universidade do estado do rio grande do norte … · aos irmãos em cristo e amigos em todas as...

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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE UERN FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS SOCIAIS FAFIC DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL DECOM O C DA QUESTÃO: PERFIL DE UM GRUPO DE ESTUDANTES NA CIDADE DE MOSSORÓ-RN BÁRBARA MARINA ALMEIDA DOS SANTOS Mossoró- RN 2013

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  • UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE UERN

    FACULDADE DE FILOSOFIA E CINCIAS SOCIAIS FAFIC

    DEPARTAMENTO DE COMUNICAO SOCIAL DECOM

    O C DA QUESTO: PERFIL DE UM GRUPO DE ESTUDANTES NA CIDADE DE

    MOSSOR-RN

    BRBARA MARINA ALMEIDA DOS SANTOS

    Mossor- RN

    2013

  • BRBARA MARINA ALMEIDA DOS SANTOS

    O C DA QUESTO: PERFIL DE UM GRUPO DE ESTUDANTES NA CIDADE DE

    MOSSOR-RN

    Monografia apresentada ao Departamento de

    Comunicao Social da Universidade do

    Estado do Rio Grande do Norte como requisito

    obrigatrio para a concluso e obteno do

    ttulo de Bacharel em Comunicao Social

    com habilitao em Publicidade e Propaganda.

    Orientadora: Prof. Dr. Marclia Luzia

    Gomes da Costa Mendes.

    Mossor RN

    2013

  • Santos, Brbara Marina Almeida dos O C da questo: perfil de um grupo de estudantes na cidade de Mossor-RN. / Brbara Marina Almeida dos Santos . Mossor, RN, 2013. 75 f. Orientador(a): Prof. Dr. Marclia Luzia Gomes da Costa Mendes Monografia (Bacharel em Comunicao Social com habilitao em Publicidade e Propaganda). Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. Faculdade de Filosofia e Cincias Sociais. Departamento de Comunicao Social.

    1. Identidade Consumo - Juventude. 2. Internet Identidade juvenil - Ps-modernidade. .I. Mendes, Marclia Luzia Gomes da Costa. II.Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. III.Ttulo.

    UERN/BC CDD 659.9

    Catalogao da Publicao na Fonte. Universidade do Estado do Rio Grande do Norte.

    Bibliotecria: Jocelania Marinho Maia de Oliveira CRB 15 / 319

  • BRBARA MARINA ALMEIDA DOS SANTOS

    O C DA QUESTO: PERFIL DE UM GRUPO DE ESTUDANTES NA CIDADE DE

    MOSSOR-RN

    Monografia apresentada ao Departamento de

    Comunicao Social da Universidade do

    Estado do Rio Grande do Norte como requisito

    obrigatrio para a concluso e obteno do

    ttulo de Bacharel em Comunicao Social

    com habilitao em Publicidade e Propaganda.

    Banca Examinadora

    __________________________________________

    Prof. Dr. Marclia Luzia Gomes da Costa Mendes

    Universidade do Estado do Rio Grande do Norte

    __________________________________________

    Prof. Ms. Gustavo Henrique de Oliveira Melo

    Universidade do Estado do Rio Grande do Norte

    __________________________________________

    Prof. Esp. Ivan Chaves Colho

    Universidade do Estado do Rio Grande do Norte

    Data da aprovao

    ___________________

  • DEDICATRIA

    A gratido a memria do corao.

    Antstenes

    A quem no vendo, creio. O Deus triuno em mim.

    Aos meus pais, Lucinete Almeida dos Santos e Gerson dos Santos, pelo caminhar lado a lado

    exercendo bem seus papis de pais e mesmo indo alm do meu entendimento.

  • AGRADECIMENTOS

    A Deus que por meio de Sua graa me supriu e supre diariamente.

    Aos meus pais, Lucinete Almeida dos Santos e Gerson dos Santos, e ao meu irmo

    Gerson Filho por terem seguido comigo at aqui, pelo apoio em todos os sentidos.

    Aos meus avs maternos, Misael Luiz Adelino (in memoriam) e Delfina Almeida

    Adelino, e aos paternos, Antonio dos Santos (in memoriam) e Maria Lcia Guilherme dos

    Santos. Pois com os seus cabelos brancos transmitiram suas experincias.

    Aos meus tios, tias e primos, que so muitos, que contriburam at mesmo para aliviar

    os momentos mais tensos me proporcionando carinho e a alegria de boas risadas. No me

    esquecendo das que so tias por opo Ceio, Ftima e ris.

    Aos grandes colegas de sala, especialmente os que se tornaram amigos para alm dela,

    Ramon Vtor, Shemilla Paiva (essa desde o colegial), Giordano Bruno, Ailton Silveira e Ktia

    Patrcia.

    Aos professores que no limitaram seus ensinos e dedicao a uma sala de aula. A fofa

    e compreensiva Daiany Dantas, ao exemplar Ricardo Silveira, a alegre Janice Leal com sua

    contagiante gargalhada, a love cats Paula Zagui, ao descontrado Tobias Queiroz e a

    colega de sala Sabrina Bezerra. Tambm mencionando as rpidas, porm timas,

    experincias passadas com os professores Esdras Marchezan, Fabiano Morais e Moiss

    Albuquerque.

    Ao professor Gustavo por aceitar fazer parte dessa histria fornecendo seus

    conhecimentos, como parte da banca. Igualmente ao professor Ivan Colho, um andarilho,

    que passou por mim no incio do curso e mesmo sem vnculo com a universidade continuou a

    ajudar em tudo, para completar fechou o ciclo da graduao tambm fazendo parte da banca

    dando grandes contribuies.

    Aos amigos de longa data, que sempre vieram at mim com apoio e orgulho, Trizia

    Mota, Uilliane Rodrigues, Giulianne Santos, Natlia Barbosa, Isis Gonalves, Patrcia Cabral,

    Leiliane e Kaline.

    Aos irmos em Cristo e amigos em todas as horas Patrcia Mota, Wallace Mota, Ana

    Luiza, Vanessa DOlivr (nome artstico para Oliveira, pois ela renega demais esse nome),

    Jssica Bezerra, Clcida e famlia.

    A ngela por ter cuidado das filhas enquanto Alexandre corrigia meus textos. Assim

    tambm como a Eliane por pegar a hora de descanso para me ajudar com as revises.

  • Aos que deram uma fora, e das grandes, para a concluso desse trabalho Geilson

    Fernandes e Jssica de Oliveira. Ambos com um presente e futuro brilhante.

    Aos que contriburam para minha formao desde a infncia na cidade de Ass-RN.

    As tias Cleizimar, Judite, Betnia, Liana, Msia, Luciana, Ana Nestor e Sandra.

    Aos funcionrios do Departamento de Comunicao da UERN, que sempre deram o

    melhor de si, (assim como gua, caf e um bom papo) para aperfeioar todo nosso estudo na

    academia.

    A todos da agncia que me proporcionou um ano de experincia no mercado e a

    colocar em prtica o que foi visto nas salas de aula. A agncia Elevare Comunicao:

    Lezianne Talyne, Lilian Frana, Atalija Holanda, caro Thiago, Franklin Dantas, Carlos

    Pedro, Nathalia Rebouas, Lia Castro e Emmano Frota.

    E finalmente, sou muito grata professora e orientadora Dr Marclia, a quem pude

    conhecer bem antes da faculdade e recruzar os caminhos. Obrigada pelo conhecimento

    passado e pelo trabalho paciente (principalmente com os emprstimos de livros, os quais

    devolvi, e com as mensagens via SMS e Whatsapp a qualquer hora do dia e tambm nos fins

    de semana). Uma grande pessoa com uma grande bagagem da vida.

    Lembro tambm de cada trabalho acadmico, cada pea publicitria, as redes sociais e

    o aconchego do meu lar. Porque tudo isso me fez prosseguir e deram um close na linha de

    chegada. Que venham as prximas fases, porque essa j foi zerada. Afinal, finalizar essa etapa

    to bom quanto ouvir Campanha aprovada!, Artigo aceito!, Tem dinheiro na sua

    conta e Fica, vai ter bolo.

  • No corao do consumo cultural, a paixonite de massa.

    Gilles Lipovetsky

  • RESUMO

    A sociedade contempornea presencia a era da informao e da sociedade em rede. Tal

    sociedade traz um jovem, integrante da gerao Z ou pontocom, que merece especial

    ateno diante de sua cultura, prticas de consumo, principalmente sobre seus ritos de

    passagens e constituio de sua identidade. Essa gerao nasceu inserida em uma sociedade

    que presencia grandes avanos tecnolgicos, por isso chamado de nativos digitais. Esse

    jovem se encontra em uma sociedade que passa por crises de identidade, constituindo nele

    identidades mltiplas. A web 2.0, termo cunhado por Tim OReilly em 2004, veio

    revolucionar a comunicao, a cultura, o consumo e tantos outros fatores da sociabilidade do

    homem. Mediante a todas essas consequncias da globalizao, o Brasil mostrou destaque

    para uma classe em especifico, a classe C. A realizao da pesquisa foi baseada nos estudos

    de recepo, com o objetivo de traar o perfil e as algumas formas de consumo dentro grupo

    de jovens na cidade de Mossor, e compreender como os entrevistados se apropriam das

    mdias digitais em tempos de convergncia. Para tanto se realizou o trabalho emprico e de

    anlise por meio de uma pesquisa quantitativa e outra qualitativa, que contriburam

    grandemente para as consideraes sobre os assuntos abordados dentro do cotidiano desse

    grupo.

    Palavras-Chave: Identidade. Consumo. Juventude. Internet.

  • ABSTRACT

    The contemporary society witnesses the information age and network society. This company

    brings a young member of Generation Z or "dot" that deserves special attention in front of

    their culture, consumption practices, especially about their rites of passages and shaping its

    identity. This generation was born inserted in a society that witnesses major technological

    advances, so it is called "digital natives". The youth are in a society that goes through an

    identity crisis, it constitutes multiple identities. Web 2.0, a term coined by Tim O'Reilly in

    2004, revolutionized communication, culture, consumption and many other factors of the

    social nature of man. Through all these consequences of globalization, Brazil showed

    prominent for a specific class, the class C. The research was based on reception studies, in

    order to profile and certain forms of consumption within the group of young people in the city

    of Mossoro, and understand how respondents take ownership of digital media in times of

    convergence. Therefore the study was performed and empirical analysis through a

    quantitative and a qualitative, which contributed greatly to the consideration of the matters

    discussed within this group everyday.

    Keywords: Identity. Consumption. Youth. Internet.

  • LISTAS

    Figuras

    Figura 1 - Caixa de dilogo do Facebook .......................... 34

    Figura 2 - de dilogo do Twitter ............ 34

    Figura 3 - Protesto #Vemprarua na cidade de So Paulo ........................... 64

    Grficos

    Grfico 1 - Evoluo das classes econmicas .................... 39

    Grfico 2 - A pirmide populacional dividida em classes econmicas ............. 39

    Grfico 3 - Sexo ..................................... 48

    Grfico 4 - Idade ............................................ 48

    Grfico 5 - Membros na famlia/casa ................................. 48

    Grfico 6 - Estudante no mercado de trabalho ........................... 50

    Grfico 7 - Curso tcnico, profissionalizante ou de lnguas .......................................... 50

    Grfico 8 - Renda da famlia .................. 50

    Grfico 9 - Celular por estudante ........... 51

    Grfico 10 - Computador em casa ............. 51

    Grfico 11 - Acesso internet ................ 51

    Grfico 12 - Meios de acesso internet ............. 51

    Grfico 13 - Frequncia de acesso internet ............. 52

    Grfico 14 - Tempo de acesso internet ............ 52

    Grfico 15 - Assuntos de interesse ................. 53

    Grfico 16 - Perfil em rede social .................................. 54

    Grfico 17 Redes sociais ............................. 54

  • SUMRIO

    INTRODUO ..................................................................................................................... 11

    1. IDENTIDADE JUVENIL ................................................................................................ 15

    1.1 O sujeito em pedaos: montando o quebra-cabea da identidade na ps-modernidade

    .................................................................................................................................................. 15

    1.2 Juventude: conceitos, vises e caractersticas ................................................................... 20

    1.2.1 Gadgets e a gerao Z: comunicao e identidade do jovem ps-moderno .................. 24

    2. SOCIEDADE, CONSUMO E MASSA: O SURGIMENTO E TRANSFORMAO

    DO SUJEITO CONSUMIDOR ........................................................................................... 29

    2.1 Consumo e sociedade: sua histria e caractersticas ......................................................... 29

    2.1.2 Web 2.0, convergncia miditica e consumo.................................................................. 33

    2.2 O grande pblico: A massa, sua cultura e seu papel na indstria ..................................... 35

    2.3 D.C (depois da crise): O novo status da Classe C brasileira ............................................. 38

    2.3.1 O novo consumidor juvenil ............................................................................................ 40

    3. RECEPO E PRTICAS DE CONSUMO DENTRO DE UM RECORTE LOCAL

    NA CIDADE DE MOSSOR-RN ....................................................................................... 43

    3.1 Metodologia: os passos da pesquisa .................................................................................. 43

    3.2 Anlises dos resultados ..................................................................................................... 47

    3.2.1 Etapa quantitativa ........................................................................................................ 48

    3.2.2 Etapa qualitativa .......................................................................................................... 55

    CONSIDERAES FINAIS ............................................................................................... 66

    REFERNCIAS .................................................................................................................... 68

    ANEXOS ................................................................................................................................ 72

  • 11

    INTRODUO

    Desde o surgimento do que Tim OReilly, em 2004, chama de web 2.0 o cotidiano da

    humanidade sofreu rpidas mudanas, principalmente no que concerne a sua comunicao e a

    forma como se identifica. O ciberespao passou a fazer parte da vida da grande maioria dos

    cidados. Eis a grandiosa vantagem deste espao: ele no limitado geograficamente, e de

    certa forma atemporal, mencionando que h uma grande abertura para a liberdade de

    expresso. Hoje grande parte da sociabilidade do sujeito se d atravs do ciberespao, que

    usa como canal as redes sociais na Internet.

    atravs dessa forma virtual de vida que o homem comeou a se reinventar e at mesmo

    a criar novas maneiras de se expressar ao lidar com esse novo espao. H ento uma

    diferenciao entre o que chamamos de espao virtual e espao offline. Uma mesma pessoa

    pode agir e reagir de formas diferentes nesses dois ambientes, mas a questo saber onde

    cada um deles comea e termina (se que pode haver essa diviso) e o que realmente

    verdade e o que apenas uma maquiagem/melhoramento do cotidiano nosso de cada dia.

    A busca do homem pela felicidade constante, ou melhor, o no estar entediado que

    motiva o homem a no deixar tudo como est. E a vida social no meio virtual traz grandes

    facilidades de buscar e expressar o novo, e principalmente a satisfao. O que poderia ser

    privado na vida social offline/real facilmente executvel no ciberespao e nisso que o

    homem se apoia para se sentir incluso e participante.

    Cabe ento, a partir do assunto ciberespao abordar a figura do jovem, principalmente no

    que diz respeito chamada gerao Z. A ideia passada sobre o jovem e a juventude de que

    um espao da vida no qual estamos em transio entre uma maturidade adiada e uma

    infncia espremida, como diz Everardo Rocha e Cludia Pereira (2009, p. 15). O jovem

    reconhecido atravs de mediaes entre atitudes, gostos, valores, estticas e etc. Os jovens

    ganham a cada dia mais espao na mdia, com matrias abordando sua importncia nas

    decises de consumo na famlia e como mediadores de inovaes tecnolgicas. nessa fase,

    que esse adulto em construo, definir seus traos marcantes.

    Os jovens tm atitudes peculiares quando se trata de identidade e possuem at mesmo

    uma frequncia na sua rotatividade. Uma gerao conectada 24 horas por dia e que tem

    informaes a um click acaba sendo bombardeada no somente pela mdia convencional. H

    informaes por todas as partes. uma categoria, um estgio da vida do homem, que merece

    estudos, principalmente como seus hbitos, cultura e consumo influenciam na vida virtual e

    na offline, e como esse conjunto de fatores exerce influncia na economia.

  • 12

    Entende-se ento a necessidade de estudar a identidade de jovem na sociedade

    contempornea e sua cultura tomando como base a recepo a partir do fluxo de contedo que

    ocorre por meio de mltiplos suportes tecnolgicos (conectados principalmente atravs da

    Internet), uma das caractersticas da convergncia miditica. Todos esses assuntos inseridos

    no contexto que aborda a nova realidade da classe C no Brasil.

    Com o intuito de alcanar os objetivos propostos pela pesquisa, organizou-se o

    trabalho em trs captulos:

    O primeiro captulo visa abordar os conceitos em torno da identidade e da juventude,

    como so vistos pela sociedade, pelo prprio indivduo, pela universidade e pelo mercado.

    Stuart Hall (2005) aborda o sentido de identidade em trs vises, a do sujeito do

    iluminismo, a do sujeito sociolgico e do sujeito ps-moderno. Na primeira viso temos um

    olhar individualista, que o eu do indivduo permanecia o mesmo desde o nascimento at a

    morte, sendo centrado, racional e no influencivel pelo meio. Na segunda, temos parte

    interior e parte exterior na constituio da identidade, onde o indivduo se apropria de algo

    do meio que j possui significado e une a si, tornando-o parte de si e agregando um

    significado prprio. Estabiliza tanto os sujeitos quanto os mundos culturais que eles habitam,

    tornando ambos reciprocamente mais unificados e predizveis (HALL, 2005, p. 12). O

    sujeito ps-moderno no possui uma identidade fixa, essencial ou permanente. Com a

    globalizao h uma forma diferente de se comunicar, conhecer e experimentar

    culturas/hbitos antes peculiares apenas de uma parcela de um continente.

    Bourdieu (1983), j afirmava que juventude apenas uma palavra para que a

    sociedade hierarquize o poder de cada indivduo sobre o outro. Em seus estudos Piaget (apud

    BOCK; FURTADO; TEXEIRA, 1999) comprova que at a fase da juventude o indivduo

    sofre a maior parte das influncias sobre sua personalidade em toda sua vida, mostrando assim

    uma identidade ainda mais flexvel. A mdia e as plataformas digitais ganharam espao na

    formao da identidade dos jovens. A globalizao trouxe uma mobilidade enorme entre os

    quatro cantos do mundo e o uso de gadgets1 facilitou ainda mais essa interao dos homens,

    independente de onde estejam e quem sejam. Como j dizia McLuahn (1964): os meios de

    comunicao passaram a ser extenso dos homens. Na gerao Z, os indivduos que compem

    esse grupo tambm so conhecidos como gerao digital. Nela a dependncia de audincia

    e produo de contedo para os meios aumentou. O jovem e sua identidade so abordados de

    1 Equipamentos tecnolgicos portteis.

  • 13

    forma que se entenda o seu cotidiano mediado por tecnologias e influncias sobre sua

    comunicao.

    Baseados nos conceitos sobre consumo, cultura de massa e a nova classe C no Brasil,

    o segundo captulo busca traar as caractersticas dessa parcela da sociedade que ganha mais

    espao no s no mercado, mas tambm nos estudos acadmicos interdisciplinares.

    O consumo ser mostrado no apenas como uma atividade de sobrevivncia,

    biolgica, mas como forma participativa de um meio/sociedade. Afinal, consumo participa

    ativamente na cultura moderno-contempornea, influenciando assim na identidade do

    indivduo. Baseado em autores como Bauman (2008) e Baudrillard(1995) e apoiado em

    algumas pesquisas recentemente realizadas por Everardo Rocha (2006, 2009) e seus

    cooperadores, haver um esclarecimento sobre o consumo como uma ao simblica e no

    apenas uma simples troca econmica.

    H mais de uma dcada o Brasil vem passando por uma fase economicamente boa e

    tal perodo vem gerando um crescimento na renda (NERI, 2010). O destaque vai para a classe

    C que ganha financiamentos, produtos e servios com preos e formas de pagamento

    adaptados para esse pblico-alvo. Com isso at mesmo as narrativas e estratgias publicitrias

    foram modificadas e adequadas a eles.

    Barbero (2001) j advertia em Dos meios s mediaes que a massa h muito j havia

    ganhado um espao maior perante a sociedade, e que atravs da cultura de massa que se

    possibilitou uma comunicao entre estratos diferentes da sociedade. Morin (2002) afirma em

    Cultura de Massas Vol. I que existem duas formas de se ver a cultura, e uma em particular

    varia de poca e sociedade. Logo, ser abordado a evoluo dessa cultura de massa e como

    ela se caracteriza em pleno sculo XXI na atual classe C brasileira.

    O terceiro e ltimo captulo conta com a parte emprica da pesquisa. Atravs do estudo

    da recepo, a pesquisa possui duas etapas. Por considerar as mediaes responsveis pelas

    influncias nas formas de decodificao, negociao e/ou rejeio em que as mensagens

    massivas podem ser sujeitadas, o estudo da recepo v a necessidade de se estudar o receptor

    e seu meio (JACKS, 1999).

    A primeira consiste na aplicao de questionrios para 96 alunos do ensino mdio de

    uma escola pblica da cidade de Mossor. Da aplicao desses questionrios realizamos uma

    triagem baseada em uma faixa dos 14 aos 18 anos, as horas de acesso internet, a forma de

    acesso internet, o uso de redes sociais entre outros quesitos classificatrios.

    Na segunda parte os jovens escolhidos passaram por entrevistas com questes abertas

    e, a partir de suas anlises, foi possvel realizar observaes de cunho qualitativo sobre o

  • 14

    comportamento desses jovens perante aparelhos tecnolgicos, contedos aos quais tiveram

    acesso e a forma como atuam nas redes sociais em seu dia-dia.

    Por meio dessas duas etapas os dados quantitativos, atravs de grficos, e qualitativos,

    por meio das respostas transcritas, sero postos em exposio os resultados e comparados com

    as teorias e pensamentos a respeito da identidade, juventude, consumo e a nova classe C

    brasileira, para que a partir da comparao entre os dados e teorias sejam feitas consideraes

    a respeito.

  • 15

    1 IDENTIDADE JUVENIL

    1.1 O sujeito em pedaos: montando o quebra-cabea da identidade na ps-

    modernidade

    Antes de descrever como se d a construo da identidade precisa-se saber a diferena

    entre os papis do indivduo dentro da sociedade e sua identidade, ou identidades (como ser

    visto mais a frente). Castells (1999) pe em sucintas palavras seus significados: os papis de

    um indivduo na sociedade esto ligados s funes do mesmo como ser pai, advogado,

    fumante, jogador de futebol; todas essas funes esto presentes ao mesmo tempo em um

    nico indivduo. Enquanto a identidade alimentada por atributos fornecidos pelo prprio

    indivduo a si mesmo, que gera um processo de individualizao. Ou seja, os papis do

    indivduo so funes que ele exerce, enquanto identidade so significados que ele deseja

    transmitir sobre si mesmo.

    A principal questo, na verdade, diz respeito a como, a partir de qu, por quem, e

    para qu isso acontece. A construo de identidades vale-se de matria-prima

    fornecida pela histria, geografia, biologia, instituies produtivas e reprodutivas,

    pela memria coletiva e por fantasias pessoais, pelos aparatos de poder e revelaes

    de cunho religioso. Porm, todos esses materiais so processados pelos indivduos,

    grupos sociais e sociedades, que reorganizam seu significado em funo de

    tendncias sociais e projetos culturais enraizados em sua estrutura social, bem como

    em sua viso de tempo/espao (CASTELLS, 1999, p. 23).

    A identidade do indivduo e/ou do grupo em que se encontra constri-se a partir de

    fatores histricos, sociais, biolgicos, de crenas, entre outros. Para apenas um indivduo ou

    mesmo para ator coletivo, podem existir mltiplas identidades. Mas todos esses fatores

    ganham ressignificados quando se trata de tendncias e concepes culturais do meio social,

    cultural, econmico, etc. em que est inserido, principalmente em relao ao tempo/espao,

    qualquer mudana em um desses fatores pode transformar completamente seus significados

    para o sujeito.

    O autor ainda aborda trs tipos de processos que influenciam na formao da

    identidade: a legitimadora, a de resistncia e a de projeto. A primeira origina a sociedade

    civil, que tem como vigncia uma estruturao da sociedade; nesse processo que se formam

    sindicatos, partidos, cooperativas que se ligam ao poder do Estado, como forma de

    relacionamento desses grupos representados com o poder pblico/poltico. A segunda, a de

    resistncia, objetiva a formao de comunidades, e tais so responsveis por uma

    luta/resistncia coletiva perante uma opresso por considerar uma batalha mais forte quando

  • 16

    se age coletivamente. A terceira, a identidade de projeto, constitui na produo do sujeito.

    Esse sujeito se projeta com o objetivo de ter uma vida diferenciada a partir de uma

    negociao, forada, com as opes de estilo de vida que lhes so oferecidas.

    Neste caso, a construo da identidade consiste em um projeto de uma vida

    diferente, talvez com base em uma identidade oprimida, porm expandindo-se no

    sentido da transformao da sociedade como prolongamento desse projeto de

    identidade (CASTELLS, 1999, p. 26).

    O autor afirma que o sujeito est sempre em busca de expressar uma identidade que

    ainda est oculta, que no foi despertada, a qual ser acordada a partir das transformaes que

    acontecem na sociedade e ela ir refletir diretamente em sua construo e expanso.

    Resume-se ento que, no que Castells (1999) chama de sociedade em rede, surgem

    processos de construo de identidade durante esse determinado perodo, gerando novas

    formas de transformao social. Isso ocorre porque a sociedade em rede est fundamentada na

    disjuno sistmica entre o local e o global para a maioria dos indivduos e grupos sociais

    (CASTELLS, 1999, v. 2, p. 27). O que essa sociedade em rede trouxe foi uma aproximao

    entre o local e o global, tornando complexa e abrangente as reformulaes dos significados a

    partir do grande leque de fatores que influenciam a construo da identidade.

    Mas para entender como essa sociedade em rede, mediada a partir de novas

    tecnologias de informao e comunicao, funciona precisa-se estudar as grandes mudanas

    sociais e culturais que fomentaram a sociedade em que se vive hoje. A sociedade

    contempornea no possui uma identidade fixa, pelo contrrio, ela complexa e variada

    baseada nas evolues sociais que presencia (HALL, 2006).

    Durante todo o processo de evoluo da sociedade facilmente destacam-se suas

    caractersticas em vrios mbitos, e essas caractersticas tendem a ficar mais complexas,

    principalmente quando se aborda a questo da identidade de um sujeito e/ou os grupos em que

    esto inseridos. Hoje, o mal do sculo conhecido como crise de identidade (HALL, 2006)

    motivada pela complexidade do homem ps-moderno por causa de suas interaes locais e

    globais e tambm do uso de novas tecnologias como mediadores dessas novas formas de

    interaes.

    A assim chamada crise de identidade vista como parte de um processo mais

    amplo de mudana, que est deslocando as estruturas e processos centrais das

    sociedades modernas e abalando os quadros de referncia que davam aos indivduos

    uma ancoragem estvel no mundo social (HALL, 2006, p. 7).

    Hall (2006) destacou trs tipos de identidades: a do sujeito do iluminismo, a do sujeito

    sociolgico e do sujeito ps-moderno. O primeiro refere-se a uma sociedade que se baseia em

  • 17

    indivduos slidos e centrados, nessa viso o sujeito visto como contnuo, o mesmo desde o

    seu nascimento at sua morte, com uma identidade imutvel. O sujeito sociolgico formado

    a partir de apropriao e reformulao de significados obtidos atravs de seu contato com o

    meio. Dessa forma o sujeito tenta estabilizar sua identidade a partir do seu eu (interior) e do

    meio (exterior) tentando evitar conflitos, at mesmo para ser unificado ao meio. O que

    diferencia o sujeito do iluminismo do sujeito sociolgico que o segundo tem interao com

    o meio, mas ambos concretizam um viver estvel, unificado, e por que no,

    predizvel/predestinado. Eles possuem comeo, meio e fim (mesmo que o primeiro seja

    imutvel, mas ambos possuem uma ordem, um fechamento, diferente do sujeito ps-

    moderno).

    Mas na era moderna aboliu-se o pensamento de um sujeito estvel e padronizado.

    Afirma-se que existe uma identidade moldada historicamente e no biologicamente. Em um

    nico sujeito h vrios eus que atravs de uma lgica (interior) se expressam conforme o

    meio que se encontram. o que Hall (1987) chama de celebrao mvel: formada e

    transformada continuamente em relao s formas pelas quais somos representados ou

    interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam (apud HALL, 2006, p. 12). Esse sujeito

    moderno se caracteriza principalmente atravs da teoria de Freud que aborda que nossas

    identidades so formadas a partir de processos psquicos e simblicos do inconsciente,

    totalmente oposta a razo, indo contra a viso de uma identidade fixa e slida.

    Assim, a identidade realmente algo formado, ao longo do tempo, atravs de

    processo inconsciente, e no algo inato, existente na conscincia no momento do

    nascimento. Existe sempre algo imaginrio ou fantasiado sobre sua unidade. Ela

    permanece sempre incompleta, est sempre em processo, sempre sendo formada

    (HALL, 2006, p. 38).

    O sujeito est sempre em estado de insatisfao com seu estado, logo abre espao

    para novas experincias, novos pensamentos que esto ocultos em sua mente que o permite

    realizar algo novo para se sentir completo e ser devidamente identificado. Mas com o fluxo de

    mudanas que ocorrem na sociedade globalizada h sempre algo a ser despertado no sujeito

    que far sua busca por uma identidade algo constante e mutvel.

    Assim como Hall (2006), Canclini (2010) e Kellner (2001) possuem a mesma linha de

    pensamento sobre a identidade do sujeito do atual perodo histrico. Eles alegam que a

    descentralizao da sociedade, as evolues tecnolgicas, o fluxo de informao, as formas de

    comunicao, a atuao do outro e etc. tornaram a identidade reflexiva, mvel e

    variavelmente constante. A transnacionalizao da economia e dos smbolos tirou a

    verossimilhana desse modo de se legitimar a identidade (CANCLINI, 2010, p. 196).

  • 18

    Quando h referncia ao meio como fator influenciador/formador de uma identidade

    inclui-se tambm o outro, at mesmo dos nossos outros eus. H no sujeito ps-moderno

    uma insatisfao com o esttico, do ser igual sempre, justamente por causa de sua tamanha

    complexidade. Ns continuamos buscando a identidade e construindo biografias que tecem

    as diferentes partes de nossos eus divididos numa unidade porque procuramos recapturar esse

    prazer fantasiado da plenitude (HALL, 2006, p. 39).

    Kellner (2001) afirma que o outro fator importantssimo na legitimao da

    identidade do sujeito ps-moderno, pois medida que o nmero de possveis identidades

    aumenta, preciso obter o reconhecimento para assumir uma identidade socialmente vlida.

    [...] Dessa maneira, na modernidade o outro um constituinte da nossa identidade

    (KELLNER, 2001, p. 296).

    O que se pode observar que com grandes acontecimentos histricos, como a

    revoluo industrial e o feminismo, houve uma progresso na sociedade e esses avanos

    trouxeram grande complexidade para a sociedade. Na era da informao os sujeitos possuem

    mais acesso (com maior velocidade) a contedos que antes era de difcil contato e mesmo de

    difcil entendimento. Cada movimento, cada cultura, cada crena, cada grupo, cada um forma

    uma identidade e o mesmo sujeito est inserido em meios caractersticos desses fatores

    (igreja, por exemplo) e tem de agir como camaleo, no para fingir, mas para se adaptar de

    acordo com um dos seus eu, pode-se dizer que uma questo de sobrevivncia.

    A identidade da sociedade ps-moderna est diretamente ligada ao processo de

    globalizao. Primeiro houve uma internacionalizao de bens materiais e simblicos,

    prprios de uma sociedade, rompendo as fronteiras. Depois veio uma produo de bens de

    todos para todos em que no se sabe bem, ou mesmo no h importncia sobre quem

    produziu; no existe uma nacionalidade dos bens, mais importante a velocidade com que

    se percorre o mundo do que as posies geogrficas a partir das quais se est

    agindo(CANCLINI, 2010, p. 32).

    Como argumenta Anthony McGrew (1992), a globalizao se refere queles

    processos, atuantes numa escala global, que atravessam fronteiras nacionais,

    integrando e conectando comunidades e organizaes em novas combinaes de

    espao-tempo, tornando o mundo, em realidade e em experincia, mais

    interconectado (HALL, 2006, p. 67).

    A globalizao tem uma grande caracterstica em relao ao espao-tempo, sua

    compresso. Apesar de suas inmeras formas concretas do seu papel na sociedade atual, a

    globalizao no se firma apenas na comercializao de um produto local em contexto global.

    Com o advento da internet e sua popularizao esses dois atores (tempo e espao) expem

  • 19

    instantaneamente o efeito global em cada casa. Da msica em primeira mo para download

    aos ataques de bombas que ocorrem em Israel, tudo ao alcance de um s click e no caso da

    televiso, est ao alcance de um controle remoto. Um acontecimento local que invade os

    canais e a rede e em milsimos de segundos se propaga por todo o globo terrestre. A cada

    matria e novo click uma nova informao, uma nova cultura e o indivduo acaba por

    absorver pelo menos uma parcela daquele contedo e agrega para si novos significados e os

    constitui como parte de sua identidade.

    O que importante para nosso argumento quanto ao impacto da globalizao sobre a

    identidade que o tempo e o espao so tambm as coordenadas bsicas de todos os

    sistemas de representao. Todo meio de representao escrita, pintura, desenho,

    fotografia, simbolizao atravs da arte ou dos sistemas de telecomunicao deve

    traduzir seu objeto em dimenses espaciais e temporais (HALL, 2006, p. 70, nfase

    do autor).

    H uma preocupao em relao identidade, principalmente no que se refere a uma

    identidade nacional ou cultural, pois a globalizao acaba por apagar essas identidades e as

    torna global, generalizada, qui superficial. O que antes tinha um pblico alvo especfico,

    hoje se tornou quase que generalizado e torna a cultura homogeneizada. Foi a difuso do

    consumismo, seja como realidade, seja como sonho, que contribuiu para esse efeito de

    supermercado cultural (HALL, 2006, p. 75), onde a cultura passou a ser mediada pelo

    mercado e bombardeando os mais diversos sujeitos. E o mercado tenta atingir os sujeitos

    geralmente de forma apelativa, demonstrando que h vrias opes de consumo e todas elas

    cabem ao mesmo sujeito, exatamente por causa das suas multifacetas.

    Os fluxos culturais, entre as naes, e o consumismo global criam possibilidades de

    identidades partilhadas como consumidores para os mesmos bens, clientes

    para os mesmos servios, pblicos para as mesmas mensagens e imagens entre

    pessoas que esto bastantes distantes umas das outras no espao e no tempo.

    medida em que as culturas nacionais tornam-se mais expostas a influncias externas,

    difcil conservar as identidades culturais ou impedir que elas se tornem

    enfraquecidas atravs do bombardeamento e da infiltrao cultural (HALL, 2006, p.

    73-74, nfase do autor).

    O mais interessante, e contraditrio, que ao mesmo tempo em que a globalizao traz

    uma pluralidade identitria para o sujeito ela acaba re-forando grupos locais. A partir do

    momento em que esses grupos se sentem ameaados, reagem de forma que potencializam e

    reafirmam sua identidade como grupo. Ou seja, com a globalizao alguns tentam resgatar a

    pureza de suas identidades (tradio) e outros simplesmente so absorvidos pela

    homogeneizao cultural que resulta dessa globalizao, ambos os fatos podem acontecer

    simultaneamente no mesmo sujeito. Mais um ponto que constitui a complexa identidade

    contempornea.

  • 20

    1.2 Juventude: conceitos, vises e caractersticas

    A juventude no apenas um aspecto biolgico/fisiolgico, mas envolve tudo que est

    em volta do jovem, sua classe, crena, gosto musical, educao, raa, cultural e tantos outros

    fatores. A palavra juventude ou adolescncia tem vrios significados a depender de como

    analisada. Entre elas est a viso da biologia, da psicologia e poltica, por exemplo. Tanto a

    ideia de juventude quanto a experincia de ser jovem se traduzem, de certa forma, por um

    processo constante de mediao entre valores, hbitos, gostos, atitudes, estticas e prticas

    sociais (ROCHA; PEREIRA, 2009, p. 15).

    Baseado na teoria do desenvolvimento humano, elaborada por Jean Piaget, existe

    quatro etapas que compem esse desenvolvimento. Estes

    [...] estudos e pesquisas de Piaget demonstraram que existem formas de perceber,

    compreender e se comportar diante do mundo, prprias de cada faixa etria, isto ,

    existe uma assimilao progressiva do meio ambiente, que implica uma acomodao

    das estruturas mentais a este novo dado do mundo exterior (BOCK; FURTADO;

    TEXEIRA, 1999, p. 98).

    Esses perodos etrios so: o sensrio-motor (0 a 2 anos), pr-operatrio (2 a 7 anos),

    operaes concretas (7 a 11 ou 12 anos) e o de operaes formais (11 ou 12 anos em diante).

    No perodo sensrio-motor quando a criana passa a perceber as coisas e a se

    movimentar a partir do meio que a cerca. nesse perodo que muitas habilidades motoras so

    desenvolvidas. O pr-operatrio destaca-se pelo aparecimento da linguagem, que

    concomitantemente responsvel por influenciar o lado social, afetivo e intelectual da

    criana. A fase de operaes concretas caracteriza-se pela realizao de operaes que visam

    um objetivo (seja ele qual for) com comeo, meio e fim e que ele seja alcanado. O que

    compreende as operaes formais que nele comea a adolescncia na viso da psicologia.

    Na adolescncia, como destaca a psicologia, esse sujeito ser capaz de fazer reflexes e tentar

    equilibrar os pensamentos e a realidade. Afirma-se ainda que nesse perodo os jovens

    possuam interesses diversos e transitrios, que quando chegam idade adulta alcanam

    estabilidade.

    Biologicamente falando a adolescncia marcada pela entrada do sujeito na chamada

    puberdade, nessa fase ocorrem mudanas fsicas/hormonais no indivduo. Mas h tericos que

    no concordam com essa viso, pois afirmam que nem sempre que ocorre o rito de passagem,

    fsica, da fase infantil para adolescncia, ou mesmo da fase adolescente para adulta, significa

    que o sujeito est psicologicamente adaptado/moldado a esse estgio demarcado pela

  • 21

    maturao biolgica. como Everardo e Cludia comentam sobre o pensamento de Van

    Gennep a respeito desse assunto:

    No entanto, Van Gennep (1977) afirma que precipitado associar os ritos de

    passagem da infncia para a adolescncia aos ritos de adolescncia, j que a idade

    da puberdade fsica pode variar de sociedade para sociedade, medida que variam

    os seus estmulos sexuais. Assim, alerta Van Gennep (1977), preciso distinguir

    entre puberdade social e puberdade fsica. A puberdade fsica, biologicamente

    definida, supe, por exemplo, que uma mulher esteja madura para procriar. Mas o

    pertencimento a uma puberdade social no est condicionado, necessariamente,

    aos limites fsicos, e a mulher capaz de procriar pode compartilhar o mesmo status

    de puberdade social com outra mulher que ainda no pode procriar. O

    pertencimento puberdade social relativo e se define atravs dos valores de uma

    dada cultura. Por isso varivel, flexvel, determinada por foras coletivas e

    deslocada dos parmetros biolgicos (ROCHA; PEREIRA, 2009, p. 29, nfase do

    autor).

    Quanto multiplicidade de identidades do sujeito h uma necessidade de

    exteriorizao e reconhecimento, o que acaba gerando o surgimento de tribos e grupos para

    interao entre os sujeitos. A mobilidade entre vrios grupos pode se dar ao mesmo tempo,

    assim como tambm sua entrada e abandono, uma caracterstica observada principalmente

    entre os jovens.

    As tribos e grupos que formam as fronteiras simblicas desse fragmentado mundo

    da adolescncia contempornea apresentaram uma possibilidade de se aproximar e

    se distanciar uns dos outros por fora de empatias ou rejeies recprocas. Da

    mesma maneira, coisas, pessoas, objetos, produtos e servios, experincias sociais

    ou escolhas estticas tambm podem apresentar importantes graus de variao entre

    o prximo e o distante do mundo do adolescente. Assim, se considerarmos a

    premissa de que a juventude um fenmeno social, que as representaes sociais,

    seja na mdia ou no senso comum, sublinham seu carter mltiplo e simblico, e

    que, sobretudo, ditam os gostos, valores e padres da cultura de consumo, podemos

    afirmar que a adolescncia mais que uma palavra e que, nesse sentido, precisa ser

    observada mais de perto (ROCHA, PEREIRA, 2009, p. 35).

    Em relao ao que diz respeito palavra em si, Bourdieu (1983), relata em uma

    entrevista que a palavra juventude apenas uma forma de rotular um perodo fsico-

    psicolgico e que utilizada como meio de exercer poder, que para os adultos seria sinnimo

    de inferioridade dos jovens e que eles devem exercer poder sobre os mesmos. uma poltica

    de controle de poder, resumindo: As classificaes por idade (mas tambm por sexo, ou,

    claro, por classe...) acabam sempre por impor limites e produzir ordem onde cada um deve se

    manter em relao qual cada um deve se manter em seu lugar (BOURDIEU, 1983, p.1-2).

    O autor tambm aborda, e at mesmo mostra como justificativa para, os conflitos entre as

    geraes, as desvalorizaes e supervalorizaes de ambas as partes que so opostas entre

    elas:

  • 22

    H perodos em que a procura do novo pela qual os recm-chegados (que so

    tambm, quase sempre, os mais jovens biologicamente) empurram os j chegados

    para o passado, para o ultrapassado, para a morte social (ele est acabado) se

    intensifica e, ao mesmo tempo, as lutas entre as geraes atingem uma maior

    intensidade: so os momentos em que as trajetrias dos mais jovens e dos mais

    velhos se chocam, quando os jovens aspiram cedo demais sucesso

    (BOURDIEU, 1983, p.10, nfase do autor).

    Essas transferncias de condies no se limitam apenas ao mbito de assumir um

    novo status em relao a deixar de ser criana para assumir o posto de adolescente. Mas aos

    ritos realizados dentro desses perodos. A adolescncia por si s j caracterizada pela

    transio, instabilidade do sujeito e esse sujeito vivencia um grande percurso em ritos de

    passagens. Rito de passagem a identificao antropolgica de um mecanismo que mostra a

    sociedade e a cultura em seu desejo de controle sobre qualquer mudana que cada um dos

    seus seres, individual ou coletivamente, queira realizar em seu interior (ROCHA; PEREIRA,

    2009, p. 25).

    H ento no s uma mudana individual, mas tambm coletiva de condio, de

    grupo. Exemplos a serem vistos so as mudanas nos gostos musicais dos jovens em que

    mudam totalmente suas atitudes, ambientes de socializao, pensamentos, vestimentas e

    passam a anular qualquer outro grupo, mesmo que j tenha feito parte anteriormente.

    importante perceber que a necessidade de pertencer a um grupo est ligada diretamente ao

    controle da sociedade (pelo menos parte dela) sobre o sujeito. Essa a essncia dos ritos de

    passagem. E na adolescncia esses ritos vm fortalecer o estado de transitoriedade do

    adolescente na sociedade. O que se presencia um jovem constitudo de ambivalncias e

    fragmentaes perante uma sociedade ps-moderna.

    A ambivalncia se caracteriza pela presena de pensamentos simultneos que

    divergem entre si. Para o jovem, por exemplo, h dvida em que estgio de maturao se

    encontra, se criana ou adulto. Essa ambivalncia se sustenta justamente em descobrir-se,

    em achar-se no mundo, de identificar-se. Como visto na teoria do desenvolvimento humano, o

    adolescente comea a refletir sobre pensamentos, discursos, o meio que o redeia. nesse

    ponto que se pode explicar a rebeldia. O que de fato conclui-se que por causa dessa

    ambivalncia, entre ser criana e adulto, o jovem se encontra encurralado para escolher como

    agir, de um lado agir como criana e ser considerado imaturo e por outro agir como adulto e

    ser considerado como dono do prprio nariz. A incoerncia dos discursos os deixa

    confusos.

    Alguns especialistas falam da busca da identidade. O adolescente no sabe mais

    quem . J no apenas filho do pai e da me ou irmo ou neto, etc., comeando a

    ser amigo de uns, inimigo de outros, desejando uns, odiando outros. Enfim, um ser

  • 23

    indefinido em busca da identidade. [...] Outros informantes falaram da descoberta da

    esfera pblica, explicando que o adolescente percebe que agora algum, que pode

    acontecer para o mundo, que se fizer uma grande confuso, vai sair no jornal, afetar

    a famlia e os amigos. Ele sabe que comea a ter um lugar mais autnomo na esfera

    pblica que o difere da criana. Essas ideias marcam o rito de separao (ROCHA;

    PEREIRA, 2009, p. 38, nfase do autor).

    A fragmentao s passou a existir na cultura ps-moderna e nela, os adolescentes

    vivem em um mundo aos pedaos. Mas apesar de a fragmentao ser uma caracterstica da

    ps-modernidade a adolescncia por si tambm se caracteriza como tal, fragmentada, tendo

    em vista o quebra-cabea da vida que essa passagem representa. Existem ainda quatro

    caractersticas que compem a fragmentao na adolescncia: a fragmentao intelectual, o

    comprometimento superficial, a compatibilizao de diferena e o de mobilizao entre

    universos simblicos. Ou seja, tem-se um jovem que se v diante de inmeras disciplinas,

    cada uma ministrada por um professor especfico que acaba aprofundando o conhecimento da

    rea, vrios aprofundamentos ao mesmo tempo, por exemplo (fragmentao intelectual). Por

    ainda agrupar traos da infncia o jovem no sente a necessidade de firmar suas decises

    podendo voltar atrs e desfaz-las facilmente (comprometimento superficial). Quando se trata

    de compatibilizar diferenas, na viso dos jovens, que quanto mais coisas absorverem

    (independente das divergncias entre elas) melhor, pois o jovem julga que um dia ir us-los

    de alguma forma, para ele tudo til (compatibilizao de diferenas). (E a mobilizao entre

    universos simblicos) quanto a sua transitoriedade no h nenhum problema de o

    adolescente transitar, com grande desenvoltura, entre grupos, tribos, subculturas, ideologias

    ou ethos diversos (ROCHA; PEREIRA, 2009, p. 45, nfase do autor).

    O mundo dos jovens ainda se alicera em nove valores: afetividade, autenticidade,

    descompromisso, gregarismo, insegurana, liberdade, poder, premncia e questionamento. O

    afeto est relacionado sua fase de fragilidade, de transitoriedade em que precisam de ateno

    e carinho. A autenticidade visa, mesmo que aparentemente antagnico, a sua diferenciao

    coletiva e individual; o ser jovem e o ser singular. O descompromisso est ligado ao

    comprometimento superficial dito anteriormente. Gregarismo caracteriza-se pelo

    agrupamento do jovem a quem ele considera como melhor amigo em cada grupo que se

    encontra para se apoiar. A insegurana algo nato da adolescncia justamente pelo fato de se

    encontrar num estgio de transitoriedade, de entrada no novo. Os teens confirmam que

    necessitam de liberdade ao mesmo tempo em que sentem a necessidade de que tenha controle

    sobre os mesmos, poder sobre eles, que lhes sejam postos limites. Esse mesmo poder tambm

    tem significado de superioridade nos grupos que se encontram. A premncia est ligada a

    pressa que tem o jovem de aprender e fazer as coisas. O desejo da experincia e vontade de

  • 24

    aprender como uma busca permanente de novas respostas. O questionamento aparece como

    uma necessidade baseada em um teste dos limites no qual questionar uma forma de

    aprendizado e compreenso de valores e instituies (ROCHA; PEREIRA, 2009, p. 48).

    1.2.1 Gadgets e a gerao Z: comunicao e identidade do jovem ps-moderno

    Com a entrada das novas tecnologias, principalmente a partir de meados da dcada de

    90, a sociedade vem reinventando sua forma de agir, comunicar e ser. O boom (motivado pela

    internet) veio com os blogs, conhecidos como dirios onlines (para exposio), que abriram

    espaos para os sujeitos se expressarem. A entrada da rotulada Web 2.0 conhecida por

    proporcionar grande abertura para a interao entre os indivduos atravs de aparatos

    tecnolgicos com auxlio da internet. Essa web 2.0, alm de contar com os blogs, possui as

    chamadas redes sociais, que permitem um contato maior entre os usurios do que o blog.

    Essas plataformas digitais disponibilizaram um universo paralelo vida offline e multiplicou

    ainda mais as possibilidades de variaes de eus do sujeito.

    Gadget um termo ingls que inicialmente foi utilizado para denominar coisas/objetos

    com o sentido de bugiganga ou geringona, sem uma utilidade para as necessidades ditas

    importantes para o sujeito, era algo abaixo das prioridades do indivduo. Mas logo ganhou um

    ressignificado, como as mltiplas utilidades tecnolgicas, por exemplo.

    Dicionrios e enciclopdias criados e autorregulamentados dentro da internet, e, por

    esse motivo, legitimados por mediadores culturais produzidos pelo prprio meio,

    definem gadget como brinquedos tecnolgicos ou cool toys para adultos, ou,

    ainda, equipamentos portteis e cotidianos (ROCHA; PEREIRA, 2009, p. 59, nfase

    do autor).

    No de hoje que h uma significativa interao dos homens com as

    tecnologias/meios. Ao passo que as tecnologias avanam, consequentemente, muda-se a

    forma de mediao e interao com esses meios, trazendo ao homem uma nova forma de

    viver. O sujeito se v dependente desses aparatos e, como afirma McLuhan (2003), passam a

    tratar essas tecnologias como uma continuao do seu corpo.

    Contemplar, utilizar ou perceber uma extenso de ns mesmos sob forma

    tecnolgica implica necessariamente em adot-la. Ouvir rdio ou ler uma pgina

    impressa aceitar essas extenses de ns mesmos e sofrer o fechamento ou o

    deslocamento da percepo, que automaticamente se segue. a contnua adoo de

    nossa prpria tecnologia no uso dirio que nos coloca no papel de Narciso da

    conscincia e do adormecimento subliminar em relao s imagens de ns mesmos.

    Incorporando continuamente tecnologias, relacionando-nos a elas como

    servomecanismos. Eis por que, para utilizar esses objetos-extenses-de-ns-mesmos,

    devemos servi-los como dolos ou religies menores. Um ndio um

  • 25

    servomecanismo de sua canoa, como o vaqueiro de seu cavalo e um executivo de

    seu relgio (MCLUHAN, 2003, p. 64).

    Hoje o destaque para interao com meios digitais vai para a gerao Z. Tambm

    conhecida como gerao digital ou gerao pontocom, caracterizada, cronologicamente

    falando, pelos que nasceram no incio da dcada de 90. Por qu? Os indivduos que nasceram

    nesse perodo, onde surgiu a World Wide Web e vrios outros avanos tecnolgicos, passaram

    a ter seu primeiro contato com tecnologias sem ter uma grande bagagem e tradies sobre

    meios de comunicao primrios, apresentando uma maior facilidade de aprendizagem e

    manuseio sobre eles, so os nativos digitais. O fato no impede que pessoas de geraes

    passadas no tenham contato dirio com as tecnologias, mas gritante o destaque dos jovens

    no que diz respeito a sua relao com esses meios tecnolgicos e a internet. As caractersticas

    dessa gerao foram cunhadas pela sociologia, porm, ainda passvel de mudanas, pois

    essa uma gerao atual e que est sujeita h vrios fatores sociais, culturais, econmicos,

    etc. que podem vir a acrescentar mais caractersticas ao seu conceito.

    O Z do termo ingls zapping que foi originado a partir de uma onomatopeia zap!

    que significava o som emitido quando se faz algo rapidamente; os brasileiros at fazem uso do

    termo zappear quando se trata de mudar frequentemente os canais de televiso, assim como

    em outros meios e aparelhos em busca de novos contedos, sempre atrs de mais informao.

    como Jenkins (2009) explica mais afundo:

    Zapeadores so pessoas que constantemente mudam de canal assistindo a

    fragmentos de programas, em vez de sentar-se para um envolvimento prolongado.

    Os fiis, na verdade, assistem a menos horas de televiso por semana do que a

    populao em geral: escolhem a dedo os programas que melhor satisfazem seus

    interesses; entregam-se totalmente a eles e os gravam para poder v-los mais de uma

    vez; passam um perodo maior de seu tempo livre falando sobre os programas; e tm

    mais probabilidade de buscarem contedos em outras mdias. [...] Os casuais esto

    em algum ponto entre os fiis e zapeadores; assistem uma determinada srie quando

    se lembram dela ou quando no tm nada melhor para fazer. [...] Nenhum espectador

    exclusivamente fiel, casual ou zapeador; a maioria assiste televiso de maneiras

    diferentes, em ocasies diferentes (JENKINS, 2009, p. 109).

    O homem, independente de sua idade, deixou de ser receptor para ser produtor e

    tambm mediador. A mdia, h muito, depende at mesmo diretamente, do consumidor. Essa

    gerao digital aumentou consideravelmente a dependncia dos meios para com o espectador-

    consumidor-produtor, os quais passaram a exigir mais das mdias e de seus contedos. Foi

    como Jenkins (2009) abordou em duas falas no seu livro Cultura da Convergncia: a

    circulao de contedos por meio de diferentes sistemas miditicos, sistemas

    administrativos de mdias concorrentes e fronteiras nacionais depende fortemente da

    participao ativa dos consumidores (p. 27); e quando as pessoas assumem o controle das

  • 26

    mdias, os resultados podem ser maravilhosamente criativos; podem ser tambm uma m

    notcia para todos os envolvidos (p.43). Vemos ento o espectador tornando-se um

    consumidor com voz e poder mediante a indstria. Alm desse poder, as novas tecnologias

    trouxeram ao sujeito novas identidades (ou formas de express-las).

    Para a felicidade dos viciados em alterao de identidade, em novos comeos e

    nascimentos mltiplos, a internet oferece oportunidades negadas ou interditadas na

    vida real. A maravilhosa vantagem dos espaos da vida virtual sobre os espaos

    offline consiste na possibilidade de tornar a identidade reconhecida sem de fato

    pratic-la (BAUMAN, 2008, p. 146-147).

    Bauman (2008) defende que essas identidades virtuais so apenas mscaras, so como

    um perodo carnavalesco, que no tem a inteno de permanecer, algo totalmente efmero no

    qual o prprio sujeito determina sua durao de existncia sem necessariamente depender do

    meio, ou seja, o sujeito quem d as cartas. Carla Leito (2006) afirma em um de seus artigos

    que, principalmente os jovens, utilizam dessas identidades virtualmente como forma de

    autoconhecimento, a internet usada como cobaia para analisar, e talvez solucionar, suas

    crises de identidade e tambm como forma de se tornarem mais comunicativos. uma

    maneira de se representar de vrias formas com mais facilidade do que seria na vida offline.

    Quando as redes de comunicao eletrnica penetram no hbitat do indivduo

    consumidor, esto equipadas desde o incio com um dispositivo de segurana: a

    possibilidade de desconexo instantnea, livre de problemas e (presume-se) indolor

    de cortar a comunicao de uma forma que deixaria parte da rede desatendidas e as

    privaria de relevncia, assim como de seu poder de ser uma perturbao. esse

    dispositivo de segurana, e no a facilidade de estabelecer contato, muito menos de

    estar junto de maneira permanente, que tona esse substituto eletrnico da

    socializao face a face to estimado por homens e mulheres treinados para operar

    numa sociedade mediada pelo mercado (BAUMAN, 2008, p. 137-138).

    As plataformas digitais, mais especificamente as redes sociais, so usadas como

    playground (LEITO, 2006). Adultos e jovens utilizam o espao para divertimento, teste ou

    mesmo descarte das suas multifacetas. H uma liberdade maior para que o sujeito se expresse,

    por isso muitas vezes tratado como um espao de divertimento. Em uma entrevista realizada

    pela mesma autora notou-se que para os adultos esse mundo virtual era apenas uma vlvula de

    escape, de realizar fantasias e fugir das experincias de fracasso, por exemplo. E para os

    jovens seria uma maneira de se encontrarem, de autoconfirmao e conhecimento.

    Resumindo, para o jovem um teste para construo/definio de sua identidade e para o

    adulto uma forma de escapar das dificuldades e transtornos da vida real, mas de qualquer

    forma as duas funes acabam servindo para expressar uma ou mais identidades do sujeito e

    como forma de entretenimento.

  • 27

    Para citar Jaurguiberry mais uma vez: Na busca da auto-identificao bem-

    sucedida, os indivduos auto-manipuladores mantm uma relao bastante

    instrumental com seus interlocutores. Estes ltimos s so admitidos para certificar a

    existncia do manipulador ou, mais exatamente, para permitir que os

    manipuladores faam seus eus virtuais carem na realidade. Os outros so

    procurados com o nico propsito de atestar, estimular e bajular os eus virtuais dos

    internautas (BAUMAN, 2008, p. 148).

    H uma semelhana sobre a construo e afirmao das mltiplas identidades do

    sujeito entre o mundo virtual e o real, ambos necessitam do outro para que a identidade de

    fato se concretize, por mais que no mundo virtual o sujeito no tenha obrigatoriamente que

    provar que a identidade que ele est transmitindo seja verdadeira. Mas perante a uma nova

    gerao e uma nova sociedade ser mesmo que o virtual (com grande sociabilidade entre os

    sujeitos, como defendem alguns autores) pode ser considerado uma farsa? O meio virtual por

    no ser palpvel deve ser tratado como mentiroso/irreal? Se for feita uma ligao a partir do

    sujeito sociolgico, como Hall (2006) j afirmava, ser visto que o mundo virtual passou a

    fazer parte da vida do sujeito, o sujeito o incorporou, mas que, no que ele chama de sujeito

    moderno, alm da ressignificao h um conjunto de eus e a internet apenas mais uma

    forma de express-los; ou seja, atualmente tem-se um sujeito que incorpora o meio, mas essa

    incorporao no o deixa estvel (com comeo, meio e fim), pelo contrrio, movimenta ainda

    mais o fluxo de identidades e ritos de passagens. Tal analogia no elimina a possibilidade da

    farsa, mas abre espao para que ambas aconteam. Como afirma Gonalves:

    Ora, no o virtual que instabiliza as identidades em um mundo de identidades at

    ento estveis. Pelo contrrio, o tema da identidade fraca, mutante, tema de nossa

    poca que j estava presente antes que se comeasse a falar de internet. Podemos

    mesmo imaginar que essa mobilidade pertence prpria essncia da identidade.

    Uma identidade imvel seria uma priso ou um delrio paranico (GONALVES,

    2006, p. 97).

    Existe a viso negativa e a viso positiva sobre a interao do homem e o meio

    tecnolgico. Uma afirma que o relacionamento/interao baseado em insegurana,

    superficialidade e fragilidade. Autores como Sennett (1998 apud COSTA, 2006, p.54) aborda

    que essa nova interao colocou um ponto final no longo prazo e que as relaes

    interpessoais se tornaram efmeras e volveis, prejudicando assim a sociabilidade dos sujeitos

    e sua confiana no outro; e Bauman (2008) fortalece, porm no to drasticamente quanto

    Sennett (1998 apud COSTA, 2006, p. 54), que essa nova sociedade que baseia sua

    sociabilidade por meio eletrnico quebra os laos sociais, das comunidades e das parcerias.

    Enquanto outros autores defendem justamente o oposto, corroborando para positividade como

    fortalecimento de laos interpessoais (intensos e permanentes) podendo ser at mesmo slidos

    e solidrios, como afirma Turkle e Nicolaci-da-Costa (COSTA, 2006).

  • 28

    H, por exemplo, movimentos sociais idealizados e iniciados atravs das redes sociais,

    aes que passaram a ser chamadas de ciberativismo. O espao abre um leque de alcance,

    muitas vezes incalculvel, e no se limita apenas ao ciberespao. O exemplo mais recente no

    Brasil, no incio de junho de 2013, foi o movimento denominado com frases como o gigante

    acordou, vem pra rua e vers que um filho teu no foge luta (tambm mobilizou

    brasileiros e estrangeiros em outros pases) que tinham como objetivo protestar contra o

    aumento das passagens de nibus, o superfaturamento da FIFA com a copa de mundo de

    futebol, reivindicando assim investimento na sade, educao e segurana, e contra o projeto

    de lei denominado PEC37 e a corrupo.

    Segundo pesquisa realizada pelo IBOPE2, 43% dos manifestantes era composto por

    jovens entre 14 e 24 anos, 49% tinham colegial completo ou ensino superior iniciado, 30%

    tinham renda familiar acima de 2 at 5 salrios mnimos. O que refora a ideia de que o ambiente

    virtual ajuda a reforar a sociabilidade e solidariedade o dado que revela como os

    envolvidos tomaram conhecimento do manifesto3. As redes sociais foram usadas por 75% deles

    para convocao de outras pessoas para as manifestaes.

    Foi posto at aqui que a juventude tem por si s uma caracterstica de transitoriedade e

    essa fortalecida pela identidade complexa e varivel do sujeito ps-moderno, que por sua

    vez ganha ainda mais intensidade no mundo virtual como consequncia dos avanos

    tecnolgicos e suas influncias no mbito sociocultural e comunicacional do mesmo. A

    globalizao umas das grandes responsveis pelas mudanas territoriais, culturais,

    econmicas e na comunicao de nova sociedade. Tendo em vista esse jovem e sua identidade

    na ps-modernidade cabe estud-lo inserido na sociedade de massa, analisando assim a

    influncia na sua cultura, comunicao e consumo. Tudo isso tambm mediante a um jovem

    que compe uma classe social com novo perfil no Brasil, a classe C, mais conhecida como

    nova classe mdia.

    2 Instituto Brasileiro de Opinio e Estatstica.

    3 Disponvel em: . Acesso em: 28 jun. 2013.

    http://g1.globo.com/brasil/linha-tempo-manifestacoes-2013/platb/

  • 29

    2 SOCIEDADE, CONSUMO E MASSA: O SURGIMENTO E

    TRANSFORMAO DO SUJEITO CONSUMIDOR

    2.1 Consumo e sociedade: sua histria e caractersticas

    O consumo no apenas por um simples fato racional e econmico, o ambiente que o

    sujeito se encontra somado racionalidade, economia e a signos. Pode-se ainda afirmar que

    o consumo se d a partir do suprimento de necessidades, de fato, mas essas necessidades

    tambm so relativas. Consumir sempre esteve e estar presente na rotina do homem como

    fora motriz para sua sobrevivncia e desenvolvimento.

    [...] o consumo uma condio e um aspecto, permanente e irremovvel, sem limites

    temporais ou histricos; um elemento inseparvel da sobrevivncia biolgica que

    ns humanos compartilhamos com todos os outros organismos vivos. Visto dessa

    maneira, o fenmeno do consumo tem razes mais antigas quanto os seres vivos e

    com toda certeza parte permanente e integral de todas as formas de vida

    conhecidas a partir de narrativas histricas e relatos etnogrficos (BAUMAN, 2008,

    p. 37).

    Nessa viso cr-se no consumo como fator biolgico, afirmado por Bauman (2008),

    como caracterstica vital e permanente no homem; acontecimento presente desde os

    primrdios do homem como, por exemplo, sair caa, praticar escambo de mercadorias, at a

    venda e compra de produtos a partir da utilizao de capital. Para se chegar at a

    complexidade do que o consumo considerado hoje necessrio analisar os fatos histricos

    ocorridos h alguns sculos, mas j bem frente desse homem paleoltico.

    McCracken (2010), fala sobre uma revoluo do consumo presenciada no Ocidente

    como consequncia da revoluo industrial. Essa revoluo se tornou responsvel por

    mudanas nos mbitos sobre espao, tempo, sociedade, famlia e indivduo. O autor divide a

    histria do consumo em trs momentos que aconteceram nos sculos XVII, XVIII e do XIX

    at ento.

    A revoluo do consumo comea ao final do sculo XVI e incio do XVII na

    Inglaterra. Nesse perodo houve um boom no consumo ocasionado pela monarquia e os

    nobres, em menor escala. O primeiro pelo fato de buscar um meio de governar atravs do luxo

    em seu vesturio, palcios, objetos de decorao, hospitalidade e refeies, entre outros. O

    consumo de tais coisas traria ao governo um misticismo de superioridade, tratado em certo

    momento como divindade. O segundo ficou por conta dos nobres, esses motivados pela

    posio social onde competiam entre si para se destacarem perante toda sociedade e serem

    lembrados pela monarquia, McCracken (2010) os denomina como buscadores-de-status.

  • 30

    O ento consumo, que realizado principalmente pela monarquia, seria o chamado

    consumo de ostentao, com inteno direta de transmitir atravs de suas posses o poder

    que possuam como governo. As compras eram feitas pelos vivos, mas a unidade de

    consumo inclua os mortos e os ainda no nascidos (MCCRACKEN, 2010, p. 32). A

    simbologia desses objetos e os valores agregados faziam parte de toda uma consequncia dos

    antepassados e uma herana para as futuras geraes.

    Aquilo que homens e mulheres uma vez esperaram herdar de seus pais, agora tinham

    a expectativa de comprar por si mesmos. Aquilo que uma vez foi comprado sob os

    ditames da necessidade, agora era comprado sob os ditames da moda. [...] Como

    resultado, as luxrias passaram a ser vistas como meros bons costumes, e os

    bons costumes passaram a ser vistos como necessidades. Mesmo as

    necessidades sofreram uma dramtica metamorfose em estilo, variedade e

    disponibilidade (MCKENDRICK apud MCCRACKEN, 2010, p.37).

    No sculo XVIII percebe-se uma participao mais ativa de outras camadas da

    populao em relao ao consumo, a monarquia passou a dividir ainda mais sua participao

    no mercado consumidor. Houve uma nova viso por parte dos homens e mulheres em que no

    se viam mais obrigados a esperar pelos avs e pais para herdarem algum objeto e um valor

    simblico a eles agregados, pois poderiam adquiri-los no mesmo instante diretamente do

    mercado. Foi essa disponibilidade no mercado que gerou o aumento do consumo de outras

    partes da sociedade. Nesse perodo presencia-se o nascimento da hoje to conhecida

    sociedade de consumo, justamente motivada pela competio social. Sendo assim, entende-

    se que o comportamento social deveras se transforma(va) em consumo levando ao indivduo a

    submeter-se cada vez mais ao papel de sujeito consumidor. O espao e o tempo sofreram uma

    reconfigurao para adaptar-se ao consumo o levando para o centro das atividades da

    sociedade e seus interesses pessoais.

    O sculo XIX no presenciou nenhuma exploso do consumo como visto no sculo

    anterior, porque, a partir de ento, o consumo passou a ser tratado pela relao direta com as

    mudanas sociais; caracterizando-se pela permanente transformao do Ocidente. Neste

    mesmo sculo pode-se presenciar o surgimento de novos estilos de vida de consumo. Uma

    variedade ainda maior de significados passou a ser agregado aos bens de consumo. O mercado

    inseriu novas estratgias de marketing para agregar valor ao produto utilizando-se da cultura,

    da esttica e outras fontes para direcionar sua venda para os novos consumidores. O consumo

    pblico passou a ser mais valorizado que o privado.

    Na sociedade moderna, segundo Bauman (2008), a sociedade de consumo est

    embasada na afirmativa que promete satisfazer/saciar os desejos do indivduo, de forma

    nunca antes vista em outras sociedades. Esse discurso move o indivduo ao ponto de almejar

  • 31

    consumir outras coisas logo aps ser saciado. H na verdade um crculo vicioso no consumo

    moderno, um prazo de validade tanto do produto ou servio como do desejo; a curiosidade

    pelo novo (novo produto, novo desejo, uma nova forma de ser feliz) o que passa a

    mover o sujeito. A prpria indstria trata de gerar novas necessidades no consumidor para que

    haja fluxo na comercializao de bens; diferente do sculo XVII que visava um consumo de

    ostentao e permanncia dos mesmos nas geraes futuras. A modernidade-lquida, assim

    chamada pelo mesmo autor, vive uma cultura agorista ou tempo pontilhista. Essas formas

    de viver transformaram o significado de tempo, onde passou a ser alinear e feito de

    instantes eternos, a sensao do agora ou nunca. Essa nova cultura em volta do tempo traz

    consigo a efemeridade, a substituio, o descarte dos produtos em um curto intervalo de

    tempo.

    Baudrillard afirma que o lugar do consumo o cotidiano, onde

    [...] todas as atividades se encadeiam do mesmo modo combinatrio, em que o canal

    das satisfaes se encontra previamente traado, [...] o envolvimento total,

    inteiramente climatizado, organizado, culturalizado (BAUDRILLARD, 1995, p. 19).

    Na sociedade de consumo h uma dependncia do objeto, de t-lo e descart-lo logo

    aps ter atingido o prazo de validade, mesmo que no se trate de algo perecvel. Os bens

    passaram a ser cada vez mais efmeros, consequentemente houve uma produo de novos

    bens e criao de novas necessidades. O objeto no mais vendido apenas como algo

    material, mas com os significados a ele agregado e que muda de sujeito para sujeito.

    O consumo claramente um conjunto de relaes feitas entre a sociedade de

    produtores (mercado, mdia), o bem e o consumidor. Esses bens de consumo sugerem

    significados que vo alm de sua caracterstica utilitria e valor comercial. Canclini (2010,

    p.65) sugere que essas vrias e constantes necessidades so sujeitadas a partir das frequentes

    mudanas tecnolgicas, da extensiva e intensa comunicao entre os sujeitos, do design dos

    objetos que acabaram por desestabilizar a identidade do sujeito antes acostumado a se

    apoiarem em bens exclusivos e sem tanta rotatividade, ou seja totalmente atrelado ao viver

    social atual. O contato com essas variveis constantes acarretam assim no fluxo de desejos

    gerando essa demanda por outros bens. O significado desses bens est atrelado ao mundo

    social. O autor segue em uma corrente de pensamento sobre o consumo em que afirma que o

    ato de consumir est diretamente ligado ao ato de pensar e principalmente que no h o

    manipulador, dono da razo (mdia e mercado) e o manipulado o passivo (consumidor), o que

    h, no mximo, uma tentativa de manipulao da escolha do consumidor. O que acontece

    uma interao entre mercadoria e consumidor no mbito racional e simblico.

  • 32

    Consumir tornar mais inteligvel um mundo onde o slido se evapora. Por isso,

    alm de serem teis para a expanso do mercado e a reproduo da fora de

    trabalho, para nos distinguirmos dos demais e nos comunicarmos com eles, como

    afirmam Douglas e Isherwood, as mercadorias servem para pensar (CANCLINI,

    2010, p. 65).

    Dessa forma, o consumo serve at para organizar as sociedades politicamente. O

    consumo um processo em que os desejos se transformam em demandas e em atos

    socialmente regulados (CANCLINI, 2010, p. 65). Os ritos de pertencimento dentro de uma

    sociedade acabam por caracteriz-la e orden-la, traz uma identidade e esta identidade est

    diretamente ligada ao consumo coletivo do grupo.

    A viso de Canclini (2010) sobre o sistema do consumo e dos significados dos bens

    em um sentido no apocalptico e no manipulador reforada quando o mesmo diz que os

    objetos passam por um processo em que primeiro so candidatos a mercadoria, depois

    passam a ser um produto propriamente mercantil e ao serem adquiridos por um consumidor

    podem perder essa caracterstica e ganhar outra (2010, p. 71). Ou seja, no est

    exclusivamente no poder do mercado e mdia a escolha do que, o que e como o consumidor

    deve adquirir bens de consumo.

    McCracken (2010) esclarece de forma mais detalhada esse processo de consumo,

    desde o produtor at o consumidor e as transferncias de significados. O primeiro passo

    dado pela empresa (e o departamento de marketing) juntamente com a agncia de publicidade,

    que ter como objetivo agregar significados contidos no mundo cultural sua comunicao

    (seja o anncio online, outdoor, comercial televisivo ou no YouTube e etc) para divulgao do

    bem de consumo especificado. Ao chegar ao mercado o bem de consumo dever ser

    decodificado (pelo menos espera-se) pelo espectador. O espectador ser responsvel pela

    autoria final do significado do bem.

    A propaganda um tipo de canal atravs do qual o significado est constantemente

    fluindo, em seu movimento do mundo culturalmente constitudo para os bens de

    consumo. Atravs do anncio, bem antigos e novos esto constantemente

    destituindo-se de velhos significados e assimilando outros. Como participantes

    ativos neste processo, somos mantidos informados do atual estado e estoque de

    significado cultural presentes nos bens de consumo. Nesta medida, a propaganda

    funciona para ns como lxico dos significados culturais correntes (MCCRACKEN,

    2010, p. 109).

    Os levantamentos feitos pelos autores em perodos histricos diferentes confirmam

    que cada sujeito consome a partir de fatores externos e seus signos com o intuito de se

    assemelhar e diferenciar dentro de grupos e sociedades. A modernidade, como consequncia

    das revolues industrial e do consumo, trouxe uma complexidade para a identidade e

  • 33

    concomitantemente para a sociabilidade desse sujeito moderno. Atrelando assim a forma de

    consumir bens e significados ao seu meio sociocultural.

    O consumo , portanto, o sistema que classifica bens e identidades, coisas e pessoas,

    diferenas e semelhanas na vida social contempornea. Por isso podemos dizer que

    os produtos e servios falam entre si, falam conosco e falam sobre ns (ROCHA,

    2006, p.31).

    A contemporaneidade ganha uma nova forma de consumir perante o cenrio da web

    2.0 e da convergncia miditica. Trazendo consigo novos vieses de significaes e

    ressignicaes constituindo uma nova identidade no sujeito.

    2.1.2 Web 2.0, convergncia miditica e consumo

    Como visto no captulo anterior, e no incio deste, a evoluo tecnolgica acarretou

    em mudanas de mbito sociocultural e comunicacional do sujeito. Com o advento da internet

    e sua popularizao a partir da dcada de 90 o sujeito ganhou uma nova funo, a de

    internauta. Sua sociabilidade dentro do ciberespao. A ento denominada Web 2.0

    caracterizada pelo uso de internet na viso mais comunicacional. onde nascem as redes

    sociais. O sujeito agora dispe de um espao paralelo ao mundo real para viver suas

    identidades, e consequentemente um novo mundo para exercer o consumo, seja de

    produtos, servios ou cultural (bem simblico).

    Essa popularizao de acesso internet deu incio inteligncia coletiva. Essa

    inteligncia foi originada no dado momento em que o sujeito passou a ter acesso a vrias

    informaes, e, por no ter capacidade de saber e acumular tudo passou a absorver e

    compartilhar informaes atravs de grupos. Essa coletividade hoje ganhou fora e pode ser

    tratada como uma fonte alternativa de poder miditico (JENKINS, 2009, p. 28). Essa

    inteligncia coletiva uma caracterstica da convergncia miditica que trouxe mudanas

    tambm para a indstria miditica.

    Por convergncia, refiro-me ao fluxo de contedos atravs de mltiplos suportes

    miditicos, cooperao entre mltiplos mercados miditicos e ao comportamento

    migratrio dos pblicos dos meios de comunicao, que vo a quase qualquer

    parte em busca das experincias de entretenimento que desejam (JENKINS, 2009, p. 27).

    A Internet, no apenas utilizada via computador, mas atravs de meios portteis, como

    smartphones e tablets, uma das fontes que mais consegue representar, ou melhor, transmitir

    a convergncia miditica. Os meios de comunicao passaram a se interligar, se fortalecer. Ao

  • 34

    contrrio do que se afirmava no pensamento apocalptico em que o rdio substituiria o jornal,

    a televiso o rdio e que a internet por sua vez substituiria a televiso; o que presenciado

    um fortalecimento dessas mdias atravs da convergncia miditica. A convergncia altera a

    relao entre tecnologias existentes, indstrias, mercados, gneros e pblicos. A convergncia

    altera a lgica pela qual a indstria miditica opera e pela qual os consumidores processam a

    notcia e o entretenimento (JENKINS, 2009, p.41).

    A sociabilidade do sujeito vem sofrendo influncia das redes sociais e sua nova forma

    de conectar um ao outro. Redes sociais so plataformas digitais que permitem que os seus

    usurios compartilhem contedos com outros usurios atravs da web. Nesse espao, assim

    como no espao offline, busca-se um feedback de seus contedos partilhados para justamente

    reforar a ideia do outro no s como destinatrio, mas como confirmador/autenticador da

    mensagem. Seguindo a lgica das nomenclaturas, o perfil de uma rede social tem o objetivo

    de descrever o usurio a partir de uma srie de dados pessoais.

    A cada dia essas redes buscam pessoalidade, empatia, para se tornar quase que um

    outro humano ou o mais perto que possa chegar disso. Esse objetivo claramente

    observado a partir das frases inseridas na caixa de publicao de status do Facebook e do

    Twitter, por exemplo. Tais redes, que j tiveram vrias perguntas em sua caixa de dilogo,

    hoje se utilizam das frases No que voc est pensando? (figura 1) e O que est

    acontecendo? (figura 2), respectivamente.

    Figura 1: Caixa de dilogo do Facebook. Fonte: www.facebook.com, jun. de 2013.

    Figura 2: Caixa de dilogo do Twitter. Fonte: www.twitter.com, jun. de 2013.

  • 35

    O novo pendor pela confisso pblica no pode ser explicado por fatores

    especficos da idade no s por eles. Eugne Enriquez resumiu a mensagem que

    se pode extrair das crescentes evidncias coletadas em todos os setores do mundo

    lquido-moderno dos consumidores: Desde que no esquea que o que antes era

    invisvel a parcela de intimidade, a vida interior de cada pessoa- agora deve ser

    exposto no palco pblico (principalmente nas telas de TV, mas tambm na ribalta

    literria), vai-se compreender que aqueles que zelam por sua invisibilidade tendem a

    ser rejeitados, colocados de lado ou considerados suspeitos de um crime. A nudez

    fsica, social e psquica est na ordem do dia (ENRIQUEZ, 2004, p. 49 apud

    BAUMAN, 2008, p. 9).

    comum encontrar no perfil da rede social do internauta uma srie de

    compartilhamentos sobre os mais diversos mbitos de sua vida pessoal e sobre sua vida como

    um coletivo, como uma sociedade. Mais que um confessionrio pode-se dizer que essas redes

    viraram um div online. O que pode ser compreendido que as pessoas a cada dia sentem

    menos medo de se expor intimamente em algo de um alcance sem tamanho. Tais aes podem

    ser justificadas com a afirmao de Gonalves: A tela no interface sem ser ao mesmo

    tempo escudo. O computador torna mais rpido, indolor e gil o ato de consumir pessoas

    (GONALVES, 2005, p. 100). As pessoas usam da interface virtual como meio para se

    expressarem, se comunicarem e principalmente para serem reconhecidos, porm, s vezes,

    esses atos no medem ou conseguem calcular as consequncias geradas.

    2.2 O grande pblico: A massa, sua cultura e seu papel na indstria

    A massa est diretamente ligada ao surgimento da sociedade de consumo, que por

    sua vez est ligada cultura de massa. Dentro dessa sociedade de massa encontramos

    caractersticas advindas da revoluo industrial, como a produo em grande escala. A

    concentrao populacional nos espaos, caracterizados pela urbanizao e industrializao,

    leva inevitavelmente a pensar na massificao (FERREIRA, 2010, p. 101). Eis a sociedade

    moderna, marcada a partir do sculo XIX. Nesse contexto tambm visto a indstria cultural

    transformando o artista/autor em produtor, onde sua arte ganha produo em srie visando

    chegar a um grande pblico com um denominador em comum para gerar o mximo de

    consumo.

    O sincretismo a melhor forma de descrever o modo que se concretiza a cultura de

    massa, ou seja, atravs da homogeneizao de contedos na criao de um

    produto/informao voltado para um pblico mais universalizado, que prope satisfaz-los em

    maior nmero possvel. Nessa linha na indstria cultural que as barreiras entre classes,

    idade, gnero, crenas e etc. sero derrubadas fazendo com que os sujeitos sejam tratados

  • 36

    como iguais, pelo menos no que diz respeito a consumir aquele produto ou contedo

    produzido pela indstria cultural (o operrio e o patro com acesso ao mesmo canal de

    televiso, por exemplo).

    Desse modo, massa deve deixar de significar adiante anonimato, passividade e

    conformismo. A cultura de massa a primeira a possibilitar a comunicao entre os

    diferentes estratos da sociedade. E dado que impossvel uma sociedade que chegue

    a uma completa unidade cultural, ento o importante que haja circulao. E quando

    existiu maior circulao cultural que na sociedade de massa? Enquanto o livro

    manteve e at reforou durante muito tempo a segregao cultural entre as classes,

    foi o jornal que comeou a possibilitar o fluxo e o cinema e o rdio que

    intensificaram o encontro (BARBERO, 2001, p. 70-71, nfase do autor).

    Jornal, rdio e o cinema foram os primeiros meios pelos quais a cultura de massa fez

    uso para propagar seus contedos. Esses meios de comunicao em massa ou mass media

    trouxeram uma nova forma de se comunicar e de consumir. Como afirma Morin (2002:40),

    as fronteiras culturais so abolidas no mercado comum das mass media. Na verdade as

    estratificaes so reconstitudas no interior da nova cultura. Hoje, a televiso e a internet,

    junto aos seus equipamentos (computador, tablets e celulares), fazem parte dessa nova forma

    de comunicao entre mdia/indstria/mercado e espectador/consumidor/massa.

    Barbero (2001) ressalta a necessidade da mdia de educar a massa para que ela

    consuma. Uma dessas educaes vem a partir da publicidade, atravs dela a mdia se utiliza

    de artifcios para encantar o consumidor, como visto anteriormente no processo de produo e

    transferncia de significados originados em uma campanha publicitria.

    A cultura de massa trouxe a comercializao da felicidade. Morin (2002) diz que a

    busca e o estar feliz est inserido na prpria ideia de viver. Para cada civilizao a

    felicidade possui um significado diferente. Na cultura de massa a felicidade projetiva e

    identificativa, ou seja, uma projeo imaginria ao mesmo tempo em que uma ideia

    vivida/buscada pelo sujeito para que prove, se deleite desse sentimento. O autor chega a

    afirmar que a felicidade a religio do sujeito moderno, que uma ideologia da cultura de

    massa. Assim se justifica as motivaes para a sociedade de produtores criarem bens que

    atrelem e supram esse sentimento de felicidade para a sociedade de consumidores nessa

    sociedade moderna.

    A juventude passa a ganhar destaque na cultura de massa. Esse destaque se deve,

    afirma Morin (2002), a nova estrutura familiar, onde os pais perderam parte de sua autoridade,

    o afeto, visto especialmente que as mes foram inseridas no mercado de trabalho. A velhice

    no mais era tratada como sinnimo de experincia e sim de atraso. Eram esses jovens que

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    passaram a se alistar no exercito e defender seu pas, esse jovem que possua virilidade

    invejvel, esse jovem que passou a movimentar a sociedade.

    Todo impulso juvenil corresponde a uma acelerao da Histria: porm, mais

    amplamente, numa sociedade em rpida evoluo, e sobretudo, numa civilizao em

    transformao acelerada como a nossa, o essencial no mais a experincia

    acumulada, mas a adeso ao movimento (MORIN, 2002, p. 147, nfase do autor).

    Nesse discurso de juventude a cultura de massa expressa um novo modelo de homem,

    aquele que busca sua realizao a partir do bem-estar, do amor, da felicidade e que no quer

    envelhecer para que consiga aproveitar ao mximo o presente, a sua jovialidade e toda a sua

    bonana.

    A relao do meio de comunicao com a massa foi analisada por alguns vieses ao

    longo dos anos, nas quais se pode constatar a mudana na viso sobre o homem-massa. As

    teorias mais famosas so a da agulha hipodrmica e a teoria crtica. A primeira, tambm

    conhecida como teoria da bala mgica, argumenta que quando os espectadores, assim como

    o tecido do corpo humano, so confrontados com alguma informao eles absorvem por

    completo o que lhes fornecido de forma passiva, assim como o tecido humano recebe toda

    substncia da agulha. A segunda, que tem Adorno e Horkheimer como uns dos seus

    defensores, afirma que a sociedade moderna sofre tamanha influncia da mass media que tem

    sua imaginao atrofiada ao ponto de consumir o que lhes posto sem contestar e que os

    significados transmitidos