tendências e desafios educaçâo especial

Upload: washington-soares

Post on 01-Jun-2018

287 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    1/266

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    2/266

    Presidente da RepblicaItamar Augusto Cautiero

    Ministro da EducaoMurlio de Avellar Hing

    Secretrio ExecutivoAntnio Jos Barbosa

    Secretria de EducaoMarilene Ribeiro dos Sc

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    3/266

    MINISTRIO DA EDUCAO E DO DESPORTOSECRETARIA DE EDUCAO ESPECIAL - SEESP

    Tendncias e Desafiosda Educao Especial

    SRIEATUALIDADES PEDAGGICAS

    1

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    4/266

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    5/266

    APRESENTAO

    O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais - INEP, na revistaEm aberto, publicou, em novembro de 1994, uma edio dedicada ao tema

    "EDUCAO ESPECIAL - A REALIDADE BRASILEIRA", cuja organiza-o foi realizada pela Professora Eunice M. L. Soriano de Alencar, do Departamentode Psicologia Escolar e do Desenvolvimento da Universidade de Braslia.

    A Secretaria de Educao Especial do Ministrio da Educao e do Desportoentende a necessidade de utilizar os avanos cientficos e tcnicos aqui descritospara desenvolver, responsvel e criativamente, prticas pedaggicas pertinentestanto para a formao, atualizao e aperfeioamento docente, como para o usode materiais adequados. Por esse motivo solicitou a anuncia do INEP para reeditara matria sob a forma de livro.

    Espera-se que este material possa contribuir para a melhoria da qualidade

    da Educao Especial.

    MARILENE RIBEIRO DOS SANTOSSecretria de Educao Especial

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    6/266

    SUMRIO

    Parte I - Qual a Questo? 7

    Um Retrato da Educao Especial no Brasil 7

    - Eunice M. L. Soriano de Alencar

    Parte II - Pontos de Vista: O que Pensam os Especialistas 15

    Autismo: Uma Histria de Conquistas 15- Ana Maria Bereohff

    A Educao do Deficiente Auditivo no Brasil 35- Jos Geraldo Silveira Bueno

    Deficincia Mental: 0 que as Pesquisas Brasileiras tm Revelado 50- Leila Regina d'01iveira de Paula Nunes e Jlio Romero Ferreira

    A Educao do Portador de Deficincia Visual (D. V.) -As Perspectivas do Vidente e do No- Vidente 82- Elcie Fortes Salzano Masini

    Perspectivas e Desafios da Educao do Superdotado 104- Eunice M. L. Soriano de Alencar

    Parte III - Poltica Educacional 125

    A Poltica de Educao Especial no Brasil 125- Rosita Edler de Carvalho

    Parte IV - Relatos de Experincias e Pesquisas 138

    Autismo: Uma Experincia na rea Educacional 138- Deusina Lopes da Cruz

    Classes para Atendimento Especial do Aluno Portadorde Deficincia Auditiva 144- Maria da Piedade Resende da Costa

    Ncleos Cooperativos: Uma Perspectiva Profissional parao Portador de Deficincia 149- Maria Helena Alcntara de Oliveira

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    7/266

    Interao: Condio Bsica para o Trabalho do Profissionalcom o Portador de Deficincia Visual 153- Maria Lcia T. M. Amiralian

    Efeitos da Aprendizagem de Habilidades deAutocontrole em Crianas Hiperativas 160

    - Francisco de Paula Nunes SobrinhoModelo Integrativa para o Tratamento de PacientesPortadores de Deficincia Mental e Distrbio de Comportamento 164- J. R. Facion

    Coreogrqfando o Cotidiano:A Expresso Corporal do Deficiente Visual 168- Mari Gndara

    Em Busca de Novos Recursos para Ajudar oDesenvolvimento Cognitivo de Crianas Surdas 172- La da Cruz Fagundes

    Pesquisa e Desenvolvimento de Novos Recursos Tecnolgicospara a Educao Especial: Boas Novas para Pesquisadores,Clnicos, Professores, Pais e Alunos 196- Fernando Csar Capovilla

    Parte V - Centros Brasileiros de Atendimento emEducao Especial 212

    Estao Especial da Lapa. Centro de Convivncia eDesenvolvimento Humano 212- Eliana Maria Ormelezi

    Fundao Catarinense de Educao Especial:Uma Instituio Pioneira 215- Rosemari das Graas Kern

    INDEPED - Um instituto Brasileiro sobre Deficincias:Um Ano de Atividades Internacionais 218- Francisco Silva Cavalcante Jnior, Marsha J.

    Clark e Gergia M. Kerns

    Instituto Benjamin Constant: A Educao de Cegos uma Realidade 224- Luzimar Alvino Sombra

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    8/266

    INS - Uma Trajetria em Prol da Educao de Surdos 229- Marilene de Almeida Monteiro Nogueira e Suely Soares da Fonseca

    Escola Integradora: Uma Alternativa para a Integrao Escolardo Aluno Portador de Necessidades Educativas Especiais 234- Erenice Nathlia Soares de Carvalho

    Parte VI - Programas Brasileiros de Ps-Graduao emEducao Especial 238

    Formao de Recursos Humanos de Alto Nivel em Educao Especial 238- Deisy das Graas de Souza e Nivaldo Nale

    O Curso de Mestrado em Educao da UERJ: Caracterizao do EixoTemtico de Educao Especial 246- Rosana Glat

    Parte VII - Peridico da rea 251

    Revista Brasileira de Educao Especial 251- Jlio Romero Ferreira e Ftima C. Denari

    Parte VIII - Resenhas 252

    - E. C. Gauderer. Autismo e outros atrasos do desenvolvimento resenhadopor Mnica Souza Neves Pereira 252

    - M. H. Windholz. Passo a passo seu caminho. Guia curricular para o ensinode habilidades bsicas - resenhado por Enicia Gonalves Mendes 256

    - M. L. T. M. Amiralian. Psicologia do excepcional - resenhado por AngelaM. Rodrigues Virgolim 258

    - M. J. S. Mazzota. Trabalho docente e formao de professores deeducao especial - resenhado por Maria Luiza Mendona Arajo 261

    - L. Pessotti. Deficincia mental: da superao cincia - resenhado porHelosa Helena Ferreira da Rosa 263

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    9/266

    TENDNCIAS E DESAFIOS DA EDUCAO ESPECIAL

    UM RETRATO DA EDUCAO ESPECIAL NO BRASIL

    Eunice M.L.Soriano de Alencar

    A presente coletnea de textos oferece uma viso global da Educao Especialno pas, com suas tendncias, problemas, desafios e perspectivas. Oferece tambmcontribuies tcnicas relativas educao de portadores de necessidades especiaisnas reas do autismo, deficincias diversas e superdotao. Constitui-se em umtrabalho de suma importncia para consulta por parte daqueles que detm o poder

    de deciso poltica sobre a rea. Constitui-se tambm em uma indispensvel fontede consulta tcnica para professores e especialistas que lidam com a EducaoEspecial.

    Esta coletnea rene artigos, onde so discutidas questes relativas conceituao, propostas educacionais, profissionalizao, formao de professores,polticas e legislao, entre outros aspectos. Para sua preparao, foram convidadosprofissionais selecionados entre os principais especialistas brasileiros em suasrespectivas reas. A coletnea inclui tambm relatos de experincias bem-sucedidase pesquisas realizadas por educadores e estudiosos de distintas instituies pblicase privadas, apresentando, alm disso, uma descrio das propostas desenvolvidasem instituies localizadas em distintas regies do Brasil, que tm como objetivo

    atender ao aluno com necessidades especiais. Fazem parte ainda desta coletnea orelato de coordenadores dos dois programas de ps-graduao na rea, onde soapresentadas a estrutura curricular e linhas de pesquisa levadas a efeito em suasinstituies, com vistas formao de pessoal de alto nvel para as atividades depesquisa e magistrio de nvel superior. Completando este quadro, incluiu-se umtexto sobre a poltica de Educao Especial no Brasil, uma nota sobre a RevistaBrasileira de Educao Especial e resenhas de alguns livros de interesse para osque atuam na rea.

    * Professora Titular do Departamento de Psicologia Escolar e do Desenvolvimento da Universidadede Brasilia.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    10/266

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    11/266

    TENDNCIAS E DESAFIOS DA EDUCAO ESPECIAL

    Masini no artigo "A educao do portador de deficincia visual (D.V.) asperspectivas do vidente e do no-vidente".

    O problema especialmente grave, uma vez que, tanto no caso do deficiente

    visual como do deficiente auditivo, nveis altamente satisfatrios de escolarizao,incluindo mesmo ensino superior, poderiam ser alcanados, caso houvesse umatendimento pedaggico especializado e processos escolares de boa qualidade. Oenorme desperdcio de talento e de potencial humano devido baixa qualidadedeve ser objeto de ateno.

    No caso do superdotado, este problema tambm alcana proporesalarmantes, uma vez que o ensino no pas est voltado para o aluno mdio e abaixoda mdia, deixando-se de lado os alunos mais capazes. Estes so, muitas vezes,hostilizados por professores mal preparados, que se sentem ameaados diante doaluno que se destaca por um potencial superior.

    Precria formao do corpo docente

    A precarssima formao dos professores que atuam na Educao Especialfoi aspecto discutido por todos os autores. Ana Maria Bereohff, no seu artigo"Autismo: uma histria de conquistas", lembra, por exemplo, que embora sejaimportantssimo o papel do professor, sendo a qualidade da relao professor-aluno o cerne de todo o atendimento da qual depende a chance de se retirar oautista do isolamento que o caracteriza, no existe no Brasil sequer um curso de

    formao especfica para professores de autistas. Conhecimentos slidos dePsicologia e Educao que viessem a orientar o professor na forma de atuar juntoa esta clientela que apresenta distrbios graves de comportamentos soimprescindveis. Entretanto, so raros os professores que dispem de taisconhecimentos.

    A inexistncia de quadros docentes bem preparados foi tambm discutidapor Jos Geraldo Silveira Bueno que lembra, por exemplo que, em 1987, dos2.226 professores de deficientes auditivos em todo o pas, 1.749, ou seja, 78,5%,no atendiam exigncia de formao de nvel superior estabelecida pelo Parecern 7/71 do Conselho Federal de Educao. O mesmo problema ocorre no ensino dodeficiente visual onde se observa tambm uma enorme heterogeneidade quanto ao

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    12/266

    Qual a Questo?

    nvel de formao de professores, com um nmero significativo de docentes quenunca receberam qualquer formao especfica. Este aspecto amplamentedocumentado no artigo de Elcie Salzano Masini, sobre a deficincia visual.

    Alm de precria formao do corpo docente, que apresenta em sua maiorianveis baixos de escolaridade, um aspecto que tambm foi apontado diz respeito baixa qualidade dos cursos universitrios de formao do educador especial. Umaanlise feita, por exemplo, por Enumo, em 1985 e por Mazzotta, em 1993, ediscutida por Leila Regina de Paula Nunes e Jlio Romero Ferreira, no seu artigosobre a deficincia mental, aponta para um quadro pouco animador, que incluicursos noturnos, reduzida ateno ao aspecto prtico da formao e carga horriaem disciplinas especficas muito aqum do desejvel.

    O descaso na qualificao do docente acompanhado de ausncia de recursosnecessrios complementao educacional do deficiente e de uma equipe deprofissionais que propicie acompanhamento psicolgico e pedaggico especializado.

    Tambm no que diz respeito ao superdotado, o importantssimo papel doprofessor, tanto para a identificao e reconhecimento do potencial superior comopara a proviso de condies favorveis ao desenvolvimento das potencialidades,requer que o mesmo receba uma preparao especializada, o que no vem ocorrendoem nosso pas. Esta preparao indispensvel, uma vez que as pesquisas indicamque professores mal qualificados tendem a se mostrar desinteressados e mesmohostis com relao ao aluno que apresenta habilidades superiores. O problema seagrava, uma vez que h muita resistncia a qualquer proposta de atendimentoespecial ao superdotado, sendo comuns atitudes ambivalentes com relao quelesque se destacam por um potencial superior, que ora so sujeitos de admirao e

    ora de hostilidade.Outros problemas graves que afligem a Educao Especial dizem respeito

    ao carter assistencialista que predomina nas propostas levadas a efeito, aspectoeste discutido tanto por Jos Geraldo Silveira Bueno como por Leila Regina dePaula Nunes e Jlio Romero Ferreira.

    Estes problemas refletem uma falta de compromisso por parte das autoridadespblicas brasileiras em investir seriamente em educao, destinando aos rgoscompetentes recursos condizentes com suas necessidades e exigindo aimplementao na prtica do que previsto na lei. Esta condio sitie qua nonpara se suprimir tanto a prtica, muitas vezes sutil, de se eliminar os deficientes doambiente escolar como a marginalizao presente nas classes e escolas especiais.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    13/266

    TENDNCIAS E DESAFIOS DA EDUCAO ESPECIAL

    Progressos e experincias inovadoras

    Ao compor um retrato da Educao Especial em nosso pas, no podemos,entretanto, nos restringir apenas aos problemas existentes. tambm oportunolembrar que progressos foram observados na rea nestes ltimos anos. Leila Reginade Paula Nunes e Jlio Romero Ferreira apontam, por exemplo, para os dispositivosda Constituio de 1988, ainda pendentes de regulamentao, que reforam agarantia da oferta obrigatria de vagas nas escolas pblicas. Lembram ainda estesautores que, no novo projeto de lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional, japrovado pela Cmara e em tramitao no Senado, h vrios pontos relevantespara a Educao Especial.

    Tambm Ana Maria Bereohff, em seu artigo sobre o autismo, destaca queos horizontes de atendimento s pessoas portadoras de necessidades educacionais

    especiais, incluindo a criana autista, vm se ampliando.

    O excelente nvel dos programas de mestrado iniciados em 1978 naUniversidade Federal de So Carlos e em 1979 na Universidade do Estado do Riode Janeiro tambm motivo de otimismo. Estes cursos vm titulando mestres, amaior parte profissionalmente envolvidos com o ensino na rea e muitos delesconstituindo ncleos de ensino e pesquisa, que seguramente j esto contribuindopara a formao de professores melhores qualificados para atuar na EducaoEspecial.

    Os distintos relatos de experincia includos no presente nmero refletemmodalidades diversas de atuao bem-sucedidas. No seu relato, Deusina Lopes da

    Cruz destaca as dificuldades vividas por uma famlia para se adaptar presenade um filho autista e o trabalho que tem sido desenvolvido pela AssociaoTeraputica Educacional para Crianas Autistas, fundada em 1987, em Braslia.Esta autora descreve ainda o processo de educao de seu filho autista, com osproblemas e as estratgias utilizadas para resolv-los. J J. R. Facion apresentaum modelo integrativo, que inclui um conjunto de medidas teraputico-comportamentais, teis no tratamento de portadores de deficincia mental edistrbios de comportamento. Descreve tambm a tcnica de "Interao CorporalCentrada", que tem sido utilizada com sucesso por ele nos ltimos quatorze anosno tratamento do autismo. Este autor ilustra o uso desta tcnica atravs da descriode um caso clnico de uma criana autista.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    14/266

    Qual a Questo?

    Um projeto de atendimento ao aluno deficiente auditivo descrito por Mariada Piedade Resende da Costa. Este projeto inclui a implementao de classesespeciais, onde tm sido utilizados procedimentos de ensino centrado no aluno, e

    colocadas em prtica todas as orientaes disponveis para o ensino da comunicao.O adequado aproveitamento dos recursos da comunidade na implementao desteprojeto tem sido tambm fator contribuinte para os bons resultados obtidos.

    O atendimento a crianas com deficincia visual ilustrado por projetosdistintos. Um deles, sob a coordenao de Elcie Salzano Masini na Faculdade deEducao da Universidade de So Paulo, inclui cursos, como de Culinria e ArtesPlsticas, para alunos com deficincia visual e mais recentemente a implementaode um curso de atualizao para pais e professores de deficientes visuaisPercebersem ver: prticas do cotidiano. A professora Elcie est tambm na coordenao deuma proposta de atendimento ao estudante universitrio deficiente visual, propostaesta descrita no texto de sua autoria.

    Maria Lcia T. M. Amiralian vem tambm estudando vrias questesrelativas ao deficiente visual, como o desenvolvimento da criana deficiente visual,a relao me-beb deficiente e o referencial perceptual do deficiente visual. Estaautora tem realizado atendimento teraputico de crianas, adolescentes e adultoscegos e com baixa viso e aponta, no texto de sua autoria, para as dificuldadesdestas pessoas, as quais percebem e compreendem o mundo atravs de outroscanais sensoriais que no os utilizados pela maioria da populao.

    A metodologia utilizada por Mari Gndara, coordenadora do CentroInterdisciplinar de Ateno ao Deficiente da Pontifcia Universidade Catlica deCampinas, no seu trabalho atravs do ritmo, da msica e da dana com crianas

    portadoras de deficincia visual, outra experincia bem-sucedida aqui includa.Uma proposta de profissionalizao do deficiente mental descrita por Maria

    Helena Alcntara, educadora da APAE/DF, ao passo que Francisco de Paula NunesSobrinho descreve um programa de treinamento de habilidades de autocontrole emcrianas hiperativas. Todas estas experincias e projetos ilustram distintasalternativas de atuao junto ao aluno com necessidades especiais e sugerempropostas a serem implementadas em prol do deficiente.

    Fernando Csar Capovilla descreve sistemas computadorizados decomunicao para deficientes de fala e tambm para avaliao de habilidadescognitivas de leitura e escrita de crianas com distrbios cognitivos e motores.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    15/266

    TENDNCIAS E DESAFIOS DA EDUCAO ESPECIAL

    Dois estudos so ainda apresentados por La da Cruz Fagundes relativos atividadede programao emLogo e comunicao via rede telemtica com alunos surdos.Estes autores apontam para diferentes tipos de ganhos observados a partir de tais

    prticas educacionais inovadoras e sublinham diversas possibilidades que taisrecursos tecnolgicos oferecem Educao Especial.

    O presente texto inclui tambm uma pequena amostra de centros deatendimentos em Educao Especial. Alguns destes centros, como o InstitutoBenjamin Constant e o Instituto Nacional de Educao de Surdos, fundados hlonga data, so bastante conhecidos. Menos conhecido o INDEPED, fundado hapenas um ano em Fortaleza, e que inclui um projeto ambicioso que engloba aformao de educadores, constituio de grupos de suporte ao deficiente e s suasfamlias e o desenvolvimento de pesquisas na rea. Este instituto tem centrado suaateno na integrao do estudante com deficincia em ambientes educacionais,partindo do princpio de que todos os alunos com deficincia podem ser educados

    em escolas regulares.

    Tambm apresentada uma descrio das atividades desenvolvidas naEstao Especial da Lapa, de So Paulo, que atende a portadores de deficinciamental, fsica, sensorial e mltiplas, a partir dos 14 anos. Neste local, 30% dasvagas so destinadas a estudantes que no apresentam necessidades especiais, nosentido de favorecer a integrao social dos primeiros.

    O sucesso da experincia com as escolas integradoras da FundaoEducacional do Distrito Federal, iniciadas em 1993, apontado no texto de EreniceNathlia Soares de Carvalho, e o pioneirismo da Fundao Catarinense de EducaoEspecial enfatizado por Rosemari das Graas Kern, no artigo onde descreve os

    principais servios desta instituio.

    As propostas implementadas por diferentes autores e nos distintos locaisanteriormente mencionados ilustram diversas possibilidades de ao que urgemserem aperfeioadas, multiplicadas e estendidas a todo o pas, com vistas a sealterar efetivamente e de forma significativa o panorama sombrio em que se encontraa Educao Especial no Brasil.

    E necessrio chamar a ateno tambm para a universidade no sentido deque invista mais nesta rea, primando na formao dos profissionais de educaoe contribuindo, atravs de seus recursos humanos, para a construo de prticaseducativas mais efetivas. Tambm de fundamental importncia que se incorporem

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    16/266

    Qual a Questo?

    na prtica os avanos observados na teoria e os achados de estudos empricoslevados a efeito, especialmente pelo corpo docente universitrio. inconcebvelque conhecimentos valiosos resultantes de pesquisas realizadas pelo pas fiquem

    apenas no mbito de suas instituies e/ou no crculo restrito de alguns poucosestudiosos.

    Estamos certos de que o retrato aqui apresentado da Educao Especialconcorrer para despertar autoridades e educadores para a necessidade urgente decondies melhores para o desenvolvimento pleno do portador de necessidadesespeciais. Acreditamos tambm que ele ser fonte de inspirao para os que atuamna rea, levando a novas propostas, gerando novas oportunidades e promovendoservios de melhor qualidade para esta clientela.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    17/266

    TENDNCIAS E DESAFIOS DA EDUCAO ESPECIAL

    AUTISMO: uma histria de conquistas *

    Ana Maria P. Bereohff**

    Ao abordar o aspecto educativo de indivduos portadores da Sndrome deAutismo Infantil, faz-se necessria uma retrospectiva histrica, passando pela se-leo natural; eliminao de crianas mal formadas ou deficientes em vrias civili-zaes; marginalizao e segregao promovidas na Idade Mdia; at um perodomarcado por uma viso mais humanista na Europa aps a Revoluo Francesa;

    para se chegar, no sculo XIX, aosprimeiras estudas sobre as deficincias.

    No incio do sculo XX, a questo educacional passou a ser abordada, po-rm ainda muito contaminada pelo estigma de um julgamento social. Nos dias dehoje. entre todas as situaes da vida de uma pessoa portadora de necessidadesespeciais, uma das mais crticas a sua entrada e permanncia na escola. Aindahoje, questiona-se a inadaptao de algumas dessas crianas. Ainda hoje, infeliz-mente, "o adulto fixa as normas e facilita ou no o acesso a elas" (Fonseca, 1987).Ainda hoje, embora mais sutil, pratica-se a "eliminao" de crianas deficientesdo ambiente escolar.

    O texto que se segue visa, principalmente, defesa do direito desses indiv-

    duos alm de no apenas existirem, mas tambm de freqentarem ambientes co-muns, como, por exemplo, escolas.

    * Na elaborao deste texto, a autora contou com a colaborao das professoras/psiclogas daFundao Educacional do Distrito Federal Analucia Soccal Seyflarth Leppos e Lcia Helena deVasconcelos Freire.** Supervisora tcnica da ASTECA (Associao Teraputica e Educacional para Crianas Autistas)e membro da Comisso Cientfica do GEPAPI (Grupo de Estudos e Pesquisas em Autismo eOutras Psicoses Infantis).

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    18/266

    PONTOS DE VISTA: O que pensam os especialistas

    Conceituao

    A maioria das definies da Sndrome de Autismo Infantil que esto sendoutilizadas, refletem o consenso profissional a que se chegou aps dcadas de estu-dos e pesquisas no assunto. Desde sua descrio clnica por Leo Kanner em 1943,inmeros autores dedicaram-se tarefa de estudar o autismo, baseados em vriasteorias e percorrendo caminhos diferentes.

    Inicialmente, baseados em teorias psicognicas, alegava-se que o problemaestava relacionado a questes afetivas e dificuldades na dinmica familiar. Porm,a necessidade de uma fundamentao mais objetiva fez mudar radicalmente o rumodas pesquisas para o campo biolgico. Acredita-se, atualmente, que autistas te-nham uma disfuno biolgica estrutural ou funcional que altera gravemente odesenvolvimento e a maturao do Sistema Nervoso Central.

    A definio mais divulgada no meio cientfico a que se segue:

    Autismo uma sndromepresente desde o nascimento e se manifes-ta invariavelmente antes dos 30 meses de idade. Caracteriza-se por res-.

    postas anormais a estmulos auditivos ou visuais, e por problemas gravesquanto compreenso da linguagem falada. A fala custa a aparecer, equando isto acontece, notam-se ecolalia. uso inadequado dos pronomes,estrutura gramatical imatura, inabilidade de usar termos abstratos. Htambm, em geral, uma incapacidade na utilizao social, tanto da lin-guagem verbal como da corprea. Ocorrem problemas muito graves derelacionamento social antes de cinco anos de idade, como incapacidade

    de desenvolver contato olho a olho, ligao social e jogos em grupos. Ocomportamento usualmente ritualistico e pode incluir rotinas anormais,resistncia a mudanas, ligao a objetos estranhos e um padro de brin-car estereotipado. A capacidade para pensamento abstrato-simblico ou

    para jogos imaginativos fica diminuda. A performance com freqnciamelhor em tarefas que requerem memria simples ou habilidade viso-es-

    pacial, comparando-se com aquelas que requerem capacidade simblicaou lingstica.

    Usam-se como sinnimos da Sndrome Autista os termos: autismoda criana, psicose infantil, sndrome de Kanner. Esta classificao ainda

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    19/266

    TENDNCIAS E DESAFIOS DA EDUCAO ESPECIAL

    cita trs outras, sob o ttulo geral de psicose com origem especfica nainfncia, a psicose desintegrativa e a psicose inespecfica (Organizao

    Mundial de Sade, 1984).

    Deficincias primrias e secundrias esto presentes na Sndrome de AutismoInfantil. So consideradas deficincias primrias as provavelmente relacionadascom os problemas subjacentes de compreenso e motricidade:

    alteraes neurolgicas;

    quociente de inteligncia;

    respostas anormais a sons;

    deficincia ou ausncia de compreenso da linguagem verbal;

    dificuldade em imitar movimentos finos e complicados;

    compreenso deficiente da informao visual;

    uso dos sentidos proximais;

    dificuldade na compreenso e uso dos gestos.

    So consideradas deficincias secundrias as relacionadas com os distr-bios de comportamento conseqentes aos itens anteriormente citados:

    dificuldade nas relaes pessoais;

    resistncia a mudana no meio ambiente ou na rotina;

    resposta anormal a situaes cotidianas;

    comportamento social inadequado;

    auto-agresso;

    movimentos anormais;

    ausncia de brincadeira imaginativa.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    20/266

    PONTOS DE VISTA: O que pensam os especialistas

    Avaliao diagnostica

    Erroneamente consideradas no testveis ou de difcil diagnstico, as crian-as autistas, durante muitos anos, estiveram merc de condutas pouco claras deavaliao.

    Na realidade, os problemas encontrados na definio de autismo refletiram-se tambm na dificuldade para a construo de instrumentos precisos e adequadosque pudessem ser utilizados na avaliao e diagnstico desses casos.

    Com relao ao diagnstico, o DSM 1II-R (Diagnostic and Statistical Ma-nual) tem sido o instrumento mais utilizado pelos profissionais, pois permite, numaabordagem multiaxial, uma avaliao mais abrangente e diferenciada (AmericanPsychiatric Association, 1990).

    No DSM III-R, os dados so considerados de acordo com cinco eixos:

    Eixo 1 - Sndromes ClnicasCondies no relacionadas a distrbio mental, mas passveis deatenoCdigos Adicionais

    Eixo 2 - Distrbios de Personalidade

    Distrbios Especificos do Desenvolvimento

    Eixo 3 - Distrbios ou Alteraes Fsicas

    Eixo 4 - Fatores Estressantes Psicossociais

    Eixo 5 - Nvel de melhor funcionamento no ano anterior

    Torna-se fundamental, em um processo diagnstico mais preciso, a obser-vao de manifestaes comportamentais seguida do uso de escalas diagnosticas.Entre elas, encontram-se: a Lista de Diagnstico de Autismo (Rivire, 1984), oCatlogo de Caractersticas e Sintomas para o Reconhecimento da Sndrome deAutismo de H. E. Kehrer, traduzida por Jos R. Facion (em Gauderer, 1993) e aEscala de Caractersticas Autistas, desenvolvida pela National Society for AutisticChildren e pela American Psychiatric Association.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    21/266

    TENDNCIAS E DESAFIOS DA EDUCAO ESPECIAL

    Avaliao Psicopedaggica

    Devem-se considerar as severas deficincias de interao, comunicao elinguagem e as importantes alteraes da ateno e do comportamento que podemapresentar estas crianas. E bsico que a programao Psicopedaggica a sertraada para esta criana esteja centrada em suas necessidades. Antes de seelaborar a programao propriamente dita, deve-se observar esse aluno para, sepossvel, conhecer quais canais de comunicao se apresentam mais receptivos auma estimulaao. Uma criana pode responder mais a estmulos visuais do queauditivos, ou ser mais sensvel a estimulaao ttil do que a verbal. Outra j poderesponder de maneira inversa (BereohT, 1991). Portanto, uma avaliao cuidadosapossibilitar uma planificao pedaggica individualizada mais adequada.

    Deve-se considerar tambm o nvel de desenvolvimento da criana ou do

    jovem autista, ao selecionar os objetivos a serem trabalhados numa programaoPsicopedaggica. fundamental observar que tal programao no esteja acimade suas condies cognitivas.

    Para compreender e educar as pessoas que apresentam um transtorno pro-fundo de desenvolvimento (como o caso do autismo), necessrio ter presenteum marco de referncia de evoluo normal e das funes que se encontram per-turbadas nesses casos.

    O princpio da normalizao faz referncia ao uso de meios o mais cultural-mente normativos possveis para poder estabelecer e possibilitar condutas que se-jam o mais culturalmente normativas possveis (Wolfensberg, em artigo publicado

    pelo C.N.R.E., Espanha, 1989). Busca-se uma maior interao do indivduo como contexto social em que vive, sendo este o objetivo final de todo programa educativo.

    Conforme destacado pelo Centro Nacional de Recursos para a EducaoEspecial da Espanha, em 1989,

    a avaliao do autismo deve ser fundamentalmente ideogrfica,pois no se trata de descobrir leis gerais de funcionamento psicol-gico, mas de investigar e analisar as caractersticas de comporla-menta individual em interao com um ambiente determinado.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    22/266

    PONTOS DE VISTA: O que pensam os especialistas

    Os autistas, na maioria das vezes, no respondem a testes e avaliaes esco-lares habituais, e por esta razo a observao de comportamento constitui-se norecurso mais eficaz para conhecer estas crianas, podendo ser utilizado para iden-

    tificar os seguintes aspectos: formas de explorar o meio;

    maneira de relacionar-se com as pessoas;

    maneira de relacionar-se com os objetos (se h uso funcional dos mesmos,'preferncias, etc);

    nvel de interao em situao no estruturada;

    desenvolvimento da comunicao;

    alteraes motoras (estereotipias, auto-agresso);

    rituais;

    jogos.

    A avaliao deve ser global, cuidadosa e detalhada, uma vez que uma dascaractersticas dos autistas a falta de uniformidade no seu rendimento.

    Entre os vrios instrumentos que podem auxiliar neste aspecto, destaca-se aEscala Portage de Desenvolvimento (Bluma, Frohman, 1978), que permite a ava-liao nas reas de Linguagem, Cognio, Cuidados Prprios, Sociabilizao eMotora, fornecendo a Idade de Desenvolvimento em cada uma destas reas e umaIdade de Desenvolvimento Geral (I.D.).

    A avaliao transforma-se, desta forma, na base do programa educativo aser desenvolvido, pois o critrio para a escolha dos objetivos est no prprio po-tencial da criana. As condutas a serem alcanadas transformar-se-o em objeti-vos a serem atingidos.

    A formulao de currculos com objetivos comportamentais remontam dcada de 70. Tais currculos foram divulgados inicialmente na Inglaterra e Esta-dos Unidos. Estes baseiam-se em alguns princpios, como os especificados a se-guir:

    maior preciso e responsabilidades, no dando lugar a improvisaes;

    http://r-nngtitnlsp.no/http://r-nngtitnlsp.no/
  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    23/266

    TENDNCIAS E DESAFIOS DA EDUCAO ESPECIAL

    maior eficcia na hora de eliminar ou trocar condutas inadequadas;

    oportunidade para observar o desenvolvimento da aprendizagem do aluno;

    diminuio de aspectos pouco mensurveis; contribuio avaliao da aprendizagem do aluno;

    maior facilidade para relacionar a aprendizagem do aluno com os objeti-vos previstos no currculo (Brennan, 1988).

    Nas ltimas dcadas, acumulou-se uma quantidade considervel de experi-ncias em tcnicas para o ensino de crianas autistas, desenvolvidas por educado-res de vrios pases. A maioria delas aponta para os seguintes objetivos gerais deeducao:

    1. prevenir ou reduzir deficincias secundrias;

    2. descobrir mtodos para recuperar deficincias primrias;

    3. descobrir formas para ajudar a criana a desenvolver funes relaciona-das s deficincias primrias.

    Propostas educacionais

    O modelo descrito a seguir fruto da unio de esforos entre a ASTECA

    (Associao Teraputica e Educacional para Crianas Autistas) e a FundaoEducacional do Distrito Federal, e vem sendo implementado sob a superviso tc-nica da autora do presente texto.

    Trata-se da implantao de classes especiais para crianas autistas integra-das ao ensino regular, viabilizando um atendimento de carter psicopedaggico.

    Participar de um processo educativo extrapola a aquisio de conhecimen-tos acadmicos. Freqentar uma escola significa, para o indivduo, a possibilidadede conviver com seus pares e vivenciar uma dimenso social da qual necessitapara desenvolver-se como qualquer ser humano. A busca de uma melhor qua-lidade de vida para este educando o que na realidade permeia este trabalho.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    24/266

    PONTOS DE VISTA: O que pensam os especialistas

    Educar uma criana autista uma experincia que leva o professor a revere questionar suas idias sobre desenvolvimento, educao, normalidade e compe-tncia profissional. Torna-se um desafio descrever o impacto dos primeiros conta-

    tos entre este professor e estas crianas to desconhecidas e, na maioria das vezes,imprevisveis.

    Segundo Rivire (1984), esta tarefa educativa provavelmente a experin-cia mais comovedora e radical que pode ter o professor. Esta relao pe prova,mais do que nenhuma outra, os recursos e habilidades do educador. Como ajudaros autistas a aproximarem-se de um mundo de significados e de relaes humanassignificativas? Que meios podemos empregar para ajud-los a se comunicarem,atrair sua ateno e interesse pelo mundo das pessoas; para retir-los de seu mun-do ritualizado, inflexvel e fechado em si mesmo?

    Ao educar uma criana autista, pretende-se desenvolver ao mximo suashabilidades e competncia favorecer seu bem-estar emocional e seu equilbriopessoal o mais harmoniosamente possvel, tentando aproxim-la de um mundo derelaes humanas significativas.

    Algumas caractersticas da Sndrome de Autismo Infantil merecem desta-que dentro de um enfoque psicopedaggico. Como se sabe,,todo autista apresentadesordem na comunicao, manifestando, ou no linguagem verbal._A dificuldadede comunicao sempre gera outros problemas. Ensinar a criana a se comunicar fundamental. Wing (em Gauderer, 1993) destaca que para a pessoa autista edifcil ou impossvel adaptar a linguagem que usa para adequar-se situao e pessoa com quem est conversando. Na realidade, esta uma das facetas do trans-torno da interao social.

    Tambm Mates (1993) considera que a maioria dos distrbios de comporta-mento so decorrentes da falta de comunicao. Visando a um nvel de comunica-o satisfatria, deve-se observar as diferenas individuais, considerando que amaioria no entende a nossa linguagem. Algumas crianas compreendero me-lhor mensagens transmitidas atravs da associao entre verbalizao e contatofsico, outras atravs de dramatizaes onde o gestual e a mmica sero usados, eainda outras se beneficiaro de utilizao de dicas visuais e/ou fsicas. Portanto,caber ao professor adequar o seu sistema de comunicao a cada aluno, respecti-vamente.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    25/266

    TENDNCIAS E DESAFIOS DA EDUCAO ESPECIAL

    Problemas de comportamento podem ser evitados, eliminando-se as situa-es especficas desencadeadoras e tambm pela criao de um ambiente calmo eordenado. Atividades adequadas inseridas no programa educacional reduzem sen-

    sivelmente a freqncia destes comportamentos. A pessoa autista pode reagir vio-lentamente quando submetida a excesso de presso. Diante deste fato, importante verificar se o planejamento proposto positivo, se foi construdolevando-se em conta os pontos fortes e fracos, ou se est tentando algo que acriana no capaz de fazer, insistindo nisso.

    Quando os problemas aparecem, pode-se ignor-los calmamente ou retirara criana do ambiente. Cont-la para acalm-la durante uma crise um bom m-todo, desde que a postura do professor no seja de agressividade e, sim, de conti-nncia, transmitindo segurana e controle da situao.

    A colocao de limites de forma clara, atravs de uma atitude diretiva porparte do educador, contribui para o desenvolvimento de maior organizao e auto-nomia desta criana, fortalecendo sua capacidade para adaptar-se aos ambientesdomsticos, comunitrios, escolar, etc. Comportamentos positivos devem ser en-corajados atravs de elogios e ateno.

    Diante destes objetivos mais abrangentes, alguns aspectos inspirados naPedagogia Waldorf (Kgelgen, 1960; Lanz, 1979) so considerados essenciaispara direcionar o fazer pedaggico nesta proposta:

    a) Rotina diria estruturada - oferece uma previsibilidade de aconteci-mentos, que permite situar a criana no espao e no tempo, onde a organizao detodo o contexto se toma uma referncia para a sua segurana interna, diminuindoassim os nveis de angstia, ansiedade, frustrao e distrbios de comportamento.O professor tambm beneficia-se dessa rotina medida que consegueoperacionalizar os objetivos do Planejamento Individual de Ensino de maneiramais dinmica e organizada. A rotina deve ser compreendida como planejamento eorganizao e no uma restrio criatividade do professor, permitindo a ele apossibilidade de maior visualizao sobre todo seu trabalho.

    b) Valorizao de elementos da natureza - estimula o aluno a perceber seumeio ambiente atravs da observao e contato com elementos, como sol, chuva,rvores, animais, visando a facilitar sua percepo e diferenciao no mundo.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    26/266

    PONTOS DE VISTA: O que pensam os especialistas

    c) Abordagem vivencial da aprendizagem - a vivncia das atividades programadas facilita a participao e o envolvimento com o objeto de trabalho, ondeo auxlio verbal na maioria das vezes insuficiente, gerando a necessidade de

    constante auxlio fsico por parte da pessoa que dirige a ao pedaggica. A abordagem vivencial permite que um mesmo objetivo para uma determinada crianaseja trabalhado em vrios contextos, possibilitando assim maior generalizao efuncionalidade de sua aprendizagem.

    d) Respeito condio humana - enfatiza a colocao da criana numprograma adequado onde as possibilidades de sucesso sejam mais freqentes doque as de fracasso. O esforo ser to valorizado quanto o resultado.

    e) Utilizao da msica - um recurso importante na sala de aula. O bomresultado do uso deste recurso depende do estilo de msica escolhido e principal-mente do momento em que esta ser utilizada. Deve ser dada prioridade a msicas

    infantis tradicionais (como, por exemplo, Ciranda-cirandinha). que possam sercantadas pelo professor estimulando a participao de todo o grupo. A msicadeve estar tambm relacionada a momentos e atividades especficas, tais comohora da chegada, saudao ao Sol, hora do lanche, da higiene, etc. Msicas clssi-cas orquestradas constituem-se num bom recurso para compor um ambiente har-monioso durante a realizao de outras atividades.

    Planejamento individual de ensino (PIE)

    A elaborao do PIE dever seguir os seguintes passos:

    A) a observao da criana em situaes livres e dirigidas constitui-se noprimeiro passo para que o professor possa conhec-la e iniciar seu vn-culo com ela;

    B) a aplicao do roteiro de observao baseado na Escala de Desenvolvi-mento Portage possibilita obter-se o perfil do aluno no incio do atendi-mento. A escala dever ser reaplicada a cada ano, permitindo a reavaliaodos objetivos propostos e conseqentemente a evoluo do aluno sinali-zado atravs de grficos.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    27/266

    TENDNCIAS E DESAFIOS DA EDUCAO ESPECIAL

    C) A seleo dos objetivos a serem trabalhados respeita a seqncia evolutivade aquisio delineada na Escala Portage, ou seja, orienta-se por umagradao das dificuldades do aluno. As habilidades bsicas so traba-

    lhadas antes das mais elaboradas, devendo a criana manifestar em seurepertrio condutas prvias, necessrias para chegar ao objetivo propos-to.

    A elaborao do Planejamento Individual de Ensino dever levarem consi-derao os pontos fortes e fracos do aluno, selecionando-se estratgias adequadase preservando-se a condio de um processo flexvel e dinmico. A metodologiadeve ter como referncia o concreto, o vivencial e o funcional.

    Inmeras estratgias devem ser utilizadas para que um objetivo seja alcan-ado. Devem estar baseadas nos interesses da criana. O fato do autista aparente-mente no demonstrar interesse pelo ambiente que o rodeia no significa necessaria-mente que este interesse no exista. Da a importncia da observao da crianapara identificar-se, como j ressaltado anteriormente, um melhor canal de comuni-cao.

    Os objetivos selecionados devem ser funcionais, isto , ter um lugar na vidado aluno. Devem ser adequados do ponto de vista do desenvolvimento e visar aquisio de maior independncia na sua vida prtica. Devem descrever de formaclara a conduta final desejada. fundamental que as aquisies possam se ge-neralizar para fora do contexto escolar. A possibilidade de sucesso aumenta, seeste objetivo for explorado passo a passo e reavaliado constantemente. Dependen-do desta avaliao, realizada com o suporte da equipe supervisora, o professormodifica ou troca o objetivo, passando ao seguinte, sempre respeitando as priori-

    dades ou necessidades emergentes do aluno. Uma vez que o desenvolvimento e oritmo das aquisies no so uniformes, a retomada de objetivos j trabalhadosanteriormente, muitas vezes, se faz necessria.

    Outro fator relevante a quantidade de objetivos escolhidos pelo professora ser explorada, para que no haja excesso de expectativas, hiperestimulao epossivelmente frustraes.

    E importante ressaltar que o perfil delineado pela Escala considerado comoum ponto de referncia na elaborao do planejamento, cabendo ao professorcomplement-lo com dados de observao.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    28/266

    PONTOS DE VISTA: O que pensam os especialistas

    Consideraes sobre o atendimento

    As consideraes a seguir referem-se especificamente ao atendimento deli-neado nesta proposta, podendo evidentemente, serem adaptadas e generalizadaspara outros contextos.

    Antes de chegar sala de aula, o aluno avaliado pela superviso tcnica,e o seu caso discutido com a coordenao pedaggica, com vistas a inseri-lo numgrupo adequado, considerando sua idade cronolgica, sua idade de desenvolvi-mento e nvel de comportamento.

    As turmas so formadas por grupos de trs a cinco crianas no mximo, sobresponsabilidade de uma professora e de um auxiliar.

    Por funcionarem em escolas de ensino regular, dada ateno especial sensibilizao dos alunos, funcionrios e comunidade escolar, fornecendo infor-maes bsicas sobre quem so e como se comportam esses alunos portadores denecessidades especiais. Esse trabalho de sensibilizao deve se manter durantetodo o ano escolar.

    necessrio que a superviso tcnica conhea profundamente o grupo dealunos e faa um acompanhamento contnuo, permitindo avaliaes peridicas eorientando remanejamentos.

    A seguir, aspectos prticos do dia-a-dia em sala de aula sero explorados. Aexperincia acumulada nos sete anos de trabalho coincide com o que relata Rivire(1984): "para promover uma verdadeira aprendizagem, o professor deve ser muitocuidadoso com: 1) a organizao e condies de estimulaao do ambiente, 2) asinstrues e sinais que apresenta criana, 3) as ajudas que lhe proporciona, 4) asmotivaes e reforos de que se serve para fomentar sua aprendizagem".

    A conduta de trabalho tem sido pautada por uma rotina pr-estabelecida,onde os momentos da criana so programados. Espera-se com isto oferecer-lheuma previsibilidade quanto s atividades desenvolvidas durante o perodo em quepermanecer na escola, desde a entrada at a sua sada, estruturando assim oambiente e as situaes de aprendizagem.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    29/266

    TENDNCIAS E DESAFIOS DA EDUCAO ESPECIAL

    A importncia do ensino estruturado ressaltada por Eric Schopler (emGauderer, 1993) no mtodo TEACCH (Tratamento e Educao para Autistas eCrianas com Deficincias relacionadas Comunicao), quando afirma: " bom

    ter em mente que, normalmente, as crianas, medida que vo se desenvolvendo,vo aprendendo a estruturar seu ambiente enquanto que as crianas autistas e comdistrbios difusos do desenvolvimento necessitam de uma estrutura externa paraotimizar uma situao de aprendizagem".

    So os seguintes os passos da nossa rotina que tem sido delineada ao longodesses anos.

    Recepo do aluno

    a)Na escola, dever ser recebido calorosamente por um profissional com oqual j tenha um vnculo estabelecido. Esta pessoa ser sua referncianesse momento, e o marcador de que o dia escolar est se iniciando. Oauxiliar desempenhar este papel conduzindo o aluno ao professor.

    b) Na sala de aula, cumprimentado pelo professor que, atravs de dicasverbais e/ou fsicas, o estimular a guardar seu material e a sentar-se emseu lugar. Este ambiente dever ser agradvel e organizado, apresentarpouca estimulaao visual, devendo o nmero de carteiras ser adequadoao nmero de alunos. Estes cuidados permitiro um maior sentimento depertinncia e de previsibilidade quanto ao espao fsico. A sala deve ter

    um tamanho que permita a realizao de atividades de mesa, individuaise em grupo, contando tambm com alguns colchonetes e almofadas.

    A aula inicia-se com o registro na lousa da seqncia de atividades do dia,com o objetivo de antecipar para a turma a programao. Cabe ao professor, coma ajuda sistemtica do auxiliar, estimular e dirigir a ateno do aluno para estemomento. Constam deste registro os seguintes itens:

    entrada;

    orao;

    msica;

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    30/266

    PONTOS DE VISTA: O que pensam os especialistas

    estria;

    tarefa;

    higiene;

    lanche;

    recreio;

    passeio;

    tarefa;

    recreao supervisionada;

    sada.

    Entrada - relata-se para o aluno que este momento j passou, trabalhandoassim informalmente o aspecto temporal.

    Orao - momento em que o professor estimula o grupo a realizar juntocom ele uma pequena saudao de agradecimento pelo dia, sinalizando o inciodos trabalhos.

    Msica - alm de atividade pedaggica especfica, utilizada para discri-minar e antecipar atividades programadas.

    Estria - criada pelo professor, contada todos os dias. Nela aparecemfatos reais e de fantasia situando o aluno dentro do contexto. A mesma vai sendo

    desenhada na lousa com giz colorido medida em que os fatos vo sendo relata-dos. Fala-se sobre o clima, sobre a vegetao, sobre a forma como cada crianachega escola, a prpria escola e suas dependncias, os alunos, o professor e oauxiliar.

    Tarefa - consiste em atividades dirigidas, em mesa ou no, individual ou emgrupo, de acordo com os objetivos traados para cada criana. Estes so levanta-dos a partir do PIE. Merece cuidado a preparao do ambiente por parte do edu-cador, ou seja: material pedaggico previamente separado, disposio de cartei-ras, etc. Habilidades novas so introduzidas pelo professor, enquanto o auxiliarsupervisiona o resto do grupo nas tarefas j predeterminadas pela programao,nas quais os alunos se encontram semidependentes ou independentes.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    31/266

    TENDNCIAS E DESAFIOS DA EDUCAO ESPECIAL

    Higiene - desenvolver habilidades que promovam maior independncia emautocuidados. Lavar as mos, escovar os dentes, tomar banho, vestir-se e despir-se, pentear os cabelos sero trabalhados em momentos especficos nos ambientes

    em que normalmente ocorrem, dentro do contexto escolar.Lanche - propicia o desenvolvimento de hbitos alimentares dentro do con-

    texto escolar. O aluno estimulado a preparar sua mesa para o lanche, manusearlancheira, pratos, copos, guardanapos e talheres. Embora esta situao objetiveprioritariamente a alimentao, tambm permite que se desenvolva o respeito pelolanche do colega, bem como compartilh-lo quando for oportuno.

    Recreio - esse momento muito importante dentro de toda a rotina, poispermite a ocorrncia da integrao com as outras crianas da escola. Trata-se deuma situao livre, pouco estruturada, onde a interao com os demais alunos daescola acontece de forma espontnea, supervisionada a distncia pelo auxiliar.

    um momento privilegiado, pois h uma solicitao direta ou indireta de uma ade-quao comportamental ao cdigo social partilhado no ambiente escolar.

    Passeio - atividade realizada fora da escola com visitas a lojas, supermerca-do, etc. Proporciona ao aluno a oportunidade de vivenciar situaes sociais nasquais a comunidade local participa direta ou indiretamente de uma aprendizagemque ocorre bilateralmente. De um lado, o aluno aprende regras sociais que permi-tem que ele conviva melhor com a sociedade e do outro, a sociedade aprende acompreender este indivduo com necessidades especiais. Cabe ao professor o pa-pel de mediador neste processo. Alm disso, exploram-se aspectos psicomotores,cognitivos e afetivos. Esse momento garante que o trabalho no fique restrito aoambiente escolar.

    Recreao supervisionada - ocorre no parque, sala de aula ou ptio. Bus-ca-se ampliar o repertrio motor atravs de atividades ldicas, com regras simplese materiais diversos. Procura-se nesta hora proporcionar ao grupo momentos desociabilizao e lazer.

    Sada - o aluno estimulado a guardar seus objetos pessoais na mochila eajudar na organizao da sala. Os trabalhos se encerram com a despedida da pro-fessora e do auxiliar aos seus alunos.

    Considerando a rotina diria descrita acima, fundamental a pontualidadena chegada do aluno escola permitindo que vivencie todas as etapas da agenda.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    32/266

    PONTOS DE VISTA: O que pensam os especialistas

    Isto garante uma previsibilidade e segurana para o aluno, diminuindo a possibili-dade de crises comportamentais durante o perodo.

    Este roteiro varia de acordo com o grupo, seu nvel de desempenho e din-mica da prpria escola, sendo que o mais importante estabelecer uma rotina esegui-la. Novamente, ressalta-se o papel da coordenao e superviso para darsuporte ao professor na definio das atividades adequadas ao grupo.

    A presena do auxiliar controlando os comportamentos inadequados do aluno,permite ao professor cumprir a rotina estabelecida. Diante de possveis crises, amanuteno da rotina transmitir criana a segurana de que, independente-mente de seu comportamento desorganizado, o ambiente continuar estruturado.Isso aumentar a possibilidade de reengaj-lo nas atividades.

    Apesar da presena de dois profissionais em sala de aula, deve estar claroque a autoridade est centrada no professor, deixando bastante evidente o papel de

    cada um no contexto pedaggico.

    Conta-se com o trabalho de dinamizao, realizado uma vez por semanapor um professor especfico que, juntamente com o auxiliar da sala, desenvolveatividades diferenciadas com o grupo de alunos. Neste dia, so enfatizados ostrabalho de artes, recreao dirigida, dramatizao com fantoches e fantasias,musicalizao e expresso corporal. Enquanto isso, o professor regente permanecena escola para rever o planejamento, reunir-se com a coordenao e supervisotcnica e atualizar-se com leituras especficas.

    A relao professor-aluno

    A relao professor-aluno constitui o cerne de todo o atendimento, poisdepender da qualidade dessa relao a chance de retirar esse aluno doisolamento que o caracteriza. Qualquer que seja a programao estabelecida, estas ganhar dimenso educativa no contexto dessa interao. Quanto maissignificativo para a criana for seu professor, maiores sero as chances de estepromover novas apren-dizagens.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    33/266

    TENDNCIAS E DESAFIOS DA EDUCAO ESPECIAL

    As possibilidades de vinculao dessas pessoas com profunda dificuldadede interao espontnea viabilizam-se, em grande parte, pela tolerncia frustra-o e persistncia dos profissionais que se propem a trabalhar com elas. Alm

    destes traos de personalidade, o educador dever basear o relacionamento comseu aluno em um conhecimento o mais abrangente possvel da Sndrome do AutismoInfantil, das caractersticas especficas da criana que educa e de tcnicas atualizadasde ensino.

    No encontro entre a pessoa do professor e a do aluno, alm do perfil profis-sional mencionado anteriormente, algumas consideraes tornam-se pertinentes.Weihs (1971) destaca que "se desejamos compreender e ajudar uma criana per-turbada ou deficiente., devemos, por um lado, perceber que somos parte do ambi-ente no qual esta criana tem de viver e crescer e, por outro lado, tentar ver seucomportamento, desempenho, habilidades e incapacidades em relao ao que sempre perfeito nela, a vivncia de sua prpria personalidade...". Na medida em

    que aprendemos a reconhecer em ns mesmos dificuldades, fraquezas e at defici-ncias, um novo caminho de compreenso e avaliao se abrir. Neste caminho, oprofessor passar por um exerccio constante de aprendizagem, pois ser portador,de uma deficincia no esgota a condio humana de um indivduo, por mais1imitante que esta possa nos parecer.

    Rivire (1984) alerta que "freqentemente os processos de aprendizagemdas crianas autistas esto to lentos e esto to alterados que a aplicao rotineirade tcnicas educativas termina na frustrao, se no for acompanhada de umaatitude de indagao ativa, de explorao criativa do que acontece com a pessoaque educamos. Quando acompanhada desta atitude, a relao educativa com cri-anas autistas (por mais exigente que seja) se converte numa tarefa apaixonante e

    que pode enriquecer enormemente tanto o professor como o aluno".

    O fato de esta proposta efetuar-se em escolas do ensino regular permite quea atuao do educador extrapole a relao bilateral com a criana. Em vriassituaes cotidianas, ele ser o mediador entre o seu aluno especial e a comunidadeescolar. Ao professor, abre-se a possibilidade de sensibilizar outras pessoas paraconhecerem as particularidades da criana autista, ao mesmo tempo em que pode-r decodificar para esta, inmeras mensagens e regras sociais que dificilmentecompreenderia sem sua ajuda.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    34/266

    PONTOS DE VISTA: O que pensam os especialistas

    Formao de educadores

    Pelo fato de ter tido a oportunidade de supervisionar um atendimento nosmoldes j descritos, no poderia me omitir a fazer algumas consideraes.

    Ainda com certo receio e preconceito que os educadores, de maneira geral,convivem com uma sala especial e com um alunado com necessidades educativasespeciais. No raro encontrarmos, no corpo docente de uma instituio, resistn-cia para a insero de um atendimento especializado.

    Se fizermos uma retrospectiva, somente h algumas dcadas que a totalausncia de ateno a essa demanda foi substituda por tmidas iniciativas de car-ter filantrpico, s ultimamente sendo legalmente reconhecido o direito dessas cri-anas educao escolar.

    Acredito que, se na formao inicial dos professores, fossem includos nocurrculo, alguns temas bsicos (e tratadas seriamente) de Educao Especial, jpoderamos vislumbrar, a curto prazo, a diminuio desses problemas.

    Se as polticas pblicas brasileiras sobre educao em geral realmente assu-missem a responsabilidade que tm para uma sensibilizao maior de toda a soci-edade e destinassem aos departamentos, secretarias e coordenaes especficas deEducao Especial recursos coerentes com suas necessidades, certamente esseprocesso seria mais rpido e finalmente perderia o carter assistencialista e prec-rio que ainda se observa nesse setor.

    Ainda no existe no Brasil um curso de formao especfica para professo-res de crianas autistas. A preparao desses professores tem sido feita atravs dealguns cursos de especializao em Educao Especial e/ou estgios supervisio-nados nas instituies que oferecem esse atendimento.

    fundamental que esses professores tenham conhecimento de Psicologia doDesenvolvimento e Aprendizagem e que sejam orientados para uma atuao ade-quada nos graves distrbios de comportamento que apresentam esses jovens.

    Faz-se necessria a criao pelas universidades de cursos de ps-gradua-o, para garantir uma formao de profissionais alicerada coerentemente entre aexperincia prtica e a busca de dados cientficos metodologicamente.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    35/266

    TENDNCIAS E DESAFIOS DA EDUCAO ESPECIAL

    Perspectivas para o futuro

    Quem acompanha, h algum tempo, a evoluo do atendimento educacional acrianas e jovens portadores da Sndrome de Autismo Infantil no Brasil, temmuitos motivos para estar otimista.

    Em primeiro lugar, pelo fato de o problema ter deixado de ser consideradoapenas do ponto de vista mdico e teraputico. Atualmente, j impossvel se falarde atendimento ao autista sem considerar o ponto de vista pedaggico.

    J so vrias as instituies que prestam esse servio. bem verdade que asiniciativas, na sua maioria, esto relacionadas s Associaes de Pais, mas cadavez mais perceptvel a tendncia de servios pblicos de se instrumentalizaremadequadamente para atender a esse alunado.

    Qualquer que seja o nvel de funcionamento das crianas tem-se valorizadouma educao escolar mais estruturada. Com isto, as crianas menos comprome-tidas tm se tornado mais sociveis, usando construtivamente as habilidades apren-didas, apesar da persistncia de alguns sintomas. J as de retardo grave, mesmopermanecendo em seu isolamento, apresentam progressos em autocuidados e nodesenvolvimento de habilidades viso-espaciais bsicas, melhorando conseqente-mente sua qualidade de vida.

    .Cada vez mais, alargam-se os horizontes do atendimento s pessoas porta-doras de necessidades educativas especiais e em especial criana autista.Cadavez mais ,valoriza-se a potencialidade e no a incapacidade de seres humanos

    Com isto, a sociedade como um todo s pode beneficiar-se.

    Referncias bibliogrficas

    AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Diagnostic and statistical manualof mental disorderes - DSM III-R. So Paulo: Manole, 1990.

    BEREOHFF, Ana Maria P. Autismo, uma viso multidisciplinar. So Paulo:GEPAP1,1991.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    36/266

    PONTOS DE VISTA: O que pensam os especialistas

    BLUMA, S. Shearer M., FROHMAN, A. Portage guide to early education. To-ronto. 1978.

    BRENNAN, Wilfred K. El currculo para ninos com necessidades especiales.Madrid: Siglo XXI, 1988.

    -FONSECA, Vitor da. Educao especial. Porto Alegre: Artes Mdicas, 1987.

    GAUDERER, Christian E. Autismo e outros atrasos do desenvolvimento: umaatualizao para os que atuam na rea; do especialista aos pais. Braslia: MAS,CORDE, 1993.

    HERNANDEZ, Juana M. Evaluacion en autismo. Madrid: Centro Nacional deRecursos para Ia Educacin Especial, 1989.

    KGELGEN, Helmut von. A educao Waldorf: aspectos da prtica

    pedaggica.2.ed. So Paulo: Antroposfica, 1960.LANZ, Rudolf. A pedagogia Waldorf. So Paulo: Antroposfica, 1979.

    MATES, Thomas. Treinamento de professores no mtodo Teacch. Sao Paulo,1993. Realizado pela AMA.

    ORGANIZAO MUNDIAL DE SADE. Classificao internacional dedoenas.9.ed. So Paulo, 1984.

    R VIERE, Angel. Evalucin y alteraciones de Ias funciones psicolgicas en autismoinfantil. Madrid: CIDE, 1988.

    ________ . Modificacin de conducta en el autismo infantil. Revista Espanola dePedagogia, v.42, n.164/165, p.28-34, 1984.

    WEIHS, Thomas J. Crianas que necessitam de cuidados especiais. So Paulo:Antroposfica, 1971.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    37/266

    TENDNCIAS E DESAFIOS DA EDUCAO ESPECIAL

    A EDUCAO DO DEFICIENTE AUDITIVO NO BRASILsituao atual c perspectivas

    Jos Geraldo Silveira Bueno

    Consideraes preliminares

    A Educao Especial tem cumprido, na sociedade moderna, duplo papel decomplementaridade da educao regular. Isto , dentro de seu mbito de ao,atende, por um lado, democratizao do ensino, medida que responde snecessidades de parcela da populao que no consegue usufruir dos processosregulares de ensino; por outro, responde ao processo de segregao da criana"diferente legitimando a ao seletiva da escola regular.

    Esta funo de complementaridade da Educao Especial reflete, no seumbito, a contradio da moderna sociedade industrial de, por um lado, oferecerescolaridade a toda a populao, j que o desenvolvimento do processo produtivose complexifica e exige, cada vez mais, mo-de-obra qualificada e, por outro,produzir a marginalizao social inerente s formas pelas quais a sociedade se

    organizou.

    Assim, dependendo das condies econmicas, polticas, sociais, culturaise educacionais de diferentes momentos histricos, a funo da Educao Especialde ampliao das oportunidades educacionais s "pessoas deficientes, excepcionaisou com necessidades especiais" pode ser a mais significativa, medida que asnecessidades concretas dessa parcela da populao parece ser o mvel maior paraa implementao de polticas educacionais.

    Professor assistente-doutor do Quadro Permanente do Programa de Estudos Ps-Graduadosem Educao: Histria e Filosofia da Educao da PUC/SP.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    38/266

    PONTOS DE VISTA: O que pensam os especialistas

    Em outras condies histricas, entretanto, sua funo de legitimadora daao seletiva da educao regular pode se tornar a mais importante, pois que aoferta de escolarizao especial parece responder muito mais ao processo de

    legitimao da marginalidade social do que ampliao das oportunidadeseducacionais a crianas que possuem alteraes que prejudicam sua escolarizaono ensino regular.

    A Educao Especial no Brasil e, em particular, a educao do deficienteauditivo, tem respondido fundamentalmente durante todo o seu transcurso histrico, legitimao da seletividade escolar porque:

    mesmo nos centros mais desenvolvidos, no tem dado conta sequer doprincpio constitucional de acesso escolaridade das crianas dos sete aos 14anos, estgio que, de alguma forma, a educao regular j atingiu. Isto , para ascrianas normais pode-se afirmar que nos grandes centros, seno a grande maioria

    da populao, pelo menos uma boa parcela dela tem acesso ao ensino bsico e quehoje o problema reside na permanncia qualificada de parte significativa dos queingressam na escola. No caso da Educao Especial isto no se confirma, j que asestimativas tm mostrado que apenas 10 a 15% da populao deficiente em idadeescolar conseguem receber alguma forma de atendimento educacional';

    os resultados, mesmo considerando-se apenas o acesso ao mnimoconhecimento bsico, deixam muito a desejar, pois a maioria da clientela noconsegue ultrapassar os nveis iniciais de escolaridade e, dentro dela, mal conseguese apropriar do conhecimento matemtico bsico e da linguagem escrita;

    a falta de clara delimitao entre as responsabilidades dos servios de

    sade e de Educao Especial, ambos extremamente necessrios ao atendimentodas necessidades da criana deficiente, impede o estabelecimento de polticaspblicas que respondam efetivamente a essas necessidades;

    As questes acima elencadas sero as balizadoras do presente trabalho que,a partir de anlise crtica sobre a situao atual da educao do deficiente auditivono Brasil, tem a inteno de apontar alguns indicadores no sentido de sua progressivademocratizao.

    ' Embora nao existam levantamentos estatsticos sobre a incidncia de excepcionais no Brasil,costuma-se estabelecer estimativas baseadas em estudos realizados em outros pases; ver, a esse

    respeito, Nise Pires, 1974, p.28.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    39/266

    TENDNCIAS E DESAFIOS DA EDUCAO ESPECIAL

    o nmero de deficientes auditivos incorporados ao ensino regular irrisrio, embora j se tenham acumulado evidncias de que a deficincia auditivano acarreta, em si, qualquer prejuzo intelectual;

    as divergncias entre os processos de reabilitao (oral versus gestualversus oral-gestual) no tm, na prtica, revertido em melhoria efetiva da qualidadedo atendimento teraputico e educacional maioria da populao deficiente auditiva,independentemente da abordagem escolhida, a no serem casos excepcionais, quasesempre absorvidos pelos sistemas privados de reabilitao e de educao.

    Educao regular e educao especial

    A Educao Especial surge nas sociedades ocidentais industriais no sculoXVIII, como parte pouco significativa de um conjunto de reinvidicaes de acesso riqueza produzida (material e cultural) e que desembocou na construo dademocracia republicana representativa, cujo modelo expressivo foi o implantadona Frana pela Revoluo de 1789.

    Uma das exigncias da nova ordem, que se contrapunha aos privilgiosconcedidos nobreza, se referia democratizao do saber, consubstanciado, entreoutros, pelo acesso escola de qualquer criana e no apenas quelas comdeterminada origem social.

    Isto , o acesso escolarizao dos deficientes foi sendo conquistado ao

    mesmo tempo em que se conquistava este mesmo acesso para as crianas em geralEm outras palavras, a histria nos mostra que a Educao Especial no nasceupara dar oportunidade a crianas que, por anormalidades especficas,apresentavam dificuldades na escola regular. A Educao Especial nasceu voltadapara a oferta de escolarizao a crianas cujas anormalidades foramaprioristicamente determinadas como prejudiciais ou impeditivas para suainsero em processos regulares de ensino. E esta no uma mera diferena denfase na anlise do percurso histrico da Educao Especial, mas uma diferena

    Desde o estudo clssico de H. Myklebust (1964), tm-se acumulado evidncias sobre as capacidadesintelectuais do indivduo deficiente auditivo.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    40/266

    PONTOS DE VISTA: O que pensam os especialistas

    definido, demonstrativa do carter de segregao do indivduo anormal e dosprocessos exigidos pelas novas formas de organizao social. Quem se debruarsobre a vida de Louis Braille, para ficarmos em um s, mas significativo exemplo,

    ver que no foi a cegueira, mas sua condio social que o levou a ter que seinternar no Instituto dos Jovens Cegos de Paris (Silveira Bueno, 1993, p.73-75).

    Todo o processo de ampliao da Educao Especial, quer em relao quantidade de crianas por ela absorvidas, quer pela diversificao das formas deatendimento e do tipo de clientela, se, por um lado, reflete, com certeza, a ampliaode oportunidades educacionais para crianas que, por caractersticas intrnsecas,apresentam dificuldades para se inserirem emprocessos escolares historicamenteconstrudos e que respondem a determinaes variadas, carregou sempre a funode legitimadora da seletividade escolar, quer seja com os deficientes do passado,quer com as crianas portadoras de necessidades especiais do presente.

    No caso especfico do Brasil, esta legitimao se efetua atravs de ummecanismo ainda mais perverso. Os deficientes, excepcionais ou alunos comnecessidades especiais, no so absorvidos pelo sistema regular de ensino. Poroutro lado, a Educao Especial, mesmo dentro de uma perspectiva segregacionista,no consegue incorporar mais do que 10 ou 15% dessa populao, fazendo comque ela seja duplamente penalizada: por ser deficiente e por no ter acesso escolaridade.

    Finalmente, boa parte dos 10 ou 15% dos privilegiados que conseguem teracesso a algum tipo de escolarizao, especialmente os que se integram s redespblicas ou entidades assistenciais, apesar de permanecerem na escola durantelargos perodos de tempo, nela quase nada conseguem aprender.

    Assim, a pequena absoro de crianas excepcionais pelo sistema de ensinoe a baixa qualidade, em geral, dos servios oferecidos a essa pequena parcelaparecem ser os fatores determinantes do percurso histrico da Educao Especialem nosso pas, desde a criao dos Institutos Imperiais no sculo passado, at osnossos dias.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    41/266

    TENDNCIAS E DESAFIOS DA EDUCAO ESPECIAL

    A educao do deficiente auditivo no Brasil situao atual

    A educao do deficiente auditivo desenvolveu-se em nosso pas, a partir dacriao do Instituto Imperial dos Surdos-Mudos, em 1857, de forma paulatina esempre insuficiente para atender demanda.

    Entre a criao do Instituto Imperial, em 1857, e a criao da segundaescola especial (Instituto Santa Therezinha So Paulo, 1929) transcorrerammais de setenta anos e desta poca para a dcada de 60, a educao do deficienteauditivo em nosso pas teve um crescimento muito pequeno^.

    A partir dos anos 60, a Educao Especial brasileira e, dentro dela, aeducao do deficiente auditivo, ampliou-se de forma jamais vista. Assim quedos 6.463 deficientes auditivos atendidos em 1974 (CENESP, 1975), passou-se

    para 19.257, em I987(MEC,SEEC, 1989), isto , com um crescimento da ordemde 198%.

    Apesar desse crescimento, a maior parte dos deficientes auditivos continuano sendo atendida por quaisquer processos de educao ou de reabilitao, oque confirma a assertiva de que o princpio constitucional de acesso ao ensinofundamental, neste caso, est muito distante de ser atingido.

    O mais grave, porm, que mesmo para aqueles que conseguem vencer estaimensa barreira, os resultados so pouco animadores. Em levantamento realizadojunto s classes para deficientes auditivos da DRECAP-3 (Diviso Regional deEnsino, da Secretaria Estadual de Educao, que congrega todas as escolas estaduais

    das Zonas Sul e Oeste da Capital do Estado de So Paulo), verifiquei que, de umtotal de 373 estabelecimentos de ensino estaduais, existiam apenas 32 classesespeciais para deficientes auditivos.

    * Para maiores detalhes sobre o desenvolvimento da Educao Especial no Brasil ver Silveira Bueno,1993. p.85-99.

    * Utilizando-se dos procedimentos de Nise Pires (1974), veremos que a estimativa sobre a incidncia dedeficincia auditiva em indivduos na idade escolar (zero a 14 anos), em 1970. no Brasil, era de 111.000;j em 1990. esta cifra deve ter se ampliado para 160/170.000. o que significaria cerca de 5,8% dapopulao estimada atendida em 1974 e 11.3%. em 1987.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    42/266

    PONTOS DE VISTA: O que pensam os especialistas

    Entre 20 dessas classes (as outras 12 no forneceram informaes), 50%(dez classes) eqivaliam s de 1osrie, 40% (oito classes) s de 2asrie e apenas10% (duas classes) correspondiam a nveis de 3a e 4a srie, o que me levou aafirmar:

    A alta concentrao de alunos nas primeiras sries demonstraque, embora o discurso oficial justifique a existncia de processosespeciais de ensino que estejam adaptados s caractersticas

    peculiares dos excepcionais, a grande maioria no consegueultrapassar os nveis iniciais da escola fundamental... (SilveiraBueno, 1993, p. 132).

    Na realidade, o que ocorre que, em nome da flexibilidade de avaliaonecessria para atender s necessidades dos deficientes, no se fixam em nossopas sries de ensino na Educao Especial como a norma para o ensino regular.Assim, no h qualquer dado oficial sobre os nveis de escolaridade alcanados emEducao Especial, o que no permite estabelecer anlises sobre a sua produtividade.O levantamento anteriormente citado s pode ser realizado atravs das informaesdiretas dos professores que, comparando o contedo trabalhado com o das classesregulares, designava o nvel de sua classe.

    Esta no-definio do nvel de ensino de cada classe especial, embora possater tido como origem a inteno de tornar mais malevel o sistema de avaliao/promoo, na realidade se volta contra o usurio, pois faz com que alunos possamser mantidos durante anos em um mesmo nvel de ensino, sem que haja qualquertipo de controle institucional.

    Esta questo se torna ainda mais grave no caso da deficincia auditiva,quando se verifica que as possveis dificuldades cognitivas so, todas elas,subordinadas ao desenvolvimento da linguagem e que, portanto, esta deficincia,

    per si, no acarreta qualquer dficit cognitivo, o que deveria resultar em bomrendimento escolar, desde que supridas as dificuldades especficas de linguagem.

    Ora, se a questo da cognio e, conseqentemente, do rendimento escolardo deficiente auditivo est subordinada a processos de habilitao e reabilitaode linguagem, seria prioritrio o desenvolvimento de programas que atacassemeste problema

    5No vou entrar aqui em consideraes sobre a polmica linguagem oral x linguagem gestual porconsiderar que, por sua importncia no que se refere anlise poltica das finalidades da educao/reabilitao do deficiente auditivo, este tema deve ser objeto de anlises mais profundas e abrangentesdo que a mera discusso tcnica sobre suas virtudes e defeitos, o que no caberia no presente trabalho.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    43/266

    TENDNCIAS E DESAFIOS DA EDUCAO ESPECIAL

    O que se nota em primeiro lugar que, exceto a pequena parcela da populaoque possui recursos financeiros para arcar com este tipo de programa, so raros osservios pblicos que desenvolvem programas de diagnstico, habilitao e/ou

    reabilitao de linguagem para crianas surdas.Boa parte desses programas so incorporados pelo sistema escolar, sob a

    capa de programas de educao precoce ou de atividades especficas de linguagemo que. por um lado, confunde duas reas de ao, a da sade e a da educao e,por outro, relega a segundo plano a questo da transmisso dos conhecimentossocialmente valorizados, o que levou Soares (1990, p.72) a afirmar, compropriedade, que

    ...o deficiente auditivo , antes de estudante, doente. S podeser estudante depois que deixar de ser doente...

    O que se pode retirar desses dados que, na mais ampla Diviso de Ensino

    da maior capital do pas, a maioria da populao inserida em classes especialmentecriadas para ela, e que a evidncia cientfica indica no possuir deficits cognitivossignificativos, no consegue ultrapassar nveis mnimos de escolarizao. Esta,sem dvida, uma questo poltica que assola tambm o ensino regular e que, parasua soluo definitiva, demanda o estabelecimento de projeto nacional de educaocomprometido efetivamente com o acesso ao saber de toda a populao. Porm,dentro de nosso espao de ao, ele se agrava medida que a falta de posicionamentomais preciso sobre aspectos especficos significativos, como os da metodologiaespecial de ensino e da formao de professores prejudica, ainda mais, o acesso aoconhecimento socialmente valorizado por parte de nossos alunos.

    Desde os primrdios da educao do deficiente auditivo na Europa, no sculoXVIII, a metodologia de ensino para crianas deficientes auditivas tem se confundidocom os processos de reabilitao de linguagem. Tanto assim que se tem designado

    "M. Ceclia Bevilcqua (1987, p. 7) verificou que, em 1985, o nmero de centros especializados nodiagnstico e tratamento de sujeitos com deficincia auditiva voltados populao de baixa rendanao chegava a 15 na cidade de So Paulo.

    7A substituio de programas de reabilitao de linguagem baseados numa abordagem oralistapor outros, fundados na linguagem gestual como "natural" do indivduo surdo ou, ainda,programas orais-gestuais no elimina a distino necessria entre as reas de reabilitao eeducao do deficiente auditivo.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    44/266

    PONTOS DE VISTA: O que pensam os especialistas

    as abordagens oralistas, gestualistas ou mistas como "mtodos de ensino ou deeducao da criana surda*.

    Embora a distino, neste caso, entre trabalho reabilitacional e escolar noseja simples, j que no se pode ignorar que impossvel se trabalhar com linguagemindependentemente do contedo que a comunicao envolve, assim como no hcondies de se atuar com determinado contedo escolar sem que se levem emconsiderao as formas de sua representao, a reduo da metodologia de ensinoespecial para deficientes auditivos a processos especficos de reabilitao delinguagem impede a distino entre dois campos de atuao que, se devem manterinterrelao contnua e estreita, precisam ter, cada vez mais, definies sobre suasreas de competncia.

    Tanto isso verdade que mesmo aspectos muito especficos da reabilitaode linguagem, como o treinamento auditivo e os exerccios articulatrios, tm sido

    considerados como integrantes do currculo escolar.Se, por um lado, a questo metodolgica tem sido problemtica, ela no

    pode ser analisada independentemente daquele que tem a responsabilidade diretapelo ensino, ou seja, o professor.

    No caso da educao do deficiente auditivo, onde a questo da apreenso docontedo escolar est intimamente ligada principal seqela de sua deficincia, aalterao nos processos de aquisio e desenvolvimento da linguagem, a questoda formao especializada assume importncia vital.

    bvio que o progresso da criana deficiente auditiva inserida em processosespeciais de ensino, como a classe e a escola especial, depende da qualidade realizadapelo professor especializado. No se pode esquecer, contudo, que, quando inseridasem classes regulares, as dificuldades inerentes sua deficincia exigemacompanhamento pedaggico especializado, com vistas garantia da assimilaodo contedo escolar e que depende de professor preparado para tal.

    No nosso pas, entretanto, bom nmero de professores no est habilitado,ou ento, submeteu-se a processos de formao de emergncia, de curta durao.

    Ver, nesse sentido, a Proposta Curricular para Deficientes Auditivos (CENESP, 1979, p.25-30). 9Soares (1990, p.83) verificou que 44% das atividades semanais existentes na Proposta Curricularpara Deficientes Auditivos sao dedicadas s reas especficas de reabilitao (fala, treinamento

    auditivo e msica). Sobre a atualidade dessas atividades ver nota 6 p. 41.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    45/266

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    46/266

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    47/266

    TENDNCIAS E DESAFIOS DA EDUCAO ESPECIAL

    Nesse sentido, a democratizao da educao do deficiente auditivo nopode ser almejada sem que se parta do suposto de que, se essa deficincia trazprejuzos a quaisquer sujeitos, o fato de pertencer s camadas subalternas muitomais significativo em um pais onde

    ...os direitos do homem, simplesmente no existem. No existem para aelite de vez que no precisa de direitos, porque tem privilgios. Est, pois, acimadeles. No existem para a imensa maioria da populao -os despossudos pois,suas tentativas de consegui-los so sempre encaradas como problemas de

    polcia e tratadas com todo o rigor do aparato repressor de um Estado quaseonipotente (Da Ros, 1989, p.26).

    A educao do deficiente auditivo no Brasil perspectivas

    Tendo em vista o balano crtico realizado neste artigo, vale a pena teceralgumas consideraes que, se no tm e nem podem ler a pretenso de oferecersolues definitivas para to graves problemas, tem o intuito de, pelo menos, ofereceralguns indicadores que possam servir de balizamento para a democratizao daeducao do deficiente auditivo no Brasil.

    Embora deva ficar claro que uma poltica consistente e efetivamentedemocrtica voltada para a educao de qualquer tipo de deficiente estejasubordinada a uma poltica educacional mais abrangente, que se volte extensoefetiva do direito educao para as crianas das camadas populares, no se podedeixar de considerar que o movimento da educao especial pode exercer influncia

    sobre a democratizao do ensino em nosso pas.Em outras palavras, no podemos utilizar as mazelas das polticas

    educacionais (que efetivamente tm sido instrumentos para que a maior parte dapopulao continue no tendo acesso e/ou permanncia qualificada escola e,conseqentemente, ao conhecimento socialmente valorizado) como muletas quejustifiquem as nossas prprias. Em muitos casos, as justificativas para o fracassoda Educao Especial em nosso pas tm sido mais realistas do que o rei,pois, nofundo, imputam a responsabilidade do fracasso da Educao Especial scaractersticas da populao usuria, nica razo pela qual existimos comoprofissionais especializados.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    48/266

    PONTOS DE VISTA: O que pensam os especialistas

    Nesse sentido, a ampliao de oportunidades educacionais atravs dossistemas pblicos de ensino de importncia fundamental para que se oferea.pelo menos, escolaridade bsica, principalmente s crianas deficientes auditivas

    oriundas das camadas populares as quais, como foi visto, so as grandesprejudicadas pela pequena oferta de vagas.

    Se a ampliao de vagas nos sistemas pblicos de ensino fundamentalpara a democratizao da educao do deficiente auditivo em nosso pas, no sepode descurar da sua permanncia qualificada. Um dos pontos centrais , comcerteza, a busca de maior produtividade, consubstanciada pela ascenso nos nveisde escolaridade. No podemos mais nos contentar com o simples fato de oferecerum mnimo de escolaridade, mas deve ser nossa finalidade a extenso de, pelomenos, a escolaridade de primeiro grau a todos os ingressantes. Se esta umameta que no pode ser alcanada rapidamente, tambm no se pode permanecer noestado atual: depois de vinte anos da criao do Centro Nacional de Educao

    Especial e da maioria dos Servios Estaduais de Educao Especial, permanecemoscom a maioria dos deficientes auditivos que ingressaram na escola nos primeirosnveis do ensino bsico, sem qualquer justificativa tcnica minimamente consistente.

    Esta questo nos leva ao problema da interrelao entre os processos dereabilitao da linguagem e os mtodos de ensino.

    Se se parte da constatao de que a criana deficiente auditiva necessita deatendimento que garanta a superao ou. pelo menos, a minimizao das alteraesprovocadas pela surdez, , portanto, fundamental que se ampliem os servios clnicosespecializados no atendimento de deficientes auditivos que permitam a aquisio edesenvolvimento de sua linguagem. Tendo em vista a anlise realizada anteriormente,

    fica claro, tambm, que a populao penalizada continua sendo a oriunda dosextratos sociais inferiores, razo pela qual parece evidente que este mais umproblema a ser encaminhado dentro de nossas polticas pblicas de sade.

    Se fato que a deficincia auditiva demanda atendimento clnicoespecializado, tambm fundamental que a Educao Especial no absorva,acriticamente, funes que no so de sua alada. Se o acesso ao conhecimentosocialmente valorizado no consiste na nica finalidade da escola moderna, ele sem dvida o mnimo que um sistema escolar que se pretenda democrtico deveatingir.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    49/266

    TENDNCIAS E DESAFIOS DA EDUCAO ESPECIAL

    No caso da educao do deficiente auditivo, fao minha as palavras deSoares (1990, p. 115) quando afirma que

    ...uma atitude poltica no assumir o trabalho clinico na escola porque:

    recupera aquilo que fundamental o exerccio, de fato da funo deprofessor: a garantia de acesso ao conhecimento socialmente disponvel, porparte dos alunos;

    escancara a negao de um direito maioria da populao: o usufrutodos servios de sade, cuja responsabilidade outorgada escola.

    Porm, a recuperao da funo bsica da escola demanda a presena dequadros docentes no s preparados tecnicamente como de condies satisfatriasde trabalho.

    Com relao formao, preciso aceitar o fato de que a eliminao dosantigos cursos de especializao ps-escola normal e sua substituio pela exignciade formao dentro do curso de Pedagogia no s no se encaminhou no sentido deuma melhor qualificao como permitiu, dada a sua pouca proliferao, amanuteno de um eterno "esquema emergencial de formao'', com cursos decurtssima durao. A superao dessa situao e uma conseqente poltica deformao de pessoal , portanto, fundamental para a qualificao progressiva daeducao do deficiente auditivo em nosso pas.

    claro que no posso deixar de levantar um aspecto que me parecefundamental, embora muito semelhante ao do sistema regular de ensino: as condiesde trabalho. No h como negar o processo de deteriorao da escola pblica no

    Brasil, que se tem refletido nas pssimas condies de trabalho, que vo desde am qualidade do espao fsico at a questo salarial, passando pela inexistnciaefetiva de projetos pedaggicos concretos e superviso do trabalho que pudessemsubsidiar e contribuir para a melhoria do trabalho docente, pela falta de materialdidtico mnimo, etc.

    Embora muito parecido, este problema se agrava com relao EducaoEspecial medida que ela encarada dentro de um enfoque assistencialista, isto ,como uma ddiva da sociedade a indivduos que jamais podero corresponder aosesforos despendidos devido sua anormalidade.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    50/266

    PONTOS DE VISTA: O que pensam os especialistas

    Assim, no devemos nos espantar quando destinado classe especial opior espao da escola, se probem atividades comuns entre crianas deficientes ecrianas normais, se encontre resistncia de diretores e professores da escola regular

    para abertura de classes especiais. Se, por um lado, isto reflete uma visopreconceituosa da sociedade, por outro, fruto dos baixos resultados alcanadosat hoje pela Educao Especial em nosso pas.

    Isto nos leva a um ltimo ponto a ser abordado, qual seja, o da polmicaentre a manuteno de escolas/classes especiais para deficientes auditivos ou a suaintegrao em classes regulares.

    Tendo em vista toda a argumentao aqui utilizada, fica evidente que noexiste qualquer razo, no caso da educao da criana surda, para manuteno desistemas segregados de ensino. Embora, nos ltimos dez anos, tenham surgidoiniciativas de administraes comprometidas com acesso cidadania dos membros

    das camadas populares que se encaminham no sentido da integrao qualificada ecom respaldo tcnico-pedaggico especializado, boa parte da discusso travadaentre os especialistas da rea tem se pautado em interesses corporativistas e demanuteno de status quo, que se destinam muito mais a no desacomodar a ns,profissionais da Educao Especial, do que a qualificar o trabalho pedaggico e,conseqentemente, oferecer possibilidades, cada vez maiores, de aprendizado porparte de nossos alunos.

    Estes foram alguns apontamentos que queramos deixar registrados, nosentido de contribuir para que o debate sobre a Educao Especial e, em particular,sobre a educao do deficiente auditivo pudesse se encaminhar, cada vez mais, nosentido de sua real e efetiva democratizao, consubstanciada por uma melhoria

    constante da qualidade do processo pedaggico e, conseqentemente, na elevaodos patamares de escolaridade alcanado por nosso alunado.

    Referncias bibliogrficas

    BEV1LCQUA, Maria Ceclia.A criana deficiente auditiva e a escola. SoPaulo: CLRBalieiro, 1987.

    BRASIL. MEC. Servio de Estatstica da Educao e Cultura. Sinopse estatstica

    da educao especial. Braslia, 1989.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    51/266

    TENDNCIAS E DESAFIOS DA EDUCAO ESPEC/AL

    CENTRO NACIONAL DE EDUCAO ESPECIAL CENESP. Educaoespecial: dados estatsticos - 1974. Braslia: MEC, DDD, 1975.

    _____ . Proposta curricular para deficientes auditivos. Braslia: MEC, DDD,1979. 11 v.

    DAROS, Silvia Zanatta. Poltica Nacional de Educao Especial: consideraes.Caderno CEDES, So Paulo, n.23, p.23-28, 1989.

    MAZZOTTA, Marcos J. da Silveira. Fundamentos de educao especial. SoPaulo: Pioneira, 1982.

    MYKLEBUST, Helmer R. The Psychology of deqfness.New York: Grune andStratton, 1964.

    PIRES, Nise. Educao especial em foco. Rio de Janeiro: Centro Brasileiro de

    Pesquisas Educacionais, 1974.SILVEIRA BUENO, Jos Geraldo. Educao especial brasileira: integrao/

    segregao do aluno diferente. So Paulo: PUC, EDUC, 1993.

    SOARES, Maria Aparecida Leite.A educao do deficiente auditivo: reabilitaoou escolaridade? So Paulo, 1990. Dissertao (Mestrado) PUC-SP.

  • 8/9/2019 Tendncias e Desafios Educao Especial

    52/266

    PONTOS DE VISTA: O que pensam os especialistas

    DEFICINCIA MENTAL: O Que asPesquisas Brasileiras Tm Revelado

    Leila Regina D 'Oliveira de Paula Nunes *Jlio Romero Ferreira**

    A inteno do presente artigo est no resgate e reflexo ac