terceirizacao no setor florestal

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Engenharia Florestal

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  • TERCEIRIZAO NA COLHEITA FLORESTAL BRASILEIRA

    OUTSOURCING IN BRAZILIAN FOREST HARVEST

    ngelo Mrcio Pinto Leite1 Amaury Paulo de Souza2

    Carlos Cardoso Machado3 Luciano Jos Minetti4

    RESUMO: Constituindo uma estratgia de negcio amplamente utilizada em todo o mundo graas sua grande aceitao nos meios empresariais, a terceirizao vem sendo bastante adotada tambm pelas empresas brasileiras, particularmente as do setor florestal. Nesse sentido, o presente artigo apresenta uma viso geral da situao da terceirizao no setor florestal brasileiro, especificamente nas atividades colheita e transporte de madeira proveniente de florestas plantadas (reflorestamentos). Palavras-chave: setor florestal, processo de terceirizao e colheita de madeira. ABSTRACT: As a business strategy broadly used worldwide thanks to its great acceptance in the enterprise world, the outsourcing has been adopted by Brazilian companies, especially in the forest sector. In this way, the present paper shows a general view of the outsourcing situation in the Brazilian forest sector, especially in the harvesting and wood transportation coming from planted forests (reforesting). Key words: forest sector, outsourcing process and wood harvest.

    INTRODUO

    O Brasil considerado um pas florestal, visto possuir a maior floresta tropical

    do mundo, com aproximadamente um tero do total (30%). O Pas se destaca

    tambm no cenrio mundial pela quantidade de florestas plantadas com eucalipto,

    ocupando a primeira posio em reas reflorestadas (GUERRA, 1995).

    Uma anlise global dos reflorestamentos no Brasil indica que o setor teve

    grande crescimento a partir da implementao da poltica de incentivos fiscais

    deduzidos do imposto de renda, adotada pelo governo federal atravs da Lei no

    5.106, de 02.09.1965. Outro fator mais recente que tambm contribuiu bastante para

    1 Prof. Assistente III da FENF-UFMT, Cuiab-Brasil; E-mail: [email protected]; 2 Prof. Titular da UFV, Viosa-Brasil; E-mail: [email protected] 3 Prof. Titular da UFV, Viosa-Brasil; E-mail: [email protected] 4 Pesquisador Titular da UFV, Viosa-Brasil; E-mail: [email protected]

  • 2

    o aumento da rea reflorestada no Pas foi a implementao de programas de

    fomento florestal, particularmente pelas empresas consumidoras de madeira.

    Assim, com o surgimento de diversas empresas reflorestadoras nas diferentes

    regies do Brasil, predominantemente no Cerrado, o Pas passou a dispor de cerca

    de 6,0 milhes de hectares de terras ocupadas por florestas plantadas (HOEFLICH e

    SCHAITZA, 1998). Atualmente, estima-se que a rea reflorestada no Brasil da

    ordem de 130.000 ha/ano, sendo grande parte deste montante (100.000 ha)

    destinado ao setor de papel e celulose (BACHA, 1999), cuja indstria teve, nos

    ltimos 20 anos, grande crescimento, principalmente em virtude de 3 fatores: altas

    inverses de capital, aumento da capacidade de produo pela instalao de novas

    fbricas e atualizao tecnolgica do setor (GUERRA, 1995). A grande maioria

    dessas indstrias concentra-se nas Regies Sul e Sudeste do Pas.

    De acordo com DONNELLE e SUCHEK (1996), a quase totalidade da rea

    ocupada por espcies florestais plantadas no Brasil constituda por quatro gneros:

    eucaliptos (60%), pinos (35%), araucria e accia (5%). Embora grande parte da

    madeira proveniente desses reflorestamentos seja destinada produo de

    celulose, utiliza-se, tambm, essa madeira para energia (lenha e carvo vegetal),

    peas serradas para mveis e construes, painis de madeira, dentre outros usos.

    Vale mencionar que, atualmente, o Brasil detm a melhor tecnologia de

    implantao, conduo e colheita de florestas de eucalipto, destacando-se ainda, no

    cenrio mundial, na produo de celulose de fibra curta em que, segundo NEVES

    (1998), o Pas ocupa o 7 lugar e a 11 posio na produo de papel.

    Portanto, a atividade florestal de grande interesse econmico para o Brasil,

    participando com aproximadamente 2,2% na formao do produto interno bruto

    (PIB) e com 6,6% do valor total das exportaes (16,5 bilhes de dlares), alm da

    gerao de cerca de 1.200.000 postos de trabalho diretos e indiretos no seu

    processo produtivo (DASSIE, 1996).

    O PROCESSO DE TERCEIRIZAO

    Segundo BRASIL (1993), a terceirizao corresponde a um processo de

    transferncia, dentro da firma (empresa-origem), de funes que podem ser

    executadas por outras empresas (empresa-destino). Essas funes incluem tanto as

    atividades de apoio como aquelas relacionadas diretamente com o processo de

  • 3

    produo. De acordo com CAPPO (1996), "terceirizar" a tendncia de transferir

    para externos (terceiros) atividades que no fazem parte do negcio principal da

    empresa.

    Para GIOSA (1999), a terceirizao um processo de gesto pelo qual se

    transferem algumas atividades no-chaves a profissionais externos - com os quais

    se estabelece uma relao de cooperao -, ficando a empresa concentrada

    somente nas tarefas essencialmente ligadas ao seu negcio principal (core business

    process).

    Vale salientar que o termo "terceirizao", do ingls outsourcing (out =

    externo, fora; e source = fonte, lugar de origem, ou seja, compra de produtos e

    servios externos), originou-se nos Estados Unidos, no incio da II Guerra Mundial, e

    se consolidou depois de seu trmino, por volta da dcada de 50. Nessa poca, a

    tcnica administrativa de terceirizao foi desenvolvida e adotada com xito,

    primeiramente pelas indstrias automobilsticas americanas e, depois, pelos

    japoneses e europeus.

    No Brasil, o processo de terceirizao foi introduzido somente no final da

    dcada de 80 e incio da de 90 (perodo correspondente abertura do mercado)

    pelas multinacionais de automveis, que, buscando agilidade, transformar-se-iam

    em meras fbricas de montagem intencionalmente dependentes da produo de

    peas para entregar a outras diversas empresas. Cabe ressaltar, entretanto, que o

    termo "terceirizao" foi utilizado pela primeira vez no Brasil, em meados da dcada

    de 80, pelo Engenheiro Aldo Sani da Riocell S.A., empresa do setor de papel e

    celulose localizada no Municpio de Guaba, RS (LEIRIA, 1995).

    Deve-se salientar ainda que, apesar de o termo ter surgido somente em

    meados da dcada de 80, as empresas brasileiras j trabalhavam com

    subcontratao, h bastante tempo, na forma de prestadores de servios, parceria,

    consultores etc. Portanto, a prestao de servios no setor florestal vem desde a

    dcada de 60, com o incio das atividades de reflorestamento no Brasil,

    principalmente na forma de contratos de obras e servios. A partir de 1976, iniciou-

    se a transferncia da atividade de transporte da madeira para prestadores de

    servios (caminhoneiros autnomos e, ou, empresas transportadoras) e, no incio

    dos anos 80, o processo ganha fora em outros setores, como transporte de

    empregados, manuteno de mquinas, servios de limpeza e de alimentao etc.

  • 4

    No obstante, a prpria Riocell S.A., que iniciou o seu processo nos setores

    de alimentao, limpeza, transporte, segurana e manuteno de edifcios no ano de

    1987, tem atualmente quase todas as atividades de silvicultura e colheita de madeira

    terceirizadas; at mesmo o setor de recursos humanos foi entregue aos prestadores

    de servios.

    Finalmente, cabe mencionar que, nos ltimos anos, quase todas as empresas

    do setor florestal brasileiro j adotaram, ou esto adotando, a terceirizao em suas

    atividades, embora no se conheam ainda, com preciso, a percentagem de

    adeptos desse processo, o nmero exato de empresas prestadoras de servios, a

    percentagem de mo-de-obra prpria e vinculada aos prestadores de servio, o

    perfil desses trabalhadores etc.

    METODOLOGIA

    Os dados desta investigao foram obtidos por intermdio do envio de

    questionrios aos responsveis de uma srie de empresas florestais conhecidas, via

    correios eletrnico e convencional. Ademais, foram analisados documentos cedidos

    pelas empresas selecionadas.

    O universo da amostra foi constitudo por 15 grandes empresas de

    reflorestamento dos locais de maior predomnio deste tipo de atividade, englobando

    as Regies Sul, Sudeste e Nordeste do Brasil, cuja rea plantada das empresas

    correspondeu a 924.260 hectares (aproximadamente 20% do total existente no

    Pas). A atividade analisada foi a colheita de madeira que corresponde a um

    conjunto de operaes efetuadas num macio florestal, com os objetivos de preparar

    e transportar a madeira at o lugar de sua utilizao, usando-se tcnicas e padres

    estabelecidos, para transform-la em produto final. Segundo CONWAY (1976), um

    sistema de colheita definido como o conjunto de operaes que podem ser

    realizadas num nico lugar, ou em lugares distintos, e que devem estar

    perfeitamente integradas e organizadas entre si, a fim de permitir um fluxo contnuo

    de madeira, evitando, dessa forma, pontos de estrangulamento para levar os

    equipamentos sua mxima utilizao.

    A amostra utilizada foi a no-aleatria ou emprica, em sua modalidade de

    amostragem intencional, opinativa e estratgia no-probabilstica. O questionrio

    utilizado foi constitudo de 25 perguntas fechadas e abertas, com a ressalva de que

  • 5

    nem todas as questes foram utilizadas neste artigo. O perodo de coleta de dados

    variou de maro a agosto de 2000.

    A maior parte das empresas avaliadas era pertencente ao segmento de papel

    e celulose, que se caracteriza por uma indstria pesada e com tecnologia bastante

    avanada, j que o setor se aperfeioa com muita rapidez, devido s crescentes

    exigncias comerciais e, sobretudo, de proteo do meio ambiente.

    RESULTADOS E DISCUSSO

    Para facilitar a compreenso, os resultados foram apresentados segundo a

    posio dos dois principais atores envolvidos no processo, conforme descrio a

    seguir.

    1) Empresa contratante

    Segundo a opinio deste ator, as principais razes para a adoo da

    terceirizao, em ordem decrescente de importncia, foram: 1) reduo dos custos

    fixos; 2) reduo dos custos com mo-de-obra e encargos sociais; 3) maiores

    flexibilidade e agilidade; 4) melhor qualidade; 5) foco no negcio principal; e 6)

    reduo da fora dos sindicatos.

    Verifica-se, portanto, que o foco no negcio principal, que apontado na

    literatura como o principal fator de deciso para a adoo da terceirizao, ficou

    apenas na quinta posio. No entanto, pode-se constatar que o fator reduo de

    custos ainda continua sendo a principal razo para a adoo da terceirizao na

    colheita florestal brasileira.

    Com relao aos principais problemas enfrentados pelas empresas florestais

    contratantes aps a implantao do processo de terceirizao, foram citados, em

    ordem decrescente de importncia, os seguintes aspectos: 1) situao financeira e

    capacidade de inverso de capital dos prestadores de servios; 2) cumprimento das

    exigncias contratuais e das metas de produo; 3) problemas burocrticos e

    operacionais; 4) fiscalizao e controle das operaes; 5) riscos de aes judiciais; e

    6) carncia de prestadores de servios especializados para execuo das diferentes

    operaes da colheita florestal.

    Quanto ao percentual de adoo da terceirizao nas atividades de colheita e

    transporte da madeira, os resultados obtidos em cada fase do processo so

    apresentados na Figura 1.

  • 6

    66 63,369,3

    100

    56,3

    71

    0

    20

    40

    60

    80

    100

    %

    CORTE

    EXTRAO CARREGAMENTOTRANSPORTE DESCARREGAMENTO MDIA

    Figura 1 - Percentual de adoo da terceirizao nas diferentes fases da colheita

    florestal, em 2000. Verifica-se, por intermdio dessa figura, que a percentagem mdia de adoo

    da terceirizao na atividade colheita de madeira proveniente dos reflorestamentos

    foi de aproximadamente 71%. Observa-se ainda nessa figura, que o menor

    percentual correspondeu ao descarregamento da madeira. A justificativa para isso

    se deve ao fato de esta operao ser realizada, na maioria das vezes, dentro do

    ptio das indstrias que dispem de equipamentos prprios para sua execuo.

    Entretanto, a atividade de transporte da madeira est praticamente 100%

    terceirizada em razo, principalmente, da grande facilidade de contratao de fretes

    a preos competitivos no Brasil. Ademais, as empresas florestais no necessitam

    manter uma grande infra-estrutura de oficina e de pessoal especializado para

    manuteno de uma frota prpria de caminhes.

    2) Prestador de servios (terceiro)

    Quanto forma de relao de trabalho ou vnculo do terceiro com a empresa

    contratante, das 15 empresas consideradas neste estudo se encontraram: 8

    empresas pertencentes a ex-empregados e 7 vinculadas a outros profissionais de

    empresas diversas. Esse fato indica a falta de preocupao das empresas

  • 7

    contratantes (usurias) quanto ao risco de possveis aes judiciais por parte dos

    ex-empregados donos de empresas prestadoras de servios, que podem alegar

    algum tipo de vnculo trabalhista nesse tipo de relao.

    Com relao s reclamaes mais comuns por parte das empresas

    contratantes, no quadro 1 so apresentados os resultados obtidos de acordo com a

    opinio dos prestadores de servios.

    Quadro 1 - Principais tipos de reclamaes das empresas contratantes, segundo a

    opinio dos prestadores de servio

    POSIO RESPOSTA CASOS CITADOS1 Qualidade dos servios 11 2 Segurana dos empregados 3 3 No houve reclamaes 2 4 Falta de cumprimento da meta de produo e

    problemas operacionais diversos 1

    Verifica-se, por intermdio do quadro 1, que a qualidade dos servios foi

    apontada pelos terceiros como o principal tipo de reclamao por parte das

    empresas contratantes, seguido da segurana dos empregados. A grande

    preocupao com a qualidade por parte das empresas florestais contratantes

    evidencia que essas empresas esto procurando se manter no mercado, atravs de

    um diferencial para seus produtos.

    Quanto s principais dificuldades para se trabalhar como prestador de

    servios, apresenta-se no quadro 2 os resultados obtidos segundo a opinio dos

    prprios terceiros.

    Quadro 2 - Principais dificuldades enfrentadas pelos prestadores de servios na execuo de suas atividades

    POSIO RESPOSTA CASOS CITADOS

    1 Custos dos equipamentos 5 2 Mo-de-obra no-qualificada 3 3 Falta de financiamentos, baixos preos pagos pelos

    servios, carncia de credibilidade nos terceiros, deslealdade na concorrncia pelos servios (poltica do menor preo) e problemas operacionais diversos

    2

  • 8

    4 Altas inverses de capital para atuar no negcio e problemas com os sindicatos (aes dos trabalhadores na justia)

    1

    Verifica-se ainda, no quadro 2 que, conforme a opinio dos terceiros, so

    muitas as dificuldades para se trabalhar como prestador de servios na colheita

    florestal, destacando-se o custo dos equipamentos e a mo-de-obra no-qualificada.

    Cabe salientar que a colheita florestal uma atividade que envolve muitas mquinas

    e equipamentos pesados, cuja maioria das peas so importadas e apresentam em

    decorrncia disso, preos de mercado elevados.

    CONCLUSES

    Com base nos resultados obtidos neste estudo, pde-se verificar que a

    terceirizao est sendo amplamente utilizada nas atividades de colheita e

    transporte da madeira proveniente de reflorestamento e, portanto, tem-se tornado

    um processo irreversvel. Tambm, fato notrio que a terceirizao tem

    proporcionado vrios resultados positivos para as empresas contratantes, como a

    reduo de custos fixos com mo-de-obra e encargos, maiores agilidade e

    flexibilidade no processo produtivo etc., embora o sistema necessite de

    acompanhamento e controle constantes por parte das referidas empresas.

    Os prestadores de servios no entanto, tm encontrado muitas dificuldades

    para trabalhar na colheita florestal, principalmente em decorrncia do alto custo das

    mquinas e equipamentos utilizados na atividade, bem como do baixo nvel de

    qualificao do trabalhador florestal brasileiro.

    Portanto, a adoo da terceirizao por parte das empresas florestais

    brasileiras deve ser muito bem analisada, dada a alta complexidade do processo,

    que tende a proporcionar profundas mudanas nas partes envolvidas. Nesse

    sentido, alm dos aspectos jurdicos e legais, os aspectos ambientais e,

    principalmente, sociais devem ser levados em considerao na implementao do

    processo de terceirizao.

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

    BACHA, C.J.C. O sistema agroindustrial da madeira. Preos Agrcolas, n.155, p.3-18, 1999.

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    BRASIL, H.G. A empresa e a estratgia da terceirizao. Revista de Administrao de Empresas, v.33, n.2, p.6-11, 1993. CAPPO, P. Sucesso da terceirizao depende do correto planejamento. O Papel, n.6, jun., p.38-42, 1996. CONWAY, S. Logging practices; principles of timber harvesting systems. San Francisco, Miller Freeman, 1976. 416 p. DASSIE, C. Silvicultura no caminho do desenvolvimento sustentvel. Celulose & Papel, n.54, p.20-24, 1996. DONNELLE, R.; SUCHEK, V. Oportunidades de expanso para o setor madeireiro. Revista madeira, v.6, n.32, p.4-6, 1996. GIOSA, L.A. Terceirizao - uma abordagem estratgica. 5. ed. So Paulo: Pioneira, 1999. 144 p. GUERRA, C. Meio ambiente e trabalho no mundo do eucalipto. 2. ed. Belo Horizonte: Agncia Terra, 1995. 143 p. HOEFLICH, V.A.; SCHAITZA, E.G. Overview of brazilian forests and forest industry, 1998. 16 p. LEIRIA, J.S.; SARATT, N. Terceirizao uma alternativa de flexibilidade empresarial. So Paulo: Gente, 1995. NEVES, M.R. Tendncias dos mercados domstico e internacional para produtos de base florestal. In: SENINRIO DE ATUALIZAAO EN SISTEMAS DE COLHEITA DE MADEIRA E TRANSPORTE FLORESTAL, Curitiba, 1998. Anais... Curitiba: FUPEF/UFPr, 1998. p.21-62.