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TEMAS DE ECONOMIA COM MATEMÁTICA (PARA MS416) José Mario Martínez Departamento de Matemática Aplicada IMECC-UNICAMP i

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TEMAS DE ECONOMIACOM MATEMÁTICA

(PARA MS416)

José Mario Martínez

Departamento de Matemática AplicadaIMECC-UNICAMP

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Prefacio

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iv Prefacio

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Sumario

1 Introdução 1

2 Previsibilidade e valores 3

3 O Sistema visto desde o Espaço 11

4 Modelando o Mundo 174.1 O Mundo como unidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 174.2 O Modelo do Mundo em versão nacional . . . . . . . . . . . . . 214.3 Compatibilização com dados existentes . . . . . . . . . . . . . 23

5 Problemas básicos da Economia 25

6 As cinco taxas 29

7 Produtividade e Competitividade 31

8 Oferta e Procura 338.0.1 Deixando o sistema funcionar à solta . . . . . . . . 468.0.2 Mais de um insumo . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49

9 Receitas de cozinha, Insumo-Produto e Funções de Produção 519.1 Matriz Insumo-Produto como instrumento analítico . . . . . . 569.2 Outra Interpretação da Metodologia de Leontief . . . . . . . . 629.3 Cálculo do Impacto usando a Matriz de Insumo-Produto . . . . 659.4 Estimativa Variacional da “Nova” Matriz de Insumo-Produto . 66

10 Produto Bruto 6910.1 Consumo e Poupança em função da renda . . . . . . . . . . . . 72

11 Teoria do Multiplicador 75

12 Mais sobre a Teoria de Determinação da Renda 81

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vi Sumario

13 Recapitulando 85

14 A Moeda 9514.1 A magia do dinheiro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9514.2 Duas equações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 100

15 Comércio Internacional 10315.1 Inflação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 105

15.1.1 Inflação de Custos . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10515.1.2 Inflaçao de Demanda . . . . . . . . . . . . . . . . . 107

16 Dívida Interna e PIB 109

17 Ativos, rendimento e incerteza 111

18 Medindo a incerteza 113

19 Portfólio com 2 ativos 117

20 Dependência e Correlação 121

21 Portfólio com n ativos 129

22 Geração de cenários 131

23 Otimização do portfólio com média e variância 135

24 Uso de algoritmos de otimização 139

25 Milonga 147

26 Milonga e Markowitz 153

27 Outros problemas de tipo Markowitz 161

28 Valor de Risco (VaR) 169

29 Otimização com restrição no Valor de Risco 175

30 Custos de transação 179

31 Problemas com vários períodos 183

32 O preço justo de um contrato 191

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Sumario vii

33 Black-Scholes 19933.1 O caso “European Call Option” . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20133.2 Fórmula para Opção de Venda (European Put Option) . . . . 20433.3 Programa para calcular o preço de Opcões de Compra e Venda,

tipo Europeu . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20533.4 Uso de Simulação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20633.5 Influência da Volatilidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20733.6 Problemas Inversos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20733.7 Mudando a Escala . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20833.8 Aposta com Felipe e André . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20933.9 Investindo em Opções . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21133.10 A Operação Borboleta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 213

34 Minimização de CVaR 215

35 Impactos 217

36 Derivativos 219

37 Uma breve introdução ao GLPK 22137.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22137.2 Instalação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 222

37.2.1 Windows . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22237.2.2 Linux . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22237.2.3 Mac . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 222

37.3 Modelos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22237.4 Análise da Saída . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 226

37.4.1 Saída Tela . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22637.4.2 Saída no arquivo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 227

Referências Bibliográficas 231

38 Regressão total 233

Referências Bibliográficas 235

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viii Sumario

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Capıtulo 1

Introducao

Estas notas começavam, antes de 2016, com o Capítulo “Ativos, Rendimento eIncertezas”. Nessa forma, foram usadas antes de 2015 para meu curso de ModelosMatemáticos em Economia. Por isso o título das notas “Elementos de Otimiza-ção e Risco”, que não deixava de ser uma advertência de que, provavelmente, oautor entende bastante de otimização, bastante menos de risco, e muito pouco deEconomia como ciência ou disciplina científica.

Mas no Natal de 2016, por razões que não vale a pena comentar, resgatei daminha biblioteca os dois volumes de Introdução à Análise Econômica de Samuelson,que havia comprado em 1976, e cuja leitura sistemática tinha tentado várias vezes,sem sucesso. Pensei que, talvez, a necessidade de ministrar um curso “de economiapara pessoas com formação matemática” me estimularia a ler o livro com algumaprofundidade e de maneira crítica. Logo percebi que a auto-disciplina de “escreveros capítulos de Samuelson com as minhas palavras” era o estímulo que precisavapara me concentrar na tarefa e fugir à tentação de ler o livro como quem lê umromance.

As novas notas são o resultado desse programa. Para ser justos com Samuelson,esclareço que, embora uso argumentos dele sem citar, muitos outros argumentos sãomeus, e o famoso economista não é culpado por erros, especulações, contradiçõese incoerências.

Nenhum leitor destas notas virará economista por sua leitura. De fato, nemo redator destas notas virará jamais economista. A razão é a mesma pela qualninguém aprenderá a nadar sem entrar na água e ninguém aprenderá anatomiasem ver um corpo por dentro. As pessoas comuns temos uma ideia razoável decomo funcionam os consumidores, por experiência própria mas, via de regra, nãosabemos como funciona uma empresa ou a administração de um Estado moderno.Uma deficiência adicional de nossa formação é que desconhecemos a história dopensamento econômico. Como mostrado por J. K. Galbraith (procure na Internet)as ideias econômicas não surgiram do nada, mas apareceram como resultado da

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2 Capıtulo 1. Introducao

evolução histórica dos sistemas de produção e, às vezes, induzidas pelos setoressociais interessados em uma ou outra justificativa. Economistas de verdade devemestar cientes desta evolução para interpretar corretamente o que diferentes autorespreconizaram e valorar na sua justa dimensão postulações que podem estar forade contexto. Por exemplo, existem os debates entre os que preconizam a aber-tura comercial e os que sustentam ideias protecionistas. Tanto uns como outrosinvocam exemplos históricos (países que prosperaram e que não prosperaram) comparecidos graus de convicção. Não é sensato assumir uma posição em relação aesse tópico baseados em considerações de teoria de jogos, “dilemas de prisioneiros”e modelos matemáticos. Afinal de contas, os exemplos históricos se encontramentre as contadas possibilidades de corroboração que há nas ciências sociais.

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Capıtulo 2

Previsibilidade e valores

O pensamento científico se caracteriza pela subserviência diante do princípio decorroboração. Provavelmente não existe o “método científico"pensado como um al-goritmo geralmente tripartito (Hipótese→ Dedução de consequências particulares→ Experimentação ou verificação). O que sim existe é que quando uma proposi-ção é corroborada, ela continua (pelo menos provisoriamente) no nosso acervo deconhecimentos, e quando ela é não-corroborada (sua negação é corroborada) elaé descartada. Corroboração é uma versão fraca da verificação (não-corroboraçãopara refutação). A corroboração pode se realizar de diferentes maneiras. Algumasciências usam o experimento, o que às vezes é possível. Outras usam a procurade observações adequadas, e também é usada a consistência com observações oucom teorias anteriores bem consolidadas. A matemática corrobora seus resultados,em geral, mediante demonstrações com rigor lógico ou com contraexemplos. Masa própria matemática trabalha, às vezes, com sistemas mais difusos de corrobora-ção. Por exemplo, nos anos 60 criou-se uma disciplina matemática nova, chamadaAnálise não-standard, que resgatava de maneira logicamente impecável os antigosinfinitesimais e conjeturou-se que, mediante esta disciplina, se poderiam obter re-sultados novos de maneira mais acelerada que com a análise tradicional. Esta foiuma conjetura matemática cuja corroboração não se reduz a provar um teoremaou mostrar um contraexemplo. Entretanto, ainda é uma conjetura matemáticapois é duvidoso que interesse a alguém que não seja matemático e que possa sercorroborada por pessoas sem formação matemática.

Para que uma proposição possa ser corroborada ela precisa estar formulada comclareza. Todos seus termos devem ser compreensíveis, suas implicações devem serderivadas de maneira inobjetável e deve estar preparada para sua constatação coma realidade, ou com proposições alternativas talvez originadas em outros desenvol-vimentos. Mas os seres humanos, cientistas ou não, não gostamos de ter nossasconjeturas refutadas, por isso nossos sentimentos nos levam a formular tais conjetu-ras, às vezes, de maneira que sua refutação seja impossível. De fato, se precisa uma

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4 Capıtulo 2. Previsibilidade e valores

forte “auto-disciplina” para escapar à tentação de formular teorias de maneira talque, aconteça o que acontecer, elas sobreviverão pela sua própria estrutura lógica(ou até tautológica).

Se submeter ao princípio de corroboração, em qualquer aspecto do conheci-mento, é um grande risco. As ideias que defendemos durante muitos anos podemcair por terra, os nossos amigos e familiares podem passar a nos considerar traido-res, precisaremos dar explicações e mudar nossos estilos de vida. Nossas posiçõeslaborais e acadêmicas podem ser ameaçadas. Por isso é muito tentador fugir dasproposições corroboráveis como o diabo da cruz. A ciência e a vida quotidiana es-tão prenhadas de artimanhas para descartar o risco de ser refutados. Por exemplo,você formula a conjetura de que X é causa de Y. Mas na realidade, no começo,você não tinha nenhuma conjetura. Você observou 100 aparições de X e contabi-lizou em quantas delas apareciam uma série de possíveis efeitos Y1, Y2, . . ., quantomais melhor. Algum destes efeitos, digamos Y8, devem ter aparecido um númerorazoável de vezes. Este é o momento em que você finge formular sua conjetura: “Xcausa Y8”. Exemplo do exemplo: Considere os nascidos em Capricornio e procureformular uma conjetura que relaciona tal fato com a proficiência em uma disciplinaou arte, escolhida de um número suficientemente grande.

As pseudociências são as disciplinas que pretendem o prestigioso status cientí-fico sem se submeter aos princípios de corroboração. A religião explicitamente nãose submete a tais princípios pois na essência da fé religiosa está o fato de que seusenunciados são verdadeiros independentemente de qualquer constatação externaindependente mas, obviamente, a religião não reivindica o status científico.

Outras disciplinas intelectuais não merecem ser chamadas de ciências, pela nãoobservância do princípio de corroboração, mas também não são pseudo-ciências,pois, em geral, não almejam o status científico. Por exemplo, marxistas, freudianos,lacanianos, estudosos bíblicos, costumam se dedicar ao estudo e aprofundamentode determinados textos, com os quais construem uma cosmovisão mais ou menosabrangente. Esta cosmovisão pode ser útil como ferramenta para a autêntica in-dagação científica (sujeita a corroboração) mas não é uma ciência em si mesma.Por exemplo, os estudosos escolásticos de Freud conseguem interpretar muitos fa-tos reais com o arcabouço do ensino do famoso inventor da Psicanálise. Com umapitada adicional de pensamento científico poderiam pôr a prova tais interpretações,mas isso não é o objetivo fundamental, na prática, dos estudos escolásticos. Emtodo caso, diante das ciências sociais (e a Economia é uma delas!) devemos sempreser prudentes. Diferenciar entre afirmações científicas, corroboráveis, e “visões domundo” é importante. Entretanto, devemos reconhecer humildemente que todosadoptamos, ao longo de nossas vidas, diferentes visões do mundo que não desejamossubmeter aos rigores da corroboração.

No clássico livro Introdução à Análise Econômica de Paul Samuelson (página 8do Tomo 1) [12] lemos: “No que se refere a muitos princípios básicos quanto a preços

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e nível de emprego, a maioria (não todos!) os economistas está razoavelmente deacordo. Esta afirmativa não significa que os economistas estão de acordo no campoda orientação. O Economista A pode ser a favor do pleno emprego a qualquer custo.O Economista B pode considerar que o pleno emprego tenha importância tão vitalquanto a estabilidade de preços. Questões básicas relativas a objetivos certos eerrados não podem ser resolvidas apenas pela ciência como tal. Elas se encontramno campo da ética e dos ‘julgamentos de valor’. O público tem que decidir, nofinal, essas questões. O que o perito pode fazer é assinalar as alternativas factíveise os custos reais que podem estar envolvidos nas diferentes decisões. Ainda assim,a mente tem que ceder ao coração aquilo que pertence ao domínio do coração”.

O parágrafo de Samuelson aponta para um aspecto crucial nas ciências soci-ais. Nas decisões econõmicas está claro que alguns objetivos são desejáveis pelamaioria da população: Crescimento sustentável, Inflação baixa, Dívida moderada,Renda bem distribuída, Eliminação da pobreza, Aumento da expectativa de vida,Satisfação generalizada das necessidades básicas, Estímulo ao progresso individuale coletivo, Eliminação das crises periódicas do sistema, etc.

Todas estas magnitudes estão conectadas entre si. Decisões em relação a dívidapública (por exemplo, taxa de juros) tem influência na inflação e no crescimento,na distribuição de renda, no aumento ou diminuição da pobreza, nos orçamentosde saúde e de educação e até no tipo de estímulo que os empreendedores têm paraorientar suas ações (especular no mercado financeiro ou produzir alguma coisa?).

Entretanto, ninguém pode saber exatamente quais são essas conexões. Porexemplo, em quanto tempo e em que magnitude um aumento da taxa SELIC afetaa inflação? Diferentes economistas tem diferentes graus de certeza em relação aessas conexões e um espírito científico corroborativo deveria levar a desenhar ex-perimentos ou selecionar observações destinadas à maior ou menor corroboraçãodas hipóteses relacionadas. Entretanto, não apenas tais corroborações são tecni-camente difíceis, mas todo o tema está inevitavemente tingido com as preferênciase valores dos economistas, seus compromissos e vinculações setoriais, acadêmicase de classe social. Dificilmente um economista sucumbirá à nobre tentação de ex-pressar com toda clareza sua hipótese sobre o impacto da taxa de juros na inflação,com uma clara previsão dos seus efeitos e a singela aceitação de que “se aconteceX, estou certo mas se acontece Y estou errado”. Nessas circunstâncias, é possí-vel uma ciência econômica? No sentido em que é possível uma ciência da Física,certamente não. O que sim é possível é a introdução implacável do pensamento ci-entífico (corroborativo) em cada momento e lugar em que as hipóteses econômicassão formuladas. As soluções serão diferentes de acordo com as prioridades que osformuladores de teorias sustentem, baseados em seus próprios valores. Mas, pelomenos, os erros mais vulgares relativos a inconsistências dentro do próprio sistemade preferências serão evitados. Um dos erros mais comuns consiste na tomada deci-sões baseada em certezas absolutas, por parte de formuladores que, tranquilamente

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6 Capıtulo 2. Previsibilidade e valores

embora de maneira subjetiva, saberiam quantificar seu grau de incerteza.

O modelo multiobjetivoMuitos economistas consideram que incertezas e valores descartam o uso da

matemática na economia. A matemática se caracteriza por definir rigorosamente eusar de maneira intransigente e obsessiva a lógica tradicional para conectar enun-ciados com significado claro. Por isso, parece suspeita a ideia de que a matemáticanão possa ser aplicada à economia, exceto que os praticantes desta ciência desejemdeliberadamente definir de maneira ambígua, ou não definir em absoluto, desis-tir da lógica tradicional ou conectar enunciados de maneira ambígua e obscura.Não sendo este o caso, a matemática sempre pode fazer o melhor possível compraticamente qualquer assunto. Por exemplo, o problema da incerteza é aceitavel-mente tratado por técnicas matemáticas como probabilidade, estatística, simulaçãoe análises de risco. O problema dos valores certamente é mais sutil, mas podemosconseguir uma boa aproximação da aproximação que a matemática pode fazer aomesmo através do “modelo multiobjetivo”. O problema de valores se refere aoque cada pessoa considera melhor ou pior, mais ou menos desejável. O objeto aser valorado, normalmente, não é simples. Todos concordamos que é melhor umaexpectativa de vida alta que uma expectativa de vida baixa, mas situações comple-xas não se descrevem por um único número, como a expectativa de vida e, quandoa descrição da situação envolve mais de uma magnitude necessariamente nos de-frontamos com problemas de comparação. Por exemplo, suponhamos que umapolítica econômica garante um crescimento de 10 por cento na renda per cápitaacompanhado de um crescimento de 10 por cento da desigualdade. (Há diferentesmaneiras de definir desigualdade. Suponhamos aqui que definimos desigualdadecomo o quociente entre a renda per cápita do 10 por cento mais rico da populaçãodividida pela renda per cápita do 10 por cento mais pobre.) Provavelmente todosconcordaremos em que é desejável uma renda per cápita tão alta quanto possível euma desigualdade tão baixa quanto possível. Se uma segunda política econômicagarante 2 por cento de aumento da renda per cápita e um crescimento de 20 porcento da desigualdade, esta segunda política econômica é pior que a primeira por-que é inferior a ela nos dois objetivos identificáveis. Mas, que acontece com umaterceira política econômica que garanta 5 por cento de crescimento da renda percápita mas um decréscimo de 3 por cento da desigualdade? Qual das duas políticaseconômicas é melhor? Obviamente, isto depende dos valores das pessoas o gruposque venham julgar ambas políticas. Omitimos aqui o fato de que, se tratando depolíticas para o futuro, aparece o fator incerteza ou viabilidade de uma ou outrapolítica econômica, mas também podemos trasladar o problema para o passado enos perguntar se preferimos vivir em uma sociedade rica em média mas desigualou pobre em média mas igualitária.

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Atividades

1. Discutam a seguinte afirmação: “O objetivo de um modelo econômico não éprever bem o futuro mas convencer os agentes econômicos de que ele conse-gue prever o futuro. Quando um modelo consegue isso os próprios agenteseconômicos se encarregam de que ele faça boas previsões.”

2. Formule 10 hipóteses corroboráveis e 10 hipóteses não corroboráveis. Paraas segundas, reformule de maneira de aumentar as chances de corroboração.

3. Para fixar ideias pense no Brasil de 2026. Coloque, no eixo horizontal de umgráfico bidimensional a variação percentual da renda per cápita em relaçãoà renda per cápita de 2015. No eixo vertical coloque a distribuição de rendamedida na forma indicada neste capítulo. (Você sabe qual é esse valor em2015?) Desenhe nesse gráfico 1783 pontos bem distribuídos pintando de verdeos que você considere possíveis e de marrom os que considere impossíveis.Para cada par de pontos A e B estabeleça se A é melhor que B desde todosos pontos de vista possíveis. Nesse caso, vamos dizer que A domina a B.Desenhe o conjunto de pontos não-dominados. A curva resultante se chamacurva eficiente ou frente de Pareto na literatura multiobjetivo. Em que pontoda curva eficiente você gostaria de viver em 2026? Compare com as escolhasde seus colegas e de sua Tia Berlarmina.

4. A tabela vigente de imposto de renda em 2015 era:

(a) Até 1903 reais por mês, isento.

(b) Em (1903, 2827] 7.5 por cento.

(c) Em (2927, 3751] 15 por cento.

(d) Em (3751, 4665] 22.5 por cento.

(e) Mais que 4665, 27.5 por cento.

Uma proposta apresentada pela bancada do PT para 2016 é a seguinte:

(a) Até 3390, isento.

(b) Em (3390, 6780], 5 por cento.

(c) Em (6780, 10170], 10 por cento.

(d) Em (10170, 13560], 15 por cento.

(e) Em (13560, 27120], 20 por cento.

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8 Capıtulo 2. Previsibilidade e valores

(f) Em (27120, 108480], 30 por cento.(g) Acima de 108480, 40 por cento.

Em primeiro lugar, transforme estas tabelas em fórmulas corretas. (Interpre-tadas literalmente, seria melhor você ganhar 2826 reais que ganhar 2828, oque, apesar das lendas urbanas, não é possível.)Segundo, estime a arrecadação que seria obtida em ambas situações.Terceiro, mantendo a arrecadação atual, elabore sua própria tabela.Quarto, para evitar erros e simplificar descrições defina polinômios interpo-ladores para todas as alternativas sugeridas e veja se fica mais bonito. Épossível conseguir um polinômio aceitável?Quinto, faça um programa que calcule o imposto de renda efetivamente pagopela população brasileira em 2016 usando quaquer tabela possível do tipo dasexibidas acima. Depois, faça um programa que otimize a tabela do Impostode Renda, maximizando a arrecadação mas impondo restrições adequadasde diferentes tipos (justiça social, progressividade, moderação nas mudanças,etcétera). Acople seu programa com um sistema interativo que permita suge-rir alternativas ao planificador observando ao mesmo tempo em quanto essasalternativas são piores que a tabela ótima do ponto de vista da arrecadação.

5. As contas de eletricidade e água são (ou poderiam ser) calculadas diferenci-ando níveis de renda (ou talvez consumo, ou uma combinação as duas coisas).O estabelecimento de “alícuotas” deve obedecer a princípios de manutençãode faturamento, justiça social, viabilidade política, etc. O problema é, assim,análogo ao do estabelecimento de uma tabela de imposto de renda (IRPF).Estabeleça todas as regras e restrições que considerar adequadas e faça umprograma para gerar alícuotas ótimas para algum bem ou serviço público.

6. Mercado Financeiro: Suponha que cada membro de um conjunto de pessoasaposta 10 reais em relação ao resultado de determinado evento (por exem-plo, O Banco Central aumentará a taxa SELIC?) Se a pessoa não acerta, elaperde os 10 reais. Se acerta ele ganha o total de reais apostados dividido onúmero de acertadores. Suponha que com uma probabilidade p o evento vaidar o resultado previsto pela maioria (por exemplo, com probabilidade p, ataxa SELIC vai aumentar se a maioria pensa que vai aumentar. Baseada nes-tes fatos, desenhe uma estratégia para ganhar dinheiro. Elabore conclusõesquanto ao comportamento dos mercados, do Banco Central e da imprensaespecializada.

7. O Dilema da Democracia: Em um país há dois partidos, chamados D e E. Ototal dos ingressos do país cresce 1 por cento todos os anos. A população se

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divide em dois conjuntos A e B. O total dos ingressos dos do conjunto A éigual ao do conjunto B, mas cada indivíduo do conjunto A ganha mais quecada indivíduo do conjunto B. Quando o partido D ganha as eleições o totaldos ingressos novos desse ano se distribui igualitariamente no conjunto A.Quando o partido E ganha as eleições o total dos ingressos novos se distribuiigualitariamente no conjunto B. Em princípio, cada pessoa no conjunto Avota no partido D e cada pessoa no conjunto B vota no partido A. Entretanto,o maior poder econômico do conjunto A faz com que consigam convenceralgumas pessoas do conjunto B a votar no partido D. A quantidade de pessoasdo conjunto B que é convencida a votar no partido D é proporcional aoquociente entre o total de ingressos do 10 por cento mais rico da populaçãoe o total de ingressos de toda a população. Esse quociente se chama Q.Obviamente, o máximo desse quociente é igual a 1, que corresponde ao casode que o 10 por cento mais rico recebe o total dos ingressos. O mínimovalor desse quociente é 0.1, que corresponde ao caso em que o 10 por centomais rico leva 10 por cento dos ingressos. A constante de proporcionalidadese chama θ, que deve ser menor ou igual que 1. Portanto, em cada eleiçãouma fração θQ dos membros do grupo B votam no partido D, enquanto osoutros seguem sua tendência natural. Faça uma simulação deste sistema paradiferentes valores de θ.

8. Leia e discuta as posições de Delfim Netto em:

http://www.planobrazil.com/delfim-netto-analisa-o-fracasso-dos-economistas/

9. O problema do crescimento infinito em um planeta finito é analisado emmuitos textos. Por exemplo:

http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2011/10/111003_capitalismo_tim_jackson_rw.shtml

Entretanto, existem muitos serviços que, como tais, formam parte do PIBde um país e não consumem absolutamente nada em termos de recursosnaturais finitos. Por exemplo, a atividade de ler poesias em voz alta em umapraça. Você poderá arguir: Tudo bem, mas quem vai pagar por isso? Bem,em uma sociedade na qual há pessoas que pagam para ter o Big BrotherBrasil disponível 24 horas por dia essa objeção é bastante irrelevante. Éimpossível adivinhar que coisas o ser humano vai considerar bens e serviçosdignos de ser remunerados no futuro. Analise a totalidade dos bens e serviçosproduzidos atualmente no mundo e classifique aqueles que são relevantes paraa sobrevivência e aqueles que parecem supérfluos. Enumere 20 serviços (oubens) que não representam nenhum ônus em termos de consumo de recursosnaturais. Analise o ponto de vista de que, a fim de contas, existe uma pequena

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10 Capıtulo 2. Previsibilidade e valores

quantidade de bens e serviços realmente úteis e que o resto dos bens e serviçosproduzidos somente servem para motivar a produção daqueles úteis.

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Capıtulo 3

O Sistema visto desde oEspaco

Se a movimentação dos seres humanos na Terra fosse contemplada desde Júpiterpor seres razoavelmente inteligentes eles veriam seres humanos trabalhando paraproduzir bens e serviços e seres humanos (muitas vezes os mesmos) consumindoesses bens e serviços para sobreviver, ser felizes e diminuír o desconforto e a dor.

Seres humanos cultivariam cenouras, fabricariam manteiga, dariam aulas dematemática, construiriam prédios e canoas, elaborariam regulamentos, fabricariampapel, extrairiam amígdalas. Seres humanos consumiriam ou fariam uso dessesbens e serviços. Talvez nossos observadores ficariam surpresos pelo empenho deseres humanos em fabricar bens aparentemente inúteis ou nefastos, como cigarrose armas, mas atribuiriam o consumo desses “bens” a estranhos aspectos de nossapsicologia, fora de sua capacidade de compreensão.

Os seres humanos se organizam para produzir bens e serviços em entidadeschamadas Empresas. Se os observadores do outro planeta olhassem com atençãoperceberiam que a produção de bens e serviços por essas “empresas” e seu consumopelo público está mediatizada por um objeto sutil chamado Dinheiro. As empresas,cujos membros se chamam produtores, ou empregados, ou trabalhadores, recebemdinheiro em troca dos objetos e serviços que produzem. Em compensação, elaspagam dinheiro a seus empregados. Os empregados, por sua vez, se transformamem consumidores para receber das empresas aqueles produtos que desejam pelodinheiro que podem pagar, de acordo com a remuneração que receberam das em-presas onde trabalham.

Logo os observadores interplanetários descobririam que o planeta Terra estádividido em países, dentro dos quais a produção de bens e serviços está organizadade maneira mais ou menos independente. Logo perceberiam que cada país tem umGoverno, entidade que joga um papel importante no funcionamento do sistema.

O dinheiro que o conjunto das empresas paga se divide em salários, lucros, alu-guéis, impostos, juros e amortizações, e gastos com importações. Cada empresaindividual também paga por insumos (compras feitas a outras empresas ou servi-

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12 Capıtulo 3. O Sistema visto desde o Espaco

ços prestados por estas) mas olhando as empresas em conjunto essas transaçõesdesaparecem pois o que uma empresa paga é o que outra recebe. Salários, Lu-cros, Aluguéis, Juros-amortizações, Impostos e Pagamentos por Importações é atotalidade de dinheiro que sai do conjunto Empresas.

“Salários” é a remuneração paga aos trabalhadores, “Lucros” é a remuneraçãoque fica com com um tipo especial de membros das empresas, chamados proprietá-rios, “Aluguéis” são pagos pelas empresas por prédios e equipamentos, “Impostos” éo que obrigatoriamente pagam ao Governo, “Juros e Amortizações” é o pagamentopor dinheiro devido. Finalmente, a empresa também pode ter despesas por comprade bens, insumos ou serviços fora do país (importações).

Agora, o dinheiro que o conjunto das empresas gasta todos os anos deve entrarde alguma maneira porque as empresas não fabricam dinheiro. As rotas de entradasão o Consumo das Famílias, os Gastos do Governo, o pagamento de dívidas, osempréstimos e as exportações.

“Consumo das Famílias” é o dinheiro que as pessoas físicas gastam comprandobens e serviços, “Gastos do Governo” é o conjunto dos pagamentos feitos pelo go-verno em troca de bens e serviços, incluindo os salários dos funcionários e as trans-ferências (por exemplo, em programas sociais). “Empréstimos” (ou investimentos)é o dinheiro que as pessoas ingressam no sistema produtivo como poupança, peloqual receberão juros.

As entradas de dinheiro no conjunto Empresas deve ser aproximadamente igualàs saídas, independentemente de equilíbrios um tanto artificiais nos balanços con-táveis.

Agora vamos fazer um Experimento Mental. Comecemos o experimento su-pondo que “Alguém” (não importa quem) compra bens e serviços pelo valor de 1trilhão (1000 bilhões) de reais do sistema produtivo.

Esse trilhão de reais sai do sistema produtivo depois de uma semana na formade pagamento de salários, lucros e impostos. Neste experimento os impostos são10 por cento dos pagamentos e vamos esquecer os lucros, de maneira que sairão900 bilhões em salários e 100 bilhões ficarão para o Governo.

Por que uma semana? Bom, é o tempo que estimamos necessário para que asempresas processem os pagamentos internos de insumos. Em um caso extremo,que todas as empresas se dediquem a um serviço como Aulas de Matemática, estapassagem para os salários e impostos seria ainda mais rápida.

De posse de 900 bilhões de reais, as famílias, depois de 3 semanas, voltariamao consumo e o Governo guardaria 100 bilhões.

Uma semana depois, as empresas pagariam os salários (810 bilhões) e os im-postos (90 bilhões). Assim, este processo se repetiria muitas vezes.

Dessa maneira, teriamos:Dia 1 de Mês 1: 1000 bilhões gastados em bens e serviços pelo público.Dia 1 de Mês 2: 900 bilhões;

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Dia 1 de Mês 3: 810 bilhões;Dia 1 de Mês 4: 729 bilhões;

e assim por diante. Depois de um ano (12 meses) a quantidade de reais gastos emconsumo (por exemplo, aulas de matemática) seria:

1000(1 + 0.9 + 0.92 + 0.93 + . . .+ 0.911) = 10001− 0.912

1− 0.9= 7176 bilhões de reais .

Se estendêssemos o período, de 12 meses para infinitos meses chegariamos a 10 milbilhões.

No período de 13 meses, o Governo teria ficado com

1000(0.1+0.1∗0.9+0.1∗0.92+. . .+0.1∗0.911 = 1000×0.11− 0.912

1− 0.9= 617.6 bilhões reais,

que se estenderiam a 1000 bilhões se o tempo fosse infinito.Se se tratasse de um único produto, se esse produto fosse a aula de matemática,

e se o preço de cada aula de matemática fosse 1000 reais, esta conta revela que, noperíodo de um ano, teriam sido produzidas 717.6 milhões de aulas de matemática,ou seja, aulas de matemática pelo valor de 7176 bilhões, partindo de uma “injeçãoinicial” do sistema de 1 trilhão de reais.

Observem também que nunca houve mais de um trilhão de reais circulandona Economia. Entretanto, foram produzidos, em um ano, bens e serviços porvalor de 7.176 trilhões, correspondendo a 7176 milhões de produtos físicos. Assim,costuma-se dizer que o poder “multiplicador” do trilhão injetado inicialmente é de7.176.

Portanto, no primeiro dia do mês 12, quando o dinheiro para consumo era0.911 × 1000 = 314 bilhões de reais, os restantes 686 bilhões estariam em mãos doGoverno, como resultado dos impostos recolhidos.

Aparentemente há uma magia nesse processo, devido a que na nossa vida quo-tidiana o dinheiro não se multiplica automaticamente. Estamos acostumados atratar o dinheiro como uma coisa em si porque assim é que funciona para cadaindivíduo da sociedade. Mas para a sociedade como conjunto o dinheiro é apenasum artifício (extremamente eficiente!) para que as pessoas trabalhem e produzamo que o conjunto da sociedade precisa. Mais ainda, a dinâmica do dinheiro fazque a sociedade produza muitos bens dos quais, estritamente falando, não precisa,como aulas de Pilates, porque essa produção ajuda à circulação pacífica dentro dosistema produtivo.

Se, magicamente, todo o dinheiro desaparecesse mas cada pessoa fosse con-vencida a fazer a mesma coisa que fazia o dia anterior à tal desaparição, ninguémpassaria fome nem frio nem deixaria de se divertir por isso (ou seja, passariam fome,frio e falta de diversões exatamente as mesmas pessoas que sofriam essa carências

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14 Capıtulo 3. O Sistema visto desde o Espaco

no dia anterior à desaparição). Certamente, não seria viável este convencimentoinstantâneo por parte das pessoas, mas em termos de psicologia social nada podeser descartado!

Por outra parte, existem sim acontecimentos que podem fazer que as pessoaspassem fome, frio e privações da noite para a manhã, que nada tem a ver com apresença ou ausência de dinheiro: guerras, catástrofes naturais e deterioração doambiente.

Este experimento mental nos leva a uma série de perguntas:

1. Que aconteceria se, em 2016, o Governo desse 1 trilhão adicional de reaispara uma parte da população, por exemplo, com um programa de tipo Bolsa-Família? (Vejam o artigo de Eduardo Fagnani em

http://brasildebate.com.br/politica-social-e-crescimento-economico/.)

Um conservador responderia que o único efeito desta transferência seria dis-tributivo, ou seja, uma parte da população teria acesso a mais bens e serviços,porque o dinheiro novo alocado em consumo não aumentaria a produção, masapenas aumentaria os preços dos produtos. Evidentemente essa é uma possi-bilidade, mas existe a possibilidade extrema contrária, que é que os produtosnão aumentassem de preço e as Empresas fossem capazes de produzir mais.A verdade está provavelmente entre os dois extremos. Vejam que o que faz “averdade” pender mais para um extremo que para outro é a existência da capa-cidade ociosa nas Empresas e o possível desemprego. Se a situação é de plenoemprego e de utilização no limite da capacidade produtiva, a resposta pendemais para o lado dos conservadores. (Isto quanto à capacidade multiplica-tiva da transferência, pois quanto a função distributiva não há controvérsiapossível.)

2. Que aconteceria se o período de um mês fosse reduzido para 15 dias? E setivesse passado para 3 meses?

No primeiro caso, o que aconteceu em um ano teria acontecido em 6 meses,portanto, bastariam 6 meses para produzir por valor de 7176 bilhões de reais(ou 716.6 milhões de aulas de matemática). Reciprocamente, se o períodoque arbitramos sendo um mês fosse de 3 meses, o que aconteceu em umano passaria a acontecer em três. Isto significa que, do ponto de vista daquantidade de bens produzidos, é melhor que a passagem de dinheiro pelasempresas e pelo público seja o mais rápido possível.

3. Que aconteceria se o público, em vez de gastar todo seu dinheiro em consumo,poupasse um 20 por cento?

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Do ponto de vista econômico esse 20 por cento se acumularia com a mesmadinâmica dos impostos. Em particular, essa acumulação nunca excederia ototal do impuso inicial de 1 bilhão de reais.

4. A distribuição de renda tem alguma relação com a velocidade de circulação?

Claramente, tem. Todos sabem que, quanto menores os ingressos, mais ra-pidamente eles são gastos em consumo. Por outro lado, a taxa de poupançatambém tem a ver com o nível de ingressos. Quanto menores os ingressos,menor a taxa de poupança.

Este sistema de produção poderia funcionar para sempre sem impostos e semlucros. Por exemplo, suponhamos que temos uma população de 1 milhão de pessoase que, no início do processo, cada uma tem 1000 reais. As necessidades destaspessoas se satisfazem com aulas de matemática. Cada aula de matemática custa1000 reais. A empresa que produz aulas de matemáticas está formada pelo mesmomilhão de pessoas que forma a população. Quando as pessoas vão à empresa acomprar as aulas de matemática, a empresa se organiza assim: A pessoa P2 dáuma aula para a pessoa P1, a pessoa P3 dá uma aula para a pessoa P2, e assimpor diante até que a pessoa P1 dá uma aula para a pessoa P1000000. Comoconsumidoras, as pessoas são alunas das aulas. Como membros da empresa, elasdão aulas e são trabalhadoras. Como consumidora, cada pessoa paga 1000 reaispara empresa. No mesmo dia, a empresa paga o salário de 1000 reais para cadatrabalhadora. Em consequência, no dia seguinte, cada pessoa-consumidora estáde volta com 1000 reais na mão. Observem que este sistema consegue produzir 1milhão de aulas de matemática por dia, valendo 1 bilhão de reais. Em um ano, aprodução física do sistema seria 365 milhões de aulas de matematica e a produçãoem dinheiro seria 365 bilhões de reais. Mas nunca houve no sistema mais de 1bilhão de reais.

Vamos avançar mais um pouco no Experimento Mental. Pensemos que há umgrupo de pessoas que resolvem guardar uma parte da remuneração que obtêmpelo trabalho nas Empresas, sejam salários ou lucros. Isto diminui o dinheiroque circula no sistema. De fato, diminui cada vez mais e, com o tempo, todo odinheiro fica em mãos desses poupadores ou do Governo. Como consequência, opúblico não tem dinheiro para consumir e as Empresas não têm a quem venderseus produtos. Isto vai produzir uma diminuição do preço dos produtos e/ou umaumento do desemprego. Por exemplo, inicialmente o preço do produto era 1000reais e os consumidores tinham 1 bilhão de reais. Portanto, se fabricava 1 milhãode produtos. Se, depois de um tempo, o dinheiro em mãos do público é 1 milhãode reais então há duas possibilidades extremas: É mantida a produção de 1 milhãode produtos mas, nesse caso, o preço de cada produto passa a ser um real ou émantido o preço de 1000 reais por produto mas nesse caso somente 1000 pessoas

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16 Capıtulo 3. O Sistema visto desde o Espaco

estão empregadas nas Empresas. Digamos que o que acontece é algo intermédioentre esses dois extremos: haverá desemprego queda dos preços.

Nesse tempo, os poupadores terão acumulado uma quantidade considerável dedinheiro. (E o Governo também.) Devido à queda dos preços, os poupadorespodem decidir gastar seu dinheiro comprando os produtos a baixo preço. Se elesfazem isso todos ao mesmo tempo, e esquecendo o dinheiro que está em mãos dogoverno, provocarão um rápido aumento do emprego e dos preços. Portanto, osPoupadores terão comprado um produto barato que, subitamente, aumentará depreço, É uma oportunidade excelente para ganhar dinheiro com a diferença.

Entrentanto, os poupadores podem fazer algo mais esperto ainda. Eles po-dem comprar uma classe especial de bens, chamados “bens permanentes” ou “decapital”, para se diferenciar do consumo. Por exemplo, podem se reunir e com-prar um prédio para que os professores ministrem aulas de matemática, ou podemcomprar computadores e equipamentos para aulas a distância. Estes bens tem aparticularidade de que, em vez de ser consumidos pelo público, são usados pelasempresas para aumentar sua produtividade, isto é, para produzir mais usando amesma quantidade de mão de obra. Quando o dinheiro é usado para comprar essetipo de bens, se diz que se realiza um investimento. Para manter os investimentosdentro de nosso experimento mental podemos pensar que os bens de capital assimadquiridos permanecem propriedade do público e que as Empresas pagam aluguelpelos mesmos. Lembrem que “aluguéis” é um dos gastos que admitimos para asempresas no experimento.

Por outro lado, temos o Governo. Este também acumula dinheiro dos impostosno nosso experimento mas seu objetivo não é, em princípio, se beneficiar de diferen-ças de preços. Portanto, pode intervir no sistema transferindo dinheiro diretamentepara o público, por exemplo, aumentando aposentadorias, criando programas tipobolsa-família e oferecendo créditos baratos. Mais ainda, o Governo pode intervirno sistema mesmo antes de que o desemprego tenha aumentado muito, o que sedenomina “política anticíclica” porque se contrapõe ao ciclo que seria produzidopela acumulação de poupança e o despejo da mesma pelo setor privado.

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Capıtulo 4

Modelando o Mundo

OModelo Mundial Latinoamericano (MML) [4] foi um audacioso projeto elaboradonos anos 70 por cientistas latinoamericanos em resposta ao Modelo do Clube deRoma [5], o qual sustentava que, para a sustentabilidade do mundo futuro, os paísesem desenvolvimento deviam inibir seu crescimento.

(Veja http://ideas.repec.org/a/eee/agisys/v3y1978i4p315-316.html)Neste capítulo vamos expor uma versão ultra-simplificada (e possivelmente ter-

giversada!) do MML.

4.1 O Mundo como unidade

Vamos considerar o Mundo inteiro como um sistema econômico onde as pessoasproduzem bens e serviços necessários para sua subsistência em bem-estar, assimcomo os médios (bens de capital) necessários para produzir tais bens e serviços eoutros bens de capital.

Consideraremos que a produção de bens e serviços, incluíndo os bens de capi-tal, no mundo inteiro, está dada por uma “função de produção” (para determinadoperíodo de tempo, digamos, um ano) dada por P (K,L,R), onde L é o número detrabalhadores alocados, K é o capital fixo usado para a produção e R são os recur-sos naturais (terra, minérios, água, etc). A produção de qualquer bem ou serviçoestá associada a uma alocação de trabalhadores, máquinas e equipamentos perma-nentes e espaço físico na Terra. Por exemplo, as aulas do curso de Matemáticasão ministradas por professores, usando materiais permanentes como os prédios daUniversidade, as louças, as cadeiras e livros, e o espaço físico que a Universidadeocupa.

Observem que uma fábrica que produz macarrão e uma Universidade que pro-duz aulas de matemática empregam, além de material permanente, material deconsumo como papel, lápis, sabonete e produtos de limpeza. Esse material deconsumo aqui é considerado como insumo intermediário, mas não final. Ou seja,

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18 Capıtulo 4. Modelando o Mundo

o papel consumido pela Universidade não se conta entre os bens e serviços consu-midos pelo público pois são apenas insumos que servem para a produção de outrobem ou serviço, as aulas.

Isto corresponde aproximadamente à contabilidade tradicional para o ProdutoBruto, que classifica a produção de um país em Consumo das Famílias + Investi-mento Privado + Gastos do Governo.

O capital K é o conjunto de máquinas, equipamentos e prédios empregadospara a produção de bens e serviços. Por outro lado P (K,L,R) é o conjunto deserviços e bens que são produzidos em um ano para consumo imediato (comida,utensílios de cozinha, aulas de matemática, bolas de futebol, máquinas, prédios,etc.) Embora L não apresenta problemas de unidades de medida, pois a medidanatural é “número de pessoas”, tanto K como P (.) precisam ser considerados comalguma medida uniforme, por exemplo, dólares de 1970, reais de 2004 ou dinaresde 1962.

P (.) é uma função de produção e, como tal, deve obedecer algumas característi-cas básicas. Sus variáveis, K, L e R, são chamadas “fatores de produção”. Fixadosvalores de K, L e R, e, a partir deles, aumentando K, a produção deve aumentar,mas a derivada da produção deve diminuir, ou seja, a função de K, com L e Rfixos, deve ser côncava. Da mesma maneira, a derivada em relação a L deve serdecrescente deixando K e R fixos e a derivada em relação a R deve ser decrescenteusando K e L fixos. Em geral, podemos pensar que há uma combinação ideal defatores para otimizar a eficiência, por exemplo, 100 dólares de capital instaladoe 1 Hectare para cada trabalhador empregado, e que, afastando dessa proporçãoapenas um dos fatores, a produção cresce, mas cada vez menos.

Funções de produção famosas com estas características são as chamadas “Cobb-Douglas”, as quais têm a forma:

PCobb−Douglas(K,L,R) = CCD ×KαLβRγ,

onde α, β, γ estão entre 0 e 1 e CCD é positivo. Usualmente se considera queα+ β + γ = 1, o que faz que, por exemplo, se tanto K como L e R se multiplicampor 2 simultaneamente, a produção também se multiplique por 2. Se α+β+γ > 1e tanto K como L e R se mutiplican por 2, então a produção cresce mais queseu dobro, o que pode ser realista em situações onde se tem “economia de escala”.De fato, uma boa função de produção deveria ser tal que a função de t dada porP.(tKefic, tLefic, tRefic) seja convexa para t pequeno e côncava para t grande, seKefic, Lefic e Refic estão nas proporções mais eficientes, de maneira a refletir tantoa economia de escala como a Lei de Rendimentos Decrescentes, que começa afuncionar para valores altos de produção.

Vamos considerar que as funções de produção não dependem do tempo, emboraesta seja uma suposição provisória, pois a produtividade, associada à tecnologia,faz que para os mesmos valores dos sistemas de produção, o produto seja maior com

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4.1. O Mundo como unidade 19

os mesmos fatores, a medida que o tempo passa. Observem que o efeito da pro-dutividade pode ser introduzido na Constante CCD e que as variações tecnológicasafetam também α e β e γ, se adotamos a formulação Cobb-Douglas.

O bem-estar das pessoas está ligado à produção de bens e serviços para con-sumo. Entretanto, os bens de capital são necessários para produzir os bens e servi-ços de consumo. Portanto, o Mundo precisa, em cada ano, distribuír seus recursosnaturais, humanos e de capital, de maneira a produzir, no longo prazo, a maiorquantidade de bens e serviços possível, mas não deve proceder de maneira afobada(produzindo apenas bens de consumo) pois isto afetaria, por falta de capital, aprodução de bens de consumo no futuro.

Por outro lado, os bens de capital perdem valor de um ano para outro (sedepreciam) com uma taxa que, em geral, se estima como sendo de 3 por centoanual.

Digamos, genericamente, que em determinado ano i, o capital fixo instaladono mundo é igual a Ki. Analogamente, a quantidade de pessoas trabalhando naprodução é Li e há Ri recursos naturais alocados na produção. Então, nesse ano,serão produzidos P (Ki, Li, Ri) bens e serviços, incluindo bens de capital.

Numerando os anos aos quais queremos aplicar o modelo de 1 até m, teremosque para todo i = 1, . . . ,m,

No ano i serão produzidos Si bens e serviços para consumo,

No ano i serão produzidos Mi máquinas, prédios, equipamentos,

Mi + Si = P (Ki, Li, Ri),

Ki+1 = 0.97Ki +Mi,

Ri ≤ Rmax,

onde Rmax é uma quantidade relacionada com a finitude dos recursos naturais,onde θ é o fator de crescimento de população, e

|Li+1 − Li| ≤ 0.1Li.

A última inequação limita a variação da força de trabalho entre dois anosconsecutivos a um 10 por cento.

Estas equações e inequações descrevem o sistema que nos interessa, o qual temcomo resultado as produções de serviços e bens de consumo e capital ao longo dem anos.

Se fosse viável planificar um sistema deste tipo, o planificador diria que asvariáveis “de controle” ou “de decisão” são Li, Ki

e Ri para i = 1, 2, . . . ,m e a

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20 Capıtulo 4. Modelando o Mundo

proporção do produto que, cada ano, corresponde a Mi. Ou seja, Mi = τiSi, ondea variável τi merece ser chamada “taxa de investimento”.

Um planificador arrojado diria que se propõe maximizar a soma S1 + . . .+Sm.Este planificador colocaria um valor dem bastante grande, mas tomaria as decisõessomente para o primeiro ano, já que depois do primeiro ano os dados mudariam elhe permitiriam otimizar o modelo de novo.

Do ponto de vista normativo, ou seja, de expor o que se pode pretender daprodução e o bem-estar do mundo, otimizar o consumo ao logo dos m anos podeoferecer um panorama razoável, embora deve ser considerado que nos últimos anos,o consumo aumentará muito como consequência dessa maximização, enquanto ocapital se reduzirá a zero porque, se o Mundo acabasse daqui a m anos, produzirbens de capital para depois não faria sentido. Portanto, independentemente dosusos planificador ou normativo, a saída do modelo somente tem sentido para osprimeiros anos depois do presente.

Finalmente, também deve ser considerado o uso do modelo “para o passado”,que teria por objetivo reproduzir o comportamento da economia mundial, digamos,nos últimos 100 anos, com as devidas ressalvas devido, por exemplo, às guerras.

Atividades

1. Crie uma função de produção que, além das virtudes de Cobb-Douglas tenhaa propriedade de que, dada a proporção mais eficiente Kefic, Lefic, Refic, afunção de t dada por P.(tKefic, tLefic, tRefic) seja estritamente convexa parat menor que certo valor e estritamente côncava para t maior que esse valor.

2. Invente dados razoáveis para rodar o Modelo do Mundo. Em cada ano tomeas decisões que o modelo precisa entrando com as mesmas na tela do com-putador.

3. Considere o Modelo como um conjunto de igualdades e desigualdades. Acres-cente desigualdades que impeçam mudanças bruscas. Usando um softwareadequado de Programação Não Linear, crie trajetórias admissíveis. Desenheas trajetórias admissíveis e escolha a mais desejável de acordo com seu cri-tério. Por exemplo, tenha em conta a finitude do planeta e a necessidade depoupar recursos naturais.

4. No Modelo apresentado a população aparece como uma variável exógena,relacionada com o número de trabalhadores. Entretanto, se pode pensar que éuma variável endógena e dependente da qualidade de vida que, neste modelo,está represenada pelo consumo per cápita. Em outras palavras, quanto maisconsumo per cápita menor a taxa de natalidade e maior a esperança de vida.Crie funções adequadas para representar esta dependência.

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4.2. O Modelo do Mundo em versao nacional 21

5. Observe que modelos deste tipo servem não apenas para auxiliar um sistemaeconômico duramente planificado mas também para orientar objetivos e pos-sibilidades para sistemas baseados no mercado. Tente traduzir as rodadas domodelo em planos de governo global flexíveis.

6. Antes de fazer nenhum experimento, responda à seguinte pergunta: Em quecondições este modelo daria respostas parecidas às do Clube de Roma? Su-gestão: O segredo está na Lei de Rendimentos Decrescentes na função deprodução. Como essa tendência pode ser evitada? Sugestões: Crescimentoda população dependente do nível de bem-estar, progresso tecnológico e varia-ções qualitativas no tipo de produto quanto ao consumo de recursos naturais.

4.2 O Modelo do Mundo em versao nacional

Agora, em vez do Mundo como totalidade, vamos considerar apenas um país, porexemplo, Brasil. O que muda em relação ao Modelo do Mundo? Evidentemente,devido a imigração e emigração as variações populacionais podem ser maiores, emporcentagem, que as constatadas no Mundo inteiro. Mas o mais importante é queo Brasil não precisa produzir todos os bens de consumo e capital que deseja, poispode comprar produtos do exterior. Da mesma maneira, Brasil pode não consumirtodos os bens e serviços produzidos, em princípio, para consumo, e pode exportaruma parte deles, assim como pode exportar bens de capital. Para comprar pro-dutos do exterior Brasil usará Dinheiro habilitado para transações internacionais,como dólares, e, em troca dos produtos exportados, também receberá dinheiro.Observem que no Modelo do Mundo o dinheiro não jogava nenhum papel. Pen-sávamos nele apenas para medir a quantidade de produtos e era irrelevante se aunidade de medida era o dólar de 1982 ou o yuan de 2004. Agora o dinheiro éuma quantidade relevante a mais, cuja evolução e fluxo é importante considerar.Assim, em cada ano i, diremos que no tesouro de Brasil há Di unidades monetárias.Entretanto, vamos considerar este dinheiro também medido na mesma unidade emque medimos bens e serviços. Por exemplo, se essa unidade é o dólar de 1982, eo dinheiro hoje no tesouro do Brasil é 700 bilhões de dólares, diremos que hoje,Di = 200 bilhões, imaginando que esse é o valor de 700 bilhões de dólares em dóla-res de 1982. (Como exercício, consulte a Internet para obter o valor correto.) Maisainda, Di pode ser positivo ou negativo. Se Di é negativo, isto significa que Brasildeve Di unidades monetárias a países do exterior e se Di é positivo significa queDi unidades lhe são devidas. Por exemplo, quando se diz que as reservas de Brasilsão 700 bilhões de dólares, o significado disto é que os Estados Unidos devem aoBrasil essa quantidade, representada por papéis do tesouro norteamericano (não“verdadeiros dólares”) que se encontram nos cofres do Banco Central. Considera-mos também que Di é a diferença entre o que nos devem e o que devemos. Há uma

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22 Capıtulo 4. Modelando o Mundo

sutileza aqui porque existe a dívida do governo com o exterior e a dívida privadacom o exterior. O que conhecemos cabalmente pelas estatísticas oficiais é a dívidado governo, e não as dívidas das empresas e particulares, que estão sujeitas a di-versas estimativas. Também não sabemos a quantidade de obrigações de bancosestrangeiros em poder de brasileiros. Porém, para o presente modelo, que não fazdiferença entre público e privado, tais distinções não são necessárias. Estritamentefalando, a quantidade Di da qual se fala aqui deveria incluír ativos e passivos tantopúblicos como privados.

Também devemos esclarecer que a dívida interna, em reais, não joga nestemodelo nenhum papel. Se trata de dívida do governo com habitantes do Brasil,denominada na moeda que o governo fabrica. Portanto, débitos e créditos se com-pensam, e o saldo, quando não importa a diferença entre Governo e público, ézero.

Por último, as quantidades Di estão sujeitas a juros. Mas como os juros secomputam sobre dólares correntes, não sobre seus valores em 1982, é necessário tercuidado quando se define sua magnitude no presente modelo. Por exemplo, se esteano (2016) o Brasil possui 700 bilhões de dólares em títulos dos Estados Unidospelos quais recebe juros de 1 por cento anual, o ano que vem a dívida dos EstadosUnidos com Brasil será 1 por cento maior, ou seja, 707 bilhões. Mas estes serãodólares de 2017, que deveremos converter para dólares de 1982 ou para a moedade referência adotada no modelo.

No Modelo do Mundo tínhamos a equação

Ki+1 = 0.97Ki +Mi.

Agora devemos considerar que o capital instalado pode ter sido acrescentadopela compra de máquinas e equipamentos no exterior. Por outro lado, bens decapital podem ser exportados. Dessa maneira, faz sentido a seguinte modificaçãoda equação colocada acima:

Ki+1 = 0.97Ki +Mi + Icap,i − Ecap,i.

Por outro lado, os bens de consumo Si apareciam no Modelo do Mundo, naseguinte forma:

Mi + Si = P (Ki, Li, Ri),

mas agora devemos considerar que pode haver exportação e importação de bensde consumo, portanto esta equação deve ser substituída por:

P (Ki, Li, Ri) = Mi + Si − Ibens,i + Ebens,i,

onde Ibens,i são os bens de consumo importados e Ebens,i representa as exportaçõesde bens de consumo. Ou seja, esta equação diz que o que é produzido no Brasil

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4.3. Compatibilizacao com dados existentes 23

para consumo é igual ao que é consumido no Brasil mais o que é exportado menoso que é importado. Note que agora Si é bens e serviços consumidos, enquanto Mi

corresponde a bens de capital produzidos.Finalmente, exportações e importações produzem uma diferença no total de

dinheiro na caixa do Brasil, as exportações somando e as importações subtraindo.Logo,

Di+1 = Di + Ecap,i + Ebens,i − Icap,i − Ibens,i + Ji,

onde Ji representa os juros (positivos ou negativos de acordo com o sinal de Di).

AtividadeFaça com a versão nacional do Modelo do Mundo, o mesmo processo indicado

para a versão mundial.

4.3 Compatibilizacao com dados existentes

O Produto Interno Bruto de um país costuma ser classificado em Consumo das Fa-mílias, Investimentos Privados, Gastos do Governo e Exportações Líquidas (C+I+G+E).

Consumo das famílias é o conjunto dos bens e serviços que as pessoas físicascompram e consomem no período considerado, ou, pelo menos, começam a consu-mir. Alimentos, vestuário, serviços de educação e saúde. Este ítem é contabilizadopela quantidade de dinheiro que as pessoas pagam por tais bens e serviços. OsInvestimentos Privados são as compras, pelas pessoas físicas e empresas, de bensde capital, como prédios e máquinas. Os Gastos do Governo incluem salários pa-gos ao funcionarismo público porque se considera que estes salários são o valordos serviços prestados. Por exemplo, o valor das aulas de matemática prestadaspor professores do Estado é o salário destes professores. O valor das pesquisas éo salário dos pesquisadores. Em Gastos do Governo também se incluem os In-vestimentos do Governo, por exemplo, a compra de um prédio para construír umHospital público. Portanto, o que chamamos antes bens de capital se encontrauma parte em Investimentos Privados e outra parte em Gastos do Governo. Porúltimo, Exportações Líquidas é a diferença entre Exportações e Importações. Emtermos de compatibilizar da melhor maneira possível os dados acessíveis com osrequerimentos do Modelo Mundial Nacional, o valor da função de produção em umdeterminado ano deveria ser o valor oficial de C+I+G+E nesse ano.

Os argumentos da função de produção são Capital Instalado (K), Trabalhadores(L) e Recursos Naturais (R). Devido à depreciação do Capital, o Capital Instaladono ano i é

[Ii + [IG]i + Icap,i − Ecap,i] +∞∑j=1

0.97j[Ii−j + [IG]i−j + Icap,i−j − Ecap,i−j],

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24 Capıtulo 4. Modelando o Mundo

onde Ii−j representa o Investimento Privado no ano i − j e [IG]i−j representa oInvestimento do Governo. Ou seja, se trata de uma série infinita em direção dopassado que, obviamente, deve ser truncada em algum momento razoável.

A variável Trabalhadores (L) pode ser obtido diretamente de estatísticas ofici-ais ou inferido da População Economicamente Ativa e das taxas de desemprego.Os Recursos Naturais R podem ser substituídos pela área do país ocupada poratividade humana.

Como resultado desta compatibilização de dados deveremos obter uma tabelaque, em cada linha, contém Ki, Li, Ri e o valor do produto interno bruto no ano i.Assim, chega o momento em que os coeficientes da função de produção devem serestimados de maneira que os valores teóricos coincidam da melhor maneira pos-sível com os valores tabelados do produto interno bruto. Feito isto, estamos emcondições de manipular o Modelo do Mundo adaptado para o Brasil.

Atividades

1. Usando o software adequado, estime os coeficientes de uma função de produ-ção razoável para os dados compatibilizados da economia brasileira necessá-rios para o Modelo do Mundo em versão nacional.

2. Proceda, com o MML-Brasil, com atividades similares às realizadas com oModelo do Mundo.

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Capıtulo 5

Problemas basicos daEconomia

Toda sociedade produz bens e serviços usando recursos e distribui os bens e recursosproduzidos entre seus membros. O “problema” da Economia é o que se produz,como se produz e como se distribui o produzido. A palavra “problema” é colocadaentre aspas propositalmente, para não induzir a ideia de que tal questão é resolvidadeliberadamente por alguma pessoa ou grupo delas.

A quantidade de um bem ou serviço costuma ser relacionada com os recursosusados para essa produção por meio de uma Função de Produção. Por exemplo,suponhamos que os recursos sejam (área de) Terra e mão de obra e que o produtoseja Cenouras. Então, dada certa quantidade de terra e certo número de pessoas,a função de produção vai nos dizer quantas cenouras seriam produzidas em umperiodo de tempo de, digamos, um ano.

Se, na mesma quantidade de terra, incrementamos a quantidade de pessoastrabalhando na produção de cenouras, a quantidade de cenouras aumentará, masaumentará cada vez menos para cada pessoa acrescentada. Da mesma maneira,se deixamos fixa a quantidade de pessoas trabalhando e incrementamos a terra,aumentará a produção mas cada vez menos para cada acre de terra acrescentado.Este tipo de fenómeno acontece muito frequentemente na economia e se denominaLei dos Rendimentos Decrescentes. Matematicamente, nos diz que a derivadaparcial primeira da produção em relação a cada recurso é positiva, mas a derivadasegunda é negativa. Por outra parte, quando os recursos são muito pequenos, amultiplicação de todos eles por um número fixo maior que 1 costuma produzirum crescimento da produção acima desse número. Chama-se a este fenómenoEconomia de Escala. As funções de produção de tipo Cobb-Douglas expressambem a lei de rendimentos decrescentes. Sua expressão é:

Produção do bem ou serviço = constante ×Rα11 ...Rαn

n , (5.1)

onde R1, . . . , Rn são as quantidades de recursos alocados, α1, . . . , αn ≥ 0 e suasoma é igual a 1.

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26 Capıtulo 5. Problemas basicos da Economia

A regra (5.1) e a própria lei dos rendimentos decrescentes não são regras uni-versais. A LRD aparece frequentemente na produção de bens e serviços e as razõespara a mesma podem ser facilmente comprendidas. Mas não se trata de uma leiuniversal sujeita a corroboração. A função de Cobb-Douglas, por outra parte, podeser usada para sugerir políticas econômicas mas sua generalidade é muito limitadae está sujeita a ajustes e corroborações apenas em situações específicas.

AtividadeProcure, na Internet, exemplos onde se relatem recursos e resultados para a

fabricação de algum bem. Os exemplos podem ser nacionais ou internacionais,restritos ou globais. Procure identificar a lei dos rendimentos decrescentes, se vocêacha que se verifica nos casos estudados. Procure ajustar uma função do tipoCobb-Douglas usando ferramentas numéricas ou de otimização pertinentes. Ana-lise a validade dos resultados, ou seja, procure corroborar.

O problema de “o que produzir” costuma ser ilustrado (pelo menos, no livrode Samuelson) com o exemplo dos canhões e a manteiga. Uma sociedade podeproduzir canhões e manteiga em diferentes quantidades. Se colocamos “Canhões”no eixo horizontal de um plano cartesiano e “manteiga” no eixo vertical, cada pontodo plano representa uma quantidade de canhões com uma quantidade de manteiga.A maioria desses pontos é inatingível. Por exemplo, Luxemburgo não pode produzir700 mil canhões e 8 milhões de toneladas de manteiga por ano. Se apagamos todosos pontos que representam pares que “Luxemburgo” não pode produzir, obteremosuma região do plano. Se (x, y) é um ponto desta região, e a ≤ x, b ≤ y, o par (a, b)também estará na região, pois se é possível produzir (x, y) também o será produzir(a, b). Em particular, (0, 0) está na região de produção possível. Agora, para cada(u, v) diferente de (0, 0) na região possível, existe um máximo valor de t tal que(tu, tv) está na região possível. (Em caso contrário, Luxemburgo seria capaz deproduzir quantidades arbitrariamente grandes de canhões ou manteiga). Os pontos(x, y) tal que não existe nenhum ponto (a, b) na região que verifica a > x, b > yformam a chamada ”fronteira eficiente de produção” 1. Uma entidade produtoraqualquer (sociedade, empresa, etc.) pode decidir produzir dois ou mais produtosem diferentes quantidades mas sempre deve fazê-lo na fronteira eficiente. Ou seja,em princípio não havería nenhuma razão para não fazê-lo na fronteira eficiente.

Entretanto, precisamos uma intuição adicional sobre a forma da fronteira efi-ciente de produção. Suponhamos que Luxemburgo está produzindo x canhões e ytoneladas de manteiga e que decide passar a produzir x+ dx canhões com dx > 0.Claramente, nesse caso vai poder produzir menos manteiga, ou seja, ainda se man-

1De fato, fronteira fraca. Fronteira forte é quando não existe nenhum (a, b) tal que a ≥ x, b ≥ ycom a igualdade estrita valendo pelo menos em um dos dois casos

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tendo na curva eficiente, produzirá y − dy toneladas de manteiga (com dy > 0).Isto significa que a curva eficiente é decrescente. Podemos afirmar que o o custode aumentar a produção de canhões de x para x + dx é igual a dy toneladas demanteiga. Mas agora suponhamos que desejamos um aumento adicional da pro-dução de canhões, digamos para x+ 2dx. Isto produzirá uma nova diminuição damanteiga que podemos fabricar. Mas quanto será esta diminuição em relação àdiminuição anterior dy? É razoável pensar que a nova diminuição será maior que aanterior. A razão é que na primeira diminuição podemos deslocar algumas pessoasque fabricam manteiga mas também sabem fabricar canhões para a fabricação decanhões. Mas na segunda diminuição estas pessoas começarão a ficar escassas, eprecisaremos deslocar mais pessoas fabricantes de manteiga para fabricar a mesmaquantidade de canhões adicional. Logo, para o mesmo aumento da produção decanhões, a diminição da produção de manteiga será cada vez maior. Em termosmatemáticos, a curva eficiente será côncava, ou seja, sua derivada segunda seránegativa.

Encontramos assim uma “lei” que tem o mesmo status que a LRD. Se chamaLei dos Custos Crescentes.

AtividadeExemplifique a “Lei” dos custos crescentes com alguma atividade do seu quoti-

diano.

Atividades para o dia-a-dia

1. As exportações do Brasil correspondem a um 13.5 por cento do PIB. Isso ébom ou ruim?

2. O faturamento dos shoppings no Natal de 2015 foi 1 por cento menor que em2014. Como você noticiaria isto? (a) Foi o pior Natal dos últimos 10 anos;ou (b) Foi o segundo melhor Natal dos últimos 10 anos.

3. Países do primeiro mundo usam 6 por cento da sua arrecadação na Previ-dência. Brasil usa 13 por cento. Se se fizesse uma reforma que fizesse essenúmero passar de 13 para 6 por cento, que aconteceria como o PIB? E como superavit primário? E com a arrecadação?

4. A dívida interna bruta do Brasil é 70 por cento do PIB. Os juros são apro-ximadamente 14 por cento por ano. É correto dizer que Brasil gasta 9.8 porcento do PIB em pagar os juros da dívida?

5. Segundo um economista, em 2016 o crescimento do Brasil será retomado. O

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28 Capıtulo 5. Problemas basicos da Economia

PIB ainda diminuirá, mas em vez de 3.5 por cento, apenas 1.75 por cento.Comente.

6. A corrupção no Brasil atinge 40 bilhões de reais por ano. A evasão de im-postos atinge 500 bilhões por ano. Compare estes números com o orçamentofederal para Saúde. Construa uma manchete de jornal relacionada com estasinformações. Comente.

7. Em uma palestra onde eu falava do analfabetismo matemático me foi pergun-tado se podia ser estimado o custo dessa deficiência em termos de produtobruto. Considerando apenas o fato de que o analfabetismo matemático con-duz as pessoas a tomar empréstimos pelos quais acabam pagando várias vezeso preço a vista de um produto, podemos estabelecer que o analfabetismo ma-temático leva as pessoas a pagar pelos produtos mais do que eles valem avista. Portanto, os compradores não podem comprar outros produtos, nãogeram demanda sobre os mesmos e, em última análise, faz com que essesoutros produtos não sejam produzidos. Isso representa uma perda efetivapara PIB que, como se sabe, é a totalidade dos bens e serviços produzidospelo país. Pense como quantifcar esse prejuízo usando dados disponíveis naInternet.

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Capıtulo 6

As cinco taxas

Costuma se dizer que a economia (em particular a brasileira) tem 5 taxas fun-damentais: A taxa de lucro, a taxa de desemprego, a taxa de câmbio, a taxa deinflação e a taxa de juros. Observe que 4 destas taxas são números adimensionais(sem unidades) mas a taxa de câmbio não: ela significa a quantidade de reais quese precisa para comprar ou vender um dólar. O que você sabe sobre essas taxas?Quais são seus valores no Brasil hoje? Quais são as relações dinâmicas entre asmesmas? Em particular, que acontece com as outras taxas quando uma taxa sobeou desce? Que relações de causa-efeito você acha que existem entre estas taxas?Você acha que pode ser estabelecido um conjunto de equações ou inequações queas relacionem?

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30 Capıtulo 6. As cinco taxas

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Capıtulo 7

Produtividade eCompetitividade

Produtividade não é um conceito absoluto, mas relativo. Uma empresa não éprodutiva em absoluto. Pode ser, sim, mais ou menos produtiva que outra.

Um produtor é mais produtivo que outro em relação a um produto quando,usando os mesmos fatores de produção, consegue produzir a mema quantidade doproduto com menores quantidades de todos os fatores. Em geral, se A é maisprodutiva que B para um determinado nível de produto, também o será para osoutros níveis, mas isto não é necessariamente assim. Por outro lado, a situação naqual as produtividades de A e B não são comparáveis, seja porque usam fatores deprodução diferentes ou porque a quantidade do fator que A usa é menor que a queusa B mas a relação se inverte quando se fala de outro fator.

Frequentemente, a produtividade se associa ao custo de produção. Isto estáerrado, porque uma empresa pode produzir com custo menor que B devido sim-plesmente a que paga salários menores e a suposição de que isto é impossível éapenas uma crença religiosa dos economistas neoclássicos. Outra razão, muito im-portante, para avaliações enganosas de produtividade se relacionam com a taxa decâmbio. Se, exemplo, o real estiver muito valorizado em relação a outra moeda omesmo produto com os mesmos fatores de produção pode ser produzido no Brasile no outro país, mas a produção no outro país pode parecer mais eficiente porqueainda para um brasileiro resulta mais barato importar o produto que comprar daempresa brasileira. O conceito de produtividade em termos monetários se chamaCompetitividade. Uma empresa é mais competitiva que outra se consegue produziro mesmo produto com menor custo.

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32 Capıtulo 7. Produtividade e Competitividade

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Capıtulo 8

Oferta e Procura

O princípio do EquilíbrioO Equilíbrio é um conceito central da economia moderna. Os sujeitos da Eco-

nomia são as pessoas físicas, as empresas e os governos. Todos estos sujeitos, ouagentes, podem transferir bens de uns para outros ou executar serviços dos quaisoutros se beneficiam. O primeiro princípio do equilíbrio diz que, dado qualquertipo de bem ou serviço, a quantidade de unidades do mesmo que, em determinadoperíodo de tempo, são vendidas, é igual à quantidade de bens ou serviços que sãocomprados. Evidentemente, isto é uma tautologia. (Bens dados de presente tam-bém podem ser considerados vendidos por preço zero.) Por exemplo, a quantidadede sapatos vendida pelos comerciantes de sapatos é igual à quantidade de sapatoscomprada pelas pessoas ou por outros agentes. O segundo princípio é que todos osagentes fazem o que querem, sujeitos a determinadas restrições físicas ou impos-tas por leis do governo. Isto parece também bastante inobjetável. Por exemplo,os fabricantes de sapatos poderiam querer fabricar 1 bilhão de sapatos em 2016,mas o governo poderia promulgar uma lei que os obrigasse a a fabricar 1 trilhão.Em geral, não existem restrições tão estritas e podemos supor que os diferentesagentes fazem o que querem com alguma liberdade e com o objetivo de maximizaralgum benefício. Por exemplo, as empresas podem querer maximizar seu lucro,os indivíduos podem querer maximizar sua felicidade. O problema é que, comoGarrincha falou para o técnico Feola antes do jogo contra a União Soviética em1958, se precisa “combinar com os russos”. Isto é, uma empresa pode querer vender1 bilhão de sapatos, mas para isso se precisa de pessoas que queiram comprar umbilhão de sapatos. E aqui é que aparece o preço. Vendedores e compradores devemchegar a um acordo quanto ao preço. Esse “acordo” pode ser desnecessário quandoo preço é imposto por um agente monopolista ou suficientemente poderoso, ou pelogoverno.

De todos modos, indo até as últimas consequências, as decisões econômicasde qualquer agente envolvem objetivos e desejos que podem ser traduzidos em

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34 Capıtulo 8. Oferta e Procura

equações matemáticas. Juntando as equações de todos os agentes se obtém ochamado “equilíbrio”.

Por momentos, o conceito de equilíbrio fica escorregadio. Superficialmente,estariamos dispostos a aceitar que os preços estão em equilíbrio quando são tais queas empresas vendem tudo o que desejam vender e os consumidores compram tudo oque desejam comprar. Entretanto, todos aceitariam que, digamos, os consumidoressão afetados por restrições a seus desejos de compra, e as empresas a seus desejos devenda. Ninguém estabelece quão restritivas podem ser estas restrições mas, indoao extremo, poderiam ser tão restritivas que obrigassem a que tudo o que fossecomprado ou vendido de determinado produto o fosse ao mesmo preço. Alguémpoderia arguir: “Ah, mas isso estaria fora do equilíbrio”, o que implicitamentesupõe que um equilíbrio “aceitável” é aquele no qual as restrições não são muitoestritas ou, em outras palavras, que não existem limites severos ao desejo.

Portanto, sempre é bom se perguntar o que é, afinal de contas, esse tal de “equi-líbrio”. Às vezes parece que se trata simplesmente de uma descrição tautológicado que acontece. Nada custa definir o que acontece com o resultado de um equi-líbrio de desejos e limitações. Talvez os economistas se sentiram muito fascinadospela noção de equilíbrio devido aos balanços de empresas, os quais, por definição,sempre devem registrar uma equivalência entre o Deve e o Haver. Talvez o essen-cial é introduzir as noções de liberdade e desejo. O que realmente acontece seriaum “equilíbrio” se é o resultado de desejos livres, em vez de ser resultado de umaimposição. Mas isto nos coloca perto daquele dilema dos árbitros de futebol que,quando acontece uma bola na mão, devem decidir se foi intencional ou não. Osaconteceres do dia a dia econômico são intencionais ou são impostos? E é legí-timo dizer que somente os intencionais correspondem a um equilíbrio? E, com asdevidas limitações e a inevitável intervenção do acaso, não seriam todos os atosintencionais? Se uma empresa não vende tudo o que aparentemente planejava, nãodevemos interpretar que criou um estoque? E quem pode dizer se esse estoque foiplanejado (desejado) ou forçado pelas circunstâncias?

O equilíbrio também costuma ser interpretado como o estado ao qual as coisastendem naturalmente quando não estão em equilíbrio. Mas isto nos cria maisproblemas dos que resolve. Que acontece com situações que os matemáticos gostamde estudar, como equilíbrios instáveis, ou sistemas com múltiplos atratores? Nãoserá que os sistemas evoluem com atores que tomam decisões o tempo todo, commaior ou menor planejamento, às vezes convergindo a equilíbrios e outras vezesnão?

Como podem ver, há múltiplos motivos para desmitificar o conceito de equi-líbrio. A fascinação que por ele têm muitos economistas e comentaristas parecemais que nada uma questão estética.

As sociedades capitalistas modernas “resolvem” os problemas do "que, comoe para quem” produzir por meio do mercado, que, por sua vez, se orienta pelas

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regras da oferta e da procura. De fato, em todas partes este mercado é imperfeito.Um mercado perfeito se caracteriza pelo fato de que seus atores não podem influirindividualmente nos preços, coisa que muitas vezes não acontece na vida real. Poroutra parte, em todas as sociedades modernas o mercado está mais ou menosmoderado pela regulamentação ou orientação do governo.

Os mercados são muitas vezes compreendidos, pelo menos intuitivamente, atra-vés de esquemas simples como as curvas de oferta e de procura. Estes modelos nãosão ”leis” da economia e, em toda sua generalidade, não estão sujeitas a corrobo-ração, portanto devem ser vistas como aproximações sensatas de comportamentosrazoáveis.

Curva de procuraColoquemos na abscissa de um plano cartesiano a procura de determinado bem

ou serviço e na ordenada os possíveis preços desse bem ou serviço. Em uma co-munidade típica para cada preço possível do bem o serviço podemos imaginar quehaverá uma determinada procura do mesmo. Isso determinará um ponto do plano.Unindo todos esses pontos temos a curva de procura relativa a esse bem. Observeque, por tradição, colocamos o preço na ordenada e a procura na abscissa, apesarde que às vezes é mais intuitivo pensar o preço como variável independente, pelomenos no caso de procura. Por exemplo, suponhamos que o bem o serviço consi-derado seja o número de consultas médicas (um serviço). Se este serviço for baratohaverá mais consultas de que se este serviço for caro. Portanto, o preço comofunção do número de consultas será uma função decrescente. Ao mesmo tempo,se, partindo de um preço dado, o preço aumenta dy reais, o número de consultasdiminuirá, mas se a partir do novo valor o preço o aumento dy se repete, o númerode consultas diminuirá menos porque em última análise não haverá mais pacientes.Isto significa que a curva de procura é, em geral, convexa.

Curva de ofertaAnalogamente, coloquemos agora na ordenada o preço do bem ou serviço e na

abscissa a oferta do mesmo. Claramente, quanto mais barato o bem ou serviçomenor será sua oferta pois não haverá muitas pessoas interessadas em prestá-lo, equanto mais caro, mais oferta o bem ou serviço terá. Ou seja, a curva de ofertaserá crescente.

Por outro lado, se vamos aumentando o preço em quantidades fixas, embora aoferta aumente porque mais médicos se sentirão inclinados a atender pacientes (porexemplo), cada vez aumentará menos por unidade de aumento de preço, devido àfinitude do número de médicos. Portanto, a curva de oferta será, em geral, tambémconvexa.

Equilíbrio

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36 Capıtulo 8. Oferta e Procura

Na intersecção das curvas de oferta e procura temos um ponto que nos dá exa-tamente o número de consultas médicas efetivamente praticadas.

Observem que as curvas de oferta e procura não são dados da realidade: sãoconstruções imaginárias (modelos) que ajudam a entender como se formam os pre-ços em um ambiente de concorrência perfeita. A realidade nos fornece somente oponto de equilíbrio. Ou seja, não existe o exercício que diz "Um dono de super-mercado sabe que a curva de procura é . . . ”. Isso é besteira.

No pregão eletrônico de uma bolsa de valores moderna o sistema da ofertae procura se observa de maneira bastante ”pura”. Se você deseja comprar umdeterminado volume de uma determinada ação por um determinado preço, você“escreve” no sistema essencialmente isso, por exemplo: “Quero comprar 100 açõesda empresa Pirulix por 5 reais a unidade”. Aí sua proposição entra em uma fila, evocê fica esperando até que chegue o momento de contemplar alguém que escreveuque queria vender ações de Pirulix por (essencialmente) esse preço. Se esse vende-dor potencial está disposto a vender por um preço até o valor pelo qual você queriacomprar, está claro que o negócio será vantajoso para ambos (fazendo a média), ea transação será efetivada.

Ou seja, o sistema funciona fazendo uma tabela dos compradores potenciaisda ação e dos vendedores potenciais, e ordenando pelos preços pretendidos. Nomomento em que o preço pretendido por um comprador fica por cima do preçopretendido por um vendedor, a transação se concreta pela média de ambos preçose ambos lances saem do sistema.

Como é de se imaginar, existem sistemas computacionais mediante os quais esteprocesso se realiza a enorme velocidade. Antigamente os pregões se realizavam aosberros na sala da bolsa, mas também funcionava.

AtividadeTanto a derivada segunda da função de procura como a derivada segunda de

sua inversa são não-negativas. Entretanto, embora a derivada segunda da funçãode oferta seja não-negativa, a derivada segunda de sua inversa é não positiva. Ex-plique este fato grafica e analiticamente.

Deslocamentos das curvas de procura e de ofertaSuponhamos que, com o passar do tempo, a curva de procura se desloca para a

direita. Isto significa que, pelo mesmo preço, o público está disposto a comprar umamaior quantidade do bem ou serviço. Tal desocamento pode ser produzido, porexemplo, por um aumento generalizado de salários. Se a curva de oferta permaneceinalterada, o preço de equilíbrio aumentará.

Por outro lado, suponhamos que a curva de procura permanece inalterada mas

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a curva de oferta se desloca para a direita. Isto significa que, pelo mesmo preço,os produtores estão dispostos a fornecer maiores quantidades do bem ou serviço,talvez por uma melhora na tecnologia. Neste caso, o preço de equilíbrio diminuirá.

Similarmente, podemos analisar o efeito dos preços de equilíbrio por desloca-mentos para a esquerda das curvas de procura ou oferta.

Preços fora do equilíbrioOs preços de equilíbrio são o resultado de uma construção teórica interpretável,

mas não devem ser confundidos com os preços efetivamente praticados. Supo-nhamos, por exemplo, que uma regulamentação do governo impõe que o preço dedeterminado bem ou serviço não exceda um valor menor que o preço de equilíbrio.Analisando a situação desde o ponto de vista das curvas de oferta e procura, ouseja, traçando uma reta horizontal na altura do preço máximo regulamentado, ob-servamos que a quantidade de bens que os produtores estarão dispostos a oferecerpor esse preço será menor que a quantidade de bens que os consumidores desejamadquirir. Dessa maneira, haverá uma situação de escassez.

Por outro lado, suponhamos que os produtores não estão dispostos a entregarseus bens ou serviços por um valor menor que certo limite, e que esse valor estáacima do preço de equilíbrio. Nessa situação haverá mais bens ou serviços dispo-níveis para venda, mas não haverá um número suficiente de compradores para osmesmos. Trata-se de uma situação de sobre-abundância.

O Equilíbrio costuma ser interpretado em termos de “eficiência” e “ausência dedesperdiço”. O sentido destas interpretações quase sempre se referem a possíveisinterpretações do governo na fixação de preços. Se o governo fixasse preços acimado ponto de equilíbrio, a procura seria menor que a oferta e, provavelmente, parteda produção se perderia. Isso cheira a desperdiço. Se o governo fixasse preçosabaixo do equilíbrio, a procura seria maior que a oferta. Alguns fornecedoresaceitariam vender pelo preço fixado, mas outros não. Possivelmente isto provocariaum mercado paralelo para os produtos.

O “equilíbrio”, seja qual for o significado, não deve ser interpretado em termosde bem-estar generalizado. Não há um valor ético associado ao equilíbrio. Há certovalor estético, que provavelmente fornece boa parte do seu encanto.

De todos modos, em nenhum caso deve ser interpretado que as curvas de ofertae procura estão disponíveis para serem observadas e que os resultados seus deslo-camentos e seus efeitos podem ser matematicamente previstos. Mais bem aconteceo contrário: São os efeitos os que são observados e interpretados com os modelosde oferta e procura, os quais, de fato, são os modelos mais simples para interpretaro sistema econômico de livre concorrência.

Experimento para desenhar as curvas de oferta e procuraVamos dividir a turma de 100 pessoas em dois grupos de 50. Vamos definir um

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38 Capıtulo 8. Oferta e Procura

produto ao qual chamarei P.P consiste em um papelzinho assinado por mim que diz assim “Vale por um

ponto adicional na nota final desta disciplina em caso de que Palmeiras vença opróximo jogo”.

Cada aluno da turma A receberá uma unidade de P. Cada aluno da turma Bnão receberá nada. Cada aluno da turma B poderá comprar uma unidade de P dealgum aluno da turma A, e não mais de uma.

Cada aluno da turma B escreverá um papel em secreto onde escreverá assim:“Estou disposto a comprar uma unidade P pelo valor de xxx pontos da minhaprópria prova”.

Cada aluno da turma A escreverá um papel em secreto onde escreverá assim:“Estou disposto a vender minha unidade P pelo valor de yyy pontos que deverãoser acrescentados à minha prova.”

Dessa maneira teremos, para cada valor do preço do produto P, quantas unida-des quereriam ser vendidas e quantas unidades quereriam ser compradas. Com asinformações dos papelzinhos da turma B desenharemos a curva de procura. Comas informações dos papelizinhos da turma A desenharemos a curva de oferta.

Assim, observaremos na prática as características destas curvas e ficaremos fe-lizes para sempre.

Os impostos e a curva de ofertaSuponhamos que na comercialização de determinado bem introduzimos um im-

posto. Isto é, estabelecemos que ao preço de comercialização deve ser acrescentadoum valor γ que será arrecadado pelo governo. O que acontece com a curva deprocura? Não acontece nada, porque para um comprador a decisão de comprarou não comprar o bem por determinado preço é independente do fato desse preçoincluír um imposto ou não. Agora, para o vendedor a situação muda. Digamosque antes do imposto ele estava disposto a vender o bem por 10 reais. Digamosque o imposto é de 2 reais. Ele estará disposto a (talvez fabricar) e vender o bempor 10 reais? Claramente não, porque desses 10 reais ele vai receber somente 8. Defato, agora ele estará disposto a fabricar e vender o bem por 12 reais. Isto significaque a curva de oferta se desloca 2 reais para cima (lembre que colocamos preço naordenada e quantidade na ascissa).

O que acontecerá com o preço de equilíbrio. De que depende? Consegue ima-ginar o Experimento anterior introduzindo um imposto que será cobrado pelo pro-fessor?

ElasticidadeO conceito de Elasticidade se aplica às curvas de oferta e de procura.Comecemos pela Elasticidade da Procura. Se, nesta curva, o preço é multipli-

cado por digamos 2, e a procura diminui por um fator maior que 2, dizemos que

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a procura é Elástica. Reciprocamente, se ao multiplicar o preço por 2 a procuradiminui em um fator menor que 2, dizemos que é Inelástica. A Procura é elásti-camente neutra se a diminuição é exatamente no mesmo fator que o aumento dopreço. Desenhe curvas de procura muito elásticas, muito inelásticas e elásticamenteneutras. Use este conceito para determinar a variação do preço pela inclusão oueliminação de um imposto. Observe que, se a procura é totalmente inelástica, opreço com imposto muda exatmente no valor do imposto. Se a procura é total-mente elástica, o preço não muda em absoluto. Lembre que preçõ aqui significapreço no equilíbrio.

Desenvolva o conceito de Elasticidade para a Curva de Oferta.

Teoria da Utilidade MarginalConsidere um bem ou serviço qualquer medido nas unidades que quiser. Por

exemplo, barras de chocolate, ou doses de whisky. (Chocolate, medido em barras,ou whisky, medido em doses.) A cada quantidade desse bem corresponde umaUtilidade (ou prazer, ou bem-estar, ou conforto, ou ausência de dor). Por exemplo,você pode considerar que uma barra de chocolate te dá uma utilidade igual a 10,duas barras uma utilidade igual a 15, 3 barras uma utilidade igual a 18, e assimpor diante. Observe que a Utilidade deve ser uma função crescente, mas que, amedida que aumenta sua possessão do bem, a utilidade de uma unidade mais cadavez é menor. Em outras palavras, U ′(z) a derivada da utilidade, também chamadaUtilidade Marginal, é positiva mas decrescente. Ou seja, a derivada segunda énegativa, ou seja as funções de utilidade são sempre côncavas.

Suponha que você tem M reais para gastar e que você vai distribuír esses reaisadquirindo n bens ou serviços. A Teoria da Utilidade estabelece que seu consumode bens estará orientado pela necessidade de maximizar sua utilidade total. Emconsequência, chamando p1, . . . , pn aos preços dos bens ou serviços em consideração(por exemplo, sendo p1 o preço de uma barra de chocolate, p2 o preço de uma dosede whisky, etcétera, você “resolverá” o seguinte problema:

Maximizar U1(x1/p1) + . . .+ Un(xn/pn) sujeita an∑i=1

xi = M e x ≥ 0.

Seja x∗ a solução do problema acima. Para cada i tal que x∗i > 0 o Teoremados multiplicadores de Lagrange estabelece que U ′i(x∗i /pi) = piλ, onde λ é o multi-plicador de Lagrange. Ou seja, para cada bem ou serviço efetivamente consumidoa derivada de sua Utilidade é proporcional a seu preço.

Vejam que esta é uma teoria sobre a formação da função de procura, pos nosdiz, dados os preços dos bens, quanto vamos consumir de cada um deles. Chegamosà conclusão que o que determina esse consumo é a derivada da função utilidade,ou Utilidade Marginal.

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40 Capıtulo 8. Oferta e Procura

Este argumento vem resolver uma dúvida que tinha o famoso Adam Smith,quem se perguntava: Por que a água, que é tão importante, é tão barata e osdiamantes, que são tão inúteis, são tão caros. A resposta é que, como a água éabundante, acrescentar um pouco mais a meu depósito vale muito pouco (Utilidademarginal muito baixa). Outra coisa aconteceria se a água fosse escassa, pois aí autilidade marginal seria muito alta.

Além disso esta teoria nos diz bastante sobre os preços relativos. Pelo menospara este consumidor, nos diz que o quociente entre o preço da barra de chocolatee a dose de whisky é proporcional ao quociente entre as derivadas das funções deutilidade correspondentes.

Observem que nada impede que um dos “bens” a que nos referimos acima são ospróprios “reais”. Com efeito, podemos nos perguntar qual é a utilidade, para quemtem x reais, de ter ∆x reais a mais. Incluindo os reais entre os bens no problemade otimização acima, sendo que o preço de um real é obviamente um real, obtemosos preços absolutos de todos os produtos que me interessem.

Dada uma configuração externa de preços, somando los resultados de todosos problemas de otimização para todos os membros da comunidade, obteriamos afunção de procura dessa sociedade para todos os bens e serviços possíveis.

O papel do Custo MarginalVimos que cada consumidor tem uma função de procura para cada bem, que

podemos considerar derivada da maximização de sua utilidade.A outra cara da moeda é o da empresa que fabrica os bens. Aqui o conceito

relevante é o de Custo. Para fabricar uma certa quantidade de certo bem B, aempresa deve gastar determinada quantidade de dinheiro. Então a função de custose desenha em um plano cuja abscissa é a quantidade do bem e cuja ordenada é odinheiro que se precisa para fabricar essa quantidade.

Como é, via de regra, essa função de custo? Ela começa com um pulo à direitado zero, que representa os custos fixos para começar a fabricar o bem. Depois, afunção é naturalmente, crescente, pois se precisa mais dinheiro para fabricar maisproduto. Entretanto, a economia de escala faz com que a função seja, no começo,côncava, ou seja, que sua derivada seja decrescente, ou seja, que “o custo de fabricaruma unidade mais” a partir de x unidades, seja cada vez menor. Essa derivada sechama “custo marginal”. Em geral, esse decréscimo no custo marginal se transformaem aumento (com respeito a x) porque, acima de determinada produção, estasomente pode ser aumentada por um forte investimento adicional. Ou seja, acimade determinado valor de x, a função fica convexa, e depois somente Deus sabe.

Por outro lado, se a empresa vende o produto por p reais a unidade, ela receberápx reais de faturamento. Qual é o objetivo da empresa? Obviamente, se trata demaximizar px − C(x). O máximo desta função se realizará em um valor de x talque p− C ′(x) = 0, ou seja, um valor de x para o qual o custo marginal seja igual

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ao preço. Resolvendo C ′(x) = p obtemos a quantidade de produto que a empresavai querer fabricar se o preço unitário for p reais. Portanto, por definição, o customarginal é a função de oferta da empresa.

Somando as funções de oferta para todas as empresas que fabricam o produtona comunidade temos a função de oferta global.

O preço praticado se deduz, como sempre, da intersecção das funções de pro-cura e de oferta, assim como as quantidades que serão fabricadas de cada produto.Deduzimos assim que a Utilidade Marginal e o Custo Marginal são os “dados” quepermitem decidir quanto se fabrica e se consume e por quais preços em uma eco-nomia de livre concorrência.

Efeitos da forma da função de custo em diferentes empresasVimos acima que, em geral, a função custo começa com um custo fixo e depois

começa a crescer de maneira côncava, ou seja, com derivada decrescente.A partir de certo volume de produção a função custo vira sua concavidade para

cima, pela necessidade de fazer novos investimentos para sustentar a produção nosnovos níveis. Estas variações poderiam se repetir várias vezes em uma mesmaempresa.

Mais ainda, se a empresa olhar globalmente suas vantagens relativas, poderiaser para ela conveniente “adiantar” o momento de fazer o novo investimento.

Vimos também que, dada a função custo, a empresa sempre tratará de maximi-zar seu lucro, ou seja, a diferença entre px e C(x), onde p é o preço. O ponto ondeesse lucro é maximizado é a quantidade de produto que a empresa está disposta aproduzir com o preço p.

Agora, que aconteceria se uma empresa tivesse sua função custo sempre côn-cava? (Ou se o seu ponto de inflexão se realizasse para x muito grande). Nessecaso, para qualquer preço p, a empresa é capaz de produzir uma quantidade ar-bitrariamente grande de produto (ou muito grande). Quanto mais à direita fica oponto de inflexão mais a empresa seria capaz de satisfazer a demanda mesmo comp pequeno.

Nesse caso, imaginemos que houvesse outra empresa fabricante do mesmo pro-duto mas na qual a inflexão se desse em um valor muito menor de x. Se p fossesuficientemente pequeno, a segunda empresa não poderia produzir nada sem terperdas. Mais tarde ou mais cedo, esta empresa teria que fechar.

Este tipo de processo pode conduzir ao monopólio ou oligopólio.

A doença holandesa

Suponha que, no Brasil, uma empresa exportadora de determinado produto étão eficiente que seu custo de produção é sempre côncavo. Já sabemos que essaempresa acabará com todos seus competidores porque conseguirá ter lucro inde-

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42 Capıtulo 8. Oferta e Procura

pendentemente do preço do produto, produzindo mais e mais. No fim, nenhumaoutra empresa produzirá o produto, se o monopôlio não for inibido. Agora, o preçodo produto que essa empresa fabrica depende do valor do dólar, porque se tratade um produto que, quase tudo, é exportado. Se o dólar se desvaloriza em relaçãoao real, a empresa recebe a mesma quantidade de dólares mas recebe menos reais.Mas para ela tanto faz porque pode produzir o que quiser com custos decrescentes.Agora pensemos nas outras empresas, mas não apenas as que fabricam o mesmoproduto, mas as que fabricam qualquer coisa que se exporta. Ora, essas empresas,em geral, não tem custos de produção sempre côncavos e, portanto, não pode su-portar uma queda de preços para sempre. Logo, estas empresas deveram fechar ouse restringir ao mercado interno. A isso se chama “a doença holandesa” ou seja,é o processo pelo qual a moeda nacional é valorizada e existe um produto de ex-portação que suporta tudo, entretanto os outros não suportam e acabam sumindo.Vejam que um real valorizado é um poderoso instrumento de combate à inflação.A chamada “desindustrialização” do Brasil tem a ver com este processo.

AtividadeSuponha que o Brasil tem 200 milhões de pessoas, divididas em 50 milhões de

famílias de 4 pessoas. Estas famílias se dividem em faixas de renda disponível, porexemplo, as faixas definidas pelas tabelas de imposto de renda. Em cada faixa háum número dado de famílias.

Cada família consome arroz (medido em kg), camisetas (unidades), livros (uni-dades) e consultas médicas (unidades).

Para cada família defina a função de utilidade de cada um desses produtos, deacordo com o bom senso. Para cada família, resolva o problema de otimizaçãoassociado a seu consumo, para cada preço possível de cada produto.

Somando, para cada preço possível, o consumo de cada produto por todas asfamílias, obtenha e desenhe a função de procura global para cada produto.

Por outro lado, suponha que cada um dos quatro bens ou serviços de consumoé fabricado por uma única empresa. Desenhe a função de custo e, para cada preçopossível, determine a quantidade de bem ou serviço que a empresa deseja produzir.Elabore assim a curva de oferta para arroz, camisetas, livros e consultas médicas.

Obtenha os preços de mercado de cada produto pela intersecção das curvas deoferta e de procura.

Preços dos Fatores de ProduçãoSuponha que uma empresa fabrica um produto qualquer, digamos, manteiga.

Para isso emprega mão e obra, matérias primas, máquinas e espaço físico (terra).Esses são os chamados “fatores de produção”. Dadas quantidades dos fatores deprodução, fica determinada a quantidade de “manteiga” que é produzida, por meiode uma “função de produção” que faz exatamente isso, relacionar as quantidades

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de fatores de produção com a produção.Agora vamos considerar o preço da manteiga como dado, e também os preços

dos fatores de produção, ou seja o preço da mão de obra (salários), das máquinas,das matérias primas, e do aluguel do espaço físico.

Por exemplo, simplifiquemos e suponhamos que temos somente dois fatores deprodução: mão de obra e leite. Suponhamos que p1 é o preço da mão de obra ep2 o preço de um litro de leite e que x1 e x2 são, respectivamente, o número detrabalhadores e a quantidade de leite. Portanto, o custo de produção é p1x1 + p2x2

onde p1 e p2 são os preços dos fatores de produção Mas a função de produção, quenos diz a quantidade de manteiga produzida é f(x1, x2). Como a empresa quermaximizar o lucro, vai querer maximizar a diferença entre pf(x1, x2) e p1x2 +p2x2.Derivando e igualando a zero, teremos que x1 e x2 serão dadas por

p∂f

∂x1

= p1 e p∂f

∂x2

= p2.

Estas identidades tem uma interpretação muito interessante, sobretudo a primeira.Com efeito, a identidade nos diz que p1 (o salário unitário) é igual ao produto de pvezes a derivada de f em relação a x1. Mas, o que é a derivada de f em relação a x1?É o aumento de produção quando a mão de obra aumenta em uma unidade (umhomem). Portanto, o salário unitário é igual ao aumento monetário da produçãoquando se acrescenta um trabalhador.

Este fato admite uma interpretação curiosa: Que o salário que é pago a todosos trabalhadores, na hipótese de “concorrência perfeita” é o que se paga ao “úl-timo” trabalhador proporcionalmente a sua participação na produção, mesmo quea participação do último em relação aos anteriores é muito pequena.

Isto é o que os marxistas consideram uma injustiça, mas o objetivo destas notasé mostrar que é um corolário natural da maximização do lucro na hipótese idealde concorrência perfeita.

Os preços de todos os fatores de produção estão determinados pelo modelo daOferta e da Procura. A Procura se determina, em todos os fatores, pela lei demaximização do lucro indicada acima. Vejam que A quantidade de produto que afirma está disposta a fabricar depende do preço do produto e do preço dos fatores.Portanto, a curva de procura de um fator depende do preço do produto, o qual porsua vez é determinado pela oferta e procura dele.

Temos que considerar o elemento tempo. Por exemplo, si falamos da Produçãode manteiga durante um mês, os fatores de produção são pessoal ocupado duranteum mês, matérias primas usadas em um mês, um mês de aluguel de espaço (terra)em um mês de aluguel de máquinas. De fato, quando falamos de salário tambémpodemos pensar que se trata de um mês de aluguel de força de trabalho. Vocêspodem pensar “Por que aluguel? E se somos donos da máquina?”. Bem, de todosmodos é aluguel, porque você estaria usando sua máquina e deixando de alugar

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44 Capıtulo 8. Oferta e Procura

para outra pessoa. Ainda mais no caso da terra.Quanto à curva de oferta dos fatores de produção, não há muito a ser dito,

exceto que tal oferta pode ser mais ou menos elástica. Por exemplo, se consideraem geral para qualquer preço possível, a quantidade de terra disponível para alu-guel é o mesmo. Não sei até que ponto isto é assim, mas é o que Titio Samuelson diz.

AtividadeDesenhe a curva de custo de produção do petròleo do Pré-Sal, ou seja, abscissa

= barris de petrôleo, ordenada = custo de produção. Desenhe no mesmo gráficoa reta de faturamento da Petrobrás, para diferentes preços do petrôleo. Claro quevocê não sabe como é a curva de custo de produção, mas você deve ter ouvido falarque, para que a produção do Pré-Sal seja lucrativa, o preço do barril deveria serde pelo menos 40 dólares. Tudo bem, então desenhe a curva de custo de produçãopara que isso seja verdade. Observe que, dado que o petrôleo é um recurso finito, ocusto de produção não poderá ser uma função côncava para sempre. De fato, essecusto deverá crescer espantosamente para valores altos de produção. Tire conclu-sões sobre a lucratividade do Pré-Sal usando diferentes perspectivas sobre o preçodo petrôleo.

JurosEstamos prestes a conhecer toda a verdade sobre a determinação de preços e

quantidades em um mercado competitivo, idealizado.As quantidades de bens e serviços que as pessoas consomem se orientam pela

maximização da utilidade com a restrição do dinheiro disponível. Portanto, essasquantidades dependem dos preços dos bens e serviços.

Por outro lado, os bens são produzidos por empresas que procuram maximizarseus lucros. A quantidade de bens produzidos se orienta pela maximização detais lucros. Portanto, essa quantidade depende dos preços dos bens de consumo etambém dos custos de produção, que depende dos preços dos fatores de produção,que os consomem.

Os fatores de produção também devem ser produzidos por empresas que maxi-mizam seus lucros, o que determina a quantidade produzida dos mesmos.

Assim, temos “bens” consumidos e “bens” produzidos que, no estado de equilí-brio, devem ser iguais. Estas quantidades aparecem tanto nas equações de consu-midores como nas equações de produtores. Em ambos tipos de equações tambémaparecem os preços, que, no equilíbrio, devem ser iguais (ou seja, o mesmo bemdeve ter o mesmo preço em todas as equações).

Todas essas equações juntas tem como incógnitas quantidades de bens e serviçosproduzidos e preços dos mesmos. Suas soluções definem o “equilíbrio” do sistemaeconômico. Como mencionamos antes, este não é um conceito ético.

Agora vamos ver a questão dos juros. Por enquanto pensamos a economia como

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um sistema que se maneja com dinheiro que pessoas ou empresas possuem e gastamcom as limitações que isso implica. Não consideramos que esse dinheiro pode seremprestado. Por exemplo, um consumidor pode não ter o dinheiro necessário paraadquirir determinado conjunto de bens, mas pode pedir dinheiro emprestado paraisso. Assim, o consumidor dos bens aparece também como um consumidor dedinheiro emprestado, e o emprestador de dinheiro é como se fosse um produtordesse tipo de bem. O juro é o preço do dinheiro emprestado. O preço de “1000reais emprestados durante um ano” é o juro que se paga por esse empréstimo.

Portanto, podemos pensar em curvas de procura e curvas de oferta.Comecemos pelas curvas de procura. Lembremos que nos casos de bens de

consumo, a confecção das curvas de procura estavam associadas ao conceito deUtilidade. Por outro lado, no caso de bens de capital, a curva de procura estavaassociada ao conceito de maximizar o lucro. A procura de dinheiro emprestadoaparece aqui das duas maneiras: Consumidores que requerem crédito e empresasque precisam dinheiro para tocar sua produção. Por outro lado, temos os bancosque captam poupança e pagam juros por ela. Assim, devemos considerar 3 moti-vações para a procura de dinheiro emprestado, e não podemos descartar que as 3motivações estejam associadas à resolução de diferentes problemas de otimização.

Consideremos o problema de otimização que resolve o consumidor. Considera-mos dados los precios de n produtos p1, . . . , pn e as funções de utilidade U1, . . . , Un.Acima vimos que o problema do consumidor seria

MaximizarU(x1) + . . .+ U(xn) sujeita a∑

xi ≤M,x ≥ 0.

Agora vamos considerar que p é o preço do dinheiro (ou seja, a taxa de juros)o que significa que o consumidor pode gastar mais que M reais, pagando umamulta que é igual a p vezes a diferença entre o que se gasta e M . A maneira maissimples de refletir esta possibilidade é considerar que o excesso de gasto, com osjuros correspondentes. representam uma des-utilidade que o consumidor considerana sua função objetivo. Em outras palavras, o problema de consumidor é

MaximizarU(x1) + . . .+ U(xn)−D[p(∑

xi −M)+] sujeita a x ≥ 0.

Observe que o consumidor pode ter juros a pagar de dívidas anteriores. Nestaformulação consideramos que esses juros já estão descontados na definição de M .

De acordo com isto, dados os preços pi e a taxa de juros p, cada consumidorvai decidir quanto consome de cada bem ou serviço.

Juros: O ponto de vista dos bancosO banco recebe dinheiro emprestado e empresta dinheiro ao público, às em-

presas e ao governo. Pelo dinheiro que recebe emprestado ele paga juros e pelodinheiro que empresta recebe juros. O dinheiro que o banco empresta ao governo

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46 Capıtulo 8. Oferta e Procura

forma parte da chamada “dívida interna” do país. (Também o público emprestadinheiro ao governo quanto compra “títulos públicos”.) A diferença dos consumi-dores, para os quais devemos inventar funções de utilidade, os bancos trabalhamcom modelos de verdade que envolvem a maximização de lucros e, sobretudo, apresença do risco. Isto é, a decisão que todo banco toma todos os dias a respeitodo manejo do seu capital tem em conta não apenas maximizar o lucro mas tambémse precaver contra os avatares da economia, como a possível inadimplência dos to-madores de empréstimos. De acordo com modelos relativamente sofisticados, maisou menos do tipo considerados na parte deste curso onde falamos de portfólios,os bancos construem, implicitamente, suas próprias funções de oferta e procura dedinheiro.

Juros: O ponto de vista das empresas

Juros: O ponto de vista do governo

8.0.1 Deixando o sistema funcionar a solta

Vamos supor uma situação muito ideal, com uma comunidade na qual existe umaúnica empresa que fabrica um único produto e onde todos os membros da comu-nidade podem trabalhar na empresa.

Sabemos que a produção física, como função do número de trabalhadores, éuma função crescente e côncava. Ou seja,

Produto = P ( Trabalhadores), P ′( Trabalhadores) ≥ 0 e P ′′( Trabalhadores) ≤ 0

∀ Trabalhadores ≥ 0.

(É mais realista pensar que a função produto é crescente, convexa por debaixode certo número de Trabalhadores e côncava além desse número. Na parte convexadevido à lei de custos decrescentes por economia de escala e na parte côncava pelalei de rendimentos decrescentes. Para o raciocínio esta secção o que interessa é aparte côncava.)

O faturamento (digamos, mensal) da empresa é igual a seu produto vezes opreço do produto:

Faturamento = Produto × Preço.

Por outra parte, os salários são o salário unitário vezes o número de trabalha-dores:

Custo = Salário × Trabalhadores.

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O Lucro é igual ao faturamento menos o custo. Vamos expressar o Lucro comofunção do número de Trabalhadores, assim:

Lucro = Faturamento − Custo

= P ( Trabalhadores)× Preço− Salário × Trabalhadores.

Neste exemplo não consideramos o Custo Fixo, que é gasto somente na aberturada empresa. (Também podemos supor que a empresa pediu um empréstimo paraesta abertura e que está pagando o custo fixo todos os meses. Depois que a empresaestá em funcionamento, a decisão sobre a produção não depende mais do custofixo.)

Derivando em relação à variável Trabalhadores, obtemos que o lucro máximoacontece quando a derivada do Lucro é zero (já que a derivada segunda é negativa),portanto:

Salário de cada trabalhador = P ′( Trabalhadores)× Preço do Produto. (8.1)

Isto significa que, para o lucro ótimo da empresa, o salário dos trabalhado-res deve ser igual ao preço do produto vezes a quantidade de produto que umtrabalhador acrescenta à produção.

Agora, o produto fabricado pela empresa deve ser comprado por alguém. Osúnicos compradores possíveis que temos neste sistema são os trabalhadores. Por-tanto, os salários dos trabalhadores devem ser suficientes para comprar todos osprodutos. Ou seja:

Trabalhadores × Salário ≥ P ( Trabalhadores)× Preço do Produto.

Logo, como o Lucro deve ser não-negativo,

Trabalhadores × Salário = P ( Trabalhadores)× Preço do Produto. (8.2)

As equações (8.1) e (8.2) definem um sistema de duas equações com duas in-cógnitas, uma delas é Trabalhadores e a outra é o quociente Salário do Trabalha-dor/Preço do Produto. A solução desse sistema representa o Equilíbrio neste casosimples.

A interpretação de (8.2) é interessante, pois diz que na solução de equilíbrioo Salário é igual ao faturamento médio. Pela equação (8.1) o Salário era igualao Rendimento Marginal, ou seja, a derivada da função Rendimento em relaçãoao número de trabalhadores. Assim, o que afirmamos aqui é que na situação deequilíbrio o Rendimento médio é igual ao Rendimento marginal.

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48 Capıtulo 8. Oferta e Procura

Observem que nesta situação de equilíbrio o lucro do dono da empresa é zero.Isso possibilita que cada trabalhador seja pago pela média, ou seja, o salário decada trabalhador é o faturamento total dividido o número de trabalhadores 2.

Mais ainda, das equações (8.1) e (8.2), dividindo uma pela outra, deduzimosque

Trabalhadores =P ( Trabalhadores )

P ′( Trabalhadores),

ou seja, que a quantidade de Trabalhadores contratadas é aquela para a qual

P ( Trabalhadores )

Trabalhadores= P ′( Trabalhadores). (8.3)

Observem que nesta equação não aparecem os preços nem os salários. Suainterpretação geométrica é clara. A reta que une a origem com o ponto

( Trabalhadores, P ( Trabalhadores))

é tangente à curva de produção nesse ponto.Agora, que significa mesmo esta equação?A função “Produção per cápita”, dada por P ( Trabalhadores)/ Trabalhadores,

atinge um máximo no ponto (verifique isso analiticamente e geometricamente).Dado que neste modelo a produção essencialmente se distribui entre os trabalhado-res podemos imaginar a lógica da situação da seguinte maneira. Quando, partindode zero trabalhadores, o número de trabalhadores aumenta, cada trabalhador novoé benvindo porque acrescenta maior produto per cápita, ou seja, todos ganham.Agora, ao chegar ao máximo, a aceitação de um trabalhador novo implica a di-minuição do produto per cápita, logo, essa contratação tenderá a não e produzir.Note que, pela equação (8.2) o produto per cápita é igual ao quociente entre osalário e o preço do produto, ou seja, ele representa bem o poder adquisitivo dosalário.

Em geral a função de produção é convexa para poucos trabalhadores e passa aser côncava depois. Veja que se a função de produção fosse côncava desde o começoa relação (8.3) seria impossível. Por exemplo, para o primeiro trabalhador já nãoseria benvindo o segundo trabalhador, pois ele diminuiria sua parte no bolo.

O sentido de uma situação de equilíbrio é que situações de não-equilíbrio deve-riam, naturalmente, tender a ela. Neste caso, a tal tendência está expressada pelo

2Poderiamos nos sentir tentados a descartar a equação (8.2) dizendo “Tudo bem, que sejamproduzidos mais bens dos que são consumidos, e daí? Não poderia ser que o dono da empresaficasse com esses bens no armário até melhor oportunidade? Bem, por um lado, essa situaçãonão seria sustentável porque o lucro se produz com o que é vendido, não com o que é produzido.Mas, para fixar ideias, pensemos que o bem produzido é, de fato, um serviço, por exemplo, aulasde matemática. Não é possível produzir aulas de matemática que não são dadas. Nem consultasmédicas.

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“egoísmo” mencionado acima. Sempre que o número de trabalhadores esteja porbaixo do valor de equilíbrio haverá pressão para contratar mais um. Sempre queestiver por cima do valor de equilíbrio, haverá pressão para demitir. Este é umexemplo de que o equilíbrio em si não é bom nem ruim.

Atividade

Na expedição ao redor do mundo de Fernando de Magalhães em 1520, quandonavegavam perto da atual Patagônia, houve uma rebelião de tripulantes que sus-citou um penoso castigo por parte do capitão. Ele simplesmente os obrigou adesembarcar e os deixou livrados a sua sorte. Nada mais se soube, oficialmente,dos desgraçados náufragos. Entretanto, documentos recentes achados em um con-vento da Guatemala revelam que, poucos dias depois do desembarco, encontraramum poblador originário solitário, que disse ser o cacique Patoruzek. O espirituosoíndio explicou que nessa inóspita região, e considerando as restrições alimentáriasdos cristãos, os quais, como tinham perdido os calendários e nunca sabiam se es-tavam na quaresma se negavam a ingerir todo tipo e carne, a única alternativa eraviver de desenterrar e comer trufas. Patoruzek, generosamente, se ofereceu paraorganizar uma empresa dedicada a essa atividade, sem cobrar um centavo. Pato-ruzek, que além de sábio cacique, era matemático, economista e botânico, explicouque a exploração de trufas devia ser feita com certa racionalidade e periodicidade,para evitar sua extinção. Mais precisamente, ele explicou explorações muito inten-sivas eram inúteis porque a função de produção era 600x2/(x2 + 1) trufas por mês,onde x significava uma turma de 10 homens. Depois de determinar adequadamentepreços para as trufas e salários para os famintos marinhos, Patoruzek procedeu àcontratação de 10 marinheiros. Por que? Que salário eles receberam? O que acon-teceu com os marinheiros que não foram empregados?

8.0.2 Mais de um insumo

Um homem trabalhando durante um mês, com 300 kg de farinha, 160 litros de águae 400 grs de sal fabrica 400 kg de pão. Entretanto, 3 homens, com 900 kg de farinha,480 litros de água e 1200 grs de sal fabricam mais de 400 kg de pão. Por exemplo,3 homens podem dividir e especializar as várias etapas de elaboração do pão parater essa maior eficiência. A isso chamamos Economia de Escala. Entretanto, 30homens com 9000 kg de farinha, 4800 litros de água e 12 kg de sal fabricarão menosde 4000 kg de pão. Isto é devido a que essa quantidade de homens não caberiamna padaria e o aumento de tudo deixaria de causar a economia de escala. Poroutro lado, 10 homens com 300 kg de farinha, 160 litros de água e 400 grs de salproduziram mais de 400 kg de pão, mas cada homem acrescentado acrescentaria

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50 Capıtulo 8. Oferta e Procura

cada vez menos na produção.Este exemplo mostra as propriedades essenciais de funções de produção “nor-

mais”. Neste exemplo a função tem 4 variáveis (trabalho x1, farinha x2, águax3 e sal x4). O pão produzido y depende dessas 4 variáveis. Ao longo da retat(1, 300, 160, 400), t ≥ 0, y depende de t, como uma função convexa para t menorque um certo valor, e côncava depois desse valor até certo valor maior, e depoisdesse valor maior de t fica novamente convexa e, como sempre, crescente. Poroutro lado, se qualquer das quatro variáveis é zero, temos que y = 0, e a dependên-cia de y em relação a qualquer variável, deixando as outras fixas, toma a forma deuma função crescente, mas com derivada decrescente, ou seja, uma função côncava.(Talvez com um pequeno intervalo de convexidade perto do valor zero da variável.)

Esse é o aspecto usual de funções de produção. Agora chamemos p1 ao preçounitário do insumo 1, p2 ao preço unitário do insumo 2, e assim por diante. Porexemplo, p1 seria o salário mensal de um trabalhador, p2 o preço de um kilo defarinha, p3 o preço de 1 litro de água e p4 o preço de um grama de sal.

Por último seja p o preço de 1 kg de pão.Dados esses preços, nosso padeiro ideal desejará maximizar seu lucro, que

nada mais é que seu faturamento menos seu custo de produção. ChamandoP (x1, x2, x3, x4) à função de produção com as características mencionadas acima opadeiro desejará

Maximizar p× P (x1, x2, x3, x4)−4∑i=1

pixi.

Assim, o lucro máximo será obtido quando

p∂P

∂xi(x∗1, x

∗2, x∗3, x∗4) = pi.

Dada a solução (x∗1, x∗2, x∗3, x∗4) desta equação, a produção de pão no mês será

P (x∗1, x∗2, x∗3, x∗4).

AtividadeSuponha, como indicado acima, que um homem trabalhando durante um mês,

com 300 kg de farinha, 160 litros de água e 400 grs de sal fabrica 400 kg de pão.Suponha que, se dobramos essas quantidades, a produção passa a ser 900 kg depão, se triplicamos a produção passa a ser 1500 kg de pão, se quadruplicamos aprodução passa a ser 1600 kg de pão, se quintuplicamos passa a 1800, e se sextu-plicamos passa a ser 2000. Averigue no supermercado Dalben o preço da farinha edo sal, na Sanasa o preço da água e, perguntando ao padeiro da esquina, o saláriode seus funcionários. Obtenha a produção ótima de pão de acordo com esses dados.

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Capıtulo 9

Receitas de cozinha,Insumo-Produto eFuncoes de Producao

Para fazer um almoço familiar baseado em Maniçoba (30 porções) precisamos:1,5 kg de maniva pré-cozida10 Folhas de louro1 kg de toucinho salgado1 kg de linguiça calabresa1/2 kg de charque1/2 kg de paio1/2 kg de carne de porco assada de forno1/2 kg de bacon200 g de Costelinha de porco defumada

4 horas1 pessoaSuponhamos que temos na nossa despensa

6 kg de maniva pré-cozida100 Folhas de louro9 kg de toucinho salgado4 kg de linguiça calabresa2 kg de charque3 kg de paio11 kg de carne de porco assada de forno2 kg de bacon900 g de Costelinha de porco defumada11 horas9 pessoasQuantos almoços familiares poderemos preparar?A solução é dividir a existência de cada um dos ingredientes pela quantidade

51

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52 Capıtulo 9. Receitas de cozinha, Insumo-Produto e Funcoes de Producao

dele necessária para preparar o almoço, e tomar o mínimo dos valores obtidos.Por exemplo, neste caso, as divisões correspondentes dão:4 (maniva)10 (louro)9 (toucinho)4 (linguiça)4 (charque)6 (paio)22 (porco)4 (bacon)4.5 (costelinha)2.75 (horas)9 (pessoas)Portanto, poderemos preparar 2.75 almoços para 30 pessoas.Em geral, se uma receita estabelece que para fabricar 1 unidade do produto são

necessãrias pi unidades do ingrediente pi, i = 1, . . . , n. e dispomos de xi unidadesde cada ingrediente i, a quantidade de unidades de produto que podemos fabricarserá

minx1/p1, . . . , xn/pn.

Esta quantidade é igual a

1

maxp1/x1, . . . , pn/xn.

Dessa maneira, resulta que a receita da maniçoba gera uma função de produçãopara essa deliciosa iguaria paraense.

Considerando que, muitas vezes, precisamos calcular derivadas das funções deprodução, vamos considerar a aproximação dada por

1

[(p1/x1)s + . . .+ (pn/xn)s]1/s.

Neste exemplo, com s = 10, o resultado da aproximação foi 2.72. Com s = 20, foi≈ 2.75.

Matriz de Insumo-Produto

Esta matriz tem por objetivo o registro de todas as transações monetáriasrealizadas em (digamos) um ano em um país ou região.

A matriz divide a Economia em setores, por exemplo S1, S2 e S3. Imaginemque S1 significa Setor e Alimentação, S2 significa Construção Civil e S3 significaServiços. A matriz de Insumo-Produto tem a forma

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(A BC 0

).

Vejamos que significa a matriz do Noroeste, A. Com o exemplo dos 3 setores, aprimeira coluna de A corresponde ao Setor S1. Na primeira linha desta coluna seencontram os pagamentos feitos pelo Setor S1 ao próprio setor S1, na segunda linhaos pagamentos feitos pelo setor S1 ao setor S2 e na terceira linha os pagamentosfeitos pelo setor S1 ao setor S3. As outras colunas da matriz A se definem demaneira análoga. Por exemplo, se

A =

100 50 8860 25 4080 70 30

teriamos que o setor S2 pagou ao setor S3 a quantia de 70 milhões de reais (diga-mos), que o Setor S3 pagou 88 milhões de reais ao setor S1, e assim por diante. Aspalavras Insumo - Produto na denominação desta matriz se deve a que, por exem-plo, quando o setor S1 paga 60 milhões ao setor S2, a interpretação mais óbvia éque S1 usou insumos para fabricar seus produtos, que por sua vez eram produtosdo setor S2.

O número de linhas da matriz C e o número de colunas da matriz B podemvariar. Aqui vamos supor que a matriz C tem 4 linhas, correspondentes a Salários,Lucros distribuídos, Impostos e Gastos com Importações.

O importante é que a soma dos elementos de cada linha de B é igual à quan-tidade de dinheiro recebido pelo setor correspondente a essa linha que não estácontemplado no dinheiro recebido dos outros setores da Economia. E, paralela-mente, a soma dos elementos de cada coluna de C é igual ao dinheiro pago pelosetor correspondente a essa coluna que não está contemplado pelos pagamentos aoutros setores.

Por exemplo, se

C =

200 150 210300 180 19060 100 20120 90 45

teriamos que o setor S1 pagou 200 milhões em salários, distribuiu 300 milhões delucros, pagou 60 milhões de impostos e importou pelo valor de 120 milhões. Outraslinhas de C podem envolver alugués e juros pagos pelas empresas de cada setor.

O número de colunas da matriz B também pode variar. De novo vamos pensaraqui que essas colunas são 4, correspondendo a Consumo das Famílias, Gastos doGoverno, Exportações e Investimentos.

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54 Capıtulo 9. Receitas de cozinha, Insumo-Produto e Funcoes de Producao

Por exemplo, se a matriz (incompleta) B é

B =

600 30 20 ?

,

temos que o setor S1 vendeu seus produtos ao público (as famílias) por valor de600 milhões, que o governo comprou produtos de S1 por 30 milhões e que o setorS1 exportou bens por valor de 20 milhões.

Deixamos o elemento (1, 4) de B sem preencher de propósito. Com efeito,pela primeira coluna de A e a primeira coluna de C temos que o setor S1 pagou100 + 60 + 80 + 200 + 300 + 60 + 120 = 920 milhões de reais. Por outro lado,pelas linha 1 de A e a linha 1 de B temos que o setor S1 recebeu, pelo menos(pois falta o elemento (1, 4) de B) 100 + 50 + 88 + 600 + 30 + 20 = 888 milhõesde reais. A diferença entre o que S1 pagou e o que (até esta conta) recebeu é de920 = 888 = 32 milhões de reais, que, evidentemente, devem ter sido aportadospor alguém. Por exemplo, as empresas do setor S1 podem ter vendido ações porvalor de 32 milhões. É a isso que chamamos investimento neste contexto, e queajuda a fechar a matriz com a satisfação da equação que iguala o dinheiro que saicom o dinheiro que entra.

Portanto, ainda incompleta, a matriz B será:

B =

600 30 20 32

,

Observem que os “lucros” pelo lado das saídas e os ”investimentos” pelo ladodas entradas são os coringas que permitem sempre fechar as contas.

Em consequência, a soma de todas as entradas da matriz B deve ser igual àsoma de todas as entradas da matriz C.

Como exercício, complete a matriz B de maneira plausível.

Matriz Insumo-Produto e Cálculo do Produto Interno Bruto

Antes de usar a matriz de Insumo-Produto para calcular o PIB, vamos fazer umpequeno e inocente ajuste. Um elemento da cada linha i da matriz B correspondea exportações, enquanto um elemento de cada coluna i da matriz C correspondea importações. Pois bem, vamos subtraír esses números e calcular a diferençaExportaçoes menos Importações. O resultado, seja positivo ou negativo, vamoscolocar no lugar da matriz B que correspondia a Exportações, e a linha da matriz

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C que corresponde a Importações será eliminada. Ou seja, na matriz modificadanão há importações, mas pode haver exportações negativas, as quais serão, de fato,os saldos entre exportação e importação. A razão desta conveniente modificação éque se, por exemplo, um setor se limita a exportar por 1 bilhão as mesmas coisasque importou por 1 bilhão, de fato não está produzindo nada. Importar, do pontode vista de produção de bens e serviços, é como “desproduzir”.

Feita esta modificação, e considerando que o PIB é a soma total dos valores dosbens e serviços produzidos durante um período de tempo (digamos, um ano), nosperguntamos agora onde aparece o PIB nesta matriz de Insumo-Produto. Para issopensemos nos bens e serviços produzidos, por exemplo, pelo setor S1. Os valoresrecebidos por esse setor se encontram nas linhas 1 de A e B. Mas os elementos dalinha 1 de A dão conta de valores pagos por outros setores para produzir outrosbens e serviços. Por exemplo, se o setor S1 é Agricultura e o Setor S3 é Conservas,o elemento (1, 3) de A poderia ser o valor pago pelo setor de Conservas ao setorAgricultura pela compra de pepinos. Agora, como o setor 3 vai enfiar esses pepinosem um vidro e vai vender o vidro-com-pepinos, o valor dos pepinos dentro do vidroserá recebido pelo setor 3 e será computado na linha 3 da coluna Consumo dasFamílias. O valor do pepino se encontra envolvido no vidro-com-pepino que ocontém. Como consequência, deduzimos que os elementos de A não contam nocálculo do PIB.

O que sim conta no cálculo do PIB é a totalidade dos elementos de B, sobretudoagora que consideramos que as exportações já estáo descontadas com as importa-ções. Logo, o PIB é a soma de todas as entradas da matriz B, que, como sabemos,é igual à soma das entradas da matriz C.

Atividade

1. Imagine uma Economia onde os setores são: Maniçoba, Maniva, Louro, Tou-cinho, Linguiça, Charque, Paio, Porco, Bacon e Costelinha. Construa umamatriz de Insumo-Produto plausível.

2. Imagine que a Unicamp fosse um setor da Economia. Como seriam a colunae a linha correspondentes a esse setor?

3. Tome uma matriz insumo-produto real e deduza funções de produção base-adas nos dados dessa matriz. Observe que funções de produção se escrevemem termos de produto físico não de valores monetários. Entretanto, vocêpode sempre definir uma unidade física como, por exemplo, “a quantidade demaniçoba que se podia comprar por 1 real em 2015”.

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56 Capıtulo 9. Receitas de cozinha, Insumo-Produto e Funcoes de Producao

9.1 Matriz Insumo-Produto como instrumento analıtico

Leontief [8], Prêmio Nobel de Economia de 1973, teve a ideia de usar as matrizesde Insumo-Produto para a planificação econômica. Para explicar esta ideia, vamosusar o exemplo com 3 setores e vamos simplificar as matrizes B e C, fazendo quetenham uma coluna e uma linha, respectivamente.

Portanto, a matriz básica de Insumo-Produto será, nesta seção,

(A BC 0

)=

a11 a12 a13 b1

a21 a22 a23 b2

a31 a32 a33 b3

c1 c2 c3

.Para fixar ideias, vamos pensar que bi é o consumo das famílias de produtos do

Setor Si e que ci é a soma dos salários pagos por esse setor (i = 1, 2, 3).Mais ainda, vamos definir

qi = ai1 + ai2 + ai3 + bi

para i = 1, 2, 3. As quantidades qi se chamam “totais brutos”.Observem que os totais brutos devem ser iguais por linhas e por colunas, ou

seja,qj = a1j + a2j + a3j + cj

para j = 1, 2, 3.Olhando por linhas, qi significa o total de dinheiro recebido pelo setor i, seja

dos setores econômicos ou do público.Olhando por colunas qi significa o total de pagamentos feitos pelo setor i. Am-

bas quantias são iguais neste modelo simplificado.Por outro lado, qi pode ser pensado como a produção física do setor i se pensa-

mos que a unidade de produção física é a produção física do setor que tem o valorde 1 real.

Portanto, vamos interpretar a informação contida na nossa matriz dizendo que:

• Para produzir q1 unidades do produto 1 se precisaram a11 unidades do pro-duto 1, a21 unidades do produto 2, a31 unidades do produto 3 e c1 unidadesde mão de obra;

• Para produzir q2 unidades do produto fabricado em S2 se precisaram a12

unidades do produto 1, a22 unidades do produto 2, a32 unidades do produtofabricado no setor S3 e c2 unidades de mão de obra;

• Para produzir q3 unidades do produto do setor S3 se precisaram a13 unidadesdo produto fabricado em S1, a23 unidades do produto 2, a33 unidades doproduto 3 e c3 unidades de mão de obra.

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9.1. Matriz Insumo-Produto como instrumento analıtico 57

c1, c2 e c3 são salários. Um real de salário pode ser idenfificado com quantidadede mão de obra que pode ser comprada com 1 real.

A Hipótese fundamental de Leontief é que as 3 afirmações acima são como asreceitas de bolo, ou seja, que a elas se aplica a regra de três: “Para produzir αq1

unidades do produto 1 se precisaram αa11 unidades do produto 1, αa21 unidadesdo produto 2, αa31 unidades do produto 3 e αc1 unidades de mão de obra” e assimpara os outros dois setores.

Essa hipótese nos leva a considerar que:

• Para produzir 1 unidade do produto 1 se precisarão a11/q1 unidades do pro-duto 1, a21/q1 unidades do produto 2, a31/q1 unidades do produto 3 e c1/q1

unidades de mão de obra;

• Para produzir 1 unidade do produto fabricado em S2 se precisarão a12/q2

unidades do produto 1, a22/q2 unidades do produto 2, a32/q2 unidades doproduto fabricado no setor S3 e c2/q2 unidades de mão de obra;

• Para produzir 1 unidade do produto 3 se precisarão a13/q3 unidades do pro-duto fabricado em S1, a23/q3 unidades do produto 2, a33/q3 unidades doproduto 3 e c3/q3 unidades de mão de obra.

Leontief era um economista socialista que, portanto, estava preocupado pelaplanificação e considerava que esta era possível e útil. O tipo de pergunta que elese formulava era do seguinte tipo:

Se desejamos que o consumo das famílias passe a ser de d1 unidades de produ-tos do setor S1, d2 unidades do setor S2, d3 unidades do setor S3 e, ainda mais,queremos incorporar trabalhadores que estão voltando da guerra, e, portanto con-tamos com L trabalhadores, quanto deve ser produzido por cada setor? quantostrabalhadores devem ser empregados?

Vamos chamar x1 à produção, por enquanto desconhecida, do Setor S1, x2 doS2 e x3 do S3.

Olhando os requerimentos com cuidado, observamos que o Setor S1 deve pro-duzir:

1. Os insumos de S1 necessários para a produção de x1 unidades de S1;

2. Os insumos de S1 necessários para produzir x2 unidades de S2;

3. Os insumos de S1 necessários para produzir x3 unidades de S3;

4. Os produtos do setor S1 que desejamos sejam consumidos pelas famílias.

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58 Capıtulo 9. Receitas de cozinha, Insumo-Produto e Funcoes de Producao

Os postulados acima nos dizem que:

a11

q1

x1 +a12

q2

x2 +a13

q3

x3 + d1 = x1.

e, raciocinando da mesma maneira com os setores 2 e 3:

a21

q1

x1 +a22

q2

x2 +a23

q3

x3 + d2 = x2;

ea31

q1

x1 +a32

q2

x2 +a33

q3

x3 + d3 = x3.

Finalmente,c1

q1

x1 +c2

q2

x2 +c3

q3

x3 = L.

Provavelmente, o sistema formado por estas 4 equações (com 3 incógnitas) nãotem solução. Entretanto, se nosso objetivo é planejar, digamos, um valor para d1,um valor para d2 e um valor para L, mas deixar livre o valor de d3, é bem possívelde que tenhamos um sistema bem determinado que responde a nossos objetivos.Mais ainda, se o que queremos é ter d1, d2, d3 e L não fixos mas entre valores queconsideramos razoáveis, é bem possível que o sistema de inequações tenha soluçãoe sirva para os objetivos de planificação.

De todos modos, a metodologia de Insumo-Produto é um instrumento poderosopara a planificação de atividades econômicas, mesmo que não estejam relacionadascom o Décimo Plan Quinquenal de Coreia do Norte.

Exemplo Numérico

Suponhamos que no Brasil há somente duas atividades produtivas, correspon-dentes ao produtos S1 (Aulas de Matemática) e S2 (Cenouras). Todos os traba-lhadores do Brasil fazem uma de duas coisas: ministrar aulas de matemática oucultivar cenouras.

Há empresas que ministram aulas de matemática e empresas que produzemcenouras.

As empresas que ministram aulas de matemática usam também aulas de mate-mática como insumo, pois muitas vezes os professores de Álgebra precisam tomaraulas de Análise e vice versa. Estas empresas também precisam cenouras comoinsumo, para alimentar seus professores enquanto estes dão aulas.

As empresas que produzem cenouras precisam aulas de matemática como in-sumo, pois com os conhecimentos de matemática elaboram complexos modelospara incrementar a produção agrícola. E também precisam insumos de sua mesmaindústria, por exemplo, sementes.

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9.1. Matriz Insumo-Produto como instrumento analıtico 59

A população do Brasil consome tanto aulas de matemática como cenouras, emais nada. O governo também é um forte consumidor de ambos produtos.

Portanto, as empresas que dão aulas de matemática produzem para outrasempresas da área, para os produtores de cenouras, para o público e para o governo.Durante 2015 a contabilidade nacional registrou que as indústrias de aulas dematemática tinham recebido:

100 bilhões de reais de outras empresas de aulas de matemática;500 bilhões de reais das indústrias de cenouras;400 bilhões de reais das famílias;900 bilhões de reais do governo.Analogamente, registrou-se na contabilidade que as empresas de cenouras ti-

nham recebido, em 2015, como resultado de suas vendas,300 bilhões de reais das empresas de aulas de matemática;900 bilhões de reais da indústria de cenouras;1200 bilhões de reais das famílias;100 bilhões de reais do governo.Ou seja, em total as empresas de matemática faturaram 1900 bilhões de re-

ais como resultado de aulas dadas. Estes 1900 bilhões podem ser pensados emtermos físicos, se soubermos o preço de cada aula de matemática. Por exemplo,se cada aula de matemática vale 1000 reais, as empresas de aulas de matemáticaproduziram 1900 milhões de aulas.

Da mesma maneira, vemos que as empresas de cenouras faturaram 2500 bilhõesde reais. Se o preço o kilo de cenoura fosse 10 reais, isto corresponderia a 250 bilhõesde kilos de cenoura.

Agora, nos dados acima vemos que as empresas de matemática pagaram 400bilhoes de reais. Ou seja, há uma diferença de 1500 bilhões entre o faturamento eos gastos.

Então a informação total sobre as transações realizadas em 2015 deve ser com-pletada explicando o que as empresas de matemática fizeram com esses 1500 bi-lhões. Digamos que a contabilidade nacional registra que as empresas de matemá-tica pagaram:

1000 bilhões em salários;500 bilhões em lucros.Analogamente vemos que as empresas produtoras de cenouras pagaram 1400

bilhões em insumos (matemática e sementes). Como receberam 2500 bilhões porsua produção. é necessário dizer o que fizeram com os 1100 bilhões que sobraram.A contabilidade oficial nos diz que pagaram:

700 bilhões em salários;400 bilhões em lucros.

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60 Capıtulo 9. Receitas de cozinha, Insumo-Produto e Funcoes de Producao

Isto completa a descrição da matriz(A BC 0

).

Neste caso, A, B e C têm duas linhas e duas colunas, da seguinte maneira

(A BC 0

)=

100 500 400 900300 900 1200 1001000 700500 400

.Aqui termina a parte descritiva do exemplo. Vemos que a soma da primeira

coluna da matriz, que representa o total dos gastos das empresas de matemática em2015 é igual à soma dos elementos da primeira linha, que representa o faturamentodessas empresas, ou seja, o dinheiro recebido. Da mesma maneira, a soma dasegunda linha da matriz representa a produção total de cenouras em 2015, emreais, e a soma da segunda coluna é o total dos gastos dessas empresas em insumos,salários e lucros.

O uso da matriz de insumo-produto para planificação parte de uma suposiçãoousada: Que cada coluna da matriz fornece a informação tecnológica de quantosinsumos e mão de obra se precisa para produzir cada unidade do produto. Assim,considerando que, pela soma da primeira linha da matriz, as indústrias matemáticasproduziram 1900 bilhões de reais em aulas, ou seja, uma quantidade de aulas quecorresponde a 1900 bilhões com os preços de 2015, e que foram gastos 300 bilhõesem cenouras, a suposição ousada diz que isso é tecnológico e normativo, ou seja quepara produzir 1900 bilhões em aulas se precisam 300 bilhões em cenouras, portantopara produzir 1 real de aulas se precisam 300/1900 reais em insumos de cenoura.Da mesma maneira, para produzir um real de aula se precisariam 1000/1900 reaisde mão de obra e 100/1900 reais de outras aulas de matemática. Isto nos leva àMatriz Tecnológica:

100/1900 500/2500300/1900 900/25001000/1900 700/2500500/1900 400/2500

=

0.053 0.200.159 0.360.5263 0.280.2632 0.16

.O importante é fazer interpretação correta. Esta “matriz tecnológica” diz, por

exemplo, que para fabricar um real de cenouras se precisam insumos por valor de0.20 reais de aulas de matemática, 0.36 reais da indústria de cenouras, 0.28 reaisde salários . . . e aqui vemos que quando nos aproximamos a dizer: 0.16 reais delucros hesitamos, pois isto parece bem pouco claro do ponto de vista tecnológicoou normativo. Com efeito, que significa que “se precisam” 0.16 reais de lucros?

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9.1. Matriz Insumo-Produto como instrumento analıtico 61

A partir dagora podemos esquecer a forma duvidosa como obtivemos a matriztecnolõgica e podemos considerar que seus coeficientes são uma verdade revelada.Melhor ainda, podemos considerar que, para obtê-la usamos métodos matemáticose estatísticos mais rigorosos que os que vem de, simplesmente, fazer contas com acontabilidade de 2015.

Nestas condições podemos responder a perguntas como a seguinte:Qual deverá ser a produção de aulas de matemática e a produção de cenouras

se a soma de demanda das famílias e do governo fosse 1500 bilhões (no caso damatemática) e 1400 bilhões (no caso das cenouras)? Quantas pessoas deverãotrabalhar em cada uma dessas indústrias (medidas em reais de 2015!) Quais seriamos “lucros previstos” em cada indústria?

Chamemos x1 à solução do problema no que se refere a aulas de matemática(medidas em reais de 2015) e x2 ao resultado no que se refere a cenouras.

Pela matriz tecnológica, a quantidade x1 deve ser igual à soma das aulas dematemática necessárias para produzir x1 unidades de aulas de matemática, maisas aulas de matemática necessárias para produzir x2 unidades de cenoura mais asaulas de matemática representadas pela nova demanda, portanto:

x1 = 0.053x1 + 0.20x2 + 1500.

Analogamente, a matriz tecnológica nos diz que x2 deve suprir os insumos para osetor de aulas de matematica, para o próprio setor das cenouras e para a demandaexterna, da seguinte forma:

x2 = 0.159x1 + 0.36x2 + 1400.

Em outras palavras:

(x1

x2

)−(

0.053 0.200.159 0.36

)(x1

x2

)=(

15001400

).

Ou seja, escrevendo x =(x1

x2

),

[I −

(0.053 0.200.159 0.36

) ]x =

(15001400

). (9.1)

Portanto,

x =[I −

(0.053 0.200.159 0.36

) ]−1 ( 15001400

).

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62 Capıtulo 9. Receitas de cozinha, Insumo-Produto e Funcoes de Producao

Ou seja, 3

x =(

0.947 −0.20−0.159 0.64

)−1 ( 15001400

).

Logo,

x =(

1.114 0.3480.277 1.649

)(15001400

)=(

21582724

). (9.2)

Portanto, x1 = 2158 e x2 = 2724. Compare com a produção do ano de 2015 deaulas de matemática (1900) e de cenouras (2500).

Agora, a nova mão de obra, medida em bilhões de reais de 2015, será:

0.5263× 2158 + 0.28× 2724 = 1898 (9.3)

enquanto que os lucros presumidos totais serão:

0.2632× 2158 + 0.16× 2724 = 1004.

A soma entre salários e lucros dá 2902 bilhões. O valor exato é 2900, pois deve serigual à demanda. (Isto deve ser provado rigorosamente como exercício, em termosdas definições dadas para cada termo.) A diferença se deve aos arredondamentosfeitos durante os cálculos.

9.2 Outra Interpretacao da Metodologia de Leontief

Consideremos a matriz de Insumo-Produto na sua forma usual, que pode ser obtidada contabilidade do governo: (

A BC 0

).

Como na secção anterior, chamaremos qi à soma das entradas da linha i de

(A B ), que coincide con a soma das entradas da coluna i de(AC

).

O Postulado de Leontief afirma que, para matrizes Insumo-Produto em diferen-tes anos, as quantidades aij/qi e cij/qi permanecem sempre as mesmas.

Na secção anterior vimos qual é o significado econômico deste postulado. Eleafirma que a quantidade de cada insumo e de mão de obra que se precisa parafabricar uma unidade de qualquer produto é sempre a mesma.

Lembremos o exemplo dado na secção anterior e a pergunta ali formulada: “Qualdeverá ser a produção de aulas de matemática e a produção de cenouras se a soma

3Esta fórmula tem uma interpretaçao interessante. Observe que, como (I −M)−1 = I +M +M2 + M3 + . . ., o que afirma a fórmula é que os insumos x são a soma da demanda, mas osinsumos que se precisam para fabricar a demanda, mas os insumos que se precisam para fabricaros insumos que se precisam para fabricar a demanda, e assim até o infinito.

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9.2. Outra Interpretacao da Metodologia de Leontief 63

de demanda das famílias e do governo fosse 1500 bilhões (no caso da matemática)e 1400 bilhões (no caso das cenouras)? Quantas pessoas deverão trabalhar emcada uma dessas indústrias (medidas em reais de 2015!) Quais seriam os “lucrosprevistos” em cada indústria?”

Vamos tentar responder essa pergunta usando somente a matriz de contabili-

dade(A BC 0

), suas propriedades básicas, e o Postulado de Leontief. A incógnita

de nosso problema seria a “nova” matriz da forma(A BC 0

)que satisfaz as no-

vas condições. Chamando(A+ B+

C+ 0

)a essa nova matriz. A condição de que a

demanda de aulas de matemática seja de 1500 bilhões nos diz que:

b+11 + b+

12 = 1500, (9.4)

enquanto a condição de que a demanda de cenouras seja 1400 bilhões nos diz que:

b+21 + b+

22 = 1400. (9.5)

A condição de que soma de linhas deve ser igual a soma de colunas nos diz:

a+11 + a+

12 + b+11 + b+

12 = a+11 + a+

21 + c+11 + c+

21 (9.6)

ea+

21 + a+22 + b+

21 + b+22 = a+

12 + a+22 + c+

12 + c+22. (9.7)

A constância dos coeficientes tecnológicos prescreve que:

a+11

q+1

=a11

q1

= 0.053,

a+21

q+1

=a21

q1

= 0.159,

a+12

q+2

=a12

q2

= 0.20,

a+22

q+2

=a22

q2

= 0.36,

c+11

q+1

=c11

q1

= 0.5263,

c+21

q+1

=c21

q1

= 0.2632,

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64 Capıtulo 9. Receitas de cozinha, Insumo-Produto e Funcoes de Producao

c+12

q+2

=c12

q2

= 0.28

ec+

22

q+2

=c22

q2

= 0.16.

Ou seja,a+

11 = 0.053(a+11 + a+

21 + c+11 + c+

21),

a+21 = 0.159(a+

11 + a+21 + c+

11 + c+21),

c+11 = 0.5263(a+

11 + a+21 + c+

11 + c+21),

c+21 = 0.2632(a+

11 + a+21 + c+

11 + c+21),

a+12 = 0.20(a+

12 + a+22 + c+

12 + c+22),

a+22 = 0.36(a+

12 + a+22 + c+

12 + c+22),

c+12 = 0.28(a+

12 + a+22 + c+

12 + c+22)

ec+

22 = 0.16(a+12 + a+

22 + c+12 + c+

22).

Portanto, por (9.4), (9.5), (9.6) e (9.7),

a+11 = 0.053(a+

11 + a+12 + 1500),

a+21 = 0.159(a+

11 + a+12 + 1500),

c+11 = 0.5263(a+

11 + a+12 + 1500),

c+21 = 0.2632(a+

11 + a+12 + 1500),

a+12 = 0.20(a+

21 + a+22 + 1400),

a+22 = 0.36(a+

21 + a+22 + 1400),

c+12 = 0.28(a+

21 + a+22 + 1400)

ec+

22 = 0.16(a+21 + a+

22 + 1400).

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9.3. Calculo do Impacto usando a Matriz de Insumo-Produto 65

Portanto,a+

11 + a+12 = 0.053q+

1 + 0.20q+2

ea+

21 + a+22 = 0.159q+

1 + 0.36q+2 .

Logo,a+

11 + a+12 + 1500− 1500 = 0.053q+

1 + 0.20q+2

ea+

21 + a+22 + 1400− 1400 = 0.159q+

1 + 0.36q+2 .

Ou seja,q+

1 − 0.053q+1 − 0.20q+

2 = 1500

eq+

2 − 0.159q+1 − 0.36q+

2 = 1400.

Isto é o sistema (9.1) com q+ como incógnita, em vez de x.A partir disto, todos os coeficientes da nova matriz de Insumo-Produto de-

finida por A+, B+ e C+ se obtém pelas equações de constância dos coeficientestecnológicos, ou seja, pelo Postulado de Leontief.

Concluíndo, nesta secção mostramos que o Postulado de Leontief é tudo oque se precisa para deduzir a nova matriz de Insumo-Produto, sem passar pelainterpretação física dos chamados coeficientes tecnológicos. A utilidade disto é quepermite deduzir matrizes de Insumo-Produto atualizadas, com as hipóteses que sedesejem, mediante a resolução de um sistema linear. Naturalmente, dependendodas hipóteses, este sistema pode ser incompatível ou ter infinitas soluções.

9.3 Calculo do Impacto usando a Matriz de Insumo-Produto

Da mesma maneira que chegamos à equação (9.2) no exemplo da Secção 9.1, temosque a quantidade dos produtos S1 e S2 que seriam produzidos acrescentando 1 realna demanda de consumo de S1 seria dada por:

x =(

1.114 0.3480.277 1.649

)(10

)=(

1.1140.277

).

Consequentemente, como na equação (9.3), os salários pagos como consequênciadessa demanda adicional, serão:

0.5263× 1.114 + 0.28× 0.277 = 0.664 reais . (9.8)

Estes 0.664 reais serão, por sua vez, usados para consumo, comprando produtosde S1 e de S2. Mantendo a proporção original de consumo entre estes dois setores,

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66 Capıtulo 9. Receitas de cozinha, Insumo-Produto e Funcoes de Producao

(400 em S1 e 1200 em S2), teremos que 0.166 reais serão consumidos em produtosS1 e 0.498 reais serão consumidos em produtos S2.

Portanto, as novas produções globais, contando insumos e consumo, de S1 eS2, serão dadas por:

x =(

1.114 0.3480.277 1.649

)(0.1660.498

)=(

0.1920.867

).

Assim, como em (9.3), os salários pagos serão:

0.5263× 0.192 + 0.28× 0.867 = 0.344. reais . (9.9)

Como antes, estes 0.344 reais devem ser distribuidos entre consumo de S1 econsumo de S2, e gerarão nova produção como em (9.3) e (9.8), e assim até o in-finito. A soma total dos salários gerados desta maneira será chamado “o Impacto”do real inicial injetado como consumo de produtos de S1.

AtividadeOs sucessivos vetores de demanda e os salários correspondentes são, como vi-

mos acima, o resultado se somar uma série infinita. Calcule essa soma de maneiracompacta. O cálculo de Impactos é vital nas discussões econômicas dos políticose seus assessores econômicos. Veja abaixo a polêmica entre o Prêmio Nobel PaulKrugman e economistas que sustentam que os cálculos de impacto exibidos pelocandidato à presidência dos Estados Unidos, Bernie Sanders, são plausíveis.

http://www.nakedcapitalism.com/2016/02/krugman-and-his-gangs-libeling-of-economist-gerald-friedman-for-finding-that-conventional-models-show-that-sanders-plan-could-work.html2

9.4 Estimativa Variacional da “Nova” Matriz deInsumo-Produto

Lembremos nossa formulação original da matriz de Insumo-Produto:(A BC 0

).

O uso desta matriz como instrumento analítico, devido a Leontief, envolve asuposição, altamente discutível, de que os quocientes entre determinados elementosdesta matriz se mantém constantes. Esta é a principal crítica de Samuelson à teoriade Leontief.

Provavelmente Leontief fez essa suposição pela falta de instrumentos adequados,no seu tempo, para cálculos numéricos mais sofisticados.

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9.4. Estimativa Variacional da “Nova” Matriz de Insumo-Produto 67

Os economistas gostam de usar os supostos de Leontief para responder pergun-tas do tipo: Qual seria o impacto na Economia de um aumento de 10 por cento

nos Gastos do Governo? Em outras palavras, como ficaria a matriz(A BC 0

)se

os Gastos do Governo aumentassem 10 por cento? Não parece haver uma formasatisfatória de responder essa pergunta usando os instrumentos analíticos da secçãoanterior.

Entretanto, uma oportunista suposição variacional nos permite sugerir respos-

tas satisfatórias a esse tipo de pergunta. A suposição é que a matriz(A BC 0

)mudará o menos possível que permita a satisfação da nova condição condição.Em outras palavras, a nova matriz de Insumo Produto será a matriz da forma(A+ B+

C+ 0

)mais próxima da matriz

(A BC 0

)que satisfaça a nova condição cujo

impacto nos interessa descobrir e que, ao mesmo tempo, satisfaça que a soma de

cada linha de (A+, B+) seja igual à soma de cada coluna de(A+

C+

)e, ao mesmo

tempo, satisfazendo que todos seus elementos são não negativos.Em símbolos, e adotando como medida de proximidade a soma dos quadrados

das diferenças dos elementos das matrizes, a função objetivo que deveremos mini-mizar é ‖A+ − A‖2

F + ‖B+ − B‖2F + ‖C+ − C‖2

F , onde ‖ · ‖F denota a “norma deFrobenius”.

Por exemplo, suponhamos que

A =(

1 24 1

), B =

(35

)e C = ( 1 7 ) .

Suponhamos que desejamos observar o efeito que teria o fato de que o elemento(1, 1) da matriz B passasse a ser 6. (O significado poderia ser que as despesas deconsumo das famílias na primera rubrica fosse dobrada.)

Então, o problema de descobrir as novas matrizes A+, B+ e C+ seria:

Minimizar(a+11−1)2+(a+

12−2)2+(a+21−4)2+(a+

22−1)2+(c+11−1)2+(c+

12−7)2+(b+11−3)2+(b+

21−5)2

sujeita aa+

11 + a+21 + c+

11 = a+11 + a+

12 + b+11,

a+12 + a+

22 + c+12 = a+

21 + a+22 + b+

21,

b+11 = 6

e todos os elementos de A+, B+ e C+ são positivos.A solução deste problema é:

A+ =(

1 1.254.75 1

), B+ =

(6

4.25

)e C+ = ( 2.5 7.75 ) .

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68 Capıtulo 9. Receitas de cozinha, Insumo-Produto e Funcoes de Producao

Portanto, o aumento de 3 unidades no consumo do produto 1 provocou umaumento de 2.25 unidades no produto bruto.

Um pequeno exemplo mostra que o esquema variacional não pode ser o únicoa determinar a “nova” matriz de Insumo-Produto. Suponha que A = (1), B = 3e C = (3). Suponha que a “nova” demanda Bnova é igual a 100. Então, pelaformulação variacional, Cnova = 100 e Anova = (1). Ou seja, para preservar umamatriz tão próxima quanto possível da anterior, o esquema variacional “precisou”de uma variação brusca de tecnologia. “Antes” se precisavam 1 real de insumo parafabricar 4 reais de produto e agora 101 reais de produto se fabricam com somente1 real de insumo.

Atividade

Afinal, como muda a Matriz Insumo-Produto por uma alteração da demanda?De acordo com o Postulado de Leontief ou de acordo com algum princípio variaci-onal? Ou por uma combinação de ambos?

Todos os dados para testar estas hipóteses estão disponíveis. É só pôr as mãosna massa.

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Capıtulo 10

Produto Bruto

Até agora falamos de Microeconomia. Agora passamos à Macroeconomia.Em Pirulândia, pequeno país encravado nos Cárpatos, as pessoas cultivam ce-

nouras e criam frangos. Em princípio, o Produto Bruto de Pirulândia em 2015foi de 24 toneladas de cenoura e 30 mil frangos. Entretanto, Pirulândia tambémtinha dois médicos e 3 professores de matemática, pelo qual a tal produto devemser acrescentadas 300 consultas médicas e 1200 horas de aula de matemática. Maisainda, a defesa das fronteiras de Pirulândia incluiu 24 × 365 horas de vigilância porparte de um arqueiro profissional. Finalmente, o Rei de Pirulândia não dispensavauma secretária que desempenhou tarefas administrativas durante 8 × 300 horas.

Assim, o produto bruto de Pirulândia foi contabilizado pela sua secretária comoo conjunto formado por 24 toneladas de cenoura, 30 mil frangos, 300 consultas mé-dicas, 1200 horas de aula de matemática, 24 × 365 horas de vigilância especializadae 8 × 300 horas de administração. Tal o conjunto de bens e serviços produzidospor Pirulândia. Ah, havia um poeta que declamava versos na praça central todosos domingos, logo devemos crescentar 48 horas de declamação de poesias líricasoriginais. Finalmente, em Pirulândia foram construídos dois galinheiros em 2015.

Entretanto, não era bem assim. Pirulândia não consumia toda a cenoura nemtodos os frangos que produzia. De fato, trocava 20 toneladas de cenoura por 10toneladas de cereais e trocava 20 mil frangos por 10 porcos de um reino vizinho.

Assim, o produto bruto de Pirulândia passava a ser contabilizado como sendo 4toneladas de cenoura, 10 mil frangos, 300 consultas médicas, 1200 aulas de mate-mática, 24 × 365 horas de vigilância, 8 × 300 horas de administração, 48 poesiase dois galinheiros.

Dada a grande diversificação deste conjunto, os pirulandeses resolveram subs-tituír todos estes bens e serviços pelos valores pelos quais tinham sido comerciali-zados, chegando assim à conclusão de que seu produto bruto em 2015 tinha sidode 137513 dinares piruleses.

Para unificar a contabilidade e poder fazer comparações do tipo “meu reino

69

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70 Capıtulo 10. Produto Bruto

ultrapassou o seu” na região dos Cárpatos, estabeleceu-se um sistema para conta-bilizar o produto bruto sem equívocos nem repetições. Desta maneira, elaborou-sea seguinte classificação pela qual a contabilidade ficava fácil de desenvolver:

(a) Consumo das pessoas de bens: Como os únicos bens que os pirulandesesconsumian e fabricavam eram as cenouras que sobravam da exportação, esta quan-tia se obtinha perguntando a cada pirulandês, em seu endereço, quantas cenourastinha consumido esse ano. A secretária se encarregava dessa tarefa, às vezes acom-panhada pelo arqueiro, quem se suspeitava que apenas desfrutava da companhiada primeira.

(b) Consumo das pessos de serviços: De novo, a pesquisa da secretária e doarqueiro permitia determinar quantos dinares as pessoas tinham gastado em con-sultas médicas e aulas de matemática.

(c) Investimentos de empresas: Havia uma única empresa em Pirulândia, a quefabricava galinheiros, portanto uma mera consulta à contabilidade desta empresadetectava os galinheiros que tinha construído. Em 2015 tinha sido um só, pois ooutro tinha sido construído pelo Rei.

(d) Gastos do governo: Aqui se acumulava tanto o consumo como o investimentodo governo, que, como vimos, incluia os salários da secretária e do arqueiro, o dopoeta (que tinha sobrado para o Rei) e a construção do galinheiro.

(e) Finalmente se acrescentava o valor das cenouras exportadas e se descontavao valor dos porcos importados.

Há diferenças sutis entre Produto Interno Bruto (PIB) e Produto NacionalBruto (PNB).

Nós sempre vamos falar do PIB, razoavelmente definido como a união de todosos bens e serviços produzidos, incluindo exportações e descontando importações, econtabilizados pelo seus preços de comercialização, descontando a possível inflaçãopara poder comparar anos consecutivos.

Também há algo chamado Produto Líquido, que, como toda coisa Líquido, é aBruta menos alguma coisa que sobra. Neste caso, é o Bruto menos a depreciaçãodos bens de capital já existentes. Por exemplo, no caso de Pirulândia, a depreciaçãodos galinheiros existentes. (Veremos que Dívida Líquida, por exemplo, é o que vocêdeve menos o que te devem.)

O PIB per cápita é o PIB dividido o número de habitantes de um país.

AtividadeUma coisa é o PIB e outra coisa é a maneira de medir o PIB. Por exemplo, como

você acha que se contabilizam os gastos feitos por turistas no Brasil? Quanto valeo trabalho realizado por um professor universitário? Se os salários dos professoresuniversitários são duplicados de um ano para outro, o produto gerado por eles seduplica? E se forem diminuídos, se reduz à metade? Que acontece com os gastosefetuados por turistas brasileiros no exterior? Se descontam, se acrescentam ou

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bilhão de dólares per capita, US$ crescimento,% compartilhado,%ano preços correntes preços 1970 preços correntes preços constantes Mundo América América do Sul1970 32.7 32.7 346 0.96 2.4 28.11971 36.3 36.4 374 11.3 0.97 2.5 27.31972 46.7 40.8 467 11.9 1.1 2.9 32.31973 66 46.4 643 14 1.3 3.6 36.41974 84.7 50.2 807 8.2 1.4 4.1 37.51975 99.5 52.8 929 5.2 1.5 4.4 41.11976 117.8 58.2 1076 10.3 1.6 4.7 42.71977 137.1 61.1 1224 4.9 1.7 4.9 42.91978 155.6 64.2 1367 5 1.6 5 44.11979 171.6 68.5 1478 6.8 1.6 4.9 41.71980 183.9 74.8 1579 9.2 1.5 4.7 391981 223.3 71.6 2008 -4.3 1.8 5 41.31982 231.7 72.2 1915 0.83 1.9 5.1 42.51983 164.2 70.1 1352 -2.9 1.3 3.5 34.81984 168.8 73.9 1339 5.4 1.3 3.3 36.71985 180.4 79.7 1393 7.8 1.3 3.3 391986 216.9 85.7 1625 7.5 1.4 3.8 41.41987 237.9 88.7 1736 3.5 1.4 3.9 42.91988 265.7 88.6 1906 -0.06 1.3 4 42.81989 361.4 91.4 2521 3.2 1.8 5 561990 406.9 87.5 2620 -4.4 1.8 5.2 52.51991 378.6 96.4 2532 10.3 1.6 4.7 45.91992 362.6 96 2328 -0.47 1.4 4.2 41.11993 406.9 100.6 2589 4.8 1.6 4.5 42.81994 580.5 106.5 3606 5.9 2.1 6 48.51995 778.1 111 4754 4.2 2.5 7.6 53.31996 849.6 113.4 5111 2.2 2.7 7.8 54.61997 881.5 117.2 5242 3.4 2.8 7.6 53.21998 853.8 117.3 5016 0.035 2.7 7.1 52.51999 594.1 117.6 3474 0.25 1.8 4.8 452000 652.4 122.6 3740 4.3 2 4.9 46.72001 560.7 124.2 3192 1.3 1.7 4.1 43.52002 512 127.5 2872 2.7 1.5 3.7 50.82003 558.9 129 3083 1.1 1.4 3.9 51.32004 669.6 136.3 3625 5.7 1.5 4.3 50.82005 892.1 140.6 4773 3.1 1.9 5.2 52.92006 1107.8 146.2 5867 4 2.2 6 53.92007 1396 155 7313 6 2.4 7 54.82008 1694.6 162.8 8846 5 2.7 8.1 54.72009 1664.6 162.4 8590 -0.23 2.8 8.3 54.92010 2209.4 174.7 11312 7.6 3.4 10.1 572011 2615.2 181.5 13266 3.9 3.6 11.2 592012 2413.2 184.7 12086 1.8 3.3 10 54.52013 2392.1 189.8 11890 2.7 3.1 9.7 53.62014 2346.5 190.1 11568 0.15 3 9.2 52.5

não têm nada a ver com o PIB? E os produtos de tabalho voluntário? E o trabalhodoméstico? E as obras de arte? A definição do PIB como bens e serviços tambémmerece questionamentos. Armas nucleares são um bem? E cigarros? E chiclete?Um bem seria simplesmente algo pelo qual alguém está disposto a pagar? Comose contabiliza a economia informal? E as drogas ilegais? Os autores de livros textocostumam dizer que todas estas coisas tem pouca influência no PIB total e que oque importa é usar sempre o mesmo critério, para poder comparar um ano comoutro.

Procure dados de PIB do Brasil tão antigos como conseguir e grafique tantoo PIB como o PIB per cápita. Compare o PIB per cápita atual com o passado edescubra qual é o ano passado no qual essa magnitude é igual à atual. Compareo PIB per cápita atual com o da Alemanha e faça a mesma comparação, digamos,para o ano 1973. Dá para ver alguma tendência?

Consulte a tabela em:http://www.kushnirs.org/macroeconomics_/pt/brazil__gdp.htmlComplete esta tabela com o PIB per cápita em dólares de 1970. (Todos os

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72 Capıtulo 10. Produto Bruto

dados para essa tarefa estão na tabela.)Pode explicar por que o PIB de Brasil decresceu em dólares entre 2013 e 2014

mas aumentou em “dólares de 1970”?Pode explicar por que o PIB per cápita em termos reais é, em 2015, 2.5 vezes

seu valor de 1971, no entanto em 1971 estávamos em pleno “Milagre Brasileiro” e,em 2015, estamos “na pior crise da história”?

10.1 Consumo e Poupanca em funcao da renda

Os economistas adoram a palavra “marginal”. Às vezes, seu uso é substituídoadequadamente pela expressão “na margem”.

Por exemplo, no Capítulo 11 do livro de Samuelson, lemos:No próximo capítulo daremos muita importância à quantia extra que as pessoas

quererão gastar em consumo se tiverem um dólar extra de renda. Os economistasse interessam tanto por este conceito que lhe deram um nome especial: “propensãomarginal a consumir”, ou PMC. (A palavra “marginal” é usada pelo economistapara significar ”extra”; assim, custo marginal será definido, mais adiante, como ocusto extra de produção de uma unidade extra de produto; utilidade marginal, comoutilidade extra de uma unidade adicional de determinado bem; receita marginalcomo receita extra por uma unidade extra da variável da qual a receita se supõedepender, e assim por diante.

Entre matemáticos, entendemos perfeitamente que esta salada de marginaiscorresponde ao conceito de derivada. Sempre que a uma variável y se coloca emfunção de uma variável x, os economistas chamarão “valor marginal de y” porunidade extra da variável x a nossa conhecida derivada de y em relação a x.

Por exemplo, Propensão Marginal a Consumir (PMC) é a derivada da funçãoconsumo em relação à renda. A quantidade de dinheiro que você gasta em consumo(ou seja que não poupa) é uma função de sua renda. Quanto maior sua renda, maiorserá essa quantidade de dinheiro, mas sua derivada será menor. O contrário ocorrequando se trata da Propensão Marginal a Poupar (PMP).

Isto significa que o consumo, como função da renda, é uma função crescente ecôncava. A poupança, entretanto, também é crescente (quanto mais renda maisvocê poupa), mas é convexa (observe que se x é renda, então

Poupança = x− Consumo.

Portanto, a derivada da função Poupança é igual a 1 menos a derivada da funçãoConsumo. Portanto, a derivada da função poupança está limitada superiormentepor 1. Como ela é crescente, ela tende a um número m entre 0 e 1. Ou seja, para xsuficientemente grande, a poupança se comporta como uma reta da forma mx+ b.Considerando que, se a renda é zero, a poupança é zero, temos que a poupança se

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10.1. Consumo e Poupanca em funcao da renda 73

comporta como mx se x é suficientemente grande.

AtividadeObtenha dados reais para desenhar a Consumo em função de Renda para a

Economia brasileira nos séculos XX e XXI. Faça a mesma coisa para sua família.Verifique, se for possível, as relações estabelecidas neste capítulo.

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74 Capıtulo 10. Produto Bruto

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Capıtulo 11

Teoria do Multiplicador

Suponha que você precisa de 1500 reais por mês para pagar seus estudos. Isso éum investimento que você está fazendo para o futuro. Você quer saber quanto vaiprecisar trabalhar dando aulas particulares para sobreviver e, ao mesmo tempo,pagar esse investimento fixo. Sua tendência natural é pensar: Vou viver com 2000reais por mês, logo vou precisar de 3500 reais por mês. De fato, você poderiafazer isso, porque você é uma pessoa individual que pode “decidir” consumir 2000reais por mês. Se, em vez de ser uma pessoa individual você se considerasse umarepública de neurônios mais ou menos desconectados, você deveria admitir queaquilo que consome é, naturalmente, uma porcentagem da sua renda, e não umaquantidade fixa. Digamos, então, que você sabe por experiência pessoal, ou porquevocê na realidade é o conjunto de habitantes do Brasil, que você consome 80 porcento da sua renda. Então, a quantidade de dinheiro que você deveria ganhar paraque sobrassem 1500 reais para seu investimento resultaria de resolver a equação:

0.2× x = 1500.

Ou seja, você deveria conseguir uma renda de 7500 reais por mês. Dessa maneira,você consumiria por valor de 6000 reais e sobrariam os 1500 que precisa para pagarseus estudos.

A equação acima nos diz que

x = 5× 1500,

e, de fato, pode ser generalizada para

Renda = 5× Investimento.

A Teoria do Multiplicador diz que as coisas funcionam dessa maneira na realidade.Keynes, em 1936, a formulou assim: “Dadas a propensão a consumir e a taxa denovos investimentos, só haverá um nível de emprego compatível com o equilíbrio”.

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76 Capıtulo 11. Teoria do Multiplicador

O Multiplicador, neste exemplo, é o número 5. O nível de emprego na frase deKeynes é o número de aulas de matemática que você deverá dar para conseguir arenda de 7500 reais.

A interpretação usual desta equação é que o Investimento tem um impactomultiplicador na renda. O multiplicador, naturalmente, é bem maior que 1, coisaque decorre do fato de que o consumo é uma fração bastante grande da renda.

A equaçãoRenda = Multiplicador × Investimento (11.1)

tem alguma coisa de magia. A impressão que dá é que basta aumentar o investi-mento para que o PIB aumente bastante. Seria como postular a equação “Chuvas= Multiplicador × Venda de guardachuvas” e postular que basta aumentar a vendade guardachuvas para que comece a chover. Em toda equação temos que ser muitocuidadosos com a postulação de causa - efeito.

Portanto, Titio Samuelson deve ter motivos mais importantes para preconizara importância de (11.1).

No Brasil o Investimento é aproximadamente 17 por cento do PIB, o que sig-nifica que o Consumo é 0.83 vezes o PIB. Portanto, aplicando (11.1) teriamos aequação

PIB = (1/0.17) Investimento = 5.88 Investimento.

Obviamente, temos aqui uma tautologia. Se o Investimento é 17 por centodo PIB, o PIB é 5.88 vezes o investimento. A interpretação generalizadora destatautologia se dá em termos de tendência: Para cada investimento adicional teriamosum incremento no PIB de quase 6 vezes esse investimento adicional. Portanto,se conseguíssimos incrementar o investimento para 19 por cento do PIB, o PIBaumentaria quase 12 por cento.

Esta conclusão aparentemente asombrosa se deve à suposição de que o Con-sumo é sempre e para sempre uma fração relativamente grande do PIB. Observeque se o Consumo fosse uma fração mais modesta do PIB, digamos 10 por cento,o multiplicador seria 1/0.9 ≈ 1.1.

Vejamos outro exemplo. Digamos que os salários dos professores da Unicampsejam iguais ao PIB do Brasil vezes 0.001. Ou seja, temos a equação

Salários professores da Unicamp = 0.001× PIB.

O raciocínio do multiplicador levaria a considerar que triplicar os salários dos pro-fessores da Unicamp (objetivo nobre, sem dúvida) conduziria naturalmente a tri-plicar o PIB. Mais ainda, se os salários da Unicamp passassem a sumar 1 trilhãode reais, o PIB do Brasil passaria a ser 1000 trilhões de reais. (Mais de 100 vezesseu valor atual.) Naturalmente, isto é absurdo. Entretanto, por que esse tipo de

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raciocínio seria válido substituíndo “Salário dos Professores da Unicamp” pela pa-lavra mais respeitável de “Investimento”. Evidentemente, se há algo de verdade nateoria do multiplicador, isso tem a ver com o significado de Investimento, não comidentidades algébricas.

AtividadeAs aposentadorias não entram no PIB porque não representam a produção de

novos bens e serviços. De fato, são transferências do Estado para um conjunto dapopulação, financiadas através da arrecadação fiscal. (Mesma coisa o Bolsa-Famíliae programas assistenciais.)

No Brasil as aposentadorias representam 14 por cento do PIB, um númeromuito alto se comparado com o de países desenvolvidos, que é aproximadamente6 por cento. Entretanto, as aposentadorias entran indiretamente no PIB porqueo dinheiro recebido pelos aposentados é gasto em consumo (de acordo com a fun-ção consumo), o dinheiro resultante das vendas correspondentes é gasto de novopor outras pessoas, e assim por diante gerando novos produtos, como no caso damultiplicatividade dos investimentos.

Como o Brasil é um país relativamente de renda baixa, podemos considerar quea função consumo para seus habitantes é 0.8x. Por isso, as aposentadorias estariamsujeitas a uma conta similar à feita acima para ser responsáveis, afinal de contas,por 70 por cento do PIB. De fato, a conta é um pouco diferente, porque, a diferençados investimentos, as aposentadorias não entram no PIB, logo em vez de 70 porcento do PIB são 56 por cento do PIB. Portanto, se uma reforma conseguisse baixaras aposentadorias para 7 por cento do PIB, o PIB cairia 28 por cento. Vejam quea redução das aposentadorias representaria uma economia para o Estado de 7 porcento do PIB original. Agora, se o PIB se reduz 28 por cento a arrecadação fiscal,que é aproximadamente 35 por cento do PIB, se reduz . . . Complete as contas,revise, corrija e tire usas consequências. Faça uma análise similar para o BolsaFamília. Observe que nos países desenvolvidos a propensão a consumir deve sermenor, portanto o efeito multiplicativo do investimento ou das aposentadorias oudo bolsa-família também deve ser menor.Atividade

Compatibilize a teoria do multiplicador na forma enunciada até aqui com afunção de Cobb-Douglas. Observe que Investimento representa incremento de Ca-pital, mas Cobb-Douglas fala de Capital, não de Investimento. Por outra parte,Mão-de-Obra é número de empregados em Cobb-Douglas. Enfim, você que sabe.

Como Keynes era um senhor muito inteligente, vejamos agora quais seriamos argumentos que levaram a formulação da teoria do multiplicador, expressadaagora mais ou menos assim: “Cada aumento de δ unidades no investimento causaum aumento demδ reais no PIB, com m (o multiplicador) significativamente maior

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78 Capıtulo 11. Teoria do Multiplicador

que 1”.Em outras palavras, vamos mostrar agora por qué a teoria do multiplicador é

razoável. Mais prcisamente, vamos mostrar que é razoável que um investimentoadicional de 1000 reais produz um crescimento da renda (do PIB) maior, e aindabem maior que 1000 reais.

Para isso, suponhamos uma vez mais que a função de Consumo é 0.8x, onde x éa renda. Suponhamos que se faz um investimento de 1000 reais para construír umafábrica. Isso implica a criação de um bem de 1000 reais, portanto, logo de cara,o PIB vai aumentar 1000 reais. Agora, esses 1000 reais foram usados em pagardigamos os operários que construem a fábrica. Esses operários recebem, assim,1000 reais que não teriam recebido se a fábrica não fosse construída. Como elesgastam em consumo 80 por cento de sua renda, resulta que eles vão comprar e,portanto, motivar a fabricação, de 800 reais adicionais de produtos. Por sua vez,estes 800 reais foram pagos para os fabricantes destes produtos, fabricantes quedepois de receber os 800 reais, empregam 80 por cento dessa grana em compraroutros produtos, que valem, assim, 640 reais que não teriam existido se não fossepelo investimento inicial. Estes 640 reais também são acrescentados ao PIB.

Pois bem, continuando assim por diante, resulta que o incremento no PIBmotivado pelos 1000 reais investidos na fábrica, produzirão um acréscimo do PIBigual a

1000 + 0.8× 1000 + 0.82 × 1000 + . . . =1

1− 0.8× 1000

reais. Ou seja, exatamente 5×1000 reais. Este é o mesmo resultado que obtivemosno começo e que parecia originado em uma mera tautologia.

Em rigor, devemos fazer uma ressalva. Quando o primeiro consumidor gastaos primeiros 1000 reais, ele compra bens de consumo a uma empresa. Essa compraforma parte do produto bruto na sua integridade, mas se distribui em salários,lucros, aluguéis e pagamento de impostos. Os salários e os lucros continuam naroda, mas somente os salários mantém a mesma taxa de consumo. Os donos delucros tem uma propensão menor ao consumo, ou seja, uma propensão maior depoupança. Portanto, cuidado, esse multiplicador pode estar bastante exagerado.Por outro lado, observem que a possibilidade de multiplicar produto no ciclo de-pende da distribuição de renda, porque rendas altas geram menos consumo querendas baixas.

AtividadeA discussão sobre o multiplicador se encontra no cerne das chamadas “políticas

de austeridade”. Não apenas o investimento mas também muitos gastos sobretudodo governo tem um efeito multiplicador no PIB. Os economistas se perguntam seeste efeito multiplicador compensa o gasto do governo. Ou seja, o governo gasta X

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reais em uma “auxílio” com poder multiplicador (por exemplo, aposentadorias oubolsa-família, ou orçamento do CNPq). Este auxílio provoca um acréscimo de βXreais no PIB. Isto é bom, mas o governo se preocupa pelo fato de ter gastado Xreais sem compensação evidente. A compensação pode vir, entretanto, pelo ladodos impostos. Pelos βX reais adicionais de PIB serão cobrados impostos, digamosrβX. Portanto, o governo recuperará o gasto se rβ ≥ 1. Em caso contrário, ogasto fará que a dívida interna aumente. Mesmo assim, devemos nos perguntar sea dívida interna aumentaria como porcentagem do PIB, não em termos absolutos.Tome dados reais, considere que as aposentadorias atualmente envolvem 14 porcento do PIB. Considere que em países desenvolvidos envolvem 7 por cento doPIB. Avalie a consequencia de uma reforma previdenciária. Considere que a dívidainterna bruta é 65 por cento do PIB. Faça as contas.

AtividadeO PIB do país é igual a 1000 dinares. A dívida interna bruta é de 700 dinares.

Os juros reais que o Estado paga sobre essa dívida são de 4 por cento anual. O go-verno decide um plano arrojado de investimentos por valor de 70 dinares. Supondouma taxa de propensão ao consumo de 80 por cento, e seguindo o raciocínio deTitio Samuelson, o resultado desse investimento vai ser de 350 dinares adicionais noPIB. Desses 350 dinares, um 35 por cento, ou seja, 122 dinares serão arrecadadospelo governo em forma de impostos. Portanto, a nova dívida interna será:

Divida anterior + Investimento adicional + Juros − 122 dinares.

Ou seja,700 + 70 + 31− 122 = 679 dinares

E o novo PIB será 1350 dinares. Logo, a dívida interna como porcentagem do PIBserá 50.3 por cento.

Discuta.

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80 Capıtulo 11. Teoria do Multiplicador

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Capıtulo 12

Mais sobre a Teoria deDeterminacao da Renda

No Capítulo anterior nos acostumaos com gráficos nos quais a Renda aparece noeixo horizontal enquanto graficamos a função Consumo, a função Poupança (quenada mais é que Renda menos Consumo) e, por separado, uma reta horizontal queindica o Investimento desejado. A função consumo é do tipo βx e, portanto, afunção Poupança é (1−β)x, onde x é a Renda e β está entre 0 e 1, mais bem pertode 1.

É interessante, neste gráfico, considerar que há um máximo valor para a Renda,que corresponde à situação de máxima renda, ou pleno emprego. Por enquanto,vamos considerar que os valores de renda onde temos o equilíbrio estão razoavel-mente afastados desse máximo. Poderia se dizer que perto do pleno emprego asleis são um pouco diferentes.

A renda na qual a reta de Investimento corta a função Poupança representa oponto de equilíbrio, pois é onde a Poupança se iguala com o Investimento, comoDeus manda.

Do ponto de vista tautológico, este gráfico nos permite deslocar para cima epara baixo a reta de Investimento e nos diz que se a deslocamos ∆I unidades paracima, esta reta corta a função poupança em um ponto de equilíbrio diferente, cujaabscissa é obtida resolvendo

Investimento + ∆I = (1− β)× Nova Renda.

Portanto,Investimento + ∆I = (1− β)× (x+ ∆x).

Considerando que na posição de equilíbrio x temos que

Investimento = (1− β)× x,

chegamos à conclusão de que

∆x =∆I

1− β. (12.1)

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82 Capıtulo 12. Mais sobre a Teoria de Determinacao da Renda

Vimos que isto poderia ser uma tautologia, mas admite uma interpretação ra-zoável em termos econômicos: Que o investimento produz uma cadeia de consumoque naturalmente afeta os novos níveis de renda por um mecanismo causa-efeitoaceitável.

AtividadeLeia e discuta o artigo de Delfim Netto, no que se refere às ideias de Keynes e as

de um economista polonês chamado Kalecki. Mais ainda, medite sobre a seguintefrase desse artigo:“ . . . a economia é um conhecimento empírico cujo uso tem de sesubmeter às condições institucionais sob as quais se vive”.

http://www.cartacapital.com.br/revista/884/um-voto-de-confianca

O efeito da parcimôniaChamamos parcimônia à vontade de poupar. Há parcimônia quando as pessoas

se negam a consumir e se obstinam em poupar.Isso corresponde a uma diminuição do coeficiente β, ou seja a um aumento de

1 − β. Vamos analisar formalmente o que acontece neste caso olhando o gráficobásico.

A reta horizontal de Investimento continua igual. Mas a reta que representaa função de Poupança aumenta, portanto o ponto de equilíbrio, onde estas retasse encontram, se desloca para a esquerda. Ou seja, de as pessoas se dispõem apoupar mais, o esquema básico nos diz que a renda vai diminuír. Isto se denominaParadoxo da Parcimônia. É um paradoxo porque a tendência natural é pensar quepoupar é bom, já que se precisa para sustentar o investimento. Mas aqui estamosdizendo que o público deseja poupar acima das oportunidades de investimentodetectadas pelas empresas. Aumenta a poupança, mas não as oportundiades deinvestir. O gráfico indica que a renda diminui.

Calculemos quanto diminui. Para simplificar, em vez de pensar que a funçãode poupança passou de ser o que era para ser (1 − β + ∆β)x vamos pensar quepassou a ser (1− β)x+ ∆P . Então teremos

(1− β)(x+ ∆x) + ∆P = Investimento.

Portanto,(1− β)∆x+ ∆P = 0.

Logo,

∆x =−∆P

1− β.

Observem que, assim como acontecia na secção anterior quando aumentava oinvestimento, aqui o efeito do aumento da poupança também é multiplicativo. Se

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a poupança aumenta uma unidade, o decréscimo da renda é bem maior, já que1− β é menor e, em geral, bastante próximo de zero.

Agora, isto é razoável ou é o mero resultado de uma tautologia?Em outras palavras, por que isto nos parece um paradoxo?Nos parece um paradoxo porque, se interpretado no nível individual, resulta

verdadeiramente absurdo. Este resultado nos diria que, se eu tenho que pagar umaquota de 2 mil reais por mês para meus estudos, seria inconveniente que poupassedinheiro.

O que acontece que este não é um resultado aplicável a economias individuais,mas as economias sociais, onde não há uma única vontade visando um objetivo.Contrariamente ao que se acredita em geral, administrar uma família não é amesma coisa que administrar uma sociedade. Este é apenas um exemplo.

Pois bem, a razão pela qual isto é razoável é similar a que vimos no capítulo an-terior. Nesse capítulo vimos que o efeito na renda provocado por um investimentoé igual a esse investimento dividido 1− β. (Argumento da série geométrica.) Poisbem, isso indica que quando β diminui esse efeito do investimento vai ser menor.Ou seja, quanto menor a propensão ao consumo (β menor), menor também a renda.

AtividadeLeia e discuta a posição do Prêmio Nobel Joseph Stiglitz sob a luz do que você

estudou até agora:outraspalavras.net/blog/2016/01/01/stiglitz-como-evitar-a-grande-queda-livre/

AtividadeDiscuta os seguintes argumentos: O tratamento de consumo e poupança de Sa-

muelson parece ser aplicável apenas ao caso em que as pessoas recebem seu salário,gastam uma parte dele e “poupam” outra parte guardando em uma gaveta. Talvezisso seja assim e países de moeda estável, mas no Brasil ninguém faz isso. Todas aspessoas investem o que sobra do seu salário em alguma “aplicação”, “fundo” ou nacaderneta de poupança. Isso é poupança inativa ou é poupança investida? Ou é aconfirmação do afirmado por Keynes, que toda a poupança é investida? Se todaessa “poupança” é “investida” onde se aplica a teoria do multiplicador? Em quemomento a poupança fica paralizada e deixa de se “multiplicar”? Se você colocaseu dinheiro no banco e o banco empresta para o governo com juros de 14.5 porcento anual, isso é investimento? O que o governo faz com esse dinheiro? Muitobem, o governo paga seus gastos correntes, e isso tem um poder multiplicativo.Se no argumento multiplicativo supomos que a pessoa gasta 80 por cento do seusalário e “poupa” o resto investindo da maneira indicada neste comentário, comofica o cálculo do PIB?

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84 Capıtulo 12. Mais sobre a Teoria de Determinacao da Renda

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Capıtulo 13

Recapitulando

Em geral, os economistas diferem entre si pelos princípios básicos. Economistaspertencentes à mesma escola rara vez têm divergências significativas. Por isso, nósque não somos economistas não perdemos nada parando para entender os princípiosbásicos tanto tempo quanto for necessário.

Este capítulo tem como objetivo parar nos princípios básicos da teoria de for-mação de renda formulada dos capítulos 12 em diante do livro de Samuelson.

Consideremos o caso de um professor universitário que recebe como salário 100mil reais por ano. Estes 100 mil reais formam parte do PIB porque, por definição,eles são o valor dos serviços produzidos por este professor. (Por outra parte, elessão contabilizados no PIB como gastos do governo.)

Agora, desses 100 mil reais o professor gasta em consumo de bens e serviços 80mil reais e poupa, por exemplo, guardando debaixo do colchão, 20 mil reais.

Se juntamos agora todos os professores universitários e demais habitantes doBrasil que recebem salários, lucros e rendas teremos por um lado o total da rendanacional anual, e, por outro lado, a quantidade de dinheiro gasto em consumo e aquantidade de dinheiro poupada.

A Teoria de Formação de Renda se baseia em que a quantidade gastada emconsumo C(x) é uma função de x, que é a renda total. Em consequência, temosque a quantidade de dinheiro poupada P (x), também é uma função que depende darenda x de maneira determinista. Em vez de passar adiante dizendo “já entendi”,não custa nada parar para pensar. Afinal de contas, uma função é uma função,não qualquer coisa, e quando dizemos C(x) ou P (x) estamos dizendo algo muitoforte: que o consumo da sociedade depende da renda total e de nenhuma outracoisa. Por exemplo, estamos excluíndo a possibilidade de que uma mudança bruscae global da propensão ao consumo seja originada por um fato inesperado, comouma conquista de um campeonato pela Ponte Preta.

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86 Capıtulo 13. Recapitulando

Por definição, temos que:

C(x) + P (x) = x para todo x ∈ IR+.

Portanto, supondo que estas interessantes funções são diferenciáveis:

C ′(x) + P ′(x) = 1 para todo x ∈ IR+

eC ′′(x) + P ′′(x) = 0 para todo x ∈ IR+.

O bom senso, por outro lado, nos leva a postular que C ′(x), chamada ”propensãomarginal a consumir” é não-crescente, ou seja C ′′(x) ≤ 0, o que leva a que P ′′(x) ≥0, ou seja, a que C(x) seja crescente e côncava e que P (x) seja crescente e convexa.

Felizmente, um gráfico empírico publicado no livro de Samuelson indica que,na prática, estas funções parecem lineares.

Agora suponhamos que as empresas descobrem um nova oportunidade de in-vestimento, devido a uma grande mudança tecnológica na fabricação de canetas.Assim, “desejam” construír fábricas para fabricar canetas com a nova tecnologia.Para isso elas precisam, em 2016, uma quantidade nada desprezível de reais, diga-mos, 500 bilhões.

De onde eles vão tirar esses 500 bilhões? A fonte natural é a poupança dosbrasileiros. (Vejam que aqui estamos excluindo a possibilidade de pedir dinheiroemprestado fora do Brasil, que veremos em outros capítulos.) Agora, essa pou-pança pode ser suficiente para cobrir o investimento ou não. Se não for suficiente,a tendência da economia será incrementar a renda para conseguir a poupança sufici-ente (você daria mais aulas de matemática para ganhar mais dinheiro se assumisseo compromisso de criar 5 cachorros). Observe que, nesta suposição inocente, estáexcluído o fato de que, com a mesma renda, a sociedade diminua seu consumopara conseguir o investimento necessário. O que a teoria assume é que isso nãovai acontecer, pelo menos sem uma coerção incompatível com as economias capi-talistas modernas. Aqui vemos a importância do fato “Uma função é uma função,e não outra coisa”. Ou seja, o que estamos afirmando aqui é que se a poupança éinsuficiente para o investimento desejado, a renda deverá aumentar.

Mas também pode ser que haja poupança sobrando, o que aconteceria se to-dos os professores universitários e demais habitantes do Brasil fossem como o TioPatinhas. (Parece que algo assim acontece há 30 anos no Japão.)

Que aconteceria nesse caso? Possuidores de uma poupança sem boas possi-bilidades de investimento, os professores universitários diminuiriam seus reclamossalariais e teriam seus vencimentos reajustados a um nível mais baixo que a inflação,donos de mercearias fechariam parte de seus negócios, os funcionários correspon-dentes perderiam os empregos, e assim por diante. Ou seja, a renda geral ou PIBdiminuiria.

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Os argumentos acima indicam que a renda sempre se mexeria tanto se a pou-pança fica por debaixo como se fica por cima do investimento. “Paradoxalmente”a falta de poupança provocaria um aumento da renda e um excesso de poupançaprovocaria uma diminuição a mesma. O paradoxo vem do equívoco de considerara sociedade como se fosse um indivíduo. Um indivíduo teria a possibilidade demudar seu consumo sem alterar sua renda. Uma sociedade somente conseguiriadiminuír ou aumentar o consumo alterando sua renda.

Bem, essa é a teoria. Isso é o que Keynes quis dizer com “Dadas a propensão aconsumir e a taxa de novos investimentos, só haverá um nível de emprego compa-tível com o equilíbrio”.

AtividadeAtenção: Um dos grandes perigos epistemológicos é confundir o fato de ter

entendido uma teoria com a confirmação da mesma. É uma tendência muito co-mum. Você fica tão encantado porque entendeu a teoria todas suas implicações,você perdeu tanto tempo com isso, que fica um torcedor fanático da mesma e nãoconsegue suportar a possibilidade de estar errado. Procure exemplos deste desviona ciência econômica e na sua própria experiência.

AtividadeA teoria de formação de renda rascunhada aqui (tomada do livro de Samuel-

son) indica que, pelo menos relativamente longe da máxima renda possível (a qualestá limitada talvez pelo pleno emprego e algo mais), investimentos do governoajudam a aquecer a aumentar o PIB e outros gastos do governo também. Recipro-camente, o que é bom para os indivíduos (restringir o consumo e poupar mais) éruim para a comunidade, e essa parece ser a razão pela qual esta teoria é difícil deaceitar para o público. Entretanto, muitos economistas acreditam nela, e outrosparece que não. Nada a objetar sobre aqueles que não acreditam na teoria, masa pergunta óbvia é: Por que aqueles economistas que acreditam na teoria relutamem sua aplicação quando assumem o governo? Em termos brasileiros, por queos economistas ditos desenvolvimentistas aderem à contenção dos gastos públicose a medidas de austeridade? Aparentemente uma coisa é escrever desde fora dogoverno e outra coisa é a administração efetiva. Discuta estas questões e pense noconceito de Risco, que afinal de contas dá nome a estas notas de aula. Quando ogoverno opta por um investimento, precisa captar poupança do público. Para issoemite títulos, que aumentam a dívida interna do governo. O seja, o governo fazum “gasto” agora para gerar um benefício futuro que provavelmente está sujeito adúvidas (O Consumo é realmente uma função da renda e somente da renda? Ese aparecem outras variáveis independentes que “alteram” essa dependência?) Nopior dos casos, o governo aumentou a dívida interna para nada. Talvez, mesmo queo ministro seja um fanático da teoria básica de formação de renda, ele não tenha

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88 Capıtulo 13. Recapitulando

condições “políticas” de assumir os riscos correspondentes. Discuta.

Equilíbrio bom e pleno empregoO equilíbrio, que, como vimos, é caracterizado pela equação

Poupança = Investimento

não é essencialmente “bom”. Ele, na Teoria da Renda, simplesmente é, e a economiatende naturalmente a ele.

Se o equilíbrio se produz para um valor baixo da renda, esto significa que, emtal equilíbrio, há desemprego, o que é ruim. Por outro lado, toda economia temuma renda máxima determinada pelo pleno emprego e a tecnologia disponível. Se oequilíbrio acontece para um renda maior que a máxima possível, ou muito próximodela, ele não é atingível: os investimentos disponíveis exigem uma renda maior oque pressiona salários e preços para cima: Inflação. Logo, em princípio, o equilíbrio“bom” sucede quando está próximo da renda de pleno emprego, mas sem exagerar.

AtividadeSamuelson afirma que o efeito de um corte de impostos é similar ao de um

aumento de investimento, mas um pouco menor. Esta afirmação é curiosa porquenão parece se sustentar no simples deslocamento da função de Consumo. Comefeito, pensemos no gráfico com a reta horizontal de Investimento e a reta (1−β)xde Poupança. Corte de imposto implica maior consumo, portanto implica que areta de Poupança fica um pouco mais para baixo. O novo equilíbrio corresponde ainterseção da reta de Investimento com a nova reta de Poupança. É fácil ver quea afirmação de que o efeito disto é “um pouco melhor” que o efeito de aumentar oinvestimento não parece correta. Faça as contas. Entretanto, a afirmação parececorreto se apelamos para o raciocínio “da série geométrica”. A razão é que a di-minuição dos impostos equivale a uma transferência de renda para o público, emtroca de nada, ou seja, não representa, em princípio, a produção de nenhum bemou serviço (ao contrário do aumento de investimento). O que sim permanece é oefeito multiplicativo do tipo: se tenho mais dinheiro para consumir, vou gastar essedinheiro em bens e serviços, e os que o recebam vão gastar etcétera, produzindouma série geométrica. Mas o resultado é menor que no caso do investimento porquefaltaria o primeiro termo. Discuta.

AtividadeFazendo algumas aproximações grosseiras: O PIB do Brasil é 8 trilhões de reais,

o investimento é 15 por cento, ou seja 1.2 trilhões. Considerando a equação básicado equilíbrio temos que 1− β = 0.15, portanto β, a derivada da função consumo,é 0.85.

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Este valor corresponde à taxa de consumo média no Brasil com a distribuiçãode renda existente. Se melhora a distribuição de renda, a taxa de consumo cresce.Supondo que o investimento não muda, qual seria a consequência de uma melhordistribuição de renda para o PIB? E se uma distribuição mais radical nos levassealém do pleno emprego? Discuta.

AtividadeDiscuta o seguinte parágrafo do prêmio Nobel de 2001 Joseph Stiglitz no livro

“La Gran Brecha” (não conheço o título da tradução portuguesa):Não é por acaso que os periodos nos quais mais grupos sociais tiveram mai-

ores ingressos - nos que houve menos desigualdade, em parte graças a impostosprogressivos - tenham sido os periodos nos que a economia do país tem crescidomais rapidamente. Também não é por acaso que a recessão atual, como a GrandeDepressão, tenha sido precedida de um grande aumento das desigualdades. Quandose concentra demasiado dinheiro na parte alta da sociedade, o gasto do americanomédio disminui, pelo menos se não conta com apoios artificiais. Trasladar o di-nheiro de baixo para cima reduz o consumo porque as pessoas com mais rendasconsomem uma proporção menor do seu dinheiro que as de rendas mais baixas.Custa entender que seja assim porque o gasto dos ricos é muito ostensivo.

Faça uma simulação computacional para deduzir a taxa de consumo média emfunção de alguma medida de distribuição de renda.

Radicalizando a teoria do multiplicador

Suponhamos que o governo usa um bilhão de reais para construír um estádiode futebol. O PIB aumentará, em primeiro lugar, em um bilhão de reais, queseria o valor do estádio. Além disso, o efeito multiplicativo, supondo uma taxa depropensão ao consumo de 0.8 aumentaria de acordo com a soma da série:

1 + 0.8 + 0.82 + . . . = 1/(1− 0.8) = 5.

Ou seja, o PIB aumentará, “em total”, 5 bilhões de reais.Agora, esse primeiro bilhão que foram gastos e distribuídos na população, desse

bilhão 0.8 bilhão foi consumido, mas 0.2 bilhão foi poupado. Do 0.8 bilhão seguinte,um 80 por cento é consumido e o restante é poupado. Em definitiva, o que époupado no processo todo acaba sendo:

0.2(1 + 0.8 + 0.82 + . . .) = 0.2/(1− 0.8) = 1 bilhão. (13.1)

Ou seja, o bilhão de investimento por parte do governo gerou 5 bilhões (con-siderando o estádio e o consumo derivado) e gerou 1 bilhão de poupança privada.Esta poupança privada pode ser usada para novo investimento, por exemplo, para

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90 Capıtulo 13. Recapitulando

construír outro estádio. Este novo estádio poderia pertencer a um fondo de inves-timento gerado pelas poupanças.

Agora, acima pensamos numa taxa de poupança igual a 0.8. Suponhamos queesta taxa seja r ∈ (0, 1). Então o aumento do PIB gerado pelo investimento inicialdo governo seria

1

1− rbilhões.

Por outro lado, a poupança gerada seria

1− r1− r

bilhões = 1 bilhão.

Observem que, se a taxa de propensão ao consumo fosse 0.2, ou seja, se as pessoaspoupassem muito da sua renda, o aumento gerado pelo investimento inicial seria1.25 bilhões e a poupança gerada seria 1 bilhão. Ou seja, a poupança geradasempre é igual ao investimento inicial, independentemente da taxa de propensãoao consumo.

Vejam que no caso extremo, em que r = 0, o único PIB gerado é o do investi-mento inicial, mas assim que o governo faz esse investimento, todo o dinheiro pagofica no bolso dos fornecedores e asssalariados e não se gera mais PIB.

Mas, o que acontece quando r = 1, ou seja, quando a taxa de poupança é zeroe todos os fornecedores e assalariados gastam todos seus proventos? Neste caso, asérie que refletiria o aumento do PIB é divergente, ou seja, o PIB gerado tenderiaa infinito, mas a poupança gerada seria 0/0? Antes de interpretar metafisicamenteesta “indeterminação” voltemos às somas parcias da série que gerou este raciocínio.Analogamente a (13.1), o que é poupado até o estágio n da série seria:

0(n∑i=1

1) = 0n bilhões.

Ou seja, todos os temos da soma parcial seriam zero. A poupança gerada não seriauma indeterminação, seria zero. Isto significa que o investimento inicial nunca seriarecuperado com investimento privado.

A consequência “econômica” disto é que “o bom” é que a propensão ao consumoseja tão alta quanto for possível, mas não tão alta que iniba totalmente a poupança.

Agora, este raciocínio começou pensando em um investimento inicial de 1 bilhãode reais. Isto corresponde ao dinheiro gasto para construír o estádio de futebol, oua estrada, ou a fábrica, mas não se refere ao que vai ser produzido pelo estádio, pelafábrica ou pela estrada. Esse bilhão de investimento é o que circula possibilitandoa produção de bens de consumo e serviço, mas ele não precisa ser um “bom inves-timento” no sentido de servir para algo. Alguém pode pensar, por exemplo, que

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um estádio de futebol não serve para nada. Em situações de depressão, duranteo New Deal nos Estados Unidos, foram construídas estradas que, nesse momento,não serviam para nada. Vimos que, como mera consequência do investimento, sehaverá 1/(1− r) bilhões de reais em bens de consumo e serviços e “sobra” 1 bilhãoem termos de poupança. Vejam que, mesmo que o bilhão inicial tenha sido apor-tado pelo governo, o segundo bilhão, poupado pelo público, não é mais do governo,e pode ser captado por uma empresa privada para, por exemplo, construír outroestádio de futebol, outra fábrica ou outra estrada.

Custa trabalho imaginar a razão pela qual mecanismo tão maravilhoso não sejaimplementado de olhos fechados por qualquer governo. O círculo é inegavelmentevirtuoso e permite uma multiplicação assustadora do produto de um país. Antesde ceder à tentação de atribuír tudo à maldade intrínseca do ser humano, vamosprocurar outra explicação.

Para mim aqui há um problema de tempo e um problema de incerteza. O bilhãode reais com o qual começa esta fábula é investido hoje mas o resultado em termosde consumo e “recuperação” do investimento não é desfrutado hoje. Até que vocênão vê os resultados, passa tempo, tempo no qual você gastou e não recebeu devolta nada. Por outro lado, a teoria de que o dinheiro pago para construír o estádiopassa mansamente para sucessivos fornecedores e trabalhadores sem empecilhosnem travas imprevistas não deixa de ser uma previsão idealizada. Na prática,muita coisa pelo meio pode acontecer. Além disso, não existe a possibilidadede fazer uma contabilidade precisa sobre o resultado da aplicação desse bilhãoespecífico. Os consumidores da corrente virtuosa participam de inúmeras outrascorrentes e o que se perceberá na economia é o resultado de todas as correntes,quem sabe algumas contraditórias com outras. Segundo Samuelson, o resultadosdo New Deal de Roosevelt confirmam plenamente a teoria do multiplicador, mashá vozes discordantes.

Eu acho que tudo seria mais fácil se, no começo, não aparecesse esse bilhãoinicial que assumimos gasto pelo governo. Isso contamina o debate e a percepçãodo risco. Para a opinião pública, construír um estádio é jogar dinheiro fora. Acontabilidade é insensível a teorias de multiplicador. Construír estradas que nãoservem para nada também, e o governo não deve se ocupar de fábricas porque éineficiente para essas coisas.

Agora, com o segundo bilhão não há tantos problemas porque, em princípio,esse bilhão está em mãos privadas. Claro que para que esse segundo bilhão, emmãos privadas, seja realmente investido se precisa “combinar com os russos” o quenem sempre é fácil. Por isso, para o governo é mais sensato confiar em que essebilhão retorne a suas arcas por meio de impostos. Para simplificar, se pensamosque tudo ou uma boa parte do que consideramos “poupança privada” é pago comoimposto ao governo, obtemos restituição exata do bilhão aos cofres públicos.

Vimos que devido ao tempo e à incerteza, há espaço para questionar a política

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92 Capıtulo 13. Recapitulando

de investir o bilhão inicial. Uma boa parte das opiniões conservadoras contráriasdevem ser atribuídas à prudência. Se combina essa prudência com os interessesde uma parte da sociedade? Bem, como esta é uma pergunta que corresponde aocampo da Política, ela não vai ser respondida nestas notas de aula.

O que sim precisamos fazer é estabelecer algumas limitações.

1. A teoria do multiplicador supõe que os bens e serviços consumidos comoconsequência do investimento inicial são produzidos no país, não importados,pois em caso de que fossem importados não contariam no Produto InternoBruto. Portanto, sua aplicação depende de um eficaz controle do governonesse sentido, seja atravês de taxas de importação ou da manutenção de umdólar caro.

2. A teoria benigna do multiplicador se aplica muito bem se supomos que cadaconsumidor que recebe dinheiro em algum estágio como pagamento deri-vado, direta ou indiretamente, do investimento, encontra no mercado benspara consumir na quantidade que deseja. Ou, em outras palavras, se existeno mercado mão de obra e capital para fabricar esses bens. Se tais coisasexistem em quantidade insuficiente, o que vai acontecer é que esses bensaumentarão de preço, pois serão muito mais demandados que ofertados e,assim, será gerada inflação. Ou seja, haverá o crescimento monetário do pro-duto bruto, mas isso não refletirá um crescimento dos bens produzidos. Issoacontece quando o PIB está perto de sua fronteira possível (em economês,o PIB está extrapolando su “potencial”). Pensem que isso pode acontecer,simplesmente, porque o país não tem a quantidade suficiente de mão de obra.Ou seja, a teoria do multiplicador encontra sua aplicação quando as econo-mias estão em recessão e o produto está por baixo do potencial. De fato, foinessas circunstâncias que estas ideias surgiram, com o New Deal que seguiuà depressão de 1930 e as ideias de Keynes.

Quando não estamos em situação de recessão parece claro que a maneira decrescer sem provocar inflação é expandindo a capacidade produtiva. Paraisso se precisa mão de obra, capital e tecnologia. Neste sentido é claro que émelhor que o investimento do governo seja em uma hidroelétrica, um Labora-tório de Pesquisa avançada, uma empresa de Petrôleo ou uma Universidadeque em um estádio de futebol. Por outra parte, parece óbvio que tais inici-ativas devem ser tomadas pelos governos democráticos e não deixar livradasà iniciativa privada.

3. É necessário se perguntar pela origem do dinheiro investido, talvez pelo go-verno. Ele pode vir do próprio orçamento do governo, pode vir de dinheiroque emprestado da sociedade (dívida interna), pode vir da venda de reservas

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em dólares (se o país tem tais reservas), pode vir dos depósitos compulsóriosdos bancos no Banco Central (esta é a sugestão de Stiglitz na entrevista ci-tada acima) pelos quais o governo pode não pagar juros. Cada caso tem suasnuances. Também pode vir da tomada de empréstimos externos, gerandodívida em dólares. Este caso é crítico porque a dívida externa deve ser pagamais tarde ou mais cedo, e se não é paga tudo se complica. Não é neces-sário ser economista para perceber que, nesse aspecto, a situação de paísescomo Brasil é bem diferente da Grécia (Por que?). Alguns economistas (vejaartigos recentes de Luis Carlos Bresser Pereira) acreditam que Brasil, emparticular, é capaz de crescer aceitavelmente apenas com poupança interna.

Atividade

Para sair da recessão, o Governo decide construír uma nova capital em Amapá,chamada Amapília. Faça um plano para este empreendimento, com previsões sériassobre seus resultados. Sugestão: Como uma cidade inteira é algo muito ambiciosoque, de fato, jamais foi feito na história da humanidade [ :) ], comece pensandoque Amapília consistirá, em princípio, apenas de um prédio.

Atividade

Assista e comente a entrevista com Joseph Stiglitz em:https://www.youtube.com/watch?v=w8OYlOCb0IM&feature=youtu.be

Atividade

Suponhamos que, para construir o estádio com um investimento de 1 bilhão dereais, se precisa pagar a 10000 funcionários. Ou seja, suponha que o bilhão vai serinvestido no pagamento de funcionários. Considere a possibilidade de pagar 1 bi-lhão para 1 funcionário e fazer trabalhar os 9999 restantes como escravos. Quantodinheiro continuaria rolando na economia depois do primeiro passo do processomultiplicativo? Bom, para responder isto falta conhecer a taxa de propensão aoconsumo (ou a poupança) do felizardo. A taxa de propensão ao consumo decrescequando a renda aumenta, ou seja, a taxa de poupança aumenta quando a rendaaumenta. (O cara que ganha o mínimo deve consumir 99 por cento da sua renda,mas o cara que ganha um milhão por mês jamais conseguiria isso.) Pois bem, de-fina, de acordo com sua imaginação, bom senso e experiência, a taxa de consumocomo uma função adequada da renda e continue a atividade somente depois de terfeito isso. Agora suponha a possibilidade de que o bilhão de reais é distribuídode maneira uniforme entre os 10000 funcionários. Quanto dinheiro continuaria ro-

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94 Capıtulo 13. Recapitulando

lando na economia?

Atividade

Suponha um investimento de 1 milhão de reais. Suponha que esse investimentoserve para pagar os serviços de 1000 pessoas. Essas pessoas estão distribuídas emdiferentes níveis de renda. De acordo com a renda dessas pessoas elam poupammais ou menos porcentagem de sua renda. Pessoas com rendas altas poupam umaporcentagem maior de seus ingressos. Cada uma destas 1000 pessoas usam o di-nheiro que não poupam para pagar bens ou serviços de 10 pessoas com diferentesníveis de renda. Cada uma dessas 10000 pessoas usam o dinheiro que não poupampara pagar bens e serviços de 10 pessoas com diferentes níveis de renda. E assimpor diante. Usando diferentes distribuições de renda calcule o PIB total geradopelo investimento inicial e a poupança acumulada. Faça diversas simulações desti-nadas a estimar a influência da distribuição de renda na variação do PIB.

Atividade

Suponha um investimento de 1 milhão de reais. Para tocar esse investimentose precisa 1 engenheiro e 10 operários. O milhão é para o pagamento deles. A taxade propensão ao consumo se considera dada por

r = 1− 0.001S,

onde S é o pagamento recebido pelo trabalhador em miles de reais, seja ele enge-nheiro ou operário. Considere as seguintes possibilidades:

1. O engenheiro recebe 900 mil reais e cada operário recebe 10 mil reais.

2. O engenheiro recebe 500 mil reais e cada operário recebe 50 mil reais.

3. O engenheiro recebe 200 mil reais e cada operário recebe 80 mil reais.

4. O engenheiro recebe 100 mil reais e cada operário recebe 90 mil reais.

Em cada caso calcule o consumo total de engenheiro e operários e a poupançados mesmos.

Considere o problema de otimização que consiste em otimizar a distribuição deremuneração entre engenheiro e operários de maneira a maximizar o consumo.

Baseada nos resultados obtidos, discuta a seguinte afirmação: “Em termos deexpandir o PIB o melhor é a máxima distribuição de renda, mas em termos derecuperação do investimento o melhor é a máxima concentração”. Escreva umamonografia discutindo este tema.

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Capıtulo 14

A Moeda

14.1 A magia do dinheiro

O efeito multiplicativo expressado na teoria do multiplicador parece indicar quehá algo de mágico no dinheiro. A mesma quantidade de dinheiro, por exemplo, 1bilhão de reais, pode circular indefinidamente provocando a produção de mais emais bens e serviços. Na realidade esta magia não tem a ver com o dinheiro emsi. Poderia ser provocada, por exemplo, por uma geladeira. Se o governo dessede presente uma geladeira a Francisco, e Francisco não precisasse dela, poderiatrocá-la por uma máquina de lavar com Manuela, mas Manuela, não precisandode geladeiras, poderia trocar a geladeira por um mês de aulas de matemáticascom Antônio. E se Antônio assim o quisesse, poderia trocar a geladeira por umtratamento oftalmológico com a Dra. Pepa. Assim por diante, a geladeira poderiavoltar a Francisco ou até ao governo se este, em determinado momento, oferecessea Jacinto (o proprietário ocasional da geladeira), uma rede de esgoto em trocadela. Ou seja, a geladeira produziu uma quantidade de bens e serviços que, foradetalhes, poderiam ir até o infinito. Esses bens e serviços também poderiam tersido produzidos sem a intermediação da geladeira. Bastaria Francisco, Manuela,Antônio, Pepa, Jacinto e os outros fazer uma assembleia se dispondo a executardeterminados trabalhos pelo bem comum, e para sempre. Não há nenhuma magianisto e, de fato, muitas “produções” se baseiam em acordos desse tipo, que sãocumpridos por coação moral, convicção, coerção, instinto, ou de outras maneirasque não envolvem circulação de geladeiras. A “circulação de geladeiras” é apenasuma das formas nas que os seres humanos resolvem o problema de produzir o queprecisam para sobreviver. Se trata de uma forma bastante eficiente.

Geladeiras são objetos interessantes porque têm um valor em si mesmas. Servempara esfriar alimentos. Diferentes atores deste drama podem avaliar que umageladeira tem o mesmo valor que um mês de aulas de matemática ou um tratamentooftalmológico, porque todas essas são coisas que servem para algo. Por outro lado,

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96 Capıtulo 14. A Moeda

não é confortável traficar com geladeiras. O dinheiro, que substituiu às geladeirascomo facilitador do sistema de produção, é muito mais cómodo, mas conta com odesconforto de, aparentemente, não servir para nada. Cem notas de cem dólaresnão servem para conservar uma maionese na temperatura adequada, nem paratransmitir conhecimentos de matemática, nem para curar uma catarata. Então,o que é o dinheiro? As antigas cédulas de pesos na Argentina eram papéis quediziam assim: “O Banco Central da República Argentina pagará ao portador e àvista a quantidade de (digamos) 100 pesos”. Revelavam assim que tais cédulaseram promessas de pagamento. Pagamento de que? Bom, de 100 pesos, coisa queninguém se perguntava o que era, porque para todo mundo 100 pesos era essa notade 100 pesos, e ninguém lia que a nota de 100 pesos era uma promessa do BancoCentral da República Argentina, na qual este se comprometia a pagar 100 pesos!

De fato, antigamente essas promessas eram promessas mesmo. Os 100 pesospodiam ser, por exemplo, 10 gramas de ouro, ou uma moeda física de ouro pesando10 gramas, ou algo parecido. Isso passou de moda. A última tentativa de mantero dinheiro como uma promessa de algo tangível aconteceu nos acordos de BrettonWoods, de 1944, nos quais os Estados Unidos se comprometeram a pagar umadeterminada quantidade de ouro em troca de 1 dólar para o resto da história domundo. Mas os Estados Unidos renegaram desse acordo em 1973 e ficou por issomesmo. Assim, o dólar ficou como uma promessa de algo que ningúem sabe o queé, mas que se sustenta na confiabilidade e o poder do governo dos Estados Unidos.Confiamos em que um dólar é “algo” porque, em última análise, confiamos queo governo dos Estados Unidos não vai nos decepcionar, ou confiamos em que osoutros confiam nisso, o que é suficiente para que nós confiemos. Se nos decepcionouuma vez, e poderá nos decepcionar muitas vezes, por exemplo, cada vez que o FEDmodifica sua taxa de juros em benefício da própria economia norteamericana, e nãoda nossa, vamos continuar confiando assim mesmo, por falta de alternativas.

O sistema capitalista, que bem poderia ser chamado “dinheirista”, se baseia naprodução de bens e serviços motorizada pela circulação dessas promessas chamadasdinheiro. A eficiência do sistema em relação aos que os precederam na história dahumanidade é fantástica. Um dos elogios mais famosos do sistema foi feito porseu mais implacável crítico, Karl Marx, no Manifesto Comunista. O sistema capi-talista não começa com a invenção do dinheiro, que existiu “sempre”, mas com apredominância de sua circulação para motivar a produção. No feudalismo os cam-pesinos produziam tudo o relevante para a subsistência mas entregavam o produtoaos senhores não em troca de dinheiro mas em troca de proteção. O motor daprodução não era o dinheiro mas o contrato feudal.

A equação MV = PQ

Aqui chamamos Q ao PIB físico em, digamos, um ano. Ou seja, Q é o conjunto

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14.1. A magia do dinheiro 97

de maçãs, brinquedos, consultas médicas e aulas de matemática ministradas esseano pelo país considerado. Chamamos P ao preço médio de cada produto fabricadoou serviço executado. Então, PQ é o PIB anual, medido na moeda vigente. Maisprecisamente, dado que não todos os preços são iguais, PQ =

∑pjqj onde qj é a

quantidade do bem ou serviço número j e pj é o preço médio desse bem ou serviçono ano considerado.

Por outro lado, chamamos M à quantidade de dinheiro em circulação, o queinclui as notas bancárias, as moedas metálicas e os depósitos em conta corrente.(Alguns economistas gostam de incluir também os depósitos de poupança, mas istonão muda o conceito.)

Então V se define como sendo PQ/M e se chama “velocidade de circulação damoeda”. Portanto, a identidade

MV = PQ = PIB

é uma tautologia. Vale por definição.Vejamos o significado de V . Suponhamos uma economia onde todo o dinheiro

circulante é uma nota de 100 reais. Entretanto, esta economia tem um PIB de 8trilhões de reais anuais. Como isto é possível? É “possível” porque a nota de 100reais circulou, ou seja, passou de uma pessoa a outra como pagamento de um bemou serviço realizado, 8 bilhões de vezes durante esse ano. Ou seja, nesse exemplotemos que V = 8× 109.

Da identidade MV = PQ resultam 4 identidades óbvias, a primeira das quaisé a definição de V :

V = PQ/M,

M = PQ/V,

Q = MV/P

eP = MV/Q.

Obviamente, as quatro são tautologias. Mas, como toda tautologia, cada umadelas esconde a armadilha de causa-efeito. A identidade P = MV/Q, por exemplo,é a base do “Monetarismo primitivo”: Se consideramos V fixo e Q fixo, resulta queo précio médio dos bens e serviços depende apenas da quantidade de dinheiro cir-culante. Trocando em miúdos, esto significa que se o governo controla o dinheiroem circulação, os preços ficarão controlados, e assim portanto a inflação.

AtividadeQuando uma empresa brasileira exporta um produto, os dólares resultantes

dessa venda são retidos pelo governo, que repassa o equivalente em reais para a

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98 Capıtulo 14. A Moeda

empresa. Ao mesmo tempo, o governo emite títulos públicos pelo valor desses reaise os vende no mercado, pagando uma taxa de juros parecida com a SELIC. À luz doMonetarismo Primitivo, explique o que isso tem a ver com o controle da inflação.Com o mesmo enfoque, explique por que aumentos da taxa de juros tenderiam areduzir a inflação.

A criação de moeda pelo sistema bancário

A maneira como os bancos “criam moeda” é a seguinte. Suponha que 1000reais são depositados em conta corrente do Banco 1. O banco não é obrigado aguardar esses 1000 reais, nem quer, porque a possibilidade de todo mundo reclamarseus depósitos ao mesmo tempo é muito baixa. O banco é obrigado, pelo BancoCentral, a manter em caixa apenas uma porcentagem de seus depósitos, digamos20 por cento. Com o outro 80 por cento pode fazer o que quiser. Ele faz o quequiser e como consequência os 800 reais ficam depositados no Banco 2. Assim pordiante, 640 reais serão depositados no Banco 3, etcétera. Todos esses depósitos sãode fato depósitos em conta corrente e, portanto, são “moeda” no sentido definidoacima. Em última análise, fazendo a soma dos sucessivos depósitos o valor finalda moeda gerada pelo depósito inicial é de 5000 reais (soma da série geométrica).Ou seja, os 1000 reais se multiplicaram por 5. Claramente, se a disposição doBanco Central é que uma fração r dos depósitos devam ser mantidos em caixa, os1000 reais iniciais “se convertem” em 1000/r reais de moeda M . Se retomamos aTeoria Monetária Primitiva, resulta que é este o valor que determina os preços.O importante é que este valor não depende somente dos reais fabricados peloBanco Central, mas também, de maneira bastante explosiva, pelo regulamentoque imobiliza uma determinada fração dos depósitos dos bancos.

Na época da hiperinflação no Brasil (1985–1994) houve outras “moedas artifi-ciais” criadas pela sociedade, notavelmente os cheques predatados. Naquela épocamuitos comerciantes emitiam cheques com datas futuras sem ter saldo suficientenas contas, com a esperança de que, por sucessivas compensações, os cheques fos-sem descontados com sucesso na data de vencimento. Naturalmente, os chequespredatados eram trocados como se fossem moeda normal, com certa desconfiançapor parte dos que os recebiam, naturalmente.

O Banco Central

O Banco Central fabrica a moeda física e estabelece regras para que a quanti-dade e o fluxo da moeda total seja adequado para o funcionamento da economia.

Atualmente a moeda é, quase sempre, fiduciária, ou seja, baseada na fé. An-tigamente a moeda fabricada tinha uma contrapartida “real”. Por exemplo, nosacordos de Bretton Woods de 1944 os Estados Unidos se comprometiam a vender

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14.1. A magia do dinheiro 99

ouro (armazendado em Fort Knox) por 35 dólares a onça. Isso implicava mantera fabricação de dólares sob control, pois pelas regras de mercado uma fabricaçãoexcessiva aumentaria o preço do dólar. Mas em 1971 os Estados Unidos tinhamfabricado um excesso de dólares para financiar a guerra de Vietnam e, por isso, opresidente Nixon anulou o compromisso. Desde então o dólar é o que é sem ne-nhuma contrapartida e se sustenta na fé que o público tenha na política monetáriados Estados Unidos. Em algumas circunstâncias, alguns governos decidiram esta-bilizar suas economias estabelecendo contrapartidas para a moeda local em dólares.Por exemplo, em 1993 o governo argentino estabeleceu a paridade peso-dólar, quesignficava o compromisso de que, sempre que solicitado, venderia dólares por umpeso a quem assim o solicitasse. Assim como o governo dos Estados Unidos nãoconseguiu sustentar a contrapartida com o ouro, o governo argentino não conseguiusustentar a contrapartida com o dólar e o compromisso foi quebrado no início de2002.

O Banco Central usa diversos instrumentos para controlar a quantidade demoeda. Um deles (considerado meio radical por Samuelson) é mudar a exigênciaquanto à fração de reservas que devem ser mantidas. (Isso se chama “depósito com-pulsório” no Brasil porque se supõe que essas reservas são depositadas no BancoCentral sem receber nenhuma remuneração.) Outros instrumentos usados peloBanco Central para controlar o dinheiro são os seguintes:

1. Operações no mercado aberto: Isto significa que o Banco Central compra(ou vende títulos do governo para quem quiser comprar (ou vender). Porexemplo, se o Banco Central vende títulos por valor de 1 bilhão de reais, ha-verá 1 bilhão de reais que somem das contas correntes dos compradores nosdiferentes bancos. Lembrem que esse bilhão de reais tem enorme poder mul-tiplicativo, portanto a operação subtrairá muitos reais da moeda bancária,diminuindo potencialmente a inflação. Por outro lado, se o Banco Centralconsidera que a economia deve ser estimulada, em momentos de depressão,ele comprará títulos do governo, com o qual injetará dinheiro no sistemabancário.

2. Modificação da taxa básica de juros. Isto é o que no Brasil se chama TaxaSelic. Se a taxa de juros está alta, quer dizer que o governo paga jurosaltos pelo dinheiro que lhe é emprestado. Portanto, os bancos podem preferiradquirir títulos do governo com suas reservas em vez de deixar o dinheiro rolarpelo sistema bancário. Dessa maneira, o poder multiplicativo das “reservasde alta potência” (as reservas que não precisam ser imobilizadas por lei) ficareduzido. Ao contrário, se a taxa de juros baixa, os bancos liberam suasreservas de alta potência para outros usos e a moeda circulante aumenta.

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100 Capıtulo 14. A Moeda

3. Outros procedimentos mais sutis, inclusive de tipo político.

O ponto de vista monetaristaOs monetaristas, sediados na Escola de Chicago cujo principal expoente foi

Milton Friedman, consideram que o governo deve se preocupar somente por mantero estoque de moeda em um nível razoável, feito o qual a economia se acomodasozinha para aumentar ou diminuír de acordo com leis imanentes. O governonão deveria se preocupar com política fiscal nem muito menos política industrial,porque só atrapalha.

Por exemplo, uma fórmula extremamente simples recomendada pelos moneta-ristas (pelo menos nos Estados Unidos em 1975, de acordo com Titio Samuelson)é que a moeda circulante deve aumentar 5 por cento por ano. E acabou. Taxas dejuros, leilões da dívida, mercado aberto, etcétera devem estar subordinados a esseobjetivo. Lembremos da fórmula MV = PQ. Se Q (o PIB físico) aumenta 5 porcento e queremos preços estáveis (P fixo), supondo velocidade de circulação semvariar, se precisa uma expansão de 5 por cento de M . O Banco Central deveriaagir para que isso acontecesse. Ou seja, se houver uma recessão não há nada quefazer exceto manter as contas equilibradas. Com o tempo o mercado percebe aseriedade da política econômica e aparecem naturalmente novas oportunidades deinvestimento.

14.2 Duas equacoes

A primeira equação fundamental que vimos nestas notas está vinculada à “Polí-tica Fiscal”. Se origina na equação “Poupança = Investimento”, mas é razoáveldesmembrá-la um pouco para diferenciar o que é política e o que é induzido. Aideia é separar os gastos do governo, chamados G, incluír o investimento públiconesses gastos, e chamar I ao investimento privado. Então a equação passa a ser: “C+ I + G = R”, onde R é o PIB. Vejam que R - C é o que chamávamos poupança,logo a nova equação é a mesma coisa que “Poupança = Investimento Privado +Gastos do Governo”.

Fiquemos então com “C + I + G = PIB”.Entretanto, lembremos que esta equação está em valores monetários, portanto

é sensato indroduzir a moeda. E a equação fundamental da moeda é “V M = PQ”, onde P é o preço médio e Q é o produto bruto físico. V é a velocidade decirculação a moeda e M é a moeda circulante, incluindo os depósitos bancários emconta corrente.

Logo, as equações fundamentais, juntando a Equação Fiscal e a Equação Mo-netária, são:

C + I +G = PQ e VM = PQ.

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14.2. Duas equacoes 101

A equação primeira é mais interessante que a equação “Investimento = Pou-pança” porque diferencia o que é política do governo e o que é induzido comoconduta do setor privado. De fato, em G contamos todos os gastos do governoincluíndo o investimento, e em I consideramos somente o investimento privado. Ogoverno pode decidir o valor de G mas para garantir um valor de I precisa “combi-nar com os russos”, como diria Garrincha.

Agora, acontece que existe um máximo para o valor de Q. Mais do que certonível de produtos físicos não pode ser produzido, por exemplo, por falta de mão deobra, capital ou tecnologia. Que acontece então se os gastos do governo G fazemcom que C + I + G é maior que P Q? O governo estaria demandando produtosque o mercado não pode fornecer. Obviamente, os preços dos produtos, ou seja,a inflação, aumentaria por esse motivo. Em última análise a equação poderia sersatisfeita pelo aumento de P, em vez de pelo aumento de Q, como seria desejável.

AtividadeNo final de 2014 no Brasil se tinha uma situação caracterizada por:

1. PIB (real, ou seja descontada a inflação) com crescimento zero;

2. Quase pleno emprego;

3. Juros altos (ou seja, severa restrição sobre M).

4. Os gastos do governo tinham crescido 6 por cento entre 2014 e 2015.

Em 2016 o governo limitou os gastos do governo com um decréscimo de 6 porcento. O desemprego aumentou e a inflação também.

Observe que os dados de G estão disponíveis para os diferentes anos, assimcomo os dados de P (que correspondem à inflação) e de P Q que se deduz dosdados do PIB. Talvez existam também dados sobre Investimento Privado (I).

Interprete todos estes fatos sob a luz das Equações Fiscal e Monetária.

AtividadeA automação, e outros progressos tecnológicos têm sido objeto de criticas pessi-

mistas desde a época que, na revolução industrial, movimentos operários destruíammáquinas para evitar o desemprego. A visão “otimista” é a seguinte: Os avançostecnológicos permitem que a fronteira direita do PIB (o máximo PIB possível)se desloque mais para a direita. Em consequência o equilíbrio representado pelaEquação Fiscal pode ser realizado com um PIB bem maior. Logo, em presençade avanços tecnológicos em termos de automação o governo deve expandir seusgastos para colocar a produção e o equilíbrio em patamares superiores com pleno

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102 Capıtulo 14. A Moeda

emprego. Discuta.

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Capıtulo 15

Comercio Internacional

Imagine que uma empresa da Sérbia deseja fabricar aguardente a partir de soja.Para isso decide importar 1000 toneladas de soja do Brasil e entra em contato coma empresa brasileira Sobrax, que vende soja. A Sobrax informa que o preço dessaquantidade de soja é 1 milhão de reais. Portanto, a empresa da Sérbia compra 1milhão de reais do governo do Brasil, que paga com dinares (a moeda sérbia). Aíintervém a taxa de câmbio entre o real e o dinar, que digamos que correspondea 5 dinares por real. Portanto, a empresa da Sérbia entrega 5 milhões de dinaresao governo brasileiro, recebe em troca 1 milhão de reais, entrega para a Sobrax1 milhão de reais e recebe as 1000 toneladas de soja. Assim Brasil exporta 1000toneladas de soja para a Sérbia, o produtor Sobrax ganha 1 milhão de reais e ogoverno brasileiro fica com 5 mihões de dinares na sua reserva de divisas. Observemque houve uma compra de moedas no meio. Brasil vendeu reais, Sérbia comproureais. Isto exerceu um sutil estímulo para o aumento do preço do real em relaçãoao dinar. A procura por reais ao longo do mundo depende da necessidade por partede outros países de comprar produtos brasileiros.

Depois de um tempo, a empresa da Sérbia é muito bem sucedida na produção deaguardente de soja e a empresa brasileira Cachaçax resolve comprar 10 milhões delitros de aguardente daquela empresa brasileira que comprou a soja. (Casualmente,esses 10 milhões de litros de aguardente podem ter sido fabricados exatamente coma soja comprada no capítulo anterior, mas isso é irrelevante para o caso.) O valorem dinares desse aguardente é 50 milhões. Portanto, a Cachaçax precisa comprar50 milhões de dinares ao governo da Sérbia, para o qual entrega 10 milhões dereais. Assim, a empresa sérbia recebe 50 milhões de dinares, o governo sérbio ficacom 10 milhões de reais em reserva de divisas e o aguardente de soja é recebidopela empresa Cachaçax. Nesta ocasião houve uma compra dinares, o que deve termotivado uma pequena valorização do dinar.

Vemos assim que a moeda de um país se faz desejável quando esse país temalgo desejável para exportar.

103

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104 Capıtulo 15. Comercio Internacional

Na realidade o processo é um pouco mais complicado porque nem o dinarnem o real são moedas aceitáveis como reserva. Portanto, no primeiro caso, aempresa da Sérbia deve primeiro comprar dólares, depois comprar reais com essesdólares, entregar os dólares para o governo brasileiro, que assim formarão partedas reservas, e entregar os reais para a empresa Sobrax. Neste processo o dólarsofre uma pequena valorização quando é procurado pela empresa sérbia, mas umapequena desvalorização quando é vendido em troca de reais. Mais precisamente,no processo o dinar se desvaloriza em relação ao dólar e o dólar se valoriza emrelação ao real. Os dólares ficam nas reservas de divisas do Brasil.

No segundo caso, a empresa Cachaçax começa comprando dólares do governobrasileiro, naturalmente com reais. Depois compra dinares do governo sérbio, comesses dólares. Finalmente, entrega os dinares ao produtor de aguardente.

Portanto, cada vez que o Brasil exporta um produto, a empresa exportadorarecebe seu pagamento em reais e o governo fica com os dólares produto da ex-portação e fica sem os reais correspondentes. Ou seja, é como se o governo doBrasil tivesse comprado dólares da empresa Sobrax. O que o Brasil faz com essesdólares é comprar títulos do governo norteamericano, ou seja, emprestar para ogoverno dos Estados Unidos, pelo qual recebe juros, em dólares. Por outro lado,para evitar que o novo milhão de reais que saiu do tesouro e passou a circular naeconomia, o governo brasileiro emite títulos por valor de 1 milhão de reais, ou seja,pede emprestado 1 milhão de reais ao público, para o qual paga os juros em reais,mais ou menos determinados pela taxa SELIC. Ou seja, neste processo, o governodo Brasil fica com maior dívida interna (em reais) e fica credor dos Estados Uni-dos (em dólares). A razão pela qual o governo faz isso é o controle da inflação. Seaquele milhão de reais ficasse circulando na economia o meio circulante aumentariaem 1 milhão de reais e, portanto, de acordo com a equação monetária, os preçosinternos aumentariam na quantia correspondente.

Agora, o raciocínio inverso também deve ser válido quando falamos de impor-tações em vez de exportações. Isto é, em caso de importação, há reais saindo daeconomia para comprar dólares, portanto o governo deveria pagar dívida a partecorrespondente de dívida interna para repor esses reais na economia e manter amoeda circulante. Compensando uma coisa com a outra deduzimos que o que ogoverno de fato faz é emitir dívida interna pela diferença entre exportações e im-portações (diferença que se denomina “exportação líquida”).

Atividade

O raciocínio pelo qual, para evitar o excesso de moeda circulante, o governocontrai dívida interna, emitindo títulos, como resultado das exportações. Com essecritério, no caso de importações, o governo deveria fazer o inverso, isto é, uma im-portação tira reais da economia, que são gastos para comprar dólares para poder

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15.1. Inflacao 105

importar. Portanto, o razoável seria que o governo pagasse parte da sua dívida in-terna para repor esses reais na economia e manter o nível de atividade. O governofaz isso? Se não faz, por que?

Teoria das Vantagens ComparativasEsta teoria sustenta os países devem especializar sua produção naqueles produ-

tos onde tenham vantagens comparativas, e importar aqueles produtos onde nãoas tenham. Em outras palavras, é uma teoria radicalmente favorável ao livre co-mércio. Países que desejam incentivar indústrias para as quais não têm vantagenscomparativas podem apelar a subsídios ou taxas. O subsídio consiste em que, porexemplo, se a indústria nacional pode produzir um produto a 10 reais, sendo que oproduto importado custaria 8 reais, o governo paga os dois reais de diferença paraque o produto nacional seja efetivamente consumido. Na mesma situação uma taxade importação consistiria em taxar o produto importado com 2 reais, de maneiraque o preço do produto importado no mercado interno fosse 10 reais.

De um modo geral, Titio Samuelson é favorável à teoria das vantagens compa-rativas. Entretanto, as seguintes observações devem ser colocadas.

1. A teoría das vantagens comparativas é estática. Ou seja, supõe que, digamos,a indústria nacional continuaria produzindo o produto sempre com um customaior que a indústria externa. Não considera a chamada Engenharia Reversa,pela qual uma indústria nacional pode se apropriar da teconologia de umaindústria estrangeira.

2. A doença holandesa joga por terra todos os argumentos favoráveis à teoriadas vantagens comparativas. Com efeito, a falta de competitividade de umaindústria nacional pode ser devida à extraordinária eficiência de outro setorda economia, fortemente exportador, que provoque a redução do valor dodólar (ou valorização da moeda nacional). Nessas circunstâncias, não temindústria nacional que aguente.

15.1 Inflacao

A inflação é o aumento consistente de todos os preços da Economia. As razões dainflação na Economia contemporânea serão analisadas em continuação.

15.1.1 Inflacao de Custos

Todos sabem que, quando o custo de algum insumo sobe, o produtor eleva o preçodo produto. Entretanto, o produtor não pode elevar o preço do produto como

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106 Capıtulo 15. Comercio Internacional

quiser, pois está sujeito a que existam compradores para o novo preço. O que oprodutor “pode fazer” é alterar seus desejos sobre quanto produzir para cada preçopossível. Ou seja, ele pode contribuír com seu voto para a curva de oferta que, nomodelo clássico, decidirá o preço praticado junto com a curva de procura.

A análise deste caso, para cada produtor, começa com um gráfico em cujaabscissa temos a quantidade de produto x e no qual desenhamos a curva de CustoC(x). Normalmente, esta função começa com um custo fixo C(0) > 0, e crescesempre, no começo em forma côncava para refletir a Lei dos Custos Decrescentese, a partir de certo valor de x, convexa (custos crescentes) para refletir o fatode que acima de certo valor alguma mudança tecnológica ou novo investimento énecessário para acompanhar a produção.

Por outro lado, podemos desenhar a curva de faturamento y = px, onde p é opreço do produto.

Para cada preço possível, e para uma função de custo como a indicada acima,temos duas possibilidades: (a) A reta y = px fica sempre por baixo da função decusto, e (b) A reta y = px corta a função de custo, em geral em dois pontos x1 ex2.

No caso (a) o custo sempre é maior que o faturamento, portanto a empresanão vai obter lucro independentemente do valor da produção x. Isto é, o ”voto” daempresa para esse possível preço é ”Não produzir nada”.

No caso (b), para os valores de produção entre x1 e x2, o faturamento é maiorque o custo. O objetivo da empresa é obter o máximo lucro, portanto ela tenderáa produzir de maneira a maximizar px = C(x). Este valor da produção será,em consequência, aquele para o qual C ′(x) = p. Chamando ”custo marginal” àderivada da função custo, diremos que o “voto” da empresa é produzir de maneiraa igualar seu custo marginal com o preço.

Agora, que acontece se a função Custo é deslocada um degrau para cima, ouseja, se em vez de ser y = C(x) passa a ser y = C(x) + b? Claramente, se C(x) + bcontinua menor que px, a empresa continuará produzindo a mesma quantidadede produto, pois a solução de [C(x) + b]′ = p será a mesma que a de C ′(x) = p.Entretanto, se b é suficientemente grande, o custo C(x)+b superará a px e a decisãoda empresa será não produzir nada. (Na realidade, ela não decidirá imediatamentenão produzir nada porque pode ser que isto seja mais caro que continuar produzindomesmo com perdas, mas se o custo aumenta suficientemente, será inevitável deixarde produzir.) Assim, o voto da empresa para um custo suficientemente alto será“para esse preço do produto não vamos produzir nada”.

Vamos agora à curva de Oferta. Já vimos que o aumento do custo faz comque, para cada preço possível, haja empresas que deixem de produzir. Ou seja, oaumento do custo faz que a curva de oferta se desloque para a esquerda. (Nas curvasde oferta e demanda costumamos colocar o preço na ordenada e a quantidade deproduto na abscissa. Se fosse o contrário diríamos que a curva de oferta se desloca

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15.1. Inflacao 107

para baixo.)Agora, se deslocamos a curva de oferta para a esquerda sem modificar a curva

de demanda, com a curva de demanda é decrescente, o preço de equilíbrio vaiaumentar e a quantidade produzida vai diminuír.

Um caso extremo que vale a pena analisar é aquele em que a curva de procuraé horizontal. Neste caso, o preço é o mesmo para qualquer demanda do produto.Isto pode acontecer em caso de o preço do produto seja forçado pelo governo. Nestecaso, o preço fica obviamente igual mas a quantidade de produto fabricado diminuiem uma quantidade exatamente igual ao deslocamento para a esquerda da curvade oferta.

Outro caso extremo é aquele em que a curva de procura é vertical, que repre-senta a situação em que a procura é a mesma independentemente do preço. Nestecaso o aumento de custo provoca um aumento do preço de equilíbrio exatamenteigual ao deslocamento da inversa da função de oferta para cima.

Um bom resumo destes argumentos seria que a elevação dos custos de produçãocertamente eleva os preços, mas não de qualquer maneira. A Inflação de Custos,por outro lado, é a elevação generalizada de preços motivada pela elevação de custosde produção.

15.1.2 Inflacao de Demanda

Uma condição necessária para a existêncida de inflação de demanda (ou procura)é que a curva de procura (preço em função de produção) se desloque para a es-querda. Com efeito, isto significa que o público está disposto a consumir mais pelomesmo preço. Se isto acontece, por exemplo, porque há mais dinheiro a disposiçãodo público ou por qualquer outro motivo, e a curva de oferta permanece a mesma,a intersecção que define o equilíbrio acontecerá para um valor maior de produtoe um valor maior de preço. Quanto maior? Depende da inclinação da função deoferta. Agora, o que deveria acontecer com a oferta para que, apesar da disposiçãodo público de comprar mais pelo mesmo preço, o preço de equilíbrio se mantivesseno mesmo lugar? Obviamente, a curva de oferta deveria se deslocar para cima.Agora, qual é o significado da curva de oferta se deslocar para cima? Claramente,os produtores se dispõem a produzir mais pelo mesmo preço. Bem, há uma situ-ação na qual isto não é possível: Quando a produção anterior esteja no limite daprodução possível. Neste caso simplesmente não é possível aumentar a produçãonem pelo mesmo preço nem por um preço maior e a maior demanda provocaráinevitávelemente inflação. Notem que se encontrar no limite da produção possí-vel corresponde a situações de pleno emprego e/ou esgotamento das possibilidadestecnológicas (necessidade iminente de novos investimentos). Excluindo esse caso, apossibilidade de produzir mais pelo mesmo preço está associada a um deslocamentopara a direita da função de custo. Com efeito, se chamamos x∗ à produção anterior

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108 Capıtulo 15. Comercio Internacional

e C(x∗) ao custo correspondente, então a nova função de custo dever cumprir

C ′nova(x) = C ′(x∗)

para x > x∗. Isto acontecerá se Cnova é C deslocada para a direita na quantidadex − x∗. Agora, nesse caso C(x) = C(x∗), portanto a possibilidade de manter opreço está associado à possibilidade de produzir mais (x−x∗) com o mesmo custo.

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Capıtulo 16

Dıvida Interna e PIB

Uma das obsessões atuais (2016) é “a trajetória do quociente entre Dívida Internae PIB”. Nada garante que esta obsessão persistirá daqui a alguns anos. Todas aspolíticas econômicas convergem para o controle dessa “trajetória”.

Chamemos D à Dívida atual e P ao produto interno bruto. Qual seria o efeitono quociente terrível de um aumento de x reais nos gastos do governo? Vamosconsiderar que quando falamos de reais já estamos descontando a inflação.

Os x reais de aumento de gastos o governo levariam a um aumento do PIBigual a βx. Entretanto, a dívida aumentaria em αx. O coeficiente β depende dopoder multiplicativo do investimento x. O coeficiente α depende da taxa de jurose dos impostos. Finalmente, devemos considerar que a dívida atual D passa a serγD daqui a um ano por efeito dos juros (reais!) vigentes.

Em todo caso, o novo quociente maldito passaria a ser

γD + αx

P + βx.

O novo quociente seria maior ou menor que o velho? Claramente, se

α

β>γD

P

o quociente maldito cresceria, e o contrário aconteceria se

α

β<γD

P.

Mais ainda, se x→∞ o quociente maldito tende a α/β, o que significa que nãohá motivos aritméticos para pensar que a trajetória da dívida é algo incontrolável.Seu controle depende simplesmente do quociente entre o custo da dívida nova eo retorno da mesma. Vejam que a função γD+αx

P+βxé crescente se α/β > γD/P e

decrescente no caso contrário.

109

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110 Capıtulo 16. Dıvida Interna e PIB

A consequência paradoxal é a seguinte. Se seu quociente γD/P já é muitogrande mesmo investimentos relativamente caros e com retorno relativamente baixodiminuirá o quociente maldito. Em outras palavras, se o governo está com γD/Pgrande, o quociente maldito não ficará maior por gastos do governo, ao contrário.Exercício

Suponha que D = 0.6P , os juros nominais são 14.5 por cento, a inflação é 9.5por cento, e o aumento de 1 real em determinado gasto do governo X produz umaumento de 1.5 reais no PIB (impacto). Suponha que os impostos arrecadadospelo governo são 35 por cento do PIB.

Quanto deverá ser investido em X para que o quociente terrível fique igual?Para que o quociente fique maior deverá ser investido mais ou menos? Brinquecom estas contas para analisar a política fiscal do governo.

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Capıtulo 17

Ativos, rendimento eincerteza

AtivosChamamos “ativo"a qualquer coisa que possa ser comprada ou vendida. Por

exemplo, mercadorias, ações de empresas, títulos do governo. Todo ativo tem umpreço em dinheiro, que aqui usaremos como sinónimo de “valor". O dinheiro tam-bém é um ativo. O valor de 1 real é, obviamente, 1 real.

Cálculo do rendimento simplesSuponhamos que temos 200 reais e que o valor de uma ação da Petrobrás é 50

reais. Compramos, com nossos duzentos reais, 4 ações da Petrobrás. Depois deum mes, o preço de cada ação é 55 reais. Nesse momento, vendemos nossas ações eobtemos, naturalmente, 220 reais. Portanto, nosso “dinheiro final"é igual ao nossocapital inicial multiplicado pelo quociente entre o preço final e o preço inicial doativo. Neste caso:

220 = 200× 55/50

O quociente entre o preço final e o preço inicial será chamado “fator de cres-cimento"e denotado por θ. O “rendimento percentual"é o capital final menos ocapital inicial dividido o capital inicial e, finalmente, multiplicado por 100. Nonosso caso:

100× r = 100× (220− 200)/200 = 10

Se o capital inicial é M , o capital final será Mθ, logo o rendimento percentualserá 100× (θ − 1).

Aparição da IncertezaNa vida real não conhecemos o preço futuro de um ativo, exceto no caso do

próprio dinheiro. Neste curso usaremos sempre o conceito de “cenários". Apesar denão conhecermos os preços futuros, podemos estabelecer diferentes possibilidadespara os mesmos. Por exemplo, sabemos que, sendo o preço da ação hoje de 50

111

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112 Capıtulo 17. Ativos, rendimento e incerteza

reais, é extremamente improvável que daqui a um mes seja 5000 reais e também éimprovável que seja 5 reais. Em outras palavras, θ = 100 e θ = 0.1 são improváveismas valores de θ próximos de 1 são bastante prováveis.

Suponhamos aqui que temos 3 cenários possíveis para o preço da ação no mesque vem:

Cenário 1: Preço = 45 reais.Cenário 2: Preço = 50 reais.Cenário 3: Preço = 56 reais.Consequentemente, teremos:Cenário 1: θ = 0.9. Capital final: 0.9M .Cenário 2: θ = 1. Capital final: M .Cenário 3: θ = 1.12. Capital final: 1.12M .Considerando que os três cenários tema mesma probabilidade, nosso capital

final será, em média, igual a:

(0.9M +M + 1.12M)/3 = 1.0067M.

Ou seja, nosso capital final aumentou, “em média", 0.67 por cento.O problema é que no pior dos casos, correspondente ao cenário 1, nosso capital

final teria diminuído 10 por cento.Suponhamos agora que temos duas decisões possíveis: investir ou não investir.

Se decidirmos investir, ganharemos, em média, 0.67 por cento do nosso capitalinicial. Entretanto, no pior dos casos (com probabilidade 1/3) perderemos 10 porcento do nosso capital.

Se nossa atitude for de “apetite pelo risco"investiremos, apostando que o piordos casos não acontecerá. Entretanto, se nossa atitude for de “aversão ao risco",não investiremos e ficaremos com nosso capital original.

Se alguém pagar para você 100 milhões de reais por jogar, uma vez, à roletarussa, você aceitaria? A atitude de apetite ou aversão pelo risco determina suaresposta nesta situação extrema.

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Capıtulo 18

Medindo a incerteza

No exemplo da aula passada a incerteza estava evidenciada pela presença de trêscenários com diferentes preços finais para o ativo com o qual estávamos lidando:45 reais, 50 reais e 56 reais. Portanto, tínhamos três cenários diferentes para nossocapital final (180, 200 e 224 reais) e três cenários para o fator de crescimento: 0.9,1 e 1.12.

Em situações mais realistas, teremos milhares de cenários e os correspondentesrendimentos aparecerão com uma distribuição de probabilidade conhecida ou não.

Podemos falar, de maneira equivalente, de cenários para preços finais, paracapital final, para fatores de crescimento ou para rendimento. Por exemplo, oscenários para rendimento percentual do exemplo são -10%, 0% e 12%.

Para fixar idéias, vamos nos concentrar em fatores de crescimento. A médiados fatores de crescimento no nosso exemplo é θ = 1.0067. A medida de incertezadeve refletir as diferenças entre a variável em cada um dos cenários e a média. Porexemplo, poderiamos definir a incerteza como a média dos módulos da diferençasda variável com a média θ. Neste caso, teriamos:

Incerteza =|θ1 − θ|+ |θ2 − θ|+ |θ3 − θ|

3

=|0.9− 1.0067|+ |1− 1.0067|+ |1.12− 1.0067|

3= 0.076.

Mais popular é o hábito de medir a incerteza como a raiz quadrada da média dosdesvios quadráticos dos valores da variável com a média. Estamos autorizados achamar “desvio padrão"(σ) a esta medida. Seu quadrado será chamado “variância".Logo:

σ2 =(θ1 − θ)2 + (θ2 − θ)2 + (θ3 − θ)2

3

=(0.9− 1.0067)2 + (1− 1.0067)2 + (1.12− 1.0067)2

3= 0.0081

113

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114 Capıtulo 18. Medindo a incerteza

eσ = 0.090.

Vamos dizer, então, que o fator de crescimento θ tem uma média igual a 1.0067 eum desvio padrão igual a 0.090.

Se o capital inicial for M , é fácil ver que a média do capital final será 1.0067M ,a variância do capital final será 0.0081M2 e o desvio padrão do capital final será0.090M .

O rendimento (r = θ− 1) tem uma média igual à média de θ menos uno, e umdesvio padrão igual ao de θ.

Comparando decisõesSuponhamos que temos somente duas decisões possíveis: (1) Investir todo o

capital em ações da Petrobrás e (2) Não investir nada.Já vimos que, considerando a variável “Capital final"a primeira decisão implica

uma média de 1.0067M com um desvio padrão (incerteza) igual a 0.090M . Pode-mos representar essa decisão como um ponto em um plano onde o eixo horizontalrepresenta o desvio padrão e o eixo vertical representa o capital final. Portanto,neste plano, a decisão (1) será representada pelo ponto (0.090M, 1.0067M).

A média do capital final na decisão alternativa (2) é, obviamente, igual a M ,pois em todos os cenários o capital final é M . Consequentemente, o desvio padrãodo capital final para esta decisão é zero. Logo, esta decisão pode ser representadapelo ponto (0,M) no plano.

O ponto (0,M) não é comparável com o ponto (0.09M, 1.0067M). O segundoseria superior ao primeiro porque a média é maior, mas o primeiro é superior aosegundo porque o desvio padrão é menor. Podemos tomar qualquer uma das duasdecisões, de acordo com humor do dia, sem ser acusados de ter agido de maneiraerrada.

Um contínuo de decisões“Investir tudo"e “Não investir nada"são decisões extremas. De maneira me-

nos radical, podemos pensar em investir x reais, para qualquer x ∈ [0,M ]. Seinvestirmos x reais teremos:

No cenário 1, Capital final igual a 0.9x+ (M − x).No cenário 2, Capital final igual a 1x+ (M − x) = M .No cenário 3, Capital final igual a 1.12x+ (M − x).Logo, a média do capital final se investirmos x reais será:

1.0067x+ (M − x).

A variância, se investirmos x reais, virá dada por:

σ2(x) =

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[(0.9x+ (M − x))− (1.0067x+ (M − x))]2

+[(1x+ (M − x))− (1.0067x+ (M − x))]2

+[(1.12x+ (M − x))− (1.0067x+ (M − x))]2/3

=[0.9x− 1.0067x]2 + [1x− 1.0067x]2 + [1.12x− 1.0067x]2

3

= 0.0081x2.

Portanto:σ(x) = 0.090x.

Logo, se representarmos a decisão de investir x reais no plano, colocando o desviopadrão do capital final na abscissa e a média do capital final na ordenada, o pontocorrespondente será: (0.090x, 1.0067x + (M − x)). Claramente, se x = 0 se tratado ponto (0,M) e, se x = M se trata de (0.090M, 1.0067M).

Mais ainda,

(0.090x, 1.0067x+ (M − x)) =M − xM

(0,M) +x

M(0.090M, 1.0067M).

Como (M − x)/M e x/M são maiores ou iguais que zero e sua soma é igual a1, temos que (0.090x, 1.0067x + (M − x)) está no segmento que une (0,M) com(0.090M, 1.0067M).

Esse segmento representa todas as decisões possíveis. Nenhum ponto deste seg-mento é superior a nenhum outro, no sentido de que, dados dois pontos quaisquer,não é possível que um dos pontos tenha “maior média e menor-ou-igual desvio pa-drão"nem “maior-ou-igual média e menor desvio padrão"que o outro.

ExercícioNo exemplo manipulado nesta aula, as únicas decisões possíveis consistem em

investir dinheiro ou ficar com o dinheiro no bolso. Vamos considerar agora queexiste também a possibilidade de jogar dinheiro fora. Considere a decisão seguinte:Investir 95 reais em ações da Petrobrás, ficar com 100 reais no bolso e jogar 5 reaisno lixo. Calcule a média e o desvio padrão do capital final para esta decisão.Represente o ponto correspondente no plano de decisões. Se trata de uma decisãoótima? Mostre no plano de decisões algumas decisões melhores que essa. Estadecisão é pior que todas as decisões do “segmento eficiente"caracterizado na aula?

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116 Capıtulo 18. Medindo a incerteza

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Capıtulo 19

Portfolio com 2 ativos

Suponhamos que dispomos de M reais e podemos usar esse dinheiro de duas ma-neiras diferentes: investindo em ações da Petrobrás ou aplicando em um ativo livrede risco. Alguém poderia argumentar que o único ativo livre de risco é o própriodinheiro, mas na prática isto não é bem assim. Os governos sempre fornecem a al-ternativa de investimento em um ativo que paga juros moderados e cuja segurançaé máxima, no sentido de que se tal ativo entrasse em colapso, o próprio dinheiroentraria em colapso também e qualquer tentativa de modelar a situação careceriade sentido. No Brasil, o típico ativo livre de risco é a caderneta de poupança.

Digamos, pois, que vamos investir x1 reais em ações da Petrobrás e x2 reais nacaderneta de poupança. Portanto:

x1 + x2 = M.

O perfil de nosos investimentos caracteriza o que chamamos um “portfólio". Di-remos que nosso portfólio estará composto por x1 reais investidos em ações daPetrobrás e x2 reais investidos na caderneta.

Trabalharemos com 3 cenários, correspondentes a 3 pares de fatores de cresci-mento para o ativo 1 e para o ativo 2. A notação será a seguinte:

θij será o fator de crescimento do ativo j sob o cenário i.Assim, os fatores de crescimento formarão uma matriz θ dada por:

θ =

θ11 θ12

θ21 θ22

θ31 θ32

.Sob o cenário i, nosso capital final será θi1x1 + θi2x2.Portanto, em média, nosso capital final será

θ11 + θ21 + θ31

3x1 +

θ12 + θ22 + θ32

3x2

117

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118 Capıtulo 19. Portfolio com 2 ativos

≡ θ1x1 + θ2x2,

onde θ1 = θ11+θ21+θ313

e θ2 = θ12+θ22+θ323

.Calculemos agora a variância do capital final. De acordo com as considerações

anteriores, a variância será (1/3) da seguinte soma de quadrados:

[θ11x1 + θ12x2 − (θ1x1 + θ2x2)]2

+[θ21x1 + θ22x2 − (θ1x1 + θ2x2)]2

+(θ21x1 + θ22x2 − [θ1x1 + θ2x2)]2.

Ou seja:σ2(x) = [(θ11 − θ1)x1 + (θ12 − θ2)x2]2

+[(θ21 − θ1)x1 + (θ22 − θ2)x2]2

[(θ31 − θ1)x1 + (θ32 − θ2)x2]2/3.

Logo:

σ2(x) =‖Ax‖2

3,

onde ‖ · ‖ denota a norma euclidiana e

A =

θ11 − θ1 θ12 − θ2

θ21 − θ1 θ22 − θ2

θ31 − θ1 θ32 − θ2

.A matriz A será chamada “Matriz de Cenários".

Portanto, o desvio padrão será:

σ(x) =

√‖Ax‖2

3.

Agora, ‖Ax‖2 = (Ax)T (Ax) = xTATAx, portanto:

σ2(x) = xTATA

3x.

A matriz C = ATA3

será chamada “Matriz de Covariância". Observe que essa matrizdepende somente dos cenários, ou seja, dos fatores de crescimento θij. O elementoc12 da matriz de Covariância se chama “covariância"entre os fatores de crescimentodos ativos 1 e 2.

Exemplo:

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Para fixar idéias, suponhamos que o periodo de tempo é um mes, e o segundoativo é a caderneta de poupança. Imaginemos três cenários para os fatores decrescimento, dados por:

Cenário 1: θ11 = 0.9, θ12 = 1.004. (O último corresponde a um rendimento de0.4 % da caderneta.)

Cenário 2: θ21 = 1.0, θ22 = 1.006.Cenário 3: θ31 = 1.12, θ32 = 1.007.Portanto, a matriz de fatores de crescimento θ virá dada por:

θ =

0.9 1.0041.0 1.0061.12 1.007

.Consequentemente,

θ1 =0.9 + 1.0 + 1.12

3= 1.0067,

correspondente a um rendimento médio de 0.67%, e

θ2 =1.004 + 1.006 + 1.007

3= 1.0057,

correspondendo a um rendimento médio de 0.57%.Calculamos agora a matriz de cenários A:

A =

0.9− 1.0067 1.004− 1.00571.0− 1.0067 1.006− 1.00571.12− 1.0067 1.007− 1.0057

=

−0.1067 −0.0017−0.0067 0.00030.1133 0.0004

Portanto, a matriz de covariância C = ATA/3 virá dada por:

C =1

3

(−0.1067 −0.0067 0.1133−0.0017 0.0003 0.0004

)−0.1067 −0.0017−0.0067 0.00030.1133 0.0004

=

=1

3

(0.0243 0.000225

0.000225 1.90× 10−5

)=(

0.00081 7.5× 10−5

7.5× 10−5 0.633× 10−5

).

Suponhamos agora que investimos 300 reais (x1) em ações da Petrobrás e 200reais (x2) na caderneta. Nosso capital final médio será, em consequência:

θ1x2 + θ2x2 = 1.0067× 300 + 1.0057× 200 = 503.15.

Logo, nosso rendimento médio será de [100× (503.15/500− 1)] %, ou seja 0.63 porcento.

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120 Capıtulo 19. Portfolio com 2 ativos

A variância do capital final correspondente a este investimento será:

σ2(x) = xTCx =

= (x1, x2)C(x1

x2

)=

(300, 200)(

0.00081 7.5× 10−5

7.5× 10−5 0.633× 10−5

)(300200

)=

(300, 200)(

0.00081× 300 + 0.000075× 2000.000075× 300 + 0.000063× 200

)=

(300, 200)(

0.2580.0351

)= 300× 0.258 + 200× 0.0351 = 84.42.

Portanto, o desvio padrão do capital final relativo a este investimento será:

σ(x) = 9.19 reais .

Assim, poderiamos pensar que, se o capital final obedecesse a uma distribuiçãonormal, com este investimento ele ficaria, em 68% dos casos, entre 503.15 − 9.19(= 493.96) e 503.15 + 9.19 (= 512.34) reais.

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Capıtulo 20

Dependencia e Correlacao

Em que medida os ganhos (ou perdas) obtidos por investimentos em dois ativos di-ferentes estão relacionados? Se tivermos determinado ganho com um investimento,podemos deduzir o ganho (ou perda) conseguido com outro investimento? Veremosque a análise da matriz de covariância nos ajuda a responder essas perguntas.

Suponhamos que as variáveis definidas pelos fatores de crescimento (ou os ren-dimentos) dos ativos sejam “independentes". Nesse caso, do fato de ganharmosmais ou menos com um ativo não podemos deduzir nada sobre ganhos ou perdascom o outro ativo. O significado da independência ou dependência de variáveisdefinidas por cenários será estudado em continuação.

Variáveis independentesPrecisamos um ponto de vista um pouco mais geral. Suponhamos que Y e Z

são duas “variáveis aleatórias discretas"cujos etados possíveis (equiprováveis) são,respectivamente, y1, y2, y3 e z1, z2, z3. A média de Y será

y =y1 + y2 + y3

3

e a média de Z será:z =

z1 + z2 + z3

3.

As respectivas variâncias serão:

σ2(Y ) =(y1 − y)2 + (y2 − y)2 + (y3 − y)2

3

eσ2(Z) =

(z1 − z)2 + (z2 − z)2 + (z3 − z)2

3.

Suponhamos agora que Y e Z são “independentes". Por exemplo, os estadosde Y podem ser os rendimentos das ações da Petrobrás daqui a um mes (digamos,

121

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122 Capıtulo 20. Dependencia e Correlacao

10%, 5% e 0.1%) e os estados de Z as temperaturas médias no verão de Aracaju(digamos, 25 graus, 30 graus e 35 graus). O fato de restringirmos a três estadospossíveis para cada variável é uma simplificação para facilitar as contas.

As diferentes possibilidades para o par de variáveis (Y, Z) são as seguintes:

(y1, z1), (y1, z2), (y1, z3),

(y1, z1), (y2, z2), (y2, z3),

(y3, z1), (y3, z2), (y3, z3).

A “independência"entre as variáveis Y e Z se expressa dizendo que todas essaspossibilidades são equiprováveis. Com efeito, ninguém pode duvidar de que, se orendimento 10% da Petrobrás tem probabilidade 1/3 e a temperatura 30 graus deAracaju tem probabilidade 1/3, então o sucesso “rendimento Petrobrás = 10% etemperatura Aracaju = 30 graus"tem probabilidade 1/9. Isto significa que temos9 cenários equiprováveis, representados pela seguinte matriz θ:

θ =

y1 z1

y1 z2

y1 z3

y2 z1

y2 z2

y2 z3

y3 z1

y3 z2

y3 z3

.

Claramente, a média dos yi na primeira coluna é igual a y e a média dos zi é z.A matriz de cenários A, em consequência, pode ser definida como:

A =

y1 − y z1 − zy1 − y z2 − zy1 − y z3 − zy2 − y z1 − zy2 − y z2 − zy2 − y z3 − zy3 − y z1 − zy3 − y z2 − zy3 − y z3 − z

.

E a matriz de covariância será:

C =(c11 c12

c12 c22

)=

1

9ATA.

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123

Vamos calcular o elemento c12 no caso em que as variáveis Y, Z são indepen-dentes:

9c12 =

(y1 − y)(z1 − z)+

+(y1 − y)(z2 − z)+

+(y1 − y)(z3 − z)+

+(y2 − y)(z1 − z)+

+(y2 − y)(z2 − z)+

+(y2 − y)(z3 − z)+

+(y3 − y)(z1 − z)+

+(y3 − y)(z2 − z)+

+(y3 − y)(z3 − z).

Logo,

81c12 =

[3y1 − (y1 + y2 + y3)][3z1 − (z1 + z2 + z3)]+

+[3y1 − (y1 + y2 + y3)][3z2 − (z1 + z2 + z3)]+

+[3y1 − (y1 + y2 + y3)][3z3 − (z1 + z2 + z3)]+

+[3y2 − (y1 + y2 + y3)][3z1 − (z1 + z2 + z3)]+

+[3y2 − (y1 + y2 + y3)][3z2 − (z1 + z2 + z3)]+

+[3y2 − (y1 + y2 + y3)][3z3 − (z1 + z2 + z3)]+

+[3y3 − (y1 + y2 + y3)][3z1 − (z1 + z2 + z3)]+

+[3y3 − (y1 + y2 + y3)][3z2 − (z1 + z2 + z3)]+

+[3y3 − (y1 + y2 + y3)][3z3 − (z1 + z2 + z3)] =

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124 Capıtulo 20. Dependencia e Correlacao

= (2y1 − y2 − y3)(2z1 − z2 − z3)+

+(2y1 − y2 − y3)(2z2 − z1 − z3)+

+(2y1 − y2 − y3)(2z3 − z1 − z2)+

+(2y2 − y1 − y3)(2z1 − z2 − z3)+

+(2y2 − y1 − y3)(2z2 − z1 − z3)+

+(2y2 − y1 − y3)(2z3 − z1 − z2)+

+(2y3 − y1 − y2)(2z1 − z2 − z3)+

+(2y3 − y1 − y2)(2z2 − z1 − z3)+

+(2y3 − y1 − y2)(2z3 − z1 − z2)

= 0.

Ou seja, o elemento c12 da matriz de covariância é zero no caso em que asvariáveis são independentes. Isto parece indicar que c12 é uma medida adequadapara a “dependência"das variáveis.

Para ver se se trata, com efeito, de uma medida adequada, vamos analisar ocaso de duas variáveis obviamente dependentes.

Variáveis dependentesSuponhamos que a variável Z é, simplesmente, o dobro da variável Y . Portanto,

os estados possíveis para a variável Z são

z1 = 2y1, z2 = 2y2, z3 = 2y3.

Observe que, neste caso, contrariamente ao anterior, a ocorrência (y1, z2) é total-mente impossível, assim como toda ocorrência (yi, zj) em que i 6= j.

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125

Neste caso, teremos:

θ =

y1 2y1

y2 2y2

y3 2y3

.Temos, assim, três cenários possíveis em vez de nove como no caso anterior. Logo:

A =

y1 − y 2(y1 − y)y2 − y 2(y2 − y)y2 − y 2(y3 − y)

.Portanto:

σ2(Z) = 4σ2(Y ).

Por outro lado, o elemento c12 da matriz de covariância seria:

3c12 = (y1 − y)(z1 − z) + (y2 − y)(z2 − z) + (y3 − y)(z3 − z) =

2(y1 − y)2 + 2(y2 − y)2 + 2(y3 − y)2 = 2× 3× σ2(Y ) = 3σ(Y )σ(Z).

Logo, c12 = σ(Y )σ(Z) neste caso de dependência extrema. Por outro lado, comou sem dependência das variáveis, o elemento (1, 2) da matriz 3C nada mais é doque o produto escalar das duas colunas, enquanto as normas destas colunas são,respectivamente, 3σ(Y ) e 3σ(Z). Portanto, em todos os casos:

|c12| ≤ σ(Y )σ(Z).

Podemos observar, ao mesmo tempo, que em outro caso de dependência extrema,digamos, quando Z = −2Y , também temos |c12| ≤ σ(Y )σ(Z). Mas, nesse caso,

c12 = −σ(Y )σ(Z).

Tudo isto sugere que uma medida adequada da dependência entre as variáveis Y eZ é:

ρ =c12

σ(Y )σ(Z).

Assim, temos sempre |ρ| ≤ 1. Quando ρ = 0 as variáveis são independentes.Quando |ρ| = 1 a dependência é máxima. Por outro lado, de acordo com o sinalde ρ, as variáveis podem estar positivamente ou negativamente correlacionadas.

Mais sobre o coeficiente de correlaçãoO coeficiente de correlação ρ é o quociente entre o produto escalar das colunas

de A e o produto de suas normas. Portanto, ρ nada mais é do que o cosseno doângulo formado pelas colunas de A. Se as variáveis são dependentes e positivamentecorrelacionadas, uma coluna é múltiplo da outra e elas tem o mesmo sentido. Se

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126 Capıtulo 20. Dependencia e Correlacao

são dependentes e negativamente correlacionadas, elas tem o sentido contrário.Quando as variáveis são independentes as colunas são ortogonais.

No Capítulo 3 tínhamos que a matriz de cenários correspondentes aos fatoresde crescimento da Petrobrás e da caderneta era:

A =

0.9− 1.0067 1.004− 1.00571.0− 1.0067 1.006− 1.00571.12− 1.0067 1.007− 1.0057

=

−0.1067 −0.0017−0.0067 0.00030.1133 0.0004

Portanto, a matriz de covariância C = ATA/3 era dada por:

C =1

3

(−0.1067 −0.0067 0.1133−0.0017 0.0003 0.0004

)−0.1067 −0.0017−0.0067 0.00030.1133 0.0004

=

=1

3

(0.0243 0.000225

0.000225 1.90× 10−5

)=(

0.00081 7.5× 10−5

7.5× 10−5 0.633× 10−5

).

Os fatores de crescimento desses dois ativos representam duas variáveis alea-tórias discretas. Podemos interpretar que o fator de crescimento é o capital finalquando o capital inicial investido é de 1 real. A matriz C é a matriz de covariânciaentre essas duas variáveis e o elemento c12 e “a covariância". A correlação entreessas variáveis é o produto escalar das colunas de A dividido o produto das normas.Isto é:

ρ =0.000225√

0.0243×√

1.90× 10−5=

0.000225

0.1559× 0.004359= 0.3311.

Lembrando que ρ pode valer entre 0 e 1, observamos que a correlação entre estasduas variáveis existe e é positiva, embora não muito grande.

Variância da SomaSuponhamos que os ativos 1 e 2 são independentes. Portanto, a matriz de cova-

riância de seus fatores de crescimento é diagonal. Consideremos os investimentos(x, 0), (0, y) e (x, y). Então:

σ2(x, 0) = (x, 0)C(x0

),

onde C é a matriz de covariância que, como vimos, pode ser escrita na forma(diagonal)

C =(c11 00 c22

).

Portanto,

σ2(x, 0) = (x, 0)(c11 00 c22

)(x0

)=

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127

= (x, 0)(c11x

0

)= c11x

2.

Analogamente:σ2(0, y) = c22y

2.

Agora,

σ2(x, y) = (x, y)(c11 00 c22

)(xy

)=

= (x, y)(c11xc22y

)= c11x

2 + c22y2 = σ2(x, 0) + σ2(0, y).

Ou seja, se os ativos são independentes, as variâncias do investimento combinadoé a soma das variâncias dos investimentos individuais.

Entretanto, se os ativos não são independentes:

σ2(x, y) = (x, y)(c11 c12

c12 c22

)(xy

)=

= (x, y)(c11x+ c12yc12x+ c22y

)= c11x

2 + c22y2 + 2c12xy.

Logo, se os ativos não são independentes, a variância da soma não é a soma dasvariâncias. Com efeito, a variância de investir x reais no ativo 1 e y reais noativo 2 difere em 2c12xy da soma das variâncias. Se os ativos estão positivamentecorrelacionados, a variância aumenta em relação a soma das variâncias e se osativos estão negativamente correlacionados a variância diminui.

Esta propriedade tem consequências financeiras bastante práticas. Se tivermosdois ativos com aproximadamente a mesma média de rendimento e aproximada-mente o mesmo desvio padrão individual, e eles estiverem negativamente correla-cionados, é mais conveniente investir nos dois, em quantidades iguais, que investirtodo o dinheiro em um só deles. Com efeito, nos dois casos teremos o mesmo rendi-mento médio mas, se investirmos x reais somente (digamos) no ativo 1, a variânciaserá:

c11x2.

Se investirmos a metade do dinheiro no ativo 1 e a outra metade no ativo 2, avariância será:

c11x2/4 + c22x

2/4 + 2c12(x/2)(x/2) = (c11 + c22)x2/4 + c12x2/2.

Logo, supondo c11 = c22, teremos a variância

c11x2/2 + c12x

2/2 = (c11 + c12)x2/2.

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128 Capıtulo 20. Dependencia e Correlacao

Assim, se c12 < 0, podemos obter uma diminuição significativa da variância e,portanto, um investimento melhor. A variância pode chegar a ser zero se c12 =−c11. Note que c11 + c12 < 0 não pode acontecer (por quê?).

O significado prático deste arrazoado é que o risco diminui se se investe emativos cujas tendências de crescimento são contrárias.

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Capıtulo 21

Portfolio com n ativos

129

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130 Capıtulo 21. Portfolio com n ativos

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Capıtulo 22

Geracao de cenarios

Nossa ferramenta fundamental para gerar cenários será a “Simulação”. Mais preci-samente, faremos uso de simulação empregando dados históricos.

Esta ferramenta é melhor que a que se baseia em distribuições de probabilidadecom parâmetros conhecidos ou estimados. O principal defeito desta última é queos acontecimentos extremos são subestimados, o que tem influência terrível nascrises. Entretanto, usando cenários podemos incorporar facilmente informações dotipo: Uma vez em cada mil todas as ações caem simultaneamente 20 por centoem um único dia. Com efeito, é suficiente estudar, nos dados históricos, qual é afrequencia de um acontecimento desse tipo e incorporá-la nos cenários.

Por outro lado, as médias fornecidas por uma simulação podem ser facilmentecorrigidas se divergirem da opinião e avaliação de economistas no contexto dospróprios cenários.

Suponhamos que temos uma série histórica de preços de 6 ativos. Esses preçosestão na matriz P , de 34 linhas e 6 colunas. A última coluna corresponde aoativo livre de risco. Seu preço é sempre igual a 1 neste caso, o que significa queconsideramos que este ativo é simplesmente a unidade monetária. A primeira linhada matriz representa os preços dos seis ativos no dia 1, a última linha representaos preços dos ativos no dia 34.

Dividindo cada linha da matriz pela linha anterior, coordenada a coordenada,obtemos uma nova matriz de 33 linhas e 6 colunas. Esta nova matriz, que cha-maremos P ′, representa a série histórica dos fatores de crescimento correspondenteaos 34 dias consecutivos escolhidos para o processo de simulação.

Suponhamos que queremos gerar diferentes cenários de fatores de crescimentopara um periodo de 50 dias, a partir de hoje. Digamos que desejamos gerar 100cenários. Para gerar cada cenário, procedemos da seguinte maneira: Partimosde um vetor inicial v = (1, 1, 1, 1, 1, 1) e, durante 50 dias consecutivos, sorteamosuma linha da matriz P ′ e subsituímos v pelo produto, coordenada a coordenada,de v pela linha sorteada. Em outras palavras, simulamos que, durante 50 dias

131

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132 Capıtulo 22. Geracao de cenarios

consecutivos, o mercado se comportou como em um dos dias da série histórica,sorteado aleatoriamente. No final destes 50 sorteios temos um novo vetor v querepresenta os fatores de crescimento dos seis ativos, em 50 dias, para um únicocenário. Desta maneira podemos gerar tantos cenários como desejarmos, obtendoa matriz de fatores de crescimento θ, que terá 100 linhas e 6 colunas.

P =

49.08 9.59 3.69 2.36 14.94 1.47.02 9.06 3.45 2.64 14.60 1.48.21 9.60 3.63 3.01 14.83 1.45.91 9.12 3.50 3.09 14.25 1.47.82 9.63 3.54 3.55 15.31 1.48.70 9.78 3.48 4.15 16.51 1.49.79 9.78 3.51 4.45 17.13 1.48.58 9.80 3.37 4.11 17.11 1.47.15 9.48 3.22 3.77 16.75 1.47.91 9.73 3.11 3.85 16.61 1.47.78 9.28 2.93 3.96 16.71 1.47.29 9.03 3.04 3.84 17.35 1.47.75 8.32 3.00 3.75 17.73 1.47.20 8.11 2.70 3.31 17.21 1.47.46 7.99 2.88 3.20 15.86 1.45.23 7.64 2.94 3.22 16.05 1.45.64 8.00 2.81 3.35 15.93 1.46.51 8.58 2.83 3.67 15.73 1.46.20 8.29 2.66 3.80 17.15 1.45.25 8.40 2.67 3.52 17.01 1.43.74 7.86 2.59 3.36 15.93 1.46.23 8.54 2.76 3.29 16.95 1.45.61 8.31 2.57 2.99 17.01 1.44.80 8.33 2.57 3.10 16.75 1.43.77 8.20 2.42 2.98 16.55 1.44.05 7.70 2.56 2.56 16.64 1.44.99 8.07 2.47 3.08 16.94 1.43.99 8.07 2.66 2.78 16.86 1.46.38 8.51 2.76 2.97 17.96 1.48.87 9.05 2.77 2.93 18.46 1.49.29 9.25 2.81 3.19 19.20 1.52.29 9.69 3.09 3.42 18.94 1.50.41 9.32 2.80 3.03 19.49 1.50.77 9.87 2.99 3.58 18.74 1.

, P ′ =

0.96 0.94 0.93 1.12 0.98 1.001.03 1.06 1.05 1.14 1.02 1.000.95 0.95 0.96 1.03 0.96 1.001.04 1.06 1.01 1.15 1.07 1.001.02 1.02 0.98 1.17 1.08 1.001.02 1.00 1.01 1.07 1.04 1.000.98 1.00 0.96 0.92 1.00 1.000.97 0.97 0.96 0.92 0.98 1.001.02 1.03 0.97 1.02 0.99 1.001.00 0.95 0.94 1.03 1.01 1.000.99 0.97 1.04 0.97 1.04 1.001.01 0.92 0.99 0.98 1.02 1.000.99 0.97 0.90 0.88 0.97 1.001.01 0.99 1.07 0.97 0.92 1.000.95 0.96 1.02 1.01 1.01 1.001.01 1.05 0.96 1.04 0.99 1.001.02 1.07 1.01 1.10 0.99 1.000.99 0.97 0.94 1.04 1.09 1.000.98 1.01 1.00 0.93 0.99 1.000.97 0.94 0.97 0.95 0.94 1.001.06 1.09 1.07 0.98 1.06 1.000.99 0.97 0.93 0.91 1.00 1.000.98 1.00 1.00 1.04 0.98 1.000.98 0.98 0.94 0.96 0.99 1.001.01 0.94 1.06 0.86 1.01 1.001.02 1.05 0.96 1.20 1.02 1.000.98 1.00 1.08 0.90 1.00 1.001.05 1.05 1.04 1.07 1.07 1.001.05 1.06 1.00 0.99 1.03 1.001.01 1.02 1.01 1.09 1.04 1.001.06 1.05 1.10 1.07 0.99 1.000.96 0.96 0.91 0.89 1.03 1.001.01 1.06 1.07 1.18 0.96 1.00

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133

θ (linhas 1–50) =

0.84 0.69 0.92 0.95 0.97 1.001.12 1.00 0.50 1.77 1.06 1.001.15 0.94 0.57 3.43 1.71 1.001.16 1.41 0.64 6.81 2.08 1.001.08 1.08 0.73 2.57 1.12 1.001.03 1.17 0.92 2.24 1.27 1.001.14 0.85 1.55 4.76 1.48 1.001.35 2.08 0.53 4.02 1.20 1.001.35 1.11 0.68 1.33 1.52 1.001.10 1.22 0.54 2.12 0.97 1.001.05 0.89 0.95 1.32 1.44 1.001.03 0.96 1.07 1.50 1.77 1.000.95 1.15 0.80 1.51 1.29 1.000.97 1.29 0.47 6.09 1.44 1.000.91 0.76 0.61 1.57 1.35 1.000.94 0.70 0.67 0.22 1.06 1.001.09 1.13 0.94 1.60 0.64 1.001.19 1.08 0.63 2.13 1.34 1.001.16 0.94 0.83 1.24 1.53 1.000.89 0.84 0.63 3.23 1.18 1.001.11 0.97 0.59 2.33 1.11 1.001.38 1.13 1.00 2.89 1.19 1.001.05 1.00 1.08 2.26 1.03 1.000.75 0.80 0.64 1.00 0.78 1.001.48 1.91 0.92 3.93 1.84 1.000.95 0.71 0.50 0.99 1.53 1.000.74 0.79 0.57 1.50 0.91 1.001.09 1.35 0.90 2.39 0.88 1.000.99 0.76 0.33 0.72 1.56 1.000.72 0.79 0.66 1.55 1.40 1.001.30 1.18 1.06 2.15 0.99 1.001.03 1.07 0.53 1.69 1.96 1.000.87 0.71 0.52 2.77 1.81 1.000.80 0.76 0.79 2.20 1.40 1.001.33 1.28 0.32 4.91 2.23 1.001.34 1.10 1.18 2.61 2.40 1.000.97 0.96 0.45 3.34 1.54 1.000.98 0.97 0.92 1.95 1.82 1.001.26 1.26 1.19 2.76 1.52 1.001.02 0.74 0.65 1.69 2.09 1.001.09 0.84 0.76 1.74 1.48 1.000.75 0.61 0.27 0.72 1.08 1.001.15 1.13 0.98 3.25 1.28 1.001.23 0.70 0.69 2.41 1.25 1.001.37 1.54 0.60 1.93 1.92 1.001.14 1.05 0.78 1.75 1.30 1.001.52 1.45 0.97 2.49 1.52 1.001.06 0.69 0.88 1.21 1.83 1.001.04 1.11 0.76 2.42 1.31 1.001.15 1.24 0.82 2.14 1.70 1.001.09 1.44 1.22 2.20 1.11 1.00

, θ (linhas 51–100) =

0.97 0.89 0.82 2.08 0.95 1.001.16 1.03 0.57 2.76 1.62 1.000.87 0.85 0.79 1.12 1.74 1.001.67 1.36 1.33 2.84 2.06 1.001.00 1.01 0.71 3.90 2.32 1.001.04 1.24 0.73 3.35 0.85 1.001.01 0.90 0.81 0.61 0.87 1.000.95 1.00 0.73 2.76 1.55 1.001.01 1.08 1.18 2.36 1.02 1.000.87 0.87 0.61 1.47 1.48 1.001.61 1.25 1.54 2.29 2.28 1.001.19 1.33 1.15 1.29 1.12 1.001.12 1.44 0.81 6.25 1.58 1.000.81 0.87 0.43 1.37 1.14 1.001.00 1.00 0.61 2.53 1.39 1.000.81 0.72 0.36 1.63 1.58 1.001.27 1.18 0.76 1.40 1.22 1.001.21 1.83 0.90 8.51 1.56 1.000.98 0.83 0.65 0.93 1.97 1.001.40 1.56 0.50 3.22 2.04 1.000.90 0.76 0.47 2.43 1.39 1.001.01 1.06 0.41 3.63 1.58 1.001.18 1.21 0.66 2.34 1.72 1.001.14 0.88 1.12 0.31 1.70 1.000.82 1.44 0.65 2.70 1.05 1.001.16 1.33 0.65 2.28 1.64 1.001.28 1.19 0.58 2.82 1.77 1.000.84 0.90 0.39 1.57 1.19 1.001.22 1.53 0.69 1.31 1.47 1.001.29 1.67 0.95 1.28 1.68 1.001.01 1.10 0.55 0.94 1.48 1.001.28 1.90 0.93 4.80 1.38 1.001.12 1.46 1.06 2.28 1.15 1.000.86 0.62 0.89 0.59 0.95 1.001.01 0.85 0.42 1.57 1.43 1.001.09 1.38 1.19 3.59 1.38 1.000.97 1.34 1.03 1.30 1.54 1.000.97 1.09 0.57 4.07 1.48 1.001.30 1.49 0.68 2.67 1.16 1.001.35 1.46 1.09 3.58 1.74 1.001.39 1.57 1.00 1.49 1.39 1.001.14 1.10 0.76 1.88 1.98 1.001.31 1.48 0.91 1.87 1.22 1.001.60 1.42 0.79 2.30 3.33 1.001.82 1.26 1.01 2.29 2.17 1.001.03 1.10 0.84 2.91 1.12 1.001.39 1.19 1.35 2.71 1.05 1.001.05 1.15 0.80 1.74 1.48 1.001.20 1.26 0.87 3.53 1.60 1.00

Usando a matriz θ podemos calcular as médias dos fatores de crescimento de cadaativo, o que dá o seguinte resultado:

θ1 = 1.11, θ2 = 1.12, θ3 = 0.78, θ4 = 2.38, θ5 = 1.47, θ6 = 1.00.

Com estes valores podemos calcular a matriz de cenários A, que nada mais é doque a matriz θ corrigida pelas médias de cada coluna.

Como temos m = 100 cenários, a matriz de covariância C será dada por:

C =1

mATA =

1

100ATA.

Os desvios padrão de cada variável são as raízes quadradas das variâncias, ou seja,as raízes quadradas dos elementos da diagonal da matriz de covariância C. Assim:

σ1 = 0.21, σ2 = 0.30, σ3 = 0.26, σ4 = 1.35, σ5 = 0.41, σ6 = 0.

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134 Capıtulo 22. Geracao de cenarios

Lembrando que o coeficiente de correlação entre duas variáveis é o produtoescalar das colunas correspondentes da matriz A dividido o produto das normasdas colunas, podemos expressar também os coeficientes de correlação em umamatriz de 6 linhas e 6 colunas.

A linhas 1–50 =

−0.27 −0.42 0.14 −1.42 −0.50 0.000.01 −0.12 −0.28 −0.61 −0.41 0.000.04 −0.18 −0.21 1.05 0.25 0.000.05 0.29 −0.14 4.43 0.61 0.00−0.02 −0.03 −0.05 0.19 −0.35 0.00−0.08 0.05 0.14 −0.14 −0.20 0.000.03 −0.27 0.77 2.39 0.02 0.000.24 0.96 −0.25 1.64 −0.27 0.000.24 −0.01 −0.10 −1.05 0.05 0.00−0.01 0.10 −0.24 −0.26 −0.50 0.00−0.06 −0.23 0.17 −1.05 −0.02 0.00−0.08 −0.16 0.29 −0.88 0.30 0.00−0.16 0.03 0.02 −0.87 −0.18 0.00−0.14 0.17 −0.31 3.71 −0.03 0.00−0.20 −0.36 −0.17 −0.80 −0.12 0.00−0.17 −0.42 −0.11 −2.16 −0.41 0.00−0.02 0.01 0.16 −0.78 −0.83 0.000.08 −0.04 −0.15 −0.24 −0.13 0.000.05 −0.18 0.05 −1.14 0.07 0.00−0.22 −0.27 −0.15 0.85 −0.29 0.000.00 −0.14 −0.19 −0.05 −0.36 0.000.27 0.01 0.22 0.52 −0.27 0.00−0.06 −0.12 0.30 −0.11 −0.44 0.00−0.36 −0.31 −0.14 −1.37 −0.68 0.000.37 0.79 0.14 1.55 0.37 0.00−0.16 −0.41 −0.28 −1.39 0.06 0.00−0.37 −0.33 −0.21 −0.87 −0.56 0.00−0.02 0.23 0.12 0.01 −0.59 0.00−0.11 −0.36 −0.45 −1.66 0.09 0.00−0.39 −0.33 −0.12 −0.83 −0.07 0.000.20 0.06 0.28 −0.23 −0.47 0.00−0.08 −0.05 −0.25 −0.69 0.49 0.00−0.24 −0.41 −0.26 0.39 0.35 0.00−0.31 −0.36 0.01 −0.17 −0.07 0.000.22 0.16 −0.46 2.53 0.77 0.000.23 −0.01 0.39 0.24 0.93 0.00−0.14 −0.15 −0.33 0.96 0.07 0.00−0.13 −0.15 0.14 −0.43 0.35 0.000.15 0.14 0.41 0.38 0.05 0.00−0.09 −0.38 −0.13 −0.69 0.62 0.00−0.02 −0.28 −0.02 −0.64 0.01 0.00−0.36 −0.51 −0.51 −1.66 −0.39 0.000.04 0.02 0.20 0.87 −0.18 0.000.12 −0.42 −0.09 0.04 −0.22 0.000.26 0.42 −0.18 −0.44 0.45 0.000.03 −0.07 0.00 −0.63 −0.17 0.000.41 0.33 0.19 0.11 0.05 0.00−0.05 −0.43 0.10 −1.17 0.37 0.00−0.07 −0.01 −0.02 0.05 −0.16 0.000.04 0.13 0.03 −0.23 0.24 0.00

, A linhas 51–100 =

−0.02 0.32 0.44 −0.17 −0.36 0.00−0.13 −0.23 0.04 −0.30 −0.51 0.000.05 −0.09 −0.21 0.38 0.15 0.00−0.23 −0.27 0.01 −1.26 0.27 0.000.56 0.25 0.55 0.46 0.60 0.00−0.11 −0.11 −0.07 1.53 0.85 0.00−0.07 0.12 −0.05 0.97 −0.62 0.00−0.10 −0.22 0.02 −1.77 −0.60 0.00−0.16 −0.12 −0.05 0.38 0.09 0.00−0.10 −0.04 0.40 −0.01 −0.45 0.00−0.24 −0.25 −0.17 −0.91 0.01 0.000.50 0.13 0.76 −0.09 0.81 0.000.08 0.21 0.37 −1.09 −0.35 0.000.02 0.32 0.02 3.87 0.11 0.00−0.30 −0.25 −0.35 −1.01 −0.32 0.00−0.11 −0.12 −0.17 0.15 −0.07 0.00−0.30 −0.40 −0.42 −0.75 0.12 0.000.16 0.06 −0.02 −0.98 −0.25 0.000.10 0.72 0.12 6.13 0.09 0.00−0.13 −0.29 −0.13 −1.45 0.51 0.000.29 0.44 −0.28 0.85 0.57 0.00−0.21 −0.36 −0.31 0.05 −0.08 0.00−0.10 −0.06 −0.37 1.25 0.11 0.000.07 0.10 −0.12 −0.03 0.25 0.000.04 −0.23 0.34 −2.07 0.24 0.00−0.29 0.32 −0.13 0.32 −0.42 0.000.05 0.21 −0.13 −0.09 0.17 0.000.17 0.07 −0.20 0.44 0.30 0.00−0.27 −0.22 −0.39 −0.81 −0.28 0.000.11 0.42 −0.09 −1.07 0.00 0.000.18 0.55 0.17 −1.10 0.21 0.00−0.10 −0.02 −0.23 −1.44 0.01 0.000.18 0.78 0.15 2.42 −0.09 0.000.01 0.34 0.28 −0.09 −0.32 0.00−0.25 −0.50 0.11 −1.79 −0.52 0.00−0.09 −0.26 −0.36 −0.80 −0.04 0.00−0.02 0.27 0.40 1.22 −0.09 0.00−0.14 0.22 0.25 −1.08 0.08 0.00−0.14 −0.03 −0.21 1.69 0.01 0.000.19 0.38 −0.10 0.29 −0.31 0.000.25 0.35 0.31 1.20 0.27 0.000.28 0.45 0.22 −0.89 −0.08 0.000.04 −0.02 −0.02 −0.50 0.52 0.000.20 0.36 0.13 −0.51 −0.25 0.000.49 0.30 0.01 −0.08 1.86 0.000.72 0.14 0.23 −0.09 0.70 0.00−0.08 −0.02 0.06 0.53 −0.35 0.000.28 0.08 0.57 0.33 −0.42 0.00−0.06 0.03 0.02 −0.64 0.01 0.000.09 0.14 0.09 1.16 0.14 0.00

,

C =

0.04 0.04 0.02 0.07 0.04 0.000.04 0.09 0.02 0.20 0.02 0.000.02 0.02 0.07 0.02 0.00 0.000.07 0.20 0.02 1.83 0.11 0.000.04 0.02 0.00 0.11 0.17 0.000.00 0.00 0.00 0.00 0.00 0.00

,

Correlações =

1.00 0.64 0.44 0.25 0.44 00.64 1.00 0.27 0.50 0.15 00.44 0.27 1.00 0.05 0.02 00.25 0.50 0.05 1.00 0.20 00.44 0.15 0.02 0.20 1.00 0

0 0 0 0 0 1

.

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Capıtulo 23

Otimizacao do portfoliocom media e variancia

Nossos dados são, agora, as médias dos fatores de crescimento de cada ativo e amatriz de covariância. Supondo que trabalhamos com n ativos, o vetor de médias θtem n elementos e a matriz de covariância C tem n linhas e n colunas. No exemploda aula passada tínhamos n = 6,

θ =

1.111.120.782.381.47

1

e

C =

0.04 0.04 0.02 0.07 0.04 0.000.04 0.09 0.02 0.20 0.02 0.000.02 0.02 0.07 0.02 0.00 0.000.07 0.20 0.02 1.83 0.11 0.000.04 0.02 0.00 0.11 0.17 0.000.00 0.00 0.00 0.00 0.00 0.00

,

Dado um portfólio x =

x1

. . .xn

, a média do capital final vem dada por

µ(x) =n∑i=1

θixi

e a variância vem dada por:σ2(x) = xTCx.

Todo investidor deseja obter a maior média possível de capital final, com omenor desvio padrão σ(x). Suponhamos que nosso investidor tem um capital

135

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136 Capıtulo 23. Otimizacao do portfolio com media e variancia

inicial igual a 100 e que resolve investir 20 por cento em cada ativo, excluindo oúltimo (livre de risco neste caso). Ou seja, sua decisão de investimento é:

x1 = x2 = x3 = x4 = x5 = 20, x6 = 0.

Nesse caso, a média do seu capital final µ(x) será 137.05 e o desvio padrão σ(x) =36.37.

Por outro lado, suponhamos que outro investidor considera o portfolio queconcentra 50 por cento no ativo 4 e 50 por cento no ativo 6. Nesse caso, teremos:

µ(x) = 168.9, σ(x) = 68.6.

Aparentemente o segundo investimento é melhor que o primeiro por dois motivos:

• A média do capital final é maior.

• Mesmo o desvio padrão sendo maior, a quantidade “média menos desviopadrão” é mais alta no segundo investimento que no primeiro (101.3 contra100.7). Isto pareceria indicar que o segundo investimento tem menos riscoque o primeiro.

Entretanto, se computarmos µ(x)− 2σ(x) em ambos casos, obteremos 64.3 noprimeiro caso e 33.8 no segundo. Considerando que, em distribuições normais, 2.5por cento dos casos ficam por debaixo de µ(x) − 2σ(x), resulta que com 2.5 porcento de probabilidade, o primeiro investimento termina abaixo de 64.3. O segundoinvestimento, com a mesma probabilidade, fica abaixo de 33.8. Portanto, em casode catástrofe, o segundo investidor perde mais que o primeiro.

Um investimento somente é melhor que outro se tiver maior média e menordesvio padrão.

Otimizar média e desvio padrão ao mesmo tempo é impossível. O portfólio quetem menor desvio padrão e o composto unicamente pelo ativo livre de risco. Masa média do capital final nesse portfólio é geralmente bastante baixa. Costuma-serepresentar os diferentes portfólios em um plano (σ, µ) onde cada portfólio x érepresentado por um ponto, sua abscissa é σ(x) e sua ordenada µ(x).

O sistema mais usual de seleção de portfólios, devido a Markowitz [9], procedeminimizando o desvio padrão (ou, equivalentemente, a variância), sujeito à restri-ção de que a média do capital final deve ser maior que uma quantidade fixada pelointeressado.

Em outras palavras, se trata de

Minimizar xTCx (23.1)

sujeta an∑i=1

θixi ≥ Q,

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137

n∑i=1

xi = M,

xi ≥ 0, i = 1, . . . , n.

Pediu-se a um conjunto de alunos de MS416 resolver o problema acima portentativa e erro, estabelecendo M = 100, Q = 110. Os resultados se encontram naTabela 6.1.

Nome x1 x2 x3 x4 x5 x6 µ(x) σ(x)Vinícius 50 50 111. 23.Tânia 20 10 10 10 10 40 120. 19.Paula 50 6 4 3 5 5 149. 46.

Antonio 7.5 10 35 25 12.5 10 135 39Vanessa 30 70 136. 32.Alex 20 20 30 30 160 50

Gaspar 30 20 25 7 10 8 114. 22.Artur 50 30 20 130. 43.César 100 111. 21.Bruno 30 50 20 109. 20.Ana 20 20 20 20 20 137. 36.

Marcelo 20 20 10 10 30 10 130. 26.Nicolao 20 20 30 10 15 5 119. 25.Caio 99 1 111. 21.Pietro 20 10 20 50 119. 18.Gustavo 20 10 5 35 20 10 159. 53.Luis 91 9 110. 19.

Roberto 10 15 20 30 15 10 147 46

Tabela 23.1. Portfólios elaborados por estudantes.

Evidentemente, tentativa-e-erro não é uma boa estratégia para resolver (23.1).Este é um problema de otimização com restrições, para o qual existem muitassubrotinas específicas que fornecem resultados melhores. Resolvendo o problema(23.1) com uma subrotina de otimização, obtemos:

x1 = x2 = x3 = 0,

x4 = 3.17, x5 = 12.05, x6 = 84.78,

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138 Capıtulo 23. Otimizacao do portfolio com media e variancia

com uma média de capital final µ(x) = 110 e un desvio padrão σ(x) = 7.21.Observe-se que nas tentativas feitas pelos estudantes, nunca foi obtido um desviomenor que 18.. A solução obtida pelo método de otimização tem as seguintescaracterísticas, se assumirmos uma distribuição normal dos retornos:

• Com probabilidade 0.16 o investidor ficará com um capital menor que µ(x)−σ(x) (102.79 reais). Ou seja, com essa probabilidade ele obterá um retornomenor que 2.79 por cento.

• Em 2.5 por cento dos casos o investidor ficará com um capital menor queµ(x) − 2σ(x) (95.58 reais). Ou seja, com essa probabilidade ele vai perdermais que 4.42 por cento do seu capital.

• Em 0.5 por cento dos cenários nosso investidor ficará com menos que 88.37reais (µ(x)− 3σ(x)). Portanto, em um 1 caso entre 200 ele perderá mais que11.63 por cento.

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Capıtulo 24

Uso de algoritmos deotimizacao

Vimos que a solução de nosso problema de obter a distribuição de investimentosmais segura com uma média de retorno garantida pode ser formulado como umproblema de otimização (23.1) e que, de fato, proceder desta forma dá melhoresresultados que o mero ensaio-e-erro.

Isto não é incomum. Muitos problemas da realidade se formulam naturalmenteem termos de otimização. É bom permanecer atentos para a estrutura “de otimiza-ção” mais ou menos escondida em uma enorme quantidade de problemas práticos.

Os problemas de otimização em dimensão finita (também chamados de “Pro-gramação não-linear” tem a forma:

Minimizar f(x)

sujeita ah(x) = 0, g(x) ≤ 0,

onde f : IRn → IR, h : IRn → IRm, g : IRn → IRp. A função f se chama“função objetivo” e as funções h e g fornecem as “restrições” do problema. Aequação h(x) = 0 representa m restrições “de igualdade”. De fato, escrevendoh = (h1, . . . , hm)T , h(x) = 0 é uma maneira abreviada de escrever:

h1(x1, . . . , xn) = 0, . . . , hm(x1, . . . , xn) = 0.

Da mesma maneira a inequação g(x) ≤ 0 representa p restrições “de desigual-dade”:

g1(x1, . . . , xn) ≤ 0, . . . , gp(x1, . . . , xn) ≤ 0.

Quando não há restrições (ou seja, m = 0, p = 0) dizemos que temos umproblema “irrestrito”.

Outras classificações de problemas de otimização são frequentemente úteis:

139

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140 Capıtulo 24. Uso de algoritmos de otimizacao

• Quando f(x) = c1x1 + . . . + cnxn, h(x) = Ax + b, g(x) = Cx + d, dizemosque se trata de um problema de “Programação linear”.

• Se h e g são funções afins, mas f é uma função quadrática, dizemos que setrata de um problema de “Programação quadrática”.

Para resolver problemas de otimização quase sempre se usam “métodos ite-rativos”. Tais métodos são programados em computadores e tomam a forma de“subrotinas” orientadas a diferentes problemas de otimização.

A maioria das subrotinas para otimização requerem que o usuário forneça, nãoapenas as fórmulas da função e das restrições, mas também as fórmulas para asderivadas primeiras (os gradientes) e, às vezes, das derivadas segundas (Hessianas).

Isto significa que o usuário deve, sempre, programar subrotinas que computemf , h, g e suas derivadas. Apesar de que ninguém usa mais cartões perfurados (quesim se usavam na época em que o autor destas notas começou a programar) aimagem do pacote de cartões é útil para estabelecer claramente de que estamosfalando: Para resolver o problema de otimização, o usuário deve carregar “umpacote de cartões perfurados” que incluem:

1. Um programa principal.

2. Subrotinas que calculam a função, as restrições e as derivadas requeridas pelasubrotina de otimização, escritas pelo usuário.

3. A subrotina de otimização. Esta subrotina, em geral, já foi escrita por outraspessoas.

A estrutura acima é a única possível, embora “softwares” modernos fazem opossível para que usuários nascidos depois de 1980 desconheçam totalmente o queestão fazendo cada vez que usam uma subrotina qualquer. O fato de ser usado umpacote de cartões ou qualquer outra base física é irrelevante. O pacote de cartõestem a vantagem de que pode ser visto e tocado. Assim, o usuário não fica com aidéia de que as soluções são fornecidas por fantasmas em tempo instantâneo.

O usuário de uma subrotina de otimização deve saber o que ela faz ou, pelomenos, deve ler atentamente nos comentários da mesma, ou na documentação, aforma em que deve ser usada. As subrotinas de otimização costumam ter mui-tos parâmetros que o usuário deve escolher. Se o usuário se negar a escolher osparâmetros com algum cuidado, ou se optar por subrotinas que não tem tantosparâmetros, pior para ele. Vai pagar sua ousadia com a ineficiência do programaou com resultados incorretos. A Programação não-linear representa uma famíliade problemas difíceis, e os bons resultados quase nunca estão garantidos. Um bom

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141

usuário de PNL deve proceder com uma certa dose de inteligência e astúcia. Re-solver um PNL não é tão rotineiro como calcular a raíz quadrada de um númeroou fazer a média dos elementos de um vetor.

No problema (23.1) definimos a função objetivo

f(x) =1

2xTCx.

Para calcular o gradiente desta função podemos proceder usando a “força bruta”,calculando cada derivada parcial por separado, ou podemos empregar procedimen-tos mais inteligentes. Como se trata de uma função quadrática, o desenvolvimentode Taylor até segunda ordem dará um resultado exato, portanto, quaisquer sejamx, s ∈ IRn,

f(x+ s) = f(x) +∇f(x)T s+1

2sT∇2f(x)s. (24.1)

Agora, fazendo os cálculos diretos:

f(x+ s) =1

2(x+ s)TC(x+ s) =

1

2(x+ s)T [Cx+ Cs] =

=1

2[xTCx+ xTCs+ sTCx+ sTCs] =

Como C é simétrica, temos:

xTCs = (xTCs)T = sTCTx = sTCx,

logo:

f(x+ s) =1

2xTCx+ xTCs+

1

2sTCs.

Portanto,

f(x+ s) =1

2xTCx+ (Cx)T s+

1

2sTCs.

Comparando esta expressão com (24.1), vemos que:

∇f(x) = Cx and ∇2f(x) = C.

Quase todas as subrotinas de otimização exigem que a função objetivo seja“minimizada” (e não “maximizada”). Isto não representa nenhum inconveniente,posto que “Maximizar f(x)” é equivalente a “Minimizar −f(x)”. Logo, se se desejamaximizar uma função é suficiente minimizar o inverso aditivo dela.

Algumas subrotinas de otimização admitem restrições somente na forma

h(x) = 0, ` ≤ x ≤ u.

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142 Capıtulo 24. Uso de algoritmos de otimizacao

Isto significa que restrições da forma gi(x) ≤ 0 ou gi(x) ≥ 0 não podem ser empre-gadas diretamente. Felizmente, isso também não representa nenhum inconvenientesério. Basta observar que a expressão

gi(x) ≤ 0

é equivalente agi(x) + zi = 0, zi ≥ 0.

Analogamente,gi(x) ≥ 0

equivale agi(x)− zi = 0, zi ≥ 0.

Nestes casos, dizemos que xi é uma variável “de folga”.Desta maneira, no caso de (23.1), escreveremos:

Minimizar1

2xTCx

sujeita an∑i=1

θixi − z1 −Q = 0,

n∑i=1

xi −M = 0

xi ≥ 0, z1 ≥ 0, para todo i = 1, . . . , n.

Assim, teremos um problema com n+1 variáveis (contando a variável de folga),duas restrições de igualdade e limitantes inferiores (0) para todas as variáveis.

As restrições de igualdade são:

h1(x) =n∑i=1

θixi − z1 −Q

eh2(x) =

n∑i=1

xi −M.

Estas duas restrições são lineares. Portanto, seus gradientes são calculadostrivialmente. De fato:

∇h1(x) =

θ1...θn−1

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143

e

∇h2(x) =

1...10

.Uma subrotina de minimização com restrições solicitará que o usuário escreva

subrotinas que calculam função, gradiente, restrições e gradientes das restrições.Tipicamente, a subrotina para calcular a função é chamada, desde a subrotina deminimização, com o comando

call fun(nvar, x, f)

(Usaremos sempre a sintaxe do Fortran que, como é sabido, é a melhor lingua-gem de programação para cálculos numéricos.)

Isto significa que o usuário deverá programar uma subrotina cujo cabeçalhoserá:

subroutine fun(nvar, x, f)

No nosso caso, a programação completa da subrotina fun, por parte do usuário,poderá ser a seguinte:

subroutine fun(nvar, x, f)implicit double precision (a-h, o-z)dimension x(nvar), aux(100)n = nvar - 1do i = 1, naux(i) = 0.d0do j = 1, naux(i) = aux(i) + c(i, j) * x(j)end doend dof = 0.d0do j = 1, nf = f + x(j) * aux(j)end dof = f/2.d0returnend

O leitor deve ter observado que algo está faltando nesta “subrotina”. De fato,

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144 Capıtulo 24. Uso de algoritmos de otimizacao

em nenhum lugar está definida a matriz de covariância c. O ideal seria que cpudesse ser passada como um parâmetro da subrotina, mas isto não é possível,porque implicaria mudar a chamada da subrotina fun, coisa que não pode ser feitaporque envolveria mudar a subrotina que faz a minimização. Em consequência,deve ser usado o recurso do common, que nada mais é que uma forma de passarparâmetros por baixo do pano. Assim, a matriz de covariância poderá ser definidano programa principal e será usada pela subrotina fun.

Dessa maneira, a programação correta de fun pode ser a seguinte:

subroutine fun(nvar, x, f)implicit double precision (a-h, o-z)dimension x(nvar), aux(100)common/markowitz/ c(100, 100)n = nvar - 1do i = 1, naux(i) = 0.d0do j = 1, naux(i) = aux(i) + c(i, j) * x(j)end doend dof = 0.d0do j = 1, nf = f + x(j) * aux(j)end dof = f/2.d0returnend

Analogamente, a subrotina que calcula o gradiente de f poderá ser assim:

subroutine grad(nvar, x, g)implicit double precision (a-h, o-z)dimension x(nvar), g(nvar)common/markowitz/ c(100, 100)n = nvar - 1do i = 1, ng(i) = 0.d0do j = 1, ng(i) = g(i) + c(i, j) * x(j)end doend do

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g(nvar) = 0.d0returnend

A subrotina que calcula a Hessiana poderá ser a seguinte:

subroutine hessi(nvar, x, hes)implicit double precision (a-h, o-z)dimension x(nvar), hes(nvar, nvar)common/markowitz/c(100, 100)n = nvar - 1do j = 1, ndo i = 1, nhes(i, j) = c(i, j)end doend dodo i = 1, nvarhes(i, nvar) = 0.d0hes(nvar, i) = 0.d0end doreturnend

Assim, a subrotina que calcula as restrições no nosso problema poderá ser:

subroutine hrest(nrest, nvar, x, h)implicit double precision (a-h,o-z)dimension x(nvar), h(nrest)common/markowitz2/temed(100), capminn = nvar - 1h(1) = 0.d0h(2) = 0.d0do i = 1, nh(2) = h(2) + x(i)h(1) = h(1) + x(i) * temed(i)end doh(2) = h(2) - 100.d0h(1) = h(1) - x(nvar) - capminreturnend

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146 Capıtulo 24. Uso de algoritmos de otimizacao

Observe-se que, neste caso, usamos outro common, que denominamos markowitz2.Este common permite informar à subrotina hrest o valor dos capitais finais mé-dios temed(i), i=1, n e o capital médio mínimo requerido, que chamamos Q naformulação do problema e que aqui se chama capmin.

Por fim, para a subrotina que calcula os gradientes das restrições, temos:

subroutine jacobh(nrest, nvar, x, aj)implicit double precision (a-h,o-z)dimension x(nvar), aj(nrest, nvar)common/markowitz2/temed(100), capminn = nvar - 1do j = 1, naj(2, j) = 1.d0aj(1, j) = temed(j)end doaj(1, nvar) = -1.d0aj(2, nvar) = 0.d0returnend

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Capıtulo 25

Milonga

Milonga é uma subrotina Fortran que visa resolver o problema de programaçãonão-linear expressado na forma

Minimizar f(x) = 0, h(x) = 0, ` ≤ x ≤ u,

onde f : IRn → IR, h : IRn → IRm. Esta subrotina foi escrita em 2002 pelo autordestas notas como instrumento didático para cursos de otimização.

O cabeçalho da subrotina Milonga é:

subroutine milonga (n, m, x, f, g, a, ifree, ele, u,* gaux, aux, d, otro, ap, gamma, beta, ktot, nftot, ngtot,* nintot, nstot, nptot, nbtot, netot, nctot,* eps, maxtang, maxcg, tol, costol, distol, iopt, iophes, iopfac,* iflag, ambda, rhoinic, rhofac, rho, h, aj,* konout, maxout, ipmil, ipt, ier, qcib, alin, ata, nlin,* rhobig, scale, isca)

Portanto, a chamada a Milonga desde o programa principal, ou desde a subro-tina de chamada deve ter a forma:

call milonga (n, m, x, f, g, a, ifree, ele, u,* gaux, aux, d, otro, ap, gamma, beta, ktot, nftot, ngtot,* nintot, nstot, nptot, nbtot, netot, nctot,* eps, maxtang, maxcg, tol, costol, distol, iopt, iophes, iopfac,* iflag, ambda, rhoinic, rhofac, rho, h, aj,* konout, maxout, ipmil, ipt, ier, qcib, alin, ata, nlin,* rhobig, scale, isca)

147

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148 Capıtulo 25. Milonga

Para usar Milonga precisamos programar a funcao objetivo, seu gradiente, asrestrições, os gradientes das restrições (Jacobiana) e, às vezes, a Hessiana da fun-ção objetivo, em subrotinas que devem se chamar, respectivamente fun, grad,hrest, jacobh e hessi.

Além disso, precisamos fornecer uma série de parâmetros, que vamos comentarem continuação. Todas os parâmetros (escalares, vetores ou matrizes) reais devemser declarados em precisão dupla.

• n: o número de variáveis.

• m: o número de restrições representadas em h(x) = 0.

• x: um ponto inicial para começar o processo iterativo. O vetor correspon-dente deve ser dimensionado no programa de chamada com pelo menos nposições.

• ele: vetor que representa a `, ou seja, os limitantes inferiores para cadavariável na solução. Deve ser dimensionado com pelo menos n posições noprograma de chamada.

• u: vetor que representa a u, ou seja, os limitantes superiores para cada va-riável na solução. Deve ser dimensionado com pelo menos n posições noprograma de chamada.

• gamma: parâmetro interno que representa as exigências de descida em cadaiteração interna de Milonga. Deve ser maior que zero e menor que 1. O valorrecomendado é 10−4, mas alguns autores preferem usar 0.5.

• beta: parâmetro interno nas buscas lineares internas de Milonga. Deve sermaior que zero e menor que 1. O valor recomendado é 0.5.

• eps: número real pequeno para decidir que o método encontrou uma soluçãoaceitável. Milonga declarará ter encontrado a solução do problema quando anorma do “gradiente do Lagrangiano projetado” é menor que eps e quandonenhuma restrição é violada em quantidade maior que eps. Costuma-se dizer,nesse caso, que uma solução com precisão eps foi encontrada.

• maxtang: Milonga procede chamando várias vezes uma subrotina chamadaTongo. Tongo é um método iterativo para minimização de funções comrestrições simples (limitantes inferiores e superiores somente). maxtang (umnúmero inteiro) é o máximo de iterações permitidas em cada chamada deTongo. Tipicamente, se coloca maxtang = 100, 500 ou 1000.

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• maxcg: A subrotina Tongo resolve, de vez em quando, sistemas lineares pelométodo dos gradientes conjugados. maxcg é o número máximo de iteraçõesque se permite para cada chamada à subrotina que usa o algoritmo de gra-dientes conjugados.

• tol: Parâmetro que governa o comportamento interno da subrotina Tongo.Deve ser maior que zero e menor que 1. Se é próximo de zero, a tendênciade Tongo é explorar mais intensamente cada face da caixa ` ≤ x ≤ u antesde abandoná-la. Recomenda-se definir tol = 0.1 no programa de chamada.

• costol: Tolerância para o cosseno. Em Tongo, as direções de busca devemformar um ângulo obtusso com o gradiente. Isto significa que o cosseno entreo gradiente e a direção de busca deve ser menor ou igual que um númeronegativo pequeno - costol. Recomenda-se definir costol = 0.000001 noprograma de chamada.

• distol: Número pequeno que define um possível fracasso de Tongo. Quandoa distância relativa entre um iterando de Tongo e o melhor candidato a ite-rando seguinte é menor que este parâmetro, Tongo retorna declarando aimpossibilidade de melhorar a aproximação até então obtida. Recomenda-se definir distol = 0.000001 no programa de chamada. Frequentementeo fracasso relacionado com distol se deve a uma programação incorretados gradientes ou a uma exigência excessiva no critério de parada (epsexcessivamente pequeno).

• iopt: Parâmetro que indica a Milonga o que deve fazer se detecta umaHessiana não definida-positiva. Se iopt=1, a diagonal da Hessiana é modi-ficada para tornar a matriz diagonalmente dominante e, em consequência,definida-positiva. Se iopt=2 a subrotina passa a resolver o sistema linearcorrespondente usando gradientes conjugados. Recomenda-se iopt=2.

• iophes: Parâmetro que indica que tipo de Hessiana será usada. iophes =1 indica a Milonga que deve usar uma Hessiana discretizada. Nesse caso, ousuário não precisa programar a subrotina hessi. iophes = 2 indica queo usuário fornece a Hessiana analítica da função objetivo. Neste caso, asubrotina hessi deve ser programada. Hessianas analíticas das restriçõesnunca são solicitadas por Milonga.

Existe uma terceira opção (iophes = 3 que não se recomenda por enquanto,por ser insegura.

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150 Capıtulo 25. Milonga

• iopfac: Se iopfac = 1 Milonga faz uma chamada inicial a Tongo que pro-cura apenas encontrar um ponto mais viável que o inicial fornecido pelousuário. Esta opção não é segura. Recomenda-se, em consequência, colocariopfac = 0 no programa de chamada.

• rhoinic: Valor inicial para o parâmetro de penalidade. Se o tamanho domódulo da função objetivo é aproximadamente igual à soma de quadradosdas restrições, recomenda-se declarar rhoinic = 1 no programa de chamada.Em caso contrário, recomenda-se que rhoinic seja aproximadamente o valorpelo qual seria necessário multiplicar o quadrado da soma das restrições paraobter um valor semelhante ao módulo da função objetivo.

• rhofac: Valor pelo qual se multiplica o parâmetro de penalidade quando,entre diferentes chamadas a Tongo, não se registrou um bom progresso emtermos de viabilidade. Recomenda-se rhofac = 1.5.

• maxout: Máximo número de iterações permitido para Milonga. Recomenda-se maxout = 100.

• ipmil: Parâmetro que governa as impressões de Milonga. Milonga imprimeinformação na tela e num arquivo conectado com a unidade de impressão 10.Se ipmil < 0 nada será impresso. Se ipmil = 1 informação sobre todas asiterações de Milonga será impressa. Se não há restrições do tipo hi(x) = 0o valor dado a ipmil é irrelevante e, nesse caso, todas as impressões sãocomandadas pelo parâmetro ipt.

• ipt: Parâmetro que governa as impressões de Tongo. Tongo imprime na telae no arquivo com a unidade 10. Se ipt < 0 Tongo não imprime nada. Seipt = 0 somente informação inicial e final sobre o desempenho de Tongo éimpressa. Se ipt = 1 Tongo imprime informação sobre todas as iterações.

• rhobig: Máximo valor permitido para o parâmetro de penalidade usado emMilonga. Recomenda-se rhobig = 106.

• isca: Parâmetro inteiro que, no caso isca = 1, provoca um escalamentoautomático das restrições. Recomenda-se, por enquanto, declarar isca = 0

• nlin: Ver a descrição de qcib, anlin, ata abaixo.

Milonga fornece dois parâmetros fundamentais de saída. O principal deles éo vetor x que, como vimos acima, também é parâmetro de entrada. Na saída, xé a melhor aproximação da solução obtida por Milonga. O segundo parâmetrode saída importante é o número inteiro ier. Se ier = 0, Milonga encontrou um

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ponto que satisfaz os critérios de viabilidade e otimalidade requeridos pelo usuáriode acordo com o parâmetro eps. Se ier tem outro valor na saída, tais critérios nãoforam atingidos. Entretanto, o julgamento da qualidade de x é função precípua dousuário inteligente. É fortemente recomendável que, depois da chamada a Milonga,o usuário continue o programa de chamada fazendo sua própria análise da solução.

Milonga usa também um conjunto de escalares, vetores e matrizes auxiliares.Alguns deles tem significado na saída, mas isso não é tão relevante, posto que reco-mendamos que a análise da solução seja feita pelo próprio usuário. Os parâmetrosauxiliares são os seguintes. Todos os vetores e matrizes reais devem ser declaradosem precisão dupla no programa de chamada.

• f: Escalar auxiliar. De fato, na saída é f(x).

• g, gaux, aux, d, otro, ap: Vetores auxiliares com pelo menos n posiçõesno programa de chamada.

• ambda, h: Vetores auxiliares com pelo menos m posições no programa dechamada.

• a: Vetor auxiliar com pelo menos n2 posições no programa de chamada.

• aj: Vetor auxiliar com pelo menos mn posições no programa de chamada.

• ifree: Vetor inteiro com pelo menos n posições no programa de chamada.

• qcib, ata: Matrizes auxiliares declaradas com exatamente nlin linhas epelo menos n colunas. nlin deve ser um parâmetro de entrada e seu va-lor deve ser exatamente o número de linhas declarado para qcib e ata noprograma de chamada.

• alin: Vetor auxiliar com pelo menos mn posições.

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152 Capıtulo 25. Milonga

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Capıtulo 26

Milonga e Markowitz

Nesta aula vamos explicar o uso de Milonga para resolver o problema de minimizara variância sujeita à restrição de que a média do capital final é maior que umparâmetro indicado pelo interessado.

Já vimos como deve ser a programação das subrotinas que calculam a funçãoobjetivo, seu gradiente e Hessiana, as restrições e a matriz Jacobiana. Aqui nosconcentraremos no programa principal.

Este programa pode começar com a seguinte declaração, que estabelece quetodas as variáveis (escalares, vetores ou matrizes) cuja letra inicial está entre a eh, ou entre o e z se considera em precisão dupla. As variáveis cuja letra inicial estáentre i e n são inteiras, a menos que se declare de outra maneira.

implicit double precision (a-h,o-z)

O programa vai ler um conjunto de dados históricos de preços de determinadasações. Aqui estabeleceremos que o número de preços lidos será de 34, e que nosocuparemos de 6 ativos. Portanto, dimensionaremos a matriz de preços históricosp com 34 linhas e 6 colunas. A necessidade dos outros dimensionamentos indicadosem continuação vem dos parâmetros que se precisam para Milonga e de cálculosque serão necessários para montar os dados do problema:

dimension p(34, 6), c(34, 6), theta(100, 6), v(6),* a(100, 6) , corre(6, 6), colnor(6), desvio(6),* x(7), y(6), aux1(100), h(10), aj(100)dimension ele(10), u(10), gaux(10), aux(10), d(10), otro(10),* ap(10), ambda(50), qcib(10, 10), ata(10, 10), alin(100),* scale(10), g(10), ifree(10)

Em continuação precisamos declarar as áreas em common, usando a mesma

153

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154 Capıtulo 26. Milonga e Markowitz

estrutura que os common usados nas subrotinas de avaliação de função, gradiente,Hessiana, restrições e Jacobiana das restrições vistas no capítulo anterior.

common/markowitz/cova(100, 100)common/markowitz2/temed(100), capmin

A partir daqui todas as instruções do programa principal são executáveis. Pri-meiro abrimos vários arquivos que serão usados para ler dados e para imprimir.

open (unit=10, file = "milonga.out")open (unit=15, file = "anaclau.dat")

Para o processo de simulação vamos precisar usar uma subrotina que calculanúmeros aleatórios. Esta subrotina precisa ser inicializada. O seguinte comandoestabelece o parâmetro de inicialização.

isem = 237

Os dados para este problema vêm dados por um conjunto de preços históricosque estão armazenados no arquivo anaclau.dat. Cada linha deste arquivo cor-responde aos preços de 5 ativos. O primeiro número de cada linha é uma data,que não nos interessa ler. As instruções seguintes colocam os preços indicados emanaclau.dat na matriz p. Depois, colocamos na sexta coluna de p os preços his-tóricos de um “ativo sem risco”, cujo preço é sempre igual a 1.

do i = 1, 34read(15, *)nada, (p(i, j), j=1, 5)p(i, 6) = 1.d0end do

Em continuação calculamos a matriz de quocientes de preços consecutivos:

do i = 1, 33do j = 1, 6c(i, j) = p(i+1, j)/p(i, j)end doend do

Agora vamos gerar 100 cenários. Para isso usamos a matriz de quocientes depreços consecutivos. Cada cenário corresponde aos fatores de crescimento em 50dias. Para gerar cada cenário sorteamos 50 números aleatórios (um para cada dia)

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entre 1 e 33, tiramos a linha correspondente da matriz c e supomos que, no dia sor-teado, os 6 ativos cresceram (ou decresceram) de acordo com os fatores indicadosnessa linha. O resultado deste processo é a matriz de fatores de crescimento theta.

do icen = 1, 100do j = 1, 6v(j) = 1.end dodo jj = 1, 50z = 33.* rond(isem)ilin = z + 1.do j = 1, 6v(j) = v(j) * c(ilin, j)end doend dodo j = 1, 6theta(icen, j) = v(j)end doend do

O vetor de médias temed é calculado nas seguintes linhas:

do j = 1, 6temed(j) = 0.d0do i = 1, 100temed(j) = temed(j) + theta(i, j)end dotemed(j) = temed(j)/100.end do

Agora estamos em condições de calcular a matriz de cenários a:

do i = 1, 100do j = 1, 6a(i, j) = theta(i, j) - temed(j)end doend do

O passo seguinte é o cálculo da matriz de covariância cova:

do i = 1, 6

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156 Capıtulo 26. Milonga e Markowitz

do j = 1, 6cova(i, j) = 0.d0do k = 1, 100cova(i, j) = cova(i, j) + a(k, i) * a(k, j)end docova(i, j) = cova(i, j) / 100.d0end doend do

Por último, precisamos declarar qual é nossa restrição para a média do capitalmínimo final:

write(*, *)’ Média de capital minimo final para Markowitz:’read(*, *) capmin

Com isto completamos o cálculo dos dados do problema de otimização. A su-brotina Milonga precisa que seja fornecido um ponto inicial. Aqui vamos suporque o capital inicial é igual a 100, o que facilita a interpretação dos resultadosem termos de porcentagens. O programa principal solicita que o usuário declarevalores iniciais para os 5 primeiros ativos.

write(*, *)’ Investimentos nos 5 primeiros ativos :’read(*, *) (x(i),i=1,5)z = 0.d0do i = 1, 5z = z + x(i)end doif(z.gt.100.) stopx(6) = 100. - z

Lembremos que Milonga trabalha com uma variável de folga adicional paracada restrição de desigualdade, portanto o número de variáveis deste problema én = 7. Além disso, o número de restrições m é igual a 2 porque trabalhamos comuma restrição de orçamento e outra de capital mínimo.

n = 7m = 2

Os vetores ele e u são limitantes inferiores e superiores para as variáveis doproblema:

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do i = 1, nele(i) = 0.d0u(i) = 1.d4end doO resto das instruções antes da chamada a Milonga corresponde a parâmetros

de entrada desta subrotina, como indicado no capítulo anterior.

nlin = 10gamma = 1.d-4beta = 0.5ktot = 1000nftot = 5000ngtot = 5000nintot = 1000nstot = 1000nptot = 1000nbtot = 1000netot = 1000nctot = 1000eps = 1.d-4maxtang = 1000maxcg = n+1tol = 0.1costol = 1.d-4distol = 1.d-4iopt = 2iopfac = 1iophes = 2rhoinic = 1.d0rhofac = 1.5d0rhofin = 1.d6ipmilo = -1maxout = 100iptong = -1rhobig = 1.d6isca = 0

A seguinte instrução é a de chamada da subrotina Milonga:

call milonga(n, m, x, f, g, aux1, ifree, ele, u,* gaux, aux, d, otro, ap, gamma, beta, ktot, nftot,

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158 Capıtulo 26. Milonga e Markowitz

* ngtot, nintot, nstot, nptot, nbtot, netot,* nctot, eps, maxtang, maxcg, tol, costol, distol,* iopt, iophes,iopfac,* iflag, ambda, rhoinic, rhofac, rhofin, h, aj,* konout, maxout, ipmilo, iptong, ier, qcib, alin, ata, nlin,* rhobig, scale, isca)

Depois da chamada a Milonga procedemos a nossa própria análise do resultadodo programa. Primeiro imprimimos ier, para revelar se Milonga acha que resol-veu o problema ou não:

write(*, *)’ ier = ’, ier

Imprimimos a solução na tela do computador:

write(*, *)’ Solucao encontrada por Milonga:’write(*, *)(x(i),i=1, 6)

Calculamos a média do capital final correspondente a esta solução:

finmed = 0.d0do i = 1, 6finmed = finmed + temed(i) * x(i)end dowrite(*, *)’ Média do capital final:’, finmed

Calculamos o desvio padrão:

do i = 1, 6y(i) = 0.d0do j = 1, 6y(i) = y(i) + cova(i, j) * x(j)end doend dodesvi=0.d0do i = 1, 6desvi = desvi + x(i)*y(i)end dodesvi = dsqrt(desvi)write(*, *)’ Desvio padrao:’, desvi

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Imprimimos o valor “Média menos 1 desvio:”:

write(*, *)’ Média menos desvio:’, finmed - desviFinalmente, fechamos todos os arquivos e damos por terminado o programa.

close(10)close(15)end

No contexto deste programa usamos uma subrotina para gerar números alea-tórios, cujo texto é o seguinte:

Integer Function Mult( P, Q)Integer P, Q, P0, P1, Q0, Q1P1 = P/10000P0 = Mod(P,10000)Q1 = Q/10000Q0 = Mod(Q,10000)Mult = Mod( Mod( P0*Q1+P1*Q0,10000)*10000+P0*Q0,100000000)returnend

Real*8 Function rond( Sem)Integer Sem, MultSem = Mod( Mult( Sem, 3141581) + 1, 100000000)rond = Sem/100000000.0d0returnend

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160 Capıtulo 26. Milonga e Markowitz

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Capıtulo 27

Outros problemas de tipoMarkowitz

Os problemas de tipo Markowitz são aqueles onde se otimiza alguma combinaçãode média e desvio padrão. Vimos nas aulas anteriores o mais básico deles, ondese minimiza o desvio padrão com uma restrição na média do capital final. Aquiconsideraremos outras variantes, todas as quais são problemas de otimização quepodem ser resolvidos usando subrotinas adequadas, como Milonga.

Combinação de média e desvio numa mesma função objetivo

Em todos os problemas considerados nesta aula, entenderemos que a matriz decovariância C ∈ IRn×n é um dado, como tambén o vetor de médias θ ∈ IRn. Paraum investimento definido por x1, . . . , xn, a média do capital final é

µ(x) =n∑i=1

θixi

e a variância (quadrado do desvio padrão) é:

σ2(x) = xTCx.

O problema que vimos nas aulas anteriores consiste em minimizar σ2(x) sujeitaa µ(x) ≥ Q. Todos os problemas considerados aqui terão as restrições adicionaisx ≥ 0 e

∑ni=1 xi = M . Usualmente, definiremos M = 100 para poder interpretar

os resultados em termos de percentagens.Agora consideraremos o problema definido por

Minimizar pσ(x)− µ(x)

sujeita, como sempre, a∑ni=1 xi = M,x ≥ 0. O parâmetro p > 0 representa um

peso atribuído ao desvio padrão em relação à média.

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162 Capıtulo 27. Outros problemas de tipo Markowitz

Este problema é equivalente a

Maximizar µ(x)− pσ(x).

Esta formulação fornece a interpretação adequada para o problema. Se supomosque a distribuição do retorno é normal, então, com p = 1, µ(x)− pσ(x) representaum valor do capital final que é maior que 16 por cento de todos os valores possíveis.Em outras palavras, µ(x)−1×σ(x) corresponde ao percentil 16 da distribuição deretornos. Da mesma maneira, p = 0 corresponde ao percentil 50, p = 2 correspondeao percentil 2.5 e p = 3 corresponde ao percentil 0.05.

Quanto maior for p maior é a aversão ao risco do investidor que decide orientarsua ação pela solução deste problema. Se p = 0, o investidor tem um apetite altopelo risco, pois ele pretende maximizar a média do retorno, independentemente daincerteza.

O problema considerado aqui pode ser resolvido usando Milonga, ou outrosalgoritmos de otimização. A função objetivo é, neste caso,

f(x) = pσ(x)− µ(x) = p√xTCx− θTx

e a única restrição é

h1(x) =n∑i=1

xi −M = 0.

Para usar Milonga precisamos calcular o gradiente de f . Neste caso,

∇f(x) =Cx√xTCx

− θ.

Este gradiente tem um problema numérico, pois não está definido quandoxTCx = 0. Portanto, precisamos de uma análise mais cuidadosa para saber oque fazer quando isso acontece.

Se xTCx = 0, temos que, para o investimento x, a incerteza é nula. Isto somentepode acontecer quando todo o investimento se concentra no ativo livre de risco.Portanto, nesse caso, a variância é mínima e seu gradiente (Cx) também é zero.Logo, quando o programa de otimização pretenda avaliar o gradiente da funçãoobjetivo em um investimento totalmente concentrado no ativo livre de risco, eleencontrará uma operação 0/0 e procederá de maneira imprevisível.

Entretanto, nossa análise do problema revela que, quando isso acontece, a vari-ância é a mínima possível e, portanto, o desvio padrão também é o mínimo possível.Isto significa que é conveniente definir que o resultado dessa conta 0/0 é zero. Por-tanto, o “usuário inteligente” deve, no sua subrotina de gradiente, tomar em contaeste fato e “definir”:

∇σ(x) = 0 se σ(x) = 0.

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163

Vamos resolver o problema agora para diferentes valores de p, usando os mes-mos dados de covariância e médias dos capítulos anteriores. Usaremos, como antes,a subrotina Milonga.

Para p = 0 estaremos maximizando a média do retorno. Sabemos, neste caso,que o resultado deve ser a concentração de todo o investimento no ativo que, emmédia, oferece o maior retorno. Com efeito, usando Milonga obtemos:

Solução encontrada por Milonga:

0.00 0.00 0.00 100.00 0.00 0.00

Média do capital final: 237.77

Desvio padrão: 135.12

Média menos desvio: 102.65

Ou seja, todo o investimento foi concentrado no ativo 4, a média do retorno foimuito alta mas o desvio foi igualmente exagerado.

Para p = 1 minimizaremos a média menos um desvio padrão, ou seja, o per-centil 16 se a distribuição fosse normal. Neste caso, obtemos:

Solução encontrada por Milonga:

0.00 0.00 0.00 32.34 67.66 0.00

Média do capital final: 176.17

Desvio padrão: 56.53

Média menos desvio: 119.64

Vemos que, neste caso, a solução ótima consiste em investir aproximadamente aterceira parte do capital no ativo 4 e o resto no ativo 5. Com uma probabilidade de83 por cento (supondo normalidade) teremos um retorno maior que 19 por cento.Isto parece muito bom, mas se calcularmos a média menos dois desvios obteremosaproximadamente o valor 120 − 57 = 63. Isto significa que, com uma probabilidede 2.5 por cento perderemos mais que 37 por cento do nosso capital, o que podenão ser muito interessante em uma situação de aversão ao risco.

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164 Capıtulo 27. Outros problemas de tipo Markowitz

Para p = 2 obtemos:

Solução encontrada por Milonga:

0.00 0.00 0.00 0.00 0.00 100.00

Média do capital final: 100.00

Desvio padrão: 0.00

Média menos desvio: 100.00

Média menos 2 desvios: 100.00

Neste caso a otimização nos recomenda não fazer nada, ou seja, concentrartodo o investimento no ativo sem risco. A média do capital final permanecerá amesma mas, pelo menos, não teremos nenhuma incerteza. Naturalmente, o mesmoresultado é obtido para qualquer valor de p maior que 2.

Maximização da média com restrição no desvio padrão

Neste problema procuramos maximizar a média do retorno sujeita a que odesvio padrão deve ser menor que uma tolerância dada. Naturalmente, a restriçãoorçamentária se mantém, portanto o problema de otimização é:

Maximizar µ(x)

sujeita aσ(x) ≤ σtol,

n∑i=1

xi = M,x ≥ 0.

Como sempre, formulamos os problemas em termos de minimização e conver-temos as desigualdades em igualdades com variáveis de folga. Logo, temos n + 1variáveis (sendo n o número de ativos) e m = 2 restrições de igualdade:

Minimizar −n∑i=1

θixi

sujeita axTCx+ xn+1 − σ2

tol = 0,

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n∑i=1

xi = 100, x ≥ 0.

Observe que colocar σtol pequeno neste problema corresponde a colocar p grandeno problema da seção anterior.

Vamos resolver o problema para diferentes valores de σtol usando Milonga.

Para σtol = 5 obtemos a seguinte solução:

Solução encontrada por Milonga:

0.00 0.00 0.00 2.20 8.35 89.45

Média do capital final: 106.93

Desvio padrão: 5.00

Média menos desvio: 101.93

Para σtol = 10 obtemos:

Solução encontrada por Milonga:

0.00 0.00 0.00 4.40 16.70 78.90

Média do capital final: 113.86

Desvio padrão: 10.00

Média menos desvio: 103.86

Finalmente, para σtol = 20:

Solução encontrada por Milonga:

0.00 0.00 0.00 8.80 33.41 57.80

Média do capital final: 127.73

Desvio padrão: 20.00

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166 Capıtulo 27. Outros problemas de tipo Markowitz

Média menos desvio: 107.73

Maximização da média com restrição no percentil normal

Neste problema maximizamos a média do retorno sujeita a restrição de que amédia menos um múltiplo do desvio padrão é maior que uma tolerância dada pelointeressado. Ou seja, se trata de

Maximizar µ(x)

sujeita aµ(x)− pσ(x) ≥Mtol

en∑i=1

xi = 100, x ≥ 0.

A idéia é que, supondo uma distribuição normal dos retornos, podemos deduziro percentil que corresponde ao valor µ(x)− pσ(x) do capital final. Assim, a p = 0corresponde o percentil 50, a p = 1 corresponde o percentil 16, a p = 2 correspondeo percentil 2.5, a p = 3 corresponde 0.05 e assim por diante.

Logo, se resolvermos o problema de otimização definido nesta secção, digamoscom p = 2, obteremos um portfólio tal que a probabilidade de acabar com umcapital final menor que Mtol não excede 2.5 por cento.

Para ser resolvido com Milonga é necessário completar a segunda restrição comuma variável de folga xn+1, de maneira que o problema toma a forma:

Maximizarn∑i=1

θixi

sujeita an∑i=1

θixi − p√xTCx− xn+1 −Mtol = 0

en∑i=1

xi = 100, x1, . . . , xn, xn+1 ≥ 0.

Vamos resolver este problema com Milonga usando p = 2 e Mtol = 95. Istosignifica que queremos maximizar a média do retorno, com a restrição de que aprobabilidade de perder mais do que 5 por cento do capital investido não exceda2.5 por cento. Rodando Milonga obtemos:

Solução encontrada por Milonga:

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0.00 0.00 0.00 3.58 13.61 82.80

Média do capital final: 111.30

Desvio padrão: 8.15

Média menos desvio: 103.15

Média menos p desvios: 95.00

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168 Capıtulo 27. Outros problemas de tipo Markowitz

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Capıtulo 28

Valor de Risco (VaR)

O Valor de Risco (VaR) [7] é uma “medida de risco”. Suponha que, como resultadode uma atividade qualquer x, você tem m resultados possíveis. Frequentemente,estamos interessados em descobrir qual é o “pior resultado possível” para agir emconsequência. Entretanto, o “pior resultado possível” não fornece uma boa guiapara a ação, por dois motivos:

• O pior resultado possível é exageradamente improvável e, em última análise,nos conduz a não fazer nada. Por exemplo, sempre é possível sermos por umcarro desgovernado ao atravessar a rua. Evitar esse resultado levaria a nuncaatravessar ruas.

• Nunca possuímos uma listagem completa dos resultados possíveis. A medidaque acrescentamos resultados possíveis a uma lista, o pior resultado se deslocae fica cada vez pior. Portanto, o pior resultado possível depende do “tamanhode nossa amostra” de resultados, o que, de novo, é pouco funcional para atomada de decisões.

Estas considerações levam a “descartar” uma pequena porcentagem dos pio-res resultados possíveis na hora de examinar o pior que pode acontecer. O piorresultado possível que fica depois de descartar os 100−α% piores resultados é cha-mado “Valor de risco” (VaR) com confiança α%. Observe que α deve ser um valorgrande (próximo de 100), pois nos interessa eliminar somente um número pequenode resultados.

Estabelecendo um valor numérico para cada resultado e com a convenção deque, quanto maior o valor, pior o resultado, podemos identificar “resultados” com“perdas” ou “custos”. Se nossa convenção fosse a contrária (quanto maior o valor,melhor o resultado) falariamos de “ganhos” ou “retornos”.

O Valor de Risco é uma medida descritiva. Corresponde a um percentil grandepara a distribuição de perdas possíveis. O Valor de Risco com confiança α nada

169

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170 Capıtulo 28. Valor de Risco (VaR)

mais é do que o percentil α na distribuição de perdas.Se a distribuição de perdas for normal, o Valor de Risco pode ser deduzido da

média e do desvio padrão. Nesse caso, sabemos que:

• Média mais 1 desvio padrão corresponde a um VaR com α = 84.

• Média mais 2 desvios padrão corresponde a um VaR com α = 97.5.

• Média mais 3 desvios padrão corresponde a um VaR com α = 99.5.

Em geral, se conhecemos o tipo de distribuição teórica do vetor de perdas,podemos estabelecer relações similares às indicadas acima, depois de calculados osparâmetros definidores da distribuição, os quais, no caso normal, são a média e odesvio padrão.

A utilidade do Valor de Risco aparece quando não se conhece o tipo de dis-tribuição teórica do vetor de perdas. Ou seja, este vetor é uma amostra de certadistribuição, mas não sabemos qual é essa distribuição. No mundo real, atribuírerradamente um tipo de distribuição a uma amostra dada pode conduzir a erroscatastróficos, sobretudo quando se trata de lidar com valores extremos.

Por exemplo, consideremos a primeira coluna da matriz θ no Capítulo 6. Estacoluna corresponde aos retornos possíveis de investir uma unidade monetária noAtivo 1 considerado nesse capítulo. Temos 100 cenários possíveis. Vemos que ospiores resultados possíveis são, neste caso, 0.72, 0.74 e 0.75, que correspondem aperder 28 por cento, 26 por cento e 25 por cento do capital investido, respectiva-mente. Portanto, descartando o 2.5 por cento de piores resultados chegamos a umaperda de 25.5 (por cento). Ou seja, 25.5 é o percentil 97.5 desta distribuição deperdas.

Agora, a média de perdas nesta coluna é −11 (por cento) e o desvio padrão é21. Portanto:

Média + 2 desvios = 31.

Isto significa que o VaR que resulta do “verdadeiro” vetor de resultados, origi-nado na simulação baseada em dados reais, com precisão de 2.5 por cento, é iguala 25.5, entretanto o VaR estimado como se a distribuição fosse normal é 31. Nestecaso, a suposição de que a distribuição é normal nos conduz a “sobre-estimar operigo”.

Os grandes bancos calculam o VaR global relativo a seus investimentos diari-amente. Quando o VaR atinge valores críticos o banco vende ativos inseguros eos substitui por posições menos voláteis. Acordos internacionais (Basiléia) exigemque os bancos mantenham um rígido controle no VaR. Procura-se, desta maneira,evitar “efeitos dominó”. A falência de um banco pode ser um fato muito improvável,mas provoca a falência de outros. A simulação destes acontecimentos correlacio-nados e catastróficos é crucial para o bom funcionamento do sistema financeiro

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171

mundial. Dessa maneira, o VaR é uma importante medida de controle para a ati-vidade cotidiana destas instituições.

Exercício. Usando as outras colunas da matriz θ considerada no texto acima,compare os valores de VaR obtidos por inspecção da matriz com aqueles produtoda suposição de normalidade.

O problema da Coerência

Consideremos duas decisões possíveis, x e y. A decisão x∧y será definida comoa decisão conjunta e simultânea de x e y. Por exemplo, se x é “comprar 10 açõesda Petrobrás” e y é “comprar 20 ações da Vale”, então x ∧ y é “comprar 10 açõesda Petrobrás e 20 ações da Vale”.

O seguinte fato é bastante evidente:

Teorema. O pior resultado possível de x∧ y deve ser melhor ou igual que a somado pior resultado possível relacionado com x mais o pior resultado possível relaci-onado com y.

Prova. Suponhamos que o pior resultado possível (perda) de x ∧ y ocorre no ce-nário j. Para este cenário, a decisão x causa uma perda rx e a decisão y causauma perda ry. O resultado conjunto das duas decisões é rx + ry. Agora, rx é umdos resultados possíveis para a decisão x, portanto é menor (melhor) ou igual queo pior resultado possível dessa decisão. Analogamente, ry é menor ou igual que opior resultado possível da decisão y. Portanto, a perda rx + ry é menor ou igualque a soma da pior perda associada à x com a pior perda associada com y. QED

Como VaR procura ser uma versão sensata do “pior resultado possível”, seriacoerente que cumprisse a propriedade acima. Ou seja, seria desejável que o VaRrelacionado com x ∧ y fosse menor ou igual que a soma do VaR relacionado comx mais o VaR relacionado com y. Para α = 100 isto é realmente assim, pois nessecaso VaR coincide com “pior resultado possível”. De fato, para valores grandes deα tal propriedade continua sendo quase sempre válida. Entretanto, para valoresmenores de α a propriedade deixa de se cumprir. De fato, consideremos a situaçãoextrema α = 0. Suponhamos que temos 3 cenários, para os quais os resultadosconjuntos das decisões x e y (perdas) são:

Cenário 1: rx = 2, ry = 5, rx + ry = 7.

Cenário 2: rx = 7, ry = 3, rx + ry = 10.

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172 Capıtulo 28. Valor de Risco (VaR)

Cenário 3: rx = 11, ry = 4, rx + ry = 15.

Portanto, com α = 0 teriamos que o “VaR” associado a x seria 2 e o VaR asso-ciado a y seria 3. Sua soma é 5. Mas o VaR associado a x∧ y é 7, que é maior que5. Esta situação se repite em casos menos extremos.

Exercício. Suponha que, para i = 1, . . . , 10, a linha i da matriz R representa osresultados (perdas) rx, ry, rx de três decisões diferentes x, y, z.

R =

49.08 9.59 3.6947.02 9.06 3.4548.21 9.60 3.6345.91 9.12 3.5047.82 9.63 3.5448.70 9.78 3.4849.79 9.78 3.5148.58 9.80 3.3747.15 9.48 3.2247.91 9.73 3.11

Calcule os valores de α para os quais se cumpre que

V aR(x∧ y) ≤ V aR(x) + V aR(y), V aR(x∧ y ∧ z) ≤ V aR(x) + V aR(y) + V aR(x),

etcétera.

Por não ser sempre verdade que V aR(x ∧ y) ≤ V aR(x) + V aR(y) critica-se aVaR como medida de risco e diz-se que esta medida não é “coerente” [11].

Valor de Risco Condicional (CVaR)

Motivados pela possível falta de coerência de VaR, foi sugerida uma medidadiferente de risco [11], chamada “Valor de Risco Condicional”. Consideremos, denovo, que “resultados” significa “perdas”. Então o CVaR com confiança α porcento é a média dos resultados maiores que o percentil α. Ou seja, CVaR nadamais é do que a média das perdas maiores que VaR. Em consequência, o CVaRcom confiança α é sempre maior ou igual que o VaR con confiança α. Como con-sequência, CVaR também é uma aproximação do pior resultado possível que nãocresce artificialmente pelo aumento de tamanho da amostra. Por outro lado, resul-tados “exageradamente ruins”, que são descartados por VaR, têm uma influênciaem CVaR. No mundo financeiro, VaR é a medida favorita de risco e o impactoda introdução de CVaR é limitado. Entretanto, CVaR é uma medida muito bem

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173

conceituada no ambiente matemático. Vejamos agora que CVaR é uma medidacoerente.

Teorema. CVaR (x ∧ y) ≤ CVaR(x) + CVaR(y).

Prova. Seja α < 100. Suponhamos que temos m cenários 1, . . . ,m, os resultadospossíveis da decisão x são r1(x), . . . , rm(x), os resultados possíveis da decisãoy são r1(y), . . . , rm(y) e os resultados possíveis da decisão x ∧ y são r1(x) +r1(y), . . . , rm(x) + rm(y).

Seja p igual à parte inteira de α×m/100. (Por exemplo, se α = 97 e m = 1373,temos α×m/100 = 1331.81 portanto p = 1331.) Portanto, CVaR (com confiançaα) corresponde sempre à média dos m− p piores resultados.

Agora consideremos todas as somas dem−p números do conjunto r1(x), . . . , rm(x)e todas as somas de m − p números do conjunto r1(y), . . . , rm(y). A maior dassomas no primeiro conjunto será chamada S(x) e a maior das somas do segundoconjunto será chamada S(y).

Por último, consideremos todas as somas dem−p números do conjunto r1(x)+r1(y), . . . , rm(x) + rm(y) e chamemos S(x∧ y) à maior dessas somas. Claramente,

S(x ∧ y) ≤ S(x) + S(y).

Dividindo ambos membros da desigualdade acima por m− p obtemos o resultadodesejado. QED

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174 Capıtulo 28. Valor de Risco (VaR)

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Capıtulo 29

Otimizacao com restricaono Valor de Risco

O Valor de Risco (VaR) supera às combinações de média e variância para a avali-ação de investimentos porque sua manipulação e interpretação não pressupõe umtipo de distribuição particular para perdas ou retornos. Trata-se de uma medidaque se adapta bem à abordagem de risco por médio de cenários, sejam estes origi-nados numa simulação ou não.

O tomador de decisões, grande ou pequeno, deseja sempre saber quanto podevir perder e com que probabilidade. A sentença “Sua probabilidade de perder maisque x reais é de 0.1 por cento” se expressa, em termos de VaR como: “Seu VaRcom confiança 99.9 por cento é igual a x”.

O surgimento de problemas de otimização associados a VaR é, assim, tão na-tural como a aparição de problemas vinculados a médias e variâncias. Em geral,problemas de otimização associados com VaR são mais difíceis que os problemasde tipo Markowitz, mas as ferramentas modernas de otimização permitem um tra-tamento razoável para os mesmos.

A linguagem mais intuitiva e adequada para lidar com VaR é dada pelo conceitode “Valor Ordenado"introduzido e desenvolvido em [1, 10] (ver as referências de[10]).

Suponhamos que o vetor de perdas relacionado com uma decisão x ∈ IRn sevincula a m cenários e vem dado por

f1(x), . . . , fm(x).

Isto significa que a decisão x provocará a perda f1(x) sob o cenário 1, provocaráa perda f2(x) no cenário 2, e assim por diante.

Ordenando as perdas de menor a maior, teremos:

fi1(x)(x) ≤ fi2(x)(x) ≤ . . . ,≤ fim(x)(x).

Observe que tanto o valor da perda como a ordem entre as mesmas depende dadecisão.

175

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176 Capıtulo 29. Otimizacao com restricao no Valor de Risco

Se m é suficientemente grande, podemos identificar qualquer número entre 0 e100 com um inteiro p(α) entre 1 e m, por exemplo, definindo p(α) como a parteinteira de αm/100 + 1.

Adotando essa identificação, o VaR com confiança α pode ser escrito:

VaRα(x) = fip(x)(x).

Os cenários 1, . . . ,m estão geralmente definidos por diferentes n-uplas de pre-ços de ativos, caso no qual as funções de perda correspondentes são lineares. Entre-tanto, nada impede que estas funções tenham componentes não lineares, situaçãoque acontece quando pensamos que os preços dos ativos podem estar influenciadospelas decisões do investidor.

O problema de otimização de portfólios que mais se adequa ao emprego de VaRé aquele no qual o objetivo é maximizar a média do retorno sujeito a que o VaRcorrespondente não exceda uma tolerância dada. Usando a notação do Capítulo11, se trata de

Maximizarn∑j=1

θjxj

sujeita an∑j=1

θijxj ≥Mtol (29.1)

para pelo menos p valores diferentes de i, e

n∑j=1

xi = M,x ≥ 0.

A restrição (29.1) estabelece que, para pelo menos p cenários, o capital finalserá maior ou igual que Mtol. Portanto, para pelo menos p cenários, a perda serámenor ou igual que M −Mtol. Isto é equivalente a dizer que, ordenando as perdaspossíveis de menor a maior, a perda que aparece no lugar p deve ser menor ouigual que M −Mtol. Portanto, se trata de uma restrição sobre o VaR vinculado àdecisão x.

Escrevendof(x) = −

n∑j=1

θjxj,

fi(x) = −n∑j=1

θijxj +Mtol,

para i = 1, . . . ,m, o problema acima pode ser escrito na forma:

Minimizar f(x)

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177

sujeita afip(x)(x) ≤ 0,

h(x) ≡n∑j=1

xi −M = 0, x ≥ 0.

Um possível algoritmo para resolver este problema é dado em continuação.

Algoritmo

Seja x ≥ 0 um portfólio inicial, x = (x1, . . . , xn). Seja I ⊂ 1, . . . ,m umconjunto de p índices diferentes tais que

fi(x) ≤ fj(x)

sempre que i ∈ I, j /∈ I.

Passo 1.

Resolvemos, com Milonga, o problema de otimização

Minimizar f(x)

sujeita afi(x) ≤ 0 para todo i ∈ I,

h(x) = 0, x ≥ 0,

obtendo assim o portfólio x+.

Passo 2.Calculamos I+ ⊂ 1, . . . ,m um conjunto de p índices diferentes tais que

fi(x+) ≤ fj(x

+)

sempre que i ∈ I+, j /∈ I.Se I+ 6= I, definir I = I+, x = x+ e voltar ao Passo 1. Se I+ = I, terminar a

execução do algoritmo.

ExercícioImplementar o algoritmo introduzido nesta aula e comparar seus resultados com

os resultados do problema de maximizar o retorno com restrição percentil normal.

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178 Capıtulo 29. Otimizacao com restricao no Valor de Risco

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Capıtulo 30

Custos de transacao

Toda compra ou venda de ativos envolve custos de transação. Estes custos sereferem ao pagamento para corretores e intermediários, impostos, encargos buro-cráticos, etcétera. Via de regra, o custo duma transação é proporcional ao tamanhoda mesma.

Vamos supor que, para o ativo j, o custo de comprar ou vender por valor de xreais esse ativo é igual a τjx. Assim, no nosso problema padrão, onde partimos desituação onde o investidor tem “reais” e se limita a comprar ativos em um únicoinstante do tempo, a média do capital final passa a ser

µ(x) =n∑j=1

θjxj −n∑j=1

τjxj

e, para cada cenário i, o capital final sob as condições desse cenário será:n∑j=1

θijxj −n∑j=1

τjxj.

O efeito prático da existência de custos de transação em termos da otimizaçãode um portfólio é que tais custos inibem aplicações de curto prazo. Com efeito,ninguém faria uma aplicação com um retorno esperado de 0.5 por cento se o custoda transação fosse 1 por cento. Para compensar o custo da transação se precisaum tempo de aplicação maior.

Até agora, em nossos exemplos, consideramos situações ideais onde o investidortem, inicialmente, apenas “dinheiro” e precisa distribuír esse dinheiro entre dife-rentes aplicações. Ao mesmo tempo ele almeja otimizar seu retorno visando umdeterminado período fixo de tempo. Nessa situação idealizada, a inclusão de custosde transação nos problemas de otimização não oferece nenhuma dificuldade.

Exercício

179

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180 Capıtulo 30. Custos de transacao

Formule todos os problemas de otimização de portfólios considerados nestasnotas incluíndo custos de transação.

O caso mais interessante e realista é quando o investidor possui inicialmente, nãouma quantidade fixa de dinheiro M , mas esse dinheiro já distribuído em diferentesaplicações.

Em outras palavras, a condição inicial é que o investidor possui, a preços atuais,x

(0)1 reais investidos no Ativo 1, x(0)

2 reais investidos no Ativo 2, e assim por diante.Para ele passar a ter x1 reais no Ativo 1, ele vai precisar vender x(0)

1 −x1 reais desseativo, em caso de que x(0)

1 > x1 ou comprar esse ativo por valor x1 − x(0)1 reais no

caso de que x1 > x(0)1 . As duas operações envolvem o custo de transação.

Dessa maneira, o capital final associado ao “novo portfólio” (x1, . . . , xn) sob ocenário i não vai ser mais

∑nj=1 θijxj, mas

n∑j=1

θijxj −n∑j=1

τj|xj − x(0)j |.

Da mesma maneira, a média do capital final associado ao novo portfólio será:

µ(x) =n∑j=1

θjxj −n∑j=1

τj|xj − x(0)j |,

onde, como sempre,

θj =1

m

m∑i=1

θij, j = 1, . . . , n.

O problema de maximizar o retorno sujeito a restrição (VaR) de que pelo menosem p cenários o capital final seja maior ou igual que uma tolerância Mtol será, enconsequência:

Maximizarn∑j=1

θjxj −n∑j=1

τj|xj − x(0)j | (30.1)

sujeita an∑j=1

xj =n∑j=1

x(0)j , x ≥ 0,

e, para pelo menos p índices de cenários i:n∑j=1

θijxj −n∑j=1

τj|xj − x(0)j | ≥Mtol.

Observe que, neste problema, o capital inicial M é igual a∑nj=1 x

(0)j .

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181

A resolução deste problema com métodos de otimização apresenta dificuldadesporque a função módulo, que aparece na formulação, não é derivável.

Entretanto, vamos fornecer aqui uma abordagem sutilmente diferente e, emúltima instância, equivalente, onde essa dificuldade é removida.

Para isso, vamos escrever, para todo j = 1, . . . , n,

xj = x(0)j + cj − vj,

onde cj ≥ 0 é o valor da compra do ativo j e vj é o valor da venda decidida paraesse ativo. Por exemplo, se inicialmente o investidor possui 12500 reais investidosem ações da Petrobrás, a preço de hoje, e decide comprar por valor de 1200 reais,teremos cj = 1250, vj = 0, xj = 12500 + 1200 = 13700.

Então, em vez de (30.1) teremos o objetivo:

Maximizarn∑j=1

θj(x(0)j + cj − vj)−

n∑j=1

τjcj −n∑j=1

τjvj (30.2)

com as restrições:

n∑j=1

x(0)j + cj − vj = M, c ≥ 0, v ≥ 0, x(0) + c− v ≥ 0 (30.3)

en∑j=1

θij(x(0)j + cj − vj)−

n∑j=1

τjcj −n∑j=1

τjvj ≥Mtol. (30.4)

para pelo menos p cenários i.Como temos que

∑nj=1 x

(0)j = M , a restrição (30.3) é equivalente a

n∑j=1

(cj − vj) = 0, c ≥ 0, v ≥ 0, x(0) + c− v ≥ 0. (30.5)

Observamos que o problema (30.2–30.4) não apresenta dificuldades quanto anão-diferenciabilidade de função objetivo ou restrições. Ou seja, não aparecemmódulos nesta formulação.

Na solução do problema (30.2–30.4) teremos que, para cada par cj, vj um dessesdois números deve ser zero. Com efeito, se os dois forem diferentes de zero e secj ≥ vj, então substituíndo cj por cj − vj e vj por zero, teremos que as restriçõesserão igualmente satisfeitas mas a função objetivo melhorará. Analogamente nocaso em que vj ≥ cj. A interpretação deste fato é óbvia: a decisão “Comprar 120e vender 60 é pior que a decisão “Comprar 60” porque no primeiro caso pagamosmais custos de transação.

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182 Capıtulo 30. Custos de transacao

Como consequência deste fato, temos que, na solução de (30.2–30.4):

cj + vj = |cj − vj|

para todo j = 1, . . . , n e

n∑j=1

τjcj +n∑j=1

τjvj =n∑j=1

τj|cj − vj|.

Portanto, o problema (30.2–30.4) é equivalente ao seguinte problema:

Maximizarn∑j=1

θj(x(0)j + cj − vj)−

n∑j=1

τj|cj − vj| (30.6)

com as restrições:n∑j=1

cj − vj = 0, c ≥ 0, v ≥ 0 (30.7)

en∑j=1

θij(x(0)j + cj − vj)−

n∑j=1

τj|cj − vj| ≥Mtol. (30.8)

para pelo menos p cenários i.Como xj = x

(0)j + cj − vj, temos que cj − vj = xj − x(0)

j , portanto, fazendo assubstituições correspondentes em (30.6–30.8) recuperamos o problema inicial cujafunção objetivo é (30.1).

Em consequência, temos que (30.2–30.4) pode ser usado em substituição doproblema original para evitar a dificuldade de lidar com módulos.

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Capıtulo 31

Problemas com variosperıodos

Até agora consideramos problemas com “um período”, no sentido de que a decisãoera tomada em um instante do tempo e, num segundo instante, depois de certotempo, se fazia uma avaliação do resultado. Supunha-se que, entre esses doisinstantes, nenhuma decisão era tomada.

Vamos acrescentar agora um ponto intermediário no tempo. Ou seja, consi-deraremos, em princípio, dois períodos. Por exemplo, o primeiro período podeterminar daqui a um mes, e o segundo período pode ir desde o fim do primeiro atéum mes depois. Portanto, falaremos de 3 instantes, numerados 0, 1 e 2.

Precisaremos refinar nossa notação. Existirão dois momentos nos quais com-praremos ou venderemos ativos. Portanto, denotaremos, para cada j = 1, . . . , n,

c(0)j = quantidade (em moeda) do ativo j comprada no instante 0,v

(0)j = quantidade do ativo j vendida no instante 0,c

(1)j = quantidade do ativo j comprada no instante 1,v

(1)j = quantidade do ativo j vendida no instante 1.Consequentemente,x

(0)j +c

(0)j −v

(0)j será a quantidade de dinheiro investida no ativo j “imediatamente

depois de tomadas as decisões do instante 0”. Observe que temos as restriçõesnaturais:

x(0)j + c

(0)j − v

(0)j ≥ 0, c

(0)j ≥ 0, v

(0)j ≥ 0

para todo j = 1, . . . , n. Além disso:n∑j=1

c(0)j =

n∑j=1

v(0)j .

Para os cenários serão necessárias agora duas matrizes θ(1) e θ(2). O cenário icorresponderá à união da linha i de θ(1) com a linha i de θ(2).

A linha (θ(1)i1 , . . . , θ

(1)in ) representa os fatores de crescimento dos ativos entre o

instante 0 e o instante 1, sob o cenário i.

183

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184 Capıtulo 31. Problemas com varios perıodos

Analogamente, a linha (θ(2)i1 , . . . , θ

(2)in ) representará os fatores de crescimento dos

ativos entre o instante 0 e o instante 1, sob o cenário i.Portanto,

x(1,i)j ≡ θ

(1)ij [x

(0)j + c

(0)j − v

(0)j ]

denota a quantidade de dinheiro investida no ativo j imediatamente antes de tomaras decisões do instante 2, sob o cenário i.

Assim:x

(1,i)j + c

(1)j − v

(1)j

será a quantidade de dinheiro investida no ativo j imediatamente depois de tomaras decisões do instante 1, sob o cenário i. De novo, teremos a restrição

x(1,i)j ≥ 0

para todo j = 1, . . . , n, i = 1, . . . ,m e

n∑j=1

c(1)j =

n∑j=1

v(1)j .

Assim, ao chegar ao instante 2 teriamos, sob o cenário i,

x(2,i)j = θ

(2)ij (x

(1,i)j + c

(1)j − v

(1)j )

reais investidos no ativo j, para todo j = 1, . . . , n.Agora, queremos impor que, computando os custos das transações, no final do

primeiro período nosso capital não seja menor que M (0)tol para pelo p cenários. Isto

significa que teremos a restrição:

n∑j=1

x(1,i)j −

n∑j=1

τj(c(0)j + v

(0)j ) ≥M

(0)tol

para pelo menos p cenários.Analogamente, queremos que algo análogo aconteça no final do segundo pe-

ríodo. Logo, devemos incluír a restrição:

n∑j=1

x(2,i)j −

n∑j=1

τj(c(1)j + v

(1)j ) ≥M

(1)tol

para pelo menos p cenários. Estes devem ser os mesmos p cenários que os mencio-nados no final do primeiro período.

Assim, o conjunto de restrições do nosso problema de dois períodos está com-pleto. Somente falta definir uma função objetivo. Como sempre, procuraremos

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185

maximizar a média do capital final, descontando os custos da transação. Portanto,maximizaremos a função f(x, u, v) dada por

f(x, c, v) =1

m

m∑i=1

n∑j=1

x(2,i)j −

n∑j=1

τj(c(0)j + v

(0)j )−

n∑j=1

τj(c(1)j + v

(1)j ).

Número arbitrário do períodos

Suponhamos que trabalhamos agora com um número arbitrário T de instantesno tempo denotados por 0, 1, 2, . . . , T . Procuraremos usar uma notação simples eadequada para esta situação.

Para começar, vamos discutir a representação dos m diferentes cenários paraos fatores de crescimento. Como temos T períodos do tempo, vamos precisar de Tmatrizes de cenários θ(1), . . . , θ(T ). Todas estas são matrizes de m linhas (o númerode cenários) e n colunas (o número de ativos). A matriz θ(t) (t = 1, . . . , T ) contémos fatores de crescimento dos preços dos ativos entre o instante t − 1 e o instantet. Assim, se fixarmos um cenário i e um ativo j e o preço do ativo j no instante 0for πj, então, sob esse cenário, o preço desse ativo será:

πjθ(1)ij no instante t = 1,

πjθ(1)ij θ

(2)ij no instante t = 2,

...πjθ

(1)ij θ

(2)ij . . . θ

(T )ij no instante t = T .

Em geral, a matriz θ(t+1) ∈ IRm×n, t = 0, 1, . . . , T − 1, representa os fatores decrescimento dos n ativos entre o instante t e o instante t + 1, para os m cenáriosconsiderados.

Chamaremos x(t,i) ∈ IRn ao vetor de dinheiro possuido nos diferentes n ativosno instante t sob o cenário i.

No instante 0 o investidor possui suas posições distribuídas nos diferentes ativosde acordo com o vetor x(0,i) que é o mesmo vetor para todos os cenários i.

A relação entre x(t,i) e x(t+1,i), t = 0, 1, . . . , T − 1, é:

x(t+1,i) =

θ

(t+1)i1 (x

(t,i)1 + c

(t)1 − v

(t)1 )

...θ

(t+1)in (x(t,i)

n + c(t)n − v(t)

n )

(31.1)

Os vetores ct e vt representam as decisões de compra e venda tomadas no instantet. A relação (31.1) é a “equação de estado” do sistema e os vetores c(t), v(t) são os“controles”.

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186 Capıtulo 31. Problemas com varios perıodos

Naturalmente, devemos ter:n∑j=1

c(t)j −

n∑j=1

v(t)j = 0 (31.2)

para todo t = 0, 1, . . . , T − 1.As restrições sobre o VaR em cada instante do tempo estabelecem que, para

todo t = 0, 1, . . . , T − 1, e para pelo menos p índices de cenários i, se tem que:

n∑j=1

x(t+1,i)j −

t∑`=0

κt−`n∑j=1

τj(c`j + v`j) ≥M

(t)tol . (31.3)

O número κ > 1 está destinado a dar mais peso aos custos de transação nosprimeiros períodos. Com efeito, a restrição (31.3) está expressada em “reais doinstante t”, mas os custos c`, v` incidiram no instante ` ≤ t. Daí a necessidade deinflacionar esses justos adequadamente.

O termo∑t`=0

∑nj=1 τj(c

(`)j + v

(`)j ) é a soma total dos custos de transação até o

instante t.Além das restrições (31.1), (31.2) e (31.3) temos as restrições óbvias de não-

negatividade:x(t,i) ≥ 0 (31.4)

para t = 0, 1, . . . , T , i = 1, . . . ,m e

c(t) ≥ 0, v(t) ≥ 0, t = 0, 1, . . . , T − 1. (31.5)

Por último, nosso problema de otimização será completo estabelecendo umafunção objetivo adequada. O natural será maximizar a média do capital finaldescontando todos os custos de transação.

Ou seja, definiremos:

f(x, c, v) =1

m

m∑i=1

n∑j=1

x(T,i)j −

T−1∑t=0

κT−1−tn∑j=1

τj(c(t)j + v

(t)j ).

Como no caso de (31.3), o número κ > 1 é um dado destinado a dar maior peso aoscustos de transação relativos aos primeiros períodos. Em outras palavras, como aquantidade x(T )

j consiste em “reais” no instante T , os custos efetuados em instantesanteriores precisam ser inflacionados por uma taxa de juros adequada.

Assim, o problema de otimização do portfólio com vários períodos com custosde transação será:

Maximizar f(x, c, v) (31.6)

sujeita a (31.1), (31.2), (31.3), (31.4) e (31.5).

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187

Dificuldades e Simplificações

O problema (31.6) pode ser bastante complicado. A complicação mais óbvia sedeve a suas dimensões. Apesar de que as variáveis de controle são as c(t) e v(t), asvariáveis de estado x(t,i) também são variáveis do problema e contribuem a definirsua complexidade. Assim, o número de variáveis pode ser contabilizado da seguintemaneira:

Variáveis c(t)j e v(t)

j : uma variável para cada ativo e para cada instante do tempo.Total: 2nT .

Variáveis x(t,i)j : uma variável para cada ativo, cada instante do tempo e cada

cenário. Total: nTm.Portanto, o número de variáveis (sem contar as de folga) está dominado por

nTm. Se n = 100,m = 1000, T = 5 teremos 500 mil variáveis. Devido a (31.1),(31.2) e (31.3), o número de restrições é da mesma ordem.

Uma complicação adicional aparece pelas restrições (31.3) do tipo VaR. Estasrestrições nos dizem que, para pelo menos p índices de cenários i, e para todot = 0, 1, . . . , T − 1, devemos ter:

n∑j=1

x(t+1,i)j −

t∑`=0

κt−`n∑j=1

τj(c`j + v`j) ≥M

(t)tol .

Aqui deve ser enfatizado que os p cenários para os quais se cumpre (31.3) devemser os mesmos para todos os instantes t. Somente dessa maneira podemos dizerque a “ probabilidade de que o capital fique por debaixo de uma quantidade dadaem algum instante t” será menor que (m− p)/m.

Em aula anterior sugerimos uma estratégia para lidar com restrições do tipoVaR. Essencialmente, esta estratégia consistia no seguinte:

(a) Selecionar as p restrições que “mais (folgadamente) se cumprem” na apro-ximação atual da solução.

(b) Resolver o problema com essas p restrições, obtendo uma nova aproximação.Observar as restrições que melhor se cumprem nesta aproximação e, se coincidiremcom as selecionadas em (a), parar. Em caso contrário, repetir (a).

Para resolver o problema atual podemos proceder de maneira parecida, masa dificuldade é que, no novo caso, cada cenário está associado, não a uma únicarestrição, mas a um conjunto de T restrições, uma para cada instante de decisão.Logo, não é tão fácil selecionar os p cenários onde as restrições melhor se cum-prem. Quando se selecionam p restrições basta ordenar um conjunto de m valoresnuméricos. Entretanto, não é possível ordenar vetores de menor a maior.

Esta dificuldade nos leva a re-formular o esquema do algoritmo anterior da se-guinte maneira:

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188 Capıtulo 31. Problemas com varios perıodos

(a) Dada a aproximação atual para a solução do problema, selecionar p cenáriosde maneira que todas as restrições de tipo VaR associadas a eles sejam satisfeitasda melhor maneira possível, ou, no caso de que restrições não sejam satisfeitas, quesejam pouco violadas.

(b) Proceder como no caso (b) indicado acima.

Observe que agora definimos (a) de maneira ambígua. A seleção dos p melhorescenários não é inequívoca. Algum sistema de pesos asociados às restrições internasde cada cenário deve ser estabelecido para essa seleção, ou alguma hierarquia en-tre as restrições deve ser considerada. Uma heurística razoável para escolher umahierarquia pode consistir em dar prioridade a restrições que estão temporalmentemais perto do momento presente.

Supondo que as dificuldades associadas à escolha (a) foram superadas, o pro-cesso de resolução do problema passa por uma sequência de problemas de Progra-mação Linear. Pacotes modernos para esta disciplina permitem lidar com númerosmuito grandes de variáveis e restrições, portanto o algoritmo sugerido acima setorna factível.

Uma simplificação por meio da qual o problema (31.6) se reduz a um únicoproblema de programação linear vem do seguinte princípio heurístico:

“Numa amostra de m elementos números reais ordenados de menor a maior, onúmero que aparece no lugar p ≈ m pode ser aproximado como o maior númerode uma amostra de q números, para um valor de q adequado menor que m”.

A aplicação deste princípio nos leva a uma simplificação importante: Em vez deconsiderar o problema (31.6) comm grande e p < m, consideraremos (31.6) com umvalor mais modesto para o número de cenários, e definindo p = m. Desta maneira,as restrições (31.3) não serão mais restrições do tipo VaR, mas restrições linearesordinárias e o próprio problema será um único problema de Programação Linear,com um número menor de variáveis e restrições. Naturalmente, os argumentoscontra esta simplificação surgem da dificuldade de decidir o tamanho da amostramenor.

De todos modos, a simplificação pode conduzir, se não à solução final do pro-blema, a uma boa aproximação inicial para a solução do mesmo.

Um tema que merece alguma discussão é o seguinte. Em nossas formulaçõesde problemas de vários períodos os custos de transação não são descontados dasvariáveis de capital, nem do capital disponível. O modelo funciona como se taiscustos fossem pagos com um caixa adicional que não aparece no problema e nãointerfere com o portfólio principal. Procedemos desta maneira para não complicaro modelo introduzindo termos não diferenciáveis nas equações de estado. De fato,podemos pensar que o sistema funciona com “o caixa auxiliar”, porque isto é sufi-

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189

cientemente realista e, sobretudo, este é um modelo destinado a orientar decisõese não um modelo de planificação. Isto significa que, ao rodar o modelo “hoje”,procuramos obter somente “a melhor decisão para hoje” apesar de que o modelonos fornece as melhores decisões para os próximos períodos. Obviamente, seriasuicida comprometer hoje todas as decisões de períodos futuros, porque o decorrerda realidade pode nos fornecer dados novos amanhã. Assim, o modelo de váriosperíodos orienta as decisões de hoje com uma perspectiva de médio ou longo prazo,mas o uso correto envolve sua alimentação permanente com dados novos e novasrodadas no futuro imediato.

Exercício. Formule o problema deste capítulo usando “restrições no percentilnormal” em vez de restrições VaR. Discuta o tamanho, vantagens e dificuldades donovo problema.

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190 Capıtulo 31. Problemas com varios perıodos

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Capıtulo 32

O preco justo de umcontrato

Caso 1.O Senhor A assina um documento que diz: “Pagarei ao portador da presente a

quantidade de 1000 reais o dia 31 de dezembro de 2009”. O possuidor deste docu-mento, pode vendê-lo. Qual é o preço justo para essa venda? Claramente, supondoabsoluta credibilidade do Senhor A e supondo dinheiro constante, ou seja, elimi-nando juros, o o preço justo seria 1000 reais. Na vida real, certamente seria algomenos que isso, pois você poderia ter algo mais interessante para fazer com 1000reais que comprar a promissória assinada pelo Senhor A, por exemplo, depositaros 1000 reais na poupança. De todos modos, este tipo de operação se faz cotidi-anamente em qualquer mercado, seja com documentos deste tipo ou com chequespre-datados.

Caso 2.O Senhor A assina um contrato que diz: “Pagarei ao portador da presente a

quantidade de 1000 reais o dia 31 de dezembro de 2009, em caso de que a corridade São Silvestre seja vencida por um brasileiro”. Quanto você pagaria por umdocumento desse tipo? Certamente, menos que 1000 reais, pois a probabilidadede um brasileiro vencer a São Silvestre é menor que 100 por cento. Pagaria maisque 1 real? Provavelmente sim, porque a história indica que os brasileiros vencema São Silvestre em mais de um caso de cada 1000. O que você certamente faria,antes de comprar um documento desse tipo, seria estimar a probabilidade de umbrasileiro ganhar a São Silvestre. Se esta probablidade fosse, digamos, 0.15, e vocêfosse possuidora do documento, você ganharia 1000 reais com probabilidade 15 porcento e nada com probabilidade 85 por cento. Logo, sua média de ganho no dia 31de dezembro seria 150 reais. Disto resulta que o “preço justo” do documento seria150 reais.

De fato, o procedimento delineado acima pode ser usado em sentido “inverso”.

191

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192 Capıtulo 32. O preco justo de um contrato

Suponhamos que desejamos estimar a probabilidade de que um brasileiro vença aprova de São Silvestre, sem usar nenhum dado do passado. Então, fazendo o papeldo “Senhor A”, oferecemos a um grupo de pessoas um contrato pelo qual cada umadelas receberá de nós a quantidade de 1000 reais, em caso de que, com efeito, a SãoSilvestre seja vencida por um brasileiro. Dessa maneira “vendemos” esses contratospelo preço que as pessoas estejam dispostas a pagar. Assim, será criado um “mer-cado” de tais contratos, cujo preço variará ao longo do tempo, pois tais contratospoderão ser negociados e re-negociados até 31 de dezembro. Se, em determinadadata, o preço pelo qual os contratos são negociados é de q reais, podemos estimarque q = 1000p, onde p é a probabilidade que o mercado estima para a vitória deum brasileiro na São Silvestre. Existe uma corrente de pesquisadores que achamque, de fato, este é um excelente método para estimar probabilidades.

Exercício O professor desta disciplina oferece um prêmio de dois pontos na notafinal para aqueles que passem determinado teste. Quanto você está disposta apagar, em termos de pontos na nota final, para comprar esse contrato? Observeque os contratos serão leiloados e que, depois de que você esteja em posse de umcontrato, você poderá negociá-lo com outros colegas.

Caso 3.O Senhor A assina o contrato: “Pagarei ao portador 5000 reais se o carro do Se-

nhor B for roubado até o dia 31 de dezembro”. Você poderia arguír: Quem estariainteressado em possuír esse contrato a não ser o Senhor B? Bom, isso é irrelevante.Do ponto de vista de ganhar ou perder dinheiro, qualquer pessoa poderia estarinteressada nesse contrato, e o fato do senhor B ser o cliente mais provável é me-ramente psicológico. Acaso você não aceitaria esse documento caso lhe fosse dadode graça? Pois bem, se aceitaria de graça quer dizer que ele vale alguma coisa.Qual seria o preço justo? De novo, devemos estimar a probabilidade do carro deSenhor B ser roubado até 31 de dezembro. Se essa probabilidade fosse p então opreço justo da promessa seria, como no Caso 2, 5000p. A diferença, neste caso, éque a probabilidade muda a medida que o tempo passa. Se estivéssemos em 30 dedezembro, esta probabilidade seria muito menor que hoje, portanto tal contratonão valeria quase nada.

Caso 4.Agora o contrato assinado pelo Senhor A diz: “Pagarei 1000 reais ao portador,

se o Palmeiras obtiver pelo menos 70 pontos no final do campeonato brasileiro defutebol”. Já sabemos a resposta: o preço justo é 1000p, onde p é a probabilidade dePalmeiras obter mais que 70 pontos. Essa probabilidade não é simples de calcular,mesmo sob a hipótese simplificadora de que as probabilidades de empate, vitóriae derrota são as mesmas. Entretanto, Podemos fazer as seguintes observações:

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193

1. Se estivéssemos no dia final do campeonato, depois da última apitada do juiz,todo estaria decidido. Esse dia o contrato valeria 1000 reais se Palmeirasobteve mais de 70 pontos e zero em caso contrário.

2. Em outras palavras, se chamamos x à variável “número de pontos do Palmei-ras”, t ao número de rodada (sendo T a última rodada), e u (função de x, t)ao preço do contrato, diriamos que:

u(x, T ) = 1000 se x ≥ 70

eu(x, T ) = 0 se x < 70.

3. Agora, se estamos no tempo T − 1, que podemos dizer sobre o preço da pro-messa? Supondo que as chances de vitória, empate e derrota são as mesmas,e lembrando que vitória vale 3 pontos e empate vale zero, então, se Palmeirasjá atingiu 70 pontos na ante-última rodada, a probabilidade dele atingir 70pontos é igual a 1 no final do campeonato, portanto:

u(x, T − 1) = 1000 se x ≥ 70.

Se, na rodada T − 1 Palmeiras atingiu 69 pontos, então, com probabilidade2/3 (empate ou vitória na última rodada) atingirá os 70 pontos, portanto:

u(x, T − 1) = (2/3)× 1000 = 666.66 se x = 69.

Da mesma maneira, se antes da última rodada Palmeiras tem 68 pontos, suaprobabilidade de atingir 70 será 1/3 (somente com vitória no último jogo). Amesma coisa acontecerá se Palmeiras tem 67 pontos na anteúltima rodada.Logo:

u(x, T − 1) = (1/3)× 1000 = 333.33 se x ∈ 67, 68.Finalmente, se Palmeiras chegar à última rodada com 66 pontos, não poderáatingir 70. Logo,

u(x, T − 1) = 0 se x < 67.

4. Vamos agora a analisar a rodada T − 2. Suponhamos que Palmeiras chegacom 66 pontos a essa rodada. Portanto, suas chances são:

(a) Atingir 69 pontos na rodada T-1 com probabilidade 1/3.

(b) Atingir 67 pontos na rodada T-1 com probabilidade 1/3.

(c) Ficar com 66 pontos na rodada T-1 com probabilidade 1/3.

Em consequência, se Palmeiras chega com 66 pontos à rodada T − 2, o pos-suidor do contrato terá, nas suas mãos:

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194 Capıtulo 32. O preco justo de um contrato

(a) Um contrato que vale 666.66 reais com probabilidade 1/3.(b) Um contrato que vale 333.33 reais com probabilidade 1/3.(c) Um contrato que vale 0 reais com probabilidade 1/3.Isto significa que o preço justo do contrato u(66, T − 2) será

(1/3)666.66 + 1/3(333.33) = 333.33 reais .

Assim por diante, estabeleceremos qual é o preço justo do contrato u(x, T−2)para todo x. É fácil ver que o que fizemos nada mais é do que aplicar afórmula:

u(x, T − 2) =u(x+ 3, T − 1) + u(x+ 1, T − 1) + u(x, T − 1)

3.

5. De fato, podemos usar uma fórmula análoga para as rodadas anteriores,obtendo:

u(x, t) =u(x+ 3, t+ 1) + u(x+ 1, t+ 1) + u(x, t+ 1)

3.

Como estas fórmulas podem ser calculadas recursivamente, é fácil completarum panorama completo indicando o preço justo do contrato para qualquer rodadae independentemente do número de pontos atual do Palmeiras.

Caso 5.O Senhor A assina um contrato onde se compromete a pagar 1000 reais ao

portador se o famoso futebolista “Ronaldo o Fenômeno” estiver abaixo dos 90 kilosno dia 31 de dezembro. Ronaldo se compromete a divulgar seu peso diariamente,mensurado diante de testigos idôneos. Para simplificar, vamos supor que o pesodo Ronaldo sempre é medido em valores inteiros (kilogramas). A pergunta quedevemos responder previamente é: Se o peso de Ronaldo hoje for de x kilos, qualé a distribuição de probabilidade de seu peso amanhã? Suponhamos que estasprobabilidades são:

50 por cento de ficar no mesmo peso25 por cento de aumentar um kilo25 por cento de diminuír um kiloA variabilidade sobre o peso de Ronaldo amanhã se denomina “volatilidade”.

Evidentemente, na data T de execução do contrato (31 de dezembro) o preço docontrato é igual a 1000 reais se Ronaldo pesar menos de 90 kilos e zero se pesarmais. Os preços nos dias T − 1, T − 2, etcétera podem ser calculados pelo mesmoprocedimento que usamos para o caso dos pontos do Palmeiras. Isto conduz àfórmula seguinte:

u(x, t) = 0.25u(x− 1, t+ 1) + 0.5u(x, t+ 1) + 0.25u(x+ 1, t+ 1).

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195

Da mesma maneira que no caso do Palmeiras, podemos calcular o preço justo destecontrato para todos os tempos t por um simples procedimento recursivo.

Caso 6.O Senhor A oferece um contrato pelo qual o portador receberá x − 1000 reais

em caso de que o preço de uma vaca no dia 31 de dezembro (chamado aqui x)ultrapasse 1000 reais. Observe que este contrato é “equivalente” a oferecer a opçãode comprar uma vaca por 1000 reais em 31 de dezembro. Com exemplo, tantofaz o Senhor A pagar ao portador x − 1000 reais como vender ao portador umavaca por 1000 reais, depois de ter comprado essa vaca no mercado por x reais.Reciprocamente, tanto faz para o portador receber uma vaca pela qual paga 1000reais, como receber x − 1000 reais, pois com esse dinheiro pode, somando seuspróprios 1000 reais, ir ao mercado e comprar a vaca por x reais. (Descontando,claro, os problemas de acomodar a vaca no seu apartamento!)

Contratos desse tipo se denominam “opções de compra”.“Opções de venda” são contratos parecidos. Neste caso, o portador recebe

1000−x reais em caso de que o preço da vaca x no dia 31 de dezembro seja menorque 1000 reais, e nada em caso contrário. De novo, podemos interpretar que oSenhor A está se comprometendo a vender uma vaca por 1000 reais ao portadorno dia 31 de dezembro.

Nada impede a invenção de contratos de opções combinadas. Por exemplo, oSenhor A se compromete a pagar ao portador x−1100 reais em caso de que o preçoda vaca x seja maior que 1100 reais e, ao mesmo tempo, se compromete a pagar900 − x reais em caso de que o preço da vaca seja menor que 900 reais em 31 dedezembro. Compradores deste tipo de opção estão querendo “se proteger” contravariações excessivas do preço da vaca.

Os contratos de opções são mais atraentes para os especuladores que a operaçãocom os ativos dos quais essas opções dependem. Por exemplo, suponhamos que oSenhor B acredita fortemente que o preço da vaca (se quiser se livrar da incomo-didade física de lidar com tais animais pode pensar que “vaca” é o nome de umpacote de ações) vai subir muito até 31 de dezembro. Supondo que o preço atualda vaca fosse 1000 reais, isso o levaria a comprar uma vaca hoje e vender o dia 31de dezembro. Assim, se a vaca passasse a valer x > 1000 reais em 31 de dezembro,o Senhor B ganharia x− 1000 reais nesta operação. Ele perderia 1000−x reais emcaso de que suas previsões não se confirmassem. Agora, comparemos esta operaçãocom a representada por “comprar uma opção de compra vaca com preço gatilho de1000 reais e vencimento 31 de dezembro”. Em caso de confirmação de previsões, oSenhor B também receberia x− 1000 reais em 31 de dezembro. Por outro lado, elenão perderia nada em caso do preço em 31 de dezembro ser menor que 1000 e, oque é mais importante, para começar a operação ele não precisaria ter 1000 reais.Bastaria que ele tivesse o suficiente para “comprar a opção”, não para comprar a

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196 Capıtulo 32. O preco justo de um contrato

vaca. Observações deste tipo são as que levam a alguns economistas a criticar adeterminação do governo brasileiro de “taxar o capital estrangeiro” que entra nabolsa, apontando sua possível inutilidade. Os críticos afirmam que, se for taxadoo capital a ser investido em ações, o capital virá igualmente por ter as mesmasexpectativas de lucros, mas como investimento em “derivativos” (leia-se “opções”neste caso).

Mas voltemos ao problema de determinação do preço justo. Independentementede se tratar de uma opção de compra ou venda ou uma combinação das mesmas, oque caracteriza ao contrato do qual falamos aqui é que o Senhor A se compromete,o dia 31 de dezembro, a pagar ao portador uma quantidade de dinheiro u(x, T ),dependendo do preço x que outro ativo X venha a ter (X = “a vaca”, no exemplo)no dia T (31 de dezembro). Conceitualmente falando, a função u(x, T ) pode serqualquer coisa. O pior que pode acontecer é que ninguém esteja interessado emcomprar esse contrato, mas isso não é problema nosso. O que nos interessa é quetrabalhamos com uma hipótese de credibilidade absoluta, ou seja, o Senhor A comcerteza cumprirá seu compromisso no dia T . Observe que u(x, T ) poderia atéser uma constante, e isto tem sentido econômico. Nesse caso, o contrato é umapromissória que o Senhor A assina em favor do portador.

Seguindo nossa metodologia anterior, suponhamos que o ativo X tem o preçox no tempo T − 1. Qual deve ser o preço do contrato nesse caso? Dependeda expectativa sobre o preço do ativo X no tempo T . Se o ativo X tem “umavolatilidade igual a σ”, o preço do ativo no tempo T terá uma distribuição deprobabilidade com uma dispersão medida por σ. Vamos supor a hipótese maissimples: que o ativo subirá com taxa 100σ por cento ou cairá 100σ por centocom igual probabilidade. No primeiro caso, o preço do contrato no tempo T seráu(x+σx, T ) e, no segundo caso, esse preço será u(x−σx, T ). Portanto, em média,o possuidor do contrato possuirá

u(x− σx, T ) + u(x+ σx, T )

2

reais no instante T . Em consequência, o preço justo do contrato no dia T − 1 será

u(x, T − 1) =u(x− σx, T ) + u(x+ σx, T )

2.

Desta maneira, podemos calcular qual é o preço justo do contrato para todos ospreços possíveis x no instante T − 1. Naturalmente, o mesmo procedimento nosserve para calcular os preços justos no tempo T − 2, T − 3, . . .:

u(x, t) =u(x− σx, t+ 1) + u(x+ σx, t+ 1)

2.

Para ser mais realistas, temos de introduzir uma complicação adicional. Ospreços possíveis para o ativo X no tempo T, supondo que o preço no tempo T − 1

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fosse x, não podem ser, com igual probabilidade, x − σx e x + σx porque, nessecaso, seria melhor em média investir os x reais em um ativo sem risco que compraro contrato. Se investirmos x reais em um ativo sem risco hoje, teremos (1 + r)xreais amanhã. A plausibilidade da transação nos leva a hipótese de que a médiade retorno no ativo X seja a mesma que a do ativo sem risco. Isto significa que osvalores possíveis equiprováveis para o ativo X no tempo T devem ser (1+r)(x−σx)e (1 + r)(x + σx). Em consequência, nos sentimos tentados a dizer que o preçojusto do contrato no tempo T − 1 deve ser

u(x, T − 1) =u((1 + r)(x− σx), T ) + u((1 + r)(x+ σx), T )

2.

Mas isto não é totalmente correto. A forma mais fácil de entender que esta fórmulaestá incompleta vem de pensar “o caso da promissória”. Ou seja, o caso em que,“independentemente do valor da vaca” u(x, T ) = 1000. O membro da direita dafórmula acima dá, obviamente, 1000, mas todos sabemos que a promessa de receber1000 reais amanhã não vale, hoje, 1000 reais, mas um pouco menos, porque setivéssemos 1000 reais hoje não os investiriamos na promessa de de receber 1000reais amanhã, mas no ativo livre de risco. Em consequência, o que deve valer 1000reais é o resultado de aplicar o preço do contrato hoje no ativo livre de risco. Emoutras palavras:

(1 + r)u(x, T − 1) =u((1 + r)(x− σx), T ) + u((1 + r)(x+ σx), T )

2.

E, em geral:

(1 + r)u(x, t) =u((1 + r)(x− σx), t+ 1) + u((1 + r)(x+ σx), t+ 1)

2.

Usando esta fórmula recursivamente podemos obter o “preço justo” do contratopara todos os valores de t anteriores. Esta é a “fórmula de retro-difusão”, a partirda qual pode ser deduzida a famosa equação diferencial Black-Scholes [3, 6].O Jogo dos Derivativos

Este é um jogo coletivo e seu objetivo é ganhar a maior quantidade de possívelde dinheiro a custas dos outros jogadores. Exige um Coordenador e um númeroindeterminado de jogadores. O Coordenador, uma vez por minuto e durante 50minutos, divulga o preço de um ativo A. No minuto zero o ativo vale 50 reais. Nominuto k + 1, o preço do ativo aumenta uma unidade ou diminui uma unidadeem relação ao minuto k, com iguais probabilidades. É sensato que o Coordenadorcalcule o novo preço usando uma moeda bem equilibrada. Cada jogador ofereceráaos outros contratos pelos quais pagará uma quantidade de dinheiro ao portadorem função do preço final do ativo A. Ou seja, cada jogador inventa seu produto

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198 Capıtulo 32. O preco justo de um contrato

financeiro, como uma função de pago dependente do preço final do ativo A, e tentavender seu produto aos outros jogadores. Todo jogador pode comercializar umaquantidade indeterminada de produtos. Os contratos podem ser negociados entreos jogadores ao longo dos 50 minutos do jogo. O jogo admite muitas variações,por exemplo, em uma delas os jogadores não conhecem o mecanismo pelo qual ossucessivos valores do ativo são gerados.

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Capıtulo 33

Black-Scholes

Este capítulo reflete uma compreensão e interpretação caseira da fórmula Black-Scholes, realizada no final de semana 12-13 de agosto de 2006.

Seja X um ativo dado qualquer. Representaremos com x o preço desse ativo.A variável t, por outro lado, será o tempo, medido (para fixar idéias) em dias.

Um derivativo é um ativo cujo preço u depende exclusivamente do preço x e dotempo t. Ou seja, u = u(x, t).

Por exemplo, um derivativo do ativo dólar é o direito de comprar um dólarno dia 31 de dezembro por 2.30 reais. Se Pirulo compra esse direito de Mengano,então, o dia 31/12, Mengano será obrigado a vender um dólar por 2.30 reais aPirulo, se o Pirulo quiser comprar.

Qual é o preço razoável para esse direito? Em outras palavras, quanto devepagar Pirulo a Mengano por esse direito hoje, 14 de agosto?

Evidentemente, esse preço “justo” depende do preço do dólar hoje, e do númerode dias que falta para o vencimento.

Se hoje fosse 30/12 e o valor do dólar hoje fosse 2 reais, a opção de comprarpor 2.30 amanhã não valeria nada. Mas se o valor do dólar hoje fosse 2.60, a opçãode comprar por 2.30 amanhã seria bastante atraente, portanto cara.

Se hoje fosse exatamente 31 de dezembro, e o valor do dólar fosse 2.20, Pirulonão pagaria nada pelo direito de comprar por 2.30. Mas se o valor do dólar hojefosse 2.40, o direito de comprar um dólar por 2.30 vale exatamente 0.10 reais.

A fórmula Black-Scholes fornece uma relação entre u, x e t que serve paraestabelecer o preço razoável do derivativo, dados x e t.

Aqui procuraremos derivar a fórmula partindo de um princípio muito simples.

Princípio da difusão retroativa: O preço de um derivativo no dia t + 1 deveser “na média” igual ao preço “real” no dia t.

Uma justificativa para este princípio me parece ser a seguinte: Suponhamos

199

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200 Capıtulo 33. Black-Scholes

que o preço “real” do ativo base hoje é 200 e que o preço esperado para amanhã,na média, também é 200. Suponhamos que o preço do derivativo hoje é 10. Se opreço médio real do derivativo amanhã fosse maior que 10, o possuidor de açõesdo ativo base teria a oportunidade de vender suas ações hoje, e comprar unidadesdo derivativo, vendendo as unidades do derivativo amanhã e recomprando maisações do ativo-base. Ou seja, haveria um ganho sem risco, o que não é admissível.A situação oposta aconteceria em caso de que o preço do derivativo amanhã fossemenor que 10. Portanto, para satisfazer a hipótese de que ganhos sem risco nãosão possíveis, temos de admitir o “Princípio”.

Vejamos os desdobramentos deste princípio. Que significa o preço do derivativo“na média”?

A qué média nos estamos referindo? Média em relação a qué?O que queremos dizer é que no dia t + 1 conhecemos o preço do ativo X, não

exatamente, mas com certa probabilidade. Dessa distribuição de probabilidadeconhecemos uma medida de dispersão, proporcional a x, digamos, σx. Assim, demaneira muito simplificada, dados x e t+1, embora o preço do derivativo se definacomo u(x, t+ 1), o “Preço na média” será dado por

u(x− σx, t+ 1) + u(x+ σx, t+ 1)

2.

O “Princípio” diz que esta média deve ser igual ao preço “real” do derivativo nodia t, para o mesmo valor de x. Em princípio, pareceria que este preço é u(x, t).Entretanto, aqui falamos de preço real, ou seja, tanto x como u devem ser pensadosem valores “verdadeiros” ou “atualizados” em relação ao dia seguinte. (Em termosbrasileiros diriamos “descontando a inflação do dia”.) Isto significa que existe umaaplicação livre de todo risco que dá uma taxa de juros diária igual a r. Nossoprincípio se refere à “moeda” definida por essa aplicação.

Portanto, os x reais no dia t+ 1 equivalem a x1+r

reais no dia t. E os u reais nodia t equivalem a (1 + r)u reais no dia t+ 1.

Logo, o “o preço real” no tempo t não é u(x, t), mas:

(1 + r)u(

x

1 + r, t).

Agora estamos em condições de escrever algébricamente o “Princípio”.

u(x− σx, t+ 1) + u(x+ σx, t+ 1)

2= (1 + r)u

(x

1 + r, t). (33.1)

A fórmula (33.1) reflete o Princípio e pode ser usada para estabelecer o valordo derivativo em função de t recursivamente, conhecidos os valores de u(x, T ) paraum T fixo.

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33.1. O caso “European Call Option” 201

Entretanto, prosseguiremos o raciocínio para ver como chegamos a Black-Scholes.Por (33.1), e usando que, sendo r pequeno, 1

1+r≈ 1− r,

u(x− σx, t+ 1) + u(x+ σx, t+ 1)− 2u(x, t+ 1)

2= (1+r)u

(x−rx, t

)−u(x, t+1).

Como σx é pequeno, podemos substituír u(x− σx, t + 1) + u(x + σx, t + 1)−2u(x, t+ 1) por ∂2u

∂x2(x, t+ 1)σ2x2.

Como rx também é pequeno, substituímos u(x− rx, t) por u(x, t)− ∂u∂x

(x, t)rx.Logo,

1

2

∂2u

∂x2(x, t+ 1)σ2x2 = (1 + r)[u(x, t)− ∂u

∂x(x, t)rx]− u(x, t+ 1).

Como r é pequeno, desprezando r2, obtemos:

1

2

∂2u

∂x2(x, t+ 1)σ2x2 = u(x, t)− u(x, t+ 1) + ru(x, t)− ∂u

∂x(x, t)rx.

Ou seja,

u(x, t+ 1)− u(x, t) +∂u

∂x(x, t)rx+

1

2

∂2u

∂x2(x, t+ 1)σ2x2 = ru(x, t).

Esta é a fórmula Black-Scholes, discretizada no tempo com ∆t = 1. Substituindo1 por ∆t, temos:

(u(x, t+ ∆t)− u(x, t))/∆t+∂u

∂x(x, t)rx+

1

2

∂2u

∂x2(x, t+ ∆t)σ2x2 = ru(x, t).

E, fazendo ∆t tender a zero:

∂u

∂t(x, t) +

∂u

∂x(x, t)rx+

1

2

∂2u

∂x2(x, t)σ2x2 = ru(x, t).

Esta é a fórmula Black-Scholes.

33.1 O caso “European Call Option”

O raciocínio da seção anterior, baseado no Princípio da Difusão Retroativa, dáorigem à seguinte EDP:

∂u

∂t+∂u

∂xrx+

1

2

∂2u

∂x2σ2x2 = ru. (33.2)

Em geral, esta equação não tem solução analítica. Entretanto, há casos par-ticulares em que tem. Este é o caso do derivativo denominado "European CallOption".

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202 Capıtulo 33. Black-Scholes

Suponhamos, como acima, que temos um ativo X cujo preço representamos porx. O derivativo U associado a X será “o direito de comprar uma unidade de X pelopreço K no tempo T ”. K é chamado “strike price” e T é o “tempo de expiração”.

A condição inicial (na realidade, final) é o preço do derivativo na data deexpiração. Obviamente, este preço final é:

u(x, T ) = max0, x−K. (33.3)

Vamos exibir uma solução analítica para (33.2) com a condição (33.3). Istosignifica que vamos exibir uma função u(x, t) que satisfaz (33.3) para todo x > 0 eque satisfaz (33.2) para todo x > 0, t < T .

Para isso, vamos definir a função de distribuição normal acumulada:

N(y) =1√2π

∫ y

−∞e−τ

2/2dτ.

Afirmamos que a função definida abaixo é uma solução de (33.2)–(33.3):

u(x, t) = xN(d1)−Ke−r(T−t)N(d2), (33.4)

onded1 =

ln(x/K) + (r + σ2/2)(T − t)σ√T − t

,

d2 = d1 − σ√T − t.

Observe que u(x, t) está bem definida para x > 0 (dado que K > 0) e T > t.Verificar que (33.4) resolve (33.2)–(33.3) significa derivar e verificar (33.2) e

substituir para verificar (33.3). Na substituição para verificar (33.3) temos umapequena dificuldade porque, estritamente falando, d1 e d2 não estão definidas parat = T . Entretanto, é fácil ver que

d1 = d2 =∞ se x > K

ed1 = d2 = −∞ se x < K.

Logo, em (33.4) temos:

u(x, T ) = xN(∞)−KN(∞) = x−K se x > K

eu(x, T ) = xN(−∞)−KN(−∞) = 0 se x < K.

Ou seja, a condição (33.3) se verifica.

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33.1. O caso “European Call Option” 203

A verificação de (33.2) resulta de derivar cuidadosamente (33.4) e ver que (33.2)se cumpre.

Acrescentamos aqui os detalhes dessa verificação, generosamente providencia-dos por Gabriel Haeser:

u(x, t) = xN(d1)−Ke−r(T−t)N(d2)

d1 =ln(x/k) + (r + σ2/2)(T − t)

σ√T − t

d2 = d1− σ√T − t

Calculando∂u

∂x:

∂u

∂x= N(d1) + x

∂N(d1)

∂x− ke−r(T−t)∂N(d2)

∂x

= N(d1) + xN ′(d1)∂d1

∂x− ke−r(T−t)N ′(d2)

∂d2

∂x

∂d1

∂x=∂d2

∂x=

(k/x)(1/k)

σ√T − t

=1

xσ√T − t

Logo∂u

∂x= N(d1) +

1

σ√T − t

(N ′(d1)− ke−r(T−t)N ′(d2)

x)

Escrevendo N ′(d2) em função de N ′(d1):

ke−r(T−t)

xN ′(d2) =

ke−r(T−t)

x

1√2πe−

d22

2

=k

xe−r(T−t)

1√2πe−(d1−σ

√T−t)2

2

=k

xe−r(T−t)

1√2πe−d12

2+d1σ

√T−t+σ2(t−T )

2

Como N ′(d1) =1√2πe−d12

2 temos que:

ke−r(T−t)

xN ′(d2) =

k

xN ′(d1)ed1σ

√t−T+(r+σ2

2)(t−T )

Substituindo a expressão de d1, temos que d1σ√t− T + (r +

σ2

2)(t − T ) =

ln(x/k), assim:

ke−r(T−t)

xN ′(d2) = N ′(d1)

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204 Capıtulo 33. Black-Scholes

Então∂u

∂x= N(d1)

Calculando∂2u

∂x2:

∂2u

∂x2=∂N(d1)

∂x= N ′(d1)

∂d1

∂x=

N ′(d1)

xσ√T − t

.

Calculando∂u

∂t:

∂u

∂t= xN ′(d1)

∂d1

∂t− ke−r(T−t)N ′(d2)

∂d2

∂t− ke−r(T−t)rN(d2)

Comok

xe−r(T−t)N ′(d2) = N ′(d1) temos

∂u

∂t= xN ′(d1)

(∂d1

∂t− ∂d2

∂t

)− ke−r(T−t)rN(d2)

Mas∂d2

∂t=∂d1

∂t+

σ

2√T − t

Logo

∂u

∂t= −xN ′(d1)

σ

2√T − t

− ke−r(T−t)rN(d2)

Substituindo∂u

∂x,∂2u

∂x2e∂u

∂tna equação de Black Scholes temos:(

−xN ′(d1)σ

2√T − t

− ke−r(T−t)rN(d2)

)+ N(d1)rx +

1

2

(N ′(d1)

xσ√T − t

)σ2x2 =

r(xN(d1)− ke−r(T−t)N(d2))

E todos os termos se cancelam, logo u(x, t) verifica a equação.

33.2 Formula para Opcao de Venda (European Put Option)

A condição final para uma Opção de Venda é

u(x, T ) = max0, K − x.

A solução analítica de Black-Scholes com essa condição final é:

u(x, t) = Ke−r(T−t)N(−d2)− xN(−d1),

onde d1 e d2 estão dados como na seção anterior.

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33.3. Programa para calcular o preco de Opcoes de Compra e Venda, tipo Europeu205

Exemplo:Calcular o preço justo da opção de venda de um dólar por 2.30 reais no dia

19/1/2007. (Hoje é 19/10/2006.) Considere que a volatilidade mensal é de 10 porcento e que a taxa mensal de juros sem risco é de 0.5 por cento.

Vamos medir o tempo em meses. Portanto, T − t = 3.Pelos dados do problema temos:K = 2.30x = 2.18 (Cotação do dólar hoje)r = 0.005σ = 0.1d1 = −0.0136d2 = −0.309.N(−d1) = 0.4458N(−d2) = 0.3785Ke−r(T−t)N(−d2)− xN(−d1) = 0.20 reais.

33.3 Programa para calcular o preco de Opcoes de Compra eVenda, tipo Europeu

c Programa callput.forinteger tiporeal tt, sigma, r, K, x, d1, d2, nd1, nd2real Nwrite(*, *) ’ Tipo de opcao? (1: Compra (call); 2: Venda (put)’read(*, *) tipowrite(*, *) ’ Tempo ate o vencimento (T - t): ’read(*, *) ttwrite(*, *)’ Coeficiente de volatilidade sigma:’read(*, *) sigmawrite(*, *)’ Taxa de juros sem risco r:’read(*, *) rwrite(*, *)’ Preco comprometido na execucao (Strike Price):’read(*, *) Kwrite(*, *)’ Preco Hoje do ativo base:’read(*, *) xd1 = ( alog(x/K) + (r + sigma**2/2.) * tt ) / (sigma * sqrt(tt))d2 = d1 - sigma * sqrt(tt)if(tipo.eq.1) thenu = x * N(d1) - K * exp(- r * tt) * N(d2)elseu = K * exp(-r * tt) * n(-d2) - x * N(-d1)

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206 Capıtulo 33. Black-Scholes

endifwrite(*, *)’ Valor da Opcao segundo Black-Scholes:’, ustopendreal function N(x)real xN = (erf(x*sqrt(2.)/2.) + 1.)/2.returnend

33.4 Uso de Simulacao

As estimativas de preço justo de uma opção fornecidas pelo Princípio de DifusãoRetroativa, ou a equação Black-Scholes, não usam a provável distribuição futurados preços do ativo base.

Entretanto, usando ferramentas de simulação, podemos obter essa distribuiçãoe usá-la para obter preços mais realistas da opção.

Suponhamos, por exemplo, que nos interessa uma opção de venda (Put Option)de tipo Europeu de um ativo-base X, cujos preços simulados na data de vencimentosão (x1, . . . , xm).

Isto significa que, na data de vencimento, os preços simulados da opção decompra são ((x1 − K)+, . . . , (xm − K)+). Assim, na média, o preço da opção nadata de vencimento será:

P =1

m

m∑i=1

(K − xi)+.

Logo, se vocé não tivesse a alternativa de botar o dinheiro da poupança comtaxa r, e você fosse indiferente ao risco, qualquer valor abaixo de P seria bompara comprar a opção hoje. Ou seja, o preço justo hoje seria P . Entretanto,como você tem a opção de depositar o dinheiro na poupança, o preço justo seráQ = P/(1 + r)T−t. Isto faz que (desconsiderando o risco) para você seja a mesmacoisa comprar uma opção ou depositar o dinheiro na poupança.

Vamos aplicar este “método” ao exemplo da seção anterior.Suponhamos que, por simulação, os valores possíveis do dólar daqui a 3 meses

são:

2.00, 2.05, 2.11, 2.13, 2.14, 2.16, 2.18, 2.19, 2.19, 2.20, 2.22, 2.25, 2.29, 2.31, 2.32.

Portanto,

P =1

15(0.30+0.25,+0.19+0.17+0.16+0.14+0.12+0.11+0.10+0.08+0.05+0.01) = 0.112.

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33.5. Influencia da Volatilidade 207

Considerando r = 0.005, teriamos:

Q = 0.112/(1 + r)3 = 0.11.

33.5 Influencia da Volatilidade

Os resultados obtidos podem levar o leitor cético a pensar que, afinal de contas, opreço justo de uma opção de compra ou de venda (call-option ou put-option) podeser aproximado pelo seguinte “algoritmo”:

(a) Chute o preço mais provável do ativo na data de vencimento.(b) Calcule, usando (a), o preço mais provável da opção na data de vencimento.(c) Faça o desconto, usando r.Este algoritmo tosco usa todas as informações requeridas por Black-Scholes

exceto σ. Portanto, o experimento interessante é descobrir como é a dependênciado preço da opção segundo Black-Scholes, em relação à taxa de volatilidade σ.

Voltemos ao problema de calcular o preço justo da opção de venda de um dólarpor 2.30 reais no dia 19/1/2007. (Hoje é 19/10/2006.) com uma taxa mensal dejuros sem risco é de 0.5 por cento. Já vimos que, para σ = 0.1 (volatilidade de 10por cento mensal), o preço Black-Scholes é 0.20.

Para diferentes valores de σ os resultados são os seguintes:σ = 0 Preço da Opção segundo Black-Scholes:0.0086σ = 0.05 Preço da Opção segundo Black-Scholes:0.15σ = 0.10 Preço da Opção segundo Black-Scholes:0.20σ = 0.15 Preço da Opção segundo Black-Scholes:0.28σ = 0.20 Preço da Opção segundo Black-Scholes:0.35σ = 0.25 Preço da Opção segundo Black-Scholes:0.43σ = 0.30 Preço da Opção segundo Black-Scholes:0.50σ = 0.35 Preço da Opção segundo Black-Scholes:0.57σ = 0.40 Preço da Opção segundo Black-Scholes:0.65σ = 0.45 Preço da Opção segundo Black-Scholes:0.72σ = 50 Preço da Opção segundo Black-Scholes:0.79Vemos que o preço da opção aumenta com a taxa de volatilidade. Isto pode

ser facilmente interpretado: Quanto mais volátil for o ativo, mais chances existemde que, no vencimento, ele venha a ter um valor muito baixo, situação na qual aopção vai ser executada e o comprador ganhará muito dinheiro. Portanto, a opçãovale mais quanto maior for a volatilidade.

33.6 Problemas Inversos

Pois é. Papai Noel não existe. Sinto muito.Vocês pensavam que um processo físico, químico ou económico era modelado

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208 Capıtulo 33. Black-Scholes

por uma equação diferencial e que, resolvendo essa equação diferencial se sabia oque iria acontecer.

Mas isso quase nunca é assim. As malditas equações diferenciais têm, quasesempre, parâmetros cujo valor não se conhece e que, frequentemente, significamcoisas que somente tem sentido pelo contexto da própria equação diferencial.

Descobrir quais têm que ser esses parâmetros é o problema, e esse tipo deproblema é o que se chama um “Problema Inverso”. Um Problema Inverso é umproblema onde você sabe qual é a solução, mas não o problema. (Esta é a definiçãoinformal de “Inverse Problem” na Enciclopédia Britannica.)

Neste caso, o parâmetro rebelde é σ, a etérea “volatilidade”. Afinal de contas,que é essa “volatilidade”? Sejamos cínicos: é o que deve ser para que a equação deBlack-Scholes dê o resultado que deve dar. É duro? A verdade sempre é dura.

Neste caso, devido a que estimamos o preço da opção por um método bastanteinformativo, o de Simulação, sabemos que tal preço deve ser igual a 0.11. Baseadosnisso, fazemos a pergunta fatídica: Qual é o parâmetro de volatilidade que faz comque a solução de Black-Scholes dê um preço igual a 0.11? Felizmente, neste casoobtemos a solução por mero ensaio e erro: σ = 0.04.

Será que vale a pena? Tudo vale a pena, se a alma não é pequena, dizia o poeta.Usando este σ podemos calcular, quem sabe, o preço de outras opções similaressem necessidade de fazer novas simulações.

Matemática Aplicada é uma arte.

33.7 Mudando a Escala

Na equação Black-Scholes supomos que o tempo está medido em alguma unidadefixa. Se mudarmos a unidade de tempo, os coeficientes da equação devem mudarde alguma maneira.

A maneira como deve mudar a taxa de juros sem risco r é óbvia pois, porexemplo, se r1 é a taxa mensal, é óbvio que a taxa diária r é tal que (1+r)30 = 1+r1.Assim, se r1 = 0.005 teremos que r = 0.000166265. Da mesma maneira, o valor deT − t que era igual a 3 (meses), deve passar a ser igual a 90 (dias).

A Volatilidade σ também deve mudar se a unidade de tempo é mudada. Quantomenor a unidade de tempo, menor deve ser σ mas, como σ é um parâmetro miste-rioso, não temos uma fórmula para essa mudança.

Para saber qual é o σ que deve ser usado para a unidade de tempo "dias",rodamos o programa com diferentes sigmas com a unidade dias, até obter o mesmoresultado que com a unidade “meses”. Lembrando que, com a unidade “meses” opreço da opção de nosso exemplo resultava ser 0.11, chegamos a conclusão que o σque deve ser usado para a unidade “dias” é 0.007.

Será que este resultado foi fruto do mero acaso? De fato, não. Lembremos aequação Black-Scholes:

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33.8. Aposta com Felipe e Andre 209

∂u

∂t+∂u

∂xrx+

1

2

∂2u

∂x2σ2x2 = ru

E suponhamos que u1(x, t) é a solução da equação quando t é medido em meses.Portanto:

∂u1

∂t+∂u1

∂xrx+

1

2

∂2u1

∂x2σ2x2 = ru1.

Dividindo ambos termos por 30, obtemos:

1

30

∂u1

∂t+∂u1

∂x

r

30x+

1

2

∂2u1

∂x2

σ2

30x2 =

r

30u1.

Mas a derivada de u1 em relação à variável “dias” é 1/30 vezes a derivada de u1

em relação à variável “meses”. Portanto, o que a equação acima diz é que a equaçãoBlack-Scholes se cumpre medindo o tempo em dias, se a taxa de juros diária ér/30 e a volatilidade diária é σ/

√30. Agora, r/30 é uma boa aproximação para

a taxa de juros diária, portanto, “deduzimos” que a volatilidade diária é σ/√

30.No nosso exemplo, tinhamos que a volatilidade mensal era σ = 0.04, portantoσ/√

30 = 0.007303, o que coincide com nossa estimativa empírica.Seguindo este raciocínio, a volatilidade anual σa deve responder à regra:

σa/√

12 = σ.

Portanto, neste caso, a volatilidade anual é 0.139.

33.8 Aposta com Felipe e Andre

Felipe e André acreditam que os resultados fornecidos numericamente pelo prin-cípio de Retrodifusão não são parecidos aos obtidos pela equação Black-Scholes.Motivados pela sua impetuosidade juvenil, não acreditam que a equação Black-Scholes se derive do princípio de Retrodifusão. Eu apostei um milhão de dólarescom eles que, de fato, a recursão (33.1) representa uma discretização da equaçãoBlack-Scholes.

Para isso, vamos fazer um experimento numérico.Resolver (33.1) com r 6= 0 é meio chato. Portanto, vamos fazer um programinha

que serve somente para r = 0. Aplicando a fórmula Black-Scholes a nosso exemplode sempre com r = 0 obtemos que o preço da opção hoje seria 0.1377. Veremosse conseguimos reproduzir esse número usando um programa para calcular (33.1).Suspense!

O programa é o seguinte:

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210 Capıtulo 33. Black-Scholes

c Programa Principio.fordouble precision x(601), u(601), sigma, K, unew(601)integer i, ttwrite(*, *)’ sigma = ’read(*, *) sigmawrite(*, *)’ Strike price=’read(*, *) Kwrite(*, *)’ T - t =’read(*, *) ttx(301) = 1.d0do i = 1, 300x(300+i+1) = x(300 + i)* (1.d0 + sigma)x(300-i+1) = x(300-i+2)*(1.d0 - sigma)end dowrite(*, *)’ x(1) = ’, x(1),’ x(300)=’, x(300)write(*, *)’ x(500) =’, x(500),’ x(601)=’, x(601)do i = 1, 601u(i) = dmax1(K - x(i), 0.d0)end dodo i = 1, ttdo j = 2, 600unew(j) = (u(j-1) + u(j+1))/2.d0end dodo j = 2, 600u(j) = unew(j)end doend dodo j = tt+1, 600-ttwrite(*, *)’ x = ’, x(j), ’ u = ’, u(j)end dostopend

Rodando este programa com σ = 0.007, T − t = 90, K = 2.30, obtemos, nasaída, todos os valores do Preço da Opção, para os diferentes preços atuais doAtivo Base, pelo Princípio da Retrodifusão (com r = 0).

Pois bem, para o valor 2.18 do ativo base, o preço justo da opção resulta ser0.13059, bem perto de 0.1377, que é o valor dado pela fórmula Black-Scholes.

Com isto, deixo por conta de Felipe e André a decisão de como vão pagar aaposta.

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33.9. Investindo em Opcoes 211

33.9 Investindo em Opcoes

Suponhamos que temos 10000 reais e que desejamos investir, durante 90 dias, nossodinheiro em tres possibilidades: O Ativo D, A Opção de Compra pelo Ativo D eA Opção de Venda do Ativo D. As opções de tipo Europeu com vencimento daquia 90 dias. Nossas variáveis de decisão serão:

y1: número de unidades que compraremos do ativo.y2: número de Call-Options que compraremos do ativo.y3: número de Put-Options que compraremos.K1: strike price para as Call-Options.K2: strike price para as Put-Options.Observem que nós mesmos decidimos K1 e K2. Ou seja, nós decidimos quais

são os strike prices das opções que vamos comprar. Para simplificar, estamospensando em comprar Call-Options com um único Strike Price, e a mesma coisacom Put-Options, mas isto poderia ser diferente.

Nosso dado principal é π, o preço atual do ativo D. Vamos supor que π = 2.18.Também suporemos uma taxa de juros sem risco mensal r igual a 0.005.

A quantidade de dinheiro que nós investiremos hoje será:

G = y1π + y2Pcall(K1) + y3Pput(K2),

onde Pcall(K1) é o preço da Call para o Strike Price K1 e Pput(K2) é o preço daPut para o Strike Price K2.

Vamos supor que os preços das opções estão bem representados pela fórmulaBlack-Scholes (o que pode demandar, a priori, um ajuste do parâmetro de volati-lidade σ a preços de mercado). De fato, a fórmula Black-Scholes funcionaria comoum “spline inteligente” para interpolar preços de mercado.

Obviamente,G = G(y1, y2, y3, K1, K2)

e nosso problema terá a restrição:

G ≤ 10000

e as restrições óbvias y1, y2, y3, K1, K2 ≥ 0.Depois dos 90 dias somos “obrigados” a vender todo nosso investimento. Por-

tanto, nessa data, receberemos a soma Sk das seguintes quantias:

(10000−G)(1 + r)3,

y1πk,

y2 max0, πk −K1,

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212 Capıtulo 33. Black-Scholes

y3 max0, K2 − πk.

Aqui, πk é o preço do ativoD na data de vencimento. Este preço é desconhecido,em princípio, e existe um preço diferente para cada cenário k.

Isto significa que, sob o cenário k, teremos uma perda igual a 10000− Sk.Escrevendo

fk(y1, y2, y3, K1, K2) = 10000− Sk,

podemos identificar o problema clássico de investir com alguma consideração parao risco. Assim, poderemos usar a aproximação tipo Markowitz, ou VaR, ou CVaR,ou qualquer outra que acharmos conveniente.

Observe que a informação sobre os “preços hoje” aparece na restrição mas nãoprecisa aparecer na função objetivo. O objetivo é maximizar Sk, ou seja, maximizaro dinheiro que terei no fim dos 90 dias.

Como exercício, podemos usar os seguintes cenários (ou outros) para os preçosdo ativo na data de vencimento:

2.00, 2.05, 2.11, 2.13, 2.14, 2.16, 2.18, 2.19, 2.19, 2.20, 2.22, 2.25, 2.29, 2.31, 2.32.

Suponhamos que decidimos comprar 1000 unidades do ativo. Isso vai custar2180 reais. Se o ativo não aumentar seu preço acima do investimento sem risco(governado pela taxa r) vamos perder dinheiro. Logo, para eliminar essa possibi-lidade, compramos 1000 put-options com strike price 2.15. Se o ativo subir muitode preço queremos aproveitar essa oportunidade tendo a opção de comprar baratono fim do periodo. Portanto, compramos 10000 call-options com strike-price 2.20.O resto do dinheiro (se sobrar alguma coisa), depositamos na poupança livre derisco. Vamos fazer as contas:

1. Como foi dito acima, na compra do ativo gastaremos 2180 reais.

2. Usando o programinha callput, vemos que o preço-hoje da put-option deveser 0.033 reais (supondo σ = 0.04, r = 0.005). Portanto, na compra dasput-options gastaremos 33 reais.

3. Da mesma maneira, o preço-hoje da call-option deve ser 0.067 reais. Portanto,na compra das call-options gastaremos 670 reais.

4. Dos cálculos acima, resulta que sobrarão 10000 − 2180 − 33 − 670 = 7117reais.

Agora, vejamos quanto teremos no final do periodo. Isto depende do cenário,ou seja, do preço do ativo no final do periodo. Para começar, como resultado daaplicação de 7117 reais sem risco, teremos 7117× 1.0053 = 7224 reais.

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33.10. A Operacao Borboleta 213

Se o preço do ativo na data de vencimento for 2.19 reais, como resultado davenda do próprio ativo obteremos 2190 reais. A call-option con strike price 2.20não vale nada, paciência. A put-option com strike price 2.15 também não valenada. Portanto, no final do periodo terei 7224 + 2190 = 9414 reais. Mau negócio.

Assim, por ensaio e erro, ou por métodos de otimização mais sofisticados, vocêpode decidir seu investimento ótimo. Lembre que você não tem um único cenárioe que o risco deve ser considerado.

33.10 A Operacao Borboleta

Uh, isto é muito difícil.Primeiro, precisamos entender o significado de Vender uma Call-Option. Em

princípio, você deve pensar, como eu pensava, que para “vender uma call-option”se precisa “ter” uma call-option no bolso, ir ao mercado e vender.

Mas não é (somente) assim. Com efeito, para vender uma Call-Option, ninguémprecisa ter uma Call-Option no bolso. De fato, “vender uma Call-Option” é amesma coisa que você assinar um compromisso de venda do ativo-base com umcomprador que “compra” a call-option, no sentido usual.

Ou seja, se Felipe compra uma call-option de mim, isto significa que eu doupara Felipe um papel onde me comprometo a vender uma unidade do ativo paraFelipe na data do vencimento (se for tipo Europeu) pelo strike price especificadono papelzinho. Por esse papelzinho Felipe vai me pagar um preço (geralmentecalculado por Black-Scholes). A partir desse momento, Felipe poderá negociaresse papel no mercado. Em particular, poderá vender a Call-Option no sentidointerpretado no começo.

Por que ambas interpretações são financeiramente equivalentes? Simplesmenteporque envolvem a mesma transferência de dinheiro entre as mesmas pessoas. Nosdois casos o “comprador” dá o mesmo dinheiro para o “vendedor”. Quem é a pessoaque fica com o compromisso de venda no final do periodo é irrelevante.

No final do periodo, a pessoa que assina a call-option está obrigada a vendero ativo pelo strike price indicado no papel. Na prática, isto significa que estáobrigada a comprar de volta a call-option. (É a mesma coisa.)

Muito bem, agora vamos ver se entendemos a Operação Borboleta. Esta con-siste no seguinte: Eu desejo comprar duas call-options de certo ativo por strikeprices 2.10 e 2.30 respectivamente. Mas, ai!, não tenho dinheiro. Então, resolvovender duas call-options por strike-price 2.20 para Felipe, para financiar a compradas duas call-options.

Como fico na data de vencimento? Depende qual venha a ser o preço de mercadodo ativo-base nessa data. Vejamos:

1. Se o preço x do ativo base na data de vencimento for menor que 2.10 minhas

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214 Capıtulo 33. Black-Scholes

duas call-options não valem nada. Por outro lado, as duas call-options queFelipe (ou outra pessoa) também não vale nada. Ou seja, no final do periodonão pagarei nem receberei nada.

2. Se o preço x do ativo base na data de vencimento estiver entre 2.10 e 2.20,uma das minhas call-options não vale nada e a outra vale x− 2.10. As call-options que Felipe tem continuam sem valer nada. Portanto, neste caso,recebo x− 2.10 reais.

3. Se o preço x do ativo base na data de vencimento estiver entre 2.20 e 2.30,uma das minhas call-options vale x− 2.10 e a outra não vale nada. As duascall-options de Felipe, por outro lado, valem x − 2.20 cada uma. Portanto,eu receberei x− 2.10 e pagarei 2× (x− 2.20). O saldo, a meu favor é

x− 2.10− 2(x− 2.20) = x− 2.10− 2x+ 4.40 = −x+ 2.30.

4. Se o preço x do ativo base na data de vencimento for maior que 2.30, umadas minhas call-options vale x − 2.10 e a outra vale x − 2.30, enquanto asduas call-options de Felipe valem x − 2.20 cada uma. Portanto, meu saldoserá:

(x− 2.10) + (x− 2.30)− 2(x− 2.20) = −4.40 + 4.40 = 0.

Parece que este é um tipo de operação bastante interessante porque eu nãoaposto nem que o ativo valerá “mais” do que algo, nem que valerá “menos” quealgo. No fundo, estou apostando para ganhar se o ativo vai ter um valor proximoao preço das Call que vendi para Felipe, mas não ganho nem perco nada se eletiver valores muito diferentes.

Vejamos um exemplo, com T − t = 3 meses, r = 0.005, σ = 0.04, Preço doativo hoje= 2.18, como sempre. Usando o programa callput, vemos que, hoje:

Preço da Call com strike price 2.10 = 0.13.Preço da Call com strike price 2.20 = 0.067.Preço da Call com strike price 2.30 = 0.028.Portanto, no momento de decidir minha operação borboleta, tenho que desem-

bolsar somente0.13 + 0.028− 2× 0.067 = 0.024 reais .

Se eu tiver sorte, e o preço do ativo for 2.20 na data de vencimento, receberei,nessa data, 0.10 reais. Portanto, terei lucrado 0.076 reais. Isto é, mais de 3 vezeso capital invertido!

Não sei o que estamos fazendo aqui em vez de ir todos a realizar operaçõesborboleta!

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Capıtulo 34

Minimizacao de CVaR

Em capítulos anteriores vimos que usar VaR como restrição é bastante viável.Entretanto, VaR como função objetivo não é tão fácil. Isto significa que o problemade Markowitz de minimizar o desvio padrão sujeito a restrições na média não é fácilde generalizar e resolver com o uso de VaR em vez do desvio padrão. A razão éque a não-diferenciabilidade e não-convexidade da função VaR se levanta comouma dificuldade difícil de ser trasposta.

Nesta aula veremos que, no caso de CVaR, as dificuldades são bem menores.Sejam f1, . . . , fm números reais tais que

f1 ≤ . . . ≤ fm.

Seja p ∈ 1, . . . ,m.Definimos

F (ξ) = (m− p)ξ +∑fi≥ξ

(fi − ξ)

para todo número real ξ.

Teorema.Se p < m, o conjunto de minimizadores de F (ξ) é o intervalo [fp, fp+1] com ovalor mínimo

∑mp+1 fi. Se p = m o conjunto de minimizadores é [fp,∞) com o

valor mínimo igual a zero.

Prova. Prove que nos conjuntos de minimizadores indicados a função toma o valormencionado. Depois, prove que, à direita, a função vale mais, e à esquerda, afunção também vale mais.

Agora suponhamos que f1(x), . . . , fm(x) são funções reais definidas em x ∈ Ω.Para cada x ∈ Ω, ordenamos estas funções de menor a maior, na forma:

fi1(x)(x) ≤ . . . ≤ fim(x)(x).

215

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216 Capıtulo 34. Minimizacao de CVaR

Consideremos o seguinte problema:

Minimizar fip+1(x)(x) + . . .+ fim(x)(x) s. a. x ∈ Ω. (34.1)

Este se denomina Problema de Minimizar CVaR.Pelo Teorema, para resolver este problema é suficiente minimizar, em relação a

x ∈ Ω, o mínimo em relação a ξ de (m− p)ξ +∑fi(x)≥ξ(fi(x)− ξ).

Isto éMinimizar

x∈ΩMinimo

ξ(m− p)ξ +

m∑i=1

max0, fi(x)− ξ.

Ou, equivalentemente,

Minimizarx∈Ω,ξ∈R

(m− p)ξ +m∑i=1

max0, fi(x)− ξ.

Este problema pode ser expressado assim:

Minimizarx,z,ξ

(m− p)ξ +m∑i=1

zi

sujeito a x ∈ Ω, zi ≥ 0, zi ≥ fi(x)− ξ, i = 1, . . . ,m.Se as funções fi(x) forem lineares e o conjunto Ω for um politopo, este é um

problema de Programação Linear.

Agora consideremos o problema:

Minimizar fip(x)(x) s. a. x ∈ Ω. (34.2)Este se denomina Problema de Minimizar VaR.Pelo Teorema, dado x ∈ Ω, sabemos que fip(x)(x) é o menor valor de ξ que

minimiza (m− p)ξ +∑mi=1 max0, fi(x)− ξ.

Portanto, o problema (34.2) consiste em

Minimizar ξ

sujeita a x ∈ Ω e à condição de que ξ é minimizador de (m−p)ξ+∑mi=1 max0, fi(x)−

ξ.Isto é, o problema (34.2) consiste em

Minimizar ξ

sujeita a x ∈ Ω e à condição de que ξ resolve o PL dado por

Minimizarξ,z

(m− p)ξ +m∑i=1

zi

sujeita a zi ≥ 0, zi ≥ fi(x)− ξ, i = 1, . . . ,m.Esta formulação corresponde à reformulação do problema OVO introduzida

(com outros argumentos) em [2].

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Capıtulo 35

Impactos

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218 Capıtulo 35. Impactos

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Capıtulo 36

Derivativos

219

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220 Capıtulo 36. Derivativos

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Capıtulo 37

Uma breve introducao aoGLPK

Capítulo escrito por Bruno Henrique CervelinEste trabalho tem como principal objetivo apresentar uma introdução ao

uso do pacote de Otimização Linear e Linear Inteira Mista GLPK, dando algumasinformações básicas sobre instalação, modelagem, implementação e análise dos re-sultados.

37.1 Introducao

O pacote GLPK (Gnu Linear Programing Kit) é um conjunto de rotinas, escri-tas em C, usado para resolução de problemas de Programação Linear (P.L.) eProgramação Linear Inteira Mista (P.L.I.M.), registrado sob a licença GNU Gene-ral Public License 3, mantido por GNU Project e desenvolvido originalmente porAndrew O. Makhorin (Instituto de Aviação de Moscou).

GLPK aceita a linguagem de modelagem GNU MathProg que é um subconjundoda linguagem AMPL.

O pacote GLPK inclui os seguintes componentes principais:

• Métodos simplex primal e dual;

• Método de pontos-interiores primal-dual;

• Método branch-and-cut;

• Tradutor para GNU MathProg;

• Interface de Programação de Aplicações (API);

• stand-alone P.L./P.L.I.M. solver.

221

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222 Capıtulo 37. Uma breve introducao ao GLPK

37.2 Instalacao

37.2.1 Windows

A versão do pacote paraWindows pode ser obtida no endereço [1], a versão atualdisponível é 4.34, para instalação é somente executar o arquivo binário baixado.

Para executar o pacote deve-se utilizar o terminal de comandos do Windows,para executá-lo deve-se abrir o menu iniciar, clicar em executar e digitar “cmd”.No terminal do comando deve-se ir à pasta onde o programa foi instalado com ocomando cd “c:\arquivos de programas\GnuWin32\bin”, ou mudando o ende-reço para o endereço onde o programa foi instalado, para rodar o solver devemosutilizar o comando glpsol –model entrada –output saida, onde entrada é onome do arquivo com o modelo e os dados de entrada do programa e saida é onome do arquivo onde será escrita a saída do programa.

37.2.2 Linux

A versão do pacote para Ubuntu pode ser instalado pelo gerenciador de pacotesdo mesmo. Para fazer a instalação em outras versões do Linux consultar [2].

Para executar o pacote deve-se utilizar um terminal do Linux. Para rodar osolver devemos utilizar o comando glpsol –model entrada –output saida ondeentrada é o nome do arquivo com o modelo e os dados de entrada do programa esaida é o nome do arquivo onde será escrita a saída do programa.

37.2.3 Mac

Para informações de como utilizar o pacote em computadores com sistema ope-racional Mac consultar [3]

37.3 Modelos

Para utilização do pacote GLPK devemos implementar o modelo de P.L. ouP.L.I.M. em uma linguagem que o pacote saiba interpretar.

Para mostrar como é o modelo lido pelo GLPK utilizaremos como exemplo oseguinte problema de minimização.

Minimizarx∑nj=1 cjxj

Sujeito a∑nj=1 ai,jxj = bi ∀ i = 1, · · · ,m

pjxj + hjxj+1 ≤ qj ∀ j = 1, · · · , n− 1x ≥ 0.

(37.1)

Onde x ∈ IR5,

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37.3. Modelos 223

b =

3020151025

, c =

475243

, p =

23

0.510

, h =

0.51220

, q =

3030303030

,

A =

1 1 1 0 0 00 0 0 1 1 11 0 0 1 0 00 1 0 0 1 00 0 1 0 0 0.3

Assim nosso modelo fica:

Implementação no GLPK/*Model*/

set I;#um conjunto de índices.

param cj in 1..6;#vetor c com índices j no conjunto 1,2,3,4,5,6.

param bi in I;#vetor b com índices i no conjunto I.

param pj in 1..5;

param qj in 1..5;

param hj in 1..5;

param ai in I, j in 1..6;/*matriz a com índices de linhas i no conjunto I e índices de colunasj no conjunto 1,2,3,4,5,6.*/

var xj in 1..6, >= 0, integer;#variáveis x com índices j no conjunto J maiores ou iguais a zero e inteiras.

minimize custo:sumj in 1..6x[j]*c[j];

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224 Capıtulo 37. Uma breve introducao ao GLPK

/*função objetivo chamada custo*/

s.t. demandai in I: sumj in 1..6a[i,j]*x[j] = b[i];/*conjunto de restrições de igualdade*/

data;

set I := ’1’ ’2’ ’3’ 4 ’cinco’;

param b:= ’1’ 30’2’ 20’3’ 154 10’cinco’ 25;

param c:= 1 42 73 54 25 46 3;

param p:= 1 22 33 0.54 15 0;

param h:= 1 0.52 13 24 25 0;

param q:= 1 302 303 304 305 30;

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37.3. Modelos 225

param a: 1 2 3 4 5 6 :=’1’ 1 1 1 0 0 0’2’ 0 0 0 1 1 1’3’ 1 0 0 1 0 04 0 1 0 0 1 0’cinco’ 0 0 1 0 0 1;

end;

Algumas explicações devem ser dadas sobre este modelo:

• O caracter “#” inicia o comentário que termina na quebra de linha.

• O comando “/*” também inicia comentários para terminá-lo usa-se o co-mando “*/”.

• Primeiramente deve-se implementar um modelo geral sem especificar os va-lores do problema a ser resolvido.

• Todo comando termina com “;”.

• Para facilitar a implementação podemos criar conjuntos de índices com ocomando “set”.

• Declaramos os parâmetros, com o comando “param”, e em qual(is) con-junto(s) seus índices variam, como foi mostrado no exemplo.

• As variáveis podem ser declaradas como canalizadas (“>= l”, “<=u”), inteiras(“integer”),binárias(“binary”), reais ou irrestritas (nas duas últimas nenhum comandoadicional deve ser colocado à frente da declaração da variável).

• A função objetiva tem nome, podemos escolher minimizá-la com o comando“minimize” ou maximizá-la com o comando “maximize”.

• Podemos inserir quantos conjuntos de restrição desejarmos, todos com nomee iniciados com o comando “s.t.”.

• As restrições podem ser de desigualdade ou igualdade.

• As restrições de desigualdade podem ser escritas usando “>=” (≥) ou “<=”(≤).

• As restrições de igualdade usam “=”.

• Os dados específicos do problema devem ser inseridos na seção “data”.

• Um conjunto pode ser de números, de strings, ou de ambos.

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226 Capıtulo 37. Uma breve introducao ao GLPK

• Conjuntos também podem ser de n-uplas, ou de conjuntos(consultar docu-mentação do GLPK).

• As strings devem estar entre aspas simples ou duplas.

• A inserção de valores nos parâmetros deve ser feita como no exemplo.

• Para definir o valor de um parâmetro devemos antes de cada valor dizer paraqual índice o estamos atribuindo.

Para mais informações consultar o Manual do GLPK.

37.4 Analise da Saıda

Após rodarmos o modelo obtemos duas saídas, uma impressa diretamente natela e outra impressa no arquivo de saída (–output saida).

37.4.1 Saıda Tela

A saída na tela não é salva em arquivo nenhum (a não ser que seja pedido comalgum comando no terminal). Nesta saída vemos a quantidade de iterações reali-zadas pelo método utilizado, a (in)factibilidade do problema, a quantidade de nósanalisados e a serem analisados no método Branch & Bound (quando trabalhamoscom problema inteiros, ou inteiro misto).

Estamos apresentando aqui, para podermos fazer uma análise mais detalhada,a saída do nosso exemplo:

Saída na Tela

glpsol –model entrada.txt –output saida.txt

Reading model section from entrada.txt...Reading data section from entrada.txt...68 lines were readGenerating custo...Generating res1...Generating res2...Model has been successfully generatedipp_basic_tech: 2 row(s) and 0 column(s) removedipp_reduce_bnds: 5 pass(es) made, 14 bound(s) reducedipp_basic_tech: 0 row(s) and 0 column(s) removedipp_reduce_coef: 1 pass(es) made, 0 coefficient(s) reduced

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37.4. Analise da Saıda 227

glp_intopt: presolved MIP has 9 rows, 6 columns, 20 non-zerosglp_intopt: 6 integer columns, none of which are binaryScaling...A: min|aij| = 3.000e-001 max|aij| = 3.000e+000 ratio = 1.000e+001Problem data seem to be well scaledCrashing...Size of triangular part = 9Solving LP relaxation...

0: obj = 6.000000000e+001 infeas = 7.400e+001 (0)∗ 6: obj = 2.090697674e+002 infeas = 0.000e+000 (0)OPTIMAL SOLUTION FOUNDInteger optimization begins...+ 6: mip = not found yet >= -inf (1; 0)+ 9: »»> 2.160000000e+002 >= 2.120000000e+002 1.9% (4; 0)+ 13: »»> 2.140000000e+002 >= 2.140000000e+002 0.0% (2; 3)+ 13: mip = 2.140000000e+002 >= tree is empty 0.0% (0; 7)INTEGER OPTIMAL SOLUTION FOUNDTime used: 0.1 secsMemory used: 0.2 Mb (166143 bytes)lpx_print_mip: writing MIP problem solution to ‘saida.txt’...

Novamente são importantes algumas observações:

• Qualquer erro na implementação do modelo será apresentado na tela quandoeste for rodado.

• Primeiro é resolvido o problema relaxado.

• São apresentadas as iterações e o valor da função objetivo enquanto o pro-blema é resolvido.

• Depois de resolvido o problema relaxado, é a vez do problema inteiro.

• É apresentada a quantidade de nós a serem analisados e a quantidade dosjá analisados (entre parênteses), assim como o valor do limitante inferior esuperior da função objetivo para as iterações.

• Por fim, é apresentado o tempo de processamento e a quantidade de memóriautilizada.

37.4.2 Saıda no arquivo

O arquivo de saída gerado pelo GLPK é um arquivo texto, onde podemos ver ovalor da função objetivo, das variáveis, das restrições e de seus limitantes superiores

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228 Capıtulo 37. Uma breve introducao ao GLPK

e inferiores.Novamente, analisaremos a saída do nosso exemplo:

Saída Arquivo

Problem: entrada.txtRows: 11Columns: 6 (6 integer, 0 binary)Non-zeros: 26Status: INTEGER OPTIMALObjective: custo = 214 (MINimum)No. Row name Activity Lower bound Upper bound––– –––––– ––––––- ––––––- ––––––-1 custo 2142 res1[’1’] 30 303 res1[’2’] 23 204 res1[’3’] 15 155 res1[4] 10 106 res1[cinco] 25.2 257 res2[1] 12 308 res2[2] 24 309 res2[3] 30 3010 res2[4] 29 3011 res2[5] 0 30No. Column name Activity Lower bound Upper bound––– –––––– ––––––- ––––––- ––––––-1 x[’1-3’] * 6 02 x[’1-4’] * 0 03 x[’1-5’] * 24 04 x[’2-3’] * 9 05 x[’2-4’] * 10 06 x[’2-5’] * 4 0

Integer feasibility conditions:

INT.PE: max.abs.err. = 6.66e-016 on row 6max.rel.err. = 2.54e-017 on row 6High quality

INT.PB: max.abs.err. = 0.00e+000 on row 0max.rel.err. = 0.00e+000 on row 0High quality

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37.4. Analise da Saıda 229

End of output

O arquivo de saída é bastante simples de ser analisado, portanto nenhum co-mentário será feito sobre ele.

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230 Capıtulo 37. Uma breve introducao ao GLPK

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Referencias Bibliograficas

[1] http://gnuwin32.sourceforge.net/packages/glpk.htm

[2] http://www.gnu.org/software/glpk/

[3] http://glpk.darwinports.com/

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232 Referencias Bibliograficas

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Capıtulo 38

Regressao total

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234 Capıtulo 38. Regressao total

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Referencias Bibliograficas

[1] R. Andreani, C. Dunder and J. M. Martínez. Order-Value Optimization:formulation and solution by means of a primal Cauchy method. Mathema-tical Methods of Operations Research 58, pp. 387-399 (2003).

[2] R. Andreani, C. Dunder and J. M. Martínez. Nonlinear-ProgrammingReformulation of the Order-Value Optimization problem. MathematicalMethods of Operations Research 61, pp. 365-384 (2005).

[3] F. Black and M. Scholes. The Pricing of Options and Corporate Liabilities.Journal of Political Economy 81 pp. 637¿654 (1973).

[4] A. D. Herrera, Scolnik, H.D., Chichilnisky, G., Gallopin, G.C., Hardoy,J.E., Mosovich, D., Oteiza, E., de Romero Brest, G.L., Suarez, C.E. andTalavera, L. Catastrophe or new society? A latin American world model,International Development Research Centre, Ottawa, Canada, 1976.

[5] D. Meadows et al, The limits of growth, Universe Books. Nova York, 1972.

[6] R. C. Merton. Theory of Rational Option Pricing. Bell Journal of Econo-mics and Management Science 4, pp. 141¿183 (1973).

[7] P. Jorion, Value at Risk: The New Benchmark for Managing FinancialRisk, third edition, McGraw-Hill, 2006.

[8] W. Leontief. Input-Output Economics, Oxford University Press, FairLawn, N.J., 1966.

[9] H. Markowitz, Portfolio Selection, The Journal of Finance 7, pp. 77-91(1952).

[10] J. M. Martínez, Order-value optimization and new applications, in SixthInternational Congress on Industrial and Applied Mathematics: Zürich,Switzerland, July 16-20, 2007 – Invited Lectures, R. Jeltsch and G. Wannereds., European Mathematical Society, Zürich, 2009, pp. 279–296.

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236 Referencias Bibliograficas

[11] R. T. Rockafellar, S. Uryasev, Optimization of conditional value-at-risk.The Journal of Risk 2, pp. 21-41 (2000).

[12] P. A. Samuelson, Introdução à Análise Econômica, Oitava Edição, tradu-zida da Nona edição em inglês, Livreria Agir Editora, 1977.