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I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015
Corrupção, política econômica e programas sociais na construção do discurso de
oposição do PSDB ao governo Lula (2003-2010)
Maikio Barreto Guimarães1
Resumo
Este artigo realiza a análise do discurso de oposição do PSDB durante o governo do presidente Luiz Inácio Lula da
Silva (2003-2010). A partir de uma perspectiva que reúne a abordagem da Análise de Discurso e elementos da Ciência
Política, o trabalho tem como objetivos, com base nos posicionamentos dos líderes tucanos2 sobre corrupção, política
econômica e programas sociais, compreender que condições de emergência marcaram a estruturação de um discurso de
oposição à gestão petista. O corpus da pesquisa foi composto pelos pronunciamentos proferidos, em plenário, pelos
líderes do PSDB na Câmara dos Deputados. O estudo também utiliza declarações de outros personagens importantes na
hierarquia tucana, retiradas do jornal Folha de São Paulo. Para melhor contextualizar o enfrentamento entre oposição e
governo, este trabalho coletou, também no periódico, manifestações de integrantes do governo e líderes do PT.
Palavras-chave: Oposição; Governo Lula; Corrupção.
Abstract
This article performs discourse analysis of the opposition PSDB during the administration of President Luiz Inácio Lula
da Silva (2003-2010). From a perspective herding approach the Analysis of Discourse and elements of Science Policy,
the study is aimed based on placements of toucan’s leaders on corruption, economic policy and social programs,
understand which emergency conditions marked the structuring of a discourse of opposition to PT management. The
corpus of research was composed by the pronoucements delivered, in plenary by leaders of PSDB in the Chamber of
Deputies. The study also uses statements of other important characters in the hierarchy tucana, taken from the
newspaper Folha de São Paulo. This work also collected at regular and PT leaders to better contextualize the coping
between opposition and government.
Key words: Opposition; Government Lula; Corruption.
Introdução
O antagonismo entre PSDB e PT pode ser compreendido a partir da polarização nas disputas
pela presidência da República. Os êxitos de Fernando Henrique Cardoso (FHC) nos pleitos de 1994
1 Graduado em Jornalismo e mestre em Ciências Sociais pela PUCRS. Professor da Faculdade São Francisco de Assis. E-
mail: [email protected] 2 O tucano é símbolo do PSDB. Por esta razão, os integrantes do partido são chamados de “tucanos”. O termo será
utilizado ao longo deste trabalho.
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e 1998 garantiram aos tucanos a possibilidade de governar o Brasil. Em 2002, a vitória de Lula
provocou uma mudança no cenário político. O PT havia conquistado, pela primeira vez, a
possibilidade de administrar o país. O PSDB, após oito anos no poder, encarnaria o papel de
oposição.
Nesta perspectiva, o propósito do presente estudo é analisar o discurso de oposição do PDSB
durante o governo Lula (2003-2010). De maneira mais específica, pretende-se, através dos
posicionamentos dos integrantes do partido sobre corrupção, política econômica e programas
sociais compreender quais foram as condições de emergência que marcaram a estruturação de um
discurso de oposição à gestão petista.
O interesse pelos temas corrupção, política econômica e programas sociais não foi aleatório.
Os três assuntos ocupam papel de relevo no enfrentamento entre PSDB e PT desde o governo do
presidente Fernando Henrique Cardoso. Maria Lúcia Rodrigues de Freitas Moritz (2006) destaca
que (entre 1995 e 2002) os petistas acusaram FHC de estimular a corrupção, promover uma política
econômica neoliberal e demonstrar pouco interesse por políticas sociais.
O discurso de ruptura do período em que o PT esteve na oposição gerava expectativas
sobre como seria o governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Na área social, a nova administração teve
inúmeras dificuldades na implementação do Fome Zero, primeiro grande programa social lançado
pela nova gestão. O êxito neste campo veio com o Bolsa Família, principal política de transferência
de renda da administração petista. Na economia, o governo surpreendeu (oposição e os aliados) pelo
pragmatismo.
Lula, principalmente durante o primeiro mandato como presidente da República (2003-
2006), precisou lidar com algumas denúncias de corrupção. A principal foi o episódio conhecido
como mensalão, que dominou a cena política brasileira no segundo semestre de 2005. Por esta
razão, o entendimento do discurso de oposição do PSDB passa pela compreensão sobre como os
tucanos se posicionaram diante dos três temas citados.
O corpus da pesquisa é composto pelos pronunciamentos proferidos em plenário pelos
líderes do PSDB na Câmara dos Deputados. O estudo também utiliza declarações dos tucanos
publicadas no jornal de circulação nacional Folha de São Paulo. Para melhor contextualizar o
enfrentamento entre oposição e governo, este trabalho também buscou, na mesma publicação,
colher manifestações de líderes do PT e integrantes do governo.
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Análise de discurso
Este trabalho está em sintonia com os pressupostos da chamada Análise de Discurso. Esta
área se constituiu, ainda na década de 1960, através do debate teórico entre Linguística, Psicanálise
e Materialismo Histórico. A Análise de Discurso nasce da aproximação destes campos de
conhecimento. O propósito era jogar luz sobre os processos que envolvem a constituição dos
discursos.
A análise de Discurso, como seu próprio nome indica, não trata da língua,
não trata da gramática, embora todas essas coisas lhe interessem. Ela trata
do discurso. E a palavra discurso, etimologicamente, tem em si a idéia de
curso, de percurso, de correr por, de movimento. O discurso é assim a
palavra em movimento, prática de linguagem: com o estudo do discurso
observa-se o homem falando. (ORLANDI, 2012, p. 15).
Eni Puccinelli Orlandi também argumenta que a Análise de Discurso “produz um
conhecimento a partir do próprio texto, porque o vê como tendo uma materialidade simbólica
própria e significativa, como tendo uma espessura semântica: ela o concebe em sua discursividade”
(ORLANDI, 2012, p. 18).
A perspectiva da Análise de Discurso prima por não considerar apenas uma frase, um
enunciado ou um texto. São considerados a complexidade do discurso e seu caráter histórico. Fica
evidenciado que a preocupação deste campo em compreender o seu objeto, o discurso, em sua
materialidade, considerando a importância de sua configuração sócio-histórica. Para ter sucesso em
interpelar sujeitos, um discurso deve ser capaz de conseguir se estabelecer em um espaço social já
ocupado por outros significados e discursos. Pode-se assinalar que, desta forma, o êxito da
interpelação envolve o processo de identificação de um indivíduo sempre já sujeito ao discurso do
outro.
O discurso só exerce poder pela identificação, pela adesão espontânea. O
exercício do poder do discurso passa muito de perto pelo conceito
gramsciano de hegemonia – liderança intelectual aceita espontaneamente.
Mister é enfatizar aqui que a referência à identificação e espontaneidade não
pressupõe qualquer proximidade com as noções de voluntarismo e
espontaneísmo. A capacidade de um discurso de exercer poder está
definitivamente associada à sua capacidade de responder demandas, de se
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inserir no conjunto de significados de uma dada sociedade, reconstruindo
posições e sujeitos. (PINTO, 1989, p.36).
Céli Pinto (2005) destaca que “todo discurso é um discurso de poder” (p. 92). Isto porque
todos os discursos pretendem impor verdades sobre um tema ou área específica do conhecimento.
Em relação ao discurso político, a autora afirma que
a característica fundamental do discurso político é que este necessita para
sua sobrevivência impor a sua verdade a muitos e, ao mesmo tempo, é o que
está mais ameaçado de não conseguir. É o discurso cuja verdade está sempre
ameaçada em um jogo de significações. Ele sofre cotidianamente a
desconstrução, ao mesmo tempo só se constrói pela desconstrução do outro.
É portanto, dinâmico, frágil e, facilmente, expõe sua condição provisória.
(PINTO, 2005, p. 89).
Na observação da construção do discurso político, é adequada a verificação da natureza do
sujeito enunciador, que é o “sujeito que fala”. Cabe destacar que a posição do sujeito enunciador do
discurso político envolve as condições relacionadas aos locais de sua enunciação, como o governo,
o parlamento e os partidos políticos.
Categoriais de análise e metodologia
O corpus da pesquisa é composto pelos pronunciamentos proferidos em plenário pelos
líderes do PSDB na Câmara dos Deputados. Além disso, buscou-se a manifestação de integrantes
do partido publicadas no jornal Folha de São Paulo. Durante a gestão de Lula, os sete líderes do
PSDB fizeram 1382 discursos. Jutahy Júnior (PSDB-BA), entre 01/02/2003-17/02/2004 e
15/02/2006-01/02/2007, fez 167 pronunciamentos. Custódio Mattos (PSDB/MG), entre 17/02/2004-
16/02/2005, foi à tribuna 48 vezes. Alberto Goldman (PSDB/SP), entre 16/02/2005-15/02/2006, fez
uso da palavra 247 vezes. Antonio Carlos Pannuzio (PSDB/SP), entre 01/02/2007 - 14/02/2008, fez
481 pronunciamentos. José Aníbal (PSDB/SP), entre 14/2/2008-3/2/2010, discursou 285 vezes.
João Almeida (PSDB/BA), 03/02/2010- 26/01/2011, foi à tribuna 154 vezes.
Dos 1382 discursos, 1218 (88,13%) foram descartados por tratarem exclusivamente de
procedimentos. Ou seja, temas como requerimentos de inversão de pauta, votação nominal,
requerimentos de retirada de matéria da pauta da Ordem do Dia, adiamento de discussão,
encerramento de discussão, suspensão de sessão, urgência na tramitação de determinada matéria,
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orientações de votação da bancada, propostas de procedimentos para as discussões, referências à
questão do quorum, anúncios de obstrução do partido, formulações de questões de ordem, pedido de
acesso a documentos, uso da palavra, discussões acerca do Regimento Interno da Câmara dos
Deputados e, menção de rompimento de acordo.
Em seu estudo, Jairo Nicolau (2000), optou por retirar os requerimentos. Isto porque
decidem sobre o processo de deliberação, mas não sobre a natureza das matérias. Foram colocados
nesta categoria também homenagens a pessoas ou instituições por datas festivas, manifestações de
solidariedade, congratulações a deputados por razões diversas.
Em 104 discursos (7,52%), são manifestadas as contrariedades dos tucanos ao orçamento
apresentado pelo governo, edição excessiva de medidas provisórias e percentual de um aumento do
salário mínimo. Os líderes do PSDB tratam de corrupção, política econômica, programas sociais em
60 (4,34%) pronunciamentos.
Dois critérios foram determinantes para a opção pelo jornal Folha de São Paulo: perfil
editorial e alcance. Em sua cobertura, a publicação prioriza o acompanhamento das questões
políticas. O periódico é vendido em todo o país. Em 2012, entre os jornais brasileiros, a Folha, de
acordo com levantamento da Associação Nacional de Jornais (ANJ), era a segunda maior
publicação do Brasil em circulação (somando-se vendas avulsas e assinantes). Foram 286 mil
exemplares vendidos por dia.3 Ou seja, informa diariamente um número significativo de pessoas.
Abrangência que, pelo perfil da função exercida, atrai e interessa aos políticos. Como destaca Céli
Pinto (2005),
nas últimas décadas, os partidos, as assembleias, os comícios e as rodas
informais de discussão receberam uma poderosa companhia da mídia falada,
escrita, televisiva, que deixou de ser um espaço onde o discurso político se
expressa e passou a ser um espaço de construção de discurso. E não pode
ficar esquecida aqui a Internet, que começa a ocupar importantes espaços
nesta arena. (PINTO, 2005, p. 79).
Através da análise das manifestações dos líderes do PSDB na Folha de São Paulo, busca-se,
além do discurso feito na tribuna, o discurso feito na imprensa.
3 Em primeiro lugar no ranking da ANJ, estava o jornal Super Notícia, de Minas Gerais. Esta publicação, pelo seu perfil
popular, não traria nenhuma contribuição para este trabalho. Jornais populares abrem pouco ou nenhum espaço para os
fatos políticos. Disponível em:<http://www.anj.org.br/a-industria-jornalistica/jornais-no-brasil/maiores-
jornais-do-brasil/>. Pesquisa feita em 31 de maio de 2012.
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Os discursos políticos têm locais de enunciação específicos, ou seja, é
absolutamente legítimo quando ele parte de partidos políticos, de
assembleias legislativas, do governo. Mas deve-se considerar que nas
democracias contemporâneas cada vez mais existem outros espaços de
construção do discurso político, que concorrem com os espaços tradicionais.
Há o discurso político estrito senso, que é o discurso político que tem locais
de enunciação muito claros, que são os locais de política, mas também há o
discurso político feito na imprensa e o discurso político feito na sociedade.
(PINTO, 2005, p. 91-92).
A pesquisa na Folha de São Paulo também foi útil para rememorar certos acontecimentos
do governo. Além disso, perceber em que momentos os petistas e demais aliados do presidente Lula
se defenderam (ou atacaram).
Oposição no regime democrático
A oposição parlamentar, com significado e conteúdo moderno, consolidou-se na Inglaterra
do século XVIII (BOBBIO, 1998; SCHMITZ, 1988; MERSEL, 2004). Era o início de um processo
de reconhecimento de que um segmento da classe política poderia se opor ao governo no
Parlamento, criticando-o e procurando substituí-lo, mas mantendo-se leal à Coroa. Além de colocar-
se como uma alternativa ao poder vigente, a oposição surge para fiscalizar e criticar o governo.
A existência de uma oposição ou minoria parlamentar ativa e responsável é
indispensável em qualquer democracia pluralista. Ao criticar o governo e
apresentar outras opções políticas, a oposição atua para garantir a
transparência e a eficiência na gestão dos assuntos públicos, aumentando,
com efeito, a confiança dos cidadãos nas instituições públicas.
(OVERMEIRE, 2008, p.1).
Em democracias que adotam o modelo Westminster, essas funções são visíveis, tendo em
vista o sistema parlamentar de governo e a existência do bipartidarismo, em que, de um lado, se
encontra o governo e, de outro, a oposição (LIJPHART, 2003). Nas democracias multipartidárias
(modelo consensual), sobretudo com regime presidencialista, a dicotomia maioria-minoria não
possui essa nitidez (LIJPHART, 2003).
O estudo da democracia hoje passa também pela análise do papel da oposição (ou
oposições). Ludger Helms (2008, pg 6-19) afirma que um dos objetivos basilares para o
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desenvolvimento da democracia é o reconhecimento do direito para os atores políticos e sociais
desafiarem e criticarem as ações e políticas do governo. Uma das características primordiais da
democracia moderna é a existência de uma oposição organizada (MERSEL, 2004).
A disputa entre governo e oposição deve estar baseada em regras que privilegiem o
equilíbrio das forças em ação. Giovanni Sartori (1966, p. 150) destaca que a oposição pode atuar
como uma "válvula de segurança", fazendo a maioria e o governo responsivos e responsáveis
perante o parlamento e o povo. Sartori (1966) fez uma distinção entre "oposição real", que se opõe
ao governo, mas não ao sistema político como tal. No outro extremo, está a “oposição anti-sistema”,
que desafia a própria legitimidade do regime.
Para Norberto Bobbio, oposição é
a união de pessoas ou grupos que objetivam fins contrastantes com fins
identificados e visados pelo grupo ou grupos detentores do poder econômico
ou político; a estes, institucionalmente reconhecidos como autoridades
políticas, econômicas e sociais, opõem os grupos de oposição sua
resistência, servindo-se de métodos e meios constitucionais e legais, ou de
métodos e meios de outros tipos, mesmo ilegais e violentos. (BOBBIO,
1998, p. 846).
Desta definição, depreende-se um segmento mais específico da oposição – a oposição
parlamentar, ou simplesmente, oposição, que pressupõe ter lugar num regime liberal-democrático.
PSDB e a corrupção no governo Lula (2003 – 2010)
Em um dos primeiros discursos na nova legislatura (2003 – 2011), Jutahy Júnior, líder do
PSDB na Câmara dos deputados, explicou como os tucanos iriam se portar na oposição ao governo
do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Não sofremos de vícios de origem, o que significa que não faremos
oposição sistemática a tudo que emana do Palácio do Planalto, ao contrário
do que sempre fez o PT na oposição. Não queremos o confronto com o
Executivo, como sempre fez o PT. Votaremos com coerência em favor
daquilo que sempre defendemos. Seremos serenos na negociação,
criteriosos no voto, duros nos debates e vigilantes na fiscalização das ações
do Governo. Nosso lema será: o que podemos fazer para melhorar o País? E
assim agiremos, até mesmo para não repetir os erros do PT, que tantos
prejuízos causaram à Nação no passado. (JÚNIOR, 2003a).
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Estavam dadas as condições internas de emergência para a estruturação do discurso, que,
conforme o líder do partido, seria marcado pelo equilíbrio. Ao afirmar que o partido não faria
“oposição sistemática”, Jutahy Júnior procurou explicitar o desejo tucano de atuar de maneira
distinta da do PT na oposição. A ideia de moderação fica mais explícita com a declaração de que o
PSDB não quer confronto com o executivo.
O PT, até chegar à presidência da República, sempre apresentou um discurso forte contra a
corrupção na vida pública. Era uma forma de se diferenciar das tradicionais forças políticas
nacionais. Durante o governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), os petistas procuraram
colar na gestão tucana o rótulo de corrupta (MORITZ, 2006). Foram denunciados casos de
corrupção no Sistema de Vigilância da Amazônia (SIVAM) e no Programa de Estímulo à
Reestruturação e Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional (PROER), que levou ajuda
financeira a bancos privados. No entanto, a medida que mais recebeu críticas durante a gestão de
FHC foi a emenda Constitucional que, em 1997, permitiu a reeleição do presidente da República,
governadores e prefeitos. A oposição acusou o governo de ter subornado os parlamentares da base
aliada para garantir a aprovação da medida (MORITZ, 2006).
Em maio de 2005, reportagem da revista Veja reproduziu imagens do funcionário dos
Correios Maurício Marinho recebendo R$ 3 mil de um empresário interessado em participar de
licitações promovidas pela estatal. Marinho afirmou que agia com aval do presidente do PTB,
Roberto Jefferson. Na defesa do governo, o ministro da Articulação Política, Aldo Rebelo, acusou a
oposição de promover um “clima de 54”. Alusão clara à crise política que levou o presidente
Getúlio Vargas ao suicídio em 24 de agosto de 1954. Em resposta, Alberto Goldman procurou
afastar do PSDB a pecha de golpista.
Em algum momento, nós aqui pregamos a derrubada de algum Governo?
Nós aqui, em algum momento, tentamos fazer com que não fosse respeitada
a decisão das urnas, decisão democrática? Vamos até o último dia, Sr.
Presidente, com a campanha Fica, Lula! Fica, Lula! Fica, Lula até o último
dia do seu mandato, 31 de dezembro de 2006. E nós esperamos que o golpe
a ser dado - que não será um golpe, mas uma decisão popular - seja feito
pelas urnas no ano que vem, e que Lula não volte ao Poder, porque já
demonstrou que não tem capacidade de comando e de liderança que deve ter
um Presidente da República, até sobre os seus Ministros. Se assim o fosse,
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não autorizaria o Ministro Aldo Rebelo falar as asneiras que tem falado
nesses dias ao povo brasileiro. (GOLDMAN, 2005b).
Eis outra condição de emergência que ganharia espaço privilegiado na formulação do
discurso tucano. Além de refutar qualquer esforço do governo para vincular o partido a práticas
pouco democráticas, o líder do PSDB procurou, ao afirmar que Lula “não tem capacidade de
comando e de liderança”, levantar dúvidas sobre a competência administrativa do chefe do poder
executivo. Diante das dificuldades iniciais do governo, os tucanos estavam confiantes que, em
2006, poderiam, “pelas urnas”, voltar ao comando do país.
Em seis de junho de 2005, o presidente nacional do PTB, Roberto Jefferson, em entrevista
exclusiva ao jornal Folha de São Paulo, revelou que o tesoureiro do PT, Delúbio Soares, pagava,
por mês, 30 mil reais a congressistas aliados. O mensalão, como ficou popularmente conhecido o
esquema, garantiria ao governo a maioria na Câmara dos Deputados (CONTEI..., 2005, p. A5). O
esquema teria beneficiado, inicialmente, o Partido Progressista (PP) e o Partido Liberal (PL). No
começo de 2005, de acordo com Jefferson, o repasse de recursos foi encerrado.
A reação do PSDB foi rápida. Com a afirmação de que “Lula tem hoje um Governo que
acabou”, Alberto Goldman ressaltou que os tucanos, mesmo diante de nova denúncia de corrupção,
não iriam defender o impeachment do presidente da República.
Nós, da oposição, achamos importante o País caminhar neste ano e meio de
Governo que Lula ainda tem pela frente e que S.Exa. fique até o final de seu
mandato. Não queremos, de forma alguma, o impedimento do Presidente,
embora achemos que neste momento tenhamos razão para isso.
(GOLDMAN, 2005c).
Em depoimento à Procuradoria Geral da República, Delúbio Soares revelou que as
campanhas petistas, em 2002, foram financiadas com recursos advindos de caixa dois.4 Delúbio,
conforme reportagem publicada no jornal Folha de São Paulo, não esclareceu que candidatos
receberam os recursos. De acordo com o ex-tesoureiro do PT, a única campanha que não teve
finanças paralelas foi a de Lula (BERGAMO, 2005, p. A5). O que passou a ser chamado de
4 Popularmente é chamado de caixa dois o dinheiro não registrado na Justiça Eleitoral que é utilizado em uma
determinada campanha eleitoral.
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mensalão, nas palavras do ex-tesoureiro do PT, nada mais era do que dinheiro não contabilizado. A
linha argumentativa de Delúbio era, jurídica e politicamente, menos danosa para o governo Lula e
para o Partido dos Trabalhadores. Caixa dois, apesar de também representar uma ilegalidade, tinha
menor potencial ofensivo que, por exemplo, suborno de parlamentares.
Afastar do PSDB a pecha de golpista ficava cada vez mais evidente como uma das
condições de emergência que moldaram o discurso dos tucanos durante o debate sobre a corrupção
nas gestões de Lula. Os líderes da legenda na Câmara dos Deputados passaram a dedicar cada vez
mais espaço para o tema. Alberto Goldman, por exemplo, voltou à tribuna para afirmar que a
oposição não havia se aliado à imprensa para fragilizar o governo.
Não é possível aceitar, em qualquer hipótese, que a qualquer manifestação
ou denúncia da imprensa nós, da Oposição, sejamos arrastados como se
fôssemos partícipes, como se estivéssemos atrás desse processo de desgaste
do PT e do Governo Lula. (GOLDMAN, 2005d).
Em dezembro de 2005, com José Serra (do PSDB) aparecendo na pesquisa Datafolha como
o potencial vitorioso na disputa presidencial do ano seguinte, parecia que a imagem da gestão
petista havia atingido o ápice do desgaste. Um desgaste que começou a perder força dois meses
depois. O governo passou a viver a retomada do apoio (e aprovação) popular. Pesquisa Datafolha,
divulgada em cinco de fevereiro de 2006, demonstrou que a gestão do presidente Lula havia
recuperado a taxa de aprovação que tinha antes do escândalo do mensalão. O governo foi avaliado
como ótimo ou bom por 36% dos entrevistados, oito pontos a mais que no levantamento anterior,
feito em dezembro. 39% consideravam o governo regular (BRAMATTI, 2006, p. A4).
O fortalecimento político do presidente Lula, como destacou Jorge Almeida (2007), está
relacionado ao esgotamento do potencial midiático da crise do mensalão, relativa moderação da
oposição e adoção de uma agenda positiva por parte do governo.
O início de 2006 vai apresentar uma nova mudança nas representações
sociais da política, reafirmando a importância dos fatores conjunturais na
alteração do comportamento do eleitor. Esta situação está ligada a uma nova
combinação de fatores direta ou indiretamente favoráveis ao governo.
Enquanto há um certo cansaço em torno das denúncias de corrupção, não
aparece uma alternativa visivelmente forte. Por um lado, a oposição de
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direita (especialmente PFL e PSDB) não mostra divergências de fundo com
as políticas implementadas.
Há uma diminuição da exposição negativa e um aumento da exposição
positiva de Lula na mídia, por diversos fatores. Alguns gerados a partir do
Estado, como o aumento do salário mínimo (que, apesar de aquém das
promessas de campanha, foi acima da inflação do período) e do efeito
cumulativo de várias políticas sociais. Falamos especialmente das de tipo
nitidamente compensatório, como o Bolsa-Família, mas também de outras
ações, como a ampliação do financiamento a pequenos produtores rurais, o
Luz para Todos, a política de cotas e o Programa Universidade para Todos
(Prouni), que, independentemente de uma avaliação de mérito, tiveram um
impacto eleitoral positivo para a reeleição. Também houve uma
intensificação da publicidade oficial, paga pelo governo federal.
(ALMEIDA, 2007, P. 133-134).
Pesquisa Datafolha, divulgada em 22 de fevereiro de 2006, demonstrou que o presidente
venceria José Serra no primeiro turno (39% a 31%) e segundo turno (48% a 43%) (LULA..., 2006,
p. A4). Lula não aparecia em vantagem nos dois turnos desde agosto de 2005. O presidente também
venceria Alckmin. Além disso, 37% dos eleitores consideravam o governo ótimo ou bom. 53%
consideravam o desempenho pessoal do presidente ótimo ou bom (LULA..., 2006, p. A4).
Se a defesa de uma atuação moderada foi (no início da gestão do PT) a tônica do discurso
tucano, percebe-se uma mudança na enunciação dos integrantes do PSDB a partir de fevereiro de
2006, quando a popularidade do governo demonstra sinais de recuperação. A possibilidade de abrir
processo de impeachment contra o presidente da República ganha força no discurso tucano. Alberto
Goldman acusou os petistas de fazerem confusão entre os conceitos de golpe de estado e
impedimento legal.
Então V.Exas. do PT, quando votaram o impeachment do Presidente
Fernando Collor de Mello, deram um golpe? V.Exas. deram um golpe? Este
Congresso Nacional deu um golpe? Não! Seguiu-se a lei! Seguiu-se a
Constituição Federal! Impeachment não é golpe! O impeachment pode
acontecer a qualquer momento se a sociedade e esta Casa entenderem que
ele é necessário. Golpe é o que o ex-presidente do seu partido, o Sr. Tarso
Genro, propôs no início do Governo Fernando Henrique Cardoso: o
movimento "Fora FHC". Isso era um golpe! Não se tratava de impeachment,
não se tratava de medida judicial, não se tratava de atividade legal, mas de
um movimento de rua, um movimento de massa. "Fora FHC" - isso era um
golpe! Golpe deram V.Exas., que passaram anos e anos dizendo da
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necessidade de tirar o Presidente Fernando Henrique, e não por medida
judicial ou ação do Congresso Nacional, mas por movimento de rua, por
movimento de massa. Isso é golpe - golpe que já deram diversos ditadores
na América Latina! (GOLDMAN, 2006).
Apesar do esforço dos integrantes do PSDB, a tentativa de vincular o presidente da
República ao mensalão, a partir de fevereiro de 2006, não sensibilizou a maioria dos brasileiros.
Luiz Inácio Lula da Silva entrou na campanha como franco favorito. O petista foi reconduzido ao
comando do Brasil com 58 milhões de votos.5 O tema corrupção, a partir do início do segundo
mandato do petista, passou a perder espaço no embate entre forças de governo e oposição.
PSDB e as políticas econômica e social do governo Lula (2003 – 2010)
Em um contexto de expectativa e certa apreensão sobre as políticas econômica e social que
seriam adotadas pelo presidente Lula, estão as condições de emergência que inicialmente forjaram o
discurso de oposição dos tucanos. Em um primeiro momento, os integrantes do PSDB se
concentraram em apontar Lula como um mau gestor na área social e por tomar decisões
equivocadas na economia. Da tribuna, Jutahy Júnior criticou a condução do Fome Zero6.
Estamos vendo que o Programa Fome Zero não é apenas um programa com
mau gerenciamento e boa concepção; é um programa com concepção errada
e mau gerenciamento. Estão caminhando numa direção extremamente
incompetente, e podem causar prejuízos imensos a quem de fato precisa do
atendimento: a camada mais pobre da nossa população. (JÚNIOR, 2003b).
Lula passou também a receber críticas pela condução da economia. Jutahy Júnior, líder do
PSDB na Câmara dos Deputados, reprovou a “conversão recente e mal assimilada” do PT “aos
princípios de mercado”. Na interpretação do tucano, os brasileiros estavam diante de uma
“metamorfose ambulante, oportunista e de ocasião” (JÚNIOR, 2003a).
5 Lula foi eleito com 58.295.042. Geraldo Alckmin (PSDB), candidato derrotado, fez 37.543.178 votos. Disponível
em:http://www.tse.jus.br/eleicoes/eleicoes-anteriores/eleicoes-2006/resultado-da-eleicao-2006. Acessado em 30 mai. 2012 6 O Fome Zero, programa social de combate à fome, foi oficialmente lançado pelo governo em 30 de janeiro de 2003.
As dificuldades na implementação do projeto, as criticas e o descompasso na relação entre os ministros da área social
fizeram o governo mudar a estratégia. Paulatinamente o Fome Zero foi retirado da agenda social da gestão petista.
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A esta altura, já está claro para a população que nada mudou na economia;
pelo contrário, retrocedemos à aplicação de remédios cada vez mais
amargos, um coquetel ortodoxo que representa um brutal golpe na retomada
do crescimento econômico do País. Onde está a esperança tão largamente
prometida aos brasileiros? (JÚNIOR, 2003a).
Em 20 de outubro de 2003, o presidente Lula lançou o programa Bolsa Família.7 O novo
projeto no campo social era resultado da unificação dos programas Bolsa Escola, Programa
Nacional de Acesso à Alimentação, Bolsa Alimentação, Auxílio-Gás e Cadastramento Único do
Governo Federal. Alberto Goldman criticou o que ele classificou como perfil assistencialista do
novo projeto na área social.
Nas políticas sociais, o que mudou? Mudou o nome do Bolsa-Escola. Junto
com outros programas já existentes, passou a se chamar Bolsa-Família.
Enquanto aquela partia do princípio de que o programa não era
assistencialista, mas visava obrigar a criança a se manter na escola e a
família a realizar obrigações para garantir sua saúde, o programa de Lula
passou por cima das exigências de contrapartida e distribuiu dinheiro a torto
e a direito. O quanto torto é, o futuro dirá. (GOLDMAN, 2005a).
Neste fragmento, são apresentados dois eixos de argumentação. No primeiro, o líder do
PSDB na Câmara dos Deputados procura demonstrar que o Bolsa Família, novo programa social da
gestão Lula, nada mais era que a união projetos implementados no período em que Fernando
Henrique Cardoso foi presidente. Por último, é defendido que o projeto, apesar de ter surgido de
iniciativas já existentes, representa um retrocesso pelo seu perfil “assistencialista”. Isto porque “o
programa de Lula passou por cima das exigências de contrapartidas”, o que abria espaço para
inúmeras irregularidades.
Goldman também criticou os resultados da política econômica nos dois primeiros anos do
governo Lula. Outro argumento passava a estar presente nos enunciados dos tucanos. A economia
brasileira, por culpa das opções do governo, não conseguia acompanhar um cenário internacional
próspero. Mais uma tentativa de mostrar que a gestão petista no setor estava na contramão do
momento histórico.
7 A lei 10.836, que oficialmente criou o programa Bolsa Família, só apareceu em 9 de janeiro de 2004. Quase todos os
programas que estão na origem do Bolsa Família foram criados ainda na gestão de Fernando Henrique Cardoso. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/lei/l10.836.htm. Acesso em: 8 jul. 2012.
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O grande sucesso alardeado pelos atuais governantes é o crescimento, em 2
anos, de 5% do Produto Interno Bruto - menor que a média dos demais
países do mundo e dos países emergentes. Em 2004, a China cresceu 9%; a
Rússia e a Turquia, 7%; a Índia, 6%. Saímos do fundo do poço e chegamos
à mediocridade, em um momento internacional excepcionalmente favorável.
Há algo a comemorar? (GOLDMAN, 2005a).
O líder do PSDB na Câmara dos Deputados voltou a criticar a “política econômica que está
destruindo o país” (GOLDMAN, 2005e). Desta vez, Alberto Goldman não mediu as palavras. “Este
Governo está sendo incompetente no gerenciamento da economia, da política e das questões
sociais.” (GOLDMAN, 2005e). A inaptidão do governo Lula para administrar a economia, na
interpretação do tucano, deixava o Brasil despreparado para enfrentar, no futuro, uma eventual crise
financeira internacional.
Como já foi colocado, após as turbulências políticas no segundo semestre de 2005, o
governo conseguiu, a partir de fevereiro de 2006, recuperar a popularidade. A reabilitação da
imagem da gestão petista criou nova condição de emergência para a paulatina reformulação do
discurso tucano. Se as áreas econômica e social davam sinais de melhoras, os líderes do PSDB
procuravam destacar que a base tinha sido construída na administração de Fernando Henrique
Cardoso.
Em outubro de 2006, Luiz Inácio Lula da Silva foi reeleito presidente do Brasil. Como
observou Antonio Lavareda (2009), a política econômica e os programas sociais, causas de
inúmeras críticas durante o primeiro mandato, tiveram papel significativo na vitória do petista.
A economia do país caminhava bem no final do primeiro governo Lula, que
se beneficiava de um ciclo de expansão internacional sem precedentes nos
últimos quarenta anos. Valera, também, o esforço que fizera para manter as
linhas gerais da política macroeconômica, o que lhe possibilitou reduzir a
inflação. O governo criara o Bolsa Família a partir de um programa anterior,
ampliando-o de 5 para 11 milhões de família beneficiárias. Aumentara em
25% o valor do salário mínimo. E dera início a vários outros programas
sociais, cujo reconhecimento pelos brasileiros resultava em elevada
aprovação. Principalmente em meio à população mais pobre. (LAVAREDA,
2009, p. 219)
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Em abril de 2008, a Agência de classificação de risco Standard e Poor’s elevou o Brasil ao
patamar de grau de investimento pela primeira vez na história. A recomendação atestava que o país
era um destino seguro para investimentos internacionais. A recuperação da boa imagem do governo
Lula e as boas notícias na área econômica reanimaram os integrantes da base do governo no
Congresso, que passaram a criticar o PSDB por não ter mais uma agenda econômica para o Brasil.
José Aníbal, líder do partido na Câmara dos Deputados, procurou rebater as acusações. “O discurso
econômico nosso é, de um lado, dizer que o essencial foi feito por nós: fim da inflação, estabilidade
econômica, Lei de Responsabilidade Fiscal, câmbio flutuante, metas de inflação. Tudo a que vocês
se opuseram - e, felizmente, mantiveram.” (ANÍBAL, 2008).
Pesquisa Datafolha, publicada em 19 de dezembro de 2010, mostrou que o governo Lula
chegava ao final com recorde de popularidade. Para 83% dos entrevistados, o presidente fez uma
gestão ótima ou boa (RODRIGUES, 2010a, p.2). FHC deixou a presidência, em 2002, com 26% de
aprovação (57 pontos percentuais abaixo de Lula). Pesquisa Datafolha revelou que, para 84% dos
brasileiros, o país estava melhor após os dois mandatos de Lula (RODRIGUES, 2010a, p. 2).
Considerações finais
Refletindo sobre a vitória da petista Dilma Rousseff sobre o tucano José Serra na disputa
presidencial de 2010, Sérgio Abranches (2011a) avalia que a oposição saiu daquela eleição
“diminuída, atordoada e sem projeto definido”. Para o pesquisador, a terceira derrota seguida na
disputa pelo comando do país foi consequência do fraco desempenho dos tucanos na oposição ao
governo Lula.
O PSDB deixou o governo e jamais soube exercer o papel de oposição.
Principalmente, o papel essencial de preparar proposta alternativa, voltada
para o futuro, que vá além do que foram os governos anteriores e que desse
novos em mais largos passos para levar a cabo o processo de modernização
inacabada do país. (ABRANCHES, 2011b).
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Durante o período em que Lula esteve na presidência (2003-2010), os tucanos não
apresentaram propostas alternativas ou deixaram claro o que fariam em um eventual retorno ao
comando do país. Para Abranches, o PSDB fracassou no papel de oposição.
O partido passou a última década sem ideias consistentes, sem programa
claro, sem se caracterizar como alternativa de poder. Tampouco exerceu
oposição, principalmente no segundo mandato do presidente Lula, que o
manteve partido no corner, imobilizado, com sua acachapante popularidade.
(ABRANCHES, 2010).
O que foi apresentado até agora possibilita afirmar que a atuação do PSDB durante o
governo Lula está próximo do que Otto Kirchheimer (1957) classificou como “eliminação de
oposição”. De acordo com o autor alemão, neste cenário, o grupo minoritário participa da disputa
pelo poder, mas já não apresenta (ou representa) um projeto alternativo.
Os tucanos tiveram dificuldades de enfrentar o governo principalmente depois que a
popularidade da administração de Lula voltou a subir. O partido tão pouco procurou apresentar
propostas alternativas (ou novas linhas de ação política) nos primeiros oito anos em que esteve na
oposição.
Foi possível constatar, através da análise do discurso, a atuação inconstante dos tucanos
durante o governo Lula. Em 2010, o PSDB foi derrotado pela terceira vez seguida em uma eleição
presidencial. O partido ainda mantém, na disputa pelo comando do país, a polarização com o PT.
No entanto, segue sem um projeto alternativo para o Brasil e sem novas bandeiras para defender.
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