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UMA PUBLICAÇÃO DO OBSERVATÓRIO ASTRONÓMICO DE LISBOA VERSÃO ELECTRÓNICA EM http://www.oal.ul.pt/oobservatorio/ A procura de Novos Horizontes no Sistema Solar

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UMA PUBLICAÇÃO DO OBSERVATÓRIO ASTRONÓMICO DE LISBOA

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A procura de Novos Horizontes no Sistema Solar

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“ASTRÓNOMO EDUCACION AL”: UMA NOVA PROFISSÃO?

FICHA TÉCNICA

O Observatório é uma publicação do Observatório Astronómico de Lisboa, Tapada da Ajuda, 1349-018 Lisboa, Telefone: 213616739, Fax:213616752; Endereço electrónico: [email protected]; Página web: http://oal.ul.pt/oobservatorio. Edição: José Afonso,Nuno Santos, João Lin Yun, João Retrê. Composição Gráfica: Eugénia Carvalho. Impressão: Tecla 3, Artes Gráficas, Av. Almirante Reis, 45A,1150-010 Lisboa. Tiragem: 2000 exemplares. © Observatório Astronómico de Lisboa, 1995.

ED

ITO

RIA

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NUNCA é demais recordar o papel extremamente importante que aAstronomia pode ter no esforço nacional de formarmos cidadãos qualificadosem Ciência e Tecnologia. O fascínio da Astronomia e Astrofísica permitecontrariar eficazmente a desertificação pelos estudantes das áreas de Ciênciaque envolvem matemática e raciocínio abstracto.

A atestar esta importância, a NASA acaba de tomar um conjunto de medidas que,na prática, institucionalizam uma nova profissão: a de “Astrónomo Educacional”.Em inglês, a designação adoptada é a de “EPO professional” (“Education andPublic Outreach profissional”). Um profissional EPO, ou “astrónomo educacional,é alguém que desenvolve, testa e dissemina materiais e programas educacionais, queposteriormente alguém (sobretudo professores) utilizam numa aula ou audiênciapública, a maior parte das vezes para alunos de escolas básicas e secundárias, noensino dito formal. Desta forma, o seu trabalho serve centenas de professores emilhares de estudantes.

A necessidade destes profissionais está bem comprovada. Professores que desejamdesenvolver actividades para os seus alunos de modo a melhorar a qualidade do seuensino, sentem grandes dificuldades em obter apoio para essa tarefa. Na situaçãoactual das comunidades universitárias, a maioria dos investigadores e professoresnão têm apetência natural para dedicar uma parcela importante do seu tempo paraeste fim. Os que o fazem são claramente insuficientes. São assim necessários umaespécie de intermediários entre os investigadores e os agentes de ensino e dedivulgação, que dedicando-se a tempo inteiro ao seu trabalho, facilitam a tarefa deeducar cientificamente a população. Note-se porém que não devem ser normalmenteos “astrónomos educacionais”, eles próprios, os agentes de ensino ou de divulgação.

Em inquéritos realizados na Europa e nos Estados Unidos da América, uma largamaioria de pessoas dizem que a Ciência e a Tecnologia tornaram as suas vidasmelhores e o seu trabalho mais interessante. Contudo, poucos afirmam estar bemesclarecidos em questões de Ciência e Tecnologia, mesmo em assuntos que têmimpacto directo nas suas vidas, tais como problemas de alimentação e saúde pública,energia, tecnologia para uso doméstico, etc. A maioria apoia um maior investimento,público e privado, em investigação científica de modo a que possa haver tambémmaior acesso ao conhecimento científico, seja através do ensino formal, seja atravésde formas mais informais de divulgação do conhecimento, dirigidas a miúdos e agraúdos, em instituições várias como museus, bibliotecas, associações, etc.

As medidas que a NASA tomou incluem um financiamento específico para que osastrónomos educacionais possam exercer o seu trabalho. Teve já como resultado aformalização desta profissão nos Estados Unidos da América, cujos profissionaisacabam de realizar uma conferência de grande envergadura. No nosso País, anecessidade de astrónomos educacionais é muito grande e pode fazer toda a diferença.A sua existência pode evitar que professores, desanimados por não encontraremapoio, desistam de fazer mais e melhor para tornarem a Ciência apetecível aos olhose mentes dos nossos alunos.

Na situação de atraso do nosso País, somos todos poucos nesta tarefa de instruir,ensinar, trazer a Ciência até aos estudantes e ao público em geral. Infelizmente,como foi anunciado no mês passado, o OAL não tem condições para continuar a dara sua contribuição para esta tarefa de forma eficiente. Continuamos sem saber se obom-senso, a visão, a inteligência, prevalecerão naqueles que têm autoridade epoder de decisão (a FCUL e a UL) sobre a importância de instituições quase sesqui-centenárias como o OAL. Quando o que está em questão são instituições comoestas, ou saímos todos a ganhar ou todos a perder. Todos: universidade, faculdade,departamentos, professores, estudantes e população em geral. Pois é este o âmbitoda nossa acção! São do Norte ao Sul do País, incluindo as Ilhas, os participantes dasnossas iniciativas. Bem hajam todos eles pelo seu interesse pela Ciência, porquererem saber mais, por quererem enriquecer os seus espíritos e alargar os seushorizontes.

João Lin Yun, Director do OAL

NA CAPA:

Podemos observar uma imagemartística da sonda New Horizons.

O lançamento da sonda espacial,no início deste ano, corresponde àprimeira fase do programa NewFrontiers da NASA, projecto quevisa o estudo dos objectos doSistema Solar - planetas, cometase asteróides.

Ao contrário de algumas sondasque regressam à Terra, a New Ho-rizons fará uma viagem apenas deida até aos confins do Sistema So-lar.

No seu percurso, esta sonda dotamanho de um piano, passará em2015 pela órbita de Plutão, e da sualua Caronte. Com o auxílio dos seteinstrumentos científicos que leva abordo, espera-se que a sonda possaesclarecer algumas dúvidas acercadas propriedades da superfície einterior, geologia e atmosferadestes corpos. Cortesia: Johns HopkinsUniversity Applied Physics Laboratory/Southwest Research Institute (JHUAPL/SwRI).

AGENDA

O Observatório Astronómico de Lisboadispõe de um serviço de visitas guiadasao seu Edifício Central. Marcações paragrupos podem ser efectuadas através dotelefone 213616730, fax 213616750, ouatravés do endereço electró[email protected]

- VISITAS GUIADAS AO OAL

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&

&

ASTRÓNOMOS MEDEM DIÂMETRO DE CARONTE Nuno Santos CAAUL/OAL

Uma equipa internacional de astrofísicosmediu com grande precisão o diâmetro e adensidade média de Caronte, a grande lua dePlutão. O resultado mostra que esta éconstituída principalmente por gelo misturadocom material rochoso.

A umas longínquas 39 UnidadesAstronómicas (UA) do Sol (uma UA equivaleà distância média do Sol à Terra), Plutão é umdos corpos do Sistema Solar que mais temalimentado controvérsias. As suas pequenasdimensões (Plutão é mais pequeno do que anossa Lua), juntamente com o facto de nosúltimos anos terem sido descobertos diversoscorpos com órbitas e massas semelhantes a ele, levaram osastrofísicos a repensar a sua definição. Deveremos classificarPlutão como um planeta ou simplesmente como um objecto trans--neptuniano?

Apesar de todo o interesse que esta pergunta levanta, adificuldade em estudar Plutão é bem ilustrada pelo facto de a sualua, Caronte, que é duas vezes mais pequena do que o planeta, tersido descoberta apenas em 1978. O sistema de Plutão é o únicoque ainda não mereceu a visita de uma sonda, e até hoje não foipossível obter uma imagem detalhada da sua superfície.

Para estudar este sistema os astrofísicos têm recorrido a umasérie de subterfúgios. E foi justamente um destes que permitiuagora medir com grande precisão o raio de Caronte. Para tal foiestudado um acontecimento bastante raro: uma ocultação de umaestrela distante pelo satélite de Plutão. A ocultação ocorreu emJulho de 2005, e pôde ser observada com telescópios em trêsobservatórios chilenos, entre os quais os grandes telescópios do

O telescópio espacial Spitzer acaba de obtera imagem mais sensível e detalhada de um doslocais mais intrigantes do Universo, o centroda Via-Láctea. Através de observações noinfravermelho, o Spitzer evitou grande partedo obscurecimento que impede o estudo docentro da Galáxia com telescópios ópticos.Acabou assim por revelar um ambientericamente povoado por estrelas idosas e poeira,mas curiosamente não desprovido de estrelasnovas e em formação.

O Sol e o Sistema Solar situam-se num dosbraços espirais da Galáxia, efectuando umaórbita completa em torno do seu centro, a 26mil anos-luz de distância, em cerca de 225milhões de anos. À medida que nosaproximamos das regiões mais centrais da Via--Láctea, o ambiente torna-se mais densamentepovoado. Próximo do centro Galáctico, ondese crê existir um buraco negro gigantesco, asórbitas de estrelas, gás e poeira completam-seem apenas alguns milhões de anos, ou mesmomenos. Contudo, o estudo desta região tãorica em fenómenos energéticos é extremamentedifícil, já que o plano da Via-Láctea está repleto de poeira. A suamaior densidade na direcção do centro da Galáxia impedevirtualmente qualquer radiação óptica desta zona de chegar aosnossos telescópios. No infravermelho, porém, a acção da poeira

é muito menor, sendo possível uma visão muitomais profunda e detalhada.

Lutando contra o enorme brilho noinfravermelho do centro Galáctico, uma equipade astrónomos efectuou vários milhares deexposições muito curtas desta região com otelescópio espacial Spitzer. Após a combinaçãode todas estas imagens, obtiveram uma visãoímpar da actividade frenética desta zona. Sãodetectados muitos milhares de estrelasrelativamente idosas, nuvens de poeira comfilamentos brilhantes e colunas de matéria quese estendem para longe do disco Galáctico,possivelmente geradas por ventos estelares.Existem também nuvens escuras, tão densasque continuam opacas mesmo noinfravermelho, e, surpreendentemente, umnúmero considerável de estrelas de grandemassa, relativamente jovens. Esta descoberta éparticularmente interessante, já que não secompreende como é que a formação de estrelasse pode dar neste ambiente tão activo e comcampos magnéticos tão fortes.

A análise destes dados encontra-se agora aser efectuada. Adicionando a informação obtida em outroscomprimentos de onda, os investigadores esperam melhorar asua compreensão da distribuição de massa e estrutura da Galáxia,bem como das semelhanças e diferenças com outras galáxias.

NOVAS VISÕES DO CENTRO DA VIA-LÁCTEA José Afonso CAAUL/OAL

VLT. O evento permitiu determinar odiâmetro de Caronte, já que conhecendo comprecisão a velocidade a que esta lua se deslocano céu, juntamente com a distância a que seencontra, é possível deduzir as suasdimensões através da medição do intervalode tempo durante o qual a estrela esteveocultada.

No caso de Plutão e da sua lua, a ocorrênciade uma ocultação é um fenómenoextremamente raro. Isto deve-se ao factodestes dois corpos, vistos a partir da Terra,terem um diâmetro angular muito pequeno(equivalente ao de uma moeda de um euro

vista a 100 km de distância para o caso de Caronte!). A únicaoutra observação de uma ocultação de uma estrela por Carontedatava de 1980.

As observações agora realizadas permitiram determinar que alua de Plutão tem um diâmetro de 603.6 km, sendo o erro dasobservações de apenas 1,4 km. Este resultado, juntamente com ajá conhecida massa de Caronte, permitiu verificar que o satélitetem uma densidade 1.7 vezes superior à da água. Tal implica queeste é constituído maioritariamente por gelos misturados commaterial rochoso.

Os dados permitiram ainda verificar que a atmosfera de Caronte,a existir, terá uma pressão inferior a cerca de 0.1 microbar. Estevalor é significativamente inferior ao anteriormente estimado paraPlutão (10-15 microbar). Este resultado parece mostrar que olimite a partir do qual a massa de um corpo é suficientementegrande para manter uma atmosfera se situa algures entre a dePlutão e a da sua lua, Caronte.

Ilustração do sistema Plutão-Caronte.Cortesia do ESO.

Esta imagem, mostra o centro da Via-Láctea, numa composição deobservações no infravermelho com otelescópio espacial Spitzer de 3.6 µm(azul) a 8.0 µm (vermelho). No total,cerca de 16 horas de observaçõesencontram-se combinadas nestaimagem, que compreende cerca de900x640 anos-luz à  distância do centroda Via-Láctea. São evidentes asenormes nuvens de poeira, muitas delasiluminadas por estrelas jovens. Oponto mais brilhante nesta imagemcorresponde ao centro Galáctico, ondeum buraco negro supermassivo deveexistir. Cortesia: NASA, JPL-Caltech eS. Stolovy (Spitzer Science Center/Caltech).

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Numa época em que muita da Astrofísica mais empolgantese faz em domínios do espectro electromagnéticoinacessíveis ao olho humano (e.g., infravermelhos, raios-X, etc.), espreitar por um telescópio apontado para o céucontinua a ser um acto irresistível. Aqui fica um breve guiade iniciação ao universo dos telescópios, que esperamosseja útil sobretudo aos professores e alunos das escolasbásicas e secundárias que nele se pretendam aventurar.

TELESCÓPIOS REFRACTORES

Trata-se de um tipo de telescópio em que, numa dasextremidades do tubo óptico, se encontra uma lente,designada por objectiva, que é atravessada pelos raiosluminosos e que os faz convergir num ponto; se os raiosque chegam ao telescópio são paralelos - é o caso da luzproveniente de objectos astronómicos - então convergemno chamado ponto focal. Uma ocular (lente, geralmentecomposta, pela qual se espreita) é colocada na outraextremidade; a sua função é ampliar a imagem (fig. 1). Nocaso da imagem de uma estrela, esta será efectivamentereduzida a um ponto (devido ao facto de as estrelas seencontrarem a grandes distâncias), mas para objectos demaior dimensão aparente, como a Lua, diz-se que a imagemse forma no plano focal do telescópio. Atribui-se a invençãodo telescópio ao holandês Hans Lippershey (1587-1619),que terá fabricado as suas primeiras lunetas (outro nomecomum para o telescópio refractor) entre 1606 e 1608.Segundo o historiador das ciências Anton van Helden, aideia de um tal instrumento já faria parte do clima culturalda época, antes de Lippershey a concretizar. Certo é que,nas mãos de Galileu Galilei (1564-1642), o telescópio setornou, a partir de 1609, numa ferramenta fundamental nadecifração do cosmos.

Um dos problemas principais que desde cedo se colocouaos utilizadores de telescópios refractores foi a aberraçãocromática. Como é sabido, a luz branca é constituída porluz de diferentes comprimentos de onda (correspondentesa diferentes cores), para os quais se verificarão ângulos derefracção diferentes. Por conseguinte, raios luminosos dediferentes cores, ao atravessarem a objectiva, serãodireccionados para diferentes focos, e o resultado será uma

imagem distorcida, com “contaminações” coloridas. Deve--se ao construtor de instrumentos John Dollond (1706-1761) a introdução da objectiva acromática, que, por meiode associações de vidros com propriedades diferentes,permite a redução deste efeito. Uma outra limitação quehistoricamente se impôs ao desenvolvimento dos refractoresfoi a abertura, ou diâmetro da objectiva (v. Conceitosfundamentais). Sem descurar todos os outros aspectostécnicos que perfazem um bom telescópio, não é exageroafirmar que, do ponto de vista da instrumentação, uma dasgrandes lutas da história da Astronomia foi, e continua aser, a construção de telescópios com aberturas tão grandesquanto possível. O limite da abertura dos refractores foiatingido em 1894, quando a firma americana Alvan Clark& Son finalizou um telescópio de 101 cm de abertura,instalado no Observatório de Yerkes (Chicago). Um sérioproblema que se coloca às objectivas muito grandes, paraalém das outras dificuldades inerentes à sua fabricação, é aacção da gravidade, que as faz flectir sob o seu própriopeso. Como num refractor a objectiva fica alojada naextremidade do tubo que é apontada aos objectos a observar,a colocação de sistemas de suporte adicionais acarretaobstruções à passagem da luz.

Para uma mesma abertura, um telescópio refractor égeralmente muito mais caro que um reflector. Para quempretende adquirir um telescópio, é de todo o bom sensodesconfiar dos refractores vendidos a preços baixos eanunciados como sendo capazes de proporcionar enormesampliações.

TELESCÓPIOS REFLECTORES

Na segunda metade do mesmo séc. XVII em que Galileufez descobertas pioneiras com os seus refractores, surgiuo telescópio reflector, que, depois de dois séculos deconcorrência com o refractor, se tornou definitivamentedominante no séc. XX. O princípio do telescópio reflectorterá sido inicialmente proposto pelo óptico escocês JamesGregory (1638-1675), que sugeriu a utilização de umespelho côncavo em vez de uma lente. Este espelho primárioficaria alojado no fundo do tubo do telescópio, e a imagemseria produzida por reflexão, sendo reenviada para o fundodo tubo por meio de um espelho secundário, posicionadojunto à outra extremidade do tubo. O observador teria acessoà imagem por meio de um orifício no espelho primário.Este modelo, conhecido como gregoriano, nunca teráchegado a ser executado pelo autor da ideia, e a paternidadedo conceito do telescópio reflector acabou por ficarassociada ao nome de Isaac Newton (1642-1727). Em1668, o multifacetado cientista inglês construiu umtelescópio semelhante ao gregoriano, mas em que os raiosluminosos, depois de reflectidos pelo espelho primário, eramdesviados, em ângulo recto, para um orifício lateral (ondese instalava a ocular), por meio de um espelho secundárioplano, posicionado num ângulo de 45º em relação àtrajectória inicial dos raios luminosos (fig. 2). Este modelo,

UMA INICIAÇÃO AO UNIVERSO DOS TELESCÓPIOS

Fig. 1 - Princípio do telescópio refractor.

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Pedro RaposoOAL

ainda hoje muito utilizado, é justamente designado pornewtoniano. Num outro modelo, introduzido em 1672 porJean Cassegrain (1625-1712), recuperou-se o designgregoriano, mas aplicando-se um espelho secundáriohiperbólico (no modelo gregoriano o espelho secundárioera elipsoidal).

Até à segunda metade do séc. XIX, os espelhos eramfabricados em metal, e perdiam facilmente poder reflector,o que exigia repetidas operações de polimento. Em 1856,Karl von Steinheil (1801-1870) e Léon Foucault (1810-1868)abriram a via de solução para este problema, produzindoum espelho a partir de vidro, que revestiram com umasuperfície reflectora metálica. Em 1930, Bernhard Schmidt(1879-1935) introduziu um novo design: um telescópio re-flector semelhante ao de Cassegrain, mas com um espelhoprimário esférico e uma lente correctora à entrada do tuboóptico. Este modelo, designado por câmara de Schmidt,pode ser construído com razões focais muito baixas (v.Conceitos fundamentais), sendo particularmente propíciopara fotografar o céu. Um modelo de compromisso muitoapreciado e usado por amadores é o Schmidt-Cassegrain(fig. 3), também muito propício à observação visual. Numaoutra configuração baseada no modelo de Cassegrain,desenvolvida pelo americano George Ritchey (1864-1945)e pelo francês Henri Chrétien (1879-1956), todas assuperfícies ópticas são hiperbólicas, o que proporciona umaeficiente eliminação do erro de coma, uma distorção dasimagens na periferia do campo visual, típica dos reflectores.O denominado telescópio Ritchey-Chrétien adquiriu, aolongo dos últimos 50 anos, uma grande relevância naAstronomia profissional e na astrofotografia amadora maisavançada. Em relação aos newtonianos, todos estes modelostêm ainda a vantagem de serem mais compactos, paraaberturas da mesma ordem, mas são geralmente mais caros.

O newtoniano é, geralmente, a opção mais lógica paraobservadores principiantes.

CONCEITOS FUNDAMENTAIS

- Abertura (D): diâmetro da objectiva ou espelho,geralmente expresso em milímetros. Condiciona o poderde captação de luz do telescópio e o seu poder de resolução.É, portanto, uma característica fundamental; a abertura, enão a ampliação, deve ser o primeiro critério de apreciaçãodas características técnicas de um telescópio.- Distância focal (f): distância de uma lente ou espelho

ao ponto onde convergem os raios luminosos.- Razão focal: quociente entre a distância focal e a

abertura de um telescópio. Por exemplo, um telescópiocom f=1200 mm e D=150 mm tem razão focal 8; estevalor exprime-se geralmente na forma f/(valor doquociente), pelo que, neste caso, teríamos um telescópiof/8. Quanto maior a razão focal, maior a imagem primária(que se forma no foco do telescópio), mas menor aluminosidade. Os objectivos do observador deverão orientara escolha quanto a este aspecto; por exemplo, umaluminosidade mais baixa é obviamente desvantajosa paraquem pretenda observar visualmente objectos difusos comoas galáxias e as nebulosas.- Poder de resolução: capacidade de resolver, em objectos

separados, duas imagens pontuais muito próximas. Comoacima se disse, depende da abertura. Na prática, condicionaa definição e o nível de detalhe das imagens.- Ampliação: Obtém-se dividindo a distância focal da

objectiva pela distância focal da ocular em uso; porexemplo, para um telescópio com f=1200 mm e uma ocu-lar com f=25mm, a ampliação será de 48x. A ampliaçãoútil de um telescópio é também condicionada pela suaabertura; para obter, em primeira aproximação, a ampliaçãomáxima útil de um telescópio, multiplica-se a sua abertura(em milímetros) por 2.4. Por exemplo, para um telescópiode D=150mm a ampliação máxima útil será de 360x. Commuita frequência, a ampliação é erroneamente tomadacomo a característica mais importante de um telescópio,e servem-se disso os vendedores menos sérios,prometendo ampliações que extravasam grandemente ascapacidades técnicas dos instrumentos que oferecem.

PARA SABER (E FAZER) MAIS

Se quiser aventurar-se na construção de um telescópio,recomenda-se que comece por uma luneta de Kepler,relativamente fácil de construir – para actividadesescolares, será ideal. Encontrará um guião emhttp://www.feiradeciencias.com.br/sala24/24_A02.asp(em Português do Brasil). Se optar por um reflector, umdobsoniano será uma boa opção – trata-se de umnewtoniano instalado numa montagem simples. Umconjunto detalhado de instruções (em inglês) está disponívelem http://members.aol.com/sfsidewalk/intro.htm. Comolivro de referência, recomenda-se Telescópios, deGuilherme de Almeida (Plátano – Edições Técnicas), umaobra abrangente, bem documentada e ilustrada.

Fig. 3 – Princípio do telescópio Schmidt-Cassegrain.

Fig. 2 – Princípio do telescópio reflector newtoniano.

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João Retrê

Desde que Galileu olhoupela sua luneta para a Lua,em 1609, que os telescó-pios se tornaram uma dasferramentas mais impor-tantes no estudo doUniverso. Com o passardo tempo e a evolução dacapacidade tecnológicahumana, os telescópiosforam-se tornando cadavez mais precisos e“poderosos”. O “poder”de um telescópio reside nasua capacidade de recolhade luz, quanto maior adimensão do elementoprincipal de recolha de luzde um telescópio (oespelho primário, no casodos telescópios reflec-tores), maior o detalhe com que os objectos podem servisualizados. Devido a este factor, os telescópios foram-setornando cada vez maiores. Porém, a atmosfera terrestre absorvee distorce a luz proveniente dos objectos celestes, deteriorandoa qualidade de observação destes. Foi com base neste problemaque surgiu a ideia de colocar um telescópio em órbita da Terra,onde as observações pudessem ser realizadas sem ainterferência negativa da atmosfera.

Em 24 de Abril de 1990, a bordo da nave espacial Discovery,um poderoso instrumento científico, resultado de um esforçoconjunto entre a NASA e a ESA, dava início a uma nova etapano estudo do Universo, que viria a revolucionar a visão humanado mesmo - o telescópio espacial Hubble. O nome destetelescópio surge em homenagem ao astrónomo Edwin PowellHubble que, em 1929, estabeleceu a relação entre a distância deuma galáxia e a velocidade com que esta se afasta da Terra:quanto mais longínqua a galáxia, maior a velocidade com queesta se afasta. Esta noção forneceu a base da teoria de formaçãodo Universo mais aceite nos dias de hoje, o Big Bang.

O Hubble está colocado em órbita da Terra, a 569 km dasuperfície, e viaja à velocidade de 7,5 km/s. Com 13,2 metros decomprimento e um diâmetro máximo de 4,2 metros, estetelescópio tem aproximadamente as dimensões de um autocarro,pesando cerca de 11 110 kg. Apesar da sua envergadura e davelocidade estonteante com que se movimenta, o Hubble possuiuma enorme estabilidade e precisão, sendo capaz de fixar umobjecto sem se desviar do seu alvo mais do que 0,007 segundo-de-arco, a largura de um cabelo humano visto à distância de 1,5km. É esta precisão, associada à sua tremenda capacidade deresolução (0,05 segundo-de-arco), que torna o Hubble uminstrumento tão poderoso em Astronomia. Se a visão do leitorpossuísse o poder de resolução do Hubble, conseguiriadistinguir a partir de Lisboa, duas moscas separadas por ummetro, estando estas em Moscovo.

Pouco tempo após a suaentrada em funcio-namento, as imagensenviadas pelo telescópiomostravam que havia umsério problema no sistemaóptico. Embora asprimeiras imagens recebi-das fossem aparentementemais nítidas que asobtidas com telescópiosterrestres, não erapossível atingir umafocalização precisa, e porisso as imagens ficavammuito aquém do que seesperava. Depois deanalisado o problema,concluiu-se que o espelhoprimário continha umdefeito, sendo esta

imperfeição da ordem dos micrómetros (a milionésima parte dometro). O problema foi solucionado acrescentando doisespelhos ao telescópio de modo a corrigir por completo aimperfeição no espelho primário.

Todas as semanas, o Hubble fornece cerca de 120 gigabytesde dados, o que equivale a uma enciclopédia completa por dia.Com mais de 400 mil observações realizadas, o Hubble estudoumais de 25 mil objectos, providenciando dados para milharesde artigos científicos.

Tendo aberto as portas para uma nova visão em diversasáreas tais como a cosmologia, formação estelar e formaçãogaláctica, este instrumento é sem dúvida um dos maiorestriunfos tecnológicos da humanidade. Entre as inúmerascontribuições do Hubble que culminaram numa compreensãomais profunda do Universo, encontram-se:

* permitiu aos astrónomos observar as profundezas do espaçoe do tempo, fornecendo uma ideia acerca dos primeiros passosda formação galáctica;

* teve um papel importante na história e evolução da matériano Universo, permitindo aos astrónomos ter uma boa ideia daquantidade e composição dessa matéria;

* forneceu evidências da existência de buracos negrospassando estes objectos da teoria para realidade;

* teve um papel importante na área da formação estelar,permitindo uma melhor compreensão e estudo de como estescorpos evoluem.

Estando há quase 16 anos ao serviço da comunidade científica,a jornada do primeiro telescópio espacial está a chegar ao fim.A sua saída de serviço está prevista para 2011 (ou mesmo an-tes caso uma missão de manutenção não seja possível esteano), altura em que será colocado em órbita o seu sucessor, otelescópio espacial James Webb. O Hubble certamente terá umfim, mas o seu legado persistirá como parte integrante da visãoe compreensão do Universo.

O TELESCÓPIO ESPACIAL HUBBLE E O SEU SUCESSORPARTE I

Imagem do telescópio espacial Hubble com a Terra como plano de fundo. Cortesia: NASA.

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PARA OBSERVAR EM FEVEREIRO

VISIBILIDADE DOS PLANETAS

Mercúrio: No fim do mês Mercúrio, pode ser observado logo após o ocaso do Sol na direcção Oeste. É preciso ter umhorizonte livre nesta direcção.Vénus: Agora Vénus passa a ser a estrela da manhã. Observe o planeta antes do nascimento do Sol na direcção Este.Vénus está perto da Terra e por isso parece grande. A fase do planeta, inicialmente um crescente fino, cresce duranteeste mês. Use um telescópio para ver a evolução da fase.Marte: É visível durante a primeira parte da noite, com o seu ocaso a ocorrer cada vez mais cedo. Afasta-se da Terrae começa a ser mais difícil de observar.Júpiter: Visível na segunda parte da noite. Na noite do dia 20 a Lua encontra-se perto de Júpiter.Saturno: É visível durante toda a noite. Use um telescópio para observar os anéis e ver o seu maior satélite, Titã.Urano e Neptuno: Não serão visíveis durante este mês.

Maarten Roos SeroteCAAUL/OAL

ASTRO SUDOKU

ASTRO SUDOKU

5 de Fevereiro - O planeta Marte e a Lua encontram-se pertodas Pleiades, um exame de estrelas aberto na constelação doCaranguejo. Com o olho nu conseguem-se ver sete estrelas nesseenxame.

ALGUNS FENÓMENOS ASTRONÓMICOS

Complete a grelha de modo a que cada linha, coluna e grelha 3x3 contenhaas letras AILOPRSTU. Depois de a grelha totalmente preenchida, descubra

o nome de três estrelas conhecidas que poderá estar escrito segundo qualquerdirecção e sentido.

FASES DA LUA

Quarto Crescente 05 Fev - 07hLua Cheia 13 Fev - 05hQuarto Minguante 21 Fev - 07hLua Nova 28 Fev - 01h

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1 de Fevereiro às 0h16 de Fevereiro às 23h

O CÉU DE FEVEREIRO

Sol Mercúrio Vénus Marte Júpiter Saturno

Dia Nasc./Ocaso Ocaso Nasc. Ocaso Nasc. Pass.

01112128

07h 44m/17h 57m

07h 33m/18h 08m

07h 21m/18h 19m

07h 12m/18h 27m

18h 13m

19h 06m

19h 49m

19h 52m

05h 45m

05h 12m

04h 53m

04h 44m

02h 20m

02h 04m

01h 49m

01h 39m

01h 42m

01h 07m

00h 30m

00h 03m

00h 32m

23h 46m

23h 03m

22h 34m

(para Lisboa; são necessárias pequenas correcções para outros locais do país. Veja em www.oal.ul.pt para outros dias)NASCIMENTO, PASSAGEM MERIDIANA E OCASO DOS PLANETAS

O mapa mostra o céu como pode ser observado em Portugal (latitude 38º N) nos dias e horas (legais) indicados. Orienteo mapa com a direcção para onde olha virada para si, p.e. se estiver a olhar para o Norte, vire esta página ao contrário.Este mapa pode ser usado igualmente noutros dias e horas de Fevereiro, apresentando-se o céu um pouco diferente.