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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE INSTITUTO DE GEOCINCIAS DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA

YASMIM RIBEIRO MELLO

Atraso e Moderno na Produo de cana-de-acar no Brasil contemporneo: distintas faces da reduo de impactos ambientais.

TRABALHO DE CONCLUSO DE CURSO (Bacharelado em Geografia)

Niteri 2009

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Yasmim Ribeiro Mello

Atraso e Moderno na Produo de cana-de-acar no Brasil contemporneo: distintas faces da reduo de impactos ambientais.

Trabalho de Concluso de Curso de Graduao em Geografia Instituto de Geocincias da Universidade Federal Fluminense (UFF), apresentando como requisito necessrio para obteno do grau de Bacharel em Geografia.

Orientadora: Prof. Dra. Mnica Cox de Britto Pereira

Niteri 2009

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MELLO, Yasmim Ribeiro Ttulo Atraso e Moderno na Produo de cana-de-acar no Brasil contemporneo: distintas faces da reduo de impactos ambientais. Yasmim Ribeiro Mello - Niteri, RJ: UFF / iGeo, 2009. 75 p.: il.; 30 cm. Trabalho de Concluso de Curso (Bacharelado em Geografia) Universidade Federal Fluminense, Instituto de Geocincias, Departamento de Geografia, 2009. Orientadora: Prof. Dra. Mnica Cox de Britto Pereira 1. Geografia. 2. Trabalho de Concluso de Curso. I. Mnica Cox de Britto Pereira. II. Universidade Federal Fluminense, Instituto de Geocincias.

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Yasmim Ribeiro Mello

Trabalho de Concluso de Curso de Graduao em Geografia Instituto de Geocincias da Universidade Federal Fluminense (UFF), apresentando como requisito necessrio para obteno do grau de Bacharel em Geografia.

Orientadora: Prof. Dra. Mnica Cox de Britto Pereira

Aprovado em: Por:

_____________________________________ Orientadora: Prof. Dra. Mnica Cox de Britto Pereira (UFF) _____________________________________ Msc. Andressa Elisa Lacerda. _____________________________________ Prof. Dr. Ruy Moreira (UFF)

Niteri 2009

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minha av, Eunice, pela beleza do corao, pelo brilho dos seus olhos e pela fora de seu sorriso.

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AGRADECIMENTOS A trajetria desses anos de graduao em Geografia no foi traada sozinha e contou com a presena de muitos amigos(as) e companheiro(as) que me ajudaram a fazer parte de cada momento vivido dentro e fora desta Universidade. minha me, por todo amor e amizade! Ao meu namorado, Hugo, obrigada pelo carinho, companheirismo e fora. minha tia Elisa Caillaux, que tanto admiro sua paixo pela geografia. minha amiga e orientadora, Mnica Cox, que convivi desde os primeiros dias de aula no ano de 2003, quando fui apresentada ao grupo Estgio de Vivncia e a partir dali pude conhecer uma pessoa linda e de grande importncia na minha formao acadmica. Ao professor e colega Srgio Nunes, agradeo sua dedicao que pude conhecer atravs de nossas conversas dentro e fora dos corredores da UFF. Ao Ruy Moreira, um professor encantador, agradeo s suas aulas que eram fantsticas, sua sabedoria e seu amor explcito Geografia. Sempre disposto a trocar com os alunos. Obrigada por todo o amor e entusiasmo! Aos Antroplogos Ronaldo Lobo e Fabinho, agradeo a disponibilidade e as ajudas com a bibliografia durante os trabalhos de monitoria e artigos publicados. Aos meus amigos dessa famlia geogrfica que formamos: Renata e Vtor, amigos para toda a vida; companheiros! Andressa e Thiago, obrigada pelas preciosas discusses e pelo carinho de vocs. Meus amigos-orientadores da vida! Lia e Daniel, agradeo a alegria diria que emana dos olhos de vocs e me faz to feliz. Marcelinho, muito obrigada pela sua biblioteca geogrfica. Luciana, que mesmo sem concluir a Geografia, faz parte desta famlia. Ao meu parceiro de trabalhos e seminrios. Ao amigo de praia, sol e mar; Rafael Mussi. Aos queridos companheiros do Estgio de Vivncia e aos amigos Lus Marola, Rodrigo Cabea, Joo, Dbora e Dani Egger. Aos funcionrios da biblioteca, Carlos e Sizira (in memorian), sempre muito atenciosos. Obrigada a todos vocs, que de forma direta ou indireta contriburam para que os trilhos dessa graduao pudessem ser percorridos e para que eu chegasse at esta estao, que no o ponto final!

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RESUMO Nestas ltimas dcadas o mundo se viu em uma progressiva escala de preocupao quanto s questes ambientais, o que resultou em debates que ganharam relevncia global, sobretudo queles relacionados s Conferencias Mundiais sobre o Meio Ambiente e Mudanas Climticas. Dentre os temas abordados emerge como uma nova concepo de desenvolvimento, o desenvolvimento sustentvel. O Brasil, inserindo-se neste contexto, busca formas de atingir mercados e ganhar espao a partir de instrumentos de tomada de deciso chamados sustentveis e ambientalmente corretos. O estmulo produo de biocombustveis, devido aos impactos apresentados pelo modelo de explorao e o uso da matriz energtica vigente assim como o esgotamento de suas reservas, tem sido o foco principal dessas discusses internacionais. O governo brasileiro, aplicando o projeto de Zoneamento Agroecolgico da Cana-de-Acar, tenta mostrar ao mundo que o etanol pode estar inserido nesta busca por um desenvolvimento mais limpo e assim, articula formas para atingir os mercados da economia global. Palavras-chave: agroecologia desenvolvimento sustentvel, etanol, cana-de-acar,

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ABSTRACT In recent decades the world was in a progressive scale of concern about environmental issues, which resulted in debates that have gained global significance, especially those related to the World Conference on Environment and Climate Change. Among the themes we have the new concept of development, "sustainable development". Brazil, in this context, searches for ways to reach markets and gain space from instruments of decision-making called sustainable and environmentally correct. The stimulus for the production of biofuels, due to the impacts produced by the model of exploration and use of the energy current and the depletion of its reserves, has been the main focus of international discussions. The Brazilian government, applying the project Agroecological Zoning of Cane Sugar, tries to show to the world that ethanol can be inserted in the search for a cleaner development and then, articulates to reach the markets of the global economy. Keywords: sustainable development, ethanol, sugar cane, agroecology

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Lista de ilustraes Figura 01. James Dean (White Car) Figura 02: Propaganda de eletrodomsticos, dcada de 1950.EUA. Figura 03: Fases do setor sucroalcoleiro no Brasil. Figura: 04 Participao % de cada Setor nas emisses de CO2 / 1998 Figura 05: Vendas de Veculos Leves (Comercial + Passeio) no Brasil por tipo de combustvel (2000-2007) Figura: 06: Trabalhadores cortando cana-de-acar Figura 07: Distribuio da lavoura da cana no territrio nacional. Figura 08: Safra 2008/2009, Cana-de-acar. Regio Centro-Sul Brasileira. Figura 09. Safras de Gois de 2005 a 2009. Figuras 10: Safra de Mato Grosso do Sul, de 2005 a 2009 . Figura 11: Safras do Estado de So Paulo, de 2003 a 2009 Figura 12. Distribuio Espacial da rea plantada de cana no Brasil por municpio 1990, 2000 e 2005 Figura 13A. Supresso da vegetao do solo para cultivo da cana-deacar.(Pernambuco) Figura 13B. Supresso da vegetao do solo para cultivo da cana-de-acar. (Pernambuco) Figura: 14 Exemplos da colheita mecanizada da Cana. Figura 15: Zoneamento: Esquema da avaliao. Figura 16: Bioma Amaznia, Bioma Pantanal e Bacia do Alto Paraguai Figura 17: Zoneamento Agroecolgico da cana-de-acar Estado de Gois

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Lista de Tabelas Tabela 01: Principais poluentes atmosfricos, fontes de emisso e efeitos sobre a sade humana. Tabela 02: Cronograma de Reduo da Queima da cana-de-acar. Tabela 03: Zoneamentos Agroecolgicos com diferentes escalas e objetivos em diversos pases do mundo.

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SUMRIO

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INTRODUO QUESTO AMBIENTAL: UMA BREVE CONTEXTUALIZAO HISTRICA

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2.1 IMPACTO AMBIENTAL E POLUIO AMBIENTAL: ALGUNS CONCEITOS 3 A PRODUO DO ESPAO ATRAVS DO USO DAS FONTES DE ENERGIA

3.1 DAS SOCIEDADES AGRRIAS AO MUNDO URBANO-INDUSTRIAL 4 PRODUO DE CANA-DE-ACAR NO BRASIL: BREVE SNTESE HISTRICA

4.1 DO BRASIL COLONIAL AO BRASIL AMBIENTAL 4.2 A CANA DE ACAR DO SCULO XXI 4.3 A PRODUO AGRCOLA PARA ALM DA RIQUEZA: IMPACTOS E POLUIO AMBIENTAL 5 INTERFACES AGRICULTURA E MEIO AMBIENTE: ZONEAMENTO AGROECOLGICO DA CANA DE AUCAR

33 35 43

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5.1 ALGUNS CONCEITOS: AGROECOLOGIA, ECOLOGIA AGRCOLA E ZONEAMENTO AGROECOLGICO 5.2 ZONEAMENTO AGROECOLGICO DA CANA-DE-ACAR 5.3 ALGUMA(S) REFLEXO(ES): AS DIMENSES DA SUSTENTABILIDADE 6 7 CONSIDERAES FINAIS REFERNCIAS

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56 64 69 71

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1 INTRODUO

O presente trabalho traz luz o tema que ronda as principais reunies governamentais tanto em mbito nacional como internacional. Trata-se da questo ambiental e do futuro quanto ao uso de fontes de energia, devido aos impactos resultantes do uso de derivados de combustveis fsseis, como tambm pelo fato de se tratar da utilizao de energia no renovvel, o que pode acarretar na escassez dessa matria prima. Toma-se como exemplo o caso brasileiro, dado os incentivos ao uso dos biocombustvis, especificamente ao etanol para a produo dos automveis flex-fuel. Os pargrafos que seguem pretendem discutir o que os governos, em particular o brasileiro, esto chamando de desenvolvimento sustentvel. Para isto, toma-se como exemplo o recm aprovado projeto de Zoneamento Agroecolgico da Cana de Acar, em que se pretende aplicar este instrumento de gesto a fim de dar uma nova viso produo de acar e de lcool no mundo. Neste sentido, a poltica nacional visa apagar a velha imagem deixada pelo prolcool e busca a garantia de que se trata de um modelo de produo ecologicamente sustentvel. O captulo I, intitulado A questo ambiental: uma breve contextualizao histrica, traz ao leitor um panorama internacional quanto s diferentes concepes acerca das questes relativas ao meio ambiente ao longo de um processo histrico que envolve, sobretudo, a segunda metade do sculo XX. O segundo captulo, A produo do espao atravs do uso das fontes de energia, aborda a crescente demanda energtica do homem nas sociedades, passando desde a conquista do fogo ao intenso uso de combustveis fsseis na atualidade, bem como os impactos provenientes o modelo produtivo que se instaurou. Neste sentido, o captulo que segue apresenta o modelo de produo da cana-de-acar e os programas de incentivo comercializao deste produto, em que esta a matria-prima para o biocombustvel etanol sendo este meio alternativo ao uso do petrleo. Destaca-se tambm, os impactos socioambientais devido as formas de implementao da lavoura canavieira.

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Por ltimo, o captulo IV Interfaces agricultura e meio ambiente: zoneamento agroecolgico da cana de acar apresenta o Zoneamento Agroecolgico da Cana Acar ao mesmo tempo questiona a proposta agroecolgica do Governo. Dessa forma, o captulo pretende levar o leitor a refletir sobre o que seriam as chamadas polticas de desenvolvimento sustentvel, uma vez que se faz evidente que mudanas estruturais na sociedade no esto se fazendo presente.

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2 A QUESTO AMBIENTAL: UMA BREVE CONTEXTUALIZAO HISTRICA

O final da dcada de 1980 e incio da dcada de 1990 constitui-se como um importante marco para as questes relativas ao meio ambiente e ao desenvolvimento das naes. As antigas polticas econmicas e sociais so reavaliadas no Relatrio Brundtland (Nosso Futuro Comum) de 1987- reiterado pela Eco-92, no Rio de Janeiro- vm tona a discusso de uma nova concepo de desenvolvimento, chamando-se ento de Desenvolvimento Sustentvel. importante destacar que as preocupaes relativas ao meio ambiente vinham ocorrendo ao longo das dcadas, envolvendo grupos sociais e econmicos distintos. Dessa forma, faz-se relevante destacar situaes pontuais importantes, que no decorrer da Histria vo deixar marcas no processo espacial e temporal, nos permitindo identificar que os momentos aqui abordados no ocorrem isolados, se cruzam, dialogam e se inter-relacionam, gerando novas idias, em conjunto com quelas passadas. Consideramos, assim necessrio uma contextualizao da questo ambiental. A Revoluo Industrial Inglesa um ponto-chave dessas preocupaes, quando se observa na Histria uma mudana radical na vida do Homem, em conjunto com o processo de urbanizao da decorrente, onde o ambiente fabril das cidades ir comportar um maior nmero de habitantes, em grande parte imigrantes das zonas rurais. Esses passavam a conviver sob novas condies, ausncia de saneamento bsico, aumento da poluio do ar e pelos prprios problemas que a vida urbano-industrial trouxe ao Homem moderno. Na segunda metade do sculo XIX, como afirma Diegues (1996), possvel observarmos o sentimento pela preservao da Natureza, com para fins estticos e recreativos, em busca de um mundo selvagem, com uma admirao pelos campos, em contraponto ao ambiente urbano degradado pelo Homem. A proposta a volta ao mundo selvagem, ao bucolismo do campo e uma busca pela paz, no sentido do paraso perdido, como bem ressalta Diegues (1996). Em 1872 tem-se a criao do Parque Nacional de Yellowstone EUA, e posteriormente, aes que seguiram essa idia de criao de reservas da vida natural selvagem natureza enquanto rea virgem como na dcada de 1940, com a criao da International Uninon for the

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Protection of Nature (IUPN), o que mais adiante, em 1956 passaria a se chamar de Unio Internacional da Conservao da Natureza e de seus Recursos (UICN)1, com sede na Sua, como uma busca de proteger a Natureza do mundo industrial e moderno. No entanto, como afirmam Lagoa e Pdua (1984) nota-se que essas propostas conservacionistas mostram-se no intuito apenas de criticar o modelo, mas no propem solues. Outros pontos relevantes a sinalizar so as duas Grandes Guerras. No que tange s questes ambientais, a Segunda Guerra vai levantar argumentos e crticas da sociedade ao uso de armas atmicas, intensificao do processo de industrializao e, conseqentemente, degradao ambiental, como contaminao do ar e poluio das guas dos rios. Conseqncias para a concentrao de mercrio ao longo da cadeia alimentar so sublinhadas por Porto-Gonalves (2004):A contaminao por Mercrio na Baa de Minamata no Japo, em 1951, com o conseqente envenenamento de mais de duas mil pessoas que consumiram o pescado, local mostrou tragicamente que a espcie humana no escapa da cadeia alimentar, como um antropocentrismo exacerbado chegou a acreditar. Assim, a problemtica dos rejeitos comea a ganhar dimenso poltica (PORTO-GONALVES, 2004. p.28).

Neste contexto, a partir da dcada de 1960, tem-se a emergncia da chamada Ecologia Social2, a fim de criticar de forma mais intensa, essa relao homem-natureza e suas contradies. Os problemas ambientais chegaram neste momento no apenas s classes menos favorecidas, mas tambm s elites. O debate ir levantar pontos quanto diferena entre pobres e ricos, brancos e negros, etc., ressaltando a ao humana como desequilibradora dos sistemas naturais. A sociedade vai expressando um descontentamento com esse projeto da modernizao. Porto-Gonalves (1989) destaca o movimento ecolgico:Talvez nenhum outro movimento social tenha levado to a fundo essa idia, na verdade essa prtica, de questionamento das condies presentes de vida. Sob a chancela do movimento ecolgico, veremos o desenvolvimento de lutas em torno de questes as mais diversas: extino de espcies, desmatamento, exploso demogrfica, poluio do ar e da gua, contaminao de alimentos, eroso dos solos (PORTOGONALVES, 1989. p.12)

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International Union for Conservation of Nature Resources A Ecologia social vai estudar o Homem e o ambiente, sendo o primeiro como um ser social e no como uma espcie diferenciada. (LAGOA e PADUA, 1984)

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Foi ao final da dcada de 1960 e incio de 1970, que o mundo observou uma crescente transformao quanto s questes ambientais, quando no debate foi sendo envolvido um nmero crescente de atores. Nesse ponto, o Ecologismo, foi sendo construdo como fruto de diversas influncias, e vinha apresentar uma proposta apenas de defesa da natureza, porm, questionava o movimento social como um todo. Acreditava-se em uma mudana na estrutura econmica global. Diversas foram as influncias para que a proposta do movimento ecologista tomasse essa proporo, por exemplo de grupos intelectuais e artsticos. Iniciado pelos norte-americanos, o movimento hippie, entre 1968 e 1970, apresentava-se justamente contra o american way of life e foi de grande relevncia para a consolidao dessas idias, abrangendo a Ecologia no apenas como uma cincia, mas de uma importncia social e poltica, com crticas sociedade opressiva, ao modelo insustentado de produo, como os casos da indstria de consumo e da Revoluo Verde. Reivindica-se no apenas a conservao dos recursos naturais, mas pensa-se no meio ambiente a partir de aspectos que envolvem a paz a Guerra do Vietn intensificou o movimento pela paz qualidade de vida, uso de energia, consumo e modo de produo de alimentos, dentre outros inmeros problemas ambientais que levantaram crticas e atingiram o mundo social, poltico, econmico e cultural como um todo; o mundo gritava com John Lennon Peace and Love. No ano de 1969, por exemplo, os EUA vm se apresentar como pioneiros na determinao de dispositivos legais para a definio de objetivos e princpios da poltica ambiental, que se deu por meio da Lei Federal denominada National Environment Policy Act (NEPA). Como um marco relevante nesse captulo da Histria dos debates ambientais foi o ano de 1972 quando aconteceu na capital da Sucia, Estocolmo, a Conferncia das Naes Unidas sobre o Homem e o Meio Ambiente. J possvel observar um momento marcado por um descontentamento ainda maior da sociedade em relao s preocupaes ambientais, abrangendo diferentes camadas sociais e atingindo um carter mais amplo ao redor do mundo, com propostas que iro abranger o movimento social como um todo, e no apenas em defesa da natureza, pois se acredita na necessidade de uma mudana na estrutura econmica global. Criou-se ento na Confrencia de Estocolmo o Programa das Naes Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentvel (PNUMA).

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Ser partir do Relatrio Brundtland (1987), conhecido como Nosso Futuro Comum, bem como da concepo de desenvolvimento sustentvel resultante desta reunio, que o mundo vai buscar iniciativas a fim de atingir a sustentabilidade e contrariar, assim, a velha concepo de desenvolvimento.O desenvolvimento sustentvel aquele que atende s necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as geraes futuras atenderem a suas prprias necessidades implica dois conceitos-chaves: conceito de necessidade, sobretudo as necessidades essenciais dos pobres do mundo, que devem receber a mxima prioridade; a noo das limitaes que o estgio da tecnologia e da organizao social impe ao meio ambiente, impedindo-o de atender s necessidades presentes e 3 futuras (Nosso Futuro Comum , 1991 p.46 apud OLIVEIRA, 2008 p.07).

Reforando esta nova concepo de desenvolvimento, um outro fato importante veio reiterar aquelas propostas surgidas na reunio de 1987 e trouxe ao mundo discusses acerca de temas que envolviam preocupaes quanto ao meio ambiente. A Conferencia das Naes Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD), mais conhecida como a Cpula da Terra , realizada no Rio de Janeiro ocorreu simultaneamente ao Frum Global das ONGs, ficou conhecida como a ECO-92 e vai reforar o debate do desenvolvimento sustentvel. Vai envolver, tambm por sua vez, diferentes atores no processo de tomada de deciso, como o caso dos agentes pblicos, privados, ONGs e da sociedade civil. Como resultado deste encontro, vale destacar a Agenda 21.A Agenda 21 coloca as cidades como ponto chave para o desenvolvimento sustentvel, levantando e apontando as principais questes para estabelecimento de assentamentos sustentveis. Sua principal contribuio tem sido influenciar as polticas especficas regulatrias, alm de trazer luz metas e objetivos a serem atingidos para a melhoria da vida urbana. (OLIVEIRA, 2008, p.1)

Cinco anos depois (1997) ocorreu no Japo mais uma reunio a fim de levantar a problemtica ambiental no mundo. Como caracterstica principal deste encontro entre os diferentes pases do globo, se deu a assinatura do Protocolo de Quioto, voltado para a reduo da emisso de gases de efeito estufa, uma vez que se coloca estes como os responsveis pelos grandes problemas ambientais. Vejamos o que sinaliza o Protocolo:

3 NOSSO FUTURO COMUM. Comisso Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. 2. ed., Rio de Janeiro: Editora da Fundao Getlio Vargas, 1991.

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The Kyoto Protocol is an international agreement linked to the United Nations Framework Convention on Climate Change. The major feature of the Kyoto Protocol is that it sets binding targets for 37 industrialized countries and the European community for reducing greenhouse gas (GHG) emissions. These amount to an average of five percent against 1990 levels over the five-year period 2008-2012. 4 (http://unfccc.int/kyoto_protocol/items/2830.php)

Justifica-se assim, que a alta emisso de CO2 na atmosfera, provocaria mltiplos impactos, dentre eles o aquecimento global. A assinatura deste protocolo apresentava-se basicamente voltada para a reduo das emisses dos gases dos chamados pases desenvolvidos, tidos como os maiores poluidores do mundo. Por sua vez, deixava margens mais flexveis aos pases em desenvolvimento, uma vez que estes precisariam emitir um determinado nmero de partculas de CO2 na atmosfera, sobretudo atravs da industrializao, para atingir o chamado desenvolvimento. O protocolo sinaliza para as responsabilidades diferenciadas, bem como para uma meta at 2012:Recognizing that developed countries are principally responsible for the current high levels of GHG emissions in the atmosphere as a result of more than 150 years of industrial activity, the Protocol places a heavier burden on developed nations under the principle of common but differentiated 5 responsibilities. (http://unfccc.int/kyoto_protocol/items/2830.php) Em dezembro de 1997, foi adotado o chamado Protocolo de Quioto, onde os pases desenvolvidos se comprometeram a reduzir suas emisses coletivas de gases de efeito estufa em mdia 5% no perodo entre 2008 a 2012 com relao s emisses de 1990. (SMAC/COPPETEC, p.07)

No entanto, os maiores poluidores do mundo, China e os EUA, este do ento presidente George W. Bush filho, no assinaram este protocolo, o que gerou grande descontentamento mundial, como fora apresentado pela imprensa e demais meios de comunicao. Sobretudo a partir da difuso de blogs e demais mdias via Internet, pde-se acompanhar muitas manifestaes de grupos ambientalistas e ONGs, contrrios postura norte-americana. Passados mais de dez anos da reunio em Quioto, em dezembro de 2009, ocorreu a Conferncia sobre Mudanas Climticas realizada na Europa, na cidadeO Protocolo de Quioto um acordo internacional ligado Organizao das Naes Unidas sobre as Mudanas Climticas. A principal caracterstica do Protocolo de Quioto que define objetivos vinculativos para 37 pases industrializados e da Comunidade Europia para a reduo de emisso de gases de efeito estufa (GEE). Este montante equivale a uma mdia de cinco por cento em relao aos nveis de 1990 durante o perodo de cinco anos de 2008-2012. (Traduo livre) 5 Reconhecendo que os pases desenvolvidos so os principais responsveis pelo elevado nvel actual de emisses de GEE na atmosfera como resultado de mais de 150 anos de atividade industrial, o Protocolo coloca um pesado fardo para as naes desenvolvidas sob o princpio de "responsabilidades comuns mas diferenciadas". (Traduo livre)4

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de Compenhague, capital da Dinamarca. O objetivo principal consistiu em discutir um novo plano de ao sobre as mudanas climticas, a fim de combater o Aquecimento Global, substituindo quele assinado em Quioto. O encontro entre pases do Norte e do Sul, foi bastante esperado e criou grande expectativa, visto que os EUA, sob a presidncia de Barack Obama, e a China pareciam estar mais abertos s negociaes. O documento oriundo desta Conferncia, definido como "insuficiente", pelo Presidente Norte-Americano, segundo reportagem da Folha Online6 , trouxe como metas limitar o aquecimento global a 2C ao ano e prev a criao de um fundo emergencial de US$ 30 bilhes pelos prximos trs anos, para ajudar pases pobres a combater as causas e efeitos das mudanas do clima; alm de angariar fundos para financiamentos de longo prazo de at US$ 100 bilhes at 2020. De grande repercusso internacional, o encontro na Dinamarca sofreu muitas crticas pelos mais diferentes grupos, como ambientalistas e comunidade acadmica, sendo retratado pela imprensa como um grande fracasso. Em entrevista apresentada no jornal Folha Online, o Ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc afirmou que com o fracasso da cpula, o mundo "perdeu uma grande oportunidade, porm em seguida afirma, que o Brasil se comprometeu a reduzir as emisses de CO2 no de 36% a 39% do volume para 2020. A principal crtica est no fato de que o documento no conseguiu fixar os objetivos de reduo das emisses poluentes, como observado na matria Imprensa do mundo retrata decepo com conferncia do clima, no jornal Folha Online publicada em 19 de dezembro de 2009:Objetivos reduzidos, metas abandonadas: Copenhague acaba em fracasso", a manchete do site do jornal britnico "The Guardian". "A conferncia da ONU alcanou um fraco esquema de acordo global em Copenhague, que ficou muito longe do que era esperado pelo Reino Unido e muitos pases pobres", indica o site. "Muitos objetivos sem cumprir", a manchete do New York Times. A conferncia mostrou que as "potncias deste mundo so incapazes de tomar decises claras e voluntrias, que no conseguiram obter mais que um acordo de questes mnimas que apenas salva as aparncias", critica o francs "Libration". (http://www1.folha.uol.com.br/folha/ambiente/ult10007u669069.shtml)

Ainda assim, aps a reunio na Dinamarca, como anunciado no stio da UNFCC na internet o secretrio-executivo da Conveno da ONU para a Mudana6 http://www1.folha.uol.com.br/folha/ambiente/ult10007u669018.shtml. Reportagem Incompetncia e egosmo marcaram cpula do clima, diz Minc, publicada em 19/12/2009

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Climtica, Yvo de Ber, aponta como concluso 03 importantes fatos que foram produzidos em Conpenhague: 1) Levantou a mudana climtica ao mais alto nvel do governo; 2) O Acordo de Copenhague reflete um consenso poltico sobre o longo prazo, a resposta global mudana climtica, 3) As negociaes trouxeram um quase total conjunto de decises para implementar a ao rpida do clima perto de ser concluda7. neste contexto de reunies e participaes de diferentes atores quanto s discusses da problemtica ambiental que podemos observar aes, tanto nos chamados pases centrais como nos perifricos, acreditando-se que possvel atingir um nvel de desenvolvimento econmico e social, entretanto sem degradar e afetar de forma negativa as questes (scio) ambientais. Algumas dessas iniciativas serviram de grande impulsionador para um poderoso mercado voltado ao marketing verde. Podemos observar, no final do sculo XX, aes voltadas para o desenvolvimento de tecnologia com o uso de energia limpa, o crescente mercado de Crdito de Carbono, o uso de materiais chamados sustentveis e reciclados, como a moda das bolsas sustentveis8 ou a crescente propaganda para o consumo de produtos com o selo de orgnicos, bem como o uso de alternativas de produo agrcola (agricultura orgnica, ecologia agrcola, agroecologia, etc.), visando garantir a produtividade, mas fugindo das tcnicas degradantes como quelas bem conhecidas da Revoluo Verde. Este novo mercado que surge, sobretudo a partir da dcada de 1990, vem apoderar-se da problemtica ambiental acompanhado de forte propaganda. Ressalta-se que, na maioria das vezes, os chamados produtos verdes so mais caros, porm, trazem conscincia ao consumidor, que por sua vez se sente engajado e atuante neste mundo onde se busca o chamado desenvolvimento sustentvel e discutem problemas de impacto e poluio ambiental. Dessa forma, como uma das alternativas aos meios tradicionais de produo e acompanhado de forte marketing verde, se discute atualmente no Brasil e no mundo algumas iniciativas, como o uso dos biocombustveis, sendo esta uma proposta que ir contemplar no apenas com um dos pontos da Eco-92, mas7

If countries follow up the outcomes of Copenhagen calmly, with eyes firmly on the advantage of collective action, they have every chance of completing the job (Mr. Boer, em entrevista no site http://unfccc.int/2860.php). (Se os pases acompanharem os resultados de Copenhague com calma, com olhos firmes sobre a vantagem da ao coletiva, eles tm todas as chances de concluir o trabalho. Traduo livre) 8 Esta bolsa no de plstico ou Ecobags

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tambm o que fora colocado na reunio em Quioto, em busca pelo desenvolvimento limpo e sustentvel, visando a reduo das emisses de gases de efeito estufa . neste desencadear histrico, portanto, que teremos a concepo de desenvolvimento sustentvel reforada na Eco-92 e que , at hoje, to discutida entre as diferentes esferas da sociedade. As questes vm tomando forma ao longo desse processo, sendo explicitada quanto s possibilidades de combater ou reduzir a poluio ambiental. Dentre as mais diferentes formas e causas da poluio ambiental, uma tem sido fortemente levantada ao longo das dcadas: o intenso uso de energias no-renovveis e seus impactos ambientais, sociais e econmicos.

2.1 IMPACTO AMBIENTAL E POLUIO AMBIENTAL: ALGUNS CONCEITOSA noo de tempo fundamental. A sociedade atual, mas a paisagem, pelas suas formas, composta de atualidades de hoje e do passado. A noo de escala igualmente importante, pois se o espao total, a paisagem no o . (SANTOS, 2007. p. 60)

Para tratarmos de impacto ambiental, consideremos a legislao brasileira. A Resoluo CONAMA N 001 de 23 de janeiro de 1986, vem considerar em seu Artigo 1 como impacto ambiental:[...] qualquer alterao das propriedades fsicas, qumicas e biolgicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matria ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente, afetam: I a sade, a segurana e o bem-estar da populao; II - as atividades sociais e econmicas; III - a biota; IV - as condies estticas e sanitrias do meio ambiente; V - a qualidade dos recursos ambientais. (CONAMA 1986)

Em Magrini (1989) iremos encontrar impacto ambiental como o que deriva de uma ao sobre o meio ambiente, e ainda quando a autora refere-se a Bolea (1984), traz como impacto ambiental a diferena entre a situao do meio ambiente (natural e social) futuro modificado pela realizao do projeto e a situao do meio ambiente futuro tal como teria evoludo sem o projeto (BOLEA, 19849 aupd MAGRINI p.86) Aqui a definio est voltada para uma Avaliao de Impacto Ambiental AIA. Verifica-se que so definies calcadas em ao-reao e que, segundo a autora,9

BOLEA, M.T.E. Evaluacin Del impacto Ambiental. Madrid, Fundacin MAPFRE, 1984.

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dificilmente espelham a complexidade da dinmica ambiental. Este fato pode ser observado devido prpria dificuldade em definir as fronteiras do impacto, dado a sua propagao espao-temporal, bem como quanto s deficincias instrumentais e metodolgicas que podem predizer as respostas dos ecossistemas s aes humanas. Assim, uma das metodologias abordadas para explicitar a dinmica espaotemporal de propagao dos impactos ambientais tem levado em considerao classificaes que vm abordar, segundo Magrini (1989, p.86-87) caractersticas tais como: Diretos indiretos; Curto longo prazo; Curta longa durao; Reversveis irreversveis; Cumulativos ou no; Sinrgicos ou no. Neste sentido, faz-se importante tambm explicitar o que entendido por poluio ambiental. Segundo o Artigo 3 III da Lei Federal brasileira de n. 6.938/81, que vem dispor sobre a Poltica Nacional do Meio Ambiente (1981), define-se poluio como a degradao da qualidade ambiental resultante de atividade que direta ou indiretamente, prejudiquem a sade, a segurana e o bem estar da populao; criem condies adversas s atividades sociais e econmicas; afetem desfavoravelmente a biota; afetem as condies estticas ou sanitrias do meio ambiente; lancem matrias ou energia em desacordo com os padres ambientais estabelecidos. (BRASIL, 1981). Como bem adverte Odum (2004), a poluio consiste[...] numa alterao indesejvel das caractersticas fsicas, qumicas ou biolgicas do ar, do solo e da gua que podem afetar, ou afetaro, prejudicialmente a vida do homem ou a de espcies desejveis, os nossos processos industriais, condies de vida e patrimnio cultural (ODUM, 2004)

Meirelles (1988, p.04) vem definir como poluio ambiental toda alterao das propriedades naturais do meio ambiente, causada por agente de qualquer espcie, prejudicial sade, segurana ou ao bem-estar da populao sujeita aos seus efeitos. Assim, existem os seguintes tipos de poluio ambiental: Poluio qumica; biolgica; trmica; radioativa; sonora e poluio visual. De acordo com uma das principais propostas do governo brasileiro de incentivo ao cultivo da cana-de-acar para a produo do combustvel derivado deste produto, tem-se a questo da reduo da poluio atmosfrica. Cabe

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destacar, dentre tantas definies, o que a NBR 896910, de julho de 1985, vem decidir sobre os termos empregados no estudo de poluio do ar como a presena de um ou mais poluentes atmosfricos. Assim, chama de Poluente Atmosfrico:[...] toda e qualquer forma de matria e/ou energia que, segundo suas caractersticas, concentrao e tempo de permanncia no ar, possa causar ou venha a causar danos sade, aos materiais, fauna e a flora e seja prejudicial segurana, ao uso e ao gozo da propriedade, economia e ao bem estar da comunidade. O mesmo significado que contaminante atmosfrico. (ABNT, 1985)

Em Bretschneider e Kurfrst (1987)11 apud Pires (2005) podemos encontrar para a definio de poluio atmosfrica a[...] introduo direta ou indireta de materiais na atmosfera em quantidades que afetam sua qualidade e composio resultando em efeitos negativos para o bem estar humano, a natureza viva e no viva, aos ecossistemas, aos materiais, aos recursos naturais e utilizao do meio ambiente (PIRES, 2005, p. 07)

Estes autores ainda complementam, definindo como poluente atmosfrico toda substncia slida, lqida ou gasosa que afeta prejudicialmente o meio ambiente aps mudanas qumicas na atmosfera ou pela ao sinergtica com outras substncias. (BRETSCHNEIDER E KURFRST,1987 apud PIRES, 2005 p.08) Os poluentes atmosfricos, por sua vez, so classificados em dois tipos: poluentes primrios e poluentes secundrios. Os poluentes primrios so emitidos diretamente da fonte poluidora para a atmosfera. Dentre eles destacam-se: Dixido de Carbono (CO2); Monxido de Carbono (CO); xidos de Nitrognio (NOx); xidos de Enxofre (SOx); Material Particulado (fumo, poeira, nvoa); Hidrocarbonetos. Os poluentes secundrios so formados na atmosfera a partir de reaes qumicas com outros poluentes (poluentes primrios). Como principais poluentes secundrios tem-se: Oznio Troposfrico (O3); Perxido de Hidrognio (H2O2); Aldedos; Peroxiacetilnitrato (PAN). A tabela 01 a seguir vem ilustrar os principais poluentes atmosfricos, suas fontes de emisso e seus efeitos sobre a sade humana.

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Norma Brasileira de Regulamentao da Associao Brasileira de Normas Tcnicas ABNT. BRETSCHNEIRDER,B.,KURFURST,J.,1987, Air Pollution Control Technology,Amsterdam-Oxford New York,Elsevier.

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Tabela 01 : Principais poluentes atmosfricos, fontes de emisso e efeitos sobre a sade humana. Fonte: Secretaria do Meio Ambiente, 1997. Citado por MONTEIRO (1998)

A partir desses conceitos e dessas classificaes evidenciadas, nota-se que no possvel desassociarmos impacto ambiental de poluio ambiental,

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independente da ordem dos fatos. Da mesma forma que importante pensar que aes que acarretem em impacto e poluio tambm trazem conseqncias quanto s questes econmicas, sociais e polticas. Por isso, neste trabalho permear por caminhos que estaro interligados e inter-relacionados com ambas as definies de impacto e poluio ambiental. Para desenvolvermos como vo se produzindo os impactos ambientais, bem como acumulando a poluio ambiental, importante considerarmos o modelo energtico, base do desenvolvimento, e as diferentes fontes de energia que foram sendo buscadas ao longo da Histria da humanidade. Essas conquistas energticas, e a importncia das mesmas para a constituio de nossas sociedades sero tratadas no prximo captulo deste trabalho.

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3 A PRODUO DO ESPAO ATRAVS DO USO DAS FONTES DE ENERGIA

Ao longo da Histria das civilizaes observamos que todo o seu movimento no espao e no tempo se desenvolveu atravs da capacidade dos diferentes usos das tcnicas que foram criadas e recriadas pelo Homem e assim, produziu-se e produz-se o espao, sendo este, como afirma Santos (2007, p.29), a soma dos resultados da interveno humana sobre a terra.O espao o resultado de um processo no qual o homem, a produo e o tempo exercem o papel essencial. a totalidade na qual o homem organiza o seu modo de vida e, ao mesmo tempo, a parte que organiza o todo nesses termos. E assim, porque um produto, um resultado das interaes globais do homem em sociedade. (MOREIRA, 2009, p.62)

A produo desses espaos deve-se ao avano das tcnicas desenvolvidas e modificadas pelo homem, como por exemplo, a capacidade de utilizao (e de transformao) das diferentes formas de energia para o desenvolvimento das sociedades. O espao , enfim, a matria trabalhada por excelncia: a mais representativa das objetificaes da sociedade, pois acumula, no decurso do tempo, as marcas das prxis acumuladas (SANTOS, 2007. p. 33). neste contexto que se faz importante a compreenso dessa dinmica espao-temporal do Homem bem como dos diferentes usos das fontes energticas para o desenvolvimento da histria da humanidade.

3.1 DAS SOCIEDADES AGRRIAS AO MUNDO URBANO-INDUSTRIAL

A tcnica vista, quase sempre, como mediadora entre a sociedade e a natureza, como se fosse uma esfera distinta. Entretanto, as tcnicas se inscrevem como parte das relaes dos homens (e mulheres) entre si e com a natureza. Os homens e as mulheres no se encontram somente diante de desafios que lhes so colocados pela natureza, mas pelos desafios que se colocam para si prprios. (PORTO-GONALVES, 2006, P.78)

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O Homem nmade ao aprender a controlar o fogo, utilizando-o para a coco de alimentos, iluminao, para seu aquecimento e sua proteo, tem sua grande conquista energtica. No entanto, segundo La Rovre (2007) trata-se ainda de uma atuao espacial limitada. , pois, a partir do advento da agricultura (cerca de 11.000 e 8.000 mil anos atrs) e da sedentarizao do Homem, quando se constituem as sociedades agrrias, que podemos observar um elevado uso das tcnicas e do aumento da capacidade do uso de fontes energticas que sero revolucionrias para a base do sustento agrcola. O uso da luz solar ser de grande importncia para as plantaes bem como a domesticao de animais para arar a terra, transporte de cargas e de pessoas. Porto-Gonalves (2006) ressalta a relao da agricultura com conhecimento das mulheres, sendo estas detentoras dos segredos da reproduo da vida. O autor faz neste trabalho um interessante jogo de palavras quanto aos saberes e sabores, em que o saber feminino est envolvido com os sabores da vida.Seus saberes trazem sabores e, assim,exigem contato, tato, at porque o sabor implica o paladar e este pressupe estar em contato o corpo deve estar presente no saber, seja com a lngua, com a boca, com as mos. (PORTO-GONALVES, 2006, p.87)

As sociedades agrrias vo desenvolver uma relao intrnseca com a terra, retirando dali a subsistncia e que at hoje podemos perceber a magnitude dessa conquista para a humanidade. Atravs da arte de plantar e colher, da troca de sementes entre os povos, das diferentes formas de manejar o solo e do artesanato que criavam retirando da prpria natureza a matria-prima para confeccionar seus instrumentos e materiais do cotidiano, foi possvel estabelecer uma relao homemnatureza capaz de garantir a riqueza das (agri)culturas do mundo. O autor do livro Globalizao da Natureza e Natureza da Globalizao (2006) segue ainda nos levando a refletir etimologicamente acerca das aes que envolvem as prticas das sociedades agrrias.O que a espcie humana conseguiu por meio das agriculturas foi a segurana alimentar, expresso que hoje volta a ganhar o debate poltico. Afinal domesticar espcies animais e vegetais torn-las parte de nossa casa (em latim, domus, da domesticar) Assim, mais uma vez, alimento e abrigo (domus, casa) voltam a se encontrar conformando um conjunto de questes interligadas para oferecer maior segurana a cada grupo que, assim, se constitui por meio de sua cultura formando seus territrios (domnios). (PORTO-GONALVES, 2006 P.209)

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Ao longo dos sculos, novas formas de utilizar fontes energticas foram sendo desenvolvidas pelo Homem. A Grcia Antiga (sculo VI e V), por exemplo, vem ilustrar a conquista do Mediterrneo como um marco importante da Histria, quando no perodo desenvolveu-se a minerao (prata) e a energia trmica para os metais e vidro. Na Idade Mdia, alm da trao animal, j possvel notar o uso de moinhos dgua e do vento, auxiliando na produo alm de outras inovaes tecnolgicas que se seguiram at a Revoluo Industrial Inglesa (Sc. XVIII), sendo esta o principal o ponto de partida da reflexo da nossa poca. A Revoluo Industrial Inglesa significa o grande marco da Histria, como LeFbvre (1968) afirma, a industrializao caracteriza a sociedade moderna. a partir dela que teremos a ruptura de um mundo essencialmente rural para um mundo urbano.At a descoberta da mquina vapor, a energia necessria para o processo de trabalho era, em sua maior parte, diretamente proveniente da biomassa, seja para alimentar os homens, seja para alimentar os animais de trao bois e cavalos, assim como a lenha que alimentava o fogo servia para cozinhar e para a fuso de metais metalurgia de guerra (armas, escudos, lanas e canhes), de utilitrios (enxadas e ps) e artesanato. (PORTO-GONALVES, 2006, p.27)

O advento da mquina a vapor vem representar essa ruptura, em que o Homem consegue alcanar um modo de produo que no mais obedece aos ciclos naturais, como por exemplo, a dependncia da energia solar, do vento, da trao de animais, etc. O tempo deixa de ser essencialmente natural para ser um tempo artificial, o tempo do relgio, o tempo da mquina, caracterizado por uma forma uniforme e abstrata. Inicialmente eram mquinas movidas lenha, mas pouco a pouco foram sendo substitudas por carvo mineral.Comeava assim a grande transio para os combustveis fsseis: nos Estados Unidos, por exemplo, a participao da lenha no consumo energtico total caa de 90 % para 20 % em apenas 50 anos, entre 1850 e 1900, enquanto no mesmo perodo o carvo subia de 10 % para 70 %. (LA ROVRE, 2007,p.9)

Ao longo do sculo XX, tem-se mais uma transio de base energtica de fundamental importncia, que ser a crescente substituio do carvo pelo petrleo.

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Nos Estados Unidos, o petrleo passa de 1 %, em 1875, a 70 % do consumo total de energia, em 1975. Neste ano, esse pas, erigido em modelo da sociedade industrial de consumo, usava em mdia 243 mil kcal/dia por habitante, representando um salto de ordem de grandeza com relao ao consumo energtico mdio do homem antes da Revoluo Industrial (mais de 10 vezes inferior). (LA ROVRE, 2007,p.9)

O perodo que vai caracterizar o sculo XX ser baseado praticamente atravs da energia gerada pelo petrleo advindo principalmente das jazidas do Oriente Mdio, o que permite a constituio de uma sociedade de consumo, sobretudo de uma sociedade do automvel. A dcada de 1950 fica marcada com a excessiva introduo de produtos norte-americanos no mercado, como o intensivo uso de eletrodomsticos atravs da cansativa propaganda do American way of life, clamando pelas facilidades que essas mquinas de cortar, triturar, aquecer, etc., poderiam trazer ao lar. E ainda, como smbolo de status dentro desta sociedade de consumo instaurada, estava o automvel, que aqui em terras tupiniquins, embalavam os sonhos dos jovens com as msicas, O Cadillac, cantadas por Roberto Carlos e Erasmo, Rua Agusta, interpretada por Educardo Arajo.Mandei meu Cadillac Pro mecnico outro dia Pois h muito tempo Um conserto ele pedia E como vou viver. Sem um carango pr correr Meu Cadillac, bi-bi Quero consertar meu Cadillac [...] (O Cadillac, Roberto Carlos e Erasmo) Entrei na Rua Augusta a 120 por hora Botei a turma toda do passeio pra fora Fiz curvas em duas rodas em usar a buzina Parei a 4 dedos na vitrina [...] Meu carro no tem breque, no tem luz, no tem buzina So 3 carburadores todos os 3 envenenados S para na subida quando acaba a gasolina S passa se tiver sinal fechado [...] (Rua Augusta, Herv Cordovil]

O cinema e a televiso sero os maiores agentes responsveis pela disseminao da cultura norte-americana, destacando a felicidade diretamente relacionada ao poder ter, o que vai aumentar o consumo e a produo industrial para um escala nunca antes vista. Este mundo material instaurado que traz como exemplo de desenvolvimento e progresso os EUA, marcado por desigualdades e

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injustias sociais. Quanto aos problemas desse modelo de desenvolvimento, Pereira (2005) aponta a seguinte questo:A construo de todo um imaginrio crdulo nas tecnologias, no importado, no estrangeiro, levou a no se perceber to nitidamente as duas pontas da questo: que de um lado, existem os inmeros problemas desse desenvolvimento da modernidade, e do outro lado, os benefcios a chegar pela modernidade, que so de fato, a iluso da eterna benesse por vir (PEREIRA, 2005).

As figuras abaixo podem ilustrar bem este fato, onde possvel observar o ator James Dean com o seu Porshe conversvel numa pose retratando poder e, na outra, tem-se a apresentao de eletrodomsticos como produtos que podem trazer praticidade a vida da mulher moderna.

Figura 01. James Dean (White Car) Fonte: http://www.picturestore.com.au/product.aspx?productID=241378

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Figura 02:Propaganda de eletrodomsticos, dcada de 1950.EUA. Fonte: http://www.fotolog.com.br/jasmina/38191481

O quadro produtivo que varia entre as dcadas de 1950 e 1960, ficou conhecido como os Anos Dourados da indstria do petrleo. Todavia, este perodo de abundncia da produo ser impactado pela primeira crise do petrleo, em 1973, quando h um grande aumento do preo desta matria-prima no mercado internacional e o mundo se v ameaado perante a dependncia de tal fonte energtica. Outro choque que deve ser levantado, foi a segunda crise de 1979/80, o que vem reforar questes quanto a fragilidade de um modelo de produo que se acreditava ilimitado. Mais ainda, so perodos que trazem tona discusses relativas a este modelo e ao meio ambiente, que j se encontra em um acelerado ritmo no s da produo, mas tambm de elevadas taxas de poluio e degradao ambiental. neste contexto, sobretudo, que diversas formas alternativas ao uso da energia derivada de combustveis fsseis vo sendo buscadas em todo o mundo.O

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que na verdade vem representar ao mesmo tempo um grande avano tecnolgico, mas por outro lado tambm representa algo que no uma grande novidade. Ao final da dcada de 1990 e incio dos anos 2000, v-se um aumento, por exemplo, do uso da energia solar e elica, o que em verdade, j era sabido por nossos mais remotos ancestrais. Dessa forma, dentro de uma lgica de mercado, quando se percebe a fragilidade de um sistema dependente de uma nica fonte energtica para sua atividade produtiva, caminha-se para buscar novas fontes de energia, bem como realizar um uso mais econmico do petrleo.A promoo de um uso mais racional da energia hoje a opo mais segura disponvel, diante das incertezas a curto prazo e das tendncias a longo prazo dos preos da energia, alm de minimizar os impactos ambientais do sistema energtico. (LA ROVRE,2002, p.11)

Nesta busca por fontes alternativas de energia que possam representar no apenas uma alternativa aos combustveis fsseis, mas tambm por se tratar de uma energia limpa, tem-se o caso dos biocombustveis. Segundo o Ministrio do Meio Ambiente e Lei n 9478/1997, entende-se por biocombustvel:[...] qualquer combustvel originado de espcies vegetais - isto , que tem origem biolgica, desde que no tenha passado por processo de fossilizao. De acordo com a definio tcnica da Lei n 9.478, de 6 de agosto de 1997, biocombustvel todo combustvel derivado de biomassa renovvel para uso em motores a combusto interna; ou, conforme regulamento, para outro tipo de gerao de energia, que possa substituir parcial ou totalmente combustveis de origem fssil. (http://www.mma.gov.br/sitio/index.php?ido=conteudo.monta&idEstrutura= 164&idConteudo=7448&idMenu=7537)

O presente estudo vem discutir mais especificamente o etanol brasileiro, provindo da cana de acar e carro-chefe de discusses envolvendo diferentes setores da sociedade, tanto em mbito nacional como tambm internacional.

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4 PRODUO DE CANA-DE-ACAR NO BRASIL: BREVE SNTESE HISTRICA

A cana-de-acar matria-prima de destaque na economia brasileira desde o sculo XVI. Este captulo pretende elucidar, atravs desses longos anos de explorao da terra para a prtica da lavoura canavieira, questes importantes e merecedoras de reflexo, perpassando por uma contextualizao histrica assim como pelos custos sociais e ecolgicos. Nos ltimos anos, no entanto, o governo brasileiro, sem abandonar o modelo vigente, vem tentando transformar a economia canavieira em um marco de desenvolvimento mais limpo, chamado de sustentvel.

4.1 DO BRASIL COLONIAL AO BRASIL AMBIENTAL

A cana-de-acar a mais antiga cultura agrcola de base comercial internacional da Histria brasileira, quando desde o sculo XVI, dada a diviso do territrio nacional em Capitanias Hereditrias, assume a mo de obra escrava e base fundiria o latifndio monocultor concentrador de terras e de renda. Merece destaque quelas que prosperaram: Capitania de So Vicente (So Paulo) e a Capitania de Pernambuco, onde focaram no cultivo da cana-de-acar. Neste perodo, em funo do clima tropical propcio e ao solo frtil de Massap, o cultivo da cana ganhou fora no litoral da Regio Nordeste brasileira, como nos Estados de Pernambuco e Bahia, como retrata Manuel Correia de Andrade (2004):Passados os primeiros anos de mera explorao florestal, iniciaram os portugueses a colonizao e ocupao do territrio por migrantes, desenvolvendo a cultura da cana de acar; inicialmente ela foi cultivada em todas as capitanias, s depois que se foi concentrando em Pernambuco e na Bahia. (ANDRADE, 2004, p.44)

Mas no sculo XVII que se tem o auge da produo da cana, quando se torna uma das principais fontes de riquezas e de desenvolvimento do Brasil Colnia, sobretudo devido ao advento do engenho, o que transformou a matria-prima (cana) em acar, e assim inseriu a produo canavieira em um sistema agroindustrial de exportao aos mercados europeus. A sua cultura demandava um grande emprego

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de mo de obra e um expressivo emprego de capitais, para a implantao dos chamados engenhos, verdadeira plantation tropical. (ANDRADE, 2004, p.44) Iniciado o ciclo da minerao do ouro do sculo XVIII, a produo da cana entra em decadncia, que segue at aproximadamente a segunda metade do sculo XX, com a retomada da produo atravs da poltica do Programa Nacional do lcool (PROLCOOL). Oberling (2008) apresenta o PROLCOOL em quatro etapas sendo elas: a primeira entre 1975 e 1979 caracterizada pelos dois choques do petrleo; a segunda, entre 1980 e 1990, com o pice do programa; a terceira entre 1991 e 2003, com o declnio e estagnao do programa e posterior desregulamentao do setor; e a quarta fase, podendo ser considerada como um PROLCOOL II, com intervenes governamentais pequenas, o surgimento de novas tecnologias, o crescimento da preocupao ambiental por causa da intensificao do efeito estufa e uma consistente alta do petrleo, chegando a patamares superiores aos valores do segundo choque do petrleo. Este trabalho concentrado nesta quarta fase, aps 2003, em que se v, como estratgia econmica, a retomada do setor sucroalcoleiro atravs do uso de fonte alternativa matriz energtica vigente, bem como para atender s demandas ambientais discutidas em mbito global.

Figura 03: Fases do setor sucroalcoleiro no Brasil. Fonte: MAPA 2008.

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4.2 A CANA DE ACAR DO SCULO XXI

O Brasil pioneiro no uso do etanol como combustvel veicular12. neste contexto (a partir de 1975) que a produo agrcola da cana-de-acar para este objetivo se faz expressiva, com o PROALCOOL, quando 220 mil hectares de terra eram produzidos ao ano para este fim. Mas foi em 2003, atravs de polticas a fim de atender uma concepo para o desenvolvimento sustentvel, enfatizado pela ECO-92, bem como para as exigncias quanto a reduo da poluio ambiental atravs da reduo de emisses de CO2 na atmosfera (Protocolo de Quioto), em conjunto com o aumento do preo do petrleo (que foi um forte impulsionador do etanol recentemente) que vem ocorrer a introduo dos automveis flex-fuel13, quando. as reas cultivadas foram aumentadas consideravelmente, ocupando uma taxa de 553 mil hectares por ano (Silva e Magrini, 2008) Pode-se observar na figura abaixo que o setor responsvel pela maior participao nas emisses de CO2 na atmosfera, o setor de transporte rodovirio individual, o que vem justificar os argumentos colocados para o incentivo da produo de automveis movidos lcool.1,5% 8,3% 11,9% Acesso em: 29 jan.2010.