientes, buscando
capturar valor e garantir a legitimidade da firma a partir de uma gestão diferenciada
dos seus múltiplos stakeholders.
Conforme pontuado no capítulo de métodos, dado que considerável parte dos
dados primários e citações coletadas se refere a este último período, nesta etapa
será feita uma abordagem de análise com uma narrativa distinta das demais
realizadas. As evidências serão agrupadas por stakeholders que tendem a gerar
pressões em cada tipo de ambiente, inclusive possibilitando uma associação mais
direta com as teorias tratadas sobre Rasc.
Inicialmente será abordado como a empresa está gerenciando o ambiente
natural (meio ambiente), e as suas motivações para passar a integrar práticas de
Rasc a sua estratégia. Como parte do ambiente de negócios, serão analisadas as
relações com os fornecedores, clientes, concessionárias, além das ações da
empresa sobre inovações de produtos, e estratégias para combater os concorrentes.
Para o ambiente institucional, serão analisadas as relações com os acionistas, o
governo e com a sociedade.
139
5.2.4.1 Gestão dos Stakeholders
Os depoimentos dos entrevistados, exemplificados no trecho da entrevista com o
funcionário E4, sugerem que a Fiat compreende a necessidade da correta gestão
dos múltiplos stakeholders como forma de resposta às pressões de um ambiente em
transformação, e como condição necessária (CN) para a longevidade saudável,
assim como proposto por Fleck (2009). As evidências indicam que, para a Fiat, este
é o caminho correto para continuar na posição de liderança do setor conciliando com
a saúde financeira da organização.
(...) [a Fiat] busca permanentemente uma visão que vai além do presente. Ela busca mesmo entender e estar sempre antenada nos cenários que se apresentam no futuro para que ela possa se adequar de uma forma ágil e de uma forma dinâmica para atender às demandas desses cenários que vão se formando à medida que os anos vão passando. Segundo, pelo dinamismo também da empresa em entender cada vez mais as demandas dos consumidores e buscar oferecer produtos que atendam a essas demandas, que atendam a essas necessidades. E, por fim assim, a forma cautelosa e a forma dedicada que ela tem com o relacionamento com os seus vários públicos. Então assim, seja com os seus empregados, que permanentemente ela busca oferecer as melhores condições possíveis de trabalho, de envolvimento, de dedicação, faz com que isso garanta uma produção efetiva, para que a gente tenha estoque para atender à demanda de mercado, é uma consequência. Com os seus fornecedores, não só buscando envolvê-los, porque hoje a Fiat como montadora ela envolve os fornecedores no desenvolvimento de produtos, não é uma empresa que produz todos os itens que compõem o seu produto final. Então a Fiat tem hoje todo o centro de design, de desenvolvimento de produto e convoca a sua cadeia de fornecedores para, junto com ela, desenvolver esses produtos. Então, assim, o diálogo constante e permanente com esses públicos, com a rede de concessionárias, que é quem está na ponta com o consumidor final representando a marca, o aperfeiçoamento constante para gerar qualidade no pós-venda, que é um grande ponto. Hoje, [somos] (...) entre as marcas, quem pode oferecer no dia a dia daquele produto mais atencioso, mais adequado, mais prático. E a preocupação permanente com todos os demais públicos, com a própria comunidade, com a própria sociedade, o seu relacionamento em buscar o meio ambiente tanto nos processos produtivos totalmente adequados e a gestão ambiental demandada hoje, mas, assim, pensar no seu produto final de uma forma mais harmônica com o meio ambiente. Então tudo isso é uma composição de fatores. E a própria liderança, hoje o corpo técnico, as lideranças da Fiat hoje buscando se reciclar, se atualizar permanentemente, (...) visualizar esses cenários futuros, sem dúvida proporciona à empresa uma linha de atuação muito próxima com o que se espera das empresas-líderes de mercado mesmo (E4).
Uma das linhas de investigação desta pesquisa foi entender o que motivou a
Fiat a passar atuar de forma sistemática em ações de responsabilidade
140
socioambiental, ao incluir estes tipos de preocupações nos seus debates
estratégicos.
Para o executivo responsável pela diretoria de responsabilidade social, as
motivações para a atuação em práticas de Rasc são, além das questões éticas e
das obrigações morais e legais, a própria sobrevivência sustentável da firma. Isto
corrobora a visão proposta por Fleck (2010) - de que as empresas deveriam operar
de modo que assegurassem boa performance econômica no longo prazo, evitando
comportamentos de curto prazo socialmente contestados ou perigosos para o
ambiente. O entrevistado E10 também evidencia o entendimento da Fiat sobre a
relação de “condição necessária” (CN) das ações de Rasc para a longevidade da
firma:
Hoje a indústria [automotiva] (...) está gerando muitos problemas para o meio ambiente, isso a gente está percebendo, a gente sabe disso, mas a gente sabe também que, se a gente não conseguisse resolver essa equação, a gente não vai ter um negócio sustentável, a gente não vai ter um negócio lucrativo, que é o objetivo de toda organização (E10).
Tanto depoimentos do presidente da firma, quanto nas entrevistas realizadas,
como com o funcionário E6, fornecem indícios de que empresa compreende as
potenciais consequências que futuras pressões do ambiente institucional podem
gerar, incluindo o questionamento sobre a legitimidade do setor, e que a empresa
precisa neutralizar tais riscos para garantir a sua legitimidade:
A sustentabilidade não é que eu gosto de abraçar árvores ou comer granola, é como posicionamento de empresa assim, de negócio. Se você parar e pensar: “bom, o carro, se a gente não cuidar da indústria automotiva, ele pode ser o que o cigarro foi”, porque o carro polui. “Olha o trânsito que está! Viu? É a Fiat [a culpada]”, brincam comigo: “Vocês estão colocando mais carros na rua!” Então, assim, se a gente não começar a debater mais mobilidade de fazer ações mais co-criadas com o governo, com escolas, tirar um pouco desses muros... bom, se a gente não cuidar de fato do nosso planeta, se a gente não pensar em materiais alternativos... vai chegar uma hora que a empresa não tem mais o que fazer. E aí nós vamos morrer (E6).
Na Fiat, entendemos que tão importante como a conquista de resultados econômicos é a forma como eles são alcançados. A perenidade da empresa e do seu negócio só é possível se os seus resultados forem sustentáveis ao longo do tempo, e essa perspectiva não considera apenas os objetivos econômicos mas também os sociais e ambientais. Ou seja, a empresa precisa ser eficiente no seu negócio, contribuir para a comunidade em que está inserida e cuidar dos recursos naturais, de forma que possa assegurar o futuro. (...) a sustentabilidade não é uma utopia. Ela é, antes, um grande desafio, um caminho de superação, que por isso jamais termina (...)
141
(trechos de entrevistas do presidente Belini, extraídos do livro de Tanure e Patrus, 2001, p. 117).
Como exemplo de resposta antecipada para neutralizar futuras pressões dos
ambiente institucional e natural, a firma adotou uma postura mais ativa em relação
aos desafios de Rasc. De acordo com as evidências coletadas, não obstante
diversas frentes de ações conduzidas pela empresa no decorrer dos últimos
períodos, o início de forma estruturada e dentro das estratégias corporativas, das
atividades de responsabilidade socioambiental da empresa em sustentabilidade foi
em 2007, com a criação do Comitê de Sustentabilidade. Este grupo possui
representante de todas as áreas da empresa para pensar de forma conjunta e
compartilhada novas ações de Rasc. O entrevistado E5 comenta que este comitê
passou um ano apenas se dedicando a estudar o tema em profundidade antes de
formular qualquer projeto ou plano de ação:
Começamos a mudar a nossa postura em 2007, depois de um seminário que fizemos e que a gente começou questionar muito essa questão de... o que a gente ia deixar para a geração futura, o que a gente ia deixar para o Brasil, entendeu? Nós vamos deixar o quê? Então esse despertar foi naquele momento. Então naquele momento ali começa a pensar, depois a gente sai com o Comitê de Sustentabilidade (...) a gente já tinha falado que a gente ia passar um ano sem mexer em nada, ia passar um ano só estudando o assunto. Para mim ninguém sabe desse negócio de sustentabilidade porque todo mundo fala que sabe. Quando todo mundo fala que sabe alguma coisa, ninguém sabe. Então vamos passar um ano aqui tentando fazer curso, participar de seminários, para a gente criar um pouco de base. Você [precisa] ter um pouco de crítica, senso crítico do que é sustentabilidade (E5). De certa forma a sociedade está mais antenada com isso não tem muito tempo para cá. Isso é verdade aqui no Brasil. A gente não se preocupava tanto com isso. Mas eu acho que aqui na Fiat não é que foi a centelha, a gente já tinha essa preocupação, mas sempre muito isolado, o pessoal da comunicação preocupava com ações sociais e para lá... A gente preocupava com alguma coisa de produto, consumo, emissões, tanto que a gente foi a primeira empresa a lançar um carro com motor 1.0, isso já tem bem mais de dez anos. Então as coisas aconteceram muito isoladamente, a formação desse comitê [de sustentabilidade] que fortaleceu, a gente começou a unificar as ações, e é uma maneira de pensar em sustentabilidade de uma cabeça única né? (E9).
O entrevistado E10, elucidou sobre a falta de uma estratégica estruturada dos
projetos de Rasc antes de 2007, enquanto o entrevistado E2 comentou que, antigos projetos sobre o tema, que eram tratados isoladamente, passaram a ser visto de forma unificada a partir deste momento:
(...) para falar do ponto de vista ambiental, também foi a primeira montadora a se certificar em ISO14.001, e a Ilha Ecológica... Então, as ações foram sendo desenvolvidas por toda a história da empresa. Eu acho que talvez nos últimos anos o que se teve é uma noção mais concreta do conceito de
142
sustentabilidade, trabalhando um pouco dentro do triple botton line e etc. De convergir isso dentro de amarras mais planejadas e ordenadas e estruturadas, mas eu não tenho dúvida que as ações nas diferentes áreas foram crescendo ao longo da empresa (E10). O projeto árvore da vida é um exemplo disso. Ele não é novo, já vem de muito tempo. Mas essas ações eram ações pontuais, muito mais focadas nas áreas afins do que uma coisa transversal na empresa (...) Agora é visto tudo de forma transversal (E2).
Na percepção de integrantes da empresa, o setor automotivo nacional, de
uma maneira geral, ainda é muito reativo às questões compulsórias do governo e da
sociedade, e a Fiat, como líder de mercado, teria a obrigação moral (PORTER;
KRAMER, 2006) de dar o exemplo atuando como first mover na implantação de
processos e práticas de responsabilidade social e ambiental corporativa. Para um
executivo da empresa entrevistado, “a tendência é que depois que a gente faz todo
mundo vem atrás” (E3).
(...) uma empresa que é líder do quarto maior mercado do mundo tem que trazer essa discussão. Ela tem que ser pioneira nessa discussão. Se não for, ela corre o risco de não ser líder em alguns anos (E10).
Então a Fiat é muito proativa nesse sentido [Rasc], ela tem acompanhado e muito. Esses temas estão no dia a dia da empresa. porque ela entende e acredita no seu papel de mobilizadora e de importante hoje ator no mercado automobilístico, por ser líder e por conduzir também questões de inovação, de tecnologias e de diferenciação para se recriar dentro do mercado e dentro da posição da sociedade que ela está hoje (E4)
O entrevistado E5, por sua vez, compreende a importância da Fiat como
incentivadora de ações de Rasc para todos os atores da cadeia produtiva da
organização, e expõe o intento da firma em atuar no tema responsabilidade
socioambiental da maneira mais estruturada possível:
Agora, do ponto de vista de empresa, a empresa entende que ela, para ser eterna, tem que fazer a parte dela, e a parte dela não é só aqui dentro da cerca. Então nós vamos trabalhar nos fornecedores, vamos trabalhar nos concessionários, vamos tentar educar os clientes para utilizar melhor nossos produtos. Então nós vamos tentar fazer a nossa parte da melhor maneira possível, a gente entende que isso é sine qua non. Não é opção, nós temos que fazer isso porque a gente quer que a empresa seja eterna, entendeu? Agora, a empresa não está dentro de uma ilha, isso que eu quero deixar bem claro. A empresa não está dentro de uma ilha, a empresa está dentro de um contexto, e esse contexto chama país, e, por mais que a gente gostaria e por mais que a empresa se esforce, ela não tem essa levada de mudar o país. Quem muda o país é a sociedade. (...) Nós, como Fiat, estamos tentando fazer aquilo que a gente consegue fazer da melhor maneira possível, dentro de um tema extremamente complexo, extremamente complicado, nós estamos tentando fazer o melhor possível (E5).
143
5.2.4.2 Meio Ambiente
Em relação à gestão do meio ambiente, a Fiat já investiu, desde a década de
1990, mais de 100 milhões de dólares em tecnologias inovadoras e projetos de
redução de emissão de resíduos e consumo de matéria-prima – conforme já
evidenciado durante a análise de empreendedorismo. Além de modernos processos
de fabricação, as evidências apontam que a empresa entende que sua
responsabilidade é sobre todo o ciclo do produto, não só pela sua produção:
O ciclo de vida [do veículo] é muito maior do que a parte nossa industrial. E é nisso que temos que começar a pensar (E1). O nosso impacto na sociedade, na posição do automóvel, ele não termina quando eu coloco o carro em cima da carreta, ele vai até lá na frente (...) Quem dera eu poder estar produzindo um produto totalmente reciclável, que não poluísse ou consumisse combustível. (...) mas [atualmente] eu posso tomar conta daquilo que eu já consigo fazer (...) controlar meu processo produtivo, já posso controlar meus descartes, já posso trabalhar novas tecnologias de forma a colocar cada vez mais no meu produto componentes recicláveis, componentes verdes, feitos de matéria-prima reciclável (...) (E2).
Com os novos processos produtivos, os números dos resultados na redução
de consumo de energia elétrica, água, recirculação da água, geração de resíduos,
reciclagem de resíduos e lixo produzido são impressionantes. De acordo com os
dados informados pela empresa (FIAT, 2012), destacam-se:
• redução de 56% (kWh/veículo) do consumo de energia elétrica entre
1994 e 2011;
• redução de 68% (m3/veículo) do consumo de água entre 1994 e 2011;
• redução de 44% na geração de resíduos (kg/veículo) entre 1994 e
2011;
• aumento da recirculação de água de 60% em 1994 para 99% em 2011;
• aumento no reaproveitamento de resíduos de 70% em 1994 para
100% em 2011.
5.2.4.3 Sociedade
Com novo olhar para a importância de diversos setores da sociedade, a atuação da organização amadureceu do assistencialismo, na década de 1970 e 1980, para filantropia e projetos pontuais de patrocínio na década de 1990 e início dos anos 2000, até chegar ao verdadeiro entendimento do que seria responsabilidade social. Começando com o reconhecimento da realidade e das
144
necessidades do entorno da fábrica, a Fiat observou que o bairro Jardim Teresópolis, com cerca de 35.000 moradores, poderia ser o primeiro passo das atividades de responsabilidade social. Dado que seria um projeto que também envolveria (e beneficiaria) área de atuação dos fornecedores, com capacitação técnica de mão de obra, foi criada a Rede Fiat de Cidadania. Percebe-se nos discursos dos executivos da empresa a preocupação entre tais ações e seu reflexo na longevidade da firma.
A Rede Fiat de Cidadania tem objetivo de criar um arsenal de oportunidades e possibilidades de atuação conjunta, beneficiando não só a comunidade, mas as próprias empresas, seja através do exercício da sua responsabilidade social empresarial, seja através de, eventualmente, formação de mão de obra qualificada para isso (E4).
O programa Árvore da Vida reuniu diversas ações, mapeadas com o objetivo
principal de inclusão social de crianças e jovens por meio de ações socioeducativas
e de capacitação profissional. Posteriormente, o programa foi dividido em quatro
projetos.
• O primeiro, Árvore da Vida – Jardim Teresópolis, é considerado até
hoje como carro-chefe das ações sociais da empresa. Ele pretende
transformar o bairro Jardim Teresópolis (em Betim) em um lugar
melhor para viver, de modo que a transformação pudesse ser mantida
pela própria comunidade (autossustentável). Foram criadas
cooperativas para fabricar produtos utilizando as sobras dos materiais
de produção da Fiat e fornecedores, que pudessem ser
comercializados e gerar renda. São exemplos desses produtos bolsas,
sacolas, jogos e chaveiros feitos com sobras de cinto de segurança,
dentre outros.
• O segundo projeto, o Árvore da Vida – Capacitação Profissional, foi
idealizado para buscar integrar a estratégia da empresa com ações de
responsabilidade social, a partir de um processo de capacitação
técnica dos jovens do entorno e de outras cidades. O foco dessa ação
são jovens de 18 a 24 anos que possam aprender um ofício e ser
contratados para as linhas de montagem da empresa e fornecedores,
ou mesmo integrar o quadro nas concessionárias em outros Estados
do país.
145
• O terceiro projeto, o Árvore da Vida – Parcerias, foca na promoção de
parcerias com entidades esportivas, de cultura ou educação ajuda
ONGs como o Instituto Minas pela Paz (IMPP) e a Casa Fiat de
Cultura.
• O quarto projeto, Árvore da Vida – Voluntariado, busca a mobilização e
o incentivo de práticas de voluntariado entre funcionários e parceiros.
No fim de 2010, o programa Árvore da Vida começou a ser expandido para
um movimento denominado “Nossa Betim”, junto com outras grandes empresas da
região que também buscam uma cidade justa e sustentável. Para o responsável do
programa na Fiat (E5), o objetivo inicial é proporcionar um verdadeiro entendimento
sobre a cidade de Betim, dos indicadores econômicos e sociais, a partir da visão dos
múltiplos stakeholders da sociedade: do governo, das empresas mas,
principalmente, da sociedade. O passo seguinte será catalogar de forma
transparente e isenta a verdadeira “fotografia social” de Betim, para que todos os
que queiram atuar em prol de uma sociedade melhor tenham ferramentas para
saber onde ou como atuar.
E5 comentou sobre a profunda desconexão entre a movimentação financeira,
e consequente arrecadação de impostos em Betim, e a situação de degradação
social da cidade. Abordou também sobre a obrigação moral das empresas da região
começarem a atuar, em paralelo com o poder público, nas questões sociais:
Você imagina, só a Fiat tem 37 anos que está em Betim, a Petrobras tem mais de quarenta. Você já foi a Betim? Rapaz... a cidade de Betim é uma coisa horrível! (...) Betim não tem nada! Então eu te falo assim: 37 anos de recolhimento de INSS, impostos etc. e tal, me parece que, se pegar os rankings das cidades brasileiras, eu acho que Betim está entre as vinte que tem maior receita. E a cidade é aquela desgraça que você viu. A cidade em momento nenhum se preparou para o futuro. Então você sabe o que nós fizemos este ano? (...) nós lançamos um programa com a cidade de Betim: “Betim minha cidade”. Nós tivemos que fazer isso, trouxemos uma ONG e dissemos: “Escuta, vamos agora, depois de 37 anos, vamos criar uma Betim do futuro”. Então, só agora, e aí eu te falo mais uma vez, isso prova também o grau de maturidade nosso com relação a assuntos de sustentabilidade. A gente chega e abraça isso, contrata o instituto Ethos, que tem uma corrente de pesquisa, eles têm esse tipo de organização em outras cidades, tem uma série de cidades que estão se mobilizando no mundo. Então nós temos agora que mobilizar a cidade de Betim, é uma coisa apartidária, para fazer isso (E5).
146
5.2.4.4 Governo e Legislação
Em relação às pressões, desafios e oportunidades geradas pelo governo,
percebe-se que a Fiat vem utilizando de diversas táticas de respostas estratégicas,
para neutralizar e até mesmo moldar o ambiente institucional. Entre elas destacam-
se a de manipulação e a de desafio (OLIVER, 1991).
Nos últimos anos, a organização estreitou sua relação com o governo, a partir
de outras esferas institucionais. Desde 2010, o presidente da companhia, Cledorvino
Belini, também se tornou o presidente da Anfavea, a principal entidade da indústria
automobilística brasileira, reconhecida pelo poderoso lobby nas mais variadas
esferas de governo e tida como responsável por influenciar questões de incentivos
fiscais, como redução de IPI e criação de barreiras tributárias.
O próprio presidente da Fiat hoje como responsável pela Anfavea (...), levando discussões diretamente para o governo, no que se refere à infraestrutura, a questões de financiamento... Então as próprias questões de tributos que incidem sobre os carros (...) todas essas são discussões que uma empresa-líder como a Fiat tem muita pertinência para falar e discutir com o poder público, porque ela hoje atua diretamente na questão desses temas (E4).
Um exemplo (de 2011) foi a comemorada vitória das montadoras instaladas
no país após a sobretaxa para a importação de veículos de marcas que não
possuam parque produtivo no Brasil, afetando principalmente as montadoras
chinesas, tidas pela associação (ANFAVEA) como a maior ameaça futura da
indústria nacional.
E eu acho que em relação a esse tema que você está falando, de navegação no ambiente, a gente vê que isso é uma questão que preocupa o Belini e que ele, por exemplo, esse aumento do IPI para importados. Isso certamente tem muito esforço dele como presidente da ANFAVEA (E11).
Mais recentemente, Fiat e a Anfavea, vêm atuando em parceria com o
Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro), além de outras
instituições públicas, a fim de criar uma regulamentação que obrigue todos os
veículos vendidos no Brasil a ter nível de eficiência energética categorizado – o
chamado Programa Brasileiro de Etiquetagem Veicular (PBEV). Aqui, claramente
existe uma tentativa de uso de estratégia de desafio (OLIVER, 1991), com uma
postura ativa para buscar moldar o ambiente.
Assim como existe atualmente uma categorização sobre o consumo nos
produtos da chamada “linha branca”, a avaliação PBEV atribui nota de A a E, por
147
categorias, do menor para o maior consumo respectivamente. Ou seja, A é o veículo
mais econômico e E o menos econômico. A obrigatoriedade serviria de insumo para
a decisão de compra do consumidor e como incentivo para que toda a indústria
buscasse melhorias tecnológicas e inovações sustentáveis nos produtos.
Além da Fiat, em 2011 somente outras cinco montadoras aderiram ao
programa e, atualmente, a adesão é voluntária e renovada anualmente. Nos
comparativos feitos atualmente pelo Inmetro, o único carro com nota A no ranking,
na categoria de subcompactos, é o Fiat Uno Mille Fire Economy 1.0, com
performance de 8,9 km/L de álcool (ciclo urbano). O modelo já havia obtido a
classificação máxima em 2010. A expectativa é que, a partir de 2012, oito
montadoras, representando mais da metade dos veículos produzidos no país,
participem do programa, o que permitirá ao consumidor fazer um comparativo dos
gastos de combustível dos veículos novos à venda no país, pois as montadoras que
aderiram à iniciativa serão obrigadas a colocar o selos de certificação.
Os analistas do setor acreditam que, em um futuro próximo, os incentivos
fiscais, como redução de IPI, poderão ser baseados de acordo com esse índice de
eficiência energética. Assim, a Fiat estaria novamente se antecipando à pressões do
ambiente institucional.
Ainda na busca sobre motivação para as ações de Rasc, questionou-se todos
os entrevistados sobre legislação ambiental e o papel do governo e demais órgãos
públicos como motivador da empresa. As evidências apontam pouca pressão desse
stakeholder na Fiat, conforme os relatos:
O governo, hoje, se limita a te colocar limites de emissões, geralmente emissões de gás nocivos (E1). A lei potencializa a ação? Eu acredito que sim, e eu acho que a lei deve servir para isso mesmo, é um papel importantíssimo que o governo faz, mas nem só dessa forma que nós gostamos de trabalhar. Não é assim que a gente trabalha. No nosso comitê dificilmente a gente trata de um assunto porque está sendo motivado por uma lei. O que a gente fica pensando é assim: “O que a gente pode fazer em termos de inclusão? O que podemos fazer em termos ambientais? O que podemos fazer em termo de comunidade vizinha?” (E2). (...) eu acho que o papel do governo é muito importante para forçar para que essas coisas aconteçam e movimentar todo o mercado naquela direção da lei. Então eu acho que isso é bem necessário. Só que a gente não faz para cumprir a lei, mas a gente faz também como pesquisa e como maneira de sair na frente no mercado, pensando também em sustentabilidade. Por exemplo, não tem nenhuma lei que fala de carro elétrico hoje, a gente já faz um carro elétrico. Hoje a gente tem um carro elétrico que, se você quiser
148
comprar, custa, sei lá, R$ 120.000,00, você pode comprar um Palio Weekend elétrico que é uma parceria da Fiat com a Itaipu. Isso não tem nenhuma lei de governo, nem nada, nem próximo de ser discutido, nenhuma montadora está caminhando nesse sentido aqui no Brasil de fazer um carro elétrico, e nós já temos uma parceria com a Itaipu. Então a preocupação não é só com a lei não. A lei é muito importante para massificar que o sistema é para toda a gama. Quando sai uma lei dessa que você tem que reduzir consumo, tem que fazer alguma coisa, alguma norma de segurança, isso sempre tem um custo envolvido, para obrigar as empresas a colocarem esse custo em toda produção precisa de uma lei, senão você vai acabar atendendo só a um pedaço e não à totalidade (E9). Eu acho legal o governo vir colocando algumas métricas a serem alcançadas (...) porque ele motiva as empresas a buscarem soluções e mexe com aqueles que não estão, talvez, tão ligados ao tema, ou que não querem saber de sustentabilidade (E2). Você tem o caminho que é a pressão e você tem o caminho das escolhas. Eu acho que tem os dois lados. No próprio caso da Fiat mesmo, por questão de legislação ambiental, ela optou como escolha a seguir as normas europeias para uma série de coisas e não as normas brasileiras. As normas brasileiras são muito mais simples, mas é uma escolha e não foi uma obrigação de legislação – ainda. Então, você tem os dois caminhos. Eu não tenho dúvida, quando a gente olha pro nosso mercado, do ponto de vista de evolução de cabeça do consumidor, de que o tema sustentabilidade nos seus diferentes vieses, vai ser cada vez mais central (E10).
Para a empresa, mesmo assim, o governo ainda está muito reativo em
relação aos efeitos colaterais dos veículos, e poderia atuar mais ativamente,
principalmente no tema mobilidade urbana. Ao se questionar alguns executivos,
durante as entrevistas de campo, sobre a atuação da empresa e do setor para
ajudar a resolver a controversa questão de engarrafamentos, esses sustentaram o
discurso de que os grandes responsáveis para solucionar questões de mobilidade
urbana são os órgãos públicos, e não a indústria (que diariamente insere centenas
de novos carros nas ruas).
O problema nosso é na utilização do carro! (...) Não tem problema em você ter carro, inclusive nós queremos até vender mais carros, mas não usa o carro durante a semana, usa transporte público. O carro, como diz no documento do carro, está lá: “veículo de passeio”. O carro é para você usar de noite, quando você for jantar com seu marido, quando precisar levar seu filho em uma emergência. Não é para usar no dia a dia. No dia a dia você tem que usar transporte público. (...) As pessoas aqui no Brasil não vão andar de metrô, não vão andar de ônibus, pois isso é sinal de pobreza. Quando que aqui no Brasil o cara vai assistir a uma ópera, vai sair de casa e entrar num metrô igual você vê em Milão, em Nova York. (...) Então a falta de transporte público no Brasil é um issue. Mas não é só para a indústria automobilística, não. É para todo mundo! (E1).
149
5.2.4.5 Acionistas
A primeira grande pressão enfrentada pela nova gestão foi a demanda dos
acionistas por melhores resultados financeiros. A Fiat do Brasil precisava voltar a dar
lucros. Tanto para manter a operação local, quanto para pode cobrir os resultados
financeiros na matriz italiana, que estava na maior crise da centenária história. Com
o início desse grande projeto de reestruturação estratégica da firma, o presidente
Belini reforçou para todos os setores da empresa que a busca da “liderança pelo
resultado econômico” no centro da estratégia seria a única forma de a empresa
evitar o processo de declínio.
Para atender às expectativas dos acionistas, foram revistos os processos
internos, e determinado que a nova meta fosse a busca da “liderança em
resultados”, e não mais a “liderança de vendas”. Essas ações possibilitaram que os
resultados financeiros da Fiat do Brasil voltasse a ser positivo em menos de um ano
e a empresa pôde voltar a contribuir com os resultados globais da Fiat. Ainda,
apesar do novo foco, apenas no ano de 2004 a Fiat perdeu o posto de “liderança em
vendas” no Brasil, conquistado em 2001.
Deixamos de almejar a obtenção dessa liderança (de mercado) a qualquer custo e passamos a buscar a liderança de resultados empresariais. Queríamos ser a empresa do setor com a melhor imagem interna e externa, o melhor atendimento aos clientes, a melhor equação de giro de capital, o melhor resultado econômico, o melhor retorno do investimento e a melhor geração de caixa para poder investir em novos produtos, novas tecnologias e novos processos. Queríamos ter o melhor relacionamento com todos os stakeholders” (trechos de entrevistas do presidente Belini, extraídos do livro de Tanure e Patrus, 2011, p. 36).
O entrevistado E10 elucidou a postura adotada pela empresa, após o ano de
2004, e expôs a sua percepção de que, se a empresa mantivesse a busca somente
pela “liderança em vendas”, poderia pavimentar o caminho para o polo da
autodestruição (FLECK, 2009). Além disso, este relato ilustra como é a atual
percepção dos gestores sobre a importância da gestão dos múltiplos stakeholders:
E o que é essa liderança de resultados? Não basta pra uma empresa como a Fiat ter liderança de mercado. Nós podemos ter liderança de mercado e ter prejuízo, e aí essa empresa acaba. É preciso ter uma liderança de resultados. Ser best in class em retorno do acionista, retorno de investimento e etc. Pra isso a gente precisa ter qualidade, produto e inovação, é um pilar técnico. Competitividade numa noção integrada e de relacionamento. Aqui estamos pensando com todos os stakeholders. Então, quando ele (Belini) vai
150
buscar uma liderança de resultados, quando ele vai pensar um modelo de negócios pré-futuro, quando ele vai pensar um modelo de negócio que leve em conta o relacionamento com todos os stakeholders e olha o futuro, ele traz, naturalmente, a noção e o conceito de sustentabilidade (E10).
5.2.4.6 Clientes e Reputação
A empresa entende que é preciso ter os clientes como foco da empresa, e
buscar formas de aumentar o grau de satisfação e fidelização com a marca.
Algumas das ações para atuar de forma positiva com esse stakeholder incluem a
melhoria dos processos de comunicação e a ampliação dos investimentos em
propaganda institucional.
Ademais, a Fiat tem uma constante preocupação com a gestão da imagem,
principalmente depois dos desgastes das primeiras fases da empresa no Brasil, e vê
nas suas ações de responsabilidade socioambiental uma força para preservar no
futuro a atual percepção do consumidor, que, pelas atuais pesquisas feitas pela
empresa, é bem positiva:
Mas, assim, eu diria o seguinte: hoje, qualquer ação que você faça e que tem um impacto econômico financeiro, mas que está ligado a um aspecto sustentável, ele não recebe uma “negativa”, entendeu? Porque a gente sabe que do ponto de vista de percepção da sociedade isso está crescendo muito. Então, assim, no nosso caso especial, nós temos uma preocupação muito grande com imagem, porque nós saímos de trás, né? A Fiat carregou ao longo de anos uma imagem de empresa que tinha qualidade ruim, só fazia carro barato etc. etc. etc., a herança do Fiat 147, tal. (...) hoje se eu faço alguma coisa que você fala, assim, “não, isso aí eu vou aumentar o custo do carro, vou precisar de um maior investimento, mas vai me fornecer por outro lado uma melhor imagem da sociedade”, não é questionado. E hoje a gente sabe que os assuntos ligados a sustentabilidade, seja do ponto de vista ecológico, de responsabilidade social, têm um apelo muito grande da sociedade. (...) eu estou falando do viés econômico-financeiro. Agora, tem outro viés também que impacta nessa tomada de decisão que é a consciência, hoje, que os membros do comitê diretivo têm para o tema, entendeu? Então eu te falo o seguinte: “não vai me dar imagem, vai aumentar o meu custo, vai aumentar o meu investimento, porém é o que temos que fazer!” Por quê? Porque é assim, porque do ponto de vista da sustentabilidade a gente está pensando num país para o futuro, numa empresa para o futuro, nós temos que fazer isso hoje (E5).
Para a empresa, apesar dos seus grandes investimentos nos meios de
comunicação para promover seus produtos, existe preocupação em garantir que só
se iniciará uma intensiva divulgação na mídia sobre as práticas de Rasc quando
todos os “telhados de vidro” (sic) (E2) forem retirados. Ou seja, a empresa não quer
se posicionar publicamente como uma empresa “100% ecologicamente correta”
151
enquanto houver risco de, ao aumentar a expectativa dos clientes, se tornar alvo de
criticas e novos questionamentos, pois, conforme visto, imagem e reputação são
fundamentais para a empresa.
Até 2011, os programas de responsabilidade socioambiental e patrocínios
culturais informados para o público e listados no site eram (FIAT, 2012):
• educação no trânsito: Moto Perpétuo; Você Apita; Direção Segura;
• inclusão social: Árvore da vida; Programa Autonomy;
• foco nos funcionários: Fundação Fiat;
• patrocínios culturais (filantropia): Fiat Mostra Brasil; Casa Fiat de
Cultura; Tesouros do Brasil; Um Poema Chamado Brasil; Brasil dos Meus Olhos; e
Retratos do Brasil.
Sobre reputação da marca, é importante registrar que existe um grupo
multidisciplinar na Fiat chamado Comitê de Imagem, que possui ampla autoridade
no processo decisório da Fiat. A empresa não quer mais carregar o peso da antiga
mácula de montadora de carros ruins e baratos, herança dos problemas com o Fiat
147. Assim, todo e qualquer projeto que venha a utilizar recursos próprios da Fiat
precisa passar pela aprovação desse comitê.
Em uma das entrevistas, um executivo (E4) comentou que “realmente só vão
em frente projetos que façam sentido e possam agregar valor à marca”. E ratifica: “O
objetivo não é olhar projetos que gerem resultado no curto prazo, mas que ajudem a
reputação da marca no longo prazo” (E4).
Todas essas demandas, o primeiro receptor, áreas das mais diversas, elas se reúnem num comitê chamado Comitê Imagem, que é um comitê com todas as áreas que de uma forma ou de outra lidam com a imagem da empresa. Todos esses programas são analisados sob um prisma de imagem que a Fiat possui, que ela tenta revisitar permanentemente para ela atuar nisso, e, a partir desse Comitê Imagem, são analisadas as ações mais pertinentes dentro da filosofia de atuação da empresa naquele momento. Então todo projeto ou patrocínio, seja ele realizado com recurso próprio da Fiat, seja realizado com recurso de incentivo fiscal da Fiat, tem um trâmite de Comitê Imagem e Comitê Diretivo, ele precisa dessas duas atas para que ele seja efetivamente realizado. Seja de R$ 200,00, seja de R$ 30.000,00 (E4). Por um lado pode parecer uma burocratização de um processo, mas por outro. se ele é feito com uma metodologia adequada, com uma periodicidade adequada e com um método de análise já alinhado entre as partes, ele é muito bom. Porque realmente só vão em frente projetos que façam sentido e que possam agregar valor à marca, né? Tanto para o seu resultado final quanto para a imagem da marca da Fiat. Então isso é interessante e importante. E, a partir desse ano de 2011, a gente está
152
começando a realizar um trabalho de gestão da reputação da Fiat, que é um trabalho diferenciado, em parceria com um instituto chamado Reputation Institute [http://www.reputationinstitute.com] aqui no Brasil, e que a gente vai ter um olhar ainda mais diferenciado, não só sobre imagem, que era a função do comitê até então. E quando a gente fala de imagem, existe uma visão mais imediatista e que pode oscilar um pouco de acordo com o mercado, com a crise, eventos, produtos, concorrência e tudo. E reputação é uma construção da imagem num prazo mais longo, ou seja, as vivências das pessoas em relação àquela marca, o que as pessoas dizem em relação àquela marca e o que a própria empresa diz em relação àquela marca. Então ele é o estudo de um sentimento mais perene do que as pessoas têm em relação àquela marca e menos pontual. Porque às vezes, ao longo dos anos, ela tem uma história diferente com alguns grupos de pessoas (E4).
A Fiat possui uma área de pesquisa que busca, com a ajuda de antropólogos
e instituições de pesquisas, como a Coppead e Dom Cabral, entender em
profundidade o desejo e expectativas dos clientes. De acordo com um entrevistado,
o importante hoje para empresa não é “olhar o cliente”, mas entender “o olhar do
cliente”:
Então hoje a Fiat entende que não é foco no cliente, não é olhar o nosso produto através da lente do cliente, do foco do cliente. Então isso a gente vê que não é o suficiente para a gente ter o negócio. Então a gente hoje tem certeza que a Fiat é uma empresa orientada ao cliente, quer dizer, a gente tem que conseguir, através das necessidades do cliente, conseguir integrar valor aos nossos produtos, só assim a gente vai conseguir realmente ter uma utilidade interessante no negócio. (...) Mas aí vem esse grande desafio, que talvez é o grande desafio das principais organizações hoje no Brasil e no mundo, né, como que a gente vai conseguir fazer através dessa orientação do cliente, através dessa lente do cliente, para a gente satisfazer essas necessidades, esses anseios, esses sonhos dos clientes, que eu falei mais atrás, e conseguir ter lucro, conseguir crescer, conseguir investir, quer dizer, esse hoje é o grande desafio talvez de todas as organizações, né. Então para a gente fazer isso, hoje a gente tem certeza de uma coisa, a gente não pode usar as mesmas ferramentas que a gente vem usando, que as indústrias vêm usando. Então a gente tem que estar sempre fazendo diferente, a gente está sempre tentando pensar diferente. A gente tem que chegar aos resultados não da mesma forma (E10). Então tem a área de pesquisa de mercado, que é uma área também que há doze anos a gente gerou também uma expertise em análise, né, em trabalhar dados, entender o comportamento de consumo, mas é uma expertise não limitada, mas é uma expertise dentro da indústria automobilística (E10).
Esse processo de buscar compreender profundamente todas as o
comportamento do consumidor não fica restrito somente as áreas de pesquisas da
empresa. Conforme evidenciado por uma pesquisadora da Coppead entrevistada
para a pesquisa:
Esse caso eu acho que é interessante porque eu acho que fala um pouquinho dessa liderança da empresa. A (Prof. X) foi fazer uma entrevista na Globo News, num programa que chama Conta Corrente, enfim, essa entrevista passou num sábado a noite, a primeira rodada da entrevista, e na
153
segunda-feira quando a (Prof. X) chegou aqui na escola tinha um e-mail escrito assim: “Parabéns!” Esse e-mail era um e-mail que dizia assim: “Sou Belini, presidente da Fiat, eu vi a sua entrevista na Globo News e acho que você pode contribuir com a nossa empresa. Se tiver interesse, por favor, entre em contato.” E aí assinado “Belini”. Foi o único e-mail que a (Prof. X) recebeu da entrevista, quer dizer, mas foi um e-mail importantíssimo. E ele mandou sábado meia noite esse e-mail quase, isso fala um pouquinho desse estado de permanente atenção. Quer dizer, de alguém que está olhando uma entrevista de alguém falando sobre um livro, sobre beleza e comportamento do consumidor e que se interessa por trazer essa discussão para dentro da empresa. E a (Prof. X) respondeu o e-mail agradecendo, dizendo que estava a disposição e em seguida a gente recebeu contato do gerente de pesquisa da empresa (E11).
Eu acho que o Belini talvez seja importante para dar esse exemplo. Quando ele é alguém que pega determinados temas e vai lá em baixo, olha, enfim, o detalhe volta e faz a discussão estratégica. Eu tenho a impressão de que eles fazem esse exercício de pensar a estratégia, mas ir em alguns momentos numa atividade que poderia ser considerada de muito detalhe para voltar, para analisar. Isso me chamou muito a atenção (E11)
Com o marcado mais competitivo, a Fiat efetuou uma série de melhorias nos
veículos, buscando atender aos desejos específicos de cada segmento. Com
investimento nos centros de pesquisas, onde antropólogos e especialistas buscam
entender as aspirações dos consumidores, a Fiat acredita ser hoje a empresa com o
maior conhecimento das expectativas, gosto e desejos dos diversos tipos de
consumidores brasileiros.
Mais recentemente, tem buscado capturar valor com novos processos de
produção, com o uso de materiais mais ecologicamente corretos, e com a oferta de
produtos com apelo de economia no consumo de combustível:
Hoje no design te falo que a gente atua através de busca por materiais que não agridam tanto o meio ambiente e que sejam reciclados também. Então, por exemplo, temos o fio que faz tecido que vem da reciclagem da garrafa pet – então tem o fio que a gente chama de “fio pet” que hoje pode ser utilizado na indústria automobilística (E3). Eu acho que (produtos mais econômicos) são um driver forte, principalmente nos segmentos de entrada (E7). (...) estamos fazendo uma modificação na nossa linha de pintura. Hoje a nossa linha de pintura é a base de solvente que polui muito. A gente vai transformá-la toda à base d´água, que é uma linha muito mais limpa, vamos falar assim. (...) Está mudando todo o sistema de abastecimento, a catalisação. Está aqui dentro, sinto que sim, e na medida do possível ela está acontecendo. É uma obra enorme que, inclusive eu, nem imaginava que fosse acontecer tão rápido, uma medida necessária e também que acrescenta esse valor ecológico no produto (E3). (...) de cinco anos para cá (2011) a gente vem cuidando dessa parte de produtos, de tornar o produto mais sustentável, tornar a Fiat mais
154
sustentável. (...) Como produto, o que eu considero mais importante é esse, é a utilização dessas matérias-primas recicláveis, de a gente poder ter produtos que agridam menos a natureza. Esse é o foco principal (E7). (...) estou olhando a parte de produto, quais iniciativas que a gente pode ter que vão envolver sustentabilidade, porque vender carro por si só já não é sustentável, né? Se fosse fazer uma ação de sustentabilidade numa indústria automobilística, seria não vender carro, só que esse é o nosso business. Então a gente tenta fazer isso porque as pessoas precisam disso, e é uma coisa que não vai deixar de existir, a gente precisa fazer isso da maneira melhor possível para o meio ambiente, porque a gente não quer que depois os recursos se esgotem e aí a gente mesmo vai estar acabando com o nosso business (E9).
Outras iniciativas de diferenciação por inovação, com motivação em Rasc, e
no apelo de menor consumo de combustível, que merecem destaque é o Eco Drive
e o Econômetro. O Eco Drive é um sistema desenvolvido na Itália que possibilita o
upload de informações de modo de condução do motorista, indicando como o
condutor poderia dirigir de maneira mais eficiente no uso de combustível e reduzir o
índice de emissão de CO2. A Fiat também publicado no website e entregue, junto
com o manual dos carros, um guia de consumo consciente:6
Eco Drive que nada mais é que um software que te ensina a dirigir da maneira mais econômica possível. Que é o seguinte: você entrou no carro, começa dirigir o carro e colocou o pendrive lá na USB do carro e aí vai monitorando como que você está dirigindo. E aí esse software te fala: “olha, você está passando a segunda marcha muito rápida”, ou então, “está demorando demais para colocar, troca a marcha mais rápido que vai ser mais econômico e vai poluir menos”. E aí depois você joga via USB dentro do computador e aí lá tem um software que te fala tudo isso, te dá um relatório. E aí você tem metas de emissões que você tem que cumprir naquele trajeto que você faz todo dia, e aí vai te educando a dirigir de uma maneira que polui menos. Isso existe na Itália e estamos trazendo para o Brasil (E9). (...) você bota o pendrive, ali você mede a sua maneira de guiar, como você pode economizar, o que você está fazendo de errado, é nisso a gente já está trabalhando, em cima dos nossos produtos para botar o Eco Drive no Brasil. Quando a gente trouxe o 500 em 2009, a gente teve essa ideia, só que a gente não tinha tempo hábil para colocar isso em prática... era um carro importado, a gente ia precisar fazer muitas adaptações que o nosso tempo, nosso lead time, não era suficiente para colocar isso. Então agora nós já vamos trazer isso para o Brasil pensando justamente nessa questão da sustentabilidade, do nível de emissões, como que as pessoas vão dirigir, como que as pessoas vão cuidar do produto, cuidar dessa maneira de poluir o meio ambiente. (E7) A gente tem o Econômetro, que é um instrumento que nós criamos no Mille em 2009, na verdade em 2008, setembro de 2008. (...) Então aquele instrumento que você tem no seu quadro que hoje já está no Mille, está no Palio Fire e no Novo Uno Vivati, que é esse segmento mais de entrada, um carro que consome menos, que emite menos. Ali nada mais é do que um
6 Tanto o manual do Eco Drive quanto o Guia de Consumo Consciente estão disponíveis nos anexos.
155
indicador de consumo instantâneo na forma analógica. Só que aquele negócio se tornou tão importante para o cliente, que a gente tem vários depoimentos que o cara já não consegue mais dirigir sem olhar para aquilo ali, para manter o ponteirinho dele no verde. Onde ele está consumindo menos, ele está emitindo menos poluente, aí nessa mesma fase nós criamos um guiazinho7 de como dirigir economicamente e ecologicamente correto de maneira mais eficiente (E7)
5.2.4.7 Concorrentes
Em relação à arena de negócios, diversas evidências sugerem que,
atualmente, o maior desafio visto pela Fiat é como responder à ameaça dos novos
entrantes, principalmente pelo preço dos carros chineses e o custo-benefício dos
modelos coreanos que, como visto no Capítulo 4, vêm ganhando rapidamente
importante participação no mercado brasileiro:
Quando você olha para as coreanas, para as chinesas, para os investimentos e para os benefícios fiscais que elas têm nos países delas e compara o nosso, o nosso custo do carro hoje chega a ser quase 40% mais caro do que esses outros produtos. Então você pensa assim: “poxa, para a gente fazer o mesmo esforço que a China, mesmo assim a China trazendo um carro para o Brasil, o nosso é 40% mais caro”. Daqui a pouco se você tiver a chance de ter dois carros com os mesmos aplicativos, te dando o mesmo conforto, a mesma segurança, você vai comprar um carro 40% mais caro? Para você comprar, ele tem que ter um algo mais, seja a marca, seja a reputação, seja o valor agregado (E6). (...) [um grande risco] são os produtos entrantes no mercado. Do mesmo jeito que há quinze anos atrás, há vinte anos atrás os japoneses não faziam o mínimo peso, hoje já são referência. Há dez anos atrás os franceses não faziam o mínimo peso, hoje já são parte grande desse mercado, e agora os chineses. Então eu acho que os produtos entrantes, os novos entrantes no mercado, são um importante fator de risco (E7). Eu acho que o grande desafio agora é o que todo mercado de consumo está sofrendo de maneira geral, que é a invasão das empresas estrangeiras, com o dólar baixo a gente não é competitivo para suportar... eles são muito competitivos para entrar no país. Então vai vir um leque grande aí de chineses, coreanos, e eu acho que a grande dificuldade pode estar aí. O mercado globalizado, ele vai contra a sustentabilidade da empresa dentro do país, porque eles conseguem chegar com um custo mais baixo do que a gente. Ainda não tem um nível de qualidade muito bom, mas eu acho que isso é questão de tempo, e eles vêm para brigar muito forte. A Hyundai mesmo já mostrou isso, eu acho que o grande desafio nosso está em manter a nossa liderança e a fatia de mercado que a gente tem mesmo com a chegada de tantos novos competidores. Se você pegar, não muito tempo atrás, era Fiat, Ford, GM e Volkswagen, não tinha outro... e ali você tinha o mercado brasileiro para aquilo tudo. Hoje a gente deve ter aqui no Brasil acho que umas treze, quinze montadoras e junto com essas que vem de fora e têm chegado competitivas, eu acho que é aí que está o desafio (E9).
7 O guia de consumo inteligente
156
Obviamente a gente tem uma série de fatores de mercados que trazem maior complexidade a ser líder hoje no Brasil. Um deles é um crescimento de competitividade do mercado. Se a gente fosse pegar o mercado hoje, nós estamos em 2011, provavelmente você lembra ali em 1992, 1990, quando a gente sabia falar o nome de todos os modelos que tinham no mercado brasileiro. A gente sabia de cor todos os carros, de todas as marcas. Era fácil. Então, ali no início da década de 1990, você tinha em torno de 21 marcas operando no Brasil e cerca de cinquenta modelos. Quando a gente chegou a 2010, pouco mais de vinte anos depois, já eram 42 marcas operando e mais de 250 modelos. Hoje, eu que trabalho na indústria automobilística, tenho dificuldade de falar todas as marcas e todos os modelos na rua. Ou seja, houve um crescimento de competitividade muito grande. Aliado a isso, o Brasil que foi durante anos vigésimo e depois acho que ali na casa entre décimo e vigésimo maior mercado do mundo, no ano passado se tornou o quarto maior mercado do mundo de automóveis. O mundo com a crise de 2008, todo mercado dando uma flutuada, você vê um Brasil crescendo e se tornando um dos maiores mercados do mundo... é natural que o mundo inteiro olhe pra cá. Então você começa a ter mais montadoras coreanas, chinesas, indianas, fora os outros players que já nem são mais tão novos assim, franceses, japoneses e as quatro grandes. Então é um crescimento de competitividade que se multiplica. Essa talvez seja uma grande ameaça do ponto de vista econômico (E10).
Porém, os fatos indicam que a empresa não está parada. O lobby feito em
conjunto com as demais montadoras tradicionais para pressionar o governo a
aumentar o IPI para carros importados, em 2010, é uma clara evidência da
estratégia de manipulação por influência (OLIVER, 1991).
Para os entrevistados, apesar de todas essas ameaças dos novos entrantes,
a manutenção da Fiat na liderança de vendas e de resultados é possível pela
maneira rápida que a firma monitora e responde às mudanças no ambiente, pelo
conhecimento das preferências e do gosto dos diferentes tipos de consumidores
brasileiros, além das inovações apresentadas pela firma.
(...) eu acho que [a razão da liderança da Fiat] é dessa cultura mesmo de responder rápido ao mercado. Algumas coisas que nós fizemos no mercado que sustentam a liderança nenhuma montadora faz. Então, assim, por exemplo, quando teve a redução do IPI em 2009, né, 2008, final de 2008, quando teve a crise... nós cancelamos todas as notas fiscais. Quando o governo liberou a redução do IPI, nós tínhamos 45.000 carros no estoque da rede, nós cancelamos todas as 45.000 notas e retransmitimos com IPI reduzido, ou seja, com os preços novos em questão de dois ou três dias. Enquanto as outras montadoras gastaram uma a duas semanas. Ou seja, o que a gente vendeu de carro com preço novo e que as outras não conseguiram vender. Então é toda essa agilidade, são em todos os locais da empresa. Você vai no industrial existe isso, você vem no comercial, você vai na engenharia, você vai em compras, você vai na qualidade, financeiro, em todas as áreas existe muito esse espírito de agilidade, de cooperação (E7).
157
5.2.4.8 Fornecedores
Além da constante busca de estreitamento de parceria no relacionamento
com os fornecedores, uma das diretrizes da política de responsabilidade
socioambiental da Fiat é levar a cultura de preservação para a cadeia de valor e
demais stakeholders. A montadora investe no aumento da conscientização e no
incentivo de engajamento das empresas fornecedoras, aumentando as suas
expectativas sobre a postura ambiental de cada parceiro comercial.
Nidumolu, Prahalad e Rangaswami (2009) afirmam que o segundo estágio de
responsabilidade socioambiental é tornar toda a cadeia sustentável. Com os
fornecedores, a Fiat reforçou a exigência de comprovação de licenciamentos
perante os órgãos fiscalizadores e observância de boas práticas ambientais. Um
exemplo, citado mais de uma vez na pesquisa de campo, foi o processo de
certificação das gráficas de Belo Horizonte, após a Fiat decidir que todo trabalho
gráfico deveria possuir o selo Forest Stewardship Council (FSC) para impressos, a
partir de 2009. De acordo com o responsável pela área de comunicação interna, a
Fiat foi a grande indutora desse tipo de certificação das gráficas de Minas Gerais:
Eu lembro quando a gente tomou essa decisão. Agora já deve ter feito uns dois anos que, em Minas, nós não tínhamos parque de fornecedores certificados ainda. Então nós chamamos os fornecedores e falamos: “A Fiat está caminhando nessa direção, vem com a gente porque senão nós vamos sair do mercado mineiro”. E hoje é legal ver, porque a gente tem umas seis ou sete boas gráficas, talvez até mais, em Minas, certificadas. É lógico que isso não veio só da Fiat, mas com o tempo virou um mercado próprio também, mas você tem hoje. Então é legal isso, eu estou me colocando na lógica de cliente. e acho que isso vale pra outras coisas (E10). Então, assim, é aí que eu acredito no poder da empresa para fazer mudança na sociedade, você entendeu? Então nós, como Fiat, fomos indutores em Belo Horizonte para trazer gráficas certificadas. Obrigamos as gráficas a se certificar, obrigamos todas as áreas da empresa a comprar papel certificado. Hoje o papel que está na impressora é papel certificado. Hoje o papel com que se faz qualquer material nosso é papel certificado (E5).
Ainda de acordo com um diretor da Fiat entrevistado “no processo de
implantação da nova unidade fabril em Pernambuco, desde as primeiras reuniões
com os fornecedores, sempre o primeiro tema da agenda é sustentabilidade” (E1). A
empresa acredita que terá a chance de iniciar, na nova planta, um verdadeiro marco
no setor automotivo no Brasil no que se refere à responsabilidade socioambiental.
158
As evidências das entrevistas apontam para um correto entendimento sobre a
corresponsabilidade da Fiat pelas práticas dos fornecedores e sobre o poder de
influência da montadora em toda a cadeia de valor:
Para eu garantir que um produto Fiat esteja totalmente livre de trabalho escravo, eu vou ter que ir até o subfornecedor do meu fornecedor. Porque o que a sociedade enxerga é o produto Fiat (E2). (...) mesmo a gente se esforçando para fazer o melhor, para fazer o diferente, nós estamos preocupados com mão de obra infantil. Aí você fala: “mas aqui na Fiat tem mão de obra infantil?” Aqui não, mas no fornecedor do fornecedor do fornecedor não sei. Eu sou responsável também, não sou só responsável por esta cerca aqui não, sou responsável pelo meu fornecedor, sou responsável pelo meu concessionário, sou responsável pelo carro que eu coloco na mão do cliente (E5).
Dentro do comitê (de sustentabilidade) tem pessoas de compras que são responsáveis pelo contato da fábrica com os fornecedores, e a gente comunica para os fornecedores quais ações de sustentabilidade que a gente está tomando e sugere que eles sigam na mesma linha, acreditando que esse é o caminho correto. Tem uma outra maneira também que, para escolher os fornecedores para vender para a Fiat, a gente tem que atender algumas normas e requisitos que estejam alinhados com essa cultura de sustentabilidade da Fiat (E9). Os fornecedores de tempos em tempos são requalificados a fazer isso, para poder serem aptos a fornecer para a Fiat. Vez ou outra a gente tem notícia de um fornecedor, por exemplo, que não tem um restaurante da maneira que devia, ou então não tem a relação com os funcionários em termos de contrato de trabalho que deveria. Então esse fornecedor a gente nem chama ele para ser um fornecedor da Fiat, mesmo que o preço dele seja mais baixo, seja possivelmente mais baixo (E9).
Uma parceria importante estabelecida pela Fiat em 2010 é com o instituto
Ethos, que será mais um canal multiplicador da visão e das práticas da empresa
entre os fornecedores:
(...) a Fiat tem a pegada de carbono, que foi um trabalho que foi feito e tudo mais, agora passa para os fornecedores, quando entra o Ethos ajudando uma plataforma, você fazer um diálogo com os fornecedores e dizendo para eles assim: “olha, se nós não trabalharmos de uma forma coletiva...” (...) quem que me garante 100% que os meus fornecedores não têm mão de obra escrava ou que não estão comprando de mão de obra escrava? (E6).
5.2.4.9 Concessionárias
O estreitamento da parceria entre fábrica e concessionárias é fundamental
para garantir aderência às estratégias e a postura de rápida resposta ao mercado. O
exemplo mais citado durante a pesquisa é que no dia seguinte ao anúncio da
159
medida de redução do IPI, em 2008, a Fiat conseguiu alterar imediatamente o preço
de todos os produtos nas concessionárias, com rápida emissão de novas notas
fiscais. O preço do Fiat Mille, por exemplo, foi de 23.400 reais para 21.600 reais,
enquanto as principais concorrentes demoraram cerca de duas semanas para fazer
a mesma ação de redução de todos os preços dos produtos:
Quanto maior for a parceria da fábrica com a concessionária, melhor será para todo o sistema comercial, industrial e financeiro. Acima de tudo, vamos ter como consequência a demanda correta do mercado no sistema logístico, por modelo, versão, cor etc. (...) É melhor ter uma concessionária saudável, que paga as contas, do que empurrar-lhe vendas e ela ter dificuldades de vender e honrar seus compromissos (trechos de entrevistas do presidente Belini, extraídos do livro de Tanure e Patrus, 2011, p. 88).
Quando observado o tema de responsabilidade ambiental e social, o pilar
concessionária é tido como basilar para a empresa, dado que é lá (na
concessionária) que ocorre a principal interface com o cliente final. Mesmo assim,
até 2011 a Fiat ainda não havia começado um processo sistemático e estruturado de
conscientização e atuação de responsabilidade socioambiental com as
concessionárias. A empresa espera que, em breve, possa implantar uma
metodologia de responsabilidade socioambiental nos quase 500 pontos de
atendimento no Brasil.
Hoje a gente tem 500 pontos de atendimento no Brasil, entre concessionárias e pontos de atendimento, claro que isso não vai se dar de um tempo para outro, elas são empresas autônomas, mas muitas já têm ações próprias de relacionamento social ou ambiental, né? E depois a gente vai tentar alinhar isso numa metodologia mais sistêmica... do que a Fiat entende como atuação sustentável ao longo dos anos e tudo, mas tem alguns pilares que já são superdesenvolvidos, principalmente o relacionamento com o cliente (E4). Do outro lado da cadeia, eu tenho a concessionária, que é meu cartão de visita com o cliente. Aquilo que uma concessionária Fiat está falando, o cliente está ouvindo a Fiat falar. É o nosso ponto de contato com o cliente. Não é o único ponto, mas é um deles, talvez é o que mais está próximo ao cliente. Ele ouve nossas propagandas, os Big Brothers que a gente coloca lá... aquilo tudo vai montando uma imagem do que é Fiat; mas, na hora da verdade, quem vai vender um carro para ele, quem vai atender um carro em pós-venda vai ser nossa concessionária. Então nós temos muito claramente na nossa cabeça que temos que trabalhar da mesma forma a nossa rede de concessionárias. Porque, se eu começo a me posicionar como uma empresa que recicla a água industrial, que utiliza outros recursos energéticos para poder mover as máquinas, que está trabalhando projetos para poder diminuir o consumo de combustível, diminuir o índice de poluição, aumentar o índice de “reciclabilidade” dos carros, estar preocupado com o que os seus fornecedores estão fazendo em relação à formação de emprego, e de repente pego uma concessionária minha
160
agredindo o meio ambiente, jogando óleo em um afluente... aquilo ali vai manchar a minha imagem. Eu não consigo separar: isso aqui é a concessionária, e eu não estou falando disso, meu negócio é “daqui” pra trás. Isso é impossível, e eu não estaria sendo responsável. Se eu quero ser, eu tenho que influenciar. O meu papel é influenciá-los (E2).
Apesar de não se tratar de amostragem representativa, o estudo verificou
que, ao menos nas concessionárias visitadas pelo pesquisador como “cliente
oculto”, realmente ainda não é praticado um discurso de empresa sustentável como
diferencial competitivo no momento da venda de veículos. Durante as visitas a duas
concessionárias da Fiat, na cidade do Rio de Janeiro, ao demonstrar interesse em
adquirir um veículo, mas com curiosidade sobre a postura da relação ao meio
ambiente, e se os vendedores tinham algum exemplo, estes apenas mencionaram
sobre os motores com baixo consumo de combustível e sobre o sistema
“econômetro” dos veículos, mas nada sobre o sistema produtivo da empresa ou
demais práticas de Rasc exercidas.
5.2.4.10 Funcionários
Para Penrose (1980), o limite para expansão e crescimento da firma está
diretamente associado à disponibilidade de recursos gerenciais, e a Fiat entende
que um dos desafios para garantir sua legitimidade passa pelo desenvolvimento de
novos líderes.
Conforme entrevistado E6, a Fiat testemunhou, no início dos anos 2000, uma
séria falta de novos líderes que pudessem substituir um grande numero de gestores
que estavam se aposentando. Neste caso, a empresa agiu de forma reativa, com o
desenvolvimento dos programas “Mapeamento de Sucessão” e o “Programa de
Desenvolvimento de Líderes” (PDL I e PDL II). Estes projetos, que agora já estão em
andamento, não atenderam ao requisito de “resposta antecipada” (FLECK,
2009), ou seja, a empresa demorou a responder ativamente e se planejar com
antecedência para evitar os riscos como o atual gargalo de mão de obra.
(...) a gente fez um grande diagnóstico, um diagnóstico interno, até para a gente saber assim, “olha, vamos entender cultura”, e um diagnóstico com uma pesquisa de clima para a gente entender os colaboradores. A pesquisa de clima apontou para a gente uma série de questões, dentre elas, gestão. E qual que era o meu problema de gestão? Basicamente que os líderes ainda estavam fazendo a gestão conforme o modelo de uma década atrás, às vezes mais diretivos, dando pouca autonomia. Então a gente falou: “bom, então nós temos que trabalhar os nossos líderes atuais, porque não é esse o modelo de gestão que a gente quer”. Comparado a isso, uma das coisas
161
que a gente começou a fazer em 2009 foi o primeiro mapeamento de sucessão. O que eu fiz? Existem hoje 208 lideranças que eu vou chamar assim... são as lideranças mais seniores da empresa. Então eu estou falando de diretor, eu estou falando do que seria um diretor, de um Belini, e de um nível gerencial. Eu sentei com os 208 e fui falando assim, me conta hoje quem é o seu sucessor. E aí o resultado veio catastrófico. (...) Quando mostrava, ele falava, nossa, eu nunca parei para pensar (...). Esses programas (implantados na empresa depois de 2008), eles limpam o passivo, não é que eu estou preparando ainda para o futuro, não, eu só estou fazendo o que eu não fiz nos últimos períodos (...). Hoje eu já não tenho mais só 208 posições executivas, eu tenho 291, porque a empresa cresceu. Ela está expandindo. (...) A gente do RH vê que tudo que a gente está fazendo hoje vai ter reflexo daqui a cinco ou dez anos, porque você está revisitando o software, um modelo mental (E6).
Desde 2010, o tema “pessoas” passou a ser o primeiro tratado nas reuniões
do comitê executivo da Fiat. O objetivo era passar uma mensagem clara para todos
os colaboradores: que a empresa estava ciente que reter talentos e manter os
funcionários motivados seria fundamental para continuar a crescer.
Tem as chinesas e coreanas chegando e querendo levar todo mundo da Fiat. E com isso começou um leilão de salário, que não tinha isso no mercado brasileiro até poucos anos atrás (E6). Tudo na vida pode ser comoditizado, mas as pessoas não (...) somente as pessoas podem fazer a diferença (trechos de entrevistas do presidente Belini, extraídos do livro de Tanure e Patrus, 2011, p. 41).
A montadora também mantém ações educativas e de conscientização para os
funcionários, visando à redução de todos os tipos de desperdício nas mais diversas
áreas da empresa, desde os vetores energéticos (água, ar comprimido, energia
elétrica, vapor e combustíveis) até os hábitos pessoais dos empregados.
A Fiat vem atuando igualmente em processos de conscientização dos
funcionários sobre responsabilidade socioambiental, principalmente com o uso dos
múltiplos processos de comunicação interna e de multiplicadores internos.
(...) quando eu estou falando comunicação interna são 13.000 empregados diretos e contando com familiares chega a 50.000 pessoas. Uma noção mais estendido considerando a família também. Então eu tenho uma revista voltada pra família, essa revista aqui é corporativa, informativos e todo um sistema de comunicação interna (...). Então nós temos um poder muito grande. No momento da sustentabilidade, na lógica de comunicação, a gente vem trabalhando muito numa esfera de nivelar isso como um modelo de pirâmide evolutiva. No primeiro você tem um nível de informação, depois conhecimento, até transformar isso em ação ativa, e o cara vira, no final dessa pirâmide, realmente um multiplicador. Isso aqui vale pra tudo. Se a gente for pensar pela sustentabilidade, a gente está trabalhando muito na base dessa pirâmide, de consolidar esse repertório conceitual de informação sobre as ações da empresa e sobre a noção de sustentabilidade pra gente conscientizar as pessoas pra atitude dentro de casa. A gente
162
trabalha dentro de um conceito da campanha que se chama “consciência sustentável” (E10). Tem uma prática da área ambiental que eu acho muito interessante que na produção eles criam uma figura que se chama “facilitador ambiental”, que é como se fosse um facilitador mesmo, mas em diferentes equipes. Então você tem uma equipe lá de dez operários. Hoje você tem o facilitador X. Então esses caras vão passando por treinamento, por conscientização e eles têm que desenvolver o olhar deles pro lado ambiental. E depois ele migra, passa a ser outro colega que passa a ser esse facilitador ambiental, mas esse cara continuou carregando isso (E10).
Existe uma preocupação recente em garantir maior diversidade no corpo de
funcionários. Para a Fiat, mais do que uma ação de Rasc, é uma forma de garantir
sucesso no longo prazo a partir dos benefícios gerados pelos processos de inclusão,
como maior inovação:
Então, quando você vem para a indústria (automotiva), você se depara com essa questão demográfica. Dentro dessa indústria você tem o corpo masculino muito maior do que a questão do feminino. E a questão de gênero, de você ter o gênero com uma certa equidade dentro da empresa, não é uma questão só para fazer bonito para a sociedade. Então assim, eu quero aumentar a quantidade de mulher dentro da Fiat, não é só para chegar aqui para você e falar que eu sou uma empresa diferenciada porque eu tenho 30% dos funcionários mulheres. É porque eu estou preocupado com a sustentabilidade econômica e financeira da empresa, e eu sei que a diversidade, a diversidade leva a isso. O diferente no dia a dia da empresa é uma soma. Se eu tiver aqui só homens trabalhando, todo trabalho deles, todo o desenvolvimento, tudo que eles pensaram, eles estão pensando igual homem. Só que eu tenho um mercado lá fora que atende homens e mulheres. (...) Eu não quero ter mulher aqui para chegar, preencher um relatório e falar, não, “30% da minha mão de obra é feminina”, “eu sou uma empresa sustentável”, não! Eu quero fazer isso aqui porque essa diversidade vai, no futuro, no médio, no longo prazo, ela vai se reverter com uma questão econômica para a empresa. Então eu preciso ter diversidade de gêneros, preciso ter diversidade (E5). Aí é que eu te falo que é o bom, porque essa diversidade cultural entre o empregado pernambucano e o empregado mineiro pode dar grandes frutos para a empresa, porque é da diversidade que vem uma série de soluções interessantes (E5). (...) quando a gente fala muito de diversidade em RH, as pessoas focam muito em gênero. Gênero é muito importante, só que olha que interessante: se eu for olhar hoje os demais itens de demografia, a minha demografia é uma demografia extremamente diversa, eu nunca trabalhei numa empresa onde eu tenho tantos profissionais seniores, pessoas de áreas completamente diferentes de formação. Então tem desde os designers, eu tenho engenheiro... (...) Então, se você olhar pelos outros aspectos, idade, é muito interessante, escolaridade. Então tem muitos doutores, muitos mestres, muitos pesquisadores, mas tem gente técnica, sabe, eu tenho uma pluralidade bem interessante. Agora, gênero eu tenho um problema, tenho problema de gênero e tenho problema de raça (...) Um dos meus objetivos é de diversidade. Promover ambientes mais diversos dentro da Fiat. Não é que a empresa acredita porque ela é boazinha de acreditar, é que ele quer
163
o que é vital para o negócio dela.(...) a gente acredita também que a diversidade é motor da inovação (E6). Eu preciso ter [diversidade] porque hoje [são] os meus consumidores, essa é a minha demografia brasileira, é nesse cenário que eu estou, e, se eu não tiver, eu tendo a não conseguir fazer as fábricas de tendências e cenários cederem da melhor forma (E6).
Por fim, mesmo com o risco de não ter garantido o desenvolvimento de novas
lideranças de forma antecipada, evidências como os repetidos prêmios de “Melhor
empresa para se trabalhar” e “Great place to work”, além do baixo índice de turnover
da montadora (abaixo de 1% nos cargos de gestão.8) apontam que a empresa
também está conseguindo manter sua legitimidade e capturar valor na relação com
mais este stakeholder.
Quadro 5.9 –- Principais desafios e pressões da quarta fase da Fiat Brasil
5.3 Síntese da Análise
Nesta etapa, as análises foram sintetizadas de forma a permitir ao leitor
compreender o inter-relacionamento dos fatos mais relevantes do setor automotivo,
e como aconteceram as mudanças descritas nos ambientes, usando como apoio
didático e criação de mapas visuais, conforme sugerido por Langley (2007). O
primeiro mapa elaborado (Figura 5.4) buscou resumir os principais marcos do setor e
da economia, bem como o momento de entrada dos principais competidores (first
8 De acordo com entrevistado E6, no último ano, de 291 gestores apenas três saíram da empresa.
Ambiente Piedoso
Ambiente Desafiador
Ambiente Inóspito
Ambiente de
Negócio
Novos concorrentes; Cobrança dos acionistas por melhores resultados financeiros; Novo paradigma no relacionamento com stakeholders;
Mercado automotivo em forte expansão – 4 maior do mundo;
Ambiente
Institucional
Inúmeras leis beneficiando o setor automotivo e protegendo a indústria das crises externas e de novos concorrentes;
Estabilidade Política; Crescimento Econômico; Aumento da disponibilidade de instrumentos de crédito Nova “classe C” com acesso ao mercado de bens duráveis; Gestão dos Stakeholders
Ambiente
Natural
Novos desafios e obrigações no tema Responsabilidade Socioambiental;
164
movers, challengers e newcomers) ou de representativas mudanças na arena
competitiva.
Figura 5.4 – Marcos do setor e da economia
Adicionalmente, tomando por base o framework utilizado nas seções
anteriores, foi desenvolvida uma análise, para cada tipo de ambiente (de negócio,
institucional e natural), visando a representar graficamente o movimento feito pela
Fiat durante o período em questão, atendendo a um dos objetivos desse estudo:
identificar o processo de transições ambientais durante o crescimento da empresa
líder do setor automotivo nacional.
Essa etapa também buscou estabelecer, sempre que possível, um
comparativo resumido sobre as perspectivas de condições de sobrevivência nos
ambientes entre a Fiat e as demais empresas da indústria automotiva nacional e,
assim tentar compreender fatores que possam ter influenciado o processo de troca
de liderança do setor. Para isso, usou como base as informações apresentadas no
capítulo quatro, sobre a evolução da indústria automotiva brasileira.
Foi possível observar diferenças nas perspectivas de condições ambientais
para o desenvolvimento das organizações atuantes do setor, principalmente no
1976
Principais Players Leis e marcos regulatórios
Fiat
1980 1984
Es mulo do
governo p/
exportação
Inicio da
década
perdida
Pico de exportações
da indústria
Principais
Inovaçõ
es para
o m
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ado b
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iro
Principais
Marc
os
Principais Marcos Setor e Economia
Principais
Pla
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Le
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Marc
os Regula
tórios do seto
r M
arc
os Eco
nom
ia /
Sociais
1970 1953
Aviso
288
1956
Plano de
Metas JK
Ford;
GM;
Volks
1967 -
1974
“Milagre
Econômico
Greves
metalúrgicos
ABC
1987 1994 1992 –1993 1990
Plano Collor e
Confisco da
poupança
IPI Reduzido para
1.000 cm3
Plano Real
Novo regime
automo vo
1997
Crise Ásia e
Rússia; Fim
regime banda
cambial
Novas greves
ABC
Abertura do
mercado
Guerra do Golfo
Aumento preço
do petróleo
Medidas câmara
setorial p/
es mular o setor
Toyota
Renault
Mitsubishi
Honda
1998
Peugeot
Citroën
Nissan
2001
Crise financeira
internacional
Redução IPI
2008 2010
Brasil torna-se 4
maior
mercado
mundial no
setor
automo vo
Forte déficit comercial
do setor
1995
Importados
1991
Aumento
importação
2009
ECO 92
Redução IPI
165
ambiente de negócios e institucional. Percebeu-se que os desafios e pressões
ambientais enfrentados por uma empresa não necessariamente são compartilhados
por toda a indústria. Além disso, durante as últimas décadas, as empresas tiveram
diferentes posicionamentos estratégicos, o que se deve em grande medida ao
momento em que começaram a atuar no mercado brasileiro (environmental
imprinting).
5.3.1 Ambiente de negócios
Figura 5.5 – Síntese do processo de transição da Fiat no ambiente de negócios
Diferente do cenário encontrado pela Fiat no inicio da sua jornada no Brasil, o
ambiente de negócios, até o meado da década de 1970 era, aparentemente,
piedoso para os demais atores (first movers). Com a baixa concorrência, e ainda
desfrutando dos incentivos do Plano de Metas de 1956, e dos bons resultados de
vendas do “milagre econômico” entre 1967 e 1974, a Ford, a GM e a Volks não
tinham maiores preocupações para investimentos em melhoria de produtos ou
apresentar para o consumidor brasileiro grandes inovações e, mesmo assim, o setor
crescia a uma taxa média de 20% ao ano.
Ambiente Piedoso
Ambiente Desafiador
Ambiente Inóspito
Ambiente de
Negócio
1970 - 1976 1976- 1990
1990 - 2003 2004- 2011
PERÍODO DESAFIO/PRESSÃOI Total inexistência de fornecedores e mão de obra
especializada na região de Betim
AMBIENTE TIPO CLASSIFICAÇÃO RESPOSTA (OLIVER, 1991)Negócio Inóspito Compromisso por balanceamento
I Mercado em forte expansão, apesar da concorrência;I Dificuldade de recebimento de peças;I Desconhecimento da marca pelo mercado consumidor;I Área rural e isolada para a implantação da fábrica;I Péssima estrutura logística;I Estar longe dos centros consumidores;II Estar situada longe do ABC e não sofrer com as greves;II Forte descontentamento dos clientes com os produtos;II Imagem desgastada;II Criação da Autolatina (Ford e Volks)
Negócio Desafiador Aceitação por conformidade Negócio Inóspito Aceitação por submissãoNegócio Inóspito Desafio - AtaqueNegócio Inóspito Compromisso por balanceamentoNegócio Inóspito Aceitação por Conformidade e DesafioNegócio Inóspito Aceitação por Conformidade e DesafioNegócio Piedoso AmortizaçãoNegócio Desafiador AmortizaçãoNegócio Desafiador Desafio - AtaqueNegócio Desafiador Evitação
II Redução brusca das vendas do setor; Negócio Desafiador AmortizaçãoII Dificuldades logísticas de recebimento de peças e
escoamento dos produtosNegócio Desafiador Desafio - Ataque
III Convencer fornecedores sobre Projeto J – Mineirização;III Imagem desgastada da empresa;III Insegurança e o descontentamento dos funcionários
Negócio Desafiador Compromisso por balanceamentoNegócio Desafiador Compromisso por pacificaçãoNegócio Desafiador Cooptação
IV Entrada de novos concorrentes;IV Cobrança dos acionistas por melhores resultados
financeiros;IV Novo paradigma no relacionamento com stakeholders;
IV Mercado automotivo em forte expansão – 4 maior do mundo;
Negócio Desafiador AmortizaçãoNegócio Desafiador Desafio - Ataque
Negócio Desafiador Compromisso por balanceamentoNegócio Piedoso Desafio - Ataque
166
Como visto, a Fiat, por sua vez, teve que romper a barreira de um ambiente
de negócios inóspito, principalmente pelos seguintes fatores: por ter que construir
uma fábrica em um ambiente rural e longe do polo automotivo e dos principais
centros consumidores (e que conseguisse gerar capacidade produtiva compatível
com as dos demais players), e pela consequente necessidade de superar fortes
desafios logísticos; por ter que iniciar todo um processo de relacionamento com
fornecedores locais; e, finalmente, por ser uma nova marca no mercado dominado
por três grandes montadoras que, juntas, fabricavam 88,5% dos veículos no país
(ANFAVEA, 2011).
Já durante os anos de 1976 a 1990, pode-se dizer que o ambiente de
negócios para todo o grupo das montadoras tradicionais, e agora já com a Fiat como
parte desse “clube”, era desafiador, mesmo que por razões diferentes. Se, por um
lado, na década de 1980 as montadoras instaladas no ABC tiveram problemas
produtivos devido às greves, a Fiat, em Betim, enfrentou sérios problemas de
aceitação dos seus produtos, principalmente por preço e qualidade percebida. Em
comum, todas sofreram com um mercado consumidor fortemente retraído e tiveram
no incentivo à exportação a fórmula de sobrevivência operacional. Gradativamente,
a Fiat conseguiu ganhar mercado e chegaria ao fim da década como a montadora
responsável por 23,27% da produção de veículos no Brasil e 11,46% de participação
de mercado (ANFAVEA, 2011).
No início da década de 1990, após a abertura do mercado pelo presidente
Collor, com as novas políticas de incentivo da indústria, termina o longo período de
estagnação e as montadoras voltam a registrar recordes de produção. Por ter saído
na frente da concorrência com o primeiro motor 1.0 do país, e após as
reformulações no seu processo produtivo, a Fiat praticamente triplicou sua
participação no mercado nacional em 4 anos, chegando ao pico histórico de 29,26%
de market share. Em compensação, a empresa teve que buscar formas de combater
suas desvantagens operacionais e de imagem.
Entre 1990 e 1997, apesar do crescimento do volume de importação e
consequente pressão para a busca de melhoria de processos e produtos, o mercado
interno se manteve basicamente dividido entre as quatro montadoras tradicionais
(Fiat, Volks, GM e Ford). Porém, com a principal consequência do novo regime
automotivo, a entrada de novas montadoras (com destaque para as francesas
167
Peugeot, Renault e Citroën, e as japonesas Honda e Toyota), o quarteto perdeu
mais de 10% de market share entre 1997 e 2001.
Gráfico 5.3 - Representatividade na produção de veículos no Brasil entre os principais
players (1976 – 2010)
Fonte: ANFAVEA (2011)
Na década de 2000, com o bom momento econômico do Brasil e o
crescimento do consumo de bens duráveis pela classe C, principalmente pela maior
disponibilidade de instrumentos de créditos, as empresas voltaram a investir no
setor. A competitividade aumentou e todos os players foram estimulados a buscar
inovações e formas de reduzir custos.
A Fiat torna-se a líder de vendas, contudo começou a apresentar um péssimo
resultado operacional. A busca por “liderança de vendas” a qualquer custo tornou a
operação brasileira deficitária. Paralelamente, os problemas financeiros da sua
matriz, em um mercado estagnado, pressionava ainda mais a filial brasileira a buscar
novas formas para rentabilizar as operações locais e europeia da montadora. Com
isso, foi preciso uma forte mudança do direcionamento estratégico da Fiat, a partir
de 2004, para a empresa voltar a ser lucrativa, e ainda mantendo a liderança de
vendas.
0,00%
10,00%
20,00%
30,00%
40,00%
50,00%
60,00%
70,00%
80,00%
90,00%
100,00%
1976 1979 1982 1985 1988 1991 1994 1997 2000 2003 2006 2009
FIAT
FORD + GM + VW
Demais Montadoras
168
No fim da primeira década do novo milênio, o Brasil se tornou mercado-chave
para todas as grandes montadoras do mundo, que desembarcaram em solo nacional
modelos mais modernos, intensificando a necessidade de diferenciação. Pode-se
afirmar que a nova ameaça às empresas instaladas no Brasil são os veículos
importados, que caíram no gosto do brasileiro principalmente pela qualidade
percebida, no caso do mercado de luxo, ou pelo baixo custo, principalmente
oferecido pelas montadoras chinesas. Provavelmente, mais do ter migrado da
posição de desafiante para a de líder de mercado, o grande desafio para a Fiat será
defender essa posição.
5.3.2 Ambiente institucional
Figura 5.6 – Síntese do processo de transição da Fiat no ambiente institucional
Na década de 1970, as características do ambiente institucional para as
montadoras já instaladas (Volks, Ford e GM) eram completamente opostas quando
comparadas às da Fiat. Enquanto as três empresas encontravam-se em um
ambiente institucional piedoso, devido à proteção de mercado, baixas expectativas
sociais, e aos elevados índices de crescimento no setor devido ao “milagre
Ambiente Piedoso
Ambiente Desafiador
Ambiente Inóspito
Ambiente
Institucional
1970 - 1976 1976- 1990
1990 - 2003 2004- 2011
PERÍODO DESAFIO/PRESSÃO AMBIENTE TIPO CLASSIFICAÇÃO RESPOSTA (OLIVER, 1991)I Lobby das 3 grandes montadoras, tanto com o governo,
quanto com os fornecedores;Institucional Inóspito
Manipulação por influência / Evitação por fugaII Mercado “fechado” para importaçõesII Crise do petróleo;II Inflação galopante;II Mercado interno em forte estagnação;
Institucional Piedoso Desafio - AtaqueInstitucional Desafiador AmortizaçãoInstitucional Desafiador AmortizaçãoInstitucional Desafiador Amortização
II Incertezas políticas Institucional Inóspito AmortizaçãoIII Abertura do mercado e entrada de novos concorrentes; Institucional Desafiador Desafio - AtaqueIII Novos acordos automotivos emergenciais (1999)III Novas leis, acordos e regulamentações para os setor
automotivo;III Incentivo fiscal para consumo de carro 1.000cm3III Grandes mudanças no cenário macroeconômico;III Crises globais;III Leis de incentivo Caros Flex;
Institucional Piedoso Compromisso por balanceamentoInstitucional Desafiador Compromisso por balanceamento
Institucional Desafiador Estratégia de manipulaçãoInstitucional Desafiador AmortizaçãoInstitucional Desafiador AmortizaçãoInstitucional Desafiador Compromisso por balanceamento
IV Nova “classe C” com acesso ao mercado;IV Leis beneficiando o setor e protegendo a indústria das
crises externas e de novos concorrentes;
Institucional Piedoso Desafio - AtaqueInstitucional Piedoso Manipulação por influência
169
econômico”, a Fiat precisava transpor diversos obstáculos para sair de um ambiente
inóspito para, pelo menos, atuar em um ambiente desafiador.
Conforme visto, a empresa teve que investir tempo e energia para combater
principalmente diversas forças do “não mercado” (BARON, 1995), como o lobby
efetuado pelas concorrentes que pretendia criar barreiras de entrada, tanto na esfera
governamental, quanto do próprio setor. Isto a forçou situar-se fora do grande polo
automotivo nacional, e longe dos principais mercados consumidores.
Do instante em que superou as barreiras e efetivamente “entrou” na arena
competitiva até o momento da abertura do mercado, a Fiat compartilhou as
principais pressões do ambiente institucional com as outras 3 montadoras do setor:
as incertezas políticas; os reflexos da crise do petróleo; a inflação galopante; uma
economia estagnada; políticas de congelamento de preços; dentre outros. Porém, a
empresa passou a se beneficiar, junto com as outras três, pela primeira vez, do que
antes era um desafio: estar “dentro” de um mercado fechado para importações.
No início da década de 1990, os reflexos da nova conjuntura econômica, com
o congelamento das cadernetas de poupanças, e da a abertura de mercado, foram
sentidos de forma similar para as montadoras aqui instaladas. A Fiat, contudo,
conseguiu, a partir de uma decisão do ambiente institucional (o regime especial de
tributação para veículos com até 1.000 cilindradas a montadora), ganhar mais
destaque no ambiente de negócios, por ser a única já preparada para usufruir desse
benefício.
Entre 1994 e 1998, o cenário para a indústria era piedoso para as montadoras
já instaladas e mais desafiador para novas entrantes (newcomers). Aliado à nova
realidade econômica, os diversos acordos automotivos elaborados em parceria com
o governo, além dos robustos aportes financeiros com recursos públicos, permitiram
que as empresas tradicionais atingissem recordes de venda e chegassem ao limite
das suas capacidades produtivas instaladas.
Com o desbalanceamento entre oferta e procura, e o grande déficit na
balança comercial do setor, o governo novamente toma decisões que gerariam
alterações na arena competitiva. O estímulo para a abertura de 14 novas unidades
fabris, e o inicio de produção local de novas marcas, compartilhando os mesmos
benefícios fiscais, gerou fortes desafios para as empresas instaladas.
O cenário institucional do final do milênio foi marcado pelas crises globais
(Ásia e Rússia), com profundos impactos na economia do Brasil, além do fim do
170
regime de paridade cambial. Como reflexo da queda no volume de vendas e perda
de lucratividade, as montadoras iniciaram processos de demissões e terceirizações.
O panorama obrigou a protelação de planos de expansão, ou mesmo a chegada de
outros concorrentes.
Outro fator de mudança nas características da indústria automotiva que
também pode ser atribuído ao governo é a regulamentação e incentivo para a
produção e consumo de veículos “flex”, que pressionou tanto as montadoras locais
quanto as importadoras a efetuarem grandes investimentos em pesquisa e
desenvolvimento de produtos.
Nos últimos anos, a consolidação do bom momento da economia brasileira; a
ascensão da nova classe C; a redução das taxas de juros e a ampliação dos
instrumentos de credito; além do potencial de crescimento do consumo de veículos
no Brasil, geraram confiança em todo o setor para a ampliação dos investimentos e
tornou, assim, o ambiente ainda mais convidativo para demais players globais.
Por fim, ficou evidenciado que a indústria automotiva continua recebendo, das
mais diferentes esferas de governo, pacotes de incentivo financeiro, além de
redução ou isenção tributárias, e por isso é tida, por muitos, como a indústria
brasileira mais beneficiada e protegida pelo Estado. No entanto, é fundamental
registrar que, por existirem grupos (clusters) de empresas dentro da mesma
indústria, determinadas ações do Estado com o discurso de beneficiar “a indústria”
acabam privilegiando um grupo de empresas em detrimento de outros.
5.3.3 Ambiente Natural
Figura 5.7 – Síntese do processo de transição da Fiat no ambiente natural
Ambiente Piedoso
Ambiente Desafiador
Ambiente Inóspito
Ambiente
Natural
1970 - 1976
1976- 1990
2004- 2011
1990 - 2003
PERÍODO DESAFIO/PRESSÃO AMBIENTE TIPO CLASSIFICAÇÃO RESPOSTA (OLIVER, 1991)I Pouca ou nenhuma pressãoII Pouca ou nenhuma pressãoIII ECO 92 - Discussões sobre necessidade de atuação no
despejo de detritos e reuso de matérias-primas - Inauguração da Ilha Ecológica
Natural Piedoso Aceitação por conformidade Natural Piedoso Aceitação por conformidade Natural Desafiador Desafio
IV Discussões sociais e políticas e novos desafios e obrigações no tema Responsabilidade Socioambiental;
Natural Desafiador Ataque
171
Em relação às pressões do ambiente natural, o estudo evidenciou que as
primeiras discussões relevantes no setor ocorreram apenas na década de 1990,
provavelmente estimuladas pelo evento da ECO 92, ainda de forma abrangente e
não direcionada especificamente para a indústria automotiva. Somente nos anos
mais recentes, foram iniciados debates mais efetivos e produtivos com o Estado e
sociedade sobre como a indústria deveria cuidar do meio ambiente e sobre os
“efeitos colaterais” dos veículos.
Mesmo assim, comprou-se que, apesar das ditas preocupações com a
poluição, com o nível consumo de combustíveis e com o problema do trânsito, as
atuais legislações brasileiras ainda são mais brandas do que em países como
Estados Unidos e Europa. Ainda, para o governo é mais simples incentivar a venda
de carros do que atuar em políticas efetivas de mobilidade urbana, por exemplo.
A Fiat manteve durante os últimos 20 anos um comportamento de moldagem,
se antecipando às potenciais pressões do ambiente natural, desde ter apresentado o
primeiro carro nacional com padrões europeus de emissão de gases poluentes, à
implantação da Ilha Ecológica na planta de Betim, ainda em 1994. Como resultado,
foi a primeira empresa brasileira – dentre todos os setores – a receber o selo de
certificação ambiental ISO 14.001.
Durante as entrevistas, a questão de preocupação com o meio ambiente foi
claramente expressa pelos representes de todas as áreas internas da Fiat. Foram
exemplificados desde os processos de concepção dos novos veículos; a escolha
preferencial por uso de materiais reciclados; a preocupação com os índices de
reaproveitamento de água e consumo de matérias-primas por veículo; até mesmo o
processo de certificação dos fornecedores e concessionárias buscando influenciar
toda a cadeia produtiva. Esses fatores, além de ajudar na reputação e manutenção
da legitimidade da empresa, reduzem sua exposição a riscos.
Em processo de pesquisa sobre as ações de práticas de responsabilidade
ambiental e social corporativa nos sites e publicações dos principais concorrentes
(Volkswagen, Ford, GM, Toyota, Honda, Peugeot, Renault e Citroën) foi comprovada
a existência de um discurso compartilhado de investimentos em busca de inovações,
produtos e processos, visando reduzir os impactos no meio ambiente e em tornar os
veículos mais econômicos. Muito embora não tenham sido realizadas comparações
em profundidade com outras empresas da indústria automotiva nacional, os
constantes prêmios de “Melhor empresa do setor de veículos e em gestão de
172
responsabilidade social e meio ambiente” 9 recebidos pela Fiat são, de certa
maneira, interessantes indícios do exercício de uma prática diferenciada pela
empresa estudada.
Figura 5.8 – Mapa visual consolidado da trajetória da Fiat entre os ambientes
9 Lista completa dos principais prêmios ambientais estão destacadas no Apêndice B
Ambiente Piedoso
Ambiente Desafiador
Ambiente Inóspito
Ambiente de
Negócio
Ambiente
Institucional
Ambiente
Natural
1970 - 1976 1976- 1990
1990 - 2003 2004- 2011
1970 - 1976 1976- 1990
1990 - 2003 2004- 2011
1970 - 1976
1976- 1990
2004- 2011
1990 - 2003
173
6. CONCLUSÃO
Este trabalho analisou o caso Fiat do Brasil descrevendo seu processo de
crescimento e de migração de uma posição de desafiante (challenger) em uma
indústria para a de líder do setor. O presente estudo também visou contribuir para o
entendimento sobre responsabilidade sócio ambiental e como este tema, tão
debatido atualmente, se relaciona com os estudos sobre crescimento e longevidade
organizacional.
Para responder ao questionamento proposto, foram utilizados como base
teórica os frameworks de Fleck (2009) e Fleck (in print). O primeiro possibilitou
entendimento sobre os padrões de respostas da empresa em relação os desafios do
empreendedorismo e de navegação no ambiente, condições necessárias para uma
organização conseguir gerar e capturar valor, possibilitando crescimento e
renovação organizacional e sucesso a longo prazo, e estão associados aos pilares
“ambiente” e “liderança” da formação estratégica de Mintzberg et al (2000). O
segundo permitiu análises sobre as teorias e estudos dos tipos de ambientes
sugeridos pela sociologia organizacional (negócios, institucional e ambiental) e os de
acordo com a perspectiva de condições de desenvolvimento da firma (piedoso,
desafiador e inóspito).
Esta dissertação também possibilita revisitar os questionamentos iniciados na
década de 1970 sobre o “determinismo” versus “escolhas estratégicas”. Partindo do
entendimento que o ambiente pode, ao mesmo tempo, restringir as opções
estratégicas ou prover uma “atmosfera” para decisões ativas de gestores
empreendedores, inferiu-se que, fosse o “ambiente” quem determina o destino das
organizações (como defendido pela ecologia de população), uma empresa
desafiante dificilmente teria condições de se tornar líder de uma indústria.
6.1 Respostas à pergunta principal e considerações sobre o processo de
crescimento da Fiat
Ao encerrar a fase de análise das evidências, confrontando-as com as
proposições teóricas discutidas no capítulo revisão bibliográfica, foi possível sugerir
algumas respostas para a pergunta que orientou este projeto de pesquisa. O estudo
concluiu que a trajetória da Fiat até o “topo do pódio” no ranking brasileiro de
174
montadoras, bem como seu processo de crescimento e manutenção de legitimidade
podem ser relacionados ao desenvolvimento de capacidade de responder
satisfatoriamente aos desafios de navegação no ambiente dinâmico e de
empreendedorismo (FLECK, 2009).
No que se refere ao empreendedorismo, o principal foco da empresa foi
tentar aumentar constantemente seu market share e, assim, melhorar seu
desempenho ao ganhar vantagens de escopo e escala. Para isso, desde o momento
da sua criação, a Fiat buscou se diferenciar dos demais concorrentes mantendo um
constante processo de criação de valor a partir de inovações de produtos e
introdução de tecnologias não presentes nos carros nacionais, além da revisão
constante dos seus processos de produção. Aliado a isso, a empresa procurou
aplicar o conhecimento que era adquirido sobre as preferências e especificidades do
mercado brasileiro nos seus carros, com grandes investimentos em áreas de
pesquisas e vincular sua marca com o mercado local.
Quanto ao desafio de navegação em ambientes dinâmicos, foi percebida
uma constante prática de monitoramento (scanning), de um comportamento ativo, e
agilidade para responder às pressões ou mesmo se antecipar aos principais
desafios dos ambientes. Com o uso de uma variedade de táticas estratégicas, a
“mão visível da empresa” (CHANDLER, 1977) não só soube responder às pressões
quanto pode atuar moldando os ambientes em que está inserida.
As evidências apontam que, por opção estratégica da empresa (MINTZBERG
et al 2000), o direcionamento adotado, principalmente após 2004, buscou atender,
de forma simultânea, as demandas dos mais diversos stakeholders, mesmo as
potencialmente divergentes. Além de criar valor para seus clientes não só por
inovações “mecânicas” nos produtos, mais facilmente copiáveis, a empresa passou
a implementar conceitos de interatividade com os clientes, de forma criativa, como o
processo de criação coletiva. Paralelamente, a organização estreitou seu
relacionamento com os fornecedores, obteve maior autonomia da matriz e retornou
melhores dividendos para os acionistas. Também ficou caracterizado um maior
entendimento sobre a necessidade de projetos, produtos e processos voltados à
responsabilidade socioambiental. Embora não seja possível sugerir uma relação de
suficiência, todo este padrão de comportamento atende a uma das condições
necessárias para a longevidade saudável (HAWKINS, 2006; FLECK, 2010).
175
A partir das evidências pesquisadas, podemos dizer que, em relação ao
desafio do empreendedorismo, empresa manteve um padrão de comportamento de
alto alcance (FLECK, 2009), com busca e avaliação eficaz de riscos e
oportunidades de expansão. A Fiat gerou valor desenvolvendo, de forma
consistente, os serviços empreendedores de ambição, versatilidade, acesso a
recursos além de capacidade de julgamento e tomada de decisão (PENROSE,
1980).
E, em relação ao desafio da navegação, o padrão de resposta da organização
é tipicamente de moldagem do ambiente (FLECK, 2009), com um monitoramento
ambiental abrangente, atuando na construção de regras e práticas inter-
organizacionais e com movimentos proativos para capturar valor e assegurar
legitimidade organizacional.
No que tange às respostas da empresa aos desafios de empreendedorismo e
navegação no ambiente, pode-se dizer que as mesmas vêm possibilitando um
processo de crescimento e renovação organizacional, e que se orienta na direção do
polo de autoperpetuação (FLECK, 2009).
Esse trabalho permite constatar que não cabe às pressões e desafios do
ambiente estabelecer toda a pauta das organizações tornando-as simplesmente
reativas, conforme sugerido por teóricos da “escola ambiental”. Mas que ao adotar
um comportamento empreendedor e de monitoramento ativo do ambiente, as firmas
não só garantem continuidade no seu processo de expansão, como podem ter como
possível consequência alcançar a posição de liderança na indústria.
6.2 A relação entre o crescimento organizacional e responsabilidades
socioambientais
As análises sugerem que, ao passar a considerar a importância da
incorporação de atitudes sustentáveis ao seu negócio, não só atuou a Fiat na
manutenção da sua legitimidade, como contribuiu para o desenvolvimento de um
perfil de empresa inovadora, deixando-a menos exposta a demais riscos
operacionais e legais.
Quando a empresa passou a entender a diferença entre responsabilidade
social e filantropia, por exemplo, e integrou práticas de Rasc às estratégias
empresariais e as incorporou no dia a dia das operações, foram adquiridas
176
importantes vantagens competitivas, como a maior eficiência na utilização de
matérias-primas no processo de produção de veículos. Pode-se anuir, a partir das
evidências, que as principais fontes de motivação da empresa para a incorporação
de práticas sustentáveis foram a busca de vantagens competitivas, a redução de
riscos operacionais e impactos ambientais, a preocupação com a reputação da
empresa e o entendimento sobre a sua obrigação moral, ou seja, fazer a coisa certa.
Apesar de ser um setor de expressiva demanda de matérias-primas, além de
responsável por grande volume de descartes e de efeitos colaterais no meio
ambiente e na sociedade, o estudo não constatou evidências de que no Brasil as
forças coercitivas do mercado consumidor ou do Estado em relação a Rasc são
intensas. As atuais legislações se restringem basicamente a políticas de emissão de
gases de efeito estufa, ou preocupações básicas com os processos produtivos. Por
exemplo, ainda não existem leis específicas sobre o uso de materiais recicláveis ou
sobre a responsabilidade das montadoras pelo ciclo de vida dos seus produtos.
Outro exemplo é o processo de incentivo ao consumo de veículos, por parte
do governo federal, principalmente com a manipulação das tarifas de IPI, que ainda
adotam a mesma postura do início da década de 1990, ou seja, de acordo com a
cubagem do motor, e não pelo grau de emissão de gases poluentes. Todavia, com o
novo selo de eficiência de consumo, do Programa Brasileiro de Etiquetagem
Veicular (PBEV), é possível que esta realidade mude, o que poderia se tornar um
novo motivador para as montadoras buscarem o desenho de produtos com menor
consumo e consequente redução de impactos ambientais. As iniciativas atuais ainda
se restringem ao âmbito dos governos estaduais como, por exemplo, o projeto “IPVA
Verde”, que entrará em vigor a partir de 2013 no Estado do Rio. A partir desse ano,
este Estado dará descontos ou aumentará o imposto de acordo com a classificação
dos veículos pelo PBEV.
Um dos impactos do crescimento do setor citado durante a parte inicial do
estudo, os grandes engarrafamentos e seus demais efeitos colaterais, não são
vistos pela empresa pesquisada como uma questão a ser resolvida pelo setor, mas
como um problema reservado apenas para o governo solucionar. Mesmo assim, a
organização entende que a mobilidade urbana e a gestão integrada de transporte
coletivo, se não resolvida, pode se tornar um gargalo ou pressão para o atual ritmo
de produção.
177
6.3 Contribuição ao arcabouço teórico
O estudo de caso sobre a Fiat do Brasil, além validar a aplicação dos modelos
teóricos propostos por FLECK (2009) e FLECK (in print) no setor automotivo
nacional, ratificou a importância do entendimento sobre a correta análise dos
desafios do ambiente, e a relação desses fatores com um potencial sucesso ou
fracasso de uma organização. Ainda, o uso do processo de abordagem histórica e
investigação longitudinal sobre a unidade de análise escolhida, conforme proposto
por YIN (1998), foi fundamental não só para o mapeamento das características dos
ambientes, como para o entendimento sobre os padrões de respostas da firma em
relação aos desafios explorados e seu caminho rumo a liderança do setor.
A pesquisa também mostrou que grupos de empresas no mesmo setor
podem estar enfrentando simultaneamente ambientes diferentes. Ou seja, a
configuração de um ambiente de uma indústria não pode ser considerada “absoluta”
para todo um setor, como geralmente considerado nas abordagens tradicionais de
estudos em estratégia. Tais abordagens tendem a considerar as “características do
ambiente” como algo compartilhado por toda a arena competitiva, ou então
praticamente a desconsideram, como no modelo sobre as forças competitivas de
Porter (1980). Esta constatação tinha sido observada anteriormente por Fleck
(2001), ao pesquisar outra ecologia temporal: a indústria de energia elétrica
americana, no seu estudo comparativo entre as empresas GE e a Westinghouse.
Essa observação ajuda na generalização das teorias para demais indústrias e
na sistematização dos conceitos abordados sobre crescimento e ambientes
organizacionais. Tal resultado deve ser observado por gestores ao se posicionarem
sobre análises ambientais e nas suas decisões estratégicas, reforçando a validade
prática deste referencial teórico.
Em relação a Rasc, a partir da análise pode-se considerar que a observação
e incorporação de práticas de Rasc são práticas esperáveis nas gestões atuais.
Além de estimular a criação de valor por processos de inovação, e gerar diversos
benefícios para a firma, são padrões de comportamentos exigidos cada vez mais
pelos diversos stakeholders, e vitais para a manutenção da legitimidade da firma.
178
6.4 Implicações do estudo de caso da Fiat para outras organizações do
setor automotivo
Além de corroborar as teorias abordadas, algumas observações a partir do
estudo de caso podem ser generalizadas para a indústria automotiva nacional. Aqui,
a classificação das implicações foram feitas de acordo com os desafios abordados
por este trabalho: empreendedorismo e navegação no ambiente.
Em relação ao processo de empreendedorismo, o aprendizado deste
trabalho confirma as teorias apresentadas e reforça que:
a) No setor automotivo é fundamental buscar a criação de valor a partir
do processo de crescimento, principalmente para poder adquirir
vantagens de escala e escopo. Além do crescimento orgânico, o
setor tem reforçado o uso de estratégias de parcerias e joint
ventures, com o foco de eliminação de players marginais.
b) Investimentos em inovações são essenciais para permitir
diferenciação em mercados cada vez mais competitivos. Essas
inovações devem focar não só nos produtos, mas nos processos e
no uso eficaz de matérias-primas;
c) O uso de plantas como plataformas de exportação são estratégias
eficazes em momentos de crises internas ou estagnação de
mercados. Para isso, cada vez mais as montadoras precisarão
apostar nos seus conceitos de carros globais. Uma condição de
sucesso dessa estratégia é manter e aprofundar o conhecimento
sobre mercados locais, atuando assim na estratégia conhecida
como “Pensar globalmente, agir localmente”;
d) Por outro lado, assim como observado no estudo de Schlie e Yip
(2000), a partir do momento que a Fiat obteve maior responsividade
local (local responsiveness) ou seja, adquiriu mais autonomia e
passou a fazer ajustes em seus veículos, serviços e formas de
condução dos negócios a nível local, tendo em consideração a
cultura nacional e as necessidades do consumidor brasileiro, a
empresa obteve melhor aceitação dos produtos e identificação com
o mercado nacional. Embora esta estratégia possa reduzir os
179
benefícios de se tornar uma plataforma de exportação e de
padronização de certos produtos, ajuda a empresa não só a atender
as preferências dos gostos dos consumidores locais, mas adaptar
sua estratégia para características dos canais de distribuição e
demandas do governo.
e) Atualmente, no mercado automotivo brasileiro, as novas entrantes
representam a grande ameaça do ambiente de negócios para as
empresas tradicionais, superando a preocupação sobre a
competição entre estes habituais atores. Dentre as novas entrantes,
as montadoras chinesas são consideradas as grandes ameaças a
médio prazo, principalmente pelo baixo preço dos produtos e ainda
oferecendo, em média, 5 anos de garantia;
f) O setor automotivo nacional desde a década de 1950 recebe uma
atenção especial do governo federal, vide os diversos regimes
automotivos e planos de proteção da indústria. Uma evidência mais
recente dessa superproteção e poder de lobby, de acordo com
Dantas (2012), é que entre o início da crise financeira internacional,
em 2008 até o fim de 2011, o governo brasileiro abriu mão de R$ 26
bilhões em impostos para a indústria automotiva. O principal
argumento é a criação e manutenção de empregos e o impacto do
setor no PIB. Contudo, durante esse período, de acordo com Dantas
(2012), o setor criou 27.753 novas vagas de trabalho, significando
que cada nova carteira de trabalho assinada pelas montadoras
custou cerca de R$ 1 milhão em renúncia fiscal aos cofres públicos.
g) Por fim, as evidências sugerem que o consumo de veículos elétricos
ou híbridos não deverá ser relevante no Brasil a curto e médio
prazo. Os principais entraves são a falta de infraestrutura de recarga
e os elevados preços quando comparados aos veículos
convencionais.
Para as implicações inferidas a partir da análise do processo de navegação
do ambiente, é interessante que as constatações do estudo para outras
organizações do setor sejam feitas a partir das perspectivas de interação com os
180
múltiplos stakeholders, pois cada parte interessada possui expectativas e uma forma
de troca de valor específica com a organização (LEPAK et al, 2007).
a) Governo: conforme visto, a relevância social e econômica da cadeia
produtiva do setor automotivo transforma a indústria como uma das
prioritárias nas manobras fiscais, de aumento do PIB, e de
manutenção de empregos. Assim, cria-se uma proximidade com
esta parte interessada, o que permite a indústria capturar valor a
partir dos processos de favorecimento do setor, como a ampliação
da demanda por facilitação de instrumentos de crédito, ou por
redução dos preços de venda, com as isenções e incentivos
tributários. Percebeu-se ainda que esta grande influência do
governo brasileiro na indústria automotiva, tem capacidade de
mudar configurações da arena competitiva de forma quase que
imediata.
b) Consumidores: a expectativa dos consumidores é, em geral, receber
produtos com alto valor percebido por um valor de troca menor,
gerando a melhor percepção de bom custo beneficio possível, além
de fatores subjetivos como a identificação com a marca e com um
determinado produto. Assim, é importante interpretar e atender os
desejos e particularidades de cada nicho de mercado. Um profundo
conhecimento dos mercados locais, aliado a agilidade de resposta
na apresentação de inovações, pode ajudar uma empresa a criar e
capturar valor em um mercado cada vez mais competitivo.
c) Fornecedores: este trabalho evidenciou que uma forma eficiente de
capturar valor é trazer a cadeia para próximo da organização. Não
apenas fisicamente, mas incluí-los nos processos e estreitar
relações de parcerias. Ainda, identificou a corresponsabilidade da
montadora sobre os processos produtivos no que se refere à Rasc,
e da consequente necessidade de influenciar o uso de práticas
socioambientalmente responsáveis;
d) Funcionários: as evidências apontam uma captura de valor ao
possibilitar um bom plano de carreira, de fazer o colaborador se
sentir representado nas decisões da firma. Esses processos podem
181
ser transformados em altos níveis de motivação, baixos índices de
turnover, e em não adesão às propostas greves, ou mesmo em
evidências mais tangíveis como prêmios de “Great Place to Work”,
todos evidenciados no caso em estudo;
e) Sociedade e meio ambiente: além de existirem obrigações da
organização em relação a práticas de Rasc, estas não poderão
sobreviver sem se tornar responsável com a sociedade em que ela
opera. Contudo, mesmo que uma firma se destaque em relação ao
tema, o processo de captação de valor criado nunca é garantido
(LEPAK et al, 2007). Mesmo que este trabalho não tenha
encontrando uma clara mensuração de relação de causa x efeito
entre as ações de Rasc e o processo de crescimento da
organização, existem evidências da captura de valor a partir dos
processos produtivos, como a redução da dependência de matérias-
primas para a fabricação do produto, além de neutralizar os riscos
de multas e outras penalidades por infrações ambientais. Porém os
processos produtivos não são estratégias difíceis de serem
replicadas, o que não só torna um desafio maior manter tais práticas
como diferenciais competitivos, mas as tornarão um pré-requisito de
sobrevivência.
6.5 Sugestões para pesquisas futuras
Finalizando, serão sugeridos algumas propostas para estudos futuros.
Algumas das evidências deste trabalho sugeriram relações que merecem ser
exploradas novamente, se possível igualmente na indústria automotiva nacional,
com o uso do mesmo referencial teórico utilizado, principalmente para poder
confrontar com os resultados alcançados no estudo de caso da Fiat do Brasil.
Tal paralelo possibilitaria robustecer ou contrapor a conclusão sobre a
necessidade dos gestores observarem em maior profundidade as características dos
ambientes em que suas empresas estão navegando, da mesma maneira que este
estudo reforçou os achados de Fleck (2001).
Por fim, ao refazer o estudo em outras empresas do setor, espera-se que o
pesquisador consiga:
182
• Entender como se comportaram as concorrentes da Fiat e seus movimentos
estratégicos durante o mesmo período estudado, especialmente os a
Volkswagen, que foi líder de mercado por mais de quatro décadas;
• Entender com mais profundidade o que as demais empresas do setor estão
fazendo em relação a Rasc e o quão diferentes são seus processos - e
estratégias - dos da Fiat;
• Entender sobre o processo de institucionalização de práticas de Rasc na
indústria automotiva nacional;
• Investigar em maior profundidade os processos de influência (lobby) da
indústria junto ao governo brasileiro e entender como acontece nos outros
países BRICS;
Um dos achados secundários deste trabalho foi a percepção sobre a velocidade
com que certas decisões do governo mudam, quase que da noite para o dia, o
ambiente competitivo. Assim, seria interessante um segundo estudo que pudesse
comparar, a partir de uma análise histórica, as decisões de outros governos em
relação a indústria automotiva.
Um último estudo sugerido poderia ser uma abordagem sobre o processo de
globalização das montadoras, com um olhar sobre benefícios entre decisões de
padronização global versus “responsividade local”, assim como feito por Schlie e Yip
(2000), e aprofundando a pesquisa sobre as relações entre matriz e filial.
183
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APÊNDICE A – QUESTIONÁRIO PARA CONDUZIR A ENTREVISTA
Recomendações principais: iniciar entrevista explicando que o foco da minha pesquisa são análises sobre o crescimento organizacional, pressões e desafios do ambiente, inclusive sobre sustentabilidade, mas sem entrar em maiores detalhes, para evitar contaminações ou respostas com vieses. A orientação é sempre usar perguntas abertas.
Garantir que as informações pessoais serão mantidas de forma confidencial,
mas que alguns comentários poderão ser usados como evidências durante a dissertação. Anotar dados pessoais: Nome, Sexo, Formação Acadêmica; Anotar dados profissionais: Área em que trabalha, Cargo, Tempo de empresa;
a) Conte-me um pouco da sua trajetória profissional (antes e durante a FIAT). b) Fale, por favor, como seu setor está relacionado com a questão da
sustentabilidade. c) Fale, por favor, como você atua ou já atuou direta ou indiretamente em
atividades ou projetos ligados à Rasc? d) De que maneiras você percebe que a empresa está atuando nessa questão
Rasc? e) Conte-me, por favor, qual é a sua visão em relação às práticas de
sustentabilidade na empresa? f) Quais são, na sua percepção, os principais desafios que a empresa teve em
relação a Rasc nos últimos anos? g) De acordo com a resposta acima, conte-me quais foram as ações e iniciativas
para responder esses desafios? h) Quais são, na sua opinião, os principais desafios que a empresa deverá ter,
em relação a Rasc?, nos próximos anos? i) De acordo com a resposta acima, conte-me quais ações e iniciativas a
empresa já tem planejadas para responder a estes desafios? j) Quais outras ações, na sua percepção, que a empresa deveria ter, mas que
não estão planejadas, para responder aos desafios de Rasc? que você citou? k) Quanto ao processo de crescimento da empresa, a que práticas você atribui
esse processo? l) Em que momento, na sua percepção, você acredita que a empresa conseguiu
se diferenciar dos concorrentes e alcançar a posição de destaque no ranking nacional?
m) Em quais aspectos você perceberia uma ameaça ao processo de crescimento da empresa?
n) De acordo com a resposta acima, quais ações você percebeu que a empresa fez ou está fazendo para responder à essas ameaças.
193
APÊNDICE B – LISTA DOS PRINCIPAIS PRÊMIOS RECEBIDOS PELA FIAT DO
BRASIL10
2011 Revista Isto É Dinheiro; - EMPRESA DO ANO 2011 Revista Isto É Dinheiro – Edição “As Melhores da Dinheiro 2011” - EMPRESA DO ANO 2011 na categoria Veículos e Indústria do Transporte Fiat Automóveis foi eleita Empresa do Ano no XII Prêmio Consumidor Moderno de Excelência em Serviços ao Cliente; Revista Exame/IBRC 7ª melhor empresa em atendimento ao cliente em 2010 e única montadora entre as 10 melhores; International Design Excellence Awards (IDEA) para Fiat MIO na categoria Estratégia de Design; Prêmio “Melhor Hatch” pela 4ª edição dos Melhores do Ano 2012 Auto Press; Prêmio “Melhor Carros Nacional até 1.000 cc” pelo Top Car TV 2011; Prêmio “Melhor Carro Nacional de 1001 até 1.599 cc” pelo Top Car TV 2011; Prêmio “Melhor Popular Imprensa Automotiva 2011” pela Abiauto; Prêmio “Carro do Ano 2012” da revista Auto Esporte com o Novo Palio 2012; Prêmio “Motor do Ano até 2.0” da revista Auto Esporte com o Motor 1.4 MultiAir; Prêmio “Publicidade do Ano” da revista Auto Esporte com a campanha do Fiat 500; Ouro no IDEA/ Brasil 2011 na categoria Estratégia de Design, com o Fiat Mio; Ouro no IDEA/ Brasil 2011 na categoria Transporte, com o Novo Uno; Ouro no IDEA/ Brasil 2011 na categoria Pesquisa, com o Novo Uno Ecology; 12° Compasso d'Oro ADI (Associação de Design Industrial) para Fiat 500; Prêmio Top XXI Design Brasil na categoria Inovação com o projeto do Fiat MIO; Prêmio Top XXI Design Brasil na categoria Destaque Empresa por sua capacidade de desenvolvimento de automóveis no Brasil; Pesquisa CINAU Fiat Palio é novamente o favorito entre os reparadores; Pesquisa CINAU Fiat Strada foi a picape leve mais recomendada pelos profissionais de reparação; 27º Prêmio Colunistas SP ”Anunciante do ano em 2010”; Instituto Datafolha Fiat foi escolhida a marca de automóveis no “Prêmio Top of Mind Internet”, pelo quinto ano consecutivo. XII Prêmio Consumidor Moderno de Excelência em Serviços ao Cliente na categoria Automóveis; The Bees Awards San Francisco, melhor trabalho em redes sociais, com Fiat Mio; Prêmio Discovery de Criatividade e Inovação, com Fiat Mio; 2010 Prêmio ‘’Executivo do Ano’’ para Cledorvino Belini – Presidente Fiat Automóveis S.A. – pela revista Auto Esporte; Prêmio “Melhor Hatch Médio” para Fiat Bravo, pela revista Car and Driver; Prêmio “10 Best” de 2011 na categoria “Melhor 1.0” para Novo Uno, pela revista Car and Driver; Prêmio “Melhor Publicidade de Produto” com a campanha “Novo Uno. Novo Tudo” pela Top Car TV; Prêmio “Melhor Publicidade de Varejo” com a campanha “Saia do quase, vá de Fiat” pela Top Car TV; Prêmio “Empresa do Ano/Minas Gerais e Centro-Oeste” pela Associação Brasileira de Comunicação Empresarial – Aberje; Prêmio “Personalidade de Comunicação do Ano/Minas Gerais e Centro-Oeste” para Marco Antonio Lage - Diretor de Comunicação Corporativa da Fiat, pela Associação Brasileira de Comunicação Empresarial – Aberje; Prêmio “Comunicação de Programas, Projetos e Ações Culturais’’ com o “case” “Rodin e Chagall na Casa Fiat de Cultura” para a Casa Fiat de Cultura, pela Associação Brasileira de Comunicação Empresarial – Aberje; Prêmio AutoData na categoria “Estratégia de Marketing” concedido ao Novo Fiat Uno; Prêmio AutoData na categoria “Veículo Automóvel”concedido ao Novo Fiat Uno;
10 Fontes: site da FIAT, acessado em 10 jun. 2012 e Livro Comemorativo dos 30 Anos da Fiat do Brasil.
194
Prêmio “Melhor Carro Nacional” pelo CAR Awards 2011 da revista Car Magazine; Prêmio “Carro do Ano 2011” da revista Auto Esporte; Prêmio “Carro do Ano 2011” pelo voto popular da revista Auto Esporte; Prêmio ‘’Melhor Campanha’’ da revista Auto Esporte; Prêmio “Melhor Carro Imprensa Automotiva” pela Abiauto (Associação Brasileira da Imprensa Automotiva); Prêmio “Melhor Carro Nacional” pela Abiauto (Associação Brasileira da Imprensa Automotiva); Prêmio “Melhor Carro Popular” pela Abiauto (Associação Brasileira da Imprensa Automotiva); Prêmio “Melhor carro até 1.000cc” pelo prêmio Top Car TV; Prêmio “Melhor Carro de 1.000 a 1.599cc” pelo prêmio Top Car TV; 2009 Melhor Empresa do setor de veículos e em Gestão de Responsabilidade Social e Meio Ambiente - ”As Melhores da Dinheiro”, da revista “IstoÉ Dinheiro”; Prêmio Lótus pela revista Frota & Cia; X Prêmio Consumidor Moderno de Excelência em Serviços ao Cliente na categoria Automóveis; Intangíveis dado à marca Fiat pela revista Consumidor Moderno; Prêmio Mineiro de Gestão Ambiental organizado pelo Governo de Minas e Secretaria Estadual de Meio Ambiente; 11º Eleição Melhores Carros pelo Best Cars Website - Melhor Hatch Pequeno (Punto); - Melhor Picape Pequena (Strada); Picape do ano – Revista Auto Esporte (Strada Adventure Cabine Dupla); Melhores do Setor Automotivo (Veículo Comercial Leve) pela revista Autodata com a Strada Adventure Cabine Dupla; Melhor Picape (Strada Adventure Cabine Dupla) - Prêmio Imprensa Automotiva 2009 Abiauto - Associação Brasileira da Imprensa Automotiva; Destaque no MKT – ABMN pelo Case: Punto T-Jet. Não é só turbo. É turbinado. A campanha de comunicação integrada que consolidou a vocação esportiva da Fiat; Carro mais econômico do Brasil e Prêmio EcoMotor (Mille Economy) - pela revista Motor Show; Vencedor do Hospital Best como “marca do veículo” na categoria ambulâncias em 2009 – Organizado pela ABMS (Associação Brasileira de Marketing em Saúde), revista Saúde Best e editora Exímia Comunicação; 7º entre os 20 melhores comerciais do mundo pela revista Creative On Line (Fiat 500); Melhor Carro Importado Abiauto (Associação Brasileira da Imprensa Automotiva) no Prêmio Imprensa Automotiva 2009 (Fiat 500); Motor do Ano – Revista Auto Esporte (Punto); Publicidade do Ano – Revista Auto Esporte (Fiat 500); 2008 IX Prêmio Consumidor Moderno de Excelência em Serviços ao Cliente na categoria Automóveis; Melhores e Maiores pela revista Exame; Auto Data - Montadora do ano; - Melhor carro do ano (Punto); Empresa Automobilística do Ano pela revista Marketing As empresas que mais respeitam o consumidor no Brasil pela revista Consumidor Moderno; Responsabilidade Social e Ambiental pela revista Época Negócios; Prêmio Balanço Anual pela Gazeta Mercantil; Os Eleitos pela revista Quatro Rodas - Stilo (Hatches Médios); - Strada (Picapes Leves); Top Car TV 2008 - Strada; - Palio ADV Locker - Melhor Comercial de Produto pela Top Car TV; Destaque no MKT – ABMN e Veículos e peças - ADVB - Case: “O oceano azul de Fiat Punto”; Carro do Ano 2008 dado ao Fiat Punto pela revista Auto Esporte;
195
Abiauto - Carro Nacional do Ano dado ao Fiat Punto; - Carro Abiauto do Ano dado ao Fiat Punto; Big Idea Chair - Prêmio Yahoo Brasil, pela campanha inovadora de lançamento do Fiat Punto pelo celular antes dos formatos tradicionais da internet; Melhor Carro Pequeno (Classe 2) – dado ao Fiat Punto na 10ª Eleição dos Melhores Carros/ Best Cars Web Site; 2007 Prêmio Top of Mind Internet”Prêmio Lótus”, revista Frota & Cia. “Furgão Leve do Ano” e “Furgão do Ano” com Fiorino e Ducato; Punto - Carro do ano Uruguai; - Carro do Ano 2008; - Prêmio Imprensa 2007; - Top Car TV Categorias: “Melhor carro Nacional” e “Melhor comercial do ano”; - Carro Interamericano 2008; Montadora do Ano; Anunciante do Ano “Caboré”; Melhores e maiores 2007, categoria ”Melhor empresa”; Top Of Mind Internet; XIII Prêmio Abemd Cases “Una Passione” e ”Siena Tetra Fuel e Stilo SP” Rally: Prêmio CBA; 2006 Melhor Empresa do Setor Automotivo pela revista Exame; Guia Exame 2000 diploma de classificação - 100 melhores empresas para se trabalhar 2000; II Prêmio Minas Desempenho Empresarial – Mercado Comum - Categoria: Maiores e Melhores 2000; - Categoria: Maiores Exportadores 2000; II Prêmio Minas Desempenho Empresarial – Mercado Comum 2000; Prêmio Auto Data 2000; Motor Fire recebe o prêmio “Marketing Best”; Novo Palio é eleito “O carro do ano” pela revista Auto Esporte e pela Abiauto; Novo Palio é considerado o “Lançamento do ano” pela revista Autodata; Fiat Rally ganha o 2º Prêmio Goodyear Off Road; A equipe Fiat Rally ganha os troféus de primeiro lugar em quatro categorias do 2º Prêmio Goodyear Off Road Prêmio Lótus 2006 com Ducato e Fiorino - A Fiat Automóveis foi uma das grandes vencedoras da edição 2006 do tradicional “Prêmio Lótus”, organizado pela conceituada revista Frota & Cia. A montadora conquistou o primeiro lugar em duas categorias: “Furgão Leve do Ano” e “Van do Ano”; 2005 Melhor Empresa do Setor Automotivo pela revista Exame; TOP CAR TV - Fiat Idea – Melhor carro nacional acima 1001 cc; - Melhor comercial de TV de produto – Fiat Idea; - Melhor comercial de TV de varejo – Paixão Fiat; - Melhor executivo de montadora – Cledorvino Belini; Revista Auto Esporte - Carro do Ano – Fiat Idea; Revista Auto Test - Mejor Auto Mercosur 2006 – Fiat Idea; Associados Minas (Estado de Minas, Diário da Tarde, Rádio Guarani, TV Alterosa) - Fiat Idea – O Melhor do Ano; Revista AUTODATA - Melhores do Setor Automotivo;
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- Responsabilidade Social; - Destaque Exportação; Revista Consumidor Moderno - As empresas que mais respeitam o consumidor na categoria Bens de Consumo – Automóveis; Guia Exame de Boa Cidadania - Relacionamento com funcionários; - Fale com o Superintendente (Prática Destaque); - Centro de Competências; - PROSA (Programa de Saúde do Adolescente); - Meio Ambiente; - Coleta Seletiva de Resíduos; - Projeto de Recirculação de Águas; - Processo de Reciclagem de Isopor; - Fornecedores; - Fórum Fiat de Fornecedores; - Consumidores/Clientes; - Programa Fiat Autonomy; - Pesquisa de Satisfação dos Clientes; - Comunidade; - Árvore da Vida; - Tesouros do Brasil; - Governo e Sociedade; - Programa ABC+; - Programa de Imunização nos Centros de Saúde; Pesquisa Marcas de Sucesso - A marca mais lembrada na categoria Indústria Automobilística; Festival de Cannes - Ponto de Venda - Fiat Ducato; Grand Prix Colunistas - Campanha Impressa Fiat Strada; Grand Prix Festival de Língua Portuguesa - Fiat Stilo; Anunciante do Ano ON Line – MSN Prêmio About de Comunicação Integrada - Fiat Idea; Rally - Fiat Palio: Campeão Brasileiro de Rally 2005, categoria A6 – pela nona vez consecutiva; - Campeão Brasileiro de Rally 2005, categoria N2; - Equipe Fiat Rally – Campeã por equipes do Brasileiro de Rally 2005; - Fiat Palio – Campeão Mineiro de Rally, categoria N2; Capacete de Ouro - Revista RACING - Dupla de Rally Luis Tedesco e Kz Morales; 2004 Presidente Belini ganha título de “Industrial do Ano”, concedido pela Fiemig (Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais) Eleita “A empresa que mais respeita do consumidor”, pela revista Consumidor Moderno Eleita Melhor do Setor Automotivo em Responsabilidade Social” - TNS Interscience A Fiat Automóveis ganha ouro e prata na 22ª Edição do Prêmio Colunistas RS 2004, realizado há mais de 30 anos pela Associação Brasileira dos Colunistas de Marketing e Propaganda (Abracomp). A montadora foi vencedora na categoria “Mídia exterior”, classificando-se para representar o Rio Grande do Sul na final nacional do Prêmio; Cinco modelos da Fiat foram eleitos a melhor compra na edição de junho da Revista Quatro Rodas: Fiat Palio Fire (até 20 mil reais), Fiat Palio ELX 1.3 (de 20 a 25 mil reais), Fiat Siena ELX 1.3 (de 25 a 30 mil reais), Fiat Siena HLX (de 30 a 35 mil reais), Palio Weekend ELX e HLX (melhor Perua); Os Eleitos (Revista Quatro Rodas): Fiat Stilo, Fiat Palio Weekend e Fiat Siena foram eleitos pela revista Quatro Rodas os modelos com o maior índice de satisfação de seus proprietários em seus segmentos. Em seu terceiro ano, a eleição foi é feita em conjunto com o instituto de pesquisas Research International, que ouviu 2.582 proprietários de carros; IX Top of Mind – Mercado Comum – Marcas de sucesso – MG – 2003/2004
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- Categoria liderança – Uno (Carro Nacional Popular); - Categoria Expressão – Palio (Carro Nacional Popular); TOP SOCIAL ADVB - Prêmio Responsabilidade Social, com o Projeto Você Apita Guia Exame de Boa Cidadania - Destaque em Cultura, com o projeto Um Poema Chamado Brasil 2004; Prêmio ABERJ - Relacionamento com a comunidade, com o Projeto Você Apita; 2003 Prêmio Top of Mind (Revista Mercado Comum), baseado em pesquisa realizada em nova regiões do Estado de Minas Gerais - Categoria Liderança – Uno (Carro Nacional Popular); - Categoria Expressão – Palio (Carro Nacional Esportivo); - Categoria Expressão – Indústria Mineira; Prêmio Lótus com Ducato e Fiorino - Pelo décimo ano consecutivo, o modelo Fiorino ganhou o Prêmio Lótus, na categoria “Furgão Leve do Ano”. O veículo conquistou o título em todas as edições do concurso; - O Ducato também foi agraciado, pela segunda vez, como o “Furgão do Ano”; Best Cars Web Site - Stilo, “Melhor Carro Médio-Pequeno do Brasil”; - Strada, “Melhor Picape Pequena do Brasil”; Revista Autoesporte - Carro do Ano 2004; Prêmio Imprensa Automotiva 2003 da Abiauto (Associação Brasileira da Imprensa Automotiva) - Prêmio Imprensa Automotiva 2003 (Categoria Nacional); Prêmio ABERJE Brasil 2003 - O livro O Brasil dos Meus Olhos, que reúne os cem melhores trabalhos inscritos no concurso homônimo promovido pela Fiat Automóveis, foi o vencedor da categoria publicação especial; Prêmio ABERJE Minas - Livro O Brasil dos Meus Olhos; - Categoria Assessoria de Imprensa; - Boletim Externo (com o Stilo News); - Publicação Interna Expresso Fiat; Entre os prêmios pelas ações de internet, a Fiat conquistou em 2003 o Abanet/MSN, com o site Doblò Adventure – categoria Comunicação-Marketing e Destaque de Design – e mais dois prêmios para as campanhas on-line do Stilo – o Cyber Lion do Festival de Cannes e Medalha de Prata no About; Colunistas 2003 - Série Ultrapassagem – Trator/ Caminhão de Lixo – este anúncio conquistou Ouro pelo Voto Popular/ About; Ouro; Festival Internacional do Rio de Janeiro da ABP - Rasgado – este anúncio institucional conquistou Bronze pelo Voto Popular/ About; Lâmpada de Bronze; El Ojo de Iberoamerica 2003 - Faixa, este anúncio para o Marea Turbo conquistou Ouro; Prêmio ABERJE - Publicação Especial, programa “O Brasil dos Meus Olhos”; 2002 Prêmio Lótus com Ducato e Fiorino - Mais uma vez, a Fiat garante o Prêmio Lótus Furgão do Ano com o Ducato, e Furgão Leve do Ano, com o Fiorino; Revista Auto Esporte - Fiat Stilo é eleito o Carro do Ano Revista Quatro Rodas - Stilo, Principal Lançamento Nacional do Ano, eleito pelos internautas do site da revista Imprensa Especializada Argentina - Stilo, O Melhor Auto 2003 TOP CAR TV - Stilo, Melhor Carro Nacional
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Prêmio Abiauto Imprensa Automotiva - Stilo, Categoria Nacional Abanet/MSN - Stilo, Melhor Campanha de Lançamento com os sites www.quecarroeesse.com.br e www.fiatstilo.com.br Revista Quatro Rodas - Palio Weekend conquista o Prêmio Os Eleitos Revistas Transporte Moderno e Technibus - Fiat recebe Prêmio Maiores e Melhores do Transporte e Logística/Categoria Montadora de Veículos Prêmio Empresa Cidadã Amiga da Comunidade Negra - Fiat Automóveis garante prêmio com a Campanha Revendo Conceitos Prêmio ABERJE Cidadania Empresarial - Programa Fiat para os Jovens Prêmio Top Social ADVB - Programa Direção Segura Ação Social Prêmio Marketing Best - Categoria Responsabilidade Social com o Projeto O Brasil Mais Bonito Começa Na Minha Cidade; Prêmio Internacional El Ojo de Iberoamerica - Hotsite do Fiat Doblò ganha prêmio inédito na Categoria Website; Prêmio ABERJE - Melhor Empresa em Comunicação Empresarial - Campanha de Comunicação Externa com “Doblò: você não esperava por isso”; - Melhor Revista Interna com a Expresso Fiat; Prêmio Festival de Londres - Campanha publicitária do Fiat Marea; TOP CAR TV - Melhor Comercial de TV Institucional, com o filme 25 anos da Fiat no Brasil; - Melhor Comercial de TV Produto Top Car TV com a campanha Revendo Conceitos; - Melhor Performance em Comunicação Top Car TV; Prêmio Melhor Empresa com Telemarketing Próprio ou Terceirizado Ativo/Receptivo - Premiação com a Atento do Brasil S.A, responsável pelo Call Center (08007071000); ABERJE (Associação Brasileira de Comunicação Empresarial) - Empresa do Ano; - Cidadania Empresarial, Prêmio ABERJE Regional Minas, com o programa “Fiat para os Jovens”Compromisso com o Futuro, com o programa “Fiat para os Jovens”; - Compromisso com o Futuro, com o programa “Fiat para os Jovens”; TOP SOCIAL ADBV - Pela quarta vez consecutiva, prêmio Ação Social, programa “Test Drive Direção Segura”; MARKETING BEST - 1º Marketing Best Responsabilidade Social, com o projeto “O Brasil mais bonito começa na minha cidade”, título instituído pela Editora Referência, pela Fundação Getúlio Vargas e pelo MadiaMundoMarketing; 2001 Revista About - O Hotsite do Novo Palio Adventure recebeu o prêmio prata na categoria “Marketing - Produtos de Consumo Duráveis”, ficando com o ouro, o Hotsite de lançamento do Marea; Top social 2001 Prêmio Abracaf V Top of Mind Expressão - Palio (Carro Nacional Popular); - Uno (Carro Nacional Popular); Inovação Set/01 Aberje 2001 – Brasil - Empresa do ano em Comunicação Empresarial Aberje 2001 - Minas Gerais Revista Interna II; Prêmio Minas Desempenho Empresarial Mercado Comum 2001 Auto Data - Melhor Empresa - Montadora Fiat; - Melhor Empresa – Veículo Automóvel Fiat Novo Palio;
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UBQ união brasileira para qualidade - VI convenção mineira CCQ – Grupo Campeão – BH 21/05/2001; Fiat Strada é eleita pela imprensa automotiva, a melhor pick-up de 2001 TOP SOCIAL ADVB - Prêmio Responsabilidade Social, com o programa “O Brasil mais bonito começa na minha cidade”; 2000 Revista Exame - Lidera o ranking “Melhores Empresas para Você Trabalhar” - Considerada novamente Melhor Empresa do Ano II Prêmio Minas Desempenho Empresarial Mercado Comum - Categoria: Maiores e Melhores 2000; - Categoria: Maiores Exportadores 2000; Guia Exame 2000 - Diploma de classificação – 100 melhores empresas para se trabalhar 2000; Prêmio Auto Data 2000 II Prêmio Minas Desempenho Empresarial Mercado Comum 2000 “Marketing Best” - Motor Fire; Revista Auto Esporte - Novo Palio é eleito “O carro do ano”; Abiauto - Novo Palio é eleito “O carro do ano”; Autodata - Novo Palio é considerado o “Lançamento do ano”; TOP SOCIAL ADVB - Prêmio Ação Social, programa “Retrato do Brasil”; 1999 Prêmio Lótus - Fiorino, Furgão Leve do Ano; Revista Auto Esporte - Marea é eleito “O carro do ano”; Prêmio Minas Desempenho Empresarial Mercado Comum - Categoria: Empresa Excelência de Minas; - Categoria: Empresa Liderança de Minas - Maior Contribuinte de Impostos de MG; - Categoria: Maior Faturamento de MG; - Categoria: Maior Exportador; ADVB Top social - Prêmio Responsabilidade Social, case “Moto Perpétuo”; Prêmio 400 primeiras empresas de MG II Prêmio Minas de Desempenho Empresarial Mercado Comum - Categoria: Liderança Setorial de Minas Industria Automotiva; - Categoria: Empresa Excelência de Minas - Maiores Receitas Operacionais; - Categoria: Excelência de Minas - Maior Contribuinte de Impostos; - Categoria: Maiores e Melhores; - Categoria: Maiores Exportadores; II Prêmio Minas de Desempenho Empresarial Mercado Comum 1998 Revista Auto Esporte - Marea é eleito “O carro do ano”; Prêmio Cacex Banco do Brasil Prêmio Carta Capital - Empresas mais Admiradas IV Top of Mind - Tempra (Carro de Luxo) - Gazeta Mercantil; - Uno 1998;
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Nordeste Auto Show - Salão Automobilístico - Destaque da Indústria Automobilística Brasileira - Recife 11/11/1998; Prêmio Minas Desempenho Empresarial Mercado Comum - Categoria: Empresa Excelência de Minas; - Categoria: Empresa Liderança de Minas - Maior Contribuinte de Impostos de MG; - Categoria: Maior Faturamento de MG; - Categoria: Maior Exportador; 1997 Revista Exame - Lidera o ranking “Melhores Empresas para Você Trabalhar” Primeira empresa do setor automotivo a ser certificada com certificado ambiental ISO 14001 Revista Carro - O Palio é considerado o melhor carro do Brasil, na categoria compacto; Palio é considerado o melhor carro do Brasil, na categoria carro pequeno Guia Exame 1997 - Diploma de classificação – 100 melhores empresas para se trabalhar; Certificado de honra ao mérito fornecido pela Companhia Mineira de Eventos pelo desenvolvimento social e industrial do Estado de MG Top of mind - Marcas de Sucesso BH; - Tempra (Carro de Luxo); 1996 Top of mind - Marcas de Sucesso BH; - Tempra (Carro de Luxo); Prêmio CNI de incentivo a qualidade e produtividade Revista Carro - “Melhor carro do Brasil” - categoria compacto; 1995 Revista Quatro Rodas - Tempra Turbo é escolhido “O Eleito do Ano”; Prêmio Minas ecologia categoria GR; Prêmio “Excelência e Análise de valor” Revista Exame - Fiat é eleita a melhor empresa para se trabalhar; 1994 Revista Exame - Fiat recebe prêmio “Empresa do Ano”; 1993 Revista Exame - Fiat recebe Diploma “Empresa do Ano”; Prêmio Qualidade MG - jornal O Debate Fundação Getúlio Vargas - Prêmio “Excelência Empresarial”; 1992 Revista Auto Esporte - Uno é eleito “O carro do ano”; 1991 II Top Marketing - Caso: Uno Mille feito para você, Uno Mille feito para vencer;
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1990 Revista Auto Esporte - Uno é eleito “O carro do ano”; 1985 Revista Auto Esporte - Fiat Prêmio é eleito “O carro do ano”; 1984 Revista Auto Esporte - Uno é eleito “O carro do ano”; 1976 Revista Auto Esporte - Fiat 147 é eleito “O carro do ano”.
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ANEXO 1 – POLÍTICA AMBIENTAL: PRINCÍPIOS E DIRETRIZES DA FIASA
POLÍTICA AMBIENTAL
PRINCÍPIOS E DIRETRIZES DA FIASA Considerando que a conservação do meio ambiente é essencial para a qualidade de vida e para o desenvolvimento sustentável, a FIAT Automóveis, como signatária da Carta Empresarial da Câmara do Comércio Internacional - CCI, e em coerência, onde aplicável, com a política para o ambiente da FIAT AUTO, se compromete a: 1- Manter um Sistema de Gestão Ambiental para assegurar o atendimento aos
requisitos legais e outros requisitos, em seus processos, produtos e serviços.
2- Promover a utilização otimizada de recursos energéticos.
3- Gerenciar os resíduos industriais, minimizando a sua geração e otimizando a reciclagem dos mesmos.
4- Buscar a melhoria contínua do desempenho ambiental de suas atividades, visando sempre a prevenção da poluição e aplicando tecnologia economicamente viável.
5- Produzir veículos condizentes com a legislação ambiental vigente.
6- Promover a conscientização e o envolvimento dos seus empregados, contratados e subcontratados que trabalham em suas instalações, para que atuem de forma ambientalmente correta.
O Sistema de Gestão Ambiental abrange a unidade fabril de Betim/MG, nas suas atividades de produção e montagem de veículos automotivos.
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ANEXO 2 – EXEMPLO DE MATERIAIS DE DIVULGAÇÃO DE AÇÕES DE
PROJETOS DE SUSTENTABILIDADE DA FIAT
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ANEXO 3 – NÚMERO DE VENDAS DE AUTOMÓVEIS E PARTICIPAÇÃO DA FIAT
NO MERCADO INTERNO BRASILEIRO
Fonte: ANFAVEA (2012)
ANOVEÍCULOS FIAT
VENDIDOS NO BRASILVEÍCULOS NOVOS
VENDIDOS NO BRASILParticipação da Fiat
1976 3.067 810.178 0,38%1977 63.468 750.685 8,45%1978 93.082 881.610 10,56%1979 111.817 924.690 12,09%
1980 120.670 886.796 13,61%1981 55.215 515.608 10,71%1982 65.611 641.992 10,22%1983 70.727 686.584 10,30%1984 62.958 628.201 10,02%1985 89.370 700.375 12,76%1986 102.402 786.386 13,02%
1987 75.778 513.632 14,75%1988 75.643 679.836 11,13%1989 80.659 703.962 11,46%1990 104.025 661.337 15,73%1991 148.559 732.444 20,28%1992 150.242 724.651 20,73%
1993 243.739 1.081.386 22,54%1994 389.234 1.330.459 29,26%1995 419.178 1.652.278 25,37%1996 447.765 1.673.136 26,76%1997 508.887 1.873.665 27,16%1998 364.414 1.466.423 24,85%
1999 304.235 1.195.609 25,45%2000 361.692 1.403.833 25,76%2001 415.406 1.511.187 27,49%2002 357.715 1.396.141 25,62%2003 340.682 1.346.330 25,30%2004 348.573 1.478.118 23,58%
2005 404.410 1.618.947 24,98%2006 465.543 1.831.712 25,42%2007 607.557 2.341.032 25,95%2008 657.763 2.670.991 24,63%2009 736.969 3.008.742 24,49%2010 760.495 3.328.948 22,84%
2011 754.275 3.425.674 22,02%