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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
Curso: Docência do Ensino Superior
A Música Aplicada à Educação - A importância da Educação Musical nos cursos de Licenciatura do
Ensino Básico
Por: Nilson Roberto Teixeira Ribeiro
Orientadora Professora Geni Lima
Rio de Janeiro 2010
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
Curso: Docência do Ensino Superior
A Música Aplicada à Educação - A importância da Educação Musical nos cursos de Licenciatura do
Ensino Básico
Apresentação de monografia à Universidade
Candido Mendes como requisito parcial para
obtenção do grau de especialista em Docência do
Ensino Superior. Por: Nilson Roberto Teixeira
Ribeiro – matrícula: C206024
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AGRADECIMENTOS
A professora Geni Lima da UCAM, pelo apreço e carinho. E em especial a paciência e atenção de Maria Helena
J. Bernardo.
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DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho à minha mãe Jocebe e tia Joana
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RESUMO
Essa monografia discute a importância da educação musical na
formação do professor do ensino básico e justifica a sua inclusão como
disciplina nos cursos de licenciatura, baseada em diferentes referenciais
teóricos.
O estudo apresenta experiências de diversas correntes da educação,
através de uma narrativa histórica, pedagógica e musical. Exibe fatos,
comentários, atividades e conceituações que norteiam o tema. No decorrer do
documento, vários exemplos são citados com a intenção de clarificar e ampliar
a visão sobre as questões da linguagem musical assim como a sua importância
na educação e na formação do professor. Sua finalidade é colaborar para o
aperfeiçoamento do processo de aprendizagem e servir como instrumento de
reflexão e questionamento.
Para concluir o trabalho são apresentadas leis e diretrizes de modo a
endossar a pertinência do tema tratado. São sugeridas algumas propostas da
pedagogia musical, que por suas características, dinâmicas e plasticidades,
podem ser vivenciadas e experimentadas tanto por alunos quanto por
professores.
Portanto, implantar a disciplina de educação musical nos cursos de
licenciatura, contribui certamente para o preenchimento de uma lacuna
verificada no campo da educação escolar. Trata-se de uma importante
estratégia para a formação mais ampliada do docente e qualificação do ensino.
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METODOLOGIA
Pesquisa bibliográfica em livros e manuais de música, educação e crítica
musical, entre outros. Foram pesquisadas também as legislações
concernentes à área da educação do ensino básico. Os eixos que
nortearam a pesquisa incluem: análise de fatos culturais, conceitos e
preconceitos da educação musical, a estimulação musical da criança,
diretrizes curriculares, estratégias pedagógicas e conteúdos disciplinares.
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SUMÁRIO Introdução......................................................................................... 8 Capítulo I - Aspectos relevantes da linguagem musical
1.1 – Breve histórico sobre a origem da música.......... 10 1.2 – A multiplicidade da linguagem dos sons.............. 13
Capítulo II - A Educação Musical na Formação do Professor do Ensino Básico
2.1 - Questões da aprendizagem musical................... 16 2.2 - A importância da educação musical na formação do professor............................................................................... 20
Capítulo III - A educação musical como estratégia pedagógica de aprendizagem e comunicação
3.1 – As Diretrizes Curriculares...................................... 22 3.2 – Estratégias Pedagógicas........................................ 28
Conclusão........................................................................................... 30 Bibliografia......................................................................................... 32
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INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como objetivo abordar a importância da
disciplina de Educação Musical no Ensino Superior para a formação de
professores do Ensino Básico, no sentido de construir reflexões sobre
possibilidades de utilização da música como "ferramenta" mediadora da
comunicação entre professor-aluno além de contribuir para a qualificação do
processo ensino-aprendizagem.
Ao identificar as dificuldades que os professores do Ensino Básico
possuem na utilização da música como recurso para as suas atividades
pedagógicas, percebe-se a necessidade e importância da inclusão da
linguagem musical como disciplina para compor essa lacuna em sua formação.
A literatura confirma que a música aplicada criteriosamente à educação,
possibilita o desenvolvimento mais harmonioso do processo educacional,
instrumentaliza a cultura geral do professor e aperfeiçoa sua prática
profissional.
É importante que o professor tenha acesso a conteúdos pertinentes à
educação musical, reconheça quais são os elementos que formam a sua teoria
e gramática; e quais os procedimentos para interagir com as atividades do seu
campo de saber.
Esse trabalho se justifica ainda pelo fato de que a linguagem musical
possui dinâmicas lúdicas e estéticas que beneficiam o desenvolvimento
cognitivo, o raciocínio lógico e a sensibilidade do aluno. Ao promover
afetividade, criatividade, comunicação e cidadania, a música abarca diferentes
áreas do ensino, traduzindo-se em importante recurso multidisciplinar.
Por tratar-se de uma linguagem universal e por atravessar diversos
campos de conhecimento, como por exemplo: a matemática, a literatura, a
história, as ciências biológicas, etc...; a educação musical pode enriquecer o
conteúdo de qualquer disciplina, através da articulação, comunicação e
sensibilização desses conteúdos no processo ensino-aprendizagem.
Segundo a Lei de Diretrizes e Bases 9394/1996 em seu artigo 43, uma
das finalidades do ensino superior é estimular a criação e difusão da cultura.
No tocante a formação do professor do ensino básico, fica evidente a
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necessidade de promoção do seu aperfeiçoamento na área da música aplicada
à educação. Como destaca a lei 11.769 de 2008, ao tornar-se obrigatório o
ensino da música na educação básica, torna-se também necessária uma
estratégia pedagógica para formação de professores na inclusão do "fazer"
musical.
Dessa forma, o presente estudo visa contribuir para a inclusão da
música aplicada à educação nos cursos de licenciatura como estratégia de
aperfeiçoamento do ensino e qualificação docente. Objetiva ainda sensibilizar o
professor quanto ao uso da linguagem musical na sua prática docente,
possibilitar a articulação de conteúdos específicos às vivências e fatos culturais
contemporâneos, ampliando a apreciação do universo da música.
O trabalho está organizado em três capítulos. O primeiro capítulo aborda
aspectos relevantes da linguagem musical no seu processo histórico-cultural e
biológico. O segundo capítulo discute questões pertinentes à aprendizagem
musical, aprofundando a análise sobre a importância da música na formação
docente. O 3º capítulo, encerrando o referido trabalho, destaca as diretrizes e
parâmetros curriculares, e apresenta estratégias para utilização da música em
diferentes disciplinas no campo da educação básica.
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Capítulo I
Aspectos relevantes da linguagem musical
1.1 Breve histórico sobre a origem da música
Em toda a história da civilização, encontramos a arte como um
instrumento mediador de cultura e socialização, influenciando hábitos,
costumes, crenças e valores. Através das manifestações artísticas, o homem
interpreta o mundo, transforma princípios e constrói idéias.
Segundo Fisher (1983), o homem passou a desenvolver seu potencial
de expressão através da arte, na medida em que a sua fala evoluiu e suas
mãos tornaram-se mais articuladas. A sua consciência passou a elaborar e
aprimorar ações e sistemas de comunicação, elevando-o de um estado de
fragmentação para um estado de ser íntegro total. Ela o capacitou a
compreender, suportar e transformar a realidade.
" A arte era um instrumento mágico e servia para o homem no
domínio da natureza e desenvolvimento das relações sociais"
(Fisher,1983:44)
Ao imitar os sons da natureza, o homem buscava comunicar-se com o
extraordinário, o mágico e o divino; já ao reproduzir os sons dos animais, uma
estratégia para abater com mais facilidade a presa.
O homem primitivo encontrou na arte, um meio de tradução de seus
conhecimentos, melhoria de suas atividades coletivas e aperfeiçoamento do
seu processo de trabalho. Neste momento, ele adquire poder sobre os objetos,
descobre instrumentos que vão facilitar a sua vida diária e garantir sua
sobrevivência. "A arte, ela própria é uma realidade social" ( Fisher, 1983: 57).
A música primitiva era essencialmente rítmica e monótona, mobilizava o
corpo e o psiquismo, além de promover momentos socializadores e coletivos. A
música não tinha função recreativa, de beleza e contemplação estética. Mário
de Andrade (1977) destaca que a música, dentre as artes, foi a que mais
tardiamente se caracterizou, porque na estética da música, exige-se
organização de sons, escalas, construção de instrumentos, técnicas de
execução, etc...
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" A música primitiva tinha uma função de comunicação mágico-
social, para afastar demônios e espíritos, e, portanto, quanto mais
horrível e feio o som, maior o seu poder de afastar as forças do
mal. O homem primitivo buscava o som feio, assustador,
simbilante, estrondante, e isso o impedia de busca de beleza
estética" (Andrade,1977:20)
No que diz respeito ao uso da palavra, a música primitiva não tinha
interesse em sons fixos, portanto, não havia preocupação com entonações ou
afinações. A fala era basicamente rítmica somente com as exigências
fisiológicas da respiração. Eram emissões sonoras, livres e geralmente de
períodos curtos.
"... é o corpo que se bota a cantar e se expande em voz. Numa
voz qualquer, puro momento vital" (Andrade,1977: 20)
Bachelard apud Ruud (1990) comenta que o homem pré-histórico
aprende a cantar na origem da atividade de fazer o fogo.
"Por fogo num graveto atritando-o no sulco de um pedaço de
madeira seca leva tempo e paciência. Esta tarefa, no entanto,
deve ter sido bastante agradável ao indivíduo cuja fantasia era
inteiramente sexual. Enquanto empenhado nesta tarefa delicada,
o homem provavelmente aprendeu a cantar" (ibidem: 35).
A questão rítmica é muito acentuada na música primitiva por suas
possibilidades de constância, proporção e simetria. O fenômeno da pulsação e
ritmos de natureza orgânica e inorgânica, como o bater do coração, respiração,
as ondas do mar, etc... exercia um forte efeito no homem, mobilizando seus
estados corporais e de consciência psíquica.
"As agitadas danças tribais que precediam uma caçada,
realmente aumentavam o sentido de poderio da tribo... os gritos
de guerra tornavam o combatente mais resoluto e mais apto a
atemorizar o inimigo (Andrade;1977:25)
Fisher (1983) ressalta que as canções ritmadas surgem no contexto do
trabalho, pois elas além de coordenar movimentos de equipe, davam apoio ao
grupo. O aspecto sonoro das canções atenuava a fadiga e sincronizava o
processo de trabalho, na medida em que a constância rítmica aumentava a
força coletiva. Os cânticos de trabalho eram ricos em improvisação individual e
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combinações de seus refrões, além de proporcionarem integração do grupo
social.
"O movimento rítmico apóia o trabalho, coordena o esforço e liga
o indivíduo ao grupo social" (Fisher,1983: 42).
Os instrumentos musicais primitivos eram basicamente de percussão,
feitos com troncos de árvores, cabaças e ossos de animais. Na ritualística
tribal, era muito comum o uso de tais instrumentos nas atividades festivas e
como forma de comunicação de eventos naturais, como exemplo, a presença
de animais ferozes, chegadas de tempestades, etc...
" No geral, os instrumentos primitivos são muito pouco melódicos,
dão sonoridades barulhentas, cavernosas, roucas ou produzem
apenas ruídos" (Andrade,1977:18)
Nas civilizações da antiguidade encontra-se a música sistematizada,
com normas técnicas e já organizada com valores de beleza estética.
Pitágoras, por exemplo, desenvolveu a teoria dos intervalos harmônicos e foi o
inventor da acústica e da regra da proporcionalidade.
Os egípcios, assírios, babilônios desenvolveram instrumentos, escalas
musicais, e a música também fazia parte de suas cerimônias festivas, da
preparação para a guerra e eventos de natureza fúnebre. Isto é comprovado
nas figuras de músicos e dançarinos encontradas no interior das tumbas.
A bíblia, através dos salmos, confirma a ocorrência de fatos musicais e a
utilização de instrumentos estruturados. Demonstra como exemplo histórico: a
harpa tocada por David na tentativa de melhorar o estado de saúde de Saul, as
trombetas que derrubaram as muralhas de Jericó e a voz de Mirian na abertura
do mar vermelho.
São os gregos, que na antiguidade, organizaram a música com a
construção de escalas, modos, etc... Ainda ligados a questões míticas e de
superstições divinas, os gregos criaram uma música com impressões
nacionais, dando-lhes características originais. Os chamados modos gregos,
que designavam geograficamente regiões da Grécia (Dórico, Frígio, Lídio,
etc...)
Conforme Mário de Andrade (1977), para os gregos, a música não era
uma arte isolada. Estava sempre unida à dança e a poesia. O compositor era
ao mesmo tempo, cantor, poeta e dançarino. A música continha texto e
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expressão coreográfica. Podemos dividir em duas grandes fases: a lírica,
dando importância ao canto coral, ao solo instrumental; e a fase da tragédia,
inteiramente cantada, e às vezes nas épocas das grandes dionisíacas eram
cantadas por quatro dias consecutivamente.
Basicamente, a característica da música primitiva e dos povos antigos, é
associada ao seu aspecto grupal de formação social. É a fase da história do
homem chamada de fase rítmica. Com a era cristã, nasce um ideal de
civilização baseado na noção de humanidade e não mais na noção de
coletividade. È somente na civilização cristã que o homem constrói
instrumentos de afinação fixa e melódica, como violino, flauta ou piano.
Com o desenvolvimento e aprimoramento de escalas e melodias, a era
cristã é denominada como a fase melódica, porque fisiologicamente, a melodia
mobiliza afetos e sentimentos individuais. Por isso, o homem associa a música
à arte de expressar os sentimentos por meio dos sons.
Podemos concluir então que desde os primórdios, a arte e a música
acompanham a evolução do homem e são fundamentais para o seu
desenvolvimento, interferindo na sua capacidade de comunicação, expressão e
trabalho. Seja no seu aspecto coletivo ou primitivo, seja no seu aspecto mais
refinado e individual da era cristã. Nesse sentido, a expressão artístico-musical
é essencial para a sobrevivência subjetiva e material do homem.
1.2 – A multiplicidade da linguagem dos sons
Os sons e a música exercem sobre a vida um poder especial. A
capacidade humana de perceber e diferenciar sons tem efeitos incríveis!
Somos muito influenciados pelo que escutamos e muitos são os sons que nos
afetam.
"Os sons ao atingirem os centros nervosos, captados pelo órgão
sensorial da audição, se transformam em percepção e sensação
que, relacionados, produzem emoção, biologicamente a emoção
provoca uma ação, pode excitar ou acalmar a criança física ou
mentalmente." ( Weigel,1988:169)
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Segundo Ruud (1991), o som é percebido através de pequenos
deslocamentos de ar ao nosso redor. Passa para o canal auricular, vibrando o
tímpano, os ossos da cóclea e envia através das células siluosas, mensagem
ao cérebro. O cérebro, por sua vez, vai discriminar os padrões e as freqüências
do som de maneira complexa e precisa, pois é nele que se processa a
identificação e reconhecimento da altura dos sons.
O ouvido pode captar sons tão fracos quanto um átomo. A percepção
auditiva discrimina, reconhece, classifica, organiza e identifica qualidades do
som. Nossos sentidos de audição estão alerta dia e noite. Mesmo enquanto
dormimos, a audição está atenta para passos, ranger de portas, sons externos,
etc... Associamos sons a situações agradáveis ou desagradáveis. A voz
humana pode ser estimulante, atraente, profunda ou às vezes até mesmo
desagradável. Os denominados sons nocivos, como buzina de carro, alarme,
ranger de unha no quadro de giz podem ser tão insuportáveis que dependendo
da sua intensidade destrói tecidos da mucosa auditiva.
Weigel (1988) afirma que os sons também nos alertam de perigos e
ativam centros de prazer. Sons e música podem nos fazer chorar, sorrir,
lembrar de fatos, de cheiros, paisagens, etc... Na audição musical, o ouvinte
experimenta diferentes tipos de humores, e reage à música através de
pensamentos e emoções de acordo com sua sensibilidade. Dessa forma, os
efeitos que os sons musicais produzem nos seres humanos nos níveis físico,
mental, emocional e social estão relacionados às reações sensoriais,
hormonais e fisiomotoras.
Os elementos musicais, tais como: ritmo, melodia e harmonia tem
significado específico para cada pessoa. Enquanto a repetição rítmica é um
meio de descarga e alívio gradativo de tensão; a melodia pode proporcionar
prazer e relaxamento.
"Todos os elementos que estruturam a música, sejam modos,
andamentos, formas musicais, harmonizações, timbres, ritmos, linha
melódica, etc., agem como estímulos. (...) provocam reações que
podem ser individuais ou comuns a um grupo social" (Weigel,
1988:169)
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A música, portanto, tem a função social de emocionar e comunicar
sentimentos, ela pode sensibilizar o indivíduo para melhor compreender e atuar
na sociedade em que vive.
Nesse sentido, a linguagem musical apresenta diferentes possibilidades
de abordagens e áreas de atuação, cada uma delas com seus próprios saberes
e conteúdos específicos.
No domínio da cultura, associamos a música à expressão da obra de
arte, ligada ou não à comunicação e ao entretenimento. Quase sempre envolve
uma complexidade de atividades e eventos que exigem planejamento,
organização, desempenho, recursos e especialistas.
Na área da saúde, a música vem sendo utilizada como instrumento
terapêutico no tratamento e reabilitação de doenças físicas ou emocionais. É
reconhecido que a música por si só conforta, restaura, integra e harmoniza
condições físicas, psicológicas e emocionais. A possibilidade de mudança de
estado de ânimo é uma experiência promovida pela música que mobiliza
funções neurovegetativas, altera padrões, reduz a dor, organiza o sistema
imunológico e potencializa ondas cerebrais com tarefas motoras sincronizadas.
A musicoterapia é a ciência que trata especificamente dessa área com
conceitos e técnicas sobre a utilização da música em um contexto que tem por
objetivo restaurar a saúde integral do indivíduo.
No campo da educação, a música é um instrumento pedagógico
formador e transformador de conhecimentos. Seus objetivos visam o
desenvolvimento do potencial musical do indivíduo, envolvem conhecimentos
da gramática musical, além do aperfeiçoamento de execução instrumental e
criação. Participa na sensibilização e formação do cidadão, contribuindo na
construção de valores, ética e consciência.
A música aponta caminhos, engloba a compreensão do mundo, amplia a
dimensão natureza e cultura. Trata-se de uma linguagem que produz sentido e
se vincula as diferentes etapas da vida. Desse modo, podemos considerar que
a multiplicidade da linguagem musical contribui para a melhoria da condição
humana.
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Capítulo II
A Educação Musical na Formação do Professor do Ensino
Básico
2.1 – Questões da aprendizagem musical
Sabemos que a música é essencial na formação humanística da criança
e do adolescente, porém, nem sempre recebe o seu devido valor. Sua
presença na escola é muitas vezes relegada a segundo plano deixando de lado
aspectos formativos relevantes da disciplina.
Para Martins (1985), o ensino da música está em geral mal estruturado,
sem seqüência, padrão e continuidade. Tais aspectos reforçam o isolacionismo
técnico e compromete a interdisciplinaridade.
"Se a música é uma linguagem, porque ainda não estão
claramente delineados os métodos de ensino dessa linguagem?
Por que tantas contradições e descaminhos?" (Martins,1985:11)
A música pode despertar no aluno o gosto pela elaboração, incentivá-lo
na consciência da riqueza ou da pobreza da música que escuta e consome;
criar uma visão crítica e histórica através dos tempos, para que consiga situar e
atualizar valores de sua própria geração.
"O aluno que entende a sua própria cultura devidamente, com
verdades e valores, está capacitado para distinguir qualidades
básicas permanentes herdadas de fontes primitivas... ou partes
da música são derivadas de costumes sociais obsoletos" (Martins,
1985:14)
Ensinar a formação de conceitos, a partir da percepção, é uma
estratégia inteligente, pois ensina o aluno a escutar para depois conceituar. A
aprendizagem musical deve considerar a maturidade para assimilação, a
sincronização corporal rítmica, o desenvolvimento da percepção de altura dos
sons, timbres e etc... Fica evidente que a imposição de currículos pré-
estabelecidos e descontextualizados podem ser devastadores para o processo
educativo.
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"o ensino e o estudo da música têm-se tornado um aglomerado
de experiência e não um processo " (Martins,1985:11)
O ensino da música envolve habilidades de percepção, execução e
cognição. Reconhecer e identificar os elementos constitutivos da música é
fundamental para a aprendizagem. Para que o resultado desse processo seja
positivo podemos nos guiar por princípios baseados na teoria de Pestalozzi e
aplicados por Lowell Mason quando introduziu a música nas escolas de Boston
- Massachusetts. Segundo esses autores, é preciso ensinar os sons antes dos
sinais, ou seja, a criança deve cantar antes de aprender a escrever as notas
musicais. A teoria deve ser ensinada a partir da vivência da prática musical
(Martins, 1985).
Podemos perceber que a música torna-se uma ferramenta que amplia as
possibilidades do conhecimento. Ao ser utilizada na educação, tem potencial
formador e transformador de diferentes universos: o físico, o emocional e o
social.
A música globaliza naturalmente diversos aspectos a serem ativados no
desenvolvimento da criança. Ao interagir com o meio ambiente, através da
inteligência, a criança experimenta, mexe em objetos e materiais, depois
organiza e posteriormente consegue transformá-lo, construindo seu
conhecimento e adquirindo compreensão de situações vividas.
As atividades de descoberta, exploração e produção de sons e melodias
podem ser surpreendentes para os alunos, pois a música favorece a auto
expressão, incentiva o desenvolvimento de aspectos cognitivos, psicomotores,
linguísticos e sócio-afetivos. Os jogos e brincadeiras de roda constituem
experiências vivas, agradáveis e enriquecedoras; e os fatos musicais
organizam ações, comportamentos e gestuais.
Quanto ao ritmo musical, identifica-se a sua importância na formação e
equilíbrio do sistema nervoso, ajuda a criança a controlar melhor o seu corpo,
aperfeiçoa a coordenação motora grossa e fina, além de conduzi-la a uma
expressividade com movimentos rítmicos harmoniosos. A descoberta, vivência,
e exploração do ritmo e movimento favorecem aquisições e noções de tempo e
espaço. Ajudam a discriminar, conceituar e observar o mundo sonoro em sua
volta.
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Nesse sentido, as atividades musicais oferecem diversas oportunidades
para a criança aprimorar sua habilidade motora, controlar seus músculos e
movimentos. O desenvolvimento rítmico prepara para a leitura, a escrita e a
proporção matemática, qualificando o processo de escolarização.
No tocante a capacidade de percepção auditiva, Weigel (1988) destaca
que o aperfeiçoamento da audição, através da música, está diretamente ligado
à acuidade de perceber diversos tipos de sons, devendo ser estimulada e
enfatizada no ensino da música.
"Ao imitar o canto dos pássaros, as vozes dos animais, ou outros
sons existentes da natureza, a criança descobre seus próprios
poderes e a sua relação com o ambiente em que vive"
(Weigel,1988:14 )
Além dos aspectos de aprendizagem musical mencionados acima,
ressalta-se ainda, a aquisição de vocabulário e ampliação da capacidade de
interpretação do mundo por intermédio das canções. Através das experiências
musicais, a criança organiza o seu próprio pensamento e aprimora a
comunicação.
A influência das atividades musicais na dimensão sócio-afetiva é
destacada por Weigel (1988), pela sua importante contribuição na formação da
identidade do aluno. Ao proporcionar satisfação e prazer, a música favorece o
desenvolvimento afetivo emocional, possibilitando a expansão dos
sentimentos, liberando impulsos e movimentos corporais.
A criança vai descobrindo-se como pessoa, percebendo-se diferente dos
outros e buscando formas de comportamentos que lhe permitam agir de modo
mais integrado no meio social. Tais atividades, sobretudo de caráter coletivo,
favorecem a auto-estima, a auto-realização, bem como a socialização.
A autora relata que os objetivos da educação musical são acima de tudo
levar as crianças a criarem relações afetivas com a música, criando o hábito de
ouvir música como se contassem histórias. A apreciação musical proporciona
um elevado nível de prazer estético, porque apreciar significa admirar, gostar,
sentir prazer, ter satisfação. A música é aprendizagem em forma de sentimento
e sensação.
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Entretanto, muitos são os problemas e dificuldades que envolvem o
ensino da música em nosso país. É acentuada a defasagem entre teoria e
prática, de tal modo que a aprendizagem musical vem se tornando uma
habilidade mecânica e repetitiva. Por um lado, não há consideração de
aspectos importantes como: as condições anatômicas e cognitivas, além do
respeito às influências culturais. Por outro, os materiais didáticos apresentados
são de conteúdo em geral obsoletos e sem relevância musical.
Faz-se necessária a reestruturação de novas estratégias e
desempenhos. Tais estratégias dizem respeito à formação de professores,
reconhecimento da competência da disciplina educação musical e
implementação de políticas de inserção da disciplina em toda a vida de
escolarização.
Consideramos pertinente que a formação musical esteja inserida num
contexto atual de reflexões e propostas para a formação de professores.
Conforme afirma Penna (2001:4) " é preciso buscar meios para capacitar o
professor das primeiras séries para o trabalho musical em suas turmas"
Reconhecer o analfabetismo musical é um passo importante, em um
país, que baseado em suas propostas de inclusão e atualização cultural,
administra a educação musical de forma pouco valorizada.
Apontar para a criação da disciplina de música nos cursos de
licenciatura é acima de tudo uma necessidade de democratização do saber,
pois a idéia não é formar especialistas, mas enriquecer a fala do professor com
acessórios e conhecimentos sobre esta linguagem.
" A arte pode ser observada (...) na música dos puxadores de
rede, nas ladainhas entoadas por tapeceiras tradicionais, na
dança de rua executada por meninos e meninas, nos pregões dos
vendedores (...) um incentivo á curiosidade pela manifestação
artística de diferentes culturas, por suas crenças, usos e
costumes, pode despertar no aluno, o interesse por valores
diferentes dos seus, promovendo o respeito e o reconhecimento
dessas distinções (...) reconhecer em si é valorizar no outro a
capacidade artística de manifestar-se na diversidade.
(Parâmetros Curriculares Nacionais - Artes, 2001:51)
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2.2 – A importância da educação musical na formação do professor
A atual sociedade globalizada aponta para uma nova configuração
mundial ao defender o respeito às diferenças culturais dos povos e nações.
Isso impõe um grande desafio na área da educação, uma vez que implica um
outro olhar para uma nova dimensão do que é ensinar e aprender. Vincular o
fazer educativo aos contextos culturais, sociais e éticos exige, portanto,
mudança na formação do professor.
Como descrito anteriormente, a música é considerada essencial na vida
das pessoas e é um elemento imprescindível na formação social, cultural e
escolar. Sua função na educação é de promover o pensamento crítico,
desenvolver a observação e compreensão histórica, incentivar a aprendizagem
prática, instrumental e perceptiva; bem como assimilar o conhecimento e
domínio da gramática musical, sensibilizando o aluno para a expansão de seu
universo criativo e lingüístico.
Parece ser consenso que a experiência musical é muito significativa no
processo escolar, entretanto, professores encontram dificuldades na inclusão
de atividades musicais em sua prática pedagógica, acima de tudo por falta de
formação específica e adequada. Muitos não receberam sequer formação
musical durante sua vida escolar e muito menos na sua preparação para a
docência.
A inclusão da disciplina música aplicada à educação nos cursos de
licenciatura, é uma alternativa positiva, porque favorece a capacitação de
competências musicais, amplia a visão do professor a respeito do potencial
educativo além de fornecer subsídios para sua prática diária. O professor que
vai atuar na educação básica encontra neste campo um vasto material
substancial para o enriquecimento de atividades didático-escolares.
Segundo Bellochio et all (2001) "faz-se necessária a ampliação dos
conhecimentos musicais do professor que atua nas séries iniciais
do ensino fundamental, apontando, como alternativa, a inclusão
da música, nos currículos de pedagogia".
Orientações didáticas vêm sendo relatadas nos documentos legais como
as Leis de Diretrizes e Bases da Educação (LDBs) e os Parâmetros
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Curriculares Nacionais (PCNs), traduzindo a importância do ensino da arte e
particularmente da música, tanto para a formação discente quanto para a
qualificação docente.
"O ensino da arte constituirá componente curricular obrigatório,
nos diversos níveis da educação básica de forma a promover o
desenvolvimento cultural dos alunos." (LDB, 1996: artigo 26 &2)
E ainda,
"O ensino da arte é área de conhecimento com conteúdos
específicos e deve ser consolidada como parte constitutiva dos
currículos escolares, requerendo, portanto, capacitação dos
professores para orientar a formação do aluno" (PCN Artes, 2001:
51)
No PCN Artes é destacada a diversidade cultural musical na escola,
corroborando para a proposta de trabalhar a música enquanto organização
sonora e meios da ampliação da experiência musical.
Segundo o artigo 43 da LDB, a Educação Superior tem como finalidade
estimular a criação cultural, favorecer o desenvolvimento do entendimento do
homem e do meio em que vive, promover a divulgação de conhecimentos
culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade, e o
aperfeiçoamento cultural e enriquecimento profissional.
Portanto, a questão de formação de professores torna-se significativa
em um momento de reconstrução da cultura escolar. O desenvolvimento
pessoal e profissional do professor potencializa a sua autonomia e estimula a
dimensão coletiva do ensinar e aprender. "o homem que dialoga, indaga, refaz
e recria própria teoria"( Freire;1970:45)
A abordagem da disciplina da música nos cursos de licenciatura não
deve tornar-se um assunto efêmero, sem vida, sem ritmo. Os conteúdos devem
apontar para uma didática, sensibilizadora, cultural e científica. Além de
aperfeiçoar a pratica profissional de sala de aula, na experimentação do que
sem dúvida naturalmente está impresso na diversidade da linguagem musical,
favorece a auto-estima, a integração e o bem estar humano.
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Capítulo III
A educação musical como estratégia pedagógica de aprendizagem e comunicação
3.1 – As Diretrizes Curriculares O ensino da música nas escolas brasileiras já constava como decreto
federal desde 1854, abrangendo noções de teoria musical e canto. Com a
revolução de 30, a educação sofreu importantes transformações. Foi criado a
Ministério da Educação e a Constituição de 1934 apresentou um capítulo
especialmente voltado para a Educação.
As escolas primárias e secundárias passaram a oferecer disciplinas de
arte como trabalhos manuais, desenho geométrico, teoria musical e canto
orfeônico. O ensino da arte era influenciado para o domínio técnico de
reprodução ou modelo.
Com o manifesto dos Pioneiros, assinado por Anísio Teixeira, a
educação passou a ser o elemento de reconstrução nacional, destacando
aspectos como: educação pública obrigatória, liberdade de ensino, e
valorização dos interesses dos alunos.
O nascimento da Escola Nova, influenciado pelo movimento modernista,
valorizou no campo da aprendizagem da arte, as emoções, os sentimentos e a
espontaneidade. Anita Malfatt e Mário de Andrade chegaram a organizar
classes de artes para crianças, criaram artigos e pesquisas na Universidade do
Distrito Federal e no curso de história da arte, onde destacam a expressão
autêntica e desinteressada da criança (Barbosa; 1988:14)
A Escola Nova destacou a importância da livre-expressão no
desenvolvimento da imaginação e inteligência da criança. Valorizou o
desempenho espontâneo do aluno com atividades de caráter não diretivo.
Na prática surgiram diversos problemas de caráter funcional e técnico,
principalmente na questão que se refere a não intervenção do professor,
deixando as crianças livremente, sem orientação, banalizando o "deixar fazer",
descaracterizando a aprendizagem musical.
23
"O objetivo fundamental era o de facilitar o
desenvolvimento criador da criança. No entanto, o que se
desencadeou como resultado da aplicação indiscriminada de
idéias vagas e imprecisas sobre a função da educação artística
foi uma descaracterização progressiva da área. Tal estrutura
conceitual foi perdendo o sentido, principalmente para os alunos"
(PCN Artes; 2001: 22 e 23)
Com a criação do Estado Novo, Villa-Lobos implantou o canto orfeônico
nas escolas, com estudos de teoria musical, aprendizagem do repertório do
cancioneiro folclórico, popular e cívico. Villa-Lobos preocupado com o descaso
com que a música era tratada nas escolas brasileiras elaborou um plano de
Educação Musical Nacional apresentado inicialmente à Secretaria de
Educação do Estado de São Paulo. Em 1931 organizou uma concentração
orfeônica chamada de "exortação cívica" com a participação de cerca de 12 mil
vozes. Foi convidado então por Anísio Teixeira, Secretário de Educação do Rio
de Janeiro, para organizar e dirigir a Superintendência de Educação Musical e
Artística que introduziria a obrigatoriedade do ensino da música e canto coral
nas escolas.
Com o apoio do presidente Getulio Vargas, Villa-Lobos organizou
concentrações orfeônicas grandiosas, reunindo sobre sua regência até 40 mil
estudantes. Em 1942 criou o Conservatório Nacional de Canto Orfeônico, cujo
objetivo era formar candidatos ao magistério para as escolas primárias e
secundárias, elaborar diretrizes para o ensino do canto orfeônico no Brasil e
promover trabalhos de musicologia.
Impulsionado pelo sistema nacionalista que vigorava na Europa e
ganhava força desde o final da década de 20, o sistema de educação musical
através do canto orfeônico foi um dos mais abrangentes movimentos de ensino
da música no país. O canto orfeônico foi implantando como disciplina em todas
as escolas, propiciando à população o acesso e cultivo do gosto pela música,
valorizando o canto regional e sem o objetivo de formar virtuoses.
Essa política pedagógica vigorou por muitos anos, sendo substituída
pela disciplina Educação Musical, criada pela LDB 4024/1961. Tal mudança
visava garantir currículos diversificados, pautados pelos princípios da liberdade
e solidariedade humana. Dentre outros artigos, destacam-se: o artigo 25, que
24
trata da finalidade do ensino primário no desenvolvimento do raciocínio lógico e
expressivo da criança, visando sua integração ao meio social. O artigo 26 cita a
iniciação dos alunos em técnicas de artes aplicadas e adequadas ao sexo e
idade. Quanto ao ensino médio, o artigo 35 prevê disciplinas e práticas
educativas obrigatórias e optativas; e no artigo 38, atividades complementares
de iniciação artística.
A Educação Musical abriu portas para uma nova concepção de ensino
da música, influenciada principalmente pelo enfoque que vinha sendo
disseminado na Europa. A incorporação dessa metodologia rompeu com a
rigidez reprodutivista da escola tradicional.
" a música pode ser sentida, tocada, dançada, além de cantada.
Utilizando jogos, instrumentos de percussão, rodas e brincadeiras
buscava-se um desenvolvimento auditivo, rítmico, a expressão
corporal e a sensibilização das crianças que são estimuladas a
experimentar, improvisar e criar" (PCN artes;2001:27)
As diretrizes e bases apontadas na lei 5692/61 redimensiona o ensino
da música no país. Em seu artigo 7º descreve a obrigatoriedade da inclusão da
Educação Artística para os currículos de 1º e 2º graus. Segundo o parecer
540/77 do Conselho Federal de Educação, a Educação Artística abrange
diversas modalidades: artes plásticas, artes cênicas e música.
Contudo, as artes foram incluídas no currículo com o estatuto de
atividade educativa e não como uma disciplina. A formação do professor era
precária e não havia trabalhos definidos para essa área, o que enfraquecia o
desenvolvimento das artes na escola. Na prática faltavam fundamentos
teóricos que dessem suporte ao planejamento dos conteúdos. Os professores
não estavam preparados para operar com diversas linguagens e não havia
ainda cursos de formação de arte nas universidades brasileiras. Somente em
1973, visando atender a demanda criada pela lei, o governo federal instituiu
cursos para a formação de arte-educadores, denominados licenciatura em
Educação Artística com a característica de licenciatura curta.
O currículo elaborado pelo MEC neste contexto, baseava-se na prática
de ateliês, informação da história da arte, folclore, estrutura e funcionamento do
ensino de 1º e 2º graus. Buscava trabalhar os conhecimentos específicos das
25
diferentes áreas da arte, de forma concomitante, numa concepção e atuação
polivalente.
Em nome desse modelo, muitos professores atuavam de forma
improvisada e espontaneísta. A "padronização nacional" imposta por
legislações disciplinares, reforçava o caráter do professor executor de tarefas.
" os professores de educação artística, capacitados inicialmente
em cursos de curta duração, tinham como única alternativa seguir
documentos oficiais (guias curriculares) e livros didáticos em
geral, que não explicitavam fundamentos, orientação teórico-
metodológica ou mesmo bibliografias específicas. As próprias
faculdades de Educação Artística, criadas especialmente para
cobrir o mercado aberto pela lei, não estavam instrumentadas
para a formação mais sólida do professor, oferecendo cursos
eminentemente técnicos, sem bases conceituais.
Desprestigiados, isolados e inseguros, os professores tentaram
equacionar um elenco de objetivos inatingíveis, com atividades
múltiplas, envolvendo exercícios musicais, plásticos, corporais,
sem conhecê-los bem, que eram justificados e divididos apenas
pelas faixas etárias " (PCN Artes; 2001:29)
Os professores de arte começaram a abrir espaço, abdicando do
trabalho superficial da polivalência, incrementando deliberadamente uma volta
ao fazer artístico da especialidade de suas áreas. Profissionais organizaram-se
em torno de um movimento denominado Arte-Educação, com encontros,
eventos, congressos por todo o país, onde eram discutidos temas sobre:
valorização e aperfeiçoamento do professor, submissão aos livros didáticos,
busca de novos valores, mudança na concepção do ensino da arte, etc... Esse
movimento impulsiona um debate profícuo sobre o tema e influencia a
construção de uma nova lei, mais afinada com as necessidades e
preocupações do professores.
Em 1996, com a promulgação da LDB 9394, o ensino da arte torna-se
componente curricular obrigatório, nos diversos níveis da educação básica com
finalidade de promover o desenvolvimento cultural dos alunos.
A disciplina Artes passa a ser tratada como área de conhecimentos
específicos, com professores especialistas para cada área. Nesse ínterim, o
26
MEC elabora e publica em 1997, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN)
que definirão princípios e estratégias para a construção de projetos educativos.
O PCN Artes aponta para a compreensão do significado da arte na educação,
explicitando conteúdos, objetivos e especificidades, tanto no que se refere ao
ensino e à aprendizagem, quanto em relação à arte como manifestação
humana. Trata-se de um grande avanço e desafio para a educação brasileira
Os PCNs definem os significados e abrangência de cada área da arte,
demarcando modalidades e fornecendo orientações gerais baseados em três
diretrizes. São os eixos da chamada "Metodologia triangular", defendida por
Ana Mae Barbosa: Produzir, Apreciar e Contextualizar – o fazer artístico, a
leitura da imagem (obra de arte) e a história da arte. Para a autora, a arte não
pode ser negligenciada e/ou diminuída quanto ao seu rigor científico. Ao
contrário, deve ser considerada como um corpo organizado de conhecimentos,
que demanda o mesmo tipo de exigência intelectual esperado das ciências
exatas e humanas.
Na construção do conhecimento em arte, a tarefa de ensinar baseia-se
em sentir, compreender a sua dimensão histórica, apreciar esteticamente,
analisar e refletir sobre ela com espírito crítico; o que requer as quatro
instâncias do conhecimento: a produção, a crítica, a estética e a história da
arte. Diz Ana Mae Barbosa (1991:10) " o que a arte na escola principalmente
pretende é formar o conhecedor, formador e decodificador da obra de arte (...)
A escola seria a instituição pública que pode tornar acesso à arte possível para
a vasta maioria dos estudantes na nossa nação"
A LDB de 1996 ao incluir o ensino da música no currículo da educação
básica, reconhece acima de tudo a grande contribuição para a formação e o
desenvolvimento educacional da criança e do jovem. O documento PCN
também representa um avanço para a área, ao definir o ensino de cada
linguagem, consolidando a proposta da concepção da arte como campo do
conhecimento com práticas pedagógicas específicas.
A organização dos conteúdos por modalidades, delega às escolas a
indicação das linguagens artísticas e da sua seqüência no andamento
curricular, favorecendo a autonomia e a flexibilidade.
"A critério das escolas e respectivos professores (...) os projetos
curriculares se preocupem em variar as formas artísticas ao longo
27
da escolaridade, quando serão trabalhadas artes visuais, dança,
música ou teatro" (PCN Artes;2001: 62 e 63)
Tais conteúdos devem sedimentar a aprendizagem artística dos alunos
do ensino fundamental em um processo contínuo na busca do domínio do
conhecimento artístico estético.
"os conteúdos podem ser trabalhados em qualquer ordem,
conforme decisão do professor, em conformidade com o desenho
curricular de sua equipe" (PCN Artes;2001:pg. 49)
Os PCNs visam a qualidade do ensino fundamental e médio, o
desenvolvimento profissional do professor e apontam para um
redirecionamento do ensino da arte, sendo importante documento
transformador.
"No Brasil, nosso maior problema é a alfabetização, isto é, há a
necessidade urgente de se enfatizar a leitura de palavras, gestos,
ações, imagens, prioridades, desejos, expectativas (...)num país,
onde os políticos ganham eleições através da televisão, a
alfabetização pela leitura da imagem é fundamental, e a leitura da
imagem artística, humanizadora". (Barbosa; 1995:63)
Concluímos então que as diretrizes e parâmetros são fundamentos
legais e orientam a prática escolar no ensino básico. Considerando a
relevância desses documentos e a pertinência da obrigatoriedade do ensino da
música, torna-se mais importante ainda problematizar a questão da
implantação da disciplina de educação musical no âmbito da licenciatura de
nível superior, de modo a aprimorar o processo de formação do professor não
especialista em música.
Destacamos que além da inclusão da música no ensino básico e o
reconhecimento dessa matéria como parte essencial do processo educativo, a
música é uma linguagem que pode e deve ser estendida como ferramenta
pedagógica para o professor generalista, que atua nas 1as séries e outras
disciplinas que compõe o currículo do ensino básico, tais como: matemática,
português, história, geografia, ciências, literatura, etc... Nesse sentido,
apresentaremos a seguir, algumas propostas e estratégias pedagógico-
musicais, com o intuito de oferecer alguns recursos a serem aproveitados na
docência de nível superior.
28
3.2 - Estratégias Pedagógicas Nesta etapa do trabalho, serão apresentadas estratégias pedagógicas
para os professores do ensino básico no tocante à utilização da "ferramenta"
música no processo educativo. São diversos e variados os caminhos e as
possibilidades, dada a amplitude da aprendizagem do universo musical. Desse
modo, destacaremos apenas alguns eixos que devem nortear o docente na sua
prática diária, como sugestões para o aperfeiçoamento de seu trabalho. Tais
eixos também podem orientar a construção de ementas e currículos das
possíveis disciplinas nos cursos de licenciatura.
Em linhas gerais, o professor deve promover situações de ensino onde
o aluno possa conhecer trabalhos artísticos, fazer análise critica da obra na
dimensão técnico-histórica. Deve ainda estimular a compreensão do objeto
artístico como artefato histórico, a observação e a análise estética.
A função do professor será de fornecer referências aos alunos,
estimulando a sua interação com a linguagem musical em uma perspectiva de
expansão do universo criativo e lingüístico do aluno.
O professor pode desenvolver um programa que considere a experiência
musical e cultural dos alunos, proporcionando através de vivências e atividades
de apreciação prática, o estímulo à reflexão sobre a música do seu contexto
histórico. Deve ainda incluir na sua prática de sala de aula, o fazer musical,
incrementando discussões sobre os elementos musicais, seus conteúdos e
referenciais pedagógicos.
A essência do fazer musical é sem dúvida, promover ludicamente o
prazer de valorizar sentimentos, emoções e cognição. Nessa prática, pode
estar presentes o universo dos jogos e brincadeiras, pois servem como
instrumentos para as várias áreas do conhecimento, como destaca Huizinga
(2004: 177 e 178)
"não resta dúvida de que o ritmo e a harmonia são fatores
comuns, tem sentido exatamente idêntico à poesia, à música e ao
jogo. Mas, enquanto na poesia, as próprias palavras elevam o
poema, pelo menos em parte, do jogo puro e simples para a
esfera da idéia e do juízo, a música nunca chega a sair da esfera
lúdica".
29
Dentre os principais objetivos da aprendizagem através da música,
ressaltamos: articulação de conteúdos específicos à vivência musical;
compreensão e identificação dos aspectos da linguagem musical; apreciação
dos aspectos morfológicos, fenomenológicos e culturais do universo sonoro;
análise de fatos históricos musicais; reconhecimento das propriedades e
qualidades dos elementos fundamentais da música; contextualização da
música em seus gêneros e formas musicais; experimentação e reconhecimento
das qualidades musicais; e apuração do "ouvido pensante", construindo valores
de juízo estético.
As estratégias metodológicas devem privilegiar a participação ativa do
aluno, por intermédio de aulas práticas com exercícios de percepção, aulas
expositivas, trabalhos em grupos, utilização de diversos tipos de materiais e
objetos sonoros, além de combinar diferentes apreciações de canções, trilhas
sonoras, etc...
È fundamental criar um ambiente propício de incentivo ao aluno no
enfrentamento de suas dificuldades na compreensão e interpretação do que
vem a ser música. Valorizar a afetividade, autocrítica, respeito ao meio
ambiente, a vida e a cidadania, são recursos favorecedores desse processo
democrático e lúdico.
A possibilidade do aluno interagir com as várias formas de execução
musical, diferenciar gêneros e formas da música, apreciar os instrumentos e
compreender sua organização familiar, constitui um amplo espectro de acesso
ao aprendizado cultural.
A avaliação deve prezar pelo respeito ao tempo mental e musical do
aluno, utilizando critérios qualitativos e quantitativos de desempenho,
participação e satisfação.
Ensinar através da música é uma tarefa extremamente complexa e
trabalhosa, porque lidamos com questões materiais, instrumentais e
conceituais. Porém, as dificuldades encontradas podem ser vencidas com
recursos criativos do que seja aprender e ensinar, bem como condições
apropriadas de trabalho. O ensino deve se desenvolver de forma espontânea e
simples na construção e articulação dos conhecimentos. Portanto, é apropriada
a inclusão do fazer musical como recurso pedagógico e potencial educativo
para consolidar e qualificar o processo ensino-aprendizagem.
30
CONCLUSÃO
Este trabalho é resultado de longa experiência profissional e intensa
pesquisa bibliográfica. Abordou a importância da educação musical na
formação docente e explicitou propostas pedagógicas pertinentes ao cotidiano
escolar. Foram apresentados temas e estratégias plenamente aplicáveis em
práticas de sala de aula, constituindo-se em consistente referencial teórico-
prático para novas reflexões.
O objetivo fundamental da educação musical é acima de tudo, facilitar
uma compreensão melhor do mundo através da sensibilização do aluno e do
professor. Essa monografia descreve que para tanto é importante a
qualificação docente na educação básica, através do acesso à formação
musical. A inclusão de uma disciplina de educação musical nos cursos de
licenciatura, pode efetivamente preencher tal lacuna, colaborando para o
aperfeiçoamento e qualificação do processo ensino-aprendizagem.
Consideramos um avanço para a educação do ensino básico o incentivo e a
implementação de políticas públicas que vem apontando destaque à matéria
música como disciplina obrigatória.
O trabalho foi organizado em três capítulos. Inicialmente apresentou a
evolução da música em suas origens históricas, destacando o papel essencial
que a música teve para a sobrevivência material e subjetiva do homem,
revelando sua capacidade de grupalização, socialização, organização para o
trabalho e reprodução da cultura. Debateu a multiplicidade da linguagem
sonora enfatizando as diferentes áreas de atuação da música, com especial
ressalva para a sua utilização na educação como recurso de formação e
transformação de conhecimentos.
Aprofundando as questões que envolvem a aprendizagem musical, o
trabalho sinalizou para as dificuldades que cercam o ensino da música em
nosso país e construiu reflexões em torno das possibilidades de implantação
da disciplina de educação musical na formação de professores.
Apoiado na análise das legislações e diretrizes que norteiam o assunto,
o referido estudo aponta ainda estratégias de enfrentamento ao oferecer a
música como ferramenta de trabalho para professores do ensino básico em
31
curso de licenciatura, demonstrando a potencialidade da interface música e
educação.
A obrigatoriedade do ensino da música abre campo para profissionais
especialistas e reconhece a importância desta matéria no campo da educação.
E para além dessa conquista, ressaltamos a urgente e necessária qualificação
dos demais professores (de outras especialidades e das séries iniciais), no
sentido de maior articulação de seus conteúdos específicos através da
linguagem musical. Desse modo, espera-se que com a inclusão da disciplina
no nível superior, sejam ampliados os conhecimentos do docente quanto a
apreciação do universo da música.
Certamente que a música, estando a serviço do homem e das
sociedades, aponta caminhos para uma consciência socializadora da cidadania
e cultura. O "fazer musical", no entendimento e compreensão mais amplo do
fenômeno sonoro, soma benefícios, tanto para o desenvolvimento da
identidade individual e coletiva, quanto para a melhoria da comunicação e
aprendizagem escolar.
32
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34
FOLHA DE AVALIAÇÃO
Nome da Instituição: Universidade Candido Mendes
Título da Monografia: Música aplicada à educação – a importância da educação musical
nos cursos de licenciatura do ensino básico
Autor: Nilson Roberto Teixeira Ribeiro
Data da entrega: 13/10/2010
Avaliado por: Conceito: