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Economia dos Intermediários Financeiros 1 INTRODUÇÃO Em Março de 1998, o economista principal para assuntos da América Latina, Guiilermo Perrry, do Banco Mundial, apresentava quatro factores-chave que teriam contribuído para a vulnerabilidade das economias asiáticas: - Acumulação de dívida externa de curto prazo, excedendo as reservas cambiais, tornando-as vulneráveis a ataques especulativos; - Obtenção de elevados empréstimos em moeda estrangeira por parte de instituições financeiras e das próprias empresas, que limitou a margem de manobra das autoridades para procederem a uma atempada desvalorização da moeda, sem colocar sob pressão financeira o sector privado; - Elevados níveis de dívida das empresas e pouco zelosos empréstimos por parte dos bancos, que se traduziram numa vulnerabilidade de uns e outros perante a elevação das taxas de juro ou de abrandamentos significativos do nível da actividade. Também este factor, contribui para a limitação da margem de manobra, anteriormente referida. - Vulnerabilidade do sector externo, resultante de várias das economias se terem defrontado com a valorização das suas moedas, (indexadas aos dólar e a valorizar desde 1995), tendo tal processo conduzido ao abrandamento das receitas de exportação e consequente défice da Balança de Transacções Correntes. Para o mesmo autor as causas da crise de solvabilidade, que assolou estes países, devido ao seu excesso de endividamento, e que conduziu ao desemprego generalizado e à diminuição dos salários, foram cinco, a saber: - Existência de incentivos a comportamentos privados contrários aos interesses públicos, materializando a situação de risco moral; - Existência, nalguns países, de formas de “capitalismo clientelar” que contribuíram para ocultar a natureza não lucrativa de muitas transacções e para não transparecer a situação financeira real de bancos, grandes empresas e conglomerados; - Quadro regulamentar e mecanismos de supervisão do sistema financeiro deficiente, agravado pela falta de informação credível sobre as actividades dos bancos; - Regimes de câmbio rígidos que levaram a uma percepção de que o risco de desvalorização era pequeno; - Processos parciais e mal sequenciados de liberalização a nível financeiro e das operações externas de contas de capital, levando a uma redução de restrições à obtenção de empréstimos no exterior ao mesmo tempo que eram mantidas restrições de propriedade estrangeira sobre entidades do sector bancário doméstico.

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Economia dos Intermediários Financeiros

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INTRODUÇÃO

Em Março de 1998, o economista principal para assuntos da América Latina,

Guiilermo Perrry, do Banco Mundial, apresentava quatro factores-chave que teriam contribuído para a vulnerabilidade das economias asiáticas:

- Acumulação de dívida externa de curto prazo, excedendo as reservas cambiais, tornando-as vulneráveis a ataques especulativos;

- Obtenção de elevados empréstimos em moeda estrangeira por parte de instituições financeiras e das próprias empresas, que limitou a margem de manobra das autoridades para procederem a uma atempada desvalorização da moeda, sem colocar sob pressão financeira o sector privado;

- Elevados níveis de dívida das empresas e pouco zelosos empréstimos por parte dos bancos, que se traduziram numa vulnerabilidade de uns e outros perante a elevação das taxas de juro ou de abrandamentos significativos do nível da actividade. Também este factor, contribui para a limitação da margem de manobra, anteriormente referida.

- Vulnerabilidade do sector externo, resultante de várias das economias se terem defrontado com a valorização das suas moedas, (indexadas aos dólar e a valorizar desde 1995), tendo tal processo conduzido ao abrandamento das receitas de exportação e consequente défice da Balança de Transacções Correntes.

Para o mesmo autor as causas da crise de solvabilidade, que assolou estes países, devido ao seu excesso de endividamento, e que conduziu ao desemprego generalizado e à diminuição dos salários, foram cinco, a saber:

- Existência de incentivos a comportamentos privados contrários aos interesses públicos, materializando a situação de risco moral;

- Existência, nalguns países, de formas de “capitalismo clientelar” que contribuíram para ocultar a natureza não lucrativa de muitas transacções e para não transparecer a situação financeira real de bancos, grandes empresas e conglomerados;

- Quadro regulamentar e mecanismos de supervisão do sistema financeiro deficiente, agravado pela falta de informação credível sobre as actividades dos bancos;

- Regimes de câmbio rígidos que levaram a uma percepção de que o risco de desvalorização era pequeno;

- Processos parciais e mal sequenciados de liberalização a nível financeiro e das operações externas de contas de capital, levando a uma redução de restrições à obtenção de empréstimos no exterior ao mesmo tempo que eram mantidas restrições de propriedade estrangeira sobre entidades do sector bancário doméstico.

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1. OS NOVOS PAÍSES INDUSTRIALIZADOS DA ÁSIA

Analisaremos neste ponto os NPI (Novos Países Industrializados) da Ásia que constituem até hoje os casos mais bem sucedidos de desenvolvimento das semiperiferias.

Muitos se interrogam sobre como foi possível que estes pequenos países com débeis economias e sem grandes riquezas naturais tenham conseguido, num curto espaço de tempo, atingir o estatuto de potências económicas de alcance mundial. Torna-se pertinente analisar se será possível estes países servirem de modelo de desenvolvimento para outros países em vias de desenvolvimento. A questão é “Será possível repetir noutras regiões do Mundo, em condições semelhantes, o “milagre asiático”?”

Nas últimas décadas, a costa asiática do Pacífico, sob a influência geoeconómica do Japão, têm feito crescer o seu peso na economia mundial. A Coreia do Sul, Taiwan, Hong-Kong e Singapura – “os dragões do oriente” – e, mais recentemente a Indonésia, a Malásia, a Tailândia, Filipinas – “os tigres do oriente” - e a China, têm conhecido um crescimento espectacular.

O sucesso das suas políticas de desenvolvimento permitiu-lhes alcançar uma rápida industrialização que concorre já em muitos domínios com a dos países mais desenvolvidos. Os produtos das suas fábricas encontram-se à venda nos mercados de todo o Mundo: automóveis coreanos tanto nos EUA como em Portugal, turbinas de Taiwan nas refinarias de petróleo do Médio Oriente, vestuário “made in” Singapura nos pronto-a-vestir asiáticos ou europeus.

1.1. FACTORES DE SUCESSO DOS “4 DRAGÕES” DA ÁSIA

Apesar de terem de ultrapassar alguns obstáculos e de possuírem entre si diferenças significativas em dimensão, população, história e estrutura política, os NPI asiáticos conseguiram tirar partido de um conjunto de factores comuns – geográficos, socioculturais e político-económicos – que em conjunto explicam a prosperidade que atingiram.

1.1.1. CONDIÇÕES GEOGRÁFICAS FAVORÁVEIS:

Mesmo possuindo fracos recursos no que respeita a fontes de energia e matéria-prima, os NPI gozam de certas facilidades, dada a sua localização geográfica, tais como: - possibilidade de praticarem uma agricultura intensiva assente na rizicultura, o que lhes permite suportar elevadas densidades populacionais; - comunicação com o exterior, tirando partido da posição marítima no Oceano Pacífico; - posição geoestratégica no prolongamento para sul do pólo económico japonês, entre os mercados da Ásia, das Américas e da Austrália.

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1.1.2. CARACTERÍSTICAS DA MÃO-DE-OBRA:

Estes países souberam aproveitar a sua mão-de-obra abundante, disciplinada que aceita baixos salários e duras condições de trabalho.

1.1.3. ÊNFASE NA EDUCAÇÃO:

O ênfase que estes países colocaram na educação, a par do Japão, baseia-se no respeito pelo estudo e exames competitivos. Acredita-se que os seus hábitos tradicionais de educação criam harmonia social e uma força de trabalho bem treinada, com elevado nível de formação técnica e científica.

1.1.4. ELEVADO NÍVEL DE POUPANÇA:

Medidas fiscais, taxas e restrições às importações, a par de um deficitário sistema social, nomeadamente de saúde e reformas encorajam as poupanças individuais.

1.1.5. FORTE ENQUADRAMENTO POLÍTICO:

Na maioria dos países da Ásia-Pacífico, o Governo exerceu uma influência preponderante na política económica seguida através de um conjunto de medidas, tais como: a concessão de empréstimos a taxas reduzidas, a atribuição de subsídios a indústrias em dificuldade, a protecção dos produtos locais face aos produtos importados e a colaboração entre os sectores público e privado (que, no entanto, varia de país para país).

1.1.6. EMPENHAMENTO NAS EXPORTAÇÕES:

Os NPI do Pacífico empenharam-se nas exportações com o objectivo de conquistarem mercados externos. No entanto, souberam tirar partido das relações com o Japão e com o Ocidente através da aquisição de tecnologias e formação de quadros. Aproveitaram, também, os baixos custos de uma abundante mão-de-obra e beneficiaram de uma ordem comercial mundial aberta, criada e protegida pelos EUA, enquanto protegiam as suas indústrias da concorrência estrangeira.

1.1.7. EXISTÊNCIA DE UM MODELO LOCAL - O JAPÃO:

Durante quatro décadas, os povos da Ásia Oriental observaram o dramático sucesso de um vizinho não ocidental, baseado nas suas qualificações educacionais e técnicas, elevadas taxas de poupança, objectivos industriais e de mercado de longo prazo, sob orientação estatal e determinação para competir nos mercados mundiais.

O Japão é desprovido de fontes de energia e de matérias – primas, derrotado na 2ª Guerra Mundial e destruído pela primeira bomba atómica lançada sobre o território, o Japão conseguiu-se firmar num dos principais lugares das nações desenvolvidas.

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Os japoneses têm uma especial predisposição para a continuidade (solidariedade entre gerações ou sucessão dos soberanos) e para o consenso. Quando os recursos naturais são raros, o potencial humano torna-se vital. É necessário desenvolvê-lo para que a economia esteja à medida de se adaptar a um meio envolvente em constante mudança. Numa única palavra: trabalhar. Foi assim que o Japão aprofundou a sua soberania nos tempos da economia agrícola e foi assim que se tornou uma economia industrial.

Os japoneses fizeram da educação, ao longo dos séculos, um bem público. Actualmente, a taxa de analfabetismo é praticamente zero. O Japão dispõe de uma força de trabalho cujo nível de educação é o mais elevado do Mundo. O outro pilar do potencial humano no Japão é um tipo de socialização que privilegia a interdependência ou, por outras palavras, a divisão do trabalho, a partilha dos riscos, as economias de custos e de tempos.

O Japão tem ao seu dispor uma excelente força de trabalho que se encontra disciplinarmente ligada às grandes empresas nas quais são desenvolvidas políticas de formação e enquadramento dos trabalhadores. O segundo aspecto está relacionado com a jornada de trabalho bastante elevada: cerca de 10 horas diárias, com poucos dias festivos no ano e com períodos de férias reduzidos. Tudo isto conjugado, conduz a elevados índices de produtividade da indústria japonesa. Foi desta forma que, no pós-guerra, o Japão conseguiu, em cerca de 15 anos, multiplicar por 10 o seu PNB, o que corresponde a uma taxa acumulativa de quase 15%, crescimento constante que nenhum outro país conseguiu ao longo da história.

1.1.8. AS TAXAS DE INVESTIMENTO

Uma das razões do alto ritmo de crescimento, reside na forte taxa de investimento. Na última década, o Japão tem vindo a investir normalmente 34% do seu PNB destacando-se, assim, de países da OCDE (que apresentam valores entre 18% e 25%) ou de países subdesenvolvidos (entre 8% e 17%).

Esta taxa de investimento deve-se a diversos factores, nomeadamente um baixo nível de salários, embora em aumento; um sistema de concentração empresarial característico, que se traduz no reinvestimento continuado da maior parte dos lucros nas empresas; o sentido de organização, o amor ao trabalho e o gosto dos japoneses pela poupança.

Outra característica da taxa de investimento é o seu elevado rendimento, que se deve a diversos factores: grande dimensão das empresas e unidades industriais, o que torna possível grandes economias de escala; alta concentração industrial no espaço físico, que permite fortes economias de aglomeração; e a associação do bem capital com uma força de trabalho altamente qualificada e, em certa medida, submissa.

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1.1.9. LIGAÇÃO ESTADO – INDÚSTRIA

Existe uma enorme sobreposição entre os grandes grupos industriais e o Estado, isto é, as grandes empresas estão perfeitamente representadas no Governo, de tal forma que não se sabe quem manda em quem. As empresas “aceitam” um certo paternalismo estatal, dentro do quadro de uma planificação indicativa flexível e audaz, que chega a delinear ritmos de crescimento. Em troca, a indústria sabe que tem reservada a maior e melhor parte do amplo mercado interno. Este é um dos grandes trunfos da indústria japonesa: uma pauta relativamente proteccionista, que lhe reserva o seu amplo mercado nacional, mas que permite o desenvolvimento de empresas altamente competitivas para o exterior.

1.1.10. COMÉRCIO INTERNO E EXTERNO

O crescimento do Japão nos últimos 25 anos deve-se acima de tudo às reacções do mercado interno, dado que os japoneses mostram uma forte apetência para o consumo (o mercado japonês é o segundo mercado de consumo do Mundo). Ainda hoje, o Japão tem um grau de abertura ao mundo exterior duas vezes e meio inferior ao da UE. Para além de barreiras como a língua, a propensão dos japoneses para comprarem produtos nacionais, existem ainda regulamentos restritivos às importações, que dificulta a penetração de empresas estrangeiras no mercado.

No entanto, no que diz respeito às exportações mostra uma grande agressividade. Tratam-se de produtos de elevado valor acrescentado como automóveis, fotocopiadoras, componentes electrónicos, microprocessadores, robots e semicondutores (90% do mercado mundial).

1.2. LIMITAÇÕES DO DESENVOLVIMENTO NOS NPI ASIÁTICOS

As transformações rápidas que ocorreram nestes países originaram desequilíbrios e tensões internas: - no plano político, à excepção de Hong-Kong, os regimes caracterizavam-se pelo autoritarismo e pela restrição das liberdades públicas, geradoras de conflitos sociais; - no plano social, a rápida industrialização trouxe graves carências de alojamento. A pobreza e o desemprego não desapareceram embora tenham reduzido bastante. As difíceis condições de trabalho são agravadas por horários muito extensos; - no plano ambiental, o rápido crescimento das taxas de urbanização e da industrialização criou fluxos de tráfego muito intensos responsáveis pelo ar extremamente poluído que se respira nas grandes cidades.

Há ainda que considerar as dificuldades externas, tais como: - o crescimento das exportações que leva a um aumento das importações, o que pode gerar um défice da balança comercial (por exemplo em Singapura e Hong-Kong). Para financiar os défices comerciais recorre-se a empréstimos externos, incentiva-se o investimento estrangeiro, acentuando-se, assim, a dependência externa; - o aumento dos salários exigido pelos trabalhadores limita a competitividade, pela diminuição das vantagens comparativas com outros Estados; - a grande dependência dos mercados americano e japonês relativamente às exportações fazem com que as reacções proteccionistas em época de crise os deixem mais vulneráveis. Por outro lado, os novos NPI, como a

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Malásia, a Indonésia e a Tailândia, são cada vez mais seus concorrentes na exportação de produtos manufacturados.

A solução parece ser a de diversificar os mercados de exportação (em especial para os mercados regionais da Ásia e dos países em vias de desenvolvimento da América Latina) e estimular a procura interna.

1.3. A GEOECONOMIA DOS NPI DA ÁSIA

Os NPI da Ásia receberam o impulso do Japão e difundem essa onda de crescimento a todo o Sueste Asiático. As “zonas económicas transnacionais” ou “triângulos de crescimento” são disso exemplo. Integrando três ou mais Estados, estas “zonas económicas” conjugam os terrenos e mão-de-obra baratos dos países em vias de desenvolvimento e a tecnologia e capitais dos NPI e dos países industrializados. Faremos, em seguida, uma breve alusão à ASEAN e à APEC, importantes veículos de cooperação entre as economias.

Associação das Nações da Ásia do Sudeste (ASEAN)

A ASEAN é constituída por sete membros, cinco fundadores: Indonésia,

Malásia, Filipinas, Singapura e Tailândia e por duas adesões: em 1984 o Brunei Durassalem e em 1985 o Vietname.

Os indicadores de base da região referentes a 1995 revelam dados interessantes, dos quais podemos salientar o PNB por habitante e a taxa de crescimento do PNB:

Quadro I

Valores em 1995 Brunei Indonésia Malásia Filipinas Singapura Tailândia Vietname

PNB por habitante 15.400 730 3.400 844 17.800 2.381 240

Taxa Cresc. do PNB 1,6% 6,7% 8,6% 5,5% 10,0% 8,3% 8,8% Fonte: Relatório sobre o Desenvolvimento no Mundo, Banco Mundial, 1997

A conferência dos ASEAN em 1992 realizada em Singapura, teve por objectivo

estabelecer a criação de uma zona de comércio livre e representou a tentativa de uma verdadeira integração regional entre os seus membros. As reduções de direitos aduaneiros começaram em 1 de Janeiro de 1993, tendo por base as ligações económicas crescentes entre os membros da ASEAN, a fraca intensidade de obstáculos não-pautais e direitos aduaneiros relativamente reduzidos.

Após a análise do total de exportações da ASEAN e o comércio intra-

Associação, facilmente se conclui que o comércio intra-regional aumentou consideravelmente, de 26,29 biliões de dólares em 1990 para 78,23 biliões em 1996. Podemos acrescentar que a ASEAN ocupava o 4º lugar no comércio mundial, a seguir à União Europeia, EUA e Japão.

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APEC (Ásia-Pacífico Economic Cooperation)

Este bloco de cooperação surgiu em 1989, com o objectivo de dar resposta ao aumento da interdependência existente entre as economias das região. Em 1998, abrange um conjunto de países que representa 55% do produto bruto mundial e 46% do comércio internacional. São 18 os países membros do bloco, a saber: os EUA, Canadá, Chile, México, Austrália, Nova-Zelândia, Papua-Nova Guiné, Brunei Darussalam, Japão, China, os dragões asiáticos ( Hong-Kong; Singapura; Coreia do Sul e Taiwan) e os tigres asiáticos (Tailândia; Malásia; Indonésia e Filipinas).

Na reunião de Seul em 1991 foram fixados os seguintes objectivos: - Manter o processo de crescimento e desenvolvimento na região e contribuir

para o crescimento a nível mundial; - Favorecer o processo de interdependência económica, cujos ganhos para a

região são evidentes, encorajando os fluxos de mercadorias, serviços, capital e tecnologia;

- Desenvolver e manter a abertura do sistema comercial multilateral; - Reduzir as barreiras ao comércio de mercadorias e serviços entre os

participantes; - Realçar o papel do sector privado, face ao seu contributo dinamizador

dentro das economias dos países participantes.

Mais tarde, em 1993, os países membros realçam a necessidade de um desenvolvimento sustentável.

Em 1994, os objectivos tornam-se mais abrangentes e o bloco declara pretender constituir uma zona de comércio livre, com liberdade de comércio e investimento, o mais tardar no ano de 2010 para as economias industrializadas e no ano 2020 para as economias em desenvolvimento.

Em 1995, é fixada uma agenda de trabalho para implementar os objectivos acima mencionados, nomeadamente nas áreas de cooperação técnica, como a energia e os transportes, a agricultura e empresas.

Em 1996, foram fixados os seguintes temas: acesso aos mercados; regime de investimento aberto; redução de custos dos negócios; infra-estruturas sectoriais.

Em suma, os traços caracterizadores da APEC são:

i) Trata-se de um bloco de cooperação de múltipla diversidade entre os seus membros, apresentando a vantagem da complementaridade estimulante das trocas comerciais e do investimento. A diversidade existente é notória do ponto de vista geográfico, do perfil das economias e dos diferentes níveis de desenvolvimento (desde os recursos naturais ao nível salarial);

ii) É um espaço económico que pretende promover uma cooperação regional aberta, respeitando as regras multilaterais, permitindo a realização de complementaridades económicas que estimulam as trocas e os investimentos à base do sector privado.

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2. MODELO DE DESENVOLVIMENTO ASIÁTICO

Nos anos de 75/95, os países asiáticos conheceram taxas de crescimento

elevadas, atingindo os 8% anuais, nomeadamente na Tailândia e Malásia. Este crescimento permitiu aproximar as estruturas destes países das dos países mais desenvolvidos, dando pleno sentido à designação de "novos países industrializados”. Assiste-se a uma "performance" notável baseada na importação de capitais, nos mercados externos e numa política económica de orientação liberal-conservadora.

Assiste-se ao aparecimento de um modelo de desenvolvimento original, de

onde se podem destacar os seguintes aspectos:

1. Taxas de Poupança Elevadas Existem na Ásia taxas de poupança internas muito elevadas, por exemplo no

Japão de 30% do PIB e de 19% em Singapura e Filipinas. Estas taxas são explicadas por motivos económicos e culturais, deficiência dos sistemas de protecção social; e as reformas vestem a forma de capitalização individual. A intermediação é feita pela Banca, sendo a poupança dos particulares uma das fonte de financiamento do sistema, adoptando-se uma política industrial e financeira que mobilizava e ajudava a afectar essa elevada poupança interna.

2. Elevados Afluxos de Capitais

A 2ª fonte de financiamento são os capitais estrangeiros, que se direccionam

para aquelas economias devido a três factores: - Baixas taxas de juro nos anos 90, nos EUA e no Japão; - Crença de que existiria uma intervenção dos Estados e das

Organizações Internacionais, caso alguma coisa corre-se mal; - Forte ligação das moedas locais a um painel onde predominava o dólar

e daí que os capitais liberados fossem em dólares. Esta massa de capital permitiu aos países asiáticos financiar os seus

investimentos, no entanto, existe o verso e o reverso da situação, onde por um lado se permite apetrechar os países de infraestruturas, por outro lado, assiste-se a uma má afectação na aplicação dos recursos.

3. Ancoragem da Política Cambial (Câmbios Fixos ligados ao Dólar) Orientação da política macroeconómica que mantinha grandes equilíbrios

agregados com a preocupação pela estabilidade dos preços, uma política orçamental prudente e a adopção de uma política cambial que associava as moedas nacionais ao dólar americano. Factor de extrema importância para a captação dos investidores que foram atraídos pelo diferencial de taxas de juro, complementado pela ausência de risco de câmbio.

Através da fixação das taxas de câmbio reduz-se a volatilidade na moeda nacional em relação ao dólar, baixando o prémio de risco da dívida liberada em dólares, permitindo que as empresas asiáticas pedissem empréstimos em dólares, seguros da manutenção da taxa cambial manipulada pelo Estado e Bancos Centrais.

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4. Predomínio das Exportações As exportações cresceram sempre a taxas superiores às do produto,

impulsionando a abertura das economias e, consequente, integração na dinâmica da economia mundial.

As exportações baseiam-se em produtos de forte intensidade de trabalho, como é o caso dos têxteis; em produtos tecnológicos progressivos; e na existência de mercados internos protegidos.

Sendo interessante analisar a taxa de abertura (rácio entre exportações e PIB), que em 1997, se situa em:

Quadro II

Taxa de Abertura

0% 20% 40% 60% 80% 100% 120% 140%

Coreia

Indonésia

Malásia

Filipinas

Tailândia

Hong-Kong

Taiwan

Paí

ses

Grau de Abertura

Após análise deste quadro, torna-se clara a orientação do aparelho produtivo em relação ao exterior.

5. Existência de um Estado Interventor

As fortes pressões políticas, com vista à manutenção de altas taxas de

crescimento, conduziram a uma longa tradição de garantias públicas, chegando a subsidiar e controlar directamente os projectos privados, ou favorecendo através de políticas de crédito directo, determinadas empresas. Toda esta política de favorecimento político induz à confiança na rendibilidade dos investimentos.

Esta situação é comum à generalidade dos países do sudeste asiático, ainda que existam algumas variantes e, nomeadamente, uma excepção, Hong-Kong. Em suma, existe um grande apoio às actividades privadas; manipulação do Estado; e aumento dos créditos concedidos por parte dos Bancos.

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3. FRAQUEZAS ESTRUTURAIS DO MODELO

Uma vez apresentado o modelo de desenvolvimento destes países, torna-se necessário fazer uma análise sobre a fraqueza estrutural deste modelo económico, que conduziu a um forte crescimento e quais os desequilíbrios que daí emergem. 1. SOBREINVESTIMENTO E APARECIMENTO DA “BOLHA FINANCEIRA”

A partir de 1995, os investimentos dirigiram-se para sectores fracamente

produtivos, devido: a direitos aduaneiros baixos derivados das negociações com a Organização Mundial do Comércio; à abertura crescente dos mercados; a custos unitários salariais no sentido de alta pressão dos sindicatos – Coreia do Sul; e ao aumento do crédito interno. Dos novos créditos concedidos, 40% dos quais, foram dirigidos ao sector imobiliário. Esta situação conduz ao aparecimento de uma “bolha especulativa” sobre a capacidade industrial (existência de sobrecapacidade instalada).

2. ACRÉSCIMO DO DÉFICE DAS BALANÇAS DE TRANSACÇÕES CORRENTES O rácio da BTC/PIB é um indicador macro-económico, que na Indonésia,

Malásia e Coreia do Sul passou de 2% em 1993 para 5% em 1996, na Tailândia onde se vai despolotar a crise financeira, este rácio atingiu os 8%.

3. FRAQUEZA DO SISTEMA BANCÁRIO E FINANCEIRO E DO CONTROLO INTERNO

Existe no sector bancário, uma falta de transparência contabilística que aliada ao afluxo de divisas potencia a proliferação de investimentos arriscados.

Importa referir que os motivos estruturais subjacentes à crise relacionam os

gestores das instituições, que não tinham competência para gerir o risco que leva ao forte endividamento e não convergência do balanço; e a falta de prudência financeira, as instituições acreditam estar cobertas por uma intervenção governamental, o que descura o sistema de regulação e supervisão e incentiva a redução de custos de informação, dando lugar à existência de informação assimétrica, empolando a prática de risco moral e de selecção adversa.

O conceito de informação assimétrica pode auxiliar a compreensão deste cenário: corresponde a uma situação em que os promotores têm melhor informação acerca do risco e rendibilidade potencial do seu projecto, do que têm as entidades financiadoras, o que origina situações conhecidas, economicamente, como selecção adversa e risco moral.

Selecção Adversa apresenta-se como a elevada probabilidade que os projectos

de mais alto risco têm de ser mais fortemente financiados, a inexistência de informações concretas sobre o nível de risco dos projectos, faz com que os financiadores tendam a preterir projectos de baixo risco e consequentes rendibilidades inferiores. Assim, os promotores dos projectos de risco reduzido e baixa, mas consistente, rendibilidade saem do mercado, apenas subsistindo os projectos mais rentáveis e arriscados.

Este fenómeno é tanto maior, quanto menor for a capacidade dos financiadores de recolher informação necessária a uma criteriosa selecção de projectos.

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O Risco Moral é caracterizado, pelo facto de, caso o projecto tenha sucesso o seu promotor fazer reverter a seu favor os elevados ganhos, e em caso de insucesso, ser o financiador a suportar todas as perdas. Para obviar estas situações, os financiadores deveriam ter impostos restrições à concessão de crédito e organizar sistemas de controlo.

4. AUMENTO DA CORRUPÇÃO E CONTEXTO POLÍTICO OBSCURO Estas situações assumem maior relevância no Japão, Coreia do Sul e na

Indonésia. A grande influência da intervenção pública, o proteccionismo e a corrupção, na

Indonésia impediu a eficiência económica e a competitividade, reduzindo a qualidade e produtividade do investimento, a confusão política, na Tailândia impediu a tomada atempada de decisões, e a falta de transparência na implementação das políticas (designadamente, infra-estruturas públicas e isenções fiscais ad-hoc) contribuíram largamente para o eclodir da crise. 4. INDÍCIOS DE CRISE

Em meados dos anos 80, dá-se a alteração das Finanças Internacionais, com o objectivo da globalização financeira.

Assiste-se a uma integração directa dos mercados financeiros, pela

ultrapassagem das estreitas regulamentações nacionais dos Estados (controlos de capitais; regulamentações de câmbios; tratamentos fiscais especiais; entre outras) para um mercado unificado. Afastou-se o princípio da especialização bancária, diluindo-se as barreiras nacionais e externas. Assistiu-se à fase de desregulamentação, acompanhada de taxas de juro variáveis e de cotações cambiais voláteis. Este processo conduz ao aparecimento de inovações financeiras (produtos como as opções, futuros , swaps, etc.) com diversas consequências, nomeadamente:

- Permitir gerar a instabilidade da taxa de juro e da taxa de câmbio; - Facilidade de passagem de um compartimento de mercado para outro,

sucessiva alternância de taxas variáveis/taxas fixas, spot/forward, para desembocar nas operações multi-divisas;

- Possibilidade de um banco comprar firme os títulos, caso estes não se escoem do mercado, dando ao emitente devedor a garantia de um financiamento a longo prazo;

- Desintermediação através de títulos renováveis a taxa variável.

A todo este fenómeno de globalização financeira, as economias dinâmicas da Ásia não escaparam.

Um dos sinais inquietantes nestes países foi a abundância de liquidez, que fez

com que aumentassem os investimentos de alto risco com rentabilidades incertas, e o financiamento do défice da BTC que se fazia no curto prazo, com capitais voláteis, acumulando a vulnerabilidade da economia.

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A subida do valor do dólar, a partir de 1995, marca um ponto de viragem da política económica e o iene cai 50% entre Abril de 1995 e Fevereiro de 1997.

Na Tailândia não é tanto a apreciação do dólar que conta, é a depreciação do

iene, é aqui que reside a contracção das exportações para os países cujas moedas não estão indexadas ao dólar, como é o caso do Japão, ao encarecer as importações de bens de equipamento.

A apreciação do dólar tem efeitos inflacionistas na medida em que o

financiamento da BTC faz-se através de capitais estrangeiros liberados em dólares. A importação de capitais obriga o Banco Central a criar moeda nacional, em contrapartida dos dólares entrados para manter a paridade do bath. Com inflação, a competitividade tailândesa decresce.

O resultado foi um processo de acumulação de capitais que conduziu a um

défice permanente e crescente da BTC em relação ao PIB.

A erosão da economia fez-se sentir através do aumento dos créditos falhados e na insolvência de algumas instituições, provocando inclusive a sua própria falência.

O excesso de confiança das empresas nas instituições financeiras, destas no

Governo e deste nas organizações supranacionais como o FMI, de que qualquer risco de insolvência estaria coberto e a existência de corrupção ao nível da concessão de crédito, conduziu inevitavelmente a uma crise económica de importância considerável.

5. A CRISE FINANCEIRA DO SUDESTE ASIÁTICO

5.1 CAUSAS DA CRISE FINANCEIRA A crise do Sudeste Asiático, que começou a partir de meados de 1997, teve causas que se podem esquematizar da seguinte maneira:

i) As moedas do bloco ASEAN e de Hong-Kong mantinham um sistema cambial ligado ao dólar norte-americano, utilizando a técnica do crawling-peg directo ou indirecto. A revalorização do dólar dos EUA, a partir de Maio de 1995, traduziu-se numa apreciação da taxa de câmbio efectiva e em perda de competitividade real das economias do Sudeste Asiático;

ii) A perda de competitividade das exportações, agravada pela desaceleração do sector da electrónica e pela estagnação da economia japonesa (taxa de crescimento de 0,5% em 1997);

iii) A concorrência acrescida por parte de novas economias emergentes que procuraram integrar-se na economia mundial;

iv) O excessivo endividamento externo de curto prazo contraído por grandes empresas voltadas para os sectores imobiliário e financeiro;

v) A ineficiente aplicação de capitais (caso da Coreia do Sul à conquista de quotas de mercado internacional);

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vi) A desaceleração das exportações e o baixo retorno de projectos de investimento, o que comprometeu o serviço da dívida;

vii) A défices volumosos das balanças de transacções correntes, aliados à liquidação de investimentos financeiros e ataques especulativos às moedas nacionais.

Descritas as principais causas, passemos aos acontecimentos. 5.2 A CRISE DE 1997 E 1998

Quando a crise eclodiu, já havia amortecimentos da actividade económica e os preços dos activos encontravam-se submetidos a vivas pressões. Daí que as autoridades monetárias fossem renitentes em aumentar as taxas de juro, tanto mais que a estrutura financeira se caracterizava por uma dívida de curto prazo ou de taxas variáveis. Com a alta taxa de juro prejudicava-se, imediatamente, os agentes que tinham obtido empréstimos e ameaçava-se a viabilidade da banca. Tratou-se de uma crise complexa que resultou da interacção de várias áreas, nomeadamente, no que respeita às reacções de investidores institucionais, ao comportamento dos mercados cambiais e à actividade bancária e obrigacionista internacional. A partir de 7 de Maio de 1997, um forte ataque especulativo foi desencadeado sobre o bath tailandês. A cotação das acções e a depreciação cambial propagou-se rapidamente a outros países. A crise da Tailândia abalou a região pela via do comércio internacional. A evolução dos mercados vê-se pelo quadro abaixo:

Quadro III (Ano de 1997)

Cotação das Acções (Var. em %)

Taxa Cambial Face ao USD (Depreciação em %) Países

1.1 a 30.6

1.7 a 3.11

4.11 a 17.11

1.1 a 17.11

1.1 a 30.6

1.7 a 3.11

4.11 a 17.11

1.1 a 17.11

Tailândia -34,4 -21,2 -7,6 -45,0 -3,0 38,5 0,5 33,6

Malásia -12,4 -33,5 -8,1 -45,7 -0,1 21,9 1,7 24,1

Filipinas -11,1 -35,2 0,6 -40,0 0,3 24,8 -2,6 22,4

Indonésia 13,5 -31,4 -11,2 -31,1 2,8 26,2 6,6 32,3

Singapura -8,7 -14,0 0,8 -19,8 2,2 7,3 1,4 11,6

Taiwan 31,9 -15,0 -1,2 12,4 1,1 9,5 1,9 11,9

Hong-Kong 15,1 -25,2 -3,3 -21,1 0,2 -0,1 -0,1 -0,1

China 36,0 -1,5 0,6 29,6 -0,1 -0,1 0,0 -0,2

Fonte: Perspectives Économiques de L'OCDE, Dezembro 1997

Na sequência da crise da Tailândia, as moedas de Taiwan e de Singapura foram depreciadas, entre 25 a 30%. O dólar de Hong-Kong sofreu, em Outubro de 1997, fortes ataques especulativos, tendo, no entanto, resistido e conservado a respectiva paridade face ao dólar norte-americano. Teve de subir, em flecha, as taxas de juro o que contribuiu para uma forte baixa das cotações das acções.

No 2º semestre de 1997, a procura interna e o investimento fixo caíram na

Tailândia, face à queda das cotações das acções e do sector imobiliário, com repercussão na Malásia, Filipinas e Indonésia.

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14

5.2.1 ETAPAS DA CRISE FINANCEIRA :

Na análise da crise asiática, é possível observar 4 fases: Fase I - Janeiro - Abril de 1997: a crise na Tailândia A primeira fase corresponde à crise da Tailândia observável nos ataques ao

bath em finais de Janeiro/princípio de Fevereiro de 1997. A sustentabilidade do peg em relação ao dólar é posta em causa, dado o

crescente défice das contas correntes, a grande dívida externa de curto prazo, o colapso da bolha especulativa no sector imobiliário, e a contínua erosão da competitividade resultante da subida do dólar relativamente ao iene.

As autoridades procuraram manter a situação da intervenção no mercado

cambial e na subida temporária da taxa de juro. Mas, as medidas revelaram-se infrutíferas e os preços na bolsa continuaram a descer, ao mesmo tempo que se faziam sentir claros sinais de nervosismo nos mercados da região, devido à baixa das exportações da Indonésia e Filipinas em 1996, países que mantinham um défice das transacções correntes elevado, embora mais baixo que o tailandês, e as cotações das acções muito elevadas.

A deterioração da situação na Tailândia contribuiu seguidamente para a queda

das cotações nas bolsas, em particular na Malásia e nas Filipinas. Estas continuavam igualmente a cair na Coreia. Contudo, a política mais flexível da taxa de câmbio neste país, com o won a declinar contra o dólar em 1996 e início de 1997, tornou esta moeda menos vulnerável a um ataque especulativo.

Fase II – Maio-Início de Julho de 1997: a crise do bath As enormes pressões contra o bath, no início de Maio levaram à intervenção

pública nos mercados. Em 15 de Maio, introduz-se o controlo sobre os mercados de câmbio e capitais e provoca subidas da taxa de juro. Estas medidas não restauraram a confiança na moeda e as fortes pressões continuaram na segunda metade de Maio e em Junho.

Na região são observáveis diversos efeitos de contágio, embora limitados pela

intervenção nos mercados de câmbios, subidas das taxas de juro e no caso de Malásia, imposição de limites para os swaps de não-residentes não relacionados com transações comerciais.

A Tailândia, face à contínua deserção de capitais, abandona a 2 de Julho a

ligação da sua moeda ao dólar, deixando a taxa de câmbio flutuar, embora permaneça enfraquecida, mesmo após uma queda de 10%.

Fase III - Início de Julho Meados de Outubro de 1997: a crise da região Para além da Tailândia, as maiores pressões emergem inicialmente nas

Filipinas, onde as autoridades mantinham de facto uma peg da taxa de câmbio em relação ao dólar. Após uma tentativa de defender o peso através da elevação das

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taxas de juro, deixaram-no flutuar a partir de 11 de Julho impondo seguidamente restrições nas transações de não residentes, com o propósito de evitar a especulação.

Efeitos de contágio verificaram-se, rapidamente, na Malásia onde as

autoridades optaram por depreciar o ringgit, em vez de subir as taxas de juro. Na Indonésia, a rupia baixou, para além da banda oficial de intervenção (fixada

em 8%) tendo, previamente, as autoridades alargado as margens de flutuação sem intervenção para 12%. Dado o insucesso das medidas adoptadas para controlar a liquidez, as autoridades deixam a rupia flutuar a partir de 14 de Agosto.

Entretanto, o bath tinha baixado 18% em relação ao dólar. A situação piorou

nos dois meses seguintes e em meados de Outubro, o declínio cumulativo das moedas contra o dólar excedia 30%, para a indonésia e Tailândia e 20% para a Malásia e Filipinas. As perdas na bolsa tinham batido todos os recordes em Agosto.

Os efeitos de contágio foram relativamente limitados, tanto nos outros países

da Ásia como fora dela. Alguns mercados emergentes que tinham feito grandes ganhos na bolsa antes de Julho (Brasil, Hungria, Rússia) sofreram correcções à baixa, tal como as suas moedas. Nos mercados maduros, os preços em bolsa continuaram a valorizar-se podendo dizer-se que nesta fase, a crise do sudeste asiático permaneceu largamente contida na região.

Fase IV - Meados de Outubro-Meados de Dezembro: Contágio pelos mercados financeiros globais Em meados de Outubro, os mercados financeiros da Ásia são submetidos a

novas pressões à baixa, mas agora os efeitos de contágio são já maiores, intensificando-se as pressões nos mercados de câmbios, incluindo em Taiwan, onde as autoridades pararam a intervenção em 17 de Outubro, deixando o novo Taiwan dólar depreciar-se 6%, e em Hong-Kong, onde as taxas de juro subiram para manter a paridade do dólar de Hong-Kong com o dólar americano. Todavia, as pressões conduziram a um declínio nos preços em bolsa de 23% em três dias, culminando com uma queda de 10% no dia 23. No dia 27, as cotações declinavam nos EUA 7% e no mundo.

Na Ásia, intensificaram-se as pressões sobre o won coreano, na última semana

de Outubro, e os preços em bolsa caiam fortemente, reflectindo a falta de confiança na capacidade das empresas para pagar as suas dívidas, com consequências para o sector financeiro. Após uma intervenção para defender o won, as autoridades passaram a banda diária de flutuação de 4,5% para 20%, no dia 20 de Novembro, requisitando em seguida o apoio financeiro do FMI.

Os efeitos de contágio nos mercados de câmbios, emergem num grande

número de países obrigando, geralmente a subidas da taxa de juro para defender as moedas nacionais. Na Rússia, a taxa de juro oficial subiu 7%, no início de Novembro, quando as pressões sobre o rublo se acentuaram e se registaram perdas de 20%, na bolsa em 28 de Outubro. As autoridades anunciaram a passagem da banda de

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intervenção de 10% para 30% em 1998. As taxas de juro subiram de novo em Dezembro, quando as pressões sobre o rublo se intensificaram.

Nos países industrializados, as correcções na bolsa do final de Outubro foram

recuperadas rapidamente e no início de Dezembro a maior parte dos mercados, com exclusão do Japão (a 24 de Novembro verifica-se a falência das quatro mais importantes firmas japonesas de corretagem), tinham recuperado a maior parte das suas perdas anteriores. Manteve-se, todavia, um ambiente de preocupação, apesar das indicações de que a economia americana estava a expandir-se, a ritmos superiores ao previsto e do aumento das taxas de juro no Canadá e na Europa.

Os ajustamentos da taxa de câmbio, o desajustamento do sector financeiro e

dos preços dos activos, o colapso da actividade de investimento provocado pelo processo de desintermediação e a erosão dos rendimentos e confiança dos consumidores, não pode ser dissociado da extraordinária inversão do fluxo de capitais, pelos detentores de informação privilegiada.

A desvalorização do bath tailandês, seguida pelas crises cambiais na Malásia e Indonésia e, pouco depois, na Coreia do Sul provoca um efeito de contágio para economias de graus idêntico e vulnerabilidades semelhantes, com elevado grau de interdependência, tanto no âmbito das trocas como no plano financeiros, sendo que recorrem aos mesmos investidores.

O contágio da crise financeira tailandesa a outros países, propaga-se: - Via Comércio Internacional; - Via Canal Financeiro, com o eclodir da crise assiste-se á fuga de capitais

destas economias para outras mais estáveis; - Com a sobrevalorização do dólar assiste-se a fuga de dinheiro em dólares e

procura de dólares. 5.3 DESENVOLVIMENTO DA CRISE

5.3.1 NO CONTEXTO ASIÁTICO

Em Agosto de 1997, a Tailândia aceitou um empréstimo do FMI de 17 biliões

de dólares, co-financiado pelo Japão e alguns outros países da região, para financiar o défice da balança de transacções correntes, que já em 1996 atingiu mais de 7% do PIB, situação que se mantinha no 1º semestre de 1997. Os compromissos assumidos, como contrapartida, por parte do governo da Tailândia, foram no sentido de obter um superavit orçamental de 1% do PIB, reforçar a solvabilidade da banca e das sociedades de crédito, pela via do aumento de poderes do banco central e liberalizar o regime de participação estrangeira no sector financeiro.

Em Dezembro de 1997, a Coreia do Sul apareceu com dificuldades financeiras

tremendas, levando a um pedido de empréstimo junto do FMI da ordem dos 57 biliões de dólares. Este facto deveu-se à excessiva dívida externa oficial e ao endividamento dos grupos económicos familiares, associado à correspondente falta de liquidez bancária. È importante recordar que, em 30 de Janeiro de 1998, a Coreia do Sul

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renegociou uma parte da dívida externa de curto prazo (24 biliões de dólares), alargando o prazo para um, dois e três anos, com garantia do Estado.

Outra crise que surgiu no 4º trimestre de 1997, foi a da Indonésia, cujas

repercussões sociais levaram à demissão do Presidente Suharto, de relembrar que só a partir de Junho de 1998 é que se começaram aplicar as medidas propostas pelo FMI. O FMI exigiu o accionamento de várias medidas, entre as quais: fixar o défice da balança corrente a menos de 2% do PIB; manter reservas de câmbio equivalentes a cinco meses de importações; desmantelar monopólios familiares; e obter um superavit orçamental de 1% do PIB.

A propagação da crise pelos países da região, tal como foi descrita, pode

confirmar-se pelo quadro abaixo:

Quadro IV

Efeito a Curto Prazo da Turbulência Financeira da Ásia (*)

Produção Industrial

Preços no Consumo

Saldo Comercial Importações Cotação Cambial Real Países

1º Sem 1997

3ºTrim 1997

1º Sem 1997

3ºTrim 1997

1º Sem 1997

3ºTrim 1997

1º Sem 1997

3ºTrim 1997

1º Sem 1997

3ºTrim 1997

Coreia 6,4 -7,8 4,4 8,9 -18,3 34,5 2,3 -35,1 -2,9 -38,7

Indonésia -- -- 5,0 29,7 8,3 18,9 0,7 -21,5 7,0 -64,4

Malásia 11,5 7,8 2,8 4,3 -2,2 3,2 5,1 -16,5 7,2 -29,8

Filipinas -- -- 4,6 7,0 -11,1 -6,6 11,1 0,4 7,7 -28,3

Tailândia 6,0 -13,0 4,4 9,0 -13,1 11,0 -8,9 -35,9 7,2 -35,6 (*) Variação em % em relação ao mesmo período do ano anterior, excepto para o saldo comercial, expresso em USD, em taxa anual

Fonte: Banque des Règlements Internationaux, Junho 1998

As economias da Tailândia, Filipinas, Indonésia e Coreia viram-se forçadas a implementaram programas de estabilização, e reformas suportadas pelo financiamento do FMI.

De acordo com o World Economic Outlook do FMI, a recuperação das

economias asiáticas, far-se-á através: - Da melhoria da situação comercial externa, consequência da

competitividade dos produtos face ao enfraquecimento das moedas, que atingiram níveis negativos substanciais, a saber:

Quadro V

Variação em 1997 Tailândia Indonésia Malásia Coreia Hong-Kong Filipinas

Taxa de Câmbio -45,5% -56,3% 34,8% 47,4% 0,3% -35,1%

Taxa de Juro 13,3% 12,3% 1,8% 16,6% 3,9% 19,6%

- E do aumento dos fluxos financeiros, quer domésticos, quer externos.

Parece-nos interessante ver qual a situação no 1º Semestre de 1998, onde se

notou um aumento das exportações, mas não o correspondente à profunda desvalorização cambial. A melhoria dos saldos fez-se, em parte, à custa da redução

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das importações. Houve um forte abrandamento das relações comerciais intra-asiáticas, devido à fragilização da procura interna dos países (redução do nível de produção e/ou desaceleração da actividade industrial).

As medidas de saneamento financeiro impostas pelo FMI, são de efeito lento, em termos de reposição da confiança e as perspectivas de crescimento do FMI para 1998 eram: Coreia –0,8%; Tailândia –3,1%; Indonésia –5%; Malásia 2,5% e para a China 7%.

Uma nota referente aos créditos de confirmação do FMI que sendo reduzidos,

a eles tem de se juntar outros financiamentos multilaterais e bilaterais. De referir que o total de financiamento à Tailândia, Indonésia e Coreia, envolveu 117,1 biliões de dólares, em termos comparativo, e para se conhecer a real dimensão da ajuda, importa referir que a crise de liquidez mexicana de 1994, envolveu 51,6 milhões de dólares norte-americanos. 5.3.2 REFERÊNCIA Á CRISE MEXICANA DE 1994

Numa breve alusão ao que foi a crise financeira do México em 1994, podemos

referir ter-se tratado de uma crise financeira de liquidez. Em 1991, assiste-se ao lançamento de uma nova política cambial, baseada na paridade deslizante face ao dólar (crawling-peg), com desvalorizações inferiores ao diferencial de inflação com os EUA. Daí que o câmbio real do peso face ao dólar se tenha apreciado, tendo como consequência o encorajamento das importações e a perda da competitividade-preço da indústria mexicana. Esta estratégia fez aparecer um importante défice da balança de transacções correntes, que atingia 8% do PIB em finais de 1994.

Por outro lado, a política de financiamento do défice da balança de transacções

correntes fez-se pela captação de capitais estrangeiros, sob a forma de investimentos de carteira. Estes são os principais factores que desembocaram na crise financeira de Dezembro de 1994. O governo determinou que o peso tivesse maior margem de oscilação, numa fase e na seguinte conduz à sua total flutuação. A decisão de desvalorizar foi tomada a 20 de Dezembro de 1994, mas já era tarde para travar a fuga de capitais.

Após a crise financeira, a economia sofreu um doloroso processo de

ajustamento estrutural, com forte queda dos salários reais, desemprego e altas taxas de juro que agravavam o endividamento das famílias e das empresas. A redução das despesas públicas e aumento de impostos exerceu um efeito de contracção da actividade económica. A política monetária, através do plano de estabilização de Março de 1995, desempenhou um papel de travagem nos salários e nos preços. Este tratamento de choque gerou uma boa capacidade de resposta, pela via das exportações de bens e serviços.

No tocante ao sector bancário que sofreu a desregulamentação depois de 1988

e a privatização dos bancos comerciais em 1991-1992, teve o seu auge de crescimento entre 1989 e 1994 (a intermediação financeira passou de 30 para 50% do PIB). Crescimento não estruturado e planificado, o que fex com que os créditos concedidos de carácter improdutivo aumentassem constantemente, e mesmo antes da

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crise financeira de Dezembro de 1994, a banca mexicana conhecia graves dificuldades.

Depois da crise do peso, houve várias incidências no sector bancário, a

depreciação fez com que os devedores mexicanos que tinham pedido empréstimos, ficassem incapacitados de os reembolsar em divisas.

As entidades mexicanas accionaram uma série de medidas para auxiliar os bancos, aplicando o seguinte conjunto de princípios:

- Limitar o risco sistémico, reforçando as normas prudenciais e as obrigações em matéria de provisões (uma conta especial de refinanciamento em dólares foi aberta pelo Banco do México, para ajudar os estabelecimentos a reembolsar a sua dívida de curto prazo em divisas);

- Preservar a confiança dos depositantes no sistema, promovendo uma cultura de pagamento nas condições de mercado;

- Aplicar um programa temporário de capitalização, emitindo obrigações convertíveis automaticamente.

O risco de uma generalizada crise dos mercados financeiros, que estão

globalizados, só pôde ser evitada pela intervenção rápida da comunidade internacional que forneceu ao México a liquidez necessária, no montante de 50 biliões de dólares.

As lições extraídas, podem sintetizar-se da seguinte forma: - Tomada de decisão tardia na política de desvalorização da moeda nacional; - Os investimentos de carteira que revestem a forma de tomadas de

participações são muito sensíveis às condições dos mercados financeiros internacionais e, em particular, às flutuações das taxas de juro;

- A rapidez da cooperação internacional em matéria de ajuda de liquidez. 5.4 CONSEQUÊNCIAS DA CRISE NA ÁSIA

O facto de se ter assistido a um forte crescimento do comércio intra-asiático, funciona como um “obstáculo” a uma rápida recuperação das economias da região, quando a crise tem aqui o seu epicentro, deixando estas economias mais dependentes dos mercados do Japão, dos EUA e da UE, para obterem um crescimento estimulado pela exportação. As perspectivas de recuperação são reduzidas, pela existência de fenómenos de sobrecapacidade nas actividades que constituíram o limitado número de sectores-motores do crescimento recente, por exemplo, os casos da electrónica, automóvel e imobiliário, o que implicará um processo longo de “destruição do capital”, antes das economias recuperarem ritmos de crescimento.

A recuperação da confiança dos investidores só se pode vir a verificar quando

for absorvida a maior parte da força de capital, que para essas economias representam os elevados níveis de crédito mal parado e se realizar uma recapitalização maciça dos bancos.

Ora, numa política económica enquadrada por câmbios fixos e mobilidade de capitais facilmente, se adivinha a perda de autonomia da política monetária. Assim, os Bancos Centrais encontram-se numa situação de aperto e tomam medidas como:

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- Subida das taxas de juro de curto prazo, para níveis elevadíssimos, a fim de furar a especulação, esta situação ocorre em Outubro de 1997, em países como Taiwan e Hong-Kong;

- Venderam fortes reservas de divisas para adquirir a sua própria moeda; - Instala-se a depressão económica; - Finalmente, abandonam a defesa da sua moeda e desacreditam-se

politicamente.

Os custos de perda de produção têm sido relativamente elevados nos países directamente expostos, em economias abertas, em relação aos seus normais abrandamentos, nos países emergentes e apesar de se verificarem novamente taxas de crescimentos elevadas poucos anos depois do início da crise, os custos de longo prazo são normalmente pesados, nomeadamente, no que respeita aos custos de reestruturação financeira que são transferidos para o sector público. Segundo o relatório do FMI de 1998, estes custos podem ascender entre 10 a 30% do PIB.

Em termos sociais assiste-se á subida dos índices de pobreza e de

desigualdade, o que poderá colocar as economias emergentes em níveis idênticos aos do início da década.

A vulnerabilidade de uma economia, em relação a uma crise cambial, porque o dólar valorizou, depende da estabilidade do seu sector financeiro, que como já vimos, no caso das economias asiáticas peca pela sua falta de transparência, controle e fiabilidade. O impacto de uma desvalorização, neste caso, de fraca solidez do sector financeiro, aumenta os impactos nas variáveis reais da economia, pois provoca uma deterioração do equilíbrio de balanço das instituições que vêm aumentar o seu passivo, sem contrapartida do lado do activo, assim, uma forte contracção da liquidez e disponibilidade do crédito pode conduzir a uma desaceleração da actividade económica.

Salientam-se os seguintes casos: Tailândia, Indonésia e Coreia ( Hong-Kong e

Singapura com fortes sectores financeiros foram apenas contagiados). Os problemas agravaram-se, neste último país, devido ao facto, de as dívidas dos conglomerados industriais coreanos serem garantidas pelas instituições financeiras. Em 1997, um grande número de empresas abre falência, por diversos factores, incluindo o sobreinvestimento no sector automóvel e aço e uma fraca lucratividade de tipo cíclico, reflectindo-se directamente nos resultados das empresas financeiras.

Na Tailândia, 56 empresas financeiras foram fechadas, e as taxas de juro

subiram para níveis muito elevados. Nas Filipinas procedeu-se a uma reforma fiscal muito restritiva. Na Indonésia, 16 bancos insolventes fecharam e outros encontram-se sob supervisão. Na Coreia, 14 bancos comerciais foram suspensos, a taxa de câmbio flutua livremente, a taxa de juro subiu fortemente e tomaram medidas para liberalizar os mercados financeiros. Na Malásia, as autoridades avançaram com um pacote de medidas de emergência incluindo grandes cortes nas despesas em infraestruturas.

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5.5 MECANISMOS DE TRANSMISSÃO E PROPAGAÇÃO AO OCIDENTE Partindo da Ásia, a crise estendeu-se pelo conjunto dos países emergentes do

mundo. Este contágio nada tem de racional. As relações comerciais entre esses países são fracas e, por vezes, nulas. Trata-se de um efeito-retorno, dirigido pelos mercados mais prudente.

Em 1996, o afluxo de capitais privados que se dirigiram aos países emergentes foi da ordem dos 200 biliões USD e continuaram a afluir nos três primeiros meses de 1997. Em Novembro de 1997, os operadores começam a desconfiar do risco dos países emergentes. As obrigações deixaram de ser emitidas naquele mês. O acesso às dívidas externas começa a ser difícil – assiste-se à deteorização da confiança dos agentes económicos. 5.5.1 A CRISE NA RÚSSIA

A 17 de Agosto de 1998, um mês depois de ter obtido um crédito do FMI de

22,6 biliões de USD, a Rússia desvalorizava a sua moeda em 34%, instaurando uma moratória unilateral do serviço da dívida e incumprimento da sua dívida interna.

Como se explica esta crise? A partir de 1993, as autoridades russas elegeram a luta contra a inflação como

prioridade: - suspenderam a criação de moeda; - contraíram empréstimos para financiar o défice volumoso do Orçamento

(títulos do tesouro russos com elevadas taxas de juro). A Rússia deveria ter estabelecido o controlo orçamental, no sentido do

equilíbrio. Ao contrário, entra numa espiral de défices auto-sustentados e fraude fiscal; atrasos de pagamento; atrasos de cobrança de receitas fiscais, não ultrapassando 65% do previsto; os juros da dívida externa, constituem 63% das receitas fiscais reais da Federação.

A contribuição da crise asiática para a Rússia foi o da diminuição das

exportações russas (a baixa da procura asiática teve um efeito recessivo sobre o custo das matérias-primas, de que a Rússia é um importante exportador). Para além disso, a Rússia estava mergulhada em movimentos separatistas e de terrorismo.

5.5.2 A CRISE NO BRASIL

Depois da Rússia, a crise estende-se à América Latina. O contágio faz-se pelos canais habituais (o canal comercial e o canal financeiro).

As exportações latino-americanas para a Ásia baixaram. É certo que sete

países latino-americanos (Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, México, Perú e Venezuela) só destinam 10,5% do total das suas exportações à Ásia Oriental, mas dois países (Perú e Chile) tiveram fortes repercussões (Perú: 25% de exportações; Chile: 38% das exportações).

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A América Latina sofre as consequências da baixa de preço das matérias-primas, que constitui uma importante rubrica do seu comércio externo (Petróleo Venezuelano; Cobre Chileno; Estanho Boliviano; o Açúcar e o Minério de Ferro Brasileiro).

No campo financeiro, a crise propagou-se ainda mais directamente. Os capitais flutuantes reconsideraram a sua estratégia e abandonaram todos os países emergentes. O Brasil foi o país mais afectado, sendo a oitava economia do mundo (o seu PNB é de 800 biliões de USD, o que representa o dobro da Rússia). O afundamento do Brasil arrastaria a Argentina, o Chile e o México.

Por outro lado, os Bancos dos EUA forneceram empréstimos à Zona de 50%

do total da sua actividade. Este apoio dos EUA, em 13 de Novembro de 1998, traduz-se numa ajuda de 41,5 biliões de dólares. É a primeira vez que as Instituições Financeiras apoiaram, preventivamente.

Em contrapartida, o Presidente brasileiro (reeleito a 6 de Outubro de 1998),

comprometeu-se a reduzir os défices públicos (8% do PIB em 1998) e a diminuir a dívida externa (mais de 200 biliões USD), através do aumento dos impostos e contracção da despesa pública. Apesar de tudo isto, o Brasil mergulha na crise em Janeiro de 1999, como resultado, acontece a flutuação do real e sua desvalorização.

5.5.3 A CRISE NO OCIDENTE

O final do ano de 1998 fechou-se com optimismo moderado. A economia dos EUA beneficiou de um crescimento de excepção (3,9% em 1997; 3,6% em 1998). A Europa comunitária, situa-se na ordem do 2,2%.

O Ocidente sai da crise asiática sem danos visíveis, devido essencialmente a

duas razões: 1) A zona asiática em crise absorve, em 1996, 95% das exportações

americanas e 7% das exportações da União Europeia. Para o conjunto dos países emergentes da Ásia, as exportações representavam 18% do total americano e 15% do total europeu.

2) H ouve um movimento de capitais simétrico, a favor das bolsas ocidentais. Existe uma diminuição das taxas de juro. A maior fragilidade vem da banca, com os empréstimos à Ásia.

6. OS INTERMEDIÁRIOS FINANCEIROS NA ÁSIA

A intermediação financeira consiste, na actividade de captar poupança junto dos agentes económicos que a realizam (têm excedentes), cedendo, posteriormente, aos investidores que têm necessidades de financiamento para os seus projectos.

A intermediação financeira assume um papel fundamental na economia, no sentido de conseguir uma conjugação das necessidades de financiamento e de investimento, funcionando como dinamizador do processo de investimento na economia.

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O sistema financeiro surgiu então, como uma necessidade para as economias usufruírem dos ganhos de comércio. Deste modo, à medida que o sistema financeiro se desenvolve surgem benefícios de risco, diversificação das fontes de investimento, consegue-se o alisamento temporal, uma alocação do investimento eficiente facilita o desenvolvimento do comércio regional e internacional e, permite explorar oportunidades de investimento de grande dimensão.

No caso de mercados perfeitos e completos, a interacção entre os agentes económicos é de tal modo eficiente que não necessitam de intermediários financeiros.

Mas, a imperfeição dos mercados e os problemas de informação assimétrica,

justificam a existência de agentes intermediários para interagirem entre aqueles que detêm poupanças e os que necessitam de financiamento para os seus projectos.

Os sistemas financeiros podem ser de dois tipos: um baseado no mercado de

capitais e outro baseado em intermediários financeiros (sistema bancário).

No caso das economias asiáticas, a intermediação é feita através da banca. 6.1 O PAPEL DOS SISTEMAS BANCÁRIOS NAS ECONOMIAS EMERGENTES DA ÁSIA

O impressionante crescimento económico de “tigres e dragões” implicou - a par

de volumoso investimento directo estrangeiro, transferências de tecnologia, deslocações maciças de mão-de-obra do sector agrícola para a indústria e serviços – um acesso fácil ao financiamento bancário. Tendo em consideração, as elevadíssimas taxas de poupança destas economias e, a virtual ausência de um mercado de dívida, fácil era concluir que os volumes progressivamente crescentes (em termos absolutos) de poupança não podiam senão afluir ás instituições bancárias. Estas, cumprindo o seu papel de intermediação, providenciavam o acesso fácil ao crédito bancário. Por outro lado, o ambiente de baixas taxas de juro do dólar americano embarateceu o acesso a esse mesmo crédito, uma vez que, praticamente, todas as moedas destas economias emergentes se encontravam indexadas ao dólar, de forma mais directa, como é o caso do dólar de Hong Kong, ou de forma mais indirecta, como é o caso do won da Coreia do Sul e rúpia da Indonésia, e portanto, a seguir as pisadas da reserva federal americana, em termos de taxas de juro, mesmo quando os desequilíbrios da economia interna (inflação e déficit externo), aconselhassem noutro sentido. Assim, na Ásia os bancos comerciais eram os maiores receptores das poupanças e o principal veículo de criação de crédito. A dimensão dos sectores bancários desta região, relativamente ao conjunto das economias a que pertencem, é das mais elevadas do mundo, reflectindo, por um lado, as substanciais taxas de poupança e, por outro, as elevadas taxas de captação bancária. No quadro abaixo, podemos evidenciar o aumento do crédito concedido nos anos anteriores à crise:

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Quadro VI

Expansão do Crédito Bancário Relativamente ao PIB(%)

Países 1980 1995

China 47,5% 83,9% Coreia do Sul 36,2% 55,7% Hong-Kong 71,7% 321,4% Singapura 62,9% 84,9% Taiwan 49,2% 143,1% Indonésia 8,1% 49,1% Malásia 33,1% 76,9% Filipinas 37,9% 39,3% Tailândia 27,5% 88,7% Japão 81,0% 115,1% Fonte: B.R.I. - 67º Rapport Annual, Juin, 1997

Nesta conjuntura, seria de admitir que os bancos asiáticos tivessem oportunidade de se robustecer, e apresentassem uma solidez financeira que os pusessem a resguardo de maiores problemas. Na realidade, sucedeu o inverso: os bancos cresceram efectivamente, mas no essencial à custa da assumpção de maiores riscos – risco de crédito, risco de mercado, risco cambial, etc..

Mas, quer os próprios bancos, quer muitas das entidades a quem eles

concediam crédito, eram considerados como estando abrangidos por uma garantia das autoridades governamentais (nuns casos por razões de proximidade política, como na Tailândia, noutros por laços familiares com as altas esferas do poder, como na Indonésia) que faria com que qualquer projecto mal sucedido, beneficiasse de uma rápida intervenção governamental, que deixasse a instituição bancária inafectada

A conjuntura económica favorável, o clima generalizado de confiança na

sustentabilidade conduziram a um processo de sobreinvestimento, que, por sua vez, se traduz na formação de uma bolha especulativa no sector imobiliário. Esta situação atingiu níveis preocupantes, na medida em que, arrastou uma subida dos preços de activos referentes a outros sectores da economia.

6.2 FRAGILIDADES DOS SISTEMAS BANCÁRIOS

Dada a anterior conjuntura, e juntando um número considerável de falências,

assiste-se ao rebentar da bolha que, no imediato, provoca uma tendência de queda dos preços dos activos que fez com que, cada vez mais empresas não cumprissem o serviço da dívida.

A incapacidade dos bancos de recuperarem os investimentos, reflectiu-se na

deterioração dos seus balanços, confrontando, também, estes intermediários financeiros com situações de escassez de liquidez, que conduziu á insolvência dos bancos.

Os investidores internacionais ao apreenderem a iliquidez do sistema

financeiro, começaram a levantar os seus investimentos, agravando ainda mais a

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capacidade de solvência dos bancos, originando um movimento maciço de saída de capitais, resultado da tentativa de minimizar as perdas e da falta de confiança generalizada nos intermediários financeiros asiáticos.

É de todo evidente que esta situação nos bancos provoca uma inevitável crise

monetária. Torna-se extremamente difícil para o Banco Central defender a moeda contra um ataque especulativo.

O Banco Central poderia ter elevado as taxas de juro directas de curto prazo,

mas comprometeria o sector imobiliário. Pensou, em actuar no mercado de câmbios. Eis a origem do “Crash” da Tailândia, onde algumas políticas foram inócuas, como o controlo de câmbios aplicado a 15 de Maio de 1997. A Tailândia tinha uma dívida externa privada de 70 biliões de dólares, liberada em dólares. O aumento das taxas de juro directoras praticado, finalmente pelo Banco Central, conduz à insolvência de numerosas instituições.

Numa situação de desequilibro entre as maturidades, e uma excessiva

exposição ao risco de crédito, um aumento das taxas de juro irá enfraquecer ainda mais os intermediários financeiros, transformando a possibilidade de colapso das instituições numa dura realidade. Neste caso, a ancoragem cambial não pode ser mantida e sucede-se a depreciação da moeda nacional.

Quando os investidores interiorizaram que a resistência da ancoragem cambial

dificilmente seria mantida, aumentaram os incentivos para atacar a moeda, que acabou por se desvalorizar.

O ataque especulativo acelerou o processo de desintermediação das

economias, pois das instituições tornam-se incapazes se solver a dívida denominada numa moeda mais forte que a nacional. Um factor adicional é que grande parte da dívida dos bancos é de curto prazo, o que culmina num problema claro de liquidez.

A crise de confiança provoca um pânico financeiro generalizado na região, os credores estrangeiros, receando o incumprimento das dívidas, começam a exigir o pagamento dos seus empréstimos, o que leva a um crescendo de levantamento de depósitos bancários e em conjunto as instituições financeiras nacionais, com posições descobertas em moeda estrangeira, apressam-se a comprar dólares para fazer face à depreciação da taxa de câmbio.

O resultado consequente, foi o pânico generalizado, accionado pela fuga de

capitais da região e que se auto-alimentava à medida que se agravavam os casos de insolvência de empresas e de instituições financeiras e acentuava o processo de deflação, acelerado pela crescente pressão sobre o sistema bancário e falta de confiança dos investidores e depositantes.

Os motivos que desencadearam a crise financeira são claros, prende-se com a

crise bancária e a crise de pagamentos. Esta situação foi consequência da fraca supervisão bancária e desregulação do sector, e da passividade dos governos que subestimaram a importância de um sistema financeiro sólido, e a necessidade de criar um conjunto de regras e políticas que obrigassem a uma actuação transparente e prudente, por parte dos intermediários financeiros.

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Parece-nos importante, sintetizar as características de fragilidade estrutural, dos sistemas bancários:

- endividamento externo muito elevado; - liberalização financeira destabilizadora; - elevados rácios de crédito/depósitos; - excessivo crescimento do crédito, gerador de bolhas especulativas dos

activos (Ex. imobiliário e a bolsa); - intervenção directa do governo na afectação do crédito; - concessão de crédito preferencial, nomeadamente a alguns grupos

económicos, familiares e/ou políticos; - falta de supervisão adequada e insipiência das normas prudenciais; - falta de transparência. Neste quadro não é difícil advinhar o que aconteceu a grande parte das

instituições que se tornaram insolventes, ou mesmo aquelas em que tal não aconteceu revelam-se incapazes de oferecer novos créditos, pois perdem a capacidade para sair da crise por si só. Assim, um processo de recapitalização torna-se inevitável, que num contexto de economia global pode passar pela entrada de instituições financeira exteriores.

6.3 A CRISE FINANCEIRA E A LIBERALIZAÇÃO

Nas economias emergentes, a liberalização do sistema financeiro conduz a uma expansão excessiva do crédito interno, suportada pela entrada de fluxos de capital do exterior.

Nestes processos de liberalização financeira, adoptam-se âncoras cambiais,

que conduzem a uma subavaliação do risco cambial, por parte dos investidores internacionais. Juntando a fraca e desadequada estrutura de supervisão e regulação do sistema, a deficiente qualificação na gestão do risco por parte das instituições financeiras faz com que a expansão do crédito incorra em excessiva exposição ao risco e à deterioração das posições de balanço do sistema bancário.

Assim, a vulnerabilidade do sector bancário aos efeitos de uma desvalorização,

a um abrandamento do ritmo de crescimento da actividade económica que provoque falências e um aumento do peso de créditos mal concedidos, significa um aprofundamento dos problemas de informação assimétrica no sistema e a eminência de uma crise bancária

A situação agrava-se quando se adiciona ao rápido processo de liberalização

financeira o problema do risco moral, traduzido numa clara falta de monitorização e de avaliação do risco, como consequência das promessas governamentais, implícitas ou explícitas, de assumir a situação em caso de choque adverso.

No longo prazo, um intermediário financeiro pode ultrapassar o problema de

informação assimétrica com os seus recursos e conduzir o seu cliente para uma estratégia adequada ao mercado.

Um sistema financeiro baseado no sistema bancário tem uma forma de gerir o risco de mercado (choques macro-económicos que afectam todos os activos), que é a possibilidade de fazer o alisamento intertemporal do risco.

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Deste modo, podemos salientar que a principal barreira a um bom desempenho dos intermediários financeiros é a informação assimétrica: que conduz a problemas de selecção adversa e de risco moral. O primeiro caso, provoca uma situação anterior à definição dos contratos financeiros; isto é, com a selecção adversa há tendência para financiar projectos com maior risco. Logo, os projectos com maior probabilidade de serem adversos são os que têm maior probabilidade de serem seleccionados. Esta situação depende da capacidade dos financiadores em obter informação que conduzam a uma boa selecção de projectos.

No caso do risco moral, ocorre após o contrato financeiro; nesta situação há

tendência para o promotor escolher projectos com maior risco, em que no caso de sucesso os ganhos são a seu favor e no caso de insucesso suporta todas as perdas. Para minimizar o risco moral é necessário impor restrições, nomeadamente na concessão de crédito.

A informação assimétrica não pode ser solucionada pelos bancos, mas estes podem obter determinada informação que outros agentes não podem. 6.4 CONTEXTO INTERNACIONAL

A conjuntura financeira internacional contribuiu significativamente para a “exuberância bancária” vivida até ao ano da crise, conjuntura que podemos classificar como “situação de excesso de liquidez”. Esse excesso de liquidez (que não nascendo na Ásia emergente transvasou para estas economias) foi criado pelas políticas monetárias extremamente acomodativas dos principais blocos económicos.

O Oriente aparece assim na cena mundial, como o destino de investimentos maciços, quer directos quer em acções e no exponencial crescimento de linhas de crédito aos bancos da região. Importa referir que os bancos americanos ainda mantiveram alguma restrição e discernimento na concessão do crédito mas a generalidade dos bancos europeus e japoneses aumentaram a sua exposição na Ásia emergente, para além do bom senso.

Existia uma procura de crédito em permanente expansão que aliada a um

contexto de taxas de juro internacionais baixas e acesso a linhas de crédito interbancário, o que rapidamente conduz os activos e passivos das instituições a assumir proporções gigantescas.

A dimensão do problema de risco moral, volta-se essencialmente para o comportamento dos bancos internacionais, que canalizaram um elevado nível de fundos para a região, assumindo existência de um nível de segurança que seria garantido por intervenção governamental ou indirectamente através de um programa de apoio do FMI.

Assim, no final de 1996 mais de 50% das responsabilidades dos países da região era de curto prazo e o rácio das responsabilidades externas de curto prazo em relação às reservas ultrapassava já os 100% na Coreia, Indonésia e Tailândia

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7. RESUMO E CONCLUSÃO No caso do modelo asiático de desenvolvimento, confiança e liquidez tiveram

uma importância decisiva. Para manter a confiança dos investidores as autoridades públicas têm de afirmar um compromisso irreversível em relação à estabilidade cambial, mas se também pretendem assegurar a liberdade de fluxos de capitais, necessários para manter o crescimento continuado do investimento, ficam vulneráveis a ataques especulativos sempre que os operadores financeiros suspeitam que está a ser considerada uma desvalorização da moeda. A opção escolhida na Ásia foi a de taxas de câmbio fixas sob a forma de moedas indexadas ao dólar e os benefícios da liquidez sob a forma de significativas entradas de capital.

Não havia dívida pública significativa e os défices na balança de transacções

correntes eram consequência de investimentos e não do consumo. Para reduzir a inflação e manter as suas posições competitivas, indispensáveis para sustentar uma estratégia de expansão económica, as economias asiáticas indexaram as suas taxas de câmbio ao valor do dólar.

Num contexto de grande mobilidade de capitais e com a redução do risco

obtida pela taxa de câmbio fixa, estes mercados tornaram-se muito atractivos para volumes consideráveis de capitais vindos do exterior. Ora, tendo sido um afluxo considerável, obrigava a uma valorização real da taxa de câmbio, mesmo que continuasse indexada ao dólar em termos nominais. A consequência é que as importações se tornaram mais baratas e as exportações mais caras: o objectivo da expansão agressiva á ameaçado por este indesejado efeito colateral da entrada de capitais, e em lugar das altas e consistentes taxas de crescimento, o que se encontra é o aumento do défice da balança de transacções correntes em percentagem do PIB.

Como há muito capital externo, terá de ser aplicado e aumenta a probabilidade de se acumularem créditos duvidosos, que deixam de cobrar juros, sobretudo se a opção pelo crescimento for mantida, contra a opção pela estabilidade e pela sustentabilidade a longo prazo, de salientar que nestes países não existe uma política de supervisão e controle bancário, pelo que se incorre em situações de risco de liquidez.

Neste ponto, a confiança fica ameaçada, porque se torna credível que as

autoridades económicas irão ser obrigadas a introduzir novas políticas monetárias e a alterar a anterior combinação de políticas, mas a necessidade de continuar com novos investimentos para não perder o ritmo de crescimento conduzirá, provavelmente, a erros de decisão, sob a forma de situações de informação imperfeita e consequentes situações de risco de selecção adversa e de risco moral.

Assistia-se a um contexto de incerteza, sobre o valor futuro da moeda por parte

dos operadores locais, confirmado pela imposição de um prémio de risco nas emissões de títulos nas bolsas locais, os governos e empresas não financeiras emitiam dívida em moeda estrangeira a uma reduzida taxa de juro. Na prática, em cada um destes países, as empresas contraiam empréstimos em dólares, mas recebiam as suas receitas nas moedas locais. Estas empresas passaram a estar

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vulneráveis ao aumento do seu endividamento externo, sobretudo porque era limitada a sua capacidade para a pagar.

Uma desvalorização implicaria que a dívida titulada em moedas estrangeiras

cresceria para além da capacidade de sustentabilidade das empresas e o seu colapso agravaria a vulnerabilidade do sector bancário. A confiança desaparece e a única esperança reside num apoio público ou internacional. Resistir à desvalorização já não é uma opção viável: os efeitos acumulados de reavaliação de activos e de ocultação de empréstimos sem remuneração não podem ser absorvidos sem o reconhecimento de perdas pesadas por parte das entidades locais, não sendo a forma mais eficaz de recuperar a confiança, interna e externa.

Se uma moeda é exposta a um ataque especulativo, a defesa do valor cambial

através da subida de taxas de juro pode ser contraproducente, uma vez que tal contracção monetária contribui para o colapso do sector bancário, se a economia não conseguir estabilizar a taxa de câmbio, uma desvalorização pode provocar uma deterioração dos balanços das instituições, resultando no mesmo colapso.

Como resumo, podemos transcrever uma descrição da crise tal como ela é

vista pelo Fundo Monetário Internacional: «Os factores internos fundamentais que conduziram ás dificuldades actuais

parece terem sido: 1º - A incapacidade para diminuir as pressões de sobreaquecimento que se

tinham tornado cada vez mais evidentes na Tailândia e que se manifestavam em grandes défices externos e em bolhas nos mercados de títulos;

2º - A insistência nos regimes de indexação de taxas de câmbio por tempo demasiado, o que encorajou o endividamento externo e conduziu a uma exposição excessiva ao risco cambial, tanto no sector financeiro como no sector empresarial;

3º - Regras prudenciais pouco rigorosas e insuficiências de supervisão, o que conduziu a uma pronunciada degradação da qualidade das carteiras de créditos dos bancos. À medida que as crises se desenvolviam, as incertezas políticas e as dúvidas quanto á firmeza e à capacidade das autoridades para concretizarem as reformas e os ajustamentos necessários acentuaram as pressões sobre as moedas e os mercados de títulos. Não há dúvida que a relutância em adoptar medidas de rigor monetário e de decidir o encerramento das instituições financeiras insolventes contribuiu para a turbulência nos mercados financeiros».

Aparentemente, as instituições financeiras internacionais negligenciaram a avaliação do risco inerente à concessão de crédito, numa clara manifestação de risco moral na crença de uma retirada estratégica, no caso de algum choque suceder.

Para ilustrar esta situação podemos referir que em finais de 1996 mais de 50%

das responsabilidades dos países da região era de curto prazo e o rácio das responsabilidades externas de curto prazo em relação às reservas ultrapassava já os 100% na Coreia, Indonésia e Tailândia.

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7.1 CRISE ASIÁTICA- APENAS UM COMEÇO?

Este processo de crise financeira teve sete consequências, com um potencial desestabilizador a curto /médio prazo:

- A crise asiática veio constituir um factor adicional de risco para o sistema

financeiro japonês, bastando recordar, que o montante dos empréstimos concedidos nos últimos anos pelos bancos nipónicos aos países em crise é equivalente a cerca de metade do conjunto dos seus capitais próprios; com a desvalorização do yen face ao dólar, o grande volume de empréstimos feitos em dólares às economias asiáticas deteriorou a posição das reservas da capital dos bancos japoneses, contribuindo para uma retracção rápida e brutal dos empréstimos às economias asiáticas em crise, agravando os problemas dos bancos e empresas da região;

- A “corrida para a qualidade”, por parte dos investidores internacionais e dos

investidores japoneses, contribuiu para que o iene se desvalorizasse mais, dificultando a recuperação das moedas dos países do sudeste asiático e constituindo uma ameaça concorrencial à Coreia do Sul e à China; a continuação da queda da moeda japonesa poderá desencadear uma onda de desvalorizações competitivas na Ásia, agravando mais a situação financeira de bancos e empresas asiáticas que se endividaram, em larga escala, em moeda estrangeira.;

- A “fuga” dos investidores dos mercados de capitais das economias

emergentes levou-os a dirigirem-se para os mercados de obrigações e acções dos EUA e Europa, adicionando-se aos mecanismos internos que vinham fazendo valorizar rapidamente os activos financeiros nesses mercados de capitais, podendo contribuir para a formação de “bolhas especulativas”;

- A situação de recessão no Japão e os riscos deflacionistas que pesam

sobre a sua economia tornam pouco provável que esta sirva de impulso para as exportações dos outros países da Ásia, colocando a economia americana na ingrata posição de ser o “importador de última instância” das economias emergentes da Ásia;

- Nos EUA, a valorização do dólar desde 1995 (em consequência do afluxo

de capitais) e a dificuldade das empresas aumentarem os preços nos EUA, devido à pressão, real ou receada, das importações asiáticas, contribui para conter a inflação, para suportar o mercado de obrigações num patamar de valorização elevado, ao mesmo tempo que, afastando a necessidade de um aumento da taxa de juro para conter uma economia em riscos de “sobreaquecimento” também afastou de imediato “nuvens” sobre o mercado de acções; mas a crise asiática, nomeadamente se se agravar, afectará os resultados das empresas americanas e, por essa via, terá um efeito potencialmente desestabilizador na bolsa;

- As quebras de actividade na Ásia, contribuíram para uma descida no preço

do petróleo, principal exportação e grande fonte de rendimento fiscal na Rússia, precipitando uma crise nos mercados financeiros daquela país, num primeiro momento desencadeando uma “fuga” por parte de investidores externos; este movimento também se fez sentir nalgumas

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praças da Europa Central, como por exemplo na República Checa e na Hungria, também influenciada pelos riscos de instabilidade política;

- As intervenções do Fundo Monetário Internacional para tentar estabilizar a

situação macro-económica e acelerar o processo de reformas estruturais consideradas urgentes, na Tailândia, Indonésia e Coreia do Sul, deixaram livres uma margem reduzida de fundos para outras crises que se venham a desencadear ou a agravar proximamente.

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ÍNDICE

1. Os Novos Países Industrializados da Ásia....................................................2

1.1. Factores de Sucesso dos “4 dragões” da Ásia..............................................2

1.2. Limitações do Desenvolvimento nos NPI Asiáticos.......................................5

1.3. A Geoeconomia dos NPI da Ásia .................................................................6

2. Modelo de Desenvolvimento Asiático............................................................8

3. Fraquezas Estruturais do Modelo................................................................10

4. Indícios de Crise ........................................................................................11

5. A crise Financeira do Sudeste Asiático........................................................12

5.1 Causas da crise financeira.....................................................................12

5.2 A Crise de 1997 e 1998..........................................................................13

5.2.1 Etapas da Crise Financeira..............................................................14

5.3. Desenvolvimento da Crise.....................................................................16

5.3.1 No contexto asiático...............................................................................16

5.3.2 Referência á crise mexicana de 1994..............................................18

5.4 Consequências da Crise na Ásia...........................................................19

5.5 Mecanismos de Transmissão e Propagação ao Ocidente.....................21

5.5.1 A Crise na Rússia...................................................................................21

5.5.2 A Crise no Brasil.....................................................................................21

5.5.3 A Crise no Ocidente...............................................................................22

6. Os Intermediários Financeiros na Ásia........................................................22

6.1 O Papel dos Sistemas Bancários nas Economias Emergentes Ásia....23

6.2 Fragilidades dos Sistemas Bancários....................................................24

6.3 A Crise Financeira e a Liberalização......................................................26

6.4 Contexto Internacional............................................................................27

7. Resumo e Conclusão...................................................................................28

7.1 Crise asiática- apenas um começo?......................................................30

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BIBLIOGRAFIA: LIVROS:

- Eduardo Raposo de Medeiros, (1998), Blocos Regionais de Integração Económica no Mundo, ISCSP;

- Economia Global e Gestão, vol III, 1998 - Allen e Gale, (2000), Comparing Financial Systems, MIT Press, cap. 9

PUBLICAÇÕES:

- O Economista 1998: Crise Económica: da Ásia para o globo? - Política Internacional, vol lI, nº. 18: A crise Asiática e as suas repercussões,

Joaquim Aguiar

PAPERS:

- Os Sistemas Bancários no Contexto da Crise das Economias Emergentes da Àsia, Luís Quintaneiro

- A Intermediação Bancária e as crises financeiras- o exemplo do sudeste asiático

- Monetary Cooperation and Contagion of Exchange Rate Crisis, Philippe Saucier e Nathalie Desthieux

RELATÓRIOS:

- Banco de Portugal, 1997, em www.bportugal.pt - FMI, 1997 e 1998, em www.imf.org - Banco Mundial, 1997, em www.bancomundial.org