universidade federal de sÃo paulo escola paulista de...

43
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO ESCOLA PAULISTA DE MEDICINA FATORES PREDITIVOS PARA A MÁ EVOLUÇÃO RESPIRATÓRIA NA SÍNDROME DE GUILLAIN-BARRÉ UMA REVISÃO DA LITERATURA KÁTYA DE CARVALHO MAURICIO RAPHAEL AKIRA SIQUEIRA ISHIBASHI SÃO PAULO 2007

Upload: phamthuy

Post on 15-Oct-2018

215 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO ESCOLA PAULISTA DE MEDICINA

FATORES PREDITIVOS PARA A MÁ EVOLUÇÃO RESPIRATÓRIA NA SÍNDROME DE GUILLAIN-BARRÉ UMA REVISÃO DA LITERATURA

KÁTYA DE CARVALHO MAURICIO

RAPHAEL AKIRA SIQUEIRA ISHIBASHI

SÃO PAULO 2007

ii

KÁTYA DE CARVALHO MAURICIO

RAPHAEL AKIRA SIQUEIRA ISHIBASHI

FATORES PREDITIVOS PARA A MÁ EVOLUÇÃO RESPIRATÓRIA NA SÍNDROME DE GUILLAIN-BARRÉ UMA REVISÃO DA LITERATURA

Monografia apresentada a Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina, para obtenção do Título de Especialista em Intervenção Fisioterapêutica nas Doenças Neuromusculares.

Orientadora: Profa. Dra. Sissy Veloso Fontes

SÃO PAULO 2007

iii

Universidade Federal de São Paulo

Escola Paulista de Medicina

Especialização em Intervenções Fisioterapêuticas nas Doenças Neuromusculares

Chefe do Departamento: Débora Amado Scerni

Coordenadores do Curso de Especialização: Prof. Dr. Acary Souza Bulle Oliveira Profa. Ms Francis Meire Fávero Profa. Dra. Sissy Veloso Fontes

iv

Kátya de Carvalho Mauricio

Raphael Akira Siqueira Ishibashi

FATORES PREDITIVOS PARA A MÁ EVOLUÇÃO RESPIRATÓRIA NA SÍNDROME DE GUILLAIN-BARRÉ UMA REVISÃO DA LITERATURA

Banca Examinadora

Professora Orientadora: Profa. Dra. Sissy Veloso Fontes

Professor Examinador: Prof. Dr. Abrahão A. J. Quadros

Professor Examinador

Aprovada em: ____/____/_____

v

DEDICATÓRIA

Aos nossos pacientes, verdadeiros motivadores para a realização

desta especialização.

A todos aqueles que se dedicam ao árduo trabalho de pesquisa,

enriquecendo e valorizando o trabalho do fisioterapeuta.

vi

AGRADECIMENTOS

A Deus, que em nossas vidas proporcionou a oportunidade do

conhecimento.

Aos nossos familiares pelo carinho, incentivo, paciência e

compreensão dedicados durante a realização deste trabalho e em todos

os momentos de nossas vidas.

A Miriam, pela valiosa contribuição na revisão gramatical e

ortográfica deste trabalho.

vii

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

• AIDP - Polineuropatia Inflamatória Desmielinizante Aguda

• AMSAN - Neuropatia Sensitivo-Motora Axonal Aguda

• AMAN - Neuropatia Motora Axonal Aguda

• CMV - Cytomegalovirus

• CO2 – Gás carbônico

• CV – Capacidade vital

• CVF – Capacidade vital forçada

• DPOC – Doença pulmonar obstrutiva crônica

• EMG – Eletromiografia

• IOT – Intubação oro-traqueal

• PaO2 – Pressão Parcial de Oxigênio

• Peak Flow – Pico de fluxo de tosse

• PEmáx – Pressão expiratória máxima

• PImáx – Pressão inspiratória máxima

• SGB - Síndrome de Guillain-Barré

• Vmin – Volume minuto

viii

RESUMO

Introdução: A Síndrome de Guillain-Barré é uma polineuropatia inflamatória, desmielinizante, aguda, de origem auto-imune e representa a causa mais comum de paralisia flácida nos países ocidentais; sua progressão é rápida e pode resultar em severo comprometimento dos músculos respiratórios em até 30% dos casos. Idealmente o risco de desenvolver insuficiência respiratória deve ser identificado o mais precocemente possível, uma vez que o rápido suporte ventilatório oferecido a estes pacientes diminui as complicações secundárias à falência respiratória, melhorando seu prognóstico. Objetivo: Identificar os fatores capazes de predizer a falência respiratória na Síndrome de Guillain-Barré. Método: Foram realizadas buscas eletrônicas nas bases de dados MEDLINE, LILACS, SCIELO, além do site PUBMED, a fim de identificar os artigos científicos indexados e publicados de 1997 a 2007. A primeira estratégia de busca utilizada nas bases de dados MEDLINE, LILACS e SCIELO foi: descritor de assunto= “Guillain-Barré syndrome” AND “respiratory failure”. Na PUBMED foi: descritor de assunto= “Guillain-Barré syndrome” AND “respiratory failure” AND limits= adult humans. A segunda estratégia de busca utilizada nas: MEDLINE, LILACS e SCIELO foi: descritor de assunto= “Guillain-Barré syndrome” AND “respiratory insufficiency”. Na PUBMED foi: “Guillain-Barré syndrome” AND “respiratory insufficiency ” AND limits= adult humans. Foram selecionados para esse estudo ensaios clínicos, estudos prospectivos e retrospectivos, realizados com humanos adultos, com diagnóstico de SGB segundo o critério padrão; estudos que envolviam outras doenças além da síndrome de Guillain-Barré foram descartados. Resultados: A primeira estratégia de busca nos trouxe 163 títulos com seus respectivos resumos; De acordo com os critérios de inclusão, apenas 6 estudos foram incluídos nesta revisão. A segunda estratégia de busca nos trouxe 57 títulos com seus respectivos resumos sendo que desses, nenhum foi incluído nesta revisão. Esses estudos envolveram 1486 pacientes dos quais 535 receberam ventilação mecânica e 951 não receberam. Conclusão: Os fatores preditivos mais utilizados são, de acordo com a revisão, o grau de incapacidade no momento da admissão, a presença de disfunção autonômica, a disfunção bulbar, a arreflexia generalizada e a rápida evolução dos acometimentos. Os testes simples de função pulmonar que podem ser realizados à beira do leito como a CV, PImáx e PEmáx, têm a capacidade de, isoladamente, predizer a possibilidade de falência respiratória. Considerando que estes testes são de fácil aplicação e de baixo custo, devem constituir prática comum nos serviços de saúde.

ix

ABSTRACT

Introduction: Guillain-Barré syndrome is an acute inflammatory demyelinating polyneuropathy and represents the most common cause of acute flaccid paralysis in western countries; it progresses rapidly and leads to severe weakness of respiratory muscles in 30% of the patients. Ideally the potential of respiratory failure development must be promptly identified as the early ventilatory support can reduce secondary complications of respiratory failure, improving patient prognostic.

Objectives: To identify the predictive factors of respiratory failure in Guillain-Barré syndrome.

Method: Electronic research in the MEDLINE, LILACS and SCIELO databases and PUBMED website in order to identify articles published from 1997 to 2007. In the first search it was used the terms “Guillain-Barré syndrome” and “respiratory failure” and in the second one, the terms “Guillain-Barré syndrome” and “respiratory insufficiency”. In PUBMED website it was also used the “limit= adult humans”. It was selected clinical trials, prospective and retrospective studies with adult human beings who had diagnosis of Guillain-Barré syndrome; the studies that involve other diseases were rejected.

Results: The first searching strategy brought 163 articles with their respective summaries. According to inclusion criteria, only 6 articles were considered in this review. The second searching strategy brought 57 articles with their respective summaries. Although none of them were included. These studies involved 1486 patients, of whom 535 received mechanical ventilation and 951 didn’t.

Conclusion: The usual predictive factors are: disability grade in admission, presence of autonomic dysfunction, bulbar dysfunction, generalized areflexia and rapid disease progression. Simple bedside measurements like pulmonary function tests (vital capacity, maximal inspiratory and maximal expiratory pressures) allow respiratory failure prediction by themselves. Considering that application of these procedures is easy and at low cost, they must be always used in clinical practice.

x

SUMÁRIO

Capa...................................................................................................................... i Folha de rosto.................................................................................................. ii Folha de identificação...................................................................................... iii Termo de aprovação........................................................................................ iv Dedicatória....................................................................................................... v Agradecimentos............................................................................................... vi Lista de abreviaturas e siglas.......................................................................... vii Resumo............................................................................................................ viii Abstract............................................................................................................ ix Sumário............................................................................................................ x I – Introdução................................................................................................... 01 I.1 Síndrome de Guillain-Barré........................................................................ 01 I.1.1 Definição.................................................................................................. 01 I.1.2 Manifestações Clínicas............................................................................ 01 I.1.3 Epidemiologia.......................................................................................... 01 I.1.4 Diagnóstico.............................................................................................. 02 I.1.5 Patogênese.............................................................................................. 04 I.1.6 Fatores desencadeantes......................................................................... 04 I.1.7 Classificação............................................................................................ 05 I.1.7.1 Polineuropatia Inflamatória Desmielinizante Aguda (AIDP).................. 05 I.1.7.2 Neuropatia Motora Axonal Aguda (AMAN)........................................... 06 I.1.7.3 Neuropatia Sensitivo-Motora Axonal Aguda (AMSAN)......................... 06 I.1.7.4 Síndrome de Miller Fisher..................................................................... 06 I.1.7.5 Outros subtipos..................................................................................... 07 I.1.8 Comprometimento autonômico................................................................ 07 I.1.9 Comprometimento respiratório................................................................ 08 I.1.9.1 Testes de função pulmonar.................................................................. 11 I.1.9.1.1 Capacidade Vital................................................................................ 11 I.1.9.1.2 Pressão inspiratória máxima e pressão expiratória máxima............. 12 I.1.9.1.3 Pico de fluxo de tosse – Peak Flow................................................... 13 I.1.10 Tratamento............................................................................................. 14 I.1.10.1 Suporte............................................................................................... 14 I.1.10.2 Imunoterapia....................................................................................... 14 II – Objetivo...................................................................................................... 15 III – Método...................................................................................................... 16 III.1 Tipo de estudo.......................................................................................... 16 III.2 Estratégias de busca................................................................................ 16 III.3 Critérios de inclusão e exclusão............................................................... 16 IV – Resultados................................................................................................ 17 IV.1 Descrição dos estudos............................................................................. 19 V – Discussão.................................................................................................. 25 VI – Considerações finais................................................................................ 27 VII – Referências bibliográficas....................................................................... 28 VIII – Anexos.................................................................................................... 32 VIII.1 – Escala de Hughes............................................................................... 32 VIII.2 – Escala de funcionalidade.................................................................. 33

xi

I - INTRODUÇÃO

I.1 Síndrome de Guillain-Barré

I.1.1 Definição

A Síndrome de Guillain-Barré (SGB), entidade clínica que deve seu nome ao

dos autores que a descreveram pela primeira vez, é uma polineuropatia inflamatória,

desmielinizante, aguda, de origem auto-imune, com uma ampla gama de sintomas

motores e sensitivos1-8. Com a erradicação da poliomielite nos países ocidentais,

tornou-se a causa mais freqüente de paralisia flácida aguda3,5,6,9,10. Na maioria dos

pacientes a neuropatia é precedida por infecção bacteriana ou viral1,5,10,11.

I.1.2 Manifestações Clínicas

Manifesta-se principalmente com fraqueza muscular ascendente e simétrica

com ou sem distúrbios sensoriais e autonômicos1,3,5,7. A fraqueza é mais importante

nos músculos proximais e os membros inferiores são comumente mais afetados que

os membros superiores. São freqüentes as parestesias proximais, que se propagam,

mas raramente atingem punhos ou tornozelos. Nos pés são relatadas sensações de

formigamento ou “alfinetadas”. Os reflexos profundos são abolidos no decorrer de

alguns dias1,7,12. Este quadro pode evoluir em poucas horas ou mesmo em alguns

dias ou semanas, e seu grau de acometimento pode variar de uma simples fraqueza

de membros inferiores a um quadro de quadriplegia1,7,13. A esta fase progressiva da

doença, segue-se um platô com persistência dos sintomas, que se mantêm

inalterados. O tempo de recuperação varia de semanas a meses.

I.1.3 Epidemiologia

Os estudos epidemiológicos mostram uma incidência anual amplamente

variável de 0.4 a 4 casos em cada 100.000 habitantes, com uma prevalência maior

xii

em homens que em mulheres1,5,8,12,14. Um estudo retrospectivo, realizado no hospital

Santa Marcelina, de janeiro de 1995 a dezembro de 2002 e publicado em 2004,

indicou uma incidência anual de 0.6 casos/ 100.000 habitantes, na proporção de 1.4

homens para 1 mulher15. Apesar do prognóstico de recuperação atribuído aos

pacientes com Síndrome de Guillain-Barré ser muito favorável, a taxa de mortalidade

encontrada pode variar de 2 a 10% dos casos1,16.

I.1.4 Diagnóstico

O diagnóstico na SGB é baseado principalmente nas características clínicas

e, muitas vezes, é considerado arbitrário uma vez que ainda não há um marcador

diagnóstico específico1,5,7,12. As características que permitem um diagnóstico

incluem critérios laboratoriais e eletrofisiológicos além dos clínicos (quadro 1)17.

Laboratorialmente, verifica-se aumento da proteína liquórica, sem pleocitose. Um

exame de líquor normal nas primeiras 48hs não exclui o diagnóstico, mas ao final de

uma semana o nível protéico deve estar elevado. Os picos de elevação protéica se

dão de quatro a seis semanas do início dos sintomas, podendo tal fato ser atribuído

ao processo inflamatório das raízes nervosas, com quebra da barreira

hematoencefálica e transudato de proteínas do plasma para o líquor, levando à

dissociação albumino-citológica5,7,12. Os estudos eletrodiagnósticos revelam uma

polineuropatia desmielinizante multifocal com degeneração axonal secundária17; a

eletroneuromiografia demonstra diminuição da velocidade de condução nervosa7,12;

alterações na eletromiografia são raras na fase inicial e as primeiras alterações são

o recrutamento anormal das unidades motoras, os potenciais de desnervação

ocorrendo normalmente após a terceira semana17.

Quadro 1 - Critérios Diagnósticos para a Síndrome de Guillain -Barré segundo Asbury e Cornblath 17

Características necessárias para o diagnóstico

• Debilidade motora progressiva em ambos os membros superiores e

inferiores

• Arreflexia

xiii

Características que apóiam fortemente o diagnóstico

• Rápida progressão dos sinais e sintomas por até quatro semanas

• Relativa simetria dos sintomas

• Sinais e sintomas sensitivos leves

• Sinais de envolvimento dos nervos craniais, especialmente fraqueza

bilateral dos músculos faciais (ocorrem aproximadamente em 50% dos

casos), da língua e da deglutição

• Início da recuperação de duas a quatro semanas após o término da

evolução

• Disfunção autonômica – arritmias, alterações de pressão e sintomas

vasomotores, quando presentes, apóiam fortemente o diagnóstico

• Ausência de febre durante o surgimento dos sintomas neurológicos

• Alta concentração de proteína liquórica na primeira semana do surgimento

dos sintomas, com concentração celular menor que 10células/mm3

• Achados eletrofisiológicos como a diminuição na velocidade de condução

nervosa ou bloqueio da mesma, quando presentes, apóiam fortemente o

diagnóstico (aproximadamente 80% dos casos de SGB)

Características que excluem o diagnóstico

• Diagnóstico de Botulismo, Miastenia, Poliomielite ou Neuropatia Tóxica

• Metabolismo anormal das porfirinas

• História recente de Difteria

• Síndrome puramente sensorial, sem fraqueza muscular

Na grande maioria dos casos de SGB verifica-se, precedendo os sintomas

neurológicos, presença de mal estar, febre, sintomas respiratórios ou

gastrointestinais. Entretanto, presença de vômito, dor abdominal, anemia,

insuficiência renal, febre, perda de peso ou anorexia simultâneos à evolução da

neuropatia, sugerem fortemente um diagnóstico primário de doença sistêmica ou

xiv

intoxicação com concomitante polineuropatia, mas excluem o diagnóstico de

síndrome de Guillain-Barré17.

I.1.5 Patogênese

A SGB apresenta uma natureza auto-imune, com múltiplas evidências tais

como atividade de linfócitos T e B no líquor e elevação dos marcadores de ativação

de macrófagos. Desta maneira pode-se afirmar que a SGB resulta de uma resposta

imune aberrante contra o tecido nervoso, com inúmeros anticorpos dirigidos a uma

grande variedade de gangliosídeos que são glucolipídeos estruturais (GM1,

GM2)2,5,8.

I.1.6 Fatores Desencadeantes

Mais de dois terços dos pacientes com SGB relatam história de infecção

prévia ao surgimento dos sintomas neurológicos, sendo as mais comuns as

infecções do trato respiratório superior ou as gastroenterites1,2,5,7,11,12,15. O intervalo

entre o processo infeccioso e o início dos primeiros sintomas neurológicos varia de

uma a quatro semanas. Múltiplos agentes infecciosos têm sido associados à SGB,

sendo os mais freqüentes o Campylobacter jejuni seguido do Cytomegalovirus

(CMV)1,2,5,7,8,10-12. Há ainda infecções pelo vírus Epstein-Barr, Mycoplasma

pneumoniae, HIV – sobretudo na fase de soro conversão, Helicobacter pylori, vírus

da varicela-zoster, Haemophilos influenzae e citomegalovirus1,2,5,7,12. Outros eventos

precedentes incluem procedimentos cirúrgicos, vacinações, doenças lifomatosas,

doenças auto-imunes, embora muitas ocorrências se refiram a casos específicos e

coincidências não possam ser descartadas5,8.

A infecção pelo Campylobacter jejuni é o fator desencadeante da SGB mais

freqüente no mundo2,8. Apesar disso, apenas um em cada mil casos de

gastroenterite por C. jejuni precedem a SGB8. Esta bactéria como fator

desencadeante da SGB tem a função de induzir uma resposta imune específica

contra nervos motores identificados como antígenos2,8. O gangliosídeo GM1

apresenta-se como o alvo, pois anticorpos anti-GM1 estão fortemente associados à

SGB precedida por infecção pelo Campylobacter jejuni e altas concentrações de

xv

GM1 estão presentes na mielina das fibras motoras em comparação às fibras

sensoriais2,5,8.

O Cytomegalovirus (CMV) é a causa viral mais comum de infecção prévia na

SGB e a presença de anticorpos IgM sugere infecção recente. A alta freqüência de

envolvimento de nervos craniais e sensitivos indica que a infecção por CMV induz

resposta imune específica contra antígenos presentes nestes nervos. Anticorpos

anti-GM2 estão associados à SGB precedida por infecção pelo CMV, mas a

distribuição do GM2 no sistema nervoso periférico é desconhecida2,5,8.

I.1.7 Classificação

A Síndrome de Guillain-Barré compreende quatro subtipos, de acordo com

sua fisiopatologia e seu comportamento eletrofisiológico1,12.

I.1.7.1 Polineuropatia Inflamatória Desmielinizante Aguda (AIDP)

Forma mais comum e mais estudada, correspondendo a 85-90% dos

pacientes com SGB. Por esta razão o termo Síndrome de Guillain-Barré é

utilizado freqüentemente como sinônimo de AIDP1,5. É uma doença autoimune,

mediada por anticorpos, deflagrada por infecção viral ou bacteriana prévia. A

eletroneuromiografia mostra diminuição da velocidade de condução nervosa, padrão

que indica tipicamente uma desmielinização. Provavelmente o alvo imunológico é a

membrana da célula de Schwann ou a própria bainha de mielina. Verifica-se grande

infiltrado linfocitário nos nervos periféricos e invasão de macrófagos na bainha de

mielina e células de Schwann, deixando os axônios desmielinizados. Tardiamente, e

secundariamente à desmielinização, pode ocorrer degeneração axonal. A

localização das lesões explica a distribuição dos déficits neurológicos, que podem

ser predominantemente proximais, distais ou ambos; podem gerar comprometimento

somente sensorial, motor ou sensório-motor; com ou sem comprometimento

autonômico, apesar de ser comum, principalmente com alterações cardíacas e da

pressão arterial que, juntamente com as complicações repiratórias, são as principais

causas de má evolução, podendo levar à morte1,5,7,8,12.

xvi

I.1.7.2 Neuropatia Motora Axonal Aguda (AMAN)

Mais comum em crianças, é uma forma puramente motora com lesão axonal,

sem comprometimento da bainha de mielina. A lesão axonal não é causada

simplesmente por processo degenerativo, mas também por um bloqueio de

condução reversível nos nódulos de Ranvier, o que explica a rápida recuperação

nestes pacientes. A eletroneuromiografia mostra uma diminuição no potencial de

ação muscular, sem diminuição significativa na velocidade de condução nervosa.

Contrariamente à AIDP, alguns pacientes apresentam hiperreflexia durante a

fase de recuperação. O comprometimento autonômico é raro e, quando presente,

é brando. A recuperação de uma lesão axonal é geralmente mais lenta que a lesão

desmielinizante, entretanto o tempo médio de recuperação é o mesmo, o que se

deve aos casos de simples bloqueio de condução nos nódulos de Ranvier1,5,7,12.

I.1.7.3 Neuropatia Sensitivo-Motora Axonal Aguda (AMSAN)

Afetando tipicamente adultos e com baixa incidência, esta forma acomete

raízes e nervos sensitivos e motores com degeneração axonal; verifica-se mínima

inflamação e desmielinização. Apesar da AMSAN diferir da AMAN apenas pelo

envolvimento sensorial, está associada a uma grave enfermidade e a uma lenta

recuperação1,5,7,12.

I.1.7.4 Síndrome de Miller Fisher

Caracterizada pela tríade clínica: oftalmoplegia, ataxia e arreflexia. A síndrome

foi incluída como subtipo da SGB devido à presença de dissociação albumino-

citológica e pela recuperação total e espontânea, apesar da fraqueza muscular não

ser a característica principal; os pacientes apresentam moderada fraqueza de

membros, diminuição da propriocepção, sem perda sensitiva. Há desmielinização e

inflamação do III e VI pares cranianos, gânglios espinhais e nervos periféricos. O

prognóstico é geralmente bom, com total recuperação em até três meses1,5,7,12.

xvii

I.1.7.5 Outros Subtipos

Alguns autores descrevem ainda um quinto subtipo, Síndrome

Sensitiva, de comprometimento exclusivamente sensitivo18. Apesar de a SGB

ser classicamente caracterizada por uma debilidade motora progressiva em

ambos os membros superiores e inferiores, estes autores encontraram

evidência neurofisiológica de desmielinização de fibras sensitivas, dissociação

albumino-citológica, infecção precedente e total recuperação. Defendem

também não se tratar de polirradiculopatia desmielinizante inflamatória crônica

devido à total recuperação dos pacientes envolvidos18.

I.1.8 Comprometimento Autonômico

O comprometimento autonômico, embora usualmente benigno, ocorre em

média em 65% dos pacientes com SGB, que invariavelmente necessitam de

monitoramento e conseqüentemente admissão em unidade de terapia intensiva. Os

acometimentos específicos são a hipertensão paroxística, hipotensão paroxística,

hipotensão postural, hiponatremia, sudorese intensa, obstrução ilíaca, bradicardia,

taquicardia ou arritmias cardíacas, bexiga neurogênica e alterações das glândulas

salivares e lacrimais19. A disautonomia apresenta-se como complicador na

abordagem das vias aéreas, quando a intubação orotraqueal é necessária; arritmias

cardíacas, particularmente bradicardias podem ocorrer durante a manipulação das

vias aéreas; além disso, deve-se sempre considerar a possibilidade de hipercalemia,

evitando o uso de succilcolina (bloqueador neuromuscular) e também a possibilidade

de resposta hipotensiva associada ao uso de algumas drogas como os barbitúricos e

benzodiazepínicos19-21. A maioria das complicações secundárias aos distúrbios

autonômicos ocorre em pacientes com fraqueza muscular generalizada e falência

respiratória19,20.

xviii

I.1.9 Comprometimento Respiratório

Existem evidências que mostram que a falência respiratória (quadro 2) e a

dependência de ventilação mecânica estão intimamente relacionadas a maiores

taxas de morbidade e mortalidade20,22-25. Aproximadamente 30% dos pacientes com

SGB evoluem com falência respiratória e necessitam de intubação orotraqueal e

ventilação mecânica13,20,22-24,26. Além disso, entre os pacientes com SGB

dependentes de ventilação mecânica, a taxa de mortalidade pode chegar a até

30%22.

A falência respiratória causada por doença neuromuscular é particularmente

perigosa uma vez que se instala de forma insidiosa e silenciosa sem os sinais

clínicos mais característicos; a capacidade vital pode cair a um nível muito baixo

antes que a hipoxemia apareça; a hipercapnia é uma característica tardia13,27.

Quadro 2 – Insuficiência Respiratória

A falência ou insuficiência respiratória pode ser definida como a

incapacidade do sistema respiratório de realizar adequada troca gasosa, podendo

ser expressa por uma inadequada oxigenação do sangue arterial, pela retenção de

dióxido de carbono sanguíneo ou pela combinação destes dois processos28. É

convencionalmente definida por uma pressão parcial de oxigênio arterial < 60

mmHg, por uma pressão parcial de dióxido de carbono arterial > 45mmHg, ou

ambos29,30. Entretanto, os significados clínicos destes valores devem levar em

consideração a história pregressa do paciente29.

O sistema respiratório é basicamente formado de duas partes: os

componentes pulmonares (vias aéreas e alvéolos), responsáveis pela troca gasosa e

os componentes que garantem a mecânica ventilatória (centro respiratório no

sistema nervoso central, trato córtico espinhal, corno anterior da medula,

motoneurônios, junção neuromuscular e a caixa torácica e sua musculatura). O

equilíbrio deste sistema depende do funcionamento dos componentes citados28 e o

tipo de insuficiência respiratória é determinado pela parte do sistema afetado. Uma

falência nos componentes pulmonares leva a uma insuficiência tipo I que cursa com

hipoxemia e normo ou hipocapnia, normalmente associadas a uma grande

xix

variedade de doenças pulmonares (pneumonias, atelectasias, enfisemas, doenças

intersticiais). Uma falência nos componentes responsáveis pela mecânica

ventilatória leva a uma insuficiência tipo II que cursa com hipoventilação alveolar e

conseqüente hipercapnia, com ou sem hipoxemia29,30. É importante ressaltar a

possibilidade de coexistirem ambos os tipos I e II no mesmo paciente.

Pelo menos quatro fatores contribuem para a evolução do comprometimento

respiratório: a) perda da proteção das vias aéreas superiores, por fraqueza da

musculatura facial, da orofaringe e laringe interferindo com os mecanismos de

deglutição e limpeza de secreções, aumentando o risco de broncoaspiração e de

obstrução mecânica do fluxo de ar, principalmente na posição supina; b) fraqueza da

musculatura inspiratória (diafragma, intercostais e músculos acessórios) resultando

em uma inadequada expansão pulmonar, com conseqüentes microatelectasias,

principalmente na periferia do parênquima pulmonar e levando a uma desigualdade

na relação ventilação-perfusão com conseqüente hipoxemia; segue-se taquipnéia

compensatória com baixos volumes pulmonares e diminuição progressiva da

complacência pulmonar, levando a um aumento do trabalho respiratório e

possivelmente à fadiga; c) fraqueza da musculatura expiratória com

comprometimento dos mecanismos de higiene brônquica, notadamente da qualidade

e eficácia da tosse, aumentando os riscos de broncoaspiração e conseqüente

pneumonia; d) finalmente, complicações pulmonares secundárias como as próprias

atelectasias, pneumonias, embolismo pulmonar, entre outras13,23,24,26,31,32.

O avanço das terapias de cuidados intensivos e o rápido suporte ventilatório

oferecido a estes pacientes, diminuem as complicações secundárias à falência

respiratória, melhorando seu prognóstico; se a intubação orotraqueal for retardada

por qualquer razão, quadros de atelectasias e broncoaspirações poderão ocorrer,

prolongando ainda mais o tempo de ventilação mecânica13,16 e, conseqüentemente,

os riscos de complicações secundárias a esta, como atelectasias, pneumonias,

empiemas e pneumotórax, entre outras13,26.

Critérios absolutos para intubação imediata incluem diminuição do nível de

consciência, parada cardíaca ou respiratória, choque, arritmias, disfunções bulbares

com comprovada broncoaspiração31. Muitos pacientes entretanto, não preenchem

xx

estes critérios, mas evoluem com fraqueza generalizada. Tais pacientes devem ser

acompanhados cuidadosamente e avaliados regularmente a fim de evitar uma

intubação em situação de emergência, o que muitas vezes ocorre durante a

noite25,31-33. A hipoventilação, que leva à desigualdade na relação ventilação-

perfusão, ocorre inicialmente durante o sono, particularmente no sono REM, como

resultado da diminuição da ação dos músculos intercostais e acessórios, deixando o

suporte ventilatório a cargo apenas de um diafragma enfraquecido32,34.

Avaliações subjetivas através das características clínicas do paciente,

associadas à aplicação de testes de função pulmonar (avaliações objetivas), podem

ajudar a identificar o risco de desenvolvimento da insuficiência respiratória, optando-

se pela intubação orotraqueal eletiva. Muitos são os sinais clínicos que devem

alertar para uma possível falência respiratória: progressão da fraqueza generalizada;

presença de disfagia e disfonia que denotam o envolvimento bulbar; ortopnéia,

dispnéia ao pequeno esforço; incapacidade para adequada higiene brônquica;

taquipnéia; taquicardia; fadiga; sensação de pânico; uso de musculatura acessória

da respiração; respiração paradoxal; tosse após deglutição que é um forte indício de

broncoaspiração; necessidade de pausa ao ler uma frase ou incapacidade de contar

até 15, após uma inspiração máxima, o que pode indicar comprometimento da

capacidade vital21,27,31,32,35.

Distúrbios do sono são um forte indício da hipoventilação e devem ser

considerados. Em muitos pacientes estes distúrbios precedem a dispnéia aos

mínimos esforços ou ao repouso. Com o aumento da fraqueza muscular, além do

sono REM, todas as demais fases do sono são afetadas pela hipoventilação com

repetidos episódios de dessaturação, o que resulta na fragmentação do sono21,32,34.

Além do monitoramento da oximetria noturna, vale observar a presença de

sonolência diurna, diminuição de apetite, dores de cabeça ao despertar e

comprometimento cognitivo e intelectual21,27,34.

Os testes de função pulmonar fornecem valores objetivos do grau de

comprometimento da função respiratória. Muitos testes existem para a avaliação da

função respiratória; entretanto, pela praticidade e facilidade de aplicação são

utilizados testes simples de capacidade vital forçada (CVF), máximas pressões

inspiratórias e expiratórias (PImax e PEmax) e pico de fluxo de tosse (Peak flow)35-

38. Estas avaliações devem ser repetidas a cada 6 a 8 horas13,21,33,35, uma freqüência

xxi

maior podendo aumentar o risco de fadiga muscular35. Também, a fim de detectar

precocemente uma queda na saturação de oxigênio, especialmente durante o sono,

os pacientes devem ser monitorados pela oximetria de pulso13,38.

Vários estudos realizados indicam fatores preditivos não diretamente

relacionados a sinais e sintomas de insuficiência respiratória: a) tempo decorrido

entre o surgimento dos primeiros sintomas e a admissão hospitalar inferior a 7

dias7,23,24,32,33,39; b) presença de anticorpos anti-GQ1b40,41; c) incapacidade para

levantar a cabeça7,23,24,32,39; d) oftalmoplegia41; e) síndrome desmielinizante32,39; f)

escala de Hughes, que avalia graus de incapacidade na admissão26; g) disfunção

autonômica7,24,33; h) aumento de enzimas hepáticas7,23.

Entretanto muitos testes preditivos, apesar de altamente reprodutíveis,

apresentam seu uso limitado pela dificuldade de aplicação (estudos

eletrofisiológicos). Na prática, os mais utilizados são a avaliação clínica, o

movimento da caixa torácica, a capacidade de higiene brônquica e os testes simples,

realizados à beira do leito, principalmente a medida da capacidade vital, que é a

mais estudada e utilizada39.

I.1.9.1 Testes de Função Pulmonar

• I.1.9.1.1 Capacidade Vital

É o teste de função pulmonar mais amplamente utilizado nas doenças

neuromusculares34,38,42; é uma medida , ou ao menos seu componente inspiratório,

da capacidade dos músculos respiratórios de contraírem-se maximamente contra as

forças elásticas do pulmão e da caixa torácica43. Para a análise dos dados são

utilizadas pelo menos três manobras que não difiram entre si mais do que 100ml44.

Entretanto, a precisão desta medida depende do esforço do paciente, da sua

cooperação, bem como da sua capacidade de oclusão labial e nem sempre isso é

possível para os pacientes com envolvimento bulbar34,42,44. A relação pressão-

volume em um pulmão normal é tal que apenas pequenas pressões são necessárias

para insuflar completamente o pulmão; sendo assim, a força muscular deve estar

substancialmente reduzida em qualquer diminuição encontrada nos valores preditos

xxii

da capacidade vital42. Ainda assim é uma medida mais significativa que a avaliação

da retenção de gás carbônico (CO2) como indicativo da hipoventilação – verifica-se

uma diminuição de 30% na capacidade vital (CV) antes que haja um aumento da

pressão parcial de CO2 arterial42. Uma variação que se mostrou muito útil na

avaliação isolada da fraqueza diafragmática é a comparação das medidas realizadas

nas posturas sentada e supina34,38,43,45. A integridade do diafragma é necessária

para expandir o tórax contra a resistência imposta pelo conteúdo abdominal na

postura supina e um decréscimo dessas medidas maior que 20-25% sugere

disfunção diafragmática e a necessidade de novas avaliações34,43,45. Em indivíduos

normais verificamos uma queda máxima de aproximadamente 14% na CV45; em

indivíduos com doença neuromuscular a queda na CV na postura supina pode

chegar até a 55%19; entretanto, uma redução de 25% já indica fraqueza

diafragmática44 e, uma redução superior a 40% mostra fraqueza significativa do

diafragma38. A capacidade vital em indivíduos normais é de 60-70ml/Kg peso31; uma

CV< 30ml/Kg está associada a uma tosse fraca e à presença de atelectasias

pulmonares e uma CV < 15ml/Kg peso é geralmente aceita como critério absoluto

para intubação orotraqueal e dependência de ventilação mecânica1,16,19,31. Outros

autores mostram-se menos tolerantes, indicando ventilação mecânica quando a

capacidade vital cai abaixo de 20ml/Kg7,13,20,21.

• I.1.9.1.2 Pressão Inspiratória Máxima e Pressão Exp iratória Máxima

O procedimento mais comum usado para avaliar a força dos músculos

respiratórios é a medida da pressão inspiratória máxima (PImáx) e da pressão

expiratória máxima (PEmáx); a medida da PImáx é muito importante pois a

musculatura inspiratória é a responsável pelo trabalho respiratório; já, a medida da

PEmáx é fundamental quando objetivamos determinar especificamente a fraqueza

de diafragma (apresentaria apenas alteração da PImax)34,42,43, sendo também um

bom indicador da capacidade de realizar a higiene brônquica27. Novamente, para a

precisão destas medidas, torna-se necessária a colaboração do paciente, uma boa

compreensão dos comandos verbais e a capacidade de oclusão labial. Ambas as

medidas de PImax e PEmax dependem dos volumes pulmonares; esta dependência

está relacionada à capacidade de um músculo gerar força de acordo com o seu

xxiii

comprimento (relação comprimento X tensão) e também às mudanças na

configuração torácica que ocorrem durante a expansão e contração da caixa

torácica43. Desta forma é muito importante que a medida das pressões inspiratória e

expiratória máximas seja realizada a partir de volumes pulmonares preestabelecidos.

Usualmente a medida da PImáx é realizada a partir do volume residual, ou seja,

após uma expiração forçada; a medida da PEmáx é realizada, normalmente, a partir

da capacidade pulmonar total, ou seja, após uma inspiração máxima. As medidas

são realizadas comumente na postura sentada, utilizando um clipe nasal um bucal

com orifício de 2mm a fim de minimizar a força gerada pela acção dos músculos

faciais44. Novamente são realizadas pelo menos três medidas com variação menor

que 20% entre si, sendo utilizado o maior valor44. Os valores de referência para a

PImáx e a PEmáx apresentam uma grande variação mesmo em indivíduos

saudáveis, principalmente entre homens e mulheres, havendo, também, um

importante decréscimo nestes valores com o envelhecimento. Comumente, aceita-se

como normais números negativos com valor absoluto de PImáx superiores a 80

cmH2O e valores de PEmáx superiores a 80 cmH2O34. Como critério para indicação

de intubação orotraqueal utiliza-se valores absolutos de PImáx inferiores a 30cmH2O

e de PEmáx inferiores a 40 cmH2O7,13,20,16,21,31.

• I.1.9.1.3 Pico de Fluxo de Tosse – Peak Flow

A tosse é o mecanismo natural de higiene brônquica, através do qual a

secreção é eliminada e a broncoaspiração evitada36,38,39; a tosse efetiva é um

processo complexo que requer uma inspiração máxima, o fechamento da glote, a

manutenção deste fechamento contra uma pressão expiratória crescente que se

torna máxima, seguida de uma súbita abertura da glote em sincronia com uma

vigorosa e coordenada exalação do ar27,36. A avaliação da tosse é realizada pela

medida objetiva do pico de fluxo de tosse, ou peak flow, cujo valor normal é superior

a 300l/min36. Quando o peak flow cai abaixo de 160l/min, a tosse não é

suficientemente efetiva para a adequada higiene brônquica; quando está entre 160-

270l/min, é passível de cair abaixo de 160l/min se uma infecção pulmonar

ocorrer34,36,37,38, o risco de pneumonia e insuficiência respiratória aumentando

grandemente37.

xxiv

I.1.10 Tratamento

O tratamento para a síndrome de Guillain-Barré tem dois componentes:

tratamento de suporte e o específico7. O tratamento de suporte é o ponto-chave da

terapia pois, os pacientes que conseguem superar a fase aguda da doença

apresentam melhor potencial de recuperação7.

I.1.10.1 Suporte

Envolve o acompanhamento rigoroso do paciente a fim de predizer a má

evolução respiratória, prevenir complicações secundárias à falência respiratória,

complicações decorrentes de uma longa permanência no leito como as tromboses

venosas, monitorar alterações provenientes da disautonomia e minimizar ocorrência

de dor7,12,19,46. Somam-se ainda o acompanhamento fisioterapêutico1,7,12,19,20,35,

terapêutico ocupacional, nutricional e psicológico1,7,19,20,35 .

I.1.10.2 Imunoterapia

Plasmaferese tem sido aceito como o tratamento de escolha para a SGB há

pelo menos 20 anos46. Apresenta benefício comprovado durante as primeiras quatro

semanas sendo que é maior o benefício, quanto antes for oferecido o tratamento46.

Entretanto, nos últimos dez anos, estudos realizados mostraram que o tratamento

com imunoglobulina intravenosa é equivalente a plasmaferese na redução dos

sintomas após 4 semanas de tratamento47, assim como na redução do tempo de

ventilação mecânica, da mortalidade e das incapacidades residuais46. Desde então

há uma tendência em eleger a imunoglobulina intravenosa como tratamento

preferencial, uma vez que é um tratamento muito mais simples, mais confortável

para o paciente, de menor custo46,47 e com menores riscos de complicações

iatrogênicas (a plasmaferese depende da passagem de um cateter central, havendo

o risco de pneumotórax)19.

xxv

II - OBJETIVO

Identificar através de uma revisão bibliográfica da literatura os fatores

capazes de predizer a falência respiratória na Síndrome de Guillain-Barré.

xxvi

III - MÉTODO

III.1 Desenho do Estudo

Revisão da literatura.

III.2 Estratégias de Busca

Para a caracterização dos fatores preditivos para a má evolução respiratória

na Síndrome de Guillain-Barré, foram realizadas buscas eletrônicas nas bases de

dados MEDLINE (Medlars Online), LILACS (Literatura Latino-Americana e do Caribe

em Ciências da Saúde), e SCIELO (The Scientific Electronic Library Online), além do

site PUBMED, através do acesso a base bibliográfica MedLine, desenvolvida pela

NLM (National Library of Medicine), a fim de identificar os artigos científicos

indexados e publicados de 1997 a 2007.

A primeira estratégia de busca utilizada nas bases de dados MEDLINE,

LILACS e SCIELO foi: descritor de assunto= “Guillain-Barré syndrome” AND

“respiratory failure”. Na PUBMED foi: descritor de assunto= “Guillain-Barré

syndrome” AND “respiratory failure” AND limits= adult humans.

A segunda estratégia de busca utilizada nas: MEDLINE, LILACS e SCIELO

foi: descritor de assunto= “Guillain-Barré syndrome” AND “respiratory insufficiency”.

Na PUBMED foi: descritor de assunto= “Guillain-Barré syndrome” AND “respiratory

insufficiency ” AND limits= adult humans.

III.3 Critérios de Inclusão e Exclusão

Inclusão: foram selecionados para esse estudo ensaios clínicos, estudos

prospectivos e retrospectivos, que avaliaram os fatores preditivos para a má

evolução respiratória na SGB, e que foram realizados com humanos adultos com

diagnóstico de SGB segundo o critério padrão.

Exclusão: estudos de caso, revisões, consensos, opiniões de especialistas;

estudos que envolvam outras doenças além da síndrome de Guillain-Barré.

xxvii

IV - RESULTADOS

A pesquisa eletrônica inicial utilizando os unitermos Guillain Barré Syndrome

and respiratory failure, identificou:

• Base de dados Medline: 90 títulos com os respectivos resumos; foram

identificados e descartados estudos de revisão narrativa e estudos de caso (n=56),

estudos realizados com crianças (n=3), estudos relacionados a outras doenças (n=8)

e estudos relacionados a assuntos irrelevantes (n=17). Apenas 6 estudos se

enquadravam nos critérios de inclusão. Artigos completos analisados (n= 42).

• Site PubMed: 70 titulos com os respectivos resumos; foram identificados e

descartados estudos duplicados, já indexados na base de dados Medline (n=54),

estudos de revisão narrativa e estudos de caso (n=7), estudos relacionados a outras

doenças (n=2) e estudos relacionados a assuntos irrelevantes (n=7).

• Base de dados Lilacs: 3 títulos com os respectivos resumos; foram

identificados e descartados estudos duplicados já indexados na base da dados

Medline (n=1) e estudos de revisão narrativa e estudos de caso (n=2).

• Base de dados Scielo: nenhum título.

Fluxograma 1. Representação dos resultados das busc as utilizando os

unitermos Guillain Barré Syndrome and respiratory f ailure.

Resultados das Buscas

Títulos com resumos identificados: 163 - PubMed (n=70) - Medline (n=90) - Lilacs (n=03) - Scielo (n=00)

Artigos completos: 42

Estudos Excluídos: - PubMed (n=70) - Medline (n=84) - Lilacs (n=03)

Estudos Inclusos para a revisão (n=6)

xxviii

A pesquisa eletrônica inicial utilizando os unitermos Guillain Barré

Syndrome and respiratory insuficiency, identificou:

• Base de dados Medline: 12 títulos com os respectivos resumos; foram

identificados e descartados estudos duplicados (n=4), estudos de revisão narrativa e

estudos de caso (n=6) e estudos realizados com crianças (n=2).

• Site PubMed: 41 títulos com os respectivos resumos; foram identificados e

descartados estudos duplicados (n=40) e estudos relacionados a assuntos

irrelevantes (n=1).

• Base de dados Lilacs: 3 títulos com os respectivos resumos; foram

identificados e descartados todos pois eram duplicados.

• Base de dados Scielo: 1 título com o respectivo resumo que foi identificado e

descartado por ser duplicado.

Fluxograma 2. Representação dos resultados das busc as utilizando os

unitermos Guillain Barré Syndrome and respiratory i nsuficiency.

Resultados das Buscas

Títulos com resumos identificados: 57 - PubMed (n=41) - Medline (n=12) - Lilacs (n=03) - Scielo (n=01)

Estudos Excluídos:

- PubMed (n=41) - Medline (n=12) - Lilacs (n=03) - Scielo (n=01)

Estudos Inclusos para a revisão (n=0)

xxix

IV.1 Descrição dos Estudos

Os estudos foram realizados na América do Norte (1)33, América do Sul

(1)48, Europa (2)23,40 e Ásia (2)24,26. Foram publicados em seis diferentes jornais entre

os anos de 1999 e 2006. O número total de participantes estudados foi de 1486

indivíduos, do sexo feminino ou masculino, divididos em dois grupos: 535 que

receberam ventilação mecânica e 951 que não receberam.

Quadro 3 – Caracterização dos Estudos selecionados Autores

Ano n° de

participantes Desenho do

Estudo Método de

mensurações Ventilados Não

ventilados

Durand et al, 200640

154 Estudo Prospectivo

• Exames laboratoriais

• Exames clínicos • Testes

eletrofisiológicos

34 120

Sundar et al, 200524

46

2 anos retrospectivos

4 anos prospectivos

• Comparação de variáveis clínicas e demográficas.

• Eletrodiagnóstico.

28 18

Cheng et al, 200426

77 Estudo retrospectivo

• Eletrodiagnóstico, estudo de condução

nervosa, EMG • Classificação de

Hughes • PImáx, PEmáx,

Vmin • Exames clínicos e dados demográficos

25 52

Sharshar et al, 200323

791, dos quais 69

foram excluídos por necessitarem

de suporte ventilatório

logo na admissão

Estudo clinico

randomizado

• Classificação de Hughes

• Exames laboratoriais

• Escala funcional de MMSS e MMII • Envolvimento

de nervos cranianos e disfunção

autonômica • Mensuração da

CV

313 409

xxx

Lawn et al, 200133

114 Estudo Retrospectivo

• Classificação de Hughes

• Exames laboratoriais

• Exames clínicos: fraqueza facial, paralisia de MMSS, disfunção

autonômica, fraqueza bulbar

• CV, PImáx, PEmáx

60 54

Schottlender et al, 199948

44 Estudo Retrospectivo

• Exames laboratoriais

• Comparações de variáveis

demográficas e epidemiológicas • EMG, função respiratória CV

31 13

Durand et al.40 estudaram todos os pacientes adultos com o diagnóstico de

SGB admitidos em uma unidade de tratamento intensivo na França entre setembro

de 1998 e janeiro de 2006. Foram incluídos no estudo 154 pacientes, que

realizaram os testes eletrofisiológicos completos pelo mesmo neurofisiologista e que

não necessitaram de ventilação mecânica antes ou durante as 24 horas em que o

teste foi realizado. Anormalidades eletromiográficas foram observadas em todos os

pacientes e anormalidades da condução nervosa sensitiva, em 71% dos pacientes.

O teste eletrofisiológico evidenciou desmielinização em 58% dos pacientes. Em

média, 34 pacientes necessitaram de ventilação mecânica após 4 dias de inclusão.

Estes pacientes, no momento da admissão apresentavam maior fraqueza de

membros, dos músculos respiratórios (mensurada pela medida da capacidade vital),

e maior freqüência de envolvimento bulbar e alterações das enzimas hepáticas, bem

como padrão eletrofisiológico desmielinizante. Os autores sugerem que a

desmielinização na SGB agrava o risco da necessidade de ventilação mecânica, e

relatam que o teste eletrofisiológico deve ser utilizado tanto para diagnóstico como

para prognóstico, especialmente se somado à mensuração da capacidade vital,

ambos como preditivos para a má evolução respiratória. No entanto, ressaltam a

xxxi

dificuldade de realização do teste eletrofisiológico padrão na prática diária. Embora

os dados sejam controversos, em 70 dos 154 pacientes, o estudo eletrofisiológico do

nervo frênico não pode ajudar na antecipação da ventilação mecânica. A hipótese de

que a desmielinização dos nervos periféricos causada pela SGB induz a um

bloqueio da condução do nervo frênico, levando assim à falência respiratória não

pode ser determinada, pois o estudo não demonstrou diferença significativa entre o

grupo de pacientes ventilados e não ventilados. Acrescentam os autores que, na

prática diária, o monitoramento dos pacientes com SGB é baseado nos exames

clínicos, em particular no movimento da caixa torácica e na capacidade de eliminar a

secreção, e também nas mensurações da capacidade vital, principalmente se estas

forem seqüenciais.

Sundar et al.24 estudaram, em um período de seis anos, sendo dois

retrospectivamente e quatro prospectivamente, 82 pacientes admitidos em um

hospital na Índia com diagnóstico de paralisia flácida; destes, 46 pacientes

satisfizeram os critérios para o diagnóstico de SGB. Dados clínicos e demográficos

foram comparados entre o grupo dos que evoluíram com dependência de ventilação

mecânica (n=28) e o grupo dos que não necessitaram dela (n=18). Os resultados

mostram que idade, sexo, infecções prévias, fraqueza facial bilateral, fraqueza

cervical e paralisia precoce de membros superiores, não predizem a necessidade de

ventilação mecânica. A presença de paralisia bulbar (64% no grupo ventilado e 11%

no não ventilado) e disfunção autonômica (50% no grupo ventilado e 5,5% no não

ventilado) foram significativamente mais comuns no grupo ventilado. Da mesma

forma, o tempo de evolução da doença foi menor neste mesmo grupo. Estudos

eletrofisiológicos foram realizados nos dois grupos antes do pico de evolução da

doença e o achado comum aos dois grupos foi uma radiculopatia motora; a

diminuição na velocidade de condução foi encontrada preferencialmente no grupo

ventilado, representando neste grupo grave desmielinização distal ou perda axonal.

Embora 36 dos 46 pacientes tenham recebido tratamento com plasmaferese ou

imunoglobulina intravenosa, o efeito da terapia relacionado à necessidade de

intubação não pôde ser avaliado, pois um significativo número de pacientes

iniciaram a terapia depois do pico da evolução da doença ter sido atingido.

Cheng et al.26 avaliaram retrospectivamente estudos eletrodiagnósticos e

registros médicos de 77 pacientes com SGB admitidos em um hospital na China

xxxii

entre janeiro de 1987 e dezembro de 2001. Dos 77 pacientes, 32% evoluíram para

falência respiratória e necessidade de suporte ventilatório; estes pacientes

apresentaram, na admissão, classificação < 3 na escala de Hughes. O tempo

decorrido entre o aparecimento dos sintomas e a intubação foi, em média, de 11

dias. No momento da intubação foi realizada a mensuração da PImáx e PEmáx. Os

pacientes que apresentaram baixos valores de PImáx e PEmáx no momento da

intubação, apresentaram complicações após o início da ventilação além de uma pior

evolução; 72% tiveram complicações após a ventilação mecânica, sendo que 64%

desenvolveram pneumonia com ou sem septicemia, 4% desenvolveram pneumonia

com empiema e 4% pneumonia com pneumotórax.

Sharshar et al.23 realizaram em uma unidade neurológica e de tratamento

intensivo na França, um estudo no qual incluíram 791 pacientes em duas triagens

clinicas randomizadas com o tratamento de plasmaferese, a primeira triagem

realizada entre 1981 e 1985 (n=220), a segunda triagem realizada entre 1986 e 1993

(n=571); sessenta e nove pacientes foram excluídos por necessitarem de ventilação

mecânica no momento da admissão. Os pacientes que evoluíram para dependência

de ventilação mecânica apresentavam, no momento da admissão, um quadro clínico

mais severo com déficit motor e sensorial difusos, arreflexia generalizada, disfunção

bulbar, paralisia facial bilateral e disfunção cardiovascular autonômica. De acordo

com os resultados obtidos, no momento da admissão hospitalar, seis variáveis foram

associadas à má evolução respiratória e conseqüente dependência de ventilação

mecânica: a) tempo decorrido entre o surgimento dos primeiros sintomas e a

admissão hospitalar inferior a 7 dias; b) incapacidade de elevar os cotovelos da

cama; c) incapacidade de levantar-se; d) incapacidade de levantar a cabeça; e)

tosse ineficaz; f) aumento das enzimas hepáticas. A probabilidade de má evolução

respiratória aumenta de 8 a 100% conforme o paciente apresente, na admissão,

nenhuma (8%) até 6 das variáveis citadas (100%). O trabalho também mostrou que

a plasmaferese pode afetar o curso da SGB e conseqüentemente a evolução para

falência respiratória. Por fim, o valor médio obtido no momento da admissão, de CV

foi significativamente mais baixo nos pacientes que necessitaram de ventilação

mecânica em comparação aos que não necessitaram; valores de CV menores que

60% do predito no momento da admissão estão significativamente associados à

evolução para ventilação mecânica.

xxxiii

Lawn et al.33 analisaram, através de registros médicos, 114 pacientes

admitidos em uma unidade de tratamento intensivo norte-americana, entre janeiro de

1976 e dezembro de 1996. De acordo com os resultados do estudo, os pacientes

que necessitaram de ventilação mecânica tiveram uma evolução mais severa da

SGB evidenciada pela presença da disfunção bulbar, disfunção autonômica e

paralisia facial bilateral. A necessidade de ventilação mecânica foi associada a um

menor tempo decorrido entre o surgimento dos sintomas neurológicos e o pico de

evolução da doença. Não houve diferenças significativas entre aqueles que

evoluíram para ventilação mecânica e os outros quanto a variáveis como sexo,

idade, presença de distúrbio gastrointestinal precedente, paralisia de membros

superiores ou doenças pulmonares. Resultados da análise do líquor foram similares

nos dois grupos. Nesse estudo, a ausência de tratamento com imunoglobulina

intravenosa e plasmaferese não foi associada à necessidade de intubação e

ventilação mecânica. Os pacientes que necessitaram de ventilação mecânica

apresentaram, no momento da admissão hospitalar, menores valores nas

mensurações da CV, PImáx e PaO2, comparados aos que não necessitaram. Os

pacientes que necessitaram de ventilação mecânica evoluíram com um decréscimo

da CV abaixo de 20 ml/Kg após a admissão, ou uma redução de pelo menos

30ml/Kg do valor predito, além de uma diminuição de 30% nos valores de PEmáx e

da PImáx. Finalmente, o estudo demonstra que valores de PImáx menores que

30cmH2O e de PEmáx menores que 40cmH2O estão fortemente associados à

dependência de ventilação mecânica. Anormalidade radiográficas como infiltrados

pulmonares e atelectasias, foram mais comumente encontradas nos pacientes que

necessitaram de ventilação mecânica.

Schottlender et al.48 analisaram as histórias clínicas de todos os pacientes

que apresentaram diagnóstico de SGB entre os anos de 1987 e 1996, admitidos em

um hospital na Argentina. Durante esse período, 44 pacientes com SGB ingressaram

no serviço com comprometimento respiratório, sendo que 70.5% evoluíram para

falência respiratória necessitando de ventilação mecânica. Em 64% dos casos

houve um evento precedente relacionado com a SGB, 86% deles com história de

processo inflamatório nos 30 dias anteriores ao surgimento dos sintomas e 14% com

história de traumatismo. Em 39 pacientes foi realizado EMG e em 20.5% deles

houve comprometimento axonal o que, segundo os autores, está relacionado a uma

xxxiv

maior severidade da doença. Foi realizado o tratamento com plasmaferese em 14

participantes e com imunoglobulina intravenosa em 3, e no grupo tratado houve uma

tendência a menor mortalidade. Os pacientes que em menos de 48 horas evoluíram

para a ventilação mecânica tiveram um período mais prolongado de suporte

mecânico: os autores sugerem que o início brusco dos sintomas com

comprometimento severo é sinal de mau prognóstico. As disfunções autonômicas

ficaram evidenciadas em 43% dos pacientes, dos quais 2 foram a óbito por

disfunção autonômica severa; para minimizar o risco dessas complicações, os

autores sugerem que é imprescindível o monitoramento cardíaco e dos sinais de

disautonomia. Entre o grupo de pacientes ventilados, 26% foram a óbito, o que foi

relacionado com a maior idade, sepsis, barotrauma e disautonomia severa.

xxxv

V - DISCUSSÃO

Devido aos avanços tecnológicos em suportes de cuidados intensivos, o

prognóstico na SGB pode ser favorável, a taxa de mortalidade, relativamente baixa e

a morbidade residual, mínima. Essa porém, é a mais comum das morbidades

neuromusculares, sua progressão é bastante rápida e está associada à falência

respiratória. Faz-se assim necessário que a equipe esteja atenta a fatores que

podem predizer essa falência respiratória para que se intervenha e se tomem

medidas eficazes em momento oportuno, garantindo assim um prognóstico

favorável.

De acordo com a análise dos estudos, variáveis demográficas como sexo e

idade, não estão associadas à má evolução respiratória, não podendo ser utilizadas

como fatores preditivos23,24,26,33,40; idade porém, pode estar associada a maior

morbidade22,26. Outras variáveis que não estão relacionadas à má evolução

respiratória, segundo resultado de três estudos, são: infecções gastrointestinais

precedentes23,24,33, fraqueza facial bilateral23,24, paralisia precoce de membros

superiores23,24,33, doenças pulmonares (DPOC, asma, fibrose pulmonar) 33 e

ausência de reflexos isolados23, embora alguns desses acometimentos estejam

relacionados à história da doença e sejam comumente encontrados em pacientes

com SGB, ventilados ou não.

Os fatores encontrados, nas populações estudadas, capazes de predizer a

má evolução respiratória foram a rápida evolução dos sintomas23,24,26,33,40, baixo

score na escala de Hughes (quanto maior o comprometimento inicial maior foi a

evolução para ventilação mecânica)23,26,33, disfunção autonômica23,24,33, disfunção

bulbar22,24,33,40 , arreflexia generalizada23,26 , fraqueza facial bilateral33. Apesar de a

capacidade de elevar a cabeça do leito ser tida como preditivo, os estudos23,24

avaliados concluíram que isoladamente a fraqueza da musculatura cervical não

prediz a má evolução respiratória.

Nos estudos avaliados, a capacidade vital foi apresentada como um teste

importante na determinação da má evolução respiratória e evolução para ventilação

mecânica23,26,33,40,48. Vários fatores podem explicar a ampla utilização deste

xxxvi

parâmetro: a) a existência de vários estudos precedentes apontando valores-limite

similares; b) teste de fácil aplicação e baixo custo; c) teste facilmente reprodutível.

Nenhum dos estudos revisados entretanto, descreveu se a aplicação do teste foi

realizada em diferentes posturas e nem ressaltou a importância da realização deste

na posição supina, pois uma variação de 20-25% nos valores medidos nas

diferentes posturas (sentada e supina) sugere disfunção diafragmática e a

necessidade de novas avaliações34,43,45 e uma redução de 40% ou mais mostra

fraqueza significativa de diafragma38.

Dos estudos revisados, dois26,33 utilizaram as mensurações da PImáx e

PEmáx como preditivos para a má evolução respiratória e, apenas um estudo26

ressalta que, pelo fato da capacidade vital só apresentar alteração quando há

acentuada fraqueza muscular42 e a PImáx refletir diretamente a força da musculatura

inspiratória, especialmente de diafragma, esta variável reflete melhor o

acometimento primário da insuficiência respiratória na SGB. Cheng et al.26 também

ressaltam a importância da mensuração da PEmáx como preditor, uma vez que a

fraqueza da musculatura expiratória está diretamente relacionada a uma tosse

ineficaz e, conseqüentemente ao comprometimento respiratório. Apesar de muitos

estudos indicarem a tosse ineficaz como um importante preditivo para a má evolução

respiratória, nenhum dos estudos revisados utiliza o pico de fluxo de tosse, peak

flow, como método de quantificação da efetividade da tosse, embora este método

seja de simples aplicação, baixo custo e alta reprodutibilidade.

Embora os testes eletrofisiológicos sejam importantes preditores, a sua

aplicabilidade na prática clínica diária é difícil, pois proporcionam desconforto ao

paciente26, necessitam de um equipamento de alto custo, da disponibilidade de um

profissional capacitado e, principalmente, porque a aplicação deles demanda tempo,

o que limita seu uso como preditor em uma doença de rápida evolução como a SGB.

xxxvii

VI - CONSIDERAÇÕES FINAIS

A má evolução respiratória nos pacientes com síndrome de Guillain-Barré

pode ser precocemente predita utilizando-se as avaliações clínicas e simples testes

de função pulmonar. As avaliações clínicas mostram-se preditores importantes

especialmente se presentes em associação. Assim, de acordo com a revisão, os

preditores mais utilizados são: a) o grau de incapacidade no momento da admissão;

b) a presença de disfunção autonômica; c) o comprometimento bulbar; d) a arreflexia

generalizada; e) a rápida evolução dos acometimentos. Os testes de função

pulmonar, CVF, PImáx e PEmáx são capazes de, isoladamente, predizerem a

possibilidade de falência respiratória. Devido à baixa sensibilidade do teste de CVF,

é recomendável, na avaliação da fraqueza diafragmática, a comparação das

medidas realizadas nas posturas sentada e supina. Apesar da capacidade vital ser o

teste de função pulmonar mais utilizado para predizer a má evolução respiratória na

SGB, a diminuição da força muscular é o acometimento primário nas doenças

neuromusculares, precedendo a diminuição dos volumes pulmonares e, por esta

razão, a PImáx é um teste mais sensível que a capacidade vital. Por fim, a

mensuração do peak flow deve ser incorporada na prática clínica a fim de quantificar

a efetividade da tosse, podendo assim tornar-se também um fator preditivo para a

falência respiratória.

As avaliações clínicas e testes simples de função pulmonar que podem ser

realizados à beira do leito, são capazes de predizer o curso da SGB e por isso, se

faz necessário que essa seja uma prática comum nos serviços de saúde, a fim de

minimizar as comorbidades decorrentes da doença.

xxxviii

VIII – ANEXOS

VIII.1 Escala de Hughes

0 Normal

1 Mínimos sinais e sintomas / capaz de correr

2 Capaz de andar 5 metros sem auxílio mas incapaz d e correr

3 Capaz de andar 5 metros com auxílio

4 Incapaz de andar – acamado ou em cadeira de rodas

5 Necessita de ventilação mecânica em pelo menos pa rte do dia

6 Morto

xxxix

VIII.2 Escala de Funcionalidade proposta por Sharshar et al. 23

Classificação funcional dos membros superiores (cad a item pontuado de 0 a 2)

1 Mover os dedos

2 Segurar uma caneta entre o polegar e o indicador

3 Realizar a flexão de cotovelo com antebraço prona do

4 Realizar a flexão de cotovelo com o antebraço sup inado

5 Em supino, erguer os cotovelos

6 Manter os membros superiores extendidos

Classificação funcional dos membros inferiores (ite ns 1-6 pontuados de 0 a 2; itens 7-10 pontuados de 0 a 1)

1 Mover os dedos

2 Realizar a dorsiflexão do tornozelo

3 Realizar a flexão plantar do tornozelo

4 Em supino, fletir os joelhos

5 Em supino, elevar o membro inferior

6 Em supino, manter o membro inferior elevado

7 Ficar em pé

8 Deambular por 5 metros com auxílio

9 Deambular por 5 metros sem auxílio

10 Levantar a partir da postura agachada

xl

VII - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1.Kuwabara S. Guillain-Barré syndrome: epidemiology, pathophysiology and management. Drugs 2004; 64(6): 597-610.

2.Jacobs BC, Rothbarth PH, van der Meché FGA, Herbrink P, Schmitz PIM, de Klerk MA, van Doorn PA. The spectrum of antecedent infections in Guillain-Barré syndrome. Neurology 1998;51:1110-1115.

3.Cecatto SB, Garcia RID, Costa KS, Novais RAB, Yoshimura R, Rapoport PB. Síndrome de Guillain-Barré como complicação de amigdalite aguda. Rev Bras Otorrinolaringol. 2003; 69(4):566-569.

4.Dourado ME, Freitas ML, Santos FM. Síndrome de Guillain-Barré com flutuações relacionadas ao tratamento com imunoglobulina humana endovenosa. Arq Neuropsiquiatr 1998; 56(3-A)476-479.

5.Ávila-Funes JA, Mariona-Montero VA, Melano-Carranza E. Síndrome de Guillain-Barré: etiología y patogénesis . Rev Invest Clin 2002; 54(4): 357-363.

6.Fernández-Ortega JF, Rojas-Román JP, Núñez-Castain MJ, Miralles-Martín E, Bravo-Utrera M. Síndrome de Guillain-Barré en Unidad de cuidados intensivos. Rev Neurol 2001; 33(4): 318-324.

7.Newswanger DL, Warren CR. Guillain-Barré syndrome. Am Fam Physician 2004; 69:2405-10.

8.Hughes RAC, Hadden RDM, Gregson NA, Smith KJ. Pathogenesis of Guillain-Barré syndrome. Journal of Neuroimmunology 1999; 100:74-97.

9.Dias-Tosta E, Kückelhaus CS. Guillain-Barré syndrome in a population less than 15 years old in Brazil. Arq Neuropsiquiatr 2002; 60(2-B):367-373.

10.Téllez-Zenteno JF, Jacinto-Tinajero JCJ, Ávila-Funes A, García-Ramos G, Negrete-Pulido O, Sentíes-Madrid H. Síndrome de Guillain-Barré. Experiencia en un hospital de tercer nivel. Rev Invest Clin 2001; 53(4): 311-314.

11.Santos NQ, Azoubel ACB, Lopes AA, Costa G, Bacellar A. Guillain Barre syndrome in the course of Dengue. Arq Neuropsiquiatr 2004; 62(1): 144-146.

12.Winer JB. Guillain Barré syndrome. J Clin Pathol: Mol Pathol 2001; 54:381-385.

13.Hahn AF. The challenge of respiratory dysfunction in Guillain-Barré syndrome. Arch Neurol 2001; 58: 871-872.

xli

14.Rees JH, Thompson RD, Smeeton NC, Hughes RAC. Epidemiological study of Guillain-Barré syndrome in south east England. J Neurol Neurosurg Psychiatry 1998;64:74-77.

15.Rocha MSG, Brucki SMD, Carvalho AAS, Lima UWP. Epidemiologic features of Guillain-Barré syndrome in São Paulo, Brazil. Arq neuropsiquiatr 2004; 62(1): 33-37.

16.Ali MI, Fernández-Péres ER, Pendem S, Brown DR, Wijdicks EFM, Gajic O. Mechanical ventilation in patients with Guillain-Barré syndrome. Respir Care 2006; 51(12):1403-1407.

17.Asbury AK, Cornblath DR. Assessment of current diagnostic criteria for Guillain-Barré syndrome. Ann Neurol 1990;27(suppl):S21-S24.

18.Oh SJ, LaGanke C, Claussen GC. Sensory Guillain-Barré syndrome. Neurology 2001;56:82-86.

19.Cálela JA. Pearls and pitfalls in the intensive care management of Guillain-Barré syndrome. Seminars in Neurology 2001; 21(4):399-405.

20.Hughes RAC, Wijdicks EFM, Benson E, Cornblath DR, Hahn AF, Meythaler JM, Sladky JT, Barohn RJ, Stevens JC. Supportive care for patients with Guillain-Barré syndrome. Arch Neurol. 2005; 62:1194-1198.

21.Rabinstein AA, Wijdicks EFM. Warning Signs of imminent respiratory failure in neurological patients. Seminars in Neurology 2003; 23(1):97-104.

22.Fletcher DD, Lawn ND, Henderson RD, Wolter TD, Wijdicks EFM. Long-term outcome in patients with Guillain-Barré syndrome requiring mechanical ventilation. Neurology 2000; 54: 2311-2315.

23.Sharshar T, Chevret S, Bourdain F, Raphaël JC. Early predictors of mechanical ventilation in Guillain-Barré syndrome. Crit Care Med 2003; 31(1): 278-283.

24.Sundar U, Abraham E, Gharat A, Yeolekar ME, Trivedi T, Dwivedi N. Neuromuscular respiratory failure in Guillain-Barre syndrome: evaluation of clinical and eletrodiagnostic predictors. Japi 2005; 53:764-768.

25.Wijdicks EFM, Henderson RD, McClelland RL. Emergency intubation for respiratory failure in Guillain-Barré syndrome. Arch Neurol. 2003; 60:947-948.

26.Cheng BC, Chang WN, Chang CS, Tsai NW, Chang CJ, Hung PL, Wang H, Lu CH. Predictive factors and long-term outcome of respiratory failure after Guillain-Barré syndrome. Am j Med Sci 2004; 327(6): 336-340.

27.Gelinas DF. Pulmonary function screening. Seminars in Neurology 2003; 23(1):89-96.

28.Isakow W, Kollef M. XI Respiratory failure. Respiratory Medicine 2007;1-18.

xlii

29.Roussos C, Koutsoukou A. Respiratory failure. Eur Respir J 2003; 22:Suppl.47, 3s-14s.

30.Hari MS, Mackenzie, IMJ. Respiratory failure. Surgery 2007; 25(9):380-387.

31.Mehta S. Neuromuscular disease causing acute respiratory failure. Respir Care 2006; 51(9):1016-1021.

32.Van Doorn PA, Jacobs BC. Predicting the course of Guillain-Barré syndrome. Lancet Neurol 2006; 5: 991-993.

33.Lawn ND, Fletcher DD, Henderson RD, Wolter TD, Wijdicks EFM. Anticipating mechanical ventilation in Guillain-Barré syndrome. Arch Neurol 2001; 58: 893-898.

34.Mustfa N, Moxham J. Respiratory muscle assessment in motor neurone disease. Q J Med 2001; 94:497-502.

35.Aboussouan LS. Respiratory disorders in neurologic diseases. Cleveland Clinic Journal of Medicine 2005; 72(6):511-520.

36.Gauld LM, Boynton A. Relationship between peak cough flow and spirometry in Duchenne Muscular dystrophy. Pediatr Pulmonol 2005;1-4.

37.Tzeng AC, Bach JR. Prevention of pulmonary morbidity for patients with neuromuscular disease. Chest 2000; 118:1390-1396.

38.Paschoal IA, Villalba WO, Pereira MC. Chronic respiratory failure in patients with neuromuscular disease: diagnosis and treatment. J Bras Pneumol 2007;33(1):81-92.

39.Hadjikoutis S, Wiles CM, Eccles R. Cough in motor neuron disease: a review of mechanisms. Q J Med 1999; 92:487-494.

40.Durand MC, Porcher R, Orlikowski D, Aboad J, Devaux C, Clair B, AnnaneD, Gaillard JL, Lofaso F, Raphael JC, Sharshar T. Clinical and eletrophysiological predictors of respiratory failure in Guillain-Barré syndrome: a prospective study. Lancet Neurol 2006;5:1021-28.

41.Kaida K, Kusunoki S, Kanzaki M, Kamakura K, Motoyoshi K, Kanazawa I. Anti-GQ1b antibody as a factor predictive of mechanical ventilation in Guillain-Barré syndrome.

42.Moxham J, Goldstone J. Assessment of respiratory muscle strength in the intensive care unit. Eur Respir J 1994; 7:2057-2061.

43.Clanton TL, Diaz PT. Clinical assessment of the respiratory muscles. Physical Therapy 1995; 75(11):983-995.

44.Maria NNS, Zanelli EM, Silva MB, Asa SKP, Fávero FM, Fukujima MM, Oliveira ASB, Fontes SB. Testes utilizados para avaliação respiratória nas doenças neuromusculares. Rev Neurocienc 2007; 15(1):60-69.

xliii

45.Lechtzin N, Wiener CM, Shade DM, Clawson L, Diette GB. Spirometry in the supine position improves the detection of diaphragmatic weakness in patients with Amyotrophic Lateral Sclerosis. Chest 2002; 121:436-442.

46.Hughes RAC, Cornblath DR. Guillain-Barré syndrome. Lancet 2005; 366:1653-66.

47.Plasma exchange/sandoglobulin Guillain-Barré syndrome group. Randomised trial of plasma exchange, intravenous immunoglobulin, and combined treatments in Guillain-Barré syndrome.

48.Schottlender JG, Lombardi D, Toledo A, Otero C, Mazia C, Menga G. Compromisso respiratorio em el sindrome de Guillain Barre. Medicina (Buenos Aires) 1999; 59:705-7C.