textos de economia e política de rolf kuntz

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Compilação de textos escritos por Rolf Kuntz no jornal O Estado de S. Paulo.

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  • Um governo atolado vai desemperrar a economia?

    Postado por: Rolf Kuntz 21/07/2013 em Artigos, Destaque, Eficincia

    Tiririca estava errado. No Brasil, sempre d para piorar, como tm

    provado com notvel diligncia a impropriamente chamada classe poltica

    e o governo da presidente Dilma Rousseff. Qual a distncia, hoje, entre

    otimismo e pessimismo nas previses econmicas? A economia brasileira

    crescer em mdia 3,2% ao ano entre 2014 e 2018, segundo a nova bola

    de cristal operada em parceria pela Fundao Getlio Vargas (FGV) e pela

    instituio de pesquisas The Gonference Board, o indicador antecedente

    composto. No discurso oficial, um crescimento inferior a 4% ou 5% ao ano

    jamais foi admitido, at h pouco tempo, como padro normal para o

    Brasil. Poderia ocorrer como consequncia de choques externos ou em

    fases de ajuste muito forte, mas sempre como situao excepcional. Hoje,

    at uma expanso pouco superior a 3% por vrios anos pode parecer

    improvvel, quando se considera a crise de produtividade da economia

    nacional.

    No h clculo seguro do potencial de crescimento do pas, mas os

    nmeros estimados vm caindo nos ltimos anos da faixa de 3,5% a 4%

    at h pouco tempo para algo entre 2,5% e 3% nas ltimas avaliaes. O

    nmero de 2,5% foi indicado esta semana pela economista Alessandra

    Ribeiro, da consultoria Tendncias, segundo o jornal Valor.

    Calcular o produto potencial pode ser muito complicado, mas, apesar

    disso, economistas e formuladores de polticas tm excelentes motivos

    para levar em conta esse conceito. A existncia de limites tem sido

    mostrada amplamente pela experincia. Pode-se ultrapass-los de vez em

    quando, mas insistir na aventura acaba normalmente em desastre.

    raphael turraHighlight

    raphael turraHighlight

    raphael turraHighlight

    raphael turraHighlight

    raphael turraHighlight

  • Inflao e desequilbrio externo so consequncias bem conhecidas e

    muito frequentes na Histria do Brasil.

    Inflao e desajuste crescente no balano de pagamentos j esto

    presentes no cenrio brasileiro, apesar do crescimento pfio dos ltimos

    dois anos e meio. Ningum deveria iludir-se com o recuo de alguns ndices

    desde o ms passado. A reduo dos preos dos alimentos tem efeito

    passageiro na formao dos indicadores, assim como a reduo das tarifas

    de transporte coletivo. Grandes fatores inflacionrios, como o desarranjo

    fiscal, a expanso do crdito e os aumentos salariais acima dos ganhos de

    produtividade, foram apontados, mais uma vez, na ata da ltima reunio

    do Comit de poltica monetria (Copom), divulgada na quinta-feira. A ata

    destoou claramente do discurso presidencial do dia anterior.

    Os autores do texto, no entanto, apontaram a possibilidade de um

    arrefecimento da demanda se nada for feito para reverter a tempo a crise

    de confiana do setor empresarial e das famlias. Por enquanto, a

    demanda domstica tende a se apresentar relativamente robusta,

    especialmente o consumo das famlias, segundo a ata. Mas os sinais de

    alerta j esto acesos. O texto contm o suficiente para indicar o risco de

    uma estagnao mais ampla, mas seus autores poderiam ter ido mais

    longe. Se o consumo cair, o investimento continuar insuficiente e a

    indstria continuar em marcha lenta, como ficaro as j estropiadas

    finanas pblicas?

    A peculiaridade brasileira outra: programas so secundrios e o

    fundamento das alianas a partilha dos benefcios do poder

    No h resposta para o problema do crescimento, no Brasil, sem a ao do

    governo, mas o governo est atolado na prpria incompetncia gerencial,

    raphael turraHighlight

  • na indigncia de ideias de seus formuladores de polticas e num esquema

    pegajoso e sufocante de alianas polticas.

    No Brasil, dizem especialistas, nenhum presidente pode governar sem

    acordos, s vezes com parceiros da pior espcie. Pode ser. Em muitos

    pases coalizes so indispensveis operao do governo. Alianas, no

    entanto, so em geral precedidas de algum entendimento a respeito de

    objetivos e mtodos. o caso, em pases da Europa, da formao de

    gabinetes para enfrentar a crise fiscal e financeira.

    A peculiaridade brasileira outra: programas so secundrios e o

    fundamento das alianas a partilha dos benefcios do poder. No se

    divide o governo como responsabilidade, mas como butim. Esse padro se

    fortaleceu com a disposio petista de aparelhar e lotear a mquina

    federal. Nada mais natural, quando um partido chega ao Palcio do

    Planalto com um projeto de poder e nenhum projeto real de governo.

    Sem alianas em torno de um programa, o governo forado a negociar

    com a base a votao de cada projeto, como se nenhuma ideia geral desse

    um sentido comum s vrias propostas. No se pode sequer confiar na

    aprovao da Lei de Diretrizes Oramentrias, condicionada pelos

    companheiros adoo de um impropriamente chamado oramento

    impositivo na prtica, uma simples manobra para tornar obrigatria a

    liberao de verbas para emendas.

    A um governo com essas condies de funcionamento e comandado por

    uma presidente cada vez mais isolada cabe a misso de promover a

    mudanas necessrias para destravar a economia, aumentar seu potencial

    de crescimento e impor ao Pas um ritmo de expanso mais parecido com

    o dos emergentes mais dinmicos.

  • Nenhuma tarefa importante ser cumprida se a presidente Dilma Rousseff

    e sua equipe forem incapazes de comear a arrumao das prprias

    contas. Para isso ser necessrio desfazer a confuso de incentivos

    temporrios e permanentes, trocar as aes pontuais pelas chamadas

    polticas horizontais e cortar o vnculo incestuoso entre o Tesouro e os

    bancos controlados pela Unio.

    Tudo isso dever ser apenas o comeo de uma lista enorme de mudanas.

    Elevar a eficincia na elaborao e na conduo de projetos de

    infraestrutura ser outro desafio to duro quanto urgente. Sem isso, at

    como exportador de matrias-primas o Pas ser cada vez menos

    competitivo.

    Que diro dessa agenda os marqueteiros eleitorais da presidente?

    Sem o governo nenhum problema se resolver, mas o prprio governo o

    primeiro problema.

    Fonte: O Estado de S. Paulo, 20/07/2013

  • Dilma no pode ser melhor que seu governo

    Postado por: Rolf Kuntz 28/07/2013 em Artigos, Democracia

    Representativa, Estado de Direito

    Nenhum governante, diz o bom senso, pode ter desempenho melhor que

    o de seu governo. No caso do Brasil, trata-se de uma administrao

    fracassada, com dois anos e meio de estagnao econmica, inflao alta,

    contas pblicas em mau estado, contas externas em deteriorao e

    resultados gerais muito inferiores aos de outros latino americanos. Alm

    disso, as possibilidades de melhora at o fim do mandato parecem muito

    escassas. Mas o senso comum dos brasileiros tem algumas peculiaridades

    notveis. Parte substancial dos cidados considera a presidente Dilma

    Rousseff melhor que seu pfio governo. Enquanto s 31% avaliam o

    governo como timo ou bom, 45% aprovam o desempenho da presidente.

    Os dados so da ltima pesquisa CNI-Ibope e confirmam, de modo geral,

    as tendncias indicadas em sondagens recentes.

    Quanto avaliao da presidente, importante ressaltar o detalhe: a

    pergunta sobre sua maneira de governar. No se trata de sua pessoa. O

    entrevistado poderia consider-la honesta, esforada, gentilssima,

    simptica e movida pelas melhores intenes, mas frustrada em seu

    empenho por divindades invejosas. O Olimpo um ninho de maldades.

    Mas a histria outra, e a est o dado intrigante. O modo de agir da

    chefe de governo avaliado mais favoravelmente que a ao do prprio

    governo, embora ela seja responsvel pela escolha dos ministros e, como

    todos sabem, centralizadora, mandona e habituada a distribuir broncas e

    a maltratar seus subordinados.

    Essa notvel dicotomia entre o presidente e a administrao federal pode

    parecer misteriosa, mas um velho componente da poltica nacional. Para

  • milhes de brasileiros, houve sempre uma distncia imensa entre a figura

    de Getlio e as prticas de seus subordinados. O presidente Joo

    Figueiredo sempre foi mais popular que seu governo, embora seu perodo

    tenha sido marcado por uma recesso pavorosa, com muito desemprego,

    empobrecimento e fome. Nessa fase, muitas famlias s conseguiram

    consumir alguma protena de origem animal, de vez em quando, porque

    supermercados passaram a vender separadamente asas de frango. Mas o

    presidente nunca foi to mal avaliado quanto qualquer de seus ministros.

    Apesar da estranha separao entre o Palcio do Planalto e os ministrios,

    ainda mais estranha no caso de uma presidente centralizadora, os

    brasileiros parecem ter noes claras de alguns dos principais defeitos da

    administrao. A avaliao dos impostos e do uso do dinheiro pblico

    inequvoca. Os entrevistados deveriam dizer se, em sua opinio, o

    governo j arrecada muito e no precisa aumentar mais os impostos para

    melhorar os servios pblicos. Essa dupla afirmao foi classificada como

    total ou parcialmente verdadeira por 87% dos consultados. Para 82%, a

    baixa qualidade dos servios pblicos deve-se mais m utilizao dos

    recursos pblicos do que falta deles. Para 91%, os impostos so

    elevados ou muito elevados.

    A presidente discorda. Na quinta-feira, quando a CNI divulgou a nova

    pesquisa realizada pelo Ibope, o Dirio Oficial registrou o veto ao projeto

    de extino da multa adicional de 10% do FGTS nos casos de demisso

    sem justa causa. Segundo a mensagem presidencial, os parlamentares

    deixaram de indicar fontes para compensar a perda de cerca de R$ 3

    bilhes e, alm disso, a falta desse dinheiro foraria o governo a reduzir

    investimentos em infraestrutura e no programa habitacional.

  • Essa notvel dicotomia entre o presidente e a administrao federal pode

    parecer misteriosa, mas um velho componente da poltica nacional

    As duas alegaes so furadas. A multa adicional, paga diretamente ao

    governo, foi criada para compensar o custo de esqueletos fiscais deixados

    pelos Planos Vero e Collor 1. Essa funo, segundo informou h um ano e

    meio a Caixa Econmica, gestora do fundo, estaria concluda em julho do

    ano passado. No tem sentido, portanto, cobrar dos congressistas a

    indicao de como compensar a perda. Em segundo lugar, o governo

    jamais deveria ter tratado essa receita como recurso permanente.

    Esse erro, uma velha tendncia da administrao brasileira, toma-se mais

    forte num governo propenso confuso na rea fiscal. A maior parte dos

    cidados acompanha muito de longe as aventuras da administrao.

    Acaba sentindo, depois de algum tempo, os efeitos dos erros acumulados,

    como os problemas de sade, segurana e educao. Nenhuma das

    grandes questes apontadas pelos entrevistados nova na imprensa

    independente.

    A comparao entre o governo atual e o do presidente Lula outra

    aparente esquisitice revelada pela pesquisa. Para 46% dos entrevistados, o

    governo da presidente Dilma Rousseff pior que o do antecessor. Em

    junho, 25% dos consultados haviam expressado essa opinio. Essa

    avaliao seria mantida, se as pessoas se dispusessem a pensar alguns

    minutos?

    Afinal, o presidente Lula quase se limitou a aproveitar, durante a maior

    parte de seus oito anos, da herana de reformas deixada pela

    administrao anterior e de um quadro internacional muito favorvel at

    o fim de 2008. Elevou o salrio mnimo, transferiu renda com recursos

  • pblicos e ampliou o mercado interno, sem nada ter feito para fortalecer a

    capacidade produtiva do Pas.

    Sua melhor realizao foi tambm a mais fcil. Ele jamais enfrentou para

    valer as tarefas mais complicadas. Alm disso, rejeitou a proposta do

    ministro Antnio Palocci de iniciar um programa srio de equilbrio das

    contas pblicas. A presidente Dilma Rousseff apenas manteve o estilo de

    seu antecessor. Ao insistir nesse caminho, acelerou a desorganizao das

    contas federais, alimentou a inflao e deixou a economia estagnar-se,

    porque as fontes internas e externas de dinamismo estavam esgotadas.

    Dilma no mais do que uma extenso da gente, disse Lula a

    companheiros, na tera-feira, num aparente impulso de veracidade. No

    faz sentido, neste caso, avaliar a extenso sem levar em conta sua

    fidelidade origem.

    Fonte: O Estado de S. Paulo, 27/07/2013

  • No comrcio exterior, o buraco dos erros polticos

    Postado por: Rolf Kuntz 04/08/2013 em Artigos, Economia de

    Mercado, Eficincia

    O Brasil s precisa conseguir um supervit comercial de US$ 4,99 bilhes

    em cinco meses mdia mensal de US$ 998 milhes para encerrar o ano

    com o saldo zerado, o pior em 13 anos, mas, ainda assim, muito melhor

    que o acumulado nos ltimos sete meses. Nada mais fcil, se os preos e o

    volume de vendas de commodities ajudarem, se a indstria se tomar mais

    competitiva e os ventos forem mais favorveis no mercado internacional.

    O entusiasmo criado pelos ltimos nmeros da indstria, com crescimento

    de 1,9% de maio para junho, combina com essa aposta. Olhados com um

    pouco mais de ateno, no entanto, os dados justificam alguma cautela: a

    produo industrial est apenas voltando aos nveis de 2011. No se deve

    esquecer o tombo do ano passado. Da mesma forma, convm olhar com

    mais cuidado as cifras da balana comercial. So mais feias do que podem

    parecer primeira vista.

    O resultado oficial de janeiro a julho inclui, na coluna da receita, US$ 2,81

    bilhes de exportaes fictcias de plataformas para extrao de petrleo.

    Foram US$ 380 milhes s no ms passado. Em sete, meses, esse tipo de

    operao ficou no segundo lugar na lista de vendas de manufaturados.

    Situou-se logo abaixo de automveis de passageiros (US$ 2,99 bilhes) e

    logo acima de leos combustveis (US$ 2,1 bilhes) e de autopeas (US$

    2,05 bilhes). S h um problema nessa classificao. O Brasil de fato

    produz e exporta veculos, leos, autopeas e avies (US$ 1,81 bilho),

    mas as plataformas so contabilizadas sem necessidade de embarque e

    sem a realizao efetiva de uma operao comercial. Sua exportao

    apenas uma formalidade para reduzir a tributao sobre equipamentos do

  • setor petrolfero. A operao legal, mas sua incluso na balana de

    comrcio distorce as contas. Sem essa receita fictcia, o rombo teria

    chegado a US$ 7,8 bilhes.

    O pas, segundo a secretria de Comrcio Exterior do Ministrio do

    Desenvolvimento, Tatiana Prazeres, ainda poder ter um saldo positivo

    este ano, embora muito menor, certamente, que o de 2012 (US$ 19,41

    bilhes). O resultado em grande parte explicvel, disse a secretria,

    pelas operaes com petrleo e derivados. Foi um dficit de US$ 15,44

    bilhes, 270,31% maior que o de um ano antes. A observao pode

    parecer razovel, mas o problema da conta petrleo est longe de ser

    acidental ou passageiro. No ano passado, o rombo, no mesmo perodo,

    havia sido 164,26% maior que o de janeiro a julho de 2011. Tambm isso

    conseqncia da poltica econmica.

    O cardpio da poltica econmica permanece quase invarivel com

    pequenas mudanas para pior

    As importaes de combustveis e lubrificantes tm aumentado porque a

    Petrobrs deixou de produzir petrleo e derivados em volumes

    suficientes. Isso resulta do estilo de gesto adotado no governo anterior,

    quando o presidente Luiz Incio Lula da Silva subordinou a estatal a seus

    objetivos polticos. A alardeada autossuficincia nunca foi muito alm do

    marketing presidencial.

    O acmulo de erros minou as finanas e a capacidade produtiva do grupo.

    Houve investimentos mal planejados, prioridades mal escolhidas, controle

    de preos e uso da empresa como instrumento de uma poltica industrial

    voluntarista. As correes iniciadas pela atual administrao tiveram

    efeitos at agora limitados. A poltica de preos, apenas atenuada nos

  • ltimos tempos, causou danos enormes produo de etanol, porque o

    lcool se tomou proporcionalmente mais caro.

    O mau estado das contas externas mais uma vez reflete os grandes erros

    da poltica econmica. As exportaes de produtos bsicos e

    semimanufaturados somaram 60,2% da receita comercial acumulada nos

    sete meses. A participao dos manufaturados cresceu ligeiramente, de

    36,8% para 37,5% (o resto da conta corresponde s chamadas operaes

    especiais). Mais uma vez, portanto, o Brasil se caracterizou como

    fornecedor de commodities e pagou um preo pesado por isso. Pela

    mdia diria, houve reduo de 1,6% na receita dos bsicos e de 6% na de

    semimanufaturados.

    Esse efeito foi particularmente sensvel em julho, quando os preos de 12

    das 22 principais commodities foram menores que os de um ano antes. Os

    valores desses bens so normalmente mais afetados pelas oscilaes da

    demanda que os preos dos manufaturados. Mas a diplomacia comercial,

    ao desprezar acordos com os mercados mais desenvolvidos, tornou o

    Brasil mais dependente da Amrica Latina para as vendas desses

    produtos.

    Tambm na regio os produtores chineses vm tomando espaos dos

    brasileiros. Nada parece mais natural. Basta levar em conta a baixa

    qualidade dos acordos comerciais firmados at com os vizinhos e as

    condies de competio, minadas pelo encarecimento da produo, pelo

    alto custo do investimento e pelo ambiente -includo o sistema de

    transportes altamente desfavorvel aos negcios. A ateno maior ao

    consumo que produo afeta a balana comercial desde 2007, quando

    as importaes comearam a crescer mais que as exportaes.

  • Nem o aparente arrefecimento da inflao justifica maior otimismo. Com

    a pioradas contas pblicas, presses inflacionrias continuaro forando o

    Banco Central a manter juros elevados. Mudanas no cenrio global

    complicam o quadro. A alta do dlar mais um fator de elevao de

    preos e o financiamento externo tende a ficar mais difcil.

    Enquanto isso, o cardpio da poltica econmica permanece quase

    invarivel com pequenas mudanas para pior. Enquanto ministros da rea

    econmica encenam um corte de gastos de R$ 10 bilhes tesourada no

    vento, na maior parte -, a presidente se dispe a liberar R$ 6 bilhes para

    amansar uma base parlamentar indcil. A eleio continua dominando as

    atenes do governo, como se todo o resto, includa uma economia de

    uns R$ 4,5 trilhes (cerca de US$ 2,2 trilhes), pudesse esperar.

    Fonte: O Estado de S. Paulo, 03/08/2013

  • Falta saber se o ET de Varginha cr no governo

    Postado por: Rolf Kuntz 11/08/2013 em Artigos, Eficincia

    quase uma crueldade pedir presidente Dilma Rousseff a substituio

    do ministro da Fazenda, Guido Mantega. Sem ser almas irms, so pelo

    menos espritos complementares. Ambos atribuem a alta da inflao nos

    primeiros meses deste ano quebra da safra americana. Nenhuma

    relao com a demanda, disse recentemente o ministro. A presidente

    reafirmou a tese da seca nos Estados Unidos na quarta-feira, ao comentar

    triunfalmente o resultado de julho, uma alta de apenas 0,03% do ndice de

    Preos ao Consumidor Amplo (IPCA). Onde encontrar um parceiro to

    adequado para esse dueto?

    Talvez no Ministrio da Educao, mas essa hiptese tem sido negada no

    Palcio do Planalto. Outra possibilidade seria chamar o ET de Varginha,

    merecedor do maior respeito, segundo a presidente. Mas seria preciso

    saber, em primeiro lugar, se ele acredita na existncia do governo

    instalado em Braslia ou se o considera mais uma alucinao coletiva ou

    produto da crendice popular. Mas todos esses detalhes, neste momento,

    so pouco importantes. Quarta-feira, esta a grande notcia, foi um dia

    glorioso para a presidente e para Mantega.

    A inflao, disseram os dois, est e sempre esteve sob controle, sem

    prejudicar a economia. O ministro, no entanto, foi mais cauteloso e

    admitiu aumentos de preos mais acelerados nos prximos meses

    como em todos os anos, segundo ele. Com a mesma prudncia, evitou

    previses mais detalhadas. Quando lhe perguntaram se a taxa acumulada

    no fim do ano ser menor que a do ano passado, quase tirou o time de

    campo. No sei, provavelmente sim, foi a resposta registrada pela

    Agncia Estado.

  • Sem a seca americana e com boa oferta de alimentos no Brasil, fica difcil

    entender essa hesitao. Talvez ele tenha lido, num momento de folga, as

    projees de mercado mantidas no site do Banco Central (BC). Na sexta-

    feira de manh o BC ainda registrava a estimativa para o ms de julho:

    0,01%, um nmero pouco melhor que o divulgado oficialmente pelo

    Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE). Os nmeros

    projetados para os meses seguintes crescem de forma quase contnua:

    0,26% em agosto, 0,43% em setembro, 0,55% em outubro, 0,55% em

    novembro e 0,67% em dezembro.

    Para o ano a srie indica uma alta acumulada de 5,72%, bem pouco

    inferior do ano passado, 5,84%. Talvez se possa falar em convergncia

    para a meta, de 4,5%, mas o avano lento e, nesse ritmo, o percurso

    dificilmente ser concludo nos 12 meses seguintes.

    Mas o governo parece continuar satisfeito com acumulados anuais abaixo

    de 6,5%. Sua meta efetiva qualquer ponto na faixa de 4,5% a 6,5%, um

    detalhe trado mais de uma vez pelo prprio ministro em suas

    declaraes. Politicamente este o ponto mais importante: a inflao

    estar bastante sob controle, segundo a linguagem presidencial,

    enquanto as taxas de 12 meses ficarem nessa rea. O compromisso com

    a estabilidade, mencionado mais uma vez pela presidente na quarta-

    feira, tem como referncia esse limite.

    O BC continua sozinho no combate inflao, num ambiente de tolerncia

    e gastana

    um compromisso frouxo, prprio de quem pouco se incomoda com a

    alta persistente dos preos. Em dez anos, uma inflao anual mdia de

    4,5% resulta numa taxa acumulada de 55,3%. Uma inflao de 2,5%, mais

    prxima das metas adotadas nos pases desenvolvidos e em vrios

  • emergentes, produziria uma alta de preos de 28% no mesmo perodo.

    Uma das consequncias seria um considervel desajuste cambial no Pas

    com taxa mais elevada.

    O ministro Mantega falou muitas vezes em guerra cambial, nos ltimos

    cinco anos. A presidente Dilma Rousseff acusou os governos dos pases

    desenvolvidos de criarem um tsunami monetrio e com isso afetarem o

    cmbio e o poder de competio dos emergentes. Ambos seriam muito

    mais realistas, e mais eficientes na poltica econmica, se dessem mais

    ateno diferena entre as taxas de inflao no Brasil e em outros

    pases.

    Mas isso parece muito improvvel. As presses inflacionrias, segundo o

    governo, vm de fora, juntamente com a crise causadora, tambm

    segundo a verso do Planalto, da estagnao brasileira. Alm disso, a

    meta de 4,5% foi estendida at 2015, com a margem de tolerncia de 2

    pontos para mais ou para menos (na prtica, para mais). Um resultado

    anual de 6,4%continuar sendo alardeado como prova do compromisso

    com a estabilidade.

    Tudo isso combina perfeitamente com o desleixo fiscal. Como os truques

    de maquiagem esto cada vez mais evidentes, o governo tem desistido,

    com jeito de criana flagrada em molecagem, de alguns expedientes

    escandalosos, como a antecipao de recebveis da Itaipu Binacional.

    cada vez mais difcil encontrar meios para entregar no fim do ano um

    supervit primrio de 2,3% do produto interno bruto, j bem menor que a

    meta inicial de 3,1%. Enquanto isso, continua a poltica fiscal expansionista

    apontada mais de uma vez pelo pessoal do BC nas avaliaes dos fatores

    inflacionrios.

  • Sem melhora na gesto das finanas pblicas nem corte de gastos, nem

    aumento da eficincia no uso do dinheiro -, mantm-se uma das causas

    principais do desarranjo dos preos. As possveis presses derivadas do

    aumento do dlar apenas complicaro um quadro j bastante ruim.

    A tarefa de frear a inflao continuar entregue aos formuladores da

    poltica monetria. Nenhum diretor do BC entender a taxa de 0,03% de

    julho, explicvel basicamente pela reduo poltica das tarifas de

    transportes e pelo recuo temporrio dos preos dos alimentos, como um

    sinal de vitria. Muito mais fcil ser declarar respeito ao ET de Varginha e

    abrir licitao para um ufdromo. Uma nova estatal poder cuidar do

    assunto. Em cinco anos as obras estaro incompletas, talvez nem

    comeadas, mas o oramento ter aumentado barbaramente.

    O BC continua sozinho no combate inflao, num ambiente de tolerncia

    e gastana.

    Fonte: O Estado de S. Paulo, 10/08/2013

  • Um governo preso numa teia de erros

    Postado por: Rolf Kuntz 19/08/2013 em Artigos, Eficincia

    Trem-bala, conta de luz, cmbio, Copa, inflao, pr-sal, gasolina,

    oramento por onde comear? Com pouco mais de um ano de mandato

    pela frente, a presidente Dilma Rousseff s realizar alguma coisa se

    romper uma teia de trapalhadas construda por ela mesma, com a

    colaborao de um dos Ministrios mais incompetentes da Histria e com

    material em parte prprio e em parte deixado por seu antecessor.

    Algumas decises sero especialmente complicadas. Se continuar

    reprimindo os preos dos combustveis, com ajustes insuficientes,

    agravar a situao da Petrobrs, j complicada por erros acumulados em

    vrios anos includa a obrigao de controlar pelo menos 30% dos poos

    de petrleo do pr-sal.

    Se atualizar os preos da gasolina e do diesel, as presses inflacionrias

    ficaro mais soltas. Isso ser melhor que represar os ndices, mas ser

    preciso apertar e talvez ampliar a poltica anti-inflacionria. Outras

    decises sero tecnicamente mais fceis, como o abandono do projeto do

    trem-bala. Mas falta saber se o governo estar politicamente disposto a

    admitir o recuo e reconhecer a acumulao de custos inteis. Mesmo sem

    sair do papel, o projeto custar pelo menos R$ 1 bilho at o prximo ano,

    somadas os valores acumulados a partir de 2005 e o do projeto executivo,

    segundo informou O Globo.

    O trem-bala s um exemplo de objetivos mal concebidos, mal

    planejados e perseguidos com invulgar incompetncia, A Copa do Mundo,

    com projetos em atraso e custos multiplicados, talvez seja o caso mais

    visvel de um compromisso assumido de forma irresponsvel e sem

    avaliao de prioridades.

  • Parte da herana recebida pela presidente Dilma Rousseff, esse

    compromisso, alm de impor despesas crescentes e graves

    constrangimentos ao governo, limita seu espao de ao. A menos de um

    ano do comeo dos jogos, um recuo parece impensvel. Para garantir a

    concluso pelo menos das obras mais importantes o governo ter de

    intervir com dinheiro. Quando o prazo ficar muito apertado, ser intil

    jogar a responsabilidade sobre os parceiros privados. Ser preciso gastar e

    ampliar o buraco nas contas pblicas.

    Essas contas j vo muito mal e tendem a piorar nos prximos 12 meses

    tambm por causa das eleies. Mas o governo, at agora, tem exibido

    muito mais preocupao com a aparncia do que com a situao efetiva

    de suas finanas. O quadro tem piorado com o uso crescente de

    maquiagem para enfeitar o quadro fiscal e os nmeros da inflao.

    Uma poltica mais prudente e mais voltada para o longo prazo teria

    tornado a economia nacional mais eficiente e menos dependente do

    cmbio para a competio global

    Essa maquiagem, a mais cara e menos eficiente do mundo, tem borrado

    os limites das polticas fiscal, de crdito e de combate inflao. Um dos

    grandes retrocessos dos ltimos anos tem sido a crescente promiscuidade

    entre o Tesouro e os bancos federais, principalmente com o BNDES.

    Recursos fiscais tambm tm sido usados na maquiagem de preos. Para

    disfarar os custos, em vez de combat-los de forma efetiva, o governo

    criou uma embrulhada com as empresas de energia eltrica.

    As tarifas foram contidas e isso se refletiu por algum tempo nos ndices de

    inflao, mas a conta para o governo est saindo bem maior do que as

    autoridades haviam calculado. O custo para o Tesouro, segundo informou

    o Estado, pode chegar a R$ 17 bilhes, o dobro do valor estimado pelas

  • autoridades no comeo do ano. O novo clculo, mais completo,

    atribudo ao consultor Mrio Veiga, um especialista em energia. S esse

    acrscimo anularia 85% do corte de R$ 10 bilhes prometido na ltima

    reviso do Oramento se esse corte fosse para valer.

    A isso ainda seria preciso somar, entre outros itens, os R$ 6 bilhes

    anunciados pelo governo para emendas oramentrias, principalmente,

    claro, de parlamentares aliados. Mas os desembolsos com as emendas

    ficaro maiores e mais difceis de comprimir, nos prximos anos, se o

    projeto de oramento impositivo, j aprovado na Cmara, passar pela

    etapa final, Os vereadores federais, tambm conhecidos como

    congressistas, podero mais facilmente realizar sua poltica paroquial,

    mais uma forma de pulverizar e desperdiar recursos do Tesouro Nacional.

    Sem apoio firme no Congresso, sem competncia gerencial, sem ministros

    capazes de planejar e de executar polticas e sem coragem de reconhecer

    e de enfrentar os desafios mais srios, o governo da presidente Dilma

    Rousseff criou e deixou acumular-se a maior parte de seus problemas, Por

    mais de dois anos insistiu na prioridade expanso do consumo, sem

    cuidar da eficincia econmica e da capacidade produtiva. Foi incapaz de

    reconhecer o esgotamento da poltica de ampliao do mercado interno

    um objetivo importante, mas insuficiente quando tratado de forma

    isolada.

    Inflao, descompasso entre importaes e exportaes e eroso das

    contas externas foram as conseqncias mais visveis desse erro. Em vez

    de atacar a inflao, o governo manteve a gastana, tentou maquiar os

    preos e ainda promoveu de forma voluntarista uma prolongada reduo

    dos juros.

  • Uma poltica mais prudente, mais corajosa e mais voltada para o longo

    prazo teria tornado a economia nacional mais eficiente e menos

    dependente do cmbio para a competio global. Ao mesmo tempo, uma

    inflao mais baixa, como em outras economias emergentes, tomaria mais

    fcil absorver os efeitos da depreciao do real.

    Como toda a poltica foi errada, tambm nesse caso a escolha muito

    custosa: o Pas fica mais competitivo com o dlar bem mais caro, mas o

    combate inflao, nesse caso, tem de ser mais duro.

    No h deciso fcil e confortvel num ambiente de erros acumulados por

    muito tempo. Com a aproximao das eleies, quantos erros o governo

    estar disposto a atacar seriamente, em vez de apenas continuar

    disfarando?

    Fonte: O Estado de S. Paulo, 17/08/2

  • Um desafio para o ministro n 40

    Postado por: Rolf Kuntz 01/09/2013 em Artigos, Economia de

    Mercado, Eficincia

    O juzo final vai criar um grave problema para os ministros da rea

    econmica. Por falta de futuro, eles ficaro impedidos de prever ou de

    prometer -resultados melhores para o ano seguinte, como fez ontem o

    ministro da Fazenda, Guido Mantega. Por enquanto eles tm essa rota de

    fuga, especialmente valiosa quando o cenrio de curto prazo parece muito

    inseguro. Mesmo diante do resultado aparentemente bom do primeiro

    trimestre, o ministro evitou projees para 2013 e anunciou 2014 como

    um ano mais promissor. Que significa promissor? A resposta ser

    especialmente importante para o trabalho do ministro nmero 40,

    principal ajudante da presidente Dilma Rousseff, seu marqueteiro eleitoral

    e grande planejador de aes polticas de impacto.

    O ministro da Fazenda recusou indicar nmeros, mas talvez possam servir

    como referncia de um ano promissor as estimativas includas na

    proposta de lei oramentria para 2014:4% de expanso para o produto

    interno bruto (PIB) e inflao de 5%, medida pelo ndice de Preos ao

    Consumidor Amplo (IPCA), usado na poltica de metas do Banco Central

    (BC).

    No so de fato previses, disse Mantega ao apresentar o projeto, na

    quinta-feira, como se os tcnicos tivessem tomado quaisquer hipteses

    mais ou menos crveis para calcular a receita e a despesa do prximo

    exerccio. Pode parecer meio estranho, mas s um pouco. Afinal,

    nenhuma esquisitice deste governo causa mais muita estranheza. Para o

    marqueteiro presidencial, no entanto, esses nmeros podero ser muito

    relevantes.

  • S para um exerccio muito simples, admita-se para este ano um

    crescimento econmico de 3% por enquanto, uma hiptese otimista. Se

    o PIB aumentar 4% em 2014, a expanso acumulada nos quatro anos de

    mandato da presidente Dilma Rousseff ser de apenas 11%. A produo

    de bens e servios ter crescido a uma taxa mdia inferior a 3% ao ano. Se

    a perspectiva de um desempenho ainda medocre neste ano e no prximo

    se confirmar, o mercado de emprego ficar provavelmente mais fraco. A

    expanso do salrio real, j menor em 2013, ser prejudicada. Os

    empresrios estaro menos dispostos a contratar e ser mais difcil

    compensar com aumentos a perda salarial causada pela inflao.

    Para estimular a produo o governo poder usar novas doses de

    benefcios fiscais, cortando tributos de setores selecionados. Nesse caso,

    insistir numa linha de ao fracassada. Incentivos desse tipo custam caro

    ao governo e s produzem efeitos localizados. Nem a mdio prazo o

    aumento da produo compensa os buracos abertos na arrecadao. Mas

    o governo parece ainda acreditar nas virtudes da poltica adotada nos

    ltimos anos. Os fatos desmentem essa crena, mas a teimosia tem sido

    muito mais forte que os fatos.

    Dois outros fatores ainda podero impulsionar o crescimento e, mais que

    isso, criar condies para uma expanso sustentvel. Em primeiro lugar,

    novas concesses para infraestrutura podero movimentar o setor da

    construo e produzir bons efeitos a curto e a mdio prazos, a comear

    pela multiplicao de empregos. Os ganhos de eficincia econmica sero

    benefcios mais duradouros e de maior alcance. O governo tem apostado

    nessas possibilidades, mas foi incapaz, at agora, de iniciar a execuo do

    programa, anunciado festivamente h um ano.

  • Se quiser tratar seriamente do assunto, a administrao federal dever ser

    mais pragmtica na elaborao dos editais, pr de lado preconceitos e

    abandonar a ideia mal concebida do trem-bala, um projeto carssimo e

    nada prioritrio neste momento. Muitssimo mais importante, nesta

    altura, cuidar das condies do transporte de carga, pensar nos sistemas

    multimodais e dar um jeito nos aeroportos ineficientes e congestionados.

    O reajuste cambial poder ser outro fator positivo. Ningum sabe qual

    ser o novo patamar do cmbio, depois de superada a atual instabilidade,

    mas o produtor nacional certamente ganhar algum poder de competio

    com o real mais barato. Ser um erro enorme, no entanto, fazer do

    cmbio o fator decisivo de competitividade, como j ocorreu em outras

    pocas. Quem entra nesse jogo condenado ao fracasso, at porque o

    estmulo cambial tende a tornar-se um vcio. Os brasileiros deveriam

    conhecer muito bem a desastrosa sequncia formada pela depreciao

    cambial e pela inflao.

    No h competitividade real e duradoura sem muito investimento. No

    segundo trimestre, o valor investido em mquinas, equipamentos,

    construo civil e obras de infraestrutura foi 3,6% maior que o dos

    primeiros trs meses do ano e 9% superior ao de igual perodo de 2012.

    Mas esse crescimento ocorreu sobre uma base muito baixa. No trimestre,

    a relao entre investimento e PIB ficou em 18,6%. Um ano antes estava

    em 17,9%. Ser preciso um esforo muito grande e muito srio para se

    chegar a uns 24% ou 25%, nvel j superado, at com folga, por vrios

    latino-americanos.

    Alm de investir mais em ativos fsicos, o pas precisar cuidar muito mais

    seriamente da formao de pessoal e da inovao tecnolgica. Sem isso

    seu potencial de crescimento continuar muito limitado. Esse potencial

  • hoje estimado na faixa de 2% a 3% por economistas de muito boa

    reputao. difcil uma estimativa precisa, mas os limites brasileiros,

    como tem mostrado a experincia, so muito estreitos, especialmente no

    setor industrial. Diante da baixa capacidade de oferta, qualquer aumento

    importante da demanda pode resultar em mais inflao e em deteriorao

    das contas externas -fenmenos muito visveis hoje, mesmo com modesto

    crescimento econmico. A soluo de problemas desse tipo vai muito

    alm do marketing eleitoral.

    Fonte: O Estado de S. Paulo, 31/08/2013

  • A retrica da pobreza e a pobreza do investimento

    Postado por: Rolf Kuntz 30/09/2013 em Artigos, Destaque, Eficincia

    Rolf Kuntz

    O governo tirou da pobreza extrema em apenas dois anos 22 milhes de

    brasileiros, disse a presidente Dilma Rousseff, em Nova York, em discurso

    na Assembleia-Geral das Naes Unidas. Se isso for verdade, essa ter sido

    a informao mais importante da fala presidencial muito mais

    importante que a maior parte do palavrrio pronunciado naquele dia por

    vrios governantes. Falta esclarecer um detalhe: se as transferncias

    governamentais forem interrompidas, quantas daquelas pessoas sero

    capazes de se manter fora da misria? Quantas se tornaram, nos ltimos

    dois anos, mais produtivas e menos dependentes de auxlio oficial?

    Nenhuma pessoa razovel se ope a programas de socorro aos mais

    necessitados. Mas por quanto tempo ser possvel manter programas to

    amplos, e com efeitos ainda pouco claros sobre a capacidade produtiva, se

    a economia continuar avanando to lentamente quanto nos ltimos dois

    anos e nove meses?

    Por enquanto, as previses mais otimistas apontam para este ano um

    crescimento econmico de 2,4%. Essa expanso ser puxada, segundo as

    novas projees da Confederao Nacional da Indstria (CNI), por

    investimentos 8% maiores que os do ano passado. Essa a parte mais

    interessante do cenrio. Se as estimativas forem confirmadas, o aumento

  • do Produto Interno Bruto (PIB) ter sido alimentado, em 2013, menos pelo

    consumo do que pela aplicao de recursos em mquinas, equipamentos,

    instalaes diversas e obras de infraestrutura. A expanso econmica

    ainda ser modesta, mas o potencial de crescimento ser reforado e

    resultados melhores podero surgir em breve.

    Mais uma vez, no entanto, o quadro fica bem menos bonito quando se

    examinam os detalhes. A maior parte do crescimento da produo de

    bens de capital mquinas e equipamentos foi concentrada no setor de

    material de transporte, especialmente de caminhes. Boa parte da

    expanso dependeu tambm da indstria de equipamentos agrcolas,

    pormenor facilmente explicvel pelo bom desempenho da agropecuria, o

    setor mais dinmico da economia nacional. Alm disso, a retomada da

    produo de bens de capital para fins industriais pode estar perdendo

    impulso. Em junho, havia sido 21,4% maior que a de um ano antes. Em

    julho, a diferena diminuiu para 13,3%, detalhe notado no Informe

    Conjuntural da CNI. Essa diferena para mais pode ainda parecer

    considervel, mas a base de comparao muito baixa.

    No h desastre vista, mas a situao poder ficar mais complicada se a

    confiana no pas cair acentuadamente

    No conjunto, a aplicao de recursos em bens de capital, instalaes e

    obras de infraestrutura continuar muito abaixo da necessria para um

    crescimento menos medocre, se as projees da CNI estiverem corretas.

    Em 2011, a soma dos investimentos em capital fixo dos setores pblico e

    privado equivaleu a 19,3% do PIB. Em 2012, a proporo caiu para 18,1%.

    Neste ano, chegar a cerca de 19,1%, se o PIB crescer 2,4% e o

    investimento, 8%.

  • A meta governamental, j modesta, alcanar 24% do PIB, taxa obtida nos

    anos 70 e nunca repetida nas dcadas seguintes. Esse objetivo parece

    ainda muito distante.

    No h acordo, entre os economistas, quanto ao potencial de crescimento

    econmico do pas. O clculo complicado, mas o conceito importante,

    porque indica o ritmo de expanso sustentvel sem novos desequilbrios.

    As avaliaes mais sombrias indicam um limite na vizinhana de 2% ao

    ano. As estimativas mais otimistas ficam prximas de 4%. Nem na melhor

    hiptese, no entanto, a economia brasileira poder crescer tanto quanto

    as mais dinmicas da regio na faixa de 4% a 6% ao ano sem acumular

    presses inflacionrias e desarranjos nas contas externas. Poder haver

    um arranque temporrio, mas faltar flego para uma corrida prolongada.

    Mesmo com o crescimento pfio dos ltimos anos, o Brasil j acumulou

    problemas considerveis. A inflao continua elevada para os padres

    internacionais e deve continuar em alta nos prximos meses, depois de

    um breve arrefecimento no meio do ano. O presidente do Banco Central

    (BC), Alexandre Tombini, reafirmou em Nova York, num encontro com

    investidores, o compromisso de continuar buscando a meta de 4,5%, mas

    ningum pode dizer com alguma segurana quando a convergncia

    ocorrer. Um dos principais obstculos, a farra das contas pblicas, deve

    atrapalhar o combate inflao ainda por um bom tempo. Quem espera

    austeridade em tempo de eleio?

    Do lado externo, o cenrio continua ruim. O BC reduziu de US$ 7 bilhes

    para US$ 2 bilhes o supervit comercial estimado para o ano. A CNI

    cortou sua projeo mais drasticamente de US$ 9,2 bilhes no Informe

    Conjuntural de junho para US$ 1,76 bilho no documento recm-

    divulgado. O BC manteve, no entanto, a previso de um dficit em

  • transaes correntes de US$ 75 bilhes, equivalente a 3,35% do PIB. O

    investimento direto estrangeiro dever chegar a 2,64% do PIB. Parte do

    buraco nas contas externas ser coberta, portanto, por outras formas, em

    geral menos saudveis, de financiamento.

    No h desastre vista, at porque o Pas dispe de mais de US$ 370

    bilhes de reservas, mas a situao poder ficar mais complicada se a

    confiana no pas cair acentuadamente. O risco tangvel. O Cristo

    Redentor representado como um foguete em decolagem numa capa da

    revista The Economist de 2009 foi substitudo, na ltima edio, por

    uma figura no rumo do desastre, depois de um voo descontrolado.

    O desafio imediato, na agenda do governo, atrair capitais privados para

    os grandes projetos federais de investimento. Para isso a presidente e as

    principais figuras da equipe econmica foram Nova York. O resultado

    ser visto nas prximas licitaes. Mas a presidente faria bem se pusesse

    no alto da agenda medidas para uma recuperao mais ampla da

    credibilidade a comear por uma poltica fiscal mais sria e sem

    contabilidade criativa, j desmascarada em todo o mundo.

    Fonte: O Estado de S. Paulo, 28/09/2013

  • Cazaquisto parte, o inferno so os outros

    Postado por: Rolf Kuntz 07/10/2013 em Artigos, Eficincia

    O Corinthians e o governo brasileiro puderam, enfim, comemorar pelo

    menos uma vitria na primeira semana de outubro. O Itamaraty conseguiu

    a adeso da Chancelaria cazaque campanha pela regulamentao da

    espionagem. Em visita a Braslia, o ministro dos Negcios Estrangeiros do

    Cazaquisto, Erlan Idrissov, foi persuadido a assinar uma declarao

    contra as prticas de interceptao ilegal de comunicaes e dados de

    cidados, empresas e membros de governos por governos e empresas

    estrangeiras. Ele se disps tambm a cooperar em foros multilaterais

    para o desenvolvimento de governana internacional apropriada para a

    segurana ciberntica. Esse compromisso aparece no 18. dos 21 itens da

    declarao conjunta divulgada na quarta-feira, vrias horas antes dos 2 a 0

    do Timo contra o Bahia. Na maior parte da semana, no entanto, a

    presidente Dilma Rousseff e sua equipe tiveram maior dificuldade nos

    esforos para conquistar confiana em seus planos e realizaes.

    Excetuado o Cazaquisto, preciso dar razo a Sartre. O inferno so os

    outros, a comear, nos ltimos dias, pela agncia Moodys de classificao

    de riscos. Mas, pensando bem, nem o Instituto Brasileiro de Geografia e

    Estatstica (IBGE), com seus pssimos indicadores de desempenho

    econmico, tem sido muito cooperativo. Na Argentina, os Kirchners

    tiveram problema semelhante com o Indec [Instituto Nacional de

    Estatstica e Censos da Argentina], mas cuidaram do assunto sua

    maneira, recauchutando o sistema pblico de estatsticas e proibindo a

    divulgao de nmeros menos favorveis por instituies privadas.

  • A economia cresce pouco, o governo usa a contabilidade criativa, o

    investimento insuficiente, as contas externas pioram e a dvida bruta

    muito maior que em outras economias emergentes

    No Brasil, bem mais simples a vida dos analistas econmicos dos

    mercados, da imprensa e das agncias de classificao de riscos. Os

    nmeros oficiais so em geral confiveis e at as lambanas, como a

    maquiagem das contas pblicas, so identificveis sem muita dor de

    cabea. No caso da inflao, tambm fcil apontar as tentativas de

    administrar os ndices prticas sem mistrio, como controlar os preos

    dos combustveis e reduzir politicamente as tarifas de eletricidade e de

    transporte pblico. No fim, os truques e problemas acabam convergindo.

    O Tesouro foi autorizado a emitir mais ttulos da dvida, no valor de R$ 2,3

    bilhes, para cobrir os custos do voluntarismo na rea da energia eltrica.

    mais um acrscimo a um endividamento de escassa utilidade para o

    fortalecimento e a expanso da economia, como a maior parte do

    dinheiro transferido pelo Tesouro aos bancos federais desde o comeo da

    crise estimado em torno de R$ 400 bilhes.

    Bem conhecidos, todos esses dados afetam a credibilidade do governo e

    prejudicam as apostas na economia nacional. Essas e outras informaes

    foram mencionadas, nesta semana, quando a Moodys anunciou a

    mudana da perspectiva da dvida soberana de positiva para estvel na

    prtica, uma espcie de advertncia, embora o vice-presidente da

    agncia, Mauro Leos, tivesse rejeitado essa interpretao. Sem melhora

    significativa, no entanto, ser difcil evitar um rebaixamento, admitiu o

    economista.

    As justificativas divulgadas pela Moodys so um bom resumo das

    avaliaes correntes fora do governo, sustentadas por muitos analistas e

  • classificadas pela presidente Dilma Rousseff na categoria do pessimismo

    adversativo. A economia cresce pouco, o governo usa a contabilidade

    criativa, o investimento insuficiente, as contas externas pioram e a

    dvida bruta muito maior que a encontrada em outras economias

    emergentes: cerca de 60% do produto interno bruto (PIB) no Brasil,

    enquanto permanece em torno de 35% em pases de desenvolvimento

    semelhante.

    No mesmo dia, em Washington, a diretora-gerente do Fundo Monetrio

    Internacional (FMI), Christine Lagarde, apresentou um panorama da

    transio da crise para o ps-crise em todos os grandes grupos de

    economias. Sem mencionar muitos detalhes, chamou a ateno para as

    presses inflacionrias no Brasil, na Indonsia e na Rssia e mencionou o

    pouco espao para estmulos fiscais em muitos emergentes. Alm disso,

    apontou o Brasil e a ndia como pases necessitados de mais investimentos

    em infraestrutura e maior abertura comercial.

    O partido est no poder h 11 anos e seu balano de realizaes abaixo

    de pfio

    No adiantaria, diante do noticirio da semana, denunciar essa fala como

    mais uma prova da perversidade do FMI. Os jornais continuam mostrando

    as dificuldades e os tropeos da poltica de infraestrutura, o IBGE

    informou crescimento nulo da produo industrial em agosto, depois de

    uma queda de 2,4% em julho, e o Banco Central (BC) cortou de US$ 7

    bilhes para US$ 2 bilhes o supervit comercial projetado para o ano.

    Alm disso, as novas projees indicaram crescimento anual do PIB de

    apenas 2,5% at o segundo trimestre de 2014 e inflao de 5,5% at o

    terceiro de 2015. Mas, segundo disse em Londres o presidente do Banco

  • Central, Alexandre Tombini, a inflao est controlada e converge para a

    meta, 4,5%. H algum prazo para essa convergncia?

    No se pode cobrar do PT, dizia o presidente Luiz Incio Lula da Silva, a

    correo de problemas acumulados desde o Descobrimento. Em outras

    ocasies, sua referncia foi a Histria da Repblica. Gente do governo tem

    citado, recentemente, a escassez de investimentos em infraestrutura nos

    ltimos 40 anos. Pessoas mais moderadas mencionam trs dcadas.

    Mas o partido est no poder h 11 anos e seu balano de realizaes

    abaixo de pfio, quando se trata de reformas complicadas (a tributria, por

    exemplo), de qualidade da gesto e de medidas para tornar a economia

    mais eficiente e com maior potencial de crescimento.

    Fidelssima a seu criador, a presidente Dilma Rousseff manteve as piores

    prticas do perodo Lula, includos o loteamento e o aparelhamento da

    administrao federal e as intervenes voluntaristas. O rebaixamento da

    classificao da dvida de longo prazo da Petrobrs, outra deciso da

    Moodys, uma das consequncias. Ningum, na equipe do Planalto,

    havia notado esse risco?

    Fonte: O Estado de S. Paulo, 05/10/2013

  • Pior que os nmeros s o otimismo de dona Dilma

    Postado por: Rolf Kuntz 20/10/2013 em Artigos, Economia de

    Mercado, Eficincia

    H uma notcia pior que a mistura de inflao em alta, economia quase

    parada, contas pblicas piorando e balano externo em deteriorao. O

    fato mais assustador, mas nada surpreendente, a tranquilidade, quase

    alegria, exibida pela presidente Dilma Rousseff e por sua solerte equipe

    econmica diante desse quadro. Este ano foi difcil para todos, disse o

    ministro da Fazenda, Guido Mantega, na apresentao do oitavo balano

    do PAC 2, o atual Programa de Acelerao do Crescimento. Foi realmente

    um ano difcil, mas ele parece haver esquecido alguns detalhes. A

    economia americana continuou em recuperao, com mais investimentos

    e mais exportaes, a Unio Europeia comeou a sair da recesso, o Japo

    continuou avanando e a maior parte dos emergentes, embora perdendo

    impulso, continuou crescendo mais que o Brasil. A economia brasileira,

    disse nesta semana o secretrio de Poltica Econmica do Ministrio da

    Fazenda, Mrcio Holland, ser uma das poucas, neste ano, com

    crescimento superior ao de 2012. Ora, alvssaras! E quantas tero crescido

    0,9% no ano passado, depois de alcanar o ritmo quase alucinante de

    2,7% em 2011?

    Se a presidente e seus ministros levam a srio o prprio discurso, ningum

    deve esperar medidas mais produtivas nos prximos meses, at porque a

    campanha para a reeleio o primeiro item da agenda presidencial. A

    inflao e as contas pblicas esto absolutamente sob controle, disse a

    presidente em Salvador, na tera-feira.Pelos dados oficiais, essa inflao

    controlada continua em alta. O IPCA-15, prvia do ndice de Preos ao

    Consumidor Ampliado, subiu 0,27% em setembro e 0,48% em outubro,

  • continuando a ascenso iniciada em agosto. Em julho havia ficado em

    0,07%, mas no ms seguinte j avanou 0,16%.

    Acabado o efeito dos truques com tarifas de nibus e de eletricidade, o

    conjunto dos preos voltou ao curso normal numa economia com muita

    gastana pblica, muita demanda privada de consumo e capacidade

    produtiva defasada. Alm disso, a difuso dos aumentos de preos passou

    de 59,5% em setembro para 65,8% em outubro, no IPCA-15, segundo

    clculo da Votorantim Corretora.

    Se a presidente e seus ministros levam a srio o prprio discurso, ningum

    deve esperar medidas mais produtivas nos prximos meses

    O indicador de difuso porcentagem de itens com majorao de preos

    rotineiramente calculado pelas instituies do mercado financeiro.

    um importante sintoma da vulnerabilidade dos vrios segmentos do

    mercado s presses inflacionrias. Quando a alta se espalha por quase

    dois teros dos preos e a alta geral acumulada em 12 meses, 5,75%,

    continua longe da meta, discutir se a inflao est controlada ou

    descontrolada um exerccio de escassa utilidade. Alm disso, o resultado

    em 12 meses deve continuar acima da meta de 4,5% nos prximos dois

    anos, at o terceiro trimestre de 2015, segundo projeo do Banco Central

    (BC) repetida na ata da ltima reunio do Comit de Poltica Monetria.

    Alm dessa ata, o BC divulgou tambm, nesta semana, seu ndice de

    atividade econmica, o IBC-Br, uma espcie de prvia do produto interno

    bruto (PIB). Esse indicador subiu apenas 0,08% em agosto, depois de ter

    cado 0,33% em julho. Mesmo com um resultado melhor em setembro, a

    comparao do terceiro com o segundo trimestre dever apresentar uma

    variao muito prxima de zero, talvez negativa, segundo a maior parte

    das projees do mercado.

  • Esse e outros nmeros parecem apontar, passados trs quartos do ano,

    um crescimento pfio em 2013, embora maior que o do ano passado. O

    ministro da Fazenda j declarou aceitar a projeo de 2,5%, formulada

    pelo BC e pelo Fundo Monetrio Internacional (FMI).

    Mas o FMI, ao contrrio do governo brasileiro, projeta a mesma taxa

    tambm para 2014 e uma expanso anual mdia, nos prximos cinco

    anos, de 3,5%, se os investimentos em infraestrutura comearem a

    deslanchar. As previses so melhores para a maior parte dos emergentes

    da sia, da Europa ex-socialista e da Amrica Latina. Quase todos, alm

    disso, continuaro com inflao menor que a do Brasil.

    O crescimento brasileiro, garante o ministro da Fazenda, ser puxado, a

    partir deste ano, principalmente pelos investimentos. Mas, como ele

    mesmo reconhece, o valor investido em equipamentos produtivos, em

    instalaes e em infraestrutura tem continuado prximo de 18% do PIB,

    poder subir um pouco este ano e caminhar esta a meta oficial para

    24% dentro de alguns anos. Ningum sabe quando essa proporo ser

    alcanada, Quando isso ocorrer, o Brasil ainda investir menos,

    proporcionalmente, do que investem hoje as economias mais dinmicas

    da Amrica do Sul.

    Se esse avano depender do governo, o caminho ser muito longo, At

    setembro o Tesouro investiu 35,7% dos R$ 91,2 bilhes previstos no

    Oramento federal, valor menor que o do ano passado, descontada a

    inflao. A infraestrutura continua muito deficiente e o setor privado, por

    muitas razes, tambm tem investido menos que o necessrio.

    A piora da balana comercial uma das consequncias. O saldo oficial de

    2013 at a segunda semana de outubro foi um supervit de US$ 964

    milhes. Na semana anterior, a exportao fictcia de uma plataforma de

  • petrleo havia adicionado US$ 1,9 bilho receita. Essa e outras

    plataformas contabilizadas neste ano jamais foram embarcadas. A

    operao tem finalidade tributria, mas contada como receita.

    A presidente e seus auxiliares costumam insistir, tambm, no discurso da

    boa gesto fiscal. Podem convencer quem ignora a contabilidade criativa e

    as ligaes perigosas do Tesouro com os bancos federais dados

    conhecidos internacionalmente e objetos de gozao dentro e fora do

    Pas. Pelo menos isto se pode dizer a favor da retrica e dos truques

    oficiais: so divertidos.

    Fonte: O Estado de S. Paulo, 19/10/2013

  • No setor externo, um desastre made in Brazil

    Postado por: Rolf Kuntz 27/10/2013 em Artigos, Economia de

    Mercado, Eficincia

    A presidente Dilma Rousseff deve terminar o ano com mais um trofu

    econmico, o pior resultado das contas externas em mais de uma dcada

    exportaes estagnadas, importaes em alta e um enorme buraco na

    conta corrente do balano de pagamentos. Nos 12 meses terminados em

    setembro o dficit na conta corrente chegou a US$ 80,51 bilhes,

    equivalentes a 3,6% do produto interno bruto (PIB), informou nesta sexta-

    feira o Banco Central (BC). No relatrio recm-divulgado foram mantidas

    as projees para 2013: saldo comercial de US$ 2 bilhes, dficit em conta

    corrente de US$ 75 bilhes (3,35% do PIB) e investimento estrangeiro

    direto de US$ 60 bilhes. Alguma melhora ser necessria, portanto, para

    se chegar ao fim de dezembro com o cenrio estimado pelo BC. Um

    quadro mais positivo, neste e no prximo ano, depender principalmente

    de uma recuperao da balana comercial e nesse quesito o Pas continua

    muito mal.

    A exportao rendeu neste ano US$ 192,59 bilhes at a terceira semana

    de outubro, 1,1% menos que no ano passado em igual perodo. A

    importao consumiu R$ 193,19 bilhes, 8,7% mais que um ano antes,

    segundo os dados oficiais. O saldo acumulado em quase dez meses, US$

    605 milhes, s foi possvel graas ao resultado favorvel obtido nas trs

    primeiras semanas do ms, um supervit de US$ 1 bilho. Mas esse

    resultado embute uma exportao meramente contbil de uma

    plataforma de petrleo no valor de US$ 1,9 bilho. Outras plataformas

    foram contabilizadas nos meses anteriores, mas foram sempre vendas

    fictcias, vinculadas concesso de benefcios fiscais.

  • Se esses nmeros fossem eliminados, o quadro do comrcio exterior

    brasileiro, j muito feio pelos nmeros oficiais, seria bem menos

    favorvel. Para acertar as contas seria tambm preciso, poderiam dizer os

    mais otimistas, eliminar as importaes de combustveis efetuadas em

    2012 e registradas s neste ano graas a um arranjo especial da Petrobrs.

    verdade, mas indispensvel lembrar uma diferena entre essas

    compras e as vendas de plataformas. Estas s ocorreram na contabilidade,

    mas as compras de combustveis foram realizadas e seria necessrio

    inclu-las nos clculos em algum momento. Se tivessem entrado nas

    contas do ano passado, o supervit comercial teria ficado bem abaixo dos

    US$ 19,41 bilhes divulgados pelo Ministrio do Desenvolvimento,

    Indstria e Comrcio Exterior.

    Se as projees do BC estiverem corretas, o Brasil vai faturar neste ano

    US$ 241 bilhes com as vendas ao exterior. O gasto com produtos

    estrangeiros chegar a US$ 239 bilhes. O valor exportado ser 0,6%

    menor que o do ano passado e 5,8% inferior ao de 2011. A importao

    ter custado cerca de 7% mais que em 2012 e 5,6% mais que dois anos

    antes. A deteriorao inegvel e a causa mais importante o

    enfraquecimento da indstria brasileira, por falta de investimentos,

    aumento de custos e dificuldade crescente para enfrentar uma disputa

    mais dura em mercados mais apertados. Isso vale para o mercado

    nacional.

    Como as condies de produo foram geralmente negligenciadas nos

    ltimos dez anos, a comear pela infraestrutura, o potencial de

    crescimento diminuiu

    As medidas protecionistas impostas pelo governo foram insuficientes para

    barrar o ingresso de produtos estrangeiros. Alm do mais, nenhuma

  • barreira tornaria os produtores brasileiros mais capazes de competir fora

    das fronteiras, mesmo em reas antes consideradas campos de caa

    tranquilos, como o Mercosul e a maior parte da vizinhana. Tambm na

    regio outros produtores tm conseguido ocupar espaos crescentes sem

    muita oposio brasileira.

    Quando se aponta a piora do balano de pagamentos especialmente da

    balana comercial -, ministros costumam citar a acumulao de reservas

    para mostrar a segurana do setor externo. Mesmo com intervenes no

    mercado cambial, como reao s turbulncias do meio do ano, o BC

    conseguiu, graas a uma estratgia bem desenhada, evitar a perda de

    moeda estrangeira e preservar mais de US$ 370 bilhes. Esse , sem

    dvida, um importante fator de segurana, mas de nenhum modo pode

    substituir a eficincia produtiva e os acordos internacionais favorveis

    expanso do comrcio.

    A poltica brasileira tem falhado nas duas frentes. A deficincia de

    investimentos, o desperdcio de recursos, o erro na escolha de prioridades

    (na poltica educacional, por exemplo) tm dificultado ganhos gerais de

    produtividade. Se as concesses derem certo, a taxa de investimentos

    chegar a 22,5% do produto interno bruto at 2018, segundo estimativa

    do Banco Nacional do Desenvolvimento Econmico e Social (BNDES).

    Muitos pases latino-americanos j esto acima desse padro, enquanto a

    taxa brasileira continua oscilando entre 18% e 19%.

    Como as condies de produo foram geralmente negligenciadas nos

    ltimos dez anos, a comear pela infraestrutura, o potencial de

    crescimento diminuiu, como seria previsvel. Hoje esse problema

    assunto da pauta internacional, pouco importando os desmentidos e

    esperneios do governo brasileiro.

  • Na outra frente, a escolha das parcerias prioritrias, tambm se

    acumularam erros desastrosos. A diplomacia comercial ps no alto da

    agenda a aproximao com mercados pouco importantes, com exceo do

    chins. Mas o comrcio com a China virou uma relao semicolonial, com

    o Brasil praticamente limitado a vender commodities, em geral de pouca

    ou nenhuma elaborao, e a importar manufaturados.

    Os imperialistas, desprezados pela diplomacia de passeata dos governos

    petistas, continuam como compradores relevantes de manufaturados e

    poderiam comprar muito mais se tivessem sido assinados acordos de livre-

    comrcio. Mas nem todos criticam a estratgia comercial brasileira e o

    desprezo petista aos grandes mercados. No caso dos chineses e outros

    exportadores realistas e dinmicos, a fantasia terceiro-mundista vivida em

    Braslia nos ltimos dez anos elimina um possvel competidor de peso.

    Fonte: O Estado de S. Paulo, 26/10/2013

  • O vilo da inflao e da estagnao

    Postado por: Rolf Kuntz 12/11/2013 em Artigos, Destaque, Eficincia

    Esqueam o tomate, a carne e as passagens areas. No falem mal das

    leguminosas, dos hortigranjeiros ou dos sales de beleza. O vilo da

    inflao nunca ser encontrado na lista de bens e servios comprados

    pelos consumidores. A imagem usada pela imprensa mera repetio de

    uma velha metfora criada l pelos anos 80 ou pouco antes. Ningum

    deve entender literalmente essa figura de linguagem. O vilo existe, sim,

    mas de outro tipo. o mesmo da estagnao econmica, da

    irresponsabilidade fiscal e da eroso das contas externas. Em uma palavra,

    o governo, embora esse nome parea um tanto inadequado para

    designar a presidente Dilma Rousseff e a trupe espalhada por 39

    ministrios, uma poro de estatais e outros rgos da administrao

    indireta.

    Explicar e justificar uma sucesso de nmeros muito ruins tem sido, h

    algum tempo, uma das principais atividades desse pessoal. Mas nenhuma

    retrica disfara o pssimo desempenho fiscal de setembro, quando at o

    resultado primrio foi negativo, ou a acelerao contnua da inflao

    mensal desde agosto. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, ainda

    classificou como bom resultado a alta de 0,57% do ndice de Preos ao

    Consumidor Amplo (IPCA) no ms passado. No h nada de bom nesse

    nmero, nem se pode ao contrrio da afirmao do ministro

    consider-lo normal para esta poca do ano.

    S se pode falar de normalidade em outro sentido: esgotado o efeito dos

    truques com as tarifas de transporte e as contas da energia, o

    recrudescimento da alta de preos foi absolutamente natural. Que mais

    poderia ocorrer, quando h um desajuste inegvel entre a demanda,

  • principalmente de consumo, e a capacidade de oferta da indstria

    nacional? Esse desajuste, bom lembrar, alimentado principalmente

    pela poltica oficial, marcada pela gastana e pelos estmulos ao consumo

    e reforada pela expanso do crdito.

    Sem esses fatores, nenhum aumento do preo do tomate ou da carne

    bovina produziria um impacto to amplo sobre todos os mercados. Alm

    disso, o efeito da depreciao cambial seria muito menos sensvel, como

    tem sido em outras economias emergentes. Aquelas, como a da ndia,

    com problemas graves de inflao, tm tambm, como o Brasil, srios

    desajustes fiscais e limitaes importantes do lado da oferta.

    O efeito da demanda tambm evidente na evoluo dos preos dos

    servios, com alta de 0,52% em outubro e 8,74% em 12 meses. No caso

    dos bens, o aumento de preos tem sido atenuado, em parte, pela

    importao crescente, mas essa uma soluo invivel quando se trata de

    aluguel residencial, conserto de automvel, consultas mdicas ou servios

    de manicures, para citar s alguns itens de uma lista muito ampla de

    atividades. O mesmo desequilbrio entre a demanda crescente e a

    capacidade de oferta muito limitada reflete-se tambm no dficit

    comercial de US$ 1,83 bilho acumulado de janeiro a outubro. Nesse

    perodo, o valor exportado, US$ 200,47 bilhes, foi 1,4% menor que o de

    um ano antes, pela mdia dos dias teis, e o gasto com importao, US$

    202,3 bilhes, 8,8% maior.

    No h como disfarar a reduo da produtividade e do poder de

    competio, resultante principalmente de uma coleo de falhas da

    poltica econmica

    O aumento das compras de petrleo e derivados diferena de US$ 6,64

    bilhes de um ano para outro foi um fator importante, mas o total da

  • importao foi determinado principalmente por outros fatores. A elevao

    de US$ 17,29 bilhes na despesa com bens estrangeiros refletiu acima de

    tudo os desajustes internos e especialmente a perda de eficincia da

    economia nacional.

    No h como disfarar a reduo da produtividade e do poder de

    competio, resultante principalmente de uma coleo de falhas da

    poltica econmica. A agropecuria ainda produtiva em grau suficiente

    para compensar os problemas sistmicos da economia brasileira e

    conquistar espaos no mercado internacional. A maior parte da indstria

    tem sido incapaz de vencer esses obstculos. Os mais comentados so as

    deficincias de infraestrutura e a tributao irracional, mas a lista ampla

    e um dos mais importantes, embora nem sempre lembrado, o

    despreparo da mo de obra.

    H pouco tempo a Confederao Nacional da Indstria divulgou pesquisa

    sobre a escassez de trabalhadores qualificados para o setor de

    transformao. Outra sondagem, nesta semana, tornou o quadro ainda

    mais dramtico: 74% das empresas de construo consultadas indicaram

    dificuldades para encontrar pessoal aproveitvel. Quase todo esse grupo

    94% reclamou da escassez de trabalhadores preparados at para

    servios bsicos, como os de pedreiro e ajudante.

    Em outros tempos, a construo exercia, entre outras, a funo

    estratgica de absorver pessoal de baixa qualificao. Isso mudou. As

    construtoras progrediram tecnologicamente e a educao ficou para trs,

    principalmente nos nveis fundamental e mdio. Pessoas um pouco mais

    atentas apontaram a m escolha do objetivo, quando o presidente Luiz

    Incio Lula da Silva decidiu cuidar prioritariamente do acesso a faculdades,

  • por meio de bolsas, cotas e maior oferta de vagas. O Pas paga caro, hoje,

    por essa deciso obviamente demaggica e eleitoreira.

    Ningum deve esperar grandes avanos na poltica educacional em curto

    prazo. No Rio Grande do Sul, nesta sexta-feira, a presidente Dilma

    Rousseff repetiu, como se fosse algo muito bom, uma ameaa muito

    ouvida nos ltimos tempos: por meio dos recursos do petrleo, a

    educao ser transformada no caminho fundamental do

    desenvolvimento. Essa uma assustadora conversa mole. O Brasil precisa

    de educao h muito tempo, preciso cuidar do assunto imediatamente

    e h recursos mais que suficientes para isso. Apostar no hipottico

    dinheiro do pr-sal equivale a encontrar mais uma desculpa vergonhosa

    para nada fazer de srio pela educao.

  • O Brasil emperrado e a tese de Nelson Rodrigues

    Postado por: Rolf Kuntz 18/11/2013 em Artigos

    Se toda unanimidade for mesmo burra, como escreveu Nelson Rodrigues,

    respeitados economistas nacionais e estrangeiros devem estar errados,

    porque as avaliaes negativas da economia brasileira esto ficando quase

    unnimes. A Standard & Poors, uma das principais agncias de

    classificao de risco, poder mudar a nota do pas antes das eleies de

    2014, se a situao das contas pblicas continuar piorando, disse em Nova

    York, na quarta-feira, o diretor responsvel pelo acompanhamento do

    Brasil, Sebastian Briozzo. Ele tambm revelou a previso de crescimento

    econmico para este ano e para 2014, em torno de 2,5%. Um dia antes o

    Conference Board, organismo especializado em estudos

    macroeconmicos, havia indicado uma projeo pouco menor para o

    prximo ano, 2,3%. Estimativas semelhantes haviam sido divulgadas pela

    Organizao para a Cooperao e Desenvolvimento Econmico (OCDE):

    expanso de 2,2% neste ano, 2,5% no prximo e 3,1% em 2015. Os

    clculos anteriores, publicados no primeiro semestre, haviam sido mais

    otimistas 3% para 2013 e 3,6% para 2014. Mas essas estimativas so

    apenas uma parte e a menos preocupante da unanimidade em

    formao.

    As coincidncias mais importantes referem-se qualidade da poltica

    econmica, ao ambiente de negcios e ao fiasco brasileiro no cenrio

    internacional, sintetizado recentemente na capa da revista The Economist

    pela queda do redentor-foguete. Na pesquisa da OCDE, as economias

    emergentes e em desenvolvimento continuam perdendo impulso, mas

    ainda devem crescer em mdia 4,5% em 2013, 5% em 2014 e 5,3% em

    2015. A zona do euro continuar em marcha lenta, mas a recesso vai

  • ficando para trs. Os Estados Unidos, mesmo com a trava nos gastos

    pblicos, devem manter-se em acelerao.

    As avaliaes negativas da economia brasileira esto ficando quase

    unnimes

    Na sondagem de clima econmico, realizada pelo instituto alemo IFO em

    parceria com a Fundao Getlio Vargas (FGV), a projeo de crescimento

    para o Brasil nos prximos trs a cinco anos ficou em 2,6%, nmero

    modestssimo quando confrontado com aqueles previstos para Chile

    (3,8%), Colmbia (3,9%), Equador (4,1%) e Peru (5%). Na avaliao do

    clima econmico o Brasil aparece em 9 lugar numa lista de 11 latino-

    americanos. Os principais problemas detectados nas entrevistas so trs

    faltas: de confiana na poltica econmica, de competitividade

    internacional e de mo de obra qualificada.

    Bem conhecidos no pas, esses pontos negativos se tomaram lugares-

    comuns nas avaliaes divulgadas por entidades internacionais pblicas e

    privadas, como a OCDE, o Banco Mundial, o Frum Econmico Mundial e

    as agncias de classificao de risco.

    A quase unanimidade internacional a respeito das ms condies do pas

    tem sido alimentada por informaes e avaliaes tambm de entidades

    oficiais brasileiras. O Banco Central (BC) tem chamado a ateno, h um

    bom tempo, para as limitaes do lado da oferta, para o desajuste no

    mercado de trabalho, para a demanda de consumo perigosamente

    aquecida e para a inflao resistente, mas a cpula do Executivo continua

    agindo como se o grande entrave ao crescimento brasileiro estivesse do

    lado dos consumidores. Como conseqncia, o governo tem queimado

    dezenas de bilhes de reais em estmulos fiscais ao mercado, com

    pouqussima ou nenhuma resposta da indstria. Mesmo o dinheiro do

  • tesouro entregue aos bancos pblicos para financiar o investimento

    produziu efeitos abaixo de pfios nos ltimos anos. O valor investido pelo

    governo e pelo setor privado continua na vizinhana de 19% do produto

    interno bruto (PIB), uns cinco pontos abaixo da mdia latino-americana.

    Os sinais de estagnao continuam pipocando. O mais recente o ndice

    de Atividade Econmica do Banco Central (IBC-Br), considerado uma

    prvia do PIB. O nmero de setembro foi 0,01% inferior ao de agosto e

    2,68% maior que o de um ano antes na srie com ajuste sazonal. O ndice

    do terceiro trimestre foi 0,12% inferior ao do segundo e o acumulado em

    112 meses chegou a 2,48%.

    A estimativa do PIB atualizada at o perodo de julho a setembro s deve

    ser divulgada no comeo do prximo ms pelo Instituto Brasileiro de

    Geografia e Estatstica (IBGE). Por enquanto, os levantamentos indicam

    um resultado muito fraco. Isso inclui o crescimento industrial de apenas

    1,1% nos 12 meses at setembro, segundo os ltimos dados do IBGE.

    Enquanto isso, a alta dos preos ao consumidor continua em acelerao,

    mesmo com a acomodao dos preos no atacado (IPA). O IGP-10 de

    novembro subiu 0,44%, freado por seu componente de maior peso: o IPA,

    com elevao de 0,4%, avanou bem menos que no ms anterior (1,48%).

    Mas os preos ao consumidor, tambm cobertos pela pesquisa,

    aumentaram 0,61%, com variao de 5,44% em 12 meses. Em outubro

    haviam subido 0,33%. A nova apurao mostrou alta de preos em seis

    dos oito grupos de bens e servios pesquisados, com destaque,

    novamente, para os servios mais um forte sinal de excesso de

    demanda.

    Toda unanimidade pode ser burra, mas pode causar muito prejuzo antes

    de ser descoberta a burrice. A movimentao no mercado financeiro j

  • tem mostrado os efeitos da desconfiana em relao poltica fiscal,

    muito frouxa, e s possibilidades de crescimento econmico nos prximos

    anos. Alm disso, restam dois motivos de preocupao.

    Primeiro: talvez haja algum exagero na tese de Nelson Rodrigues. Nesse

    caso, pelo menos algumas unanimidades podero ser fundamentadas.

    Segundo: mesmo avaliaes defeituosas podem motivar profecias

    autorrealizveis. Pelo sim, pelo no, a presidente Dilma Rousseff deveria

    pensar nessas possibilidades, para tentar garantir nos prximos anos uma

    economia mais bonitinha e menos ordinria.

    Fonte: O Estado de S.Paulo

  • Aleluia: expanso de 1,5%, apesar do mau-olhado

    Postado por: Rolf Kuntz 01/12/2013 em Artigos, Economia de

    Mercado, Eficincia

    Maravilha: a economia brasileira pode ter crescido 1,5% em 2012, um

    esplndido resultado, muito melhor que a expanso de 0,9% at agora

    registrada oficialmente. Alm disso, as contas pblicas esto em timas

    condies, embora algumas pessoas trabalhem, segundo o secretrio do

    Tesouro, Arno Augustin, para transformar fundamentos fortes e

    tranquilos em situaes de tenso. Maravilha, de novo! Estamos a um

    passo de ouvir algum ministro ou secretrio atribuir mau-olhado aos

    crticos da poltica econmica. Por que no? Quando tiverem, afinal, de

    reconhecer um fiasco, podero acusar algum crtico ou opositor de ter

    enterrado um sapo no subsolo do Ministrio da Fazenda. Isso ser quase

    to sofisticado quanto continuar atribuindo a inflao brasileira a choques

    de preos um efeito aparentemente despercebido em muitos outros

    pases em desenvolvimento. Mas, descontados os sapos e o olho maligno,

    vai tudo bem, segundo o governo, a comear pela evoluo do produto

    interno bruto, o Superpib.

    A presidente Dilma Rousseff adiantou a reviso para 1,5% em entrevista

    ao jornal espanhol El Pas. Revises so normais, disse ela, e ocorrem

    tambm nas contas dos Estados Unidos. verdade, mas parece ter havido

    uma confuso. Segundo a informao original, posta em circulao alguns

    dias antes dessa entrevista, a nova taxa de crescimento dever resultar de

    uma alterao no clculo, com a introduo de uma nova estimativa do

    setor de servios. No seria propriamente a correo de um erro

    estatstico, mas um aperfeioamento do sistema de dados. Mas isso

  • dever envolver uma reconstruo da srie e cedo para dizer, sem mais

    informaes, como ficar o conjunto.

    Os dados mais importantes, por enquanto, so outros: um crescimento de

    1,5% em 2012 continuar sendo menos que pfio, inferior ao de grandes

    pases em crise, como Estados Unidos (2,8%) e Japo (2%), e muito menor

    que a mdia dos emergentes e em desenvolvimento (4,9%). Atribuir esse

    desempenho crise internacional apenas uma forma de jogar sobre os

    outros a responsabilidade pelas prprias falhas, um discurso pouco

    melhor que o do mau-olhado e do sapo.

    Do lado da indstria, principal fonte de empregos decentes e, no passado,

    foco mais importante de modernizao tecnolgica, as perspectivas

    continuam ruins. O desempenho da economia vem de frustrao em

    frustrao, disse na quinta-feira o diretor de pesquisas e estudos

    econmicos da Federao das Indstrias do Estado de So Paulo (Fiesp),

    Paulo Francini. Em outubro, o indicador de nvel de atividade (INA) da

    indstria paulista foi 0,4% menor que em setembro, descontadas os

    fatores sazonais, e 0,2% inferior ao de um ano antes. Alm disso, o

    aumento do INA de agosto para setembro foi revisto de 1,3% para 0,2%. O

    avano acumulado em 12 meses ficou em 2,2%. Mesmo a expanso de

    2,5% estimada para o ano ficar longe de compensar meramente zerar

    a queda de 4,1% em 2012.

    No se sustenta uma grande economia em desenvolvimento com uma

    indstria estagnada e um volume ridculo de investimentos

    Do lado da oferta, o PIB brasileiro continuar puxado pela agropecuria e

    pelo setor de servios. Do lado da demanda, o governo tem apostado na

    expanso do investimento. Se isso for confirmado, ser um mero efeito

    estatstico, j que o total investido diminuiu no ano passado. Na melhor

  • hiptese, o investimento medido pela formao bruta de capital fixo

    (recursos aplicados em mquinas, equipamentos, infraestrutura e outras

    instalaes) ficar de novo na vizinhana de 19% do PIB. De fato, os

    componentes mais dinmicos da demanda continuaro sendo o consumo

    privado, apesar de algum arrefecimento, e os gastos de governo,

    basicamente de custeio.

    No se sustenta uma grande economia em desenvolvimento com uma

    indstria estagnada e um volume ridculo de investimentos. Do lado

    privado, a disposio para investir depende principalmente da confiana

    na poltica e da expectativa de crescimento. As empresas j investiram

    com muito mais dinamismo em pocas de juros bsicos mais altos, at

    porque as taxas cobradas pelo principal financiador, o Banco Nacional do

    Desenvolvimento Econmico e Social (BNDES), sempre foram subsidiadas.

    Os subsdios continuam, mas a poltica do BNDES perdeu o rumo e

    tambm isso tem travado o crescimento.

    Leiles bem-sucedidos no setor de infraestrutura podero resultar em

    mais investimentos. Mas o xito desses leiles tem sido turbinado pela

    promessa de subsdios por intermdio do BNDES ou da participao de

    estatais, como indicou o professor Srgio Lazzarini, do Insper, em

    excelente artigo no Estado de quinta-feira. O governo poderia usar de

    outra forma esses bilhes. Por que atrair capital privado com subsdios, se

    os negcios so lucrativos? Essa foi a grande pergunta deixada pelo artigo.

    Esse exemplo de mau planejamento e mau uso de recursos combina com

    o resultado das contas pblicas. O supervit primrio do governo central

    em outubro, R$ 5,4 bilhes, foi o mais baixo para o ms desde 2004. O

    acumulado em dez meses, R$ 33,4 bilhes, chegou a apenas 45,7% da a

    meta de R$ 73 bilhes, j inferior inicial. Segundo o secretrio do

  • Tesouro, o governo central conseguir nos dois meses finais os R$ 39,6

    bilhes necessrios para fechar a conta. Se conseguir, ser graas a

    receitas extraordinrias, como as prestaes do Refis, o programa de

    refinanciamento de impostos.

    O setor pblico total s acumulou R$ 51,2 bilhes de supervit primrio

    no ano, 46,1% do prometido para 2013. Em outubro, a contribuio de

    Estados, municpios e estatais foi de apenas R$ 932 milhes. Mas isso

    deixou de ser problema para o governo central, agora oficialmente

    comprometido s com o prprio resultado. Nem esse est garantido. Falta

    um captulo sobre mau-olhado nos manuais de finanas pblicas.

    Fonte: O Estado de S. Paulo, 30/11/2013

  • Mistura txica: inflao, estagnao e crise fiscal

    Postado por: Rolf Kuntz 09/12/2013 em Artigos, Economia de Mercado

    Ningum vai jogar a toalha. A inflao j estourou a meta, com 4,95% at

    novembro. A economia encolheu 0,5% no terceiro trimestre e cresceu

    apenas 2,3% em 12 meses. Mas a presidente Dilma Rousseff ainda poder

    falar em vitria se o ano terminar com alta de preos inferior a 5,84%,

    resultado final de 2012, e expanso do produto em torno de 2,5%. Nessa

    altura, poucos lembraro a maior parte dos micos de 2013, includa a

    entrevista ao jornal El Pas, quando ela anunciou a reviso do crescimento

    do ano passado para 1,5%. Houve reviso, sim, mas de 0,9% para 1%,

    como informou nesta semana o Instituto Brasileiro de Geografia e

    Estatstica (IBGE). Talvez numa prxima correo aparea a taxa de 1,5%,

    mas quem se importar, alm da presidente?

    Em qualquer pas governado por gente comum, a mistura de crescimento

    econmico em torno de 2,5% com inflao acima de 5% seria considerada

    um desastre. Neste Brasil de governantes incomuns, as autoridades

    torcem por esse resultado. Que mais poderiam ambicionar, neste

    momento? Alm disso, cantam vantagem, apontando pases com

    crescimento menor, mas, curiosamente, em posio bem melhor na

    escala de risco de crdito. Agncias de classificao cometeram erros

    notveis nos ltimos 20 anos, mas seus critrios, de modo geral, fazem

    sentido e suas avaliaes so levadas a srio no setor financeiro.

    No mercado, todo mundo sabe do risco de rebaixamento da nota do

    Brasil. O ministro da Fazenda at j se mostrou preocupado com essa

    possibilidade. Mas nem por isso decidiu cuidar seriamente das contas

    pblicas, admitir os problemas e pr de lado a contabilidade criativa e a

    poltica de remendos fiscais. H poucos dias o ministro desistiu de mais

  • uma operao para maquiar as contas federais uma jogada com

    participao da Caixa e da Eletrobrs. Mas s mudou de ideia quando uma

    reportagem do Valor escancarou a manobra e toda a imprensa foi atrs da

    histria. A armao de um lance desse tipo havia sido mencionada algum

    tempo antes na cobertura do Estado.

    O desarranjo das contas pblicas tem sido apontado como um dos

    principais fatores da inflao

    Segundo o plano, a Caixa financiaria, com garantia do Tesouro,

    pagamentos devidos por subsidirias do setor de energia a um fundo

    setorial. Isso pouparia ao Tesouro uma transferncia de R$ 2,6 bilhes.

    Assim ficaria um pouco mais fcil obter o supervit primrio de R$ 73

    bilhes prometido pelo ministro. Se o governo alcanar esse resultado,

    ser principalmente graas a manobras e a receitas extraordinrias, como

    os bnus de concesses de infraestrutura e as parcelas do programa de

    refinanciamento de dvidas tributrias, o Refis. Este programa dever

    render uns R$ 20 bilhes. S a Vale dever entrar com uns R$ 6 bilhes

    nessa coleta. E s o bnus do leilo do campo de Libra, no pr-sal, dever

    proporcionar R$ 15 bilhes. A soma desses valores garantir quase

    metade do resultado primrio fixado para o governo central.

    O desarranjo das contas pblicas tem sido apontado como um dos

    principais fatores da inflao. A alta de preos est obviamente vinculada

    ao descompasso entre a demanda e a oferta interna, reconhecido por boa

    parte dos analistas e de novo mencionado na ata da ltima reunio do

    Comit de Poltica Monetria do Banco Central (Copom/BC). O presidente

    do BC, Alexandre Tombini, citou num discurso, nesta semana, o recuo das

    taxas acumuladas de inflao, mas necessrio muito otimismo para

    festejar os nmeros conhecidos.

  • A inflao oficial, medida pelo ndice de Preos ao Consumidor Amplo

    (IPCA), chegou a 4,95% no ano e a 5,77% em 12 meses. A variao mensal

    ficou em 0,54%, ligeiramente abaixo da observada em outubro (0,57%).

    Cinco dos nove grupos de despesas encareceram mais que no ms

    anterior. O ndice de difuso parcela de itens com aumento de preos

    passou de 67,7% em outubro para 68,2%, confirmando, mais uma vez, a

    ampla disseminao das presses inflacionrias. No h como sustentar

    nem havia antes a tese oficial de uma inflao derivada da alta dos

    alimentos ou da valorizao internacional das commodities. O custo da

    alimentao tem subido menos, assim como os preos das matrias-

    primas, como confirma a Fundao Getlio Vargas (FGV). Entre outubro e

    novembro a alta dos preos no atacado passou de 0,71% para 0,12%,

    enquanto a dos preos ao consumidor acelerou de 0,55% para 0,68%.

    Inflao alta e contas pblicas em baixa combinam de forma desastrosa

    com a indstria emperrada

    Nem um resultado final abaixo dos 5,84% do ano passado est garantido,

    porque o IPCA de dezembro vai registrar os aumentos de preos de

    combustveis, cigarros, eletricidade, gua e esgoto, como observou o

    economista Fernando Parmagnani, da consultoria Rosenberg &

    Associados. Alm disso, um ligeiro recuo da inflao neste ano por

    enquanto, s uma hiptese de nenhum modo garante uma nova

    reduo do acumulado em 2014, advertiu Salomo Quadros, da FGV.

    Houve coisas atpicas neste ano, disse ele, lembrando a interferncia

    poltica nos preos administrados.

    Inflao alta e contas pblicas em baixa combinam de forma desastrosa

    com a indstria emperrada. A produo industrial cresceu 0,6% de

  • setembro para outubro uma bela notcia, depois do fiasco do terceiro

    trimestre. Mas a comemorao pode ter sido exagerada.

    bom examinar as mdias mveis trimestrais de dois anos. Como a

    indstria foi mal em 2011, a evoluo em 24 meses ficou abaixo de pfia.

    Nos trs meses terminados em