universidade do estado do rio grande do norte … · aos irmãos em cristo e amigos em todas as...
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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE UERN
FACULDADE DE FILOSOFIA E CINCIAS SOCIAIS FAFIC
DEPARTAMENTO DE COMUNICAO SOCIAL DECOM
O C DA QUESTO: PERFIL DE UM GRUPO DE ESTUDANTES NA CIDADE DE
MOSSOR-RN
BRBARA MARINA ALMEIDA DOS SANTOS
Mossor- RN
2013
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BRBARA MARINA ALMEIDA DOS SANTOS
O C DA QUESTO: PERFIL DE UM GRUPO DE ESTUDANTES NA CIDADE DE
MOSSOR-RN
Monografia apresentada ao Departamento de
Comunicao Social da Universidade do
Estado do Rio Grande do Norte como requisito
obrigatrio para a concluso e obteno do
ttulo de Bacharel em Comunicao Social
com habilitao em Publicidade e Propaganda.
Orientadora: Prof. Dr. Marclia Luzia
Gomes da Costa Mendes.
Mossor RN
2013
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Santos, Brbara Marina Almeida dos O C da questo: perfil de um grupo de estudantes na cidade de Mossor-RN. / Brbara Marina Almeida dos Santos . Mossor, RN, 2013. 75 f. Orientador(a): Prof. Dr. Marclia Luzia Gomes da Costa Mendes Monografia (Bacharel em Comunicao Social com habilitao em Publicidade e Propaganda). Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. Faculdade de Filosofia e Cincias Sociais. Departamento de Comunicao Social.
1. Identidade Consumo - Juventude. 2. Internet Identidade juvenil - Ps-modernidade. .I. Mendes, Marclia Luzia Gomes da Costa. II.Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. III.Ttulo.
UERN/BC CDD 659.9
Catalogao da Publicao na Fonte. Universidade do Estado do Rio Grande do Norte.
Bibliotecria: Jocelania Marinho Maia de Oliveira CRB 15 / 319
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BRBARA MARINA ALMEIDA DOS SANTOS
O C DA QUESTO: PERFIL DE UM GRUPO DE ESTUDANTES NA CIDADE DE
MOSSOR-RN
Monografia apresentada ao Departamento de
Comunicao Social da Universidade do
Estado do Rio Grande do Norte como requisito
obrigatrio para a concluso e obteno do
ttulo de Bacharel em Comunicao Social
com habilitao em Publicidade e Propaganda.
Banca Examinadora
__________________________________________
Prof. Dr. Marclia Luzia Gomes da Costa Mendes
Universidade do Estado do Rio Grande do Norte
__________________________________________
Prof. Ms. Gustavo Henrique de Oliveira Melo
Universidade do Estado do Rio Grande do Norte
__________________________________________
Prof. Esp. Ivan Chaves Colho
Universidade do Estado do Rio Grande do Norte
Data da aprovao
___________________
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DEDICATRIA
A gratido a memria do corao.
Antstenes
A quem no vendo, creio. O Deus triuno em mim.
Aos meus pais, Lucinete Almeida dos Santos e Gerson dos Santos, pelo caminhar lado a lado
exercendo bem seus papis de pais e mesmo indo alm do meu entendimento.
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AGRADECIMENTOS
A Deus que por meio de Sua graa me supriu e supre diariamente.
Aos meus pais, Lucinete Almeida dos Santos e Gerson dos Santos, e ao meu irmo
Gerson Filho por terem seguido comigo at aqui, pelo apoio em todos os sentidos.
Aos meus avs maternos, Misael Luiz Adelino (in memoriam) e Delfina Almeida
Adelino, e aos paternos, Antonio dos Santos (in memoriam) e Maria Lcia Guilherme dos
Santos. Pois com os seus cabelos brancos transmitiram suas experincias.
Aos meus tios, tias e primos, que so muitos, que contriburam at mesmo para aliviar
os momentos mais tensos me proporcionando carinho e a alegria de boas risadas. No me
esquecendo das que so tias por opo Ceio, Ftima e ris.
Aos grandes colegas de sala, especialmente os que se tornaram amigos para alm dela,
Ramon Vtor, Shemilla Paiva (essa desde o colegial), Giordano Bruno, Ailton Silveira e Ktia
Patrcia.
Aos professores que no limitaram seus ensinos e dedicao a uma sala de aula. A fofa
e compreensiva Daiany Dantas, ao exemplar Ricardo Silveira, a alegre Janice Leal com sua
contagiante gargalhada, a love cats Paula Zagui, ao descontrado Tobias Queiroz e a
colega de sala Sabrina Bezerra. Tambm mencionando as rpidas, porm timas,
experincias passadas com os professores Esdras Marchezan, Fabiano Morais e Moiss
Albuquerque.
Ao professor Gustavo por aceitar fazer parte dessa histria fornecendo seus
conhecimentos, como parte da banca. Igualmente ao professor Ivan Colho, um andarilho,
que passou por mim no incio do curso e mesmo sem vnculo com a universidade continuou a
ajudar em tudo, para completar fechou o ciclo da graduao tambm fazendo parte da banca
dando grandes contribuies.
Aos amigos de longa data, que sempre vieram at mim com apoio e orgulho, Trizia
Mota, Uilliane Rodrigues, Giulianne Santos, Natlia Barbosa, Isis Gonalves, Patrcia Cabral,
Leiliane e Kaline.
Aos irmos em Cristo e amigos em todas as horas Patrcia Mota, Wallace Mota, Ana
Luiza, Vanessa DOlivr (nome artstico para Oliveira, pois ela renega demais esse nome),
Jssica Bezerra, Clcida e famlia.
A ngela por ter cuidado das filhas enquanto Alexandre corrigia meus textos. Assim
tambm como a Eliane por pegar a hora de descanso para me ajudar com as revises.
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Aos que deram uma fora, e das grandes, para a concluso desse trabalho Geilson
Fernandes e Jssica de Oliveira. Ambos com um presente e futuro brilhante.
Aos que contriburam para minha formao desde a infncia na cidade de Ass-RN.
As tias Cleizimar, Judite, Betnia, Liana, Msia, Luciana, Ana Nestor e Sandra.
Aos funcionrios do Departamento de Comunicao da UERN, que sempre deram o
melhor de si, (assim como gua, caf e um bom papo) para aperfeioar todo nosso estudo na
academia.
A todos da agncia que me proporcionou um ano de experincia no mercado e a
colocar em prtica o que foi visto nas salas de aula. A agncia Elevare Comunicao:
Lezianne Talyne, Lilian Frana, Atalija Holanda, caro Thiago, Franklin Dantas, Carlos
Pedro, Nathalia Rebouas, Lia Castro e Emmano Frota.
E finalmente, sou muito grata professora e orientadora Dr Marclia, a quem pude
conhecer bem antes da faculdade e recruzar os caminhos. Obrigada pelo conhecimento
passado e pelo trabalho paciente (principalmente com os emprstimos de livros, os quais
devolvi, e com as mensagens via SMS e Whatsapp a qualquer hora do dia e tambm nos fins
de semana). Uma grande pessoa com uma grande bagagem da vida.
Lembro tambm de cada trabalho acadmico, cada pea publicitria, as redes sociais e
o aconchego do meu lar. Porque tudo isso me fez prosseguir e deram um close na linha de
chegada. Que venham as prximas fases, porque essa j foi zerada. Afinal, finalizar essa etapa
to bom quanto ouvir Campanha aprovada!, Artigo aceito!, Tem dinheiro na sua
conta e Fica, vai ter bolo.
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No corao do consumo cultural, a paixonite de massa.
Gilles Lipovetsky
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RESUMO
A sociedade contempornea presencia a era da informao e da sociedade em rede. Tal
sociedade traz um jovem, integrante da gerao Z ou pontocom, que merece especial
ateno diante de sua cultura, prticas de consumo, principalmente sobre seus ritos de
passagens e constituio de sua identidade. Essa gerao nasceu inserida em uma sociedade
que presencia grandes avanos tecnolgicos, por isso chamado de nativos digitais. Esse
jovem se encontra em uma sociedade que passa por crises de identidade, constituindo nele
identidades mltiplas. A web 2.0, termo cunhado por Tim OReilly em 2004, veio
revolucionar a comunicao, a cultura, o consumo e tantos outros fatores da sociabilidade do
homem. Mediante a todas essas consequncias da globalizao, o Brasil mostrou destaque
para uma classe em especifico, a classe C. A realizao da pesquisa foi baseada nos estudos
de recepo, com o objetivo de traar o perfil e as algumas formas de consumo dentro grupo
de jovens na cidade de Mossor, e compreender como os entrevistados se apropriam das
mdias digitais em tempos de convergncia. Para tanto se realizou o trabalho emprico e de
anlise por meio de uma pesquisa quantitativa e outra qualitativa, que contriburam
grandemente para as consideraes sobre os assuntos abordados dentro do cotidiano desse
grupo.
Palavras-Chave: Identidade. Consumo. Juventude. Internet.
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ABSTRACT
The contemporary society witnesses the information age and network society. This company
brings a young member of Generation Z or "dot" that deserves special attention in front of
their culture, consumption practices, especially about their rites of passages and shaping its
identity. This generation was born inserted in a society that witnesses major technological
advances, so it is called "digital natives". The youth are in a society that goes through an
identity crisis, it constitutes multiple identities. Web 2.0, a term coined by Tim O'Reilly in
2004, revolutionized communication, culture, consumption and many other factors of the
social nature of man. Through all these consequences of globalization, Brazil showed
prominent for a specific class, the class C. The research was based on reception studies, in
order to profile and certain forms of consumption within the group of young people in the city
of Mossoro, and understand how respondents take ownership of digital media in times of
convergence. Therefore the study was performed and empirical analysis through a
quantitative and a qualitative, which contributed greatly to the consideration of the matters
discussed within this group everyday.
Keywords: Identity. Consumption. Youth. Internet.
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LISTAS
Figuras
Figura 1 - Caixa de dilogo do Facebook .......................... 34
Figura 2 - de dilogo do Twitter ............ 34
Figura 3 - Protesto #Vemprarua na cidade de So Paulo ........................... 64
Grficos
Grfico 1 - Evoluo das classes econmicas .................... 39
Grfico 2 - A pirmide populacional dividida em classes econmicas ............. 39
Grfico 3 - Sexo ..................................... 48
Grfico 4 - Idade ............................................ 48
Grfico 5 - Membros na famlia/casa ................................. 48
Grfico 6 - Estudante no mercado de trabalho ........................... 50
Grfico 7 - Curso tcnico, profissionalizante ou de lnguas .......................................... 50
Grfico 8 - Renda da famlia .................. 50
Grfico 9 - Celular por estudante ........... 51
Grfico 10 - Computador em casa ............. 51
Grfico 11 - Acesso internet ................ 51
Grfico 12 - Meios de acesso internet ............. 51
Grfico 13 - Frequncia de acesso internet ............. 52
Grfico 14 - Tempo de acesso internet ............ 52
Grfico 15 - Assuntos de interesse ................. 53
Grfico 16 - Perfil em rede social .................................. 54
Grfico 17 Redes sociais ............................. 54
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SUMRIO
INTRODUO ..................................................................................................................... 11
1. IDENTIDADE JUVENIL ................................................................................................ 15
1.1 O sujeito em pedaos: montando o quebra-cabea da identidade na ps-modernidade
.................................................................................................................................................. 15
1.2 Juventude: conceitos, vises e caractersticas ................................................................... 20
1.2.1 Gadgets e a gerao Z: comunicao e identidade do jovem ps-moderno .................. 24
2. SOCIEDADE, CONSUMO E MASSA: O SURGIMENTO E TRANSFORMAO
DO SUJEITO CONSUMIDOR ........................................................................................... 29
2.1 Consumo e sociedade: sua histria e caractersticas ......................................................... 29
2.1.2 Web 2.0, convergncia miditica e consumo.................................................................. 33
2.2 O grande pblico: A massa, sua cultura e seu papel na indstria ..................................... 35
2.3 D.C (depois da crise): O novo status da Classe C brasileira ............................................. 38
2.3.1 O novo consumidor juvenil ............................................................................................ 40
3. RECEPO E PRTICAS DE CONSUMO DENTRO DE UM RECORTE LOCAL
NA CIDADE DE MOSSOR-RN ....................................................................................... 43
3.1 Metodologia: os passos da pesquisa .................................................................................. 43
3.2 Anlises dos resultados ..................................................................................................... 47
3.2.1 Etapa quantitativa ........................................................................................................ 48
3.2.2 Etapa qualitativa .......................................................................................................... 55
CONSIDERAES FINAIS ............................................................................................... 66
REFERNCIAS .................................................................................................................... 68
ANEXOS ................................................................................................................................ 72
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INTRODUO
Desde o surgimento do que Tim OReilly, em 2004, chama de web 2.0 o cotidiano da
humanidade sofreu rpidas mudanas, principalmente no que concerne a sua comunicao e a
forma como se identifica. O ciberespao passou a fazer parte da vida da grande maioria dos
cidados. Eis a grandiosa vantagem deste espao: ele no limitado geograficamente, e de
certa forma atemporal, mencionando que h uma grande abertura para a liberdade de
expresso. Hoje grande parte da sociabilidade do sujeito se d atravs do ciberespao, que
usa como canal as redes sociais na Internet.
atravs dessa forma virtual de vida que o homem comeou a se reinventar e at mesmo
a criar novas maneiras de se expressar ao lidar com esse novo espao. H ento uma
diferenciao entre o que chamamos de espao virtual e espao offline. Uma mesma pessoa
pode agir e reagir de formas diferentes nesses dois ambientes, mas a questo saber onde
cada um deles comea e termina (se que pode haver essa diviso) e o que realmente
verdade e o que apenas uma maquiagem/melhoramento do cotidiano nosso de cada dia.
A busca do homem pela felicidade constante, ou melhor, o no estar entediado que
motiva o homem a no deixar tudo como est. E a vida social no meio virtual traz grandes
facilidades de buscar e expressar o novo, e principalmente a satisfao. O que poderia ser
privado na vida social offline/real facilmente executvel no ciberespao e nisso que o
homem se apoia para se sentir incluso e participante.
Cabe ento, a partir do assunto ciberespao abordar a figura do jovem, principalmente no
que diz respeito chamada gerao Z. A ideia passada sobre o jovem e a juventude de que
um espao da vida no qual estamos em transio entre uma maturidade adiada e uma
infncia espremida, como diz Everardo Rocha e Cludia Pereira (2009, p. 15). O jovem
reconhecido atravs de mediaes entre atitudes, gostos, valores, estticas e etc. Os jovens
ganham a cada dia mais espao na mdia, com matrias abordando sua importncia nas
decises de consumo na famlia e como mediadores de inovaes tecnolgicas. nessa fase,
que esse adulto em construo, definir seus traos marcantes.
Os jovens tm atitudes peculiares quando se trata de identidade e possuem at mesmo
uma frequncia na sua rotatividade. Uma gerao conectada 24 horas por dia e que tem
informaes a um click acaba sendo bombardeada no somente pela mdia convencional. H
informaes por todas as partes. uma categoria, um estgio da vida do homem, que merece
estudos, principalmente como seus hbitos, cultura e consumo influenciam na vida virtual e
na offline, e como esse conjunto de fatores exerce influncia na economia.
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Entende-se ento a necessidade de estudar a identidade de jovem na sociedade
contempornea e sua cultura tomando como base a recepo a partir do fluxo de contedo que
ocorre por meio de mltiplos suportes tecnolgicos (conectados principalmente atravs da
Internet), uma das caractersticas da convergncia miditica. Todos esses assuntos inseridos
no contexto que aborda a nova realidade da classe C no Brasil.
Com o intuito de alcanar os objetivos propostos pela pesquisa, organizou-se o
trabalho em trs captulos:
O primeiro captulo visa abordar os conceitos em torno da identidade e da juventude,
como so vistos pela sociedade, pelo prprio indivduo, pela universidade e pelo mercado.
Stuart Hall (2005) aborda o sentido de identidade em trs vises, a do sujeito do
iluminismo, a do sujeito sociolgico e do sujeito ps-moderno. Na primeira viso temos um
olhar individualista, que o eu do indivduo permanecia o mesmo desde o nascimento at a
morte, sendo centrado, racional e no influencivel pelo meio. Na segunda, temos parte
interior e parte exterior na constituio da identidade, onde o indivduo se apropria de algo
do meio que j possui significado e une a si, tornando-o parte de si e agregando um
significado prprio. Estabiliza tanto os sujeitos quanto os mundos culturais que eles habitam,
tornando ambos reciprocamente mais unificados e predizveis (HALL, 2005, p. 12). O
sujeito ps-moderno no possui uma identidade fixa, essencial ou permanente. Com a
globalizao h uma forma diferente de se comunicar, conhecer e experimentar
culturas/hbitos antes peculiares apenas de uma parcela de um continente.
Bourdieu (1983), j afirmava que juventude apenas uma palavra para que a
sociedade hierarquize o poder de cada indivduo sobre o outro. Em seus estudos Piaget (apud
BOCK; FURTADO; TEXEIRA, 1999) comprova que at a fase da juventude o indivduo
sofre a maior parte das influncias sobre sua personalidade em toda sua vida, mostrando assim
uma identidade ainda mais flexvel. A mdia e as plataformas digitais ganharam espao na
formao da identidade dos jovens. A globalizao trouxe uma mobilidade enorme entre os
quatro cantos do mundo e o uso de gadgets1 facilitou ainda mais essa interao dos homens,
independente de onde estejam e quem sejam. Como j dizia McLuahn (1964): os meios de
comunicao passaram a ser extenso dos homens. Na gerao Z, os indivduos que compem
esse grupo tambm so conhecidos como gerao digital. Nela a dependncia de audincia
e produo de contedo para os meios aumentou. O jovem e sua identidade so abordados de
1 Equipamentos tecnolgicos portteis.
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forma que se entenda o seu cotidiano mediado por tecnologias e influncias sobre sua
comunicao.
Baseados nos conceitos sobre consumo, cultura de massa e a nova classe C no Brasil,
o segundo captulo busca traar as caractersticas dessa parcela da sociedade que ganha mais
espao no s no mercado, mas tambm nos estudos acadmicos interdisciplinares.
O consumo ser mostrado no apenas como uma atividade de sobrevivncia,
biolgica, mas como forma participativa de um meio/sociedade. Afinal, consumo participa
ativamente na cultura moderno-contempornea, influenciando assim na identidade do
indivduo. Baseado em autores como Bauman (2008) e Baudrillard(1995) e apoiado em
algumas pesquisas recentemente realizadas por Everardo Rocha (2006, 2009) e seus
cooperadores, haver um esclarecimento sobre o consumo como uma ao simblica e no
apenas uma simples troca econmica.
H mais de uma dcada o Brasil vem passando por uma fase economicamente boa e
tal perodo vem gerando um crescimento na renda (NERI, 2010). O destaque vai para a classe
C que ganha financiamentos, produtos e servios com preos e formas de pagamento
adaptados para esse pblico-alvo. Com isso at mesmo as narrativas e estratgias publicitrias
foram modificadas e adequadas a eles.
Barbero (2001) j advertia em Dos meios s mediaes que a massa h muito j havia
ganhado um espao maior perante a sociedade, e que atravs da cultura de massa que se
possibilitou uma comunicao entre estratos diferentes da sociedade. Morin (2002) afirma em
Cultura de Massas Vol. I que existem duas formas de se ver a cultura, e uma em particular
varia de poca e sociedade. Logo, ser abordado a evoluo dessa cultura de massa e como
ela se caracteriza em pleno sculo XXI na atual classe C brasileira.
O terceiro e ltimo captulo conta com a parte emprica da pesquisa. Atravs do estudo
da recepo, a pesquisa possui duas etapas. Por considerar as mediaes responsveis pelas
influncias nas formas de decodificao, negociao e/ou rejeio em que as mensagens
massivas podem ser sujeitadas, o estudo da recepo v a necessidade de se estudar o receptor
e seu meio (JACKS, 1999).
A primeira consiste na aplicao de questionrios para 96 alunos do ensino mdio de
uma escola pblica da cidade de Mossor. Da aplicao desses questionrios realizamos uma
triagem baseada em uma faixa dos 14 aos 18 anos, as horas de acesso internet, a forma de
acesso internet, o uso de redes sociais entre outros quesitos classificatrios.
Na segunda parte os jovens escolhidos passaram por entrevistas com questes abertas
e, a partir de suas anlises, foi possvel realizar observaes de cunho qualitativo sobre o
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comportamento desses jovens perante aparelhos tecnolgicos, contedos aos quais tiveram
acesso e a forma como atuam nas redes sociais em seu dia-dia.
Por meio dessas duas etapas os dados quantitativos, atravs de grficos, e qualitativos,
por meio das respostas transcritas, sero postos em exposio os resultados e comparados com
as teorias e pensamentos a respeito da identidade, juventude, consumo e a nova classe C
brasileira, para que a partir da comparao entre os dados e teorias sejam feitas consideraes
a respeito.
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1 IDENTIDADE JUVENIL
1.1 O sujeito em pedaos: montando o quebra-cabea da identidade na ps-
modernidade
Antes de descrever como se d a construo da identidade precisa-se saber a diferena
entre os papis do indivduo dentro da sociedade e sua identidade, ou identidades (como ser
visto mais a frente). Castells (1999) pe em sucintas palavras seus significados: os papis de
um indivduo na sociedade esto ligados s funes do mesmo como ser pai, advogado,
fumante, jogador de futebol; todas essas funes esto presentes ao mesmo tempo em um
nico indivduo. Enquanto a identidade alimentada por atributos fornecidos pelo prprio
indivduo a si mesmo, que gera um processo de individualizao. Ou seja, os papis do
indivduo so funes que ele exerce, enquanto identidade so significados que ele deseja
transmitir sobre si mesmo.
A principal questo, na verdade, diz respeito a como, a partir de qu, por quem, e
para qu isso acontece. A construo de identidades vale-se de matria-prima
fornecida pela histria, geografia, biologia, instituies produtivas e reprodutivas,
pela memria coletiva e por fantasias pessoais, pelos aparatos de poder e revelaes
de cunho religioso. Porm, todos esses materiais so processados pelos indivduos,
grupos sociais e sociedades, que reorganizam seu significado em funo de
tendncias sociais e projetos culturais enraizados em sua estrutura social, bem como
em sua viso de tempo/espao (CASTELLS, 1999, p. 23).
A identidade do indivduo e/ou do grupo em que se encontra constri-se a partir de
fatores histricos, sociais, biolgicos, de crenas, entre outros. Para apenas um indivduo ou
mesmo para ator coletivo, podem existir mltiplas identidades. Mas todos esses fatores
ganham ressignificados quando se trata de tendncias e concepes culturais do meio social,
cultural, econmico, etc. em que est inserido, principalmente em relao ao tempo/espao,
qualquer mudana em um desses fatores pode transformar completamente seus significados
para o sujeito.
O autor ainda aborda trs tipos de processos que influenciam na formao da
identidade: a legitimadora, a de resistncia e a de projeto. A primeira origina a sociedade
civil, que tem como vigncia uma estruturao da sociedade; nesse processo que se formam
sindicatos, partidos, cooperativas que se ligam ao poder do Estado, como forma de
relacionamento desses grupos representados com o poder pblico/poltico. A segunda, a de
resistncia, objetiva a formao de comunidades, e tais so responsveis por uma
luta/resistncia coletiva perante uma opresso por considerar uma batalha mais forte quando
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se age coletivamente. A terceira, a identidade de projeto, constitui na produo do sujeito.
Esse sujeito se projeta com o objetivo de ter uma vida diferenciada a partir de uma
negociao, forada, com as opes de estilo de vida que lhes so oferecidas.
Neste caso, a construo da identidade consiste em um projeto de uma vida
diferente, talvez com base em uma identidade oprimida, porm expandindo-se no
sentido da transformao da sociedade como prolongamento desse projeto de
identidade (CASTELLS, 1999, p. 26).
O autor afirma que o sujeito est sempre em busca de expressar uma identidade que
ainda est oculta, que no foi despertada, a qual ser acordada a partir das transformaes que
acontecem na sociedade e ela ir refletir diretamente em sua construo e expanso.
Resume-se ento que, no que Castells (1999) chama de sociedade em rede, surgem
processos de construo de identidade durante esse determinado perodo, gerando novas
formas de transformao social. Isso ocorre porque a sociedade em rede est fundamentada na
disjuno sistmica entre o local e o global para a maioria dos indivduos e grupos sociais
(CASTELLS, 1999, v. 2, p. 27). O que essa sociedade em rede trouxe foi uma aproximao
entre o local e o global, tornando complexa e abrangente as reformulaes dos significados a
partir do grande leque de fatores que influenciam a construo da identidade.
Mas para entender como essa sociedade em rede, mediada a partir de novas
tecnologias de informao e comunicao, funciona precisa-se estudar as grandes mudanas
sociais e culturais que fomentaram a sociedade em que se vive hoje. A sociedade
contempornea no possui uma identidade fixa, pelo contrrio, ela complexa e variada
baseada nas evolues sociais que presencia (HALL, 2006).
Durante todo o processo de evoluo da sociedade facilmente destacam-se suas
caractersticas em vrios mbitos, e essas caractersticas tendem a ficar mais complexas,
principalmente quando se aborda a questo da identidade de um sujeito e/ou os grupos em que
esto inseridos. Hoje, o mal do sculo conhecido como crise de identidade (HALL, 2006)
motivada pela complexidade do homem ps-moderno por causa de suas interaes locais e
globais e tambm do uso de novas tecnologias como mediadores dessas novas formas de
interaes.
A assim chamada crise de identidade vista como parte de um processo mais
amplo de mudana, que est deslocando as estruturas e processos centrais das
sociedades modernas e abalando os quadros de referncia que davam aos indivduos
uma ancoragem estvel no mundo social (HALL, 2006, p. 7).
Hall (2006) destacou trs tipos de identidades: a do sujeito do iluminismo, a do sujeito
sociolgico e do sujeito ps-moderno. O primeiro refere-se a uma sociedade que se baseia em
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indivduos slidos e centrados, nessa viso o sujeito visto como contnuo, o mesmo desde o
seu nascimento at sua morte, com uma identidade imutvel. O sujeito sociolgico formado
a partir de apropriao e reformulao de significados obtidos atravs de seu contato com o
meio. Dessa forma o sujeito tenta estabilizar sua identidade a partir do seu eu (interior) e do
meio (exterior) tentando evitar conflitos, at mesmo para ser unificado ao meio. O que
diferencia o sujeito do iluminismo do sujeito sociolgico que o segundo tem interao com
o meio, mas ambos concretizam um viver estvel, unificado, e por que no,
predizvel/predestinado. Eles possuem comeo, meio e fim (mesmo que o primeiro seja
imutvel, mas ambos possuem uma ordem, um fechamento, diferente do sujeito ps-
moderno).
Mas na era moderna aboliu-se o pensamento de um sujeito estvel e padronizado.
Afirma-se que existe uma identidade moldada historicamente e no biologicamente. Em um
nico sujeito h vrios eus que atravs de uma lgica (interior) se expressam conforme o
meio que se encontram. o que Hall (1987) chama de celebrao mvel: formada e
transformada continuamente em relao s formas pelas quais somos representados ou
interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam (apud HALL, 2006, p. 12). Esse sujeito
moderno se caracteriza principalmente atravs da teoria de Freud que aborda que nossas
identidades so formadas a partir de processos psquicos e simblicos do inconsciente,
totalmente oposta a razo, indo contra a viso de uma identidade fixa e slida.
Assim, a identidade realmente algo formado, ao longo do tempo, atravs de
processo inconsciente, e no algo inato, existente na conscincia no momento do
nascimento. Existe sempre algo imaginrio ou fantasiado sobre sua unidade. Ela
permanece sempre incompleta, est sempre em processo, sempre sendo formada
(HALL, 2006, p. 38).
O sujeito est sempre em estado de insatisfao com seu estado, logo abre espao
para novas experincias, novos pensamentos que esto ocultos em sua mente que o permite
realizar algo novo para se sentir completo e ser devidamente identificado. Mas com o fluxo de
mudanas que ocorrem na sociedade globalizada h sempre algo a ser despertado no sujeito
que far sua busca por uma identidade algo constante e mutvel.
Assim como Hall (2006), Canclini (2010) e Kellner (2001) possuem a mesma linha de
pensamento sobre a identidade do sujeito do atual perodo histrico. Eles alegam que a
descentralizao da sociedade, as evolues tecnolgicas, o fluxo de informao, as formas de
comunicao, a atuao do outro e etc. tornaram a identidade reflexiva, mvel e
variavelmente constante. A transnacionalizao da economia e dos smbolos tirou a
verossimilhana desse modo de se legitimar a identidade (CANCLINI, 2010, p. 196).
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Quando h referncia ao meio como fator influenciador/formador de uma identidade
inclui-se tambm o outro, at mesmo dos nossos outros eus. H no sujeito ps-moderno
uma insatisfao com o esttico, do ser igual sempre, justamente por causa de sua tamanha
complexidade. Ns continuamos buscando a identidade e construindo biografias que tecem
as diferentes partes de nossos eus divididos numa unidade porque procuramos recapturar esse
prazer fantasiado da plenitude (HALL, 2006, p. 39).
Kellner (2001) afirma que o outro fator importantssimo na legitimao da
identidade do sujeito ps-moderno, pois medida que o nmero de possveis identidades
aumenta, preciso obter o reconhecimento para assumir uma identidade socialmente vlida.
[...] Dessa maneira, na modernidade o outro um constituinte da nossa identidade
(KELLNER, 2001, p. 296).
O que se pode observar que com grandes acontecimentos histricos, como a
revoluo industrial e o feminismo, houve uma progresso na sociedade e esses avanos
trouxeram grande complexidade para a sociedade. Na era da informao os sujeitos possuem
mais acesso (com maior velocidade) a contedos que antes era de difcil contato e mesmo de
difcil entendimento. Cada movimento, cada cultura, cada crena, cada grupo, cada um forma
uma identidade e o mesmo sujeito est inserido em meios caractersticos desses fatores
(igreja, por exemplo) e tem de agir como camaleo, no para fingir, mas para se adaptar de
acordo com um dos seus eu, pode-se dizer que uma questo de sobrevivncia.
A identidade da sociedade ps-moderna est diretamente ligada ao processo de
globalizao. Primeiro houve uma internacionalizao de bens materiais e simblicos,
prprios de uma sociedade, rompendo as fronteiras. Depois veio uma produo de bens de
todos para todos em que no se sabe bem, ou mesmo no h importncia sobre quem
produziu; no existe uma nacionalidade dos bens, mais importante a velocidade com que
se percorre o mundo do que as posies geogrficas a partir das quais se est
agindo(CANCLINI, 2010, p. 32).
Como argumenta Anthony McGrew (1992), a globalizao se refere queles
processos, atuantes numa escala global, que atravessam fronteiras nacionais,
integrando e conectando comunidades e organizaes em novas combinaes de
espao-tempo, tornando o mundo, em realidade e em experincia, mais
interconectado (HALL, 2006, p. 67).
A globalizao tem uma grande caracterstica em relao ao espao-tempo, sua
compresso. Apesar de suas inmeras formas concretas do seu papel na sociedade atual, a
globalizao no se firma apenas na comercializao de um produto local em contexto global.
Com o advento da internet e sua popularizao esses dois atores (tempo e espao) expem
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instantaneamente o efeito global em cada casa. Da msica em primeira mo para download
aos ataques de bombas que ocorrem em Israel, tudo ao alcance de um s click e no caso da
televiso, est ao alcance de um controle remoto. Um acontecimento local que invade os
canais e a rede e em milsimos de segundos se propaga por todo o globo terrestre. A cada
matria e novo click uma nova informao, uma nova cultura e o indivduo acaba por
absorver pelo menos uma parcela daquele contedo e agrega para si novos significados e os
constitui como parte de sua identidade.
O que importante para nosso argumento quanto ao impacto da globalizao sobre a
identidade que o tempo e o espao so tambm as coordenadas bsicas de todos os
sistemas de representao. Todo meio de representao escrita, pintura, desenho,
fotografia, simbolizao atravs da arte ou dos sistemas de telecomunicao deve
traduzir seu objeto em dimenses espaciais e temporais (HALL, 2006, p. 70, nfase
do autor).
H uma preocupao em relao identidade, principalmente no que se refere a uma
identidade nacional ou cultural, pois a globalizao acaba por apagar essas identidades e as
torna global, generalizada, qui superficial. O que antes tinha um pblico alvo especfico,
hoje se tornou quase que generalizado e torna a cultura homogeneizada. Foi a difuso do
consumismo, seja como realidade, seja como sonho, que contribuiu para esse efeito de
supermercado cultural (HALL, 2006, p. 75), onde a cultura passou a ser mediada pelo
mercado e bombardeando os mais diversos sujeitos. E o mercado tenta atingir os sujeitos
geralmente de forma apelativa, demonstrando que h vrias opes de consumo e todas elas
cabem ao mesmo sujeito, exatamente por causa das suas multifacetas.
Os fluxos culturais, entre as naes, e o consumismo global criam possibilidades de
identidades partilhadas como consumidores para os mesmos bens, clientes
para os mesmos servios, pblicos para as mesmas mensagens e imagens entre
pessoas que esto bastantes distantes umas das outras no espao e no tempo.
medida em que as culturas nacionais tornam-se mais expostas a influncias externas,
difcil conservar as identidades culturais ou impedir que elas se tornem
enfraquecidas atravs do bombardeamento e da infiltrao cultural (HALL, 2006, p.
73-74, nfase do autor).
O mais interessante, e contraditrio, que ao mesmo tempo em que a globalizao traz
uma pluralidade identitria para o sujeito ela acaba re-forando grupos locais. A partir do
momento em que esses grupos se sentem ameaados, reagem de forma que potencializam e
reafirmam sua identidade como grupo. Ou seja, com a globalizao alguns tentam resgatar a
pureza de suas identidades (tradio) e outros simplesmente so absorvidos pela
homogeneizao cultural que resulta dessa globalizao, ambos os fatos podem acontecer
simultaneamente no mesmo sujeito. Mais um ponto que constitui a complexa identidade
contempornea.
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1.2 Juventude: conceitos, vises e caractersticas
A juventude no apenas um aspecto biolgico/fisiolgico, mas envolve tudo que est
em volta do jovem, sua classe, crena, gosto musical, educao, raa, cultural e tantos outros
fatores. A palavra juventude ou adolescncia tem vrios significados a depender de como
analisada. Entre elas est a viso da biologia, da psicologia e poltica, por exemplo. Tanto a
ideia de juventude quanto a experincia de ser jovem se traduzem, de certa forma, por um
processo constante de mediao entre valores, hbitos, gostos, atitudes, estticas e prticas
sociais (ROCHA; PEREIRA, 2009, p. 15).
Baseado na teoria do desenvolvimento humano, elaborada por Jean Piaget, existe
quatro etapas que compem esse desenvolvimento. Estes
[...] estudos e pesquisas de Piaget demonstraram que existem formas de perceber,
compreender e se comportar diante do mundo, prprias de cada faixa etria, isto ,
existe uma assimilao progressiva do meio ambiente, que implica uma acomodao
das estruturas mentais a este novo dado do mundo exterior (BOCK; FURTADO;
TEXEIRA, 1999, p. 98).
Esses perodos etrios so: o sensrio-motor (0 a 2 anos), pr-operatrio (2 a 7 anos),
operaes concretas (7 a 11 ou 12 anos) e o de operaes formais (11 ou 12 anos em diante).
No perodo sensrio-motor quando a criana passa a perceber as coisas e a se
movimentar a partir do meio que a cerca. nesse perodo que muitas habilidades motoras so
desenvolvidas. O pr-operatrio destaca-se pelo aparecimento da linguagem, que
concomitantemente responsvel por influenciar o lado social, afetivo e intelectual da
criana. A fase de operaes concretas caracteriza-se pela realizao de operaes que visam
um objetivo (seja ele qual for) com comeo, meio e fim e que ele seja alcanado. O que
compreende as operaes formais que nele comea a adolescncia na viso da psicologia.
Na adolescncia, como destaca a psicologia, esse sujeito ser capaz de fazer reflexes e tentar
equilibrar os pensamentos e a realidade. Afirma-se ainda que nesse perodo os jovens
possuam interesses diversos e transitrios, que quando chegam idade adulta alcanam
estabilidade.
Biologicamente falando a adolescncia marcada pela entrada do sujeito na chamada
puberdade, nessa fase ocorrem mudanas fsicas/hormonais no indivduo. Mas h tericos que
no concordam com essa viso, pois afirmam que nem sempre que ocorre o rito de passagem,
fsica, da fase infantil para adolescncia, ou mesmo da fase adolescente para adulta, significa
que o sujeito est psicologicamente adaptado/moldado a esse estgio demarcado pela
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maturao biolgica. como Everardo e Cludia comentam sobre o pensamento de Van
Gennep a respeito desse assunto:
No entanto, Van Gennep (1977) afirma que precipitado associar os ritos de
passagem da infncia para a adolescncia aos ritos de adolescncia, j que a idade
da puberdade fsica pode variar de sociedade para sociedade, medida que variam
os seus estmulos sexuais. Assim, alerta Van Gennep (1977), preciso distinguir
entre puberdade social e puberdade fsica. A puberdade fsica, biologicamente
definida, supe, por exemplo, que uma mulher esteja madura para procriar. Mas o
pertencimento a uma puberdade social no est condicionado, necessariamente,
aos limites fsicos, e a mulher capaz de procriar pode compartilhar o mesmo status
de puberdade social com outra mulher que ainda no pode procriar. O
pertencimento puberdade social relativo e se define atravs dos valores de uma
dada cultura. Por isso varivel, flexvel, determinada por foras coletivas e
deslocada dos parmetros biolgicos (ROCHA; PEREIRA, 2009, p. 29, nfase do
autor).
Quanto multiplicidade de identidades do sujeito h uma necessidade de
exteriorizao e reconhecimento, o que acaba gerando o surgimento de tribos e grupos para
interao entre os sujeitos. A mobilidade entre vrios grupos pode se dar ao mesmo tempo,
assim como tambm sua entrada e abandono, uma caracterstica observada principalmente
entre os jovens.
As tribos e grupos que formam as fronteiras simblicas desse fragmentado mundo
da adolescncia contempornea apresentaram uma possibilidade de se aproximar e
se distanciar uns dos outros por fora de empatias ou rejeies recprocas. Da
mesma maneira, coisas, pessoas, objetos, produtos e servios, experincias sociais
ou escolhas estticas tambm podem apresentar importantes graus de variao entre
o prximo e o distante do mundo do adolescente. Assim, se considerarmos a
premissa de que a juventude um fenmeno social, que as representaes sociais,
seja na mdia ou no senso comum, sublinham seu carter mltiplo e simblico, e
que, sobretudo, ditam os gostos, valores e padres da cultura de consumo, podemos
afirmar que a adolescncia mais que uma palavra e que, nesse sentido, precisa ser
observada mais de perto (ROCHA, PEREIRA, 2009, p. 35).
Em relao ao que diz respeito palavra em si, Bourdieu (1983), relata em uma
entrevista que a palavra juventude apenas uma forma de rotular um perodo fsico-
psicolgico e que utilizada como meio de exercer poder, que para os adultos seria sinnimo
de inferioridade dos jovens e que eles devem exercer poder sobre os mesmos. uma poltica
de controle de poder, resumindo: As classificaes por idade (mas tambm por sexo, ou,
claro, por classe...) acabam sempre por impor limites e produzir ordem onde cada um deve se
manter em relao qual cada um deve se manter em seu lugar (BOURDIEU, 1983, p.1-2).
O autor tambm aborda, e at mesmo mostra como justificativa para, os conflitos entre as
geraes, as desvalorizaes e supervalorizaes de ambas as partes que so opostas entre
elas:
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H perodos em que a procura do novo pela qual os recm-chegados (que so
tambm, quase sempre, os mais jovens biologicamente) empurram os j chegados
para o passado, para o ultrapassado, para a morte social (ele est acabado) se
intensifica e, ao mesmo tempo, as lutas entre as geraes atingem uma maior
intensidade: so os momentos em que as trajetrias dos mais jovens e dos mais
velhos se chocam, quando os jovens aspiram cedo demais sucesso
(BOURDIEU, 1983, p.10, nfase do autor).
Essas transferncias de condies no se limitam apenas ao mbito de assumir um
novo status em relao a deixar de ser criana para assumir o posto de adolescente. Mas aos
ritos realizados dentro desses perodos. A adolescncia por si s j caracterizada pela
transio, instabilidade do sujeito e esse sujeito vivencia um grande percurso em ritos de
passagens. Rito de passagem a identificao antropolgica de um mecanismo que mostra a
sociedade e a cultura em seu desejo de controle sobre qualquer mudana que cada um dos
seus seres, individual ou coletivamente, queira realizar em seu interior (ROCHA; PEREIRA,
2009, p. 25).
H ento no s uma mudana individual, mas tambm coletiva de condio, de
grupo. Exemplos a serem vistos so as mudanas nos gostos musicais dos jovens em que
mudam totalmente suas atitudes, ambientes de socializao, pensamentos, vestimentas e
passam a anular qualquer outro grupo, mesmo que j tenha feito parte anteriormente.
importante perceber que a necessidade de pertencer a um grupo est ligada diretamente ao
controle da sociedade (pelo menos parte dela) sobre o sujeito. Essa a essncia dos ritos de
passagem. E na adolescncia esses ritos vm fortalecer o estado de transitoriedade do
adolescente na sociedade. O que se presencia um jovem constitudo de ambivalncias e
fragmentaes perante uma sociedade ps-moderna.
A ambivalncia se caracteriza pela presena de pensamentos simultneos que
divergem entre si. Para o jovem, por exemplo, h dvida em que estgio de maturao se
encontra, se criana ou adulto. Essa ambivalncia se sustenta justamente em descobrir-se,
em achar-se no mundo, de identificar-se. Como visto na teoria do desenvolvimento humano, o
adolescente comea a refletir sobre pensamentos, discursos, o meio que o redeia. nesse
ponto que se pode explicar a rebeldia. O que de fato conclui-se que por causa dessa
ambivalncia, entre ser criana e adulto, o jovem se encontra encurralado para escolher como
agir, de um lado agir como criana e ser considerado imaturo e por outro agir como adulto e
ser considerado como dono do prprio nariz. A incoerncia dos discursos os deixa
confusos.
Alguns especialistas falam da busca da identidade. O adolescente no sabe mais
quem . J no apenas filho do pai e da me ou irmo ou neto, etc., comeando a
ser amigo de uns, inimigo de outros, desejando uns, odiando outros. Enfim, um ser
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indefinido em busca da identidade. [...] Outros informantes falaram da descoberta da
esfera pblica, explicando que o adolescente percebe que agora algum, que pode
acontecer para o mundo, que se fizer uma grande confuso, vai sair no jornal, afetar
a famlia e os amigos. Ele sabe que comea a ter um lugar mais autnomo na esfera
pblica que o difere da criana. Essas ideias marcam o rito de separao (ROCHA;
PEREIRA, 2009, p. 38, nfase do autor).
A fragmentao s passou a existir na cultura ps-moderna e nela, os adolescentes
vivem em um mundo aos pedaos. Mas apesar de a fragmentao ser uma caracterstica da
ps-modernidade a adolescncia por si tambm se caracteriza como tal, fragmentada, tendo
em vista o quebra-cabea da vida que essa passagem representa. Existem ainda quatro
caractersticas que compem a fragmentao na adolescncia: a fragmentao intelectual, o
comprometimento superficial, a compatibilizao de diferena e o de mobilizao entre
universos simblicos. Ou seja, tem-se um jovem que se v diante de inmeras disciplinas,
cada uma ministrada por um professor especfico que acaba aprofundando o conhecimento da
rea, vrios aprofundamentos ao mesmo tempo, por exemplo (fragmentao intelectual). Por
ainda agrupar traos da infncia o jovem no sente a necessidade de firmar suas decises
podendo voltar atrs e desfaz-las facilmente (comprometimento superficial). Quando se trata
de compatibilizar diferenas, na viso dos jovens, que quanto mais coisas absorverem
(independente das divergncias entre elas) melhor, pois o jovem julga que um dia ir us-los
de alguma forma, para ele tudo til (compatibilizao de diferenas). (E a mobilizao entre
universos simblicos) quanto a sua transitoriedade no h nenhum problema de o
adolescente transitar, com grande desenvoltura, entre grupos, tribos, subculturas, ideologias
ou ethos diversos (ROCHA; PEREIRA, 2009, p. 45, nfase do autor).
O mundo dos jovens ainda se alicera em nove valores: afetividade, autenticidade,
descompromisso, gregarismo, insegurana, liberdade, poder, premncia e questionamento. O
afeto est relacionado sua fase de fragilidade, de transitoriedade em que precisam de ateno
e carinho. A autenticidade visa, mesmo que aparentemente antagnico, a sua diferenciao
coletiva e individual; o ser jovem e o ser singular. O descompromisso est ligado ao
comprometimento superficial dito anteriormente. Gregarismo caracteriza-se pelo
agrupamento do jovem a quem ele considera como melhor amigo em cada grupo que se
encontra para se apoiar. A insegurana algo nato da adolescncia justamente pelo fato de se
encontrar num estgio de transitoriedade, de entrada no novo. Os teens confirmam que
necessitam de liberdade ao mesmo tempo em que sentem a necessidade de que tenha controle
sobre os mesmos, poder sobre eles, que lhes sejam postos limites. Esse mesmo poder tambm
tem significado de superioridade nos grupos que se encontram. A premncia est ligada a
pressa que tem o jovem de aprender e fazer as coisas. O desejo da experincia e vontade de
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aprender como uma busca permanente de novas respostas. O questionamento aparece como
uma necessidade baseada em um teste dos limites no qual questionar uma forma de
aprendizado e compreenso de valores e instituies (ROCHA; PEREIRA, 2009, p. 48).
1.2.1 Gadgets e a gerao Z: comunicao e identidade do jovem ps-moderno
Com a entrada das novas tecnologias, principalmente a partir de meados da dcada de
90, a sociedade vem reinventando sua forma de agir, comunicar e ser. O boom (motivado pela
internet) veio com os blogs, conhecidos como dirios onlines (para exposio), que abriram
espaos para os sujeitos se expressarem. A entrada da rotulada Web 2.0 conhecida por
proporcionar grande abertura para a interao entre os indivduos atravs de aparatos
tecnolgicos com auxlio da internet. Essa web 2.0, alm de contar com os blogs, possui as
chamadas redes sociais, que permitem um contato maior entre os usurios do que o blog.
Essas plataformas digitais disponibilizaram um universo paralelo vida offline e multiplicou
ainda mais as possibilidades de variaes de eus do sujeito.
Gadget um termo ingls que inicialmente foi utilizado para denominar coisas/objetos
com o sentido de bugiganga ou geringona, sem uma utilidade para as necessidades ditas
importantes para o sujeito, era algo abaixo das prioridades do indivduo. Mas logo ganhou um
ressignificado, como as mltiplas utilidades tecnolgicas, por exemplo.
Dicionrios e enciclopdias criados e autorregulamentados dentro da internet, e, por
esse motivo, legitimados por mediadores culturais produzidos pelo prprio meio,
definem gadget como brinquedos tecnolgicos ou cool toys para adultos, ou,
ainda, equipamentos portteis e cotidianos (ROCHA; PEREIRA, 2009, p. 59, nfase
do autor).
No de hoje que h uma significativa interao dos homens com as
tecnologias/meios. Ao passo que as tecnologias avanam, consequentemente, muda-se a
forma de mediao e interao com esses meios, trazendo ao homem uma nova forma de
viver. O sujeito se v dependente desses aparatos e, como afirma McLuhan (2003), passam a
tratar essas tecnologias como uma continuao do seu corpo.
Contemplar, utilizar ou perceber uma extenso de ns mesmos sob forma
tecnolgica implica necessariamente em adot-la. Ouvir rdio ou ler uma pgina
impressa aceitar essas extenses de ns mesmos e sofrer o fechamento ou o
deslocamento da percepo, que automaticamente se segue. a contnua adoo de
nossa prpria tecnologia no uso dirio que nos coloca no papel de Narciso da
conscincia e do adormecimento subliminar em relao s imagens de ns mesmos.
Incorporando continuamente tecnologias, relacionando-nos a elas como
servomecanismos. Eis por que, para utilizar esses objetos-extenses-de-ns-mesmos,
devemos servi-los como dolos ou religies menores. Um ndio um
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servomecanismo de sua canoa, como o vaqueiro de seu cavalo e um executivo de
seu relgio (MCLUHAN, 2003, p. 64).
Hoje o destaque para interao com meios digitais vai para a gerao Z. Tambm
conhecida como gerao digital ou gerao pontocom, caracterizada, cronologicamente
falando, pelos que nasceram no incio da dcada de 90. Por qu? Os indivduos que nasceram
nesse perodo, onde surgiu a World Wide Web e vrios outros avanos tecnolgicos, passaram
a ter seu primeiro contato com tecnologias sem ter uma grande bagagem e tradies sobre
meios de comunicao primrios, apresentando uma maior facilidade de aprendizagem e
manuseio sobre eles, so os nativos digitais. O fato no impede que pessoas de geraes
passadas no tenham contato dirio com as tecnologias, mas gritante o destaque dos jovens
no que diz respeito a sua relao com esses meios tecnolgicos e a internet. As caractersticas
dessa gerao foram cunhadas pela sociologia, porm, ainda passvel de mudanas, pois
essa uma gerao atual e que est sujeita h vrios fatores sociais, culturais, econmicos,
etc. que podem vir a acrescentar mais caractersticas ao seu conceito.
O Z do termo ingls zapping que foi originado a partir de uma onomatopeia zap!
que significava o som emitido quando se faz algo rapidamente; os brasileiros at fazem uso do
termo zappear quando se trata de mudar frequentemente os canais de televiso, assim como
em outros meios e aparelhos em busca de novos contedos, sempre atrs de mais informao.
como Jenkins (2009) explica mais afundo:
Zapeadores so pessoas que constantemente mudam de canal assistindo a
fragmentos de programas, em vez de sentar-se para um envolvimento prolongado.
Os fiis, na verdade, assistem a menos horas de televiso por semana do que a
populao em geral: escolhem a dedo os programas que melhor satisfazem seus
interesses; entregam-se totalmente a eles e os gravam para poder v-los mais de uma
vez; passam um perodo maior de seu tempo livre falando sobre os programas; e tm
mais probabilidade de buscarem contedos em outras mdias. [...] Os casuais esto
em algum ponto entre os fiis e zapeadores; assistem uma determinada srie quando
se lembram dela ou quando no tm nada melhor para fazer. [...] Nenhum espectador
exclusivamente fiel, casual ou zapeador; a maioria assiste televiso de maneiras
diferentes, em ocasies diferentes (JENKINS, 2009, p. 109).
O homem, independente de sua idade, deixou de ser receptor para ser produtor e
tambm mediador. A mdia, h muito, depende at mesmo diretamente, do consumidor. Essa
gerao digital aumentou consideravelmente a dependncia dos meios para com o espectador-
consumidor-produtor, os quais passaram a exigir mais das mdias e de seus contedos. Foi
como Jenkins (2009) abordou em duas falas no seu livro Cultura da Convergncia: a
circulao de contedos por meio de diferentes sistemas miditicos, sistemas
administrativos de mdias concorrentes e fronteiras nacionais depende fortemente da
participao ativa dos consumidores (p. 27); e quando as pessoas assumem o controle das
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mdias, os resultados podem ser maravilhosamente criativos; podem ser tambm uma m
notcia para todos os envolvidos (p.43). Vemos ento o espectador tornando-se um
consumidor com voz e poder mediante a indstria. Alm desse poder, as novas tecnologias
trouxeram ao sujeito novas identidades (ou formas de express-las).
Para a felicidade dos viciados em alterao de identidade, em novos comeos e
nascimentos mltiplos, a internet oferece oportunidades negadas ou interditadas na
vida real. A maravilhosa vantagem dos espaos da vida virtual sobre os espaos
offline consiste na possibilidade de tornar a identidade reconhecida sem de fato
pratic-la (BAUMAN, 2008, p. 146-147).
Bauman (2008) defende que essas identidades virtuais so apenas mscaras, so como
um perodo carnavalesco, que no tem a inteno de permanecer, algo totalmente efmero no
qual o prprio sujeito determina sua durao de existncia sem necessariamente depender do
meio, ou seja, o sujeito quem d as cartas. Carla Leito (2006) afirma em um de seus artigos
que, principalmente os jovens, utilizam dessas identidades virtualmente como forma de
autoconhecimento, a internet usada como cobaia para analisar, e talvez solucionar, suas
crises de identidade e tambm como forma de se tornarem mais comunicativos. uma
maneira de se representar de vrias formas com mais facilidade do que seria na vida offline.
Quando as redes de comunicao eletrnica penetram no hbitat do indivduo
consumidor, esto equipadas desde o incio com um dispositivo de segurana: a
possibilidade de desconexo instantnea, livre de problemas e (presume-se) indolor
de cortar a comunicao de uma forma que deixaria parte da rede desatendidas e as
privaria de relevncia, assim como de seu poder de ser uma perturbao. esse
dispositivo de segurana, e no a facilidade de estabelecer contato, muito menos de
estar junto de maneira permanente, que tona esse substituto eletrnico da
socializao face a face to estimado por homens e mulheres treinados para operar
numa sociedade mediada pelo mercado (BAUMAN, 2008, p. 137-138).
As plataformas digitais, mais especificamente as redes sociais, so usadas como
playground (LEITO, 2006). Adultos e jovens utilizam o espao para divertimento, teste ou
mesmo descarte das suas multifacetas. H uma liberdade maior para que o sujeito se expresse,
por isso muitas vezes tratado como um espao de divertimento. Em uma entrevista realizada
pela mesma autora notou-se que para os adultos esse mundo virtual era apenas uma vlvula de
escape, de realizar fantasias e fugir das experincias de fracasso, por exemplo. E para os
jovens seria uma maneira de se encontrarem, de autoconfirmao e conhecimento.
Resumindo, para o jovem um teste para construo/definio de sua identidade e para o
adulto uma forma de escapar das dificuldades e transtornos da vida real, mas de qualquer
forma as duas funes acabam servindo para expressar uma ou mais identidades do sujeito e
como forma de entretenimento.
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Para citar Jaurguiberry mais uma vez: Na busca da auto-identificao bem-
sucedida, os indivduos auto-manipuladores mantm uma relao bastante
instrumental com seus interlocutores. Estes ltimos s so admitidos para certificar a
existncia do manipulador ou, mais exatamente, para permitir que os
manipuladores faam seus eus virtuais carem na realidade. Os outros so
procurados com o nico propsito de atestar, estimular e bajular os eus virtuais dos
internautas (BAUMAN, 2008, p. 148).
H uma semelhana sobre a construo e afirmao das mltiplas identidades do
sujeito entre o mundo virtual e o real, ambos necessitam do outro para que a identidade de
fato se concretize, por mais que no mundo virtual o sujeito no tenha obrigatoriamente que
provar que a identidade que ele est transmitindo seja verdadeira. Mas perante a uma nova
gerao e uma nova sociedade ser mesmo que o virtual (com grande sociabilidade entre os
sujeitos, como defendem alguns autores) pode ser considerado uma farsa? O meio virtual por
no ser palpvel deve ser tratado como mentiroso/irreal? Se for feita uma ligao a partir do
sujeito sociolgico, como Hall (2006) j afirmava, ser visto que o mundo virtual passou a
fazer parte da vida do sujeito, o sujeito o incorporou, mas que, no que ele chama de sujeito
moderno, alm da ressignificao h um conjunto de eus e a internet apenas mais uma
forma de express-los; ou seja, atualmente tem-se um sujeito que incorpora o meio, mas essa
incorporao no o deixa estvel (com comeo, meio e fim), pelo contrrio, movimenta ainda
mais o fluxo de identidades e ritos de passagens. Tal analogia no elimina a possibilidade da
farsa, mas abre espao para que ambas aconteam. Como afirma Gonalves:
Ora, no o virtual que instabiliza as identidades em um mundo de identidades at
ento estveis. Pelo contrrio, o tema da identidade fraca, mutante, tema de nossa
poca que j estava presente antes que se comeasse a falar de internet. Podemos
mesmo imaginar que essa mobilidade pertence prpria essncia da identidade.
Uma identidade imvel seria uma priso ou um delrio paranico (GONALVES,
2006, p. 97).
Existe a viso negativa e a viso positiva sobre a interao do homem e o meio
tecnolgico. Uma afirma que o relacionamento/interao baseado em insegurana,
superficialidade e fragilidade. Autores como Sennett (1998 apud COSTA, 2006, p.54) aborda
que essa nova interao colocou um ponto final no longo prazo e que as relaes
interpessoais se tornaram efmeras e volveis, prejudicando assim a sociabilidade dos sujeitos
e sua confiana no outro; e Bauman (2008) fortalece, porm no to drasticamente quanto
Sennett (1998 apud COSTA, 2006, p. 54), que essa nova sociedade que baseia sua
sociabilidade por meio eletrnico quebra os laos sociais, das comunidades e das parcerias.
Enquanto outros autores defendem justamente o oposto, corroborando para positividade como
fortalecimento de laos interpessoais (intensos e permanentes) podendo ser at mesmo slidos
e solidrios, como afirma Turkle e Nicolaci-da-Costa (COSTA, 2006).
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H, por exemplo, movimentos sociais idealizados e iniciados atravs das redes sociais,
aes que passaram a ser chamadas de ciberativismo. O espao abre um leque de alcance,
muitas vezes incalculvel, e no se limita apenas ao ciberespao. O exemplo mais recente no
Brasil, no incio de junho de 2013, foi o movimento denominado com frases como o gigante
acordou, vem pra rua e vers que um filho teu no foge luta (tambm mobilizou
brasileiros e estrangeiros em outros pases) que tinham como objetivo protestar contra o
aumento das passagens de nibus, o superfaturamento da FIFA com a copa de mundo de
futebol, reivindicando assim investimento na sade, educao e segurana, e contra o projeto
de lei denominado PEC37 e a corrupo.
Segundo pesquisa realizada pelo IBOPE2, 43% dos manifestantes era composto por
jovens entre 14 e 24 anos, 49% tinham colegial completo ou ensino superior iniciado, 30%
tinham renda familiar acima de 2 at 5 salrios mnimos. O que refora a ideia de que o ambiente
virtual ajuda a reforar a sociabilidade e solidariedade o dado que revela como os
envolvidos tomaram conhecimento do manifesto3. As redes sociais foram usadas por 75% deles
para convocao de outras pessoas para as manifestaes.
Foi posto at aqui que a juventude tem por si s uma caracterstica de transitoriedade e
essa fortalecida pela identidade complexa e varivel do sujeito ps-moderno, que por sua
vez ganha ainda mais intensidade no mundo virtual como consequncia dos avanos
tecnolgicos e suas influncias no mbito sociocultural e comunicacional do mesmo. A
globalizao umas das grandes responsveis pelas mudanas territoriais, culturais,
econmicas e na comunicao de nova sociedade. Tendo em vista esse jovem e sua identidade
na ps-modernidade cabe estud-lo inserido na sociedade de massa, analisando assim a
influncia na sua cultura, comunicao e consumo. Tudo isso tambm mediante a um jovem
que compe uma classe social com novo perfil no Brasil, a classe C, mais conhecida como
nova classe mdia.
2 Instituto Brasileiro de Opinio e Estatstica.
3 Disponvel em: . Acesso em: 28 jun. 2013.
http://g1.globo.com/brasil/linha-tempo-manifestacoes-2013/platb/
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2 SOCIEDADE, CONSUMO E MASSA: O SURGIMENTO E
TRANSFORMAO DO SUJEITO CONSUMIDOR
2.1 Consumo e sociedade: sua histria e caractersticas
O consumo no apenas por um simples fato racional e econmico, o ambiente que o
sujeito se encontra somado racionalidade, economia e a signos. Pode-se ainda afirmar que
o consumo se d a partir do suprimento de necessidades, de fato, mas essas necessidades
tambm so relativas. Consumir sempre esteve e estar presente na rotina do homem como
fora motriz para sua sobrevivncia e desenvolvimento.
[...] o consumo uma condio e um aspecto, permanente e irremovvel, sem limites
temporais ou histricos; um elemento inseparvel da sobrevivncia biolgica que
ns humanos compartilhamos com todos os outros organismos vivos. Visto dessa
maneira, o fenmeno do consumo tem razes mais antigas quanto os seres vivos e
com toda certeza parte permanente e integral de todas as formas de vida
conhecidas a partir de narrativas histricas e relatos etnogrficos (BAUMAN, 2008,
p. 37).
Nessa viso cr-se no consumo como fator biolgico, afirmado por Bauman (2008),
como caracterstica vital e permanente no homem; acontecimento presente desde os
primrdios do homem como, por exemplo, sair caa, praticar escambo de mercadorias, at a
venda e compra de produtos a partir da utilizao de capital. Para se chegar at a
complexidade do que o consumo considerado hoje necessrio analisar os fatos histricos
ocorridos h alguns sculos, mas j bem frente desse homem paleoltico.
McCracken (2010), fala sobre uma revoluo do consumo presenciada no Ocidente
como consequncia da revoluo industrial. Essa revoluo se tornou responsvel por
mudanas nos mbitos sobre espao, tempo, sociedade, famlia e indivduo. O autor divide a
histria do consumo em trs momentos que aconteceram nos sculos XVII, XVIII e do XIX
at ento.
A revoluo do consumo comea ao final do sculo XVI e incio do XVII na
Inglaterra. Nesse perodo houve um boom no consumo ocasionado pela monarquia e os
nobres, em menor escala. O primeiro pelo fato de buscar um meio de governar atravs do luxo
em seu vesturio, palcios, objetos de decorao, hospitalidade e refeies, entre outros. O
consumo de tais coisas traria ao governo um misticismo de superioridade, tratado em certo
momento como divindade. O segundo ficou por conta dos nobres, esses motivados pela
posio social onde competiam entre si para se destacarem perante toda sociedade e serem
lembrados pela monarquia, McCracken (2010) os denomina como buscadores-de-status.
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O ento consumo, que realizado principalmente pela monarquia, seria o chamado
consumo de ostentao, com inteno direta de transmitir atravs de suas posses o poder
que possuam como governo. As compras eram feitas pelos vivos, mas a unidade de
consumo inclua os mortos e os ainda no nascidos (MCCRACKEN, 2010, p. 32). A
simbologia desses objetos e os valores agregados faziam parte de toda uma consequncia dos
antepassados e uma herana para as futuras geraes.
Aquilo que homens e mulheres uma vez esperaram herdar de seus pais, agora tinham
a expectativa de comprar por si mesmos. Aquilo que uma vez foi comprado sob os
ditames da necessidade, agora era comprado sob os ditames da moda. [...] Como
resultado, as luxrias passaram a ser vistas como meros bons costumes, e os
bons costumes passaram a ser vistos como necessidades. Mesmo as
necessidades sofreram uma dramtica metamorfose em estilo, variedade e
disponibilidade (MCKENDRICK apud MCCRACKEN, 2010, p.37).
No sculo XVIII percebe-se uma participao mais ativa de outras camadas da
populao em relao ao consumo, a monarquia passou a dividir ainda mais sua participao
no mercado consumidor. Houve uma nova viso por parte dos homens e mulheres em que no
se viam mais obrigados a esperar pelos avs e pais para herdarem algum objeto e um valor
simblico a eles agregados, pois poderiam adquiri-los no mesmo instante diretamente do
mercado. Foi essa disponibilidade no mercado que gerou o aumento do consumo de outras
partes da sociedade. Nesse perodo presencia-se o nascimento da hoje to conhecida
sociedade de consumo, justamente motivada pela competio social. Sendo assim, entende-
se que o comportamento social deveras se transforma(va) em consumo levando ao indivduo a
submeter-se cada vez mais ao papel de sujeito consumidor. O espao e o tempo sofreram uma
reconfigurao para adaptar-se ao consumo o levando para o centro das atividades da
sociedade e seus interesses pessoais.
O sculo XIX no presenciou nenhuma exploso do consumo como visto no sculo
anterior, porque, a partir de ento, o consumo passou a ser tratado pela relao direta com as
mudanas sociais; caracterizando-se pela permanente transformao do Ocidente. Neste
mesmo sculo pode-se presenciar o surgimento de novos estilos de vida de consumo. Uma
variedade ainda maior de significados passou a ser agregado aos bens de consumo. O mercado
inseriu novas estratgias de marketing para agregar valor ao produto utilizando-se da cultura,
da esttica e outras fontes para direcionar sua venda para os novos consumidores. O consumo
pblico passou a ser mais valorizado que o privado.
Na sociedade moderna, segundo Bauman (2008), a sociedade de consumo est
embasada na afirmativa que promete satisfazer/saciar os desejos do indivduo, de forma
nunca antes vista em outras sociedades. Esse discurso move o indivduo ao ponto de almejar
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consumir outras coisas logo aps ser saciado. H na verdade um crculo vicioso no consumo
moderno, um prazo de validade tanto do produto ou servio como do desejo; a curiosidade
pelo novo (novo produto, novo desejo, uma nova forma de ser feliz) o que passa a
mover o sujeito. A prpria indstria trata de gerar novas necessidades no consumidor para que
haja fluxo na comercializao de bens; diferente do sculo XVII que visava um consumo de
ostentao e permanncia dos mesmos nas geraes futuras. A modernidade-lquida, assim
chamada pelo mesmo autor, vive uma cultura agorista ou tempo pontilhista. Essas formas
de viver transformaram o significado de tempo, onde passou a ser alinear e feito de
instantes eternos, a sensao do agora ou nunca. Essa nova cultura em volta do tempo traz
consigo a efemeridade, a substituio, o descarte dos produtos em um curto intervalo de
tempo.
Baudrillard afirma que o lugar do consumo o cotidiano, onde
[...] todas as atividades se encadeiam do mesmo modo combinatrio, em que o canal
das satisfaes se encontra previamente traado, [...] o envolvimento total,
inteiramente climatizado, organizado, culturalizado (BAUDRILLARD, 1995, p. 19).
Na sociedade de consumo h uma dependncia do objeto, de t-lo e descart-lo logo
aps ter atingido o prazo de validade, mesmo que no se trate de algo perecvel. Os bens
passaram a ser cada vez mais efmeros, consequentemente houve uma produo de novos
bens e criao de novas necessidades. O objeto no mais vendido apenas como algo
material, mas com os significados a ele agregado e que muda de sujeito para sujeito.
O consumo claramente um conjunto de relaes feitas entre a sociedade de
produtores (mercado, mdia), o bem e o consumidor. Esses bens de consumo sugerem
significados que vo alm de sua caracterstica utilitria e valor comercial. Canclini (2010,
p.65) sugere que essas vrias e constantes necessidades so sujeitadas a partir das frequentes
mudanas tecnolgicas, da extensiva e intensa comunicao entre os sujeitos, do design dos
objetos que acabaram por desestabilizar a identidade do sujeito antes acostumado a se
apoiarem em bens exclusivos e sem tanta rotatividade, ou seja totalmente atrelado ao viver
social atual. O contato com essas variveis constantes acarretam assim no fluxo de desejos
gerando essa demanda por outros bens. O significado desses bens est atrelado ao mundo
social. O autor segue em uma corrente de pensamento sobre o consumo em que afirma que o
ato de consumir est diretamente ligado ao ato de pensar e principalmente que no h o
manipulador, dono da razo (mdia e mercado) e o manipulado o passivo (consumidor), o que
h, no mximo, uma tentativa de manipulao da escolha do consumidor. O que acontece
uma interao entre mercadoria e consumidor no mbito racional e simblico.
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Consumir tornar mais inteligvel um mundo onde o slido se evapora. Por isso,
alm de serem teis para a expanso do mercado e a reproduo da fora de
trabalho, para nos distinguirmos dos demais e nos comunicarmos com eles, como
afirmam Douglas e Isherwood, as mercadorias servem para pensar (CANCLINI,
2010, p. 65).
Dessa forma, o consumo serve at para organizar as sociedades politicamente. O
consumo um processo em que os desejos se transformam em demandas e em atos
socialmente regulados (CANCLINI, 2010, p. 65). Os ritos de pertencimento dentro de uma
sociedade acabam por caracteriz-la e orden-la, traz uma identidade e esta identidade est
diretamente ligada ao consumo coletivo do grupo.
A viso de Canclini (2010) sobre o sistema do consumo e dos significados dos bens
em um sentido no apocalptico e no manipulador reforada quando o mesmo diz que os
objetos passam por um processo em que primeiro so candidatos a mercadoria, depois
passam a ser um produto propriamente mercantil e ao serem adquiridos por um consumidor
podem perder essa caracterstica e ganhar outra (2010, p. 71). Ou seja, no est
exclusivamente no poder do mercado e mdia a escolha do que, o que e como o consumidor
deve adquirir bens de consumo.
McCracken (2010) esclarece de forma mais detalhada esse processo de consumo,
desde o produtor at o consumidor e as transferncias de significados. O primeiro passo
dado pela empresa (e o departamento de marketing) juntamente com a agncia de publicidade,
que ter como objetivo agregar significados contidos no mundo cultural sua comunicao
(seja o anncio online, outdoor, comercial televisivo ou no YouTube e etc) para divulgao do
bem de consumo especificado. Ao chegar ao mercado o bem de consumo dever ser
decodificado (pelo menos espera-se) pelo espectador. O espectador ser responsvel pela
autoria final do significado do bem.
A propaganda um tipo de canal atravs do qual o significado est constantemente
fluindo, em seu movimento do mundo culturalmente constitudo para os bens de
consumo. Atravs do anncio, bem antigos e novos esto constantemente
destituindo-se de velhos significados e assimilando outros. Como participantes
ativos neste processo, somos mantidos informados do atual estado e estoque de
significado cultural presentes nos bens de consumo. Nesta medida, a propaganda
funciona para ns como lxico dos significados culturais correntes (MCCRACKEN,
2010, p. 109).
Os levantamentos feitos pelos autores em perodos histricos diferentes confirmam
que cada sujeito consome a partir de fatores externos e seus signos com o intuito de se
assemelhar e diferenciar dentro de grupos e sociedades. A modernidade, como consequncia
das revolues industrial e do consumo, trouxe uma complexidade para a identidade e
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concomitantemente para a sociabilidade desse sujeito moderno. Atrelando assim a forma de
consumir bens e significados ao seu meio sociocultural.
O consumo , portanto, o sistema que classifica bens e identidades, coisas e pessoas,
diferenas e semelhanas na vida social contempornea. Por isso podemos dizer que
os produtos e servios falam entre si, falam conosco e falam sobre ns (ROCHA,
2006, p.31).
A contemporaneidade ganha uma nova forma de consumir perante o cenrio da web
2.0 e da convergncia miditica. Trazendo consigo novos vieses de significaes e
ressignicaes constituindo uma nova identidade no sujeito.
2.1.2 Web 2.0, convergncia miditica e consumo
Como visto no captulo anterior, e no incio deste, a evoluo tecnolgica acarretou
em mudanas de mbito sociocultural e comunicacional do sujeito. Com o advento da internet
e sua popularizao a partir da dcada de 90 o sujeito ganhou uma nova funo, a de
internauta. Sua sociabilidade dentro do ciberespao. A ento denominada Web 2.0
caracterizada pelo uso de internet na viso mais comunicacional. onde nascem as redes
sociais. O sujeito agora dispe de um espao paralelo ao mundo real para viver suas
identidades, e consequentemente um novo mundo para exercer o consumo, seja de
produtos, servios ou cultural (bem simblico).
Essa popularizao de acesso internet deu incio inteligncia coletiva. Essa
inteligncia foi originada no dado momento em que o sujeito passou a ter acesso a vrias
informaes, e, por no ter capacidade de saber e acumular tudo passou a absorver e
compartilhar informaes atravs de grupos. Essa coletividade hoje ganhou fora e pode ser
tratada como uma fonte alternativa de poder miditico (JENKINS, 2009, p. 28). Essa
inteligncia coletiva uma caracterstica da convergncia miditica que trouxe mudanas
tambm para a indstria miditica.
Por convergncia, refiro-me ao fluxo de contedos atravs de mltiplos suportes
miditicos, cooperao entre mltiplos mercados miditicos e ao comportamento
migratrio dos pblicos dos meios de comunicao, que vo a quase qualquer
parte em busca das experincias de entretenimento que desejam (JENKINS, 2009, p. 27).
A Internet, no apenas utilizada via computador, mas atravs de meios portteis, como
smartphones e tablets, uma das fontes que mais consegue representar, ou melhor, transmitir
a convergncia miditica. Os meios de comunicao passaram a se interligar, se fortalecer. Ao
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contrrio do que se afirmava no pensamento apocalptico em que o rdio substituiria o jornal,
a televiso o rdio e que a internet por sua vez substituiria a televiso; o que presenciado
um fortalecimento dessas mdias atravs da convergncia miditica. A convergncia altera a
relao entre tecnologias existentes, indstrias, mercados, gneros e pblicos. A convergncia
altera a lgica pela qual a indstria miditica opera e pela qual os consumidores processam a
notcia e o entretenimento (JENKINS, 2009, p.41).
A sociabilidade do sujeito vem sofrendo influncia das redes sociais e sua nova forma
de conectar um ao outro. Redes sociais so plataformas digitais que permitem que os seus
usurios compartilhem contedos com outros usurios atravs da web. Nesse espao, assim
como no espao offline, busca-se um feedback de seus contedos partilhados para justamente
reforar a ideia do outro no s como destinatrio, mas como confirmador/autenticador da
mensagem. Seguindo a lgica das nomenclaturas, o perfil de uma rede social tem o objetivo
de descrever o usurio a partir de uma srie de dados pessoais.
A cada dia essas redes buscam pessoalidade, empatia, para se tornar quase que um
outro humano ou o mais perto que possa chegar disso. Esse objetivo claramente
observado a partir das frases inseridas na caixa de publicao de status do Facebook e do
Twitter, por exemplo. Tais redes, que j tiveram vrias perguntas em sua caixa de dilogo,
hoje se utilizam das frases No que voc est pensando? (figura 1) e O que est
acontecendo? (figura 2), respectivamente.
Figura 1: Caixa de dilogo do Facebook. Fonte: www.facebook.com, jun. de 2013.
Figura 2: Caixa de dilogo do Twitter. Fonte: www.twitter.com, jun. de 2013.
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O novo pendor pela confisso pblica no pode ser explicado por fatores
especficos da idade no s por eles. Eugne Enriquez resumiu a mensagem que
se pode extrair das crescentes evidncias coletadas em todos os setores do mundo
lquido-moderno dos consumidores: Desde que no esquea que o que antes era
invisvel a parcela de intimidade, a vida interior de cada pessoa- agora deve ser
exposto no palco pblico (principalmente nas telas de TV, mas tambm na ribalta
literria), vai-se compreender que aqueles que zelam por sua invisibilidade tendem a
ser rejeitados, colocados de lado ou considerados suspeitos de um crime. A nudez
fsica, social e psquica est na ordem do dia (ENRIQUEZ, 2004, p. 49 apud
BAUMAN, 2008, p. 9).
comum encontrar no perfil da rede social do internauta uma srie de
compartilhamentos sobre os mais diversos mbitos de sua vida pessoal e sobre sua vida como
um coletivo, como uma sociedade. Mais que um confessionrio pode-se dizer que essas redes
viraram um div online. O que pode ser compreendido que as pessoas a cada dia sentem
menos medo de se expor intimamente em algo de um alcance sem tamanho. Tais aes podem
ser justificadas com a afirmao de Gonalves: A tela no interface sem ser ao mesmo
tempo escudo. O computador torna mais rpido, indolor e gil o ato de consumir pessoas
(GONALVES, 2005, p. 100). As pessoas usam da interface virtual como meio para se
expressarem, se comunicarem e principalmente para serem reconhecidos, porm, s vezes,
esses atos no medem ou conseguem calcular as consequncias geradas.
2.2 O grande pblico: A massa, sua cultura e seu papel na indstria
A massa est diretamente ligada ao surgimento da sociedade de consumo, que por
sua vez est ligada cultura de massa. Dentro dessa sociedade de massa encontramos
caractersticas advindas da revoluo industrial, como a produo em grande escala. A
concentrao populacional nos espaos, caracterizados pela urbanizao e industrializao,
leva inevitavelmente a pensar na massificao (FERREIRA, 2010, p. 101). Eis a sociedade
moderna, marcada a partir do sculo XIX. Nesse contexto tambm visto a indstria cultural
transformando o artista/autor em produtor, onde sua arte ganha produo em srie visando
chegar a um grande pblico com um denominador em comum para gerar o mximo de
consumo.
O sincretismo a melhor forma de descrever o modo que se concretiza a cultura de
massa, ou seja, atravs da homogeneizao de contedos na criao de um
produto/informao voltado para um pblico mais universalizado, que prope satisfaz-los em
maior nmero possvel. Nessa linha na indstria cultural que as barreiras entre classes,
idade, gnero, crenas e etc. sero derrubadas fazendo com que os sujeitos sejam tratados
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como iguais, pelo menos no que diz respeito a consumir aquele produto ou contedo
produzido pela indstria cultural (o operrio e o patro com acesso ao mesmo canal de
televiso, por exemplo).
Desse modo, massa deve deixar de significar adiante anonimato, passividade e
conformismo. A cultura de massa a primeira a possibilitar a comunicao entre os
diferentes estratos da sociedade. E dado que impossvel uma sociedade que chegue
a uma completa unidade cultural, ento o importante que haja circulao. E quando
existiu maior circulao cultural que na sociedade de massa? Enquanto o livro
manteve e at reforou durante muito tempo a segregao cultural entre as classes,
foi o jornal que comeou a possibilitar o fluxo e o cinema e o rdio que
intensificaram o encontro (BARBERO, 2001, p. 70-71, nfase do autor).
Jornal, rdio e o cinema foram os primeiros meios pelos quais a cultura de massa fez
uso para propagar seus contedos. Esses meios de comunicao em massa ou mass media
trouxeram uma nova forma de se comunicar e de consumir. Como afirma Morin (2002:40),
as fronteiras culturais so abolidas no mercado comum das mass media. Na verdade as
estratificaes so reconstitudas no interior da nova cultura. Hoje, a televiso e a internet,
junto aos seus equipamentos (computador, tablets e celulares), fazem parte dessa nova forma
de comunicao entre mdia/indstria/mercado e espectador/consumidor/massa.
Barbero (2001) ressalta a necessidade da mdia de educar a massa para que ela
consuma. Uma dessas educaes vem a partir da publicidade, atravs dela a mdia se utiliza
de artifcios para encantar o consumidor, como visto anteriormente no processo de produo e
transferncia de significados originados em uma campanha publicitria.
A cultura de massa trouxe a comercializao da felicidade. Morin (2002) diz que a
busca e o estar feliz est inserido na prpria ideia de viver. Para cada civilizao a
felicidade possui um significado diferente. Na cultura de massa a felicidade projetiva e
identificativa, ou seja, uma projeo imaginria ao mesmo tempo em que uma ideia
vivida/buscada pelo sujeito para que prove, se deleite desse sentimento. O autor chega a
afirmar que a felicidade a religio do sujeito moderno, que uma ideologia da cultura de
massa. Assim se justifica as motivaes para a sociedade de produtores criarem bens que
atrelem e supram esse sentimento de felicidade para a sociedade de consumidores nessa
sociedade moderna.
A juventude passa a ganhar destaque na cultura de massa. Esse destaque se deve,
afirma Morin (2002), a nova estrutura familiar, onde os pais perderam parte de sua autoridade,
o afeto, visto especialmente que as mes foram inseridas no mercado de trabalho. A velhice
no mais era tratada como sinnimo de experincia e sim de atraso. Eram esses jovens que
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passaram a se alistar no exercito e defender seu pas, esse jovem que possua virilidade
invejvel, esse jovem que passou a movimentar a sociedade.
Todo impulso juvenil corresponde a uma acelerao da Histria: porm, mais
amplamente, numa sociedade em rpida evoluo, e sobretudo, numa civilizao em
transformao acelerada como a nossa, o essencial no mais a experincia
acumulada, mas a adeso ao movimento (MORIN, 2002, p. 147, nfase do autor).
Nesse discurso de juventude a cultura de massa expressa um novo modelo de homem,
aquele que busca sua realizao a partir do bem-estar, do amor, da felicidade e que no quer
envelhecer para que consiga aproveitar ao mximo o presente, a sua jovialidade e toda a sua
bonana.
A relao do meio de comunicao com a massa foi analisada por alguns vieses ao
longo dos anos, nas quais se pode constatar a mudana na viso sobre o homem-massa. As
teorias mais famosas so a da agulha hipodrmica e a teoria crtica. A primeira, tambm
conhecida como teoria da bala mgica, argumenta que quando os espectadores, assim como
o tecido do corpo humano, so confrontados com alguma informao eles absorvem por
completo o que lhes fornecido de forma passiva, assim como o tecido humano recebe toda
substncia da agulha. A segunda, que tem Adorno e Horkheimer como uns dos seus
defensores, afirma que a sociedade moderna sofre tamanha influncia da mass media que tem
sua imaginao atrofiada ao ponto de consumir o que lhes posto sem contestar e que os
significados transmitidos