stephan kantz

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Nossa bandeira deveria conter a frase invertida: “Progresso e Ordem”, no sentido Progresso e depois Ordem. Um dos modismos em administração de empresas na década de 80 foi a criação da “missão da empresa” e das “cartas de princípios”, que você encontra incrustadas nas paredes da maioria das salas de recepção das grandes empresas. Algumas têm cinco pontos básicos, outras chegam a ter doze. A “missão” mais antiga que eu conheço tem 1000 anos e pertence a uma entidade beneficente, a Ordem dos Cavaleiros da Cruz de Malta, “obsequium pauperum”, servir aos pobres, uma missão que se mantém até hoje. O Brasil é um dos poucos países do mundo que possuem uma “carta de princípios”, nisto somos administrativamente inovadores. Nossa carta de princípios reza “Ordem e Progresso”, nesta ordem, o lema positivista de Auguste Comte gravado em nossa bandeira. Ordem é a precondição para todo progresso “. “Ordem por base, progresso por fim” , diz Comte em seu “Cours de Philosophie Positive”. Boa parte das políticas econômicas de Getúlio Vargas, fã de Auguste Compte, dos Governos Militares, de Fernando Henrique Cardoso e Pedro Malan, seguiram o lema positivista de manter a casa em ordem, sem inflação, por exemplo, como precondição para o progresso.

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Page 1: Stephan Kantz

Nossa bandeira deveria conter a frase invertida: “Progresso e Ordem”, no sentido Progresso e depois

Ordem.

Um dos modismos em administração de empresas na década de 80 foi a

criação da “missão da empresa” e das “cartas de princípios”, que você

encontra incrustadas nas paredes da maioria das salas de recepção das

grandes empresas.

Algumas têm cinco pontos básicos, outras chegam a ter doze.

A “missão” mais antiga que eu conheço tem 1000 anos e pertence a uma

entidade beneficente, a Ordem dos Cavaleiros da Cruz de Malta, “obsequium

pauperum”, servir aos pobres, uma missão que se mantém até hoje.

O Brasil é um dos poucos países do mundo que possuem uma “carta de

princípios”, nisto somos administrativamente inovadores. 

Nossa carta de princípios reza “Ordem e Progresso”, nesta ordem, o lema

positivista de Auguste Comte gravado em nossa bandeira.

“Ordem é a precondição para todo progresso“. “Ordem por base, progresso por

fim”, diz Comte em seu “Cours de Philosophie Positive”.

Boa parte das políticas econômicas de Getúlio Vargas, fã de Auguste Compte,

dos Governos Militares, de Fernando Henrique Cardoso e Pedro Malan, seguiram

o lema positivista de manter a casa em ordem, sem inflação, por exemplo,

como precondição para o progresso.

Page 2: Stephan Kantz

Temos uma Constituição de mais de 300 parágrafos que põe “ordem” em tudo,

ou em quase tudo.

Para abrir uma empresa no Brasil são necessárias dezenas de autorizações

prévias para podermos começar tudo em “ordem”.

Nosso lema deixa bem claro que “ordem” vem em primeiro lugar, sem “ordem”

não há progresso.

Ricardo Semler, um dos primeiros a escrever um livro de administração no

Brasil que se tornou best-seller popular, Virando a Própria Mesa, mostra uma

interessante inconsistência.

“Ordem e progresso são incompatíveis”, argumenta Semler.

Progresso, por definição é desordem.

Criatividade é bagunça e confusão.

Basta observar a mesa de um cientista, injustamente chamado de louco por

suas atitudes desordeiras.

“Ou se escolhe ordem ou se escolhe progresso”, diz Semler.

Eu tenho uma terceira interpretação, que segue a linha de Semler mas é um

pouco diferente.

Nossa bandeira deveria conter a frase invertida: “Progresso e Ordem”, no

sentido Progresso e depois Ordem.

Depois da bagunça da criação, é necessário ter uma fase mais calma de

consolidação.

Todos os cientistas sabem disso.

Page 3: Stephan Kantz

De tempos em tempos, até eles criam vergonha e arrumam o laboratório.

Progresso primeiro, ordem depois faz mais sentido do ponto de vista

operacional.

Quem coloca a sociedade em ordem não são os intelectuais, como nos querem

fazer acreditar, mas sim advogados, contadores jornalistas, historiadores,

professores.

São eles que ajudam a consolidar os “progressos” feitos pelos

cientistas,empreendedores, criadores e revolucionários, sedimentando-os em

leis e lições para que o restante da sociedade possa imitá-los.

Até os progressistas mais revolucionários precisam, periodicamente, de um

governo mais conservador, para que as mudanças se tornem consagradas,

sedimentadas e difundidas.

Quem gera o progresso sem dúvida são os criadores, os inovadores, as

pequenas empresas e os pequenos empresários, os artistas que quebram

paradigmas, os que destroem a “ordem” e a visão reinante, os que se arriscam

e mostram o exemplo.

A desordem dessa fase precisa de uma pausa para respirar e de membros da

sociedade preocupados em consolidar as conquistas geradas.

Nosso erro fundamental, portanto, foi inverter o processo.

A ordem sucede ao progresso.

Não o antecede, como reza nossa bandeira.

Originalmente Publicado na Revista Veja abril de 2002, página 20. Nada

mudou. 

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Page 4: Stephan Kantz

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