universalização da educação pública e seus impactos

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CENTRO UNIVERSITÁRIO PADRE ANCHIETA GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS ECONÔMICAS FELIPE DE SOUZA ALMEIDA UNIVERSALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO PÚBLICA E SEUS IMPACTOS ECONÔMICOS: uma abordagem liberal através da perspectiva da Escola Austríaca de Economia Jundiaí - SP 2011

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  • CENTRO UNIVERSITRIO PADRE ANCHIETA

    GRADUAO EM CINCIAS ECONMICAS

    FELIPE DE SOUZA ALMEIDA

    UNIVERSALIZAO DA EDUCAO PBLICA E SEUS IMPACTOS

    ECONMICOS: uma abordagem liberal atravs da perspectiva da Escola

    Austraca de Economia

    Jundia - SP

    2011

  • CENTRO UNIVERSITRIO PADRE ANCHIETA

    GRADUAO EM CINCIAS ECONMICAS

    FELIPE DE SOUZA ALMEIDA

    UNIVERSALIZAO DA EDUCAO PBLICA E SEUS IMPACTOS

    ECONMICOS: uma abordagem liberal atravs da perspectiva da Escola

    Austraca de Economia

    Monografia apresentada banca

    examinadora da graduao do Centro

    Universitrio Padre Anchieta, como exigncia

    parcial para obteno do ttulo de bacharel

    em cincias econmicas sob a orientao do

    Prof. Dr. Fabrcio Jos Piacente.

    Jundia SP

    2011

  • sempre o indivduo que pensa. A sociedade no

    pensa da mesma forma que no come nem bebe. A

    evoluo do raciocnio humano, desde o pensamento

    simples do homem primitivo at o pensamento mais

    sutil da cincia moderna, ocorreu no seio da

    sociedade. No obstante, o pensamento em si uma

    faanha individual.

    Ludwig Von Mises

  • FELIPE DE SOUZA ALMEIDA

    UNIVERSALIZAO DA EDUCAO PBLICA E SEUS IMPACTOS ECONMICOS: uma abordagem liberal atravs da perspectiva da Escola

    Austraca de Economia

    Monografia aprovada como requisito parcial para a obteno do ttulo de bacharel em Cincias Econmicas pela seguinte banca examinadora da graduao do Centro Universitrio Padre Anchieta: Nota: ____________ Data da defesa:________________ ______________________________ Orientador ______________________________ ______________________________ ______________________________ Assinatura do aluno

  • RESUMO

    O presente trabalho monogrfico estabelece a anlise dos impactos econmicos da

    atual poltica de educao pblica brasileira - poltica que garante acesso irrestrito e

    obrigatrio s instituies de ensino fundamental e mdio pblicos, considerando

    tambm o ensino superior e a ampliao do acesso sempre em pauta nestas

    polticas, como sendo incapaz de atingir seus objetivos histricos e tericos como

    transformador scio-econmico. H de se entender como ocorre a gesto da

    educao no plano nacional com os gastos pblicos e repasse das arrecadaes

    entre os nveis federativos e suas polticas educacionais, organizao e

    regulamentao nas disposies da atual Constituio da Repblica, assim como as

    investigaes sobre os impactos econmicos luz da teoria econmica da Escola

    Austraca e anlises da absoro pelo mercado de trabalho de pessoas por anos de

    estudo. As hipteses levantadas e dados estatsticos permitiro o entendimento do

    atual panorama que vive a sociedade em relao educao pblica e sua

    influncia na manuteno do quadro econmico no Brasil, numa dinmica de

    subdesenvolvimento e persistente excluso social, que as polticas educacionais tm

    por objetivo reverter este quadro, configurando em um crculo vicioso de degradao

    ideolgica.

    Palavras-chave: Educao pblica. Universalizao da educao. Federalismo.

    Poltica Pblica. Economia Poltica.

  • ABSTRACT

    This monograph provides an analysis of economic impacts of the current Brazilian

    public education policy - policy that guarantees unfettered and compulsory access to

    primary and secondary public schools, also considering higher education and its

    expanding access always at stake in these policies, as being unable to achieve their

    historical and theoretical goals as transforming socio-economic development. It

    inquires in how the management of education in national public spending and

    transfer of revenues between the federal levels and its educational policies,

    organization and regulation of the current provisions in the Republic's Constitution, as

    well as investigations of the impacts by the light of the Austrian School of Economics;

    the analysis of absorption in the labor market of people by years of study. The

    hypotheses and statistical data make the understanding of the current picture society

    that lives in relation to public education and its influence in maintaining the economic

    situation in Brazil, in a process of underdevelopment and persistent social exclusion,

    the aim of the educational policies to revert this very picture, setting up a vicious

    circle of ideological degradation of society.

    Keywords: Public education. Universal public education. Federalism. Public Policy.

    Political Economy.

  • SUMRIO

    INTRODUO ...................................................................................................................................... 7

    1. RETROSPECTIVA DA EDUCAO NO BRASIL .................................................................... 9

    2. EDUCAO FEDERATIVA: A CONSTITUCIONALIDADE DA UNIVERSALIZAO .... 17

    2.1. DO ARRANJO LEGAL E ADMINISTRATIVO CENTRALIZADO .................................... 17

    2.2. DA ORGANIZAO DESCENTRALIZADA E OPERACIONALIZAO DA

    EDUCAO PBLICA .................................................................................................................. 19

    2.3. DA QUESTO FISCAL: TRIBUTAO, ARRECADAO E APLICAO ................. 20

    2.3.1 Da tributao e arrecadao ....................................................................................... 20

    2.3.2. Da configurao da tributao .................................................................................. 22

    3. DOS IMPACTOS ECONMICOS: UMA ABORDAGEM TERICA .................................... 27

    3.1. DA EDUCAO PBLICA NO BRASIL: A COMPULSORIEDADE DE UM BEM NO-

    ECONMICO .................................................................................................................................. 29

    3.1.1. Consideraes sobre o mercado .............................................................................. 31

    3.2. DA EDUCAO: A TRANSFORMAO DE UM BEM ECONMICO EM NO

    ECONMICO .................................................................................................................................. 33

    3.3. A CRTICA DA MERCANTILIZAO DA EDUCAO ................................................... 38

    4. DOS IMPACTOS ECONMICOS: DA TEORIA CONSTATAO EMPRICA .............. 42

    CONCLUSO ..................................................................................................................................... 46

    REFERNCIAS .................................................................................................................................. 48

  • 7

    INTRODUO

    A educao na Histria da humanidade tornou-se decisiva para se obter um

    grau de riqueza e bem-estar. Esta condio apenas foi alcanada aps a

    organizao social ter eficincia econmica, resultado da industrializao, ou seja,

    produo em massa de bens, tendo como referencial histrico a revoluo industrial

    da Inglaterra nos sculos XVIII e XIX.

    O acesso ao ensino bsico, formal ou no, possibilitando a alfabetizao de

    grande parte da populao, se fez na necessidade no apenas de aumentar a

    produtividade utilizando-se de tcnicas cada vez mais sofisticadas e intensificao

    das cincias aplicadas, mas como instrumento civilizatrio ou de imposio

    ideolgica.

    Saber identificar signos lingsticos e oraes com certa complexidade no s

    decisivo no aumento da produtividade como o primeiro passo para se obter

    especializao e grau mais elevado de civilidade.

    A questo histrica da educao no Brasil que est fortemente atrelada

    Europa desde a era colonial repousa em referenciais tericos diversos. Este trabalho

    monogrfico contemplar a universalizao da educao que fora se perpetuando a

    partir da disposio econmica das polticas pblicas educacionais brasileiras at os

    dias de hoje, tendo como resultado prtico os diversos referenciais tericos dos

    ltimos sculos.

    Contudo, a universalizao e obrigatoriedade da educao tm conseqncias

    adversas alm de no atingir as expectativas. Do alto nvel de desocupao no

    Brasil como constatao de uma dinmica econmica aqum do esperado e

    necessrio para um maior nvel de riqueza e bem-estar. Esta pssima dinmica

    econmica na gerao de riqueza intensificada por uma arrecadao tributria e

    financiamento desigual entre as unidades e entes da federao, que torna a

    disponibilidade dos recursos na sociedade mais escassos.

  • 8

    Da arrecadao e financiamento desigual explica a impossibilidade das

    polticas pblicas lograrem por no estarem em sintonia com as realidades polticas

    e econmicas locais.

    As conseqncias adversas so percebidas pela no absoro do mercado de

    trabalho de pessoas com maior escolaridade, criando um contingente de pessoas

    fora da atual dinmica econmica - notadamente entre os mais jovens recm-

    formados - que no encontram trabalho apesar da terica qualificao por anos de

    estudo.

    A percepo desta realidade nociva para o desenvolvimento da sociedade

    justifica o estudo por compreender que falta uma abordagem liberal-clssica

    autntica. No apenas por apelo pela pluralidade de idias como tambm uma

    denncia da existncia de um nico vis de pensamento econmico aliado

    ideologizao scio-poltico que permeia as Cincias Humanas e a organizao

    poltica no Brasil.

    A anlise dos resultados ter o enfoque exclusivo da cincia econmica. O

    cunho terico da pesquisa de natureza bibliogrfica. Os dados histricos so

    embasados atravs de livros, artigos e pginas virtuais na internet (MATOS; VIEIRA,

    2001, P. 40) assim tambm com os dados estatsticos de rgos oficiais.

    A anlise terica dos resultados est em escritos que versam a Escola

    Austraca de economia. Os Princpios de Economia Poltica (1871) de Carl Menger,

    Ao Humana (1949) de Ludwig von Mises, Educao no Obrigatria, de Felipe

    Rangel Celeti (2011) sero o arcabouo que permitir esclarecer a universalizao

    da educao pblica como sendo uma educao compulsria e que ter impactos

    econmicos distinguveis pela anlise apriorstica.

  • 9

    1. RETROSPECTIVA DA EDUCAO NO BRASIL

    De forma a compreender holisticamente a insero da educao e impactos na

    dinmica social e econmica no Brasil necessrio uma contextualizao histrica

    para compreenso conveniente da anlise econmica e seus axiomas. Da

    colonizao no sculo XVI redemocratizao da repblica nos anos 1980

    ocorreram diferentes condues e reformas dos sistemas educacionais ocasionando

    mutaes progressivas conforme as correntes de pensamentos surgidos e influentes

    na sociedade brasileira.

    O Brasil fora descoberto no dia 22 de abril de 1500. Praticamente toda a

    primeira metade do sculo XVI a colonizao era esparsa. Para a Coroa Portuguesa

    e companhias de navegao, colonizar terras onde no se encontrava metais

    preciosos era economicamente invivel. O cultivo em larga escala de produtos com

    grande apreciao mundial se daria um sculo depois. A extrao de Pau Brasil

    seria a atividade econmica que propiciaria uma dinmica social crescente no

    primeiro sculo aps o descobrimento. Colonos vinham para o Brasil e encontravam

    uma terra virgem em civilidade onde tribos guerreiras lutavam constantemente por

    territrio e supremacia. A Civilizao Ocidental tinha desafios no Novo Mundo

    maiores que se tinha no Europa.

    Desde que chegaram ao Brasil, os jesutas estabeleceram escolas e comearam a ensinar a ler, a escrever e a cantar. Nbrega, em sua primeira carta do Brasil, atesta: O irmo Vicente Rijo ensina a doutrina aos meninos cada dia e tambm tem escola de ler e escrever, O colgio, contudo, era o grande objetivo, porque com ele preparariam novos missionrios. Apesar de, inicialmente, o colgio ter sido pensado para os ndios os que ho de estar no Colgio ho de ser filhos de todo este gentio -, j em 1551 se dizia: este colgio (...) ser bom para recolher os filhos dos gentios e cristos para ensin-los e doutrinar. O que representava a alfabetizao para os jesutas a ponto de quererem, desde o incio, alfabetizar os ndios quando nem em Portugal o povo era alfabetizado? (PAIVA, 2003, p. 43)

    Os jesutas chegaram ao Brasil em 1549 e comearam sua catequese

    erguendo um colgio em Salvador da Bahia e fundando a Provncia Brasileira da

    Companhia de Jesus. Cinqenta anos mais tarde, j tinham colgios pelo litoral, de

  • 10

    Santa Catarina ao Cear. Pouco antes da supresso da Ordem, no sculo XVIII,

    eram 670 por todo o pas, distribudos em aldeias, misses, escolas e seminrios.

    A Ordem dos jesutas tinha como misso clara a educao do evangelho. Seria

    um grupo autnomo que respondia religiosamente Sancta Sedes Apostolica, o

    Vaticano, espalhavam os valores judaico-cristos sendo subordinados ao Papa,

    representante maior da Igreja Catlica. Estes valores constituem toda a Civilizao

    Ocidental e seus costumes, suas cincias, por fim, a civilidade entre os indivduos,

    sociedade, natureza e o mundo espiritual.

    Ao desembarcarem imbudos do dever de espalhar o evangelho, certamente os

    jesutas se depararam com o maior desafio conhecido at o momento: conseguir

    relacionar-se socialmente com indivduos que no dominavam qualquer cincia e

    civilidade. Os ndios organizavam-se em tribos e tinham uma dinmica social

    primitiva, assim como atividade econmica baseada estritamente no extrativismo de

    subsistncia.

    A educao dos colonos, como visto em Paiva (2007), era insistente. A

    promoo do bem-estar para os de mesma cultura era primeiramente pelo lado

    espiritual, que impactava conseqentemente na educao formal e das cincias,

    quando possvel, para melhor interao social, baseado na justia. Por outro lado,

    no caso dos indgenas, a cultura era totalmente desconhecida. Os primeiros

    habitantes do Brasil tinham prioridade na educao por motivos bvios: eles

    representavam perigo constante por sua cultura tpica guerreira, inclusive canibal

    para algumas tribos como os tupinambs. (NARLOCH, 2009)

    Educar era a maneira de transmitir a cultura (costumes e credos). Para Regis de Morais, apesar da briga dos jesutas com senhores de escravos, no Norte do pas, e da defesa da liberdade indgena no Sul; a Companhia de Jesus trouxe um vasto sonho imperialista que quis substituir a cultura aqui vigente ento pela ibrica (MORAIS, 1989, p.75). A europeizao, pensa o autor, teve mais xito do que costumeiramente imaginamos (MORAIS, 1989, p.75 apud CELETI, 2011)

    Esta educao baseava-se nas letras. O Ratio studiorum, que organizava os

    estudos da Companhia, estabelecia pormenores o currculo do Colgio. A Gramtica

  • 11

    Mdia; a Gramtica Superior, as Humanidades; a Retrica. Havia ainda a Filosofia e

    a Teologia para quem se preparasse para o sacerdcio (PAIVA, 2007, p. 44)

    A Coroa Portuguesa tambm tinha um comprometimento pblico, na qualidade

    de estado legal, com a educao. Regimentos foi uma nova poltica ditada em 17 de

    dezembro de 1548 por D. Joo III, o Colonizador, preocupado com suas colnias,

    numa ao alm-mar da Coroa Portuguesa para educao e aculturao dos povos

    indgenas e orientais.

    A educao nessa poca era empreendida por instituies religiosas

    fundamentalmente, sendo ponta-de-lana para a Civilizao Ocidental ter como

    adeptos quem um dia era inimigo dos cristos, e propunha trgua para queles que

    potencialmente poderiam ameaar os valores judaico-cristos, como os

    mulumanos. Nesse sentido, os esforos da Coroa Portuguesa para poltica pblica

    foi de assegurar, ou o que se entendia como, os empreendimentos e p-las como

    assunto de estado. Do Regimentos:

    Dele dependeria (...) o xito da arrojada empresa colonizadora; pois que, somente pela aculturao sistemtica e intensiva do elemento indgena aos valores espirituais e morais da civilizao ocidental e crist que a colonizao portuguesa poderia lanar razes definitivas. (MATTOS, 1958, p. 31)

    Embora os jesutas agissem em vrias colnias no mundo, na colnia brasileira

    especificadamente, tinham que se adequar ao Regimento portugus. Ribeiro (2007)

    aponta como poltica pblica a adequao do plano de estudos numa elaborao de

    forma diversificada, com o objetivo de atender diversidade de interesses e

    capacidades.

    Interesses esses que entravam em conflito de acordo com o setor social. O

    exemplo claro disso o esforo de catequizar ndios pelos religiosos e de escravizar

    ndios pela arrojada empresa colonizadora, mais precisamente as companhias

    comerciais e a Coroa Portuguesa. Sabe-se que a escravido nessa poca era aceita

    como atividade comercial legtima pelo estado, e uma das mais lucrativa durante os

    sculos seguintes, principalmente para este ltimo, que controlaria trfico de

    escravos entre colnias africanas e americanas no trfico de escravos. Este

  • 12

    desenrolar histrico s aconteceu pelo xito da Companhia de Jesus no Brasil na

    disseminao do evangelho. Tornar os ndios civilizados seria um passo importante

    para estabelecer a justia ao menos aos nativos da terra brasilis:

    Se fossem escravizados pelos fazendeiros, os ndios poderiam entrar na justia e requerer a liberdade. Freqentemente ganhavam. A escravido indgena tinha sido proibida pelo rei dom Pedro segundo de Portugal em 1680, e vetada novamente, um sculo depois, pelo marqus de Pombal, primeiro-ministro do reino portugus. (NARLOCH, 2009)

    A institucionalizao educao pblica no Brasil estava consoante ao que

    ocorria na Europa a partir do sculo XVIII.

    Em 1759, o Marqus de Pombal expulsou os jesutas de Portugal e das

    colnias. Esta atitude resultaria na primeira reforma na educao no Brasil. As

    escolas propostas por Pombal teriam as aulas rgias, nas quais haveria o estudo de

    Latim, Grego, Filosofia e Retrica. (CELETI, 2011 p. 39).

    A educao jesutica tinha sua organicidade consagrada quando Pombal fez a

    primeira reforma educacional. O caos do ensino brasileiro por causa das aulas

    rgias se instalou a despeito da existncia de escolas por outras ordens religiosas,

    como os Beneditinos, os franciscanos e os Carmelitas (NISKIER, 2001, p. 34 apud

    CELETI, 2011, p.39).

    Para substituir a educao fornecida pelos jesutas, at ento uma das poucas

    se no a nica forma dos brasileiros se educarem, fora criado um novo imposto em

    1772 para estatizar no Brasil, num ideal iluminista orientado para a modernidade

    europia de oferta pblica de educao, o controle e gesto administrativa do

    sistema escolar. (SECO; AMARAL, 2006 apud CELETI, 2011, p. 40).

    Aps a declarao da independncia do Brasil, o fornecimento de educao

    pblica centralizado no parecia atender ao ideal de oferta de educao primria de

    maneira uniforme para alfabetizao da populao. As discusses se limitavam

    criao de uma universidade. (MORAIS, 1989, p. 98 apud CELETI, 2011, p. 40). A

    ateno sobre a organizao da educao pblica apenas ocorreu com o Ato

  • 13

    Adicional Constituio em 1834, descentralizando a responsabilidade e deixando o

    cargo de proporcionar o acesso ao ensino para cada provncia.

    Embora a estatizao da educao pblica, numa apropriao inicial da Coroa

    Portuguesa e depois do Imprio do Brasil, j limitava um sistema de ensino

    tradicional dos jesutas de maneira prtica, somente em 1891 que fora previsto em

    constituio a separao legal da igreja do estado.

    Numa breve abordagem terica, isso significa a supresso dos direitos naturais

    frente ao estado. Sendo as polticas pblicas para a educao do Marqus de

    Pombal, ministro do reino de Portugal de 1750 a 1777, nitidamente iluministas, o

    corolrio da Civilizao Ocidental dos sculos XVI e XVII no Brasil deu espao

    secularizao do educao:

    A Europa passava por transformaes profundas. Conforme o iluminismo avanava, os estados caminhavam para a modernidade. Tais ideais de tolerncia s liberdades iro marcar um perodo de laicidade. Estado e igreja so separados. Neste novo contexto poltico-social a educao torna-se o meio pelo qual a humanidade atingiria as luzes. O esclarecimento chegava pelo caminho da educao. Foi seguindo este caminho que ocorreram as transformaes polticas europias. Em contrapartida, haviam as colnias europias. Em tais colnias o iluminismo demorou para se instalar. A demora foi bem maior em terras lusfonas. (CELETI, 2011, p. 38)

    O empreendimento educacional nos primeiros sculos de colonizao era,

    antes de tudo, uma livre associao entre os indivduos, numa organizao e

    administrao descentralizada, sendo alfabetizao e evangelizao de pessoas

    com culturas diferentes entre si e dos colonizadores expresso mxima desta livre

    associao, calcada na teologia poltica da Civilizao Ocidental:

    O homem um ser social, os telogos catlicos concordam com Aristteles na definio da natureza humana, e a formao de uma repblica ordenada seriam um dos meios mais eficazes pelos quais o homem poderia ser levado plenitude de suas virtudes, plenitude de sua natureza nica e privilegiada graa divina. Especialmente as cidades, enquanto artefatos ordenados integrados ordem sagrada da repblica, so vistas muito convenientes ao gnero humano. Na cidade, produto sntese da cultura, o homem pode encontrar tudo o que precisa para viver e desenvolver-se no conhecimento da ordem, e a participar dela plenamente, em corpo e

  • 14

    esprito. A cidade proporciona, ou deve proporcionar, comodidade ao corpo do homem, assim como encarna e encena as leis das coisas espirituais, as quais o homem deve seguir e se integrar. A integrao do homem ao corpo mstico do estado se d nesta ntima participao social, corprea e espiritual. A ajuda da sociedade efetivamente material, fsica, mas ao promover o desenvolvimento da vida propriamente humana, esta ajuda se dirige e se reveste, cada vez mais, de uma ndole espiritual, e dirigida conquista do reino do esprito. Seguindo os ditames da Natureza, a Repblica colabora ento para realizar a ordem sobrenatural que gratuita e generosamente Deus estabeleceu entre os homens. Essa ordo naturalis, que Deus introduz na natureza atravs de sua lei eterna, o homem deve reproduzir a seu modo no mundo da cultura, dentro do qual se encontra a prpria repblica e suas manifestaes e representaes fsicas, a cidade, a arte etc. Criar uma cultura neste contexto catlico contra-reformista colaborar com Deus no acabamento de sua prpria obra, por isso toda verdadeira cultura est sempre animada por um sopro divino. O homem apenas um instrumento divino na criao da cultura, iluminado pela graa divina que aperfeioa a natureza. (BASTOS, 2005)

    A constitucionalizao da educao pblica, agora leiga, a partir de 1891, seria

    uma constante. O Brasil Repblica durante o sculo XX sofrera diversas mudanas

    nos regimes polticos e vrias cartas constitucionais foram concebidas. O trato com a

    educao variaria entre uma menor e maior centralizao das obrigaes dos entes

    federativos para com as polticas pblicas educacionais. A constituio de 1934

    daria poderes Unio de legislar e coordenar o sistema pblico de ensino em todo o

    Territrio:

    Art. 150 - Compete Unio: a) fixar o plano nacional de educao, compreensivo do ensino de todos os graus e ramos, comuns e especializados; e coordenar e fiscalizar a sua execuo, em todo o territrio do Pas; b) determinar as condies de reconhecimento oficial dos estabelecimentos de ensino secundrio e complementar deste e dos institutos de ensino superior, exercendo sobre eles a necessria fiscalizao; c) organizar e manter, nos Territrios, sistemas educativos apropriados aos mesmos; d) manter no Distrito Federal ensino secundrio e complementar deste, superior e universitrio; e) exercer ao supletiva, onde se faa necessria, por deficincia de iniciativa ou de recursos e estimular a obra educativa em todo o Pas, por meio de estudos, inquritos, demonstraes e subvenes. Pargrafo nico - O plano nacional de educao constante de lei federal, nos termos dos arts. 5, n XIV, e 39, n 8, letras a e e, s se poder renovar em prazos determinados, e obedecer s seguintes normas:

  • 15

    a) ensino primrio integral gratuito e de freqncia obrigatria extensivo aos adultos; b) tendncia gratuidade do ensino educativo ulterior ao primrio, a fim de torn-lo mais acessvel; c) liberdade de ensino em todos os graus e ramos, observadas as prescries da legislao federal e da estadual; d) ensino, nos estabelecimentos particulares, ministrado no idioma ptrio, salvo o de lnguas estrangeiras; 42 e) limitao da matrcula capacidade didtica do estabelecimento e seleo por meio de provas de inteligncia e aproveitamento, ou por processos objetivos apropriados finalidade do curso; f) reconhecimento dos estabelecimentos particulares de ensino somente quando assegurarem a seus professores a estabilidade, enquanto bem servirem, e uma remunerao condigna (BRASIL, 1934).

    No Estado Novo, perodo fascista quando Getlio Vargas se tornaria ditador, a

    Unio s viria a ter mais poder, numa clara intensificao da ideologia nacional-

    socialista. O intervencionismo do estado seria expresso pela supresso de

    ensinamento de lngua estrangeira em instituies de ensino pblico e privado.

    (SEYFERTH, 1999).

    Haveria na dcada de 1930 um movimento municipalista, i.e., de

    descentralizao da educao pblica, assunto que estaria marginalizado por vrias

    dcadas conseguintes.

    O enfraquecimento poltico dos governos subnacionais gerou uma quase extino da federao, o que, diante da dualidade existente, contribuiu para o fracasso de uma mudana educacional nos primeiros nveis de ensino. Curioso, se no frustrante, notar que no mesmo contexto histrico, mais especificamente em 1932, foi lanado o Manifesto dos Pioneiros da Educao Nova (SBPC, 1995), do qual participara com destaque Ansio Teixeira, que acreditava na possibilidade de o varguismo revolucionar a educao por meio de uma combinao entre ao nacional e descentralizao. Como se percebeu, sua viso de mundo foi derrotada. (ABRUCIO, 2010, p. 55)

    Em 1967, o regime militar estabelece uma nova constituio prevendo de

    maneira obrigatria e gratuita o ensino de indivduos de sete aos quatorze anos nos

    estabelecimentos oficiais. (BRASIL, 1967).

    Embora a freqncia obrigatria j seja prevista na constituio de 1937, e

    aps vrios regimes com espectro ideolgico claro, a compulsoriedade da educao

  • 16

    teria variaes apenas na abordagem ideolgica e na promoo de nveis

    educacionais mais altos das esferas federativas:

    Juntamente com a obrigatoriedade e gratuidade do ensino, o governo insere, em 1969, as disciplinas de Educao Moral e Cvica (EMC) e Organizao Social e Poltica Brasileira (OSPB). Ambas as disciplinas logo tornarem-se a forma mais fcil de transmitir a ideologia do estado, especialmente atravs das diretrizes aprovadas em 1971. A educao comea a ser vista pelos dirigentes do estado, de acordo com o primeiro artigo da Lei 5.692, como forma de proporcionar ao educando a formao necessria ao desenvolvimento de suas potencialidades como elemento de auto-realizao, qualificao para o trabalho e preparo para o exerccio consciente da cidadania (BRASIL, 1971). Ainda que seja possvel apontar uma tendncia de dividir a responsabilidade da educao entre Unio, Estados, Distrito Federal, Territrios, Municpios, empresas, famlia e comunidade em geral (como aponta o Artigo 41 da Lei 5.692); o controle educacional era estatal. Em seguida ao Artigo 41, a lei enftica na questo da obrigatoriedade. A sociedade toda era responsvel em fazer valer o aspecto compulsrio da educao. O Pargrafo nico declarava (Brasil, 1971) que respondem, na forma da lei, solidariamente com o Poder Pblico, pelo cumprimento do preceito constitucional da obrigatoriedade escolar, os pais ou responsveis e os empregadores de toda natureza de que os mesmos sejam dependentes. (CELETI, 2011, p. 42 43)

  • 17

    2. EDUCAO FEDERATIVA: A CONSTITUCIONALIDADE DA

    UNIVERSALIZAO

    A Constituio da Repblica promulgada em 1988 fora decisivo para

    implementar em todo o territrio nacional o acesso irrestrito educao pblica em

    todos os nveis de ensino e dispositivos legais para a regulamentao e interao e

    colaborao entre os entes federativos.

    Art. 206. O ensino ser ministrado com base nos seguintes princpios: I igualdade de condies para o acesso e permanncia na escola; II liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber; III pluralismo de ideias e de concepes pedaggicas, e coexistncia de instituies pblicas e privadas de ensino; IV gratuidade do ensino pblico em estabelecimentos oficiais; V valorizao dos profissionais do ensino, garantidos, na forma da lei, planos de carreira para o magistrio pblico, com piso salarial profissional e ingresso exclusivamente por concurso pblico de provas e ttulos; VI gesto democrtica do ensino pblico, na forma da lei; VII garantia de padro de qualidade. (BRASIL, 1988)

    Garantido como direito de todo o cidado, o acesso irrestrito educao

    pblica se d pelo arranjo administrativo centralizado e organizacional

    descentralizado. Todas as unidades federativas e municpios devem suprir a

    demanda reservando parte do oramento pblico destes entes para a educao. Ao

    governo federal compete a regulamentao do currculo escolar e administrao de

    grande parte das receitas pblicas recolhidos via tributos federais, alm da

    responsabilidade organizacional das instituies federais de ensino.

    2.1. DO ARRANJO LEGAL E ADMINISTRATIVO CENTRALIZADO

    Compreende-se centralizao da legislao da administrao educacional

    pblica a competncia restrita ao governo federal em legisla sobre diretrizes e bases

    da educao nacional (BRASIL, 1988, par. 24 do art.22).

    Os dispositivos legais e diretrizes da educao pblica, objetivos e

    financiamento federal centralizado expresso pelo Plano Nacional de Educao de

  • 18

    acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educao so previstos na Constituio

    de maneira explcita, como a seguir:

    Art. 214. A lei estabelecer o plano nacional de educao, de durao plurianual, visando articulao e ao desenvolvimento do ensino em seus diversos nveis e integrao das aes do poder pblico que conduzam : I erradicao do analfabetismo; II universalizao do atendimento escolar; III melhoria da qualidade do ensino; IV formao para o trabalho; V promoo humanstica, cientfica e tecnolgica do Pas. (BRASIL, 1988)

    A universalizao do atendimento escolar previsto na Constituio como

    resultado de polticas pblicas em nvel nacional, assim como sua manuteno que,

    por sua vez, depende da cooperao entre a Unio e os estados, o Distrito Federal e

    os municpios. A Constituio mais uma vez explicita a organizao educacional no

    artigo 211:

    Art. 211. A Unio, os Estados, o Distrito Federal e os Municpios organizaro em regime de colaborao seus sistemas de ensino. 1. A Unio organizar o sistema federal de ensino e o dos Territrios, financiar as instituies de ensino pblicas federais e exercer, em matria educacional, funo redistributiva e supletiva, de forma a garantir equalizao de oportunidades educacionais e padro mnimo de qualidade do ensino mediante assistncia tcnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municpios. 2. Os Municpios atuaro prioritariamente no ensino fundamental e na educao infantil. 3 Os Estados e o Distrito Federal atuaro prioritariamente no ensino fundamental e mdio. 4 Na organizao de seus sistemas de ensino, os Estados e os Municpios definiro formas de colaborao, de modo a assegurar a universalizao do ensino obrigatrio. (BRASIL, 1988)

    Reconhecidas as competncias dos entes federativos, a regncia da Unio se

    dar administrativamente no to somente nas instituies pblicas federais, mas

    tambm nas estaduais e municipais, garantir equalizao e padro mnimo de

    qualidade (entendido aqui como manuteno do sistema educacional pblico)

    mediante assistncia tcnica e financeira aos entes da federao.

    Tambm incumbe em regime de cooperao - aos municpios atuao no ensino

    fundamental e na educao infantil aos Estados e Distrito Federal prioridade nos

    ensinos fundamental e mdio.

  • 19

    Desta maneira a organizao dos sistemas de ensino dos estados e

    municpios, assim como formas de colaborao, sero competncias destes

    mesmos entes a fim de garantir a oferta da educao pblica irrestrita garantida por

    lei.

    2.2. DA ORGANIZAO DESCENTRALIZADA E OPERACIONALIZAO DA

    EDUCAO PBLICA

    A educao federativa no Brasil ocorre essencialmente na operacionalizao,

    i.e., a oferta da educao pblica tender ao grau mximo de descentralizao,

    sendo este resultado um efeito natural do arranjo federativo. Conforme pargrafo 6

    do artigo 30 - compete aos municpios manter, com a cooperao tcnica e

    financeira da Unio e do Estado, programas de educao pr-escolar e de ensino

    fundamental.

    Quanto operacionalizao e universalizao do ensino fundamental e mdio,

    tambm se estendem ao Estado:

    Art. 208. O dever do Estado com a educao ser efetivado mediante a garantia de: I ensino fundamental, obrigatrio e gratuito, assegurada, inclusive, sua oferta gratuita para todos os que a ele no tiveram acesso na idade prpria; II progressiva universalizao do ensino mdio gratuito;

    III atendimento educacional especializado aos portadores de deficincia, preferencialmente na rede regular de ensino; IV atendimento em creche e pr-escola s crianas de zero a seis anos de idade; V acesso aos nveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criao artstica, segundo a capacidade de cada um; VI oferta de ensino noturno regular, adequado s condies do educando; VII atendimento ao educando, no ensino fundamental, atravs de programas suplementares de material didtico-escolar, transporte, alimentao e assistncia sade. (BRASIL, 1988)

    A organizao descentralizada conforme artigo 211 da Constituio da

    Repblica no ser refletida no mbito fiscal, sendo que o Estado Nacional agir

    pela Unio para a garantia no somente legal da oferta de ensino fundamental, mas

    tambm de sua administrao.

  • 20

    No campo das polticas pblicas, a descentralizao organizacional tem efeitos

    positivos ao permitir o aumento da eficincia na alocao de recursos. De toda a

    manuteno exigida, os ganhos com a descentralizao ocorrem na inibio de

    desperdcio e corrupo. (ABRUCIO, 2010 p.46), consagrando tambm no setor

    pblico os avanos da administrao do setor privado.

    2.3. DA QUESTO FISCAL: TRIBUTAO, ARRECADAO E APLICAO

    Os Municpios, Estados e Unio tem competncias definidas e estruturao

    descentralizada na oferta da educao pblica, conforme visto at ento. No

    entanto, a centralizao jurdico-administrativa privativo Unio permite indagar

    sobre como financiado todo o aparato educacional.

    Tratando-se de uma Repblica Federativa e toda sua mquina operacional, o

    aparato estatal, imprescindvel tratar tambm da tributao que financia todas a

    polticas pblicas.

    A questo fiscal passa a ser ento o cerne da investigao de como os entes

    da federao garantem o acesso irrestrito ao ensino fundamental e progressiva

    universalizao do ensino mdio, alm do acesso ao ensino superior gratuito nas

    universidades pblicas. Como so administrados os tributos, quanto cada ente

    arrecada e quanto se destina para a educao pblica elucidar a atual arranjo

    federativo.

    2.3.1 Da tributao e arrecadao

    A anlise da tributao ser pela identificao dos tributos das trs esferas da

    Repblica seu arranjo administrativo impactando na operacionalizao da educao

    pblica. Cada esfera federativa possui sua prpria tributao que lhe garante a

    renda prpria. Desta maneira, cada competncia que fora atribuda aos entes para o

    fornecimento do ensino pblico ser realizada mediante tributao de cada ente.

    Conforme visto, a Unio, assim como os Estados, cooperar no somente

    tecnicamente como tambm financeiramente com os Municpios. Alm disto, do

    Oramento Pblico de cada ente ter um gasto mnimo estipulado pela Constituio

    da Repblica com educao:

  • 21

    Art. 212. A Unio aplicar, anualmente, nunca menos de dezoito, e os Estados, o Distrito Federal e os Municpios vinte e cinco por cento, no mnimo, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferncias, na manuteno e desenvolvimento do ensino. (BRASIL, 1988)

    Os Estados, o Distrito Federal e Municpios tero sua renda proveniente no

    apenas da tributao competente a eles como tambm os repasses da Unio

    comprometidos para a educao pblica. Antes de fazer uma anlise da participao

    de cada na tributao total devem-se levar alguns aspectos importantes quanto

    realidade fiscal do Brasil. Um deles a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) que

    limita gastos excessivos de Estados e Municpios alm da sua renda usual

    proveniente de tributos e repasses da Unio.

    A LRF tem base no artigo 163 da Constituio da Repblica que prev lei

    complementar que dispor sobre as finanas pblicas com o intuito de balizar a

    disciplina fiscal, o controle e a sustentabilidade intertemporal das contas pblicas

    nas trs esferas de governo. Para efeitos prticos, os resultados fiscais so

    pautados em metas da dvida lquida e do supervit primrio do setor pblico e

    regras que impedem que a Unio, os Estados, o Distrito Federal e Municpios

    contraiam dvidas insolventes. (NUNES, 2000)

    Os resultados desta lei complementar, a LRF, para o setor privado uma maior

    oferta de poupana j que os Estados e Municpios no poderiam rolar suas dvidas,

    i.e., cobrir seu dficit do oramento e dvida lquida e consumindo grande parte da

    poupana do mercado. Para o setor pblico a crescente dvida bruta e os juros

    cessaram para nveis aceitveis que no compromete o Oramento Pblico em

    grande parte com o servio da dvida, garantindo um bom saneamento fiscal e

    induzindo s boas prticas pblicas.

    No entanto, para a Unio a LRF no produz efeitos como para os outros entes.

    Desde que fora promulgado a lei complementar, as despesas da unio foram

    superiores arrecadao. O refinanciamento da dvida uma constante. (BRASIL,

    2011). Sendo assim, a Unio a nica esfera federativa capaz de obter

    financiamento no mercado financeiro nacional e internacional e sem preocupao

    com uma situao fiscal coerente com a realidade tornando os gastos da Unio mais

    elsticos comparado outras esferas. Os resultados so a antpoda da disciplina fiscal

  • 22

    prevista em Constituio e pela LRF. As leis tm implicaes no apenas na

    questo fiscal conforme dito, mas tambm no tratamento poltico delas e a Unio

    no se vale destas regras. (BRASIL, 2011)

    2.3.2. Da configurao da tributao

    Analisar o quanto tributa os Municpios, os Estados e o Distrito Federal e a

    Unio fundamental para se entender o trato com a educao pblica em um

    ambiente federado, considerando toda a constitucionalidade e organizao

    contemplada at agora. Da perspectiva poltica, a administrao deste servio

    pblico centralizada na esfera da Unio e reflete na arrecadao dos tributos no

    territrio nacional.

    Participao de cada ente federativo do total tributado, em

    porcentagem:

    Fonte: IBPT Instituto Brasileiro de Planejamento Tributrio

    O grfico demonstra uma alta concentrao dos tributos arrecadados na Unio.

    Ao longo dos anos aps a promulgao da Constituio da Repblica em 1988

    percebe-se a consolidao de arranjo federativo que no corresponde s premissas

  • 23

    clssicas de descentralizao poltica e administrativa dos Estados. (GEBARA,

    2010)

    Para os sistemas educacionais pblicas esta incoerncia federativa prevista

    no artigo 211. Da ordem poltica, no h a possibilidade de gerir os recursos de

    maneira apropriada pelos Estados e Municpios onde houve a arrecadao. A lgica

    simples: do total arrecadado em territrio nacional, a Unio fica com maior parte

    (69,5% em 2010) e distorce o poder poltico e econmico dos Estados, que por sua

    vez h evidentes disparidades econmicas regionais, sendo assim suas

    necessidades. (BRASIL, 2009)

    Dos totais arrecadados pela Unio, h o repasse de parte dos tributos para os

    Estados. A Unio, mais uma vez, tem o papel de administrador central que utilizar

    critrios polticos contemplados pela Constituio da Repblica. O fundamental para

    a anlise da educao pblica da cooperao financeira entre os entes. No atual

    arranjo federativo, a Unio dispe da maior parte dos tributos nacionais para o

    repasse. O prximo grfico ilustra como o repasse pela Receita Federal do Brasil

    (RFB) no ano de 2009:

    Fonte: Portal da Transparncia do Governo Federal RFB Sistema DW-Arrecadao - Dados de 2009

  • 24

    A distoro dita anteriormente ilustrada empiricamente com os dados do

    quanto os respectivos Estados receberam dos tributos federais em relao ao que

    fora arrecadado de suas economias. As disparidades entre o Estado que mais

    recebe e o que menos recebe repasse da seguinte grandeza: o Estado de So

    Paulo recebeu 11% do que fora arrecadado enquanto o Estado do Acre, por sua

    vez, recebeu 1086% dos tributos federais. As diferenas regionais demonstram no

    ser um empecilho administrao pblica, ao menos para os que recebem mais que

    pagam aos cofres da Unio.

    Da arrecadao de tributos em 2009, os tributos federais representam 69,54%

    do total arrecadado, enquanto que os tributos estaduais representam 25,88% e os

    municipais 4,58%. Percebe-se a centralizao da arrecadao atravs da

    porcentagem que representam os tributos federais. (BRASIL, 2009a)

    Dos tributos federais, deduzido a Receita Previdenciria, a RFB administrou R$

    497,38 bi arrecadados dos Estados e Distrito Federal.

    Dos R$ 1,09 tri o total arrecadado pela mquina pblica, tal receita do RFB

    corresponde a 45,63% de toda a arrecadao. J as transferncias do Governo

    Federal para os Estados, Distrito Federal e municpios foram de R$ 209,36 bi. Isso

    corresponde a 42,05% do total de receita administrado pelo RFB, 19,2% de todo a

    arrecadao de 2009. (BRASIL, 2009)

    Dos tributos federais totais, s 27,61% voltam para os Estados, sendo

    absorvido para assuntos do Governo Federal 72,39% destes tributos, ou R$ 550,07

    bi. Portanto, as receitas da Unio deduzidas transferncias para os Estados, DF e

    Municpios fica em 50,46% da arrecadao geral.

    Estes nmeros refletem o que a Constituio Federal contempla. No inciso 1

    do artigo 212 explicita:

    1. A parcela da arrecadao de impostos transferida pela Unio aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municpios, ou pelos Estados aos respectivos Municpios, no considerada, para efeito do clculo previsto neste artigo, receita do governo que a transferir.

  • 25

    H de se recobrar que, independente da arrecadao absoluta dos Municpios,

    Estados e Distrito Federal reflete a dinmica econmica regional.

    Constitucionalmente existe uma porcentagem mnima para gastos com educao,

    que por sua vez sofre disparidade se considerados os repasses da Unio para os

    Estados e Municpios. (BRASIL, 2009)

    J no se pode dizer o mesmo dos anseios de cada populao, pois em

    relao educao pblica, h um gasto mnimo contemplado pela Constituio.

    Inclusive o repasse dos tributos Unio no tem sintonia com os anseios polticos

    locais.

    O poder poltico da Unio em detrimento dos outros entes federativos vai alm

    de uma assero emprica como fora demonstrado at aqui. Ela a todo o momento

    a priori, i.e., passvel de entendimento terico e constatao pelo mtodo dedutivo.

    A prpria Constituio da Repblica de 1988 vislumbra este federalismo de

    departamento. No h um poder constitudo para os Estados de forma que se

    organizem e tenham autonomia sobre si. As polticas pblicas estaduais devem

    orbitar as polticas pblicas nacionais, essas ltimas que desconsideram as

    diferenas econmicas entre as regies e os Estados.

    3. A distribuio dos recursos pblicos assegurar prioridade ao atendimento das necessidades do ensino obrigatrio, nos termos do plano nacional de educao. (BRASIL, 1988)

    O inciso 3 do artigo 212 da Constituio da Repblica normativa a respeito

    do trato com os recursos pblicos. Conforme o grfico dos Estados, o ensino

    obrigatrio tem sua qualidade, a manuteno do sistema pblico de ensino, de forma

    planificada e igualitria.

    Esta viso no compartilhada por parte dos estudiosos na rea da educao.

    A municipalizao ficou vinculada s negociaes polticas entre os estados e municpios, sem que houvesse uma arena institucional para isso e/ou critrios claros de repasse de funes, de modo que este processo dependeu muito mais do jogo de poder federativo para alm da poltica educacional em si. Dito de outro modo, no houve incentivos financeiros, gerenciais ou de democratizao que

  • 26

    guiassem a relao entre os nveis de governo e sua necessria colaborao. (ABRUCIO, 2010, p.61)

    Nesta citao, o entendimento sobre a dinmica federativa errnea. Uma

    Repblica Federativa um instrumento que em si permite polticas educacionais de

    todo os tipos. Tendo como referncia a constitucionalidade da federao dos EUA,

    concomitantemente com o aspecto jurdico de interveno dos Estados na Unio, os

    aspectos polticos das funes desenvolvidas dos poderes estaduais esto mais

    prximos do quotidiano das pessoas e onde os partidos, carreiras dos homens

    pblicos e a vida poltica em geral so dominados ou influenciados. (GEBARA, 2010,

    p.18)

    A municipalizao a intensificao das relaes pblicas em uma esfera mais

    prxima da populao. No entanto, na realidade brasileira, a descentralizao da

    educao pblica somente de ordem organizacional. Politicamente e

    administrativamente a centralizao na esfera federal antes de tudo constitucional,

    refletido na gesto dos recursos pblicos.

    Os incentivos financeiros e gerenciais tambm so previstos no artigo 211

    citado neste trabalho monogrfico. Abrucio de alguma maneira entende que a arena

    institucional, a Repblica Federativa, no a adequada. Certamente o regime

    federativo com o iderio de Hamilton, Madison e Jay, autores dos artigos federalistas

    que embasaram a constituio americana, no compartilhada pelos crticos da

    descentralizao da educao, como Abrucio. Ainda sim, tais crticas ao sistema

    vigente no Brasil no so vlidas por desconsiderarem os antagonismos do

    federalismo americano do federalismo brasileiro. No se pode considerar que no

    exista uma arena institucional, talvez no a idealizada pelos crticos. justamente a

    centralizao jurdica e poltica da Unio que a vigente no Brasil. A

    municipalizao da educao no Brasil de uma Repblica parcialmente federativa,

    por no compreender um federalismo fiscal ao federalismo jurdico-poltico. (CURY,

    2010, p. 163 cf. ABRUCIO, 2010).

  • 27

    3. DOS IMPACTOS ECONMICOS: UMA ABORDAGEM TERICA

    A histria recente da humanidade mostra uma busca de disseminar

    conhecimento como instrumento emancipador. Primeiro de ordem espiritual, seguido

    de conhecimentos cientficos. Estes conhecimentos cientficos permitiram um

    aumento do bem-estar de muitos indivduos. Ao mesmo tempo, as relaes sociais

    nunca foram to intensas, surgindo at antteses do bem-estar atravs de

    movimentos polticos armados e revolucionrios.

    A despeito de todas problemticas polticas, os estados tornaram-se

    obcecados em disponibilizar acesso educao. Via de regra, h duas possibilidade

    disto acontecer: no mbito privado ou no mbito pblico.

    Em todas elas haver uma coordenao de esforos, uma cadeia complexa de

    aes de muitos indivduos agindo de maneira proposital para atingir o objetivo.

    Qualquer que seja a opo, uma vez constatada, os agentes agiro de forma que

    alcance os objetivos segundo seus preceitos.

    Esta o objeto de estudo da cincias econmicas: a ao humana. Numa

    clebre frase, Ludwig Von Mises diz que economia no lida com coisas e objetos

    materiais tangveis, trata dos homens, suas aes e propsitos. Esta ser a

    abordagem deste trabalho monogrfico na investigao dos impactos econmicos

    da educao pblica no Brasil, embasando-se teoricamente na praxeologia, ou

    estudo da ao humana. Tal pensamento cientfico conhecido como Escola

    Austraca de economia, surgido no sculo XIX ao fazer uma anlise marginal e

    praxeolgica nicos em seu tempo, no entanto foi um resgate da tradio do

    pensamento de origem catlica e europia continental de estudos econmicos dos

    escolsticos tardios da Universidade de Salamanca, na Espanha no perodo

    conhecido como Sculo Dourado Espanhol, de meados do sculo XVI at o fim do

    sculo XVII. (SOTO, 2005)

    No contexto da educao pblica brasileira aps a Constituio da Repblica, o

    objeto de estudo ser a singularidade da sociedade em questo. Estabelece-se por

    meio de leis universais os impactos econmicos da universalizao da educao no

    Brasil. Tais leis obedecem aos axiomas de modo que pela lgica de suas premissas

  • 28

    quaisquer implicaes derivam delas mesmas. De maneira prtica, o raciocnio

    analtico meramente conceitual e dedutivo.

    Ao estudar os impactos econmicos estaremos tratando de resultados de

    aes humanas, que podem ocorrer e deixar de ocorrer. No apenas por

    convenincia, a cincia apriorstica a nica que permite estudar algo to complexo

    e que pode no estar ao olho nu, ou seja, passvel de constatao emprica, que,

    por sua vez, deve estar suportada por uma base terica que por si j uma

    investigao coerente e cientfica fruto do raciocnio dedutivo.

    A tarefa mais importante do raciocnio apriorstico , por um lado, revelar tudo o que se pode inferir das categorias, conceitos e premissas e, por outro, mostrar o que no se pode inferir. Sua funo tornar claro e evidente o que antes era obscuro e desconhecido. (MISES, 1990, p.56)

    O que poderia se esperar do esforo em tornar a educao no Brasil

    obrigatria? Como os entes da federao em conjunto com a sociedade civil iro se

    comportar neste cenrio? Quais mtodos so possveis para auferir o xito das

    polticas pblicas educacionais? Seria possvel uma anlise que desconsiderasse

    qualquer mensurao e investigao dos resultados? Seria prudente esperar outro

    resultado do que o apresentado?

    As respostas para estes questionamentos no seria possvel se no

    considerarmos o mtodo dedutivo permeando toda e qualquer investigao.

    Sero tratados conceitos que exporo o raciocnio no somente deste trabalho,

    mas dos prprios conceitos em si. No haver induo por entender que tal mtodo

    distorce a compreenso da realidade pela razo de que asseres no so

    passveis de reflexes em conjunto com a prpria natureza do objeto. A verdade no

    estaria luz da razo, sendo somente uma viso fidesta do assunto.

    Desta maneira, considerando todos os dados pertinentes, o conhecimento de

    como as instituies em questo esto organizadas em contemplar a educao

    pblica, fazendo par com as aes dos agentes no cerne do estudo, este trabalho

    tem como meta expor a realidade alm de uma abordagem historicista. O tempo

  • 29

    ser a razo das aes humanas no espao, os resultados das relaes sociais e

    todo o seu propsito.

    3.1. DA EDUCAO PBLICA NO BRASIL: A COMPULSORIEDADE DE UM BEM

    NO-ECONMICO

    Tratar da educao pblica tratar de todo o arranjo dos sistemas de ensinos

    dos das esferas federativas para um fim claro: a obrigatoriedade dos ensinos bsico,

    fundamental e mdio em todo o territrio nacional:

    Nos ltimos anos, assistimos ampliao da obrigatoriedade da educao. O texto original da Constituio de 1988 distinguiu o dever do Estado da obrigatoriedade, esta ltima aplicada ao indivduo, sujeito do Direito. Estabeleceu, no caput do artigo 208, o dever do Estado para com a educao e, em seu inciso I, obrigava o indivduo apenas ao ensino fundamental, posteriormente definido como de oito anos de durao pela Lei n 9.394/1996 (a LDB). Posteriormente, o texto constitucional foi alterado primeiro pela Emenda Constitucional n 14/1996, que tornou mais precisa a redao da verso original, eliminando uma impreciso que estendia a obrigatoriedade aos maiores de 14 anos. (OLIVEIRA, 2007) Mais recentemente, a obrigatoriedade foi alterada por meio da Lei n 11.114, de 16/05/2005, que estabeleceu o incio do ensino fundamental aos seis anos e, em seguida, pela Lei n 11.274, de 06/02/2006, que estabeleceu o ensino fundamental de nove anos. Finalmente, com a Emenda Constitucional n 59, de 11/11/2009, estabeleceu-se a obrigatoriedade do ensino dos quatro aos 17 anos, abrangendo a pr-escola, o ensino fundamental e o ensino mdio. (PORTELA DE OLIVEIRA, 2010, p. 9 cf. ABRUCIO, 2010)

    Para compreender os impactos da obrigatoriedade e acesso irrestrito ao

    sistema pblico de ensino, h de se considerar pontos cruciais no comportamento

    dos indivduos e as interaes sociais propositadas.

    Considerando a sociedade brasileira, o acesso irrestrito educao tem o

    intuito claro de possibilitar o aumento do bem-estar individual e previsto na

    Constituio da Repblica. A compulsoriedade visto como direito garantido:

    Art. 205. A educao, direito de todos e dever do Estado e da famlia, ser promovida e incentivada com a colaborao da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exerccio da cidadania e sua qualificao para o trabalho. (BRASIL, 1988)

  • 30

    A promoo da educao como dever do Estado deve ser incentivada com a

    colaborao da sociedade para fins individuais de melhoria do aspecto humano e

    social.

    Surgem dois problemas prticos. Primeiramente, como auferir a melhoria do

    aspecto humano e social de uma a pessoa, sendo que ela ter um valor subjetivo e

    individualizado do ensino, assim como o proveito, e que a nica opo dela se

    restringe em ter educao a qual tem acesso irrestrito, a pblica, sendo a privada

    sujeito oferta no mercado?

    A segunda pergunta mais simples e que pode ajudar a responder a questo

    anterior: como ofertar uma educao para todos e que atenda aos anseios histricos

    e constitucionais de melhoria do bem-estar da sociedade brasileira?

    H de se considerar tudo o que fora abordado at aqui sobre a educao

    pblica no Brasil. Ainda sim, a anlise que se faz do servio pblico universal e

    baseado na ao humana, precisamente da ao dos brasileiros quanto

    universalizao da educao.

    Supondo que a oferta da educao pblica seja plena, para que ocorra tal fato,

    ter-se- tributado o suficiente para custear o servio. Da tributao, independente da

    quantidade monetria, o que poderia ser usado para outros fins ter-se- custeado o

    que compulsrio. Se o ensino atendesse as expectativas de cada pessoa em

    melhorar seu bem-estar, logo no haveria de ser obrigatrio Alm disso, como se

    pode admitir o pleno desenvolvimento de uma pessoa, bem como seu preparo para

    o exerccio da cidadania e sua qualificao para o trabalho se no h a possibilidade

    de uma aferio individual e que este indivduo no possua outra opo to quo

    acessvel quanto os sistemas pblicos disponveis?

    Estamos diante de uma situao injusta, sendo que a tributao lhe serviria

    para atender suas necessidades, porm o indivduo no carrega consigo a chance

    de optar por algo que de fato atenderia seus anseios em relao ao que dispe dos

    sistemas pblico comparativamente.

  • 31

    Mesmo se por presses polticas o indivduo tivesse suas reivindicaes

    atendidas, teramos ento um favorecimento individual de um bem pblico. Se o

    contrrio, reivindicaes polticas fossem atendidas e tivesse presso sobre outro

    indivduo, o bem-estar seria uma imposio Ou melhor, a pessoa se desenvolveria

    pr-moldado, como um agente social e econmico passivo. Seria o estgio

    derradeiro de uma oferta de educao pblica plena o no xito de seus propsitos.

    Para entender de maneira completa, joga-se luz sobre a tributao. Essencial

    para a manuteno do sistema pblico, ela representao monetria da produo

    individual confiscada pelos entes federativos. Considerar aqui as problemticas

    polticas quanto tributao seria desviar o foco da representao exata e

    implicaes prticas para a sociedade: so recursos obtidos em um ambiente

    econmico, onde as interaes sociais propiciaram um intercmbio de produo em

    que as pessoas inseridas buscavam atender seus desejos. Os recursos foram

    retirados do mercado.

    3.1.1. Consideraes sobre o mercado

    H de se definir exatamente o que um ambiente de mercado. Apesar das

    inmeras abordagens ideolgicas das escolas de pensamento como a Marxista,

    Fabiana e Frankfurt, o mercado tratado pela Escola Austraca de maneira objetiva:

    A economia de mercado o sistema social baseado na diviso do trabalho e na propriedade privada dos meios de produo. Todos agem por conta prpria; mas as aes de cada um procuram satisfazer tanto as suas prprias necessidades como tambm as necessidades de outras pessoas. Ao agir, todos servem seus concidados. Por outro lado, todos so por eles servidos. Cada um ao mesmo tempo um meio e um fim; um fim ltimo em si mesmo e um meio para que outras pessoas possam atingir seus prprios fins. (MISES, 1990, p. 360)

    Neste ambiente as pessoas agem por meio de incentivos. um processo

    impulsionado pela interao social de vrios indivduos. No pode ser visto como

    determinante social, muito pelo contrrio. Somente determinada estrutura social, no

    considerando certas limitaes polticas, permite uma economia de mercado.

    Ainda mais:

  • 32

    Desde que se comeou a estudar sistematicamente economia ou economia poltica, tm estado todos de acordo com a idia de que a tarefa deste ramo do conhecimento investigar os fenmenos do mercado, isto , a determinao da relao de troca dos bens e servios negociados no mercado, sua origem na ao humana e seus efeitos nas aes posteriores. Toda ao motivada pelo desejo de suprimir um determinado desconforto. Pouco importa, para a cincia da ao, a maneira pela qual as pessoas qualificam esse desconforto do ponto de vista fisiolgico, psicolgico ou tico. (MISES, 1990, p.325)

    tambm atravs do mercado que a Unio, os Estados e Distrito Federal e

    Municpios financiam seus sistemas pblicos via tributos.

    Atravs da praxeologia, o estudo da ao humana, os tributos representam

    uma interferncia na mpar na sociedade brasileira. Parte da produo confiscada

    do mercado e vai para os governos que por sua vez ofertam servios pblicos,

    incluindo a educao. No mercado, os indivduos trocam bens e servios sendo eles

    guiados por incentivos em suprimir determinado desconforto, valorando subjetiva e

    individualmente. O tributo incide nessas trocas e subtrai a riqueza, diminuindo a

    oferta.

    Vale lembrar que a oferta de bens no atende toda a demanda. O mercado procura

    atender at sua capacidade, dentro de um sistema de preos - lucro ou prejuzo aos

    ofertantes - que sinaliza qual atividade econmica est gerando valor, i.e., atende de

    maneira mais eficiente a demanda. A escassez uma situao:

    [...] verificada constantemente, em relao grande maioria dos bens tendo como resultado inevitvel que parte das necessidades existentes ter que permanecer desatendida. No nos referimos aqui aos artigos de luxo, pois no caso destes a situao acima automtica. Ocorre que as peas de vesturio mais elementares, as moradias mais comuns, os vveres mais generalizados e outros artigos tambm fazem parte dessa categoria de bens. Mesmo terras, pedras, retalhos e refugos, via de regra, no se encontram disponveis em quantidades tais que se consiga atender a todas as necessidades existentes. (MENGER, 1983, p. 269)

    O cerne da tributao est na limitao de escolha da sociedade brasileira. Os

    impostos, taxas de todos os tipos, regulamentaes e contribuies compulsrias

  • 33

    Repblica Federativa efetivamente aloca parte da riqueza dos indivduos para fins

    de polticas pblicas.

    As polticas pblicas por sua vez no compreendem o ambiente de competio

    que o mercado. No h sinais claros de satisfao dos indivduos quanto aos

    servios que esto obrigados a pagar. A compulsoriedade da educao o

    distanciamento desta interao social dinmica do mercado: no h opo

    equivalente ao valor do tributo para ser gasto nem mesmo com outro servio

    equivalente.

    3.2. DA EDUCAO: A TRANSFORMAO DE UM BEM ECONMICO EM NO

    ECONMICO

    A educao pblica no Brasil tende oferta plena. O acesso universal um

    objetivo de todas as esferas governamentais. Ento se pode aceitar que esta oferta

    no conseguir atender s necessidades dos brasileiros por desconsiderar estas

    mesmas necessidades.

    Se a iniciativa pblica conseguisse garantir acesso irrestrito educao, este

    seria uma contradio. No que as polticas pblicas no pudessem estabelecer

    plena oferta, mas sim do bem em questo, a educao.

    A questo no mais a tributria, como visto anteriormente. Certamente

    importante para entender a dinmica e os impactos econmicos, porm, tudo

    apenas conseqncia, aplicao prtica do que fundamental.

    E o fundamento da incapacidade de oferta plena de educao est na natureza

    do ofertante: a repblica. Novamente, considerar as problemticas polticas

    desnecessrio e prejudicial para o entendimento correto. A natureza da repblica

    independe do aspecto poltico.

    A repblica , etimologicamente, a coisa pblica, o que de apropriao de

    todos. Costuma-se ser objeto de estudo o estado para analisar polticas pblicas.

    Todavia, aqui o estado deve ser compreendido como algo anterior forma de

  • 34

    governo, ou seja, a ao poltica. A repblica uma apreenso que se sucede da

    ao poltica. No importa se monarquia, estado de direito, ditadura ou

    democracia. Todas as formas de governo apreendem a repblica e suas

    amlgamas. (ARISTTELES, 2004, p 188)

    Tornar a educao pblica significa a apropriao da educao por todos. Se o

    conhecimento construdo interiormente, i.e., individualmente, a educao como

    bem pblico no compreende esta interioridade. Externar o que s pode ser

    construdo interiormente , na melhor das hipteses, condicionamento de algo j

    construdo e estabelecido pela sociedade. O condicionamento, portanto, uma

    conseqncia direta, e tem seu efeito prtico o nivelamento pelo menor

    denominador comum.

    A universalizao da educao pblica na Repblica Federativa do Brasil

    exatamente isso. Estender a todos o acesso educao transformar um bem

    econmico, o conhecimento, em um bem no econmico. No apenas isso, mas a

    descaracterizao do federalismo ao centralizar a administrao das polticas

    pblicas na esfera da Unio.

    Bem econmico na perspectiva austraca quando a demanda pelo bem em

    qualquer hiptese maior que a oferta e sendo assim objeto da economia humana.

    Este fenmeno ocorre quando as pessoas que, mesmo na qualidade de membros

    de sociedade, continuam a procurar seus interesses particulares. (MENGER, 1983,

    p.270)

    Estes bens econmicos s o so por possurem valor de troca, i.e., um

    indivduo dispe-se de bem econmico que possui para obter outro do mesmo valor

    de outro indivduo. "o que no tem valor (de troca) no pode ser riqueza. Essas

    coisas no fazem parte da Economia Poltica." (SAY, 1803, p.2 apud MENGER).

    A educao por ser um bem econmico, portanto, ser objeto de troca, sendo

    que sua demanda maior que a oferta, poderia explicar a universalizao da

    educao pblica no Brasil, que a tornaria em um bem no econmico sem

    necessidade de contrapartida, i.e, perdendo o valor de troca.

  • 35

    Ocorre que, ao tornar a educao em um bem no econmico, isso implica

    necessariamente em um regresso cultural da sociedade. A educao que uma vez

    tinha valor e possibilitava alcanar maior bem-estar, a oferta irrestrita agora no

    possui os sinais implcitos de perda de valor. Perda, pois o valor que antes possua

    era por ser um bem econmico. Em Menger:

    [...] os progressos dos homens no conhecimento do nexo causal das coisas com seu bem-estar humano, fazendo com que surjam novos usos dos bens em questo. [...] trata-se, no caso, de fenmenos que costumam acompanhar a transio dos homens de uma fase cultural inferior para um estgio superior; com isso, conclui-se que, com o advento do progresso cultural, os bens no econmicos tm a tendncia de se transformar em bens econmicos, e isso, sobretudo, pelo fato de que um dos fatores que no caso influem -a demanda humana -sofre aumento, em decorrncia do progresso cultural. Se a isso se acrescer ainda a diminuio das quantidades disponveis dos bens em questo, nada mais natural do que ocorrer o seguinte: bens cuja quantidade disponvel, em estgio cultural anterior, superava em muito a demanda humana e, portanto, eram bens no econmicos, com o correr do tempo transformaram-se em bens econmicos. (MENGER, 1983, p. 274).

    O poder transformador dos sistemas educacionais pblicos, agora

    universalizados, perde-se assim que a oferta atinja plenamente sua demanda.

    Pela lgica, se h abundncia na oferta de educao na sociedade, esta

    considerada uma sociedade culturalmente superior. A contradio com a realidade

    brasileira flagrante, pois a universalizao tem como meta atingir uma sociedade

    culturalmente superior, que tenha padres elevados de bem-estar, porm

    transformando um bem econmico em no econmico. Em outras palavras,

    tornando artificial o desenvolvimento da sociedade.

    O Brasil dispe ento de sistemas educacionais pblicos que no condizem

    com a realidade cultural-econmica. Enquanto em um pas culturalmente

    subdesenvolvido o ensino primrio representa um bem econmico, o mesmo no

    acontece no caso do pas desenvolvido, onde o ensino primrio abundante,

    superando at a demanda da populao. (MENGER, 1983, p. 275)

  • 36

    O acesso irrestrito educao se d s duras penas, pois o bem-estar da

    sociedade posto como um desafio educao. Cobram-se tributos que diminuem

    o bem-estar da sociedade, em contrapartida transforma um bem econmico em um

    no econmico. Perde-se duas vezes, pois a riqueza produzida pelo mercado, que

    promoveria o bem estar, subtrada para custeio da universalizao da educao.

    Esta riqueza uma vez subtrada, na melhor das hipteses, tem condies mnimas,

    conforme visto at ento, de promover o bem-estar agora mais necessrio que

    antes.

    Ainda sobre a educao compulsria como poder transformador e promovedor

    de bem-estar, alm de incoerente, h sensvel incompreenso dos indivduos na

    sociedade. Mises argumenta:

    Tambm se afirma freqentemente que o fracasso do homem pobre no processo de competio causado por sua falta de instruo. S pode haver igualdade de oportunidade, costuma-se dizer, quando a educao, em qualquer grau, se torna acessvel a todos. Prevalece hoje a tendncia de reduzir as diferenas entre as pessoas a diferenas de educao, negando-se a existncia de diferenas inatas como a inteligncia, a fora de vontade e o carter. Geralmente no se percebe que a educao nunca pode ser mais do que uma doutrinao de teorias e idias j conhecidas. A educao, qualquer que seja o seu benefcio, transmisso de doutrinas e valores tradicionais. , por necessidade, conservadora; produz imitao e rotina, e no aperfeioamento e progresso. (MISES, 1990, p. 433 434)

    Tal argumento tambm implica diretamente na crtica centralizao e

    cooperao entre os entes federativos no Brasil. Conforme abordado nos captulos

    anteriores, existe uma concentrao administrativa e legal no que tange a educao

    pblica na Unio e prevista na Constituio da Repblica, cooperao tcnica entre

    os entes e equalizao da oferta pblica em todo o territrio nacional em detrimento

    de uma potencial oferta adequada em todas as Unidades Federativas.

    Fora observado que no h autonomia dos Estados. A despeito das questes

    polticas de soberania nacional o que seria um atraso ao pensamento reduzir

    questes internas e individuais num discurso nacional-socialistas uma educao

    que pertena a todos esbarra em uma inconvenincia social:

  • 37

    que nada inspira menos confiana do que algo cuja posse comum a muitas pessoas. Damos exagerada importncia ao que propriamente nos pertence, ao passo que s consideramos as propriedades comuns em proporo a nos interesse. (ARISTTELES, 2004, p. 40).

    A Unio a esfera em que se concentram os maiores encargos com a

    educao e em que todos os cidados brasileiros teriam poder poltico. A educao

    pblica como bem no econmico a expresso mxima da proposio aristotlica

    em qualquer mbito social.

    Considerar tudo que fora exposto permite caracterizar a educao pblica

    universal como algo prejudicial para econmica, alm de incua socialmente. No

    entanto, no permite estender essa proposio a sua totalidade. Isso significa que, o

    sistema pblico de educao no Brasil no pode atingir seus objetivos, mas no

    impede que em algum momento uma frao desta oferta plena logre seus objetivos.

    A possibilidade se deve a diferenciao da qualidade do bem no econmico.

    E exatamente o que acontece com algumas instituies educacionais pblicas.

    Goza-se de prestgio e estima entre a populao alguma instituio pblica que

    supre a adequadamente a demanda em qualidade.

    Nestas instituies pblicas verifica-se alta competitividade no acesso:

    pelo fato de haver certas quantidades parciais atendendo melhor, ou de maneira mais completa, as necessidades existentes, pode acontecer que essas passem a transformar-se em bens econmicos, permanecendo como bens no econmicos as quantidades que no possuem essa qualidade superior. (MENGER, 1983, p. 276)

    Nestes locais, admite-se quem tem melhor qualificao, o que garante o

    prestgio. A qualificao dos alunos nestas instituies, como se espera, fora

    conseguida ou no mercado de educao ou em outra instituio pblica de

    excelncia. E que, por sua vez, deve ter tido algum tipo de educao familiar

    superior para ter ingressado na instituio pblica de excelncia. Se formos ao

    radical, fatalmente constataremos que a famlia que possua maior bem-estar, e no

    necessariamente maior escolaridade, que possibilitou o ingresso dos filhos em tais

    instituies. E nem poderia ser diferente, pois como j estudado aqui, a educao

  • 38

    como bem econmico correspondente a qualquer oferta no mercado que tenha

    valor equivalente. Ainda sobre a distino das qualidades e quantidades:

    a razo que diversifica os bens em econmicos e no econmicos permanece a mesma: no caso das quantidades de bens de qualidade superior, trata-se de bens econmicos pelo fato de sua demanda superar a oferta; ao contrrio no caso dos bens de qualidade inferior, estes esto disponveis em quantidade superior demanda (demanda que no pode ser suficientemente atendida pela disponibilidade dos bens de qualidade superior), razo pela qual continuam sendo bens no econmicos. Como se v, no se trata, no caso, de exceo em relao aos princpios enunciados, mas antes de confirmao dos mesmos. (MENGER, 1983, p. 276)

    No h qualquer possibilidade de tratar a educao como um bem

    naturalmente no econmico. Ele na verdade nunca ser a no ser artificialmente.

    Primeiro as definies estariam deturpadas: ofertar educao precisa de espao

    fsico, funcionrios e professores, investimento e manuteno. Por isso os tributos

    para financiamento.

    3.3. A CRTICA DA MERCANTILIZAO DA EDUCAO

    Segundo que mesmo com a oferta de educao pblica plena, virtual ou real,

    no extingue a oferta de educao privada.

    O cerne no tratar educao como mercadoria. Os crticos da educao

    como bem econmico e a favor da universalizao da educao denunciam a

    mercantilizao da educao como entrave transformao scio-econmica, que

    para esses crticos se baseiam na doutrina marxista.

    Mercadoria em Karl Marx qualquer objeto que por si confere valor-de-uso e

    valor-de-troca, sendo as distines entre eles e de ordem qualitativa e quantitativa,

    respectivamente.

    Do valor-de-uso de uma mercadoria seria ter uma utilidade ditada pela qualidade

    que ela em tese teria, sendo assim:

    esta utilidade nada tem de vago e de indeciso. Sendo determinada pelas propriedades do corpo da mercadoria, no existe sem ele. O

  • 39

    prprio corpo da mercadoria, tal como o ferro, o trigo, o diamante, etc., , conseqentemente, um valor-de-uso, e no o maior ou menor trabalho necessrio ao homem para se apropriar das qualidades teis que lhe confere esse carcter. Quando esto em causa valores-de-uso, subentende-se sempre uma quantidade determinada, como uma dzia de relgios, um metro de tecido, uma tonelada de ferro, etc. Os valores-de-uso das mercadorias constituem o objecto de um saber particular: a cincia e a arte comerciais. Os valores-de-uso s se realizam pelo uso ou pelo consumo. Constituem o contedo material da riqueza, qualquer que seja a forma social dessa riqueza. (MARX, 1974)

    A noo de educao como mercadoria de valor-de-uso , na realidade, o que

    se sustenta a oferta pblica irrestrita. A educao por si lhe confere status

    transformador social e promovedor de bem-estar. Certamente, utilizar o argumento

    de mercantilizao da educao como crtica a existncia de educao privada

    mesmo com a plena oferta pblica seria uma contractio in adjecto, pois a

    praxeologia explica que a satisfao dos indivduos no estaria sido garantida

    apenas pela oferta pblica, pelos motivos j estudados aqui. Desta maneira, a

    educao naturalmente no lhe confere valor-de-uso por si e no poderia ser tratado

    como mercadoria a no ser que este fosse transformado em um bem no

    econmico.

    Em Menger, constata-se que a diferenciao do bem econmico e no

    econmico a maior demanda do bem que a oferta e vice-versa. Em Say e toda a

    Escola Austraca, a noo de valor fora constatado como sendo subjetivas e de

    acordo coma as necessidades individuais. Da valorao do bem econmico as

    trocas seriam equivalentes ao custo de no mais possu-las, sendo que um bem que

    um indivduo deseja adquirir vale o tanto quanto for necessrio para que ele oferte

    outro bem que outro indivduo deseja para que este deixe de possuir, consumando

    assim as trocas em ambiente social chamado mercado.

    Em Marx, onde repousa a crtica de mercantilizao, ou seja, o que se

    entende dessa doutrina como tratamento da educao como bem econmico, h o

    valor-de-troca da mercadoria, em ambiente onde ocorrem as trocas, j dito:

    O valor-de-troca surge, antes de tudo, como a relao quantitativa, a proporo em que valores-de-uso de espcie diferente se trocam entre si, relao que varia constantemente com o tempo e o lugar. O

  • 40

    valor-de-troca parece, portanto, qualquer coisa de arbitrrio e de puramente relativo; um valor-de-troca intrnseco, imanente mercadoria. (MARX, 1974)

    O que Marx diz como arbitrrio e puramente relativo necessariamente o

    mtodo de crtica dele para o valor-de-uso, que assumiria relao qualitativa entre

    as mercadorias.

    Em Marx (1974), na sociedade burguesa, em virtude de uma fictio juris

    econmica, qualquer comprador considerado como possuindo um conhecimento

    enciclopdico das mercadorias.

    Teria que considerar esta assero se considerar que as pessoas de alguma

    maneira conhecem a utilidade e disponibilidade de antemo. Embora a oniscincia

    do valor-de-uso pelas pessoas seja questionada, o que caracterizaria os indivduos

    como homo oeconomicus, isso sequer considerado pela praxeologia. O preo dos

    bens serviria exatamente para exprimir um valor que algum estaria disposto a

    pagar daquilo que o indivduo assume conhecer. No entanto, para Marx, isso seria

    arbitrrio e puramente relativo. Certamente relativo, pois se considera o mercado,

    ou no contexto do autor, a sociedade burguesa, como um corpo social onde

    indivduos exercem livremente suas trocas valorando individualmente qualquer bem

    econmico compreendo o entendimento individualmente. Isso relativo porm, no

    arbitrrio, como presumir que as mercadorias sejam necessariamente bens

    econmicos simplesmente pela finalidade em si. De qualquer maneira, o

    pensamento marxista condiciona que existe uma finalidade pr-estabelecida para

    todos os bens e no permite compreender as diferenas flagrantes entre os

    indivduos da sociedade e suas disponibilidades.

    No apenas isso. A inventividade, criatividade, necessidades gerais sequer

    seguem algum conhecimento enciclopdico, mas sim o ditam. O comprador, a

    pessoa que anseia por educao, que v sua escolha reduzida pela

    compulsoriedade, estar se sujeitando, especificadamente o que seria a crtica

    liberdade de escolha - a concepo de que algum, no caso Marx ou qualquer outra

    pessoa, teria a oniscincia do valor-de-uso intrnseco das mercadorias em um

  • 41

    ambiente em que o bem econmico foi universalizado, a ter a educao

    mercantilizada.

    A ao humana j sofre uma induo.

    O que levou Marx a formular sua doutrina dobre ideologias foi o desejo de solapar o prestgio da cincia econmica. Marx tinha plena conscincia da sua incapacidade para refutar as objees levantadas pelos economistas quanto praticabilidade dos projetos visionrios dos socialistas. (MISES, 1990, p. 110)

    Sendo assim, a compulsoriedade explicada pela viso de Karl Marx sobre os

    bens e idealizao dos indivduos e das relaes sociais, Celeti argumenta que a

    no h autorrealizao possvel se as potencialidades individuais servirem ao

    tecnicismo ou pratica de uma conduta social previamente estabelecida por uma

    educao ideolgica. (CELETI, 2010, p. 43)

    Nenhuma inconsistncia ideolgica pode proporcionar uma soluo satisfatria, ou seja, uma soluo para os problemas que os fatos da realidade nos apresentam. O nico efeito das ideologias contraditrias esconder os problemas reais e, conseqentemente, impedir as pessoas de encontrarem a tempo a poltica adequada para resolv-los. (MISES, 258, p. 258)

  • 42

    4. DOS IMPACTOS ECONMICOS: DA TEORIA CONSTATAO EMPRICA

    Por todo o Brasil imperativo o tema desemprego. As polticas pblicas, das

    Municipais s da Unio, sempre pautam a gerao de empregos como garantidor de

    maior nvel na qualidade de vida e de arrecadao pblica. Do abastecimento de

    gua e energia, passando por isenes e incentivos fiscais, manuteno do

    servio de sade e educao: das polticas pblicas, os objetivos delas sero

    sempre os mesmos.

    No entanto, nenhuma dessas polticas tem mais importncia quanto melhor

    qualidade de vida quanto educao pblica. Independente do ponto poltico que se

    observe ou do mtodo utilizado, assim como os fins gerao e distribuio de

    renda, acessibilidade de produtos e servios, transferncias de renda (BRASIL,

    2004) o acesso universal educao pblica como transformador social e

    econmico o meio defendido pelas polticas para atingir seus objetivos.

    A relao entre a educao e emprego para as polticas pblicas mais que

    correlacional. A cincia econmica estabelece a causalidade entre educao e

    emprego. Um maior dinamismo econmico observado pelo maior dinamismo do

    emprego do capital humano, e sua absoro no mercado geral sendo um indicativo

    de prosperidade.

    Sendo assim, o capital humano disponibilizado atenderia as exigncias do

    mercado pois este ltimo retribuiria ao capital em um nvel adequado para a

    manuteno desta disponibilidade. Em suma, uma sociedade com nvel de

    escolaridade progressivamente elevado significaria que as exigncias do mercado

    estariam sendo atendidas e que a dinmica econmica estaria em uma trajetria

    virtuosa.

    Infelizmente no possvel constar esta dinmica virtuosa no Brasil. A cincia

    desta sentena, sendo a problemtica desta monografia, percebida no apenas

    teoricamente como fora feito at agora, mas passvel de constatao emprica, ou

    seja, encontra-se na realidade da sociedade brasileira.

  • 43

    O que se observa uma crescente variao do nvel de desemprego

    justamente quando h maior escolaridade. Em artigo, Pochmann (2004) ilustra essa

    dinmica:

    Fonte: IBGE (PNAD) Elaborao: SDTS/PMSP

    Um acompanhamento da dinmica do emprego por nvel educacional [...] permite dar conta desta realidade. Em primeiro lugar, vale ressaltar a queda da participao no total de ocupados das pessoas com menos de 1 ano de instruo (analfabetas), de 17,9% para 10,7% entre 1992 e 2002. No extremo oposto, a participao daqueles com mais de 15 anos de estudo (curso superior completo) no conjunto dos ocupados salta de 5,1% para 7,4% ao longo do perodo. Enquanto existiam, no incio da dcada de 1990, 3,3 milhes de trabalhadores com curso superior, 10 anos depois eram 5,8 milhes os trabalhadores formados, um acrscimo de 75%. (POCHMANN, 2004, p. 388)

    Em um primeiro momento, possvel concluir que a o contingente de

    indivduos escolarizados maior que a demanda do mercado. De 1 a 6 anos de

    estudo, as variaes nas taxas de desemprego entre os perodos foram

    decrescente, assumindo que a absoro do mercado de trabalho em funo da

    escolaridade atingiu em 2002 o mesmo nvel que 1992. De maneira prtica, o

    sistema educacional conseguiu suprir a demanda do mercado por indivduos com

    at 6 anos de estudo com a mesma eficincia de uma dcada atrs.

    De maneira objetiva, a melhor situao entre os perodos de plena

    universalizao da educao foi conseguir o mesmo desempenho no que compete o

  • 44

    ensino fundamental. Quanto maior escolaridade, maior se apresentou a ineficincia,

    no conseguindo suprir ao menos o mesmo nvel de 10 anos atrs. Esse fenmeno

    mais que um desvio do objetivo, mas sim um efeito-colateral.

    Na nsia da universalizao da educao, esta no apenas falha de maneira

    miservel, mas introduz uma distoro onde os indivduos mais escolarizados no

    conseguem postos de trabalho nem quando se considera o mesmo nvel de

    demanda no primeiro perodo em 1992.

    Quanto questo da escolaridade, percebe-se que as taxas de desemprego se elevaram a um ritmo mais rpido justamente para os nveis de maior escolaridade entre 1992 e 2002. Para os segmentos com 14 anos de estudo, a desocupao cresceu 76,9%, 3 vezes a mais que o ritmo de crescimento do desemprego para os segmentos educacionais com at 3 anos de estudo. (POCHMANN, 2004 p. 387)

    No entanto, essa realidade no surpreende se adotarmos a teoria econmica

    da Escola Austraca. Isso j fora previsto pela natureza do bem no econmico que

    o servio pblico de acesso irrestrito.

    Essa dinmica do mercado de trabalho est atualizada. De acordo com o

    estudo Education At a Glance da OCDE Organizao para Cooperao e

    Desenvolvimento Econmico (2011) atualiza este fenmeno adverso. Das pessoas

    entre 25 e 64 anos, as taxas de desempregos so maiores para quem possui ensino

    mdio que para quem tem o ensino fundamental. Em 2007, o desemprego desses

    indivduos com ensino mdio foi de 7% contra 5,6% de quem cursou at o ensino

    fundamental. Em 2009, a diferena de desempregados com mais de 9 anos de

    estudo foi 26,3% maior de quem tinha at 8 anos de estudo, permanecendo a

    mesma dinmica desde 1992. (OCDE, 2011, p. 132)

    Desta faixa de idade, se assume ento que a escolaridade dos indivduos

    esteja consolidada e que sua absoro no mercado de trabalho seja mais regular

    que os ingressantes dos 15 aos 24 anos.

    E entre os jovens entre 15 e 24 anos, as razes dessa distoro educacional

    se tornam evidentes. Os nveis de desemprego de quem acabaram de se

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    escolarizar, tendo o ensino mais atualizado que o grupo analisado anteriormente,

    so os mais altos de toda a populao do Brasil:

    Levantamento apresentado [...] pelo instituto revelou que a maior parte das pessoas que esto fora do mercado, apesar de se esforarem para integr-lo, est com idade entre 18 e 29 anos. Embora esse grupo responda por somente cerca de 30% da amostra do instituto, perfazem 54% dos desempregados. A pesquisa detectou que 45% dos que no esto trabalhando procuram uma vaga h mais de seis meses. Dentro deste grupo, quase um quarto das pessoas est na condio de desempregado h mais de um ano. (IPEA, 2011)

    Sendo a oferta de postos de trabalhos insuficientes para esta demanda, o fator

    remunerao no seria um empecilho s contrataes, pois 40% deste grupo de

    pessoas aceitariam trabalhar por valor igual ou menor que o salrio-mnimo vigente

    durante a pesquisa de R$ 510. (IPEA, 2011)

    O sistema educacional brasileiro, portanto, no cumpre seu papel de

    transformador econmico e social como esperado. Alm disso, cria uma distoro

    clara que contraria as expectativas tericas, constitucionais e administrativas. Dos

    objetivos da universalizao da educao no Brasil, no geral, no so alcanados

    desde sua constitucionalizao em 1988, na realidade se distancia criando um

    contingente de pessoas com muitos anos de estudo que no absorvidas pelo

    mercado de trabalho. Reciprocamente, o mercado no geral no transformado pela

    alta oferta de pessoas escolarizadas.

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    CONCLUSO

    Este trabalho monogrfico se conclui ilustrando o atual panorama da educao

    pblica no Brasil, bem como o seu desenrolar histrico, como sendo danoso ao

    desenvolvimento econmico ao no compreender as razes das relaes sociais. O

    que era um empreendimento livre e religioso, a educao tornou-se um instrumento

    da ideologia por quem controlasse o estado. Dos tempos de domnio da Coroa

    Portuguesa, a primeira reforma educacional exemplo dos sucessivos fracassos

    que ocorreriam at o Brasil Repblica, em 1889 em diante. Pela conduo poltica

    centralizada e megalomanaca, com intenes claras de universalizao rumo

    obrigatoriedade, em contraste com as instituies de ensino nos primeiros sculos

    de Brasil Colnia, a sociedade brasileira fora restringida de uma oferta educacional

    mais ampla e condizente.

    Os custos sempre foram altos. A compulsoriedade, conforme demonstrado,

    resulta em saldo duplamente negativo. Mesmo considerando plena oferta pblica,

    virtualmente a partir de 1988, os custos para financiar esta oferta restringem

    imediatamente o bem-estar e impossibilita acesso alternativo educao. A Escola

    Austraca de pensamento econmico elucida as aes individuais e seus impactos

    nas relaes sociais de trocas de maneira universal, histrica e atualmente.

    A educao fora al